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Eneida
Nascido de pai ignorado, muito cedo arrancado do colo materno, sem brasões nem glórias. José é um gato
malhado, branco e preto, como é comum aos torcedores do Botafogo.
Entrou para a minha família, da qual é hoje um dos membros mais ilustres. Vivemos um para o outro, se assim
posso dizer.
Em certos momentos, chego a temê-lo. Por que me olhará assim, com os olhos azuis agora, amarelo depois, muito
verdes em certos momentos, olhos que lembram os meus passados distantes, naqueles em que eu era ainda
sonhadora e visionária? Por que me olha assim José, horas a fio, sem se mexer, sem pestanejar, como se estivesse
me passando a limpo, me aprendendo de cor? O que quererá dizer esse olhar profundo que acompanha nos
menores gestos? Estarei sendo aplaudida, criticada, ou simplesmente apenas amada? José, seu comportamento,
suas ações, sua maneira de encarar a vida, dá para um volume e isto é uma crônica. Ora, crônica é conversa
rápida, peça jornalística, ou literária que deve ser curta, pelo que vou direta às azeitonas.
A primeira vez que José viu uma azeitona, ela estava inteira.
Dei-lhe porque sua presença, no momento em que me alimento, exige participações. A azeitona caiu no chão, fugiu,
correu e José atrás dela. Naturalmente conseguiu afinal prendê-la, porque José, como já disse, é de minha família:
teimoso, persistente, corajoso. Logo que conseguiu a presa, provou-a, abandonou-a Uma conquista nem sempre
vale a pena ser guardada, foi com certeza o que pensou.
Agora, a funcionária da casa, que exerce também as funções de cozinheira - é ótima -, preparou um prato no qual
entravam azeitonas partidas, sem caroço. Ora, uma azeitona , assim, deixa de ter o interesse inicial, torna-se um
ingrediente qualquer, um tempero, uma coisa que perdeu sua origem, digamos mesmo: uma azeitona sem caroço é
um simulacro de azeitona. Desejei ver o que pensaria José daquele fruto que perseguiu um dia; como iria julgá-la
agora que não podia correr, fugir? Dei-lhe pedaços de azeitona do referido prato, cujo nome não sei, porque não é
minha especialidade conhecer nomes de comidas.
José provou as fatias do fruto da oliveira (tentei em vão fugir deste pernosticismo) e gostou. Desde o primeiro
momento, com o primeiro pedaço comido, olhou-me em êxtase. Senti que para seu paladar muito exigente (cada
um com sua personalidade e José tem a sua bem forte), a azeitona estava sendo considerada delícia. Fiquei
observando suas reações.
Comeu, comeu, e à medida que comia tornava-se tão feliz, que, terminando o que havia no prato, teve a mais linda
demonstração de alegria: virou as patinhas para o alto, deitou-se de costas e agitou-se num contentamento total.
José descobriu, num almoço, o sabor das azeitonas. Não sei se percebeu que aquelas fatias eram daquele caroço
vestido que perseguiu uma vez.
a) torcedor do Botafogo
b)sem "pedigree"
e)sonhador e visionário
33 - Assinale a passagem que comprova a resposta ao item anterior
b) "... com olhos azuis agora, amarelo depois, muito verdes em certos momentos..."
34 - Para a autora, José não é um gato qualquer. Assinale a passagem que não o comprova.
b) à perspicácia do gato.
c) à sua perspicácia
a) petrificada
b) sendo aplaudida
c) desnudada
d) sendo criticada
e) sendo amada
a) perscrutadora e inquietantemente
b) rápida e desconfiadamente
d) percuciente e maldosamente
e) insistente e depreciativamente
a) a história de um gato
42 - "A azeitona caiu no chão, correu de José atrás dela", com a certeza de que era:
c) um novelo de lã
d) um petisco
e) um brinquedo