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DOSSIÊ 2020

UM ESTUDO IMPARCIAL DA MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS

100000

10000
BRASIL
1000
CHIPRE
VIETNAM
100
N. ZELANDIA
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Conscience
DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

VOCABULÁRIO CIENTÍFICO E ABREVIAÇÕES

COVID-19: sigla para a doença causada pelo coronavírus descoberto em 2019.

Distanciamento social: distância de 2 metros entre pessoas.

Higiene das mãos: limpeza apropriada frequente para evitar risco alto de contágio pelo trajeto
(superfícies contaminadas) -> (mãos) -> (mucosas).

Lockdown: confinamento máximo da população, liberada somente para compras de mantimentos e


atendimento médico, incluindo remédios.

Máscara: tecido cotton, tricoline, antimicrobiano ou equivalente em termos de bloqueio ao


coronavírus, que cubra totalmente o nariz e boca, sem aberturas, bem fixado ao rosto.

Medidas de contenção: distanciamento social, rastreamento de contatos, controle de fronteiras,


quarentena, higiene das mãos, lockdown, máscaras e testes em massa, válidas para SARS de
coronavírus.

MERS: sigla em inglês para SARS de origem no Oriente Médio.

Quarentena: 14 dias de isolamento de infectado, para evitar novas infecções.

Rastreamento de contatos: pesquisa dos contatos anteriores de infectados.

SARS: sigla em inglês, que significa Síndrome Respiratória Aguda Severa, causada por um
coronavírus.

Testes em massa: testes de confirmação de infectados em grande quantidade, fundamental para


posterior acompanhamento e rastreamento dos contatos dos confirmados, que é medida de
contenção eficaz.

Transmissão sustentada: continuidade de novas contaminações pessoa-pessoa de patógeno


contagioso em um grupo populacional definido, mesmo estando este grupo isolado de fontes
externas do mesmo patógeno, como outros animais e outros grupos humanos.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

ÍNDICE

VOCABULÁRIO CIENTÍFICO E ABREVIAÇÕES .................................................................. 2


INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 4
DESEMPENHO DOS PAÍSES NA PANDEMIA DE COVID-19 ......................................... 7
AS MEDIDAS DOS PAÍSES QUE ALCANÇARAM A EXCELÊNCIA ............................. 12
O PRIMEIRO SURTO DE CORONAVÍRUS (SARS, 2002) ............................................. 17
O SEGUNDO SURTO DE CORONAVÍRUS (MERS, 2014) ............................................. 22
OS ALERTAS ANTES DA PANDEMIA DE 2020............................................................... 23
O TERCEIRO SURTO DE CORONAVÍRUS (COVID-19, 2020).................................... 26
A CORRIDA PELA VACINA CONTRA A COVID-19......................................................... 36
A FALSA DICOTOMIA ECONOMIA x SAÚDE PÚBLICA ............................................... 43
A “SURPRESA” COM AS NOVAS VARIANTES MAIS DESTRUTIVAS ...................... 46
CONCLUSÕES ............................................................................................................................... 50

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

INTRODUÇÃO

No Brasil, muitos hoje estão preocupados unicamente com os atrasos na vacinação.


Esquecem que o problema maior ocorreu muito antes, ainda em março de 2020. Uma boa parte dos
líderes mundiais não adotaram as políticas de saúde públicas corretas contra o COVID-19, conforme
mostra o ranking de performance do Instituto Lowy da Austrália. Mas, felizmente, graças ao fato de
que diversos países tomaram as medidas corretas, hoje é mais claro os enormes erros cometidos.

Este Dossiê compila referências confiáveis, com as datas mais antigas possíveis, que
explicitam as medidas de contenção viáveis contra os surtos da COVID-19. Tais medidas, quando
seguidas desde o início, evitam grande parte dos óbitos. Todas as referências vitais para esta tese
central estão disponíveis na www, a apenas um clique sobre o texto destacado em azul.

Após recente óbito de dois parentes próximos por COVID-19 e mais de 250.000 óbitos no
Brasil, nosso grupo decidiu pesquisar e publicar este Dossiê. Nosso grupo é formado por jornalistas,
comentaristas políticos, microempresários e médicos, todos brasileiros de verdade.

Ex-apoiadores do Governo de Bolsonaro, nos declaramos apartidários, sem financiadores,


que não nós mesmos. Este Dossiê é disponibilizado gratuitamente para qualquer tipo de uso,
distribuição, impressão e reprodução, desde que citada a fonte: “Conscience”. Por medida de
segurança, preferimos nos manter anônimos.

Um vírus é o microorganismo mais simples possível, no sentido de que ele não respira, não
controla os seus movimentos, não se alimenta, não excreta, não possui sequer um neurônio. Ele não
tem metabolismo, está na fronteira do mundo vivo e não-vivo. Ele não realiza nenhuma tarefa
sozinho. O que é um vírus então? É um tipo de bug que os seres vivos têm.

O coronavírus consegue entrar na célula porque tem uma “chave” para isso, o que confunde
a célula. Após entrar, a célula replica a informação genética do coronavírus como se estivesse
efetuando uma réplica de algo útil para a célula. Depois disso, cópias do vírus finalmente escapam
para infectar outras células. Assim, a doença se instala.

Quanto à família dos coronavírus, são vírus em que as tais “chaves” formam uma geometria
que lembra uma coroa, como mostrado na capa desde Dossiê, por isso recebem esse nome. Nem
todos os coronavírus são letais: Alguns apenas causam resfriados comuns.

Entretanto, muito antes da pandemia de 2020, houveram duas variantes de coronavírus que
causavam a Síndrome Respiratória Aguda Severa (a sigla em inglês é SARS), que era mortal. Como
será detalhado neste Dossiê, estas duas variantes de coronavírus agressivos causaram uma
pandemia em 2003 e um surto local no Oriente Médio em 2014.

Para que as pessoas tenham uma visão resumida do quadro completo do que ocorreu no
ano de 2020, façamos uma analogia em tempo reduzido. Imagine que em um Shopping Center de
uma pequena cidade, inicia-se um incêndio de grandes proporções. Ao soar o ruidoso alarme de

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emergência, funcionários das diversas lojas se voltam aos seus respectivos gerentes, aguardando
orientações.

Ocorre que somente alguns dos gerentes já trabalhavam no Shopping desde 2002, e
felizmente tinham participado dos treinamentos de 2002 e 2014 (representam os dois surtos de
coronavírus anteriores a 2020). Muitos gerentes eram novatos naquele tipo de incêndio. Mas os
gerentes não se conheciam bem entre si. Não parecia óbvio quem era experiente e quem não era.

Naquela confusão, os bombeiros, sabendo disso, foram até os gerentes inexperientes para
explicar que haviam medidas ideais como máscara contra fumaça, distanciamento “social” dos focos
de incêndio, e, em último caso, uma sala com paredes anti-chama para confinamento (equivale ao
Lockdown contra a COVID-19).

Os gerentes experientes acataram de pronto as recomedações dos bombeiros, e muito


poucos funcionários dessas lojas perderam a vida. Estes gerentes até já foram reconhecidos pelo
ótimo desempenho e foram promovidos.

Para a surpresa de todos e desespero dos bombeiros, muitos dos gerentes novatos, não se
sabem bem o porque, foram contra as medidas corretas e ficaram procurando manuais de
procedimentos sem encontrá-los, e até seguiram recomendações de palpiteiros sem formação em
combate a incêncios.

Não teria sido vergonha nenhuma, para os gerentes novatos, terem seguido à risca os
mesmos passos dos gerentes mais experientes. Seria um sinal de sabedoria, simplesmente imitar os
gerentes experientes. Estupidez é ir contra a maioria dos mais experientes, quando você não tem
experiência, principalmente quando há muitas vidas em jogo.

A única viatura de combate à incêndios da pequena cidade era ultrapassada e estava fora de
uso. Então, no meio daquela confusão para salvar vidas, a maioria dos gerentes contrataram uma
nova viatura disponível na cidade vizinha, que se chamava VACINA. Mas houve um gerente que se
negou a participar da contratação daquela viatura, porque discordava de parte do contrato, apesar
dos outros gerentes terem já aceitado.

Isto resultou em mais mortes na Loja do gerente que se negou à aceitar a ajuda da cidade
vizinha, então os óbitos se acumulavam a cada hora que passava.

O resultado foram muitos óbitos evitáveis, como se sabe. Mesmo com o fogo ainda
queimando por dias, é chocante perceber que alguns poucos gerentes continuam a desorientar seus
funcionários, que continuam indo à óbito por dias e dias.

Tão chocante quanto a atitude de certos gerentes, são os poucos funcionários fanáticos que
continuam os seguindo, mesmo sabendo que depois que o fogo acabar, eles não terão mais os seus
empregos e o gerente terá sido demitido!

Deixando de lado a analogia, as perguntas mais relevantes dessa pandemia deveriam ser:

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1) a partir de qual data estavam facilmente acessíveis os artigos científicos que


informariam, em tempo, sobre como lidar com o coronavírus, ainda no início de
2020?

2) a partir de qual data era possível identificar os países mais experientes nesse tipo
de vírus?

Experientes ou não, os líderes dos países do mundo tinham a obrigação de descobrir o mais
rápido possível, dado o poder da máquina pública federal. O Dossiê responderá ambas as
perguntas, e tudo ficará claro como a luz do dia.

Os autores desejam uma boa leitura, e que este Dossiê sirva para inspirar melhorias
permanentes nas legislações e nas gestões de crises futuras. Talvez a maior lição seja a importância
de seguir os países mais experientes e os especialistas da área, especialmente nos momentos mais
críticos.

Conscience

Março de 2021.

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DESEMPENHO DOS PAÍSES NA PANDEMIA DE COVID-19

Segundo o Painel do Coronavírus da Organização Mundial da Saúde (OMS), desde o


primeiro óbito por COVID-19, ocorrido em 17 de janeiro de 2020, até 3 de março de 2021, foram
2.539.427 óbitos por COVID-19 no mundo todo. O Brasil, apesar de ter apenas 2,7 % da população
mundial, foi responsável por 10,1 % dos óbitos até 2020, ou seja, somos quase 4 vezes pior do que a
média mundial na gestão da pandemia de COVID-19.

Ao comparar certos países, quanto a óbitos por milhão e classificação de desempenho na


contenção da pandemia de COVID-19, torna-se claro que os líderes dos países tiveram ampla
variação de performance. A tabela abaixo busca detalhar esses parâmetros.

Tabela comparativa – dados socioeconômicos

Ranking Óbitos Habitantes Média


PIB / capita
País Lowy COVID-19 (milhões) Óbitos /
2020
2020 2020 2019 milhão hab.
Nova Zelândia 38.675 1 25 4,9
Vietnã 3.497 2 35 96,5
Tailândia 7.295 4 64 69,6
5,78
Chipre 26.240 5 129 1,2
Latvia 17.230 9 668 1,9
Sri Lanka 3.697 10 211 21,8

Estados Unidos 63.051 94 345.253 328,2


Irã 7.256 95 55.438 83,0
Colômbia 5.207 96 43.495 50,0 958,0
México 8.069 97 126.507 127,5
Brasil 6.450 98 195.411 211,0

A terceira coluna da tabela mostra o resultado de uma pesquisa séria e detalhada realizada
pelo Instituto Lowy. É uma organização sem fins lucrativos, que se sustenta por doações, sem
orientação política, que fez a mais completa análise das medidas adotadas por 98 países na
contenção do COVID-19.

Como verifica-se na tabela anterior, a Nova Zelândia ficou em primeiro lugar no ranking
Lowy, pois adotou as melhores medidas. O Brasil obteve o vergonhoso último lugar.

Na quarta coluna, tem-se o número total de óbitos até o dia 28 de dezembro de 2020,
conforme Painel da Doença do Coronavírus da Organização Mundial da Saúde (OMS). Os números
são claramente coerentes com a classificação do Instituto Lowy, mostrando correlação inversa
entre óbitos e performance na gestão da pandemia.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Na segunda coluna, apresenta-se o produto interno bruto por habitante, em dólares,


objetivando mostrar que a performance não está ligada à riqueza do país. Pertinente notar que o
Vietnã e o Sri Lanka são dois países pobres em relação ao Brasil (quase metade do nosso
PIB/capita), e no entanto, isso não os impediu, de forma nenhuma, de ter um excelente resultado na
contenção do coronavírus. Vietnã teve apenas 35 óbitos até o final de dezembro de 2020, e Sri
Lanka, 221 óbitos.

É impressionante a performance do Vietnã, especialmente porque a população deste país é


de 96,7 milhões, possui um extensa fronteira terrestre com a China, o epicentro da pandemia de
2020, e além disso tem um PIB/capita de apenas metade do brasileiro. Os recursos reduzidos não
os impediram de ter uma performance exemplar. Que dizer da administração de Donald Trump dos
EUA, com PIB/capita 20 vezes maior, completamente humilhada, de joelhos no quesito saúde
pública?

A grande questão é: de onde o Vietnã tirou as medidas corretas para acertar desde o início
da pandemia? Se tivesse sido somente o Vietnã e mais nenhum outro país, poderíamos pensar que
eles teriam uma genética privilegiada, ou a posse do “segredo do Universo”. Entretanto, como se vê
na tabela, diversos outros países também conseguiram tal intento. Teria sido sorte?

Este Dossiê provará que foi experiência administrativa, consenso científico aplicado e
lucidez, ou seja, o mínimo que se espera dos governos no século XXI, principalmente nas maiores
nações do mundo.

A quinta coluna mostra a população do país em milhões de habitantes em 2019. O objetivo é


apontar que o argumento de que o Brasil não pôde conter o coronavírus porque tem grande
população está completamente equivocado. Atentar, mais uma vez, para o exemplo louvável do
Vietnã. Com população de 96,5 milhões de habitantes, praticamente a metade da população
brasileira, conseguiu controlar muito bem os surtos de COVID-19, alcançando o segundo lugar no
ranking do Instituto Lowy. A Tailândia também tem uma população relativamente grande, 69
milhões, e isso não os impediu de ter grande sucesso na contenção dos casos de COVID-19.

A sexta coluna é a mais importante. Vê-se a diferença entre as melhores e piores gestões da
pandemia. Os piores países foram 165 vezes “mais eficientes” em gerar óbitos do que os melhores
países. Tem alguma chance dos países de melhor desempenho terem alcançado esse resultado por
acaso ou sorte? É muito difícil de acreditar. Realmente muito difícil. Vejamos o caso dos EUA, o país
mais rico do mundo.

