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Nº 6 - 2022
Teófilo Otoni - Minas Gerais
ISSN 2448-2102
Diretoria Executiva
Presidente: Íris Soriano Nunes Miglio
Vice-Presidente: Munira Molaib
Secretário Geral: Wilson Colares da Costa
Secretária Adjunta: Elisa Augusta de Andrade Farina
Tesoureiro Geral: Eduardo Amorim Silva
Tesoureiro Adjunto: Ricardo Peixoto Maia
Diretor de Comunicação: Antonio Jorge de Lima Gomes
Oradora: Dulcina Regina Ribeiro Molina
Presidente de Honra: Gilberto Ottoni Porto
Conselho Deliberativo
Agnes Ruschid Tolentino, Eder Detrez Silva, Elvira Schuffner Cadah,
Leônidas Conceição Barroso e Wallace Gomes Moraes
Comissão de Admissão
Fany Moreira, Jair Duarte Pêgo Junior e Rivani Lopes Negreiros
Imagem da capa: Gravura da artista plástica Yara Tupynambá, em homenagem ao colono; exposta
em placa de aço escovado no saguão de entrada da Câmara Municipal de Teófilo Otoni; a placa
contempla ainda um poema de Ozorio Couto. A homenagem foi patrocinada pelos irmãos Geraldo
Magela Hermógenes da Silva e Sebastião Hermógenes da Silva.
Os conceitos emitidos nos textos desta edição são de inteira responsabilidade dos autores e não representam,
necessariamente, a opinião do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri.
Os direitos autorais foram cedidos para esta edição.
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Sumário
Apresentação - Íris Soriano Nunes Miglio...................................................................................05
Independência! Podemos comemorá-la? - Gilberto Ottoni Porto................................................07
Primeiras estradas de penetração entre os vales do Mucuri e baixo Jequitinhonha -
Adevaldo Rodrigues de Souza.....................................................................................................09
Grupo Folclórico Pastorinhas da Paz: histórias de fé e memórias do Vale do Mucuri -
Sandra Helena Barroso................................................................................................................13
Vinte anos da Academia de Letras de Teófilo Otoni - Antônio Jorge de Lima Gomes................22
A última edição do “O Liberal” - Humberto Luiz Salustiano Costa............................................33
Maria José: Companheira e Mestra - Gilberto Ottoni Porto........................................................39
O Colégio Tiradentes de Teófilo Otoni - Petrônio Dantas Vieira.................................................43
O legado de Hilda Ottoni Porto Ramos (Didinha) para a cidade de Teófilo Otoni -
Magali M. A. Barroso..................................................................................................................45
Proveitosas Aulas de Latim... Sobre Dom Waldemar Chaves de Araújo, marcante
Bispo da Diocese de Teófilo Otoni - João Bosco de Castro.........................................................49
Jubileu do Bom Jesus do Matosinho. A grande festividade da Diocese de Guanhães -
Dilton Maria Pinto - Gilson Mateus Soares................................................................................51
Pioneiros pela fé - Edineia Felix..................................................................................................55
História da Diocese de Almenara Igreja discípula e missionária a serviço do Reino de
Deus, celebrando seus 40 anos de caminhada - Pe. Cláudio Eduardo Cordeiro.........................59
Biografia de Padre Giovanni Battista Lisa - Joana Alves Louback.............................................62
Paulistas e criminosos fugidos à justiça”: a história da Revolta do Serro do Frio, 1718 a 1720 -
Danilo Arnaldo Briskievicz..........................................................................................................68
Colégio Normal Santa Clara: Um marco e centro de referencia na educação da região -
Wallace Gomes Moraes...............................................................................................................82
Luiz Leal: probidade e ternura - Regina Ribeiro Molina.............................................................93
Desbravando o Vale do Mucuri: o carro que chegou em Ataléia antes da estrada -
Adão Alves Teixeira.....................................................................................................................97
Composição histórica: o município de Teófilo Otoni e derivados - José Moutinho dos Santos.. 105
O grande desafio dos Maxakali (Tikmũ’ũn) - Adevaldo Rodrigues de Souza.............................109
Estrada de Ferro Bahia e Minas: Verdades Históricas - Oldair Ferreira Motta - Erika Pereira Sulz....118
As materialidades da Estrada de Ferro Bahia-Minas no município de Teófilo Otoni: entre a
degradação e o esquecimento - Sérgio Lana Morais...................................................................124
Análises microbiológicas, físico-químicas e toxicológicas com avaliação de risco à saúde
humana na captação de amostras de água na zona rural de um município do Vale do Mucuri
(Itambacuri-MG) - Mayra Soares Santos e outros.......................................................................132
Preservando um capítulo da história do Vale do Mucuri: O resgate da memória de magistrados
que atuaram em Teófilo Otoni - Isabella Dias Almeida - Lívia Guedes Dias - Renzzo Giaccomo
Ronchi..........................................................................................................................................141
De São Jorge a Nova Módica: história, fé, poesia - Julizar Dantas.............................................148
Jequibay: saberes sobre o uso de plantas para fins medicinais do povo Pankararu Pataxó a
partir de múltiplas linguagens - Nehewane Pankararu Braz e outros..........................................155
A saga de Frei Serafim de Gorizia e Frei Angelo de Sassoferato a caminho de Itambacuri -
Wallace Gomes Moraes...............................................................................................................161
Um escritor que nem precisava de livros - Eugênio Maria Gomes.............................................171
Das Selvas do Mucuri até Filadélfia - Arquétipos Histórico - Antropológicos - Gladiston Vieira dos Santos.. 173
A magnífica comemoração do primeiro centenário de Teófilo Otoni - Íris Soriano Nunes Miglio.177
O centenário de Teófilo Otoni: Comemoração com brilhantismo pela Prefeitura e Câmara Municipal..178
Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri - Histórico, patronos e quadro social......................185
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“Arrisquei um cento de vezes a minha vida, arruinei a minha saúde e sacrifiquei os
meus interesses. Foi mister sujeitar-me ao agro viver nas mais inóspitas brenhas. Era
somente a cada ano, quando volvia ao Rio de Janeiro, que eu avaliava o insano da
luta em que estava empenhado. Então, comparando as doçuras do lar doméstico com
a vida agreste das selvas, confesso que me arrependia do passo temerário que havia
dado. Mas, de volta ao Mucuri, a imaginação predominava, e por entre os espinhos via
somente flores”
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Apresentação
Sempre procurando levar a você, apreciador da história do vale do Mucuri, in-
formações sobre relevantes acontecimentos que pavimentaram a vida e o seu progresso, o
Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri – IHGMucuri – apresenta, nesta sexta revista,
28 artigos elaborados por seus sócios e devotados amigos.
É sempre enriquecedor ler maravilhosos trabalhos que refletem o espírito de
grandeza de queridos colaboradores ao doar conhecimentos, dedicando parte de suas vi-
das, para que fatos históricos deste belo vale sejam sempre relembrados, e despertem, em
todos nós, um justo sentimento de pertencimento à sua terra, berço acolhedor dos filhos
naturais ou adotivos, como também, de muitos de seus ancestrais, que aqui viveram,
trabalhando, procurando ser felizes e vitoriosos.
Considerada uma jóia de raro valor, reproduzimos um artigo do então jornal Folha
de Minas, de 1953, que descreve com raro brilho, como foram magníficos os eventos aqui
realizados para comemorar o primeiro centenário de fundação de Teófilo Otoni.
Breve estaremos comemorando os 170 anos daquele 7 de setembro de 1853,
quando centenas de brasileiros, vindos do norte de Minas, acorreram ao pequeno povoado,
plantado no seio da Mata Atlântica, para presenciarem seu nascedouro, batizado com a
belíssima palavra de origem grega, Filadélfia, e escolhido por ser a cidade americana, no
ideário republicano, símbolo da liberdade e amor fraterno. Estamos longe daquele tempo!
Importante rememorar e trazer à tona, toda a saga que foi a construção do pro-
gresso da região, dos municípios que emergiram do antigo município de Filadélfia, com
repetidos festejos, incluindo uma edição da Revista nº 7, com artigos alusivos à data.
Outrossim, vale lembrar, que desde a fundação da nossa cidade, esses primei-
ros povoadores, vindos do Jequitinhonha influenciaram a vida e o desenvolvimento da
nossa região. Sua história, as lutas que travaram pela sua sobrevivência em momentos de
crise, trazem explicações para seu deslocamento para o vale do Mucuri.
Estudos que tratam de seus fatos históricos importam, sobretudo para compre-
endermos a repercussão que tiveram em nosso destino.
Assim, nesta revista, o prezado leitor, vai encontrar trabalhos, frutos de sérias
pesquisas, tanto sobre o vale do Mucuri – geografia, estradas, os indígenas, primeiros
povoadores de Filadélfia , informações sobre a flora, recursos naturais: a água, municí-
pios emancipados, poder judiciário, sistema educacional, música, folclore, traços biográ-
ficos de personalidades que deixaram marcas na vida da comunidade - como também,
do vizinho Jequitinhonha, representados pelos artigos: A Revolta do Serro Frio – 1718 a
1720, Primeiras estradas de penetração entre os vales do Mucuri e baixo Jequitinhonha,
considerando que tais estudos constituem valiosos elementos que permitem muitos
esclarecimentos sobre as ocorrências nos primórdios de Filadélfia.
Vale também ressaltar, que as comemorações importantes para nosso Vale, re-
ceberam registros referenciais às datas. Os vinte anos da colenda Academia de Letras
de Teófilo Otoni. Valorosa instituição, com importantes e contínuos trabalhos em prol da
difusão da língua e literatura para nossa gente. O artigo 200 Anos do Sete de Setembro
que marcou a Independência do Brasil, com a opinião de Teófilo Benedito Ottoni sobre
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“quem são os verdadeiros heróis”, da gloriosa data.
Por fim, do fundo do coração, queremos deixar aqui registrada nossa sincera
gratidão a todos que cooperaram para a realização desta revista, nos enviando seus va-
lorosos artigos, contribuindo assim com a missão primordial do IHGMucuri, de levar
para nossos contemporâneos mais conhecimentos sobre a história do vale do Mucuri.
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Independência! Podemos comemorá-la?
Gilberto Ottoni Porto*
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“Queriam-me, e dizem que querem, aclamar Imperador. Protesto a Vossa Majes-
tade que nunca serei perjuro, que nunca lhe serei falso; e que eles farão esta loucu-
ra, mas será depois de eu e todos os portugueses estarmos feitos em postas, o que
juro a Vossa Majestade escrevendo nesta com meu próprio sangue estas palavras:
Juro sempre ser fiel a Vossa Majestade, à nação e à constituição portuguesa”.
Continua Teófilo Benedito Ottoni: “Se Sua Alteza guardava o Brasil era unica-
mente a título de depósito, determinado a entrar com ele no inventário da herança paterna.”
Nesse ano de eleições, mais que nunca, precisamos estar alertas para eleger
representantes do povo, realmente comprometidos com a nação, com os mais sofridos e
necessitados. Eleger presidente, governadores, deputados e senadores que tenham voca-
ção para servir e não para se servirem.
O povo precisa ser devidamente orientado, instruído e organizado, para partici-
par de partidos políticos que tenham programas realmente adequados às suas necessida-
des. Esses partidos são os maiores responsáveis pela qualidade e representatividade dos
eleitos, pois são eles que têm as melhores condições para selecionar pessoas realmente
dignas, preparadas e com ficha limpa, para disputar as eleições. Se temos verdadeiros
bandidos no Legislativo e Executivo, a responsabilidade pela má escolha não pode ser
imputada apenas ao povo, que tem pouca condição numa campanha, com tempo reduzido
e cheia de desinformação, para conhecer realmente os candidatos já previamente escolhi-
dos pelos partidos.
Infelizmente, o nosso sistema democrático com a Constituição Cidadã, está se-
riamente ameaçado. Milícias do ódio, espalhando inverdades, valorizando a violência, a
tortura e o desrespeito às instituições, estão cada vez mais ativas. É preciso combatê-las
com as armas da verdade, do diálogo sereno e racional, da união e do entendimento.
Assim fazendo, seremos dignos de comemorar os 200 anos da nossa indepen-
dência, ainda inconclusa, mas fortalecida pela participação do povo, que realmente legi-
tima todo o processo, e não deve permitir que uma elite egoísta, preconceituosa e racista
se fortaleça pela omissão dos comodistas e alienados.
*Engenheiro Civil e Sanitarista, sócio fundador e Presidente de Honra do Instituto Histórico e Geográfico do
Mucuri.
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Primeiras estradas de penetração entre os vales do
Mucuri e baixo Jequitinhonha
Adevaldo Rodrigues de Souza*
PRIMÓRDIOS
Um dos grandes sonhos de Teófilo Benedito Ottoni era o de criar outro meio de
comunicação entre o vale do Mucuri e o do Jequitinhonha, pois o único existente era atra-
vés de Capelinha até Filadélfia. O engenheiro Miguel de Teive Argolo – responsável pela
construção da Estrada de Ferro Bahia e Minas – também imaginou construir uma estrada de
pedestre que partisse do km 210 – entre as estações de Mayrink e Urucu – até São Miguel,
atual cidade do Jequitinhonha. A ligação entre essas regiões só foi concretizada por inicia-
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tiva dos moradores de São Miguel do Jequitinhonha, que em 1902 abriram um caminho de
pedestres saindo de Quartéis, atual Joaíma, e seguindo a embocadura do rio Pampã com
o rio Mucuri até a altura da cachoeira dos Caboclos a 31 km de Urucu e finalmente o seu
destino final – povoado de Urucu, atual Carlos Chagas. Ela foi empreitada a Ico Fagundes,
que teve como auxiliar Louis-Jean Joseph Blanc – agrimensor francês residente em Teófilo
Otoni que executou a planta da estrada.
Posteriormente, o governo estadual tomou paternidade desse caminho de pedestres
com proposta de melhoramentos. Em 1906 foi liberada a primeira quota de subversão e os
serviços de inspeção foram confiados ao agrimensor João Bley Filho. Os trabalhos de aber-
tura foram iniciados da estação de Urucu e margeando o rio Mucuri por 31 km até alcançar
a embocadura do rio Pampã e, seguindo sua margem direita até quase da nascente desse rio.
Depois desceu a serra do Tomba Virou para penetrar na bacia do Jequitinhonha, com per-
curso total de 180 km. Quando os trabalhos da estrada estavam no km 110 João Brey Filho
foi substituído pelo engenheiro Alfredo de Oliveira Graça, que acompanhou os trabalhos até
sua conclusão. No trajeto da estrada surgiram as pontes sobre os rios: Negro, São Miguel,
Anta Podre e no Córrego Água Quente.
Foram supervisores da estrada Domingos Luiz Machado, que, após sua morte, foi
substituído por Vicente Calmon de Almeida. A estrada chegou ao povoado de Bom Jesus
do Rio Negro em setembro de 1907, sendo, na ocasião, rezada uma missa por Frei Patrício
Mejer da Província de Nossa Senhora de Teófilo Otoni, data considerada como nascimento
da atual cidade de Crisólita. A estrada prosseguiu até chegar ao povoado de Tomba Virou
(Fronteira dos Vales) e, em dezembro de 1909 alcançou o povoado de Quartéis. Daí con-
tinuou até atingir São Miguel do Jequitinhonha, em 1910, totalizando quatro anos para ser
concluída, com um número que variava de 40 a 100 trabalhadores nas diversas modalidades.
Posteriormente, ao longo dessa estrada surgiram os povoados de: Rio Negro (Crisólita) –
1907; Águas Belas (Águas Formosas) – 1914 e São Pedro (distrito de Umburatiba) – 1915.
A estrada entre Urucu e São Miguel foi tão importante para a população dos vales
dos rios Pampã, Negro e Umburanas como a estrada Santa Clara foi para a região de Teófilo
Otoni, pois permitiu a integração do baixo Jequitinhonha com a Estrada de Ferro Bahia e
Minas, tornando as trocas de mercadorias mais favoráveis. Ela foi construída para passagem
de pedestres e tropas, entretanto, em 1938, foi percorrida de Joaíma até Carlos Chagas pelo
coronel Lídio Araújo – pai do cantor Eduardo Araújo – em um carro Ford, despertando a
curiosidade das pessoas por onde passava. A foto a seguir mostra a chegada triunfal em
Carlos Chagas, onde o feitor da aventura é mostrado no detalhe.
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ESTRADA ENTRE RIO NEGRO E TEÓFILO OTONI
Até 1914 o meio de comunicação e negócios entre Rio Negro e Teófilo Otoni era
feito pela estrada de pedestres de Rio Negro até Urucu (Extensão de 102 km e construída
em 1907) e depois pela Estrada de Ferro Bahia e Minas até a estação de trem de Teófilo
Otoni. Os mercadores utilizavam bastante esse trajeto, entretanto necessitavam de uma
estrada mais curta para facilitar e reduzir os custos do transporte de mercadorias.
Chefiados por Aristides Nunes Pereira os moradores do povoado de Rio Negro
e adjacências iniciaram a construção de uma estrada, direto desse povoado até Teófilo
Otoni. Ela começou a uma distância de 6 km da confluência dos rios Negro com Pampã.
Depois em direção ao rio Mucuri transpôs a cachoeira “Alemoas” e alcançou o córrego
“Jacaré” até o povoamento de São Miguel do Pita. Daí ela seguiu até a antiga Colônia São
Jacinto para atingir Teófilo Otoni.
A estrada de Rio Negro até Teófilo foi iniciada em 1913 e concluída em 1914. O
custo de sua construção ficou a cargo do empresário Aristides Nunes Pereira com alguma
colaboração da Câmara Municipal de Teófilo Otoni.
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REFERÊNCIAS
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Grupo Folclórico Pastorinhas da Paz: histórias de
fé e memórias do Vale do Mucuri/MG
Sandra Helena Barroso*
Resumo
Permitam-me ousar escrever o pouco que sei sobre o Grupo Folclórico Pastorinhas da
Paz, do vale do Mucuri. Grupo esse, composto por mulheres e homens que nos convidam
a engendrar pelos caminhos constitutivos da fé.O objetivo é refletir sobre o Grupo Folcló-
rico Pastorinhas da Paz, numa perspectiva teológica. As Pastorinhas da Paz construíram
histórias de fé que guardam na memória do vale do Mucuri.
Palavras-Chave: Memória. Teologia. Grupos Religiosos. Folclore.
Introdução
“Felizes aqueles que fazem parte dessa jornada”.
(Durvalino dos Santos Costa).
1
Dom Quirino Adolfo Schmitz nasceu em Gaspar (SC) a 22 de novembro de 1918, filho de João José Schmitz
e Catarina Moser Schmitz. Foi para a Igreja de Teófilo Otoni e região, anunciando o Reino de Deus. (Catedral,
Semanário Litúrgico Catequético. Teófilo Otoni, 22/11/1998).
13
Grupo composto por mulheres e homens com idade superior a 60 anos. Utilizam de ins-
trumentos musicais, como pandeiro, violão e sanfona em suas apresentações. Possuem
vestimentas próprias nas cores branca e vermelha. São pessoas que construíram entre elas
laços de amizade. Sendo assim tornaram-se uma família de fé. “A esperança e a fé em
Deus sempre acompanharam minha caminhada no grupo”. (VERMEULE, 2016, p.27).
O GRUPO FOLCLÒRICO...
Foi então que procurei pela Tida (Erotides Quintal) para conversarmos sobre o destino
do Grupo Pastorinhas da Paz e da vontade já expressada pela minha mãe, para que ela
assumisse a coordenação. Isto feito, ela convocou as outras pessoas já indicadas pela
minha mãe e todos foram unânimes na confirmação: O Grupo de Pastorinhas da Paz
vai continuar. Passei para Tida tudo que minha mãe havia deixado que se relacionas-
se com as Pastorinhas e ofereci meu apoio, que já existia mesmo antes do falecimento
dela. No entanto, agora, teria que ser mais efetivo. Fui acolhida pelo Grupo com mui-
ta alegria e carinho. Fiquei sendo uma espécie de apoiadora faz-tudo: agenda, ofícios,
reuniões, decisões. Foi criada uma Associação, pois precisávamos de nos transfor-
mar em pessoa jurídica para conseguir algum apoio oficial. Fui escolhida para presi-
dir esta Associação e ao longo destes anos, temos tentado melhorar o que já temos e
incentivando, convidando novas pessoas a participarem”.(BARROSO, 2016, p.18).
14
Tendo por base o depoimento da senhora Helena Guedes, com relação à conti-
nuidade do grupo, é notável a unanimidade de todos os envolvidos no processo decisório.
A coragem, a determinação, a atitude, o amor e a fé são requisitos básicos para que algo
de bom aconteça. Nesse sentido, o grupo continuou e continua...
A perseverança faz com que grupos folclóricos, vençam as barreiras das novas
e vastas opções culturais, ou não, que a sociedade atualmente oferece. “Os pastoris se
cantam ainda em vários Estados do Norte, mas em plena decadência, e, em pouco tempo,
deles só restarão lembranças”. Almeida (1980 apud CASCUDO,1980). Corroborando
com o autor, o declínio dos pastoris é uma realidade, mas, ainda existem pessoas que
lutam para amenizar esse quadro.
Com relação ao estado das Minas Gerais, alguns pastoris permanecem, com
dificuldades, como o próprio grupo das Pastorinhas da Paz, de Teófilo Otoni. Em alguns
municípios mineiros, mesmo precariamente, grupos de pastorinhas sobrevivem. Outros
renascem e atuam, como é o caso das Pastorinhas da Comunidade Quilombola de Pi-
nhões, Santa Luzia e região.
Pastorinhas, Pastoril, Auto do Presépio, diz respeito aos “cantos, louvações,
loas2, entoadas diante do presépio na noite do Natal, aguardando-se a missa da meia
noite”. “Representavam a visita dos pastores ao estábulo de Belém, ofertas, louvores,
pedidos de benção. ” (CASCUDO, 1980, p. 588).
Almeida (1980 apud CASCUDO, 1980)relata que,
2
Portugal possui o Auto do Presépio, gênero típico registrado por Rodney Gallop (Portugal, 180, Cambridge,
1936). “Loas das Lapinhas”, cantadas na Ilha da Madeira. (Luis Chaves, Páginas Folclóricas, 144). Citado por
Cascudo, Luis da Câmara. Dicionário do folclore brasileiro. São Paulo: Melhoramentos, 1980, p.588.
15
lho. Como instrumentos musicais, levam a sanfona, o violão, o triângulo e o pandeiro.
As pastoras cantam e fazem leve coreografia com seus pandeiros.As Pastorinhas da Paz
possuemo objetivo de levar a paz e alegria aos lares, por meio de cânticos, nas noites
natalinas. As Pastorinhas da Paz têm em seu repertório musical, melodias que retratam o
nascimento do menino Jesus. Canções de entrada, permanência e saída do local visitado.
A letra da música abaixo, se refere ao canto de saída. Ou seja, quando o grupo se despede
da casa que foi visitada.
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Vó Rita... Assim era chamada a fundadora do Grupo Folclórico Pastorinhas da
Paz. Venceu muitos obstáculos na sua trajetória de vida, mas, conseguiu realizar um so-
nho, ser pastorinha e convidar novos integrantes para também ingressarem nessa congre-
gação. Grupo formado por pessoas maduras, de ambos os sexos, e a maioria com idade
superior a 60 anos. Construir histórias que ajudam na edificação de uma cidade, indepen-
de da idade, requer atitude e “Vó Rita” teve. O tempo passou, mas o Grupo Folclórico
Pastorinhas da Paz continuou. Sendo assim, a família das pastoras e pastores da paz, se
comprometeram em serem peregrinos da fé, assim como fizeram os personagens bíblicos,
Maria e José.
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Figura 4 : Vó Belinha, uma das primeiras integrantes do Grupo das Pastorinhas.
Ao pronunciar ‘Maria(s) e José (s) ” ,do Mucuri, nos remete a história bíblica
de uma mulher e de um homem que ajudaram a edificar histórias. Maria e José foram
guiados pela fé que professavam, e assim, contribuíram para que houvesse um ontem,
um hoje e um amanhã. Na educação de seu filho Jesus, mostraram que tudo que é feito
com dedicação fica na memória. Hoje, nas igrejas católicas, nos rituais de comunhão
é repetido o que na época fez Jesus Cristo:“Fazei isso em minha memória”. (BÍBLIA
SAGRADA,1990,p.1472).
Reportando para os dias atuais, os componentes do Grupo Folclórico Pastorinhas
da Paz, são guiados pela fé que professam. Por este viés pode-se dizer que também fizeram
e fazem tudo em memória de Jesus Cristo. Cada participante do grupo também possui suas
histórias:Maria Jovelina Pereira (Vó Belinha), uma das primeiras integrantes do grupo e ami-
ga de Vó Rita, Erotides Quintal, Juverlina Costa Barbosa, Sebastiana Vermeule, Francisca da
Silva Dutra, Geraldo Pereira da Cruz, Maria das Graças Ferreira da Cruz, Dalva Chácara Sa-
les, Neroite Colen Gomes, Terezinha do Rosário Lopes Marques, Elídio Gomes Rocha, Luiz
Antônio Blank de Freitas, João Edez Borges de Souza, Maria Francisca Nunes,Durvalino dos
Santos Costa, Maria Elizabette de Souza, Maria Júlia Brandão Siqueira.
Todos os componentes do grupo, supracitados, não são apenas um nome a mais,
para compor uma listagem.São pessoas dignas que trazem inscritas em seus olhos, (aqui
considerado, reflexo da alma) muitas histórias, que, com certeza ficarão guardados na me-
mória. Afinal, não é apenas um grupo folclórico, pois “acabamos nos transformando em
uma família das Pastorinhas da Paz”. (SIQUEIRA, 2015, p. 53).Família essa que ajudou
a fazer história. Os componentes da família das Pastorinhas da Paz vieram de Guiricema,
Malacacheta, Francisco Sá, Águas Formosas, Itambacuri, Teófilo Otoni, Espírito Santo,
Novo Cruzeiro, Valão (Distrito de Poté), Campanário, Comercinho. E assim construíram
a história do Vale do Mucuri, porque cada integrante dessa família cristã, veio com sua
bagagem histórica, construindo-se no tempo e no espaço. Lembra-nos muito dos vagões
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de uma locomotiva, cada vagão puxa o outro, formando uma composição harmônica. Nos
“vagões” da vida, pode-se dizer que o Grupo das Pastorinhas da Paz ergueu uma família
de peregrinos da fé. Por falar em fé, como vive-la nos tempos de hoje? É possível?
Antes de falar de Deus, o teólogo fala com Deus: a teologia nasce da pre-
ce! É no falar-se-com-Deus que emerge o falar-se-de-Deus. Á base do ato te-
ológico está o encontro com o Deus vivo e santo em comunhão de amor,
que resulta em escuta e entrega ao Mistério Maior. (MATOS, 2011, p.22).
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Por sua vez, teologia vem para mostrar alamedas para que o homem se oriente
em busca da sua realização espiritual. Por esse viés, ao observar o Grupo Folclórico
Pastorinhas da Paz, nota-se que os integrantes do grupo são pessoas espiritualizadas. São
mulheres e homens de fé. Conhecem Deus por meio das orações e cânticos que louvam
o menino Jesus nos presépios natalinos. Também se comprometem com os integrantes
do grupo e com a Comunidade. Revelam-se a Deus, por meio de suas ações espirituais
e humanas. E Deus a eles também se revela. A revelação de Deus no âmbito teológico e
pela bíblia se dá por meio do acontecimento em Cristo.
Segundo Moing (2008, p. 581),
Considerações Finais
O Grupo Folclórico Pastorinhas da Paz, do vale do Mucuri, nos traz belas recorda-
ções. São tantas histórias que se tornam um convite a engendrar pelos caminhos
que as pessoas constroem em nome da fé. O Grupo Folclórico Pastorinhas da Paz,
pode ser visto sob uma perspectiva teológica, uma vez que nele se encontram de-
talhes de religiosidade, como os pastores muito citados em passagens bíblicas. As
Pastorinhas da Paz durante sua trajetória construíram histórias de fé que guardam
na memória do vale do Mucuri.
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Referências
BARROSO, Sandra Helena. Vó Rita e algumas histórias: as pastorinhas da paz. Belo Horizonte: Gráfica O
Lutador, 2016.
CATEDRAL. Semanário Litúrgico Catequético. Teófilo Otoni, 22 de novembro de 1998.
CASCUDO, Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 5. Ed. São Paulo: Melhoramentos, 1980. p. 588-589.
COSTA, Durvalino dos Santos. Entrevista: Durvalino dos Santos, 2015. Entrevista concedida a MARTINS,
Minie; BARROSO, Sandra Helena. Teófilo Otoni, 2015. (Inédito).
KONINGS, Johan. Ser cristão: fé e prática. Petrópolis: Vozes, 2011.
LIBANIO, João. Eu creio, nós cremos: tratado da fé. São Paulo: Edições Loyola, 2004.
MATOS, Henrique Cristiano José. Estudar teologia: iniciação e método. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.
MOING, Joseph. O homem que vinha de Deus. São Paulo: Edições Loyola, 2008.
SIQUEIRA, Maria Júlia Brandão. Entrevista: Maria Júlia Brandão Siqueira, 2015. Entrevista concedida a
MARTINS, Minie; BARROSO, Sandra Helena. Teófilo Otoni, 2015. (Inédito).
STORNIOLO, Ivo; BALANCIN, Euclides Martins. Bíblia sagrada. Ed. pastoral. São Paulo: Paulinas, 1990.
p. 1472.
*Mestra em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Sócia Efetiva do
Instituto Histórico e Geográfico do Vale do Mucuri. Membro Titular da Academia de Letras de Teófilo Otoni.
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Vinte anos da Academia de Letras de Teófilo Otoni
(2002-2022)
Antônio Jorge de Lima Gomes*
1.Introdução
A Academia de Letras de Teófilo Otoni (ALTO) foi fundada oficialmente em 20
de dezembro de 2002 sendo composta por 30 membros titulares e efetivos. No entanto,
os primeiros movimentos para sua criação surgiram em agosto de 2002, numa reunião da
Diretoria do Automóvel Clube de Teófilo Otoni.
Foi justamente a Diretoria do Automóvel Clube que, no decorrer de 2002, reu-
niu um grupo de pessoas para planejar as comemorações do cinquentenário da Sede So-
cial daquela instituição. A intenção era reunir os talentos artísticos da cidade, envolvendo
literatura, música, artes plásticas, teatro e afins, no sentido de dar visibilidade ao prédio
sede e sobretudo ao próprio Automóvel Clube.
Após várias reuniões e com o apoio e persistência de um grande número de
participantes, foi amadurecendo a criação da Academia de Letras de Teófilo Otoni, do
Clube de Veículos Antigos “Perdidos no Tempo” e da empresa particular ZAFT Comuni-
cação que passou a trazer peças teatrais regularmente para a cidade através do programa
“Grandes espetáculos”, que foi implantado pelo próprio Automóvel Clube, utilizando-se
o salão nobre e o salão do restaurante do próprio Clube (CERQUEIRA, 2005).
Foi um trabalho incessante, convidando pessoas envolvidas com literatura, es-
critores, poetas, jornalistas e historiadores, no sentido de se organizar e regulamentar a
criação da ALTO. O grupo inicial contou com a coordenação da professora Amenaide
Bandeira Rodrigues, que criou uma comissão formada pelos principais representantes
das diversas vertentes culturais da cidade.
A primeira sessão oficial ocorreu no dia 29 de novembro de 2002 na sede do Au-
tomóvel Clube, já sob o comando de Amenaide Bandeira Rodrigues, que foi a primeira
presidente da Academia de Letras e já contou com a presença de 18 membros titulares.
Esta seção foi denominada Café-com-Letras.
Com este forte apoio houve acordo para se realizar imediatamente o registro
de criação da ALTO, que aconteceu alguns dias depois, em 20 de dezembro de 2002 no
Cartório Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Teófilo Otoni, e que contou com uma
sessão solene no Salão do Automóvel Clube, com a presença de todos os membros, tra-
jados a rigor, na qual, foi realizada a cerimônia de posse dos acadêmicos.
A partir da criação oficial, as reuniões passaram a ser realizadas no Automóvel
Clube de Teófilo Otoni, recebendo amparo total da Diretoria que apoiava a causa, ceden-
do o espaço daquela entidade para as sessões e deliberações.
No ano seguinte à criação, a ALTO foi reconhecida como instituição de Utilida-
de Pública Municipal por meio da Lei 5.188 de 02 de setembro de 2003. Posteriormente
teve o reconhecimento do Estado, como sendo de Utilidade Pública Estadual pela Lei
16.267 de 18 de julho de 2006.
Com o reconhecimento público da importância da Academia de Letras, ocorreu
22
expressivo apoio do Poder Público Municipal, fazendo com que as sessões literárias fos-
sem realizadas, em sua maioria, nos fins de semana, na Câmara Municipal, localizada na
Praça Tiradentes, no centro da cidade de Teófilo Otoni.
2. Os símbolos
Na figura (1) apresentamos o selo da ALTO, sendo este, a chancela oficial da
Academia de Letras em forma de pirâmide, com uma pena do lado esquerdo do vértice.
Todo o conjunto é circundado por um círculo picotado. Trata-se do carimbo seco destina-
do a dar cunho oficial, como chancela que rubrica os documentos oficiais da ALTO.
23
Figura 2 – Brasão da Academia de Letras de Teófilo Otoni.
3. O Estatuto Democrático
Desde a criação, a ALTO estabeleceu um estatuto próprio e um regulamento
interno, para nortear suas ações e gestão, sempre no sentido de democratizar e congre-
gar pessoas que estejam inseridas em atividades literárias e artísticas, apoiando as mais
diversas formas de expressão da arte, ciências e cultura, subsidiariamente respeitando a
legislação brasileira pertinente.
No artigo quinto do estatuto fica estabelecido que no desenvolvimento de suas
atividades, a entidade não fará qualquer tipo de discriminação com relação a cor, etnia,
sexo, condição social ou financeira, concepção religiosa ou filosófica, orientação política
ou qualquer outra condição.
No regimento interno estão delineados os meios para cumprir com suas finalida-
des, com as seguintes atividades: reuniões ordinárias, extraordinárias, solenes e especiais,
programa editorial de que constará a publicação da revista literária “Café-com-Letras”;
do jornal lítero cultural “Pensando ALTO” e demais publicações oficiais, a manutenção
do sítio eletrônico: www.letrasto.com, a expansão da Biblioteca Dona Didinha e do Nú-
cleo de Documentação de Literatura, bem como a realização de premiações, concursos,
ciclos de estudos, comemorações cívicas, culturais e outras atividades congêneres.
4. Os Objetivos
A entidade já nasceu com os seguintes objetivos: congregar pessoas que se dedi-
quem às atividades literárias e artísticas nas mais diversas formas de expressão; realizar
estudos e pesquisas na área da literatura local e regional; promover e incentivar a cultura
através da realização de conferências, exposições, concursos, cursos e outras atividades
de natureza cultural; propagar o culto, o estudo, a exaltação e a divulgação da vida e obra
de personagens históricas e figuras literárias que ajudaram a construir a grandeza do mu-
nicípio e região; coletar, pesquisar, elaborar e divulgar estudos e informações de cunho
cultural, relacionados aos interesses da entidade, e, por fim, promover o aprimoramento
da língua pátria nos seus aspectos científico, histórico e artístico.
24
5. Os Membros Fundadores
Desde sua fundação foram previstas 30 cadeiras para membros efetivos; cada
uma é designada numericamente e tem um patrono imutável, em homenagem a persona-
lidades que tenham se notabilizado nas letras, nas ciências, nas artes, na política, na edu-
cação e/ou na imprensa. A ALTO conta com um quadro social de membros honorários,
beneméritos, convidados de honra e membros correspondentes.
A seguir apresentamos todos os membros fundadores:
Amenaide Bandeira Rodrigues
Angélica Feitosa dos Santos
Antônio Lopes Chácara
Dulcina Regina Ribeiro Molina
Elane Tomich Buchmann
Elisa Augusta de Andrade Farina
Flávia Luisa Barbosa Pinheiro
Hilda Ottoni Porto Ramos
Isaura Caminhas Fasciani
João Batista Vieira de Souza
José Geraldo Silva
Leuson Francisco da Cruz
Luiz Alberto Bassoli
Maria Laura Pereira da Silva Couy
Neusa Ferreira Sena
Ricardo Lopes Marques Junior
Sônia Maria Vasconcelos da Silva
Tadeu Raimundo Laert
6. Os Patronos da ALTO
A Academia de Letras de Teófilo Otoni possui um total de 30 patronos imutáveis,
cujos nomes são apresentados a seguir, a partir da cadeira número e são os seguintes:
Celso Ferreira da Cunha (1917-1989) - Patrono Oficial
Professor, gramático, filólogo, crítico literário, ensaísta, medievalista e escritor
Pedro de Paula Ottoni (1922- 2002) - Patrono da Cadeira 01
Professor, advogado e desportista
Ruy Homero de Oliveira Campos (1910 – 1993) - Patrono da Cadeira 02
Professor, advogado e orador
Lourenço Ottoni Porto (1892-1956) - Patrono da Cadeira 03
Professor, médico e agente político
Olbiano Gomes de Mello (1882- 1969) - Patrono da Cadeira 04
Professor, economista, jornalista, historiador, escritor e agente político
Paul Max Rothe (1903-1991) - Patrono da Cadeira 05
Escritor e historiador
Pedro Antonio do Nascimento (1903-1973) - Patrono da Cadeira 06
Compositor e violonista.
Régulo da Cunha Peixoto (1920-2003) - Patrono da Cadeira 07
Professor, advogado e magistrado.
