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L O G
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I A brunofregnibassetto

HISTÓRIA EXTERNA
DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS

|e d usP
Bruno Fregni Bassetto, professor

titular de Filologia Romanica na Fa­

culdade de Filosofia, Letras e Ciên­

cias Humanas da USP, dispensaria

apresentações não fosse o estado de

abandono em que foram deixados os

estudos dessa disciplina nas universi­

dades brasileiras. Seguidor da obra de

Theodore Maurer «Ir., o professor Bas­

setto é filólogo por vocação, opção e

convicção, possuidor de uma vasta

cultura, conhecendo - além do grego,

latim e alemão - todas as línguas ro-

mânicas e muitos de seus dialetos.

Tem dedicado todo o seu tempo ao

ensino, pesquisa e divulgação da

filologia românica, veículo indispen­

sável para quem quer conhecer a

fundo qualquer uma dessas línguas.

Esta obra é, portanto, resultado de

muitos anos de estudos e de uma longa

prática de docência.

Aqui o leitor encontrará a descrição

dos diversos métodos filoiógicos utili­

zados na abordagem de textos, assim

como a história externa das línguas


e l e m e n t o s d ®
FILOLOGIA
ROMANICA
ESP U N IV E R S ID A D E D E S Ã O P A U L O

Reitor João Grandino Rodas


Vice-reitor Hélio Nogueira da Cruz

|e d usP
E D IT O R A DA U N IV E R S ID A D E D E S Ã O P A U L O

Diretor-presiden te Plinio Martins Filho

C O M IS S Ã O E D IT O R IA L

Presidente Rubens Ricupero


Vice-presidente Carlos Alberto Barbosa Dantas
Antonio Penteado Mendonça
Chester Luiz Galvão Cesar
Ivan Gilberto Sandoval Falleiros
Mary Macedo de Camargo Neves Later
Sedi Hirano

Editora-assistente Carla Fernanda Fontana


Chefe Téc. t)iv. Editorial Cristiane Silvestrin
elementosde

FILOLOGIA
ROMANICA brunofregnibassetto

VOLUME I

HISTORIA EXTERNA DAS LÍNGUAS ROMANICAS


Copyright Ο 2001 by Bruno Fregni Bassetto

Ia edição 2001
2a edição 2005
2a edição, Ia reimpressão 2013

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Bassetto, Bruno Fregni


Elementos de Filologia Românica: História Externa das Línguas,
Românicas v. 1 / Bruno Fregni Bassetto - 2. ed. 1. reimpr. - São
Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2013.

Bibliografia.
ISBN 978-85-314-0601-0

1. Filologia românica 2. Línguas românicas I. Título. II. Título:


História Externa das Línguas Românicas

00.5383 CDD-440

índices para catálogo sistemático:


1. Filologia românica 440
2. Línguas românicas: Filologia 440

Direitos reservados à

Edusp - Editora da Universidade de São Paulo


Rua da Praça do Relógio, 109-A, Cidade Universitária
05508-050 - São Paulo - SP - Brasil
Divisão Comercial: Tel. (11) 3091-4008 / 3091-4150
www.edusp.com.br - e-mail: edusp@usp.br

Printed in Brasil 2013

Foi feito o depósito legal


S u m á r io

Abreviaturas ...................................................................................................................11
P refácio.................................................................................................. 13
Introdução........................................................................................................................17
Conceito de Filologia R om ânica................................................................ 17
Diacronia das Línguas R o m ân icas........................................................................41

1. O Trabalho Filológico ........................................................................................... 43


Crítica T e x tu a l........... ............ 44
R ecensio................................... 44
Collatio codicum ............................... 45
Estemática ..........................................................................................................46
Emendatio . . . . i .................. . ......................................................................... 48
Crítica Histórico-Literária ............... 51
A utenticidade.................................................................................... 51
Datação ............................................................................ . ...............................52
F o n tes........................................................................................................... .52
Circunstâncias ............... 53
S o rte.....................................................................................................................54
Unidade e Integridade........................................................................................55
Linguagem do T ex to .......................................................................................... 55
Avaliação Crítica ...............................................................................................56
Exegese do Porm enor...............................................................................................57
E d iç ã o ....................................................................................................................... 60
Edição C rítica............. ....................................................................................... 60
Edição Diplomática .......................................................................................... 60
Edição Paleográfica .......................................................................................... 61
Outros Tipos de E dição......................................................................................61

2. Métodos da Filologia R om ânica.............................................................................63


Método Histórico-Comparativo .............................................................................63
Método Idealista ................................................................................ 68
Método da Geografia Lingüística...........................................................................70
Método de Wõrter und Sachen (“Palavras e Coisas”) ......................................... 74
Método Onomasiológico ........................................................................................76
Método Neolingüístico ou Espacial ...................................................................... 78
Método da Teoria das Ondas ( Wellentheorie) ...................................................... 81
Métodos A f in s ..........................................................................................................83
Considerações sobre os M é to d o s...........................................................................85

3. Origem das Línguas R om ânicas.............................................................................87


O Latim e suas V ariedades......................................................................................87
Características do Latim V u lg a r.............................................................................92
A Latinização............................................................................................................ 99
Fatores da Latinização ...........................................................................................103
Exército Romano .............................................................................................103
Colônias Militares ...........................................................................................104
Colônias Civis ............................ 105
Administração R om ana....................................................................................106
Obras Públicas ................................................................................................. 107
Comércio .......................................................................................................... 109
Fontes do Latim Vulgar ........................................................................................ 110
Inscrições P opulares........................................................................................ 111
Papiros A ntigos................................................................................................. 115
Gramáticos e Mestres de R etórica..................................................................116
Tratados T écnicos.............................................................................................118
Relatos de Peregrinações ............................................................................... 120
Textos Latinos Tardios ....................................................................................123

ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Textos Cristãos .................................................................................................125
G lo ssários......................................................................................................... 127
As Línguas Românicas como Fontes do Latim Vulgar ...............................135
A Fragmentação da R om ânia................................................................................138
Causas In tern as.................................................................................................138
Causas Externas: As Invasões......................................................................... 140
A Formação das Línguas R om ânicas...................................................................152
Fase de B ilingüism o........................................................................................ 152
S ubstrato............................................................................................................153
Superstrato ....................................................................................................... 157
A dstrato..............................................................................................................163
Latim Medieval: Adstrato Perm anente.......................................................... 171

4. A R o m â n ia .............................................................................................................177
Conceito de R om ânia.............................................................................................177
Períodos da România ............................................................................................ 179
România Antiga ............................................................................................... 179
România Medieval .......................................................................................... 179
România Moderna .......................................................................................... 181
Fases da Evolução das Línguas R om ânicas........................................................ 183
Fase Latina ....................................................................................................... 184
Fase Romance ................................................................................................... 185
Fases das Línguas Românicas M odernas...................................................... 186
Classificação das Línguas R om ânicas................................................................ 248
Classificação de Friedrich D i e z .....................................................................249
Outras C lassificações......................................................................................250
A România Contínua ......................................................................................256
Características e Inter-relacionamento das Línguas Românicas ......................260
Balcano-Romance............................................................................................ 260
Reto-Romance ................................................................................................ 263
Ítalo-Romance...................................................................................................264
Galo-Romance ................................................................................................ 265
Ibero-R om ance................................................................................................ 270

Bibliografia ..................................................................................................................275

índice dos Autores Citados ..................................................... ................................. 281


índice Temático ........................................................................................................ .287
índice de Palavras ................................................................................... 331
M ap a s............................................................................................................................ 351

SUMÁRIO I 9
A b r e v ia t u r a s

a. - alto calabr. - calabrês emil. - emiliano


ablat. - ablativo campid. - campidanês eng. - engadino
acus. - acusativo cast. - castelhano esl. - eslavo
adj. - adjetivo cat. - catalão eslov. - esloveno
afr. - africano celt. - celta etim. - etimológico
al. - alemão centr. - central etr. - etrusco
alb. - albanês Cf. - Confira
amer. - americano champ. - campanhês fr. - francês
ant. - antigo clás. - clássico franc. - franco
ár. - árabe conj. - conjunção franc.-prov. - franco-provençal
arag. - aragonês cons. - consoante friul. - friulano
art. - artigo cr. - cristão
croat. - croata gal. - galego
bas. - basco galur. - galurês
bearn. - bearnês dalm. - dalmático gasc. - gascão
berb. - berberel dat. - dativo gaul. - gaulês
bergam. - bergamasco dial. - dialeto, dialetal gen. - genitivo
bras. - brasileiro gertn. - germânico
búlg. - búlgaro ecles. - eclesiástico gót. - gótico
gr. - grego milan. - milanês rét. - rético
mir. - mirandês rom. - romeno
hol. - holandês moçár. - moçárabe romanh. - romanholo
liúng. - húngaro moder. - moderno
sânscr- sânscrito
iber. - ibérico nap. - napolitano sard. - sardo
ind. - indiano neerl. - neerlandês serv. croat. - servo-croata
ind.-eur. - indo-europeu neogr. - neogrego sic. - siciliano
ingl. - inglês nom. - nominativo sing. - singular
ístr. - ístrio norm. - normando sobres. - sobresselvano
ístr.-rom. - ístrio-romeno nuor. - nuorês subst. - substantivo
it. - italiano
oc. - ocidental tirol. - tirolês
lat. - latim or. - oriental tose. - toscano
leon. - leonês trent. - trentino
lit. - literal (mente) pic. - picardo tur. - turco
litu. - lituano piem. - piemontês
log. - logudorês pis. - pisano v. - veja
lomb. - lombardo pol. - polonês vai. - valão
port. - português vegl. - veglioto
mác.-rom. - mácedo-romeno prep. - preposição vên. - vêneto
maced. - macedônio prov. - provençal veron.- veronês
méd. - médio vog. - vogal
megl.-rom. - megleno-romeno ragus. - ragusano vulg. - vulgar

12 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


P r e f á c io

A disciplina Filologia Românica sempre foi bastante prestigiada na Universi­


dade de São Paulo, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Objeto da
dedicação de várias gerações de professores e pesquisadores, entre os quais se desta­
ca o Prof. Theodoro Henrique Maurer Jr., intemacionalmente conhecido por seus
escritos, a Filologia Românica firmou tradição e adquiriu, no decurso de décadas,
feições e rumos próprios na Universidade de São Paulo. E intenção destes “Elemen­
tos” resgatar e fixar essas feições e esses rumos próprios dos estudos filológicos, evi­
tando que se percam ou se alterem indevidamente.
A estrutura deste trabalho é a mesma da do curso de Filologia Românica, ministra­
do na graduação do curso de Letras da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.
Inicialmente, dada a evidente falta de transparência na terminologia, foi preciso definir
“filologia” e “filólogo”, como também “românico”. Uma breve biografia de “filólogo”,
construída através da análise do conteúdo semântico das ocorrências do termo em textos
gregos, latinos, medievais e modernos, levou a uma definição coerente de “filologia”. Por
outro lado, a exata conceituação de “românico” deve evitar uma série muito extensa de
confusões com reais ou imaginários homônimos e parônimos. Todas essas considerações
levam também a colocar a lingüística moderna na posição que realmente lhe compete.
Sendo o texto algo fundamental para os estudos filológicos em geral, apresen-
tam-se em seguida os passos fundamentais do trabalho filológico: a crítica textual, a
crítica histórico-literária e a análise do pormenor. Seguem-se depois as partes filoló-
gicas da história externa das línguas românicas: os métodos usados, o latim e suas
variedades, com ênfase particular no chamado “latim vulgar”, variedade essencial­
mente falada e, por isso, de reconstituição difícil. Sabendo-se que foi dessa varieda­
de que nasceram as línguas românicas, sobre ela concentraram-se os estudos, mos­
trando suas características e sua difusão pelo vasto Império Romano por diversos
fatores. As fontes desse latim vulgar merecem atenção especial; cada tipo foi devida­
mente exemplificado, apesar das dificuldades bibliográficas nessa área.
A queda do Império Romano ocasionou a fragmentação política e lingüística
da România; para uma correta compreensão do aparecimento das línguas e dos diale­
tos românicos, confluíram causas externas e internas, relacionadas a fatores econômi­
cos, políticos, étnicos, culturais, administrativos e outros - dos quais se procurou dar
uma visão clara, embora sucinta. Na história da formação das línguas românicas, inse-
rem-se necessariamente os conceitos de substrato, superstrato e adstrato, além do
bilingüismo inicial; nesse contexto, destaca-se ainda o papel do latim medieval e ecle­
siástico como fonte perene de empréstimos às línguas românicas nascentes.
No conceito de România em suas diversas fases, chegamos ao estudo das línguas
românicas modernas, começando do Oriente para o Ocidente; a um estudo individual de
cada uma, seguem-se as diversas tentativas de classificação e, por fim, a caracterização
dos vários blocos românicos, segundo tendência mais recente. Nessa perspectiva,
deram-se os traços lingüísticos mais importantes de algumas variedades românicas
pouco conhecidas entre nós, como o gascão, o rético, o franco-provençal e o logudorês.
Pretendemos, como ficou dito, resgatar a tradição da Filologia Românica na
Universidade de São Paulo. Contudo, foi indispensável também adequar o curso à
realidade educacional do país. A considerável queda de qualidade do ensino brasilei­
ro reflete-se sobremodo nas universidades, no ensino superior em geral e na Filologia
Românica em particular, já que requer conhecimentos pertencentes ao domínio de
vários ramos do saber. Assim, o conhecimento do latim é cada vez mais restrito; estu­
dam-se muito pouco as línguas românicas, mesmo o francês ou o castelhano; geogra­
fia e história antigas, ciências imprescindíveis na diacronia, são bastante negligencia­
das. Essas e outras deficiências dos conhecimentos de nossos alunos levaram-nos a
introduzir no trabalho detalhes aparentemente dispensáveis, mas certamente úteis
pelo menos aos que tiveram uma formação menos sólida. Nesse sentido, os “Ele­
mentos” diferem de outros elaborados alhures, sobretudo na Europa, onde os alunos
ou leitores certamente têm um embasamento cultural sem aquelas deficiências, já
que os conhecimentos supostos pela Filologia Românica se referem à própria terra
natal, em parte pelo menos, o que não se dá entre nós.

14 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


A bibliografia é outro calcanhar-de-aquiles para o romanista brasileiro. Não
dispomos de documentação especializada; por isso, só foram feitas referências a obras
realmente disponíveis. Por razões didáticas, evitou-se a multiplicidade de citações,
especialmente em notas de rodapé, elencando-se apenas as consideradas indispensá­
veis. Mesmo o grande esforço dispendido ultimamente para ampliar a bibliografia
românica da Biblioteca Central, com a aquisição de dezenas de obras, não conseguiu
desfazer nossa imensa defasagem; basta considerar, por exemplo, a magnífica biblio­
grafia específica que Cario Tagliavini apõe a cada um dos capítulos em Le origini
delle lingue neolatine, obras fora de nosso alcance, em sua grande maioria.
A experiência e a necessidade nos levaram a elaborar alguns índices, visando
a facilitar o uso da obra; dentre eles, sem dúvida, o mais útil é o temático de maté­
rias, que tanta falta faz em outras obras semelhantes. Não foram poucas as dificulda­
des técnicas surgidas na confecção dos mapas; graças, porém, à competência e à
dedicação de alguns funcionários e técnicos, aos quais agradecemos, chegou-se a
resultados razoáveis.
Este primeiro volume trata da chamada história externa das línguas români-
cas, ficando a história interna para o segundo volume. Quod Deus bene vertat!

B runo F regni B assetto

prefácio 15
In t r o d u ç ã o

CONCEITO DE FILOLOGIA ROMÂNICA

CONCEITO DE FILOLOGIA

O conceito de Filologia não é univoco; divergem muito os autores ao defini-


la, ao determinar os limites de seu campo de atuação e até seu objeto de estudo. Daí
a necessidade de se levantar a biografia do termo, ainda que concisa, na busca de seu
conteúdo semântico. Obviamente, é necessário partir do que nos legaram os gregos,
os inventores do termo.
O termo “filólogo”, que certamente precedeu “filologia” e “filologar” (pouco
usado), é encontrado inicialmente em Platão e em Aristóteles, mas o termo é sem
dúvida anterior. Significando etimologicamente “amigo da palavra”, encaixa-se na
filosofia dos estóicos. Assim, Ó λ ό γ ο ς , a palavra, é a expressão, a exteriorização do
vovç, a inteligência; por isso, o filólogo é aquele que apreende a palavra, a expressão
da inteligência, do pensamento alheio e com isso adquire conhecimentos, cultura e
aprimoramento intelectual. Sabemos que, pelo menos até o século V a.C., essa pala-
vra era eminentemente oral e o filólogo era falante ou ouvinte; quando a palavra
escrita se tornou mais comum, através dos papiros e dos pergaminhos, o filólogo era
o amigo da palavra tanto falada e ouvida como a escrita, segundo se depreende dos
textos em que o termo é usado. Em seguida, por ser a palavra escrita bem mais aces­
sível por seu caráter permanente, ainda que restrita a um grupo mais reduzido, o
termo “filólogo” passou a designar, em especial, os que liam e escreviam. Com isso
modificou-se, em parte, o significado inicial do termo, para “aquele que gosta de
falar ou de aprender, ouvindo”.
Os textos seguintes, escolhidos entre aqueles em que o termo ocorre, buscam
fundamentar essas afirmações; veja-se a seguinte passagem de Aristóteles:

[...] και Λακεδαιμόνιοι Χ'ιλονα και των γερόντων έποίησαν, ήκιστα φιλόλογοι
δντες [...]·

[...] e os espartanos (homenagearam) a Quilon e o colocaram entre os gerontas, embora fossem bem
pouco filólogos [...]

Sabe-se que Quílon é um dos chamados sete sábios; foi poeta lírico e epis-
tológrafo, tendo vivido no século VI a.C.. A fama lhe deu aquela dignidade por parte
de seus conterrâneos, conhecidos como bem pouco dados ao cultivo da palavra.
Nessa passagem, “filólogo” conserva o significado etimológico de “amigo da
palavra” ou que gosta de falar ou de ouvir.
Há outras ocorrências do vocábulo em Aristóteles e sobretudo em Platão
(Teeteto, 146a; Fedro, 236e; Leis, 641 e; República, 582e; Laques, 188e). Nenhum
desses tópicos, porém, é suficientemente claro quanto ao conteúdo semântico de
“filólogo”. Veja-se, por exemplo, o seguinte:

Απλοϋν τό γ ’ έμόν, α$ Νικ'ια, περϊ λόγων έστ'ιν. ει δέ βούλει, ούκ άπλοϋν,


ν ά λλα διπλοΰν. καϊ γάρ άν δόξαιμι τώ φιλόλογος είναι και αύ μισόλογος2.

Minha posição, ό Níquia, é simples em relação às palavras. Ou se quiseres, não simples mas
dupla. Pois tenho a impressão de amar as palavras e também de odiá-las.

Nesse texto, como em outros de Platão, “filólogo” não parece ter significado
específico ou técnico; acontece o mesmo com termos afins, como πολύλογος e
βραχύλογος, respectivamente, “que fala muito” ou “loquaz” e “de fala curta” ou

1. A Arte da Retórica, 1398b.


2. Laquea, 187c.

18 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


“conciso”, sem ampliação semântica. Mas há certa especificidade do termo no tópi­
co seguinte:

Α νάγκη, εφη, ά ό φιλόσοφος τέ κ α ι ό φιλόλογος επ α ιν εί, ά λ η θ έσ τα τ α ε ίν α ι3.

Necessariamente - diz - tudo quanto o filósofo e o filólogo aprovam é o mais verdadeiro.

Platão aí distingue claramente o “filósofo” e o “filólogo”, considerando am­


bos como especialistas suficientemente abalizados para opinar sobre o que é ou não
verdadeiro; para isso é necessário ter conhecimentos e discernimento e não apenas
ser bom falante. Assim fica claro que o termo tendia a se especificar já na época de
Platão; em Isócrates (436-338 a.C.), “filologia” tem o sentido de “gosto pelo estudo
das palavras” (Antidosis, XV, 296), cujo despertar é considerado de grande valia no
trabalho educativo.
Em Cícero (106-43 a.C.), encontra-se a forma comparativa de “filólogo”, em
caracteres gregos, cujo conteúdo significativo é bastante claro, na linha do pensa­
mento grego:

Postea autem quam haec coepi φιλολογώ τερα, iam Varro mihi denuntiaverat magnam
sane et gravem προσφώνησιν. (AciAllicum, XII, 13,3)

Mas depois que dei início a essas obras mais cuidadas literariamente, Varrão já me anun­
ciara uma grande e certamente profunda consagração.

Cícero compara os discursos que antes escrevia com obras de outros gêneros
que passou a escrever e considera as últimas “mais filológicas” que as primeiras.
Conhecemos o caráter altamente literário de seus discursos; qual será então o signi­
ficado desse comparativo? Levando-se em conta o caráter mais pragmático do gêne­
ro oratório, “mais filológico” parece estar relacionado à gratuidade dos temas abor­
dados, como o destino, a amizade, a velhice e a natureza dos deuses, no qual se busca
apenas a cultura e o exercício do raciocínio. Cícero não traduziu nem transliterou o
termo grego certamente por não encontrar no latim um correspondente. No mesmo
Ad Atticum, o termo volta a ocorrer, mas em caracteres latinos:

Ergo illam Α καδημικήν, in qua homines nobiles illi quidem sed nullo modo philologi
nimis acute loquuntur, ad Varronem transferamus. (XIII, 12,3)

3. República, 582e.

INTRODUÇÃO j 19
Portanto, transfiramos para Varrâo aquela Acadêmica, na qual aqueles homens, nobres sem
dúvida, mas de forma alguma filólogos, falam de modo por demais contundente.

Cícero distingue nobreza e cultura; os homens são nobres, mas não têm o refi­
namento intelectual requerido pelo ambiente acadêmico - não são filólogos, o que é
denunciado pelo modo de falar. O mesmo conteúdo semântico têm as ocorrências do
termo em Ad Familiares, XVI, 21, 4 e Ad Atticum, 11,17.
Foram inventariadas 56 ocorrências em autores gregos e latinos, sobretudo em
Estrabão (séculos I a.C.-I d.C.), Arriano (século II d.C.), Ateneu (séculos 11-111 d.C.),
Longinus (213-273 d.C.), Plutarco (42-126 d.C.), Estobeu (450-500 d.C.), além dos
já citados. O nosso vocábulo é usado com o significado de “amigo do estudo ou do
conhecimento”, “amante da leitura” e, algumas vezes, “amigo da palavra falada”
(como em Plutarco - Vidas Paralelas, — Catão Maior, 22, 1-2). Quase sempre,
porém, o termo está relacionado a homens de letras e autores de qualquer tipo de obra
escrita. Encontra-se também “filologia” e, mais raramente, “filologar” (como em
Arriano - Dissertationes Epitecti, III, 10, 10-11; Ateneu - Os Deipnosofistas, 160 e-
f), no sentido de “dissertar com erudição”.
Gaius Suetonius Tranquillus, historiador romano do tempo dos imperadores
Trajano e Adriano (séculos l-II d.C.), em De Grammaticis et Rhetoribus, parte da
obra De Viris Illustribus, nos explica o que se entendia por “filólogo” em sua época:
tendo apresentado Lucius Ateius Praetextatus como nascido em Atenas, prisioneiro
de guerra em 86 a.C. e como tal levado a Roma, auxiliar de Salústio na montagem
de Breviarium Rerum Romanarum, por fim acrescenta: “[...] Philologus ab semet
nominatus”. O motivo dessa autodenominação está explicado numa carta que Ateius
Praetextatus escreveu a seu amigo Lélio Herma:

[...] scripsit se in Graecis litteris magnum processum habere et in Latinis nonnullum.

[...] escreveu ter conseguido grande avanço nas letras gregas e algum progresso nas latinas.

Em seguida, Suetônio esclarece:

Philologi adpeilationem adsumpsisse videtur, quia sic ut Eratostbenes, qui primus hoc cog­
nomen sibi vindicavit, multiplici variaque doctrina censebatur. Quod sane ex commentariis eius
adparet, quanquam paucissimi extent; de quorum tamen copia sic altera ad eundem Hermam epis­
tola significat: “Hylen nostram alliis memento commendare, quam omnis generis coegimus, uti scis,
octingentos in libros!”. (De Gram. eI Rhet., 5-10)

Parece ter tomado a denominação de Filólogo porque, como Eratóstenes, que por primeiro
reivindicou para si próprio esse cognome, era considerado por seu multiplice e variado conheci-

20 J ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


mento. Isso se depreende claramente de seus comentários, embora restem pouquíssimos; a respeito
do volume deles uma outra carta ao mesmo Herma acentua: “Lembra-te de recomendar a nossa
Floresta, na qual reunimos, como sabes, oitocentos livros de todos os gêneros!”.

Eratóstenes (275-194 a.C.), de quem fala Suetônio, era de Cirene na Líbia, norte
da África; foi discípulo de Calímaco (século 111 a.C.) e de Lisânias, também tutor real a
convite de Ptolemeu, o Euergetes, e depois chefe da famosa biblioteca de Alexandria,
sucedendo a Apolonius Rhodius. E considerado o sábio mais versátil de seu tempo. Os
especialistas alexandrinos contemporâneos chamavam-no βήτα, isto é, muito próximo do
máximo, e também o denominavam κένταθλος, isto é, aquele que se distingue em todos
os gêneros ao mesmo tempo. Esse expoente da humanidade considerava que “filólogo”
era o adjetivo que melhor o caracterizava, no que foi seguido por Ateius Praetextatus.
Considerando-se que, a julgar pelos poucos fragmentos de que dispomos, o
melhor da obra de Eratóstenes versa sobre Geografia, não é correto restringir o
campo do filólogo romano ou grego à literatura ou às artes. Eratóstenes e Ateius são
sábios, que dispunham de amplos conhecimentos sobre “todos os gêneros”, isto é,
todos os ramos da Ciência, obviamente incluindo gramática e problemas de lingua­
gem. Nesse contexto, “filólogo” tem um conteúdo semântico bem específico.
Entretanto, outros textos mostram que persiste a ausência de univocidade do
termo, embora as discrepâncias semânticas não sejam tão aberrantes. Considere-se o
seguinte texto de Lucius Annaeus Seneca (4 a.C./ 1 d.C.-65), em que se esclarecem
as especialidades do “filósofo”, do “filólogo” e do “gramático”:

Cum Ciceronis librum dc re p. prendit hinc philologus aliquis, hinc grammaticus, hinc
philosophiae deditus, alius alio curam suam mittit. Philosophus admiratur contra iustitiam dici tam
multa potuisse. Cum ad hanc eandem lectionem philologus accessit hoc subnotat: duos Romanos
reges esse quorum alter patrem non habet, alter matrem. Nam dc Serui matre dubitatur: Anci pater
nullus, Numae nepos dicitur.
Praeterea notat eum quem nos dictatorem dicimus et in historiis ita nominari legimus, apud
antiquos magistrum populi vocatum. Ilodieque id exstat in auguralibus libris et testimonium est,
quod qui ab illo nominatur magister equitum est. Aeque notat Romulus periisse solis defectione;
provocationem ad populum etiam a regibus fuisse: id ita in pontificalibus et aliqui sunt argui qui
putant et Fenestella. Eosdem libros cum grammaticus explicuit, primum verba expse-reapse dici a
Cicerone, id est re ipsa, in commentarium refert, nec minus sepse, id est, se ipse. Deinde transit ad
ea quae consuetudo sacculi mutavit, tamquam ait Cicero: “Quoniam sumus ab ipsa calce eius inter­
pellatione revocati”. Hanc quam nunc in circo creiam vocamus calce antiqui dicebant. Deinde
Ennianos colligit uersos et in primis illos de Africano scriptos [...] Ennium hoc ait Homero se sub­
ripuisse, Ennio Virgilium. (Cartas, Lv. XVIII, 30ss.)

Quando pega o livro de Cícero De Republica um certo filólogo aqui, um tal gramático ali,
acolá alguém dado à Filosofia, cada um revela ao outro sua preocupação. O filósofo se admira de

introdução | 21
que se tivesse podido afirmar tantas coisas contra a justiça. Quando o filólogo chega a esse mesmo
ponto observa o seguinte: há dois reis romanos, um dos quais não tem pai c o outro não tem mãe.
Pois pairam dúvidas sobre a mãe de Servus; não se conhece o pai de Ancius, sendo apenas consi­
derado neto de Numa. Nota ainda que aquele a quem chamamos o ditador e lemos que assim era
denominado nas histórias, entre os antigos era designado por mestre do povo. Ainda hoje consta
nos livros de augurios e há prova de que, quem era designado por aquela expressão, de fato era o
mestre da cavalaria. Observa ainda que Rômulo morreu durante um eclipse do sol; que houve pro­
vocação contra o povo da parte também dos reis: assim está nos (livros) pontificais c há alguns
peritos que pensam assim, como Fenestella4. Quando o gramático abre os mesmos livros, primei­
ramente comenta que as palavras expse-reapse foram ditas por Cícero, isto é, “pela própria coisa”,
ainda mais sepse, isto é, “ele mesmo”. Passa depois para aquilo que o uso secular mudou, como
diz Cícero: “Pois fomos chamados de volta do fim da carreira por seu grito”. Aquilo que agora, no
circo, chamamos cretam (“cal”, “giz”) os antigos diziam calcem. Em seguida, reúne versos de
Ênio, em primeiro lugar aqueles referentes ao Africano. [...] Afirma que Ênio tirou isso de Homero
e Virgílio, de Ênio.

Sêneca traça bem o perfil do gramático e do filólogo; o gramático se preocu­


pa com problemas específicos de língua e de literatura, como expressões típicas,
arcaísmos, influências literárias. O filólogo apresenta análises, deduções, inter-rela-
cionamento de fatos, conhecimento dos livros de história, de arúspices e dos escritos
pontificais - índices de uma cultura ampla, própria do sábio, do Filólogo, como
Eratóstenes e Ateius.
Em outras ocorrências do termo “filólogo”, o contexto confere maior peso a
um ou outro aspecto semântico: considerando-se o caráter extremamente amplo do
seu conteúdo significativo, é fácil compreender posições e conceituações diver­
gentes. Desde as primeiras atestações, porém, está pelo menos implícito o texto
escrito, como no de Sêneca. Outros textos indicam claramente o interesse do filólo­
go por todas as formas de manifestação do pensamento, mesmo a palavra falada ou
ouvida. Veja-se, como exemplo, esta passagem de Plutarco ( Vidas Paralelas - Catão
Maior, 22,2):

Ευθύς ούν οί φιλολογώτατοι των νεανίσκων επι τούς άνδρας ιεντο και
συνήσαν, άκροώμενοι και θαυμάζοντες αύτοΰς.

Então, os mais β /ólogos dos jovens se aproximaram logo e cercaram os homens, ouvindo-
os com atenção e admirando-os.

4. Fenestella (35 a.C.-36 d.C.) escreveu uma História Romana, em 22 livros, das origens até 57 a.C.. As cita­
ções, que dele foram feitas, sobretudo por Ascônio, mostram ter tido grande autoridade antes do período
Ciceroniano. Os fragmentos que chegaram até nós revelam um acurado senso critico e grande dedicação ao
estudo dos problemas sociais e institucionais da Roma antiga.

22 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Os homens, de que fala Plutarco (42-126 d.C.), eram filósofos relacionados
com Carnéades, o Acadêmico, e com Diógenes, o filósofo, vindos a Roma em mis­
são diplomática. “Filólogo” indica aí aqueles que tinham muita vontade de aprender,
levando aqueles jovens a quase pressionar os sábios gregos; são “os amigos da
palavra”, a palavra que instrui e alarga horizontes. Por isso Plutarco qualifica-os de
“filólogos” (no superlativo), e não de filósofos como os seus interlocutores.
Uma outra acepção é dada ao termo por Sextus Empiricus (cerca de 200 d.C.)
em Contra os Matemáticos, I, 235:

Και πάλιν εν διαλέχει άποβλέποντες πρός τους παρόντας τάς μεν ιδιωτι­
κός λέξεις παραπέμψομεν τήν δέ άστειοτέραν καί φιλολόγον συνήθεαιν
μεταδιώξομεν. ώς γάρ ή φιλολόγος γαλάται παρά τοΐς ’ιδιώταις, ούτως ή
'ιδιωτική παρά τοΐς φιλολόγοις.

Ε de novo, numa dissertação, tendo em vista os presentes, procuraremos as expressões mais


refinadas e filológicas e deixaremos de lado as expressões comuns, pois, como o uso culto é ridicula­
rizado pelos que só se guiam pelo comum, da mesma forma o comum o é pelos do uso culto.

Sextus Empiricus distingue com clareza aquilo que na terminologia da


linguística moderna se chama “norma” ou “nível” lingüístico; segundo ele, é preciso
adequar a linguagem à platéia: para os mais cultos, expressões mais refinadas e
“filológicas” e para os mais simples, expressões comuns, a fim de se evitar o ridícu­
lo. O conteúdo semântico de “filólogo” aponta claramente para algo refinado, culto
e estilizado no campo da linguagem, como em Cícero.
Em Longinus (213-273 d.C.), encontra-se uma das poucas ocorrências do
verbo φίλολογεΐυ, no sentido de “discorrer, dissertar com conhecimento” e, sem
dúvida, também com alguma elegância, em O Sublime, XXIX, 2:

Αλλά γάρ ά λις ΰπερ τής εις τά υψηλά των σχημάτων κρήσεως έκ παρεν-
θήκης τοσαΰτα πεφιλολογήσθαι, Τερεντιανέ φΐλτατε.

Muitos, porém, já dissertaram bastante, por digressão, sobre o uso das figuras em relação
ao sublime, caríssimo Terenciano.

Desses textos pode-se concluir que o termo “filólogo” denota, quase sempre,
uma idéia de refinamento intelectual, de amplos conhecimentos gerais ou específi­
cos, de cultura em geral e de domínio da linguagem em particular. Entretanto, não se
chegou à univocidade do termo. Textos contemporâneos dos citados acima trazem o
termo em sua acepção não-específica, próxima da etimológica, como o tópico
seguinte de Ateneu, autor dos séculos II-I1I d.C., em Os Deipnosofistas, 39b:

INTRODUÇÃO | 23
Φησίν Άληξις καί ότι
οίνος
φιλολόγους πάντας
ποιεί τους πλείονα
πίνοντες αυτόν.

Alexis diz também que


o vinho
torna loquazes a todos
os que o bebem
em maior quantidade.

E a notória loquacidade de muitos quando se embriagam, conforme sugere


também o contexto; não parece aceitável a tradução “ami des lettres” que lhe dá a
edição Belles Lettres, a não ser em sentido jocoso ou pejorativo. Sob esse aspecto,
um interessante jogo de palavra de Zenão nos foi legado por Estobeu (século V d.C.)
em Florilégio, 36, 26:

Ζήνων τών μαθητών έφασκε τους μέν φιλολόγους είναι τους δε


λογοφίλους.

Zenão dizia dos alunos que uns eram filólogos, mas outros, logófilos.

Ao “filólogo” interessa a comunicação, o conteúdo significativo e enriquece-


dor da mensagem, enquanto para o “logófilo” palavras são palavras apenas. Evidente
é o sentido pejorativo de “logófilo”, como o é também, de modo geral, φ ιλόλαλος
(“verborrágico”); ambos, porém, nunca foram atribuídos a um verdadeiro “filólogo”.
Não se consegue, porém, chegar à univocidade; a partir do significado eti-
mológico de “amigo da palavra”, “amante do falar”, seu campo semântico se amplia
bastante, passando a abranger tudo o que se refere ao ato da comunicação pela lin­
guagem sob qualquer de suas formas. Nessa acepção abrangente se acomodam todas
as variantes semânticas, até a atribuição do qualificativo aos sábios “de múltipla e
variada doutrina”, na expressão de Suetônio, para os quais a língua é mais um meio
do que o objeto de estudo (o que é próprio do gramático). Entretanto, pode o filólo­
go tomar a linguagem como objeto de suas atenções sem extrapolar, embora isso não
tenha acontecido com freqüência. Assim, há quem diga que Sinésio de Cirene (370-
413 d.C.) teria entendido filologia como pesquisa de palavras; contudo, a passagem
em que tal afirmação se baseia parece, no mínimo, bastante vaga:

Καί ó φιλόσοφος ó καθ ημάς συνέσται μέν έαυτώ τε καί τώ θεώ διά
φιλοσοφίας, συνέσται δέ τοίς άνθρώποις διά τών ύφειμένων του λόγου δυνάμεων.

24 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Έπιστήσεται μέν ούν, ώς φιλόλογος- κρίνει δέ, ώς φιλόσοφος, εκαστόν τε και
πάντα5.

Ε ο filósofo entre nós se encontrará consigo mesmo e com Deus através da filosofia; encon-
trar-se-á com os homens através das forças subjacentes à palavra. Terá, pois, conhecimentos como ■
filólogo; c, como filósofo, julgará tanto as partes como o todo.

Sinésio distingue dois aspectos do cristão culto: o “filósofo” e o “filólogo”;


este sabe usar a força das palavras na comunicação com os homens, mas isso não sig­
nifica que faça pesquisas específicas sobre as palavras; semanticamente, nesse tópi­
co “filólogo” significa “sábio”, como Eratóstenes e Ateius, mas de nenhum modo
algo parecido com pesquisador de etimologias.
O citado texto de Sêneca mostra claramente que os antigos distinguiam o
filólogo do “gramático”. E m fle Grammaticis et Rhetoribus, Suetônio discorre sobre
vinte “grammatici” e dezesseis “rhetores”; dos vinte gramáticos, apenas um se con­
sidera igualmente filólogo: Lucius Ateius. A respeito da introdução dos estudos de
gramática em Roma, afirma Suetônio nessa obra:

Primus igitur, quantum opinamur, studium grammaticae in urbem intulit Crates Mallotes,
Aristarchi aequalis, qui missus ad senatum ab Attalo rege inter secundum et tertium Punicum bel­
lum sub ipsam Ennii mortem, cum regione Palatii prolapsus in cloacae foramen crus fregisset per
omne legationis simul et valetudinis tempus, plurimas fecit adsidueque disseruit ac nostris exem­
plum fuit ad imitandum. (2, 1-3)

Portanto, o primeiro, ao que saibamos, a introduzir o interesse pela gramática na Cidade foi
Crates de Maios, contemporâneo de Aristarco, que, enviado ao senado pelo rei Átalo entre a segun­
da e a terceira guerra púnica, perto da própria morte de Ênio, tendo caído numa abertura do esgoto
na região do Palatino e quebrado a perna, durante todo o tempo da legação e da convalescença, pro­
cedeu frequentemente a leituras públicas e dissertou com frequência, dando aos nossos um exemplo
a ser imitado.

A visita de Crates a Roma foi em 168 a.C.; ele foi o primeiro diretor da biblio­
teca de Pérgamo e escreveu sobre Homero, Hesiodo, Eurípedes e Aristófanes, entre
outros, sob uma perspectiva filosófica e conservadora. Não era, portanto, um simples
“gramático”, isto é, alguém que só se preocupava com problemas especificamente de
língua, segundo a caracterização de Sêneca. A dificuldade consiste em precisar o
conteúdo semântico de “Gramática”. Ainda no De Grammaticis et Rhetoribus, 4, 2,
Suetônio informa:
i

5. Migne, Patmlogia Graeca, vol. LXVI, p. 1126 (Dion, 43b).

INTRODUÇÃO j 25
Appellatio grammaticorum Graeca consuetudine invaluit sed initio litterati vocabantur.

A denominação de gramáticos prevaleceu por influência grega; no começo, porém, eram


chamados “literatos”.

Esse texto confirma a sabida influência grega sobre a cultura latina e nos
ajuda a recompor a terminologia do ponto de vista histórico, já que semanticamente
se fica na mesma: γράμμα, γράμματος é littera em latim. Suetônio fornece outros
esclarecimentos:

Cornelius quoque Nepos libello quo distinguit litteratum ab erudito, “litteratos vulgo quidem
appellari” ait “eos qui aliquid diligenter et acute scienterque possint aut dicere aut scribere”, ceterum
proprie sic appellandos poetarum interpretes, qui a Graecis grammatici nominentur. (//;., 4, 2-3)

Também Cornelius Nepos, no livrinho em que distingue literato de erudito, afirma que
comumente são chamados literatos os que são capazes de dizer ou escrever algo de modo especial,
com profundidade e conhecimento de causa, aliás devendo ser assim chamados propriamente de
intérpretes dos poetas, aqueles que seriam denominados gramáticos pelos gregos.

Note-se nesse texto de Suetônio a caracterização do “literato”, que deve saber


expressar-se muito bem e de modo artístico, sendo realmente estudioso e intérprete
dos poetas. Por outro lado, destaque-se a expressão “[...] possint dicere aut scribere”;
dá-se à expressão oral a mesma importância que à escrita, de modo que um literato
não precisava necessariamente ser um escritor.
Havia ainda outras graduações nessa mesma linha, fornecidas por Suetônio no
mesmo capítulo (4, 4-5):

Sunt qui litteratum a litteratore distinguant, ut Graeci grammaticum a grammatista, et illum


quidem absolute hunc mediocriter doctum existiment.

Há os que distinguem “literato” de “literator”, como os gregos distinguem “gramático” de


“gramatista”; àquele consideram douto de modo absoluto e a este apenas medianamente douto.

Fazia-se, portanto, distinção entre “erudito”, “literato” e “literator” entre os


romanos, e entre “gramático” e “gramatista” entre os gregos; há também freqüentes
oposições entre “filósofo” e “filólogo”. Segundo Suetônio, esses qualificativos eram
atribuídos conforme o grau de conhecimento do agraciado, embora os limites fossem
bastante fluidos. Ao que se sabe, não houve contestação quando Eratóstenes e Ateius
se autodenominaram “filólogos”. Plotino (205-269/70 d.C.), porém, contestou a
qualificação de “filósofo” a Cassius Longinus (213-273 d.C.), segundo o relato de
Porfírio (232/3-305 d.C.), em Π ερ ί Πλωτ'ιυου βίου (“Sobre a Vida de Plotino”).

26 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Plotino denominou suas aulas σ υ ν ο υ σ ια ι (“assembléias”), nas quais se liam textos,
logo em seguida comentados pelo mestre. Quando da leitura de Cassius Longinus,
Porfrno conta:

Αναγνωθέντος δέ α ίπ φ του τε Περί άρχών Λογγινου και του Φιλάρχαιου,


φιλόλογος μέν, έφη, ό Λογγίνος, φιλόσοφος δέ ούδαμώς. (14,18-20)

Tendo-se lido para ele Sobre os Princípios e O Amante de Antigiiidades de Longinus, diz
ele: “Longinus é filólogo, mas filósofo de modo algum”.

O motivo de Plotino atribuir a Longinus o qualificativo de “filólogo” c não de


“filósofo” é que Longinus, ao falar de Platão, se atém de preferência aos aspectos
estilísticos. A informação é dada por Proclus (410/12-485) nos Comentários a Timeu
(de Platão), onde afirma que Longinus destaca a preocupação dc Platão “em enfeitar
e diversificar sua linguagem, referindo-se às mesmas coisas uma vez de um modo e
outra, dc outro. Dc fato, chamou a façanha de velha (ά ρ χα ΐο ν ), o texto, de antigo
(π α λ α ιό ν ) e o homem, de não-novo (οΰ νέον)”. São três expressões sinônimas,
certamente buscadas por Platão, que dão ao texto um valor artístico sem diminuí-lo
a qualquer título em seu conteúdo filosófico. Contudo, Orígenes, Aristóxenes,
Jâmblico e Proclus não concordam com esse modo de analisar Platão; Proclus
declara que a única maneira digna de explicar o pensamento de Platão é a filosófica:

ά λλ’ oúk ή πολυπραγμοσύνη τής λέξεως

e não o multiforme emprego dc termos6.

Este episódio mostra que os especialistas sabiam delimitar com bastante pre­
cisão os diversos campos do conhecimento e não admitiam intromissões. Cassius
Longinus faz análise literária de Platão c, por isso, é “filólogo” e não “filósofo”, já
que não discute suas idéias. Por outro lado, Eunapius (345-420 d.C.), em Vita
Sophistarum, chama Iionginus “biblioteca viva e museu ambulante”, o que o torna
um erudito, um filólogo como Eratóstenes e Atcius. Contudo, os comentários
literários que levaram Plotino a qualificar Cassius Longinus de “filólogo” pertence à
seara própria do “gramático” grego ou do “literato” latino, segundo Suetônio. Pelo
que se conhece de Cassius Longinus, pode-se dizer que o filólogo desse período é
também, ou pode ser, analista c crítico literário, ramo que faz parte do universo cul­
tural do “sábio” ou do “erudito”, segundo os padrões da época. Em nenhum dos

6. Cf. Festugière, Proclus: commentaire sur le Timée, Paris, URIN-SNRS, 1966, p. 124 (Proclus, 87, 14-15).

INTRODUÇÃO I 27
autores pesquisados encontrou-se qualquer referência à pesquisa etimológica,
semântica ou formal do léxico como atividade característica ou própria do filólogo,
que eventualmente pode exercê-la.
Quando o cristianismo se impõe, começa a rarear a ocorrência do termo. Não
é encontrado em Santo Agostinho (354 a 430), ou em Anicius Manlius Severinus
Boethius (480-583), nem em Izidoro de Sevilha (602-634), cujas Etymologiae, quase
enciclopédicas, não fazem qualquer menção a filólogo ou à filologia. Desse período,
destaca-se apenas Martíanus Capella com De Nuptiis Mercurii et Philologiae, da
primeira metade do século V: a Filologia, cercada ancilarmente pelas sete artes, sobe
ao céu para se casar com Mercúrio, o deus da eloqüência. Capella é apenas um com­
pilador; na segunda parte, trata superficialmente das sete artes. Filologia em Capella
deve ser entendida no sentido grego, de conhecimentos vastos e múltiplos, com
inclusão das artes em geral e da literatura em particular.
Tudo indica, pois, que o termo “filólogo” deixou de ser corrente a partir do
século VI no Ocidente. A nova mentalidade cristã levou os estudiosos a outra visão
do mundo, a outra mentalidade dominada sobretudo por problemas religiosos; tenta­
va-se suprimir tudo o que não se pudesse cristianizar. Também a cultura greco-latina
passou por esse crivo; textos clássicos eram copiados por necessidade didática, ser­
vindo de modelo estilístico no aprendizado do latim, e isso para um número relativa­
mente pequeno de aficcionados, sobretudo da classe alta. O próprio clero desconhe­
cia o latim, tanto que o papa Zacarias (741-752) se viu obrigado a reconhecer como
válido o batismo administrado com a fórmula: “In nomine de Patria, et Filia et
Spiritua Sancta.”
A tentativa de Carlos Magno (768-814) de reverter essa situação não produziu
os resultados esperados, como também a reforma de Cluny, no século XI. Enquanto
uma restrita intelectualidade ainda se dedicava ao latim, a língua e a literatura gregas
eram praticamente esquecidas em toda a Europa. Apenas com os primeiros movimen­
tos do Renascimento, voltam a ser estudadas; assim, em 1396, Emmanuel Chrysolora
vem de Constantinopla a Florença como professor de grego, depois de um hiato de
700 anos.
Nos séculos XV e XVI, surgem renomados humanistas e a filologia é retoma­
da com a pesquisa “real” dos antigos, buscando uma explicação compreensiva dos
textos. Nessa perspectiva, é preciso citar especialmente a trilogia formada por José
Justo Escalígero (1540-1653), Cláudio de Saumaise (1588-1653) e Isaac Casaubon
(1559-1614). Ligado a esses três e, de certa forma, seu guia, Júlio César Escalígero
(1484-1558), exerceu grande influência tanto pela disputa mantida com Erasmo de
Roterdam (1467-1536) como por suas edições das obras deTeofrasto e de Aristóteles,
a publicação dos seus Poetices Libri VII (1561), de teoria literária, e o De Causis
Linguae Latinae, considerada a primeira proposta de uma gramática latina específi-

28 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


ca. Como humanista, médico e poeta, Júlio César Escalígero é o modelo do “sábio”
ou “filósofo” na acepção grega e latina. O termo “filólogo” volta a qualificar os
expoentes intelectuais, e a filologia ressurge com vigor, como se vê na obra de
Guillaume Budé ou Guliermus Budaeus (1467-1540), dito o Erasmo da França, De
Philologia Libri II (1532), tendo sido um dos primeiros a escrever também em
francês, além de obras redigidas em grego e latim.
Nos séculos XV e XVI, as línguas nacionais se firmam e surgem gramáticas
de todas elas, bem como dicionários e manuais. A grande preocupação é a origem das
línguas, embora os estudos não tenham base científica nem filológica: assim, sob
influência da Bíblia, um número considerável de autores consideravam o hebraico
como a língua primitiva, entre outros, G. Postei, em De Originibus seu de Hebraicae
Linguae et Gentis Antiquitate (“Das Origens, ou da Antiguidade da Língua e do Povo
Hebreus”) (Paris, 1538); e Bibliander, em De ratione communi omnium linguarum et
litterarum commentarius (“Comentário sobre a razão comum de todas as línguas e
letras”) (Zurique, 1548).
Como não se havia descoberto as famílias de línguas indo-européias, nem o
próprio indo-europeu, os estudiosos formulavam teorias nem sempre lógicas e
aceitáveis. Os que então se denominavam filólogos escreveram obras como
Thesaurus Polyglottus (J. Mésiger, Francfurt, 1603), em que são citadas 400 línguas;
ou o Dicionário Multilingüe (Londres, 1677), em que onze línguas se colocam lado
a lado. Surgem os primeiros dicionários bilíngües, como o primeiro inglês-francês de
Randle Cotgrave (Londres, 1632) e em seguida o italiano (1645), o espanhol (Job
Ludolf, 1675) etc.
É sabido que os gregos e os romanos não se interessavam por outras línguas
que não a própria, mostrando até certo menoscabo pelos não falantes do grego ou do
latim ao chamá-los “barbari”. Durante toda a Idade Média, a única língua considera­
da nobre, digna de ser instrumento de arte era o latim; já o grego praticamente foi
esquecido. No Renascimento, nasce o interesse pelas línguas regionais, depois nacio­
nais e os horizontes se ampliam.
Nesse período, os que se denominam filólogos, como Lefèvre, d ’Étaples,
Bibliander, Nebrija, Calepin, Postei, Dubois, Goropius, H. Estienne, Francisco
Sanchez e outros, são assim considerados por se dedicarem a questões relacionadas
com a linguagem ou com línguas; fixa-se então o conteúdo semântico comumente
atribuído ao filólogo: pesquisador da ciência da linguagem e da literatura a partir de
textos. Não mais se aplica aos “de múltiplos e variados conhecimentos” como
Eratóstenes, Ateius e Longinus. Verifica-se, portanto, uma restrição do antigo signi­
ficado do termo. Na prática, filólogo é o que se ocupa sobretudo com o texto escri­
to, principalmente antigo. Não se exige mais que tenha “conhecimentos amplos e
variados”, ainda que se encontre quem os tenha; o recurso a outros ramos do conhe-

INTRODUÇÂO I 2 9
cimento humano, como a geografia, a história, a filosofia, a mitologia, a teodiccia c
outras especialidades, se faz quando o conteúdo especifico do texto o exigir.
Entretanto, entre essas posições encontram-se muitas variações, tanto que mui difi­
cilmente se encontram duas definições iguais de filólogo ou de filologia. A maior
diferença está na amplitude semântica do termo, que vai desde “sábio”, com conhe­
cimentos cm todos os ramos da ciência, ate àquele que estuda apenas a palavra escri­
ta. Rccordcm-se os graus litterator, litteratus, grammaticus c philologus entre os
romanos c γραμματιστής, γραμματικός c φιλόλογος entre os gregos. Moder-
namente, essas distinções perderam o significado e surgiram outras denominações,
como glotólogo, lingüista etc. Não poucos qualificados de filólogos seriam apenas
literatos ou gramáticos entre os antigos; outros, ao contrário, são mais merecedores
do qualificativo “filólogo” que os antigos, cm vista da gama mais ampla de conheci­
mentos de que dispõem.
Os séculos XVII c XVIII foram produtivos cm relação aos estudos lingüísticos
em geral: publicaram-se gramáticas, devendo-se destacar a Grammaire Générale et
Raisonnée (“Gramática Geral e Razoada”) de Port Royal; há muitos estudos de
fonéticas, muitas propostas de reforma ortográfica, pesquisas e teorias sobre a
origem das línguas (devendo-se destacar Giambattista Vico (1668-1744) com
Scienza Nuova), questões estilísticas (as famosas Remarques de Vaugelas), abor­
dagem filosófica da linguagem (Hobbes, Spinosa, Locke, Leibniz, Condillac), inter-
relações das línguas c outros aspectos. São, porém, muito esparsas as referências à
filologia, já que esses séculos são eminentemente teóricos.
O conhecimento do sânscrito, aprofundado no século XIX, é um marco impor­
tante na história do estudo da linguagem e da filologia. As primeiras alusões ao sâns­
crito estão em algumas cartas de Sassetti, do século XVI. Mcncionc-se também a
publicação Memória, do jesuíta Coeurdoux, que teve alguma repercussão, tanto que
o abade Barthélemy, de Paris, lhe pediu uma gramática c um dicionário sânscritos,
em 1763. Contudo, o interesse pelo sânscrito se generalizou entre os estudiosos com
a comunicação que William Jones fez à Sociedade Asiática de Bengala, em 1786, na
qual refere as relações observadas entre o sânscrito de um lado, e o grego, o latim, o
celta, o gótico e o antigo persa, de outro. Ainda no século XVIII, Paulin de Saint-
Barthélemy, por dezesseis anos (1774-1790) missionário cm Malabar, publicou
várias obras sobre o sânscrito: Grammatica Sanscridana (Roma, 1790) c De antiqui­
tate et affinitate linguae zendicae, sanscridanae et germanicae (Pádua, 1799).
Embora se publiquem gramáticas do sânscrito na Inglaterra, como as de Carrey,
Forster, Colebrooke e Wilkins, e até um dicionário (Wilson), é em Paris, no Colégio
da França, que surge o grande centro de investigação do Sânscrito sob a direção de
Silvestre de Sacy, em 1806. Com ele, pesquisam e trabalham Alexander Hamilton,
Chézy, Quatremère, Rémusat, Fauriel, os irmãos Schlegel, Humboldt e Franz Bopp.

30 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Nesse contexto, aplica-se ao estudo das línguas o método comparativo, usual então
nos trabalhos científicos. Os que se dedicam aos problemas da linguagem são chama­
dos filólogos. Analisam, comparam, classificam, estabelecem relações de parentesco
entre as línguas, traduzem e comentam textos, como Ramus Rask (1787-1832), Franz
Bopp (1791-1867) - considerado o fundador da gramática comparada com Über das
Konjugationssystem der Sanskritsprache in Vergleichung mit jenem der griechischen,
lateinischen, persischen und germanischen Sprachen (“Sobre o Sistema de
Conjugação da Língua Sânscrita em comparação com o das Línguas Grega, Latina,
Persa e Germânica”, Francfurt, 1816), Friedrich Schleicher (1821-1867) sobretudo
com a obra Über die Sprache und Weisheit der Indier (“Sobre a Língua e a Sabedoria
dos Indianos”).
Desenvolvem-se, assim, novos campos de estudo comparativo das línguas,
cuja base é o sânscrito; paralelamente, continuava a desenvolver-se a filologia greco-
romana, cujos mentores se mostravam inicialmente desconfiados em relação às novas
orientações; seu trabalho, porém, obteve grandes êxitos sobretudo no trabalho
filológico da crítica textual. Destaca-se, sob esse ponto de vista, Georg Curtius
(1820-1885) que, além de estudar a etimologia do vocabulário grego, escreveu Die
Sprachvergleichung in ihrem Verhàltniss zur klassischen Philologie (“O Comparatis-
mo Linguístico em sua Relação com a Filologia Clássica”, Dresden, 1845); pela
comparação com as outras línguas indo-européias, investiga a história das línguas
clássicas, associando assim os estudos histórico-comparativos com a filologia.
Curtius se considerava filólogo, por entender filologia como o estudo das línguas
sobretudo clássicas, quer de sua literatura quer de sua gramática. Filólogos são tam­
bém considerados os que estudam as línguas românicas; August Schlegel foi pioneiro
nesse campo, com Observations sur la langue et la littérature provençales (“Obser­
vações sobre a Língua e a Literatura Provençais”), de 1818 - obra semelhante à de
Jacob Grimm sobre poetas medievais alemães.
O provençal, língua de uma grande literatura lírica no século XII, atraiu a
atenção dos romanistas; assim, François Raynouard (1761-1836) dedicou-se ao
provençal e publicou Choix des poèsies originales des Troubadours (“Seleção de
Poesias Originais dos Trovadores”), cujo primeiro volume contém uma Grammaire
de la langue romane (“Gramática da Língua Romana”)7; o sexto volume traz uma
Grammaire comparée des langues de l 'Europe Latine (“Gramática Comparada das
Línguas da Europa Latina”).

7. Para Raynouard, as línguas românicas não derivaram diretamente do latim; mas do latim vulgar se derivou
uma “ língua romana”, que ele identifica com o provençal e do qual as outras línguas seriam derivadas.
Aliás, já Dante Alighieri, no De Vulgari Eloquentia, afirmara que o provençal é a língua-mãe do italiano e
do castelhano.

INTRODUÇÃO
Friedrich Diez (Giessen, 1794 - Bonn, 1876), formado segundo os princípios
do romantismo alemão, aplicou às línguas românicas o método histórico-comparati-
vo que Franz Bopp usara no estudo das línguas indo-européias e Jacob Grimm no das
línguas germânicas. Diez começou estudando obras castelhanas antigas, resultando
Altspanische Romanzen, de 1818; passou depois ao provençal, a conselho de Goethe,
a quem fizera a visita quase obrigatória a todos que tivessem alguma pretensão
acadêmica; segundo indicação de Goethe, começou pela leitura das obras de
Raynouard. Resultaram desse estudo Die Poesie der Troubadours (“A Poesia dos
Trovadores”), de 1826; Leben und Werke der Troubadours. Ein Beitrag zur nãheren
Kenntnis des Mittelalters (“Vida e Obras dos Trovadores. Uma Contribuição para um
Conhecimento mais aproximado da Idade Média”), de 1829. Do provençal e do
castelhano, Diez passou a estudar outras línguas românicas e, entre 1836 e 1843,
publicou sua Grammatik der romanischen Sprachen (“Gramática das Línguas
Românicas”), em três volumes; e em 1854, Etymologisches Wòrterbuch der romanis­
chen Sprachen (“Dicionário Etimológico das Línguas Românicas”). Logo na
primeira página de sua Gramática, Diez faz derivar diretamente do latim vulgar as
seis línguas românicas, que ele havia considerado como tais entre todas as variedades
estudadas. O ponto de partida das línguas românicas é a língua falada pelos romanos,
não a forma escrita, literária, diferentemente do que pensaram Dante Alighieri e
Raynouard. Por isso F. Diez é considerado o pai da Filologia Românica.
As lacunas da obra de Diez, compreensíveis em um pioneiro, foram elimina­
das por Wilhelm Meyer-Lübke (1861-1936). Com sua Grammatik der romanischen
Sprachen (Leipzig, 1890/1892), título idêntico ao da gramática românica de Diez,
amplia consideravelmente o campo românico, pois estuda e inclui todas as línguas e
dialetos. Concebida dentro dos princípios dos neogramáticos, essa Gramática ainda
hoje representa a mais segura codificação da romanística, embora superada em
alguns aspectos, sobretudo fonéticos. Seu Romanisches Etymologisches Wòrterbuch
(“Dicionário Etimológico Românico”), publicado entre 1911 e 1920, embora não
contenha ainda todo o vocabulário românico, continua fundamental para a romanís­
tica; completa e supera o de Diez e o Lateinisch-romanisches Wòrterbuch de G.
Kõrting (1845-1913). Apesar de sua formação neogramática, perceptível também em
outras obras como a sua Italienische Grammatik (“Gramática Italiana”) de 1890 e
Einführung in das Studium der Romanischen Sprachwissenschaft (“Introdução ao
Estudo da Lingüística Românica”), Meyer-Lübke soube avaliar e aceitar as contribui­
ções de correntes novas, como a Geografia Lingüística e Wõrter und Sachen
(“Palavras e Coisas”), da qual foi um dos fundadores.
No âmbito da dialetologia românica, destaca-se Graziadio Isaia Ascoli (1829-
1907), com Saggi Ladini (“Ensaios Ladinos”) (1873), mostrando que o rético, mesmo
fragmentado dialetalmente, constitui de fato uma língua e não apenas ebenbiirtige

32 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Schwestern (“irmãs gêmeas”), segundo definição de Diez. Ascoli soube aplicar ade­
quadamente os princípios da Geografia Linguística em suas pesquisas sobre os diale­
tos italianos, tanto que a obra delas resultante é considerada modelar.
Na história dos estudos da linguagem, a contribuição da Geografia
Lingüística foi importante especialmente depois que J. Gilliéron (1854-1926) lhe deu
fundamentação científica mais sólida. Aplicando os princípios da Geografia
Lingüística, o filólogo Matteo Bartoli (1873-1946) chegou à por ele denominada
Neolingüística, depois rebatizada Lingüística Espacial; os princípios teóricos dessa
corrente foram elaborados por Giulio Bertoni (1878-1941) sobre a fundamentação
idealista de Benedetto Croce e Karl Vossler. De início, Bartoli era ligado aos neogra-
máticos, principalmente a Meyer-Lübke; como romanista, recolheu tudo o que pôde
da boca do último falante do dialeto dalmático, o veglioto, o que representa hoje a
fonte disponível mais importante dessa língua românica morta. Bartoli pesquisou os
estratos lingüísticos da antiga Dalmácia e da península da Istria, particularmente da
toponímia; daí surgiu a necessidade da criação do termo “substrato” para designar os
vestígios deixados pela língua de um povo que desaparece na língua de outro que se
lhe sobrepôs. Esse conceito se revelou fecundo em suas aplicações.
No campo românico, surgiu também a onomasiologia, que estuda “como um
objeto ou um conceito é expresso dentro de um domínio lingüístico determinado”,
abrangendo os campos da lexicologia, da semântica e da geografia lingüística, segundo
Vittorio Bertoldi. O nome, porém, é criação do romanista austríaco AdolfZauner (1870-
1943) em Die romanischen Namen der Kôrperteile (“Os nomes românicos das partes do
corpo”). Os estudos onomasiológicos se multiplicaram depois da publicação dos Atlas
Lingüísticos, aproximando-se do método Wôrter und Sachen, com o qual têm pontos de
contato. Com isso, a pesquisa léxica não se restringiu à fonética ou à semântica; tornou-
se uma verdadeira biografia da palavra. Um exemplo dessa tendência é o Franzõsisches
Etymologisches Wõrterbuch (FEW) do romanista suíço Walter von Wartburg (1888-
1971), em que tenta mostrar influências e cruzamentos semânticos e formais entre os
vocábulos no decurso da história, sua vitalidade, extensão etc. Estudando a influência
dos povos germânicos sobre o latim vulgar e as diversas variedades de romances, o autor
criou o termo “superstrato”, análogo ao “substrato” de Ascoli. E o romanista holandês
Marius Valkhoff (*1905) propôs “adstrato” para designar as influências entre duas lín­
guas justapostas ou superpostas, termo mais aceito que seu sinônimo “parastrato”.
Em outros movimentos, correntes e teorias relativas à linguagem, que surgi­
ram no fim do século XIX e início do XX, como a Teoria das Ondas, de Johannes
Schmidt (1843-1901), e a Escola Idealista e Estética, de Karl Vossler (1872-1949),
não se faz distinção entre filologia e lingüística. Como “estudo científico da lin­
guagem”, a lingüística tomou grande impulso depois de Ferdinand de Saussure
(1857-1913), considerado o pai da lingüística moderna.

INTRODUÇÃO | 33
Levando em conta a posição de destaque de Saussure e a grande aceitação que
teve sua teoria lingüística, convém analisar com mais detalhe o que diz sobre o con­
ceito de Filologia, em Cours de Linguistique Générale, obra póstuma, publicada por
dois discípulos seus - Charles Bally (1865-1947) e Alberto Sechehaye (1870-1946)
- e m 1916, com base em anotações de aulas. Aí Saussure estabelece as seguintes
fases do estudo da linguagem:
A primeira fase é assim caracterizada:

Grammaire, inaugurée par Ics grccs, continuée principalement par les français - fondéc sur
la logique et depourvue de toute vie scientifique et désintéressée sur la langue elle-même.

Gramática, inaugurada pelos gregos, continuada sobretudo pelos franceses - fundada sobre
a lógica c desprovida de qualquer vida científica e desinteressada da própria língua.

Não parecem justas essas afirmações; basta considerar o caráter não normati­
vo da Gramática de Dionísio Trácio, a primeira a surgir no Ocidente. Também não se
pode ignorar totalmente a tradição gramatical latina, embora sua contribuição não
seja altamente considerável; dizer que os franceses foram os principais continuadores
dos gregos é desconhecer a escola irlandesa dos séculos V-VII, além das escolas
árabes de Kufah e Bassora, por exemplo. E também, no mínimo, um exagero negar
aos estudos gramaticais e lingüísticos dos gregos todo caráter cientifico.
A fase seguinte é a filológica:

Ensuite parut la philologie. II existait déjà à Alexandrie une école “philologique”, mais ce
terme est surtout attaché au mouvement scientifique créé par Friedrich August Wolf à partir de 1777
et qui poursuit sous nos ycux.

Em seguida apareceu a filologia. Em Alexandria já existia uma escola “filológica”; esse


termo, porém, está ligado sobretudo ao movimento científico criado por Friedrich August Wolf a
partir de 1777 e que continua sob nossos olhos.

Sobre a escola filológica de Alexandria já se falou aqui com referências a


nomes, obras e métodos de trabalho. Quanto à filologia moderna, Saussure a liga
sobretudo ao movimento iniciado pela posição tomada por Friedrich August Wolf
(1759-1824): ao matricular-se na Universidade de Gõtting, Wolf conseguiu fazê-lo
como “studiosus philologiae” e não “theologiae”, como era costume. Queria a inde­
pendência da filologia. Posteriormente, como professor da Universidade de Halle,
criou um novo método de interpretação dos clássicos e sua obra Prolegomena ad
Homerum (Halle, 1795) abalou os meios humanistas da época; exigia maior rigor
científico na interpretação dos clássicos. Com Darstellung der Altertumswissens-
chaft nach Begriff, Umfang, Zweck und Wert (“Apresentação da Ciência da Antigüi-

34 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


dade segundo Conceito, Abrangência, Finalidade e Valor”), Wolf deu início à publi­
cação da revista Museum der Altertumswissenschaft (“Museu da Ciência da
Antigüidade”), em 1807; dedicada a Goetlie, a Darstellung é considerada o manifes­
to da nova filologia clássica, ainda viva no início do século XX, segundo testemunho
de Saussure.
A terceira fase, segundo Saussure:

“Philologie comparative” ou “grammaire comparée”. Commencement par 1’orientaliste


anglais W. Jones (+1794). En 1816, Franz Bopp (“Système de la conjugaison du Sanscrit”) étudie
Ies rapports qui unissent le sanscrit avec le germanique, le grec, le latin etc. (Cours, pp. 13-15)

“Filologia comparativa” ou “gramática comparada”. O começo é do orientalista inglês W.


Jones, falecido em 1794. Franz Bopp (“Sistema da Conjugação do Sânscrito”) estuda as relações
que unem o sânscrito com o germânico, o grego, o latim etc.

Saussure refere-se à descoberta do sânscrito, ao papel de W. Jones e ao tra­


balho de Bopp (ver p. 31). Deve-se notar, porém, que “gramática comparada” é uma
expressão comumente atribuída a F. Schlegel; não existe, entretanto, nenhuma obra
dentro do comparatismo intitulada “filologia comparada”.
Os enunciados de Saussure traduzem mais uma vez a polissemia dos termos
“filologia” e “gramática”, tanto que ele mesmo sente a necessidade de definir melhor
o objeto da filologia:

La langue n’cst pas 1’unique objet de la philologie, qui veut avant tout fixer, interpreter,
commenter Ies textes; cette première étude amène à s’occuper aussi de 1’histoire littéraire, des
moeurs, des institutions etc; partout eile use de sa méthode propre, qui est la critique. Si elle abor­
de Ies questions linguistiques, c’est surtout pour comparer des textes de différentes époques, deter­
miner la langue particulièrc à cltaque auteur, déchiffrer et expliquer des inscriptions dans une langue
archalque et obscure. (Cours, p. 13-14)

A língua não é o único objeto da filologia, que pretende, antes de tudo, fixar, interpretar e
comentar os textos; esse primeiro estudo faz com que se ocupe também com a história literária, cos­
tumes, instituições etc.; em toda parte ela usa seu método próprio, que é a critica. Se aborda as
questões linguísticas, é cspecialmente para comparar textos de épocas diferentes, determinar a lín­
gua particular de cada autor, decifrar e explicar inscrições numa língua arcaica e obscura.

Para Saussure, portanto, a filologia é a ciência que estuda textos e tudo quanto
for necessário para tornar esses textos acessíveis: a língua utilizada e todo o universo
cultural que essa língua representa; isso implica o conhecimento de uma série conside­
rável de outras ciências, como história, geografia, epigrafia, paleografia, hermenêuti­
ca, exegese, edótica, literatura etc. Daí, o filólogo “deve avere un’emdizione molto

introdução | 35
vasta”, resume Cario Tagliavini8. Esse enfoque evoca as figuras de Eratóstenes,
Longinus e Ateius, que tinham o mesmo conceito de filologia; a diferença entre um
filólogo clássico e um moderno está nos meios e no instrumental técnico à disposição
do moderno, além da ampliação enorme dos campos do conhecimento, que os séculos
foram operando. Hoje é praticamente impossível alguém dominar todos os ramos do
conhecimento. Mudaram-se, portanto, as condições gerais, a humanidade progrediu
cada vez mais rapidamente até chegar ao avanço vertiginoso atual da ciência. Nessa
perspectiva, o que Saussure considera filologia se afigura como algo lógico, e não que­
bra o conteúdo semântico do termo, transmitido pela biografia do termo.
Uma pesquisa a respeito das definições de “filologia” em autores renomados
mostra que o termo continua polissêmico. Se cada autor dá sua definição, como veri­
ficou Emílio M. Martínez em seu Diccionario Gramatical, s.v., é porque, segundo
Ernest Renan:

La philologie est, de toutes le branches de Ia connaissancc luimaine, celle dont il est le plus
difficile de saisir le but et runité9.

A filologia é, dentre todos os ramos do conhecimento humano, aquele do qual é mais difí­
cil depreender a finalidade e a unidade.

Dentro dessa imprecisão de finalidade e abrangência, que procede dos próprios


criadores do termo, as definições são formuladas segundo a perspectiva da especiali­
dade de cada um. E assim Schlegel, em 1818, define filologia como “estudo geral das
línguas”, o que parece mais uma definição de lingüística. Heinrich Lausberg a define
como “estudo de todos os ‘discursos’ que os homens pronunciam ou pronunciaram”10.
Caracterização essa inadequada justamente pela imprecisão de finalidade e abrangên­
cia. Também inadequada, por diminuição indevida da abrangência, é a definição apre­
sentada por Joaquim Mattoso Câmara Jr.: “Filologia é o estudo da língua na literatu­
ra”11. Dentre as numerosas definições encontradas, duas se destacam pela adequação;
a primeira é a do filólogo e arqueólogo alemão August Boeckh (1785-1867):

Philologie ist die Erkenntnis des Erkannten.

Filologia é o conhecimento do conhecido.

Semelhante em seu conteúdo significativo, mas em outros termos é a de


Ernest Renan:

8. Le origini delle Ungue neolaíine, p. 56


9. Lavenir de Ia Science, p. 126.
10. Linguística Romànica, vol. I, p. 37.
11. Dicionário de Filologia e Gramática, s.v.

36 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÀNICA


La philologie [...] est Ia Science des produits de 1’esprit humain12.

A filologia [...] é a ciência dos produtos do espírito humano.

Em conclusão, a biografia do termo “filólogo” pode ser dividida nas seguintes


fases:

1. As primeiras ocorrências nos textos gregos dos séculos V e IV a.C. apresentam a


acepção etimológica de “amigo da palavra”, isto é, aquele que gosta de falar ou
de ouvir a palavra. Um ou outro texto sugere a conotação de “tagarela”, como
Ateneu, (38b); a grande maioria, porém, dá ao termo o significado de “estu­
dioso”, “que gosta de aprender”, como em Plutarco (Catão Maior, 22, 2) e Cícero
(Ad Atticum, 11, 17) , ou de “culto”, “sábio”, “refinado”, como estágio subse-
qüente de quem aprendeu através da palavra, como em Aristóteles {Retórica,
1398b) e Cícero (Ad Atticum, XIII, 12, 3).
2. Com Eratóstenes de Círene (275-194 a.C.), filólogo é sinônimo de sábio, pessoa
de vasta cultura e conhecimentos em todos os ramos, expressos em muitos livros.
Trata-se de uma espécie de título, posteriormente atribuído também a Ateius e
Longinus. Esses filólogos estão sempre relacionados com a palavra - escrita ou
falada ou ouvida - em geral. De fato, é uma especialização semântica do vocábu­
lo, mas que coexiste com o significado etimológico e suas derivações polissêmi-
cas mais imediatas. Nessas acepções, o termo é encontrado em textos até o sécu­
lo VI, quando se torna raro até praticamente desaparecer.
3. Com os primeiros indícios do Renascimento, na segunda metade do século XIV,
volta-se a estudar novamente os clássicos na Itália e depois^em toda a Europa.
Reaparecem os filólogos, como os Escalígeros, Saumaise, Casaubon, Wolf, entre
tantos outros nomes conhecidos, que estudam, comentam e editam os clássicos
latinos e gregos. Com isso se fixa o conceito moderno, em sentido estrito, de
filologia como a ciência do significado dos textos; e em sentido mais amplo,
como a pesquisa científica do desenvolvimento e das características de um povo
ou de uma cultura com base em sua língua ou em sua literatura.

CONCEITO DE ROMÂNICO

Entendida como ficou definida, a filologia pode ser germânica, clássica, esla­
va, românica etc., conforme seu objeto específico. Assim, a filologia será “români-

12. Lavenir de Ia Science, pi 138.

INTRODUÇÃO 37
ca” se tiver como objeto específico as línguas e os dialetos que se originaram do
latim vulgar, e suas respectivas literaturas de qualquer espécie, desde as origens até
sua situação atual.
“Românico” é um derivado parassintético de “romano”, que é por sua vez pro­
veniente de “Roma”. Os habitantes de Roma eram chamados “Romani”, em oposi­
ção aos “Latini” e, posteriormente, a outros povos do Império Romano. Os latinos
eram os habitantes da planície do Latium, um povo de origem mista, vivendo em
numerosas comunidades pequenas, “populi”; nos séculos VI-IV a.C., foram se agru­
pando em associações maiores, cujos fundamentos eram religiosos; a maior delas foi
a de Júpiter Latiaris, no Monte Albano, presidida por Roma. A partir do século III
a.C., Roma se impôs sobre os demais povos, tornando mais distintos os conceitos
“latino” e “romano”. “Romano” tinha, origínariamente, um conteúdo étnico e políti­
co, como nas expressões “civis Romanus” ou “populus Romanus”. Depois, com a
expansão do Império, o direito civil manteve em evidência o significado político de
“Romano”. Com o edito de Caracala, de 212 d.C., que concedeu a cidadania romana
a todos os habitantes livres do Império, todos passaram a ser chamados romanos; o
termo assumiu um conteúdo coletivo e passou a designar os povos mais diversos.
Do ponto de vista linguístico, todos os que falavam latim eram chamados
“Romani” em qualquer parte do Império. Desse fato surgiu o derivado România
(roman(us) + -ia), da mesma foram que se formaram Gallia, Lusitania, Britannia etc.,
para designar o conjunto dos territórios onde se falou latim e, posteriormente, os ter­
ritórios onde se fala uma língua românica. O termo aparece pela primeira vez em
Paulo Orósio, no século V, num tópico em que afirma ser intenção de Ataulfo, o
Godo, fazer nascer a Gótia sobre as ruínas da România. As antigas denominações
Imperium Romanum, Orbis Romanus são substituídas pela nova designação.
Com a queda do Império Romano no século VI, “Romanus” e “Romania”
ficaram semanticamente restritos ao campo lingüístico e cultural; “Romani” desig­
nava os que falavam uma língua derivada do latim - uma “Romana Lingua”. Essa
expressão está documentada no Art. 17 dos cânones do Concilio de Tours, do ano
813, no qual se ordena aos pregadores em geral e aos bispos em particular que tradu-
zam suas homílias “in rusticam Romanam linguam aut Thiotiscam” (ver texto com­
pleto à p. 173).
Os mesmos dizeres são novamente encontrados no II Concilio de Reims, reu­
nido naquele mesmo ano na antiga Durocortorum Civitas Remorum; o cânon XV
não cita diretamente uma variedade lingüística “romana rustica”, mas ordena que
os sermões e as homílias sejam proferidos “secundum proprietatem linguae”
(“segundo as diferenças de língua”). Entretanto, ο I Concilio de Mogúncia, realiza­
do em 847, volta a repetir a mesma prescrição, exatamente com os mesmos termos,
do Concilio de Tours.

38 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


O significado cultural da expressão “Romana Lingua” fica claro quando com­
parado com o da “Thiotisca”. Reconhece a existência de novas línguas distintas do
latim, o que se verifica novamente nos Juramentos de Estrasburgo, proferidos no dia
14 de fevereiro de 842. Nesse documento se estabelece ainda com maior clareza a
distinção entre os “Romani”, a população da antiga província romana da Gália, e os
“teutos”, isto é, os habitantes dos territórios de além do Reno.
Embora mais raramente, já no latim arcaico se usava o adjetivo “Romanicus”
no sentido de “à maneira romana”; posteriormente, “Romanicus” associou-se ao
novo conceito de România; daí que Romanice fabulare ou parabolare, “falar roma-
nicamente” se opõe a Latine ou Romane loqui, “falar latinamente ou romanamente”.
Desse modo, a forma sincopada desse advérbio latino - “romance” - passou a desig­
nar as variedades lingüísticas derivadas do latim:

port. romance
ant. cast. romanz e romance
ant. prov. romans
ant. fr. romanz
rét. rumantsch e romontsch
it. romanzo

No português, de romancium, termo do latim medieval, originou-se romanço, “lín­


gua românica”; na comparação românica, surgiu protoromanço, indicativo dos “tra­
ços fonológicos, morfológicos e sintáticos latinos que explicam os traços correspon­
dentes nas línguas românicas”13. Nessa protolíngua, que é uma dedução teórica do
método histórico-comparativo, só entram elementos colhidos nas línguas românicas,
incluindo-se os do latim literário recebidos por via culta. Nesse particular, essa pro­
tolíngua difere do latim vulgar.
Na Idade Média, escrever em francês era escrever em romance, como Li
romanz de Renarf, as composições de Dante, Petrarca e Boccaccio em italiano eram
romanzi; e os verbos correspondentes eram enromancier ou romancier, romanzare e
romanzar. O termo “romance” passou a designar as obras literárias escritas em qual­
quer uma das línguas românicas. Eram geralmente obras de ficção, em prosa ou em
verso, que ficavam desse modo ao alcance de um público mais amplo, sobretudo
feminino, já que o latim se tornara a língua só dos cultos.
Com a decadência da poesia épica e cavalheiresca, no final do século XVI,
firma-se, na Inglaterra e na Alemanha, o gênero “romance”, como sinônimo de nar­
rativa dos novos tempos, escritos na língua do povo. Houve assim uma ampliação

13. J. Mattoso Câmara Ji\, Dicionário de Filologia e Gramática, s.v.

INTRODUÇÃO I 39
semântica do termo, de designativo da língua utilizada para o próprio texto. Nessas
narrativas predominava a emoção, não raro exagerada, proporcionando ao termo
“romântico”, dado aos apreciadores dessa literatura, uma conotação pejorativa. Com
J. G. von Herder (1744-1803), que deu ao romantismo um valor estético próprio, res­
peitável; com os irmãos Grimm, que recolheram contos, narrativas e lendas entre
lenhadores e carvoeiros, e com von Arnim e Brentano, que fizeram o mesmo com os
cantos populares, o movimento romântico se firmou. Formaram-se com isso novos
campos semânticos, com base em “romano”.
A denominação România continuou sendo usada em regiões do antigo
Império Romano, em que não surgiu um centro de projeção maior que lhes impuses­
se outro nome. É o que se verifica na Península Balcânica, onde se encontra a
Romênia, no território da antiga Dácia, e cuja língua se chama limba romana ou
romaneascã; os habitantes da região ao sul do Danúbio são chamados aromâni, e os
de uma pequena região do nordeste da Península da Istria se denominam rnmeri.
Essas denominações supõem um período em que todos os habitantes dos Bálcãs eram
chamados simplesmente de “romani”; não tinham nenhum laço político estável, por
serem nômades e, por isso, o rom. român tem o significado também de “pastor” e
“escravo”, conteúdo semântico dado pelos dominadores eslavos. A falta de centros
políticos, administrativos e comerciais fez com que os habitantes da antiga Récia
também atribuíssem a si mesmos o nome de “romani” por oposição aos “barbari”;
daí proveio rumantsch ou romontsch com que se designa a variedade lingüística dos
Grisões na atual Suíça, além do nome do próprio povo: pievel romontsch.
O nome “România” continua ainda na província italiana da Romagna
(< Romania), nome atribuído por Constantinopla no período em que essa província
italiana fazia parte do Império do Oriente, e assumido pelos vizinhos lombardos.
Além dos já citados, em diversos campos semânticos, Roma e Romano deram
origem a um número considerável de derivados. Ficando apenas no português, por
motivo de brevidade, tomado como exemplo, encontram-se;

romã, de romana mala, “fruta romana” (antes de 1377), com os derivados ver­
náculos romanal, romãzeira, romeira, romãzeiral·,
romagem (< prov. romeatge (1533));
romaico (< ρομα,ικός, grego mod., “relativo a Roma ou aos romanos”);
romança (< it. romanza', daí a variante romanza);
romanceiro (< cast. romancero);
romancista (1623), romancear (século XVII);
romanesco (< fr. romanesque\ século XIX);
romanidade',
romanin (< it. romanino, “moeda dos papas de Avinhão”);

40 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


romanisco\
romanizar, romanização, romanizante, romanizador;
romanear, “pesar em balança romana”;
romaneio, “lista com especificações de mercadorias”;
romanesco, romanescar,
romanho, romanhês, romanholo;
romani, “dialeto cigano”;
romanicista, romanicismo',
romanofilia, “amizade pelos romanos”;
romanofobia, “medo dos romanos”;
romanologia, romanologista, romanologismo\
romantesco, romantice, romanticidàde, romanticismo;
romântico, romantismo, romantizar, romantização;
romão de romanu > romãnu > romãu > romão (século XIII);
romar, romeiro, romaria (1282), romaico e roméico, romeirista, “organizador
de romarias”;
romeu;
romípeta, romífuga\
romenismo, romenista, romenidade.

Essa produtividade tão expressiva, em campos semânticos tão variados, mos­


tra a grande influência que Roma exerceu e vem exercendo, tanto como a capital do
Império Romano quanto como sede do cristianismo, sobre a cultura e a civilização
ocidentais. Esse é o mundo com o qual a Filologia Românica se relaciona, estudan­
do suas línguas e seu universo cultural.

DIACRONIA DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS

Toda variedade lingüística pode ser estudada, sob o ponto de vista diacrônico,
em sua história externa ou interna. Sob o prisma da história externa, investigam-se a
origem da língua ou do dialeto, o território ocupado e possíveis expansões, as influên­
cias do substrato, do superstrato e do adstrato, os fatos políticos, econômicos, sociais
e culturais que, de alguma forma, influíram em sua evolução; além disso, podem ser
importantes para a correta compreensão de sua evolução, o número de seus falantes,
o volume de obras que dela se serviram, a penetração de seu léxico, principalmente,
nos falares dos povos vizinhos etc. Este é o objeto de estudo do presente volume.
A história interna estuda a língua em sua evolução interna, ou seja, nos vários
níveis linguísticos - fonético, morfológico, sintático, léxico e mesmo estilístico até

INTRODUÇÃO 41
certo ponto. Em Filologia Românica, esses dois aspectos são pesquisados no latim e
suas variedades, sobretudo a vulgar, e nas línguas e dialetos românicos. Os textos
constituem a base de pesquisa; mas é importante que essa base seja realmente con­
fiável. Essa confiabilidade é obtida através do trabalho filológico da Edótica, cujos
passos principais são indicados a seguir.

42 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


1
Ο Τ RABALHO

F il o l ó g ic o

Ο trabalho filológico tem por objetivo a reconstituição de um texto, total ou


parcial, ou a determinação e o esclarecimento de algum aspecto relevante a ele rela­
cionado. Estende-se desde a crítica textual, cujo objeto é o próprio texto, até as ques­
tões histórico-literárias, como a autoria, a autenticidade, a datação etc., e o estudo e
a exegese do pormenor.
Os princípios científicos do trabalho filológico rigoroso se devem a Karl
Lachmann (1793-1851), a quem se devem também as primeiras edições críticas da
filologia clássica; em seguida, o método foi aplicado à filologia germânica e à filo­
logia românica. Lachmann expôs suas posições teóricas e metodológicas nas edições
do Novo Testamento em grego (1842-1850) e do poema De Rerum Natura de
Lucrécio (1850). Giorgio Pasquali (1865-1952), com Storia delia tradizione e criti­
ca dei testo (“História da Tradição e Crítica do Texto”), de 1934, continuou e com­
pletou as definições de Lachmann. Antes deles um texto era reproduzido com base
em apenas um manuscrito, que nem sempre era o melhor, apenas o mais próximo e
acessível ao editor; a escolha de eventuais variantes era feita com critérios subjetivos.
Entretanto, do Renascimento até Lachmann surgiram grandes filólogos, cujas edi­
ções críticas de autores gregos e latinos não foram superadas até hoje, baseadas que
foram em sólidos princípios críticos e hermenêuticos, mas que não fizeram escola.
Como exemplos, citem-se Erasmo de Rotterdam (1466-1536), José Justo Escalígero
(1540-1609), Dionísio Lambino (1520-1572), os holandeses Justo Lípsio (1547-
1606) e Nicolás Heinsius (1620-1681), Jean Leclerc (1657-1736), Richard Bentley
(1662-1742), considerado o filólogo mais importante antes de Lachmann.
Modernamente, de acordo com as melhores doutrinas, o trabalho filológico é
feito em três etapas, que serão discutidas a seguir.

CRÍTICA TEXTUAL

O objetivo desta primeira etapa é a reconstituição do texto, isto é, tentar


“emendar” o texto para aproximá-lo ao máximo da forma que recebera do próprio
autor. Consta das seguintes fases discutidas a seguir.

RECENSIO

Esta fase foi denominada recensio (“recenseamento”) por Lachmann; consis­


te no levantamento de todos os códices14 existentes da obra a ser publicada.
Distingue-se aqui a tradição direta da tradição indireta. A tradição direta é constituí­
da pelos manuscritos ou pelas edições impressas da obra. Os manuscritos podem ser
do próprio autor, denominados então “autógrafos”, ou de copistas, chamados “apó-
grafos”. A tradição dita indireta é constituída por versões, comentários, citações, alu­
sões, glosas, paráfrases e imitações, além das fontes. Ainda que devam ser utilizados
com cautela, os dados fornecidos pela tradição indireta podem ser de grande utilida­
de para a compreensão do texto.
A recensio pode levar a resultados diversos: achar-se um manuscrito único
(codex unicus), ou uma só edição de um texto impresso (editio princeps), ou vários
manuscritos do mesmo autor (codices plurimi), ou ainda várias edições. Tratando-se
de manuscritos da Antigüidade Clássica, de papiro ou de pergaminho, a recensio
requer normas específicas, uma vez que os manuscritos existentes distam vários
séculos de seus autógrafos. Note-se que o próprio autógrafo saía não raro com erros;
prova-o a queixa de Cícero a seu irmão Quinto:

14. C ódice designa um lexlo manuscrito, geralmente antigo, grafado em papiro ou pergaminho. Não se confun­
de com nenhuma acepção de “ código” .

44 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


[...] ita mendose et scribuntur et veneunt15.

[...] assim enganosamente tanto se escrevem como se vendem.

Recorde-se ainda que, naquele tempo, cada edição constava apenas de um exemplar,
escrito à mão; toda multiplicação era feita da mesma maneira. Os copistas, embora
frcqücntasscm escola específica existente cm Roma, erravam em seu trabalho por dis­
tração, cansaço, má leitura e até por decisão própria. Se os próprios autores clássicos,
como Cícero c Marcial, se referem a obras suas com erros e defeitos, é possível ima­
ginar o grande número de erros e defeitos de toda espécie nas cópias feitas durante
séculos, como nos 400 códices da De Consolatione Philosophiae, de Boethius16.
Nem sempre é fácil completar a recensio, sobretudo, se a obra estiver em
códices, que percorrem muitas vezes caminhos estranhos através de leilões, furtos,
doações c muitas circunstâncias estranhas. Como exemplos, Petrarca encontrou em
Liège, na França, dois discursos de Cícero, até então desconhecidos, um dos quais
era o Pro Archia·, Afrânio Peixoto arrematou manuscritos dos séculos XVII e XVIII,
que continham poesias de Gregório de Matos Guerra, num leilão em Lisboa. Os
manuscritos de Cláudio Manuel da Costa foram arrematados num leilão da bibliote­
ca particular do poeta José Maria Herédia, em Paris, por Caio de Melo Franco.

COLLATIO CODICUM

Completada a recensio direta e indireta, passa-se à fase seguinte, a collatio


codicum, isto é, a comparação dos diversos códices ou edições da tradição direta.
Depois de um exame geral, seleciona-se um manuscrito mais completo ou que pare­
ça bom, ou, no caso do impresso, a última edição ou outra que se afigure melhor; esse
manuscrito ou essa edição torna-se a base da comparação, sendo denominado apenas
“texto” ou “exemplar de colação”. O resultado imediato desse trabalho é a elimina­
ção dos chamados codices descripti, isto é, as cópias de um modelo existente e
conhecido, denominado “exemplar de cópia” ou “antígrafo”. Como é óbvio, o conhe­
cimento do antígrafo torna o apógrafo sem qualquer valor para a crítica textual; por
isso, a eliminatio codicum descriptorum significa rejeitar as cópias coincidentes, por
não trazerem nenhuma contribuição ao trabalho filológico.
Há muitos aspectos e problemas que devem ser levados em conta pela collatio.
Comum é a inserção de um fragmento de extensão variável na cópia de um documento

15. Ad Quintum, III, 5.6.


16. Cf. Segismundo Spina, Introdução à Edótica, pp. 87-88

O TRABALHO FILOLÓGICO I 45
ou texto literário, com que se altera o original, fato denominado “interpolação” e que,
segundo Lachmann, é suficiente para levar à eliminação do documento; contudo, as par­
tes não contaminadas de um texto podem ajudar a se chegar mais perto do arquétipo ou
do original perdido. Outro princípio da crítica textual diz que “recentiores non sunt dete­
riores” (“os mais recentes não são [necessariamente] os piores”), ou seja, um manuscrito
mais antigo, e assim supostamente mais próximo do arquétipo, não é necessariamente
melhor que um mais recente, pois este pode ter tido como fonte um códice mais perfeito
e completo que os demais. Cita-se como exemplo concreto dessa possibilidade o caso do
manuscrito P, do Livro de Alexandre, datado do século XV, considerado por especialistas
como Miiller e Llorach mais perfeito e íntegro que os testemunhos dos séculos XIII e XIV.
Se na tradição impressa a collatio é relativamente fácil pela multiplicação em
série, com manuscritos exigem-se minuciosos exames e procedimentos específicos.
Assim, caso um manuscrito apresente, em determinado tópico, a ausência de uma ou
mais palavras, ou algum termo deslocado ou ininteligível, e um outro manuscrito tem
furos ou borrões no mesmo tópico, infere-se com clareza que o primeiro é cópia do
segundo. Outros critérios são o confronto dos erros comuns, dos pontos críticos, das
interpolações etc., através dos quais é possível estabelecer as relações de “consangui­
nidade” entre os diversos códices ou as famílias de códices.
Depois desse estudo, passa-se à classificação dos textos, segundo terminolo­
gia própria: o texto original do autor se denomina autógrafo·, uma cópia imediata do
autógrafo é um apógrafo\ o texto existente ou postulado como fruto da reconstitui­
ção e considerado o mais próximo do original, ou “o original das cópias existentes”,
tem o nome de arquétipo ou exemplar ceterorum na nomenclatura de Lachmann; sob
outro ponto de vista, o arquétipo também é chamado codex interpositus, por estar
situado entre o original e os manuscritos existentes. Como nem todos os manuscritos
provêm diretamente de um arquétipo, entre esse e um grupo de manuscritos por vezes
se interpõe um subarquétipo, existente ou reconstituído.

ESTEMÁTICA

Depois de devidamente classificados os documentos pertencentes à tradição


direta, passa-se ao que Lachmann denominara originem detegere, “desvendar a ori­
gem”. Consiste no estabelecimento da genealogia do códice, isto é, sua filiação e
modo de transmissão. O modo de transmissão genealógica pode ser:

a. vertical, quando a derivação é direta do original ou do arquétipo;


b. transversal, quando a derivação é por comparação de textos de épocas, lugares e
valor diferente;

46 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


c. horizontal, se for por colação de textos da mesma época e lugar;
d. por contaminação, nos casos em que o copista inseriu as anotações marginais ou
interlineares, suprimindo com isso os correspondentes tópicos originais; a linha
pontilhada, no stemma, indica esse modo de transmissão.

Fixada a filiação genealógica e o modo de transmissão, constrói-se o stemma


codicum, espécie de árvore genealógica invertida. Embora haja outros critérios, a tra­
dição edótica indica a natureza dos textos através de letras específicas:

Ω simboliza o original, o autógrafo;


(0 simboliza o arquétipo;
α , β, γ, δ... indicam os subarquétipos;
A, B, C, D... indicam os códices existentes em papiro ou papel, os chamados “mem-
branáceos”;
a, b, c, d... indicam os códices existentes em pergaminho, denominados “cartáceos”.

Nem todos, porém, adotam esse sistema para designar os códices. Há os que os
indicam por meio da letra inicial do nome da instituição ou do lugar onde foram encon­
trados, ou ainda do nome de seu proprietário, como se pode ver no estema dos manuscri­
tos da Ars Grammatica, de Dionísio Trácio, no estabelecimento feito por Gustav Uhlig17:

(U)
____________________ |____________________

____(B)_

(C)

I I
V (E)

H____A
f

Nesse estema, M indica o códice Monacensis Victorianus; o L, o Leidensis


Vossianus; G, o Grottaferratensis; V, o Venetus Marcianus; o F, o Fabricii Bibliotheca
Graeca etc. Mesmo nessas indicações, a uniformidade é precária e difícil; assim, por
exemplo, ο V de Gustav Uhlig é M em E. Bekker, por ser inicial de Marcianus. Na

17. Dionysii Thracis Ars Grammatica, pp. XXX e 215-216.

O TRABALHO FILOLÓGICO I 47
convenção edótica geral, não há esse problema, como se pode verificar no estema de
Ars Donati, de Louis Holtz; note-se que o autor indica a transmissão transversal não
por linha pontilhada, mas pela letra ou letras do “terminus a quo”, entre parênteses,
como por exemplo (G) (ver p. 49).

EMENDATtO

Emendatio é o nome dado ao conjunto das operações que visam à correção do


texto. E certamente a parte mais importante desse processo da reconstituição do
texto, porque, segundo um postulado da tradição manuscrita, “quem diz cópia, diz
erro”. Um exame de qualquer apógrafo revela tópicos mal transcritos, obscuros, com
interpolações, erros gramaticais e expressões estranhas, distoantes daquilo que se
conhece do autor, além de muitos outros problemas e dificuldades de vários tipos.
O primeiro passo será fazer modificações na escritura manuscrita, procuran­
do adequá-la à tradição impressa com a aplicação dos princípios da paleografia.
Depois, para a correção dos erros, pode servir-se dos subsídios que os próprios códi­
ces lhes oferecem: tem-se então a emendatio ope codicum. Caso, porém, os códices
não sejam suficientes sob esse ponto de vista, o filólogo deverá utilizar-se de sua
intuição e de seus conhecimentos, fazendo então a emendatio ope ingenii ou emen­
datio ope conjecturae, ou ainda, divinatio ou crítica conjectural.
Na emendatio ope codicum, fazem-se uma comparação e um exame das
variantes encontradas nos códices estudados na collatio. Escolher-se-á a variante que
obedecer ao cálculo das probabilidades, à lei da maioria; assim, numa tradição de três
ramos - A.B.C. - deverá ser adotada a variante que ocorre em dois, porque não é lógi­
co supor que dois copistas fizessem a mesma inovação na mesma passagem. Caso
um tópico apresente três variantes, a solução não poderá ser alcançada ope codicum.
As lições de um único códice, chamadas “leituras singulares”, devem ser eliminadas.
Por vezes, as indicações da tradição indireta podem esclarecer passagens corrompi­
das como no final do capítulo VI, Livro I, dos dois manuscritos do Orto do Esposo,
da Biblioteca Nacional de Lisboa, onde se lê:

Eu asy como a amor do recebimento estendí os meus ramos e os meus ramos são de õrra e de graça.

O termo recebimento não faz sentido algum na frase. Como, porém, se trata de uma
citação bíblica, do livro do Eclesiástico, 24:22, facilmente se descobre o erro com o recur­
so à fonte: “Ego quasi terebinthus extendi ramos meos, et rami mei honoris et gratiae.” O
termo “terebinto” era certamente desconhecido e estranho ao copista e por isso foi substi­
tuído por outro que pareceu semelhante ao original, pelo menos ao próprio amanuense.

48 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


O TRABALHO FILOLÓGICO

Estema dos principais códices da Ars


Donati, segundo Louis Holtz, em Donat et
Ia tradition de 1’enseigm ent gram atical.

-L.
O
DONATO

Ano

500

600

700

800

900

1000
A emendatio ope conjecturae envolve a intuição do filólogo c o conhecimen­
to profundo que deve ter do autor, da arte e da época do texto estudado. Essas quali­
dades lhe permitem até recriar passagens mutiladas ou totalmcnte danificadas por
manchas, desgastes ou perfurações dos códices. Essa intuição vem sendo cientifica­
mente amparada pela psicologia da cópia, ou melhor, pela psicologia da atenção. A
atenção é o suporte psicológico da boa ou má transcrição de qualquer texto. O can­
saço, as interrupções do trabalho pelas mais diversas razões, as falhas de memória na
retenção dos segmentos a transcrever, os erros de leitura ocasionados pelos movi­
mentos dos olhos do original para a cópia e vice-versa, a semelhança dos termos
parônimos, dos homógrafos heterofônicos e incontáveis outros motivos são objetos
da psicologia da atenção. O filólogo, conhecendo bem essa psicologia da atenção,
está em boas condições para a emendatio ope conjecturae.
Os erros podem ser também causados pela cultura, pela profissão, pelo sentimen­
to patriótico, pela religião ou nacionalidade do copista. Assim, o copista culto, que conhe­
cia o tópico de Virgílio, “summa papavera carpit” (Eneida, IV, 486), copiou “papavera”
em vez de “summa cacumina carpit” ao transcrever Ovidio. Termos mais raros e, por
isso, desconhecidos são substituídos pelos parônimos fonéticos, como no Miles
Gloriosus de Plauto, o copista substituiu heminas (v. 831) porfeminas (“venda de lã para
os olhos” e “mulheres” - numa indesejável modificação semântica, portanto). Um copis­
ta de origem germânica escreverá, como pronuncia, suafis por suavis ou fotum por votum.
Um documento impresso do Auto das Barcas, de Gil Vicente, conservado na Biblioteca
Nacional de Madri, mostra que o tipógrafo desconhecia a língua com que trabalhava,
introduzindo grande número de castelhanismos como libros, estoy, tenemos, otra etc.
O fato de os copistas tentarem sempre tornar os textos mais inteligíveis, subs­
tituindo o que lhes parece menos usual, levou Karl Lachmann ao princípio da “lectio
difficilior preferenda est facioliori” (“a leitura mais difícil deve ser preferida à mais
fácil”). O conhecimento que o filólogo deve ter do estilo do autor, das condições lin-
güísticas de sua época faz com que respeite o princípio do “usus scribendi”, aplica­
do desde a época dos alexandrinos. O exemplo de respeito a esse princípio foi dado
por Aristarco, que consultava a “consuetudo” antes de se decidir por alguma varian­
te dos manuscritos de Homero.
Na emendatio ope conjecturae, merecem atenção especial as interpolações,
mais freqüentes nos documentos de história e de direito, como também as glosas
explicativas, inserções de correções e anotações marginais no próprio texto da cópia;
mais complicantes são as glosas interlineares, mais facilmente incorporadas ao pró­
prio texto. Mais comum é a substituição da palavra pela glosa, embora haja casos cm
que a palavra glosada se mantém.
Há ainda muitos aspectos que a emendatio deve levar devidamente cm conta;
o que se disse, porém, é suficiente para mostrar tanto as dificuldades como a impor-

50 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


tância dessa etapa do trabalho filológico; realmente, da exatidão desse trabalho e dos
acertos do filólogo nas escolhas dependem o valor e a qualidade do texto final.

CRÍTICA HISTÓRICO-LITERÁRIA

Terminado o trabalho da crítica textual com a reconstituição do texto, passa-


se ao estudo dos vários aspectos da chamada crítica histórico-literária, que procura
esclarecer possíveis pontos obscuros, eliminar lacunas no conhecimento de dados a
respeito do texto etc. Aqui também são usados os critérios internos fornecidos pelos
próprios documentos, como também os critérios externos, sobretudo citações, alu­
sões, referências etc. A crítica histórico-literária aborda os itens identificados a
seguir.

AUTENTICIDADE

Autenticidade diz respeito à autoria do texto, que se dirá autêntico se realmen­


te for do autor ao qual se atribui. A autoria, sobretudo no caso dos manuscritos, fre­
quentemente não é clara; havendo qualquer dúvida, cabe ao filólogo a tarefa de resol­
vê-la. Assim, o conhecido Appendix Probi recebeu esse título por ter sido encontrado
no fim do livro Instituta Artium, de Valerius Probus (fim do século I d.C.); contudo,
essa relação de 227 pares de palavras, uma pertencente à norma culta e a outra, à vul­
gar, como viridis non virdis, não pode ser da autoria de Valerius Probus porque, em
nenhuma passagem de Instituta Artium, sequer faz referência à norma vulgar. Não é,
portanto, coerente supor que viesse a fazer uma relação em que opõe duas variedades
linguísticas, uma das quais ignorou sistematicamente em toda a obra. Esse documen­
to deveria denominar-se Appendix ad Probum, segundo sugeriu Friedrich Diez.
Utilizando-se os princípios do critério interno, Afrânio Peixoto estudou o léxi­
co, as expressões típicas, os torneios próprios etc. das Cartas Chilenas, publicadas
anonimamente por motivos históricos, e concluiu demonstrando que o autor da carta-
prefácio foi Cláudio Manuel da Costa e o das outras doze foi Tomás Antônio
Gonzaga. Por outro lado, o trabalho filológico nesse aspecto pode levar também a se
negar a autenticidade de um documento, considerado então apócrifo, como os evan­
gelhos atribuídos a Pedro, André e outros. Outras vezes, demonstrada a autenticida­
de falsa, antepõe-se “pseudo-” ao nome do suposto autor apenas para identificá-lo;
desse modo, atribui-se a um Pseudo-Choeroboscus uma obra sobre os salmos, erro­
neamente atribuída a Georgius Choeroboscus, respeitado gramático na linha de
Dionísio, o Trácio, do século VI d.C..

O TRABALHO FILOLÓGICO 51
DATAÇÃO

Determinar a data, o ano ou, pelo menos, a época em que o documento foi
escrito pode ser muito útil para a compreensão de seu conteúdo, de sua forma,
finalidade e outros aspectos, já que um escrito, de uma forma ou de outra, é um
reflexo de sua época. Esse trabalho, porém, pode ser difícil e nem sempre conclu­
dente, mesmo com uso de acurados critérios internos e externos. Quanto à datação
do Appendix Probi, por exemplo, divergem entre si Gaston Paris, W. A. Baehrens,
Sittl, Kübler, Ullmann e Foerster; entretanto, desse debate, levando-se em conta a
finalidade do Appendix, que seria preparar funcionários para o palácio imperial,
recrutados dentre a classe social mais baixa, conhecedora apenas do latim vulgar,
considerando-se ainda que, a partir do século IV, predominavam os cristãos nessa
classe social e a respeito dos quais não há qualquer referência, inferiu-se que o
documento deve ser anterior ao século IV. Fixou-se então seu aparecimento entre
200 e 320 d.C..
O próprio conteúdo da obra pode fornecer subsídios valiosos para sua data­
ção. Assim, Octavius, uma apologia do cristianismo e uma das primeiras obras da
literatura cristã, de Marcus Minucius Felix (200-240 d.C.), faz referências ao discur­
so de um inimigo declarado do cristianismo, um certo Fontanus; sabe-se que esse dis­
curso contra os cristãos foi proferido em 170. Por outro lado, S. Cipriano cita várias
vezes o Octavius de Minucius Felix em Quod idola dii non sint, obra também de
caráter apologético. Embora seja difícil estabelecer a cronologia das obras de S.
Cipriano, pode-se tomar o ano de seu martírio, 258, como “terminus ad quem”; o
“terminus a quo” é dado pelo discurso de Fontanus, isto é, 170. Pode-se desse modo
afirmar com segurança que o Octavius foi escrito entre 170 e 258. Apesar da relati­
va imprecisão, a datação estabelecida por esse processo filológico é perfeitamente
aceitável.

FONTES

Neste tópico, pesquisam-se as citações diretas e as indiretas, as alusões, os


possíveis plágios, as imitações, em resumo, toda e qualquer influência de outros
autores sobre o texto. Até recentemente, o conceito de plágio era muito relativo e não
merecia maior atenção. Nos gramáticos latinos, por exemplo, percebe-se a influência
constante da Ars Grammatica de Dionísio Trácio, como nos quatro “modos” de deri­
vação léxica, em que por vezes não se mudam nem os exemplos. Aliás, praticamen­
te toda a terminologia gramatical latina é tradução, transliteração ou decalque das
fontes gregas correspondentes.

52 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


O clássico da literatura portuguesa, Manuel Bernardes (1644-1710), escreveu
Nova Floresta (1706), erudita coletânea de sentenças e reflexões. O adjetivo “nova”
alude a alguma outra obra semelhante, anterior; recuando no tempo, encontra-se a
HYLEN (“Floresta”), de Ateius Praetextatus (ver p. 20), também uma considerável
reunião dos mais diversos temas em cerca de oitocentos livros, modelo dos cinco
volumes de Manuel Bernardes.
O conhecimento das fontes pode facilitar também o conhecimento e a com­
preensão do conteúdo do texto. Assim, o Boosco Deleitoso, obra anônima do século
XIV ou XV, teve influência realmente grande de De vita solitaria, de Petrarca, tanto
que por vezes mais se assemelha a uma tradução. A passagem da folha 11 do capítu­
lo 17 do Boosco não é claro: “ordindo ateados negócios”. O significado de “ateados”
se torna claro, quando consultada a fonte, onde se lê: “Ante lucem diurni telam nego­
tii orditur”. A palavra “telam” explica a passagem, cuja significação é “negócios
urdidos com teia”.
De outro ponto de vista, o estudo das fontes pode levar à reconstituição, pelo
menos parcial, de obras perdidas, como as da poetisa Safo, de quem só se conhece o
que se recolheu em citações, referências, alusões etc. Da mesma forma, reconstituiu-
se boa parte do que se perdeu dos 25 livros do De Lingua Latina de Marcus Terentius
Varro (116-27 a.C.), obra da qual apenas os livros 5 e 6 chegaram íntegros até os nos­
sos dias, além de parte dos de número 7 a 10; das muitas citações, referências etc.,
foi possível conhecer o caráter geral dessa primeira gramática da língua latina.

CIRCUNSTÂNCIAS

Circunstâncias são todas as variáveis que “estão ao redor” de algo. Situar um


documento em seu contexto histórico, cultural, social e político pode facilitar a com­
preensão de sua mensagem, esclarecer tópicos e alusões, além de alinhar autor e obra
segundo as diversas correntes filosóficas, literárias, políticas etc. Aqui também se
aplicam os critérios internos e externos.
O local, em que uma obra foi escrita ou no qual o autor viveu, pode ter con­
siderável importância filológica. Não se sabe ao certo, por exemplo, onde o
Appendix Probi foi composto. Por critérios internos, alguns de seus enunciados
sugerem Roma, como 134, vico capitis Africae non vico caput Africae', 136, vico
castrorum non vico castrae', enquanto outros parecem indicar Cartago, no norte da
África, como 48, Byzacenus non Bizacinus', 106, Syrtes non Syrtis. E compreensível
que se citem logradouros públicos de Roma; o mesmo, porém, não se pode dizer
dessas citações de localidades pouco conhecidas no norte da África. Se o autor as
cita, é porque as conhecia bem, desde seu nome correto, levando a crer, com algu-

O TRABALHO FILOLÓGICO I 53
ma probabilidade, que ele tivesse vindo de lá; assim, o autor do Appendix Probi
seria um africano, residindo em Roma e trabalhando em um paedagogium (“escola
para escravos”) de que talvez fosse proprietário. Esse paedagogium estava sem
dúvida situado no vico capitis A fricae, local em que havia um monumento em home­
nagem à África, em forma de busto, monumento de cuja existência há outras ates-
tações. Conhecem-se também outras inscrições que atestam a existência dessa esco­
la para escravos e nas quais se encontram os mesmos “erros” que o Appendix
corrige, como o de considerar caput Africae como expressão invariável, sem dúvida
pertencente à língua falada.
O conhecimento das circunstâncias torna mais acessíveis as Cartas Chilenas
sob vários aspectos. A situação político-social explica o anonimato da obra, bem
como o próprio título; era preciso satirizar, verberar a opressão, protestar contra o
exagero dos impostos, contra a “derrama” injusta, mas também evitar, se possível, as
represálias, através do disfarce de alguém supostamente distante, em Santiago do
Chile. O estilo e a forma em verso ligam o documento ao movimento cultural e à
época do Arcadismo. As circunstâncias políticas e sociais opressivas fazem brotar o
nativismo, que vai culminar com a Inconfidência Mineira. O cenário é Ouro Preto,
antiga capital da Província de Minas Gerais, principal produtor do ouro, tão deseja­
do pela metrópole. Neste documento, os dados fornecidos pelos critérios internos são
comprovados pelos externos, principalmente pela História e Literatura.

SORTE

Neste item, o filólogo procura rastrear a sorte, boa ou má, do documento. O


êxito de um texto manuscrito se avalia pelo número de cópias, pelas citações, refe­
rências, estudos, alusões etc. Veja-se, por exemplo, o número de códices da obra de
Donato, prova de sua grande influência e autoridade durante toda a Idade Média nos
estudos gramaticais, ao lado de Prisciano. Na tradição impressa, o êxito de uma obra
se mede pelo número de exemplares, de edições e reimpressões.
Os grandes monumentos literários da humanidade como as obras de Homero,
Virgílio, Dante, Shakespeare, Goethe, Camões, Machado de Assis, para citar apenas
alguns, contam com inúmeras edições de vários tipos, por toda parte. A Bíblia foi o
primeiro livro a ser impresso e é também o mais publicado em todas as línguas.
Autores há que sintetizam bem o pensamento e as tendências de sua época;
por isso suas obras conseguem sucessivas edições; como aconteceu, por exemplo,
com as Remarques sur Ia langue française (1647), de Vaugelas, que tiveram vinte
edições em alguns decênios; atendo-se mais a questões de estilo e “du bon usage” da
época, atualmente seu valor é mais histórico do que gramatical.

54 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


UNIDADE E INTEGRIDADE

A um manuscrito era possível acrescentar textos e também suprimir-lhe uma


parte menor ou maior; estudando esse ângulo, o filólogo verifica a integridade da
obra, isto é, se está inteira, íntegra c completa. Intimamente ligada à integridade está
a unidade do texto, cuja verificação leva à identificação e posterior eliminação de
possíveis adulterações, seja através da coerência interna, seja pelo plano da obra, ou
ainda pelo vocabulário, pelo estilo ou outro aspecto relevante. Como já foi mencio­
nado, o Appendix Probi foi acrescentado à gramática de Valerius Probus; não pode
ser de sua autoria, porque não existem sequer referências à norma vulgar em toda a
obra e por isso seria uma grande incoerência interna e algo contrário à unidade do
documento admitir que Probus cotejasse forma literárias com as correspondentes do
latim falado, variedade lingüística sistematicamente ignorada por ele.
O único códice existente de Disputationum adversus Nationes Libri VII (Paris,
n“. 1661), publicado em 305 d.C., do professor de retórica convertido ao cristianis­
mo Arnóbio, apresenta incoerentcmentc um “liber octavus”, em evidente contradição
com o título que enumera claramente sete. Verificou-se que o “liber octavus” na ver­
dade era o Octavius, a obra apologética de Marcus Minucius Felix; as duas obras
haviam sido juntadas, provavelmente pela semelhança do assunto, e o copista confun­
diu Octavius com octavus, incorporando uma obra à outra, quebrando assim a inte­
gridade dos documentos. Através de testemunhas da tradição indireta, como S.
Cipriano com a já citada Quod idola dii non sint, sabe-se que o Octavius é de
Minucius Felix, o que remete à questão da autenticidade. É óbvio que os aspectos da
Crítica Histórico-Literária estão intcr-rclacionados.

LINGUAGEM DO TEXTO

Do estudo da linguagem do documento, o filólogo pode colher muitas infor­


mações importantes para um conhecimento mais aprofundado do próprio texto.
Desse modo, o estudo da linguagem do Octavius mostra que seu autor era leitor assí­
duo de Cícero, de quem imita a técnica dc argumentação.
Se o estilo dc fato revela a personalidade do autor, a linguagem do texto mere­
ce atenção especial. Tomando o Novo Testamento apenas como documento histórico,
o exame da linguagem das epístolas dc Paulo, com periodo de orações incompletas,
indicando súbitas mudanças na linha de pensamento, aponta para uma personalidade
forte, dc raciocínio rápido e enérgico. E nos Evangelhos, o constante uso do conec-
tivo ÒXl (“que”, “porque”), mesmo nos casos dc discurso direto, torneio expressivo
tipicamente hebraico, como o é também o emprego do plural pelo singular, por exem-

O TRABALHO FILOLÓGICO 55
pio em Mt. 5,3 - ή βασιλεία τω ν ουρανών, (“ο reino dos céus”) - fato que só
em Mateus ocorre 35 vezes contra apenas cinco no singular, além de numerosos
hebraismos léxicos, não deixam qualquer dúvida quanto à língua materna dos evan­
gelistas. O apuro maior ou menor da linguagem está relacionado com o grau de cul­
tura do autor, como se nota no grego mais burilado do médico Lucas, embora seja a
variedade usualmente comum; Mateus, João e Marcos usam a mesma “koiné”, mas
de forma mais simples e popular.
A linguagem deixa entrever as influências recebidas pelo autor, sua filosofia,
suas preferências léxicas e sintáticas, sua cultura, a provável filiação a algum movimen­
to filosófico ou literário etc. No trabalho de Crítica Histórico-Literária, o filólogo des­
tacará um ou vários aspectos, conforme o objetivo ou as necessidades de cada caso.
Encontram-se também casos particulares de linguagem tão específica que
quase chegam a constituir um idioleto ou idiolalia, como dizia Ascoli, isto é, uma lin­
guagem caracteristicamente individual, embora haja também quem negue essa pos­
sibilidade, argumentando que a língua é necessariamente coletiva. Contudo, se o
vocabulário, os torneios frasais, o estilo em geral tornarem um autor identificável
pela leitura de algumas linhas, não é ilógico falar de idioleto “lato sensu”; basta con­
siderar casos como o de João Guimarães Rosa, sobretudo em Grande Sertão:
Veredas, Primeiras Estórias e Tutaméia.

AVALIAÇÃO CRÍTICA

Como último passo desta etapa, o filólogo fará uma avaliação crítica final da
obra sob dois aspectos: seu valor documental e seu valor literário. Um texto como o
Appendix Probi não tem valor literário; como documento, porém, é de grande valor
para os estudos românicos, porque apresenta duas normas latinas em oposição, uma
das quais, a vulgar, relaciona as formas que explicam as românicas correspondentes,
bem como as tendências fonéticas permanentes, como a síncope da pós-tônica, por
exemplo. Por outro lado, a Cena Trimalchionis do Satyricon de Petrônio apresenta
valor literário e estético com a caracterização cômica de um novo-rico; o aspecto lin­
guístico desse texto é particularmente interessante para a Filologia Românica, preci­
samente por ter Petrônio colocado na boca de Trimalquião vários vulgarismos que
conferem ao contexto um tom cômico, mas que, ao mesmo tempo, nos foram trans­
mitidos, o que de outra forma dificilmente o seriam.
Há textos que, inegavelmente, juntam o valor documental ao literário, como o
De Bello Gallico de Caio Júlio César; o valor documental é histórico, étnico, político,
geográfico, estratégico-militar etc., enquanto o grande valor literário e estilístico da
prosa de César é universalmente reconhecida; portanto, um aspecto não exclui o outro.

56 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


O valor documental pode se tornar de difícil apreensão, na medida que desa­
parecem ou se modificam as circunstâncias sociais, locais etc., nas quais o documen­
to nasceu. Assim, a Comédia, posteriormente denominada Divina Comédia, de Dante
Alighieri (1265-1321), escrita conforme o modelo ático antigo de Comédia, segundo
o qual é indispensável a nomeação expressa das pessoas envolvidas, tem valor histó­
rico; esse valor, porém, não é apreendido senão depois de alguns estudos. Como obra
literária é um dos monumentos da humanidade. Mesmo uma obra eminentemente
literária pode-se tornar indiretamente fonte documental como Grande Sertão:
Veredas, de João Guimarães Rosa, por exemplo, que dá muitas informações sobre a
fauna e a flora da região focalizada, os usos e costumes, as crenças, a mundividência
da população, embora de maneira geralmente implícita.

EXEGESE DO PORMENOR

Completando o trabalho filológico, procurar-se-á esclarecer os detalhes ou


os pormenores, que o leitor provavelmente não consiga entender claramente, ou
que mereçam um aprofundamento maior. Para isso, aplicam-se os princípios da
hermenêutica, a ciência da interpretação; à prática dessa ciência se dá o nome de
exegese (do grego έξήγησις, do verbo έξηγέομαι, “eu conduzo, guio, explico,
interpreto”).
A exegese do pormenor buscará aclarar as alusões muitas vezes obscuras,
verificará a autenticidade e a correção das citações, possíveis erros históricos; tenta­
rá ao menos explicar expressões típicas, tópicos obscurecidos por interpolações ou
supressões, pesquisará a razão de aparentes ou reais incoerências do texto e outros
problemas semelhantes. Esse trabalho exige do pesquisador muitos conhecimentos
de ciências afins, bem como do contexto próximo e remoto.
Assim, todo o trabalho filológico, na prática, já foi feito em relação ao Novo
Testamento, considerado aqui apenas como documento histórico. Contudo, sempre
surgem dúvidas sobre o significado último de uma determinada palavra, ou sobre a
tradução correta de determinada expressão. Nessa perspectiva, procurou-se basear a
crença na reencarnação no tópico do Evangelho de João 3:3. Em tais dúvidas é indis­
pensável partir do texto original, que é o seguinte para o caso:

Ά π ε κ ρ ιό η Ιη σ ο ύ ς κ α ι ε’ιπ εν α ύ τφ . 'Αμήν, ά μ ή ν , λέγω σοί. εά ν μή τ ις γεννη ύή


ά ν ω ύ ε ν , ού δ ύ ν α τ α ι 'ιδεΐυ τήυ β α σ ιλ ε ία ν τού θεού.