Com mais de 345 mil óbitos ao final de 2020, é impressionante e vergonhoso o desempenho
negativo dos Estados Unidos, porque é um país riquíssimo e dos mais desenvolvidos
cientificamente, em comparação com muitos outros países muito mais competentes contra o
COVID-19. Os EUA foi sonoramente incompetente na gestão da pandemia, ficando na posição 94 do
ranking de performance do Instituto Lowy. Na conclusão deste Dossiê, será apresentado possíveis
causas da má gestão dos piores países.

A tabela a seguir mostra os óbitos após 15 semanas do primeiro caso de COVID-19 e o


número de idosos acima de 65 anos em alguns países. Cai por terra, com uma pesquisa de poucos
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minutos, a justificativa errônea de que os países com mais idosos são os que tem pior performance.
Isto é anti-científico.

Tabela comparativa – COVID-19

Óbitos após 15 semanas % acima de


País
do 1° caso 65 anos

Nova Zelândia 22, em 01/06 15,3 %

Vietnam 0, em 20/04 7,5 %

Tailândia 51, em 25/05 17,2 %

Chipre 19, em 15/06 14,0 %

Latvia 28, em 08/06 19,8 %

Sri Lanka 9, em 04/05 11,0 %

Brasil 35.026, em 01/06 10,0 %


Fonte: clicar no texto em sublinhado em azul.

Quanto aos percentuais de idosos no total da população, percebe-se claramente que a Nova
Zelândia (15,2%), Tailândia (17,2%) e Latvia (19,8%) estão acima do percentual brasileiro (10%), e
isso não os impediu, em absoluto, que tivessem ótimas performances no controle dos sustos de
coronavírus, tendo aqueles, respectivamente 22, 51 e 28 óbitos ao final de 15 semanas do primeiro
caso. O Brasil teve 35.026 óbitos no mesmo período. Aqui já se vê graves falhas na gestão da
pandemia. Em outros países, os responsáveis já teriam sido punidos.

O gráfico a seguir compara a curva de crescimento de casos novos de COVID-19 logo nas
primeiras 12 semanas, a partir do primeiro caso confirmado. Nota-se claramente que a gestão das
performances de excelência focaram na contenção dos casos (prevenção que salva vidas),
mantendo-os cuidadosamente sempre abaixo dos 1.000, ao invés de agir depois que muitos óbitos
já ocorreram (atraso que condena a morte de milhares). Estas políticas preventivas foram
noticiadas pela imprensa?

A política de só agir corretivamente, porque é assim que se aparece mais na mídia e se


ganha mais votos, apresenta o seu lado mais cruel nos momentos críticos da história. Longe de
justificar, mas a mídia que só noticia as ações corretivas e não divulga as políticas preventivas,
contribui para a prevalência da política corretiva. Os dramas e mazelas dão mais audiência.

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Novos casos de COVID-19 por semana

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1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Fonte: Painel da Doença do Coronavírus da OMS, 2020.

O número de casos é o sinal mais precoce de que muitos óbitos virão nas semanas seguintes,
e de que as medidas de contenção precisam ser bem mais fortes. Especialmente verdadeiro quando
se trata de saúde, ainda mais em Saúde Pública de milhões. O humilde, porém sábio, amplamente
aplicável, ditado popular nos lembra: “é melhor prevenir do que remediar”.

Notar que o eixo vertical do gráfico está em escala logarítmica! Todos os países bem
classificados, conteram os seus surtos rapidamente, mantendo-os cuidadosamente sempre abaixo
de 1.000 casos ao longo das primeiras 12 semanas. Estas políticas preventivas de saúde pública
foram noticiadas?

Um Brasil, órfão de lideranças, assistia atônito seus casos crescerem descontroladamente,


se espalhando de norte a sul, de leste a oeste, em todos os estados, ultrapassando a marca de 1.000
casos novos na quarta semana, e 10.000 casos novos na sétima semana.

Ao chegar a aterrorizante cifra de quase 100.000 casos novos na 12ª semanda, em um país
continental com mais de 200 milhões de habitantes, o Brasil opta conscientemente em fletar com o
caos e novas cepas imprevissíveis, pois a superlotação das UTIs leva ao colapso do sistema de saúde
e os doentes graves vão a óbito nas ruas, nas filas, em casa, nos asilos. Sem contar com os doentes
de outras patologias que não poderão ser atendidos devido à lotação das UTIs.

Quanto mais contaminados, mais replicações o vírus tem, e com isso mais chances de
surgirem mutações geneticamente viáveis. Isso se aprende no ensino médio. O COVID-19 terá muito
mais oportunidades de sofrer mutações imprevissíveis. Algumas dessas mutações podem ser mais
contagiosas, outras podem ser mais letais e algumas podem ser imunes à vacina. É imprevissível. É
uma questão simples de ciência genética. Há muitos riscos em se permitir a explosão de surtos no
caso da COVID-19.

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Um vírus, associado a incompetência, foi capaz de tudo que assistimos em 2020, e continua
em 2021. O que será de nós quando a crise climática e outras consequências da superexploração
dos recursos naturais vierem realmente com força? Estaremos preparados? Como fazer para que as
lições sejam permanentes, se é que aprendemos algo?

Como se pode explicar que tantos países, como Nova Zelândia, Tailândia, Chipre, Vietnã,
Latvia, Sri Lanka, entre outros, conseguiram ter uma ótima performance? Sorte ou competência?
Acaso ou responsabilidade?

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AS MEDIDAS DOS PAÍSES QUE ALCANÇARAM A EXCELÊNCIA

Apresenta-se a seguir um visão comparada das medidas de contenção ao longo do tempo,


durante o ano de 2020, adotadas pelos países melhor classificados na gestão da pandemia. Percebe-
se muitos pontos em comum.

Medidas
contra Medidas internas Testes de Rastreamentos
País
importação de contenção COVID-19 de contatos
de casos
Quarentenas Máscara, distância Testes em Sim, durante
Nova para quem e higiene das mãos massa, durante toda a pandemia.
Zelândia, 25 entra no País, nos alertas níveis toda a Incentivo à TODA
óbitos em desde 21/03. 2, 3 e 4. Lockdown pandemia. população para
2020 severo e eficiente manter registros
de 24/03 a 27/04. de contatos.
Quarentenas 16/03: Máscara Com muita Rigoroso,
para quem obrigatória, antecipação, acompanhar até
entra no País distância e higiene foram mais de 3° grau,
com 100% dos das mãos (com 200.000 testes quarentena para
custos pagos moderação). aplicados em contatos de 1°
Vietnam, 35 pelo Governo Lockdown na 3ª 120 centros, grau dos
óbitos em (medida válida onda em fabricados pelo infectados.
2020 até setembro julho/agosto. Exército
de 2020). Quarentenas para Vietnamita ao
ativos, contatos de custo
1° grau e aproximado de
recomendado aos 20 dólares cada.
de 2° grau.
Suspensão de Chegou a fabricar Testes de Sim, há rastreio
vôos mais de 1 milhão temperatura, de contatos
Tailândia, 61
internacionais de máscaras por sintomas em desde o mês de
óbitos em
desde 04/04. dia. Diversas hospitais e fevereiro de
2020
medidas de aeroportos. 2020.
contenção.
Quarentenas A partir de 13/03: 48.325 testes Desde abril de
para quem escolas fechadas, realizados até 2020, o Ministério
entra no país. proibição de 21 de abril, com da Saúde
Proibido entrar aglomerações, 817 casos investiga e
no País desde contatos, proteger confirmados. rastreia os
15/03 até grupos de risco. Somente contatos dos
Chipre, 119
28/05, exceto Quarentenas para pacientes com casos positivos.
óbitos em
casos bem sintomáticos. piora sintomas
2020
específicos. De 16/03: um mês fazem teste de
21/03 até sem comércio, laboratório.
19/04, só entra exceto
cargas, supermercados.
viajantes não. 17/03: homeoffice
para setor público.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Pertinente reparar quantas vezes as medidas comprovadas cientificamente foram utilizadas


pelos países de alta performance: máscara, higiene das mãos, distanciamento, lockdown e controle
de fronteiras.

Para saber mais detalhes, seguem as referências utilizadas para produzir a tabela-resumo
anterior, e alguns detalhes sobre as medidas de contenção dos países de excelência.

País: Nova Zelândia Continente: Oceania


Posição no ranking Lowy: 1° (excelente)
População: 4,9 milhões Primeiro caso: 28/02/2020
Sumário das medidas: Assim que a primeira ministra Jacinda Ardern percebeu o primeiro
aumento exponencial dos casos em meados de março de 2020, tratou logo de criar um sistema de
níveis de alarme bem organizado de 1 a 4. Nível 1 é apenas fazer testes em massa, rastrear os
contatos dos infectados e quarentenar infectados e visitantes. Nível 4 é lockdown, alerta máximo,
além de proibição de eventos e viagens mesmo dentro do país. Desde 24 de março de 2020 até 27
de abril de 2020, a Nova Zelândia manteve-se em Lockdown (nível 4). Sempre chamando o seu
povo de “nosso time de 5 milhões”, Ardern decretou retorno ao nível 1 a partir de 8 de junho de
2020, sem qualquer necessidade de máscaras, trabalho normal, vida social normal, com liberdade
de viagens internas e eventos com aglomeração. Isso tudo com apenas 25 mortes, seis meses antes
de qualquer vacina. A comunicação com a população era eficiente, e uma das metáforas visuais para
explicar porque tantas medidas eram necessárias, era a do queijo suíço mostrado a seguir. Quando
se quer prevenir um risco sério, aplicam-se diversas medidas redundantes porque se uma delas
falhar, haverá outras para assegurar a eliminação do risco. Importante notar que a primeira
ministra Ardern demonstra uso das medidas cientificamente comprovadas, timing perfeito e
capacidade de unir o povo. Uma lider global para ser lembrada por muito tempo como exemplo de
gestão de excelência.
Fontes principais: Health Emergency Dashboard, OMS (COVID-19) e New Zealand COVID-19 Alert
Level Summary

Metáfora visual utilizada sabiamente pelo Governo da Nova Zelândia.

Os perigos são as setas vermelhas

perigo não evitado!

3 perigos bloqueados
Fonte: Wikipedia

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

País: Vietnã Continente: Ásia


Posição no ranking Lowy: 2° (excelente)
População: 100 milhões Primeiro caso: 23/01/2020
Sumário das medidas: Com apenas 300 casos e zero mortes nos primeiros 4 meses, importante
ressaltar a grande população, baixo PIB/capita do país, fronteira com a China e data do primeiro
caso. Apesar desses enormes desafios, o país se saiu muito bem nas medidas de contenção,
realizando mais de 1.000.000 de testes, ao custo de aproximadamente 20 dólares por teste
(segundo informações). Acredita-se que o sucesso se deve à outras 3 epidemias recentes que o país
enfrentou, SARS em 2003 e gripe aviária entre 2004 e 2010. No dia 21 de janeiro, o Governo
solicitou preparação antecipada de leitos isolados nos hospitais. A população colaborou muito com
o rastreamento de contatos até 3° grau. Desde o primeiro caso, em 23 de janeiro, o Vietnã fechou as
rotas aéreas para Wuham. Quem entrou no país, sendo residente ou nativo, de fevereiro até
setembro de 2020, teve todas as suas despesas de quarentena pagas pelo Governo! O Ministério da
Saúde criou uma linha direta para informações gerais, além de comunicados muito ágeis e em toda
a mídia sobre a pandemia. O país ficou de fevereiro a março e de abril a julho sem qualquer
transmissão comunitária e terminou o ano de 2020 com incríves 35 mortes! É o melhor resultado
mundial em mortes/milhão de habitantes. Experiência, coragem e confiança nas medidas
comprovadas cientificamente. Essa foram as qualidades do Governo de excelência do Vietnã.
Fonte principal: Emerging COVID-19 success story: Vietnam’s commitment to containment, Global
Change Data Lab, 30 de Junho de 2020

Modelo visual do rastreamento de contatos do Vietnã

Fonte: Emerging COVID-19 success story, Global Change Data Lab

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Após apresentar detalhes e referências do Vietnã e Nova Zelândia, estes 2 países


emblemáticos na excelência da gestão dos pequenos surtos iniciais de COVID-19, que pela
incompetência de outros países se tornou a maior crise sanitária do mundo em um século,
apresentaremos mais dois exemplos memoráveis de performance de excelência: Chipre e Tailândia.

País: Tailândia Continente: Ásia


Posição no ranking Lowy: 4° (excelente)
População: 66,6 milhões Primeiro caso: 08/01/2020
Sumário das medidas: Já em fevereiro haviam rastreamento de contatos, testes de temperatura e
sintomas em hospitais e aeroportos. Com mais de 1.000 novos casos em março, em 26/03 o
Governo decreta estado emergência. Com mais de 2.000 casos, no início de abril, inicia o toque de
recolher, suspensão de vôos e lockdown em certas regiões. O Governo já se organizava em março de
2020 para produzir 50 milhões de máscaras. Apesar de que 2.000 casos é muito para o mês de abril,
o destaque se deve ao timing ótimo logo de início com rastreamentos e testes, além acertada
produção em massa de máscaras pelo próprio Governo da Tailândia.
Fontes principais: Anadolu Agency, relatório OMS e Xinhuanet News.

País: Chipre Continente: Europa


Posição no ranking Lowy: 5° (excelente)
População: 1,2 milhões Primeiro caso: 09/03/2020
Sumário das medidas: A primeira medida teve início em 27/02, com a criação do Centro de Gestão
da Crise pelo governo central. Aglomerações proibidas acima de 75 pessoas desde 11/03. Ministro
das Relações Externas é contra viagens de nativos ao exterior. Para punir desobediência, governo
criou multa. Proibido entrar no País desde 15/03 até 28/05, exceto casos bem específicos. De
21/03 até 19/04, só entram cargas, viajantes não. Escolas fechadas, evitar aglomerações, contatos,
proteger grupos de risco, a partir de 13/03. 17/03: homeoffice para setor público. 16/03:
fechamento de comércios por um mês, exceto supermercados e farmácias. Em 24/03 até 13/04,
todos os espaços públicos foram proibidos. Multa foi dobrada para 300 euros em 30/03. No fim de
março, o Governo lançou um pacote de auxílio para estudantes de Chipre no exterior que não
puderam retornar ao país. Regras claras e na medida certa, profissionalismo e medidas baseadas
em ciência foram as marcas do Governo do Chipre para proteger a vida do seu povo, que é a coisa
mais fundamental que se espera de um Governo decente.
Fonte: COVID-19 Health System Response Monitor (OMS)

Poderia ser coincidência que estes 4 países alcançaram todos excelentes resultados com as
mesmas medidas de contenção? Perceba que, de posse dos dados deste capítulo é possível concluir
que mesmo com diferentes etnias, climas, continentes, PIB/capita, percentual de idosos, todos
tiveram excelentes resultados com as mesmas medidas de contenção. As medidas de sucesso são as
mesmas, simplesmente porque o patógeno é o mesmo.

