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A vida de Jiu não começou no dia de seu nascimento.

No entanto, para todos que não a


conhecia de verdade isto era uma verdade absoluta. Para Jiu, sua vida começou ao
completar oito anos e recebeu muitas notícias e presentes, coisas boas e ruins, mas que
sempre a fazem rever melhor suas perspectivas e saber o que pode ou não fazer (uma lista
bem longa) e em quem deve confiar ou fazer amizades (lista contendo apenas sua família e
Chris).

Continuando, sua vida começou aos oito anos, mas para entender melhor sua história é
necessário que algumas outras coisas sejam explanadas antes, ela prefere optar por uma
verdadeira história bonitinha e um pouco clichê demais.

Aos doze anos ela estava naquela fase depressiva, rabugenta, um estilo (desculpe a
palavra) meio foda-se, e realmente estava vestindo a roupa adolescente em crise. Seus pais
então resolveram fazer uma festa surpresa, não entendendo que ela possuía o timing social
necessário para estabelecer amizades, acabaram convidando os amigos da escola de Jiu
principalmente porque se negavam a acreditar que sua filha não tivesse amigos.

Mesmo com convites enviados a um grande número de pessoas, não foram muitas as que
apareceram e, uma delas, sendo a própria aniversariante.

Logo que chegou em casa e eles gritaram aquele clássico bordão de festas: "surpresaaa"
com a última letra cantada ela não pensou duas vezes e pulou para fora de casa apenas
fechando a porta e indo para o único lugar onde sabia que não haveria ninguém.

No parque da cidade interiorana que ela morava raramente apareciam crianças por lá.
Afinal, quem iria querer andar em um balanço que só rangia, um escorrega impossível de
subir por não possuir mais a escada e um carrossel antigo demais que já estava sem os
cavalos, era decadente, mas ela gostava daquele lugar, pois se sentia confortável porque
nada ali era perfeito.

Bem, dessa vez diferiu, ela chegou ao parque para descobrir que o lugar normalmente não
habitado por outros seres humanos além dela, agora estava sendo habitado por um garoto
magricela, de cabelos escuros, lisos e uma pele mais pálida que a da própria garota.

O garotinho estava de costas quando a encarou mostrou os mais belos olhos azuis que a
garota já viu. A garota se sentindo acuada, tentou intimidá-lo (uma tentativa miseravelmente
falha) afinal uma adolescente com doze anos, um metro e quarenta e seis de altura nunca
iria intimidar um menino de quinze anos e com um metro e setenta e dois. Mas, mesmo
assim, ela tentei, considerava aquele lugar seu e ele não poderia estar ali.

— FLASHBACK MOMENT ON —

Pov Jiu

— O que você está fazendo aqui? — perguntei -


C: Ahn...oi? — ele respondeu parecendo confuso
— Oi...O que está fazendo aqui? — repeti
C: Estou sentado ué — ele disse dando de ombros e me fazendo revirar os olhos
— Estou vendo, vai embora! — quase gritei
C: Porquê? — novamente ele parecia confuso
— Você não faz as perguntas, eu faço, agora v-a-i e-m-b-o-r-a — disse lentamente
soletrando as últimas duas palavras para enfatizar
C: Mas, porquê? — confuso pela terceira vez
— Porque eu luto jiu-jitsu e se você não sair do meu parque agora eu vou te bater — menti
descaradamente
C: Seu parque, quanto custou? — ele perguntou com um sorriso de deboche
— Não banque o engraçadinho, agora anda, vai embora — sacudi as mãos no ar ficando
impaciente
C: Não — ele disse com um sorriso de quem está se divertindo
— Estou te avisando — travei meu maxilar antes de falar e as palavras saíram meio
estranhas
C: Já disse, não, pode tentar me bater.

— FLASHBACK MOMENT OFF —

E assim, começou uma amizade que já dura cerca de cinco anos, óbvio que ela não bateu
nele. Na verdade, o que aconteceu é que quando ele me mandou bater nele ela "amarelou"
porque, que garota de doze anos luta jiu-jitsu naquela cidade? E bem, ela um ano mais tarde
(aos treze) começou a aprender. O engraçado é que ele não foi embora, ele ficou e desde
então resolveu que não iria mais a deixar.

