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BRUNO SOERENSEN
KATHIA BRIENZA BADINI MARULLI
EDITORA
1 9 9 9
© 1999, by Autores
Direção geral
Henrique Villibor Flory
Editor e capa
Aroldo José Abreu Pinto
Ilustração de contra-capa
Mulher em um interior de Fernand Léger
Diretora Administrativa
Luciana Ap. Wolf Zimermann Abreu
Editoração Eletrônica e Projeto Gráfico
Rejane Rosa
Revisão
Letizia Zini Antunes
Marcela Cristina de Souza
p.494; 27cm
ISBN: 85-7473-012-2
CDD 614
EDITORA
Dedicatórias
SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Bruno Soerensen
Agradecimentos
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Colaboradores
Andréa Alves Soerensen
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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Sumário
Introdução ........................................................................................................................... 21
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XIV – Zoonoses e enfermidades transmissíveis comuns ao homem e aos animais ...... 359
A saúde do homem depende em grande parte da saúde dos animais ........................ 359
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Introdução
Muito tem sido dito a respeito da “Saúde Pública”, porém tal denominação é empre-
gada com diferentes sentidos. Assim, ao iniciar este “Manual”, torna-se importante de-
fini-la. Pode-se dizer que Saúde Pública é a ciência e a arte de evitar doenças, pro-
longar a vida e promover a saúde física, mental, social e a eficiência, através de
esforços organizados da comunidade para o saneamento do meio ambiente, o con-
trole de infecções na comunidade, a organização de serviços médicos e paramédicos
para o diagnóstico precoce e o tratamento preventivo de doenças, e o aperfeiçoa-
mento da máquina social que irá assegurar a cada indivíduo, dentro da comuni-
dade, um padrão de vida adequado à manutenção da saúde.
De maneira mais simplificada, pode-se dizer que é uma atividade social cujo obje-
tivo é promover e preservar a saúde e, conseqüentemente, o bem-estar da popula-
ção. Cabe à Saúde Pública papel essencialmente operacional para a melhoria da
qualidade de vida na sociedade.
Assim, seus objetivos são:
prolongar o período de vida;
prevenir agravos à saúde;
promover o pleno exercício da capacidade funcional.
A Saúde Pública busca atingir seus objetivos principalmente por meio de medidas
preventivas. A Medicina Preventiva é a aplicação de conhecimentos adquiridos con-
seqüentes ao estudo dos fatores determinantes endógenos, ou do organismo. Faz
a preservação da saúde. É diferente da Medicina Curativa, que toma providências
após a instalação da doença.
São objetivos da Medicina Preventiva:
promoção da saúde;
prevenção da invalidez total (tratamento e reabilitação);
proteção específica.
Enquanto o profissional de Saúde Privada trabalha com indivíduos, geralmente bus-
cando a resolução de um problema único, o profissional de Saúde Pública trabalha com
grupos ou comunidades, buscando alcançar um esforço comunitário organizado a fim de
impedir ou controlar doenças nesta população. O objetivo final de ambos é o mesmo, ou
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Bruno Soerensen
Kathia Brienza Badini Marulli
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I - Noções de Epidemiologia
Kathia Brienza Badini Marulli
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1. Aspectos históricos
O início da Epidemiologia confunde-se com o princípio da própria Medicina. A partir
do momento em que o homem começou a preocupar-se com as doenças que o acome-
tiam e a tentar desvendar suas causas, estava criada a Epidemiologia.
O homem primitivo, da Era Paleolítica, era inicialmente vegetariano. Com o desen-
volvimento de técnicas de caça e pesca, surge um novo problema: a conservação destes
novos alimentos. Assim, como solução, o homem começa a manter os animais apreendi-
dos vivos, em cativeiro. Com este maior contato, o homem começa, a partir da Era
Mesolítica, a praticar a domesticação dos animais. Com o passar do tempo, vai aumen-
tando o número de pessoas e de animais naquelas comunidades primitivas e, conseqüen-
temente, também cresce a ocorrência de doenças. O homem começa a observar que
alguns dos animais que consegue capturar são mais fracos, provavelmente doentes. A
partir daí, está estabelecido o primeiro fato epidemiológico: o homem primitivo procura
descobrir e explicar as causas das doenças, tenta estabelecer uma relação de causa e
efeito. É o primeiro passo para o desenvolvimento da Epidemiologia.
As doenças estão, nessa época, envoltas numa atmosfera de magia. Assim, acredita-
se, por exemplo, que as almas dos mortos podem ser a causa das enfermidades. Apesar
de algumas tentativas para estabelecer-se relações entre a ocorrência de doenças e a
época do ano, o clima, as fases da lua e o consumo de carnes, as principais explicações
são dadas pelos feiticeiros, que se valem de aspectos religiosos.
Vindos da Assíria, Babilônia, têm-se os primeiros registros conhecidos de Medicina
dos Animais, que estão no Código de Esununna (1900 a.C.), Papiros dos Kahunas (1800
a.C.) e Código de Hammurabi (1700 a.C.).
No Velho Testamento da Bíblia (1500 a.C.) encontram-se diversas regras sanitárias
passadas ao povo como normas religiosas. Além da proibição da utilização da carne
suína na alimentação, pode-se citar como exemplo a indicação existente no Levítico de
que “se um rato cair num vaso de barro, este deverá ser quebrado”. O rato era conside-
rado um animal impuro e os utensílios de barro eram muitas vezes utilizados no preparo
de alimentos ou no transporte de água. Assim, pode-se perceber que os hebreus tinham
conhecimentos sobre a transmissão de doenças e como preveni-las.
Até o século V a.C. as doenças são relacionadas com forças e poderes sobrenatu-
rais. Na obra Ilíada, de Homero, é narrada uma epidemia que assolou a Grécia e que
teria sido causada pela ira de Apolo.
Hipócrates (460-370 a.C.), o pai da Medicina, realiza a observação dos doentes e
afirma que a doença é um fenômeno ordenado, devido a causas naturais. Acredita tam-
bém na influência dos fatores ambientais (“ar, águas e lugares”).
Aristóteles (384-332 a.C.) descreve a ocorrência e o tratamento de doenças dos
animais, inclusive discorrendo sobre a transmissão da Raiva.
Em Roma, Marcus Terentius Varro (117-26 a.C.) acreditava que os causadores das
doenças eram “animálculos invisíveis”, criaturas minúsculas que não poderiam ser vistas
pelos olhos, flutuariam pelo ar e penetrariam no corpo humano através da boca e do
nariz. Defendia também que as terras pantanosas eram insalubres para as habitações
humanas. Nessa época começa o isolamento dos animais doentes do rebanho sadio,
medida imposta pelo governo para controlar surtos de doenças transmissíveis. No pri-
meiro século da Era Cristã, é instituída a quarentena, pelos romanos.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
da doença. A partir das lesões de uma ordenhadeira, foi desenvolvida a vacina contra a
Varíola, que obteve ótimo resultado na imunização das pessoas. Esta é considerada a
primeira imunização ativa artificialmente induzida da história da humanidade.
Em Londres, no século XIX, inúmeras epidemias de Cólera grassavam entre a popu-
lação, causando grande número de óbitos. John Snow, no período de 1849 a 1854, desen-
volveu um minucioso trabalho de observação e dedução e estabeleceu a via de transmis-
são hídrica como sendo a principal, possibilitando, dessa maneira, a adoção de medidas
preventivas adequadas e a interrupção da epidemia. Deve-se ressaltar a importância do
trabalho de Snow, principalmente se forem levadas em consideração as dificuldades da
época e o fato que o agente etiológico da doença só foi isolado posteriormente, em 1883.
Também foi de extrema importância o trabalho desenvolvido pelo médico húngaro
Ignaz Semmelweis (1818-1865) a respeito da Febre Puerperal, quando conseguiu, em
1847, diminuir a taxa de incidência desta enfermidade em decorrência da instituição da
obrigatoriedade da higiene e desinfecção das mãos. Antes de adotar tal medida, alunos
do curso de Medicina realizavam autópsias e, em seguida, e sem nenhuma higiene das
mãos, examinavam pacientes internadas na maternidade em que Semmelweis trabalha-
va; os estudantes desempenhavam o papel de veiculadores animados, infectando as
pacientes. Apesar dos resultados obtidos pelo médico, seus colegas da época repudia-
ram a medida profilática. Somente a partir de 1878 a prática da antissepsia, lavagem das
mãos e dos instrumentos cirúrgicos, passou a ser adotada de forma mais ampla. Tam-
bém a partir desta época, teve início o uso de luvas de borracha.
Neste retrospecto histórico, não se pode deixar de mencionar a figura excepcional de
Louis Pasteur (1822-1895), considerado o “pai da bacteriologia”. Além de seus estudos
a respeito da fermentação da cerveja e do leite e do desenvolvimento da técnica da
pasteurização, em 1865, identificou e isolou inúmeras bactérias, dentre elas o Bacillus
anthracis (1881). Desenvolveu vacina contra a Cólera Aviária, a partir de culturas ate-
nuadas de Pasteurella spp. Desenvolveu a vacina anti-rábica (1885), importante passo
na prevenção de enfermidade tão temida até os dias de hoje.
Em 1886, os estudos de Zenker trazem à tona a transmissão de doenças dos animais
para o homem. Ele conseguiu estabelecer a relação entre a Triquinelose humana e a
Triquinelose suína, ressaltando a importância dos alimentos de origem animal como fonte
de doenças para o homem.
Em 1892, Smith, Kilborne e Curtice conseguem provar que a transmissão da Babesiose
é feita por carrapatos, estabelecendo nova forma de transmissão, por meio de vetores.
Não podemos deixar de citar alguns brasileiros extremamente importantes, que atua-
ram na Microbiologia e na Saúde Pública no final do século XIX e início do século XX,
como, por exemplo, Oswaldo Cruz, Carlos Chagas, Emílio Ribas, Adolfo Lutz, Rocha
Lima e Vital Brazil.
Oswaldo Cruz foi o responsável pela erradicação da Febre Amarela no Rio de Janei-
ro, no início deste século, elaborando e executando um rigoroso plano de reforma sanitá-
ria que recebeu a oposição de parte da população.
Devido às inúmeras epidemias que ocorriam nessa época e ao alto custo da importa-
ção de soros e vacinas, tornou-se imprescindível a instalação de um laboratório que
produzisse o soro antipestoso, tarefa realizada na época apenas pelo Instituto Pasteur, de
Paris. Assim, em 1899, foi criado o Instituto Serumtherápico, instalado numa fazenda em
Manguinhos, que daria origem ao Instituto Butantan, em 1901. Neste Instituto, dirigido
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
inicialmente por Oswaldo Cruz, foram formados inúmeros pesquisadores brilhantes que
muito contribuíram para a melhoria da saúde dos brasileiros.
Carlos Chagas, que foi um dos discípulos de Oswaldo Cruz, descreveu um novo
parasita, em 1908. Deu a ele o nome de Trypanosoma cruzi; estudou todo o ciclo
evolutivo do agente, bem como o quadro clínico da enfermidade. Descreveu a morfologia
e biologia de novas espécies de protozoários, realizou pesquisas no campo da Entomologia
e participou do combate à Malária no Brasil.
Emílio Ribas, juntamente com Adolfo Lutz e Vital Brazil, participou do controle da
epidemia de Peste Bubônica em Santos (SP), em 1899; realizou pesquisas sobre a Varí-
ola, conseguindo debelar um surto da doença que ocorreu no Estado de São Paulo em
1898. Estudou a transmissão da Febre Amarela demonstrando, em 1903, que o mosquito
era o vetor do agente etiológico, refutando a tese dos “contagionistas”.
Adolfo Lutz identificou, em São Paulo, a Blastomicose Sul-americana. Além de iden-
tificar e debelar surtos de Cólera e de Peste em várias localidades do estado, por meio
de suas pesquisas conseguiu estabelecer a natureza tifoídica das “febres paulistas”.
Dentre as pesquisas realizadas por este cientista brasileiro destacaram-se os estudos
sobre Ancilostomose, Esquistossomose e Leishmaniose.
Foi Rocha Lima o responsável pela identificação do agente etiológico do Tifo
Exantemático, a quem deu o nome de Rickettsia prowazeeki. Em 1927 assumiu o cargo
de diretor do Instituto Biológico, em São Paulo.
Vital Brazil desenvolveu pesquisas sobre ofidismo e outras doenças endêmicas e
epidêmicas que grassavam em nosso meio. Foi o primeiro diretor do Instituto Butantan,
descobriu a especificidade dos soros antiofídicos e, graças ao seu trabalho de difusão do
uso desses soros pelo interior do Brasil, conseguiu diminuir significativamente a mortali-
dade por acidentes ofídicos.
Este panorama geral sobre a história da Medicina e de alguns fatos relevantes para
a Epidemiologia teve como objetivo tecer alguns comentários sobre a evolução dos
conceitos, para que fique mais claro como chegamos ao que somos. Devemos louvar
os nossos novos cientistas, as novas tecnologias, o conhecimento moderno, mas não
podemos esquecer nossas origens. Nada seríamos sem aqueles que nos precederam e
que conseguiram alcançar grandes vitórias com armas primitivas e com um arsenal
muito menor do que o que temos hoje a nossa disposição.
2. Conceitos fundamentais
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Já uma epidemia que ocorre numa área restrita, como uma escola ou uma ou poucas
fazendas, é chamada de SURTO EPIDÊMICO. Se imaginarmos que o bolo servido
numa festa de aniversário estava contaminado por toxina estafilocócica, provocando
uma intoxicação alimentar nos convidados que o consumiram, teremos um exemplo de
surto epidêmico.
Uma outra forma de classificar as epidemias é por meio de sua velocidade na etapa
de progressão, ou seja, na fase em que o número de casos está aumentando. Se esta
progressão é rápida, com a incidência máxima de casos sendo atingida num curto espa-
ço de tempo, diz-se que é uma epidemia explosiva ou maciça. É o que acontece,
geralmente, nos casos de intoxicações cujos agentes são veiculados pela água ou ali-
mentos contaminados.
Por outro lado, se a incidência máxima da enfermidade for atingida lentamente, com
os casos se sucedendo vagarosamente, a denominação empregada é epidemia lenta. É
o que acontece quando o agente etiológico da enfermidade tem baixa resistência ao
meio externo ou quando a população atingida é resistente ou imune ao agente em ques-
tão.
De acordo com o mecanismo de transmissão da enfermidade, pode-se classificar a
epidemia em progressiva (ou propagada) ou em epidemia por fonte comum. A epide-
mia progressiva ou propagada é aquela em que a disseminação da doença acontece
em cadeia. A progressão é lenta e o mecanismo de transmissão é de hospedeiro a
hospedeiro. É o caso das epidemias de Sarampo.
Quando não existe o mecanismo de transmissão de hospedeiro a hospedeiro, estamos
frente a epidemias por fonte comum. O agente etiológico é transmitido por meio da
água, dos alimentos, do ar ou por inoculação. A transmissão não precisa ocorrer neces-
sariamente ao mesmo tempo e no mesmo lugar. Estas epidemias são, geralmente, explo-
sivas e localizadas.
Ao estudarmos epidemias por fonte comum, podemos subdividi-las em dois tipos, de
acordo com a extensão do intervalo de tempo em que a fonte produz efeitos. Assim,
quando a exposição ao agente se dá durante um curto intervalo de tempo e pára, não
tornando a ocorrer, dizemos que é uma epidemia por fonte pontual (ou epidemia
focal). Já se a fonte tem existência dilatada e a população fica exposta a ela por um
longo período de tempo, denomina-se epidemia por fonte persistente. No exemplo
dado acima, de um bolo de aniversário contaminado, teríamos uma epidemia por fonte
pontual (só quem esteve na festa esteve exposto e, com o fim do bolo, a fonte de conta-
minação acabou). Se pensarmos que uma determinada população está recebendo água
de abastecimento contaminada por esgotos, temos um exemplo de fonte persistente.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
conhecidas pode ser incluída no grupo das não-infecciosas crônicas e das infecciosas
agudas.
Doença contagiosa “é uma doença infecciosa cujo agente etiológico atinge os sadi-
os através de contato direto com indivíduos infectados”. Toda doença contagiosa é tam-
bém infecciosa.
Doença transmissível é “qualquer doença causada por um agente infeccioso espe-
cífico, ou seus produtos tóxicos, que se manifesta pela transmissão deste agente ou de
seus produtos, de uma pessoa ou animal infectados ou de um reservatório a um hospe-
deiro suscetível direta ou indiretamente por meio de um hospedeiro intermediário, de
natureza vegetal ou animal, de um vetor ou do meio ambiente” (OPAS, 1992).
Ao tratar-se de enfermidades transmissíveis, é bastante comum a utilização do mo-
delo denominado “cadeia epidemiológica”, no qual cada elemento envolvido está ligado
ao outro como se fossem elos de uma mesma corrente. Estes elementos são o agente
infectante, a fonte de infecção, as vias de eliminação, as vias de transmissão, as portas
de entrada, o suscetível e os comunicantes. A seguir, comentários a respeito de cada um
destes itens.
1. Agente infectante
É o causador da enfermidade (vírus, bactéria, protozoário, etc.), que passará por
cada um dos elos da corrente epidemiológica.
2. Fonte de infecção
Segundo alguns autores, a fonte de infecção é sempre um vertebrado. Entretanto, de
acordo com a Organização Mundial da Saúde, a fonte de infecção é “a pessoa, animal,
objeto ou substância da qual o agente infeccioso passa a um hospedeiro”. É onde o
agente sobrevive e de onde se espalhará.
As principais fontes de infecção são os homens ou animais doentes ou portadores.
Entre os doentes, pode-se ter doentes típicos (aqueles que apresentam o quadro clínico
conhecido de determinada doença); doentes atípicos (o quadro clínico não é caracterís-
tico) e doentes em fase prodrômica (estão na fase inicial da doença; já apresentam
alterações orgânicas, mas ainda não começaram a manifestar os sintomas da doença
que contraíram).
Quanto aos portadores, existem os sãos, os em incubação e os convalescentes.
Portadores sãos possuem o agente etiológico e o transmitem, porém não manifestam a
enfermidade, seja por resistência natural ou por imunidade adquirida. Os portadores em
incubação são aqueles que vão apresentar a doença, tão logo termine o período de
incubação. Os sintomas ainda não apareceram, mas o indivíduo já está eliminando o
agente e contaminando o meio ou infectando novos hospedeiros. Os portadores conva-
lescentes são os que tiveram a doença e já se curaram, mas ainda estão expelindo o
agente. O estado de portador convalescente pode ser temporário ou pode persistir por
períodos longos (neste caso, são denominados portadores convalescentes crônicos).
Recebem o nome de reservatórios, animais de espécie diferente da principal estu-
dada, que permitem a sobrevivência do agente. Por exemplo, ao estudarmos Raiva cani-
na, se um cão atacar outro cão, chamaremos o agressor de fonte de infecção. No entan-
to, se um gato for o agressor, ele será denominado reservatório.
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3. Vias de eliminação
É o veículo utilizado pelo agente para sair do hospedeiro, passando ao meio externo.
Para cada agente existe uma via de eliminação de maior importância epidemiológica,
que está intimamente ligada ao tipo de sintomatologia causada por ele. São vias de
eliminação as secreções oro-nasais, as fezes, a urina, o sangue, o leite, o pus, as
descamações cutâneas, dentre outras.
4. Vias de transmissão
É o meio pelo qual o agente etiológico alcança o novo hospedeiro.
5. Portas de entrada
A porta de entrada é o local por onde o agente consegue penetrar no hospedeiro. São
inúmeras as possíveis portas de entrada num organismo: pele, boca, mucosas, trato res-
piratório, etc..
A porta de entrada preferencial de determinado agente está intimamente relacionada
com o tipo de transmissão e com características do próprio agente. No caso da
Leptospirose, por exemplo, as portas de entrada podem ser a boca (no caso da ingestão
de alimentos ou água contaminados) ou a pele (no caso de pessoas que permanecem
muito tempo em contato com água de enchentes, por exemplo).
6. Suscetível
O suscetível é o elo final da cadeia epidemiológica. Ele é o indivíduo que, devido a
inúmeras características – espécie, estado nutricional, estado imunológico, condições de
vida, contato com alguma fonte de infecção – será o novo hospedeiro do agente patogênico
estudado. É aquele que sofrerá a nova infecção.
7. Comunicantes
Os comunicantes, também denominados contatos, são indivíduos que tiveram a pos-
sibilidade de sofrer a infecção, mas que, no momento do estudo, não se sabe se estão ou
não infectados. Muitas vezes, quando se procede à vigilância epidemiológica de um caso
de determinada enfermidade de notificação compulsória, verifica-se que existem outras
pessoas, familiares ou não, que moram na mesma residência do doente e que ainda não
estão apresentando sintomas. Estas pessoas são consideradas comunicantes.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Se uma pessoa informa a uma autoridade sanitária a ocorrência de 100 casos de uma
determinada doença, pode-se dizer que está ocorrendo uma epidemia? Vamos imaginar
algumas situações:
a) 100 casos de uma determinada doença ocorreram no período de uma semana,
numa mesma cidade;
b) 100 casos de uma doença ocorreram numa mesma cidade, ao longo de um ano;
Fica claro que, se alguém fornecer apenas o número de casos que aconteceram, sem
dar maiores informações, nada poderá ser concluído. Cada um dos exemplos acima
constitui um quadro epidemiológico diferente, que deveria desencadear diferentes ações
por parte das autoridades sanitárias do local.
Assim, para que se consiga ter uma real percepção da situação de saúde de uma
população, devem-se quantificar os problemas de saúde que ali ocorrem. As doenças
podem ser “medidas” por meio de vários aspectos: gravidade, duração, freqüência, etc..
Deve ser colhido o maior número de informações possível a respeito do problema de
saúde em questão, como por exemplo:
• características da população afetada (com relação a sexo, idade, raça, profissão,
etc.), para que se possam estabelecer os grupos mais suscetíveis;
• freqüência da enfermidade naquela população ao longo do tempo e no momento
atual, para que se possa comparar e estabelecer a gravidade do problema;
• características da enfermidade ou do agravo em questão, riscos que ele acarreta e
mecanismos de prevenção e controle do problema.
Quando dizemos que ocorreram 100 casos de uma doença, estamos fornecendo um
dado de freqüência da enfermidade, mas em número absoluto. Para que se possa esta-
belecer a significância epidemiológica deste dado e também para que se possam estabe-
lecer comparações com outras populações (ou com a mesma população em épocas
diferentes), deve-se transformar este dado de freqüência da enfermidade num valor
relativo. Para isso são empregados inúmeros indicadores de saúde compostos por índi-
ces, coeficientes, taxas e razões. A seguir, comentaremos um pouco a respeito dos mais
utilizados.
⇒ Morbidade
A morbidade refere-se ao comportamento das doenças e dos agravos à saúde
em uma população exposta. É usada para mensurar a freqüência dos problemas de
saúde na população. Nada mais é do que o número de casos de uma doença (ou
agravo) num determinado período. São fontes de dados de morbidade as notifica-
ções, estatísticas sobre doentes hospitalizados ou atendidos em ambulatórios, regis-
tros dos serviços de assistência médica públicos ou particulares, etc..
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
⇒ Incidência
Em Epidemiologia, a incidência traduz a idéia de intensidade com que acontece a
morbidade em uma população. É medida mediante o número de casos novos de uma
doença ou agravo registrados na população num determinado período. O coeficiente de
incidência é utilizado para comparar os riscos que duas populações têm de adquirir um
problema de saúde ou como varia o risco numa mesma população no tempo.
número de casos novos (iniciados)
Coeficiente de Incidência = num determinado período numa área x 10n
população exposta ao risco neste
período, na mesma área
⇒ Prevalência
“Em Epidemiologia, a prevalência é o termo descritivo da força com que subsistem
as doenças nas coletividades. Consiste no número de casos existentes da doença ou
agravo, novos ou antigos.”
⇒ Mortalidade
Citaremos, a seguir, os principais indicadores de Mortalidade empregados em
Epidemiologia.
* Mortalidade geral
O coeficiente de mortalidade geral mede o risco que um indivíduo da população corre
de morrer por qualquer causa no período considerado. Este coeficiente geralmente é
utilizado para avaliar o estado sanitário de determinada área.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
* Mortalidade infantil
Mede o risco de morte para criança menor de um ano de idade. É um indicador do
nível de saúde e de desenvolvimento social de uma região.
* Mortalidade neonatal
Mede o risco da criança morrer nas suas quatro primeiras semanas de vida. Neste
período a morte geralmente está relacionada com agressões sofridas pelo feto durante a
vida intra-uterina ou com condições do parto. As principais causas de óbito são do tipo
endógeno, como anomalias congênitas e afecções perinatais.
* Mortalidade pós-neonatal
Mede o risco de a criança morrer após a quarta semana de vida e até completar um
ano de idade. Neste período, geralmente a morte é conseqüência de causas de natureza
ambiental e social (causas exógenas), provocando, por exemplo, gastroenterites, infec-
ções respiratórias e desnutrição.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
* Letalidade
A letalidade mede o poder que uma doença tem de provocar a morte dos indivíduos
que adoeceram por esta doença. Permite avaliar a gravidade da doença.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Vigilância epidemiológica
De acordo com a Lei no 8.080 de 19 de setembro de 1990, “entende-se por Vigilância
Epidemiológica um conjunto de ações que proporcionam o conhecimento, a detecção ou
prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde
individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de preven-
ção e controle das doenças ou agravos”.
Cada país possui um sistema próprio de notificação de casos e de vigilância às ocor-
rências relacionadas à saúde. O objetivo de todos os sistemas de vigilância é o mesmo
em qualquer parte do mundo: coletar informações de rotina a respeito da situação de
saúde local e transmiti-las para um nível central. Assim, pode-se perceber, que os siste-
mas de Vigilância Epidemiológica estão geralmente organizados em níveis, que se orde-
nam hierarquicamente, da periferia para o nível central.
As informações colhidas pelos sistemas de Vigilância devem auxiliar o gerenciamento
e a avaliação das atividades de saúde de determinada região ou país. Estas informações,
ou dados, após serem colhidos, devem ser consolidados, analisados e divulgados. Para
que se consiga desenvolver um bom trabalho em Vigilância Epidemiológica, um dos
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* Caso suspeito: pessoa cuja história clínica, sintomas e possível exposição a uma
fonte de infecção sugerem que o mesmo possa estar ou vir a desenvolver alguma doen-
ça infecciosa (CDC, 1988).
* Caso autóctone: caso da doença que teve sua origem dentro dos limites do lugar
em referência ou sob investigação.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
II - Elementos de Bioestatística
Sebastião Marcos Ribeiro de Carvalho
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
2. Descrição de dados
Ao realizarmos um estudo estatístico completo de um fato, é necessário desenvolver-
mos diversas fases do método estatístico, sendo as principais: definição do problema,
planejamento, coleta dos dados, apuração dos dados, apresentação dos dados, análise e
interpretação dos dados.
Os dados, após coletados, apurados, organizados e resumidos (mediante contagem e
grupamento), precisam ser apresentados para que possam descrever a população ou
amostra adequadamente, permitindo uma rápida análise do fenômeno em estudo. Pode-
mos descrever os dados por meio de tabelas, gráficos e medidas.
2.1 Descrição tabular de dados
A descrição tabular de dados é uma apresentação numérica dos dados. Dispomos os
dados em linhas e colunas ordenadamente, segundo algumas regras adotadas pelos esta-
tísticos. No Brasil as regras foram fixadas pelo Conselho Nacional de Estatística. Os
conjuntos de dados coletados e sumarizados em tabelas, referentes a qualquer variável,
denominam-se, em estatística, de série estatística. Para diferenciar uma série estatística
de outra, levam-se em conta três características presentes na tabela que as representa:
a época (fator corporal ou cronológico) a que se refere o fenômeno analisado, o local
(fator espacial) onde o fenômeno acontece e o fenômeno (espécie do fato ou fator
especificativo) que é descrito.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
146091 17,87 194 608 18,93 nc nc 297 0762 29,43 637775 19,72
16696 2,04 26926 2,62 nc nc 374533 3,71 81075 2,51
15158 1,85 27088 2,63 nc nc 37 4463 3,71 79692 2,46
4630 0,57 5846 0,57 nc nc 6 2333 0,62 16709 0,52
1930 0,24 3189 0,31 nc nc 4 4403 0,44 9559 0,29
4385 0,54 7137 0,69 nc nc 9 2733 0,92 20795 0,64
8462 1,03 18069 1,76 nc nc 34 498 3,42 61029 1,89
380277 46,51 414059 49,27 nc nc 583065 57,76 1 377401 42,59
240037 29,36 331197 32,21 nc nc 379177 37,56 950411 29,38
Total 817666 100,00 1028119 100,00 - - 1009484 100,00 3234 446 100,00
47
SOERENSEN & BADINI MARULLI
fictícios (simulados).
Como exemplo, observando a Tabela 1, temos: Fonte: dados, n.0 20, nov.96 (adapta-
da).
f) Notas: são esclarecimentos de ordem geral, colocadas no rodapé da tabela logo
após a fonte (se houver), que servem para esclarecer o conteúdo das tabelas ou para
explicar o método utilizado no levantamento dos dados. São numeradas em algarismos
arábicos, ou por meio de símbolos gráficos, sendo bastante comum o asterisco.
Observando a Tabela 1, temos:
1- Excluídos os empregos em clínicas de complementação diagn/terap.
g) Chamadas: explicam ou conceituam determinados dados, servem para esclare-
cer minúcias em relação a eles. São numeradas em algarismos arábicos, mas costuma-
se usar também símbolos gráficos ou letras.
