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APRESENTAÇÃO

Caríssimos irmãos em Cristo, Salve Maria Santíssima!

Nosso Senhor Jesus Cristo, antes de iniciar a sua vida pública, viveu um tempo
de Oração, Jejum e Penitência por 40 dias no deserto. Ele mesmo instituiu e nos
ensinou a abservância deste tempo, que chamamos de Quaresma, para estarmos
mais unidos à sua Paixão, morte, e por fim, celebrarmos jubilosos sua
Ressurreição.

Para nós é um tempo de conversão, propício para o recolhimento, oração,


meditação, penitências, exercício das obras de misericórdia, e especialmente,
para crescermos na Fé.

Este material foi elaborado para ajudar os fiéis católicos a viverem com
intensidade e profundidade todos os dias da Quaresma e Semana Santa. Aqui
você encontrará sugestões de penitências, orações, meditações de Santo Afonso
de Ligório para todos os dias, Meditação das Dores de Maria Santíssima,
Meditação das Palavras de Cristo na Cruz, Oficio das Trevas, Relógio da Paixão
do Senhor, Preparação para a Confissão, e muito mais.

Enfim, desejo que através das páginas a seguir, você tenha a oportunidade de
refletir sobre a própria vivência da Fé, e principalmente que se encontre com o
Cristo Vivo, nosso Salvador. Que a Virgem Mãe Imaculada, São José seu
esposo, intecedam por você nesta caminhada.

✠ Viva Cristo Rei

Pe. Frederico de Jesus Lopes


SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO
SUGESTÕES DE PENITÊNCIAS
ORAÇÕES PARA VIVER BEM A QUARESMA
LADAINHA QUARESMA
ORAÇÕES PARA ANTES E DEPOIS DAS MEDITAÇÕES
MEDITAÇÕES PARA A QUARESMA E SEMANA SANTA
VIA SACRA
MEDITAÇÃO DAS 7 DORES DE NOSSA SENHORA
MEDITAÇÃO DAS 7 PALAVRAS DE CRISTO NA CRUZ
OFÍCIO DAS TREVAS
RELÓGIO DA PAIXÃO DO SENHOR
PREPARAÇÃO PARA A CONFISSÃO
SUGESTÕES DE PENITÊNCIAS VIVER BEM PARA A QUARESMA

Neste tempo Quaresmal somos chamados a realizar penitências para a nossa


conversão pessoal, pela conversão dos pecadores, pelas almas do purgatório,
e outras intenções particulares. Segue algumas sugestões de penitências:

1. Penitências gastronômicas
Devemos fazer pelo menos uma penitência deste tipo, pois o jejum nos
coloca dentro de um padrão bíblico. Escolha uma dessas sugestões:

– Trocar a carne por peixe, ovos ou queijo (ou mesmo comer puro);
– Comer menos arroz, feijão, pão, macarrão, para sair da mesa com um pouco
de apetite;
– Eliminar todos os doces, refrigerantes, chocolates e demais guloseimas;
– Nas refeições, acrescentar algo que seja desagradável, como diminuir a
quantidade de sal ou colocar um condimento que quebre um pouco o sabor;
– Comer algum legume ou verdura que não se goste muito;
– Diminuir ou mesmo tirar as refeições intermediárias (como o lanche da
tarde);
– Tomar café sem açúcar, ou água numa temperatura menos agradável;
– Reservar algum dia para o jejum total ou parcial.

2. Penitências corporais
Apenas para ajudar a não perdermos o sentido do sacrifício ao longo do dia,
a não sermos relaxados, devendo ser pequenas e discretas. Seguem as
sugestões:

– Dormir sem travesseiro;


– Sentar-se apenas em cadeiras duras;
– Rezar alguma oração mais prolongada de joelhos;
– Não usar elevadores ou escadas rolantes;
– Trabalhar sem se encostar na cadeira;
– Cuidar da postura corporal;
– Descer um ponto antes do ônibus e fazer uma parte do caminho à pé;
– Deixar de usar o carro e pegar um transporte coletivo.
3. Penitências morais
São as mais importantes. Que tal escolher mais de uma?

– Não reclamar das contrariedades do dia, mas agradecer e louvar a Deus;


– Sorrir sempre, mesmo quando haja um nervoso;
– Moderar a frequência às redes sociais, celular e computador (reduzir a
poucas vezes ao dia);
– Desligar as notificações do celular;
– Fazer os serviços mais incômodos na casa e no trabalho, ajudando os
outros;
– Acordar mais cedo para fazer oração;
– Não ouvir música no carro;
– Não assistir TV, mas dedicar este tempo à leitura;
– Não usar jogos eletrônicos, caso seja viciado;
– Fazer algum trabalho voluntário;
– Rezar mais pelos outros, do que por si mesmo;
– Reservar dinheiro para dar esmolas, mas, sobretudo atenção aos mendigos;
– Não se defender quando alguém lhe acusa;
– Falar bem das pessoas que se gostaria de criticar;
– Ouvir as pessoas incômodas sem as interromper;
– Dormir no horário, mesmo sem vontade.

OBRAS DE MISERICÓRDIA CORPORAIS E ESPIRITUAIS

É um dever de todo Cristão Católico, por amor e a Jesus Cristo, se exercitar


na prática das Obras de Misericórdia. Lembrando sempre que, no irmão que
sofre, encontramo-nos com Nosso Senhor Jesus Cristo.

Obras Corporais:
1ª Dar de comer a quem tem fome;
2ª Dar de beber a quem tem sede;
3ª Vestir os nus;
4ª Dar pousada aos peregrinos;
5ª Assistir aos enfermos;
6ª Visitar os presos;
7ª Sepultar os mortos.
Obras Espirituais:
1ª Dar bons conselhos;
2ª Ensinar os ignorantes
3ª Corrigir os que erram;
4ª Consolar os tristes;
5ª Perdoar as injúrias;
6ª Sofrer com paciência as fraquezas do nosso próximo;
7ª Rogar a Deus por vivos e defuntos.

ORAÇÕES PARA VIVER BEM A QUARESMA

I
Senhor,
Nesta Quaresma, tempo de mergulhar no meu interior,
de revisão e de conversão, ensina-me a descer sempre mais
até onde Tu te encontras: o meu coração.
Como “descer” até aí?

Pelo silêncio, encontrando tempo para rezar,


pela leitura da Tua Palavra que tanto me quer dizer,
pelos Sacramentos, especialmente a Confissão e a Santa Missa.

Também pela aceitação das contrariedades,


o peso das circunstâncias e da monotonia da vida…
com os olhos postos em Ti.

Senhor, Tu que estás no meu íntimo,


ajuda-me nesta Quaresma a fazer uma viagem ao meu interior,
para aí me encontrar contigo!

Amém.
II

Senhor Jesus, Rei da Misericórdia, neste tempo quaresmal,


coloco-me aos pés de tua Sagrada Cruz e, humildemente, peço-vos a graça de
viver intensamente estes 40 dias de conversão.

Concedei-me a perseverança na vida de oração para que, estando unido ao teu


amor, minha vida seja reflexo de tua bondade.
Que minhas orações não sejam somente palavras,
mas se traduzam em gestos concretos de misericórdia.
Ajudai-me a viver o jejum como oportunidade
de unir-me a tantos irmãos e irmãs
que não tem o necessário para sua subsistência.

Que meu jejum seja uma oportunidade de estar mais disponível para acolher
tua presença salvadora em minha alma.

Fortalecei-me na prática da esmola.


Que minhas mãos sejam as tuas mãos a ajudar os que mais precisam.
Iluminai meu coração para reconhecer tua face sofredora naqueles que vivem
à margem da sociedade.
Que meus olhos não se desviem daqueles que eu encontrar
à beira do caminho, mas os acolha como a Ti mesmo.

Por tuas Santas Chagas, ajudai-me a atravessar os desertos espirituais, e que


Tua Palavra seja para mim uma bússola
a indicar o caminho da vida eterna.
LADAINHA QUARESMAL

Senhor, tende piedade de nós.


Cristo, tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.

Pai santo, ouvi-nos.


Pai justo, atendei-nos.

Deus Pai dos céus, tende piedade de nós.


Deus Filho, Redentor do mundo, tende piedade de nós.
Deus Espírito Santo, tende piedade de nós.
Santíssima Trindade, que sois um só Deus, tende piedade de nós.

Deus, que não quereis a morte do pecador, mas que se converta e


viva, tende piedade de nós.
Que destes a Lei no monte a Moisés, após quarenta dias de jejum,
Que, pelas preces de Moisés em jejum, perdoastes os pecados ao povo,
Que protegestes Daniel em jejum na cova dos leões,
Que perdoastes os ninivitas, que jejuaram e a vós clamaram,
Que livrastes da destruição da cidade os ninivitas, por fazerem penitência
cobertos de sacos, cinzas e cilícios,
Que perdoastes o pecado a Davi, que se confessou e mortificou no cilício,
Que atendestes e confortastes Judite coberta de cilício e prostrada nas
cinzas diante de vós,
Que salvastes Jonas, que a vós clamava, do ventre da baleia,
Que livrastes do exército do assírios a Ezequias, que, coberto de sacos,
cinzas e jejuns, junto com o povo vos invocava,
Que fizestes Ester em jejum encontrar graça aos olhos do rei,
Que libertastes do patíbulo a Mardoqueu, que em sacos e cinzas vos
invocava,
Que viestes em socorro dos macabeus, que jejuavam e, cobertos de sacos e
cinzas, vos invocavam,
Que vos manifestastes no Templo a Ana, perseverante em jejuns e orações,
Que revelastes muitos mistérios aos profetas, que jejuavam e se
mortificavam,
Que atendestes os sacerdotes que, em cilícios, rogavam pelo povo e
ofereciam sacrifícios,
Que por quarenta dias e quarenta noites jejuastes no deserto,
Que, por vossos Apóstolos, instituístes o jejum quaresmal,
Que iluminastes a Paulo, após três dias de jejum e oração,
Que perdoais os pecados aos homens pela penitência,
Que nos escolhestes e temperastes no caminho da humilhação,
Que dais lugar e tempo para o perdão dos pecados,
Que castigais todo filho que acolheis e amais,
Que não quereis que alguns pereçam, mas que todos se convertam e
arrependam,
Que alcançastes por vossa graça a Mateus, ainda sentado na coletoria,
Que fizestes sair justificado o publicano que batia na peito,
Que recebestes paternalmente o filho pródigo que a vós retornara,
Que fizestes manar uma fonte de água viva para a mulher samaritana,
Que acolhestes os publicanos e pecadores e com eles comestes,
Que a Maria Madalena, porque muito amara, muitos pecados perdoastes,
Que olhastes benignamente para Pedro, que três vezes vos negara,
Que recebestes no Paraíso o ladrão arrependido,
Que tirais a iniquidade, os crimes e os nossos pecados,
Que, para afastar a vossa ira, nos mandastes chorar, vestir-nos de cilícios e
cobrir-nos de cinzas,
Que vos apiedais de todos os que, em jejuns, choros e lágrimas, se
convertem a vós,
Que, após a penitência, não mais vos recordais de nenhum de nossos
pecados,
Deus misericordioso e pronto para nos perdoar nossas malícias, tende
piedade de nós.

Sede propício, perdoai-nos, Senhor.


Sede propício, ouvi-nos, Senhor.

De todo mal, livrai-nos, Senhor.


De todo pecado,
De todo perigo de mente e corpo,
De bebedeiras e intemperanças,
De toda impureza e torpeza,
De iras, rixas e discórdias,
De toda negligência e indolência,
De toda impenitência e dureza de coração,
De uma morte súbita e desprevenida,
Da condenação eterna,
Por vosso batismo e santo jejum,
Por vossas três tentações,
Por vossa sede e fome,
Por vossos trabalhos e dores,
Pela tríplice sentença de morte contra vós proferida,
Por vosso tremendo e cruento sacrifício na cruz,
No dia da ira e da calamidade, livrai-nos, Senhor.

Ainda que pecadores, nós vos rogamos, ouvi-nos.


Para que nos perdoeis,
Para que vos digneis conduzir-nos à verdadeira penitência,
Para que possamos produzir dignos frutos de penitência,
Para que mereçamos chorar dignamente os nossos pecados e alcançar a
vossa graça,
Para que vos digneis purificar por este sagrado jejum e livrar de toda
iniquidade a vossa Igreja,
Para que vos ofereçamos sempre os nossos corpos como hóstia viva, santa e
agradável,
Para que nos concedais entrar, pelas tribulações do tempo presente, na
glória futura,
Para que vos digneis atender-nos,
Filho de Deus, nós vos rogamos, ouvi-nos.

Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo, perdoai-nos, Senhor.


Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo, ouvi-nos, Senhor.
Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo, tende piedade de nós.

Jesus Cristo, ouvi-nos.


Jesus Cristo, atendei-nos.

Senhor, tende piedade de nós.


Cristo, tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.

Pai-nosso...

℣. Chorem os sacerdotes, servos do Senhor, entre o pórtico e o altar.


℟. Tende piedade, Senhor, tende piedade do vosso povo.
℣. Não nos trateis segundo os nossos pecados,
℟. Nem nos castigueis em proporção de nossas faltas.

℣. Ajudai-nos, ó Deus, nosso Salvador,


℟. E pela glória do vosso nome, Senhor, libertai-nos.

℣. Sede propício, Senhor, aos nossos pecados,


℟. Por vosso santo nome.

℣. Senhor, ouvi minha oração,


℟. E chegue até vós o meu clamor.

Oremos. — Deus eterno e todo-poderoso, tende piedade dos penitentes,


sede propício aos suplicantes e concedei-nos os benefícios de vossas
misericórdias: para que estes jejuns sejam remédio de mente e de corpo
para todos os que invocam o vosso nome e deploram os próprios crimes
perante a vossa clemência; a fim de que todos os que vos invocarem
pedindo a remissão de seus pecados encontrem saúde de corpo e de alma e
alcancem, na eterna bem-aventurança, o prêmio prometido aos que
fielmente vos servem.

Deus, que criastes admiravelmente o homem e mais admiravelmente o


redimistes: dai-nos resistir, com mente forte, às seduções do pecado e servir
de coração sincero a vossa majestade.
Ouvi clemente, nós vos pedimos, Senhor, as preces do vosso povo; a fim de
que os que justamente somos afligidos por nossos pecados, pela glória do
vosso nome, sejamos piedosamente libertados.
Protegei, Senhor, nós vos pedimos, com piedade contínua a vossa família; a
fim de que, sob a vossa proteção, se veja livre de todas as adversidades e,
por boas obras, se mantenha devota ao vosso nome.
Deus, que não desejais a morte, mas a penitência dos pecadores: olhai
benignamente para a fragilidade da condição humana e assisti com piedade
benigna os nossos esforços; a fim de que, por vossa grande misericórdia,
alcancemos felizmente o perdão de nossos pecados, a constância no vosso
serviço e o prêmio prometido aos perseverantes. Por Nosso Senhor Jesus
Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina na unidade do Espírito
Santo. Amém.
℣. Senhor, ouvi minha oração,
℟. E chegue até vós o meu clamor.

℣. Bendigamos ao Senhor.
℟. Graças a Deus.

℣. E que as almas dos fiéis defuntos, pela misericórdia de Deus, descansem


em paz.
℟. Amém.
ORAÇÕES PARA ANTES E DEPOIS DAS MEDITAÇÕES

ANTES
Meu Senhor e meu Deus, creio firmemente que estás aqui, que me vês, que
me ouves. Adoro-te com profunda reverência, peço-te perdão dos meus
pecados e graça para fazer com fruto este tempo de oração. Minha Mãe
Imaculada, São José meu pai e senhor, meu anjo da guarda intercedei por
mim.

DEPOIS
Dou-te graças, meu Deus, pelos bons propósitos, afetos e inspirações que me
comunicaste nesta meditação. Peço-te ajuda para os pôr em prática. Minha
Mãe Imaculada, São José meu pai e senhor, meu anjo da guarda intercedei
por mim.
MEDITAÇÕES
PARA A
QUARESMA
E SEMANA
SANTA
QUARTA-FEIRA DE CINZAS - A lembrança da morte e o jejum
quaresmal.
Memento homo, quia pulvis es et in pulverem reverteris —
«Lembra-te, ó homem, que és pó e em pó te hás de tornar»(Gen. 3,
19).

Sumário. Os insensatos que não creem na vida futura, estimulam-se


com o pensamento da morte a passarem bem a vida. De maneira bem
diferente devemos nós proceder, os que sabemos pela fé que a alma sobrevive
ao corpo. Nós, lembrando- nos de que em breve temos de morrer, devemos
cuidar da nossa eternidade e por meio de oração e penitência aplacar a divina
justiça. É com este intuito que a Igreja, depois de pôr as cinzas sobre a
cabeça, nos ordena o jejum da Quaresma.

I. Para compreendermos em toda a sua extensão o sentido destas


palavras, imaginemos ver uma pessoa que acaba de exalar o último suspiro.
Deus, a cada um que vê esse corpo, inspira nojo e horror. Não passaram bem
vinte e quatro horas depois que aquela pessoa morreu, e já o mal cheiro se faz
sentir. É preciso abrir as janelas e queimar bastante incenso, afim de que o
fedor não infeccione a casa toda. Os parentes com pressa mandam levar o
defunto para fora da casa e entregar a terra.
Metido que foi o cadáver na sepultura, vai se tornando amarelo e
depois preto. Em seguida, aparece em todos os membros uma lanosidade
branca repelente, donde sai um pús infecto que corre pela terra e donde se
gera ulna multidão de vermes. Os ratos vêm também procurar o pasto nesse
cadáver, roendo-o uns por fora, ao passo que outros entram na boca e nas
entranhas. Despegam-se e caem as faces, os lábios, os cabelos; escarnam-se
os braços e as pernas apodrecidas, e afinal os vermes, depois de consumidas
todas as carnes, consomem-se a si próprios. E deste corpo só restará um
esqueleto fétido, que com o tempo se divide, ficando reduzido a um punhado
de pó.
Eis aí o que é o homem, considerado como criatura mortal. Eis aí o
estado a que tu também, meu irmão, serás, talvez em breve, reduzido: um
punhado de pó fedorento. Nada importa ser alguém moço ou velho, são ou
enfermo: a todos caberá a mesma sorte, o que a Igreja recorda pondo as
cinzas bentas indistintamente sobre a cabeça de todos: Memento homo, quia
pulvis es et in pulverem reverteris — «Lembra-te, ó homem, queés pó em pó te
hás de tornar».
II. Os insensatos que não creem na vida futura e têm as verdades
eternas por fábulas, estimulam-se, com a lembrança da morte, a levar vida
folgada e a gozarem. Comedamus et bibamzs; cras enim moriemur1 —
«Comamos e bebamos, porque amanhã morreremos». De maneira bem
diferente, porém, diz Santo Agostinho, deve proceder o cristão, que pela fé
sabe que a alma sobrevive ao corpo, e que depois da morte deste, terá de dar
contas rigorosíssimas de tudo quanto tiver feito. — O cristão, que se
lembra que em breve deverá deixar o mundo, cuidará da sua eternidade e
procurará aplacar a justiça divina com penitencias e orações. É por isso
exatamente que a Igreja, depois de nos ter posto as cinzas sobre a cabeça,
ordena a seus ministros que notifiquem aos fiéis o jejum quaresmal: Canite
tuba in Sian: sanctificate ieiunium 2 — «Fazei soar a trombeta em Sião,
santificai o jejum».
Conformemo-nos, portanto, com as intenções de nossa boa Mãe; e
como ela mesma o ordena, sejamos no santo tempo da Quaresma «mais
sóbrios em palavras, na comida, na bebida, no sono, nos divertimentos»8, e, o
que é mais necessário, afastemo-nos mais de toda a culpa por meio de uma
vida recolhida e consagrada a oração, porquanto, no dizer de São Leão, «sem
proveito se subtrai o alimento ao corpo, se o espirito não se afasta mais da
iniquidade».
Meu amabilíssimo Redentor, consenti que eu una a minha salutar
abstinência com a que Vós com tanto rigor por mim quisestes observar no
deserto. Consenti também que nesta união eu a ofereça a vosso Pai divino,
como protestação de minha obediência à Igreja, em desconto de meus
pecados, pela conversão dos pecadores e em sufrágio das almas santas no
purgatório. Tenho intenção de renovar esta oferta todos os dias da Quaresma.
«Vós, porém, ó Senhor, concedei-me a graça de começar este solene jejum
com devida piedade e de continuá-lo com devoção constante» 1, afim de que,
chegada a Pascoa, depois de ter ressurgido convosco para a vida da graça,
seja digno de ressuscitar também para a vida da glória. Fazei-o pelo amor de
Maria Santíssima. (*II 226.)

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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QUINTA-FEIRA – Amor de Jesus Cristo em dar-se anós como alimento

In funiculis Adam traham eas, in vinculis caritatis ... et declinaviad eum


ut vesceretur — «Eu as atrairei com as cordas com que se atraem os
homens, com as prisões da caridade ... inclinei-me para ele, para que
comesse» (Os. 11, 4).

Sumário. Quanto se julgaria distinguido o súdito a quem o príncipe


mandasse algumas iguarias da sua mesa? Jesus Cristo, porém, na santa
comunhão, nos dá para sustento, não só uma parte da sua mesa, mas o seu
próprio corpo, a sua alma e a sua divindade. Será porventura uma pretensão
exagerada da parte do Senhor, se, em compensação de tão grande dom, nos
pede o nosso pobre coração todo inteiro? Todavia quantos cristãos não há que
lh'o recusam completamente ou lh'o querem dar, mas dividido entre ele e as
criaturas?

I. Jesus Cristo não satisfez o seu amor, sacrificando a suavida por nós
num oceano de ignominias e dores, afim de patentear o amor que nos tinha.
Além disso, e para nos obrigar mais fortemente a amá-lo, quis, na véspera da
sua morte, deixar- se todo a nós como nosso alimento na santíssima
Eucaristia. — Deus é todo-poderoso, mas depois de dar-se a uma alma neste
Sacramento de amor, não lhe pode dar mais. Diz o Concílio de Trento que
Jesus, dando-se aos homens na santa comunhão, derramou (por assim dizer)
neste único dom todas as riquezas de seu amor infinito: Divitias sui erga
homines amoris velut effudit.

Como não se julgaria honrado, escreve São Francisco de Sales, o


vassalo a quem o príncipe enviasse algumas iguarias da sua mesa! E que seria
se lhe desse para sustento alguma coisa da sua própria substância? Jesus
Cristo, porém, na Santa comunhão, nos dá para sustento, não só uma parte de
sua mesa, não só uma parte da sua carne sacrossanta, mas o seu corpo inteiro:
Accipite et comedite: hoc est corpus meum 1 - «Tomai e comei, isto é o meu
corpo». E com o corpo nos dá também a alma e a divindade. Numa palavra,
diz São João Crisostomo, Jesus Cristo dando-se a si próprio no Santíssimo
Sacramento, dá tudo que tem e não lhe resta mais nada para dar: Totum tibi
dedit,nihil sibi reliquit.
É, pois, com razão que este dom é chamado por Santo Thomas:
sacramento e penhor de amor, e por São Bernardo: amor dos amores: amor
amorum, porque Jesus Cristo reúne e completa neste sacramento todas as
outras finezas do seu amor para conosco. Pelo mesmo motivo Santa Maria
Magdalena de Pazzi chamava o dia em que Jesus instituiu este sacramento, o
dia do amor. Ó maravilha e prodígio do amor divino! Deus, o Senhor de
todas as coisas, se faz todo nosso!
II. Praebe, fili mi, cor tuum mihi 2— «Meu filho, dá-me teu
coração». Eis o que Jesus Cristo nos diz lá de dentro do santo Tabernáculo:
Meu filho, em compensação do amor que te

mostrei, dando-te o dom inapreciável do Santíssimo Sacramento, dá-me o teu


coração e ama-me de hoje em diante com todas as tuas forças, com toda a tua
alma. —Parece-te porventura, meu irmão, que o nosso Salvador é exigente
demais, depois de se ter dado a si próprio sem reserva? Todavia, quantos
cristãos não há que recusam por completo seu coração a Jesus, ou querem
dividi-lo entre ele e as criaturas!
Ó meu caro Jesus, que mais podeis executar para nos atrair a vosso
amor? Ah! Dai-nos a conhecer por que excesso de amor Vos reduzistes a
estado de alimento, para Vos unir a pobres e vis pecadores como somos? Meu
Redentor, vossa ternura para comigo tem sido tão grande, que não recusastes
dar-Vos muitasvezes todo a mim na santa comunhão; e eu, quantas vezes tive
a ingratidão de Vos expulsar da minha alma! Mas não é possível que
desprezeis um coração contrito e humilhado. Por mim Vos fizestes homem,
por mim morrestes, e chegastes a Vos fazer meu alimento; após isto, que Vos
fica ainda por fazer no intuito de conquistardes meu amor? Ah! Não poder eu
morrer de dor, cada vez que me lembro de ter assim desprezado vossa graça!
Ó meu Amor, arrependo-me de todo o meu coração de Vos ter ofendido. Amo-
Vos, ó Bondade infinita; amo-Vos, ó Amor infinito. Nada mais desejo senão
amar-Vos, e nada mais temo senão viver sem Vos amar.. Meu amado Jesus,
não recuseis vir à minha alma. Vinde, porque estou resolvido a morrer antes
mil vezes, que repelir-Vos de novo, e quero fazer tudo para Vos agradar.
Vinde e abrasai- me todo no vosso amor. Fazei com que me esqueça de todas
as coisas, para não mais pensar senão em Vós, e só a Vós buscar, meu único e
soberano Bem. — O Maria, minha Mãe, rogai por mim, e, por vossas
orações, tornai-me reconhecido para com Jesus Cristo, que tanto amor me
tem. (II 403.)

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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SEXTA-FEIRA - Comemoração da Coroa de espinhosde Nosso Senhor
Jesus Cristo
Et milites plectentes coronam de spinis, imposuerunt capiti eius
—«E os soldados tecendo de espinhos uma coroa, lh'a puseramsobre a
cabeça» (JO. 19, 2).

Sumário. Os bárbaros algozes, não contentes com a horrível


carnificina feita em Jesus com a flagelação, lhe põem por escárnio uma corda
de espinhos na cabeça e apertam-na de modo que os espinhos penetraram até
ao cérebro. Eis como o Senhor quis reparar a maldição fulminada contra a
terra, isto é, contra Adão, em consequência da qual a natureza humana não
pode produzir senão abrolhos e espinhos de culpas! Eis como Jesus quis
expiar os nossos maus pensamentos!

I. Os bárbaros algozes ainda não contentes com a horrenda


carnificina feita no Corpo sacrossanto de Jesus Cristo com a flagelação,
instigados pelos demônios e pelos judeus, querendo tratá-lo de rei de
comedia, lhe põem aos ombros um farrapo de um vestido vermelho, ao invés
de manto real; uma cana verde na mão à guisa de cetro, e na cabeça um feixe
de espinhos entrelaçados em forma de coroa. E para que esta coroa não só lhe
servisse de ludibrio, mas também lhe causasse grande dor, foi feita na opinião
comum dos escritores, em forma de capacete ou chapéu, de sorte que cobria
toda a cabeça do Senhor, descia até sobre a testa.

Além disso, colhe-se do Evangelho de São Mateus, que os algozes


com a mesma cana batiam nos espinhos compridos, afim de entrarem mais
dentro na cabeça. Com efeito, no dizer de São Pedro Damião, chegaram a
penetrar até ao cérebro: spinae cerebrum perforantes. Se um só espinho
encravado no pé de um leão o faz ressoar toda a floresta com seus dolorosos
gemidos, imagina quão amarga deve ter sido a dor de Jesus Cristo que tevetoda
a sagrada cabeça perfurada, a parte mais sensível do corpo humano, ao qual se
reúnem todos os nervos e sensações.
Tão atroz tormento não foi para Jesus de curta duração; bem ao
contrário, foi o mais longo da sua Paixão, porquanto durou até a Sua morte.
Visto que os espinhos ficavam encravados na cabeça, todas as vezes que lhe
tocavam na coroa ou na cabeça, sempre se lhe renovavam as dores. E o
Cordeiro manso deixou-se atormentar à vontade dos algozes, sem proferir uma
só palavra. — Era tão grande a abundância de sangue que corria das feridas,
que lhe cobria o rosto, ensopava os cabelos e a barba, e lhe enchia os olhos.
São Boaventura chega a dizer que não era já o belo rosto de Senhor que se via,
mas o rosto de um homem esfolado. Eis aí, exclama o Bem-aventurado
Dionysio Carthusiano, como quis ser tratado o Filho de Deus, para obter para
nós a coroa de gloria no céu.

II. Maledicta terra in opere tuo ... spinas et tribulos germinabit


tibi1 - «A terra será maldita na tua obra.... ela te produzirá espinhos e
abrolhos». Esta maldição foi lançada por Deus contra Adão e toda a sua
descendência; pois que pela terra não se entende tão somente a terra material,
senão também a natureza humana, que estando infectada pelo pecado de
Adão, não produz senão espinhos de culpas. — Para cura desta infecção, diz
Tertuliano, foi mister que Jesus Cristo oferecesse a Deus o sacrifício do seu
longo tormento da coroação de espinhos. Por isso Santo Agostinho não hesita
em dizer que os espinhos não foram senão instrumentos inocentes; mas que
os espinhos criminosos, que propriamente atormentaram a cabeça de Jesus
Cristo, foram os nossos pecados, e em particular, os nossos maus
pensamentos: Spinae quid nisi peccatores?. É isso exatamente o que Jesus
Cristo mesmo deu a entender, quando apareceu certa vez a Santa Teresa,
coroado de espinhos. Quando a Santa lhe testemunhava a Sua compaixão,
disse-lhe o Senhor:
«Teresa, não te compadeças de mim pelas feridas que me abriram os
espinhos dos judeus, mas antes pelas que me causamos pecados dos
cristãos.» — Ó minha alma, tu também atormentaste então a cabeça de teu
Redentor com o teu frequente consentimento no pecado. Por piedade! Abre ao
menos agora osolhos, vê e chora amargamente o grande mal que fizeste.
Ah, meu Jesus, Vós não tínheis merecido ser tratado por mim como
Vos tenho tratado. Reconheço a minha ingratidão; arrependo-me de todo o
meu coração. Peço-Vos que não somente me perdoeis, mas que me deis tão
grande dor, que durante a minha vida toda continue a chorar as injúrias que
Vos fiz. Sim, Jesus meu, perdoai-me, visto que Vos quero amar sempre e
sobre todas as coisas, «E Vós, ó Eterno Pai, concedei- me que, venerando na
terra, em memória da Paixão de Jesus Cristo, a sua coroa de espinhos, mereça
ser um dia por ele coroado no céu com uma coroa de gloria e honra.»1 Fazei-o
peloamor do mesmo Jesus Cristo e de Maria, sua Mãe. (*I 570.)

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SÁBADO - Primeira dor de Maria Santíssima –Profecia de Simeão
Tuam ipsius pertransibit gladius — 'Uma espada tras- passaráa tua
alma» (Luc. 2, 35).

Sumário. O Senhor usa esta compaixão conosco, de não nos deixar


ver as cruzes que nos esperam, afim de que astenhamos de sofrer uma só vez.
Maria Santíssima, ao contrário, depois da profecia de São Simeão, tinha
sempre diante dos olhos e padecia continuamente todas as penas que a
esperavam na Paixão do Filho. Mas se Jesus e Maria inocentes tanto
padeceram por nosso amor, como ousaremos lamentar-nos, nós que somos
pecadores, quando temos de padecer um pouco por amor deles?

I. Neste vale de lágrimas, cada homem nasce para chorar, e cada um


deve padecer sofrendo aqueles males que diariamente lhe acontecem. Mas
quanto mais triste seria a vida, se cada um soubesse também os males futuros
que o têm de afligir! O Senhor usa esta compaixão conosco, de não nos
deixar ver as cruzes que nos esperam, afim de que, se as temos de padecer, ao
menos as padeçamos uma só vez. — Mas Deus não usou semelhante
compaixão para com Maria, a qual, porque Deus quis que fosse Rainha das
dores e toda semelhante ao Filho, teve sempre de ver diante dos olhos e de
padecer continuamente todasas penas que a esperavam; e estas foram as penas
da paixão e morte de seu amado Jesus.

Eis que no templo de Jerusalém, Simeão, depois de ter recebido o


divino Infante em seus braços, lhe prediz que aquele seu Filho devia ser alvo
de todas as contradições e perseguições dos homens, e que por isso a espada
de dor devia traspassar-lhe a alma: Et tuam ipsius animam pertransibit
gladius. — Davi, no meio de todas as suas delicias e grandezas reais, quando
ouviu que o profeta Nathan lhe anunciava a morte do filho, não tinha mais
paz: chorava, jejuava, dormia à terra nua. Não é assim que fez Maria. Com
suma paz recebeu ela a nova da morte do Filho, e com a mesma paz continuou
a sofrê-la; mas ainda assim, que dor não devia sentir o seu Coração!
Nem serviu para lh'a mitigar o conhecimento que já de antemão
tinha do sacrifício a fazer, pois que, como foi revelado a Santa Teresa, a
bendita Mãe conheceu então em particular e mais distintamente todas as
circunstâncias dos sofrimentos, tanto exteriores como interiores, que haviam
de atormentar o seu Jesus na sua Paixão. Numa palavra, a mesma Bem-
aventurada Virgem disse a Santa Mechtildes, que a este aviso de São Simeão
toda a sua alegria se converteu em tristeza.
II. A dor de Maria não achou alívio com o correr do tempo; ao
contrário, ia sempre aumentando, à medida que Jesus, crescendo em
sabedoria, em idade e em graça, junto de Deus e junto dos homens 1, se
tornava mais amável aos olhos de sua

Mãe, e se avizinhava mais o tempo da sua amargosa Paixão. Eis o que a


própria divina Mãe revelou a Santa Brígida: «Cada vez que eu olhava para
meu Filho, sentia o meu coração oprimido de nova dor, e enchiam-se meus
olhos de lagrimas».
Ruperto abade contempla Maria dizendo ao Filho enquanto o
alimentava: «Fasciculus myrrhae dilectus meus mihi; inter ubera mea
commorabitur 2. Ah, Filho meu, eu te aperto entre meus braços, porque muito
te amo; mas quanto mais te amo, tanto mais para mim te transformas em
ramalhete de mirra e de dor, pensando em tuas penas. Tu és a fortaleza dos
Santos, e um dia entrarás em agonia; és a beleza do paraíso, e um dia serás
desfigurado; és o Senhor do mundo, mas um dia serás preso Como um réu; és
o Criador do universo, mas um dia te verei ferido pelas pancadas; numa
palavra, tu és o Juiz de todos, a gloria dos céus, o Rei dos reis, mas um dia
serás sentenciado, desprezado, coroado de espinhos, tratado como rei de
escárnio e pregado num infame patíbulo. E eu, que sou tua Mãe, eu, que te
amo mais que a mim mesma, terei de ver-te morrer de dor, sem te poder dar o
menor alívio: Fasciculus myrrhae dilectus meus mihi— «O meu amado é
para mim um ramalhete de mirra».
Se, pois, Jesus, nosso Rei, e Maria, nossa Mãe, bem que inocentes,
não recusaram por nosso amor padecer durante toda a sua vida uma pena tão
atroz, não é justo que nós nos lamentemos, se padecemos um pouco; nós que
porventura muitas vezes temos merecido o inferno. (*I 232.)

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PRIMEIRA
SEMANA DA
QUARESMA
DOMINGO - Jesus no deserto e as tentações das almasescolhidas
“lesus ductus est in deserium a spiritu, ut tentaretur a diabolô”
— «Jesus foi levado pelo espirito ao deserto, para ser tentadopelo
diabo» (Mt. 4, 1).

Sumário. Meu irmão, se o Senhor permite que sejas tentado, não


desanimes, porquanto vae nisso um sinal de que elete ama e te quer fazer mais
semelhante Jesus Cristo, que, como refere o Evangelho de hoje, foi também
tentado. Esforça-te, porém, a exemplo do próprio Redentor, por empregar
todos os meios para seres vencedor. Especialmente refreia as tuas pequenas
paixões desordenadas, mortificando-as pela penitencia, e recorre sempre a
Deus pela oração continua.

I. Os trabalhos que mais afligem nesta vida as almas amantes de


Deus, não são tanto a pobreza, a enfermidade e as perseguições, como as
tentações e as securas espirituais. Quando a alma goza da amorosa presença de
Deus, todas as tribulações, em vez de a afligirem, mais a consolam,
fornecendo-lhe a ocasião para oferecer a Deus algum penhor de seu amor.
Mas ver-se pela tentação em perigo de perder a graça divina e temer na
secura que já a perdeu, é isso uma pena demasiado amarga para quem ama
deveras a Deus. — Observemos, porém, que é esta a sorte comum das almas
santas: Quia acceptus eras Deo, necesse fuit, ut tentatio probaret te1—
«Porque eras aceito de Deus, por isso foi necessário que a tentação te
Provasse».

Quem foi mais santo do que Jesus Cristo? Todavia ele foi levado pelo
espirito ao deserto para ser tentado pelo diabo. Emprimeiro lugar, foi tentado
de gula, porque «tendo jejuado quarenta dias e quarenta noites, teve fome. E
chegando-se a ele o tentador, disse: Se és o Filho de Deus, dize que estas
pedras seconvertam em pães». Depois foi tentado de presunção, porque
«o diabo o transportou à cidade santa e o pôs sobre o pináculo do templo e
lhe disse: Se és o Filho de Deus, lança-te de aqui abaixo, porque está escrito:
Recomendou-te aos seus anjos, e eles te levarão nas palmas das mãos, afim
de que nem sequer tropeces numa pedra.» Finalmente foi tentado de idolatria;
porque o diabo, vendo-se vencido uma outra vez, «o transportou ainda a um
monte muito alto, e mostrou-lhe todos os reinos do mundo e a gloria deles e
lhe disse: Todas estas coisas te darei, seprostrado me adorares.»
Uma alma, pois, por se ver tentada, não deve ainda temer como se já
tivesse caído no desagrado de Deus; antes deve então ter mais confiança de ser
amada de Deus, que a quer tornar mais semelhante a seu Filho unigênito e dar-
lhe ocasião para adquirir grandes méritos para o céu. Quoties vincimus, toties
coronamur
- «Cada Vitória é uma nova coroa», diz São Bernardo.
II. Os meios de que nos devemos servir para vencer as tentações,
são os mesmos que nosso divino Redentor nos ensina com o seu exemplo no
Evangelho de hoje. — Cum ieiunasset quadraginta diebus — Jesus jejuou
quarenta dias. Para vencermos todas as tentações, e em particular as dos
sentidos, é mister que nós também, especialmente neste tempo da Quaresma,
mortifiquemos a carne pelo jejum, pela penitência, e pelo recolhimento, e que
ao mesmo tempo avigoremos o espírito com meditações e orações, porque só
de pão vive o homem, masde toda a palavra que sai da boca de Deus.
Non tentabis Dominum Deum tuum — «Não tentarás ao Senhor teu
Deus». Para vencermos as tentações, devemos em segundo lugar evitar as
ocasiões de pecado. Aqueles que se expõem voluntariamente aos perigos e
não pretendem cair, tentam Deus para fazer milagres. A custodia dos anjos,
diz São Bernardo, é prometida a quem caminha nos caminhos de Deus, viis
suis, e não àquele que se expõe voluntariamente ao perigo de cair num
abismo. — Vade, Satana— «Vai-te, Satanás».
Finalmente o terceiro meio para sairmos vencedores, consiste em
expulsarmos o demônio inteiramente de nossa almae em estarmos resolvidos a
adorar a Deus nosso Senhor, e servi- lo a ele só. Oh! Quantos há que não
cuidam em refrear as suas paixões nascentes, e que imaginam poder servir a
dois senhores. Mas depois, ao primeiro assalto mais forte de qualquer tentação,
acabam por cair e perder-se eternamente!

Ó meu amabilíssimo Jesus, vejo que no passado caí e recaí tão


miseravelmente, porque me descuidei de imitar os vossos divinos exemplos.
Arrependo-me de todo o coração; peço-Vos perdão e prometo que para o
futuro serei mais cuidadoso. Mas fortalecei a minha fraqueza. Eu Vo-lo peço
pela mortificação que praticastes, abstendo-Vos por quarenta dias de toda a
alimentação, e pela humildade que mostrastes, permitindo ao demônio que Vos
tentasse como a qualquer outro filho de Adão. «Ó Deus, que purificas a vossa
Igreja com a anual abstinência quaresmal: concedei a vossa família, que com
boas obras execute o que Vós deseja obter com a sua abstinência.»1 Doce
Coração de Maria, sede minha salvação. (*I 837.)

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SEGUNDA-FEIRA - Bem-aventurado o que não quer outra coisa senão a
Deus
Beati pauperes spiritu, quoniam ipsorum est regnum coelorum
— «Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é oreino doa
céus» (Mt, 5, 3).

Sumário. Persuadamo-nos bem de que só Deus pode contentar-nos;


mas não contenta senão aqueles que são pobres de espirito, isso é, de desejos
terrestres, e nada querem fora dele. Se, portanto, nós também queremos achar
a verdadeira felicidade, desfaçamo-nos de todo o afeto a terra, entreguemo-
nos a Deus sem reserva e digamos frequentes vezes: Senhor, disponde de
mim, e de tudo que é meu, segundo o vosso agrado;eu não quero senão o que
Vós quereis.

I. Pelos pobres de espirito entendem-se aqueles que são pobres de


desejos terrestres, e nada querem fora de Deus. Estes são pobres nos desejos,
mas não na realidade, porque desde a presente vida vivem contentes. Por isso
o Senhor não diz: Deles será, mas: deles é o reino dos céus: Ipsorum est
regnum caelorum; porquanto já nesta terra são ricos em bens espirituais que
de Deus recebem. Apesar de pobres em bens temporais, vivem contentes em
seu estado, em contraste com os ricos em desejos terrestres, que na vida
presente sempre são pobres e vivem descontentes, por grandes que sejam as
suas riquezas. — Jesus Cristo, como diz o Apóstolo 1, quis ser pobre, para,
com o seu exemplo, nos ensinar o desprezo dos bens terrestres, e desta forma
nos tornar ricos em bens celestes, que são imensamente mais preciosos e de
duração eterna. Eis porque declara que, quem não renuncia a tudo quanto
possui na terra com certo apego, não pode ser seu verdadeiro discípulo 2.
Persuadamo-nos de que só Deus faz contentes, mas não faz
plenamente contentes senão aquelas almas que o amam de todo o coração.
Que lugar pode o amor de Deus achar num coração cheio de coisas terrestres?
Muitas almas se queixam de que na meditação, na comunhão, nos outros
exercícios de devoção não acham a Deus. Santa Teresa lhes diz: Desprende o
teu coração das criaturas, e acharás a Deus.
Desfaçamo-nos, portanto, de todo o afeto terrestre eespecialmente da
vontade própria; demos a Deus toda a nossa vontade sem reserva e digamos-
lhe: Senhor, disponde de mim, e de tudo que é meu, segundo o vosso agrado.
Não quero senão o que Vós quereis, e sei que não quereis senão o que é melhor
paramim. Fazei que eu Vos ame sempre, e nada mais desejo.

II. O único meio para nos desprendermos das criaturas, é a aquisição


de um grande amor a Deus. Enquanto o amor divino não ficar sendo senhor de
toda a nossa vontade, nunca chegaremos a ser santos. O meio, pois para
adquirirmos esse amor divino predominante é a santa oração. Roguemos,
portanto, sempre a Deus que nos dê o seu amor, e assim nos veremos
desprendidos de todas as coisas criadas. — O amor divino é um roubador que
santamente nos tira todos os afetos terrestres. Como não há força capaz de
resistir a morte, assim tampouco há impedimento, por insuperável que se nos
afigure, que possa resistir ao amor divino. O amor vence tudo. Pelo seu amor
a Deus os santos mártires venceram os tormentos mais atrozes e a morte mais
dolorosa.
Por outro lado, se uma alma não chega a dar-se toda a Deus, acha-se
sempre em perigo de abandoná-Lo e perder-se; como, ao contrário, quem
deveras se deu todo a Deus, pode estar certo de que não mais o abandonará,
porque o Senhor é liberal e fiel para com o que se lhe dá sem reserva. Donde
vem que algumas pessoas, que de primeiro levavam vida santa, vieram depois
a cair tão profundamente, que deixaram bem pouca esperança acerca de sua
salvação? Donde vem isso? Vem, respondo, de que não tinham dado
inteiramente a Deus; a sua própria queda é o sinal certo disso.
Meu Deus e meu verdadeiro amador: não permitais que minha alma,
criada para Vos amar, ame qualquer ousa senão a Vós, e não seja toda vossa,
visto que me resgatastes com o vosso sangue. Ah, Jesus meu, como será
possível que depois de ter conhecido o vosso amor para comigo, ame alguma
coisa fora de Vós? Peço-Vos, que me queirais atrair sempre mais ao íntimo
do vosso Coração. Fazei com que me esqueça de tudo, afim de não buscar
nem desejar senão o vosso amor. Jesus meu, em Vósconfio. — Ó Maria, Mãe
de Deus, em vós pus as minhas esperanças. Desprendei-me de tudo que não
seja Deus, para que ele seja o único objeto de todo o meu amor e de minha
felicidadeeterna. (II 304.)

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TERÇA-FEIRA - Quanto é doce a morte do justo
Iustorum animae in manu Dei sunt, et non tanget illos
tormentum mortis — «As almas dos justos estão na mão deDeus, e
não os tocará o tormento da morte» (SB. 3, 1).

Sumário. É assim: os tormentos que na morte afligem os pecadores,


não afligem os santos, porque já antes desse tempo deixaram pelo afeto os
bens terrestres, consideraram as honras como fumo e vaidade e viveram
desapegados dos parentes, amando-os só em Deus. D'outra parte, que
felicidade morrer entregando-se nos braços de Jesus Cristo, que quis sofrer
uma morte tão amarga, afim de nos obter uma morte doce e cheia de
consolação! Irmão meu, se na primeira noite a morte te colhesse, qual seria a
tua morte, a do justo ou a do pecador?

I. É assim: os tormentos que na morte afligem os pecadores, não


afligem os santos: Non tanget illos tormentum mortis— «Não os tocará o
tormento da morte». Os santos não se abalam com esse Proficiscere, anima —
«Parte, ó alma», que tanto assusta os mundanos. Os santos não se afligem
com o terem de deixar os bens da terra, porque nunca lhes tiveram o coração
ligado. Deus é o Senhor do meu coração, diziam eles sempre, a minha porção
é Deus para sempre — Deus cordis mei et pars mea Deus in aeternum 1. Sois
felizes, escrevia o Apostolo a seus discípulos que pela causa de Jesus Cristo
tinham sido despojados dos seus bens, sois felizes, porque suportastes com
alegria a rapina dos vossos bens, sabendo que tendes um cabedal melhor e
permanente: Cognoscentes vos haberemeliorem et manentem substantiam 1.
Os santos não se afligem por deixarem as honras, por- que desde
muito as desprezaram e tiveram na conta do que efetivamente são, fumo e
vaidade. Só estimaram a honra de amarem a Deus e de serem por ele amados.
Nem se afligem por deixarem os parentes, porque só amaram em Deus;
morrendo, recomendam-nos ao Pai celeste que os ama mais do que eles o
podiam, e como esperam salvar-se, pensam que melhor lhes poderão valer na
pátria celestial do que ficando na terra. Em suma, o que disseram durante
toda a vida: Deus meus et omnia
— «Meu Deus e meu tudo», repetem-no com mais consolação e ternura no
momento da morte.
Quem morre no amor de Deus, não se inquieta com as dores que
acompanham a morte; antes, nelas se compraz pensando que a vida vai
acabar e que depois não lhe resta mais tempo para sofrer por Deus e
testemunhar-lhe outras provas do seu amor. Por isso oferece-lhe com afeto e
paz estes últimos restos da Sua vida, e consola-se unindo o sacrifício da sua
morte ao sacrifício que Jesus Cristo ofereceu um dia por ele na cruz ao seu
eterno Pai. E assim morre feliz, dizendo: In pace in idipsum dormiam et
requiescam 2. — «Em paz dormirei nele e repousarei». Oh! Que felicidade
morrer entregando-se e repousando nos braços de Jesus Cristo, que nos amou
até a mortee quis sofrer uma morte tão dolorosa, afim de nos obter uma morte
doce e cheia de consolação! — Meu irmão, quais seriam os teus sentimentos,
se tivesses de morrer neste instante?
II. Ó meu amado Jesus, que para me obter uma morte suave,
quisestes sofrer uma morte tão cruel no Calvário, quando é que Vos verei? A
primeira vez que Vos terei de ver, ver-Vos- ei como meu Juiz no próprio
lugar em que expire. Que Vos direi então? Que me direis? Não quero esperar
até então para pensar nisso; quero premeditá-lo agora. Dir-Vos-ei:
Meu caro Redentor, sois Vós aquele que morreu por mim? Houve
um tempo em que Vos ofendi; fui ingrato para convosco, e não merecia
perdão; mas, ajudado pela vossa graça, entrei em mim mesmo, e no resto da
vida chorei os meus pecados, e Vós me haveis perdoado. Perdoa-me agora
novamente, que estou a vossos pés, e dai-me a absolvição total das minhas
faltas. Não merecia mais amar-Vos tendo desprezado o vosso amor; mas pela
vossa misericórdia me tendes atraído o coração, o qual, se Vos não amou
segundo o vosso mérito, amou-Vos pelo menos sobre todas as coisas,
deixando tudo para Vos agradar. Que me dizeis agora? Verdade é que gozar o
paraíso e possuir-Vos no vosso reino, é uma felicidade grande demais para
mim. Não tenho, porém, coragem de viver longe de Vós, mormente agora,
que me deixastes ver o vosso amável e belo rosto. Peço-Vos, pois, o paraíso,
não para ter mais gozo, mas para melhor Vos amar.
Mandai-me para o purgatório todo o tempo que Vos aprouver.
Manchado, como ainda estou, não quero entrar nessa pátria de pureza e ver-
me entre essas almas puras. Mandai-me ao purgatório, mas não me expulseis
para sempre da vossa presença. Basta-me que no dia que Vos aprouver, me
chameis ao paraíso para nele cantar eternamente as vossas misericórdias. Por
ora, ó meu amado Juiz, levante a mão, abençoai-me dizei- me que sou vosso e
que Vós sois e sereis sempre meu. Eu sempre Vos amarei, e Vós sempre
também me amareis. Agora vou para longe de Vós, vou para o fogo; mas vou
contente, porque vou para Vos amar, meu Redentor, meu Deus, meu tudo.
Vou contente, sim; mas sabei que, enquanto estiver longe de Vós, a minha
maior pena será esse apartamento. Vou, Senhor, contar os instantes que
decorrerão até que me chameis. Tende piedade de uma alma que Vos ama
com todas as suas forças e deseja ver- Vos para melhor Vos amar.
É assim, Jesus meu, que espero então falar-Vos. Peço-Vos
entretanto, que me deis a graça de viver de modo que possadizer-Vos então o
que agora pensei. Dai-me a santa perseverança, dai-me o vosso amor. Fazei-
o pelo amor de MariaSantíssima. (II 36.)