Conclui-se que não foi sorte, foi gestão central organizada, focada na antecipação de casos (e
não em milhares de óbitos), bem como baseada em evidências e melhores práticas.

Finalmente, faz-se necessário explicar de onde estes países obtiveram as melhores práticas.
Estavam realmente de fácil acesso para todos os Ministros de Saúde (ou equivalentes) do mundo, já

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

no início de 2020? Ou somente os especialistas muito perspicazes poderiam ter encontrado tais
práticas de excelência em tempo para evitar os surtos de COVID-19?

Vale ressaltar que em nenhum dos países bem sucedidos se vê sequer a menção à
expressões como “isolamento vertical”, “tratamento precoce”, “cloroquina”, “imunidade de
rebanho”, “ivermectina”, “sol”, “zinco”, “fé” ou qualquer outra que não sejam as medidas de
contenção da ciência epidemiológica consolidada contra coronavírus agressivo causador de SARS,
que é doença grave. Estas propostas ou não são comprovadas ou são impraticáveis. O que quer que
seja, não devem ser utilizadas como base de políticas públicas de saúde, dado o grande volume de
pessoas afetadas.

A lista de medidas “alternativas” parece ser propositalmente grande para nos manter
ocupados. Mas aqueles líderes das nações do mundo que tentaram utilizar as medidas
“alternativas”, que não tem comprovação científica, devem apresentar, de imediato, evidências
sólidas às suas decisões, datadas à época em que optaram por tais medidas.

Muitos tomaram decisões erradas ou não tomaram medida alguma, em detrimento do que
já era cientificamente comprovado como eficaz: distanciamento social, uso de máscara, higiene das
mãos, lockdown, controle de fronteiras e rastreamento e isolamento de contatos.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

O PRIMEIRO SURTO DE CORONAVÍRUS (SARS, 2002)

Faz-se oportuno explicitar o conceito de medicina baseada em evidência, termo que logo se
tornaria uma bandeira a ser defendida pelos especialistas a partir de 1990. O termo significa:

“o consciente, explícito e judicioso uso da melhor e mais atual evidência disponível nas tomadas de
decisão para sobre o cuidado individual de pacientes”.

(tradução dos autores)

Este conceito é especialmente útil nesses tempos de pandemia, em que muitos políticos
propagam ideias anti-científicas mirabolantes. Em 7 anos, o termo foi citado em mais de 1.000
artigos científicos da área médica. Tornou-se em pouco tempo muito, popular e influente, indicando
claro consenso, ou seja, seu impacto positivo e abrangência eram evidentes.

O primeiro surto humano de coronavírus, que se tem notícia ocorreu de 2002 a 2004,
infectou mais de 8.000, provocou uma epidemia de SARS (sigla em inglês que significa Síndrome
Respiratória Aguda Grave).

Ainda em 2003, um grupo de pesquisadores dos EUA iniciaram estudos para desenvolver
uma vacina. De acordo com artigo da revista Clinical Infectuous Disease, publicado em 2003 pela
Oxford University Press:

“no início de abril de 2003 que pesquisadores do National Institutes of Health dos Estados Unidos
começaram a desenvolver uma vacina contra SARS”

(tradução dos autores)

Aquelas pesquisas infelizmente foram interrompidas, mas em 2020 o conhecimento desta e


de outras pesquisas foram reaproveitados para acelerar o desenvolvimento das vacinas que hoje
estão salvando vidas e a economia em muitos países. Com isso, quer-se evidenciar que haviam
indícios de que uma vacina contra o coronavírus não iniciaria “totalmente do zero”, e assim poderia
ser produzida rapidamente em 2020.

Até o final do surto, aquele primeiro coronavírus resultou em 774 óbitos em 26 países,
incluindo Tailândia, Singapura, China e Vietnã. Nesta lista de países, portanto, está a resposta para a
segunda pergunta fundamental deste Dossiê, com 16 anos de antecedência à pandemia de 2020. A
resposta para a primeira pergunta vem logo em seguida.

A doença alcançou quase 10% de letalidade, naquele primeiro evento mundial grave de
coronavírus. Na mesma rapidez em que aquela crise sanitária ganhou grande repercussão na época,
foi logo esquecida pela maioria da população, como se nunca mais pudesse acontecer. Entretanto,
alguns cientistas continuavam a pesquisar o assunto.

Uma vacina não havia sido desenvolvida, somente iniciada, mas mesmo assim aquele tipo de
coronavírus foi praticamente erradicado do planeta. De acordo com um artigo científico do The New

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

England Journal of Medicine, de junho de 2004, evitou-se grandes surtos apenas com rastreamento
e quarentena dos contatos dos infectados, isolamento de casos confirmados, uso de máscaras e,
em casos extremos, uso de confinamento (lockdown). Portanto, estas eram as melhores e mais
atuais evidências de medidas de contenção eficazes. Informações estas já disponíveis desde 2004.
Não é surpresa que aqueles países melhor classificados na gestão da pandemia, adoraram
precisamente estas medidas. Aqui está a resposta para a primeira pergunta fundamental deste
Dossiê: junho de 2004.

Assim como todas as referências vitais deste Dossiê, as 2 referências anteriores deste
capítulo estão disponíveis a um clique sobre o texto em azul, sem qualquer embaraço, na www, para
qualquer um acessar, sem qualquer senha, cadastro ou custo. Só é preciso ter acesso a internet e um
dispositivo com navegador web.

As duas referências sobre o primeiro surto de coronavírus, publicadas entre 2003 e 2004,
são de um dos mais conceituados e tradicionais jornais médicos do mundo, o The New England
Journal of Medicine, que publica na área há mais de 200 anos. Sem dúvida, os artigos eram de leitura
obrigatória para os governos e especialistas em saúde pública para elaboração do enfrentamento
do COVID-19, e estavam disponíveis há mais de 15 anos antes do surto de 2020.

Como se não bastasse, no ano de 2004, duas pesquisadoras da Universidade de Évora


publicaram, em português de Portugal, um relevante estudo de 36 páginas sobre os surtos de SARS,
2002, o primeiro coronavírus. Para elaborar o documento, as pesquisadoras consultaram 48
referências. Uma verdadeira revisão sobre o assunto. A fundação da Universidade de Évora
remonta o ano de 1556, instituição esta que hoje está entre as oito melhores de Portugal.

Ao se detalhar os destaques de uma instituição, os autores pretendem reconhecer a


credibilidade destas. Certamente, não é somente a longevidade em si como único fator de
credibilidade, mas a longevidade com contínua produção científica de qualidade, esta sim, é
indicativo.

O estudo é contundentemente revelador, pois, em linguagem didática, desnuda medidas de


contenção que coincidem em 100% com as melhores medidas dos melhores países na atual
pandemia de 2020.

Vale lembrar mais uma vez, que assim como todas demais referências deste Dossiê, o estudo
da Universidade de Évora está disponível a um clique, sem qualquer embaraço, na www.

Na página 19 do referido, tem-se:

“... o modo de transmissão mais importante parece ser o contacto directo de membranas mucosas,
nariz, olhos, boca, com gotículas respiratórias infecciosas expelidas através da tosse ou espirro”.

Isto é precisamente o modo de transmissão do COVID-19 de 2020.

Na página 20 do mesmo documento:

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

“... um desses vôos... constitui um evento “superspreading” cujo caso fonte foi um homem de 72 anos
que tinha visitado um conhecido no Hospital Prince of Wales em Hong Kong, e que resultou num
cluster de 24 casos prováveis”.

O trecho se refere a um superespalhamento do vírus dentro de uma aeronave, mostrando


que a transmissão é muito alta em local fechado, com aglomeração, não somente em hospitais. Isto é
preocupante.

Mas o melhor trecho está a seguir, que deixa muito claro as medidas de contenção dos
surtos de coronavírus, é uma verdadeira “receita de bolo” pronta, perfeita para 2020, que muitos
políticos fizeram questão de ignorar. O povo com nível de escolaridade limitado não saber, é
normal, mas os líderes das maiores nações do mundo, que deveriam ter educado o povo, errarem a
tal ponto?

Considerar os milhões de óbitos de 2020/2021 como se fossem inevitáveis? Nós, os autores,


considemos isso uma aberração em pleno século XXI. Algo que será difícil compreender no futuro,
especialmente se nenhum julgamento dos responsáveis for feita. Aliás, outros genocídios serão
automaticamente legitimados no futuro, se a devida responsabilização não ocorrer.

Tudo está inequivocamente desnudo ali. A partir da página 21, leia-se no mais claro
português (de Portugal), não deixando quaisquer dúvidas:

“Na ausência de uma vacina, o método encontrado mais eficiente para controlar a SARS foi
quebrar a corrente de transmissão de pessoas infectadas para pessoas saudáveis. Para tal foram
adoptadas três actividades, que datam dos primeiros dias da microbiologia: detecção de casos,
isolamento ou quarentena e registo dos contactos. A detecção procura identificar casos de SARS o mais
cedo possível do aparecimento dos sintomas. Uma vez estando os casos identificados, o próximo passo
é garantir o seu rápido isolamento, de acordo com procedimentos estritos de controlo de infecção. A
terceira actividade consiste em identificar todos os contactos próximos estabelecidos por cada caso e
segui-los atentamente, efectuando-lhes testes médicos diários e possível isolamento em casa
(quarentena). Em conjunto, estas três actividades permitem reduzir o número de contactos diários
possíveis para cada caso infeccioso potencial, permitindo igualmente reduzir o tempo compreendido
entre o aparecimento da doença e o isolamento, o que, por sua vez, possibilita a diminuição da
probabilidade do vírus se espalhar a outros indivíduos.

O sucesso da adopção destas três actividades permite admitir que, embora este novo
coronavírus seja suficientemente transmissível para causar uma vasta epidemia, não é tão contagioso
que não possa ser controlado com medidas básicas de saúde pública.

A adopção das recomendações em termos de viagens, emitidas pela WHO no dia 15 de Março,
marcou um ponto de viragem no desenvolvimento inicial deste surto epidémico. Isto é demonstrado
pelo facto de ter sido nas áreas onde já se tinham detectado casos antes dessas recomendações terem
sido feitas (Vietnam, Hong Kong, Singapura e Toronto) que se registaram os maiores e mais severos
surtos, todas eles caracterizados por correntes de transmissão secundária estabelecidas fora do foco
inicial dos hospitais. Após as recomendações terem sido lançadas, todos os países com casos
importados, com excepção de províncias na China, foram capazes de, através de uma rápida detecção
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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

de casos e isolamento de doentes, prevenir transmissões futuras e manter o número de casos


adicionais em níveis muito baixos.”

O texto se faz tão claro por si só, que quase não é necessário acrescentar. Mas não custa os
autores enfatizarem, já que boa parte das lideranças mundiais parecem ter ignorado.

Importante destacar que não se está com isso afirmando que todos os coronavírus
causadores de SARS terão exatamente o mesmo padrão. Está-se colocando sim que toda vez que
surgir um novo coronavírus agressivo, na ausência de estudos científicos específicos, adota-se as
medidas de contenção da variante mais similar possível, até que novas evidências provem que há
outras medidas mais indicadas. Isto está de acordo com o conceito de medicina baseada em
evidências, explicado logo no início deste capítulo.

As informações das três referências sobre o primeiro coronavírus, de 2002 a 2004, colocam
completamente por terra qualquer afirmação de que o coronavírus é algo novo, que até os
cientistas estavam perdidos em 2020, que a ciência não sabia nada sobre medidas de contenção, e
que por isso houveram tantos óbitos.

Negativo.

Já era conhecido pelo mundo todo desde 2002, e devidamente controlado sem vacina desde
2004, dominado na sua transmissão. E portanto, eram evitáveis os milhões de óbitos da COVID-19,
em 2020, desde que se adotasse a medicina baseada em evidências.

De acordo com o artigo da The NEW ENGLAND JOURNAL of MEDICINE, a sequência genética
completa daquele coronavírus já havia sido obtida. Sabia-se que: 1) o tempo de quarentena era de
14 dias, 2) 99% dos infectados tinham febre como primeiro sintoma, e 3) aquele coronavírus
causava, em alguns pacientes, uma pneumonia viral que progredia rapidamente (SARS). Isto deixa
qualquer epidemiologista sério bastante preocupado...

Trata-se de um vírus mortal, causador de pneumonia grave, resultando em alta mortalidade,


justamente porque ataca o sistema respiratório levando o infectado a óbito por hipoxia. Exatamente
como o COVID-19.

REFERÊNCIAS DESTE CAPÍTULO

Ariel L. Zimerman, MD., PhD, Evidence-Based Medicine: a short history of a modern medical
movement, American Medical Association Journal of Ethis, 2013

Joseph S.M. Peiris, M.D., D.Phil., Kwok Y. Yuen, M.D., Albert D.M.E. Osterhaus, Ph.D., and Klaus Stöhr,
Ph.D., The Severe Acute Respiratory Syndrome, The NEW ENGLAND JOURNAL of MEDICINE, 2003

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

David S. Fedson, Vaccination for Pandemic Influenza and Severe Acute Respiratory Syndrome:
Common Issues and Concerns, Clinical Infectious Diseases, Volume 36, Issue 12, 15 de junho de 2003,
Páginas 1562–1563

M.H.Sc., Erin Kennedy, M.H.Sc., Elizabeth Rea, M.D., Wil Ng, M.H.Sc., Tamara Wallington, M.D.,
Barbara Yaffe, M.D., M.H.Sc., Effie Gournis, M.Sc., M.P.H., Elisa Vicencio, M.H.Sc., Sheela Basrur, M.D.,
M.H.Sc., and Richard H. Glazier, M.D., M.P.H., Public Health Measures to Control the Spread of the
Severe Acute Respiratory Syndrome during the Outbreak in Toronto, The NEW ENGLAND JOURNAL of
MEDICINE, 2004

Vanessa Correia e Sara Albuquerque, Severe Acute Respiratory Syndrome (SARS), A primeira doença
grave transmissível do séc. XXI, Universidade de Évora, 2004

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

O SEGUNDO SURTO DE CORONAVÍRUS (MERS, 2014)

Todas as novas informações deste artigo foram extraídas de artigo da revista The Lancet
publicado em junho de 2005. O segundo surto de coronavírus no mundo teve início em 2012, se
prolongando até 2015. Vale citar que o coronavírus de 2002 e este não são idênticos geneticamente,
mas são sim parentes muito próximos. Foi batizado de MERS (sigla em inglês que significa
Síndrome Respiratória do Oriente Médio), por ter camelos da Arábia Saudita como hospedeiro
intermediário.