Exemplificando, podemos observar na Tabela 1:
2- Inclui médicos residentes
3- Estimado a partir do total de empregados “outros de nível superior”.
48
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
50 [ — 60 55 9
60 [ — 70 65 8
TOTAL 40
Fonte: Montenegro, M.R.G., Incidência e Extensão de Lesões de Arteriosclerose em Aortas e
Artérias Coronárias. Estudo Baseado em 250 casos, tese de livre-docência; Faculdade de Medi-
cina, USP, 1 962. (Berquó et al., 1981, p. 74)
Tabela 3. Distribuição de casos de Trombose Venosa e controles de acordo com uso de anticon-
cepcionais.
TROMBOSE VENOSA
USO DE CONTRACEPTIVOS ORAIS CASOS CONTROLES
Sim 25 350
Não 5 570
TOTAL 30 920
Fonte: Rouquaryol (1994, p.180)
49
SOERENSEN & BADINI MARULLI
logarítmica.
Logo abaixo do gráfico deve constar, por exemplo, Figura 1 e o título do mesmo.
Todo gráfico deve ser construído numa escala que não desfigure os fatos ou as rela-
ções que se deseje destacar.
Os gráficos podem ser cartogramas ou diagramas:
i) Cartogramas: mapa geográfico ou topográfico em que as freqüências das catego-
rias de uma variável são projetadas nas áreas específicas do mapa, utilizando-se cores
ou traçados cujos significados constam em legendas anexadas às figuras. Em
epidemiologia, os mapas alfinetados são de grande emprego para apreciar o apareci-
mento e a expansão de certas moléstias.
ii) Diagramas: gráficos em que a magnitude das freqüências é representada por
certa mensuração de uma determinada figura geométrica. Se a medida utilizada for o
comprimento, tem-se o diagrama de ordenadas; se a medida utilizada for a área ou
superfície da figura, têm-se o diagrama de barras, o histograma, setores circulares e
diagramas circulares; quando se usa o volume da figura, temos o estereograma. Na
representação de um diagrama deve ser levada em conta a natureza da variável: quali-
tativa ou quantitativa (Berquó et al., 1981).
a.1) Descrição gráfica de variável qualitativa
Podemos descrever graficamente uma variável qualitativa por meio dos seguintes
gráficos: linear, de ordenadas, de barras, de colunas, de círculos, de setores circulares e
estereogramas.
Diagramas de círculos: às áreas dos diversos círculos devem ser proporcionais as
magnitudes das freqüências.
Diagrama linear: no caso de variáveis qualitativas não se justapõem os retângulos
nem se unem as ordenadas dos diagramas; há, entretanto, um caso que foge ‘à regra
geral’, o das séries históricas (referem-se às divisões do tempo: meses do ano, dias da
semana, ano-calendário), obtendo-se o que denominamos diagrama linear. Nesse caso,
unimos as extremidades das ordenadas por segmentos de retas, obtendo-se uma inter-
pretação dinâmica do fenômeno (Berquó et al., 1981) .
a.2) Descrição gráfica de variável quantitativa
Nas distribuições de freqüências a uma variável quantitativa precisamos fazer a dis-
tinção se a variável é discreta ou contínua.
Nas distribuições discretas os diagramas mais usados são os de ordenadas e os de
barras. Nas distribuições contínuas os gráficos usados são o polígono de freqüências e o
histograma, sendo que o sistema de eixos utilizado é o sistema cartesiano ortogonal,
colocando-se nas abscissas os valores das classes das variáveis em estudo e nas orde-
nadas, os valores das freqüências.
No caso de uma distribuição contínua com classes de intervalos diferentes, precisa-
mos fazer o ajuste das freqüências, pois, caso contrário, a magnitude da figura geométri-
ca não será proporcional à freqüência com que ocorre a variável. O ajuste é feito calcu-
lando-se a densidade de cada classe, que é definida como o quociente entre a frequência
relativa proporcional de cada classe e a amplitude da respectiva classe.
Para representar variável quantitativa temos ainda o polígono de freqüências acumula-
das, no qual o interesse é o do conhecimento da freqüência total dos valores.
Ilustraremos a descrição gráfica de variável qualitativa, a partir da Tabela 4 a seguir:
50
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Tabela 4. Diagnóstico de biópsias de mama, feitas entre 1963 e 1972, inclusive, no H.S.R.J.
Diagnóstico Freqüência
Displasia 1010
Tumor benigno 344
Tumor maligno 329
Inflamatória 54
Outros 288
Total 2.025
Fonte: Vieira (1988, p.34)
1200
1000
800
Frequência 600
400
200
0
Displasia Tum or Tum or Inflam atória Outros
benigno m aligno
Diagnóstico
Outros
Inflam atória
Tum or m aligno
Tum or benigno
Displasia
In f la m a t ó r ia O u tr o s
3 % 1 4 %
T u m o r m a lig n o
1 6 %
51
SOERENSEN & BADINI MARULLI
1200
1000
800
600
400
200
0
Displasia Tumor benigno Tumor maligno Inflamatória Outros
x=Σ——
x i , onde : x = média; S = soma; xi = dados; n = n. de dados
n
Exemplo 1: Obter o peso corporal médio de cinco recém-nascidos vivos na Materni-
52
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
dade do HC, com os pesos corporais de 2.950 g, 2.750 g, 3.500 g, 3.150 g e 3.250 g.
Σ xi fi
x = ——— , onde n = S fi , i = 1, 2, ... , p
n
11 >
>
11 10
10 5
Fig. 1 - Pacientes com hipertensão segundo a idade Fig. 2 - Pacientes com hipertensão segundo a idade
em anos completos em anos completos
53
SOERENSEN & BADINI MARULLI
S ( xi - x) 2
(1) s2 = ——-—— , o denominador n-1, recebe o nome de
n - 1 graus de liberdade.
54
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
5 0 0
7 2 4
______________________________
S x = 20 S(xi-x)=0 S(xi-x)2 = 8
______________________________
Desenvolvendo algebricamente (1) e (2), obtemos as fórmulas de uso mais fácil para
quem dispõe de calculadora eletrônica:
Matematicamente: s = Ö ( s 2 )
5. Probabilidade
5.1 Estudo de um fenômeno coletivo
Fenômeno: qualquer acontecimento natural
A sua descrição pode ser realizada mediante um modelo matemático que permite
55
SOERENSEN & BADINI MARULLI
56
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
1. 0 ≤ p(ai ) ≤ 1 e 2. Σ p(ai ) = 1
57
SOERENSEN & BADINI MARULLI
NCF(5) 1
P(5/Ímpar) = ——————— = ——— = 0,3333 ou 33,33%
NCF(ímpar) 3
P(A/B) = P(A)
Ex.: A probabilidade de, ao lançarmos uma moeda e um dado, sair cara na moeda
tendo saído face 5 no dado são eventos independentes.
58
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
5.11 Exemplos:
1. Distribuições de freqüências relativas para um dado, para vários tamanhos de
amostra (uso da tábua de números aleatorios):
Tabela 1. Dist. de frequências relativas para um dado, para vários tamanhos de amostra.
X = n.o de pontos f/n ; n = 10 f/n ; n = 50 f/n ; n = µ
1 0,10 0,22 1/6=0,167
2 0 0,12 1/6=0,167
3 0,10 0,14 1/6=0,167
4 0,20 0,14 1/6=0,167
5 0,30 0,14 1/6=0,167
6 0,30 0,24 1/6=0,167
1,00 1,00 1,00
Fonte: Wonnacott & Wonnacott (1985, p.40)
Solução:
Os possíveis valores de X são: 0, 1, 2, e 3 meninas, mas não são todos igualmente
prováveis, o que podemos verificar observando a árvore de probabilidades a seguir:
3.0
0
2. m→ m,m,m→ 1/8
0
1. m
h→ m,m,h→ 1/8
m
m→ m,h,m→ 1/8
h
h→ m,h,h → 1/8
m→ h,m,m→ 1/8
m
59
SOERENSEN & BADINI MARULLI
h→ h,m,h → 1/8
h
m→ h,h,m → 1/8
h
h→ h,h,h → 1/8
p(x) . X P(X=x)
3/8 . 0 1/8 = 0,125
2/8 . 1 3/8 = 0,375
1/8 . . . . . 2 3/8 = 0,375
0 1 2 3 X 3 1/8 = 0,125
Figura 1. Distrib. de probab. do número de meninas em uma família com três filhos.
4. A otite média é uma moléstia do ouvido que representa uma das causas mais
frequentes de consulta médica nos primeiros dois anos de vida da criança. Seja X a
v.aleatória que representa o número de otite média nos dois primeiros anos de vida da
criança. Supondo que o número de episódios de otite tenha a distribuição dada na Tabela
2, abaixo (Curi, 1998, p.77):
x 0 1 2 3 4 5 6
p(x) 0,129 0,264 0,271 0,185 0,095 0,039 0,017
60
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
6. Distribuições de probabilidades
6.1 Introdução
As distribuições de probabilidades têm utilidade na teoria relativa à Inferência Es-
tatística, metodologia que permite fazer afirmações sobre características de uma po-
pulação, baseando-se em resultados de uma amostra retirada dessa população.
Quando usamos a Estatística na resolução de problemas biomédicos, verificamos
que muitos problemas apresentam as mesmas características, o que nos permite estabe-
lecer um modelo teórico para a determinação da solução destes problemas.
Os principais componentes de um modelo estatístico teórico são:
1. os possíveis valores que a variável aleatória X pode assumir;
2. a função de probabilidade associada à variável aleatória X;
3. o valor esperado da variável aleatória X;
4. a variância e o desvio-padrão da variável aleatória X.
61
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Exemplo:
Experimento: lançamento de uma moeda, a variável aleatória X anota o número de
caras obtidas. Determine a variância e o desvio-padrão da variável aleatória X.
Solução:
Os possíveis resultados de X são 0 e 1, com probabilidades P(x=0)= 1/ 2 e P(X=1) =
1 / 2, logo temos um experimento de Bernoulli.
62
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
p(S) = p,p(F)= q ),
iii) Se estamos interessados na ocorrência de x sucessos e (n-x) fracassos, indepen-
dentemente da ordem de ocorrência, então diremos que a v. aleatória X admite distribui-
ção binomial de probabilidades, definida por:
Descrição: B ~ (n , p ), onde
n = n.o repetições
p = probabilidade de sucesso em cada repetição.
3. µ (x) = n.p
4. σ2 (x) = n . p . q
5. σ (x) = v n . p .
Ex.1: Teste de 20 questões, com 5 alternativas, das quais apenas uma é correta. Se o
estudante responder as questões ao acaso:
I) qual é a probabilidade que consiga acertar exatamente 10 questões?
IIi) qual a esperança de acertos?
III) qual a variância dos acertos?
IV) qual o desvio padrão dos acertos?
Solução:
I) E: responder uma questão, com p(s) = 1/5 e p(f) = 4/5, sendo n = 20 repetições
independentes, com 10 sucessos.
20
Como p(X=x) = ( ) (1/5)10 . (4/5)20 - 10 = 0,0020 ou 0,2 %
10
ii) µ(x) = np = 20 x 0,2 = 4 questões
iii) σ2(x) = npq = 20 x 1/5 x 4/5 = 3,2 (questões)2
iv) σ(x) = √ npq = √ 20 x 0,2 x 0,8 = 1,8 questões
Observações:
a) P(X=x) = 0, isto é, com uma variável contínua, a probabilidade de X=x é sempre
igual a zero. Somente tem sentido calcular probabilidades em intervalos.
b) Como P(X = a) = P(X = b ), temos: P(a £ x £ b) = P (a < x £ b ) = P (a £ x < b)
= P (a < x < b)
64
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
65
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Notas:
a) A área total sob a curva normal padronizada = 1
b) Área à direita de 0 (zero) = 0,5
c) Área à esquerda de 0 (zero) = 0,5
d) Área entre 0 e Z1 = P(0 < z < Z1 )
Ex.1: Considere uma população cuja PAM apresenta m = 110 mm Hg e s = 10 mm
Hg. Calcule as probabilidades (Curi, 1998, p.95).
a) PAM entre 110 e 125
b) PAM entre 95 e 105
c) PAM entre 100 e 105
d) PAM > 122
e) PAM < 94
f) PAM no intervalo que inclui dois desvios ao redor da média
g) quais os dois valores da PAM no item f ?
h) qual é o valor da PAM a partir da qual se tem 10% das PAM mais altas?
Solução:
a) P(110<X<125) = P(0< z <1,5) = 0,4332 ou 43,32 %
b)P(95<X<110) = P(-1,5< z <0) = 0,4332 ou 43,32 %
c) P(100<X<105)=P(-1< z <-0,5) = 0,1498 ou 14,98%
d) P(X > 122) = P(z > 1,2) = 0,5-P(0 < z < 1,2) = 0,1151 ou 11,51%
e) P(X < 94) = P(z < - 1,6) = P(z > 1,6) = 0,0548 ou 5,48 %
f) P(m - 2s < X < m + 2s) = P( -2 < z < 2 ) = 0,9544 ou 95,44%
g) x1 = µ - 2σ = 90 e x2 = µ + 2σ = 130 → P(90 < X < 130) = 0,9544 ou 95,44 %
h) Tabela : P(X > Xc ) = 0,10 = P( z > zc )
P(0 < z < zc) = 0,40 ® zc = 1,28 ® zc = 1,28 = (Xc - 110)/10
logo: X c = 122,8 mm Hg, portanto 10% das pressões são superiores a 122,8 mm Hg,
ou seja
P( X > 122,8 ) = 0,10.
7. Métodos de inferência 66
7.2 O que são hipótese nula e hipótese alternativa? Como determinar qual é
qual?
Em termos estatísticos a hipótese científica é desdobrada em duas hipóteses estatís-
ticas: uma hipótese inicial que formulamos denominada de hipótese de nulidade e deno-
tada por H0 e uma outra denominada de hipótese alternativa e denotada por H 1 ou Ha.
Ao formularmos uma hipótese estatística Ho, o nosso objetivo é rejeitá-la. Admitindo
essa hipótese Ho como verdadeira, se verificarmos que os resultados obtidos em uma
amostra diferem acentuadamente dos esperados para essa hipótese, com base na teoria
das probabilidades, podemos concluir que as diferenças observadas são significativas, e
rejeitamos a hipótese de nulidade em favor de uma outra denominada Ha.
Para determinarmos qual é a H0, formulamos a hipótese de nulidade Ho , em geral,
como a negação da hipótese científica formulada pelo pesquisador, sendo que a hipótese
alternativa Ha, em geral, coincide com a proposta pelo pesquisador (Curi, 1997).
Portanto, testar hipóteses consiste em decidir a respeito de duas situações possíveis:
ou H0 é verdadeira ou H1 é verdadeira. Para maior facilidade de interpretação e nota-
ção, faremos referencia sempre à hipótese nula H0.
A aceitação de H0 implica na rejeição de H1 e, caso contrário, a rejeição de H0
representa a aceitação de H1.
Exemplo 2. Levando-se em conta o exemplo 1 da questão 1, em termos estatísticos a
hipótese científica é formulada como:
67
SOERENSEN & BADINI MARULLI
H0: não existe diferença dos níveis de colesterol quando se comparam filhos de pais
com antecedentes de doença cardíaca e as crianças em geral.
Ha: pais com doença cardáca no passado devem ter filhos com colesterol mais eleva-
do.
Ou seja:
H0: o nível médio de colesterol de filhos de pais com antecedentes cardíacos é 175
mg%/ml.
Ha: o nível médio de colesterol de filhos de pais com antecedentes cardiacos é maior
que 175 mg%/ml.
7.3 O que são erro tipo I (erro a) e erro tipo II (erro b)?
A tomada de decisões a respeito da população será sempre com base na observação
de amostras retiradas dessa população, portanto estaremos expostos a cometer erros.
No caso os erros são de dois tipos: rejeitar H0 quando H0 é verdadeira ou aceitar H0
quando na realidade essa hipótese é falsa.
A probabilidade de rejeitar H0 quando H0 é verdadeira é a chamada probabi-
lidade de erro Tipo I, a qual indicamos por a, e corresponde ao nível de
significância do teste.
A probabilidade de aceitar H0 quando falsa é a chamada de probabilidade de
erro Tipo II, a qual indicamos por b.
Estado da Natureza
Decisão H0 é V H0 é F
Aceita-se H0 Decisão correta Erro tipo II = b
Rejeita-se H0 Erro tipo I = a Decisão correta
Esses dois tipos de erros, Tipo I e Tipo II, estão de tal forma associados que, se
diminuirmos a probabilidade de ocorrência de um deles, automaticamente aumentamos a
probabilidade de ocorrência do outro.
Na prática procede-se de maneira que o erro Tipo I seja o mais importante de ser
evitado, as hipóteses são formuladas de modo tal que H0 seja a hipótese cuja rejeição
injusta constitua o erro de maior importância (Carvajal, 1986).
Exemplo 3.
Utilizando as hipóteses estatísticas do Exemplo 2, podemos enunciar os dois erros
como:
Erro Tipo I: concluir que o nível médio de colesterol de filhos de pais com anteceden-
tes cardíacos difere da média de referência, 175 mg%/ml, quando na verdade isto não
ocorre.
Erro Tipo II: concluir que o nível médio de colesterol de filhos de pais com anteceden-
tes cardíacos não difere da média de referência, 175 mg%/ml, quando na verdade ele
difere.
Devemos observar que cometer o erro do Tipo I ou o erro do Tipo II sempre implica
prejuízos monetários e não monetários.
68
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
9. Amostragem
9.1 Introdução
O total de indivíduos sob investigação, com ao menos uma característica em comum,
é chamado de população. Sendo praticamente impossível realizarmos o estudo de todos
os elementos de uma população (problemas de custo, de tempo, de pessoal treinado
adequadamente, e outros) em uma determinada pesquisa, o mais comum é selecionar-
mos uma parte da população para estudo, obtendo-se um conjunto de elementos denomi-
nado de amostra. Para que a amostra seja representativa da população de onde proveio,
cada elemento da população deve ter igual chance de participar da amostra, evitando-se
um viés de seleção. Um outro erro muito comum é a amostra muito pequena ou seleci-
onada de forma tendenciosa.
A amostra será, portanto, a base para qualquer investigação científica que se queira
realizar. É preciso, entretanto, que tenhamos alguns conhecimentos básicos de estatísti-
ca e bastante senso crítico para realizarmos inferências para o todo, a partir de informa-
ções com base em parte desse todo (transferência da informação obtida com base na
amostra para toda a população). Mesmo que a amostra seja tomada dentro da mais
estrita técnica, ainda existe uma margem de erro quando se faz a inferência (Padovani,
1995).
Antes de se iniciar a amostragem (processo de seleção de uma amostra), devem ser
discutidos os critérios segundo os quais os elementos da população serão selecionados
para a amostra. O método de amostragem fica estabelecido ao estabelecermos os crité-
rios de seleção.
72
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
I. Método naturalístico
O método naturalístico (cross-sectional-sampling) realiza à seleção de um conjunto
com n indivíduos, a partir de uma grande população e, então, verifica a presença ou
ausência de características de interesse do pesquisador em cada indívíduos. Somente o
tamanho da amostra (n) é determinado para a coleta dos dados a priori.
73
SOERENSEN & BADINI MARULLI
dentro de cada estrato. Seu uso torna-se obrigatório quando as populações são muito
heterogêneas.
Exemplo: São comuns como estratos: sexo, idade, grupo étnico, estado civil, renda,
entre outras.
74
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Exemplo: Se p = 40 %; q = 60 % ; E = 5 % , fica :
( 40 x 60 )
n = ————— = 368,8 ou 369 pessoas
(5 / 1,96 ) 2
75
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Para uma discussão mais detalhada sobre o tamanho da amostra consultar Cochran
(1965).
76
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Água
Kathia Brienza Badini Marulli
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
ça de microrganismos patogênicos.
Os coliformes classificam-se em totais e fecais. Os coliformes são representados
pelos gêneros Citrobacter, Enterobacter e Klebsiella. As bactérias que são exclusiva-
mente de origem fecal são as da espécie Escherichia coli.
A ausência de coliformes é prova de uma água bacteriologicamente potável.
Os principais métodos utilizados para quantificação de coliformes na água são o
Método dos Tubos Múltiplos (Número Mais Provável) e o Método da Membrana Filtrante.
1-) Cólera
Causada pela bactéria denominada Vibrio cholerae. A doença só ocorre em seres
humanos. As pessoas se infectam pela ingestão de água ou alimentos contaminados, ou
por levar mãos ou objetos contaminados à boca. O principal sintoma é a diarréia, bastante
líquida, que causa forte desidratação, podendo levar à morte.
2-) Salmonelose
É muito comum. Causada por várias espécies das bactérias do gênero Salmonella.
O quadro mais grave é causado pela Salmonella typhi, e recebe o nome de Febre
Tifóide. As pessoas se infectam pela ingestão de água ou alimentos contaminados
pelas fezes de animais ou homens, doentes ou portadores. Os principais sintomas são
febre, dores abdominais, cefaléia, vômitos, diarréia, mialgias.
4-) Hepatite
Enfermidade causada por vírus da família Picornaviridae. O agente sai das fezes
de pessoas infectadas, contaminando água ou alimentos. Os sintomas principais são:
febre, náuseas, anorexia, icterícia.
6-) Amebíase
O agente é um protozoário, Entamoeba histolytica. A infecção se dá pela ingestão
de água ou alimentos contaminados. Os principais sintomas são febre, calafrios, diarréia
com sangue ou muco.
83
SOERENSEN & BADINI MARULLI
7-) Ascaridíase
Enfermidade parasitária. As pessoas se infectam pela ingestão de água ou verduras
contaminadas pelos ovos dos Ascaris. Sintomas: cólica, diarréia, vômito e sintomas res-
piratórios.
8-) Esquistossomose
Agente: Schistosoma mansoni. Possui hospedeiro intermediário (caramujo do gêne-
ro Biomphalaria). As pessoas se infectam ao entrar em águas poluídas por esgoto ou
fezes de portadores (as cercárias penetram ativamente na pele).
9-) Leptospirose
Agente: bactérias do gênero Leptospira. Enfermidade relacionada à ocorrência de
enchentes e à presença de ratos, que são os reservatórios do agente. As pessoas podem
se infectar pelo contato direto (penetração pela pele ou mucosas), ou pela ingestão de
água ou alimentos contaminados. Os sintomas mais freqüentes são febre, dor de cabeça,
dores musculares, conjuntivite, prostração, icterícia.
10-) Dengue
Existe a reprodução de vetores na água. A enfermidade é causada por um vírus da
família Togaviridae e o vetor é o mosquito Aedes aegypti. Os principais sintomas são
febre, calafrios, dor de cabeça, dores musculares, fotofobia, vômito.
11-) Malária
Agente: Plasmodium vivax, P. falciparum, P. malariae. Vetor: mosquito do gênero
Anopheles. Principais sintomas: calafrios, febre alta, vômito, dor de cabeça, sudorese.
Acessos a cada 24 horas (febre “terçã maligna”), 48 horas (febre “terçã benigna”) ou
72 horas (febre “quartã”).
Prevenção
Para as enfermidades de transmissão fecal-oral as medidas gerais de profilaxia
são: saneamento adequado (abastecimento com água tratada, proibição do uso de esgo-
to ou águas contaminadas para a irrigação de verduras, instalação de rede de esgoto,
destino adequado para o lixo, etc.); educação sanitária para a população; medidas de
higiene pessoal; higiene no preparo de alimentos.
Para a Esquistossomose: drenagem e aterro; aplicação de molusquicidas; evitar
banhos em rios e lagoas.
Leptospirose: combate aos roedores; higiene pessoal; evitar natação em rios e
lagoas; evitar contato com água de enchentes; vacinação de animais; vacinação de
pessoas expostas a risco.
Dengue e Malária: controle e erradicação do mosquito (combate aos criadouros).
Tratamento de água
Na maioria das vezes a água necessita sofrer um tratamento antes de ser utilizada
pela população. Este tratamento pode ser feito nas residências, quando o volume a ser
utilizado é pequeno, mas, geralmente é realizado por técnicos especializados nas Esta-
ções de Tratamento de Água (E.T.A.s). São inúmeras as finalidades do tratamento da
água, como por exemplo:
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Processos utilizados
Existem vários métodos que podem ser empregados para que se realize o tratamento
da água. A escolha do método vai depender da quantidade de água a ser tratada, da
finalidade a que ela se destina e do tipo de correção ou tratamento que é necessário que
se faça. Podemos dividir os processos utilizados para o tratamento de água em físicos,
mecânicos e químicos.
Processos físicos: baseiam-se na utilização do calor e de raios ultravioletas.
O calor é utilizado como forma de tratamento para pequenas quantidades de água.
Geralmente, ferve-se a água por 10 a 15 minutos, com o objetivo de destruir microrganis-
mos. Este procedimento, no entanto, não é suficiente para a destruição de esporos (a
ebulição deve ser mais prolongada, atingindo uma temperatura de 110 a 120o C).
A utilização do calor provoca alguns inconvenientes, como alterações químicas na
água (os bicarbonatos solúveis presentes na água tornam-se insolúveis e se precipitam,
desprendendo ácido carbônico), gosto desagradável e dificuldade de digestão (a água se
torna “pesada” devido à eliminação do oxigênio).
No caso do emprego de raios ultravioletas, é necessária a utilização de equipamentos
especiais que possuem lâmpadas de vapor de mercúrio em globos de quartzo. Este tipo de
tratamento também é indicado somente para pequenos volumes de água. Os raios
ultravioletas destroem bactérias e esporos, oxidam a matéria orgânica, não alteram o sabor
ou odor da água e não oferecem riscos à saúde do consumidor.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
reta de alguma substância coagulante, que a mistura desta substância seja rápida e
eficiente e ocorra por um período suficientemente longo para que haja a produção de
flocos. Geralmente o processo de decantação dura um período de 8 a 10 dias. Também
é necessário que os tanques de decantação sejam lavados periodicamente.
A filtração consiste em forçar a passagem da água através de filtros, que podem ser
lentos ou rápidos. Os filtros consistem em leitos ou câmaras artificiais onde são deposi-
tadas camadas de areia, seixos e brita ou outros materiais como carvão, pedra-pome,
substâncias fibrosas, etc.. Os filtros lentos têm capacidade de filtrar 2.500 a 6.000 litros/
m2/dia e são geralmente utilizados em pequenos serviços de tratamento de água. Sua
limpeza é feita pela remoção ou revolvimento da camada superior de areia. Geralmente
estes filtros não exigem a utilização de tratamento químico prévio. Na superfície da areia
ocorre a formação de uma membrana biológica (“plankton”), que, na verdade, é uma
lama coloidal com microrganismos vivos e mortos, da qual depende o sucesso da filtra-
ção.
Quando são empregados filtros rápidos, a água deve ser primeiramente submetida a
um processo químico de coagulação. No caso dos filtros rápidos não há necessidade da
existência de areia fina ou da formação do “plankton”. A água passa pelo filtro com ou
sem pressão. A lavagem do filtro é feita pela reversão da corrente, com a água limpa
entrando pela parte de baixo do filtro. Sua capacidade de filtração é de até 150.000
litros/ m2/ dia.
A velocidade de filtração depende do tipo de material filtrante, da altura da lâmina de
água e da diferença do nível da água que sai com o da água que entra no filtro. Os
efeitos da filtração são:
⇒ retenção mecânica das partículas em suspensão;
⇒ sedimentação, adsorção e arejamento;
⇒ trocas eletrolíticas e alterações biológicas, que modificam as características químicas
da água.
Correções especiais
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Esgoto
Kathia Brienza Badini Marulli
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Tratamento de esgoto
Existem vários motivos para que se realize o tratamento de esgotos:
1. razões higiênicas: evitar contaminação direta ou indireta;
2. razões econômicas: valor das propriedades, pesca, etc.;
3. razões estéticas;
4. razões legais.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Tratamento biológico
1. Fossa séptica: usada principalmente na zona rural. Tanque de sedimentação.
Ocorre a sedimentação da parte sólida. A decomposição é anaeróbica. Redução de até
40% da D.B.O..
2. Lagoas de estabilização:
2.1.Facultativas: Nelas se processa a decomposição aeróbica e anaeróbica. O es-
goto entra na lagoa em sentido contrário aos dos ventos. Período de ação varia de 3 a 6
meses.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
biológico. Não devem ser muito profundas, para facilitar a penentração do oxigênio.
Período de retenção varia de 10 a 15 dias. Redução de nutrientes.
Lixo
Kathia Brienza Badini Marulli
De maneira geral, todas as atividades desenvolvidas pelo homem geram algum tipo
de resíduo, que pode ser gasoso, líquido ou sólido, sendo este último também denominado
“lixo”.
O desenvolvimento industrial e o crescimento desordenado das cidades causaram
aumento considerável na quantidade de resíduos sólidos formados e, na maioria das
vezes, isto gerou problemas ainda não solucionados. Assim, sabe-se que aproximada-
mente 240.000 toneladas de resíduos são produzidas pela população brasileira, diaria-
mente, e 95% desse lixo recebe destinação inadequada, ou seja, fica a céu aberto.
Existem vários tipos de resíduos sólidos, cada qual com características próprias. Os
resíduos sólidos comuns são aqueles provenientes dos estabelecimentos comerciais e
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
dos domicílios. Cada morador de área urbana produzia, em média, meio quilo de lixo por
dia, em 1982; em 1996, a média foi de 750 gramas per capita. No Japão, cada habitante
produz 2 kg de lixo ao dia.