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QUARTA-FEIRA - Contas que terá de dar a Jesus Cristo, quem
não segue a vocação
Auferetur a vobis regnum Dei, et dabitur genti facienti fructus eius —
«Ser-vos.' tirado 0 reino de Deus, e será dado a umPOVO que faça
o. fractos dellc. (Muttb. 21, 43).

Sumário. Avivemos a nossa fé. A graça que o Senhor nos concedeu


chamando-nos viver em sua casa é muito mais excelente do que se nos
tivesse chamado a sermos rei do reino mais extenso da terra. Quanto maior,
porém, a graça, tanto mais o Senhor se irritará contra nós, se não lhe tivermos
correspondido; tanto mais rigoroso será o nosso julgamento no dia das contas.
Ai de nós, se não obedecermos a chamada divina, ou se por nossa culpa
perdermos a vocação!

I. A graça a vocação ao estado religioso não é uma graça ordinária;


ela é multo rara e Deus a poucos a concede: Non fecit taliter omni nationi2—
«Não fez assim a todas as nações». Oh! Esta graça de ser chamado a vida
perfeita e a ser doméstico de Deus em sua casa, quanto é superior a de ser
chamado a ser rei do reino mais extenso do mundo! Pois, que comparação
pode haver entre um reino temporal na terra e o reino eterno do céu?
Quanto maior, porém, a graça, tanto mais o Senhor se irritará contra
quem não lhe tiver correspondido, e tanto mais rigoroso será o seu
julgamento no dia das contas. Se um rei chamasse um pastorzinho para seu
palácio, afim de o servir entre os nobres de sua corte quão grande não
seria a indignação daquele príncipe, se o súdito recusasse o seu favor, para
não deixar o seu pobre redil e o seu pequeno rebanho?
Deus bem conhece o preço das suas graças; por isso castiga
rigorosamente àquele que as despreza. Ele é o Senhor: quando chama, quer
ser obedecido, e obedecido prontamente; pelo que, quando com a sua luz
chama uma alma à vida perfeita, e esta não corresponde, priva-a de sua luz e
abandona-a no meio das trevas. Oh! Quantas almas desgraçadas veremos
reprovadasno dia do juízo, porque não quiseram obedecer a voz de Deus!
II. Agradece, portanto, ao Senhor, ter-te convidado a segui-lo; mas
treme, se não correspondes a graça. Chamando-te Deus a servi-lo mais de
perto, é sinal que Deus te quer salvo; mas só te quer salvo pelo caminho que
te indica e escolhe. Se queres salvar-te seguindo o caminho que tu mesmo te
escolhes, corres grande perigo de o não obteres. Pois, ficando no século ou a
ele voltando, quando Deus te quer religioso, não receberás de Deus aqueles
auxílios eficazes que te havia preparado em sua casa, e sem os quais não te
salvarás. Oves meae vocem meam audiunt1— «As minhas ovelhas ouvem a
minha voz». Quem não quer obedecer à voz de Deus, dá sinal de que não é
ovelha de Jesus, mas será condenado com os bodes no vale de Josaphat.
Senhor, Vós tivestes para comigo este excesso de bondade, de
escolher-me de entre tantos outros, para me colocar entre os vossos servos
prediletos e fazer-me morar na vossa casa. Conheço quanto esta graça é
grande, e quanto eu dela era indigno. Eis-me aqui: quero corresponder a
tamanho amor, quero obedecer-Vos. Já que fostes tão generoso para comigo,
chamando-me, quando eu não Vos procurava, e além disso Vos era tão
ingrato, não permitais que eu venha a cair nesta outra ingratidão suprema, de
deixar-Vos, a Vós que por meu amor derramastes o vosso sangue e destes a
vida, para novamente me entregar ao mundo, meu inimigo, que no passado
tantas vezes me tem feito perder a vossa graça e a minha eterna salvação. Pois
que me chamastes, dai-me a força para obedecer.
Já prometi obedecer-Vos, e de novo vo-lo prometo; mas se Vós não
me concedeis a graça da perseverança, não Vos posso ser fiel. A Vós peço esta
perseverança, quero-a e espero-a pelos vossos merecimentos. — Dai-me a
coragem de vencer as paixões da carne, com que o demônio quer que eu Vos
atraiçoe.Amo-Vos, meu Jesus, e me consagro todo a Vós. Já sou vosso evosso
quero ser para sempre. — Maria, Mãe e esperança minha, Vós sois a Mãe da
perseverança, que só com a vossa intercessão é concedida; vós m’a haveis de
alcançar; em vós confio. (IV 416.)

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QUINTA-FEIRA - Quanto Jesus deseja unir-se conosco na santa
Comunhão
Desiderio desideravi hoc Pascha manducare vobiscum, antequam
patiar — «Tenho desejado ansiosamente comer convosco esta
Pascoa, antes que padeça». (Lc. 22, r 5).

Sumário. Nenhuma abelha esvoaça com tanta avidez sobre as flores


para lhes sorverem o mel, como Jesus vai morar nas almas que o desejam. Eis
porque no Evangelho nos convida tantas vezes a que nos aproximemos dele
na santa Comunhão. Faz tantas promessas e tantas ameaças, para manifestar o
grande desejo que tem de unir-se conosco. Que ingratidão, pois, se não
correspondemos a grande amor!

l. Jesus Cristo chama hora sua a noite em que devia começar a Sua
paixão. Mas como é que pode chamar uma hora tão funesta a sua hora? É
porque foi a hora por ele almejada em toda a sua vida, visto que havia
determinado que naquela noite havia de nos deixar a santa Comunhão,
destinada a consumar a sua união com as almas diletas, pelas quais devia em
breve dar o sangue e a vida. Eis aqui o que naquela noite Jesus disse a seus
discípulos: Desiderio desideravi hoc pascha manducare vobiscum — «Tenho
desejado ansiosamente comer esta páscoa convosco». Palavra pela qual o
Redentor quis dar a entender o desejo ansioso que tinha de unir-se conosco
neste santíssimo Sacramento de amor: Desiderio desideravi — «desejei
ansiosamente»; estas palavras, diz São Lourenço Justiniani, saíram do
Coração de Jesus abrasado em imenso amor.
Ora, a mesma chama que então ardia no Coração de Jesus, está
ardendo ali até ao presente; e a todos nós renova o convite feito então aos
apóstolos de o receberem: Accipite et comedite, hoc est corpus meum1 -
«Tomais e comei: isto é o meu corpo». Além disso, para atrair-nos a recebê-lo
com amor, promete o paraíso: Qui manducat meam carnem, habet vitam
aeternam 2 - «Quem come a minha carne, tem a vida eterna». No caso
contrário, ameaça-nos com a morte eterna: Nisi manducaveritis carnem Filii
hominis, no habebitis vitam in vobis 3 — «Se não comerdes a carne do Filho
do homem, não tereis a vida em vós».
Estes convites, estas promessas, estas ameaças nasceram todas do
desejo que tem Jesus Cristo de se unir conosco na santa comunhão, e este
desejo nasce do amor que nos tem. «Não há abelha», disse um dia o Senhor a
Santa Mechtildis, «que com tanta avidez esvoace sobre as flores para lhes
sorver o mel, como eu anseio entrar nas almas me desejam». Porque Jesus nos
ama, quer ser amado de nós, e porque nos deseja seus, quer ser desejado, diz
São Gregório: Sitit sitiri Deus. Bem-aventurada a alma que se aproxima da
mesa da comunhão com grande desejode se unir a Jesus Cristo!
II. Adorável Jesus meu, não podeis dar-nos maiores provas de amor
para nos fazer compreender quanto nos amais. Destes vossa vida por nós;
ficastes no Santíssimo Sacramento, para que venhamos aqui alimentamos de
vossa carne, e qual grande desejo tendes que Vos recebamos! Como podemos
ser sabedores de tantas finezas de vosso amor, sem ficarmos abrasados no
vosso amor? Longe de mim, afetos terrenos, saí de meu coração; vós é que me
impedis de arder no Jesus como Elearde por mim. Ó meu Redentor, que outros
testemunhos de afetoposso ainda esperar, depois dos que me tendes dado? Por
meu amor sacrificastes a vossa Vida inteira; por meu amor abraçastes uma
morte tão amarga e ignominiosa; por meu amor chegastes, por assim dizer, a
aniquilar-Vos, reduzindo-Vos na Eucaristia a estado de alimento, para Vos
dardes todo a mim. Ah, Senhor! Não permitais que eu seja ingrato a tão
grande bondade.
Graças Vos dou pelo tempo que me concedeis para chorar minhas
ingratidões e Vos amar. Arrependo-me, ó soberano Bem, de ter tantas vezes
desprezado o vosso amor. Amo-Vos, ó Bondade infinita; amo, Vos, ó
Tesouro infinito; amo-Vos, ó Amor infinito, digno de infinito amor. Jesus,
meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas. Por piedade, ajudai-me, ó meu
Jesus, a banir do meu coração todos os afetos que não são para Vós, para que
daqui por diante não deseje, não busque e não ame senão a Vós, Meu amado
Redentor, fazei com que eu Vos ache sempre e sempre Vos ame. Apoderai-
vos de toda a minha vontade, para que queira somente o vosso beneplácito.
Meu Deus, meu Deus, a quem então amarei, se não amo a Vós em quem
encontram todos os bens? Só a Vós quero, e nada mais. — Ó Maria, minha
Mãe, tomai meu coração e enchei-o de perfeitoamor a Jesus. (II 406.)

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SEXTA-FEIRA - Comemoração da lança e dos cravos de nosso Senhor
Jesus Cristo
Unus militum lancea latus eius aperuit, et continuo exivit sanguis
et aqua —«Um dos soldados abriu-lhe o lado com uma lança, e
imediatamente saiu sangue e água» (Jo. 19, 34).

Sumário. Sendo o coração um dos primários órgãos da vida, claro


está que tem parte principal nos afetos do homem, tanto nos bons como nos
maus. Exatamente para sarar esta raiz viciada dos pecados quis Jesus Cristo
que seu Coração fosse traspassado pela lança, assim como pouco antes, para
expiar a culpa de Adão em estender a mão ao fruto vedado, e para reparar os
abusos da liberdade, quis que as mãos e os pés lhe fossem traspassados pelos
cravos. Ó inventos admiráveis do amor de Deus! E nós não amaremos?

I. Reflete um devoto escritor que na Paixão de Jesus Cristo tudo foi


excesso assombroso. Hebreus e Gentios, sacerdotes e seculares, todos juntos
conspiraram para fazê-lo, como o predissera Isaias, o homem de dores e de
desprezos. Causa horror a consideração do complexo de maus tratos e
injurias que fizeram Jesus sofrer em menos de metade de um dia, desde a
captura até a morte. Mas quem não esperaria que ao menos depois da morte
teriam deixado de ultrajá-lo? Todavia não sucedeu assim.
Refere São João, que os Judeus, para não deixarem os corpos na
cruz durante o sábado de Páscoa, pediram a Pilatos que mandasse quebrar
as pernas aos supliciados e que os fizessem descer da cruz1. Eis que Maria,
enquanto está chorandoa morte do Filho, vê alguns homens, armados de barras
de ferro, que se avizinham de Jesus. A tal vista primeiramente tremeu de
espanto, depois disse assim, como medita São Boaventura: Parai; ah! Meu
Filho já está morto! Deixai de o injuriar e deixai também de me atormentar
mais a mim, sua pobre Mãe! Mas, enquanto está assim falando, vê, ó Deus!
Um soldado que vibra com ímpeto uma lança e com ela abre o lado de Jesus:
Unus militum lancea Iatus eius aperuit.
A esse golpe tremeu a cruz, o Coração de Jesus ficou dividido e saiu
sangue e agua. Não havia mais sangue além daquelas gotas restantes, que o
Salvador também quis derramar, para nos fazer entender que não tinha mais
sangue para nos dar. A injuria daquela lançada foi de Jesus, mas a dor foi toda
de Maria Santíssima.
Minha alma, aproxima-te enternecida da cruz, une as tuas penas com
as de tua querida Mãe e prostra-te assim aos pés do Senhor, afim de que corra
sobre ti esse sangue divino.

II. Sendo o coração um dos primários órgãos e como queprincípio da


vida, claro está que ele tem parte principal nos afetos do homem, segundo o
que está escrito: Do coração saem os maus pensamentos, os homicídios, os
furtos e as maledicências 1. Foi exatamente para sarar esta raiz viciada dos
pecados, que Jesus quis ser ferido em seu sacratíssimo Coração, assim como
pouco antes, para expiar a culpa de Adão em estender a mão para o fruto
vedado, e para reparar os abusos da liberdade humana, quis que lhe fossem
traspassados as mãos e os pés. — Por isso é que a Igreja não hesita em
venerar a Lança e os Cravos que tiveram a ventura de ser tintos com o sangue
do Senhor. No Oficio em sua honra exclama saudando-os: «Aperfídia judaica
escolheu-vos para instrumentos de perversidade; mas o Deus do céu vos
transformou em ministrosde graça. Pelo que das chagas que abristes no corpo
sacrossanto de Jesus, como de outras tantas fontes, nos brotam as graças
celestes» 2.
Meu irmão, unamos os nossos afetos aos de nossa boa Mãe, a Igreja.
Peçamos ao Senhor perdão do abuso que nós também temos feito da
liberdade. Roguemos-lhe que virando contra nós aqueles cravos e aquela
lança, tire vingança das ofensas que lhe fizemos, ferindo-nos o coração, as
mãos e os pés. Os pés, para que de hoje em diante sejam impotentes em nos
expor às ocasiões perigosas; as mãos, para que deixem de praticar o mal; o
coração, para que, livre de todo apego desordenado as criaturas, arda sempre
de amor divino: Omnisque corde e saucio profanus ardor exeat1.

Eis o que Vos peço, ó meu Deus! «A Vós, que na fraqueza da


natureza humana quisestes ser traspassado com cravos e ferido pela lança,
suplico-vos, concedei-me, que venerando na terra a memória desses cravos e
dessa lança, eu vá depois alegrar-me no céu pelo glorioso triunfo de vossa
Victoria». 2 Fazei-o por amor do Coração aflitíssimo de Maria. (*I 248)

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SÁBADO – Segunda dor de Maria Santíssima – Fuga para o Egito
Accipe puerum et matrem eius, et fuge in Aegyptum — «Toma oMenino e
sua Mãe, e foge para o Egito» (MT 2, 13).

Sumário. A profecia de São Simeão acerca da Paixão de Jesus e das


dores de Maria começou desde logo a realizar-se na fugida que teve de fazer
para o Egito, afim de proteger o Filho daperseguição de Herodes. Pobre Mãe!
Quanto não devia ela sofrer tanto na viagem como durante a sua permanência
naquele país entre os infiéis! Vendo a Sagrada Família na sua fuga,
lembremo-nos que nós também somos peregrinos sobre a terra. Para
sentirmos menos os sofrimentos do exilio, à imitação de São José tenhamos
conosco no coração a Jesus e Maria.

I. Como serva, que ferida pela flecha, aonde vai leva a sua dor,
trazendo sempre consigo a frecha que a feriu; assim a divina Mãe, depois da
profecia funesta de São Simeão, levava sempre consigo a sua dor com a
memória continua da paixão do Filho. Tanto mais, que aquela profecia
começou desde logo a realizar-se na fugida que o Menino Jesus teve de fazer
para o Egypto, afim de se subtrair à perseguição de Herodes: Surge et accipe
puerum et matrem eius et fuge in Aegyptum — «Levanta- te, toma o Menino e
Sua Mãe, e foge para o Egito».
Que pena, exclama São João Crisóstomo, devia causar ao Coração de
Maria, o ouvir a intimação daquele duro exílio com seu Filho! «Ó Deus»,
disse então Maria suspirando, como contempla o Bern aventurado Alberto
Magno, «deve, pois, fugirdos homens aquele que veio a salvar os homens?»
Cada um pode considerar quanto padeceu a Santíssima Virgem
naquela viagem. A estrada, conforme a descrição de São Boaventura, era
áspera, desconhecida, cheia de bosques, pouco frequentada, e sobretudo
muito longa, de modo que a viagem foiao menos de trinta dias. O tempo era de
inverno; por isso tiveram de viajar com neves, chuvas e ventos, por caminhos
arruinados cheios de lama, sem terem quem os guiasse ou servisse. Maria
tinha então quinze anos, e era uma donzela delicada, não acostumada a
semelhantes viagens. Que dó fazia ver aquela Virgemzinha fugir com o
Menino nos braços e acompanhada somente de São José!
Pergunta São Boaventura: Quomodo faciebant de victu? ubi nocte
quiescebant?— «De que alimentavam-se? Onde passavam as noites? » E de
que outra coisa podiam alimentar-se, senão de um pedaço de pão duro, trazido
por São José, ou mendigado? Onde deviam dormir, especialmente no extenso
deserto pelo qual deviam passar, senão sobre a terra, ao relento, com perigo de
ladrões ou de feras em que abunda o Egito? Oh! Quem tivera encontrado
aquelas três personagens, por quem as haveria então reputado senão por três
pobres mendigos e vagabundos?

II. Opina Santo Anselmo que os santos peregrinos no Egito


habitaram a cidade de Heliópolis. Considere-se aqui a grande pobreza em que
deviam viver nos sete anos que ali permaneceram, como afirma Santo
Antonino com Santo Tomas e outros. Eram estrangeiros, desconhecidos, sem
rendimentos, sem dinheiro, sem parentes. Como diz São Basílio, chegaram
com dificuldade a sustentar-se com os seus pobres trabalhos. Escreve
Landolpho de Saxônia (e isto seja dito para consolação dos pobres), que
Maria se achava em tão grande pobreza, que algumas vezes não tinha nem
sequer um pouco de pão, que o Filho lhe pedia, obrigado pela fome.
Ver assim Jesus, Maria e José andarem fugitivos, peregrinando por
este mundo, ensina-nos que também devemos viver nesta terra como
peregrinos, sem que nos apeguemos aos bens que o mundo oferece, pois que
em breve os havemos de deixar e de ir para a eternidade: Non habemus hic
manentem civitatem, sed futuram inquirimus 1 — «Não temos aqui cidade
permanente, mas procuramos a futura». Demais, ensina-nos que abracemos as
cruzes, já que neste mundo não se pode viver sem cruz. —A Bem aventurada
Veronica de Binasco, Agostiniana, foi levada em espirito a acompanhar
Maria com o Menino Jesus ao Egito, finda a qual lhe disse a divina Mãe:
«Filha, acabas de ver com quantas fadigas chegamos a este pais; sabe, pois,
que ninguém recebe graças sem padecer».
Quem deseja sentir menos os trabalhos desta vida, deve, a imitação
de São José, tomar consigo Jesus e Maria: Acipe puerum et matrem eius —
«Toma o Menino e sua Mãe». A quempelo amor traz no coração este Filho e
esta Mãe, se lhe tornam leves, quiçá doces e estimáveis, todas as penas.
Amemo-os, pois, e consolemos a Maria acolhendo o seu Filho dentro dos
nossos corações, que ainda hoje é continuamente perseguido pelos homens os
seus pecados. (*I 235.)

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SEGUNDA
SEMANA DA
QUARESMA
DOMINGO - A transfiguração de Jesus Cristo e as delicias do
paraíso.
Domine, bonum est nos hic esse — «Senhor, é bom estarmosaqui»
(Matth. 17, 4)

Sumário. Consideremos hoje a beleza do paraíso e raciocinemos


assim: São Pedro e os seus felizes companheiros provaram apenas uma só
gota da doçura celestial; não viram senão um raio da divindade. Todavia
ficaram de tal modo arrebatados, que desejavam permanecer ali para sempre.
O que será então de nós, quando nos saciarmos na fonte das delicias, e virmos
a Deus tal qual é, face a face? Para chegarmos a tão grande recompensa,
devemos antes de mais nada combater e sofrer alguma cosa na terra.

I. No Evangelho de hoje lemos que certo dia Nosso Senhor,


querendo dar a seus discípulos um antegozo da beleza do paraíso, «tomou
consigo a Pedro, a Thiago e a João seu irmão, e os conduziu de parte a um alto
monte e transfigurou-se diante deles. O seu rosto ficou refulgente como o sol,
e suas vestiduras se fizeram brancas como a neve. E eis que lhes apareceram
Moysés e Elias, falando com ele. E tomando a palavra, disse Pedro a Jesus:
Senhor, bom é que estejamos aqui: se queres, façamos três tabernáculos, um
para ti, outro para Moisés e outropara Elias: Domine, bonum est nos hic esse».
Detenhamo-nos também a considerar um pouco a belezado paraíso e
raciocinemos assim: São Pedro e os seus felizes companheiros provaram
apenas uma só gota da doçura celestial e nem assim puderam conter-se que
não rogassem a Jesus, lhes fosse concedido permanecerem sempre naquele
lugar. Que será então de nós, quando o Senhor saciar os seus escolhidos da
abundância de sua casa e os fizer beber na torrente das suas delicias ?1 São
Pedro e os outros dois apóstolos não viram senão um único raio da divindade
de Jesus Cristo, o qual transluziu da sua sagrada humanidade. Todavia, não
podendo sustentar tão viva luz, ficaram deslumbrados, e como fora de si,
caíram de bruços sobre a terra. Que será então quando o Senhor se deixar ver
a seus escolhidos face a face, como é em si mesmo? — Tão bela sorte nos
espera também a nós, meu irmão, se nos esforçarmos por merece-la ao menos
no tempo de vida que aindanos resta.
Ó doce esperança! Virá um dia em que nós também veremos a Deus
como é, isto é, veremos a beleza incriada, que encerra, de modo infinitamente
perfeito, todas as belezas espalhadas pelo universo: Similes ei erimus,
quoniam videbimus eum sicuti est2— «Seremos semelhantes a ele porque o
veremoscomo é».
II. A gloria de que gozaram os três venturosos discípulos, foi de curta
duração; porque «enquanto Pedro ainda falava, uma nuvem luminosa os
envolveu. E logo saiu da nuvem uma voz que disse: Este é meu Filho
amado, em quem coloquei toda a minha complacência: ouvi-o. Chegou-se a
eles Jesus, tocou-os e lhes disse: Levantai-vos e não temais. Eles, então,
levantandoos olhos, já não viram ninguém, senão só Jesus: Neminemviderunt,
nisi solum Iesum.
Com isso o Senhor nos quer dar a entender que as consolações que
faz degustar a seus servos, têm por único fim anima-los ao trabalho,
porquanto o tempo presente é um tempo de merecer e não de gozar. Eis
porque no meio daquela visão celestial, Moisés e Elias não falaram senão das
penas e ignomínias do Calvário: Dicebant excessum eius2— «Falavam da
sua saída deste mundo». São Pedro é de certo modo repreendido porque
desejava ficar sempre no gozo daquelas delicias: Non enim sciebat quid
diceret 1—«Não sabia o que dizia».
Animemo-nos, portanto, e procuremos sofrer com paciência as
tribulações que Deus nos envia, oferecendo-as ao Senhor em união com as
penas que Jesus Cristo sofreu por nosso amor. Quando as cruzes nos afligirem,
levantemos os olhos ao céu e consolemo-nos com a esperança do paraíso.
Tudo é poucoou antes nada para merecermos o reino do céu.
Meu amado Redentor, agradeço-Vos as luzes que me dais agora!
São sinais de que me quereis salvo a gozar um dia

convosco no céu. Quero salvar-me, não tanto para gozar, como para Vos
agradar e amar. Amo-Vos, Jesus, meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas.
Pesa-me de Vos ter ofendido e proponho nunca mais tornar a ofender-Vos.
Mas já que me vedes destituído de toda a força, amparai a minha fraqueza,
afim de que eu Vos seja fiel. «Guardai-me interior e exteriormente, para que
me defendais de adversidades no corpo e limpeis a minha alma de maus
pensamentos»2 Doce Coração de Maria, sede minha salvação.

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SEGUNDA-FEIRA - Como devemos preparar-nos paraa morte.
Dispone domui tuae, quia morieris tu et non vives — «Dispõede tua
casa, porque morrerás e não viverás» (IS. 38, 1).

Sumário. A experiência prova que morrem felizmente os que, no


último momento, estão já mortos para o mundo, isto é, desligados dos bens
de que nos deve separar a morte. É, pois, preciso que desde já aceitemos a
privação dos bens, a separação dos parentes e de todas as coisas da terra,
lembrando-nos que, senão o fizermos voluntariamente agora, necessariamente
teremos de o fazer na morte, mas com risco da salvação eterna. Quem ainda
não escolheu um estado de vida, tome aquele que houveraquerido escolher na
hora da morte.

I. Diz Santo Ambrósio que morrem felizmente os que, no tempo da


sua morte, estão já mortos para o mundo, isto é, desligados daqueles bens de
que forçosamente os deve separar a morte. Imprescindível, pois, se torna que
desde já aceitemos a privação dos bens, a separação dos parentes e de todas
as coisas da terra. Se não fizermos isto voluntariamente durante a vida,
seremos forçados a fazê-lo na morte, mas então com extrema dore com risco da
salvação eterna.
A este propósito observa Santo Agostinho que, paramorrer em paz, é
vantajosíssimo colocarmos em ordem durante a vida os negócios temporais,
fazendo desde já a disposição dos bens que é preciso deixar, afim de não
termos de nos ocupar, então, senão da nossa união com Deus. — Naquela
hora convém que só se fale em Deus e no paraíso. Os últimos momentos da
vida são demasiadamente preciosos para serem desperdiçados em
pensamentos terrestres. É na morte que se acaba a coroa dos escolhidos,
porque é então que se recolhe a maior soma de merecimentos, aceitando os
sofrimentos e a morte comresignação e amor.
Semelhantes sentimentos, porém, não os poderá ter na morte quem
não os tiver excitado durante a vida. Com este fim, pessoas devotas têm por
habito renovarem todos os meses a protestação da boa morte com os atos
cristãos de fé, esperança e caridade, com a confissão e comunhão, como se já
estivessem no leito de morte, próximas a saírem deste mundo. Oh, como esta
prática nos ajudará a caminharmos bem, a nos desprendermos do mundo e
morrermos de boa morte! Beatus ille servus, quem, cum venerit dominus eius,

inveniet sic facientem1—«Bem-aventurado aquele servo a quem seu senhor,


quando vier, encontre a fazer isto.
Quem espera a toda a hora a morte, ainda que esta venhasubitamente,
não pode deixar de morrer bem. Ao contrário, o que se não faz na vida, é
dificílimo fazê-lo na morte. — A grandeserva de Deus, irmã Catarina de Santo
Alberto, da ordem de Santa Teresa, estando para morrer, gemia e dizia:
Minhas irmãs, não é o medo da morte que me faz gemer, porque há vinte e cinco
anos que a estou esperando; gemo por ver tantas pessoas iludidas, que vivem
no pecado, e esperam, para se reconciliarem com Deus, à hora da morte, em
que eu com dificuldade posso pronunciar o nome de Jesus.
II. Examina-te, meu irmão, e vê se tens o coração ape- gado a
alguma coisa terrestre: a alguma pessoa, a algum posto, a alguma casa, a
alguma riqueza, a alguma sociedade, a alguns divertimentos, e lembra-te que
não és eterno. Tudo terás de deixar um dia, e talvez em breve. Porque queres
então ficar agarrado a esses objetos com risco de morreres cheio de
inquietações? Oferece desde já tudo a Deus, estando disposto a privar-te de
tudo, quando lhe agradar.
Se não tens ainda escolhido o estado de vida, toma o que na hora da
morte quiseras ter escolhido e que te deixará morrer mais contente. Se já o
escolheste, faze agora o que então quiseras ter feito no teu estado. Faze como
se cada dia fosse o último de tua vida e cada ação a última que praticas: a
última oração, a última confissão, a última comunhão. Imagina, numa
palavra, a cada hora que já estás no leito da morte, ouvindo a intimação:
proficiscere de hoc mundo— «parte deste mundo», e por isso repete muitas
vezes a protestação para a boa morte, dizendo:

O meu Deus, só poucas horas me restam; nelas Vos quero amar


quanto possa na vida presente, para mais Vos amar na outra. Pouco tenho que
Vos oferecer; ofereço-Vos os meus padecimentos e o sacrifício da minha
vida, em união com o sacrifício que Jesus Cristo Vos ofereceu por mim na
cruz. Senhor, as penas que sofro são poucas e leves em comparação com as
que mereci; tais como são, aceito-as em testemunho do amor que Vos tenho.
Resigno-me a todos os castigos que me queirais infligir nesta vida e na outra,
contanto que Vos possa amar na eternidade. Castigai-me tanto quanto Vos
aprouver, mas não me priveis do vosso amor. Sei que não merecia mais amar-
Vos, por ter tantas vezes desprezado o vosso amor; mas Vós não podeis repelir
uma alma arrependida. Pesa-me, ó meu supremo Bem, de Vos haver
ofendido. Amo-Vos de todo o coração e em Vós ponho toda a minha
confiança. A vossa morte, ó Redentor meu, é a minha esperança. Deposito a
minha alma em vossas mãos chagadas. — Maria, minha querida Mãe,
socorrei-me nesse grande momento. Desde já vos entrego o meu espirito:
dizei a vosso Filho que se apiede de mim. A vós me recomendo, livrai-me do

inferno1.

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TERÇA-FEIRA - Efeitos que em nós produz a divinagraça.
Infinitus thesaurus est hominibus; quo qui usi sunt, participes facti
sunt amicitiae Dei — «EIa é um tesouro infinito para os homens; do
qual os que usaram têm sido feito participantes daamizade de Deus».

Sumário. Porque havemos de ter inveja dos grandes do mundo? Se


estamos na graça de Deus, participamos da sua própria natureza; somos, por
assim dizer, um com ele e de momento a momento podemos adquirir tesouros
imensos de merecimentos para a eternidade. A nossa alma é então tão bela
aos olhos do Senhor, que põe nela a sua complacência. Tudo isto Jesus Cristo
no-lo mereceu pela sua Paixão; e por isso devemos prestar-lhe continuas ações
de graças.

I. No dizer de Santo Tomás de Aquino, o dom da graça é superior a


todos os dons que uma criatura possa receber, porque a graça é a participação
da própria natureza de Deus. Já antes tinha São Pedro dito o mesmo: Ut per
haec (promissa) efficiamini divinae consortes naturae1— «Para que por elas
(as promessas) vos torneis participantes da natureza divinas. Tal é a
dignidade que Jesus Cristo nos mereceu pela sua paixão: ele nos comunicou o
mesmo resplendor que recebeu de Deus2.

Numa palavra, quem está na graça de Deus, forma, de certo modo,


uma pessoa com Deus: Unus spiritus est3 — «É umespírito com ele». E, como
disse o Redentor, na alma que ama a Deus, vem habitar a Santíssima
Trindade: Ad eum veniemus, et mansionem apud eum faciemus4 — «Viremos
a ele, e faremos nele morada».
É tão bela aos olhos de Deus a alma em estado de graça, que ele
próprio lhe faz o elogio: Como és formosa, amiga minha, como és formosa!5
Parece que Deus não pode apartar dela os olhos, nem cerrar os ouvidos a
nenhum dos seus pedidos: Oculi Domini super iustos, et aures eius ad preces
eorum6—«Os olhos do Senhor estão sobre os justos e os seus ouvidos abertos
aos rogos deles». Dizia Santa Brígida que nenhum homem poderia ver a
beleza de uma alma na graça de Deus, sem morrer de alegria. E Santa
Catarina de Sena, tendo visto uma alma assim, afirmou que de boa mente
daria a vida para que nunca aquela alma perdesse tamanha beleza. Por isso a
mesma Santa beijava a terra que os sacerdotes pisaram, pensando que pelo
seu ministério as almas eram colocadas na graça de Deus.

Além disso, que tesouros de merecimentos não pode ajuntar a alma em estado
de graça! Cada instante pode adquirir uma glória eterna, porquanto, como diz
Santo Tomas, qualquer ato de amor produzido pela alma merece um paraíso à
parte.
Porque temos então inveja dos grandes do mundo? Estando na graça
de Deus, podemos adquirir continuamente grandezas muito mais altas no céu.
II. A paz de que ainda na terra goza a alma em estado de graça, só
pode ser compreendida por aquele que a provou: Gustate et videte, quoniam
suavis est Dominusi — «Provai e vede quão suave é o Senhor». Não pode
deixar de ser cumpridaa palavra do Senhor: Gozam muita paz os que amam a
divina leiii. A paz do que vive unido com Deus, excede todas as doçurasque nos
podem advir dos sentidos ou do mundo: Pax Dei quae exsuperat omnem

sensum 8.
Ó meu Jesus, Vós sois o bom pastor que se deixou matar para nos dar
a vida, a nós, vossas ovelhas. Quando eu fugia de Vós, não deixastes de
correr atrás de mim e de me procurar; recebei-me, agora, que Vos procuro e
que volto arrependido a vossos pés. Restitui-me a graça, que miseravelmente
perdi por minha culpa. De todo o coração me arrependo e quisera morrer de
dor, quando penso nas inúmeras vezes que Vos voltei as costas. Perdoai-
me pelos merecimentos da morte cruel que por mim padecestes na cruz.
Prendei-me com os doces laços do vosso amor e não permitais que
outra vez me afaste de Vós. Dai-me forças para sofrer com paciência todas as
cruzes que me envieis, visto ter merecido as penas eternas do inferno. Fazei
que abrace com amor os desprezos que me possam vir dos homens, visto ter
merecido estar eternamente sob os pés dos demônios. Fazei, numa palavra,
com que obedeça em tudo as vossas inspirações e vença, por vosso amor,
qualquer respeito humano. — Resolvido estou a servir de hoje em diante
somente a Vós. Digam os outros o que quiserem; eu quero amar somente a
Vós, meu Deus amabilíssimo, só a Vós quero agradar; mas dai-me o vosso
auxílio sem o qual nada posso. Amo-Vos, Jesus, meu Deus, amo- Vos sobre
todas as coisas, de todo o coração, e confio em vosso Sangue. — Maria,
minha esperança, ajudai-me com as vossas orações. Glorio-me de ser vosso
servo, e vós vos gloriais de salvar os pecadores que a vós recorrem; socorrei-
me, pois, e salvai-me. (II 87.)

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QUARTA-FEIRA 1 - Da dignidade de São José, Esposo da Virgem Maria.
Iacob autem genuit Ioseph, virum Mariae, de qua natus est Iesus
— «Jacó gerou a José, esposo de Maria, da qual nasceu Jesus»(Mt 1,
16).

Sumário. Para formarmos uma ideia da dignidade de São José, basta


ponderarmos que, na qualidade de esposo de Maria e chefe da sagrada
Família, tinha verdadeiros direitos sobre a Mãe de Deus e seu divino Filho,
que assumiram a obrigação de lhe obedecer, e lhe obedeceram em tudo.
Quanto devemos, pois, honrar àquele a quem Deus honrou tanto! Quanto
devemos confiar na eficácia da sua proteção! — E tu, és-lhe realmente
devoto?... Recorres prontamente a ele em tuas ne- cessidades?

I. Considera em primeiro lugar a dignidade de São José por ser


esposo de Maria. Nesta qualidade adquiriu o direito de lhe dar ordens, e
Maria, na qualidade de esposa, assumiu a obrigação de obedecer a São José.
O humílimo São José nunca se serviu de mandos para com a santa Virgem,
mas somente de pedidos, por venerar nela a grande santidade e a dignidade de
Mãe de Deus. A humílima Esposa, porém, entre todas as criaturas a mais
humilde, considerava sempre aqueles pedidos como outras tantas ordens. —
Ó Maria, ó José, ó Esposos santíssimos, que por vossa grande humildade vos
fizestes tão amados de Deus, suplico-vos que me alcanceis o perdão de todosos
meus atos de soberba, e a graça de sofrer d’aqui por diante com paciência
todos os desprezos e injurias que me vierem da parte dos homens, porquanto
hei merecido ser pisado aos pés dosdemônios no inferno.
Considera em segundo lugar a alta dignidade de São José por lhe ser
conferido por Deus o ofício de pai de Jesus Cristo: Et erat subditus illis1—«E
era-lhes submisso». Quem é que estava submisso? O Rei do mundo, o Filho
de Deus e também verdadeiramente Deus todo poderoso, eterno, perfeito, em
tudo igual ao Pai. Este é quem na terra quis estar submisso a São José. Por si
mesmo não tinha José autoridade sobre Jesus, por não ser o pai verdadeiro,
mas tão somente o pai putativo. Como esposo, porém, e chefe de Maria, foi o
chefe também de Jesus Cristo, enquanto homem, por ser o fruto das entranhas
de Maria. Quemé dono de uma arvore, o é também dos frutos.
Eis porque a Beata Virgem o chamou pai de Jesus: Pater tuus et ego

dolentes quaerebamos te2—«Eu e teu pai angustiados te procurámos».


Foi, portanto, a São José, como chefe daquela pequena Família, que
coube o ofício de mandar, e a Jesus o de obedecer; de sorte que Jesus nada
fazia, não se movia, não tomava alimento nem repouso, senão segundo as
ordens de José. O dignidade inefável!

II. Devemos honrar muito àquele a quem Deus mesmo tanto tem
honrado. E grande confiança devemos colocar na proteção de São José,
que viu nesta terra o Senhor do mundo submisso às suas ordens. Escreve
Santa Teresa: «O Senhor nosquis dar a entender que, assim como na terra quis
ficar submissoa São José, assim faz agora no céu tudo o que o Santo lhe pede.»
Meu santo Patriarca, pela grande reverência que, como a seu esposo,
vos teve Maria, rogo-vos que me recomendeis a ela, e me alcanceis a graça de
ser o seu verdadeiro e fiel servo até a morte. E pela submissão que na terra
vos mostrou o Verbo encarnado, obtende-me a graça de lhe obedecer e de
ama-lo perfeitamente. No céu Jesus se compraz em conceder todas as graças
que vós pedis em favor daqueles que a vós se recomendam. Eu também,
miserável como sou, me recomendo a vós, escolho-vos por meu advogado
especial e prometo honrar- vos cada dia com algum obséquio particular. Meu
Pai, São José, por piedade, alcançai-me aquela graça que vós sabeis ser mais
útil à minha alma, e especialmente a virtude da santa pureza.
«Sim, glorioso São José, pai e protetor das virgens, guarda fiel, a
quem Deus confiou Jesus, a mesma inocência, e Maria, a virgem das virgens,
eu vos peço e conjuro por Jesus e Maria, este duplo deposito a vós tão caro,
com vosso eficaz auxilio dai-me conservar meu coração isento de toda
mancha, e que, puro e casto, sirva constantemente a Jesus e Maria em perfeita

castidade.» 1 — E vós, ó Mãe de Deus e minha Mãe Maria, pela santa


humildade e obediência com que executastes tudo que vosso santo Esposo
José vos pedia, alcançai-me de Deus a graça da santa humildade e da perfeita

obediência a seuspreceitos divinos2.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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QUINTA-FEIRA - Jesus presente nos altares para ser acessível a todos.
Venite ad me omnes, qui laboratis et onerati estis; et ego
reficiam Vos — «Vinde a mim todos os que estais cansados e
carregados, e eu vos aliviarei» (Mt 11, 28).

Sumário. Nesta terra não é permitido a todos os súbditos falar ao


príncipe. O mais que os pobres podem esperar, é falar- lhe por meio de
terceira pessoa. Não é assim com o Rei de céu, que está no Santíssimo
Sacramento. Com este pode falar quem o deseje, e sem acanhamento.
Procuremos, portanto, ir muitas vezes à sua audiência e expor-lhe todas as
nossas necessidades. Peçamos-lhe particularmente que desligue o nosso a
coração detodas as cousas terrestres, e o encha do seu santo amor.

I. Dizia Santa Teresa que nesta terra não é permitido a todos os


súditos falar a seu príncipe. O mais que os pobres podem esperar é falar-lhe
por meio de terceira pessoa. Mas para conversar convosco, ó Rei do céu, não
se precisa de terceira pessoa; quem quiser, pode achar-Vos no Santíssimo
Sacramento, e falar-Vos à vontade e sem acanhamento. Por isso a mesma
Santa dizia que Jesus Cristo velou a sua majestade sob as aparências do pão,
para nos inspirar mais confiança e nos tirar todo o temor de nos aproximarmos
dele.
Ah! Parece que lá dos altares, Jesus ainda cada dia exclama e diz:
Venite ad me omnes, qui laboratis et onerati estis, et ego reficiam vos— «Vinde
a mim todos os que estais cansados e carregados, e eu vos aliviarei». Vinde a
mim, vós pobres, vinde enfermos, vinde atribulados, vinde justos e pecadores:
em mim achareis o remédio para todos os vossos males e aflições. O que
Jesus Cristo deseja é consolar a quem a ele recorre. Permanece presente sobre
os altares tanto de dia como de noite para ser acessível a todos e comunicar a
todos as suas graças.
Por isso os santos achavam na terra tão grande satisfação em estar na
presença de Jesus sacramentado, que os dias e noites se lhes afiguravam como
instantes. A condessa de Feria, depois de entrada na ordem de Santa Clara,
nunca se fartava de ficar no coro a visitar o Santíssimo Sacramento.
Perguntada uma vez o que fazia tanto tempo diante do santo Tabernáculo,
respondeu que eram tão grandes as delicias que nisso gozava, que queria ficar
ali toda a eternidade. — São João Francisco Regis, depois de passar o dia no
confessionário ou no púlpito, passava as noites na igreja, e achando-a alguma
vez fechada, deixava-se ficar à porta exposto ao frio e ao vento, para ao
menos de longe fazer companhia a seu amado Senhor. São Filipe Neri
exclamava à vista do Santíssimo Sacramento: «Eis aí o meu amor! Eis ai todoo
meu amor!» Ah! Se Jesus Cristo fosse também todo o nosso amor, a nós
também os dias e noites passadas na sua presença se nos afigurariam como
instantes!

II. Em todas as vossas necessidades particulares, como no tomar ou


dar conselho, nos perigos, nas aflições, enfermidades e tentações,
especialmente nas contra a pureza, recorrei sempre a Jesus sacramentado, e
não podendo fazê-lo de corpo, fazei-o pelo menos em espirito. Achando-vos
diante do santo Tabernáculo, dizei muitas vezes com São Felipe Neri: «Eis aí o
meu amor! Eis aí todo o meu amor».
Sim, meu amado Redentor, só a Vós quero amar; quero que sejais o
único amor de minha alma. Sinto-me morrer de dora lembrança de ter outrora
amado as criaturas e minhas satisfações próprias mais que a Vós, e de ter
virado as costas a Vós, ó Bem infinito. Vós, porém, para não me verdes
perecer, me suportastes com tanta paciência, e em vez de me punirdes, me
feristes o coração com tantas flechas de amor, de sorte que não pude mais
resistir às vossas finezas e me dei todo a Vós. Vejo que me quereis
inteiramente para Vós. Mas já que o que- reis, fazei-o; porquanto a Vós
pertence fazer que assim seja.
Livrai-me de todo o apego a terra e a mim mesmo, e fazei com que eu
procure agradar somente a Vós, não pense senão em Vós, não fale senão de
Vós, e não deseje senão arder de amor para convosco, viver e morrer por
Vós. Ó amor de meu Jesus, vem e apodera-te de todo o meu coração e expele
dele todo o amor que não é para Deus. Amo-Vos, ó Jesus sacramentado,
amo-Vos, minha vida, meu tesouro, meu amor, meu tudo. — Ó Maria, minha
esperança, rogai por mim e dai-me ser todo de Jesus. (II 402.)

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SEXTA-FEIRA - Comemoração do sagrado Sudário de Nosso Senhor
Jesus Cristo.
Et depositum (corpus) involvit sindone — «Tendo descido (ocorpo),
amortalhou-o num lençol» (Lc. 23, 53).

Sumário. Para que estivéssemos sempre lembrados de seu amor,


quis Jesus Cristo deixar a sua sagrada esfinge estampada no santo Sudário.
Não faltam na vida de Jesus feitos gloriosos cuja imagem nos podia deixar.
Sendo, porém, a cor rubra da Paixão a mais apropriada para representar o
amor, deixou de parte todos os demais fatos da sua vida, e quis representar
perante nós o Homem das dores, afim de que nos fosse tanto mais amável,
quanto mais desfigurado. Amemo-lo, pois, de todo o coração e soframos de
boa mente alguma coisa por seu amor.
I. «Duas coisas», escreve Cícero, «fazem conhecer um amigo:
fazer-lhe bem e sofrer por ele; e esta última coisa é a maior prova de um
verdadeiro amor». Deus já tinha feito brilhar o seu amor para com os homens,
em grande número de benefícios; mas, diz São Pedro Crisólogo, julgou muito
pouco para seu amor, somente fazer-lhes bem, se não achasse outro modo de
lhe mostrar quanto o amava, sofrendo e morrendo por ele, como fez tomando
a natureza humana. Por isso escreve o Apostolo São Paulo, que a morte de
Jesus Cristo pela salvação dos homens demonstrou até onde chegava o amor
de Deus paraconosco, as suas miseráveis criaturas: Apparuit benignitas et

humanitas Salvatoris nostri Dei1 — «Apareceu a benignidade e o amor de


Deus, nosso Salvador».
Afim de que sempre nos lembrássemos deste seu excesso de amor,
depois de consumada a Redenção do gênero humano, quis deixar-nos a sua
imagem estampada no Sudário em que o envolveram depois da morte. Não
faltavam, de certo, na vida de Jesus mil feitos gloriosos, cuja representação
nos podia deixar, tais como sejam a adoração dos Magos, a transfiguração no
Tabor, a ressurreição de Lazaro, a multiplicação dos pães e mais outros. Mas,
no dizer de São Bernardo, porque «a cor rubra da Paixão é a mais apropriada
para representar o grau supremo e incomparável de amor, Jesus deixou de
parte todo o fato glorioso, para se nos representar no estado de miséria predito
por Isaias: Como homem de dores, objeto de desprezo e o último dos homens,
ferido por Deus e humilhado, como um leproso, o mais miserável dos filhos
dos homens, coberto de chagas desde a cabeça aos pés, maltratado e
desfigurado, até não ter mais aparência de homem: unde nec reputavimus

eum2.
Ah, meu amantíssimo Senhor, em vista de tantos testemunhos do
vosso amor, quem poderá deixar de Vos amar? Tinha razão Santa Teresa, ó
meu amabilíssimo Jesus, de dizer que, quem não Vos ama, prova que não
Vos conhece.