Até maio de 2015, foram 1.180 casos confirmados até mesmo na Europa, Ásia (incluindo
China e Coréia do Sul), EUA, mas principalmente no Oriente Médio. Todos estes casos foram
rastreados até o epicentro, no Oriente Médio.

Foram 483 óbitos, resultando em aproximadamente 40% de letalidade por SARS,


exatamente a mesma doença do coronavírus de 2002. A forma de transmissão, na sua maioria
limitada aos hospitais, se dava por contato direto com fluídos de pacientes com sintomas, mas
possivelmente também por gotículas de espirros e tosse dos contaminados.

O estudo publicado na revista The Lancet faz um comparativo muito detalhado e claro,
revelando grandes semelhanças entre ambos coronavírus. Tanto na MERS de 2014, quanto na SARS
de 2002, mais de 98% dos contaminados apresentavam febre como primeiro sintoma. É por isso
que agora observamos tantos funcionários fazendo a leitura de nossa temperatura toda vez que
entramos em espaços confinados, como estabelecimentos comerciais e outras edificações.

Vale deixar claro que estas informações sobre o MERS foram obtidas em artigo do jornal
médico The Lancet, um dos mais respeitados e tradicionais do mundo, fundado em 1823.

O coronavírus de 2002 deixou quase 8.000 infectados e 774 óbitos, ou seja, em média 10%
de letalidade. Já o MERS de 2014, o segundo coronavírus grave, se dispersou bem menos ao deixar
1.180 infectados, mas causou 483 óbitos, 40% de letalidade. Um era mais letal, o outro mais
contagioso.

Portanto, as duas epidemias anteriores a 2020 mostraram que os coronavírus podem


apresentar diferentes combinações de contágio e letalidade. Ok. Seria razoável cogitar a
possibilidade de um coronavírus, uma terceira variante, trazer uma certa combinação entre
letalidade e contágio que causasse estragos maiores? Sim, é razoável pensar que isso era possível.

REFERÊNCIA DESTE CAPÍTULO

Prof Alimuddin Zumla, FRCP, Prof David S Hui, FRCP, Prof Stanley Perlman, MD, Middle East
Respiratory Syndrome, THE LANCET, VOLUME 386, ISSUE 9997, P995-1007, 2015

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

OS ALERTAS ANTES DA PANDEMIA DE 2020

Uma publicação da conceituada National Academy of Sciences dos EUA, com 44 páginas
ricamente ilustradas, ainda em 2010, informa que o grande aumento de vôos comerciais
intercontinentais podem levar a um rápido espalhamento de doenças infecciosas. Além disso, diz a
publicação, a superpopulação e suas consequências aumentam a possibilidade de emergências de
novos patógenos.

O jornalista David McCandless publicou um livro, em 2014, onde ele resume patógenos,
letalidade e taxa de contágio, adaptado a seguir. Por exemplo, a dengue possui contágio igual a 5, o
que significa que 1 contaminado transmitirá a doença para outros 5 indivíduos. A AIDS possui
letalidade igual a 80%, o que significa que a doença causa óbito em 80% dos contaminados (isto era
antes dos tratamentos mais modernos). Estes eram os dados que se apresentavam até 2014.

Letalidade e contágio de certas doenças


PERCENTUAL DE LETALIDADE

TAXA DE CONTÁGIO

Fonte: Adaptado de McCandless, 2014


As epidemias dos coronavírus MERS, 2014 e SARS, 2002, conhecidos à época e descritos
aqui neste Dossiê, têm diferentes contágios e letalidades. Esta era a informação disponível em 2014.

A história da ciência nos mostra que não é prudente fazer uma análise simplória, tal como
julgar que a MERS de 2014 deveria causar mais óbitos do que a SARS de 2002, somente com base
no fato de que a primeira é mais letal. A medicina e a saúde pública, assim como muitos fatos
científicos, muitas vezes fogem ao senso comum dos que não possuem formação científica. Mais um

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

motivo para reconhecermos os especialistas de cada área, especialmente na tomada de decições de


grande impacto nas populações.

Conforme apresentado anteriormente neste Dossiê, ao contrário daquilo que o senso


comum poderia tentar prever, a doença que causou a maior destruição foi justamente a SARS de
2002, e não a MERS.

A letalidade de um patógeno depende da agilidade no atendimento, da genética dos


indivíduos, da condição de saúde prévia da população, entre outros fatores.

A taxa de contágio, por sua vez, é variável muito dinâmica, oscilando conforme os hábitos
das pessoas (relacionados ao modo de transmissão) e da adoção massiva das medidas
comprovadamente eficazes de contenção das doenças contagiosas por parte da população.

Por tudo isso, é difícil prever com muita precisão o poder destrutivo de uma doença
contagiosa, pois depende da combinação de dois fatores complexos: contágio e letalidade.

Exatamente por essa dificuldade de previsão é que a estratégia deve ser adotar logo as
medidas mais restritivas disponíveis no momento, seguindo os especialistas dos países mais
experientes, até que se tenha melhores evidências estatísticas.

A tabela a seguir mostra os óbitos por dia de certas doenças em todo o mundo. Basta
comparar com o gráfico anterior e identificar que não há correlação totalmente clara entre óbitos
por dia e letalidade, ou óbitos por dia e contágio.

Óbitos por dia no


Patologia
mundo
Tuberculose* 3014
AIDS 2110
Dengue 50
Catapora* 12
Fonte: The Lancet e OMS (março de 2020)
* Já existe vacina.

Bill Gates, o visionário cofundador da Microsoft, criadora do sistema operacional Windows,


fez diversas declarações anteriores a 2020 a respeito da possibilidade de uma pandemia. Em 2015,
Bill Gates gravou um vídeo para a organização TED, conhecida por divulgar apresentações curtas e
impactantes de pessoas famosas, afirmando claramente:

“Se algo matar mais de 10 milhões de pessoas nas próximas décadas, é mais provável que seja um vírus
altamente contagioso do que uma guerra. Não mísseis, mas micro-organismos.”

(tradução dos autores)

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Em 21 de janeiro de 2017, nove autores de referência publicam, na renomada revista The


Lancet, um artigo online sobre a criação da Coalizão de Inovações em Preparação para Epidemias
(em inglês, a sigla é CEPI).

Neste artigo, os autores afirmam que:

“[…] o mundo não está preparado o suficiente para detectar e responder às ameaças epidêmicas.”

(tradução dos autores)

Entre as causas da falta de preparo, segundo o artigo, está o pouco interesse em


desenvolver vacinas pelo baixo lucro diante do risco que grandes laboratórios privados teriam,
especialmente se os surtos não afetassem a economia dos países ricos.

No artigo, como sinal claro de que as ameaças de novas epidemias faziam sentido, setores
públicos privados, filantrópicos, não-governamentais, intergovernamentais e organizações civis do
mundo todo criaram a CEPI, para um novo modelo de financiamento de desenvolvimento de
vacinas.

Portanto, no ano de 2017, os especialistas em epidemiologia, e até mesmo uma parte das
lideranças mundiais, davam um claro sinal de que não somente acreditavam que graves ameaças
epidêmias se avizinhavam, mas também que a vacina era a solução. Não há qualquer dúvida, com
base nas referências aqui apresentadas.

Entretanto, semanas antes de se tornar oficialmente pandêmica, muitos outros sinais ainda
indicariam que era justamente o COVID-19 que materializaria as previsões publicadas amplamente
pela National Academy of Science, por Bill Gates e pela conceituada The Lancet, muito antes de 2020.

REFERÊNCIA DESTE CAPÍTULO

Institute of Medicine. 2011. What You Need to Know About Infectious Disease. Washington, DC: The
National Academies Press

Børge Brende, Jeremy Farrar, Diane Gashumba, Carlos Moedas, Trevor Mundel, Yasuhisa Shiozaki,
et al., CEPI—a new global R&D organisation for epidemic preparedness and response, The Lancet, 18
de janeiro, 2017

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

O TERCEIRO SURTO DE CORONAVÍRUS (COVID-19, 2020)

Foi às 23:59 do dia 30 de dezembro de 2019, uma segunda-feira, que a Sociedade


Internacional para Doenças Infecciosas dá o seu primeiro alerta online de uma pneumonia, que
depois seria identificada como a COVID-19:

“os tão propalados casos de pneumonia inexplicáveis se referem a 4 casos de pneumonia que não
puderam ser diagnosticados ao mesmo tempo: febre (igual ou maior que 38°C); características de
imagem de pneumonia ou síndrome de desconforto respiratório agudo; ....”

(tradução do autores)

Assim como outros coronavírus anteriores, mais uma vez o primeiro sintoma seria a febre.
Ainda era apenas um sutil presságio, faltando meras 24 horas do início do fatídico ano novo de
2020. Naquele momento, tratava-se apenas de uma pneumonia inexplicável, sem nome e restrita a
Wuhan, na China.

Mas baseado nas experiências anteriores com MERS, SARS e influenza, já haviam fortes
expectativas de ser um coronavírus ou vírus influenza.

Mantendo a sequência cronológica dos fatos, em 2 de janeiro de 2020, o pesquisador


Edward Holmes da Universidade de Sidney, Austrália, em consórcio com a Universidade de Fudan,
China, publica um comunicado no website www.virological.org sobre o sequenciamento genético
do microorganismo responsável pela desconhecida pneumonia de Wuhan, afirmando que era sim
um coronavírus.

Neste momento, já se sabia ser um coronavírus causador de síndrome respiratória SARS.


Um alerta online da OMS (Organização Mundial de Saúde) com relação àquela mesma doença
pulmonar desconhecida ocorreu, com 3 dias de atraso, em 5 de janeiro de 2020. Já eram 44 casos,
portanto dez vezes mais do que à 6 dias atrás, e 11 em estado grave, 25 % do total.

Neste alerta de 5 de janeiro, a OMS declarava:

“Baseando-se nas informações fornecidas pelas autoridades nacionais, a OMS aplica as


recomendações de medidas de saúde pública e vigilância para influenza e para infecções respiratórias
aguda severa.”

(tradução dos autores)

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Imagem: Coronavírus. Fonte: Wikipedia.

De acordo com este alerta da OMS, já seria aplicável o Guia Infection prevention and control
of epidemic- and pandemic-prone acute respiratory diseases in health care, também da OMS,
disponível para download gratuito desde 2014.

Este guia da OMS de 156 páginas detalha todos os cuidados para hospitais com pacientes
portadores de infeccções respiratórias agudas contagiosas. Isto inclui evitar contato com gotículas
aéreas dos pacientes, entre outras medidas por parte dos médicos e enfermeiros nos hospitais. De
início, era apenas uma recomendação limitada as unidades de saúde.

Portanto, já em janeiro de 2020, apesar de serem medidas restritas aos hospitais, já se vê


aqui a forma de transmissão definida, e portanto percebe-se a fundamentação por trás daquelas
que viriam a ser as medidas padrão de contenção para a população em geral: uso de máscara e
distanciamento de 2 metros.

A partir daquele momento, era urgente deslocar a atenção dos principais epidemiologistas e
autoridades de saúde pública dos países para o estudo dos surtos anteriores de coronavírus e em
novas informações de Wuhan, aguardando dados sobre a letalidade, taxa de contágio,
procedimentos de testes de confirmação de casos, enfim, sobre a possibilidade de se tornar uma
epidemia ou até uma pandemia.

Epicentro da pandemia 2020, Wuhan, China. Fonte: Google Maps.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Em 17 de janeiro de 2020, um artigo do jornal The Guardian defendia que, com base em
estatísticas, o número real de casos não-detectados de coronavírus na China já seria algo entre 190
e 4.000. Também já se falava sobre a possibilidade da transmissão sustentada.

Em um segundo artigo em 20 de janeiro de 2020, o jornal The Guardian publica que o


coronavírus já havia chegado na Tailândia, no Japão e na Coréia do Sul, se espalhara por toda a
China. Já havia até suspeita de um caso na Austrália. A pior notícia era a suspeita de subestimação
de total de casos e da possibilidade de transmissão sustentada.

O problema é que o surto se torna autosustentado, independente de isolar ou não o


epicentro. Ao contrário do MERS de 2014, já não faria tanta diferença para o mundo isolar ou não o
mercado de carnes de Wuhan, China, onde o coronavírus teria saltado de animais hospedeiros para
humanos pela primeira vez.

Em 21 de janeiro de 2020, a agência ABC News da Austrália publica online um artigo onde
mostra um vídeo de funcionários, todos com roupa de proteção dos pés à cabeça e máscara,
medindo a temperatura de passageiros dentro de um avião na China. Isso por si só já denota
também a gravidade da situação.

Um dia depois, 22 de janeiro, a OMS confirma pela primeira vez a transmissão sustentada
do novo coronavírus. Em 30 de janeiro de 2020, a OMS publica o relatório situacional nº 10,
contabilizando 7.818 casos de COVID-19 no mundo todo e anuncia o “Alerta Nível Internacional de
Emergência de Saúde Pública”. O relatório também cita que há confirmação de 82 casos espalhados
em 18 países. A transcrição literal de parte do relatório da OMS (30/jan/2020):

“Durante os surtos anteriores devido a outros coronavírus (MERS e SARS), a transmissão


comunitária ocorria por meio de gotículas, contato e fômites*, sugerindo que o modo de transmissão
do 2019-nCoV pode ser semelhante. Os princípios básicos para reduzir o risco geral de transmissão de
infecções respiratórias agudas inclui o seguinte:

• Evitar contato próximo com pessoas que sofrem de infecções respiratórias agudas.

• Lavar as mãos com frequência, especialmente após contato direto com pessoas doentes ou
seu ambiente.

• Evitar o contato desprotegido com animais de fazenda ou selvagens.

• Pessoas com sintomas de infecção respiratória aguda devem praticar a etiqueta da tosse
(manter distância, cobrir tosse e espirrar em lenços ou roupas descartáveis e lavar as mãos).

• Dentro das instalações de saúde, melhorar as pr|ticas padrão de prevenção e controle de


infecções em hospitais, especialmente em departamentos de emergência.”

* Fômites é qualquer superfície onde o vírus possa se fixar temporariamente entre o


humano emissor e o humano receptor.