25
Reynaldo Ottoni Porto (1891-1947) - Patrono da Cadeira 08
Professor, poeta, escritor, orador, historiador, advogado e agente político
Augusto Pereira de Souza (1907-1993) - Patrono da Cadeira 09
Jornalista e agente político
Adail Barbosa de Oliveira (1935-2004) - Patrono da Cadeira 10
Escritor e poeta
Lourival Pechir (1917-2004) - Patrono da Cadeira 11
Radialista, comunicador e empresário
Dom Quirino Adolfo Schmitz (1918 -2007) - Patrono da Cadeira 12
Religioso, teólogo e escritor
Joaquim Nunes (1941 – 1990) - Patrono da Cadeira 13
Professor e advogado
Joaquim Alves Portugal (1906-1962) - Patrono da Cadeira 14
Professor
Tristão Ferreira da Cunha (1890-1974) - Patrono da Cadeira 15
Professor, jornalista, escritor, advogado e agente político
José Alfredo de Oliveira Baracho (1928-2007) - Patrono da Cadeira 16
Professor, jurista e escritor
Nelson de Figueiredo (1917-1996) - Patrono da Cadeira 17
Jornalista e historiador
Rubem Somerlate Tomich (1921 -2002) - Patrono da Cadeira 18
Professor, advogado, jornalista e cronista
Dely Coelho Nogueira (1940-1987) - Patrono da Cadeira 19
Médico, advogado, magistrado e escritor
Darcy de Almeida (1911-1976) - Patrono da Cadeira 20
Professor, médico, jornalista, orador e escritor
Libório Zimmer (1911-1994) - Patrono da Cadeira 21
Professor, pastor luterano e agente político
Johann Leonhard Hollerbach (1835-1899) - Patrono da Cadeira 22
Professor, pastor e missionário luterano
Petrônio Mendes de Souza (1914-1981) - Patrono da Cadeira 23
Médico e agente político
Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto (1911-1989) - Patrono da Cadeira 24
Professor, advogado, magistrado e escritor
Ione Lewicki da Cunha Mello (1918 – 1977) - Patronesse da Cadeira 25
Professora e farmacêutica
Leônidas Alves Lorentz (1914-1993) - Patrono da Cadeira 26
Professor, advogado, escritor, poeta e empresário
Luiz Gonzaga de Carvalho (1926-2006) - Patrono da Cadeira 27
Professor, cronista, escritor, poeta e radialista
Noé Rodrigues dos Santos (1930-2008) - Patrono da Cadeira 28
Professor, advogado, jornalista e radialista.
João Salomé de Queiroga (1810-1878) - Patrono da Cadeira 29
Poeta, jornalista e magistrado
João Gonçalves Sollero (1882-1967) - Patrono da Cadeira 30
Professor, jornalista, músico, maestro compositor e agente político.
26
Patronesse: Biblioteca e da Medalha de Mérito Cultural
Hilda Ottoni Porto Ramos (1917-atual)
Professora, musicista, poetisa, artista plástica e compositora
Patronesse: Prêmio Academia de Letras
Isaura Caminhas Fasciani (1916-2008)
Professora, poetisa e escritora
Patrono do Prêmio Jovem Escritor
Fábio Antonio da Silva Pereira (1917-1997)
Professor, advogado e agente político
Patrono das edições especiais
Friedrich Wilhelm Albert Schirmer (1834-1924)
Professor, poeta, compositor, desenhista, artista plástico e agente político
Patrono: Membros Correspondentes
Luiz de Almeida Cruz (1913-2011)
Médico e produtor rural
Patrono: Membros Beneméritos
Horácio Rodrigues Antunes (1856-1906)
Professor, engenheiro e jornalista
Patrono: Membros Honorários
Serafim Ângelo da Silva Pereira (1919-2010)
Historiador, escritor e jornalista
Patrono: Convidados de Honra
Monsenhor Otaviano José de Magalhães (1907-1989)
Sacerdote católico e Professor
27
Cadeira Nº 11 – José Geraldo Silva
Cadeira Nº 12 – Leuson Francisco da Cruz
Cadeira Nº 14 – Neusa Ferreira Sena
Cadeira Nº 15 – Marcos Miguel da Silva
Cadeira Nº 16 – José Carlos Pimenta
Cadeira Nº 17 – Sandra Helena Barroso
Cadeira Nº 18 – Olegário Alfredo da Silva
Cadeira N° 19 – Jader Moreira Rafael (In memoriam)
Cadeira Nº 20 – Márcio Barbosa dos Reis
Cadeira Nº 21 – Wallace Gomes Moraes
Cadeira Nº 22 – Leônidas Conceição Barroso
Cadeira Nº 23 – Gecernir Colen
Cadeira Nº 24 – Raquel Melo Urbano de Carvalho
Cadeira Nº 25 – Therezinha Melo Urbano De Carvalho
Cadeira Nº 26 – Wilson Colares da Costa
Cadeira Nº 27 – Maria Laura Pereira da Silva Couy
Cadeira Nº 28 – José Salvador Pereira Araújo
Cadeira Nº 29 – Marlene Campos Vieira
Cadeira Nº 30 – Wilson Ribeiro
28
Figura 3 – Medalha anual de Mérito Cultural Dona Didinha (ALTO, 2022).
29
Figura 4 – Troféu bienal Isaura Caminhas Fasciani (ALTO, 2016).
30
Figura 5 – Fachada da sede definitiva da UETO, ALTO e IHGM.
Considerações finais
O apoio recebido inicialmente pelo Automóvel Clube de Teófilo Otoni, em
nome de sua diretoria no ano de 2002, no sentido de comemorar o cinquentenário de sua
sede, contribuiu de forma decisiva para o movimento de criação da Academia de Letras
de Teófilo Otoni (ALTO).
Nestes 20 anos de existência a ALTO tem-se destacado com a realização de
centenas de atividades literárias e culturais, adaptando-se constantemente às mudanças
inerentes dos novos tempos e contribuindo para o desenvolvimento educacional, da cul-
tura, das letras, das artes e da sociedade.
Esta já nasceu direcionada para agregar talentos artísticos, escritores, historia-
dores e poetas, cada um a seu modo. Fez parte do alicerce que permitiu no dia 20 de de-
zembro de 2002 ao registro definitivo no Cartório Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca
de Teófilo Otoni.
Além de congregar pessoas que se dedicam às atividades literárias e artísticas
nas mais diversas formas de expressão, também é inerente à ALTO realizar estudos e
pesquisas na área da literatura local e regional.
A ALTO vem contribuindo incessantemente com os avanços do conhecimento,
pois a educação está presente em todos os momentos da vida do ser humano, sendo mais
absorvida da infância até a idade adulta. Importante o acesso à literatura em suas diferen-
tes vertentes.Trata-se de uma educação cultural.
31
O ensino cultural tem como função o poder de integrar os diferentes saberes e
levá-los a discussão e reflexão. A educação dialógica é pautada no diálogo e na troca de
saberes, proporcionando o desenvolvimento da capacidade crítica e transformadora (GO-
MES; GOMES, 2018).
Assim se explana a importância da Academia de Letras, levando à sociedade
livros, poesias, romances, ficções, contos, crônicas e arte, contribuindo para o gosto da
leitura, aspectos científicos, históricos e artísticos, sobretudo para as crianças e jovens,
fomentando a cultura e motivando a incessante busca do conhecimento.
O lema presente no escudo é sustentado por um listel em prata, contendo a frase
em latim: AMOR VINCIT OMNIA que significa “O AMOR VENCE TUDO”. Assim seja.
Referências:
ACADEMIA DE LETRAS DE TEÓFILO OTONI (ALTO). Patronos da Academia de Letras de Teófilo Otoni.
Disponível em: <https://letrasto.com/patronos-perpetuos/>, acesso em 23 jul 2022.
CERQUEIRA, J. A. D. Como surgiu a ideia. Segunda Revista Literária da Academia de Letras de Teófilo Otoni,
2005.
GOMES, P. S.; GOMES, A. J. L. Educação escolar dialógica: As raízes para o avanço do acesso à saúde no
Brasil e em Portugal. Vozes dos Vales, v. 13, p. 1-23, 2018.
GOMES, A. J. L. Leite, Queijo e Requeijão: Escola Estadual Deputado Geraldo Landi completa 60 anos na
educação (1959-2019). Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri. Teófilo Otoni, v. 4, p. 108-116,
2020.
GOMES, A. J. L. Fazenda Córrego da Inveja: A região da inspiração infanto-juvenil de Isaura Caminhas
Fasciani. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri, v. 5, p. 44-52, 2021.
* Professor Adjunto da UFVJM, Coordenador do Mestrado PPGTAS desde 2020, Coordenador do grupo de
pesquisas GEOVALES desde 2014, Coordenador da Engenharia Civil (2011), Vice-Diretor do ICET de 2011
a 2015. Doutor em Geofísica no Observatório Nacional (2009). Mestre (2003), Engenharia Civil pela Souza
Marques (1981), Especialização em Docência Superior pela Faculdade Simonsen (1996), Licenciatura Plena
em Matemática no Centro Universitário Augusto Motta (2000), Licenciatura Plena em Física pela Fundação
Técnico-Educacional Souza Marques (2001), Especialista em Gestão Ambiental pela UERJ (2001). Membro
da SBGf desde 2001, ALTO desde 2013 e do IHGM do Mucuri desde 2014.
32
A última edição do “O Liberal”
Humberto Luiz Salustiano Costa*
33
Dirigir o nosso agradecimento a cada um, ‘per si’, seria humana e materialmente
impossível. Por isso nos valemos do estilo clássico, o agradecimento coletivo, destacado
por classes.
Aos amigos de toda parte de modo geral, pelo conforto moral e solidariedade
em momentos adversos. Por ajuda financeira e material. Por conselhos e advertências
prudentes. Por favores e facilidades prestados.
Aos assinantes, base de sustentação do jornal, principalmente aos que vêm
acompanhando este jornal desde sua primeira edição. Um destaque especial não pode-
mos deixar de dedicar aos assinantes do sexo feminino e, curiosamente e principalmente,
viúvas, pela pontualidade com que pagam suas assinaturas.
Aos anunciantes, principalmente aos que ajudaram a editar as tradicionais edi-
ções de Natal, de preço elevado, porém superado, graças à boa vontade e cooperação
dos que amavelmente participavam dessa nossa iniciativa, suprimida com pesar no ano
corrente.
Dos anunciantes um nome queremos destacar – Dr. Luiz Lignani Neto. Desde
sua chegada a nossa cidade, antes mesmo de abrir seu consultório, teve início a publica-
ção ininterrupta de seu anúncio – dia 13 de dezembro de 1960 – mantida durante 22 anos.
Aos prestimosos cartórios do nosso fórum e generosos advogados, desde os mais
antigos da comarca até os recém-formados. A estes, um agradecimento todo especial.
Por que não incluir aqui desafetos e intrigantes? Foram úteis também à nossa
evolução por nos estimularem a reações no campo de trabalho quando agiam para nos
tirar de combate; como aqueles que usaram todos os meios junto ao Ministério do Traba-
lho para fechar o jornal com a alegação de que não éramos diplomados. Também os que
usaram de artifícios desonestos para tirar publicidade nossa, com intrigas e mentiras aos
pés de ouvido. A estes, devotamos nosso sentimento de piedade por terem se revelado de
espíritos tão mesquinhos.
Assinalamos nosso reconhecimento e particular gratidão pelos cuidados dispen-
sados ao ‘O Liberal’ na manipulação de sua distribuição aos funcionários da EBCT.
Finalmente, a todo mundo que aceitou e detestou o ‘O Liberal’, o nosso muito
obrigado”.
Sob o título “PERDEMOS TODA A VONTADE DE VIVER E TODO O DESE-
JO DE LUTAR”, o jornalista Augusto Pereira esclarece sobre os motivos que o levaram
a encerrar as atividades de 36 anos do “O Liberal”, em editorial de primeira página, que
transcrevemos na íntegra.
“Cada qual, livremente, faz o seu próprio preço, alto ou baixo, e ninguém vale
senão o que se faz valer; taxa-te, pois, livre ou escravo; isto depende de ti”. - Epicteto
DESMORONADO enfim o “curto período de 15 anos” da tenebrosa Ditadura
Vargas, em 1945, insólito vendaval de manifestações de contentamento cívico irrompeu
de todos os recantos da Pátria subjugada, até então, à temida Polícia Especial (“boinas
vermelhas”) ou à draconiana mordaça do famigerado DIP.
Como vagalhões se arrebentando em rochedos, atiçava a doutrinação aposto-
lar do “Brigadeiro da Libertação” labaredas de excitação da nossa índole democrática,
incitando manifestações de contentamento cívico, desatinando multidões por toda parte
atraidas pela palavra persistente e persuasiva de oradores calorosos e brilhantes.
34
Nas andanças doutrinárias com o facho do liberalismo político pelo Brasil aden-
tro, qual o Nazareno levando à Galiléia a palavra do Pai, Eduardo Gomes veio a padecer
também, à mesa da imensa Ceia de Democracia que oferecia ao Brasil liberto de longa
ditadura, do mesmo episódio que culminou com o drama do Calvário, perdendo a Presi-
dência da República em virtude da insânia de um político aventureiro.
Participando então, também, da arrancada democrática liderada pela UDN no
cenário mais impetuoso, no campo mais ardente de jornada cívica – Rio de Janeiro – com
a responsabilidade de Secretário Geral da Resistência Democrática do Centro da Cidade
do Rio de Janeiro, empolgados pelo calor cívico da memorável campanha de reconquista
da nossa liberdade de manifestação do pensamento, corremos de pronto para a nossa
Teófilo Otoni afim de aqui fundarmos “O LIBERAL”.
Não deixava de ser, na época, um tanto temerária a ousada iniciativa visada
pelas ameaças e tentativa de retorno dos saudosistas apeados do poder por serem ainda
frágeis, periclitantes, os raios de liberdade despontados.
Um braço hercúleo erguido, todavia, sustinha com mão firme a espada desem-
bainhada, em postura vigilante de combate com a retaguarda protegida pelo entusiasmo
cívico e contagiante da consciência nacional, detentora novamente das prerrogativas ine-
rentes ao cidadão livre numa Pátria soberana. Gen.Canrobert Pereira da Costa, era outra
voz que se impunha pelas suas convicções democráticas e pela sua inconteste liderança
no seio das nossas Forças Armadas, fiadoras do movimento vitorioso de libertação polí-
tica nacional.
Apreciadores das notórias virtudes democráticas do então Ministro da Guerra,
o convidamos para ser o patrono do lançamento do “O LIBERAL”, gesto que o sensi-
bilizou sobremaneira, fato comprovado pela Mensagem que nos entregou pessoalmente
em audiência especial no seu Gabinete de trabalho e que encimou a primeira página da
primeira edição deste jornal, que circulou dia 1º de Janeiro de 1947.
Acreditamos que a Bandeira recebida do Gen.Canrobert não foi desmerecida em
nossas mãos. Soube o “O LIBERAL” honrá-la com destemor e altivez no decurso dos
seus trinta e seis anos de lutas com veemente empenho.
Antecedendo a vitória da Revolução Democrática de 31 de Março de 1964 já
ocupava o “O LIBERAL”, com a mesma determinação de “intransigente combate aos
extremismos e defesa da Democracia”, a trincheira que se harmonizava com a bandeira
recebida do Gen.Canrobert.
Desde então, com a impetuosidade do Guma de Jorge Amado, jamais paramos
de velejar. Ora ao capricho de vagalhões rasgando o negro véu de noites tenebrosas, ora
ao sabor de calmarias doiradas pelo sorriso do astro-rei em dias de mar sereno e cinti-
lante. Em nenhum instante fraquejou o pulso. Em nenhum momento o espírito se viu
nublado.
Yemanjá não desampara a quem lhe é afeiçoado...
A despeito dos escolhos, chegamos ao fim do roteiro da abertura democrática.
Pisamos em terra firme, as eleições tranquilas de 15 de Novembro próximo passado.
Ao fim da travessia, no decurso de quase dois decênios, assombrosa decepção
nos aguarda no cais da Democracia. Presentes, com poderes mais amplos, os mesmos
Brizolas, os mesmos Arraes, os mesmos Darcys e tantos outros que já havíamos “expeli-
35
do” ao mar na noite de 31 de março de 1964.
Tarrafeados pelos “luas pretas” do Planalto retornam ao nosso convívio político
os mesmos homens que iam incendiando o Brasil em 1964. Tragédia que só foi evitada
em virtude da reação da mulher brasileira que veio às ruas de rosário à mão apelar às
Forças Armadas no sentido de salvarem a Pátria à margem do abismo.
Para desencanto nosso, esses mesmos militares, profanando a memória do au-
têntico revolucionário de 1964 – Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco – rea-
bilitam com a influência do próprio sistema os “sapos” expelidos do Governo pátrio em
1964 por força das orações das mulheres brasileiras.
“Le Brésil n’est pas um pays serieux” – Correta a afirmação do Presidente Char-
les De Gaulle.
Porque, então, nos sacrificarmos física, econômica, partidária e socialmente,
simplesmente por devotamento a um idealismo sincero que, em verdade, não encontra
correspondência já na formação militar, onde o padrão de civismo exige invulnerabilida-
de para servir de exemplo à nossa juventude?
O “O Liberal” sobrevive com imensos sacrifícios, convencido de que não é
somente o cidadão com mandato político ou função pública que seja o devidamente cre-
denciado para servir à Pátria. Em qualquer ângulo de atividade humana em que nos colo-
camos somos compelidos a esse dever. Defendemos os direitos humanos e a Democracia.
Batalhamos pela liberdade de manifestação do pensamento. O desfecho das eleições de
15 de Novembro próximo passado nos veio advertir para o sentido realista do problema.
Tudo não passa de pantomima. Idealismo é utopia.
Por reprovarmos um e outro estilo deliberamos arrear a Bandeira recebida do
saudoso Gen.Canrobert, hasteada no topo do “O LIBERAL” dia 1º. de Janeiro de 1947,
fazendo circular a edição de hoje como nossa última edição. Edição da despedida.
Antes dessa decisão nos entregáramos ao exame de consciência debruçados so-
bre Max Nordau, que nos despertou para uma realidade que até então não queríamos
aceitar:
“A contradição constante entre as nossas ideias e todas as manifestações da nos-
sa civilização, a necessidade de viver no meio de instituições que parecem mentirosas, é
o que nos torna pessimistas e céticos; é a chaga sangrenta do mundo civilizado. N’este
conflito intolerável, PERDEMOS TODA A VONTADE DE VIVER E TODO O DESEJO
DE LUTAR”.
Sabe-se que o desencanto do jornalista Augusto Pereira, mostrado em seu edito-
rial de despedida, chegou ao lamentável desfecho de dar fim a todo o acervo do “O Libe-
ral”, perdendo-se desse modo um bom período de registro da história de Teófilo Otoni, o
que nos causa profunda tristeza.
Da nossa infância e juventude, ainda hoje guardamos na lembrança pelo menos
quatro dos grandes jornais que marcaram época na cidade dos meus amores e dos meus
encantos. E ao mencioná-los rendemos nosso tributo póstumo aos diretores do “O Mu-
curi”, Sr. Durval Campos; do “O Norte de Minas”, Sr. Paulo do Rosário; do “O Correio
de Teófilo Otoni”, Dr. Ricardo Alves Pinto, e do “O Liberal”, Sr. Augusto Pereira, cujos
nomes, de inteira justiça, fazem parte da nossa galeria de benfeitores.
Igual menção é oportuno que façamos, também, aos pioneiros do jornalismo na
36
“cidade do amor fraterno”, nominando, dentre outros, os seguintes: Antônio Luiz Pinto
de Noronha, Honório de Araújo Maia, Joaquim Amado Ferreira, Max Phaff, Manoel Pe-
reira, Carlos Prates Sobrinho, Tristão Ferreira da Cunha, Rudolph Nunes, Horácio Ro-
drigues Antunes, Frei Canísio, Nerval de Figueiredo, Lothar Rudolph, Floriano Mendes,
José Vieira de Matos, Chateaubriand d’Angelis e Silva, Fábio Amado Ferreira, Filogônio
de Carvalho, Artur Achtschin, Juscelino Barbosa, Vicente Ferreira Paulino, Lourenço
Otoni Porto, Alfredo Sá, Arsênio Pessoa Lins, Raimundo Campos, José Martins Prates,
Thomaz Gonzaga Campos, Olbiano de Melo, Eloino de Matos, José Jesulino de Matos,
José d’Ascenção Belga, Serafim Ângelo Pereira da Silva, Francisco Matias, Marinho
Viana, Domingos Soares da Cruz, Tito Guimarães, Patrício Ferreira Gomes, Eurico Soa-
res de Sá, Cláudio Soares de Oliveira, Antônio Pereira dos Santos, major João Pungirum
e os estudantes Lauro Meneses e Gladistone da Silva Pereira, segundo registro extraído
do arquivo da colecionadora Fany Moreira.
Vale, finalmente, mencionar o registro do aviso de acerto de contas com os seus
assinantes através do seguinte anúncio de primeira página da histórica última edição do
“O Liberal”.
“AVISO AOS ASSINANTES COM CRÉDITO
Aos assinantes que pagaram adiantadamente assinaturas com vencimentos em
meses do próximo ano, bem como aos que já nos enviaram cheque para assinatura de
1983 comunicamos que não só as diferenças a vencer como as do ano próximo serão
devolvidas até dia 31 próximo. ”
37
Legenda da foto: Sr. Augusto Pereira, diretor-proprietário do “O Liberal”, na entrega da flâmula de seu hebdo-
madário ao Sr. Juscelino Kubitscheck de Oliveira.
*Jornalista, sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri, ocupante da cadeira 45, tendo como
patrono Francisco de Paula e Silva. Membro honorário da Academia de Letras de Teófilo Otoni e membro
efetivo e um dos fundadores da Academia Caratinguense de Letras, ocupante da cadeira 7, tendo como patrono
Teófilo Benedito Otoni. Faleceu em 26 de setembro de 2022, aos 85 anos de idade.
38
Maria José:
Companheira e Mestra
Gilberto Ottoni Porto*
40
seus problemas, demonstrando uma maturidade e sabedoria fantásticas.
Teófilo Otoni, sob a liderança do Padre Giovani, acolitado por uma equipe mo-
tivada e competente, mostrou a capacidade revolucionária da força da união. Três bairros
foram construídos em mutirão por um povo aguerrido, dotado de alegria contagiante. Na
área rural a pastoral da igreja, com as pequenas comunidades e propriedades familiares,
dinamizava a agricultura hortifrutigranjeira na produção de alimentos sem agrotóxicos,
fugindo da monocultura e do exclusivismo da pecuária.
Foram anos inesquecíveis que, no final da década fortaleceram tanto o PT ga-
rantindo Lula chegar ao 2º turno na disputa com Collor à Presidência da República. Atrás
de tudo isso estava a liderança inconteste de Maria José, sua crença na força do povo
galvanizava todos nós. Sua dedicação prazerosa, seu testemunho de trabalho foram um
catalizador magnífico.
Quando deputada em Belo Horizonte, participei com ela em várias reuniões de
Fé e Política que agregavam companheiros consagrados como o Secretário Aloísio Pi-
menta e outros luminares. No meu 2º mandato na AFATO, pedi licença por dois meses
para poder, em Teófilo Otoni, dedicar-me exclusivamente à campanha de Maria José à
Prefeitura.
Maria José empolgava as pessoas nos comícios. Lembro demais da música da
campanha:
*Engenheiro Civil com pós graduação em Engenharia Sanitária. Sócio fundador do Instituto Histórico e Geo-
gráfico do Mucuri do qual é Presidente de Honra.
42
O Colégio Tiradentes de Teófilo Otoni
Petrônio Dantas Vieira*
43
blicado no Diário Oficial em 14 de Abril desse mesmo ano. Todavia, a Escola já estava
autorizada a funcionar desde 10 de fevereiro desse mesmo ano, pelo Conselho Estadual
de Educação e pela 37ª SRE.
O próximo desafio seria o local onde funcionaria a escola.
Era prefeito de Teófilo Otoni, o Dr. Edson Gonçalves Soares. Ele cedeu o prédio
do antigo Centro de Atenção Integrada à Criança (CAIC) para ser instalado, provisoria-
mente o Colégio, com prazo estipulado de desocupação até o ano de 2002.
Outro desafio, foi conseguir mobiliário para o colégio. Parte dos materiais, con-
seguimos os usados do próprio CAIC, outra parte veio de doações das empresas, da
maçonaria e até dos usados de outros Colégios Tiradentes da Polícia Militar.
Fizemos a composição do corpo docente. Com base nos pareceres do Conselho
Estadual de Educação, no dia 08 de Março de 1999 ficou marcada a data da instalação
solene do Colégio Tiradentes em Teófilo Otoni.
Era um sonho em que poucos acreditavam, mas que se tornava realidade.
Por ironia do destino, no dia 03 de Fevereiro de 1999, o Diário Oficial de Minas
Gerais, publicava a passagem para a reserva remunerada do coronel Petrônio Dantas
Vieira. Eu tinha 30 dias para entregar o comando.
Só me faltavam, teoricamente, 05 dias para presidir oficialmente a instalação do
Colégio Tiradentes, considerando que eu só poderia ficar até o dia 03 de março. O colégio
foi inaugurado no dia 08 de março de 1999.
Porém, como não havia tempo suficiente para eu inaugurar o colégio, no dia 22
de fevereiro de 1999, passei o comando do 19º Batalhão, deixando tudo pronto para a
inauguração. Dependeria somente, do desfecho do ato materializado e da luta concluída.
Orgulho-me de tudo isso. Fiz valer o sangue nas veias, herdado da minha mãe, Ma-
ria Aureolina Soares Vieira, que teve a vida pautada na educação, como professora e diretora
de escolas estaduais e municipais em Teófilo Otoni: A missão estava cumprida! Ainda hoje,
o Colégio aí permanece como motivo de orgulho para todos os teófilo-otonenses.
*Coronel Veterano da PMMG, Especialista em Segurança Pública pela Fundação João Pinheiro, Especialista
em Gestão em Segurança Pública pela Fundação João Pinheiro, Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito
de Teófilo Otoni (FADITO), Advogado (OAB-MG), Especialista em Direito Civil (FADIVALE), Graduado
em Segurança Privada, Diretor Geral da PHILADELPHIA Escola de Segurança Privada. Autor dos livros Os
Sobreviventes, Os Filhos da Viúva, A Beira do Fogão e O Cabo e o Comandante.
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O legado de Hilda Ottoni Porto Ramos (Didinha)
para a cidade de Teófilo Otoni
Magali M. A. Barroso*
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pela Prefeitura Municipal. Aos noventa anos, em 2007, recebeu como homenagem da
ALTO ter seu nome dado à Biblioteca da Instituição. Os dois outros livros — Memórias
Vivas... Vivas Memórias e Aquarelas da vida— foram publicados, respectivamente, em
2009 e 2010. A Academia de Letras instituiu, em 2011, a Medalha de Mérito Cultural
Dona Didinha e, em 2012, lançou o livro Dona Didinha: a pescadora de sonhos com
depoimentos de intelectuais teófilo-otonenses sobre a vida e obra dessa mulher multifa-
cetada. Em 2017, a mesma instituição a homenageou com a Medalha Centenário Dona
Didinha, com a qual tenho a honra de ter sido agraciada. Também figurava nos quadros
do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri, como Sócia Honorária.
Quando o livro sobre sua obra foi lançado, intitulado A liberdade de tecer pala-
vras e criar poemas: vida e obra literária de Hilda Ottoni Porto Ramos – Dona Didinha,
à época de seu aniversário de 104 anos, houve uma live, promovida pela Academia de
Letras de Teófilo Otoni, da qual ela participou, estando muito lúcida e agradecida pela
homenagem. Brindou a todos nós com seus versos e com os de seu pai, do qual era pro-
funda admiradora, com tanta fluência e sentimento, mostrando ser portadora de memória
prodigiosa e muito amor pelo que sempre fez.
Hilda Ottoni Porto Ramos residia ora em sua casa em Teófilo Otoni, que dividiu
com Iraci, sua dama de companhia por mais de sete décadas, ora em Lagoa Santa com
sua filha Lizia. Viajar para ela sempre foi motivo de alegria. Outra paixão é a casa de
Alcobaça, onde nas férias recebia a família com os onze netos e onze bisnetos. Estando
lá, andava pela praia, festejava o encontro do rio com o mar e se perdia observando a
vastidão de água, que se colore de forma diferente, dependendo da época do ano ou da
hora do dia. Aquela paisagem foi retratada em vários de seus textos. Recentemente, Lizia
encontrou em seus guardados e me enviou o seguinte texto: “Se minha vida, que se torna
bem longa, se resumir nas palavras dos poemas que o viver me inspiraram, aos que os
lerem faço um pedido: não os considerem apenas formas literárias, mas se aprofundem
nos sentimentos que os geraram”.
Didinha, em entrevista à TV Imigrantes, na ocasião de seus 93 anos, se mostra-
va alegre com sua jornada existencial e disse que, enquanto tivesse lucidez, gostaria de
obter de Deus a graça da vida. Ficava feliz ao tocar seu piano, escrever versos e prosas,
e vencer o desafio da tela em branco, deixando em forma de flores seus sentimentos e
vivências.
Em seus últimos anos, esteve com sua filha Lizia, morando em Lagoa Santa, na
região metropolitana de Belo Horizonte. E, na manhã da véspera do Dia das Crianças,
Didinha nos deixou. Como era de se esperar, voltou para Teófilo Otoni, sua cidade natal
querida, na qual viveu, criou família e cuja face mudou com sua habilidade para deixar
herdeiros de seu talento, onde conseguiu o afeto das pessoas e o respeito das Instituições
Culturais e Públicas. A cidade a recebeu no dia de Nossa Senhora Aparecida de 2022,
para guardá-la eternamente em seu coração e território.
Em seu livro Memórias Vivas ... Vivas Memórias, ela deixa seu testamento, em
forma de versos no poema Quando.
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“Quando...
No anoitecer da vida
Meus olhos não mais reabrirem
Quando...
Velho coração, cansado
Não mais pulsar ... parando
Naquele momento
Quero sim partir
Como herança deixar ficar
meu Testamento:
Dividam em partes iguais
Sem rancor
Sobras de um grande Amor
Que consegui guardar
Por ter sido, vivido:
É ... a maior,
a melhor
Parte de mim!”
Hilda Ottoni Porto Ramos (Teófilo Otoni, 24/04/1917; Lagoa Santa, 11/10/2022).
Foram 105 anos espargindo a luz da sabedoria, do amor, da sensibilidade e agora pode ser
vista brilhando como uma estrela no universo de cada um que com ela conviveu.
*Sócia efetiva do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri e do Instituto Histórico e Geográfico de Minas
Gerais. Membro Correspondente da Academia de Letras de Teófilo Otoni. Autora do livro A liberdade de tecer
palavras e criar poemas: vida e obra literária de Hilda Ottoni Porto Ramos – Dona Didinha, de 2021.
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Proveitosas Aulas de Latim...
Sobre Dom Waldemar Chaves de Araújo,
marcante Bispo da Diocese de Teófilo Otoni.
João Bosco de Castro.*
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conversação, fonêmica, prosódia, ortoepia, noções lexicais, suficientes ao desenvolvimento
da capacidade da leitura do Missal Romano, para não fazermos feio nas oficiações mais roti-
neiras e sacramentações mais simples. O estudo sistêmico e metodológico da Língua Latina,
com declinações, morfossintaxe, estilística, análise de forma e conteúdo, para compreensão
e tradução de texto, veio-me, curricularmente, no Ginásio Estadual de Bom Despacho, mer-
cê dos Professores Elvino Paiva de Oliveira e Geraldo Majela de Melo Santos, e, mais tarde,
com o acréscimo de Literatura Latina, de 1970 a 1973, no Curso de Licenciatura em Letras,
pelos Professores Padre Vicente Pinto dos Santos e Frei Romão. Todavia, a excelência das
primeiras aulas do então Seminarista Waldemar Chaves de Araújo, no singelo espaço daque-
la Capelinha Militar, em julho de 1956, ainda é ponto alto de meu interesse em estudos do
Latim, Português e Línguas e Literaturas Românicas.
Naqueles saudosos tempos de menino da Vila Militar do Machado de Prata, em
Bom Despacho, em casa, eu falava sobre as aulas de Latim e a didática amistosa e eficaz do
jovem Professor, o Seminarista Waldemar Chaves de Araújo. Ao ouvir-me, Papai ─ Major
João Rodrigues de Castro, àquela época Sargento, da Polícia Militar Mineira ─ não deixava
para menos:
─ Waldemar será piedoso e excelente sacerdote. É muito estudioso, inteligente,
dedicado à Fé e de família modelar. Ele é filho do Sô-Sudário Araújo e cunhado do Zico da
Casa Assumpção. Dona Elza do Nico Marques sempre faz elogios a ele, como rapaz muito
cuidadoso com as pessoas e dedicado aos estudos. Ela até o ajuda a manter-se no Seminário.
Quando contei sobre minhas primeiras aulas de Latim, ensinadas pelo Seminarista
Waldemar Chaves de Araújo, à Doma Maria de Lourdes d’Avó Gontijo, minha Professora
de Tudo no Curso Primário do Coronel Praxedes, ela enfatizou-me:
─ O estudo de Latim é muito importante. Conheço a família do Seminarista Wal-
demar, principalmente o Pai dele, o Sô-Sudário Araújo, homem simples, mas trabalhador e
honrado. Dona Elza do Sô-Nico Marques, minha vizinha, sempre elogia a inteligência dele,
inclusive dá-lhe ajuda material e financeira para ele manter-se no Seminário.
Poucos anos após aquelas memoráveis aulas de Latim, ordenou-se presbítero o
Diácono Waldemar Chaves de Araújo, e passei tempos sem vê-lo. Depois, soube dele como
Pároco do Santuário de Nossa Senhora de Lourdes, em Belo Horizonte, ao fim da década de
1980, quando foi sagrado Bispo e nomeado Titular da Diocese de Teófilo Otoni, da qual se
transferira, bons anos transcorridos, para a Diocese de São João d’el Rei, em cuja Cátedra
se honorificou na Dignidade de Bispo Emérito.
Quanto bem me fizeram e fazem aquelas proveitosas Aulas de Latim ministradas
a mim e a outros Coroinhas pelo inesquecível Seminarista Waldemar Chaves de Araújo, há
sessenta e quatro anos, em Bom Despacho-MG, no histórico Santuário de Santa Efigênia, hoje
Paróquia Militar dirigida pelo Tenente-Coronel-Capelão Padre Sebastião Gonçalves Fernan-
des, em local nobre da Vila Militar do Sétimo Batalhão da Força Pública de Minas Gerais!
*Oficial Superior Veterano da PMMG e Professor de Línguas e Literaturas Românicas, Ciências Militares da
Polícia Ostensiva, Ciências Policiais, Ética e Deontologia, Crítica Textual, Políticas Públicas e Preservação
da Ordem Pública. Livre-docente, por Notório Saber, de Historiografia de Polícia Militar (História da Polícia
Militar de Minas Gerais). Pertence à Academia de Letras de Teófilo Otoni e ao Instituto Histórico e Geográfico
do Mucuri (membro correspondente). Ensaísta, Prosador e Poeta.
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Jubileu do Bom Jesus do Matosinho. A grande
festividade da Diocese de Guanhães
Dilton Maria Pinto*
Gilson Mateus Soares**
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Figura 2: Primitiva imagem do Bom Jesus do Matosinhos
No século XX, na década de 30, a antiga estrutura física estava ruindo. Frei
Vicente de Licodia, frade capuchinho, de origem italiana idealizou o atual Santuário. A
pedra fundamental foi lançada no dia 8 de dezembro de 1931 e as obras foram incorpo-
rando o antigo templo, à frente do novo, com os fundos do antigo.
No ano de 1932, durante o Jubileu, os devotos puderam ver o encontro de dois
santuários integrados. O antigo já decadente e já ia se despedindo, enquanto que o novo
manifestava todo vigor com grandes blocos de alvenaria. Durante os tempos de obra não
houve interrupção do Jubileu.
A 19 de março de 1934 a imagem do Bom Jesus foi retirada de seu trono por
causa das obras e foi transladado em procissão para a Igreja Matriz. As visitas se torna-
ram diárias na Matriz para ver a imagem. Em 12 de maio retornou, imponente para o
novo Santuário, com conclusão das obras. Os três altares da antiga igreja foram mantidos
na nova estrutura.
A partir de 1911, D. Joaquim Silvério de Souza, então Bispo de Diamantina, já
pensava deixar a administração do Santuário aos cuidados dos padres Capuchinhos. Frei
Vicente chegou em 1916. Poucos anos, após a construção do novo Santuário, faleceu.
Seus restos mortais encontram-se no interior do templo. A permanência dos Capuchinhos
foi até o ano de 1995, quando retornou aos padres diocesanos.
A presença dos devotos, durante o jubileu, sempre foi bastante numerosa tornan-
do-se crescente com o passar dos anos. Em 1978 registrado no jornal “Voz da Conceição”
relata o quantitativo de pessoas para o jubileu e 2002 em diante, com os relatos da Folha
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Diocesana, importante jornal regional:
Em 1978 temos a presença de 5.528 devotos, 959 barracas, com visitantes da
Bahia, Goiás, São Paulo. De Minas eram 952 barracas.
Em 2002 presença de 40.000 devotos e mais de 500 barracas.
Em 2008 são 50.000 devotos e mais de 600 barracas.
Em 2012 consta a presença de 80.000 fiéis, lembrando que a cidade de Concei-
ção em 2010, conta com pouco mais de 17.000 habitantes.
O jubileu é a maior festividade da diocese de Guanhães e da região. Há pessoas
que contam 30, 40, 50 e até 60 anos de participação ininterruptas do jubileu. Nos dois anos
da Pandemia, o Santo Jubileu fora realizado sem público, mas usando as redes sociais.
O Bom Jesus de Portugal saiu, algumas vezes em procissão, por alguns mo-
mentos como esse, ocorridos em Conceição. Ele saiu em 1596, 1644 por cheias extremas
nas cidades, em 1696 por peste mortífera, 1944 durante a Segunda Guerra Mundial, para
pedir paz ao mundo e o último registro foi em 1967 na comemoração com cinquentenário
das aparições de Nossa Senhora de Fátima.
Em Conceição do Mato Dentro, os momentos de saída da imagem do Bom Jesus
foram poucos, o primeiro foi para pedir chuva, com data não registrada, ocorrendo no sé-
culo XVII ou XIX. O segundo registro é de setembro de 1919, quando a gripe espanhola
fizera inúmeras vítimas na região. A imagem saiu para pedir a cura e que cessasse todo
malefício causado na região e no mundo. No encerramento do Jubileu de 2020, ocorrido
exclusivamente com transmissão via internet, sem presença de público, por causa da pan-
demia do coronavírus que acomete o Brasil e o mundo, a imagem do Bom Jesus saiu em
carreata pedindo cura para o mundo, agora não o povo que vai na procissão, Ele que vai
passando em frente às casas dos devotos. A imagem foi retirada do altar 101 anos depois
da última grande necessidade. Foi um momento de muita fé.