A Vulgata dá a essa passagem a seguinte tradução: Respondit Jesus et dixit ei: Amen, amen
dico tibi, nisi quis renatus fuerit denuo, non potest videre regnum Dei.

O TRABALHO FILOLÓGICO 57
Comparando a tradução da Vulgata, na qual se basearam muitas das traduções
correntes em varias línguas, com o texto original grego, percebem-se algumas incorre­
ções significativas: em primeiro lugar, γεννάο μαι, voz média de γεννάω (“gerar”,
“fazer nascer”), tem o sentido de “criar”, “fazer nascer de si mesmo” e, como resulta-
tivo, “nascer”. Poder-se-ia também interpretar a forma do texto γεννηθή (subjuntivo
aoristo) como passiva - “se não for gerado” - sem maiores implicações semânticas. De
qualquer modo, não há no verbo grego nenhuma idéia de repetição, o que mostra a ine­
xatidão da tradução latina “renatus fuerit”.
Descartada essa possível base verbal, o problema podería estar no advérbio
t άνωθεν, sintético formado de άνω, “em cima”, e da partícula que indica procedência
- θεν; o conteúdo semântico de άνωΐΐεν é, portanto, “vindo de cima” ou “de cima para
baixo”, exatamente o expresso pelo vocábulo quando se encontra nos clássicos, como
em Tucídides (4,75): ύδατος άνωθεν γενομένου... (“tendo-se originado uma chuva
de cima a baixo...”). Não se encontra nos clássicos nenhuma ocorrência do termo com
o significado de “outra vez” ou “novamente”. Entretanto, no grego comum e mais recen­
te da chamada κοινή (διάλεκτος), o vocábulo pode ter adquirido o sentido secundá­
rio de “outra vez” por ampliação semântica, conforme se pode inferir da pergunta de
Nicodemos. Note-se, contudo, que Nicodemos usa o termo δεύτερον (v. 4) e não
άνωθεν; aquele realmente significa “uma segunda vez” ou “outra vez”. Na resposta,
volta a ser usado o termo-chave, ao qual o interlocutor não havia dado a devida atenção:

δει υμάς γεννηθήναι άνωθεν (v. 7)

é preciso que vós nasçais do alto.

Esse novo nascimento se faz “pela água e pelo espírito”, através da ação de Deus
e não pela volta ao seio materno, como o entendera Nicodemos, sem relação com aspec­
tos físicos. Daí, não é exata a tradução da Vulgata, bem como de todas as baseadas nela
como a tão difundida no Brasil, de João Ferreira de Almeida:

Em verdade, em verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus.

Entretanto, ά ν ω θ ε ν não é um “hápax”, isto é, uma palavra que ocorre isola­


damente uma só vez, o que dificulta a correta compreensão de seu conteúdo semân­
tico. Encontra-se novamente em Gálatas 4: 8-9, que convém confrontar com a já ana­
lisada em busca de uma confirmação semântica:

Α λλά τότε μέν ούκ ε'ιδότες θεόν εδουλεύσατε τοις φύσει μή ούσιν θεοίς·
νύν δε γνόντες θεόν, μάλλον δέ γνωσθέντες ύπό θεού, πώς επιστρέφετε πάλιν έπι
τά άσθενή και πτωχά στοιχεία, οίς πάλιν άνωθεν δουλεύσαι θέλετε;

58 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


A tradução da Bíblia de Jerusalém, presumivelmente a mais confiável, é a seguinte:

Outrora, é verdade, não conhecendo a Deus, servistes aos deuses que, na realidade, não o são.
Mas agora, conhecendo a Deus, ou melhor, sendo conhecidos por Deus, como é possível voltardes nova-
mente a esses fracos e miseráveis elementos, aos quais vos quereis escravizar outra vez?

O texto grego é particularmente interessante: usa duas vezes πάλιν e uma vez
ά ν ω θ ε ν . O primeiro é um advérbio, acusativo relacionai de *πάλις, substantivo da
família do verbo πέλομαί, “voltar”, “retornar”; o advérbio significava então inicial­
mente “para trás” e depois “de novo”, significado único já nos tempos homéricos. Não
há, portanto, qualquer dúvida quanto ao conteúdo semântico desse advérbio.
Entretanto, o que mais chama a atenção no texto aos Gálatas é o fato de
πάλιν e de άνωθεν serem usados juntos, justapostos. Parece muito pouco prová­
vel que se trate de simples pleonasmo, porque cada qual tem seu conteúdo semânti­
co suficientemente definido, sem precisar perdê-lo no contexto frasal, através de uma
fusão pleonástica. Da mesma forma, o estilo do autor, Paulo, não leva a supor um
pleonasmo; escreve densamente, embora sem deixar de ser ágil. Ainda que conheces­
se a retórica, declara não apreciar os artifícios da eloqüência humana (Ts. 1,5; 1 Cor.
2,4s; 2 Cor. 11,6). Portanto, ver nesse caso um pleonasmo não se coaduna com o esti­
lo, a linguagem e a intenção do autor.
Pelo contexto, podemos atribuir a cada um dos termos seu significado etimo-
lógico: π ά λ ιν denota a volta à antiga escravidão, a falsos deuses e άνωθεν expres­
sa a perda da dignidade de filho de Deus e herdeiro de seu reino (v. 6) e, portanto,
um rebaixamento; o vocábulo adquire com isso um valor semântico e expressivo
especial, certamente irredutível a um simples pleonasmo sem maior força significa­
tiva. Em conclusão, a tradução correta e fiel desse tópico deve ser:

[...] aos quais vos quereis novamente escravizar, rebaixando-vos.

O “rebaixando-vos” traduz o “de cima para baixo”, perfeitamente dentro do


contexto do capítulo IV; assim se resolve também o aspecto formal, com a tradução
objetiva dos dois advérbios e se descarta o pleonasmo, certamente não intencionado
pelo autor.
Por esse exemplo, necessariamente detalhado, vê-se que a exegese do porme­
nor exige do filólogo erudição e conhecimentos de várias ordens, o que o aproxima
do crítico, do gramático e do lingüista. Leva também a pensar no conceito de
Filologia dos antigos gregos e romanos, segundo as definições de August Boeckh e
de Ernest Renan (p. 36).

O TRABALHO FILOLÓGICO I 59
EDIÇÃO

Concluído o trabalho filológico, poderá o autor publicar seu trabalho; depen­


dendo de seus objetivos, poderá escolher o tipo de edição que for mais conveniente,
dentre os quais convém caracterizar os mais importantes.

EDIÇÃO CRÍTICA

A chamada edição crítica é, sem dúvida, a que melhor se coaduna com o


longo esforço do trabalho filológico. Embora sem normas universalmente aceitas,
deverá apresentar;

a. Uma Introdução, em que se indicam os problemas encontrados e as soluções dadas


na crítica textual, os critérios adotados em suas diversas etapas; o conspectus siglo­
rum, o conjunto das siglas indicativas dos diversos códices, das diversas edições
ou editores e das abreviaturas mais usadas; também serão úteis outras informa­
ções, como as colhidas no estudo histórico-literário, selecionadas de acordo com
a importância dos esclarecimentos em relação à compreensão do texto.
b. O Texto reconstituído; as variantes encontradas formam o “aparato crítico”, no
rodapé de cada página, com a indicação do códice ou documento em que cada
variante se encontra. Dependendo do caso, acrescentam-se os resultados da her­
menêutica, como interpretações, comentários, notas e os esclarecimentos obtidos
pela exegese do pormenor. Dependendo do assunto, um glossário pode ajudar
consideravelmente a compreensão do texto.

EDIÇÃO DIPLOMÁTICA

A edição diplomática (< δ ίπ λ ω μ α , “algo dobrado em dois” - forma dos


documentos emitidos por altos funcionários romanos, espécie de passaporte ou
salvo-conduto) consiste na “reprodução tipográfica do original manuscrito, como se
fosse completa e perfeita cópia do mesmo na grafia, nas abreviações, nas ligaduras,
em todos os seus sinais e lacunas, inclusive nos erros e nas passagens estropiadas”18.
Justifica-se uma edição diplomática pela necessidade de tornar o documento
acessível a um número maior de interessados e evitar maiores danos à fonte, além de

18. S. Spina, Introdução à Edótica. p. 78.

60 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


tornar o texto um pouco mais acessível, facilitando-sc a leitura. Em todo caso, reco-
menda-se que uma edição diplomática seja acompanhada dos fac-símiles do original;
desse modo, pode-se comparar a reprodução tipográfica com os aspectos paleográfi-
cos do manuscrito.
Além desse tipo de edição puramente diplomática, há a denominada diplomá-
tico-interpretativa ou semidiplomática, que procura facilitar ainda mais a leitura pelo
desdobramento das abreviaturas, separação das palavras e colocação da pontuação.
Exemplo desse tipo de edição diplomático-interpretativa é a feita por José Pedro
Machado e Elza Paxeco Machado do Cancioneiro Colloci-Brancuti, hoje Cancio­
neiro da Biblioteca Nacional de Lisboa.

EDIÇÃO PALEOGRÁFICA

A edição paleográfica resulta da transcrição de um manuscrito antigo (<


π α λ α ιό ς , “antigo”), mais perfeita que a reprodução fac-similada, porque ressalta
particularidades do texto e do material que só um perito pode descobrir. Assim, uma
edição paleográfica identifica a redação primitiva, vários tipos de pormenores cali-
gráficos, como correções e sinais apostos por revisores subseqüentes, as diversas tin­
tas utilizadas, tipos de letras e suas diversas configurações, casos de superposição de
duas escritas, retoques, correções e emendas de épocas diferentes. Nesse trabalho,
usam-se técnicas modernas obtidas sobretudo pela química. Exemplo de edição cri­
tica é a de Ramón Menéndez Pidal, que precede a edição crítica do Cantar dei Cid,
feita sobre o único manuscrito existente, a do copista Per Abbat. Com esse trabalho
filológico, é possível aproximar-se bastante do estado primitivo do códice.

OUTROS TIPOS DE EDIÇÃO

Os meios técnicos modernos revolucionaram as formas de reprodução de tex­


tos; invcntaram-sc diversos meios mecânicos de cópia. A fotografia, a fototipia ou
heliografia atualmente são técnicas usadas em casos especiais, tendo perdido sua pra-
ticidade; o meio de reprodução mais usado é a xcrografia (cópia “a scco”, do grego
ξηρός, “seco”). A fotografia do texto é o fac-símile, reprodução fiel do original. Pela
impressão anastática, em que se usam processos químicos, e pela homeografia e iso-
grafia obtêm-se reproduções de velhas gravuras ou desenhos (homeografia) ou de
letras manuscritas de modo preciso (isografia); esse processo foi inventado em 1844
por Rodolf Appel, usado ainda hoje para copiar documentos antigos, cuja recompo­
sição tipográfica exigiría muito tempo c materiais específicos.

O TRABALHO FILOLÓGICO I 61
Nos últimos decênios, os computadores vêm substituindo muitas dessas téc­
nicas editoriais e de produção e reprodução de textos; trata-se de uma tecnologia
ainda em pleno desenvolvimento, mas que tem facilitado muito todo tipo de publica­
ção. Dentre os muitos avanços, basta citar os bancos de dados que permitem ao com­
putador corrigir automaticamente os erros de ortografia.
Sob outros pontos de vista, citam-se ainda outros tipos de edição, como:

a. Edição comentada
Ao texto são apostas explicações, esclarecimentos e notas sobre pontos presu­
mivelmente obscuros, ou termos específicos ou técnicos, vocábulos polissêmicos,
alusões etc. A exegese do pormenor costuma ser de grande utilidade nesse contexto.

b. Edição escolar
As características desse tipo de edição são determinadas pelos objetivos visa­
dos junto ao público-alvo. Deve ser facilitada e adequada à fácil compreensão de seu
conteúdo e tem, por isso, muitos pontos de contato com a edição comentada, deven­
do apresentar muitas notas e explicações, sempre que se fizerem necessárias. O valor
de tais edições, sobretudo de obras literárias, é diminuído em razão da supressão de
tópicos considerados inconvenientes, o que lhes tira a integridade.

c. Edição popular
Os objetivos da edição popular são a difusão da obra em grande escala e a sua
consequente popularização. Além da adequação do próprio texto ao público-alvo,
este tipo de edição caracteriza-se sobretudo pelo emprego de papel mais barato, com­
posição cerrada e formato compacto com o objetivo de diminuir os custos e tornar a
obra acessível ao povo em geral.

62 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


2
M étodos da

F il o l o g ia R o m â n ic a

Dentre os vários métodos utilizados em Filologia Românica, uns são mais


adequados e, por isso, mais produtivos, enquanto outros, emprestados de ciências
afins, trazem apenas alguma contribuição para um conhecimento maior dos conteú­
dos da Romanística. Para uma visão mais completa de determinados problemas, fre­
quentemente é preciso aplicar mais de um método e confrontar os resultados obtidos.

MÉTODO HISTÓRICO-COMPARATIVO

Friedrich Diez tornou-se o pai da Filologia Românica aplicando o método his-


tórico-comparativo, que havia sido usado por Franz Bopp no estudo das línguas indo-
européias e por Jakob Grimm no das línguas germânicas. Os resultados obtidos por
Diez, ao aplicar o método às línguas românicas, foram os melhores possíveis, dife­
rentemente do que ocorrera com os outros autores, porque são bem conhecidos e
documentados tanto o “terminus a quo”, a base latina, como o “terminus ad quem”,
as línguas e os dialetos românicos, o que não aconteceu com os outros casos. Por
isso, Ferdinand de Saussure tinha razão ao dizer que Max Müller, Curtius e Friedrich
Schleicher, os principais mentores da Escola Comparatista, não se perguntaram para
onde os levaram as comparações estabelecidas ou as relações encontradas, já que lhes
faltavam conhecimentos suficientes das línguas originárias, ou seja, do “terminus a
quo”. Com as línguas românicas, porém, são ideais as condições para a aplicação dos
princípios comparatistas, tanto que novos métodos e novas teorias são primeiramen­
te testados no mundo românico.
Depois de Diez, Meyer-Lübke incorporou ao método princípios dos neogra-
máticos e, ao aplicá-lo desse modo à Filologia Românica, deu-lhe uma perspectiva
histórica mais coerente e adequada.
O método histórico-comparativo é aplicável a casos de grupos de línguas
genealogicamente afins. Dados colhidos nas línguas com a mesma origem são com­
parados entre si para se lhes encontrar a forma originária, determinar os metaplasmos
ocorridos, verificar-lhes o significado, a formação de novos campos semânticos, o
motivo ou os motivos de tais formações, e inúmeras questões semelhantes. Um exem­
plo bastante ilustrativo é o do verbo “deixar” em português:
Carolina Michaélis de Vasconcellos, no Glossário do Cancioneiro da Ajuda'9,
derivou “deixar” supondo *delaxare, com os metaplasmos delaxare > delaixar >
deleixar > deeixar > deixar, apóia-se nas formas correntes desleixo e desleixado. As
alterações supostas são comuns dentro da evolução normal dos vocábulos em portu­
guês, de modo que a suposição de Carolina Michaélis não é absurda.
Entretanto, o levantamento e a comparação das formas correspondentes nas
outras línguas e dialetos românicos mostram que não foi esse processo, embora
foneticamente possível, que originou o termo português. O REW registra as seguin­
tes formas:

rom. a lasa
it. sul e ant. lassare
it. mod. lasciare
log. lassare
eng. lascher
friul. lasá
fr. laisser
prov. laisar
cast. ant. lexar
port. ant. leixar

19. Em Revista Lusitana, vol. XXII, n. 1-4, 192p.

64 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


sicil. dassari
prov. oeste dexà
cat. dexar
cast. mod. dejar
port. mod. deixar.

Nota-se que há dois grupos de formas, um com /1/ e outro com /d/ iniciais, cujos ter­
ritórios se sobrepõem, pelo menos em parte, na Ibéria: port. e cast. têm leixar e lexar
nas respectivas fases antigas e deixar e dejar modernamente, enquanto o sicil. e o
prov. oeste e o cat. só têm e tiveram a forma com /d/ inicial.
Portanto, a forma portuguesa “deixar” deve ser colocada nesse contexto români-
co mais amplo e não é certamente correto derivá-la através de mutações que são carac­
terísticas do port., como a síncope do /1/ intervocálico, sem a qual não se chegaria à
forma atual; aliás, o maior problema da cadeia evolutiva suposta está na falta de docu­
mentação da forma *deeixar. O cast., cuja forma supõe o mesmo étimo, não sincopa o
/1/, como também o cat.: lat. dolorem > cast. dolor, port. dor, lat. colorem > cast. color,
cat. color, port. cor, lat. malum > cast. maio, cat. mal, port. mau. Desse modo, a forma
portuguesa seria um fato isolado e incomum, chegando a uma forma convergente por
um caminho possível, mas de fato não trilhado, já que as formas correspondentes nas
outras línguas e dialetos românicos do mesmo étimo invalidam essa derivação.
E preciso, portanto, explicar a razão da existência das duas variantes na
România. O possível cruzamento analógico com dare (dare + laxare - REW 4955)
não é admissível tanto fonética como semanticamente. Entretanto, encontram-se em
latim vários casos em que /1/ e /d/ são intercambiáveis, sem alteração de significado,
por influência comprovada inicial dos sabinos ou dos gregos: olor - odor; alipes -
adipes (Appendix Probi 178); lingua - dingua20; lacrima - dacrima; solium - sedeo.
Com isso, é lícito supor a existência no latim vulgar tanto de laxare como de daxa-
re, fato que explica as variantes românicas.
No português, deixar é registrado apenas a partir do século XV; pode-se dedu­
zir daí que essa era a variante da língua falada e leixar, a de caráter mais erudito, que
se arcaizou. Desleixo e desleixado são derivados de laxare, mas com outro prefixo -
dis—ou de+ex-, mais antigos. Os vocábulos eruditos do português, semanticamente
afins, têm laxare como étimo: laxação, laxante, laxar, laxativo, laxidão, laxiorismo,
laxiorista, laxiorístico, laxismo, laxista e laxo.
Essas considerações, segundo o método histórico-comparativo, permitem
concluir que daxare era uma variante popular, por influência sabina, de laxare·, essa

20. Cf. Ernout-Meillet, Díaionnaire étymologique de Ia langue latine. s.v. língua.

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÂNICA I 65


forma popular, porém, só conseguiu suplantar a outra e fixar, na faixa ocidental oeste
da România, isto é, parte da Provença, Ibéria e Sicilia, essa variante como única,
arcaizando a outra.
O método histórico-comparativo tem sido particularmente útil na reconsti­
tuição do léxico do latim vulgar. Principal fonte léxica das línguas românicas, o
latim vulgar certamente nunca terá seu tesouro vocabular totalmente documenta­
do, tendo-se perdido muitos termos usuais e correntes. Contudo, partindo-se de
dados fornecidos pelas línguas românicas, pode-se postular com segurança a exis­
tência dos vocábulos-fontes correspondentes no latim vulgar, ainda que não docu­
mentados, mas que podem ou não ser documentados posteriormente. Assim, de
ango, anxi, “apertar”, “estreitar”, o latim literário derivou anxietas, encontrado por
exemplo em Cícero (Tusc. 4,37) e anxietudo (Cícero, De Rep. 2,68). De anxieta­
tem há em port. ansiedade, cast. ansiedad, fr. anxiété, it. ansietà; como se vê essas
formas são eruditas e posteriores. As formas herdadas são it. ansia, log. ansa, fr.
ant. ainse, cast. ansia, cat. ansia, port. ânsia. A forma latina correspondente anxia,
postulada pelas línguas românicas citadas, não foi encontrada no latim literário,
mas devia ser corrente no latim vulgar. Tentou-se relacionar ânsia com angor ou
angina, o que seria possível sob o ponto de vista semântico, mas praticamente
impossível sob o fonético; posteriormente, registrou-se a ocorrência da forma vul­
gar anxia, comprovando definitivamente o acerto da suposição pelo método histó­
rico-comparativo.
Convém ainda lembrar que a primeira edição do Romanisches Etymologisches
Wõrterbuch (REW) de Meyer-Lübke, de 1911 a 1920, continha cerca de 10.000 ver­
betes, dos quais 1.000 partiam de vocábulos supostos (com *); atualmente, esse
milhar foi reduzido a menos da metade através da descoberta documental dos vocá­
bulos latinos correspondentes. Esse fato demonstra a validade dos princípios sobre
os quais se baseia o método histórico-comparativo no domínio românico, do qual se
conhece o “terminus ad quem” bem como o caminho para se chegar ao “a quo”.
Se uma palavra é panromânica ou, pelo menos, encontrada na maioria das lín­
guas românicas, pode ela ser suposta no latim vulgar com certeza quase absoluta.
Assim, embora não documentados até agora, devem ter sido correntes no latim vul­
gar os vocábulos-fontes dos correspondentes românicos:

*excappare: port. escapar, cast. escapar, cat. escapar, prov. escapar, fr. échapper, it.
scappare, rom. scapa.
*pariculum: port. parelho (parelha), cast. parejo, cat. parelio, prov. parelh, fr. pareil,
friul. pareli, eng.paral’, it. parecchio.
*rasicare: port. rasgar, cast. rasgar, cat. rascar, prov. rascar, fr. ant. raschier, log.
razigare, venez. raskar, lomb. raskar.

66 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
O método histórico-comparativo, porém, não obteve os mesmos resultados
satisfatórios em todos os níveis da linguagem. Na fonética, na morfologia, no léxico
e questões afins o método revelou-se profícuo. Sua aplicação à sintaxe apresenta
maiores dificuldades porque nesse nível é mais difícil comprovar a regularidade e a
constância das correspondências em que o método se fundamenta. O campo sintáti­
co é o mais sujeito às particularidades tanto individuais como coletivas, conforme se
pode verificar, por exemplo, no emprego românico do subjuntivo, precisamente o
modo que expressa o ponto de vista do falante.
Em todo caso, o estudo de certos aspectos sintáticos pelo método histórico-com­
parativo, segundo o conceito de pancronia de Walther von Wartburg-1, foi produtivo.
Assim, as formas on do francês e hom do provençal foram consideradas uma
criação literária do francês e do provençal antigos para denotar a indeterminação do
sujeito, sem vinculação com o lat. horno ou com o mcinn germânico. Os corresponden­
tes encontrados nas outras línguas românicas (it. uonio, cast. ant. ome, cast. mod. hom-
bre, port. arc. ome) teriam adquirido aquela função sintática por influência do francês
e/ou do provençal. Posteriormente, porém, se demonstrou que homo, já em Catão (De
Agricultura 157, 8 e 48, 1-2), era usado com essa função sintática, equivalendo ao
nosso “se”, como em “Deve-se respeitar a lei”. Se a expressão já se encontra no latim
arcaico, pode-se supor que tenha tido uso corrente no latim vulgar, já que este conser­
vou muitas características daquele. Aplica-se aqui o princípio da filologia de só supor
a existência de uma expressão, palavra ou função no latim vulgar nos casos em que
ela se encontre em várias línguas românicas, sem possibilidade de ter surgido de modo
independente em cada uma delas. Inversamente, caso um termo se encontre em uma
só língua, maior é a probabilidade de que se trate de uma criação própria. Contudo, é
preciso levar em conta que se trabalha com um princípio metodológico genérico; cada
caso deve ser estudado de modo individual. Mesmo quando um termo foi conservado

21. Saussure introduziu, nos estudos linguísticos, os termos sincronia, diacronia e pancronia. Sincronia, termo
criado pelo antropólogo inglês Alfred Reginald Radcliffe-Brown (1881-1955), foi usado por Saussure (1916)
para designar o estudo lingüístico com abstração do elemento tempo, restringindo-o ao eixo das simultanei-
dades. A diacronia, para Saussure, estuda a língua em sua evolução no tempo, no eixo das sucessões. A sin­
cronia estuda “estados de língua”, momentos em que as modificações, por mínimas, não têm importância
considerável. O conceito saussuriano de pancronia designa um tipo de abordagem da língua que transcende
os sistemas particulares, as línguas consideradas individualmente (sistemas denominados “idiossincrônicos”
por L. Hjelmslev (1928), como sinônimo de “gramática descritiva”); a pancronia busca fixar leis gerais da
estrutura e do funcionamento do sistema da língua, do qual os diversos sistemas lingüísticos são apenas casos
particulares. Walther von Wartburg dá o nome de pancronia à confluência da sincronia com a diacronia. Sob
esse ponto de vista, só se consideram completos os estudos dos fatos lingüísticos, se forem levados em conta
tanto o sistema como a sua evolução no tempo. Essa evolução é a história do mesmo sistema.

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÂNICA I 67


por apenas uma língua românica, pode ele ser herança latina, como o rom. sarcina,
“bagagem”, de sarcina, ae, só encontrado nessa língua (REW 7598).
Portanto, o método histórico-comparativo, devidamente usado, foi e continua
sendo profícuo, realmente muito útil para o conhecimento tanto do latim vulgar como
das línguas românicas; o mesmo se verificou nos outros campos em que foi empre­
gado, como no das línguas germânicas e eslavas.

MÉTODO IDEALISTA

Por seu caráter filosófico e de lingüística geral, o método dito idealista de


Karl Vossler (1872-1949) foge um tanto dos parâmetros propriamente filológicos.
Contudo, por ter Vossler aplicado seus princípios idealistas e estéticos às línguas
românicas, sobretudo ao francês, convém resumir-lhes os pontos principais.
Em Positivismus und Idealismus in der Sprachwissenschaft (“Positivismo e
Idealismo na Ciência da Linguagem”), de 1904, Vossler atribui ao positivismo a pes­
quisa dos fatos lingüísticos, de modo objetivo, enquanto o idealismo procura estabe­
lecer as relações de causalidade entre eles; parte, portanto, do princípio de que o fato
lingüístico é motivado.
Para Vossler, a linguagem é expressão da alma humana; por isso, a história da
língua é idêntica à das várias formas de expressão, isto é, é igual à história da arte, posi­
ção semelhante à de Benedetto Croce, que identifica a expressão lingüística à estética22.
Enquanto os filósofos e filólogos antigos haviam procurado as relações entre a lingua­
gem e a lógica; enquanto as posições dos neogramáticos haviam levado à grande ênfa­
se do fator psicológico, como o fez, por exemplo, W. Wundt nos dois alentados volu­
mes do Võlkerpsychologie. Eine Untersuchung der Entwicklungsgesetze von Sprache,
Mythus und Sitte (“Psicologia dos Povos. Uma Pesquisa das Leis do Desenvolvimento
da Linguagem, Mito e Costume”), Vossler acentua o caráter alógico da língua. As pala­
vras são apenas símbolos e toda expressão lingüística é meramente individual; cada
expressão é uma recriação, que carrega sempre algo da alma do falante e, por isso, é
diferente de qualquer outra expressão de todos os outros falantes. Assim, a psicologia
pouco explica, porque a linguagem se identifica com a estética.
No campo prático, Vossler tentou aplicar as idéias em Frankreichs Kultur im
Spiegel seiner Sprachentwicklung (“A Cultura da França espelhada em seu Desenvol-

22. O seguinte tópico da página 165 da Esletica come sciema dei I 'espressione e linguística genemle mostra o
pensamento de Croce: “ I problemi scientifici delia linguística sono i medesimi di quelli delPestetica e gli
errori e le verità delPuna sono gli errori e le verità delPaltra.”

68 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


vimento Linguístico”), de 1913. Expõe aí uma história da língua literária francesa, cm
que procura explicar todas as transformações de séculos de cultura através do
Sprachgeist, o “espírito da língua”, considerado a causa das relações entre a evolução
do francês c a da vida política e da literatura do país. Como exemplo, afirma que a men­
talidade típica (Zeitgeisl, “espírito da época”) do mercantilismo, calculista e estreita,
dos fins da Idade Média (século XIV e XV), teve como conscqüência na língua a fixa­
ção definitiva do emprego do artigo partitivo, que era raro no francês antigo.
Contra tal interpretação, objeta-se, primeiramente, que a relação entre o
Zeilgeist e o fato lingüístico não é evidente nem necessária, pois o consumismo mate­
rialista não precisa ter indispensavelmente implicações com o uso de partitivos. Além
disso, o latim vulgar já conhecia expressões como bibere de aqua e edere de pane,
em lugar do clássico bibere aquam e edere panem. Nas línguas românicas o sardo, a
mais arcaizante de todas, usa o “de” com sentido partitivo mesmo sem artigo, como
de abba vrista (“água fresca”), de binu (“vinho”)23. A idéia de partição, embora não
expressa por artigos partitivos específicos, encontra-se no castelhano (unos huevos,
unas cartas), no romeno (nigte piini, ni§te copii - “uns pães”, “uns meninos”) e no
português em “uns pedaços”, “uns elementos”. Desses fatos românicos pode-se
deduzir que uma certa tendência cm direção ao partitivo provém do próprio latim vul­
gar. Se houvesse realmente relação entre o Zeitgeist mercantilista e o fato lingüísti­
co, os povos entre os quais esse espírito é mais evidente, como os ingleses c ameri­
canos, deveríam usar com muita freqüência o partitivo, o que não ocorre.
O fato inegável de que se acentuou o emprego do partitivo em francês no sécu­
lo XV se deve mais à procura de clareza, já que foi nessa época que se deixou de pro­
nunciar o /s/ final, índice de plural; o partitivo foi um recurso da própria língua na ten­
tativa de diferenciar o singular do plural na fala. No italiano antigo, o uso do partitivo
era mais comum que atualmente em expressões como fu dato d ’un boníssimo vino
(“foi oferecido um ótimo vinho”), mangiare dei buno (“comer (d)o bom”), cogliere
deifrutti (“colher frutos”)24; no italiano, porém, as coincidências entre o singular e o
plural são frequentes cm decorrência do seu sistema de formação do plural; assim,
uma frase como “Conquistcrò città” é ambígua, pois pode significar tanto o singular
como o plural. “Conquistcrò dcllc città”, com a presença do partitivo delle, não apre­
senta ambigüidadc, já que o artigo traz a marca do plural. Não havendo ambigüidadc
cm relação ao número, o partitivo não é necessário, como em “Conquistcrò villagi”.
Walther von Wartburg, cm Evolution et structure de la langue française, reto­
mou as idéias de Vosslcr, mas de modo mais lingüístico, baseando-se cm módulos

23. Cf. Wagner, Lingua Sarda, p. 372.


24. Meyer-Lübke, Grammatik der Romanischen Spruchen, III, p. 387 ss.

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÂNICA 69


históricos c descritivos; leva cm conta fatos lingüísticos, sociais c individuais, rela­
cionando melhor a língua com os fatos sociais, políticos c literários do país.
Atenuando o idealismo de Vossler, Wartburg mostra que a língua é de fato uma
expressão da cultura e da mundividcncia do povo que a usa. Entre outros, adotaram
princípios desse método, com maior ou menor amplitude, Eugen Lcrch (1888-1952),
Lco Sfíitzer (1887-1960) e Giulio Bertoni (1878-1942).
Em conclusão, os resultados a que chegou o método idealista são cm geral
inexatos e inconcludentes. Falta a seus princípios contato mais direto com os fatos
lingüísticos; parte de fatos não considerados cm todos os seus aspectos, nem relacio­
nados com um número maior de causas possíveis, além de selecionados segundo
princípios idealistas não muito claros; destaque-se dentre esses o de que a língua é
alógica c o conscqücntc exagero da importância da estilística e do individual.

MÉTODO DA GEOGRAFIA LINGÜÍSTICA

Enquanto o método histórico-comparativo parte de fatos devidamente com­


provados em textos ou observados nas línguas estudadas, a geografia linguística
se ocupa com a situação cm que uma língua se encontra num determinado momen­
to, em localidades ou em regiões previamente escolhidas. Não se utiliza de docu­
mentos escritos como objeto de sua pesquisa, mas investiga sobretudo a lingua­
gem falada.
A idéia do método geográfico encontra-se embrionariamente nos Saggi
Lcidini (“Ensaios Ladinos”) de Graziadio Isaia Ascoli, publicados cm 1873, e nos
quais estudou os dialetos da antiga Récia sob o ponto de vista histórico-gcográfico.
Em fins do século XIX, o lingüista alemão Georg Wcnkcr (1852-1911) pre­
tendeu fixar cm mapas o domínio dos dialetos alemães. Para isso elaborou um ques­
tionário apenas fonético c o enviou a professores, párocos católicos e pastores pro­
testantes de toda a Alemanha. Os primeiros mapas de Wenkcr são de 1889, mas só
cm 1926 se publicou o primeiro fasciculo, sob o título Deutscher Sprachatlas (“Atlas
Lingüístico Alemão”) e coordenação de Ferdinand Wrede (1863-1934). Essa obra só
foi concluída em 1956 por W. Mitzka, em 128 mapas. Os resultados foram opostos
aos esperados por Wenker: de fato não é possível delimitar claramcnte os dialetos,
pois verificou-se a existência de grande influência mútua, de mutações constantes c
muitas permutas, tanto que nem foi possível traçar isoglossas.
Um outro atlas somente fonético é o de Gustav Weigand (1860-1930),
Linguistischer Atlas des dakorumãnischen Sprachgebiets (“Atlas Lingüístico do
Domínio da Língua Daco-Romena”). Em 67 mapas, aproveitou suas pesquisas ante­
riores c publicou o trabalho em 1909.

70 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Com essas experiências, o método da geografia lingüística foi sendo aprimo­
rado através da caracterização exata de suas etapas: elaboração cuidadosa do questio­
nário, levando-se em conta os objetivos visados; os melhores meios de aplicação
desse questionário; seleção cuidadosa das regiões ou das localidades a serem pesqui­
sadas, também de acordo com os objetivos visados; definição do tipo possivelmente
ideal de informante, do número deles, além de outras especificações variáveis. Os
mapas resultantes perfazem os “atlas lingüísticos”, em que figuram as localidades
pesquisadas com os dados levantados e outras informações pertinentes.
As características científicas do método foram definidas por Jules Gilliéron
(1854-1926), que idealizou e concretizou o primeiro grande atlas lingüístico moder­
no, o Atlas Linguistique de la France. Havia verificado que as experiências anterio­
res haviam revelado, nos estudos dialetológicos,

mots ou formes peu sürs, sans précision de lieux, de temps, de circonstances, de valeur, recueillis
dans des conditions si diverses qu’ils sont rarement comparables entre eux. Au mieux, ce sont de
matériaux de dictionnaire que viennent compléter les dictionnaires de langue littéraire: dictionnai-
rc, cimetièrc: on ne fait pas un tableau de vie avec les noms des épitaphes25.

palavras ou formas pouco seguras, sem exatidão de lugares, de tempo, de circunstâncias, de valor,
recolhidas em condições tão diferentes que dificilmente são comparáveis entre si. No máximo, são
matérias de dicionário que vêm completar os dicionários da língua literária: dicionário, cemitério:
não se .faz um quadro de vida com os nomes dos epitáfios.

Corrigindo essas falhas, Gilliéron alterou a sistemática; preparou um questio­


nário com cerca de 1.900 perguntas, que deveríam ser feitas a informantes de 639
localidades, preferencialmente em pontos geográficos afastados. Gilliéron inovou
também ao entregar a coleta dos dados a Edmond Edmont (1848-1926). Edmond era
comerciante cm Saint-Pol, na Picardia, mas também um bom dialetólogo amador,
tendo publicado um excelente dicionário do seu dialeto natal. Tinha ainda o raro dom
de uma extraordinária acuidade auditiva para os menores matizes fonéticos, dom que,
aliado ao fato de não ser linguista profissional e com isso isento de influências teó­
ricas, fazia dele um aplicador ideal dos questionários. A coleta dos dados foi realiza­
da em quatro anos, de 1897 a 1901. Gilliéron não elaborou, como haviam feito seus
prcdccessorcs Wcnker e Weigand, os resultados; apenas publicou, a partir de 1902, os
mapas representando com números os 639 pontos pesquisados e a forma dialetal,
conforme ouvida por Edmond, veio em transcrição fonética. A publicação só foi con­
cluída em 1912, constituindo doze volumes “in folio”.

25. M. Roques, Jules Gilliéron. Paris, 1926, p. 9. /Ipui/Tagliavini, Le Origini ilelle Lingue Neolatine, p. 26.

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÂNICA | 71


Os estudos dos dados do Atlas, feitos por Gilliéron, seus discípulos e colegas,
mostraram muitos problemas antes ignorados ou apenas mencionados pela escola
neogramática, então dominante, com os da homonímia e da etimologia popular.
Como exemplo de homonímia resultante da homofonia, Gilliéron encontrou na
Gasconha a palavra azã, correspondente do fr. faisan (“faisão”) e bigey, fr. vicaire
(“vigário”) como substitutos do que deveria ser a forma dialetal proveniente do lat.
gallum (“galo”). No gascão, a geminada /11/, em posição final por apócope, passa
normalmente a /-t/, resultando a forma gat, homófona e homônima de gat, de cattum
(“gato”). No ambiente de características rurais dos pequenos povoados, tal conver­
gência de formas dos nomes de dois animais domésticos e comuns deveria levar ao
desaparecimento de uma delas. A criatividade popular elevou o galo a faisão, dada a
relativa semelhança; por outra via, o comparou metaforicamente a um padre vigário,
que “deve zelar pelas mulheres pias e devotas do lugar”, infere Wartburg26, acordan­
do-as com seu canto para a missa diária.
Entretanto, o termo gat (< gallum) persiste em outras denominações compos­
tas, em que não há possibilidade de homonímia, como nas variantes perligal’, de per­
dix gallus, ou perdrigat (“perdiz”). Daí se concluí que houve uma época em que gat
convivia com seu homônimo e que seus substitutos azã e bigey são posteriores.
Outros exemplos de homonímia é o fr. moudre, resultado da convergência
fonética do lat. mulgere (“ordenhar”) e molere (“moer”); essa homonímia, sobretudo
no meio rural, era insustentável. Por isso, moudre ficou com o sentido de “moer”,
certamente por ser de uso mais freqüente e generalizado, enquanto a idéia de “orde­
nhar” passou a ser expressa por traire, tirer, ajuster e outras expressões.
Quanto à etimologia popular27, Gilliéron identificou-a no ir.fum ier (“estru-
meira”). Da palavra latina *fimarium (REW 3307a) provém a forma mais antiga
femier, como, porém, da estrumeira costuma sair fumaça, o povo associou fem ier a
fitmée (“fumaça”); da associação semântica passou-se à aproximação fonética, resul­
tando fumier. Embora a consoante labial /f/ possa ocasionar a mutação /e/ > /u/, a
aproximação semântica é mais aceitável no francês; um caso semelhante no portu­
guês é ferrolho, do lat. verruculam. Em português, /v/ inicial não passa a /f/; mas a
etimologia popular ligou ferrolho a “ferro”, metal de que aquele objeto geralmente é
fabricado, o que explica a mudança /v/ > /f/.
Os aperfeiçoamentos do método, dados os bons resultados obtidos por
Gilliéron, foram adotados por outros estudiosos e pesquisadores e outros atlas lin-

26. Einfuhrung in Pmblematik und Methodik der Sprachwissenschaft, 1943, p. 126.


27. O termo “etimologia popular” foi criado por Ernest Wilhelm Fõrstermann (1822-1906); em alemão
Volkstymologie, em francês ètymologie du peuple.

| E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
güísticos foram montados, que convém citar. Os suíços Karl Jaberg (1887-1958) e
Jakob Jud (1882-1952) fizeram o Sprach- und Sachcitlas Italiens und Südschweiz
(“Atlas Lingüístico e de Coisas da Itália e do Sul da Suíça”), conhecido pela sigla
AIS, em 8 volumes “in folio”, entre 1928 e 1940. Impresso em duas cores, inclui as
cidades e ordena os mapas por grupos de matérias e em ordem alfabética. Os auto­
res consideraram importante o elemento antropológico e por isso incluíram a pesqui­
sa de “coisas” nos questionários, segundo os princípios dos métodos Wõrter und
Sachen e da Onomasiologia, de que se tratará mais adiante.
Matteo Bartoli (1873-1946) e Giuseppe Vidossi (1878-1969) iniciaram o
Atlante Linguístico Italiano (ALIt) com apoio da Società Filologica Friulana; o núme­
ro de perguntas é elevado e o questionário abrange aspectos mais amplos. A guerra
impediu os trabalhos e o empreendimento perdeu Bartoli e o capaz aplicador Ugo
Pellis, lingüista friulano. A obra foi depois reiniciada por Benvenuto Terracini (1886-
1968). Das ilhas, foi publicado o Saggio di Atlante Linguístico delia Sardegna, em
1964, por Terracini e T. Franceschi. O melhor atlas da Córsega é o de Gino Bottiglioni
(1887-1963), o Atlante Linguístico Etnográfico Italiano delia Corsica (ALE1C).
Na Península Ibérica, Antonio Griera (*1887), discípulo de Jules Gilliéron em
Paris, iniciou o Atlas Linguistic de Catalunya em 1912; sua publicação, porém, só foi
concluída em 1964 por causa da guerra civil espanhola. Tomás Navarro (*1884) ini­
ciou, em 1925, o Atlas de la Península Ibérica, cujo primeiro volume só foi publica­
do em 1962 também devido à guerra civil e mundial. Por essa razão também o mate­
rial coletado foi levado para a França, depois para os Estados Unidos, voltando a
Madri só em 1951. Em Portugal, Paiva Boleo preparou o Atlas Linguístico de Portugal
(ALP), através do método pouco seguro de questionário por correspondência.
Aproveitando as experiências acumuladas através dos outros atlas, os rome­
nos, sob a direção de Sextil Pugcariu (1877-1948), organizaram Atlasul Linguistic
Român (ALR) em duas séries: ALR I, com 2.160 perguntas para serem formuladas em
301 localidades e publicadas em tamanho normal dos outros atlas do gênero; o ALR
11, com 4.800 perguntas, aplicadas em 85 localidades, em mapas quatro vezes meno­
res. Os pesquisadores e redatores do ALR I, Sever Pop (1901-1961), e do ALR II, Emil
Petrovic (1898-1968), publicaram também pequenos atlas, respectivamente ALRM I
e ALRM II, com mapas coloridos e elaboração de alguns problemas fonéticos, mor-
fológicos e léxicos. Alguns problemas de caráter internacional, como guerras e a ces­
são da Modávia à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, dificultaram bastan­
te esse empreendimento.
Como se vê, a moderna România européia foi mapeada, embora não se tenha
ainda o resultado total final desse vultoso trabalho. Atualmente, a tendência é regio­
nalizar os atlas linguísticos, tornando-os mais particularizados, uns apenas linguísti­
cos, outros também antropológicos ou etnográficos. São exemplos os atlas do lionês

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÀNICA I 73


(1950-1956), do valão (1953-1958), do gascão (1954-1958), do Maciço Central
(1957), do champanhês, do andaluz, do leonês, das Canárias e outros.
Na América Latina, cita-se o Atlas Lingiiístico e Etnográfico de Colômbia,
elaborado pelo Instituto Caro y Curvo, de Bogotá. Uma série de mapas, inseridos em
El Espanol en Puerto Rico, de T. Navarro, forma de fato um pequeno atlas do espa­
nhol falado nessa ilha da América Central (1948). No Brasil, há estudos de geogra­
fia lingüística na Bahia, na Paraíba e outros regionais, com transcrição fonética em
mapas, mas considerados estudos preliminares. Na Universidade de São Paulo, está
em andamento a elaboração do Atlas Toponímico do Estado, trabalho ligado à disci­
plina Toponímia, da área de Línguas Indígenas da Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas.
A contribuição do método da geografia lingüística para a romanística foi, sem
dúvida, valiosa, apesar de seu caráter unilateral: recolhe apenas dados linguísticos ins­
tantâneos; de modo geral, não registra aspectos e vocábulos satíricos, familiares e afe­
tivos, dado seu caráter sintético. Por exemplo, o ALF registra apenas 30 expressões
para “avarento” e uma única para “rico”, quando se sabe que existem na Galo-româ-
nia cerca de 200 expressões para “avarento” e 80 para “rico”; da mesma forma, o AIS
dá apenas de 2 a 6 termos para “cabeça”, e apenas um em 400 pontos; ora, isso certa­
mente não correspondente à realidade lingüística, já que “cabeça” é o ponto de parti­
da para numerosas formas de caráter afetivo, jocoso, pejorativo e familiar.
Contudo, tem o mérito de dar uma visão geral da situação atual da língua, cau­
sando uma revolução benéfica nos estudos da linguagem; com a geografia lingüísti­
ca realizou-se o ideal neogramático de estudar a língua viva. Mostra como as pala­
vras se chocam entre si, migram, arcaizam-se, renascem ou desaparecem, tornando
claro que, em última análise, o fator determinante de todo esse processo é o aspecto
semântico, cuja busca fez nascer outros métodos de pesquisa.

MÉTODO DE W ÔRTER UND SA C H E N (“PALAVRAS E COISAS”)

Os neogramáticos haviam dado ênfase especial ao aspecto fonético; a geogra­


fia lingüística preocupou-se bastante com a semântica, sugerindo a necessidade de se
conhecer, sempre que possível, o objeto designado por determinado termo, a fim de
se captar devidamente seu significado. Conhecendo-se a natureza, as medidas, a
forma, o uso etc. dos objetos, é possível fixar a origem e a história das palavras com
as quais esses mesmos objetos são designados. Para Hugo Schuchardt (1842-1929) e
Rudolf Meringer (1859-1931), mentores deste método, as coisas precedem suas
denominações e podem até existir sem que as tenham; consideravam que há uma
estreita relação entre essas duas realidades.

74 j ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Dessa visão, subjacente já na gramática grega, surgiu a corrente Wõrter und
Sachen (“Palavras e Coisas”) ou Sachen und Wõrter, como preferia Schuchardt, já
que as coisas precedem as palavras. Por Sachen entendiam qualquer realidade “tanto
acontecimentos e estados como objetos, sensíveis ou insensíveis, reais ou irreais”211.
Pelo conhecimento em profundidade da “coisa”, chega-se ao ετυ μ ο ς da palavra que
a designa, isto é, o significado correto e originário com que a coisa foi primeiramen­
te nomeada.
Sob esse prisma, foram estudados os termos românicos derivados do VáX.f i ca­
tum: port.fígado, cast. hígado, cat.fedge, prov.fedge, fr. ant.firie, fr. mod.foie, friul.
fiyat, eng. fio , it.fegato, vegl.fekuat, rom. ficat, além de muitas variantes dialetais
(REW 8494). Trata-se, portanto, de um termo panromânico. Entretanto, o termo lati­
no correspondente é iecur, de início, não se sabia como havia surgido o vocábulo
românico por não se conhecer a “coisa” designada por ficatum. A pesquisa mostrou
que a “coisa” etimológica estava no costume dos gregos de engordar patos e porcos
com figos; dessa prática resultava que o fígado desses animais se tornava maior e
melhor para o consumo, sendo então denominado ήπαρ συκωτόν pelos gregos,
isto é, “fígado engordado com figo” (gr. σύκου, lat. ficum, port. figo). Os romanos
importaram a mercadoria e o nome, traduzindo-o por iecur ficatum·, por braquisse-
mia, reduziu-se a expressão ao segundo elemento apenas. Assim, ficatum substituiu
totalmentc a denominação antiga iecur c tornou-se o étimo dos termos românicos.
O exame das designações românicas levanta a dificuldade fonética de formas
que partem de ficatum, proparoxítona, enquanto outras supõe ficatum, paroxítona.
Verificou-se que as formas proparoxítonas são mais recentes, nas quais a influência
grega é maior, devida ao cristianismo, que usava inicialmente o grego comum. Nas tra­
duções ou nos decalques dos oxítonos gregos, esses se tornavam proparoxítonos em
latim, como gr. Òpcpavóç, lat. orphanus, port. órfão·, gr. μοναχός, lat. monachus,
port. monge. Assim, o paroxítono ficátum foi formado segundo o paradigma dos dever-
bais com base no supino, sempre paroxítono; é a forma mais antiga, conservada no
rom. ficat, no venez. figà, friul. fiat, eng.fió, camp.figáu. As variações de acento e de
quantidade do /i/ devem ser atribuídas ao uso muito freqücntc da palavra em toda a
România, sofrendo obviamente as mais diversas influências no aspecto fonético.
Com essas etapas, o método une a pesquisa da palavra (“Wortforschung”) à
da coisa (“Sachforschung”) de maneira acurada, do que resulta a História da Coisa-
Palavra (“Sachwortgcschichte”). São exemplos desse procedimento os trabalhos de
Schuchardt sobre a etimologia do fr. trouver, prov. trovar, it. trovare, port. trovar etc.;
ou de Herculano de Carvalho, intitulado: Coisas e Palavras: Alguns Problemas

28. H. Schuchardt, Brevier (Ein Vudemecum der allgemeinen Sprachwissenschaft), p. 118.

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÂN1CA I 75


Etnográficos e Linguísticos relacionados com os Primitivos Sistemas de Debulha na
Península Ibérica (Coimbra, 1953).
Outra etapa do método, segundo Schuchardt, consiste no Atlas de Imagens
(“Bildatlas”), no qual se estampariam fotografias e ilustrações dos objetos comuns
da vida cotidiana da România, dada a dificuldade de se visualizar determinados obje­
tos nunca vistos. Sugere também a criação de museus etnológicos regionais e um
outro central, geral, românico, como ponto de referência para os estudos de Wõrter
und Sachen. O veículo de divulgação do método, seus objetivos e resultados foi a
revista Wõrter und Sachen, Kulturhistorische Zeitschrift fiir Sprach- und
Sachforschung (“Palavras e Coisas: Revista de Cultura e História para Pesquisa de
Linguagem e de Coisas”), iniciada em 1909 por Rudolf Meringer, Wilhelm Meyer-
Ltibke e outros. Foi o título da revista que fixou o nome do método Wõrter und
Sachen e não Sachen und Wõrter, como queria Schuchardt e como seria lógico, já
que, como ficou dito, as coisas precedem as palavras.
Claras são as relações deste método com a Geografia Lingüística, que encam­
pou as idéias e os princípios daquele em vários casos, como o Sprach- und Sachatlas
Italiens und Ràtoromanischen Schweiz (“Atlas de Linguagem e Coisas da Itália e da
Suíça Reto-românica”), de Karl Jaberg e Jakob Jud. Outros atlas se propuseram pes­
quisar elementos antropológicos, etnográficos e outros da mesma linha, cujas idéias
condutoras, em última análise, são as mesmas.
Em conclusão, “Palavras e Coisas” rompeu os limites estreitos dos neogramá-
ticos, buscando o que há de vivo e não sujeito a cegas leis na linguagem; buscando
estabelecer a etimologia e até a biografia das palavras, deu o devido lugar à semân­
tica e tornou os estudos filológicos mais objetivos.

MÉTODO ONOMASIOLÓGICO

Com pontos em comum com a Geografia Lingüística e “Palavras e Coisas”, o


método onomasiológico, também conhecido como onomasiologia, isto é, o estudo
das denominações, se propõe investigar os vários nomes atribuídos a um objeto, ani­
mal, planta, conceito etc., individualmente ou em grupo, dentro de um ou vários
domínios lingüísticos. Seus objetivos são, portanto, semânticos e lexicológicos, bus­
cando descobrir os aspectos vivos e as forças criadoras da linguagem.
O método onomasiológico não foi criado por apenas um pesquisador; seus
princípios foram se desenvolvendo aos poucos. Como predecessores da moderna
onomasiologia, citam-se F. Brinkmann, que estudou os nomes do cavalo nas línguas
românicas e no inglês (1872): Luigi Morandi (1844-1922), com estudo sobre as
expressões italianas para “morrer” (1883); importância maior tem Friedrich Diez

76 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
com Romanische Wortschõpfung (“Criação Vocabular Românica”), publicado em
1875, como apêndice à Grammatik der romanischen Sprachen (“Gramática das
Línguas Românicas”). Fora do domínio românico, A. Fr. Pott estudou os nomes do
arco-íris (Bennenungen des Regenbogens) em línguas do mundo todo (1853); Jakob
Grimm publicou Über die Namen des Donners (“Sobre os Nomes do Trovão”) (1853
também) e F. Miklosich pesquisou Die slavischen Monatsnamen (“Os Nomes
Eslavos dos Meses”) (1868).
Contudo, com Cario Salvioni (1858-1920) e seu trabalho sobre as denomina­
ções italianas do vagalume (1892) e com o romanista suíço Ernest Toppolet (1870-
1939) e seu estudo sobre os nomes românicos de parentesco, estabeleceram-se os
princípios da onomasiologia científica, também chamada “lexicologia científica”
por Toppolet.
Depois da publicação dos atlas lingüísticos, a onomasiologia foi usada em
numerosos estudos, dos quais são exemplos Die romanischen Namen der Kõrperteile
(“Os nomes Românicos das Partes do Corpo”) de Adolf Zauner (1870-1943), publica­
do em 1902; I nomi romanzi delle stagioni e dei mesi (“Os Nomes Românicos das
Estações e dos Meses”) de Clemente Merlo (1879-1960), editado em 1904 com o sub­
título Saggio di Onomasiologia (“Ensaio de Onomasiologia”) . No domínio da língua
portuguesa, há Designações Portuguesas para “Embriagues”, de H. Kroll, e As
Designações para “Fígado ” nas Línguas Românicas (1958) de Serafim da Silva Neto.
O método onomasiológico permite ver a cultura do povo cuja língua se estu­
da, costumes, ocupações, instrumental, crenças e crendices, moradia, enfim, sua
mundividência. Permite sentir a linguagem viva, traduzindo a vivência cultural do
povo. Assim, o lagarto, por exemplo, é considerado amigo do homem e seu vigia,
despertando-o na eminência duma picada de cobra; essa crença, encontrada na Itália,
Récia e França, transparece nas designações do lagarto: sic. guardal-omu, rét. war-
thaomu, eng. salvaón (vardcí ou salva, “salvar”, + om, “homem”), lomb. salvacristiàn
(cris tiàn, “homem”), fr. dial. éveillette (“que acorda”). Da mesma forma, o animal
carnívoro europeu, a doninha, parecida com o furão brasileiro, é considerado a encar­
nação de um mágico: por isso recebe as seguintes denominações afetivas para cap-
tar-lhe as boas graças: cast. comadreja (“comadrezinha”), fr. belette (“belezinha”), it.
donnola (“damazinha”), rom. nevastã (“noiva”); mesmo fora do domínio românico,
encontram-se al. sul Schõntierlein (“belo bichinho”), dinam. Kjõnne (“linda coisi-
nha”) e no sueco Jungfru (“senhorita”).
Pela onomasiologia, é possível caracterizar as atividades de uma região e situá-
las no tempo. A população da Sardenha, muito conservadora, atualmente se dedica
tanto à pecuária como à agricultura; entretanto, estudos onomasiológicos provaram
que inicialmente sua atividade se restringia à pecuária: o vocabulário sardo referente
à vegetação, aos pastos e à pecuária é geralmente pré-romano, enquanto o relaciona-

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÂNICA 77


do com a agricultura, os instrumentos agrícolas, os cercais, a vinoviticultura etc. c de
origem latina: lat. aratru > log. aratru, port. arado·, lat. iugu > log. yugu, port. jugo·,
lat .falce > log .farke, port .foice·, lat. vite > log. bide, port. vide (videira); lat. vinea >
log. binza, port. vinha', lat. polline > log. poddine, (port. farinha).
A onomasiologia pode também fazer a história c a biografia das palavras,
ligando-se assim a Wõrter und Sachen c à dialctologia, mas vai além dessa última,
pois se estende a todos os níveis lingüísticos. Entendida desse modo, abrange inclusi­
ve a toponímia, não sendo raros os estudos de etimologia e história dos nomes de
lugar; nessa investigação é necessário combinar conhecimentos lingüísticos com os do
meio ambiente, como o fizeram Albert Dauzat na França, Auguste Vincent na Bélgica,
Jõran Sahlgren e Eilert Ekwall na Suécia. De certo modo, a onomasiologia segue o
caminho inverso da etimologia; esta toma o significante para chegar aos significados,
enquanto aquela procura dar a história da palavra, desde a época mais antiga até che­
gar aos nossos dias, explicando, ou pelo menos tentando explicar, as diversas influên­
cias sofridas, os cruzamentos semânticos, sua vitalidade c freqüência de uso etc.

MÉTODO NEOLINGÜÍSTICO OU ESPACIAL

Este método, mais que os anteriores, é uma decorrência da geografia lingüís-


tica. Seu principal mentor foi Matteo Bartoli (1873-1946), com Introduzione alia
neolinguistica, de 1925, donde veio o nome do método. Contudo, o mesmo autor
publicou, em 1945, Saggi di linguística spaziale (“Ensaios de Lingüística Espacial”).
Durante certo período, contou com a colaboração de Giulio Bertoni (1878-1942),
antigo seguidor do idealismo de Karl Vossler. Bertoni aproveitou alguns postulados
teóricos de Vico, Humboldt, Schuchardt, Gaston Paris, Ascoli, Croce e de seu mes­
tre Vossler.
Bartoli, que havia sido discípulo do neogramático Meyer-Lübke, entusias-
mou-se com os resultados da geografia lingüística e opôs-se aos princípios neogra-
máticos, sobretudo a suas leis fonéticas, consideradas demasiado rígidas. Entretanto,
embora se declarem adversários dessas leis, na prática os neolingüistas as aplicam e
até propõem outras novas, ainda que com o nome diferente de norme areali (“normas
de área”), fixadas conforme a posição da palavra no espaço.
Apesar dessa contradição, esse método mostra o modo pelo qual a história
dos diversos aspectos da língua deixa seus traços no espaço. Utilizando-se dos dados
da geografia lingüística, estabelece relações cronológicas entre os vários fenômenos
lingüísticos, o que anteriormente só se obtinha através de documentação nem sem­
pre disponível. Com essa perspectiva, os neolingüistas estabeleceram as seguintes
“normas de área”:

78 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
1. Havendo palavras diferentes em fases cronológicas distintas para um significa­
do, a forma da área mais afastada ou de acesso difícil costuma ser a mais anti­
ga. Nesse sentido, consideram-se áreas afastadas os extremos da România, isto
é, a Ibéria, de um lado, e a Romênia, de outro; o acesso pode ser difícil pela
interposição de montanhas, mar e outros acidentes geográficos. Aplicando-se
essa norma, haedus (“cabrito”) é mais antigo que caprilius por se ter mantido
no log. edu c no rom. ied, variedades de área de difícil acesso ou de região
afastada, enquanto caprittus ficou no prov. cabrit, daí para o fr. cabri, cat.
cabrit, cast. cabrito, port. cabrito e it. capretto - formas consideradas mais
recentes, vindas do latim tardio. A área do Logudoro, a de acesso mais difícil
da Sardenha, deve apresentar formas mais antigas se comparadas às da Itália,
área central:

lat. domus - casa > log. domo·, it. casa (“casa”)


lat. magnus - grandis > log. manmr, it. grande (“grande”)
lat. agrestis - silvaticus > log. areste\ it. selvático (“selvagem”)
lat. ianua - porta > log. giànna\ it. porta (“porta”).

A norma correspondeu aos fatos nesses exemplos. Encontram-se, porém, casos


contrários, em que a mais antiga forma se encontra no italiano, embora sejam
mais raros, como it. volere, do lat. vulg. volere (por velle), mas log. kerrere, de
quaerere, na acepção de “querer”, em que houve alteração semântica tardia de
“procurar”, significado próprio de quaerere, para “querer”.

2. De acordo com esta segunda “norma de área”, as formas de regiões periféricas


são mais antigas que as correspondentes centrais. Ibéria e Dácia, laterais, apre­
sentam o mais antigo fervere·, port. ferver, cast. hervir, rom. a fierbe, enquanto a
Gália, Catalunha, Récia e Itália, centrais, herdaram o mais recente bullire: fr.
bouillir; prov. boulhir; cat. bullir; eng. buVir, friul. bulir; it. bollire. Contudo, o
vocábulo também se encontra no log. buddire\ o port. bulir passou a significar
“mexer”, “mover”, “tocar”.
Da mesma forma, lat. arena se conservou no port. areia, no cast. arena, no cat. e
prov. arena e no rom. arinã e anina no sul e no norte do país, enquanto no cen­
tro se usa nisip (do eslavo) e homoc (do húngaro). A palavra mais recente lat.
sabulum permanece no it. sabbia, fr. sable, que o emprestou ao provençal. O deri­
vado port. saibro e o gal.jebra têm o sentido específico de “areia grossa”.

3. São mais antigas as palavras conservadas em áreas mais amplas que as correspon­
dentes encontradas em áreas mais restritas. Assim, dos pares causa e lucru, frigi-

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÂNICA I 79


dus e recens, findere e crepare, frater efratellus, o primeiro elemento é mais anti­
go e permaneceu nas áreas mais amplas:

causa > port. cousa (ou coisa), cast. cosa, cat. cosa, prov. cauza, fr. chose,
eng. coza, friul. coze, log. ant. casa, vegl. causa;
frigidum > port. frio, cast. frio, cat. fred, prov. freg, fr. froid, it. freddo, eng.
fraid, friul .fred, log .frittu;
findere > port. fender, cast. hender, cat. fendre, prov. fendre, fr. fendre, eng.
sfender, iX.fendere;
frater > nap. frate, it. ant.frate, sic.frati, log.fradi, eng. frar e fra, friul. fradi,
piem .frâire, prov. fra ire, fr. frère, rom. frate. No português os derivados/racfe
e frei, bem como a correspondente castelhana fray, sofreram restrição semân­
tica, designando cada um dos membros de uma Ordem religiosa; a forma frei
é usada sempre que for seguida do nome próprio e só particularmente em
outras situações, quando se usa apenas frade.
Os termos provenientes do segundo elemento desses pares encontram-se em áreas
bem mais restritas e por isso são mais recentes:

lat. lucru > rom. lucru (“coisa”);


recens > rom. rece (“frio”);
crepare > rom. a crepa (“rachar”);
fratellu > it. fratello, lomb.fradèl, vên. fradelo e galur. fraddu (“irmão”).

Ainda que mais raramente, observam-se casos em contrário, em que as palavras


mais recentes se encontram em áreas mais amplas e as mais antigas em áreas mais
restritas, como nos pares li(n)gula e densus, cochleariii e spissus:

lat. li(n)gula > rom. lingurã;


densus > rom. des.

Essas duas palavras herdadas pelo romeno são mais antigas que as duas do outro
par, fugindo a esta “norma de área”, mas está perfeitamente de acordo com a
segunda. Nas demais regiões românicas, conservaram-se as formas mais recentes:

lat. cochleariu (< gr. κοχλιάρ ι Οv) > port. colher, cast. cuchara, fr. cuiller,
it. cuchiaio;
spissus > port. espesso, cast. espeso, fr. épais, it. spesso.

4. Regiões de latinização mais tardia costumam conservar formas mais antigas,


sobretudo em relação à Itália; isso quer dizer que o latim da Itália era mais ino-

80 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
vador que o do Império em geral. Assim, comedere permaneceu na Ibéria: port.
comer, cast. comer, mas it. mangiare (< manducare)', avunculus ficou no fr.
onde, mas o it. tem zio (< thius); e li(n)gula encontra-se no rom. lingunt, enquan­
to o it. conservou a forma mais recente cuchiaio (< cochleariu).
Casos contrários também se verificam, como as já citadas lat. volere > it. volere
e lat. quaerere > log. kerrere, das quais a forma italiana é mais antiga que a cor­
respondente logudoresa.

5. Palavras desaparecidas, arcaizadas ou menos usuais costumam ser as mais antigas.


Por exemplo, focus, que significava “lar”, “habitação” na norma literária, na norma
vulgar substituiu totalmente ignis no sentido de “fogo”; de ignis nada se conservou
no léxico herdado das linguas românicas. Lat. vulg.focu: > port .fogo, cast. fuego,
cat.foc, prov. fuec, fr.feu, friul.fug, eng. fõg, log.fogu, it. fuoco, vegl.fuk, rom. foc.

Essas cinco “normas de área” poderíam ser reduzidas a duas ou três, como se
notou acima. Essa metodologia é esquemática demais, pois os fatos lingüísticos não
podem reduzir-se a fórmulas rígidas, sem levar em consideração as grandes variações
causadas por fatores sociais, estilísticos, dos diversos estratos etc. Além disso, a con­
firmação prática dessas “normas” tem sido bastante relativa, já que fatos contrários
ao que elas estabelecem não são tão raros quanto se podería esperar. Alguma contri­
buição pode ser delas obtida, quando combinadas entre si e com outros métodos; aju­
dam a estabelecer as características gerais e as tendências das línguas e dialetos
românicos, mas a contribuição específica dessa corrente foi mais negativa que posi­
tiva, porque suas normas carecem da abrangência e da precisão indispensáveis.

M ÉTODO DA TEO RIA DAS ONDAS ( W ELLENTH EO RIE)

As primeiras idéias, que posteriormente vieram a constituir a chamada


“Teoria das Ondas”, foram expressas por Schuchardt em Der Vokalismus der
Vulgãrlatein (“O Vocalismo do Latim Vulgar”), em 1866; o mesmo Schuchardt
desenvolveu-as um pouco mais na preleção Über die Klassifikation der romanischen
Mundarten (“Sobre a Classificação dos Dialetos Românicos”), proferida em 1870,
mas publicada só em 1900.
Contudo, foi Johannes Schmidt (1843-1901) quem formulou os princípios da
“Teoria das Ondas” na obra Die Verwandtschaftsverhàltnisse der indogermanischen
Sprachen (“As Relações de Parentesco das Línguas Indo-européias”), de 1872.
Segundo Johannes Schmidt, a distribuição e as inovações das línguas não são
atribuíveis a tendências nelas imanentes, segundo se deduz da Stammbaumtheorie

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÂNICA I 81


(“Teoria da Árvore Genealógica”) de August Schleicher (1821-1868). Essa teoria,
cujos princípios foram inspirados pela filosofia hegeliana, via nas línguas organis­
mos naturais que surgem, crescem e se desenvolvem conforme leis fixas e depois
envelhecem e morrem, sem que a vontade humana possa intervir. Nessa mesma filo­
sofia linguística, Arsène Darmesteter (1846-1888) escreveu seu conhecido La vie des
mots (1878) (“A Vida das Palavras”) e William Dwight Whitney (1827-1894) publi­
cou em 1875 The Life and Growth o f Language (“A Vida e o Crescimento da
Linguagem”). De acordo com essa teoria, imagina-se a distribuição das línguas sob
a forma de uma árvore genealógica, de cujo tronco saem os ramos que, por sua vez,
se subramificam.
Segundo J. Schmidt, porém, essa visão não seria a correta, pois de fato as
inovações lingüísticas se propagam como ondas, irradiadas continuamente de cen­
tros geográficos humanos de prestígio, que se cruzam e entrecruzam com freqüên-
cia. Essa doutrina está relacionada com a geografia lingüística, enquanto a de
Schleichel se liga ao método histórico-comparativo. Assim, conforme a
Wellentheorie, um fato fonético, por exemplo, surge em determinado ponto de um
território e começa a se expandir, como o /t/ passou a ser pronunciado /ts/ na região
dos Alpes, ao sul da Alemanha, como em Herta > Hertsa > Hertz > Herz (“cora­
ção”); por contágio constante e progressivo, essas mudanças se estenderam por toda
a Alemanha. Do mesmo modo, a ditongação d o /17 e d o / ü / longos, como em min
> mein e brun > brann, partindo provavelmente da Boêmia, estendeu-se por todo o
país num período de 300 anos.
No domínio românico, a conhecida linha La Spezia-Riminí, delineada por
Matteo Bartoli, estabelece a fronteira entre duas fontes irradiadoras: Roma, ao sul, e
Ravena, ao norte. Ao sul dos contrafortes dos Apeninos, as ondas irradiadas por
Roma mantiveram as características dos falares italianos, ajudadas por fatores histó­
ricos e religiosos, pelo substrato etrusco e pela geografia montanhosa dos Apeninos.
Ao norte, a importante diocese de Ravena, com forte influência bizantina, contrapôs
outro tipo de influência lingüística, ajudada pelo substrato celta e pelo fator geográ­
fico da planície do rio Pó. O resultado lingüístico foram variedades diferentes ao
norte pertence à România Ocidental e o sul, à Oriental, ainda que esse fato não tenha
como causa única centros irradiadores diversos (ver mapa 24, p. 379).
Durante os séculos da existência do Império Romano, sem dúvida foi Roma
o grande centro de irradiação lingüística para suas províncias através da presença da
administração, do comércio, das colônias civis e militares, do exército cujas legiões
eram freqüentemente deslocadas para regiões diferentes; com isso obteve-se uma
relativa uniformidade do latim, até de sua variedade vulgar, que se fracionou de
maneira mais ou menos rápida, quando a unidade política se quebrou e Roma deixou
de ser irradiadora cultural e lingüística.

82 E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
Contudo, a Teoria das Ondas não abrange a totalidade do fato lingüístico;
apenas o observa e o acompanha, o estuda no espaço, mas não explica sua natureza
ou as causas múltiplas que podem produzi-lo. Combinada com elementos da geo­
grafia linguística, da lingüística espacial e de outros métodos pode ser útil à
Filologia Românica.

MÉTODOS AFINS

Essas grandes linhas metodológicas, sucintamente expostas acima, entrecru-


zam-se e, devidamente combinadas, até se auxiliam mutuamente. De uma metodolo­
gia mais geral pode-se conceber outras mais particularizantes. Assim, da geografia
lingüística surgiram a geologia e a estratigrafia lingüísticas.
Pela observação da existência e da superposição de diversos estratos léxicos,
a geologia lingüística refaz a genealogia das palavras pelo estudo dos fósseis.
Gilliéron verificou, por exemplo, que as formas francesas arcaicas para “abelha”
eram è e e f do lat. apem, e és no plural (< apes); a forma è proveio do plural és, ori­
ginando homonímia com wé e è provenientes do lat. a vem e também com wé do lat.
vespam. No norte da França, houve indecisão entre as formas wé e é, surgindo as
variantes ézé(s) e wézé(s). Desse modo, uma frase como le vol d 'ézé(s) podia signi­
ficar tanto “o vôo dos pássaros” como “o vôo das abelhas”. Para evitar a homonímia,
adaptaram-se outras palavras para “pássaro”, como jeune, oiselet, moíneau; para
“abelha”, essaim (“enxame”), considerado pela etimologia popular como coletivo de
és. Com essaim significando tanto “abelha” como “enxame”, criou-se nova homoní­
mia; enquanto em outros territórios da França essaim ou jeton designava o “enxame”,
só na região norte essaim (“abelha”) foi substituído por outras designações como
mouche, les mouches, jeuneau etc. O termo ep (< apem) é um empréstimo do diale­
to da íle-de-France, muito isolado, além de perder-se no fluxo frasal e confundir-se
com os homônimos citados; foi por isso reforçado com mouche, resultando mouche-
ep, cujo segundo elemento foi confundido com o sufixo comum -ette. Daí, dos com­
postos e{s)-ep e mouche-ep saíram essette e mouchette. Mouchette, porém, significa
mais precisamente “pequena mosca”, mais corrente no uso comum com significado
de “abelha”; para evitar essa nova homonímia, forma-se um novo composto mouche
à miei para “abelha” que se estende pelo norte da França a partir do século XV. Em
Paris, substituiu-se mouche à miei por mouche-abeille, para estabelecer uma corres­
pondência com mouche-guèpe (“vespa”), indicando dois insetos que picam. Abeille
é um empréstimo do provençal abelho.
A estratigrafia lingüística é o estudo da história da superposição dos estratos
léxicos, investigando a origem e as migrações das palavras. Busca sistematicamente

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÂNICA | 83


as palavras que aparecem nos mais antigos documentos medievais, sendo por isso
chamada também de “geografia lingüística medieval”.
Os dados do AIS (ver p. 73), por exemplo, revelam que a palavra bosco é usada
em toda a Itália, enquanto selva, do lat. silva, só é encontrado esporadicamente na
região centro-sul (Campânia, Lácio e Marcas). Sabe-se que a palavra originária para
“bosque”, tanto na Itália como na França, era o lat. silva > it. selva, fr. ant. selve; é
óbvio, portanto, que um estrato bosco se sobrepôs ao estrato selva. Quanto à origem
da palavra vencedora, it. bosco, duas fontes se apresentam: o gr. β οσ κ ή (“pasto”) e o
germ. oc. *bosk (“bosque”). Restava descobrir se fora o termo grego que havia se
imposto do sul para o norte, ou o germânico, indo do norte para o sul. Recorrendo aos
documentos medievais mais antigos, foi possível verificar o uso constante do termo
selva no sul da Itália, a partir de Gubbio, à medida que se caminha do norte para o sul,
sempre mais tardiamente vai sendo encontrada a forma boscunr. em Asti e Cremona
em fins do século IX; Monza, Milão e Parma, na primeira metade do século X;
Brescia, Novara, Bobbio e na Emília, na segunda metade do século X; Florença,
começo do século XI e em Gubbio, no século XII. Assim, a estratigrafia lingüística
mostrou que foi o termo germânico o que se superpôs ao antigo selva.
Portanto, na busca da origem das palavras, os dados da estratigrafia comple­
tam e explicam os fornecidos pela geografia lingüística, que não podem ser comple­
tos em si mesmos.
O método onomasiológico, por sua vez, considerado de modo sincrônico,
levou J. Trier e outros à concepção da teoria dos Sprachliche Felder (“campos lingiiís-
ticos”), aplicando ao estudo da linguagem a idéia de “campo”. Essa noção é um
empréstimo da física, com seus “campos de força” (Kraftfelder), da “teoria do campo”
da psicologia da forma (Geslaltpsychologie), aplicada à estrutura do léxico. Segundo
Trier, nenhuma palavra está isolada na consciência do falante, mas se insere num con­
junto de outras expressões semanticamente relacionadas, formando um Wortfeld mais
ou menos fechado. Estudou-se, por exemplo, o “campo de palavras” relacionado com
a compreensão no início do século XIII, termos como v/Tsheit (“sabedoria”), Kunsl
(“arte”) e List (“astúcia”). O mesmo campo de palavras é estudado em períodos dife­
rentes; comparam-se depois os resultados obtidos, de modo que o método se torna de
fato diacrônico. Esse aperfeiçoamento da onomasiologia permitiu estudar também os
conceitos abstratos, dificilmente atingíveis de outra forma.
Semelhante em vários pontos à teoria de Trier, a Lexicologia Social de G.
Matoré, exposta em La méthode en Iexicologie. Domaine français (“O Método em
Lexicologia. Domínio Francês”), em 1953, considera a palavra sempre como um ele­
mento de conjuntos maiores, classificados segundo as estruturas sociais. A base de seus
champs notionnels (“campos nocionais”) é a teoria das gerações; assim, Matoré divi­
diu em onze gerações o período de 1520 a 1887, atribuindo de 30 a 36 anos para cada

84 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


uma e estudando depois as respectivas estruturas vocabulares. Dentro desses campos
nocionais, Matoré destaca os mots-clés e os mots-témoins. Esses últimos, “palavras-tes-
temunho”, seriam neologismos denotativos de mudanças sociais. Desse modo, coke
(“carvão mineral”), por volta de 1770, seria a “palavra-testemunho” dos primeiros
albores da industrialização em grande escala, pois o uso dessa matéria-prima permitiu
a produção de aço em grande escala, muito maior que o carvão vegetal.
Da mesma forma, a introdução de magazin (“grande armazém”), entre 1820
e 1825, indicaria nova mentalidade comercial, fazendo surgir outras como employé
(“empregado”), commis (“caixeiro”), rayon (“prateleira”), facture (“fatura”), client
(“cliente”) etc. Entretanto, o método se afigura falho, já que magazin, por exemplo,
se encontra em um decreto real com o sentido de “grande armazém” um século antes,
em 1723.
Os mots-clés (“palavras-chaves”), como “unidades lexicológicas que definem
uma sociedade”, indicariam o ideal desejado por certa comunidade; exemplifica com
honnête homme como ideal social de meados do século XVI1 e philosophe, do sécu­
lo XVIII na sociedade francesa. As palavras-chaves, porém, podem representar ape­
nas mudanças sociais rápidas, de comprovação difícil.
Entretanto, as teorias dos Campos Lingüísticos de Trier e a da Lexicologia
Social de Matoré não foram devidamente ainda aplicadas no domínio românico. A
teoria de Trier foi seguida em uma série de trabalhos sobre o alemão.

CONSIDERAÇÕES SOBRE OS MÉTODOS

A linguagem é, inegavelmente, uma herança social, cuja história se estende por


séculos. Uma visão completa, um conhecimento detalhado de seu mecanismo, de sua
estrutura, de sua semântica e até de sua ortografia só podem ser obtidos através da pes­
quisa diacrônica. Os métodos, expostos acima em suas linhas essenciais, não deixam
dúvida de que a Filologia Românica se desenvolveu com o método histórico-compara-
tivo, adotado com mais êxito aqui do que no campo para o qual havia sido criado. As
possíveis deficiências desse método foram sendo corrigidas depois pela geografia lin-
güística e pelos outros métodos derivados, como a onomasiologia, Wõrter und Sachen,
lingüística espacial etc. Enquanto o método histórico-comparativo procura as ligações
entre o “terminus a quo” e o “terminus ad quem”, o latim vulgar e as línguas români-
cas respectivamente, os outros métodos têm como objeto especificamente o “terminus
ad quem”, pois investigam sincronicamente aspectos atuais dessas mesmas línguas,
cujas explicações, porém, devem ser buscadas diacronicamente.
Estabelece-se com isso uma integração entre a diacronia e a sincronia, que na
romanística é perfeitamente possível, porque só dela se conhecem bem o ponto de

MÉTODOS DA FILOLOGIA ROMÂNICA I 85


partida e o de chegada; esse fato não ocorre alhures, como na germanística ou na
eslavística, por exemplo. Desse modo, o campo românico se torna um laboratório em
que se experimenta a eficiência de novas metodologias; essa situação privilegiada
levou Leo Spitzer a considerar a romanística como a praeceptrix linguisticae. A farta
documentação disponível dispensa o recurso a hipóteses e suposições. Dispõe-se de
fatos que levam o pesquisador do concreto para o abstrato, do singular para o con­
junto e para o geral, ou “do microscópio para o macroscópio”, na expressão de
Schuchardt. Enfim, a Filologia Românica se rege pelos princípios da indução, que se
coaduna melhor com a natureza de seu objeto.

86 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
3
O r ig e m d a s

L ín g u a s R o m â n ic a s

É sabido que as línguas românicas provêm do latim; o termo “latim”, porém,


não é univoco, já que existem numerosas variedades. Interessa à Filologia Românica
particularmente o chamado “latim vulgar”, eminentemente falado e, por isso, de
reconstituição árdua, mas a verdadeira fonte das línguas românicas. É preciso tam­
bém saber como essa variedade do latim foi levada a todos os recantos do Império
Romano, a documentação existente, além de os fatores que propiciaram o apareci­
mento de várias línguas a partir desse latim vulgar.

O LATIM E SUAS VARIEDADES

Originariamente, o latim era apenas o dialeto de Roma, restuito à margem do


rio Tibre. Língua de camponeses e pastores, era rude, concreta e sem refinamento de
qualquer espécie. Pertence à família indo-européia e, dentro dela, ao grupo Kentum.
Juntamente com o osco dos samnitas, o sabélico, o volsco, o umbro e o falisco, o
latim forma o grupo chamado itálico (ver mapa 2, p. 354).
Quando os romanos começaram a se projetar, a Itália era um mosaico de ra­
ças. Os pouco conhecidos etruscos, ao norte de Roma, atingiram elevado grau de
civilização e no século VI a.C. dominaram Roma e estenderam seus domínios até
Cápua, ao sul. Contudo, por volta do ano 500 a.C., Roma conseguiu expulsar os
dominadores etruscos do rei Tarquinio, o Soberbo, e implantou a República. A estra­
tégica posição da cidade, no coração do Lácio e de toda a península, facilitou a con­
solidação da cidade como potência emergente; com hábeis alianças, como o Foedus
Cassianum no princípio do século V, que estabeleceu uma aliança estreita entre Roma
e os povos itálicos, e também com várias guerras, os romanos venceram as resistên­
cias de povos poderosos, como os samnitas ao sul e os etruscos ao norte.
Com a vitória sobre Pirro, rei do antigo Epiro nos Bálcãs, chamado contra a
expansão romana pelos gregos de Taranto, vitória obtida em Benevento, em 275,
depois de várias derrotas perante 20.000 mercenários, 3.000 cavaleiros e 26 elefan­
tes trazidos por Pirro, encerra-se a primeira fase da expansão de Roma; seu domínio
abrange a Itália desde a Sicilia até a planície do rio Pó. Ao mesmo tempo, enfrenta­
va dificuldades internas com a revolta dos plebeus endividados e espoliados de seus
direitos civis contra os patrícios; uma tropa armada dos plebeus ocupou o monte
sagrado do Aventino, em 494, e só se retiraram depois da criação dos concilia plebis
tributa, isto é, assembléias do povo por tribos, fato que constitui o primeiro tipo de
greve de que se tem notícia. Mas a igualdade de direitos só foi conseguida em 287
a.C., com a admissão dos plebeus em todas as magistraturas.
Datam dessa época também as primeiras colônias romanas nos territórios con­
quistados na Itália, importante fator de latinização da própria península. Em 272, todo
o território da Itália faz parte da confederação romana c praticamente todos os povos
se submetem ao direito romano, pagando impostos c obrigando-se ao serviço militar.
Quando Cartago se firmou como potência naval, no século III a.C., os roma­
nos fizeram vários tratados de não agressão com os cartagineses. Subjugados os
samnitas depois de três guerras, bem como os demais povos da Itália, lançaram-se
os romanos à guerra contra Cartago. A primeira guerra púnica (269-241 a.C.) ter­
minou com o estabelecimento da primeira “província”, a Sicilia, em 241, e logo
depois as da Sardenha e da Córsega em 238. Apesar das vitórias de Aníbal, a segun­
da guerra púnica (218-201) aniquilou o poderio de Cartago depois da batalha de
Zama, vencida por Cipião, o Africano. Desde então os romanos passaram a chamar
o Mediterrâneo de mare nostrum. Mas só depois da terceira guerra púnica (149-
146), com a destruição de Cartago, o norte da África se torna província romana
(146) (ver mapa 1, p. 353).
Expandindo-se em várias frentes, Roma incorpora a Hispânia em 197, o
Illyricum em 167, a Grécia, denominada Achaia, em 146, a Ásia Menor cm 129, a
Gália Narbonensis em 120. A Gália Cisalpina, conquistada em 191, tornou-se pro-

88 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


víncia cm 81, bem como a região dos venetos, submetidos cm 215. A Gália
Transalpina, denominada também Comata ou Mclcnuda, foi a grande conquista de
Caio Júlio César em 51-50. O Egito tornou-se província em 30 a.C., a Récia e o
Nórico em 15 a.C., a Panônia em 10 d.C., a Capadócia em 17 d.C., a Britânia em 43
e a Dácia em 107 d.C., sob o imperador Trajano (98-117), que faz as últimas conquis­
tas, incorporando também a Arábia do Norte, a Armênia, a Assíria e a Mesopotâmia
entre 114 e 117. Com isso, o Império Romano atingiu sua extensão máxima, com um
total de 301 províncias (ver mapa 1, p. 353).
Essas datas indicam geralmente o início da latinização, que não teve, porém,
a mesma profundidade em todas as províncias. No Oriente, a latinização foi bastan­
te superficial; a Hispânia e a Sardcnha exigiram dois séculos para uma romanização
efetiva, enquanto outros territórios, como os Agri Decumates e a Britânia, nunca
foram totalmcnte assimilados, embora haja marcas do latim por toda parte.
Dentro desse vasto território, o latim era a língua dos dominadores. Em con­
tato com tantos idiomas diversos, o latim influenciou-os c foi por eles influenciado,
principalmentc no léxico da variedade lingüística denominada latim vulgar, falada
pelo povo, como se verá mais adiante. Além disso, o aumento da riqueza, advindo das
conquistas, o crescimento populacional de Roma e o desenvolvimento da cultura
refletiram-se no latim, diversificando-o em diversas normas lingüísticas, geralmente
bem documentadas.
Procedendo a um rápido retrospecto histórico do latim, encontra-se o primei­
ro documento, a Fíbula de Preneste, aproximadamente do ano 600 a.C.: MANIOS
MED FHEFHAKED NVMASIOI (Manius me fecit Numerio). Ainda que seja um docu­
mento isolado, essa inscrição é aceita como um ponto de referência inicial para a his­
tória do latim, ao lado de outros escritos epigráficos, como os epitáfios dos Cipiões.
Nessa fase das origens, o latim devia ser relativamente uniforme, tendo como foco
irradiador de influência o sermo urbanus de Roma.
Nas primeiras conquistas, os romanos costumavam destruir as cidades e levar
seus habitantes para Roma. Depois abandonaram esse costume; assim mesmo,
porém, a população da cidade aumentou bastante. Uma das conseqüências foi a acen­
tuação das diferenças sociais entre a classe mais alta dos patrícios, oficiais militares,
dirigentes etc. e a mais baixa, a plebe, fato que se refletiu na língua; essa diferença
acentua-se ainda mais por volta do século IV com um crescente refinamento cultural
das classes altas. Delineiam-se então duas normas lingüísticas: o sermo urbanus, a
linguagem do estrato social mais culto, e o sermoplebeius da massa popular inculta,
designação genérica, na qual se distinguem o sermo rusticus, a fala descuidada dos
camponeses e pastores, o sermo castrensis do importante segmento militar e o sermo
peregrinus, usado pelos estrangeiros cm geral, cada vez mais numerosos, e aprendi­
do de ouvido, por isso também o mais alterado.

O R IG E M D AS L ÍN G U A S R O M Â N IC A S 89
Com a conquista da chamada Magrui Graecia, que compreendia boa parte do
sul da Itália, muitos gregos foram levados para Roma em 272 a.C., entre eles Lívio
Andrônico, que viria a ser o iniciador da literatura latina. Em 240, Lívio apresentou
em Roma sua primeira peça teatral, provavelmente uma tragédia segundo Cícero
(Brutus, 72) e Titus Pomponius Atticus (110-32 a.C.) em Liber Annalis·, ambos se
basearam nas pesquisas de Varrão, pois a peça se perdeu. Lívio fez também uma
adaptação da Odisséia de Homero ao mundo romano, sob o nome de Odissia. Nasceu
assim a literatura latina, que conta ainda com Névio (poesia épica e dramática), Ênio
(épica, dramática e lírica com a introdução do hexametro dactílico), Lucilio (sátira),
Marcus Publius Cato (prosa) e Plauto (comédia). Desse modo, embora com grande
influência grega, começou a formação de outra norma lingüística, escrita e sempre
mais estilizada, o sermo litterarius ou classicus. O período áureo do latim literário
vai de 81 a.C., com o primeiro discurso de Cícero que chegou até nós, Pro Quintio,
a 14 d.C., ano da morte do imperador Augusto. Essa norma conservou-se uniforme
por oito séculos aproximadamente e só com dificuldade se encontram particularida­
des regionais, como a patavinitas do historiador Tito Lívio.
Essas diversas normas lingüísticas não eram desconhecidas pelos autores lati­
nos. Cícero (106-43 a.C.) e Quintiliano (30-95 d.C.) distinguem claramente a urba­
nitas da rusticitas, respectivamente em De Oratore 111, 11, 42 e em Institutio
Oratoriae, XI, 3, 10. Profundo conhecedor do latim, Cícero menciona também em
outras passagens essas variedades, com em Ad Familiares, IX, 21:

Quid tibi ego in epistulis videor? Nonne plebeio sermone agere tecum... Epistulas vero cotidianis
verbis texere solemus.

Que pareço eu a ti nas cartas? Não pareço tratar contigo na língua do povo... Pois costumamos tecer
as cartas com as palavras do dia a dia.

Ou ainda com mais clareza em Academica, I, 2:

Didicisti enim non posse nos Amafmii aut Rabirii similes esse, qui nulla arte adhibita de rebus ante
oculos positis vulgari sermone disputant [...]

Aprendeste, pois, que nós não podemos ser semelhantes a Amaflnio ou a Rabirio, que sem arte algu­
ma discutem sobre as coisas que lhes caem sob os olhos numa linguagem vulgar.

Não se pode supor que Cícero, no primeiro texto, afirmasse estar usando a
norma gramaticalmente incorreta da massa inculta; também não afirma que Amaflnio
(filósofo estóico) e Rabirio (poeta épico) do segundo texto se expressassem na norma
popular: diz apenas faltar-lhes aquela forma artística esmerada, própria do sermo lit-

90 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


terarius. Mas é claro que Cícero distingue bem duas modalidades linguísticas: a usada
costumeiramente nas conversas das pessoas cultas, como o próprio Cícero e os dois
autores citados por ele no texto, e a outra, na qual se deve usar arte. A língua coloquial
das classes cultas denomina-se sermo urbanus ou urbanitas, sermo usualis ou usus,
sermo cotidianus ou cotidianitas, sermo consuetudinarius ou consuetudo, ou ainda,
sermo vulgaris, mantida por vários romanistas como sinônimo dos anteriores, que não
deve, porém, ser confundido com o que normalmente se entende por latim vulgar.
Os dois textos não aludem ao latim falado pela grande massa popular, aliás,
ignorado por gramáticos e escritores de modo sistemático. Certamente não se encon­
trarão no sermo vulgaris das cartas de Cícero ou nos escritos de Amafínio e Rabirio
as formas rejeitadas superlex (por suppellex), imfimenatus (por effeminatus), ficda
(por frigida) e tantas outras documentadas pelo Appendix Probi ou conservadas nas
tabellae defixionum, nas inscrições tumulares etc. Essa variedade denomina-se sermo
plebeius ou rusticus (rusticitas), peregrinus (peregrinitas) e castrensis ou militaris.
Modernamente, a designação mais aceita é latim vulgar.
O seguinte gráfico sintetiza a história e os desdobramentos dessas três varie­
dades do latim:

-» Português
- » Galego
Castelhano
-> Catalão
Provençal
- * Francês
Rético
-> Sardo
- » Italiano
-» Dalmático
Romeno

Resumindo, segundo esse esquema “cacto deitado”, a partir de meados do


século III a.C., distinguem-se três normas no latim de Roma:

O R IG E M D A S L ÍN G U A S R O M Â N IC A S [ 91
a. O sermo classicus ou litterarius: burilado, artístico, sintético, só escrito, que atin­
giu o ápice estilístico no período áureo da literatura latina entre 81 a.C. c 14 d.C.,
tanto na prosa com Cícero, César e Salústio, como no verso com Virgílio,
Horácio, Ovidio, Lucrécio e Catulo. É uma cstilização do sermo urbanus.
b. O sermo urbanus: a língua falada pelas classes cultas de Roma, certamente cor­
reto do ponto de vista gramatical, mas sem os refinamentos e a estilização da
variedade literária, denominada vulgaris por Cícero. Os falantes dessa norma
eram também os principais detentores da norma literária.
c. O sermo plebeius: essencialmente falado, era a norma da grande massa popular
menos favorecida, analfabeta. Foi metodicamente ignorada pelos gramáticos e
escritores romanos, mas era viva e real; apresenta variantes sobretudo no léxico,
segundo o modo de vida dos falantes, distinguindo-se o sermo rusticus, o castren­
sis e o peregrinus.

CARACTERÍSTICAS DO LATIM VULGAR

Como as línguas românicas provêm do latim vulgar, obviamente é essa norma


lingüística que interessa particularmente à Filologia Românica. Para caracterizar o
latim vulgar é prático e concludente compará-lo com o literário, muito bem descrito
pelos gramáticos e escritores. Desse cotejo conclui-se que o latim vulgar, em relação
ao literário, é:

a. Mais SIMPLES em todos os níveis


Na fonética, a perda da quantidade vocálica e sua substituição pelo acento
intensivo, por exemplo, trouxe como conseqüência, entre outras, a redução das dez
vogais (as cinco longas e as cinco breves) a sete, seis ou cinco apCnas, segundo as
diversas regiões da România, com específicas evoluções posteriores.
Na morfologia, as sutis è pouco claras distinções flexionais das declinações
foram reduzidas; as semelhanças fizeram com que a 2a. declinação absorvesse a 4a.,
que acabou desaparecendo. A 5a. declinação detinha um número relativamentc peque­
no de palavras e se confundia facilmente com a 3a. ou teve a flexão -ie substituída por
-ia e incorporada à Ia., fato de que há muitos exemplos, como materies e materia,
luxuries e luxuria, facies e facia, dies e dia, variações encontradas no uso vulgar desde
época antiga. Em conseqüência, uma parte das línguas românicas herdou a distribui­
ção do léxico nominal em três grupos, decorrentes das três “declinações” do latim vul­
gar, como o português, por exemplo, que da Ia. declinação tem nomes em -a (mensa
> mesa), da 2a. em -o (libru > livro) e da 3a. em -e ou consoante (occidente > ociden­
te; imagine > imagem; feroce > feroz; facile > fácil).

92 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Quanto aos numerais, o latim vulgar conhece apenas os cardinais, com os
quais expressa todas as relações de número. Dos outros três tipos - ordinais (primus,
sextus, vicesimus, octingentesimus), distributivos (singuli, seni, viceni, duceni) e
multiplicativos (semel, secies, vicies, ducenties) - encontram-se poucos vestígios
apenas das primeiras formas dos ordinais. Mesmo com os cardinais ocorre uma uni­
formização pela troca da subtração, como em duodeviginti (18), undeviginti (19),
pela adição, resultando decem et (ou ac) octo, decem et (ou ac) novem\ o mesmo pro­
cesso foi depois aplicado também aos outros números, como decem (et) sex, decem
(et) septem etc., simplificação atestada pelas línguas românicas.
O gênero neutro, herança do indo-europeu, era uma complicação, já que
semanticamente não se distinguia do masculino e a diferenciação formal era muito
pequena; assim os neutros singulares passaram para o masculino, eliminando-se um
problema antigo de palavras de gênero flutuante, como aevus e aevum (“época”),
caseus e caseum (“queijo”), collus e collum (“pescoço”) etc. Os plurais neutros da 2a.
declinação em -a foram considerados nominativo singular da Ia., como folia, ligna,
pira etc. O gênero neutro, entre as línguas românicas, só se encontra no romeno e em
escassos vestígios cm outras.
Considerável simplificação deu-se nos demonstrativos e indefinidos princi­
palmente. Dos seis demonstrativos (is, hic, iste, ille, ipse e idem) permaneceram
apenas três (iste, ipse c ille), que expressam de modo simples c claro as mesmas fun­
ções das formas antigas, ainda que com o auxílio de partículas de reforço, como
ecc 'iste ou eccu 'iste, também accu 'ille, metipse ou metipsimus (> port. mesmo, cast.
mismo, fr. même, it. medesimo etc.). Nos indefinidos, cujo conteúdo significativo
era vago por natureza, distinções tênues não podiam se manter e muitos foram eli­
minados; perdeu-se a distinção entre alter e alius, uter e quis, uterque e quisque,
entre outros.
Na sintaxe, o latim vulgar não faz mais as distinções entre non e ne nas nega­
ções, generalizando o non; o uso da preposição de generalizou-se e substituiu ab e
ex, de difícil distinção sob o aspecto semântico. A maior simplicidade na sintaxe veri-
fica-se também na ordem das palavras na oração e na construção do período, até
certo ponto conseqüência da perda dos casos e das declinações.

b. Mais ANALÍTICO
De acordo com sua origem indo-européia, o latim era uma língua essencial­
mente sintética, rica em recursos flexionais, com os quais expressava muitas funções
e relações entre os termos da oração. As deficiências desse sistema flexionai eram
supridas por torneios analíticos. A perda sempre crescente das flexões no latim vul­
gar tornou-o cada mais analítico pelo uso de preposições, advérbios, pronomes c ver­
bos auxiliares para expressar funções e relações entre os termos. As preposições

O R IG E M D A S L ÍN G U A S R O M Â N IC A S I 93
substituem as flexões casuais. O futuro passa a ser expresso por perífrase com ver­
bos auxiliares, como cantare habeo ou cantare volo·, emprega-se o indicativo onde o
clássico usava o subjuntivo: Quid debeo dicere? por Quid dicam?
Muito clara é a tendência analítica do latim vulgar ao eliminar as formas sin­
téticas da voz passiva dos verbos no infectum, através da generalização do modelo
analítico do perfectum·, amor (“sou amado”), amabar (“era amado”) e amabor (“serei
amado”) foram substituídas por amatus sum, amatus eram c amatus ero, criando-se as
formas, inexistentes na norma culta, amatus fui, amatus fueram, amatus fuero. Com
isso, eliminou-se a dualidade de formas na expressão da voz passiva, prevalecendo o
processo analítico, que foi conservado pelas línguas românicas cm todas as formas
passivas, formadas pelo participio + aux. ser (< esse), ressalvando-se apenas o rome­
no, que emprega a fi(< fieri) em lugar de esse.
Um tipo particular de forma sintética observa-se nos chamados verbos
depoentes, como ulciscor (“vingar-se”), obliviscor (“esquecer-se”), patior (“sofrer”),
que tinham forma passiva, mas sentido ativo. Causavam muitas confusões e por isso
desapareceram bastante cedo, sendo substituídos por formas ativas, como se pode ver
na Carta do Rustius Barbarus a seu amigo Pompeu (início do século II d.C.):

Si tan [sic] cito virdia mi non mittes,


stati amicitiam tuam obliscere debio?

Se não me envias tão logo as verduras,


devo já esquecer tua amizade?

O latim literário expressava o comparativo de superioridade e o superlativo


dos adjetivos por sufixos próprios em formas sintéticas: altus - altior (“alto” -
“mais alto”) e altissimus; em casos especiais, como com os adjetivos em -eus, -ius,
e -uus (magis idoneus, magis dubius e magis arduus) ou por motivos estilísticos, ο
latim literário lançava mão das formas analíticas com magis ou maxime. O latim
vulgar, porém, simplificou o sistema, usando sempre a forma analítica no compara­
tivo de superioridade, certamente influenciado analogicamente pelo de igualdade e
de inferioridade (“tamquam” e “minus - quam”), c formando o superlativo analiti-
camente com advérbios de intensidade (valde, maxime). Certo número de compara­
tivos sintéticos foi conservado nas línguas românicas, provenientes de maior, minor,
melior e peior. As formas do superlativo absoluto sintético hoje encontradas nas lín­
guas românicas, menos no romeno, foram reintroduzidas na época do Re­
nascimento, sendo portanto eruditas. Note-se que as formas comparativas conserva­
das são muitas vezes confundidas com o superlativo, já nas Glossas de Reichenau:
optimos: meliores.

94 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


c. Mais CONCRETO
O caráter concreto do latim vulgar é uma decorrência do modo de vida de seus
falantes e de sua mundividência, voltada sobretudo para os problemas materiais. Esse
aspecto tem reflexos em todos os aspectos da língua, sendo porém mais evidente no
léxico e na sintaxe.
Assim, termos abstratos, denotativos de qualidades e de atividades intelec­
tuais ou de generalizações, que pressupõem trabalho de abstração, são praticamente
desconhecidos, ao passo que os nomes de coisas concretas são muito numerosos. A
busca dessa concretude se faz sentir no modo claro, analítico e objetivo de expressar
os pensamentos através do uso de artigos, pronomes pessoais, possessivos etc.
A necessidade de uma melhor caracterização e identificação dos substantivos
levou à criação dos artigos definidos e indefinidos, inexistentes no latim literário,
embora haja, desde a fase arcaica, ocorrências de ille e ipse (ou a variante ipsus) com
função e significação de artigo definido e de unus, indefinido, como o conhecido:

Sicut unus pater familias Itis de rebus loquor. (Cicero, De Oratore, I, 132)

Falo sobre essas coisas como uni pai de familia.

Na Vulgata, os exemplos são ainda mais claros, como o encontrado em Mateus 26,29:

Accessit ad eum una ancilla.

Aproximou-se dele uma empregada.

É certo que os artigos se firmaram como tais na fase romance. O fato, porém,
de que todas as línguas românicas os têm, permite afirmar a existência deles no latim
vulgar.
No léxico, o latim vulgar conservou as tendências das origens, quando as
acepções abstratas tinham por base sempre um termo designativo de algo concreto:
putare significava etimologicamente “podar” e só posteriormente “julgar” (pois para
“podar” de modo correto é preciso “julgar” os ramos a fim de selecionar os mais
viçosos); rivalis era aquele que repartia as águas do rio (rivus) para irrigação ou para
o gado e depois “competidor”, pela insuficiência da água disponível; versus era o
sulco deixado pelo arado e posteriormente “linha de escrita”; altus, “alimentado”
(part. pass. de alere) e depois “que cresceu pela alimentação”, “alto”; sapere, “sabo­
rear”, “ter gosto”, depois “saber”, “ser entendido”.
Na sintaxe, a ausência do hábito da abstração leva os falantes do latim vulgar
a preferir as frases não ligadas entre si, sem expressar explicitamente as relações de
dependência. Predomina a justaposição, inexistindo a complicada correlação dos

O R IG E M D A S L ÍN G U A S R O M Â N IC A S 95
tempos. São comuns os torneios assindéticos do tipo Volofacias (“Quero que faças”),
Cave cadas (“Tome cuidado para que não caias”). As inscrições fornecem muitos
exemplos de períodos assindéticos, como os seguintes:

Sarra, non belle facis, solum me relinquis. (CIL, IV, 1951)


Sarra, não ages amavelmente, tu me deixas sozinho.

Vincis: gaudes, perdis: ploras. (Inscriptiones Latinae Selectae, 9453)


Vences: ficas contente, perdes: choras.

Bene labes oze, a (ssem) des; cras gratis. (CIL, 8244)


Toma um bom banho hoje, paga um vintém; amanhã é grátis.

Do mesmo modo, poucas são as conjunções empregadas; das coordcnativas,


apenas o et é encontrado; das várias alternativas (an, aut, sive ou seu, vel) só aut era
usada, ao passo que das adversativas, explicativas e conclusivas (sed, at, immo,
verum, quin, enim, nam, ergo, itaque) não se conservou nenhuma no romance.
Esses aspectos são suficientes para se concluir que de fato a língua é um refle­
xo da cultura de seus falantes, uma manifestação de seu modo de vida regido pelas
imposições concretas das necessidades imediatas.

d. Mais EXPRESSIVO
Considerando-se o caráter eminentemente falado do latim vulgar, deve-se
supor nessa comunicação a ênfase, a espontaneidade e a afetividade, antigas tendên­
cias do latim. Essa característica explica as consoantes geminadas em nomes bem
populares, como *pappa ou *atta, “pai”, mamma, “mãe”, nassus depois nasus,
“nariz”, bucca, “boca”, guttur, “garganta”, braccium ou bracchium, “braço”, lippus,
“ramelento”, gibbus, “corcunda”, flaccus, “caído”, “de orelhas compridas”, siccus,
“seco” e outros. Em muitos desses vocábulos, a etimologia não explica as gemina­
das, a não ser em razão da expressividade popular em tais termos correntes de con­
teúdo concreto29. O mesmo se observa nos nomes de animais domésticos, como
vacca (mas sânscr. vaçã), “vaca”, gallum, “galo” e caballus, “cavalo”.
A reduplicação é outro recurso expressivo de origem popular: gurgulio ou
curculio, “caruncho”, populus, de origem itálica (cf. umbro poplu), “povo”, excep­
cional em relação ao tipo indo-europeu.
Alguns sufixos verbais e nominais de origem popular são carregados de
expressividade; assim os verbos de sentido inicialmente freqüentativo em -tare, for­
mados à base do supino do verbo originário, como *specio - spectare; cano - can-

29. Para outros exemplos e maiores aprofundamentos, vejam-se Meillet, Esquisse d'une histoire de Ia langue
laíine, p. 166 ss. e Maurer, O Problema do Latim Vulgar, p. 184 ss.

96 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


tare, e em -itare - vivo - victitare. Produtivo foi o sufixo formador de nomes de agen­
te em -a, designando pessoa de nível social inferior, como verna (“escravo nascido
na casa do senhor”), vappa (“vinho estragado”, “patife”), scurra (“civil” e “parasi­
ta”) e o nome próprio Agrippa. Note-se ainda a geminada dos três últimos e a cono­
tação pejorativa dos três primeiros.
A afetividade transparece de modo particular através de palavras com sufixos
diminutivos, bastante numerosas no latim vulgar, que deram origem a corresponden­
tes românicos, embora com perda do caráter diminutivo. Desse modo, de vetas
(“velho”) formou-se o diminutivo afetivo vetulus, registrado no n°. 5 do Appendix
Probi sob a forma popular veclus (vetulus non veclus), donde port. velho, cast. viejo,
cat. vell, prov. vielli, fr. vieil, eng. vegl, friul. vieli, it. vecchio, log. vettsu, vegl. vie-
klo, rom. vechiu. A expressividade esta em auricula por auris, também panromâni-
ca: port. orelha, cast. oreja, cat. orella, prov. aurelha, fr. oreille (> it. ant. oreglia),
eng. ural'a, friul. orel'e, log. oriya, it. orecchio, vegl. orakla, rom. ureche. O mesmo
se verifica em acus > acucula (“agulha”), apis > apicula (“abelha”), agnus > agnel­
lus (“cordeiro”), ager > agellus (“campo cultivado”), signum > sigillum (“sinal”),
pedis > pedunculus (“piolho”). O gosto pela forma diminutiva é uma característica
da linguagem familiar do povo romano, encontrando-se algumas ocorrências mesmo
nos escritos mais populares de Cícero e de Horácio. Há os de caráter realmente dimi­
nutivo, denotando mais a pequenez do objeto, como acucula por acus (“agulha”),
lenticula por tens (“lentilha”); mas é evidente a afetividade em nepticula por neptis
(“neta” e “sobrinha”), anucula por anus (“velha”).
Também o sufixo -on-, uma das origens do nosso -ão, foi muito produtivo no
latim vulgar, designando geralmente qualidades pouco recomendáveis, como aleo -
aleonem (“jogador”) de alea (“o dado”). Outras vezes, tem sentido aumentativo de
reforço, nas duas raízes indo-européias designativas de “homem”, guerreiro e macho,
*ner- e *wiro-, no emprego corrente, o latim conservou só vir, que se encontra na
Ibéria *virone > port. barão > varão, cast. baróir, ner- ficou na forma sufixada no
sobrenome Nero, Neronis. Em nomes de objetos, -on- tinha primitivamente sentido
pejorativo ou aumentativo como em talum > talonem (“calcanhar”), conservado no
it. talione, friul. talon, fr. talou, prov. e cat. talo, port. talão; bastum > bastonem (port.
bastão, fr. báton, it. bastone, prov. baston, cat. e cast. baston). Outros exemplos são
cap(p)onem por capum (“capão”), coleonem por coleum (“testículo”), ericionem por
ericium (“ouriço”), carduum > cardum > cardonem (“cardo”), em que também a
supressão do hiato l-uu-l revela a origem vulgar do termo.
A língua clássica é muito sóbria no emprego de formas expressivas e afetivas,
mantendo sempre um caráter aristocrático e solene. A língua popular, porém, mante­
ve os recursos expressivos do latim arcaico, alguns dos quais foram apontados acima.
Com a evolução normal da língua, muitos termos expressivos substituíram os primi-

O R IG E M D AS L ÍN G U A S R O M Ã N IC A S j 97
tivos e com isso perderam a conotação característica, como se verifica na maioria dos
correspondentes românicos.

e. Mais PERMEÁVEL A ELEMENTOS ESTRANGEIROS


São inevitáveis as influências recíprocas entre os idiomas, sobretudo os
empréstimos léxicos. A norma culta latina era refratária a empréstimos, admitindo
apenas termos designativos de algo novo ou técnico. A atitude dos detentores da
norma culta nos é indicada por Cícero cm De Officiis, 21:

Ut enim sermone eo debemus uti qui notus est nobis ne, ut quidam, Graeca verba inculcan­
tes, iure optimo irrideamur.

Assim, pois, devemos usar aquela linguagem que nos é conhecida, para que, como alguns
que introduzem palavras gregas, não sejamos ridicularizados com toda razão.

Cícero cita a maior fonte de empréstimos léxicos em todos os níveis, o grego.


A cultura grega, mais elevada que a latina e atuante pela presença de muitos gregos
em Roma, desde a conquista da Magna Grécia, em 240 a.C., de fato forneceu o maior
contingente de vocábulos ao léxico latino, mesmo ao literário. Na língua popular,
esses empréstimos são muito numerosos, pois não havia entre seus usuários nenhu­
ma preocupação purista.
Entre os empréstimos gregos melhor representados nas línguas românicas
citam-se: petra por lapis (port. pedra, cast. piedra, cat. pedra, prov. peira, fr. pier-
re, eng. peidra, friul. piere, log. pedra, it. pietra, vegl. pitra, rom. piatrã) (REW
6445); chorda por funis (“corda”), colaphus por ictus (“golpe”), spatha por gladius
(“espada”), calamus por harundo (“caniço”), cyma por cacumen (“pico”) etc. Há
ainda muitos empréstimos ou decalques antigos, como aer (“ar”), apotheca (“des­
pensa”), bal{i)neum (“banho”), camera (“abóboda”), c(h)alare (ficou em “calado”
do navio - “ceder”), corona (“círculo”), crapula (“bebedeira”), grabatus (“catre”),
gubernare (“dirigir”), lampas (“lâmpada”), machina (“invenção”, “instrumento”),
macellum (“açougue”, mercado de carnes e de peixes), oleum (“óleo”), phalanga
(“estaca”), poena (“castigo”), punire (“punir”), striga (“feiticeira”); outros são
mais tardios, como bursa (“bolsa”), cara (“cabeça”, “rosto” - século VI, suplantan­
do vultus), encaustum (“tinta”, usado por atramentum), cata (“cada”), podium
(“estrado”, “balcão”), tumba (“túmulo”) e outros.
Muito antigos são os empréstimos itálicos, sobretudo oscos e umbros, como bos
(“boi”), lupus (“lobo”), scrofa (“porca”); influências dialetais explicam formas diver­
gentes como bubalus e bufalus (“búfalo”, panromânico), bubulcus e bufulcus (“vaquei­
ro” - it. bifolco, “lavrador”), ilex e elex (“azinhcira”), pumex e pomex (“pedra pomes”),
sibilare e sifüare, das quais há representantes nas línguas românicas: sibilare > rom.

98 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


siuera, mác.-rom. giura e suira, friul. sivilá, prov. fular, cat. fu la r e xiular, cast. silbar;
de sifilare > fr. siffler e chiffler, prov. si/Iar e siblar, cast. chillar, cat. xillar e chiflar,
camp. sitiai e suilai; também tuber e tufer (“cogumelo comestível”). Destaque-se o
caráter concreto e cotidiano do conteúdo semântico desses empréstimos.
Através da Gália Cisalpina, conquistada em 81 a.C., muitos termos celtas
entraram no latim vulgar, por exemplo: carrus (“carro”, panromânico), aluda (> fr.
alouette, prov. alausa, cat. alova —“cotovia”), betulla (“vidoeiro” - árvore), cervi­
sia (“cerveja”), carpentum (“carruagem”), marga (“calcário”), sapo (“sabão”), bec­
cus (“bico” - substituiu rostrum > port. rosto), camminus (“fogão”), cambiare (“tro­
car”), leuca (“légua”), bracae (“calça”), camisia (“camisa”, panromânico), scortum
(“couro”). Esses empréstimos celtas foram incorporados pelo latim vulgar antes da
grande expansão do Império; não poucos ascenderam à norma culta, sendo encon­
trados na literatura, sobretudo em obras de caráter mais popular.
Os empréstimos ibéricos são mais regionais e apenas alguns tiveram difusão
mais ampla, como gurdus (“grosseiro”, “gordo”), baia (cat. badia, cast. e port. baia,
fr. baie e it. baia). Os germanismos só se encontram nas línguas românicas ocidentais,
menos os que vieram através do celta, como os citados sapo, bracae e camisia. Fontes
latinas documentam alguns, como aringus (“arenque” - século I I I ) , burgus (“castelo”
- século IV), brutes (“noiva”). Do século III em diante, quando os germanos se torna­
ram mais numerosos nas legiões, entram outros empréstimos ou decalques referentes
à atividade militar, como werra (“guerra”), helm (“capacete”), *warnyan (“guarnir”,
“guarnecer”), wardan (“guardar”), suppa (“sopa”, panromânico, menos romeno); de
gahlaiba (gah [“vivo”, “alegre”] + laiba [“grande pão”]) formou-se companio [cum +
pan(is) + io] (“companheiro”, o que come do mesmo pão).
De outros termos correntes no latim vulgar não se conhece com certeza a ori­
gem, como cattus (“gato”, ibérico ou africano), caballus (“cavalo”, celta, asiático ou
balcânico), sappinus (“abeto”), basium (“beijo”), rocca (“rocha”).
O fato de se encontrar certo número desses empréstimos léxicos também em
outras obras literárias mostra que as diversas normas do latim não eram estanques e
que havia influências mútuas. Por outro lado, fica muito clara a permeabilidade do
latim vulgar às influências estrangeiras em toda a sua história; assinale-se ainda o
caráter concreto dessa norma: todos os empréstimos designam objetos, animais,
plantas, vestes, ações etc.

A LATINIZAÇÃO

A história da língua latina, particularmente do latim vulgar, está intimamente


ligada à do Império Romano. A medida que se expandiam as fronteiras do Império

O R IG E M D AS L ÍN G U A S R O M Â N IC A S I 99
por meio de conquistas e de hábeis alianças, alargava-se também o espaço territorial
do latim. Crescendo com o Império, decaiu com ele, mas não morreu: em situações
geográficas e em condições sociais, econômicas e culturais diferentes, do latim vul­
gar, falado pelas populações deixadas pelo refluxo político de Roma, nasceram as
línguas românicas, que o perpetuam.
Como já se viu, toda a Península Itálica, com exceção apenas da parte ao norte
dos rios Macra e Rubicão, fazia parte do Império de Roma. Etnicamente, porém, era
um conglomerado de raças, destacando-se:

a. Os ctruscos, entre os rios Arno e Tibrc c conhecidos por Tusci, donde o nome de
Toscana para o território ocupado, e também por Tyrrheni, daí Tirreno, o mar ao
oeste. Possuidores de elevada civilização no séculoVl a.C., chegaram a dominar
Roma e a ocupar a costa tirrena ao sul, até a Campanha, fixando-se em Cápua,
Nola e Pompéia e, ao norte, até a Emília e a Valpadana. Dos etruscos vêm prova­
velmente os nomes da própria Roma (Ruma) c do rio Tibre (etr. Thepre, lat.
Tiberis)·, o alfabeto latino foi inspirado pelo etrusco, que se baseou, por sua vez,
no alfabeto grego. Quanto à origem, discute-se se a língua etrusca era autóctone
ou asiática, ligada ao indo-europeu; as muitas inscrições conhecidas, como a
“telha” de Cápua, a placa de chumbo de Magliano, o cipo de Perúgia, são em
geral breves e de natureza funerária e por isso só com nomes próprios; as mais
longas são poucas e de interpretação difícil. Os romanos adotaram dos etruscos o
uso dos três nomes (praenomen, nomen, cognomen), como Marcus Tullius Cicero
por exemplo, diversamente de todos os outros povos indo-europeus; também
alguns nomes romanos correspondem exatamente a semelhantes etruscos, como
etr. A ide = lat. Aulus, etr. Fapi = lat. Fabius, etr. Petrumi = lat. Petronis e outros.
Na toponímia, são de origem etrusca Chianti < etr. Clante, Módena < etr. Muta-
na (“túmulo”), Volterra < etr. Velathri, Todi < etr. Tular (“cipo”, “coluna com ins­
crições”), lat. Tuder. O sufixo -na, com as variantes -ena, -enna, -ina, identificam
nomes etruscos como Ravenna, Porse(n)na, Caecina, Maecenas.
b. Os chamados povos itálicos incluíam os umbros, os oscos, os samnitas, os volseos,
os sabinos, os auruncos e os picenos. Lingüisticamente, dividiam-se em dois gru­
pos: latino-falisco, ou seja, o latim e o dialeto de Falerii, cidade situada no territó­
rio etrusco, onde hoje se encontra Cività Castellana, na província de Viterbo; e o
osco-umbro (ou umbro-sabélico ou itálico propriamente dito) compreendia os
seguintes dialetos: 1. O osco dos antigos samnitas, falada no Samnium, Campanha,
parte da Lucânia e do Abruzo e em Messina, na Sicilia. E conhecido através de
aproximadamente 200 inscrições, das quais as mais importantes são a Tabula
Bantina e o Cippus Abellanus; 2. Os dialetos sabélicos, pouco conhecidos, eram
falados no território entre o Samnium e a Umbria; o pelinho, o marrucino, o vesti-

100 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


no, o mársico e o sabino são variedades dialetais sabélicos. O volsco, falado ao sul
da Umbria na região costeira, aproxima-se mais do umbro, e é conhecido especial­
mente pela inscrição da Tabula Velliterna; e 3. O umbro era falado na Umbria anti­
ga, menor que a atual, situada entre os rios Tibre e Nera, sendo o dialeto mais ao
norte dos dialetos itálicos. É bem conhecido graças às famosas “Tábuas Iguvinas”.
c. Japígios e messápios habitavam nas regiões do Abruzo e da Apúlia, até a
Península Salentina. Sua língua, o messápico, é indo-européia, próxima do ilíri-
co; foi implantada nas regiões citadas, ao que tudo indica, por volta do início do
primeiro milênio a.C.; um número considerável de inscrições do messápico foi
recolhido e publicado por F. Ribezzo (1875-1925) em Corpus Inscriptionum
Messapicarum. Encontram-se traços na toponímia (ver mapa 2, p. 354).
d. Os gregos fundaram muitas colônias nas regiões do sul da Itália; segundo Eusébio
de Cesaréia, a fundação de Cuma data de 1050 a.C.. A colonização mais intensa
é do século VIII a.C., atingindo maior extensão nos dois séculos seguintes, abran­
gendo também a Sicilia segundo Tito Livio e Estrabão. O conjunto das cidades
gregas é conhecido por Graecia Magna ou Graecia Maior, em grego Μ ε γ ά λ η
Ε λ λ ά ς , nome mencionado pela primeira vez por Políbio (II, 39,1). Os dialetos
falados na Magna Grécia eram dóricos; ainda que sejam encontrados emprésti­
mos antigos ao latim, a latinização do território foi mais lenta e difícil por causa
da superioridade da cultura grega; o grego persistiu ali até época tardia. Ainda nos
tempos de Tácito (55-120 d.C.), Nápolis era considerada urbs quasi Graeca.
Ainda hoje se fala grego na região de Bova, ao sul da Calábria, e na “Terra
dO tranto” ao sul da cidade de Lecce. Discutem os pesquisadores se essas duas
ilhas do grego são continuação da antiga língua da Magna Grécia ou consequên­
cia da dominação bizantina de 535 a 1071. Muitos dos já mencionados emprésti­
mos gregos mais antigos vieram da Magna Grécia.
e. Na Sicilia, habitavam dois povos, os sicanos na parte ocidental e os siculos na
oriental, dos quais se encontram vestígios na toponímia. Sobre a língua dos sica­
nos há divergências quanto à origem: podería ter vindo da Ibéria e não ser indo-
européia, ou pertencer ao grupo itálico. A dos siculos, na qual existem algumas
inscrições, glossas e nomes próprios, tem características indo-européias.
Também um povo lígure teria ocupado parte da Sicilia em época muito antiga.
Entretanto, as pesquisas do substrato levaram a supor uma língua ainda mais anti­
ga, chamada mediterrânea, comum à Sicilia, à Sardenha, e à Córsega, como tam­
bém ao sul da Itália, territórios em que se encontram os fonemas cacuminais e a
tendência a passar -11- > -dd- (por exemplo: lat. caballu > log . kaddu “cavalo”)
(ver mapa 2, p. 354).
A latinização desses povos, localizados aproximadamente ao sul da linha La
Spezia-Rimini, iniciou-se assim no século III a.C. A posição estratégica de Roma,

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMANICAS | 101


no coração do Lácio, junto à foz do rio Tibre, transformou-a no centro de irradia­
ção da Península, facilitando a consolidação das conquistas. Intemamente, em
509 a.C., foi expulso Tarquinio, o Soberbo, o último rei etrusco, e estabelecida a
República. Em 390 a.C., Roma foi saqueada pelos gauleses, mas a cidade se refez
com bastante rapidez. Enfrentou depois as lutas internas entre patrícios e plebeus,
que só terminaram com a admissão dos plebeus em todos os cargos em 287 a.C..
Para consolidar seu domínio sobre os povos da Itália conquistada, os romanos
concederam-lhes a cidadania, ficando assim submetidos ao direito romano e à
obrigação do serviço militar.
Com o surgimento de Cartago como potência econômica e militar, empenharam-
se os romanos nas chamadas guerras púnicas; a primeira (269-241) terminou com
a criação da primeira província romana, a Sicilia, em 241, seguidas pela da
Sardenha e pela da Córsega, em 238. Com a vitória de Cipião, o Africano, em
Zama (202), termina a segunda guerra púnica (218-201) com a capitulação de
Cartago e a cessão do território de Siracusa a Roma. Mas só depois da terceira
guerra púnica (149-146), Cartago é destruída por Cipião Emiliano, cognominado
por isso Africanus Minar, o norte da África toma-se província romana e o
Mediterrâneo é chamado mare nostrum pelos romanos.
Bem organizada intemamente e dominando o Mediterrâneo, depois das guerras
púnicas, Roma expandiu rapidamente seus domínios. Desse modo, quando da
morte de Trajano em 117, o Império Romano havia atingido sua extensão máxima
com 301 províncias e estados confederados, abrangendo praticamente o mundo
então conhecido, com exceção do extremo Oriente e dos povos germânicos de
além do Reno (ver mapa 1, p. 353).
Neste vasto território, foi implantado o latim. Algumas regiões, porém, não che­
garam a ser latinizadas, como a Grécia, o Egito, a Ásia Menor e os territórios
mais orientais do Império; outras só foram superficialmente, como a Britânia e os
Agri Decumates. Em geral, o processo de latinização foi lento, como a Hispânia,
por exemplo, cuja conquista teve início em 218, durante a segunda guerra púnica,
com desembarque em Ampurias e a posterior ocupação de Sagunto (215),
Cartagena (208) e a região da atual Andaluzia; a tomada de Jaca (197) consolidou
a conquista. Contudo, apenas em 19 d.C. a região dos Montes Cantábricos, ao
norte, foi efetivamente romanizada. Outro exemplo é a Sardenha que, embora
incorporada em 238 a.C., somente em meados do século I d.C. estava de fato
romanizada. Sobre as características dos idiomas dos povos incorporados ao
Império Romano, será dito o necessário em tópicos específicos, já que o grau de
importância entre eles, como substrato de uma língua ou de um dialeto români-
cos, varia consideravelmente.