(tradução dos autores)

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Vinte e dois de janeiro de 2020. Esta é data-chave.

Esta era a hora H do dia D.

Eis a questão: quão cedo cada ministro de saúde (ou equivalente), de cada país, tomou
medidas de acompanhamento e preparação contra esse surto em Wuhan? Como os ministros da
saúde trabalharam para convencer os líderes políticos e outros ministros sobre o que uma
pandemia de coronavírus poderia exigir em termos de antecipação?

A partir dessa data, uma “luz vermelha” deveria acender, pois tratava-se de um coronavírus
agressivo causador de SARS. Já se sabia o tamanho do risco, pelo ocorrido nas epidemias anteriores,
SARS, 2002, e MERS, 2014. Esses vírus podem ter letalidades e contágios variáveis, de tal forma que
era preciso acompanhar de perto as pesquisas.

Era preciso cautela e atenção, e sempre adotando o princípio da precaução na saúde


pública. Aplicar também a já citada medicina baseada em evidência. Era o caso de quarentenar
todos os viajantes que passassem pela China, para dizer no mínimo.

Os líderes dos países deveriam, por obrigação humanitária, exigir estudos, pesquisa,
reuniões, elaboração de material de publicidade para a população, propostas de medidas de
contenção contra essa nova ameaça real. A questão não é criar pânico ou histeria, ao revés, porque
quanto mais antecipadas forem aplicadas as medidas de contenção, menor o custo econômico de
tais medidas, menor o impacto na vidas das pessoas e mais rápido será a redução do impacto do
vírus.

Como vimos, foi exatamente isso que fizeram Tailândia, Vietnã, Nova Zelândia, entre outros
países, como Coréia do Sul. Desde junho de 2020, depois de um forte e definitivo lockdown de
pouco mais de um mês, a Nova Zelândia tem vida praticamente normal.

Acompanhar os preparativos, as reações dos governos mais experientes em surtos similares


era obrigatório, em um primeiro momento. Estes países mais experientes incluem China, Coréia do
Sul, Tailândia e Vietnã, conforme mostrado nos capítulos da SARS de 2002 e MERS de 2014 deste
Dossiê. Estas atitudes, combinada com a aplicação antecipada, decidida e organizada das medidas
de contenção teriam salvo milhões de vidas pelo mundo todo.

Em um segundo momento, as lideranças e especialistas deveriam verificar as tendências no


desenvolvimento das vacinas ou medicamentos pelos principais laboratórios pelo mundo, conforme
será descrito mais a frente neste Dossiê.

Era preciso encomendar, distribuir e utilizar milhões de: a) kits de testes, b) medidores de
temperatura, c) frascos de álcool gel, d) máscaras e e) material de publicidade com as medidas de
contenção. Aqueles países que se antecipassem teriam melhores preços, atendimento mais
antecipado e controle sobre os surtos. Consequentemente a recuperação econômica seria muito
mais rápida.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Até o final de janeiro, segundo um artigo da BBC, eram 9.262 casos e 213 óbitos somente na
China, com outros casos confirmados também na Alemanha, Japão, EUA, Vietnã, Singapura, Coréia
do Sul, Austrália, Malásia e França.

O Brasil, portanto, era país privilegiado, talvez por sua distância do epicentro. Não estava na
lista dos primeiros a confirmar presença do novo coronavírus. Assim, dispôs de tempo o suficiente
para observar os acontecimentos com relativa menor urgência, em relação aos países afetados
desde o início. Um privilégio que não foi aproveitado.

A evolução das medidas mais eficientes e todas as novas informações sobre contágio,
letalidade, grupo de risco, entre outras, eram dados muito úteis na organização das políticas
públicas de contenção do COVID-19. Entretanto, sabemos hoje que as tais medidas de contenção
não foram adotadas seriamente pelo tempo necessário no Brasil, principalmente por ação ou
omissão do Governo Federal, conforme mostra o boletim informativo nº 10 da Conectas Direitos
Humanos, de janeiro de 2021. Infelizmente, essa foi a triste realidade.

O ex-Ministro da Saúde Luiz Henrique Madetta publicou um ótimo livro detalhando suas
dificuldades com o Presidente Bolsonaro e decretou, com boa antecedência, situação de perigo
iminente em saúde pública em 4 de fevereiro de 2020. Com isso, iniciou-se processo de repatriação
de brasileiros em Wuhan, foi possível realizar contratos sem licitações para agilizar as preparações
contra o COVID-19, entre outras ações. Infelizmente, como já foi explicado, Madetta foi impedido de
continuar o seu trabalho, pois foi demitido em abril de 2020 (!).

Os autores não encontraram a data, a partir da qual, Madetta se conectou com um tal de
comitê de especialistas para discutir a pandemia de COVID-19. O prazo de finalização deste Dossiê
não nos permitiu essa pesquisa. Sabe-se que o comitê seria formado por especialistas em
epidemiologia da Fiocruz, USP, UNICAMP, UFRJ, entre outras instituições de referência nacionais,
alguns dos quais o nosso grupo já teve contato.

Era cada vez mais urgente que os responsáveis pela saúde dos países observassem muito de
perto a evolução dos casos, óbitos e medidas de contenção, para seguir os melhores resultados dos
países com surtos claramente controlados.

Em 21 de fevereiro de 2020, o The Lancet publica um alarmante estudo de pacientes críticos


acometidos com COVID-19. O estudo identificava que para cada 1.000 infectados com SARS-CoV-2 (
nome do vírus da doença COVID-19), 73 deles precisam necessariamente de internação em Unidade
de Terapia Intensiva (UTI), em média por 7 dias, e 52 deles dependem completamente do
ventilador pulmonar para sobreviver. O mais preocupante é a rápida evolução do quadro dos
pacientes para uma hipoxia (falta de oxigênio) e ainda a afirmação chocante:

“a severidade da pneumonia SARS-COV-2 impõe grande estresse nos recursos de tratamento crítico
nos hospitais, especialmente se não estiver adequadamente equipado com pessoal e equipamentos”.

(tradução dos autores)

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Os números eram claros: não havendo respiradores, a letalidade é de 5,2%, ou talvez até
mais. Simples assim. Havia contágio razoável de uma doença sem cura, com letalidade também
razoável, que aumentava bastante caso não houvessem respiradores suficientes.

Para um especialista sério em epidemiologia, a expressão “impõe grande estresse nos


recursos de tratamento crítico nos hospitais” é um claro sinal de grande alerta. A cada semana que se
passava, os sinais eram cada vez mais assustadores, qualitativa e quantitativamente. Àquela altura,
não havia dúvidas. Só certezas.

Principalmente o Governo Federal, dotado da máquina pública mais poderosa do país,


deveria perceber que o mundo estava diante de uma potencial “bomba-relógio global”, pronta para
explodir em semanas. Porque tantos líderes mundiais não reagiram adequadamente? Porque
alguns preferiram adotar a defensiva afirmação de ser um “vírus Chinês”? Não importa a origem,
mas sim salvar vidas. E o mais importante agora, estamos aprendendo alguma lição com todas estas
perdas?

O primeiro caso confirmado de COVID-19 no Brasil ocorreu em 25 de fevereiro de 2020 no


hospital Albert Einstein, em São Paulo. Portanto, no Brasil, houve o intervalo de 22 de janeiro até 25
de fevereiro para preparação. O Governo Federal fez algo concretamente durante esse intervalo de
mais de um mês, para providenciar insumos, material publicitário e políticas para enfrentar o
coronavírus?

Apenas 4 dias depois, o relatório situacional no. 40 da OMS revela números pandêmicos
incontroláveis. Ocorria um crescimento exponencial do patógeno COVID-19 de apenas 44 casos,
concentrados somente em Wuhan, para mais de 85 mil casos espalhados por todo o planeta. Como
Bill Gates havia afirmado em 2015 e nove especialistas renomados em 2017, o mundo precisava
voltar sua atenção para ameaças epidêmicas!

E há ainda quem duvide de outros alertas cientificamente comprovados, dos quais, os


principais são as mudanças climáticas e a super-exploração dos ecossistemas. Quantos óbitos
evitáveis ainda vamos amargar, para começarmos a levar à sério tais alertas?

Na China, com um povo, governo e sistema de saúde experientes em epidemias similares, a


letalidade do coronavírus estava em aproximadamente 4,9 % até 28 de dezembro de 2020. Se toda
a população brasileira contraísse o vírus de uma só vez e se tivéssemos, somente se tivéssemos,
condições equivalentes as da China, teríamos, em tese, para além de 10,5 milhões de óbitos
evitáveis pela “gripezinha”.

O jornal de referência The New York Times publicou, em 19 de março de 2020, um artigo
intitulado “Quais países tem achatado a curva do coronavírus?”. O artigo é uma resumo do
desempenho de boa parte dos países com casos de COVID-19 até aquele momento.

Como se não bastassem todas as referências até o final de fevereiro de 2020, mais uma
excelente fonte de informação aqui. É um mapa perfeito para os líderes menos experientes, sobre
quais países contactar para encontrar as melhores medidas de contenção e sua operacionalização,

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

caso não tivessem encontrado ainda na literatura específica, ou se tivessem quaisquer dúvidas na
interpretação das mesmas.

Curvas de novos casos de COVID-19 no início da pandemia – 2020

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Fonte: The New York Times

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Nota-se nos gráficos anteriores, que China, Singapura, Coréia do Sul, Tailândia e Hong Kong
enfrentaram muito bem o início dos surtos e conseguiram controlar, pelo menos em alguns
momentos de fevereiro a março de 2020. Entrar em contato com os ministérios da saúde destes
países era fundamental, além de seguir as medidas deles para salvar vidas e ganhar tempo contra o
inimigo.

Era possível identificar o certo e o errado, no mesmo artigo, por contraste com as curvas do
mesmo documento, de países com muitos casos crescentes e sem controle, tais como Itália e
Espanha. O mesmo teria acontecido por um curto espaço de tempo com a própria China, em
fevereiro, resultando em muitos óbitos. Como se vê na curva, a China reagiu ainda em tempo e
conseguiu evitar o pior e conter o surto no final do mês de fevereiro.

À título de exemplificação do quanto as medidas de contenção e da gravidade da pandemia


eram evidentes, até mesmo um apresentador de TV identificou corretamente o que fazer, ainda em
março de 2020.

Logo depois do assustador pico de óbitos por coronavírus na Itália (dispensa referências), o
apresentador de TV, brasileiro de verdade, Marcos Mion, publica um vídeo no Youtube em
22/03/2020, parcialmente transcrito a seguir:

“[...] Eu recebi um gr|fico da J.P. Morgan, mas que faz todo o sentido, porque casa com a fala do
ministro da saúde, o Mandetta, que de 6 a 20 de abril vai ser o pico do contágio ... o nosso sistema de
saúde vai entrar em colapso ... […] Tem que parar tudo. Tem que ficar dentro de casa. [...] Use luvas,
higienize a sua mão o tempo inteiro, que a maior forma de contágio é levar a mão a qualquer mucosa.
Mucosa é nariz, boca, ouvido, botar a mão na cara. Não faça isso. Ande com álcool gel no bolso [...] O
sistema de saúde em colapso, quer dizer que você chega no hospital e você não vai ser atendido, não
tem médicos, não tem aparelhos, não tem jeito. E o que é pior de tudo, não é só por causa do corona,
mas as outras enfermidades, acidentes, acidentes domésticos, tudo continua acontecendo. E as pessoas
precisam muitas vezes de UTI, por causa dessas outras enfermidades, e não vão encontrar! Isso que
dizer que na periferia, as pessoas vão morrer na rua, vão morrer nas casas, vão morrer a caminho do
hospital, vão morrer no corredor. A gente está falando realmente de um filme de terror. [...] Todas as
autoridades estão gritando que nós vamos entrar em colapso, e que o nosso país vai ter um tombo, que
talvez seja o maior do planeta, em relação ao corona. Porque a China tomou atitude muito rápido, a
Itália demorou, e olha que aconteceu? A gente está mais ou menos como a Itália, [...] não dá nem para
comparar, na verdade [...] a Itália tem 60 milhões, nós estamos em 200 milhões [...] o nosso tombo vai
ser maior, certo? Isso é um sistema de saúde colapso, é um filme de terror que você nunca imaginou na
sua vida.”

E não é que o apresentador Marcos Mion e o ministro Mandetta, que aliás recebeu pouco
apoio do Presidente e foi demitido em abril de 2020 (!), estavam ambos certos?

Sim, o Brasil obteve o maior tombo do planeta em 2020:

a) último lugar no ranking de gestão da pandemia;

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

b) saída recorde de investimentos estrangeiros no país;


c) o real se desvalorizou muito, entre as maiores economias;
d) desemprego aumentou para 14,6%, um recorde histórico;
e) os investimentos cairam a níveis de 1968.

Além disso tudo, a vacinação está muito lenta, por não termos feito a compra antecipada.
Obviamente que não haveria vacina no mundo em breve. É a lei econômica mais óbvia: oferta e
procura. Mas a questão da vacina será melhor discutida no próximo capítulo.

E o que o presidente do Brasil dizia na mesma época? Basta que o leitor clicar aqui e assistir
o pronunciamento oficial “genial” de 24/03/2020, também no Youtube. Como pode o presidente,
com todo o poder, todo o orçamento da máquina pública, e tantos especialistas das melhores
universidades da América Latina disponíveis, errar tanto? Conforme boletim n° 10 de direitos na
pandemia, da Conectas, o Governo Bolsonaro teve a teimosia de continuar errando na maioria dos
assuntos da pandemia, initerruptamente. E porque ninguém fez nada para impedí-lo a tempo?

REFERÊNCIA DESTE CAPÍTULO

Infection prevention and control of epidemic- and pandemic-prone acute respiratory infections in
health care. Guideline. World Health Organization. ISBN 978 92 4 150713 4, 2014

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

A CORRIDA PELA VACINA CONTRA A COVID-19

A adoção das medidas de contenção, conforme seguido pelos países de melhor desempenho
logo no início dos surtos, era fundamental para se ganhar tempo contra o inimigo.

Entretanto, sabe-se que alguns governos argumentaram que o uso de máscaras, higiene e
distanciamento não poderia durar para sempre e por isso precisavam enfrentar o vírus com o
isolamento vertical ou imunidade de rebanho.

Este capítulo é necessário para evidenciar que, para um especialista que se mantive-se
atualizado, a vacina claramente não estava distante.