II. O Padre Segneri Junior aconselhou a uma sua con- fessada,


escrevesse ao pé do Crucifixo estas palavras: Eis aí como se ama! Parece que
é isso também o que pelo sagrado Sudário Jesus Cristo quer dizer a cada um
de nós, particularmente quando, para evitar algum incomodo, abandonamos o
bem que mais lhe agrada, e chegamos talvez a renunciar à sua graça: Eis ai
como se ama! — Com razão dizia São Francisco de Sales: «Todas as chagas
do Redentor são outras tantas bocas que nos dizem que devemos sofrer por
amor dele; e a ciência dos santos consiste em sofrer constantemente por
Jesus.»
Amemos, pois, a Jesus (assim nos exorta o amante Santo Agostinho),
amemos a Jesus ao menos por gratidão, amemos de todo o coração ao Esposo
celeste, que nos deve ser tanto mais querido e aceito, quanto mais
desfigurado se nos mostra. Devemos patentear este nosso amor sofrendo de
boa vontade alguma cousa por Jesus, aceitando com resignação o que ele
mesmo nos envia para nosso bem.
Ó meu amado Salvador Jesus! Vejo-Vos todo coberto de chagas; fito
o vosso rosto, já não mais belo, mas todo horrendo de ver e manchado de
escarros e sangue. Quanto mais desfigurado Vos vejo, tanto mais belo Vos
acho e digno de amor. Que são estas chagas e contusões, senão sinais de vosso
amor e de vossa ternura para comigo? Quisestes ser maltratado assim para
tornar bela a minha alma e limpá-la das manchas do pecado. Agradeço-Vos,
meu Senhor; pesa-me de ter-me ajuntado aos algozes para Vos maltratar.
Aceito em espirito de penitência todas as cruzes que queirais enviar, e
prometo amar-Vos sempre de todo o meu coração. Ajudai-me com a vossa
graça a ser-Vos fiel. «Ó meu Deus, Vós, que deixastes os vestígios da vossa
paixão no santo Sudário, no qual José de Arimateia envolveu o vosso
sacratíssimo Corpo: concedei-me, propicio, que pelos merecimentos de vossa
1
morte e sepultura chegue à gloria da ressurreição.» Fazei-o pelo amor do
Coração aflitíssimo de Maria. (*I 544.)

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SÁBADO - Maria Santíssima, modelo de amor para com Deus.
Ego Mater pulchrae dilectionis — «Eu sou a Mãe do beloamor»
(Eclo 24, 24),

Sumário. O fogo de amor em que ardia o Coração da Santíssima


Virgem foi tão veemente, que ela não repetia os atos de amor, como fazem os
outros santos, mas por um privilégio singular amou a Deus sempre
atualmente com um continuo ato de amor. Mas se Maria amou e ama tanto a
seu Deus, certamente ela não exige outra coisa de seus devotos, senão que o
amem também. Como é que tu o amas? Se por ventura te sentes frio, chega-te
com confiança a tua amada Mãe e roga-lhe que te façaseu semelhante.

I. Deus, que é amor, veio ao mundo para ascender em todos a


chama do seu divino amor; mas nenhum coração ficou tão abrasado como o
Coração de sua Mãe, o qual, sendo todo puro dos afetos terrenos, estava todo
disposto para arder neste santo fogo. Por isso o Coração de Maria se tornou
todo fogo e chamas, como se lê nos Cânticos sagrados: Lampades eius,

lampades ignis atque flammarum1 — «As suas lâmpadas são umas lâmpadas
de fogo e de chamas». Fogo, ardendo interior- mente, como explica Santo
Anselmo, e chamas, resplandecendopara fora com o exercício das virtudes.
Revelou a própria Maria a Santa Brígida, que neste mundo ela não
teve outro pensamento, outro desejo, nem outro gosto senão Deus. Eis
porque a sua alma bendita e absorta sempre nesta terra na contemplação de
Deus, fazia inúmeros atos de amor. Ou, para melhor dizer, como escreve
Bernardino de Bustis, Maria não multiplicava os atos de amor, como fazem
osoutros santos; mas, por um privilegio singular, ela amou a Deus atualmente
com um continuo ato de amor. Qual águia realsempre tinha os olhos fixos no
divino Sol, de maneira (diz São Pedro Damião) que nem as ações da vida lhe
impediam o amor,nem o amor lhe impedia a ação.
Acrescentam Santo Ambrósio, São Bernardino e outros, que nem
mesmo o sono interrompia o ato de amor da Santíssima Virgem; de modo que
podia verdadeiramente dizer com a sagrada Esposa: Ego dormio, et cor meum
vigilat1— a. Eu durmo e o meu coração vela». Foi figura de Maria o altar
propiciatório, no qual nunca se extinguia o fogo, nem de dia, nem de noite.
Numa palavra, afirma o Bem-aventurado Alberto Magno que Maria foi cheia
de tão grande amor, que quase não podia caber mais amor numa pura criatura
terrestre. Os próprios serafins podiam descer do céu, para aprenderem no
Coração de Maria como se deve amar a Deus. No reino celeste ela só, entre
todos os santos, pode dizer a Deus: Senhor, senão Vos amei quanto mereceis,
ao menos amei-Vos quanto me foi possível.

II. Já que Maria ama tanto a seu Deus, não há certamente coisa
alguma que ela exija tanto de seus devotos como que o amem igualmente. E o
que a divina Mãe disse à Bem-aventurada Ângela de Foligno, num dia em que
esta tinha comungado; é o que ela disse também a Santa Brígida: «Filha, se
queres cativaro meu amor, ama o meu Filho.»
Pergunta Novarino, porque a Santa Virgem, à imitação da Esposa
dos Cantares, rogava aos anjos que fizessem saber ao seu Senhor o grande
amor que lhe consagrava, dizendo: Adiuro- vos ...ut nuntietis ei, quia amore

langueo2 - «Eu vos conjuro ... que lhe façais saber que estou enferma de
amor?» Por ventura não sabia Deus quanto ela o amava? Com certeza sabia-
o, responde o autor sobredito, que a Virgem quis fazer patente a nós o seu
amor; afim de que, assim como ela estava ferida de amor, nos infligisse a
mesma ferida: Ut vulnerata vulneret. Porque foi toda fogo em amar a Deus,
por isso, como diz São Boaventura, abrasa e torna seus semelhantes todos os
que a amam e a ela se aproximam. Pelo que Santa Catarina de Sena chamava
a Maria Santíssima portatrix ignis: a portadora do fogo do amor divino. Se
queremos também arder nesta beata chama, procuremos sempre
aproximarmos à nossa Mãe santíssima comsúplicas e afetos.

Ah, Rainha do amor, Maria! Sois vós, no dizer de São Francisco de


Sales, a mais amável, a mais amada e a mais amante de todas as criaturas. Ah,
minha Mãe! Vós, que ardestes sempre e toda em amor a Deus, dignai-vos dar-
me ao menos uma faísca desse amor. Rogastes a vosso Filho por aqueles
esposos aos quais faltava o vinho: Vinum non habent1— «Eles não têm
vinho»: não rogareis por nós a quem falta o amor a Deus, ao qual temos tanta
obrigação de amar? Dizei somente: Amorem non kabent— «Eles não têm
amor», e alcançar-nos-eis o amor. Outra graça não vos pedimos senão esta. Ó
minha Mãe! Por quanto amais a Jesus, atendei-nos, rogai por nós. (*I 258.)

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TERCEIRA
SEMANA DA
QUARESMA
DOMINGO -O demônio mudo e as confissões sacrílegas
Erat (Iesus) eiciens daemonium, et illud erat mutum— «Estava(Jesus)
expelindo um demônio, e ele era mudo» (Lc. 11, 14).

Sumário. O demônio mudo de que fala o Evangelho, significa o


falso pudor com que o espirito infernal, depois de seduzir o cristão a ofender
seu Deus, procura faze-lo ocultar o pecado na confissão. Ah, quantas almas
caem todos os dias no inferno por este ardil diabólico! Meu irmão, se jamais o
demônio te vier tentar assim, pensa que, se é vergonhoso ofender a Deus tão
bom, não o é o confessar o pecado cometido e o livrar-se dele. Quantos
santos são venerados sobre os altares, que até fizeram uma confissão pública!

I. O demônio mudo de que fala o Evangelho é o falso impedimento


com que o espírito infernal procura fazer-nos calar na confissão os pecados
cometidos, depois de primeiro nos ter cegado para não vermos o mal que
cometemos e a ruina que nos preparamos ofendendo a Deus. — Com efeito,
exclama São João Crisóstomo, o demônio faz em todas as coisas o contrário do
que Deus faz. O Senhor pôs vergonha no pecado para que o não cometamos;
mas depois de o havermos cometido, anima-nos a confessá-lo, prometendo o
perdão a quem se acusa. O demônio, ao contrário, inspira confiança ao
pecador com a esperança do perdão; mas cometido o pecado, cobre-o de
vergonha, para que se não confesse.

Por este ardil diabólico, oh, quantas almas já foram precipitadas e


ainda se precipitam cada dia no inferno! Sim, porque os miseráveis convertem
em veneno o remédio que Jesus Cristo nos preparou com seu preciosíssimo
sangue, e ficam presas com uma dupla cadeia, cometendo depois do primeiro
pecado outro mais grave: o sacrilégio.
Irmão meu, se por desgraça a tua alma está manchada pelo pecado,
escuta o que te diz o Espirito Santo: Pro anima tua ne confundaris dicere
verum1. Sabe, diz ele, que há duas qualidades de vergonha; deves fugir
daquela que te faz inimigo de Deus, conduzindo-te ao pecado; mas não da
que se sente ao confessá-lo e te faz receber a graça de Deus nesta vida e a
gloriado paraíso na outra.
Se, pois, te queres salvar, não te envergonhes de fazer uma boa
confissão; aliás a tua alma se perderá. As feridas gangrenosas levam à morte,
e tais são os pecados calados na confissão; são chagas da alma que se
gangrenaram.

II. Meu filho, vergonhoso é o entrar nesta casa, mas não sair dela.
Assim falou Sócrates a um seu discípulo que não quis ser visto ao sair de uma
casa suspeita. É o que digo também àqueles que, depois de cometerem um
pecado grave, têm vergonha de o confessar. Meu irmão, coisa vergonhosa é
ofender a um Deus tão grande e tão bom; mas não o é confessarmos o
pecado cometido e livrar-nos dele. Foi por ventura coisa vergonhosa para
Santa Maria Madalena o confessar em público aos pés de Jesus Cristo, que era
uma mulher pecadora? Foi motivo de vergonha confessar-se uma Santa Maria
Egípcia, uma Santa Margarida de Cortona, um Santo Agostinho, e tantos
outros penitentes, que algum tempo tinham sido grandes pecadores? Por meio
de sua confissão fizeram-se santos.
Animo, pois, meu irmão, animo! (Falo a quem cometeu a falta de
ocultar por vergonha um pecado.) Tem ânimo e dize tudo a um confessor. Dá
gloria a Deus, e confunde o demônio que, como diz o Evangelho, quando
saiu do homem, anda por lugares secos, buscando repouso, e não o acha. —
Porém, depois de te teres confessado bem, prepara-te para novos e mais
violentos assaltos da parte do inimigo infernal. Ai de quem o deixa entrar
novamente, depois de o haver expulso! Et fiunt novissima hominis illius
peiora prioribus — «O último estado do homem virá a ser pior do que o
primeiro».
Ó meu amabilíssimo Jesus! Iluminai o meu espirito, afim de que
nunca mais me deixe obcecar pelo espírito maligno a cometer de novo o
pecado. Pesa-me de Vos haver ofendido, e proponho com a vossa graça antes
morrer que tornar a ofender- Vos. Mas, se por desgraça cair novamente, dai-
me força para sempre vencer o demônio mudo e confessar-me sinceramente ao
vosso ministro. «Peço-Vos, Deus todo-poderoso, que atendais propicio às
minhas humildes súplicas, e que em minha defesa estendais o braço de vossa
majestade.»1 Doce Coração de Maria,sede minha salvação. (*III 413.)

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SEGUNDA-FEIRA - Da verdadeira sabedoria.
Et dedit illi scientiam sanctorum — «E deu-lhe a ciência dossantos»
(Sb. 10, 10).

Sumário. Oh, que bela ciência, a de saber amar a Deus e salvar a


alma. É esta a ciência mais necessária de todas, porquanto, se soubéssemos
tudo e não nos soubéssemos salvar, nada nos aproveitaria e seriamos
eternamente infelizes; ao passo que seremos eternamente bem-aventurados, se
soubermos amar a Deus, ainda que no mais fossemos completamente
ignorantes. Quantos sábios estão no inferno! Quantos, que aqui foram
ignorantes, gozam no paraíso! Que aproveitou aqueles a sua sabedoria?... que
prejuízo causou a estes a sua ignorância?

I. Compreendamos bem que os verdadeiros sábios são aqueles que


sabem adquirir a graça de Deus e o paraíso. Que belaciência a de amar a Deus e
salvar a alma! O livro onde se ensina a salvar a alma, é de todos o mais
necessário. Se soubéssemos tudo e não nos soubéssemos salvar, nada nos
aproveitaria e seriamos para sempre desgraçados. Ao contrário, seremos
eternamente felizes se soubermos amar a Deus, ainda que no mais fossemos
completamente ignorantes. Beatus qui te novit, etsi alia nescit — «Bem-
aventurado o que Vos conhece, ó Deus, embora ignore todas as outras
coisas!» exclamava Santo Agostinho.
Certo dia Frei Gil disse a São Boaventura:
— Feliz de ti, Padre Boaventura, que sabes tantas coisas, e eu pobre
ignorante nada sei; tu podes ser muito mais santo do que eu.
— Escuta — respondeu-lhe o Santo, — se uma velhinha ignorante
souber amar a Deus mais do que eu, ela será mais santado que eu.
Surgunt indocti, et rapiunt coelum — «Os ignorantes levantam-se e
conquistam o céu», disse Santo Agostinho. Quantos rústicos que não sabem
ler, mas sabem amar a Deus, se salvam, e quantos sábios segundo o mundo se
condenam! Aqueles, e não estes, são os verdadeiros sábios. Que grandes
sábios foram um São Pascal, um São Feliz, capuchinho, um São João de Deus,
apesar de ignorarem as ciências humanas! Que grandes sábios foram tantos
outros, que, deixando o mundo, se foram encerrar nos claustros, ou viver nos
desertos! Que grandessábios tantos mártires, tantas virgens, que renunciaram a
ilustres alianças, indo morrer por amor de Jesus Cristo! — Numa palavra, os
que renunciam aos bens terrestres para se consagrarem a Deus, são chamados
homens desenganados. Portanto, os que abandonam a Deus pelos bens do
mundo,devem ser chamados homens enganados.
Irmão meu, em qual das duas categorias te queres achar? Para que
faças boa escolha, aconselha-te São João Crisóstomo que visites os
cemitérios, que são as mais excelentes escolas para aprender a vaidade dos
bens terrestres e a ciência dos santos. Proficiscamur ad sepulchra — «Vamos
aos túmulos». Dize-me:sabes ali distinguir quem foi rei, nobre ou literato?
Eu por mim — acrescenta o Santo— não vejo senão um montão de
ossos, de vermes e de podridão.
II. Irmão meu, se queres ser sábio, não basta conheceres a
importância de teu fim: é preciso também empregares os meios para o
alcançares. Todos se quereriam salvar e ser santos; mas como não procuram
os meios, não se santificam e perdem-se. É preciso evitar as ocasiões,
frequentar os sacramentos, fazer oração, e mais do que tudo, gravar no
coração as maximas do Evangelho, como sejam: Quid prodest homini, si
universum mundum lucretur? — «Que aproveita ao homem ganhar o mundo
inteiro? É preciso perder tudo, até a vida, para salvar a alma2». Para seguir
Jesus Cristo, deve-se recusar ao amor próprio a satisfação que deseja3. A
nossa salvação consiste em fazer a vontade de Deus4. São estas as máximas e
outras semelhantes, que devem frequentes vezes ser objeto da nossa
meditação, se nós também quisermos ser verdadeiros sábios e salvar-nos.
Ó Pai das misericórdias, lançai um olhar sobre a minha miséria e
tende piedade de mim. Iluminai-me e fazei-me conhecer o meu
desvairamento passado, para o deplorar, e a vossa infinita bondade, para a
amar. Ó meu Jesus: Ne tradas bestiis animas confitentes tibi5—«Não
entregueis às feras as almas que Vos louvam». Derramastes o vosso sangue
para me salvar; não permitais que me torne ainda escravo do demônio, como
já o fui no passado. Arrependo-me de Vos ter deixado, o supremo Bem.
Amaldiçoo todos os instantes em que, por minha própria vontade, consenti no
pecado, e uno-me estreitamente à vossa santa vontade, que só deseja a minha
felicidade.
Ó Padre Eterno, pelos merecimentos de Jesus Cristo, dai- me a força
para executar tudo o que é do vosso agrado. Deixai- me antes morrer do que
opor-me à vossa santa vontade. Ajudai- me com a vossa graça a depositar
unicamente em Vós todo o meu amor, e a desligar-me de todos os afetos, que
não se referema Vós. Amo-Vos, ó Deus de minha alma, amo-Vos sobre todas
as cousas, e de Vós espero todos os bens, o perdão, a perseverança em vosso
amor e o paraíso para Vos amar eternamente. — Ó Maria, pedi estas graças
para mim. Vosso Filho não vos recusa nada. Esperança minha, em vós confio.
(*II93.)

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TERÇA-FEIRA - A separação dos escolhidos e dos réprobos no Juízo
final.
Exibunt angeli, et separabunt maios de medio iustorum —
«Sairão os anjos e separarão os maus do meio dos justos» (Mt13, 49).

Sumário. Quando todos os homens estiverem reunidos no Vale de


Josaphat, virão os anjos separar os réprobos dos escolhidos. Estes ficarão à
direita e aqueles serão para sua confusão impelidos para a esquerda. Oh, que
triste separação! Meu irmão, de que lado nos acharemos nesse dia? À direita
com os escolhidos, ou à esquerda com os condenados? Se quisermos estar à
direita, deixemos o caminho que conduz à esquerda.

I. Assim que os homens tiverem ressuscitado, ser-lhes-á intimado


que se dirijam todos ao Vale de Josaphat, para serem julgados. Quando todos
estiverem ali reunidos, virão os anjos e separarão os réprobos dos escolhidos:
Exibunt angeli, et separabunt maios de medio iustorum. Os justos ficarão à
direita, e os condenados serão impelidos para a esquerda. — Que magoa não
sentiria quem fosse banido da sociedade ou da Igreja! Mas que dor muito
maior não sentirá, quando se vir expulso da companhia dos Santos! Unus
assumetur, et alter relinquetur1 —
«Um será tomado, e outro será desprezados». Diz São João Crisóstomo que,
se os réprobos não tivessem outra pena a sofrer, esta confusão já seria para eles
um suplício infernal.

Atualmente no mundo são julgados felizes os príncipes e os ricos; e


são desprezados os santos que vivem na pobreza e humildade. Ó cristãos
fieis, vós que amais a Deus, não vos aflijais porque neste mundo viveis
desprezados e em tribulações: Tristitia vestra vertetur in gaudium2—«A vossa
tristeza se há de converter em alegria». Então se dirá que vós sois os
verdadeiros felizes, e tereis a honra de ser proclamados os cortezões da cortede
Jesus Cristo.
Que brilhante figura não fará então um São Pedro de Alcântara, que
foi vilipendiado como apóstata! Um São João de Deus, que foi tratado como
insensato! Um São Pedro Celestino, que morreu numa prisão depois de ter
abdicado o papado! Que honra receberão então tantos mártires, cruciados
aqui pelos algozes! Tunc laus erit unicuique a Deo3—«Então cada um terá de
Deus o louvor». Que horrível figura, pelo contrário, não fará um Herodes, um
Pilatos, um Nero, e tantos outros grandes da terra, agora condenados! — Ó
partidários do mundo, espero-vos no Vale de Josaphat; aí mudareis sem
dúvida de sentimentos; aídeplorareis a vossa loucura. Infelizes! Por uma curta
aparição no teatro deste mundo, tendes de fazer depois o papel de condenados
na tragédia do juízo final.
II. Os escolhidos serão colocados à direita, ou antes, segundo o
que diz o Apóstolo, para sua maior gloria, serão elevados aos ares sobre
as nuvens, para irem com os anjos ao encontro de Jesus Cristo, que deve vir
do céu: Rapiemur cum illis in nubibus, obviam Cristo in aera!— «Seremos
arrebatados com eles nas nuvens ao encontro de Cristo». E os condenados,
como um rebanho de cabritos destinados ao matadouro, serão impelidos para
a esquerda, esperando pelo Juiz, que virá pronunciar publicamente a
condenação de todos os seus inimigos. — Meu irmão, de que lado nos
acharemos nós nesse dia? À direita com os escolhidos, ou à esquerda com os
réprobos?
Ó meu amado Redentor, ó Cordeiro de Deus, que viestes ao mundo,
não para castigar, mas para perdoar os pecados: ah! Perdoai-me sem demora,
antes que chegue o dia em que deveis ser meu Juiz. Se eu então viesse a
perder-me, à vossa vista, ó doce Cordeiro, que me tendes aturado com tanta
paciência, a vossa vista seria o inferno do meu inferno. Ah! perdoai-me,
repito, sem demora. Com o socorro da vossa mão misericordiosa, fazei-me
sair do precipício, onde me fizeram cair os meus pecados. Arrependo-me, ó
soberano Bem, de Vos ter ofendido tantas vezes. Amo-Vos, ó meu Juiz, que
tanto me haveis amado.
Suplico-Vos pelos méritos da vossa morte, que me deis uma graça
tão eficaz, que me torne de pecador em santo.

Prometestes atender a quem Vos roga: Clama ad me et exaudiamte2 — «Clama


por mim e eu te atenderei». Não Vos peço bens terrenos; peço-Vos a vossa
graça, o vosso amor e nada mais. Atendei-me, ó meu Jesus, pelo amor que
me dedicastes morrendo por mim na cruz. Meu amado Juiz, sou um culpado,
mas um culpado que Vos ama mais que a si próprio. Tende piedade de mim!
— Maria, minha Mãe, vinde depressa em meu auxilio, agora que me podeis
ainda socorrer. Não me abandonastes quando vivia esquecendo-me de vós e
de Deus. Socorrei-me, já que estou resolvido a servir-vos sempre e a nunca
mais ofender a meu Senhor. Ó Maria, vós sois a minha esperança. (II 114.)

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QUARTA-FEIRA - Da glória de São José, Esposo daVirgem Maria.
Qui custos est Domini sui, glorificabitur — «O que é o guardado seu
Senhor, será glorificado» (Pv. 27, 18).

Sumário. Devemos ter por certo que a vida de São José, sob a vista e
na companhia de Jesus e Maria, foi uma oração continua, cheia de fé, de
confiança, de amor, de resignação e de oferecimento. Visto que a recompensa
é proporcionada aos merecimentos da vida, considera quão grande será no
paraíso a gloria do santo Patriarca. Com razão se admite que ele, depois da
Bem-aventurada Virgem, leva vantagem a todos os demais Santos. Por isso,
quando São José quer obter alguma graça para seus devotos, não tanto pede,
como de certo modo manda a Jesuse Maria.

I. A gloria que Deus confere no céu a seus Santos, é proporcionada


a santidade de vida que eles levaram em terra. Para termos uma ideia da
santidade de São José, basta que consideremos unicamente o que diz o
Evangelho: Ioseph autemvir eius, cum esset iustus1—«José seu esposo, como
era homem justo». A expressão homem justo significa um homem que possui
todas as virtudes; porquanto aquele a quem falta uma delas, não pode ser
chamado justo.
Ora, se o Espírito Santo chamou a São José justo, na ocasião em que
foi escolhido para Esposo de Maria, avalia, que tesouros de amor divino e de
todas as virtudes o nosso Santo não devia auferir dos colóquios e da continua
convivência com a sua santa Esposa, que lhe dava exemplos perfeitos de
todas as virtudes. Se uma só palavra de Maria foi bastante eficaz para
santificar ao Batista e para encher Santa Isabel do Espirito Santo, a que alturas
não pensamos que deve ter chegado a bela alma de José pela convivência
familiar com Maria, da qual gozou pelo espaço de tantos anos?
Além disso, que aumento de virtudes e de méritos não deve ter
adquirido São José convivendo continuamente por tantos anos com a própria
santidade, Jesus Cristo, servindo-o, alimentando-o e assistindo-lhe nesta
terra?
Se Deus promete recompensar aquele que por seu amor dá um
simples copo de água a um pobre, considera quão alta gloria terá dado a José,
que o salvou das mãos de Herodes, forneceu-lhe vestidos e alimentos, o
trouxe tantas vezes nos braços e carregou com tamanho afeto. — Devemos ter
por certoque a vida de São José, sob a vista e na companhia de Jesus e Maria,
foi uma oração continua, cheia de atos de fé, de confiança, de amor, de
resignação e de oferecimento. Se, pois, a recompensa é proporcionada aos
merecimentos ajuntados na vida, considera quão grande será a gloria de São
José no paraíso!
II. Santo Agostinho compara os demais Santos com estrelas, mas
São José com o sol. O Padre Soares diz que é muito aceitável a opinião que
depois de Maria São José leva vantagem a todos os demais Santos em
merecimento e em gloria. Donde o Venerável Bernardino de Bustis conclui
que São José, de certo modo, dá ordens a Jesus e Maria quando quer impetrar
algum favor para os seus devotos.
Meu santo Patriarca, agora que gozais no céu sobre um trono
elevado junto do vosso amadíssimo Jesus, que vos foi submetido na terra,
tende compaixão de mim, que vivo no meio de tantos inimigos, maus espíritos
e más paixões, que me dão combates contínuos para me fazerem perder a
graça de Deus. Ah! Pela felicidade que tivestes, de gozar na terra, sem
interrupção, da companhia de Jesus e Maria, alcançai-me a graça de passar o
resto de minha vida sempre unido a Deus e de morrer depois no amor de Jesus e
Maria, para que um dia possa ir gozar, convosco, da sua companhia, no reino
dos bem-aventurados.
E Vós, ó meu Amado Jesus, meu amantíssimo Redentor, quando
poderei ir gozar-Vos e amar-Vos no paraíso face a face, seguro de não Vos
poder mais perder? Enquanto viver, estarei exposto a tal perigo. Ah, meu
Senhor e meu único Bem, pelos merecimentos de São José, que Vós amais e
honrais tanto no céu; pelos merecimentos de vossa querida Mãe; e mais
ainda, pelos merecimentos de vossa vida e morte, pelas quais merecestes para
mim todo o bem e toda a esperança: não permitais que em tempo algum eu me
separe nesta terra de vosso amor, afim de que possa ir para a pátria do amor, a
possuir-Vos e amar-Vos com todas as minhas forças e nunca mais em toda a
eternidade afastar-me da vossa presença e do vosso amor. (II 432.)

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QUINTA-FEIRA - Grandeza da dádiva que Jesus Cristo nos fez na
santíssima Eucaristia.
In omnibus divites facti estis in illo —«Em todas as coisas fostes
enriquecidos nele» (1 Cor. 1, 5).

Sumário. É tão grande a dádiva que Jesus Cristo nos fez na


santíssima Eucaristia, que, apesar de ser poderosíssimo, sapientíssimo e
riquíssimo, não pode, nem sabe, nem tem para dar-nos outra mais excedente.
Como é, pois, possível que os homens, tão sensíveis a qualquer delicadeza,
fiquem insensíveis a tão grande dom e paguem o seu benfeitor com ingratidão.
Se
nós também fomos no passado tão ingratos, peçamos de todo o coração que
Jesus nos perdoe.

I. Santo Agostinho, considerando a grandeza do dom queJesus Cristo


nos oferece na santíssima Eucaristia, ficou tão enlevado, que escreveu esta
celebre sentença, que com tal dádiva Jesus esgotou, por assim dizer, os seus
atributos infinitos. — Deus, assim diz o santo Doutor, é poderosíssimo, e se
quisesse, poderia, a um só sinal seu, criar mil mundos cada qual mais bonito.
Contudo, apesar de ser todo-poderoso, não nos pode oferecer outro dom mais
precioso do que este: Cum esset omnipotens, plus dare non potuit. — Deus é
sapientíssimo, e a sua sabedoria, como diz o Real Profeta, não tem limites1.
Mas com toda a sua sabedoria, não sabe achar um dom mais excelente do que a
santíssima Eucaristia: Cum esset sapientissimus, plus dare nescivit. — Deus
afinal é riquíssimo, e os seus tesouros são inesgotáveis. Todavia, com toda a
sua riqueza não tem joia mais preciosa ou mais estimável do que esta para nos
presentear: Cum esset ditissimus, plus dare nescivit. — E a razão é óbvia:
Na santíssima Eucaristia Jesus Cristo nos dá não somente a sua
humanidade, senão também a sua divindade. Para nos oferecer, pois, outro
dom mais excelente do que este, necessário seria quenos desse um Deus maior
do que ele mesmo; o que é impossível.Tinha razão Isaias em
exclamar: Notas facite adinventiones eius2 — «Publicai, ó
homens, as invenções amorosas de nosso bom Deus». Se o Redentor não
nos tivesse feito espontaneamente este donativo, quem é que lh’o ousaria
pedir? Quem é que se atreveria a dizer-lhe: Senhor, se quereis fazer-nos
conhecer o vosso amor, escondei-Vos sob as espécies de pão e vinho e
consenti que Vos tomemos como nosso alimento? Mas o que nunca
poderiam imaginar os homens, concebeu-o e cumpriu-o o grande amor de
Jesus Cristo. Ó prodígio de amor!

II. Santa Maria Magdalena de Pazzi costumava dizer que depois da


comunhão a alma pode repetir a palavra de Jesus: Consummatum est— «Está
consumado». Visto que o meu Deusse me deu a si mesmo nesta comunhão, ele
fez um último esforço de seu amor para comigo, e não tem mais nada para me
dar. — Mas como é, pois, possível que os homens, de ordinário tão
sensíveis a qualquer cortesia que se lhes faz, ficam tão insensíveis ao dom
inapreciável do Santíssimo Sacramento e pagam a Jesus Cristo com a mais
negra ingratidão? — Ah! Meu irmão, se no passado tu também foste um
daqueles ingratos, pede sinceramente perdão e resolve-te a sacrificar de hoje
em diante tudo por Jesus Cristo, assim como ele se sacrificou todo por ti
neste inefável mistério.
Ó meu Jesus, o que é que Vos levou a dar-Vos inteiramente para
nosso sustento? E depois deste dom, que mais Vos resta para nos obrigar a
amar-Vos? Iluminai-nos, Senhor, e fazei-nos conhecer qual foi esse excesso
de amor que Vos levou a transformar-Vos em alimento para Vos unirdes a
nós, pobres pecadores. Mas se Vos dais inteiramente a nós, justo é que
inteiramente nos dêmos a Vós. — Ó meu Redentor, como é quepude ofender-
Vos, a Vós que me haveis amado tanto, e que não pudestes fazer mais para
ganhar o meu amor? Por mim Vos fizestes homem, por mim morrestes e Vos
fizestes meu alimento. Dizei-me, que Vos restava fazer ainda?
Amo-Vos, Bondade infinita; amo-Vos, Amor infinito; meu Deus,
amo-Vos sobre todas as cousas. Senhor, entrai frequentes vezes na minha
alma, inflamai-me inteiramente no vosso santo amor, e fazei com que tudo
esqueça para só pensar em Vós e não amar senão a Vós. — Maria Santíssima,
rogai por mim. Com a vossa intercessão, tornai-me digno de receber muitas
vezes o vosso Filho sacramentado. (*II 159.)

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SEXTA-FEIRA - Comemoração das cinco Chagas de Nosso Senhor
Jesus Cristo.
Haurietis aquas in gaudio de fontibus Salvatoris — «Tirareiscom
alegria águas das fontes do Salvador» (Is. 12, 3).

Sumário. As Chagas de Jesus são aquelas benditas fontes preditas


por Isaias, das quais podemos tirar todas as graças, se as pedimos com fé. São
fontes de misericórdia, fontes de esperança, e sobretudo fontes de amor;
porquanto as suas águas, ao passo que purificam a alma das manchas da
culpa, abrasam-na no santo amor. Avizinhemo-nos muitas vezes daquelas
fontes do Salvador, para apagar a nossa sede dasgraças.

I. As Chagas de Jesus Cristo são aquelas benditas fontes preditas por


Isaias, das quais podemos tirar todas as graças, se as pedimos com fé:
Haurietis aquas in gaudio de fontibus Salvatoris — «Tirareis com alegria
águas das fontes do Salvador».
São em primeiro lugar fontes de misericórdia. Jesus Cristo quis que
lhe fossem traspassados as mãos, os pés e o lado sacrossanto, afim de aplacar
por nós a divina justiça, e ao mesmotempo abrir-nos um abrigo seguro, no qual
nos pudéssemos subtrair às flechas da ira de Deus.
Por isso, o Senhor mesmo nos anima, dizendo no Cânticodos cânticos:
Vem, pomba minha, nas aberturas da pedra1; istoé, na interpretação de São
Pedro Damião: vem dentro destas minhas chagas, onde acharás todo o bem
para tua alma. — Mais expressivas ainda são as palavras de que se serve na
profecia deIsaias: Ecce in manibus meis descripsi te2—«Eis aí que te graveiem
minhas mãos». Como se dissesse: Minha pobre ovelha, tem ânimo; não vês
quanto me custaste? Eu te gravei em minhas mãos, nestas chagas que recebi
por teu amor. Elas me solicitam sempre a ajudar-te e defender-te de teus
inimigos; tem, pois, amor e confiança em mim.
As Chagas de Jesus são também fontes de esperança; porquanto,
como escreve São Paulo, o Senhor quis morrer consumido pelas dores, afim
de merecer o paraíso para todos os pecadores arrependidos e resolvidos a
emendar-se: Et consummatus, factus est omnibus obtemperantibus causa
salutis3 — «E pela sua consumação foi feito autor da salvação para todos os
que lhe obedecem». — Durante uma enfermidade, São Bernardo se viu certa
vez transportado perante o tribunal deDeus, onde o demônio o acusava de seus
pecados e lhe dizia que não merecia o céu. Respondeu-lhe então o Santo: «É
verdade que eu não mereço o paraíso; mas Jesus tem dois direitos para este
reino: um por ser Filho verdadeiro de Deus, outro por tê-lo merecido com a
sua morte. Contentando-se com o primeiro, cedeu-me o segundo, em virtude
do qual peço e espero a glória celeste». É isto, meu irmão, o que nós
também podemos dizer:

As Chagas de Jesus Cristo são os nossos merecimentos, a nossa esperança:


Vulnera tua merita mea.
II. As Chagas de Jesus Cristo são, em terceiro lugar, fontes de
amor; porque as águas que ali brotam, purificam as almas e ao mesmo tempo
abrasam-nas daquele santo fogo que o Senhor veio ascender sobre a terra nos
corações dos homens. Pelo que São Boaventura exclama: «Ó Chagas que
feris os corações mais duros e abrasais as almas mais frias de amor divino.»
São Paulo protestou solenemente de si: Non enim iudicavi scire me
aliquid inter vos, nisi Iesum Christum, et hunc cruciftxum1—«Não entendi
saber entre vós coisa alguma senão a Jesus Cristo, e este crucificado». Não
ignorava, de certo, o Apóstolo que Jesus Cristo nascera numa gruta, que
passara trinta anos de sua vida numa oficina, que ressuscitara e subira ao céu.
Não obstante isso diz que não queria saber senão de Jesus crucificado, porque
este mistério o excitava mais a amá-lo, vistoque as sagradas Chagas lhe diziam
o amor imenso que Jesus nos teve. — Recorramos, pois, frequentes vezes por
meio de uma meditação atenta, a estas fontes divinas do Salvador: Omnes
sitientes venite ad aquas2—«Todos vós os que tendes sede, vindeàs aguas».

Eterno Pai, lançai vossos olhos sobre as Chagas de vossodivino Filho:


estas Chagas Vos pedem todas as misericórdias para mim; perdoai-me, pois,
as ofensas que Vos fiz; apoderai- Vos de meu coração todo, para que não ame,
busque nem deseje cousa alguma fora de Vós. Ó Chagas de meu Redentor,
formosas fornalhas de amor, recebei-me e inflamai-me, não com o fogo do
inferno que mereço, mas com a santa chama de amor a este Deus que quis
morrer por mim, à força de tormentos.-— «E Vós, Eterno Pai, que pela paixão
de vosso Filho unigênito e pelo sangue que ele derramou por suas cinco
chagas, renovastes a natureza humana, perdida pelo pecado: concedei-me
propício que, venerando na terra estas chagas divinas, eu mereça conseguir
no céu o fruto do sangue preciosíssimo de Jesus.»1 — Fazei-o pelo amor do
próprio Jesus Cristo e de Maria Santíssima.(*I 588.)

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SÁBADO - Terceira Dor de Maria Santíssima — Perda de Jesus no templo.
Ecce pater tuus et ego dolentes quaerebamus te — «Eis que teupai e eu te
andávamos buscando cheios de aflição» (Lc. 2, 48).

Sumário. A dor de Maria pela perda de Jesus foi sem dúvida uma
das mais amargas; porque ela então sofria longe de Jesus, e a humildade fazia-
lhe crer que o Filho se tinha apartado dela por causa de alguma negligência
sua. Sirva-nos esta dor de conforto nas desolações espirituais; e ensine-nos o
modo de buscarmos a Deus, se jamais para nossa desgraça viermos a perde-lo
por nossa culpa. Lembremo-nos, porém, de que quem quiser achar a Jesus,
não o deve buscar entre os prazeres e delicias, mas no pranto, entre as cruzes
e mortificações, assim como Maria o procurou.

I. Quem nascer cego, pouco sente a pena de ser privado de ver a luz
do dia; mas quem em outro tempo teve a vista e gozou a luz, muita pena sente
em se ver dela privado. E assim igualmente as almas infelizes que, cegas pelo
lodo desta terra, pouco têm conhecido a Deus, pouco sentem a pena de não o
acharem. Ao contrário, quem, iluminado pela luz celeste, foi feito digno de
achar no amor a doce presença do supremo Bem, ó Deus! Que tristeza sente
em ver-se dela privado.
Vejamos, portanto, o muito que a Maria, acostumada a gozar
continuamente a dulcíssima presença de seu Jesus, devia ser dolorosa a
terceira espada que a feriu, quando, havendo-o perdido em Jerusalém, por
três dias se viu dele separado. — Alguns escritores opinam que esta dor
não foi somente uma das maiores que teve Maria na sua vida, mas que foi em
verdade a maior e mais amarga. E com razão, porque então ela não sofria em
companhia de Jesus, como nas outras dores; e porque a sua humildade lhe
fazia crer que Jesus se tinha afastado dela por alguma negligência no seu
serviço. Por esta razão aqueles três dias lhe foram excessivamente longos e se
lhe afiguraram séculos, cheios de amargura e de lágrimas.
Num quem diligit anima mea vidistis?1—«Vistes porventura aquele
a quem ama a minha alma?». É assim que a divina Mãe, como a Esposa dos
Cantares, andava perguntando por toda a parte. E depois, cansada pela fadiga,
mas sem o ter achado, oh, com quanto maior ternura não terá dito o que disse
Ruben de seu irmão: Puer non comparet, et ego quo ibo? 2 —
«O menino não aparece, e eu para onde irei?» O meu Jesus não aparece, e eu
não sei que mais possa fazer para o achar; mas aonde irei sem o meu tesouro?
Ah, meu filho dileto! Cara luz de meus olhos: faze-me saber onde estás, afim
de que eu não ande mais errando e buscando-te em vão. Numa palavra,
afirma Orígenes que pelo amor que esta santa Mãe tinha a seu Filho, padeceu
mais nesta perda de Jesus, que qualquer outro mártir no tormento que o privou
da vida.

II. Esta dor de Maria, em primeiro lugar, deve servir de conforto


àquelas almas que estão desoladas e não gozam a doce presença de seu
Senhor, gozada em outros tempos. Chorem, sim, mas chorem com paz, como
chorou Maria a ausência de seu Filho. Não temam por isso de terem perdido a
divina graça, animando-se com o que disse Deus mesmo a Santa
Teresa:
«Ninguém se perde sem o conhecer; e ninguém fica enganado sem querer ser
enganado.» — Se o Senhor se ausenta dos olhos da alma que o ama, nem por
isso se ausenta do coração. Esconde-se muitas vezes para ser por ela buscado
com mais desejo e amor. Mas quem quer achar a Jesus, é preciso que o
busque, não entre as delicias e os prazeres do mundo, mas entre as cruzes e
mortificações, como o buscou Maria: Dolentes quaerebamus te — «Nós te
andávamos buscando cheios de aflição».
Além disso, neste mundo não devemos buscar outro bemsenão Jesus.
Jó não foi, por certo, infeliz quando perdeu tudo o que possuía neste mundo,
até descer a um monturo. Porque tinha consigo Deus, também então era feliz.
Verdadeiramente infelizes e miseráveis são aquelas almas que perderam a
Deus. Se, pois, Maria chorou a ausência do Filho, quanto mais deveriam
chorar os pecadores que perderam a divina graça, e aos quais Deus diz: Vos

non populus meus, et ego non ero vesler1— «Vós não sois meu povo, e eu
não serei mais vosso».

Mas a maior desgraça para aquelas pobres almas, diz Santo


Agostinho, é que, se perdem um boi, não deixam de procura-lo; se perdem
uma ovelha, não poupam diligência para achá-la; se perdem um jumento, não
têm mais repouso; mas se perdem o sumo Bem, que é Deus, comem, bebem e
ficamquietos. — Ah, Maria, minha Mãe amabilíssima, se por minha desgraça
eu também perdi a Jesus pelos meus pecados, rogo-vos, pelos méritos das
vossas dores, fazei que eu depressa o vá buscare o ache, para nunca mais tornar
a perdê-lo em toda a eternidade.(*1 238.)

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QUARTA
SEMANA DA
QUARESMA
DOMINGO – A multidão faminta e as almas do purgatório
Unde ememus panes ut manducent hi? – “Onde compraremospães
para que estes comam?” (Jo 6, 5)

Sumário. A tenra compaixão que moveu o Senhor a multiplicar os


pães para dar de comer à multidão que o seguia, deve mover-nos a socorrer as
almas do purgatório, que são muito mais numerosas e muito mais famintas de
seu alimento espiritual, que é Deus. O meio principal de que devemos usar
para lhes levar socorro é a santíssima Eucaristia. Em sufrágio dessas almas,
visitemos frequentemente a Jesus sacramentado; aproximemo-nos da mesa da
comunhão, e, se não podemos mandar celebrar missas, ouçamos ao menos
todas as que as nossas ocupações nos permitam ouvir.

I. Refere o Evangelho que, estando Jesus assentado sobre um monte,


levantou os olhos, e viu ao redor de si uma multidão de quase cinco mil
pessoas, que O seguiam, porque viam os milagres que fazia sobre os
enfermos. Em seguida, sabendo que um moço tinha cinco pães de cevada e
dois peixes, tomou-os em suas mãos, e, tendo dado graças, os mandou
distribuir à multidão. Não somente houve o bastante para todos se fartarem,
mas com os pedaços que sobejaram, os apóstolos encheram doze cestos. Eis aí
o grande milagre que Jesus Cristo fez por compaixão de tantos pobres
corporalmente.

Ora, é justo, ou para dizer melhor, é necessário que tenhamos


compaixão das almas de outra multidão muito mais numerosa e
incomparavelmente mais faminta do seu alimento espiritual: devemos
compadecer-nos das almas benditas do purgatório. — Pobres almas! São
muitas as penas que padecem naquele cárcere de tormentos; porém, acima de
tudo aflige-as a privação da dulcíssima presença de Deus, cuja beleza infinita
já conhecem. Não há na linguagem humana palavras apropriadas para
exprimir qual seja esta pena; mas ainda que possuíssemos as palavras
adequadas, faltar-nos-ia a capacidade de compreendê-las, preocupados como
estamos com as coisas terrestres.
Mas a pena que a privação de Deus traz consigo é bem
compreendida pelas pobres almas que a padecem. Por isso levantam a sua voz
lamentosa e pedem-nos que lhes saciemos a fome inconcebível de
contemplarem quanto antes o objeto de seu amor: Miseremini mei, saltem
vos, amici mei, quia manus Domini tetigit me (1) — “Compadecei-vos de
mim, ao menos vós, que sois meus amigos, porque a mão do Senhor me
feriu”.

II. O milagre da multiplicação dos pães, assim como se conclui do


Evangelho, foi feito para provar a presença verdadeira de Jesus na Eucaristia;
e mesmo, segundo observavam os doutores, foi uma figura da Mesa
eucarística. Eis, pois, o meio eficacíssimo de que, à imitação do Redentor,
devemos lançar mão para saciarmos a fome das almas benditas do purgatório.
— Visitemos muitas vezes o divino Sacramento, comunguemos com
frequência; sobretudo mandemos celebrar em alívio das almas o sacrifício
incruento da missa, ou ao menosouçamos para sufragá-las todas as missas que
pudermos. “Cada missa que se celebra”, diz São Jerônimo, “faz sair várias
almas do purgatório”. E São Gregório acrescenta: “Quem assiste
devotamente à missa, alivia as almas dos fiéis defuntos e contribui para lhes
serem perdoados completamente os pecados”.
Pelo que uma pessoa muito devota às almas do purgatório, cada vez
que ouvia tocar a entrada para uma missa, afigurava-se ver as almas no meio
das chamas e ouvir os seus gritos lastimosos e angustiados. “Então”, assim
dizia, “por urgentes que sejam as minhas ocupações, não posso deixar de
assistir ao divino sacrifício, nem tenho coragem de lhes dizer: Esperai,
porque hoje falta-me o tempo para vos ajudar”. — Façamos do mesmo modo,
e fiquemos certos de que aquelas santas prisioneiras saberão mostrar-se
agradecidas. Além disso, virá o tempo em que, estando nós também no
purgatório, nos medirão a nós com a medida que nós tivermos medido aos
outros(2).

Ó dulcíssimo Jesus, pela compaixão que mostrastes para com as


multidões famintas que Vos acompanhavam, tende piedade das almas do
purgatório. Volvei também para mim os vosso olhos piedosos, “e fazei, ó
Deus todo-poderoso, que na aflição pelas minhas iniquidades, respire com a
consolação de vossa graça”(3). † Doce Coração de Maria, sede minha
salvação.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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SEGUNDA-FEIRA – Meios para alcançar o amor de Deus e a santidade

Desideria occidunt pigrum… qui autem iustus est tribuet, et non


cessabit – “Os desejos matam o preguiçoso; porém, o que é justo dará e não
cessará” (Pv 21, 25-26)

Sumário. Quem quiser ser santo não se deve contentar com o


desejo, mas deve resolver-se a por depressa mãos à obra, porque o demônio
não teme as almas irresolutas. Os meios para chegar a um fim tão sublime, são
particularmente dois: a oração, que faz o amor divino entrar no coração, e a
mortificação, que dele remove a terra e o torna apto a receber o fogo divino.
Ganhemos ânimo; comecemos desde já a empregar estes meios e nós também
chegaremos a ser santos.
I. Quem mais ama a Deus é mais santo. Dizia São Francisco Borges
que a oração faz entrar o amor divino no coração, ao passo que a mortificação
dele remove a terra e fá-lo apto a receber aquele fogo sagrado. Quanto mais
espaço a terra ocupa no coração, tanto menos lugar achará ali o santo amor:
Sapientia… nec invenitur in terra suaviter viventium (1) — “A sabedoria…
não se acha na terra dos que vivem em delícias”. — Por isso é que os Santos
sempre procuraram mortificar, o mais possível, o seu amor próprio e os seus
sentidos. “Os santos são poucos, mas devemos viver com os poucos, se nos
quisermos salvar com os poucos”, escreve São João Clímaco: Vive cum
paucis, si vis regnare cum paucis. E São Bernardo diz: “Quem quer levar vida
perfeita, deve levar vida singular: Perfectum nonpotest esse nisi singulare.”
Para sermos santos, devemos, antes de mais nada, ter o desejo de nos
tornarmos santos: desejo e resolução. Alguns sempre desejam, mas nunca
começam a por mãos à obra. “De semelhantes almas irresolutas”, dizia Santa
Teresa, “o demônio não tem medo. Ao contrário, Deus é amigo das almas
generosas.”
É, pois, um engano do demônio, no dizer da mesma seráfica Santa,
fazer-nos pensar que há orgulho em se querer tornar santo. Seria orgulho e
presunção se metêssemos a nossa confiança em nossas obras ou resoluções;
mas não, se esperamos tudo de Deus, que então nos dará a força que nos falta.
— Desejemos, portanto, e ardentemente, chegar a um grau sublime de amor
divino e digamos com coragem: Omnia possum in eo qui me confortat (2) —
“Eu posso tudo naquele que me fortalece”. Se não achamos em nós tão
grande desejo, peçamo- lo instantemente a Jesus Cristo, que não deixará de
no-lo dar.
II. Devemo-nos, portanto, alentar, tomar uma resolução e começar;
lembrando-nos de que, na perfeição cristã, segundo a expressão de São
Francisco de Sales, vale muito mais a prática do que a teoria. O que não
podemos fazer com as nossas próprias forças, ser-nos-á possível com o auxílio
de Deus, que prometeu dar-nos tudo o que Lhe pedíssemos: Quodcumque
volueritis, petetis, et fiet vobis (3).
Ó meu amado Redentor, Vós desejais o meu amor e me mandais que
Vos ame de todo o coração. Sim, Jesus meu, quero amar-Vos de todo o meu
coração. Não, meu Deus — assim Vos direi, confiado em vossa misericórdia,
— não me assustam os pecados que cometi, porque agora detesto-os e
abomino-os mais do que qualquer outro mal, e sei que Vos esqueceis das
ofensas da alma que se arrepende e Vos ama. Porque Vos ofendi mais do que
os outros, quero, com o auxílio que de Vós espero, amar- Vos mais do que os
outros.
Senhor meu, Vós me quereis santo, e eu quero tornar-me santo, não
tanto para gozar no paraíso, como para Vos agradar. Amo-Vos, bondade
infinita! † Jesus, meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas, e me consagro
todo a Vós, vós sois o meu único bem, o meu único amor. Aceitai-me, ó meu
amor, e fazei-me todo vosso, e não permitais que ainda Vos dê desgosto.
Fazei com que eu me consuma todo por Vós, assim como Vós Vos
consumistes todo por mim. — Ó Maria, ó Esposa mais amável do Espírito
Santo, e a mais amada, obtende-me amor e fidelidade. Alcançai-me somente,
ó minha Mãe, que eu seja sempre vosso devoto servo; porquanto quem se
distingue na devoção para convosco, distingue-se também no amor a vosso
divino Filho.