A amizade dele é algo muito mais forte do que uma simples amizade (mentes maliciosas
não devem maliciar isto) é quase como uma irmandade, protegem um ao outro sem intenção
de receberem algo em troca, riem um da cara do outro, brincam e pregam peças. Mas,
também sabem como agir com questões sérias, como quando ela contou para Chris o que
havia acontecido aos seus oito anos e ele de início travou por longos minutos, depois ele
negou, ficou com raiva e agora aceitou (talvez, não totalmente), mas, ela deu o tempo que
ele precisava para digerir, com ela foi a mesma coisa e melhorou depois que o conheceu
aquele dia no parque.

Por muito tempo, a garota supôs ser ele quem precisava dela por ter uma vida complicada,
pais divorciados, brigas o tempo todo, ele tinha que passar uma semana na casa de um, e
uma semana na casa do outro. Ela nunca tentou imaginar como seria viver no meio daquele
fogo cruzado, pois teve sempre a certeza de que nunca iria ter de passar por nada parecido,
seus pais se amavam e se apaixonavam um pelo outro a cada novo dia.

Aos dez anos, ela dizia querer encontrar alguém exatamente como seu pai, mas foi
crescendo e percebi que não desejava ninguém como seu pai, e sim queria alguém que a
olhasse como ele olha para a mãe dela, que sorrisse como ele sorria feito um bobo quando
fala, ou faz qualquer coisa perto dela, alguém em quem confiar cegamente, alguém para se
entregar completamente de todas as formas já conhecidas pelos seres humanos e o mais
importante. Alguém que pudesse a amar. Mas, como nem tudo são flores, em uma noite seu
pai foi até ela para uma conversa.

— FLASHBACK MOMENT ON —
Pov Jiu

Robert: Você já olhou para o céu em uma noite bem estrelada não olhou Moon? Já viu todas
aquelas estrelas? — Era meu pai quem estava falando, ele conseguia controlar mais
suas emoções que a mamãe, alguns minutos depois eles me levaram até a varanda e
abriram as janelas.

— Sim, papai, estou vendo agora — Eram vários pontinhos brancos, brilhantes e de
tamanhos diferentes, era incrível poder olhar para todo aquele lugar escuro de
pontinhos brancos, era bom olhar para algo que eu não conhecia antes, era como se
tivesse mais valor.

R: Sabe porque demos a você o apelido de Moon. Não sabe? Todos cobiçam as estrelas,
nós temos nossa Lua particular, você meu amor. — Eu sorria para ele doce quando de
repente ele assumiu um olhar sério. — Moon, você vê aquela estrela mais brilhante nos
céus, aquela, a partir de hoje é a estrela da vovó Cheng. — Eu engulo em seco o olhando
e ele continua — não demorará muito também para irmos embora de volta para casa
querida. Receio que precisaremos voltar para Bordeaux, minha cidade natal.

— O que aconteceu com a vovó? Porque papai? Porque devemos ir? Porque não podemos
ficar? — Olhava ele triste sem entender bem o que estava acontecendo. Eu amava
vovó Cheng, e sabia que ela estava muito doente, mas eu não conseguia ver um
motivo para não vê-la mais.

R: Porque é o necessário para se fazer, meu anjo. Nós devemos ir, e fazer o possível para
continuarmos bem. — Suspiro pesado e concordo com ele.

— FLASHBACK MOMENT OFF —

Aos dez anos, a garota não entendia as palavras de seu pai. Mas, conforme crescia, ela
conseguia sentir o peso de cada palavra que ouviu naquela noite. A perda de sua avó virou
um empecilho em seu peito que a impediu de deixar que as pessoas se aproximassem dela
o suficiente para fazê-la se importar.

Depois daquele dia, o assunto de ir embora era como se fosse um "grande elefante branco
na sala" e por mais que ela se recusasse a aceitar, sabia que o terrível dia chegaria. No
início do ano em que faria 14 anos, e 2 sendo amiga de Chris, foi quando seus pais
decidiram ser hora de partir. A garota precisava dar adeus a Chris, que a essa altura
passava boa parte de seus dias frequentando a casa da garota.

Mas, ela não conseguiu, pediu a seus pais para que não falassem sobre o assunto na frente
dele e, em troca, iria com eles como sempre havia sido o Plano. Ela só não queria ter que
dar adeus, Chris era importante demais.