A outra categoria de resíduos sólidos é a dos especiais ou perigosos, na qual se
incluem também os resíduos industriais, radioativos e hospitalares, também denominados
contaminados ou sépticos.
Outros resíduos são os provenientes da varrição de ruas e praças, entulhos gerados
pela construção civil, podas de árvores e produtos de jardinagem e, ainda, carcaças de
animais mortos encontrados em vias públicas.
A composição qualitativa e quantitativa de lixo varia de acordo com a comunidade
que o produz. Conhecendo-se as características do lixo de uma cidade, pode-se escolher
a melhor solução para seu destino final. Podemos citar como exemplo o caso de Porto
Alegre (RS), cujo lixo é rico em matéria orgânica, altamente degradável, enquanto que o
do Rio de Janeiro (RJ) é rico em vidro e terra, que são materiais não degradáveis. A
importância desta diferença será abordada posteriormente.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Poluição atmosférica
Contaminação ambiental por gases resultantes
da combustão de veículos automotores
Bruno Soerensen
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
que não o suporta nas quantidades em que é introduzido. Dentre as inúmeras substâncias
poluentes emitidas pelas indústrias siderúrgicas e metalúrgicas durante seu processo
produtivo, podem-se citar:
óxido de ferro: fumaça avermelhada liberada pelas siderúrgicas de aço;
anidrido sulfuroso: originado pela combustão de combustíveis fósseis como carvão ou
diesel e presente na fumaça das indústrias siderúrgicas;
chumbo: encontrado principalmente nas águas que recebem efluentes industriais. O
chumbo é um veneno cumulativo e a intoxicação crônica causada por ele é denomi-
nada saturnismo. O saturnismo é freqüentemente uma doença profissional, que pode
inclusive levar à morte. Existem mais operários expostos à ação do chumbo e seus
compostos do que a qualquer outro metal tóxico;
cianetos: o íon cianeto é muito tóxico. Os cianetos alcalinos simples formam íons
quando dissolvidos na água. Muitos dos cianetos complexos são mais estáveis em
solução aquosa. Normalmente são pouco tóxicos mas, sob certas condições, estes
complexos decompõem-se, resultando vários graus de toxidez, dependendo do metal
presente e da proporção dos grupos CN- convertidos em cianetos simples. As fontes
industriais de CN- são a galvanização, cementação, banhos para clarificação de me-
tais, refinação de ouro e prata, lavadores de gás para processos piréticos
(coqueificação, refinação, alto-forno), borracha, fibras acrílicas, indústrias de plásti-
cos, intermediários de processos químicos, etc.;
compostos fenólicos: provocam cheiro e sabor desagradáveis na água potável em
concentrações mínimas de 50 a 100 ppb. Se a água for clorada, 5 ppb darão um gosto
ruim. Os fenóis são poderosos bactericidas e, por isso, interferem nos testes de DBO.
Cargas superiores a 200 mg/l podem matar as bactérias dos lodos ativados e dos
filtros biológicos e, por esse motivo, as quantidades que podem ser lançadas nas
redes públicas de esgoto são limitadas. São tóxicos para os peixes em concentrações
de 1 a 10 mg/l.
Impacto ambiental
Quando os técnicos da Companhia Estadual de Tecnologia de Saneamento Básico –
CETESB – detectam elevada concentração de poluentes na atmosfera, alcançando-se
uma situação considerada crítica, podem determinar a paralisação de indústrias, como
medida preventiva. Foi o que aconteceu, por exemplo, em setembro de 1995, quando o
município de Cubatão (SP) entrou em estado de pré-alerta, levando a CETESB a para-
lisar uma série de unidades industriais de empresas de fertilizantes e siderúrgicas, com o
objetivo de reduzir o nível de poluição. Os técnicos detectaram 297 microgramas de
poeira ou material particulado por metro cúbico de ar; o limite para o pré-alerta é de 250
microgramas. Material particulado é qualquer partícula inferior a 100 micrômetros
(milionésima parte do metro), presentes na fumaça ou fuligem. As partículas inferiores a
10 micrômetros, possíveis de serem inaladas, são chamadas partículas inaláveis. Os efeitos
na saúde causados pelo material particulado são a diminuição da capacidade pulmonar e o
aumento da incidência de doenças respiratórias; a potencialização de sintomas em doentes
com asma e bronquite; o aparecimento de câncer em pessoas com pré-disposição genéti-
ca, devido a substâncias minerais e compostos orgânicos presentes nas partículas.
A paralisação das indústrias é uma medida preventiva que costuma ser adotada ape-
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
nas em situações críticas, mais comuns no inverno, quando as condições climáticas tor-
nam-se bastante desfavoráveis.
Em pesquisa realizada pela Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo em
conjunto com cinco universidades alemãs, durante um período de seis anos, foi concluído
que a concentração de poluentes em estado gasoso na atmosfera de Cubatão está con-
taminando o solo e a água, destruindo a vegetação nativa e ameaçando a Serra do Mar,
possibilitando a ocorrência de deslizamentos. Segundo os pesquisadores, em Cubatão
existe uma nuvem de poluentes situada entre 200 e 400 metros de altitude, sendo que a
concentração de poluentes na nuvem é de cinco a seis vezes superior à concentração na
superfície. O efeito direto é a morte da vegetação original da Serra do Mar, que já
perdeu cerca de 60 a 70% de suas plantas.
Os gases expelidos pelas indústrias vão para a atmosfera, reagem com a água e, com
a chuva, depositam-se no solo. Segundo a pesquisa, o grau de acidez nas camadas
profundas do solo da região é elevado; a conseqüência disso é a absorção do ácido pelas
raízes e a morte das plantas. Também foi observado um maior grau de acidez na água
dos rios. Segundo os pesquisadores, mesmo com a suspensão do lançamento de poluentes,
o solo levaria de 10 a 20 anos para se recuperar.
Roedores
Kathia Brienza Badini Marulli
Desde a mais remota Antigüidade os ratos vivem próximos aos homens, causando-
lhes prejuízos e transtornos. Para exterminá-los, gregos e romanos mantinham gatos e
doninhas domesticadas em suas casas.
Considerado um animal impuro no Antigo Testamento, consta das leis de Moisés que,
se um rato cair dentro de um vaso de barro, este ficará contaminado e deverá ser
quebrado.
Já no século VI, por volta do ano 542 d.C., tal animal desempenhou papel importante
na disseminação de um surto de Peste bubônica no Egito, que se espalhou por todo o
império romano da época.
Introduzido na Europa pelos barcos vindos do Oriente Médio na época das Cruzadas,
o rato preto ou rato do telhado (Rattus rattus) instalou-se primeiramente nos portos.
Posteriormente, espalhou-se para as cidades européias em desenvolvimento, cujas con-
dições sanitárias precárias propiciaram ambiente adequado para o roedor, fornecendo-
lhe abrigo e alimentos. Por volta de 1600, durante outra severa epidemia da “Peste
Negra”, os médicos da época associaram, pela primeira vez, a doença à presença do
rato.
No século XVIII, vinda da Ásia, outra espécie de ratos entrou na Europa: o marrom
ou rato do esgoto (R. norvegicus). Da Europa, os ratos chegaram à América e Austrá-
lia, por meio das embarcações utilizadas nas conquistas e no comércio marítimos.
Como pode-se perceber, a história dos ratos sempre esteve intimamente ligada à
história do homem; entretanto sua companhia sempre foi e continua sendo extremamen-
te indesejável.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Insetos
Kathia Brienza Badini Marulli
Mosquitos
Conhecidos por inúmeros nomes populares como pernilongos, muriçocas, muriranhas
e carapanãs, os mosquitos pertencem à Ordem Diptera e são classificados em vários
gêneros de importância, que, além de serem vetores de inúmeros agentes patogênicos,
causam queda do rendimento nos trabalhadores que sofrem seus ataques noturnos.
Quanto às características biológicas dos mosquitos, pode-se dizer que possuem ciclo
de desenvolvimento com metamorfose completa (denominados holometábolos), com-
preendendo as fases de ovo, larva, pupa e adulto. Os machos se alimentam de seiva
vegetal e somente as fêmeas sugam sangue, necessário para a maturação dos ovos, que,
em número de 100 a 400, são depositados em ambientes aquáticos. As larvas e pupas
também vivem na água e os adultos, alados, procuram viver nas proximidades dos domi-
cílios humanos. O ciclo biológico dos mosquitos leva cerca de 7 a 10 dias e sua vida
média é de 3 meses.
O pernilongo comum pertence ao gênero Culex, se reproduz em águas estagnadas e
poluídas e possui hábitos noturnos, causando grande incômodo às suas vítimas. Algumas
espécies deste gênero são vetores da Wuchereria bancrofti, agente causador da
“Elefantíase” ou Filariose Bancroftiana, de alta incidência no continente africano.
Os representantes do gênero Aedes possuem hábitos diurnos e preferem depositar
seus ovos em águas limpas. O principal representante deste gênero é o Aedes aegypti,
responsável pela transmissão do vírus causador da Dengue. Esta espécie também é o
vetor do agente da Febre Amarela, em seu ciclo urbano.
Outros gêneros de mosquitos importantes são Anopheles (transmissor do Plasmodium
causador da Malária), Phlebotomus (vetor do agente da Leishmaniose) e Simulium (co-
nhecidos como “borrachudos”, possuem picada bastante dolorosa).
100
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Como praticamente qualquer local em que fique água acumulada pode servir para a
postura dos ovos dos mosquitos, pode-se perceber que estes insetos possuem inúmeros
criadouros. Estes criadouros podem ser divididos em:
domésticos – vasos, lagos ornamentais, ralos, caixas d’água, calhas entupidas,
vasilhames ao relento;
urbanos – cemitérios, valas, construções civis, galerias de águas pluviais;
naturais – rios, lagos, plantas, etc..
O controle dos mosquitos deve ser baseado em medidas que impeçam sua prolifera-
ção. É necessário que seja feito um trabalho de educação sanitária junto à população,
esclarecendo-a sobre os inconvenientes do acúmulo de água em recipientes expostos,
para que não se formem criadouros domésticos. Deve-se também investir em sanea-
mento básico, dando destino adequado ao lixo e proporcionando rede coletora de esgoto
aos municípios.
Quanto aos métodos de combate, deve-se, sempre que possível, procurar atingir
o inseto em seu estado larval, por meio de métodos mecânicos (drenagem e aterro
de criadouros) ou biológicos (emprego de peixes que se alimentam das larvas ou de
larvicidas biológicos, como as suspensões com Bacillus thuringiensis). Em casos
específicos, e tomando as devidas precauções com o meio ambiente, substâncias
químicas podem ser utilizadas para a destruição das larvas.
O combate ao inseto adulto em nível ambiental pode ser feito, como quando se em-
prega a termonebulização, que é a aspersão de inseticida por meio da utilização de
equipamento apropriado, normalmente colocado em cima de caminhões, e geralmente
utilizado em locais com grandes infestações ou em situações de risco de epidemia de
Dengue, por exemplo. Esta prática, popularmente conhecida como “fog” ou “fumacê”, é
uma atividade de alto custo e de difícil realização, pois requer planejamento cuidadoso,
equipamento adequado e pessoal treinado. Quando utilizada de maneira errada, pode
trazer conseqüências indesejadas como desequilíbrios ambientais e problemas de saúde
na população, como casos de alergias e alterações respiratórias.
Moscas
Assim como os mosquitos, as moscas pertencem à Ordem Diptera. São inúmeras as
espécies de interesse, cada qual com peculiaridades próprias. Estes insetos causam
desconforto para homens e animais, além de proporcionarem prejuízos (como a danifica-
ção de couros pelas larvas da Dermatobia hominis, por exemplo) e veicularem agentes
patogênicos.
Seu ciclo biológico possui as fases de ovo, larva, pupa e adulto. A Dermatobia hominis
necessita de outros insetos para o transporte de seus ovos, e estes transportadores rece-
bem o nome de foréticos. A larva desta mosca penetra ativamente na pele e é conhecida
popularmente como “berne”.
As miíases, denominadas vulgarmente “bicheiras”, podem ser classificadas como
cutâneas ou cavitárias, acidentais ou obrigatórias e, ainda, como biontófagas ou primári-
as, necrobiontófagas ou secundárias e necrófagas. As miíases primárias são aquelas
que se instalam em tecidos normais, vivos. Já as secundárias, localizam-se em tecidos
necrosados de hospedeiros vivos. As miíases necrófagas são as encontradas em cadá-
veres.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Barbeiros
Existem vários gêneros de insetos que recebem a denominação popular de “barbei-
ros”, como o Triatoma, Rhodnius, Paustrongylus, etc.. A principal importância destes
insetos é sua atuação na transmissão do Trypanosoma cruzi, protozoário causador da
Doença de Chagas.
Estes insetos habitam ninhos de pássaros, colchões e, principalmente, frestas nas
paredes das casas, em especial nas de barro e pau-a-pique.
As medidas de controle consistem na substituição das casas citadas por casas de alve-
naria, o que seria o ideal, apesar de economicamente inviável. Manter a higiene das habi-
tações também é de grande importância, assim como proceder à retirada de ninhos de
102
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
pássaros dos beirais das casas. Coberturas de capim em telhados devem ser evitadas. O
uso de produtos químicos para o combate do inseto pode ser feito, sendo usado principal-
mente o BHC a 15%, que tem efeito residual de 3 meses.
Baratas
O ciclo biológico das baratas possui as fases de ovo, ninfa e adulto. Dependendo da
espécie, podem ser ovíparas, ovovivíparas ou vivíparas. Possuem vida média de 4 me-
ses.
Existem cerca de 3500 espécies de baratas, sendo a maioria de vida silvestre. As
principais espécies de baratas domésticas são a Periplaneta americana e a Blattella
germanica.
Estas baratas passam os dias escondidas em ambientes escuros e úmidos, como
fossas e tubos de esgoto, e à noite saem em busca de alimentos, penetrando nas cozi-
nhas ou depósitos dos hospitais, restaurantes ou residências. Sua importância está rela-
cionada com a transmissão de doenças, principalmente por meio da contaminação de
alimentos, seja pela regurgitação e deposição de excrementos seja pelo contato. Os
microrganismos podem permanecer viáveis no tegumento, tubo digestivo ou excretas
das baratas durante dias ou semanas. Estes insetos são responsáveis, ainda, por proble-
mas estéticos e de mau odor, além de danificarem livros e tecidos.
Para controle do problema, as medidas preconizadas são o acondicionamento adequado
do lixo, manutenção dos ralos em bom estado de conservação, proteção dos alimentos a fim
de impedir-se o acesso das baratas e evitar-se utilização de inseticidas.
Pulgas
O ciclo biológico destes insetos compreende as fases de ovo, larva, pupa e adulto. Os
ovos são depositados sobre o hospedeiro ou no ambiente em que ele vive, e a fêmea só
faz a ovoposição após alimentar-se de sangue. Em média, a eclosão dos ovos se dá em
1 a 2 semanas após a postura. Os adultos conseguem sobreviver vários meses sem
alimentação.
A importância das pulgas consiste na debilitação que podem provocar em hospedei-
ros mais sensíveis, quando a infestação é alta, bem como na sua atuação como vetores
de agentes patogênicos. Os causadores da Peste e do Tifo murino, por exemplo, são
veiculados por pulgas. Estes insetos são também responsáveis por graves manifesta-
ções alérgicas, no homem e nos animais, e pela transmissão de parasitas como o
Dipylidium caninum.
Existem diversas espécies de pulgas, espalhadas por todo o mundo. As principais são
a Pulex irritans, que parasita o homem, a Xenopsylla cheopis, que é a pulga dos ratos,
e a Ctenocephalides canis e Ctenocephalides felis, pulgas que parasitam respectiva-
mente os cães e gatos.
Para o controle destes insetos deve-se promover a desinfestação nos animais domés-
ticos (mecânica ou por meio de produtos químicos, dependendo da idade do animal e do
grau de infestação), a limpeza do ambiente, de preferência com o auxílio de um aspira-
dor de pó, e a utilização de inseticidas.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Piolhos
O piolho do couro cabeludo é o Pediculus capitis. Ele se localiza preferencialmente
na parte posterior da cabeça, de onde se desloca para as outras regiões, e alimenta-se de
sangue, várias vezes ao dia. O ciclo biológico dura, em média, 3 a 4 semanas. Os ovos
dos piolhos recebem a denominação de lêndeas e cada fêmea coloca a quantidade de 50
a 100 ovos. A vida média do adulto gira em torno de 1 mês.
Os piolhos provocam grande desconforto, devido ao prurido que induzem, causado
pela saliva do inseto, que é introduzida no hospedeiro no momento da picada. Muitas
vezes as pessoas, ao se coçarem, provocam feridas, que podem se infectar, piorando o
problema.
Para o combate a esse inseto, é necessária a retirada das lêndeas, que pode ser feita
manualmente, com a ajuda de vinagre morno e pente fino. Atualmente, existem produtos
comerciais que têm ação sobre os insetos adultos e sobre as lêndeas. Os produtos tradi-
cionais, à base de benzoato de benzila ou de monossulfiram, agem apenas sobre os
piolhos, e não sobre as lêndeas. Além do tratamento dos infestados e dos seus
comunicantes, é recomendável a manutenção de hábitos de higiene pessoal, o que difi-
culta a propagação desta parasitose.
Carrapatos
Kathia Brienza Badini Marulli
Dentro do Filo Arthropoda, além dos insetos, existe outra classe de interesse para a
Saúde Pública: a Arachnida. Os carrapatos fazem parte da classe Arachnida, ordem
Acari, subordem Ixodides.
Os aracnídeos possuem quatro pares de patas (os insetos possuem apenas três).
Quanto ao desenvolvimento dos ovos, os carrapatos são hemimetábolos, ou seja, do ovo
sai uma larva com aparência semelhante à do adulto.
Os ovos dos parasitas são depositados no solo ou em “esconderijos” fora do hospe-
deiro. As larvas que saem destes ovos procuram um hospedeiro para se alimentarem de
seu sangue e voltam ao solo, onde sofrem mudas. Existem carrapatos que necessitam de
apenas um hospedeiro para concluir seu ciclo evolutivo (como é o caso do Boophilus
microplus), outros precisam de vários hospedeiros (como é o caso do Amblyomma
cajennense, que precisa de três hospedeiros). Os adultos também são hematófagos.
Os carrapatos são altamente resistentes, podendo ficar muito tempo sem se alimen-
tar. As fêmeas colocam de 2.000 a 10.000 ovos e a duração do ciclo depende das
condições ambientais (temperatura e umidade), podendo variar de dois meses a até 6
anos, se as condições não forem favoráveis.
Estes parasitas são responsáveis por inúmeros prejuízos como:
desvalorização dos couros dos animais, pelos estragos que causam ao se fixarem
neles;
atraso no desenvolvimento dos animais altamente parasitados;
enfraquecimento dos animais infestados (segundo alguns autores, um carrapato suga
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Morcegos
Kathia Brienza Badini Marulli
105
SOERENSEN & BADINI MARULLI
enquanto os insetívoros têm uma gestação de dois a três meses, a dos fitófagos gira
em torno de três a cinco meses, e o período de gestação dos morcegos hematófagos é
de sete meses. Geralmente nasce apenas um filhote por gestação, mas alguns morce-
gos insetívoros podem gerar dois a três filhotes por gestação.
Os morcegos são animais de hábitos noturnos e necessitam de abrigos para repou-
sar durante o dia. Eles procuram locais de pouca ou nenhuma luz, onde se alojam em
grupos de 100 a 2.000 animais, denominados colônias. Estes abrigos são, na maioria
das vezes, cavernas, fendas de rocha, ocos de árvores, túneis abandonados, mas eles
também se abrigam em sótãos, forros de casas, porões, garagens, estábulos, etc..
Geralmente os morcegos saem de seus abrigos ao entardecer ou no início da noite. Os
morcegos conseguem voar e enxergar bem no escuro. Os microquirópteros se comu-
nicam e voam orientados por sons de alta freqüência. Este sistema, denominado
“ecolocalização” (ou localização pelos ecos), é popularmente conhecido como “sonar
dos morcegos”. O sistema consiste na emissão de ultra-sons que, ao encontrarem um
obstáculo, retornam em forma de ecos captados pelos seus ouvidos muitos sensíveis,
possibilitando a sua orientação. Os megaquirópteros não possuem este sistema, orien-
tando-se basicamente pela visão.
Morcegos hematófagos
Alguns morcegos se alimentam de sangue, como já foi dito anteriormente (Desmodus
rotundus, Diaemus youngi e Diphylla ecaudata). Eles auxiliam no controle populacional
de pequenos vertebrados, mas sua maior importância reside no fato de atuarem como
transmissores da Raiva. Cada vampiro suga, em média, 20 mililitros de sangue por noite.
Atacam preferencialmente bovinos, eqüinos, caprinos e pequenos animais domésticos.
Também sugam sangue humano, mas só atacam pessoas que estejam imóveis, dormin-
do. Para se alimentarem, os morcegos fazem uma incisão na pele da vítima e bebem o
sangue através de dois sulcos localizados sob a língua. Os morcegos possuem o hábito
de utilizar o mesmo ferimento por mais de uma noite seguida e, geralmente, atingem o
dorso dos animais.
Os morcegos estão envolvidos na epidemiologia de diversas enfermidades, sendo as
mais importantes a Raiva e a Histoplasmose. Estas doenças podem ser transmitidas ao
homem, direta ou indiretamente, assim como a outros animais de sangue quente.
A Raiva é transmitida pela mordedura e os morcegos são, atualmente, o segundo
maior transmissor da doença para os seres humanos, no Brasil. Inicialmente, acreditava-
se que os morcegos hematófagos eram imunes ao vírus da Raiva, mas evidências atuais
sugerem que os morcegos também morrem em conseqüência da enfermidade, não atu-
ando como reservatórios imunes do vírus. Os morcegos não-hematófagos podem portar
o vírus rábico, mas só o transmitem ao homem por contato ocasional, quando ocorre a
manipulação indevida de morcegos moribundos.
No caso da Histoplasmose, a infecção ocorre pela inalação de esporos do fungo
Histoplasma capsulatum, que são comumente encontrados em solos enriquecidos por
matéria orgânica, como em abrigos de morcegos e, ainda, em galinheiros e pombais.
Para o controle dos morcegos hematófagos podem-se utilizar substâncias
anticoagulantes à base de Warfarina, de três maneiras diferentes: aplicação do produto
sobre as feridas recentes causadas pelos morcegos em animais de criação; aplicação do
106
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
produto no pescoço, dorso e lombo dos animais que provavelmente serão atacados no
rebanho (que são os de temperamento mais dócil e que dormem na periferia do rebanho)
ou tratamento tópico de morcegos capturados. Neste último caso, devem-se primeira-
mente capturar alguns morcegos (com puçás ou redes) e passar em suas costas uma
pequena quantidade de pasta anticoagulante. Devolvem-se, então, os animais ao local de
origem. Como eles possuem o hábito de se lamberem uns aos outros, vários morrerão
por hemorragia interna. Cada morcego empastado mata vinte ou trinta outros.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Água
Cetesb. Técnica de Abastecimento e Tratamento de Água. São Paulo: Cetesb-Ascetesb, 1987.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
110
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Produção de alimentos
José Cezar Panetta
Foram necessários cem mil anos para que a população terrestre chegasse a três
bilhões de habitantes. Entretanto, órgãos estatísticos, como a Organização Mundial da
Saúde, sustentam que serão precisos menos de quarenta anos para que tal população
seja duplicada. Todo prognóstico sobre o futuro da humanidade, nos mais variados as-
pectos, está intimamente relacionado com os recursos alimentares com os quais o ho-
mem poderá contar para a sua subsistência, no momento em que o número de habitantes
da Terra tiver atingido um grau assaz elevado. Um argumento simplista poderia conside-
rar infundada a preocupação pelas disponibilidades alimentares do futuro. Ora, o homem
não conseguiu, mediante a evolução racional da lavoura e da indústria, equilibrar o quo-
ciente população/alimentação? Seria, pois, uma apreensão sem fundamento?
Infelizmente, não é o que ocorre. Já nos tempos atuais, cerca de metade da huma-
nidade não come o suficiente para saciar a fome, em virtude de falta de gêneros
alimentícios, tanto em qualidade como em quantidade. As principais vítimas da fome
são as crianças, das quais milhões caem doentes e morrem unicamente porque a sua
alimentação é muito pobre em proteínas. As que sobrevivem estão enfraquecidas e
constituem presas fáceis das doenças da infância.
De tudo isso, entende-se facilmente que ao homem cabe a tarefa de inovar conheci-
mentos e meios que lhe permitam produzir alimentos suficientes para corrigir os
desequilíbrios, além de proporcionarem o aumento das disponibilidades alimentares para
o futuro. Conseqüentemente, crescem as investigações no mundo todo, na esperança de
uma melhoria da situação alimentar, sobretudo no concernente aos produtos altamente
protéicos. Por meio dessas pesquisas, aliadas a uma exploração de fontes alimentares
ainda completamente inexploradas, o homem conseguirá garantir a sua sobrevivência.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
processos de conservação pode e deve funcionar como elemento impediente das oscila-
ções verificadas no valor dos gêneros alimentícios, garantindo ao produtor o pagamento
justo e incrementando a produção.
O abastecimento de gêneros essenciais para a alimentação do homem não se situa
unicamente no terreno científico e econômico, mas converte-se em problema político
dos mais importantes, preocupando profundamente os governos e as entidades internaci-
onais, visto que o crescimento das populações de há muito ultrapassou a produção de
alimentos (quantitativa e qualitativamente), principalmente no que se refere aos alimen-
tos protéicos. Na tentativa de sanar a desproporção estabelecida entre o aumento
populacional e as reservas alimentares, não basta produzir grandes safras, quando não
se conta com meios de conservação adequados para proteger os alimentos contra a
deterioração.
Por outro lado, para se garantir ao homem uma dieta variada e completa, torna-se
indispensável armazenar produtos perecíveis, que por capricho da natureza são produzidos
somente em certas épocas do ano e em determinadas regiões do globo. Graças aos atuais
métodos de conservação, o homem pode, em qualquer latitude e em qualquer estação do
ano, contar em sua mesa com os mais variados alimentos, desde que disponha de recursos
financeiros para prover o seu organismo dos princípios básicos e nutritivos que a dieta lhe
prescreve ou o capricho lhe dita. Graças aos métodos de que o homem lançou mão para
preservar os alimentos, tornou-se-lhe possível fazer reservas de imensas safras sem a
menor preocupação de perdê-las.
Assim, os limites impostos pela natureza à produção de diversos alimentos, limites
esses responsáveis pelas grandes oscilações de preços nos mercados, foram alargados
gradativamente, não mais devendo existir, desde que em todas as épocas do ano e em
qualquer ponto da terra o homem possa dispor do alimento que deseja, libertando-se
conseqüentemente das restrições próprias às estações de produção. Caso típico é o
consumo da carne congelada que, além de permitir a poupança de abate de animais,
evita o desfalque dos rebanhos nas épocas de seca, impedindo as grandes variações de
preço.
Outro aspecto positivo oferecido pelos modernos processos de conservação diz res-
peito aos excedentes de produção, problema sério que sempre afligiu economistas e
governos, posto que, tratando-se na maioria das vezes de produtos perecíveis, ou o pro-
dutor ficava à mercê das quedas, ou assistia desesperadamente à marcha progressiva
da deterioração. Este fenômeno não pode e não deve ocorrer mais, pois adequados
métodos de proteção, idealizados por exaustivas pesquisas procedidas em todos os paí-
ses do mundo, socorrem o produtos e lhe garantem a justa retribuição pelo esforço
despendido. Mas, o que é mais importante, a conseqüência mais humana advinda dos
progressos no campo da conservação alimentar é, sem dúvida, o fato de os mesmos
permitirem que as camadas sociais mais baixas adquiram gêneros alimentícios saudáveis
por preços coadunantes com suas possibilidades monetárias, já que, impedindo a deteri-
oração dos alimentos armazenados, favorecem-se automaticamente preços mais acessí-
veis.
Finalmente, alguns fatos do passado talvez possam melhor ilustrar como a evolução
dos meios de conservação influenciou a vida do homem e a própria civilização dos po-
vos. As grandes descobertas que marcaram brilhantemente os séculos XIV e XV, as
explorações pelas selvas e as grandes epopéias bélicas contaram sempre com um fator
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América Latina.
A ocorrência de agentes patogênicos de caráter infeccioso ou parasitário nos alimen-
tos pode ser estabelecida em sua origem, sendo neste caso autóctones dos próprios
animais produtores, como também provenientes do processamento e manipulação das
matérias-primas durante a elaboração dos derivados. Qualquer que seja o momento da
anexação do patógeno no alimento, a sua presença é sempre um risco à saúde pública,
merecendo atenção especial o estudo dos pontos críticos de contaminação, sobre os
quais o higienista de alimentos deverá redobrar os cuidados.
Diferentes variáveis interferem sobre a viabilidade de instalação e multiplicação dos
agentes zoonóticos nos alimentos de origem animal. Devem ser enfatizados as seguintes:
natureza do alimento, composição química, métodos de transformação, condições de
conservação, armazenagem e distribuição, natureza bioquímica do agente zoonótico, ci-
clo biológico do agente. Esses fatores, entre outros de igual ou maior importância, na
dependência das características intrínsecas e extrínsecas de cada alimento, devem ser
cuidadosamente estudados, pois de seu controle eficiente dependerá, em última análise,
a proteção do alimento e do consumidor.