Em janeiro de 2021, Dr. Gonzalo Vecina Neto, fundador e ex-presidente da ANVISA, foi
entrevistado pelo Correio Braziliense. O artigo online é intitulado “Governo ‘não moveu uma palha’
pela vacina, diz fundador da Anvisa”. Não é nosso grupo portanto que afirma isso. É um especialista.

Segundo ele, todos os laboratórios produtores de vacinas, como Pfizer, Janssen, etc,
precisam primeiro de um “pedido formal”, “acordo de intenção de compra” ou “compromisso de
compra”, como queira chamar. Somente depois disso, os laboratórios entram com toda a
documentação na ANVISA. Para se ter a aprovação da ANVISA, é preciso ter CNPJ no Brasil, toda
uma estrutura no país, além do elevado custo e tempo de todo o processo junto a ANVISA.

No mesmo artigo, o Dr. Gonzalo, com razão, afirma sua posição:

“Chega a ser criminosa a forma como o Ministério da Saúde e o governo federal trataram a
questão da vacinação. Temos que cobrar da pasta sobre a forma como se comportou até agora;
abandonou a população brasileira. Se não fosse a Fundação Oswaldo Cruz e o Instituto Butantan, por
vontade própria terem ido atr|s de vacina, não teríamos nenhuma.”

De acordo com artigo online da BBC Brasil publicado em fevereiro de 2021:

“Tanto Gonzalo Vecina Neto quanto a a epidemiologista Ethel Maciel dizem que o primeiro e
maior erro foi o governo federal foi não comprar vacinas antecipadamente, ainda em 2020.

No meio do ano passado, quando fabricantes anunciaram que estavam desenvolvendo vacinas,
vários países como Chile, Colômbia, Reino Unido e integrantes da União Europeia negociaram a
compra desses produtos ainda na fase de testes.”

Ethel Maciel é epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo. Dr.


Gonzalo Vecina Neto, foi fundador e ex-presidente da ANVISA.

Ainda segundo a BBC, a Pfizer, que estava desenvolvendo vacina para COVID-19 em 2020,
respondeu à reclamação do Governo Federal do Brasil sobre certos termos considerados abusivos
no processo de compra:

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“A Pfizer rebateu, também com a divulgação de nota, dizendo que esses mesmos termos foram
aceitos por outros países que compraram a vacina, entre eles Estados Unidos, Colômbia, Chile, Reino
Unido, Japão, Equador e a União Europeia.”

Portanto, está claro, por estes dois trechos acima, que o Governo Federal do Brasil foi
excessivamente receoso e lento demais sobre a compra das vacinas.

A cada semana que passa são milhares de óbitos evitáveis que se acumulam, atrasos na
retomada da economia, desvalorização da moeda, aumento do risco-Brasil, surgimento de novas
variantes, aumento dos prejuízos com a saúde pública, enfim, o caos se agrava. Quem vai pagar essa
conta? Todos nós brasileiros! Por isso precisamos reclamar, discutir, e fazer algo para mudarmos o
status quo.

Especificamente sobre as negociações com as duas únicas vacinas disponíveis no Brasil até
fevereiro de 2021, a BBC Brasil informa:

“O governo Jair Bolsonaro aceitou a proposta da Fiocruz, mas, em outubro do ano passado,
rejeitou uma proposta do Butantan que previa a entrega de 45 milhões de doses da CoronaVac até
dezembro de 2020 e outras 15 milhões no primeiro trimestre de 2021- isso garantiria ao menos 60
milhões de doses na primeira fase de vacinação.

Na época, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, defendeu fechar o acordo, mas o presidente
Jair Bolsonaro foi contra. Pesaram na decisão uma disputa política com o governador de São Paulo,
João Doria, e a pressão de militantes de direita que levantavam desconfiança sobre uma vacina
produzida na China.

"Da China nós não compraremos. É decisão minha. Eu não acredito que ela transmita
segurança suficiente para a população pela sua origem. Esse é o pensamento nosso", disse Bolsonaro
no dia 21 de outubro, em entrevista à rádio Jovem Pan.

Depois, em janeiro, o presidente Jair Bolsonaro voltou atrás e firmou acordo para comprar as
vacinas do Butantan. O problema é que essa demora na negociação atrasou, também, o calendário de
entrega dos produtos.”

Aqui, o Governo Federal, nominalmente na pessoa do Presidente Jair Messias Bolsonaro,


demonstra preconceito contra a vacina somente pelo fato de ser da China, ao rejeitar 60 milhões de
doses da Coronavac por alguns meses, de outubro de 2020 a janeiro de 2021. Tudo indica que o
Governo Federal tem parte sobre pelo menos 3 meses de atrasos na vacinação.

O problema é que cada mês de atraso na vacinação significa um mês a mais de atraso na
retomada da economia, desgaste da população com as medidas de contenção e, como se tudo isso
não bastasse, óbitos evitáveis. 30 dias x 500 óbitos/dia (média) = 15.000 óbitos evitáveis, para cada
mês de atraso na vacinação.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Mas como tantos países acreditaram no desenvolvimento da vacina contra o COVID-19,


muito tempo antes de estar pronta? Quais eram os indícios de que a vacina seria confiável e eficaz,
se produzida em tão pouco tempo? Vacinas normalmente podem levar até dez anos para serem
desenvolvidas!

Para entendermos porque havia, ainda em 2020, fortes sinais de que a vacina contra a
COVID-19 viria logo, é conveniente voltarmos um pouco no tempo. Isto é importante, porque houve
alguns líderes que afirmaram que a vacina levaria 10 anos para ser desenvolvida, e que por isso a
única alternativa era “enfrentar” o vírus, apostando na “imunidade coletiva” ou “imunidade de
rebanho” ou ainda no isolamento vertical, enfim, ideias mirabolantes.

Não é muito difícil entender porque a imunidade de rebanho não seria viável. Primeiro
trata-se de uma doença sem cura e letal, principalmente se ocorre em picos, como se observou
claramente na Itália. Isso porque 5% dos infectados aproximadamente, precisam de ventilação
pulmonar, então as UTIs sofrem rápido colapso, e estes 5% se converter diretamente em óbitos.
Esse percentual hoje representaria 7,6 milhões de brasileiros.

Quanto ao isolamento vertical, o problema é que é teoricamente possível, entretanto


impraticável socialmente. Como preparar milhões de residencias brasileiras (34,5% delas têm pelo
menos um idoso) para isolar seus idosos por tanto tempo, enquanto toda a sociedade leva vida
normal? Isso seria cruel e teria custo muito alto, senão impraticável. Nunca houve uma política
pública clara, prática e detalhada para o isolamento vertical.

Atualmente, as vacinas são amplamente reconhecidas como um dos maiores sucessos da


medicina moderna, como explicado claramente em artigo assinado por 9 especialistas dos EUA,
Líbano e Itália. As vacinas são tão amplamente utilizadas nos programas de vacinação no mundo
para salvar milhares de vidas, que torna-se desnecessário colocar mais referências. Os
negacionistas delirantes que provem cientificamente e estatisticamente suas fantasias.

Portanto, a seguir será oportunamente explicitado os sinais de que sim, haviam dados
suficientes para inferir, com razoável probabilidade, que uma vacina para o COVID-19 seria não
somente desenvolvida, mas seria em tempo recorde. Na realidade, de fato, não somente uma, mas
uma dezena foram desenvolvidas em tempo recorde.

No ano de 1996, a revista Nature Biotechnology publicou um estudo muito amplo, com 551
vacinas desenvolvidas até aquele ano. No estudo, verificou-se que de 1983 até 1994, o tempo de
médio de desenvolvimento de uma vacina era de 10 anos.

Com o progresso científico acelerado que o mundo moderno experimenta, o


desenvolvimento rápido de vacinas estava cada vez mais visível no horizonte. Talvez não para
políticos, mas do ponto de vista da comunidade de especialistas atualizados sim, era visível.

Como já foi dito em capítulo anterior neste Dossiê, candidatas de vacina foram
desenvolvidas contra o primeiro coronavírus (SARS-CoV). Há mais de uma década atrás, um artigo
da revista Emerging Infectious Diseases de 2005 afirma:

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

“Atualmente, uma vacina de SARS-CoV inativado est| em testes clínicos na China.”

(tradução dos autores)

Sabe-se que este não era o único desenvolvimento na época. Laboratórios dos EUA e de
Oxford, Reino Unido, também possuíam candidatas a vacinas contra coronavírus. Portanto, o
caminho estava já iniciado. Apesar de aquele primeiro coronavírus possuir apenas 80% de
semelhança genética com o atual vírus causador da COVID-19, boa parte das pesquisas foram
aproveitadas.

Pode-se dizer que o desenvolvimento das vacinas contra o coronavírus da COVID-19 não
teve início exatamente em 2020, portanto, mas sim mais de uma década antes. Isto ajuda a explicar
porque tantos países aceitaram a compra antecipada da vacina. Criou-se um efeito multiplicador,
uma “bola de neve”. Os contratos de pré-venda injetaram mais e mais recursos, e assim propiciaram
o desenvolvimento em tempo recorde.

Em setembro de 2017, a CEPI, que já foi citada antes neste documento, publica uma
chamada online de propostas para para financiar tecnologias para redução no tempo de
desenvolvimento de vacinas contra epidemias.

Neste artigo, o chefe executivo da CEPI, Dr. Richard Hatchett, afirma:

“Podemos ter certeza, sem qualquer dúvida, que o mundo enfrentará outro Ebola, SARS ou até gripe
espanhola. E não estamos preparados. As vacinas podem ser a apólice de seguro que precisamos para
combater tais epidemias, quando elas surgirem.”

(tradução dos autores)

Além de notar o esforço para acelerar as vacinas, perceber também que a sigla SARS foi
utilizada nesse texto de 2017. Lembrando, o COVID-19 é SARS.

Segundo artigo de 2018 da Natural Review Drug Discovery, havia uma nova geração de
vacinas capazes de acelerar os desenvolvimentos e fabricação em grande escala, chamadas de
mRNA. No resumo do artigo, leia-se:

“As vacinas de mRNA representam uma alternativa promissora {s abordagens convencionais


de vacinas devido à sua alta potência, capacidade de rápido desenvolvimento e potencial para
fabricação de baixo custo e administração segura.”

(tradução dos autores)

Em 18 de março de 2020, o Instituto Milken publica uma lista atualizada de vacinas em


desenvolvimento contra COVID-19. A lista apresentava 40 candidatas de vacinas, já em testes pré-
clínicos! Os laboratórios de desenvolvimento estavam realmente acelerando o processo.

Esta pandemia era muito diferente daquelas restritas a países pobres da África ou somente
ao Oriente Médio, por exemplo. Não, no caso da COVID-19, muitos países ricos estavam sendo
afetados, e assim, estes investiram pesado nas vacinas. Isso era uma situação única na história: a
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combinação de 1) todo o mundo, com muitos recursos, desejando uma vacina contra a COVID-19 o
mais rápido possível com 2) toda a tecnologia e ciência do século XXI à disposição.

O NETFLIX lançou, em abril de 2020, um documentário de três episódios, denominado


“explicando o coronavírus”. No segundo episódio, lançado em 16 de junho de 2020, é evidente a
grande expectativa de muitos laboratórios com a possibilidade de vacinas mRNA para o COVID-19
já no início de 2021. Portanto, desde junho de 2020, até mesmo o grande público não especializado
já tinha acesso a essas notícias animadoras.

Evidente que decisões importantes de Saúde Pública não podem ser tomadas apenas com
base em documentários televisivos. Este episódio seria apenas um ponto de partida para estudos
mais aprofundados.

Segundo o documentário, existem 3 tecnologias de vacinas: primeira, segunda e terceira


gerações. A primeira utiliza vírus atenuado, que precisam ser cultivados por meses em ovos, um
processo lento e de difícil produção em massa. Em abril de 2020, haviam 9 candidatos de vacinas
desse tipo contra o COVID-19.

Fonte: Nature Reviews, Microbiology

A segunda geração de vacinas é mais segura do que a primeira, porque utiliza somente o
antígeno, que são como as “chaves” que o COVID-19 utiliza para entrar nas células do nosso corpo.
Haviam 72 vacinas (!) desse tipo em desenvolvimento em abril de 2020. Com esse antígeno, que
também precisa ser cultivado, o corpo consegue aprender a se defender, e então se tornar imune ao
vírus.

Em abril de 2020, eram 27 candidatas de vacina da terceira geração, a mais avançada, que é
denominada mRNA. Esta vacina entrega ao corpo somente as instruções genéticas para que as
células do corpo da pessoa vacinada fabrique os antígenos do vírus.

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Dessa forma, é como se aquele tempo de “cultivo” fosse realizado dentro do corpo do
indivíduo vacinado. Tem-se uma vacina muito segura, e a produção pode ser aumentada muito
rapidamente, acelerando o desenvolvimento e entrega das encomendas de milhares de doses de
vacina necessárias já na fase de testes clínicos.

Com estes dados em mãos, os Ministérios de Saúde deveriam aprofundar os estudos,


contactar os laboratórios frequentemente e tudo o mais que fosse preciso para ter os sinais claros e
suficientes sobre o potencial desses desenvolvimentos. A saúde de grande parte da população
estava em jogo. Mas porque não o fizeram?

Em 30 de abril de 2020, lê-se, em artigo online da revista The New York Times, que 7
grandes laboratórios de pesquisa estavam avançando na fase de testes clínicos de vacinas de mRNA
contra o COVID-19:

 Cansino;
 Biontec-Pfizer;
 Moderna;
 Inovio;
 Sinovac;
 Oxford;
 Imperial College.

Na realidade, no final de abril de 2020, considerando também as vacinas em estágios


anteriores aos testes clínicos, haviam 95 vacinas diferentes na corrida, de acordo com o artigo da
The New York Times. Será que um líder de uma nação poderia afirmar com certeza que nenhuma
dessas 95 vacinas teria sucesso?

Parecia mais prudente acreditar que seria possível sim, já que haviam tantas candidatas. Era
preciso monitorar os desenvolvimentos, os investidores, os países, os contratos de compra
antecipada que viriam a ser celebrados, para que o Brasil não ficasse para trás.

Ainda no artigo da The New York Times, tem-se a seguinte afirmação:

“Felizmente, j| temos um avanço na primeira fase do desenvolvimento de vacinas: a pesquisa. Os


surtos de SARS e MERS, que também são causados por coronavírus, estimularam muitas pesquisas. O
SARS e o SARS-CoV-2, o vírus que causa o COVID-19, são aproximadamente 80% idênticos e ambos
usam as chamadas proteínas de pico para se agarrar a um receptor específico encontrado nas células
dos pulmões humanos. Isso ajuda a explicar como os cientistas desenvolveram um teste para Covid-19
tão rapidamente.”