* Sacerdote da Diocese de Guanhães, Historiador, Pós Graduado em História do Brasil, Pós Graduado em Pa-
trimônio Histórico pelo ISEED- FAVED – Instituto Superior de Educação Elvira Dayrell – Faculdade do Vale
Elvira Dayrell, Curso de Missiologia e Pastoral com extensão universitária pelo CCM – Brasília em parceria
com o Instituto Berthier – RS.
** Licenciado e Bacharel em Filosofia pela UFJF, Bacharel em Teologia pelo CES/ITASA. Especialista em Fi-
losofia Moderna e Contemporânea pela UFJF. Autor dos livros: Dores de Guanhães. Manual Histórico (2008),
O Catolicismo em Dores de Guanhães. Um retrospecto Histórico (2010), Inferências Históricas sobre Dores de
Guanhães (2015) e Fazenda Cavaco. Patrimônio Dorense (2020).
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Pioneiros pela fé
Edineia Felix*
Resumo: O objetivo deste trabalho é não deixar cair no esquecimento à memória de pes-
soas que pela fé enfrentaram muitas dificuldades para contribuir com a formação sócio
cultural da região. Com o lema de levar o evangelho a todo o mundo chegaram ao vale do
Mucuri deixando para trás a própria pátria e um estilo de vida confortável.
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se faz necessária a presença de um pastor e mais colportores, vendedores de literatura ad-
ventista, chegando sucessivamente os irmãos Berger, colportores, e os pastores Westphal,
Graf, Ehlers, Hoelze e Spies, que dividem o território. A Spies vem entregue as regiões
do Espírito Santo e Minas Gerais uma das maiores e mais difíceis a ser desbravada.
Os irmãos colportores Friedrich e Albert Berger chegam ao Brasil em 06 de
agosto 1895 vindos dos Estados Unidos. No mesmo ano se instalam no vale do Mucuri e
começam seus trabalhos em São Jacinto com a família de Eduard Thomas e vizinhos. Os
irmãos se casam com as irmãs Klauss e nos anos seguintes deixam o Mucuri e se instalam
na região sul do país.
No dia 08 de outubro de 1896 Spies parte do Rio de Janeiro em uma embarcação
rumo a Vitória no Espírito Santo onde Albert Berger o esperava. Dali prosseguiram com
um vapor até Caravelas mas o trem de passageiros que partia nas proximidades já havia
seguido viagem o que os fez esperar por 5 dias a partida do novo comboio. A viagem de
trem era precária com constantes atrasos e descarrilhamentos principalmente nas subidas,
sendo muitas vezes necessário viajar no vagão de mercadorias. As últimas 50 milhas
foram feitas a pé e a cavalo até chegarem a São Jacinto onde os recém convertidos os
esperavam ansiosos. Nessa viagem Spies faz o primeiro batismo adventista nas águas do
São Jacinto e 19 pessoas passam a compor a quinta igreja adventista da país e a primeira
no estado de Minas Gerais. Os primeiros membros eram das famílias Thomas, Klauss,
Schultz, Braun, Döehler, Hirle e Knüpfer.
Spies não poupa críticas ao descrever a região e vê com surpresa o estado de
desgraça no qual vivem os imigrantes numa terra fértil, mas, mal utilizada. Segundo ele,
os colonos dedicam pouco tempo ao cultivo de frutas, visto a crença que o consumo das
mesmas causava febre amarela, tendo como dieta básica arroz, feijão e carne das quais
grande quantidade de derivado de suínos e carne seca. Inaceitável aos olhos de Spies era
a utilização de farinha de mandioca no lugar de pães e o uso do café em detrimento aos
sucos naturais.
Os índios não passaram inobservados aos adventistas mas, visto a barreira lin-
guística, os trabalhos, missionários se concentraram com os descendentes de língua ale-
mã, para prosseguir com os brasileiros, alguns anos mais tarde, quando teve início a
publicação de literatura na língua local.
Spies não deixou desapercebido o grau de instrução dos colonos que carecia de
conhecimentos básicos o que dificultava a propagação do evangelho. Muitas vezes era
necessário retroceder no estudo da língua e da interpretação de textos para seguir com
o objetivo inicial. Era iminente a necessidade de escolas e assistência sanitária básica
aos irmäos de fé, mas não era fácil obter obreiros qualificados que pudessem se fixar em
locais tão isolados. A obra adventista estava ainda nos primórdios e a primeira escola
paroquial só foi concretizada oficialmente com a chegada de Henry Haefft em 1917.
Foram várias as viagens de Spies e a esposa Isadora à região. Em 1899 Isadora
escreve um artigo para a revista adventista norte americana descrevendo as suas perple-
xidades. A posição geográfica que propiciava o isolamento dos moradores era a base do
retrocesso dos mesmos na opinião de Isadora. A anemia era uma condição comum entre
os moradores do Mucuri que não se dedicavam ao cultivo de frutas e verduras, mas arroz
e milho. As nozes e frutas eram deixadas para os pássaros e macacos da selva e como
56
brinquedos para as crianças. Os animais eram criados soltos o que limitava o plantio de
hortas de forma sistematizada. Ou seja, faltava a infra estrutura de base para os colonos,
acesso à educação e saúde.
Friedrich Weber Spies nasceu em Filadélfia no estado da Pensilvânia no dia
29/06/1866 e faleceu em Santo André em 31/07/1935. Torna-se adventista aos 22 anos.
Casa-se com Isadora Read também norte americana, com quem tem uma única filha
Mabel Spies. Depois da sua conversão é transferido como missionário na Alemanha e
somente em 1895 chega ao Brasil, já ordenado como pastor.
Henry Haefft nascido do estado do Oregon, fluente em inglês e alemão, parte
de Nova York em companhia da mulher Rosa também do Oregon no dia 06/09/1913 e
chegam ao porto de Santos no dia 25/09 do mesmo ano. Em maio de 1917 recebe o cha-
mado para dirigir a escola paroquial já existente em São Jacinto. A primeira turma era
constituída de 29 alunos no período diurno dos quais 4 desistiram visto que a fé professa-
da pelos pais os impedia de prosseguir com os adventistas. No período noturno o número
era menor, 19 alunos que pelas dificuldades da dupla jornada, trabalho/estudos, foram
desistindo dos estudos.
Haefft foi muito além da sua missão no Mucuri, ou seja, educar e evangelizar, se
dedicou também ao ensino da agricultura, técnicas de conservação dos alimentos, educa-
ção alimentar e estabeleceu um pequeno ambulatório para o tratamento dos doentes e um
curso de técnicas básicas de saúde para 16 pessoas.
Mesmo com a saúde debilitada pela gripe espanhola não desistiu da sua missão
vindo a falecer no dia 09/07/1921, em Teófilo Otoni.
Posteriormente, outros estrangeiros percorreram as estradas do Mucuri em prol da
fé adventista. A falta de um pastor adventista residente na região até o inicio do século XX
fez com que pastores de outras áreas chegassem a Teófilo Otoni para celebrar casamentos
e batismos, eventos importantes para a vida social da comunidade. São alguns deles:
Huldreich F. Graf: nasce em 08/07/1855 na Prússia emigrou nos Estados Uni-
dos em 1869. Chega ao Brasil em outubro de 1895 com a família. Falece em Taquari – RS
no dia 04/12/1946.
Waldemar Ehlers: nasce em 17/02/1879 na Alemanha e falece em Jaraguá do
Sul em fevereiro 1929.
Herman Paul Streithorst (nome modificado no Brasil para Germano Paulo):
nasce na Prússia no dia 06/06/1889 e falece em Sumaré no dia 26/01/1979. Trabalhou
também na Bélgica e nos Estados Unidos.
K. Kaltenhauser: Nasceu em 04/03/1878 em Duderstadt, Alemanha. Foi trans-
ferido ainda jovem na África onde se casa, mas se torna viúvo depois de 4 meses e meio,
vindo a contrair as segundas núpcias em 1914 com a missionária/enfermeira Lina Barho.
Chega em 1940 em Teófilo Otoni, onde residiu por alguns anos e falece em Petrópolis,
em 05/07/1948.
Chester Clarence Schneider: nascido em 16/04/1892 nos Estados Unidos.
Chega ao Rio de Janeiro em 1922. Falece no 13/02/1956, na sua casa no Rio de Janeiro.
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Referencias Bibliograficas:
ACHTSCHIN DOS SANTOS, Marcio et al. As Gerais distantes das Minas fragmentos da História do Vale do
Mucuri. ISBN: 978-85-62925-00-9. Teófilo Otoni: Frota, 2009.
ACHTSCHIN DOS SANTOS, Marcio. A formação econômica, política, social e cultural do Vale do Mucuri.
ISBN: 978-85-908323-4-8. Teófilo Otoni: UFVJM, 2018.
BORGES, Michelson. A chegada do adventismo ao Brasil, 3° edição. ISBN: 978-85-345-2840-5. Tatuí: Casa
Publicadora Brasileira, 2020.
CULTRERA, Samuele. Una Missione fra i selvaggi del Brasile. Parma: Istituto Missioni Estere, 1923
Haefft, H. “Theophilo Ottoni (Minas)”, Revista mensal, Vol. 13 N° 4, Abril 1918, p. 7
Haefft H. “Missionaries on Their Way to Brazil”, Advent Review and Sabbath Herald, January 26; 1914 p. 11
MOLAIB, Munira. “Libaneses em Teófilo Otoni”, Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri, N°
2 Agosto 2017 p. 23 – 25.
SPIES, Isadore. “Menas Geraes, Brazil”, The Missionary Magazine, June1899 p 252 e 253.
SPIES, F. W. “A Visit to Minas Geraes, Brazil”, The Advent Review and Sabbath Herald, January, 19; 1897
p. 43
SPIES, F.W. “Learning Patience in Brazil”, The Missionary Magazine, July 1899 p. 314 a 316
SPIES, F. W. “Progress in Brazil”, The Missionary Magazine, August 1899 p. 348 e 349
Copia dos primeiros registros de membros da Igreja Adventista de alto São Jacinto, 1899.
https://encyclopedia.adventist.org página visitada no dia 31 Julho 2022.
*Médica e sócia correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Vale do Mucuri e da Academia de Letras
de Teófilo Otoni. Reside em Gênova/Itália.
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História da Diocese de Almenara
Igreja discípula e missionária a serviço do Reino de Deus,
celebrando seus 40 anos de caminhada
Pe. Cláudio Eduardo Cordeiro*
Com a colaboração de Rita Botelho e Tânia Botelho
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Jacinto, Santo Antônio do Jacinto, Rubim e Rio do Prado e a Ordem dos Frades Menores
em Jequitinhonha. Também contávamos com a presença do missionário italiano Pe. Luiz
Sandrini nas paróquias de Jordânia, Salto da Divisa e Santa Maria do Salto.
Durante a visita do Papa São João Paulo II ao Brasil, foi ordenado pelo próprio
Papa o padre Valdir Brito, que também fez parte do clero diocesano, falecendo, porém,
ainda muito jovem.
O segundo bispo da diocese de Almenara foi Dom Diogo Reesink. Ele governou
a diocese de 1889 a 1998. Ele foi nomeado para esta diocese em 02 de agosto de 1989 e
ordenado bispo em 21 de outubro do mesmo ano.
Dom Diogo nasceu na Holanda em 1934 e pela Ordem dos Frades Menores
(Franciscanos) veio como missionário para o Brasil, permanecendo até o seu falecimento
em 2019. Em 1998 foi nomeado bispo de Teófilo Otoni, onde ficou até se tornar emérito
em 2009.
As marcas principais de seu governo na diocese de Almenara foram a implan-
tação do projeto Bíblia em Comunidade (SAB – Serviço de Animação Bíblica), trazendo
diversos cursos de Bíblia em parceria com a Paulinas Editora e com o CEBI. Também
neste período foram elaboradas cartilhas de formação em fé e política e foi criado o
movimento de casais, precursor da Pastoral Familiar. A Renovação Carismática Católica
também foi trazida nesa época para a diocese.
Como vimos anteriormente, um dos desafios da diocese de Almenara foi a ca-
rência de vocações sacerdotais. Tínhamos poucos padres para muitas paróquias. O único
padre diocesano ordenado por Dom Diogo foi o padre João Amaral Rocha.
O terceiro bispo da diocese de Almenara foi Dom Hugo Maria van Steeekelem-
burg. Assim como Dom Diogo, ele também é de origem holandesa, tendo nascido em
1937. Também como Dom Diogo, ele pertencia à Ordem dos Frades Menores, vindo para
o Brasil como missionário.
Foi nomeado bispo da diocese de Almenara em 23 de julho de 1999 sendo sa-
grado bispo em 24 de setembro do mesmo ano. Permaneceu nesta diocese até se tornar
emérito no ano de 2013.
Uma das maiores realizações de Dom Hugo na diocese, foi a implantação do
projeto das Santas Missões Populares. Este projeto tinha como objetivo animar as pe-
quenas comunidades com a formação de equipes missionárias desenvolvendo diversos
trabalhos evangelizadores. Todas as comunidades da diocese foram contempladas com
esse projeto.
Dom Hugo também construiu o Centro Pastoral Irmão Amado, para abrigar as
pastorais nos encontros com menor número de pessoas e ainda finalizou a estruturação do
prédio da Cúria Diocesana.
Outra grande realização de Dom Hugo foi a instalação do Seminário Maior São
João Batista em Belo Horizonte no ano de 2006, para a preparação dos vocacionados ao sa-
cerdócio.Também instalou o propedêutico na paróquia São Pedro Apóstolo em Almenara.
Foi durante seu governo que a diocese viu florescer um grande número de vo-
cações, tanto locais como vindas de outras dioceses. Foi Dom Hugo quem ordenou os
padres Nery (2004), Newton (2004), David (2006), Aleandro (2007), Anderson (2009),
Claudio (2011) e Rafael (2013).
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Foi também neste período que a Ordem dos Frades Menores Capuchinhos se
instalou em nossa diocese nas paróquias do Salto da Divisa e Santa Maria do Salto.
Também acolhemos a Congregação da Companhia de Maria que assumiu os cuidados do
Centro Diocesano de Pastoral.
Foi Dom Hugo quem criou em 2005 às paróquias Nossa Senhora de Fátima em
Mata Verde e Nossa Senhora da Consolação em Divisópolis, desmembrando-as das paró-
quias São João Batista e São Pedro de Almenara e no dia 08 de dezembro de 2011 criou
a paróquia Nossa Senhora D’Ajuda em Monte Formoso.
Dom Hugo iniciou a Pastoral Familiar, Vocacional e do Dízimo e realizou várias
Assembleias Diocesanas, mas a marca maior do seu episcopado na diocese de Almenara foi
a consciência missionária, de todo o povo de Deus, através das Santas Missões Populares.
Depois de 14 anos servindo a diocese de Almenara, Dom Hugo pediu sua renún-
cia ao Papa Francisco, e este acolheu o seu pedido e no dia 19 de junho de 2013 nomeou
Monsenhor José Carlos Brandão Cabral, da diocese de Limeira-SP, para a nossa Diocese.
O quarto bispo de nossa diocese é, portanto, Dom José Carlos Brandão Cabral.
Ele nasceu em 1963 e recebeu a sagração episcopal no dia 15 de setembro de 2013 assu-
mindo a diocese no dia 20 de outubro do mesmo ano.
Dom Cabral logo organizou a Gestão Econômica e Canônica na Cúria Dio-
cesana e em todas as paróquias da diocese de Almenara. Implantou um sistema digital
interligado para facilitar a administração financeira, canônica e pastoral.
Outra marca de seu governo foi a divisão da diocese em cinco regiões pastorais
chamadas de foranias para facilitar os trabalhos e ter uma melhor participação dos leigos
nos Conselhos e nas formações.
Ele também trouxe para a diocese de Almenara as Irmãs Canossianas e as en-
viou para trabalhar na Comunidade Santo Antônio da Paróquia São João Batista, em Al-
menara. E também acolheu os Pequenos Irmãos do Santíssimo Sacramento mandando-os
para ajudarem nas paróquias São Sebastião de Salto da Divisa e Nossa Senhora da Con-
ceição em Santa Maria do Salto. Enviou os Frades Menores Capuchinhos para servirem
na catedral diocesana de São João Batista na cidade de Almenara.
Durante seu governo foram ordenados os padres Gabriel e Leandro (2017) e
Regis, Sebastião e Alexandre (2020).
Em 2019, Dom Cabral criou e instalou a Paróquia Imaculada Conceição e Santo
Antônio na cidade de Palmópolis, desmembrando-a de Rio do Prado.
Em 2021, Dom Cabral acolheu as Irmãs da Congregação das Irmãs Batistinas e
as enviou para ajudar na Paróquia Nossa Senhora a do Desterro, em Jordânia.
São estas e outras tantas realizações que celebramos nestes 40 anos de existên-
cia. Somos um povo alegre, festivo, acolhedor e dinâmico. Graças a essas características
que, apesar de nossas limitações socioeconômicas que conseguimos caminhar como o
“Povo de Deus que no deserto andava”.
*Bacharel em Filosofia pelo Seminário Sagrado Coração de Jesus em Diamantina e licenciatura em Teologia
Instituto Santo Tomás de Aquino em Belo Horizonte. Pós-Graduado em Psicologia e Filosofia. Atualmente é
Coordenador Geral de Pastoral da Diocese de Almenara. É pároco na Paróquia São Pedro Apóstolo e formador
do Seminário Propedêutico em Almenara.
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Biografia de Padre Giovanni Battista Lisa
Joana Alves Louback*
RESUMO
O presente trabalho visa apresentar para a sociedade um pouco da vida e legado deixado
por um dos mais importantes missionários que já existiu em nossa região, o Padre Gio-
vanni Battista Lisa, oriundo do norte da Itália, região de Piemonte, que deixou tudo para
viver com os pobres e para os pobres, sobretudo da Zona Sul da cidade de Teófilo Otoni,
Minas Gerais. Seu legado é imensurável, pois traduz-se essencialmente na promoção do
ser humano, no combate às desigualdades socioeconômicas e no resgate da cidadania,
como mecanismo de transformação das realidades excludentes.
1- INTRODUÇÃO
A vida do Padre Giovanni Battista Lisa, foi um exemplo de doação total no servir
aos mais pobres e excluídos da sociedade. Sua obra não se resumiu à construção de bairros
inteiros em mutirão, garantindo moradia digna para os mais necessitados ou à criação de
instituições que promoveram a organização do povo para conquista de seus direitos fun-
damentais, como formação profissional, trabalho e renda. O seu maior feito se refere à for-
mação humana das pessoas que tiveram a grata oportunidade de conviver com o mesmo e,
sobretudo, o seu testemunho vivido, com profunda coerência evangélica, unindo fé e vida,
Bíblia e realidade cotidiana. Viveu, portanto, profundamente a Teologia da Libertação e
a opção preferencial pelos pobres. Foi responsável pela formação de diversas lideranças
comunitárias e sociais em Teófilo Otoni e região, no campo e na cidade, militantes de uma
sociedade mais justa e fraterna para todos, tendo um olhar especial e de profundo amor
para com as crianças, adolescentes e jovens. Sua fé o levou a semear a semente de uma
nova sociedade, impelindo muitos, pelo seu testemunho de vida, a continuar a luta por
uma sociedade mais justa e igualitária, construída por todo cidadão e cidadã, onde, cada
um, por mais simples que seja, tem sua importância fundamental nesta construção.
2 - SEU PAÍS
Padre Giovanni Battista Lisa nasceu em 17de junho de 1931, na cidade de Cerezolle
62
D’Alba, Itália e faleceu em 15 de abril de 2022,com 90 anos de idade, na cidade de
Teófilo Otoni, Estado de Minas Gerais, Brasil.Teve uma origem pobre, sendo filho de
marceneiro.Foi um dos oito filhos de Thomaz Lisa e Lúcia Valle, que possuíam quatro
filhos homens e quatro mulheres. Seu pai foi prefeito da pequena cidade de Cerezolle
D’Alba por três mandatos, todos voluntários como era naquela época. Apenas um de seus
irmãos, o Carlo, ascendeu economicamente no ramo de marcenaria com a loja de móveis
chamada Mobilli Lisa. Os outros irmãos levaram uma vida de trabalhador operário. Seu
irmão mais velho, Francesco, foi levado ao campo de concentração de Auschwitz, na
segunda guerra mundial, de onde conseguiu fugir. Ele fazia parte dos partizziano, gru-
po de guerrilheiros que resistiram contra os alemães durante a segunda guerra. Seu pai
também ia ser levado juntamente com o filho mas foi tirado da fila por um amigo que o
reconheceu e o retirou do grupo.
Cerezolle D’Alba é uma pequena cidade do norte da Itália, com uma população
de cerca de mil famílias, próximo da cidade de Alba, como o distrito de Mucuri é para
Teófilo Otoni. Alba é a cidade polo da região e sede da diocese, onde Padre Giovanni fez
seus estudos como seminarista e, posteriormente, atuou como reitor do mesmo seminário.
Alba e Cerezolle D´Alba estão localizadas na região de Piemonte, norte da Itá-
lia, a qual tem Torino como a capital regional. Em Torino foi fundada a fábrica da Fiat e
em Alba foi crida a fábrica de Chocolate Ferrero, onde é produzida a saborosa Nutella e
o delicioso bombom Ferrero Roché, entre outros.
4 - SUA VOCAÇÃO
Segundo seu próprio relato, padre Giovanni dizia que sua mãe foi determinante
na sua decisão de se tornar padre porque um dia ela lhe disse, com todo carinho, que ele
tinha vocação. Em outro momento disse para que procurasse o padre na sua cidade, Cere-
zolle D’Alba. Sua mãe preparou tudo com o padre e, quando o religioso fez o importante
convite a Giovanni, não teve como não lembrar daquela afirmação da sua mãe que dizia:
sabe, meu filho, você tem vocação. E ali mesmo ele deu seu sim, definitivamente para a
entrada promissora na revolucionária missão de profeta da libertação, como todos enten-
dem ter sido tão querido Padre Giovanni.
7- A TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO
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pescador de homens (e mulheres), no mais profundo sentido evangélico.
Através da sua vocação missionária demonstrou total compreensão de seu lugar
no discipulado de Jesus Cristo ao aceitar plenamente Seu chamado e envio, contido nas se-
guintes palavras: “Ide ao mundo inteiro e anunciai a Boa Nova do Reino a toda criatura”.
O Padre Giovanni foi referência para a fundação de diversas instituições em Teófilo
Otoni, como Casa Nazaré, criada pela amiga italiana Ana Maria Poggio, importante insti-
tuição de assistência social e educacional a crianças e adolescentes, na Zona Sul de Teófilo
Otoni; entidade O Ninho, conhecida como Creche Ninho ou Casa das Meninas, fundada pela
saudosa freira Irmã Zoé da Cunha Menezes, no mesmo período da APJ; AMCA - Apoio à
Mulher, à Criança e ao Adolescente, entidade muito bem cuidada pelos queridos amigos, o
casal Janice de Franz.
A partir do Concílio Vaticano II, as Conferências de Puebla e Medelin, a Teolo-
gia da Libertação marcou definitivamente o ser e o fazer do Padre Giovanni que, a partir
de seu corpo, mente e alma, fez de Teófilo Otoni uma referência de uma igreja onde a fé e
a vida caminhavam de mãos dadas, na certeza de que a Justiça e a Paz se abraçarão, como
rezam os Salmos 85 e 106.
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to eles estão sofrendo. 8 Por isso desci para livrá-los das mãos dos egípícios
e tirá-los daqui para uma terra boa e vasta, onde há leite e mel com fartura: a
terra dos cananeus, dos hititas, dos amorreus, dos ferezeus, dos heveus e dos jebuseus.
9 Pois agora o clamor dos israelitas chegou a mim, e tenho visto como os egípcios os opri-
mem.10 Vá, pois, agora; eu o envio ao faraó para tirar do Egito o meu povo, os israelitas”.
9 - SEU LEGADO
TESTAMENTO
“Declaro que, a partir de um fato acontecido na minha vida, quando era um dia de chu-
va e eu participava do enterro de uma pobre mulher no primeiro Cemitério Pindorama,
determinei que o lugar da minha sepultura deverá ser aquele cemitério, popularmente
chamado de Pindorama. Assim declarei também ao nosso Bispo de então. Peço por favor
que o túmulo seja somente de terra sem outra ornamentação a não ser uma simples cruz
de madeira. Obrigado!
Em comunhão fraterna de oração e de coração.”
Teófilo Otoni, 11-03-2003, tempo de Quaresma, preparando a Páscoa.”
Giovanni Batista Lisa.
10- CONCLUSÃO
Em Teófilo Otoni, o Padre Giovanni deixou algumas marcas, das quais ninguém
poderá apropriar-se, esconder, silenciar ou negar:
1- A Associação Aprender Produzir Juntos - APJ, entidade, de fomento ao asso-
ciativismo, cooperativismo, economia popular solidária, educação profissional e para a
cidadania, criada por ele em 08 de julho de 1984, hoje a principal referência nas citadas
áreas, em nossa cidade e região, bem como no Estado de Minas Gerais.
2- Os bairros Vila Esperança, Taquara, São Benedito, e Paulo Freire, construídos
em mutirão, através da campanha dos 50 alqueires, na década de 80, sendo este último, fei-
to a aquisição do terreno na época e construído por meio de políticas públicas,de moradias
populares no Governo do Presidente Lula em parceria com o Governo Municipal da sau-
dosa prefeita, Maria José Haueisen Freire, que preparou o terreno já adquirido,pelo,Padre
Giovanni em nome do Comitê Popular das Associações dos Bairros.
3- A fundação do Partido dos Trabalhadores, de vários sindicatos, movimentos
populares e comunidades eclesiais de base.
4- Era um período em que a Igreja italiana começava a enfraquecer-se e, segun-
do seu relato,quando decidiu vir para o Brasil, ao comunicar ao bispo da diocese de Alba,
66
este levantou-se da sua cadeira e deu-lhe um forte abraço dizendo: te agradeço, te agrade-
ço! Então ele sai da Itália e vem fazer uma revolução que marcou profundamente nossa
cidade, nossa igreja e o nosso povo. Dá para imaginar qual seria o destino de Teófilo Otoni
sem este conjunto de entidades, sindicatos e organizações sociais que o Padre Giovanni
criou ou inspirou? Fruto desse conjunto de lutas e organizações este Município elegeu a
primeira mulher prefeita e o prefeito mais jovem de Minas Gerais. Os padres italianos
marcaram e determinaram definitivamente a vida e a história da nossa cidade e região.
67
“Paulistas e criminosos fugidos à justiça”: a
história da Revolta do Serro do Frio, 1718 a 1720
Danilo Arnaldo Briskievicz*
68
reconhecimento de sua função em 17 de março de 1705 (BIBLIOTECA NACIONAL,
1938, p. 352-360).No dia 19 de março de 1705 foi enviada a sua patente de capitão-mor
dos distritos do Serro do Frio e Itacambira(BIBLIOTECA NACIONAL, 1938, p. 11-12).
Interessante correspondência levada até d. Rodrigo da Costa pelo guarda-mor
Antônio Soares Ferreira dá conta das relações iniciais de poder, autoridade e privilégios
nas minas do Serro do Frio. Carta datada de 28 de janeiro de 1704 foi remetida ao go-
vernador-geral do Brasil pelo frei padre Pedro da Cruz – a quem é usado o pronome de
tratamento vossa paternidade – e que obteve a seguinte resposta, em 17 de março de 1705:
O dito capitão sendo filho de um pai, que também serviu a sua majestade, que Deus guar-
de, neste estado não pode deixar de ter todas as prendas que vossa paternidade me segura,
e assim o tem mostrado, no desinteresse, e ativos brios com que se emprega no serviço do
dito Senhor, e arrecadação de sua Real Fazenda, e bem temporal e espiritual desse povo,
com o que, da eleição que nele fiz, não só aceito agradecimento que vossa paternidade
me dá, mas também espero se me deem os parabéns dela, como se me devem, pelo sin-
gular gosto que tenho de tão grande acerto(BIBLIOTECA NACIONAL, 1938, p. 9-10).
Estimo muito estar vossa mercê entregue da provisão, que lhe remeti, de guarda-mor desses
seus descobrimentos, e de posse do dito cargo, sem contradição de pessoa alguma, antes me
consta, ser com grande gosto, e satisfação desse povo, o que não posso duvidar, assim pelo
grande zelo que vossa mercê mostra no serviço de sua majestade, que Deus guarde, como
por filho de um pai tão digno de sua real grandeza, o que bem testemunha este estado, e ca-
pitania respeito da grande parte que teve na extinção do gentio, que a inficionava, e assim
espero, ver em vossa mercê logradas aquelas mercês, que o dito senhor lhe deve fazer, pois
com tanto trabalho e despesa de sua fazenda se expôs a lhe fazer este tão grande serviço,
só por aumentar a do mesmo Senhor, de que lhe hão de resultar tão lucrosos aumentos; e
pelo que me toca a mim nesta parte, dou a vossa mercê, quanto me é possível, e posso, os
agradecimentos, e parabéns, do bem que tem obrado, deixando todos os mais interesses, só
afim de conseguir estes descobrimentos (BIBLIOTECA NACIONAL, 1938,p. 352-353).
***
70
Salvador, na Bahia.
Depois da organização das minas do Serro do Frio, como era de costume, o
descobridor Antônio Soares Ferreira, ou para ser exato, o colonizador do Serro do Frio
onde surgiu o concelho da Vila do Príncipe, passou para outro lugar, à procura de novas
primazias. Após as tensões e motins que originaram a criação da Vila do Príncipe, foi o
ano de 1720 o auge das tensões locais que deram origem – ou justificaram para a Coroa
portuguesa – como era intenção do governo do conde de Assumar, a criação de uma co-
marca nova, com seu novo ouvidor, submisso ao governo da capitania. Assim, “tornara-se
imprescindível a criação de novas comarcas amputadas a Sabará”. Para Morais (1942, p.
32), “os ouvidores, autoridades máximas nas Comarcas, representantes direitos da Coroa
Portuguesa, absorviam, a um só tempo, várias incumbências: Ouvidor Geral, Provedor de
Defuntos, Ausentes e Resíduos, Capelas e da Fazenda Real, Corregedor supremo em toda
a Comarca e Intendente da Real Fundição. O Ouvidor do Serro Frio exercia jurisdição
ordinária, civil e criminal em seu distrito, por bem do regimento dos ouvidores do Rio
de Janeiro”. Além disso, o ouvidor podia constituir o corpo administrativo com seus fun-
cionários nomeados por provisões e patentes, garantindo novos cargos para os “homens
bons” do distrito serrano. Essa era a troca mais importante: com a chegada de uma nova
ordem em 1714 com a Vila do Príncipe e com a criação da Comarca do Serro do Frio
em 1720 o conde de Assumar angariou o respeito dos “homens bons” interessados na
distribuição das novas mercês. Os bandeirantes perderam sua notoriedade para os oficiais
do Senado da Câmara, os ouvidores e seus funcionários. A antiga ordem bandeirante do
Regimento de 1702 deu lugar ao novo corpo político das Ordenações.
A cronologia dos fatos da Revolta do Serro do Frio parece, por vezes, estar caó-
tica. Isso se deve ao fato da demora de chegada das notícias, através das cartas oficiais e
suas repercussões. É preciso atentar-se ao fundo da questão: o conde Assumar queria im-
plantar uma nova comarca com capital na Vila do Príncipe par reordenar definitivamente
o distrito de cabo a rabo, ou seja, em sua totalidade. Para fazer esta mudança radical era
necessário tirar os bandeirantes de cena com ardilosos processos de culpabilização de
usurpação. É preciso lembrar que no ano de 1720, em Vila Rica, os questionamentos da
autoridade do conde de Assumar levaram à Revolta de Filipe dos Santos. No distrito ser-
rano o opositor do conde de Assumar foi o descobridor serrano Antônio Soares Ferreira e
o grupo que fizera a colonização do distrito serrano. Tirar os antigos mandatários, colocar
novos chefes locais, esta era a intenção de Assumar neste contexto.
Em resumo, a Revolta do Serro do Frio pode ser contada assim: o descobri-
dor das minas do Serro do Frio, Antônio Soares Ferreira, mudou-se, em busca de novos
descobrimentos para as proximidades do arraial de Conceição do Mato Dentro, para ser
exato, no morro que levava seu nome. Neste lugar, depois de uma disputa com o conde
de Assumar por poder e autoridade locais e troca de acusações, acabou assassinado em
1720, com uma guerra entre os seus defensores e a comitiva do coronel José Borges Pin-
to, destacado para levar vivo ou morto o bandeirante paulista. Tudo foi orquestrado pelo
governador da Capitania de São Paulo e Minas do Ouro, d. Pedro Miguel de Almeida
Portugal, o conde de Assumar que viu seu opositor assassinado ao tentar fugir da ordem
de prisão por desobediência às ordens de abandonar aquelas minas. “Rei morto, rei pos-
to”. Bandeirante morto, comarca nova criada.
71
O conde de Assumar foi governador da Capitania de São Paulo e Minas do Ouro
entre 14 de setembro de 1717 a 4 de setembro de 1721. Seu governo teve como funda-
mento o gesto pedagógico da violência, especialmente reconhecido pelos historiadores
no desfecho da Revolta de Vila Rica, em 1720, quando usou da dissimulação e da mentira
para negociar o conflito em torno da arrecadação dos impostos pela construção das casas
de fundição em território mineiro. Ele mandou enforcar e esquartejar o corpo de Filipe
dos Santos, homem pobre (que, segundo possuía o dom da oratória, ou seja, era capaz de
usar o discurso para mobilizar seus pares, sendo muito querido pelo povo. O assassinato
do guarda-mor descobridor das minas do Serro do Frio Antônio Soares Ferreira antecede
à morte de Filipe dos Santos, demonstrando como o governo do conde de Assumar não
estava para brincadeira: seu fundamento era a violência, gesto pedagógico que demonstra
a fraca relação de poder e de autoridade metropolitana em território mineiro e a sua inca-
pacidade – ou desprezo absoluto – em criar mecanismos de diálogo com o corpo político
colonial. Talvez por isso, os Senados da Câmara tenham se tornado uma instituição ambí-
gua em alguns casos: se por um lado negociavam com o governo da Capitania, do Brasil
ou de Portugal, ajustando medidas, em função da república, por outro, acabavam por
denunciar os desvios de conduta – a desobediência civil – e tomavam as providências, no
sentido de manter o ordenamento, em benefício do governo metropolitano. Um jogo de
poder complexo, com relações micromoleculares de poder, baseadas em acordos, interes-
ses difusos, narrativas múltiplas e por vezes desencontradas. Isso fica claro na narrativa
da revolta de Vila Rica – ou a justificativa do assassinato de Filipe dos Santos – escrita
por jesuítas com auxílio do conde de Assumar, em 1720:
Explicarei brevemente o modo com que neste país se formam os motins, e o com que o
povo neles entra. Estes jamais se fazem, senão pela meia-noite, no maior silêncio dela;
e esta é bastante prova de que o povo, nem agora, nem nas sublevações passadas cui-
dou nunca em levantar-se, ainda que, depois de excitados à força pelos cabeças, parece
que por seu gosto sustenta o tumulto, tal é a natureza do vulgo, que para se alegrar
e folgar com seu próprio mal, basta ser novidade e sem razão, porque tem por hom-
bridade e capricho, seguir tudo o que vem contra a razão, contra a piedade e contra o
agradecimento [...] Começa-se ordinariamente a formar o motim por seis ou sete mas-
carados, a que acompanham trinta ou quarenta negros armados, dos quais a uns fazem
ocupar as bocas das ruas, a outros mandam ir batendo, e onde logo não se abre, arrom-
bam as portas dos moradores, que, como pela maior parte sejam térreas, limitadas e
de pouca resistência, qualquer empuxão as tira de seus eixos. Correndo assim as ruas,
e gritando – Viva o povo, senão morra! – os moradores, por não experimentarem na-
quele repente alguma violência na fazenda ou na vida, vão dando passos em seu dano,
como rebanhos de ovelhas, após os mesmos lobos que as devoram. Depois de terem
alarmado o povo, que ainda ignora o para que é semelhante ajuntamento, levanta-se
um mascarado, e começa a dizer em voz alta: Meu povo, quereis que façamos isto ou
aquilo? E se todos não dizem que sim, os negros armados ou ferem, ou matam alguns
dos que lhes ficam mais à mão; até que os outros, por não caírem em igual desgraça,
convêm no que dizem os máscaras (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 1994, p. 84-85).
72
crime grave, pois a providência estava prevista no Regimento de 1702. Contudo, ao que
parece, não era bem esse o motivo. A dissimulação do conde de Assumar era bastante
conhecida e ele era hábil em criar situações para defender seus interesses e não permitir
questionamentos de sua autoridade. Segundo Franco (1989, p. 162), um hipócrita: “o
conde de Assumar, em carta de Vila Rica de 6 de agosto de 1720, dirigida ao coronel
Borges, lamentava hipocritamente o fato”.
Analisando os documentos, fica claro que a queixa do governador em relação às
lavras de ouro do bandeirante paulista, baseava-se na necessária lucratividade para a Co-
roa portuguesa, da qual fazia-se defensor dos interesses. Assim, essas datas dariam me-
nor rendimento do que o necessário ou se equiparariam com as datas de cobre, de valor
bastante reduzido naquele contexto. Esse é o motivo que aparece na primeira ordem de
proibição das lavras, expedida em 10 de dezembro de 1718 (REVISTA DO ARQUIVO
PÚBLICO MINEIRO, 1933, p. 512), completada com outra ordem ao mestre-de-campo
Jerônimo Pereira da Afonseca para que não mais permitisse qualquer pessoa de minerar
nas terras, por ser o rendimento inferior às minas de cobre. Isso incluía os escravos de
Manuel Corrêa Arzão. Três dias depois, em 13 de dezembro, a situação já havia mudado
completamente, pois o mesmo governador conde de Assumar mandou uma carta a An-
tônio Soares Ferreira declarando que após segunda pesquisa sobre o ouro de sua lavra
autorizava a exploração, confirmando que o mesmo não teria usurpado as terras da Coroa
portuguesa.