A posição do consumidor deve merecer preocupação específica do higienista alimen-
tar. Neste sentido, deve-se buscar sua educação sanitária, no mais amplo sentido, que
deverá abranger não só sua educação formal, mas também atentar para os hábitos e
costumes tradicionais, que de per si constituem-se em risco à sua saúde, como é o caso
do hábito de consumir alimentos crus ou insuficientemente tratados por temperaturas
eficientes na destruição dos agentes zoonóticos.
Outro ponto a ser forçosamente analisado é o da legislação sanitária que rege a
inspeção, vigilância e proteção dos alimentos de origem animal. Normas e padrões de-
vem ser, em primeiro lugar, realistas em relação ao país ou região onde deverão ser
aplicados e, em segundo, deverão estar permanentemente atualizados em face ao co-
nhecimento científico produzido no setor.
Os Quadros 1 e 2 mostram, respectivamente, os principais agentes de zoonoses de
caráter infeccioso e de caráter parasitário, eventualmente detectados nos alimentos de
origem animal.
QUADRO 1
Agentes de zoonoses de caráter infeccioso,
detectados nos alimentos de origem animal
MICRORGANISMO ALIMENTO
Brucella abortus leite e derivados
Salmonella sp leite e derivados
carne e derivados
Mycobacterium bovis leite e derivados
Staphylococcus aureus leite e derivados
carne e derivados
Escherichia coli EH leite e derivados
carne e derivados
Listeria monocytogenes carne e derivados
Shigella sp leite e derivados
carne e derivados
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QUADRO 2
Agentes de zoonoses de caráter parasitário,
detectados nos alimentos de origem animal
MICRORGANISMO ALIMENTO
Cysticercus cellulosae carne e derivados
Echinococcus granulosus carne e derivados
Phagicola sp pescado
Dyphilobotrium sp pescado
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
1,8%).
A tendência geral de Desnutrição com relação ao tempo vem diminuindo, com exce-
ção de Guatemala e Panamá. Brasil e República Dominicana tiveram importantes redu-
ções em suas taxas. A melhora do nível nutricional em muitos países está relacionada à
adequada aplicação de programas de imunização, controle de doenças infecciosas, ali-
mentação adequada especialmente durante episódios agudos de enfermidades e estraté-
gias de incentivo à amamentação natural e educação alimentar. Cabe salientar que,
apesar dos melhoras da situação nutricional de alguns países, expressas na média naci-
onal, há grande discrepância regional.
A desnutrição no nordeste brasileiro tem sido um problema preocupante há algum
tempo para a Saúde Pública. O governo do Ceará, entre 1992 e 1994, recebeu apoio do
Banco Mundial para estabelecer centros de combate à desnutrição. Este trabalho foi
avaliado em 1996 quando constatou-se a baixa efetividade, que não corresponderia às
recomendações da OMS. As taxas de aumento de peso eram inadequadas, o período de
reabilitação era muito alto e a taxa de letalidade eram também demasiadamente alta:
40% ou mais. Isto ocorreu devido à má definição dos critérios de admissão e alta, a
profissionais mal qualificados e ao fato que as mães não recebiam instruções apropria-
das. Em conseqüência, recomendou-se providenciar nova estruturação dos centros, es-
tabelecimento de novos objetivos, padronização dos critérios de admissão e alta,
capacitação dos funcionários e estabelecimento de indicadores de resultados.
As mudanças nos padrões alimentares, o cuidado com a saúde e a urbanização afe-
taram tanto os grupos mais favorecidos como os mais carentes. Há problemas que não
afetam apenas as crianças mas também os adultos. A OMS analisou a obesidade em
crianças de 0 a 6 anos tomando como critério o peso corporal acima de dois desvios
padrões do valor mediano para a altura. No Brasil e Nicarágua foi de 2,2%, na Argenti-
na 2,5%, na Venezuela 3,8% atingindo 10,7% no Chile. Com relação à massa corporal,
observou-se que a prevalência foi maior em mulheres principalmente nas idades de 20 a
29 anos e em nível sócio-econômico menor. Observou-se obesidade em mulheres e
homens respectivamente no Chile (49,7% e 39,5%), na Colômbia (50% e 30,1%), no
Brasil (39,8% e 28,8%), na Costa Rica (39,6% e 22,1%), em Cuba (39,4 e 31,5%), no
Peru (36,7% e 28,2%) e na Argentina (28,3% e 39,9%). A obesidade é um problema de
Saúde Pública que requer atenção especial pois constitui um fator de risco para várias
enfermidades como diabetes méllitus tipo II, hipertensão arterial, outros distúrbios
cardiovasculares e respiratórios, diminuindo a esperança de vida.
Deficiência de micronutrientes
A deficiência de micronutrientes está localizada em determinadas áreas geográficas,
afetando grupos mais vulneráveis da população.
As informações a respeito da prevalência de anemia devida à carência de ferro
(anemia ferropriva) são limitadas devido a estudos não representativos. Segundo a OMS,
considera-se anemia quando a hemoglobina for inferior a 11 gramas/decilitro de sangue
em gestantes e crianças com idade inferior a cinco anos, uma vez que é a população
mais afetada. Os pontos de corte para a populações que vivem em grandes altitudes
ainda não está definido. Estudos recentes evidenciaram grandes disparidades de infor-
mações decorrentes de procedimentos inadequados de amostragem e fontes de infor-
mações.
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V Higiene de alimentos
Kathia Brienza Badini Marulli
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dor único, do tipo doméstico. Estabelecimentos comerciais devem possuir diversas câ-
maras frias, cada qual com uma faixa de temperatura, ideal para armazenar cada tipo de
alimento. Cremes, molhos, alimentos prontos (principalmente os à base de carne) e res-
tos de comida também devem ser mantidos na geladeira.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
de água do alimento, como a desidratação e a salga, os que alteram o pH, como a adição
de vinagre ou de ácidos naturais e, finalmente, a própria utilização de agentes químicos,
como por exemplo, os nitratos e nitritos.
Os fatores ambientais de maior importância relacionados ao desenvolvimento dos
microrganismos nos alimentos são a temperatura e a umidade. É fato amplamente co-
nhecido que o binômio temperatura-umidade tem papel fundamental no desenvolvimento
dos microrganismos. Com relação aos alimentos, se a temperatura ambiente estiver alta,
as condições para a multiplicação dos microrganismos serão melhores do que em tem-
peraturas muito baixas, pois a maioria dos microrganismos patogênicos são mesófilos,
isto é, desenvolvem-se melhor numa faixa de temperatura entre 30 e 400C. Quanto à
umidade, seus efeitos podem ser melhor observados quando armazenamos alimentos
por algum tempo: se a umidade relativa for maior que 70%, haverá o aparecimento de
mofos (também designados bolores) e o alimento estará então sujeito à deterioração.
Muitas vezes, um alimento sofre contaminação microbiológica, mas como é servido
logo após o seu preparo, não traz nenhum prejuízo ao consumidor. Isto acontece porque
não houve o período de tempo necessário para a multiplicação dos microrganismos (e
para que eles atingissem a dose infectante necessária para provocar alterações patoló-
gicas no hospedeiro). Se fizermos o raciocínio inverso, fica fácil concluir que, quanto
maior o tempo entre o preparo e o consumo do alimento, maior a probabilidade de ele vir
a se tornar a fonte de um surto de intoxicação alimentar.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
1. Inquérito epidemiológico:
Entrevistar as pessoas envolvidas, colhendo dados como:
todos os alimentos ingeridos nas últimas 24 horas;
os sintomas: tipo e hora de início;
número de pessoas (doentes e não doentes) que comeu cada alimento.
3. Tomada de amostras:
alimentos;
vômito dos pacientes;
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Produtos hortícolas
Kathia Brienza Badini Marulli
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Fontes de contaminação
Os produtos hortícolas podem sofrer contaminação durante as diferentes etapas por
que passam, desde seu plantio até sua comercialização.
A primeira fonte de contaminação para os vegetais pode ser o próprio solo onde eles
são produzidos. Resíduos industriais, lixo urbano, lodo de esgoto e fezes de animais
podem ser utilizados na adubação das culturas, desde que previamente tratados. Porém,
adubos orgânicos mal compostos ou crus servem como fonte potencial de microorganismos
patogênicos e o problema é ainda mais sério quando são usados em plantas cujas partes
comestíveis são as folhas. Também os agrotóxicos podem contaminar os solos e perma-
necer muitos anos neles. Os produtores devem ter sempre em mente que, uma vez
poluído, o solo é de difícil recuperação (Costa, 1985).
A água utilizada na irrigação dos vegetais é a fonte de contaminação mais freqüente.
Devido à grande quantidade de água utilizada nas plantações, raramente os produtores
servem-se de água tratada por companhias de saneamento, devido à inviabilidade econô-
mica que isso representaria. Assim, a água utilizada para irrigação normalmente provém
de rios e córregos, que muitas vezes recebem descargas de esgoto das comunidades vizi-
nhas. As chuvas, os animais e o próprio retorno da água utilizada para irrigação também
podem poluir o manancial. Como os rios geralmente são pequenos, a poluição recebida
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Controle
Devido à maior importância que os produtos hortícolas vêm adquirindo para a alimen-
tação dos brasileiros, deve-se dar uma maior atenção aos aspectos higiênico-sanitários
destes alimentos.
São poucos os dados existentes sobre o papel destes produtos na transmissão de
enfermidades ao homem, porém, devido à alta contaminação que estes alimentos so-
frem, a probabilidade de servirem como via de transmissão de doenças é alta.
Os produtos hortícolas representam uma vasta área de atuação para o profissional de
Saúde Pública e, até este momento, pouca coisa foi feita.
A solução mais adequada para o problema é a implantação de um Programa de
Controle dos Produtos Hortícolas, com atuação em todas as etapas envolvidas, desde a
produção até a comercialização dos alimentos.
Para que se atinjam os objetivos deste Programa, além da conscientização do profis-
sional é necessário que todos os segmentos da sociedade estejam envolvidos. Assim, os
produtores devem ser orientados e assumir a responsabilidade pelo que irão produzir; os
funcionários dos órgãos de fiscalização e controle devem zelar pelo cumprimento da
legislação existente e pelo trabalho educativo a ser desenvolvido, e os consumidores
devem exigir um produto de qualidade. Somente assim, com cada um desempenhando
seu papel, pode-se alcançar uma melhora significativa na qualidade dos alimentos ofere-
cidos à população.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Leite
Kathia Brienza Badini Marulli
No século XIX, o fornecimento de leite para as cidades era feito por chácaras situa-
das nas vizinhanças (Gancho, 1991). De acordo com a descrição de Mawe, “de galiná-
ceos e de gado havia abundância perto da cidade, mas como não se armazenavam
forragens, o gado só engordava no tempo de boas pastagens. As vacas eram ordenha-
das sem regularidade, recebiam fracas rações de sal e eram geralmente consideradas
‘um estorvo’; o uso de leite de cabra era mais generalizado. Os derivados do leite eram
produzidos sob precárias condições higiênicas, de modo que a manteiga logo ficava
rançosa e o queijo não prestava”. Na cidade de São Paulo, a comercialização de produ-
tos de fácil deterioração era feita nas ruas, nos tabuleiros das negras ou nas mulas dos
caipiras vindos das redondezas e de localidades mais distantes como Cotia e Juqueri
(Morse, 1970).
No início do século XX, com a propagação da energia elétrica, a indústria de laticínios
teve incremento considerável, principalmente na região do sul de Minas e em São Paulo.
O processo de industrialização expulsou bois e vacas das redondezas das cidades em
crescimento (Gancho,1991). Nessa época, a cidade de São Paulo possuía cerca de 240.000
habitantes, sendo a produção de leite efetuada na periferia da cidade, por produtores
cuja origem era predominantemente portuguesa, conhecidos como “vaqueiros”, que dis-
tribuíam o produto por meio de carrocinhas movidas por 2, 4 ou 6 animais de tração
(Meireles, 1983).
Nos anos 20, com o crescimento da cidade, a produção de leite tornou-se insuficiente
para abastecer a população e foi necessário importar leite de outras regiões, criando-se,
dessa maneira, as condições para a implantação de usinas e entrepostos na Capital,
voltados para a distribuição do leite. Nessa época surgiu a “Sociedade União dos Va-
queiros” que, por meio de uma usina de beneficiamento de leite, pasteurizava, engarra-
fava e distribuía à população o leite que vinha das cercanias de São Paulo (Meireles,
1983).
Na década de 30, o abastecimento de leite na cidade de São Paulo era realizado pelos
vaqueiros, que distribuíam leite cru, e pelos entrepostos e usinas. A partir de junho/julho
de 1933, a fiscalização sanitária sobre o leite comercializado pelos vaqueiros foi intensi-
ficada, pois os mesmos não estariam cumprindo o estabelecido no artigo 20 do Decreto
no 5.032 de 20/05/1931, que regulamentava produção, consumo e fiscalização do leite e
produtos derivados (Meireles, 1983).
Em julho de 1939, o Governo do Estado baixou decreto instituindo o “Regulamento do
Policiamento do Serviço de Alimentação Pública” que, entre outras exigências, estabele-
ceu que todo o leite a ser distribuído à população a partir de 01 de dezembro do mesmo ano
deveria ser pasteurizado (Meireles, 1983). Esta resolução gerou polêmica: alguns defendi-
am que a medida traria maior segurança ao consumidor, além de possibilitar o transporte
do leite de outras regiões sem que o produto se deteriorasse tão rapidamente. Entretanto,
outras pessoas eram radicalmente contrárias à pasteurização, afirmando que a mesma
permitiria a constituição do monopólio, fato este que acarretava o favorecimento de um
reduzido número de usinas particulares, assim como o encarecimento do produto, e a con-
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
seqüente queda do consumo. Os usineiros, já naquela época, pagavam pouco aos produto-
res, e muitos rebanhos leiteiros foram transformados em rebanhos de corte (Amaral, 1963).
A produção próxima ao centro consumidor (considerada melhor do ponto de vista econô-
mico, higiênico e social, segundo Amaral, 1963) foi a primeira que se reduziu, pela possibilida-
de dos interessados comprarem leite produzido em municípios distantes e até em outro esta-
dos, onde os preços eram insignificantes. Em 1936, 32,85% do leite consumido na cidade de
São Paulo, o que correspondia a 47.000 litros, era produzido nos arredores da cidade. Já em
1943, apenas 9,89% (10 a 15 mil litros) eram produzidos nas vizinhanças, sendo o restante
vindo de longe, até de Minas Gerais, de onde chegava repasteurizado, apesar disso ser proi-
bido por lei (Amaral, 1963).
Seja pela deficiência no abastecimento de leite realizado pelas usinas distribuidoras,
seja pelo hábito de consumo do leite cru ou pelos dois motivos citados, a verdade é que
a antiga forma de comercialização do produto nunca desapareceu.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
O processo de pasteurização
Ainda na tentativa de melhorar a qualidade do produto e de diminuir o risco de doen-
ças, foi estabelecida pelas autoridades a obrigatoriedade da pasteurização do leite a ser
distribuído à população, a partir de dezembro de 1939. A pasteurização é um processo
desenvolvido pelo cientista Louis Pasteur, entre 1860 e 1864, a partir de experiências
com vinho; foi aplicado para beneficiamento do leite para consumo das grandes cidades
dos Estados Unidos em fins do século passado. O processo utilizado era chamado “holder
pasteurization” (pasteurização lenta) e consistia em aquecer o leite durante 30 minutos a
uma temperatura pouco superior a 610C. Esse mesmo processo foi utilizado no Brasil
principalmente nas décadas de 20 e 30, sendo substituído pelo denominado HTST (“high
temperature-short time”), a partir da década de 40 (Meireles, 1983).
Como sempre, alguns setores foram favoráveis à decisão, enquanto outros se
posicionaram contrariamente à pasteurização. Um médico da época afirmava que “não
basta qualquer pequena e casual ingestão de leite cru de animais doentes para que o
homem contraia uma infecção, como parecem dar a entender os técnicos dos serviços
responsáveis pela instituição da pasteurização obrigatória”. Relatava ainda que o produ-
to chegava às usinas de pasteurização com taxas de 5 a 30 milhões de germes/cm3 ou
mais e que, com a pasteurização, o produto transformava-se em “cemitério de micróbi-
os” (Amaral, 1957).
Alguns autores, naquela ocasião, defendiam a quebra do monopólio estabelecido pe-
las usinas, o reestabelecimento da produção próxima aos centros consumidores e a dis-
tribuição rápida do produto e em condições higiênicas satisfatórias. Para eles, a solução
seria abolir a pasteurização obrigatória para o produto com condições de chegar ao
consumidor satisfatoriamente, independente dela. Defendiam que, se houvesse a conve-
niência em manter a obrigatoriedade no tocante à pasteurização, ela deveria ser realiza-
da pelos produtores, possivelmente organizados em cooperativas fiscalizadas pelo go-
verno. Acreditavam que o ideal era tentar obter um produto que pudesse ser fornecido e
consumido cru (Amaral, 1963).
Apesar de obrigatória, a pasteurização, em 1958, atingiu apenas 312.988 toneladas de
leite, o que representava cerca de 10% da produção nacional (Amaral, 1963).
Qualidade do leite
A qualidade higiênica do leite depende de vários fatores, que vão desde o estado
sanitário dos animais, até a comercialização do produto. A limpeza efetiva dos recipien-
tes, utensílios e equipamentos utilizados na ordenha, a qualidade da água usada para
higienização, conjuntamente com a higiene cuidadosa do local e do pessoal, são elemen-
tos de grande importância. Interferindo na qualidade e quantidade do leite estão ainda a
zona de criação, o clima, a salubridade do lugar, a fertilidade das terras, a alimentação
dos animais, o pessoal encarregado do serviço, as vias de comunicação e a organização
do comércio. O conjunto destes itens é o que determina a obtenção de um bom leite no
139
SOERENSEN & BADINI MARULLI
140
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Devido à evolução do hábito de consumo, iniciado pelo leite cru, passando pelo fervi-
do, depois pelo pasteurizado e mais recentemente chegando ao “longa vida”, os consu-
midores estariam devidamente protegidos (Rogick, 1979).
Entretanto, não é essa a situação atual dos consumidores de leite. O leite cru conti-
nua sendo comercializado em larga escala e nem todos os seus usuários têm o hábito de
submetê-lo à fervura. A qualidade do leite pasteurizado continua sendo um problema e
grande parte de seus compradores tenta proteger-se fervendo o produto. E, por uma
série de motivos, o leite continua sendo um alimento que veicula agentes patogênicos
para o homem.
A contaminação do leite começa no momento da ordenha quando esta é realizada
sem obedecer os preceitos de higiene adequados. O próprio ordenhador é uma importan-
te fonte de contaminação para o produto. Têm-se ainda, os equipamentos, a água utiliza-
da para higienização dos equipamentos, o tempo decorrido entre a ordenha e o recolhi-
mento do leite pelos caminhões, não térmicos, que levarão o produto até a estação de
resfriamento ou usina de pasteurização, e que costuma variar de 4 a 7 horas (Aranalde
et al., 1974; Wilson, 1977). Ao realizarem a enumeração de Staphylococcus em leite
cru, alguns pesquisadores afirmaram que o tempo decorrido entre a ordenha e a chega-
da dos latões à plataforma de recepção das indústrias, bem como as condições de trans-
porte da matéria prima, influenciaram os resultados das contagens (Mesquita et. al.,
1988).
O principal problema sanitário da atividade leiteira é, indiscutivelmente, a mastite, e
alguns autores afirmam que 50% das vacas apresentam este problema (Krug, 1985). A
literatura cita que provavelmente o Staphylococcus aureus é o patógeno mais comumente
isolado das mastites bovinas. No Brasil, a freqüência de isolamento deste agente tem
variado de 5,0 a 83,54%, de acordo com dados de diferentes pesquisas (Ferreiro, 1980).
A presença de S. aureus em leite de conjunto tem sido verificada em 46,9 a 100% das
amostras estudadas (Nader Filho, 1987).
O S. aureus é um microrganismo cuja importância reside no fato de algumas cepas
serem capazes de produzir enterotoxinas termorresistentes, que permanecem ativas à
temperatura de 100oC por 30 minutos. As enterotoxinas são designadas pelas letras A a
F, sendo que a mais envolvida em surtos de intoxicações alimentares é a enterotoxina A.
Geralmente são as cepas coagulase-positivas que produzem as toxinas, sendo que algu-
mas cepas podem produzir 2 ou 3 enterotoxinas diferentes (Acha & Szyfres, 1989).
Além do sério problema das mastites estafilocócicas, a estrutura de coleta do produto
cria condições para a multiplicação de S. aureus no leite, pois o produto fica à tempera-
tura ambiente até ser transportado à usina, como foi citado anteriormente. Tendo em
vista as condições sanitárias do rebanho nacional, aliada às condições higiênicas da
ordenha, torna-se difícil a obtenção de leite cru isento de Staphylococcus coagulase-
positiva (Mesquita et al., 1988).
Se, por um lado, sabe-se que nem todas as cepas de S. aureus coagulase-positiva são
produtoras de enterotoxinas (Mesquita et al., 1988), pode-se afirmar, em contrapartida,
que os estafilococos são os microrganismos mais comumente envolvidos em intoxica-
ções alimentares por produtos lácteos (Cruz, 1984) e o leite é a fonte mais comum das
toxinas estafilocócicas C e D (Holmberg & Blake, 1964, citados por Acha & Szyfres,
1989). Todos os estafilococos coagulase-positiva, isolados de alimentos, devem ser con-
siderados como potencialmente produtores de toxinas (Aranalde et al., 1974). Alguns
autores têm observado que, dentre as cepas de S. aureus isoladas em casos de mastite
141
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Fraudes
Fraude, logro, ação praticada de má-fé, falsificação, adulteração. A rigor, fraude é
tudo aquilo que se desvia das características normais, inclusive de peso e preço de um
determinado alimento. Podem-se ainda considerar como fraude os artifícios usados sem
o consentimento oficial e que não fazem parte de uma prática universalmente aceita
(Riedel, 1987).
142
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A adulteração dos alimentos sempre foi uma prática corriqueira. Dois fatores atua-
ram permanentemente para o aumento da quantidade de alimentos de forma artificial: o
aumento extraordinário da população e a insuficiente produção de alimentos frente ao
crescimento populacional (Ribeiro, 1993).
Em 1892 foi criado no Estado de São Paulo o Serviço Sanitário, composto pelo Con-
selho de Saúde Pública e pela Diretoria de Higiene, esta última auxiliada por diversas
seções, dentre as quais o Laboratório de Análises Químicas. A Diretoria de Higiene
realizava inúmeras atividades, como por exemplo a fiscalização da alimentação (Ribeiro,
1993).
Em 1894, o Laboratório de Análises Químicas divulgou relatório sobre as principais
falsificações encontradas nos alimentos consumidos pela população de São Paulo. Ana-
lisando o leite, foram constatadas a presença de bicarbonato de sódio e miolo de vitelas.
As falsificações não eram raras, e o leite, alimento de ampla demanda, era um dos
produtos mais cobiçados na multiplicação por meio de processos artificiais, principal-
mente nas épocas de entressafras (Ribeiro, 1993).
Em 1909, em matéria publicada no jornal Folha do Povo, encontrava-se o seguinte
comentário: “o leite de vaca não é alimento para ninguém, desnatado, diluído e contami-
nado, cheio de impurezas de toda a espécie”.
Segundo o chefe da subdivisão de Bromatologia e Química do Instituto Adolfo Lutz,
Bruno Rangel Pestana, o padrão de leite adotado em São Paulo a partir de 1934 permi-
tiria a inclusão de 15% de água no produto. A redução do teor de gorduras no leite para
3% seria uma possibilidade para as usinas pasteurizadoras fraudarem o produto por
meio da aguagem e do desnate (Amaral, 1963).
Ainda segundo Pestana, a aguagem era a fraude mais freqüente no leite de São
Paulo; cerca de 60% das amostras de leite analisadas no I.A.L. tinham água, apesar de
estarem com teor de gordura e extrato seco desengordurado dentro dos padrões estabe-
lecidos.
Um ex-secretário de saúde, Dr. Queirós Guimarães, referiu-se ao produto como “água
leitosa”. Já o Dr. Carlos Prado, diretor do Departamento da Criança, dizia que “a própria
vaca se sentiria humilhada e ofendida, diante da acareação com o suposto alimento
original de suas tetas” (Amaral, 1957).
Dentro do Programa de Monitoramento do Leite Pasteurizado no Estado de São
Paulo, realizado pela Secretaria de Estado da Saúde no período de fevereiro de 1990 a
dezembro de 1990, que analisou 383 amostras de leite pasteurizado tipos A, B, e C,
foram encontradas 93,20% das amostras com índice crioscópico acima do limite permi-
tido, o que demonstra que a fraude pela adição de água continua ocorrendo (Centro de
Vigilância Sanitária, 1993. Dados não publicados).
143
SOERENSEN & BADINI MARULLI
permanentemente com leite beneficiado. Para que exista autorização para esse tipo de
comércio, o produto deve ser oriundo de propriedade cujas instalações permitam a ob-
tenção de leite em perfeitas condições de higiene, proceder de rebanho mantido em
condições sanitárias satisfatórias, ser distribuído ao consumo até três horas após o térmi-
no da ordenha, ser integral e satisfazer aos padrões oficiais (Decreto-Lei no 66.183 de 5/
2/1970).
Sabe-se, entretanto, que é grande o número de pessoas, produtores ou não, que ven-
dem leite cru nas cidades do interior do Brasil, mesmo naquelas onde tal procedimento é
proibido por lei. Por tratar-se de produto clandestino, não sofre qualquer tipo de controle
higiênico-sanitário, expondo a saúde pública a riscos incalculáveis. A falta de estudos
específicos e de dados estatísticos sobre tal situação permite apenas que se suponha a
gravidade da mesma.
Segundo a Comissão Técnica da Delegacia Federal de Agricultura (1982), o problema
do leite é complexo, com desdobramentos de natureza social, econômica, sanitária, política
e cívica. A produção de leite é sustentada por pequenos produtores rurais com poucos
recursos financeiros e técnicos. O baixo nível cultural do produtor revela sua necessidade
de receber treinamentos e assistência técnica para produzir mais e melhor (Krug, 1985).
Além disso, devido à sua condição social, a prescrição de normas higiênicas constitui fator
limitante, havendo uma acomodação evidente, não só do trabalhador braçal, como também
do proprietário (Costa et al, 1983).
A produtividade do rebanho nacional é baixa e o preço com que se remunera o leite
ao produtor brasileiro é um dos menores do mundo (Panetta, 1982; Krug, 1985). Assim,
numa tentativa de aumentar sua renda, uma parcela considerável de produtores vem
abandonando as cooperativas e entrando na chamada “economia informal”, vendendo
seu produto diretamente ao consumidor. Os que fazem o comércio clandestino de leite
cru ficam em situação privilegiada, pois não sofrem inspeção qualitativa de seu produto
e, ainda recebem o preço de mercado do leite tipo C, o dobro do que receberiam na
indústria.
Por questões culturais, boa parte da população prefere consumir o leite cru, ao invés
do pasteurizado. Em estudo realizado pela Federação da Agricultura do Estado do Paraná,
em 1969, foi constatado que o consumo de leite cru era cinco vezes maior que o de leite
pasteurizado.
Segundo dados de 1985, da produção brasileira estimada, pouco mais de 51% vinha
sendo entregue às indústrias com Inspeção Federal. A quantia restante ficava na propri-
edade para consumo próprio, produção de queijo e manteiga, alimentação de bezerros,
venda a queijarias e venda de leite cru diretamente ao consumidor, a qual, segundo o
autor, vinha aumentando assustadoramente (Krug, 1985). Em Santa Maria (RS), por
exemplo, aproximadamente 80% da população recebia leite cru, na década de 70 (Moreira,
1971). Em Minas Gerais representa 50% do abastecimento, está presente inclusive na
periferia de São Paulo, e em cidades isoladas seu consumo chega a 100% (Leite B,
1994).
A venda de leite cru diretamente à população não acontece somente no Brasil. Ocor-
re no México (“leche bronca”), inclusive na capital, no Uruguai (“leche del tambo”), na
Itália (“latte crudo”), e certamente em muitos outros países. Nos Estados Unidos seu
comércio é permitido em algumas regiões, desde que em pequena quantidade. O que
diferencia o Brasil do restante do mundo é o volume. Faltam estatísticas oficiais, mas
acredita-se que o leite cru corresponde a 30 ou 40% do total de leite bebido no país
144
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
(Leite B, 1994).
A baixa qualidade do leite é um problema muito comum no país (Krug, 1985). Este fato
torna-se mais alarmante em relação ao leite cru, produzido precariamente e distribuído nas
residências pelos “leiteiros”, que passam um tempo relativamente longo entregando o produ-
to, representando um perigo à Saúde Pública (Ferreiro, 1980).
Porém, para o consumidor, muitas vezes o que mais importa é a comodidade da entrega
domiciliar, o preço menor que o do leite pasteurizado, a manutenção de um hábito cultural
e/ou a possibilidade de liquidar sua conta mensalmente. Para ilustrar a questão econômica,
pode-se citar o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Leite B, Jorge
Rubez, que afirma que o leite foi tirado do cardápio dos pobres por causa do arrocho
salarial. “Em 1970, o salário mínimo comprava 350 litros de leite. Em 1980, já havia caído
para 230 litros. Em julho de 1994, antes da estréia do real, o mínimo de 64 URV só adquiriu
125 litros” (Leite B, 1994).