102 i ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


FATORES DA LATINIZAÇÃO

Latinização ou romanização é a assimilação cultural e lingüística dos povos


incorporados ao universo da civilização latina. O fato de tantos povos de língua, raça e
cultura diferentes terem adotado a língua e, pelo menos em parte, a civilização dos ven­
cedores é um fenômeno único na história da humanidade. Essa aceitação, porém, não
se deveu a imposições diretas. As conquistas romanas tinham caráter político e econô­
mico; não houve por parte de Roma pretensão de impor aos conquistados sua língua ou
sua religião; ao contrário, considerava o uso da língua latina como uma honra. Se os
druídas foram perseguidos na Gália, isso aconteceu porque o uso de vítimas humanas
nos sacrifícios feria o direito romano, ao qual se dava grande valor e importância. O
Novo Testamento mostra que os romanos não eliminavam instituições políticas, religio­
sas ou jurídicas, obviamente desde que não conflitantes, dos povos incorporados: o
povo judeu manteve a religião, o sinédrio, o sumo sacerdote, os levitas e os saduceus;
até a casa real de Herodes continuou a existir. Deviam pagar os impostos, enquanto as
legiões cuidavam da segurança e ao governador romano era reservada a palavra final
em questões jurídicas específicas, como no caso da condenação à morte.
De modo geral, a política foi de aproximação a Roma dos povos conquista­
dos. Depois da destruição de Alba Longa, os romanos compreenderam que o sistema
de arrasar as cidades e levar seus habitantes para Roma não podia continuar; passa­
ram então a deixar que as comunidades subjugadas continuassem a existir. Habil­
mente procuraram fórmulas jurídicas que lisonjeavam o amor próprio e patriótico dos
vencidos, embora tais fórmulas sempre fossem mais favoráveis a Roma, quer pro-
pondo-lhes alianças de diversos tipos, como o Foedus Cassianum (século V a.C.),
que uniu estreitamente a Roma os povos itálicos, quer pela concessão da tão cobiça­
da cidadania romana, mas raramente a “plena” (com iura, honores e munera) e, com
certa facilidade, a “menor”, duitas sine suffragio, a cidadania sem direito a voto.
Se Roma não impunha sua língua nem cerceava o livre uso dos idiomas nati­
vos, a latinização só podería concretizar-se indiretamente. Os principais fatores desse
processo são descritos a seguir.

EXÉRCITO ROMANO

As legiões foram, sem dúvida, a base do Império e de sua expansão. Como


ponta de lança, o exército era o primeiro a entrar em contato com os outros povos, tanto
na conquista como na subsequente ocupação. O exército era composto por legiões de
6.000 homens, com várias subdivisões, como os manipuli (César, De Bello Gallico,
2,25,2), a trigésima parte de uma legião ou cerca de 200 homens, e as centuriae (Livio,
1,13,8), 60 por legião com 100 soldados cada, sob o comando de um centurião.

O R IG E M D A S L ÍN G U A S R O M À N IC A S I 103
O soldado era inicialmente recrutado na Itália, dentre a plebe; com a expansão,
porém, a Península não dispunha de contingentes suficientes para suprir todas as
necessidades do serviço militar. Por isso passou a ser recrutado nas províncias já
romanizadas, cuja língua usual era obviamente o latim vulgar. Políbio nos dá uma
idéia da movimentação de soldados ao citar um documento de 225 a.C., que conta para
aquela época, antes da segunda guerra púnica, 423.000 soldados aliados para 325.000
de cidadãos romanos. Dadas as crescentes necessidades, o serviço militar passou a ser
obrigatório para todos os itálicos em 89 a.C.. Antes da guerra civil, César e Pompeu
passaram a recrutar provincianos não cidadãos; César recrutou sobretudo nas Gálias
Cisalpina e Transalpina. O imperador Augusto (63 a.C-14 d.C.) dava preferência ao
soldado da Itália, mas permitia o recrutamento nas províncias mais romanizadas, prin­
cipalmente nas cidades. As tropas ditas “auxiliares” (auxilia) eram constituídas só de
estrangeiros, muitas vezes homens incultos do campo; constituíam metade de um
exército de aproximadamente 300.000 homens no início do século I d.C.. No fim
desse século, a Itália não fornece mais legionários, como se deduz da ausência de
nomes itálicos no cemitério de Carnuntum, na Panônia; eles provêm de fato das pro­
víncias mais romanizadas e as tropas auxiliares, das menos integradas.
Esses dados mostram a importância do exército como fator de difusão do
latim vulgar sob a forma usada nas províncias de origem ou aprendida no exército, o
sermo militaris ou castrensis, variante do latim vulgar. Em contato permanente com
a população subjugada, eram milhares de indivíduos latinizando, difundindo a cultu­
ra e a língua latinas, sem que o percebessem.

COLÔNIAS MILITARES

O imperador Augusto, no ano 16 a.C., fixou o tempo de serviço militar em 16


campanhas; no ano 5 d.C., elevou esse tempo para 20; cumprido esse regulamento,
os soldados eram aposentados. Augusto regulamentou esse costume já antigo; na
época de Mário (157-86 a.C.) e Silas (138-78 a.C.) foram estabelecidas as colônias
militares. Generais e magistrados recompensavam seus soldados, após a aposentado­
ria, com terras produtivas, confiscadas a seus proprietários. Formavam-se, assim,
colônias de militares veteranos, localizadas em todo o Império à escolha dos interes­
sados; freqüentemente situavam-se as colônias militares nas proximidades das fron­
teiras, buscando reforçar a defesa com a presença desses ex-combatentes.
Recrutados muito cedo, ao término do serviço militar eram adultos; caso ainda
não a tivessem, recebiam a cidadania romana. Nas colônias, contraíam matrimônio
com mulheres autóctones e a família falava latim. Mesmo os que tivessem vindo das
províncias, permaneciam tantos anos no ambiente romano do exército que se romani-

104 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


zavam profimdamente, sob o comando de oficiais que certamente usavam o sermo
urbanus. Quanto ao número desses veteranos, qualquer estimativa é difícil, mas sabe-
se que, apenas durante os anos da guerra civil, receberam terra nesse tipo de colônia
cerca de 500.000. Essas considerações mostram bem a importância das colônias de
veteranos como um ponderável fator de latinização (ver mapa 3, p. 355).

COLÔNIAS CIVIS

Desde as primeiras conquistas, quando os romanos removiam a população


vencida, eram instaladas colônias civis para atender às demandas de terras por parte
dos plebeus. Com a expansão do Império, essas colônias se multiplicaram em todas
as províncias. Podiam ser “romanas”, constituídas por cidadãos com todos os direi­
tos (ius suffragii e ilis honorum) ou “latinas”, daqueles que só tinham o ias latinum.
As colônias romanas eram menores, constituídas por cerca de 300 pessoas, isentas
dos tributos pelo ius italicum, enquanto as latinas chegavam a vários milhares. Eram
estabelecidas em territórios subjugados para garantir a ordem, impedir rebeliões e,
obviamente, produzir alimentos e outros bens; quando sua finalidade precípua era a
produção de bens de consumo, denominavam-se “colônias agrárias” e foram instituí­
das pelos Gracos (séculos 111-11 a.C.).
Como recurso para manter a paz e a coesão do Império, as colônias civis esta­
vam espalhadas por todas as províncias, sobretudo na África, Península Ibérica, Gália,
Panônia, Nórico e Dácia. Suetônio, em De Vila Caesarum (Julius Caesar, 42), relata
que César assentou 80.000 cidadãos em colônias transmarinas, ao mesmo tempo em
que proibia a saída da Itália de qualquer cidadão entre vinte e sessenta anos, a não ser
em casos específicos, revelando que todo o processo era bem controlado. Conhecido
é o caso da Dácia conquistada, segundo relata o historiador Eutrópio (século IV d.C.):

Traianus, victa Dacia, ex toto orbe Romano infinitas co copias hominum transtulerat ad agros et
urbes colendas. (Breviarium ab urbe coiulita, VIII, 6)

Vencida a Dácia, Trajano havia transferido para lá imensas quantidades de homens de todo o mundo
romano, pára que habitassem os campos e as cidades.

Com isso, a latinização da Dácia foi tão rápida e profunda que em aproximadamen­
te cinqüenta anos estava definitivamente integrada ao Império, conservando a latini-
dade mesmo quando abandonada por Roma e invadida pelos bárbaros.
O peso e a importância das colônias civis no processo de latinização é eviden­
te; eram milhares e milhares de pessoas falando o latim em contato direto e constan-

O R IG E M D AS L ÍN G U A S R O M Â N IC A S [ 105
te com a população autóctone. A rede de relações, que inevitavelmente se estabele­
ciam, levava a uma uniformização lingüística e cultural (ver mapa 3, p. 355).

ADMINISTRAÇÃO ROMANA

Concluída a conquista, distribuíam-se adequada e estrategicamente as legiões


e instalava-se a administração romana. Foi nesse contexto que surgiu a “província”,
de início o território que um magistrado com imperium administrava; imperium era
o supremo poder administrativo, com o comando na guerra, a interpretação e a apli­
cação das leis, até a pena de morte. No início de cada ano, normalmente as provín­
cias eram atribuídas aos cônsules pelo senado. Até a primeira guerra púnica, todas as
províncias estavam na Itália; fora da Península, as primeiras foram, como já se notou
acima, a Sicilia (241 a.C.) e a Sardenha (238 a.C.); em 197 a.C., criou-se a da
Hispânia, logo dividida em duas, a Hispânia Citerior e a Hispânia Ulterior, governa­
das por dois pretores adrede criados, com imperium especial: essas duas serviríam de
modelo para as subseqüentes.
A administração das províncias evoluiu bastante com o tempo. Incumbia-lhe
mantê-las fiéis a Roma, promover sua defesa interna e externa, coletar os impostos
(como o tributum soli, espécie de imposto territorial, o tributum capitis, soma fixa,
denominado também stipendium, ou um dízimo em espécie, as decumae, muitas vezes
coletado pelo publicani por delegação dos censores), e ministrar os serviços de aten­
dimento jurídico, encargo geralmente exercido pelo praetor. Com algumas alterações,
esse sistema foi aplicado a todas as províncias. Pelo ano 14 d.C., entretanto, as provín­
cias foram classificadas em dois tipos: as senatoriais e as imperiais. As senatoriais
(Narbonensis, Baetica, Numidia, África Proconsularis, Cyrene, Macedonia, Epirus,
Achaia, Bithinia, Pontus) eram mais antigas e mais romanizadas, nas quais o exército
se fazia menos necessário; as imperiais (Aquitânia, Gália Lugdunensis, Lusitânia,
Tarraconensis, Dácia, Illyricum) foram instituídas por Augusto. O Egito foi a primei­
ra província a ser declarada “sujeita ao Povo Romano”, com exclusão da ingerência
dos senadores e governada por um prefeito eqüestre, comandante também do exérci­
to. Províncias menores, como a Judéia e o Nórico, eram entregues a prefeitos e, pos­
teriormente, a procuradores, apenas com um destacamento, mas sem exército.
Por essas resumidas informações sobre a organização da administração das
províncias, percebe-se que os responsáveis pela gerência dos territórios pertenciam à
aristocracia romana; conseqüentemente, falavam o sermo urbanus, como também os
funcionários mais graduados. Os contatos permanentes com Roma e a duração rela­
tivamente curta das gestões da alta burocracia favoreciam a unidade lingüística do
sermo urbanus por toda parte. Por outro lado, com o relacionamento constante com

106 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


a comunidade da região, pode-se supor uma influência considerável da norma falada
culta, de maior prestígio, dos administradores sobre o latim vulgar. Esse contato per­
manente era um obstáculo a que a norma vulgar se modificasse de maneira mais rápi­
da regionalmente, mantendo-se mais ou menos uniforme nas diversas províncias.
Algo semelhante devia acontecer também com o sermo castrensis, pelo relaciona­
mento dos oficiais com os legionários.
Contudo, é certo que o latim usado pela administração das províncias foi um
ponderável fator de latinização, já que era veículo de comunicação nos contatos com
a população, latina e não-latina, e a língua de todos os documentos. Acentue-se que o
prestígio do idioma dos vencedores se impunha e atraía sobretudo as elites conquista­
das, os que buscavam títulos e cargos e todos quantos quisessem prestar serviço de
qualquer espécie à administração, como os publicani por exemplo. Começavam apren­
dendo latim, tendo como primeiro ponto de referência o idioma da administração.

OBRAS PÚBLICAS

Com o exército, com as colônias civis e militares e a administração, os roma­


nos espalhavam pelas províncias sua cultura, sua língua e seu estilo de vida.
Buscando integração e coesão entre as partes do Império, construíam obras públicas
que serviam a seus intentos, mas beneficiavam a toda a população. Dentre essas
obras, destacam-se:

a. Estradas
Como instrumento de acesso rápido entre as regiões pelo exército, pelos men­
sageiros, comerciantes e pela população em geral, as estradas tiveram grande impor­
tância na consolidação do Império e no processo de latinização. Conhece-se bem a
história de dezenove viae, algo realmente excepcional para a época, como a famosa
Via Appia, que data de 312 a.C., principal ligação pavimentada com o sul da Itália até
Brundisium, com 234 milhas (337 km); a Aemilia, construída em 187 a.C. e fator
fundamental da rápida romanização da Gália Cisalpina; a Aemilia Scauri (107 a.C.);
a Annia (153 a.C.), no norte da Itália; a Aurélio, na Etrúria, rumo ao norte; a Cássia
e a Cloelia, ambas na Etrúria; a Domitia, do Ródano na Gália até a Hispânia; a
Egnatia (130 a.C.), da costa do Adriático até Bizâncio; a Flaminia (220 a.C.), de
Roma ao mar Adriático com várias ramificações; a Latina, antiga via irradiadora em
direção ao sul da Itália; a Popilia, norte e sul até Rhegium; a Postumia (148 a.C.),
direção norte da Itália até Gênova e Provença atual e para o leste até Aquilea e
Bálcãs; a Cloelia Augusta, na Raetia e na Germânia, e outras.
As estradas sempre merecem muita atenção de imperadores, cônsules, censo­
res e questores, que as pavimentavam com pedras e mantinham um serviço constan­
te de manutenção tanto que trechos delas ainda hoje existem.

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS | 107


b. Abastecimento de água
Os aqucdutos são com justiça considerados a principal contribuição de Roma
para a arquitetura e a higiene. Os primeiros serviços de água foram os de Aquae Appia
de 312 a.C. e de Anio Vetus de 272 a.C.. Os romanos acumularam considerável acervo
técnico, desde a captação até a distribuição da água através de canais, túneis, pontes,
sifões invertidos etc. Gastavam somas enormes nesse serviço, como no de Aqua Mareia,
em Roma, em que foram aplicados 180 milhões de sestércios e no de Nicomedia, na
Bitínia, 3 229 000. A distribuição era feita através de reservatórios (castella) para fontes
públicas, termas, banhos, saunas e consumidores particulares. Não se cobravam taxas e
a manutenção era da responsabilidade da comunidade. Na República, esses serviços
eram encargo dos censores ou edis, que tinham a “cura urbis”; Augusto instituiu os car­
gos de “curatores aquarum” sob o comando geral de um cônsul (ver mapa 3, p. 355).
Os principais centros urbanos de todo o Império dispunham desse serviço,
encontrado até em regiões onde a latinização não chegou a ser profunda, como na
Britânia {Aquae Sulis, Londinium e Cilurnum bem ao norte) e na Síria (Dura-Europus,
na fronteira com a Mesopotâmia). Obviamente, esse beneficio público captava a simpa­
tia da população, dispondo-a a assimilar a cultura romana c com ela a língua latina.

c. Teatros
O conhecido interesse dos romanos pelo teatro e representações levou-os a
construir prédios para esse fim em todo o império. Embora baseados em modelos
gregos, os teatros romanos evoluíram e, na época imperial, os arquitetos chegaram a
modificar detalhes importantes dos protótipos gregos, como a columnatio. Desde o
primeiro construído em Roma por Pompeu, cm 55 a.C., muitos teatros foram ergui­
dos em cidades de alguma importância em todas as províncias, como por exemplo
Termesso na Pisidia, Nicopolis no Epiro, Bostra, Es-Suhba e Gérasa na África, Aries,
Orange e Lion na Gália, Mérida e Sagunto na Ibéria. Representavam-se comédias,
patominas, exibições de mimos, de saltimbancos c espetáculos circenses.
Não há informações precisas sobre o idioma usado nesses espetáculos; supõe-
se que as línguas locais fossem ocasionalmente empregadas, mas o latim, em normas
variáveis segundo o tipo de espetáculo, teve papel preponderante. Desse modo é pos­
sível avaliar o peso dos teatros no processo de latinização.

d. Outros edifícios
A presença romana se fazia sentir ainda através de outros edifícios públicos, como
o fórum, templos, basílicas, monumentos (arcos, colunas) e bibliotecas, sobretudo nas
cidades maiores. Marcavam o grau de cultura e civilização de Roma e difundiam o latim.
Quanto a escolas públicas, o Império não teve uma organização especial, embora o impe­
rador ordinariamente pudesse conferir títulos e imunidade a professores; as escolas eram

108 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


particulares e o poder público agia como benfeitor. César atraiu professores gregos a
Roma, ofertando-lhes a cidadania romana e Augusto os excluiu do decreto de expulsão
(Suetônio, Caesar, 42,2; Divas Augustas, 42, 3); Vespasiano criou a primeira cadeira de
retórica latina e grega em Roma, cujo último indicado foi Quintiliano. Trajano deu o
munus educationis a 5.000 crianças pobres; as intervenções do Estado nas escolas torna­
ram-se mais comuns na época tardia do Império, em pontos como escolha dos professo­
res e fixação de escalas salariais. Em todo caso, um sistema educacional próprio nunca
foi desenvolvido e o número de escolas era reduzido, atendendo sobretudo às classes
mais altas. Centros de cultura importantes eram raros, citando-se, nos séculos II e I a.C.,
Massilia (Marseille) na Gália, Alexandria no Egito, Antioquia na Síria, Tarso na Cilicia,
Éfeso e Pérgamo na Ásia Menor, nos quais a influência grega sempre foi preponderante.
A primeira biblioteca pública foi fundada em 39 a.C. por Gaius Asinius Pollio
(76 a.C.-4.d.C.), com o espólio da guerra contra os partinos da Ilíria. No século II
d.C., havia bibliotecas públicas emThamugadi e Cartago na África, em Nemausus na
Gália, Dyrrhachium na Ilíria, Phillipi na Macedonia e outras mais numerosas na
Grécia e Ásia Menor. Obviamente, eram freqüentadas pelas classes mais altas e
representavam centros de irradiação da cultura latina, ainda que mesclada com mui­
tos elementos assimilados dos gregos. Assim, latinizando a elite da sociedade, esco­
las e bibliotecas muito contribuíram para a consolidação do Império, dada a influên­
cia das elites sobre a massa popular (ver mapa 3, p. 355).

COMÉRCIO

A localização geográfica de Roma transformou a cidade também em grande


centro comercial, desde o início de sua história, primeiramente de toda a Itália e
depois de todo o Império. De início, o comércio era livre, movimentado por várias
categorias de profissionais: os mercatores (“negociantes”), os caupones (“tabernei-
ros”), os navicularii (“armadores”) e os negotiatores (“negociadores”); esses últimos
eram a um só tempo comerciantes, banqueiros, industriais e donos dos entrepostos.
Até a época de César, eles tomaram conta do comércio com todas as províncias,
incluindo depois a Britânia e a Dácia, movimentando um volume de cargas realmen­
te grande. Comerciantes do Mediterrâneo visitavam a Germânia, o sul da Rússia atual,
a Sibéria ocidental e chegaram à China, mantendo um contato com os chineses atra­
vés das províncias orientais e do Irã, pelo oceano ou pelas rotas das caravanas.
A difusão do latim por meio dessas atividades comerciais foi bastante apre­
ciável, tanto que se encontram palavras latinas e gregas desse campo semântico no
irlandês, no germânico, no pálavi (língua persa do período dos Sassânidas - 224-652
d.C.), no semita e iraniano e algumas até nas línguas indianas e mongólicas.

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMANICAS 109


O comércio externo das províncias era controlado por collegia de negocian­
tes, organizações particulares só oficializadas pelo imperador Adriano, cujos emissá­
rios percorriam o Império em todas as direções. Tornaram-se importante fator de lati-
nização, difundindo o latim até em regiões não pertencentes ao Império. Embora
utilizassem uma terminologia própria e técnica, os comerciantes usavam normalmen­
te o latim vulgar.

FONTES DO LATIM VULGAR

Os fatores indicados da latinização do Império Romano deixam claro que a


norma vulgar foi preponderante no processo de difusão e fixação do latim nas pro­
víncias, uma vez que era falada pelo exército, pelos colonos civis e militares e pelos
comerciantes - que mantinham contato direto e permanente com as populações
autóctones; os outros fatores sem dúvida foram importantes indiretamente.
Contudo, o latim vulgar era uma língua falada, não havendo nenhum docu­
mento escrito só nessa variedade lingüística. Os gramáticos latinos o ignoram, a não
ser em rápidas alusões, pouco esclarecedoras. Por isso, a documentação de que dis­
pomos é indireta, além de incoerente e incompleta, estando aí a maior dificuldade
encontrada na reconstituição do latim vulgar. Só escreve quem aprendeu a fazê-lo e
esse aprendizado, naturalmente, é calcado na norma culta. Assim, quem escreve, cor­
rige, reduzindo ainda mais a possibilidade de serem documentadas as formas de fato
usadas na fala corrente, mas muito importantes para a Filologia Românica, já que são
a raiz das correspondentes nas línguas românicas. Mesmo assim, a reduzida cultura
ortográfica, a distração, a negligência e até a busca de possíveis efeitos estilísticos do
escrevente, nos legaram uma considerável quantidade de informações que permitem
uma reconstituição razoável do latim vulgar falado.
Essa documentação, portanto, é incidental e por isso incoerente, pois, em geral,
o escrevente não se dá conta de que está misturando níveis lingüísticos diferentes; a
mesma expressão pode ocorrer em um só documento grafada de duas ou mais manei­
ras diversas. Assim, por exemplo, a carta de um recruta, escrita em papiro no início do
século II d.C. e encontrada em Karanis, no Egito, escreve con matrem meam (“com
minha mãe”) e con tirones (“com recrutas”), indicando a tendência de o acusativo
substituir o ablativo com as preposições todas, ao lado do correto con rebus meis
(“com minhas coisas”), expressão certamente aprendida na escola. Escreve também,
lado a lado, nihil e nil, mihi e mi, respectivamente a forma literária, escolar e a vulgar,
falada, que vai explicar as românicas correspondentes como o port. mim, por exem­
plo. Seria fácil multiplicar os exemplos em todos os níveis. Essas incoerências, porém,
são providenciais, pois permitem perceber as tendências próprias do latim vulgar,
encontradas também em suas continuadoras, as línguas românicas.

10 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Além de incoerentes, essas fontes de documentação são incompletas. Muitos
vocábulos e fatos linguísticos não foram documentados ainda, outros certamente
nunca o serão, precisamente pela natureza incidental dessas formas, apesar de sua
quantidade e variedade. Muitas dessas lacunas podem ser eliminadas fazendo-se o
caminho inverso, ou seja, partindo das línguas românicas é possível postular, com
segurança, a existência de um vocábulo no latim vulgar, ainda que não documenta­
do. Desse modo, as línguas românicas são realmente fontes de valor extraordinário
na reconstituição do latim vulgar, principalmente se houver a concordância do rome­
no, isolado das demais desde o século 111 d.C..
O trabalho filológico de reconstituição do latim vulgar utiliza-se de fontes de
diversos tipos, inscritas e escritas, além da criteriosa comparação dos dados forneci­
dos pelas línguas e dialetos românicos. Como fontes do latim vulgar, destacam-se as
descritas a seguir.

INSCRIÇÕES POPULARES

Volume considerável, ainda que muitas vezes fragmentário, de informações


linguísticas é dado pela epigrafia, isto é, a ciência que se ocupa da leitura e interpre­
tação das inscrições antigas em “monumentos”, ou seja, em material durável, como
metal, pedras e madeira. Para a Romanística são importantes:

a. Inscrições parietais
Essas inscrições foram gravadas com estilete, menos comumente a carvão, em
muros, paredes, monumentos, banheiros etc.; são conhecidas como “graffiti”. Existe
um tipo considerado oficial, formas mais ou menos fixas e estereotipadas, contendo
louvores aos deuses, elogios fúnebres, loas a figuras nobres ou proeminentes, atas
públicas ou particulares e outros assuntos semelhantes; essas são de pouco interesse
para a Filologia Românica, a não ser as da época final do Império. As que interessam
são populares, por seu caráter aliterário e de expressão clara da linguagem corrente
das classes incultas. Todas essas inscrições foram reunidas por Th. Mommsen, sob
auspícios da Academia de Berlim, no Corpus Inscriptionum Latinarum e conhecido
pela sigla CIL, a partir de 1862, em 16 volumes, subdivididos em várias partes; cada
volume contém as inscrições duma cidade ou região. Coletâneas posteriores foram
completando, por regiões correspondentes às antigas províncias romanas, as inscri­
ções recolhidas pelo CIL; estão disponíveis as da Algéria, Tunísia, antiga África
Proconsular, Marrocos, Gália Narbonense, Espanha (latina e visigoda), Itália, Síria,
Panônia, Dácia, Astúrias, Galícia e outras. Paralelamente, foram publicadas outras
coletâneas mais específicas, como a Inscriptiones Latinae Christianae Veteres, de E.
Diehl (1924-1930) e a Inscriptiones Latinae Selectae, de H. Dessau (1892-1916).

O R IG E M D AS L IN G U A S R O M Â N IC A S j
O material epigráfico disponível é, portanto, muito abundante. De particular
interesse filológico são as inscrições de Pompéia e de Herculano, cidades soterradas
pela erupção violenta do Vesúvio em 79 d.C.; as escavações encontraram inscrições
muito bem conservadas pelas cinzas, que nos permitem uma visão do modo de vida de
uma cidade da província. Relatam a ração alimentar dos escravos, os resultados dos
jogos de dados, a data de nascimento de um burrinho, declarações de amor ou de ódio,
de inveja, de alegria, erotismo etc. Só as recolhidas em Pompéia são cerca de 15.000;
os próprios pompeanos julgavam exagerada tanta pichação, segundo se vê na inscrição:

Admiror, paries, te non cecidisse ruinis, qui tot scriptorum taedia sustineas. (CIL, IV, 1904)

Admiro-me, parede, não teres caído em ruínas, tu que agiientas o tédio de tantos escritores.

Em geral, esses escritos denotam a precária escolaridade dos escreventes pela abun­
dância de vulgarismos, ausentes na epigrafia oficial. Um exemplo:

Quisquis | ama, valia, |


peria qui n | osci amare !
Bis [t] anti pe | ria quisqu | is
amare vota. (CIL, IV, 1173)

Viva todo aquele que ama, morra aquele que não sabe amar! Morra duas vezes todo aquele que proí­
be amar.

São bem perceptíveis algumas tendências do latim vulgar: a apócope de certas con­
soantes finais, como o /-t/ nas formas verbais (amaft], valia[t], peria[ij, vota[t])\ em
valia há a fuga do hiato, transformado em ditongo (valia por valea), preparando a
futura palatalização (cf. port. valha)·, a força da analogia na linguagem corrente em
non scit pelo tradicional e clássico nescit, o hiperurbanismo no uso do genitivo de
preço bis tanti pelo usual bis tanto·, e o arcaísmo vota por veta.
Outro exemplo (CIL, IV, 3948):

Talia te fallant utinam mendacia, copo:


tu vedes acuam et bibes ipse merum.

Oxalá tais mentiras te enganem, taberneiro:


vendes água e bebes tu mesmo vinho puro.

No aspecto fonético, note-se a redução do ditongo /au/ a /o/ em caupo > copo
(“taberneiro”), fenômeno de origem rústica e bastante difundido (Claudius >
Clodius, cauda > coda, paupere > popere, fauce > foce), embora o ditongo /au/ se
tenha mantido em algumas línguas românicas, como no provençal e no romeno. A
síncope da nasal em vedes por vendes verifica-se também em algumas línguas româ-
nicas, como no português e no gascão. A indistinção entre /i/ e /e/ átonos em vendes

112 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


por vendis e em bibes por bibis é bastante comum nesses documentos e indica clara­
mente que as formas do futuro não eram usadas, pois essa indistinção entre vendis e
bibis, formas do presente indicativo, e vendes e bibes, do futuro, suprimia o elemen­
to distintivo; é uma das razões por que nenhuma língua românica herdou essa forma
do futuro. Em acuam por aquam há sem dúvida um caso de hiperurbanismo, já que
a tendência vulgar era substituir a lábio-velar /qu-/ pela velar simples /c-/ com som
de /k-/, como em anticus por antiquus, ecus por equus, como por quotno (do) etc.
Reforça essa suposição a escolaridade relativa do escrevente, revelada pela melodia
e construção dos períodos e pela manutenção das consoantes finais, sobretudo o /-m/
dos acusativos.

b. Tabellae defixionum
São inscrições, também conhecidas como “plaquinhas de execração”, geral­
mente de metal (chumbo, estanho, bronze), havendo-as também de mármore ou de
terracota. Gravavam-se nelas fórmulas cabalísticas, entregando aos deuses do infer­
no os inimigos ou rivais, ou tentando neutralizar malefícios e maldições. Foram
encontradas em toda parte do Império, principalmente no norte da África; têm cará­
ter eminentemente popular, da autoria de escravos, gladiadores, soldados e libertos.
Inscrevia-se o nome do amaldiçoado, mas nunca o do amaldiçoante. São freqüentes
as descrições pormenorizadas da pessoa, as repetições e as palavras cabalísticas, as
combinações de letras latinas e gregas com finalidade mágica e invocatória, como
este início de uma tabella do século III, encontrada em Hadrumentum:

Alimbeu
columbeu
petalimbeu [...]

As plaquinhas de execração eram depositadas nas sepulturas, em poços, sob


os edifícios ou simplesmente enterradas. A linguagem é bem vulgar, pesada, repeti­
tiva, cheia de pleonasmos e anacolutos; os vulgarismos e os termos chulos são abun­
dantes. Vejamos um exemplo:

Te rogo qui infer | nales partes tenes, con | mendo tibi iulia Faustil | la, Marii filia, ut eam
ceie | rius abducas infernalis partibus in num | eru tu abias.
Rogo a ti, que dominas as regiões infernais, encomendo-te Júlia Faustila, filha de Mário,
para que a leves para baixo o mais rapidamente possível para as regiões do inferno e a con­
serves no número dos teus.

Notáveis são as ausências do l-ml do acusativo em Iulia(m) Faustilla(m),


numeru(m) tu(um), apócope muito comum nas inscrições desse tipo; em (h)abias, a

O R IG E M D AS L ÍN G U A S R O M Â N IC A S
falta do /h-/ mostra que as aspiradas não eram mais pronunciadas. Em infernalis por
infernalibus houve confusão de declinaçòes, incluindo-se um adjetivo da 3a. entre os
da 2a. por semelhança de flexão casual.

c. Inscrições tumulares
Essas inscrições são encontradas em todas as regiões do Império e distribuídas
por vários séculos. Trata-se de inscrições de caráter permanente, geralmente em
pedra ou mármore, e por isso mais cuidadas; daí ser indispensável submeter seus
dados a uma sólida crítica. Além de seguirem formulários e modelos, pode haver
erros cometidos pelo incisor ao copiar o que o ordinator havia escrito no papiro, per­
gaminho ou em tabuinha encerada.
A norma lingüístiea vai desde a literária, em alusões à Eneida de Virgílio até
ao mais típico latim falado; apenas na época latina mais tardia, as inscrições tumula­
res se nivelam lingüisticamente pelo latim vulgar.
Exemplo, de Colônia (d l., XIII, 8481):

ln oh tumolo regiescet in pace bone memorie Leo vixet annus XXXXXII transiel nono Ids.
ühtuberes.

Neste túmulo, Leo descansa na paz da boa memória; viveu 52 anos; faleceu no nono dia dos idos de
outubro.

É forte a influência germânica nessa inscrição, marcada pelas aspirações em


oh (hoc) e ohtuberes por octobres e pela epêntese de um /-e-/ para desfazer o encon­
tro consonântico /br-/; a forma regiescet por requiescet parece ser erro do incisor, com
alguma influência do superstrato germânico. Em bone memorie verifica-se a redu­
ção do ditongo /-ae/ > /-e/, fartamente documentada. A indistinção entre /i/ e /e/ está
em regiescet por requiescit, em vixet por vixit e em transiet por transiit, comprovan­
do a perda da noção de futuro nos verbos da 3a. e da 4a. conjugações; indistinção se
verifica também entre /o/ e /u/ átonos em tumolo por tumulo e em annus por annos,
perdendo-se, nesse último, a distinção entre nominativo e acusativo, exemplo claro
do declínio do sistema das declinaçòes. A pouca cultura do ordinator ou do cinzela-
dor revela-se na grafia do numeral XXXXXII por LII.
A partir de 180 d.C., aparecem as inscrições tumulares cristãs. É sabido que
o cristianismo se difunde inieialmente entre as camadas mais pobres das cidades
maiores, o que explica o nome de paganus, “pagão”, ao não batizado; etimologica-
mente, é o habitante de um pagus, "vila”, “povoado”. Por isso, as inscrições cristãs
apresentam os mesmos vulgarismos encontrados nas outras, pois seguem os mesmos
parâmetros, diferindo apenas no aspecto religioso. Um exemplo (Diehl, ILC, 1464):

114 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Hic quiescit ancilla dei, [q]uc de sua omnia possedit domum ista, quem amice deflen solaciumqfuc]
requirunt; pro hunc unum ora subolem, quem superistitem re[li]quisti eterna requiem felicita[ti]s
causa man[c]bis. IIIIX Kalcndas Otobris. Cucurbitinus et Abum[d]antius hic gimul quiescit dd. nn.
Gratiano V et Teodosio Aaugg.

Aqui descansa a serva de Deus, que de todo o seu possuiu esta casa, a quem as amigas choram e
estão em busca de consolação; pede por este único descendente que deixaste sobrevivendo; (a ti)
eterno descanso, e continuarás causa de felicidade. Dia 14“ das calendas dc outubro. Aqui descan­
sam também Cucurbitino e Abundâncio. Sob nossos senhores Graciano V e Teodósio Augustos.

Nessa inscrição tumular, encontrada em Roma e datada de 380, observa-se a


apócope de /-m/ e /-t/ finais: ista por istam, deflen por deflent, eterna por aeternam;
a redução do ditongo /-ae/ > /-e/ em amice por amicae e eterna por aeterna; a epên-
tese de um /-i/ em superistitem por superstitem; a rara troca da sibilante /s/ pela oclu-
siva velar sonora /g/ em gimul por simul; a inversão gráfica do numeral parece suge­
rir uma transcrição do modo de enumerar quattuor et decem (IIIIX por XIV); as
preposições regem o acusativo {de sua omnia, pro hunc unum subolem), contraria­
mente ao ablativo do latim literário, comprovando a tendência vulgar de substituir os
demais casos pelo acusativo, mais encorpado, que se tornou o caso lexicogênico das
línguas românicas ocidentais; no aspecto sintático, observe-se a errônea concordân­
cia do verbo no singular com um sujeito composto em Cucurbitinus et Abundantius...
quiescit por quiescunt.
As inscrições populares em geral, como se pode ver, espelham as tendências
linguísticas do latim vulgar que explicam as características das línguas românicas.
Denotam ainda a pouca cultura gramatical dos escreventes sob vários aspectos, des­
tacando-se o ortográfico em que há uma excepcional incoerência, mesmo em ter­
mos que são elementos integrantes de fórmulas e modelos seguidos em toda parte;
por exemplo, coniux (“esposa”), é grafado coiiux, conigi, conig(e), cozux, cozuce,
coiucem; para vixit (“viveu”) encontram-se grafias como viesit, vieset, vixxit, vixsit,
visset, viset, vigxit, visit, bixit, bisit, bixset, bise e outras. Essas variações gráficas
sem dúvida representam também variações de pronúncia.

PAPIROS ANTIGOS

Por ser um material muito frágil, o papiro antigo é raro nas partes ocidentais
do Império. Mas nas regiões áridas do Egito e Próximo Oriente foram descobertos
numerosos documentos nesse material, a maioria dos quais em grego e cerca de 400
em latim. Cerca de uma centena desses papiros latinos são literários, com textos de

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS |


Virgílio principalmente ou de conteúdo jurídico; os demais trazem correspondên­
cias, glossários, documentos militares e particulares. Os encontrados até 1954
foram reunidos no Corpus Papyrorum Latinarum por R. Cavenaile (Wiesbaden,
1956-1958).
Os documentos em latim mostram a vida levada pelos soldados nos destaca­
mentos militares, a organização administrativa e jurídica do Império Romano naque­
las regiões, bem como a influência muito grande do grego. O latim era falado pelo
exército e membros da administração; fora desses quadros, era aprendido nas esco­
las ou nos livros; essa situação só se alterou com a reforma de Diocleciano, que deu
ao Egito o mesmo status das outras províncias e incentivou o uso do latim no leste;
o conhecimento do latim e das leis romanas se tornou indispensável para o êxito na
carreira pública. Desde então, o latim aparece no preâmbulo e na subscrição de todos
os processos jurídicos do norte do Egito. Mesmo assim, a latinização do Oriente foi
superficial, já que a língua corrente era o grego, tanto que existem papiros escritos
em latim mas com caracteres gregos.
Contudo, esses documentos nos revelam traços do latim no Oriente; os de
caráter popular, como a correspondência dos soldados, apresentam muitos vulgaris-
mos. Por exemplo, uma carta de um certo Rustius Barbarus a seu amigo Pompeu, do
século 11 d.C., encontrada em Ostracon, no Egito (CPL, 304) escreve virdia por viri­
dia (“verduras” de virde por viride, com a síncope da pós-tônica), obliscere por obli­
visci (“esquecer” e indício claro da transformação dos verbos depoentes em comuns);
exiut por exivit ou exiit (“saiu”), coliclos por cauliculos (“a couve”, com a síncope da
pós-tônica e a redução do ditongo /au/ a lol, fatos comuns também em documentos
do Ocidente).

GRAMÁTICOS E MESTRES DE RETÓRICA

Os gramáticos e mestres de retórica latinos preocupavam-se quase exclusiva­


mente com a norma culta. Desde Ápio Cláudio (século II a.C.), passando por Varrão,
Cícero, Quintiliano, Donato até Prisciano (século VI d.C.), escrevem sobre vitia et
virtutes orationis. Por “vitia” entendiam erros cometidos por pessoas menos cultas
ou também vocábulos e construção de uso popular, rejeitados pela língua literária,
sobretudo barbarismos e solecismos. Entretanto, não se percebe uma preocupação
maior com qualquer outra variedade que não a culta; trata-se sem dúvida de questões
próprias da norma literária, tais como expressões ainda não suficientemente estiliza­
das ou cristalizadas. E o que se pode deduzir da afirmação de Cícero, relativa a uma
construção criticada (De Oratore, 48, 159):

116 j ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMANICA


Consule veritatem, reprehendent; refer ad aures, probabunt.

Consulta o fato, rejeitarão; relaciona com o ouvido e aprovarão.

Certamente, não há nesse tópico nenhuma alusão ao latim vulgar, embora o reprova­
do possa pertencer ao uso popular.
O que os gramáticos e retores atestam é a existência de uma variedade “vul­
gar”, “rústica” e “antiga”. O ideal da boa linguagem era o latim da Urbs, a urbani­
tas·, tudo quanto diferisse dessa norma, pertencia à rusticitas, à vulgaritas, como
escreveu Quintiliano (Institutio Oratoriae, XII, 10,40):

Nam mihi aliam quandam videtur habere naturam sermo vulgaris, aliam viri eloquentis oratio.

Pois a linguagem vulgar parece-me ter uma certa natureza, enquanto outra é a do discurso de um
orador.

O mesmo Quintiliano afirma (VI, 3, 17) que a rusticitas [denominada barbaries por
Aulus Gellius (século II d.C.), citando o gramático Nigidius (século 1 d.C.)] difere da
norma culta dos oradores in verbis et sono et usu, isto é, no vocabulário, na pronún­
cia e na construção. Não dá, porém, exemplos nem detalhes. Algumas informações
são fornecidas de modo indireto, como a redução do ditongo /au/ a /o/ em Festus
(202, 13), considerada alteração característica da rusticitas:

Orata genus piseis appellatur a colore auri quod rustici “orum” dicebant, ut auriculas “oriculas”.

Denomina-se “orata” (por “aurata”) uma espécie de peixe por causa da cor de ouro, que os campo­
neses pronunciavam “orum” (por “aurum”), da mesma forma que diziam “oriculas” por “auriculas”
(“orelhas”).

A variedade linguística era também um fator de distinção social, segundo se conclui da


decisão de Claudius Pulcher, pertencente ao clã dos Claudii e inimigo de Cícero, de pas­
sar a chamar-se Clodius quando perdeu sua condição de patrício e passou à de plebeu.
Os gramáticos e retores latinos, portanto, atestam claramente a existência da varieda­
de comumente denominada “latim vulgar” pelos romanistas; apontam diferenças nos
diferentes níveis linguísticos, sem explicitá-las. Daí ser mínima a contribuição deles
para a reconstituição do latim falado pelo povo. Relembre-se aqui o Appendix Probi,
aposto aos Instituta Artium por um desconhecido mestre-escola, que utilizava a obra
de Valério Probo (fins do século I d.C.) e corrigia formas vulgares. Mas o próprio
Probo não faz qualquer referência ao que se denomina latim vulgar, conforme proce­
dimento comum aos “gramáticos” latinos.

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS | 117


TRATADOS TÉCNICOS

Não sendo literatos, os autores de tratados sobre agricultura, arquitetura,


medicina, veterinária, culinária etc. não dispunham de conhecimentos lingüísticos
suficientes para escrever segundo a norma literária. Usavam uma linguagem caracte­
rística, na qual se encontram numerosos vulgarismos, que, comparados com os de
outras fontes seguramente vulgares, constituem uma contribuição importante para a
reconstituição do latim vulgar. Dentre os mais conhecidos, destacam-se:

a. Marcus Porcius Cato


Dito “censorius” (234-149 a.C.) escreveu DeAgri Cultura em 160 a.C., em que
trata do cultivo de vinhas, olivais, árvores frutíferas e pastagem no Lácio e na Campânia;
sua linguagem é arcaica; seu léxico, muito pobre; e, seu estilo, duro e seco. Aulus
Gellius (Noctes Atticae, XIII, 18,1) qualifica sua linguagem como formam ingenii impo­
litam ac plane rudem (“forma de arte não polida e completamente rude”). Seus nume­
rosos arcaísmos fundamentam muitas formas correspondentes do latim vulgar.
Com influências léxicas populares em decorrência do assunto, inclui-se neste
tópico Marcus Terentius Varro (116-27 a.C.), com Rerum Rusticarum Libri III (37
a. C.); trata da agricultura em geral e da criação de aves, abelhas e peixes, tentando res­
tabelecer o interesse pela vida no campo. Também Lucius Iunius Columella (século I
d.C.), com De Re Rustica, pela mesma razão traz alguma contribuição, embora sua
prosa seja elegante e direta; escreve segundo sua experiência de fazendeiro bem-suce­
dido, herdada em parte de sua família, proprietária de terras na Ibéria, sua província de
origem, como Sêneca. Dos três, a maior contribuição é dada por Catão.

b. Vitruvius Pollio (século I a.C.)


Esse autor aproveitou a própria experiência como arquiteto e engenheiro militar
e escreveu De Architectura', usou também os escritos de Hermogenes (200 a.C.) e de
outros arquitetos gregos. A importância de Vitrúvio para a reconstituição do latim pro­
vém de seu reduzido conhecimento gramatical, reconhecido por ele mesmo ao afirmar
que “non architectus potest esse grammaticus” (“arquiteto pode não ser gramático”).

c. Tratado de Veterinária
Mulomedicina Chironis é a tradução do tratado de Quíron, de quem se conhe­
ce apenas o primeiro nome. O tradutor mostra tão pouco conhecimento do latim que
os numerosos e variados vulgarismos levaram alguns autores a considerá-la obra de
um copista inexperiente. A escassez de bibliografia latina sobre o assunto motivou a
Vegécio Renato (fins do século IV d.C.), que reescreveu a obra de Quíron e de outros

118 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


tratadistas numa linguagem mais cuidada, já que, segundo ele, os anteriores “elo­
quentiae inopia ac sermonis ipsius vilitate sordescunt” (“sujam-se pela falta de elo-
qíiência e pela própria vileza da linguagem”). Alguns exemplos:

clodice por claudicet, “manque” (2, 110)


tocius por totius, “de todo” (3, 208)
per hanc racionem por hac ratione (3, 208)
hec vicia por haec vitia, “esses males” (3, 212)
nichil por nihil, “nada” (3, 209)

Na morfologia, o uso das preposições é muito amplo, formas ativas substi­


tuem as passivas etc. Trata-se de um documento do latim da época, de grande utili­
dade para os romanistas.
No início do século V, Marcellus Empiricus, ou Burdigalensis, escreveu Liber
de Medicamentis, uma compilação de outros escritos médicos, os de Escribônio
Largo, Pseudo-Apuleio, Plínio (em Naturalis Historia) e Pseudo-Teodoro.
Transcreveu-os literalmente, mas intercalou receitas populares e práticas supersticio­
sas. O texto fornece dados importantes para o estudo da evolução dos casos e da sin­
taxe em geral.
Inclui-se aqui, também, a tradução latina do tratado farmacológico de Dioscó-
rides (século I d.C.), sendo conhecido como Dioscórides Latino. Data do século VI ou
VII. O texto apresenta formas interessantes para o estudo da evolução do latim, a par de
muitos helenismos, mantidos pelo parco conhecimento técnico do tradutor, como por
exemplo lissodectis, “mordido por cão raivoso”, decalque de λυσσόδηκτος.
As duas traduções latinas do compêndio de medicina de Oribásio, médico do
imperador Juliano, são conhecidas como Oribasius Latinus. O original grego já tem
contribuição de diversos autores, com muitas glosas de permeio. As traduções apresen­
tam diferenças entre si; a segunda é mais extensa que a primeira, embora procedam as
duas da região de Ravena. Sob o aspecto lingüístico, ambas contêm notáveis traços vul­
gares, destacando-se o uso do acusativo pelo nominativo (“quorum enim magnas sunt
venas” [I, 9] - “cujas veias, porém, são grandes”), indistinção entre /b/ e Ivl (“frigdo-
res bel bulnerationes” [I, 33] por frigora ve! vulnerationes - “friagens e ferimentos”).
Um exemplo interessante do futuro perifrástico, modelo da forma correspondente da
maioria das línguas românicas (“De birtutibus...diximus, simul etiam et pensas et men­
suras coctiones dicere habemus. [Pref. II] - “Falamos das virtudes... ao mesmo tempo
diremos também os pesos e as medidas dos cozidos”).
Notam-se nesses documentos muitas formas e torneios característicos da fase
romance, na qual o latim vai perdendo lentamente suas estruturas próprias, transfor­
mando-se nas línguas românicas.

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS


d. Tratados de Culinária
Neste terreno, deStaca-se Apicius, conhecido mestre da gastronomia romana,
com Artis Magiricae Libri X (“Dez livros de Arte Culinária”), tratado de receitas que
se perdeu. Dispomos apenas de um resumo dele do século IV ou V com o título De
Re Coquinaria, em que foram introduzidos muitos vocábulos populares. No século
VI, o godo Vinidário, que parece ter conhecido o texto completo de Apicius, fez um
resumo para seu uso pessoal, introduzindo outros vulgarismos ainda mais pesados,
denotando completa indiferença pela linguagem.
Também do século VI é Anthimus, médico bizantino que viveu entre os godos
e dedicou sua obra De Observatione Ciborum ao rei franco Teodorico (rei em 511).
Não se trata de arte culinária, mas do valor nutritivo e das propriedades dos alimen­
tos. Sua linguagem busca a correção, mas de fato reflete o latim da época, já bem dis­
tante dos parâmetros clássicos e cheio de vulgarismos, que não consegue evitar:

Agnellinas vero carnes aut de edis optimae sunt qualiter volueris, aut vaporatas aut elixas
in iuscello; etiam et assas bonas sunt. (Ed. de Liechtenlian, 5)

As carnes de cordeiro, porém, ou de cabrito são ótimas como quiseres, cozidas no vapor ou
no molho; assadas também são boas.

O acusativo plural substitui totalmente o nominativo; o genitivo é expresso pela pre­


posição de com ablativo (de edis), embora o mais comum seja o acusativo (de lac­
tes, cum petras rotundas [75], cum alias species [89]). O plural lactes é masculino,
comprovando o desaparecimento do neutro. Vê-se claramente que os casos não mais
correspondem às respectivas funções sintáticas, em geral indicadas por preposições.

RELATOS DE PEREGRINAÇÕES

Conhecidos pela designação de Itineraria, os relatos de peregrinações, sobre­


tudo à Terra Santa, são bastante numerosos; foram reunidos em Itineraria
Hierosolimitana Saeculi III- VIII por P. Geyer (Viena, 1898). A maior parte consiste
em pequenos textos com indicações de distâncias, apontamentos e rápidos informes;
sua importância para a Filologia Românica é reduzida, se excetuarmos a Peregrinatio
Egheriae.
O Itinerarium Burdigalensis é da autoria de um peregrino da Aquitânia e data­
do de 333. Apresenta os mesmos vulgarismos de outros textos, conforme se pode ver:

Item ab Hiericho ad mare mortuo milia novem. Est aqua ipsius valde amarissima, ubi in
totum nullius generis piscis est nec aliqua navis, et si qui hominum miserit se ut natet, ipsa aqua eum
versat, (p. 24)

120 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Da mesma forma, de Jerico ao mar morto nove mil. A água dele é muito amarga, onde não
há absolutamente peixe de espécie nenhuma, nem embarcação alguma e se algum homem se atirar
para nadar, a própria água o faz voltar.

Observe-se a falta de concordância em ad mare mortuo por mortuum ou, pos­


sivelmente, o autor considerasse mare no ablativo; em valde amarissima há um pleo­
nasmo bem ao gosto popular.
Juntamos neste item outros pequenos relatos: De situ Terrae Sanctae de
Teodósio, do início do século VI d.C.. Em um período como “per octo dies ibi mis­
sas celebrantur et mulla mirabilia ibi domnus facit”· (“durante oito dias missas são
celebradas ali e o senhor faz ali muitos milagres”) encontra-se o acusativo pelo nomi­
nativo (missas por missae) e um exemplo de síncope da pós-tônica, em domnus por
dominus. Por outro lado, o uso das formas sintéticas da voz passiva nas formas do
“infectum” é ainda corrente e correto.
Do fim do mesmo século VI é o Itinerarium de Antonino Placentino, do qual
se conservaram duas redações; a mais antiga apresenta maior número de vulgaris-
mos, conforme se pode verificar em “deinde venimus in civitate Tiberiade in qua sunt
termas [...] salsas” (7) (“depois chegamos à cidade de Tiberiade em que existem tei­
mas [...] salgadas”). O acusativo tende realmente a substituir o nominativo; a prepo­
sição in conserva apenas a idéia de algo estático, perdendo a noção de movimento
“para dentro de”.
O Itinerarium Egheriae (ou Etheriae) é a mais importante das narrativas de
peregrinações à Terra Santa; foi atribuída a Sílvia da Aquitânia, parente do impera­
dor Teodósio, pela distinção que lhe é dada ao ser recebida por altos dignatários e
acompanhada por destacamentos militares. Parece certo, porém, que a autora era da
Galiza, com certa cultura literária, revelada pelas alusões bíblicas, históricas e geo­
gráficas. Sua linguagem é bastante correta gramaticalmente e por isso esse itinera­
rium não pode ser considerado como documento do latim vulgar; contudo, a autora
escreve com bastante liberdade, recorrendo a expressões da língua falada sempre que
lhe faltem as correspondentes gramaticais; há também as que se podem atribuir â dis­
tração ou ainda a erros dos copistas. O estilo é leve e a expressão das idéias, em geral,
ciara. Para a Romanística interessa principalmente a estrutura e o aspecto geral do
texto, cujas tendências prenunciam as das línguas românicas, já que o documento é
do período do declínio do latim, pois foi escrito entre 380 e 420. O manuscrito foi
descoberto por I. Fr. Gamurrini em 1884; trata-se de uma cópia do século XI, feita
em Monte Cassino, à qual faltam o início e a parte final.
Encontram-se incoerências gráficas, como as variantes eçlesia (III, 3), aeccle-
sia (III, 3), ecclesia (III, 4); nichil por nihil, o que pode denotar pronúncia diferente.
O uso da preposição é bastante generalizado, anunciando torneios românicos: cum
grandi labore (III, 2), in ea die (III, 2), de contra illum montem (II, 7), per giro (III,

O R IG E M D AS L ÍN G U A S R O M Â N IC A S
6), locus de evangelio (XXXVI, 4). O verbo sedere aparece com freqíiência, quase
sempre com sentido de “ser” do português e do castelhano, como em XXV, 1:

Sane quia hic consuetudo sic est, ut de omnibus presbyteris, qui sedent, quanti volunt, prae­
dicent [...]

Certamente porque o costume aqui é que preguem todos os presbíteros que estão presentes
e quantos quiserem [...]

Os demonstrativos ille e ipse são usados com muita freqüência, mas em mui­
tos tópicos semanticamente esvaziados e próximos ao artigo românico:

Haec ergo vallis ipsa est, in cuius capite ille locus est, ubi sanctus Moyses, cum pasceret
pecora [...] (II, 2)

Este é, pois, o vale em cujo cume está o lugar onde santo Moisés, quando apascentava o
gado [...]

Claro é também o valor indefinido de unas em várias passagens, como por


exemplo:

[...] dicitur ibi oratio apta loco et diei, dicitur etiam mnis ymnus [sic] aptus et legitur ipse locus de
evangelio ubi dixit discipulis suts [...] (XXXVI, 2)

ali é dita [uma] oração adequada ao lugar e ao dia, diz-se também um hino adequado e lê-se o
lugar do evangelho onde diz aos seus discípulos [...]

Por outro lado, o texto conserva as formas sintéticas características do latim lite­
rário, tanto no comparativo de superioridade dos adjetivos, como na voz passiva dos
tempos verbais no infectum', os verbos depoentes mantêm suas características; não são
raras as construções literárias como o acusativo com infinitivo, o ablativo absoluto e o
participio conjunto. Esses fatos fazem com que a Peregrinatio não possa ser conside­
rada um monumento do latim vulgar. Veja-se o seguinte trecho como exemplo:

[...] leguntur lectiones aptae, dicuntur psalmi vel antiphone [sic], fit oratio, benedicuntur cathecu-
meni et sic fedeles, et fit missa. Missa autem facta, accedunt omnes [...] et sic revertuntur unusquis-
quis ad domum suam [...] (XLII, in fine)

[...] lêem-se lições adequadas, recitam-se salmos ou antífonas, faz-se oração, abençoam-se catecú-
menos e também fiéis e se faz a missa. Terminada a missa, porém, todos se aproximam [...] e cada
um volta para sua casa [...]

122 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


TEXTOS LATINOS TARDIOS

Os autores latinos do período clássico nos legaram poucas informações sobre


o latim vulgar ou mesmo sobre a urbanitas; expressões e certos torneios populares
aparecem quando intervém personagens do povo, como nas comédias de Plauto, ou
em relatos curiosos em Horácio, Juvenal, Pércio e Marcial. Alguns textos latinos tar­
dios, porém, acentuaram o caráter popular das personagens desses relatos com fins
estilísticos ou cômicos, dando valiosos subsídios para o conhecimento da variedade
popular.

S aty rico n

Petronius Arbiter, ou apenas Arbiter, é o nome do autor, nos manuscritos, da


obra Satyricon; discute-se ainda se esse Arbiter se identifica com o “arbiter elegan­
tiae” da corte de Nero, pois Petrônio era nome bastante comum no século I d.C.,
enquanto Arbiter era muito raro. A descrição que Tácito dá do “arbiter elegantiae”
sugere pessoa espirituosa e refinada, precisamente as qualidades exigidas do autor do
Satyricon. Da obra chegaram até nós partes dos livros 14, 15 e 16, mas a Cena
Trimalchionis, de particular importância para a Filologia Românica, está intacta.
Literariamente, é uma espécie de paródia, na qual se contam as aventuras do narra­
dor Encolpius e de seu amigo Giton, em geral no sul da Itália. Na Cena percebem-se
traços de crítica literária e de sátira. Na Antigüidade, a obra foi pouco conhecida;
fazem rápidas referências a ela Terentianus Maurus e Sidonius Apollinaris; na Idade
Média, era conhecida através dos florilégios.
A Cena Trimalchionis, ou seja, a “Ceia de Trimalquião”, descreve o banque­
te dado aos amigos por esse novo rico; mostra a casa, os costumes do anfitrião e de
seus convidados, um grupo de libertos, charlatães vulgares e exímios comilões. A lin­
guagem deles é cheia de vulgarismos, reunidos aqui num bloco, muitos documenta­
dos antes de modo isolado. Petrônio usa tais vulgarismos como recurso estilístico,
procurando caracterizar as personagens também através da linguagem; com maestria
imita a fala dos escravos e libertos, contrastante com a de outras figuras aristocráti­
cas de sua narrativa.
Na Cena Trimalchionis, a flutuação do gênero neutro é sensível: balneus por
balneum, vinus por vinum, vasus por vas; thesaurum por thesaurus (46, 8) contrasta
com o acusativo plural em: “Ego fidem meam malo quam thesauros”. (57, 9)
(“Prefiro minha fidelidade a tesouros.”). Em 42, 4 encontra-se o depoente loqui, mas
em 46, 1 está a forma vulgar: “Quia tu, qui potes loquere, non loquis”, “Porque tu,
que podes falar, não falas”.

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS | 123


Nesse tópico fala um liberto, que diz loquere por loqui e loquis por loqueris,
transformando um depoente num verbo comum; em outras passagens, porém, encon-
tram-se numerosas formas depoentes e literárias, como videor (42, 3), morior (57, 6),
nascuntur (57, 3), persegni (63, 4), negotiari e morer (75, 3) etc. Fica claro, portan­
to, a intenção estilística das formas vulgares. Em plovebat por pluebat (44, 18) há a
forma vulgar que dá origem às correspondentes românicas (port. chover, cast. llover,
cat. ploure, prov. ploure, fr. pleuvoir, friul. plovi, eng. plover, log. pióere, it. piovere,
rom. a ploa), enquanto a forma literária pluere não deixou vestígios. Exemplos de
formas vulgares de síncope da pós-tônica são lamna por lamina (57, 4), peduclum
por peduculum (57, 7) etc. Numerosas são as formas diminutivas, uma característica
do latim vulgar: casulas (46, 2), servulus (46, 3), Graeculis (46, 5), lamellulas (57,
6), misella (63,4), cubiculum (77,4) entre outros. Pronomes reforçados segundo tor­
neio popular são freqíientes, como is ipse (57, 1); notável é a forma petroniana, não
encontrada em outros textos, ipsimus (63, 3) no sentido de “amo”, base do pronome
românico de identidade.
No léxico, bellus substitui pulcher e, devido à convergência homonímica,
acaba determinando o desaparecimento também de bellum (“guerra”), substituído
por termo germânico ou eslavo. Há também curiosos compostos populares, como ad
domusionem (< d o mu + usionem) (“para uso doméstico”), lacticulosus, derivação
duplamente popular (“desmamado há pouco”) e manuciolum (“punhado de palhas”).

T e s t a m e n t u m Po r c e l l i

Antiga paródia de caráter jurídico, o Testamento do Porquinho já era conheci­


do por São Jerônimo; foi escrito por volta de 350. Seu autor conhecia muito bem a
terminologia técnica do Direito Romano e sua linguagem é gramaticalmente correta.
Os vulgarismos usados procuram efeitos cômicos, por conotação com significados
populares, como capitinae (“cerdas da cabeça”), cymae (“brotos”), popia (“colher”),
soliversator (“fuçador do solo”), vascella (“vasilhas”) entre outros.

T a b e l a s A l b e r t in a s

Dentre outros documentos tardios (séculos V-VI), destacam-se as chamadas


Tabellae Albertini, encontradas emTúnis em 1928. Trata-se de documentação parti­
cular, em 45 tabelas de madeira, com 34 documentos escritos a tinta, várias das quais
indubitáveis palimpsestos. Contêm relatos de dotes, assentamentos de compra e
venda, operações comerciais em geral; trazem a assinatura dos autores e procedem
de lugares diferentes, desconhecendo-se a razão de terem sido reunidas num só lugar.
Seguem fórmulas fixas, mas são originais quando enumeram bens e descrevem obje-

24 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


tos e pessoas, tópicos que deixam entrever a cultura, o ambiente e as modalidades lin­
guísticas correntes.
Examinando a Tabella XIV como exemplo, lê-se um documento de venda de
uma propriedade com olival, datado possivelmente de fevereiro de 496. Redigido
dentro dos parâmetros cartoriais da época, não distingue os fonemas /b/ e N / (vocci-
vulis, benderent, boluerit, biso e viso, ao lado de venditor, deveri por deberi, sivi por
sibi etc.). Algumas expressões são curiosamente fundidas numa só palavra: iuris-
queorum < iurisque eorum, (“e do direito deles”), eredesveorum < heredesve eorum
(“ou os herdeiros deles”). Sistematicamente se reduz /ae/ a /e/ (olive por olivae,pecu-
nie por pecuniae)', duodecimo reduz-se a dodecimo, forma suposta pelas línguas
românicas. Algumas grafias chamam a atenção, como a já encontrada alhures nichil
por nihil, e a estranha queperit por ceperit, indicando a conservação do valor velar
do Icl. A parte final atesta suscrissi e subscribsi por subscripsi, apontando possível
flutuação de formas ou subscritores de origens diferentes.

TEXTOS CRISTÃOS

A língua da Igreja primitiva foi o grego da “koiné”, variedade em que foram


redigidos os livros do Novo Testamento, inclusive a carta de Paulo aos romanos. A
primeira comunidade cristã foi fundada entre as classes mais baixas das grandes
cidades, particularmente entre elementos de origem oriental e judia. Com a expansão
do cristianismo, passou-se a latinizar termos hebraicos e gregos, formando-se uma
língua religiosa técnica. Trazendo uma nova visão do mundo, o cristianismo devia
adequar o léxico a essa visão diferente; assim, muitos são os empréstimos ou decal­
ques gregos: anathema, angelus, apostata, apostolus, baptismus, baptizo, catechu­
menus, charisma, diaconus, eleemosyna, ecclesia, episcopus, evangelium, martyr,
neophytus e presbyter entre muitos outros. Na busca da expressão de novos valores,
dá-se nova acepção a vocábulos comuns latinos: peccare significa “transgredir a lei
de Deus” e não “tropeçar”;fides é “fé” religiosa e não “fidelidade”; lavacrum desig­
na o sacramento do batismo e não mais simplesmente “banho” etc.
Quando a comunidade cristã aumentou, foi necessário adequar os textos à lín­
gua que a maioria conhecia, o latim vulgar. Surgiram assim várias traduções da Bíblia,
em linguagem adaptada aos destinatários, cristãos latinos incultos. As primeiras datam
da segunda metade do século II, com muitos vulgarismos, induzidos até certo ponto
pela própria “koiné” do original grego. Note-se que não se trata de tradução em latim
vulgar, mas que procura aproximar-se da fala corrente. Mais tarde surgiu o latim ecle­
siástico, de caráter culto, dos chamados Padres da Igreja, que não deve ser confundi­
do com o latim cristão antigo, encontrado nessas traduções bíblicas.

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS | 125


A Vetus Latina de fato abrange um conjunto de traduções anteriores a S.
Jerônimo (348-420), entre as quais se destacam a ítala, literalmente fiel ao texto
grego, com muitos plebeismos, e a Afra, literalmente melhor. A Vulgata, como é
conhecida a tradução de S. Jerônimo, só em parte é uma nova tradução, pois mantém
o caráter literal da ítala, além de não ter modificado nada dos livros da Sabedoria,
Eclesiastes, Baruc e Macabeus I e II; o Atos dos Apóstolos, o Apocalipse e as
Epístolas foram apenas retocados.
Na ítala, não são raros os casos de confusão com as desinências casuais; por
èxemplo, Marc. 15, 1: “[...] cum senioribus et scribis et totum concilium [...]”; ou 15,
7: “Erat autem in carcerem [...]” - em que o acusativo substitui o ablativo, tendência
tantas vezes comprovada. Em Jo. 2, 21: “Ille autem dicebat de templo corporis sui”,
o ille tem a função do pronome pessoal românico “ele”. Destaca-se na Vetus Latina
a estrutura das orações, com a colocação dos termos em ordem lógica, muito próxi­
ma da encontrada nas línguas românicas, como em Marc. 15, 4:

Iterum Pilatus interrogavit eum dicens: Non respondes eis quicquam? Ecce quanta te accusant.

De novo Pilatos interrogou-o dizendo: Não lhes respondes alguma coisa? Eis de quantas coisas te
acusam.

Algumas construções da Vulgata, estranhas à primeira vista, se devem ao lite-


ralismo da tradução, que procura manter a construção grega, tanto quanto possível,
por respeito à Bíblia. Isso se verifica na ordem das palavras, característica do grego
e mantida no latim: Luc. 15, 8, “drachmas decem”, com a posposição do numeral
correspondente ao grego δραχμάς δέκα; mas “duos filios”, conforme δύο
υιούς; em 16, 1: 6ς ε’ιχεν οικονόμου é traduzido por “qui habebat vilicum”. Por
causa do grande respeito pelo texto sagrado, não se pode exagerar a contribuição
desse texto bíblico para a reconstituição do latim vulgar.
Outros textos cristãos são importantes para a Filologia Românica, como os
escritos de Santo Agostinho (354-430) ou de Izidoro de Sevilha (602-636), por suas
observações sobre fatos lingüísticos. De particular interesse filológico é a Regula
Monachorum de S. Bento de Núrsia, com a qual teve pleno êxito a primeira tentati­
va de implantar no Ocidente as regras monásticas do Oriente cristão. Há duas edições
dessa Regra, a segunda das quais é mais ampla e melhor. Revela a pouca cultura e
reduzido conhecimento literário de seu autor. Como reflexo do latim daquela época,
dá interessantes informes sobretudo na sintaxe. As preposições vêm sistematicamen­
te com o acusativo, substituindo o ablativo: “mox omnes de sedilia sua surgant”
(“logo todos se levantem de seus assentos”) (9); “cum responsoria sua” (16); “De
quarum rerum omnium colorem et grossitatem...” (55) (“Sobre a cor e grossura de
todas essas coisas...”) etc.

126 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


GLOSSÁRIOS

Glossários são elencos de palavras ao lado das quais é aposta outra, que a tra­
duz ou explica, da língua do leitor ao qual se destina. Originaram-se das anotações
marginais ou interlineares em passagens menos claras; essas anotações foram depois
reunidas e ordenadas por critérios diversos. O termo “glossário” tem como base o
termo grego γλώσσα (“palavra”, “língua”); já em Aristóteles (Retórica, 1410 b 12
e Poética, 1457 b 4) tem também o significado de “palavra rara ou estrangeira que
precisa de explicação”. Edições de referência são a de G. Lõwe e G. Gõtz, Corpus
Glossariorum Latinorum, em cinco volumes (Leipzig, 1889-1923), aos quais foram
depois juntados os dois volumes complementares do Thesaurus glossarum emenda­
tarum, como os volumes VI e VII da coleção; complementar é ainda a edição de W.
M. Lindsay (Paris, 1926-1931) dos Glossaria Latina iussu Academiae Britannicae
edita em cinco volumes.
Para a Filologia Românica nem todos os dados dessas fontes têm o mesmo
valor; muitos, porém, são extremamente valiosos para o estudo do léxico. Note-se
que foram escritos por pessoas cultas, que liam os textos, refletindo com isso o nível
cultural da época, relativamente baixo.

O Glossário de R eichenau

Conhecido igualmente como Glossas de Reichenau, é originário do sul da


França; data do final do século VIII. Reichenau é uma pequena ilha do lago de
Constança, na Suíça, na qual há um mosteiro beneditino fundado em 724; esse mos­
teiro foi um dos principais centros de cultura da época carolíngea. Atualmente na
biblioteca de Karlsruhe, esse glossário contém de fato dois, um bíblico e outro bíbli-
co-patrístico; muitas glossas provêm de outros glossários e de escritores tardios e
apontam tendências léxicas do latim da Gália dos séculos IV e V. Procuram explicar
expressões da Vulgata com palavras ou torneios mais populares; o segundo traz ainda
outras palavras em ordem alfabética.
Exemplos da parte bíblica:

743 - excubent: vigilent (“vigiem”)


749 - uva passa; uva sicca (“uva passa”)
767 - luxit: flevit, ploravit (“chorou”)
801 - ulciscere: vindicare (“vingar”)
810 - ictus: coipus (“golpe”)
1557 - pueros: infantes (“meninos”)

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMANICAS 127


2471 - articulos: digitos (“dedos”)
3012 - dilexi: amavi (“amei”).

Do glossário alfabético:

22 - arena: sabulonem (“areia”)


45 - atram: nigram (“negra”)
483 - detegere: discooperire (“descobrir”)
723 - Gallia: Francia (“França”)
732 - hiems: ibernus (“inverno”)
1031 - novacula: rasorium (“navalha”)
1238 - pulempta: farina (“farinha torrada de cevada”)
1569 - sus: porcus
1640 - vespertiliones: calves sorices (“morcego”)
1708 - utere: usitare (“usar”).

Vê-se que os termos explicativos, em sua maioria, representam os corres­


pondentes românicos modernos, como de ibernus (tempus) > rom. iarnã, vegl.
inviamo, it. inverno (verno no sul), log. ierru, sobres, unviern, eng. iviern, friul.
inviam, fr. hiver, prov. ivern, cat. ivern, cast. invierno, gal. iverno e port. inverno.
De hiems não ficaram vestígios românicos. Em outros casos, algumas línguas
românicas mantiveram uma, enquanto as outras optaram pelo sinônimo: assim,
arena continua no port. areia, cast. arena, cat. arena, prov. arena, log. rena, rom.
arina (ao lado do esi. nisip)\ mas sabulonem (ou sabulum) deu it. sabbia, fr. sable
e prov. sable (e também arena).
Acontece também que as línguas românicas modernas tenham formas diver­
gentes das apresentadas no glossário. Um exemplo é o 1640 do alfabético. No it. ant.
havia vipistrello e vepistrello como continuadores de vespertilio (semanticamente
ligado a vespertinus: daí, “animal que sai ao cair da noite”). Em toda a Itália há mui­
tas variantes com base etimológica popular, como friul. barhast(r)in, romagn. bal-
bastrel, pis. pilustrello, emil. palpastrel etc. No francês ficou a forma indicada pelo
glossário chauve souris (“rato calvo”), de uma palavra vulgar *soricius (“rato”); os
dialetos franceses apresentam variantes, como norm. surigok e kaksuri, champ. suri
shod. Nas línguas da Península Ibérica, porém, não se conservou nenhum dos ter­
mos contidos no glossário, pois todas têm por base mus, muris: port. morcego, cast.
murciego, do qual cat. morisek ou misirek, burisek e milisek, partindo de murem
caecum (“rato cego”). Apenas o galego, com espertello se relaciona com vesperti­
lio. O romeno emprestou liliac do búlgaro, enquanto o alemão o denomina
Fledermaus, “rato voador”.

128 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


As glossas de Reichenau atestam ainda a perda completa dos verbos depoen-
tes: ulciescere por ulcisci (801), utere por uti (1708); por outro lado, os muitos vocá­
bulos no acusativo denotam que esse caso já havia substituído a maioria dos outros.

As Glossas de K assel

As Glossas de Kassel são assim denominadas por serem conservadas na biblio­


teca de Kassel, centro-norte da Alemanha, ao sul de Gõttingen. É um glossário latim
- alemão, tematicamente organizado, isto é, agrupa expressões relativas a um deter­
minado assunto, como partes do corpo, casa, vestuário, animais domésticos etc. Traz
também períodos inteiros, típicos da conversação. A parte latina ainda não é romance,
embora bem próxima; as glossas germânicas representam certamente o alemão da
Baviera, região sul da Alemanha, onde teria sido exarado em 802. Alguns exemplos:

17 - tundi meo capilli: slcir min falis


18 - radi me meo colli: skir minan hals
19 - radi meo parba: skir minam part
53 - figido: lepara (al. mod. leber)
131 - implentis est: foi ist (Voll ist)
163 - Aia tutti: Wela alie (Wohl alie).

Exemplo de frase inteira:

181 - Indica mih quomodo nomen habet homo iste: Sage mir uueo namum
habet deser man. (“Dize-me que nome tem este homem”.)

A parte latina tem elementos de várias regiões (Itália, Récia e Gália) e repre­
senta o chamado baixo latim, mesclado com vulgarismos, mais numerosos que os
encontrados no glossário de Reichenau. O uso das surdas pelas sonoras, como em
parba por barba, mostra que a língua materna do autor era o germânico; note-se tam­
bém o barbarismo na ausência de concordância nominal em meo capilli, meo colli e
meo parba e o desaparecimento completo das declinações.

O Glossário do Vaticano

O Glossário do Vaticano data do século VII; de procedência ibérica, é conser­


vado na biblioteca do Vaticano (códice 3321). Dele procedem outros quatro de menor

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÁNICAS j 129


importância; há quem o atribua a Izidoro de Sevilha, mas não se tem certeza de sua
autoria. Exemplos:

52, 2 - demonizationes: subprestitioncs


52, 10 - demolire: dissipare
76, 18 - fimum: stercus animalium
11,6 - flagrat: ardet
77,8 - flagitat: rogat, petit
77, 17 - fallere: mentire
95,21 - inlustrem: gloriosum vel novilem
- inmitis: non placavilis
125,32 - non dubium: verum
- nonnulli: aliquanti vel aliqui.

Também nesse glossário se verifica que as formas glosadas desaparecem (fla­


gitat, fallere) ou representam formas eruditas nas línguas românicas (demolire),
enquanto as explicativas, de modo geral, foram conservadas e incorporadas ao léxi­
co românico: assim, lat. ardere > port. arder, cast. arder, cat. ardrer, prov. ardre, fr.
ant. ardre e ardoir, eng. arder, friul. ardi e ardé, it. ardere, vegl. ardár, rom. arde.
Outros exemplos são rogat, petit, mentire. Documenta-se mais uma vez a flutuação
dos fonemas /b/ e / v / e a não assimilação do /n/ em inlustrem e inmitis.

G l o s s á r io P s e u d o - iz i d o r i a n o

O Glossário Pseudo-izidoriano foi atribuído durante muitos séculos a Izidoro


de Sevilha, mas trata-se de uma compilação de vários outros mais antigos, dos quais
alguns nos são desconhecidos. E possível que seja originário da Ibéria, já que muitas
glosas eram conhecidas na península na época dos visigodos. Alguns exemplos:

590, 35 augumentum: profectus


591, 60 bassus: crassus
bostar: locus ubi stant boves
595, 3 cusire: consuere
597, 50 enulum: caldarium
604, 6 manubiare: vigilare, pernoctare
mansionarius: ostiarius

Entre os vocábulos desse glossário, alguns não são comuns, como bostar ou
bostare, “curral”, “cocheira”, encontrado no port. ant. bostal e no cast. ant. bostar

130 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


(REW 1228). Mas enulum (“panela”) e manubiare (literalmente “ter à mão”, no glos­
sário “vigiar” e “pernoitar”) são raros e não deixaram vestígios românicos.
Mansionarius substitui ostiarius, ambos significando “porteiro”. Ostiarius, de ostium
- suplantado em toda a românia por porta - ficou no fr. huissier, de onde passou para
o it. usciere e para o cast. ant. uxier, o fr. huissier supõe uma variante *ustiarius e
modernamente significa “recepcionista”, “bedel” e “oficial de justiça”. Mansio, no
latim literário, significa “morada” e “habitação” além de “hospedaria”. Nas línguas
românicas, essa acepção continua no fr. maison, donde passou para o it. ant. magione
e port. ant. maisom (“casa”); o port. mansão é semi-erudito no significado de “habi­
tação suntuosa”. Nas demais línguas e dialetos românicos, assumiu sentidos diversos:
no dalm. mochuna significa “redil”, “abrigo para ovelhas”; nos dialetos italianos ber-
gam., trent. e veron. mazun é “galinheiro”; na região de Como, na Itália, mazon desig­
na um tipo de “cabana alpina”; no Vale Sassina, mazon é “estábulo com piso de feno”;
no log. e no campid. masoni é “estábulo de cabras ou de ovelhas” e “chiqueiro”; no
eng. maschun designa o “poleiro”. O cast. mesón ainda hoje conserva um dos signifi­
cados clássicos de “hospedaria”, sendo uma das razões para se supor a origem ibéri­
ca do documento. Note-se que as palavras românicas partem de masione com sínco­
pe do fonema /n/, enquanto o port. mansão o mantém por ser semi-erudito.

As G lossas E m ilian en ses

As Glossas Emilianenses estão em um manuscrito do século X, conservado no


convento de San Millán, situado ao oeste da província espanhola de Logrono. São tex­
tos religiosos, reunidos numa espécie de ílorilégio de exempla selecionados das Vitae
Patrum, de escritos litúrgicos e sermões atribuídos a Santo Agostinho. Por volta de
meados do século X, os textos foram glosados marginal ou interlinearmente; como as
de Silos, as Glossas Emilianenses parecem supor um outro glossário anterior; ao con­
trário do de Reichenau, este glossário usa conscientemente a língua vulgar, primeiro
exemplo do ibero-romance, com suas características bem definidas. Reflete também
o chamado latim visigótico, que perdurou na Ibéria até o século XI, e que explica as
formas latinas não atribuíveis a uma relatinização das correspondentes românicas.
Exemplos de Item alius sermo:

incurrit [kaderat]
Non se circumveniat qui talis est [non se cuempetet elo uamne en sivi]
implere dissimulant [tardarsan por implire]
talia plura conmittunt [tales muitos fazen]
alicotiens [alquandas beces]

ORIGEM DAS LlNGUAS ROMÂNICAS j


litigare non erubescunt [non se bergu(n)diant tramare]
criminis [peccatos]
exacturus [e la probatione] usuram [ela legem]
[Como aiutorio de nuestro dueno Christo, [...] e qual dueno salbatore [...] e qual
duenno tienet eia mandatione cono Padre, [...] enos sieculos delo(s) sieculos].

As explicações, indicadas acima pelos colchetes, documentam várias caracte­


rísticas do romance castelhano: o futuro expresso através da locução infinitivo +
habere está em kaderat (cader + at < cadere habet), ainda sem a síncope da sonora
/d/ intervocálica, mod. caerá; também em tardarsan, ou seja, tardar se han corres­
pondente ao mod. se tardarán. O desconhecimento dos casos se percebem em crimi­
nis [peccatos], em que um genitivo singular é traduzido por um (acusativo) plural,
embora se possa supor a intenção de traduzir apenas o sentido da palavra. O demons­
trativo latino illu, illa aparece com clareza usado como artigo definido cm elo uamne,
de la probatione, ela legem, cono, ela mandatione, enos sieculos delos sieculos. No
aspecto fonético, há vários exemplos da ditongação do /e/ e do /o/ breves, como
cuempetet, de computet, cast. mod. cuente; uamne, de homine, mod. hombre; nues­
tro, de nostrir, dueno, de dominu, mod. dueno; tienet, de tenet; sieculos, de saeculu
> seculu, cast. mod. siglo. Observa-se ainda a flutuação dos fonemas /b/ e /v/, no lati-
nismo si vi por sibi e em beces por veces. Note-se também a vocalização do /1/ em
muitos > muitos, sem a qual não se explicaria o cast. mod. muchos.

Os H er m eneu m ata

Os chamados hermeneumata (lit. “interpretações”) são glossários bilíngües,


mais freqüentemente com o texto grego em primeiro lugar. Assemelha-se a manuais
escolares ou de conversação; os vocábulos ou orações curtas são dispostos em ordem
alfabética ou temática. Foram conservados em várias recensões e denominados
segundo o nome do lugar que se acham os respectivos manuscritos. Apenas das difi­
culdades de datação, pode-se situá-los no século III ou IV. São geralmente atribuídos
a Dositeu, cognominado Magister (século IV), cuja Ars Grammatica, também bilín-
güe, destinou-se aos gregos que queriam aprender latim; o texto cm latim era origi­
nalmente interlinear. O conjunto desses glossários é conhecido por Pseudo-
Dositheana Hermeneumata no CGL de G. Gõtz e constitui o vol. III.

a. Hermeneumata Montepessulana
São conservados em Montpellier, no sul da França, donde lhe advém o nome;
alguns dados do texto levam a afirmar que foram escritos na Itália. O manuscrito data

132 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


do século IX; a parte grega vem em primeiro lugar e em caracteres gregos, mas sem
nenhum acento ou sinal de aspiração (“spiritus”). Alguns exemplos:

284. 42 πορευου πεδαριον vade puer


και αγγιλον et nuntia
οτι ερκομαι quoniam venio
δοται μοι υποδήματα date mihi calciamenta
285, 19 υδας που μενσι scis ubi manet
ο φίλος μου amicus meus
285, 33 αγωμεν ημείς eamus nos
προς τους άλλους φίλους ad alios amicos
42 πως τα παιδια quomodo infantes
ζωσιν vivunt
287, 12 τριφον με frica me
288, 2 δος ημειν πιν da nobis bibere
50 ηδη οψε εστιν iam sero est
αγωμεν εις οικον eamus in domum
54 εκοωμεν τι δηπνησαι habemus quid cenare?
289, 4 δος κειρομαγιον da mappa ad manus

O caráter mais coloquial das formas latinas é notado em diversos tópicos:


vade (284,42), imperativo de vado (“caminhar”, “dirigir-se”) substitui as formas
monossilábicas de eo, ire (“ir”) demasiado curtas e por isso sem destaque no fluxo
frasal, além dos freqüentes choques homonímicos; de ire persistiram asTormas arri-
zotônicas, mais encorpadas como eamus (285,33 e 288,50). Esses fatos explicam a
conjugação românica de ire, nas línguas que o conservaram, e empregam raízes for­
malmente diversas, como port. vou - imos (ou vamos), cast. voy - vamos, prov. vau
- artam, fr. vais - allorts, eng. vegn - giain, it. vado - andiamo etc. A expansão do
uso das preposições é clara em eamus in domum por domum eamus e em mappa ad
manus. Em calciamenta por calceamenta (“sapatos”) há a transformação do hiato em
ditongo (-ea- > -ia-), além da forma popular sufixada calceus > calceamentum.
Tendo sido escrito por um professor de línguas, o texto em geral é gramaticalmente
correto; assim, a apócope do /m/ em mappa (“toalha”) pode ter sido erro do copista.

b. Hermeneumata Monacensia
Constam em dois manuscritos conservados em Munique, na Alemanha. O arqué­
tipo data talvez do século IX e as duas cópias são do século XII, feitas na própria
Alemanha. Os termos gregos glosados estão escritos em caracteres latinos e a translite-
ração nem sempre é muito fiel. Alguns exemplos:

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS j 133


175, 24 cili: lavia
33 ule: gengive
58 onuces: unguas
181,44 adelfos gnesios: germanus
185, 21 melimela: metiana
186, 61 octapus: polupus
196, 59 capilion: coponium
213,46 erotison auton: interroga iluum
idinametha iseltin: si possumus intrare
218, 33 ideichis peperation: vide si habes piperatum
37 dos sycoton: da ficatum
219, 6 metatroximon: cum scarias.

Esses exemplos mostram que se trata de um glossário temático. O grego tam­


bém tem caráter bastante popular, com freqüentes reduções de ditongos, como
χεΐλοι > cili (“lábios”), ε ισ ε λ θ ε ϊν > iseltin. Nesses exemplos, ocorrem apenas
dois casos, o nominativo e o acusativo, mesmo onde deveria haver o ablativo, como
cum scarias (“com escarolas”). Em 213, 46, o demonstrativo ille substitui o clássico
is (eum no texto), apontando para as múltiplas funções que ille (illa, illud) havería de
ter nas línguas românicas. Para o estudo do léxico românico, esse glossário oferece
subsídios interessantes. O gr. adelfos é traduzido por germanus (181, 48) e não por
frater, este conservado em quase toda a România, com exceção na Ibéria, onde ger­
manus > port. irmão, cast. hermano, emprestado ao log. ermanu (“hipócrita”), bearn.
yirmá, enquanto frater se especializou semanticamente na acepção de “membro de
ordem religiosa”, de modo semelhante ao gr. ά δ ε λ φ ό ς e φ ρά τηρ, este “membro de
uma φ ρ α τρ ία ” (“irmandade”). Metiana (185, 21), forma dissimilada de mattiana, é
neutro plural da segunda declinação (mattianum pomum) que na linguagem vulgar
passou para a primeira e como singular. Conservou-se só na Península Ibérica, port.
maçã, cast. manzana (cast. ant. maçand), denominação advinda de C. Matius (sécu­
lo I a.C. ou d.C.), especialista romano em arboricultura. Polupus, variante de polypus
(< gr. π ο λ ύ κ ο υ ς , “de muitos pés”), é mais antiga que octopus (ο κ τό π ο υ ς, “de oito
pés”); polypus originou port. polvo, cast. pulpo, cat. pop, prov. purpre e pourpre, fr.
poulpe e pieuvre, it. polpo (REW 6641). Note-se ainda a difusão de ficatum, decal­
que do gr. OVKCúXÓv, que substitui totalmente tanto iecur (“fígado”) em latim, como
ή π α ρ no grego (Cf. p. 75).

c. Hermeneumata de Monza
Constam em um códice conservado na Biblioteca Capitular de Monza, na Itália;
trata-se de um glossário italiano-grego do século X. A parte grega é atribuída a um

134 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


monge do sul da Itália, enquanto os esclarecimentos apostos foram escritos em uma
cidade da planície do rio Pó, ao norte. Não é documento do latim vulgar; contudo, inte­
ressa à Filologia Românica por fornecer dados que ajudam a compreender a evolução
de uma língua românica. Traz palavras isoladas e poucas frases. Alguns exemplos;

51 gallo - aletora (ά λ έκ το ρ α )
59 dominica - curiaci (κ υ ρ ια κ ή )
31 de mandegare- desmetinaosefaimo (δός μ ε τ ί ν α Ί σ α φ ά [γ ]ω μ ε [ν ]).

Algumas palavras têm características nitidamente vulgares duma região pro­


vavelmente entre as cidades de Pavia e Bobbio. Outras apresentam uma relatinização
clara (auricula, ungula, digito), em seu todo fonético; em ainda outro grupo de ter­
mos, o aspecto erudito se nota pela reconstituição das surdas intervocálicas como em
vestito, braca, lupo, lepore. Falta, portanto, uma separação mais visível entre o latim
e o romance.
Os romanistas enumeram ainda muitos outros documentos que são fontes do
latim vulgar. Entre tantos, mencionem-se a Historia Francorum, Vitae Patrum e De
Gloria Confessorum de Gregório de Tours (538-594); as coleções de leis, conhecidas
como Leges Barbarorum, como as várias redações da Lex Salica, a mais antiga das
quais remonta ao rei franco Clóvis (482-511), a Lex Ribuaria, Lex Romana Raetica
Curiensis (ou Utimensis); os Chronicarum Libri IV de Fredegarius e as Continuationes
Fredegarii (século VIII), o Liber Historiae Francorum, de 727 (publicado em Monu­
menta Germaniae Historica por B. Krusch); as Vitae Sanctorum Merovingicae (sécu­
los VI-VII); as Formulae, modelos de documentos legais (séculosVII-IX); os Diplomata
Saeculorum VII-VIII, coletânea de documentos notariais, mais numerosos da França
que da Itália e da Espanha. Destaque especial merece o Appendix Probi ou Ad Probum,
já citado, por sua excepcional contribuição para a reconstituição do latim vulgar.

AS LÍNGUAS ROMÂNICAS COMO FONTES DO LATIM VULGAR

Todos os dados recolhidos das fontes acima citadas não são suficientes para a
reconstrução completa do latim vulgar. Não existindo nenhum escrito totalmente em
latim vulgar, por ter sido apenas falado, essas fontes indiretas, além de incoerentes,
não conseguem cobrir seu universo. Certamente essa norma falada utilizava um
vocabulário seguramente mais extenso em relação àquele que ficou registrado oca­
sionalmente em documentos. Entretanto, as línguas românicas herdaram e usam mui­
tos vocábulos ainda não documentados por aquelas fontes. Assim, havendo consen­
so entre as línguas românicas em relação a um determinado vocábulo não

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS I 135


documentado, pode-se pcrfeitamente supor sua existência no uso corrente do latim
vulgar originário. Nessa perspectiva, as línguas românicas perfazem uma fonte de
referência de valor singular na reconstituição do latim vulgar. Um exemplo da vali­
dade desse princípio é o Romanisches Etymologisches IVõrterbuch, o conhecido
REW, de W. Meyer-Lübke: elencando apenas as palavras herdadas nas línguas româ­
nicas, das cerca de 10000, em torno de 1 000 vinham assinaladas como formas ori­
ginárias supostas, através de um asterisco, na primeira edição (1911-1920). Desde
então essas 1.000 foram sendo documentadas, confirmando a forma suposta, tanto
que o número de palavras ainda não devida e definitivamente documentadas baixou
atualmente para menos da metade em relação à primeira edição do REW.
Nesse contexto, porém, algumas línguas românicas desempenham um papel espe­
cial: é o caso do romeno e do sardo, este até certo ponto, dado o isolamento cm que eles
se desenvolveram. O romeno ficou isolado desde que o imperador Aureliano retirou da
Dácia suas legiões, em 270 d.C.. Depois disso, a Romênia fez parte do Império Bizantino,
sofrendo assim a influência linguística e cultural do grego e, mais tarde, do eslavo, inclu­
sive do velho eslavo litúrgico, e ainda da língua oficial, o médio búlgaro. Esse isolamen­
to em relação às outras línguas românicas perdurou durante a Idade Média e início da
Moderna. Somente no século XVIII, com a volta de parte da Igreja ao catolicismo roma­
no, os transilvanos tiveram contato mais duradouro com os povos de língua românica atra­
vés da administração húngara. Anteriormente, apenas estudantes moldavos em universi­
dades polonesas haviam tido contato com o Humanismo italiano. Esses fatos despertaram
nos romenos a consciência de sua latinidade, levando-os a um movimento sempre cres­
cente pela relatinização lingüística, que acabou ocorrendo sobretudo a partir de 1860, com
a substituição do alfabeto cirílico, até então usado, pelo latino. Houve então uma conside­
rável relatinização do léxico, sobretudo através do italiano e do francês (v. p. 267s).
O sardo, em especial o dialeto logudorês, destaca-se por seu caráter arcaizan-
te e conservador, atribuível a circunstâncias históricas, geográficas e políticas. A
romanização foi profunda, embora lenta, durante o período em que a Sardenha per­
tenceu ao Império (238 a.C.-455 d.C.). Conquistada pelos vândalos em 455, admi­
nistrativamente ficou ligada à África, sede do reino dos vândalos, até ser reconquis­
tada pelo imperador Justiniano (482-548) do Império Romano do Oriente cm 534. O
fato de ter estreitas ligações com o norte da África durante quase um século explica
certas semelhanças lingüísticas entre a Sardenha e a África. Por outro lado, a ilha
sempre foi um lugar de deportação, o que contribuiu consideravelmente para seu iso­
lamento em todos os sentidos, além de inibir a imigração espontânea. É preciso ainda
levar em conta os quase quatro séculos de dominação catalã e castelhana (1327-
1720), que deixaram influências léxicas nos dialetos sardos.
Portanto, na reconstituição do latim vulgar com elementos fornecidos pelas
línguas românicas é preciso levar em conta o romeno e o sardo, cujo isolamento os

136 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


levou a uma evolução própria, sem as influências mútuas observadas entre as demais
línguas românicas; além disso, o romeno ficou privado da permanente influência do
latim medieval, sobretudo como grande fonte de empréstimos. Assim, se um elemen­
to fonético, léxico, morfológico ou sintático se encontra em todas as línguas români­
cas, inclusive no romeno e no sardo, pode-se perfeitamente inferir que tal elemento
fazia parte do universo do tronco lingüístico, o latim vulgar, mesmo que esse fato não
tenha sido documentado de outro modo.
Acontece também que formações independentes sejam realizações posterio­
res de tendências gerais e comuns, ainda que haja diferenças na forma ou no proces­
so lingüístico. Por exemplo, o artigo definido, criado no latim vulgar e comum a
todas as línguas românicas, teve suas funções fixadas em época bastante posterior;
há numerosas coincidências em seu emprego na România, mas o romeno apresenta
o artigo com características próprias, como a posposição: fratele, “o irmão”, calul, “o
cavalo”, steaua, “a estrela”.
A coincidência de criações independentes entre as línguas de ramos isolados
pode ocorrer, mas é extremamente excepcional; entretanto, as criações comuns, pro­
venientes de tendências gerais intrínsecas, apresentam grande número de resultados
idênticos, formando um todo harmonioso e uniforme. E nessa perspectiva que o
romeno e o sardo se tornam pontos de referência importantes. Todas as línguas româ­
nicas têm suas particularidades, pois são línguas propriamente ditas, mas as seme­
lhanças em uma infinidade de formas dão ao grupo uma fisionomia bem parecida em
todos os níveis lingüísticos.
Nesse processo comparativo, obviamente é preciso levar em conta a anti-
güidade do fato lingüístico estudado, para se poder situá-lo, ou não, no período da
unidade inicial. Um elemento documentado no romeno, no sardo e nas outras línguas
românicas em sua fase mais antiga tem toda possibilidade de se ter originado do latim
vulgar; caso contrário, trata-se sem dúvida de uma criação mais recente. Convém
acentuar mais uma vez a importância do romeno nesse particular, por não ter evoluí­
do, como as línguas românicas do Ocidente, sob a égide espiritual e cultural da Igreja
de Roma, cuja língua oficial era o latim, fonte constante de empréstimos c de influên­
cias diversas; isolado, o romeno conservou apenas o que herdou do latim, pelo menos
até a rclatinização na segunda metade do século XIX.
Como exemplo, a biografia de qualis mostra que seu emprego como pronome
relativo é antigo, por ser comum a todas as línguas românicas, inclusive ao romeno
e ao sardo: rom. care (< calem), vegl. kal, it. quale, log. kale (< calem), eng. quel,
friul. cual, fr. quel, prov. cal, cat. cal, cast. cual, port. qual. Perdida a correlação
comum com talis, qualis passou a concorrer com o pronome quem, tanto relativo
como interrogativo; como pronome relativo, vem precedido de artigo cm várias lín­
guas românicas, mas não em romeno. Os diversos empregos são desenvolvimentos

ORIGEM DAS LlNGUAS ROMÂNICAS


posteriores, próprios de cada língua. Assim, em romeno Cine vine? (“Quem veio?”)
pode ser expresso também por Care vine?, embora haja nesse último uns laivos de
sentido pejorativo. Do mesmo modo, qual é sentido mais como erudito em várias lín­
guas românicas, sendo substituído por que (< quem), mais uniforme e popular.
Em conclusão, com os dados colhidos nessas fontes é possível reconstituir o
latim vulgar, falado, até um ponto razoável e mais ou menos completo, ainda que o
recurso às fontes, incoerentes e incompletas, exija sempre muito critério e prudência.
Destaque-se ainda a situação privilegiada das línguas românicas, das quais se conhe­
cem o “terminus a quo” e o “terminus ad quem”, o que permite traçar com seguran­
ça a história externa e interna da evolução delas, fato que não se dá com a germanís-
tica, com a eslavística, às quais falta um conhecimento mais pormenorizado e
documentado do “terminus a quo”. Novos documentos são sempre descobertos e o
número de lacunas ainda existentes nos estudos românicos vai se reduzindo.

A FRAGMENTAÇÃO DA ROMÂN1A

Nos parágrafos anteriores, foram traçadas as grandes linhas da história do


Império Romano e da língua utilizada cotidianamente pelo povo, ainda que de modo
não uniforme, bem como as fontes que nos permitem reconstituir essa variedade lin­
guística essencialmente falada.
O vasto Império Romano, porém, sempre esteve ameaçado por causas tanto inter­
nas como externas e só com muita luta e grande esforço sua existência foi prolongada por
alguns séculos, após os primeiros indícios de decadência no século III d.C.. Importa
conhecer essas causas, pois, com a fragmentação do Império, também o latim vulgar se
fragmentou mais rapidamente, dando origem às línguas e aos dialetos românicos.

CAUSAS INTERNAS

As causas internas da fragmentação do Império são de variada natureza e os


historiadores dão maior peso a um ou a outro fator do processo. Todos, porém, tive­
ram sua importância e contribuíram para esse fim. Dentre eles, destacam-se:

D e s p o v o a m e n t o d o I m p é r io

Trata-se de um mal antigo, que já havia preocupado o imperador Augusto (27


a.C.-14 d.C.) e que se agrava no século IV com as guerras civis e as constantes inva-

38 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


sões dos bárbaros; a essas causas juntou-se uma terrível epidemia de peste, que durou
quinze anos e ceifou milhões de vidas. Em conseqüência, a população do Império
ficou reduzida mais ou menos à metade em relação ao século II, o chamado século
dos Antoninos, desde Trajano (98-117) a Cômodo (180-192). Consequentemente,
algumas regiões fronteiriças, com os Agri Decumates, despovoaram-se quase total­
mente, abrindo espaço para invasões dos bárbaros, pacíficas ou não; o recrutamento
ficou difícil e não havia braços suficientes nos campos, com os inevitáveis reflexos
na produção de alimentos e os problemas sociais decorrentes.

E m pobrecim ento e Im p o s t o s

Em meados do século 111, acentuou-se a instabilidade social, causada sobretudo


pelas guerras civis e desordens administrativas, além das invasões dos bárbaros; essa
situação impediu a produção normal da agricultura, do comércio, da indústria e da mine­
ração. Estradas mal conservadas e inseguras bloqueavam o fluxo do comércio, que por
isso se tornou regional. Os preços dispararam puxados por uma inflação violenta; nem a
decretação de “preços máximos” pelo imperador Diocleciano (301) conseguiu contê-los.
Todos esses fatores provocaram um empobrecimento geral, incompatível com os altos
impostos cobrados para a manutenção do fausto da corte imperial, com seus inúmeros
funcionários, que consumia somas fabulosas. Esse descompasso, num período de profun­
da recessão econômica, provocou o descontentamento e uma corrupção generalizada.

D ec a d ên c ia M il it a r

O exército romano, mantido sempre sob uma disciplina muito rígida, era o
braço direito e o ponto de apoio dos imperadores. Por causa da crescente instabilida­
de política, social e econômica, os imperadores apoiaram-se sempre mais em suas
legiões, dando privilégios aos oficiais e depois aos soldados. Com Septimio Severo
(193-211), esses privilégios se tornaram tão exagerados que levaram à chamada “anar­
quia militar”. Desde que Alexandre Severo (231-235), filho de Septimio, foi assassi­
nado, o senado reconheceu como imperadores vinte e seis generais, sem contar os que
usurparam indevidamente o título. Todos tiveram morte violenta entre guerras civis
incessantes. O período dessa anarquia militar durou 50 anos (235-285), até que o
imperador Diocleciano (284-305) conseguiu restabelecer a ordem e reorganizou o
Império, implantando um sistema descentralizado, que esvaziou as pressões militares.
Apesar das reformas de Diocleciano e da subseqiiente de Constantino, o
Grande (307-337), não havia meios suficientes para a defesa do Império; os efeti-

o r ig em das línguas ro m â n ic a s ! 139


vos diminuíram bastante. Conhecido é o caso do general Juliano, que venceu a bata­
lha de Estrasburgo (Argentoratum), em 357, com apenas 13.000 soldados, contra os
alamanos. O despovoamento geral do Império forçou os imperadores a buscar refor­
ços entre os povos bárbaros. Ocasiões houve em que se engajava uma tribo inteira
que vivesse nas proximidades das fronteiras, com a finalidade de defendê-las
mediante pagamento. Prisioneiros de guerra bárbaros recebiam terras para cultivar
com a condição de responder prontamente a qualquer convocação militar. Nessas
condições, encontram-se colônias de bárbaros em todo o Império; na Gália, havia
tais colônias de francos, teutões, batavos e sármatas. Eram bons soldados, mas exi­
gentes, indisciplinados e freqüentemente traidores. Desse modo, o Império conse­
guia, incluindo os meios tradicionais de recrutamento, chegar perto dos 450.000
homens indispensáveis à sua defesa, embora em condições precárias, pelas razões
apontadas. Essa “invasão pacífica” de germanos e eslavos, mais ampla do que
comumente se supõe, vai constituir a primeira camada do superstrato, fator impor­
tante na diferenciação do latim vulgar.

CAUSAS EXTERNAS: AS INVASÕES

Externamente, o Império Romano sempre esteve em luta contra os povos ditos


“bárbaros”, partas, persas, eslavos e germanos principalmente. O termo barbarus foi
emprestado do grego βάρβαρος, termo onomatopaico, designativo de qualquer pes­
soa não grega e, posteriormente, não romana ou não latina; no cristianismo primiti­
vo, designava os gentiles ou pagani, isto é, os não cristãos; o termo não tinha cono­
tação pejorativa no grego ou no latim.
Enquanto Roma dispôs de forças militares suficientes, esses bárbaros foram
mantidos fora dos limites do Império. A referida “invasão pacífica” ocorreu antes do
início das grandes invasões (375-568), sobretudo de germanos, o que explica antigos
empréstimos léxicos ao latim vulgar. Além de sua presença no exército e nas colônias,
eram encontrados por toda parte; já no século IV, empregados domésticos, pedreiros,
aguadeiros e carregadores eram godos em sua maioria. O historiador Amianus
Marcelinus (330-395) conta que os visigodos, derrotados pelos hunos em 375,
“humildemente pediam que fossem admitidos no território romano”; e Eunapius (345-
420) mostra-os “em pé, à margem, estendendo as mãos, chorando, gritando em meio
a todo tipo de súplicas, pedindo que lhes fosse permitida a passagem do rio Danúbio”.
Essas invasões pacíficas foram mais freqüentes e intensas no Império do Oriente.
Com o enfraquecimento do Império, porém, a situação mudou; em fins do
século IV, começam as grandes invasões, que durarão quase dois séculos. Dada a
importância desses povos para as línguas românicas, vários dos quais vieram a for-

140 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


necer os elementos do superstrato às línguas e dialetos emergentes, convém conhe­
cer o essencial de sua história.
O movimento invasor foi desencadeado pelos hunos; povo de pastores de ori­
gem desconhecida, expulso da China depois do segundo império huno do Turquistâo
(36-35 a.C.), os hunos fixaram-se ao sul das estepes russas; em 375, destruíram o
império ostrogodo, ao norte do Mar Negro. Sob o comando de Atila (441-453), ata­
caram Constantinopla, de cujo imperador conseguiram igualdade de direitos e dirigi-
ram-se para o Ocidente; ao invadirem o norte da Gália, foram derrotados na batalha
dos Campos Catalâunicos (451); no ano seguinte (452), fizeram uma rápida incursão
na Itália e se retiraram para suas terras na planície de Tisza, no centro da Europa. Sob
o rei Ardarico, os germanos gépidas destruíram o reino dos hunos; os remanescentes
voltaram para a Ásia. Os hunos não deixaram qualquer vestígio que viesse a afetar as
línguas românicas.
Se os hunos não se fixaram no território da România, o mesmo não aconteceu
com os outros povos que vieram em seguida. Os principais povos são referidos a seguir.

O s VÂNDALOS

Os vândalos eram parte dos povos germânicos orientais. As primeiras informa­


ções situam-nos no leste central europeu, ao sul da Escandinávia. Foram chamados
Vandilii por Plínio. No século II d.C., estavam divididos em dois ramos: Ásdingos e
Sílingos. Pressionados pelos godos, migraram para o sul, às margens do Danúbio, ata­
cando freqüentemente o Império Romano nos séculos III e IV. Sob pressão dos hunos,
os vândalos se aliam aos Quadas, Suevos e Alanos e atravessam o rio Reno (31-12-406);
durante três anos devastaram a Gália e em 409 invadiram a Península Ibérica. Como alia­
dos, os suevos e os ásdingos se fixaram na região da Galíza, os alanos na Lusitânia e os
vândalos e os sílingos na Bética, ao sul. Posteriormente, os sílingos foram dizimados
pelos visigodos; os alanos, fugindo à perseguição dos visigodos, juntaram-se aos ásdin­
gos e remanescentes dos sílingos e se fixaram no sul da Península, na região da atual
Andaluzia (< Vancktlusia, “terra dos vândalos”), em 429. Sob Genserico (428-477), con­
quistaram o norte da África e fundaram o primeiro reino bárbaro dentro da România
(428-543); dominam o Mediterrâneo com sua frota, conquistando a Sicilia, o sul da
Itália, a Sardenha, a Córsega e, por fim, Roma (455). Mas em 534-535, Belisário, gene­
ral do imperador Justiniano, do Oriente, conseguiu destruir o reino dos vândalos; a reo-
cupação do território, porém, foi lenta por causa da resistência da população.
Lingüisticamente, os vândalos estavam ligados ao gótico, língua dos povos
germânicos orientais, da mesma forma que os godos. A passagem dos vândalos pela
Península Ibérica foi relativamente rápida, de modo que é difícil determinar possíveis

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS j 141


influências de superstrato. Os hábitos de pilhagem dos vândalos conferiram à sua
passagem pelos territórios da România um caráter muito mais negativo, como obser­
vou o biógrafo de Santo Agostinho, Possídio, que os qualifica de “Romaniae everso­
res” (“destruidores da România”). Foram eles os responsáveis, em grande parte, pela
erradicação da florescente civilização românica do norte da África, antes uma região
profundamente romanizada. Quanto aos suevos, pertenciam lingüisticamente ao ger­
mânico ocidental e seu reino ocupou a região ao norte do rio Tejo até a Galiza nos
séculos IV e V, tendo sido subjugado pelos visigodos na segunda metade desse últi­
mo século. Essa superposição torna difícil distinguir as influências do superstrato,
mas atribui-se ao suevo o port. “britar” < suevo *briutan, “quebrar”, “despedaçar”
(ver mapas 4 e 5, pp. 357 e 359).

Os G odos

Originários do sul da Escandinávia, no século II d.C., os godos estabeleceram-


se às margens do mar Báltico, junto à foz do rio Vistula. Por volta de 150 d.C., des-
locaram-se para o leste europeu, dividindo-se em dois grandes grupos: visigodos ou
godos do oeste e ostrogodos ou godos do leste; os gépidas e os hérulos eram também
godos. Tendo os hunos lhes destruído o reino na região do mar Báltico, os ostrogo­
dos migraram e se fixaram na Panômia e colaboraram com o Império do Oriente.
Exigentes e indisciplinados, aos poucos se apoderam da situação. Seu rei Teodorico
(493-526), nomeado comandante das milícias e patrício, invade a Itália e vence
Odoacro, que havia sido proclamado rei pelos mercenários germânicos em 476, data
que marca o fim do Império Romano do Ocidente. Fundou então o reino dos ostro­
godos, cujo território abrangia a Itália, a Sicilia, a Dalmácia e Panônia (493-553).
Depois de uma longa guerra (535-553), o imperador Justiniano, do Oriente, recon­
quistou a Itália; a maioria dos ostrogodos sobreviventes aceitou a proposta de Narses,
o general de Justiniano, de permanecer na Itália, como súditos e soldados do Império
Romano do Oriente; cerca de um milhar preferiu o exílio. Com isso os ostrogodos
desapareceram como nação, sem deixar influência lingüística considerável.
Os visigodos, empurrados pelos hunos, recebem autorização do imperador
Valêncio, em 376, para se instalar na Mésia e na Trácia. Depois de dois anos de atritos,
rebelam-se contra o imperador e vencem a grande batalha de Adrianópolis, e o impe­
rador Teodósio lhes cede os territórios ocupados, na qualidade de confederados (378).
Sob Alarico (410), que se arrogou o título de rei, os visigodos fizeram uma excursão
de pilhagem pelos Bálcãs (395-401); atacaram depois a Itália, mas foram derrotados
duas vezes por Estilicão (402 e 403). Depois da tomada de Roma, em 410, Alarico vai
para o sul da Itália, onde morreu. Voltam os visigodos para o norte e o rei Wallia fun-

142 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


da o reino de Tolosa no sul da França (410-507), estendido depois até a Espanha pelo
rei Eurico. Clóvis, rei dos francos, venceu o rei visigodo Eurico II em 507, obrigando
os visigodos a se retirarem para a Península Ibérica, que foi toda ocupada após a vitó­
ria sobre os suevos a noroeste; não lhes pertenciam uma faixa bizantina ao sul e outra
ao norte, menor, dos bascos. O fim de seu reino aconteceu com a invasão dos árabes,
que derrotaram o rei Roderico em 711. Politicamente, os visigodos formaram uma
casta militar e outra de proprietários rurais. Em 589, o rei Recaredo abraçou o catoli­
cismo, abjurando o arianismo, e com isso caiu a proibição dos casamentos com a popu­
lação românica; as relações entre godos e romanos foram regularizadas por um código
jurídico, base dos Fueros peninsulares dos séculos Xll e XIII. Quanto à língua, o latim
sempre foi a escrita tanto da Igreja como do Estado. Em contato com a dos invasores,
o romance peninsular se enriqueceu com numerosos empréstimos léxicos e até com
alguns morfológicos, como os sufixos -arde, -ardo, -engo de covarde, galhardo, sola-
rengo, mulherengo etc. (ver mapas 5 e 6, pp. 359 e 360).

A B ritânia

A Britânia foi abandonada por volta de 410 por Constantino Ille ocupada pelos
pictos da Caledonia e pelos escotos da Irlanda. Pelo ano 450, desembarcaram na ilha
os anglos, os saxões e os jutos, vindos do continente e empurraram os antigos habi­
tantes para o leste, o país de Gales e uma parte foi para a Península da Armória, sobre­
tudo bretões, donde o nome posterior Bretanha. No contexto da luta dos bretões com
os invasores surge a lenda do rei Artur. Fundaram-se sete Estados independentes, só
unificados por Ecbert de Wessex, que fora educado na corte de Carlos Magno, entre
802 e 839. A romanização pouco profunda da Britannia não conseguiu fazer nascer na
ilha uma língua românica; contudo, deixou ao inglês uma grande herança léxica,
reforçada posteriormente por numerosos empréstimos sobretudo do francês.

Os Francos

Em meados do século III (258), o povo dos francos estava estabelecido à direi­
ta do rio Reno, entre os saxões ao norte e os burgúndios e alamanos ao sul. Sem aban­
donar seus territórios, os francos aos poucos avançam pelo norte e nordeste da Gália,
chegando ao rio Soma no século V Os reis de diversas tribos francas (ripuários, sálios)
fundam pequenos reinos que foram reduzidos à unidade pela força por Clóvis (482-
511); esse rei conquistou em seguida todos os territórios ainda em poder de Roma
entre os rios Soma e Loire, ao vencer Syagrius em 486. Obtém sucessivas vitórias con-

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂN1CAS I 143


tra os alamanos (496), os burgúndios (500), os visigodos (507); os sucessores de
Clóvis conquistam definitivamente o reino dos burgúndios, estendendo o reino fran­
co até o Mediterrâneo, além da incorporação da Turíngia e da Baviera. Ao contrário
do que ocorreu na Ibéria, os reis francos souberam criar um Estado comum para a
população românica e franca. A grande influência dos francos na língua mostra que a
colonização germânica foi intensa: os topônimos e a terminologia rural conservados
só poderíam se fixar caso fossem usados de modo permanente por quem lidasse com
a terra e não por uma camada superficial de senhores feudais. Além da ausência de
traços duma romanização anterior, como ocorreu com os visigodos por exemplo, os
francos ocuparam a Gália de modo desigual; com as migrações do século V, em mea­
dos do século VI distinguem-se três regiões na Gália, nas quais se encontram três lín­
guas românicas: ao norte, a população românica era numericamente maior que a dos
germanos; a região em torno de Genebra, Lion e Grenoble tinha considerável popula­
ção românica, mas menos francos e borguinhões. O resultado, nessas duas regiões, foi
uma lenta mas segura assimilação dos dois povos, cujos reflexos lingüísticos estão nas
características do francês e do franco-provençal. Em face desse norte germanizado, o
sul conservou seu caráter mais românico, uma vez que a difusa camada superior dos
visigodos já se havia romanizado e a presença dos francos se reduziu a poucos funcio­
nários reais e alguns nobres, tornados grandes proprietários rurais. Assim se explica a
existência de línguas românicas diferentes dentro de um mesmo país, línguas que
Dante Alighieri identificou através da maneira de dizer “sim”, langue d ’dil (< hoc
illud) e langue d ’oc (< hoc [est], “é isso”) (ver mapa 6, p. 360).

Os Lombardos

Os lombardos vieram da Escandinávia e se estabeleceram no vale do rio Elba


inferior (400-500); em seguida, passam pela Morávia e fundam um primeiro reino na
Panônia. Depois de aniquilar o reino dos gépidas, aliam-se aos ávaros e invadem a
Itália, onde fundam um segundo reino em 568. Conquistam a cidade de Pavia e se
estabelecem sobretudo na planície do rio Pó, mas incorporam também a Toscana,
Úmbria, Espoleto e o Benevento, além dos ducados de Trento e Friul; em 560, a con­
quista estava completa. Ficaram em poder dos bizantinos o exercado de Ravena, a
Istria, o ducado de Roma e o de Nápolis, o sul italiano e a Sicilia. Posteriormente,
conseguem os lombardos anexar mais alguns desses territórios, mas o reino lombar-
do termina em 774, quando é conquistado por Carlos Magno, que se declara “o rei
dos francos e dos lombardos”. Anteriormente, nas contínuas lutas entre romanos e
lombardos, a ajuda dos francos do rei Pepino, o fundador da dinastia carolíngea, deu
aos romanos algumas vitórias, das quais resultou a constituição dos chamados

144 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


“Estados Pontifícios” pela doação ao papa Estêvão II de Ravena, Romanha e Marcas,
que os lombardos haviam recentemente conquistado aos bizantinos. Carlos Magno
confirmou a doação desses territórios ao papa, criando uma situação de descontinui-
dade territorial da Itália que, com extensão variável no correr dos séculos, vai perdu­
rar até 1870. Ao conquistarem a Itália, os lombardos agiram inicialmente com cruel­
dade, saqueando as cidades, matando os proprietários rurais antes de se apoderarem
de suas terras, conforme relato de Paulo Diácono. Agiram de modo diferente dos
godos e dos francos; eliminaram a elite romana, aniquilaram o direito romano e se
sobrepuseram à população românica pela força. Entretanto, não havia proibição de
casamentos mistos e a lenta conversão dos lombardos ao catolicismo, melhorou um
pouco o relacionamento entre os dois povos, sem chegar a ser bom, tanto que a popu­
lação nativa sempre buscou o apoio dos francos. Com a coroação de Carlos Magno
como imperador em 800, termina definitivamente a dominação lombarda na Itália,
além de ser o marco da ruptura final entre Ocidente e Oriente e de confirmar Roma
como centro espiritual da Europa, sede do cristianismo.
Lingüisticamente, a fixação dos lombardos no norte da Itália fez com que a
região, já distinta das outras quanto ao substrato (celta), se integrasse nas tendências
rético-gálicas. Os elementos lombardos no léxico italiano são mais numerosos que os
ostrogodos; ao todo são cerca de 300 palavras, correntes nas regiões de colonização
lombarda mais intensa, mas que se difundiram também em outros territórios; parte
delas foi incorporada à língua literária. Exemplos são o lomb. *wizzu (“castigo”)
encontrado nos topônimos La Guizza (Pádua) e Valle di Vizze (Alto Adige); bastante
difundido é o it. stamberga, do lomb. stainberga, originariamente “casa de pedra”;
lomb. ruspi > vên. ruspio, rnilan. ruspan, “primitivo”, “não trabalhado”.

Os A lam an o s

Os alamanos, povo germânico vindo da parte superior do rio Meno, passaram


o Reno até o lago de Constança, ocupando a Alsácia e o norte da Suíça (455-480). Os
alamanos entraram como uma cunha e cortaram duas importantes vias transversais,
com graves conseqüências para as comunicações dentro do Império Romano, nas
regiões do rio Reno e dos rios Necar, afluente direito do Reno, e Danúbio. Interditando
essas duas rotas, impediram o comércio, o deslocamento de tropas e a interação lin-
güística; considerando-se que a leste, na atual Baviera, os romanos permaneceram
ainda por mais dois séculos e meio, percebe-se o peso dessa cunha dos alamanos, que
interrompeu as comunicações entre a Gália e as regiões alpinas, sobretudo a Récia, na
qual se acentuou a diferenciação de suas variedades dialetais. Essa influência, através
de lentos mas contínuos avanços em direção ao sul, se prolongou até o século XIII.