A questão girava até então em torno do rendimento das lavras de ouro, não de
sua divisão correta, com a previsão das terras da Coroa portuguesa aparentemente tendo
sido realizadas e arrematadas como de costume, em conformidade com o Regimento de
1702. No mesmo dia 13 de dezembro, o conde de Assumar mandou o mestre-de-campo
autorizar a exploração das lavras do paulista descobridor das minas do Serro do Frio, por
terem o mesmo rendimento que as de Pitangui.
Parece que o conde de Assumar, disposto a comprovar sua autoridade nas
minas gerais, questionada na Vila Rica com sedição liderada por Filipe dos Santos
(28/06/1720) aproveitou-se do clima de revanchismo e desautorizações de seu governo
nas minas gerais, provindos de vários lugares e por diversas lideranças locais, e aca-
bou por decretar a prisão de Antônio Soares Ferreira. Não havia motivo para mandar
prendê-lo, exceto aquele de mostrar-se mais poderoso que o governador no distrito
serrano das minas.
Mandou prender o bandeirante paulista por capricho ou proteção de seu cargo?
Tratou-se de uma ação impensada ou o uso clássico da razão instrumental na governa-
mentalidade? Fato é que no mesmo ano da morte de Filipe dos Santos na Vila Rica foi
também assassinado o descobridor das minas serranas, praticamente ao mesmo tempo,
em lugares diferentes. A aversão do Conde de Assumar pelos sertanistas paulistas ou
súditos desobedientes que por algum motivo questionavam sua autoridade fica evidente
na sua carta escrita no dia 10 de dezembro de 1717 ao rei de Portugal, em que solicitava
a criação das justiças na Vila do Príncipe, ou seja, a criação do cargo de ouvidor-geral
com uma nova comarca nas Minas Gerais. A resposta de D. João V foi a seguinte, no dia
10 de setembro de 1718:
73
Dom João por graça de Deus rei de Portugal e dos Algarves [...] faço saber a vós dom
Pedro de Almeida, Conde de Assumar, governador da Capitania General da Capitania de
São Paulo e terras das Minas que se viu a vossa carta de dez de dezembro do ano passado
em que dais conta de que nos sertões desse governo há uma vila de que chamam do Prín-
cipe na Serra do Frio distante oito ou dez dias da Vila do Sabará a qual se há povoando
de paulistas e criminosos fugidos à justiça e como no tal sítio se hão descobrindo novas
minas mui abundantes, seria conveniente nomear-se para ele um ouvidor por que ainda
que no princípio lhe não fosse fácil o administrar justiça livremente pouco a pouco se
costumariam os moradores a recorrerem à justiça como tinha sucedido nas mais ouvido-
rias, e que além destas razões convinha haver o tal ministro na dita vila, assim por terem
os habitadores dela mais perto ministro a quem recorressem, como para ter cuidado nos
quintos em que a experiência mostrava tanta dificuldade na cobrança pela distância em
que se achava e que dando-se-lhe boa ordem no princípio poderiam ter grande acréscimo
os quintos por serem as tais minas muito abundantes de ouro, e sem este remédio muita
dificuldade depois a tirá-las do mau costume em que se achavam na posse de os não
pagar faltando os meios de os obrigar a força e assim vos parecia que criando-se o dito
ouvidor fosse tal ministro em que concorresse além das mais partes a do bom modo para
suavemente estabelecer e conservar com os moradores por ser a experiência certa que
melhor aceitos são os ministros que com a docilidade administram justiça que os que
com o rigor das leis a querem executar. E pareceu [...] que visto vos ter concedido doze
mil cruzados pela ocasião das jornadas e visitar que haveis de fazer nas terras do vosso
governo vades no tempo que for mais oportuno ao dito distrito com o ouvidor-geral mais
vizinho que se entende deve ser o da sua comarca, instituais juiz ordinário e vereadores
das pessoas de mais confiança e prudência úteis para este ministro, e o tal ouvidor com
toda a suavidade procurar unir aos demais moradores a boa forma da república e obe-
diência às leis, regimentos e ordens minhas, e no caso que se aumente esta povoação
e poderia então criar o lugar de ouvidor como apontais. El rei nosso senhor mandou
por João Telles da Silva [...] (ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, SC-04, fl. 184-187).
74
vias da aplicação da justiça imediatamente, sob o olhar atento do ouvidor-geral.
Importante é o papel do chamado regalismo como razão de estado e doutrina
para a administração ou governamentalidade de d. João V de 1706 a 1750. O Conde de
Assumar era um dos defensores dessa postura de sossegamento da república ou da pre-
sença massiva dos mecanismos de ordenamento social diante dos olhos dos súditos. Os
procedimentos disciplinares da governamentalidade portuguesa da última etapa do An-
tigo Regime português reverberou no gesto pedagógico colonial da organização política
brasileira, mineira e serrana.
De simples arraial de lavras de ouro, as minas do Serro do Frio rapidamente
se transformaram em território fundamental para a colonização do vale do Jequitinho-
nha, dos caminhos gerais da Serra do Espinhaço e dos caminhos da Bahia na Serra de
Itacambira, e já no século XVIII previa-se expansão para o vale do rio Doce. Paróquia
com vigário encomendado em 1713, a Vila do Príncipe instalou seu Senado da Câmara
em 1714, abrigando a capital da Comarca do Serro do Frio em 1720, recebendo o título
de paróquia colada em 1724 com a nomeação do vigário Simão Pacheco (o mais bem
remunerado da capitania mineira do século XVIII) e recebeu a destinação da Real casa
de Fundição em 1750. A história da vila serrana com tantos “homens bons” em sua sede,
espalhando-se pelos diversos povoados e arraias, com constante trânsito interprovincial
e intercontinental não poderia passar despercebida no cenário político do século XVIII
quando o tema é o regalismo.
Ao mesmo tempo em que o regalismo se capilarizava nas minas do Serro do
Frio – títulos da organização do povoado em expansão, arraial, vila e a pleiteada capital
da comarca pelo Conde de Assumar desde 1717 – criava-se a modernidade política em
que se deve dizer de tudo, de tudo falar publicamente (para vários historiadores a época
moderna inicia-se em 1789 apenas, mas consideramos que seus fundamentos são arti-
culados em transição anterior, no Antigo Regime). A insistência do Conde de Assumar
em colocar um ouvidor-geral na Vila do Príncipe pode ser justificada pelo próprio nome
do magistrado: um ouvidor é quem escuta as queixas dos habitadores para promover a
justiça a quem tira o sossego da república; um ouvidor é também um corregedor, um
magistrado especializado em disciplinar os habitadores ou súditos pelo cumprimento dos
regimentos e ordens da Coroa portuguesa. Por trás do regalismo há duas virtudes pró-
prias do Antigo Regime, a honra e a cumplicidade que de certa forma sedimentavam as
alianças entre a Coroa portuguesa e seus magistrados e os “homens bons” (RAMINELLI,
2016, p. 2).
A resposta de d. João V foi para não criar a comarca serrana no ano de 1718.
Em dois anos, ou seja, em 1720, sua mentalidade mudou e ele resolveu dividir o territó-
rio brasileiro criando a capitania de Minas Gerais separada da de São Paulo e criando a
Comarca do Serro do Frio, desmembrando a justiça das Minas Gerais, aproximando os
“homens bons” serranos do regalismo português.
O conde de Assumar não desistiu de criar a comarca serrana. O que nos interessa
agora é mostrar outra carta do governador, estabelecido em Minas Gerais, em que ele trata
do problema dos desobedientes, especialmente os “paulistas” e “criminosos”. Ele descre-
ve sua visão política do descobridor das minas do Serro do Frio, Antônio Soares Ferreira.
O governador temia como ninguém a desagregação da obediência popular pela presença e
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conluios entre os “homens bons” do descobrimento. A carta é longa, por isso vamos des-
tacar alguns trechos que nos mostram diretamente o ponto que nos interessa analisar nesse
momento: as motivações para o assassinato do bandeirante paulista Soares Ferreira.
Em primeiro lugar, a data da carta, 30 de maio de 1720 (em resposta a outra
carta do dia 10 de setembro de 1718), posterior à expedição oficial que culminou com
o assassinato de Soares Ferreira, carta esta contemporânea da tomada dos terrenos do
bandeirante paulista em Conceição do Mato Dentro, em que o governador já havia auto-
rizado a expedição do sertanista José Borges Pinto para prendê-lo. O processo de criação
da comarca do Serro do Frio coincidiu inteiramente com as providências para acabar com
a autoridade de Soares Ferreira nas minas serranas.
Vejamos: no dia 17 de fevereiro de 1720 foi expedida a ordem régia, comuni-
cando ao Conde de Assumar, “que se mandou criar ouvidor para a Vila do Príncipe do
Serro do Frio, com o mesmo ordenado que têm os mais ouvidores gerais das comarcas de
Minas Gerais, o qual lhe será pago em moeda, e não em oitavas, como está disposto” (BI-
BLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL, Doc. 76, 17/02/1720); no dia 21 de fevereiro
de 1720 foi enviada uma carta, “na qual se declara que se tem resoluto criar-se um novo
governo em São Paulo, separado do de Minas, e que para se evitar a disputa entre os con-
fins das Minas Gerais com o governo do Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco, tomasse
ele, governador conde de Assumar, as informações necessárias sobre este particular, dan-
do conta do que se assentar com o seu parecer, e se puder, tomar a resolução que for mais
conveniente” (BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL, Doc. 76, 21/02/1720); no
dia 16 de março de 1720, foi enviada uma ordem “na qual se declara ao governador de
Minas Gerais que se mandou criar o lugar de ouvidor-geral da Vila do Príncipe e prover
nele ao bacharel Antônio Rodrigues Banha, e que vença o ordenado de quinhentos mil
réis como os mais ouvidores de Minas Gerais, e que estes lhe sejam pagos em moeda
e não em oitavas”(BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL, Doc. 77, Cód. 1612,
16/03/1720).
Em segundo lugar, a carta é tardia em relação às ordens régias de criação da
comarca, por causa do tempo necessário de envio de Lisboa para a Vila Rica. D. João V
já havia decidido pela criação da comarca serrana. Por isso, a carta relata o contexto do
Conde de Assumar: expedição nas minas serranas e os problemas da sedição da Vila Rica,
liderada por Filipe dos Santos; esse anacronismo permite entender o que se passava no
governo do Conde de Assumar, ou seja, focos de desobediência civil na capital mineira e
na Vila do Príncipe; o governador afirmou que o impedimento de uma ouvidoria serrana
daria o benefícios aos criminosos, “fiados em que a distância que os constitui senhores
de suas ações os isente dos castigos justamente devido aos seus procedimentos vindo por
este respeito a ser aquele distrito um como asilo de inumeráveis malfeitores por que o
Cerro onde mais se avizinha a Vila Real do Sabará e Rio das Velhas, cabeça da comarca,
são cento e dez dias de violentas marchas e sempre por passos trabalhosos” (ARQUIVO
PÚBLICO MINEIRO, SC-04, fl. 807). O Conde de Assumar gostaria de magistrados
para coibir a ação dos criminosos pela presença física de um ouvidor-geral.
Em terceiro lugar, a visão do Conde de Assumar das minas do Serro do Frio era
semelhante a um território sem lei, destituído de qualquer controle dos magistrados da
Coroa portuguesa. Ele afirmou que “é Cerro cemitério de tanta fazenda alheia e centro de
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tanto assassino quantos são os seus habitadores, por que toda aquele aquém ou o delito ou
a dívida sustar e põe em cuidado por não andar com mais receios” (Apm-Sc 04, fl. 808) os
cobradores do governo. Um lugar de excessos e desmandos. Veja bem que o governador
está se dirigindo ao rei português, tentando persuadi-lo de que ele, o governador, está em
campanha de moralização do gesto pedagógico colonial, ou seja, está tentando implantar
o império da lei segundo os regimentos da Coroa portuguesa. Sem saber da aprovação da
criação da comarca, o governador continua seus apontamentos contra os habitadores cri-
minosos, aqueles que descaminham os rendimentos dos quintos através do contrabando e
não pagam suas obrigações para com a Coroa portuguesa.
Em quarto lugar, agora, sim, o governador parece justificar sua ação que cul-
minou com a morte do paulista Antônio Soares Ferreira. Seu objetivo é informar ao rei
dos desmandos do antigo descobridor, considerado o líder dos revoltosos, por quem se
deixava proteger a fim de não cumprir com suas obrigações com a Coroa portuguesa. A
acusação era de que o bandeirante paulista usurpava as minas, ou seja, não pagava as
obrigações do quinto do ouro e desviava os rendimentos. Assim, o Conde de Assumar
afirmou que:
Ainda não param aqui os danos que experimenta a Fazenda Real também o tem não
pequeno em que os mais poderosos se apressam e apropriam de muitas terras minerais
onde a pinta é maior e só elas lavram tirando a vossa majestade a conveniência que
há em lavrassem muitos naquelas partes em que ouro mais cinge e se extrai com mais
abundância e facilidade e baste por todos Antônio Soares Ferreira o qual ordenando-lhe
eu o ano passado que em permitação de outras me mandasse duas libras de ouro do seu
morro para remeter a vossa majestade segundo a sua ordem que por queixas da Bahia
e Rio de Jaeiro a pedia para dele se fazer exame e advertido segunda vez não só não
remeteu o ouro, mas nem resposta me tornou, porque está certo que ao longe encontram
mandá-lo como ele merecia atacar, e tão despótico se conserva que nas Mato Dentro
da que ele território se tem levantado com o tal morro que notoriamente é grandioso
e dilatado com pinta visto e descoberto por todo ele não consentindo que outra pessoa
alguma lavre e cate no dito morro assim como os anos passados o havia feito Domingos
da Silva Monteiro no morro chamado de Antonio Dias sobranceiro ao Ouro Preto, o qual
livre e franqueado depois com o levante contra os paulistas ele só tem largamente dado a
quinta parte do ouro que há saido de todas estas minas e ainda hoje trabalham e mineram
nele o melhor de quatro mil negros podendo outros tantos lavrar no morro que ocupa e
defende o dito Antonio Soares (ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, SC-01, fl. 810-811).
Para o coronel José Borges Pinto - Vossa mercê é única pessoa a quem neste gover-
no tenho encomendado as diligências mais dificultosas que tem havido por enten-
der que ninguém daria delas melhor satisfação, e porque o conhecido valor de vos-
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sa mercê e o zelo do serviço de sua majestade fazem que eu tenha sempre os olhos
nele para as ocasiões de empenho, por isso agora fiz só da pessoa de vossa mercê e
de ninguém mais a prisão do capitão-mor Antonio Soares Ferreira morador em Mato
Dentro por ser assim conveniente ao real serviço, e veja vossa mercê o como dispõe
esta prisão para que eu não suceda, como a de Manuel Rodrigues Soares, mas espe-
ro que use vossa mercê da mesma astúcia que usou na prisão do falcão dispondo-se
dela com sorte e com tanto segredo que senão suponha que por hora eu tal lhe mandei,
e possa colher os negros de Manuel Correa Arzão na lavra desarmados para que lhe
não façam a vossa mercê alguma oposição, e dando vossa mercê disto boa satisfação
lhe empenho a minha palavra de fazer com sua majestade todos os esforços possíveis
para que lhe dê o prêmio correspondente a este serviço e aos demais, e além disto ex-
perimentará vossa mercê em mim um agradecimento mui sincero naquilo que vossa
mercê mais deseja [...] (ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, SC-09, Rolo 02, fl. 227).
Ao juiz ordinário da Vila do Príncipe [Domingos do Vale Padilha]: depois de deliberar os mo-
tivos determinantes da prisão que mandou efetuar do capitão-mor Antônio Soares Ferreira,
residente em Mato Dentro – um rebelde contra as ordens e bandos e determinações régias –
recomenda-lhe tomar conhecimento judicial das suas culpas em cartório, remetendo o resultado
dessa diligência para o final julgamento em junta de justiça; determina entregar a ordem inclusa
a quem servir de guarda-mor para repartir o morro que o dito Antônio Soares usurpara, depois de
tirar a data de sua majestade (REVISTA DO ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, 1933, p. 669).
Nas citações acima percebem-se, mais uma vez, a forma dissimulada de agir do
conde de Assumar. Há dois anos legalizara a exploração das minas, afirmando que estava
tudo correto. O que mudou nesse período? Qual a nova acusação? A de usurpação das
terras reais, ou seja, acusou Antônio Soares Ferreira de não distribuir e fazer arrematar as
braças, terras da Coroa portuguesa.
Para justificar sua ação, o conde de Assumar ordenou ao “guarda-mor do dis-
trito, para ir ao Mato Dentro do Serro do Frio e repartir pelos mineiros o morro que se
chama Antônio Soares Ferreira e que foi por este usurpado, tirando previamente a data de
sua majestade” (REVISTA DO ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, 1933, p. 669). O re-
sultado foi um motim do bandeirante paulista Antônio Soares Ferreira que contou com a
participação de todos os seus camaradas e escravos. No conflito, acabou assassinado. Isso
foi confirmado por carta do conde de Assumar ao coronel José Borges Pinto, datada de 06
de agosto de 1720. Nela, o governador afirmou – não sabemos se de maneira debochada
ou não – que o coronel preferia não tivesse Antônio Soares Ferreira morrido.
As providências seguintes são bem interessantes do ponto de vista do modus
operandi do conde de Assumar: segundo o relato do coronel, os participantes do motim
juraram vingança, especialmente Manuel Corrêa Arzão, um de seus parentes. Ele man-
dou, então, o coronel, prender Manuel Corrêa Arzão e mandá-lo para Vila Rica; resolver
a situação dos escravos, possivelmente arrematando-os e recolhendo os rendimentos para
a coroa; regularizar as lavras, conferindo seu funcionamento; além disso, em pagamento
simbólico pela ação resoluta, autorizou o coronel José Borges Pinto a assumir a “regên-
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cia provisória do distrito do Serro do Frio ficando a outra parte a cargo de Pedro Pereira
[de Miranda], divisão essa que deliberou fazer agora por ser aquele distrito muito ex-
tenso” (REVISTA DO ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, 1933, p. 669). A divisão ficou
confirmada – o Mato Dentro para o coronel José Borges Pinto e a Vila do Príncipe para
Pedro Pereira de Miranda – por carta datada de 08 de dezembro de 1720.
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Referências
ARENDT, Hannah. Sobre a violência. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1994.
ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO. Seção colonial. SC-01 Rolo 01 1605-1799 Registro de alvarás, regimentos,
cartas e ordens régias, cartas patentes, provisões, confirmações de cartas patentes, sesmarias e doações; SC-04
Rolo 01 1709-1722 Registro de alvarás, ordens, cartas régias e ofícios dos Governadores ao Rei; SC-09 Rolo
02 1713-1717 Registro de cartas, ordens, despachos, instruções, bandos, cartas patentes, provisões e sesmarias.
ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO. Seção colonial. Coleção Casa dos Contos. CC-1002 1702-1709 Livro
primeiro de receita e despesa da Fazenda Real referentes às minas do Serro Frio e de Itacambira; CC-1003
1710 Livro dos rendimentos do gado para corte. Arrematação do contrato dos dízimos pelo Capitão Geraldo
Domingues; CC-1005 1711-1714 Livro que há de servir da receita da Fazenda Real nesta Superintendência das
minas do Serro do Frio.
FRANCO, Francisco de Assis Carvalho. Dicionário de bandeirantes e sertanistas do Brasil: século XVI-XVII-
-XVIII. São Paulo: Comissão do IV Centenário da Cidade de São Paulo,1954.
FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO. Discurso histórico e político sobre a sublevação que nas Minas houve no ano
de 1720. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1994.
MORAIS, Geraldo Dutra de. História de Conceição do Mato Dentro. Belo Horizonte: Biblioteca Mineira de
Cultura, 1942.
PROVISÕES, PATENTES E SESMARIAS 1717-1721. Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte/
MG, ano XXIV, 1933.
PAIVA, Adriano Toledo. Uma tradição paulista nas Minas: descobridores e conquistadores nos sertões doura-
dos. Belo Horizonte: Fino Traço Editora, 2016.
RAMINELLI, Ronald. Justificando nobrezas: velhas e novas elites coloniais 1750-1807. História, São Paulo,
v.35, 2016, p. 1-26.
*Doutor em Educação. Professor do Instituto Federal de Minas Gerais – IFMG, campus Santa Luzia. Membro
correspondente da Academia de Letras de Teófilo Otoni e do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri. Este
estudo é parte da pesquisa do estágio pós-doutoral no Departamento de Pós-Graduação em História da UFMG,
sob a supervisão da Dra. Adriana Romeiro, realizado entre 2022 e 2023.
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Colégio Normal Santa Clara:
Um marco e centro de referência na educação da região
Wallace Gomes Moraes*
82
co de aritmética e noções de Geografia e História. Foram matriculadas 47 alunas das
quais 12 são filhas de indígenas. No dia da visita achavam-se presentes 36 meninas”
Através deste documento, é fácil avaliar os esforços dos Padres Diretores em prol
do ensino, que durante mais de 6 lustros tinham conseguido alfabetizar centenas e cente-
nas de indígenas e civilizados, preparando o terreno para magníficas realizações presentes.
Desde o ano de 1905, no qual D. Joaquim Silvério de Souza, como bispo co-
adjutor com direito à sucessão, tomou em suas mãos o governo da Diocese, concentrou
esforços de seu episcopado com iniciativas, visando a fundação de obras uteis e vitais em
prol das cidades e vilas de sua vasta diocese, como Conceição do Mato Dentro, que viu
surgir, por sua iniciativa o colégio para meninas, dirigido por religiosas.
O bispo Dom Joaquim Silveiro de Souza, interessado pelo assunto, em visita ao
aldeamento de Itambacuri, sugeriu a frei Serafim que criasse um colégio para meninas,
a ser administrado por freiras. Com a aquiescência de Frei Serafim,dirigiu pedido ao
então Núncio Apostólico, Exmo.e Revmo. D. Júlio Tonti, que também aceitou a ideia da
construção do colégio em Itambacuri. Prontificou-se o bispo a oferecer ajuda financeira
e logística para o empreendimento. O zeloso prelado não se limitou apenas a sugerir a
ideia, mas quis ajudar com a quantia de Cr$ 1.500,00 propondo a Frei Serafim acrescentar
quantia igual para o impulso inicial das obras.
O diretor da colônia, Frei Serafim, respondeu imediatamente, aceitando a pro-
posta. As ordens vieram e foram cumpridas. Foi suspensa e adiada a construção do Colé-
gio para meninos, esperando em breve, retomar os trabalhos, mais folgadamente, com o
auxílio dos dois sacerdotes capuchinhos prometidos, que não deviam tardar a chegar.
Frei Serafim:
“Depois de algum tempo, escreveu ao prelado dizendo que os dois sacerdotes que hão de vir
serão empregados na pregação das missões tão almejadas, por V. Exa. uma vez que nós dois,
já idosos, temos a nosso cargo a responsabilidade da catequese e civilização dos índios. Em
todo caso, carece estudar os meios e modos de estabelecer nesta diocese de Diamantina,
nossa Ordem com noviciado e estudos, saindo, deste modo, do estado incerto e inseguro”
Iniciada a construção, foi levada a termo de forma célere, a fim de evitar todo e
qualquer estorvo, oriundo de outras imprevistas iniciativas. Neste aspecto, Frei Serafim
recomenda ao deputado Epaminondas Esteves Otoni que não tenha pressa em pleitear a
emancipação de Itambacuri, mas trate do caso com prudência, pois:
“a emancipação nesta quadra daria a morte à catequese, por que é sustentada e man-
tida pelas sobras de nossos ordenados e mais proventos como espórtulas de missas e
donativos espontâneos dos fiéis, com que são vestidos e alimentados os numerosos
menores indígenas de ambos os sexos, aqui recolhidos, fornecendo-se-lhes também li-
vros, papel e objetos escolares. Socorremos também os índios velhos e desvalidos e,
aos que vão chegando, damos roupa, ferramentas, alimento e remédios, como ultima-
mente aconteceu com os trinta e tantos selvícolas que vieram de Figueira quase nus.”
Frei Serafim, que viveu sempre na mais austera pobreza franciscana, despre-
zando todas as comodidades da vida, teve necessidade, nessa altura, de pensar em ga-
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rantir juridicamente o solo sobre o qual tinha, em troca de imensos e heroicos sacrifícios
erguidos, os edifícios sagrados: igreja, cemitério, residência dos padres missionários e
colégio, requerendo ao Secretário do Interior do Estado de Minas, nos termos da lei n.
27, artigo 22, § 4, a concessão gratuita dos lotes urbanos 39 e 40 e dos lotes rurais 100,
101 e 114, para neles construir o edifício do colégio e respectivas dependências. Nessa
mesma ocasião requereu, com os mesmos fundamentos, os lotes urbanos 49, 37 e 38 para
a construção do Campo Prático Agrícola, totalizando uma área aproximada de 760 mil
metros quadrados.
Paralelamente à construção do colégio, foram sendo realizados melhoramentos
necessários ao saneamento do arraial, consistindo na drenagem e retificação de alguns tre-
chos do rio Itambacuri, do Fortuna e dos regatos, abrindo canais para o dessecamento de
pântanos e pequenas lagoas, a fim de impedir o desenvolvimento de febres de máu caráter.
O “Estrelo Polar” órgão oficial da diocese de Diamantina, publicou nessa época,
um longo artigo informativo:
“Duas palavras sobre o Itambacuri”, tecendo elogios aos Padres Diretores, lou-
vando o seu progresso e as iniciativas em curso, isto é, a construção do co-
légio para o sexo feminino, ‘cujo edifício de grandes proporções está sen-
do quasi ultimado’ e noticiava estar projetada “a ampliação da Casa dos Padres
Capuchinhos, afim de poderem dar aos moços mais adequada instrução com maior
soma de conhecimentos, e receber na Ordem Seráfica os que revelarem vocação”.
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um serviço relevante prestado à causa da civilização pelos Revmos. amigos a juntar aos
muitos dos que lhes é devedor o progresso e adiantamento dessas regiões, tão sábiamen-
te entregues à vossa prudente administração pelo Governo do Estado de Minas.Ofere-
ço aos Revmos. Amigos meu limitado préstimo no Rio de Janeiro, e terei muito prazer
em poder ser-vos util em alguma cousa, se para isso me poderem utilizar. Confessando
eternamente grato e penhorado, fico dos Revmos. Padres, Admirador e amigo obrigado
(Ass.) Emílio Schnor (Engenheiro Civil)!
85
Assim que entrou para o convento das franciscanas, Madre Serafina assumiu a
direção da escola, tornando-se conhecida por sua personalidade forte e trato competente
na criação e administração de instituições de ensino, sendo muitas vezes chamada para
abrir escolas, consolidando-as e passando depois sua administração a outrem.
A freira era habilidosa não apenas na criação das escolas, mas também na for-
mação de professores. Além disso, tinha a manifesta vontade de expandir sua obra para
missões em regiões carentes, como a esta altura já havia feito com a Índia. Como seu ob-
jetivo era, sobretudo, a renovação dos métodos de ensino; nem sempre eram pacíficas as
relações entre Madre Serafina e seus superiores, mais ligados aos processos tradicionais.
Assim, anos mais tarde a irmã fundou o Instituto das Clarissas Franciscanas
Missionárias do Santíssimo Sacramento, com o firme propósito de continuar a promover
mudanças nos modos de ensinar. No dia 14 de maio de 1898, 14 freiras professaram seus
votos no novo Instituto, que daí por diante iniciou seu processo de expansão.
Madre Serafina preferia abrir escolas em regiões pobres, onde houvesse maior
necessidade de assistência, mas seu grande sonho era estabelecer comunidades de missão
em terras estrangeiras.
Dom Joaquim Silvério de Souza, bispo de Diamantina, certo de que encontrara
a solução ideal para a situação resolveu convidar as freiras do Santíssimo Sacramento a
criar o colégio em Itambacuri. O convite foi feito por meio do Núncio Apostólico Dom
Júlio Tonti, que escreveu diretamente para a fundadora do Instituto, Madre Serafina, e
conseguiu convencê-la da importância do projeto.
Madre Serafina encarou o convite como uma mensagem divina e o pedido foi
prontamente aceito. Restava agora conseguir voluntárias entre as irmãs que pudessem se
interessar pelos trabalhos no Brasil.
Tão grande era o seu zelo pelas Missões que ela mesma quis chefiar este projeto.
Ela teve papel importante também nessa fase, conversando com as irmãs de forma discreta
para não influenciar diretamente em uma decisão tão importante quanto a de se deslocar
para as missões em terras distantes e desconhecidas. Em pouco tempo, apresentaram-se 4
voluntárias, que receberam instruções e começaram os preparativos para a vinda ao Brasil.
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Em maio de 1907, estava tudo pronto para a partida.
No dia 30 de maio de 1907, festa do Corpo de Deus, a fundadora Madre Serafina
e Irmã Verônica acompanharam as 4 missionárias até o porto de Génova, despedindo-se
de cada uma delas, de forma efusiva e maternal. As despesas da viagem da Itália ao Itam-
bacuri foram pagas pelo bispo D. Joaquim, que, na sua pobreza sabia encontrar recursos
para beneficiar as almas e engrandecer a Pátria, (anotações do Tombo).
As freiras que se sentiram vocacionadas e aceitaram o desafio da missão foram:
Benedita do Redentor (Onesta Braga), Ana dos Inocentes (Malvina Leoni), Francisca
dos Santos Estigmas (Santina Gardigli) e Bernardina do Santo Nome de Jesus (Emma
Baldassari) que saíram da Abadia de Bertinoro, na Itália, viajando pelo Mediterrâneo e
Atlântico, até o Brasil.
Ao cair da tarde o vapor “Úmbria” da Companhia Floria e Rubattino, deixou o
porto, iniciando sua longa viagem, levando as quatro Clarissas que, com o coração despe-
daçado pela separação de tão boa mãe e da pátria querida, sentiam-se, entretanto felizes por
servirem assim a Deus e ao próprio Instituto. A viagem do porto de Gênova até o Rio de
Janeiro durou 15 dias. Assim, a 15 de junho de 1907 as freiras estavam em solo brasileiro.
No Rio de Janeiro as Irmãs Clarissas foram recebidas por Frei José de Castro-
giovanni, superior do Convento dos Capuchinhos do Morro do Castelo.
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quase cem cavaleiros.
O cortejo chegou à cidade no dia 3 de julho de 1907. Os fundadores, Frei Sera-
fim e Frei Ângelo, aguardavam as missionárias. As freiras foram recebidas com festa, fo-
guetes, repicar de sinos e banda de música. Conta-se que esta foi a primeira apresentação
de banda de música de que se tem registro em Itambacuri.
Além disso, o percurso até a casa que abrigaria as irmãs e o colégio estava enfei-
tado com flores, bananeiras e bandeirinhas. As saudações de boas-vindas se estenderiam
por vários dias, pois a comunidade cheia de dificuldades, via nas irmãs uma possibilidade
de melhoria nas condições de vida. Os outros padres, (Frei Vicente de Licodía, Frei Gas-
par, Frei Manoel e o Irmão Frei Felix de Vizzini) não escondiam sua alegria pela chegada
das irmãs.
No dia seguinte pelas 7 horas, Frei José, companheiro de viagem, celebrou, priva-
damente a primeira santa missa na capela das Religiosas, em cujo sacrário deixou, entregue
ao seu amor e adoração, a sagrada Eucaristia, fonte inexaurível de todos os heroísmos.
As manifestações populares não cessavam. Às 10 horas, no Santuário de N. S.
dos Anjos, onde as Irmãs foram conduzidas em procissão, Frei Gonzaga Gouverneur, O.
F. M., vigário de Teófilo Otoni, cantou missa, pronunciando eloquente discurso. À noite
a população reunida na frente do convento das Religiosas, fez-lhes calorosas manifesta-
ções, falando o Revmo. Frei Gaspar de Módica.
O regozijo popular durou ainda alguns dias, expandindo-se em diversas manei-
ras: soltando balões, queimando foguetes e dando “vivas”. As irmãs, cansadas da longa
viagem, saudosas da pátria distante e emocionadas pelo que viam e ouviam em redor de
si, cercadas pelo respeito e veneração do povo, davam graças a Deus. O Colégio “Santa
Clara” estava fundado. Frei Serafim não cabia em si de alegria ao ver finalmente na mis-
são por ele fundada.
Irmã Bernardina, fixou nas suas “Memórias” as impressões da chegada:
“Na entrada do povoado apeiamos das nossas cavalgaduras.” Frei Serafim, que é o Superior,
juntamente com Frei Ângelo e o •povo vieram ao nosso encontro, en-quanto os sinos repi-
cavam festivamente e espocavam foguetes no espaço. Organizou-se uma espécie de procis-
são: na frente iam os frades, atrás, nós, as quatro religiosas, uma pequena banda de música
tocava alguns dobrados, e atrás a população. Conduziram-nos ao nosso futuro convento
(que é o primeiro edifício da Colonia). A rua que leva ao convento estava toda enfeitada
com plantas, bandeirinhas e lanterninhas. No limiar do convento, Frei Ângelo pronunciou
poucas palavras, em língua italiana, convidando-nos a tomar posse e entrar na Casa que
nos tinha sido destinada. Frei Serafim acolheu-nos com paternal expansão, e ia repetindo:
“Nunc Dimittis Servum Tuum”. “Agora, Senhor, despedes o teu servo . . . • S. Lucas, 2, 22.
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“O Colégio Santa Clara é dirigido por cinco religiosas Franciscanas. Por três vezes e por
três Inspetores técnicos, foi visitado, e, ultimamente em novembro pp. pelo Exmo Diretor
Geral Dr. Carlos Prates e sua comitiva. Todos ficaram admiradíssimos emreparar a esmera-
da educação na parte escolar, finos trabalhos manuais executados pelas meninas indígenas
e filhas de nacionais civilizados. O ensino escolar éministrado pelo Asilo gratuitamente e
pela manutenção de meninas indígenas. O magnânimo Governo de Minas dá um auxílio de
quatro contos de reis anuais. Para os habitantes desta Colônia, nada há melhor que o Colé-
gio e a infância feminina se mostra extraordinariamente constante na frequência às aulas.
O Colégio Santa Clara progrediu dia a dia sob a direção e administração das
Irmãs Franciscanas, auxiliadas no início, por distintas professoras, sendo a primeira, na
ordem cronológica: D. Maria Jacinta da Silva, irmã do mestre de cultura, Sr. José Jacinto
Junior, professora bem preparada.
A Irmã Bernardina do SS. Nome de Jesus, sucedeu na direção do colégio a Irmã
Francisca das Chagas, que se manteve no cargo brilhantemente, até o ano de 1921. Outras
vieram na sequência: Relação das primeiras madres superioras do Colégio Santa Clara:
Irmã Bernardina do SS. (1907- 1909), Irmã Francisca das Chagas (1909 1921), Irmã Ana
dos Inocentes (1921 – 1931), Irmã Noemi do Getsemani (1931).
Desde o início de sua exuberante vida, o Colégio “Santa Clara’’ prestou enor-
mes benefícios, não só aos filhos de indígenas, que em 1911 ali se achavam abrigados
em número de trinta e cinco, como também às filhas de nacionais civilizados, atingindo
estas o número de cem. Realizavam-se assim plenamente as previsões do Exmo. Bispo
diocesano, D. Joaquim, ao lançar a ideia da fundação do colégio.
A influência do Colégio Santa Clara não se limitava à educação, dos indígenas
catequizados, mas, se estendia a toda a população de uma zona vasta, muito rica e cheia
de futuro. A educação consistia em trabalhos manuais, fiação e tecelagem, bordado, cos-
tura, trabalhos de Bristol e artesanato, além da instrução na catequese e educação escolar
sistemática.
90
Em 1912 o colégio é autorizado a montar o curso secundário e cinco anos depois
é criada a Escola Normal Santa Clara. O colégio não só se firmou como passou a ser um
centro de referência de estudo e cultura em nossa região, formando centenas de jovens
para exercício do magistério. Em 1912 foi introduzido em seu programa o curso secun-
dário, que em 1914 tomou grande impulso
Em 1923 começou-se a pleitear a equiparação do colégio, sendo feita a aquisi-
ção de um gabinete de física e química no valor de sete contos de reis. Nessa ocasião era
vigário o Revmo. Frei Gaspar de Módica, continuador incansável da obra imensa que
herdara dos santos fundadores, o qual valendo-se da boa vontade, prestigio e patriotismo
do Dr. Alfredo Sá e do apoio de alguns amigos, conseguiu, em virtude do decreto nº 7.534
publicado no “Minas Gerais” de 26 de fevereiro de 1926, para o Colégio “Santa Clara” as
regalias de escola normal equiparada, vindo o mesmo assinado pelo preclaro presidente
Antônio Carlos Ribeiro de Andrade e pelo ilustre secretário do interior Dr. Francisco Luiz
da Silva Campos. Grande foi a satisfação do povo de Itambacuri e dos padres capuchi-
nhos pela magnífica conquista.
A bênção de Deus acompanhava visivelmente os passos, no Brasil, do Instituto
das Irmãs Clarissas Franciscanas Missionárias do SS. Sacramento, que, valendo-se da
boa índole do povo brasileiro, encontrou no seio de tradicionais famílias mineiras, ótimas
vocações. As vocações foram aumentando todos os anos e, a quantidade não prejudicou
a qualidade, isto é, a fisionomia verdadeira do Instituto, cujo traço principal é o espírito
franciscano missionário.
Muitas moças normalistas, cultas e piedosas, de Conceição de Mato Dentro, Cara-
velas, Teófilo Otoni, Curvelo, Diamantina, Minas Novas, Araçuaí e de outras cidades minei-
ras, e do próprio Itambacuri, infundiram nova vitalidade à Congregação, pois, assimilando
elas o espírito austero e missionário das religiosas vindas da Itália, em tempos diversos,
harmonizando-o com o saber e com as exigências do ensino moderno, criaram uma auréola
de prestígio que a faz estimada em todas as cidades de Minas onde mantém casas.
Itambacuri se transformava dia a dia, naturalmente, sem choque nem atritos com
o passado. No ano de 1927, mais precisamente em 08 de dezembro receberam o diploma
de normalistas as alunas: Nair Esteves Guedes, Adilla Pirajá Cecílio da Silva (Araçuai);
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Aurora Esteves Otoni (Teófilo Otoni), Catarina Magalhães, Joana Lago Pinheiro, Yolan-
da Lago Pinheiro, Maria de Lourdes Lago Pinheiro e Faride Rafael Zandim (Itambacuri).