No Brasil, a média geral de consumo de leite fluido era de 42,1 litros por habitante,
por ano, em 1986. Somava-se a isso o consumo de derivados, da ordem de 19,2 litros/
habitante, perfazendo um total de 61,3 litros anuais ou 0,167 litro diário. O requerimento
da FAO (Organização de Alimentação e Agricultura das Nações Unidas), para nossas
condições, é de 0,400 litro diário (havia, então, um déficit de 39,6 litros anuais) (Revista
Balde Branco, 1986).
O Brasil é um dos principais países produtores de leite do Cone Sul, mas o consumo de
leite e derivados lácteos é um dos mais baixos, se comparado ao da Argentina, Chile e
Uruguai. Segundo a Associação Brasileira dos Produtores de Leite B (ABPLB), o Brasil
produzia 13,3 bilhões de litros por ano, enquanto a Argentina produzia 5,9 bilhões de litros
por ano, o Chile 1,23 bilhões e o Uruguai, 989 mil litros de leite por ano. No entanto, o
consumo de leite e derivados no Brasil era de 85 litros por habitante ao ano, enquanto que
na Argentina era de 190 litros, no Chile 125 litros e no Uruguai, 230 litros por habitante, por
ano (A. B. P. L. B., 1990).
Vários fatores contribuem para que o consumo de leite em nosso país seja baixo, dentre
eles, o preço do produto. O leite e a carne bovina são os alimentos que representam os
maiores gastos na alimentação das famílias. Em todos os níveis de renda, o dispêndio com
esses produtos ultrapassa 20 por cento do gasto total (Barelli et al., 1988).
Assim, muitas vezes o consumo do leite cru passa a ser uma alternativa para que o
produto continue a ser comprado, apesar dos riscos que esta prática possa acarretar.
Além disso, quem compra o leite cru parece acreditar que está adquirindo um produto
melhor do ponto de vista nutricional, e isento de fraudes. Sabe-se, entretanto, que a
pasteurização tem pequeno ou nenhum efeito sobre o valor nutritivo do leite, e a segu-
rança obtida por esse processo excede qualquer possível efeito nos nutrientes. Com o
aumento de consumo do leite não pasteurizado, cresce também a possibilidade de ocor-
rência de surtos relacionados à ingestão deste alimento (A. P. H. A., 1978).
Finalizando este panorama geral da situação atual, deve-se citar a implantação de
mini e microusinas de leite. No estado de São Paulo existiam, em 1995, 65 mini e microusinas
registradas, com uma produção média de 50.000 litros de leite/dia. São estabelecimentos
que produzem e/ou recebem, beneficiam e empacotam até 3.000 litros diários e que
foram instituídas pela Resolução SAA no 24 de 01/08/94, que normatizou a Lei Estadual
no 8.208/92. Com isso, o produtor tem a possibilidade de beneficiar sua própria produção
de leite, oferecendo à população um alimento com preços competitivos, maior lucratividade
e com padrão de qualidade igual às outras empresas do ramo (Castilho, 1995).
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Carne
Kathia Brienza Badini Marulli
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Ø Inspeção ante-mortem:
A inspeção “ante-mortem” é realizada durante o período em que os animais perma-
necem em descanso e dieta hídrica e tem como objetivo exigir e verificar os certificados
de vacinação e sanidade do gado; identificar o estado higiênico-sanitário dos animais
para auxiliar, com os dados informativos, a tarefa de inspeção “post-mortem”; identificar
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
e isolar os animais doentes ou suspeitos, antes do abate, bem como vacas com gestação
adiantada ou recém-paridas; verificar as condições higiênicas dos currais e anexos (Roça,
1994).
Ø Banho de aspersão:
Após o descanso, os animais seguem por uma rampa de acesso para o boxe de
atordoamento. Nessa rampa, é realizado o banho de aspersão, por meio de um sistema
de chuveiros dispostos transversal, longitudinal e lateralmente, com os jatos orientados
para o centro do banheiro. A água do banho deve ser hiperclorada, com 15ppm de cloro
disponível (Brasil, 1968).
O objetivo do banho antes do abate é limpar a pele para assegurar uma esfola higiê-
nica e reduzir a poeira, pois com a pele úmida, a sujeira na sala de abate estaria diminu-
ída. Também contribuiria para melhorar a sangria, devido à da vasoconstrição periférica
que provoca.
Ø Atordoamento:
O atordoamento ou insensibilização consiste em colocar o animal em um estado de
inconsciência que perdure até o fim da sangria, não causando sofrimento desnecessário
e promovendo uma sangria tão completa quanto possível (Gil, 1985).
Pode-se empregar um dos métodos de insensibilização a seguir: concussão cerebral,
pistola de dardo cativo, corte da medula, degola, eletronarcose e processos químicos
(Roça, 1994).
O método mais utilizado no Brasil é a concussão cerebral. O atordoamento pode ser
realizado por meio da marreta ou martelo pneumático ou pistola pneumática. O método
considerado mais eficiente e menos desumano para a insensibilização de bovinos e ovi-
nos é a utilização da pistola de dardo cativo, que não é recomendada, entretanto, para
suínos, devido à forma anatômica do crânio destes animais (Roça, 1994).
Para os rituais judaico e maometano de abate, deve-se proceder à degola ou jugulação
cruenta, por meio de incisão rápida no pescoço do animal, com faca bastante afiada,
cortando pele, músculos, esôfago, traquéia, artérias carótidas e veias jugulares (Roça,
1994).
Após a insensibilização, o animal desliza sobre a grade tubular da área de vômito e é
suspenso ao trilho aéreo por um membro posterior. Neste momento, pode ocorrer
regurgitação, devendo o local possuir água em abundância, para lavagem (Mucciolo,
1985).
Ø Sangria
É realizada pelo corte da barbela e secção da aorta anterior e veia cava anterior, no
início das artérias carótidas e final das veias jugulares. O sangue é recolhido pela canaleta
de sangria. É conveniente a utilização da duas facas de sangria, uma para o corte da
barbela e outra para os vasos sangüíneos. Após seu uso, as facas devem ser mergulha-
das na caixa de esterilização (Roça, 1994).
A quantidade de sangue de bovinos é estimada em 6,4 a 8,2 litros/100 kg de peso
vivo. Numa boa sangria, necessária para a obtenção de uma carne com adequada capa-
cidade de conservação, é removido cerca de 50% do volume total de sangue, sendo que
o restante fica retido nos músculos, vasos e órgãos vitais (Forrest, 1979; Piske, 1982).
Vários fatores podem interferir na eficiência da sangria, como por exemplo, o estado
150
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Ø Esfola
A esfola é a atividade de remoção do couro do animal. Ainda com o animal suspenso
no trilho, deve-se proceder a retirada dos chifres e patas dianteiras, abertura da barbela
até a região do mento, incisão longitudinal da pele do peito até o ânus e corte das patas
traseiras. Inicia-se, então, a retirada do couro e a desarticulação da cabeça. Deve-se
tomar muito cuidado ao executar todas as fases da esfola, a fim de evitar-se a contami-
nação cruzada entre o couro e a carne, por meio das mãos ou das facas (Roça, 1994).
Após a separação da pele nas extremidades, às vezes a esfola é completada mecani-
camente, por tração. A seguir, é realizada a oclusão do esôfago e a separação do con-
junto cabeça e língua (Roça, 1994).
Ø Evisceração
Geralmente é realizada pela abertura da cavidade torácica, abdominal e pélvica, atra-
vés de um corte que passa em toda a sua extensão. É realizada a serragem do esterno e
a oclusão do duodeno, próximo ao piloro e ao reto, juntamente com a bexiga urinária.
Deve-se tomar cuidado para que não ocorram lesões no trato gastrointestinal e urinário
durante a abertura do abdômen e separação do esterno com a serra (Roça, 1994).
As vísceras são extraídas (com exceção dos rins) e conduzidas para inspeção, por
meio de mesa rolante. Posteriormente, são encaminhadas à seção de triparia, geralmen-
te por meio de condutos denominados “chutes”.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Fontes de contaminação
Ø Pele: a pele apresenta uma grande e diversificada população de microrganismos,
normais da própria pele ou adquiridos do solo, água, pasto e fezes. O regime de criação
dos animais é um dos fatores que afetam a contaminação da pele. Bovinos em regime de
criação extensiva podem apresentar menos bactérias fecais e mais microrganismos do
solo do que os animais estabulados. Os principais microrganismos encontrados na pele
são os psicrotróficos (provenientes do solo, água, vegetais), Pseudomonas spp, Moraxela
spp e Acinetobacter spp (da água e vegetação) e Brochothrix thermosphacta (do solo
e fezes) (Roça, 1995).
Ø Trato gastrointestinal: no momento do abate, o rúmen pode conter aeróbios
mesófilos, psicrotróficos, E. coli, bactérias do grupo das Enterobacteriaceae e Salmonella
spp. Além dessas, as fezes podem também conter Clostridium perfringens. De acordo
com as estatísticas das toxinfecções alimentares, o gênero de bactérias mais perigoso
veiculado pelas carnes é o Salmonella spp (Ingram, 1985; Klinger, 1983). A população de
salmonelas no rúmen e nas fezes dos bovinos no momento do abate depende, entre outros
fatores, da alimentação e distância de transporte (quanto maior a distância, maior contato
dos animais com material fecal e, conseqüentemente, maior concentração de salmonelas
no rúmen) (Roça, 1995).
Ø Ar: após a remoção da pele, as carcaças ficam sujeitas à contaminação pela
deposição de microrganismos do ar da sala de matança (Empey, 1939). A qualidade do
ar depende principalmente do controle higiênico do estabelecimento, considerando que
pisos, paredes, equipamentos, utensílios, magarefes e sistemas de ventilação e drena-
gem são fontes potenciais de contaminação do ar atmosférico (Roça, 1995).
Entre os principais microrganismos presentes nos matadouros-frigoríficos, encon-
tram-se os micrococos, coliformes, bacilos e estafilococos. Geralmente, há predomínio
de Escherichia coli no ar ambiente de currais e sala de matança, e baixas contagens
deste microrganismo nas câmaras de resfriamento, ocorrendo o inverso com as
Pseudomonas spp (Barratt, 1983).
Momentos da contaminação
Ø Durante as operações de abate: a maior parte da contaminação bacteriana da
carcaça que ocorre durante as operações de abate é adquirida durante a esfola. A
superfície da carcaça é contaminada principalmente pela pele, mediante a faca utilizada
para as primeiras incisões, das mãos dos operários ou do próprio contato da carcaça
com a pele já separada (Roça, 1995).
Vários fatores afetam a adesão das bactérias na superfície das carcaças, como o
gênero do microrganismo, a temperatura ambiente, substratos presentes na carne e ca-
152
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Carne moida
A carne fresca só pode ser vendida moída se a moagem for realizada na presença do
comprador. Esta determinação visa proibir a adição de outros produtos ao alimento (“sebo”,
aponevroses, etc.) ou sua manutenção por longos períodos de tempo na forma moída, o
que aumentaria o risco de contaminação do produto (Riedel, 1987).
Em trabalho realizado em Campina Grande (PB), entre outubro de 1994 e novembro de
1995, foram analisadas 90 amostras de carne moída, sendo que 60 amostras foram colhi-
das em feiras livres e 30 em supermercados. Com relação a microrganismos mesófilos
aeróbios ou anaeróbios facultativos, os valores médios obtidos nas amostras provenientes
das feiras livres foi de 2,6 x 106 UFC/g e de 2,5 x105 UFC/g para as dos supermercados.
Das amostras de feiras livres, 55% apresentaram contagem superior a 106 UFC/g e 11,7%
superior a 107 UFC/g de bactérias mesófilas. Nas amostras coletadas em supermercados,
o nível de contaminação era menor: 73,3% das amostras apresentou contagem acima de
105 UFC/g (Florentino, 1997).
Ainda apresentando dados do trabalho citado acima, os pesquisadores encontraram
58,4% das amostras obtidas em feiras livres com valores maiores que 106 UFC/g de
coliformes totais, com valores médios de 1,9 x 106 UFC/g; contagem superior a 105
NMP/g em 50% das amostras para coliformes fecais (CF) e contagem superior a 104
UFC/g de Staphylococcus spp. Nas amostras dos supermercados os dados foram 66,6%
das amostras com contagem superior a 105 UFC/g com valores médios de 1,7 x 105
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
UFC/g de coliformes totais; 30% das amostras com contagem superior a 104 NMP/g de
CF e 53,3% das amostras com contagem superior a 102 UFC/g de Staphylococcus spp.
Em todas as amostras analisadas foi detectada a presença de Salmonella spp.
Os autores concluíram que o produto sofreu contaminação desde a etapa de abate
dos animais, até a etapa de moagem da carne, quando a contaminação superficial é
introduzida e distribuída no produto. A falta de higiene dos utensílios e equipamentos que
entram em contato com a matéria-prima e sua manipulação inadequada são importantes
fontes de contaminação. A diferença entre as amostras das feiras livres e as dos super-
mercados, relativamente pequena, deve-se à refrigeração do produto, fazendo com que
o crescimento dos microrganismos já existentes seja inibido (nas feiras livres as carnes
ficam expostas à temperatura ambiente, aumentando ainda mais o nível de crescimento
dos microrganismos). De acordo com a Portaria 01/87 do Ministério da Saúde, que
estabelece ausência de Salmonella spp em 25 g do produto, a carne moída comercializada
nas feiras livres e supermercados de Campina Grande estava inadequada para consu-
mo, constituindo um risco para a saúde de seus consumidores (Florentino, 1997).
Anabolizantes
A discussão sobre a utilização dos anabolizantes na pecuária de corte vem esten-
dendo-se há muitos anos. Os defensores dessa prática afirmam que é necessário
produzir uma quantidade maior de alimentos para suprir a demanda de uma popula-
ção mundial que cresce exageradamente; para isso, devem ser empregadas novas
formas de produção ou tecnologias, como os anabolizantes, por exemplo, que, além
de tudo, seriam inócuos à saúde dos consumidores. Outras pessoas acreditam que
somente alimentos naturais, ou produzidos de forma natural, devem ser consumidos
pelo homem; afirmam que os alimentos produzidos com o auxílio de anabolizantes
seriam cancerígenos. Quem estaria com a razão?
Anabolizantes são substâncias, de natureza hormonal ou não, que aumentam a reten-
ção, pelo organismo, de nutrientes fornecidos pela alimentação. Principalmente, aumen-
tam a retenção do nitrogênio protéico e não protéico presentes nos alimentos e sua
subseqüente transformação em proteína, particularmente nos músculos esqueléticos.
Portanto, produzem um aumento da massa muscular e do peso dos animais (Palermo
Neto, 1998).
Os anabolizantes de interesse agropecuário podem ser classificados, de acordo com
a sua origem, em três grupos: compostos naturais, sintéticos (xenobióticos) e estilbenes.
Os anabolizantes naturais são aqueles que existem normalmente no organismo dos ani-
mais (anabolizantes endógenos). Como exemplos, podem ser citados a testosterona,
17β-estradiol e progesterona. Os xenobióticos são anabolizantes obtidos por síntese
laboratorial (acetato de tembolona e acetato de melengestrol) ou por modificações da
estrutura química de substâncias naturais, como é o caso do zeranol. Finalmente, estilbenes
são anabolizantes sintéticos, obtidos a partir dos hormônios naturais (Palermo Neto, 1998).
Vários fatores podem modificar os efeitos dos anabolizantes. Entre eles, podem ser
citados, a presença ou não da castração; a espécie , raça, sexo e idade dos animais
tratados; o tipo, quantidade e freqüência do anabolizante usado, bem como a existência
ou não de associações de agentes, o tipo de implante empregado e o momento da admi-
nistração (quanto tempo antes do abate). De importância fundamental é a quantidade da
154
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
155
SOERENSEN & BADINI MARULLI
156
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Produtos hortícolas
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
161
SOERENSEN & BADINI MARULLI
162
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
VI - Mortalidade infantil
Mortalidade infantil
Introdução
As primeiras análises sobre nascimento e morte reportam ao século XVII. John Grant,
um comerciante londrino de roupas masculinas, foi o pioneiro das estatísticas de nascimen-
to e morte. Estudando o número de mortes em Londres, durante o último terço do século,
demostrou a regularidade de certos fenômenos sociais e vitais, publicando, em 1662, seu
clássico: “Observações Naturais e Políticas... Por meio dos Boletins de Mortalidade”. Foi
o primeiro a indicar o excesso de nascimento de homens em relação às mulheres e a
gradativa redução deste referencial (20, 21).
No século XVIII, cada vez mais se tomava consciência da necessidade das informa-
ções estatísticas para determinar-se o número e as características das populações, caben-
do à Suécia a primazia das coletas de estatísticas oficiais, em 1748 (21).
Por volta de 1750, iniciou-se um rápido aumento da população na Europa. O ponto
crucial desta expansão, com altas taxas de nascimentos, estava na mortalidade infantil,
extremamente alta, especialmente entre os filhos dos pobres. Em algumas freguesias de
Londres, a mortalidade de crianças variava entre 80 e 90%, sendo ainda mais alta entre os
menores de um ano. Como conseqüência desta grande perda de vidas, iniciou-se, na Ingla-
terra e em outros países, um movimento de reformas contra os fatores e condições respon-
sáveis pelas mortes de crianças (21).
Na passagem do século XVIII para o XIX, os estudiosos reconheciam ser possível
evitar grande parte da mortalidade infantil e acreditavam que suas principais causas
eram a desnutrição, a ignorância dos pais, o alimento contaminado, entre outros fatores,
atribuídos total ou parcialmente à pobreza. Sabia-se também, que o número de mortes de
crianças alimentadas artificialmente era maior do que o das alimentadas no peito (21).
Em 1816, o médico inglês, John Bunnel Davis, estabeleceu um dispensário para cri-
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
N.º de óbitos de residentes com menos de um ano, em uma dada população e ano
——————————————————————————————--- X 1000
164
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
165
SOERENSEN & BADINI MARULLI
dos.
PÁIS ANO CMI Proporção (%) Proporção (%) Proporção (%)
(/1000) 0-27 dias > 27 dias diarréia
Japão 1960 30.7 55.5 44.5 7.7
1970 13.1 65.9 34.1 3.6
1980 7.5 65.8 34.2 0.9
1986 5.2 59.2 40.8 0.3
1992 4.5 53.0 47.0 0.2
EUA 1960 26.0 71.9 28.1 2.8
1969 21.0 74.7 25.3 1.2
1974 16.7 73.4 26.6 1.3
1984 10.8 64.9 35.1 0.4
1991 8.9 62.5 37.5 0.4
Portugal 1960 77.5 27.1 63.9 26.5
1971 49.8 45.3 54.7 20.9
1979 26.0 60.5 39.5 9.6
1985 17.8 68.2 31.8 3.8
1993 8.7 63.6 36.4 1.1
Polônia 1960 56.8 45.1 54.9 8.7
1970 33.2 59.0 41.0 2.2
1980 21.3 62.6 37.4 2.7
1985 22.1 70.5 29.5 1.1
1994 13.4 71.7 28.3 0.3
Chile 1974 63.3 40.7 59.3 14.0
1980 36.6 49.9 50.1 4.5
1989 17.1 53.4 46.6 2.2
Fonte: World Health Organization In: Szwarcwald et al, 1997.
166
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
167
SOERENSEN & BADINI MARULLI
senta os valores das taxas estimadas de mortalidade infantil, neonatal precoce, neonatal
tardia e pós-neonatal, do Brasil e regiões, segundo dados do Ministério da Saúde, nos
Indicadores e Dados Básicos – Brasil – 97 (IDB 97) (10).
168
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
te no período neonatal, vem sendo exaustivamente estudada. Crianças com baixo peso
ao nascer (menos de 2.500g) apresentam uma menor probabilidade de sobrevivência do
que as nascidas com peso adequado (19,29).
Puffer e Serrano, na década de 70, com base nos dados da Investigação Interamericana
de Mortalidade na Infância, observaram que 73% das mortes ocorridas no período
neonatal eram de crianças de baixo peso (19).
As diferenças que se estabelecem na freqüência de nascimentos com peso baixo,
quando se comparam os países mais desenvolvidos com os menos desenvolvidos, estra-
tos pobres com estratos ricos de um mesmo país, revelam uma associação causal com a
estrutura sócio-econômica das populações (12).
Nos países mais desenvolvidos, onde há registro dos pesos de nascimento, há nu-
merosos estudos discutindo o papel do baixo peso ao nascer como determinante da
mortalidade infantil. Porém, 90% das crianças nascidas com baixo peso são de países
periféricos, onde há poucas informações sobre a distribuição e o impacto desta variá-
vel na determinação da mortalidade nos menores de um ano (29).
O baixo peso ao nascer é influenciado por características ligadas às variáveis da
criança (sexo, idade gestacional, gemelaridade), fatores biológicos maternos (idade, peso,
altura, intervalo interpartal, antecedentes obstétricos), fatores sociais (escolaridade, fumo
na gravidez) e de assistência médica (consultas pré-natais e tipo de parto) (29).
A tendência declinante das curvas de mortalidade infantil merece ser analisada
mais detalhadamente, por meio do estudo simultâneo de séries históricas dos coefi-
cientes de mortalidade infantil e das freqüências de baixo peso ao nascer, para se
conhecer o papel desta variável na determinação da mortalidade (12).
A idade materna também tem sido considerada como fator de relevância no compor-
tamento da mortalidade infantil. A forte associação entre ambas tem sido bastante docu-
mentada, encontrando-se as mais altas taxas entre os filhos de mães adolescentes (me-
nores de 20 anos) e de maiores de 35 anos (2,4,6,19).
Estudo realizado nos Estados Unidos (3) referiu uma forte associação entre idade
materna e altas taxas de mortalidade infantil e idade materna e alta incidência de baixo
peso ao nascer. Os resultados sugeriram que a prevenção da mortalidade neonatal e, por
conseqüência, da mortalidade infantil entre os recém-nascidos de mães adolescentes
depende da prevenção do baixo peso ao nascer. Moreno Vásquez (13), analisando as
causas da redução da mortalidade neonatal em Cuba, no período de 1970 a 1987, men-
ciona, como condição favorável, a diminuição das taxas de fecundidade das mulheres
com menos de 20 anos, que vem ocorrendo desde de 1975.
Outro fator que mantém estreita relação com a mortalidade no primeiro ano de vida
é o sexo do recém-nascido, com a mortalidade masculina quase sempre maior que a
feminina, em todas as sociedades, independentemente do grau de desenvolvimento. Este
fenômeno é denominado de supermortalidade ou sobremortalidade masculina (1). Por
outro lado, o sexo feminino, segundo vários estudos, freqüentemente apresenta maiores
proporções de crianças com baixo peso ao nascer (8,23,28).
Estudos sobre a evolução da mortalidade infantil evidenciam sua associação com a
situação e as condições estruturais das sociedades, sendo a ela atribuídas não somente
causas biológicas mas, principalmente, causas e determinações de ordem sócio-econô-
mica e sócio-ambiental, por ser fortemente influenciada pelos agentes externos localiza-
dos na sociedade, tais como, os serviços de saúde, saneamento e higiene e as relações
169
SOERENSEN & BADINI MARULLI
familiares e sociais (moradia, trabalho, renda, nível de informação, proteção social, etc.)
(15).
Tais fatos mostram o caráter complexo dos determinantes da mortalidade infantil,
especialmente quando, concomitantemente à piora nas condições de vida, possam estar
ocorrendo outros fenômenos, tais como, redução da natalidade, espaçamento das gesta-
ções, a expansão do saneamento básico, a intervenção dos serviços de saúde, entre
outros (17).
Comentários finais
De maneira geral, o declive da mortalidade infantil no Brasil, quando comparado
com dados internacionais, foi lento e gradual, favorecendo as regiões mais desen-
volvidas, em que a presença de uma estrutura de serviços de atendimento à popula-
ção e um nível mais elevado de vida garantiram condições mais adequadas de sub-
sistência (15,25). Nestas regiões, há um predomínio do componente neonatal, e pro-
gressos adicionais dependerão do controle da mortalidade por causas perinatais e
por doenças respiratórias, por meio de intervenções específicas nos programas de
pré-natal e assistência ao parto e ao recém-nascido.
No Norte e Nordeste, que ostentam os níveis mais elevados do país, o descenso
apresentou um ritmo mais lento, permanecendo com um padrão semelhante ao de soci-
edades muito pobres, com altas taxas de morte por doenças intestinais e pouca redução
do componente pós-neonatal (15,22,25). Nestes estados, o controle da mortalidade in-
fantil envolve ainda, além das intervenções citadas acima, a implementação de políticas
públicas, tais como, extensão da rede de água potável e esgoto, campanhas de vacinação
e universalização dos acessos à assistência médico-hospitalar.
170
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
cobaia, rata e camundonga. Neste último grupo as trocas materno-fetais são maiores.
Desta maneira, quanto à espécie humana, do ponto de vista prático, a imunoprofilaxia
do tétano umbilical (mal dos sete dias), em mães não imunizadas, deverá ser feita pela
vacinação durante a gravidez, para que forme anticorpos e os transfira ao feto impe-
dindo que o recém nascido corra o risco de apanhar tétano. Esta recomendação deve-
rá correr paralelamente à desinfecção do umbigo. Independentemente deste fato, se
recomenda a alimentação da criança recém-nascida com o leite materno, para com-
pletar a transferência de anticorpos que não foi possível pela via transplacentária.
No caso especial de animais, existe transferência de anticorpos pelo leite somente
nas primeiras horas após o parto.
Os trabalhos publicados pela Organização Mundial da Saúde sobre o assunto apre-
sentam as seguintes vantagens da lactância :
01. É a melhor alimentação para a criança;
02. Reduz a incidência de alergias;
03. Economia. Não se perde;
04. Anticorpos. Transmite imunidade contra infecções;
05. A criança não fica constipada e tem menos diarréia;
06. Temperatura sempre adequada e constante;
07. Leite sempre fresco, nunca coalha;
08. Vínculo emotivo;
09. Cômodo, uma vez aceito;
10. É digerido facilmente em duas a três horas;
11. Imediatamente disponível;
12. Nutritivamente balanceada;
13. Reduz as doenças diarréicas.
São raros os casos em que o uso do leite materno tem contra-indicação médica.
A lactância materna deve ser estimulada. Atualmente aumentam pressões sociais
para que isso não aconteça com as mães que trabalham. Recomenda-se que somente
na impossibilidade do uso do leite materno sejam ministrados substitutos.
Um estudo realizado em nosso país demonstrou que as crianças com idade de 0-2
meses que não foram alimentadas com leite materno tiveram 25 vezes mais possibilida-
des de morrer por doenças diarréicas comparadas àquelas alimentadas exclusivamente
com o leite da mãe. Ainda conclui-se que as crianças de seis meses a um ano de idade
que estavam sendo alimentadas com leite materno junto com alimentos para desmame e
outros leites, tiveram menos diarréia que aquelas em que a dieta não incluía o leite
materno.
Independentemente das vantagem do leite materno, soma-se incidência bem mais
elevada de câncer de mama em mulheres que não tiveram filho ou que não amamenta-
ram seus filhos.
Mortalidade infantil
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
175
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Introdução
As práticas sócio-culturais do uso de drogas são bastante antigas. O escritor britâni-
co Aldous Huxley chegou a afirmar que muito antes da aurora da civilização, nossos
antepassados já se intoxicavam com sedativos, euforiantes e alucinógenos de origem
natural. Sabe-se, há muito tempo, que os povos andinos fazem uso de folhas de cocaína,
os índios do sul dos Estados Unidos e do México utilizam a mescalina e os afegãos, o
cânhamo, uma espécie de maconha (Graeff, 1984).
São bastante antigas também as preocupações relativas ao estudo das ações huma-
nas, que ocuparam lugar de destaque no pensamento dos fundadores da filosofia ociden-
tal. Para Sócrates, Platão e Aristóteles, a ação harmoniosa, racional, associada com o
saber e com o bem, recebia o nome de virtude; identificada pela idéia da moderação e
evitação dos excessos, a ação virtuosa tinha como parâmetro para o julgamento do
cidadão da antiga Grécia suas conseqüências para a vida na “polis” (cidade-estado).
O sentido oposto ao da virtude foi caracterizado pela palavra vício, derivada do latim
“vitiu”, que significa inclinação para o mal ou defeito grave que torna uma pessoa ou
coisa inadequada para determinados fins ou funções. O termo vício, com o passar do
tempo, foi sendo utilizado para significar o abuso de drogas.
Segundo Foucault, a idéia de que alguém pudesse ser um viciado começou a ser
gestada na metade do século passado, sendo que até o século XIX a ingestão regular de
álcool, por exemplo, só era entendida como um problema social se chegasse a causar
algum transtorno à ordem pública, ou seja, a compreensão dos vícios era regida por um
viés exclusivamente moral e público e não como um problema instalado no indivíduo
(Guiddens,1993). Só no início do século XIX, com os trabalhos pioneiros de Thomas
Trotter e Magnus Huss, os transtornos causados pela evolução dos quadros de alcoolis-
mo começaram a ser associados à idéia de uma doença manifesta no indivíduo, a uma
compulsão do indivíduo em relação a um determinado objeto e às suas conseqüências
orgânicas e psíquicas (Galduroz e Andreatini, 1992).
Em um dos seus últimos escritos, “O mal-estar na civilização”, Freud se refere à vida
por volta de 1929 como árida, proporcionando aos viventes apenas sofrimentos, decep-
ções e tarefas impossíveis, contrariando profundamente o princípio de prazer que deve-
ria comandar a vida e o funcionamento do aparelho psíquico desde o seu início. Tão
grande é o massacre sobre o indivíduo no seu processo de iniciação à cultura dominante
que o princípio de prazer acaba por transformar-se em um “modesto princípio de realida-
de”.
