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O luto é um café frio e fraco

O ano é 2023 e tudo corre tranquilamente para as festividades de fim de ano, enquanto eu
me preparo emocionalmente para sobreviver a 10 dias de convivência direta com a minha
fámilia. —Não me leva a mal, eu amo a minha mãe, mas o fato é que nunca conseguimos
conviver em paz e hamonia por mais de uma semana— Como eu dia dizendo, tudo corria bem
até chegar a notícia de que a minha ex-sogra, se é que existe ex-sogra, até porque juridicamente
as sogras são eternas, diferentemente do cônjuge, aquelas nunca serão ex.
Bom, como eu ia dizendo, dia 7 de dezembro recebi essa notícia de tirar o chão dos pés. A
morte de dona Fátima acometida por um câncer de mama que vinha a mais de ano ceifando a sua
vida lentamente. Também fazia mais de ano que eu não via dona Fátima, não falava com ela,
pois, após um término de relacionamento tudo o que você menos quer na vida é que a sua ex
namoradaouse pensar que você está correndo atrás dela. Ainda mais um término como o nosso
em que eu fui tão humilhada. E assim eu segui por mais de um ano amando dona Fátima a
distância, sentindo um imenso carinho e, por vezes, vontade de estar perto. Quando recebi a
notícia a sensação que tive foi a de “nada”, a de completa ausência, aquele vazio, que de tão
vazio ocupa um lugar imenso e pesa sobre o peito da gente. A última vez que eu havia lidado
com o luto eu tinha apenas 8 anos e foi na noite de Natal. Dessa vez eu tenho 27 anos e está
próximo ao Natal, e esse lugar vazio, esse espaço ocupado por dona Fátima e que agora é
ausência, eu não sei como lidar.
E o fato de eu estar escrevendo estas linhas são a prova do meu “não saber”. Eu sei que
não falava com dona Fátima há mais de ano, eu sei, mas uma coisa é eu saber que ela continuava
ali, que durante as minhas férias eu poderia viajar para a cidade dela para tomar um café com
queijo de manteiga. Agora....Agora eu estou tomando o meu café frio, e tão fraco que consigo
enxergar o fundo do copo. O meu erro foi acreditar que o tempo me esperaria, que eu chegaria
em Caicó para passar parte das minhas férias e encontraria um Fátima debilitada, sim, mas vivia.
O meu erro foi acreditar que o tempo às vezes para de correr tão rápido, principalmente para
quem tem câncer.
E todas as falácias de “agora ela descansou”, “agora ela está em paz e parou de sofrer”,
todas essas palavras ditas na intenção de um consolo são inúteis, porque o luto é egoísta, o luto
nos faz querer mais dias ao lado de alguém mesmo em sofrimento. Essa ausência tem gosto de
café frio e fraco, esse vazio é a ausência dos cafés com queijo às tardes. Cada um lida com o luto
de um jeito, e o meu jeito é não saber o que fazer além de sussurar um eu sinto muito, dona
Fátima, e repetir esse mantra até pegar no sono.

13/12/2023 14:49

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