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136-O Inverno

Tenho vindo, no âmbito desta rubrica musicológica, a apresentar-vos as quatro estações do ano
aproveitando-as para fazer ouvir a obra de Vivaldi com o mesmo nome.

Como já falei antes, são quatro concertos supostamente compostos tendo como ideia criativa quatro sonetos
provavelmente também eles da autoria de António Vivaldi. Relembro que a forma musical «concerto»
desenvolve-se à volta do diálogo de um instrumento ou pequeno grupo de instrumentos com toda a
orquestra. No tempo de Vivaldi, a orquestra era somente constituída por instrumentos de corda friccionada,
ou seja, da família dos violinos. Os instrumentos de sopro quando apareciam era como solistas. No caso
destes concertos das Estações, quem sola é o Violino que toma o nome de Concertino.

Não vale a pena sublinhar que os invernos de hoje não têm o mesmo rigor dos de antigamente. Basta-me
recuar à minha infância e lembrar as invernias da terra onde cresci, a Campeã, quase no alto do Marão. Não
havia inverno que não nevasse uns dias seguidos para nossa alegria. Além de não irmos à escola, a diversão
eram os bonecos de neve, construídos a partir da neve que se nos acumulava nas chancas ou nos socos que
calçávamos. Para além do «sku» nas encostas, que era como chamávamos a uma tábua onde nos
sentávamos e bota escorrega por aí abaixo.

Temperaturas abaixo dos zero graus eram mais que habituais. A geada que se formava após os nevões, além
de a conservarem, criavam os nossos gelados da água que escorria das lousas dos telhados a que
chamávamos sincelos. Não sou dos que diz «bons tempos» porque esses tempos não foram assim tão bons,
embora tivessem proporcionado experiências hoje quase impossíveis de repetir. Tenho na memória o meu
pai a ir à fonte à água e a enterrar-se até às coxas na neve. E trazia água quando a havia; que, de vez em
quando gelava no cano que a trazia da nascente! Aí, a minha mãe conseguia a água para cozinha derretendo
a neve, já me não lembro se dentro dos potes ou das panelas.

Mas vamos à música. Vou deixar tocar todo o 1º andamento, construído sobre estes versos: «Tremendo de
frio, no meio de cortantes ventos, os dentes tremem de frio». Embora o solo pertença, originalmente, ao
Violino, gostei muito desta interpretação solista do violoncelista croata, Luka Sulic.

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