Nestes escritos, as drogas são chamadas de substâncias tóxicas ou veículos
intoxicantes, e são caracterizadas como armas entre as mais rudes e eficazes usadas
pelos homens para evitar a dor e os sofrimentos e na busca de prazer. De forma extre-
176
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
177
SOERENSEN & BADINI MARULLI
saúde brasileira (SUS) causadas pelo uso indiscriminado de drogas dobraram entre 1993
e 1997 e os gastos com os pacientes triplicaram no mesmo período, incluindo problemas
com o uso abusivo de drogas ilícitas e com remédios estimulantes do SNC socialmente
aceitos, como os antidepressivos, emagrecedores, anorexígenos, etc.
Graeff (1984) define abuso de drogas como a auto-administração de uma droga que
desvia dos padrões sócio-culturais aceitos, uma vez que a maioria das sociedades huma-
nas admitem a auto-administração de certas drogas e rejeitam de outras, da mesma
forma como diferem entre as culturas as normas de conduta social. O uso abusivo de
drogas vem sendo denominado pela imprensa, por pesquisadores e também pelo público
leigo como “vício”. Apesar do viés moral impregnado neste conceito, alguns autores
modernos apontam o vício como uma forma não estável de comportamento que tende a
aumentar em sua importância, podendo mesmo resultar num processo no qual uma de-
pendência cada vez maior do comportamento viciado gera, além de um comprometi-
mento de todas as atividades sociais e produtivas, sentimento de pânico e autodestruição
em substituição às sensações outrora obtidas de bem-estar e êxtase.
O componente psicológico nas manifestações do comportamento viciado ficou co-
nhecido neste século como compulsão, uma forma de comportamento que um indivíduo
acha muito difícil ou impossível interromper pelo poder da vontade e cuja realização
produz a liberação de uma tensão. Para Giddens, os processos de compulsão geralmente
são precedidos de uma sensação de êxtase, uma sensação especial de libertação, triunfo
ou relaxamento. Uma vez estabelecido o padrão de comportamento, a sensação de êx-
tase provinda deste passará a funcionar como fator de compensação.
Mesmo considerando as implicações químicas, os vícios nos remetem necessaria-
mente a processos psicológicos, uma vez que os estados mórbidos de dependência po-
dem se manifestar não só por meio do uso abusivo de cocaína, mas por meio de outros
comportamentos, tais como apostar em corridas de cavalos ou apresentar compulsão
sexual, por exemplo.
Depoimentos de usuários sobre as situações nas quais recorrem ao uso da droga
permitem vislumbrar algum sentido para a droga em suas vivências: circunstâncias de
extrema ameaça externa ou angústia (a droga é utilizada como um “analgésico psíqui-
co”), situações sentidas como lhes exigindo algo acima de suas capacidades (a droga é
usada como um “fortificante, que funciona como injeção de poder e coragem) e na
criação de um momento grupal de prazer e divertimento (a droga é utilizada como um
substituto ou complemento do lazer).
Uma vez incorporado pela medicina, o vício foi definido como uma doença resultan-
te da interação entre um organismo e uma droga, concepção que segundo alguns autores
significou o início de uma compreensão que se instauraria como oposição à idéia mora-
lista do vício (Galduroz e Andreatini,1992). Se por um lado, o conceito de drogadicção (o
vício entendido como uma doença) facilita a aceitação do problema do paciente por
parte dos amigos e familiares, fortalecendo a convivência familiar e comunitária, por
outro, pressupõe uma atitude passiva do dependente, incentivando sentimentos de inse-
gurança em seus próprios recursos (Ancona-Lopez e Figueiredo,1990).
O conceito de farmacodependência surgiu em 1973 e, por recomendação da OMS,
passou a ser utilizado em substituição aos conceitos de toxicomania, vício, drogadicção,
etc. Estado psíquico e às vezes físico produzido pela interação entre um organismo vivo
178
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-IV –, publicado
pela Associação Americana de Psiquiatria, apresenta critérios diagnósticos para trans-
tornos relacionados a substâncias. A utilização do termo substância e não mais substân-
cia psicoativa objetiva não limitar a atenção às substâncias que têm como efeito principal
uma atividade de alteração cerebral (por exemplo, a cocaína), porque este conceito não
inclui substâncias químicas com propriedades de alteração cerebral (exemplo: solventes
orgânicos). E substância é preferível à droga (substância química, manufaturada), já que
os padrões de abuso podem estar associados ao consumo de substâncias que não se
destinam ao consumo humano (por exemplo, cola de avião ou de sapateiro). O abuso de
substância é mais comum quando o consumo é recente, embora alguns indivíduos pos-
sam continuar, por um longo tempo, sofrendo as conseqüências sociais adversas relaci-
onadas ao abuso da substância sem desenvolver evidências de dependência. A caracte-
rística essencial da dependência de substância é a presença de um agrupamento de
sintomas cognitivos, comportamentais e fisiológicos indicando que o indivíduo continua
utilizando uma substância, apesar de problemas significativos relacionados a ela.
O abuso de substância é diagnosticado como um padrão mal-adaptativo de uso de
substância levando a prejuízo ou sofrimento clinicamente significativo, manifestado por
três ou mais dos sintomas abaixo relacionados, ocorrendo a qualquer momento, no mes-
mo período de 12 meses:
(1) uso recorrente da substância resultando em um fracasso em cumprir obrigações
importantes relativas a seu papel no trabalho, na escola ou em casa (por ex., repetidas
ausências ou fraco desempenho ocupacional relacionados ao uso de substância; ausên-
cias, suspensões ou expulsões da escola relacionadas à substância; negligência dos fi-
lhos ou afazeres domésticos);
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
(2) uso recorrente da substância em situações nas quais isto representa perigo físico
(por ex., dirigir um veículo ou operar uma máquina quando prejudicado pelo uso da
substância);
(3) problemas legais recorrentes relacionados à substância (por ex., detenções por
conduta desordeira relacionada à substância);
(4) uso continuado da substância, apesar de problemas sociais ou interpessoais per-
sistentes ou recorrentes, causados ou exacerbados pelos efeitos da substância (por ex.,
discussões com o cônjuge acerca das conseqüências da intoxicação, lutas corporais).
O diagnóstico de dependência de substância pode ser aplicado a qualquer classe de
substâncias, exceto a cafeína. A dependência é definida como um padrão mal-adaptativo
de uso de substância que leva a prejuízo ou sofrimento clinicamente significativo, mani-
festado por três ou mais dos sintomas abaixo relacionados, que ocorram a qualquer
momento, no mesmo período de 12 meses:
1) Tolerância, que é definida por qualquer um dos seguintes aspectos:
(a) uma necessidade de quantidades progressivamente maiores da substância para
adquirir a intoxicação ou efeito desejado;
(b) acentuada redução do efeito com o uso continuado da mesma quantidade de
substância.
2) Abstinência, que se manifesta por qualquer dos seguintes aspectos:
(a) síndrome de abstinência característica da substância:
A - desenvolvimento de uma síndrome de abstinência específica da substância devi-
do à cessação (ou redução do uso pesado e prolongado da substância);
B - síndrome de abstinência específica da substância causa sofrimento ou prejuízo
clinicamente significativo no funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas im-
portantes da vida do indivíduo;
C - os sintomas não se devem a uma condição médica geral, nem são mais bem
explicados por outro transtorno mental.
(b) A mesma substância (ou substância estreitamente relacionada) é consumida para
aliviar ou evitar sintomas de abstinência.
3) A substância é freqüentemente consumida em maiores quantidade ou por um
período mais longo que o pretendido.
4) Existe um desejo persistente ou esforços malsucedidos no sentido de reduzir ou
controlar o uso da substância.
5) Muito tempo é gasto em atividades necessárias para a obtenção da substância
(por ex., consultas a múltiplos médicos ou longas viagens de automóvel), na utilização da
substância ou na recuperação de seus efeitos.
6) Importantes atividades sociais, ocupacionais ou recreativas são abandonadas ou
reduzidas em função do uso da substância.
7) O uso da substância continua, apesar da consciência de ter um problema físico ou
psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado pela subs-
tância.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
1. Álcool
O etanol, ou álcool etílico, é a forma de álcool que se pode beber, que confere os
efeitos prazerosos mais significativos às bebidas alcoólicas.
O álcool promove alterações no humor, comprometimento crescente da crítica, com
conseqüente diminuição das inibições comportamentais, prejuízo da capacidade motora,
distúrbios da fala e diminuição dos reflexos. A ingestão de altas doses pode provocar
graves distúrbios orgânicos, paralisia respiratória e indução de um estado de coma. O
uso crônico de álcool pode provocar distúrbios gastrointestinais, cardiovasculares, neu-
rológicos e psiquiátricos.
O uso contínuo e progressivo de bebidas alcoólicas, passando das fermentadas (vi-
nho, cerveja) para as destiladas (pinga, vodca, uísque), é capaz de promover no indivíduo
um aumento de tolerância aos efeitos químicos do álcool, ou seja, o indivíduo vai neces-
sitar beber uma quantidade cada vez maior de bebida para obter o efeito químico dese-
jado.
Depois de instalado o quadro de dependência física e psíquica, o alcoolista precisa
recorrer constantemente à ingestão de doses de bebidas alcoólicas durante o dia como
forma de manter um nível de álcool em seu organismo, evitando durante um certo perí-
odo os desconforto dos sintomas de abstinência.
Neste estágio, as perdas da vida social do alcoolista já se fazem sentir: o relaciona-
mento familiar e profissional e sua saúde física e mental começam a apresentar as
seqüelas da evolução do quadro. Do ponto de vista clínico a situação limite para o depen-
dente de álcool é conhecida como “delirium tremens”, uma síndrome de abstinência na
qual o usuário é acometido por alucinações visuais e auditivas e disfunções cardíacas
que, sem atenção médica adequada, pode levar o indivíduo à morte.
2. Anfetaminas
As anfetaminas clássicas, metanfetamina, dextroanfetamina e metilfenidrato apre-
sentam seus principais efeitos no sistema dopaminérgico. As anfetaminas também são
chamadas de simpatomiméticos, estimulantes ou psicoestimulantes.
As anfetaminas causam a liberação de catecolaminas (dopamina e noradrenalina) e
de serotonina. Entre seus efeitos destacam-se a diminuição do sono, sensação de estar
bem disposto, estado de ânimo elevado e aumento de atividade motora, quando usadas
em baixas quantidades. Com o aumento da quantidade ingerida, as anfetaminas, indutoras
de estado de dependência, geram, nos estados de abstinência, letargia, depressão, com-
portamento agressivo, etc.
Segundo o DSM-IV, o sulfato racêmico de anfetamina (benzedrine) foi sintetizado
pela primeira vez em 1887 e introduzido na prática clínica em 1932, como um inalante
vendido sem prescrição para o tratamento de congestão nasal e asma. Em 1937, compri-
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
3. Cafeína
A cafeína é mais freqüentemente encontrada na forma de café ou chá e é a substân-
cia psicoativa mais amplamente utilizada nos países ocidentais. O DSM-IV prevê os
diagnósticos de intoxicação com cafeína, transtorno de ansiedade induzido por cafeína e
transtorno de sono induzido por cafeína; não apresenta categorias diagnósticas para
abuso, dependência ou abstinência de cafeína, apesar de diversos estudos relatarem
dados consistentes como a presença de dependência física e fenômenos de abstinência
relacionados à cafeína.
Presente em uma variedade de bebidas, alimentos e medicamentos (vendidos com ou
sem prescrição médica), é possível encontrar cafeína em quantidades significativas no
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
4. Canabinóides
Cannabis é o nome abreviado para Cannabis sativa, planta que contém canabinóides
psicoativos, dentre os quais o tetrahidrocanabinol (THC) é o mais abundante. Chamada
habitualmente de maconha, erva ou marijuana, é possível encontrar também outras no-
menclaturas descrevendo formas de variadas potências: hemp, chasra, bhang, ganja,
dagga, sensemilla, haxixe.
Os efeitos imediatos do uso da maconha são a vasodilatação do vasos sanguíneos
das conjuntivas (daí os olhos vermelhos) e a taquicardia. Verifica-se ainda um sentimen-
to de euforia, risos despropositados, gracejos, zombaria, liberação sexual, secura na boca
e aumento do apetite (vulgarmente denominado “larica”). O uso continuado pode levar à
fadiga extrema, isolamento, eventos alucinatórios de caráter persecutório e distorção da
noção de tempo e espaço. Seu uso crônico pode levar a doenças respiratórias crônicas
e câncer pulmonar, em função da inalação dos mesmos hidrocarbonos carcinogênicos
presentes no tabaco.
O uso repetido em grandes quantidades de maconha induz à tolerância, mas sem
grande capacidade de provocar estados agudos de abstinência. Os sintomas de absti-
nência, com uma interrupção súbita, limitam-se a um ligeiro aumento da irritabilidade,
inquietação, insônia, anorexia e leve náusea.
Os potenciais efeitos medicinais da Cannabis como analgésico, anticonvulsivante e
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
hipnótico foram reconhecidos no séc. XIX e início deste século. Recentemente, a cannabis
e seu principal componente ativo (THC) têm sido utilizados com sucesso no tratamento
de náusea secundária às drogas, no tratamento do câncer e para estimular o apetite em
pacientes com AIDS, além disso sua utilização no tratamento de glaucoma tem sido
proposta, devido à redução da pressão intra-ocular.
Alguns estudos constatam (ainda sem confirmações conclusivas) que o uso prolon-
gado de maconha pode alterar as concentrações de testosterona (reduzir a produção de
espermatozóides), desregular o ciclo menstrual e aumentar a suscetibilidade a convul-
sões.
5. Cocaína
A cocaína é um dos vários alcalóides extraídos das folhas de coca, planta cultivada e
usada pelos índios do Peru há mais de 1000 anos. Era uma erva considerada sagrada
pelos Incas e seu uso era restrito a cerimônias religiosas e sacrifícios.
Lima (1996) apresenta alguns dados curiosos sobre o histórico do uso da cocaína na
América. Em 1884, a cocaína pura já estava disponível para comercialização e um ano
após já era vendida pelo laboratório Parke-Davis em quinze formas diferentes, incluindo
cigarros, injetável e para ser inalada. O produto era anunciado pela empresa como algo
que “substitui a comida, torna o fraco corajoso, o silencioso loquaz e torna a dor suportá-
vel”. Outras companhias comercializavam kits sofisticados de cocaína que incluíam até
seringas hipodérmicas. Um extrato de folhas de coca foi produzido e tornou-se um su-
cesso imediato, a ponto de seu criador ser condecorado com uma medalha pelo Papa
Leão XII, um reconhecido adepto da bebida. Sua publicidade apregoava que o “Vinho de
Coca Mariani liberta o corpo do cansaço, elevando o espírito, criando uma sensação de
bem-estar”.
Os efeitos da cocaína são semelhantes à maioria dos estimulantes, vasoconstrição
periférica e taquicardia, aumento da capacidade física, excitação, redução do sono e de
apetite. Observam-se, ainda, estado de alerta, euforia, hiperatividade, irritabilidade,
agressividade, agitação e impotência. O uso crônico induz à dependência e o aumento
das quantidades consumidas pode acarretar o aparecimento de um estado psicótico que
se caracteriza por tendências paranóides, comportamentos excêntricos e incontroláveis.
A reação tóxica ou overdose pode provocar convulsões, alucinações táteis e visuais,
falência cárdio-respiratória e grande risco de morte.
O “crack” é resultado de um processo no qual a cocaína não refinada, em forma de
pó (cloridrato de cocaína) ou pasta, se volatiza ao ser adicionada ao bicarbonato de sódio
e aquecida, se transformando em pedra. O seu nome se origina do som característico da
cocaína sendo “fritada”. Quando fumado, a absorção pelos alvéolos pulmonares aumen-
ta em cerca de 200 vezes o poder da droga, se comparada à cocaína inalada. Os efeitos
da droga são sentidos num intervalo entre 10 a 20 segundos e sua duração é de no
máximo 5 a 10 minutos, favorecendo a instalação rápida da compulsão da droga. O
tempo de ação desta forma de administração da cocaína é bem semelhante ao da coca-
ína consumida pela via intravenosa (“baque” ou “pelos canos”).
Araújo Lima (1997) apresenta alguns dados sobre a evolução do uso do crack. Em
maio de 1985, o New York Times publicou seu primeiro artigo sobre o crack, “uma
simples e barata forma de cocaína fumada”, uma droga altamente potente que começa-
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
6. Alucinógenos
Os alucinógenos também são chamados de psicodélicos ou psicomiméticos, porque,
além de induzirem alucinações, causam perda do contato com a realidade e uma expan-
são ou elevação da consciência. Não possuem uso médico e apresentam alto potencial
de abuso. São encontrados vários alucinógenos na natureza, sendo os mais conhecidos a
psilocibina (de alguns cogumelos) e a mescalina (do cacto peiote). Há mais de 100
alucinógenos sintéticos e naturais usados atualmente. O alucinógeno sintético clássico é
a dietilmanina do ácido lisérgico (LSD).
O LSD foi sintetizado em 1938, por Albert Hoffman, que vivenciou o primeiro episó-
dio alucinógeno induzido pela droga. O LSD pode ser discutido como protótipo geral dos
alucinógenos e seus principais efeitos são sobre os sistema de recepção da serotonina.
A tolerância para o LSD desenvolve-se rapidamente (em 3 ou 4 dias de uso contí-
nuo), mas também é rapidamente revertida (em 4 a 6 dias). Não existe uma dependência
física de alucinógenos nem sintomas de abstinência, mas pode-se desenvolver uma de-
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
7. Inalantes ou Solventes
Os inalantes são substâncias que contêm hidrocarbonetos que volatizam facilmente
e, quando aspirados, são rapidamente absorvidos pelos pulmões e enviados ao cérebro,
atuando de forma bastante similar ao álcool. Tem efeitos farmacodinâmicos específicos
que não são bem compreendidos, exercem ação depressora sobre o SNC e potencializam
os efeitos de outros depressores como o álcool, barbitúricos e benzodiazepínicos.
Essas substâncias são comercializadas por meio de produtos para os mais diferentes
usos: combustíveis, solventes de tintas, removedores de manchas, etc., podendo-se citar
como exemplos dessas substâncias a acetona, água-raz, benzina, cola de sapateiro, cola
de aviões, fluidos de isqueiros, éter, gasolina, lança-perfume, tiner, tintas em spray, etc.
Os inalantes, em pequenas doses, atuam como desinibidores, e provocam sensações
de euforia, excitação e sensações agradáveis de estar flutuando. Altas doses provocam
medo, ilusões sensoriais, alucinações visuais e auditivas e distorções do tamanho corpo-
ral. Os sintomas neurológicos podem incluir fala arrastada, velocidade diminuída da fala
e ataxia. O uso prolongado pode estar associado a irritabilidade, instabilidade emocional
e comprometimento de memória.
A síndrome de abstinência não é freqüente, mas caracteriza-se por perturbações do
sono, irritabilidade, inquietação, sudorese, náusea, vômito, taquicardia e, ocasionalmente,
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
8. Nicotina
O tabagismo, comportamento bastante valorizado até o final da primeira metade des-
te século, passou a sofrer um intenso combate com restrições, tanto em relação aos
pontos de comercialização quanto ao uso nos locais públicos.
O componente psicoativo do tabaco é a nicotina que tem efeitos sobre o sistema
nervoso central, agindo sobre os receptores de acetilcolina. Embora seja classificada
como um psicostimulante suave, a nicotina pode desencadear quadros bastante severos
de dependência em fumantes inveterados e a falta de nicotina no organismo desenca-
deia uma síndrome de abstinência, com sintomas tais como, tremores nas mãos, irritação,
ansiedade, depressão, etc.
Os efeitos comportamentais da nicotina são uma melhor atenção, aprendizagem e
capacidade para solução de problemas. Usuários relatam melhora do humor, diminuição
da tensão e de sentimentos depressivos. Contrastando com os efeitos estimulantes sobre
o SNC, a nicotina atua como um relaxante dos músculos esqueléticos.
Os sintomas de intoxicação em doses baixas incluem náusea, vômito, salivação, pali-
dez (vasoconstrição periférica), diarréia, tontura, cefaléia, aumento da pressão sanguí-
nea, taquicardia, tremores e suores frios. Doses de 60 mg em adulto são fatais.
As contra-indicações ao consumo contínuo e progressivo do cigarro são muitas, como
o desenvolvimento de bronquite crônica que pode levar ao enfisema e outras disfunções
respiratórias graves. O uso crônico de cigarros pode levar o seu usuário a desenvolver
insuficiência cardíaca e a acidentes vasculares coronarianos.
Além da nicotina, a combustão do cigarro libera outras substâncias, igualmente noci-
vas ao organismo humano, como o alcatrão. Inúmeras pesquisas apontam uma clara
correlação epidemiológica entre a freqüência do uso do cigarro e o aumento dos casos
de câncer pulmonar. Além disso, verificaram que a fumaça do cigarro inalada por outras
pessoas é tão nociva (ou mais) do que para o próprio fumante.
A adoção de políticas que disciplinem e previnam tanto o uso de cigarros quanto o do
álcool são de difícil execução em virtude dos fatores psíquicos e sociais que encorajam
o seu uso em alguns contextos, além dos interesses econômicos dos fabricantes da
ordem de alguns bilhões de dólares.
9. Opióides
Opiáceo e opióide são termos que têm origem na palavra ópio. Extraído do suco da
papoula, uma planta cultivada na Ásia, o ópio teve o seu principal alcalóide isolado em
1803 pelo farmacêutico alemão Sertürner, que o denominou morfina devido a Morfeu,
deus do sono.
Os opiáceos abrangem qualquer preparo ou derivado do ópio, como o próprio ópio, a
morfina, a heroína e a codeína. Os opióides referem-se aos narcóticos sintéticos de ação
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Tratamento e prevenção
Silveira (1995) apresenta diversas abordagens terapêuticas utilizadas no tratamento
de dependências: a manutenção da abstinência (ex.: Alcoólicos Anônimos, Narcóticos
Anônimos, etc.); a substituição de uma dependência ilícita por outra similar, porém sob
controle do médico (ex.: substituição do uso de heroína por metadona); o controle
medicamentoso da sintomatologia associada às dependências (modelo psiquiátrico tradi-
cional, com utilização de benzodiazepínicos); a adequação de indivíduos que apresentam
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Considerações finais
Os problemas decorrentes do uso abusivo de drogas se configuram como um proble-
ma de Saúde Pública com desdobramentos em todas as áreas da vida da população e
demandam um esforço de toda a sociedade civil para sua superação. O enfrentamento
desses problemas passa por um debate com toda a população sobre políticas de saúde,
de prevenção e da transformação da realidade social brasileira.
É extremamente necessária a revisão de todas as políticas adotadas até agora na
medida em que o agravamento das questões de saúde pública relacionadas ao consumo
de cigarro e de álcool, e a violência que circunda o uso de consumo de drogas ilícitas
com o assassinato diário de jovens, crianças e adolescentes, nos dão mostras de que o
atual tratamento dispensado ao problema é extremamente inadequado.
Não existem soluções prontas, mas experiências bem-sucedidas em todo o mundo
nos indicam que não há combate bem-sucedido ao uso abusivo de drogas (sejam lícitas
ou ilícitas) sem o combate à miséria, às desigualdades sociais, e sem que se consiga a
melhoria da condições de vida de toda a população.
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Introdução
A saúde mental não pode ser compreendida descontextualizada da saúde num senti-
do mais amplo. Saúde, hoje, não é mais concebida como ausência de doença, mas como
uma complexa inter-relação de fatores que dizem respeito à relação do homem com o
seu meio social. O binômio saúde-doença, por sua vez, não pode ser compreendido
isolado do contexto sócio-histórico-cultural; os aspectos sociais devem ser considerados
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acorda muitas vezes durante a noite para fumar, deixa de viajar de avião para não ter
que ficar sem o cigarro e perde compromissos.
A dependência de nicotina é o transtorno mental mais freqüente, atingindo 25% das
pessoas, seguido pela desordem afetiva, 18,4% e depressão, 18 %. A ansiedade 12,5%,
as fobias, 8,4% (conforme quadro abaixo). A pesquisadora afirma que os dados da
pesquisa demonstram os principais sintomas dos habitantes dos grandes centros urba-
nos, onde o tempo para o lazer é reduzido, e que pesquisas anteriores feitas em grandes
cidades de outros países chegaram a resultados muito parecidos.
TranstornosFreqüência ...................................... (%)
Dependência de Nicotina .......................................... 25
Desordem Afetiva .................................................. 18,4
Depressão e Depressão Crônica ............................... 18
Ansiedade ............................................................... 12,5
Fobias ........................................................................ 8,4
Dependência de Álcool ............................................ 5,5
Fobia Social ............................................................... 3,5
Síndrome do Pânico .................................................. 1,6
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
poderia simular os sintomas para conseguir uma pensão ou evitar a prisão. A presença
de sintomas factícios não exclui a coexistência de sintomas somáticos ou psicológicos
verdadeiros.
Os transtornos dissociativos caracterizam-se essencialmente por uma perturba-
ção nas funções habitualmente integradas de consciência, memória, identidade ou per-
cepção do ambiente. O distúrbio pode ser súbito ou gradual, transitório ou crônico, esta
categoria compreende os seguintes transtornos: amnésia dissociativa, fuga dissociativa,
transtorno dissociativo de identidade, transtorno de despersonalização.
Os transtornos sexuais e da identidade de gênero agrupam três categorias: as
disfunções sexuais, caracterizadas por uma perturbação no desejo sexual e nas altera-
ções psicofisiológicas que caracterizam o ciclo de resposta sexual (excitação, orgasmo e
resolução), causando sofrimento acentuado e dificuldade interpessoal (ex.: aversão se-
xual, ejaculação precoce, disfunção erétil, vaginismo, etc.); parafilias, caracterizadas
por anseios, fantasias ou comportamentos sexuais recorrentes e intensos que envolvem
objetos (fetichismo), sofrimento ou humilhação (masoquismo), crianças com 13 anos
ou menos (pedofilia), pessoas sem o seu consentimento (frotteurismo), entre outros; e
os transtornos da identidade de gênero, apresentando forte e persistente identifica-
ção com o gênero oposto e desconforto com o próprio sexo, ou sensação de inadequação
no papel de gênero deste sexo. As situações incomuns causam sofrimento ou prejuízo
em alguma área importante da vida do indivíduo.
Os transtornos alimentares caracterizam-se por severas perturbações no com-
portamento alimentar como a anorexia nervosa (recusa em manter o peso corporal em
uma faixa normal mínima), a bulimia nervosa (episódios repetidos de compulsões ali-
mentares seguidos de compensações como vômitos auto-induzidos ou uso de laxantes,
ou outros medicamentos, jejuns e exercícios excessivos), e transtorno alimentar sem
especificação.
Os transtornos do sono são agrupados em quatro sessões principais, de acordo
com a suposta etiologia. Os transtornos primários do sono decorrem de anormalida-
des endógenas nos mecanismos de geração ou nos horários de sono/vigília. Quando o
transtorno do sono está relacionado a outro transtorno mental (por ex., transtor-
no de humor ou transtorno de ansiedade), é necessária uma atenção clínica independen-
te. O transtorno de sono devido a uma condição médica envolve efeitos fisiológicos
diretos de uma condição médica geral sobre o sistema de sono/vigília. O transtorno de
sono induzido por substância envolve o uso atual ou descontinuação recente do uso
de uma substância.
Há transtornos do controle dos impulsos não classificados em outro local. A
característica essencial dos transtornos do controle dos impulsos é o fracasso em resistir
a um impulso ou tentação de executar um ato perigoso para a própria pessoa ou para
outros. Nesta categoria agrupam-se alguns transtornos tais como a cleptomania (impul-
so incontrolável para o furto), a piromania (impulso incontrolável de atear fogo) e a
tricotilomania (puxar de forma recorrente os próprios cabelos).
Os transtornos da personalidade podem ser definidos como um padrão persisten-
te e relativamente estável ao longo do tempo num modo de pensar, sentir ou se compor-
tar, que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo, que é invasivo
e inflexível. Tem seu início na adolescência ou começo da idade adulta, é estável ao
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico e prognóstico
Talvez essas categorias diagnósticas tenham sugerido (ou descrito) características
próprias ou de pessoas próximas (parentes, amigos). Isso é possível uma vez que elas
abordam reações humanas, anseios, desejos e medos. Mas uma característica só atinge
o nível de transtorno quando “promove um sofrimento clinicamente significativo”, isto é
quando incomoda a pessoa, promove perdas nas suas relações afetivas, financeiras, ou
de trabalho, quando a pessoa passa a se esquivar (evitar determinadas situações) em
função dela. Assim, de maneira nenhuma o indivíduo é capaz de fazer um “auto-diag-
nóstico”. O diagnóstico de um transtorno mental precisa satisfazer critérios que não
foram aqui descritos. Apenas um profissional de saúde mental treinado (psicólogo, psi-
quiatra) pode realizar um diagnóstico com segurança, definindo inclusive o tipo de inter-
venção necessária.