A solenidade da primeira colação de grau foi brilhantíssima. O paraninfo, Dr.
Alfredo Sá, fez-se representado pelo Professor José Vicente de Mendonça que, sendo dos
mais ilustres professores do colégio e um dos cidadãos que, juntamente com Frei Gaspar,
por ele mais trabalhou, pronunciou importante e vibrante discurso, no qual historiou a
fundação, toda a existência do colégio e os trabalhos para, sua equiparação, pondo em
relevo as figuras dos que mais auxiliaram a Escola Normal: o Dr. Alfredo Sá, Vice -Pre-
sidente do Estado e o infatigável vigário, Frei Gaspar de Módica.
O Colégio Santa Clara tinha o internato para as moças oriundas de outras loca-
lidades e o externato para as moças residentes em Itambacuri. Por longos anos a Escola
Normal do Colégio Santa Clara formou professoras normalistas além de muitas moças
terem seguido a vocação religiosa e tornaram-se freiras da Congregação, sendo conside-
rado na época, um centro de referência de ensino na região.
Referências:
Apontamentos biográficos” do Prof. Padre José Gennaioli sobre ‘’A Serva de Deus” - Madre M. Clara Se-
rafina de Jesus • -Traduzido por uma religiosa da Congregação” - Livraria Católica do Ginásio Arnaldo -L.
Belo-Horizonte,- 1942.
Jornal O Itambacury, década de 1930.
MORAES, Wallace Gomes, Itambacuri: O Vale das Águas, Ed. Ixtlan, SP, 2014
PALAZZOLO, Frei Jacinto de. Nas Selvas dos Vales do Mucuri e do Rio Doce. 3ª Edição. Companhia Editora
Nacional. São Paulo - 1973.
Revista da Escola Normal Colégio “Santa Clara” - Numero Comemorativo, Lembrança da Primeira For-
matura de Normalistas, 1927
RODRIGUES, Carmem. Missão no Brasil das Clarissas Franciscanas Missionárias do Santíssimo Sacramento.
Telecart. Belo Horizonte - 2003.
*Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri - Cadeira 04, Sócio Correspondente do Instituto
Histórico e Geográfico de Minas Gerais, Membro Efetivo da Academia de Letras de Teófilo Otoni - Cadeira
21, Administrador, Professor da ALFA/UNIPAC, Assessor Técnico da Cooperativa dos Produtores Rurais de
Itambacuri Ltda.
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Luiz Leal: probidade e ternura
Regina Ribeiro Molina*
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entusiasmou-se.
Defendeu a permanência da estrada de ferro Bahia e Minas, chamando-a de
“artéria da região”, para integração, transporte de suas riquezas e comunicação de seus
habitantes.
Presença sedimentada no Estado, ao tempo em que políticos criam o MDB, Luiz
é um dos fundadores do partido na região. Ao ser candidato a prefeito de Teófilo Otoni,
cresceu sua popularidade entre a juventude. Fez uma administração sem mácula.
Por volta de 1975, a TV Itacolomi era a maior transmissora mineira. Num pro-
grama chamado “Mineiros frente a frente”, Luiz representou a cidade de Teófilo Otoni.
Beneficiou-se com o sucesso sobre as cidades Sete Lagoas, Uberaba, Uberlândia e La-
vras. Essa vitória tornou-o mais popular. Ganhou um grupo escolar, cinquenta televisores
e muitos outros prêmios. Estabeleceu-se a marca: um prefeito jovem, apresentando um
programa de TV e batendo algumas das cidades mais tradicionais.
Os amigos orgulharam-se desse prefeito, alicerçado na ética e no engajamento
popular.
Assim, Luiz começa uma longa caminhada, que o tornaria conhecido como con-
ceituado político e uma referência de sensatez em Minas Gerais. Daí, tiraria, para ofere-
cer aos que o conheceram, e tanto o amaram, o legado de admirável exemplo de quem
sempre buscou dar grandeza ao gênero humano e dignidade ao ato de viver.
Exemplar na dedicação, como filho, neto, pai, avô, sobrinho, cidadão e, sobretudo,
como amigo. Sempre de bem com a vida. O mundo poderia desabar, Luiz não queria guerra.
Luiz foi eleito prefeito de Teófilo Otoni e exerceu o mandato de 1973 a 1977.
Canalizou o rio Todos os Santos, fez com que os funcionários se casassem para se ins-
creverem no INAMPS, calçou e asfaltou ruas, melhorou o processo de educação e de
saúde (através de Postos). Não se classificou só por obras, mas modificou o pensamento
e engajou uma nova população. Luiz inicia um novo tempo para o Nordeste Mineiro, ao
abraçar a vida pública. Adquiriu um costume de reuniões, para encontrar alternativas de
fraternidade. Com a generosidade da juventude (Luiz nunca foi um idoso), apascentar as
legiões famintas, curar as feridas sociais com palavras de estímulo, sedar a dor dos que
chegam trôpegos e desalentados, em busca de um motivo para viver.
1979-1987 - Deputado Federal. Diretor Administrativo da Companhia Urbani-
zadora de Contagem (CUCO). Criou a Avenida João César de Oliveira, asfaltou o Eldo-
rado, Várzea das Flores, toda aquela região.
Bem conhecido, resolveu candidatar-se a deputado federal. Com minguados
recursos, porém convincente em suas palavras; ganhou apoio de cidadãos de sua terra.
Destacou-se, na eleição, contra políticos conhecidos da ARENA. Um grupo novo queria
renovação. Esse grupo acompanhou Luiz Leal, elegendo-o coordenador da bancada do
MDB de Minas Gerais. Época de ditadura, um período completamente atípico.
Eleito, mais tarde, presidente da Comissão de Finanças da Câmara, conseguiu
colocar o ordenado do Presidente da República, pela primeira vez no Brasil. Depois, pas-
sou para a Comissão de Transporte. Culminou com a Constituinte. Nessa época, aprovou
uma Zona de Processamento de Exportação (ZPE) para sua terra, Teófilo Otoni, que traz a
alcunha de Capital Mundial das Pedras Preciosas. A ZPE produz e exporta, através dessa
zona, livre de tributação, na exportação, como na importação.
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Entre 1987 a 1991, Luiz foi Deputado Constituinte. Reeleito para compor a
Assembleia Constituinte: órgão responsável pela elaboração da Constituição de um país.
Época de movimentação na vida política. Convidado para ser Secretário da Educação,
vem a Minas e retorna à Câmara Federal, pois seu suplente iria votar com a ARENA, na
Constituinte. Convidado novamente, agora Secretário de Justiça, volta a Minas, constrói
a penitenciária de Contagem, a de Teófilo Otoni e a de Caratinga. Após esse entrevero,
regressa à Câmara para encerrar, como Constituinte.
Quando, em 1987, foi Secretário da Educação, Luiz não conseguiu equacionar o
item principal: o vencimento dos professores. Naquela época quase todos os professores
queriam ter adjunção para melhorar o salário. Luiz não conseguiu chegar ao patamar
ideal, mas atingiu o razoável, no tempo.
Teófilo Otoni tem uma evolução setorial. Passa a ser mais pecuária que agro,
continua exportadora de pedras, porém adquire status no ensino. Hoje temos trinta e
oito mil alunos, na região, fazendo faculdades: Medicina, Engenharia, Arquitetura, Psi-
cologia, Direito. Fato que não existia tempos atrás. Esses estudantes não são só pessoas
novas. São também pessoas de meia idade, dando um colorido novo a Teófilo Otoni, de
20, 30 anos atrás. Nessa grande mudança, inseriram-se em seu habitat, um pouco con-
servador, jovens de outras regiões, com um poder aquisitivo menor, porém, gerando um
colorido à cidade, no sentido econômico, ponto fundamental.
Arquitetando-se um cidadão.
A longínqua Teófilo Otoni não dispunha de estabelecimento de ensino superior,
razão da inevitável mudança de Luiz. “Eu olho para a mala aberta sobre a minha cama
e penso que não gostaria de partir. Queria ficar um pouco mais, aproveitar a nova casa,
sentar na varanda, em silêncio; olhar os passantes, embaixo, e tentar entender o caminho
das nuvens, em cima.” Não lhe agrada a ideia de ficar longe do ninho. “De repente, me
dou conta de que já parti. Aquele que era eu, já está longe, colhendo risos pela estrada,
mas o coração apertado, sonhando com o regresso.”
Nas conversas, suas histórias, seus personagens, as canções que encheram de
romantismo as madrugadas seresteiras, neste pedaço de terra. Esses encontros come-
çavam no Restaurante Amigo do Rei prosseguiam em lugares previamente marcados e
tinham fim no lugar de origem, onde se faziam elaborados comentários, sem desdenhar
de alguém.
Luiz, cidadão do mundo, desejava nada mais que a paz. Viveu do jeito que
queria: com dignidade, coragem, bom humor e compostura. Falava como se fosse eterno.
Nunca percebeu o limite de sua influência. Uma vida com sentido, plena de realização;
sem fórmulas para relacionamentos.
O espaço de convívio poderia ainda estar deserto. Com sua presença já se sentia
o incrível da situação. Quase um ritual: aproxima-se. O lugar é cativo, o whisky prepara-
do. Abriga-se aos presentes. Ambiente minúsculo, aconchegante. Pode haver participa-
ção simultânea de todas as mesas. Cansado de audiências, de aulas ministradas no dia,
faz-nos interrogações para as quais não existem respostas, enquanto se acalma. Lembran-
do Mia Couto, escritor Moçambicano: “Chaminé que construísse em minha casa, não
seria para sair o fumo, mas para entrar o céu.”
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Na presença de Luiz, saía-se da solidão e ele se fazia amável companhia. Mes-
mo calado, mesmo distante, Luiz é aquele que não precisa perguntar por nós e que, sem-
pre que o vemos, mesmo que tenham passado anos, é como se estivéssemos estado com
ele ontem.
Um deus sem mistério, muito claro e visível; a poesia era o êxtase, o estar em
Deus (en-thousiasmos, entheos). Esse era Luiz Leal. Meu colega no magistério. Amigo
querido do Gildo. Deixou-nos em 26 de outubro de 2017.
Com certeza, ao destacar sua caminhada de oitenta e um anos, ele gostaria
de louvar o amor que os familiares lhe proporcionaram: sua esposa Helaine, amor de
sua vida, que tolerou seus cansaços; os filhos queridos: Valeska Patrícia, Luís Geraldo,
Yaskara, Veruska Agnesse, Leonardo e Gabriela. Os netos, queridos de sua vida: Caroli-
na, Gabriel, Isabela, Luísa, Ana Amantea, Laura Amantea e Gregório. Os pais: João Soa-
res Leal Sobrinho e Laura Elisa Sedlmaier Leal; os irmãos, por quem teve muito apreço:
Altino, João Carlos, Ruy, Domingos Ernesto, Sebastião Soares, Regina Maria, Antônio
Francisco e Cleyton Marcelus.
Relatar acontecimentos da vida ou vivências de um amigo/irmão é tarefa peno-
sa. Perdão, se não atingi o propósito. Bateu-me uma saudade insuportável. Ao respirar
novos ares, deparei-me com o poema de Edmond D’Haraucourt:
*Graduada em Letras Clássicas pela Universidade Federal de Minas Gerais, com Pós-graduação em Língua
Portuguesa e Redação pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, é sócia fundada e efetiva do
Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri, ocupante da cadeira 37.
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Desbravando o Vale do Mucuri: o carro que chegou
em Ataléia antes da estrada
Adão Alves Teixeira*
No ano de 1836 o engenheiro francês Pierre Victor Renault foi contratado pelo
governador da província de Minas Gerais, desembargador Antônio da Costa Pinto, para
explorar as matas do vale do Mucuri e escolher um local ideal para a implantação de um
degredo na floresta, destinada a condenados e vagabundos. Antes mesmo dele concluir
essa missão, o governador da província mineira determinou que o francês explorasse tam-
bém o rio Todos os Santos, afluente do Mucuri, e este, até a sua barra no oceano Atlântico.
Impunha-se, na época, a necessidade de conhecer o solo brasileiro mediante o desbra-
vamento das matas, até então habitadas por gentios, e nesse propósito, a expedição de
Renault percorreu o rio Todos os Santos da sua nascente até desembocar no rio Mucuri.
Para isso enfrentou o engenheiro e sua equipe, com coragem e abnegação, toda
a rusticidade da natureza: a selva impenetrável - que para avançar tinha de abrir picadas
a golpes de foice e facão, as subidas íngremes, as depressões abruptas dentro da mata, as
chuvas torrenciais, as brenhas ásperas infestadas de insetos que infernizavam a vida dos
expedicionários - muitos deles transmissores de febres tropicais e outras doenças, o perigo
dos animais de grande porte e dos peçonhentos, ervas venenosas, o emaranhado de cipós,
os espinhos, travessias de rios, córregos, brejos, atoleiros, o cansaço, enfim muita penúria.
Era imensa a dificuldade de locomoção encontrada pelos desbravadores na terra inóspita.
Outro fator que apavorava a expedição, era a presença de selvagens canibais
da tribo dos ferozes aimorés ou botocudos, que habitavam a região e se movimentavam
silenciosamente, ocultados pela densa vegetação, observando os passos da expedição, às
vezes desferindo ataques traiçoeiros que forçavam os expedicionários a repelir a agressão
com armas de fogo e outros meios, até os índios desaparecerem novamente na mata, sem
cumprirem o propósito de expulsar os invasores de suas terras.
Depois de alcançar a barra do rio Todos os Santos, a expedição desceu o Mucuri
em canoas por eles feitas no local, até o oceano Atlântico, onde existia um pequeno po-
voado denominado São José do Porto Alegre, atual cidade de Mucuri, na Bahia. Em seu
relatório Renault contou as peripécias da longa exploração em terras do Brasil através da
Mata Atlântica e dos rios do vale do Mucuri e descreveu o lugar como uma selva bucó-
lica, servida por quedas d´água, com fauna e flora abundantes, madeiras de lei, muitas
especiarias (poaia, quina, noz moscada, canela-da-índia, sassafrás), dizendo que a mata
era saudável, que o rio Todos os Santos era riquíssimo em pedras preciosas em todo o seu
percurso, e que o Mucuri era majestoso e todo navegável (Eduardo Magalhães Ribeiro,
pag. 34). O relatório de Renault causou grande sucesso na Europa.
Naquela época a política do império era voltada para a ocupação dos vazios
populacionais do imenso território brasileiro. Teófilo Benedito Otoni, residente na ci-
dade do Rio de Janeiro, que além político era empresário, influenciado pelo relatório de
Renault e acreditando nas vantagens econômicas que o novo lugar tinha a oferecer, idea-
lizou a criação de um núcleo de colonização nas matas do Mucuri, a ser gerido de forma
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empresarial, para o que instituiu a Companhia de Comércio e Navegação do Mucuri, que
iniciou as suas atividades no ano de 1847, com o sonho grandioso de explorar e colonizar
todo o vale do Mucuri e ali implantar uma cidade, que se constituiria no núcleo central da
região nordeste de Minas Gerais.
O pioneiro Teófilo Otoni tinha também em mente implantar um serviço de nave-
gação fluvial nos rios Todos os Santos e Mucuri, para ligar o sertão ao mar, e possibilitar
o transporte de passageiros e da futura produção da companhia. Haveria a necessidade de
atrair moradores para a região, pois o crescimento populacional resultaria em maior busca
por terras e viabilizaria a exploração das matas cheias de índios do vale do Mucuri, com
possibilidade de explorar lavras para a extração de pedras preciosas e de utilizar o terreno
fértil do lugar para o plantio de roças, produção de mantimentos e criação de animais.
Após a realização de duas expedições pelos rios Mucuri e Todos os Santos, com
a finalidade de explorá-los, Teófilo Otoni tomou conhecimento que na época da seca as
águas do rio Mucuri baixavam a um nível impraticável à navegação, restando a possi-
bilidade de navegabilidade permanente até o litoral somente depois de uma cachoeira
existente nas proximidades de Santa Clara (Nanuque), mas apenas para pequenos navios
a vapor e assim mesmo de forma precária, por se tratar de rio raso.
Mas, em vez de desistir, o pioneiro fortaleceu a sua convicção da necessidade de
ligar o nordeste mineiro ao litoral e concebeu um projeto audacioso, de abrir uma estrada
de rodagem através da floresta para estabelecer uma comunicação terrestre entre o futuro
povoado de Filadélfia e o de Santa Clara, e implantar o seu sonhado serviço fluvial a par-
tir da cachoeira de Santa Clara, para ser operado através de pequenos navios a vapor até
São José de Porto Alegre, para, a partir daí, o transporte ser feito pelo litoral até a cidade
do Rio de Janeiro em navios de maior capacidade. Isso exigiu severas mudanças do seu
plano original.
Teófilo Otoni fundou, então, o povoado de Filadélfia às margens do rio Todos os
Santos. Esse nome foi escolhido para homenagear a próspera cidade norte-americana do
mesmo nome, que representava o progresso e era considerada o berço da liberdade, e a
data inaugural, 07 de setembro de 1853, foi uma homenagem à Independência do Brasil
de Portugal.
Iniciada a construção da estrada, que recebeu a denominação de Santa Clara, o
percurso foi dividido em 5 trechos:
“Na sua construção, foi dividida em cinco seções. A primeira Filadélfia/Saudade, ti-
nha 4 léguas e 3 quartos, dezessete pontes sobre córregos e rios com madeira de lei,
e exigiu aterro de 8 mil braças cúbicas. A segunda seção Saudade/Morro do Cupan,
de 3,5 léguas, exigiu a construção de quinze pontes. A terceira, Cupan/Urucu, 5 lé-
guas e um quarto. O trecho Ribeirão das Pedras era de 7 léguas e a última seção,
de 6 léguas, até Santa Clara, exigiu a abertura de trechos na rocha viva e uma mu-
ralha de 26 palmos de altura, à beira do rio Mucuri.” (Nilmário Miranda, p.104).
A região viu-se tomada de grande euforia e, em 1854, sentia-se o progresso de
Filadélfia e de Santa Clara, com o andamento dos trabalhos de abertura da estrada de
rodagem dentro da mata. Para acelerar o serviço da estrada e incrementar a colonização
da região, Teófilo Otoni começou a pensar na possibilidade de contar também com mão
de obra estrangeira.
Para conter os ataques dos índios ao pessoal da Companhia e garantir a seguran-
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ça do transporte de cargas, considerou a necessidade da criação de instalações militares,
para proteção também dos viajantes e das famílias dos colonos, obtendo do governo im-
perial a instalação do quartel de Urucu (Carlos Chagas), por Decreto de 14 de fevereiro
de 1855, às margens da estrada em construção.
Trechos da estrada margeavam a Serra Map Map Crac, então habitada pelos te-
míveis botocudos, o que levou Teófilo Benedito Otoni a exigir da sua equipe de trabalho
um tratamento de respeito e amizade com os gentios, dando-lhes presentes, principal-
mente ferramentas, visando estabelecer um bom relacionamento. Também, foi necessário
alterar o curso original da estrada para desviar de aldeias indígenas, com o que Teófilo
Otoni angariou a confiança dos selvagens e garantiu o prosseguimento das obras dentro
de suas terras, pois ao verem respeitadas as aldeias, perceberam que os construtores da
estrada não estavam ali para tomar as suas terras ou dizimar o seu povo.
Conseguiu, com o apoio do governo imperial, trazer a sonhada mão de obra es-
trangeira para trabalhar na Companhia do Mucuri, tanto na estrada como na colonização
do vale do Mucuri, mediante o recebimento de um quinhão de terras cultiváveis para cada
família de imigrante europeu, e em 1856 chegaram os primeiros colonos alemães, suíços
e portugueses da Ilha da Madeira, que foram logo empregados na construção da estrada.
O pioneiro Teófilo Otoni contou ainda com a mão de obra prestada por 100 traba-
lhadores chineses que chegaram juntamente com a primeira leva de colonos provenientes
da Europa. Ao contrário desses, os chineses não recebiam terras para cultivar, mas apenas
salários e ficavam alojados em ranchos ao longo da estrada (Nilmário Miranda, p. 104).
Antes disso, a Companhia Vale do Mucuri se valia dos serviços prestados por
grupos de brasileiros, escravos nacionais e africanos, e de lavradores trazidos do Vale do
Jequitinhonha, que teve uma ocupação mais antiga, iniciada no período da mineração de
Diamantina (Márcio Achtschin Santos e Leônidas Conceição Barroso, p. 19 e 71).
O projeto de Teófilo Otoni lançava bases econômicas e sociais ao possibilitar
a milhares de pessoas o acesso à propriedade, e também, por estar a província de Minas
Gerais isolada, longe do mar, os meios de comunicações terrestre e fluvial, implantados
pelo pioneiro, satisfaziam os anseios dos moradores e viajantes.
O vale do Mucuri, como um todo, foi palco de uma saga em plena selva bruta e
teve a sua colonização feita por brasileiros e imigrantes, que se deslocaram para a mata
desconhecida do nordeste de Minas Gerais, expondo-se como alvos de feras, febres, fle-
chas, desconforto, insegurança e dificuldade de adaptação à floresta tropical, resultando
num futuro cheio de dificuldades e de bravura, com o amansamento de selvagens e a
conquista da terra sob o comando de Teófilo Benedito Otoni.
A estrada pioneira, aberta no sertão, foi inaugurada em 23 de agosto de 1857 e é
considerada a primeira estrada de rodagem do Brasil, com 180 quilômetros de extensão,
largura mínima de três metros e com pontes de madeira em todos os córregos e rios,
registrando-se que no ano de 1859 ali trafegaram cerca de 40 carros particulares puxados
por burros e mulas, 200 carros de boi e 400 tropas de burros (Paulo Chagas Pinheiro,
apud Márcio Achtschin Santos e Leônidas Conceição Barroso, p. 51).
O trecho navegável do rio Mucuri, entre São José de Porto Alegre e a cachoeira
de Santa Clara, numa extensão de 25 léguas, cerca de 150 quilômetros (Wallace Gomes
Moraes, p. 48), permitia embarcar cargas e pessoas no pequeno vapor da companhia, o
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“Peruípe”, numa viagem que, quando o tempo estava bom e não havia interrupções por
encalhamento em bancos de areias, durava sete horas e meia. A partir dali a viagem pros-
seguia pela costa marítima em outro vapor da companhia, o “Mucuri”, até a cidade do
Rio de Janeiro.
Filadélfia foi elevada a distrito em 1857 e emancipada como cidade em 1878,
com a denominação de Teófilo Otoni, quando o seu fundador já era morto.
A estrada de rodagem Santa Clara, com o tempo reduziu-se a mera estrada de
tropas de burros de carga, mas teve relevante influência, pois por um período permitiu a
sobrevivência da região.
A Estrada de Ferro Bahia e Minas, tão sonhada por Teófilo Benedito Otoni, foi
criada em 1879, seguia o rumo oeste/leste e ligava o vale do Mucuri ao oceano Atlân-
tico. Ela iniciava-se no município de Araçuaí-MG, no vale do Jequitinhonha, passava
por Teófilo Otoni e terminava em Caravelas e Ponta de Areia, na Bahia, e teve enorme
importância social e econômica no transporte diário de pessoas e riquezas da região.
Após a invenção do automóvel e a introdução de carros movidos a motor a ga-
solina no interior brasileiro, com o advento de tratores a óleo diesel munidos de pneus ou
esteiras, e de lâminas para cortar o solo e remover a terra, alguns trechos da extinta estra-
da Santa Clara foram adaptados para trafegar veículos automotores, o que possibilitou a
viagem de carro de Teófilo Otoni a Carlos Chagas e Nanuque.
O município de Ataléia, integrante do vale do Mucuri, surgiu com a fundação
do povoado de Santa Cruz do Norte em 29.10.1930, que se emancipou posteriormente
como município, pelo Decreto-lei nº 1.058, de 31.12.1943, editado pelo governador do
Estado de Minas Gerais, em um cenário social e econômico de um Brasil agrícola, numa
época em que o deslocamento de pessoas na região era feito exclusivamente por montaria
a cavalo e o transporte de mercadorias no lombo de tropas de burros e mulas.
Foi nessa ocasião que os intrépidos Tenente Pedro, da ativa da Polícia Militar de
Minas Gerais e os cidadãos João Lopes e Homero Barbosa dos Santos, este último fazen-
deiro do distrito de Pedro Versiani, em façanha memorável, desafiando a total ausência de
estradas de rodagem no recém criado município de Ataléia, conseguiram chegar de carro
na nova cidade, para levar ao conhecimento de todos os seus moradores o progresso da
tecnologia do transporte rodoviário, que estava mudando os costumes do mundo e cau-
sando a substituição dos cavalos e charretes pelos automóveis, que superavam, sob todos
os aspectos, o transporte animal.
Esse feito extraordinário dos três destemidos viajantes ocorreu em agosto do ano
de 1944, apenas oito meses após a emancipação do município de Ataléia, quando saíram
de carro da cidade de Teófilo Otoni, distante 70 quilômetros, num automóvel Ford, mo-
delo 1929, ainda não tão eficiente e seguro como os carros modernos, passando por Pedro
Versiani, Saudade e Cupan (atual Entroncamento de Ataléia), onde deixaram a estrada
principal e seguiram à direita, em direção à nova cidade, passando a trafegar a partir dali
por trilhas cavaleiras que ligavam Bias Fortes, Cupan, Ataléia e São Fidelis (Fidelândia),
que eram completamente inadequadas para o tráfego de veículos de quatro rodas.
Enfrentando adversidades em terreno não preparado para o uso rodoviário, os
viajantes chegaram ao destino com o carro já sem operacionalidade, tanto que entrou na
cidade de Ataléia arrastado por bois de carro emprestados por fazendeiros por onde pas-
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saram. Os três aventureiros, eufóricos e triunfantes, foram recebidos como verdadeiros
heróis pela população, que se viu seduzida pela grandeza dos viajantes e do veículo moto-
rizado. O carro permaneceu na praça da igreja por muitos dias, simbolizando o progresso.
Era um tempo em que a abertura de estradas para carros naquela região era vista
com ceticismo, cuja possibilidade não era sequer cogitada pelas autoridades locais, até
surgirem aqueles destemidos motoristas conduzindo a máquina do progresso e mostrado
a nova realidade do mundo dos transportes, o que motivou o prefeito nomeado de Ata-
léia, Sr. João Ribeiro da Silva Neves Júnior, a criar uma comissão constituída pela classe
produtora da região, visando a construção de uma estrada de rodagem de Ataléia até o
entroncamento de Teófilo Otoni, com o auxílio comunitário e com as ferramentas dispo-
níveis no cotidiano de cada um, inspirados em Teófilo Benedito Otoni, que no passado
construiu uma estrada de rodagem de 180 quilômetros dentro da mata virgem.
Na ocasião a Prefeitura Municipal realizou uma sessão solene destinada a ho-
menagear os viajantes, e também para marcar o início da construção da estrada por eles
imaginada, quando o prefeito determinou a lavratura de uma ata, para registrar para a
posteridade tão importantes fatos, que tem o seguinte teor:
“Ata da Assembléia organizada pelo Sr. Prefeito de Ataléia, afim de ser re-
solvida com a cooperação dos habitantes do município de Ataléia, a constru-
ção da Estrada de rodagem que ligará o dito Município ao de Teófilo Otoni.
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meira vez introduziu um automóvel nas terras do Município de Ataléia.
Tomou a palavra o Sr. Prefeito, falando sobre a construção da estrada, obedecendo a
pareceres ligados aos poderes administrativos do Estado, organização de uma comis-
são liderada pelo Sr. João Lopes, para tomar conta da realização da construção da
estrada. Foi eleito para presidente da mesma, por unanimidade, o Sr. Ten. Pedro que
em seguida usou da palavra, expondo suas condições de servidor da Pátria e do Es-
tado, excusando-se e pedindo que fosse indicado outro candidato para a presidência
da comissão, afim de não serem prejudicados os serviços de construção da estrada.
O Sr. Antonio Barboza aparteou pedindo ao Sr. Tne. Pedro a aceitação do cargo. Fa-
lou mais uma vez o Sr. Prefeito de Ataléia, sobre a destemerosa façanha, de não mais
o Ten. Pedro e sim Pedro Ferreira, João Lopes e Homero Barboza. Propôs em segui-
da o Sr. Prefeito, os nomes para a comissão, sendo aceito: Clemente Ferraz, Salim
Gazel, Miguel Halchaar, Pacífico Costa, Antero Celestino, Antonio Lemos, Home-
ro Barboza, Joel de Souza, Péricles Guedes, Vicente Pedroso, Clarismundo Pereira,
Antonio Benigno, Augusto Ferreira, Jovino Miranda, Manoel Maurício, Olímpio dos
Santos, José de Souza Paula, Wilfredo Míglio, Geraldo Lopes, Olímpio Silva, Mano-
el Alves Teixeira, Joaquim Vieira, Francisco Vieira, Cezário Lemos, Amadeu Raidan,
Melrin Schalub, Salles Gazel, Charif Gazel, João Teixeira e filhos, José de Araújo,
José de Aguilar, Cândido Penedo, Antonio Duarte de Oliveira, Ermelindo Magalhães,
Gustavo Laender e Elias Santana, sendo a dita comissão presidida elo Sr. João Lopes.
O fim dessa comissão é organizar e angariar auxílio para a construção da estrada.
Os Srs. Homero Barboza e Clemente Ferraz, em seguida fizeram donativos para a
construção da estrada, abrindo assim a lista de contribuições na Assembléia. Usou da
palavra o Sr. Prefeito propondo ainda ao Sr. Ermelindo Magalhães, que se dispôs a
contribuir com o que lhe for possível. Foi proposta e aceita a comissão. Presidente de
Honra Ten. Pedro Ferreira. Assinatura dos presentes à sessão histórica, realizada na
Prefeitura Municipal, no dia 20 de agosto de 1944. (a) João Ribeiro da Silva Neves
Júnior, Pedro Ferreira dos Santos, João Feliciano Lopes da Silva, Caio da Rocha, Sal-
les Gazel, Antonio Barbosa, Charif Bezerra Gazel, Clemente Esteves Ferraz, Herme-
lindo Magalhães Lopes, Salim Hassem Gazel, Homero Barbosa dos Santos, Cândido
Rodrigues Penedo, Péricles Ottoni Guedes, Martiniano Laender Guedes, Brício José
Severo, José Petrovick, Leonídio Machado Netto, Anuar Gazel, Elias Ignácio de San-
tanna, Nassar Miguel Alchaar, Pacífico José da Costa. Ataléia, 20 de agosto de 1944.”
102
Essa estrada de terra foi inaugurada no ano de 1952, já na administração do
prefeito seguinte, Sr. Carlos Martins de Freitas, e permitiu o tráfego de jipes, automóveis,
camionetas, caminhões e jardineiras (ônibus) na região, formando verdadeira força reno-
vadora do desenvolvimento, com os veículos automotores vencendo caminhos e distân-
cias, abrindo-se com isso novas portas para o progresso através do transporte de gente e
de produtos, o que incrementou, inclusive, o surgimento de escolas rurais e a mobilidade
de professores e livros para difundir a cultura na região.
No ano de 1966 registra-se a extinção da Estrada de Ferro Bahia e Minas, que
tanta importância teve para a região, e o início da abertura de uma rodovia federal, que os
antigos de Ataléia insistiam em chamar de Estrada Santa Clara, porque seguia, em alguns
trechos, o mesmo trajeto da antiga estrada Filadélfia-Santa Clara, de sentido transver-
sal, de Teófilo Otoni para o litoral. Essa via, que foi entregue à população devidamente
pavimentada por asfalto, no início da década de 1980, passou a ser o meio principal de
escoamento de toda a região, tendo recebido a denominação oficial de BR-418 (Estrada
do Boi) e interligou as cidades de Teófilo Otoni, Carlos Chagas, Nanuque e outras, para
se encontrar, mais adiante, com a BR-101, de onde se ramifica para a orla marítima.
É importante citar o seguinte trecho, alusivo às estradas da região:
“O fim da Estrada de Ferro Bahia e Minas veio com a promessa da abertura de uma
estrada de rodagem asfaltada seguindo, na medida do possível, o mesmo percurso do
leito da ferrovia, o que só veio acontecer na década de 1980, deixando a região por
mais de 15 anos desprovida de estradas apropriadas para o seu deslocamento e esco-
amento da produção. Durante este período a população fez-se valer de grandes tre-
chos da velha estrada de rodagem Santa Clara, e o que ninguém poderia imaginar é
que, mais de 100 anos depois da sua construção, por falta de outra alternativa, a Santa
Clara voltaria a desempenhar seu papel de integrar o sertão de Minas Gerais ao lito-
ral sul da Bahia.” (Wikipédia – Plano IPAC Resumido – Prefeitura de Teófilo Otoni).
103
Referências:
Nilmário Miranda - TEÓFILO OTTONI A REPÚBLICA E A UTOPIA DO MUCURI. São Paulo, 2007. Caros
Amigos Editora.
Márcio Achtschin Santos e Leônidas Conceição Barroso - A ESTRADA SANTA CLARA NO SÉCULO XIX:
Caminho de “Gentes” e Vivências no Mucuri. Belo Horizonte, 2017. Gráfica O Lutador.
Lais Ottoni Barbosa Ferreira - POVOADORES DO VALE DO MUCURI. Rio de Janeiro, 2004. Fábrica de
Livros Senai-RJ/Funguten.
Paulo Chagas Pinheiro - TEÓFILO OTONI: MINISTRO DO POVO. B. Horizonte, 1982. Itatiaia - e INL,
Fundação Nacional Pró-Memória.
Wallace Gomes Moraes – SOBRE AS ÁGUAS DO MUCURI. São Paulo, 2012. Ixtlan.
*Natural de Ataléia, Juiz de Direito aposentado pelo Estado de Mato Grosso do Sul e membro correspondente
da Academia de Letras de Teófilo Otoni e do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri.
104
Composição histórica:
o município de Teófilo Otoni e derivados
José Moutinho dos Santos*
106
Julião. A cidade faz parte da bacia do rio Mucuri, que se estende por outros 16 municipios
e está incluída na bacia agrupada do Atlântico Leste.
No decorrer do século XX a cidade continuou a se destacar no ramo da extração
de pedras preciosas, sendo reconhecida como a “Capital Mundial das Pedras Preciosas”. O
uso de recursos tecnológicos tem sido cada vez mais aplicados na extração dos minerais.
O Vale do Mucuri.
Trata-se de uma das regiões do estado brasileiro, Minas Gerais, cujo nome se
deve ao fato de o vale ser percorrido pelo rio Mucuri. E entre as suas principais cidades,
a mais populosa é Teófilo Otoni. O território do vale do Mucuri, está localizado no nor-
deste de Minas Gerais, divide-se em duas áreas distintas: médio e baixo Mucuri. Solo de
média e alta composição, exigindo pouca correção para o cultivo, Alto Mucuri: solo árido
de baixa fertilidade, necessitando de correção para o cultivo, exigindo assim tecnologia
e conta com 27 (vinte e sete) municípios e uma área de 24.882 km²: Águas Formosas,
Ataléia, Bertópolis, Campanário, Carlos Chagas, Catuji, Crisólita, Frei Gaspar, Fronteira
dos Vales, Itaipé, Itambacuri, Jampruca, Ladainha, Malacacheta, Machacalis, Nanuque,
Ouro Verde de Minas, Pavão, Pescador, Poté, Serra dos Aimorés, Teófilo Otoni, Umbu-
ratiba e mais 03 municípios criados em l995: Franciscópolis, Novo Oriente de Minas e
Setubinha.
Com limites geográficos:
A LESTE com o sul da Bahia e o norte do Espírito Santo
Ao NORTE, região do médio Jequitinhonha de Minas Gerais.
Ao SUL, estado do Espirito Santo e região do Vale do rio Doce de Minas Gerais
A OESTE, região do Alto Jequitinhonha de Minas Gerais.
DADOS DEMOGRÁFICOS:
*Advogado, escritor e poeta, sócio correspondente do Instituto Histórico do Mucuri e membro correspondente
da Academia de Letras de Teófilo Otoni – Minas Gerais.
108
O grande desafio dos Maxakali (Tikmũ’ũn)
Adevaldo Rodrigues de Souza*
BOTOCUDOS
109
Figura 1: Botocudos, Buris, Pataxós e Mucharís (1834)
Fonte: Jean-Baptiste Debret
110
maxakali às margens dos rios Prado, Alcobaça e Itanhém. Embora mantivessem relações
de comércio com os brancos, viviam em lutas encarniçadas com os botocudos. Eram
errantes, e, a partir das margens dos rios citados, seguiram o percurso em direção à Serra
dos Aimorés, alcançando as bacias dos rios Jequitinhonha, Itanhém e seus afluentes.
SEDIMENTAÇÃO
Segundo algumas versões, após ataques ferozes dos botocudos sobre os ma-
xakali, os últimos asilaram-se no Quartel do Alto dos Bois (Angelândia), junto com os
Maconi, que também eram perseguidos pelos botocudos. Como não se adaptaram a esse
quartel, os maxakali voltaram para o vale do Jequitinhonha e, perseguidos pelos Botocu-
dos, foram alojados no Quartel de Água Branca, onde surgiu o povoado de Quartéis, hoje
cidade de Joaíma. Em 1811 o alferes Julião Fernandes Leão, cumprindo determinação do
governo da Província de Minas Gerais, chegou para fundar e dirigir esse quartel. A evan-
gelização ficou por conta do padre José Pereira Lidoro e depois pelo padre Domingos
de Casali, sendo que o assentamento já chegou a abrigar dois mil índios entre maxakali,
nacknuke e malali. Nem todos os maxakali fixaram em Quartéis, pois o grupo do cacique
Ariary, não aceitando as humilhações do alferes Julião e a catequese imposta pelo padre
Domingos, fugiram para a cabeceira dos rios Rubim do Sul e Prates. Mais tarde esse gru-
po tentou fixar-se em Salto da Divisa, entretanto foram expulsos por posseiros brancos
ávidos para conseguir aumentar seus latifúndios. Depois de percorrerem por Palmópolis
e Medeiros Neto os índios maxakali voltaram e finalmente fixaram-se nas cabeceiras
dos córregos Umburaninha, Pradinho e Água Boa, nos atuais municípios de Bertópolis e
Santa Helena de Minas.