No dia marcado para partir, a garota arrumou suas coisas e ajudou seus pais a
encaixotarem seus pertences para enfim levá-los ao caminhão da mudança. Nesse dia, a
rua em que morava estava agitada e ela queria apenas acabar logo com o problema.
Quando a última caixa foi colocada, o caminhão partiu, e seus pais estavam arrumando o
carro para partirem. Mas, ao olhar para o fim da rua, pôde ver Chris vindo, a plenos
pulmões, para encontrá-la. O garoto gritava por ela que o olhou por alguns segundos até
sentir o nó na garganta e entrar no carro.

Seus pais a olharam e vendo como ela estava quase chorando resolveram que esta seria a
hora ideal de partir, saíram com o carro e a visão que ela tinha era do garoto moreno, alto de
olhos azuis correndo na rua de sua casa.

Quando ele finalmente pareceu cansar, sentiu seu celular vibrar em seu bolso e uma
mensagem de Chris brilhou em sua tela.

Eu vou te ver de novo, é uma promessa.


Chris

— THREE YEARS LATER —

Pov Jiu

O relógio digital do celular marcava oito e cinquenta da manhã quando eu abri a porta de
casa. Todas as luzes estavam desligadas. O silêncio predominava a não ser pelo som dos
eletrodomésticos em funcionamento. Eu tirei os saltos bem na porta e passei a fazer meu
caminho descalça, procurando fazer o mínimo de barulho. Passei pelo hall de entrada, pela
sala e segui pelas escadas para o segundo andar, dando de cara com um corredor amplo.

Meus passos foram diretamente ao meu quarto. Eu empurrei a porta entreaberta e a fechei
atrás de mim. Ouvia a respiração tranquila de Lucca (meu cachorro) e Potemki (minha gata),
ambos deitados aos pés da cama enquanto caminhava até a cômoda. Lá, deixei minha
bolsa e dirigi-me ao banheiro.

Entrei pela sua porta quando ouvi algo. Levei alguns segundos até me conscientizar de que
era a voz de Elizabeth, minha irmã caçula. Eu ouvi a porta ranger e, rapidamente arranquei
meu vestido sujo do meu corpo, enrolando-me num robe de seda escura que havia puxado
às cegas do suporte na parede.

Quando saí pela porta do meu quarto, pude vê-la no meio do corredor escuro, com as mãos
escondendo seu rosto. Eu caminhei de encontro à menina que chorava um choro abafado e
abaixei-me à sua frente, chamando seu nome em sussurros. Levei minhas mãos aos seus
braços, tirando as suas pequeninas de seu rosto.

— DIALOGUE MOMENT ON —

"Tive um pesadelo…", disse entre o pranto e eu franzi o cenho, levando minhas mãos
ao seu rosto, trazendo seu olhar ao meu. Parecia ainda não estar consciente o
suficiente.
"O que houve?", sussurrei em questão.

"O Max... Ele... Eu...Eu tive um pesadelo muito ruim", abaixou o olhar, fechando os olhos
e eu respirei fundo, erguendo meu corpo com o seu. Elizabeth agarrou-se em minha
nuca e afundou seu rosto pela curvatura do meu pescoço. Eu chiava, procurando
calá-la, enquanto minha mão direita percorria suas pequenas costas.

"Não é real, tudo bem? Seu irmão está dormindo, eu posso ouvi-lo respirar", eu disse ao
chegar à beira da escada. E, então, eu desci os degraus tranquilamente. Eu percebia
que ela fungava e respirava distorcidamente enquanto fazia meu caminho até a
cozinha. Acendi as luzes e sentei a menina na bancada. Eu já sabia o que fazer; não
era a primeira vez que eu chegava em casa a tempo de pegá-la acordando por conta
de um pesadelo.

A menina tinha os cabelos desgrenhados e o rosto suado. Ela passou, de um modo


desajeitado, as mãos em seu rosto, afastando alguns fios de seu campo de visão e tentou
respirar fundo. Começou a balançar as pernas enquanto se mantinha de braços cruzados.

Lembro-me de tê-la visto reclamar de um monstro grande e marrom, de uma fada do mal, de
um tubarão com dentes de vampiro ou até mesmo de bonecas assustadoras, mas nunca
nada sobre sangue ou mortes.

"O que... exatamente aconteceu enquanto estava dormindo?", perguntei e dei as costas,
abrindo os armários à procura do achocolatado em pó.

Elizabeth respirou fundo e soltou um suspiro distorcido.