O diagnóstico tem um papel fundamental no modelo médico, fornece uma descrição
dos sintomas que permite indicar a estratégia de intervenção (tratamento mais adequado
para cada quadro) e estabelecer o prognóstico (prever o desenvolvimento da enfermida-
de). Saraceno (1997) questiona a importância atribuída ao diagnóstico em saúde mental
e chama a atenção para as suas limitações no sentido de definir o prognóstico, destacan-
do outras variáveis que interferem no tratamento e que seriam capazes de explicar
diferentes evoluções e resultados a partir de um mesmo diagnóstico:
histórico da enfermidade, agudez ou cronicidade do quadro;
recursos ou características individuais do paciente: (nível intelectual e grau
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
um fenômeno que tem ocupado muitos pesquisadores da área da saúde. São práticas
que propõem autoconhecimento, desenvolvimento da consciência e desbloqueio emoci-
onal, utilizando técnicas que não têm comprovação científica ou se baseiam em “crenças
cosmológicas” (concepções de morte, vida e destino), não passíveis de avaliação cientí-
fica. Incluem-se sob esta denominação genérica conjuntos heterogêneos de atividades:
técnicas advinhatórias e de descrição de personalidade, como tarô e astrologia; técnicas
de medicina alternativa, como florais, e esotéricas, como harmonização energética, an-
jos e gnomos (Tourinho e Carvalho Neto, 1995). A procura por tais práticas para trata-
mento de problemas de saúde denuncia a dificuldade de acesso aos serviços de saúde,
como também de adesão aos tratamentos propostos que, com freqüência, não conside-
ram o sujeito como um todo, nem as especificidades de seu contexto sócio-cultural.
Cientistas sociais entendem a proliferação das práticas alternativas como uma reação à
opressão do humano pela objetividade social e ao afastamento da psicologia de questões
como mito, religião e misticismo que não importantes no desenvolvimento humano e
precisam ser melhor compreendidas (Ciampa, 1998).
Considerações finais:
A classificação dos problemas de saúde mental proposta pelo DSM-IV, bem como o
modelo médico, apesar de hegemônicos, não são a única possibilidade de compreensão
do sofrimento humano. As críticas mais persistentes à lógica proposta por este modelo
dizem respeito a uma excessiva objetivação dos sintomas por meio de categorias
nosológicas que acabam por perder de vista tanto o fator humano, como também as
determinações econômicas, políticas e sociais presentes no cotidiano da pessoas que
demandam atenção para os seus agravos de saúde.
Uma outra possibilidade para a compreensão do sofrimento mental é a proposta pelo
modelo psicossocial que busca encontrar o sujeito concreto no entrecruzamento das
suas experiências de vida com as determinações do contexto social. Os adeptos deste
modelo acreditam ser possível obter uma compreensão rigorosa do binômio saúde-doen-
ça sem negar a singularidade da experiência do sujeito, bem como as determinações da
realidade concreta.
Altos índices de sofrimento mental denunciados por surtos epidêmicos de pessoas
acometidas por depressão, stress, síndrome do pânico, uso abusivo de drogas, etc. são
resultantes das formas de organização social que negam, à imensa maioria da população
brasileira, as condições básicas para a garantia de uma existência digna.
Não se quer afirmar aqui que todo o sofrimento psíquico advém das adversidades e
desigualdades sociais, e muito menos que eles se extinguiriam quando as referidas desi-
gualdades fossem superadas. A falta e a incompletude são as marcas constitucionais do
ser humano e, mesmo em condições sociais bastante favoráveis, as insatisfações pesso-
ais não vão deixar de produzir algum sofrimento psíquico.
O que podemos afirmar é que um contexto favorável ao desenvolvimento humano
oferece às pessoas formas e meios mais adequados para a expressão de suas insatis-
fações, angústias, frustrações, etc. Os serviços de saúde mental alternativos ao mode-
lo psiquiátrico (núcleos de atenção psicossocial, centros de convivência, lares abriga-
dos, etc.) funcionam como um espaço bastante importante para aqueles que deman-
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Compreende-se por trauma ou traumatismo toda lesão produzida por agente externo
que provoca dano tecidual no organismo. Nos indivíduos abaixo dos 40 anos, o trauma
representa a principal causa de óbito ou invalidez, consistindo em sério problema de
saúde pública. Em estimativa realizada no Brasil em 1998 pelo serviço de cirurgia do
trauma do Professor Dario Birolini da Universidade de São Paulo, ficou constatado que
cerca de 125 mil indivíduos morrem por ano devido ao trauma. Neste estudo, verificou-
se também que sobrevivem aproximadamente 200 mil com seqüelas permanentes. Em
relação à etiologia, observaram uma maior prevalência dos agentes penetrantes, em
relação aos acidentes com veículos. Finalizando, os pesquisadores relataram que o go-
verno gastou uma quantia aproximada de 1 bilhão de dólares para atender, ainda que
precariamente, a todo este contingente. Em que pesem a prevenção e a elaboração de
leis mais rígidas numa tentativa de controlar sua progressão, o número de pacientes com
trauma vem aumentando ao longo do tempo pelo desenvolvimento tecnológico, o aumen-
to populacional e a maior oferta de equipamentos que desprendem grande quantidade de
energia.
Indubitavelmente os traumatismos faciais são aqueles que mais preocupam o pacien-
te, embora outras lesões corporais também sejam de importância.
A face pode ser dividida didaticamente em três regiões. O terço superior compreende as
órbitas e seu conteúdo que executam a função visual. No terço médio, situam-se a maxila, o
nariz e o pavilhão auricular e na porção inferior, a mandíbula. Juntos estes elementos perfa-
zem as funções auditivas, respiratórias e de alimentação. Por ser a principal região que o
indivíduo utiliza para se relacionar com o meio ambiente e seus semelhantes, os traumatismos
e desfigurações que ocorrem na face têm um impacto sócio-econômico mais acentuado
que em outras regiões do corpo humano.
A transformação de energia cinética em energia de deformação aplicada à face
produz lesões que são dependentes da direção e do tempo de aplicação. Renê Le Fort
foi um dos primeiros a estudar sistematicamente a relação entre quantidade de energia,
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
direção, duração do impacto com suas conseqüências sobre a face, num trabalho publi-
cado em 1901. Seus estudos iniciais levavam em conta impactos de energia relativamen-
te baixa, que produziam fraturas clássicas na região que se tornaram conhecidas com os
nomes de Le Fort I, Le Fort II e Le Fort III. Todavia estas relações deixaram de ser
encontradas nos dias de hoje porque as máquinas mais recentes, oriundas do avanço
tecnológico, manipulam grandes quantidades de energia, produzindo fraturas complexas
no esqueleto craniofacial.
Os principais agentes encontrados nos traumatismos faciais são:
a) Acidentes com veículos automotores em geral;
b) Agressão;
c) Acidentes domésticos e ligados ao lazer.
Outras causas como fraturas patológicas, armas de fogo, arma branca e acidentes de
trabalho são particulares de uma região.
As conseqüências dos traumatismos faciais demandam uma considerável quantia de
recursos dos órgãos oficiais e empresas seguradoras. Dependendo da gravidade do
traumatismo, o indivíduo sofrerá uma perda que pode ser de natureza estética, funcional,
ou ambas, mobilizando um número grande de profissionais na tentativa de restituir as
perdas. Entre as especialidades médicas mais solicitadas encontram-se a neurologia,
cirurgia plástica, oftalmologia, microcirurgia. Outras especialidades são a ortodontia, ci-
rurgia bucomaxilar, fonoaudiologia, fisioterapia e psicologia. Dependendo da gravidade,
os tratamentos são prolongados e os períodos de convalescência arrastam-se por anos,
com a realização de várias cirurgias.
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foram abordados. Por isso, foi feita uma revisão, aprovada em 8 de julho de 1998, que
ampliava os conceitos e normatizava o atendimento pré-hospitalar, inclusive descreven-
do os profissionais, os tipos de viatura e os materiais necessários para esse serviço.
Ainda falta regulamentar os cursos para os profissionais que fazem atendimento pré-
hospitalar, pois por todo o país há diferenças na carga horária, teórico–prática. Com
relação ao profissional médico, as técnicas e os procedimentos necessários para o A.P.H.
não fazem parte do currículo das Escolas Médicas, com exceção de uma experiência
pioneira da Universidade Federal de São Paulo que introduziu em 1998, como parte da
grade curricular, o ensino de Atendimento Pré-Hospitalar. Para quem trabalha com aten-
dimento pré-hospitalar é fácil afirmar que se trata de uma nova especialização médica.
Como em todos os lugares do mundo, em São Paulo a situação não foi diferente.
Médicos e profissionais de vários pronto-socorros, preocupados com a forma como pes-
soas vítimas de acidentes chegavam aos hospitais com o Corpo de Bombeiros, que en-
contrava uma dificuldade enorme porque, após liberar as pessoas do que as prendia no
local do acidente, não tinha como atendê-las e muito menos como transportá-las, acarre-
tando esse fato alta mortalidade e morbidade, criaram em 1979 o “Projeto Vaga Zero”
para gerenciar o atendimento das emergências como um todo e posteriormente, em
1983, a chamada “Comissão de Recursos Assistenciais de Pronto Socorro – CRAPS”.
Desse envolvimento de vários órgãos e da necessidade da busca de conhecimento e
aprimoramento do atendimento às emergências, criou-se uma associação chamada “Com-
panheiros das Américas” para o intercâmbio entre Estados Unidos e Brasil. Essa associ-
ação é composta por quatro oficiais do Corpo de Bombeiros, um membro da Defesa Civil
e três médicos que foram a Chicago em 1986 para realizar um Curso de Técnicas em
Emergências Médicas. No regresso, os oficiais apresentaram um relatório ao Comandan-
te Geral da Corporação, no qual propunham a reformulação dos conceitos e da instrução
de primeiros socorros bem como a criação de um serviço específico com viaturas, equipa-
mentos e pessoal, específicos para o atendimento e transporte das vítimas. Disso surgiu o
Projeto Resgate em 1987 e, posteriormente, em 10 de março de 1994, após sete anos de
atendimento, consolidado pelo decreto, o Sistema Integrado de Atendimento às Emergên-
cias do Estado de São Paulo – SISTEMA RESGATE – convênio entre Secretaria de
Segurança Pública, representada pelo Corpo de Bombeiros, e Secretaria do Estado da
Saúde.
Paralelamente a isso, médicos da Cirurgia Geral e do Trauma do Hospital das Clíni-
cas de São Paulo, que iniciaram o processo de estudos em 1979, foram para os Estados
Unidos fazer o curso do A.T.L.S. (Advanced Trauma Life Support) e trouxeram para
o Brasil em 1987 para sua difusão. Hoje já contamos também com o P.H.T.L.S. (Pre
Hospital Trauma Life Support) e o A.C.L.S. (Advanced Cardiac Life Support) entre
outros, como o pediátrico e alguns mais básicos para profissionais não médicos.
Todo esse esforço representa uma redução na taxa de mortalidade de 30% das víti-
mas atendidas pelo Sistema Resgate, embora o número de ocorrências tenha aumenta-
do.
O Serviço iniciou no começo do ano de 1990 com atuação na Grande São Paulo e em
mais de 14 municípios do Estado, utilizando-se 36 Unidades de Resgate, duas Unidades
de Suporte Avançado e um Helicóptero para atendimento de 1.896 ocorrências.
Atualmente, no ano de 1998, existem 237 Unidades de Resgate, sendo 37 na capital,
duas Unidades de Suporte Avançado, helicóptero e cerca de 4.000 técnicos em Emergên-
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das mortes súbitas devidas a uma coronariopatia acontecem fora do hospital e é possível
que um grande número dessas mortes pudesse ser evitado pelo acesso rápido ao serviço
médico de emergência e ao desfibrilador, uma vez que cerca de 90% das paradas cardí-
acas acontecem em fibrilação ventricular.
O traumatismo é a maior causa de óbito e de seqüelas comprometendo desde a popula-
ção pediátrica até a adulta jovem (1-44 anos). A faixa etária mais afetada é a de 15-35 anos,
constituindo-se o trauma na primeira causa de óbito desta faixa. O trauma atinge, portanto,
população economicamente ativa que, se não morre, fica seqüelada, deixando de produzir e
aumentando os gastos devido ao tratamento das seqüelas.
Segundo o Departamento Nacional de Trânsito, em 1997 30.430 pessoas morreram e
268.925 ficaram feridas no País por acidentes de trânsito. Na fixa etária de 15-35 anos,
situam-se 13.892 mortes e 126.931 feridos.
Registram-se em média um acidente a cada 2,6 minutos, uma pessoa ferida a cada
11,7 minutos e uma pessoa morta a cada 4,3 horas (7).
Além da perda de vidas e gastos com a saúde, que no ano de 1997 foram de U$ 300
milhões, há danos materiais (U$ 400 milhões) e perdas de produção (U$ 800 milhões)
para o país, que é um dos líderes mundiais da mortalidade no trânsito (o índice de fatali-
dade do Brasil supera a marca dos 10 – número de mortos em acidentes para cada
conjunto de 10.000 veículos).
Tanto nas emergências clínicas quanto nas traumáticas, a primeira ação ainda é a
prevenção, para minimizar os fatores de risco e melhorar a qualidade de vida e seguran-
ça das pessoas.
Grande parte dos acidentes está relacionada ao consumo de álcool (8), ao não-uso ou
uso inadequado dos dispositivos de segurança e à desobediência, principalmente em
relação ao limite de velocidade.
A educação da população é fundamental para prevenir e evitar as emergências e,
quando elas acontecem, é importante também que a população saiba o que fazer, isto é,
acionar o Sistema Médico de Emergências e iniciar o Suporte Básico à vida, mantendo as
condições até que o serviço de atendimento pré-hospitalar chegue.
Nos moldes nacionais atuais, enfoca-se o atendimento às emergências e, pratica-
mente, muito pouco o atendimento às urgências médicas. Por quê? As emergências
médicas são os agravos à saúde que põem em risco a vida do paciente e necessitam ser
atendidas em minutos. Nos casos de trauma, estudiosos dão valores aos minutos; por
exemplo, os dez minutos que se seguem a um trauma são chamados minutos de platina
e a primeira hora, hora de ouro. As urgências não necessitam ser atendidas em minutos;
por exemplo, um paciente com cólica renal que não melhora com medicação via oral de
uso de costume, necessita de medicação endovenosa; “ – Esse paciente irá morrer?
Claro que não, mas necessita de atendimento médico? – Sim.” Provavelmente este
paciente terá que contar com o apoio de vizinhos, amigos ou solicitar um táxi, pois o
serviço público nas proporções em que se encontra não dá conta das emergências clíni-
cas, quanto mais das urgências, sem contar os casos psiquiátricos que são um outro
problema.
Por esse motivo estão crescendo os serviços privados de atendimento pré-hospitalar
que proporcionam atendimento de emergência, urgência e, em alguns casos, até de con-
sulta. Não são iguais aos argentinos que vendem o plano individual; a maioria, aqui no
Brasil, está ligado a um convênio médico ou seguro saúde que, mediante o pagamento de
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Cardiologia
Carlos Benedito de Almeida Pimentel
Não há dúvida quanto aos fatores que contribuem para uma doença cardíaca: o taba-
gismo; a dieta sem orientação; o “stress” dentro das atividades diárias, quer profissionais
ou domésticas; o álcool e suas implicações cardíacas; o exercício, que pode não fazer bem
ao coração; a hipertensão arterial que nem sempre é tratada e acompanhada de forma
ideal. Não podemos deixar de citar o aspecto da hereditariedade familiar e outras doenças
que facilitam a afecção cardíaca, tais como o Diabetes Mellitus, Doenças Pulmonares,
Disfunções Tireoideanas, Doenças Hematológicas, Doenças Reumáticas Auto-imunes,
Doenças Neuro-musculares e outras.
TABACO – É indubitável a relação entre o hábito de fumar e a cardiopatia. Clara-
mente, fumar leva ao aumento da arteriosclerose tanto no homem quanto na mulher.
Os mecanismos envolvidos incluem o efeito do monóxido de carbono, da nicotina e
de outras substâncias, no metabolismo lipídico, no transporte de oxigênio, na maior libe-
ração de aminas vaso-pressoras, nas injúrias ao endotélio vascular, permitindo que me-
canismos sejam ativados na íntima de determinadas artérias.
O uso do tabaco nas diferentes formas também facilita a trombose pelo aumento dos
níveis de fibrinogênio, pelo aumento da agregação plaquetária, pela policitemia que acon-
tece como doença pulmonar e o sinergismo com a vaso-constrição periférica.
Há indícios de que o tabaco, por meio de sua mutagenicidade, se relaciona com a
aterogenicidade; o fumante submetido aos efeitos cancerígenos do tabaco sofreria alte-
rações celulares em nível de células da musculatura lisa.
Quanto aos lípides, há aumento do processo oxidativo das lipo-proteínas de baixa
densidade, ponto de partida para as primeiras modificações do endotélio vascular.
DIETA – A dieta ocupa um dos lugares mais importantes na gênese das cardiopatias,
principalmente as isquêmicas. Sem dúvida a presença das gorduras de forma excessiva
na alimentação se relaciona com a doença arterial coronariana (DAC).
A média do consumo da gordura total, ácidos saturados, colesterol da dieta é exces-
siva em muitos países. Observações e estudos demonstram que os níveis séricos de
colesterol estão relacionados à taxa de mortalidade e ao aumento da probabilidade da
doença arterial coronariana (DAC).
Uma forma de sentirmos o problema são observações a respeito dos japoneses que
vivem no Japão, no Havaí e nos EUA. Elas mostram o impacto ambiental e dos costu-
mes em indivíduos com uma origem genética comum. No Japão, onde a incidência de
doenças cardíaca é baixa, a quantidade de gorduras saturadas na dieta é tradicionalmen-
te baixa.
Em japoneses que vivem no Havaí, a incidência se situa entre a dos japoneses que
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
vivem no Japão e a dos que vivem nos EUA. Os japoneses que vivem nos EUA conso-
mem, aproximadamente, a mesma quantidade de gordura saturada e colesterol que os
outros grupos étnicos, tendo o mesmo risco de DAC que eles.
A incidência da DAC é mais baixa nos países onde a dieta é tradicionalmente vege-
tariana. Gostaríamos de lembrar que nos períodos de escassez de alimentos, nas condi-
ções de semi-inanição que ocorreram na Europa na época da Segunda Guerra Mundial,
a ocorrência de DAC foi reduzida. Após a guerra, com a normalização dos alimentos
voltou a crescer a incidência de doenças ateroscleróticas e do Diabetes Mellitus.
STRESS – O “stress” pode ser classificado como doméstico, intermediário e profis-
sional. O doméstico inicia-se logo que abrimos os olhos e acordamos, os primeiros raios
de luz atingem nossa retina e provocam a primeira grande liberação de aminas vaso-
pressoras na circulação.
Consideramos como doméstico todo “stress” relacionado aos problemas domésticos
e familiares. Chamamos de “stress” intermediário o “stress” da rua, do transporte, do
social. O “stress” profissional é o do próprio trabalho, da competição inerente ao traba-
lho e a guerra paralela que com freqüência acontece nos bastidores do trabalho.
Sabemos claramente que neste aspecto há enorme influência da política do governo
quanto à ordem, à segurança, ao mercado de trabalho, à meta educacional e principal-
mente à política econômica. Consideremos a equação: bem-estar mental no numerador
e “stress” no denominador, quando esta fração tende ao mínimo há aumento da doença
coronariana.
ÁLCOOL – Alguns estudos mostraram que o consumo moderado de álcool, em
torno de 35 mililitros de álcool por dia, e o risco de doença arterial coronariana (DAC)
variam em relação inversa. O mecanismo pelo qual o consumo moderado de álcool
protege contra a DAC não está claro. Possivelmente está relacionado com aumento da
concentração do colesterol de alta densidade (HDL Colesterol). Quando analisamos o
consumo excessivo, observamos aumento da mortalidade.
EXERCÍCIOS – Devemos esclarecer um erro que vem se imortalizando na idéia das
pessoas, de que o exercício faz bem ao coração de uma forma direta, deixando-o mais
forte. Isto não é verdade!
O exercício faz bem aos músculos dos membros do corpo e principalmente ao san-
gue, depurando-o dos excessos calóricos habituais, dessa forma reduzindo fatores que
contribuiriam para induzir aumento da aterogenicidade. Devemos lembrar que o ideal
seria a ingestão de um suporte calórico adequado aos gastos diários normais. O coração
já se exercita batendo de 60 a 100 vezes por minutos durante as 24 horas de cada dia,
independentemente dos exercícios extras.
HIPERTENSÃO ARTERIAL – A hipertensão arterial é um dos mais importantes
fatores de risco para a morbi-mortalidade cardiovascular. A pressão arterial elevada
mantida por longo prazo leva à falência de múltiplos órgãos como coração, cérebro, rins,
olhos e vasos sistêmicos. Com relação ao coração, por exemplo, temos comprometi-
mento vascular, incremento da aterogenicidade, podendo-se da angina progressiva che-
gar ao máximo de evento lesivo: o Infarto do Miocárdio (IM). Há também comprometi-
mento miocárdico, ou seja do músculo cardíaco, hipertrofia ventricular esquerda e insu-
ficiência cardíaca.
O indivíduo hipertenso apresenta um envelhecimento precoce de seu sistema arterial,
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Infarto é uma condição patológica, caracterizada pela necrose que se segue de anóxia
ou hipóxia, em território com circulação do tipo terminal, podendo formar-se em qual-
quer órgão; porém a maioria dos infartos ocorre nos rins, baço, cérebro e no coração.
O infarto no miocárdio ocorre devido à obstrução coronária. Esta obstrução ocorre
pela formação de ateroma que, com o passar do tempo, se acumula nas paredes das
artérias, tornando-as mais estreitas. O sangue flui com dificuldade, tornando a circula-
ção sangüínea mais lenta e é possível que ocorra a formação de coágulos, que obstruem
a passagem do sangue. Isto leva à necrose do tecido do coração.
A maioria dos infartos do miocárdio (IM) ocorre pela manhã, quando a agregação
plaquetária é maior, e os produtos liberados pelas plaquetas podem ser identificados no
sangue imediatamente após um infarto (Bogliolo, 1978).
Segundo dados do IBGE de 1990 (Anuário Estatístico do Brasil, 1994), as doenças da
circulação pulmonar e outras formas de doenças do coração foram responsáveis por
9,57% dos casos de óbitos, sendo que o infarto agudo do miocárdio, isoladamente, foi
responsável por 6,12% do número total de óbitos. Na região sudeste o número de óbitos
por infarto foi de 30.844 indivíduos, o que representa 3,77% do número total de óbitos
ocorridos no Brasil em 1990.
Geralmente o homem tem cinco vezes mais a chance de ter um infarto do miocárdio
que as mulheres. O risco feminino é mais alto a partir da menopausa e no caso e mulhe-
res que trabalham fora de casa.
Sendo o infarto do miocárdio uma situação patológica de alta letalidade, há uma
preocupação em se conhecerem os fatores determinantes de sua ocorrência. Sabe-se
que fatores de risco exógenos e endógenos, entre os quais os fatores hereditários, indu-
zem primeiro à aterogênese e posteriormente ao infarto do miocárdio.
Entre os fatores bioquímicos que levam ao aumento do risco de o indivíduo sofrer um
infarto no miocárdio, os mais importantes e conhecidos são o colesterol elevado, glicose
elevada e agregação plaquetária elevada.
O colesterol, em níveis elevados, é um dos fatores contribuintes para a formação de
ateromas, o que leva a complicações arterioscleróticas.
Diversos estudos epidemiológicos têm permitido observar que o risco de contrair
doenças cardíacas (para indivíduos com mais de 40 anos) com colesterolemia menor ou
igual a 2,10 g/l é três vezes menor que em indivíduos com mais de 2,30 g/l, e seis vezes
menor que em indivíduos com mais de 2,60 g/l.
O colesterol é geralmente dividido em frações, em que a HDL (lipoproteína de alta
densidade) é considerado como fator protetor, e a LDL e VLDL (lipoproteína de baixa
densidade e lipoproteína de muito baixa densidade) são consideradas como fator de risco
(Allain et al. 1974).
Os triglicérides formam a maior parte do peso do tecido adiposo, constituindo-se, desse
modo, numa potente forma de armazenamento de energia. O movimento dos ácidos graxos
no organismo ocorre com grande rapidez em resposta a vários estímulos (dieta, exercícios
físicos, stress, etc.). Por este motivo é de se esperar que os triglicérides (um dos mais
importantes veículos para o transporte dos ácidos graxos) variem também a sua concen-
tração em resposta a estes fatores fisiológicos. O equilíbrio desse mecanismo pode ser
alterado conduzindo a níveis anormais de triglicérides circulantes. A persistência dessa
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
condição pode levar a muitas patologias, tais como doenças hepáticas, renais, hiperlipidemias
essenciais, etc. (Trinder, 1969).
Um caso que apresenta um grande interesse é o aumento de triglicérides em indiví-
duos obesos, o que pode levar a uma doença cardíaca. Por volta de 50% dos lipídeos das
lesões ateromatosas que ocorrem nas artérias coronárias são triglicérides. Uma grande
porcentagem de pacientes com infarto no miocárdio também exibe hipertriglicemia
(Trinder, 1969).
Os níveis plasmáticos de glicose são importantes porque refletem alterações na bio-
química celular em nível citoplasmático e mitocondrial, há interferência nos mecanismos
da síntese de colesterol e de sua auto-regulagem. As modificações osmóticas provavel-
mente afetam a parede vascular. Estes efeitos bioquímicos e físico-químicos fazem com
que quatro entre cinco diabéticos morram de alguma doença circulatória ou cardíaca.
O exame de agregação plaquetária tem grande importância na prevenção de doen-
ças do miocárdio, pois por meio dele é possível analisar se o comportamento agregante
das plaquetas na corrente sangüínea ocorre espontaneamente ou não, de forma exacer-
bada.
Para a formação de um ateroma é necessário que a placa na túnica íntima apresente
uma agregação central de células com origem nos macrófagos e nas células musculares
lisas (CML), algumas das quais podem ter morrido e liberado lipídeos extra-celulares e
resíduos celulares circundados por CML, e possivelmente por fibroblastos originados na
parede arterial. O ateroma em desenvolvimento foi relacionado a uma reação inflamató-
ria crônica, com células T ativadas, monócitos, macrófagos, células endoteliais, plaquetas
e CML. O IM pode ocorrer devido a um espasmo sobre a lesão ou ruptura de uma placa
e formação de um trombo que interrompe subitamente o fluxo de sangue; a adesão e
ativação plaquetária junto com a malha de fibrina contribuem para a formação do trombo.
Miocardiopatias
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Neurologia
Jaime Newton Kelmann
Introdução
Os neurônios e a glia necessitam para o seu metabolismo ininterrupto de um supri-
mento de cerca de 150 mg de glicose e 72 litros de oxigênio para um período de 24 horas,
pois estas substâncias não podem ser armazenadas e a função cerebral só pode funcio-
nar por poucos minutos se elas forem reduzidas a um nível crítico. O sangue arterial
supre o tecido cerebral com os nutrientes necessários para o seu metabolismo e o san-
gue venoso remove os produtos tóxicos como o CO2, metabólitos ácidos e calor.
Cada contração do coração leva através da aorta ascendente cerca de 70 ml de
sangue, dos quais 15 ml são destinados ao cérebro. O cérebro adulto pesa aproximada-
mente 1.500 g, tendo um fluxo sanguíneo de 750 a 1.000ml de sangue por minuto. Deste
total, 350 ml fluem através da artéria carótida interna e 100 a 200 ml através do sistema
vertebro-basilar.
Considerações anatômicas
Cada hemisfério cerebral é suprido pela sua própria artéria carótida interna que é
originária da bifurcação da artéria carótida comum que se encontra na altura do angulo
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
da mandíbula ao lado da faringe e entra no crânio pelo canal carótido. As duas artérias
carótidas internas entram pelo seio cavernoso ao lado da sela túrcica. Após o seio temos
os ramos da artéria oftálmica, que se divide em dois ramos, as artérias cerebrais anteri-
ores e médias. Este sistema vascular supre os nervos ópticos e a retina, os lobos frontais,
parietais e parte do lobo temporal.
As artérias vertebrais e basilar funcionam como únicas. Cada artéria vertebral é
originária da artéria subclavia que vem através de um canal ósseo da vértebra cervical e
entra no crânio pelo forame magno, dando a artéria cerebelar postero-inferior e as arté-
rias espinais médias e anteriores. Na junção ponto medular, as duas artérias vertebrais
unem-se para formar a artéria basilar, que emite três grupos de ramos: as artérias
paramediana, circunferencial curta e circunferencial longa. O fim da artéria basilar no
nível do meio do tronco cerebral se divide em em duas artérias cerebrais posteriores que,
por sua vez, suprem a porção medial dos lobos temporais occipitais do cérebro. O siste-
ma vêrtebro-basilar supre a porção superior da medula espinal, o tronco cerebral, o
cerebelo, o tálamo óptico e os aparelhos auditivos e vestibulares.
Existem várias conexões entre os sistemas carotídeos e vêrtebro-basilares através
do circulo de Willis, através das artérias comunicantes anterior e posteriores. Esta rica
rede anastomótica protege o cérebro por algumas obstruções que possam acontecer.
Por exemplo, uma obstrução da artéria carótida interna no pescoço pode receber sangue
através da carótida externa, oftálmica e artéria interna intracraneana. Obstrução de
artéria vertebral pode receber sangue através da interconexão entre a carótida externa
e as artérias vertebrais distais. Uma obstrução na artéria cerebral média assintomática é
suprida pela interconexão entre os ramos distais da artéria cerebral posterior e a artéria
cerebral anterior.