Devido aos constantes conflitos entre índios maxakali e os posseiros, em 1920 o
governo de Minas Gerais cedeu à União 2.000 hectares de terras sob seu domínio, para a
111
instalação de postos indígenas na cabeceira do rio Umburanas, visando resolver a questão
dos chamados índios errantes. Só vinte anos depois, em 1940, foi demarcada a área cha-
mada de Terras Indígenas Água Boa e deixando sem solução a área hoje conhecida por
Terras Indígenas Pradinho. A insatisfação dos índios e os conflitos com os fazendeiros
motivaram a reabertura das negociações entre o Serviço de Proteção ao Índio e o governo
mineiro para demarcação das Terras Indígenas, Pradinho, que começaram em 1951 e
concluíram em 1956. Porém, a demarcação criou um fato inusitado: as duas áreas ficaram
isoladas por um corredor de fazendas, inviabilizando o contacto e os deslocamentos dos
índios entre as duas áreas e agravando os conflitos com os fazendeiros. Os direitos territo-
riais das terras indígenas do Pradinho e Água Boa só foram homologados em 04/10/1996
pelo governo federal.
112
NOME E LÍNGUA
Segundo a pesquisadora Frances Blok Popovich (1980) – que fez pesquisa jun-
to aos índios Maxakali, em 1959 –, o linguista theco Loukota classificou a língua Ma-
xakali como “Paleo-american”. Já o escritor Aryon Rodrigues a classificou como tronco
“Macro-Jê”, sendo a classificação aceita até os dias de hoje. Quanto ao termo “maxaka-
li”, Popovich considera desconhecido, isto é, não surgiu do próprio povo, pois eles nem
conseguem pronunciá-lo com facilidade. Ela afirma que o etnólogo Curt Nimuendajú
(1958) considera que o termo usado para designar a si próprios era Monacó bm”. Depois
completa: é bem possível que Nimuendajú estivesse se referindo ao termo mõnãyxop
(antepassado). Depois ela conclui que o termo adequado para designação desses povos é
tikmũ’ũn, também é um coletivo de nós.
Atualmente o português é falado com relativa fluidez entre os povos tikmũ’ũn,
entretanto, entre si, eles se comunicam na língua tribal, o que, para muito, deixa o grupo
um pouco isolado.
A aldeia consta apenas de cinco choças, cujas paredes e teto são feitos de palhas de palmei-
ra frouxamente entretecidas e alguns abrigos baixos, do habitual formato esférico. Essas
choças limitam uma praça irregularmente quadrilátera, em cujo centro se acha um poste
branco de braça e meia altura, em torno do qual estes índios costumam executar as suas
danças... Dentro das choças, encontramos o mobiliário de sempre -: cabaças usadas como
recipientes para água, redes de cipó, arcos e flechas. (NASCIMENTO, N.F.p.43,1984).
113
As choças dos machacalí são pequenas e mal feitas, de planta retangular, de cumeeira ou
meia-água, cobertas de casca de pau ou capim. Algumas têm paredes de barro. Em Água Boa
as choças formam quase uma rua (...) Dormem em giraus sobre trapos de roupa, pois rara-
mente possuem uma esteira. Outros dormem no chão, à beira do fogo. As suas redes de imbi-
ra de ambaúva só servem para descansar durante o dia”. (NIMUENDAJÚ, pag. 90, 1958).
Como o passar dos anos os maxakali foram modificando esses costumes, prin-
cipalmente após o meado do século XX, devido à influência do homem branco e da
assistência social recebida do governo. Os tikmũ’ũn gostam de festas e danças, apesar de
seus semblantes retratarem tristeza. Eles comemoram a colheita do milho, da mandioca,
melancia e apreciam as festividades do dia 28 de junho com fogueiras, danças e canto.
Entre os povos maxakali é normal a união de casais da mesma tribo, quando os
casamentos acontecem com idade aproximada de 13 anos para a índia e 17 anos para o
índio. Após o nascimento de um filho há separação conjugal até que a criança comece
andar; que acontece em torno de um ano. Nesse período pode haver conluio do marido
com outras índias, pois na tribo há mulheres que aceitam esse tipo de realacionamento.
Entre os casais podem acontecer separações, período em que a mulher permanece com
os pais, podendo posteriormente decidir pela reaproximação ou afastamento definitivo
dos cônjuges. Atualmente eles possuem registro civil, mas cada índio goza do direito de
ter dois nomes, sendo um indígena e outro brasileiro, não havendo sobrenome. O faleci-
mento de um índio comove toda a tribo, havendo jejuns, choros e lamentações. Havendo
necessidade especial ou perigo para a aldeia reúnem-se os líderes com os pajés em seu
templo religioso – normalmente no centro da aldeia –, sendo depois comunicado à tribo
o resultado das resoluções. Popovich faz uma descrição desses povos.
“Os maxakali são um povo extraordinário. Durante os oitenta anos de contato per-
manente com a cultura dominante, mantiveram sua \língua, suas tradições orais,
sua religião e seu sistema de parentesco. O sistema de parentesco é o sustentácu-
lo da organização política. Os chefes de família, através de suas opiniões, exer-
cem forte liderança, e sua sociedade igualitária é governada à base de consenso.
Tudo isso traz propósito e continuidade em suas vidas” (POPOVICH, 1994, p.47).
114
COMO VIVEM ATUALMENTE
Figura 3: Evolução das moradias dos maxakali do século passado e nos dias de hoje.
Fonte: Foto: Geralda Soares, 1985 – https://www.ufmg.br/espacodoconhecimento.
115
EM BUSCA DE NOVOS ESPAÇOS
Figura 4: Povos indígenas maxakali em Itamunheque – Isael Maxakali e sua esposa Sueli Maxakali.
Fonte: https://apiboficial.org – https://www.premiopipa.com
116
REFERÊNCIAS
GEBER, Henrique (1863) - Noções Geográficas e Administrativas de Minas Gerais. Minas Gerais.
NASCIMENTO, N. F. (1984) - A luta pela sobrevivência de uma sociedade tribal do nordeste mineiro. São
Paulo/USP (Dissertação de Mestrado).
NIMUENDAJÚ, C.(1958) - “Indios Maxacaris” In Revista de Antropologia. São Paulo, EDUSP.
POPOVICH, F.B.(1980) - A Organização Social dos Maxakali. Brasília, SIL.( Dissertação de Mestrado Apre-
sentada ao Departamento de Sociologia da Universidade do Texas em Arlington).
SANTOS, Péricles Ribeiro. Pioneiros de Águas Formosas. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1970.
SOUZA, Adevaldo Rodrigues de. Do Vale ao Paraíso: A saga dos colonizadores do Mucuri, Pampã, Norte e
Umburanas. Belo Horizonte: Usina do Livro, 2014.
CEDEFES. A luta dos índios pela terra: contribuição à história indígena de Minas Gerais. Contagem: Cedefes,
1987. 120 p.
https://www.ufmg.br/espacodoconhecimento/pelos-mundos-indigenasmaxak.
https://apiboficial.org/2021/09/30/retomada-maxakali-ocupa-terra-para-construir-a-aldeia-escola-floresta.
117
Estrada de Ferro Bahia e Minas:
Verdades Históricas
Oldair Ferreira Motta*
Erika Pereira Sulz**
INTRODUÇÃO
O prolongamento da Estrada de Ferro Bahia e Minas quando alcançou o muni-
cípio de Teófilo Otoni, construiu monumentos inapagáveis do extraordinário progresso
ferroviário no Estado de Minas Gerais. Projetados por um singular estudo dos métodos
construtivos utilizados na sua construção, que evidenciam uma sucessão de sábias deci-
sões adotadas pela conceituada equipe técnica da ferrovia.
Os seus idealizadores projetaram pontilhões, túneis, estações, armazéns, almo-
xarifados, depósitos de combustível, oficinas, serrarias, ferrarias, galpões, farmácias,
hospitais, vilas de operários e todas as demais edificações provisórias necessárias para
o fluxo dos trabalhos. E ergueram, na via permanente que atravessou o vasto território
do vale do Mucuri, um autêntico repositório artístico do período suntuoso da Estrada de
Ferro Bahia e Minas.
A leitura deste singelo artigo, embora sucinto, está pautado exclusivamente no
acervo do Arquivo Público Mineiro e assegura a confiabilidade, perante estas informa-
ções ocorridas no período que antecede a inauguração da estação ferroviária na nossa
cidade do amor fraterno, dentre as quais, estão transcritas aqui com a sua grafia original:
- A decisão para iniciar o prolongamento até o ponto terminal da ferrovia, na
cidade de Teófilo Otoni;
- O empréstimo do Estado de Minas Gerais para a sua execução;
- As aquisições das locomotivas;
- Os responsáveis pelo projeto da estação ferroviária de Teófilo Otoni;
- A citação de outras estações ferroviárias projetadas em locais diferentes do
que conhecemos.
ATA DA 48º SESSÃO
A ata da 48º sessão, realizada no dia 17 de setembro de 1894, contém a reco-
mendação do secretário de Agricultura do Estado de Minas Gerais que foi encaminhada
para os diretores, Bueno Brandão, Manoel Guilherme da Silveira e Gustavo Adolpho
Schmidt, iniciarem a construção do prolongamento da ferrovia até a cidade de Teófilo
Otoni. E conforme consta na ata, a diretoria acatou a recomendação e tomou a seguinte
decisão:
[...] A Diretoria mandou publicar os anúncios para a concorrência de propostas até
o dia 20 de outubro próximo, para construção por 3 empreitadas distinctas dos tre-
chos desde o kilometro 149, até a cidade, de Theophilo Ottoni (Philadelphia) ponto
terminal da estrada; sendo os referidos annuncios publicados no Diario Official, e
em mais tres folhas diarias de maior circulação desta capital [...]. (APM / SA-651)
Os primeiros trabalhadores contratados para iniciar o prolongamento da ferro-
via, chegaram na estação de Urucu no dia 02 de outubro de 1894, conforme consta na
nota de despesa do mesmo dia:
118
02/10/94 - Construcção da estrada - pago a José Mogado por conta de 1:000#000,
preço para adquirir 100 trabalhadores e leval-os até Urucú - 350.000. (APM / SA-657
LOCOMOTIVAS
A lista dos vagões para serem utilizados nas locomotivas BALDWIN do tipo
Consolidations Classe 10-24E, do tipo Mogul e do tipo Americano, adquiridos pela fer-
rovia da Hausph Biedrn Companhia, foi a seguinte:
- 10 carros plataforma;
- 22 volumes de peças pertencentes ao freio Westinghouse;
- 15 carros fechados para mercadorias;
- 2 para inflamaveis;
- 4 vaggons abertos para mercadorias;
- 3 carros para correios e bagagens;
- 2 para animais;
- 1 carro de 40 passageiros 1ª Classe;
- 1 pa 60 passageiros 2ª Classe;
- 2 mistos para 20 p. de 1ª e 40 de 2ª Classe. (APM / SA-662)
Deveis mandar fazer por elle e pelo Sr Siegher os projectos das estações de Th:
Ottoni, Saudade, Tanque, dos armazens e officinas das caixas dágua e gyrado-
res, não esquecendo os depositos de carros, machinas, inflammaveis etc [...].
120
(APM / SA-672)
121
CURIOSIDADE
REFERÊNCIAS:
FONTES PRIMÁRIAS
SA-651 - Atas das sessões da Diretoria da Companhia da E. F. Bahia e Minas - 1893-1895;
122
SA-655 - Livro diário da Companhia E. F. Bahia e Minas - 1894-1895;
SA-657 - Livro-caixa da Companhia Bahia e Minas - 1894-1896;
SA-662 - Ordens de serviços, correspondências e relatórios - E. F. Bahia e Minas. - 1895-1897;
SA-672 - Correspondência expedida - prolongamento da E. F. Bahia e Minas. - 1896-1897;
SA-5 Cx 01 Pc 27 S/D - Caixa de documentos avulsos.
ABREVIAÇÕES
APM = Arquivo Público Mineiro, SA = Secretaria de Agricultura, S/D = Sem Data
123
As materialidades da Estrada de Ferro Bahia-Minas
no município de Teófilo Otoni:
entre a degradação e o esquecimento
Sérgio Lana Morais*
INTRODUÇÃO
METODOLOGIA
124
EFBM no município de Teófilo Otoni; 2) realização dos trabalhos de campo e o geor-
referenciamento das reminiscências, caracterização fotográfica e a aplicação da ficha de
cadastro básico para inventário dos bens imóveis do patrimônio ferroviário adaptado do
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN, 2010).3) Ao final, as in-
formações técnicas foram armazenadas em um banco de dados geográficos na plataforma
de geovisualização do Story Maps (ArcGIS Online) para fins de divulgação científica.
125
Após 17 anos do início das obras, finalmente, a estação da área central de Phila-
delphia foi inaugurada em 03 de maio de 1898 com forte repercussão popular (LEMOS,
2016). Coincidentemente, exatos 68 anos depois, seria editado o decreto nº 58.341 que
disciplinaria a erradicação de ferrovias e ramais antieconômicos no país, dentre as quais
estaria a EFBM. Embora o destino preferencial da EFBM fosse a cidade do Serro que
àquela época ocupava uma centralidade importante na rede urbana mineira que se interio-
rizava, os seus trilhos nunca chegariam a alcançá-la. Após a passagem por Philadelphia,
os trilhos rumaram a noroeste para acessar o Vale do Jequitinhonha e somente quatro
décadas mais tarde ocorreria a inauguração da Estação de Araçuaí que permaneceu como
“ponta da linha” até a sumária extinção da ferrovia em 1966.
Figura 01:Traçado original e estações da Estrada de Ferro Bahia-Minas entre 1881 a 1966.
126
direita do rio Todos os Santos, principal afluente da porção mineira do rio Mucuri. Dos
municípios por onde os trilhos da EFBM passavam, Teófilo Otoni é o que reunia a maior
quantidade de estações e pontos de embarque (PE) sendo oito no total, a saber: Estação
de Bias Fortes; Estação de São João; Estação de Pedro Versiani; PE Planície; PE Itamu-
nheque, PE Cantinho; Estação de Teófilo Otoni e Estação Aliança.
Mesmo com um espectro de elementos naturais e antrópicos que conduzem à
degradação, ainda permanecem representados nas paisagens de Teófilo Otoni os diver-
sos “tempos” da EFBM, mas infelizmente, boa parte da população local não consegue
identificá-los ou remetê-los aos tempos áureos das ferrovias na região. A partir de levan-
tamentos cartográficos e realizações de trabalhos de campo, foram georreferenciadas e
mapeadas 21 reminiscências arquitetônicas, constituídas por estações ferroviárias, ca-
sas de turmas, pontilhão, locomotiva, túneis e outras edificações que fazem referência
à temática. Tais elementos, sob a perspectiva material, apresentam diversos fatores de
degradação de suas estruturas e/ou foram substancialmente descaracterizados ao longo
do tempo que ficaram inertes (quadro1).
127
Quadro1.Reminiscências arquitetônicas da EFBM no município de Teófilo Otoni e o
estado de conservação.
128
Após a descontinuidade da ferrovia, os bens imóveis passaram a integrar o pa-
trimônio da Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA), nos termos da Lei n° 3.155, de
13/03/1957 e posteriormente foram erradicados via decreto n° 58.341, de 03/05/1966. De
acordo com o Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (DNIT), todas as
estações e bens do trecho foram vendidos ou doados para as prefeituras dos municípios
aos quais os referidos bens pertencem. Mesmo considerando a importância da EFBM
para o desenvolvimento econômico e processo de ocupação da região do Vale do Jequi-
tinhonha, as estações da linha, neste momento não somam atributos que justifiquem a
formalização de sua proteção em nível nacional. Assim sendo, é recomendado que a
análise de atribuição de valor cultural dos bens seja atribuída as instâncias munici-
pais e estadual” (Silva, 2018, p. 91, grifo nosso).
Conforme demonstrado poucos elementos materiais da EFBM passaram por
processo de patrimonialização até o momento. Por sua vez, com a finalidade de divulga-
ção das materialidades e amparados no uso de geotecnologias,organizamos uma platafor-
ma de geovisualização que permite a leitura visual e interativa dos elementos ferroviários
identificados.No ambiente de geovisualização desenvolvido por meio da plataforma do
ArcGIS Online, o usuário encontrará a espacialização das reminiscências arquitetônicas
oriundas da EFBM, a caracterização fotográfica e a condição de preservação, obtida a
partir da realização de trabalhos de campo e da aplicação do protocolo de inventário do
patrimônio ferroviário (Figuras 02, 03 e 04). O acesso ao ambiente virtual se dá mediante
link: https://arcg.is/0LGW1H.
Figura 02: Página inicial desenvolvida pela pesquisa com a espacialização das materia-
lidades da EFBM existentes no município de Teófilo Otoni.
129
Figura 03: Identificação das edificações da Turma 34 localizadas na zona rural do muni-
cípio de Teófilo Otoni.
130
REFERÊNCIAS
Almeida, L.M.C.; Lopes, M.E.A.; Souza Jr, T.O.; Morais, S.L.; Costa, A. Da Bahia-Minas ao Bahiminas: inven-
tário do patrimônio cultural da Estrada de Ferro Bahia-Minas no município de Teófilo Otoni-MG. In: Seminário
de Iniciação Científica do IFNMG, 9., 2021, Teófilo Otoni. Anais [...]. Teófilo Otoni: Instituto Federal do Norte
de Minas Gerais, 2021. p. 84-86. Disponível em: <https://drive.google.com/file/d/1phCVJw-vbcZ58uX8x-
521bUutDtbA4M0l/view>. Acesso em: 19 jun. 2021.
Achtschin, Márcio. A formação econômica, política, social e cultural do Vale do Mucuri. Teófilo Otoni:
publicação do autor, 2018, 176 p.
CGT. Guia Geral das Estradas de Ferro e Empresas de Transporte com elas articuladas. G-1. Estações,
Portos e Agências. Controladoria Geral de Transportes, 1960.
Eleutério, Arysbure Batista. Estrada de Ferro Bahia e Minas: a ferrovia do adeus. 2ª ed. Teófilo Otoni: pu-
blicação do autor, 2016.
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). I centenário das ferrovias brasileiras. Rio de Janeiro:
IBGE, 1954.
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Manual Técnico do Patrimônio Ferroviário.
IPHAN, Programa Monumenta, 2010. 88p.
Lemos, Felipe Ribeiro. O decreto do fim: Estrada de ferro Bahia e Minas. Teófilo Otoni: Frota, 2016. 120 p.
Martins, Marcos Lobato. A formação regional do Mucuri: O homem, o rio e a mata no nordeste de Minas
Gerais. São Paulo: Annablume, 2018, 436p.
Silva, F. S. Patrimônio Ferroviário em Minas Gerais: bens imóveis. Brasília: Iphan, Ministério da Cultura,
2018.
*Licenciado em Geografia pelo Centro Universitário do Leste de Minas Gerais (UNILESTE/MG). Mestre em
Sustentabilidade Socioeconômica e Ambiental pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).Doutorando
em Geografia – Tratamento da Informação Espacial pela PUC-MG. Atualmente é professor de Geografia do
IFNMG Campus Teófilo Otoni.
131
Análises microbiológicas, físico-químicas e toxi-
cológicas com avaliação de risco à saúde humana
na captação de amostras de água na zona rural de
um município do vale do Mucuri (Itambacuri-MG)
Mayra Soares Santos1,3
Maria Cecília Ribeiro Miranda Metzker1,3
Guilherme Lages Rodrigues1
Luiz Ricardo Sousa Corrêa1,2,3
Mayne Luisa Veronesi Silva1,3
Jairo Lisboa Rodrigues¹,3
Resumo
A água é um recurso natural essencial para o planeta, sendo indispensável no desenvol-
vimento de diversas atividades, e principalmente para o consumo humano. Apesar de sua
importância vital, esse recurso vem sendo cada vez mais contaminado por metais tóxicos
provenientes de processos industriais, agrícolas, de mineração ou mesmo por processos
litogênicos. Alguns metais são essenciais para o bom funcionamento do corpo huma-
no, porém, em altas concentrações podem ser prejudiciais à saúde. Além disso, exis-
tem metais, que mesmo em baixas concentrações, são considerados nocivos. As doen-
ças transmitidas pela água geralmente estão relacionadas à presença de microrganismos
patogênicos na água potável. Para que a água seja considerada potável, ou seja, própria
para consumo, ela deve estar livre de contaminantes químicos e biológicos e atender a
determinados requisitos visuais. Há um grande número de domicílios rurais no município
de Itambacuri, sem água encanada, sendo mal abastecidos, sem o devido monitoramento.
Este trabalho teve como objetivo realizar uma avaliação da qualidade da água com base
na contaminação físico-química, microbiológica e por metais, nas águas utilizadas para
consumo humano nesta região, bem como para calcular o risco total à saúde, causado por
alguns dos metais analisados. O risco de câncer também foi calculado, a partir de uma
possível contaminação por arsênico. Verificou-se que em 15 pontos, dos 36 analisados, há
risco potencial à saúde humana não cancerígeno e em nenhum ponto analisado há risco
de câncer, devido à concentração de arsênio.
Palavras-chave: Comunidades rurais, água potável, microbiologia da água, análise físi-
co-química, análise de risco.
Introdução
A água é um recurso natural essencial para a manutenção da vida. Devido à pos-
sibilidade de ocorrência de patógenos e contaminantes químicos na água para consumo
humano, isso pode ser um risco potencial para a saúde da população.
Nos últimos anos, tem crescido a preocupação com a contaminação ambiental
132
por metais tóxicos. Cada vez mais a exposição humana a esses metais vem aumentando,
pois seu uso se diversificou, incluindo aplicações industriais, agrícolas (fertilizantes),
domésticas e tecnológicas (TCHOUNWOU, 2014). Mesmo sem ação antrópica, o au-
mento das concentrações de metais também pode ocorrer por processos naturais, como
intemperismo e lixiviação.
Alguns metais como cobalto (Co), cobre (Cu), cromo (Cr), ferro (Fe), magnésio
(Mg), manganês (Mn), molibdênio (Mo), níquel (Ni), selênio (Se) e zinco ( Zi) são consi-
derados essenciais para as funções bioquímicas e fisiológicas. Além disso, alguns metais
mesmo em baixas concentrações podem ser perigosos para a saúde humana (TCHOU-
NWOU, 2014).
Um elemento importante a ser considerado é o alumínio (Al), composto neuro-
tóxico que, quando absorvido em grande quantidade, pode causar, em longo prazo, ence-
falopatia grave em pacientes que realizam diálise renal, podendo levar a distúrbios neuro-
lógicos (FREITAS et al., 2005). A água também pode conter um excesso de íons de ferro
e manganês dissolvidos, pois não há oxigênio suficiente para oxidá-los e precipitá-los. A
alta exposição ao manganês afeta o sistema nervoso, causando uma doença degenerativa,
denominada doença de Parkinson, cuja característica é a perda de coordenação. Além
disso, o excesso de manganês no organismo reduz a absorção de ferro causando anemia,
além de afetar o sistema nervoso central, reprodutivo e respiratório (TSALEV, 1984).
Enquanto a absorção excessiva de ferro leva ao acúmulo desses íons nos tecidos, podendo
causar hemocromatose, que provoca pigmentação bronzeada na pele, além de distúrbios
hepáticos (CONAMA, 1986).
O arsênio é conhecido como carcinogênico humano pela Agência Internacional
para Pesquisa sobre o Câncer (IARC) e Conferência Americana de Higienistas Industriais
(ACGIH) (IARC, 2010; ACGIH, 2003). Os sintomas da exposição aguda ao arsênio são
os mesmos para os derivados orgânicos e inorgânicos: gastroenterite grave com início
após 30 minutos de exposição (ATSDR, 2010), dentre outros.
Tendo em vista o grande número de domicílios rurais no município de Itamba-
curi que são abastecidos precariamente, por cisternas, nascentes, poços e águas fluviais
sem o devido monitoramento, este trabalho visa avaliar o nível de contaminação por meio
de análises microbiológicas, de metais e físico-químicas nas águas utilizadas para consu-
mo humano, bem como a análise de risco à saúde humana para alguns metais e risco de
câncer utilizando arsênio como parâmetro.
Materiais e Métodos
Área de estudo: A área de estudo compreende a área rural do município de Itam-
bacuri com população de 7.690 habitantes. O município de Itambacuri está localizado no
estado de Minas Gerais, na mesorregião do vale do Rio Doce (IBGE, 2010). Foram co-
letadas amostras de água para consumo humano (poços artesianos, cisternas, nascentes,
córregos, lagoas artificiais, poços), em quinze comunidades rurais.
Coleta de amostras: A coleta das amostras foi realizada de acordo com o proce-
dimento adotado pela CETESB (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental,
2010). Para isso, foram utilizados frascos de polipropileno, com tampa, metal free de 15 e
133
50 ml. Amostras de água foram coletadas em 15 comunidades rurais, três pontos de coleta
em sete comunidades, dois pontos em sete comunidades e um ponto em uma comunida-
de, totalizando 36 pontos de coleta. Os parâmetros físico-químicos, microbiológicos e de
metais foram avaliados no Laboratório de Poluentes e Análise Multiusuário do Instituto
de Ciência, Engenharia e Tecnologia da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha
e Mucuri (ICET-UFVJM). Todas as amostras também foram armazenadas em frascos,
tampados, em geladeira a 4°C.
Parâmetros físico-químicos: Os parâmetros físico-químicos analisados foram:
potencial de hidrogênio (pH), turbidez e temperatura.
(1)
Onde ADD é a dose média diária, medida em microgramas por quilogramas por
dia (µg/kg/dia), Cw é a concentração média de metais na água, medida em microgramas
por litro (µg/L), IR é a taxa de ingestão, medida em litros por dia (L/dia), EF é a frequ-
ência de exposição, medida em dias por ano (dias/ano), ED é a duração da exposição,
medida em anos, BW é o peso corporal, medido em quilogramas (kg) e AT é o tempo
médio (dias). Foram utilizados EF de 350 dias e ED de 30 anos para adultos. O AT foi
calculado a partir da multiplicação de ED por 365 dias para risco não carcinogênico e ris-
co carcinogênico 70 x 365 dias (GIRI & SINGH, 2015). O valor médio de Bw utilizado
foi de 70 kg e o consumo médio de água de 2 l/dia para um homem adulto brasileiro para
os cálculos.
A caracterização do risco foi quantificada por potenciais riscos à saúde humana,
os riscos não carcinogênicos foram determinados por meio do quociente de perigo (HQ),
que foi estimado comparando a exposição aos contaminantes ou sua ingestão média com
a dose de referência correspondente (RfD) da Eq. (2). Se o valor de HQ exceder 1, pode
haver preocupação com possíveis dados de saúde, mas não especificamente com efeitos
cancerígenos.
(2)
134
dos metais detectados, conforme descrito na Eq. (3). Se o valor de HI exceder 1 indica
que existe um risco potencial de um efeito adverso na saúde humana, estudos adicionais
são necessários para especificar os efeitos. Quanto maior o HI, quanto maior o valor do
HI superior a 1, maior o risco à saúde humana (USEPA, 2004; GIRI & SINGH, 2015).
(3)
(4)
Resultados e Discussão
135
A Tabela 1 apresenta os resultados das avaliações de risco à saúde, onde o HQ
(quocientes de risco) é o risco calculado de ingestão de determinados metais pela popula-
ção enquanto HI (índice de risco) é a soma dos quocientes de risco. Vários metais foram
analisados, mas apenas quatro apresentaram alteração quando comparados aos limites
exigidos pela legislação. São eles mercúrio, alumínio, manganês e ferro. O arsênio, ape-
sar de possuir valores dentro dos parâmetros, possui alta toxicidade e por este motivo
também foi analisado seu valor do quociente de perigo.
E se HQ <1 ou HI <1, é improvável que o indivíduo exposto sofra um efeito
adverso à saúde perceptível. Em contraste, se HQ > 1 ou HI > 1, existe a possibilidade de
136
que um efeito não canceroso possa ocorrer com uma probabilidade que tende a aumentar
à medida que o HI aumenta (MAN et al., 2010). Visto este ponto, dezesseis pontos exce-
dem a unidade para valores de HI, como distribuídos na Figura 2.
Figura 2 – Mapa dos resultados da avaliação de risco total não cancerígeno da zona rural
de Itambacuri-MG.
O gráfico abaixo (Figura 3) mostra os valores de HI referentes aos pontos co-
letados, comparando com o limite recomendado pela USEPA, 2004. Os pontos 26 e 33
apresentam altos valores de HI devido à grande quantidade de alumínio metálico nas
amostras. Acredita-se que a presença de Al no solo da região seja um fator natural de
contaminação, pois segundo a Empresa de Pesquisa e Recursos Minerais (CPRM, 1997)
a região apresenta solo podzólico vermelho amarelo, rico em óxidos de ferro e alumínio.
Nos pontos 1, 4, 5, 6, 17, 18, 21, 22, 23, 24 e 36, o valor do pH mostrou-se
abaixo do limite aceitável, acredita-se que a presença de matéria orgânica na água pode
causar redução potencial de hidrogenação.
Segundo a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB, 2009) a
turbidez da água é o grau de atenuação da intensidade que um feixe de luz sofre ao atra-
vessá-la, devido à presença de sólidos em suspensão, como partículas inorgânicas (areia,
lodo, argila) e detritos orgânicos, como algas, bactérias e plâncton. Exposta, a alteração
em vinte e uma amostras pode ser justificada pela má conservação e falta de limpeza da
fonte de água utilizada, gerando a presença de materiais orgânicos e inorgânicos.
A temperatura da água é um parâmetro importante para a manutenção e quali-
dade da vida aquática. Alguns estudos, como o da Qualidade das Águas Superficiais do
Brasil (ANA, 2012), afirmam que a faixa ideal para este parâmetro é de 22 a 26ºC. A ex-
trapolação do limite de algumas amostras é explicada pela exposição direta do manancial
à incidência solar e ausência de proteção vegetal, podendo gerar redução da concentração
de oxigênio dissolvido na água.
De acordo com a American Public Health Association (2012), as bactérias que
produzem uma colônia vermelha com brilho metálico (dourado) dentro de 24 h de incu-
bação a 35°C em meio tipo Endo são consideradas membros do grupo dos coliformes. O
grupo coliforme é baseado na produção de aldeídos a partir da fermentação da lactose.
138
Embora essa característica bioquímica faça parte da via metabólica de produção de gás
no teste de múltiplos tubos, algumas variações no grau de desenvolvimento do brilho
metálico podem ser observadas entre os coliformes. A presença de coliformes totais foi
detectada em muitos pontos, exceto em seis amostras.
A característica distintiva dos coliformes termotolerantes é que eles são resisten-
tes a altas temperaturas e, portanto, são capazes de crescer e fermentar a lactose a 44° C. Os
termotolerantes são frequentemente conhecidos como coliformes fecais porque os regimes
de alta temperatura devem suprimir as bactérias de origem não fecal. No entanto, bactérias
não fecais (vivas, ambientais) ainda podem estar presentes mesmo nessas condições (VON
SPERLING, 2007).
Termotolerantes são bactérias que têm a Escherichia coli como seu principal
constituinte. A E. coli é geralmente considerada um indicador de contaminação fecal e da
presença de patógenos potencialmente nocivos, e não como um patógeno bacteriano em
si (ALVES, 2002). Entre os pontos analisados, dezesseis apresentaram valores positivos,
indicando uma possível contaminação fecal, animal ou humana.
Referências
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março de 2005.
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139
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¹
Instituto de Ciência, Engenharia e Tecnologia. Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri. Rua
do Cruzeiro, 01, Jardim São Paulo, Teófilo Otoni-MG, 39803371.
2
Grupo de Extensão e Pesquisa em Agricultura Familiar- GEPAF-UFVJM
3
Movimento Pró rio Todos os Santos e Mucuri- Teófilo Otoni-MG.
140
Preservando um capítulo da história do Vale do Mucuri:
O resgate da memória de magistrados
que atuaram em Teófilo Otoni
Isabella Dias Almeida*
Lívia Guedes Dias**
Renzzo Giaccomo Ronchi***
Abstract: Assets of an intangible nature are also part of the cultural heritage, which is
why society, in cooperation with the government, can adopt initiatives aimed at preser-
ving the institutional memory of public bodies and institutions, especially because they
are built by people. In this sense, it is the right of local society to know and have access
to the institutional memory of the judiciary, especially in the centenary district of Teófilo
Otoni, for which reason the creation of a photographic gallery with all the magistrates
who have worked in the city since the beginning of the 1990s , materializing an important
chapter in the history of the mucuri valley, contributes to the educational formation of
the entire legal community and represents a gesture of recognition to those who, in the
exercise of a dignified and honorable public function, dedicated themselves to exercising
jurisdiction with the purpose of maintaining social peace and safeguarding rights.
INTRODUÇÃO
O presente texto foi escrito em coautoria para publicizar uma importante inicia-
tiva adotada pela direção do foro da comarca de Teófilo Otoni (segundo biênio de gestão
2022/2023) consistente na elaboração de uma galeria fotográfica com todos os magistra-
dos que já atuaram na cidade. Para além de um ato que traduz o reconhecimento em favor
de todos os magistrados que já trabalharam na comarca, a iniciativa vai ao encontro da
política adotada pelo conselho nacional de justiça, que compreende a memória do poder
141
judiciário como parte integrante do patrimônio cultural brasileiro.
O texto está estruturado em dois capítulos. No primeiro, cuidou-se de compre-
ender a importância do resgate da memória institucional do poder judiciário. No segundo,
foi demonstrada a iniciativa adotada pela direção do foro da comarca de Teófilo Otoni
para preservar a lembrança dos juízes que já atuaram na cidade.
Nas considerações finais, sugere-se que essa iniciativa seja levada ao conheci-
mento da presidência do tribunal de justiça de Minas Gerais servindo como paradigma
para que todas as outras comarcas também façam esse trabalho com a finalidade de res-
gatar, de forma integral, a memória do poder judiciário de Minas Gerais.
Metodologicamente, o texto valeu-se de uma revisão bibliográfica contextuali-
zando a importância e a necessidade de preservação de registros históricos. Além disso,
também foi utilizada a análise documental considerando a iniciativa adotada pela direção
do foro e a pesquisa feita pela comissão responsável pela busca dos nomes dos juízes que
já atuaram na comarca de Teófilo Otoni.
142
informações contribuem para além da esfera burocrático-formal, preservando a história,
a cultura e a memória das pessoas que exerceram essa importante função para manter a
paz social.
Não fossem essas pessoas que exerceram a magistratura em grande parte de
suas vidas, a sociedade jamais teria a oportunidade de resgatar historicamente, de for-
ma documental, quem foram os juízes responsáveis por importantes decisões que foram
proferidas em processos judiciais, ora preservando o meio ambiente, ora preservando o
patrimônio público, ora, também, visando o aperfeiçoamento das instituições, ora, ainda,
condenando ou absolvendo réus em processos criminais de grande repercussão, além de
que, por primazia, são os maiores responsáveis pela proteção dos direitos humanos, no
caso de grave ameaça.
São mulheres e homens que no exercício independente de suas prerrogativas fa-
zem valer a autoridade do Direito e, como disse Dallari (2008, p. 47) em sua obra O poder
dos juízes, “longe de ser um privilégio para os juízes, a independência da magistratura
é necessária para o povo, que precisa de juízes imparciais para harmonização pacífica e
justa dos conflitos de direitos”.
Em texto publicado no Fundacentro (BRASL, 2020) foi ressaltado que
A memória é um dos alicerces que dá sentido à vida. Com uma instituição não é di-
ferente. Preservar a memória institucional é manter a instituição viva e uma for-
ma de fortalecer suas bases. Para que essa memória seja preservada, é preciso
conservar fotos, documentos, objetos e organizar os registros dos fatos. Os erros
e acertos do passado ajudam a entender o presente e a planejar ações futuras.
143
Designa servidores para compor equipe para pesquisa e elaboração de galeria fotográfica
dos juízes e ex-diretores de foro que atuaram nesta Comarca.
RESOLVE:
Art. 1º. Designar os servidores efetivos Diane Lima de Castro, Jerônimo Marcelo Borges,
Milene Ferreira Silva, Spártacus Miranda Matos, Wolney Vieira da Costa e a assistente
da direção do foro Isabella Dias Almeida, para, sob a presidência da primeira servido-
ra, compor a equipe para pesquisa e levantamento de dados dos juízes que atuaram na
comarca de Teófilo Otoni, bem assim os ex-diretores de foro, a fim de elaborar galeria
fotográfica a ser implantada junto ao novo prédio do fórum, cuja construção está prevista
para ser executada no início do próximo ano.
144
Vistos,
Ciente da Portaria nº 136/2021, pela qual o Juiz Diretor do Foro da Comarca de Te-
ófilo Otoni designa “os servidores efetivos Diane Lima de Castro, Jerônimo Marcelo
Borges, Milene Ferreira Silva, Spártacus Miranda Matos, Wolney Vieira da Cos-
ta e a assistente da direção do foro Isabella Dias Almeida, para, sob a presidência da
primeira servidora, comporem a equipe para pesquisa e levantamento de dados dos
juízes que atuaram na comarca de Teófilo Otoni, bem assim os ex-diretores de foro,
a fim de elaborarem galeria fotográfica a ser implantada junto ao novo prédio do fó-
rum, cuja construção está prevista para ser executada no início do próximo ano”.