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TERÇA-FEIRA - Da nobreza da alma
Fili, in mansuetudine serva animam tuam, et da illi honorem
secundum meritum suum – “Filho, guarda a tua alma na
mansidão, e dá-lhe honra segundo o seu merecimento” (Ecle 10, 31)

Sumário. A nossa alma é, sem dúvida, mais preciosa do que todos os


bens do mundo, não só pela sua nobre origem, senão também, e muito mais,
pelo preço do seu resgate e pela sublimidade do seu destino. Por isso o
demônio estima-a tão alto, que para se apoderar dela não descansa. Ora dize-
me: se o inimigo vela sempre para perder a nossa alma, como podemos nós
ficar dormindo o sono da tibieza?

I. Devemos considerar bem que o negócio da nossa eterna salvação


é um negócio das mais graves consequências, porque se trata da alma, e,
tendo-se perdido esta, tudo está perdido. A alma, diz São João Crisóstomo,
deve ser tida por nóscomo mais preciosa que todos os bens do mundo. E, para
compreender esta verdade acrescenta São Eleutério, se não nos basta saber
que Deus a criou à sua imagem e semelhança, seja- nos ao menos suficiente
saber que Jesus Cristo pagou um preço de valor infinito para remir a alma da
escravidão do demônio: Sinon credis Creatori, interroga Redemptorem — “Se
não acreditas no Criador, interroga ao Redentor”.
Assim é: para salvar nossas almas, o próprio Deus sacrificou seu
Filho à morte; e o Verbo eterno não duvidou resgata-las a troco de seu sangue.
Empti enim estis pretio magno (1) — “Fostes comprados por alto preço”. Pelo
que um santo Padre, considerando o preço do resgate humano, chega a dizer:
Parece que o homem vale tanto como Deus. — Tinha muita razão São Filipe
Neri de tratar pela salvação da alma. Se tem tamanho valor a nossa alma, que
bens do mundo poderemos dar em troca, se viermos a perdê-la? Quam dabit
homo commutationem pro anima sua? (2) — “Que dará o homem em troca
da sua alma?”
Se houvesse na terra homens mortais e outros imortais, e se os
mortais vissem os imortais preocupados com as coisas do mundo, procurando
granjear honras, bens e prazeres mundanos, dir-lhes-iam sem dúvida: Quanto
sois insensatos! Podeis adquirir bens eternos e pensais nessas coisas
miseráveis e passageiras? E é por elas que vos condenais a penas eternas na
outra vida? Deixai esses bens terrestres para aqueles que, como nós, tudo vem
acabar com a morte. Mas não! Todos somos imortais. Como é então que
tantas pessoas perdem a alma em troca das miseráveis satisfações deste
mundo?
II. Devemos de hoje em diante empregar toda a diligência na
salvação da nossa alma, e por isso devemos fugir das ocasiões perigosas,
resistir às tentações e frequentar os sacramentos. Vede, diz Santo Agostinho;
o demônio estima tanto uma alma, que para se apoderar dela, não dorme, mas
anda continuamente ao redor de nós buscando perdê-la. Ora, se o inimigo
vela sempre para a nossa perdição, havemos de ficar dormindo o sono da
tibieza? Vigilat hostis, dormis tu?
Ah, meu Deus! De que serviram os longos anos que me haveis dado
para adquirir a salvação eterna? Vós, ó Redentor meu, resgatastes a minha
alma à custa do vosso sangue e ma destes para trabalhar pela sua salvação, e
eu não trabalhei senão para perdê-la, ofendendo-Vos a Vós, que tanto me
haveis amado. Agradeço-Vos o tempo que ainda me concedeis para reparar
tão grande perda. Perdi a alma e a vossa amável graça!
Senhor, arrependo-me e sinto-o de todo o coração. Ah, perdoai-me,
pois que d’oravante estou resolvido a perder todos os bens, incluindo a vida,
antes que perder a vossa amizade. Amo-Vos sobre todas as coisas e tenho a
firme vontade de Vos amar sempre, ó Bem supremo, digno de todo o amor.
Ajudai- me, ó meu Jesus, a fim de que esta resolução não seja semelhante às
outras que formei no passado e que foram outras tantas infidelidades. Deixai-
me antes morrer do que tornar a ofender- Vos e deixar de Vos amar.
— Ó Maria, esperança minha, salvai-me, obtendo-me a santa
perseverança.

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QUARTA-FEIRA - Sentença dos escolhidos e dos réprobos no Juízo
Universal
Venite, benedicti Patris mei, possidete paratum vobis regnum…
Discedite a me, maledicti, in ignem aeternum –“Vinde, benditosde meu
Pai, possui o reino que vos está preparado… apartai- vos de mim,
malditos, para o fogo eterno” (Mt 25, 34-41)

Sumário. No Juízo final, a fim de que os réprobos sintam mais a


grandeza do bem que perderam, será primeiro pronunciada a sentença dos
escolhidos. E enquanto estes entrarem triunfantes no paraíso, o divino Juiz se
voltará para os réprobos, e amaldiçoando-os, condená-los-á a se afastarem
d’Ele para queimarem no fogo eterno. Meu irmão, com a vida que vais
levando, qual das duas sentenças julgas que naquele diaserá a tua?

I. São Bernardo diz que no Juízo universal Jesus pronunciará


primeiramente a sentença dos justos, chamando-os à glória do paraíso, a fim
de que os réprobos sintam maior pena à vista do que perderam. Jesus Cristo,
pois, voltar-se-á para os escolhidos, e com o semblante cheio de benevolência
lhes dirá: Venite, benedicti Patris mei — “Vinde, benditos de meu Pai”. São
Francisco de Assis, sabendo por uma revelação que era predestinado à glória,
não podia conter a alegria. Qual não será então a alegria dos que ouvirem
estas palavras do Juiz: “… Vinde, filhos benditos, entrai no reino que vos
espera; não tendes mais nada a sofrer, nada mais a recear; estais salvos, e salvos
por toda a eternidade. Abençôo o sangue que por vós derramei, e abençôo as
lágrimas que vós derramastes sobre os vossos pecados. Vamos ao paraíso
onde juntos permaneceremos eternamente.” A Santíssima Virgem abençoará
também os seus dedicados servos e os convidará a acompanhá-la à celeste
morada; e assim cantando aleluia! aleluia! Os escolhidos entrarão triunfantes
no paraíso, para possuírem, louvarem eamarem eternamente a Deus.
Ao contrário, os réprobos voltados para Jesus Cristo dir-Lhe-ão: Que
será feito de nós, desgraçados? — Vós, assim dirá o Juiz eterno, já que haveis
recusado e desprezado a minha graça: Discedite a me, maledicti, in ignem
aeternum — “Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno”. Discedite:
apartai-vos, nunca mais vos quero ver nem ouvir. Maledicti, ide, malditos, ide,
já que haveis desprezado a minha bênção. — Mas para onde, Senhor, para
onde devem ir estes desgraçados? In ignem, para o inferno, onde devem arder
em corpo e alma. Mas, por quantos anos ou por quantos séculos? O que?
Anos? Séculos? In ignem aeternum, por toda a eternidade, enquanto Deus for
Deus.
Ó pecado maldito, a que triste destino levarás um dia tantas pobres
almas, remidas pelo sangue de Jesus Cristo! Ó almas desgraçadas, às quais
está reservado um destino tão lastimável. — Dize-me, meu irmão, qual das
duas sentenças julgas que será a tua naquele dia. Queres ser um dia
abençoado com os escolhidos à tua direita! Deixa então o caminho que te
leva a ser maldito com os réprobos à esquerda.
II. Depois da sentença, os réprobos, segundo Santo Efrém,
despedir-se-ão dos Anjos, dos Santos, dos parentes e da divina Mãe. E neste
instante um vasto abismo se abrirá no meio do vale, e nele cairão juntamente
os demônios e os condenados, que sobre si ouvirão fechar essas portas, que,
durante toda a eternidade, nunca e nunca se hão de abrir.
Ah, meu Deus e meu Salvador, qual será a sentença que me tocará no
último dia? Se neste momento, meu Jesus, me pedísseis contas da minha
vida, que outra coisa poderia responder-Vos, senão que mereço mil vezes o
inferno? Sim, meuamado Redentor, é verdade que mereço mil vezes o inferno;
mas sabei que Vos amo e que Vos amo mais que a mim mesmo. Quanto às
ofensas que Vos fiz, estou possuído de tal dor, que antes quisera ter sofrido
todos os males que ter-Vos desagradado. Ó Jesus meu, condenais os
pecadores obstinados, mas não os que se arrependem e Vos querem amar.
Aqui me tendes aos vossos pés com o coração contrito; deixai-me ouvir uma
Palavra de perdão.
Já mo declarastes pela boca do Profeta: Convertimini ad me, et
convertar ad vos (1) — “Convertei-vos a mim, e Eu me converterei a vós”.
Tudo abandono, renuncio a todos os gozos, a todos os bens do mundo;
converto-me e ligo-me a Vós, Redentor meu amabilíssimo. Ah! Recebei-me
em vosso Coração e ali abrasai-me com o vosso santo amor; inflamai-me de
tal modo que nunca mais pense em separar-me de Vós. Jesus meu, salvai-me,
e que a minha salvação consista em amar-Vos sempre, e louvar para sempre
as vossas misericórdias: Misericordias Domini in aeternum cantabo (2) —
“Eternamentecantarei as misericórdias do Senhor”.
— Maria, minha esperança, meu refúgio e minha Mãe, ajudai-me e
alcançai-me a santa perseverança. Ainda não se perdeu ninguém que
recorresse a vós; a vós me recomendo, tende piedade de mim.

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QUINTA-FEIRA - União da alma com Jesus na Santa Comunhão
Qui manducat meam carnem et bibit meum sanguinem, in me manet et
ego in illo – “Aquele que come a minha carne e bebe o meu sangue fica
em mim e Eu nele” (Jo 6, 57)

Sumário. Jesus tinha-se dado aos homens como mestre, como


modelo e como vítima; restava-Lhe somente que se desse como alimento, a
fim de fazer-se uma coisa conosco. É o que fez instituindo a santa Eucaristia. Ó
dignação de um Deus para comos homens! Mas como é que há tantos homens
que não O amam e Lhe respondem com ingratidão!… Se no passado nós
também temos sido do número desses ingratos, esforcemo-nos para amá- Lo
tanto mais para o futuro.

I. Diz São Diniz, o Areopagita, que o efeito principal do amor é


procurar a união com o objeto amado. Exatamente para se unir com as nossas
almas foi que Jesus Cristo instituiu a santa Comunhão. Tendo-se dado a nós
como mestre, como modelo e como vítima só Lhe restava dar-se a nós como
nosso sustento, para fazer-se um só conosco, assim como o sustento se
identifica com aquele que o toma. Foi o que fez instituindo este Sacramento
de amor.
Jesus Cristo não pode contentar-se com unir-se à nossa natureza
humana; com este sacramento quis ainda achar o modo de unir-se a cada um
de nós e de ser todo de quem o recebe. A este respeito escreveu São
Francisco de Sales:

“Em nenhuma outra ação pode o Salvador ser


considerado nem mais terno nem mais amoroso, do que nesta, na qual se
aniquila, por assim dizer, e se reduz a manjar, a fim de entrar em nossas
almas, e unir-se aos corações dos seus fiéis”.
Numa palavra, porque Jesus nos ama ardentemente, quer unir-se
conosco pela Eucaristia, a fim de que nos tornemos uma coisa com Ele, e o
seu coração seja um só coração com o nosso. “Voluisti, ut tecum unum cor
haberemus”, diz São Lourenço Justiniani: “Quisestes que tivéssemos um só
coração convosco”. E primeiro já o dera a entender o próprio Jesus: Qui
manducat meam carnem, in me manet et ego in illo — “Quem come a minha
carne permanece em mim e Eu nele”. — Assim, na comunhão Jesus une-se
com a alma e a alma com Jesus, e esta união não é de mero afeto, mas
verdadeira e real. “Como dois pedaços de cera derretidos se misturam”, diz
São Cirilo de Alexandria, “assim o que comunga se torna uma coisa com Jesus
Cristo. Ó condescendência infinita de um Deus para com os homens! Mas
como é então possível que estes não O amem e Lhe respondam com
ingratidão?

II. Para nos mantermos sempre em união com Jesus Cristo,


aproximemo-nos frequentemente e com as devidas disposições da Mesa
Eucarística; e se és diretor de almas, exorta as tuas dirigidas à comunhão
frequente. Costumava o Bem-aventurado João de Ávila dizer que os que
censuram as pessoas que frequentam a comunhão fazem o papel do demônio,
que temgrande ódio a este sacramento, porque dele as almas recebem o fervor
para progredirem na perfeição. — Quando comungamos, afiguremo-nos que
Jesus Cristo nos diz o que um dia disse à suaquerida serva Margarida de Ypres:
“Vê, minha filha, a bela união entre nós; pois, ama-me, fiquemos sempre unidos
no amore nunca mais nos separemos”.
Ah, meu Jesus! Eis o que Vos peço e quero sempre pedir-Vos na santa
comunhão: Unidos fiquemos sempre, e jamais nosseparemos. Sei que não vos
separareis de mim, se não for eu o primeiro a me separar de Vós. Ai! Todo o
meu medo é que no futuro venha eu a separar-me de Vós pelo pecado, como
fiz outrora. Por piedade, não o permitais, ó meu amadíssimo Redentor: Ne
permittas me separari a te. Até a morte, estarei sempre exposto a este perigo;
ah! Conjuro-Vos, pelos merecimentos de vossa Paixão, deixai-me antes
morrer do que cair nesta desgraça. Repito-o e Vos peço a graça de repeti-lo
sempre: Não permitais que me separe de Vós! Não permitais que me separe de
Vós!
Ó Deus de minha alma, amo-Vos, amo-Vos; quero amar-Vos sempre,
e não amar senão a Vós. Protesto à face do céu e da terra, só a Vós quero e
nada mais. Jesus meu, escutai-me, eu o repito: só a Vós quero e nada mais.
Ó Mãe de misericórdia, Maria, intercedei neste momento por mim; obtende-
me a graça de não me separar mais de Jesus, e não amar mais senão a Jesus.

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SEXTA-FEIRA - Comemoração do preciosíssimo Sangue de Nosso
Senhor Jesus Cristo
Redemisti nos, Domine, in sanguine tuo… et fecisti nos Deo nostro
regnum –“Remiste-nos, Senhor, em teu sangue, e fizeste-nos reino para
Deus” (Ap 5, 9)

Sumário. O Senhor não se contentou com pagar pela suamorte a pena


a nós devida e anular com o seu sangue a sentença da nossa condenação
eterna; quis ainda, no sacramento da penitência, preparar-nos um banho
salutar de seu sangue, no qual pudéssemos, à vontade, lavar-nos das manchas
do pecado. E nós não O amaremos de todo o coração?… Tomemos o belo
hábito de oferecer frequentemente este Sangue preciosíssimo ao Eterno Pai,
para obtermos todas as graças de que precisamos.

I. O nosso amantíssimo Redentor não veio ao mundo para outro


fim, senão para salvar os pecadores. Por isso não se contentou com pagar pela
sua morte a pena a nós devida e anular com o seu sangue a sentença da nossa
eterna condenação (1); mas com o mesmo sangue quis ainda preparar-nos um
banho salutar para nos limparmos das manchas dos nossos pecados: Dilexit
nos, et lavit nos in sanguine suo (2) — “Ele nos amou e lavou em seu
sangue”. — E isso não somente uma vez, senão quantas quisermos;
porquanto, prevendo que, depois do Batismo, tornaríamos a manchar-nos
pelo pecado, estabeleceu, por meio do sacramento da penitência, que aquele
banho durasseaté à consumação dos séculos.

Pelo que o Apóstolo nos anima dizendo: Accessistis… ad


mediatorem Iesum, et sanguinis aspersionem, melius loquentem quam Abel
(3) — “Chegastes… ao mediador Jesus, e à aspersão do sangue, que fala
melhor que o de Abel”. Meus irmãos, assim parece dizer-nos, por mais
pecadores que sejais, não percais a coragem; pois tendes de tratar, não com
um mediador qualquer, mas com Jesus Cristo. Se o sangue dos bodes e dos
touros sacrificados tirava aos Hebreus as manchas corporais exteriores, a fim
de que pudessem ser admitidos aos ministérios sagrados; quanto mais o
sangue de Jesus Cristo, que por amor se ofereceu a pagar por nós, tirará das
nossas almas ospecados para podermos servir ao nosso Deus? (4)
Ah! Quanto melhor, conclui São Paulo, o sangue do Redentor
implora por nós a divina misericórdia, do que o sangue de Abel bradava por
vingança contra Caim! — É o que o Senhor mesmo disse também a Santa
Maria Madalena de Pazzi:
“A minha justiça converteu-se em clemência pela vingança tomada
no corpo inocente de Jesus Cristo. O sangue deste meu Filho não pede
vingança, como o sangue de Abel, mas somente misericórdia e piedade, e à tal
voz a minha justiça fica necessariamente aplacada. Este sangue liga-me, por
assim dizer, as mãos, de modo que não posso mais movê-las para tomar
vingança dos pecados, como antes tomavam.”

II. Como fruto da presente meditação nutramos uma terna devoção


ao sangue divino. Cada vez que meditares na Paixão de Jesus Cristo, chega-te
a Ele em espírito e pede-Lhe que te purpureie todo com o seu preciosíssimo
sangue. No tribunal da penitência, afigura-te ver no Confessor a própria
pessoa do Redentor, que na absolvição derrama sobre ti o seu sangue; e
quando fores comungar, imagina que chegas teus lábios ao lado sagrado de
Jesus. Sobretudo habitua-te a oferecer muitas vezes ao Eterno Pai o sangue
preciosíssimo de Jesus Cristo, em satisfação pelos teus pecados, pelas
necessidades da santa Igreja, pela conversão dos pecadores e em sufrágio das
almas do purgatório.
† “Ó Sangue preciosíssimo de vida eterna, mercê e resgate de todo o
universo, bebida e lavacro de nossas almas, que defendeis continuamente a
causa dos homens junto ao trono da suprema misericórdia, adoro-vos
profundamente, e quisera, quanto me é possível, desagravar-vos de todas as
injúrias e desprezos que continuais a receber da parte dos homens, e
particularmente daqueles que temerariamente se atrevem a blasfemar contra
vós. Quem não bendirá esse Sangue de infinito valor: quem não se sentirá
abrasado de amor a Jesus, que o derramou? Que seria de mim, se não fora
remido por esse Sangue divino? Quem vos fez correr até à última gota das
veias de meu Senhor? Ah! Foi certamente o amor. Ó amor imenso que nos deu
este bálsamo tão salutar! Ó bálsamo inestimável, brotado da fonte de um
amor imenso! Fazei, ah! Fazei que todos os corações, todas as línguas vos
louvem, exaltem e agradeçam agora e sempre, até ao dia da eternidade.” (5)
“E Vós, Eterno Pai, que destinastes para Redentor do mundo vosso
Filho unigênito e quisestes ser aplacado pelo seu sangue: suplico-Vos,
concedei-me que, enquanto estiver aqui na terra, eu venere solenemente esse
preço de nossa salvação, e seja por ele de tal modo livrado de todos os males
da vida presente, que mereça gozar eternamente os seus frutos no céu.” (6)
Fazei-o pelo amor do mesmo Jesus Cristo e de Maria Santíssima.

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SÁBADO - Dor de Maria Santíssima em consentir na morte de Jesus
Proprio Filio suo non pepercit, sed pro nobis omnibus tradidit illum –
“Não poupou a seu próprio Filho, mas entregou-o pornós todos” (Rm
8, 32)

Sumário. Embora Maria Santíssima já tivesse consentido na morte


de Jesus Cristo, desde que aceitou a maternidade divina, quis todavia o Pai
Eterno, que ela renovasse o consentimento no tempo da Paixão, afim de que,
juntamente com a vida do Filho, fosse também sacrificado o coração da Mãe.
Pelos merecimentos deste consentimento tão espontâneo como doloroso, a
Santíssima Virgem foi feita Reparadora do gênero humano, e credora de toda
a nossa gratidão. Quantos, porém, lhe pagam com a ingratidão mais
monstruosa, renovandopelo pecado a paixão do Filho e as dores da Mãe!

I. Ensina Santo Tomás que, conferindo a qualidade de mãe direitos


especiais sobre os filhos, parece conveniente que Jesus, inocente e sem culpa
própria merecedora de suplício, não fosse destinado à morte de cruz sem que a
Santíssima Virgem consentisse e o oferecesse espontaneamente a morrer.
Verdade é que Maria já dera o seu consentimento quando foi escolhida para
Mãe do Redentor. Quis, porém, o Eterno Pai que ela o renovasse no tempo da
Paixão, afim de que, juntamente com o sacrifício da vida do Filho, fosse
também sacrificado o coração da Mãe.

A Bem-Aventurada Virgem, ao pensar no Filho amado, que em


breve ia perder, tinha os olhos sempre arrasados de lágrimas, e, como ela
mesma revelou à Santa Brígida, um suor frio corria-lhe pelo corpo, por causa
do temor do doloroso espetáculo que se avizinhava. Eis que, chegando
finalmente o dia destinado, veio Jesus e chorando se despediu da Mãe, para ir
morrer. Diz Cornélio a Lapide que, para compreendermos a dor que Maria
então sentiu, seria mister que compreendêssemos o amor que tal Mãe tinha a
tal Filho. Como, porém, poderemos fazer ideia disso?
Ah! os títulos unidos de serva e mãe, de filho e Deus acenderam no
coração da Virgem um incêndio composto de mil incêndios, de tal modo que
São Guilherme de Paris chega a dizerque Maria amou a Jesus Cristo tanto, que
uma pura criatura não seria quase capaz de amá-lo mais: Quantum capere
potuit hominis modus. No tempo da Paixão, todo este incêndio de amor se
converteu num mar de dor. Pelo que São Bernardino disse:
«Todos os sofrimentos do mundo, se fossem ajuntados, não poderiam igualar
à dor de Maria». Pobre Mãe! E nós não nos compadeceremos dela?
II. Dizem os santos Padres que a Bem-Aventurada Virgem, pelos
merecimentos que adquiriu oferecendo a Deus o grande sacrifício da vida
de seu Filho, deve com razão ser chamada: Reparadora do gênero
humano; restauradora dasnossas misérias, Mãe de todos os fiéis cristãos, nova
Eva que nos gerou para a vida, dissemelhante da outra Eva que foi a causa
primeira da nossa perdição. ― Por isso o Bem-aventurado Alberto Magno
afirma que, assim como somos obrigados a Jesus Cristo pela paixão a que se
submeteu por nosso amor, somos obrigados igualmente a Maria pelo
martírio que na ocasião da morte do Filho quis sofrer espontaneamente pela
nossa salvação. Infelizmente, porém, quantos cristãos, em vez de se
mostrarem agradecidos, pagam à nossa boa Mãe com a mais monstruosa
ingratidão! ― Disto exatamente se queixou a mesma Santíssima Virgem
com a Bem-aventurada Colleta, franciscana. Aparecendo-lhe um dia e
mostrando-lhe Jesus Cristo, todo desfigurado pelas chagas: «Filha», disse-lhe,
«eis aícomo os pecadores tratam continuamente a meu Filho,
renovando-lhe a morte e a mim as dores».
Ó minha bendita Mãe! é assim que os homens respondemao amor que
lhes mostrastes, consentindo em que vosso Jesus morresse pela nossa
salvação. Ingratos como são, nem depois deo haverem crucificado, deixam de
persegui-lo com os seus pecados, e assim continuam também a afligir-vos, ó
grande Rainha dos Mártires. Eu também fui um daqueles infelizes. Ah! minha
Mãe dulcíssima, alcançai-me lágrimas para chorar tamanha ingratidão.
Pela dor que sentistes, quando vosso Filho se despediu de vós para ir de
encontro à morte, obtende-me a graça de contemplar sempre com fruto os
mistérios dolorosos da sua Paixão, especialmente nestes dias em que a Igreja
faz dela recordação especial. Esta graça eu vo-la peço pelo amor do mesmo
Jesus Cristo; de vós a espero.

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QUINTA
SEMANA DA
QUARESMA
DOMINGO - Grande fruto que se tira da meditação da Paixão de Jesus
Cristo
Abraham, pater vester, exultavit, ut videret diem meum: vidit etgavisus
est – “Abraão, vosso pai, desejou ansiosamente ver o meu dia: ele o
viu e exultou de gozo” (Jo 8, 56)

Sumário. Não é sem razão que Abraão e com ele os demais justos
do Antigo Testamento desejavam tão ansiosamente ver o dia do Senhor. Sim,
porque depois da vindade Jesus Cristo, é impossível que uma alma crente que
medita nas dores e ignomínias que Ele sofreu por nosso amor, não se abrase
em amor e não se resolva firmemente a tornar-se santa. Se, pois, queremos
progredir no caminho de perfeição, meditemos a miúdo, e especialmente
nestes dias, na Paixão do Redentor, e meditando afiguremo-nos que
presenciamos os mistérios dolorosos.

I. Não é sem razão que o patriarca Abraão desejouansiosamente ver


o dia do Senhor; e que, tendo tido a ventura devê-lo por uma revelação divina,
ainda que em espírito somente, se alegrou em seu coração, como atesta o
Evangelho de hoje. Sim, porque o tempo que se seguiu à vinda de Jesus
Cristo, já não é mais tempo de temor, mas tempo de amor: Tempus tuum,
tempus amantium (1).
Na Lei antiga, antes da Encarnação do Verbo, podia o homem, por
assim dizer, duvidar se Deus o amava. Depois de O havermos visto, porém,
morrendo por nós, exangue e vilipendiado sobre um patíbulo infame, já não
podemos duvidar que Ele nos ame com toda a ternura. — Quem poderá
jamais compreender, que excesso de amor levou o Filho de Deus a pagar a
pena dos nossos pecados? E, todavia, isso é um ponto defé: Dilexit nos, et lavit
nos in sanguine suo (2) — “Ele nos amou, lavou-nos em seu sangue”. Ó
misericórdia infinita! Ó amor infinito de Deus!
Mas porque é que tantos cristãos olham com indiferença para Jesus
Cristo crucificado? Que na Semana Santa assistem à comemoração da morte
de Jesus, mas sem algum sentimento de ternura e gratidão, como se não se
comemorasse um fato verdadeiro, ou não lhes dissesse respeito?
Não sabem, ou não creem, porventura, o que os santos Evangelhos
dizem acerca da Paixão de Jesus Cristo? Com certeza o creem, mas não
refletem. Entretanto, é impossível que uma alma crente, que medita nas dores
e ignomínias que Jesus Cristo padeceu por nosso amor, não se abrase de amor
para comEle e não tome uma forte resolução de tornar-se santa, a fim de não
se mostrar ingrata para com Deus tão amante. Caritas Christi urget nos (3) —
“A caridade de Cristo nos constrange”.

II. Meu irmão, se queres sempre crescer em amor para com Deus e
progredir na perfeição, medita a miúdo na Paixão de Jesus Cristo, conforme o
conselho que te dá São Boaventura: Quotidie mediteris Domini passionem.
Especialmente nestes dias, que procedem a comemoração da sua morte
dolorosíssima, guiado pelos sagrados Evangelhos, contempla com olhos
cristãos tudo que o Salvador sofreu nos principais teatros de seu padecimento;
isto é, no horto das oliveiras, na cidade de Jerusalém e no monte Calvário.
Para que tires desta meditação o fruto mais abundante possível,
representa-te os sofrimentos de Jesus Cristo tão vivamente, que te pareça
veres diante dos olhos o Redentor tão maltratado, e sentires em ti mesmo as
chagas que n’Ele abriram as pontas dos espinhos e dos cravos, a amargura do
vinagre e fel, o pejo das ignomínias e dos desprezos: Hoc enim sentite in
vobis, quod et in Christo Iesu (4) — “Senti em vós o que Jesus Cristo sentiu”.
Ao passo que assim meditas, repete muitas vezescom o Apóstolo: Tudo isso o
Senhor tem feito e padecido por mim, para me mostrar o seu amor e ganhar o
meu: Dilexit me, et tradidit semetipsum pro me (5) — “Ele me amou e se
entregou por mim”. E não O amarei?
Sim, amo-Vos; † Jesus, meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas; e
porque Vos amo, pesa-me de Vos haver ofendido, e proponho antes morrer do
que Vos tornar a ofender. “Vos, ó Senhor onipotente, lançai sobre mim um
olhar benigno, para que por vossa proteção seja regido no corpo e defendido
na alma”.
(6) † Doce Coração de Maria, sede minha salvação.

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SEGUNDA-FEIRA - Conselho dos Judeus e traição de Judas
Expedit vobis, ut unus moriatur homo pro populo, et non tota gens
pereat – “Convém que morra um homem pelo povo e que não pereça
toda a nação” (Jo 11, 50)

Sumário. Tendo os iníquos pontífices decretado a morte de Jesus


Cristo, tiveram grande satisfação ao ver que Judas, um dos discípulos, se
oferecia a traí-Lo e entregar-Lho nas mãos. OSenhor conhece perfeitamente a
felonia de Judas e todavia não deixa de tratá-lo como amigo na mesma forma
que d´antes; olha- o com benevolência, não recusa a sua companhia e chega a
prostrar-se-lhe aos pés para os lavar. Ó inefável benignidade! Que belo
exemplo para nós, se o quisermos aproveitar!

I. No mesmo tempo em que Jesus andava derramando graças e


fazendo milagres para benefício de todos, reúnem-se osprimeiros personagens
da cidade de Jerusalém a fim de tramarem a morte do Autor da vida. Refere
São João que se ajuntaram os pontífices e os fariseus em conselho e diziam:
Que fazemos nós? Este homem faz muitos milagres; se o deixamos assim
livre, todos crerão nele. Mas um deles, por nome Caifás, respondeu que lhes
convinha que um homem morresse pelo povo, e não perecesse a nação toda.
“E desde aquele dia”, diz o mesmo São João, “pensavam em como haviam de
o fazer morrer.” — Ah, Judeus! Não temais; vosso Redentor não fugirá,
porquanto veio à terra exatamente para morrer, e pela sua morte livrar-vos a
vós e a todos os homens da morte eterna.

Entretanto Judas apresenta-se aos pontífices e diz: Quid vultir mihi


dare, et ego vobis eum tradam? (1) — “Que me quereis dar, e eu vô-Lo
entregarei?” Oh! Que alegria deviam sentir os Judeus, pelo ódio que
devotavam a Jesus Cristo, ao verem que um dos seus discípulos o queria trair
e entregar-Lho nas mãos! Consideremos nisso o júbilo que, por assim dizer,
reina no inferno, quando uma alma, depois de servir a Jesus Cristo por muitos
anos, vem a traí-Lo por qualquer miserável bem ou vil satisfação.
Mas, ó Judas, já que estás resolvido a vender o teu Deus, exige pelo
menos o preço que Ele vale. É um bem infinito, merecedor portanto de um
preço infinito. Porque, pois, concluis o negócio por trinta dinheiros? At illi
constituerunt ei triginta argenteos (2) — “E eles prometeram-lhe trinta
dinheiros de prata”. — Minha alma, deixa Judas, e fixa em ti mesma os teus
pensamentos. Dize-me, por que preço vendeste tu mesma tantas vezes a graça
divina ao demônio?
Ah, meu Jesus, quantas vezes Vos virei as costas, e a Vós preferi um
capricho, um empenho, um prazer passageiro e vil! Sabia que, pecando,
perdia a vossa amizade e voluntariamente a troquei por um nada. Tivesse
morrido antes de fazer-Vos tão grande ultraje! Ó meu Jesus, arrependo-me de
todo o coração e quisera morrer de dor.

II. Contemplemos agora a benignidade de Jesus Cristo, que, sabedor


do ajuste feito por Judas, contudo, vendo-o, não o repele de si, nem o olha
com maus olhos; admite-o em sua companhia, e ainda à sua mesa; repreende-o
pela sua traição com mo único intuito de chamá-lo à resipiscência; e vendo-o
obstinado, chega a prostrar-se diante dele e a lavar-lhe os pés para desta arte
o enternecer.
Ah, meu Jesus, é assim também que fizestes comigo. Eu Vos
desprezei e traí, e não me repelis; não deixais de olhar-me com amor, e me
admitis à vossa mesa da santa comunhão. Meu amado Salvador, nada mais
podeis fazer para me obrigar a Vos amar. E eu terei ânimo de continuar a
ofender-Vos e pagar-Vos com a minha ingratidão? Não, meu Deus, não quero
mais abusar da vossa misericórdia. Agradeço-Vos a luz com que me iluminais
e prometo que mudarei de vida. Vejo que já não me podeis suportar mais
tempo. Porque, pois, esperarei até que Vós mesmo me mandeis ao inferno, ou
me abandoneis em minha vida de perdição, castigo este maior do que a
própria morte?
Meu Jesus, eis que me prostro aos vossos pés. Peço-Vos perdão das
ofensas a que Vos fiz e rogo-Vos que me recebais em vossa graça. Quem me
dera poder recomeçar os anos passados; quisera empregá-los unicamente em
vosso serviço, ó Senhor meu. Os anos, porém, não voltam mais; por
piedade, fazei ao menos que empregue o que me resta de vida, unicamente
em amar-Vos e fazer que outros também Vos amem. — Ó grande Mãe de
Deus e minha Mãe Maria, socorrei-me com a vossa intercessão, pedi a Jesus
que me faça todo seu. Peço-vos esta graça pela parte que tomastes na Paixão
de vosso divino filho.

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TERÇA-FEIRA - Última ceia de Jesus Cristo com os seus discípulos
Vespere autem facto, discumbebat (Iesus) cum discipulis suis –
“Chegada, pois, a tarde, pôs-se (Jesus) à mesa com os seus
discípulos” (Mt 26, 20)

Sumário. Imaginemos ver Jesus Cristo que, sentado à mesa com os


discípulos, come o Cordeiro Pascal, figura do sacrifício d’Ele mesmo, que no
dia seguinte seria oferecido sobre o altar da Cruz. Imaginemos vê-Lo também
no momento de prostrar-Se diante dos Apóstolos e de Judas para lhes lavar os
pés. Vendo um Deus que Se humilha a tal ponto por nosso amor, ficaremos
sempre tão orgulhosos, que não sabemos suportar uma palavra de desprezo, a
mais leve falta de atenção?

I. Sabendo Jesus que era chegada a hora de sua morte, em que devia
partir deste mundo, como até então tinha amado os homens com amor
excessivo, quis naquela hora dar-lhes as últimas e maiores demonstrações de
seu amor. Vede-O, como sentado à mesa e todo inflamado de amor, Se volta
para os seusdiscípulos e lhes diz: Desiderio desideravi hoc Pascha manducare
vobiscum (1) — “Tenho desejado ansiosamente comer convosco esta
Páscoa”. Discípulos meus (e o mesmo disse Jesus então a todos nós), sabei
que em toda a minha vida não tive outro desejo senão o de celebrar convosco
esta Última Ceia; porquanto logo em seguida irei sacrificar-Me pela vossa
salvação.

Portanto, ó meu Jesus, tendes tão vivo desejo de dar a vida por nós,
as vossas miseráveis criaturas? Ah! Esse vosso desejo, como não deve excitar
em nossos corações o desejo de padecer e morrer por vosso amor, visto que
por nosso amor desejais tão ansiosamente padecer e morrer! Ó amado
Redentor, fazei-nos saber o que quereis de nós; queremos agradar-Vos em
tudo. Queremos dar-Vos gosto para respondermos ao menos um pouco ao
grande amor que nos tendes.
Entretanto é posto na mesa o cordeiro pascal, figura de nosso
Salvador mesmo. Assim como aquele cordeiro foi consumido na Última Ceia,
assim o mundo veria no dia seguinte o Cordeiro divino, Jesus Cristo,
consumido de dores sobre o altarda Cruz.
Itaque cum recubuisset ille (Ioannes) supra pectus Iesu
— “Tendo-se ele (João) reclinado sobre o peito de Jesus” (2). Ó feliz de vós,
João, discípulo predileto, que reclinando a cabeça sobre o peito de Jesus,
compreendestes a ternura do Coração do nosso amante Redentor para com as
almas que O amam! — Ah! Meu dulcíssimo Senhor, que repetidas vezes me
favorecestes com tão grande graça! Sim, pois que eu também compreendi a
ternura do vosso afeto para comigo cada vez que me consolastes com luzes
celestes e doçuras espirituais. Mas, não obstante isso, Vos fui infiel! Suplico-
Vos que não me deixeis mais viver tão ingrato para com a vossa bondade!
Quero ser todo vosso: aceitai-me e socorrei-me.
II. Deinde mittit (Iesus) aquam in pelvim, et coepit lavare pedes
discipulorum (3) — “Depois (Jesus) deita água numa bacia e começa a lavar
os pés dos discípulos”. — Minha alma, contempla a teu Jesus que Se levanta
da mesa, depõe suas vestiduras e, tomando uma toalha branca, Se cinge. Em
seguida deitando água numa bacia, de joelhos diante de seus discípulos,
começa a lavar-lhes os pés. Eis, pois, que o Rei do mundo, o Unigênito de
Deus, Se humilha até lavar os pés a suas criaturas! Ó Anjos, que dizeis a isso?
Já teria sido um grande favor, se Jesus Cristo lhes houvera permitido
lavarem-Lhe com lágrimas os pés divinos, assim como permitiu à Maria
Madalena. Jesus, porém, quis prostrar-Se aos pés dos seus servos, a fim de
nos deixar no fim da sua vida este grande exemplo de humildade, e mais esta
grande prova do amor que tem aos homens.
E nós, ó Senhor, seremos sempre tão orgulhosos que não sofremos
uma palavra de desprezo, uma pequena falta de atenção, sem que logo
fiquemos ressentidos, e nos venha o pensamento de vingança? Todavia, pelos
nossos pecados temos merecido sermos calcados aos pés dos demônios no
inferno.
Ah, meu Jesus, reconheço que é um grande castigo de meus pecados
o terem-me feito soberbo, depois de me terem feito ingrato. Para o futuro
não será assim; pois que o vosso exemplo me fez as humilhações sumamente
amáveis. Prometo que de hoje em diante suportarei por vosso amor qualquer
injúria e afronta que me seja feita; mais, desejo e peço ser humilhado
convosco. — Mas, ó Senhor, para que servem estes meus propósitos sem o
vosso auxílio para executá-los? Já que me quereis salvo, ó meu Jesus
desprezado, ajudai-me a suportar em paz todos os desprezos que em minha
vida tenha de receber. Concedei-me esta graça pelo mérito dos opróbrios que
sofrestes,e pelas dores de vossa e minha querida Mãe Maria.

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QUARTA-FEIRA - Jesus ora no Horto e sua sangue
Tunc venit Iesus cum illis in villam, quae dicitur Gethsemani –“Então
foi Jesus com eles a uma herdade, que é chamada Gethsemani”
(Mt 26, 36)

Sumário. O Filho de Deus, para nos ensinar o modo de orar, pede


no horto a seu Pai divino, que O exima de beber o cálice de sua Paixão; com
resignação, porém, acrescenta que se conforma em tudo à divina vontade.
Prostra-se com a face na terra, e é tão grande o temor, o aborrecimento e a
tristeza que Lhe sobrevém pela previsão dos seus padecimentos e da nossa
ingratidão, que chega a suar sangue vivo. Ah, meu pobre Senhor, se eu menos
houvera pecado, Vós menos teríeis sofrido.
I. Finda que foi a ação de graças depois da Ceia, Jesus sai do
cenáculo com os seus discípulos, entra no horto de Getsêmani e se põe em
oração. Mas, ai! No mesmo instante assaltam-No juntos grande temor, grande
aborrecimento e grande tristeza. Com o coração oprimido pela dor, o nosso
Redentor diz que a sua alma bendita está triste até à morte: Tristis est anima
mea usque ad mortem (1). — Jesus quis que então Lhe fosse presente aos
olhos toda a funesta cena dos tormentos e opróbrios que Lhe estavam
preparados. Na Paixão, estes tormentos afligiram-No um após outro; mas ali
no horto vieram cruciá-Lo todos juntos, as bofetadas, os escarros, os açoites,
os espinhos, os cravos e os vitupérios, que depois deveria sofrer. Submisso,
aceita-os todos; mas, aceitando-os treme, agoniza e ora.
Mas, meu Jesus, quem Vos constrange a sofrer tantas penas?
Constrange-me, responde, o amor que tenho aos homens.
— Ah! Que assombro devia causar no céu o ver a força feita fraqueza! Um
Deus aflito! E para que? Para salvação dos homens, suas criaturas! Naquele
horto foi oferecido o primeiro sacrifício: Jesus foi a vítima, o amor, o
sacerdote e o ardor de seu afeto para com os homens foi o fogo sagrado que
consumiuo sacrifício.
Pater mi, si possibile est, transeat a me calix iste (2) — “Pai meu, se
é possível, passe de mim este cálice”. Assim ora Jesus: Meu Pai, se é
possível, isenta-me de beber este cálice tão amargoso. Mas Jesus ora assim,
não tanto para ficar isento, como para nos fazer compreender a pena que padece
e aceita por nosso amor. Ora assim também para nos ensinar que nas
tribulações nos é permitido pedir a Deus que nos livre; mas ao mesmo tempo
devemo-nos conformar em tudo com a vontade divina, e dizer o que Ele disse:
Verumtamen non sicut ego volo, sed sicut tu (3)
— “Todavia não seja como eu quero, mas sim como tu”.
Sim, meu Senhor, por vosso amor abraço todas as cruzes que me
queiras enviar. Vós, embora inocente, padecestes tanto por meu amor, e eu,
pecador como sou, depois de haver tantas vezes merecido o inferno, me
recusei a sofrer para Vos agradar e obter de Vós o perdão e a graça! Non
sicut ego volo, sed sicut tu; seja feita não a minha vontade, mas, sim, sempre a
Vossa!
II. Procidit super terram (4). Durante a sua oração, Jesus prostrou-se
com a face em terra, porquanto, vendo-se coberto com a vestidura sórdida de
todos os nossos pecados, parece que se envergonhava de levantar os olhos ao
céu. — Ó meu amado Redentor, não me animaria a Vos pedir perdão de tantas
injúrias que Vos fiz, se as vossas penas e os vossos merecimentos não me
dessem confiança. Eterno Pai: Respice in faciem Christi tui
(5) — “Ponde os olhos no rosto de vosso Cristo”; olhai, não para as minhas
iniquidades, mas para esse vosso Filho dileto, que treme, que agoniza e sua
sangue a fim de obter para mim o vosso perdão. Vede-O e tende piedade de
mim.
Que! Jesus meu, não há nesse jardim para Vos suplicar nem algozes,
nem açoites, nem espinhos, nem cravos; que é então que faz correr o vosso
sangue? Ah! compreendo agora: não foi a previsão de vossos tormentos
próximos a causa de vossa aflição, pois espontaneamente Vos oferecestes a
sofrê-las. Foi a vista de meus pecados; eles foram o cruel lagar que fez correr
o sangue de vossas sagradas veias. De sorte que não Vos foram desumanos os
algozes, nem cruéis os açoites, os espinhos, a cruz; desumanos e cruéis vos
foram, ó meu dulcíssimo Jesus, os meus pecados, que tanto Vos afligiram no
horto. Se eu menos houvera pecado, menos houvéreis Vós padecido. Eis
então, ó meu Jesus, como correspondi ao amor que vos trouxe a morrer por
mim: não fiz mais que ajuntar novas penas e tantas outras que tivestes de
sofrer.
Ó meu amado Senhor, pesa-me de Vos ter ofendido; sinto dor, mas
não bastante; quisera conceber uma dor capaz de me tirar a vida. Ah! pela cruel
agonia que sofrestes no horto, dai- me uma parte do horror que tivestes de meus
pecados. Se outrora Vos afligi por minha ingratidão, fazei que Vos agrade
daqui emdiante por meu amor. — Ó Maria, Mãe das dores, recomendai- me a
vosso Filho aflito e triste por meu amor.

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QUINTA-FEIRA - Jesus é preso, amarrado e conduzido a Jerusalém
Comprehenderunt Iesum et ligaverunt eum – “Eles prenderama Jesus e
o ataram” (Jo 18, 12)

Sumário. Imaginemos ver a Jesus, que, abandonado de seus


discípulos, é preso, atado e levado a desoras e com grande tumulto pelas ruas
de Jerusalém. Ao verem-No assim, todos que O veneraram, já O odeiam e se
envergonham de O terem tido pelo Messias. Se nós, à vista de um Deus tão
humilhado por nosso amor e para nosso ensino, ainda amarmos os bens
fugazesda terra, ambicionarmos as honras e preeminências, não somos dignos
do nome de cristãos.

I. O Redentor, sabendo que Judas se aproximava, acompanhado


dos Judeus e dos soldados, levanta-se, banhado ainda no suor da agonia
mortal. Com o rosto pálido, mas com o coração todo abrasado em amor, vai-
lhes ao encontro para se lhes entregar nas mãos, e vendo-os chegados perto,
diz: Quem quaeritis? — “A quem buscais?” — Afigura-te, minha alma, que
neste momento Jesus te pergunta também: Dize-me, a quem buscas? Ah, meu
Senhor, a quem poderei buscar senão a Vós, que descestes do céu à terra para
me buscar e não me ver perdido?
Comprehenderunt Iesum, et ligaverunt eum — “Eles prenderam a
Jesus e o ligaram”. Ó céus, um Deus ligado! Que diríamos, se víssemos um
rei preso e ligado pelos seus servos?

E que dizemos agora vendo um Deus entregue às mãos da gentalha? Ó cordas


bem-aventuradas! Vós que ligastes o meu Redentor, ah! Liga-me a Ele, mas
liga-me de tal modo que nunca mais me possa separar de seu amor. —
Considera, minha alma, como um lhe liga as mãos, outro o injuria, mais outro
o empurra, e o Cordeiro inocente se deixa ligar e empurrar quanto quiserem.
Não procura fugir das mãos deles, não chama por auxílio, não se queixa de
tantas injúrias, nem mesmo pergunta por que é tratado assim. Eis, pois,
realizada a profecia de Isaías: Oblatus est quia ipse voluit, et non aperuit os
suum; sicut ovis ad occisionem ducetur (2) — “Foi oferecido, porque ele
mesmo quis, e não abriu a sua boca; ele será levado como uma ovelha ao
matadouro”.
Mas onde é que se acham os seus discípulos? Que fazem? Já não
podendo livrá-Lo das mãos de seus inimigos, ao menos que o tivessem
acompanhado para defenderem a inocência de Jesus perante os juízes, ou
sequer para o consolarem com a sua presença! Mas não; o Evangelho diz:
Tunc discipuli eius, relinquentes eum, omnes fugerunt (3) — “Então os seus
discípulos desamparando-O, fugiram todos”. Qual não devia ser a tristeza de
Jesus, vendo que até os seus discípulos queridos fugiam e O desamparavam?
Mas, ó céus, então o Senhor viu ao mesmo tempo todas aquelas almas que,
sendo por Ele mais favorecidas, haviam de abandoná-Lo depois e de Lhe
virar ascostas.
II. Ligado como um malfeitor, o nosso Salvador entra em Jerusalém,
onde poucos dias antes fora aclamado com tantas honras e louvores. Passa a
desoras pelas ruas, entre lanternas e tochas, e tão grande é o alarido e
tumulto, que todos deviam pensar que se levava qualquer grande criminoso.
A gente chega à janela e pergunta: quem é que foi preso? e respondem-lhe:
Jesus, o Nazareno, que foi desmascarado como sendo um sedutor, um
impostor, um falso profeta e réu de morte. — Quais não deviam ser então em
todo o povo os sofrimentos de desprezo e indignação, quando viram Jesus
Cristo, acolhido primeiro como o Messias, preso por ordem dos juízes, como
impostor!
Ah! Como se trocou então a veneração em ódio, como se arrependeu
cada um de O ter honrado, envergonhando-se de ter honrado um malfeitor,
como se fosse o Messias! — Eis, pois, a que estado se reduziu o Filho de
Deus para nos mostrar o nada das honras e dos aplausos do mundo! E como é
que eu, apesar de ver um Deus tão humilhado e injuriado por meu amor,
como é que eu hei de viver tão amante dos bens fugazes da terra, ambicionar
as honras, as dignidades, as preeminências, e não saber sofrer o mínimo
desprezo? Ai de mim, pecador e soberbo!