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS j 145


Os E slavo s

Os Eslavos (slovo, “palavra”) constituem um dos principais ramos indo-euro-


peus. Partiram, sem dúvida, da região pantanosa do rio Pripet, afluente do Dnépcr, e
do rio Bug, modemamente território da Rússia Branca c da Ucrânia. Nos primeiros
séculos, a história dos eslavos está ligada à dos germanos, sobretudo godos, dos
hunos, dos alanos e de populações turcas, com as quais conviviam numa espécie de
simbiose. As primeiras referências aos eslavos se encontram cm Plínio (Gaius Plinius
Secundus, 23/24-79 d.C.), o Velho, Tácito (Cornelius Tacitus, séculos l-II d.C.), c
Ptolemeu (Claudius Ptolemaeus, século II d.C.), que os chamam Venedi ou Veneti
(Wendes em alemão). No século VI, os escritores Procópio, historiador grego, que
acompanhou o general bizantino Belisário nas guerras na Pérsia, África c Itália, e
Jordanes, historiador godo, falam dos esclavenos estabelecidos no Danúbio inferior
e depois nos Alpes orientais. No início do século VII, vários povos eslavos ocupam
os territórios abandonados pelos germanos a leste do rio Elba.
Dividem-se em três ramos: os orientais agrupavam os russos, os ucranianos,
os grandes russos e os russos brancos; os ocidentais compreendiam os poloneses,
obodritas, pomeranos, sorbos, tchecos e eslovacos; e, os meridionais, os eslovenos,
sérvios, croatas e búlgaros. À Filologia Românica interessam sobretudo os eslavos
meridionais e ocidentais, já que se instalaram nas províncias romanas dos Bálcãs, na
Dalmácia e no Noricum; nesses territórios, substituíram o romance românico por
suas línguas eslavas, transformando o balcano-romance em substrato. Apenas o dal-
mático conseguiu sobreviver por alguns séculos, sobretudo a variante de Ragusa e o
veglioto, desaparecido no final do século XIX, como último reduto dessa língua
românica, empurrada pelo eslavo para o mar durante séculos. A única língua româ­
nica que conseguiu superar todas as influências e manter-se como tal foi o romeno,
como é sabido.
Friedrich Diez, cm sua classificação das línguas românicas, dá ao romeno o
nome de “valaco”; esse termo, e seu derivado “Valáquia”, tem uma biografia curio­
sa. No Glossário de Kassel, “romani” é traduzido por uualha. Originariamente, o
termo germânico Walhos designava apenas uma tribo céltica, que é chamada Volcae
por Júlio César (Bel.Gal., 6,24,1 c 7,7,4); os Volcae eram originários de uma região
ao norte do rio Meno; por volta do ano 300 a.C., migraram mais para o sul, tornan-
do-se vizinhos dos povos germânicos, que estenderam o nome Volcae para todos os
celtas e depois para todos os não germânicos, ou seja, para todos os estrangeiros.
Assim, no nórdico, valir é o nome dado aos remanescentes das populações celtas da
Britânia e da Gália Ocidental e a outros estrangeiros, inclusive os romanos. No anti­
go alto alemão, Walha designava exclusivamcnte os românicos da França c da Itália,
e Walho-lant, especificamente a Itália, e daí o adjetivo gentílico walhisc, walhisch no

146 ELEMENTOS DE FILOLOGIA.ROMÂNICA


médio alto alemão, welsch no alemão moderno. No neerlandês, waals designa os
vizinhos de língua francesa, os valões da Bélgica. Do germânico, o termo Walha pas­
sou para o eslavo na forma *vlab\ no eslavo eclesiástico vlab é “Vlachus, generatim
homo Romanae originis” (“valaco, homem de origem romana em geral”); depois o
termo se especializa e denomina especificamente os romanos mais próximos dos
eslavos, os romenos. O território desses “valacos”, a Valáquia, é um dos dois grandes
principados de cuja união resultou a Romênia moderna, oficialmente denominada
Jarã Romaneascã. Em outras línguas o termo também é encontrado com acepções
semelhantes; assim no russo, voloh é “valaco”, mas na literatura antiga significava
“italiano”; no polonês, wloch é “italiano”; no húngaro, oláh significa “romeno” e do
plural, vlasi, tiraram olasz, “italiano” e Olaszország, “Itália”. Levado por pastores
romenos, o eslavo vlah assumiu várias acepções em diversas regiões da Europa
Oriental.
As línguas eslavas tiveram importância de peso para o romeno, justamente por
ter essa língua românica ficado isolada do mundo cultural latino e por se ter desen­
volvido no âmbito de superstratos e adstratos eslavos, bizantinos, turcos e húngaros.
Essas influências são percebidas na fonética, sobretudo do /a/ e /I/, como em bãtrin
(< veteranu), “velho” e intii (< antaneus), “primeiro”; na morfologia, pelo emprésti­
mo de vários sufixos (-ac, -nic, -içre, -aci etc.); a sintaxe é essencialmente a români­
ca, com pouca influência eslava. Mas é no léxico que se encontra a maior contribui­
ção eslava, com substituição de palavras usuais, como drag, “querido”, bogat, “rico”,
trup, “corpo”, slab, “franco”, sarac, “pobre”, boalã, “doença”, iubi, “amar”, hrãni,
“alimentar”, izvor, “fonte” etc. Numerosos são também os empréstimos léxicos hún­
garos, principalmente na Transilvânia; nas regiões próximas à Turquia, encontram-se
numerosos empréstimos turcos, como odaie, “quarto”, “casa”, cioban, “pastor”,
musafir, “hóspede” etc. menos frequentes na Transilvânia. Outras fontes de emprés­
timos são o albanês e o neogrego.

Os Á rabes

Obviamente, as invasões árabes não atingiram mais o Império Romano do


Ocidente, desaparecido politicamente havia cerca de meio século. Não foram, por­
tanto, uma causa de sua ruína. Mas, levando-se em conta a contribuição árabe para a
formação das línguas românicas, é indispensável resumir os fatos que colocaram os
árabes em contato com a população românica e tiveram influência decisiva na distri­
buição territorial das línguas românicas, sobretudo na Península Ibérica, onde o
domínio e a própria existência das línguas e dos dialetos não seriam de modo algum
os mesmos que os de hoje.

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS j 147


A Península Arábica é o ponto de partida, de irradiação dos povos semitas. Os
primeiros indícios dos árabes datam do terceiro milênio a.C., mas sabe-se ao certo
que sucessivas ondas de tribos nômades migraram para a Síria na segunda metade do
segundo milênio. Na Bíblia há muitas referências ao povo árabe, embora o nome
“Arábia” não seja anterior ao século IX, dado pelos gregos. Referências mais claras
estão nos anais dos reis da Síria, sobretudo de Salmanassar (858-823 a.C.) e
Assurbanipal (668-626 a.C.), que relatam expedições contra os aríbi ou arabu, dos
quais exigem homenagens e tributos. Os árabes foram dominados por
Nabucodonosor (Jeremias 49, 28), por Dario e Alexandre Magno. Estrabón conta a
expedição do general romano Elius Gallus pela Arábia Deserta até a Arábia Félix em
25-24 a.C., e sob Trajano a região se tornou província romana em 105 d.C.. Heródoto
dá muitas informações sobre os árabes, seus usos e costumes, religião com seus
diversos deuses, a produção de incenso, ouro, pedras preciosas e gado; eram comer­
ciantes, distribuindo seus produtos com caravanas de camelos.
A causa que revolucionou o mundo árabe e o fez irromper na România foi
sobretudo religiosa. Um comerciante da capital Meca, Maomé (ar. Mohamet - 570-
632), sob influência do judaísmo e do cristianismo, sentiu-se chamado a pregar nova
forma de religião monoteísta; foi por isso perseguido e teve que fugir para outra cida­
de no dia 15 de junho de 622, data conhecida como hégira (“fuga”, “exílio”) e início
do islamismo. Em Medina-Yathrib (“cidade do profeta”) conseguiu adeptos e em
janeiro de 630 voltou a Meca; purifica a cidade e a Caaba, antigo santuário dos ára­
bes, e elimina todos os ídolos, implantando o monoteísmo. Logo após a morte do
profeta, inicia-se a guerra santa de tantas conseqüências para o mundo ocidental.
No período dos “califas (‘sucessores’) eleitos” (632-661), Abou Bekr submete
as tribos revoltadas da própria Arábia e inicia o movimento de conquista. O califa
Ornar, o “comandante dos crentes” (634-644), conquista a Palestina, a Síria e o Egito
e os bizantinos abandonam Alexandria em 642. O califa transforma o Estado árabe
numa teocracia universal e impõe uma administração militar: o comandante das tro­
pas de ocupação é, ao mesmo tempo, governador civil, chefe religioso e juiz supremo.
O califa Othman, dos Omeiadas, (644-656) conquistou a Líbia, tomando a capital
Barka (645). Superadas sérias dificuldades e lutas internas, inclusive com a viúva de
Maomé, Aícha, a dinastia dos Omeiadas (661-750) afasta os concorrentes, transfere a
capital para Damas, na Síria, e reorganiza a administração, os impostos e continua a
guerra santa; no leste incorporam as cidades de Kabul, Bukara e Samaranda, a sudes­
te do mar Arai. Sitiam por duas vezes Constantinopla (674-678 e 717-718) sem êxito.
No Ocidente, Abd El Malik anexa a África do Norte com a tomada de Cartago (698),
e em 711 Tarik foi ao Estreito de Gibraltar (< Dejbel al Tarík) e vence o rei visigodo
Roderico, conquista Córdoba e Toledo (712); avança contra a França, passa por Tolosa
(721), mas é vencido por Charles Martel, rei dos francos, na batalha de Poitiers (732);

148 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


os árabes recuaram para a Península Ibérica, onde se estabeleceram. O que restou do
exército cristão se refugiou nos Montes Cantábricos ao norte, sob o comando de
Pelágio, de onde logo começou o movimento da reconquista, que se estendeu por
quase oito séculos. Em território francês, os árabes ocuparam a Septimânia, atual
Laguedoc, por pouco tempo. O rei Pepino, filho de Carlos Martel, os expulsou; Carlos
Magno incorpora a chamada “Marca da Espanha”, uma faixa de território que come­
ça um pouco a oeste de Pamplona até o Mediterrâneo, em 778; em 803 venceu os ára­
bes em Barcelona, tendo antes anexado as Baleares (799) (ver mapa 8, p. 363).
Entre árabes e conquistadores houve certa tolerância nos dois primeiros sécu­
los; a dominação árabe, porém, foi diferente da dos povos germânicos e eslavos. Os
motivos são de natureza étnica, cultural e lingüística. Os germanos eram indo-euro-
peus, enquanto os árabes eram semitas, donde também a considerável diversidade
linguística. Culturalmente, os germanos tinham uma convivência secular com a
romanidade, com exceção de alguns, como os francos, enquanto a cultura árabe era
totalmente diferente; entretanto, a religião foi certamente um fato decisivo e funda­
mental de distanciação entre árabes e população românica: enquanto essa era cristã,
ainda que ariana, aqueles viviam o fanatismo de uma nova religião que os impelia
para a guerra santa e no paraíso prometia aos guerreiros um harém de huris. Esses
fatores levaram os dois povos a viverem, de modo geral, segregados, caso único de
adstrato superposto.
Sob a dominação árabe, a população românica se dividiu em dois grupos: os
moçárabes, que permaneceram cristãos, e os muladíes, que abraçaram o islamismo;
todos, porém, continuaram a falar o seu romance. Esse fato é confirmado pelos estu­
dos das muaxas, composições poéticas em caracteres árabes ou hebraicos, que termi­
nam com versos em aljamia, romance ibérico, grafado com caracteres árabes; tais
versos são chamados xárias e carjcis. As muaxas eram em árabe clássico; se escritas
em árabe dialetal, denominavam-se zéjel. Trata-se de uma criação árabe, imitada
pelos cristãos e judeus; esses últimos tinham grande liberdade sobretudo no sul, na
região da antiga Bética, onde prosperaram.
Entretanto, os árabes nunca chegaram a dominar totalmente a região norte, dos
Montes Cantábricos. Os remanescentes cristãos fundaram nesse território pequenos
reinos: o de Navarra, dividido pelo rei Sancho III (1000-1035) em Aragão, Castela e
Navarra em 1029; o Condado de Barcelona, proveniente da Marca da Espanha, ao sul
dos Pireneus, estabelecido por Carlos Magno; e o reino das Astúrias ou de León, ao
noroeste da Península. Desses reinos, por volta do ano 1000, partem os movimentos
de reconquista. Os primeiros ataques começam depois da grande guerra civil árabe no
Emirado de Córdoba, que pôs fim à dinastia dos Omeiadas (1008-1028).
Refeitos da derrota que lhes infligiu, em 978, o vizir Almanzor, os reinos cris­
tãos iniciam a reconquista efetiva. Em 1037, unem-se os reinos das Astúrias (ou

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS I 149


León) e Castela. Afonso I, rei de Aragão (1104-1134), conquista a cidade e a região
de Saragoça em 1118; em 1137 unem-se o reino de Aragão e o Condado de Barcelo­
na e o rei Jaime I (1213-1276) conquista a cidade de Valência e as ilhas Baleares
(1235). Pedro III, de Aragão, ataca a Itália: conquista a Sicilia em 1282; em 1326, os
aragoneses incorporam a Sardenha e, em 1458, o reino de Nápolis. Por outro lado, os
castelhanos tomam Toledo à dinastia árabe dos Almorávidas, em 1085, com a presen­
ça de Rodrigo Díaz de Vivar, El Cid (“senhor” em árabe), que inspirou a grande epo­
péia castelhana. Em 1212, os castelhanos vencem os árabes em Las Navas de Tolosa,
pondo fim ao reino árabe dos Almohadas (1145-1212). O rei Fernando 111, o santo,
(1217-1252) conquista Córdoba; em 1340, na batalha de Salado, os árabes são ven­
cidos e os castelhanos reconquistam Gibraltar ao sultão de Marrocos. Restava apenas
o reino árabe de Granada, o último em território europeu, que atingiu no século XIV
grande esplendor cultural sob a dinastia dos Nasridas, tendo Alhambra como um de
seus marcos mais expressivos. Em 1479, Castela e León foram unificados pela paz
de Alcacovas e, em 1492, tomaram Granada e atacaram a África, concluindo defini­
tivamente a reconquista (ver mapa 8, p. 363).
No contexto da reconquista, situa-se a origem de Portugal. Os árabes não foram
além dos Montes Cantábricos, ao norte dos quais se constituiu o pequeno reino das
Astúrias, em 718, até transformar-se no reino de León em 910, de cujo território fazia
parte a região que seria o berço de Portugal. O rio Douro foi a fronteira natural entre ára­
bes e cristãos, constituindo uma faixa de terras bem pouco povoadas, devastadas pelo rei
Afonso I das Astúrias no século VIII. No final do século IX, a região começou a ser repo­
voada por galegos, asturianos, leoneseses, moçárabes vindos do sul, tornando-a etnica-
mente diferente da Galiza, ao norte do rio Minho. As vitórias dos cristãos empurraram
os árabes para o sul e tornaram mais densa a população entre os rios Minho e Douro.
Afonso III (866-910) restaurou Braga, Porto, Lamego, Viseu e Coimbra. A restauração
de Portucale, cidade à margem direita do Douro, na estrada Braga-Lisboa, e seu repo-
voamento se deu em 868 sob o comando de Vímara Peres. No final do século X, admi­
te-se a existência de um condado em território aproximadamente idêntico ao portucalen-
se, cujos titulares agiam com muita liberdade, dada a grande distância em relação à sede
leonesa. Nesse processo de repovoamento, os mosteiros e a Igreja tiveram papel relevan­
te como centros de aglutinação, de cultura e de vivência, o que explica a influência ecle­
siástica na formação do português, certamente maior do que em qualquer outra língua
românica; assim, o português é a única língua românica em que se conseguiu abolir o
nome dos deuses pagãos na designação dos dias da semana.
No final do século XI e no início do seguinte, a região entra na esfera de influên­
cia da Abadia de Cluny, sob o patrocínio de Afonso VI, que mantinha estreitas relações
com o ducado francês da Borgonha. Sob a influência de Cluny, que chegou a ter cerca
de dois mil mosteiros sob sua orientação, o ritual hispânico foi substituído pela liturgia

150 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


/

romana, difundida por Cluny, e a escrita maiúscula gótica foi abandonada em favor da
minúscula de tipo francês; de lá veio a representação gráfica das palatais /lh/ e /nh/. Por
outro lado, Afonso VI destacou do reino de León o Condado Portucalense - que se
estendia de fato do Minho ao Mondego e, de direito, até ao rio Tejo - e o dá como feudo
ao conde Henrique de Borgonha, em reconhecimento por serviços prestados. Deu-lhe
também Dna. Teresa, sua filha natural, como esposa. Admite-se que Dna. Teresa não se
conformou em ser apenas condessa, enquanto sua meia-irmã, Urraca, era rainha. Por
isso, estimula a já forte disposição do marido de intervir na guerra civil existente entre
Castela, León e Galiza. Ao mesmo tempo, combate os árabes e firma cada vez mais seus
próprios domínios, até falecer em 1112 ou 1114. Dna. Teresa assume o Condado
Portucalense e passa a chamar-se Regina Tarasia de Portugal. Apóia ora um ora outro
dos contendores, procurando tirar vantagens. Em 1126, com a morte da rainha Urraca,
ocupa o trono de Aragão Afonso Vil, que força Dna. Teresa a lhe prestar vassalagem,
mas o filho D. Afonso Henriques se rebela e vence a batalha de São Mamede, perto de
Guimarães, em 24 de junho de 1128. Foi o primeiro passo para a independência total.
Depois da batalha de Ourique (1139), Afonso se proclama rei de Portugal, reconhecido
como tal por Afonso VII em 1143. Prossegue na conquista dos territórios árabes ao sul;
em 1147 conquista Lisboa, ajudado por cruzados alemães, franceses, ingleses e flamen­
gos; em 1159 e de novo em 1165 toma Évora; Beja, Cáceres, Serpa e Juromenha são
conquistadas em 1166. A confirmação do reino de Portugal pela Igreja só veio em 1179,
quando o papa Alexandre III concedeu a Afonso Henriques o título de rei. Somente sob
Afonso III (1246-1277), Portugal incorpora o extremo sul, Al-gharb (“terra do
Ocidente”), embora de limites indefinidos na época, indo além do rio Guadiana em ter­
ritório andaluz (ver mapa 8, p. 363).
Além da Península Ibérica, os árabes estabeleceram-se na Sicilia (827) e na
Córsega (850). Na Sicilia, o domínio árabe se estendeu até a chegada e a conquista
da ilha pelos normandos, que tomaram Messina em 1061 e Palermo em 1072.
Contudo, os normandos respeitaram a cultura implantada durante os dois e meio
séculos de dominação árabe; esse período foi suficiente para deixar traços na topo-
nímia e introdução de numerosos empréstimos léxicos e alguns nomes de família,
além de muito raros traços fonéticos. Também na Sicilia, o árabe permaneceu um
adstrato superposto, não tendo conseguido sobreviver como língua. Apenas na ilha
de Malta, o dialeto românico em formação foi substituído por outro magrevino,
muito modificado posteriormente por grande influência italiana, que foi sempre a
língua literária da ilha.
Concluindo, o conjunto dessas causas acabaram destruindo politicamente o
Império Romano do Ocidente, cujo fim sobreveio em 476, quando Odoacro, general
germânico a serviço do Império Ocidental, depôs Rômulo Augústulo, o último impera­
dor. O Império do Oriente, constituído definitivamente em 395, sobrevive por séculos

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMANICAS | 151


até sua destruição pelos turcos em 1453. Entretanto, as bases culturais e lingüísticas do
Império Romano absorveram o impacto dos invasores em muitas regiões; em outras,
como no norte da África, mesmo em territórios profundamente romanizados, aquelas
bases foram erradicadas; em outras ainda, como na Península Balcânica e na Britannia,
os vestígios da latinização, em grau maior ou menor, continuam perceptíveis no substra­
to, depois de tantos séculos de superposição de culturas e línguas diferentes. Nesta expo­
sição sobre as grandes invasões, foi incluído um resumo do domínio árabe na Ibéria e da
longa Reconquista, dadas as repercussões lingüísticas que esses fatos tiveram nessa
região da România, embora o Império Romano do Ocidente não mais existisse.

A FORMAÇÃO DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS

Todo esse universo de fatores de várias ordens é que vai explicar a formação
das línguas românicas. Com base nesses fatores, sobretudo de natureza externa, é
possível caracterizar cada uma delas e mostrar por que, de uma variedade razoavel­
mente uniforme, como foi o latim vulgar, surgiram línguas diversas ainda que irmãs.
Nesse processo de diferenciação, é preciso lembrar que a latinização não foi
uniforme em todas as partes do Império Romano, conforme já se discriminou acima.
E as línguas românicas vão surgir e se desenvolver nas províncias em que a latiniza­
ção tinha lançado raízes mais profundas e resistentes a mudanças políticas e sociais,
bem como a intermináveis guerras e invasões. Distinguem-se várias etapas nesse pro­
cesso de evolução do latim vulgar para as línguas e dialetos românicos.

FASE DE B1L1NGÜISMO

Subjugado um povo de língua diferente e ocupado seu território, segue-se uma


fase de bilingüismo, em que dominadores e dominados continuam a usar seu próprio
idioma por período de tempo muito variável, sobretudo se não houver disposição do
dominador de impor ao dominado sua própria língua, como aconteceu com os roma­
nos. Assim, o osco, falado na Campânia, ao sul do Lácio, por samnitas, frentanos,
lucanos, brútios, mamertinos e apúlios, era usado ainda em 79 d.C., segundo se con­
clui das inscrições de Pompéia. Estrabão (64/3 a.C.-21 d.C.) afirma que farsas atela-
nas, a única manifestação literária osca conhecida, eram representadas em osco na
própria Roma, no início do primeiro século da nossa era. Por outro lado, sabe-se que,
por volta de 280 a.C., Roma já havia incorporado o território osco a seus domínios.
Somente com a denominada “Guerra Social” (91-87 a.C.), pela qual os povos confe­
derados (“socii”) obtiveram a cidadania romana, o latim conseguiu sobrepujar o

152 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
osco, ainda que de modo lento. Da mesma forma, houve bilingüismo na Gália (celta
e latim), na Ibéria (ibérico e latim), na Sicilia (árabe e dialeto siciliano) etc.

SUBSTRATO

Entretanto, não é comum a manutenção do bilingüismo. A língua de maior


prestígio cultural e político tende a se impor naturalmente sobre a outra, que passa a
perder seus falantes, que acabam por adotar o idioma de maior prestígio, até que o
uso de sua língua materna se torne restrito, geralmente, às regiões periféricas e rurais
ou venha a desaparecer. No caso de ser a língua do povo vencido que deixa de ser
usada para se utilizar da do vencedor, de maior prestígio, deixando, contudo, marcas
nessa última, fala-se de “substrato” (sub + stratum, “camada de baixo”); a denomi­
nação foi cunhada por Graziadio Isaia Ascoli e logo adotada por Albert Schleicher e
Matteo Bartoli. Define-se substrato como “as marcas linguísticas advindas do povo
que abandona seu idioma, levadas para a língua que passa a adotar”.
As marcas do substrato, com mais freqüência, estão no léxico e na fonética;
são mais raras na morfologia e muito raras ainda na sintaxe. Por exemplo, no Brasil
o substrato tupi, o mais presente se comparado com o de outros grupos indígenas
(bororo, carajá, caraíba, cariri, catuquina, xavante, tucano, xibará e jê), forneceu ao
português grande número de topônimos, designações da fauna e da flora, de utensí­
lios etc. No total, chega-se a vários milhares, pertencentes ao chamado “vocabulário
cultural”. Por outro lado, não se encontrou nenhum fato linguístico indiscutivelmen­
te de influência tupi no campo da fonética, na morfologia e na sintaxe do português
do Brasil; esse fato, sem dúvida, pode-se atribuir à grande diversidade dos dois idio­
mas e ao considerável desnível cultural dos seus falantes. Assim, não é aceitável atri­
buir à influência tupi o fenômeno da despalatalização de /-lh-/ a /-i-/, comum na fala
popular inculta em todo o Brasil, já que essa despalatalização se verifica praticamen­
te em todas as línguas românicas; trata-se de uma tendência interna de simplificação,
independente de influências externas, como se pode ver no yeismo do castelhano, do
italiano, do sardo, do francês e até do romeno.
No campo românico europeu, o latim se sobrepôs às línguas dos povos con­
quistados, muitos dos quais acabaram por adotar a língua latina por força dos fatores
apontados; a grande diversidade de povos da Itália antiga (oscos, umbros, sabinos;
lígures, vênetos, japígíos, messápios; celtas e réticos) explica a grande variedade de
substratos. Na Gália, o celta com suas variedades, na Ibéria, o ibérico e o celta se tor­
naram outros tantos substratos, elementos diferenciadores do latim vulgar, ainda que
a longo prazo e, por isso, uma das causas da formação das várias línguas românicas
(ver mapa 9, p. 364).

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS | 153


A ação do substrato costuma ser lenta; a inclusão definitiva de um fato lin-
güístico modificado por essa ação na língua receptora pode levar séculos para acon­
tecer. Por exemplo, o nome Ignatius (“Inácio”) tornou-se popular apenas com Santo
Inácio de Loiola (1491-1556), cujo nome verdadeiro era Inigo, modificação do basco
Ennecus > Yenego > Ifiigo, da qual Ignácio é a forma latinizada. Mas já um docu­
mento do século IX traz o nome de um tal Ennecus Arista e em inscrições descober­
tas em Ascoli, do ano 90 a.C., foi encontrado o patronímico Elandus Enneces (atual­
mente seria Elando Iniguez) entre vários nomes de pessoas provenientes da região ao
norte do rio Ebro. Isso mostra que o nome basco Ifiigo, antes de se tornar popular e
difundido através do nome do santo fundador da Companhia de Jesus, ficou latente
no substrato por cerca de mil anos (do século I a.C. ao IX d.C.) até reaparecer e se
difundir outros cinco séculos depois. Contudo, é justo supor que esse nome próprio
tenha sido usado antes e também depois das datas documentadas.
Da mesma forma, as assimilações /-nd-/ > /-nn-/ e /-mb-/ > /-mm-/, encontra­
das na Itália central e meridional, são atribuídas ao substrato osco-umbro; note-se
que essas assimilações não se verificam pouco ao norte, tendo como limite o rio
Esino, nas proximidades da cidade de Ancona, já que nessa região ao norte o subs­
trato é celta. Assim, na Úmbria, no Lácio e em parte da Toscana, ao sul, aqueles fatos
se fazem presentes, por exemplo, em lat. expandere > spanne, infundere > nfonne,
palumba > palomma na região de Sora-Caserta. Por outro lado, ao norte do rio Esino,
situam-se os chamados dialetos galo-itálicos (piemontês, lombardo, lígure e emilia-
no-romanholo) em que aqueles grupos consonânticos se mantêm; entretanto, em
vários deles o substrato celta faz com que o /u /e o /a/ latinos passem a /ii/ e /e/ como
no francês, indicando claramente a diversidade regional de substrato. Entretanto, os
primeiros dados documentais de inscrições com /-nn-/ datam do século VI e em
outras regiões a documentação só foi encontrada nos séculos X e XI, o que represen­
ta um hiato de cinco a dez séculos, respectivamente, em relação ao desaparecimento
do osco no século I d.C.. Sabe-se, porém, que substituir /-nd-/ por /-nn-/ era conside­
rado um barbarismo ou, no mínimo, um provincianismo; por isso, enquanto foi gran­
de o prestígio de Roma e do latim, não houve possibilidade de que essa mutação se
impusesse. Quando, porém, o esplendor do poder romano começou a declinar, con­
comitantemente o latim perdeu o caráter de ideal língüístico, o que abriu espaço para
o afloramento da ação do substrato, antes contida.
Desses fatos conclui-se que a ação do substrato depende de causas sociais,
políticas, históricas e até estilísticas - estas últimas segundo tendências populares à
simplicidade ou ao descuido, ou mesmo cultas em busca de aprimoramento ou de
purismo. Desse modo, até que um conjunto desses fatores favoráveis permita o aflo­
ramento e a expansão definitiva das mutações resultantes, a força do substrato pode
ficar latente por longos períodos de séculos, durante os quais a duplicidade de for-

154 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
mas coexiste. Esse fato ocorreu por exemplo, na Ibéria com o fonema /f/ emitido
como /h/ aspirado, influência do substrato ibérico e do adstrato basco; os iberos não
dispunham do fonema /f/, substituindo-o por uma aspiração - o fonema mais próxi­
mo de que dispunham. Isso ocorreu inicialmente na região dos Montes Cantábricos
e na Gasconha, limítrofes dos bascos; encontra-se no castelhano e no gascão, apenas
com a diferença de que o gascão aspira sempre o /f/, enquanto o castelhano o conser­
va quando seguido de /r/ ou de ditongo, como \at. focum > cast.fuego, gasc. huèc; lat.
frigidu > cast. frio, gasc. heret (com epêntese de um /e/ antes do /r/); nos demais
casos, tanto o castelhano como o gascão seguem o mesmo caminho: lat.filu > cast.
hilo, gasc. hièu\ \ai.furnu > cast. horno, gasc. hiirnu. Entre as línguas e dialetos da
Península Ibérica, o castelhano é o único que apresenta essa mutação, singular tam­
bém, além do gascão entre as línguas românicas em geral: lat .folia > port. folha, cat.
fulla, prov. folha, fr.feuille, eng.fògla, h.foglia, log.fodza, vegl. fuola, rom.fo a ie -
e somente no cast. hoja e no gasc. huelho.
As classes cultas castelhanas consideravam a pronúncia do /f/ aspirado, um
barbarismo ou um vulgarismo c mantinham a emissão do /f/. Considerando-se que
quem escrevia o fazia em latim e a escrita se restringia às camadas mais elevadas da
população, compreende-se que as primeiras atestações de termos com /h/ por /f/, só
aparecem no século IX, freqüentemente junto com outros com /f/, como Fortiz em
documentos oficiais e Hortiz na linguagem popular, encontrados em Aragão, e até
oce, do lat .fauce, sem /h/, em 923. Essa duplicidade de formas, nas normas culta e
popular respectivamente, persistiu até o final do século XV, quando as formas com /h/
entraram na norma culta. Foi aspirado durante os séculos XV e XVI, tomando-se mudo
no século XVII (/f/ > /h/ > /φ/). Com a reconquista, essa influência do substrato ibero
estendeu-se para o sul, numa luta entre esses dois fonemas que ainda não terminou.
Essas verificações relativas à ação persistente do substrato permitem superar
certas descontinuidades entre fatos lingüísticos, de quatro a dez séculos, demonstran-
do-se que na realidade não houve nenhum hiato ou ruptura, já que /-nn-/ por/-nd-/ e
/h/ por /f/ sempre permaneceram correntes entre o povo, embora sem serem notados
e anotados; latentes, porém ativos. Essa duplicidade de formas, existente durante
séculos no substrato, é a melhor refutação da tese dos neogramáticos de que os sons
mudam rapidamente e com precisão mecânica, de que as mutações estão completas
tão logo se manifestem. Refuta igualmente a teoria fonológico-estruturalista das
“casinhas” vazias e depois cheias na estrutura, já que de fato as supostas “casinhas”
nunca estiveram vazias, pois estiveram sempre ocupadas e preenchidas pela variante
advinda da ação do substrato, não conhecida30.

30. Cf. Vidos, Manual de Linguística Románica, pp. 212-216; Menéndez Pidal, Origenes dei Espanol, passim.

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS I 155


Pode também ocorrer que o substrato não consiga explicar determinados termos,
como os designativos de animais, plantas, configurações geográficas etc., sugerindo a
existência de um estrato anterior, a que se denominou subsubstrato. Exemplo é a denomi­
nação de uma espécie de cabra, de pêlo pardo-avermelhada, cujo “habitat” são as partes
mais altas dos Alpes e dos Pireneus e que era desconhecida pelos romanos até conquista­
rem aquelas regiões. O nome desse animal provém de uma língua muito antiga e só foi
documentado uma vez em latim: camox, passando depois às línguas românicas, como
port. camurça, cast. gamuza, prov. camos, fr. chamois, tirol. kyamorts, friul. kanuils, eng.
kamuotsch, lomb. kamosch (> it. camozza), piem. kamus (> it. camoscio). Percebe-se que
o domínio dessa denominação abrange a cordilheira dos Alpes, passando pelo sul da
Gália, Pireneus e os Montes Cantábricos, até a Galiza (ver mapa 19, p. 374).
Estudos de Manuel Alvar, Vittorio Bertoldi, Jakob Jud e Walther von
Wartburg sobre o subsubstrato do norte da Ibéria e sul da França mostraram a exis­
tência de uma outra denominação para camurça, de origem ibérica e, portanto, pos­
terior, numa faixa estreita nas duas vertentes dos Pireneus: cat. isarda, isárt; gasc.
izárt; bearn. izár, isar, sarri; arg. sarrio; prov. uzár. Essas denominações se relacio­
nam etimologicamente com o termo basco izar, “estrela” e, por extensão, “mancha
branca em forma de estrela na testa de um animal”; daí izardum, “animal com estre­
la na testa”, do ibérico *izar-di, “animal com estrela”. A mancha branca na testa é
característica da camurça. E relacionando o basco izar, “estrela”, com o berbere ishri,
também “estrela” e considerando ainda que os iberos ocuparam a Ibéria vindos da
África, onde viviam os berberes, conclui-se que as denominações ibéricas do animal
são posteriores à de camox, cujo território foi dividido em dois pelos iberos com os
nomes com base em izar, como o mostram as línguas e dialetos acima citados.
O termo “camurça”, em outras regiões da România, designa um tipo de couro
semelhante ao dessa espécie de cabra, usado em confecções; geralmente não se trata
do legítimo couro da camurça, sendo apenas um caso de ampliação semântica.
Também uinum (“vinho”) e outros termos da vinoviticultura provêm do sub­
substrato de um idioma muito antigo, mediterrâneo. Embora ainda persistam dúvi­
das, pode-se atribuir a esse subsubstrato o fonema cacuminal (ou cerebral) existente
nos falares do sul da Itália e na Sardenha, onde substitui /-11-/ do latim, como em
caballu > log. kaddu; villa > bidda.
O subsubstrato, presente nos casos mencionados, se originou de uma unidade
étnica e lingüística, denominada “unidade mediterrânea”, cujos domínios abrangia
toda a bacia do mar Mediterrâneo até a Ásia Menor, incluindo as cordilheiras dos
Alpes e dos Pireneus. Essa “unidade mediterrânea” pode ser a base de certas concor­
dâncias, verificadas por Max Leopold Wagner, K. Bouda, Johann Hubschmid e
outros, em numerosos topônimos encontrados em diversas regiões mediterrâneas,
além de particularidades comuns ao antigo sardo e ao basco como, por exemplo, a

156 E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
dificuldade na emissão do /{/, a tendência a uma vogal protética sempre que a pala­
vra começa por /r/ (lat. rege > bas. errege, rota > errota, ripa > erripa, rugia > arru­
gia, “canal ou passagem nas minas”), entre outras, comuns também ao gascão.

SUPERSTRATO

Tendo como modelo o já existente “substrato”, Walther von Wartburg criou


“superstrato” para designar os vestígios e as influências de um povo dominador no
idioma do dominado, idioma esse que passa a ser usado por ambos, já que a língua
do dominador político deixa de ser falada, como aconteceu com o franco na Gália,
com o godo na Ibéria, com o lombardo na Itália etc. Difere do substrato pela situa­
ção em que se encontra o povo da língua que vem a desaparecer: politicamente domi­
nado no substrato e dominante no superstrato. Aqui também os fatores determinan­
tes para a sobrevivência da língua remanescente são o maior prestígio cultural e o
desenvolvimento linguístico.
No campo românico, importância maior atribui-se ao superstrato germânico; o
eslavo, especialmente em relação ao romeno, teve influência tardia. A partir do século
III, godos, francos, lombardos, alamanos, borguinhões e suevos, mais que outros, exer­
ceram influência linguística na România. Além dos topônimos e antropônimos mais
gerais, contam-se cerca de 200 empréstimos léxicos provenientes dos godos (visigodos
e ostrogodos), 520 dos francos no galo-romance e 280 dos lombardos no ítalo-roman-
ce. Como se vê, o francês apresenta forte influência do superstrato germânico, sobre­
tudo franco, tanto quantitativa como qualitativa, pois tomou conto empréstimos verbos
e adjetivos, o que não é comum: franc. hatjan > fr. luar (“odiar”); kausyan > choisir
(“escolher”); blâo > bleu (“azul”); brim > brim (“castanho”, “moreno”).
Essa grande influência dos francos se deve ao prolongado período de bilingüis-
rno de quatro séculos (do V ao IX) na França do norte, quando as duas línguas, como
adstratos, eram faladas tanto pelos dominadores francos como pela população rornâni-
ca. A língua germânica só desapareceu no século X e o último documento escrito em
franco é de 881. Nesse contexto, entende-se que, além dos empréstimos léxicos, o
bilingüismo tenha deixado também vestígios fonéticos; a proximidade do franc. haut
com o lat. ai tu, sobretudo levando em consideração a vocalização /1/ > /u/, fez com que
a palavra românica passasse a ser pronunciada com a aspiração muito comum no fran­
co: fr. haut (“alto”) e Ia hauteur (“a altura”), em que a aspiração impede o apóstrofe da
vogal do artigo. De modo geral, porém, as palavras de origem germânica conservadas
em outras línguas românicas, diversamente do francês, não mantiveram a aspiração:
germ. hilms > it., cast. e port. elmo (“capacete”); franc. Iiehn > fr. ant. heaume, mas no
prov. elm e no cast. yelmo (“elmo”). Na sintaxe, considera-se a colocação do determi-

ORIOEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS í 157


nante antes do determinado um traço do superstrato franco, como em Pro Deo amur
nos Juramentos de Estrasburgo (842) e Li Deo inimi na Cantilena de Santa Eulcüia. À
medida que o bilingüismo se enfraquece, vai prevalecendo a colocação românica deter-
minado-determinante, passando-se a considerar a antiga colocação como um arcaísmo.
A relatinização do francês durante a Idade Média eliminou muitos traços atribuídos à
influência desse superstrato (ver mapa 7, p. 361).
Na Península Ibérica, o superstrato visigodo não deixou traços muito numero­
sos, apesar de um domínio de dois séculos e meio; explica-se essa reduzida influên­
cia pelo fato de os visigodos se terem romanizado bastante durante suas andanças
pela România antes de se fixarem na Ibéria. Deixaram de falar sua língua gótica no
século VII. Como se viu, os visigodos permaneceram por 90 anos no reino que fun­
daram em Tolosa, no sul da França, antes de ocuparem a Península Ibérica; por isso,
vários empréstimos são comuns às duas regiões; gót. stakka > port. cast., cat. e prov.
estaca, além de numerosos derivados (Cf. REW, 8218); gót. *gasalya (“companhei­
ro”) > prov. gazalha (subst., “companhia”), agazalhar (“associar-se”), cast. (a)gasa-
ja r (> log. akkazadare), port agasalhar (etim. “acolher de modo amigável”) (REW,
3697); gót. *wanjan (“chorar”) > port. ganir, cast. guahir (REW, 9486); gót. wida
(“condutor de estranhos”) > port. guia, cast. guia (> log. gia), cat. guia, prov. guiza,
fr. ant. guie, it. guida (> fr. guide) (REW, 9528).
Na Península Ibérica, poucos são os empréstimos indiscutivelmente tomados
aos visigodos; por exemplo, gót. *gansus > port. e cast. ganso; *hagya (“protetor” -
al. mod. hegen) > cast. aya (> it. aió), port. aio\ *lofa > port. luva, cast. ant. lu(v)a.
Nos demais níveis lingüísticos, o visigodo não deixou vestígios claros.
Na Itália, o primeiro superstrato importante proveio dos ostrogodos, cujo
reino na Península durou pouco mais de meio século (494-555), uma vez que os héru-
los e membros de outras tribos germânicas, que vieram com Odoacro, eram em
número reduzido. Assim, esse superstrato ostrogodo forneceu ao italiano cerca de 70
empréstimos, referentes à administração e à atividade bélica, mas nenhum que se
refira à vida das classes superiores; muito poucos entraram na língua literária e os
poucos que sobrevivem, estão nos dialetos, como gót. *blauths > vên. bioto (“nu”),
lomb. biot, piem. biot e biut. De maior peso foi o superstrato lombardo; diferente­
mente dos ostrogodos, os lombardos não haviam tido uma romanização prévia, de
modo que acabaram por impor, como verdadeiros conquistadores, uma nova admi­
nistração, baseada nas fara (“clãs”), termo muito freqüente em topônimos e que deli­
mita com bastante precisão as regiões colonizadas por eles (Farra d’Alpago, Farra di
Saligo, Fara Vicentino, Fallavecchia, Fara in Sabina, Fara Filiorum Petri etc.).
Numerosos são também os topônimos provenientes de nome próprio lombardo, ter­
mos administrativos e jurídicos, hoje em desuso. O conjunto dos empréstimos léxi­
cos lombardos, que entraram no léxico italiano, chega a cerca de 300 palavras; alguns

158 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
exemplos: lomb. spehon (“observar atentamente”) > it. spiare (> fr. épier, cat. espiar,
cast. espiar, port. espiar)·, lomb. baile ou palk > it. balcone e palco·, lomb. banka e
panka > it. banca e panca - alguns dos quais se difundiram nas línguas do Ocidente
com significado por vezes específico (ver mapa 7, p. 361).
Com a conquista do reino lombardo pelos francos (Cf. p. 144), torna-se mais
difícil distinguir se os empréstimos francos vêm diretamente do novo dominador ou
se o caminho foi o do galo-romance. Há casos em que a fonética ajuda a seguir a via
correta: sabe-se que o /w/ germânico inicial passa a /gu/ nas línguas românicas;
assim, os termos românicos correspondentes ao germ. windan (> fr. guinder, cast.
guindar, port. guindar, it. ghindare) só podem ter vindo através do galo-romance, já
que conservam /gu/ como dígrafo. Entretanto, pela união política os empréstimos
francos se tornaram mais numerosos, sobretudo os relativos aos novos usos e costu­
mes, às novas instituições jurídicas e administrativas etc.
Na morfologia, são de origem germânica, especificamente franca ou lombar-
da, certos empréstimos de sufixos, que se difundiram entre as línguas românicas.
Assim -isk por exemplo passou ao provençal como -esc e daí ao italiano sob a forma
-esco, difundindo-se depois às demais línguas românicas como em port. burlesco
(> *burula, “brincadeira”, “gracejo”), it. burlesco, fr. burlesque, prov. burlesc, cat.
burlesc, cast. burlesco, rom. burlesc, eng. burlesc. Entretanto, esse sufixo não era des­
conhecido pelas demais línguas indo-européias; daí, ter havido quem questionasse
esse empréstimo. De fato, o indo-europeu dispunha do sufixo -islco, -iska, segundo
Brugmann e Delbriic ( Vergleichende Grammatik der Indogermanischen Sprachen II,
tomo 1, p. 501 s.); no grego, formava diminutivos, com παις > παιδίσκος,
παδ'ισκη (“menininho”, “menininha”); δεσπότης > δεσποτίσκος (“senhorzi-
nho”), άνθρωπος > άνθρωπίσκος (“homenzinho”); no latim, formava adjetivos,
embora mais raros: priscus (< prae + iscus > priiscus > priscus), “antigo”; mariscus
(de mas, maris, “varão”), “masculino”; no celta aparece em nomes de povos, como
Taurisci, Vivisca gens, e em nomes de lugar, por exemplo, Viviscum, Matriscum,
Seniscum', no germânico, -iska é um formante muito produtivo, indicando modo, rela­
ção e procedência e também forma adjetivos, como gót. mannisks, ant. a. al. mennisc,
“humano”; gót. gudisks, “divino”; funisks, “ardente”; muitos adjetivos formados com
esse sufixo encontram-se no antigo alto alemão, como kindisk, “infantil”; kuningisk,
“real”; burgisk, “urbano”; spanisk, “hispânico”; romisk e rumisk, “romano”; antarisk,
“estranho”; altisk, “velho” etc.; é encontrado também no lituano sob a forma -iszka:
bèrniszkas, “servil”; deviszkas, “divino” etc. Conclui-se que esse sufixo é uma heran­
ça do tronco comum indo-europeu; em vários ramos sua produtividade se reduziu bas­
tante, como no latim e no celta, ou se restringiu semanticamente, como no grego, em
que tem sempre sentido diminutivo; sendo muito produtivo no germânico franco, revi­
gorou-se também nas línguas românicas pela coincidência com o já existente pela

O R IG E M D A S L ÍN G U A S R O M Â N IC A S j 159
herança latina. No português, os termos emprestados ao grego, como asterisco
(“pequeno astro”), menisco (“pequena lua”) serviram de modelo a outras formações,
como chuvisco, pedrisco, bem como em verbos com denotação diminutiva do tipo
chuviscar, bebericar, lambiscar, mordiscar, namoricar. Observe-se ainda que este
sufixo mantém o /i/, enquanto -esco, semanticamente não diminutivo, vem com /e/:
grotesco, picaresco, pitoresco, carnavalesco, nababesco, livresco, animalesco - e traz
certa conotação pejorativa. Tanto o aspecto semântico como o fonético mostram que
se trata de empréstimos diferentes, embora se possa fazê-los remontar a uma base
única indo-européia.
Ainda em relação aos sufixos, havia no germânico antigo -ing, resultante da
combinação de dois elementos sufixais indo-europeus, l-n-l e 1-kJ (<-ko ou -ka); com
desdobramento da nasal vocálica (l-n-l > l-in-l) e a sonorização /-k/ > l-gl, resultou
-ing, designativo de origem, como Salingi, de pessoas, de seres vivos em geral, ou
considerados como tais: ant. a. al. kuning, “rei”, mahting, “homem poderoso”, husin-
ga (pl.) “deuses do lar”) etc. Encontrado também em outras línguas indo-européias,
como o islandês antigo, esse sufixo era corrente nos idiomas dos godos, francos,
lombardos etc., dos quais passou como empréstimo para as línguas românicas sob a
forma -engo ou -ingo. Na Itália, há topônimos formados por nome de pessoa mais o
sufixo -engo, provenientes do superstrato gótico, como por exemplo, Buttanengo, na
região de Novara ao norte do país (< gót. *Bòttiliggs) e Malarengo (< gót.
Malaharjis) na região de Brescia; outros topônimos provêm do superstrato lombar-
do, que se distingue do gótico pela mutação /-tt-/ > l-zz-l > l-ss-l, em Bussolengo
(Verona) por exemplo, além de se formarem topônimos tanto de nomes lombardos
como de latinos: Massalengo (lomb. mazó) e Pastrengo (lat. pastor). Contudo, nem
toda ocorrência desse sufixo necessariamente é proveniente do superstrato germâni­
co, já que se conhece um sufixo pré-romano em -enc.
Na Ibéria, -engo forma sobretudo adjetivos: port. solarengo, cast. solariego
(mas cat. pairai)', port. avo engo; port. mulherengo, cast. mujeriego; port. realengo,
abadengo, reguengo, monstrengo e outros. O sufixo -ardo (< germ. -hart) forma pri­
meiramente nomes de lugares e de pessoas, como Bernhart > Bernard (o), Reginhart
> fr. Renard; depois passa a formar nomes comuns, difundindo-se da França para a
Ibéria e Itália; exemplo é gót. bansts (“celeiro”) > fr. ant. bastard, mod. bâtard, prov.
bastart; cat. bastard, cast. bastardo, port. bastardo, it. bastardo, rom. bastard
(“expressão jurídica eufemística para designar o filho gerado fora do matrimônio
legal, no ‘celeiro’, não no ‘palácio’”). Esse empréstimo se tornou bastante produtivo,
sobretudo no italiano e no português, do qual são exemplos galhardo, felizardo, mos-
cardo, javardo, tabardo e outros.
No romeno, a influência e as possíveis contribuições do superstrato germâni­
co são poucas e controversas. Gamillscheg enumerou 26 empréstimos gépidas, mas

60 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


que podem ser atribuídos a antigos substratos ou a outras fontes, como, por exemplo,
tapei, “cepa”, que pode provir do latim vulgar, ou tufa, “moita”, documentado em
latim por Vegécio e encontrado também no albanês. Na Transilvânia e no Banato, há
numerosos empréstimos germânicos, mais recentes, através do contato com colônias
de saxões, implantadas na Transilvânia nos séculos XII e XIII; outros vieram através
da administração húngara e austríaca. Entrepostos comerciais dos saxões, sobretudo
em Brasov (em al. Kronstadi), difundiram palavras germânicas também nos outros
principados romenos.
Se o superstrato germânico muito pouco influenciou o romeno, o eslavo, ao
contrário, deu ao romeno uma contribuição muito vasta nos diversos níveis lingüísti-
cos. Isolado das demais línguas românicas desde fins do século III, o romeno recorre
ao eslavo da mesma forma que as outras línguas românicas recorrem ao latim ecle­
siástico e medieval com fonte de empréstimos. No léxico, palavras eslavas substituí­
ram as correspondentes latinas, extremamente usuais, por exemplo: lat. amare, rom.
a iubi; finis, rom. sfirsft (“fim”); honor, rom. cinste (“honra”); canis, rom. cirag
(“querido”); pauper, rom. sãrac (“pobre”); corpus, rom. trup (“corpo”); morbus,
rom. boalã (“doença”); descendere, rom. a coborí (“descer”); infans, rom. prunc
(“criancinha”); sanus, rom. teafãr (“sadio”),· avarus, rom. scump (“avarento”) etc. Os
termos de caráter religioso provêm do eslavo antigo, usado na liturgia: gre§ealã
(“culpa”), a sflnji (“santificar”), voie (“vontade”), ispitã (“tentação”), a izbavi
(“livrar”), ficioarã (“virgem”) etc. Por outro lado, há cerca de 120 palavras de ori­
gem latina só encontradas no balcano-romance; exemplos são lat. densus > rom. cies,
dalm. dais (as outras línguas românicas partem de spissu, como port. espesso)·, lat.
cerebrum > rom. creier (“cérebro”, erudito em port.) e alb, krie (“cabeça”); lat. hos­
pitium > rom. ospãt (“banquete”) e alb. shtepi e neogr. σ π ίτ ι (“casa”); lat. adjuto­
rium > rom. ajutor (“ajuda”); lat. blanditia > rom. blindeje (“mansidão”); lat. langui­
dus > rom. línced (“fraco”); lat. Ungulii > rom. lingurã (“colher” < cochlearium).
Na fonética, o superstrato eslavo emprestou ao romeno os fonemas ΙάΙ e lâl,
este último geralmente grafado /V - vogais posteriores guturalizadas; até 1954 escre­
via-se lâl ou IV segundo a etimologia da palavra: manu > mán; infrenare > infrena; a
reforma ortográfica de 1954 uniformizou a grafia do fonema para /V e um adendo
àquela reforma, em 1965, restituiu a grafia etimológica /â/ ao nome do país e a seus
derivados: România, român (“romeno”), romanas (“rapaz valente”), românca
(“romena”), românesc (“romeno”), a români (“romenizar-se”) etc. Esse fonema /i/ é
muito comum no romeno: intii (< *antaneus, “primeiro”), ínapoi (“depois”, “atrás”)
gigilice (“ninharia”), ginit (“borborinho”) etc. Atribui-se também à influência eslava
a perda ou não-distinção fonológica entre /O/ e /0/.
Na morfologia, mais do que aconteceu com outros superstratos em relação às
línguas românicas, o eslavo legou ao romeno numerosos sufixos, bastante produti-

O R IO E M D A S L ÍN G U A S R O M Â N IC A S | 161
vos: a) -ac: buimac (“perturbado”), burlac (“solteirão”); b) -cã (forma o feminino a
partir do masculino): român/româncã (“romeno/romena”), orãsean/orãseanca
(“urbano/urbana”), sãtean/sãteancã (“aldeão/aldeã”); c) -ealã : pirotealã (“sonolên­
cia”), minjealã (“sujeira”), perpelealã (“tormento”); d) -nic: abraznic (“insolente”),
polusnic (“criado”), voinic (“valente”); e) -itã: mlãditã (“raminho”), mranitã (estru­
me”), ocnitã (“nicho”). Dentre os prefixos, rãs- (rãz- ante vogal ou consoante sono­
ra) foi bastante produtivo no significado básico de “repetição” ou “intensificação”,
como em rãscintãtor (“repetidor de canto”), rãsciti (“reler”), rãscoace (“cozinhar
além do conveniente”); rãzbunare (“vingança”), rãzbate (“penetrar”).
Considera-se como empréstimo eslavo o prefixo ne-, de sentido negativo, que
substitui in- comum às línguas românicas. Entretanto, no próprio latim, o ne- era o
prefixo usado com esse sentido com verbos, como scio/nescio, volo/nolo (< nevolo
> no(y)olo > nolo) e com substantivos, por exemplo,fas/nefas; subsiste em formas
antigas, como *necessis, nefandus, nefastus, neuter, nemo, nullus, nunquam, nus­
quam etc. In- era empregado sobretudo com adjetivos e advérbios, como pro-
bus/improbus e improbe. Embora sempre tenha havido concorrência entre as duas
formas, in- expandiu-se consideravelmente na época imperial, na qual aparece em
muitos neologismos, principalmente em Ovidio (indelebilis, indigestus, innabilis,
indefletus, irriquietus etc.). Posteriormente, a linguagem literária, técnica e, em par­
ticular, eclesiástica ampliaram consideravelmente o uso de in- na formação de adje­
tivos e de substantivos, traduzindo o ót- privativo grego. Por outro lado, tanto ne­
co mo in- remontam à raiz indo-européia comum /n/, da qual provieram o ά(ν)-
grego, o a- iraniano, o un- germânico, o an- celta, o ne- eslavo, o a- do sânscrito, o
an- osco-umbro e o in- latino diante de consoante, forma variante de ne-, Essas con­
siderações sugerem cautela em atribuir sem mais ao substrato eslavo a presença do
ne- negativo no romeno, já que ele existia na base latina, embora enfraquecido; o
largo emprego do ne- no eslavo, sem dúvida, reviveu no balcano-romance a produti­
vidade perdida. Nesse sentido, é inegável a influência eslava, pois o romeno é a única
língua românica que emprega comumente esse prefixo: nearticulat (“inarticulado”);
necinste (“desonra”); nedrept (“incorreto”); nedespãrtit (“inseparável”); nesigur
(“inseguro”); nechibzuire (“irreflexão”) etc.
Essa grande influência do superstrato eslavo sobre o romeno deveu-se em
grande parte ao cristianismo, conforme se notou acima. Enquanto no Ocidente a
Igreja utilizava o latim eclesiástico e depois a “rustica romana lingua” em seus ser­
mões, nos Bálcãs o eslavo substituiu o grego na liturgia em fins do século IX; com
isso, os principados romenos, ao norte do Danúbio, adotaram o eslavo eclesiástico
como língua oficial nos séculos X e XI. A convivência política e religiosa com os
eslavos continuou, sobretudo quando Ionitta foi coroado “rei dos búlgaros e dos vala-
cos” em 1204. O povo, porém, continuou a falar o romance. No século XIV, os prin-

162 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
cipados da Valáquia e da Moldávia tornaram-se independentes, mas a Transilvânia
continuou sob o domínio húngaro. Mesmo assim, os primeiros documentos valacos
e moldavos, do século XIV, ainda são redigidos em eslavo, ou seja, em médio búlga­
ro. Essa situação perdura ainda por mais dois séculos, nos quais a Igreja Ortodoxa e
os governos eslavos impediram o aparecimento de obras em romeno. O primeiro
texto em romeno é a carta de Neacsul, de Címpulung, ao juiz Hans Benkner, de
Brasov na Transilvânia, em 1521. Depois disso, multiplicam-se consideravelmente,
as publicações de livros religiosos em romeno, como conseqüência da “profissão de
fé luterana” de Augusburgo (1530), sobretudo traduções feitas pelo diácono Coresi.
Convém notar que Coresi, natural de Tírgoviste, ao sul da Transilvânia, adotou seu
dialeto, modificando bastante os textos, provenientes de Muramures, e do norte da
Transilvânia. A grande difusão de suas obras fez com que a variante lingüística nelas
usada viesse a se tornar a língua literária romena nos séculos posteriores, cujos albo­
res, porém, remontam ao século XVI.

ADSTRATO

Além das situações de substrato e superstrato, ocorre também a de adstrato,


descrita por Mattoso Câmara, em Dicionário de Filologia e Gramática, s.v., como
“toda língua que vigora ao lado de outra, num território dado, e que nela interfere
como manancial permanente de empréstimos”. Basta, portanto, que dois povos de
idiomas diferentes sejam vizinhos e mantenham relacionamento de qualquer tipo
para a caracterização da situação de adstrato.
A causa dessa situação pode ser invasão ou conquista, como foi o adstrato
árabe na Península Ibérica a partir de 711; o árabe conviveu então com os romances
ibéricos que receberam maior ou menor influência. As variantes do sul, cuja convi­
vência com o árabe foi de quase oito séculos, foram influenciadas mais profunda­
mente, sendo por isso chamados “moçárabes” (< ár. musta 'rab, “tornado árabe”,
“arabizado”) nativos românicos que assimilaram a cultura árabe e eram bilíngües;
escreviam seu falar romance com caracteres árabes e por isso tais escritos são cha­
mados aljamia (“língua estrangeira”). Quando, porém, os árabes foram expulsos em
1492, a população românica continuou a falar seu dialeto, apenas enriquecido por
numerosos empréstimos. Apesar dos quase oito séculos de convivência num só terri­
tório, não houve absorção de um povo pelo outro nem o desaparecimento de uma lín­
gua. As causas desse fato pouco comum foram religiosas; tanto os islamitas árabes
como os cristãos eram muito apegados à própria crença, sendo relativamente poucos
os que se convertiam à outra; mesmo nesses casos, sofriam algum tipo de restrição,
como os muladies, cristãos convertidos ao islamismo; além desse aspecto religioso,

O R IG E M D AS L ÍN G U A S R O M A N IC A S 163
a grande diferença de língua e de cultura foi fator que impediu maior aproximação e
possível fusão dos dois povos. Situação semelhante ocorreu com o grego e o latim
durante o período em que a Grécia pertenceu ao Império Romano; nesse caso, a
causa da permanência da situação de adstrato foi a superioridade cultural grega, além
da presença relativamente pequena dos romanos no território grego.
Pode-se afirmar que esse aspecto torna o adstrato diferente do substrato e do
superstrato: no adstrato nenhuma das línguas intervenientes desaparece; apenas con­
vivem e se influenciam. No caso dos árabes da Península Ibérica e dos romanos na
Grécia, houve convivência no mesmo território, pelo que se pode denominar tal
situação de “adstrato superposto”, historicamente mais raro. Normalmente, com cer­
teza mais de acordo com a acepção dada por M. Valkhoff, o idealizador do termo,
calcado conforme o modelo dos dois anteriores, adstrato designa a influência entre
duas línguas correntes em territórios limítrofes, a que se pode então denominar “ads­
trato justaposto”, pelo fato de não ocuparem simultaneamente o mesmo território.
Exemplos desse adstrato justaposto são o antigo castelhano e o basco, as línguas da
Gália e o latim da “Província”, até a conquista de Caio Júlio César (51-50 a.C.), as
línguas germânicas e o latim antes das invasões, e o dialeto romeno da Transilvânia
e o húngaro desde o tempo dos Habsburgos, embora haja aspectos circunstanciais
mais ou menos importantes em cada caso. Conclui-se que o adstrato superposto exer­
ça normalmente mais influência que o justaposto, tendo em vista o contato mais ínti­
mo entre as duas línguas.
Assim, o domínio árabe na Ibéria e na Sicilia, nesta por dois séculos e meio
(827-1061) e de onde foram expulsos pelos normandos, não logrou constituir um
superstrato lingüístico, mas foi apenas um adstrato superposto, uma vez que as duas
populações, românica e árabe, mantiveram seus respectivos idiomas, embora com
influências mútuas. Na ilha de Malta, porém, na qual as barreiras étnicas, religiosas,
culturais e sociais não estavam tão consolidadas como na Ibéria e na Sicilia, formou-
se um dialeto semita que, com a contribuição de numerosos elementos italianos pos­
teriores, constitui o maltes, meio de expressão cultural e literário da ilha. Na Sicilia,
porém, a contribuição do adstrato árabe se reduziu a empréstimos léxicos, topônimos
e nomes de família.
Na Ibéria, a longa permanência dos árabes legou às línguas e aos dialetos
românicos grande contribuição léxica. Donos de uma cultura diferente, hauriram-na
em parte de contatos com civilizações do Oriente, anteriormente conquistado. Os
empréstimos léxicos, comparáveis em importância e em quantidade aos do germâni­
co franco ao francês, inicialmente foram os de conteúdo semântico concreto nos sécu­
los 1Χ-ΧΙΙ: substantivos em sua maioria e pouquíssimos adjetivos e verbos, que fica­
ram geralmente restritos ao português e ao castelhano, pois são menos numerosos no
catalão por motivos históricos (conquista de Barcelona, estabelecimento da “Marca da

64 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
Espanha” e do Condado de Barcelona por Carlos Magno, já em 812. (Cf. p. 149). Al­
guns exemplos: port. alcachofra, cast. alcachofa, cat. escarchofa; port. aldeia, cast.
a Idea (mas cat. llogarret); port. arrabalde, cast. arrabal, cat. raval; port. alcova,
cast. alcoba, cat. alcova·, port. almofada, cast. almohada, (mas cat. coixi)·, port. tare­
fa , cast. tarea, (mas cat. tasca, fr. tâche); port. azul, cast. azul, (mas cat. blau, blavor,
fr. bleu < germ. blau)·, port. alcáçar, cast. alcázar, cat. alcàsser (forma arabizada do
lat. castra, significando “fortaleza” ou “palácio real”); port. acicate, cast. acicate,
(mas cat. agullò) etc. Há empréstimos que só se encontram em português, como
açude, alface, alfaiate etc. Quanto ao número de empréstimos léxicos árabes, diver­
gem os romanistas; W. D. Elckoc somou cerca de 4.000; Antenor Nascentes
(Dicionário Etimológico I, Introd.) enumera 609 e Serafim da Silva Neto (História
da Língua Portuguesa, p. 343) estima esse número entre 400 e 1.000 no português.
À medida que desenvolviam suas atividades na Península, os árabes transmi­
tiam a nomenclatura correspondente ao romance; assim, deixaram nomes de produ­
tos da terra (acelga, açafrão, algodão, alfafa, abricó, azeite, arroz [empréstimo árabe
ao grego όριζα ou δρίζον, por sua vez empréstimo do iraniano], limão e laranja [de
origem persa], açúcar), termos referentes à moradia {bairro, azulejo, alfombra, almo­
fada, jarra, taça [de origem persa], alvanel), às vestimentas (aljuba [fr. jupe], jibão,
albornoz, alfaiate, recamar), à administração e à guerra (alcaide, califa, aguazil;
almirante, arsenal, atalaia, adail, alfanje, aljava, alferes, acicate, ginete), ao comér­
cio {aduana, armazém, arroba, almude, maravedi, quintal [medida de peso]). Como
substantivo abstrato cita-se apenas alvoroço·, de adjetivos, apenas baldio, mesquinho,
cadimo, algarvio, e os nomes de cor azul (de origem persa), carmesim e escarlate.
Por vezes, termos árabes formam grupos de cognatos, como ár. bátil (“inútil”) > port.
baldo, baldio, debalde (cast. en balde), baldado, baldar (cast. baldar, cat. baldar).
A aglutinação do artigo definido árabe al, cujo /1/ é assimilado por algumas
consoantes subseqüentes (cf. adelo, anadel, agúmia, arrais, açafate, azagaia, açuce-
na, atabaque) nos empréstimos encontrados nas línguas da Ibéria, se deve ao fato de
grande parte dos invasores serem berberes, mouros incultos, cuja língua não tinha
artigos; por isso, os próprios transmissores do árabe aglutinavam o artigo ao nome,
dando à população românica, que aprendia o idioma de ouvido, a clara impressão de
que se tratava realmente de um vocábulo único. Entretanto, tal aglutinação não se deu
aos empréstimos árabes ao siciliano, porque os invasores da ilha eram árabes, mais
cultos, que não aglutinavam sistematicamente o artigo como os berberes. Comparem-
se: ár. al mahzin (“depósito”) > sic. magasenu > it. magazzino, fr. magazin, mas port
armazém, cast. almacén (e cat. magatzeni)·, ár. al dar-assinàa (“casa de construção”)
> sic. darsena (“dique seco”), da qual surgiram muitas variantes na Itália, intemacio-
nalizando-se a forma vêneta arsenal·, ár. as-sukkar > it. zucchero, fr. sucre, cat. sucre,
eng. zucher (al. Zucker, ingl. sugar), mas port. açúcar, cast. azúcar, ár. az-zaferan >

O R IG E M DAS LlNGUAS R O M A N IC A S I 165


it. zafferano, fr. safran, cat. safrà, eng. safrauna e zafrauna (al. Safran, ingl. saffron)
mas port. açafrão e cast. azafran.
Outros empréstimos árabes relativos à cultura medieval nos campos da mate­
mática, medicina, astronomia, química e filosofia, tornaram-se patrimônio cultural
do Ocidente, tendo a Ibéria ou a Sicilia como ponto de partida; através do italiano e
do francês atingem as outras línguas.
Alguns termos usuais da matemática são de origem árabe; assim, ár. al-jabr,
propriamente “restauração” e “redução”, foi romanizado como “álgebra” por
Leonardo Fibonacci, célebre matemático de Pisa, que, em 1202, tornou conhecidos
matemáticos árabes com seu Liber Abacci; “álgebra” foi tirado do título da obra de
Muhammad ibn Musa al-Hwarizmi, Ciência das Reduções e das Comparações. Por
outro lado, Hwarizmi significa “originário de Hwarizm”, nome de uma região da
Ásia Central, e é o sobrenome do matemático Muhammad ibn Musa (século IX), do
qual se derivou algarismo, símbolos gráficos usados na representação sistemática
dos números pelo sistema decimal. Os algarismos devem sua forma característica (1,
2, 3,4, 5, 6, 7, 8, 9, 0) a símbolos que continham as respectivas quantidades de ângu­
los internos; assim, o 1 tinha um ângulo interno, o 2, dois ângulos internos, o 3, três
ângulos internos e assim por diante, enquanto o zero (“0”) com sua forma arredon­
dada não contém nenhum ângulo interno. Posteriormente estilizados, esses algaris­
mos substituíram os outros sistemas de representação numérica, menos transparentes
e mais complicados, como o latino por exemplo. Aliás, o termo zero também se liga
ao adstrato árabe; o adjetivo comum ár. shifr (“vazio”) passou a significar “zero” por
influência da palavra sânscr. shunya, usada pelos matemáticos hindus na acepção de
“zero” por também significar “vazio”. Leonardo Fibonacci latinizou shifr como
zephirum, que teve no italiano a evolução zefiro > zefro > zero, forma documentada
em italiano já em 1491. Do italiano passou para o fr. zèro, cast. cero, cat. zero, port.
zero, rom. zero. Por outro lado, ár. shifr entrou no castelhano como cifra, passando
ao it. cifra, fr. chiffre, cat. xifra, port. cifra, al. Ziffer e no ingl. cipher. O significado
comum é “quantidade total”.
Grandes mestres na astronomia, os árabes legaram a todas as línguas européias
vários termos técnicos nesse campo: ár. as-simut ou as-sumut (pl. de as-samt, “dire­
ção”) deu port. azimute, cast. azimut, cat. azimut, fr. azimut, it. azimut, ant. azimutto),
significando “distância angular, medida sobre o horizonte a partir do sul no sentido
horário ou anti-horário, até o círculo vertical que passa por um determinado astro”. Na
Idade Média, por uma leitura errônea dos códices, em que se leu /ni/ em vez de /m/
no termo ár. samt, semt ou zemt, originou-se port. zênite, cast. zenit, cat. zenit, fr.
zénith, it. zenit, rom. zenit, eng. zenit; também al. Zenit, ingl. zenith. No mesmo uni­
verso semântico, ár. nazir (na expressão nazir as-samt, “oposto ao zênite”) > port.
nadir, cast. nadir, it. nadir, rom. nadir. Do ár. al-manah, propriamente “mapas astro-

66 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
nômicos”, usados para determinar a posição média do sol, da lua e dos cinco princi­
pais planetas, dias da semana etc., passou ao port. almanaque, cast. almanaque, it.
almanacco etc. no sentido de “calendário”. O termo está em manuscrito espanhol do
século XIII, citado também nesse século por Roger Bacon (Opera, XV, 120).
Na química, deve-se aos árabes a difusão de alguns termos da química medie­
val; do grego bizantino χυμε'ια, os árabes formaram al-kimiya, donde port. alqui­
mia, cast. alquimia, it. alchimia, documentado já no século XIII e emprestado às lín­
guas do Ocidente, no sentido de “pedra filosofal, substância que transforma metais
comuns em ouro”. O nome árabe mais comum dessa pedra filosofal, porém, era al-
ksir (< gr. ξηρόν, “seco”) > port. elixir, cast. elixir, fr. elixir, it. elisire, rom. elixir,
com o significado de “licor mágico” e “remédio maravilhoso”. Outro empréstimo
árabe às línguas modernas é al-kuhl ou al-kuhul, significando “pó para tingir sobran­
celhas e pálpebras”, produzido a partir do antimônio; no português e no castelhano
antigos, álcool designava o antimônio, portanto, o metalóide sólido, de cor branca-
azulada; entretanto, no próprio árabe há referências a preparados líquidos também
denominados “álcool”. Mas foi Teofrasto Paracelso, que, no início do século XVI,
denominou “álcool” a substância volátil extraída do vinho; atualmente, port. álcool,
cast. alcohol, cat. alcohol, fr. álcool, eng. alcohol, it. álcool, rom. álcool (al. Alkohol,
íng. álcool) designa a substância volátil extraída de açúcares e amiláceos.
No domínio dos jogos, provêm do árabe vários termos muito difundidos, como
toda a terminologia referente ao xadrez, aprendida com os persas, que a haviam empres­
tado por sua vez dos indianos. Do antigo indiano shaturang(a) tiraram o ár. shitranj, isto
é, “de quatro membros”, por ser composto idealmente de quatro tipos de armas: carros,
cavalos, peões e elefantes; daí port. xadrez, ant. cast. axedreç, mod. ajedrez, fr. échecs,
prov. escac, cat. escacs, it. scacchi. A finalidade do jogo é imobilizar o rei adversário;
daí ter-se trazido também o termo persa shah, “rei”, em shah mat, “o rei (está) morto”,
quando se atinge aquela finalidade, originando port. xamate, cast.jaque y mate ou jaque
mate, fr. échec et mat, it. scacco matto\ influência do castelhano jaque e do francês
échec trouxe xeque ao português, termo denotativo de ameaça ao rei, que substituiu o
primitivo xa em xamate, dando a forma atual xeque-mate ou apenas mate, “morto”. No
francês, échec passou a ser usado em expressões como donner échec, no sentido de “pôr
impedimento”, “controlar”, passando depois a significar “cédula de pagamento”, senti­
do adotado pelo inglês sob a forma check, de onde voltou ao francês como cheque e daí
se difundiu para as línguas modernas na acepção de “cheque bancário”.
Ainda no jogo de xadrez, na concepção antiga havia dois elefantes postados
ao lado do rei e da rainha, respectivamente; em árabe, al-fil é “elefante”, palavra que
foi contaminada pela parônima ár. al-faris, “porta-bandeira”, originando port. alfe-
res, cast. alférez, fr. alfier, it. alfiere, designativo das figuras que substituíram as dos
elefantes do primitivo jogo de xadrez e receberam novas designações, com port.

ORIGEM DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS 167


bispo, ír.fou (“louco”), rom. nebun (“louco”), al. Làufer etc. O ár. al-fil é derivado
de uma língua camita da África; da expressão nah al-fil, “dente de elefante” ou azm-
al-fil, “osso de elefante”, provêm o port. marfim e o cast. marfil, em oposição às
demais línguas românicas que têm do lat. *eboreus > it. avorio, fr. ivoire, prov. ivori
(evori e avori), cat. evori (bori) [basco bori], rom. ivoriu, sendo corrente também
fildes, de origem turca, al. Elfenbein, “osso de elefante” - revelando maior influên­
cia árabe na Península Ibérica.
Difundido entre as línguas românicas é o derivado do ár. az-zahr, “dado”, > port.
azar, cast. azar, cat. atzar, prov. azar, fr. ant. hasard (com -d por contaminação com o
sufixo -ard, donde o it. azzardó), it. ant. zara, zaro, formas indicativas de procedência
siciliana pela ausência do a-, Do ponto de vista semântico, o cast. azar era o nome de
um jogo de dados, chamado “a face desfavorável do dado”, conforme refere Alfonso X,
o Sábio, no mais antigo tratado de xadrez (1283); da Espanha passou para a França como
hasard, no sentido de “o número seis no jogo de dados”, “uma espécie de jogo de dados”
e “oportunidade” e no fr. mod. “acaso”, “risco”. No português, tem o significado mais
corrente de “má sorte”, “adversidade” e no castelhano, o de “casualidade”.
No aspecto fonético, contrariamente ao sucedido com o superstrato germâni­
co, a população românica assimilou em parte o ritmo acentuai do árabe; em conse-
qüência manteve a tônica em empréstimos proparoxítonos (càfila, sáfaro, almôndega,
Alcântara, além dos já citados) e em paroxítonos com consoante líqüida final (aljôfar,
arrâtel, âmbar, almocâvar), ao lado de numerosos oxítonos (anafil, algeiroz, avanel,
alamar, almofariz, alecrim, aldebaram, borzeguim, baldaquim, alcatruz, arroz, ata-
bal, anadel, javali (< jabalii, “montês”). A conservação dessas tônicas de certa forma
contrariam tendências acentuais do português de eliminar os proparoxítonos pela sín- ,
cope da pós-tônica e fazer coincidir a tônica com fonemas líqüidos e nasais.
Na toponímia, há nomes de origem latina que foram popularmente modifica­
dos segundo as características fonéticas árabes, como Caesaraugusta > ár. Saragusta
> cast. Zaragoza. Mais raros são os exemplos dos topônimos formados com um ele­
mento árabe e outro latino, como o ár.jabal ou jebel e o lat. monte(m) que deram sic.
Muncibeddu, it. Mongibello, o Etna.
Portanto, foi muito importante a contribuição árabe para as línguas românicas
da Ibéria e, através do siciliano, para o italiano, sobretudo no léxico. Embora muitos
empréstimos se tenham arcaizado, outros estão definitivamente incorporados ao léxi­
co de muitas línguas românicas e não românicas, segundo se demonstrou através dos
exemplos dados.
Outra língua românica, que recebeu influência de adstratos específicos, foi o
romeno. Depois do eslavo (Cf. p. 161), a dominação turca otomana nos séculos XV e
XVI deixou pouco mais de 900 empréstimos ao romeno da Valáquia e da Moldávia, dos
quais pouquíssimos passaram para a Transilvânia; muitos se arcaizaram e uns tantos

168 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


persistem no uso comum: tur. oda > rom. odaie, “cômodo”, “casa”; tur. çoban > rom.
cioban, “pastor”; turc. musafir > rom. musafir, “hóspede”; tur. ulufe > rom. leafa,
“salário”, “soldo”; tur. cavush > rom. ceau§, “estafeta”, “correio”; tur. murdar > rom.
murdar, “sujo”, “indecente”; tur. pehlivan > pehlivan, “acrobata”, “charlatão” etc.
Outra fonte importante de empréstimos ao romeno foi o adstrato húngaro,
sobretudo através da Transilvânia, região que pertenceu politicamente à Hungria por
muito tempo, até 1918; são cerca de 600 e tardios, encontrados praticamente só no
daco-romeno. Contudo os primeiros empréstimos húngaros já aparecem nos documen­
tos eslavos redigidos no território romeno nos séculos XIV e XV. Exemplos: húng. làb
> rom. laba, “pata”; húng. csinos > rom. cinas, “lindo”, “querido”; húng. varos > rom.
oras, “cidade” (Cf. lat. duitatem > rom. cetate, “fortaleza”); húng. dsingás > rom. gin­
gas, “sensível”, “temo”; húng. gond > rom. gind, “pensamento”; húng. szallás > rom.
sãlas, “domicílio”, “moradia”; húng. nem > rom. neam, “povo”, “nação”; húng. munca
> rom. muncâ, “trabalho penoso”; húng. cenk> rom. tine ou tine, “cria ”, “nenezinho ”.
A situação geográfica do território romeno e as vicissitudes históricas têm dei­
xado ainda outras marcas na língua, além das citadas. Fazendo parte do Império
Bizantino, cuja língua era o grego, além da proximidade territorial com a própria
Grécia, o romeno recebeu forte influência do adstrato grego em vários períodos. Os
mais antigos empréstimos gregos foram indiretos, através do latim ou do eslavo;
assim, rom. martur, “testemunho”, é mais provável ter vindo pelo lat. martyr, atesta­
do já em Tertuliano e usual na terminologia eclesiástica, do que diretamente do gr.
μάρτυρ; também rom. ciumã, “peste” através do lat. cyma, “inchaço”, < gr. κύμη;
rom. trufie “orgulho”, “arrogância” < gr. τρυφή. Por aspectos fonéticos é possível
estabelecer o período em que se deu o empréstimo; sabe-se que, no período bizantino,
o /u/ grego era pronunciado /i/, como se verifica, por exemplo, em rom. mistrie, “tro-
lha”, “colher de pedreiro”, do grego médio μυστρί(ον). Por outro lado, vários termos
eclesiásticos gregos entraram no romeno pelo eslavo antigo, língua oficial da Igreja
romena durante séculos: gr. καλόγηρος > esp. ant. kaluger > rom. cãlugãr,
“monge”; gr. κελλ'ΐον > esl. ant. kelija > rom. chilie, “cela”, “retiro”. Alguns emprés­
timos do grego médio podem, contudo, ter sido diretos, como gr. médio φελός (clás.
δφελος) > rom.folos, “utilidade”, “lucro”; gr. méd. φρίκη > rom. fricã, “medo”; gr.
méd. λείπω > rom. lipsi, “faltar”, “privar”. Um número considerável de vocábulos,
porém, são emprestados durante a dominação fanariota (“fanariot” era o título dado
aos príncipes gregos que, sob a égide Bizâncio, governaram os principados romenos
de 1711 a 1821); com os fanariotas vieram muitos imigrantes gregos, responsáveis por
vocábulos neogregos no romeno, aproximadamente 640. De fato, a maioria teve vida
curta como empréstimo; outros foram de fato incorporados, como, por exemplo,
neogr. ανάποδα > rom. anapoda, “ao contrário”; κουνουπίδι > rom. conopidã,
“couve-flor”; neogr. φύλλα > rom.fd ã , “folha de papel”; neogr. μόλεμμα > rom.

O R IG E M D A S L ÍN G U A S R O M A N IC A S I 169
molimã, “epidemia”; neogr. νόστιμος > rom. nostim, “gentil”, “amável”; neogr.
πλήκτω > rom.plictisi, “aborrecer”; neogr. καλαμάρι > rom. cãlimarã, “tinteiro”.
Por fim, o romeno conta cerca de 50 empréstimos do albanês, alguns dos
quais são muito antigos, mostrando uma notável afinidade entre o romeno, o dalmá-
tico e o albanês. Atribui-se tal afinidade à continuidade geográfica, ao substrato ilí-
rio-trácio comum e ao isolamento das duas línguas românicas. Em relação a esse
substrato comum, a dificuldade está em se localizar o berço do romeno, ou melhor,
do proto-romeno: se na Dácia de Trajano, ao norte do rio Danúbio, ou ao sul. Muitos
romanistas, dentre os quais se destaca Alexandru Philippide (1859-1933), julgam que
o berço do proto-romeno foi à direita do Danúbio, onde teria havido uma simbiose
com o albanês. A ausência de elementos germânicos antigos, o caráter búlgaro dos
mais antigos empréstimos eslavos e as concordâncias com o albanês são os argumen­
tos filológicos para essa localização. Admitindo-se que o albanês seja continuação de
um dialeto trácio-ilírico, apesar do pouquíssimo conhecimento que se tem dessas
duas línguas indo-européias (o trácio, do grupo satem, e o ilírio do kentum), havería
um substrato comum que explica, com certa segurança, a correspondência entre anti­
gos empréstimos ao romeno e os termos encontrados no albanês: rom. mal, “margem
escarpada”, alb. mal, “monte”. (Cf. Dacia Maluensis da época do imperador Marco
Aurélio (161-180 d.C.) e Dacia Ripensis, terra natal de Aureliano (215-275), onde
também venceu godos e vândalos); rom. argea, “cabana de verão onde se tece o
linho”, alb. ragal, “cabana”; rom. abur, “vapor”, alb. avul; rom. brad, “abeto”, alb.
breth; rom. mazãre, “ervilha”, alb. mothule etc. Esses empréstimos podem ser dire­
tos do substrato ou através do albanês. Do adstrato e, portanto, mais recentes, são alb.
budze > rom. buzã, “lábio”; alb. grumas > rom. grumaz, “garganta”; alb. kopil > rom.
copil, “menino”, “criança”; alb. thap > rom. [ap, "bode”.
Em conclusão, o exposto mostra a existência de uma complexa rede de inter-
relações dos idiomas, que se influenciam mutuamente, em grau maior ou menor con­
forme o prestígio da cultura que representam, conforme as diversas situações de subs­
trato, superstrato e adstrato. Em que pesem as dificuldades provenientes do pouco
conhecimento de que se dispõe sobretudo do “terminus a quo” em relação sobretudo
ao substrato, não se pode negar a produtividade desses conceitos, quando usados com
critério. Não é raro que alguma dessas três situações se altere no decurso do tempo,
podendo mesmo confundir-se, tornando difícil caracterizá-las com clareza e precisão,
como no caso do trácio-ilírico, do albanês e do romeno. Mudança de uma condição a
outra temos no celta, que foi adstrato do latim antes das conquistas de Caio Júlio César;
depois da incorporação da Gália ao Império, veio a tomar-se substrato do latim. No
século VI, os celtas da Britânia ocuparam e colonizaram a Bretanha francesa e a língua
celta se tomou superstrato do romance da região, tendo sido até então adstrato; com a
posterior colonização francesa da Bretanha, essa variedade celta tornou-se outra vez

170 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


substrato. Desse inter-relacionamento as línguas não conseguem eximir-se; mesmo as
que permanecem isoladas por alguma razão política ou geográfica, como a variante
sarda do logudorês, até certo ponto ilhada por sua situação geográfica que dificulta a
comunicação, sempre acabam sofrendo influências, ainda que menos intensas.
Assim, não resta dúvida de que os fatores do substrato, do superstrato e do
adstrato, aliados a outros de natureza diversa, como as próprias tendências internas
do latim vulgar, propiciaram a diversificação linguística, da qual se originaram as lín­
guas românicas.

LATIM MEDIEVAL: ADSTRATO PERMANENTE

Quando Odoacro depôs o último imperador romano, Rômulo Augústulo (475-


476), e se tornou o primeiro rei bárbaro de Roma (476), a norma urbana culta do latim,
a urbanitas, usus ou quottidianitas dentro de pouco tempo deixou de ser usada. Mas
o sermo plebleius continuou a ser falado, embora se fragmentasse em dialetos de
modo mais ou menos lento ao perder os suportes de sustentação de sua relativa unida­
de, que haviam sido a administração romana, o exército, a estrutura comercial etc.
A norma literária, ainda que empobrecida, continuou a ser empregada como
língua de cultura, do direito e dos documentos em geral. Outro fator de peso para a
sobrevivência dessa norma foi sua adoção como língua oficial da Igreja cristã, cató­
lica (< καΦ όλην [γην] “universal”) e romana, que herdou, de alguma forma, o ina-
pagável prestígio da Roma antiga, capital do mundo antes civil, agora religioso;
assim, essa norma latina de fato nunca desapareceu, mas continuou a existir como a
língua escrita do Ocidente.
Com o lento despontar das línguas românicas escritas e literárias, o latim con­
tinuou, assim mesmo, a ser usado como língua da ciência. Sempre que o léxico her­
dado, reconhecível pelos metaplasmos que lhe deram feição fonética e morfológica
característica em cada língua românica, necessitava dum termo novo para designar
algo diferente, um conceito recém-criado, uma descoberta etc., recorria ao tesouro
desse latim escrito, a esse adstrato sempre à mão. Esse recurso explica a freqüente
existência de termos populares herdados ao lado de outros semi-eruditos e eruditos,
provenientes da mesma base latina, nas línguas e dialetos românicos; por exemplo, lat.
macula é o ponto de partida para o port. malha, mancha (populares herdados), mágoa
(semi-erudito) e mácula (erudito); lat. plenu > port. cheio (popular) e pleno (erudito);
no francês, os empréstimos tardios do latim são mais visíveis, dadas as grandes trans­
formações sofridas pelos vocábulos herdados; matum > múr (popular), mas maturité
(erudito) e (orbatus) ab oculis > aveugle (“cego”), mas cécité (erudito). A influência
do latim não se restringiu às línguas românicas; a visão cultural latina se manifesta nos

O R IG E M D A S L ÍN G U A S R O M Â N IC A S j 171
decalques encontrados, por exemplo, no alemão: lat. patria terra > al. Vaterland\ lat.
conscientia > al. Gewissen; lat. misericors > al. barmherzig; lat. omnipotens > al. all-
màchtig; lat. compassio > Mitleid; lat. exceptio > al. Ausnahme; lat. obiectum > al.
Gegenstand\ lat. curriculum vitae > al. Lebenslauf. Outros decalques foram feitos pelo
alemão sobre o modelo românico, sobretudo francês, como em fr. expression > al. aus-
druck\ fr. expressif> al. ausdruckvoll·, fr. impression > al. Eindruck etc., cm que o con­
teúdo semântico é latino e românico e apenas os elementos formais são alemães,
segundo acontece com os decalques em geral. Aliás, decalques de vocábulos latinos
estão presentes praticamente em todas as línguas ocidentais: lat. progressus (> port.
progresso, cast. progresso, cat. progrés, fr. progrès, eng. progress, it. progresso, rom.
progres) > al. Fortschritt, dinamarquês Fremskrid, sueco framsteg, holandês vooruit-
gang, tcheco pokrok, croata napredak, ncogr. πρόοδος, húng. haladás.
O latim medieval serviu de modelo também cm outros níveis lingüísticos; na
sintaxe, era parâmetro da prosa literária das línguas românicas ocidentais, que man­
tiveram desse modo a tradição. Trata-se, pois, de influência culta.
O exposto acima refere-se mais à variante denominada “latim medieval pro­
fano”, segundo o esquema da p. 91. Entretanto, o “latim eclesiástico” sem dúvida
teve maior peso como fonte de empréstimos para as nascentes línguas românicas.
Continuação do literário, o eclesiástico é o latim dos Padres da Igreja, dos documen­
tos oficiais etc. Obviamente, não era o clássico de Cícero ou de César, mas também
não se identifica com o chamado latim vulgar, nem com o “latim cristão” dos primei­
ros séculos. Será útil caracterizar essas variedades.

L atim E c lesi Astico

Caracteriza-se como herdeiro do literário no que ele tinha de mais útil ou


necessário para a expressão da nova mentalidade cristã, com fonética e estrutura um
tanto diversa da língua literária antiga, além de enriquecido pela contribuição grega
e popular. Adotado pela Igreja, cm substituição ao grego, desde fins do século II, sob
o papa Vítor I, esse latim é a língua do culto, das escolas, da teologia, da filosofia,
do direito, da ciência e da literatura até a Renascença, ainda que passe a sofrer a con­
corrência das línguas românicas nos últimos séculos.
O latim eclesiástico, portanto, não se confunde com o vulgar. Segundo já
ficou esclarecido, o latim vulgar era falado c se fragmentou nos diversos dialetos
românicos, enquanto o latim eclesiástico continuou a ser a língua oficial da Igreja. E
difícil dizer até quando o povo conseguia entender o latim utilizado nas funções reli­
giosas, inclusive nas homílias. Conhecido é o “terminus ad quem” aproximado, atra­
vés do artigo 17 das determinações do Concilio dc Tours, cm 813:

172 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Visum est unanimitati nostrae ut quilibet episcopus habeat omelias continentes necessarias animo-
nitiones, quibus subiecti erudiantur... Et ut easdem omelias quisque aperte transferre studeat in rus­
ticam Romanam linguam aut Thiotiscam, quo facilius cuncti possint intelligere quae dicuntur.

A todos nós pareceu necessário que cada bispo faça homílias, que contenham os ensinamentos indis­
pensáveis, com os quais os fiéis sejam instruídos... E que cada um procure traduzir com clareza
essas homílias para a rústica romana língua ou teodisca, de modo que todos possam compreender
mais facilmente o que se diz.

Essa determinação mostra que, naquele início do século IX, o povo não mais
entendia, e muito menos falava, o latim, em sua variedade vulgar, falada, que já se havia
transformado na “rustica romana lingua”, ao lado da simplesmente “teodisca” ou ger­
mânica; é clara a oposição entre essas variedades e o latim eclesiástico, até então usado
nos sermões e no qual estão redigidas as determinações do Concilio. Note-se o adjeti­
vo “rustica”, denotando o caráter inculto daquela norma na visão dos que usavam o
latim eclesiástico culto. A expressão “Romana lingua”, mas sem o qualificativo “rusti­
ca”, encontra-se em outro documento, datado de 14/2/842, os Juramentos de Estras­
burgo. Redigidos em latim medieval pelo cronista Nitardo, os Juramentos trazem tam­
bém o primeiro texto nessa “Romana lingua”, ao lado da tradução na “teodisca lingua”.
São quatro juramentos, com os quais Luís, o Germânico, e Carlos, o Calvo, filhos de
Luís, o Pio, depois da batalha de Fontenoy-en-Puisaye (841), renovaram sua aliança
contra o irmão Lotário. Luís, o Germânico, era rei dos francos orientais, em cuja terra
se usava língua germânica, enquanto Carlos, o Calvo, era rei dos francos ocidentais,
cuja língua era o galo-romance. Nesse contexto, Luís, o Germânico, prestou seu jura­
mento na “Romana lingua” para que os soldados de seu irmão pudessem entender,
enquanto Carlos, o Calvo, fez o mesmo na “teodisca lingua” para que o exército de Luís
também pudesse entendê-lo; depois, o exército de cada um dos reis jurou em sua pró­
pria língua. Note-se que os reis Carlos e Luís conheciam as duas línguas, enquanto os
soldados somente falavam uma, a “romana” ou a “teodisca”. Filologicamente, os
Juramentos de Estrasburgo são importantes porque delineiam o quadro linguístico do
século IX na Europa ocidental: o latim medieval, como a língua escrita da cultura e duas
variantes populares, faladas, genericamente denominadas “Romana lingua” e “teodis­
ca lingua”. Confirma-se com isso a verificação do Concilio de Tours de que o povo não
mais entendia o latim.

L atim E clesiástico b L atim Cristão

O latim, adotado pelo cristianismo em substituição ao grego no século II, é


denominado “latim cristão”, que se caracteriza por aspectos populares, buscando

O R IG E M D AS L ÍN G U A S R O M A N IC A S I 173
adaptar-se às condições lingüísticas dos novos convertidos, em sua maioria provenien­
te das classes sociais inferiores. Essa característica é perceptível na ítala ou Vetus
Latina, com seus numerosos plebeísmos. Entretanto, desde os primeiros tempos, a
Igreja teve seus doutores, conhecedores do latim culto e conscientes dessas duas varie­
dades lingüísticas, como Santo Agostinho (354-430) ao dizer: “Melius est reprehen­
dant nos grammatici quam non intelligant populi” (“É preferível que os gramáticos
nos repreendam do que os povos não nos entenderem”) {Com. in Psalm. 138, 20).
Com a chamada “paz constantiniana”, decorrente do Edito de Milão (313),
verifica-se um nova fase, criativa, mas de caráter erudito, que será o latim eclesiásti­
co propriamente dito, a lingua permanente da Igreja. O latim cristão, porém, era uma
língua de caráter técnico e religioso, calcada sobre a κοινή grega dos primeiros tem­
pos do cristianismo; nessas condições é que surgem as traduções bíblicas para o
latim, mantendo-se o mais fielmente possível os torneios, as expressões e as constru­
ções do original grego, que contém, por sua vez, muitos hebraísmos.
Roma e África do Norte são os dois maiores centros iniciais de formulação do
pensamento cristão em latim; da África provêm os mais antigos documentos cristãos
em latim, destacando-se Acta Martyrum Scillitanorum e Passio Perpetuae et
Felicitatis, escritos por volta de 180. Ligados à África são também Tertulíano
(Quintus Septimius Florens Tertulianus, 160-240), nascido em Cartago, Santo
Agostinho (Aurelius Augustinus) nascido em Tagasta (atual Algéria), São Cipriano,
bispo de Cartago (248), e Marcus Minucius Felix (200-240), de provável origem afri­
cana. Esses autores cristãos, porém, conheciam bem os clássicos latinos, dos quais
receberam grande influência. Recorde-se o sonho de São Jerônimo, contado por ele
mesmo: Diante de Cristo, declara-lhe ser cristão, ao que Cristo lhe responde com
severidade: “Mentiris, Ciceronianus es, non Christianus; ubi thesaurus tuus, ibi et cor
tuum” (“Mentes; és ciceroniano e não cristão, pois onde estiver teu tesouro, ali tam­
bém estará teu coração”). Portanto, os dirigentes eclesiásticos, os doutores das
Igrejas e as pessoas cultas que abraçavam o cristianismo, conheciam uma variedade
do latim, muito próximo ao da decadência. Essa variedade, com maior ou menor
influência do latim clássico, tornou-se língua eclesiástica; paralelamente, o povo cris­
tão usava uma variedade popular, baseada no “latim vulgar”, enriquecida com nume­
rosos empréstimos gregos e adaptações semânticas de termos latinos para expressar
a visão cristã do mundo.
Como empréstimos gregos, o latim cristão apresenta, entre outros, anathema,
angelus, apostata, baptisma e baptizare, catechumenus, charisma, erisma, diabolus,
diaconus, eucharistia, ecclesia, eleemosyna, episcopus, evangelium, martyr, myste­
rium, neophytus, presbyter, synodus etc. Outros termos gregos foram adaptados ao
léxico latino, segundo as características e tendências da norma vulgar, por tradução
aproximada, como σαρκικός > carnalis·, πνευματικός > spiritalis·,

174 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
άποκάλυψις > revelatio; επιφάνεια > epifania; λόγος > verbum; μεγαλεία >
magnalia; παλιγγενεσία > regeneratio; άποκατάστασις > restauratio.
Outros termos foram semanticamente adaptados, por metáfora ou por metoní-
mia, para expressar a visão cristã, como por exemplo, em lavacrum, “banho frio” >
“batismo”, peccare, “tropeçar” > “infringir um mandamento”, “pecar”; virtus,
“força” > “qualidade moral”; salus, “bem-estar” > “salvação da alma”; gratia, “bene­
ficio” > “dom divino”; mysterium, “algo secreto” > “verdade revelada”; confiteri,
“reconhecer o erro cometido” > “confessar” (a fé ou os pecados).
Nos campos morfológico e sintático, é difícil apontar características do cha­
mado latim cristão que o distingam claramente do latim vulgar. Na prática, tudo
quanto se afirma de um é possível afirmar do outro, como o emprego do neutro plu­
ral pelo singular (retia por retes, “rédea”, ligna por lignum, “lenha”, ou pira por
pirum, “pera”), ou mudança de conjugação dos verbos, fato muito comum em todas
as línguas românicas, ou ainda a preferências por diminutivos, que é uma caracterís­
tica do latim vulgar (Cf. p. 97). O cristianismo não modificou a língua falada pelo
povo, mas alterou e modificou a mentalidade, a cosmovisão e com isso também o
modo de expressar essa nova realidade mais com um léxico adequado do que com
novas estruturas morfológicas e sintáticas.

L atim E clesiástico e L atim M edieval

Inicialmente, o latim usado pela Igreja estava mais próximo da variedade vul­
gar, uma vez que os próprios apóstolos, em sua maioria, não eram homens letrados,
e o maior número dos que abraçavam a nova fé eram pessoas humildes e incultas.
Posteriormente, a partir do século IV, o latim eclesiástico se aproxima da norma lite­
rária através dos escritos dos Padres e Doutores da Igreja, ainda que mantenha pon­
tos de contato com a língua do povo, sobretudo nos primeiros séculos. Essa norma
eclesiástica, porém, manteve nos diversos níveis lingüísticos tudo quanto era neces­
sário à clara expressão do pensamento. Nesse aspecto, o latim eclesiástico e o cha­
mado latim profano não se distinguem senão pela temática abordada (ver esquema na
p. 91). Enquanto o latim vulgar, e com ele o latim cristão, se fragmentava em nume­
rosos dialetos, durante a fase “romance” das línguas românicas, o latim, herdeiro da
tradição literária romana, tomou-se a língua da Igreja, das escolas e das ciências,
desde a queda do Império Romano até o Renascimento, quando as línguas români­
cas começaram a fazer-lhe concorrência mais séria.
O latim medieval, dito profano, foi utilizado geralmente por pessoas cultas
que o aprendiam e o utilizavam em obras de todos os gêneros (história, medicina,
matemática, jurisprudência, filosofia, crônicas, narrativas etc.). Sua utilização era

O R IG E M D A S L ÍN G U A S R O M Â N IC A S | 175
mais individual, não era imposto e, por isso, manteve-se em níveis lingüísticos geral­
mente aceitáveis.
No latim eclesiástico, porém, houve períodos de decadência, em que até as
fórmulas rituais sofriam mutilações. Lembre-se novamente o fato de o papa Zacarias
(741-752) ter sido levado a reconhecer a validade do batismo ministrado por padres
com a estranha fórmula “In nomina de Patria, et Filia et Spiritua Sancta”. Nesse con­
texto, situa-se a chamada Renascença Carolíngea no século IX. Carlos Magno (768-
814) percebeu a grande decadência do clero em geral; temendo mau entendimento
das Escrituras, o perigo resultante para a missão salvadora da Igreja, convocou gran­
des mestres, como Alcuíno, da Inglaterra, Paulo Diácono, Pedro de Pisa e Paulino de
Aquiléia, da Itália, e Teodulfo, da Espanha, para elevar o nível cultural do clero. Por
ordem do imperador, dioceses e abadias fundaram escolas, onde se ensinava o latim
ciceroniano; a conseqüência foi a separação clara entre o latim e o romance, elimi­
nando-se o “latim arromançado”. Na Espanha, a chamada Reforma de Cluny reabi­
litou o latim clássico, sobretudo sob o rei Afonso VI (1072-1109).
O efeito desses movimentos de reforma e de aprimoramento foram duradouros
e o conhecimento do latim aprofundou-se consideravelmente, inclusive com o apareci­
mento de numerosos escritores, poetas, teólogos e pensadores, firmando-se ainda mais
o latim como língua literária e científica, pelos menos até o século XVIII, mesmo
depois que as línguas modernas românicas, germânicas e eslavas se haviam firmado.
Pelo menos até o Renascimento, todas as obras eram escritas em latim, bem como as
leis, as ordenações régias ou eclesiásticas, testamentos, escrituras e documentos em
geral nos tabelionatos e até as receitas médicas; como decorrência desse excesso de uso
do latim, não entendido pela população, o governo português determinou, em 1498,
que essas receitas fossem escritas em português, impondo penas ao médico que as exa­
rasse em latim, bem como ao boticário que as aviasse. O mesmo aconteceu na França,
em 1539, quando o rei Francisco I mandou, com a ordenação conhecida como Villers-
Cotterêts, que todas as sentenças fossem registradas e transmitidas aos interessados em
francês e não mais em latim, a fim de se evitarem más interpretações. Também nas
escolas, o ensino era ministrado em latim. As primeiras tentativas de se usar a língua
materna foram as de Port-Royal, no século XVII; nas “Petites Ecoles” passou-se a
empregar o francês no aprendizado do latim, do grego e de todas as demais disciplinas.
E nesse imenso acervo cultural e literário, adstrato sempre disponível, que as
línguas românicas vão buscar os elementos lingüísticos, de que necessitassem em
todos os níveis; trata-se, portanto, de influência culta, mas muitas vezes assimilada
pela língua falada, de tal modo que frequentemente se torna difícil reconhecê-la.
•Representou ainda um grande laço de união entre as línguas românicas do Ocidente,
conferindo-lhes certas semelhanças, independentemente das de sua origem, o que
não aconteceu com o romeno, isolado desses influxos por diversos motivos.

76 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


4

A R o m â n ia

Para a localização das línguas românicas no tempo e no espaço, os antigos con­


ceitos de Orbis Romanus e Imperium Romanum não são mais adequados, dadas as
várias acepções atribuídas ao termo “romano” (ver p. 38-39). As denominações dos
territórios do Império Romano são pontos de referência iniciais para a localização das
línguas e dialetos românicos; deslocamentos e modificações posteriores dos pontos de
vista étnico, político e lingüístico exigiram uma denominação mais abrangente.

CONCEITO DE ROMÂNIA

Documentado pela primeira vez por Paulo Orósio, discípulo de Santo


Agostinho, em Historiae Adversus Paganos (VII, 6, 43), o termo România parece ser
uma criação popular, já que ao citá-la Paulo Orósio acrescenta “ut vulgariter loquar”
(“para falar de modo popular”). Inicialmente, como “romano” se opunha a “bárba­
ro”, no sentido de “estrangeiro”, ou seja, “não latino” ou “não grego”, România se
opunha a Barbaria e Barbaries·, nesse sentido, no período clássico encontra-se o
termo Barbaria. Quanto a România, porém, não se sabe quando passou a ser corren-
te; a expressão de Paulo Orósio faz supor que se trata de um termo usual na lingua
falada, designando todo o império romano ou o mundo romano. Curiosamente, essa
atestação de România coincide com o período cm que o mundo romano se esfacela-
va e os godos pretendiam construir a Gótia sobre as ruínas da România. O termo
ocorre também no biógrafo de Santo Agostinho, Possídio, que qualifica os vândalos
de “Romaniae eversores”.
No Oriente, encontram-se várias atestações de România, empregado como
sinônimo de Império Romano tanto Ocidental como Oriental. Assim, Santo Atanásio
(295-373) considera Roma a “capital da România”: Μητρόπολις ή 'Ρώμη τής
'Ρωμανίας. Também Santo Epifãnio (315-403) diz que o espírito demoníaco domi­
nou Ario e o levou a pôr fogo na Igreja, fogo “b κατείληφε πάσαν τήν
'Ρωμανίαν σχεδόν, μάλιστα τής άνατολής τα μέρη” (“que incendiou quase
toda a România, sobretudo as partes do Oriente”).
No Ocidente, România mantém o sentido político equivalente a Império
Romano, como o atesta o historiador dos godos Jordanes, em Getica, 25: “Diuque
cogitantes (Visigothae) tandem communi placito legatos ad Romaniam direxere, ad
Valentem imperatorem, fratrem Valentianiani.” (“E refletindo por muito tempo, final­
mente os visigodos, de comum acordo, enviaram legados à România, ao imperador
Valente, irmão de Valentiniano”) . Posteriormente, România passa a designar os ter­
ritórios onde se mantinha a cultura romana, sobretudo onde se falava uma língua
românica. Quando Carlos Magno fundou o chamado Sacro Império Romano, Româ­
nia adquiriu também um sentido político, como o denota um documento do rei Luís,
o Pio, c de Lotário, em que se alude a “in nostris et Romaniae finibus” (“nos nossos
territórios e nos da România”). Quando, porém, o poder passou a ser exercido por
imperadores residentes na Gcrmânia, o termo România voltou a designar apenas os
territórios de língua românica, particularmente a Itália. Assim, sem conteúdo semân­
tico bem definido, o termo chega até a se opor simplesmente a Lombardia, cspccial-
mente depois que os bizantinos conquistaram o exarcado de Ravena e a região de
Pontápole que, por ser a única na Itália a pertencer ao Império Romano do Oriente,
era designada por “România”, donde o nome da atual Romagna, único topônimo
derivado de România. Era considerada uma “Romaníola”, ou seja, uma pequena
România, provindo daí o adjetivo étnico romagnolo.
O moderno conceito de România, porém, somente foi fixado com o advento
da Filologia Românica. Em sua Grammatik der romanischen Sprachen, de 1836,
Friedrich Diez (1794-1876) consagrou o termo ao dividir a România em Ocidental e
Oriental, no que foi seguido posteriormente pelos romanistas em geral; com isso, o
termo se tomou corrente. Gaston Paris buscou definir esse conceito em 1872; com
base na tradição, define-se România como o conjunto dos territórios onde se falou
latim ou onde se fala atualmente uma língua românica, incluindo-se as respectivas

178 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


literaturas e a cultura de seus povos. Levando-se em conta as mudanças ocorridas no
tempo e no espaço relativas à abrangência dos territórios considerados românicos,
distinguem-se três fases na história da România.

PERÍODOS DA ROMÂNIA

Levando-se em conta os elementos da definição, a história da România se


divide em três períodos, como veremos a seguir.

ROMÂNIA ANTIGA

Como se notou, as primeiras atestações da România indicam que o termo era


sinônimo de Império Romano ou Orbe Romano, com denotação étnica e política no
Ocidente e apenas política no Oriente. A esse conjunto de territórios, que nos primei­
ros decênios do século II d.C. atingiu sua extensão máxima, com um total de 301 pro­
víncias, dá-se o nome de România Antiga. A denominação se apóia em critérios mais
políticos que lingüísticos e culturais. É certo que em todas as províncias, mesmo nas
mais distantes, o latim era falado pelo menos pelo exército, pela administração, pelos
colonos e comerciantes. Mas houve províncias que fizeram parte dessa România
Antiga por muito pouco tempo, como a Armênia (de 114 a 117 d.C.), a Assíria e a
Mesopotâmia (de 115 a 117 d.C.), nas quais a latinização foi nula. Em todo o Oriente,
a língua usual era o grego, e o latim não chegou a se impor; basta lembrar que dos
milhares de papiros existentes, provenientes daquela região, apenas cerca de quatro­
centos são escritos em latim e, mesmo assim, há os grafados com caracteres gregos;
e a influência grega é perceptível praticamente em todos eles.
Outras regiões, como os Agri Decumates, a leste do rio Reno e norte do rio
Danúbio, e também a Britânia, conquistada lentamente entre 43 e 71 d.C., foram lati-
nizadas apenas superficialmente; nesses territórios, a presença romana deixou seus
traços em numerosas ruínas de obras públicas, tais como aquedutos, teatros, estradas
etc., mas poucos vestígios do latim (ver mapa 1, p. 353).

ROMÂNIA MEDIEVAL

A redução da România Antiga começou, portanto, já no século II d.C.. As inva­


sões dos povos germânicos e eslavos, como se viu, causaram a fragmentação primeira­
mente política e posteriormente lingüística da România. O Império do Oriente subsistiu

A ROMÂNIA 179
ainda por cerca de dez séculos; ali, porém, o predomínio da língua e da cultura gregas
sempre foi incontestável, embora o latim tivesse sido a língua oficial por muito tempo.
Assim, com a queda do Império Romano do Ocidente, em 476, o conceito de
România passou a ser principalmente cultural e lingüístico e eventualmente político.
A România Medieval abrange as regiões em que se continuou a falar o latim vulgar,
agora em rápido processo de fragmentação rumo a dialetos e línguas românicas atra­
vés da fase romance. Trata-se de uma România reduzida, composta pela Itália, Récia,
Gália, Ibéria, ilhas mediterrâneas, Dalmácia e Dácia, territórios onde, grosso modo,
nasceríam os dialetos e as línguas românicas. Perderam-se as já citadas regiões fra­
camente romanizadas; os Bálcãs, como o atestam dados do substrato em vários pon­
tos, desromanizaram-se mais lentamente. A Dalmácia continuou pertencendo ao
Império do Ocidente na divisão de 395, depois da morte de Teodósio, o Grande,
enquanto a região do leste, dita “Praevalitana” passou a pertencer ao do Oriente.
Assim, a antiga Dalmácia permaneceu por mais um século e meio sob a influência
de Roma, tendo sido dominada por Constantinopla em 535; com isso, sua evolução
lingüística acompanhou em parte a das línguas românicas ocidentais. Explica-se
desse modo que o ragusano, dialeto da região de Ragusa ao sul, só tenha desapareci­
do no século XV; e o dalmático, língua falada ao longo da costa do mar Adriático e
cujo último reduto foi a ilha de Veglia ou Querso (esl. Krk), donde o nome veglioto,
descoberto e estudado por Matteo Bartoli, desapareceu somente no fim do século
XIX (ver mapa 12, p. 367).
A perda desse território da România começou durante a Idade Média; os dia­
letos românicos foram sendo lentamente empurrados em direção ao mar, tomando-se
substrato das línguas eslavas hoje ali dominantes. A Dácia, mesmo isolada e total­
mente cercada por falares não românicos, nunca deixou de fazer parte da România,
bem como pequenas ilhas lingüísticas onde se falam variedades consideradas dialetos
do romeno.
Na Gália, perdeu-se a parte oriental da Bélgica e parte da Bretanha, ocupada
pelos bretões celtas provenientes, no século VI, das ilhas britânicas e falantes de uma
variedade lingüística do ramo celta britânico, como o címrico e o cômico. Na
Península Ibérica, exclui-se apenas o País Basco, na divisa com a França e ao longo
do golfo de Biscaia; seu território, porém, vem sendo diminuído através dos séculos;
hoje abrange aproximadamente a metade do espaço que ocupava no século XVI.
No continente africano, as perdas da România foram grandes. A África
Romana constava da Africa Proconsularis (região da antiga Cartago), da Mauretania
Caesarensis, Tingitana e Numidia, ou seja, do Marrocos à Tripolitânea em termos
atuais. Todo o norte africano havia sido bem romanizado até Leptis Magna, na pro­
víncia da Africa Proconsularis-, nos territórios mais ao oriente, a presença grega era
grande e a latinização extremamente tênue. Com a invasão dos vândalos e a subse-

180 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


qiiente formação do primeiro reino bárbaro dos vândalos (429-534) em território do
Império, a cultura latina começou a ser erradicada do norte da África; com a tomada
de Cartago por Abd El-Malik, em 698, e implantação do domínio árabe, os traços da
cultura latina foram quase totalmente eliminados, tanto que nem o domínio de fran­
ceses e espanhóis em séculos posteriores conseguiu reanimá-los.
Com todas essas perdas, a România Medieval representa a fase territorialmen­
te menos extensa, mas foi nela que as línguas românicas se formaram.

ROMÂNIA MODERNA

A fase moderna da România começa no fim do século XV, quando portugue­


ses e espanhóis, levados pelo êxito da reconquista da Península Ibérica, atacaram o
norte da África; os portugueses ocupam Tânger e Ceuta (1471) e os espanhóis, Meli-
la (1497) e Oram (1509) na região do atual Marrocos. Ao mesmo tempo, os portugue­
ses projetam contornar a África para continuar a combater o islamismo e completar a
reconquista, além de^reaver a Terra Santa com a ajuda de um certo Padre João, da
Abissínia, que se supunha cristão. A esses objetivos religiosos juntaram-se outros, eco­
nômicos e comerciais, como estabelecer relações diretas com a África Oriental, tendo
em vista escravos, ouro, especiarias e outras mercadorias (ver mapa 8, p. 363).
Iniciaram-se, assim, as grandes navegações com a descoberta da Ilha da Ma­
deira (1419), dos Açores (1431) e Cabo Verde (1445). Vasco da Gama encontra a rota
para as índias em 1498, contornando o cabo das Tormentas e, em 1500, Pedro Álva­
res Cabral chega ao Brasil. Cristóvão Colombo descobre a América Central em 1492,
seguido por numerosas expedições que incorporaram grande parte das Américas ao
reino espanhol e nelas implantaram a língua castelhana. A primeira grande expedição
francesa para a América do Norte é de 1524 e a seguinte de 1534, chefiadas respecti­
vamente pelo florentino Verrazano e por Jacques Cartier. Samuel de Champlain
(1567-1635) é o primeiro governador do Canadá, com autoridade sobre a Terra Nova,
Nova Escócia e Nova França; com a chegada de mais de 10.000 colonos franceses,
outra língua românica é implantada no Novo Mundo. Nas Antilhas, o francês foi intro­
duzido em São Cristóvão (1625), São Domingos, Guadalupe, Martinica (1635) e Haiti
(1655); no continente da América do Sul, o francês só é falado na Guiana Francesa.
Na África, o português foi implantado com as sucessivas conquistas na Guiné
Portuguesa, Angola, Moçambique e nas ilhas de Príncipe e São Tomé. As possessões
espanholas na África não chegaram a implantar o espanhol, como em Rio d’Ouro (na
altura das Canárias) e na Guiné Espanhola. O francês convive ainda hoje com diale­
tos locais nas antigas possessões da África Ocidental Francesa (1904), África
Equatorial Francesa (1852-1905), em Madagascar (1896), Marrocos e Congo Francês.

A ROMÂNIA 181
A Algéria pertenceu à França de 1830 a 1962, ano em que lhe foi concedida a inde­
pendência completa, condicionada apenas à concessão de garantias aos franceses ali
residentes. Em 1906, cerca de 13% da população era francesa; com a independên­
cia, muitos desses franceses denominados "pieds noirs” (“pés pretos” ) emigraram.
Por causa do grande número de variedades dialetais autóctones, o francês ainda
hoje é a língua de cultura tanto nos países do norte da África (Argélia, Tunísia,
Marrocos) como nos territórios centrais do continente, que foram antigas posses­
sões francesas.
No Oriente, o português se fixou nos pequenos enclaves conquistados na
índia: Diu, Damão, Goa, Mangalor; com a ocupação militar desses territórios por
Nehru, em 1961, a situação do português ficou difícil. Já em Macau, na foz do rio
Sikiang na China, o português evoluiu para um dialeto crioulo ainda hoje existente,
tendo acontecido o mesmo em Java, Málaca e Singapura e em alguns pontos da ilha
do Ceilão, onde se fala o crioulo malaio-português. Também o castelhano das
Filipinas veio a se transformar em um tipo crioulo. De modo semelhante, na ilha de
Curaçao, próxima da Venezuela, nas Antilhas, formou-se uma variedade crioula,
denominada “papiamento”, com base inicial portuguesa mas atualmente com forte
influência castelhana, que dispõe até de modesta literatura e é usada em jornais e
revistas, embora a ilha seja uma possessão holandesa11. Em fins do século passado,
as possessões francesas no Oriente compreendiam a Cochinchina (1862), o
Cambodja (1863), o território do atual Vietnam (1883), Laos (1893) e Tonkin, ao
norte (1884); na Península da índia, pertenceram à França os enclaves de Yanaon,

x '

31. Como exemplo das características gerais de um dialeto crioulo, segue um texto em papiamento, publicado
no jornal Bon Dia Aruba, em Oranjestad, capital da ilha Aruba, que com as de Curaçao c Bonaire constitui
o pequeno arquipélago de domínio holandês no Caribe; o texto é de 29 de julho de 1994:
“Nos norma y balornan a desaparecé
E ehempelnan aki ta demostrá bon clá cu nos gobernantenan tampouco no ta conciente di nos cultura.
E concientisacion di nos cultura a cuminsá na scol, pero no mediante di gobierno, pero mediante un comision
boluntario. PAPIAMENTO, nos idioma nacional, tainbe ta un parti importante di nos cultura. Tambe na e
parti aki nos mester pone mas atencion, principalmente awor cu nos tin masha hopi influencia di otro idioma.
Seis ana pasa a lanta e comision PAPIANDO PAPIAMENTO. Meta di comision mencioná ta pa promové
Papiamento. Tabatin diferente actividad y c último proyecto tabata e pôster “JufTrouw ik heb een boter mee-
gebrengt”, eu a sali a ana aki y eu ta trata e problema di idioma den ensenansa.
Actualmente e promé eurso di Papiamento Grado Tres [Papiamento L.O.] na Aruba ta tumando lugar na
Instituto Pedagogieo Arubano. Pa e curso e vaknan cu ta wordo duna ta. fonética, fonologia y graniatica di
Papiamento. Riba e tereno di Papiamento a haci diferente investigacion cientifico. Actualmente Instituto di
Cultura junto cu Departamento di Knsefianza ta traha riba e investigacion di frecuencia di palabra. Manera
nos a ripará tin hopi trabao pa haci riba e tereno di cultura. Mester pon mas atencion na historia cultural di
Aruba y esaki principalmente den ensenanza. Pesey analizá bon bo vota, busca esun eu bo ta sinti eu Io por
aportá mas riba e tereno aki. Deposita bo voto eu nos cultura y nos edueaeion den mente. Ta algo cu mester
di un renovacion y continuacion”.

182 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Mahé e Pondichery; na Oceania, as ilhas Marquesas, Tahiti e Tuomotu entre outras.
Mais permanente é a influência do francês nas ilhas da Oceania do que nos territó­
rios do continente asiático, onde o francês permaneceu nos meios cultos.
Convém ainda lembrar as migrações, que têm levado milhares de falantes de
uma língua românica para países ou regiões de língua não românica, em busca de
melhores condições de vida, como os milhões de latinos que vivem nos Estados
Unidos, Canadá, Inglaterra, Alemanha e alhures. No computo geral, esses migrantes
representam um número expressivo, difícil, porém, de ser calculado, tendo em vista
que muitos deles são clandestinos.
Há ainda grupos isolados de fala românica, embora restrita, como os sefardi-
tas levantinos, judeus de fala castelhana, expulsos em 1492 e acolhidos inicialmente
pela Turquia; atualmente, vivem também na Bósnia, Macedônia, Bulgária, Romênia
e Grécia; o castelhano deles ainda hoje corresponde ao do período clássico, com a
conservação do /f/, que não passou a /h/ ou a /φ/, distinção das sibilantes /s/ e Izl sur­
das e sonoras etc., e que é conhecido como “ladino”, quando usado nos livros reli­
giosos. Parte deles contentrou-se em Salônica, onde chegaram a constituir metade da
população. De Portugal, os judeus foram expulsos por D. Manuel I, o Venturoso, em
1496; fixaram-se sobretudo na Holanda, na capital Amsterdam, na Alemanha, na
cidade de Hamburgo e na Baviera, e na Itália em Livorno. Um manuscrito do século
XVIII afirma que os judeus da Holanda e de Livorno falavam todos o português.
Atualmente, porém, é certo que os de Livorno falam o italiano; na Alemanha e na
Holanda, o português conservou-se por mais tempo, como também o castelhano no
ambiente sefardita, mas atualmente restam apenas alguns nomes de família e um
número restrito de vocábulos.
O esboço acima traçado da expansão dos povos e coletividade de língua româ­
nica mostra que a România Moderna é a mais ampla das três, embora não se tenha fixa­
do em todos os territórios para os quais a respectiva língua românica foi levada. De
qualquer forma, porém, as línguas românicas são faladas em todos os continentes,
detentoras em toda parte duma literatura muito vasta e valiosa (ver mapa 25, p. 380).

FASES DA EVOLUÇÃO DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS

Nos itens acima foram abordados, particularmente, os aspectos relativos à loca­


lização do latim e das línguas românicas no espaço, aspectos mais relacionados com
sua história externa. Resta verificar as fases de sua evolução interna, ou seja, as fases
através das quais o latim, em sua variedade vulgar, originou as línguas românicas.
Sob esse ponto de vista, a diacronia das línguas românicas se divide em três
fases, cujo “terminus a quo” é o latim vulgar e o “terminus ad quem” são as línguas

a r o m â n ia 183
românicas, passando-se por uma fase intermediária comumente denominada “roman­
ce” e que eventualmente poderá ser subdividida.

