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A POÉTICA DA MATERIALIDADE
E DA TEMPORALIDADE
Aurora Carapinha
Universidade de Évora
2
Aurora Carapinha, O Jardim - Fundação Calouste Gulbenkian, F.C.G., Lisboa 2006.
p. 84.
3
Idem.
4
Cf. António Borges de Coelho, Portugal na Espanha árabe, Geografia e Cultura, l°vol.,
Lisboa, Editorial Caminho, Lisboa, 1989, p. 254; Camilo Pessanha, Clepsidra, Edições
Ática, Lisboa, 1956, pp. 97-98; Vinicius de Moraes, Antologia Poética, Edições Dom
Quixote, Lisboa, 2001, p. 242.
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3
Marguerite Yourcenar, O Tempo esse Grande Escultor, Difel, Lisboa, 1983, p. 50. Num
outro documento, que acompanha o programa, intitulado Esquema de Constituição, na
alínea que enuncia os Estudos Complementares, é expresso mais uma vez esta forte
intenção do desenho ser determinado pelo movimento pois prevê-se a elaboração de
estudos sobre a Evolução do Parque; crescimento e evolução no decorrer das estações.
Cf. Aurora Carapinha, O Jardim - Fundação Calouste Gulbenkian, F.C.G., Lisboa
2006. p. 86.
6
Para uma melhor contextualização desta I geração de Arquitectos paisagistas veja-se:
o
10 Idem, p. 93.
1 1
Aurora Carapinha, Da Essência do Jardim Português, 2 vols. Dissertação apresentada à
Universidade de Évora para a obtenção do grau de doutor no ramo de Artes e Técnicas da
Paisagem, Especialidade de Arquitectura c Arte dos Jardins, Évora, 1995 (policopiado).
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1 2
Citado por Aurora Carapinha, O Jardim - Fundação Calouste Gulbenkian, F.C.G.,
Lisboa 2006. p. 146.
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torno desta água que pensa. O desenho com água é criteriosamente pro-
jectado: ocupa a clareira, pontua o interior das orlas. A água, em movi-
mento ou parada, em conjunto com o sistema vegetal que se lhe associa,
apresenta-se pela capacidade reflectora que possui, como a matéria subtil
que tudo pode revelar. As suaves películas de água, "os olhos do jardim"
que repousam delicadamente na interioridade dos altos fustes ou na sua
exterioridade, aprofundam, duplicam e invertem cada uma dos espaços
onde se encontram. Transfigurando-os em luminosidade e imagem reflec-
tida. Também a bruma artificial que dos altos fustes desce - e que orvalha
e retempera a vegetação - esfuma e retracte a luz metálica.
Cada espécie, arbórea, arbustiva e herbácea plantada, corresponde a
uma realidade ecológica precisa, determinada pela morfologia do terreno;
cada espécie proposta pertence à nossa flora silvestre, ou pelo carácter
universalista da nossa cultura, pertence à flora que o nosso devir cultural
tomou como nossa. Todas elas se encontram no seu devido lugar. Nada é
gratuito, ou supérfluo. Tudo é tudo. Tudo é ser e estar.
A luz, a agua, a vegetação autóctone, a morfologia do terreno, a fau-
na aquática, as aves, o movimento e a vivência foram os elementos fortes
do desenho. Tudo se relaciona com o topus e com a sua dimensão natural
e cultural.
Todo o jardim é desenhado a partir da provocação que a fisicidade
dos elementos naturais despertam nos nossos sentidos. Luz, matéria e
tempos são os protogonistas na definição de cada uma das ambiências
que se projectaram para o espaço.
A fisicidade da água e da luz transformam-se em céu na terra, a
riqueza ecológica, que a presença da água sempre determina, sublima-se
em qualidade ambiental, ecológica e paisagística do espaço onde se inse-
re, a vegetação e a luz constroem lugares de recato, quietação e de socia-
bilidade.
Tendo como ponto de partida a relação emotiva que se estabelece
com a natureza concebeu-se uma paisagem real, um espaço, presente, e
como tal visível e sensível que oferece à percepção a sua transitoriedade,
a sua dinâmica própria, o seu desígnio de vida e de morte, a sua lógica de
funcionamento, de construção e de transformação inter-relacionai entre os
sistemas, que a configuram, e o Homem.
O Jardim Gulbenkian é o Lugar onde se constrói e concentra a este-
ticidade difusa imanente da paisagem de que nos fala Rosario Assunto.
Para além do espaço que é, ele é sobretudo um lugar de muitas oportuni-
dades, ocasiões, estados, condições e situações resultantes de uma relação
com a Natureza. Ele é um estímulo da própria Natureza, onde cada um de
nós se reconhece e identifica.
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ABSTRACT