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A temática de desigualdade de gênero e a suposta superioridade do homem em relação à

mulher, está presente na sociedade desde a antiguidade. Diante do cenário patriarcal,


onde a concepção social é de que a mulher é responsável por cuidar do lar, criar os filhos
e realizar os serviços domésticos enquanto o homem trabalha e sustenta sua família,
somente começou a sofrer mudanças a partir da Revolução Francesa, onde as mulheres
começaram a reivindicar seus direitos, embora tenham continuado sofrendo com a
submissão. Já no século XX, com a ida dos homens para as guerras mundiais, a mulher
começou a se inserir no campo do trabalho, ganhando seu espaço e mostrando sua
capacidade. Diante disso, pouco a pouco as mulheres foram lutando por sua
emancipação e igualdade perante os homens, mostrando que eram capazes de realizar
as mesmas funções que eles, trabalhar e estudar, não se restringindo ao âmbito
doméstico. Contudo, ainda hoje, há a concepção de que a mulher é responsável por
cuidar do ambiente doméstico e de criar os filhos, ou seja, lhe foi atribuída uma dupla
função: o trabalho externo e o do lar (ROSA; LOPES; FRANCISCHINI, 2017).

Atualmente, o sexo feminino ainda é acometido pela desigualdade, pela violência


física, psicológica e moral, situações machistas que impactam diversas mulheres
brasileiras. Posto isso, viu-se a necessidade da criação de uma lei federal de proteção à
mulher vítima de violência no ano de 2006, decorrente do caso de Maria da Penha, uma
mulher que ficou paraplégica após ser brutalmente agredida pelo marido. Esta lei visa
proteger a mulher vítima de violência doméstica ou familiar, ou seja, aquela que ocorre
dentro de casa ou entre familiares, seja abuso físico, sexual, psicológico, negligência ou
abandono. Dentre as punições previstas ao agressor, temos a saída do agressor do
domicílio e a proibição de aproximação da vítima (ROSA; LOPES; FRANCISCHINI, 2017).

No ano de 2020, se espalhou pelo mundo uma pandemia devido ao contágio pelo
novo corona vírus, que até então era desconhecido pela ciência e poderia ser letal. Diante
deste cenário, adotou-se uma medida mundial de isolamento social a fim de conter a
propagação do vírus, fazendo com que a população se mantivesse dentro de casa em
tempo integral para se protegerem. Esta nova realidade fez com que os índices de
violência doméstica aumentassem bruscamente no Brasil, devido à ampla convivência
familiar forçada, instabilidade emocional e econômica da população. De acordo com a
Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos, registrou-se um aumento de 18% no volume
de denúncias de violência doméstica no Brasil, entre os dias 1 e 25 de Março de 2020,
mês que iniciou o lockdown no Brasil. A partir disso, o acesso aos serviços de apoio às
vítimas, foi reduzido e as vítimas evitam a busca de ajuda presencial devido ao temor do

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contágio pelo novo corona vírus, fazendo com que a procura por plataformas digitais e
canais de atendimento online ganhassem espaço. Além disso, a utilização de redes
informais de suporte social tem um papel importante no encorajamento, identificação e
rede de apoio entre vítimas, bem como servem como uma alerta aos agressores de que
as mulheres estão se aliando em prol desta causa (VIEIRA; GARCIA; MACIEL, 2020).

Em se tratando de redes de apoio e meios para buscar auxílio em casos de


violência doméstica, as redes sociais vêm sendo amplamente utilizadas como forma de
procurar ajuda e ganhar visibilidade a respeito da agressão. Em Dezembro de 2020, uma
jovem moradora de Campo Grande, utilizou a própria rede social para denunciar
agressões e ameaças do ex-namorado, que não aceitava o fim do relacionamento.
Durante o relacionamento do casal, o companheiro não permitia que a jovem trabalhasse,
a espancava sempre que conseguia um novo emprego, lhe obrigava a ficar em casa e
mesmo após medida protetiva provisória, o mesmo continuava a perseguindo. Diante
disso, a jovem publicou fotos nas redes sociais relatando as agressões sofridas e fazendo
um apelo por ajuda, pois não sabia se no dia seguinte estaria viva (REZENDE, 2020).
Além deste caso, em Fevereiro de 2021 a mídia expôs o caso de uma mulher que era
agredida pelo marido que era caminhoneiro na cidade de Bady Bassitt. Nesta ocasião, a
esposa estava viajando com o marido havia sete meses, tendo sido agredida diversas
vezes e impedida de retornar para casa. A vítima relatou que ao conseguir utilizar a
internet, publicou uma imagem nas redes sociais com um “X” vermelho na palma da mão,
na esperança de alguém reconhecê-lo e associá-lo a campanha “Sinal Vermelho” que
oferece ajuda à mulheres vítimas de violência. Após a repercussão da imagem, a polícia
conseguiu localizá-la e deter o agressor (VASCONCELOS, 2021).