FASE LATINA

Esta fase latina corresponde ao período em que o latim vulgar e urbano era a
língua do Império, isto é, aproximadamente do século VI a.C. ao século V ou VI d.C.,
durante os quais intervieram todos os fatores internos e externos que, posteriormen­
te, farão surgir as línguas românicas. Embora o “terminus a quo” seja o latim vulgar,
os fatos mostram que a relativa coesão interna da norma vulgar foi mantida, enquan­
to o latim da administração e outras instituições centralizadoras atuavam como cata­
lisadores. Com o desaparecimento da norma urbana, no início do século VI aproxi­
madamente, a vulgar entrou em processo de fragmentação mais ou menos rápido
conforme a região. A rapidez da fragmentação foi determinada por fatores como o
grau de latinização e a ação dos substratos e superstratos, além das variações diale­
tais do próprio latim vulgar.
Quanto a essas variedades do latim vulgar, muito se tem discutido. Levados
pelo propósito de dar às línguas românicas uma fonte única, romanistas do século
passado exageram em salientar uma homogeneidade quase absoluta, dificilmente
sustentável. Contudo, as divergências de pormenor entre as línguas românicas postu­
lam bases latinas vulgares diversificadas e explicadas pela época em que a região foi
latinizada, pelas distâncias em relação ao centro e pela dificuldade de acesso e de
comunicação. Desse modo, as regiões de colonização mais ajitiga teriam um latim
mais arcaico, enquanto as mais recentes apresentariam uma língua mais evoluída. A
distância da Ibéria e da Dácia, em relação a Roma, explicaria os arcaísmos do latim
vulgar dessas regiões, o mesmo acontecendo com a Sardenha, pelas dificuldades de
acesso, além das inibições normais decorrentes de se considerar a ilha como terra de
degredo. Essas circunstâncias, porém, podem ter sido atenuadas pela presença da
administração e os outros fatores apontados.
Por outro lado, são também inegáveis as numerosas concordâncias panromâ-
nicas no léxico, na fonética, na morfologia e na sintaxe. Em conclusão, pode-se afir­
mar que o latim vulgar, como toda língua ou dialeto falado em regiões amplas, apre­
senta uma uniformidade básica com variantes mais ou menos notáveis. Exemplo de
grande uniformidade é dado pelo latim literário, escrito, sendo muito raras as exce­
ções nessa norma, como a controvertida “patavinitas” de Tito Lívio (59 a.C.-17 d.C.).
O governador da Gália Cisalpina, Asinius Pollio, segundo relato de Quintiliano (Ins­
titutio Oratoriae, de 1.5.56 e 8.1.3), criticou o sabor provinciano de certas expressões
de Tito Lívio, contrastantes com a autêntica urbanitas romana, por usar regionalis-

184 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


mos próprios de Patavium, atual Pádua, sua cidade natal. As criticas de Pollio provo­
caram a indignação de Morhof (1639-1691), que transformou a patavinitas de Livio
em asinitas de Pollio em sua obra De Patavinitate Liviana (1685).

FASE ROMANCE

Esta fase abrange o período em que o latim vulgar começa a se modificar até
se transformar nas línguas românicas modernas. Trata-se de um processo lento, que
se estende por séculos e acabou por alterar estruturalmente o latim vulgar e fragmen­
tar sua unidade no plano territorial. Cronologicamente, é muito difícil estabelecer
datas, mesmo aproximadas; entretanto, admite-se que a perda da quantidade vocáli-
ca e sua substituição pelo acento de intensidade e outras modificações fonéticas se
deram nos séculos IV e V As modificações morfológicas e sintáticas, como a substi­
tuição dos casos por torneios preposicionados, a criação dos artigos, a conjugação
passiva só analítica, as formas verbais perifrásticas etc. tornam-se claras apenas nos
séculos VII ou VIII. Essas breves averiguações mostram que não houve nenhum limi­
te cronológico claro entre o latim e as línguas românicas, não sendo, portanto, pos­
sível dizer quando o latim vulgar deixou de ser falado, pois foi um processo gradual
sem maiores injunções, cujo “terminus ad quem” são as línguas românicas.
Chegou-se, assim, a uma época em que esse conjunto de modificações fez
com que o latim já não fosse mais entendido. A esse tipo de linguajar se deu o nome
de romance, originário do Romanice fabulare, oposto ao Latine loqui. A primeira
atestação, muito clara, da existência desse romance é o já citado cânon 17 das reso­
luções do Concilio de Tours. Sabendo-se que qualquer modificação em grandes ins­
tituições, como a Igreja, é lenta, pode-se afirmar com segurança que já antes do sécu­
lo IX o povo em geral ou grande parte dele só falava o romance e não entendia mais
latim, conhecido apenas por aqueles que freqüentavam as escolas e essas eram pou­
cas, destinadas preferencialmente a nobres e clérigos.
Da mesma forma que o latim vulgar, as variedades não foram escritas. Os que
escreviam, faziam-no em latim medieval, sob as mais diversas denominações, como
latim patrístico, litúrgico, eclesiástico, dos diplomas, das chancelarias, notarial, dos
tabeliães etc., ainda que nesses documentos se encontrem muitos termos romances,
mais numerosos que os do latim vulgar em textos literários. A atitude das pessoas cul­
tas em relação ao romance era semelhante à dos escritores e gramáticos latinos relati­
vamente ao sermo plebeius. Entretanto, em razão de essa elite culta, não houve de fato
interrupção entre a literatura latina tardia e a literatura latina medieval; os modelos para
a prosa e para o verso continuaram a ser os clássicos, residindo a dificuldade, cada vez
maior, no manejo de uma língua não mais falada ordinariamente; nesse contexto, sur-

a r o m â n ia 185
gem os glossários (ver p. 127), destinados a facilitar a leitura de textos em latim, lín­
gua que já soava diferente, como quando lemos textos do português arcaico.
O processo modificador, em direção ao romance e às línguas românicas, come­
çou bem cedo sob a influência dos substratos e dos adstratos, já durante o período do
bilingüismo. Datam desses primórdios os empréstimos léxicos das línguas itálicas (tos-
cano, prenestino, paduano etc.), que Quintiliano considera como verba peregrina
(“palavras estrangeiras”), embora afirmando “licet omnia Italica pro Romanis habeam”
(“ainda que considere romanas todas as [palavras] itálicas”) em sua Institutio Oratoriae
1.5.56. Com a queda do Império, as forças do substrato e do superstrato aceleram o pro­
cesso, ocasionando o que W. von Wartburg denominou Ausgliederung, desmembra­
mento ou fragmentação lingüística da România.
A evolução desse processo modificador e fragmentador era percebida por
observadores, como São Jerônimo (348-420), discípulo de Aelius Donatus, ao afir­
mar que o latim se modificava “et regionibus quotidie... et tempore” (Comm. ad. Gal.
2.3). A hipérbole expressa pelo quotidie (“diariamente”) denota a rapidez da frag­
mentação lingüística aos olhos do autor. Os regionalismos e os empréstimos léxicos
se multiplicam e se fortalecem. A ausência de um fator de unificação, como havia
sido, por exemplo, a administração romana, facilitou a ação, embora inconsciente,
das tendências modificadoras na fonética, na morfologia, na sintaxe e no léxico. No
período romance, a fragmentação da România foi tão grande que nenhuma varieda­
de lingüística conseguiu a princípio destacar-se como comum a alguma região mais
vasta, conforme se vê na história de cada uma das línguas românicas.

FASES DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS MODERNAS

Em substituição às forças centrípetas de Roma, surgiram outros centros, quer


políticos - sobretudo capitais de novos reinos e ducados - , quer religiosos, com as dio­
ceses e suas escolas e mosteiros. Formam-se, portanto, muitos centros, cuja área de
influência não tem limites definidos. Aliás, os habitantes do antigo Império Romano
não eram regionalistas; integrados ao orbis Romanus, desconheciam o nacionalismo
como nós o entendemos. O romance local era considerado apenas uma forma popular
e familiar da língua comum, o latim. Embora divididos politicamente em vários reinos
que os povos bárbaros haviam construído sobre as ruínas do Império Romano, as popu­
lações românicas mantiveram por muito tempo ainda o sentimento de pertencerem a
uma só grande nação. Certamente, a tentativa de Carlos Magno de restaurar o antigo
Império Romano procurou capitalizar esse sentimento. Por outro lado, o cristianismo,
com sua doutrina transcendentalista, é um fator que não favorecia o aparecimento do
nacionalismo e com ele o anseio por uma língua nacional distintiva. A Igreja, com sua

186 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


complexa unidade religiosa e herança cultural latina, representou uma grande força de
coesão da Europa Ocidental, sobretudo a partir da conversão dos povos bárbaros.
Quando, porém, os limites das diversas nações vieram a tornar-se menos ins­
táveis e os falares românicos assumiram o status de línguas literárias, ainda que de
modo bastante lento, a situação se altera. De início, porém, não se pode falar a rigor
de línguas; são antes um conjunto de dialetos. Razões diversas levaram uma dessas
variedades a se destacar e depois a se impor sobre as demais, relegando-as ao plano
familiar ou, no máximo, regional.
A fase romance é variável para as diversas línguas românicas, de modo que as
respectivas línguas literárias surgem em épocas diferentes; os primeiros documentos
surgem entre os séculos IX e XVI. Assim, consideram-se os dois textos em “romana
lingua” dos Juramentos de Estrasburgo (842) o primeiro documento em uma língua
românica. Contudo, não se sabe com certeza de que região da França seria o dialeto
usado; os dultismos indicam certa elaboração, como o emprego do subjuntivo sit,
dificilmente admissível como vulgar. Só no ano de 987, a corte real francesa se ins­
tala na íle-de-France, iniciando com isso a elevação do dialeto local, o frâncico, até
então sem qualquer notoriedade, à condição de língua oficial e, posteriormente, lite­
rária, o que vem a se concretizar apenas no século XV. Nessa escalada, essencial lhe
foi o apoio político, sobretudo em sua luta contra a concorrência do normando no
século XII e a do picardo no século XIII.
Em português, os primeiros documentos começaram a surgir no século XII; a
poesia datável mais antiga é a cantiga de amor de Paay Soarez de Taveiroos - “No
mundo non m ’ei parelia” - escrita entre 1189 a 1206. Formado com base nos falares
de Lisboa e de Coimbra e maiores contribuições dos dialetos do sul que dos do norte,
o português literário não sofreu concorrências dialetais, como o francês, mas teve
que firmar sua identidade perante o castelhano. Assim, Gil Vicente (1470-1540) tem
autos e farsas em português e em castelhano e em algumas de suas obras usou as duas
línguas, refletindo uma situação em que não eram ainda bem claros os limites distin­
tivos entre as duas línguas, o que vai ocorrer com Luís Vaz de Camões (1524-1580)
em Os Lusíadas (1572).
De modo geral, as línguas românicas assumiram sua feição literária definiti­
va nos séculos XV e XVI; em algumas há consideráveis diferenças entre a língua dos
primeiros documentos e a literária moderna. Lendo-se, por exemplo, a Chanson de
Roland tem-se a impressão de uma língua estranha com muitos poucos pontos de
contato com o francês atual; o mesmo acontece com o castelhano do Cantar dei mio
Cid, embora em menor proporção.
Nessa perspectiva, o provençal dos séculos XI ao XIII, como língua literária
da lírica trovadoresca, apresenta notável unidade, apesar das variações dialetais. Da
mesma forma, o catalão literário dos séculos XIII, XIV e XV se caracteriza por uma

AROMÂNIA I 187
extraordinária unidade linguística, explicada pelo fato de ter como modelo a língua
oficial da chancelaria do reino de Aragão.
A língua literária italiana fundamenta-se nas obras de Dante Alighieri (1265-
1321), Francesco Petrarca (1304-1374) e Giovanni Boccaccio (1313-1375), escritas,
em parte, no dialeto toscano ou, mais precisamente, florentino. Quando a Accadenda
delia Crusca, influenciada pelas Prose delia volgar língua, publicadas em 1525 por
Pietro Bembo, escolheu como modelo de seu primeiro dicionário a língua daquela
famosa tríade, especialmente a de Boccaccio, o florentino do século XIV se consa­
grou como a língua literária da Itália, caso único entre as línguas românicas. Esse
retorno ao modelo medieval, já literário, explica a manutenção das mesmas feições
linguísticas, tanto que um leitor italiano de hoje não encontra maiores dificuldades
em compreender a Divina Commedia de Dante, a não ser uma ou outra expressão. A
grande aceitação da variante florentina entre os intelectuais obstou que outros diale­
tos chegassem à condição ambicionada de língua literária.
No conjunto das línguas românicas, os motivos principais que levam uma
variedade dialetal à categoria de língua literária são de ordem cultural e política.
Onde nenhum desses motivos foi suficientemente forte, nenhuma variedade lingüís-
tica conseguiu sobrepor-se às demais; é o que se deu com o rético, em cujo ramo oci­
dental pelo menos cinco dialetos ainda disputam o privilégio de ser a língua literária.
Na Romênia, a falta de unidade política fez com que a verdadeira literatura romena
só surgisse no século XIX.
Em conclusão, cada língua românica tem sua história característica e uma tra­
jetória própria, que convém conhecer. Vejamos, a seguir, os principais tópicos da his­
tória externa de cada uma delas; eventualmente, serão citados também fatos da his­
tória interna.

O Ro m e n o

Apesar de ter tido menos de dois séculos de latinização, pois, conquistada


pelo imperador Trajano (98-117 d.C.) entre 101 e 106, teve de ser abandonada por
Aureliano em 270, sob pressão dos sármatas e visigodos, a antiga Dácia se latinizou
de modo suficientemente profundo, para que ali surgisse uma língua românica. Essa
rápida latinização da Dácia se deveu a uma verdadeira substituição de população,
tendo havido um repovoamento com colonos vindos de todo o Império, segundo
informa o historiador Eutrópio:

Traianus, victa Dacia, ex toto orbe Romano infinitas eo copias hominum transtulerat ad agros et ur­
bes colendas. (Breviarium ab urbe condita, VIII, 6)

88 j E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
(
Vencida a Dácia, Trajano havia transferido para lá imensas quantidades de pessoas para habitar as
cidades e cultivar os campos.

Essa substituição de população era comum depois das conquistas iniciais de Roma,
tornando-se muito rara posteriormente. No caso da Dácia, ela explica o fato dessa
região ter sido latinizada no curto período de cinqüenta anos.
O abandono precoce da região por Roma teve consideráveis conseqiiências
culturais e lingüísticas. Enquanto as línguas românicas do Ocidente mantinham con­
tato permanente com o latim medieval da Igreja, das escolas, da administração e dos
documentos oficiais, o romeno permaneceu no âmbito da cultura bizantino-eslava,
cuja língua oficial e religiosa era inicialmente o grego. Depois, com a constituição
dos principados eslavos, passou-se a usar o eslavo antigo e o médio búlgaro; esse
eslavo então empregado foi denominado também “paleoeslavo” ou “antigo eslavo
eclesiástico”, escrito com o alfabeto cirílico. O Estado romeno começou a se consti­
tuir, quando Ionitza Asan foi coroado “rei dos búlgaros e dos valacos” em 1204.
Enquanto os húngaros se apoderavam da Transilvânia, ao norte, a Valáquia e a
Moldávia se tornaram principados independentes no século XIV. A Valáquia, que os
nativos, mantenedores mais fiéis da tradição latina, chamavam Tarã Romaneciscã,
ocupava o território ao norte do rio Danúbio até aos montes Cárpatos. Destaca-se,
nesse período, a figura de Besarab, voivoda de Arge§, região do centro da România,
que venceu os húngaros, sendo por isso celebrado em poemas épicos como o Negru-
Voda, o fundador da Valáquia. A voivodia ou principado da Moldávia foi fundada por
Bogdan, voivoda da região de Muramurej, ao norte, libertando-se dos húngaros em
1359. No século XV, as duas voivodias foram submetidas pelos turcos. Em 1859,
conseguiram a independência e a união de ambas formou a Romênia moderna, reco­
nhecida internacionalmente em 1878.
A longa e atribulada história da Romênia se reflete, obviamente, em sua cul­
tura e em sua língua. Nos primeiros documentos, a língua usada é o médio búlgaro;
o paleoeslavo substituiu o grego eclesiástico em fins do século IX, quando a Igreja
búlgara se declarou independente da de Constantinopla. Em 1020, a Igreja romena se
uniu à búlgara, ainda que os romenos tenham sido cristianizados por missionários
ocidentais, conforme o comprovam os termos cristãos mais antigos, de origem lati­
na, como angelu > inger (“anjo”), basilica > bisericã (“igreja”), paganu > pagin
(“pagão”, “não-batizado”) etc.
Esses primeiros escritos são livros religiosos dos séculos XIII e XIV, prove­
nientes da Moldávia; não se tem certeza se documentos anteriores, como o Savina
Kniga (“Evangelho”) e o Codex Suprasliensis, ambos do século XI, foram escritos
nas regiões do norte. A maioria dos documentos oficiais e particulares se perdeu; pre­
servaram-se apenas os posteriores ao século XIV e algumas crônicas, ainda mais tar-

A ROMÂNIA I 189
dias. Através dos escritos que se conservaram, verifica-se que de vez em quando aflo­
ram nomes próprios, apelidos e topônimos romenos entre o médio búlgaro. Na
Romênia, portanto, essa língua teve o mesmo papel que o latim medieval no
Ocidente: era a língua da escrita e da Igreja, enquanto o romance era a linguagem do
povo. Da mesma forma que se encontram vulgarismos romances nos documentos em
latim no Ocidente, nos escritos búlgaros acham-se palavras romenas ou torneios sin­
táticos próprios da língua materna do copista ou do autor. Exemplos desse fato, ante­
riores ao século XVI: ales, “resultado” de alege < lat. alegere > eligere, “escolher”;
buor < bour < lat. bubalus, “búfalo” e “antílope”; cumnat < lat. cognatus, “cunha­
do”; jude < lat. iudex, “juiz”; lac < lat. lacus, “lago”; portar < lat. portarius, “por­
teiro”. Reflexos claros do romeno falado são os nomes próprios, já com o artigo defi­
nido posposto: Albul, Amarul, Albeçtii; encontram-se também formas intermediárias
da cadeia evolutiva, como os nomes próprios Urícle e Urecle, de 1412 e 1437 respec­
tivamente, em que o grupo /-ci-/ ainda não havia passado a l-ch-l, que soa IkJ: lat.
auricula > auricla > rom. ureche, “orelha”.
Nas regiões do norte pertencentes à Hungria, bem como na Transilvânia que,
embora independente, mantinha relações de vassalagem com a coroa húngara, o
latim era a língua da cultura, das escolas, das leis, dos tribunais e, em parte, até da
administração desde o século XI. Nesses documentos húngaros encontram-se tam­
bém elementos populares romenos, especialmente nomes próprios e topônimos; a
dificuldade está em saber se esses nomes representam de fato designações populares,
ou se são apenas adaptações de termos de outras origens, já que a língua usada era o
latim. Um exemplo incontestável, porém, encontra-se em um documento do início do
século XIII, no qual se cita um vassalo de Arad, distrito de Bihor, de nome Fichur,
correspondente ao romeno ficior ou fecior < lat. *fetiolum, “filhinho”. Fichur é
encontrado no húngaro, no século XVIII, como sobrenome (ver mapa 10, p. 365).
A partir da metade do século XIV, durante cerca de dois séculos, o eslavo foi a
língua oficial das chancelarias e da Igreja nos territórios romenos, o que impediu o
romeno de firmar-se como língua escrita. Somente em 1521, aparece o primeiro docu­
mento escrito em romeno, ainda assim com a introdução e a saudação final em eslavo;
é uma carta, escrita pelo grão senhor boiardo Neacgu de Cimpulung ao juiz Hans
Benkner, da cidade de Brasov, comunicando uma incursão dos turcos pelo rio Danúbio.
Usa o alfabeto cirílico da época, mas denomina a região da Valáquia Tarã Romaneascã.
Os primeiros escritos religiosos em romeno são de meados do século XVI,
conservados em quatro códices. Contêm parte dos Evangelhos e dos Atos dos
Apóstolos, uma tradução em prosa dos salmos e duas outras versões também dos sal­
mos (de Verone(e e de Hurmuzachí). Os muitos erros, repetições, omissões e interpo-
lações deixam claro que são cópias de códices mais antigos. Em geral, supõe-se que
sejam traduções feitas sob inspiração luterana, cuja reforma se estendeu rapidamen-

90 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


te pela Transilvânia. O primeiro livro impresso em romeno é um catecismo protes­
tante, traduzido do húngaro e publicado em Sibiu, cidade da Transilvânia, em 1544,
que se perdeu. O catecismo de Coresi, porém, publicado na cidade de Brasov, em
1559, se conservou quase integralmente. Também os calvinistas traduziram livros e
os publicaram em romeno, com fins propagandísticos; foram os primeiros a tentar
escrever o romeno com o alfabeto latino. Esse propósito de abandonar o alfabeto cirí-
lico e substituí-lo definitivamente pelo latino foi retomado pela escola latinista da
Transilvânia, no início do século XIX; seus mentores eram católicos do rito grego e
haviam estudado em Roma e Viena. Conseguiram seu objetivo lentamente, pois, só
em 1860 o alfabeto latino foi oficialmente adotado.
As primeiras atestações do romeno são, portanto, bastante tardias. Enquanto
as línguas românicas do Ocidente já dispunham de vasta literatura artística, na
Romênia encontram-se apenas traduções de catecismos e hinos. Os romenos não têm
uma literatura medieval, e a autêntica literatura romena só despontou com vigor no
século XIX. Antes de mais nada, foi necessário unificar a ortografia e com ela a lín­
gua nacional literária, problema que se arrastou de 1880 a 1953; papel preponderan­
te nesse trabalho é atribuído aTitu Maiorescu (1840-1917). Dentre os grandes nomes
da literatura moderna romena, destacam-se Ion Creangã (1837-1889), contista mol-
davo, Mihai Eminescu (1850-1889), poeta clássico e lírico pertencente à literatura
universal, Ion Luca Caragiale (1852-1912), autor de romances, contos e peças tea­
trais, Mihail Sadoveanu (1880-1961), com mais de cem obras de todos os gêneros,
Barbu §tefãnescu Delavrancea (1858-1918), romancista e dramaturgo, Tudor Arghesi
(1880-1967), comparado a M. Eminescu, um dos maiores poetas romenos e autor
também de muitas obras em prosa, George Calinescu (1899-1965), prosador, crítico
e historiador literário, para citar apenas alguns.
Se a literatura romena é tardia, a contribuição da Romênia para a Filologia
Românica foi de valor especial; isolada de suas irmãs ocidentais durante tantos séculos,
soube manter a estrutura latina do idioma, que foi complementada, nos séculos XVIII e
XIX, pela “lealdade de cultura”, nome pelo qual críticos e historiadores romenos deno­
minam a reintegração do romeno entre as línguas de cultura na Europa moderna.
Única língua românica conservada no leste europeu, o romeno apresenta qua­
tro dialetos principais:

a. O daco-romeno (“dacoromân”) é falado na atual Romênia, na Bessarábia e parte


da Bucovina, que pertenceram até recentemente à União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS), em parte do Banato, integrante do território iugos­
lavo, além de alguns vilarejos na Bulgária e na Hungria, próximos à fronteira. O
daco-romeno não tem variações dialetais acentuadas. A língua literária se baseia
na variedade da Valáquia, com influências moldavas e transilvanas.

AROMÂNIA | 191
b. Mácedo-romeno ou aromeno (“aromân”), cujos falantes são denominados vlachs
pelos cronistas bizantinos já no século X; é falado ao sul do rio Danúbio de modo
disperso; é encontrado na Grécia (Tessália e Epiro), na Bulgária em várias loca­
lidades e, especialmente na Macedônia, na região de Bitola. Com base nessa
variedade foram feitas muitas tentativas no sentido de restaurar o romeno comum.
c. O megleno-romeno ou meglenítico - designação desconhecida pelos próprios
falantes, que se autodenominam vlashi - é falado na região nordeste de Salônica,
tendo como centros as cidades de Nanta, Cupa, Tarnareca; abrange ainda grupos
de emigrados na Dabrógea e na Ásia Menor. Em romeno, diz-se “meglenoromân”.
d. O ístrio-romeno (“istroromân”) é falado numa pequena região próxima ao Monte
Maior, na região centro-oriental da Península da Istria, e em outras pequenas con­
centrações ao norte. Atualmente, todos os ístrio-romenos são bilíngües pela con­
vivência com os croatas (ver mapa 11, p. 366).

Embora haja diferenças entre os quatro dialetos romenos, sobretudo por causa
dos empréstimos léxicos de outras línguas, com as quais convivem, é exagerado con­
siderá-los como outras tantas línguas românicas nos Bálcãs. No que se refere ao mol-
davo, o problema é certamente mais político que linguístico. A chamada “questão
moldava” tem raízes históricas.
O principado da Moldávia, região na parte norte oriental da antiga Dácia,
incluiu, do século XIV ao início do XIX, a Bessarábia, cujo território se situa ao leste,
entre os rios Dniestre e Prut, e onde se desenvolveram variantes daco-romenas com
características moldavas. Com o tratado de paz de Bucareste (1812), a Bessarábia foi
incorporada à Rússia, à qual ficou unida até o fim da Primeira Guerra Mundial em
1918, quando voltou a pertencer à Romênia. Com algumas dezenas de milhares de
romenos, que habitavam a região além do rio Dniestre, foi constituída, em 1924, a
República Socialista Soviética da Moldávia, unida à Ucrânia. Em agosto de 1940, a
Bessarábia foi separada da Romênia e incorporada à República da Moldávia. Essa
atribulada história da região de fato não apresenta fatores importantes que pudessem
acentuar as diferenças dialetais; na Moldávia, apenas não se acompanhou de perto a
relatinização da língua romena no século XIX, nem se passou a usar o alfabeto lati­
no, mas se continuou a escrever com o alfabeto cirílico até 1905, quando se adotou
o alfabeto russo parcialmente romenizado. O movimento separatista se acentuou a
partir de 1924, quando passaram a denominar seu idioma “limba moldoveneascã”; os
resultados, porém, foram inexpressivos, dada a exigüidade de seu território.
Lingüistas e filólogos soviéticos, por evidentes razões políticas, empenham-
se em transformar o moldavo numa língua autônoma; desse modo, havería no Oriente
duas línguas românicas, o que é sustentado também por alguns lingüistas romenos.
Com o recente esfacelamento da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, as ten-

192 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


dências separatistas se atenuaram no campo lingüístico, ainda que a Moldávia tenha
preferido continuar politicamente independente (ver mapa 10, p. 365).
Entretanto, os defensores da autonomia do moldavo apontam apenas poucas
diferenças linguísticas, insuficientes para fundamentar a pretendida autonomia. Citam
certas particularidades fonéticas e léxicas, muitas das quais encontráveis também em
outras áreas do romeno, como por exemplo, ciolan, “osso”. Na literatura, a posição
deles é ainda mais incoerente, porque consideram pertencentes à literatura moldava
autores como Creangã e Eminescu, cuja língua é indiscutivelmente o romeno.
Conhecedores do assunto, como Cario Tagliavini (Origini, p. 360), afirmam que o
moldavo literário é o romeno literário, com pequenas influências populares moldavas,
aliás não desconhecidas nos domínios do romeno, como já se disse; além disso, a lín­
gua literária moldava não representa de fato a língua falada pelo povo. A falta de argu­
mentos sólidos levou os próprios lingüistas adeptos da independência do moldavo a
silenciar sobre o assunto, uma vez cessados os entusiasmos políticos. A língua literá­
ria daco-romena, formada com base na variedade falada entre Tirgovijte e Brasov, tem
contribuído bastante para a homogeneidade dos dialetos da Romênia; usada também
pelos escritores moldavos, pode vir a contribuir para evitar maiores diferenciações
dialetais na República da Moldávia, mesmo politicamente independente.

O Dalm a tic o

Única língua românica morta, o dalmático foi falado na região da antiga


Dalmácia, província romana situada na parte norte-ocidental da Península dos
Bálcãs. As mais antigas referências ao romance do litoral da Damácia são bastante
vagas; historiadores e viajantes fazem distinções entre os “romanos” e os “eslavos”
e suas respectivas línguas; à dos primeiros denominam “latina”, “dalmatina” e “fran­
ca”. Esses dados se encontram em Constantino Porfirogeneta, em um relato das cru­
zadas, e datam de 948.
Pouco se sabe sobre as variantes lingüísticas das cidades litorâneas; informa­
ções mais amplas existem apenas sobre a cidade de Ragusa, ao sul, e sobre a ilha de
Veglia, hoje rebatizada com o nome eslavo otokK rk, embora tivesse ocupado o lito­
ral desde a cidade de Fiume (atual Rijeka) até Antívari (modernamente Bar). A res­
peito do dialeto de Ragusa (hoje Dubrovnik), há notícias específicas numa descrição
da cidade, feita por Filippo Diversi, que era diretor de uma escola, em 1440. O regu-
sano sobreviveu pelo menos até o fim do século XV, pois há registro dum debate
sobre ele no senado da cidade, datado de 1472. O dalmático da cidade de Zara (atual
Zadar, no litoral croata) deve ter tido uma sobrevivência mais curta; as informações
disponíveis, porém, são muito limitadas (ver mapa 11, p. 366).

a r o m â n ia | 193
Sobre o dialeto da ilha de Veglia, o veglioto, o mais antigo testemunho consta
em um relatório de Giambattista Giustiniani, magistrado veneziano, datado de 1553;
como síndico de Veneza, Giustiniani inspecionava as cidades litorâneas (Querso,
Ossero, Arbe, Nona, Traú, Espálato, Sebenico, Lessina, Ragusa, Zara), e anotou as lín­
guas faladas na região: o vêneto, o servo-croata e um idioma particular da ilha de
Veglia, considerado por ele como um calmone (“gíria”) de algum falar eslavo. Dá a
entender que a língua “dalmatina” ou “franca” só podia ser usada pelos homens,
enquanto as mulheres deviam fazer uso do eslavo.
Outras possíveis referências ao veglioto, como a de Conrad Gesner, no
%
Mithridates (1555), a de Farlati, no Illyricum Sacrum (fins do século XVIII) e a de
Grappin e Cassas (Voyage pittoresque et historique de VIstrie et de la Dalmatie, de
1802), não o identificam com clareza; assim, a Voyage pittoresque identifica a língua
ouvida na região com o “ilírico”. Somente em meados do século XIX, especialistas
começam a estudá-lo mais acuradamente; o lingüista Bernardino Biondelli (1804-
1886) foi considerado o “descobridor do dalmático” por Sever Pop (La Dialetologie,
I, p. 649). Embora Biondelli nada tenha publicado, seu pedido de informações, dirigi­
do ao médico Giambattista Cubich, morador da ilha, despertou em Cubich um gran­
de interesse pelo dialeto local. Em 1861, a revista Ulstriano começa a publicar parte
das pesquisas realizadas por Cubich. Tomando conhecimento dessas publicações,
Ascoli inseriu uma longa nota em seus Saggi Ladini (1873) sobre esse dialeto, na qual
diz: “In questo dialetto, che noi diremo, tanto per dargli un nome, veglioto [...]”
(“Neste dialeto, que nós chamaremos, apenas para lhe dar um nome, veglioto [...]”).
O nome “veglioto” de Ascoli foi bem-aceito de modo geral, bem como as apro­
ximações lingüísticas que estabeleceu com o romeno e os dialetos istrianos de Rovigno
e Dignano. Motivado pela publicação de Ascoli, o professor de línguas clássicas
Antônio Ive publicou, em 1886, um artigo intitulado “UAntico Dialetto de Veglia”,
ainda hoje de grande valor pelos textos e pelo vocabulário que contém; encontra-se o
vol. IX do Archivio Glottologico Italiano. Esses estudos despertaram o interesse espe­
cial de Matteo G. Bartoli, que procurou salvaguardar o dialeto prestes a desaparecer da
ilha. Foi a Veglia três vezes, em 1897, 1899 e 1901; em 1897, entrevistou longamente
o último veglioto, Antonio Udina, dito Burbur, falecido no ano seguinte. Com o mate­
rial dessas entrevistas e de muitas outras pesquisas, Bartoli escreveu Das Dalmatische,
Altromanische Sprachreste von Veglia bis Ragusa und ihre Stellung in der Appenino-
Balkanischen Romania (“O Dalmático, Resíduos Lingüísticos de Românico Antigo de
Veglia a Ragusa e sua Posição na România Apenino-Balcânica”). A obra foi escrita em
alemão, porque constituiu a tese de láurea do autor na Universidade de Viena, tendo
sido publicada pela Kaiserliche Akademie der Wissenschaften, em 1906, em dois volu­
mes. Nesse trabalho, Bartoli resume a contribuição de outros autores, como Ascoli,
Mussafia, Schuchardt, Meyer-Lübke; apresenta os resultados de sua pesquisa das fon-

94 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


tes orais e escritas, não só do veglioto como do dalmático em geral; faz um esboço da
etnografia da Ilíria, com considerações histórico-geográficas sobre a extensão do dal­
mático em diferentes períodos históricos e suas relações com as línguas vizinhas. Traz
numerosos textos e um estudo resumido sobre sua gramática e léxico. Essa obra de
Bartoli se tornou o ponto de referência em todos os estudos sobre o dalmático em geral
e o veglioto em particular. No Brasil, não se pode omitir o trabalho de Maria Luísa
Fernández Miazzi, O Dialeto Veglioto, com o subtítulo Problemática Geral, Textos
Fundamentais e Levantamento Fonético, Morfológico e Sintático. Nessa tese de douto­
ramento em Filologia Românica, apresentada à Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, ainda inédita, há estudo de textos e
uma sistematização gramatical do veglioto na fonética, morfologia e sintaxe.
Das Dalmatische de Bartoli provocou muitas discussões, sobretudo a classifi­
cação do dalmático entre as línguas apenino-balcânicas ou do ramo oriental. Muitos
romanistas não concordam com essa classificação; os debates se prolongaram por
decênios, envolvendo Sextil Pu§cariu, Clemente Merlo, Jakob Jud, Ernest
Gamillscheg, H. Gelzer, Meyer-Lübke, Petar Skok, Alfredo Schiaffini, Matteo Bartoli
e outros. Os debates se prolongaram mesmo depois da morte de Bartoli (1946) sobre
diversos aspectos da problemática do dalmático, como sua classificação nos quadros
românicos, a validade das fontes de informação e questões propriamente lingüísticas.
Sob o aspecto especificamente lingüístico, deve-se levar em conta a influên­
cia do vêneto, já que a região da antiga Dalmácia esteve sob o domínio político de
Veneza por tempo variável; assim, a região de Ragusa fez parte do império vêneto de
1205 a 1358, enquanto os territórios litorâneos mais ao norte lhe pertenceram por
mais tempo, de que resultaram níveis diversos de influência também na língua. Por
outro lado, o dalmático apresenta semelhanças com o romeno e com os elementos
latinos do albanês, sobretudo em relação à conservação da estrutura da língua arcai­
ca e a aspectos semânticos do léxico. Foneticamente, o dalmático é bastante conser­
vador no consonantismo e inovador no vocalismo; ditonga praticamente todas as
vogais, inclusive o /a/, fato raro entre as línguas românicas, como em lat. casa >
dalm. kuosa',palm > puolma\ tatam > tuota\ barbam > buarba\ falsum >fuals', *san-
guem > suang - conforme o /a/ seja livre ou travado, embora não seja regra geral;
são exemplos de ditongação de outras vogais lat. bellum dalm. bial; ferrum > fiar,
ventum > viant', cenam > kaina\ piram > paira', aprilem > aprail·, nidum > naid, fari­
nam > faraina] cornu > kuarn; portam > puarta', sortem > suarf, colorem > kolaur,
nipotem > nepauf, solem > saul\ crucem > krauk; gulam > gaula; nucem > nauk;
durum > doir, lucem > loikr, uvam > joiva. Essa abundante ditongação é sem dúvida
a característica mais distintiva do dalmático no contexto românico.
Quanto aos dialetos, pode-se distinguir duas variedades no dalmático: o meri­
dional, conhecido como “ragusano”, desaparecido no século XV, e o veglioto, cujo

AROMÂNIA | 195
último reduto foi a ilha de Veglia (esl. Krk) e cujo último falante foi, como se viu,
Antonio Udina, o Burbur (ver mapa 12, p. 367).
Os documentos em dalmático são poucos e nenhum deles tem caráter literá­
rio. O primeiro documento, em que aflora certo número de elementos romances é um
testamento do século X, escrito em latim medieval e reproduzido por Giovanni Lucio
em Historia di Dalmazia et in particulare di Traú, Spalato e Sebenico, publicada em
Veneza, em 1674. Em um inventário ragusano mais antigo (1280), encontram-se mui­
tos vocábulos claramente dalmáticos, porém isolados. Os primeiros documentos
redigidos em dalmático são duas cartas, conhecidas como “zaratinas” por terem sido
escritas na cidade de Zara ou a ela dirigidas; uma é de 1325 e a outra, de 1397. As
duas cartas tratam de pendências judiciais.
O que se conhece do dalmático se deve às coletâneas de Biondelli, Cubich,
Ive e, sobretudo, Matteo Bartoli, que organizou todo o material disponível.

O It a l ia n o

A história multissecular da Península Itálica e a grande diversidade étnica,


verificada em todas as suas regiões durante lapsos consideráveis de tempo, explicam
a impressionante quantidade de variantes dialetais em território hoje italiano. Apenas
durante o Império Romano, a Itália teve unidade política; modernamente, essa uni­
dade só foi restabelecida em 1870. Esse longo hiato de tempo, em que seu território
foi muitas vezes desmembrado e suas partes pertenceram a reinos, impérios e povos
diferentes, favoreceu a manutenção mais firme das variantes dialetais.
Assim, na planície do rio Pó, o substrato lígure ao oeste, celta ao centro e
vêneto (ilírico) ao leste, com o superstrato germânico, sobretudo lombardo, são os
fundamentos étnicos que caracterizam os atuais dialetos chamados “alto-itálico” ou
“setentrionais” ou ainda “galo-itálicos”; compreendem quatro grupos bastante dife­
renciados entre si: piemonteses, lombardos, lígures e emiliano-romanholos. A deno­
minação “galo-itálicos” é de Bernardino Biondelli (1804-1886) e foi aceita por
Ascoli e outros lingüistas; situam-se grosso modo ao norte da linha La Spezia-
Rimini. Esses dialetos pertencem ao ramo ocidental na classificação das Línguas
Românicas, embora as características do ramo ocidental não se encontrem de modo
uniforme nos vários grupos dialetais. Fora de seus territórios atuais, formas antigas
desses dialetos são encontrados em antigas colônias lombardas na Sicilia
(Sanfratello, Nicósia, Novara, Aidone) e na Basilicata (Potenza).
Os dialetos vênetos têm características diferentes em relação ao galo-itálicos,
como a ausência de /ii/ e do /o/ e a conservação das vogais finais, com isso aproxi-
mando-se do toscano. Apresentam várias subdivisões, como o veneziano, o veronês,

96 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


o paduano, ο feltrino etc., devendo-se incluir as variantes istrianas de caráter arcaico,


faladas em pequenos territórios da Península da ístria, nas localidades de Rovigno,
Dignano, Fasano, Fallesano e Sissano (ver mapa 12, p. 367).
Os dialetos centro-meridionais se dividem em três blocos, se excluirmos os dia­
letos toscanos, que formam um grupo à parte: a) os falares das Marcas, da Úmbria e
do Lácio; b) os dos Abruzos, da Apúlia, Campânia e Lucânia; c) os da Península
Salentina, Calábria e Sicilia. Trata-se de uma grande variedade dialetal, mas que tem
várias características comuns, como as assimilações progressivas /-nd-/ > /-nn-/ e /-mb-
/ > -mm-/ (quando > quanno; piombo > piommó) e /-1I-/ > /-dd-/ ou /-dd-/ cacuminais,
o que ocorre também no logudorês e é atribuído ao antigo subsubstrato mediterrâneo.
Entre esses grupos, há outros de transição, mas sem salto brusco demais, a não ser na
região central, na passagem dos galo-itálicos para o toscano, no divisor de águas dos
Montes Apeninos.
Os dialetos toscanos, divididos em quatro grupos (florentino, pisano-pistoien-
se, senense e aretino), são particularmente interessantes por seu caráter conservador
e por incluir o florentino, base da língua literária italiana.
Ligam-se aos dialetos toscanos as variedades da ilha da Córsega, divididos em
dois grupos pela cadeia de montanhas que atravessa a ilha de noroeste a sudeste: o
cismontano, ao nordeste, e o ultramontano, a sudeste. Esse último assemelha-se ao
do norte da Sardenha, o galurês, por seu caráter arcaizante, distinguindo /i/ e /u/ de
/e/ e de /o/ e passando /-li-/ e /-11-/ à cacuminal /-dd-/, vestígios da antiga língua local,
posteriormente alterada em profundidade pelos toscanos. Atualmente, os dialetos
corsos, especialmente os cismontanos falados na maior parte da ilha, denotam gran­
de influência do toscano antigo, fato que tem importância também para a história do
italiano. A língua oficial da Córsega, porém, é o francês, já que a ilha pertence poli­
ticamente à França desde 1769 (ver mapa 13, p. 368).
O quadro dialetal italiano, porém, é extremamente complexo. O que ficou
exposto acima é apenas uma tentativa ampla, geral e bastante imperfeita de classifi­
cação, pois se agrupam variedades através de algumas características comuns ou con­
vergentes, não se levando em consideração tantas outras, possivelmente ainda mais
importantes. Entretanto, convém lembrar que os próprios filólogos italianos diver­
gem bastante em suas classificações, bastando confrontar as apresentadas, por exem­
plo, por Cario Tagliavini, F. Schürr, Giulio Bertoni, C. Merlo, Gerhard Rohlfs,
Matteo Bartoli, Alfredo Schiaffini.
Perante tanta variedade dialetal, somente algo realmente excepcional teria
força suficiente para destacar uma delas, tornando-a língua geral e literária. A partir
do século IX, começam a surgir pequenos textos, inscrições, depoimentos em proces­
sos e poemas em diversos dialetos. No século XII, autores lombardos e vênetos tenta­
ram estabelecer uma língua literária comum, com participação de figuras do porte de

AROMÂNIA | 197
Bonvesin de la Riva, Giacomino da Verona, Uguccione da Lodi e Gerardo Patecchio.
Também em outras regiões da Itália despontam manifestações literárias, como na
Umbria, com São Francisco de Assis, na Toscana e em Bolonha. Contudo, nessa
época, o principal centro literário formou-se na corte de Frederico II, rei da Sicilia,
para o qual convergiram poetas e literatos de todas as partes da Itália; essa escola foi,
de fato, a primeira tipicamente italiana, denominada “siciliana”, apesar de apenas dez
dos seus vinte e nove poetas serem sicilianos; isso “quia regale solium erat Sicilia”.
Entretanto, foi na Toscana, especificamente em Florença, que surgiu a língua li­
terária italiana, baseada no dialeto toscano-florentino. Impressionado com a língua lite­
rária provençal, que havia atingido grande aceitação entre os poetas, independentemen­
te de variantes dialetais, como uma κοινή das cortes, Dante Alighieri (1265-1321)
procurou uma forma linguística que reunisse o que de melhor houvesse nas diversas
variedades da Itália; essa κοινή deveria posteriormente ser adotada como língua literá­
ria em todas as regiões da Itália, já que nenhuma das variantes correntes lhe parecia dis­
por das qualidades literárias necessárias, que havia observado no provençal. Descarta,
de início, o toscano em particular, segundo declara no Capítulo III do Livro I em De
Vulgari Eloquentia: “Quod in quolibet idiomate sunt aliqua turpia, sed pro ceteris tus-
cum est turpissimum” (“Pois em qualquer idioma sempre há algo feio mas, diante dos
outros, o toscano é feíssimo”).
Não tendo encontrado a κ ο ινή desejada entre os falares italianos, Dante
Alighieri, quando resolveu a usar “il volgare”, lançou mão do florentino, apesar de
sua relutância inicial, tanto que poucas são as formas não florentinas na Commedia
e empregadas por razões estéticas na boca de não toscanos, embora haja também lati-
nismos e galicismos. A localização geográfica central de Florença, as condições his­
tóricas da época e o uso da mesma língua por outros dois grandes nomes, Francesco
Petrarca, com as conhecidas Rimas e seus clássicos sonetos, e Giovanni Boccaccio,
com Decamerone, difundiram o florentino por toda a Itália como língua literária;
fizeram também desaparecer a pretendida língua literária de base vêneta do norte, já
com algum prestígio no século XIII.
Em torno da língua literária italiana, levantou-se a chamada “questione delia
lingua”, cujas controvérsias se estenderam por séculos. Uma corrente pretendia que
o modelo a ser seguido fosse o toscano antigo dos três grandes autores, a “florentini-
dade” antêntica. O principal defensor dessa posição, juntamente com Antonio
Cèsare, P. Giordani e G. Leopardi, foi Pietro Bembo com Prose delia vulgar lingua
(1525); Bembo aí propõe, como modelo, o toscano de Petrarca para a poesia e o de
Boccaccio para a prosa. Opunham-se a essa corrente os que pretendiam como mode­
lo literário o florentino falado, tais como Benedetto Varchi (1503-1565) e
Giambattista Gelli (1498-1563). Em 1582, foi fundada em Florença a Accadenda
delia Crusca (it. crusca significa “farelo”, expressão burlesca) com a finalidade de

198 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


defender a língua literária dos três grandes; elaborou-se o Vocabulário degli
Accademici delia Crusca, baseado sobretudo em Boccacio e publicado em Veneza
em 1612. Foram fixados o léxico e sua ortografia, a pronúncia e a estrutura grama­
tical; esse Vocabulário serviu de modelo para os de outras línguas românicas. Com
isso, prevaleceu a posição dos partidários da linguagem da tríade.
Desse modo, a língua literária italiana teve sua gênese característica, diferen­
te das demais no campo românico; nasceu de fatores meramente literários, não da
supremacia política e cultural de um dialeto, como o francês e o castelhano, nem por
ser a língua da chancelaria de um reino, como o catalão, nem a variante culta, poéti­
ca e literária internacional, como o antigo provençal. Entretanto, a falta de unidade
política da Itália, durante os séculos XVII e XVIII, não permitiu que aquele florenti-
no literário se tornasse efetivamente a língua nacional, como aconteceu com o fran­
cês e o castelhano. Essa situação peculiar da Itália levou a língua literária a uma gran­
de rigidez, que foi quebrada por Alessandra Manzoni ao usar o florentino falado
pelas classes cultas em Ipromessi sposi.
O toscano literário, já no século XV, se impôs sobre o romanesco, o dialeto
literário de Roma. Pelo fim do século XVI ou começo do seguinte, o antigo romanes­
co desapareceu, surgindo outro de caráter toscano. Depois da unificação da Itália,
Roma de fato se torna o grande centro irradiador da língua nacional, sobretudo
depois da Primeira Guerra Mundial. Atualmente, os meios de comunicação de massa,
particularmente o cinema e a televisão, têm difundido essa língua de bases florenti-
nas, tornando-a viva e presente em toda a Itália e reduzindo, com isso, a importância
dos dialetos, historicamente de grande peso.
Fora do território politicamente italiano, fala-se o italiano na República de San
Marino (um dialeto romanholo), na Suíça (nos Cantões do Ticino e dos Grisões), na
Córsega (embora a língua oficial seja o francês, desde 1769), na Istria e na Venezia
Giulia (pertencentes à antiga Iugoslávia desde o fim da Segunda Guerra Mundial), nas
principais cidades da costa dalmática e no principado de Mônaco. Além disso, é a lín­
gua de cultura da ilha de Malta e a “língua franca” para europeus e árabes na Líbia.
Esparsamente, é falado por emigrantes de muitas partes do mundo, sobretudo nas
Américas. No Brasil, conserva-se em grupos compactos, sobretudo no Rio Grande do
Sul, Santa Catarina e São Paulo; na cidade de São Paulo, bairros inteiros, como a Bela
Vista e o Brás, trazem marcas indeléveis da língua e da cultura italianas.

O S a r d o

Para compreender as características dos dialetos sardos, é preciso um conheci­


mento, ainda que sumário, dos povos que desfilaram em sua história plurimilenar. A

AROMÂNIA | 199
chamada população “mediterrânea” ocupou a Sardenha e a Córsega pelo menos até o
fim do período neolítico; deixaram muitos vestígios, sobretudo nos notáveis “nuraghi”,
construções cônicas, consideradas expressões da arquitetura megalítica. No século VI
a.C., foi ocupada em parte por gregos e cartagineses; aliados, etruscos e cartagineses,
expulsaram os gregos depois de tê-los vencido na batalha de Alalia (537 a.C.), ficando
os cartagineses com a Sardenha e os etruscos com a Córsega. Diante dessas invasões,
os autóctones refugiaram-se nas montanhas centrais da ilha. Em 238 a.C., os romanos
conquistaram tanto a Sardenha como a Córsega, aproveitando-se de uma revolta dos
mercenários cartagineses. A latinização foi lenta, embora profunda, com uma luta cons­
tante contra a população autóctone do interior e também contra a população puniciza-
da das regiões litorâneas. As duas ilhas tornaram-se província romana em 227, até os
tempos do Império, quando a Córsega foi transformada numa província independente.
Os romanos não tinham simpatia pelos sardos, por considerá-los venais e
maus, como escreveu Sextus Pompeius Festus (século II d.C.): “Sardi uenales: alius
alio nequior” (“Os sardos são venais; um pior que o outro”). A Sardenha foi consi­
derada uma terra conquistada, que devia enviar dinheiro e mantimentos a Roma, e até
o Império, não lhe foi concedida nenhuma cidade livre; com alguma frequência, ser­
via de terra de exílio. As constantes revoltas dos nativos só cessaram em 114 a.C.,
depois de uma severa repressão, mas o banditismo continuou. Apenas no último
século a.C., a Sardenha atingiu alguma prosperidade e uma integração mais profun­
da ao Império Romano, especialmente com a exploração das minas de prata e de
ferro. Mas nunca chegou a ser uma região próspera. Mesmo assim, a considerável
autonomia permitida pelos romanos foi importante fator para a aceitação da cultura
latina, que transmitiu aos nativos as técnicas da agricultura, que desconheciam por
serem pastores, como o demonstra o léxico sardo atual.
A Sardenha pertenceu ao Império até 455 d.C., ano em que foi conquistada
pelos vândalos; em 535, os bizantinos, sob o imperador Justiniano, a reconquistaram
para o Império do Oriente. Sob vândalos e bizantinos, a administração da Sardenha
ficou subordinada à da África, o que explica as semelhanças lingüísticas da latinida-
de sarda com a africana. Nessa época, foi sensível a imigração de elementos hetero-
glotas, geralmente forçada, já que o isolamento da ilha a tornava adequada como
lugar de degredo.
Embora de identificação um tanto insegura, pode-se atribuir a esses diversos
substratos vários elementos lingüísticos presentes nos dialetos sardos. Dentre os filólo-
gos que estudaram o sardo, destaca-se Max Leopold Wagner (1880-1962), em particu­
lar no que tange ao substrato pré-românico, com Historische Lautlehre des Sardischen
(“Fonética Histórica do Sardo”). Wagner atribui à influência do subsubstrato mediter­
râneo, entre outros traços: os fonemas cacuminais, encontrados também na Sicilia e no
sul da Itália e semelhantes às consoantes enfáticas do berbere, como lat. caballu > log.

200 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


kaddu; lat. vallem > log. badde, calabr. vadde; a prótese duma vogal ao lr-1, como no
basco e no gascão, como em it. ragionato > log. arregonad (“arrazoado”); it. ringra-
ziare > galur. irringraziá (“agradecer”); it. mvinava > galur. arruinaa (“estragava”);
incompatibilidade em relação ao fonema /f/, semelhante à verificada nas regiões do
norte da Ibéria e na Gasconha, em que o /f/ passa a M: it. fuggire, galur. vuggire; it.
fontana, galur. vuntana; it. femina, galur. vemina; it. figlie, galur. viddoli etc. Essas
características se conservam no logudorês e no galurês das regiões centrais. Essas e
outras características aproximam o substrato sardo daquele encontrado na Ibéria, sobre­
tudo na região norte. Sabe-se da existência de migrações ibéricas, como a dos balaros,
pelos territórios mediterrâneos; importações de colonos iberos também são documen­
tadas. Os dados, porém, são muito fluidos e não permitem que se explique, através
deles, todas as questões relativas ao paleosardo na fonética e no léxico.
As influências do superstrato provieram das diferentes dominações sofridas.
Apesar de quase um século de dominação vândala (455-534) e de um ano sob os
ostrogodos (552-553), não há, contudo, empréstimos germânicos desses dois povos;
os germanismos encontrados no sardo vieram através do italiano ou já pertenciam ao
latim vulgar. Em 827, os árabes conquistaram a Sardenha, mas também não deixaram
empréstimos diretos; os poucos existentes vieram através do catalão e do castelhano,
línguas importantes como adstratos superpostos em relação ao sardo. Isso porque,
depois da união com a Catalunha (1137), o reino de Aragão conquistou não só a
Sardenha em 1326, como também as ilhas Baleares e a Sicilia (1382), estabelecendo
um domínio que vai durar até 1720. Os aragoneses introduziram o catalão na ilha. Em
1479, com a “Paz de Alcacovas”, Aragão e Castela se uniram politicamente, embora
conservassem de início suas constituições particulares e, naturalmente, suas respecti­
vas línguas; com o predomínio de Castela, o castelhano foi levado para a Sardenha,
onde foi implantado, ainda que lentamente, sobretudo nas regiões dos dialetos galurês
e sassarês. O castelhano se tornou a língua oficial dos tribunais e das escolas até 1764
e muitos autores sardos usaram tanto o castelhano como o catalão em suas obras. A
considerável influência ibérica, porém, não chegou a atingir as regiões montanhosas
do interior. Assim, “janela” na maior parte da Sardenha é o castelhanismo ventana,
mas na região de Gennargentu se conservou fronesta (< ht. fenestra); no campidanês,
usa-se kalentura, do cast. calentura, “febre”, mas no logudorês se conservou /í-eó« (<
lat .febrem). Na terminologia administrativa e eclesiástica, muitos são os empréstimos
castelhanos e catalães, como cat.jutge > campid.jiuggi, nuorJujje, “juiz”; lat. sedem
> cat. seu > log. sa seu, “a catedral”; cat. trona > log. trona, “púlpito”. De origem cata-
lã é também grande parte da terminologia relativa à pesca.
Depois de 1720, ano em que a Sardenha foi trocada pela Sicilia e passou a
fazer parte do reino de Savóia, as influências lingüísticas provêm então da
Lombardia, do Piemonte e da Savóia, ainda que com reduzidos resultados práticos.

AR O M Â N IA | 201
O tratado de Viena, em 1815, constituiu o Reino de Piemonte-Sardenha, que incluía
também a Savóia; esse reino durou até 1860. Foi dele que partiu o movimento de uni­
ficação da Itália, completada com a tomada dos Estados Pontifícios e a queda dos
Bourbons em Nápolis. A Sardenha se torna parte integrante da Itália; com isso, a
influência do italiano sobre os dialetos sardos tem sido crescente, principalmente nos
centros urbanos como Cagliari ao sul e Sássari ao norte.
Os documentos antigos da Sardenha são numerosos e homogêneos; a grande
maioria apresenta caráter jurídico, mas seu valor lingüístico é considerável, pois for­
necem valiosos subsídios para a história do direito italiano. Não possuem, porém,
nenhum valor literário. Alguns são do século XI ou XII, tendo como base lingüística
o logudorês. O isolamento da ilha, a ausência de uma tradição jurídica e a necessida­
de de tornar os documentos jurídicos compreensíveis aos interessados fizeram com
que se adotasse o romance local como língua jurídica. Formou-se, assim, um “volga-
re illustre”, a cuja base logudoresa se acrescentaram particularidades regionais. Esses
documentos contêm registros de privilégios, cartas de alforria, testamentos etc.,
havendo alguns escritos com caracteres gregos.
Muito mais numerosos são os chamados “condagos” (it. condaghi), documen­
tos de questões jurídicas, de assentamentos ou o conjunto desses assentamentos. O
nome revela certamente influência bizantina, pois κουχάκιου, cujo significado primi­
tivo é “rótulo”, no grego bizantino significava “documento”, geralmente oficial, e tam­
bém “tomo” e “volume”, a acepção em que se usa “condagos” nos textos sardos. Esses
documentos encontram-se, sempre, nas igrejas e nos mosteiros, que eram os locais onde
esse tipo de escrituração era feito. De alguns desses “condagos”, como a Condaghe di
San Michele di Savenor, só chegou até nós uma tradução espanhola do século XVII.
Existem, porém, outros no original e conservados integralmente, como o Condaghe di
San Pietro di Silki, convento perto de Sássari, que contém cópias de documentos do
próprio convento e de outros dele dependentes; data da segunda metade do século XII,
tendo sido continuado até ao século XIII; o dialeto utilizado é o logudorês. Importantes
do ponto de vista lingüístico são ainda Condaghe di San Nichola de Tndlas, com os atos
do mosteiro de 1113 até a primeira metade do século XIII, e Condaghe di S. Maria di
Bonàrcado, dos séculos XII e XIII, esse redigido em campidanês.
Apesar de sua pequena extensão territorial, a Sardenha apresenta vários dia­
letos, que formam quatro grupos principais: a) o logudorês, considerado a variante
sarda mais representativa; foi usado por escritores e poetas como um “volgare illus­
tre”. Tem três variedades regionais; o nuorês, com centro em Nuoro, a sudeste do
Logudoro, considerado por alguns como um dialeto diferenciado; o central, em torno
de Bonorva, estendendo-se pelo sudeste do Logudoro; e o setentrional, cujo centro é
a cidade de Ozieri. b) o campidanês, na parte sul da ilha, no território do Campidano,
cujo maior centro é Cagliari. c) o galurês, no território da Gallura, na parte norte

202 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


oriental, d) o sassarês, na região em torno da cidade de Sassari e estendendo-se pelo
extremo norte ocidental da Sardenha (ver mapa 14, p. 369).
Lingüisticamente, o campidanês se aproxima dos dialetos centro-meridionais
da Itália, mas conserva as características gerais do sardo. O galurês e o sassarês apre­
sentam influências do toscano, estando por isso bastante próximos dos dialetos da
Córsega, embora sem perder a estrutura do sardo.
No conjunto, o sardo é a língua românica mais arcaizante. No vocalismo con­
serva as cinco vogais latinas sem a quantidade, inclusive o /i/ e o /u/ correspondentes
às breves, como su kaddu (“o cavalo”), su pilu (“o pelo”). Mantém o valor velar do Icl
latino, como em lat. cinque > log. kimbe; caelu > kelir, nuce > nuke; centum > kentu;
bucca > bukka. Como as línguas ocidentais, forma o plural com o acréscimo de /-s/:
muru/muros, kariaza/karíazas (“cereja”), omine/omines. Os artigos definidos foram
derivados do demonstrativo ipse, ipsa, ipsum, como no catalão e diferentemente das
demais línguas românicas, que partiram de ille, illa, illud', do acusativo ipsum e ipsam
o sardo tirou su e sa para o singular e de ipsos e ipsas, sos e sas para o plural.
Na Sardenha, a terceira conjugação verbal prevaleceu sobre a segunda: lat.
debêre > *débere > log. dépere, no campid. dépiri\ lat. habêre > * hábere > log. áere
(REW 3958). O sardo é também a única língua românica que manteve o imperfeito
do subjuntivo, ainda hoje vivo na região de Barbagia: lat. serviret > log. serbiret
(“servisse”); lat. texeret > log. tésseret (“tecesse”). No léxico, conserva termos não
encontrados em outras línguas românicas, como lat. domus > log. domo (“casa”); lat.
coniugare > log. koyuare (“casar”) etc. (ver p. 265).
Em conseqüência das ocupações estrangeiras no decurso da história, ainda
hoje há na Sardenha enclaves lingüísticos: na cidade de Alghero e região, na costa
norte ocidental, fala-se o catalão, com algumas características arcaicas e certas ino­
vações, embora todos os seus habitantes falem também o italiano e entendam os dia­
letos sardos vizinhos. No extremo sul, em Carloforte, na ilha de San Pietro, e em
Calasseta, ao norte da ilha de San Antiocho, fala-se o genovês.

O Rético

Os problemas lingüísticos levantados pela chamada “questão ladina” têm leva­


do os romanistas a muitas discussões e polêmicas, a começar pela designação, pelo
nome desse conjunto de dialetos das regiões alpinas da Suíça e da Itália, que não é
único. Os autores italianos o denominam “ladino” ou “reto-romance” (Tagliavini,
Ascoli, Bartoli); “ladino” é forma derivada normalmente de “latinum”, usada inicial­
mente por J. T. Haller em 1832. O termo, porém, só é corrente em uma pequena parte
do domínio, no vale Badia e na Engadina; designa ainda o espanhol dos judeus dos

a românia I 203
Bálcãs. “Reto-romance” é preferido pelos romanistas alemães (Ratoromanisch), em­
bora a área linguística do rético não coincida com o território da antiga Récia roma­
na, pois somente as variedades ocidentais se encontram nesse território, enquanto as
orientais estão no antigo Noricum e na região do Friul. Ernest Gamillscheg e Fr.
Schiirr propuseram Alpenrômanisch (“Romance Alpino”), termo também impreciso e
amplo demais. No Brasil, a designação mais comum é “rético”, com freqüência acom­
panhada de uma outra, adotada por Theodoro Henrique Maurer Jr., Serafim da Silva
Neto, Sílvio Elia (também “reto-romance” e “ladino”), Joaquim Mattoso Câmara Jr.
(também “ladino”) e outros. Na tradição da Universidade de São Paulo, sempre se tem
usado “rético” por motivos práticos, embora reconhecendo a inexatidão do termo.
Contudo, a “questione ladina”, da qual o problema do nome é apenas uma
parte, reside de fato na contestada unidade linguística do rético. Os lingüistas e filó-
logos que negam essa unidade ao rético são, em geral, italianos, destacando-se Cario
Battisti e Cario Salvioni; o mais radical é Battisti que nega não apenas uma unidade
linguística rética, como também uma unidade histórica e genética entre os três ramos:
o ocidental dos Grisões, o central dolomítico e o oriental, friulano; para ele, os dia­
letos ocidentais dos Grisões se ligam diretamente com os falares lombardos através
das variantes lombardo-ladinas, e os centrais e orientais seriam a continuação direta
do vêneto. Outros filólogos, porém, como Tagliavini e Caspar Pult, baseados em pes­
quisas feitas pelo Instituto de Glotologia da Universidade de Pádua, concluem que
existe uma inegável unidade rética, ainda que estreitamente ligada aos falares italia­
nos vizinhos. Entretanto, as fronteiras lingüísticas entre o friulano e os dialetos vene­
tos setentrionais são claras; por outro lado, são numerosos os traços lingüísticos
comuns ao rético dos Dolomitas (em território italiano e austríaco) e aos dialetos do
alto rio Adige; mas não é difícil distinguir o dialeto dos Grisões do de seu vizinho
lombardo alpino. Os Grisões têm plena consciência da individualidade de sua língua,
que, desde a Idade Média, percorreu um caminho diferente tanto do italiano como do
francês e do lombardo.
Desde 1938, depois de um plebiscito no qual votaram a favor 90% dos eleito­
res, a Constituição da Federação Suíça (Art. 116) reconhece o reto-romance como a
quarta língua nacional (Nationalsprache), mas não como língua oficial
(Amtssprache), o que é reservado ao alemão, ao francês e ao italiano, nos quais
devem ser redigidos os atos oficiais, leis etc. O rético pode ser usado como língua
oficial dentro de seu próprio território pela autoridade local. Essa restrição deve-se à
falta de unidade linguística do próprio rético e à pequena porcentagem populacional
(apenas 1%) em relação ao total do país (ver mapa 15, p. 370).
A história conhecida da Récia e sua língua começa no ano 15 a.C., quando
Druso e Tibério, enteados do imperador Augusto, conquistaram a região depois de
duros combates com a selvagem população alpina. Em meados do século I d.C., esta-

204 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


belece-se a província da Raetia, cuja capital era Augusta Vindelicorum. Sob o impe­
rador Diocleciano (284-303 d.C.), a Récia tornou-se um dos doze departamentos da
Itália; pouco depois, foi dividida em Récia I e Récia II, cujas capitais eram respecti­
vamente Curia e Augusta Vindelicorum; separava-as uma linha reta de leste ao oeste,
do rio Inn ao lago de Constança.
Muito pouco se sabe sobre os primitivos habitantes da Récia e sobre o proces­
so de latinização da Província. Linguistas modernos julgam que os habitantes primi­
tivos eram um povo de língua não indo-européia, semelhante ao etrusco. Nos primei­
ros séculos, a latinização foi superficial; os contatos entre romanos e a população
local limitavam-se ao exército e à administração das duas capitais. Somente durante
os séculos IV e V, a Récia se latinizou totalmente pela população romana expulsa da
província de Vindelícia, ao sul do Danúbio, e do Noricum. No século V, a Récia II foi
conquistada pelos bávaros e suevos; em 538, a Récia I é incorporada ao reino dos
francos. Pouco depois, o território ao norte de Hirschensprung, nas imediações do
vale Saint-Galloise, no Reno, foi anexado ao cantão alamano, fato lingiiisticamente
importante, porque deu início à germanização do rético regional, onde se encontra
ainda hoje uma fronteira dialetal.
Até o século IX, a região entre o lago de Constança e o Hirschensprung é
bilíngue, mas ao sul o dialeto romance permanece intato. Nos primeiros séculos de
dominação franca, o governador por eles designado (praeses Raetiae, posteriormen­
te, rector Raetiae) era sempre alguém da região, cargo cumulativo com o de bispo de
Coira. No começo do século IX, Carlos Magno separou o poder civil do eclesiástico;
a Récia tornou-se um ducado alemão, cujo titular e seus colaboradores diretos
vinham da Alemanha. Ao mesmo tempo, a diocese de Coira foi desmembrada da de
Milão e incorporada à de Mayance. Esses fatos históricos influíram bastante na
romanidade da Récia: Coira deixa de ser aos poucos o grande centro de cultura que
havia sido; embora a população continue a manter a fisionomia rética até o século
XV, as elites civis e eclesiásticas, representantes da cultura, são de língua alemã. Com
isso, a língua perdeu seu centro de irradiação e de cultura e a oportunidade única de
conservar sua unidade lingüística. Permaneceu firme o rético dos Grisões durante
toda a Idade Média, limitado, porém, ao uso corrente de uma população da monta­
nha, o. que explica a parca produção de textos desse período, ao contrário do que
ocorria na Ibéria, na Itália e na França. Faltaram à Récia centros urbanos importan­
tes, que fossem também grandes centros de cultura.
A agitação religiosa da Reforma e da Contra-reforma levou Giachem Bifrun,
em 1560, a traduzir o Novo Testamento para o puter da Engadina Alta, idioma de
Samedan, sua cidade natal. Em 1562, Durich Chiampel traduziu o Cudesch da
Psalms (Livro dos Salmos) para o vallader da Engadina Baixa, sua língua natal, pois
era natural de Susch. Bifrun e Chiampel fixaram as respectivas variantes linguísticas

A ROMÃNIA | 205
com a publicação de suas traduções, que tiveram considerável difusão e iniciaram a
tradição literária da língua. Contudo, a primeira obra propriamente literária, não nas­
cida de motivação religiosa, foi Chianzun da Ia guerra dal Chiasté d'Miisch, de Gian
Travers (1528)32.
O fato de se ter iniciado a literatura rética com duas variantes lingüísticas tor-
nou-se um obstáculo para a formação de uma língua literária única. Os usuários do
puter e do vallader não chegaram a um acordo nesse sentido, o que levou os escrito­
res de outras regiões ao emprego de seu próprio dialeto. Desse modo, o pastor pro­
testante Stefan Gabriel, embora originário da Engadina Baixa, escreveu em sobres-
selvano (al. Oberwaldisch - outra variedade dialetal) Ilg ver sutaz da pievel giuvan
(“O verdadeiro consolo das pessoas jovens”), publicado em 1611, em que são nota­
das as influências do vallader. No mesmo ano, o padre capuchinho Gion Antoni
Calvenzano, de origem lombarda mas estabelecido na região da Subselva {al.
Unterwalden), publicou um catecismo católico em subselvano, outra variedade lin-
güística. Pouco depois, apareceram obras escritas em sobremirano, dialeto da região
de Oberhalbstein e do rio Albula, nos Grisões. Várias tentativas de unificação da lín­
gua literária não tiveram êxito, tanto as antigas como as mais recentes. Chegou-se
mesmo a pensar numa espécie de síntese das variantes existentes, o interrumantsch,
de caráter administrativo e instrumental, que parece, contudo, inviável, por falta de
condições. Atualmente, os dialetos literários que apresentam maior vitalidade são o
sobresselvano e o vallader (/valáder/).
As cinco variedades do rético, portanto, com o status de línguas escritas, de
leste a oeste, são o ladin da Engadin’ota ou puter, o ladin da Engadina Bassa ou val­
lader, o surmiran (“sobremirano”), o sutsilvan (“subselvano”) e o sursilvan (“sobres­
selvano”). Ao lado dessas variedades dialetais literárias, existem numerosos dialetos,
designados genericamente por rético ou reto-romance ocidental, ou rumantsch e
romontsch, donde a forma aportuguesada romanche. Esse conjunto do rético ociden­
tal se estende pela Suíça no cantão dos Grisões, na região do chamado Biindner
Oberland, de Oberalp a Reichenau (sobresselvano), na Engadina Alta e Baixa, de
Zernez à fronteira com a Áustria (ver mapa 15, p. 370).
O chamado rético central encontra-se na Itália, na região dolomita, cujo cen­
tro é o maciço do Sella; os vales, onde ainda se fala essa variedade lingüística, são os
de Fassa, Gardena, Badia, Marebbe, Livinallongo, Ampezzo e Comélico, mais ao
oriente. As regiões para o oriente, como grande parte do Cadore, apenas conservam

32. Trata-se de uma pequena epopéia, com 704 versos em puter, em versos rimados, sobre uma das guerras dos
Grisões contra a fortaleza de Musso, junto ao lago de Como. Travers (1483-1563) escreveu para seu próprio
entretenimento (“in otio suo meditavit”) sem pretender publicá-la. Narra suas próprias experiências, pois
participou dos acontecimentos como capitão dos Grisões de Valtelina.

206 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


certas características réticas, percebidas até nos territórios do lado esquerdo do rio
Piave (ver mapa 16, p. 371).
Desse rético central não há documentação antiga. Conhece-se o registro de
um pastor de Laces, no vale de Venosta, mas perdido; as poucas frases conhecidas
indicam que o dialeto usado pertencia à Engadina Baixa. Com exceção de alguns tes­
temunhos indiretos, as atestações do rético central datam do século XVII: o pequeno
vocabulário de S. P. Bartolomei di Pergine, uma modesta literatura dialetal, alguns
escritos de caráter religioso encontrados sobretudo no Vale Gardena. Também a poe­
sia lírica popular nessa variante é muito escassa.
A terceira e última secção do rético é a oriental, situada na região do Friul e,
por isso, denominada friulano. Abrange os limites do Comélico até as proximidades
da cidade de Trieste, no litoral do mar Adriático. Até o século passado, a região de
Trieste e de Muggia usava o rético oriental; hoje o vêneto se lhe sobrepôs, da mesma
forma que se infiltrou ao longo do vale do rio Piave, separando o rético oriental do
central, do mesmo modo que a infiltração de população de língua alemã, em grande
parte dos vales dos rios Adige e Isarco, quebrou a ligação entre as variantes central
e ocidental. Perdeu, portanto, terreno.
Entretanto, no rético oriental ou friulano, ao contrário das outras duas secções,
existe documentação consideravelmente antiga e uma tradição literária ininterrupta,
que nunca perdeu o caráter vernáculo. O mais antigo documento é uma inscrição no
campanário de Racchiuso, que data do início do século XII; do final do século XIII
chegou-nos um fragmento de registro civil, em friulano; suas dezenove linhas,
porém, são de pequeno valor lingüístico, pois, contêm quase só nomes próprios. Do
século XIV são os atos do “Duomo di Gemona”, abertos por Jacopo Foncasio e data­
do de 1336, exarados em friulano. Depois dessa data até ao fim do século, os docu­
mentos se tornam sempre mais numerosos. De grande interesse para a filologia são
os Frammenti grammaticali latino-friulani dei secolo XIV, publicados em Udine
(1921) por Alfredo Schiaffini; contêm exercícios de tradução do friulano para o
latim, além de algumas noções gramaticais. Na poesia, o friulano conta com uma das
mais belas poesias líricas populares da Itália, além de muito rica. A mais antiga,
escrita por volta de 1380, é Piriç myó doç inculurit (“Pierina, minha doce coloridi-
nha”). No século XVI, começa a fase propriamente literária do friulano, com grandes
nomes nos séculos XVII e XVIII, como Ermes de Colloredo (1622-1692) e Pietro
Zorutti (1792-1867), a qual continuou sem interrupção até nossos dias.
Nesse quadro geral das três secções do rético atual, coloca-se a referida “ques­
tione ladina”. Embora a toponímia revele um substrato uniforme, as infiltrações de
outras línguas tornaram as fronteiras lingüísticas pouco claras em todas as direções,
com transições graduais com o italiano, o lombardo, o vêneto etc. As dificuldades
levantadas pela fragmentação lingüística dialetal, pela maior ou menor semelhança

a r o m â n ia | 207
com as variedades idiomáticas circunvizinhas, pela ausência de uma vigorosa litera­
tura em pelo menos duas secções e por outros fatores, têm levado os romanistas a
longas discussões sobre a chamada “questione ladina”, ainda sem conclusão ou con­
senso. Ascoli e Theodor Gartner (1843-1925), especialistas no assunto, consideravam
os três ramos como oásis de uma antiga unidade lingüística, quebrada pelas infiltra­
ções de idiomas vizinhos. Cario Battisti e Cario Salvioni, como se viu, negaram ao
rético qualquer unidade, mesmo a primitiva, não reconhecendo qualquer relação
entre o rético ocidental dos Grisões, o central dolomítico e o oriental friulano.
Ernesto Giacomo Parodi (1862-1923) e Matteo Bartoli concluíram apenas que o réti­
co realmente está mais próximo do italiano do que de outras línguas. Cario Tagliavini
admite aquela unidade lingüística primitiva; afirma também que de fato há maior afi­
nidade com o alto italiano e que algumas formas caracteristicamente réticas são
encontradas bem mais ao sul do que se acreditava, conforme as pesquisas do Instituto
de Glotologia da Universidade de Pádua.
Já antes, em 1882, na 5a. edição da Grammatik der Romanischen Sprachen,
Friedrich Diez havia escrito que o rético, por ele denominado Schurwalsche, por
várias razões não podia ter o mesmo status de “ebenbürtige Schwester” (“irmã
gêmea”) que as outras seis variedades românicas, que considerou línguas e não dia­
letos. Entretanto, outros romanistas, como Jakob Jud e Walther von Wartburg, Caspar
Pult, B. E. Vidos, entre outros, admitem o rético como língua românica com caracte­
rísticas fonéticas, morfológicas, léxicas e sintáticas próprias. As divergências se refe­
rem mais aos prováveis relacionamentos com as línguas vizinhas. No campo fonéti­
co, os três ramos têm em comum, por exemplo: a) o /s/ como índice de plural: lat.
muni > rét. oc. mir, centr. mur e or. mur, com os respectivos plurais, mirs, mures,
murs; b) conservação dos grupos consonânticos iniciais /bl-/, /cl-/, /gl-/, /fl-/ e /pl-/,
como em lat. clave > rét. oc. kla f centr. kle, or. klaf\ lat. glacies > rét. oc. e centr.
glatsch, or. glatscha; c) a palatalização do Ici e do /g/ seguidos de /a/: lat. caballus >
rét. oc. chavals, centr. tschavcil, or. chavál; lat. gallina > rét. oc. djilinya, centr. djili-
na e or. djalina.
Essas características fonéticas afastam o rético do italiano e o aproximam do
galo-romance. Quanto à manutenção do l-sl, o sobresselvano mantém-no nos neutros
latinos, como em lat. pectus > pez; tempus > temps, da mesma foram que o ant. fr. pi:
e tems. O francês também conserva os grupos consonânticos citados (clé ou clef
“chave”; glace, “gelo”). Contudo, a palatalização do /c-/ e do /g-/ seguido de /-a/ ocor­
reu no francês entre os séculos VI e VIII, enquanto no rético, sobretudo na secção cen­
tral, é mais recente. Assim, na toponímia, encontram-se documentados Kanal, no vale
do rio Adige (desde 1392), Kasten < lat. Castellum, no vale de Funes, Kompatsch <
lat. Campaceum, na região de Luson e Stelvio. Trata-se, portanto, do mesmo fato lin­
guístico, mas de épocas bem diferentes e sem relação de interdependência. O mesmo

208 | E L E M E N T O S DE F IL O L O G IA R O M Â N IC A
se pode dizer da vocalização do /-1/ seguido de /-t-/, como lat. alteru > rét. oc. auter,
centr. auter, eng. oter, em fr. autre, it. altro. Entretanto, enquanto no galo-romance
essa vocalização se deu entre os séculos III e V, nas variantes réticas ocidental e cen­
tral ela não é anterior ao século XV; os documentos em rético ocidental do fim do
século XIV aos do início do século XVI trazem topônimos que conservam ainda o /-1/,
tais como Puntalta (depois Puntata) e Gualt (moderno Guad). No friulano, esse voca­
lização não ocorre: lat. altu > friul. alt; *altiare > altsá (port. “alçar”). São, portanto,
fatos coincidentes mas de épocas diferentes, atribuíveis a tendências internas.
Entre o franco-provençal do Cantâo de Vaiais, na Suíça, e o rético dos Grisões,
ocorre o fenômeno notável dos chamados “ditongos endurecidos” (al. verhârtete
Dipfithonge), nos quais a semivogal /i/ ou /u/ se consonantiza para impedir a mono-
tongação, como nos seguintes exemplos: lat. nive > lat. vulg. neve > neive > rét. oc.
nekf, franc-prov. nele; \i\t.flore > flour > rét. oc.flokr; lat. si ti > lat. vulg. sete > seit
> rét. oc. sekt, franc.-prov. schek. E um fenômeno regional, bastante restrito e de
explicação difícil, já que não acontece nas outras duas secções réticas nem é geral no
franco-provençal.
No léxico, observam-se pontos de convergência entre os três ramos, que apon­
tam para uma primitiva unidade: lat. vulg. soliculus > rét. oc. sulegl, centr. soreje ou
sorogle, or. sorèli (fr. soleil, mas ital. sole, “sol”); lat. dragiu (do celta) > rét. oc.
dratg, centr. drai ou d rei, or. dras (mas it. crivello, “crivo”). O léxico rético reflete
também certas contingências históricas; sabe-se quão importantes foram as dioceses
durante a Idade Média. Assim, os vales que pertenceram à diocese de Coira, no
Cantão dos Grisões, mantêm uma terminologia religiosa e eclesiástica diversa daque­
la usada nos vales pertencentes então à diocese de Como ou de Milão. Alguns exem­
plos, primeiramente com o termo da diocese de Coira e em seguida o corresponden­
te da de Como ou de Milão: lat. incipere (“começar”) > scheiver (“carnaval”, com
idéia de “começo” da quaresma), e carnelevare > carnavá (it. carnevale); lat. quin­
quagesima > tschunqueismas, e lat. ecles. pentecostes > pentecoste; hebdomas >
emda, e septimana > setimana (it. settimana); basilica > baselgia, e ecclesia > gesa
(it. chiesa); signum > zen, e campana > campana (it. campana, “sino”); lat .patrimis
> padrin, e lomb. godazzo > giidaz e guidaz (“padrinho”). Os termos das circunscri-
ções diocesanas de Como e de Milão são de um dialeto lombardo, com influências
italianas. E interessante observar que essas diferenças léxicas confirmam as posições
de H. Morf, Jakob Jud, P. Gardette, A. Tierbach, F. Schürr e outros, de que as sedes
episcopais centralizavam as atividades, sobretudo festivas, de seus diocesanos.
Explicam-se, assim, as fronteiras lingüísticas e dialetais, uma vez que os limites das
dioceses geralmente coincidiam com as fronteiras administrativas das antigas civita­
tes romanas, ou mesmo das províncias; essas, por sua vez, eram estabelecidas sobre
as divisões étnicas e tribais que os conquistadores romanos habilmente respeitavam.

A ROMÂNIA | 209
Por outro lado, essa situação centralizadora impedia comunicações mais freqüentes
entre as diversas dioceses, com reflexos lingüísticos claros, já que facilitava a ação
dos substratos e dos superstratos, como se observa no caso das dioceses de Coira,
Como e Milão.
Enfim, admite-se uma unidade original das três variedades réticas, ainda que
sem consenso dos romanistas, unidade não destruída pelas diversidades fonéticas e
léxicas, aliás não tão acentuadas sobretudo entre as secções ocidental e central,
enquanto a oriental friulana sofre maior influência do vêneto e do italiano. São,
porém, inegáveis as correspondências do rético tanto com o galo-romance como com
o ítalo-romance.

O Pr o v e n ç a l

A região sul da antiga Gália foi incorporada ao Império Romano em 128-120


a.C., depois de uma intervenção para ajudar a colônia grega Massilia, ameaçada por
uma poderosa coligação celta. Passou a chamar-se Provincia Narbonensis, do nome
da capital Narbo (atual Narbonne), ou simplesmente “Província”, donde “Provença”,
“provençal” etc. Mesmo com uma latinização profunda da região, o celta dos autóc­
tones continuou a ser usado ainda por muito tempo, embora menos que nos territó­
rios do norte, conquistados por Júlio César de 58 a 51 a.C., cujas campanhas foram
relatadas pelo próprio César no De Bello Gallico.
A formação de duas línguas na Gália se deve a vários fatores. Antes de tudo,
a estrutura orográfica da região sul, com as três barreiras quase inexpugnáveis dos
Pireneus, do Maciço Central e dos Alpes, favorece a fixação e a estabilidade das
populações, em contraste com as grandes planícies do norte. Nesse território do sul,
vários substratos e subsubstratos foram comprovados: uma cultura da era do bronze
em ambos os lados dos Pireneus, correspondente à civilização megalítica, da qual os
bascos hodiernos seriam os últimos representantes; pelo segundo milênio antes da
era cristã, vieram os lígures, de origem pouco conhecida, e estabeleceram-se nos
Alpes da Provença; em seguida, pelo ano 1.100 a.C., vieram os celtas, trazendo a cul­
tura do ferro; os iberos, vindos da África, ocupam o litoral pelo ano 500 a.C.; entre
os séculos VI e III a.C., os gregos fundaram entrepostos comerciais e cidades, desta-
cando-se Massilia (Marseille); a partir do século V a.C., começam a aparecer na
região os gauleses, também celtas, participantes da civilização da La Tène, cuja
influência, porém, foi bem menor na região sul que na do norte. Sobre esses vários
substratos estabeleceu-se a latinização. Com as grandes invasões germânicas, acen­
tua-se essa dualidade étnica: o superstrato franco ao norte e o dos burgúndios ao
sudeste da Provença, uma vez que a influência dos visigodos foi pequena. O período

210 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


de bilingüismo germânico-romance estendeu-se pelo menos até o século IX na região
norte, enquanto a influência franca foi menos atuante ao sul. Além desses fatores, sul
e norte diferem ainda na organização agrária e jurídica, no sul com o direito escrito
e no norte com o consuetudinário.
Nesse contexto, formou-se o chamado provençal, a lenga romana dos docu­
mentos administrativos, em oposição ao latim. Nos séculos XIII e XIV, encontra-se o
roman em numerosos documentos municipais, em oposição ao francês ou langue du
roi. Nos textos literários, roman opõe-se tanto ao francês como ao latim. Desde o iní­
cio do século XIII, o gramático catalão Raimon Vidal de Besalú difunde a designa­
ção limosi (“limosino”) como genérica para o conjunto dos dialetos da langue d ’oc.
Usa-se também proensal ou proensales no mesmo sentido, termo divulgado por
escritores italianos, para os quais o sul da Gália continuou sempre a ser a Provincia
Romana e seus habitantes, os Provinciales, em oposição aos Francigenae do norte.
Essa designação foi consagrada pelos romanistas; mas por ser ambígua, tende a ser
reservada apenas para o dialeto específico da Provença. O termo langue d'oc desig­
nava inicialmente a região onde se falava essa língua, a Occitania\ tudo indica ter
sido Dante Alighieri o primeiro a usar essa denominação, lingua d "oco {De Vulgari
Eloquentia, I, cap. VIII e Vita Nuova, XXV), opondo-a à língua d'oil (fr.) e às do si
(it. e cast.), segundo o emprego de cada uma da partícula para indicar afirmação.
Dentre essas e outras denominações, apenas provençal e langue d ’oc sobreviveram,
além do derivado languedocien, apoiados que foram pela História e pelas universi­
dades, apesar de sua ambigüidade. Em vista disso, occitan (“occitano”), que não
apresenta anfibologia alguma, vem sendo considerado o termo mais adequado para
designar o conjunto dos falares do sul. Aliás, a administração central vem consagran­
do esse termo desde o século XIV, ao falar de lingua occitana, patria e republica
occitana, de patria linguae occitanae, como se falava de Occitania e se opunha lin­
gua occitana à lingua gallica, o francês. No começo do século XIX, esse termo revi­
veu sob as formas occitanique e occitanien através das obras de Fabre dOlivet
(Poésies occitaniques) e de Rochegude {Parnasse occitanien e Glossaire occitanien).
Entretanto, nem todos aceitaram o termo, como, por exemplo, o movimento felibris-
ta com Frederico Mistral (1830-1914). No Brasil, a designação mais usada é “pro­
vençal”, mas entendida na acepção indicada de “occitano”.
Região de intensa cultura, a Provença começou a apresentar traços de seu
romance muito cedo. Em documentos dos séculos VII-IX, encontram-se vocábulos e
frases da língua falada, como nos juramentos de fidelidade ao senhor do Castelo de
Lautrec (985-989) ou a Guilherme IV de Montpellier (1059). O primeiro documento
totalmente em provençal é um testamento de 1102. Como língua literária, é usado em
um dos mais antigos monumentos artísticos da România, o poema sobre Boethius, do
qual restou um fragmento de 258 versos decassílabos; da mesma época, provavel-

A ROMÂNIA I 21 I
mente de 950, é a Chanson de Sainte-Foy d ’Agen, com 593 versos octossílabos, redi­
gidos no dialeto limosino. Dentre os mais antigos textos em prosa, dos séculos IX-
XI, citam-se a tradução dos capítulos XIII a XVII do Evangelho de São João e dos
Sermons et préceptes religieux.
E sabido, porém, que foram os trovadores os brilhantes consagradores do pro-
vençal. Muito antes dos trouvères (poetas e jograis do norte, que usavam a langue
d'oil) e desvinculados dos ciclos épicos, glória do norte da França, os trovadores ela­
boraram uma poesia lírica extremamente refinada, tanto no conteúdo como na forma,
com uma versificação e uma prosódia de grande riqueza, acompanhadas por melo­
dias de caráter litúrgico. O ideário da lírica trovadoresca consiste em uma concepção
original do amor (o fin 'amors), baseada na idealização da mulher segundo ética
humanista, a exaltação da damna em uma joie d 'amors, o aperfeiçoamento moral do
amante, levado pelas qualidades morais (verta) da dama. Esses elementos tornaram
a lírica trovadoresca um dos pontos altos da poesia e do pensamento universais,
atraindo os talentos poéticos europeus de toda a França, da Península Ibérica, da
Itália e até mesmo da Alemanha. Por isso, nos séculos XI, XII e XIII, o provençal é a
língua-tipo da poesia lírica, como o galego-português o será mais tarde na Ibéria. O
florescimento dessa língua literária foi facilitado pela aceitação que os trovadores
tiveram junto aos senhores feudais, a reis e a imperadores, não apenas na Provença
mas em muitas cortes européias.
As primeiras poesias dos trovadores aparecem em torno do ano 1100; consi­
dera-se Guilherme VII (1071-1127), conde de Poitiers e duque da Aquitânia, o pri­
meiro dos trovadores. Embora não se tenha a obra completa de todos, são conheci­
dos os nomes de mais de 400 poetas líricos, dentre os quais destacam-se Arnaut
Daniel, Bernart de Ventadour, Aimeric de Pegulhan, Bertran de Born, Girault de
Borneilh, Jaufre Rudel, Gaucelm Faidit, Raimbaut de Vaqueiras, Guiraud Riquier e
Joffre de Foxa.
Do ponto de vista lingüístico, o que mais chama a atenção, desde suas primei­
ras manifestações, é a grande unidade dessa língua poética; as diferenças dialetais
são mínimas em todo o território, independentemente da origem do trovador. Não
houve um estágio literário dialetal, como aconteceu com o francês; todos os trovado­
res, mesmo os italianos e catalâes, adotam de imediato a “koiné” da época. A esco­
lha da língua literária se fez sem imposições, de modo espontâneo, ao que parece pela
imitação da língua dos primeiros grandes trovadores. Os dialetos certamente existiam
e se empregavam familiarmente, mas pouco influíram na língua literária, de modo
que não houve predominância política de um dialeto sobre outro. Pensou-se que a
base dessa língua comum fosse o limosino; de fato, porém, essa suposição partiu dos
elogios à “parladura de Limosi” de Raimon Vidal no tratado Las Razós de Trobar.
Embora seja um problema de difícil especificação, admite-se que a “koiné” literária

212 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA R O M Â N IC A


dos trovadores se formou com contribuições de vários dialetos, inclusive o da região
da Aquitânia, donde era “o primeiro dos trovadores”, Guilherme VII. Desse modo, os
trovadores realizaram espontaneamente o ideal de Dante na Itália: estruturar uma lín­
gua literária com contribuições de todos os dialetos.
Essa língua literária difundiu-se rapidamente através de toda a Provença, man­
tendo-se até meados do século XIV, quando sobreveio a decadência, cuja causa prin­
cipal foi a atividade de hereges albigenses na região. Convencido por um emissário
papal, Simon de Montfort chefiou uma cruzada contra os albigenses, de 1208 a 1229;
essa guerra devastou as províncias meridionais, sobretudo depois da batalha de Muret
(12/9/1213), na qual Montfort derrotou a coligação de várias cidades (Béziers,
Tolosa, Carcassona, Foix, Comminges) e Pedro II de Aragão. O resultado imediato
desses fatos, somados ainda à condenação do uso do provençal como língua de here­
ges pelo papa Inocêncio IV, em 1245, foi a desestruturação social, o empobrecimen­
to dos grandes senhores; com isso, os trovadores perderam o apoio e o ambiente em
que trabalhavam, principalmente depois da fracassada revolta de 1242. Começou
então a lenta agonia da poesia trovadoresca das cortes e o declínio da língua literá­
ria, pois os trovadores foram obrigados a emigrar.
Entretanto, do mesmo modo que se fala de uma língua literária comum, cita-
se também uma língua jurídica e administrativa igualmente comum em toda a região.
Até fins do século XIII, a unidade do provençal administrativo é sólida, com poucas
variações dialetais; muito numerosos são os documentos dessa época: registro de
títulos de propriedade, de venda, de privilégios, de coletorias municipais e seus rela­
tórios, de deliberações municipais etc. Os documentos anteriores ao século XI são
escritos em latim; nesse século, começam a apresentar termos provençais, até que se
fixe o romance provençal, língua clara e precisa com fórmulas fixas por um longo
uso, com grafia própria e válida para todas as regiões; essa situação foi conseguida
no século XII. Somente a partir do século XIV, o francês começa a se infiltrar nessa
língua administrativa, até substituí-la completamente no século XVI.
Um outro aspecto importante da história do provençal consiste nas codifica­
ções dos gramáticos. Essas tentativas de sistematização buscavam fixar a língua e tor­
nar mais fácil o ensino aos estrangeiros, principalmente italianos e catalães. Juntam
sempre o conhecimento da língua com o gênero literário, tentando ensinar os dois ao
mesmo tempo, como o mostram os títulos de suas obras: Las Razós de Trobar, de
Raimon Vidal de Basalu; Regles de Trobar, de Joffre de Foxa; Donat Proensal, em
latim e em provençal, de Hugues Faidit, escrito em meados do século XIII, um resu­
mo da gramática latina de Donato, donde o título; as famosas Leys d'Amor, de 1356,
trazem um conjunto de regras ortográficas, fonéticas, morfológicas e estilísticas da
“lingua romana”, além de normas de métrica e retórica, sendo uma tentativa de rever­
ter o processo de decadência em que estava a poesia trovadoresca.

A ROMÂNIA 21 3
Paralelamente, inicia-se a infiltração mais persistente do francês, embora encon­
trando muita resistência até fins do século XV. Entre 1350 e 1400, as regiões interme­
diárias entre as línguas d'o il e d ’oc adotam o francês como língua administrativa e de
comunicação. No extremo sul da costa mediterrânea e na região dos Pireneus, só por
volta de 1600 o francês se estabelece como a língua administrativa; a língua falada, cor­
rente, porém, continua a ser o provençal, de modo que o edito de Villers-Cotterêts
(1539), que determinou o uso exclusivo do francês em todos os atos do judiciário,
excluindo tanto o latim como o provençal, apenas sacramentou uma situação de fato. O
francês é a língua oficial e o provençal é a falada pelo povo. Contudo, a literatura pro­
vençal não desapareceu de todo; há novelas, contos, vidas de santos, sermões, tratados
de ciências naturais e medicina, além de anais de crônicas de várias cidades e até uma
enciclopédia, Elucidari de las proprietals de totas res naturais, de Gaston de Foix.
Precisamente quando o provençal deixa de ser língua oficial, aconteceu um
primeiro renascimento literário, graças às obras de Pey de Garros (1525-1583) na
Gasconha, Ballaud de La Ballaudière (1543-1588) na Provença, e Aurger de Galhard
(1532-1597) em Languedoc. Influenciados pelo petrarquismo, querem transformar o
provençal num “volgare illustre” e protestam veementemente contra as imposições
reais do francês; destaca-se nesse protesto o tolosano Pèire Godolin (1580-1649), que
apresentou, em 1631, um autêntico manifesto em favor da língua d ’oc, capaz de res­
ponder a todas as exigências da expressão literária, com vocabulário rico, com vocá­
bulos sem correspondência mesmo no latim ou no grego. Se nada de prático conse­
guiram no campo político, esses autores do primeiro renascimento mantiveram pelo
menos o interesse pela língua e a tradição literária.
O segundo renascimento do provençal, denominado Félibrige, começou com
a reunião, no castelo de Font-Ségugne, perto de Avignon, de sete jovens poetas pro-
vençais (Frederico Mistral, José Roumanille, Teodoro Aubanel, Anselmo Mathieu,
Afonso Tavan, Paulo Giéra e João Brunet). Pretendiam restaurar a língua e a litera­
tura provençais com um programa bem definido de ortografia e de gramática, além
de uma nova visão das relações entre língua e literatura. O nome félibre (“poeta”,
“escritor” da língua d ’oc) foi encontrado por Mistral numa composição popular; seu
significado etimológico é obscuro, fato que, segundo ele, conferia ao movimento um
tom de encantamento e de mistério. Com a divulgação feita através de um novo órgão
de imprensa, o Armana Prouvençau (“Almanaque Provençal”) e o êxito de Mirèio de
Frederico Mistral, o novo movimento se consagrou e partiu em busca de seus objeti­
vos, assim definidos por Mistral em suas Memórias de 1906:

1. Reavivar na Provença o sentimento da raça,


2. Restaurar a língua natural e histórica da região,
3. -Restituir ao provençal sua dignidade através da consagração da poesia.

214 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Uma das primeiras tarefas do Félibrige foi fixar a ortografia, cuja tradição se
perdera; não se chegou a um acordo por causa das grandes variedades dialetais. A
escolha do dialeto literário, o da região de Maillane, terra natal de Mistral como tam­
bém da maioria dos sete félibres, não foi feliz, porque aquele dialeto é um dos mais
diferenciados, trazendo problemas ortográficos na representação de fonemas das
outras variedades. Um estudo completo desse problema foi feito por Jules Ronjat
(1864-1925), em L ’ourtougràfi prouvençalo (1908) e em Grammaire Istorique des
Parlers Provençaux Modernes. Mas somente com a intervenção direta de Mistral,
chegou-se a estabelecer um sistema simples e relativamente coerente na ortografia.
No enriquecimento da língua, destaca-se Trésor du Félibrige, “verdadeiro
monumento do provençal e dos outros dialetos d ’oc, obra de lexicologia e enciclopé­
dia meridional”, na avaliação do romanista Pierre Bec {La langue occitane, p. 102).
Fruto de vinte anos de trabalho de Mistral, ainda hoje conserva o seu valor, relacio­
nado que está com o Dictionnaire provençal-français, de Honnorat, também enciclo­
pédia, com mais de cem mil palavras antigas e modernas. No Trésor du Félibrige,
Mistral procurou eliminar os galicismos que haviam substituído os correspondentes
provençais, sempre que possível. Contudo, foi como poeta, autor de Mirèio,
Calandau e Neita, que Mistral se tornou internacionalmente conhecido e considera­
do um dos maiores poetas modernos. Sua temática, como também a dos félibres em
geral, é a terra natal, sua tradição e seus costumes, as montanhas, as flores e o mar.
Ainda que o Félibrige não tenha alcançado totalmente os objetivos propostos,
o certo é que a Provença (ou a Occitânia) não mais deixou de produzir grandes nomes
na literatura, como Antônio Perbosc e Augusto Fourès.
Depois da morte de Mistral (1914), vários eventos mostram o interesse por
essa língua românica, garantindo-lhe a perpetuidade, dentre os quais se destacam a
fundação da Escola Occitana (1919), do Instituí d'Eludes Occitanes (1945), a reali­
zação do Premier Congrès International de Langue et Littérature du Midi de Ia
France, em 1955, que se vem repetindo a cada três anos, a fundação da Universidade
Occitana de Verão (1972) e da Association Internationale d ’Etudes Occitanes (A. I.
E. O.) em 1981. Além disso, gramáticas e dicionários de alto nível, como os de Louis
Alibert, atlas lingüísticos e estudos dialetológicos dão vida nova ao provençal.
Quanto aos dialetos, cujos limites foram modernamente fixados com mais
clareza, Jules Ronjat os classifica em cinco grupos: 1) provençal (de Agen a Nice),
cujo subgrupo rodiano perfaz a base da língua literária moderna; 2) linguadociano-
guienense (território central, com Tolosa, Albi e Cahors); 3) aquitano ou aquitano-
pirenaico (ao oeste do rio Garona); 4) alverniatense-limosino (região central-norte do
território, limitado ao sul pelo rio Dordogne); 5) alpino-delfinatense (região leste, na
fronteira italiana e limitada ao norte pelo franco-provençal). Sob pressão do francês,
a língua oficial, os dialetos lentamente vêm perdendo terreno, principalmente os das

A ROMÁNIA | 215
regiões norte. Com exceção do gascão, apresentam notável unidade lingüística. Jules
Ronjat destacou dezenove traços característicos, dos quais onze fonéticos, cinco mor-
fológicos, dois léxicos e um sintático, em relação às línguas e aos dialetos românicos
vizinhos (ver mapa 17, p. 372).
Vejam-se alguns exemplos:
Na fonética, /u/ > /ii/ como no francês, no rético e nos dialetos do norte da
Itália: lat. luna > prov. luna, fr. luna, eng. lüne, mas cat. lluna, cast. luna, port. lua.
Um outro aspecto fonético do provençal é a não nasalação de vogais seguidas de
fonemas nasais, contrariamente ao que acontece no francês, franco-provençal e no
português. No provençal, como no italiano e no castelhano, as vogais nessa situação
conservam o timbre da vogal oral correspondente. A ditongação do /e/ e do /o/ bre­
ves latinos só se dá nos casos em que houver /i/ ou /u/ na sequência: lat. vetulu > prov.
vielh, mas it. vecchio, port. velho; lat. lectu > prov. lieit ou liech, cat. Ilieit > llit, mas
fr. lit, it. letto, cast. lecho, port. leito; lat. octo > prov. ueit, uech e uòch, mas it. otto,
port. oito; lat. oculu > prov. uelh ou uòlh, mas it. occhio, cast. ojo, port. olho; lat. bove
> prov. buòu, cast. buey, mas it. bove, log. boe, cat. bou, port. boi; lat. focu > prov.
fougu > fuòc, it. fuoco, cast. fuego, mas rom. foc, cat. foc, port. fogo. Em todas as
outras condições, essas duas vogais breves latinas se mantêm em provençal com tim­
bre aberto, não ocorrendo a ditongação espontânea: lat. decem > prov. dètz, rom.
zece, log. dege, port. dez, mas it. dieci, eng. diesch, cast. diez; lat. lit. caelum > lat.
vulg. celu > prov. cèl, log. kelu, cat. cel, mas it. cielo, eng. schiel, fr. ciei, cast. cielo;
lat. rota > prov. ròda, cat. roda, log. roda, port. roda, mas it. ruota, cast rueda. O pro­
vençal mantém, portanto, em grande parte, o vocalismo tônico de sete fonemas; ape­
nas o /p/, proveniente do correspondente longo latino, passa a /u/ no século XIV: lat.
dolore > prov. ant. dolor > mod. dulur; flore > flor > flur; esse fechamento é carac­
terístico do provençal. Contrariamente ao francês e geralmente ao franco-provençal,
o provençal conserva o /a/ tônico: lat. capra > prov. cabra e chavra, fr. ant. chievre >
mod. chèvre, franc-prov. chievre; lat. pratu > prov. prat, fr. pré, franc-prov. pra; como
se vê, o franco-provençal, palatalizando apenas nos casos em que precede uma pala-
tal (capra > chievre), ocupa uma posição intermediária. Como o romeno, o proven­
çal conserva o ditongo /au/ latino, em oposição às outras línguas românicas: lat. auru
> prov. aur, rom aur, mas fr. or, it. oro, cat. or, cast. oro, port. ouro; lat. audire > prov.
auzir, rom. auzi, mas it. udire, fr. ant. oir, cat. ohir, oure, cast. oir, port. ouvir.
Na morfologia, o provençal se distancia do francês e se aproxima das línguas
da Ibéria pela conservação das desinências número-pessoais dos verbos, tornando
dispensável o uso dos pronomes pessoais retos: canti, cantas, canta, cantam, cantatz,
cantan; no francês e no franco-provençal, pelo menos quatro das seis formas coinci­
dem na pronúncia, o que exige o uso do pronome. Note-se a flexão característica /-i/
para a primeira pessoa singular, diversa do cat. eant, cast. e port. canto, fr. je chante.

216 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Diferentemente do francês, é corrente no provençal o uso do pretérito perfei­
to simples (cantèri, mas ir. j'a i chanté, “eu cantei”) e do imperfeito do subjuntivo,
este expressando a idéia de irrealidade em orações como: S ’aguèssi un ostal, seriai
content(“Se eu tivesse uma casa, estaria contente”). Outro torneio do provençal, ine­
xistente no francês, é o emprego da terceira pessoa do plural para indicar a indeter-
minação do sujeito: Dison que lo blad es de bon copar (“Dizem que o trigo é fácil de
cortar”). Essa idéia também se expressa pela terceira singular com a partícula se: Se
ditz qu 'aquels camps son una riquessa (“Diz-se que esses campos são uma riqueza”).
O provençal ainda dispõe do indefinido òm, correspondente do francês on, mas des­
conhecido nas línguas ibéricas modernas. Também em contraste com o francês, o
franco-provençal e o italiano, emprega-se em provençal o subjuntivo no imperativo
negativo: (Non) fagas pas aquò. Enquanto no português há o mesmo torneio “Não
faças isso”, no francês, por exemplo, conserva-se o imperativo: Ne fais pas cela.
Essas considerações mostram com clareza que, embora enquadrado no galo-
romance, o provençal difere consideravelmente do francês e se aproxima bastante das
línguas ibéricas.

a. O Gascão
Ainda que aparentado ao provençal, o gascão, do ponto de vista linguístico, é
tão diferenciado que há romanistas que o consideram uma língua autônoma. Por isso,
é necessário conhecê-lo pelo menos em suas linhas gerais.
Ronjat denomina o gascão, juntamente com o bearnês, “aquitano”. E falado na
Gasconha, limitado ao sul pelo Pireneus, ao oeste pelo Atlântico, ao leste pelo rio
Garona desde sua foz até a cidade de Tolosa, entrando ainda pelo curso do rio Ariège,
afluente do Garona, ao sul. Contudo, o rio Garona é o principal ponto de referência nos
limites lingüísticos entre o gascão e os demais dialetos da região (ver mapa 17, p. 372).
Já os antigos provençais consideravam o gascão língua estrangeira, tão estran­
geira quanto o francês, o inglês, o castelhano e o lombardo, segundo as Leys d ’A mors
(11, 388). Muitas de suas características são em razão do substrato ibérico, próprio do
território sul-ocidental da antiga Gália, fato que aproxima o gascão do castelhano, do
aragonês e, sobretudo, do basco. Os historiadores antigos atestam a presença de
povos diferentes tanto étnica como lingiiisticamente na Gália. No tempo de César e
no século I d.C., os aquitanos, que teriam ocupado toda a extensão norte da vertente
dos Pireneus, eram claramente distintos dos celtas e de outras populações celtizadas,
dos quais eram separados grosso modo pelo rio Garona, como aliás o diz César:
“Gallos ab Aquitanis Garumna flumen dividit” {De Bello Gallico, I). No contexto do
Império Romano, a região foi primeiramente denominada Provincia Aquitana Tertia,
depois Novempopulania e, finalmente, Vasconia, do nome do povo vascão, ancestral
dos atuais gascões. Esses vascões eram numerosos, tanto que no século VI fizeram

A R O M Â N IA I 217
muitas incursões pelo sudoeste da Gália. Já se disse que as influências germânicas
foram mais acentuadas ao norte, sobretudo as dos francos, pois o reino visigodo de
Tolosa (ver pp. 142-143) deixou escassos vestígios. O sul permaneceu mais fiel às
tradições e à cultura latina, originando-se daí uma oposição nem sempre velada entre
as duas regiões e sensível no decurso da História.
As características étnicas e o relativo isolamento da região explicam o siste­
ma fonológico original e a base lexical peculiar do gascão; muitos desses elementos
encontram-se também do outro lado dos Pireneus, com coincidências até com o por­
tuguês. O isolamento da Gasconha se acentuou ainda mais em relação aos territórios
vizinhos, pois levou vida politicamente autônoma sob os seus duques (ver mapa 17,
p. 372).
Dentre as características lingüísticas do gascão, destacam-se as seguintes:

1. Na fonética, o gascão, da mesma forma que o castelhano, em parte, e o basco, não


conhece o fonema /f/, que passa sempre a uma aspiração, representada por /h/: lat.
filia > gasc. hilha (“filha”); farina > haría (“farinha”); flore > hlor (“flor”); fri-
gidu > hred (“frio”); focu > huèc (“fogo”); fila > hiu (“fio”); calefare > cauhar
(“esquentar”); fabru > hàure (“artífice”); furna > hum (“forno”) etc.
Um traço que pertence também à evolução histórica do português, é a sínco­
pe sistemática do /-n-/ intervocálico no gascão; comparando-se o languedociano
com o gascão, verifica-se farina - haria\ una - ua (“uma”); luna - lua (“lua”);
esquina - esquia (“costas”) [< frísio skatja]; amenar - amiar (“levar”); semenar
- semer (“semear”). No gascão se dá a síncope total do /-n-/, enquanto no portu­
guês, antes da síncope, ocorre a nasalação da vogal anterior, que se palatiza e se
desloca para a vogal posterior como em vicinu > viclnu > vicio > vizinho.
Da mesma forma que o aragonês e o basco, o gascão acrescenta um /a-/ pro-
tético ao lr-1 inicial, pronunciado com forte vibração pela ponta da língua, do que
resulta (arr-/, como em rat - arrat (“rato”); rasim - arrasim (“uva”); riu - arriu
(“rio”); rai - urrai (“raio”); ram - arram (“ramo”); ròda - arròda. No castelha­
no, há exemplos que remontam ao século XI: rancura - arrancura; razón - arra-
zón; no aragonês, há arriyer < lat. ridere (“rir”).
Único na România é o tratamento que o gascão dá ao /11/; em posição final, pas­
sou a /-tscli/ e depois a /-t/, como em bellu > bètsch > bèt (“bonito”); agnellu >
anhètsch > anhèt (“cordeiro”); castellu > castètsch > castèt (“castelo”). Em posi­
ção intervocálica passa a l-r-l simples: bella > bèra (“bonita”); bullire > borir (“fer­
ver”); gallina > garia (“galinha”); illa > era (“a” - artigo feminino). O /-1/ simples
final, como acontece em largas regiões do Brasil, vocaliza-se em /-u/: lat. salem >
sal > gasc. sau; melem > mèu; malum > máu; filum > hiu (“fio”). Esse traço,
porém, encontra-se também em outros dialetos provençais e no antigo francês.

218 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Os grupos l-mb-l e l-ná-l se reduzem a /-m-/ e /-n-/ respectivamente, como no
catalão, no castelhano, no português falado do Brasil, e em algumas regiões do
sul da Itália: camba > cama (“perna”); palumba > paloma (“pomba”); landa >
lana (“charneca”); intendere > enténer (“ouvir”); *tondere > toner (“tosquiar”);
germ. stunda > estona (“momento”).
Na prática, o gascão não distingue os fonemas /b/ e /v/, emitidos ambos como
/b/; vaca é pronunciado [bako], vin soa [bi(n)]; essa convergência é mais geral
que no castelhano e em certos dialetos provençais, tanto que levou Scaliger a con­
siderar esse povo muito feliz, uma vez que para os gascões bibere est vivere.
Diferentemente dos outros dialetos provençais, o gascão não apresenta tam­
bém o ditongo no sufixo proveniente do lat. -ariu, tendo -er, -era, como o cata­
lão, enquanto os dialetos vizinhos têm -ièr, -ièra.
2. Na morfologia, a originalidade do gascão não é tão sensível como na fonética.
Entretanto, são características as formas do artigo definido, bem diversas não só
das dos dialetos provençais como também das línguas românicas: lat. ille > gasc.
eth e illa > era (prov. Io, Ia; fr. le, la; port. o, a etc.).
Características, porém, são as desinências verbais de várias formas; assim, no
imperfeito do indicativo, o gascão apresenta flexões em è ou èva (pronunciada
[èwo]) para os verbos em -er, como arridè ou arrideva de arrider (“ele ria”); volè
ou volèva de voler (“ele queria”). Para os verbos em -ir tem a desinência -iva,
como dromiva, de dromir (“ele dormia”), em oposição às formas correntes occi-
tanas risiá (“ele ria”), voliá (“ele queria”), dormia (“ele dormia”). Também no
pretérito perfeito, o gascão dispõe de formas diferentes: -è ou -à para os verbos
da primeira conjugação, como cantè/cantà, enquanto o provençal tem cantèt/can-
tèc; -ó ou -óc para a segunda, por exemplo, arridó/arridoc (“ele riu”); e -/ para a
terceira, dormí (“ele dormiu”).
3. Na sintaxe, destaca-se o uso corrente de diversas partículas “enunciativas”, que
precedem orações independentes ou principais: que, be, ou b \ja , e. Diferentes na
origem, tendem a se confundir semanticamente no gascão moderno. Servem ape­
nas de reforço expressivo, pois são de natureza expletiva: “Auèi que he calor!”
(“Hoje faz calor!”), “ZTac vòs?” (“Quereis?”), “Ja i vau” (“Eu vou aí”), “E l’as
entenut?” (“Ouviste isso?”).
4. Ao lado do léxico geral, comum ao galo-romance do sul, o gascão tem um núme­
ro considerável de temos de origem não latina ou celta. Prováveis vestígios do
subsubstrato de um antiga civilização aquitano-pirenaica, esses termos designam
sobretudo animais e plantas, além de acidentes geográficos; há os também relati­
vos à atividade pastoril. Através do basco, chegou-se a identificar a origem de
muitos deles, sobretudo com os estudos de G. Rohlfs; exemplos: avajon (“murta”
ou “mirto”), harri (“sapo”), lagast (“carrapato”), sarri (“camurça”).

A ROMÂN1A | 219
Documentos antigos em gascão não são numerosos. Ao lado de algumas
palavras vulgares que aparecem em documentos de registros abaciais de La
Réole, La Sauve-Majeure, Sorde-FAbbaye e outras, de fins do século XII, exis­
te uma cobla em gascão no conhecido descort (tipo de poesia) de Raimbaut de
Vaqueiras, em que há também versos em provençal, francês, italiano e galeco-
português. Entre os documentos em prosa, citam-se alguns pergaminhos com
atos da “Commandarie du Temple” de Montsaunès, sendo o mais antigo de
setembro de 1179. Também o “Libro d ’oro” de Baiona conservou alguns textos
notáveis em gascão. Poucos são os escritos antigos, de valor literário; entre eles,
cita-se a tradução da Disciplina Clericalis de Pedro Afonso, num manuscrito da
biblioteca de Madri.

b. O Franco-Provençal
No outro lado do território francês, na região centro-oriental, mas abrangen­
do também parte da Itália, no Piemonte, das proximidades de Turim até Aosta, e
ainda da Suíça Romanda, encontra-se outro grupo de dialetos, diferentes tanto do
francês e do italiano, como do provençal. Foi denominado franco-provençal por G. I.
Ascoli em seus Schizzi franco-pmvenzali (1878), que usou os mesmos critérios lin­
guísticos empregados em Saggi Ladini, pelos quais reconheceu a independência do
rético. Outros romanistas denominam-no “francês sul-oriental” ou ainda “médio-
rodanês”. Os limites de seu território, porém, são bastante incertos, sobretudo ao
norte. A Suíça Romanda é o território mais amplo e mais denso do domínio franco-
provençal, cujo uso, entretanto, tende a diminuir. O avanço é do francês, a língua de
cultura ensinada nas escolas. De fato, o franco-provençal nunca foi uma língua dita
de civilização; há numerosos documentos oficiais, como “chartes” (escrituras de títu­
los de propriedade, de compra e venda, registros de outorga de títulos, de atas públi­
cas e particulares etc.), mas sua literatura é pobre (ver mapa 18, p. 373).
Do ponto de vista lingüístico, porém, trata-se de uma variedade bem caracte­
rizada, segundo assinalou Ascoli:

II franco-provenzale insieme reunisce, con alcuni suoi caratteri specifici, piú altri caratteri,
che parte son comuni ai francese, parte lo sono al provenzale, e non proviene già da una tarda con-
fluenza di elementi diversi, ma bensè attesta Ia sua propria indipendenza istorica, non guari dissimi­
le da quella per cui fra di loro si distinguono gli altri principali tipi neo-latini. (Schizzi, p. 71)

O franco-provençal também apresenta, ao lado de alguns caracteres especificamente seus,


muitos outros, que em parte são comuns ao francês, em parte ao provençal, e não é proveniente tanto
de uma confluência tardia de elementos diversos, mas que, embora afirme sua própria independên­
cia histórica, não se afigura muito diferente daquela pela qual se distiguem os outros tipos neolati-
nos mais importantes.

220 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Para Ascoli, portanto, o franco-provençal não é o resultado de confluências tardias de
elementos diversos, mas sempre ostentou independência lingüística, da mesma forma
que a tiveram as demais línguas românicas. Mais categórico na afirmação da autono­
mia lingüística do franco-provençal é P. Gardette:

Le francoprovençal a des caractéristiques plionétiques, un vocabulaire propre, qui permettent


de le mettre à part des dialectes d’o'íl comme des dialcctes d’oc, en sorte qu’on peut parier d’une lan­
gue francoprovençale et dire que trois langues se partagent le domaine gallo-roman: la langue d’o'íl,
Ia langue d’oc et le francoprovençal. (“En marge des Atlas linguisticques du Lyonnais, du Massif
Central, du Francoprovençal du centre”, Revue de linguistique romane, XXVIII, 1964, p. 69.)

O franco-provençal tem características fonéticas e um vocabulário próprio que permitem


distingui-lo tanto dos dialetos “d’o'íl” como dos dialetos “d’oc”, de modo que se pode falar de uma
língua franco-provençal e afirmar que três línguas dividem entre si o domínio galo-romance: a lín­
gua “d’o'il”, a língua “d’oc” e o franco-provençal.

No contexto histórico do galo-romance, o franco-provençal esteve mais liga­


do ao norte; entretanto, aproximadamente pelo ano 700, afastou-se lentamente tanto
dos dialetos franceses do norte como dos falares do sul. O período de maior esplen­
dor do franco-provençal situa-se nos séculos XI e XII, quando a cidade de Lyon foi o
centro lingüístico e a capital da Gália. Depois dos burgúndios, Lyon perdeu impor­
tância política, não mais vindo a ser sede de Estado nem berço de uma literatura apre­
ciável por bastante tempo. Por causa de sua posição geográfica, prensado entre lín­
guas de expressão, o franco-provençal se fragmentou; para isso contribuiu também o
esfacelamento político: Lyon e o Delfinado passaram para o domínio do rei da
França; a região de Vaud foi incorporada à de Berna; o Franco-Condado, ao da
Borgonha e, posteriormente, passou para o domínio do rei da Espanha; apenas a
Savóia e Genebra continuaram independentes. Desde o século XIII, o francês é a lín­
gua administrativa e jurídica e logo literária e das escolas em Lyon; o mesmo acon­
teceu logo em seguida na antiga Borgonha, atual Suíça Romanda, bem como na
Savóia. A variedade local do franco-provençal foi, durante certo tempo, a língua ofi­
cial da antiga República de Genebra; posteriormente, porém, abandonou espontanea­
mente sua língua, adotando o francês - fato raro na România (ver mapa 18, p. 373).
Lingüisticamente, o franco-provençal se aproxima bastante do provençal no
vocalismo e mais do francês no consonantismo. Assim, conserva o /a/ tônico como
no provençal, enquanto o francês tem /e/: lat. pratu > franc.-prov. pra, prov. prat, mas
fr. pré (“prado”); lat. pane > franc.-prov. pari, prov. pan, e fr. pain. Sob influência de
uma palatal, porém, /a/ > /e/ de modo mais constante que em francês: lat. casa >
franc.-prov. chieu, fr. chez, mas prov. casa; lat. cantare > franc.-prov. tsãtá, fr. chan-
ter, prov. cantar, lat. carricare > franc.-prov. tsardsí, fr. ant. chargier, mod. charger,

A ROMÂNIA 221
prov. cargar. São características do franco-provençal as palatalizações de consoantes,
como Id + /a/ passa a /ts/: lat. campu > tsã;furca >fuertse; /g/ + /a/ passa a /dz/: gal­
bini/ > dzuono (fr.jaune). Em algumas regiões, sobretudo na Savóia, /ts/ passa a /s/
com possibilidade de várias evoluções posteriores.
Diversamente do francês e do provençal, o franco-provençal conserva o /o/
final, proveniente do /u/ breve latino: lat.fabru > franc.-prov. ant. /avra, fr. ant.fevre,
prov. fabre (“artífice”); lat. intro > franc.-prov. entro, fr. entre, prov. entre; lat. vulg.
quattro > franc.-prov. quatro, fr. quatre, prov. quatre; lat. debitu > franc.-prov. dedo,
fr. dette, prov. depte, deute ou deude (“dívida”); lat. desidero > franc.-prov. desiro, fr.
j e désire, prov. ieu dezeji.
O léxico é muito conservador, contando com vários elementos pré-românicos,
o que não é estranho em um território de montanhas; considerável é o número de
empréstimos do superstrato burgúndio. Por outro lado, a fragmentação dialetal é
grande, podendo-se afirmar que cada vale tem sua variedade linguística própria.
Em nenhum momento de sua história, como observou P. Àbischer em
Chrestomathie franco-provençale (1950), os falantes do franco-provençal tiveram o
ideal de fazer de seu idioma uma língua literária. Mesma na Savóia, em Grenoble ou
em Lyon, os que escreviam, faziam-no em francês, em burguinhão ou mesmo em latim.
Por isso, nenhum dialeto conseguiu o status de língua literária; em várias regiões, como
na Savóia, os primeiros documentos franco-provençais só aparecem no século XVI.
Hermann Suchier (1848-1914), em Die Mundart der Strassburger Eide (“O
Dialeto dos Juramentos de Estrasburgo”), de 1902, chegou à conclusão de que a
variedade dos juramentos, feitos na “romana lingua”, seria um dos dialetos franco-
provençais; baseava-se na posição geográfica intermediária entre o francês e o pro­
vençal, o que permitiría que os soldados de Carlos, o Calvo, provenientes de todas as
regiões da Gália, entendessem o que se jurava. Essa hipótese, porém, não tem funda­
mentos sólidos. Os primeiros e indiscutíveis traços do franco-provençal encontram-
se no mais antigo poema românico sobre Alexandre Magno, do qual se conservou
fragmento de 105 estrofes monorrimas; está redigido em provençal e data do século
XI. Da metade do século XIII, existem vários documentos em franco-provençal, como
uma lista dos vassalos do conde de Forez, um escrito jurídico de Neuchâtel (1265),
um recibo de um cobrador de impostos (1271) e um longo documento relativo à
administração e à jurisdição dos condes de Vienne (1276). Também do século XIII é
a Lenda de São Bartolomeu, cuja língua lembra a de Lyon.
Representam produtos da literatura dialetal, a obra de Marcelino Allard no
dialeto de Forez, do início do século XVII, o monólogo satírico La vieille lavandière
de Grenoble, certamente de Laurent de Briançon, da primeira metade do século XVI;
Laurent é também autor do poemeto Le bonquet dela Faye, com 454 versos, de algu­
mas canções de Natal no dialeto da Savóia e de algumas farsas no dialeto de

222 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Friburgo. Do começo do século XVII é a Chanson de 1'Escalade de Genève, da qual
duas quadras darão uma idéia dessa língua românica pouco conhecida entre nós;
texto de Tagliavini (Le Origini, p. 494):

On vo dera qifétai cela canaillc,


Lou Savoyar contrc noutra mouraille
Trai eitiellé on dressia et plianta,
Et par iqué dou san y son monta.
Etian antra, veniron u courdegarda,
Yo i firon onna ruda montada.
Is avion tenaillé et marté
Qu’étivon fai avoi du boun acié.