"Era um quarto sujo. As luzes estavam acesas e logo estava tudo escuro e eu ouvi barulhos
de correntes também. Eu chamava você, chamava pelo papai e chamava pelo Max porque
eu estava com muito medo, aí…", a ouvi engolir a seco. Àquela altura, eu já segurava o
pote de metal com mais firmeza que o normal, enquanto tirava algumas colheres de
chocolate em pó para a panela.

"As luzes começaram a piscar e eu ouvi muitos, muitos, muitos gritos…", tornou a chorar e
eu chiei mais uma vez, enquanto puxava a garrafa de leite para perto, derramando o
líquido com o pó escuro.

"Não se perca", pedi e Elizabeth voltou a respirar fundo, murmurando um simples


"Tudo bem".

"Eu vi o Max machucado, ele estava todo cheio de sangue. E, de repente, meu vestido
também estava sujo, e eu acordei", a mais nova terminava quando eu liguei o fogo e
virei-me para a mesma.

Eu nunca costumava ignorar coisas como essa. E já sabia o que significava. Foi a minha vez
de respirar fundo. Seus olhos estavam vermelhos e suas lágrimas escorriam freneticamente,
apesar da morena não chorar mais. Eu levei meus polegares às suas bochechas, secando
seu rosto.
"Você ainda está com medo?", perguntei, logo, observando-a balançar a cabeça
negativamente em movimentos rápidos e contínuos. Mantinha seus olhos bem
abertos e atentos. Eu apoiei minha mão direita na bancada, inclinando levemente meu
corpo para frente, assim, aproximando nossos corpos, enquanto levava minha direita
para brincar sutilmente com seus fios de cabelo. Eu a adorava.

"Ouça bem... O medo é necessário para sermos cuidadosos. Se não sentíssemos medo,
seríamos expostos ao perigo com muita frequência. Mas o medo nos deixa fracos e
incapazes de pensarmos e agirmos de forma consciente. O medo pode nos ajudar, mas o
excesso dele pode nos machucar e…", mordi meu lábio inferior quando fui interrompida.

"O que é necessário?" — questionou e eu puxei o ar pelos meus lábios entreabertos.

"Necessário é tudo aquilo que precisamos. Você precisa dormir para não ficar cansada.
Logo, dormir é necessário" — respondi pacientemente.

"E incapazes?" — franziu o cenho para mim. Eu ergui uma de minhas sobrancelhas.

"Todo incapaz é aquele quem não consegue fazer algo. Que não consegue fazer algo",
respondi.

"Igual eu que não consigo andar de bicicleta? Então eu sou incapaz de andar de bicicleta?",
a ouvi questionar com as sobrancelhas erguidas e acabei por deixar escapar um
sorriso um tanto quanto bobo pela forma de como diz palavras difíceis que não lhe
são usuais.

"Sim, é mais ou menos isso. Outro dia eu explico melhor para você", eu disse e notei ela
corresponder meu sorriso com um sorriso bem maior. Fui pedida para continuar,
então pigarreei. "Por ora, era o bastante; eu só ia pedir para você nunca deixar o medo
vencer você. Porque eu sei que você é capaz", meu sorriso desfez-se.

"Eu consigo", ela repetiu e eu assenti, depositando um beijo demorado no topo de sua
testa úmida. Minha mão esquerda acariciava seus fios e meus olhos estavam bem
abertos e fixos na janela enquanto minha mente perturbava-me com a possibilidade
de novos jogos e torturas.

Logo o chocolate estava quente e Lizzie não demorou mais que três minutos para beber
toda a caneca. Eu a ajudava a descer da bancada, quando fui surpreendida:

"Mamãe, porque tem cartões de Boas-vindas por todo o canto?", questionei franzindo o
cenho e eu tranquei meu maxilar, pigarreando.

"Eu, nós, vamos ter visitas hoje", respondeu simplesmente e apagou as luzes da
cozinha. A menina estava na frente e eu acompanhei seus passos hesitantes. Ao
chegar ao segundo andar, perguntou se podia dar boa noite para Maximillian já que
não o tinha feito mais cedo. Eu abri cautelosamente a porta do quarto do mais novo e
esperei na porta.
A ouvi dizer que o amava, embora fosse um garoto chato que a tratava friamente às vezes.
Eu abaixei o olhar, mordendo meu lábio para segurar a risada. Provavelmente deixara um
beijo em sua testa ou em seu rosto antes de sair do quarto.