5
Affonso Teixeira Lages; Alair Soares Mendonça; Aluizio Valle de Mattos; Amaury Silva; André Leite Praça;
Andreya Alcântara Ferreira Chaves; Antônio Carlos Ribeiro; Antônio Tenório; Argemiro Otaviano Andrade;
Aristides Alves Pereira; Bárbara Lívio; Bruno Sena Carmona; Caetano Levi Lopes; Cantídio Pereira Alvim;
Christyano Lucas Generoso; Dely Coelho Nogueira; Edivaldo Amorim Farias; Emerson Chaves Motta; Eustá-
quio da Cunha Peixoto; Fabrício Simão da Cunha Araújo; Francisco da Silva Goulart; Francisco José de Almeida
Brant; Francisco Lins Ayque de Meira; Geraldo França Correia; Geraldo José Duarte de Paula; Geraldo Rodri-
gues de Oliveira; Gustavo Henrique Moreira do Valle; Helvécio Rosenburg; Hermelindo Introcaso Pascoal;
Jefferson Keiji Saruhashi; João Bosco Kumaira; José Amado Henriques; José Arnóbio Amariz de Sousa; José
Duarte Lana Sobrinho; José Francisco Chein; José Maria Moraes Pataro; José Osorito Colares; José Paulino
de Freitas Neto; Juliana Alcova Nogueira; Juliana Mendes Pedrosa; Juliano Abrantes Rodrigues; Júlio Luiz de
Lucena Pereira; Kênea Márcia Damato Mendonça; Lélio Erlon Alves Tolentino; Leonardo Cohen Prado; Lou-
renço Migliorini Fonseca Ribeiro; Lucas Sávio de Vasconcellos Gomes; Luiz Gonzaga Silveira Soares; Lupércio
Paulo Fernandes de Oliveira; Manoel Faustino Corrêa Brandão Júnior; Maria Lúcia Caporali de Freitas; Marino
Ferreira Porto; Maurício Simões Coelho Júnior; Mauro Sérgio de Souza Schettino; Melissa Pinheiro Costa Lage;
Myriam da Conceição Saboya Coelho; Natal Dias Campos; Neuza Maria Guido; Nuno da Cunha Melo; Oswaldo
Prate; Otávio Augusto de Melo Acioli; Ovidio César Nascentes Coelho; Pedro Anísio Maia; Rafael Andrade;
Rêidric Victor da Silveira Condé Neiva e Silva; Reneuda de Alencar Bezerra Moreira; Renzzo Giaccomo Ron-
chi; Ricardo Vianna da Costa e Silva; Robson Luiz Rosa Lima; Rodrigo Mendes Pinto Ribeiro; Rodrigo Moraes
Lamounier Parreiras; Rosimere das Graças do Couto; Rubens Celso de Abreu; Rubens Gabriel Soares; Salatiel
de Resende Fernandes Neto; Teresinha Dupin Lustosa; Thomas Ferreira Espeschit Arantes; Velmem Daibert
Feo; Vicente Ferreira Paulino; Vinicius da Silva Pereira; Vital Soriano de Souza; Wagner Alcântara Pereira.
145
neiro de 19905. Posteriormente, foram solicitados ao mesmo setor os contatos dos juízes
ou dos pensionistas dos juízes que trabalharam na comarca, além de também ter sido feito
contato com desembargadores e juízes que ainda se encontram em atividade.
O contato foi feito para informar sobre a construção da galeria fotográfica e,
também, para solicitar a colaboração dos magistrados (desembargadores e juízes de pri-
meira instância) com a disponibilização de material para implementação do projeto con-
sistente numa breve biografia e fotografia impressa ou em mídia enviada para o endereço
do fórum ou email da administração do foro.
Dando seguimento ao projeto, também foi demandado o órgão do tribunal de
justiça de Minas Gerais, responsável pela Gerência de Suprimento - GESUP, solicitando
verba para aquisição de molduras e impressões das fotos.
Em resposta, o setor acolheu o pedido, deixando o numerário à disposição para
viabilizar a inauguração da galeria.
Assim sendo, vê-se que a galeria fotográfica visa restaurar a memória e a his-
tória de autoridades do poder judiciário local que contribuíram para a cidade de Teófilo
Otoni e região.
A construção de uma galeria destinada à memória dos juízes que atuaram na co-
marca de Teófilo Otoni contribui para minimizar o distanciamento ainda existente entre
o poder judiciário e a população, colaborando, também, para a formação educacional de
toda a comunidade jurídica.
O projeto se encontra em fase de execução e será concluído a tempo de a galeria
fotográfica ser inaugurada junto com a conclusão e inauguração da obra de ampliação e
reforma do fórum de Teófilo Otoni.
A galeria fotográfica possuirá um local apropriado para destacar, cronologica-
mente na linha do tempo, todos os magistrados e ex-diretores do foro que atuaram na
comarca de Teófilo Otoni, resgatando, assim, um importante capítulo da história do vale
do mucuri.
CONCLUSÃO
5
Embora outros juízes tenham atuado na comarca de Teófilo Otoni antes de 1990, optou-se temporalmente
por este marco dada a grande dificuldade de obtenção de informações a respeito desses magistrados e seus
familiares.
146
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Letras, 2017.
147
De São Jorge a Nova Módica: história, fé, poesia
Julizar Dantas*
Essa jornada nos remete à analogia com os percursos de dois rios. Nascem sepa-
rados. Após o encontro das águas, seguem unidos rumo ao mar. Do lado de cá, uma aldeia
indígena localiza-se às margens do Itambucuri6 – rio das conchas –, leste de Minas. Do
outro lado do Oceano Atlântico, encontra-se a cidade de Módica, Itália. Distante 8.500
quilômetros entre si,o destino as conecta.
Nas selvas do Mucuri, comandada pelo chefe “capitão” Pohóc, habita numero-
sa tribo de origem Crakacatãm, Mocurim e Nhãnhãn, falantes da língua dos Borum. São
nativos de Poté, Pontarút, Noret, Ampâ e Trindade. Migraram para aquela região com o
avanço da colonização do Mucuri. A aldeia conta oitocentos “homens em arcos”, uma rede
sentinela de pequenos grupos aliados, atentos na defesa da acirrada disputa contra colonos
e grupos indígenas rivais (MISSAGIA DE MATTOS, 2018).
A convivência com os colonizadores pioneiros ocorre pela participação de intér-
pretes, conhecidos como “línguas”.Um deles, Félix Ramos da Cruz,casa-se com a índia
Umbelina, filha do chefe Pohóc. Dessa união, nasce Domingos Ramos Pacó, primeiro pro-
fessor indígena de Itambacuri, autor do manuscrito Uma Pequena Narração ou Origem; de
Como foi Descoberto o Itambacuri =1873=. Essa narrativa de Pacó nos revela o contraste
na descrição da selva: a visão lúdica dos aborígenes e o ambiente hostil aos olhos dos
missionários. Pacó também critica o modelo de catequese: incentivo à miscigenação para
negar a identidade indígena. (PACÓ, 1918, apud RIBEIRO, 1996, p. 201-11; MISSAGIA
DE MATTOS, 2018)).
Antes da chegada dos capuchinhos à região, já se conhecia a existência da tribo de
Pohóc e seus aliados. Empresário e político, exímio estudioso da distribuição geográfica dos abo-
rígenes, Teófilo Benedito Ottoni mantivera contatos com os índios sem virtude das atividades
logísticas da Companhia de Comércio e Navegação do Mucuri (MISSAGIA DE MATTOS, 2018).
Serafim de Gorízia e Ângelo de Sassoferrato, da Ordem dos Frades Menores Ca-
puchinhos, recebem as “letras obedienciais”, nomeando-os missionários apostólicos, Roma,
6/2/1872. No Brasil, incumbiram-se da catequese indígena nas colônias do Mucuri, Provín-
cia de Minas Gerais. Frei Ângelo relata: “As instruções consistiam em nos estabelecermos
nas matas do Mucuri, no lugar mais apropriado para reunião de múltiplas tribos selvagens.”
Chegam a Filadélfia, hoje Teófilo Otoni. Ali permanecem durante seis meses. Nesse tempo,
dedicam-se às pesquisas, observações, excursões, explorações e projetos, à procura do lugar
ideal para a fundação do aldeamento central imperial (PALAZZOLO, 1954).
Frei Serafim e comitiva chegam ao alto da serra divisora das águas do Itamba-
curi e córrego d’Areia, na tarde de 19 de fevereiro de 1873. Frei Ângelo assim descreve o
descobrimento de Itambacuri: “Por meio de um intérprete manifestamos aos índios o que
pretendíamos fazer, salientando que o Governo nos enviara para que os tornássemos felizes
e lhes pedíamos informações sobre o sítio, em que vagavam”. Frei Serafim, ante a beleza
Itambacuri (tambaquir-ri) – o rio dos montes de cascas, de mexilhões ou de conchas. Form. De TAMBÁ, ostra,
6
mexilhões, marisco, concha; QUI, QUIBA, depósito, jazida; RI, corrente d´água, rio (PONTES, 1970, p.200).
148
do lugar, compreende a graçadivina talhada aos propósitos dos trabalhos apostólicos. Ex-
clama: - “Daqui não sairei mais!” Consolida-se a fundação do Aldeamento Central Nossa
Senhora dos Anjos do Itambacuri.7 Na oportunidade, ocorre o encontro inicial, mediado
pelo “língua” Félix Ramos, entre os frades capuchinhos,o cacique Pohóc e o povo da tribo
(PACÓ, 1918, apud RIBEIRO, 1996, p. 201-11; PALAZZOLO, 1954).
Além-mar, em Módica, província de Ragusa, ilha de Sicília, nasce Giorgio Za-
ppulla, 20/11/1897. Aos 16 anos de idade, veste o hábito da ordem fundada por São Fran-
cisco de Assis. Segundo regra franciscana, troca o nome de batismo por Frei Gaspar de Mó-
dica. Conclui filosofia e teologia aos 22 anos, 1902. Cumpre o serviço militar obrigatório.
Torna-seum dos pioneiros entre os capuchinhos enviados pelo padre provincial de Siracusa
a Itambacuri. Parte do porto de Gênovacom destino ao Brasil, 14/7/1904. Aporta no Rio de
Janeiro aos 7 de agosto do mesmo ano. Já em Itambacuri, profere o primeiro sermão em
português, 22/01/1905 (PALAZZOLO, 1954; RODRIGUES, 2015).
Missionário, espírito bandeirante, embrenha-se pela Mata Atlântica. Constrói es-
tradas, capelas e povoados. Numa ocasião, Frei Gaspar abre uma picada no meio da mata.
Depara-se com um povoado, 29/06/1925. O povo teria exclamado: - “São Pedro vos trouxe
aqui.” Frase origináriado nome do arraial São Pedro, atual município de Pescador.
Frei Gaspar de Módica celebra bodas de prata sacerdotais, 1927. Revigorado,
estimula-se à instalação da colônia italiana – Nova Siracusa – na gleba de terra de 4.000
alqueires, cedida pelo governo estadual, destinada ao cultivo do café. A partir de Itambacu-
ri, via São Pedro, abre outra picada direção leste. Quarenta trabalhadores o acompanham.
Uma semana após, encontra um ribeirão. Denomina-o São Jorge, homenagem ao padroeiro
da cidade natal. Ali acredita ter encontrado o local predestinado ao empreendimento (PA-
LAZZOLO, 1954; PEREIRA, 1994).
Mês de julho, inicia-se a construção de Nova Siracusa às margens do Córrego de
São Jorge. Frei Gaspar ordena a derrubada da mata e abertura de clareira. Organiza ranchos
fechados com madeira roliça e cobertura de folhas. Ergue um cruzeirode madeira de lei.
Constrói capela dedicada ao santo de devoção. Nesse local, celebra missa, hasteia as ban-
deiras do Brasil e da Itália, 17/7/1927. À noite, lampiões a carbureto iluminam os ranchos.
Acendem-se fogueiras com lenha seca para afugentar as onças (PEREIRA, 1994).
Um fato novo interrompe o projeto de Nova Siracusa. O governo italiano encerra
os subsídios de emigração, inviabilizando a vinda dos colonos. Frei Gaspar reformula o
projeto. Decide doar 70 hectares de terra para cidadãos corretos e honrados, predispostos a
viver no povoado de São Jorge (PEREIRA, 1994; GONÇALVES, no prelo).
Sobre a origem do Santo, conforme a tradição, trata-se de soldado dos tempos do
imperador Diocleciano venerado como mártir cristão. Jorge nasceu na Capadócia, entre 275
e 280, Era Cristã. Após a morte do pai, emigra para a Palestina acompanhado pela mãe. No
exército romano obtém a patente de capitão e o cargo imperial de tribuno militar. Muda-se
para Roma. Nomeado conde, exerce altas funções na corte (TEMPESTA, 2019; VATICAN NEWS, 2022).
7
Aldeamento Central Nossa Senhora dos Anjos do Itambacuri, criado pela Portaria do governo Provin-
cial, 25/1/1872; consolidado em 19/2/1873. Distrito de Itambacuri, subordinado ao município de Teófilo
Otoni,mediante a Lei estadual n° 556, de 30/8/1911. Município de Itambacuri e seus 4 distritos (Itambacuri,
Aranã, Frei Serafim e Igreja Nova) criado pela Lei estadual n° 843, de 7/9/1923 (COSTA, 1997).
149
O imperador Diocleciano emana um decreto para a perseguição aos cristãos, 303
d.C.Jorge distribui os bens para os pobres. Na data deaprovação do decreto imperial pelo
senado, protesta contra o falso culto aos deuses pagãos. Reafirma a fé em Cristo. Questio-
nado sobre o significado da Verdade, responde: – “A Verdade é meu Senhor Jesus Cristo,
a quem vós perseguis, e eu sou servo de meu redentor e, n’Ele confiado, me pus no meio
de vós para dar o testemunho sobre Ele.” Diante de Diocleciano, Jorge rasga o decreto
imperial. A manutenção da fidelidade a Cristo, apesar das tentativas em dissuadi-lo, resulta
em decapitação 23/4/303 d.C. Está sepultado em Lida, na Palestina (TEMPESTA, 2019;
VATICAN NEWS, 2022).
Elegeram o Santo Mártir Jorge padroeiro da Inglaterra, da Geórgia, da Lituânia
e de Portugal, além das cidades de Módica e Nova Módica. A celebração da festa litúrgica
ocorre no dia 23 de abril. Na simbologia da imagem, a espada e a lança representam a
palavra de Deus. O cavalo branco simboliza a pureza e a santidade, armas indispensáveis
na luta contra o mal, o dragão. (TEMPESTA, 2019; VATICAN NEWS, 2022).
O começo de 1932 foi exaustivo. A última viagem de Frei Gaspar sucede aos 8 de
março. Peregrina nas regiõesde Capela da Baixinha de Todos os Santos, Poté e São Miguel.
Em São José do Fortuna, celebra missa, 19 de março. Retorna a Itambacuri, diabético e
vítima deum tumor na cabeça. Apesar disso, trabalha durante a Semana Santa. Celebra pela
última vez a missa conventual do domingo da Ressurreição. Abril, primórdios de maio,
padece dores atrozes. Despede-se do corpo físico, inicia a jornada espiritual em 16/05/1932
às 8h30 (PALAZZOLO, 1954, p. 463).
“Aquele que em vida jamais descansou, repousa agora, como sempre desejara, na
sepultura, que, para ele se abriu, ao lado dos túmulos dos fundadores, à sombra do santu-
ário de Nossa Senhora dos Anjos” (PALAZZOLO, 1954, p. 463). Frei Gaspar de Módica
(Figura 1) morre aos 53 anos, no fervor das atividades, em Itambacuri, sendo homenageado
pelo poeta do “rio das Conchas” com um soneto de despedida (Figura 2).
Figura 1- Frei Gaspar de Módica. Figura 2- Soneto em homenagem ao Frei Gaspar de Módica
Arquivo pessoal José Edler Gonçalves. (PALAZZOLO,1954, p. 464).
150
O arraial de São Jorge evolui. Emergem construções históricas. O barracão dos
padres, 1929, serve de local das celebrações religiosas, escola de alfabetização e pousada.
Ergue-se a igreja na subida de um morro, 1934 (Figura 3).
Figura 4- ALVES, José, 1998. Pintura: Fazenda Estrela, Córrego de São Jorge. Propriedade de Napoleão Barbosa
Dantas e Lica, adquirida do desbravador Gregório dos Reis Silva, 1951.
151
Um prédio erguido em 1956 facilita o agrupamento das escolas isoladas exis-
tentes na comunidade. Surgem as Escolas Reunidas Dr. Alair Alves Costa, Decreto no.
6.445 do Governo do Estado de Minas Gerais, 23/12/1961. Amplia-se o ensino até a
quarta série do primeiro grau. A reestruturação de 1987 cria a Escola Estadual Dr. Alair
Alves Costa e estende o ensino até a oitava série. Atualmente, ela atende aos anos finais
dos Ensinos Fundamental, Médio e Profissionalizante.
A elevação a distrito com o nome de Nova Módica, homenagem ao fundador, de-
corre da Lei n° 1.039 de 12/12/1953. A emancipação política, Lei n° 2.764 de 30/12/1962
(COSTA, 1997), cria o do município de Nova Módica sob a gestão interina de Antônio
Barbosa de Assis. Anael Inácio Ramos foi o primeiro prefeito eleito pelo povo, gestão
1963-1966. Privilegia abertura de estradas, iluminação pública e educação. Cria-se uma
creche para o acolhimento de crianças carentes. Relata Iná Farias Ramos: “As merendas
vinham de Teófilo Otoni, muita fartura! Os sacos dos mantimentos eram de um pano
muito bom. Nós os desmanchávamos para fazer as roupas das crianças.” Entre as futuras
administrações municipais, destaca-se, pela longevidade, Sinval Neves Miranda, eleito
por três mandatos.
1964, missionário capuchinho, Padre João (Giovanni) Sacco assume as igrejas
de Pescador, Nova Módica e São José do Divino. “Estradas poeirentas ou lamacentas
ligam as localidades da paróquia que visito, uma vez por mês, na tentativa de garantir
um mínimo de assistência religiosa.” (SACCO, 1992). Padre João lega inúmeras obras
sociais. Em destaque, estão o Centro Infantil Padre João Sacco em Nova Módica e o
hospital da cidade de Pescador. Faleceu aos 75 anos, 7/9/2008.
Nova Módica pertence ao bioma da Mata Atlântica, Bacia Hidrográfica do Rio
São Mateus (SM1), mesorregião do Vale do Rio Doce (IGAM. 2009). Abrange uma área
territorial de 375,9 km2. Estima-se a população/2021 em 3.548 pessoas. A rodovia estadual
MG-311 conecta Nova Módica à BR-116,principal via de transporte do Brasil com 4.486
km de extensão. A economia local gera emprego aos, neomodicanos. Concentra-se em três
atividades principais: administração pública, pecuária e comércio. Principal atração turís-
tica: festa do padroeiro São Jorge, 23 de abril (IBGE, 2021). Reflexo do atual estágio de
desenvolvimento, inaugura-se moderna sede da Prefeitura Municipal, 7/12/2019 (Figura 5).
Figura 5- Sede da Prefeitura Municipal de Nova Módica. Administração 2017-2020 - Prefeito Walter Junior
Ladeia Borborema. Fotografia: Gustavo Plínio Moreira de Jesus
152
NOVA MÓDICA
BIBLIOGRAFIA
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Belo Horizonte: BDMG Cultural, 1997.
IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Nova Módica. Rio de Janeiro, 2021.
2021. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/nova-modica/historico. Acesso em: 1 ago. 2022.
IGAM – INSTITUTO MINEIRO DE GESTÃO DAS ÁGUAS. Bacia Hidrográfica do Rio São Mateus. Belo
Horizonte, 2009. Disponível em: https://www.comites.igam.mg.gov.br. Acesso em: 2 ago. 2022.
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mos Pacó, na transição para a República. Em: PACHECO DE OLIVEIRA, coord. Os Brasis e suas memórias:
os indígenas na formação nacional, 2018. Disponível em: https://osbrasisesuasmemorias.com.br/biografia-do-
mingos-paco/. Acesso em: 22 jul. 2022.
PALAZZOLO, Jacinto de. Nas Selvas dos Vales do Mucuri e do Rio Doce. Como surgiu a cidade de Itamba-
curi, fundada por Frei Serafim de Gorizia, Missionário Capuchinho (1873-1952). São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1954.
PEREIRA, Serafim Ângelo da Silva. Resumo Histórico da Cidade de Nova Módica. Câmara Municipal
de Nova Módica, 09 de mar. 1994. Disponível em: https://novamodica.cam.mg.gov.br/historia-do-municipio/.
Acesso em: 24 jul. 2022.
PESCADOR (MG). Conheça a história do nosso município. Pescador, 2022. Disponível em:https://pescador.
mg.gov.br/cidade. Acesso em: 25 jul. 2022.
153
PONTES, Salvador Pires. Nomes indígenas na geografia de Minas Gerais. 1970, p.200. Biblioteca Digital
Curt Nimuendajú–Coleção Nicolai. Disponível em: https://www.etnolinguistica.org. Acesso em: 11 ago. 2022.
RODRIGUES, Márcia. Frei Gaspar (Capuchinho italiano). Câmara Municipal de Frei Gaspar. 04 mar. 2015.
Disponível em: https://www.freigaspar.mg.leg.br/institucional/A-Cidade/Historia. Acesso em: 24 jul. 2022.
TEMPESTA, Orani João.São Jorge. CNBB Igreja Católica Apostólica Romana. 24 abr. 2019. Disponível
em: https://www.cnbb.org.br/sao-jorge-2/. Acesso em: 25 jul. 2022.
SACCO, Gianni. Notas de uma “viagem”. Pescador, 1992. Disponível em: https://dongianni.org/documen-
ti/lettere-di-don-gianni-sacco/159-la-missione.html. Acesso em: 05 ago. 2022.
S. JORGE MÁRTIR. Vatican News, Estado da Cidade do Vaticano, 23 abr. Disponível em: https://www.vati-
cannews.va/pt/santo-do-dia/04/23/s--jorge-martir.html. Acesso em: 24 jul. 2022.
*Mestre em Saúde Pública (FMUFMG). Médico cardiologista. Médico do trabalho. Sócio correspondente
do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri. Membro correspondente da Academia de Letras de Teófilo
Otoni – Nova Módica – MG.
154
Jequibay: saberes sobre o uso de plantas para fins
medicinais do povo Pankararu Pataxó a partir de
múltiplas linguagens
Nehewane Pankararu Braz ¹
Raiana Silva Soares 2
Witaty Braz da Silva ²
Gabriel Ferreira Vieira ³
Samara Arcanjo e Silva 4
Larissa Duarte Araújo Pereira 5
Lillian Gonçalves de Melo 6
Ernani Calazans de Oliveira 7
Introdução
Nesta proposta de pesquisa, o foco foi investigar - a partir de múltiplas linguagens - sa-
beres do povo indígena Pankararu Pataxó - dos vales do Jequitinhonha e Mucuri - com o intuito de
preservar formular e conhecer conhecimentos, voltados para a cultura, com ênfase para o contato
com a mãe terra por meio de plantas, principalmente, as medicinais.
Para isso, realizou-se um estudo sob o viés da Linguística Aplicada que, segun-
do Moita Lopes (2014), concebe a linguagem como constitutiva da vida social e enfatiza
que as práticas discursivas mostram identidades sociais inseridas em um contexto de
multiplicidade, do dinamismo em que esses saberes são revestidos de importância e sig-
nificações diversas, incitadas pela memória e identidade de um povo. Pode-se enfatizar
que, nesta proposta de pesquisa, a linguagem, como prática exerceu uma função fun-
damental de preservação da memória coletiva dos saberes do povo indígena Pankararu
Pataxó sob o viés de diálogos nas diversas áreas, entre elas: Linguagem, Antropologia,
Cultura, História, Arte, Botânica, Meio Ambiente e Agrícola, dentre outras.
A problemática norteadora da presente pesquisa deu-se em questionar: Quais
saberes originários - Povo Pankararu Pataxó do território da aldeia Cinta Vermelha
Jundiba no vale do Jequitinhonha - são preservados no uso e cultivo de plantas me-
dicinais e contato com a mãe terra? Quais elementos - pertencentes a essas práticas
de linguagem - incitam a memória coletiva dos Povos Indígenas e a deturpação dos
estereótipos românticos de projeção dos povos indígenas?
Registros da utilização de plantas como remédio pelos indígenas brasileiros fo-
ram realizados desde a época do Brasil colonial por padres e missionários. Gaudêncio et
al. (2020) relatam que se utilizava caju para cura de febres e dores no estômago, enquanto
o abacaxi verde poderia curar feridas. O tabaco (Nicotiana tabacum), também chamado
de petum, amplamente utilizado em cerimônias religiosas, inclusive por jesuítas como o
Padre Manuel da Nóbrega, e rituais indígenas, era utilizado para diversas condições, tais
como paralisia, asma e sarna.
Estudos etnobotânicos vêm sendo realizados no Brasil e no mundo para que se
conheça a medicina popular de povos tradicionais, seja para sistematizar o conhecimento,
155
seja para descobrir novos fármacos. No entanto, Albuquerque (2000) destaca que ainda
existem poucos estudos etnobotânicos voltados para a população indígena. Um estudo
realizado por Coutinho et al. (2002), em comunidades indígenas no Maranhão, concluiu
que projetos, nesse viés, são importantes para o resgate do conhecimento medicinal das
plantas, garantindo que seja repassado às gerações próximas, bem como destaca a impor-
tância da preservação da flora.
156
estudos botânicos de Johansen (1940), Jensen (1962) dentre outros estudiosos dessas
áreas. Cabe ressaltar que esta pesquisa contou com uma equipe multidisciplinar, há par-
ticipantes das diversas áreas de conhecimentos atendendo aos procedimentos analíticos e
objetivos propostos.
Resultados e discussão
158
as plantas medicinais.
Dentre os materiais a serem produzidos - nesta pesquisa- cabe ressaltar: pre-
servação de narrativas dos povos originários, registro das plantas medicinais através da
fotografia e produção de um catálogo virtual, promoção de rodas de discussão e exposições
dos resultado com o intuito de promover futuros investimentos na área de pesquisa, tecno-
logia, economia, e desenvolvimento - social, cultural, artístico e ambiental - relacionados
à identidade indígena e os benefícios de uso e preservação das plantas medicinais e suas
diversas funcionalidades.
Na prática do laboratório foram produzidos três laminários contendo lâminas
com secções transversais e paradérmicas de 12 espécies e 15 exsicatas de material vege-
tativo de espécies com uso medicinal catalogadas na Aldeia Cinta Vermelha Jundiba.
Agradecimentos
Referências
1
Discente do curso técnico integrado em Agroecologia do IFNMG – campus Araçuaí.
2
Discente do curso superior em Engenharia Agrícola e Ambiental do IFNMG – campus Araçuaí.
3
Discente do curso técnico integrado em Meio Ambiente do IFNMG – campus Araçuaí.
4
Doutora em Botânica (UFV). Docente do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais, Campus Araçuaí.
5
Doutora em Geografia, Tratamento da Informação Espacial (PUC Minas). Docente do Instituto Federal do
Norte de Minas Gerais, Campus Araçuaí.
6
Doutora em Linguística e Língua Portuguesa (PUC Minas). Docente do Instituto Federal do Norte de Minas
Gerais, Campus Araçuaí.
7
Mestre em Artes (UFMG). Docente do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais, Campus Araçuaí
160
A saga de Frei Serafim de Gorizia e Frei Angelo de
Sassoferato a caminho de Itambacuri
Wallace Gomes Moraes*
162
Em janeiro de 1872, Frei Serafim passeava pelo claustro do Colégio São Fidé-
lis quando Frei Ângelo veio a seu encontro. Os dois não se conheciam e Frei Serafim
perguntou-lhe o nome. Frei Ângelo respondeu e foi questionado se tinha algum país de
preferência para o trabalho nas missões.
Ao responder que não, Frei Serafim o convidou a seguir com ele para o Brasil,
pois procurava um companheiro que lhe ajudasse nas atividades missionárias. Frei Ân-
gelo, que aguardava uma indicação do destino, respondeu que sim. Em 6 de fevereiro de
1872 eles receberam do superior-geral as “letras obedienciais”, estando assim nomeados
como missionários apostólicos para o Brasil.
Antes de sair de Roma, os futuros missionários, cientes da responsabilidade que
acabavam de assumir, prostraram-se em oração diante do túmulo de São Pedro e São
Paulo, pedindo a Deus as graças necessárias ao êxito da missão.
Em seguida, o Papa Pio IX os recebeu para dar a bênção apostólica. Os três con-
versaram por alguns minutos e o Papa se despediu com as palavras que Frei Ângelo re-
gistrou em seu caderno de anotações: “Ide, filhos caríssimos, evangelizai os indígenas
e trazei-os ao aprisco do Senhor. A bênção de Deus e a Nossa Apostólica vos anime,
vos fortaleça e vos ampare”.
No dia 19 de fevereiro de 1872, os dois missionários partiram para Civitavec-
chia, uma comunidade italiana da região do Lácio, província de Roma, onde embarcaram
num pequeno navio costeiro que os levaria a Gênova. No porto da cidade embarcaram no
vapor Poitou, da companhia francesa sediada em Marselha, Société Générale des Trans-
ports Maritimes à Vapeur, que, aproveitando a oportunidade da não existência de uma
linha marítima regular entre os portos do Mediterrâneo e a costa Leste da América do Sul,
criaram a rota Marselha-Rio de Janeiro-Buenos Aires.
A bordo deste navio então, os dois missionários seguiram para o Brasil, em 10 de
março de 1872. O navio chegou ao Brasil, em 03 de abril de 1872, após 25 dias de viagem.
Os missionários seguiram para o convento do Morro do Castelo, no Rio de Janeiro, onde
chegaram de surpresa. Eles foram recebidos com alegria pelo então comissário-geral Rev-
mo. Frei Caetano de Messina e pelos demais religiosos da comunidade.
Como o governo tinha pressa em enviar missionários para ajudar a resolver a
situação que envolvia os indígenas da região do Mucuri, em Minas Gerais, Frei Serafim
e Frei Ângelo ficaram no Rio de Janeiro apenas pelo tempo necessário para se orientarem
acerca da missão e aprenderem os primeiros elementos da língua do país. Eles seriam
responsáveis por trazer os indígenas da mata ao convívio da civilização e acabar com os
repetidos massacres e incursões feitas por eles nas frentes de colonização.
Através da portaria baixada em 7 de junho de 1872, o Ministro dos Negócios da
Agricultura, Comércio e Obras Públicas, Cândido Borges Monteiro, Visconde de Itaúna,
comunicou ao Revmo. Comissário-geral dos missionários capuchinhos, Frei Caetano de
Messina, a nomeação e requisição dos dois novos missionários, com a incumbência da
catequese dos indígenas nas colônias do Mucuri. Frei Caetano então, diante desta deter-
minação, entregou-lhes as cartas obedienciais, discriminando as respectivas atribuições e
confortando-os com sua bênção.
Alguns dias depois, os missionários seguiram viagem para Juiz de Fora por
estrada de ferro. Esta estrada de ferro, denominada Companhia da Estrada de Ferro de
163
D. Pedro II, foi aprovada em 9 de maio de 1855, através do decreto n. 1.599 sendo uma
sociedade composta por acionistas, sob a direção de Christiano Benedicto Ottoni.
O projeto mestre tinha como objetivo a construção de uma espécie de “espinha
dorsal” entre o Rio de Janeiro e a estação de Belém em Japeri, na Província do Rio de
Janeiro, que teria conexões com todas as regiões do Brasil, através de ramais a serem
construídos pela própria companhia, ou, por meio de outras ferrovias, visando promover
a completa integração do território brasileiro sobre trilhos, a partir do Município da Corte
(a então cidade do Rio de Janeiro).
As obras começaram em 11 de junho de 1855 e, em 29 de março de 1858, foi
inaugurada a seção que ligava a estação Aclamação (na cidade do Rio de Janeiro) à Fre-
guesia de Nossa Senhora da Conceição de Marapicu (atual Queimados), num total de
48,21 km. Nessa época havia cinco estações: Campo (atual Central do Brasil), Engenho
Novo, Cascadura (todas no Município da Corte), Maxambomba (atual Nova Iguaçu) e
Queimados, na Província do Rio de Janeiro. Em 8 de novembro do mesmo ano, a estrada
de ferro se estendeu até Belém (atual Japeri), no sopé da Serra do Mar.
Dando sequência na expansão dos trilhos, em 1860, foi concluído o ramal de
Macacos (atual ramal de Paracambi), a partir de Japeri, que era o ponto de partida para
que a Estrada de Ferro D. Pedro II atravessasse a Serra do Mar. Em 12 de julho de 1863,
os trilhos chegaram a Rodeio (atual Engenheiro Paulo de Frontin) e no ano seguinte, à
região fluminense do Vale do Paraíba. O primeiro trem de passageiros alcançou Barra do
Piraí em 9 de agosto de 1864.
Após a conclusão da transposição da Serra do Mar, a linha se bifurcou em Barra
do Piraí, com a linha tronco, chamada Linha do Centro, seguindo na direção de Entre
Rios (atual Três Rios) e tendo como destino a Província de Minas Gerais; e o Ramal de
São Paulo, que seguiu à margem direita do Rio Paraíba do Sul com destino a Província
de São Paulo. Em Entre Rios (atual Três Rios, onde chegou em 13 de outubro de 1867, a
Estrada de Ferro D. Pedro II encontrou-se com a Estrada de Rodagem União e Indústria,
inaugurada em 1861.
Com a construção desse trecho, o governo transferiu para a Estrada de Ferro D.
Pedro II o tráfego de gêneros e produtos feito pela estrada União e Indústria. Segundo os
contratos aprovados pelo decreto n. 4.320, de 13 de janeiro de 1869, o motivo seria evitar
“os efeitos de uma concorrência forçosamente nociva a ambas” (BRASIL, 1869, p. 12).
O trajeto da ferrovia também continuou crescendo, alcançando o Porto Novo do
Cunha em 1871. Nesse mesmo ano foi inaugurado o trecho da ferrovia até Juiz de Fora,
do ramal denominado Linha do Centro. Esse ramal deveria partir de Entre Rios, seguir
pelo Vale do Paraibuna e atravessar a Serra da Mantiqueira em direção ao Planalto de
Barbacena, ponto de convergência dos Vales do São Francisco, do Rio Doce e do Rio
Grande, que englobavam quatro quintos do território mineiro. (MATOS, 1995, p. 53-54).
Chegando em Juiz de Fora, os freis foram recebidos pelo sargento Torquato Do-
nato de Sousa Bicalho que, por ordem do diretor-geral, os levaria a Ouro Preto, então
capital de Minas Gerais. Para chegar até Ouro Preto o restante da viagem foi feita a cavalo.
Providos de boa tropa e de víveres necessários para a viagem, acompanhados
pelo Sargento Torquato e por mais dois mestres, seguiram no sentido de Outro Preto,
onde receberiam instruções do diretor-geral de proteção aos índios, Sr. Brigadeiro Antô-
164
nio Luís de Magalhães Mosqueira.
Seguiram pelo trajeto da Estrada Real cumprindo o itinerário: Juiz de Fora, Ta-
buões (Ewbank da Câmara), Palmyra (Santos Dumont), Borda do Campo (Antônio Car-
los), Barbacena, Santana da Ressaca (Ressaquinha),Santana de Carandaí (Carandaí), Que-
luzito (Santo Amaro), Queluz (Conselheiro Lafaiete), Ouro Branco, Itatiaia, Ouro Preto.
A região de Ewbank da Câmara era batizada de ‘Tabuões’, devido à forma pela
qual as pessoas do lugar superavam as condições geológicas que se apresentavam naque-
le solo. A fim de possibilitar o tráfego eram colocadas enormes tábuas sobre o terreno
úmido, lamacento e frio, característico daquela localidade de brejo, e inúmeras taboas.
Em Ouro Preto, onde chegaram em 20 de junho de 1872, mereceu um ofício do
Diretor Geral dos Índios, Antônio Luiz de Magalhães Mosqueira, ao Comissário Geral da
Ordem no Rio de Janeiro, Frei Caetano de Messina, notificando-o da chegada dos freis
Serafim e Ângelo à capital mineira.
Frei Serafim e Frei Ângelo permaneceram por dois meses, tomando conheci-
mento da situação envolvendo índios e governo, bem como para obter maiores conheci-
mentos relacionados à região, indispensáveis ao bom desempenho da missão.
Após esse período, seguiram rumo a Filadélfia, hoje Teófilo Otoni. O itinerário
a ser seguido era: Mariana que ficava a 2 léguas rumo ao leste, passando pelo vilarejo
de Taquaral e o arraial de Passagem. Depois de uma cavalgada de aproximadamente 2
horas chega-se a Mariana. Daí seguiram para o vilarejo de Camargos, o arraial de Bento
Rodrigues e o arraial de Inficionado (atual Santa Rita Durão) que recebeu esse nome em
homenagem ao ilustre filho da terra, Frei José Santa Rita Durão.
Seguindo no sentido de Catas Altas alcançaram a vila de Santa Barbara passan-
do pelo vilarejo de Cocais, para, logo em seguida, chegar à vila de São Gonçalo do Rio
Abaixo até à cidade de Itabira do Mato Dentro (Itabira) distrito de Bom Jesus do Amparo
e Itambé do Mato Dentro.
Nesta parte da viagem conforme ofício do Diretor Geral dos Índios, Antônio
Luiz de Magalhães Mosqueira, ao Deputado Provincial, Capitão José Bento Nogueira
Junior,em 3 de agosto de 1872, eles deveriam se dirigir primeiramente a Peçanha para se
encontrar com outros religiosos da sua ordem que já se achavam no novo aldeamento da
Imaculada Conceição do Rio Doce, e logo depois se dirigir ao Serro em busca da con-
signação e da gratificação. Tais valores seriam tirados da quota de 30 contos votada pela
165
Assembleia Legislativa Provincial pela Lei 1:921.
Ainda ciente das dificuldades que os frades iriam enfrentar na região, Mosquei-
ra, como diretor geral, buscava construir uma rede de solidariedade para ajudar aos novos
missionários capuchinhos e assim, enviaria outro ofício para o deputado de Minas Novas,
José Bento Nogueira Junior.
No oficio, o Diretor pedia ajuda ao deputado para que os missionários pudessem
ser auxiliados quando da sua chegada, e que a estes fossem pagos a quota destinada para
a fundação do aldeamento no vale do Mucuri, não só das consignações concedidas pelo
governo, como do recebimento das gratificações, que lhes foram concedidas bem como
o engajamento de oficiais operários para as obras indispensáveis do novo aldeamento,
quando não seja possível obtê-los no Mucuri.
As gratificações para frei Serafim e Ângelo deveriam ser pagas por algum cole-
tor de Minas Novas, para o qual Mosqueira enviou uma ordem emitida pela tesouraria,
que estabelecia o valor de 100 contos para serem pagos mensalmente a cada um dos
missionários, mais a consignação de 800 contos pela coletoria do serro, a saber: 400 para
serem pagos no mês de maio e 400 no de junho. Como isto não se concretizou, deram
sequência à viagem.
Em seguida chegou-se ao arraial de Morro do Pilar e de lá pousaram em Itapoa-
canga. Posteriormente, seguiram até Conceição do Serro (atual Conceição do Mato Den-
tro). Depois de 1 légua chega-se ao arraial de Santo Antônio do Rio do Peixe (Alvorada
de Minas) até a cidade do Serro Frio (Serro), com distância de 3 léguas.