A vós será dito quem era essa canalha. Os saboianos contra nossas muralhas três escadas encosta­
ram e por elas trezentos subiram. Tendo entrado, chegaram ao corpo de guarda, onde fizeram uma
rude montada. Eles tinham tenazes e martelos, que eram feitos com bom aço.

O Francês

Segundo se disse quando se tratou do provençal (ver p. 210), o aparecimento


de línguas diferentes no território da antiga Gália deveu-se a fatores geográficos e
étnicos. Enquanto o relevo montanhoso do sul favorecia a fixação das populações,
com o conseqüente conservadorismo em vários campos, inclusive no lingüístico, as
grandes planícies do norte propiciavam fácil movimentação e com isso dificultavam
a fixação de raízes mais profundas, acarretando modificações mais rápidas.
Etnicamente, o norte apresentou condições mais homogêneas que o sul, onde
é conhecida a presença dos lígures (a partir do segundo milênio a.C.), iberos, fení-
cios e gregos principalmente. No norte, dominaram os celtas e os gauleses (século V
a.C.), também celtas; a latinização, iniciada com a conquista da Gália por Caio Júlio
César, encontrou uma base étnica mais uniforme que a do sul. Com as grandes inva­
sões germânicas, a constituição de um reino visigodo em Tolosa acentua ainda mais
a diferenciação em relação ao norte. Enquanto os visigodos já estavam, em parte,
romanizados ao se estabelecerem na Aquitânia, os burgúndios e sobretudo os francos
conservaram todas as características germânicas quando invadiram a Gália; desse
fato resultaram graus diferentes de superstrato. Conjugando-se essas diferenças de
substratos e de superstratos com as condições geográficas características, além de
uma latinização mais profunda no sul, explicam-se as variedades lingüísticas surgi­
das na região das Gálias, onde se pode afirmar a existência de quatro línguas româ-
nicas, caso se levem em conta apenas critérios lingüísticos.

A ROMÂNIA 223
Nessas condições, a história do francês, ou língua “d’oc”, deveria ser diferente.
Contrariamente ao que aconteceu no sul, em que existiram uma surpreendente κοινή
literária e uma brilhante literatura lírica, no norte as primeiras manifestações literárias
foram dialetais, entre as quais não figura o francês. Até o século XII, não há uma língua
literária uniforme, reflexo da ausência de unidade política, social e linguística. Desde a
ascensão de Hugo Capeto (987), o primeiro rei a ignorar o franco e a usar única e cons­
tantemente o frâncico, até Luís XI (1461-1492), a história da França resume-se basica­
mente na luta da realeza contra o feudalismo, cujo estrutura favorecia a descentralização.
Por isso, até o fim da Idade Média, as poesias épicas foram redigidas no dialeto anglo-
normando; composições líricas e épicas surgem na Champanha e na Picardia e as pri­
meiras crônicas são escritas no dialeto champanhês. Centros culturais são as cortes de
Chrétien de Troies (Champanha), Artois, Arras (Picardia) e Rouen (Normandia).
Entretanto, quando Paris se projeta como capital real, em fins do século XIII, com Luís
IX, o Santo, o modesto dialeto de íle-de-France, o frâncico, passa também a se projetar
literariamente, até tornar-se a língua nacional no século XV. Em fins do século XIV, os
citados centros regionais haviam perdido importância política e cultural, passando a
segundo plano. O movimento centrípeto em relação a Paris foi acelerado pela unificação
nacional, uma conseqüência da Guerra dos Cem Anos (1337-1453), durante a qual Paris
foi um centro de referência e polarização. O grande desenvolvimento de Paris sob Carlos
VII (1422-1461), com a consequente centralização da cultura, projetou ainda mais o frân­
cico. Também a invenção da imprensa, logo e largamente utilizada pelos reis franceses,
muito ajudou na difusão do frâncico, já que era a língua usada em numerosos impressos.
Portanto, fatores políticos, históricos e culturais fizeram com que o frâncico,
inicialmente sem maior projeção e importância, se tornasse a língua oficial e literá­
ria da França em período de tempo relativamente breve. Foi uma trajetória diferente
da do italiano, por exemplo, para o qual, como se viu, valeu o critério cultural, com
as obras de Dante, Petrarca e Boccaccio elevando o dialeto florentino a língua nacio­
nal e literária.
Quanto à situação atual dos dialetos franceses, A. Meillet (Les langues dans
iEurope nouvelle, p. 108) chegou à seguinte conclusão:

Les savants qui, dans Ia moitié septentrionale de Ia France, veulent étudier les parlers locaux
n’en trouvent plus que de traces; dans des villes aussi petites que Remiremont (dans les Vosges), le par­
ier local ifexiste plus qu’à 1’état de souvenir. Dans les simples villages, le patois meurt rapidcmcnt. On
voit approcher le moment oii, dans toute Ia France du Nord, jusqu’ à Bordeaux, jusq’au Massif Central
et jusq’au sud de Lyon, il ifexistera plus que le français commun, plus ou moins correctement parlé.

Os especialistas que, na metade norte da França, quiserem estudar os falares locais não vão
encontrar senão vestígios; nas cidades pequenas como Remiremont (nos Volges), o falar local só

224 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


existe como recordação. Nos povoados simples, o dialeto morre rapidamente. Vê-se a aproximação
do momento em que, em toda a França do norte, até Bordeaux, o Maciço Central e até o sul de Lyon,
só haverá o francês comum, falado mais ou menos corretamente.

Essa situação dos dialetos atribui-se à administração centralizada do Estado,


à vida social e econômica preponderante de Paris, cuja língua se tornou “parler direc-
teur” do uso literário e, no século XV, a própria língua literária francesa. Nesse con­
texto, o decreto Villers-Cotterêts de Francisco I (1539), que impôs o uso exclusivo do
francês em todos os tribunais, dispondo que os atos jurídicos fossem “pronunciados,
registrados e entregues às partes em língua materna francesa, e não de outro modo”,
apenas sacramentou uma situação de fato, pelo menos em relação ao norte.
Embora sem a importância que tiveram na Idade Média e nas condições aponta­
das por Meillet, os principais dialetos franceses são: o normando, ao norte, cujos centros
principais são Caen e Rouen; o picardo, ao longo do Canal da Mancha (Lille, Amiens,
Arras); o valão, com centro em Liège, na Bélgica; o champanhês, no centro-norte, tendo
Troyes e Reims como centros; o loreno, nas fronteiras com a Bélgica, na região de Metz;
o franco-contês, na região de Besançon, na fronteira com a Suíça; o borguinhão com cen­
tro de Dijon, no centro-oeste; o santongês, na região do Departamento de Saintonge, na
costa atlântica, ao norte da foz do Garona; o pictevino, no centro-leste, na região de
Poitiers; e o angevino, ao norte dos dois anteriores, na região de Angers e Tours.
Alguns dialetos têm revelado maior resistência à influência de Paris; assim, o
normando e o picardo conservam o /c/ velar antes de /a/: lat. vacca > vak, fr. vache\
lat. cantare > kanté, fr. chanter. Mas o valão, certamente por ser falado pela popula­
ção francesa da Bélgica, apresenta raros indícios de influência de Paris, além de con­
tar com notável literatura regional. No valão /en/ não passou a /ã/, como ocorreu em
outras regiões, conforme o modelo parisiense: lat. vendere > vinde [vêd], fr. vendre
[vãdre]; mantém o /s/ antes de consoante surda: fr. métier, valão mesti; ditonga o /e/
e o / 0/ breves em sílaba travada, como em h t. festa > valão fiesse, fr. fête; lat. mortu
> valão muert, fr. mort. A proximidade com línguas germânicas (flamengo, alemão)
levou o valão a conservar o /h/ aspirado, como em luiya, fr. haie (“sebe”), e o /w/ dos
empréstimos germânicos não passa a /gu/ segundo ocorre geralmente na România:
germ. wordon (“observar”) > valão wàrder mas fr. garder, it. guardare, eng. guar-
der, prov. e cat. guardar, cast. e port. guardar (ver mapa 17, p. 372).
Certo é que a difusão do frâncico como língua oficial causou o enfraquecimento
e a fragmentação dos dialetos, da mesma forma que ocorreu com os dialetos gregos com
a difusão da κοινή. Entretanto, houve também influências dialetais na formação do fran­
cês; assim, é de origem popular a tendência a apocopar consoantes finais, bem como o
/e/ mudo, a reduzir a palatal lateral /-11/ ou /-ili-/ a /y/ ou /i/, como em famille [farniie],
travailler [travaiiê]; desde 0 século XVI, está documentada a evolução, na boca do povo

A ROMÂNIA I 225
inculto de Paris, do ditongo oi > óe> oé > οά > uá, que acabou entrando na língua culta
com a Revolução Francesa, pela qual as classes proletárias assumiram o poder.
Em pequenos territórios da França, falam-se ainda variedades linguísticas não
românicas: o basco é falado em três regiões (Labourd, Basse Navarre e Soule) dos
Pireneus; o bretão, variedade do céltico insular, afim do címrico e do córnico, implanta­
do na Península Armórica no século VI, é falado na Basse Bretagne, estando em regres­
são desde o século X; é usado por cerca de um milhão de pessoas, quase todas bilíngües.
Nas proximidades de Dunquerque e Hazenbrouck, fala-se o flamengo; e em parte da
Alsácia e da Lorena, o alemão é usado por cerca de dois milhões e meio de pessoas.
Lingüisticanrente, o francês é a língua românica mais diferenciada sob vários
aspectos, em virtude da conjugação de fatores particularmente fortes do substrato e
do superstrato. Dentre as particularidades do francês, destacam-se no vocalismo: pas­
sagem do /a/ átono final a /e/, sendo também a única vogal que permanece nessa
posição: lat. porta > fr. porte·, mas lat. portu > fr. port; morte > morf, lupu > loup\
em sílaba livre, / e /, / e / e / o/, / p / s e ditongam por ditongação espontânea, como
em lat. mele > fr. miei (mas prov. mel, port. mel), através de mel > meei > meei e
finalmente miel\ lat. cor > fr. ant. cuer, mod. coeur (mas prov. cor e port. cor [em
“saber de cor”]); em sílaba travada, porém, não se dá a ditongação, como em lat. cor­
pus > fr. ant. cors, mod. corps, prov. cors, port. corpo·, lat. perdit > fr. ant. pert, prov.
pert, port. perde. Nesse aspecto, o castelhano difere dessas línguas por ditongar tanto
em sílaba livre como travada: miei, muerte, cuerpo, pierde.
No consonantismo, muito cedo o francês sonorizou e depois sincopou as vela­
res surdas intervocálicas: lat. maturu > fr. ant. meiir, mod. mür, mas prov. madur,
port. maduro·, lat. sapere > fr. savoir, mas prov. saber, port. saber, lat. rota > fr. roue,
mas prov. ròda, port. roda. Palataliza o / c / e o /g/ seguidos de /a/: lat. caballu > fr.
cheval, mas prov. cavai, port. cavalo·, lat. castellu > château, mas prov. castel, port.
castelo-, lat. gallu > fr. ant. jal, prov. gal, port. galo-, essa palatalização, porém, não
ocorre no normando nem no picardo.
A substituição do acento de intensidade por um tipo de acento frasal e as fre-
qüentes síncopes e apócopes na emissão tornaram o francês uma língua oxítona, em
oposição ao provençal e ao catalão, eminentemente paroxítonas; além disso, as nume­
rosas palatalizações, com reflexos tanto sobre o vocalismo como sobre o consonantis­
mo, as abundantes nasalações deram ao francês uma fisionomia articulatória bastante
original, diferenciada tanto das outras línguas da România como da própria França.
Entre as línguas românicas é o francês que dispõe dos documentos mais anti­
gos. Dois dos Juramentos de Estrasburgo, pronunciados a 14 de fevereiro de 842,
perfazem o primeiro documento escrito numa língua românica, que procura transcre­
ver a fala corrente a fim de ser entendida pelo exército de Carlos II, o Calvo, cujos
soldados não conheciam outra língua. Apesar de amplo estudo feito por eminentes

226 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


filólogos, tais como Gaston Paris, G. Lücking, E. Koschwitz, A. Wallenskõld, A.
Ewert, A. Castellani, H. Suchier, R. A. Hall Jr., F. Lot, entre outros, não se obteve
determinar o dialeto empregado. Parece, contudo, provável tratar-se duma espécie de
“roman commun”, uma língua artificial e convencional, redigida pelo responsável
pelos juramentos, que teria usado elementos de várias procedências, de acordo com
a origem muito diversa dos soldados de Carlos II. De qualquer forma, porém, o docu­
mento torna claro que no século IX o povo não mais entendia e muito menos falava
o latim; por outro lado, o documento tem valor lingüístico histórico, pois exemplifi­
ca as línguas usuais no século IX: o latim medieval, escrito, usado pelo cronista
Nitardo, a romana lingua (no caso, uma variedade francesa) e a teodisca língua (o
germânico, ou melhor, uma variedade franca da região do Reno, já identificada). Não
tem, contudo, qualquer valor literário.
Valor lingüístico e literário tem a Cantilène de Sainte Eulalie, que data do ano
900 aproximadamente; é uma pequena peça litúrgica de 29 versos, procedente do
nordeste francês; a língua está numa fase próxima ao francês antigo dos textos clás­
sicos. O /a/ tônico livre é representado por /e/ (spede, portede), o /o/ breve dá o anti­
go /uó/ (buona). Entre os mais antigos documentos literários do francês, é preciso
citar La Passion du Christ, conservada em Clermont-Ferrand; é um poema de 516
versos, em que são perceptíveis influências do provençal, atribuídas à influência do
copista. No mesmo códice, encontra-se ainda a Vie de Saint Léger. O documento com
os dois poemas é do ano mil aproximadamente. Já a Vie de Saint Alexis, de 1040, tem
forma literária mais perfeita, apresentando um caráter mais épico; aqui já são muito
claras as características da língua francesa.
Dentre as “chansons de gestes” da épica profana, destaca-se a Chanson de
Roland, o melhor poema épico da antiga literatura francesa e um dos mais belos da
literatura universal; a data de composição é discutida, mas a mais provável é a esta­
belecida por Giulio Bertoni, entre 1060 e 1070. Chegaram até nós duas redações,
uma em versos assonantes e outra rimada; a de versos assonantes é mais antiga e mais
bela, cuja língua tem matizes anglo-normandos; e a rimada, conservada em Veneza,
apresenta expressões dialetais franco-italianas. A obra levanta vários problemas filo-
lógicos, como possíveis acréscimos (por exemplo, o cerco de Narbona por Carlos
Magno), além da datação, local de redação e de língua. Quanto à língua, parece ser
o francês já literário ou “ilustre”, embora contenha regionalismos de caracterização
muito difícil. Seu autor anônimo, porém, certamente a redigiu na França e não na
Inglaterra ou na Itália.
Nos séculos seguintes, todos os gêneros tiveram grande florescimento e a prosa
aprimorou-se com os grandes cronistas, como Villehardouin e Joinville. Não sofren­
do qualquer interrupção posterior, o conjunto da literatura francesa se projeta como
uma das mais importantes do mundo, exercendo influência enorme sobre todas as lín-

a rom ânia | 227


guas românicas e também não românicas, cujos reflexos são os inúmeros galicismos,
encontrados por toda parte. No contexto românico, particularmente importante foi a
contribuição do francês, ao lado do italiano, para a relatinização do romeno no sécu­
lo passado.

O Catalão

Passando para a Península Ibérica, em sua parte oriental, encontra-se o domí­


nio do catalão, que abrange a região oriental ao longo do mar Mediterrâneo, desde o
sul de Alicante até à divisa com a França, com a forma aproximada de um triângulo,
alongado em direção ao sul; é falado também nas ilhas Baleares.
Quanto à etimologia de “catalão” e “Catalunha” na realidade ela nos é desco­
nhecida. A primeira atestação é de 1114; poucos anos depois, Catalania, Catalanicus
e Catalanensis aparecem no Liber Maiolichinus, poema de autor italiano, escrito em
baixo latim. E importante notar que essas primeiras menções se encontram em auto­
res italianos, cujos escritos se relacionam com a expedição contra os piratas mouros
nas ilhas Baleares, empreendida conjuntamente pelo conde de Barcelona e a
República de Pisa. Desde meados do século XII, “catalão” e “Catalunha” são usuais
entre os povos cristãos, enquanto os árabes denominavam “francos” os habitantes do
território da Catalunha. Apenas isso é o que se sabe com certeza, segundo Joan
Coromines (El que s 'ha de saber de la llengua catalana, p. 68).
As várias etimologias apresentadas não são aceitáveis. A hipotética e difundida
Gothalandia, “terra dos godos”, não é documentada em parte alguma, além de apre­
sentar problemas fonéticos intransponíveis. Sendo uma denominação germânica, deve­
ria ter sido criada pelos francos, uma vez que só eles poderíam considerar a Catalunha
como “a terra dos godos” por excelência. Para se explicarem as mutações fonéticas, o
termo deveria passar aos árabes, através dos quais seria possível explicar a mutação /g/
> /c/ e a conservação da surda intervocálica /t/. E Coromines acrescenta:

I des de les terres musulmanes hauria passat finalmente a Itália i Catalunya; trasmissió no
sois inversemblant per si mateixa, sinó contradita rodonament pcl fct que eis moros no van usar mai
un mon semblant. (Op. cit., p. 69)

Na realidade, não se conhece a etimologia de “catalão”, que também não é um


termo tradicional. Em vista disso, Coromines supõe que essa denominação deva ter
sido criação local, ou talvez até individual, nascida de uma deformação possivelmen­
te de Lacetani, depois bem-aceita e generalizada, porque veio de encontro a uma
necessidade imperiosa. Pois o país dos catalães era uma realidade viva e vibrante,
mas não tinha nome; novas entidades requeriam novas denominações, como Portugal

228 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


e Castilla. Os italianos sentiram a necessidade de uni nome bem claro para designar
essa nação jovem e ambiciosa, uma vez que “Marca Hispânica”, “el Comtat” ou
“Barcelona” não eram suficientemente esclarecedoras. Partindo, pois, de Lacetani,
povo bem conhecido em extenso território ao oeste de Barcelona, por metátese, ter-
se-ia enunciado Catelani, termo documentado em Bolonha em 1266, em Veneza em
1340; em seguida, generalizou-se o termo, também com a forma Catalani. Por ana­
logia com os nomes de região, como Aquitania, Lucania, Francia etc., formou-se
Catalunya. Historicamente, a Catalunha começou a diferenciar-se das outras regiões
ibéricas, quando Carlos Magno reconquistou Barcelona aos árabes em 801, entregan­
do a região a um sobrinho, fato que aproximou o nascente romance regional aos fala­
res do sul da França. Posteriormente, o Condado de Barcelona aliou-se aos reinos
%

cristãos vizinhos na reconquista dos territórios ao sul (ver p. 150). Em fins do sécu­
lo IX, dentro do sistema feudal, o condado era um feudo do reino de Navarra, torna­
do hereditário para a família Geoffroi em 888. As conquistas se sucederam: primei­
ramente o litoral; no ano de 1230, Jaime I, o Conquistador (1213-1260), incorporou
as ilhas Baleares (Maiorca, Minorca e Ibiza) e Valência (1238); em 1268, os catalães
conquistaram Múrcia, mais ao sul, já constituindo um reino único com Aragão, cuja
língua oficial era o catalão. Em 1344, Pedro IV, de Aragão, fixou as formas de trata­
mento “segons grau de cascun” nas Ordinacions sobra b regiment de tots los
Officials de la seva cort. Quando o reino de Aragão se uniu ao de Castela, em 1479,
aumentou a influência do castelhano sobre o catalão.
Lingüística e literariamente, a história do catalão divide-se em três fases: a
nacional, dos primórdios ao século XV; a da decadência, nos séculos XVI, XVII e
XVIII; e o da renascença, de meados do século XIX ao nosso século.
A fase nacional compreende o período em que Catalunha e Aragão perfaziam
um só reino, mas 80% da população falava o catalão; nessa época, o rival do cata­
lão não era o castelhano, mas o latim e o provençal. No século XII, os poetas cata­
lães escreviam na língua d ’oc, também chamada “limosino”, e só em parte em
catalão. Pelo fim da Idade Média, porém, as obras são escritas em catalão puro. Por
volta de 1300, já dispõe de produção em muitos gêneros literários, inclusive histó­
ria, filosofia e teologia; Ramon Llull (1235-1316) é o grande destaque desse perío­
do, cuja obra imensa versa sobre muitos assuntos, sobretudo temas filosóficos, enci­
clopédicos e históricos; a parte em catalão abrange cerca de trinta volumes. O século
XIII viu florescer a crônica, a narrativa em prosa e em verso, o apólogo e os temas
religiosos; as traduções da Bíblia circulavam já em 1234. Destaca-se Arnau de
Vilanova, cuja obra científica foi escrita, em parte, em catalão. Escreveram-se ou
traduziram-se muitos livros sobre matemática, astronomia e medicina; por volta de
1350, Joan Jacme escreveu um tratado de oftalmologia. No campo dos estudos gra­
maticais, Ramon Vidal de Basalú (1160-1230) é autor da mais antiga gramática,

A ROMÂNIA | 229
conservada, de uma língua moderna. Entre 1371 e 1380, surgiram dicionários de
rima; no século seguinte, publicam-se dicionários diversos. Do século XIV foram
conservados textos dramáticos, que se tornaram o ponto de partida das grandes
peças teatrais castelhanas do Renascimento. Língua de um Estado de longa tradição
parlamentar, o catalão conta ainda com numerosas obras de caráter oratório, com
reflexos no direito; assim, o Código de Direito Marítimo, elaborado pelo “Consolat
de Mar”, teve aceitação internacional.
No século XV, o catalão atinge o apogeu como língua literária. Depois da união
política com Castela, começa a decadência no século seguinte. A relativa liberdade
inicial foi restringida depois da guerra civil (1701-1713); o castelhano foi imposto
como língua oficial; mesmo assim, os tribunais e as escolas conseguiram manter o
catalão até 1858. A poesia e as canções populares de toda a Catalunha tiveram então
considerável desenvolvimento; nas homílias e temas religiosos nunca se deixou de
usar o catalão, como também na vida familiar, no comércio e na correspondência.
A Renaixença começou em 1833, quando Caries Aribau (1798-1862) escre­
veu Oda a la Pátria, fazendo uso de uma língua rica, estilizada e realmente literária,
mostrando que não houvera solução de continuidade, apensar dos séculos de estag­
nação e decadência. Sob inspiração do Romantismo, prosperaram a poesia, a prosa
literária e, logo depois, os escritos científicos e técnicos, com reflexos nas atividades
governamentais e administrativas. Datas importantes dessa Renaixença são 1859,
com a restauração dos Jocs Florais (segundo os Jeux Floraux, de Tolosa, espécie de
concurso poético, instituídos em 1323); 1864, início da grande obra dramática de
Pitarra; 1877, publicação de L ’A tlàntida, o primeiro grande poema bem-sucedido;
1883, publicação de La Papallona, o primeiro romance de Narcís Oller; em 1900,
assume caráter permanente o primeiro jornal diário La Veu de Catalunya (“A Voz da
Catalunha”); 1907, fundação da academia científica Instituí d'Estudis Catalans, que
teria um congênere para os estudos provençais, o Instituí dE tudes Occitanes, em
1945). Em 1931, o catalão recobrou o caráter oficial; logo depois da guerra civil
(1936-1939), porém, todas essas conquistas da Renaixença foram novamente supri­
midas pelo “caudilho” Francisco Franco, o que levou os catalães a lhe oporem todo
tipo de resistência e oposição. Só conseguiram reaver a liberdade, inclusive a linguís­
tica, com o estabelecimento da monarquia parlamentar sob o rei Juan Carlos
Bourbon, em 1978 (ver mapa 19, p. 374).
O catalão é hoje falado na chamada Catalunha Histórica (Catalunya ou E!
Principal), que compreende Barcelona, Gerona, Tarragona e Lérida; em pequena
parte limítrofe de Aragão, em amplos territórios das regiões de Valência e Alicante,
ao sul e nas ilhas Baleares; fora do território da Espanha, é língua oficial da peque­
nina República de Andorra, nos Pireneus, nas fronteiras da Catalunha e de Aragão;
em território francês, é falado no Roussillon, a antiga Septimania dos godos (cat.

230 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Rosselló-, mais comumente, porém, o território é denominado Catalunya Francesa).
É ainda falado em Alghero e proximidades, ao noroeste da Sardenha, desde 1353,
embora atualmente todos os seus habitantes sejam pelo menos bilíngües, falando
também o italiano e compreendendo os falares sardos.
Quanto aos dialetos catalães, é notável sua uniformidade, característica aliás
também das outras línguas ibéricas. São geralmente divididos em ocidentais e orien­
tais; os orientais abrangem os falares do Rossillon, das regiões de Barcelona, Garona
e da parte norte-oriental da província de Tarragona e das Baleares; os ocidentais são
falados nos vales de Andorra, na parte oriental de Aragão, em Lérida, na parte oci­
dental da província de Tarragona e no território do antigo reino de Valência. O ponto
de referência dessa diferenciação dialetal é o rio Llobregat; certos aspectos são atri­
buídos às diferentes épocas da reconquista.
A principal diferença entre os dois grupos dialetais está no tratamento dado
ao /a/ e ao /e/ átonos: os dialetos ocidentais os conservam distintamente, enquanto os
orientais emitem ambos como /e/ surdo, como em lat. mandare, sentire > cat. oc.
maná, senti, cat. or. menài, senti. O catalão de Alghero identificava-se inicialmente
com o oriental; mas o contato permanente com o sardo levaram o /a/ e o /e/ átonos a
serem pronunciados como um /a/ claramente aberto: mandare > maná; venire >
vani. Note-se a constante síncope do /d/ precedido de /n/.
Os problemas relativos ao caráter linguístico, específico do catalão, não che­
garam a constituir uma “questão catalã” semelhante à “questione ladina”, mas foram
muito debatidos pelos romanistas. Trata-se de uma língua ou de um simples dialeto?
Pertence ao galo-romance ou ao ibero-romance? A hesitação começou com Friedrich
Diez; na primeira edição de sua Grammatik der Romanischen Sprachen, de 1836,
considera o catalão como um dialeto provençal; na segunda, em 1856, já o conside­
ra uma língua ligada ao provençal, não mais um simples dialeto; na terceira edição,
declara (vol. I, p. 112) considerar o catalão uma língua independente, apenas aparen­
tada com o provençal. Atualmente, não se nega mais o status de língua ao catalão.
Em relação à filiação a um dos dois blocos, ibero-romance ou galo-romance, diver­
gem ainda os romanistas. Assim, Meyer-Lübke, E. Bourciez, Gerhard Rohlfs, Pierre
Bec, A. Griera, entre outros, incluem o catalão entre as línguas do galo-romance.
Outros, como B. E. Vidos, Harri Meier, Menéndez Pidal, Amado Alonso, para citar
apenas alguns, consideram-no idioma do ibero-romance. Essas divergências devem-
se a considerações sobretudo lingüísticas; sob esse ponto de vista, realmente o cata­
lão está mais próximo do provençal do que do castelhano. Algumas considerações
mostram esse fato com clareza:

a. O castelhano ditonga espontaneamente o /e/ e o /o/ breves latinos, livres ou tra­


vados, o que não ocorre nem com o catalão nem com o provençal:

A R O M Â N IA I 231
pede > cast. pie cat. peu prov. pe
septem > siete set set
mola > muela mola mola
porta > puerta porta porta

b. O castelhano não ditonga o /e/ e o /o/ breves e tônicos diante de palatal, enquan­
to o catalão e o provença! os ditongam:

lat. pectum > cast. pecho cat. pit prov. pieit


folia > hoja full fuelha

As formas catalãs provêm da redução do tritongo resultante da ditongação


espontânea do /e/ > /ié/ ou do /o/ > /uo/ e mais o /i/ proveniente da vocalização
do /d: pectu > pieit > pit, ou folia > fueilla > falia > full.

c. Em castelhano conservam-se o /e/ e o /o/ átonos finais, com exceção do /e/ pre­
cedido de /d/, mas são apocopados no catalão e no provençal:

lat. caballu > cast. caballo cat. cavall prov. cal


portu > puerto port port
parte > parte part part
morte > muerte mort mort

d. A passagem lf-1 > /h-/ (> φ) só se dá no castelhano; o catalão e o provençal man­


têm o lf-l:

lat. femina > cast. hembra cat. fembra prov. femna


furmica > hormiga formiga formiga

e. Os grupos /cl/ e /li/ passam a /dz/ e em seguida ao /j/ característico do castelha­


no, enquanto no catalão e no provençal se palatalizam como no português:

lat. veclu > cast. viejo cat. ve// prov. vielh (“velho”)
palia > paja palia palha (“palha”)

No léxico, o castelhano não tem determinados elementos do galo-romance,


' comuns ao catalão e ao provençal, o que se explica pela história da reconquista aos
árabes; reconquistada por Carlos Magno, a região de Barcelona ficou sob a adminis­
tração de um sobrinho do imperador. Como o catalão estivesse, na época, em fase de

232 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


formação, a influência provençal era inevitável; além disso, o condado de Barcelona
esteve mais ligado territorial, cultural e politicamente ao sul da França, bastando lem­
brar o casamento de Berengário III, conde de Barcelona, com Dolcetta, herdeira do
condado da Provença. Por outro lado, há no castelhano elementos dos visigodos não
encontrados nas outras duas línguas.
Contudo, mesmo no campo fonético, encontram-se fatos comuns ao catalão e
ao castelhano, mas inexistentes no provençal. Alguns exemplos;

a. No catalão e castelhano, o /u/ permanece, enquanto no provençal passa a /ii/ como


no francês:

lat. muru > cast. muro cat. mur prov. mür


luna luna lluna lüna

b. Tanto o catalão como o castelhano palatalizam /-nn-/, mas não o provençal, que
o reduz a /-n-/:

lat. pinna > cast. pena cat. penya prov. pena


annu > ano any [anh] an

c. O ditongo latino /au/ se reduz a /o/ nas duas línguas ibéricas, mas se mantém no
provençal (como no romeno e geralmente no sardo):

lat. causa > cast. cosa cat. cosa prov. causa


tauru > toro toro taur
auru > oro or aur

Na morfologia, o catalão e o castelhano não têm certos traços característicos


do galo-romance, como a antiga declinação de dois casos (nominativo e acusativo),
da qual o francês ainda hoje conserva vestígios como no relativo qui/que.
Essas e outras considerações levaram vários romanistas, sobretudo Meyer-
Liibke em Das Katalanische (“O Catalão”), publicado em 1925, a enquadrar o cata­
lão no galo-romance. Entretanto, essa conclusão decorreu de um erro de método,
pois o idioma diferente da Península Ibérica é o castelhano e não o catalão, como o
demonstrou Menéndez Pidal; daí que a comparação deve ser feita com o conjunto das
línguas e dos dialetos ibéricos, o chamadopan-ibero-romance, bastante uniforme até
o século X, segundo reconstituição de Menéndez Pidal. Posteriormente, o castelha­
no, bastante diferenciado, se sobrepôs a essa uniformidade; por ser a língua mais
divergente, é a menos indicada como parâmetro. Assim, os fatos lingüísticos, consi-

a rom ânia [ 233


derados diferenciadores, não são exclusivos; por exemplo, o /e/ e o /o/ tônicos breves
ante palatal ditongam-se não só no catalão, no provençal e no francês, como também
nos dialetos peninsulares, das Astúrias à Andaluzia, inclusive no moçárabe: lat. podiu
> arag. pueyo > puio\ lat. octo > leon. vuecho; lat. nocte > leon. nueche; lat. oculu >
moçár. welyo e leon. weyo. Da mesma forma, /e/ e /o/ átonos finais são apocopados
não só no francês, provençal e catalão, mas também em outros dialetos, como em ara-
gonês, por exemplo, cat. corte, arag. cort; monte - mont; suave - suau.
O fato lingüístico mais diferenciador, porém, é a aspiração do /f/ > /h/ (> φ),
inicialmente exclusiva no território castelhano-basco-gascão, posteriormente levada
para o sul; mas o /f/ inicial permaneceu em todas as línguas e dialetos peninsulares,
do catalão ao português e até no castelhano antigo. O mesmo aconteceu com os gru­
pos /cl/ e /li/, que passaram a /dz/ e depois a /j/ na região cantábrica, enquanto se pala-
talizaram na maioria das línguas românicas, inclusive no português, no provençal, no
catalão, no galego e no dialeto leonês.
Portanto, pelo menos até o século X, havia certa unidade lingüística pan-
ibero-românica em toda a Península; a reconquista aos árabes fez com que o caste­
lhano funcionasse “como uma cunha”, dividindo a Ibéria em duas partes. Explica-se
assim a posição do catalão: língua basicamente ibérica, mas levada a aproximar-se
mais do galo-romance pelas circunstâncias históricas, desde os visigodos, depois a
invasão árabe e a conseqüente reconquista, apoiada pela França e daí a natural
influência lingüística e cultural sobretudo da Provença. Esses fatores, porém, não
chegaram a transformar o catalão em uma língua do galo-romance; tem correspon­
dências com as línguas e dialetos de ambos os lados dos Pireneus, sendo por isso
“una habla hispânica pirenaica”, segundo definição de Amado Alonso.

O Castelh an o

A história do castelhano está intimamente relacionada com a invasão árabe na


Península Ibérica; sem o conjunto dos fatos decorrentes dessa invasão, sem dúvida o
quadro das línguas ibéricas seria muito diferente. Com a ocupação árabe a partir de
711, os cristãos, reduzidos a pequenos grupos, refugiaram-se na região noroeste das
montanhas das Astúrias sob o comando de Pelágio. Aos poucos, organizam-se peque­
nos Estados independentes; pelo ano 800, Castilla é apenas um condado do reino das
Astúrias ou de León. Em 1029, Sancho II (1000-1035), rei de Navarra, herdou o con­
dado de Castilla e depois dividiu seu reino em três: Aragão, Navarra e Castilla
(Castela) (ver mapa 8, p. 363).
Aproveitando-se do enfraquecimento dos árabes, causado pela guerra civil
(1008-1028) que pôs fim ao califado dos Omeiadas, os pequenos reinos cristãos

234 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


começaram a reconquista. Em 1037, o reino de Castela uniu-se ao de León e conquis­
tam Toledo, em 1085, tendo Rodrigo Dias de Vivar, el Cid (“senhor” em árabe), como
o grande herói e tema da primeira grande epopéia em castelhano. Sob Alfonso VII
(1126-1157), Castela torna-se suserana de todos os Estados cristãos. Depois da der­
rota de Alarcos (1185), obtém-se nova aliança. Em 1212, os castelhanos vencem os
árabes em Las Navas de Tolosa e incorporam o reino dos Almohadas. Nova fase
começou com o casamento dos chamados reis católicos, Isabel de Castela (1474-
1504) e Fernando II de Aragão, em 1469; uma década depois, os dois reinos se fun­
diram em um só. Em 1492, com a conquista de Granada, o último reino árabe no
extremo sul, completa-se a reconquista e inicia-se a expansão ultramarina, com a
anexação de Melilla (1497) e de Orã (1509), no norte da África.
No avanço rumo ao sul, os castelhanos encontraram as populações românicas
mais ou menos arabizadas, denominadas moçárabes (ár. musfarib, “tornando
árabe”), mas que haviam conservado sua fala românica e a fé cristã. Os moçárabes
eram bilíngües; usavam o árabe como língua de cultura e o romance no uso comum;
e é sabido que o bilingüismo é um meio eficaz de transferência de empréstimos, con­
forme o demonstra o grande número de arabismos nas línguas românicas da Ibéria.
Mais profunda foi a influência árabe no extremo sul, principalmente na Andaluzia,
cujo dialeto moderno não é considerado uma continuação do romance local, mas uma
superposição de elementos castelhanos do norte e do centro, superposição posterior
a uma população românica bastante reduzida em número, desde fins do século XV.
Sob o domínio árabe de quase oitocentos anos, é óbvio que as variantes româ­
nicas do moçárabe deveríam ter características conservadoras e arcaizantes; esse fato
destacou ainda mais os aspectos diferenciados do castelhano, que se lhes impôs como
língua oficial. De modo geral, o moçárabe concorda lingüisticamente com as outras
línguas e dialetos ibéricos: os grupos /cl/ e /li/ se palatalizam, como em lat. cunicu-
lu > moçár. conelyo, arag. ant. conello, port. coelho, cat. conill, fr. ant. conil, prov.
conilh, mas cast. conejo. O moçárabe conserva o /t/ do grupo /ct/, como as outras lín­
guas e dialetos da Ibéria: lat. lacte > moçár. laite, lahte, leite; port. leite, cat. llet, mas
cast. leche. O mesmo acontece com o /j-/, proveniente de /i/ lat. seguido de vogal: lat.
ianuariu >januariu > moçár. jenáir, leon. jenero, arag. ant .jenero, port .janeiro, cat.
gener, ir.janvier, it. gennaio, mas cast. enero; aliás, essa é uma das características do
castelhano, segundo se vê nos exemplos: lat. iactare > cast. echar (“atirar”); germa­
nii > ermano > hermano (“irmão”); ieiunu >jajuno > ayuno (“jejum”); gelare > elar
> helar (“gelar”); geniperu > juniperu > enebro (a árvore “junipero”); gengiva >
jengiva > encia (“gengiva”).
Até meados do século XI, o castelhano era o dialeto da região “de los castil-
los”, donde o nome “Castella” (“fortificações”), que compreendia a parte oriental da
Galícia, a Cantábria e o curso superior do rio Ebro; começou a ser designada por esse

A ROMÂNIA [ 235
nome no século IX. As influências do substrato ibérico, continuadas pelas do adstra-
to basco (ver pp. 154-155), deram ao castelhano essa feição lingüística diferenciada
em relação ao pan-ibero-romance. A supremacia política, cultural, literária e lingüís­
tica do castelhano despontou de sua força interna, mas se deveu também ao enfraque­
cimento do reino de Navarra e à decadência do de León, firmando-se a partir da
segunda metade do século XI, quando assumiu o comando da reconquista. Enquanto
os dialetos de León, Navarra e Aragão se mostravam indecisos quanto à fixação de
determinadas mutações, por exemplo, os ditongos espontâneos /ué/ e /ié/, indecisão
revelada pelo emprego de alomorfes, como poblo, puoblo, e puablo, ou certo, cierto
e ciarto, o castelhano já usava as formas ditongadas pueblo, cierto, puerta, cielo etc.
Da mesma forma, propagaram-se as mutações típicas do castelhano /f/ > /h/, /cl/ e /li/
> /j/, /ct/ > /ch/ [tch], /j/ inicial > /φ/, durante os séculos XII a XV.
O prestígio cultural e literário do castelhano aumentou sobretudo com o rei
Afonso X, o Sábio (1252-1284), cuja corte foi um centro de irradiação do castelha­
no como língua literária; o próprio Afonso X é autor das conhecidas Cantigas de
Santa Maria e do primeiro tratado de xadrez (1283), além de outras obras. Em sua
corte, a principal atividade cultural era a tradução; obras árabes sobre os mais diver­
sos assuntos foram traduzidas quase exclusivamente por judeus, cuja aversão pelo
latim, por ter sido a língua de seus perseguidores, os levou a traduzir para o castelha­
no, fato que o favoreceu em vários sentidos. Desse modo, razões políticas, literárias
e culturais levaram o castelhano a se tornar a língua oficial da Espanha, suplantando
lentamente as outras variedades, semelhantemente ao que ocorreu com o frâncico.
Desde o final do século XV, o castelhano foi a língua literária de toda a Espanha.
Como já se viu, o castelhano é a língua mais diferenciada da Península
Ibérica. O menor grau de latinização da região de Castilla, la Vieja, habitada por
várias raças ibéricas (cântabros, várdulos e autrigões) e efetivamente incorporada ao
Império Romano apenas no ano 19 a.C., explica a maior independência lingüística do
castelhano em relação ao latim e seu desenvolvimento posterior, em contraste com as
outras línguas e dialetos peninsulares, que se desenvolveram em regiões mais profun­
damente latinizadas (ver mapa 19, p. 374).
Os dialetos espanhóis são relativamente uniformes. De norte a sul, os princi­
pais são:

a. o leonês, cujo território atual abrange a província de León, parte das Astúrias, a
região ocidental de Villafranca dei Bierzo e de Ponferrada; para o sul, estreita-se
até se restringir as pequenas regiões em Zamora, Salamanca e Extremadura. Está
ligado lingüisticamente ao mirandês, da região norte de Portugal, sendo por isso
denominado de co-dialeto por José Leite de Vasconcelos. Aliás, o leonês tem
características que o aproximam do português: /au/ > /ou/ como em lat. causa >

236 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


leon. coiisa, port. causa ou coisa·, tauru > leon. e port. touro·, /1/ + cons. vocaliza-
se em /u/: lat. altem > leon. e port. outro. Ao contrário do castelhano, mas de
acordo com o português, conserva o /f/ inicial: lat. filu >filo (“fio”); sincopa tam­
bém o /n/ intervocálico: lat. rana > leon. raa (“rã”); depois de consoante surda,
dá-se o rotacismo /1/ > /r/ como lat. platea > leon. praza, port. praça.
b. o aragonês, falado nas antigas regiões de Aragão e Navarra, sofreu forte influên­
cia castelhana; sua variedade mais conservadora se encontra na província de
Huesca, na cordilheira dos Pireneus.
c. Os dialetos do sul, dentre os quais se destaca o andaluz, foram muito influencia­
dos pelo castelhano depois da reconquista. O estrato antigo do andaluz apresenta
características arcaicas e conservadoras, modificadas pela contribuição árabe
durante o período do moçárabe e, depois, pelo castelhano.
d. Menciona-se ainda o chamado judeu-espanhol, a variante falada pelos sefarditas.
Expulsos da Espanha, juntamente com os mouros, em 1492, os sefarditas encon­
traram asilo no Império Turco, espalhando-se depois pelos Bálcãs; alguns milha­
res vivem na Bósnia, Macedônia, Grécia, Bulgária, Romênia e Turquia, e muitos
deles foram mortos pelos nazistas. Seu dialeto é muito semelhante ao castelhano
do período clássico: mantém o lí-l inicial, distingue o /s/ sonoro do /s/ surdo, bem
como o /z/ sonoro do /z/ surdo. A manutenção dessa língua durante tanto tempo
deve-se ao seu uso em livros religiosos. Também é conhecido como “ladino”
(< latinum); a designação é antiga, pois, no verso 2769 do Cantar dei mio Cid,
fala-se de “moro latinado”, isto é, um mouro que falava espanhol, em oposição
ao árabe falante de outra língua estrangeira. Daí, enladinar significa “traduzir
para o espanhol”. Durante a Idade Média, “ladino” era o mouro que falava caste­
lhano e o termo, levado para as Américas, designava o índio que falava a língua
dos conquistadores na Argentina, no Peru, no Equador, na Colômbia e na América
Central; em Cuba era o negro de fala castelhana, passando depois a designar os
mestiços. Atualmente, o termo é desusado.

Os primeiros documentos em castelhano, sem contar as atestações indiretas


nos escritos em baixo latim peninsular, aparecem na segunda metade do século X: as
Glossas Emilianenses (ver p. 131), com registros de uma ou duas palavras e apenas
alguns períodos inteiros, ocorrendo o mesmo com as Glossas Silenses, do mosteiro
de Santo Domingo de Silos. Datam também do século X os poemas líricos em árabe
e em hebraico, que eram concluídos com uma estrofe em romance, denominada
“carja” (< harajat, kharje ou kharjas)·, descobertos há alguns decênios, esses poemas
nem sempre são de fácil interpretação.
O primeiro poema em castelhano, que chegou até nós, é o Cantar dei mio Cid,
escrito na primeira metade do século XII por autor desconhecido, cujo valor literário

a r o m â n ia | 237
é equivalente à Chanson de Roland. Composto por volta de 1140, sugere a existência
de uma epopéia anterior; foi conservado num único manuscrito de 1307, uma cópia
feita por Pedro Abad, só publicada em 1779 por Tomás Antonio Sánchez em
Collección de poesias antiguas castellanas. Foi composto na província de Sória, no
extremo sul-leste de Castilla, la Vieja, ao que parece por trovador de Medinaceli; a lín­
gua é o castelhano arcaico, com influências aragonesas. Soma 3730 versos, divididos
em dois hemistíquios, com métrica irregular; celebra a personagem histórica de El Cid
Campeador, cujo nome era Rodrigo Díaz de Vivar (1026 ou 1040-1099). Divide-se em
três cantares: Cantar dei Destierro, Cantar de las Bodas e Cantar de Corpes. Dada a
importância do texto para a Filologia Românica e em especial para o castelhano, con­
vém transcrever alguns versos, citados por Tagliavini (Le Origini, p. 506):

Todos son adobados quando mio Çid esto ovo fablado;


las armas avién presas e sedién sobre los cavalos.
Vi[di]eron la cuesta yuso la fuerça de los francos;
al fondón de la cuesta, çerca es deMIano,
mandólos ferir mio Çid, el que en buen ora nasco;
esto fazen los sos de voluntad e de grado;
los pendones e las lanças tan bien las van enpleando,
a los unos firiendo e a los otros derrocando.
Vençido a esta batalha el que en buen[a] nasco;
al co[m]de don Remont a preson le a tomado;
lii gaiió a Colada que más vale de mil marcos, (v. 1000 ss.)

Todos já estavam vestidos quando meu Cid isso falou; haviam pegado as armas e estavam sentados
sobre os cavalos. Viram pela encosta abaixo o exército (força) dos francos (= catalães); perto do fim
da encosta, próximo ao terreno plano, mandou-os atacar meu Cid, o qual em boa hora nasceu; isso
os seus fazem com vontade e com agrado; os pcndões e as lanças tão bem vão usando, ferindo uns
e derrubando outros. Venceu essa batalha aquele que em boa hora nasceu; fez prisioneiro o conde
dom Remont; dele ganhou a Colada (uma espada), que vale mais de mil marcos.

Algumas características do castelhano já estão claras nesse texto: a ditonga-


ção do /e/ e do /o/ breves latinos, em lat. bene > bien; *fortia >fuerça (mod.fuerza);
bonu > bueno. Por outro lado, mantém-se ainda o /f/ inicial, como em fablado (mod.
habladó), fondón (mod. hondón, hondo, “fundo”), ferir (mod. herir), fazen (mod.
hacen); nota-se também indecisão em relação aos fonemas /b/ e /v/ em ovo (mod.
hubo < lat. habuit), cavallos (mod. caballo) etc. As formas dos pronomes possessi­
vos não se haviam ainda fixado; as tônicas e as átonas são usadas sempre sem qual-'
quer distinção (mio Cid e los sos, mod. los suyos).
Dentre as primeiras atestações documentais do castelhano, destaca-se Los
Siete Infantes de Lara, sem dúvida da segunda metade do século XII; dos primeiros

238 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


decênios do século XIII, são o Libro de los Reyes de Oriente, o Libro de Apolonio e
o Poema de Alexandre, todos de autores desconhecidos. O primeiro poeta, cujo nome
se conhece, é Gonzalo de Berceo (fins do século XII e primeira metade do seguinte),
do qual se conhecem três vidas de santos, três poemas dedicados à Virgem e outros
três poemas de temas religiosos.
Em relação à língua, Alfonso X, o Sábio, ao fixar a capital em Toledo, deter­
minou que o significado duvidoso de palavras fosse definido pelo atribuído à pala­
vra em Toledo, oficializando indiretamente o castelhano. Nos séculos XV, XVI e
XVII, o castelhano se firmou como língua nacional e sua literatura desenvolveu-se
muito, atingindo o apogeu no século XVII, o “siglo de oro”, a época de Miguel
Cervantes (1547-1616), Lope de Vega (1562-1635), Calderón de la Barca (1600-
1681) e outros. Para cuidar das questões relativas à língua foi fundada a Real
Academia, em 1718.
Com a expansão das grandes descobertas do século XVI, o castelhano se
espraiou pelo imenso império colonial espanhol (ver pp. 181-183). Firmou-se sobretu­
do nas Américas, onde continua a ser a língua oficial e falada, ainda que conviva com
as línguas nativas em algumas regiões, como no Paraguai, por exemplo, onde todo o
povo fala também o guarani. Com esse convívio, o castelhano nas Américas enrique­
ceu-se lexicalmente com a contribuição araucana no Chile, a guarani no Paraguai, a
quéchua (quíchua) na Bolívia, Equador e Peru, a nauatl no México. Em geral, conser­
va as características da língua da Espanha, se bem que nas Américas certas tendências
dialetais tendem a se firmar, embora não de modo uniforme. Por exemplo, na Colômbia
o “yeísmo”, isto é, a redução da palatal lateral a um iode (/11/ > /y/), é bem menos difun­
dido que na Argentina, onde é emitido como 1)1 português: caballo > cabayo > cabajo\
calle > caye > caje. Cabe lembrar ainda que nas Filipinas e em Curaçao o castelhano
criolizou-se sob influências locais diversas (ver mapa 25, p. 380).

O Po r t u g u ê s

A afirmação de que a história política, cultural e lingüística da Península


Ibérica seria muito diferente sem a invasão árabe é particularmente válida para
Portugal e a língua portuguesa. Como se sabe, Portugal veio a ser um país indepen­
dente dentro das alterações políticas motivadas pelas guerras da reconquista.
Henrique de Borgonha (França) veio ajudar os reis de Castela, com tropas, na guer­
ra contra os árabes; Alfonso VI de Castela, como recompensa, deu-lhe sua filha natu­
ral Tareja como esposa e o Condado Portucalense, entre os rios Minho e Douro, tendo
como capital a cidade do Porto; de Portu Cale, nome do condado, proveio o nome
Portugal. O próprio Henrique de Borgonha, instigado também por Dna. Tareja, que

A ROMÂNIA | 239
se considerava relegada a segundo plano pelo pai, autoproclamou-se “conde pela
graça de Deus”, iniciando o movimento pela independência política. Seu filho,
Alfonso Henriques, vencendo a batalha de Ourique (1139), foi proclamado rei por
suas tropas; fixou a capital em Coimbra, até a conquista de Lisboa em 1147. Seus
sucessores continuam a guerra contra os árabes em direção ao sul, até que o rei
Alfonso III completou a conquista, vencendo os árabes nos Algarves em 1250.
Os limites do Portugal medieval e moderno não coincidem com os da antiga
província romana, a Lusitânia. Em 197 a.C., os atuais territórios de Portugal com toda
a Ibéria constituíam uma só província romana. Sob o imperador Augusto (63 a.C.-14
d.C.), a Ibéria foi dividida em três províncias: a Tarraconensis (norte do rio Douro e
parte oriental norte da Península), Lusitânia (sul do Douro, incluindo Salamanca ao
leste, com limites indo em direção ao sul, ladeando Toledo, seguindo depois o curso
do rio Anas [atual Quadiana], com Emerita Augusta por capital); e a Bética (região da
Península ao sul, capital Córduba). Essa divisão foi feita em 27 a.C.; nova subdivisão
foi processada pelo imperador Constantino (285-337 d.C.), que das três fez outras
sete, ficando a Lusitânia limitada ao norte pelo rio Douro, ao oeste e sul pelo Atlântico
e a leste suas fronteiras eram ligeiramente mais alargadas que as atuais.
Lingüisticamente, no Condado Portucalense usava-se o mesmo dialeto que na
Galiza, sendo por isso conhecido como galego-português ou português-galego. Ao
sul do Douro, formou-se o “romance moçárabe”, que sobreviveu até meados do sécu­
lo XIII, pelo menos no extremo sul. Com a conquista dessa região pelos portugueses
do norte, o moçárabe foi absorvido, deixando escassos vestígios e é praticamente
desconhecido. Alguns topônimos mostram que esse dialeto tinha tendências diferen­
tes do português, como a manutenção do /1/ e do /n/ intervocálicos, sincopados no
português já no século XI, mas conservados no sul: Myrtilis > *Mirtula > Mèrtola\
basilica > baselga; ár. wadi (“rio”) + Ana > Odiancr, o próprio nome da capital man­
tinha o /n/ intervocálico, só o perdendo posteriormente: ár. Al-Ashbuna > cast. ant.
Lisbona, port. mod. Lisboa.
Por outro lado, a expansão rumo ao sul fez com que o português se afastasse
do galego, enquanto absorvia o romance moçárabe. Mesmo assim, entre o português
e o galego existem mais semelhanças que diferenças. Assim, o galego mantém, da
mesma forma que o português, o sistema vocálico de sete fonemas, sendo fonológi-
ca a distinção entre / e / e / e /, por exemplo, ves (“tu vês” [de ver]) e vès (“tu vens”
[de vir]); presa (“presa”) e presa (“pressa”); preto (“perto”) e preto (“preto”,
“negro”), e entre / o / e / o/: corvo (“curvo”) e corvo (“corvo”) ;podo (“eu podo” [de
podar] e podo (“eu posso”); tola (“boba”) e tola (“montão”). Em discordância com o
castelhano, conserva sempre o /f-/ inicial latino como o português: lat .filum > gal.
fio, port .fio, mas cast. hilo; lat. ferrum > gal .ferro, port. ferro, cast. hierro; lat. folia
> gal. folia-, port. folha, cast. hoja (ver mapa 19, p. 374).

240 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Como o português, o galego sincopa o /1/ e o /n/ intervocálicos nas mesmas
condições: lat. lana > gal. Ia, port. lã, cast. lana; lat. homine > gal. home, port.
homem, cast. hombre. No galego, a tendência foi a de eliminar os sons nasais, no
que se afastou do português: lat. cum > gal. co, port. com, cast. con; lat. bonu > gal.
bo, port. bom, cast. bueno. Nesse particular, existem variações dialetais; no galego
central e norte-ocidental, normalmente se suprime a consoante nasal final, sobretu­
do no plural, como cans > cas (“cães”), bens > bes, leirons > leirós (“ratazanas”),
alguns > algús. No conjunto das línguas ibéricas, o galego assemelha-se, nesse
aspecto, ao catalão que suprime os fonemas nasais em maior escala por apocopar
geralmente as vogais finais, com exceção do /a/: lat. amoenu > cat. amè (“ameno”),
commissione > comissiò, commune > comú, manu > mà, pane > pá; no galego,
ameno, comisión, man etc. Contrariamente ao castelhano, o galego não apocopa o
/e/ final, precedido da dental /-d-/: seguridade, enfermidade, saudade (mesmo sig­
nificado que tem em português).
O galego desconhece a ditongação espontânea, como o português, e tão fre-
qíiente no castelhano; a conservação do sistema de sete fonemas vocálicos é uma
conseqüência da não ditongação do /e/ e do lol breves latinos em ditongos crescen­
tes: lat. septem > gal. e port. sete, mas cast. siete; lat .perna > gal. e port .perna, cast.
pierna; lat. pelle > gal. pel, port. pele, mas cast. piei; lat. porcu > gal. e port. porco,
mas cast. puerco; lat. ovu > gal. e port. ovo, mas cast. nevo; lat. somnium > gal. sono,
port. sonho, mas cast. sueno.
O galego difere do castelhano também na evolução do tratamento dado ao
grupo /-ct-/, mas identifica-se com as formas correspondentes do português, por exem­
plo: lat. lacte > gal. e port. leite, mas cast. leche; lat. nocte > gal. e port. noite, mas
noche no cast. O galego e o português dão o mesmo tratamento fonético aos grupos /cl-/,
/fl-/ e /pl-/, tornando-os palatais chiantes, enquanto o castelhano os torna palatais late­
rais: lat. clave > gal. e port. chave, mas cast. Ilave; lat. clamare > gal. e port. chamar,
mas cast. llamar, \at. flamma > gal. e port. chama, cast. llama; lat .pluvia > gal. chui-
va, port. chuva, cast. lluvia; lat. plenu > gal. cheo, port. cheio, cast. lleno.
O português sonorizou /t/ > /d/ e depois sincopou a sonora das formas verbais
da segunda pessoa do plural, enquanto o galego apenas sonorizou a surda sem sinco­
pá-la; essas formas galegas são iguais às do português arcaico: lat. timetis > gal.
temedes, port. temeis (< timetis > timedes > temees > temeis); lat .fugitis > gal. fuxi-
des, port. fugis.
Na morfologia, as duas línguas continuam muito próximas; os artigos defini­
dos de ambas se singularizam dentro da România pela não conservação do /1/ de illu,
illa; gal. o cabalo, a auga (“a água”); os galos, as raínas (“rainhas”), tendo, portan­
to, o galego as mesmas formas que o português: o - a; o s - as. Também as combina­
ções e as contrações de preposições com os artigos definidos são bem semelhantes:

A ROMÂNIA | 241
a (prep.) + o > ao (port. e gal.); a + a > à (port. e gal.) e com o artigo no plural a +
as > às e, a + os > aos; de + o(s) > do(s), de + a(s) > da(s) (port. e gal.); em/en +
o(s) > no(s), em/en + a(s) > na(s). Com as preposições com e por, o galego conser­
va contrações que se arcaizaram em português: con + o > co, con + os > cos, con +
a > coa, con + as > coas; por + o > polo, por + a > pola etc. No português moder­
no, as formas polo, pola, polos, polas foram substituídas por pelo, pela, pelos, pelas,
o que resultou da confluência semântica das preposições per e por. As mesmas con­
trações se dão também com os artigos indefinidos: port. de + um > dum; em + um
> num etc; gal. de + un > dun; en + un > nun etc. Essas preposições se contraem
também com os pronomes pessoais da terceira pessoa e os demonstrativos em ambas
as línguas: gal. dei - delia; port. dele - dela; gal. daquel, daqueloutro, daquilo, dese,
deste etc., e port. daquele, daqueloutro, daquilo, desse, deste etc.
O artigo indefinido galego apresenta uma palatalização (ao menos inicialmen­
te) na forma feminina, desconhecida em português: gal. un - uns, unha - unhas; mas
port. um - uns, uma - umas. As formas dos pronomes possessivos são coincidentes:

meu - minha gal. meu - mina


teu - tua teu - tua
seu - sua seu - sua
nosso - nossa noso - nosa
vosso - vossa voso - vosa
seu - sua seu — sua

Como o português e o castelhano, o galego não tem o possessivo correspondente à


terceira pessoa plural, para mais de um possuidor, como as outras línguas da
România (cat. llur, prov. lor, fr. leur, it. loro, rom. lor < lat. illorum)
Na sintaxe, destaca-se a existência viva do infinitivo pessoal, forma de que
somente o galego e o português dispõem na România. Exemplos em galego: “Para arris­
carmos ese dineiro queremos seguridades.” “De seguirdes tan tolos, acabaredes mal.”
Os aspectos comparados mostram a grande proximidade lingüística do por­
tuguês e do galego; sendo parte integrante do território da Espanha, torna-se inevi­
tável a influência do castelhano, a língua oficial, sobre o galego; apesar de tudo,
porém, o galego não se descaracterizou, mantendo sua feição própria, bem mais pró­
xima do português.
Em sua expansão rumo ao sul, o português do Condado Portucalense entrou
em contato com a variante da região de Lisboa, conquistada aos árabes em 1147 com
o auxílio de cruzados alemães, franceses, ingleses e flamengos. Em 1250, tornou-se
capital do país, sob Afonso III, passando por um processo de repovoamento e reorga­
nização. Da mesma forma que Paris em relação ao francês, Lisboa se tornou o cen-

242 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


tro de convergência e de nivelamento das diferenças linguísticas das várias regiões,
sobretudo as galegas ao norte e as moçárabes ao sul. A influência da capital aumen­
tou com o considerável desenvolvimento econômico, em razão da posição geográfi­
ca, do comércio marítimo e da fundação da Universidade em 1290. A necessidade de
uma língua administrativa e logo literária fixou o português como uma forma de lín­
gua geral, na qual se conciliaram as tendências inovadoras do norte com as conser­
vadoras do sul. Desse modo, a língua literária portuguesa não se formou com base
em um único dialeto, como sucedeu com o francês, o italiano e o castelhano, mas
através de contribuições de todos os dialetos. A partir do século XV, o português lite­
rário mostra características desconhecidas pelos falares da província do Minho; esse
fato comprova que os dialetos falados entre os rios Douro e Mondego, que passa por
Coimbra, tiveram papel importante na história da língua. Sendo um país pequeno em
extensão territorial, com dialetos bastante homogêneos, sobretudo depois da absor­
ção do moçárabe, parece justo supor que, em Portugal, tenha surgido o “volgare illus­
tre” imaginado por Dante Alighieri na formação da língua literária, conforme ocor­
reu com o provençal no século XII.
Assim, o período arcaico do português costuma ser dividido em três fases: a)
a proto-histórica, do século XI ao XII; b) a trovadoresca, de influência lírica proven­
çal, em que se usa ainda o galego-português, até 1350; c) a de língua geral, usada
sobretudo na prosa literária, até o século XVI. No século XV, a prosa literária tomou
grande impulso, enquanto a poesia decaiu; exemplos dessa prosa são Leal
Conselheiro, do rei D. Duarte (1391-1438); o Trautado da Virtuosa Benfeyturia, do
Infante D. Pedro (1392-1449), cuja fonte inspiradora foi o De Beneficiis de Sêneca;
Boosco Delleitoso, de autor desconhecido e só publicado em 1515; e especialmente as
crônicas de Fernão Lopes, que abrangem os reinados de D. Pedro I, D. Fernando e D.
João I. No século XV, Gil Vicente (1470-1540) escreveu 45 peças teatrais, autos e far­
sas, em português, em castelhano e, em ambas as línguas, 18 delas. Parece haver ainda
alguma imprecisão na delimitação, clara e precisa, entre as duas línguas, o que vai se
verificar de modo definitivo com Os Lusíadas de Luiz Vaz de Camões (1524-1580).
Para exemplificar, o texto de um testamento datado de 1193:

In Christi nomine, Amen. Eu eluira Sanchiz offeyro o meu corpo áás virtudes de San Saluador
do moensteyro de Vayram, e offeyro co’no meu corpo todo o herdamento que ey en Centegãus e as
tres quartas do padroadigo d’essa eygleyga e todo hu herdamento de Crexemil, assi um das sestas
como todo u outro herdamento: que u aia u moenteyro de Vayram por en saecula saeculorum.

Vê-se que as características gerais da língua portuguesa já estavam delinea­


das: sonorização das consoantes surdas intervocálicas (virtudes, todo), formas pró­
prias dos artigos definidos sem o /1/, ainda que sem forma graficamente fixa (o ou
u), quadro dos pronomes devidamente delineado {eu, meu, essa)·, note-se a ausência

A ROMÀNIA ; 243
de qualquer ditongação espontânea {corpo, cast. cuerpo; herdamento, cujo corres­
pondente castelhano é heredamiento). O verbo haver, de lat. habere, ainda conserva
o sentido latino de “possuir” (ey e aia, mod. hei e haja).
Em relação aos dialetos, já se viu que a reconquista levou-os a uma relativa
homogeneidade. Mesmo assim, distinguem-se os dialetos: a) interamnense, entre os
rios Minho e Douro, do qual são variedades o alto-minhoto, o baixo-minhoto e o
baixo-duriense; b) transmontano, da região de Trás-os-Montes, tendo o raiano e o
alto-duriense como variedades; c) beirão, da região da Beira Alta e Baixa, incluindo
Coimbra e Aveiro; d) meridional, que abrange o estremenho (Estremadura), o alente-
jano, que inclui a variedade de Olivanza na Espanha, e o algarvino bem ao sul,
Os chamados dialetos insulares são falados nas ilhas dos Açores e da Madeira
e estão ligados ao algarvino; apresentam algumas características: nos Açores, o /u/
soa /ii/ como em francês, /ou/ > /o/ e /o/ > /u/, por exemplo, flor >flur; também /-ão/
> /-3/, como mão > mã. Na ilha da Madeira, também o /o/ soa como /u/ e o /i/ tem
um som deserito por Gonçalves Viana como intermediário entre o do /1/ e de /lh/,
semelhante ao eslavo i.
Com as grandes descobertas marítimas do século XVI e as subseqüentes colo­
nizações (ver pp. 181-182), o português foi levado a todos os continentes. Já em
1441, Nuno Tristão chegou ao Cabo Branco, e à Senegâmbia em 1445; Diogo Gomes
e Antônio de Nola chegaram ao arquipélago do Cabo Verde e às ilhas de Ano-Bom;
São Tomé e Príncipe foram descobertas em 1470. Os navegadores portugueses foram
abordando sucessivamente o Zaire, o Congo e Benim. Bartolomeu Dias passou pelo
Cabo das Tormentas em 1488, abrindo o caminho para a língua portuguesa em dire­
ção ao Oriente, enquanto o Brasil era incorporado ao domínio português em 1500.
Como resultado da ocupação de tantos territórios e de séculos de colonização, fala-
se hoje o português em Angola, Moçambique, Mombaça, Melinde e Quiloa; dialetos
crioulos encontram-se na Guiné, no arquipélago do Cabo Verde e nas ilhas de S.
Tomé, Ano-Bom e Príncipe. Na Ásia, o português crioulizou-se em Diu, Damão,
Bombaim (onde é chamado “norteiro”), Caul e Baçaim, em Mangalor, Cananor, Maé
e Cochim; não se crioulizaram as variedades de Goa, que foi a antiga capital do impé­
rio português no Oriente, e do litoral de Coromandel, na Península da índia. Mas são
crioulos os falares de Macau, enclave em território chinês, das ilhas Malaias, de Java,
Singapura e Málaca; na ilha de Timor fala-se um dialeto português na região norte-
oriental e um crioulo em parte do Ceilão (ver mapa 21, p. 376).
No Brasil, o português é basicamente o mesmo de Portugal, tanto na norma
culta e literária, como na popular; de modo geral, porém, o português falado brasi­
leiro é mais conservador que o de Portugal. Depois de quase cinco séculos, apontam-
se algumas diferenças entre o português falado em Portugal e no Brasil. Na fonética,
algumas divergências são:

244 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


a. No Brasil, toda vogal seguida de fonema nasal tem o timbre fechado: falamos,
demos, demônio, colônia, enquanto em Portugal essas vogais têm timbre aberto;
nem no falar culto se faz distinção entre contamos (/â/) e contamos (/á /) para dis­
tinguir o presente do pretérito perfeito do indicativo na primeira conjugação; essa
distinção é considerada hiperurbanismo.
b. No Brasil, vogais átonas pró- ou pós-tônicas são fechadas, resultando um vocalismo
de apenas cinco fonemas, salvo raros casos regionais como em Pernambuco (pèxe-
ra, jèrimum, Rècifé)\ pronunciam-se fechadas as vogais que, resultantes de antigas
crases, são emitidas abertas em Portugal: Bras. mordomo, Port. mordomo (< lat.
maiordomo > maordomo > moordomo); Bras. pregar, Port. pregar (< lat. praedica­
re >predigar > preegar); Bras. padeiro, Port. padeiro (< lat. panatariu >paadeiro).
c. Pró-tônico, o /e/ é sempre pronunciado entre nós, embora possa sê-lo como /e/
ou como /i/; também o /i/ na mesma posição soa claramente /i/. Em Portugal,
tanto o /e/ como o /i/ pró-tônicos são sincopados: Bras .fechar, redondo, pessoa,
menino (também minino), militar, ministro, vizinho, mas Port. fch a r, r dondo,
p 'ssoa, m 'nino, m 'Utar, m 'nistro, v 'zinho. Da mesma forma o / o / pró-tônico é
pronunciado normalmente no Brasil, mas passa a /u/ ou sofre síncope em
Portugal: Bras. orelha, ondulação, porteiro, coroa', Port. urelha, undulação, pur-
teiro, curoa ou c 'roa.
d. O ditongo /ei/ em sílaba tônica se mantém no português do Brasil; em posição
átona, sobretudo na proximidade de uma consoante líqüida ou fricativa, é reduzi­
do a /e/: leite, falei, sei', e primeiro /primero/, brasileiro /brasilero/, beijo /bejo/,
peixe /pexe/. Em Portugal, /ei/ emite-se /ai/: leite /laiete/, primeiro /primairo/, beijo
/baijo/, peixe /paixe/. O mesmo fenômeno acontece com o ditongo /êi/, grafado
/ém/, pronunciado em Portugal com /ãi/: também /tambêi/ e /tambãi/ respectiva­
mente, ninguém /ninguêi/ e /ningãi/. Esse fato representa um esforço, certamente
involuntário, de evitar a redução do ditongo a uma vogal simples, o que aconteceu
também com o alemão, língua que na escrita conservou a pronúncia antiga dos
ditongos /ei/ e /eu/, modernamente emitidos como /ai/ e /ói/ respectivamente,
como Eid /Aid/, “juramento”, Freiheit /Fraihait/, “liberdade; Eule /Óile/, “coruja”;
beugen /bóiguen/, “curvar”; Feuchtigkeit /Foihtigkait/, “umidade”.
e. Enquanto em Portugal costuma aparecer u /i/ paragógico depois de uma líqüida,
como em sali (sal), soli (sol), Manueli (Manuel), doutori (doutor), deberi (dever),
no Brasil esse fenômeno nunca se verifica. E também totalmente desconhecido
entre nós o acréscimo de um /i/ para se desfazer um hiato, como por exemplo A i
água, faltou a i aula, comum na fala popular lusitana. Por outro lado, no falar bra­
sileiro, freqüentemente aparece um /e/ ou um /i/ epentético para facilitar a emis­
são de um grupo consonantal, o que não se verifica em Portugal: adevogado ou
adivogado por “advogado”, abissoluto por “absoluto”; corrúpito por “corrupto”.

A ROMÂNIA I 245
f. Os pronomes pessoais ditos oblíquos são tônicos no Brasil e totalmente átonos
em Portugal. Assim, me, te, se, lhe aqui são pronunciados /mi/, /ti/, /si/, /lhi/, em
Portugal perdem totalmente a tonicidade, sendo emitidos /mV, /t’/, /s7, /lhV, for­
mando uma só unidade com o verbo com o qual estão relacionados. Obviamente,
essa diversidade de emissão tem reflexos sintáticos inevitáveis.
g. No Brasil, normalmente não se confundem os fonemas /b/ e /v/, cuja alternância
é corrente em Portugal, onde vou soa [bou], viste, [biste], burro [vurro], vento
[bento] etc. Apenas alguns vocábulos são usados indiferentemente com /b/ ou /v/
como vassoura ou bassoura, varrer ou barrer, assobiar ou assoviar.

Dessas tendências divergentes pode-se deduzir que em Portugal tende-se a


suprimir vogais átonas, ao passo que no Brasil são mantidas e, até certo ponto, refor­
çadas; por outro lado, a fala brasileira tende a suprimir consoantes, especialmente em
posição final. Essas tendências, se persistentes, levarão essas duas variedades a uma
diferenciação cada vez maior a longo prazo.
Na sintaxe, destacam-se algumas diferenças relativas à colocação e à regência
nominal e verbal:

a. Conseqüência de sua emissão tônica, os pronomes pessoais oblíquos são usados


no Brasil em posição proclítica, mesmo no início da oração: “Me garantiram que
entregariam as fitas à tarde.” “Te respondo na próxima semana.” Dada a comple­
ta atonicidade desses pronomes em Portugal, tais construções seriam praticamen­
te impronunciáveis. Pela mesma razão, é freqüente em Portugal a contração de
pronomes, como me + a > ma, lhe + o > Iho, nos + o > no-lo etc., muito rara no
falar brasileiro: “O documento? Ele não lho deu?”, “A verdade, no-lo diz a Bíblia,
está somente em Deus.”
b. O falante lusitano usa o infinitivo regido pela preposição a, enquanto no Brasil se
prefere o gerúndio: “Estamos a lembrar os pontos mais interessantes da viagem”.
(Port.), “Estamos lembrando os pontos mais interessantes da viagem”. (Bras.).

Muitas expressões portuguesas empregam a preposição a, mas as correspon­


dentes brasileiras usam de, a, com:

cheiro a cebola cheiro de cebola


cobertura a zinco cobertura de zinco
cedeu a grande pena cedeu com grande pena
sentar-se à mesa sentar-se na mesa
estar à janela estar na janela
estourar a rir estourar de rir.

246 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Ainda em relação ao uso das preposições, no Brasil é comum o uso de em com
verbos que expressam movimento, ao passo que em Portugal se usa a: “ir no mer­
cado”, “chegar na janela”, em oposição a “ir ao mercado”, “chegar à janela”.

No léxico, as diferenças são mais consideráveis; a implantação da língua por­


tuguesa no território brasileiro, com clima, fauna, flora e uma população autóctone
de língua, usos e costumes diferentes, além de sua grande extensão de mais de oito e
meio milhões de quilômetros quadrados, foi lenta. Basta lembrar que, ainda nos mea­
dos do século XVIII, a língua geral era o tupi; de seus habitantes apenas um terço
falava o português e esse terço era bilíngüe. A importação de escravos negros trouxe
outro elemento de língua e cultura diferentes. Nesse contexto, o léxico português
obviamente devia sofrer grandes influências não sentidas em Portugal, a não ser indi­
retamente. Assim, o léxico do português brasileiro foi enriquecido com cerca de dez
mil palavras indígenas e africanas. Exemplos de vocábulos indígenas: a) antropôni-
mos: Araci, Baraúna, Guaraciaba, Iracema, Jurema, Juraci, Jupira, Moema, Peri,
Uhirajara; b) topônimos: Aracaju, Botucatu, Itatiaia, Caraguatatuba, Itapira,
Itatiba, Itapecirica, Paranapiacaba, Sorocaba, Pernambuco·, c) flora: abacaxi, buri­
ti, caruru, guabiroba, ipê, jabuticaba, jacarandá, mandioca, peroba, sapé·, d) fauna:
araponga, arara, gambá, jacaré, juriti, jaburu, maracanã, paca, perereca, sara cura,
sucuri, tamanduá, tatu, urubir, e) alimentos: moqueca, pirão; f) utensílios: jacá, tipi-
ti, arapuca, urupema, sururuca; g) crenças: saci, caipora, curupira. Embora menos
numerosos, os empréstimos de procedência africana são correntes, como Caxambu,
Carangola, Guandu, Quilombo (topônimos); candomblé, Exu, Iemanjá, mandinga,
macumba, zumbi (crenças); aluá, cuscuz, munguzá, quibebe, quiçamã, quindim,
vatapá (alimentos). A grande maioria desses milhares de empréstimos não passou à
língua em Portugal.
Ao lado dessas novas incorporações, grande número de vocábulos adquiria no
Brasil significado diferente daquele de Portugal. Do Dicionário Contrastivo Luso-
Brasileiro, de Mauro Villar, foram tirados os seguintes exemplos:

bicha Bras. fila (bicha, “verme”)


candeeiro abajur (candeeiro, “lamparina”)
carpete tapete (carpete, “revestimento fixo de piso”)
despistar derrapar (despistar, “iludir”)
esquadra delegacia (esquadra, “conjunto de navios de guerra”)
fulminante espoleta (fulminante, “instantâneo”)
galão média (galão, “medida de capacidade”)
impedido ordenança (impedido,“barrado”)
neve sorvete

A ROMÂNIA [ 247
pastelaria confeitaria (pastelaria, “lugar onde se vendem apenas
pastéis”)
revisor fiscal (revisor, “corretor”)
sopeira empregada (sopeira, “terrina”)

A especificação semântica desses poucos exemplos, que poderíam ser facilmente


multiplicados, se deve à metáfora, à metonímia e a outros mecanismos semânticos,
identificáveis sem grandes dificuldades.
Fora do Brasil, o português não é falado em outras regiões das Américas, a não
ser por alguns milhares de emigrantes portugueses e brasileiros, especialmente nos
Estados Unidos da América. Já se falou (ver p. 182) do papiamento, falar crioulo de
Curaçao, nas Antilhas; acrescente-se que sua base portuguesa se estabeleceu nos sécu­
los XVI e XVII, quando o português era a língua geral do litoral da África, onde se ia
buscar o escravo negro para as plantações das Antilhas, do Suriname e da América do
Norte; posteriormente, o castelhano se impôs naquelas partes, imprimindo uma feição
espanhola ao papiamento, não apagando, porém, os vestígios do português naqueles ter­
ritórios, particularmente no alto dos rios Saramaca, Surinam e Cotica, além de emprés­
timos ao negro-inglês, conhecido como taki-taki, espécie de crioulo da língua inglesa.
Quanto ao português dos judeus sefarditas, atualmente está desaparecido, res­
tando apenas nomes de família e restrito número de vocábulos (ver p. 183). Por fim,
as variedades denominadas “co-dialetos” portugueses por José Leite de Vasconcelos
(Esquisse d'une dialetologie portugaise, passim), todas faladas em regiões limítrofes
com a Espanha, são consideradas de transição, uma vez que têm características das
duas línguas e até de outros dialetos. Assim, o riodonorês ou rionorês, de Riodonor,
e o guadramilês, de Guadramil, ambos na região de Bragança, província de Trás-os-
Montes, apresentam características comuns ao português, ao castelhano e ao galego,
como os sons nasais e /ct/ > /it/ do português; mas conservam o /1/ intervocálico como
no castelhano; e a palatal /lh/ passa a /y/, do mesmo modo que no asturiano-leonês:
lat. auricula > oricla > ureya. O mirandês, da Terra de Miranda, também na região de
Trás-os-Montes, é considerado por filólogos espanhóis um dialeto leonês pelo trata­
mento dado ao /e/ e ao /o/ breves latinos, a conservação do /1/ e do /n/ intervocálicos,
além de outros aspectos léxicos e morfológicos. Entretanto, fazendo parte do territó­
rio português, não deixa de receber constante influência da língua nacional e oficial.

CLASSIFICAÇÃO DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS

Hugo Schuchardt (1842-1929) tratou da classificação das línguas românicas na


conferência Über die Klassifikation der romanischen Mundarten (“Sobre a

248 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Classificação das Línguas Românicas”), pronunciada em 1870, mas só publicada em
1900; concluiu não ser possível chegar a uma classificação científica por não haver
critérios adequados. Isso porque os elementos a serem classificados, as línguas româ­
nicas, têm a mesma natureza, idêntica origem básica, embora com diferenciações sufi­
cientes para serem identificados como irmãos e irmãs; daí não ser possível estabele­
cer “classes” no sentido próprio do termo. As línguas românicas não são também tão
numerosas a ponto de serem necessárias muitas características para configurá-las indi­
vidualmente. Não se trata, portanto, de uma classificação propriamente dita, mas de
um tipo de agrupamento por semelhança de aspectos internos e externos.
Por razões geográficas, com algumas implicações lingüísticas, os romanistas
referem-se a “blocos”, denominados segundo as regiões: balcono-romance, ítalo-
romance, reto-romance, galo-romance e ibero-romance; não é uma classificação,
mas uma espécie de agrupamento para facilitar referências e citações.

CLASSIFICAÇÃO DE FRIEDR1CH DIEZ

Não se pode afirmar que o pai da Filologia Românica tivesse intenção de pro­
por uma classificação das línguas românicas. Diez de fato preocupou-se em distinguir,
entre os falares da România, quais deveria considerar língua e quais deveria enumerar
entre os dialetos. Nessa perspectiva, fica mais fácil compreender os critérios por ele
empregados nessa distinção em sua Grammatik der romanischen Sprachen (I, p. 1):

Seis línguas românicas chamam nossa atenção pelas características de sua gramática ou
pela importância de sua literatura: duas orientais, o italiano e o valaco; duas sul-ocidentais, o espa­
nhol e o português; duas norte-ocidentais, o provençal e o francês [...].

Os critérios são claramente enunciados: lingüísticos (“características de sua gramáti­


ca”), literários (“importância de sua literatura”); por esses critérios chega a só seis lín­
guas românicas. A posição geográfica não chega a ser um critério propriamente dito,
mas um elemento externo de localização: oriente e ocidente, norte e sul. Pois essa loca­
lização não significa que os três blocos citados perfaçam grupos afins, caracterizados
e distintos; que semelhanças havería, por exemplo, entre o italiano e o romeno (chama­
do “valaco” por Diez) tanto do ponto de vista gramatical como literário? Diez diz ape­
nas que as seis variedades são línguas e não dialetos. Isso fica claro, quando se aplicam
esses critérios às outras variedades não consideradas línguas por ele. Assim, Diez con­
sidera o catalão um dialeto do provençal, na primeira edição de sua Grammatik, data­
da de 1836; na segunda, de 1856, o catalão já é tido como língua e língua independen­
te, embora ligada ao provençal; na terceira edição declara que a “a língua catalã [...] não
está propriamente na relação de dialeto para com o provençal; define-se melhor como

A ROMÂNIA I 249
um idioma independente, embora bem aparentado com aquele Ao negar inicial­
mente o status de língua ao catalão, Diez não levou em consideração sua literatura mais
antiga que a do castelhano, nem o fato de ter sido a língua oficial do vasto império do
reino de Aragão; de fato, o catalão deixou de ser considerado língua pelo critério polí­
tico, implícito: faltava-lhe um território independente. Por outro lado, o provençal, cuja
língua e literatura Diez conhecia muito bem, também não dispunha de território inde­
pendente, e assim mesmo foi considerada língua. Em relação ao português, se Portugal
não fosse um país independente e o português uma língua oficial, certamente seria con­
siderado um dialeto castelhano, como o galego, apesar de sua valiosa literatura e “as
características de sua gramática” (ver mapa 22, p. 377).
Diez não inclui entre as línguas românicas também o sardo, ainda que lingüis-
ticamente bem caracterizado sob diversos aspectos fonéticos, morfológicos e léxicos;
nos critérios adotados, porém, faltavam-lhe a literatura e o território autônomo, sendo
por isso ligado por Diez ao italiano. Em relação ao rético, por ele denominado
Schurwàlsche, e de fato indicativo apenas da variedade do Cantão dos Grisões, a
ausência de uma literatura própria expressiva, a diversidade dialetal sem que uma das
variedades se destacasse e a falta de expressão política levaram Diez a não conside-
rá-lo uma língua. Põe-se aqui a “questione ladina”; se o autor tivesse levado em con­
sideração o conjunto dos dialetos réticos - ocidentais (valáder, puter, engadino), cen­
trais (dolomíticos) e orientais (friulano) - certamente teria assumido a posição dos
romanistas posteriores, principalmente levando em conta a antiga e ininterrupta tra­
dição de uma das literaturas líricas populares mais belas e ricas da Itália, como as v/7-
lotte. Quanto ao dalmático, Diez não chegou a conhecê-lo, embora o dialeto veglio-
to no seu tempo ainda fosse falado na ilha de Veglia.
Portanto, os critérios de Diez foram lingüísticos, políticos, literários e geográ­
ficos; de fato, porém, esses critérios serviram mais para uma possível distinção entre
o que seja língua e o que seja dialeto. Para isso, basta considerar sua hesitação em
relação ao catalão. E o critério meramente geográfico não é suficiente para uma clas­
sificação científica, segundo a árvore porfiriana, por exemplo.

OUTRAS CLASSIFICAÇÕES

Vários romanistas propuseram suas classificações das línguas românicas,


com ênfase em um ou outro critério; depois dos Saggi Ladini de Ascoli, porém, os
critérios glotológicos passaram a prevalecer. W. Meyer-Lübke, em Einführung in das
Studium der romanischen Sprachwissenschaft, de 1920, enumera nove línguas româ­
nicas: romeno, dalmático, reto-romance (rético), italiano, sardo, provençal, francês,
espanhol e português. Somente em 1925, depois dos debates com filólogos espanhóis

250 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


(ver p. 233 ss.), mudou sua posição em relação ao catalão, que antes havia excluído
da relação das línguas românicas da Península Ibérica.
Cario Tagliavini (Le Origini, p. 354) apresenta outro quadro: a) balcano-
romance, abrangendo o romeno, com o qual se relaciona o dalmático, embora per­
tencente ao grupo itálico; b) ítalo-romance, com o dalmático, o italiano, o sardo e o
rético; c) galo-romance, com o francês, o franco-provençal, o provençal (e o gascão)
e o catalão, este relacionado com o grupo ibérico; d) ibero-romance, com o castelha­
no e o português. Essa classificação do Mestre Tagliavini considera o dalmático
como “il ponte di passaggio” entre o balcano-romance e o ítalo-romance, da mesma
forma que o catalão o é entre o galo-romance e o ibero-romance. Destaque-se a inclu­
são do franco-provençal e a menção expressa ao gascão.
Matteo Bartoli, pesquisando os estratos lingüísticos das regiões de Trieste,
ístria e Dalmácia, conseguiu conhecer melhor o dalmático através de seu último
falante (ver p. 194). Com a aplicação do conceito de substrato de Ascoli, Bartoli
acrescentou aos critérios de classificação os fatores étnicos, conferindo-lhes uma
base científica mais sólida. Foi assim que estabeleceu a conhecida linha La Spezia-
Rimini, do mar Tirreno ao Adriático, separando a Itália em norte e sul; a Itália do
norte pertence lingüisticamente ao ramo ocidental e a do sul, ao ramo oriental, devi­
do ao substrato. Assim, na região de Rimini, por exemplo, o pequeno rio Esino sepa­
rava o território dos celtas, ao norte, do dos itálicos, ao sul; em conseqüência, hoje se
falam dialetos metauropisaurinos de substrato celta ao norte do Esino (entre Ancona
e Rimini), enquanto ao sul se usam os dialetos das Marcas, de substrato itálico. Essa
base étnica foi respeitada pela administração romana e, posteriormente, pela Igreja,
que incorporou a parte sul à diocese de Roma, deixando a parte norte para a diocese
de Ravena, onde se fez sentir ainda forte influência bizantina.
Assim, com os novos dados disponíveis, Bartoli reconhece dez línguas româ­
nicas e as classifica em dois ramos: a) Oriental ou Apenino-Balcânico, abrangendo o
romeno, o dalmático e o italiano; por suas características lingüísticas, incluiu nesse
ramo também os empréstimos latinos às línguas eslavas dos Bálcãs, ao albanês e ao
neogrego; e b) Ocidental ou Pireneu-alpino, abarcando o rético, o sardo, o francês, o
provençal, o catalão, o castelhano e o português.
Apesar de dar denominações geográficas aos dois ramos, baseadas, como se
vê, nas cadeias de montanhas e no nome da península dos Bálcãs, os principais crité­
rios dessa classificação de fato são de caráter lingüístico, especialmente fonético e
morfológico. Os mais importantes são três:

1. Sonorização ou conservação das oclusivas surdas intervocálicas latinas


As línguas do ramo oriental as conservam, enquanto as do ramo ocidental as sono­
rizam, já por volta do século Y substituindo-as pelas respectivas homorgânicas sonoras:

A R O M Â N IA 251
/c/ [k] > /g/; /p/ > /b/ (> /v/ > /φ/); /t/ > /d/.

Exemplos de /c/ > /g/:

lat .ficu > port .figo, cast. higo, cat .figa, prov.figa, fr. ant .fi, fr. moA.figue, eng. fic,
log. figu; mas it. fico, sic.fiku, corso fiku, gasc. hik, vegl. faika, mác.-rom. hic,
megl.-rom. icã (rom. smochinã < esi. ant. smokvina);
lat .focu > port .fago, cast./nego, cat .foc, prov.fuec, fr. feu, eng. fõg, friul./wg, log.
fogu; mas it .fuoco, vegl.foku, rom .foc,
lat. formica > port. formiga, cast. hormiga, cat. formiga, prov. formiga, fr. fourmi,
eng.furmia, log. formiga-, mas it. formica, vegl.formaika, rom.furnicã.

Para que se dê a sonorização das consoantes surdas é indispensável, como se


observa nos exemplos acima, que estejam em posição intervocálica; não se dá a sono­
rização se a consoante estiver entre vogal e semivogal ou vice-versa; se a consoante
for geminada, torna-se simples e conserva-se, como em lat. bucca > port. boca, cast.,
cat. e prov. boca, fr. bouche, eng. buoka, (log. bukka), friul. buke; (it. bocca), vegl.
buka, rom. bucã, alb. buke. A sonora, que substitui a surda, pode vir a ser sincopada
posteriormente, fato que ocorre com freqüência no francês (catena > chaine; focu >
feu ;formica >fourmi). Em casos como cat.foc e prov.fuec, não se deu a sonoriza­
ção porque houve antes a apócope da vogal átona final.

Exemplos de /p/ > /b/ (> /v/ > /φ/):

lat. popiilu > port. pobolo > poboo > povoo > povo, cast. pobolo > poblo > puoblo
> pueblo, cat. poble, prov. poble, fr. ant. pueble, fr. mod. peuple (regressão erudi­
ta), eng. põvel, log. pobulu; mas it. popolo, rom. popor;
lat. *cepulla > port. cebola, cast. cebolla, cat. cebolla, prov. cebola (> fr. ciboulé),
eng. ciguola e log. kibudda; mas it. cipolla, dalm. kapula (> vegl. kapul); o rom.
tem ceapã < lat. caepa, “cebola”;
lat. sapone > port. sabão, cast. jabón, cat. sabá, gasc. sablun, prov. sabo, fr. savon,
friul. savon, eng. savun, log. sabone; mas it. sapone, vegl. sapaun, rom. sapun.

Exemplos de /t/ > /d/:

lat. matum > port. maduro, cast. maduro, cat. madur, prov. madur, fr. miir, eng.
madiir, friul. madur, log. maduru; mas it. maturo, vegl. matoir(e), rom. matur;
lat. catena > port. cadeia, cast. cadena, cat. cadena, prov. cadena, gasc. kadine, fr.
chaine, eng. kadaina, friul. kadena, log. kadena; mas it. catena, vegl. kataina,
mác-rom. catina;

252 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMANICA


lat. venditore > port. vendedor, cast. vendedor, cat. venedor, prov. vendedor, fr. ven-
deur, eng. vendèder, log. bendidore\ mas it. venditore, rom. vinzãtor.

2. O tratamento dado ao /c/ do grupo l-c t-l


Nas línguas do ramo ocidental ocorre a vocalização, enquanto nas do ramo
oriental há uma assimilação consonântica, total no italiano, mas parcial no dalmáti-
co e no romeno, como nos exemplos:

lat. octo > port. oito, cast. oito > ocho, cat. vuit, prov. uech; fr. huit, eng. och, friul.
vot, (log. otto); mas it. otto, vegl. guapto, rom. opt;
lat. nocte > port. noite, cast. noite > noche, cat. nit (< naeit), prov. nuech, fr. nuit, eng.
not, friul. not, (log. notté)\ mas it. notte, rom. noapte;
lat. lacte > port. leite (< laite), cast. leite > leche, cat. llet (< llieit), prov. lach, fr. lait,
eng. lat, friul. lait, (log. latte)·, mas it. latte, rom. lapte.

Essa vocalização ou assimilação das oclusivas intervocálicas permitem distin­


guir os termos vernáculos dos eruditos; em português, por exemplo, são formações
vernáculas leiteiro, leiteria, leitoso, leitão, aleitar etc., enquanto lacteo, lactose, lacto-
biose, lactocrono, lactoso são eruditas, partindo da raiz latina. No francês, a língua
românica foneticamente mais distanciada do latim, a distinção entre vocábulos verná­
culos e eruditos é ainda mais clara, como nnir (“maduro”) e maturité (“maturidade”),
eau (“água”) e aqaeux (“aquoso”), chauve (“calvo”) e calvitie (“calvície”); obviamen­
te, outros metaplasmos, além da vocalização, atuaram na formação do léxico francês.
De modo geral, o português, o castelhano e o italiano apresentam formas vernáculas
e eruditas mais claramente relacionáveis entre si e com a raiz latina do que o francês.

3. Tratamento dado ao l-sl final


As línguas do ramo ocidental o conservam, ao passo que as do ramo oriental
o suprimem:

lat. nos > port. nós, cast. nos (nosotros), cat. nos (nosaltres), prov. nos, fr. nous, eng.
nus, friul nus\ mas it. noi, vegl. noi, rom. noi;
lat. duos > port. dois, cast. dos, cat. dos, prov. dos, fr. deus > deux, eng. dus, (friul.
doi), log. duos·, mas it. due, vegl. doi, rom. doi.

A causa do desaparecimento do l-s l final nas línguas do ramo oriental ainda é


discutida pelos romanistas. Contudo, essa sibilante devia ser bastante fraca, já que é
frequentemente omitida em inscrições, particularmente no século II; no século
seguinte reaparece com certa assiduidade, talvez por influência das escolas. De qual-

A ROMÂNIA I 253
quer forma, nos romances italiano e romeno o /-s/ final desapareceu completamente,
embora se conservasse nos outros e em localidades restritas, como Pompéia, cujas
inscrições atestam a estabilidade desse fonema; convém lembrar, porém, que
Pompéia, no meio século anterior à erupção do Vesúvio, desfrutava de uma privile­
giada situação econômica, social e cultural.
Enquanto as consoantes finais, sobretudo /-m/ e /-t/, eram apocopadas em
toda a România, no Ocidente o /-s/ final resistiu em virtude de suas claras funções
morfológicas nos nomes e nos verbos. No Oriente, o desaparecimento do /-s/ final
alterou profundamente todo o sistema das declinações. Não se pronunciando mais o
/-s/ do acusativo plural e o /-m/ do singular, houve confluência de formas com a con-
seqüente neutralização da idéia de número:

acus. sing. casam > casa - canem > cane


acus. plur. casas > casa - canes > cane

Para fugir a essa ambigüidade, recorreu-se às formas do nominativo plural


para recompor a distinção de número: lat. casae > it. case, rom. case.
Analogicamente, as palavras terminadas em /-o/ passaram a formar o plural em /-i/,
segundo o modelo da segunda declinação latina, estendendo-se o processo para as
palavras advindas da terceira declinação:

rom. astru - a§tri; multiplu - multipli


cíine - ciini; rege - regi
it. a Ibero - alberi; giorno - giorni
cone - cani; fiore - fiori

Na conjugação verbal, o desaparecimento do /-s/ final teve reflexos especial­


mente na segunda pessoa do singular, da qual era o morfema número-pessoal: lat.
dormis (em oposição a dormi-o, dormi-t etc.) > it. dormi, rom. dormi (“tu dormes”).
Tomando o romeno como exemplo, verifica-se que o /-i/ se tornou o morfema
número-pessoal da segunda pessoa singular e o /-Ji/ o da segunda plural, em todas as
conjugações, modos e tempos, como nas formas seguintes:

Modo Indicativo:
Presente cinti cintali, “cantas” - “cantais” (a cinta)
lucresi lucrari, “trabalhas” - “trabalhais” (a lucra)
taci tãceti, “calas” - “calais” (a tacea)
faci faceti, “fazes” - “fazeis” (a face)
cobori coboriti, “desces” - “desceis” (a cobori)

254 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Impcrf.
cintai - cintaíi, “cantavas” - “cantáveis”
lucrai — lucrari, “trabalhavas” - “trabalháveis”
tãceai - tãceati, “calavas” - “caláveis”
fãceai - fãcea{i, “fazias” - “fazíeis”
coborai - cobora{i, “descias” - “descícis”
Pcrf.
cintaçi - cintarãli, “cantaste” - “cantastes”
lucraçi - lucrarãíi, “trabalhaste” - “trabalhastes”
taciqi - tãcurã{i, “calaste” - “calastes”
faciqi - Jacurã[i, “fizeste” - “fizestes”
coboríf - coborirã[i, “desceste” - “descestes”
Mais que pcrf.
cintasef - cintaserali, “cantaras” - “cantáreis”
lucraseçi - lucrasera[i, “trabalharas” - “trabalháreis’
tãcuseçi - tãcuserã(i, “calaras” - “caláreis
Jacuse§i - fâcuserãli, “fizeras” - “fizêreis”
coboriseçi - coboriserã(i, “desceras” - “descêreis

Modo Subjuntivo:
/0 :
Presente sã cinli - sã cinta[i, “cantes” - “canteis”
sã lucrezi - sã lucrati, “trabalhes” - “ trabalheis”
sã taci - sã tãce{i, “cales” - “caleis”
sã faci - sã faceti, “faças” - “façais”
sã cobori - sã coborif, “desças” - “desçais”

Os ajustes que o romeno fez em sua conjugação, motivados pelo desapareci­


mento do /-s/ final, não conseguiram evitar formas convergentes; cinta(i, por exemplo,
pode ser presente ou imperfeito do indicativo ou ainda presente do subjuntivo; com o
uso obrigatório de sã como índice de subjuntivo, restam duas formas iguais a serem
devidamente distinguidas pelo contexto. E claro que esse problema surgiu também por
causa das alterações de morfemas modo-temporais; a síncope do /-b-/ do imperfeito
do indicativo latino (lat. cantabas > port. cantavas, fr. chantais etc.) e as alterações
decorrentes tornaram algumas formas do imperfeito iguais às correspondentes do pre­
sente indicativo; assim, el cinta, noi cintam, voi cintali são formas do presente e el cin­
ta, noi cintam, voi cintati, do imperfeito. Nas das primeiras, a passagem / ã/ do presen­
te para /a1 do imperfeito as toma distintas, ficando apenas voi cintati sem qualquer
traço distintivo para os dois tempos, mesmo levando em conta que todas as formas do
imperfeito são oxítonas. O italiano manteve o morfema modo-temporal do imperfei-

A R O M Â N IA I 255
to, apenas lenizando a sonora (/b/ > /v/): lat. cantabas > it. cantavi e cantabatis > can-
tavate; desse modo, no italiano, o problema não é tão sensível.
Portanto, em linhas gerais, esses critérios estritamente lingüísticos distinguem
razoavelmente bem os dois ramos. Convém observar, porém, que o sardo ocupa,
nesse contexto, uma posição particular, uma vez que conserva o /-s/ final, mas não
sonoriza as surdas intervocálicas, segundo se observa nos exemplos dados, além de
assimilar o /c/ do grupo /ct/; mesmo assim é incluído entre as línguas do ramo oci­
dental. Observe-se ainda que, mesmo ao sul da linha La Spezia-Rimini, existem
regiões com os traços lingüísticos do Ocidente, como a zona fronteiriça entre a
Lucânia e a Calábria e a do sul de Ancona. E preciso mencionar ainda o fenômeno
verificado na antiga Etrúria, cujo território corresponde aproximadamente ao da Tos-
cana moderna, denominado gòrgia toscana, “garganta toscana”; consiste na aspira­
ção das consoantes surdas intervocálicas, inclusive por fonética sintática: it. fico >
tose. fih o (“figo”), poco > poho (“pouco”), mi ca > miha (“migalha”); la casa > la
hasa (“a casa”). A área de aspiração do /-c-/ é mais ampla que a do /-t-/ (it. dito >
tose. ditho [“dedo”], stato > statho [“estado”]), enquanto a do /-p-/ é muito reduzida;
exemplos de /-t-/ > /-ph-/: it. cupola > tose. cuphola (“cúpula”), lupo > lupho
(“lobo”), scopa > scopha (“vassoura”). E sabido que o etrusco tinha os três fonemas
aspirados, representados na grafia pelas letras gregas correspondentes (φ, θ, χ); por
isso, atribui-se essa característica gòrgia toscana à influência do substrato etrusco,
embora não haja unanimidade entre os romanistas.
Essas questões, entre outras, mostram quão relativa é qualquer classificação
das línguas românicas, mesmo baseada em critérios lingüísticos, em princípio, aceitá­
veis. Apesar dos muitos problemas que enfraquecem essa classificação, tornando-a
bastante relativa, mesmo assim não deixa de ter seu valor principalmente de caráter
prático, sendo por isso mantida pela maioria dos romanistas (ver mapa 22, p. 377).

A ROMÂNIA CONTÍNUA

Os parâmetros, pelos quais se tentou classificar as línguas românicas, não


conseguiram superar as dificuldades que levaram Schuchardt a desistir. Era necessá­
rio, por isso, buscar outros padrões e critérios capazes de diluir esses obstáculos. A
homogeneidade, relativa mas considerável, das línguas românicas de fato não propi­
cia bases científicas para uma classificação, entendida como o estabelecimento de
grupos formados com fundamento em afinidades lingüísticas, literárias e culturais,
já que se trata de irmãos e irmãs. Fisionomias muito parecidas levam a confusões,
ainda que compreensíveis. Tomando-se, por exemplo, o romeno como termo de com­
paração - por ter ficado durante séculos isolado das outras línguas românicas e

256 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


adquirido, por isso, uma fisionomia lingüística particular - varia bastante a posição
dos romanistas, quando tentam estabelecer com que língua ou dialeto românico o
romeno apresenta um número maior de concordâncias. Segundo levantamento de
Tagliavini (Le Origini, p. 353), Ascoli aproxima o romeno do rético, particularmen­
te do friulano; Iorgu Iordan, G. Alessio e H. Lüdtke, dos dialetos sul-italianos; A.
Viciu e P. Iroaie, do siciliano; R. Huss, do provençal; G. Scholz, G. Giuglea, Fl.
Sãdeanu e I. Iordan (1964), do castelhano; e S. Pop, do sardo.
Uma visão clara dessa problemática levou Amado Alonso a buscar novos cri­
térios, cristalizados em sua proposta da Romània Contínua. O ponto de partida foi o
debate sobre o caráter ibérico ou gálico do catalão; Amado Alonso chegou à conclu­
são de que as línguas de ambos os lados dos Pireneus apresentam “um parentesco
especial [...] na fonética, na gramática e no léxico” (“Partición de las Lenguas
Românicas”, in Estúdios Lingiiisticos, I, p. 1075). Essas línguas são o catalão, o ara-
gonês, o gascão e o provençal.
Considerando o conjunto das línguas românicas sob essa perspectiva, Alonso
chegou a outros critérios, conhecidos como “culturais”, não propriamente para “clas­
sificar”, mas estabelecer relações entre as línguas e os dialetos românicos. Esses cri­
térios são: a) Grau de latinização inicial; b) Grau de fidelidade posterior à tradição
latina. Na avaliação do “grau de latinização inicial”, é preciso levar em conta vários
fatores, tais como a época da latinização, a distância maior ou menor em relação a
Roma, o nível cultural do povo conquistado, a maior ou menor resistência oposta à
penetração da cultura latina, variação do esforço colonizador romano e outros aspec­
tos. Assim, o elevado nível cultural dos gregos não permitiu uma latinização senão
superficial da Grécia; a forte presença da cultura grega em todo o Oriente não dei­
xou espaço para a latinização. Na Palestina, a rebeldia religiosa e política dos judeus
impediu qualquer assimilação cultural. Na Gália, a intensidade da latinização da
“Província”, incorporada ao Império 70 anos antes da Gália do norte, foi muito
maior, não apenas pela diferença de época, mas também pela cultura celta no norte,
mais elevada do que se supunha. Nessa perspectiva, mal se pode comparar o grau de
latinização da Gália do norte com o da Itália, por exemplo, ou até com o da Dácia.
Como se viu, conquistada pelo imperador Trajano numa guerra mais difícil e demo­
rada que o previsto, tudo indica que a Dácia teve sua população substituída por ele­
mentos recrutados em todo o Império; o resultado foi uma latinização profunda e
rápida, que foi capaz de resistir a grandes vicissitudes posteriores, apesar do período
relativamente curto em que faz parte do Império Romano (107-271) e do isolamen­
to de muitos séculos em relação às demais línguas românicas.
Contudo, apenas esse critério da “latinização inicial” não é suficiente, uma
vez que fatos posteriores poderíam alterar, ou mesmo apagar, o caráter latino da lín­
gua ou dialeto. Daí a necessidade do segundo critério, o do “grau de fidelidade pos-

A ROMÂNIA I 257
terior à tradição latina”. O norte da África, por exemplo, cuja latinização se iniciou
no século III a.C., chegou a ter centros florescentes de cultura latina; vicissitudes his­
tóricas, porém, em particular as invasões dos vândalos e dos árabes, não permitiram
que ali surgisse sequer um dialeto românico, uma vez que a tradição latina foi total­
mente destruída. Nos Bálcãs, as regiões mais romanizadas da Panônia, do Ilírico e
Mésia foram perdendo lentamente a tradição latina e o romance balcânico acabou por
tornar-se substrato das línguas eslavas dominantes, restando apenas ilhas de falar
românico de populações, além disso, bilíngües, como os falantes do ístrio-romeno.
Nesse contexto, o dalmático foi sendo empurrado em direção ao Adriático, até seu
desaparecimento com Udina, Burbur, em 1898.
Com base nesses dois princípios, Amado Alonso propõe o que denominou
Romãnia Contínua, na qual a divisão da România em Oriental e Ocidental conserva
um valor relativo. Assim, até o século III, quando a Dácia foi abandonada pelas
legiões e pela administração, ela formava um conjunto com a Dalmácia e a Itália,
levando-se em conta o tratamento dado ao /-s/ final, por exemplo. A partir daí, o
romance da Dácia ficou isolado e não lhe foi possível conservar a tradição latina,
como na Itália, que não sofreu a forte influência bizantina e eslava como o romeno.
Por isso, Alonso isola o romeno e o dalmático, que passam a constituir o ramo orien­
tal a partir do século IV, enquanto o italiano, conservando melhor a tradição latina,
se aproxima sempre mais das línguas românicas do Ocidente, fato mais consentâneo
com a realidade lingüistica; realmente, o italiano está mais próximo do provençal e
demais línguas ocidentais que do romeno.
A partir do século V, o romance do norte da Gália passa a sofrer forte influên­
cia dos francos, germanos que não haviam sido romanizados anteriormente; em con­
sequência, a língua francesa se afasta consideravelmente dos parâmetros latinos e
com isso do provençal, catalão, castelhano etc. Em vista disso, Alonso separa tam­
bém o francês da România Contínua, a partir do século VI. Assim, o francês e o
romeno não se enquadram em nenhum grupo, principalmente por suas particularida­
des lingüísticas, enquanto as outras línguas românicas se inter-relacionam mais facil­
mente pela maior fidelidade à tradição latina. Posição semelhante à de Amado
Alonso têm A. Meillet (Linguistique historique et linguistique générale, p. 310) e Th.
H. Maurer (A Unidade da România Ocidental, p. 13). Baseados também em fatos
culturais e lingüísticos, situam só o romeno no ramo oriental e as outras integram o
ramo ocidental (ver mapa 23, p. 378).
Entretanto, considerando o caráter basicamente latino tanto do romeno como
do francês, B. E. Vidos (Manual, pp. 296-297) julga que não se deve excluí-los da
România Contínua. Através dos dialetos, é possível integrar todas as línguas sem
interrupção, do Oriente ao Ocidente. O ponto de partida é a unidade originária, sobre
a qual se desenvolveram as línguas românicas. Começando pelo Oriente, Vidos mos-

258 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


tra que a região de fronteira entre os dois ramos está no romance da península da
Istria, atualmente de caráter friulano com influências do dialeto de Veneza. Ali, o
romance originário, porém, pelo que se pode concluir da toponímia e dos emprésti­
mos ao eslavo, era oriental: não havia sonorizado ainda as surdas intervocálicas,
como Lauretum > Luretu (em Fasana e Pirano), Porta Aurata > Porta Rata (em Pola),
lacus > laku etc. Também o ditongo /au/ se mantinha, bem como o grupo /-gn-/ não
se palatalizara ainda. Era, portanto, um falar do dalmático. O estrato friulano-vene-
ziano, ocidental, que cobriu o primitivo, forma o elo de ligação entre os falares do
Oriente (romeno, dalmático) com os do Ocidente. Através do friulano e dos dialetos
intermediários, chega-se ao ítalo-romance, ao vêneto de um lado, e por outro, ao lom-
bardo. A região norte italiana com seus dialetos galo-itálicos, como o lombardo, é
uma extensa zona de transição lingüística entre o grupo italiano propriamente dito
(toscano) e o galo-romance, respectivamente ao sul e ao norte da linha La Spezia-
Rimini, desempenhando o papel de degrau entre o ítalo-romance e o galo-romance.
No conjunto do galo-romance, o franco-provençal, por suas particularidades lingüís-
ticas, estabelece o elo entre o francês ao norte e o provençal ao sul; as estreitas rela­
ções entre o provençal e o catalão ligam, por esse lado, o galo-romance ao ibero-
romance, pois o catalão, mesmo relacionado com o provençal, não deixa de ser uma
língua basicamente ibérica, como o demonstrou Menéndez Pidal. Estabelece assim o
elo de ligação com o castelhano e o português. O castelhano por sua vez, pelas afi­
nidades com o gascão, estabelece oura ligação com o galo-romance e com o francês,
que não deve, portanto, ser isolado.
Essa é a perspectiva pela qual Vidos vê a România: um continuum, no qual
todas as línguas românicas se integram harmoniosamente. A passagem do território
de uma para o de outra é feita através de fronteiras lingüísticas bastante fluidas, deli­
mitadas não por limites políticos, mas por feixes de isoglossas que se estendem, por
vezes, por faixas bastante largas. Por sua fundamentação lingüística, a divisão em
ramo oriental e ramo ocidental conserva um valor relativo; mas a visão do conjunto
das línguas românicas como um continuum está mais de acordo com os fatos e evita
as dificuldades de se chegar a uma “classificação” propriamente científica, confor­
me já Schuchardt havia percebido.
Fortalece esse enfoque a presença constante do latim, fonte à qual as línguas
românicas recorrem sempre em busca de empréstimos; por outro lado, a história
mostra as contínuas influências mútuas entre as línguas românicas, variáveis segun­
do as épocas e o prestígio literário, cultural, político etc. Lembrem-se as influências
do francês sobre as outras línguas românicas e mesmo não românicas, as do proven­
çal nos séculos de glória de sua literatura lírica e, particularmente, a grande contri­
buição francesa e italiana para o processo de relatinização do romeno no século pas­
sado. Embora não haja estudos específicos sobre o assunto, também na România

A ROMÂNIA I 259
não-européia observam-se zonas de fronteira lingüística, como ao longo dos limites
entre o Brasil e seus vizinhos, sobretudo Argentina, Paraguai, Bolívia, Peru e
Colômbia, onde não são raros os empréstimos léxicos.

CARACTERÍSTICAS E INTER-RELACIONAMENTO
DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS

Informações esparsas já foram dadas sobre características e inter-relaciona-


mentos das línguas românicas nas páginas anteriores. As observações em torno da
România Contínua, porém, sugerem algumas considerações mais precisas sobre esse
tema. Estuda-se uma família de línguas com semelhanças e diferenças, que se obser­
vam, “mutatis mutandis”, entre os componentes de qualquer família. Importa não
esquecer que o “terminus a quo” é o mesmo, o latim vulgar, que, alterado por fato­
res vários, sobretudo os do substrato e superstrato, se fragmentou nas diversas lín­
guas românicas, o “terminus ad quem” (ver mapa 24, p. 379).

BALCANO-ROMANCE

No balcano-romance, as condições das duas línguas românicas não foram


favoráveis. Se o romeno assumiu, em alguns aspectos fonéticos e léxicos, uma posi­
ção mais distanciada no quadro românico, isso se explica por fatos históricos: isola­
mento desde o século III até pelo menos o século XVIII, influência inicialmente grega
e bizantina, depois eslava, tanto do ponto de vista político e histórico-jurídico, como
religioso (ver pp. 188-192). Esteve literalmente “cu faja intorgi spre Oriente” (“com o
rosto voltado para o Oriente”). Até o século XVIII, o romeno não teve a seu alcance o
adstrato cultural latino, fonte permanente de empréstimos para todas as línguas româ­
nicas do Ocidente, o latim medieval, que não desapareceu com o Império político, mas
continuou como língua literária, cultural, jurídica e notarial, além de língua oficial da
Igreja. A reintegração do romeno à România Contínua começou timidamente no sécu­
lo XVIII através de estudantes moldavos que, em universidade polonesas, entraram em
contato com o humanismo italiano. No século seguinte, a administração húngara levou
o latim para a Transilvânia e, com a conversão de parte da Igreja romena ao
Catolicismo, a reintegração se acentuou. Assim, autores católicos transilvanos, como
George §incai (1753-1816), Petru Maior (1761-1821) e Samuel Micu (1745-1816),
formados em Roma e em Viena, procuraram eliminar do romeno termos estrangeiros,
isto é, de origem não latina; tentaram também usar o alfabeto latino em substituição
ao cirílico, esforço que culminou com a oficialização do alfabeto latino em 1860. O

260 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


grande desejo de voltar às origens latinas levou alguns autores, por exemplo, A. T.
Laurian (1810-1881), a modificar a grafia para aproximar as palavras de seu étimo
latino, escrevendo questora por acestora (gen. plural de acest. “este”), credentia por
credin(a (“crença”, “fé”), adeque por adecâ mod. adicã (“isto é”) etc.; descobrem
hipotéticos étimos latinos para vocábulos eslavos, de tipo res bellica > rã sb el >
rãzboi. Na segunda metade do século XIX, escritores e teóricos da língua aproximam-
se ainda mais da cultura românica ocidental e os empréstimos franceses tornam-se
muito numerosos; também palavras italianas foram incorporadas em grande número,
particularmente por Heliade Radulescu (1802-1872). Toda essa influência foi erudita
e exercida por escritores formados na França em sua maioria. Toda a terminologia
científica e da teoria literária foi tomada como empréstimo do francês: fr. collection
> rom. co/ec/ie; copier > a copia', com pleter > a completa-, erudition > e ru d ire ,
accessoire > acesoriw, appréhension > aprehensiune e tantos outros. A influência
francesa foi tão profunda que chegou a se fazer sentir até na sintaxe. Atualmente,
porém, diminuiu bastante, parte dos empréstimos caíram em desuso, mas a grande
maioria permaneceu, substituindo em definitivo os correspondentes eslavos, húnga­
ros, neogregos, turcos etc., relatinizando consideravelmente o léxico.
Por outro lado, esse movimento de reintegração mostrou mais uma vez o valor
da herança latina no romeno: no léxico conta com 141 palavras de origem latina
só encontradas no romeno; na fonética, distingue claramente o/ o/ e o /u/ breves, as
consoantes surdas intervocálicas foram mantidas; na morfologia, é a única língua
românica que conserva um sistema de declinação, ainda que reduzido; ao contrário
do português e do castelhano, conserva as quatro conjugações latinas com algumas
variantes, claramente perceptíveis nas flexões da primeira pessoa do plural: n oi cin-
tám ( "nós cantamos”), noi tacém (“nós calamos”), n oi fá c e m (“nós fazemos”) e noi
auzim (“nós ouvimos”) provenientes do lat. cantam us, tacem us, fa c im u s e audim us.
No contexto do balcano-romance, o dalmático tinha características em comum
com o romeno, mas também com os dialetos italianos, tanto do sul como do norte.
Com a divisão do Império em do Ocidente e do Oriente, em 395, a Dalmácia fez parte
do Ocidente até 535; conseqüentemente, o dálmato-romance ficou durante esse tempo
na esfera lingüística ocidental, participando das evoluções não verificadas no leste,
como no vocalismo, por exemplo, com sete fonemas vocálicos iniciais. Da mesma
forma que o ístrio primitivo, o sardo e o proto-romeno, o dalmático conservou o /g/ e
o /c/ [=k] como velares, como as oclusivas surdas intervocálicas em geral. O que mais
caracteriza o dalmático, porém, é a grande ditongação espontânea de praticamente
todas as vogais tanto livres como travadas (ver p. 195), fato singular em toda a
România; mesmo nos poucos casos em que parece não se ter verificado, Meyer-Lübke
julga ter havido redução de um ditongo primitivo, tanto em /o/ breve > /u/ (lat. fo c u >
f u o k > fu k ) como em /e/ breve > /i/ (lat. decem > d iek > dik\ bene > bien >bin)

A r o m â n ia | 261
(Grammaire, I, p. 202). O argumento é aceitável, tendo-se em vista que /e/ e /o/ bre­
ves, em boa parte das línguas românicas, se ditongam, o que leva a supor que tenham
sido os primeiros a sofrerem a ditongação espontânea e uma posterior monotongação.
No léxico, o dalmático foi muito conservador, bastante relacionado com o
romeno e com os elementos latinos do albanês. Contudo, as afinidades lingüísticas do
dalmático são ainda muito discutidas entre os romanistas; C. Tagliavini relaciona-o
com o romeno e o albanês, enquanto Matteo Bartoli, sem dúvida o maior conhecedor
dessa língua, liga-a estreitamente aos dialetos sul-italianos e, particularmente, aos da
região da Apúlia e dos Abruzos, geograficamente frontais à Dalmácia. Bartoli baseou-
se, para isso, no substrato ilírico comum a essas regiões, já que os messápios da Apúlia
eram ilíricos, e também no fato de que o movimento para as colônias militares e o
comércio com a Dalmácia partiam da Itália meridional; só mais tarde Veneza veio a
tornar-se o grande centro comercial, que dominou totalmente o mar Adriático e suas
rotas. Muitos romanistas aceitaram a posição de M. Bartoli; Clemente Merlo (1879-
1960), porém, procurou mostrar as afinidades do dalmático, especialmente do veglio-
to, com o rético. De uma forma ou de outra, o dalmático é o elo de ligação entre o bal-
cano-romance com as línguas românicas ocidentais, seja com o ítalo-romance
segundo Bartoli, com sua designação de România Apenino-Balcânica, seja com o
reto-romance através do friulano e do vêneto, a partir da posição de Merlo. Contudo,
é possível conciliar as duas posições, admitindo-se aquela influência italiana primei­
ra, recuada no tempo, ficando com isso relacionada com os fenômenos do substrato,
enquanto a penetração do rético só se inicia com a projeção de Veneza, república aris­
tocrática, como grande potência marítima e centro comercial nos séculos XII a XV.
Controlando toda a região norte-oriental da Itália e seu comércio, Veneza dominou a
ístria e toda a costa dálmata por volta de 1400, até Ragusa. Assim se explica o supers­
trato vêneto-rético do dalmático (ver mapa 11, p. 366).
Em que pesem essas diferenças, o termo balcano-romance é mais pertinente
que ítalo-romance, galo-romance ou ibero-romance, porque não se funda sobre uma
base política nem étnica, uma vez que seu substrato é constituído pelo trácio e pelo
ilírico, mas está em conformidade com a realidade lingüística, reflexo duma unidade
geográfica e cultural, mais claramente delimitável que a dos outros blocos. Traços
típicos do balcano-romance, encontrados também nas línguas são românicas:

a. A assimilação do /c/ do grupo /-ct-/ > /-pt-/ ou /-ft-/: lat. lucta > rom. luptã, alb.
lufié; lat. coxa > rom. coapsã, alb. kofshè\ serv.-croat. kopsa, maced. coapsa.
Note-se o mesmo metaplasmo, sempre que o /c/ for seguido de consoante.
b. Os pronomes demonstrativos eram pospostos ao substantivo e por isso também os
artigos definidos se pospõem, como acontece também com outras línguas balcâ­
nicas, o albanês e o búlgaro: lat. homo illu > rom. omul (om+[u]l); frater ille >

262 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


rom. fralele (frate+le), ao passo que no Ocidente os artigos definidos são sempre
antepostos (port. o irmão, cast. el hermano, fr. lefrère e it. ilfratello). O fato bem
atestado de que o demonstrativo latino, do qual se originou o artigo definido
românico, podia preceder ou suceder o substantivo, é suficiente para explicar a
posposição do artigo no romeno, sem contudo negar as influências das línguas
circunvizinhas que dispunham do mesmo tipo de colocação,
c. Só no balcano-romance se constrói a forma do futuro com o auxílio de volere (“que­
rer”): lat. vulg. voleo scribere > rom. voi serie (“escreverei”), búlg. pisa-shta, alb.
do shkruaj e no neogr. θέλω γράφεΐν ou "θα γράφω; essa forma se encontra, em
parte, também no dalmático. Própria é ainda a construção das formas passivas bal­
cânicas com o verbo fieri > rom. a fi, por exemplo voif i chemat (“serei chamado”).