"Você precisa dormir agora. Mais tarde tem que ir à nova escola", tornei a caminhar pelo
corredor junto à mais nova que logo suspirou. Entrou em seu quarto e eu acendi a luz,
esperando-a subir na cama. Meu corpo estava encostado no batente enquanto minha
mão ameaçava desligar o interruptor. Elizabeth sentou-se agarrando a pelúcia e
ergueu o olhar para mim.

"Bom dia", disse.

"Bom dia", respondi antes de desligar as luzes e sair, fechando a porta atrás do meu
corpo.

— DIALOGUE MOMENT OFF —

Depois do banho de quase quarenta minutos, vesti uma das roupas simples e uma calças
branca e prendi meu cabelo num coque. Antes de sair do banheiro, encarei meu reflexo e
respirei fundo. Estava cansada, tanto fisicamente quanto psicologicamente. Desliguei as
luzes e fechei a porta atrás de mim, caminhando até a cama. Franzi o cenho ao notar o
pequeno corpo por debaixo das cobertas, muito bem aconchegada debaixo da coberta.

Eu soltei um pequeno suspiro e rolei sutilmente meus olhos, antes de subir na cama.

"Tudo bem, eu não queria estar no seu lugar, de qualquer forma", disse após bufar,
ajeitando-me nas cobertas, de forma que eu pudesse encarar o teto. Conformei-me com a
vista monótona acima de mim; sabia que não entenderia o que minha mãe pretendia tão
cedo.

Anos se passaram após aquela fatídica conversa com meus pais. Eu estava preparada
desde então. Mas, todos sabem que por mais preparação que tenhamos, nunca estamos
realmente prontos para nada. A carta de matrícula chegou quando eu menos esperava,
enquanto almoçava tranquilamente com minha família. Os olhos de minha mãe brilharam ao
abrir a carta e perceber que eu, realmente, fui selecionada para ir à faculdade que ela havia
frequentado na infância.

Ao levantar mais tarde vejo que minha mãe estava novamente aprontando. Ela havia
preparado uma festa para "comemorar", reviro os olhos ao notar minha casa cheia. Passei o
dia sendo cordial e ouvindo votos de boa sorte e todo aquele clichê que todo mundo
desejava.

Minha tia chega pela manhã do dia seguinte em minha casa para me levar até a
universidade onde passaria bons anos. Estava pronta e já havia me despedido de todos,
demorando mais com meu pai e Elizabeth. Ela me leva então para a estação e parti rumo à
nova vida que me esperava. A viagem dura em torno de 4 a 7 horas e era meio longe, mas
finalmente cheguei.
Assim que cruzei os portões, vi uma moça loira, esguia com um sorriso doce que dizia se
chamar Alice, ela disse que ela iria me ajudar a me adaptar aos padrões, normas e condutas
praticadas na universidade. Isso durou algum tempo e em seguida ela disse que eu
precisaria me deixar para eu poder desfazer a mala.

— FOUR YEARS LATER —

FLASHBACK ON

Hoje faz exatamente 4 ano que ela se foi. Não pense que ela foi, de fato, embora porque ele
não foi, e pelo menos para mim, ela ainda habitava em algum lugar dentro do meu peito.
Minha família havia diminuído (pelo menos para mim) quando recebi a notícia de que minha
mãe havia falecido de um “mal súbito” sendo que em um dia estava bem, passeando com
Lizzie e quando a encontraram no outro dia já não tinha mais vida.

Lizzie sempre insistiu na história de que minha mãe havia sido morta pelo ‘monstro da casa’
que a atormentava e não a deixava dormir. Eu, por outro lado, nunca acreditei muito nisso
até o dia em que vi minha pequena Lizzie ser arremessada para a pista movimentada de
carros, mas ao olhar ao redor não encontrei ninguém ali a não ser eu e Chris.

Sentia meu corpo pesado e sem conseguir reagir para salvá-la, e pude vê-la chorar
enquanto apontava para algo assustador que até esse dia não vi em minha frente. Chris
correu, ele a tirou da pista a tempo apenas para lançá-la para a calçada e ser atingindo por
um carro.