Do Serro a Diamantina, com distância de aproximadamente 9 léguas passando
pelo arraial de Capivari, Milho Verde, São Gonçalo do Serro (atual São Gonçalo do Rio
das Pedras), Vau. Em Diamantina após descanso tomaram a estrada que alcançava Minas
Novas e Araçuaí, cruzando o rio Jequitinhonha na localidade de Mendanha e o rio Araçu-
aí, na localidade de Mercês de Araçuaí.
O trajeto seguiu para o arraial de Mendanha, o arraial de Rio Manso (atual Cou-
to de Magalhães), vilarejo de Rio Preto (São Gonçalo do Rio Preto), arraial de Araçuaí
(atual Senador Modestino Gonçalves), arraial de São João Batista de Minas Novas (atual
Itamarandiba), Alto da Piedade (atual cidade de Turmalina,)
Daí seguiram até o Arraial de Nossa Senhora da Graça (atual Capelinha), Alto
dos Bois, passando pelas Comunidades de Sapé, Timirim, Córrego do Engenho, arraial
de Setubinha, passando por lugarejos como Alaú, Quartel, Santa Cruz, Trindade, Santa
Maria de São Félix (Santa Maria do Suaçuí), Urupuca, e sítios onde estão situados atu-
almente os municípios de Agua Boa, Malacacheta, Poté, Filadélfia (Teófilo Otoni).
Essas rotas de tropeiros existiam em toda região. Mesmo a chamada Estrada
Real, que se estendia para o norte até a vila de Minas Novas, como rota de escoamento
do ouro e dos diamantes lavrados na região de Diamantina, não passava de uma rústica
trilha de animais.
Nessas viagens, feitas por tropa de burros comandadas por tropeiros, carrega-
vam poucos tipos de apetrechos, a maioria feita em couro. A cozinha da caravana era
composta de trempe (tripé desmontável com ganchos nas hastes) e panelas de ferro. As
cangalhas dos cargueiros eram de madeira, recebendo bruacas de couro ou os balaios de
custa, fabricados com taquara trançada.
166
Nas bruacas e nos balaios eram acondicionadas as cargas, cobertas com couro
de boi. Cada burro da tropa recebia uma cangalha, o “dobro” (pano colocado como forro
entre o costado do animal e a cangalha ou arreio), o peitoral (colar de couro que prendia
a cangalha), a “retranca” (rabicho colocado atrás do animal, para impedir a cangalha de
escorregar) e a “sopradeira” (uma espécie de bocal que impedia o animal de comer na
estrada), as duas últimas peças também feitas com couro de sola.
A comida era simples e prática: feijão, farinha de mandioca ou biju, toucinho,
carne seca, pó de café, açúcar mascavo ou rapadura. Nos pousos, comiam feijão quase
sem molho com pedaços de carne de sol e toucinho (feijão tropeiro), que era servido com
farofa e couve picada. Já as bebidas alcoólicas, só eram permitidas em ocasiões especiais:
nos dias muitos frios tomavam um pouco de cachaça para evitar constipação e como re-
médio, para picada de insetos.
A vestimenta nestas ocasiões era basicamente chapéu, capa e/ou manta com uma
abertura no centro, jogada sobre o ombro, botas de couro flexível que chegavam até o
meio da coxa para proteção nos terrenos alagados, nas matas em dias de chuva além de
picadas de animais peçonhentos.
A viagem a cavalo, de Ouro Preto a Filadélfia durou 20 dias. A época do ano não
era a melhor para uma incursão como aquela e as chuvas tornaram o caminho ainda mais
penoso. Chegando a Filadélfia, os freis tinham a missão de procurar o lugar ideal para
instalar o aldeamento, desbravando as matas do Mucuri.
A chegada dos franciscanos, em Filadélfia, foi saudada com entusiasmo pela po-
pulação, na esperança de que ali ficassem. Mas não foi assim. Os missionários cumpriram
as ordens recebidas ao saírem da capital do Império e deixaram o povoado de Filadélfia,
retirando-se para a fazenda do Capitão Leonardo Esteves Otoni, distante de lá cerca de
25 quilômetros.
Os Frades ficaram na fazenda por seis meses aprendendo, colhendo informa-
ções, fazendo observações, elaborando projetos e explorando a floresta à procura do
melhor lugar para estabelecerem o aldeamento, aproveitando que Capitão Leonardo se
relacionava com algumas tribos de índios. Este lugar serviu como ponto estratégico para
reunir diversas tribos de índios que vagavam nas imensas matas.
A floresta na região era densa, de mata fechada. Percorriam-na somente índios
como: Crakeatan, Mucurim, Nhanhã, Catolés, Potão, Nacrechés, Aranãs e as feras bravias.
Para se achar um local conveniente e de acordo com as instruções recebidas dos
órgãos governamentais, era preciso estudar a região e percorrer a floresta bruta, tarefa
difícil principalmente para dois freis – ainda mal aclimatados e não familiarizados com
semelhante empreitada. E ainda se deve levar em conta os grandes perigos que a selva
oferecia.
Aos freis foram sugeridos alguns sítios como Potão, cujos terrenos ótimos esta-
vam ocupados pelo Capitão Leonardo Esteves Otoni, a quem seria preciso indenizar. Os
sítios Saudade, Planície e Cana Brava também apareceram como opção, mas não possuí-
am os requisitos exigidos e recomendados pelo governo Imperial. Tais sugestões partiam
de interessados que, mais tarde, se revelariam inimigos da catequese.
O tempo passava e Frei Serafim se preocupava em encontrar logo o tal lugar. Na
margem do rio São Mateus, o Frei mandou fazer uma derrubada, ajudado nesta tarefa pe-
167
los índios Potões, com os quais tinha estabelecido certa relação. Esses índios informaram
a Frei Serafim da existência de um lugar muito melhor, não muito distante, rico em águas
e com abundante caça e pesca.
O local ficava a 25 quilômetros de onde eles estavam. Frei Serafim abandonou
então o rio São Mateus e seguiu com os índios tomando o caminho indicado por eles. O
que os índios disseram seria exatamente o tipo de lugar procurado por Frei Serafim e seu
grande auxiliar Frei Ângelo.
Na tarde do dia 19 de fevereiro de 1873, Frei Serafim, Frei Ângelo e o grupo
que os acompanhavam chegaram ao alto da serra que divide as águas dos rios Itamba-
curi e Córrego d’Areia. Do alto dava para ver o soberbo vale que lhes extasiava a vista.
Era um panorama imponente de beleza selvagem. As águas do córrego (Pitak ou Taruk)
corriam pela encosta do Morro Grande. O Frei compreendeu ser aquele o lugar indicado
pela vontade de Deus para plantar o marco da fundação do aldeamento e a tenda do seu
apostolado, chegando a profetizar: “Daqui não sairei jamais! ”
Frei Ângelo (1915), autor da memória sobre a fundação de Itambacuri, relata
que uma vez tendo chegado às matas do Mucuri, deparou-se com uma medonha e inós-
pita mata. Ao europeu causava espanto as árvores seculares do Brasil de 30, 40 e mais
metros de altura e de grossura extraordinária.
Diante desse universo até então desconhecido, Frei Serafim, entusiasmado, pro-
feriu a seguinte previsão como fim da nobre missão:
168
Assim, o dia 13 de abril de 1873 estava fundado o Aldeamento de Itambacuri. A
partir daí seguiu-se uma série de trabalhos orientados sempre pela vocação e perseveran-
ça dos frades para a instalação da catequese. Foram muitas as dificuldades enfrentadas
desde o início, mas os freis sabiam que o projeto de catequização e aldeamento, suplan-
tava em muito os problemas encontrados e levaram a efeito sua obra.
REFERENCIAS
*Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri- Cadeira 04, Sócio Correspondente do Instituto
Histórico e Geográfico de Minas Gerais, Membro Efetivo da Academia de Letras de Teófilo Otoni- Cadeira
21, Administrador, Professor da ALFA/UNIPAC, Assessor Técnico da Cooperativa dos Produtores Rurais de
Itambacuri Ltda.
170
Um escritor que nem precisava de livros
Eugênio Maria Gomes*
171
decê-la e, rotineiramente, costumava enviar um cartão ou um ofício, com belas palavras
de agradecimento.
Naquele nosso último encontro, depois de muita prosa e muito riso, lhe sugeri
que, o próximo livro, fosse um compilado de seus discursos e ele respondeu sorrindo:
“Nem pensar!”. Achei que fosse, apenas, mais uma daquelas respostas evasivas e que,
com o tempo, assim como aconteceu com “A verdade dos fatos”, o convenceria quanto à
publicação de alguns de seus discursos. Desta vez, não deu...
O bom esposo, pai, avô e amigo de todos, resolveu partir. O excepcional jorna-
lista, presidente do grupo Sistec, fundados e presidente emérito do MAC – Movimento
Amigos de Caratinga -, membro do Conselho Diretor da Funec, foi procurar outras pa-
ragens. O grande escritor, o homem que mais publicou em jornal impresso; que proferiu
os discursos mais belos, nas mais diversas oportunidades; que nos emocionava com a
oração das 18 horas, na Rádio Caratinga; que ajudou a fundar a Academia Caratinguense
de Letras e que era confrade atuante na Academia de Letras de Teófilo Otoni e membro
efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri, já não está mais entre nós. Fica o
seu legado, resta a saudade e permanecem seus escritos, seus ensinamentos, o valor de
sua amizade e a sua história.
Descanse em paz, amigo Humberto Luiz Salustiano Costa.
*Professor, escritor, é membro efetivo da Academia Caratingunese de Letras, sócio correspondente do Instituto
Histórico e Geográfico do Mucuri e membro correspondente da Academia de Letras de Teófilo Otoni.
172
Das Selvas do Mucuri até Filadélfia - Arquétipos
Histórico - Antropológicos
Gladiston Vieira dos Santos
A chegada dos colonizadores nas selvas do Mucuri foi marcada por elementos
semelhantes aos dos tempos antigos. Havia a mesma presença, tanto da realidade objetiva
da natureza exuberante e perigosa da floresta, quanto da constituição subjetiva dos seus
pensamentos e sua imaginação, compondo em seu psiquismo a percepção de sua relação
com o outro, em sua unicidade e perspectivas de transcendência.
O que motivou Ottoni a adentrar um mundo selvagem, terra inóspita de mil ame-
aças? E seus seguidores, arregimentados das aldeias nativas ou de terras de além-mar? O
que buscavam os germânicos, franceses, italianos, espanhóis, frades capuchinhos e pasto-
res doutras nacionalidades, chineses, africanos dentre outros, quando saíram do seu terri-
tório de origem, para reiniciar a vida em tão audaciosa aventura?
173
Foram tantos, de várias origens, que ora mais de perto, dos confins da terra,
somaram-se à causa da construção de estradas, roças, pastagens, edificações, trazendo
técnicas inovadores, e ergueram uma Filadélfia, a “cidade do amor fraterno.”
Há que se refletir. É na esteira dessa condução histórica, no ensejo desse legado
tão antigo, mas também tão próximo, que tudo se interliga.
É a vocação originária, um legado remoto fincado na alma, na natureza do caça-
dor da pré-história. Um movimento abissal que veio ecoando até chegar ao desbravador
liberal que aqui aportou, há quase dois séculos. Seu movimento ainda ressoa e também
nos convoca, num apelo, às vezes quase apagado pela turbulência nadificante da era da
técnica moderna.
Não é essa coragem, esse discernimento, essa ousadia, tão vinculadas às pro-
fundezas do psiquismo do homo sapiens, que são, entretanto, o motor mais potente e
mais marcante que impera a todo o momento, nas expressões mais originárias da nossa
espécie?
Porém, se estamos todos, mesmo que adormecidos, no arco amplo da ousadia
e audácia, nem sempre em todos e em todo o tempo, desponta essa virtude maior que é
dar prosseguimento ao chamado da liberdade, tão oportunamente cunhado na bandeira
de Minas – Libertas quae sera tamen – liberdade ainda que tardia! Não faz parte dos
fracos e tíbios sair da acomodação e ir à planície caçar uma fera ou libertar-se dos limi-
tes territoriais que os oprimem e os condicionam. Não é nessa linhagem de passividade
que se ousa lutar e se reconhecer titular de direitos. Mas há, e sempre deve ser desperta
a curiosidade, a abertura das asas do espírito, nesse desejo de conhecimento da verdade,
desejo natural implícito nos nossos elementos constitucionais, para dominar a terra e dela
tirar proveito. Citando novamente João Paulo II:
“A fé e a razão (Fides et Ratio) constituem como que as duas asas pelas quais o espírito
humano se eleva para a contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração do
homem o desejo de conhecer a verdade e, em última análise, de O conhecer a Ele, para que
conhecendo-O e amando-O, possa chegar também à verdade sobre si próprio.” (Idem).
174
nossa unidade foi concebida e delineada em seus decisivos traços. Ali nossa formação se
aprimorou e cresceu até o parto, momento pleno de heranças remotas, projeto de centenas
de milhares de ancestrais, pulsando nos genes de nossa carne e advindos do mistério da
vida. Como nos retrata poeticamente essa instância e essa estância do conforto da casa,
os versos bem cantados pelo conjunto de rock Pink Floyd, na música Bresthe Reprise do
álbum Time:
“...Home, home again,
I like to be when I can!” (1)
“Lar, lar de novo. Eu gosto de estar aqui quando posso!”
Na atualidade, incontáveis conterrâneos já saíram e ainda saem do vale do Mu-
curi e do Jequitinhonha. Certamente movidos pelos mesmos impulsos do passado, pois
Ulisses e Abraão ainda vigem na alma de cada homem e de cada mulher, de cada jovem,
seja qual for sua origem ou condição. E curiosidade, liberdade, busca incessante da felici-
dade, no encontro logístico da holística existencial, tudo conflui a um paradigma da nossa
realização como pessoa humana. Infelizmente, na contramão desse entendimento vale o
exemplo do preconceito racial que levou alguns historiadores incautos, legitimadores do
sistema escravocrata, a afirmar que o indígena teria mais vocação para a liberdade que o
negro africano. Essa justificativa insensata e desumana, não reconhece a liberdade como
valor ontológico da nossa natureza íntima.
Retomemos como referência a questão nietzscheana, que com grande sabedoria
o filosofo alemão Martin Heidegger (1889-1976) nos faz lembrar, num dos seus textos
cujo título é – Quem é Zaratustra de Nietzsche? – personagem de nome Zaratustra (que
em linguagem persa significa A Estrela de Ouro) figurando o anunciador de um homem
mais humano (Übermensch – Além-do-Homem), que aquele que Friedrich Wilhelm Niet-
zsche (1844-1900) conheceu em seu século. Se a esse momento se constata tempo fe-
cundo de um superlativo humanismo na Alemanha, contemporaneamente também o era,
tempo fértil no arrojo e na espiritualidade dos pioneiros do Mucuri.
A obra mais conhecida e mais popular de Nietzsche; Assim Falou Zarathustra:
um livro para todos e para ninguém (em alemão: Also Sprach Zarathustra: Ein Buch für
alle und Keinen) foi escrito em 1883 e 1885. Uma obra magnífica, marcada pelas mes-
mas inquietações e também no mesmo século que Teófilo Benedito Ottoni e seguidores
viviam aqui, nestas plagas selvagens. Vigorava o período do Segundo Reinado, quando
ainda éramos a última monarquia escravista das Américas. A atitude desse nosso altivo e
audaz fundador está fortemente presente aí, como legado que devemos reverenciar. Ele
lutou com ardor juntamente com alguns corifeus da liberdade que cunhavam para os li-
vros de história o sonho republicano e a utopia liberal. É na escuta sincera desse chamado
milenar para a liberdade, às vezes dormitando em nosso espírito, que ousamos continuar
na caminhada que visa a pela realização dos nossos ideais. O habitante do vale do Mu-
curi de hoje não pode deixar perecer e enterrar o legado do Liberal do Serro, cujo sonho
republicano ainda atravessa nossa existência como um facho de luz frente às ameaças de
um retrocesso político. Dizia Nietzsche, “o homem é um ente que tem que ser superado.”
Temos que incessantemente ultrapassar o que somos.
Mas a tarefa é, e sempre foi desafiadora. Exige ciência e sapiência, memória
histórica e decisão consciente.
175
Encerro, num momento em que acontece o horrendo espetáculo de destruição
da Ucrânia. Fosse aquele povo carente de sua identidade e da sua memória histórica não
estaria resistindo, bravamente, a toda forma de infortúnio e ameaças. Também o hoje
cobra o mesmo de nós. Nossa essência clama por altivez, postura ativa e firme, com luta
renhida, frente à crescente onda extremista que ameaça toda a construção do Estado De-
mocrático de Direito do Brasil. A região, com grandeza e brio, apesar da carência social,
irmanou-se com todo o Nordeste, sempre respondendo e fazendo-se presente na vida
republicana. Desde os Luzias, a antessala do projeto republicano nacional, somos um
referencial indispensável nas lutas políticas e sociais da nossa pátria, pela conquista da
liberdade. É honroso ter no passado e certamente no futuro, irmãos conterrâneos, homens
e mulheres, cujas faces estampadas nas galerias do tempo, mostram agora e depois, abne-
gadas figuras, nos marcos da nossa história.
Aqui, citando mais uma vez o povo germânico, que com grande sabedoria nos
leva muito a pensar, recolhamos os desafios de agora para um enfrentamento que ultra-
passa todas as nossas fronteiras. Estamos frente às questões da paz social, da prosperi-
dade econômica, no cuidar do clima e dos biomas, convencidos da concepção atual de
família humana universal. Colocamos nossa vocação arquetípica na direção urgente de
questões de nossa sobrevivência e das gerações vindouras, e com grande perplexidade.
Esse profundo pensamento é um caminho aberto por dois dos maiores filósofos da Mo-
dernidade: Nietzsche e Heidegger. Eles, com a pertinência semelhante ao movimento de
construção da Estrada da Companhia do Mucuri, nos devolvem a questão fundamental
do sentido e direção da caminhada da nossa existência. Na nossa pretensa governança
do vale do Mucuri das Minas Gerais, e mais, das tantas maravilhas do nosso país e do
mundo, devemos estar às voltas pensando, a perguntar pelo nosso destino: “ – O Homem
dá conta de ser senhor dessa Terra?”
Bibliografia
HEIDEGGER, Martin. Quem é Zaratustra de Nietzsche? In: Ensaios e Conferências. Trad. Emmanuel Carneiro
Leão, Gilvan Fogel e Márcia Sá Cavalcanti Schuback. Petrópolis, RJ: Vozes, 5ª Ed.2008. P. 87-110 (Pensamen-
to Humano).
HEIDEGGER, Martin. “...Poeticamente o Homem habita ...” In : Ensaios e Conferências. Traad. Emmanuel
Carneiro Leão, Gilvan Fogel e Márcia Sá Cavalcanti Schuback . Petrópolis, RJ: VOZES, 5ª ed. 2008. P. 165-
183 (Pensamento Humano).
NIETZSCHE, F. W. Assim falou Zarathustra. São Paulo: Martin Claret, 2002ª. (A Obra Prima da Cada Autor)
JOÃO PAULO II. Encíclica Fides e Ratio – sobre as relações entre fé e razão ( 13-09-1998) 2ª edição. Paulus,
1998.
PALAZZOLO , Fr. Jacinto de. Nas Selvas do Vale do Mucuri e do Rio Doce. Cia. Editora Nacional. São Paulo,
2ª Ed. 1952.
COL. Os Pensadores . Vol. NIETZSCHE. Obras Incompletas. Trad. Gérard Lebrun. Abril Cultural. 1983.
JUNG, Carl Gustav. Os Arquétipos e o Inconsciente coletivo. Trad. Maria Luiza Appy, Dora Mariana R. Fer-
reira da Silva . Petr
176
A magnífica comemoração do primeiro
centenário de Teófilo Otoni
Iris Soriano Nunes Miglio
Presidente do IHGMucuri
177
O CENTENÁRIO DE TEÓFILO OTONI:
COMEMORAÇÃO COM BRILHANTISMO PELA
PREFEITURA E CÂMARA MUNICIPAL
Suplemento Comemorativo do Centenário de Teófilo Otoni
FOLHA DE MINAS
Belo Horizonte, domingo, 20 de setembro de 1953.
A abertura oficial das comemorações do Centenário realizada no dia 1º, foi uma
178
festa das mais significativas. O povo se reuniu na praça Tiradentes, onde se realizou a
solenidade, aplaudindo vibrantemente os oradores que se fizeram ouvir. Coube ao Dr.
Aristides Alves Pereira, juiz de direito da comarca, proferir o discurso com que as autori-
dades saudavam o primeiro século de criação do município. Falou, em seguida, o prefeito
Germano Augusto de Souza, que cortou a fita simbólica que circundava o arco do triunfo
armado naquela praça e encimado por imenso retrato de Teófilo Benedito Ottoni, cercado
de lâmpadas coloridas. Falaram ainda o deputado Tristão da Cunha, o vice-prefeito Pe-
trônio Mendes de Souza e o Dr. Sidônio Ottoni, vice-presidente da Câmara Municipal.
No mesmo local foi prestada, logo após, uma homenagem do povo de Teófilo
Otoni às colônias alemã, baiana e libanesa que tanto contribuíram para a prosperidade e
desenvolvimento do município.
A homenagem consistiu na inauguração de três belos painéis alusivos às ativi-
dades daquelas colônias. O ato contou com a presença de representantes das colônias
homenageadas, entre esses o Dr. Darci de Almeida, o Sr. Alexandre Mattar, o pastor
Schulup, pastor Librório Zimer, pastor Américo Gomes Coelho, pastor Vindilino Raister
e pastor Elquias.
O primeiro orador foi o Dr. Petrônio Mendes de Souza. Seguiram-se com a pala-
vra o Sr. Fabio Antonio da Silva Pereira, Dr. Ricardo Alves Pinto. Em nome das colônias
homenageadas discursaram o Dr. Darci de Almeida, pela colônia baiana, o Sr. Nagib
Ganem, pela colônia libanesa e o pastor Schulup, pela colônia alemã.
180
cívica, na qual foram homenageados o deputado Tristão da Cunha, o Dr. Alfredo Sá e o
Dr. José Martins Prates.
Na tarde do dia 5 teve lugar a inauguração dos poços artesianos no bairro Grão Pará.
A solenidade foi das mais concorridas e entusiásticas.
Mais tarde, na ampla praça Duque de Caxias, a Prefeitura homenageou a memó-
ria do Dr. Manuel Esteves Ottoni, o primeiro médico da cidade e o fundador da primeira
escola primária.
Todos os estabelecimentos de ensino da cidade estavam representados e uma
multidão assistia à homenagem que consistia na inauguração do busto do Dr. Manuel
Esteves Ottoni defronte ao edifício do Ginásio Estadual.
Os oradores da solenidade foram os Srs. Petrônio Mendes de Souza, vice-pre-
feito, prof. Celso Cunha, Dr. Newton Antônio da Silva Pereira e as professoras Francisca
Salvino Ottoni e Ieda Abrantes Couy.
Em sessão solene a Câmara Municipal reuniu-se para homenagear o ilustre filho
daquela cidade o deputado Tristão da Cunha.
O seu retrato foi inaugurado na sede da edilidade, onde ele iniciou a sua vida
pública como vereador pelo distrito de Pedro Versiani.
O homenageado foi saudado pelo Dr. Geraldo Landi, Dr. Rui Campos e verea-
dor Isaias Bonfim, tendo o deputado Tristão da Cunha proferido comovido discurso de
agradecimento.
PRAÇA DE ESPORTES
182
José Amado Henriques, juiz municipal, o Dr. Orlando Fadini, promotor de justiça, o
Dr. Petrônio Mendes de Souza, vice-prefeito, o Dr. Luiz Duarte, promotor de justiça
de Araçuaí, prefeitos dos municípios vizinhos e outras autoridades.
Na festa daquele dia chegava a Teófilo Otoni o governador Juscelino Kubits-
chek que foi recebido no aeroporto pelas autoridades municipais, deputados, prefeitos
dos municípios do vale do Mucuri e numerosas outras pessoas.
O chefe do executivo estadual recebeu carinhosa manifestação popular na sua
passagem pelas ruas da cidade, dirigindo-se para a Câmara Municipal onde foi acolhi-
do com vibrantes aplausos.
Na Câmara Municipal o governador do Estado foi saudado pelo Sr. Domingos
Soares de Sá que lhe transmitiu a presidência.
Exaltando a data e a figura de Teófilo Otoni discursaram os vereadores Antô-
nio Barbosa e Bráulio Xavier. O vereador Rui Campos agradeceu, em nome do legis-
lativo municipal, a presença do governador do Estado, fazendo o elogio de sua obra
administrativa.
O governador Juscelino Kubitschek proferiu, então, notável oração, expri-
mindo a satisfação com que o povo mineiro, por seu intermédio, participava daquelas
comemorações, fazendo o elogio do progresso daquela cidade e da região e traçando
incisivo perfil da figura de Teófilo Ottoni.
INAUGURAÇÃO DA ESTÁTUA
PEDRA FUNDAMENTAL
A fonte luminosa doada pelos pedristas já foi encomendada à uma fábrica alemã
e ainda este ano deverá ser inaugurada.
Por ocasião das festas do Centenário, foi realizada a cerimônia do lançamento da
pedra fundamental da fonte luminosa, na praça Tiradentes, onde a mesma será localizada.
A solenidade contou com a presença do governador Juscelino Kubitschek, do
deputado Tristão da Cunha, do prefeito Germano Augusto de Souza, do Dr. Aristides
Alves Pereira, juiz de direito da Comarca, Dr. Petrônio Mendes de Souza, vice-prefeito e
outras altas autoridades, além de grande massa popular.
O Sr. Armando Vasconcelos Horta, um dos líderes do comércio de pedras, falou
no ato, em nome dos seus companheiros, dizendo do carinho e da amizade com que os
pedristas eram acolhidos em Teófilo Otoni e que a homenagem que prestava à cidade era
prova de gratidão de todos os seus colegas.
Em agradecimento falou o Dr. Petrônio Mendes de Souza, vice-prefeito do
município.
184
Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri
Histórico, patronos e quadro social
185
Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri
Resgatando valores históricos e geográficos de um povo
O Instituto Histórico e Geográfico do Mucuri, abreviativamente, IHGMucuri, fun-
dado em 17 de julho de 2003 e instalado oficialmente em 14 de agosto de 2003, em sessão
solene realizada no Cine Palácio, como parte das atividades do Simpósio “Teófilo Bene-
dito Ottoni e Teófilo Otoni: Sesquicentenário”. É uma sociedade civil de direito privado,
sem fins econômicos, de caráter científico e cultural, com sede em Teófilo Otoni, Minas
Gerais, compõe-se de 50 associados efetivos com suas respectivas cadeiras e patronos.
Conta ainda com um quadro social de sócios honorários, beneméritos e correspondentes.
Tem por objetivos: congregar pessoas que se dediquem a atividades e estudos na área da
história, geografia e demais ciências afins; reverenciar, exaltar e cultuar a memória dos
vultos beneméritos, cuja atuação nas diferentes áreas da atividade humana contribuiu
para a evolução e progresso do município de Teófilo Otoni e região; colaborar com as
autoridades públicas em trabalhos de preservação e divulgação do patrimônio histórico
e cultural da região de Teófilo Otoni; comemorar as principais datas do calendário cívi-
co, nomeadamente aquelas representativas do município de Teófilo Otoni; promover ou
patrocinar pesquisas, cursos, concursos, premiações, excursões culturais, comemorações
cívicas, exposições, palestras, seminários, ciclos de estudos, e outras atividades corre-
latas; promover outros eventos que, por sua natureza e definição, venham a contribuir
para o desenvolvimento técnico-científico e cultural dos seus associados; exercer toda e
qualquer outra atividade que possa contribuir para o desenvolvimento cultural do muni-
cípio de Teófilo Otoni e, se possível, de toda a região do Mucuri; promover ou estimular
a publicação de livros, revistas e outras obras sobre a região.
Ainda é facultado ao IHGMucuri: elaborar projetos e firmar convênios ou contratos
com entidades públicas e privadas da área da educação e cultura, brasileiras e internacio-
nais, que visem ao interesse da coletividade;interligar, coligar ou filiar-se a outras orga-
nizações; apoiar iniciativas de entidades afins, bem como receber doações, contribuições,
serviços e legados.
Edita regularmente a Revista do IHGMucuri, destinada à publicação de artigos
originais e inéditos, resenhas e edição crítica de documentos na área de história e afins. O
periódico, é aberto à participação dos sócios e convidados especiais.
Realiza, periodicamente, sessões solenes e especiais para recepção e posse de só-
cios para o quadro social, lançamentos de obras, entrega de premiações e condecorações.
Outrossim, anualmente, em agosto, celebra-se a inauguração da Estrada Santa Clara-
Philadelphia: a primeira estrada de rodagem do Brasil e o Dia Nacional do Historiador,
ocasião em que ocorre a outorga da Medalha de Honra Reynaldo Ottoni Porto, destinada
a homenagear, anualmente, professores de história e geografia que atuaram no ensino
das disciplinas, na rede pública ou privada, no município de Teófilo Otoni ou região e,
se encontram aposentados, ou afastados preliminarmente para aposentadoria, e, em anos
alternados, o Prêmio Frei Samuel Tetteroo, em que são agraciadas pessoas naturais ou
jurídicas que se hajam destacado na promoção de estudos e, na difusão de conhecimentos
de história, geografia e ciências afins, assim como no fomento a cultura; defesa e preser-
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vação do patrimônio histórico, artístico e cultural dos vales do Mucuri e Jequitinhonha.
Mantém o Centro de Documentação Maria José Haueisen Freire, com o objetivo
de receber, organizar, conservar, descrever e divulgar informações constantes do acervo
histórico e bibliográfico, proporcionando um espaço de memória e pesquisa. O Centro de
Documentação é constituído de biblioteca com riquíssimo acervo bibliográfico sobre a
região do vale do Mucuri e do arquivo, em que são guardados e conservados documentos
(jornais, manuscritos, iconográficos) e demais objetos de valor histórico-cultural para a
cidade de Teófilo Otoni.
Em parceria com a Academia de Letras de Teófilo Otoni, outorga, a cada ano, a
Medalha Conselheiro João da Matta Machado, que tem como finalidade homenagear
pessoas naturais com idade igual ou superior a 70 anos que se tenham dedicado ao desen-
volvimento cultural, econômico, social, desportivo, cívico, educacional, científico e/ou
religioso na cidade de Teófilo Otoni e região do vale do Mucuri e, o Diploma e Medalha
de Honra ao Mérito Albert Schirmer, para homenagear profissionais das artes plásticas,
cerâmica, escultura, xilogravura, desenho, artesanato e demais áreas afins.
Declarado de utilidade pública municipal por meio da Lei 5.294, de 21 de maio de
2004, e, de utilidade pública estadual, por meio da Lei 17.595, de 27 de junho de 2008.
Em 2015, foi distinguido pelo governo do Estado de Minas Gerais, com a Comenda
Theophilo Ottoni, em reconhecimento ao trabalho desenvolvido na área da preservação
da memória do vale do Mucuri.
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Patronos perpétuos:
Cadeira: Patrono:
01 ..................................................... Teófilo Benedito Ottoni
02 ..................................................... Ignácio Antonio Fernandes
03 ..................................................... Joaquim José da Costa Ramos
04 ..................................................... Christiano Benedicto Ottoni
05 ..................................................... Olbiano Gomes de Mello
06 ..................................................... Godofredo Ferreira
07 ..................................................... João da Matta Machado
08 ..................................................... Padre Virgolino
09 ..................................................... Pastor Hollerbach
10 ..................................................... Vital Soriano de Souza
11 ..................................................... Manoel Esteves Ottoni
12 ..................................................... Antonio Soares da Costa
13 ..................................................... Pedro José Versiani
14 ..................................................... Elisa Laval
15 ..................................................... Frei Dimas de Kock
16 ..................................................... Marcelo Pereira Guedes
17 ..................................................... João de Carvalho Borges
18 ..................................................... Horácio Rodrigues Antunes
19 ..................................................... Frei Ângelo de Sassoferrato
20 ..................................................... Albert Schirmer
21 ..................................................... Artur Achtschin
22 ..................................................... Benjamim Ferreira da Cunha
23 ..................................................... Leonardo Esteves Ottoni
24..................................................... Jose Carlos Gomes da Silva
25 ..................................................... Alberto Laender
26 ..................................................... Giovani Batista Miglio
27 ..................................................... Antonio Jacinto Pimenta
28 ..................................................... Antonina Chaves de Sá
29 ..................................................... Cacique Poton
30 ..................................................... Abel Jacinto Ganem
31 ..................................................... Feliciano Lopes Bamberg
32 ..................................................... Bruno Rudolph
33 ..................................................... Júlio Haueisen.
34 ..................................................... Reynaldo Ottoni Porto
35 ..................................................... Paulo Vasconcelos do Rosário
36 ..................................................... Paulo Pinheiro Chagas
37 ..................................................... Augusto Pereira de Souza
38 ..................................................... Nerval de Figueiredo
39 ..................................................... Arno Schaper
40 ..................................................... Roberto Sander
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41 ..................................................... Domingos de Castro
42 ..................................................... Epaminondas Esteves Ottoni
43 ..................................................... Isaias da Silva Bonfim
44 ..................................................... Franz Roedel
45 ..................................................... Francisco de Paula e Silva
46 ..................................................... Francisco Soares de Sá
47 ..................................................... Teodolino da Silva Pereira.
48 ..................................................... Carlos Langkamer
49 ..................................................... Nelson de Figueiredo
50 ..................................................... Letícia Esteves Ottoni
Patronos especiais:
Patrono: Prêmio
Frei Samuel Tettero
Patrono: Medalha
Conselheiro João da Matta Machado
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Quadro social
Sócios efetivos:
Adevaldo Rodrigues de Souza
Agnes Ruschid Tolentino
Altamiro Fernandes da Cruz
Antonio Jorge de Lima Gomes
Baltazar José Filho
Dulcina Regina Ribeiro Molina
Eder Detrez Silva
Ediel Vieira Rangel
Eduardo Amorim Silva
Elisa Augusta de Andrade Farina
Elvira Schuffner Cadah
Fany Moreira
Felipe Ribeiro Lemos
Gecernir Colen
Gilberto Ottoni Porto
Igor Alves Noberto Soares
Íris Soriano Nunes Miglio
Jair Duarte Pêgo Junior
Jairo Lisboa Rodrigues
Jorge Luiz dos Santos Gomes
José Carlos Pimenta
Leônidas Conceição Barroso
Magali Maria de Araújo Barroso
Mariana da Silva Ferreira
Munira Molaib
Oldair Ferreira Motta
Rafael Geraldo Ramos dos Santos
Ricardo Peixoto Maia
Rivani Lopes Negreiros
Roberdan Silva Barroso
Sandra Helena Barroso
Wallace Gomes Moraes
Wilson Colares da Costa
Sócios Honorários:
Dom Aloisio Jorge Pena Vitral
Newton de Figueiredo
Nilmário Miranda
Antonio Fonseca da Silva
Aureo Eduardo Magalhães Ribeiro
Frei Júlio César Borges do Amaral, OFMCap.
190
Sócio Benemérito:
Theomar Sampaio Paraguassu
Sócios Correspondentes:
Adão Alves Teixeira – Goiânia/GO
Alan Nunes Araújo – Belém/PA
Antônio Gilberto Costa – Belo Horizonte/MG
Arolda Maria da Silva Figuerêdo – Teixeira de Freitas/BA
Bergston Luan Santos – Salinas/MG
Camila Amaral Pereira – Governador Valadares/MG
Carlos Alberto Mensitieri Almeida – Teixeira de Freitas/BA
Daniela Martins Cunha – Governador Valadares/MG
Diego Filipe Cordeiro Alves - Belo Horizonte/MG
Dilton Amadeu Onofri - Itapema/SC
Douglas Sather dos Reis – Diamantina/MG
Edileila Maria Leite Portes – Governador Valadares/MG
Edineia Felix Gênova /Itália
Eugênio Maria Gomes - Caratinga/MG
Eunice Maria Lima Soriano de Alencar – Brasília/DF
Fábio Guilherme Vogel - Brasília/DF
Fernando da Matta Machado - Rio de Janeiro/RJ
Flaviana Tavares Vieira Teixeira – Diamantina/MG
Francieli Aparecida Marinato – Cuiabá/MT
Francisco Soriano de Souza Nunes - Rio de Janeiro/RJ
Gilmar Ferraz da Silva – Teixeira de Freitas/BA
Gladston Passos Salles – Rio de Janeiro/RJ
João Bosco de Castro - Bom Despacho/MG
Jorge Fregadolli – Maringá/PR
José Amalri do Nascimento – Rio de Janeiro/RJ
José Anchieta Antunes de Souza – Recife/PE
José Antonio de Ávila Sacramento - São João del Rey/MG
José Aylton de Mattos – Caratinga/MG
José Campos de Souza – Macaé/RJ
José Celso da Cunha - Belo Horizonte/MG
José Geraldo Batista - Caratinga/MG
José Moutinho dos Santos – Belo Horizonte/MG
Larissa Duarte Araújo Pereira - Santana/PA
Lina de Lima – Itanhaém/SP
Monir Aly Saygli- Caratinga/MG
Odair Leitão Alonso – Campinas/SP
Ozório José Araújo do Couto – Belo Horizonte/MG
Paccelli Jose Maracci Zahler- Brasília/DF
Paulo Henrique Jurza Abranches - Belo Horizonte/MG
Paulo Orlando Rodrigues de Mattos - Governador Valadares /MG
191
Priscilla dos Santos Gomes - Massy/França
Rosália Caldas Sanábio de Oliveira - Belo Horizonte/MG
Terezinha Teixeira Santos – Guanambi/BA
Weder Ferreira da Silva – Muriaé/MG
Wenderson Cardoso – Contagem/MG
Memória e Saudade:
Sócios Efetivos:
Dalva Guedes Marx
Humberto Luiz Salustiano Costa
Jader Moreira Rafael
Leandro Jacomo Scopel Marx
Sócias Honorárias:
Hilda Ottoni Porto Ramos
Maria José Haueisen Freire
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