RETO-ROMANCE

Quanto ao reto-romance, as três variedades que o compõem sofrem pressão


de línguas literárias de maior prestígio. O friulano, ou rético oriental, perdeu para o
vêneto a região de Trieste e de Muggia; o vêneto infiltrou-se também ao longo do rio
Piave, invadindo o território do rético dolomítico central. Dialetos italianos (trentino,
lombardo) expandem-se por regiões antes réticas. Mesmo o rético ocidental, pela
falta de uma língua literária única (ver p. 206), fica exposto e permeável a influên­
cias do italiano, do francês e, ao norte, do alemão. O forte apego às variantes diale­
tais, aliado à vontade de levá-las à condição de língua literária, impede o aparecimen­
to de uma língua literária única e suficientemente representativa, que a consagre no
conjunto das línguas românicas e a torne mais resistente a influências externas.
Ressaltem-se, porém, a unidade e a interdependência das três variantes réticas
no campo da fonética (ver p. 208) e, no léxico, a conservação de vocábulo geralmen­
te não encontrados em outras línguas românicas: lat. coccinu > eng. cotschen (“ver­
melho”); mure > miir (“rato”); nausea > nosch (“mau”); incipere > antscheiver
(“começar”; cf. rom. íncepe); intellegere > inclér ou incleger (“compreender”; cf.
rom. in[elege)·, codex > cudesch (“livro”), que manteve o significado do latim com
exclusividade; nas outras línguas românicas, o termo significa “coletânea de leis ou
disposições”, como it. codico, fr. code, prov. codi, cat. codi, cast. código, port. códi­
go', algumas formas românicas denotam o caráter erudito do termo.
Enquanto o termo balcano-romance se mostrou adequado à situação lingüís-
tica dos Bálcãs, o reto-romance não corresponde à realidade étnico-lingüística ou
político-geográfica: os réticos não eram um povo etnicamente uno, além de a efetiva
romanização da Récia ter-se dado tardiamente por contingentes expulsos da
Vindelícia e do Nórico (ver p. 205): além disso, o território onde se fala o rético não

a r o m â n ia | 263
coincide com o da antiga Récia, como o Alto Ádige, que pertencia ao Nórico, e o
norte oriental da Itália.

ÍTALO-ROMANCE

O ítalo-romance caracteriza-se, em comparação com os outros blocos, por ser


bastante conservador. O sardo é a língua românica mais conservadora, seguido pelo
italiano; ambas são as que menos se afastaram do latim. O toscano, representado
sobretudo pelo florentino, mergulha na tradição latina, muito bem conservada. No
léxico, as palavras que expressam.os conceitos mais usuais mantêm a forma latina
com alterações mínimas, o que não costuma acontecer nas outras línguas românicas;
alguns exemplos: lat. aqua > it. acqua; asinu > asino; amare > amare; canis > cane;
calidus > caldo; cervus > cervo; caelu > cielo; credere > credere; habere > avere;
filius > figlio; homo > uomo; matre > madre; mare > mare; patre > padre; ridere >
ridere; sole > sole; terra > terra; videre > vedere; vivere > vivere. Essa fidelidade às
formas latinas do italiano se torna mais clara, se compararmos essas formas com as
correspondentes do francês, a língua mais inovadora dentro da România: fr. eau
(“água”), âne (“asno”), aimer (“amar”), chien (“cão”), chaud (“quente”), cerf
(“cervo”), ciei (“céu”), croire (“crer”), avoir (“ter”), fils (“filho”), homme (“homem”),
mère (“mãe”), père (“pai”), rire (“rir”), soleil (“sol”), terre (“terra”), voir (“ver”),
vivre (“viver”). Algumas palavras francesas estão de fato distantes das corresponden­
tes latinas (eau, chien, chaud), outras permitem entrever a base latina; as portuguesas
mostram uma posição intermediária em relação ao italiano e ao francês.
O italiano teve no século XVI seu período de grande influência sobre as
demais línguas românicas; foi então a fonte de empréstimos léxicos na área das
artes, das ciências, da navegação, do vestuário e da moda, de que são exemplos
arquitrave, bancarrota, banco, bastião, camisola, cantilena, cartucho, emboscada,
grotesco, mosaico, pantalona, risco. Posteriormente, a falta de unidade política e a
chamada “questione delia lingua” (ver p. 198), com o apego excessivo dos linguai
ou linguaioli (“pedantes”) às formas do florentino clássico, resultaram no decrésci­
mo da influência do italiano no mundo românico. Somente na primeira metade do
século XIX, Alessandra Manzoni conseguiu revitalizar o italiano com base no flo­
rentino corrente, tornando-o a língua literária do país depois da reunificação políti­
ca em 1870. Atualmente, ressalte-se a importância do rádio, da televisão e do cine­
ma como veículos de difusão do italiano, em particular o cinema, cujos filmes são
produzidos em Roma, novamente o grande centro de irradiação cultural da
Península; com essa projeção, difunde-se sempre mais também a linguagem da capi­
tal com seus torneios e expressões.

264 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


No ítalo-romance se inclui o sardo, o que se deve entender apenas sob o aspec­
to político, uma vez que lingüisticamente é uma realidade totalmente diversa, nada
tendo a ver com o substrato itálico. Mesmo os critérios lingüísticos que dividem os
ramos ocidental e oriental da România não se aplicam plenamente ao sardo; pois, se
conserva o /-s/ final como as línguas do ramo ocidental, não sonoriza as consoantes
surdas intervocálicas nem vocaliza o Id do grupo l-ct-l, segundo as características do
ramo oriental. É incluído entre as línguas do Ocidente por sua posição geográfica,
ainda que, do ponto de vista lingüístico, devesse ter uma classificação própria.
Além das citadas características do sardo, especialmente do logudorês (ver p.
202), atribuíveis sobretudo ao isolamento de seu território insular, é considerável o
número de palavras latinas conservadas pelo sardo e não encontradas nas outras lín­
guas românicas; exemplos, colhidos no REW: lat. agnile > log. annile (“ovil”);
annectare > annettere (“ligar”); annodulare > annoyare (“atar”); annubilare >
annuidzare (“escurecer-se”); *arellare > areddare (“endurecer”); atterminare >
attremenare (“ultrapassar”); audacia > atta (“ousadia”); avenarius > enarzu
(“joio”); calcitrare > kalkidare (“pisar”); calendaria strena > kandelarzu (“presente
de ano bom”); infercire > enferkire (“arrolhar”); inferre > inferrere (“tapar”); inno­
cuus > innókidu (“bobo”); coniugium > konyuyu (“casamento”); ajfidicare > affika-
re (“confiar”); tra(ri)smutare > attramudare (“mudar de pasto” [gado]); patentem >
padente (“floresta”); patrius > padriu (“claro”); primore > primore (“principalmen­
te”); onus > onus (“peso”); senecem > sénege (senex, “velho”); verutus (“pontudo”)
> berrudu (“com chifres”).
Língua mais conservadora de todas, o sardo foi qualificado de “parque natu­
ral da România” por J. Jud e Theodoro Henrique Maurer sugere que lhe seja dado um
lugar à parte do contexto românico (O Problema do Latim Vulgar, p. 35).

GALO-ROMANCE

O galo-romance, contrariamente ao ítalo-romance, é o mais inovador de toda a


România; atribui-se esse fato à conjugação de influências do substrato celta e do
superstrato franco, este mais fiel a suas origens germânicas. Em conseqüência, já no
século ΙΙΙ,ο francês reforçou o acento de intensidade, levando as vogais tônicas em síla­
ba livre à ditongação espontânea e eliminando as vogais finais, com exceção do /a/, que
passa a /e/, fato único entre as línguas românicas. Até o século Y já havia sonorizado
as consoantes surdas oclusivas intervocálicas e sincopado as sonoras resultantes. Por
isso, as palavras francesas encurtaram-se, tomaram-se oxítonas, afastando-se bastante
das correspondentes latinas, singularizando-se também nesse aspecto no contexto
românico. As homonímias se tornaram freqüentes, como eau (“água”), e haut (“alto”);

A ROMÂNIA I 265
aoút (“agosto”), ou (“onde”), e ou (“ou”). No século XI, deixou-se de pronunciar o /-1/
final e, no século XIII, também o /-s/ final, originando novas homonímias, como fois
(“vez"),foie (“fígado”) efoi (“fé”), mais sensíveis, porém, na conjugação verbal: can­
tas > chantes; cantat > chantef, cantabas > chantais; cantabat > chantaif, para evitar
a homonímia verbal, fez-se obrigatório o uso do pronome pessoal.
Essa acentuada evolução fonética do francês estabeleceu uma distinção muito
clara entre o léxico herdado e os termos eruditos e semi-eruditos, introduzidos na lín­
gua a partir especialmente do século XIV por necessidade científica. Afrancesaram-
se termos abstratos latinos, sem correspondentes na língua; caso houvesse, não eram
de uso geral, pareciam inadequados, além de apresentarem, por vezes, muitas varian­
tes; assim, cécité (< lat. caecitatem) se impôs e tornou arcaicas aveugloison, aveu-
glerie, aveugleté, aveuglesse, aveugleüre e aveuglissement; o mesmo aconteceu com
lat. maturitatem > fr. maturité, que substituiu meiireté; e lat. calvitiem > fr. calvitie
impôs-se a chauvece, chauveur, chauveure, derivados de chauve. A maior fidelidade
do léxico das outras línguas românicas, mesmo dentro do galo-romance, ao latim evi­
tou, pelo menos em parte, essa ruptura formal entre o léxico herdado e os emprésti­
mos posteriores. Comparem-se os seguintes exemplos: lat. articula > port. artelho
(prov. artelh) com as formas eruditas articular e articulação·, lat. digitu > port. dedo
(cast. dedo, cat. dit, prov. det, fr. doigt [dwá], eng. daint, friul. det, it. dito, log. didu,
vegl. detco, rom. deget) com digital, digitação; lat. auricula > lat. vulg. oricla > port.
orelha (cast. oreja, cat. orella, prov. aurelha, fr. oreille, friul. oregle, eng. uragla, log.
oryia, it. orecchio, vegl. orakla, rom. urechè) com auricular.
Por motivos políticos, econômicos e culturais, o francês foi guindado a uma
posição de destaque no contexto românico e mesmo não românico, exercendo sem­
pre grande influência. Na Itália, o influxo francês se intensificou com a incorporação
do império lombardo e a formação do grande império de Carlos Magno, de modo que
a presença francesa foi intensa nos séculos IX e X; no início do século XI, os norman­
dos, então já de língua francesa, conquistaram o sul da Itália e a Sicilia; peregrina­
ções sempre numerosas vinham da França e várias ordens religiosas, como os clunia-
censes, os cistercienses e os cartusianos, estabeleceram-se na Itália. A confluência
desses fatos históricos explica a contribuição lingüística do galo-romance ao italiano
desde as origens, com o aporte de vocábulos francos e de outras origens. Na literatu­
ra, a lírica provençal foi modelo para a primeira floração literária surgida na corte do
reino da Sicilia no século XIII, com escritores que compuseram em francês e em pro­
vençal. Dessa época provém o it. giullare, do prov. joglar (< lat. iocularis, que por
via direta dá o it. giocolare)', o francês antigo jogler e joculer é a base do it. gioco-
liere; lat. ministerialis > fr. menestrèl > it. menestrello (port. menestreí); prov. troba-
dor > it. trovatore. Vêm por empréstimo também nomes de instrumentos musicais
(viola, liuto [“alaúde”], cennamella [“flauta”]), da falcoaria, do feudalismo e do sis-

266 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
tema administrativo; são exemplos desses últimos fr. hommage, termo feudal que
expressava inicialmente o juramento de fidelidade do vassalo a seu suserano, origem
do it. omaggio, enquanto prov. omenatge > cast. homenaje, port. homenagem·, tam­
bém o fr. baron (< germ. baro [“homem livre”]) > it. barone, cast. barón, port. barão;
lat. comite > fr. comte, prov. conte > it. conte (cat., cast. e port. conde); do lat. comes
stabuli (“administrador das cavalariças” e depois “diretor da cavalaria”) > fr. conné-
table > it. ant. connestabile e contestabile, mod. contestàbile (port. condestável);
germ. marahskalk (“empregado que cuida dos cavalos”) > fr. maréchal > it. mares-
ciallo e port. marechal. Outros empréstimos referem-se a nomes de armas, de cultu­
ra como gaul. leuca (“milhar”) > prov. légua > it. lega, port. légua; lat. pagus >
pagensis (“circunscrição”, “região”) > fr. pays > it. paese (cast. país, port. pais).
No século XVII1, o iluminismo francês refletiu-se na Itália, como aliás em
toda a România; o mesmo aconteceu com a Revolução e as modificações na visão do
mundo e da cultura dela resultantes.
Na Península Ibérica, inicialmente foi maior a influência do provençal nas três
línguas da região, fato explicado pela cruzada de Simon de Montfort contra os albigen-
ses, a devastação e pobreza resultantes (ver p. 213); sem o apoio de seus protetores,
empobrecidos, os trovadores se refugiaram nas cortes ibéricas e italianas, levando con­
sigo o provençal. Mesmo assim, a influência francesa foi considerável nos séculos XII e
XIII, quando a migração de franceses para a Ibéria aumentou, favorecida por casamen­
tos de reis espanhóis com princesas francesas e provençais, tendo sido considerável a
contribuição francesa para as guerras da Reconquista. Quando o francês se tornou a lín­
gua oficial também da região sul da França nos séculos XIV e XV, aumentou também
sua influência ao sul dos Pireneus. Da mesma forma que na Itália, as ordens monásticas
de origem francesa se fixaram também na Ibéria e sua presença foi particularmente
importante em Portugal. As constantes peregrinações de franceses a Santiago de
Compostela criaram o “caminho francês”, assim chamado devido ao número de peregri­
nos procedentes da França e de franceses estabelecidos ao longo dele.
Em Portugal, a presença francesa está intimamente ligada ao próprio nasci­
mento do país na fundação do Condado Portucalense com D. Henrique, senhor de
Besançon, na Borgonha. Daí a multiforme influência no país nos campos da política,
do comércio, da cultura e das artes, com a vinda de cavaleiros, colonos e eclesiásti­
cos franceses. Ainda que não restritos às línguas da Península Ibérica, são emprésti­
mos tomados ao francês, por exemplo, além dos já mencionados acima, fr.forêt, prov.
forest > port. floresta, cast. floresta, it. foresta, do lat. forestis (silva), significando
“mata reservada de caça”, “mata real”; a forma portuguesa e castelhana sofreu con­
taminação semântica de “flor”; fr. claire voie (“clara via”) > port. clarabóia, cast. cla­
rabóia; lat. cappellu > fr. chapeau > port. chapéu, mas it. cappello, prov. capell, cat.
capell; termos relativos às finanças difundiram-se, como fr. endosser (< dos, “cos-

A r o m â n ia I 267
tas”) > port. endossar, cast. endosar, fr. finer (“pagar”) > finance (“recursos mone­
tários” > “negócios monetários”) > port. finanças, it. finanza\ fr. financier > port.
financeiro, it. finanziarío-, it. aggio (“sobretaxa exigida em relação ao valor nominal
do metal da moeda” em Ravena) > fr. agios > port. ágio; it. aggiotaggio > fr. agiota-
ge > port. agiotagem, cast. agiotaje; fr. assemblée > port. assembléia, cast. asamblea,
it. assemblea. Dos muitos termos militares, destacam-se fr. général > port. general,
cast. general, it. generale·, fr. brigadier (< it. brigata, “divisão de exército”) > port.
brigadeiro, cast. brigadier, fr. lieutenant (lieu + tenant, “ocupante de um posto”) >
port. tenente (com supressão do substantivo); fr. sergent > port. sargento, cast. sar­
gento, it. sergente; fr. recrue, com base no participio passado de emite (“crescer”),
significando “o que vem aumentar de novo” o exército, forma o verbo recruter
(1691), donde port. recrutar e recruta, cast. reclutar e recluta, it. reclutare e rècluta,
como também os derivados, fr. recrutement > port. recrutamento etc.; commandant
> port. comandante, cast. comandante, it. comandante·, fr. déroute > port. derrota,
cast. derrota, cat. derrota', fr. arrière-garde > port. retaguarda, cast. retaguardia, cat.
reraguarda, it. retroguardia.
Na relatinização do romeno, iniciada no século passado, o francês e, um
pouco menos, o italiano serviram de modelo para a incorporação de todo um léxico
de origem latina. Entretanto, segundo observou Th. H. Maurer (A Unidade da
România Ocidental, p. 76), o romeno deu preferência a um vocabulário panromâni-
co, isto é, aos termos pertencentes ao conjunto das línguas românicas, ainda que essa
disseminação se devesse a uma anterior influência francesa ou italiana. Assim,
mesmo com as palavras às quais se costuma atribuir origem francesa, o ponto de par­
tida da forma é o latim e as línguas românicas em geral; o francês representou uma
espécie de modelo formal e semântico, o que não impede que haja no romeno, da
mesma forma que nas outras línguas românicas, numerosos galicismos. Uma compa­
ração entre as formas acolhidas pela relatinização do romeno e as correspondentes
românicas mostra que todas as línguas ocidentais dispõem desses termos, com pou­
cas exceções. Exemplos de termos da relatinização romena com os correspondentes
franceses (italianos ou latinos):

abajur (abat-jour) apartament (appartement)


abate (abbatre) aplause (lat. applausus)
absorbi (absorber) armonie (harmonie)
acorda (accorder) artã (lat. artem)
admira (admirer) avocat (avocat)
afabil (lat. affabilis) banca (it. banca)
aluzie ou aluziune (allusion) batalie (it. battaglia)
amor (lat. amor) broda (broder)

268 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


buchet (bouquet) natura (lat. natura)
carierã (carrière) nervos (nerveux)
chestiune (question) nuanld (nuance)
combate (combattre) oferi (lat. offerre)
compune (lat. componere) opinie ou opiniune (opiniori)
construi (construire) original (lat. originalis)
consulta (consulter) palid (lat. pallidus)
copie (it. cópia) pantalon (pantalon)
cristaliza (cristalliser) parol (parole)
depinde (dependre) poezie (poésie)
deplasa (déplacer) portret (portrait)
deplinge (déplorer) pretinde (prétendre)
deveni (devenir) prinf (prince)
direcpe (directiori) produce (lat. producere)
discuta (discuter) proflla (profller)
doctor (lat. doctor) promite (lat. promittere)
dresa (dresser) protesta (protester)
dura (durer) reclama (reclamer)
emofiona (émotionner) regula (lat. regulare)
exemplu (lat. exemplum) reproduce (lat. reproducere)
explicare (explicatiori) ridicul (lat. ridiculus)
flu id (fluide) sentiment (sentiment)
formida (formule) speranfã (it. speranza)
important (important) spera (lat. sperare)
ingrat (ingrat) suride (sourire)
insufla (insuffler) susura (sussurer)
invita (inviter) suvenir (souvenir)
istòric (historique) §tiin(ã (lat. scientia)
libertate (lat. libertatem) tresari (tressaillir)
lux (luxe) unie (lat. unicus)
material (matèriel) visita (it. visita)
mersi (merci) voala (voiler)
modera (modérer) vocabular (lat. vocabularium)
moment (moment) vocafie (lat. vocatio)
nafiune (natiori) voiaj (voyage)

Através desses exemplos, que poderíam facilmente ser multiplicados, nota-se


que o romeno adaptou os empréstimos a seu sistema léxico e morfológico; para isso,
desloca o acento tônico se necessário, usa seu sistema próprio de prefixos (fr. décou-

A ROMÂNIA I 269
rager mas rom. descuraja) e acolhe por vezes o empréstimo num sentido específico
(doctor, “médico”, curte, “corte de um rei”), casos de empréstimos semânticos.
Outras vezes lança mão de elementos do sistema vernáculo e imita apenas o modo de
composição (fr. prétendu, rom. pretins·, fr. résigner, modelo de resemna [re + semna]
e fr. déplorer [de + ploraré], modelo de deplínge [de + plangere]. Sem dúvida, o fran­
cês foi o modelo adotado nesse processo de relatinização do romeno, as formas foram
as latinas e o conteúdo semântico foi o românico moderno, embora seja clara a pre­
sença de numerosos galicismos, comuns igualmente nas demais línguas românicas.
Enquanto a influência do francês sobre o romeno é tardia, na Itália e na Ibéria
o galo-romance se fez presente bem mais cedo. Basta lembrar a presença do proven-
çal no condado barcelonês já no século IX, com as conseqüências sobre o catalão,
precisamente na época em que este se formava; no século XII, poetas catalães escre­
viam em provençal (ver p. 229), o que não aconteceu com o castelhano, ainda que a
influência francesa tenha levado o reino de Navarra e, depois, o de Castela a substi­
tuir a escrita gótica pela francesa. Em Portugal, a primeira escola literária é geral­
mente conhecida como “provençal”; desse período ficaram empréstimos como tro­
vador, menestrel, rouxinol, burel etc. Com a decadência da literatura provençal, a
francesa a substituiu, especialmente a partir do século XVIII, exercendo grande
influência na literatura portuguesa, como também na brasileira, cujos reflexos são
claramente perceptíveis na temática, nos gêneros e nos empréstimos.

IBERO-ROMANCE

No ibero-romance, o catalão é a língua mais inovadora em relação às outras


duas, o castelhano e o português; o português é mais conservador que o castelhano.
Assim, o catalão apocopou as vogais átonas finais, menos o /-a/, acompanhando o
francês e o provençal, ao contrário, porém, do castelhano e do português: lat. ponte
> cat. pont, prov. pont, fr. pont, mas port. ponte, cast. puente; lat. monte > cat. mont
e munt, prov. mont, fr. mont, mas port. monte, cast. monte·, lat. maritu > cat. marit,
prov. marit, fr. mari, mas port. marido, cast. marido·, lat. strictu > cat. estret, prov.
estret, fr. étroit, mas port. estreito, cast. estrecho. Por outro lado, o catalão não voca­
liza o /1/ do grupo /-lt-/ mas o conserva, diferentemente das demais línguas: lat. alte­
ra > cat. altre, mas port. outro, cast. otro, prov. autre, fr. autre; em outras posições,
ocorre a palatalização /1/ > /11/: lat. lacte > cat. llet; latinu > llati; linu > lli (“linho”);
lutu > llot (“lodo”).
No léxico, o português e o castelhano são conservadores; situados em territó­
rio periférico da România, mantiveram palavras como lat. comedere > port. comer,
cast. comer, lat. cuius > port. cujo, cast. cuyo; lat. percontari > port. perguntar, cast.

270 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


preguntar; lat. metiri > port. medir, cast. medir. Nas outras línguas românicas edere
ou comedere foi substituído pelo mais recente manducare (rom. minca, vegl. manon-
ka, fr. manger > it. mangiare, eng. manger, cat. menjar, prov. majuga e mangar, log.
mandigare e manigare)·, o mesmo aconteceu com cuius, percontari e metiri nas
outras línguas, menos no sardo, a mais arcaizante de todas, que conservou kuyu, pre-
guntare e medire.
A contribuição do superstrato germânico para a formação do léxico português
e castelhano é de cerca de 50 empréstimos apenas, enquanto no galo-romance os
empréstimos do franco somam em torno de 520 e no ítalo-romance há 200 do góti­
co e 280 do lombardo aproximadamente. Entretanto, o português e o castelhano
somam cerca de 4.000 empréstimos árabes, incluindo-se aí também os muitos já em
desuso; no italiano e no francês são bem menos numerosos, embora haja divergência
em relação a esses números entre os romanistas (ver pp. 164-165).
Na fonética, o português e o galego conservam o sistema de sete fonemas
vocálicos, encontrado também no catalão e no provençal, ainda que com menor niti­
dez e alcance fonológico, particularmente na oposição entre os pares / e / e / e / e / o
/ e / o /. Por manter clara essa distinção, o português e o galego desconhecem total­
mente a ditongação espontânea, comum no castelhano (lat.fera > cast. fiera, mas cat.
fera\ lat. centu > cast. cien, mas cat. cent\ lat. bonu > cast. bueno, mas cat. 6o; lat.
hortu > cast. huerto, mas cat. hortf, observe-se que na Ibéria apenas o castelhano tem
essa ditongação. A ausência dessa ditongação e a conservação das vogais finais, em
oposição ao catalão, fazem do português (e do galego em parte) a língua mais arcai­
zante dentre as línguas da região, caráter manifestado ainda pela manutenção da
denominada mesóclise, isto é, a colocação de pronomes oblíquos átonos entre os for­
mantes das formas do futuro do presente e do futuro do pretérito, {explicar-lhe-ei,
envia-lo-emos, apresentar-vo-lo-ão; atirar-nos-iamos, mandar-lhos-ia, contar-mos-
ias)·, essa construção, hoje de uso apenas literário, era perfeitamente normal antes
que se perdesse a noção de que essas formas eram compostas, de fato, de duas (infi­
nitivo + haver, como explicar lhe hei). O português manteve a mesóclise, mas o cas­
telhano, o catalão e o provençal, que a tinham em fases arcaicas, a eliminaram pos­
teriormente; no francês, a aglutinação dos dois formantes foi imediata, segundo o
confirmam os Juramentos de Estrasburgo·, salvarai, prindrai.
O infinitivo pessoal ou flexionado é hoje traço característico do português e
do galego (ver p. 242), mas existiu também no leonês do século XIII, no napolitano
do século XV e no sardo. Trata-se, portanto, de um traço bastante difundido na
România mas só mantido pelo português e pelo galego e cujo emprego, restrito de
início, foi-se ampliando e firmando sintaticamente, enquanto desaparecia nas outras
línguas e dialetos. Ainda no âmbito da morfologia, o português conservou as formas
do mais que perfeito simples do indicativo, encontrado também no castelhano e no

A ROMÂNIA I 271
provençal, mas inexistente no francês e no italiano, que contam apenas com as for­
mas compostas (fr.j'avais chanté, it. io avevo cantato - port. eu cantara e eu tinha
cantado).
A influência do ibero-romance sobre as outras línguas da Românica está rela­
cionada com fatos históricos, políticos e econômicos. Assim, o catalão e, posterior­
mente, o castelhano influenciaram o italiano, quando do domínio aragonês em
Nápolis e na Sicilia nos séculos X1II-X1V e a presença do castelhano na Itália nos
séculos XVI-XVII, como também na Sardenha (ver pp. 200-201). Datam dessa época
os empréstimos castelhanos ao italiano, por exemplo, cast. mozo > it. mozzo (“criado
de cavalariça”, “grumete”), lindo > lindo (“belo”), crianza > creanza (“educação”),
desenvoltura > disinvoltura (“desembaraço”), sociego > sussiego (“gravidade”). Na
morfologia, o italiano tomou emprestado o sufixo castelhano -illa > -iglia: cast.
manilla > it. maniglia (“algemas”), mantilia > mantiglia (“mantilha”), pastilla >
pastiglia (“pastilha”). Na literatura, várias comédias da primeira metade do século
XVI trazem numerosos castelhanismos, havendo mesmo autores que escreveram em
castelhano; a temática freqüentemente era espanhola, como as duas farsas de Iacoppo
Sannazzaro (1456-1530) sobre a conquista do reino árabe de Granada, o último redu­
to árabe na Espanha, em 1492, encerrando o longo período da reconquista.
Com as grandes descobertas, o português e o castelhano entraram em conta­
to com novas realidades e numerosos termos exóticos que as designavam; o prestígio
político, de que a Espanha dispôs nos séculos XVI e XVII, e nesse último também
literário devido ao gongorismo, facilitou a penetração de termos castelhanos em
outras línguas, como cast. bizarro > fr. bizarre, it. bizarro, port. bizarro (> bas. bizar,
“barba”); cast. camarada (< it. camerata) > fr. camarade, prov. camarada, port.
camarada (“colega de quarto”); cast .fanfarrón > port .fanfarrão, ív.fanfaron, it .fan-
farone; cast. barraca > it. baracca > fr. baraque; cast. corredor (de uma fortificação)
> fr. corridor, it. corridore > corridoio; cast. carapacho > fr. carapace, it. carapace,
port. carapaça. Dentre os americanismos, introduzidos na Europa através do caste­
lhano, citam-se cast. maíz (< taino) > fr. mais, it. mais, port. mais (al. Mais, ingl.
maize); cast. tabaco (< haitiano) > fr. tabac, it. tabacco, cat. tabac, port. tabaco (al.
Tabaky, cast. batata ou patata (< aruaque) > it. patata, port. batata, cat. batata, fr.
patate (batate no século XVI) (ing. potato, al. Batate, “batata-doce”); cast. cacao
(< nauatl kakauatl) > fr. cacao, it. cacao, port. cacau (al. Kakao); cast. chocolate
(< nauatl tschokoatl) > fr. chocolat, it. cioccolato, cat. xocolata e port. chocolate (al.
Schokolade); cast. tomate (< asteca tomatl) > fr. tomate, cat. tomaca, port. tomate (al.
Tomate)·, cast. canibal (caribe) > fr. cannibal, it. cannibale, port. canibal.
Os portugueses expandiram seus domínios também no Oriente, donde trouxe­
ram vários produtos e seus nomes, como sagu (malaio) > cast. sagu, it. sagit; port.
manga (do tamil, através do malaio) > fr. mangue, it. mango, cast. manga; port.

272 | E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
bambu (malaio) > cast. bambu, fr. bambou, it. bambu (al. Bambus (rohr)). Notável é
o termo banana, proveniente de uma língua africana da Guiné: o nome da fruta é
nana, e o ba- é um morfema gramatical, índice de pluralidade, mas anteposto; daí
banana significa “bananas”. Também alguns termos vernáculos portugueses passa­
ram a outras línguas; por exemplo, pintada > fr. pintade, cast. pintada-, port. feitiço >
fr. fetiche, cast. hechizo, ú.feticcio; port. crioulo > fr. créole, it. crèolo, cast. criollo
(al. Kreolé).
Segundo se vê dos exemplos dados, os termos trazidos pelos navegadores
designam coisas concretas, plantas, frutas, animais etc. e que se internacionalizaram.
Por outro lado, as línguas da Ibéria, convivendo num mesmo território, obviamente
se influenciam mutuamente através do comércio, do intercâmbio cultural, do turismo
e dos meios de comunicação. O catalão e o galego, cujos falantes são integrantes de
uma nação que tem o castelhano como língua oficial, estão mais sujeitas a influxos
sobretudo léxicos. No português, os empréstimos léxicos tomados ao castelhano no
decurso do tempo são muitos, dos quais são exemplos amistoso, apetrecho, camari­
lha, caudilho, castanhola, colcha, cordilheira, endechas, façanha, fandango, hedion­
do, mochila, neblina, novilho, pandeiro, pirueta, realejo, rebelde, trecho.
Essa breve incursão comparativa por entre os blocos das línguas românicas
mostra que a família não se desfez, mas mantém contatos permanentes entre si, umas
mais que outras, e com isso solidificam os traços de parentesco, perfazendo de fato
uma România “contínua”, integrada, conforme a visão de B. E. Vidos, especialmen­
te depois da relatinização do romeno. Cada língua, cada dialeto conserva suas carac­
terísticas, devidas a fatores diversos, expostos em linhas gerais no que ficou dito
neste trabalho; contudo, essas características próprias, mesmo nas que mais se dis­
tanciaram do tronco comum, não apagam a origem comum a todas, os traços funda­
mentais herdados do latim vulgar.

A ROMÂNIA 273
B ib l io g r a f ia

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Os textos dos autores gregos e latinos, transcritos no decurso deste trabalho, foram retirados das
edições criticas de The LOEB Classical Library, Harvard Univcrsity Press, ou dc Bcllcs Lcttrcs,
Paris, ou de B. G. Teubner, Stuttgart. Dada a convergência básica das versões, não nos pareceu
importante discriminar topicamcnte a fonte utilizada.

280 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Ín d ic e d o s

A u t o r e s C it a d o s

A Aribau, Caries, 230


Abad, Pedro, 238 Aristarco, 25; 50
Abbat, Per, 61 Aristófanes, 25
Afonso, Pedro, 220 Aristóteles, 17; 18; 28; 37; 127
Agostinho, Santo, 28; 126; 131; 142; 174; 177; Arnóbio, 55
178 Arriano, 20
Alfonso X, o Sábio, 168 Artur, rei, 143
Alibert, Louis, 215 Ascônio, 22
Alighieri, Dante, 31; 32; 39; 54; 57; 188; 198; Assis, Machado de, 54
211; 213; 224; 243 Assurbanipal, 148
Allard, Marcelino, 222 Atanásio, Santo, 178
Alonso, Amado, 231; 234; 257; 258 Ataulfo, o Godo, 38
Alvar, Manuel, 156 Ateneu, 20; 23; 37
Amafinio, 90 Atticus, T. Pomponius, 90
Andronico, Livio, 90 Aubanel, Teodoro, 214
Anthimus, 120
Apicius, 120 B
Apollinaris, Sidonius, 123 Bacon, Roger, 167
Aquiléia, Paulino de, 176 Baehrens, W.A., 52
Arghesi, Tudor, 191 Baiona, 220
Ballaudière, B. de Ia, 214 Carnéades, o Acadêmico, 23
Barbarus, Rustius, 116 Carvalho, Herculano de, 75
Barca, Calderón de la, 239 Castellani, A., 227
Bartoli, Matteo, 33; 73; 78; 82; 153; 180; 194; Cato, Marcus Porcius, 118
195; 196; 197; 208; 251; 262 Cato, Marcus Publius, 90
Basal ú, Raimon Vidal, 211,212, 213, 229 Catulo, 92
Battisti, Cario, 204; 208 Cavenaile, R., 116
Bec, Pierre, 215; 231 Cervantes, Miguel, 239
Bekker, E., 47 César, Caio Júlio, 56; 92; 103; 104; 105, 109,
Bembo, Pietro, 188; 198 146, 164, 170, 172,210,217
Benkner, Hans, 190 Cèsare, A., 198
Bentley, Richard, 44 Cesaréia, Eusébio de, 101
Berceo, Gonzalo de, 239 Chiampel, Durich, 205
Bernardes, Manuel, 53 Chrysolora, Emmanuel, 28
Bertoldi, Vittorio, 33; 156 Cícero, MarcosTúlio, 19; 20; 21; 44; 45; 66; 90;
Bertoni, Giulio, 33, 70 91; 92; 95; 98; 100; 116; 117; 172
Bibliander, 29 Címpulung, Nea§cu de, 190
Bifrun, Giachem, 205 Cipião, o Africano, 88
Biondelli, Bernardino, 194; 196 Cipriano, São, 52; 55; 174
Boccaccio, G., 39; 188; 198; 211 Cirene, Sinésio de, 24
Boeckh, August, 36, 59 Cláudio, Apio, 116
Boethius, A. M. S., 28; 45; 216 Coeurdoux, 30
Boleo, Paiva, 73 Colebrooke (gramát.), 30
Bopp, Franz, 30; 31; 32; 35; 63 Colloredo, Ermes de, 207
Bom, Bertran de, 212 Columella, L. I., 118
Borneilh, Girault de, 212 Condi Mac, 30
Bottiglioni, Gino, 73 Coresi, o Diácono, 163; 191
Bouda, K„ 156 Coromines, Joan, 228
Bourciez, Edouard, 231 Costa, Cláudio Manuel da, 45; 51
Brentano, 40 Cotgrave, Randle, 29
Briançon, Laurent de, 222 Creangã, lon, 191
Brinkmann, 76 Croce, Benedetto, 33; 78
Brugmann, Karl, 159 Cubich, Giambattista, 194; 196
Brunet, João, 214 Curtius, Georg, 31
Budé, Guillaume, 29
Burdigalensis, M. E., 119 D
Daniel, Arnaut, 2 12
C Darmesteter, Arsène, 82
Calepin, 29 Dauzat, Albert, 78
Calímaco, 21 Dessau, Η., III
Calinescu, George, 191 Diácono, Paulo, 145; 176
Calvenzano, G. Antoni, 206 Diehl, E„ 111; 114
Câmara Jr., J. Mattoso, 36; 39; 163; 204 Diez, F rie drich, 32; 33; 51; 63; 64; 76; 146; 178;

Camões, Luiz Vaz de, 54; 187; 243 208; 231


Capella, Martianus, 28 Diógenes, o Filósofo, 23
Caragiale, Ion Luca, 191 Diversi, Filippo, 193

282 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Donatus, Aelius, 116; 186; 213 Gamillscheg, E„ 160; 195; 204
Dositeu, Magister, 132 Gamurrini, I. Fr., 121
Duarte, Dom, 243 Gardette, P., 209; 221
Dubois, J., 29 Garros, Pey de, 214
Gartner, Theodor, 208
E Gelli, Giambattista, 198
Ekwall, Eilert, 78 Gellius, Aulus, 117, 118
Elckoc, W. D„ 165 Gelzer, H„ 195
Elia, Silvio, 204 Geyer, P, 120
Emiliano, Cipião, 102 Giéra, P, 214
Eminescu, Miliai, 191 Gilliéron, Jules, 33; 71; 72; 83
Empiricus, Sextus, 23 Giordani, R, 198
Ênio, 22; 25; 90 Giuglea, G., 257
Epifânio, Santo, 178 Giustiniani, G., 194
Eratóstenes, 20; 21; 22; 25; 26; 29; 36 Godolin, Pèire, 214
Escalígero, José Justo, 28, 37; 44 Goetlie, 32; 35; 54
Escalígero, Júlio César, 28, 37· Gonzaga, T. Antônio, 51
Espanha, Teodulfo da, 176 Grappin e Cassas, 194
Estienne, H., 29 Grimm, Jacob, 31; 32; 63
Estóicos, 17 Guerra, G. de Matos, 45
Estrabão, 20; 101; 152 Guilherme, duque da Aquit., 212
Eunapius, 27, 140
Eurípedes, 25 H
Eutrópio, 105; 188 Hall, R. A., 227
Ewert, A., 227 Haller, J. T„ 203
Hamilton, A., 30
F Heinsius, Nicolás, 44
Faidit, Gaucelm, 212 Herder, J. G.von, 40
Farlati, 194 Herédia, José Maria, 45
Fauriel, 30 Hermogenes (arquit.), 118
Felix, M. Minucius, 52; 55; 174 Heródoto, 148
Fibonacci, L., 166 Hesiodo, 25
Foix, Gaston de, 214 Hjelmslev, Louis, 67
Foncasio, Jacopo, 207 Hobbes, 30
Fontanus, 52 Holtz, Louis, 48
Forster (gramát.), 30 Homero, 25; 54; 90
Fõrsterniann, E.W., 72 Honnorat, 215
Fourès, Augusto, 215 Horácio, 92; 97; 123
Foxa, Joffre de, 2 12; 2 13 Hubschmid, Johann, 156
Franceschi, T., 73 Humboldt, 30; 78
Franco, Caio de Melo, 45 Huss, R., 257
Fredegarius, 135
I
G lordan, lorgu, 257
Gabriel, Stefan, 206 Iroaie, P, 257
Galhard, A., 214 Isocrates, 19

IN D IC E DOS A U T O R E S C IT A D O S I 283
J Lucio, Giovanni, 196
Jaberg, KarI, 73; 76 Lücking, G., 227
Jacme, Joan, 229 Lucrécio, 43; 92
Jâmblico, 27 Ludolf, Job, 29
Jerônimo, São, 124; 126; 186 Liidtke, H„ 257
Joinville, 227
Jones, William, 30 M
Jordanes, 146; 178 Machado, Elza, 61
Jud, Jakob, 73; 76; 195; 208; 209; 265 Machado, José Pedro, 61
Juvenal, 123 Maior, Petru, 260
Maiorescu, Títu, 191
K Malos, Crates de, 25
Kõrting, G., 32 Manzoni.AL, 199; 264
Koschwitz, E., 227 Marcelino, Amiano, 140
Kroll, H„ 77 Marcial, 45; 123
Krusch, B., 135 Mário, 104
Kiibler, A., 52 Martínez, E. M„ 36
Matius, Caius, 134
L Matoré, G., 84; 85
Lachmann, KarI, 43; 44; 46; 50 Maurer, Th. Henrique, 96; 204; 265, 268
Lambino, Dionísio, 44 Maurus, Terentianus, 123
Largo, Escribônio, 119 Meier, Harri, 231
Latino, Discórides, 119 Meillet, A., 96; 224; 225
Latino, Oribásio, 119 Meringer, Rudolf, 74; 76
Laurian, A. T., 261 Merlo, Clemente, 77; 195; 197; 262
Lausberg, H., 36 Meyer-Liibke, 32, 33, 64, 66, 78, 136, 194, 195,
Leclerc, Jean, 44 231,233,250
Lefèvre, 29 Mésiger, J., 29
Leibniz, 30 Miazzi, M. L. R, 195
Lélio Herma, 20 Micu, Samuel, 260
Leopardi, G., 198 Miklosich, R, 77
Lerch, Eugen, 70 Mistral, Frederico, 214; 215
Lisânias, 21 Mitzka, W„ 70
Lindsay, W. M„ 127 Mommsen, Th., 111
Lipsio, Justo, 44 Morandi, Luigi, 76
Livio, Tito, 90; 101; 103; 185 Monfort, Simon de, 213
Llorach, E. Alarcos, 46 Morf, H„ 209
LluII, Ramon, 229 Miiller, Max, 46; 63
Locke, 30 Musa, Muhammad Ibn, 166
Lodi, Uguccione da, 198 Musafin, A., 194
Loiola, Inácio, 154
Longinus, Cassius, 20, 23; 27; 29, 36 N
Lopes, Fernão, 243 Nascentes, Antenor, 165
Lot, R, 227 Navarro, Tomás, 73; 74
Lõwe, G., 127 Nebrija, A., 29
Lucilio, 90 Nepos, Cornelius, 26

284 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Névio, 90 Postei, G., 29
Nigidius, 117 Pott, A. Fr., 77
Nitardo, 227 Pratextatus, L. Ateius, 20, 21, 22,25, 26, 27, 29,
Núrsia, S. Bento de, 126 37, 53
Prisciano, 116
O Probus, Valerius, 117
Olivet, Fabre d’, 211 Proclus, 27
Oller, Narcis, 230 Procópio (liist.), 146
Orígenes, 27 Pseudo-Apuleio, 119
Orósio, Paulo, 38; 177, 178 Pseudo-Teodoro, 119
Ovidio, 50; 92; 162 Ptolemeu, Cl., 21; 146
Pugcariu, Sextil, 73; 195
P Pulcher, Claudius, 117
Paracelsus, 167 Pult, Caspar, 204; 208
Paris, Gastou, 52; 78; 178; 227
Parodi, E. Giacomo, 209 Q
Pasquali, G., 43 Quatrcmère, 30
Patccchio, Gerardo, 198 Quilon, 18
Pegulhan, Aimeric de, 212 Quintiliano, 90; 109; 117; 184; 186
Peixoto, Afrânio, 45; 51 Quíron, 118
Pelágio, 149
Pellis, Ugo, 73 R
Perbosc, A., 2 15 Rabirio, 90
Peres, Víntara, 150 Radulescu, Heliade, 261
Petrarca, F„ 39; 45; 53; 188; 198; 224 Rask, Ramus, 31
Petronius, Arbiter, 56, 123 Rémusat, 30
Petrovic, Emil, 73 Renan, Ernest, 36; 59
Philippide, A., 170 Renato, Vegécio, 118; 161
Pidal, R. M., 61; 231; 233; 259 Rhodius, Apolonius, 21
Pisa, Pedro de, 176 Ribezzo, F., 101
Placentino, Antonino, 121 Riquier, Guiraud, 212
Pergine, S. P. Bartolomei de, 207 Riva, Bonvesin de Ia, 198
Pitarra, 230 Rochegude, 211
Platão, 17; 18; 19; 27 Rohlfs, Gerhard, 197; 219; 231
Plauto, 90; 113 Ronjat, Jules, 215; 216
Plínio, G. S„ 119; 141; 146 Roques, Mário, 71
Plotino, 27 Rosa, J. Guimarães, 56; 57
Plutarco, 20; 22, 23, 37 Roumanille, J., 214
Políbio, 101, 104 Rudel, Jaufre, 212
Porfirogeneta, C., 193
Pollio, Gaius Asinius, 109, 185 S
Pollio, Vitruvius, 118 Sacy, Silvestre, 30
Pompeu, 104; 108 Sadcaru, F. L., 257
Pop, Sever, 73; 194, 257 Sadoveanu, Mihail, 191
Porfírio, 26 Sahlgren, Jõran, 78
Possídio, 142; 178 Saint-Barthélemy, Paulin, 30

ÍNDICE DOS AUTORESCITADOS | 285


Salmanassar, 148 U :
Salústio, 20; 92 Ulilig, Gustav, 47; 48
Salvioni, Cario, 77; 204, 208
Sanchez, Francisco, 29 V
Sannazzaro, I., 272 Valkhoff, M„ 33; 164
Sassetti, Filippo, 30 Vaqueiras, Raimbaut de, 212; 220
Saumaise, Claúdio de, 28; 37 Varchi, Benedetto, 198
Saussure, Ferdinand de, 33-35; 36; 63; 67 Varrão, M.T., 19; 116; 118
Schleicher, Alberi, 30, 82, 153 Vasconcellos, C. Micháelis, 64
Schlegel, August, 30, 31 Vasconcelos, J. Leite, 236, 248
Schmidt, Johannes, 33; 81 Vaugelas, 30; 54
Scliolz, G„ 257 Vega, Lope de, 239
Schuchardt, Hugo, 74; 75; 76; 78; 81; 194, 248, Ventadour, Bernart de, 2 12
256, 259 Verona, Giacomino da, 198
Schürr, F„ 204; 209 Viana, Gonçalves, 244
Sechehaye, Albert, 34 Vicente, Gil, 50; 187; 243
Sêneca, L. Annaeus, 21; 22; 25; 243 Viciu, A„ 257
Sevilha, Izidoro de, 28; 126 Vico, Giambattista, 30; 78
Shakespeare, 54 Vidos, B. E„ 208; 231; 258; 259; 273
Silas, 104 Vidossi, G., 73
Silva Neto, Serafim da, 77; 165; 204 Vilanova, Arnau de, 229
§incai, George, 260 Villar, Mauro, 247
Sittl, K„ 52 Villehardouin, 227
Skok, Petar, 195 Vinidário, o Godo, 120
Spitzer, Leo, 70; 85 Virgílio, 22; 50; 54; 92; 114; 116
Estobeu, 20; 24 Vossler, Karl, 33; 68; 69; 70; 78
Suchier, H., 222; 227
Suetônio, G.T., 20; 21,24, 25; 26; 27; 105; 109 W
Wagner, M. L„ 156; 200
T Wallenskõld, A., 227
Tácito, Cornélio, 101; 123; 146 Wartburg, W„ 33; 67; 69; 70; 72; 156; 186; 208;
Tagliavini, Cario, 36; 71; 193; 197; 204; 208; 209
223; 238; 251; 257; 262 Weigand, Gustav, 70; 7 1
Tavan, Afonso, 2 14 Wenker, Georg, 70; 7 1
Taveiroos, P. S., 187 Wessex, Ecbert de, 143
Teodósio (século VI), 120 Whitney, W. Dwiglit, 82
Teofrasto, 18 Wilkins, 30
Terracini, Benvenuto, 73 Wilson (dicion.), 30
Tertuliano, 169; 174 Wolf, Friedrich August, 30; 34
Tierbach, A., 209 Wrede, Ferdinand, 70
Toppolet, Ernest, 77 Wundt, Wilhelm, 68
Tours, Gregório de, 135
Trácio, Dionisio, 34; 47; 52 Z
Travers, Gian, 206 Zauner, A., 33; 77
Trier, J„ 84; 85 Zenão, 24
Tucídides, 58 Zorutti, Pietro, 207

286 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Ín d ic e T e m á t ic o

A nomenclatura ár. no port., 165; 166


das províncias, 106; 107; 108, 109
ACADEMIA funções, 106
de Carnéades, o Acadêmico, 23 organização, 107; 108; 109
delia Crusca, 188; 198 suporte da unidade do lat. vulg., 171; 184
Real Espanola, 239 terminologia gót. na Itália, 158; 160

ADJETIVO ADSTRATO
analitismo nos graus do lat. vulgar., 93 árabe superposto, 149; 164
diminutivos afetivos, 97 árabe na Ibéria, 148; 149; 164
empréstimos do ár., 165; 166 empréstimos, 165; 166; 167; 168
empréstimos germ., 157 basco, do cast., 155; 236
graus na Peregrinatio, 122 cat. e cast., do sardo, 201
sufixo gr. Λσκος, 159 condições, 163; 164
sufixo germ. -iska, 159 criação de Valkoff, 33
definição, 163
ADMINISTRAÇÃO justaposto, 164
árabe, 148 latino, do rom., 171; 260
lat., língua da Húng., 190 produtividade, 170
lombarda na Itália, 158; 159 rom.: turc., Iiúng. gr., alb., 169; 170
ver parastrato ALBANÊS
/Ae/ > /e/, 114; 115 afinidade léxica com o rom. e o dalrn., 161; 170
ver “monotongação” empréstimos ao rom., 170
semelhanças com o dalm., 195
AFÉRESE simbiose com o rom., 170
de /g/ e /j/ iniciais no cast., 235; 236 substrato ilirio-trácio, 170

ÁFRICA ALBIGENSES
bibliotecas, 109 hereges, 213
centro do pensamento cristão, 174 ligados à decadência do prov., 213
colônias romanas, 102 reflexos na Ibéria, 267
conquistada por portugueses e espanhóis, 150; 181
domínio árabe, 148 ALFABETO
guerras pímicas, 102 cirilico no rom., 190
inscrições, 111 substituição pelo latino, 191; 260; 261
italiano, língua franca da Líbia, 199 cirilico e russo no moldavo, 192
ligação com a Sardenha, 200 cirilico no eslavo, 189
perda da tradição lat., 152; 258 etrusco, origem do latino, 100
perdas na România Medieval, 180; 181 grego, base do etrusco, 100
província romana, 88; 102 grego em documentos sardos, 202
Proconsularis, 106 em papiros do Oriente, 115
reino dos vândalos, 141; 180; 181 substituição do gótico pelo latino na Espanha, 271
“Tabellae Albertini”, 124
“Tabellae Defixionum”, 113 AL-GHARB, 151
teatros, 108
“vico capitis Africae”, 53 ALGHERO
bilingüismo, 231
AGLUTINAÇÃO enclave cat. na Sardenha, 203
do artigo no ár. ibérico, 165
AGRICULTURA
ÁGUA colônias agrárias, 105
abastecimento, 108 terminologia agrícola latina no sardo, 200
“curadores aquarum”, 108 tratados, fontes do lat. vulg., 118
serviços nas Províncias, 108
serviços cm Roma, 108 AGRI DECUMATES, 102; 139; 179

ALAMANOS ALJAMIA
influência na Récia, 145; 205 “língua estrangeira”, 163
território, 145 romance ibérico, 149
território invadido, 145
vencidos pelos francos, 145 ALPENROMANISCH, 204

ALANOS AMERICANISMOS
aliados dos vândalos, 141 no. cast., 272
na Lusitânia, 141 nas línguas européias, 272
relação com os eslavos, 146 no port. do Brasil, 247

288 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
AMTSSPRACHE, 204 AQUITANIA
denominações, 217
ANDALUZ pátria do I° trovador, 212
atlas, 73 província romana, 217
conquista romana, 102 território, 2 1 7 ; 218
influência árabe, 235 sede do reino visigodo, 223
origem do andaluz moderno, 235; 236, 237 Sílvia da Aquitânia, 121
origem de “Andaluzia”, 141 ver Novêmpopulania e Vascônia
território em parte port., 151
AQUITANO
civilização aquitano-pirenaica, 219
ANGEVINO
gascâo-bearnês (Ronjat), 217
dialeto fr„ 225
território, 217; 218
território, 225

ÁRABES
ANGLOS conquistas, 148; 149
na Britânia, 143 domínio na Sicilia, Sardenha e Córsega, 151; 200
empréstimos léxicos, 152; 164
ANTROPÔNIMOS domínio na Ibéria, 164; 165; 166; 167; 168
bascos no cast., 154 empréstimos, 164; 165; 166; 167; 168
francos e godos, 157 domínio no norte da África, 181
lombardos, 157 quebra da tradição lat., 258
nomes de povos no celta em -iscas e -ardo, 159; expulsãp da Ibéria, 234
160 história do povo, 147
origem, 147; 148
APARATO CRÍTICO Maomé e o islamismo, 148
na edição crítica, 60 Província romana da Arábia, 148
resultado da collatio, 45 reinos na Ibéria, 234
relações com os ibéricos, 151
APÓCOPE
das consoantes finais na Romênia, 254 ARAGONÊS
-conseqiiências, 254 caráter pirenaico, 257
do /e/ em fr., 226 dialeto espanhol, 237
do /e/ e /o/ no cat. e no prov., 231; 232 língua do reino de Aragão, 150; 151
do /m/ do acus., 114; 115; 132 na Sicilia, Sardenha e Nápolis, 150
do /t/ dos verbos, 112; 115 território, 237
de vogal no cat., 270 união ao Condado Barcelonês, 150
de vogal no gasc., 72
ARAUCANO
de vogais no fr., 265
língua falada no Chile, 239

APPENDIX PROBI
AR1BI ou ARABU, 148
“Appendix ad Probum", 51; 55
autoria, 5 1; 52 AROMENO, 192
dados, 55; 65; 91; 97; 117; 135
datação, 52 ARQUITETURA
o que é, 51 nos teatros, 108

ÍNDICE TEMÁTICO | 289


tratados, fontes do lat. vulg., 118 ASTÚRIAS
técnica romana no abastecimento de água, 108 reino cristão, 150
torna-se reino de León, 150
ARTIGO
aglutinado pelos berberes, 165 ATLAS
criação do lat. vulg., 137 Atlante Lingüistico Italiano, 73
definido Atlas Linguistic de Catalunya, 73
no gasc. eth e era, 2 19 Atlas Linguístico y Etnográfico de Colonibia, 74
no port. e gal. sem /I/, 241 Atlas Lingüistico de Portugal, 73
posposto no rom., 137; 262 Atlas Linguistique de Ia France, 71
no sardo, de ipse, 203 Atlas de Ia Península Ibérica, 73
época do aparecimento, 185 Atlasul Linguistic Român, 73
primeiros exemplos, 189; 190 Atlas regionais, 73
formas em, 193; 243 Deutscher Sprachatlas, 70
ille e ipse como art., 95; 122 fontes de estudos e métodos, 33
indefinido Linguistischer Atlas des dacorumãnischen
nas Glossas EmiUanenses, 132 Sprachgebiets, 70
na Peregrinatio, 122 produto da geografia linguística, 33; 71
no port. e no gal., 242 Saggio di Atlante Lingüistico delia Sardegna, 73
partitivo Sprach- und Sachatlas Italiens und Südschweiz, 73
no it., 69
no lat. vulg., 69; 95 AURUM >orum, 117
produto do “Zeitgeist”, 69 ver “monotongação”
no rom. e no sard., 69
AUTENTICIDADE
do Appendix Probi, 5 1
ASPIRAÇÃO
apócrifos, 51
das consoantes surdas no toscano, 256
das Cartas Chilenas, 5 1
/f/ > /h/ no bas., cast. c gasc., 155; 218
problema filológico, 50; 51
inexistente do /h/ no lat. vulg., 114
inexistente em empréstimos germânicos, 157
AVALIAÇÃO CRÍTICA
influência germ. nas inscrições, 114
parte da crítica histórico-literária, 56
influência franca no fr., 157
“gòrgia toscana”, 256
"ΑΝΩΘΕΝ, 58; 59

ASSIMILAÇÃO ' ΑΠΑΞ


do /-c-/ do grupo l-ct-l (hápax), definição, 58
no Ramo Ocidental, 253
no balcano-romance, 262
no ítalo-romance, 265 B
no sardo, 256
do /1/ do artigo árabe, 165 BeV
nâo-assimilação do /n/ nos glossánós, 130 confundidos em Portugal, 246
distintos no Brasil, 246
ASTRONOMIA indistinção, 115; 132
contribuição léxica árabe, 166 em Oribásio, 119

290 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


na Tabellae Alberi ini, 125 BERBERES
no Glossário do Vaticano, 130 aglutinavam o artigo ár., 165
nas Glossas Eniilianenses, 132 consoantes enfáticas, 200
lenizaçâo (b > v) no imperfeito indicativo, 255; 256 origem africana, 156
v > b no gascão, 219
no Cid, 238 BESSARÁBIA
características da língua, 192
BALAROS, 201 localização, 192
parte da Moldávia, depois território russo e ro­
BALEARES meno, 192
anexadas por Carlos Magno, 149
conquistadas por Jaime I, 150; 229 BÍBLIA
dialeto catalão, 229 de Jerusalém, 59
domínio aragonês, 201 linguagem, 55
primeiro livro impresso, 54
BARBARIES tradução de S. Jerônimo, 126
sinônimo de “rusticitas” em Aulus Gellius, 117 características vulgares, 126
traduções para o cat., 229
BARBARISMO tradução do Novo Testamento para o rético, 205
condenado pelos gramáticos, 116
BIBLIOTECAS
considerados como barbarismos
de Alexandria, 21
/-nd-/por/-nn-/, 154
no Império Romano, 108
/-h-/ por /-f-/, 155
de Karlsruhc, 127
no Glossário de Kassel, 129
de Pérgamo, 25
galicismos e latinismos em Dante Alighieri, 198
a primeira de Roma, 109
galicismos eliminados do prov. por F. Mistral,
do Vaticano, 129
214
galicismos no rom., 268
BIZANTINOS
abandonaram Alexandria, 148
BARBARUS
adstrato no balcano-romance, 147
origem e significado, 140 destruíram o reino vândalo na África, 141
domínio na Romagna, 40
BASCO
fanariotas na Romênia, 169
adstrato do cast., 235; 236
influência no rom. 189; 258
diminuição do território, 180
presença na Sardenha, 200
onde é falado na França, 226
representante da civilização megalítica, 210 BILDATLAS, 76
semelhanças lingülsticas com o sardo e o gas­
cão, 200; 201 BILINGÜISMO
território, 180 em Alghero, Sardenha, 231
no Brasil, até século XVIII, 247
BATAVOS entre os bretòes, 226
colônias na Gália, 140 celta-latim, 153
fase da implantação do latim, 152; 186
BÁVAROS franco-romance, 157
conquistadores da Rccia II, 205 germânico-romance nas Gálias, 211

ÍN D IC E TEMÁTICO | 291
ibérico-latim, 153 C
ístrio-romano, 192; 258
dos moçárabes, 235 CACUMINAIS
osco-latim, 152; 153 exemplos no sardo, 156
no Paraguai, 239 extensão territorial, 101; 156; 197; 201
na Récia (Constança), 204; 205 origem, 101
romance-árabe na Ibéria e na Sicilia, 163; 164 tipo de fonema, 101
entre os valões, 225
CAMOX, 156
BOÉCIO (BOETHUS)
códices De Consolatione Philosophiae, 45 CAMPIDANÊS
poema em provençal, 211 características, 203
dialeto sardo, 202
BRASIL “condaghi” em campid., 202
descoberta, 181; 244
diferenças semânticas léxicas entre Brasil e Por­ CAMPOS
tugal, 247; 248 “de força”, 84
empréstimos léxicos tupis e africanos, 247 linguísticos de Trier, 84; 85
fonemas nasais, 245 “notionnels”, 84
influências francesas, 270 “Wortfeld”, 84
o port. do Brasil, 244; 245; 246; 247; 248
CANADÁ
BRETÃO implantação do fr., 181
afim do címrico e córnico, 226
bilingüismo, 226 CANTAR DEL MIOCID
expulsão para a Armória, 143 comentário linguístico, 238; 239
lenda do rei Artur, 143 composição c divisões, 238
onde é falado na França, 226 língua, 187; 238; 239
variedade do céltico insular, 180; 226 texto (excerto), 238
tipo de verso, 238
BRITÂNIA
abandono pelos romanos, 143 CARJAS, 149; 237
conquistas e latinização, 89; 143
grau de latinização, 152; 179 CARTAGO, CARTAGINESES
invasões dos anglos, escotos, jutos, pictos e sa- cartagineses na Sardcna, 200
xões, 143 guerras púnicas, 25; 88; 102
serviços romanos de água, 108

BURD1GALENSE (Itinerarium), 120 Chilenas


autoria, 51
BURGÚNDIOS
circunstâncias, 53
decadência, 221
de Neac§u de Cimpulung, Γ documento em ro­
sem pré-romanização, 223
meno, 190
superstrato do franc.-prov., 221; 222; 223
Zaratinas, 196
superstrato na Provença, 210
território, 210 “CASINHAS VAZIAS”
ΒΗΤΑ (Eratóstenes), 21 conceito estruturalista, 155

292 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


preenchidas por elementos desconhecidos do nas escolas, 230
substrato, 155 fases da língua, 229
história externa, 228; 229; 230; 231; 232; 233; 234
CASTELHANO influência do cast., 229
adstrato superposto ao sardo, 201 influência do prov., 231; 232; 270
Cantar dei Mio Cid, 237; 238 língua “hispânica pirenaica”, 234; 257
causas da diferenciação no contexto ibérico, 236 origem do nome, 228
conservador no léxico, 270 pan-ibero-romance, 233
contribuição léxica das línguas americanas, 239 papel na România Contínua, 259
dialetos continentais, 236; 237 a questão catalã, 231; 232; 233; 234; 257
dialetos crioulos nas Filipinas e em Curaçao, origem da idéia da România Contínua, 257
182;239 a Renaixença, 230
ditongação espontânea, 271 Rosselló, 230; 231
documentação, 237; 238; 239 território, 228; 230
empréstimos unidade da língua nos séculos XII a XV, 187
árabes, 164; 165; 271 uso da “langue d’oc” na literatura, 229
franceses, 267 volta do caráter oficial da língua, 230
germânicos, 271
ao italiano, 272 CAUPONES, 109
às línguas românicas, 272; 273
ao português, 273
CELTA
ao sardo, 201
adstrato do latim, 170
estudos do cast. ant. por Diez, 32,
bretões, 180
expansão da língua, 181; 182; 183
gauleses, 210; 223
/f/ > /h/, 155; 232; 234; 236
grau de cultura, 257
história externa, 234; 235; 236; 237; 238; 239
povo da cultura do ferro, 210
latinização, 236
substrato e superstrato do lat. e do romance,
oficialização da língua, 239
170; 171
origem do nome, 235
substrato do it., 196; 251
papel na România Contínua, 259
substrato nas Gálias, 223; 265
sefarditas, 183; 237
tempo de uso nas Gálias, 210
substrato c adstrato ibérico e basco, 236
substrato cântabro, várdulo, autrigâo, 236
CENTURIAE, 103
território, 235; 236

CATALÃO CHAMPANHES
adstrato superposto ao sardo, 201 atlas lingüístico, 73
características, 231; 232; 233; 234 dialeto francês, 225
cast., língua oficial, 230 nas primeiras crônicas, 224
Catalunya Francesa, 231
conquistas ao sul, 229 CHANSON
conservação do /1/ no grupo /It/, 270 de gestes, 227
dialeto para F. Diez, 249; 250 de Roland
dialetos, 231 data, redações, 227
diferenciação no contexto ibérico, 231; 270 língua, 187; 227
documentação, 229; 230 de Sainte-Foy d’Agen, 212

ÍNDICE T E M Á T IC O I 293
CHARTE COLLATIO CODICUM
tipo de documento, 220 definição, 45; 46
procedimento, 46
CHURWÀLSCHE
o rético (F. Diez), 208; 250 COLLEGIA MERCATORUM, 110

CÍMRICO, 180; 226 COLÔMBIA


Atlas Linguístico y Etnográfico, 74
CIRCUNSTÂNCIAS
“yeismo” pouco difundido, 239
tópicos da crítica histórico-literária
local, 53
COLÔNIAS
o que são, 53
de bárbaros, 140
/-CI-/ > /-ch-/[k], rom., 190
civis, 105; 106
/-cl-/ e /-li-/ > /-j-/, cast., 232; 234
tipos, 105
> /-II-/ cat. e prov., 232
direitos, 105
moçár., 235
gregas no sul da Itália, 100; 101
CLASSIFICAÇÃO importância, 106
militares, 104; 105
das línguas românicas, 196; 248-260
de C. Tagliavini, 251 -na Dalmácia, 142
de F. Diez, 249; 250 primeiras na Itália, 88
de Matteo Bartoli, 251 de saxões na Transilvânia, 161
de Meyer-Liibke, 250; 251
tentativa de Schuchardt, 248; 249 COLUMNATIO, 108
blocos rontânicos, 249; 260-273
critério de F. Diez, 250 COMBINAÇÕES
a România Contínua, 256; 257; 258; 259; 260 prep. + art. no port. e gal., 241; 242
critérios culturais, 256; 257; 258
complementação de B. E. Vidos, 258; 259 COMÉRCIO
fator de latinização, 110
CODEX entre a Itália e Dalmácia, 262
apógrafo, 46 importância, 110
arquétipo, 46 período de decadência, 139
autógrafo, 46 profissionais do ramo, 109
definição, 44 Veneza no Adriático, 262
“descripti”, 45
“interpositus”, 46 CONCILIA PLEBIS TRIBUTA, 88
leitura do “unicus”, 48
“plurimi”, 44 CONCÍLIOS
subarquétipo, 46 de Mogúncia, 38
“unicus”, 44 de Rei ms, 38
de Tours, 38
CO-DIALETOS fim do lat. vulg., 173
características, 248 línguas faladas na Europa medieval, 93
guadramilês, 248 texto do art., 172; 173; 185
mirandês, 236; 248
riodonorês (rionorês), 248 CONDAGHI, 209

294 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMANICA


CONJUNÇÕES Reforma de Cluny, 176
coordenativa et, 96 Renascença Carolíngea, 176
pouco usadas no lat. vulg., 96 desconhece “filólogo”, 28
influência
CONSPECTUS SIGLORUM na formação do port., 174
da edição crítica, 60 nas inscrições tumulares, I 14
no rét., 209
CONTRAÇÕES latim cristão
prep. + art. no port. e gal., 241; 242 características, 172; 174; 175
de pronomes em Portugal c no Brasil, 246 centros de difusão, 174
fases, 174
CÓRNICO, 180; 226 substituto do grego, 174
latim eclesiástico
CORPUS difere do vulg., 172
Glossariorum Latinorum, 127 herdeiro do literário, 172
Thesaurus glossarum emendatarum, 127 e lat. medieval, 175; 176
Inscriptionum Latinarum nova mentalidade, 28; 175
edição, 111 propagação entre os pobres, 114; 175; 176
exemplos, 112; 113 textos cristãos, 125
o que é, 111
Inscriptiones Latinae Christianae, I 12 CRÍTICA
Inscriptiones Latinae Selectae, 112 avaliação final do trabalho filológico, 56
Papyrorum Latinarum, I 16 conjetural na “emendatio”, 48
histórico-literária, 51-57
CORRELAÇÃO DOS TEMPOS textual, 44-51
inexistente no lat. vulg., 95; 96 textual nos séculos XVIII e XIX, 31

CORSO CRITÉRIOS
características, 197 dc classificação das línguas românicas
dialeto toscano, 197 de F. Diez, 249; 250
fr., língua oficial, 197 dc M. Bartoli, 251
variedades dialetais, 197 linguísticos da divisão da România em Ociden­
tal e Oriental, 251; 252; 253; 254; 255; 256
CRIOULO avaliação, 256
cast. nas Filipinas e em Curaçao, 182; 183; 239; internos e externos no trabalho filológico, 48;
248 51; 54
texto em papiamento, 182 da România Contínua, 256;#257; 258; 259; 260
cast, e port. no Oriente, 182
port. na África, 244 CRUSCA
port. na Ásia, 244 Accadenda, 198
taki-taki, ingl., 248 expressão burlesca, 198
ligação com a “questione delia língua”, 198
CRISTIANISMO Vocabulário, 199
autores cristãos, 126; 174
contribuições linguísticas, 125; 174; 175 CULINÁRIA
decadência do lat. entre o clero, 28; 176 tratados, fontes do latim vulgar, 120

ÍN D IC E T E M Á T IC O J 295
CURA URBIS, 108 história externa, 193; 194; 195; 196
influência do vêneto, 195
CURATORES AQUARUM, 108 passiva com fieri, 263
substrato trácio-ilírio, 170; 262
território, 180; 193
D
DATAÇÃO
/D/ - /I/ do Appendix Probi, 51
intercâmbio, 65 do Odavins, 52
causa, 65 em que consiste, 52

DÁC1A DECALQUES
abandono pelos romanos, 188 alemães sobre o latim, 171; 172
arcaísmos e sua causa, 184 alemães sobre o francês, 172
colônias, 105 ficatum sobre συκω τόν, 134
grau de latinização, 188 latinos cristãos sobre o grego, 125; 174
latinização rápida, 105; 257 em línguas ocidentais, 172
Maluensis e Ripensis, 170 sobre o grego em Dioscórides Latino, 119
parte do império bizantino, 136
parte da România, 180 DECLINAÇÕES
província romana, 102; 188 confundem-se 2“ e 3a no lat. vulg., 114
região românica isolada, 136; 189 confusão entre nominativo e acusativo, 115;
relatinização, 136; 261; 268; 269; 270 119; 120; 121; 129; 134
desaparecimento
DACO-ROMENO, 191 no Glossário de Kassei, 129
nas Glossas Emiiianenses, 132
DALMÁC1A dois casos no galo-romance, 233
domínio do vêneto, 195 reduzidas no lat. vulg., 92
estratos estudados por Matteo Bartoli, 33; 251 no romeno, 261
evolução ocidental, 180 substituição por preposições, 92; 120
latinização, 257
parte do Império do Ocidente, 261 DEPOENTES, 94; 116; 124
parte da România Medieval, 180 ver“verbo”
Praevalilana, 180
DESPALATALIZAÇÂO
DALMÁTICO do /-IIW, 153
afinidade com o balcano-romance, 170; 195; ver “yeismo”
262
afinidade com o reto-romance, 262 DESPOVOAM ENTO
características do léxico, 261; 262 do Império Romano, 138
na classificação de M. Bartoli, 195; 251 causas, 138
desconhecido de Diez, 250 consequências, 139
dialetos, 195
ditongação, 195; 262 DIACRONIA
documentação, 196 definição, 67
extensão à ístria, 258 das línguas românicas, 183

296 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


DIALETOLOGIA /-ea-/ > /-ia-/
de Amado Alonso, 257 nas inscrições, 112; 113
românica de Ascoli, 32; 194 nos hermeneumata, 132; 133; 134
de Sever Pop, 194 espontânea
/e/ > /ie/, /o/ > /uo/ (/ue/)
DIALETOS no cast., 231; 271
castelhanos, 236; 237 no fr„ 226; 265
catalães, 231 no prov., 216
dalmáticos, 195; 196 no valão, 225
franceses, 225 de /e/ e /o/ + palatal
italianos, 196; 197 no cat. e prov., 232
portugueses, 244 no fr., 234
provençais, 2 15 nos dialetos ib., 234
réticos, 206; 207; 250 inexistente em port. e no gal., 241; 243; 244 (texto)
romenos, 191; 192 presente no Cid, 238
sardos, 202; 203 redução no dalm., 261
total do dalm., 195; 261
DICIONÁRIO
bilíngues, 29 DITONGOS
Contrastivo Luso-Brasileiro, 247 ausência de /-ier/ no gasc., 2 19
delia Crusca, 188; 198 “endurecidos” no franc.-prov. e no rét., 209
Elucidari (prov.), 214 /ei/ e /ei/ em Portugal c no Brasil, 245
Franzõsisches Etymohgisches Wõrterbuch evolução /oi/ > /uá/ no fr., 225
(FEW), 33 manutenção de /au/ no prov., 2 16; 233
Latino-Românico (Kõrling), 32 redução
multilíngiies, 29 /ão/ > /ã/ na i1ha da Madeira, 244
Picardo, 7 1; 72 /au/ > /o/ no cast. e no cat., 233
Provençal-Francês, 215 no dalm., 261
de rimas (cat.), 230 /ué/ e /ié/ no cast., 236
Românico Etimológíco (Dicz), 32
Romanisches Etymologisclws Wôrterbuch DOLOMITA
(REW), 32; 136 documentação, 206; 207
Sânscrito (Wilson), 30 território, 204; 206; 207
Trésor du Félibrige, 2 15
DRUIDAS
perseguidos na Gália, 103
DIMINUTIVOS
expressivos no lat. vulg., 97
ΔΙΠΛΩΜΑ
no lat. cristão, 175
etimologia, 60
na língua literária, 99
em Petrônio, 124
sufixo grego -ίσκος, 159 E
empréstimo ao port., 160
verbos no port., 160 EDIÇÃO
comentada, 62
DITONGAÇÂO crítica, 60
al. /i/ > /ei/, 82 diplomática, 60

ín d ic e t e m á t ic o | 297
escolar, 62 gépidas ao rom., 160; 161
fac-similada, 61 germânicos ao lat., 99
paleográfica, 61 ao rom., 161
popular, 62 gregos antigos e médios ao rom., 169
“princeps”, 44 ao lat. cr., 125
semidiploniática, 61 ao lat. vulg., 98
hebraicos ao lat. cr., 125
EDITO húngaros ao rom., 169
de Caracala, 38 ibéricos ao lat., 99
de cidadania plena e menor, 103 it. às línguas ocidentais, 264
de cidadania a soldados aposentados, 104 ao sardo, 202
latinos comerciais a línguas do mundo, 109
EMENDATIO cr. ao rom., 189
definição, 48 medievais às línguas românicas, 172
“ope codicum” ou “coniecturae”, 48 posteriores ao fr., 266
lombardos ao it., 145; 157
EMILIANENSES, 131 morfológicos
ver “Glossários” francos e lombardos (sufixos) ao fr., 159; 160
germ. ao fr., 157; 271
EMPOBRECIMENTO número de ár. ao port., 165; 271
causa da decadência, 139 panromânicos ao rom., 268
permeabilidade do lat. vulg., 98
EMPRÉSTIMOS port. às línguas européias, 272
africanos ao port. do Brasil, 247 prov. ao it. 266; 267
albaneses ao rom., 170 ao port., 270
ár. às línguas ibéricas, 164; 165 rom. ao búlgaro, 190
ár. ao siciliano, 151 saboienses ao sardo, 201; 202
ausência suevos ao port., 142
de ár. e germ. no sardo, 201 tupis ao port. do Brasil, 247
castelhanos turcos ao rom., 147; 168; 261
ao it., 272 verbos e adjetivos germ. ao fr., 157; 271
às línguas européias, 272 visigodos às línguas ibéricas, 143; 158; 271
ao port., 272; 273
ao sardo, 201 EPÊNTESE
cat. ao sardo, 201 de /e/ em /br/ em inscrições, 114
eslavos ao rom., 147; 168; 261 de /e/ no gascão, 155
etruscos ao lat., 100 de /e/ ou /i/ no port. do Brasil, 245
fonéticos de /i/ no port. europeu, 245
aspiração etrusca ao toscano, 256
francos ao fr., 158 ERUDITO
proparoxítonos ár. mantidos em port., 168 distinto do popular, 253
fr. às línguas ocidentais, 267 identificação fácil no fr., 253
ao it., 266; 267
ao port., 267 ESCLAVENOS
ao rom., 261; 268; 269; 270 povo eslavo, 146
francos ao fr., 157; 271 território, 146

298 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


ESCOLAS ESTEMÁTICA
dc Alexandria, 21; 34 definição, 46
árabes de Bassora c Knfali, 34 exemplo, 47
o cast. nas escolas sardas, 201 modos de transmissão genealógica, 46; 47
centro de cultura no Império Romano, 109 sistemas, 47
Comparatistas, 35; 63
dc copistas em Roma, 45 ESTRADAS
o lat. nas escolas medievais, 172; 176; 189 cortadas pelos alamanos na Récia, 145
Idealista e Estética, 33 fator de latinizaçâo, 107
intervenção estatal no Império, 109 mal conservadas na decadência, 139
latinista da Transilvânia, 190; 191 nomes e extensão, 107
Neogramática, 72
“Pctites Écolcs” de Port Royal, 176 ETIMOLOGIA
no periodo romance, 185 caminho inverso da onomasiologia, 78
públicas c particulares no Império, 108; 109 έτυμος, 75
na Renascença Carolíngea, 176 não explica as geminadas populares, 97
Siciliana, 198 popular
criador do nome, 72
ESLAVOS exemplos fr. e port., 72; 83
nos Bálcãs, 146 do vocabulário grego (Curtius), 31
convivência com muitos povos, 146
língua ESTRATIGRAFIA LINGÜÍSTICA
antiga, 136 definição e exemplos, 83; 84
oficial nos Bálcãs, 162; 189
oficial da Igreja rom., 190 ETRUSCOS
alfabeto, 100
médio búlgaro, fonte do rom., 190
origem, 146 aliados dos cartagineses, 200
denominações, 100
ramos, 146
territórios, 146 documentação, 100
dominadores dc Roma, 88
som eslavo no dialeto madeirense, 244
empréstimos ao lat., 100
ESTÉTICA fonemas aspirados, 256
escola de K. Vossler, 33 origem, 100
idêntica à expressão linguística (Croce), 68 semelhança com a língua da Récia pré-romance,
205
ESTILÍSTICA substrato toscano (gòrgia), 256
causa de variações formais, 8 1 território, 88; 100
importância exagerada pelo idealismo, 70 uso dos três nomes, 100
modelos clássicos, 28 civilização, 100
de Platão em Longinus, 27
torneios vulgares de efeitos estilísticos, 123; 124 EXEGESE
valor do Satyricon, De Bello Gallico, 56 definições, 57
em Vaugelas, 30 exemplo, 57; 58; 59
do pormenor, 57
ESTADOS PONTIFÍCIOS
constituição, 144; 145 EXÉRCITO ROMANO
incorporação á Itália, 202 alistamento de bárbaros, 140

ÍN D IC E T E M Á T IC O 299
anarquia militar, 139 das línguas românicas, 183
aposentadoria, 104 latina, 184; 185
colônias militares, 104; 105 romance, 185; 186
contingentes, 104 moderna, 186; 187; 188
fator de latinização, 103; 104
organização, 103 FÉL1BRE, 214
origem dos soldados, 104
privilégios, 139 FÉLIBRIGE
recrutamento na decadência, 140 objetivos e participantes, 214; 215
serviço obrigatório. 104 resultados, 215
tempo de serviço, 104 segundo renascimento prov., 214
tropas auxiliares, 104
“sermo castrensis” ou “militaris”, 91; 104; 107 FENÍCIOS
suporte da unidade do lat. vulg., 107; 171 na Sardenha, 200
no sul da Gália, 223
EUFEMISMOS
afetivos, 77 FILOLOGIA
exemplos, 77 ciências auxiliares, 30; 35; 57
conceito, 17-37
Ηπαρ συκωτόν, 75 para gregos e romanos, 17-27
na Idade Média, 28
nas Idades Moderna e Contemporânea, 31;
F 32; 33; 34; 35
no Renascimento, 28; 29; 30
/f/ > /h/ em Saussure c F. A. Wolf, 34; 35
no cast., 155; 232; 234; 236 e os estudos histórico-comparativos, 32
no Cid, 238 definições, 36; 37
no gascão, 2 18 e a Chanson de Roland, 227
no leonês, 237 fases da biografia do termo, 37
/f/110 safardita, 183; 237 objeto (Saussure e Rcnan), 36
/f/ > /v/ no sardo, 201 “praeceptrix linguisticae”, 86

FALISCO FILÓLOGO
língua do grupo itálico, 87 biografia do termo, 17-37
território, 101 nos autores gregos, 17; 18; 22; 23; 24; 25
nos autores latinos, 19; 25; 26
FAMÍLIA na Idade Média, 28
de línguas, 3 1 na Idade Moderna, 31; 32; 33
indo-européia, 29; 87 na Idade Contemporânea, 34; 35; 36
no Renascimento, 28; 29; 30
FANARIOTAS, 169 definição, 36
fases do conceito, 37
FASES hiato no uso do termo desde o século VI, 28
da biografia de “filólogo”, 37
do catalão, 229 FLAMENGO
do estudo da linguagem, segundo Saussure, 34; 35 na região de Dunquerque, 226

300 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


y
FLORENTINIDADE, 198 homonímias, 72; 83; 265
“illustre” na Chanson de Roland, 227
FLORENTINO implantação
base do it. literário, 188, 198 na África, 18 1
“linguai” ou “linguaioli”, 264 no Canadá e Antilhas, 18 1
opinião de Dante, 198 influência
oposição do vêneto, 197; 198 do galo-rontance
“questione delia lingua”, 198 na Itália, 266; 267
nas línguas ibéricas, 267
FOEDUS CASSIANUM, 88; 103 no romeno, 228; 268; 269; 270
e os Juramentos de Estrasburgo, 187
FONTES língua de cultura na África, 181; 182
na critica histórico-l itcrária, 52; 53 oficial de Lyon, 221
exemplos, 53 dVil, 211; 214; 221
do latim vulgar, 110-138 primeiros usos modernos como língua literária, 29
características, 110; III pressões sobre o prov.. 2 13; 2 14
espécies, 111-136 próximo do consonantismo franc.-prov., 221
inscrições populares, III; 112; 113; 114; 115 suas possessões no Oriente, 182
papiros antigos, 115 substratos e superstratos, 223
gramáticos e mestres de retórica, 116
tratados técnicos, 118 FRÂNCICO
peregrinações, 120 dialeto de Ile-de-France, 224
textos lat. tardios, 123 consequências para os outros dialetos, 225
textos cristãos, 125 “parler directeur”, 225
glossários, 127 trajetória semelhante à do cast., 236
línguas românicas, 135
FRANCIGENAE, 21 I
FRAGMENTAÇÃO
da România, 138-152 FRANCO-CONTÊS
causas dialeto francês, 225
externas, 140-152 território, 225
internas, 138; 139; 140
processo, 186; 187 FRANCO-PROVENÇAL
características, 221; 222
FRANCÊS denominações, 220
Alias Lingaistique, 71 ditongos endurecidos, 209
ausência de mesóclise, 271 documentação, 222
avanço no franc.-prov., 220 elo entre o fr. e o prov., 259
base étnica, 223 história externa, 220; 221; 222; 223
características, 226 limites com o prov., 2 15
chansons de gestes, 227 língua oficial da República de Genebra, 221
dialetos, 223; 224; 225 melhor período, 221
documentação, 226; 227; 228 palatalização /c/ > /ch/, 2 16
edito Villers-Cotterêts, 176; 214; 225 perda das funções número- pessoais, 216; 217
o frâncico, 224 texto, 223
história externa, 223-228 superstratos, 144

ÍN D IC E T E M Á T IC O
FRANCOS origem da autora da Peregrinatio, 121
colônias no Império, 140 semelhanças e diferenças em relação ao port.,
cultura, 144 240; 241; 242
desaparecimento da língua, 157 separação do port., 240
diferenças norte-sul, 144 sistema vocálico, 240
expansão territorial, 143 superstrato suevo, 141
habitantes da Catalunha para os árabes, 228
ocupação desigual da França, 144 GALEGO-PORTUGUÉS
relações com a Catalunha, 228 língua trovadoresca, 243
superstrato na Gália, 157; 210; 223; 265 língua-tipo da poesia no século XIV, 212; 213
território inicial, 143 território, 242; 243
tribos, 144
vitória sobre os visigodos em Tolosa, 143 GÁLIA
avanço dos francos, 143
FRIULANO bilingüismo, 153; 157
elo entre România Oriental e Ocidental, 259; 262 colônias romanas, 105
influências na Istria, 259 conquista da
literatura lírica, 207 Cisalpina, 88; 99; 104
manutenção do /1/ em /lt/, 209 Narbonense, 88; 106
rético oriental, 207 Transalpina (Comata ou Melenuda), 104
Società Filologica Friulana, 73 diferentes graus da latinização, 257
território, 207 druídas, 103
empréstimos da Cisalpina ao lat. vulg., 99
FUEROS, 143 fonte de recrutamento militar, 104
hunos na Gália, 141
FUTURO línguas românicas, 223
construção com volere no balcano-romance, 263 Lyon como capital, 221
construção perifrástica Narbonense no CIL, III
nas Gl. Emilianenses, 132 perdas na România Medieval, 180
no lat, vulg., 94 províncias, 89
em Oribásio, 119 substratos e superstratos, 157; 223
indistinção entre presente e futuro nas inscri­ subsubstrato no sul, 156
ções, 113; 114 “valir” na Ocidental, 146
mesóclise no ant. cast., 131; 271 via Aemilia para a Cisalpina, 107
mesóclise no ant. cat. e prov., 271
no port. moderno, 271 GALICISMO
perdido no lat. vulg., 114; 116 na Commedia de Dante, 198
presente e pretérito, 271 eliminados do prov. por Mistral, 215
verbos no fut. nos Juramentos de Estrasbwgo, 271 nas línguas românicas, 228
no rom., 268

G GALO-ITÁLICOS
dialetos, 154
GALEGO alto-itálicos ou setentrionais, 196
conserva o /f/, 240 elo de ligação na România Contínua, 259
elimina nasais finais, 241 quais são, 196

302 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


GALO-ROMANCE GENERO
caráter inovador, 265 neutro
fornecedor de empréstimos, 264; 265; 266; 267; eliminado no lat. vulg., 93
268; 269; 270 flutuante na Cena, 123
nas Glossas de Kassel, 129 ignorado nos tratados, 120
o léxico gascão, 219
língua dos Juramentos de Estrasburgo, 173 GENOVÊS
posição do cat., 231; 232; 233; 234 dialeto italiano, 196
posição do prov., 217 enclave na Sardenlia, 203
situação do franc.-prov., 221
GEOGRAFIA LINGÜÍSTICA
substratos e superstratos, 265
atlas linguísticos, 70; 71; 72; 73; 74
via de empréstimos ao it., 158; 159
o ALF de Gilliéron, 7 1
colocação dos princípios por Ascoli, 33
GALURÊS
completa o método histórico-comparativo, 85
dialeto sardo, 202 critérios científicos, 70
características, 203 fundamentação de Gilliéron, 33; 7 1; 72
território, 202 início com Georg Wenker, 70
medieval, 84
GASCÃO método, 70-76
aparentado ao prov., 217 relação com outros métodos, 33; 74; 76; 83; 84;
atlas, 74 85; 86
características da língua, 218; 219; 220 resultados, 33; 68
incluído na classificação de C. Tagliavini, 251 avaliação, 68
história externa, 217; 218; 2 19; 220
língua pirenaica diferenciada, 217; 257 GEOLOGIA LINGÜÍSTICA
originalidade derivada da geografia linguística, 83
causas, 218 exemplos em Gilliéron, 83
fonética, 218 em que consiste, 83
léxica, 218; 219
papel na România Contínua, 259 GÉPIDAS
próximo ao basco, 2 18 destruiram o reino huno, 141
substrato ibérico, 155 empréstimos ao rom., 160
subsubstrato mediterrâneo, 156; 157 ramo dos godos, 142
território, 2 17
GLOSSÁRIO
textos e documentação, 220
da edição crítica, 60
vascões, ancestrais, 217
fontes do lat. vulg.
definição, 127
GAULESES edições, 127 '
ver “celtas” Emilianense, 131; 237
Kassel, 129
GEMINADAS origens, 127
recurso expressivo popular Pseudo-lzidoriano, 130
inexplicáveis pela etimologia, 96 Reichenau, 127; 128; 129
tendência do lat. vulg., 96 Silenses, 237
exemplos, 97; 98 Vaticano, 129

Í N D I C E T E M Á T IC O | 303
GLOTÓLOGO das Linguas Romanicas
sinônimo dc “filólogo”, 30 dc F. Dicz, 32; 231; 249
de W. Meyer-Liibke, 32
GODOS de Port Royal, 30
história ligada aos eslavos, 146 românica mais antiga (R. V. de Besalú), 229
influência de superstrato, 157 Sanscridana, 30
origem, 142 do sânscrito, 30
queriam construir a Gótia, 178 Vergleichende der indogermanischen Sprachen,
prestadores de serviços no Império, 140 159
vencidos na Dácia, 170
visigodos e ostrogodos, 142; 143 GRAMÁTICOS
campo de estudo (Sêneca), 21; 22
GÓRGIA TOSCANA
Crates de Malos, introdutor dos estudos em
exemplos, 256
Roma, 25
o que é, 256
distintos dos “gramatistas”, 26; 27; 30
substrato ctrusco, 256
e os eruditos, 25; 27
e os filólogos e filósofos, 20; 21; 22
GOTHALANDIA
fixam a língua lírica prov., 213
base de “Catalunha”, 228
fontes do lat. vulg., 116; 117
etimologia inaceitável, 228
“gramatista”, o que eram, 26
GÓTICO em Sêneca, 2 1; 22
língua dos germanos orientais, 141 ver “neogramático”
dos godos e vândalos, 141
GRANADA
GRAECIA MAGNA vel MAIOR, 101 expressão da cultura ár., 150
farsas de I. Sannazzaro sobre a reconquista, 272
GRAFFITI, 111 ultimo reduto ár. na Ibéria, 150
ver “inscrições” e “fontes do lat. vulg.”
GREGO
GRAMÁTICA adstrato do lat., 98
Ars Donati, 48 colônias
Ars Grammatica (Dositeu), 132 na Magna Grécia, 90; 102
codificações do prov., 213 de Massilia, 210
Comparada (Bopp), 3 1; 35 Nápolis, “urbs quasi Graeca”, 102
Comparée cies langues de I 'Europe Latine, 3 1 na Sardenha, 200
conteúdo e significados do termo, 26 no sul da Gália, 223
De Causis Linguae Latinae, 28 desinteresse por outras línguas, 29
Descritiva (Hjelmslev), 67 em documentos sardos, 202
Dionysii Thracis Ars Grammatica, 34; 47; 52 empréstimos
Donat Proensal (H. Faidit), 213 cristãos, 125; 174
Instituta Artium (V Probus), 51; 117 ao lat., 98
interesse inicial em Roma, 25 ao rom., 135; 169
Istorique des parlers provençaux modernes, 2 15 esquecido na Idade Média, 29
Italienische Grammatik (W. Meyer Liibke), 32 Influência
de ia langue romane, 31 nos centros culturais, 109
De Lingua Latina (Varrão), 53 na nomenclatura gramatical latina, 26

304 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


nos teatros, 108 hcbraismos
nas traduções bíblicas, 174 conectivo em discurso direto, 55; 56
nos tratados técnicos, 118; 119; 120 superlativo hebraico, 55
nos hermeneumata, 133; 134 na tradução da Bíblia, 174
iniciadorcs da literatura latina, 90 língua primitiva, 29
língua nas muaxas, 149
da Igreja primitiva, 125; 189
do Império Bizantino, 169 HÉGIRA, 148
do Oriente, 180
de papiros, 115; 179 HERMENEUMATA
lutas contra Roma, 88 definição, 132
modelo dos teatros romanos, 108 Monacensia, 133
onde é falado na Itália, 101 Montepessulana, 132
resistência à latinização, 101 de Monza, 134
substituído Pseudo-Dositheana, 132
pelo eslavo na liturgia balcânica, 189
pelo lat. eclesiástico, 172 HERMENÊUTICA
ver“exegese”
GRISÒES
ditongos endurecidos, 209 HÉRULOS
influência na Itália, 158
diversidade léxica, 209
ramo dos godos, 142
documentação, 205; 206
falantes do rét. ocidental, 204
HIATO
território, 206; 207
supressão no lat. vulg. por
unidade linguística na Idade Média, 205
crase, 97; 113; 114; 124
ditongação, 112; 133
GRUPO
itálico, 87
HIPERURBAN1SMO
componentes, 87
acuam por aquam, 113
genitivo de preço em inscrição, 112
GUADRAMILÊS
vogal + nasal aberta no port, do Brasil, 245
características, 248
co-dialeto port., 24S
HISPÂNIA
território, 248
conquista, 102
GUARANI divisões, 106
latina e visigoda no CIL, III
falado no Paraguai, 239
latinização lenta, 102
segunda língua do país, 239
origem do glossário Pseudo-lzidoriano, 130
província de Columella c de Sêneca, 118
II reconquista, 234; 235
teatros, 108
HÁPAX superstrato visigodo, 158
definição, 58 viu Domitia, 107

HEBRAICO HISTÓRIA
empréstimos ao lat, cr„ 125 externa e interna, 41; 188

ÍN D IC E T E M Á T IC O | 305
Francorum, 135 IBEROS
da lingua e da arte em Vossler, 68 empréstimos ao lat. vulg, 99; 156
Romana (Fenestella), 22 procedência, 210
della tradizione e critica dei testo, 43 raças, 236
dos topôn imos, 77 substrato na Ibéria, 153; 154; 155; 156; 236
no sul da Gália, 210; 223
HISTÓRICO-COMPARATIVO território, 155; 156; 210
método, 63-68
aplicação, 64 IDEALISMO
aplicado às linguas, 3 1 na ciência da linguagem segundo Vossler, 68
associado à Filologia, 32 princípios, 70
criação de F. Bopp, 3 1
produtividade IDIOLALIA, 56
léxica, 66 ver “idioleto”
na reconstituição léxica, 67
nos outros níveis, 67; 68 IDIOLETO
na sintaxe, 67 definição, 56
usado por J. Grimm e F. Diez, 32 em J. G. Rosa, 56

HOMEOGRAFIA, 61 ILÍRIO
identificado com o dalmático de Veglia, 194
HOMONÍMIA língua indo-européia do grupo kentum, 170
no gascão, 72; 73 messápio-ilírio, 262
no francês, 83; 266 substrato
no latim, 124 do alb., 170
na Apúlia,'262
HUNOS do it. do norte, 196
derrota na Gália e desaparecimento, 141
destruidores do reino visigodo, 142 IMPOSTOS
roteiro das marchas, 141 causa
da decadência do Império, 139
das Cartas Chilenas, 54
espécies (capitis, decumae, soli), 106
isenção das colônias romanas, 105
/i / > /ei/ na Teoria das Ondas, 82 nas províncias, 106
os publicanos, 106; 107
IBÉRIA
ver “Hispânia” INDO-EUROPEU
base Inl de sufixo negativo, 162
IBERO-ROMANCE descoberta do sânscrito, 30; 35
caráter das línguas, 270 estudado por F. Bopp, 63
contribuições léxicas, 272; 273 grupo itálico, 87; 100
particularidades linguísticas, 271 povos
primeiro documento, 131 albanês, 170
substrato, 153 eslavos, 146
superstrato, 272 latino, 87; 100

306 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


sículos e sicanos, ΙΟΙ francos, 143; 144
trácio-ilírico, 170 gépidas, 141; 144
raízes *ner- e 97 godos, 142
sufixo -isko, -iska, 159 hérulos, 142
sufixo /n/ + /ko/, 160 liunos, 141
lombardos, 144; 145
INSCRIÇÕES ostrogodos, 142
epitáfios dos Cipiõcs, 89 pictos, anglos, jutos e saxões, 143
fibula de Preneste, 89 sílingos, 141; 142
“graffiti”, 11 I suevos, 141; 142
espécies, 11 I vândalos, 141; 142
tabellae defixionum, 113 visigodos, 142; 143
tumulares, 114 “pacíficas” de germanos e eslavos, 140; 141
-cristãs, 114
valor dos dados, 253; 254 IPSIMUS, 124

INSCRIPTIONES ISLAMISMO
Latinae Christianae Veteres, 11 I ver“árabe”
Latinae Selectae, I 11
ISOGRAFIA, 61
INTEGRIDADE
na crítica histórico-literária, 55 ÍSTRIA
perda em edições escolares, 62 características atuais, 259
estratos pesquisados por Bartoli, 33; 251
INTERCÂMBIO influência italiana nos dialetos, 197
de /b/ e /v/ istrio-romenos, 192
nas inscrições, 115 ligação entre os ramos oriental e ocidental, 258;
na Mulomedicina, I 18 259
em Oribásio, 119 os rumeri, 40
nas Tabelas /libertinas, 125
de /d/ e /I/ no sabino e no grego, 65 ÍSTRIO-ROMENO
antigo caráter oriental, 259
INTERPOLAÇÀO dialeto romeno, 192
definição, 46 território, 258
espécies, 50 falantes bilíngües, 192
influências do friulano e do vêncto, 259
INTERRUMANTSCH
pretendida síntese dos dialetos réticos, 206 ÍTALA
ver “Vetus Latina”
INVASÕES
causa da decadência do Império, 140 ÍTALO-ROMANCE
grandes invasões, 140-152 caráter conservador, 264
alamanos, 143; 145 empréstimos lombardos, 157; 158; 159
árabes, 147; 148; 149; 150; 151; 152 fidelidade maior ao lat., 264
ásdingos, 141; 142 ligação com o dalm., 262
burgúndios, 143 ligado ao galo-romance pelo lombardo, 259
eslavos, 146; 147 posição do sardo, 265

ÍNDICE TEMÁTICO ! 307


ITALIANO JOCS FLORALS
Atlante Linguístico, 73 concurso poético em cat., 230
base literária florentina, 198; 199
dialetos centro-meridionais, 197 JUDEUS
Dicionário delia Crusca, 188 expulsos de Portugal, 183
dialetos, 196-198 no Império Romano, 103
formação do plural, 254 resistência à latinização, 257
história externa, 196; 197; 198; 199 sefarditas de fala port., 183; 248
ítalo-roniance, 264; 265 sefarditas levantinos, 183
língua em Diez, 249 sob os árabes na Ibéria, 149
língua literária em Florença, ao norte, Úmbria e tradutores do árabe na Península Ibérica, 236
Florença, 198
os linguai, 264 JURAMENTOS DE ESTRASBURGO
linha Ia Spezzia-Rimini, 82; 101; 196; 251; 259 dialeto, 222
onde é falado fora da Itália, 199 forma românica do futuro, 271
papel de Dante, Petrarca e Boccaccio, 198; 199 influência do superstrato franco, 158
período de influência, 264 línguas usadas, 39
questione delia lingua, 198 primeiro documento em língua românica, 173;
reunificação política, 196 187; 226; 227
revitalização por A. Manzoni, 199; 264 “roman commun”, 227
o romanesco, 199 romana lingua e teodisca, 173
situação política nos séculos XVII e XVIII, 199
substratos e superstratos, 196
“volgare illustre”, 198 K

ITINERARIUM Κ αθ’ &λην (γην), 171


Burdigalensis, 120
Egheriae (Etheriae), 121 KASSEL
linguagem, 121 glossário, 129; 130
Itineraria Hieimolimitana Saeculi lll-VIII, 120 exemplos, 129
De situ Terrae Sanctae, 121 fatos gramaticais, 130
ver “Peregrinações” tipo lat. -al., 129
“uualha” traduz “romani”, 146
IUS
civile, 88
Κοινή
italicum, 105
grega, 58; 225
latinum, 105
base do lat. cr., 174
suffragii et honorum, 105
imaginada por Dante, 198
provençal, 198; 212; 213; 223
J sarda no campo jurídico, 202

JAPÍGIOS E MESSÁPIOS
documentação, 101 L
língua, 101
messápios, substrato na Apúlia, 262 LACETANI
território, 101 habitantes da região de Barcelona, 229

308 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


por metátese, Calelani, 229 influência cultural nos Bálcãs, 190
território, 229 língua oficial no Oriente, 180
na Hungria, 190
LADINO nomenclatura agrícola no sardo, 77; 78
“enladinar”, 237 oposto a eslavo nos Bálcãs, 180
espanhol dos judeus, 203; 237 partitivo, 69
índio de fala cast., 237 pertence à família kentum, 87
língua dos sefarditas, 183; 237; 248 primeiros documentos, 89
características, 183 substrato eslavo nos Bálcãs, 180
mouro de fala cast,, 237 substratos, 97; 98; 153; 154; 155; 156
negro ou mestiço em Cuba, 237 termo não univoco, 87
sinônimo de "rético”, 203 textos nas escolas medievais, 28
variedades
LANGUE D’OC castrensis, 89; 91; 92; 104; 107
diferente do franc.-prov., 221 litterarias, 90; 91; 92
diversas denominações, 2 11 peregrinus, 89; 91; 92
félibre, 214 rusticus, 89; 91; 92
língua literária da Catalunha no século XII, 229 urbanus, 89; 91; 92; 106
manifesto de P. Godolin, 214 vulgar; 91; 92; 93; 94; 95; 96; 97; 98; 99
origem do nome, 144; 211 vulgaris, 90; 91
território inicial, 211 gráfico, 91
ver “provençal” visigótico, 131

LANGUE DOÍL LATIM ARROMANÇADO, 176


diferente do franc.-prov., 221
história externa, 223; 224; 225; 226; 227; 228 LATIM CRISTÃO
origem do nome, 144; 2 1I autores e obras, 174
ver “francês” características, 174; 175
centros, 174
LANGUE DU ROI empréstimos gregos, 174
oposto a ronian, 2 11 decalques e adaptações semânticas, 174

LATIM LATIM ECLESIÁSTICO


cristão, 125 características, 172
da decadência, 176 e lat. cristão, 173; 174; 175
decalques sobre o gr., 75 e lat. medieval, 175; 176
desconhecido pelo clero medieval, 28 período de decadência, 176
empréstimos reforma de Cluny e efeitos, 176
celtas, 99 renascença carolíngea, 176
gregos, 98 substituto do grego, 172
ibéricos, 99
itálicos, 98 LATIM MEDIEVAL
fase das origens, 89 fontes de empréstimos, 171
no grupo itálico, 100 influência na sintaxe, 172
indeterminação do sujeito no lat. arcaico, 67 língua de cultura, 171
influências entre as variedades, 89; 107 período de decadência, 28

ín d ic e t e m á t ic o | 309
proibido em receitas médicas, 176 em que consiste, 103
sem influência sobre o rom., 134; 260 superficial
única língua literária, 28 nos Agri Decumates, 102
na Britannia, 102
LATIM VULGAR na região do Reno, 179
atestação dos gramáticos, 117 técnicas, 103
base do lat. cr., 174
das línguas românicas, 32 LAT1NO-FALISCO
caráter arcaico na Ibéria, Dácia e Sardenha, 184 território, 100
características, 92; 93; 94; 95; 96; 97; 98; 99
analítico, 93 LEGES BARBARORUM, 135
concreto, 95
expressivo, 96 LEXAR E DEIXAR, 64; 65
permeável a influências, 98
simples, 92 LENIZAÇÃO
denominações, 91; 92 /b/ > /v/ no imperfeito do indicativo, 256
diferenciação, 111; 171
fontes, 111-138 LEONÊS
fragmentação, 184 atlas, 74
causas, 184 características, 236; 237
e o lat. eclesiástico, 175 dialeto cast., 236
no Oriente, 179 infinitivo pessoal, 271
quando desapareceu, 173 ligado ao mirandês, 236, 248
relação com o “urbanus”, 184 próximo ao port., 236
com o “sermo vulgaris”, 91 território, 236
“terminus a quo” das línguas românicas, 138;
170; 183; 260 LEX
uniformidade básica, 184 Ribuaria, 135
vocabulário, 135; 136 Romana Raetica Curiensis, 135
vulgaritas em Quintiliano, 117 Salica, 135

LATINE LOQUI, 39; 185 LEXICOLOGIA


científica ou onomasiologia, 77
LATINIZAÇÃO “mots-clés”, 85
da Dácia, 105; 106; 257 objeto, 76
erradicação na África, 152 social, 85
extensão, 103
fatores, 102; 103; 104; 105; 106; 107; 108; 109; /-LI-/ e /-LL-/
110 > /- d d - / no calabrês, 201
das Gálias, 103; 257 no corso, 197
graus, 88; 179 no sardo, 2 0 1
da Itália, 87; 100; 101 /- II- / > /- r - / no gasc., 218
lenta na Ibéria, 102 /-11/ > /-ts c h / > / - t/ no gasc., 218
na Sardenha, 102; 200 / ( i) ll- / > /- y - / no fr., 225
nula no Oriente, 116; 257 /-1-/ + cons. > /- u - / no leonês e no p o rt., 237
processo, 102; 103 /-1/ > /- u / no gasc., 2 18

310 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


LIGURE ocidentais e orientais, 196; 251; 252; 253; 254;
nos Alpes da Provcnça, 2 10; 223 255; 256
na Itália, 153 “rustica romana lingua”, 173
na Sicilia, 101
substrato do it., 196 LINGÜÍSTICA ESPACIAL, 33
ver “neolingüistica”
LIMOSINO (LIMOSI)
Chanson de S. Foy, 2 12 LINHA LA SPEZIA-RIMINI
documentação, 2 11 divide lingüisticamente a Itália, 82; 102; 196
“parladura de Lemosi”, 2 12 fundada no substrato, 251; 259
possível base da κοινή provençal, 212
sinônimo de “langue d’oc”, 211; 229 LIONÊS
de “proensal”, 2 11 atlas, 73
usado na Catalunha, 229
LITERATO E LITERATOR
LÍNGUA ROMANA em Suetônio, 26; 27
designação do prov., 3 1
LOGURODÊS
sistematização gramatical, 213
dialeto sardo, 202
ver “romana lingua”
território, 202
LÍNGUAS traços específicos, 202
árabe, 147 variedades dialetais, 202
celta, 223 “volgare illustre”, 202
eslavas, 146
LOMBARDO
germânicas, 141
ação contra os romanos, 145
indígenas americanas, 239; 272
colônias na Sicilia, 196
indígenas do Brasil, 153
destruidores do reino gépida, 144
indo-européias, 87; 100; 101; 170
dialeto de Milão e Como, 209
na Itália antiga, 153
elo na România Contínua, 259
d’oil, d’oc e do si, 144; 211
influências léxicas, 145; 157
românicas, 188; 189; 190; 191; 192; 193
invasores da Itália, 156
fontes do lat. vulg. 135; 136; 137; 138
limites dialetais, 207
papel do rom. c do sard., 136; 137
organização social, 145
LÍNGUAS ROMÂNICAS origem, 144
blocos, 260-273 o reino lombardo, 144
características e inter-relacionamento, 260 superstrato do it., 196
continuadoras do lat. vulg., 110 tentativa de língua literária, 197
fases de evolução
LORENO
latina, 184
dialeto fr., 225
romance, 185
românica moderna, 186; 187; 188
feição definitiva, 187; 188 M
fontes do lat. vulg., 135; 136; 137; 138; 139
formação, 152-176 MÁCEDO-ROMENO
história externa. 188-248 dialeto romeno, 192
número, 250; 251 sinônimo de “aromeno”, 192

ÍNDICE TEMÁTICO j 311


MAGNA GRAECIA MERCATORES, 109
conquista pelos romanos, 90
dialetos, 101 MESÓCLISE
empréstimos ao lat., 101 conservada em port., 271
história, 101 eliminada em outras línguas, 271
latinização, 101 inexistente em fr., 271
luta contra os romanos, 88 origem, 271
origem dos iniciadores da literatura latina, 90
território, 101 MÉTODOS
afins, 83; 84; 85
MALTA geografia linguística, 83; 84; 85
dialeto semita, 164 histórico-comparativo, 31; 63; 64; 65; 66; 67; 68
influência italiana, 151 primeiras aplicações, 31
it., língua literária, 151 idealista, 67; 68; 69; 70
neolingüístico ou espacial, 78; 79; 80; 81
MANIPULI, 103 onomasiológico, 76; 77; 78
teoria das ondas, 81; 82; 83
MARCA DA ESPANHA, 149; 150; 164; 165;
Wõrter unci Saclien, 74; 75; 76
229

MESSÁPIO
/-M B-/
documentação, 101
> /-m-/ no gasc., 219
época, 101
> /-mm-/ nos dialetos it. meridionais, 154;
e ilírios, substrato na Apúlia e nos Abruzos, 262
197
território, 101
influência do substrato osco-umbro, 154
mantidos nos dialetos galo-itálicos, 154
M1RANDÊS
MEDICINA características, 248
contribuição árabe, 166 co-dialeto port., 236
tratados, fontes do lat. vulg., 119 ligado ao leonês, 236

MEDITERRÂNEA MOÇÁRABE
cultura pré-românica, 101 bilingüismo, 235
extensão e características da “Unidade”, 101; características arcaicas, 235
156; 157 colônias ao norte, 150
língua, 101 conservação de /-I-/ e /-n-/ intervocálicos no
origem das cacuminais, 101 port., 240
na Sardenlia, 156; 200 “muladíes”, 149
os nuraghi, 200 quem eram, 149; 163; 235
substrato na Itália, 197 romance, 149; 163
subsubstrato, 156; 200 território, 240

MÉDIO-RODANÊS MOLDÁVIA
sinônimo de franc.-prov., 220 cessão à URSS, 192
empréstimos turcos, 168
MEGLENO-ROMENO fundação, 189
dialeto rom., 192 independência política, 193

312 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


primeiros escritos, 189 NAVARRA
principado, 163 divisão, 149
a “questão moldava", 192; 193 reino cristão, 149

MONACENSIA, 133 NAVICULARII, 109


ver “hermeneumata”
/-ND-/
MONOTONGAÇÃO
> /-nn-/ no sul da Itália, 154; 197
/ae/ > /e/, 114; 115; 125
> /-n-/ no cat., 231
/au/ > /o/, 112; 116; 117 > /-n-/ no gasc., 219
/au/ mantido no dalm., 262
no prov., 2 16
NE-
no romeno, 2 16 prefixo, 162
evitada pelo»; "ditongos endurecidos”, 209
fato “rústico” em Festus, 117
NEGOTIATORES, 109
no grego medieval, 134

NEOGRAMÁTICOS
MONTEPESSULANA, 132
ênfase ao fator psicológico, 68
ver “hermeneumata”
ênfase à fonética, 74
MONUMENTA GERMANIAE HISTORICA, ideal, 74
135 ligações de Meycr-Liibke e de M. Bartoli, 33; 78
princípios na Filologia Romanica, 64
MONZA, 134 relação com Wõner und Saclien, 76
ver “hermeneumata” teses refutadas pela ação do substrato, 155

MOTS NEOLINGÜÍSTICA
-clés (palavras-chave), 85 conclusões, 81
-tèmoins (testemunho), 85 denominações, 78
método, 33; 78; 79; 80; 81
MUAXAS, 149 “norme areali”, 78; 79; 80; 81
relação com a Geografia Linguística, 78
MULADÍES, 149; 163
NEOLOGISMO
MUNUS EDUCATIONIS, 109
denotativo de mudança social, 85
com in- na época imperial, 162
N
NEUTRO
NASALAÇÀO desaparecimento no lat. vulg., 93; 120
existente no fr., franc.-prov. e port., 216 flutuação em Pctrônio, 123
inexistente no prov., 216 plural da 2“. declinação considerado singular da
Ia, 134; 175
NATIONALSPRACHE, 204
NORICUM
NAUATL conquista, 102
língua do México, 239 emigrados colonizam a Récia, 205
empréstimos léxicos, 272 território do rét. or., 204

ÍNDICE TEMÁTICO |
NORMANDO adjetivos cognatos, 211
conquista da Sicilia e do sul da Itália, 151; 266 instituições linguísticas, 216
dialeto francês, 225 origem do nome, 211
influência na Sicilia, 164 território, 211
não palataliza /c/ e /g/ + /a/, 226
OCCITANO
NORME AREALI conjunto dos falares do sul da França, 211; 2 15
as cinco de Bartoli, 78; 79; 80; 81 literatura, 211
o que são, 78 oposto ao francês, 211
ver “métodos” ver “provençal”

NORTEIRO ODISSIA, 90
dialeto crioulo port., 244
ONOMASIOLOGIA
NOVEMPOPULANIA criação do termo, 33
um nome da Aquitânia, 217 definição, 33; 76
território gascão, 217 lexicologia científica, 77
ver “Vascônia” método, 76; 77; 78
métodos derivados, 84; 85
NOVO TESTAMENTO primeiros trabalhos, 33; 76; 77
fonte do lat. vulg., 125 relações com
revela a organização romana nas províncias, 103 a etimologia, 78
textos na exegese do pormenor, 57; 58; 59 a geografia lingüística, 73; 76
tradução rética, 205; 206 Wõrter und Sachen, 78
ver “Vulgata” e “Vetus Latina”
ORBIS ROMANUS, 177; 179
NUMERAIS
grafias populares, 114; 115; 125 ORDINATOR, 114
no lat. vulg., 93
sistema de algarismos arábicos, 166 ORGANIZAÇÃO
subtração por adição, 93 agrária e jurídica na Provença, 211
civil do Império, 104
NUORÊS, 202 comercial do Império, 109
dos Estados Pontifícios, 144; 145
NURAGHI, 200 do exército romano, 103; 104
do Império nos papiros do Oriente, 116
dos lombardos na Itália, 145
O do mundo árabe, 148
na Ibéria, 149
OBRAS PÚBLICAS das províncias, 89; 103; 104; 105; 106; 107;
abastecimento de água, 108 108; 109
estradas, 107
fatores de latinização, 110 ORTOGRAFIA
outros edifícios, 108 fixada no it. pela Accadentia delia Crusca, 199
teatros, 108 no prov. pelo Félibrige, 214
OCCITÂNIA incoerências gráficas

314 ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


nas inscrições, 114; 115 > /dz-/ > /j-/ no cast., 232; 234
na Peregrinatio, 120 > /ly-/ no moçár., 235
nas Tabellae /li bertini, 124 /cl-/, /fl-/, /pl-/ > /ch-/ no port. e gal., 241
nas gramáticas prov., 2 13 > /II-/ no cast., 241
Vourtougràfi pmuvençalo, 215 /gn/ não palatalizado na ístria, 259
propostas de reforma no século XVII, 30 /l-/> /II-/ no cat., 270
substituição da grafia gótica pela fr. na Ibéria, 15 1 de nasal em port., 2 18
única do prov. do século XII, 213 l-nn-l > /fi/ no cast., 233
unificada no rom., 191 > l-ny-l no cat., 233
valor histórico de seu estudo, 85 origem popular de /-I1-/ > l-y-l no fr., 225
no pronome possessivo feminino no port. e gal.,
OSCO-UMBRO 242
documentação, 100; 101
empréstimos ao lat., 98 PÁLAVI, 109
farsas oscas em Roma, 152
nas inscrições em Pompéia, 152 PALAVRAS E COISAS
língua indo-européia, 87 Worter and Sachen
membro do grupo itálico, 87 Biltlatlas, 76
outras denominações, 100 empregado no Atlas suíço, 73
prefixo negativo an-, 162 método, 32; 33; 75-78
Tabula Bantina e Cippus Abellanus, 100 relação com a Geografia Linguística, 78
território, 100 Sachforscli ung, 75
tribos, 152; 153 Wortforschnung, 7 5

OSTROGODOS PALEOESLAVO
empréstimos ao it., 158 denominações, 189
influência reduzida, 142 grafia cirilica, 189
invasores do Oriente, 141 língua oficial dos principados rom., 189
presença na Sardenha, 201 substituiu o grego, 189
ramo dos godos, 142
reino na Itália, 142 PALIMPSESTOS, 124
território, 142
vencidos pelos bizantinos, 142 PANCRONIA
acepção de Hjelmslev, Saussure e Wartburg, 67
definição, 67
P
PAN-IBERO-ROMANCE
PAEDAGOGIUM, 54 época, 233; 234
posição do cat., 234
PALATALIZAÇÃO o que é, 233
no artigo indefinido feminino no gal., 242 reconstituição de M. Pidal, 233
de /c/ e /g/ + /a/ no fr., 208; 226
> lts-1 e ldz-1 no franc.-prov., 222 PAPIAMENTO
no rét., 208 base port., 248
inexistente no norm. e pic., 226 dialeto crioulo, 182
/cl-/ e /ly-/ > /111-/ ou /II-/ no prov. e cat., 232 texto, 182

ÍNDICE TEMÁTICO 315


PAPIRO formação com /-s/ nas línguas do ramo ociden­
antigos, fontes do lat. vulg., 115 tal, 254
coletâneas, 116 com alternância vocálica nas do ramo orien­
material dos códices, 44 tal, 254
com l-sl no rét., 208
PARAGOGE não emissão do l-sl em fr., 69
de /-i/ em Portugal, 245 partitivo para indicar plural em it., 69
plurais neutros tidos como nome singular, 93
PARASTRATO, 33 /-Ji/ na 2a. plural em rom., 254; 255
ver “adstrato” supressão de nasal no plural no gal., 241

PARTÍCULAS POPULI LATINI, 38


enunciativas no gasc., 2 19
PORTU CALE, 239
PARTITIVO, 69; 70
ver “artigo”
PORTUGAL
o Condado Portucalense e D. Henrique, 151;
PATAVINITAS
239; 267
de Tito Livio, 185
condições territoriais anteriores, 149; 150; 239;
240
PEREGRINAÇÕES
conquista do sul, 151; 240
fontes do lat. vulg., 120; 121; 122
contribuição das ordens religiosas, 150; 267
francesas na Ibéria, 267
domínios de além-mar, 181; 182
francesas na Itália, 266
importância em Diez, 250
ver “Itineraria”
origem, 149; 150; 239; 240
PICARDO papel de Dna. Tareja, 239; 240
dialeto fr., 225 processo da independência política, 151; 239
situação étnica em fins do século IX, 150
não palataliza /c/ + /a/, 226
obras líricas e épicas, 224 território antigo e atual, 240
território, 225
PORTUGUÊS
PICTEVINO artigo definido, 241
dialeto fr., 225 igualdade com o gal., 241
território, 225 do Brasil, 244; 245; 246; 247
comparação com o gal., 240; 241; 242
PIRRO conservador no léxico, 270
rei do Epiro, 88; 104 dialetos e co-dialetos, 244; 248
crioulos do Oriente, 182; 244
PLEONASMO insulares, 244
frequente na Peregrinatio, 120 características, 244
nas Tabellae Defixionum, 113 “norteiro” de Bombaim, 244
inexistente em Gal., 59 documentação, 187; 243
empréstimos
PLURAL árabes, 164; 165; 271
ausência de possessivo para a 3" plural no port. mantém-se a tônica, 168
e gal., 242 castelhanos, 272

316 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


exóticos, 272 PRONOMES
franceses, 267 ausência de possessivo da 3“ pessoa pl. no port.
germânicos, 271 e gal', 242
história externa, 239-248 contração com preposição no port. e gal., 241; 242
infinitivo pessoal, 242; 271 demonstrativos pospostos no balcano-romance,
influências 262; 263; 264
do gal. c do moçár., 243 formas contractas dos pessoais no lat. vulg. 110
do fr. na literatura, 270 formas reforçadas, 94
implantação ille > ele, pessoal, 126; 134
na África, 18 1 ipsimus em Petrônio, 124
no Brasil, 181 perdas de indefinidos, 93
no Oriente, 182 pessoais em fr., 266
língua literária, 243 oblíquos no port. do Brasil e Portugal, 246
fases do período arcaico, 243 òm no prov., 217
língua para F. Diez, 250 formas románicas, 67
mantém a mcsóclisc, 271 possessivos do cast., 238
o mais que perfeito simples do indicativo, 271 do port. e gal., 242
possessivos port. e gal., 242 quadro port. já completo no século XII, 243
semelhanças com o gasc., 218 qualis, relativo, 137
território europeu, 239 formas románicas, 137; 138
territórios ultramarinos, 244 redução dos demonstrativos no lat. vulg., 93
“volgare illustre” port., 243 o relativo que (< quem), 138
simplificação no lat. vulg., 93
POSITIVISMO uso obrigatório dos pessoais no fr. e franc.-prov.,
na ciência na linguagem, 68 216; 217; 261

PRÓTESE
PRAESES RAETIAE, 205
de /a/ ante /r-/ no gasc., 2 18
no arag. e no basco, 156; 157; 218
PREFIXOS de /a/ ou /i/ ante /r/ no sardo, 201
d is-, de + ex no port., 65
ne- no lat. e no rom., 162 PROTO-ROMANCE, 39; 40
raiz indo-europcia/n/, 162
rãs c rãz no rom., 162 PROTO-ROMENO
berço, 170
PREPOSIÇÕES
a com infinitivo, 246 PROVENÇAL
combinações e contrações no port. e no gal., 241 autores, 212; 213; 214
de pelo genitivo na Peregrinatio, 120; 122 características, 216; 217
de substituiu ab e ex, 93 codificações gramaticais, 213
em com verbos de movimento, 247 declínio com os albigenses, 213; 267
in sem idéia de movimento, 121 denominações, 211
regem acusativo, 110; 115; 120; 126 dialetos, 215; 216
substituem casos, 93; 120; 132 estudos de A. Schlegel e Raynouard, 31
uso diverso no port. de Portugal c do Brasil, 246 Félibrige, 215
uso nos tratadistas, 119 história externa, 210-217