Donde, ó meu Senhor, me pode vir tamanho orgulho, depois que


mereci tantas vezes o inferno? Meu Jesus, suplico- Vos pelos merecimentos
dos desprezos que sofrestes, dai-me a graça de Vos imitar. Proponho com o
vosso auxílio reprimir de hoje em diante todo o ressentimento e receber com
paciência, alegria e contentamento todas as humilhações, todas as injúrias e
todas as afrontas que me possam ser feitas. Proponho, além disso, para Vos
agradar, fazer todo bem possível a quem me despreza; ao menos falarei
sempre bem dele e rogarei por ele. Vós, ó meu Senhor, pelas dores de Maria
Santíssima, fortalecei estes meus propósitos e dai-me a graça de Vos ser fiel.

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SEXTA-FEIRA - Comemoração das sete Dores de Maria Santíssima
O vos omnes qui transitis per viam, attendite et videte, si est dolor
sicut dolor meus – “Ó vós todos os que passais pelo ca-minho,
atendei e vede, se há dor semelhante à minha dor” (Lm 1, 12)

Sumário. Bem compete à Bem-Aventurada Virgem o título de


Rainha dos Mártires, porque, semelhante em tudo a Jesus, sofreu, em toda a
sua vida, no coração um martírio, ao mesmo tempo o mais longo e o mais
doloroso. E o seu martírio não ficou estéril; muito ao contrário, produziu um
fruto inestimável de vida eterna, de modo que todos os que se salvam, são
disso devedores, depois de Jesus Cristo, às dores de Maria. Se nos queremos
mostrar verdadeiros filhos da nossa aflita Mãe, imitemos a sua paciência e
resignação.

I. Assim como Jesus se chama Rei de Dores e Rei dos Mártires,


porque padeceu na sua vida mais que todos os outros mártires; assim Maria é
com razão chamada Rainha dos Mártires. Mereceu este titulo por ter sofrido
o martírio mais longo e mais doloroso que se possa padecer depois do de seu
Filho.
A Virgem pôde dizer o que o Senhor disse pela boca de Davi:
Defecit in dolore vita mea, et anni mei in gemitibus (1) — A minha vida
passou-se toda em dor e lágrimas, porquanto a minha dor, que era a
compaixão de meu amado Filho, não se afastava jamais do meu pen•samento,
vendo eu sempre todas as penas e a morte que Ele um dia devia padecer. —
Revelou a mesma divina Mãe a Santa Brígida, que, ainda depois da morte do
Filho e depois de sua ascensão ao céu, a lembrança da sua paixão estava
sempre fixa e recente no seu terno coração de mãe, quer comesse, quer
trabalhasse.
O martírio de Maria foi também de todos o mais dolo•roso,
porquanto, ao passo que os outros mártires tiveram o corpo dilacerado pelo
ferro, ela teve a alma traspassada e martirizada, como já lhe predisse São
Simeão: Et tuam ipsius animam (doloris) gladius pertransibit (2) — “E uma
espada (de dor) te traspassará a alma”. Ora, quanto a alma é mais nobre que o
corpo, tanto maior foi a dor de Maria que a de todos os mártires. — A tudo
isso acresce que ela padeceu sem alívio algum. Para os outros mártires, o seu
amor a Jesus fazia-lhes os tor•mentos doces e suaves; para a divina Mãe,
porém, o mesmo amor se lhe tornou cruel algoz, e fazia todo o seu martírio.
Numapalavra, conclui um sábio escritor, o martírio de Maria na Paixãodo Filho
foi tão grande, porque ela só podia dignamente compadecer-se da morte de
um Deus feito homem.
II. A dor de Maria na Paixão de Jesus Cristo não foi estéril, como a
das mães comuns à vista dos filhos que sofrem. Não; foi, ao contrário, uma
dor que produziu frutos abundantes de vida eterna. São Cipriano, falando
dos mártires, disse que o seu sangue era como que uma semente de cristãos,
querendo dizer que por um só homem que caía vítima da perseguição,
surgiam logo muitos pagãos a pedirem o batismo e abraçarem a religião
perseguida. Esta fecundidade, porém, do martírio, nada é em comparação da
do martírio da Rainha dos Mártires.
Com efeito, sabemos que pelo mérito do sacrifício dolo•roso que
Maria fez na morte de seu Filho, foi ela feita de•positária dos merecimentos
de Jesus Cristo, Co-Redentora do gênero humano e Mãe de todos os fiéis que
lhe foram confiadosna pessoa de João: Mulier, ecce filius tuus (3) — “Mulher,
eis aí teu filho”. De sorte que todos os que se salvaram, se salvam e ainda
vierem a salvar-se, todos serão devedores da sua salvação, depois de Jesus
Cristo, ao martírio do Coração de Maria. — Se, portanto, nós também
quisermos um dia ir gozar no céu, sejamos devotos servos desta querida Mãe,
e, à imitação dela, soframos com paciência as penas que tenhamos a sofrer, e
todas as graças que queiramos pedir ao Senhor, peça-mo-las pelos
merecimentos das incomensuráveis dores que ela sofreu no correr de toda a
sua vida, e especial•mente na Paixão de seu Filho.
Sim, ó Rainha dos Mártires, prometemos ser-vos fiéis;mas vós
mesma deveis alcançar-nos esta graça.

— “E Vós, ó meu Deus, em cuja paixão, segundo a profecia de


Simeão, a alma dulcíssima da gloriosa Virgem e MãeMaria foi traspassada por
uma espada de dor: concedei propício que nós, que celebramos a memória de
suas dores e padecimentos, possamos, pelos méritos gloriosos e inter•cessão
de todos os Santos que se acharam ao pé da cruz, obter os felizes frutos dessa
mesma paixão”.

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SÁBADO - Jesus é apresentado aos pontífices e por eles condenado à
morte
At illi, tenentes Iesum, duxerunt ad Caiphan principem
sacerdotum – “Eles, prendendo a Jesus, O levaram a Caifás, príncipe
dos sacerdotes” (Mt 26, 57)

Sumário. Imaginemos ver a Jesus Cristo perante o tribunal de


Caifás. Ali é esbofeteado, tratado de blasfemador, declarado réu de morte, e
como tal, maltratado de mil modos. Jesus, porém, no meio de tantos
opróbrios, nada perde de sua serenidade e doçura, e parece que com o seu
silêncio nos diz: Se quiserdes desagravar-me das injúrias que me fazem,
suportai por meu amor os desprezos, assim como eu os suporto por vosso
amor.

I. Eis que o Redentor é levado como em triunfo à presença de


Caifás, que já O estava esperando, e vendo-O diante de si, só e desamparado
de seus discípulos, ficou cheio de contentamento. Minha alma, contempla o
teu Senhor, que ali está todo humilde e manso. Contempla o seu belo rosto,
que, no meio de tantas injúrias e desprezos, não perdeu a sua serenidade e
doçura. O ímpio pontífice interroga Jesus sobre seus discípulos e sobre sua
doutrina para achar algum pretexto de condenação. Jesus responde-lhe com
humildade: “Eu não falei em segredo, mas em público; todos estes que aqui
estão podem dar testemunho do que eu falei”. Senão, quando depois de uma
resposta tão justa e tão branda, um algoz mais insolente avança do meio da
chusma e, tratando Jesus de atrevido, lhe dá uma forte bofetada dizendo: “É
assim que respondes ao sumo sacerdote?” Ó Deus, como pôde uma resposta
tão humilde e tãomodesta merecer tão grave insulto?
Entretanto, o Conselho procurava testemunhas para o condenar à
morte; mas não encontravam; pelo que o pontífice vai novamente buscar
matéria de condenação nas palavras de nosso Salvador mesmo, e lhe diz:
Adiuro te per Deum vivum, ut dicas nobis, si tu es Christus Filius Dei (1) —
“Eu te conjuro, pelo Deus vivo, que nos digas, se tu és o Cristo, o Filho de
Deus”. O Senhor, ouvindo que O conjuravam em nome de Deus, confessa a
verdade e responde: “Sim, eu o sou: e um dia me verás, não tão desprezível
como estou agora diante de ti, mas assentado num trono de majestade como
juiz de todos os homens, acima das nuvens do céu”. Ouvindo estas palavras,
o pontífice, em vez de prostrar-se com o rosto em terra para adorar a seu Deus,
rasga seus vestidos e diz: “Para que mais precisamos de testemunhas? Acabais
de ouvir a blasfêmia. Quid vobisvidetur? (2) — “Que vos parece?” E todos os
outros sacerdotes responderam que sem dúvida alguma Ele era réu de morte.
— Ah, meu Jesus, o mesmo disse também vosso Eterno Pai, quando Vos
oferecestes a expiar os nossos pecados. Meu Filho, disse, já que queres
satisfazer pelos homens, és réu de morte, e por isso énecessário que morras.
II. Tunc expuerunt in faciem eius, et colaphis eum ceciderunt (3)
— “Então cuspiram-Lhe no rosto e deram-Lhe bofetadas”. Sendo Jesus Cristo
declarado réu de morte, puseram- se todos a maltratá-Lo como a um malfeitor.
Um cospe-Lhe no rosto, outro dá-Lhe empuxões, mais outro Lhe dá
bofetadas. Vendando-Lhe os olhos com um pano, escarnecem d’Ele,
chamando-O falso profeta, e dizendo: “Já que és profeta, profetiza agora
quem Te bateu”. Escreve São Jerônimo que foram tantos os insultos e injúrias
que naquela noite foram feitos ao Senhor, que só no dia do juízo final serão
conhecidos todos.
O sofrimento de Jesus foi ainda aumentado pelo pecado de Pedro,
que O renega e jura que nunca O conheceu.
Vai, minha alma, vai ter naquela prisão com o teu Senhor aflito,
escarnecido e abandonado; agradece-Lhe e consola-O com o teu
arrependimento, visto que tu também algum tempo O desprezaste e renegaste.
Dize-Lhe que quiseras morrer de dor, lembrando-te que no passado Lhe
amarguraste tanto o doce Coração, que tanto te amou. Dize-Lhe que agora O
amas e não queres senão padecer e morrer por seu amor.
Ah! Meu Jesus, esquecei os desgostos que Vos dei, e lançai sobre
mim um olhar de amor, assim como lançastes sobre Pedro, depois que Vos
renegou. Ó grande Filho de Deus, ó amor infinito, que padeceis por aqueles
mesmos homens que Vos odeiam e maltratam! Vós sois a glória do paraíso:
honra demasiada tereis feito aos homens, se os houvéreis admitido somente a
beijar-Vos os pés. Mas, ó Deus, quem Vos reduziu a esse extremo de
ignomínia, de servirdes de ludibrio à gente mais vil do mundo? Dizei-me, meu
Jesus, que posso fazer para Vos desagravar da desonra que vossos algozes
vos infligem com os seus insultos? Ouço-Vos responder-me: Suporta por
meu amor os desprezos, assim como eu os suportei por teu amor. Sim,
Redentor meu, quero obedecer-Vos. Ó Jesus, desprezado por minha causa,
aceito e desejo ser desprezado por vossa causa, quanto Vos agradar. Dai-me,
porém, a graça para Vos ser fiel. Fazei-o pelas dores da vossa e minha
querida Mãe Maria.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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SEMANA
SANTA
DOMINGO DE RAMOS - Jesus faz a sua entradatriunfal em Jerusalém
Ecce rex tuus venit tibi mansuetus, sedens super asinam et pullum
filium subiugalis – “Eis que o teu Rei aí vem a ti cheio de mansidão,
montado sobre uma jumenta e um jumentinho,filho do que está sob o
jugo” (Mt 21, 5)

Sumário. Imaginemos ver Jesus na sua entrada triunfal em


Jerusalém. O povo em júbilo lhe vai ao encontro, estende seus mantos na
estrada e juncam-na de ramos de árvores. Ah! Quem teria dito então que o
Senhor, acolhido agora com tão grande honra, dentro em poucos dias teria de
passar ali como réu, condenado à morte? Mas é assim: O mundo muda num
instante o Hosanna em Crucifige. E não obstante isso somos tão insensatos,
que por um aplauso, por um nada nos expomos ao perigo de perdermos para
sempre a alma, o paraíso de Deus.

I. Estando próximo o tempo da Paixão, o nosso Redentor parte de


Betânia para fazer a sua entrada em Jerusalém. Contemplemos a humildade
de Jesus Cristo, que, sendo o Rei do céu, quer entrar naquela cidade montado
numa jumenta. — Ó Jerusalém, eis que o teu rei aí vem humilde e manso.
Não temas que Ele venha para reinar sobre ti ou apossar-se das tuas riquezas;
porquanto vem a ti cheio de amor e piedade para te salvar e dar-te a vida pela
sua morte.
Entretanto os habitantes da cidade, que, havia já tempos, O
veneravam por causa de seus milagres, foram-Lhe ao encontro. Uns
estendem os seus mantos na estrada por onde passa, outros juncam o
caminho, em honra de Jesus, com ramos de árvores. — Oh! Quem teria dito
que o mesmo Senhor, acolhido agora com tanta demonstração de veneração,
havia de passar por ali dentro em poucos dias como réu condenado à morte,
com a cruz aos ombros!?
Meu amado Jesus, quisestes fazer a vossa entrada tão gloriosa, a fim
de que a vossa paixão e morte fosse tanto mais ignominiosa, quanto maior foi
a honra então recebida. A cidade, ingrata, em poucos dias trocará os louvores
que agora Vos tributa, por injúrias e maldições. Hoje cantam: “Glória a vós,
Filho de Davi; sede sempre bendito, porque vindes para nosso bem em nome
do senhor.” E depois levantarão a voz bradando: Tolle, tolle, crucifige eum
(1) — “Tira, tira, crucifica-O”. — Hoje tiram os próprios vestidos; então
tirarão os vossos, para Vos açoitar e crucificar. Hoje cortam ramos e
estendem-nos debaixo de vossos pés; então tomarão ramos de espinheiro, para
Vos ferir a cabeça. Hoje bendizem-Vos, e depois hão de cumular-Vos de
contumélias e blasfêmias. — Eia, minha alma, chega-te a Jesus e dize-Lhe
com afeto e gratidão: Bendictus, quivenit in nomine Domine (2) — “Bendito o
que vem em nome doSenhor”.

II. Refere depois o Evangelista, que Jesus chegando perto da infeliz


cidade de Jerusalém, ao vê-la, chorou sobre ela, pensando na sua ingratidão e
próxima ruína. — Ah, meu Senhor, chorastes então sobre Jerusalém, mas
chorastes também sobre a minha ingratidão e perdição; chorastes ao ver a
ruína que eu a mim mesmo causava, expulsando-Vos de minha alma e
obrigando-Vos a condenar-me ao inferno. Peço-Vos, deixai queeu chore, pois
que a mim compete chorar ao lembrar-me da injúria que Vos fiz ofendendo-
Vos. Pai Eterno, pelas lágrimas que vosso Filho então derramou por mim,
dai-me a dor de meus pecados, já que os detesto mais que qualquer outro mal
e resolvido estou a amar-Vos para o futuro, de todo o coração.
Depois que Jesus entrou em Jerusalém, e se fatigou o dia todo na
pregação e na cura de enfermos, quando chegou a noite, não houve quem o
convidasse a descansar em sua casa; pelo que se viu obrigado a voltar para
Betânia. — Santa Teresa considerando certa vez num Domingo de Ramos,
naquela descortesia para com o seu divino Esposo, convidou-Ohumildemente
a vir hospedar-se no seu pobre peito. Agradou-seo Senhor tanto do convite de
sua esposa predileta, que, ao receber a sagrada Hóstia, afigurava-se à Santa
que tinha a boca cheia de sangue vivo e ao mesmo tempo gozava uma doçura
paradisíaca.

Também tu, meu irmão, dirige a Jesus, especialmente quando te


aproximas da santa comunhão, o convite que venha hospedar-se em tua alma,
a fim de não sofrer mais.
— E agora roga a Deus que, “tendo Ele feito Nosso Senhor tomar
carne e sofrer a morte de cruz, para dar ao gênero humano um exemplo de
humildade para imitar, te conceda a graça de aproveitar os documentos de
sua paciência e de alcançar a glória da ressurreição” (3). — Recomenda-te
tambémà intercessão da Virgem Maria.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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SEGUNDA-FEIRA - Jesus é levado a Pilatos e a Herodes, e posposto a
Barrabás
Et vinctum adduxerunt eum, et tradiderunt Pontio Pilato praesidi
–“E preso O conduziram e entregaram ao governador Pôncio Pilatos”
(Mt 27, 2)

Sumário. Imaginemos ver Jesus Cristo, que em meio de uma


multidão de gentalha insolente é conduzido ao tribunal de Pilatos, depois ao
de Herodes e afinal novamente ao de Pilatos. Este, para livrá-Lo, apresenta-O
ao povo juntamente com um ladrão e assassino; mas o povo responde: Seja
livre Barrabás, e Jesus seja crucificado. Ó céus! Todas as vezes que pecamos,
fizemos o mesmo, pospondo nosso Deus a um vil interesse, a um pouco de
fumo, a um vil prazer.

I. Ao amanhecer, os príncipes dos sacerdotes novamente declaram


Jesus réu de morte, e depois conduzem-no a Pilatos, a fim de que este O
condene a morrer crucificado. Pilatos, tendo interrogado diversas vezes tanto
os Judeus como nosso Salvador, reconhece que Jesus é inocente e que todas
as acusações são calúnias. Sai, pois, para fora e declara que não acha em
Jesus culpa alguma para condená-Lo. Vendo, porém, que os Judeus se
empenhavam sumamente em fazê-Lo morrer, e ouvindo que Jesus era da
Galiléia, para tirar-se dos apuros, remisit eum ad Herodem (1) — “devolveu-
O a Herodes”.
Herodes ficou muito contente ao ver Jesus levado à sua presença.
Esperava ver um dos muitos milagres obrados pelo Senhor e dos quais
tinha ouvido falar. Interrogou-O muito, mas Jesus se calou e não lhe deu
resposta alguma; castigando assim a vã curiosidade daquele insolente: At ipse
nuhil illi respondebat(2). Ai da alma a qual o Senhor não fala mais.
— Meu Jesus, eu também tinha merecido este castigo, por ter
resistido tantas vezes às vossas misericordiosas inspirações. Mas, meu amado
Redentor, tende piedade de mim e falai-me: Loquere, Domine, quia audit
servus tuus (3) —“Falai, Senhor, porque o vosso servo escuta”. Dizei-me
o que desejais de mim; quero obedecer-Vos e contentar-Vos em tudo.
Herodes, vendo que Jesus não lhe respondia, desprezou-
O e tratando-O como a um doido, fez escárnio d’Ele, mandando- O vestir uma
túnica branca, e motejou dele com toda a sua corte, e assim desprezado e
escarnecido mandou-O de novo a Pilatos. Eis que Jesus, vestido com aquele
manto de escárnio, é levado pelas ruas de Jerusalém.
— Ó meu desprezado Salvador, faltava-Vos ainda esta injúria, a de
ser tratado como um doido. Cristão, vede como o mundo trata a Sabedoria
eterna! Feliz de quem se compraz em ser considerado pelo mundo como
doido, e não quer saber outra coisa senão a Jesus crucificado, amando os
sofrimentos e os desprezos! Perante Deus terá mais valor um desprezo
suportadoem paz por amor d’Ele, do que mil disciplinas.

II. O povo israelítico tinha direito a exigir do governador romano no


grande dia da Páscoa que deixasse ir livre um dos prisioneiros. Pelo que
Pilatos lhes mostrou Jesus e Barrabás, homem criminoso, dizendo: Quem
vultis dimittam, vobis, Barabbam an Iesum? (4) — “Qual quereis que vos
solte, Barrabás ou Jesus?” Pilatos esperava que o povo com certeza preferiria
Jesus a Barrabás, um celerado, homicida e salteador, que todos deviam
detestar. Mas o povo, instigado pelos príncipes da sinagoga, de repente e sem
deliberar, pede Barrabás. — Pilatos, surpreso e indignado ao ver um inocente
posposto a tão grande malfeitor, diz: Quid igitur faciam de Iesu?
— “Que farei então de Jesus?” Todos gritam: “Seja crucificado!” Pergunta
outra vez Pilatos: “Mas, que mal fez Ele?” Eles porém gritam com mais
força: “Seja crucificado!” Crucifigatur!
Assim como Jesus e Barrabás foram apresentados ao povo, assim
também perguntou-se ao Pai Eterno, qual Ele queria que fosse salvo, seu Filho
ou o pecador. E o Pai Eterno respondeu: Morra meu Filho e seja salvo o
pecador. É o que nos afirma o Apóstolo (5); é o que nos diz Jesus Cristo
mesmo: Sic Deus dilexit mundum, ut Flium suum unigenitum daret (6) —
“Tanto amou Deus ao mundo, que lhe deu seu Filho unigênito”.

— Mas, como é que os homens correspondem a estas supremas finezas do


amor?
Ai de mim, meu Senhor! Todas as vezes que cometi o pecado, fiz
como os Judeus. A mim também se perguntava o quedesejava: a Vós ou ao vil
prazer; e respondi: Quero o prazer e pouco se me dá perder o meu Deus. É
assim que falei então; mas agora estou arrependido de todo o coração, e digo
que prefiro a vossa graça a todos os prazeres e tesouros do mundo. Ó Bem
infinito, ó meu Jesus, amo-Vos acima de todos os outros bens; só a Vós quero
e nada mais. — Ó Mãe das dores, minha Mãe Maria, impetrai-me a santa
perseverança.

Meditação para a tarde do mesmo dia. Jesus preso à coluna e


flagelado
Tunc ergo apprehendit Pilatus Iesum et flagellavit – “Pilatostomou
então a Jesus e o mandou açoitar” (Jo 19, 1)

Sumário. Contemplemos como os algozes pegam dos açoites e a um


sinal dado começam a bater por toda a parte em nosso divino Redentor. Seu
corpo virginal primeiro torna-se roxo; depois começa a correr o sangue, e
com tão grande abundância, que ficam manchados, não só os açoites, senão
também as vestes dos algozes e a própria terra. Pelo que o Senhor ficou
transfigurado como um leproso, coberto de chagas desde a cabeça até aos pés.
E nós continuaremos a acariciar estacarne rebelde?
I. Vendo Pilatos que falharam os dois meios empregadospara não ter
que condenar ao inocente Jesus, isto é, a remessa para Herodes e a
apresentação ao lado de Barrabás, toma o alvitre de lhe dar um castigo
qualquer e depois mandá-Lo embora. Convoca portanto os Judeus e lhes diz:
“Apresentastes-me este homem como um agitador; não acho, porém,
n’Ele culpa alguma, nem tampouco a achou Herodes. Todavia para vos
contentar mandarei castigá-Lo edepois mandá-Lo-ei embora.”
Ó Deus, que injustiça clamorosa! Declara-O inocente, e depois
manda-O castigar!
Mas, qual é o castigo, ó Pilatos, a que condenas este inocente? Vais
condená-Lo a ser açoitado? A um inocente infliges uma pena tão cruel e tão
vergonhosa? Sim, foi o que se fez. Tunc ergo apprehendit Pilatus Iesum, et
flagellavit (1) — “Então Pilatos tomou a Jesus e mandou que O açoitassem.”
— Minha alma, contempla como, depois de uma ordem tão injusta,
os algozes agarram furiosos o Cordeiro mansíssimo,e entre gritos e alaridos o
levam ao Pretório e o prendem à coluna. E Jesus, que faz Jesus? Todo
humilde e submisso, aceita por nossos pecados o tormento tão doloroso e
ignominioso. Eis como os verdugos já pegam dos açoites, e ao sinal dado
levantam os braços e começam a bater por toda a parte, na carne sagrada do
Senhor. — Ó algozes, estais enganados, o criminoso não é Ele; fui eu que
mereci esses castigos
Ó minha alma, queres ser do número daqueles que indiferentes
contemplam um Deus açoitado? Considera a dor, e mais ainda o amor com
que o teu dulcíssimo Senhor padece por ti tão grande suplício. Com certeza,
entre os açoites Jesus pensava em ti. Se Ele tivesse sofrido por amor de ti um
golpe só, já deverias estar abrasado de amor para com Jesus e dizer: “UmDeus
quis ser batido por amor de mim!” Jesus porém quis, para satisfação de teus
pecados, que Lhe fossem rasgadas e dilaceradas todas as carnes, segundo a
profecia de Isaías: Ipse autem vulneratus est propter iniquitates nostras (2) —
“Ele foi ferido pelas nossas iniquidades”

II. O corpo virginal de Jesus primeiro torna-se todo roxo; depois o


sangue começa a correr por toda a parte. Ó céus! Os algozes já Lhe rasgaram
a carne toda, e sem piedade continuam a bater nas feridas e a ajuntar novas
dores. Assim o mais famoso de todos os homens fica tão desfigurado, que
impossível é reconhecê-Lo. Numa palavra, Jesus é reduzido a um estado tão
lastimável, que parece como que um leproso, coberto de chagas desde a
cabeça até aos pés: Et nos putavimus eum quasi leprosum (3) — “E nós o
julgamos como que um leproso”. E para que tudo isso? Para me livrar dos
suplícios eternos. Desgraçado e infeliz de quem não Vos ama, ó Deus de
amor!
Mas enquanto os algozes O açoitam tão cruelmente, que faz o nosso
amável Salvador? Não fala, não se queixa, não geme; mas paciente oferece
tudo a Deus a fim de abrandá-Lo para conosco. Sicut agnus coram tondente
se, sine voce, sic non aperuit os suum (4) — “Como um cordeiro diante do
que o tosquia, emudeceu, e não abriu a sua boca”
Ah, meu Jesus, Cordeiro inocente! Os bárbaros algozes Vos Tiram,
já não a lã, mas, sim, a pele e a carne. É esse o batismo de sangue pelo qual
suspirastes durante a vossa vida toda. Eia, minha alma, lava-te no sangue
precioso de que foi embebida aquela terra ditosa. — Meu dulcíssimo
Salvador, como poderei duvidar do vosso amor, vendo-Vos todo ferido e
dilacerado por meu amor? Cada chaga é uma prova inegável do afeto que me
tendes. Cada ferida pede-me que Vos ame. Uma só gota do vosso sangue era
bastante para a minha salvação; mas Vós quereis derramá-lo todo sem
reserva, a fim de que eu também me dê a Vós sem reserva. Sim, meu Jesus,
sem reservaalguma me dou todo a Vós; aceitai-me e ajudai-me a ser-Vos fiel.
Fazei-o pelas dores de vossa e minha querida Mãe Maria.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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TERÇA-FEIRA - Jesus é coroado de espinhos e apresentado ao povo
Et plectentes coronam de spinis, posuerunt super caput eius – “E
entrançando uma coroa de espinhos Lha puseram na cabeça”
(Jo 19, 1)

Sumário. Depois de terem açoitado a Jesus, os algozes, tratando-O


como rei de comédia, atiram-Lhe sobre os ombros um manto de púrpura,
colocam-Lhe um caniço na mão, e põem- Lhe na cabeça uma coroa de
espinhos, na qual batem fortemente com o caniço, a fim de que penetre mais.
O Senhor ficou reduzido a tão triste estado, que Pilatos julgou que comoveria
de compaixão os próprios inimigos, só com apresentá-Lo. Contemplemo-Lo
também, e pensando que foi tão maltratado por nosso amor, não tenhamos a
crueldade de dizer com os judeus: Crucifigatur — “Seja crucificado”.

I. Contemplemos os outros bárbaros suplícios que os soldados


infligiram a nosso Senhor já tão atormentado. Instigados, e, como afirma São
João Crisóstomo, subornados pelo dinheiro dos Judeus, reúnem ao redor de
Jesus toda a corte, põem-Lhe aos ombros um manto vermelho a servir de
manto real, nas mãos colocam-Lhe um caniço a servir de cetro e na cabeça
um feixe de espinhos a servir de coroa. Os espinhos estavam entrelaçados em
forma de capacete, de modo que Lhe cobria a cabeça toda: Et plectentes
coronam de spinis, posueruntsuper caput eius.

Mas, porque os espinhos com a força das mãos não penetravam


bastante na cabeça sagrada, já tão ferida pelos açoites, tomam-Lhe o caniço, e
enquanto Lhe escarravam também no rosto, batem com toda a força sobre a
cruel coroa, de sorte que rios de sangue corriam da cabeça ferida pelo rosto e
sobre o peito. Ah, espinhos ingratos! É assim que atormentais o vosso
Criador? — Mas, para que acusar os espinhos? Ó pensamentos perversos dos
homens, sois vós que transpassastesa cabeça do meu Redentor.
Eia, minha alma, prostra-te aos pés de teu Senhor coroado; detesta ali
os teus consentimentos pecaminosos, e roga- Lhe que te traspasse com um
daqueles espinhos, consagrados pelo seu preciosíssimo sangue, a fim de que
não o tornes mais a ofender. — Enquanto os bárbaros algozes, juntando o
escárnio àdor, o tratam como rei de comédia, d’Ele motejam e o esbofeteiam,
tu, pelo menos, reconhece-O pelo Supremo Senhor de tudo, como na verdade
é; feito agora Rei de dor por amor doshomens.
II. Voltando outra vez Jesus ao pretório de Pilatos, depois da
flagelação e coroação de espinhos, este, ao vê-Lo todo dilacerado e
desfigurado, capacitou-se de que comoveria o povo à compaixão, só com
mostrá-Lo. Saiu, pois, para a varanda como nosso aflito Salvador, e disse:
Ecce homo — “Eis aqui o homem”. Como se dissesse: Judeus, contentai-
vos com o que este inocente tem sofrido até agora; vede a que estado se acha
reduzido. Que medo ainda podeis ter que Ele queira fazer-se vosso rei, visto
que não pode mais viver? Deixai-O ir morrer em sua casa. Exivit ergo Iesus,
portans coronam spineam, et purpureum vestimentum (1) – “Jesus saiu
coroado de espinhos evestido de um manto de púrpura”.
Minha alma, tu também contempla naquela varanda a teu Senhor,
ligado e arrastado por um algoz. Vê-O, como ali está meio despido, se bem
que coberto de chagas e sangue, com as carnes todas rasgadas, com aquele
farrapo de manto purpúreo, que serve tão somente para escarnecê-Lo, e com
a cruel coroa que continuamente o atormenta. Vê a que estado se acha
reduzido o teu Pastor, para te achar, a ti, sua ovelha perdida.
Ah meu Jesus! Quantos papéis de teatro fazem-Vos os homens
representar, mas todos eles de dor e de ignomínia. Ó dulcíssimo Redentor,
inspirais compaixão às próprias feras, mais aí não achais piedade! Ouve o que
aquele povo responde Crucifige, crucifige eum! (2) — “Crucifica-o, crucifica-
o!” Mas, ó Senhor meu, o que dirão no último dia, quando Vos virem na
glória, sentado como Juiz num trono de luz? Ai de mim! Jesus meu, houve
um tempo em que eu também disse: “Crucifica-o, crucifica-o!” Foi quando
Vos ofendi pelos meus pecados.
Agora arrependo-me deles mais que de todos os outros males e amo-
Vos sobre todas as coisas, ó Deus de minha alma. Perdoai-me pelos
merecimentos de vossa Paixão. — Ó Mãe de dores, Maria, fazei que no dia
do juízo eu veja vosso Filho aplacado e não irado para comigo.

Meditação para a tarde do mesmo dia. Jesus é condenado e vai


ao Calvário
Tunc ergo tradidit eis illum ut crucifigerunt – “Então entregou-lhes Jesus,
para ser crucificado” (Jo 19, 16)

Sumário. Imaginemos ver Jesus Cristo que escuta a injusta sentença


de morte, aceita-a por nosso amor, e abraçando a cruz, se encaminha para o
Calvário. Os judeus temendo que a cada momento expire, e desejosos de O
ver morrer crucificado, obrigam a Simão Cirineu a levar a cruz atrás de Jesus.
Unamo- nos ao ditoso Simão, e abraçando com resignação a nossa cruz,
carreguemo-la atrás de Jesus, que no-la manda para nosso bem.

I. Considera como Pilatos, depois de proclamar diversas vezes a


inocência de Jesus, finalmente a torna a proclamar, lavando as mãos e
protestando que é inocente do sangue daquele justo. Se, pois, havia de morrer,
os judeus deveriam responder por Ele. Em seguida lavra a sentença e condena
Jesus à morte. Ó injustiça nunca mais vista no mundo! O Juiz condena o
acusado ao mesmo tempo que o declara inocente!

Lê-se a iníqua sentença de morte na presença do Senhor condenado;


este escuta-a, e todo conformado com o decreto de seu Eterno Pai, que o
condena à cruz, aceita-a humildemente, não pelos delitos que os judeus lhe
imputavam falsamente, mas pelas nossas culpas verdadeiras, pelas quais se
tinha oferecido a satisfazer com a sua morte. Na terra, Pilatos diz: Morra
Jesus; eo Pai Eterno confirma a sentença no céu dizendo: Morra meu Filho. E
o mesmo Filho acrescenta: Eis-me aqui, obedeço e aceito a morte, e a morte
de cruz: Humiliavit semetipsum, factus obediens usque ad mortem, mortem
autem crucis (1) — “Humilhou-se a si mesmo, feito obediente até a morte, e
morte de cruz.”
Meu amado Redentor, aceitais a morte que eu devia sofrer, e pela
vossa morte me alcançais a vida. Agradeço-Vos, ó amor meu, e espero ir ao
céu para cantar eternamente as vossas misericórdias: Misericordias Domini in
aeternum cantabo (2) Mas, já que Vós inocente aceitais a morte de cruz, eu
pecador aceito de boa vontade a morte que me destinais; aceito-a com todas
as penas que a tenham de preceder ou de acompanhar, e desde agora ofereço-
a a vosso Eterno Pai em união com a vossa santa morte. Vós morrestes por
meu amor, eu quero morrer por vosso amor.

II. Lida a sentença, o povo desgraçado levanta um brado de júbilo e


diz: “Felizmente Jesus é condenado à morte! Vamos depressa, não percamos
tempo, prepare-se a cruz, e façamo-Lo morrer antes do dia de amanhã, que é a
Páscoa.” — E no mesmo instante agarram a Jesus, tiram-Lhe o manto
vermelho dosombros e entregam-Lhe os seus próprios vestidos; a fim de que,
segundo diz Santo Ambrósio, fosse reconhecido pelo povo por aquele mesmo
impostor (assim o chamavam) que poucos dias antes fora recebido como
Messias. Depois tomam duas rudes traves, que compõem em forma de cruz, e
mandam-Lhe com insolência que a leve sobre seus ombros até o lugar do
suplício. Ó Deus, que crueldade, carregar com tamanho peso um homem tão
maltratado e enfraquecido!
Jesus abraça a cruz com amor e encaminha-se para o Calvário. O seu
aspecto naquele caminho é tão lastimoso, que asmulheres de Jerusalém, ao vê-
Lo, O acompanham, chorando e lamentando tamanha crueldade. Mas, nem
assim os pérfidos judeus são levados à compaixão! Ao contrário, desejando,
por um lado, ver Jesus crucificado, e, por outro, temendo que expirasse no
caminho, visto que caía quase a cada passo, tiraram-Lhe a cruz dos ombros e
obrigaram certo homem, de nome Simão, a carregá-la. — Minha alma, une-te
ao ditoso Cirineu; abraça a tua cruz por amor de Cristo, que por teu amor
padece tanto. Vê como Ele vai adiante e te convida a segui-Lo: Qui vult
venire post me, tollat crucem suam, et sequatur me (3)
— “Se alguém quiser vir após mim, tome a sua cruz e siga-me”.
Não, meu Jesus, não quero deixar-Vos; quero seguir-Vos até morrer.
Pelos merecimentos desse caminho doloroso, dai-me força para carregar com
paciência a cruz que quiserdes mandar- me. Ah! Vós nos fizestes nimiamente
amáveis os sofrimentos e os desprezos, abraçando-os por nós com tanto amor!
Ó Mãe de dores, Maria, rogai a vosso Filho por mim.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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QUARTA-FEIRA - Quarta Dor de Maria Santíssima – Encontro com
Jesus, que carrega a cruz
Vidimus eum, et non erat aspectus, et desideravimus eum –“Vimo-
Lo, e não havia nele formosura, e por isso nós O estranhamos”
(Is 53, 2)

Sumário. Consideremos o encontro que no caminho do Calvário


teve o Filho com sua Mãe. Jesus e Maria olham-se mutuamente, e estes
olhares são como outras tantas setas que lhes traspassam o Coração amante.
Se víssemos uma leoa que vai após seu filho conduzido à morte, aquela fera
havia de inspirar-nos compaixão. E não nos moverá à ternura ver Maria que
vai após o seu Cordeiro imaculado, enquanto o conduzem à morte por nós?
Tenhamos compaixão, e procuremos também acompanhar a seu Filho e a ela,
levando com paciência a cruz que nos dá o Senhor.

I. Medita São Boaventura que a Bem-aventurado Virgem passou a


noite que precedia a Paixão de seu Filho sem tomar descanso e em dolorosa
vigília. Chegada a manhã, os discípulos de Jesus Cristo vieram a esta aflita
Mãe: um a referir-lhe os maustratamentos feitos a seu Filho na casa de Caifás,
outro os desprezos que recebeu de Herodes, mais outro a flagelação ou a
coroação de espinhos. Numa palavra, cada um dava a Maria uma nova
informação, cada qual mais dolorosa, verificando-se nela o que Jeremias tinha
predito: Non est qui consoletur eam ex omnibus caris eius (1) — “Não há
quem a console entre todos os seus queridos”.

Veio finalmente São João e lhe disse:


“Ah, Mãe dolorosa! Teu Filho já foi condenado à morte, e já saiu,
levando Ele mesmo a sua cruz para ir ao Calvário. Vem, se O queres ver e dar-
Lhe o último adeus, em alguma rua, por onde tenha de passar”.
Ao ouvir isto, Maria parte com João; e pelo sangue de que estava a
terra borrifada conhece que o Filho já por ali tinha passado. A Mãe aflita toma
por uma estrada mais breve e coloca- se na entrada de uma rua para se
encontrar com o aflito Filho, nada se-lhe dando das palavras insultuosas dos
judeus, que a conheciam como mãe do condenado. — Ó Deus, que causa de
dor foi para ela a vista dos cravos, dos martelos, das cordas e dos outros
instrumentos funestos da morte de seu Filho! Como que uma espada foi ao
seu coração o ouvir a trombeta, que andava publicando a sentença
pronunciada contra o seu Jesus.
Mais eis que já, depois de terem passado os instrumentos e os
ministros da justiça, levanta os olhos e vê, ó Deus! Um homem todo cheio de
sangue e de chagas, dos pés até a cabeça, com um feixe de espinhos na cabeça
e dois pesados madeiros sobre os ombros. Olha para Ele, e quase não O
conhece, dizendo então com Isaías: Vidimus eum, et non erat aspectus (2) —
“Nós O vimus e não havia n’Ele formosura”. Mas finalmente o amor lho faz
reconhecer e o Filho, tirando um grumo de sangue dos olhos, como foi
revelado a Santa Brígida, encarou a Mãe e a Mãe encarou o Filho. Ó olhares
dolorosos, com que, como tantas flechas, foram então traspassadas aquelas
almas amantes!
II. Queria a divina Mãe abraçar a Jesus, como diz Santo Anselmo;
mas os insolentes servos a repelem com injúrias, e empurram para diante o
Senhor aflitíssimo. Maria, porém, segue
— muito embora preveja que a vista de seu Jesus moribundo lhecausaria uma
dor tão acerba, que a tornaria rainha dos mártires. O Filho vai adiante, e a Mãe
tomando também a sua cruz, no dizer de São Guilherme, vai após Ele, para
ser crucificada com Ele.
Se víssemos uma leoa que vai após o filho conduzido à morte,
aquela fera nos causaria compaixão. E não nos inspirará compaixão o ver
Maria, que vai após o seu Cordeiro imaculado, enquanto o levam a morrer por
nós? Tenhamos compaixão por ela, e procuremos também acompanhar o Filho
e a Mãe, levando com paciência a cruz que nos envia o Senhor. — Pergunta
São João Crisóstomo, porque nas outras penas Jesus Cristo quis ser só, mas a
levar a Cruz quis ser ajudado pelo Cirineu? E responde: Ut intelligas, Christi
crucem non sufficere sinne tua: Não basta para nos salvar só a cruz de Jesus
Cristo, se nós não levamos com resignação até a morte também a nossa.

Minha dolorosa Mãe, pelo merecimento da dor que sentistes ao ver o


vosso amado Filho levado à morte, impetrai- me a graça de levar também
com paciência as cruzes que Deus me envia. Feliz de mim, se souber
acompanhar-vos com a minha cruz até a morte! Vós e Jesus, sendo inocentes,
levastes uma cruz muito pesada, e eu pecador, que tenho merecido o inferno,
recusarei a minha? Ah, Virgem imaculada, de vós espero socorro, para sofrer
com paciência as cruzes.

Meditação para a tarde do mesmo dia. Jesus é crucificado entre


dois ladrões
Crucifixerunt eum, et cum eo alios duos, hinc et hinc, medium autem
Iesum – “Crucificaram-No e com Ele outros dois, um de uma parte, e
outro da outra, e no meio Jesus” (Jo 19, 18)

Sumário. Imaginemos que junto com a divina Mãe presenciamos a


crucifixão de Jesus Cristo. Eis que, plantada já a cruz, o Filho de Deus está
neste patíbulo infame, suspenso em suas próprias feridas, e sofre tantas
mortes, quantos momentos durou aquela longa agonia. Ó Deus! Jesus pensou
então em cada um de nós, e a previsão de nossas culpas tornava-Lhe a morte
mais dolorosa. Unamo-nos em espírito com a Santíssima Virgem, e
aproximemo-nos para beijar a preciosa Cruz com coração contrito e amante.
I. Logo que Jesus chegou ao Calvário, todo exausto de dores e de
cansaço, deram-Lhe a beber o vinho misturado com fel, que era costume dar
aos condenados à cruz, para diminuir neles o sentimento da dor. Jesus,
porém, querendo morrer sem alívio, provou apenas e não quis beber. Depois,
tendo-se a multidão colocado em círculo ao redor de Nosso Senhor, os
soldados arrancaram-Lhe as vestes, pegadas ao corpo todo chagado e
dilacerado, e com as vestes Lhe arrancaram também pedaços da carne. Em
seguida deitaram-no sobre a cruz. Jesus estende as sagradas mãos e oferece
ao Eterno Pai o grande sacrifício de si mesmo e pede-Lhe que O aceite pela
nossa salvação.
Os soldados furiosos tomam os pregos e os martelos, e traspassando
as mãos e os pés de nosso Salvador, pregam-no na cruz. Afirma São Bernardo
que na crucifixão de Jesus os algozes se serviram de pregos sem ponta, para
que causassem dor mais violenta. O som das marteladas ressoa pelo monte, e
chega aos ouvidos de Maria, que se achava perto, acompanhando o Filho.
— Ó mãos sagradas, que com vosso tato curastes tantos enfermos, porque
vos traspassam agora sobre a cruz? Ó pés sacrossantos, que vos cansastes
tantas vezes na busca das ovelhas perdidas, que somos nós, porque vos
pregam com tantador nesse patíbulo?
Quando se toca apenas num nervo do corpo humano, é tão aguda a
dor, que causa desmaios e convulsões mortais. Quão grande não terá sido,
pois, a dor de Jesus, quando Lhe traspassaram com cravos as mão e pés,
partes cheias de ossos e nervos? Ó meu dulcíssimo Salvador, quanto Vos
custou a minha salvação e o desejo de ser amado por mim, miserável verme!
E, ingrato como sou, tantas vezes Vos tenho recusado o meu amor e virado as
costas!
II. Eis que levantam a cruz com o Crucificado, e a deixam cair com
força no buraco aberto no rochedo. Enchem-no em seguida com pedras e
paus, e Jesus fica suspenso na cruz entre dois ladrões até deixar a vida, como
havia predito Isaías: Et cum sceleratis reputatus est (1) — “Ele foi posto no
número dos malfeitores”. Ó Deus, quanto padece na cruz o nosso Salvador
moribundo! Cada parte de seu corpo tem as suas dores; e uma não pode
aliviar a outra, porque as mãos e os pés estão pregados fortemente. Ó céus, a
cada instante Ele sofre dores mortais. Ora faz firmeza nas mãos, ora nos pés,
mas em qualquer parte que seja, sempre se Lhe aumenta a dor, porque o
sacrossanto corpo de Jesus se apoiava nas próprias feridas.
Se ao menos, no meio de tantas dores, os presentes se
compadecessem de Jesus e o acompanhassem com as lágrimas na sua agonia
amargosa! Não, ao contrário, os Escribas e os Fariseus injuriam-No e
prorrompem em escárnios e blasfêmias. E os algozes, feita a partilha das
vestes de Jesus e tirada a sorte a túnica, sentam-se indiferentes debaixo do
patíbulo, esperandoa morte do Salvador.
Minha alma, no meio de suas convulsões e de tantos opróbrios o
Senhor pensava em ti e via que tu também um dia te havias de juntar a seus
inimigos, para Lhe tornar a morte mais dolorosa. Mas não desanimes por
isso; chega-te humilhada e enternecida à cruz, junta-te a tua Mãe Maria, e
beija o altar no qual morre o teu amantíssimo Redentor. Coloca-te a seus pés
e faze que aquele divino sangue corra sobre ti. Roga ao Eterno Pai, dizendo,
mas em sentido diferente daquele com que o disseram os judeus: Sanguis eius
super nos (2) — “O seu sangue caia sobre nós”. Senhor, venha sobre nós este
sangue, e lave-nos dos nossos pecados! Este sangue não Vos pede vingança,
como o sangue de Abel, mas pede para nós misericórdia e perdão. — Ó Mãe
de dores, Maria, rogai a vosso Filho por nós.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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QUINTA-FEIRA - O dia do Amor
Sciens Iesus quia venit hora eius, ut transeat ex hoc mundo adPatrem,
cum dilexisset suos, qui erant in mundo, in funem dilexiteos – “Sabendo
Jesus que era chegada a hora de passar destemundo para o Pai, como
tinha amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo
13, 1)

Sumário. Embora Jesus Cristo em todo o curso de sua vida mortal


nos tivesse amado ardentemente e nos tivesse dado mil provas do seu amor
infinito, todavia, quando chegou ao termo dos seus dias, quis dar-nos a prova
mais patente pela instituição do Santíssimo Sacramento. Ai o Senhor se faz
não só nosso constante companheiro, mas ainda nosso sustento e se nosdá todo
inteiro. Com muita razão, portanto, Santa Maria Madalena de Pazzi chamava
a quinta-feira santa o Dia do Amor

I. Um pai amoroso nunca patenteia melhor a sua ternura e o seu afeto


para com o filhos do que no fim da sua vida, quando os ve em torno do seu
leito, aflitos e com os olhos em pranto, e pensa que em breve deve abandoná-
los. Tira do seu coração e põe sobre os seus lábios o resto de sua vida prestes
a extinguir- se, abraça aqueles penhores queridos do seu amor, exorta-os a
serem sempre bons, imprime-lhes no rosto os mais ternos beijos, e misturando
as suas lágrimas com as dos filhos, beijos, e misturando as suas lágrimas com
as dos filhos, lança-lhes a sua bênção. Depois manda trazer o que mais
precioso possui e dando a cada um uma última lembrança: Tomai, diz, e
lembrai-vos sempre do amor que vos tenho dedicado.