Diante do aumento do número de casos de violência doméstica durante o período


de isolamento social no Brasil em 2020, o Governo Federal publicou em Junho de 2020
uma portaria com orientações de atendimento às vítimas através do Sistema Único de
Assistência Social (SUAS), a fim de garantir a continuidade do serviço. O serviço ofertado
pela assistência social à população em estado de vulnerabilidade é considerado essencial
no país e portanto não pode ser interrompido, o que inclui o atendimento à mulheres
vítimas de violência doméstica. Este atendimento vem sendo realizado conforme as
orientações sanitárias a fim de garantir a saúde dos atendidos e dos trabalhadores,
realizando as adaptações necessárias de acordo com o recursos disponíveis e com a
gravidade da pandemia em cada região, como por exemplo, o atendimento através de
vídeo chamado em plataformas digitais (BRASIL, 2020).

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A assistência social continua mapeando as demandas e identificando situações de
urgência com relação ao atendimento das vítimas de violência doméstica ao longo do
período pandêmico, que necessitam de adequações para garantir segurança à vítima,
realizando monitoramento, encaminhando as vítimas para alojamentos emergenciais
quando necessário e ofertando a possibilidade de atendimento psicossocial remoto, salvo
em casos onde o agressor reside com a vítima e se faz necessário o atendimento
presencial individual em ambiente seguro com distanciamento social (BRASIL, 2020).
Contudo, muitas comunidades e municípios de pequeno porte não possuem a infra-
estrutura necessária para prestar um atendimento de qualidade à estas vítimas, com a
escassez de recursos tecnológicos de qualidade, além de que nem sempre a vítima
possui à sua disposição um aparelho eletrônico que possibilite o atendimento remoto por
vídeo chamada. Deste modo, muitas vezes o atendimento presencial acaba
sobrecarregado, dificultando a contingência do novo corona vírus e a proteção desta
população, tanto das vítimas quanto dos trabalhadores da área. Diante disso, acredito que
o governo federal deva disponibilizar aos municípios e comunidades mais carentes, os
recursos necessários para que o atendimento remoto possa ser realizado e efetivo,
disponibilizando smartphones ou computadores aos trabalhadores e vítimas que
necessitam deste serviço.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BRASIL. Ministério da Cidadania. Portaria Nº 86, de 1 de Junho de 2020. Brasília, 2020.


Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-86-de-1-de-junho-de-2020-
259638376 Acessado em: 30 de Abril de 2021.

REZENDE, G. Jovem usa rede social para denunciar agressões de ex: 'Quando
conseguia emprego, ele me espancava de novo'. Portal G1, 31 de Dezembro de 2020.
Disponível em: https://g1.globo.com/ms/mato-grosso-do-sul/noticia/2020/12/31/jovem-usa-
rede-social-para-denunciar-agressoes-de-ex-quando-conseguia-emprego-ele-me-
espancava-de-novo.ghtml Acessado em 30 de Abril de 2021.

ROSA, L. C. B.; LOPES, M. H.; FRANCISCHINI, M. C. L. Direito e Legislação Social.


Maringá: Unicesumar, 2017.

VASCONCELOS, T. Mulher que pediu socorro na web após apanhar do marido fala
sobre agressões: ‘Ele bebia e me batia’. Portal G1, 27 de Fevereiro de 2021. Disponível
em: https://g1.globo.com/sp/sao-jose-do-rio-preto-aracatuba/noticia/2021/02/27/mulher-

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que-pediu-socorro-na-web-apos-apanhar-do-marido-fala-sobre-agressoes-ele-bebia-e-
me-batia.ghtml Acessado em: 30 de Abril de 2021.

VIEIRA, P. R.; GARCIA, L. P.; MACIEL, E. L. N. Isolamento social e o aumento da


violência doméstica: o que isso nos revela?. Rev. bras. epidemiol., Rio de Janeiro , v.
23, e200033, 2020. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?
script=sci_arttext&pid=S1415-790X2020000100201&lng=en&nrm=iso. Acessado em: 29
de Abril de 2021.

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