ÍNDICE TEMÁTICO | 317


influência na Ibéria, 267 Lusitânia, 240
do fr., 214 Mesopotamia, 89
institutos occitanos modernos, 215 Noricum, 89
κοινή lírica, 212 número máximo, 179
latinização, 210; 223 organização, 106
lingua para F. Diez, 249 Panônia, 89; 105
língua da heresia, 213 parâmetros de divisão, 209
jurídica, 213 política concernente, 103
pirenaica, 257 Récia, 89; 204; 205
“romana”, 31; 213 Sardenha e Córsega, 88; 200
dos trovadores, 2 12 Sicilia, a primeira, 88
modelo para Dante, 198 tipos imperiais e senatoriais, 106
obras de F. Mistral, 215 Venécia, 89
origem do nome, 2 10 ver “latinização”
orografia favorável ao substrato, 210; 211
“Parladura de Limiosi”, 212 PSEUDO-IZIDORIANO, 130
período áureo, 187 ver “glossários”
primeiro renascimento, 214
primeiros documentos, 211; 212 PSICOLOGIA
protótipo para a escola siciliana, 266 da atenção, 50
“provinciales” e “francigenae”, 211 dos povos (Wundt), 68
proximidade com as línguas ibéricas, 217 valor, 68
substratos e superstratos, 156; 210; 223
PUTER
unidade lingüística trovadoresca, 212
dialeto da Engadina Alta, 205
fixado por G. Bifrun, 205
PROVÍNCIA
África, 88
divisões, 180
Q
Aquitânia, 217
Armênia, Arábia, Assíria, 89; 102 QUADAS, 141
Ásia Menor, 102
base das divisões do CIL, 111 QUALIS
Bética, 240 biografia, 137
Britânia, 89; 102
Capadócia, 89 QUÉCHUA ou QUÍCHUA
coincidência com dioceses, 209 onde é falado, 239
Dácia, 89; 105
QUESTIONE
Egito, 89; 102
do catalão, 231; 232; 233
fatores de unidade, 82
delia Lingua (it.), 198
Gálias, 88
Ladina, 203; 204; 207; 208
divisões, 104
graus de latinização, 179
Grécia (Achaia), 88; 102 R
Hispânia, 88
divisões, 240 RAGUSANO
Illyricum, 88; 106 dialeto dalrn., 146; 180; 193; 195

ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


RECENSIO próximo ao romeno (Ascoli), 257
objetivo, 44 quarta língua nacional, 204
o que é, 44 “romani” oposto a “barbari”, 39
Saggi Laditii, 32; 70
RECONQUISTA (PENÍNSULA IBÉRICA) Sclnirwâlsclw, 208
campanhas, 149; 235 variedades
consequências, 181; 234 ocidental, 206
implantação de /Ii/ por /f/, 155 central dolomita, 206
contribuição francesa, 234; 267 território, 207
início, 149; 234 oriental friulana, 207
e Portugal, 239 documentação, 207
supremacia cast., 236 território, 207
união de Castela e León, 235
ver “árabes” RETORES
fontes do lat. vulg., I 17
REDUPLICAÇÃO
RETO-ROMANCE
consonantal popular, 96; 97
características, 263
expressiva no lat. vulg., 96
considerações gerais, 263
perdas territoriais, 263
REICHENAU, 127
sinônimo de “rético”, 203; 204
ver “glossários”
vocábulos próprios, 263
ver “rético”
RENASCIMENTO
carolíngeo, 28; 176
RIODONORÊS ou RIONORÊS
catalão (“Rcnaixença”), 230 co-dialeto port., 248
clássico
estudos, 28; 198 ROMA
línguas nacionais, 29 abastecimento de água, 108
retomada da filologia, 28; 36 no Appendi.x Probi, 53
provençal, 214 capital da România, 178
centro espiritual, 145
RÉTICO centro de irradiação ao sul, 82
ausência de língua literária única, 188 centro religioso e cultural, 41; 136; 171; 174
características, 208; 209; 210 espiritual do Ocidente, 145
causas da diversidade léxica, 209; 2 10 conquistada pelos vândalos, 141
correspondências com o galo- e com o ítalo- pelos visigodos, 141
romance, 208; 210 derivados, 38; 39; 40; 41
denominações, 40; 203; 204; 207 deposição de Rômulo Augústulo, 151; 171
dialeto para Diez, 250 expansão, 88; 89
ebenbürtige Schwestern, 208 habitantes primitivos, 38
dialetos, 206 inicio dos estudos gramaticais, 25; 26
domínio franco, 205 não impunha o lat., 103
nas glossas de Kasscl, 129 origem do nome, 100
história externa, 203-210 política com os aliados, 103
latinizaçâo do território, 205 posição entre os latinos, 38
língua, não dialeto, 251 posição estratégica, 88; 101

ÍNDICE TEMÁTICO I 3 1 9
prestígio perene, 171 ROMANIA
projeção atual, 264 atestações, 178
resumo histórico, 100; 103 Contínua, 256; 257; 258; 259; 260
Romaníola, 178 complementação de Vidos, 258-259
sem influência no rom., 136 critérios de A. Alonso, 257; 258
teatros, 108 criação do termo, 40; 178
definição, 40; 178
ROMAGNA derivações, 40; 4 1
adjetivo étnico, 178 extremos, 79
origem do nome, 40 fragmentação, 138-152; 186
causas internas, 138; 139; 140
ROM AN
causas externas, 140-152
“commun” nos Juramentos de Estrasburgo, 227
Linha La Spezia-Rimini, 196
oposto a “langue du roi”, 2 11
Moderna, 181; 182; 183
sinônimo de prov., 211
expansão na África, 181; 182
ROMANA LINGUA na América, 181; 182; 183
“romance”, 39; 187 no Canadá, 181; 182
“rustica”, 162 no Oriente, 183; 184
Ocidental e Oriental, 82; 178; 196; 249; 251
ROMANCE oposta a “Barbaries”, 177
balcano-romance, 260 a “Lombardia”, 178
condições históricas, 260; 261 origem do nome, 38
o dalmático, 261; 262 outras denominações, 37; 38; 178
palavras lat. únicas, 161 períodos, 179; 180; 181; 182; 183
o romeno, 260; 261 antigo, 179
substrato do eslavo, 146 medieval, 179; 180; 181
traços característicos, 262; 263 moderno, 181; 182; 183
validade do termo, 262 significações, 178
fase de evolução do lat., 175; 183; 184; 185 superstratos germânicos, 157; 186
gênero literário, 39 “Romaniae eversores”, 142; 178
logudorês, “volgare illustre”, 202 territórios perdidos, 180
origem, 39
período histórico, 187 ROMÂNIA CONTÍNUA
sinônimo de língua românica, 39 critérios de A. Alonso, 257; 258
ponto de partida, 257
ROMANCHE, 206 complementação de B. E. Vidos, 258; 259; 273
ver “rético” perspectivas, 259
posição do fr. e do rom., 258
ROMANCIUM, 39
o que é, 258
ROMANDA (SUÍÇA)
território frac.-prov., 220 ROMANICE FABULARE, 39; 185
fr., língua oficial, 221
ROMANÇO
ROMANESCO “língua românica”, 39
dialeto de Roma, 199
difusão atual, 264 ROMANE LOQUI, 39

320 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


ROMANICO “lealdade de cultura”, 191
conceito, 39 línguas oficiais, 189
derivados, 39 literatura tardia, 188; 191
no lat. arcaico, 39 origem do nome, 40
sinônimo dc língua românica, 270 parte do balcano-romance, 260; 261
primeiros documentos, 163; 190
ROMÂNTICO relação com os dialetos istrianos, 194
conotação inicial pejorativa, 40 relatinização, 268; 269; 270
fixação semântica, 40 semelhanças com outras línguas e dialetos
valor estético (Herdcr), 40 românicos, 256; 257
significados de româii, 40
ROMANUS, ROMANI superstrato eslavo, 147; 16-63
derivados em port., 40; 41 Tare7 Româneascã, 189; 190
habitantes dos Bálcãs, 40 tentativas de relatinização, 260; 261
oposto a “bárbaro”, 177 termos lat. únicos, 161
a "eslavo” na Dalmácia, 40 ver “valaco”
Romana lingua, 39
significado nos Bálcãs, 40 ROTACISMO
na Récia, 40 /I/ > /r/ no leonês, 237
na Romagna, 40
na România, 38 RUMERI (na ístria), 40
uallia no glossário de Kassel, 146
vlaclms, 147
S

ROMENO
SABÉLICO
base da língua literária, 163; 191
dialetos, 100; 101
berço do proto-rom., 170
língua do grupo itálico, 87
na classificação de Diez, 249
território, 100
cm outras, 250; 251
condições históricas, 260
SABINOS
continuador do nome dc Roma, 39
permutavam /I/ e /d/, 65; 66
contribuição à reconstituição do lat. vulg., 136; povo itálico, 100
137
dialetos, 191; 192 SACHFORSCHUNG, 75
empréstimos
albaneses, 170 SAMNITAS
gregos, 169 falantes do osco, 87; 100
húngaros, 169 guerras contra Roma, 88
turcos, 169 parte do grupo itálico, 87
eslavo, língua oficial nos séculos X c XI, 162
formação do plural, 254 SÂNSCRITO
formas verbais, 254; 255; 256 dicionário dc Wilson, 30
fundação da nação, 189 Grammatica Sanscridana, 30
herança latina, 260; 261 Memória de Cocurdoux, 30
história externa, 188; 189; 190; 191; 192; 193 métodos c técnicas, 30; 31
latinização, 257 obras dc F. Bopp, 31; 35

ÍNDICE TEMÁTICO J
Paris, centro de estudos, 30 dialeto sardo, 203
primeiras alusões, 30 território, 203
em Saussure, 35
William Jones, 30; 35 SATYRICON
autoria, 123
SANTONGÊS flutuação do neutro, 123
dialeto fr., 225 formas diminutivas, 124
território, 225 gênero literário, 123
sátira na Cena Trimalcliionis, 123
SARDO
vulgarismos intencionais, 123
antigo infinitivo pessoal, 271; 272
ausência de germanismos, 201 SAXÕES
caráter conservador, 264 na Britânia, 143
características, 201 colônias e empréstimos na Transilvânia, 161
os condaglii, 202 entrepostos em Brajov, 161
conserva as consoantes surdas intervocálicas,
256; 265 SEDERE
o /s/ do plural, 256; 265 sentido de esse na Peregrinatio, 122
não vocaliza o /c/ do grupo /ct/, 256; 265
dialeto do it. para Diez, 250 SEFARDITAS
dialetos, 202 judeus de fala port., 183; 248
documentação antiga, 202 de fala cast., 183; 237
empréstimos savoienses e it., 201; 202 “ladino”, 183; 237
enclaves aloglotas, 203 língua, 183; 237
fonte especial do Iat. vulg., 136; 137 onde estão, 183; 237
história externa, 199; 200; 201; 202; 203
ilha de degredo, 184, 200 SEPTIMÂNIA, 149
influência cat. e cast., 136; 150
SICANOS e SÍCULOS
isolamento territorial, 171; 200
documentação, 101
léxico pastoril pré-romano, 77; 78; 200
origem, 101
língua, não dialeto, 250; 251
território, 101
os numghi, 200
origem da cacuminal /dd/, 156; 197
SICÍLIA
“parque natural da România”, 265
características dialetais, 197
parte do ítalo-romance, 265
centro literário de Frederico II, 198
posição “sui generis”, 265
colônias lombardas, 196
relação com o lat. da África, 136
domínio árabe, 164
termos lat. exclusivos, 265
cast. e cast., 150; 201
traços específicos, 203
normando, 164
subsubstrato mediterrâneo, 200; 201
empréstimos árabes, 164
SÁRMATAS escola siciliana, 198
colônias na Gália, 140 híbridos ár.-romances, 168
presença na Dácia, 188 parte da Magna Grécia, 101
ponto de partida da difusão dos empréstimos
SASSARÊS árabes, 165
características, 203 primeira província romana, 88

322 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


sículos e sicanos, ΙΟΙ mesóclise nas línguas românicas, 271
documentação, ΙΟΙ no port., 271
origem, 101 negação com non no lat. vulg., 93
trocada pela Sardenha, 201 on no fr. e prov., 67
partículas expletivas no gasc., 219
SÍLINGOS, 141 períodos assindéticos no lat. vulg., 95
perda das declinações, 114
SÍNCOPE posposição do artigo em rom., 190
do /b/ em /-mb-/ no gasc., 2 19 produtividade do método histórico-comparativo,
do /d/ em /-nd-/ no cat., 231 67; 68
no gasc., 218 simplificações no lat. vulg., 93
nos dialetos it., 197 prevalência da justaposição, 95
intervocálico no cast., 132 tempos e modos no prov., 217
na 2a. plural em port., 241 uso do infinitivo e do gerúndio no Brasil e
do /1/ no port. e gal., 65; 241 Portugal, 246
no fr., 252 vitia et virtutes orationis, 116
do /n/ no gal., 241
no gasc., 218 SISTEMA
no leonês, 237 administrativo lombardo na Itália, 158
no port., 218; 237 educacional no Império, 108; 109
do /t/ em formas verbais port. e gal., 241 ctrusco dos três nomes adotados pelos romanos,
das sonoras intervocálicas em fr., 226; 265 100
idiossincrônicos, 67
SINCRONIA de sete vogais tônicas no port. e gal., 270; 271
aplicação de Saussure, 67
criação de Radcliffc-Brown, 67 SOBREMIRANO
definição, 67 dialeto rético, 206

SOBRESSELVANO
SINTAXE
dialeto rético, 206
acusativo pelo nominativo em fontes do lat.
Obenvaldisclt, 206
vulg., 119, 120; 121; 126
colocação dos termos na Vetus Latina, 126
SOCIETÀ FILOLOGICA FRIULANA, 73
dos pronomes átonos cm port., 246
concordância verbal nas inscrições, 114 SOLECISMOS
na Peregrinatio, 12 1
condenados pelos gramáticos, 116
confusão dos casos no lat. vulgar, 110
declinação de dois casos em fr., 233 SONORIZAÇÃO
empréstimos do lat. medieval, 253 das oclusivas surdas intervocálicas no Ramo
evolução sintática em M. Empiricus, 119 Ocidental, 251
fixação da sintaxe românica, 185 surdas permanecem na ístria, 259
indeterminação do sujeito no prov., 67; 217 /k/ > /g/ no sufixo germânico -ing, 160
infinitivo pessoal no leonês antigo, 271 /t/ > /d/ no fr., 252
no port. e gal., 271 no port. e gal., 241
no sardo antigo, 271
influência franca na colocação fr., 157; 158 SPRACHGEIST
do lat. crist., 175 “espírito da língua”, 69

ÍNDICETEMÁTICO I 323
SPRACHL1CHE FELDER no sul da Itália, 156
"campos linguísticos”, 84 /II/ > /dd/, 197
pirenaico (camox), 156
STAMMBAUMTHEORIE
teoria da árvore genealógica, 81; 82 SUEVOS
aliados dos vândalos, 141
STUDIOSUS PHILOLOGIAE, 34 conquistadores da Récia II, 205
influência, 142
SUBJUNTIVO língua germânica oc., 143
cultismo nos Juramentos de Estrasburgo, 187 reino na Galiza, 142
emprego românico, 67 superstrato do port., 142
imperfeito lat. conservado no sardo, 203 vencidos pelos visigodos, 143
expressa irrealidade no prov., 217
substituído pelo indicativo no lat. vulg., 94 SUFIXOS
usado como imperativo no prov., 217 contaminação de -and com ár. azar em fr., 168
eslavos -nic, -i$te, -aci, -ca, -eala etc. no rom.,
SUBSELVANO 147; 162
dialeto rético, 206 etruscos -na, -ena, -enna no lat., 100
fr. - ette, 93
SUBSTRATO franco -isk - esc no prov., 159
ação lenta, 154 > -esco no it., port. etc., 159
celta, do fr„ 223; 226; 262 germânico -ing > cast., it., port. -engo, 160
no norte da Itália, 145; 154 -hart > fr., it., port., -ardo, 160
conceito, 153 indo-europeu -isko > gr. ισκος e lat. -iscus, 159
criação do termo, 33 port. -esco, -iscar, 160
do gascão (aquitano), 217 latinos expressivos
ibérico, 155 diminutivos, 97; 124
ilírio-trácio do alb., 170 freqiientativos (-tare), 96
do dalm., 170 pejorativos (-a, -on), 97
do rom., 170 não ditongação de -er e -era no gascão, 2 19
itálico, do it., 251 visigodos -arde, -ardo, -engo nas línguas ibéri­
lat., do eslavo balcânico, 180; 184; 251 cas, 143
mediterrâneo, da Sardenha, 156
do sul da Itália, 156 SUJEITO
osco-umbro na Itália, 154 formas de indeterminação no prov., 217
pré-românico, na Récia, 207 honio no lat., 67
produtividade do conceito, 170 nas línguas românicas, 67
tupi, do port. do Brasil, 153
variedades no Império, 153 SUPERSTRATO
vários na Provença, 210 burgúndio, do fran.-prov., 222
vêneto-rét. no dalm., 262 criação do termo, 33; 157
definição, 157
SUBSUBSTRATO eslavo, do rom., 162
conceito, 156 franco e burgúndio, na França, 144; 157; 158;
diversos na Provença, 210 223; 226; 265
mediterrâneo, na Sardenha, 156 graus diversos na Gália, 223

324 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
lombardo, na Itália, 158; 1% TERMINUS
ostrogodo, na Itália, 158 "a quo”, o lat. vulg., e “ad quem”, as línguas ro-
suevo, em Portugal, 143 mânicas, 66; 138; 170; 183; 260
visigodo, na Ibéria, 158 “a quo” no stemma codicum, 48

TESTAMENTUM PORCELLI
T
fonte do lat. vulg., 124
/t/ > /ts/, 82
Teoria das Ondas, 81; 82; 83 TEUTOS ou TEUTÒES
colônias na Gália, 140
TABELLAE opostos a “Romani”, 39
A Ibertinae, 124; 125 território, 39
defixionum, 91; 113; 114
TEXTO
TAKI-TAKI cast. antigos, 237
crioulo do ingl., 248 cat. antigos, 229
cristãos, 125; 126
TARÃ ROMÂNEASCÃ 147 fr. antigos, 226; 227; 228
franc.-prov. antigos, 222
TEATROS
gascões antigos, 220
columnatio, 108
latinos tardios, fontes do lat. vulg., 123; 124; 125;
idioma dos espetáculos, 108
126
cm todo o Império, 108
objeto da crítica textual, 44
TEORIA objeto da Filologia, 29; 34
da “árvore genealógica”, 82 port. antigos, 243
do “campo”, 85 primeiros moldavos, 189
dos “campos linguísticos”, 85 primeiro rom., 190
das gerações, 85 reconstituído, 60; 61
fonológico-cstruturalista, 155 “exemplar de colação”, 45
linguística de Saussure, 34
das Ondas, 33; 81; 82; 83 TEODISCA LÍNGUA
onde era falada, 227
TERMINOLOGIA oposta a “romana”, 39; 173
administrativa c eclesiástica català no sardo, 201
agrícola do sardo, 200 TOPÔNIMOS
árabe de produtos agrícolas, 165 ár. na Ibéria, 168
da classificação dos textos, 46 na Sicilia, 168
do comércio no Império, 109 etruscos, 100
eclesiástica, 169; 201 da Dalmácia, 33
jurídica no Testamentum Porcelli, 124 formados com gót. -engo na Itália, 160
literária e científica emprestada do fr. pelo rom., francos na Gália, 144
261 godos, 157
da pesca, empréstimo do cat. ao sardo, 201 da ístria, 33
religiosa no rético, 209 lombardos na Itália, 158
rural na Gália dos francos, 144 messápios, 101
do xadrez, empréstimo ár., 167 objeto da onomasiologia, 78

ÍNDICETEMÁTICO | 325
rom. em textos búlgaros, 190 u
sículos, 101
da “Unidade Mediterrânea”, 156 /u/ > /ii/
uniformes no substrato rét., 207 no fr., prov., rét. e dialetos it., 216
sem palatalização do /k/, 208
UMBRO
TOSCANO documentação, 101
base do it., 197 empréstimos ao lat., 98; 99
no corso, conservador da tradição lat., 264 língua itálica, 87; 153
gòrgia, 256 território, 101
léxico, 264 ver “osco-unibro”

TRABALHO FILOLÓGICO UNIDADE


objetivo e partes, 43-62 na crítica histórico-literária, 55
princípios científicos, 43; 44 Mediterrânea
extensão, 156
TRÁCIO
subsubstrato do sardo e do basco, 156
língua indo-européia, 170
substrato do alb., 170
UNIVERSIDADE
de Lisboa, 243
TRADIÇÃO
Occitana de Verão, 2 15
direta e indireta na recensio, 44; 45
impressa na critica textual, 45
URBANITAS
denominações, 171
TRATADOS
fim de uso, 171
técnicos, fontes do lat. vulg., 118; 119; 120
norma culta de Roma, 89; 90; 91; 106; 117; 123
TROVADORES patavinitas de Livio, 185
codificadores da gramática, 213
consagradores do prov., 212 URBS QUASI GRAECA, 101
difusão do nome, 266
dispersão na decadência, 213 USUS SCRIBENDI, 50
estudos de A. Schlegel, 31
estudos de trouver, 75
os primeiros, 212 V
seleções poéticas, 31
técnicas líricas e nomes, 212 VALACO
os trouvères do norte, 2 12 biografia do termo, 146
unidade linguística, 212 influência húngara, 169
principado independente, 163; 189
TUPI sinônimo de “romeno” em F. Diez, 146; 249
empréstimo ao port. do Brasil, 188; 247 ver “romeno”
língua geral, 247
substrato do port. no Brasil, 153 VALÁDER
dialeto da Engadina Baixa, 205
TUSC1, 100 fixação com Cudesch da Psalms, 205
ver “etruscos” língua escrita, 206

326 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M A N IC A
VALÃO conservação do mais que perfeito simples no
atlas, 73 port., cat e prov., 271; 272
características, 225 depoentes na Cena, 124
dialeto fr., 225 derivados expressivos no lat. vulg., 96
desaparecimento dos depoentes, 94; 116; 124
VÂNDALOS empréstimos germ. ao fr., 157
alianças com outros povos germânicos, 141; 142 época do aparecimento da passiva analítica, 185
ásdíngos e sílingos, 141 formas analíticas no lat. vulg., 94
na Ibéria, 141 compostas do mais que perfeito no fr. e no
origem, 141 it., 272
posse da Sardenha, 200; 201 do futuro e da passiva no lat. vulg., 94
primeiro reino bárbaro na África, 141; 181 do imperfeito e do perfeito do indicativo no
“Romaniae eversores”, 142; 178 gascão,219
supressão da tradição latina na África, 258 homonímia em fr., 72; 266
indistinção entre a primeira plural do presente e
VASCÔNIA
perfeito no port., 245
um dos nomes da Aquitânia, 217
infinitivo flexionado em port., 242; 271
ver “Novempopulania”
no gai., leon. e sard., 271
VATICANO, 129 manutenção das flexões número-pessoais no
ver “glossários” prov., 217
morfemas e -// nas segundas pessoas no rom.,
VEGLIOTO 254; 255
afinidade com o rét., 262 mudanças de conjugação no lat. cr., 175
desconhecido por Diez, 250 pmvebal por pluebat, 124
dialeto dalm., 194 prevalência da terceira conjugação sobre a
documentação antiga, 194 segunda no sardo, 203
origem do nome, 194 quatro conjugações no rom., 261
período de sobrevivência ao eslavo, 146 subjuntivo no imperativo negativo no prov., 217
último falante anotado por M. Bartoli, 33; 196 uso do pretérito perfeito simples nas línguas
rom., 271
VENEDI ou VENETI, 146 de a fl no balcano-rom., 263
ver “eslavos” rada por eo, 133
voz passiva no balcano-rom., 263
VÊNETO
dialetos, 196
VETERINÁRIA
falado na costa dálmata, 194
tratados, fontes do lat. vulg., 118; 119
influência sobre o dalm. e o veglioto, 195; 262
sobre o rét., 2 10
VETUS LATINA
limites com o friul., 204; 207
Afia e ítala, 126
VERBA PEREGRINA, 186 construções vulgares, 126; 174
influência do grego, 126
VERBO plebeísmos, 174
auxiliares da passiva, 94 tradução bíblica, 126; 174
consequências da supressão do /s/ final no ver­ ver “Vulgata”
bo rom., 253; 254; 255
no it., 254; 255 VILLERS-COTTERÊTS, 176; 214; 225

ÍNDICETEMÁTICO | 327
VILLOTTE VOLGARE
poesia lírica it., 250 “illustre”de Dante, 198
do log., 202
V1SIGODOS do port., 243
cultura, 142 do prov., 198
desaparecimento da língua, 158 retorno do prov. a “volgare illustre” no século
empréstimos do superstrato, 158 XVII, 214
influência, 143
invasões no Oriente e Itália, 142 VOLSCO
organização social na Ibéria, 143 documentação, 101
pedido de entrada no Império, 142 povo itálico, 87
presença na Dácia, 188 território, 101
ramo dos godos, 142
reino em Tolosa e Espanha, 142; 223 VOZ
vitória sobre os suevos, 143 auxiliares românicos na passiva, 94
eliminação da passiva sintética no lat. vulg., 94;
VITIA ET VIRTUTES ORATIONIS, 116
116; 124; 129
dos depoentes, 94
VLACHS
em Petrônio, 124
aromenos, 192
nas Glossas de Reichenau, 129
VOCABULÁRIO época do aparecimento da passiva analítica, 185
formas sintéticas em Teodósio (século IV), 121
delli Accademici delia Cntsca, 199
passiva com fieri no balcano-romance, 263
ver “dicionário”
substituição da passiva pela ativa nos tratados, 119
VOCALISMO
átono de cinco no Brasil, 245 VULGATA
redução no lat. vulg., 92; 93 exemplo de artigo indefinido, 95
tônico de sete no port. e gal., 240 no Glossário de Reichenau, 127
Der Vokalismus der Vulgãrlatein, 8 1 textos, 57; 58
tipo dc tradução, 126
VOCALIZAÇÃO tradução dc S. Jerônimo, 126
do /c/ de /-ct-/ > /u/ nos co-dialetos, 248 ver “Vetus Latina”
no cat., 232
no gal. e port., 241
no ramo ocidental, 253 W
conservação de /-It-/ no cat., 270
do /I/ > /u/ no fr., 157 /w/ germ. >/gu-/ nas línguas rom., 159
no friul, 209 /w/ > /w/ no valão, 225
no galo-romance, 209
no rét., 209 WELLENTHEORIE, 81
do /I/ > /i/ no cast. ant., 132 ver “Teoria das Ondas”
do /I/ de /-It-/, 270
do /-I/ final > /-u/ no gasc., 218 WÕRTER UND SACHEN
afinidade com a onomasiologia, 33
VOIVODA Atlas, 76
príncipe romeno, 189 etapas do método, 75

328 | ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


na geografia linguística, 73; 76 Y
método, 33; 74; 75; 76
resultados, 76 YEÍSMO
na América, 239
WORTFORSCHUNG, 75 nos co-dialetos port., 248
pesquisa da palavra, 75 nas línguas românicas, 153
sinônimo de despalatalízação, 153

X
Z
XADREZ
terminologia introduzida pelos ár., 167; 168 ZEITGEIST
“espírito da época”, 69
XÁR1AS, 149 não explica os fatos linguísticos, 69; 70

ZÉJEL, 149

IN DICE T E M Á T IC O j 329
Ín d ic e d e Pa l a v r a s

Este índice relaciona as palavras que foram analisadas ou arroladas como exemplo; transcreve-se a
forma que a palavra apresenta no texto, independentemente de outras considerações.

A acicate (port., cast.), 165 afabil (rom.), 268


acorda (rom.), 268 affidicare (lat.), 265
à(s) (port., gal.), 242 acqua (it.), 264 affikare (log.), 265
abacaxi (port.), 247 açúcar (port.), 165 agasajar (cat.), 158
abadengo (port.), 160 acucula (lat.), 97 agasalhar (port.), 158
abajur (port., rom.), 247; 268 açude (port.), 165 agazalhar (prov.), 158
abate (rom.), 268 acus (lat.), 97 agellus (lat.), 97
abba (sard.), 69 adail (port.), 165 aggio (it.), 268
abíssoluto (port.), 245 adelo (port.), 165 aggiotaggio (it.), 268
abraznic (rom.), 262 adecã (rom.), 261 ágio (port.), 268
abricó (port.), 165 adevogado (port.), 245 agios (fr.), 268
absorbi (rom.), 268 adi vogado (port.), 245 agiotage (fr.), 28
abur (rom.), 170 adjutorium (lat.), 161 agiotaje (cast.), 268
açafate (port.), 165 admira (rom.), 268 agnellus (lat.), 97
açafrão (port.), 165 aduana (port.), 165 agnile (lat.), 265
acelga (port.), 165 aer (lat.), 98 agrestis (lat.), 79
acesoriu (rom.), 261 áere (log.), 203 aguazil (port.), 165
agullò (cat.), 165 alferes (port.), 165; 167 an (prov.), 233
agúmia (port.), 165 alférez (cast.), 167 anadel (port.), 168
aia (port. ant.), 244 alfier (fr.), 167 anafil (port.), 168
aimer (fr.), 264 alfiere (it.), 167 anapoda (rom.), 169
ainse (fr. ant.), 66 alfombra (port.), 165 anathema (lat. cr.), 174
aio (port. ant.), 158 algarismo (port.), 166 âne (fr.), 264
ajedrez (cast.), 167 algarvio (port.), 165 angelus (lat. cr.), 125; 174
ajuster (fr.), 72 álgebra (port.), 166 angina (lat.), 66
ajutor (rom.), 161 algeiroz (port.), 168 ango, anxi (lat.), 66
Al-Ashbuna (ár.), 240 algodão (port.), 165 angor (lat.), 66
al-faris (ár.), 167 algús (gal.), 241 anhèt (gasc.), 218
al-fil ([ar.), 167 aljava (port.), 165 anhètsch (gasc.), 218
al-jabr (ár.), 166 aljôfar (port.), 168 animalesco (port.), 160
al-kimiya (ár.), 167 aljuba (port.), 165 anina (rom.), 79
al-ksir (ár.), 167 Alkohol (al.), 167 annectare (lat.), 265
al-kuhul (ár.), 167 allmãchtig (ah), 172 annettere (log.), 265
al-manah (ár.), 166 almanacco (it.), 167 annile (log.), 265
alamar (port.), 168 almanaque (port., cast.), 167 annodulare (lat.), 265
alberi (it.), 254 almirante (port.), 165 annoyare (log.), 265
albero (it.), 254 almocávar (port.), 168 annu (lat.), 233
Albegtii (rom.), 190 almofada (port.), 165 annubilare (lat.), 265
albornoz (port.), 165 almofariz (port.), 168 annuidzare (log.), 265
Albul (rom.), 190 almohada (cast.), 165 ansa (log.), 66
alcáçar (port.), 165 almôndega (port.), 168 ansia (cast., cat., it.), 66
alcachofa (cast.), 165 almude (port.), 165 ânsia (port.), 66
alcaide (port.), 165 alquimia (port., cast.), 167 ansiedad (cast.), 66
Alcântara (port.), 168 alt (friuh), 209 ansiedade (port.), 66
alcàsser (cat.), 165 alteru (lat.), 270 ansietà (it.), 66
alcatruz (port.), 168 *altiare (lat.), 209 antarisk (ant. a. ah), 159
alcázar (cast.), 165 altre (cat.), 270 antscheiver (eng.), 263
alcliimia (it.), 167 altro (it.), 209 anucula (lat.), 97
alcoba (cast.), 165 altsá (friuh), 209 anus (lat.), 97
alcohol (cast., cat., eng.), 167 aluá (port.), 247 anxietas (lat.), 66
álcool (it., rom., fr., ingl.), 167 aluzie (rom.), 268 anxiété (fr.), 66
álcool (port.), 167 aluziune (rom.), 268 anxietudo (lat.), 66
alcova (port.), 165 alvanel (port.), 165; 168 any (cat.), 233
aldea (cast.), 165 alvoroço (port.), 165 ano (cast.), 233
aldeia (port.), 165 amare (it.), 264 ao(s) (port., gah), 242
alecrim (port.), 168 Amarul (rom.), 190 aoüt (fr.), 266
alege (rom.), 190 âmbar (port.), 168 apartament (rom.), 268
aleitar (port.), 253 amè (cat.), 241 apetrecho (port.), 273
aleonem (lat.), 97 amenar (prov.), 218 apicula (lat.), 97
ales (rom.), 190 ameno (gah), 241 aplause (rom.), 268
alface (port.), 165 amiar (gasc.), 218 apostata (lat. cr.), 174
alfafa (port.), 165 amistoso (port.), 273 apostolus (lat. cr.), 125
alfaiate (port.), 165 amoenu (lat.), 241 apotheca (lat.), 98
alfanje (port.), 165 amor (rom.), 268 aprail (dalm.), 195

332 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


aprehensiune (rom.), 261 asino (it.), 264 ayuno (cast.), 235
aqueux (fr.), 253 assemblea (it.), 268 az-zahar (ár.), 168
Aracaju (port.), 247 assemblée (fr.), 268 azã (gasc.), 72
Araci (port.), 247 assembléia (port.), 268 azar (port., cast., prov.), 168
arado (port.), 78 assobiar (port.), 246 azeite (port.), 165
araponga (port.), 247 assoviar (port.), 246 azimut (cast., cat., fr., it.), 166
arapuca (port.), 247 asterisco (port.), 160 azimute (port.), 166
arara (port.), 247 atabal (port.), 168 azm al-fil (ár.), 168
aratru (lat., log.), 78 atalaia (port.), 168 azul (port., cast.), 165
areddare (log.), 265 atta (log.), 265 azulejo (port.), 165
•arcllarc (lat.), 265 *atta (lat.), 96 azzardo (it.), 168
arena (lat., cast., cat., prov.), 79 atterminare (lat.), 265
arestc (log.), 79 attramudare (log.), 265 B
argea (rom.), 170 attremenare (log.), 265
arinã (rom.), 79 atzar (cat.), 168 badde (log.), 201
aringus (lat. vulg.), 99 audacia (lat.), 265 badia (cat.), 99
armazém (port.), 165 auga (gal.), 241 baia (lat. vulg.), 99
armonie (rom.), 268 aur (prov., rom.), 216; 233 bala (port.), 99
arquitrave (port.), 264 aurelha (prov.), 97 baie (fr.), 99
arrabal (cast.), 165 auricula (lat.), 97 bairro (port.), 165
arrabalde (port.), 165 auricular (port.), 266 ba!(i)neum (lat.), 98
arrai (gasc.), 218 auru (lat.), 233 balcone (it.), 159
arrais (port.), 165 Ausdruck (al.), 172 baldaquim (port.), 168
arram (gasc.), 218 ausdruckvoll (al.), 172 baldar (port., cast., cat.), 165
arrancura (cast.), 218 Ausnahme (al.), 172 baldio (port.), 165
arrasim (gasc.), 218 auter (rét.), 209 baldo (port.), 165
arrat (gasc.), 218 autre (fr.), 209 balk (lomb.), 159
arrátcl (gasc.), 168 autre (prov., fr.), 270 balneus (lat.), 123
arrazón (cast.), 218 auzi (rom.), 2 16 bambou (fr.), 273
arregonad (log.), 201 auzir (prov.), 216 bambu (malaio, port., cast.), 273
arrière-garde (fr.), 268 avajon (gasc.), 219 Bambus (rolir) (al.), 273
arriu (gasc.), 218 avenarius (lat.), 265 banana (port.), 273
arriyer (arag.), 218 avere (it.), 264 banca (it.), 159
arroba (port.), 165 aveuglerie (fr.), 266 bancã (rom.), 268
arroda (gasc.), 218 aveuglesse (fr.), 266 bancarrota (port.), 264
arroz (port.), 165 aveugleté (fr.), 266 banco (port.), 264
arrugia (basc.), 157 aveugleiire (fr.), 266 banka (lomb.), 159
arruinaa (galur.), 201 aveuglissement (fr.), 266 bansts (gót.), 160
arsenal (port.), 165 aveugloison (fr.), 266 baptisma (lat. cr.), 174
artã (rom.), 268 avocat (rom.), 268 baptismus (lat. cr.), 125
artelli (prov.), 266 avoengo (port.), 160 baptizare (lat. cr.), 174
arte Ilio (port.), 266 avoir (fr.), 264 baptizo (lat. cr.), 125
articulação (port.), 266 avori (prov.), 168 baracca (it.), 272
articular (port.), 266 avorio (it.), 168 barão (port.), 97; 267
articulu (lat.), 266 avul (alb.), 170 baraque (fr.), 272
as-simut (ár.), 166 axedreç (cast. ant.), 167 Baraúna (port.), 247
asamblea (cast.), 268 aya (cast.), 158 baro (germ.), 267

Indice d e palavras | 333


barón (cast.), 97; 267 bín (dalm.), 261 brigadier (fr., cast.), 268
baron (fr.), 267 binu (log.), 69 brigata (it.), 268
barone (it.), 267 binza (log.), 78 britar (port.), 142
barraca (cast.), 272 biot (lomb., piem.), 158 •briutan (suevo), 142
barrer (port.), 246 bioto (vên.), 158 broda (rom.), 268
baselga (port.), 240 biso (lat. vulg.), 125 brun (fr.), 157
baselgia (rét.), 209 bispo (port.), 168 brutes (lat. vulg.), 99
basílica (lat. cr.), 240 biut (piem.), 158 buarba (dalm.), 195
basium (lat. vulg.), 99 bizar (base.), 272 bubalus (lat.), 98
bassoura (port.), 246 bizarre (fr.), 272 bubulcus (lat.), 98
bastão (port.), 97 bizarro (port., cast., it.), 272 bucã (rom.), 252
bastard (cat., rom.), 160 blanditia (lat.), 161 bucca (lat.), 96, 252
bastard (fr. ant.), 160 blâo (franc.), 157 bucliet (rom.), 269
bastardo (port., cst., it.), 160 blau (germ., cat.), 165 budze (alb.), 170
bastart (prov.), 160 *b!auths (gót), 158 bueno (cast.), 238; 241; 271
bastião (port.), 264 blavor (cat.), 165 buey (cast.), 216
baston (prov., cat., cast.), 97 bleu (fr.), 157; 165 bufalus (lat.), 98
bastone (it.), 97 blindeje (rom.), 161 bufulcus (lat.), 98
bastonem (lat.), 97 bo (cat.), 271 buimac (rom.), 162
bastum (lat.), 97 bo (gal.), 241 buka (vegl.), 252
batalie (rom.), 268 boca (port., cast., cat., prov.), buke (alb., friul.), 252
bâtard (fr.), 160 252 bukka (log.), 203; 252
batata (port., cat., cast.), 272 bocca (it.), 252 bufir (eng.), 79
Batate (al.), 272 boe (log.), 216 bulir (friul.), 79
bátil (ár.), 165 bogat (rom.), 147 bullir (cat.), 79
bâton (fr.), 97 boi (port.), 216 bullire (lat.), 79
be (gasc.), 219 bollire (it.), 79 buoka (eng.), 252
bebericar (port.), 160 boluerit (lat. vulg.), 125 buona (fr. ant.), 227
beijo (port.), 245 bom (port.), 241 buor (rom.), 190
belette (fr.), 77 bonu (lat.), 241; 271 buòu (prov.), 216
bellum (lat.), 124 bori (cat., base.), 168 burel (port.), 270
bellus (lat.), 124 borir (gasc.), 218 burgisk (ant. a. al.), 159
benderent (lat. vulg.), 125 borzeguim (port.), 168 burgus (lat. vulg.), 99
bendidore (log.), 253 bos (lat.), 98 buriti (port.), 247
bèra (gasc.), 218 Botucatu (port.), 247 burlac (rom.), 162
Bernard(o) (port.), 160 bou (cat.), 216 burlesc (prov., cat., eng., rom.),
Bernhart (germ.), 160 bouche (fr.), 252 159
bérniszkas (litu.), 159 bouillir (fr.), 79 burlesque (fr.), 159
berrudu (log.), 265 boulhir (prov.), 79 bursa (lat.), 98
bes (gal.), 241 bour (rom.), 190 buzã (rom.), 170
bètsch (gasc.), 218 bove (lat.), 2 16
beugen (al.), 245 bracc(h)ium (lat.), 96 C
bial (dalm.), 195 brad(rom.), 170
bicha (port.), 247 brasileiro (port.), 245 cabajo (cast. amer.), 239
bide (log.), 78 braun (al.), 82 caballo (cast.), 239
bien (dalm.), 261 breth (alb.), 170 caballus (lat.), 96
bigey (gasc.), 72 brigadeiro (port.), 268 cabalo (gal.), 241

334 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
cabayo (cast. amer.), 239 cantar (prov.), 221 cattus (ibér., afr.), 99
cabra (prov.), 216 cantare (lat.), 96; 97 cauda (lat.), 112
cabri (fr.), 79 cantilena (port.), 264 caudilho (port.), 273
cabrit (prov., cat.), 79 cap(p)onem (lat.), 97 cauhar (gasc.), 218
cabrito (port., cast.), 79 capell (prov., cat.), 267 causa (lat., prov., leon.), 233;
cacao (cast., fr., it.), 272 capitinae (lat.), 124 236
cacau (port.), 272 cappello (it.), 267 causa (lat., vegl.), 80
cacumen (lat.), 98 cappellu (lat.), 267 cauza (prov.), 80
cadeia (port.), 252 capretto (it.), 79 cavai (prov.), 226
cadena (cast., cat., prov.), 252 caprittus (lat.), 79 cavallo (cast. ant.), 238
cadimo (port.), 165 capum (lat.), 97 cavush (tur.), 169
caecitatem (lat.), 266 cara (lat.), 98 Caxambu (port.), 247
Caesaraugusta (lat.), 168 Caraguatatuba (port.), 247 caye (cast. amer.), 239
cáfila (port.), 168 Carangola (port.), 247 cebola (port., prov.), 252
caipora (port.), 247 carapace (fr., it.), 272 cebolla (cast., cat.), 252
caje (cast. amer.), 239 carapaclio (cast.), 272 cécité (fr.), 266
cal (cat., prov.), 137 caparaça (port.), 272 cel (cat.), 216
calamus (lat.), 98 cardonem (lat.), 97 cèl (prov.), 216
calcitrare (lat.), 265 cardu(u)m (lat.), 97 cenk (húng.), 169
caldo (it.), 264 care (rom.), 137 cennamella (it.), 266
calendaria strena (lat.), 265 cargar (prov.), 222 cent (cat.), 271
calentura (camp.), 201 carierã (rom.), 269 centu (lat.), 271
califa (port.), 165 carmesim (port.), 165 *cepulla (lat.), 252
calvitie (fr.), 266 carnalis (lat. cr.), 174 cérebro (port.), 161
calvitiem (lat.), 266 carnavá (rét.), 209 cerebrum (lat.), 161
cama (gasc.), 219 carnavalesco (port.), 160 cerf (fr.), 264
camarada (port., prov., cast.), 272 carnelevare (lat.), 209 cero(cast.), 166
camarilha (port.), 273 carnevale (it.), 209 certo (cast. dial.), 236
camera (lat.), 98 carpete (port.), 247 cervo (it.), 264
camarade (fr.), 272 cartucho (port.), 264 cetate (rom.), 169
camarata (it.), 272 caruru (port.), 247 chaine (fr.), 252
camisola (port.), 264 cas (gal.), 241 chalare (lat.), 98
camos (prov.), 156 casa (log. ant.), 80 chama (port., gal.), 241
camoscio (it.), 156 casa (lat., port., it.), 79 chamois (fr.), 156
camox (lat.), 156 casa (prov.), 221 chanter (fr.), 221
camozza (it.), 156 castanhola (port.), 273 chapeau (fr.), 267
campana (lat., rét., it.), 209 castel (prov.), 226 chapéu (port.), 267
camurça (port.), 156 castelo (port.), 226 charger (fr.), 221
candeeiro (port.), 247 castèt (gasc.), 218 chargier (fr. ant.), 221
candomblé (port.), 247 castètsch (gasc.), 218 charisma (lat. cr.), 125
cane (it.), 254; 264 castra (lat.), 165 château (fr.), 226
cani (it.), 254 casulas (lat.), 124 chaud (fr.), 264
canibal (cast.), 272 cata (lat.), 98 chauveure (fr.), 266
canibal (port.), 272 catechumenus (lat. cr.), 125 chauve (fr.), 253
cannibal (fr.), 272 catena (lat., it.), 252 chauvece (fr.), 266
cannibale (it.), 272 catina (mác.-rom.), 252 chauveur (fr.), 266
cano (lat.), 96 cattum (lat.), 72 chavál (rét. or.), 208

ín d ic e d e p a l a v r a s I 335
chavals (rét. oc.), 208 claire voie (fr.), 267 condestável (port.), 267
chave (port., gal.), 241 clamare (lat.), 241 conejo (cast.), 235
cliavra (prov.), 216 clarabóia (cast.), 267 conello (arag. ant.), 235
check (ingl.), 167 clarabóia (port.), 267 conelyo (moçár.), 235
cheio (port.), 241 clave (lat.), 241 confeitaria (port.), 248
cheo (gal.), 241 clé (fr.), 208 confiteri (lat. cr.), 175
chèque (fr.), 167 clef (fr.), 208 conil (fr. ant.), 235
cheque (port.), 167 co (gal.), 241 conilh (prov.), 235
chestiune (rom.), 269 cos (gal.), 242 coniugare (lat.), 203
chcval (fr.), 226 coas (gal.), 242 connestabile (int. ant.), 267
chèvre (fr.), 216 coapsã (rom., mac.), 262 connétable (fr.), 267
cliez (fr.), 221 çoban (tur.), 169 construi (rom.), 269
chien (fr.), 264 coccinu (lat.), 263 consulta (rom.), 310
chiesa (it.), 209 cochleariu (lat.), 80 conte (prov., it.), 267
chieu (franc.-prov.), 221 coda (lat. vulg.), 112 contestábile (it.), 267
chievre (fr. ant.), 216 code (fr.), 263 copia (rom.), 261
chievre (franc.-prov.), 216 codex (lat.), 263 copie (rom.), 269
chiffler (fr.), 99 codi (prov., cat.), 263 copil (rom.), 69; 170
chiffre (fr.), 166 código (it.), 263 cordilheira (port.), 273
chiflar (cat.), 99 código (port., cast.), 263 coroa (port.), 245
chilie (rom.), 169 coelho (port.), 235 corona (lat.), 98
chillar (cast.), 99 coeur (fr.), 226 corpo (port.), 226
chocolate (port., cast.), 272 cognatus (lat.), 190 corps (fr.), 226
choisir (fr.), 157 coisa (port.), 80; 237 corredor (cast.), 272
chorda (lat.), 98 coiuccm (lat. vulg.), 115 corridoio (it.), 272
chose (fr.), 80 coixi (cat.), 165 corridore (it.), 272
chover (port.), 124 colaphus (lat.), 98 corrúpito (port.), 245
chuiva (gal.), 241 colcha (port.), 273 cors (fr. ant., prov.), 226
chuva (port.), 241 coleonem (lat.), 97 cort (arag.), 234
chuviscar (port.), 160 colher (port.), 80 corvo (gal.), 240
chuvisco (port.), 160 com (port.), 241 cosa (cast., cat.), 80; 233
ciarto (cast. dial.), 236 comadrcja (cast.), 77 cotschcn (eng.), 263
cibouie (fr.), 252 combate (rom.), 269 cousa (port.), 80, 237
ciei (fr.), 216; 264 comedere (lat.), 81; 270 coxa (lat.), 262
cielo (it., cast), 216; 264 comer (port., cast.), 81; 270 coza (eng.), 80
cien (cast.), 271 comisión (gal.), 241 coze (friul.), 80
cierto (cast.), 236 comissió (cat.), 241 crapula (lat.), 98
cifra (port., cast., it.), 166 comite (lat.), 267 creanza (it.), 272
ciguola (eng.), 252 commissione (lat.), 241 credere (it.), 264
cinque (lat. vulg.), 203 companio (lat. vulg.), 99 creier (rom.), 161
cinste (rom.), 161 compassio (lat.), 172 créolc (fr.), 273
cioban (rom.), 147; 169 completa (rom.), 261 crèolo (it.), 273
cioccolato (it.), 272 compune (rom.), 269 crepa (rom.), 80
ciolan (rom.), 193 comte (fr.), 267 crepare (lat.), 80
cipher (ingl.), 166 comú (cat.), 241 crianza (cast.), 272
cipolla (it.), 252 con (cast.), 241 criollo (cast.), 273
duitatem (lat.), 169 conde (port., cast., cat.), 267 crioulo (port.), 273

336 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
erisma (lat. er.), 174 désire (fr.), 222 drag (rom.), 147; 161
crivello (it.), 209 desiro (franc.-prov.), 222 dragiu (celt.), 209
croire (fr.), 264 despistar (port.), 247 drai (rét. centr.), 209
crusca (it.), 198 det (prov., friul.), 266 dras (rét. or.), 209
esinos (hiing.), 169 deteo (vegl.), 266 dratg (rét. oc.), 209
cual (cast., friul.), 137 dette (fr.), 222 drei (rét. centr.), 209
cubiculum (lat.), 124 dètz (prov.), 216 dresa (rom.), 269
cuchara (cast.), 80 deude (prov.), 222 dromir (gasc.), 219
cucliiaio (it.), 80 dente (prov.), 222 dsingás (húng.), 169
cudesch (eng.), 263 deux (fr.), 253 due (it.), 253
cuer (fr. ant.), 226 deviszkas (litu.), 159 dulur (prov.), 216
cuerpo (cast.), 226 dez (port.), 216 dum (port.), 242
cu ilier (fr.), 80 dezeji (prov.), 222 dun (gal.), 242
cuius (lat.), 270 diabolus (lat. cr.), 174 duos (lat., log.), 253
cujo (port.), 270 diaconus (lat. cr.), 125; 174 dura (rom.), 269
cum (lat.), 241 didu (log.), 266 dus (eng.), 253
cumnat (rom.), 190 dieci (it.), 216 dzuono (franc.-prov.), 222
cuphola (tosc.), 256 diek (dalm.), 261
curculio (lat.), 96 diesch (eng.), 216 E
curriculum vitae (lat.), 172 diez (cast.), 216
curte (rom.), 270 digitação (port.), 266 e (gasc.), 2 19
curupira (port.), 247 digital (port.), 266 eau (fr.), 253, 264
cuscuz (port.), 247 digitu (lat.), 266 *eboreus (lat.), 168
cuyo (est.), 270 dik (dalm.), 261 ecclesia (lat. cr.), 125; 174
cyma (lat.), 98; 169 disinvoltura (it.), 272 échapper (fr.), 66
cymae (lat.), 124 discuta (rom.), 269 echar (cast.), 235
dit (cat.), 266 échec et mat (fr.), 167
D ditlio (tosc.), 256 échecs(fr.), 167
dito (it.), 266 edu (log.), 98
daint (eng.), 266 djalina (rét. or.), 208 Eid (al.), 245
dais (dalm.), 161 djilina (rét. centr.), 208 Eindruck (al.), 172
debalde (port.), 165 djilinya (rét. oc.), 208 eleemosyna (lat. cr.), 125; 174
deberi (port.), 245 do (s) (port., gal.), 242 elex (lat.), 98
décourager (fr.), 269; 270 doctor (rom.), 269 Elfenbein (al.), 168
dedo (fran.-prov.), 222 dodecimo (lat. vulg.), 125 clisire (it.), 167
dedo (port., cast.), 266 doi (friul., vegl., rom.), 253 élixir (fr.), 167
dege (log.), 216 doigt (fr.), 266 elixir (port., cast., rom.), 167
deget (rom.), 266 doir (dalm.), 195 elm (prov.), 157
delegacia (port.), 247 dois (port.), 253 elmo (port., cast., it.), 157
densus (lat.), 80, 161 dolor (prov. ant.), 216 emboscada (port.), 264
déperc (log.), 203 domo (log.), 79; 203 emda (rét.), 209
dépiri (camp.), 203 domusionem (lat.), 124 emojiona (rom.), 269
déplorcr (fr.), 270 doninha (port.), 77 empregada (port.), 248
depte (prov.), 222 donnola (it.), 77 en balde (cast.), 165
derrapar (port.), 247 dos (cast., prov., cat.), 253 enarzu (log.), 265
des (rom.), 80, 161 do shkruaj (alb.), 263 encia (cast.), 235
desenvoltura (cast.), 272 doutori (port.), 245 endechas (port.), 273

I n d ic e d e p a l a v r a s I 337
endosar (cast), 268 explicajie (rom.), 269 fervere (lat.), 79
endossar (port.), 268 expressif (fr.), 172 fete (fr.), 225
endosser (fr.), 267 expression (fr.), 172 feticcio (it.), 273
enebro (cast.), 235 Exu (port.), 247 fetiche (fr.), 273
enero (cast.), 235 ey (port. ant.), 244 *fetiolum (lat.), 190
enferkire (log.), 265 feu (fr.), 81, 252
enfermidade (gal.), 241 F Feuchtigkeit (al.), 245
enténer (gasc.), 219 feuille (fr.), 155
entre (fr., prov.), 222 fablado (cast. ant.), 238 fevre (fr. ant.), 222
entro (franc.-prov.), 222 fabre (prov.), 222 fi (fr. ant.), 252
épais (fr.), 80 façanha (port.), 273 fiar (dalm.), 195
épier (fr.), 159 faika (vegl.), 252 fiat (friul.), 75
epifania (lat. cr.), 175 faisan (fr.), 72 fic (eng.), 252
episcopus (lat. cr.), 125; 174 falce (lat.), 78 ficat (rom.), 75
era (gasc.), 218 falei (port.), 245 ficatum (lat.), 75
eredesveorum (lat. vulg.), 125 famille (fr.), 225 Fichur (húng.), 190
ericionem (lat.), 97 fandango (port.), 273 ficior (rom.), 190
ericium (lat.), 97 fanfaron (fr.), 272 fico (it.), 252
errege (base.), 157 fanfarrão (port.), 272 ficum (lat.), 75; 252
erripa (base.), 157 fanfarrón (cast.), 272 fides (lat. cr.), 125
errota (base.), 157 fanfarrone (it.), 272 fiera (cast.), 271
escacs (cat.), 167 fara (lomb.), 158 fierbe (rom.), 79
escapar (port., cast., cat., prov.), faraina (dalm.), 195 fiesse (vai.), 225
66 farina (prov.), 218 figa (cat., prov.), 252
escarlate (port.), 165 farke (log.), 78 figà (venez.), 75
espeso (cast.), 80 fauce (lat.), 112; 155 fígado (port.), 75
espesso (port.), 80; 161 favro (franc.-prov.), 222 figáu (carnp.), 75
espiar (port., cast., cat.), 159 fazen (cast. ant.), 238 figlie (it.), 201
esquadra (port.), 247 fechar (port.), 245 figlio (it.), 264
esquia (gasc.), 218 fecior (rom.), 190 figo (port.), 75; 252
esquina (prov.), 218 fedge (cat., prov.), 75 figu (log.), 252
estaca (port., cast., cat., prov.), fegato (it.), 75 figue (fr.), 252
158 feitiço (port.), 273 filio (tose.), 256
estona (gasc.), 219 fekuat (vegl.), 75 fiku (sic. corso), 252
estrecho (cast.), 270 felizardo (port.), 160 fila (port.), 247
estreito (port.), 270 fembra (cat.), 232 fildej (rom.), 168
estret (cat., prov.), 270 femier (fr.), 72 filo (leon.), 237
étroit (fr.), 270 femina (it.), 201 fils (fr.), 264
eucharistia (lat. cr.), 125; 174 fentna (prov.), 232 filu (lat.), 155
Eule (al.), 245 fender (port.), 80 *fimarium (lat.), 72
evangelium (lat. cr.), 25; 174 fendere (it.), 80 finanças (port.), 268
éveillette (fr.), 77 fendre (cat., prov., fr.), 80 finance (fr.), 268
evori (prov., cat.), 168 fera (lat., cat.), 271 financeiro (port.), 268
exeappare (lat.), 66 ferir (cast. ant.), 238 financier (fr.), 268
exceptio (lat.), 172 ferro (port., gal.), 240 finanza (it.), 268
exemplu (rom.), 269 ferrolho (port.), 72 finanziario (it.), 268
expandere (lat.), 154 ferver (port.), 79 findere (lat.), 80

338 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


finer (fr.), 268 Fortiz (cast.), 155 fulla (cat.), 155
fió (eng.), 75 Fortschritt (al.), 172 fulminante (port.), 247
fio (gal.), 240 fou (fr.), 168 furnée (fr.), 72
fiore (it.), 254 fourmi (fr.), 252 fumier (fr.), 72
fiori (it.), 254 fra (eng.), 80 funis (lat.), 98
firie (fr. ant.), 75 frade (port.), 80 funisks (gót.), 159
fiscal (port.), 248 fradèl (lomb.), 80 fuòc (prov.), 216
fiyat (friul.), 75 fradelo (vên.), 80 fuoco (it.), 81; 216; 252
flaccus (lat.), 96 fradi (log., friul.), 80 fuok (dalm.), 261
flamma (lat.), 241 fradi (eng.), 80 fuola (vegl.), 155
flokr (rét. oc.), 209 fráire (piem.), 80 furca (lat.), 222
flor (prov. ant.), 2 16 fraire (prov.), 80 furmia (eng.), 252
floresta (port., cast.), 267 framsteg (sueco), 172 furmica (lat., rom.), 232; 252
fluid (rom.), 269 frar (eng.), 80 furnu (lat.), 155
flur (açoriano), 244 frate (nap., it. ant., rom.), 80 fuxides (gal.), 241
foaie (rom.), 155 fratele (rom.), 263
foc (cat., rom.), 81; 252 fratello (it.), 80 G
foce (lat. vulg.), 112 fratellu (lat.), 80
focu (lat.), 81; 152 frater (lat.), 80 gahlaiba (germ.), 99
fodza (log.), 155 frati (sic.), 80 gal (prov.), 226
fog (eng.), 81; 252 fray (cast.), 80 galão (port.), 247
fbgla (eng.), 155 freba (log.), 201 galbinu (lat.), 222
foglia (it.), 155 fred (cat., friul ), 80 galhardo (port.), 160
fogo (port.), 81; 216; 252 freddo (it.), 80 gallum (lat.), 72
fogu (log.), 81; 252 freg (prov.), 80 galo (port.), 226
foi (fr.), 266 frei (port.), 80 galos (gal.), 241
foice (port.), 78 Freiheit (al.), 245 gambá (port.), 247
foie (fr.), 266 Fremskrid (din.), 172 gamuza (cast.), 156
fois (fr.), 266 frère (fr.), 80 ganir (port.), 158
foku (vegl.), 252 frigidus (lat.), 80; 155 ganso (port., cast.), 158
folha (port., prov.), 155 frio (port., cast.), 80; 155 gansus (gót.), 158
folia (lat.), 155; 232 frittu (log.), 80 garder (fr.), 225
folia (gal.), 240 froid (fr.), 80 garia (gasc.), 218
folos (rom.), 169 fronesta (sard.), 201 ‘ gasalya (gót.), 158
fondón (cast. ant.), 238 fuals (dalm.), 195. gat (gasc.), 72
fontana (it.), 201 fuec (prov.), 81, 252 gaula (dalm.), 195
forest (prov.), 267 fuego (cast.), 81; 155; 216; 252 gazalha (prov.), 158
forcsta (it.), 267 fuellia (prov.), 232 Gegenstand (al.), 172
forestis (lat.), 267 fuerça (cast. ant.), 238 gelar (port.), 235
forêt (fr.), 267 fuertse (franc.-prov.), 222 gelare (lat.), 235
formaika (vegl.), 252 fuerza (cast.), 238 gener (cat.), 235
formica (lat., it.), 252 fug (friul.), 81; 252 général (fr.), 268
formiga (log.), 252 fuggire (it.), 201 general (port., cast.), 268
formiga (port., cat., prov.), 232; fugis (port.), 241 generale (it.), 268
252 fugitis (lat.), 241 gengiva (lat., port.), 235
formula (rom.), 269 fuk (dalm., vegl.), 81; 261 geniperu (lat.), 235
‘ fortia (lat.), 238 full (cat.), 232 gennaio (it.), 235

ÍN DICE DE PALAVRAS 339


germanu (lat.), 235 guinder (fr.), 159 hiéu (gasc.), 155
gcsa (rét.), 209 guiza (prov.), 158 higo (cast.), 252
ghindare (it.), 159 gurdus (lat. vulg.), 99 hik (gasc.), 252
gia (log.), 158 gurgulio (lat.), 96 hilha (gasc.), 218
giànna (log.), 179 guttur (lat.), 96 hilms (germ.), 157
gibbus (lat.), 96 hilo (cast.), 155; 240
gígílice (rom.), 161 H hiu (gasc.), 218
gínd (rom.), 169 hlor (gasc.), 218
ginete (port.), 165 hablado (cast.), 238 lioja (cast.), 155; 232; 240
giocolare (it.), 266 liacen (cast.), 238 hombre (cast.), 241
giocoliere (it.), 266 haedus (lat.), 79 home (gal.), 241
giorni (it.), 254 ♦hagya (gót.), 158 homem (port.), 241
giorno (it.), 254 liaie (fr.), 225 homenagem (port.), 267
gíríit (rom.), 161 liaír (fr.), 157 homenaje (cast.), 267
giullare (it.), 266 haja (port.), 244 hommage (fr.), 267
glace (fr.), 208 haladás (húng.), 172 homme (fr.), 264
gladius (lat.), 98 haría (gasc.), 218 homoc (rom.), 79
glatsch (rct.), 208 harri (gasc.), 219 liondo (cast.), 238
glatsclia (rét. or.), 208 harundo (lat.), 98 hondón (cast.), 238
godazzo (lomb.), 209 hasard (fr.), 168 hormiga (cast.), 232; 252
gond (húng.), 169 hatjan (franc.), 157 horno (cast.), 155
grabatus (lat.), 98 hàure (gasc.), 218 hort (cat.), 271
Graeculis (lat.), 124 haut (fr.), 157; 265 Hortiz (cast.), 155
grande (it.), 79 hauteur (fr.), 157 hortu (lat.), 271
grandis (lat.), 79 liaya (vai.), 225 hospitium (lat.), 161
gratia (lat. cr.), 175 heaume (fr. ant.), 157 houèc (gasc.), 155; 218
grotesco (port.), 160; 264 hebdomas (lat.), 209 hrcd (gasc.), 218
grumas (alb.), 170 hechizo (cast.), 273 hubo (cast.), 238
grumaz (rom.), 170 hediondo (port.), 273 huelho (gasc.), 155
guabiroba (port.), 247 hegen (al.), 158 huerto (cast.), 271
Guandu (port.), 247 hei (port.), 244 huevos (cast.), 69
guanir (cast.), 158 helar (cast.), 235 huit (fr.), 253
guapto (vegl.), 253 lielm (fr.), 157 híirnu (gasc.), 155
Guaraciaba (port.), 247 lielm (germ.), 99
guardal-omu (sic.), 77 hembra (cast.), 232
guardar (port., cast., cat., prov.), hender (cast.), 80
225 herdamento (port.), 244 iactare (lat.), 235
guardare (it.), 225 heredamiento (cast.), 244 ianua (lat.), 79
guardar (eng.), 225 heret (gasc.), 155 ianuariu (lat.), 235
gubernare (lat.), 98 herir (cast.), 238 icã (melg.-rom.), 252
gíidaz (rét.), 209 hermano (cast), 235 ictus (lat.), 98
gudisks (gót.), 159 Hcrta (al.), 82 iecur (lat.), 75
guia (port., cast., cat.), 158 Hcrtsa (al.), 82 ied (rom.), 79
guidaz (rét.), 209 Hertz (al.), 82 ieiunu (lat.), 235
guide (fr.), 198 hervir (cast.), 79 lemanjá (port.), 247
guie (fr.), 158 hic (mác.-rom.), 252 ignis (lat.), 81
guindar (port., cast.), 159 hierro (cast.), 240 ilex (lat.), 98

340 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


impedido (port.), 247 izár (bearn.), 156 juriti (port.), 247
important (rom.), 269 izar-di (ibér.), 156 jutge (cat.), 201
imprcssion (fr.), 172 izardum (bas.), 156
improbe (lat.), 162 izárt (gasc.), 156 K
improbus (lat.), 162 izbavi (rom.), 161
inapoi (rom.), 161 izvor(rom.), 147 kadaina (eng.), 252
íncepe (rom.), 263 kadena (friul.), 252
incipere (lat.), 209 J kadine (gasc.), 252
incleger (eng.), 263 Kaddu (log.), 101; 156; 201
inclér (eng.), 263 ja (gasc.), 219 kaina (dalm.), 195
indefletus (lat.), 162 jabal (ár.), 168 Kakao (al), 272
indelebilis (lat.), 162 jabalii (ár.), 168 kakauatl (nauatl), 272
indigestus (lat.), 162 jabón (cast.), 252 kal (vegl.), 137
infercire (lat.), 265 jaburu (port.), 247 kalaur (dalm.), 195
inferre (lat.), 265 jabuticaba (port.), 247 kale (log.), 137
inferrere (log.), 265 jacá (port.), 247 kalkidare (log.), 265
infundere (lat.), 154 jacarandá (port.), 247 kaluger (esl. ant.), 169
ínger (rom.), 189 jacaré (port.), 247 kamosh (lomb.), 156
ingrat (rom.), 269 jal (fr. ant.), 226 kamuotsch (eng.), 156
innabilis (lat.), 162 janeiro (port.), 235 kamus (piem.), 156
innocuus (lat.), 265 janvier (fr.), 235 kamuts (friul.), 156
innókidu (log.), 265 jaque mate (cast.), 167 kandelarzu (log.), 265
insufla (rom.), 269 jarra (port.), 165 kanté (norm.), 225
in(elcgc (rom.), 263 jaune (fr.), 222 kapul (vegl.), 252
intellegere (lat.), 263 javali (port.), 168 kapula (dalm.), 252
íntli (rom.), 147 javardo (port.), 160 kariaza (log.), 203
iocularis (lat.), 266 jebel (ár.), 168 kataina (vegl.), 252
ipê (port.), 247 jebra (gal.), 79 kausyan (franc.), 157
Iracema (port.), 247 jejum (port.), 235 kelija (esl. ant.), 169
irringraziá (galur.), 201 jenáir (moçár.), 235 kelu (log.), 203; 216
irriquietus (lat.), 162 jenero (leon., cast. ant.), 235 kentu (log.), 203
isar (bearn.), 156 jerimum (port. bras.), 245 kerrere (log.), 79; 81
isarda (cat.), 156 jibào (port.), 165 kimbe (log.), 203
isárt (cat.), 156 joculer (fr. ant.), 266 kindisk (ant. a. al.), 159
ishri (berb.), 156 joglar (prov.), 266 Kjõnne (dinam.), 77
Itapecirica (port.), 247 jogler (fr. ant.), 266 klaf (rét. oc. e or.), 208
Itapira (port.), 247 joiva (dalm.), 195 kle (rét. centr.), 208
Itatiaia (port.), 247 jude (rom.), 190 kofsliê (alb.), 262
Itatiba (port.), 247 jugo (port.), 78 konyuyu (log.), 265
iubi (rom.), 147; 161 juiggi (campid.), 201 kopil (alb.), 170
iudcx (lat.), 190 jujje (nuor.), 201 kopsa (serv.-croat.), 262
iugu (lat.), 78 Jungfru (sueco), 77 koyuare (log.), 203
iurisqueorum (lat.), 125 junipero (port.), 235 krauk (dalm.), 195
ivoire (fr.), 168 jupc (fr.), 165 Kreole (al.), 273
ivori (prov.), 168 Jupira (port.), 147 krie (alb.), 161
ivoriu (rom.), 168 Juraci (port.), 247 kuarn (dalm.), 195
izar (bas.), 156 Jurema (port.), 247 kuosa (dalm.), 195

ÍN DICE DE PALAVRAS 341


k y a m o rts ( tir o l.) , 156 lé g u a ( p o r t . ) , 2 6 7 lu ( v ) a ( c a s t. a n t . ) , 1 5 8

k u y u ( lo g . ) , 2 7 1 le g u a ( p o r v . ) , 2 6 7 lu a ( g a s c . ) , 2 1 8

le ir ó s ( g a l. ) , 2 41 lu a ( p o r t . ) , 2 1 6

L le it ã o ( p o r t . ) , 2 5 3 lu c r t i ( la t . , r o m . ) , 7 9 ; 8 0

I c it e ( p o r t . , m o ç á r . , g a l. ) , 2 3 5 ; lu c t a ( la t . ) , 2 6 2

la ( g a . ) , 2 4 1 2 41; 245; 253 lu f t e ( a l b . ), 2 6 2

lã ( p o r t . ) , 2 4 1 l e it e ir o ( p o r t . ) , 2 5 3 l i in a ( p r o v . ) , 2 3 3

la h a s a ( t o s c . ) , 2 5 6 le it e r ia ( p o r t . ) , 2 5 3 lu n a ( p r o v . c a s t.) , 2 1 6 ; 2 3 3

là b ( h ú n g . ) , 1 6 9 le it o ( p o r t . ) , 2 1 6 lu n e ( f r . ) , 2 1 6

la c ( r o m . ) , 1 9 0 le it o s o ( p o r t . ) , 2 5 3 lu p h o ( t o s c . ) , 2 5 6

la c h ( p r o v . ) , 2 5 3 le n s ( la t . ) , 9 7 lu p t ã ( r o m . ) , 2 6 2

la c te ( la t . v u lg . ) , 2 5 3 ; 2 7 0 le n t ic u la ( la t . ) , 9 7 lu p u s ( la t . ) , 9 8

lá c te o ( p o r t . ) , 2 5 3 le t t o ( i t . ) , 2 1 6 L u r e t u ( is t r . - r o m . ) , 2 5 9

la c t ic u lo s u s ( la t . ) , 1 2 4 le u c a ( g a l. ) , 2 6 7 lu t u ( la t . ) , 2 7 0

la c t o b io s e ( p o r t . ) , 2 5 3 li ( n ) g u la ( la t . ) , 8 0 ; 161 lu v a ( p o r t . ) , 1 58

la c t o c r o m o ( p o r t . ) , 2 5 3 li e c l i ( p r o v . ) , 2 1 6

la c to s e ( p o r t . ) , 2 5 3 lie it (p ro v .), 2 1 6 M
la c to s o ( p o r t . ) , 2 5 3 lig n a ( la t . c r .) , 1 75

la c u s ( la t . ) , 1 9 0 li m ã o ( p r o t . ) , 1 6 5 m à (c a t.), 241

la g a s t ( g a s c . ) , 2 1 9 li n c e d ( r o m . ) , 161 m ã ( a ç o r ia n o ) , 2 4 4

la h te ( m o ç á r . ) , 2 3 5 li n d o ( c a s t., it . ) , 2 7 2 m a c e llu m ( la t . ) , 9 8

la it ( f r „ f r i u l . ) , 2 5 3 lin g u r ã ( r o m . ) , 8 0 ; 161 m a c h in a ( la t . ) , 9 8

la it e ( m o ç á r . ) , 2 3 5 li n u ( la t . ) , 2 7 0 m a c u m b a (p o rt.), 2 4 7

la k u ( i s t r . - r o m . ) , 2 5 9 lip p u s ( la t . ) , 9 6 m a d re ( it .) , 2 6 4

la m b is c a r ( p o r t . ) , 1 6 0 l i p s i ( r o m . ) , 1 65 m a d u r ( c a t . , p r o v ., e n g . , f r i u l . ) ,

la m n a ( la t . v u lg . ) , 1 2 4 L is b o a ( p o r t . ) , 2 4 0 252

la m p a s ( la t . ) , 9 8 L is b o n a ( c a s t. a n t . ) , 2 4 0 m a d u ro (p o rt.), 2 2 6 ; 2 5 2

la n a ( c a s t.) , 2 4 1 Iit ( fr.), 2 1 6 m a d u r u ( lo g . ) , 2 5 2

la n a (g a s c .J t 2 1 9 liu t o ( it.) , 2 6 6 m a g n a lia ( la t . c r .) , 1 75

la n g u id u s ( la t . ) , 161 liv r e s c o ( p o r t . ) , 1 6 0 m a g n u s ( la t . ) , 7 9

la p is ( la t . ) , 9 8 lla n t a ( c a s t.) , 2 4 1 m a io r d o m u ( la t . ) , 2 4 5

la p te ( r o m . ) , 2 5 3 lla m a r ( c a s t.) , 2 41 M a is ( a l. ) , 2 7 2

la r a n ja ( p o r t . ) , 1 65 lla t i (c a t.), 2 7 0 m a is ( f r . ) , 2 7 2

la t ( e n g . ) , 2 5 3 lla v e ( c a s t.) , 2 4 1 m a is ( i t . ) , 2 7 2

la t i n u ( la t . ) , 2 7 0 ll e n o ( c a s t.) , 2 4 1 m a is ( p o r t . ) , 2 7 2

la tt e ( i t . , lo g . ) , 2 5 3 lie t ( c a t.) , 2 3 5 ; 2 5 3 ; 2 7 0 m a iz ( c a s t . ) , 2 7 2

L ã u f e r ( a l. ) , 1 6 8 Ili (c a t.), 2 7 0 m a iz e ( i n g l . ) , 2 7 2

la v a c r u m ( la t . c r .) , 1 2 5 ; 1 7 5 l l i t (c a t.), 2 1 6 m a l ( r o m . , a lb . ) , 1 7 0

la x io r i s m o ( p o r t . ) , 6 5 llo g a r r e t ( c a t . ) , 1 65 m a m m a ( la t . v u lg . ) , 9 6

la x io r i s t a ( p o r t . ) , 6 5 U o t (c a t.), 2 7 0 m a n ( g a l. ) , 2 4 1

l a x io r i s t ic o ( p o r t . ) , 6 5 l l o v e r ( c a s t.) , 1 2 4 m a n á ( c a t. o c .) , 2 3 1

la x is t a ( p o r t . ) , 6 5 llu n a ( c a t.) , 2 1 6 ; 2 3 3 m a n d ig a r e ( lo g . ) , 2 7 1

la x o ( p o r t . ) , 6 5 l l u v i a ( c a s t.) , 2 41 n ta n d in g a ( p o r t . ) , 2 4 7

L e b e n s la u f ( a l. ) , 1 7 2 * lo f a (g ó t.) , 158 m a n d io c a ( p o r t . ) , 2 4 7

le c lie ( c a s t.) , 2 3 5 ; 2 4 1 ; 2 5 3 l o i k ( d a l n t . ) , 1 95 m a n d u c a r e ( la t . ) , 2 7 1

le c h o ( c a s t . ) , 2 1 6 lo q u e r e ( la t . v u lg . ) , 1 2 4 m a n g a ( m a la io , p o r t ., c a s t.), 2 7 2

le g a ( i t . ) , 2 6 7 lo u p ( f r . ) , 2 2 6 m a n g a r (p ro v .), 271

342 | E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M A N IC A
manger (fr.), 271 mennisc (ant. a. al.), 159 muela (cast.), 232
mangiare (it.), 81; 271 mère (fr.), 264 muert (vai.), 225
mango (it.), 272 Mértula (port.), 240 muerte (cast.), 226; 232
mangue (fr.), 272 mesquinho (port.), 165 mujeriego (cast.), 160
manigare (log.), 271 mesti (vai.), 225 mulgere (lat.), 72
maniglia (it.), 272 métier (fr.), 225 mulherengo (port.), 160
manilla (cast.), 272 metiri (lat.), 271 multipli (rom.), 254
manjuga (prov.), 271 mèu (gasc.), 218 multiplu (rom.), 254
mannisks (gót.), 159 meiir (fr. ant.), 226 munca (húng.), 169
mannu (log.), 79 meüreté (fr.), 266 munguzá (port.), 247
manonka (vegl.), 271 miei (fr. cast.), 226 munt (cat.), 270
mantiglia (it.), 272 rniha (tose.), 256 mur (cat.), 233
manuciolum (lat.), 124 militar (port.), 245 mur (fr.), 226; 252
Manueli (port.), 245 minca (rom.), 271 miir (prov.), 233
maracanã (port.), 247 ministerialis (lat.), 266 mur (rét. centr.), 208
marahskalk (germ.), 267 ministro (port.), 245 murdar (tur., rom.), 169
maravedi (port.), 165 mínjealã (rom.), 162 mure (lat.), 263
mare (it.), 264 mir (rét. oc.), 208 muro (cast.), 233
maréchal (fr.), 267 *Mirtula (lat. vulg.), 240 muros (sard.), 203
marechal (port.), 267 misella (lat.), 124 muro (log.), 203
maresciallo (it.), 267 mistrie (rom.), 169 musafir (tur., rom.), 147; 169
marfil (cast.), 168 Mitleid (al.), 172 Myrtilis (lat.), 240
mari (fr.), 270 mlãdijã (rom.), 162 mysterium (lat. cr.), 174
marido (port., cast.), 270 mochila (port.), 273
mariscus (lat.), 159 Moema (port.), 247 N
marit (cat., prov.), 270 mola (cat., prov.), 232
maritu (lat.), 270 molere (lat.), 72 nababesco (port.), 160
martur (rom.), 169 moment (rom.), 269 nadir (port., cast., it., rom.), 166
martyr (lat. cr.), 169; 174 monachus (lat.), 75 nah al-fil (ár.), 168
mate (port.), 167 monge (port.), 75 naid (dalm.), 195
matoir(e) (vegl.), 252 Mongibello (it.), 168 namoricar (port.), 160
matur (rom.), 252 monstrengo (port.), 160 nepaut (dalm.), 195
maturitatem (lat.), 266 mont (arag.), 234 napredak (croat.), 172
maturité (fr.), 253; 266 mont (fr., prov., cat.), 270 nas(s)us (lat.vulg.), 96
maturo (it.), 252 monte (lat., port., cast.), 270 najiune (rom.), 269
niaturu (lat.), 252 moqueca (port.), 247 naturã (rom.), 269
màu (gasc.), 218 mordiscar (port.), 160 nauk (dalm.), 195
mazãre (rom.), 170 mordomo (port.), 245 nausea (lat.), 263
média (port.), 247 mort (cat., prov.), 225 nazir (ár.), 166
medir (port., cast.), 271 mortu (lat.), 225 neam (rom.), 169
mein (al.), 82 mosaico (port.), 264 nearticulat (rom.), 162
mel (port., prov.), 226 moscardo (port.), 160 neblina (port.), 273
menestrel (port., fr.), 266 mothule (alb.), 170 nebun (rom.), 168
menestrello (it.), 266 moudre (fr.), 72 *necessis (lat.), 162
menino (port.), 245 mozo (cast.), 272 nechibzuire (rom.), 162
menisco (port.), 160 mozzo (it.), 272 necinste (rom.), 162
menjar (cast. ant.), 271 mranijã (rom.), 162 nedespãrjit (rom.), 162

ÍNDICEDEPALAVRAS I 343
nedrept (rom.), 162 O original (rom.), 269
nefandus (lat.), 162 oriya (log.), 97; 266
nefas (lat.), 162 obiectum (lat.), 172 oro (it., cast.), 216; 233
nefastus (lat.), 162 obliscere (lat. vulg.), 1(6 orphanus (lat.), 75
nek (franc.-prov.), 209 occhio (it.), 216 ospãj (rom.), 161
nekf (rét. oc.), 209 oce (cast. ant.), 155 oter (eng.), 209
nem (liúng.), 169 och (eng.), 253 otro (cast.), 270
nemo(lat.), 162 ocho (cast.), 253 otto (it., log.), 216; 253
neophytus (lat. cr.), 174 ocnijã (rom.), 162 ou (fr.), 266
nepticula (lat.), 97 octo (lat.), 234; 253 ou (fr.), 266
neptis (lat.), 97 oda (turc.), 169 oure (cat.), 216
nervos (rom.), 269 odaie (rom.), 147; 169 ouro (port.), 216
nescio (lat.), 162 oferi (rom.), 269 outro (port., leon.), 237; 270
nesigur (lat.), 162 ohir (cast. ant.), 216 ouvir (port.), 216
neuter (lat.), 162 oir (cast.), 216 ovo (cast. ant.), 238
neve (port.), 247 oir (fr. ant.), 216 ovo (port., gal.), 241
nfonne (tose.), 154 oito (port.), 216; 253 ovu (lat.), 241
nichil (lat. vulg.), 121 ojo (cast.), 216
ninguém (port.), 245 oláh (húng.), 147 P
nisip (rom.), 79 olasz (húng.), 147
nit (cat.), 253 Olaszország (húng.), 147 pà (cat.), 241
no(s) (port., gal.), 242 oleum (lat.), 98 paca (port.), 247
noapte (rom.), 253 olho (port.), 216 padeiro (port ), 245
noclie (cast.), 241; 253 omaggio (it.), 267 padente (log.), 265
nocte (lat.), 253 omenatge (prov.), 267 padre (it.), 264
noi (it., vegl., rom.), 253 ornine (log.), 203 padrin (rét.), 209
noite (port., gal.), 241; 253 omnipotens (lat.), 174 padriu (log.), 265
nolo (lat.), 162 omul (rom.), 262 paese (it.), 267
nos (lat., cast., cat., prov.), 253 oncle (fr.), 81 pagensis (lat.), 267
nós (port.), 253 ondulação (port.), 245 pagín (rom.), 189
nosch (eng.), 263 onus (lat., log.), 265 pagus (lat.), 267
nostim (rom.), 170 opinie (rom), 269 pain (fr.), 221
not (eng.), 253 opiniune (rom.), 269 paira (dalm.), 195
notte (it., log.), 253 opt (rom.), 253 pairai (cat.), 160
nous (fr.), 253 or (fr., cat.), 216; 233 país (port.), 267
novilho (port.), 273 orakla (vegl.), 97; 266 paja (cast.), 232
nuanjã (rom.), 269 ora§eancã (rom.), 162 palco (it.), 159
nuech (prov.), 253 ordenança (port.), 247 palha (prov.), 232
nuit (fr.), 253 orecchio (it.), 97; 266 palia (lat. vulg.), 232
nuke (log.), 203 oreglia (it. ant.), 97 palk (lomb.), 159
nullus (lat.), 162 oreille (fr.), 97; 266 palia (cat.), 232
num (port.), 242 oreja (cast.), 97; 266 paloma (gasc.), 219
nun (gal.), 242 orel’e (friul.), 97 palomma (tose.), 154
nunquam (lat.), 162 orelha (port.), 97; 245; 266 palumba (lat.), 154; 219
nus (eng., friul.), 253 orella (cat.), 97; 266 pan (prov., franc.-prov.), 221
nusquam (lat.), 162 órfão (port.), 75 panatariu (lat.), 245
not (friul.), 253 oricla (lat. vulg.), 266 panca (it.), 159

344 I ELEMENTQS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


pandeiro (port.), 273 perdix gallus (lat.), 72 plictisi (rom.), 170
panka (lomb.), 159 perdrigat (gasc.), 72 ploa (rom.), 124
pantalon (rom.), 269 pèrc (fr.), 264 ploure (cat., prov.), 124
pantalona (port.), 264 perereca (port.), 247 plovebat (lat. vulg.), 124
paral’ (eng.), 66 perguntar (port.), 270 plover (eng.), 124
Paranapiacaba (port.), 247 Peri (port.), 247 plovi (friul.), 124
parecchio (it.), 66 perligal’ (gasc.), 72 pluvia (lat.), 241
pareil (fr.), 66 perna (lat., port., gal.), 241 poble (cat., prov), 252
parcjo (cast.), 66 Pernambuco (port.), 247 poblo (cast. dial.), 236
parelh (prov.), 66 peroba (port.), 247 pobulu (log.), 252
parelho (port.), 66 perpelealã (rom.), 162 podium (lat.), 98; 234
pareli (friul.), 66 pert (fr., prov.), 226 podo (gal.), 240
parelio (eat.), 66 pessoa (port.), 245 poena (lat.), 98
pariculum (lat.), 66 prétendu (fr.), 270 poezie (rom.), 269
parol (rom.), 269 petra (lat.), 98 polio (tosc.), 256
part (eat., prov.), 232 peu (eat.), 232 pokrok (tcheco), 172
parte (cast.), 232 peuple (fr.), 252 pola (gal.), 242
pastelaria (port.), 248 pèxera (port. bras.), 245 polline (lat.), 78
pastiglia (it.), 272 pez (sobres.), 208 polo (gal.), 242
pastilla (cast.), 272 phalanga (lat.), 98 polujnic (rom.), 162
patata (cast., it.), 272 piatrã (rom.), 98 pomex (lat.), 98
patate (fr.), 272 picaresco (port.), 160 pont (cat., prov., fr.), 270
patentem (lat.), 265 pie (cast.), 232 ponte (lat., port.), 270
patrimis (lat.), 209 piedra (cast.), 98 popia (lat. vulg.), 124
patrius (lat.), 265 picit (prov.), 232 popolo (it.), 252
pays (fr.), 267 pici (cast.), 241 popor (rom.), 252
pe (prov.), 232 pierde (cast.), 226 populus (lat.), 96; 252
peccare (lat. er.), 174 piere (friul.), 98 porco (port., gal.), 241
pecho (cast.), 232 pierna (cast.), 241 porcu (lat.), 241
pectum (lat.), 232 pierre (fr.), 98 port (fr.), 226
pedra (port., eat., log.), 98 pietra (it.), 98 porta (cat., prov.), 232
pedrisco (port.), 160 piine (rom.), 69 porta (lat., it., port.), 79
peduclum (lat. vulg.), 124 pinna (lat.), 233 portar (rom.), 190
pedunculus (lat.), 97 pióere (log.), 124 portarius (lat.), 190
pehlivan (tur., rom.), 169 piommo (it. dial.), 197 porte (fr.), 226
peidra (eng.), 98 piovere (it.), 124 porteiro (port.), 245
peira (prov.), 98 pira (lat. er.), 174 portret (rom.), 269
peixe (port.), 245 pirão (port.), 247 potato (ingl.), 272
pcl (gal.), 241 pirotealã (rom.), 162 põvel (eng.), 252
pela(s) (port.), 242 pirueta (port.), 273 povo (port.), 252
pelle (lat.), 241 pisa-shta (búlg.), 263 pra (franc.-prov.), 216
pelo(s) (port.), 242 pit (cat.), 232 praça (port.), 237
pena (prov.), 233 pitra (vegl.), 98 praedicare (lat.), 245
pentecoste (rét.), 209 piz (fr. ant.), 208 prat (prov.), 216
penya (eat.), 233 platea (lat.), 237 praza (leon.), 237
pena (cast.), 233 plenu (lat.), 241 pré (fr.), 216
percontari (lat.), 270 pleuvoir (fr.), 124 pregar (port.), 245

IN D IC E D E P A L A V R A S i 345
preguntare (sard.), 271 quibebe (port.), 247 retaguarda (port.), 268
presa (gal.), 240 quiçamã (port.), 247 retaguardia (cast.), 268
presbyter (lat. cr.), 174 quilombo (port.), 247 retia (lat. cr.), 175
pretinde (rom.), 269 quindim (port.), 247 retroguardia (it.), 268
pretins (rom.), 270 quinquagesima (lat.), 209 revelatio (lat. cr.), 175
preto (gal.), 240 quintal (port.), 165 revisor (port.), 248
primeiro (port.), 245 ridere (it.), 264
primore (lat., log.), 269 R ringraziare (it.), 201
prinj (rom.), 269 rire (fr.), 264
priscus (lat.), 159 raa (leon.), 237 risco (port.), 264
produce (rom.), 269 ragal (alb.), 170 rocca (lat. vulg.), 99
profila (rom.), 269 ragionato (it.), 201 roda (port, cat., log.), 216; 226
progrés (cat.), 172 raína (gal.), 241 ròda (prov.), 216; 226
progrès (fr.), 172 rana (lat.), 237 român (rom.), 161
progres (rom.), 172 rancura (cast.), 218 românaj (rom.), 161
progreso (cast.), 172 rascar (cat., prov.), 66 româncã (rom.), 161
progress (eng.), 172 raschier (fr. ant.), 66 românesc (rom.), 161
progresso (port.), 172 rãsbunare (rom.), 162 rornâni (rom.), 161
progressus (lat.), 172 rãsciti (rom.), 162 Româniã (rom.), 161
promite (rom.), 269 rãscintãtor (rom.), 162 romisk (ant. a. al.), 159
protesta (rom.), 269 rãscoace (rom.), 162 roue (fr.), 226
prunc (rom.), 161 rasgar (port. cast.), 66 rouxinol (port.), 270
puablo (cast. dial.), 236 rasicare (lat.), 66 rovinava (it.), 201
puarta (dalm.), 195 raskar (venez., lomb.), 66 rueda (cast.), 216
pueble (fr. ant.), 252 raval (cat.), 165 rumisk (ant. a. al.), 159
pueblo (cast.), 252 rãzbate (rom.), 162 ruota (it.), 216
puente (cast.), 270 razigare (log.), 66 ruspan (milan.), 145
puerco (cast.), 241 realejo (port.), 273 ruspi (lomb.), 145
puerta (cast.), 232 realengo (port.), 160 ruspio (vên.), 145
puerto (cast.), 232 rebelde (port.), 273
puio (arag.), 234 recamar (port.), 165 S
pumex (lat.), 98 rece (rom.), 80
punire (lat.), 98 recens (lat.), 80 sa(s) (log.), 203
puoblo (cast. dial.), 236 Rècife (port. bras.), 245 sa seu (log.), 201
puolma (dalm.), 195 reclama (rom.), 269 sabão (port.), 252
ridicul (rom.), 269 sabbia (it.), 79
Q redondo (port.), 245 saber (port., prov.), 226
regeneratio (lat. cr.), 175 sablun (gasc.), 252
quaerere (lat.), 79 Reginhart (germ.), 160 sabó (prov., cast.), 252
qual (port.), 137 reguengo (port.), 160 sabone (log.), 252
quale (it.), 137 regula (rom.), 269 sabulum (lat.), 79
qualis (lat.), 137 Renard(fr.), 160 saci (port.), 247
quanno (it. dial.), 197 reproduce (rom.), 269 sáfaro (port.), 168
quatre (fr., prov.), 222 reraguarda (cat.), 268 sagu (it.), 272
quatro (franc.-prov.), 222 resemna (rom.), 270 sagu (malaio, cast., port.), 272
quel (fr., eng.), 137 résigner (fr.), 270 saibro (port.), 79
queperit (lat. vulg.), 125 restauratio (lat. cr.), 175 sali (port.), 245

346 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


Μ

salus (lat. cr.), 175 septem (lat.), 241 spanne (tose.), 154
salvacristiàn (lomb.), 77 septimana (lat.), 209 spatha (lat.), 98
salvaón (eng.), 77 serbiret (log.), 203 *specio (lat.), 96
•sanguem (lat.), 195 servulus (lat.), 124 spectare (lat.), 96
sapaun (vegl.), 252 set (prov., cat.), 232 spehon (lomb.), 159
sapé (port.), 247 sete (port., gal.), 241 spera (rom.), 269
sapere (lat.), 226 setimana (rét.), 209 speranja (rom.), 269
sapone (lat., it.), 252 settimana (it.), 209 spesso (it.), 80
sappinus (lat. vulg.), 99 seu (cat.), 201 spiare (it.), 159
sapun (rom.), 252 sfender (eng.), 80 spiritalis (lat. cr.), 174
saracura (port.), 247 shah (persa), 167 spissus (lat.), 80; 161
Saragusta (ár.), 168 shaturang(a) (ind. ant.), 167 stainberga (lomb.), 145
sarcina (lat., rom.), 68 shifr(ár.), 166 stakka (gót.), 158
sarri (bearn.), 156 shitranj (ár.), 167 stamberga (it.), 145
sarri (gasc.), 219 shtepi (alb.), 161 statho (tose.), 256
sarrio (arag.), 156 shunya (sânscr.), 166 strictu (lat.), 270
sãteancã (rom.), 162 sibilare (lat.), 98 striga (lat.), 98
sjiintã (rom.), 269 siblar (prov.), 99 stunda (germ.), 219
sau (gasc.), 218 siccus (lat.), 96 su (log.), 203
saudade (gal.), 241 siete (cast.), 232; 241 su kadçiu (log.), 203
saul (dalm.), 195 siffler (fr.), 99 su pilu (sard.), 203
savoir (fr.), 226 sifilare (lat.), 98 suang (dalm.), 195
savon (fr., friul.), 252 si fiar (prov.), 99 suart (dalm.), 195
scacchi (it.), 167 sigillum (lat.), 97 suau (arag.), 243
scacco matto (it.), 167 silbar (cast.), 99 subscribsi (lat.vulg.), 125
scapa (rom.), 66 silvaticus (lat.), 79 sucuri (port.), 247
scappare (it.), 66 jiuera (rom.), 99 suefio (cast.), 241
scheiver (rét.), 209 sivilá (friul.), 99 suilai (camp.), 99
schek (franc.-prov.), 209 skatja (frísio), 219 §uira (rom.), 99
scliiel (eng.), 216 slab (rom.), 147 sulai (camp.), 99
Schokolade (al.), 272 sociego (cast.), 272 sulegl (rét. oc.), 209
Schõntierlein (al.), 77 sole (it.), 209; 264 suppa (germ.), 99
scopha (tose.), 256 soleil (fr.), 209; 264 suride (rom.), 269
scrofa (lat.), 98 soli (port.), 245 sururuca (port.), 247
scump (rom.), 161 soliculus (lat.), 209 suscrissi (lat. vulg.), 125
scurra (lat.), 97 soliversator (lat.), 124 sussiego (it.), 272
seguridade (gal.), 241 somnium (lat.), 241 susura (rom.), 269
sei (port.), 245 sonho (port.), 241 suvenir (rom.), 269 t
sekt (rét. oc.), 209 sono (gal.), 241 synodus (lat. cr.), 174
selvático (it.), 79 sopeira (port.), 248 szallás (húng.), 169
semenar (prov.), 218 soreje (rét. centr.), 209
semer (gasc.), 218 sorèli (rét. or.), 209 T
semt (ár.), 166 Sorocaba (port.), 247
senecem (lat.), 265 sorogle (rét. centr.), 209 tabac (fr., cat.), 272
sénege (log.), 265 sorvete (port.), 247 tabacco (it.), 272
senti (cat.), 231 sos (log.), 203 tabaco (port., cast.), 272
sentiment (rom.), 269 spanisk (ant. a. al.), 159 Tabak (al.), 272

ÍN D IC E D E P A L A V R A S | 347
tabardo (port.), 160 trovador (port.), 270 vache (fr.), 225
taça (port.), 165 trovar (prov., port.), 75 vadde (calabr.), 201
tâclic (fr.), 165 trovare (it.), 75 vak (norm.), 225
talão (port.), 97 trovatore (it.), 266 vani (cat. algh.), 231
talis (lat.), 137 trufie (rom.), 169 vappa (lat.), 97
talione (ít.), 97 trup(rom.), 147; 161 varão (port.), 97
taló (prov., cat.), 97 tsã (franc.-prov.), 222 varos (húng.), 169
talon (fr., friul.), 97 tsardsí (franc.-prov.), 221 varrer (port.), 246
talonem (lat.), 97 tsãntá (franc.-prov.), 221 vascella (lat.), 124
talum (lat.), 97 tschavál (rét.centr.), 208 vassoura (port.), 246
tamanduá (port.), 247 tschkoatl (nauatl), 272 vasus (lat. vulg.), 123
também (port.), 245 tschunqueismas (rét.), 209 vatapá (port.), 247
(ap (rom.), 170 tuber (lat.), 99 vecchio (it.), 216
tapete (port.), 247 tufer (lat.), 99 vechiu (rom.), 97
tareá (cast.), 165 tumba (lat.), 98 veclus (lat. vulg.), 97; 232
tarefa (port.), 165 tuota (dalrn.), 195 vedere (it.), 264
tasca (cat.), 165 vegl (eng.), 97
tatu (port.), 247 U velho (port.) 97; 216
taur (prov.), 233 vell (cat.), 97; 232
tauru (lat.), 233 ua (gasc.), 218 vemina (galur.), 201
temetis (lat.), 241 Ubirajara (port.), 247 vendéder (eng.), 253
temeis (port.), 241 udire (it.), 216 vendedor (port. cast., prov.), 253
temedes (gal.), 241 uech (prov.), 216; 253 vendeur (fr.), 253
temps (sobres.), 208 neit (prov.), 216 venditore (it.), 253
tems (fr. ant.), 208 uelh (prov.), 216 vendre (fr.), 225
terra (it.), 264 uevo (cast.), 241 vencdor (cat.), 253
terre (fr.), 264 uinum (lat.), 156 verbum (lat. cr.), 174
tésseret (log.), 203 ulufe (tur.), 169 verna (lat.), 97
tliap (alb.), 170 un(s) (gal.), 242 verruculum (lat.), 72
thesaurum (lat. vulg.), 123 unha(s) (gal.), 242 verutus (lat.), 265
tipiti (port.), 247 unic (rom.), 269 ves (gal.), 240
tirer (fr.), 72 uòch (prov.), 216 vettsu (log.), 97
tola (gal.), 240 uòlh (prov), 216 viant (dalm.), 195
tomaca (cat.), 272 uomo (it.), 264 vicaire (fr.), 72
Tomate (al.), 272 uragla (eng.), 266 victitare (lat.), 97
tomate (port., fr.), 272 ural’a (eng.), 97 viddoli (galur.), 201
tomatl (nauatl), 272 ureche (rom.), 97; 190 vide (port.), 78
tóner (gasc.), 219 Uricle (rom.), 190 vieil (fr.), 97
toro (cast., cat.), 233 urubu (port.), 247 viejo (cast.), 97; 232
tra(n)smutare (lat.), 265 urupema (port.), 247 vieklo (vegl.), 97
traire (fr.), 72 uualha (germ.), 146 vielh (prov.), 97; 216; 232
travailler (fr.), 225 uzár (prov.), 156 vieli (friul.), 97
trecho (port.), 273 vin (gasc.), 219
tresari (rom.), 269 V vinde (vai.), 225
trobador (prov.), 266 vinea (lat.), 78
trona (cat., log.), 201 vaca (gasc.), 219 vinha (port.), 78
trouver (fr.), 75 vacca (lat.), 96; 225 vinus (lat. vulg.), 123

348 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


vínzator (rom.), 253 vultus (lat.), 98 xeque (port.), 167
viola (it.), 266 vuntana (galur.), 201 xeque-mate (port.), 167
virdia (lat. vulg.), 116 xifra (cat.), 166
*virone (lat.), 97 W xillar (cat.), 99
virtus (lat. cr.), 175 xiular (cat.), 99
visita (rom.), 269 waals (neerl.), 147 xocolata (cat.), 272
vite (lat.), 78 wadi (ár.), 240
vivere (it.), 264 Walha (ant. a. al.), 147 Y
vivre (fr.), 264 walhisch (méd. a. al.), 147
vixsit (lat. vulg.), 115 Walho-lant (méd. a. al.), 146 yelmo (cast.), 157
vizinho (port.), 218; 245 Walhos (germ.), 146 yugu (log.), 78
*vlab (esl.), 147 *wanyan (gót.), 158
vlachs (rom.), 192 wardan (germ.), 99 Z
vlali (esl.), 147 wàrder (vai.), 225
voala (rom.), 269 *warnyan (germ), 99 zara (it. ant.), 168
vocajie (rom.), 269 warthaomu (rét.), 77 Zaragoza (cast.), 168
vocabular (rom.), 269 welsch (al.), 147 zaro (it. ant.), 168
vocavulis (lat. vulg.), 125 welyo (moçár.), 248 zece (rom.), 216
voi serie (rom.), 263 werra (germ.), 99 zemt (ár.), 166
voiaj (rom.), 269 weyo (leon.), 234 zen (rét.), 209
voie (rom.), 161 wida (gót.), 158 zenit (cast., cat., it., eng., rom.,
voinic (rom.), 162 windan (germ.), 159 al.), 166
voir (fr.), 264 *wizza (lomb.), 145 zênite (port.), 166
volere (lat. vulg., it.), 79; 81 wloch (pol.), 147 zénith (fr.), 166
voloh (russo), 147 wordon (germ.), 225 zenith (ingl.), 166
vooruitgang (hol.), 172 zephirum (lat.), 166
vot (friul.), 253 X zéro (fr.), 166
vuecho (arag.), 234 zero (port., cat., it., rom.), 166
vuggire (galur.), 201 xadrez (port.), 167 Ziffer (al.), 166
vuit (cat.), 253 xamate (port.), 167 zumbi (port.), 247

ÍNDICE DEPALAVRAS I 349


M apas

1. O Império Romano, de Augusto a T rajano.............................................................................353


2. Povos da Itália Antiga .............................................................................................................354
3. Principais Centros de Cultura do Império Romano................................................................ 355
4. Migrações dos Povos Germânicos no Séc. III d.C................................................................... 357
5. Migrações dos Povos Germânicos desde o final doséculo IV .................................................359
6. Reinos Germânicos em 480 .................................................................................................... 360
7. Situação Política da Europa no Séc. IV ................................................................................. 361
8. Fases da Reconquista da Península Ibérica.............................................................................363
9. Substratos na Ibéria, Gália, Itália e Civilização de la T è n e ................................................... 364
10. Regiões Históricas do Romeno (domínio do Daco-Romeno) ............................... 365
11. Os Dialetos Romenos na Europa A tual................................................................................... 366
12. Península da fstria e seus Dialetos ..........................................................................................367
13. Principais Dialetos da Itá lia .................................................................................................... 368
14. A Sardenha e seus Dialetos ......................................................................................... 369
15. Línguas da S u íç a ......................................................................................................................370
16. Domínio do Rético Central .................................................................................................... 371
17. Principais Dialetos do Francês e do Provençal ...................................................................... 372
18. Domínio (aprox.) do Franco-Provençal............................................................. 373
19. Principais Dialetos do Português, Castelhano e Catalão ........................................................374
20. Línguas e Principais Dialetos da Ibéria ......................... 375
21. Regiões de Fala Portuguesa no M undo................................................................................... 376
22. România Ocidental e Oriental ................................................................................................377
23. România Contínua (segundo A. Alonso e Vidos) .................................................................. 378
24. As Línguas Românicas e alguns de seus Dialetos na Europa A tual...................................... 379
25. A România Moderna - Línguas Românicas no Mundo ....................................................... 380

352 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


M apas 1 e 2
1. O IMPÉRIO ROMANO, DE AUGUSTO A TRAJANO

Eburacum
Britannia
Londinium
' 43-47 i
Inferior
O 'h '
Superior W
% ®
^e/9/cs, / %
Lutetia
Raetia Noricum
Caucasus
Aquitania
Burdigala,
Narbonensis Pontus Euxinus
Narbo
Massilia (Mar Negro)
Caesaraugusta

Corsicai Roma / %
Byzamtum
<s>%-
Tarraco Macedonia
Neapolis
Sardinia
Pergamum

Lycaonia
Carthago Nova Sicilia Athenae

Achai
Mare I b e r i c ^ Carthago
Melita Dura-Europus
Numidia Rhodus
Hadrumetum

Damascus
Tingitana Cyprus
Babylon

Cyrene Alexandria
1 Províncias Senatoriais
Leptis
1 Províncias Imperiais
Cyrene
Nações Aliadas Memphis

WÊk Anexações até 117 d.C.


Aegyptus Sinus Arabicus

MAPAS I 353
2. POVOS DA ITÁLIA ANTIGA

Réticos

Ligures

Gregos

IKricos

Etruscos

Faliscos

Itálicos
Cartagineses
(Fen(cios)

Siculos

354 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


PRINCIPAIS CENTROS DE CULTURA DO IMPÉRIO ROMANO

irrCtlurnum

-*\Eburacum
J Glevym — Li ndum )
^ U lpiaTraiano
Aquae gulis3 ^ Camoludunum)
•Π" Aquisgranum
P * C 7 .
λ ^."Verulamium Coi. Agripina G
Londinium Telbiacum
ΤΤΓAquae Mattiacorum
viqmagus 1__S'fculiobona m i üu Moguntiacum
n n r J w TTJ^Rotomagus
CaesaromagusnIá l TTiáINoviodunum . . . .
— 1 L u tetia ^ ^Aiinustnmamjs ™ r Civitas Aquensis
Lutetia A u gu stom a gu s u v a A u gu sta V indelicorum ■Vindobona NapocaO
Agedincum11· ^Cambodunum
_ Vesontio TirBrigantium 1Tr Carnuntum
τ·Μ τττ λ Apulum'
Avaricum Biturigum __ ™ ___ Viri
n 1TM Augustodunum Aventicum Comum Scarbantia Ulpia Traiana
1 Mediolanum VO Poetovio Aquincum
TTia Santonum O Lugudunum Ρ β Augusta Pragtpria Sirmium
M Vienna^ N e A u g u sta T a u r i n o r u f i C / \ Mursa'"'
Emona sisquia Drobeta
TTteBurdigaia τπη -+ -) w Ppla
^ m i Pollentia Bononia \ Ratiaria^- Pontus Euxinus
TolosauTa. -nj^Nemausus /'Z . Florentia b La Claudia Aequum Callatis
Scupi (Mar Negro)
τ Massilia nsae ” Ti^jAfequm ^
Narbo M artiusy*"-Jtwi" o » . _3BlNicaea \ 4 Q<«Spotetum Salonae
Flaviobriga Develtum
/ lulii Vj p0l s' Çf e Firmum Narona
Sinope
Cluniãljj]
/ Mariaríá ‘ ! ^ rentN _ V“ T , Epidaurus
Caesaraugusta Dyrrhachium
larcino Tusculum'1^ — iceria Philippi
Termes V Byllis F Heraclea Pontica
Tarraco 0& Turris Libisonis. Cumae-· Nicaea
Herculanum , VButhrotum
Praesidium lulium Saguntum Pollentia — ^ fS ^ P r u s a
Pompei' Diurni
V a le n tia ./ p ,,m Forum Traiani P b ^ 'rActium Aezani
Olisipo ~ir Norba Caesarina
O Corduba
Orchomenus’ 41Hierapolis
jjj- Aphrodisias Iconium
* Italica xucci ~ir Salaria Panormus. Termae. Vibo Valentia
, Olbasa
L— ... r Carthago Novav ^Hirperaeae Comama idus
Atenas Dura-Europus
Hasta Regi! Acinipo / i p j Catina Ninica Antiochia
Saldae Chullu Aerae.
lt-SI Syracusae Halicarnassus
Gades^·^/ . Carthago farsus ■A p a m e a
Rusicade Patara
Icosium
Zama 5 ^ Cnossus
° Λβ Palmyra
T in g i s ^ ^ I Rusadd Clupea Melita
Cartenna J Thelepte.
Zilis ~T — . , TmJ TCurubis Heliopolis
Lixus V (Dppidum Novum
Lambaesis £ Thubursicum Creta
Leptis Minoi^ Hadrumetum
Babba
Thamugadi Cyprus Berylus
Acholla ·πη Q f l Gadara
O Volubilis Claudia Ptolemais
Thaenae Q iG e ra sa
Samara
Cyrene Hi Emmaus
D ireito s R e s e r v a d o s B . F. B a s s e tt o

Leptis Magna Aelia Capitolina


Alexandria (Jerusalém)
Λ Teatros 1 Bibliotecas
Cyrene
Oya Petra
Ί τ Colônias Militares TTT Termas
Aegyptus
0 Colônias Civis t Cidades Mortas
Arsinoe n a

MAPAS I 355
M apa 4
4. MIGRAÇÕES DOS POVOS GERMÂNICOS NO SÉC. ΙΠ d.C.

_L/ ^ S o d o s (sec.ll d.C.)


ã x õ ^ U f f C O S ^ ^ oi ^ é p i de μa ius - Â p o r volta de 250)

s. Vândalos»,
^ « '/j Ásdingos )
^ I S í l i n g o e r ^ +/- 25°)
Treveri
Marcomanos n ^
/ Va
SV 2 __Quadas
Argentorate^. j Alamanos

Parisii
Visigodos /1
(depois de 270) y
Verona Dácia (abandonada em 270) Pityus
Aquiieia

Burdigala Ravenna
-jç Tolosa Naissus -jç. Pontus Euxinus
Narbo a Florentia Nicopolis (Mar Negro) Trapezus
Regnum
Tarraco Partharum
Caesaraugusta m
Corsica Roma
(Sassamdarum
tThessalunica W Heraclea ab 224 a.D.)
^ Toledo
Olisipo
Sardinia; 'fr Caesarea
Pergamum ^ Ancyra
Edessa
Carthago Nova
Messana ★
^ Hispal Ephesus Nisibis
Sicilia
V y Syracusae
Carthago Antiochia
Tingis Palmira
^vlMelita 3 Rhodus ★
Creta Aelia Capitolina
(Jeru salem)
Cyprus
D ireito s R e s e r v a d o s B. F. B a s s e tt o

A - Ásdingos OS - Ostrogodos Va - Vândalos Cyrene Alexandria


G - Godos S - Sflingos Vi - Visigodos
H - Hérulos Sv - Suevos Cidades
Aegyptus
M - Marcomanos Sx - Saxões

MAPAS I 35 7
M apas 5 e 6
5. MIGRAÇÕES DOS POVOS GERMÂNICOS DESDE O FINAL DO SÉCULO IV

Anglos
Vândalos
Ásdingos

Sílingos J /
n | Quadas
Burgundios Suevos
até 438 ( (400) Gépidas

Parisii

Aureliani J l/
Verona
Reino visraodo Visigodos
\ deToldsa
(376)
Naissus
Ataulto Pontus Euxinus
Suevos .. Nicopolis (Mar Negro)
asd e 411) Narbo
p in g o s (411
Corsica Regnum
(yzantium Partharum
ilantinopl;
Alanos Ataulfo (+ 415) (Sassanidarum
Neapolis
Heraclea ab 2 2 4
Pergamum

Messana
Uhenae ★ Edessa
Asdingos
Rhegium •inthus Ephesus
V ândalos Sicilia ★ Nisibis
Syracusae
Antiochia
Vândalos^
(439-534) P Rhodus

Palmira

i Aelia Capitolina
Cyprus " (Jerusalem)
D ireitos R e s e r v a d o s B. F. B a s s e t t o

AI - Alanos Sx - Saxões Cidades


Cyrene
Fr - Francos Va - Vândalos + Falecimentos Alexandria
Os - Ostrogodos Vi - Visigodos
Sv - Suevos
Aegyptus

MAPAS I 359
6. REINOS GERMÂNICOS EM 480
D ireito s R e s e r v a d o s B. F. B a s s e tto

360 í E L E M E N T O S DE F IL O L O G IA R O M Â N IC A
M apa 7
7. SITUAÇÃO POLÍTICA DA EUROPA NO SÉC. IV (ATÉ A MORTE DE TEODORO, O GRANDE - 526)
D ireito s R e s e r v a d o s B. F. B a s s e tt o

MAPAS | 361
M apas 8 e 9
D ireito s R e s e r v a d o s B. F. B a s s e tt o

8. FASES DA RECONQUISTA DA PENÍNSULA IBÉRICA


Ravena

Córsega
Aragão Roma
Barcelona

Lisboa

iranada

Ceuta
* 1431 ^5 Malta
Melila Barbáricos
1497

MAPAS 363
9. SUBSTRATOS NA IBÉRIA, GÁLIA, ITÁLIA E CIVILIZAÇÃO DE LA TÈNE

Civilização de La Tène


La Tène — Réticos
V fcJI I ç l U o J s

Ligures ■
\Etruscos\

x %

Siculos

Celtas I I Iberos Celtiberos

364 E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
10. REGIÕES HISTÓRICAS DO ROMENO (DOMÍNIO DO DACO-ROMENO)

Limites ................ Limites — — — Limites das


Internacionais da Romênia Regiões Romenas

MAPAS 365
11. OS DIALETOS ROMENOS NA EUROPA ATUAL

Megleno-Romeno Ístrio-Romeno • Localidades

366 I E L E M E N T O S DE F IL O L O G IA R O M Â N IC A
12. PENINSULA DA ÍSTRIA E SEUS DIALETOS

m apas I 367
13. PRINCIPAIS DIALETOS DA ITÁLIA

Cadeia dos Apeninos ★ Principais cidades

368 I E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
14. A SARDENHA E SEUS DIALETOS

Dialetos Grupos do
Anglonès não Sardos Gennargentu

Galurês I Logudorês Outros Dialetos

MAPAS | 369
15. LÍNGUAS DA SUÍÇA
D ireito s R e s e r v a d o s B. F. B a s s e tt o

370 E L E M E N T O S D E F IL O L O G IA R O M Â N IC A
- ............. .................. - - ■ — .... ..........■■— —j

16. DOMÍNIO DO RÉTICO CENTRAL


MAPAS
17. PRINCIPAIS DIALETOS DO FRANCÊS E DO PROVENÇAL

372 I ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


18. DOMINIO (APROX.) DO FRANCO-PROVENÇAL

MAPAS | 373
19. PRINCIPAIS DIALETOS DO PORTUGUÊS, CASTELHANO E CATALÃO

374 : ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA


20. LINGUAS E PRINCIPAIS DIALETOS DA IBÉRIA

Basco I I Castelhano □ Catalão Galego Português

/'
Lim ites: Leonès S Antigos do Leonês - Aragonês
i Aragonês

MAPAS í 375
376
I
ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA 21. REGIÕES DE FALA PORTUGUESA NO MUNDO

Oceano Glacial Ártico

o
o

1. B rasil
2. P o rtu g a l
3. A ç o re s , Ilha d a M a d e ira
4. A rq u ip é la g o d o C a b o V e rd e
o
5. G u in é , S e n e g â m b i a c
6. B e n in to
7.
8.
S ã o T o m é e P rin c ip e
C o n g o , Z a ire , A n g o la
0)
9. M o ç a m b iq u e o
10. M om çaba O
11. D iu, D a m ã o , B o m b a im , G o a ,
M a m g a lo r, M a é , C o c h im , C a n a n o r
12. J a v a , Tim or, S i n g a p u ra , Ilh a s M a la ia s
13. M a c a u
14. Ilh a s M á la c a s
22. ROMÂNIA OCIDENTAL E ORIENTAL

0 0 ! í u BI W ° υΒ

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23. ROMÂNIA CONTÍNUA (SEGUNDO A. ALONSO E VIDOS)
u>
oo
E L E M E N T O S DE F IL O L O G IA R O M Â N IC A
24. AS LÍNGUAS ROMANICAS E ALGUNS DE SEUS DIALETOS NA EUROPA ATUAL

D ire ito s R e s e r v a d o s B. F. B a s s e tt o

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Ό
25. A ROMÂNIA MODERNA - LÍNGUAS ROMÂNICAS NO MUNDO

00
o Oceano Glacial Ártico

A t
ELEMENTOS DE FILOLOGIA ROMÂNICA

1. Q u e b e c (C a n a d á)
2 . M é x ic o e A m é ric a C e n tra l
3 . A n tilh a s ( C u b a , H aiti, C u r a ç a o , P o rto
R ic o , M a rtin ic a )
4 . A m é ric a d o S u l
5. E u r o p a ( P o rtu g a l, E s p a n h a , F r a n ç a ,
B é lg ic a , Itá lia , S u í ç a , R o m ê n ia )
6 . A ç o r e s e M a d e ir a
7 . A r q u ip é la g o d o C a b o V e rd e
8 . G u in é , S e n e g â m b i a e B e n in
9 . I lh a s d e S ã o T o m á e P r ín c ip e
10. C o n g o , Z a irte , A n g o la e M o ç a m b iq u e ,
M om baça
D iu, D a m ã o , B o m b a im , G o a , M a n g a lo r,
M a é , C o c h im , C a n a n o r
J a v a , T im or, S i n g a p u r a , I lh a s M a la ia s
M acau,
I lh a s M á la c a s
F ilip in a s
I lh a s B a ix a s , M a r q u e s a s ,
T u b u a í, Ilh a s d a S o c i e d a d e
Título Elementos de Filologia Românica Vol. I:
História Externa das Línguas Românicas
Autor Bruno Fregni Bassetto
Produção Ana Lucia Novaes
Marilena Vizentin
Projeto Gráfico Ana Lucia Novaes
Capa Marcos Keith Takahashi
Mapas Ponto & linha
Editoração Eletrônica Ponto & Linha
Revisão Técnica Luiz Alberto Cabral
Revisão de Texto Luicy Caetano de Oliveira
Revisão de Provas Fábio Duarte Jolv
Tania Mano Maeta
Marilena Vizentin
Divulgação Regina Brandão
Cinzia de Araújo
João Argentin Neto
Secretaria Editorial Eliane dos Santos
Formato 18 x 25,5 cm
Tipologia Times New Roman 10/14,5
Papel Certificado FSC® Cartão Supremo 250 g/m^ (capa)
Certificado FSC® Pólen Soft 80 g/m^ (miolo)
Número de Páginas 388
Tiragem 3 000
CTP, Impressão e Acabamento Rettec Artes Gráficas

£ 5
FSC
www.fsc.org

MISTO
P a p e l p ro d u z id o
a p a rtir d e
f o n te s r e s p o n s á v e is

FSC* C103028
romãnicas, desde a constituição e o

posterior esfacelamento do Império

Romano - com a projeção do latim

e suas variedades passando pelas

invasões bárbaras e chegando até fins

do século XV, quando começam a se

constituir as atuais línguas latinas da

Europa. O segundo volume, sobre a

história interna das línguas romãnicas,

contém um estudo acurado de todo o

processo de modificações fonéticas,

morfológicas e sintáticas por que pas­

sou o latim, em cada região outrora

ocupada por Roma.

Elementos de Filologia Romãnica é

uma importante obra de consulta que

pode também ser lida de um fôlego só,

porque, além de instigante, foi escrita

num estilo simples e claro. Privilégio

e conquista de um pesquisador, mas

sobretudo de um raro professor, cuja

qualidade essencial é a generosidade

de transmitir o que sabe, sabendo que,

ao fazê-lo, acaba por saber mais.

henrique nurachco
NA DEF INI ÇÃO DE F ERD INAN D DE SAUSSURE, A

FILOLOGIA É A CI ÊNC IA QUE ESTUDA OS TEX­

TOS E T U D O Q U A N T O FOR NECESSÁRIO PARA

TORNÁ-LOS ACESSÍVEIS: NÃO SÓ OS ASPECTOS

PROPRIAMENTE LINGUÍSTICOS, MAS- T O D O O

UNIVERSO CULTURAL QUE UMA DETERMINADA

LÍNGUA REPRESENTA. ■ RESULTADO D O TRA­

BALHO DE MUITOS ANOS DE PESQUISA E EN­

SINO, ELEMENTOS DE FILOLOGIA R O MÂNI CA

FOI ELABORADO PARA F ORNECER ORIENTAÇÃO

SEGURA A ESTUDANTES E DEMAIS INTERESSA­

DOS, AP RESENTANDO OS C O NC E I T O S F UNDA­

MENTAIS DESSA D I SC I P LI N A E OS DIVERSOS

M ÉTODO S TR ADI CI ONALMENTE EMPREGADOS.

TRATA TAMBÉM DA ORI GEM DAS LÍNGUAS R O ­

MANICAS, COM ÊNFASE NO CHAMADO LA­

T I M VULGAR, PARA C H E GA R ATÉ AS LÍNGUAS

M ODE RNA S DESSE G RUP O, A C O M P A N H A N D O

AS FASES DE SUA EVOLUÇÃO E OS TIPOS DE

CLASSIFICAÇÃO EXISTENTES. A EDIÇÃO INCLUI


ISBN 978-85-314-0601-0

UM Í ND I CE DAS PALAVRAS ANALISADAS, ALÉM


IIIIII
9“ 8 8 5 3 1 "4 0 6 0 10 11
DE ÍNDICES TEMÁTICO E DE AUTORES CITADOS.

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