(tradução dos autores)

Em 5 de maio de 2020, a CEPI anuncia em seu site a nona parceria para desenvolvimento de
vacina contra o COVID-19. Muito mais poderia se informar sobre os investimentos,
desenvolvimentos, laboratórios referentes as vacinas contra o COVID-19, porque os sinais das

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vacinas no horizonte eram tão abundantes quanto os sinais de sucesso das medidas de contenção
contra o COVID-19, enquanto a vacina não chegava.

Antecedendo os testes clínicos, a primeira etapa no desenvolvimento de vacinas é a criação


de candidatas a vacinas, como se fossem “protótipos”. O tempo desta primeira etapa vinha caindo
ano após ano. De acordo com o episódio já citado da NETFLIX, um protótipo de vacina SARS, 2002,
foi criada em 20 meses. Para EBOLA, 2014, em 7 meses. E para ZIKA, 2016, em apenas 6 meses. Mas
para a COVID, 2019, todos os recordes anteriores foram quebrados. Uma candidata contra COVID-
19 foi criada em apenas 65 dias!

Os fatos anteriores citados neste capítulo mostram que haviam muitas apostas no
desenvolvimento de vacinas para COVID-19, de tal forma que se fazia urgente a celebração de
compra antecipada destas para garantia de doses suficientes.

Um artigo online da revista Nature de 30 de novembro de 2020, consta que até aquela data,
mais de 10 bilhões de doses de vacinas contra COVID-19 estavam encomendadas. Desse montante,
quantos milhões de doses o Brasil já havia encomendado na época? Eis uma questão a ser
respondida pelo Governo Federal, com provas rastreáveis àquela data.

Até março de 2021, segundo documento online do Instituto Milken, já citado anteriormente,
haviam 11 vacinas em uso contra COVID-19 no mundo, com 251 em desenvolvimento.

Os países que hoje têm as vacinas contra o COVID-19 mais baratas e em maior quantidade,
fizeram compras antecipadas muito antes que qualquer agência sanitária de qualquer país tivesse
as aprovado. Evidentemente, se os países investidores fossem esperar injetar recursos somente em
vacina finalizada e com 100 % de chance de ser aprovada, levaríamos muito mais tempo para a
descoberta da vacina para COVID-19. É com investimentos antecipados, mesmo que haja riscos, que
a ciência e tecnologia evoluem. Investimentos, este é o motor dos avanços tecnológicos, e do
desenvolvimento das nações.

REFERÊNCIAS DESTE CAPÍTULO

Inaya Hajj Hussein, Nour Chams, Sana Chams, Skye El Sayegh, Reina Badran, Mohamad Raad, Alice
Gerges-Geagea, Angelo Leone, Abdo Jurjus, Vaccines Through Centuries: Major Cornerstones of Global
Health, Grupo Frontier, 2015

Struck, Mark-M., Vaccine R&D success rates and development times, Nature Biotechnology, volume
14, maio de 1996

Norbert Pardi, Michael J. Hogan, Frederick W. Porter e Drew Weissman, mRNA vaccines — a new era
in vaccinology, Nat Rev Drug Discov. Abril de 2018; 17(4): 261–279

Shibo Jiang, Yxian He e Shuwen Liu, SARS Vaccine Development, Emerging Infectious Diseases, julho
de 2005

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

A FALSA DICOTOMIA ECONOMIA x SAÚDE PÚBLICA

A pergunta que não quer calar é porque tantos governos foram irresponsáveis com a Saúde
Pública? Porque tantos setores da sociedade, como falsos líderes religiosos, obscuros canais de TV,
jornalistas inexcrupulosos, etc, defenderam “tratamentos” e “medidas” absurdas? E os médicos que
receitaram remédios sem comprovação, alguns até com efeitos adversos graves? Estes não terão
suas licenças e diplomas cassados, bem como responsabilizados por influenciar a opinião pública
tão negativamente?

Alguns governos alegaram que seria melhor manter a “vida normal”. Isto resultaria na
contaminação massiva em pouco tempo, em máxima velocidade exponencial, e o resultado já
sabíamos desde o ínicio pelo exemplo da Itália.

Esses governos precisam apresentar artigos científicos e estudos sólidos, com dados
econômicos dos seus países, todos estes à época, para comprovar que suas decisões eram as
melhores e eram baseadas em previsões confiáveis e fatos concretos, melhores do que as medidas
corretas.

A Universidade de Cambridge está entre as 10 melhores universidades do mundo, e já


produziu 82 prêmios nobel, em seus 8 séculos de história. O Journal of Benefit-Cost Analysis da
Universidade de Cambrigde publicou, em maio de 2020, um estudo sobre as vantagens em se adotar
as medidas de distanciamento social contra a COVID-19.

No estudo preditivo, conclui-se que a adoção do distanciamento resultaria em 5,2 trilhões


de economia para os EUA. Ou seja, a sua não-adoção, leva a um prejuízo de 5,2 trilhões de dólares.

O trecho que declara isso é:

“Usamos previsões epidemiológicas e econômicas para realizar uma r|pida an|lise de custo-benefício
do controle do surto de COVID-19. Supondo que as medidas de distanciamento social possam reduzir
substancialmente os contatos entre os indivíduos, encontramos benefícios líquidos de cerca de 5,2
trilhões de dólares em nosso caso de referência.”

(tradução dos autores)

Em 1919, ocorreu uma forte epidemia de gripe espanhola nos EUA e muitas cidades
adotaram o lockdown, mas nem todas. Era uma doença contagiosa que, assim como a COVID-19,
poderia ser contida com distanciamento social.

Ortigos online da BBC News Brasil, do El país Brasil e do Sindicato do Comércio Varejista do
Estado de São Paulo, todos publicados antes de 8 de abril de 2020, são unânimes em afirmar que
aquelas cidades americanas que adotaram o distanciamento social, cresceram mais após a gripe
espanhola.

Portanto, ambos os exemplos citados neste capítulo apontam para um melhor custo-
benefício para a adoção de medidas de contenção, em detrimento da não-adoção de medida alguma.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Não é muito difícil entender o porque disso. Faz sentido. Um lockdown bem feito, rápido e
forte, é capaz de quase zerar a transmissão. Isso ocorre para doenças contagiosas que dependem do
contato próximo. Depois que os casos ativos transmitem para os seus familiares, ocorrerá a
interrupção quase total de novos casos. Depois de algumas semanas, dependendo do ciclo do
patógeno em questão, o lockdown pode ser interrompido e a partir daí sim, a vida volta
praticamente ao normal. Este é o motivo pelo qual é muito lucrativo fazer um bom lockdown.

Conforme já relatado neste Dossiê, foi exatamente um lockdown eficiente que a Nova
Zelândia fez, com liderança, competência e rigor, de 24/03/2020 até 27/04/2020. A partir daquela
data, a vida do povo neozelandês passou a ser quase como antes da pandemia por todo o ano de
2020 (!), muito antes da vacina. Festas sem máscara, trabalho normal, transportes funcionando,
poucos óbitos, economia em recuperação.

Evidentemente, já que parte do mundo não fez igual à Nova Zelândia, a quarentena de 14
dias para visitantes continuou necessária por muito tempo. Mas, a transmissão sustentada não
existia mais. Era quase zero casos durante muito tempo ao longo de 2020, depois de um lockdown
bem feito!

Agora vamos ao outro extremo! É simples, basta constatar a destruição social, política e
econômica do Brasil em 2020/2021, incluindo agora a “nova” variante, esta que não tem na verdade
nada de novo. Era também previsível.

Variantes, com consequências graves, surgiram em todos os países que tiveram grande
quantidade de casos. Quanto maior o número de multiplicações de um vírus, maior a chance de
novas variantes. Isso é estatística básica.

Assim, a falta de um lockdown eficiente, no caso de doença contagiosa letal sem tratamento
eficaz, é a causa de inúmeros problemas, pois resulta em prejuízos com:

 leitos extras de UTI;


 diárias extras de UTI, com atraso no tratamento de outros doentes;
 equipamentos de ventilação pulmonar;
 medicamentos para intubação;
 contratação de mais pessoal médico;
 despesas funerárias;
 redução da atividade econômica por tempo indeterminado;
 pagamento de auxílio financeiro por tempo indeterminado;
 incertezas econômicas, com fuga de capitais;
 surgimento de mutações do vírus, com complicações adicionais;
 assistência social a famílias e sequelados sobreviventes;
 outros prejuízos.

Assim, encerra-se a questão da falsa dicotomia entre economia versus medidas de


contenção contra o COVID-19. Aqueles que discordam, apresentem documentos científicos
melhores, que afirmem o contrário.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

REFERÊNCIAS DESTE CAPÍTULO

Linda Thunström, Stephen C. Newbold, David Finnoff, Madison Ashworth e Jason F. Shogren, The
Benefits and Costs of Using Social Distancing to Flatten the Curve for COVID-19, Cambridge University
Press: 21 de maio de 2020

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

A “SURPRESA” COM AS NOVAS VARIANTES MAIS DESTRUTIVAS

A evolução genética de vírus é algo complexo. É preciso sermos honestos neste capítulo. Há
centenas de fatores que afetam as chances de surgirem mutações de uma espécie de vírus.

Por isso, para manter a tarefa o mais simples possível e ainda útil, o único ponto que se quer
esclarecer neste capítulo é que um grande número de infectados resulta em mais alta probabilidade
de emergir mutações agressivas, mais letais ou mais contagiosas, em relação a um pequeno número
de infectados. Ou seja, defende-se aqui que quanto maior o números de infectados, maior a chance
de surgir desastrosas mutações.

As novas variantes de vírus adicionam complexidade e imprevisibilidade à já presente crise


sanitária e econômica. É uma péssima ideia permitir que isso aconteça, mas é exatamente o que
ocorre quando o número de casos é grande.

Como está mais evidente à população em geral agora (especialistas já sabiam há muito
tempo), estas variantes podem ser mais transmissíveis e/ou mais letais. Sempre se soube disso, no
instante em que se comparou as diferenças entre o SARS, 2002, o MERS, 2014 e o COVID-19. Todos
estes são vírus similares, se diferenciando, por exemplo, na taxa de contágio e na letalidade. Supor
que mutações do COVID-19 poderiam ser mais letais ou mais contagiosas era razoável.

A possibilidade do surgimento de mutações só reforçam ainda mais a necessidade de se


trabalhar desde o primeiro caso confirmado, para evitar ao máximo os grandes surtos, ou grandes
ondas. Estas mutações mais destrutivas acrescentam descontroles, imprevisibilidades e colapsos
econômicos, sociais, hospitalares e políticos.

Qualquer estudante de biologia do ensino médio aprende o evolucionismo a probabilidade


aplicada a genética. Desde que não doutrinado na anti-científica origem divina, aprende que as
mutações genéticas dominantes tem mais chances de sucesso quanto maior o número de eventos
reprodutivos. Simples assim.

É lei básica da estatística.

É possível jogar um dado 10 vezes e não resultar no número dois nenhuma vez. Mas ao
jogarmos um dado, desde que não viciado, insistentemente por 1.000 vezes, certamente o número
dois surgirá muitas vezes. Digamos que a destruidora mutação de maior contágio ou letalidade
seria o número dois neste exemplo.

Para provar que isso é senso comum, até mesmo usuários de um site não cientificamente
monitorado, é capaz de dar a resposta para a pergunta inicial deste capítulo. Neste link do site
Reddit há 370 respostas, algumas afirmando que sim, uma maior população infectada, resulta em
maior chance de mutações viáveis. Nenhuma das 370 respostas nega tal afirmação, pelo contrário,
vão além com base nela.

Como foi dito, até estudantes de ensino médio podem entender isso, nem é preciso ser um
grande especialista em epidemiologia ou um gênio. Portanto, é risco excessivo qualquer estratégia
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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

que envolva grande número de casos, para doença fatal, contagiosa e sem tratamento eficaz no ano
de 2020.

Uma daquelas respostas é particularmente interessante. Embora seja de longe uma


referência científica, é dotada de sabedoria e bom senso:

“É muito similar a um fogo na floresta. Um foco pequeno e isolado é facilmente controlado. Um vez que
se espalha, os recursos requeridos para controlá-lo, e os danos subsequentes são muuuuuito maiores.
Se a direção do vento (mutação) mudar, derepente uma população completamente nova de
combustível se torna disponível e o fogo pode se espalhar novamente.”

(tradução dos autores)

O contexto deixa claro que mutação se refere a variante ou cepa de coronavírus. São
sinônimos.

Em artigo científico da Revista National Science Review de janeiro de 2020, já se


manifestavam as preocupações quanto ao acompanhamento de mutações do coronavírus recém-
descoberto em Wuhan:

“... um monitoramento cuidadoso das mutações, evoluções e adaptações é necessário ... O vírus
humano-infeccioso pode ser tornar mais infeccioso mas menos virulento na medida em que
continua a (co-) evoluir e se adaptar aos hospedeiros humanos.”

(tradução dos autores)

Ou seja, um artigo tão antecipado quanto janeiro de 2020 já alertava o mundo para uma
possível mutação que pudesse alterar os rumos daquele que aparentava momentaneamente ser
apenas um surto local à região de Wuhan.

Em artigo de fevereiro de 2020 do The Telegraph do Reino Unido, facilmente acessível na


www:

“A Dra. Nathalie MacDermott, professora do National Institutes of Health Research no King’s College,
Londres, afirma que vírus sofrem mutações o tempo todo – frequentemente as mutações tem pouco
efeito, mas elas podem tornar o vírus mais forte ou mais contagioso.

Ela afirma que uma única mutação no vírus Ebola durante a epidemia de 2014-16 no leste africano,
onde em torno de 11 mil pessoas morreram, significou que a doença se tornou mais contagiosa.”

(tradução dos autores)

Ou seja, aqui tem-se mais um sinal de que mutações podem causar grandes problemas. Não
é nada de novo, portanto, que esses eventos mutacionais aleatórios, quando ocorrem em grande
quantidade, resultem em trágicos surtos com consequências fatais.

Em 17 de março de 2020, um artigo da revista Journal of Virology declara:

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

“É alarmante que nossos dados prevêem que uma mutação simples N501T (correspondente a mutação
S487T no SARS-CoV) pode aprimorar significativamente a afinidade de conexão entre o 2019-nCoV
RBD e o ACE2 humano”

(tradução dos autores)

Ou seja, o texto afirma que uma pequena mudança nos genes do coronavírus pode criar uma
epidemia bem mais perigosa. Mais uma vez, é péssima ideia qualquer plano que permita aumento
de casos de COVID-19 descontroladamente, como é o caso dos EUA, Brasil, México, entre outros
desastres, pela alta probabilidade de surgir novas cepas mais destrutivas.