Foi exatamente assim que quis fazer conosco Jesus Cristo,


verdadeiro Pai da nossa alma e Pai tão amante, que na terra não tem havido,
nem jamais haverá outro igual. Embora emtodo o curso da sua vida mortal nos
tivesse amado com amor ardente, e nos tivesse dado mil provas do seu amor
infinito, todavia, quando chegou ao termo dos seus dias, quis dar-nos a prova
mais patente, pela instituição do Santíssimo Sacramento. E por isso, na
mesma noite em que devia ser traído, reuniu os seus discípulos ao redor de si,
instituiu a Santíssima Eucaristia, e disse-lhes para os consolar de sua próxima
partida:
Filhos meus, vou morrer por vós, para vos mostrar o amor que vos
tenho. Posto que, escondido debaixo das espécies sacramentais, deixo-vos o
meu corpo, a minha alma, a minha divindade, a mim mesmo todo. Numa
palavra, não quero nunca estar separado de vós, enquanto estiverdes na terra:
Ecce ego vobiscum sum, usque ad consummationem saeculi (1) – “Eis que
estou convosco, até a consumação dos séculos”.
– Meu irmão, que tal te parece esta extrema fineza de Jesus Cristo?
Não tinha razão Santa Maria Madalena de Pazzi de chamar a quinta-feira santa
o dia do amor?
II. Jesus Cristo não satisfez o seu amor, fazendo-se nosso constante
companheiro; quis ainda fazer-se nosso sustento, afimde se unir intimamente
à nossa alma, e santificá-la com a sua presença. E nesta manhã, qual
amante apaixonado, que deseja ser correspondido, de dentro da Hóstia
consagrada, onde nos observa sem ser visto, está espreitando todos os que se
preparampara alimentar-se com a sua carne divina, observa em quepensam, o
que amam, o que desejam e as ofertas que irão apresentar-lhe.
Irmão meu, prepara-te para recebê-lo com as devidas disposições.
Aviva a tua fé na presença real de Jesus Cristo neste inefável mistério; dilata o
teu coração pela confiança, lembrando-te que te pode fazer todo o bem, muito
te amam e vem a ti exatamente para te enriquecer com as suas graças.
Humilha-te profundamente diante da sua divina majestade, e lembrando-te
que no passado, em vez de amares um Deus tão bom, o tens magoado,
voltando-lhe as costas e desprezando a sua amizade, pede-lhe perdão e toma a
resolução de que para o futuro antes quererás morrer do que tornar a ofendê-
lo. – Mas prepara-te sobretudo para receber Jesus Cristo com amor, e
convida-o pelo desejo.
Vinde, ó meu Jesus, vinde depressa e não tardeis. Ó meuparaíso, meu
amor, meu tudo, quisera receber-Vos com aquele amor com que Vos
receberam as almas mais santas e mais amantes, com que Vos recebeu Maria
Santíssima. Uno a minha comunhão de hoje com as suas. – Santíssima
Virgem e minha Mãe Maria, eis que vou receber o vosso Filho. Quisera ter o
vosso coração e o amor com que recebeis a santa comunhão. Dai-me hoje o
vosso Jesus, assim como o destes aos pastores e aos santos Magos. Desejo
recebê-lo de vossas mãos puríssimas. Dizei-lhe que sou vosso servo devoto,
porque assim me olhará com olhar mais amoroso e me apertará mais
estreitamente contrao seu Coração, quando vir a mim.

Meditação para a tarde do mesmo dia. Quinta Dor de Maria


Santíssima – Morte de Jesus
Et erit vita tua quasi pendens ante te – “A tua vida estará comosuspensa
diante de ti” (Dt 28, 66)

Sumário. Contemplemos a acerba dor de Maria Santíssima no


Calvário, obrigada a assistir a Jesus moribundo e ver todas as penas que Ele
padecia, sem, contudo, Lhe poder dar alívio. Então a aflita Mãe não cessou de
oferecer a vida do Filho à divina justiça pela nossa salvação. Lembremo-nos
que pelo merecimento de suas dores cooperou para nos fazer nascer para a
vida da graça. Por isso todos nós somos seus filhos. Ó, como aVirgem exerceu
sempre e ainda exerce bem o ofício de Mãe! Mas como nos vemos nós como
filhos?

I. Fogem as mães da presença dos filhos moribundos; e se por acaso


alguma mãe se vê obrigada a assistir um filho que está para morrer, procura-
lhe todos os alívios que pode dar. Concerta-lhe a cama, para que esteja em
posição mais cômoda;
serve-lhe refrescos, e assim a própria mãe procura mitigar a própria dor. Ah,
mãe a mais aflita de todas as mães, ó Maria! Incumbe-vos o assistir a Jesus
moribundo, mas não vos é permitido dar-Lhe algum alívio.
Maria ouviu o Filho dizer: Sitio — tenho sede; mas não lhe foi
permitido dar uma gota de água para Lhe mitigar a sede. Só pode dizer-Lhe,
como contempla São Vicente Ferrer: Filho, não tenho senão a água de minhas
lágrimas. Fili, non habeo nisi aquam lacrimarum. Via que sobre aquele leito
de morte, Jesus, pregado com três cravos de ferro, não achava repouso.
Queria abraçá-Lo para Lhe dar alívio, ao menos para O deixar expirar entre
seus braços; mas não podia. Via o pobre Filho, que naquele mar de aflições
buscava quem O consolasse, como Ele já tinha predito pela boca do profeta
Isaías (1). Mas quem entre os homens O desejava consolar, se todos eram
seus inimigos? Mesmo sobre a cruz um O blasfemava e escarnecia de uma
maneira, outro de outra, tratando-O como um impostor, ladrão, usurpador
sacrílego da divindade, digno de mil mortes.
O que mais aumentou a dor de Maria e a sua compaixão para com o
Filho, foi ouvi-Lo sobre a cruz lamentar-se de o Eterno Pai também O ter
abandonado: Deus, Deus meus, ut quid dereliquisti me? (2) — “Deus meu,
Deus meu, porque me desamparaste?” Palavras, como disse a Bem-aventurada
Virgem à Santa Brígida, que não puderam nunca mais sair-lhe da idéia,
enquanto viveu. De modo que a aflita Mãe via o seu Jesus atormentado de
todas as partes; queria aliviá-Lo mas não podia.Pobre Mãe!
II. Pasmavam os homens, diz Simão de Cássia, vendo que a divina
Mãe guardava o silêncio, sem se queixar no meio da sua grande dor. Mas, se
Maria guardava o silêncio com a boca, não o guardava com o coração,
porquanto naquelas horas não fazia se não oferecer à justiça divina a vida do
Filho pela nossa salvação. Saibamos, pois, que pelo mérito de suas dores ela
cooperou para nos fazer nascer para a vida da graça e por conseguinte somos
filhos de suas dores: Mulier, ecce filius tuus — “Mulher, eis aí teu filho”.

Naquele mar de amargura era este o único alívio que então a


consolava: o saber que por meio de suas dores nos conduzia à salvação
eterna. — Desde então começou Maria a exercer para conosco o ofício de boa
Mãe; pois que, como atesta São Pedro Damião, foi pelas súplicas de Maria que
o bom ladrão se converteu e se salvou, querendo a divina Mãe recompensá-lo
assim pela delicadeza que outrora lhe mostrou na viagem ao Egito. E o
mesmo ofício de mãe tem a Bem-aventurada Virgem continuado sempre e
continua a exercer. Nós, porém, com as nossas obras mostramo-nos deveras
seus dignos filhos?

Ó Mãe, a mais aflita de todas as mães! Morreu, enfim, vosso Filho,


tão amável e que tanto vos amava! Chorai; que tendes razão para chorar.
Quem jamais poderá consolar-vos? Só vos pode consolar o pensamento que
Jesus com sua morte venceu o inferno, abriu o céu fechado aos homens, e
ganhou tantas almas. Do trono da cruz reinará sobre tantos corações que,
vencidos pelo amor, com amor Lhe servirão. Não recuseis entretanto, ó minha
Mãe, que vos acompanhe a chorar convosco, já que mais que vós tenho razão
de chorar pelas ofensas que tenho feito a Vosso Filho. Ah, Mãe de
Misericórdia! Em primeiro lugar pela morte de seu Redentor, e depois pelos
merecimentos de vossas dores, espero o perdão e a salvação eterna.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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SEXTA-FEIRA - Morte de Jesus
Et inclinato capite, tradidit spiritum – “E inclinando a cabeça,rendeu o
espírito” (Jo 19, 30)

Sumário. Contempla como depois de três horas de agonia, pela


veemência das dores, as forças faltam a Jesus; entrega o corpo ao próprio
peso, deixa cair a cabeça sobre o peito, abre a boca e expira. Alma cristã,
dize-me: não merece porventura todo o nosso amor um Deus que, para nos
salvar da morte eterna, quis morrer no meio dos mais atrozes tormentos?
Todavia, como são poucos os que amam e muitos os que, em vezde O amarem,
Lhe pagam com injúrias e ultrajes.

I. Considera que o nosso amável Redentor é chegado ao fim da sua


vida. A mortecem-se-Lhe os olhos, o seu belo rosto empalidece, o coração
palpita debilmente, e todo o sagrado corpo é lentamente invadido pela morte.
Vinde, anjos do céu, vinde assistir a morte do vosso Deus. Vós, ó Mãe
dolorosa, Maria, chegai-vos mais próxima à cruz, levantai os olhos para
vosso Filho, e contemplai-O atentamente, porque está prestes a expirar.
Pater, in manus tuas commendo spiritum meum (1) — “Pai em
vossas mãos entrego o meu espírito”. É esta a última palavra que Jesus
profere com confiança filial e perfeita resignação com a vontade divina. Foi
como se dissesse: Meu Pai, não tenho vontade própria; não quero nem viver
nem morrer. Se é vossa vontade que eu continue a padecer sobre a cruz, eis-
me aqui, estou pronto para obedecer; em vossas mãos entrego o meu espírito;
fazei de mim segundo a vossa vontade. — Tomara que nós disséssemos o
mesmo, quando temos alguma cruz,deixando-nos guiar pelo Senhor, conforme
o seu agrado. Tomara que o repetíssemos especialmente no momento da
morte! Mas para bem o fazermos então, devemos praticá-lo muitas vezes em
nossa vida.
Entretanto, Jesus chama a morte, que por deferência não ousava
aproximar-se do autor da vida, e lhe dá licença para lhe tirar a vida. E eis que
finalmente, enquanto treme a terra, se abrem os túmulos e se rasga o véu do
templo, eis que pela veemência da dor faltam as forças ao Senhor moribundo,
baixa o calor natural, falha a respiração. Jesus abandona o corpo ao próprio
peso, deixa cair a cabeça sobre o peito, abre a boca e expira: Et inclinato
capite, tradidit spiritum (2). — Parti, ó bela alma do meu Salvador, parti e ide
nos abrir o paraíso, fechado até agora, ide apresentar-Vos à Majestade divina,
e alcançai-noso perdão e a salvação.
As pessoas presentes, voltadas para Jesus Cristo, por causa da força
com que proferiu as suas últimas palavras, contemplam-No com atenção
silenciosa, vêem-No expirar, e notando que não se move mais, dizem:
Morreu, morreu. Maria ouve que todos o dizem, e ela também exclama: Ah,
Filho meu, já morreste; estais morto.
II. Morreu! Ó Deus! Quem é que morreu? O Autor da vida, o
Unigênito de Deus, o Senhor do mundo. Ó morte, que fizeste pasmar o céu e
a natureza! Um Deus morrer pelas suas criaturas! — Vem, minha alma,
levanta os olhos e contempla esse Homem crucificado. Contempla o Cordeiro
divino já imolado sobre o altar da dor; lembra-te de que Ele é o Filho dileto
do pai Eterno, e que morreu pelo amor que te tem dedicado. Vê esses braços
abertos para te acolherem; a cabeça inclinada para te dar o ósculo de paz; o
lado aberto para te receber. Que dizes? Não merece ser amado um Deus tão
bom e tão amoroso? Ouve o que do alto de sua cruz te diz o Senhor: Meu
Filho, vê se há alguém no mundo que te tenha amado mais do que eu, teu
Deus!
Ah meu Jesus, já que para minha salvação não poupastes a vossa
própria pessoa, lançai sobre mim esse olhar afetuoso com que me olhastes um
dia, quando estáveis em agonia sobre acruz; olhai-me, iluminai-me, e perdoai-
me. Perdoai-me em particular a ingratidão que tive para convosco no
passado, pensando tão pouco na vossa paixão e no amor que nela me haveis
mostrado. Dou-Vos graças pela luz que me concedeis decompreender através
de vossas chagas e de vossos membros dilacerados, como por entre umas
grades, o afeto tão grande e tão terno que ainda guardais para comigo.
Ai de mim, se depois de receber estas luzes deixasse de Vos amar,
ou amasse outra coisa que não a Vós. Morra eu, assim Vos direi com São
Francisco de Assis, morra eu por amor de vosso amor, ó meu Jesus, que Vos
dignastes morrer por amor de meu amor. Ó Coração aberto de meu Redentor,
ó morada feliz das almas amantes, não Vos dedigneis receber agora minha
misera alma.
Ó Maria, ó Mãe de dores, recomendai-me a vosso Filho, a quem
vedes morto sobre a cruz. Vede as suas carnes dilaceradas, vede o seu Sangue
divino derramado por mim, e conclui disto quanto lhe agrada que lhe
recomendeis a minha salvação. A minha salvação consiste em que eu O ame,
e este amor vós mo deveis impetrar, mas um amor grande, um amor eterno.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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Meditação para a tarde do mesmo dia. Sexta Dor de Maria
Santíssima – Jesus é descido da cruz
Ioseph, deponens eum, involvit sindone – “José, depondo-O dacruz, O
amortalhou no sudário” (Mc 15, 46)

Sumário. Consideremos como, depois da morte do Senhor, dois dos


seus discípulos, José e Nicodemos, o descem da cruz e O depõem nos braços
da aflita Mãe, que com ternura O recebe e O aperta contra o peito. Se Maria
fosse ainda capaz de dor, que pena sentiria vendo que os homens, tendo visto
seu Filho morto por amor deles, continuam a maltratá-Lo com os seus
pecados? Não atormentemos mais a nossa aflita mãe, e se pelo passado nós
também a temos afligido com as nossas culpas, voltemos arrependidos ao
Coração aberto de seu Jesus.

I. Temendo a Mãe dolorosa, que depois do ultraje da lançada outras


injúrias fossem feitas a seu amado Filho, pede a José de Arimatéia, obtivesse
de Pilatos o corpo de seu Jesus, a fim de que ao menos morto O pudesse
guardar e livrar dos ultrajes. Foi José ter com Pilatos e expôs-Lhe a dor e o
desejo da aflita Mãe, e diz Santo Anselmo que a compaixão para com ela
enterneceu Pilatos e o moveu a conceder-lhe o corpo do Salvador.
Eis que descem Jesus da cruz. Foi revelado a Santa Brígida, que para
o descimento encostaram à cruz três escadas. Primeiro, os santos discípulos
despregaram as mãos e depois os pés, e os cravos foram entregues a Maria,
como refere Metaphrastes. Depois, segurando um o corpo de Jesus por cima, e
outro por baixo, o desceram da cruz. Bernardino de Bustis medita como a
aflita Mãe se levanta sobre as pontas dos pés, e, estendendo os braços, vai
receber o querido Filho; abraça-O e depois senta-se debaixo da cruz.

Vê a boca aberta e os olhos escurecidos; examina aquelas carnes


dilaceradas, aqueles ossos descarnados; tira-Lhe a coroa e examina o estrago
feito pelos espinhos naquela santa cabeça; observa as mãos e os pés
traspassados, e diz: Ah, meu Filho! A que estado te reduziu o amor para com
os homens! Que mal lhes fizeste para assim te maltratarem? Ah! Meu Filho, vê
como estou aflita, olha-me e consola-me; mas já não me vês. Fala, dize-me
uma palavra e consola-me; mas já não falas, porque estás morto… Ó
espinhos cruéis, cravos atrozes, bárbara lança, como pudestes atormentar
assim o vosso Criador? Mas, que espinhos, que cravos! Ah, pecadores,
exclamava, assim tendes maltratadoo meu Filho!
II. Ó Virgem Santíssima, depois que vós com tanto amor destes ao
mundo o vosso Filho para a nossa salvação, eis que o mundo já vo-Lo restitui.
— Mas, ó Deus! Como mo restituis tu?Dizia então Maria ao mundo. Dilectus
meus candidus et rubicundus (1). Meu Filho era branco e vermelho, não pela
cor, mas pelas chagas que Lhe tens aberto. Ele era belo, agora, em vez de
belo, é todo deforme; Ele encantava com o seu aspecto, agora causa horror a
quem O vê.
Assim se expressava então Maria e se queixava de nós. Mas se agora
fosse ainda capaz de dor, que diria? E que pena sentiria, ao ver que os
homens, depois da morte de seu Filho, continuam a maltratá-Lo e crucificá-
Lo com os seus pecados? Não continuemos, pois, a atormentar esta dolorosa
Mãe, e se pelo passado nós também a temos afligido com as nossas culpas,
façamos o que ela mesma nos diz: Redite, praevaricatores, ad cor (2):
Pecadores, voltai ao Coração ferido de meu Jesus; voltai arrependidos, e Ele
vos acolherá. — Revelou a mesma Bem- aventurada Virgem a Santa Brígida,
que ao Filho descido da cruz ela fechou os olhos, mas não pode fechar-Lhe os
braços, dando com isso Jesus Cristo a entender que queria ficar com os
braçosabertos, para acolher todos os pecadores arrependidos, que voltam para
Ele.
Ó Virgem dolorosa, ó alma grande nas virtudes e grandetambém nas
dores, pois que tanto estas como aquelas nascem do grande incêndio de amor
que tendes a Deus. Ah, minha Mãe! Tende piedade de mim, que não tenho
amado a Deus e O tenho ofendido. As vossas dores me dão grande confiança
para esperar o perdão. Mas isto não me basta; quero também amar o meu
Senhor, e quem me pode alcançar isto melhor do que vós, que sois a Mãe do
belo amor? Ah Maria! Vós consolais a todos; consolai-me também a mim.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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SÁBADO SANTO. Sétima Dor de Maria Santíssima –Sepultura de Jesus
Involvit sindone, et posuit eum in monumento –“Amortalhou-Ono
sudário, e depositou-O no sepulcro” (Mc 15, 46)

Sumário. Consideremos como a Mãe dolorosa quis acompanhar os


discípulos que levaram Jesus morto à sepultura. Depois de O ter acomodado
com suas próprias mãos, diz um último adeus ao Filho e ao sepulcro, e volta
para casa, deixando o coração sepultado com Jesus. Nós também, à imitação
de Maria, encerremos o nosso coração no santo tabernáculo, onde reside
Jesus, já não morto, mas vivo e verdadeiro como está no céu. Para isso é
mister que o nosso coração esteja desapegado detodas as coisas da terra.

I. Quando uma mãe assiste a seu filho que padece e morre, sem
dúvida ela sente e sofre todas as penas do filho; mas quando o filho
atormentado, já morto, deve ser sepultado e a aflita mãe deve despedir-se dele,
ó Deus! O pensamento de o não tornar a ver é uma dor que excede todas as
outras dores. Essa foi a última espada que traspassou o coração aflito de
Maria.
Para melhor considerá-la, voltemos ao Calvário e observemos
atentamente a aflita Mãe, que ainda tem abraçado seu Jesus morto e se
consome de dor ao beijar-Lhe as chagas. Ossantos discípulos, temendo que ela
expirasse pela veemência da dor, animaram-se a tirar-lhe do regaço o depósito
sagrado, para o sepultarem. Com violência respeitosa tiraram-lh’O dos braços,
e embalsamando-O com aromas, envolveram-No em um sudário adrede
preparado. — Eis que já O levam à sepultura; já se põe em movimento o
cortejo fúnebre. Os discípulos carregam o corpo exânime; inúmeros anjos do
céu O acompanham; as santas mulheres O seguem e juntamente com elas vai a
Mãe aflitíssima,acompanhando o Filho à sepultura.
Chegados que foram ao lugar destinado, a divina Mãe acomoda nele
com suas próprias mãos o corpo sacrossanto; e, ó!Com quanta vontade Maria
se sepultaria ali viva com seu Jesus! Quando depois levantaram a pedra para
fechar o sepulcro, afigura-se-me que os discípulos do Salvador se voltaram
para a Virgem com estas palavras: Eia, Senhora, deve-se fechar o sepulcro:
tende paciência, vede pela última vez o vosso Filho e despedi-vos d’Ele. —
Ah! Meu querido Filho (assim deve ter falado então a aflita Mãe), não te hei
então de tornar a ver? Recebe, pois, nesta última vez que te vejo, recebe o
último adeusde mim, tua afetuosa Mãe.
II. Finalmente os discípulos levantam a pedra e encerram no santo
sepulcro o corpo de Jesus, aquele grande tesouro, a que não há igual nem na
terra nem no céu. Diz São Boaventura, que a divina Mãe, antes de deixar o
sepulcro, abençoou aquela sagrada pedra. E assim dando o último adeus
ao Filho e ao sepulcro, volta para sua casa, mas deixa o seu coração
sepultadocom Jesus.
Sim, porque Jesus é todo o seu tesouro, e, como disse Jesus: Ubi
thesaurus vester est, ibi et cor vestrum erit (1) — “Onde está o vosso tesouro,
aí estará também o vosso coração”. E nós, onde teremos sepultado o nosso
coração? Talvez nas criaturas? No lodo? E porque não o teremos sepultado
com Jesus, o qual, bem que subido ao céu, contudo quis ficar, não morto, mas
vivo, no Santíssimo Sacramento do altar, precisamente para ter consigo e
possuir os nossos corações? Imitemos, pois, Maria; encerremos os nossos
corações no santo Tabernáculo, para não mais o tornarmos a tomar.
Entretanto, colocando-nos em espírito com a dolorosa Mãe junto ao sepulcro
de Jesus, unamos os nossos afetos com os de Maria e digamos com amor:
Ó meu Jesus sepultado! Beijo a pedra que Vos encerra. Mas
ressuscitastes ao terceiro dia. Ah! Pelos méritos de vossa gloriosa
ressurreição, fazei com que no último dia eu ressuscite convosco na glória,
para estar sempre unido convosco no céu, para Vos louvar e amar
eternamente. Eu Vo-lo peço pela vossa paixão, e pela dor que sentiu a vossa
querida Mãe, quando Vos acompanhou ao sepulcro.
RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS
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Meditação para a tarde do mesmo dia. Solidão de Maria
Santíssima depois da sepultura de Jesus
Posuit me desolatam, tota die maerore confectam –“Pôs-me em
desolação, afogada em tristeza todo o dia” (Lm 1, 13)

Sumário. Ah, que noite de dor foi para Maria a que se seguiu à
sepultura do seu divino Filho! A desolada Mãe volve os olhos em torno de si, e
já não vê o seu Jesus, mas representam- se-lhe diante dos olhos todas as
recordações da bela vida e da desapiedada morte do Filho. Como se não
pudesse crer em seus próprios olhos: Filho, pergunta a João, aonde está o teu
mestre? E à Madalena: Filha, dize-me onde está o teu dileto?… Minha alma,
roga a Santíssima Virgem, que te admita a chorar consigo. Ela chora por amor,
e tu, chora pela dor dos teus pecados.

I. Diz São Boaventura que, depois da sepultura de Jesus, as mulheres


piedosas velaram a Bem-aventurada Virgem com um manto lúgubre, que
lhe cobria todo o rosto. Acrescenta São Bernardo, que na volta do sepulcro
para a sua casa a pobre Mãe andava tão aflita e triste, que comovia muitos a
chorarem, ainda que involuntariamente: Multos etiam invitos ad lacrimas
provocabat. De modo que, por onde passava, todos aqueles que a
encontravam, não podiam conter as lágrimas. Os santos discípulos e as
mulheres que a acompanhavam, quase que choravam mais as penas de Maria
do que a perda de seu Senhor.
Quando a Virgem passou por diante da Cruz, banhada ainda com
o sangue do seu Jesus, foi a primeira a adorá-la. Ó santa Cruz, disse então,
eu te beijo e te adoro, já que não és mais madeiro infame, mas trono de amor e
altar de misericórdia, consagrado com o sangue do Cordeiro divino, que em ti
foi imolado pela salvação do mundo. — Deixa depois a Cruz e voltaà sua casa.
Chegada ali, a aflita Mãe volve os olhos em torno, e não vê mais o seu Jesus;
em vez da presença do querido Filho, apresentam-se-lhe aos olhos todas as
recordações da sua bela vida e da sua desapiedada morte.
Recorda-se dos abraços dados ao Filho no presépio de Belém, da
conversação com ele por trinta anos na casa deNazaré; recorda-se dos mútuos
afetos, dos olhares cheios de amor, das palavras de vida eterna saídas daquela
boca divina. E depois se lhe representa a cena funesta presenciada naquele
mesmo dia; vêem-lhe à memória os cravos, os espinhos, as carnes dilaceradas
do Filho, as chagas profundas, os ossos descarnados, a boca aberta, os olhos
escurecidos. E com tão funesta recordação, quem poderá dizer qual tenha
sido a dor, a desolação de Maria?
II. Ah, que noite de dor foi para a Bem-aventurada Virgem aquela
que se seguiu à sepultura do seu divino Filho! Voltando-se a dolorosa Mãe
para São João, perguntou-lhe com voz triste: Ah! Filho. Onde está o teu
mestre? Depois perguntou à Madalena: Filha, dize-me onde está o teu
dileto? Ó Deus!

Quem no-Lo tirou?… Chora Maria, e todos os que estão com ela choram
também. E tu, minha alma, não choras? Ah! Volta-te aMaria, e roga-lhe que
te admita consigo a chorar. Ela chora por amor, e tu, chora pela dor de teus
pecados: Fac ut tecum lugeam. Minha aflita Mãe, não vos quero deixar só a
chorar; não, quero acompanhar-vos também com as minhas lágrimas. Eis a
graça que hoje vos peço; alcançai-me uma memória contínua, junto com uma
terna devoção para com a paixão de Jesus e a vossa; a fim de que todos os
dias que me restam de vida, não mesirvam senão para chorar as vossas dores e
as do meu Redentor. Espero que, na hora de minha morte, essas dores me
darão confiança e força para não desesperar à vista das ofensas que tenho
feito ao meu Senhor. Elas devem impetrar-me o perdão, a perseverança e o
paraíso.
E Vós, † “ó meu Senhor Jesus Cristo, que para resgatar o mundo
quisestes nascer, receber a circuncisão, ser condenado pelos judeus, traído por
Judas com um ósculo, acorrentado, levado para o sacrifício como inocente
cordeiro, arrastado com tanta ignomínia diante de Anás, Caifás, Pilatos e
Herodes, acusado por falsas testemunhas, flagelado, esbofeteado, carregado
de opróbrios, coberto de escarros, coroado de espinhos, ferido com uma cana,
vendado, despojado de vossos vestidos, pregado e levantado na cruz entre
dois ladrões, abeberado de fel e vinagre e traspassado por uma lança; suplico-
Vos, ó Senhor, em nome dessas santas penas que venero, ainda que indigno,
suplico-Vos por vossa santa cruz e morte, livrai-me do inferno e dignai-Vos
levar-me para onde levastes o bom ladrão crucificado convosco, ó meu Jesus,
que viveis e reinais com o Pai e o Espírito Santo, por todos os séculos dos
séculos. Assim seja.”(1)

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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DOMINGO - A ressurreição de Jesus Cristo e a esperança do Cristão
Haec dies quam fecit Dominus: exultemus et laetemur in ea –
“Este é o dia que fez o Senhor; regozijemo-nos e alegremo-nos
nele” (Sl 117, 24)

Sumário. Façamos um ato de fé viva na ressurreição de Jesus


Cristo; cheguemo-nos a Ele em espírito para Lhe beijar as chagas
glorificadas, e regozijemo-nos com Ele por ter saído do sepulcro vencedor
da morte e do inferno. Lembrando-nos em seguida que a ressurreição de
Jesus é o penhor e a norma da nossa, avivemos nossa esperança, e
ganhemos ânimo para suportar com paciência as tribulações da vida
presente. Lembremo-nos, porém, que para ressuscitarmos gloriosamente
com Jesus Cristo devemos primeiro morrer com Ele a todos os afetos
terrestres.

I. O grande mistério que em todo o tempo pascal, e


especialmente no dia de hoje, deve ocupar as almas amantes de Deus, e
enchê-las de dulcíssima esperança, é a felicidade de Jesus ressuscitado. Já
meditamos que Jesus, no tempo de sua Paixão, perdeu inteiramente as
quatro espécies de bens que o homem pode possuir na terra. Perdeu os
vestidos até a extrema nudez; perdeu a reputação pelos desprezos mais
abomináveis; perdeu a florescente saúde pelos maus tratos; perdeu
finalmente a vida preciosíssima pela morte mais horrível que se pode
imaginar. Agora porém, saindo vivo do fundo do sepulcro, recebe com
lucro abundantíssimo tudo quanto perdeu.

O que era pobre, ei-Lo feito riquíssimo e Senhor de toda a terra. O


que a si próprio se chamava verme e opróbrio dos homens, ei-Lo coroado
de glória, assentado à direita do Pai. O que pouco antes era o Homem das
dores e provado nos sofrimentos, ei-Lo dotado de nova força e de uma vida
imortal e impassível. Finalmente o que tinha sido morto do modo mais
horrível, ei-Lo ressuscitado pela sua própria virtude, dotado de sutileza, de
agilidade, de clareza, feito as primícias de todos os que dormem com a
esperança de ressuscitarem também um dia à imitação de Cristo: Christus
resurrexit a mortuis, primitiae dormientium (1)
Detenhamos-nos aqui para tributar a nosso Chefe divino as
devidas homenagens. Façamos um ato de fé viva na sua ressurreição, e
cheguemo-nos a Ele para beijarmos em espírito os sinais de suas cinco
chagas glorificadas. Alegremo-nos com Ele, por ter saído do sepulcro,
vencedor da morte e do inferno, e digamos com todos os santos: “O
Cordeiro que foi imolado por nós, é digno de receber o poder, a divindade,
a sabedoria, a fortaleza, a honra, a glória e a bênção.” (2)
II. Regozijemo-nos com Jesus Cristo; mas regozijemo- nos
também por nós mesmos, porquanto a sua ressurreição é o penhor e a
norma da nossa, se ao menos, como diz São Paulo, morrermos primeiro
interiormente ao afeto das coisas terrestres:

Si commortui sumus, et convivemus (3) — “Se morrermos com Ele, com


Ele também viveremos”. Ó doce esperança! “Virá a hora em que os
mortos ouvirão a voz do Filho de Deus” (4); e então pelo poder divino
retomaremos o mesmo corpo que agora temos, mas formoso e
resplandecente como o sol. Nós também ressuscitaremos!
A esperança da futura ressurreição é o que consolava o santo Jó
no tempo de sua provação. “Eu sei”, disse ele, e nós, digamos o mesmo no
meio das cruzes e tribulações da vida presente: “eu sei que o meu
Redentor vive, e que no derradeiro dia surgirei da terra; e serei novamente
revestido de minha pele,e na minha própria carne verei a meu Deus… esta
minha esperança está depositada no meu peito.” (5)
Meu amabilíssimo Jesus, graças Vos dou que pela vossa morte
adquiristes para mim o direito à posse de tão grande bem, e hoje pela vossa
ressurreição avivais a minha esperança. Sim, espero ressurgir no último
dia, glorioso como Vós, não tanto por meu próprio interesse, como para
estar para sempre unido convosco, e louvar-Vos e amar-Vos eternamente.
É verdade que pelo passado Vos ofendi com os meus pecados; mas agora
arrependo-me de todo o coração e pela vossa ressurreição peço- Vos que
me livrais do perigo de recair na vossa desgraça: Per sanctam
resurrectionem tuam, libera me, Domine — “Pela vossa santa ressurreição,
livrai-me, Senhor”.
“E Vós, Eterno Pai, que no dia presente nos abristes a entrada da
eternidade bem-aventurada, pelo triunfo que vosso Unigênito alcançou
sobre a morte: aumentai com o Vosso auxílio os desejos que a vossa
inspiração nos instila” (6). Fazei- o pelo amor do mesmo Jesus Cristo e de
Maria Santíssima.

RAMALHETE ESPIRITUAL/ INSPIRAÇÕES/ PROPÓSITOS


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VIA SACRAV
Oração Inicial

Todos: Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém!

Meu amorosíssimo Jesus, prostrado humildemente aos vossos pés


santíssimos, peço-vos, com todo o coração, perdão dos meus pecados os
quais eu choro e detesto, especialmente por serem uma ofensa à vossa infinita
bondade. Proponho-me querer antes morrer que vos ofender; ao invés,
declaro querer vos amar sobre todas as coisas até a morte. Em compensação
por tantos débitos por mim contraídos com a vossa divina justiça, ofereço-vos
este breve exercício da Via Sacra em união com aquela viagem dolorosa que
Vós fizestes ao Calvário por mim, indigníssimo pecador. Aceitai, ó Senhor,
esta pequena oferta e dai-me a graça de ganhar todas as santas indulgências
concedidas pelos vossos vigários, os Sumos Pontífices, segundo a intenção
dos quais agora pretendo rezar, também para sufragar com elas as pobres
almas do purgatório, depois de lhes ter aplicado uma indulgência plenária,
aplico-a também por mim.
Amém.
1.ª Estação — Jesus é condenado à morte

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: Pilatos perguntou: “Que farei, então, com Jesus, que é chamado o
Cristo?” Todos responderam: “seja crucificado!” Pilatos falou: “Mas que mal
ele fez?” Eles, porém, gritaram com mais força: “Seja crucificado!” (Mt
27,22-23).

Dir: Contemplemos como Jesus Cristo, já flagelado e coroado de espinhos,


foi por fim injustamente condenado à morte por Pilatos. (Breve momento em
silêncio)

Todos. — Ó Jesus adorável, não foi Pilatos, mas minha vida iníqua que vos
condenou à morte. Pelo mérito deste tão penoso itinerário, no qual entrais
rumo ao monte Calvário, peço-vos que benignamente me acompanheis no
caminho pelo qual minha alma se dirige à eternidade. Amo-vos, ó Jesus, meu
Amor, mais do que a mim mesmo, e do fundo do coração me arrependo de
vos ter ofendido. Não permitais que eu novamente me separe de vós. Dai-me
amor perpétuo a vós e fazei de mim o que quiserdes. O que vos for agradável
também o será para mim.

A morrer crucificado,
Teu Jesus é condenado
Por teus crimes, pecador.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


2.ª Estação — Jesus carrega a Cruz

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: Então Jesus disse aos discípulos: “Se alguém quer vir após mim, renuncie
a si mesmo, tome a sua cruz e me siga; pois quem quiser salvar a sua vida, a
perderá; mas quem perder a sua vida por causa de mim, a encontrará. Com
efeito, do que adianta alguém ganhar o mundo inteiro, mas arruinar a sua
vida? O que poderia dar em troca de sua vida?” (Mt16,24-26).

Dir: Contemplemos como Jesus Cristo, levando a Cruz aos ombros,


lembrava-se no caminho de oferecer por nós ao Pai eterno a morte que havia
de sofrer. (Breve momento em silêncio)

Todos. — Ó amabilíssimo Jesus, abraço todas as adversidades que, por vossa


vontade, hei de tolerar até a morte e, pelo duro sofrimento que suportastes
carregando a Cruz, peço-vos que me deis forças para que eu também possa
carregar, com ânimo forte e paciente, minha própria cruz. Amo-vos, ó Jesus,
meu Amor, e arrependo-me de vos ter ofendido. Não permitais que
novamente me separe de ti. Dai-me amor perpétuo a vós e fazei de mim o que
quiserdes.

Com a Cruz é carregado,


E do peso acabrunhado,
Vai morrer por teu amor.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


3.ª Estação — Jesus cai pela primeira vez

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: “O Senhor Deus abriu-me os ouvidos, e eu não fui rebelde, nem recuei.
Apresentei as costas aos que me feriam, e a face aos que me arrancavam a
barba; não desviei o rosto dos insultos e dos escarros. O Senhor Deus é quem
me ajuda: por isso, não fiquei envergonhado”. (Is 50,5-7b)

Dir: Contemplemos a primeira queda de Jesus sob o peso da Cruz. Tinha Ele
a carne, por causa da cruenta flagelação, ferida de muitos modos e a cabeça
coroada de espinhos; derramara ainda tanto sangue, que mal podia mover
os pés por falta de forças. E porque era oprimido pelo grave peso da Cruz e
assolado sem clemência pelos soldados, por isso aconteceu-lhe de cair
muitas vezes por terra ao longo do caminho. (Breve momento em silêncio)

Todos. — Ó meu Jesus, não é o peso da Cruz, mas o dos meus pecados que
de tantas dores vos cobre. Rogo-vos, por esta vossa primeira queda, que me
protejais de toda queda em pecado. Amo-vos, ó Jesus, de todo o meu
coração; arrependo-me de vos ter ofendido. Não me permitais novamente cair
em pecado. Dai-me amor perpétuo a vós e fazei de mim o que quiserdes.

Pela Cruz tão oprimido,


Cai Jesus, desfalecido,
Pela tua salvação.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


4.ª Estação — Jesus se encontra com sua Mãe dolorosa

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: “Simeão os abençoou e disse à Maria, sua mãe: Este é destinado a ser
causa de queda e de reerguimento de muitos em Israel, e a ser um sinal de
contradição. Assim, serão revelados os pensamentos de muitos corações.
Quanto a ti, uma espada traspassará a alma”. (Lc 2,34-35)
Dir: Contemplemos como deve ter sido o encontro, neste caminho, do Filho e
da Mãe. Jesus e Maria se olharam entre si, e os olhares mudos que trocaram
foram outras tantas espadas a atravessar o coração amante de ambos.
(Breve momento em silêncio)

Todos. — Ó amadíssimo Jesus, pela dor tão grande que experimentastes


neste encontro, tornai-me, eu vos peço, verdadeiramente devoto de vossa
Mãe santíssima. E vós, ó minha dolorosa Rainha, intercedei por mim e
alcançai-me uma tal memória dos suplícios de vosso Filho, que minha mente
esteja para sempre detida na piedosa contemplação deles. Amo-vos, ó Jesus,
meu Amor; arrependo-me de vos ter ofendido. Não me permitais novamente
pecar contra vós. Dai-me amor perpétuo a vós e fazei de mim o que
quiserdes.

De Maria lacrimosa,
No encontro lastimoso,
Vê a imensa compaixão.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


5.ª Estação — O Cirineu ajuda Jesus a carregar a Cruz

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: “Enquanto levavam Jesus, agarraram um certo Simão de Cirene, que


voltava do Campo, e puseram-lhe a cruz aos ombros, para que carregasse
atrás de Jesus”. (Lc 23,26)

Dir. Contemplemos como os judeus obrigaram Simão de Cirene a carregar a


Cruz atrás do Senhor, vendo Jesus quase expirar a cada passo devido ao
cansaço e temendo, por outra parte, que morresse no caminho aquele que
queriam ver pregado à Cruz. (Breve momento em silêncio)

Todos. — Ó dulcíssimo Jesus, não quero, como o Cirineu, repudiar a Cruz.


De bom grado a abraço e tomo sobre mim; abraço especialmente a morte que
para mim estabelecestes, com todas as dores que ela trará consigo. Uno
minha morte à vossa e, assim unida, ofereço-a a vós em sacrifício. Vós
morrestes por amor a mim; quero também eu morrer por amor a vós, com a
intenção de vos agradar. Vós, porém, ajudai-me com a vossa graça. Amo-vos,
ó Jesus, meu Amor, e arrependo-me de vos ter ofendido. Não permitais que
eu novamente vos ofenda. Dai-me amor perpétuo a vós e fazei de mim o que
quiserdes.

Em extremo desmaiado,
Deve auxílio, tão cansado,
Receber do Cireneu.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


6.ª Estação — Verônica enxuga com um sudário o rosto de Jesus

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: “...Não tinha aparência nem beleza para que o olhássemos, nem
formosura que nos atraísse. Foi desprezado, como o último dos homens,
homem das dores, experimentado no sofrimento, e quase escondíamos o rosto
diante dele; desprezado, não lhe demos nenhuma importância” (Is 53,2-3).

Dir. Contemplemos como aquela santa mulher Verônica, vendo Jesus


abatido pelas dores, com o rosto banhado em suor e sangue, estendeu-lhe um
pano em que, purificada a face, Ele deixou impressa sua imagem. (Breve
momento em silêncio)

Todos. — Ó meu Jesus, formosa era antes a vossa face; mas agora não
aparece assim, tão deformada está por feridas e sangue! Ai de mim, como era
formosa também minha alma, quando recebi a vossa graça pelo Batismo:
mas, pecando, tornei-a disforme. Vós somente, meu Redentor, lhe podeis
restituir a antiga beleza. Para que o façais, rogo-vos pelo mérito de vossa
Paixão. Amo-vos, ó Jesus, meu Amor; arrependo-me de vos ter ofendido.
Não permitais que eu novamente vos ofenda. Dai-me amor perpétuo a vós e
fazei de mim o que quiserdes.

O seu rosto ensanguentado,


Por Verônica enxugado,
Eis, no pano, apareceu.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


7.ª Estação — Jesus cai pela segunda vez

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: “Entretanto, ele assumiu as nossas fraquezas, e as nossas dores, ele as


suportou. E nós achávamos que ele era um castigado, alguém ferido e
humilhado. Mas ele foi ferido por causa das nossas iniquidades, esmagado
por causa de nossos crimes. O castigo que nos dá a paz caiu sobre eles, por
seus ferimentos fomos curados”. (Is 53,4-5)

Dir: Contemplemos a segunda queda de Jesus sob o peso da Cruz, na qual se


lhe aprofundam todas as chagas da venerável cabeça e de todo o corpo, e se
renovam todas as angústias do doloroso Senhor. (Breve momento em
silêncio)

Todos. — Ó mansíssimo Jesus, quantas vezes me concedestes o perdão! Eu,


porém, recaí nos mesmos pecados e renovei minhas ofensas contra vós. Pelo
mérito desta vossa nova queda, ajudai-me a perseverar em vossa graça até a
morte. Fazei, em todas as tentações que avançarão contra mim, que em vós
sempre me refugie. Amo-vos de todo o meu coração, ó Jesus, meu Amor;
arrependo-me de vos ter ofendido. Não permitais que eu novamente vos
ofenda. Dai-me amor perpétuo a vós e fazei de mim o que quiserdes.

Outra vez desfalecido,


Pelas dores abatido,
Cai por terra o Salvador.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


8.ª Estação — Jesus consola as mulheres de Jerusalém

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: “Seguia-o uma grande multidão do povo, bem como de mulheres que
batiam no peito e choravam por ele. Jesus, porém, voltou-se para elas e disse:
‘Mulheres de Jerusalém, não choreis por mim! Chorai por vós mesmas e por
vossos filhos!’” (Lc 23,27-28)

Dir: Contemplemos como estas mulheres, vendo Jesus morto de cansaço e


coberto de sangue, são tocadas de compaixão e choram copiosamente. Mas,
voltando-se a elas, Ele diz: “Não choreis por mim; antes, chorai por vós
mesmas e por vossos filhos”. (Breve momento em silêncio)

Todos. — Ó doloroso Jesus, choro os pecados que cometi contra vós, não só
pelas penas de que me fizeram digno, mas, sobretudo pela tristeza que vos
causaram a vós, que tanto me amastes. Ao choro me move menos o inferno
que o amor a vós. Ó meu Jesus, amo-vos mais do que a mim mesmo;
arrependo-me de vos ter ofendido. Não permitais que eu novamente vos
ofenda. Dai-me amor perpétuo a vós e fazei de mim o que quiserdes.

Das mulheres piedosas,


De Sião filhas chorosas,
É Jesus consolador.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


9.ª Estação — Jesus cai pela terceira vez

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e carregados de fardos, e eu


vos darei descanso. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque
sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para vós, pois meu
jugo é suave e o meu fardo é leve.” (Mt 11,28-30)

Dir: Contemplemos a terceira queda de Cristo sob o peso da Cruz. Caiu


porque era demasiada a sua fraqueza e excessiva a crueldade dos algozes,
que lhe queriam acelerar a marcha, embora Ele mal pudesse dar um passo.
(Breve momento em silêncio)

Todos. — Ó Jesus tão maltratado, pelo mérito desta falta de forças que
quisestes padecer no caminho do Calvário, confortai-me, eu vos peço, com
tanto vigor, que já não tenha respeito algum às opiniões dos homens e
domine minha natureza viciosa: porque ambas as coisas foram a causa por
que desprezei outrora a vossa amizade. Amo-vos, ó Jesus, meu Amor, de
todo o meu coração; arrependo-me de vos ter ofendido. Não permitais que eu
novamente vos ofenda. Dai-me amor perpétuo a vós e fazei de mim o que
quiserdes.

Cai, terceira vez, prostrado,


Pelo peso redobrado
Dos pecados e da Cruz.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


10.ª Estação — Jesus é despido de suas vestes

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: Eles o crucificaram e repartiram suas vestes, tirando a sorte sobre elas,
para ver que parte ficaria a cada um. (Mc 15,24)

Dir: Contemplemos com que violência arrancaram as vestes a Cristo. Como


o traje interior estivesse muito pegado à carne, aberta pelos flagelos, os
carnífices, ao puxarem-lha, rasgaram-lhe também a pele. Tenhamos
compaixão de Nosso Senhor e lhe falemos assim:

Todos. — Ó inocentíssimo Jesus, pelo mérito da dor que padecestes nesta


espoliação, ajudai-me, eu vos peço, a despir-me de todo afeto às coisas
criadas e, com toda a inclinação de minha vontade, converter-me somente a
vós, que sois tão digno do meu amor. Amo-vos de todo o meu coração;
arrependo-me de vos ter ofendido. Não permitais que eu novamente vos
ofenda. Dai-me amor perpétuo a vós e fazei de mim o que quiserdes.

De suas vestes despojado,


Por algozes maltratado,
Eu vos vejo, meu Jesus.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


11.ª Estação — Jesus é pregado na Cruz

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: Quando chegaram ao lugar chamado Calvário, ali crucificaram Jesus e os


malfeitores: um à sua direita e outro à sua esquerda. Jesus dizia: “Pai, perdoa-
lhes! Eles não sabem o que fazem!”(Lc 23,33-34)

Dir: Contemplemos como Jesus é arremessado sobre a Cruz e, de braços


estendidos, oferece sua vida ao Pai eterno em sacrifício pela nossa salvação.
Os carnífices o pregam à Cruz e, depois de erguerem esta, deixam-no
levantado num infame patíbulo, abandonado a uma morte cruel. (Breve
momento em silêncio)

Todos. — Ó Jesus tão desprezado, pregai meu coração aos vossos pés, para
que, com vínculo de amor, eu permaneça sempre a vós ligado e jamais seja
de vós separado. Amo-vos mais do que a mim mesmo, arrependo-me de vos
ter ofendido. Não permitais que eu novamente vos ofenda. Dai-me amor
perpétuo a vós e fazei de mim o que quiserdes.

Sois por mim na Cruz pregado,


Insultado, blasfemado,
Com cegueira e com furor.
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


12.ª Estação — Jesus morre na Cruz

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: Em seguida, sabendo Jesus que tudo estava consumado, para que se
cumprisse a Escritura, disse: “Tenho sede!” Havia ali uma vasilha cheia de
vinagre. Fixaram uma esponja embebida em vinagre num ramo de hissopo e
a levaram à sua boca. Havendo Jesus tomado do vinagre, disse: “Tudo está
consumado!”. Inclinou a cabeça e entregou o espírito. (Jo 19,28-30)

Dir: Contemplemos Jesus preso à nossa Cruz. Após três horas de luta,
consumido enfim pelas dores, Ele deu o corpo à morte e, de cabeça
inclinada, entregou o espírito. Ajoelhemo-nos: (Breve momento em silêncio)

Todos. — Ó Jesus morto, movido por íntimos afetos de piedade, beijo esta
Cruz em que vós, por minha causa, cumpristes o curso de vossa vida. Pelos
pecados cometidos, mereci uma morte infeliz; mas vossa morte é minha
esperança. Pelos méritos de vossa morte, concedei-me, peço-vos, que,
abraçado aos vossos pés e abrasado de amor por vós, eu entregue um dia meu
espírito. Amo-vos de todo o meu coração; arrependo-me de vos ter ofendido.
Não permitais que eu novamente vos ofenda. Dai-me amor perpétuo a vós e
fazei de mim o que quiserdes.