Inclusive, esse acidente lhe rendeu um braço quebrado, uma perna engessada e um par de
costelas machucados. Esse dia, foi o mais aterrorizante que um dia imaginei passar, ao
perguntar a Chris se ele havia visto algo no dia e a resposta negativa dele me fez ter certeza
de que minha irmã não havia inventado nada do que dizia.

Chris teve que partir depois de se recuperar dos ferimentos recebidos após salvar minha
irmã Lizzie e já não o via desde o dia em questão. Explicando melhor, ele havia se alistado e
decidido seguir esse tipo de carreira militar enquanto isso eu estava apenas de visita a
minha casa, pois, desde que havia entrado na UCLA só os via nas férias de verão. Não
importa o que as pessoas dizem, ele nunca sairia de dentro de meus devaneios e eu
cumpriria a minha promessa de mantê-lo sempre junto a mim.

FLASHBACK OFF

Os raios de sol que passavam despercebidos pelo vidro da porta de correr, refletiram em
meu rosto sem dó, me fazendo apertar os olhos com força antes de abri-los minimamente, e
desviando o rosto para o lado, de modo a evitar a claridade que veio para atrapalhar meu
sono. Fiquei algum tempo olhando para o nada antes de pegar meu celular em baixo do
travesseiro para ver as horas. Não dera, ainda, o horário para o despertador soar. Acabei
acordando antes do normal. Desativei o alarme, pondo o aparelho de lado, e me levantei,
sentando na cama.
Conforme minha mente ia acordando, lembranças do que eu deveria fazer retornavam do
meu subconsciente. Fui para o banheiro fazer o que devia, depois voltei para o quarto. Vesti
meu uniforme, e abri a geladeira pegando uma caixa de leite. Coloquei o canudo e tomei
devagar, enquanto ainda tentava recusar os pensamentos de voltar para a cama e fingir uma
doença qualquer.

Joguei a caixinha no lixo, peguei meu celular e sai do dormitório. De lá, fui até o lugar onde
um dos garotos da minha turma pediu que nós nos encontrássemos. Para minha grande
sorte, acabei chegando primeiro que todos, então fiquei fitando o lugar à minha volta.

Era perto da cidade. Uma ponte afastada. Dava para ver o movimento dos carros lá em
baixo. Algumas pessoas passavam por mim de a pé, outras de bicicleta. Cheguei até ver
garotos andando de skate ali. O sol ia aumentando cada vez mais. E a sombra diminuía,
assim como o ar fresco, que era tomado lentamente pelo calor que a grande estrela
emanava lá de cima. Me virei de costas para a bola de fogo e me apoiei com as mãos para
trás, agarrando o corrimão.

De longe pude ver a figura de Alice se aproximando lentamente, enquanto tapava a boca
para impedir as pessoas de vê-la bocejando. Dei um grande sorriso para mim mesma, já
que não ficaria mais sozinho olhando para o nada.

— Bom dia... — cumprimentou meio sonolenta, se escorando no corrimão com os


braços cansadas. Me assustei um pouco ao ver as olheiras fundas em seu rosto,
como se não dormisse a uma semana. — o quê?! — questionou meio irritada ao ver eu
encará-la por um tempo.

— Eh?... — apontei para a parte inferior dos olhos, tentando perguntar sem muita
ofensa o porquê das olheiras pretas em seu rosto. Talvez fosse maquiagem e eu não
sabia. Uma... Nova moda talvez? não sei, afinal eu não costumava me ligar muito
nisso.

— O quê? — não deve ter entendido o que eu quis dizer. Peguei meu celular e fiz seu
reflexo refletir em sua frente. Ela olhou confusa, mas deu um pequeno grito,
apalpando os bolsos do cinto em busca de algo. — MEU DEUS, QUE HORRORI! —
Tirou um pincel de maquiagem, e um pó de rosto, e com o reflexo do meu celular,
começou a passar o pó no rosto. Fiquei com cara de taxo pelo fato de servir de apoio
para um 'espelho”.

— Preciso estar bem, hoje quero te apresentar um amigo novo, ele está muito curioso em te
conhecer. — eu apenas revirei os olhos, já estava farta em explicar os motivos de eu
normalmente não me interessar pelos garotos da universidade. — Ei, esse é diferente,
tenho certeza! Ele não parecia interessado em sair com você apenas para dizer depois por
aí que conseguiu! — Ela disse e eu balancei a cabeça em negação. O que me restava
era esperar para saber quem seria a tal pessoa.

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