Segundo a OMS, o Vietnã, com mais de 90 milhões de habitantes e PIB/capita menor que
metade do brasileiro, aplicou todas as medidas rigorosas e, segundo painel da OMS, teve menos que
1.500 casos de COVID-19 em todo o ano de 2020. Não há variante Vietnamita até o fim de 2020
porque a pequena quantidade de casos foi muito pequena e assim a probabilidade de surgir uma
variante qualquer é menor.

O Brasil, ao revés, “cultivou” quase 8 milhões de casos confirmados de COVID-19 no mesmo


período de tempo.

Agora, vejamos quantas replicações ocorreram com o vírus nestes 2 países. Segundo artigo
científico do National Institute of Health dos EUA, cada paciente infectado com o COVID-19 possui
um pico de um bilhão de partículas virais dentro do seu corpo, o que ocorre ao longo de 14 dias na
maioria dos casos.

Portanto, matemática simples, as replicações do COVID-19 em cada país é estimada


multiplicando-se o número de casos confirmados da doença pelo número de virions em cada
pessoa:

BRASIL, 8 milhões de casos x 1 bilhão virions = 8 quatrilhões de eventos

VIETNÃ, 1.500 casos x 1 bilhão de virions = 1,5 trilhão de eventos

O Brasil tem certamente muito mais chances de desenvolver (ou talvez a palavra melhor
seja cultivar?) novas variantes viáveis do que o Vietnã, por exemplo. Talvez algo como 5.000 vezes
mais chance. Em qual país seria esperado novas variantes mais agressivas?

Portanto, qualquer estratégia que envolva um grande número de contaminados, tais como
imunidade de rebanho ou isolamento vertical, significa assumir riscos sabidamente elevados. É o
que todas as referências científicas confiáveis anteriores a abril de 2020 revelam claramente.

Novas variantes imprevisíveis são mais um fator que justifica o melhor custo-benefício em
sufocar os surtos logo no início com adoção das medidas comprovadas na prática como as mais
eficazes.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Neste momento do Dossiê, acredita-se não ser necessário acrescentar mais justificativas
para provar, tanto que era certo o surgimento de mutações quanto que a única estratégia viável
seria simplesmente imitar os países bem-sucedidos. Também já não é necessário evidenciar mais
referências a tais países de excelência. Tudo já foi fartamente esclarecido.

Já há referências científicas suficientes. Cabe aos irresponsáveis que defenderam outras


medidas, trazer à luz da sociedade e dos tribunais, as provas científicas à época em que suas
medidas arriscadas foram aplicadas, tanto para salvar vidas quanto para preservar a economia.

REFERÊNCIAS DESTE CAPÍTULO

Xiaoman Wei, Xiang Li, Jie Cui, Evolutionary perspectives on novel coronaviruses identified in
pneumonia cases in China, National Science Review, 29 de janeiro de 2020

Yushun Wan,a Jian Shang,a Rachel Graham,b Ralph S. Baric,b Fang Lia, Receptor Recognition by the
Novel Coronavirus from Wuhan: an Analysis Based on Decade-Long Structural Studies of SARS
Coronavirus, Journal of Virology, publicado em 17 de março de 2020

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

CONCLUSÕES

Referências confiáveis mostraram as medidas corretas contra a COVID-19 desde o ano de


2004, bem como os países que eram exemplo na contenção dos primeiros surtos, tão cedo quanto
março de 2020.

Desde 22 de janeiro de 2020, a OMS entres muitas outras instituições sérias já indicavam
alto risco de pandemia.

As candidatas a vacinas para SARS,2002, EBOLA, ZIKA, entre outros, mostraram aceleração
no desenvolvimento de imunizantes. Pelo volume de investimentos nos 7 laboratórios
desenvolvendo vacinas em fase clínica, por terem aproveitado estudos de vacinas para SARS, 2002,
haviam consideráveis indícios, a partir de 30 de abril de2020, de que a ciência alcançaria o feito tão
esperado em tempo recorde.

Predições da Universidade de Cambridge de maio de 2020 e dados da pandemia da gripe


espanhola de 1919 indicavam que o melhor para a economia eram as medidas de contenção
eficazes: distanciamento social, máscaras, higiene das mãos, testes e rastreamentos, controle de
fronteiras e até lockdown.

Não é surpresa que os países com maior número de casos sejam os que se surpreenderam
com as variantes mais contagiosas ou mais letais. Isto é fato estatístico que estudantes do ensino
médio têm conhecimento. É mais um motivo principalmente para a adoção precoce das medidas de
contenção, mas também a qualquer tempo não havendo a vacinação em massa.

Recentemente, o mundo se deparou com o fato de que as notícias falsas digitais, ou


fakenews, tem o poder de influenciar em BREXIT, em resultados de eleições, entre outras decisões
que afetam significativamente as democracias.

Mas agora o mundo se choca com a evidência de mais um poder mortal das fakenews,
associada com a falta de profissionalismo e negacionismo, tudo isso em pleno século XXI. Apesar
dos esforços, “alguma coisa está fora da nova ordem mundial”, como diria Caetano.

Não era tão óbvio que a tragédia humanitária do COVID-19 e a incompetência política eram
evitáveis, dado o número razoável de países que arriscaram a vida dos seus povos por medidas não
comprovadas cientificamente, e portanto potencialmente suicidas.

Para deixar bem claro: a ausência de medidas ou a adoção de quaisquer outras


medidas não comprovadas cientificamente, durante pandemia de doença mortal sem cura,
foi, é e sempre será genocídio em potencial. É roleta russa. Esclarecer isso foi o objetivo deste
Dossiê. Não se aplica somente à COVID-19.

Em qual elo a cadeia vital de informação se rompeu? Como de praxe, é mais provável que a
falha tenha ocorrido na comunicação entre áreas distintas, ou seja, entre o ministro da saúde e
outros ministros, ou entre o ministro da saúde e o presidente (ou primeiro-ministro). Estes elos de
falha estão destacados em vermelho.
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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Pesquisadores na fronteira da ciência

Especialistas em epidemiologia e saúde pública

Ministro de Saúde Outros ministros

Presidente Política de saúde pública

Esquema simplificado de demanda de políticas de saúde pública

Fonte: autoria própria

Sabe-se que os óbitos por COVID-19 não são distribuídos igualmente pela população, mas
sim é um genocídio seletivo. Talvez a maior lição da pandemia seja a necessidade de resolver
constitucionalmente (nas leias mais fundamentais) o falso dilema entre economia e saúde pública,
bem como a obrigatoriedade de uso da ciência, na base das decisões governamentais dos países. Os
políticos precisam ser mais restringidos.

Precisamos realizar a importância dos avôs e das avós para as suas famílias, em especial
para os seus netos. Quem tem memória de avô ou de avó, sabe o que isso significa. Devem lembrar o
que é ser amado na infância.

Infelizmente, parece que deixamos morrer algo que já está em falta hoje no mundo, e
provavelmente nos fará ainda mais falta no futuro. Como seríamos, como humanidade, se não
tivéssemos avôs e avós... essa é a grande questão! É isso que está em jogo, pois sabe-se desde o
início da pandemia, que entre as vítimas fatais, 85% é de idosos.

É errônea também a justificativa de que os países com mais idosos são os que tiveram pior
performance. Isto também é anti-científico e vai contra as evidências. É transferir covardemente a
responsabilidade das gestões incompetentes sobre a própria população que é assassinada.

Há uma infinidade de justificativas que os líderes políticos utilizaram para não adotarem as
medidas corretas. Na realidade, havendo fácil acesso as medidas bem detalhadas e comprovadas de
contenção contra o COVID-19, qualquer nova proposta de substituição ou eliminação destas recai
na responsabilidade de quem as propõem. Espera-se, no mínimo, que se apresentem provas
científicas para tais mudanças.

Realmente não há como determinar, com grande precisão, que a desinformação A ou B


resultam em exatamente 30% ou 60% mais óbitos respectivamente, por exemplo. Mas sim, é
cientificamente correto afirmar que a desinformação A ou B influenciaram decisivamente nos
óbitos, que eram em sua maioria, evitáveis.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

A tabela a seguir mostram algumas justificativas dos políticos, e ao lado as explicações do


porque são inverdades.

Afirmação falsa Motivo de ser falsa

Países com mais idosos tem mais Falso. Os dados de % de idosos e performance na gestão da
óbitos. pandemia, detalhados aqui neste Dossiê, mostram que não
há esta correlação.

A pandemia é culpa da mídia. Falso. Não há qualquer evidência científica entre mídia e
contágio ou letalidade da COVID-19. Tal relação é tão
absurda, que isso nem sequer está na agenda de qualquer
pesquisa séria. Ao revés, a mídia é de vital importância na
divulgação ampla das medidas de contenção à população.

A adoção das medidas de Falso. Evidentemente um Lockdown muito longo é


contenção causa tanto desemprego prejudicial. Exatamente por isso, deve-se fazer um
que resulta em mais mortes do que Lockdown bem feito, para que seja curto e eficiente.
o próprio vírus. Exemplo disso é a Nova Zelândia.

Zinco, sol, exercícios físicos são Falso. Não há cura, não há tratamento precoce. Tais
suficientes para evitar o COVID-19 medidas simplesmente não insuficientes, frente a certas
doenças muito agressivas. Seria como quere curar a AIDS,
que também envolve o sistema imunológico, com tais
medidas. Não é suficiente.

A letalidade do COVID-19 é de Falso. Apenas a letalidade não é parâmetro suficiente para


apenas 3,5%, portanto não há com prever o poder destrutivo de um coronavírus.
o que se preocupar.

Fonte: autoria própria

O que será de nós se não lutarmos agora para evitar que outras tragédias como essa
pandemia se repitam? A opinião dos autores é que vão se repetir, se as leis não forem revistas.
Talvez seja preciso responsabilização dos líderes. Essa pandemia é resultado da relação entre os
homens, não é um evento natural súbito, como um tsunami ou terremoto.

Bastava que os países menos experientes adaptassem as medidas de contenção do Vietnã,


Coréia do Sul ou Tailândia, e teríamos evitado milhares de óbitos por todo o mundo. Porque isso
não foi feito o quanto antes? Os óbitos eram definitivamente evitáveis.

A OMS agiu com propaganda massiva a favor das medidas de contenção? A OMS não tem
autonomia suficiente para isso? Não seria o caso então, de rever o grau de independência da OMS?

Bastava mais bom senso e menos delírios, mais pesquisa epidemiológica e menos
negacionismo científico. Mais coragem, governantes, para enfrentar a falsa dicotomia de que conter

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

o vírus seria pior economicamente. Mais humanidade e menos desprezo aos idosos, senhores
“líderes do mundo”.

Não surpreende tanto a truculência e o negacionismo da classe política e parte da classe


empresarial. São nos momentos críticos da maior crise sanitária global nos últimos cem anos, as
pessoas se revelam. O pior é o povo sem educação não conseguir avaliar o cenário todo.

Parece razoável pensar que 2.554.694 óbitos evitáveis é resultado muito ruim para o século
XXI, dado os avanços da medicina contemporânea. Em especial nos países com pouca vacinação, o
genocídio que continua a ocorrer initerruptamente no mundo hoje é uma tragédia sanitária sem
precedentes no mundo moderno. É preocupante isso acontecer no século XXI. O que poderá vir pela
frente?

A seguir, uma lista de possíveis causas da não-adoção das medidas de contenção contra o
COVID-19, o que pode trazer alguma luz para a questão. Certamente, o objetivo desta lista não é
esgotar o assunto. Jamais. É outrossim, instigar a reflexão e investigação dos fatos concretos que
levaram à pandemia. Esta pandemia não é causada pelo vírus, mas sim pela incompetência.

Certamente, a causa da desastrosa gestão de certos países foi uma combinação dos fatores
acima, não havendo uma causa única.

Os líderes das nações do mundo, principalmente dos países de dimensões continentais com
muito mais recursos disponíveis, teriam a obrigação de dominar os desafios, de assumir o
protagonismo, ou de se cercarem dos melhores especialistas, para vencerem com o melhor
custo/benefício possível.

Os países com desastrosa gestão da pandemia (Estados Unidos, Irã, Colômbia, México e
Brasil, por exemplo) deverão, cada qual, fazer as devidas investigações. Isto não é vingança, mas
justiça, muito importante para evitar novos genocídios no futuro.

Esse vírus não é Chinês ou dos laboratórios de vacinas. As investigações devem confirmar
ou não se essa pandemia é resultado da onda de individualismo, de ganância, de egoísmo, de
desumanidade e do desrespeito com os idosos.

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DOSSIÊ 2020: A MAIOR PANDEMIA DOS ÚLTIMOS CEM ANOS Conscience

Causas da má gestão da pandemia Possíveis soluções

nível intelectual, experiência em gestão e de Deveriam ter humildade para delegar e


alfabetização científica dos líderes confiar nos especialistas.
(negacionistas não servem para liderar no
século XXI)

grau de polarização da população (povo mais Os líderes deveriam ter discurso de união
polarizado se une menos em torno de causa e/ou fazer uma linguagem de comunicação
comum) específica para cada grupo

extensão territorial Os líderes deveriam adotar uma estratégia


nacional, em consenso com os estados, mas
delegar aos estados a execução adaptada às
suas particularidades, além de adotar níveis
diferentes de alerta COVID-19, conforme o
grau de surto de cada região.

nível de desenvolvimento em epidemiologia O país deveria contratar conselheiros de


países mais experientes em epidemias de
coronavírus – foram duas antes da de 2020

nível de respeito aos idosos Não havia tempo hábil para mudar a cultura
da população. Sugere-se divulgar vídeos dos
idosos sofrendo nas UTIs como estratégia de
sensibilização.

capacidade de adaptação das instituições e Não havia tempo para grandes melhorias, por
unidades de saúde isso mesmo o controle precoce dos surtos de
casos, não de óbitos, é a melhor, mais segura
e mais barata medida, enquanto se esperava
pela vacina.

Grau de confiança da população nos líderes essa confiança aumentaria na medida em que
que criam as políticas de saúde pública a população observasse poucas mortes no
país, em relação à outros países. Simples
assim. Lamentavelmente, no Brasil ocorreu
exatamente o contrário, e nada foi feito para
evitar o pior.

Conscience

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