Por meus crimes padecestes,


Meu Jesus, por mim morrestes,
Como é grande a minha dor!
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


13.ª Estação — Jesus é descido da Cruz e entregue à sua mãe

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: Depois disso, José de Arimatéia, que era discípulo de Jesus, porém às
escondidas por medo dos judeus, pediu a Pilatos permissão para retirar o
corpo de Jesus. Pilatos permitiu, e José foi e retirou o corpo. Veio também
Nicodemos, aquele que anteriormente fora de noite falar com Jesus. Ele
trouxe uma mistura de mirra e aloés, cerca de cem libras. Eles pegaram o
corpo de Jesus e o envolveram, com perfumes, em faixas de linho, ao modo
de como os judeus costumavam sepultar. (Jo 19,38-40)

Dir: Contemplemos como dois dos discípulos de Jesus, José e Nicodemos, o


tiram morto da Cruz e o colocam nos braços de sua Mãe dolorosa, que
recebe o Filho morto com grande amor e o abraça ternamente. (Breve
momento em silêncio)

Todos. — Ó Mãe das Dores, pelo amor com que amais o vosso Filho,
recebei-me como servo vosso e rogai a Ele por mim. E vós, ó meu Redentor,
porque por mim morrestes, fazei, benignamente, com que eu vos ame; a vós
somente desejo nem quero nada fora de vós. Amo-vos, ó Jesus, meu Amor, e
arrependo-me de vos ter ofendido. Não permitais que eu novamente vos
ofenda. Dai-me amor perpétuo a vós e fazei de mim o que quiserdes.

Do madeiro vos tiraram


E à Mãe vos entregaram
Com que dor e compaixão!
Pela Virgem dolorosa,
Vossa Mãe tão piedosa,
Perdoai-me, meu Jesus.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


14.ª Estação — Jesus é sepultado

℣. Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.


℟. Porque, pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo.

L1: No lugar onde Jesus foi crucificado, havia um jardim, e no jardim um


sepulcro novo, no qual ninguém ainda havia sido posto. Como era o dia da
Preparação dos judeus e o túmulo estava perto, ali puseram Jesus. (Jo 19,41-
42)

Dir: Contemplemos como os discípulos levam Jesus exânime ao lugar da


sepultura. Triste, a Mãe os acompanha e com as próprias mãos acomoda o
corpo do Filho à sepultura. Fecha-se este, enfim, e todos vão-se embora.
(Breve momento em silêncio)

Todos. — Ó Jesus sepultado, beijo esta pedra que vos acolheu; mas, após três
dias, haveis de ressurgir! Por vossa ressurreição, fazei-me, eu vos peço,
ressurgir glorioso convosco no último dia e ir para o Céu, onde, unido a vós
para sempre, vos hei de louvar e amar por toda a eternidade. Amo-vos e
arrependo-me de vos ter ofendido. Não permitais que eu novamente vos
ofenda. Dai-me amor perpétuo a vós e fazei de mim o que quiserdes.

No sepulcro vos deixaram,


Sepultado, vos choraram,
Magoado o coração.
Meu Jesus, por vossos passos,
Recebei em vossos braços
A mim, pobre pecador.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória.


Oração final a Jesus crucificado
Eis-me aqui, ó meu bom e dulcíssimo Jesus! Humildemente de coração
prostrado em vossa presença, peço e suplico-vos, com todo o fervor de minha
alma, que vos digneis gravar em meu coração os mais vivos sentimentos de
fé, esperança e caridade, de verdadeiro arrependimento de meus pecados, e
um firme propósito de emendar-me, enquanto vou considerando, com vivo
afeto e dor, as vossas cinco chagas, tendo presentes as palavras que já o
profeta Davi punha em vossa boca, ó bom Jesus: “Transpassaram minhas
mãos e os meus pés e contaram todos os meus ossos” (Sl 21, 17).

A Nossa Senhora das Dores


Ó Mãe das Dores, Rainha dos mártires, que tanto
chorastes vosso Filho, morto para me salvar,
alcançai-me uma verdadeira contrição dos meus
pecados e uma sincera mudança de vida. Mãe, pela
dor que experimentastes quando vosso divino
Filho, no meio de tantos tormentos, inclinando a
cabeça expirou à vossa vista sobre a cruz, eu vos
suplico que me alcanceis uma boa morte. Por
piedade, ó advogada dos pecadores, não deixeis de
amparar a minha alma na aflição e no combate da
terrível passagem desta vida à eternidade. E, como
é possível que, neste momento, a palavra e a voz
me faltem para pronunciar o vosso nome e o de
Jesus, rogo-vos, desde já, a vós e a vosso divino
Filho, que me socorrais nessa hora extrema, e
assim direi: Jesus e Maria, entrego-vos a minha
alma. Amém.

Salve Rainha...
MEDITAÇÃO DAS 7 DORES
DE NOSSA SENHORA
Meus irmãos, Maria, a Mãe Dolorosa, no instante da profecia de
Simeão, soube que sua vida seria marcada por angústias e sofrimentos.
Hoje, nesta Terça-feira da Semana Santa, meditemos cada umas das
suas 7 Dores, que a piedade popular nos recorda. Com Maria,
acompanhemos Jesus,no Seu “caminho pascal”.

Antífona Inicial

Ó Vós todos que por aqui passais: olhai e vede, olhai e vede: se existe
dor semelhante àminha, se existe dor semelhante à minha?

Saudação
Presidente: Em nome do Pai, e do Filho e doEspírito Santo.
Ass.: Amém.
P.: Salve, ó Santa Mãe de Deus:
Ass.: Vós destes à luz o Rei que governa o céu e a terra pelos séculos
eternos.

Oração
P.: Oremos. Ó Deus, quando o vosso Filho foi exaltado, quisestes que
sua Mãe estivesse de pé, junto à cruz, sofrendo com ele. Dai à vossa
Igreja, unida a Maria na paixão de Cristo, participar da ressurreição do
Senhor. Que convosco vive e reina, na unidade do Espírito Santo.
Ass.: Amém.

As Dores de Maria na Palavra de Deus

Canto
Bendita sejais, Senhora das Dores! Ouvi nossos rogos, Mãe dos
pecadores!Ó mãe dolorosa, que aflita chorais Repleta de angústia,
bendita sejais!
1ª Dor: Maria acolhe a profecia de Simeão(Lc 2, 34-35)

Leitor: Simeão abençoou-os e disse a Maria, sua mãe: “eis que esse
menino foi posto para a queda e para o soerguimento de muitos em Israel,
e como um sinal de contradição. E a ti uma espada transpassará tua alma!
Para que se revelem os pensamentos íntimos de muitos corações”.

P: Compadecemo-nos de Vós, Senhora, pela dor que padecestes com a


profecia de Simeão, quando vos disse que o Vosso coração seria o alvo da
paixão de vossas dores, obrigando-vos em memória desta dor.

Pai nosso... Ave Maria...

A voz de Simeão no Templo escutais


Cruéis profecias, bendita sejais!

2ª Dor: A Sagrada Família sai em fugapara o Egito (Mt 2,13-18)

L: Após sua partida, um anjo do Senhor apareceu a José em sonho e lhe


disse: "Levante-se, toma o menino e sua mãe, e foge para o Egito. Fique
lá até que eu lhe diga, pois Herodes vai procurar o menino para matá-lo".
Então ele se levantou, tomou o menino e sua mãe durante a noite, e partiu
para o Egito, onde ficou até a morte de Herodes. E assim se cumpriu o
que o Senhor tinha dito pelo profeta: "Do Egito chamei o meu filho".
Quando Herodes percebeu que havia sido enganado pelos magos, ficou
furioso e ordenou que matassem todos os meninos de dois anos para
baixo, em Belém e nas proximidades, de acordo com a informação que
havia obtido dos magos. Então se cumpriu o que fora dito pelo profeta
Jeremias: "Ouviu-se uma voz em Ramá, choro e grande lamentação; é
Raquel que chora por seus filhos e recusa ser consolada, porque já não
existem".
P: Compadecemo-nos de Vós, Senhora, pela dor que sofrestes no desterro
ao Egito, pobre e necessitada naquela longa viagem. Fazei, Senhora, que
sejamos livres das perseguições de nossos inimigos.

Pai nosso... Ave Maria...

O Céu manda um Anjo dizer que fujais


Da fúria de Herodes, bendita sejais!
3ª Dor: Perda do Menino Jesus no templo (Lc 2, 48-51)

L: Ao vê-lo, ficaram surpresos, e sua mãe lhe disse: "meu filho, por que
agiste assim conosco? Olha que teu pai e eu, aflitos, te procurávamos". Ele
respondeu: "Por que me procuráveis? Não sabíeis que devo estar na casa de
meu Pai?" Eles, porém, não compreenderam a palavra que ele lhes dissera.
Desceu então com eles para Nazaré e era-lhes submisso. Sua mãe, porém,
conservava todos esses fatos em seu coração.

P: Compadecemo-nos de Vós, Senhora, pela dor que padecestes, com a


perda de vosso Filho em Jerusalém por três dias. Concedei-nos lágrimas
de verdadeira dor para chorar nossas culpas, pelas vezes que perdemos
nosso Deus.

Pai nosso... Ave Maria...

Voltando do Templo, Jesus não achais


Que susto sofrestes, bendita sejais!

4ª Dor: Maria se encontra com Jesusno caminho do calvário


(Lm 1,12)

“Ó vós todos, que passais pelo caminho: olhai e julgai se existe dor igual
à dor que me atormenta, a mim que o Senhor feriu no dia de sua ardente
cólera”.

P: Compadecemo-nos de Vós, Senhora, pela dor que padecestes vendo


vosso Filho com a cruz sobre os ombros, caminhando para o Calvário
entre escárneos, baldões e quedas. Fazei, Senhora, que levemos com
paciência acruz da mortificação e dos trabalhos.

Pai nosso... Ave Maria...

Que dor indizível, quando o encontrais


Com a cruz às costas, bendita sejais!
5ª Dor: Maria está de pé junto a cruz deseu filho Jesus (Jo 19, 25-27)

L: Perto da cruz de Jesus, permaneciam de pé a sua mãe, a irmã da sua


mãe, Maria mulher de Cléofas, e Maria Madalena. Jesus, então vendo sua
mãe e, perto dela, o discípulo a quem amava, disse à sua mãe: “Mulher,
eis o teu filho!”. Depois disse aodiscípulo: “Eis tua mãe!”. E a partir dessa
hora, o discípulo a recebeu em sua casa.

P: Compadecemo-nos de Vós, Senhora, pela dor que padecestes vendo


morrer vosso Filho, pregado numa cruz entre dois ladrões.
Fazei, Senhora, que pela cruz de vosso Filho sejamos livres dos nossos
vícios e paixões desordenadas.

Pai nosso... Ave Maria...

A dor que ainda cresce quando o contemplais


Jesus expirando bendita sejais

6ª Dor: Maria recebe em seus braços ocorpo do seu Filho (Mt 27, 57-59)

L: “À tardinha, um homem rico de Arimateia, chamado José, que era


também discípulo de Jesus, foi procurar Pilatos e pediu-lhe o corpo de
Jesus. Pilatos cede-o. José tomou o corpo, envolve-o num lençol
branco”.

P: Compadecemo-nos de Vós, Senhora, pela dor que padecestes ao


receberdes em vossosbraços aquele Santíssimo Corpo de Jesus repleto por
tantas chagas e feridas. Fazei, Senhora, que nosso coração viva ferido do
amor divino, e morto a todo amor profano.

Pai nosso... Ave Maria...

No vosso regaço, seu corpo abrigais


Com ele abraçada, bendita sejais!
7ª Dor: Sepultura de Jesus (Jo 19, 40-42)

L: “Tomaram então o corpo de Jesus e o envolveram em faixas com os


aromas, como os judeus costumam sepultar. Havia um jardim, no lugar em
que ele foi crucificado, e no jardim, um sepulcro novo, em que ninguém
ainda fora depositado. Ali então, por causa da Preparação dos judeus e da
proximidade do túmulo eles depositaram Jesus”.

P: Compadecemo-nos de Vós, Senhora, pela dor que padecestes em vossa


piedade, depois de sepultado vosso Filho. Fazei, Senhora, que fiquemos
sepultado para tudo o que é terreno e vivamos só para Deus e para vós.

Pai nosso... Ave Maria...

Sem filho e tal filho então suportais


Cruel solidão bendita sejais

Oração final

Mãe de Deus, Mãe Soberana, Mãe das Dores de hoje e para sempre eu me
entrego a vós, como filho e servo. Consagro ao vosso serviço a minha
alma, o meu corpo e tudo que me pertence. Abençoa a minha família, os
meus trabalhos, os meus haveres. Sede minha protetora na vida e conduzi-
me ao céu para viver por toda a eternidade.
Bênção P.: O Senhor esteja convosco.
Ass.: Ele está no meio de nós.
P.: O Deus de bondade, que pelo Filho da Virgem Maria quis salvar a
todos, vos enriqueça com sua benção.
Ass.: Amém.

P.: Seja-vos dado sentir sempre e por toda parte a proteção da Virgem, por
quem recebestes o autor da vida.
Ass.: Amém.
P.: E vós, que vos reunistes hoje para meditar suas Dores, possais colher a
alegria espiritual e o prêmio eterno.
Ass.: Amém.
P.: Abençoe-vos Deus todo-poderoso, Pai eFilho + e Espírito Santo.

Ass.: Amém.
P.: Ide em paz e o Senhor vos acompanhe.
Ass.: Graças a Deus.

Antífona Mariana

Sub tuum praesidium confugimus, sancta Dei Genetrix; nostras


deprecationes ne despicias in necessitatibus nostris, sed a periculis
cunctis libera nos semper, Virgogloriosa et benedicta.

À vossa proteção recorremos, Santa Mãe de Deus não desprezeis as


nossas súplicas em nossas necessidades; mas livrai-nos sempre de todos os
perigos, ó Virgem gloriosa e bendita.
MEDITAÇÃO DAS 7 PALAVRAS DE
Nosso Senhor Jesus Cristo na Cruz
Leitor: Irmãos, hoje queremos meditar as Sete Palavras ditas por Jesus na
Cruz. “Se não houvesse a cruz, a vida não seria pregada ao lenho com cravos.
Se a vida não tivesse sido cravada, não brotariam do lado as fontes da
imortalidade, o sangue e a água, que lavam o mundo.” Que essa celebração
nos ajude a compreender o infinito amor de Deus por cada um de nós. Com
bastante piedade, acompanhemos.

Canto

Vitória! Tu reinarás! Ó Cruz! Tu nos salvarás!


1. Brilhando sobre o mundo, que vive sem tua luz, tu és um sol fecundo, de
amor e de paz, ó Cruz!
2. Aumenta a confiança do pobre e do pecador, confirma nossa esperança
na marcha para o Senhor.
3. À sombra dos teus braços a Igreja viverá. Por ti no eterno abraço o Pai
nos acolherá.

SAUDAÇÃO

Presidente: Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo.


Todos: Amém.

P: Nós vos adoramos Senhor Jesus Cristo e vos bendizemos.


T: Porque pela vossa santa cruz remistes o mundo.

P.: São sete expressões ditas por Jesus na Cruz e recolhidas pelos
evangelistas; elas condensam a vida do Crucificado. Nestas expressões
revela-se a identidade de Jesus: quem Ele é e sua missão. Vamos contemplar
o significado das “palavras pronunciadas por Jesus na Cruz”, deixando-nos
impactar e iluminar por elas. São palavras densas, carregadas de vida;
palavras “excêntricas”, onde Jesus sai de si e se dirige aos outros.

OREMOS. Ó Deus, que para salvar a todos dispusestes que o vosso Filho
morresse na cruz, a nós, que conhecemos na terra este mistério, dai-nos
colher no céu os frutos da redenção. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso
Filho, na unidade do Espírito Santo. Amém.
P.: Atentos e com os olhos fitos na Cruz do Senhor, meditemos com bastante
piedade o sermão das sete palavras de Jesus.

1. PERDÃO
“Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem”
(Lc 23,34)

Jesus, na sua vida pública, sempre revelou o perdão do Pai; no encontro com
os pecadores deixou transparecer a misericórdia reconstrutora de Deus. O
perdão foi a marca de sua vida e deve ser também a marca dos seus
seguidores. É difícil perdoar: a dor, o orgulho, a própria dignidade, quando é
violentada, grita pedindo “justiça”, buscando “reparação”, exigindo
“vingança”... Mas, perdão? Surpreende-nos que Jesus na Cruz seja capaz de
continuar vendo humanidade em seus verdugos; Ele é capaz de continuar
crendo que há esperança para aqueles que cravam seus semelhantes na Cruz.
Porque, esta palavra de perdão, dita a partir do madeiro, é sobretudo uma
declaração eterna: o ser humano, todo homem e toda mulher, conserva sua
capacidade de amar nas circunstâncias mais adversas. E todo ser humano, até
aquele que é capaz das ações mais atrozes, continua tendo um germe de
humanidade em seu interior e que permite que haja esperança para ele.
Perdoar é atrever-se a ver o que há de verdadeiro, de beleza em cada um. O
perdão é capaz de ver dignidade e faísca de humanidade escondida no
coração do verdugo. O perdão abre futuro, destrava a vida e não se deixa
determinar pelos erros do passado; ele quebra distâncias, nos faz descer em
direção à fragilidade do outro, ao mesmo tempo que revela nossa fragilidade.

T: É enquanto pecadores que somos chamados a perdoar e não enquanto


justos. Por isso, no perdão é onde mais nos assemelhamos a Deus, pois só Ele
podia inventar o perdão. Deus também continua me perdoando hoje, pelas
atitudes pecaminosas em minha vida que destroem, rompem, ferem os outros
e o meu mundo.

(Silêncio) Pai-nosso...

Deus santo, Deus forte, Deus imortal, Tende piedade de nós! (2x).
2. COMPANHIA
“Hoje estarás comigo no paraíso”
(Lc 23,43)

Jesus sempre viveu “em más companhias” e agora morre entre dois ladrões.
Mais uma vez, não assume o papel de juiz sobre dos outros mas oferece uma
nova chance de salvação. O moribundo que dá vida: presença solidária, que,
mesmo em meio ao pior sofrimento, oferece companhia a outros sofredores.
Um dos ladrões, impactado pela serenidade e testemunho de Jesus “rouba o
paraíso”.

T: Jesus revela uma promessa que muitas pessoas precisam ouvir hoje,
sobretudo aqueles que carregam cruzes injustas e pesadas, que vivem
realidades atravessadas pela dor, pela solidão, dúvida, incompreensão ou
pranto... Como soarão estas palavras no interior de cada um de nós: “Hoje
estarás comigo no Paraíso”.

(Silêncio) Pai-nosso...

Deus santo, Deus forte, Deus imortal, Tende piedade de nós! (2x).

3. APOIO
“Mulher, eis o teu filho; filho, eis a tua mãe”
(Jo 19,26)

Maria, mulher do “sim”; “sim” que se prolonga até à Cruz, onde, de pé,
revela sua presença materna e consoladora junto a seu Filho Jesus. A
presença de Maria na vida de Jesus não é acidental: foi aquela que mais
amou, conheceu e seguiu Jesus. Ela agora é nossa referência fiel no
seguimento do seu Filho. Despojado de tudo, Jesus tem um tesouro a nos dar:
entrega sua própria mãe para que ela seja presença cuidadora e de ternura
junto aos seus filhos sofredores. Jesus não nos deixa órfãos; sempre
precisamos dos cuidados e do consolo de uma mãe; alguém para nos
acompanhar nas horas mais obscuras e difíceis; alguém que nos sustenta nos
momentos trágicos; alguém que compartilha nossas perdas... e que também
está presente nas horas boas, que chegarão. É como se Jesus nos dissesse:
“Para viver o meu seguimento, inspire-se nela, tenha-a como referência”.
T: São tantas pessoas junto ao pé da cruz, inumeráveis homens e mulheres
de Igreja que foram e são companheiros de caminho, de esforço, de apoio, de
buscas e de amor. João, também de pé junto à Cruz, representa todo seguidor
fiel de Jesus, mesmo nos momentos de crise.

(Silêncio) Pai-nosso...

Deus santo, Deus forte, Deus imortal, Tende piedade de nós! (2x).

4. SOLIDÃO
“Meu Deus, meu Deus, porque me
abandonaste?” (Mt 27,46)

O grito de Jesus na Cruz condensa o grito da humanidade sofredora; é o


próprio Deus que grita seu abandono. Esse grito de Jesus revela uma
Presença no próprio abandono, embora, de imediato não se sinta esta
presença. Grito que não fica no vazio, mas aponta para a Vida. Todos
perguntamos: “Onde está Deus no sofrimento, na violência, na morte...?” E
Deus responde, perguntando: “Onde está você no meu sofrimento, na
violência que sofro, na morte... de meus filhos/as?” O sofrimento da
humanidade é o sofrimento de Deus; Deus não é insensível e distante da dor
dos seus filhos. Quem não passa por momentos de noite escura, de
insegurança, de absoluta incerteza...? Quem não viveu experiências de
abandono, de falta de sentido na vida, de solidão, de rejeição...?

T: No entanto, nos atrevemos a seguir adiante, com nossos projetos,


compromissos e esforços em seu nome. O desafio está em não ceder, em não
crer que tudo tem sido uma mentira. O desafio é não abandonar, não render-
se, não voltar atrás nesses momentos. Entende-se, assim, o grande “grito” que
brotou das profundezas da dor de Jesus na Cruz e que continua ecoando como
clamor angustiado. Um grito é, na verdade, um convite a um compromisso
solidário. O grande grito de Jesus é a certeza de tudo o que sustenta o seu
coração; ao ecoar junto aos crucificados, provocará grandes novidades. Um
grito que não fica no vazio mas aponta para a vida.
(Silêncio) Pai-nosso...

Deus santo, Deus forte, Deus imortal, Tende piedade de nós! (2x).
5. SEDE
“Tenho sede...” (Jo 19,28)

Jesus sempre foi um homem “sedento”: fazer a vontade do Pai, realizar o


Reino, compromisso com a vida, presença solidária junto aos sofredores,
fazer conhecido a Deus como Pai/Mãe... Agora grita sua derradeira sede: um
mundo sem dor, sem exclusão, sem violência. Grita o homem com a garganta
ressequida: sede na garganta e sede no coração. Sede expansiva, sede que
descentra.

T: O grito de Jesus na Cruz recolhe todos esses brados da humanidade


quebrada. E não há explicação; não há sentido; não há justiça. Só um grito a
mais. A sede de Jesus desperta em nós outras “sedes”: de quê tenho sede?
Sede de sonhos, de mundo novo... Sede mobilizadora que ativa as melhores
energias dentro de nós, que desperta nossa criatividade... “Quem tem sede
venha a mim e beba”. Quem não tem sede não busca, não cria.

(Silêncio) Pai-nosso...

Deus santo, Deus forte, Deus imortal, Tende piedade de nós! (2x).

6. COMPROMISSO.
“Tudo está consumado” (Jo 19,30)

Parece contradição alguém dependurado na Cruz afirmar que tudo está


consumado; tem-se a impressão de fracasso total. Mas na Cruz Jesus leva até
às últimas consequências sua Encarnação: mergulha e se faz solidário com
todos os crucificados da história. “Desce” até às profundezas do sofrimento
humano e ali revela a presença do Deus compassivo. No alto da Cruz, Jesus
tem consciência que não viveu em vão; sua presença fez a diferença; viveu
para os outros. Jesus morre com as mãos cheias de vida; gastou a vida a
serviço da vida; deixou pegadas nos corações de quem encontrou pela vida.
“Jesus morreu de tanto viver”. Morreu de bondade, de compaixão, de justiça.
T: Uma vida consumada faz fecunda a morte. Uma história consumada de
Amor. Vida consumada quando se consome no serviço aos outros. Jesus
desencadeou um movimento de vida.

(Silêncio) Pai-nosso...

Deus santo, Deus forte, Deus imortal, Tende piedade de nós! (2x).

7. SENTIDO.
“Pai, em tuas mãos entrego meu espírito” (Lc 23,46)

Só quem viveu intensamente uma vida expansiva pode acolher a própria


morte com paz, confiança, serenidade e abandono nos braços do Pai. Jesus
morre como tinha vivido: ancorado na confiança do Pai. Jesus, que sempre
prolongou as mãos do Pai, agora entrega-se confiadamente nos braços do
mesmo Pai. Jesus sempre viveu em profunda sintonia com o Pai; agora Ele dá
um “salto vital” nos braços do Pai. A morte nos inspira medo; mas na morte,
somos todos iguais, sozinho diante de Deus. A morte é a última ponte que
nos conduz ao Pai. Seremos abraçados do outro lado da ponte. Nosso destino
é o coração de Deus.

T: Não só na hora da morte, mas a cada dia somos chamados a “entregar o


espírito”; num mundo em que todos buscam seguranças, que em tudo querem
ter “salva-vidas”, num mundo que nos convida a ter as costas cobertas...
queremos arriscar, apostar pelo Reino; queremos nos sentir confiados,
atravessar tormentas ou espaços serenos, sentindo-nos protegidos pelas mãos
do Pai. Mãos que curam, acariciam, sustentam...

(Silêncio) Pai-nosso...

Deus santo, Deus forte, Deus imortal, Tende piedade de nós! (2x).
P.: Após termos contemplado a figura de Jesus que do alto da Cruz, revela-
se, se faz conhecer, queremos também nos conhecer e buscar nos configurar
a Ele.

O que vemos ao contemplar a Cruz?

A Cruz é expressão da máxima compaixão e comunhão, com Jesus e com os


sofredores. Ela aponta para Aquele que foi fiel ao Pai e ao Reino. Por isso, a
Cruz não um “peso morto”. A partir da Cruz de Jesus, iluminamos e damos
sentido às nossas cruzes.
Num instante de silêncio, contemplemos a Cruz do Senhor e nos lembremos
o que nos diz o profeta Isaías: “A verdade é que ele tomava sobre si nossas
enfermidades e sofria, ele mesmo, nossas dores; e nós pensávamos fosse um
chagado, golpeado por Deus e humilhado! Mas ele foi ferido por causa de
nossos pecados, esmagado por causa de nossos crimes; a punição a ele
imposta era o preço da nossa paz, e suas feridas, o preço da nossa cura.”

(Todos se ajoelham)

P: Rezemos juntos:

Eis-me aqui, ó bom e dulcíssimo Jesus! De joelhos ante a vossa divina


presença eu vos peço e suplico, com todo fervor de minha alma, que vos
digneis gravar em meu coração os mais vivos sentimentos de fé, de esperança
e de caridade, de verdadeiro arrependimento de meus pecados e vontade
firmíssima de me emendar, enquanto com sincero afeto e íntima dor de
coração considero e medito em vossas cinco chagas, tendo bem presentes
aquelas palavras que o Profeta Davi já dizia de Vós, ó bom Jesus:
“Transpassaram minhas mãos e meus pés, e contaram todos os meus ossos.”

(Todos se levantam)
BENÇÃO FINAL

Pres: O Senhor esteja convosco.


T: Ele está no meio de nós.

Pres: O Pai de misericórdia, que vos deu um exemplo de amor na paixão do


seu Filho, vos conceda, pela vossa dedicação a Deus e ao próximo, a graça
de sua bênção.
T: Amém.

Pres: O Cristo, cuja morte vos libertou da morte eterna, conceda-vos


receber o dom da vida.
T: Amém.

Pres: Tendo seguido a lição de humildade deixada pelo Cristo, participeis


igualmente de sua ressurreição.
T: Amém.

Pres: Abençoe-vos Deus todo-poderoso, Pai e Filho + e Espírito Santo.


T: Amém.

Ide em paz e que o Senhor vos acompanhe.


T: Graças a Deus.

Canto

Fiel Madeiro da Santa Cruz / ó árvore sem rival. / Que selva outro lenho
produz, / que traga em si fruto igual. / Quão doce peso conduz / ó lenho
celestial. / Fiel Madeiro da Santa Cruz / ó árvore sem rival

Cantem meus lábios a luta / que sobre a cruz se travou. / Cantem o nobre
triunfo / que no madeiro alcançou. / O redentor do universo / quando por nós
se imolou.
OFÍCIO DAS TREVAS
INVITATÓRIO

† Abri os meus lábios, ó Senhor.


Q: E minha boca anunciará vosso louvor.

SALMO 94 (95)
Convite ao louvor de Deus
Animai-vos uns aos outros, dia após dia, enquanto ainda se disser ‘hoje’.
(Hb 3,13)

Todos: Cristo por nós foi tentado, sofreu e na cruz morreu, vinde todos
adoremos.

Vinde, exultemos de alegria no Senhor; *


aclamemos o rochedo que nos salva.
Ao seu encontro caminhemos com louvores, *
e com cantos de alegria o celebremos!

Todos: Cristo por nós foi tentado, sofreu e na cruz morreu, vinde todos
adoremos.

Na verdade, o Senhor é o grande Deus, *


o grande Rei, muito maior que os deuses todos.
Tem nas mãos as profundezas dos abismos, *
e as alturas das montanhas lhe pertencem;
o mar é dele, pois foi ele quem o fez, *
e a terra firme suas mãos a modelaram.

Todos: Cristo por nós foi tentado, sofreu e na cruz morreu, vinde todos
adoremos.

Vinde adoremos e prostremo-nos por terra, *


e ajoelhemos ante o Deus que nos criou!
Porque ele é o nosso Deus, nosso Pastor, †
e nós somos o seu povo e seu rebanho, *
as ovelhas que conduz com sua mão.

Todos: Cristo por nós foi tentado, sofreu e na cruz morreu, vinde todos
adoremos.
Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: †
"Não fecheis os corações como em Meriba, *
como em Massa, no deserto, aquele dia,
em que outrora vossos pais me provocaram, *
apesar de terem visto as minhas obras. "

Todos: Cristo por nós foi tentado, sofreu e na cruz morreu, vinde todos
adoremos.

Quarenta anos desgostou-me aquela raça, †


e eu disse: "Eis um povo transviado, *
seu coração não conheceu os meus caminhos!"
E por isso lhes jurei na minha ira: *
"Não entrarão no meu repouso prometido!"

Todos: Cristo por nós foi tentado, sofreu e na cruz morreu, vinde todos
adoremos.

Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo, *


Como era no princípio, agora e sempre. Amém.

Todos: Cristo por nós foi tentado, sofreu e na cruz morreu, vinde todos
adoremos.

OFÍCIO DE LEITURAS

HINO

Cantem meus lábios a luta/ que sobre a cruz se travou;/


cantem o nobre triunfo/ que no madeiro alcançou/
o Redentor do Universo/ quando por nós se imolou.

O Criador teve pena/ do primitivo casal,/


que foi ferido de morte,/comendo o fruto fatal,
/e marcou logo outra árvore,/ para curar-nos do mal.

Tal ordem foi exigida/ na obra da salvação:


/ cai o inimigo no laço/ de sua própria invenção./
Do próprio lenho da morte/ Deus fez nascer redenção.
Na plenitude dos tempos,/ a hora santa chegou/
e, pelo Pai enviado,/ nasceu do mundo o autor;/
e duma Virgem no seio/ a nossa carne tomou.

Seis lustros tendo passado,/ cumpriu a sua missão./


Só para ela nascido,/ livre se entrega à Paixão./
Na cruz se eleva o Cordeiro,/ como perfeita oblação.

Glória e poder à Trindade./ Ao Pai e ao Filho, louvor./


Honra ao Espírito Santo./ Eterna glória ao Senhor,/
que nos salvou pela graça/ e nos remiu pelo amor. Amém.

SALMODIA

SALMO 2
O Messias rei e vencedor
Uniram-se contra Jesus, teu santo servo, a quem ungiste (At 4,27).

Todos: Os reis de toda a terra se reúnem e conspiram os governos todos


juntos contra o Deus onipotente e o seu Ungido.

Lado direito: Por que os povos agitados se revoltam? *


por que tramam as nações projetos vãos?
Por que os reis de toda a terra se reúnem, †
e conspiram os governos todos juntos *
contra o Deus onipotente e o seu Ungido?

Lado Esquerdo: “Vamos quebrar suas correntes”, dizem eles, *


“e lançar longe de nós o seu domínio!”
Ri-se deles o que mora lá nos céus; *
zomba deles o Senhor onipotente.
Ele, então, em sua ira os ameaça, *
e em seu furor os faz tremer, quando lhes diz:

Lado direito:“Fui eu mesmo que escolhi este meu Rei, *


e em Sião, meu monte santo, o consagrei!”
O decreto do Senhor promulgarei, †
foi assim que me falou o Senhor Deus: *
Lado Esquerdo: “Tu és meu Filho, e eu hoje te gerei! –

Podes pedir-me, e em resposta eu te darei †


por tua herança os povos todos e as nações, *
e há de ser a terra inteira o teu domínio.
Com cetro férreo haverás de dominá-los, *
e quebrá-los como um vaso de argila!”

Lado direito: E agora, poderosos, entendei; *


soberanos, aprendei esta lição:
Com temor servi a Deus, rendei-lhe glória *
e prestai-lhe homenagem com respeito!

Lado Esquerdo: Se o irritais, perecereis pelo caminho, *


pois depressa se acende a sua ira!
– Felizes hão de ser todos aqueles * que põem sua esperança
no Senhor!

Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo, *


Como era no princípio, agora e sempre. Amém.

Todos: Os reis de toda a terra se reúnem e conspiram os governos todos


juntos contra o Deus onipotente e o seu Ungido.

**APAGAM-SE AS DUAS VELAS MAIS AO EXTREMO DO


CANDELABRO DE TREVAS. **

SALMO 21(22),2-23 [24-32]

Todos: Eles repartem entre si as minhas vestes e sorteiam entre si a


minha túnica.

Lado direito: Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes? * E


ficais longe de meu grito e minha prece?
Ó meu Deus, clamo de dia e não me ouvis, * clamo de
noite e para mim não há resposta!
Lado Esquerdo Vós, no entanto, sois o santo em vosso Templo, *
que habitais entre os louvores de Israel.
Foi em vós que esperaram nossos pais; *
esperaram e vós mesmo os libertastes.
Seu clamor subiu a vós e foram salvos; *
em vós confiaram e não foram enganados.

Lado direito: Quanto a mim, eu sou um verme e não um homem; * sou o


opróbrio e o desprezo das nações. Riem de mim todos aqueles que me
vêem, *
torcem os lábios e sacodem a cabeça:
“Ao Senhor se confiou, ele o liberte *
e agora o salve, se é verdade que ele o ama!”

Lado esquerdo: Desde a minha concepção me conduzistes, *


e no seio maternal me agasalhastes.
Desde quando vim à luz vos fui entregue; *
desde o ventre de minha mãe sois o meu Deus!
Não fiqueis longe de mim, porque padeço; *
ficai perto, pois não há quem me socorra!

Lado direito:Por touros numerosos fui cercado, *


e as feras de Basã me rodearam;
escancararam contra mim as suas bocas, *
como leões devoradores a rugir.

Lado esquerdo: Eu me sinto como a água derramada, *


e meus ossos estão todos deslocados;
como a cera se tornou meu coração, *
e dentro do meu peito se derrete.

Lado direito:Minha garganta está igual ao barro seco, †


minha língua está colada ao céu da boca, *
e por vós fui conduzido ao pó da morte!
Cães numerosos me rodeiam furiosos, *
e por um bando de malvados fui cercado.

Lado esquerdo: Transpassaram minhas mãos e os meus pés *


e eu poso contar todos os meus ossos.
Eis que me olham e, ao ver-me, se deleitam! †
Eles repartem entre si as minhas vestes *
e sorteiam entre si a minha túnica.

Lado direito:Vós, porém, ó meu Senhor, não fiqueis longe, *


à minha força, vinde logo em meu socorro! Da espada
libertai a minha alma, *
e das garras desses cães, a minha vida!

Lado esquerdo: Arrancai-me da goela do leão, *


e a mim tão pobre, desses touros que me atacam!
Anunciarei o vosso nome a meus irmãos *
e no meio da assembléia hei de louvar-vos!

Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo. *


Como era no princípio, agora e sempre. Amém.

Todos: Eles repartem entre si as minhas vestes e sorteiam entre si a


minha túnica.

**APAGAM-SE AS DUAS VELAS SEGUINTES EM DIREÇÃO AO


CENTRO DO CANDELABRO DE TREVAS. **

SALMO 37(38)

Todos: Os que buscam matar, me perseguem e procuram tirar minha


vida.

Repreendei-me, Senhor, mas sem ira; *


corrigi-me, mas não com furor!

Vossas flechas em mim penetraram; *


vossa mão se abateu sobre mim.
Nada resta de são no meu corpo, *
pois com muito rigor me tratastes!
Não há parte sadia em meus ossos, *
pois pequei contra vós, ó Senhor!
Meus pecados me afogam e esmagam, *
como um fardo pesado me oprimem.

Cheiram mal e supuram minhas chagas *


por motivo de minhas loucuras.
Ando triste, abatido, encurvado, *
todo o dia afogado em tristeza.

As entranhas me ardem de febre, *


já não há parte sã no meu corpo.
Meu coração grita e geme de dor, *
esmagado e humilhado demais.

Conheceis meu desejo, Senhor, *


meus gemidos vos são manifestos;
bate rápido o meu coração, †
minhas forças estão me deixando, *
e sem luz os meus olhos se apagam.

Companheiros e amigos se afastam, †


fogem longe das minhas feridas; *
meus parentes mantêm-se à distância.

Armam laços os meus inimigos, *


que procuram tirar minha vida;
os que buscam matar-me ameaçam *
e maquinam traições todo o dia.

Eu me faço de surdo e não ouço, *


eu me faço de mudo e não falo;
semelhante a alguém que não ouve *
e não tem a resposta em sua boca.

Mas, em vós, ó Senhor, eu confio, *


e ouvireis meu lamento, ó meu Deus!
Pois rezei: “Que não zombem de mim, *
nem se riam, se os pés me vacilam!”
U: Senhor, estou quase caindo, * minha dor não me
larga um momento! Sim, confesso, Senhor, minha
culpa: * meu pecado me aflige e atormenta.

São bem fortes os meus adversários †


que me vêm atacar sem razão; *
quantos há que sem causa me odeiam!
Eles pagam o bem com o mal, *
porque busco o bem, me perseguem.

Não deixeis vosso servo sozinho, *


3. meu Deus, ficai perto de mim! Vinde logo trazer-me socorro, * porque
sois para mim salvação!

Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo. *


Como era no princípio, agora e sempre. Amém.

Todos: Os que buscam matar, me perseguem e procuram tirar minha


vida.

**APAGAM-SE AS DUAS VELAS SEGUINTES EM DIREÇÃO AO


CENTRO DO CANDELABRO DE TREVAS. **

Padre. As falsas testemunhas se ergueram.


Todos. E vomitam violência contra mim.
PRIMEIRA LEITURA
Da Carta aos Hebreus (9,11-28)

Cristo, sumo sacerdote, com o seu próprio sangue, entrou no Santuário uma
vez por todas.

Irmãos, Cristo veio como sumo sacerdote dos bens futuros. Através de uma
tenda maior e mais perfeita, que não é obra de mãos humanas, isto é, que
não faz parte desta criação, e não com o sangue de bodes e bezerros, mas
com o seu próprio sangue, ele entrou no Santuário uma vez por todas,
obtendo uma redenção eterna. De fato, se o sangue de bodes e touros, e a
cinza de novilhas espalhada sobre os seres impuros os santifica e realiza a
pureza ritual dos corpos, quanto mais o Sangue de Cristo, purificará a
nossa consciência das obras mortas, para servirmos ao Deus vivo, pois, em
virtude do espírito eterno, Cristo se ofereceu a si mesmo a Deus como
vítima sem mancha.
Por isso, ele é mediador de uma nova aliança. Pela sua morte, ele
reparou as transgressões cometidas no decorrer da primeira aliança. E,
assim, aqueles que são chamados recebem a promessa da herança eterna.
Onde existe testamento, é preciso que seja constatada a morte de quem fez
o testamento. Pois um testamento só tem valor depois da morte, e não tem
efeito nenhum enquanto ainda vive aquele que fez o testamento. Por isso,
nem mesmo a primeira aliança foi inaugurada sem sangue. Quando
anunciou a todo o povo cada um dos mandamentos da Lei, Moisés tomou
sangue de novilhos e bodes, junto com água, lã vermelha e um hissopo. Em
seguida, aspergiu primeiro o próprio livro e todo o povo, e disse: “Este é o
sangue da aliança que Deus faz convosco”. Do mesmo modo, aspergiu com
sangue também a Tenda e todos os objetos que serviam para o culto. E
assim, segundo a Lei, quase todas as coisas são purificadas com sangue, e
sem derramamento de sangue não existe perdão.
Portanto, as cópias das realidades celestes tinham que ser
purificadas dessa maneira; mas as próprias realidades celestes devem ser
purificadas com sacrifícios melhores. De fato, Cristo não entrou num
santuário feito por mão humana, imagem do verdadeiro, mas no próprio
céu, a fim de comparecer, agora, na presença de Deus, em nosso favor. E
não foi para se oferecer a si muitas vezes, como o sumo sacerdote que,
cada ano, entra no Santuário com sangue alheio. Porque, se assim fosse,
deveria ter sofrido muitas vezes, desde a fundação do mundo. Mas foi
agora, na plenitude dos tempos, que, uma vez por todas, ele se manifestou
para destruir o pecado pelo sacrifício de si mesmo. O destino de todo
homem é morrer uma só vez, e depois vem o julgamento. Do mesmo
modo, também Cristo, oferecido uma vez por todas, para tirar os pecados
da multidão, aparecerá uma segunda vez, fora do pecado, para salvar
aqueles que o esperam.

RESPONSÓRIO (Is 53,7.12)

Leitor. Foi levado como ovelha ao matadouro; e, maltratado, não abriu a


sua boca; * Foi condenado para a vida de seu povo.
Todos. Foi levado como ovelha ao matadouro; e, maltratado, não abriu a
sua boca; * Foi condenado para a vida de seu povo.

Leitor: Ele próprio entregou a sua vida e deixou-se colocar entre os


facínoras.
Todos: Foi condenado para a vida de seu povo.

**APAGA-SE A PRÓXIMA VELA, À ESQUERDA, NO


CANDELABRO DE TREVAS. **
SEGUNDA LEITURA

Das Catequeses de São João Crisóstomo, bispo.


(Cat. 3,13-19: SCh 50,174-177)
(Séc. 4)
O poder do sangue de Cristo

Queres conhecer o poder do sangue de Cristo? Voltemos às


figuras que o profetizaram e recordemos a narrativa do Antigo
Testamento: Imolai, disse Moisés, um cordeiro de um ano e marcai as
portas com o seu sangue (cf. Ex 12,6-7). Que dizes, Moisés? O sangue de
um cordeiro tem poder para libertar o homem dotado de razão? É claro
que não, responde ele, não porque é sangue, mas por ser figura do sangue
do Senhor. Se agora o inimigo, ao invés do sangue simbólico aspergido
nas portas, vir brilhar nos lábios dos fiéis, portas do templo dedicado a
Cristo, o sangue verdadeiro, fugirá ainda mais para longe.
Queres compreender mais profundamente o poder deste sangue?
Repara de onde começou a correr e de que fonte brotou. Começou a brotar
da própria cruz, e a sua origem foi o lado do Senhor. Estando Jesus já
morto e ainda pregado na cruz, diz o evangelista, um soldado aproximou-
se, feriu-lhe o lado com uma lança, e imediatamente saiu água e sangue: a
água, como símbolo do batismo; o sangue, como símbolo da eucaristia. O
soldado, traspassando-lhe o lado, abriu uma brecha na parede do templo
santo, e eu, encontrando um enorme tesouro, alegro-me por ter achado
riquezas extraordinárias. Assim aconteceu com este cordeiro. Os judeus
mataram um cordeiro e eu recebi o fruto do sacrifício.
De seu lado saiu sangue e água (Jo 19,34). Não quero, querido
ouvinte, que trates com superficialidade o segredo de tão grande mistério.
Falta-me ainda explicar-te outro significado místico e profundo. Disse
que esta água e este sangue são símbolos do batismo e da eucaristia. Foi
destes sacramentos que nasceu a santa Igreja, pelo banho da regeneração
e pela renovação no Espírito Santo, isto é, pelo batismo e pela eucaristia
que brotaram do lado de Cristo. Pois Cristo formou a Igreja de seu lado
traspassado, assim como do lado de Adão foi formada Eva, sua esposa.
Por esta razão, a Sagrada Escritura, falando do primeiro homem,
usa a expressão osso dos meus ossos e carne da minha carne (Gn 2,23),
que São Paulo refere, aludindo ao lado de Cristo. Pois assim como Deus
formou a mulher do lado do homem, também Cristo, de seu lado, nos deu a
água e o sangue para que surgisse a Igreja. E assim como Deus abriu o
lado de Adão enquanto ele dormia, também Cristo nos deu a água e o
sangue durante o sono de sua morte.
Vede como Cristo se uniu à sua esposa, vede com que alimento
nos sacia. Do mesmo alimento nos faz nascer e nos nutre. Assim como a
mulher, impulsionada pelo amor natural, alimenta com o próprio leite e o
próprio sangue o filho que deu à luz, também Cristo alimenta sempre
com o seu sangue aqueles a quem deu o novo nascimento.

Padre: Não foi nem com ouro nem prata que fostes remidos, irmãos; mas
sim pelo sangue precioso de Cristo, o Cordeiro sem mancha. * Por ele nós
temos acesso num único Espírito ao Pai.

Todos: Não foi nem com ouro nem prata que fostes remidos, irmãos; mas
sim pelo sangue precioso de Cristo, o Cordeiro sem mancha. * Por ele nós
temos acesso num único Espírito ao Pai.

Padre: O sangue do Filho de Deus nos lava de todo pecado.

Todos: Por ele nós temos acesso num único Espírito ao Pai.
**APAGA-SE A PRÓXIMA VELA, À DIREITA, NO CANDELABRO
DE TREVAS. *
SALMODIA

Salmo 50(51)
Tende piedade, ó meu Deus!
Renovai o vosso espírito e a vossa mentalidade. Revesti o homem novo (Ef 4,23-
24).

Todos: Deus não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós.

Padre: Tende piedade, ó meu Deus, misericórdia! *


Na imensidão de vosso amor, purificai-me!
Lavai-me todo inteiro do pecado, *
e apagai completamente a minha culpa!

Todos: Eu reconheço toda a minha iniqüidade, *


o meu pecado está sempre à minha frente.
Foi contra vós, só contra vós, que eu pequei, *
e pratiquei o que é mau aos vossos olhos! –

Padre: Mostrais assim quanto sois justo na sentença, *


e quanto é reto o julgamento que fazeis.
Vede, Senhor, que eu nasci na iniqüidade *
e pecador já minha mãe me concebeu.

Todos: Mas vós amais os corações que são sinceros, *


na intimidade me ensinais sabedoria.
Aspergi-me e serei puro do pecado, *
e mais branco do que a neve ficarei.

Padre: Fazei-me ouvir cantos de festa e de alegria, *


e exultarão estes meus ossos que esmagastes.
Desviai o vosso olhar dos meus pecados *
e apagai todas as minhas transgressões!

Todos: Criai em mim um coração que seja puro, *


dai-me de novo um espírito decidido.
4. Senhor, não me afasteis de vossa face, *
nem retireis de mim o vosso Santo Espírito!
Padre: Dai-me de novo a alegria de ser salvo *
U: confirmai-me com espírito generoso!
Ensinarei vosso caminho aos pecadores, *
V: e para vós se voltarão os transviados.

Todos: Da morte como pena, libertai-me, * e minha


língua exaltará vossa justiça! Abri meus lábios, ó
Senhor, para cantar, * e minha boca anunciará vosso
louvor!

Padre: Pois não são de vosso agrado os sacrifícios, *


e, se oferto um holocausto, o rejeitais.
Meu sacrifício é minha alma penitente, *
não desprezeis um coração arrependido!

Todos: Sede benigno com Sião, por vossa graça, *


reconstruí Jerusalém e os seus muros!
E aceitareis o verdadeiro sacrifício, *
os holocaustos e oblações em vosso altar!

Todos: Demos glória a Deus Pai Onipotente e a Seu Filho Jesus Cristo, Senhor
nosso, e ao Espírito que habita em nosso peito, pelos séculos dos séculos,
amém.

Todos: Deus não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós.

**APAGAM-SE AS DUAS VELAS SEGUINTES EM DIREÇÃO AO


CENTRO DO CANDELABRO DE TREVAS. **

Cântico – Hab 3,2-4.13a.15-19


Deus há de vir para julgar
Erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima (Lc 21,28)

Todos: Jesus Cristo nos amou até o fim e lavou nossos pecados com seu
sangue.

Eu ouvi vossa mensagem, ó Senhor, *


e enchi-me de temor.
Manifestai a vossa obra pelos tempos *
e tornai-a conhecida.
5. Senhor, mesmo na cólera, lembrai-vos * de ter
misericórdia!
Deus virá lá das montanhas de
Temã, * e o Santo, de Farã.

O céu se enche com a sua majestade, *


e a terra, com sua glória.
Seu esplendor é fulgurante como o sol, *
saem raios de suas mãos.

Nelas se oculta o seu poder como num véu, *


seu poder vitorioso.
Para salvar o vosso povo vós saístes, *
para salvar o vosso Ungido.

E lançastes pelo mar vossos cavalos *


no turbilhão das grandes águas.
Ao ouvi-lo estremeceram-me as entranhas *
e tremeram os meus lábios.
A cárie penetrou-me até os ossos, *
e meus passos vacilaram.
Confiante espero o dia da aflição, *
que virá contra o opressor.

Ainda que a figueira não floresça *


nem a vinha dê seus frutos,
a oliveira não dê mais o seu azeite, *
nem os campos, a comida;

mesmo que faltem as ovelhas nos apriscos *


e o gado nos curais:
mesmo assim eu me alegro no Senhor, *
exulto em Deus, meu Salvador!

O meu Deus e meu Senhor é minha força *


e me faz ágil como a corça;
para as alturas me conduz com segurança *
ao cântico de salmos.
Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo. *
Como era no princípio, agora e sempre. Amém.

Todos: Jesus Cristo nos amou até o fim e lavou nossos pecados com seu
sangue.

**APAGAM-SE AS DUAS VELAS SEGUINTES EM DIREÇÃO AO


CENTRO DO CANDELABRO DE TREVAS. **

Salmo 147(147 B)
Restauração de Jerusalém
Vem! Vou mostrar-te a noiva, a esposa do Cordeiro! (Ap
21,9).

Todos: Adoramos, Senhor, vosso madeiro, vossa ressurreição nós


celebramos. A alegria chegou ao mundo inteiro, pela cruz que nós hoje
veneramos.

Padre: Glorifica o Senhor, Jerusalém! *


Ó Sião, canta louvores ao teu Deus!

Todos: Pois reforçou com segurança as tuas portas, *


e os teus filhos em teu seio abençoou;
a paz em teus limites garantiu *
e te dá como alimento a flor do trigo.

Padre: Ele envia suas ordens para a terra, *


e a palavra que ele diz core veloz;
ele faz cair a neve como lã *
e espalha a geada como cinza. –

Todos: Como de pão lança as migalhas do granizo, *


a seu frio as águas ficam congeladas.
Ele envia sua palavra e as derrete, *
sopra o vento e de novo as águas corem.
Padre: Anuncia a Jacó sua palavra, *
seus preceitos e suas leis a Israel.
Nenhum povo recebeu tanto carinho, *
a nenhum outro revelou os seus preceitos.

Todos: Demos glória a Deus Pai Onipotente e a Seu Filho Jesus Cristo, Senhor
nosso, e ao Espírito que habita em nosso peito, pelos séculos dos séculos,
amém.

Todos: Adoramos, Senhor, vosso madeiro, vossa ressurreição nós


celebramos. A alegria chegou ao mundo inteiro, pela cruz que nós hoje
veneramos.

**APAGAM-SE AS DUAS VELAS SEGUINTES EM DIREÇÃO AO


CENTRO DO CANDELABRO DE TREVAS. **

LEITURA BREVE (Is 52,13-15)

Ei-lo, o meu Servo será bem sucedido; sua ascensão será ao mais alto grau.
Assim como muitos ficaram pasmados ao vê-lo – tão desfigurado ele estava
que não parecia ser um homem ou ter aspecto humano – do mesmo modo ele
espalhará sua fama entre os povos. Diante dele os reis se manterão em
silêncio, vendo algo que nunca lhes foi narrado e conhecendo coisas que
jamais ouviram.

Ajoelhemo-nos

Todos: Jesus Cristo se humilhou e se fez obediente, obediente até à morte e


morte de cruz.
BENEDICTUS (Lc 1, 68-79)

*DURANTE O BENEDICTUS APAGAM-SE AS VELAS DO ALTAR.

Todos: Acima de sua cabeça puseram escrito o motivo da culpa e do crime de


Cristo: Jesus Nazareno, o Rei dos judeus.

Bendito † seja o Senhor Deus de Israel, *


que a seu povo visitou e libertou;
e fez surgir um poderoso Salvador *
na casa de Davi, seu servidor,
como falara pela boca de seus santos, *
os profetas desde os tempos mais antigos,
para salvar-nos do poder dos inimigos *
e da mão de todos quantos nos odeiam.
Assim mostrou misericórdia a nossos pais, *
recordando a sua santa Aliança
e o juramento a Abraão, o nosso pai, *
de conceder-nos que, libertos do inimigo,
a ele nós sirvamos sem temor †
em santidade e em justiça diante dele, *
enquanto perdurarem nossos dias.
Serás profeta do Altíssimo, ó menino, †
pois irás andando à frente do Senhor *
para aplainar e preparar os seus caminhos,
anunciando ao seu povo a salvação, *
que está na remissão de seus pecados.
Pelo amor do coração de nosso Deus, *
Sol nascente que nos veio visitar
lá do alto como luz resplandecente *
a iluminar a quantos jazem entre as trevas
e na sombra da morte estão sentados †
e para dirigir os nossos passos, *
guiando-nos no caminho da paz.

Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo. *


Como era no princípio, agora e sempre. Amém.

Todos: Acima de sua cabeça puseram escrito o motivo da culpa e do crime de


Cristo: Jesus Nazareno, o Rei dos judeus.
PRECES

Padre: Adoremos com sincera piedade a Cristo, nosso Redentor, que por nós
sofreu a Paixão e foi sepultado para ressuscitar ao terceiro dia; e peçamos
humildemente:

Senhor, tende piedade de nós!

Cristo, nosso Mestre e Senhor, obediente até à morte por nosso amor,
ensinai-nos a obedecer sempre a vontade do Pai
Senhor, tende piedade de nós!

Cristo, nossa vida, que morrendo na cruz, destruístes o poder da morte e do


inferno,
– ensinai-nos a morrer convosco, para merecermos também ressuscitar
convosco na glória. Senhor, tende piedade de nós!

Cristo, nosso Rei, que fostes desprezado como um verme e humilhado


como a vergonha do gênero humano,
– ensinai-nos a imitar a vossa humildade salvadora. Senhor, tende
piedade de nós!

Cristo, nossa salvação, que destes a vida por amor dos seres humanos, vossos
irmãos e irmãs,
– fazei que nos amemos uns aos outros com a mesma caridade. Senhor, tende
piedade de nós!

Cristo, nosso Salvador, que de braços abertos na cruz quisestes atrair para vós
a humanidade inteira,
– reuni em vosso reino os filhos e as filhas de Deus dispersos pelo mundo.
Senhor, tende piedade de nós!

Pai nosso....
ORAÇÃO

P: Olhai com amor, ó Pai, esta vossa família, pela qual nosso Senhor Jesus
Cristo livremente se entregou às mãos dos inimigos e sofreu o suplício da
cruz. Por nosso Senhor Jesus Cristo, nosso Filho, na unidade do Espírito
Santo.
T: Amém.

O Sacerdote entra na sacristia com a vela que representa o Cristo, toda a Igreja
fica escura, em seguida ele retorna para mostrar que as trevas não vencerão.
Em seguida ele abençoa e despede o povo, dizendo:

P. O Senhor esteja convosco.


T. Ele está no meio de nós.
P. Abençoe-vos Deus todo-poderoso, Pai e Filho † e Espírito Santo.
T: Amém.

Dada a bênção, acrescenta-se:


V. Ide em paz e o Senhor vos acompanhe.
R. Graças a Deus.

Faz-se o strepitus com um pedaço de madeira ou o breviário, significando o


terremoto ocorrido na morte de Jesus. Os demais podem juntar-se ao strepitus
com seus breviários.

APAGA-SE A ÚLTIMA VELA DO CANDELABRO DE TREVAS.


TODOS SAEM EM SILÊNCIO.
RELÓGIO DA PAIXÃO DE NOSSO
SENHOR JESUS CRISTO

24 horas da Paixão de Nosso Senhor com as meditações do livro


“Vida e Paixão do Cordeiro de Deus” da Beata Anna Catarina
Emmerich.
O Relógio da Paixão de Cristo é uma reconstituição dos acontecimentos da
nossa Salvação desde o fim da tarde de hoje até o sepultamento de Jesus.

Em cada hora da sua Paixão, o próprio Cristo nos convida a fazer-Lhe


companhia e a consola-Lo com nosso amor!

9hs – Jesus Lava os Pés de Seus Discípulos

“Jesus, ensinando sobre o lava pés, disse que era uma purificação das faltas
quotidianas, porque os pés, caminhando descuidadamente na terra, se sujavam
continuamente. Esse banho dos pés era espiritual e uma espécie de absolvição.
Pedro, porém, viu nele apenas uma humilhação muito grande para o Mestre; não
sabia que Jesus, para salvá-lo e aos outros homens, se humilharia na manhã
seguinte até a morte de cruz.”

20hs – Jesus na última Ceia – Institui a Santíssima Eucaristia

“Não me lembro de ter visto o Senhor comer as espécies consagradas, a não ser
que eu não reparasse. Dando o Santíssimo Sacramento, deu-se de modo que
parecia sair de si mesmo e derramar-se nos Apóstolos, em uma efusão amor
misericordioso.”

21hs – Jesus Reza no Horto das Oliveiras

“Quando Jesus se afastou dos discípulos, vi em redor dele um largo círculo de


imagens horríveis, o qual se apertava mais e mais. Cresceu-lhe a tristeza e a
tribulação e retirou-se tremendo para dentro da gruta, semelhante ao homem
que, fugindo de uma repentina tempestade, procura abrigo para rezar; vi, porém,
que as imagens assustadores o perseguiram lá dentro da gruta, tornando-se cada
vez mais distintas. A estreita caverna parecia encerrar o horrível espetáculo de
todos os pecados cometidos, desde a primeira queda do homem até ao fim dos
séculos, como também todos os castigos.”
22hs – Jesus Entra em Agonia e Sua Sangue

“A princípio estava Jesus de joelhos, rezando tranquilamente; mais tarde,


porém, se lhe assustou a alma, à vista da atrocidade dos inumeráveis crimes e da
ingratidão dos homens para com Deus; assaltaram-no na angústia e dor tão
veementes, que suplicou tremendo: ‘Meu pai, se for possível: passe este cálice
longe de mim. Meu Pai, tudo vos é possível: afastai este cálice de mim’. Depois
sossegou e disse: ‘Não faça, porém, a minha vontade, mas a vossa’. A sua
vontade e a do Pai eram uma só, mas entregue à fragilidade da natureza humana,
por amor, Jesus tremia à vista da morte.”

23hs – Jesus Recebe o Beijo de Judas, o traidor

“Judas aproximou-se então de Jesus, abraçou e beijou-o dizendo: ‘Deus te salve,


Mestre’. E Jesus disse: ‘Judas, é com um beijo que atraiçoas o Filho do
Homem?’. Então os soldados cercaram Jesus e os oficiais, avançando, puseram
as mãos em Nosso Senhor.”

00hs – Jesus é Preso e conduzido

“Amarraram Jesus de uma maneira cruel, com as mãos sobre o peito, prendendo
sem compaixão o pulso da mão direita por baixo do cotovelo do braço direito,
com cordas novas e duras, que lhe cortavam a carne. Passaram-lhe em volta do
corpo um cinturão largo, no qual havia pontas de ferro e argolas de fibra ou
vime, nas quais amarram-lhe uma espécie de colar, no qual havia pontas e
outros corpos pontiagudos para ferir; desse colar saíam, como uma estola, duas
correias cruzadas sobre o peito até o cinturão, ao qual foram fortemente
apertadas e ligadas. Fixaram ainda, em diversos pontos do cinturão, quatro
cordas compridas, pelas quais podiam arrastar Jesus para lá e para cá, conforme
lhes ditava a maldade. Todas essas correias eram novas e parecias preparadas de
propósito desde que começaram a pensar em prender Jesus.”

1h – Jesus é Conduzido a Anás

“Jesus estava em pé diante de Anás, calado, de cabeça baixa, pálido, cansado,


com as vestes molhadas e enlameadas, as mãos amarradas, seguro com cordas
pelos oficiais. Anás, velho malvado, magro, com pouca barba, cheio de
impertinência e de orgulho farisaico, sorria hipocritamente, como se não
soubesse de nada e se admirasse de ser Jesus o preso que lhe haviam anunciado.
A arenga com que recebeu Jesus, não sei repeti-la com as mesmas palavras, mas
era mais ou menos a seguinte: ‘Olá! Jesus de Nazaré! És tu? Onde estão então
seus discípulos, os teus numerosos adeptos? Onde está teu reino? Parece que
tudo saiu muito diferente do que pensavas! Acabaram agora as injúrias;
esperávamos pacientemente até que estivesse cheia a medida das tuas
blasfêmias, dos teus insultos aos sacerdotes e violações do Sábado. Quem são os
teus discípulos? Onde estão? Agora te calas? Fala, agitador e sedutor do povo!
Já comeste o cordeiro pascal de modo insólito, à hora e em lugar fora de
costume. Queres introduzir uma nova doutrina? Quem te deu o direito de
ensinar? Onde estudaste, fala! Qual é a tua doutrina?”.

2hs – Jesus é Entregue a Caifás

“Caifás, furioso pelos depoimentos contraditórios e a confusão das duas últimas


testemunhas, levantou-se do assento, desceu alguns degraus até estava Jesus, e
disse: ‘Não responder nada a esta acusação?’. Indignou-se, porém, de Jesus não
o olhar; os oficiais puxaram então, pelos cabelos, a cabeça de Nosso Senhor,
para trás e bateram-lhe com os punhos por baixo do queixo. Mas o Senhor não
levantou os olhos. Caifás, porém, estendeu com veemência as mãos e disse em
tom furioso: ‘Conjuro-te pelo Deus vivo, que nos digas se és o Cristo, o
Messias, o Filho de Deus Bendito!’.”

3hs – Jesus é Negado por Pedro

“Fatigado pelas angústias e o medo, tinha-se esquecido da promessa presunçosa


de querer antes morrer do que negar o aviso profético de Jesus; mas à vista do
Mestre, esmagou-o a lembrança do crime que acabava de cometer. Tinha
pecado; pecado contra o Salvador, tão cruelmente tratado, condenado inocente,
sofrendo tão resignado toda a horrível tortura. Como desvairado de contrição,
saiu apressadamente pelo pátio exterior, a cabeça velada e chorando
amargamente; não temia mais ser interrogado; teria então dito a todos quem era
e que pecado se pesava na consciência. ⠀
Quem se atreveria a dizer que em tais perigos, angústias, em tal pavor e
confusão, numa tal luta entre amor e medo, cansado, insone, prestes a perder a
razão pela dor de tantos e tão tristes acontecimentos dessa noite horrível, com
uma natureza tão simples como ardente, quem se atreveria a dizer que, em
iguais condições teria sido mais forte do que Pedro?”
4hs – Jesus é condenado a Morte pelo Sinédrio

“Levantaram-se todos, cobrindo Jesus de escárnio e insultos, chamando-o de


vagabundo, miserável, de obscuro nascimento, que queria ser o Messias e
sentar-se à direita de Deus. Deram ordem aos oficiais de amarrá-lo de novo, pôr
lhe uma cadeia de ferro em redor do pescoço, como aos condenados à morte,
para assim levá-lo ao tribunal de Pilatos.”

5hs – Jesus é conduzido a Pilatos

“Pilatos olhou para Jesus com assombro e disse-lhe: ‘És então o rei dos
judeus?’. Jesus respondeu: ‘Dizeis isso de ti mesmo ou foram outros que te
disseram isto de mim?’. Pilatos, indignado de ver Jesus julgá-lo tolo a ponto de
perguntar espontaneamente a um homem tão pobre e miserável se era rei, disse
em tom desdenhoso: ‘Por acaso sou judeu, para me interessar por tais misérias?
Teu povo e seus sacerdotes entregaram-te a mim, para condenar-te como réu de
crime capital; dize-me, pois, o que fizeste?’. Respondeu-lhe Jesus em tom
solene: ‘O meu reino não é deste mundo; se o meu reino fosse deste mundo, eu
teria servidores, que combateriam por mim, para não me deixar cair nas mãos
dos judeus; mas meu reino não é deste mundo’. Pilatos estremeceu ao ouvir
essas graves palavras de Jesus e disse pensativo: ‘Então és mesmo rei?’. Jesus
respondeu: ‘É como dizes, sou rei. Nasci e vim a este mundo para dar
testemunho da verdade e todo aquele que é da verdade atende à minha voz’.

6hs – Jesus é Desprezado por Herodes

“Proferiram acusações tumultuosamente, logo ao entrarem; Herodes, porém,


olhou com curiosidade para Jesus e quando o viu tão desfigurado e maltratado, o
cabelo desgrenhado, o rosto lacerado e coberto de sangue e imundícies, a túnica
toda suja de lama, esse rei mole e voluptuoso sentiu dó e nojo. Virou o rosto,
com um gesto de nojo, e disse aos sacerdotes: ‘Levai-o daqui, limpai-o; como
podeis trazer à minha presença um homem tão sujo e maltratado?’. Os oficiais
levaram então Jesus ao átrio; trouxeram água numa bacia e um esfregão e
limparam-no cruelmente; pois o rosto estava ferido e passavam o esfregão com
brutalidade.”
7hs – Jesus é devolvido a Pilatos

“Cada vez mais enfurecidos, tornaram os príncipes dos sacerdotes e os inimigos


de Jesus a trazê-lo de novo de Herodes a Pilatos. Estavam envergonhados de não
lhe ter conseguido a condenação e ter de voltar novamente para aquele que já o
tinha declarado inocente. Por isso tomaram na volta outro caminho, cerca de
duas vezes mais longo, para mostrá-lo naquela humilhação em outra parte da
cidade, para poder maltratá-lo tanto mais pelo caminho e dar tempo aos agentes
de instigaram o povo a agir conforme as maquinações tramadas.”

8hs – Jesus é Flagelado

“Nosso Senhor e Salvador, o Filho de Deus, verdadeiro Deus e verdadeiro


homem, contraía-se e torcia-se, como um verme, sob os açoites dos celerados;
ouviam-se os Seus gemidos e lamentos, doces e claros, como uma prece
afetuosa no meio de dores dilacerantes, entre o sibilar e estalar dos açoites
carrascos (…) Os violentos golpes rasgaram todas as contusões do santo corpo
de Jesus; o sangue regou o chão, em redor da coluna, e salpicou os braços dos
carrascos. Jesus gemia, rezava, torcia-se de dor.”

9hs – Jesus é Coroado de Espinhos

“Arrancaram de novo toda a roupa do corpo ferido de Jesus e impuseram-lhe um


manto de soldado, curto, vermelho, velho e já roto, que nem lhe chegava até os
joelhos. Pendiam dele ainda alguns restos de borlas amarelas; jaziam em um
canto do quarto dos verdugos, que costumavam impô-los aos que tinham
açoitado, seja para enxugar lhes o sangue, seja para escarnecê-lo. Arrastaram a
Jesus para a coluna e empurraram-no brutalmente, com o corpo despido e ferido,
sobre o escabelo coberto de pedras e cacos. Depois lhe puseram a coroa de
espinhos na cabeça. Essa tinha dois palmos de altura, era muito espessa e
trançada com arte; em cima tinha uma borda um pouco saliente. Puseram-lhe
com muita força, de modo que formavam uma coroa ou um chapéu.”

10hs – Jesus, Posposto a Barrabás, é Condenado a Morte

“Jesus, ainda vestido do rubro manto irônico, com a coroa de espinhos na


cabeça, as mãos ligadas, foi então conduzido pelos oficiais e soldados que o
cercavam, entre os assobios do povo, para o tribunal, onde o colocaram entre os
dois ladrões. Pilatos, sentado no tribunal, disse mais uma vez, em voz alta, aos
inimigos de Jesus: ‘Eis aí o vosso rei!’. Eles, porém, gritaram: ‘Fora! Morra!
Crucifica-o!’. Pilatos disse: ‘Devo então crucificar o vosso rei?’. Mas os
príncipes dos sacerdotes gritaram: ‘Não temos outro rei senão o César’. Então
Pilatos não disse mais palavra em favor de Jesus, nem mais lhe falou, mas
começou a pronunciar a sentença: ‘Por isso condeno Jesus Nazareno, rei dos
judeus, a ser pregado na cruz!’.”

11hs – Jesus Recebe a Cruz e a Abraça por Nós

“Quando jogaram a cruz no chão, aos pés de Jesus, ele se ajoelhou junto à
mesma e, abraçando-a, beijou-a três vezes, dirigindo ao Pai Celestial, em voz
baixa, uma oração comovente de ação de graças pela redenção do gênero
humano, a qual ia realizar. Como os sacerdotes, entre os pagãos, abraçam um
altar novo, assim abraçou Jesus a cruz, o eterno altar do sacrifício cruento da
expiação. Os carrascos, porém, com um arranco nas cordas, fizeram Jesus ficar
ereto, de joelhos, obrigando-o a carregar penosamente o pesado madeiro ao
ombro direito e com o braço direito segurá-lo, com pouco e cruel auxílio dos
carrascos. Vi anjos ajudando-o invisivelmente, pois sozinho não teria
conseguido suspendê-l; ajoelhava-se, curvado sob o pesado fardo.”

12hs – Jesus é Despojado das Vestes e Crucificado

“Jesus, imagem viva da dor, foi estendido pelos carrascos sobre a cruz; ele
próprio se sentou sobre ela e eles brutalmente o deitaram de costas. Colocaram-
lhe a mão direito sobre o orifício do prego, no braço direito da cruz, e aí lhe
amarraram o braço. Um deles se ajoelhou sobre o Seu santo peito, enquanto
outro lhe segurava a mão, que estava se contraindo, e um terceiro colocou o
cravo grosso e comprido, com a ponta limada, sobre essa mão cheia de benção,
e cravou-a nela, com violentas pancadas de um martelo de ferreiro. Doces e
claros gemidos ouviram-se da boca do Senhor; o sangue sagrado salpicou os
braços dos carrascos; rasgaram-lhe os tendões da mão, os quais foram
arrastados, com o prego triangular, para dentro do estreito orifício. Contei as
marteladas, mas esqueci, na minha dor, esse número. A Santíssima Virgem
gemia baixinho e parecia estar sem sentidos exteriormente; Madalena estava
desvairada.”

13hs – Jesus perdoa o bom ladrão


Dimas diz ao outro ladrão “Nem sequer temes a Deus, tu que sofres o mesmo
suplício? Quanto a nós, fez-se justiça
pois recebemos o castigo que as nossas ações mereciam,
mas Ele nada praticou de condenável”.
E acrescentou: “Jesus, lembra-Te de mim quando estiveres no teu reino”.
Ele respondeu-lhe: “Em verdade te digo: Hoje estarás Comigo no Paraíso”.

14hs – Jesus nos Deixa Maria por Mãe

“Assim não é de admirar que Jesus, dirigindo-se à Santíssima Virgem, não


dissesse ‘Mãe’, mas ‘mulher’; pois que ela ali estava na sua dignidade de mulher
que devia esmagar a cabeça da serpente, naquela hora em que aquela promessa
se realizava, pelo sacrifício do Filho do Homem, seu próprio filho. Não era de
admirar lá que Jesus desse João por filho àquela a quem o Anjo saudava: ‘Ave
Maria, cheia de graça’, porque o nome de João significa ‘graça’, pois todos são
o que os respectivos nomes significam e João tornara-se filho de Deus e Jesus
Cristo vivia nele. Percebia-se que Jesus, naquele momento, dava com aquela
palavras uma mãe, Maria, a todos que, como João, o recebem e, crendo nele, se
tornam filhos de Deus, que não foram nascidos do sangue, nem da vontade da
carne, nem da vontade do homem, mas do próprio Deus.”

15hs – Jesus Morre na Cruz

“Tendo chegado a hora da agonia, Nosso Senhor lutou com a morte e um suor
frio cobriu-lhe os membros. João estava sob a cruz e enxugou lhe os pés com o
sudário. Madalena, esmagada pela dor, encostava-se à cruz no lado de trás. A
Santíssima Virgem estava entre a cruz do bom ladrão e a de Jesus, amparada
pelos braços de Maria de Cléofas e Salomé, olhando para o Filho, que lutava
com a morte. Então disse Jesus: ‘Tudo está consumado!’ e, levantando a cabeça,
exclamou em alta voz: ‘Meu Pai, em vossas mãos entrego o meu espírito”. Foi
um grito doce e forte, que penetrou o Céu e a terra; depois inclinou a cabeça e
expirou.”

16hs – Jesus é Transpassado Pela Lança

“A Santíssima Virgem e os outros, cujos olhos estavam sempre fixos no


Salvador, viram a súbita ação do oficial com grande angústia e acompanharam o
golpe da lança com um grito de dor, precipitando-se para a cruz. Maria caiu nos
braços das amigas, como se a lança lhe tivesse atravessado o próprio coração e
sentisse o ferro cortante atravessá-lo de lado a lado.”

17hs – Jesus é Descido da Cruz

“(…) Foi, pois, e tirou o corpo de Jesus. Acompanhou-o Nicodemos (aquele que
anteriormente fora de noite ter com Jesus), levando umas cem libras de uma
mistura de mirra e aloés. Tomaram o corpo de Jesus e envolveram-no em panos
com os aromas, como os judeus costumam sepultar.” (Jo 19, 38-40)

18hs – Jesus é Sepultado

“No lugar em que ele foi crucificado havia um jardim, e no jardim um sepulcro
novo, em que ninguém ainda fora depositado. Foi ali que depositaram Jesus por
causa da Preparação dos judeus e da proximidade do túmulo.” (Jo 19, 41-42)
PREPARAÇÃO PARA A
CONFISSÃO

Sacramento da Penitência
Para uma boa Confissão:
1. Fazer bem o exame de consciência.
2. Estar sinceramente arrependido dos pecados cometidos que tanto ofenderam a
Deus.
3. Ter o firme propósito de não mais pecar.
4. Confessar os próprios pecados junto do confessor dizendo-os com toda a
sinceridade, clareza e objetividade. Falar quantas vezes cometeu o pecado. Não
esconder nenhum pecado mortal.
5. Não contar histórias ou pecados dos outros.
6. Reparar o mal que se fez cumprindo a penitência o que o confessor indicar.

Uma confissão não tem valor se:


1. Se omite voluntariamente algum pecado grave e o
número de vezes que se cometeu.
2. Se não se estiver arrependido do pecado cometido.
3. Se não existir o propósito de mudança de vida.
4. Se não se quiser cumprir a penitência imposta.

Afinal, o que é pecado?


O pecado é um ato consciente, voluntário e livre que ofende o coração de Deus,
enfraquece o pecador no seu seguimento de Jesus. Expressa nossa falta de amor
a Deus e ao próximo. É uma falta contra a razão, à verdade e a reta consciência.

Para que seja pecado é preciso que haja:


 Liberdade: nada me obriga a fazer isso;
 Conhecimento: eu sei que isso é pecado;
 Consentimento: mesmo assim eu quero fazê-lo;
 Ato: eu faço.

Proposta de Exame de Consciência


É bom encontrar um lugar silencioso, calmo, que favoreça a reflexão, a análise
de si mesmo, o recolhimento. Uma vez na presença de Deus, o exame de
consciência deve começar com a invocação do Espírito Santo, pois só Ele é
capaz de nos dar os frutos esperados do exame, a perfeita contrição dos nossos
pecados e a conversão. Em seguida é bom fazer um ato de humildade, ou seja, é
preciso assumir uma atitude de reconhecimento e aceitação de nossas faltas. A
melhor maneira de alcançar a contrição, o arrependimento e a conversão é o
confronto da vida com a Palavra de Deus e a paixão de Cristo, prova máxima do
seu amor para conosco. Jesus morreu para nos salvar, e é na sua paixão que se
manifesta o ápice da misericórdia do Pai. Dessa forma, o exame de consciência
deve ser o confronto de nossos atos com algumas balizas da nossa fé, por
exemplo: as bem - aventuranças, os mandamentos da Lei de Deus, os
mandamentos da Igreja, etc.

Exame de Consciência

Oração Preparatória:
Em nome do Pai + e do Filho + e do Espírito Santo. Amém.

Vinde Espírito Santo, enchei os corações...

Meu Deus e Senhor vou receber agora o santo Sacramento da Penitência.


Ajudai-me para isso com o auxílio de vossa graça; porque nada posso sem vós.
Enviai-me o Espírito Santo, para que conheça bem o número e a gravidade de
meus pecados, e sinceramente deles me arrependa e faça um firme propósito de
não pecar mais. Assisti-me com a vossa graça, para que confesse sinceramente
os meus pecados e não esconda nada do que devo dizer. Dai-me força para me
emendar verdadeiramente. Amém.
Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por mim, pobre pecador, para que faça uma
boa confissão e alcance o perdão de todos os meus pecados.
Jesus, Maria, José, esclarecei-me, socorrei-me, salvai-me. Amém.
Santo Anjo da Guarda e todos os Anjos e Santos de Deus, rogai por mim nesta
hora. Amém.
Pai Nosso..., Ave Maria..., Glória ao Pai...

Perguntas para ajudar no Exame de Consciência:

Exame inicial
Há quanto tempo não me confesso? Escondi, conscientemente, algum pecado
grave em alguma confissão precedente? Confessei o melhor que me lembro, o
número de vezes que cometi cada pecado grave? Confessei com clareza os meus
pecados ou fui demasiado genérico? Cumpri a penitência que me foi imposta
pelo sacerdote? Reparei as injustiças que cometi? Comunguei alguma vez em
pecado mortal? Respeitei sempre o jejum eucarístico de uma hora antes da
comunhão? Estou verdadeiramente arrependido dos meus pecados e luto para
não os voltar a cometer?

1º Mandamento: Adorar a Deus e amá-Lo sobre todas as coisas.


Duvidei voluntariamente da existência de Deus Pai, Filho e Espírito Santo?
Acreditei apenas num ser supremo? Revoltei-me contra Deus nos meus
sofrimentos? Deixei-me levar pelo desespero? Duvidei da bondade ou da
onipotência de Deus? Tive ódio de Deus? Esperei alcançar o Céu sem querer
abandonar o pecado? Esperei alcançar o Céu confiando apenas nos meus
esforços, esquecendo-me que sem a graça de Deus é impossível perseverar no
bem? Cometi pecados no intuito de confessá-los mais tarde, abusando assim da
Misericórdia de Deus? Tenho posto em dúvida ou negado, deliberadamente,
alguma verdade revelada por Deus e como tal ensinada pela Igreja? Tenho
rezado diariamente com atenção e devoção? Frequentei os sacramentos de má
vontade? Leio e medito, com frequência, na Palavra de Deus? Procuro
esclarecer-me e formar-me na fé com a ajuda do Catecismo da Igreja Católica?
Defendi, por exemplo, que podemos nos confessar diretamente a Deus, ou que o
“casamento” civil entre batizados é aceitável em certos casos, ou ainda que
todas as religiões são iguais? Li alguma coisa, ouvi alguma música, ou vi algum
programa contra Deus, contra a Igreja ou contra os bons costumes? Recebi
indignamente algum sacramento? Faltei ao respeito das coisas santas, por
exemplo, conversando ou brincando dentro da igreja, vindo indecentemente
vestido para a igreja, ou omitindo a genuflexão sempre que passo diante do
Santíssimo Sacramento? Coloquei a minha vontade, as minhas ideias, o
dinheiro, o trabalho, os divertimentos, o prazer, a fama, o poder ou alguma coisa
criada em primeiro lugar na minha vida? Adorei a Satanás? Invoquei Satanás?
Usei coisas, li textos, ou ouvi músicas que invocam explicitamente o demônio?
Sou supersticioso? Pratiquei a magia, o espiritismo, fui à bruxa, a médiuns, ou a
curandeiros? Pratiquei a adivinhação através da astrologia, do jogo do copo, do
pêndulo, das cartas do tarôt, da leitura da palma da mão ou coisas semelhantes a
estas? Acreditei em horóscopos? Usei amuletos como a ferradura, o corno, as
figas, os cristais ou coisas semelhantes? Acreditei nas “energias”, nas ideias do
Nova Era, na reencarnação, no Reiki, ou em coisas semelhantes a estas?

2º Mandamento: Não invocar o Santo Nome de Deus em vão.


Blasfemei ou falei sem respeito contra Deus, contra os Santos ou contra as
coisas santas? Falei mal da Igreja, do Papa, dos Bispos ou dos Padres?
Pronunciei levianamente o Nome de Deus, de Jesus, de Maria ou de algum
santo, por exemplo, em anedotas ou piadas? Achei graça a tais piadas? Jurei
sabendo que era falso o que prometia? Jurei fazer alguma coisa injusta ou
ilícita? Roguei pragas a alguém? Deixei de cumprir algum voto ou promessa que
tenha feito a Deus ou a algum santo?

3º Mandamento: Santificar os domingos e festas de guarda.


Faltei à Missa ao domingo ou em algum dia santo? Cheguei tarde à Missa por
culpa própria? Trabalhei ou mandei trabalhar nesses dias sem grave
necessidade? Dediquei, nesses dias, mais tempo a Deus, à família, aos pobres,
aos doentes e ao descanso?

4º Mandamento: Honrar pai e mãe e os outros legítimos superiores.


Obedeci aos meus pais enquanto estive sob a sua tutela? Manifesto-lhes o
devido amor, gratidão e respeito? Ajudo-os espiritual e materialmente?
Entristeci-os com as minhas atitudes, palavras ou comportamentos? Abandonei-
os na velhice ou na doença? Tenho rezado por eles? Zanguei-me com os meus
irmãos? Maltratei-os? Tenho transmitido a fé aos meus filhos? Atrasei o seu
batismo, ou a sua primeira comunhão? Tenho-me empenhado na sua educação?
Defendo-os do pecado? Dei-lhes maus exemplos? Corrigi com firmeza e
paciência os seus defeitos? Fui amável com os estranhos e, ao contrário, pouco
amável com os de casa? Usei palavras duras com o meu esposo(a)? Evitei as
discussões diante dos filhos mais pequenos? Perdoo ao meu esposo(a) das suas
falhas? Faltei-lhe de algum modo ao respeito? Ajudo, dentro das minhas
possibilidades, os meus familiares nas suas necessidades espirituais ou
materiais? Obedeço à Igreja, ou discuto os seus preceitos? Guardei a abstinência
de carne nas sextas-feiras ao longo do ano? Guardei o jejum e a abstinência na
quarta-feira de cinzas e sexta-feira santa? Confessei os meus pecados graves,
pelo menos, uma vez por ano? Comunguei, pelo menos, uma vez por ano por
altura da Páscoa da Ressurreição? Tenho contribuído para as necessidades da
Igreja, segundo as minhas possibilidades, através do Dízimo e ofertas? Obedeci
ao Papa, ao meu Bispo e ao meu Pároco? Obedeci às leis justas das autoridades
civis?

5º Mandamento: Não matar nem causar outro dano no corpo ou na alma a


si mesmo ou ao próximo.
Causei algum prejuízo ao próximo com palavras ou com obras? Desejei-lhe
mal? Agredi alguém? Insultei alguém? Deixei-me levar pela ira? Alimentei
pensamentos de vingança? Guardo, no coração, ódio ou rancor contra alguém?
Alimento ressentimentos? Perdoei sinceramente as ofensas que recebi? Deixei
de falar ou nego a saudação a alguém? Cheguei a ferir ou a tirar a vida ao
próximo? Colaborei, de algum modo, em atos que ocasionassem a morte de um
inocente? Pratiquei, aconselhei ou facilitei o crime gravíssimo do aborto?
Defendi o aborto? Fui gravemente imprudente na condução de veículos
motorizados pondo em risco a minha vida e a dos outros? Cometi algum
atentado contra a minha vida? Alimento pensamentos de suicídio? Embriaguei-
me ou, levado pela gula, comi mais do que devia? Usei drogas? Preocupei-me
eficazmente pelo bem do próximo, advertindo-o de algum perigo material ou
espiritual, em que se encontrava? Escandalizei o próximo, incitando-o a pecar,
com as minhas conversas, o meu modo de vestir, ou convidando-o a praticar
alguma má ação? Visto-me com decência ou sou sensual e provocante? Procurei
reparar o mal que causei pelo escândalo?

6º Mandamento: Guardar castidade nas palavras e nas obras. 9º


Mandamento: Guardar castidade nos pensamentos e nos desejos.
Consenti em pensamentos ou desejos contra a castidade? Fixei o olhar, falei ou
li coisas sensuais ou obscenas? Vi pornografia? Procurei o prazer sexual por si
mesmo, fora do ato conjugal? Tive liberdades no namoro? Respeitei o corpo da
minha namorada(o)? Pequei contra a castidade por atos? Sozinho (masturbação)
ou acompanhado (adultério, fornicação, com pessoas do mesmo sexo)? Havia
alguma circunstância - de parentesco, matrimônio, consagração a Deus, ou
menoridade - que tornassem ainda mais grave aquela ação? Vivo maritalmente
com alguém com a qual não estou casado pela Igreja? Permiti situações que me
colocaram numa situação próxima de pecado? Tenho em conta que expor-me a
essas ocasiões já é pecado? Antes de assistir a um filme ou de ler um livro
procuro informar-me sobre a sua classificação moral? Usei do matrimônio
indevidamente procurando o prazer sexual fora do ato conjugal? Neguei ao meu
cônjuge os seus direitos? Tive intenção de tornar o ato conjugal voluntariamente
infecundo praticando assim a contracepção? Tomei a pílula, usei o preservativo,
ou o dispositivo intrauterino, laqueei as trompas, ou interrompi o ato conjugal
para evitar ter filhos? Aconselhei ou defendi a contracepção? Usei do
matrimônio somente naqueles dias em que julgo não poder haver descendência
sem ter razões graves? Faltei à fidelidade conjugal por pensamentos ou por
ações? Mantenho amizades que são ocasião habitual do pecado de infidelidade?
Estou disposto(a) a abandoná-las?

7º Mandamento: Não furtar nem injustamente reter ou danificar os bens do


próximo. 10º Mandamento: Não cobiçar as coisas alheias.
Roubei algum objeto ou alguma quantia em dinheiro? Tive inveja dos outros?
Cobicei as coisas alheias? Paguei aos empregados os salários devidos pelo seu
trabalho? Paguei os impostos? Trabalhei com empenho as horas que devia, ou
desperdicei tempo? Abusei da confiança dos meus superiores? Prejudiquei o
Estado, por exemplo, abusando do seguro desemprego ou da baixa médica?
Desrespeitei os direitos de autor, copiando livros, software, filmes ou músicas,
contra a vontade do autor? Devolvi ao respectivo dono coisas emprestadas ou
que tenha encontrado? Aproveitei-me injustamente da desgraça alheia?
Prejudiquei, de algum modo, o próximo nos seus bens? Enganei o próximo
cobrando mais do que o valor justo combinado, ou alterando a quantidade ou
qualidade dos bens ou dos serviços prestados? Reparei todas as injustiças que
cometi o melhor que pude? Tolerei abusos ou injustiças que tinha obrigação de
impedir? Fiz acepção de pessoas ou manifestei favoritismos? Gastei mais do que
permitem as minhas possibilidades? Desperdicei dinheiro no jogo ou em outras
coisas desnecessárias ou supérfluas? Trato com cuidado das minhas coisas ou,
por desleixo, deixo-as estragarem-se? Sei aceitar, com espírito cristão, a falta de
coisas necessárias ou, nesses momentos, deixo-me vencer pela murmuração e
pela revolta?

8º Mandamento: Não levantar falsos testemunhos nem de qualquer outro


modo faltar à verdade ou difamar o próximo.
Disse mentiras? Minto habitualmente com a desculpa de que se tratar de
mentiras que não prejudicam ninguém? Fiz juízos falsos ou temerários? Copiei
nos exames? Revelei, sem motivo justo, defeitos graves alheios que, embora
sejam reais, não são conhecidos pelos outros? Caluniei, atribuindo ao próximo
defeitos que não eram verdadeiros? Já reparei os males que causei com a
difamação? Disse mal dos outros baseando-me apenas nas coisas que ouço por
aí? Colaborei, nas minhas conversas, na calúnia, na difamação ou na
murmuração? Semeei discórdias, inimizades ou falsas suspeitas com as minhas
palavras? Exagerei os defeitos do próximo? Gosto de ouvir falar mal dos outros?
Caio com facilidade na crítica?

Exame dos 7 pecados capitais


1. Soberba
Fui humilde ao pensar, comparei-me com outros, tratei de chamar a atenção com
minha sabedoria, meu físico, etc.? Reconheço-me pequeno? Desprezo os outros
em meu coração? Me ressenti pelo trato ou posto recebido? Qual é a motivação
das minhas aspirações?
Distingo entre o que é doutrina e o que é minha opinião? Sou prudente ao dar
minha opinião? Acredito que é a única? Acredito que sem minha presença as
coisas não vão bem? Sei distinguir o que é minha missão ou me intrometo no
que não me corresponde?
Reconheço que não tenho razão de me glorificar, mas sim em Cristo? De que
forma minhas ações estão misturadas com orgulho, vaidade e egoísmo?
Reconheço os meus enganos e peço perdão? Posso ajudar sem mandar?

2. Avareza
Estou apegado às coisas? Sacrifico tempo, dinheiro, para servir segundo o plano
de Deus? Jogo com o dinheiro com a ambição de ganhar mais?

3. Luxúria
Tenho consumido conteúdo pornográfico pela internet ou por outros meios?
Tenho buscado prazer pessoal com a masturbação? Tenho tido pensamentos
impuros em relação às outras pessoas? Uso roupas provocativas/sensuais? Faço
o uso de substâncias que tiram o meu autodomínio e o meu pudor?

4. Ira
Sei lidar com as cruzes, doenças, com problemas nas relações, no trabalho, etc.?
Perco a paz ou manifesto mau humor quando as coisas não estão como eu
espero? Jogo a culpa nas minhas circunstâncias e nunca assumo os meus
próprios erros?

5 . Gula
Como mais do que o necessário? Faço jejum? Estou viciado em álcool ou
drogas?

6. Inveja
Sinto ciúmes por talentos ou conquistas dos outros, ou me alegro quando eles
melhoram? Busco ajudar os outros em suas necessidades ou me fecho em meu
egoísmo?

7. Preguiça
Sou atento a cumprir meus deveres? O que faço para edificar a minha
família/comunidade? Sou rápido em servir mesmo que não tenho vontade?
“Descanso” mais do que necessário? Deixo sempre as coisas para mais tarde?

A CONFISSÃO

Tendo feito um profundo exame de consciência, é bom elencar por escrito ou


mentalmente os pecados cometidos e deles se arrepender com sinceridade. Só
então, chegou a hora de procurar o padre ao qual você irá confessar-se.

SAUDAÇÃO INICIAL: Como toda celebração, também a confissão tem início


com a saudação trinitária e a informação ao padre de quando foi a sua última
confissão, ou seja, há quanto tempo você não se confessa, e qual o seu estado
de vida religioso (solteiro(a), casado(a), padre, irmão(ã) consagrado(a).

ACUSAÇÃO: É o momento em que você vai dizer ao padre os pecados


cometidos e sua intensidade (número de vezes). Pode iniciar dizendo: Padre,
dai-me a vossa benção, estou aqui porque pequei e estes são os meus
pecados...

ACONSELHAMENTO: O padre, se achar necessário, aconselhará você a


respeito de como progredir na vida cristã e a vencer determinados pecados.

ATO DE CONTRIÇÃO: “Meu Deus, eu estou muito arrependido(a) de ter


pecado, pois ofendi a vós, fiz mal a mim mesmo(a) e ao meu próximo. Mas,
prometo esforçar -me e, com a ajuda de vossa graça, não mais pecar ”
Ou
“Criador e Redentor meu, por serdes vós quem sois, sumamente Bom e digno
de ser amado sobre todas as coisas, e porque vos amo e estimo, pesa -me,
Senhor, por vos ter ofendido; pesa-me, também, por ter perdido o céu e
merecido o inferno, mas, proponho, firmemente, com o auxílio da vossa divina
graça, e pela poderosa intercessão de Vossa Mãe Santíssima, emendar-me e
nunca mais Vos tornar a ofender. Espero alcançar o perdão das minhas culpas,
por vossa infinita misericórdia. Amém!”

PENITÊNCIA: Após o ato de contrição, o padre lhe proporá um exercício que


demonstre sua gratidão pelo perdão e sua disposição para uma vida nova.

ABSOLVIÇÃO: Em seguida, impondo -lhe as mãos, rezará a seguinte fórmula


de absolvição: “Deus, Pai de misericórdia, que, pela Morte e Ressurreição
de seu Filho, reconciliou o mundo consigo e enviou o Espírito Santo para
remissão dos pecados, te conceda, pelo ministério da Igreja, o perdão e a
paz. E eu te absolvo dos teus pecados, em nome do Pai e do Filho e do
Espírito Santo. ”

Vá em Paz, o Senhor te perdoou!

Rezar o Salmo 31(32)

Feliz o homem que foi perdoado e cuja falta já foi encoberta!


Feliz o homem a quem o Senhor não olha mais como sendo culpado, e em cuja
alma não há falsidade!
Enquanto eu silenciei meu pecado, dentro de mim definhavam meus ossos e eu
gemia por dias inteiros, porque sentia pesar sobre mim a vossa mão, ó Senhor,
noite e dia; e minhas forças estavam fugindo, tal como a seiva da planta no
estio.
Eu confessei, afinal, meu pecado, e minha falta vos fiz conhecer.
Disse: ‘Eu irei confessar meu pecado!’ E perdoastes, Senhor, minha falta.
Todo fiel pode, assim, invocar-vos, durante o tempo da angústia e aflição,
porque, ainda que irrompam as águas, não poderão atingi-lo jamais.
Sois para mim proteção e refúgio; na minha angústia me haveis de salvar, e
envolvereis a minha alma no gozo da salvação que me vem só de vós.
‘Vou instruir-te e te dar um conselho; vou te dar um conselho a seguir, e sobre ti
pousarei os meus olhos:
Não queiras ser semelhante ao cavalo, ou ao jumento, animais sem razão; eles
precisam de freio e cabresto para domar e amansar seus impulsos,
pois de outro modo não chegam a ti’.
Muito sofrer é a parte dos ímpios; mas quem confia em Deus, o Senhor, é
envolvido por graça e perdão.
Regozijai-vos, ó justos, em Deus, e no Senhor exultai de alegria! Corações retos,
cantai jubilosos!
Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo.
Como era no princípio, agora e sempre. Amém.

Oração à Maria Santíssima


Santíssima Virgem Maria, rainha do céu! Tive a desgraça de cair em pecado,
mas me arrependi e recebi o perdão no santo Sacramento da Penitência. Venho
humildemente a vós, ó minha Santíssima Mãe, para vos agradecer, de todo o
meu coração, por me haverdes ajudado e alcançado de Jesus o perdão de todas
as minhas culpas. De novo me consagro ao vosso serviço. Lembrai-vos, ó minha
doce Mãe, de que tornei a ser vosso filho; tende compaixão de mim e recebei-
me de novo debaixo de vossa maternal proteção. Em vós ponho, depois de
Jesus, toda minha confiança e espero que não me abandonareis, como mereço.
Pois ainda estou exposto ao perigo de tornar a ofender o vosso divino Filho,
meu Senhor Jesus Cristo, a quem só quero amar até o último suspiro. Os meus
inimigos não dormem, as tentações me hão de perseguir de novo, por toda a
parte. Protegei-me, Rainha gloriosa do céu, defendei-me, ó minha boa Mãe,
socorrei-me contra os ataques do inferno, ó Virgem Imaculada! Preservai-me da
desgraça imensa de perder a minha alma e ao meu Deus; pois é essa a graça que
vos peço, ó Maria, e espero poder alcançá-la pela vossa piedosa intercessão.
Amém.
Ó Maria, concebida sem pecado, rogai por nós, que recorremos a vós!

Após, um profundo Exame de Consciência e estando sinceramente arrependido,


anote seus pecados para não esquecer! (trazer esta colinha na confissão)
Na hora da confissão diga:
Padre, dai-me a vossa benção, pois eu pequei. Faz _______ (meses/anos) da
minha última confissão. Sou (casado na igreja, solteiro, viúvo-a)
Estes são os meus pecados: (Dizer o número de vezes e o pecado que cometeu:

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Meu Pai e meu Deus, reconheço com muita dor que pequei! Eu Vos ofendi, ó
Meu Redentor, e mereci os vossos castigos. Por Maria, minha e vossa Mãe,
declaro que não quero pecar mais. Por Ela, eu Vos peço perdão. Amém.
Após, um profundo Exame de Consciência e estando sinceramente arrependido,
anote seus pecados para não esquecer! (trazer esta colinha na confissão)

Na hora da confissão diga:


Padre, dai-me a vossa benção, pois eu pequei. Faz _______ (meses/anos) da
minha última confissão. Sou (casado na igreja, solteiro, viúvo-a)
Estes são os meus pecados: (Dizer o número de vezes e o pecado que cometeu:

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Meu Pai e meu Deus, reconheço com muita dor que pequei! Eu Vos ofendi, ó
Meu Redentor, e mereci os vossos castigos. Por Maria, minha e vossa Mãe,
declaro que não quero pecar mais. Por Ela, eu Vos peço perdão. Amém.
JANEIRO
NO ANO 2024
DO NASCIMENTO DE NSJC

ORGANIZAÇÃO E DIAGRAMAÇÃO
PE. FREDERICO DE JESUS LOPES

CAPA
MARINA LOPES

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