As pequenas artérias e arteríolas que saem da superfície das artérias e penetram no
parênquima têm poucas conexões entre si. Quando uma destas fica obstruída, temos
uma isquemia ou infarte no tecido.
Estas pequenas artérias e arteríolas controlam o fluxo no cérebro. Os capilares ter-
minam próximos ao corpo celular dos neurônios, levando os nutrientes para as células.
Acredita-se que os astrócitos regulam o fluxo de nutrientes e metabólitos entre o corpo
celular e o sangue capilar.
Dentro deste sistema, somente as arteríolas têm um sistema de trocas do pCO2 e o
pO2 e respondem dramaticamente a agentes farmacológicos. Quando a pressão parcial
de dióxido de carbono do sangue arterial aumenta, as arteríolas se dilatam e o fluxo
sanguíneo cerebral aumenta. Quando o CO2 é reduzido, elas sofrem constrição e o fluxo
é diminuído. Mudancas na pressão parcial de oxigênio têm o efeito oposto, embora não
seja tão dramático.
Isquemia e infarto-oclusivas
220
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Embolismo
Embolismo cerebral é o termo usado para descrever a oclusão de uma artéria pelo
fragmento de um coágulo de sangue, tumor, gordura, ar, ou outra substância estranha. A
seqüência de eventos é parecida com a descrita para o enfarto, exceto pelo elemento
vasoespasma que pode ser suprimido. Os êmbolos, em sua maioria, são estéreis, mas
podem ocorreu nas endocardites bacterianas aguda e subaguda ou processo séptico no
pulmão que contenha bactéria. Como resultado podemos ter uma arterite, abscesso,
encefalite localizada ou meningite.
ETIOLOGIA – O embolismo pelo ar pode ser causado por traumas no pulmão ou
liberação de bolhas de nitrogênio na circulação geral seguida de uma rápida redução da
pressão barométrica. O embolismo gorduroso é associado a fraturas ósseas ou injúria
nos tecidos.
Nas crianças, o embolismo cerebral é comumente associado a doença valvular do
coração (reumática ou congênita), sobreposta por uma endocardite. Nos adultos, o
embolismo é comumente causado pela fibrilação atrial ou infarto do miocardio. Um
trombo no átrio esquerdo pode ser deslocado durante uma fibrilação ou após uma
cardioversão para restaurar o ritmo cardíaco. Após o infarto do miocárdio, a porção do
coágulo que forma pode chegar às artérias cerebrais.
A causa mais comum de ataques isquêmicos transitórios é o microembolismo das
placas arterioescleróticas das artérias que vão para o cérebro. Essas placas formam os
coágulos que podem ser quebrados ou ulcerados, colocando na circulação o seu conteú-
do de colesterol e cálcio.
PATOLOGIA – O tecido suprido por uma artéria embolizada fica isquêmico e, a
menos que o êmbolo se desintegre ou migre, o infarto pode virar hemorrágico. Exceto
nos casos em que o êmbolo contenha bactéria, as mudanças patológicas no tecido cere-
bral são as mesmas do infarto cerebral devido à aterotrombose. Se o êmbolo é séptico,
ele pode levar à formação de um aneurisma micótico que pode romper-se posteriormen-
te. O êmbolo cerebral é geralmente múltiplo e associado ao embolismo de vasos perifé-
ricos, como o infarto no pulmão, fígado, rins, e outras vísceras.
Considerações clínicas
Incidência
A doença cerebrovascular é a mais comum causa neurológica nos adultos, sendo
encontrada em 25% das autópsias realizadas. Choques que ocorrem nos estágios finais
das doenças cerebrovasculares são catastroficamente resultantes da arteriesclerose e
hipertensão. O AVC mata 275.000 e deixa com seqüelas cerca de 300.000 americanos
anualmente, sendo 30% abaixo de 65 anos de idade. A arterioesclerose cerebral repre-
senta 15% das admissões de doentes crônicos .
A freqüência de sintomáticos de doenças cérebro-vasculares depende em parte da
idade, sexo e localização geográfica. Cerca de 70% dos ictos são devidos a
ateromatrombose, 20% a hemorragia de vários tipos e 10% a embolismo. Todavia o
embolismo é mais freqüente em jovens e a hemorragia em negros. Coonseqüentemente,
a incidência de varias formas encontradas em hospitais depende da população local.
222
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Sinais focais que antecedem o icto, quando presentes, são um presságio de que vai
ocorrer um infarto ou uma hemorragia. Em um terço dos casos, ataques isquêmicos
transitórios causam afasia, parestesia, alteração nos campos visuais, ou parestesias em
um lado do corpo antes do déficit permanente.Um aneurisma pode comprimir um nervo
craneano e causar sinais focais por semanas e meses antes que se rompa.
As seguintes informações devem ser obtidas do paciente ou da família em todos os
casos de fatos premonitórios:
1-Convulsões
2-Irregularidades cardíacas
3-Dor de cabeça
4-Distúrbios visuais
5-Distúrbios auditivos
6-Alterações mentais
7-Fatores precipitantes-TCE-hematoma subdural, etc.
8-Fatores predisponentes
9-História pregressa
10-História familiar.
Início
Na maioria dos casos, os sintomas do episódio cérebro-vascular são abruptos e
aparecem com a máxima intensidade em poucos minutos ou horas. Estes sintomas
podem ser focais ou generalizados. Desde um sintoma neurológico focal, paralisia,
perda da sensibilidade, alterações na fala, etc. são relatadas como o local em que
ocorreu o infarto ou a hemorragia e as correlacionamos com a provável síndroma de
varias artérias cerebrais. Sintomas generalizados, que incluem cefaléia, vomitos, con-
vulsões e coma, são mais comuns nos pacientes com hemorragia intracerebral e sub-
aracnoidea. Em muitos casos a confusão, desorientação e perda da memória são tam-
bém presentes durante o período imediato do icto. São relatados como disturbios da
função cerebral e associados com doença cérebro-vascular generalizada.
Curso
O curso da doença depende do tipo e da extensão da lesão e da presença ou ausência
de outros fatores complicantes. A mortalidade é cerca de 80% nos casos seguidos de
hemorragia cerebral, cerca de 50% nos casos de hemorragia subaracnoidea e cerca de
30% na oclusão de vasos por um trombo. Quando existem pequenos vasos no local do
trombo ou do embolo, o paciente geralmente vive, a menos que ocorram complicações.
Em casos graves, podemos ter uma sobrevida de poucas horas a muitos meses.
Como exceção, temos a ruptura de um aneurisma grande que pode causar a morte em
alguns minutos. Ocasionalmente, o paciente com hemorragia cerebral pode sobreviver.
A morte em menos de 24 horas é rara em pacientes que apresentaram embolia ou
infarto cerebral, se ocorrer será muitos dias ou semanas após o icto.
Os sintomas focais neurológicos em caso de hemorragia cerebral, com pouca exce-
ções, são mais severos logo no início da doença.Uma pequena porcentagem aumenta a
severidade e a extensão em um periodo de poucas horas e pode ser explicado pelo aumen-
to da hemorragia. A progressão dos sinais neurológicos focais é incomum em pacientes
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
com infarto ou embolismo cerebral. Quando isto ocorre pode ser explicado devido ao
envolvimento independente de outros vasos na propagação do trombo do ponto original
para outro ramo, trombosando o vaso. Em pacientes com trombose da artéria basilar e
cerebelar póstero-inferior a progressão da sintomatologia neurológica pode ocorrer num
periodo de poucas horas ou dias.
Os sintomas que geralmente são produzidos pelo choque são mais intensos após o
icto, podendo levar ao coma profundo e à morte. Em casos fatais, o estágio terminal da
doença é caracterizado por aumento da temperatura, pulso e alteração respiratória e
declínio progressivo do nível de consciência.
Prognóstico
O prognóstico quanto ao retorno da função não pode ser previsto quanto ao grau
durante os primeiros dias ou semanas após o choque. Na maioria dos casos não fatais
também não poderemos opinar quanto ao prognóstico. Alguns atributos transitórios
são sintomas no caso de espasmo cérebro-vascular, mas a mais provável explicação é
transitória associada à isquemia cerebral com microembolismo ou vaso-espasmo. Mas,
comumente, a melhora tem lugar vagarosamente e o paciente fica com alguma seqüe-
la residual, como dificuldade para deambular, usar suas mãos ou falar. Em alguns
pacientes não encontramos melhora.
Metade dos pacientes que sobrevivem ao choque fica inválida e sujeita ao perigo de
recorrência em semanas, meses ou anos. Metade dos pacientes que sofreram infarto
cerebral pode eventualmente morrer de doença cardíaca.
Em pacientes idosos, com arterioesclerose generalizada, o curso pode ocorrer com a
presença de muitas pequenas lesões cérebro-vasculares chamadas de lacunas, que po-
dem produzir sintomas mínimos e sinais como torpor, tontura, cãibra e disartria.
Prevenção do choque
Devemos ficar cientes dos fatores que predispõem ao choque; a profilaxia pode ser
usada para identificar a pessoa que tem a probabilidade de ter um choque e podem-se
instituir medidas preventivas. A primeira e mais destacada é a que tem história de hiper-
tensão, hiperlipoproteinemia, diabetes melitus, doença coronariana em parentes da famí-
lia.
Em adição à suscibilidade genética, existem vários fatores como o nível excessivo de
colesterol e gorduras, fumar cigarros e presença de estresse crônico e prolongado con-
flito emocional.
A hipertensão arterial é a mais importante causa, quando determinada por um au-
mento crônico das pressões sistólicas e diastólicas, o risco de choque é grande. O au-
mento abrupto da pressão arterial apresenta um grande risco. É essencial que os pacien-
tes hipertensos controlem sua pressão.
Tratamento
A terapia deve ser dividida em duas partes. A primeira fase é ligada diretamente a
salvar a vida do paciente e a segunda será a reabilitação.
Epilepsia
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Conceito
Não existe uma definição completamente satisfatória de epilepsia. Trata-se, geral-
mente, de uma condição crônica, compreendendo um grupo de doenças que têm em
comum crises epilépticas que recorrem na ausência de doença tóxico-metabólica ou
febril.
Crises epilépticas são eventos clínicos que refletem disfunção temporária de uma
pequena parte do cerebro (crises focais) ou de área mais extensa envolvendo os dois
hemisférios cerebrais (crises generalizadas). A crise epiléptica é causada por descarga
anormal excessiva e transitória das células nervosas. Os sintomas de uma crise depen-
dem das partes do cérebro envolvidas na disfunção.
Crises epilépticas são sintomas comuns de doenças neurológicas agudas:
meningoencefalite, trauma cranioencefálico, doenças cérebro-vasculares.
Ou doenças clínicas: anóxia, estado hipoglicêmico não cetótico, insuficiência renal,
hepática.
Uma das primeiras descrições registradas de um paciente com epilepsia pode ser
encontrada em um texto de Acádico de 2000 a.C., o qual fornece uma descrição de um
episódio convulsivo. No passado acreditava-se que a epilepsia fosse uma manifestação
de espíritos do mal ou uma expressão do descontentamento divino. Dois pesquisadores
são considerados os introdutores dos conceitos modernos da epilepsia: Jackson Hughlings,
que caracterizou uma crise como uma descarga elétrica excessiva, súbita na substância
cinzenta, e Growers, que contribuiu para enriquecer os dados sobre as características
clínicas das várias formas de epilepsia, sendo um dos primeiros a levantar questões
relativas ao tratamento e prognóstico.
Diagnóstico
O primeiro passo no diagnóstico é definir, pela anamnese, se os episódios realmente
são epilépticos e então tentar identificar a causa.
O processo para o diagnóstico das crises epilépticas geralmente depende da decrição
pormenorizada das crises pelo paciente, por parente ou testemunha. A história deve
incluir a descrição dos sintomas prodrômicos ou iniciais “aura ou crise parcial”, as mani-
festações críticas e os sintomas ou sinais pós-íctais. A maior dificuldade pode ocorrer
nas primeiras crises. Quando várias crises já ocorreram, de modo geral, os dados podem
ser verificados por vários informantes ou situações distintas.
Obter informações precisas sobre a ocorrência dos eventos é fundamental no pro-
cesso diagnóstico. Devem-se incluir na documentação do episódio fatores precipitantes,
ocorrência de aura ou aviso, áreas do corpo inicialmente afetadas, progressão da ativi-
dade e sua evolução, duração da crise e momento de ocorrência no dia.
Devem ser observados os movimentos involuntários ou automatismos, tais como es-
talar os lábios, mastigação ou careta, movimentos oculares, alteração da consciência,
liberação esfincteriana, apnéia, cianose, quedas, mudança no comportamento, confusão
mental, mordedura de língua ou traumatismo, automatismo ou movimentos involuntários
com os membros, déficits focais transitórios durante e após a crise, apatia, disturbio de
linguagem e cefaléia.
O médico que inicialmente atende o paciente deve obter a maior quantidade possível
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
de dados. O paciente deve ter tempo e ser estimulado a falar espontaneamente sobre a
descrição dos sintomas e sinais e, posteriomente, ser intensamente interrogado.
O exame físico geral deve ser dirigido para sinais de doenças específicas ou
malformações que causam epilepsias, tais como alterações cutâneas, como manchas
café com leite, que são associadas a manchas cor-de-vinho-do-porto com sindrome de
Stuge-Weber, adenoma sebáceo facial com assimetria de face e membros que sugere
lesão lateralizada e auscuta de sopro craneano que aponta para doenças vasculares.
O exame neurológico convencional é geralmente normal em pacientes com epilepsia.
A presença de anormalidades sugere que as crises são secundárias e a doença cerebral
orgânica.
Prognóstico
O estabelecimento do prognóstico é importante, tanto para planejar um tratamento
racional como para a verificação dos fatores preditores dos resultados. Numerosos pon-
tos podem ser examinados ao se verificar o prognóstico da epilepsia e estes incluem: o
risco de recorrência após a primeira crise, as chances de remissão após mais de uma
crise, as chances de recorrência quando deveria ocorrer remissão e a perspectiva de
aumento de mortalidade.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
1.2. SINTOMÁTICA
Epilepsia Parcial Contínua Progressiva Crônica
Síndromes c/ Crises c/ Quadros Específicos de Manifestação
- Epilepsia Lobo Temporal
- Epilepsia Lobo Frontal
- Epilepsia Lobo Parietal
- Epilepsia Lobo Occipital
1.3. CRIPTOGÊNICAS
2.3. SINTOMÁTICAS
2.3.1. Etiologia inespecífica
Encefalopatia Mioclônica Precoce
Encefalopatia Epiléptica Infantil Precoce com Surto-supressão
Outras Epilepsia Generalizadas Sintomáticas
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
4. SÍNDROMES ESPECIAIS
4.1. CRISES CIRCUNSTANCIAIS
Convulsões Febris
Crises Isoladas ou Estado de Mal Isolado
Crises Ocorrendo Somente em Evento Tóxico ou Metabólico
As principais características clínicas que permitem localizar a origem das epilepsias loca-
lizadas sintomáticas ou criptogênicas podem ser esquematizadas na Tabela III.
A epilepsia do lobo temporal vem sendo reconhecida como uma síndrome especifica
devido à sua alta prevalência e a freqüente refratariedade ao tratamento medicamentoso.
Geralmente inicia-se na infância, embora possa aparecer em qualquer idade. Alterações
eletroencéfalograficas, com descargas epileptiformes uni ou bilateralmente na região
temporal anterior e início ictal no eletrodo esfenoidal, são caracteristicas da síndrome,
apesar de não ocorrerem em todos os pacientes.
Os pacientes geralmente têm exame neurológico normal, exceto com déficit de me-
mória recente, observado na maioria dos indivíduos controlados.
Observam-se exames radiodiagnósticos normais ou evidência de alteração na RM
sugestivas de esclerose mesial, hipometabolismo no SPECT interictal e hipermetabolismo
ictal na região temporal, e evidência de disfunção uni ou bilateral na avaliação
neuropsicológica. Os pacientes podem ter história familiar de epelepsia e antecedentes
de convulsão febril prolongada na infância.
Diagnóstico diferencial
Distúrbios episódicos ou paroxísticos podem simular crises epilépticas.
Crises refratárias ao tratamento, quando acompanhadas de função cognitiva e EEG
232
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Etiologia
Aproximadamente 70% dos pacientes têm epilepsias idiopáticas ou criptogênicas.
Assim em 30% dos pacientes, quando bem investigados, podemos determinar a etiologia.
Quase todas as doenças que atingem a substância cinzenta, muitas da substância
branca (doença metabólica) e inúmeras doenças sistêmicas podem causar crises epilép-
ticas. Três fatores causais podem estar envolvidos: predisposição individual, presença de
lesão epileptogênica cerebral (local ou generalizada) e alterações bioquímicas ou elétri-
cas cerebrais.
As causas das crises podem ser divididas em dois grupos: agudas ou remotas.
As causas agudas variam com a faixa etária. Entre as causas podemos citar: fatores
genéticos e perinatais, doenças infecciosas, fatores tóxicos, trauma ou agentes físicos,
distúrbios vasculares, metabólicos e nutricionais, doenças degenerativas e
heredofamiliares. No nosso meio, a causa mais freqüente é a neurocisticercose.
Eletroencefalograma
Mesmo com o avanço da neuroimagem, o EEG ainda é o exame de maior sensibilida-
de na avaliação das epilepsias. O EEG interictal tem a finalidade de: a) confirmar o
diagnóstico clínico, b) ajudar na classificação das crises e das síndromes epiléptica, c)
fornecer informação prognóstica. Um primeiro EEG pode ser normal em 30 a 40% dos
pacientes epilépticos, sendo mais usado no seguimento de pacientes epilépticos crônicos,
mas neste caso não está bem estabelecido.
Tratamento medicamentoso
O tratamento medicamentoso das epilepsias é aceito como tratamento sintomático,
isto é, visa primáriamente ao controle das crises epilépticas.
A seleção das drogas antiepilépticas é baseada, primariamente, na sua eficácia para
tipos específicos de crises de epilepsia.
Imagem e cirurgia
A ressonância magnética tem provocado verdadeira revolução no esclarecimento
etiológico das epilepsias, identificando alterações estruturais passíveis de remoção, tais
como lesões atróficas, displásicas ou neoplásicas. Os resultados cirúrgicos têm sido
particularmente excelentes quando estas lesões ocorrem no lobo temporal.
Estigma
A palavra epilepsia ainda provoca rejeição de pacientes e até de determinados médi-
cos. Disritmia, termo inadequado, cada vez menos é utilizado como sinônimo de epilep-
sia. Muitas vezes reflete o preconceito do próprio médico em relação às epilepsias.
O esclarecimento para o paciente e para a família, da condição crônica e da impor-
tância da adêrencia ao tratamento, é fundamental.
233
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Epilepsia na infância
É na infância que encontramos a maior quantidade de pessoas que apresentaram
episódios convulsivos. Temos as crises neonatais, as convulsões febris e as chamadas
de epilepsia benigna na infância e as graves da infância.
Convulsão febril
Convulsão febril (CF) é um evento próprio da infância, geralmente ocorrendo entre 3
meses e 5 anos de idade, associado à febre, mas sem evidência de infecção intracraneana
ou com outra causa definida. São excluídas da definição aquelas crianças que tiveram
convulsões afebris previamente. CF deve ser distinguida de epilepsia, que se caracteriza
por crises afebris recorrentes.
O baixo limiar da córtex em desenvolvimento, a suceptibilidade da criança a infec-
ções, a propensão alta e o componente genético afetando o limiar convulsígeno são
fatores que se combinam e justificam porque a CF é um fenômeno da primeira infância
e é sobrepujado com o crescimento.
CF pode ser simples: se a crise for generalizada, com duração inferior a 15 minutos,
não recorrer em 24 horas e não apresentar anormalidade neurológicas pós-ictal, ou com-
plexa se a crise for focal ou durar mais do que 15 minutos ou recorrer em 24 horas.
A incidência de CF na população febril varia de 1% na China, 8% no Japão, 14% em
Guam, 2 a 4% na Europa e EUA, e 4% no Brasil.
O prognóstico a longo prazo é favorável. Em crianças acompanhadas até 7 anos de
idade não foram observados óbitos ou seqüelas motoras ou aumento do prejuízo intelec-
tual.
Cerca de um terço das crianças que tiveram CF terão uma ou mais CFs recorrentes.
Consideram-se os principais fatores preditivos de recorrência: a idade em que ocorre a
primeira crise (menor de 18 meses), a presença de história familiar positiva para convul-
sões, a duração de febre alta antes da CF inicial e a temperatura durante a CF. A história
familiar positiva para CF significa similar convulsígeno à febre geneticamente determi-
nado e, como este limiar é mais baixo, o início do quadro é precoce e a curta duração da
febre (muitas vezes com temperaturas não são altas) pode desencadear a crise.
O risco global de epilepsia seguido à CF é bastante baixo e variável segundo o
estudo e o tempo de seguimento. O risco de epilepsia nestes pacientes foi de 1,5% na
idade de 7 anos. Os seguintes fatores são de risco para a epilepsia: história familiar de
epilepsia, anormalidades neurológicas e complexa. Se nenhum fator estiver presente,
o risco será de 1%. Quando apenas um só fator estiver presente, o risco será de 2%.
Do pequeno grupo de alto risco com dois ou mais fatores presentes (6% da casuística),
10% das crianças desenvolveram epilepsia.
Alguns autores acreditam que o melhor tratamento para crianças que tiveram a
primeira CF não é a prescrição medicamentosa, mas sim, a conversa com os pais,
procurando informá-los e acalmá-los, assegurando-lhes que a grande maioria das
CFs são únicas, não causam dano físico e não necessitam de tratamento.
O maior benefício do tratamento da CF é a prevenção de futuras CFs. Não há qual-
quer evidência de que o tratamento prolongado com anticonvulsivantes previna o desen-
volvimento de posterior epilepsia.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Crises neonatais
O período neonatal é limitado, convencionalmente, às quatro primeiras semanas de
vida e as crises convulsivas, relativamente freqüentes nesse período, constituem mani-
festações de anormalidade cerebral, estando associadas a alto risco de mortalidade ou a
seqüelas neurológicas permanentes. O prognóstico está relacionado à etiologia das cri-
ses, aos fatores perinatais e às condições associadas à evolução clínica neurológica. A
incidência varia de 1,5 a 14/1.000 nascidos vivos em função não somente do diagnóstico
clínico como da idade gestacional do récem-nascido (RN).
As manifestações clínicas das convulsões neonatais constituem-se não somente de
movimentos clônicos fragmentários, abalos mioclônicos, extensão tônica, espasmos
posturais, como também de crises sutis caracterizadas por períodos breves de apnéia,
choro súbito anormal, desvio tônico do olhar, alterações vasomotoras e movimentos de
sucção ou deglutição que ocorrem isolados ou associados a outras manifestaçõoes epi-
lépticas. As alterações clínicas associam-se ou não a padrões eletrográficos ictais ca-
racterísticos no RN a termo e pré-termo. Dessa maneira, anormalidades críticas típicas
ou atípicas e os registros poligráficos obtidos por ocasião das descargas estão relaciona-
dos ao desenvolvimento neuro-anatômico e fisiológico do cerebro, estando os neurônios,
prolongamentos axonais e comissuras, em início de desenvolvimento.
Nas crises neonatais as manifestações críticas podem ou não estar associadas à
alteração no EEG e apresentam a classificação a seguir:
1. Crises associadas à alteração no EEG:
a) Focal clônica
b) Mioclônica
c) Focal tônica
d) Apnéia
2. Crises sem alterações consistentes no EEG ou não relacionadas:
a) Automatismo motor: movimentos oro-linguais, oculares, pedalagem, rotatórios dos
braços ou movimentos complexos;
b) Generalizada tônica: em extensão, flexão ou mista;
c) Mioclônicas: generalizada, focal e fragmentária.
3. Espasmos infantis.
4. Crises eletroencefalográficas sem manifestação clínica.
As descargas no EEG permanecem localizadas, sendo sua propagação lenta, rara-
mente sincrônica bilateral, variável em voltagem e freqüência, possibilitando a detecção
de alterações na freqüência cardíaca e respiratória antecedendo a descarga elétrica
encefálica anormal.
As convulsões neonatais podem ser secundárias a multiplas causas, todavia as prin-
cipais são: trauma de parto, anóxia, anormalidades congênitas, metabólicas gerais, infec-
ções, drogas, hipertensão, dependência a piridoxina, aminoacidopatias, kernicterus, tóxi-
ca e familial.
A encefalopatia-hipóxico isquêmica secundária à asfixia perinatal constitui a etiologia
mais comum de crises convulsivas neonatais, podendo estar relacionada à idade
gestacional, em que no RN pré-termo se constata comprometimento proeminente da
substância branca periventricular e nos RN a termo, nas regiões corticais.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
O diagnóstico etiológico das crises neonatais pode ser feito por meio dos anteceden-
tes maternos e familiares, da história gestacional e pirinatal do RN. O exame clínico e
neurológico minucioso deve ser realizado juntamente com a investigação laboratorial. A
história pregressa do parto é fator importante para a apresentação de hipóteses
diagnósticas.
Constatando-se uma única vez os fenômenos convulsivos e afastada a possibilidade
de alterações metabólicas, inicia-se a terapêutica com anticonvulsivantes. Em nosso
meio, o fenobarbital constitui a droga de primeira escolha e a fenitoína de segunda.
Do ponto de vista evolutivo, os fatores que conferem mau prognóstico às crises
convulsivas neonatais são: o estado de mal, as crises do tipo tônicas e mioclônicas, o
índice de Apgar menor que 3 no quinto minuto e o padrão do EEG (baixa voltagem),
multifocal, surto supressão.
TABELA I
SÍNDROMES EPILÉPTICAS DA INFÂNCIA
1-PERÍODO NEONATAL
Convulsão neonatal idopática benigna: familiar e não familiar
Encefalopatia mioclônica precoce
Encefalopatia epiléptica infantil precoce com surto-supressão
3-PERÍODO INFÂNCIA
Epilepsia ausência infantil
Epilepsia parcial benigna com espículas centro-temporais
Epilepsia benigna da infância com paroxismos occipitais
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TABELA II
CRITÉRIOS DE BENIGNIDADE SEGUNDO AICARDI
Inteligência normal
Ausência de sinais neurológocos
Ausência de dano cerebral demonstrável
Início após os dois anos
Baixa freqüência de crises
Limitado numero de crise tônico-clônicas generalizadas
Apenas um tipo de crise
Ausência de crises tônico-atônicas
Breve período de crises incontroláveis
Boa resposta à terapia anticonvulsivante
EEG normal no início do tratamento
Rápida melhora eletroencefalográfica com a terapia
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
epilépticas podem seguir à SW, sendo que, 50 a 60% dos casos evoluem para SLG,
epilepsia multifocal parcial secundariamente generalizada.
EPILEPSIA MIOCLÔNICA GRAVE DO LACTENTE – Descrita por Dravet et
al., inicia-se no primeiro ano de vida na forma de convulsões febris recorrentes e poste-
rior aparecimento de abalos mioclônicos. Freqüentemente há crises parciais com ou sem
generalização secundária, associadas a história familiar positiva para epilepsia e convul-
são febril, em 31% dos casos. O traçado eletroencefalogáfico mostra espícula-onda
lenta generalizada e poliespículas, com fotosensibilidade precoce e anormalidades fo-
cais. A partir do segundo ano de vida, observa-se o aparecimento de ataxia e sinais
piramidais (81% dos casos), além de mioclonias. Este tipo de epilepsia é muito resistente
ao tratamento medicamentoso e todas as criancas afetadas apresentam deficiência inte-
lectual e distúrbio da personalidade.
EPILEPSIA MIOCLÔNICO-ASTÁTICA – É constituída por crises primáriamente
generalizadas mioclônicas, astáticas e mioclônico-astáticas, associadas a crises de au-
sência, generalizadas tônicas e tônico-clônicas. Inicia-se entre o primeiro e o quinto ano
de vida, em crianças normais, com predomínio no sexo masculino. (2:1). O traçado
eletrencefalográfico apresenta espículas-ondas lentas bilaterais de 2-3 Hz e poliespículas-
ondas lentas. A evolução é variável, podendo haver remissão expontânea ou evolução
para demência, especialmente nos casos associados a crises generalizadas. Os casos de
prognóstico mais reservados são aqueles em que as crises se iniciam no primeiro ano de
vida, febris ou afebris, do tipo tônico-clônica generalizada, além da presença do estado
de mal, crises de ausência e lentificação do ritmo de base no traçado eletroencefalográfico.
Valproato é a droga de escolha, sendo indicado ACTH nos casos resistentes (15-30U/
m). Apresenta predisposição genética, do tipo poligênica.
SÍNDROME DE LENNOX-GASTAUT – Esta síndrome epiléptica foi definida por
Gastaut et al. Constitui-se por crises epilépticas, em sua maioria do tipo axial tônica, mas
também de crises atônicas, ausências atípicas e mioclonias; o traçado
eletroencefalográfico apresenta complexos espículas-ondas lentas difusas ou espículas-
ondas lentas ao redor de 2Hz e presença de retardo mental, associado a distúrbios psi-
quiátricos. Inicia-se antes de 8 anos, com maior incidência entre os 3-5 anos e predomí-
nio no sexo masculino. Em relação à etiologia, a SLGG pode ocorrer em crianças
préviamente normais ou em crianças com comprometimento do desenvolvimento
neuropsicomotor, associados ou não a disturbios psiquiátricos, ou ser precedida por SW.
O prognóstico é reservado em relação ao controle das crises, que são de vários tipos e,
devido à deterioração intelectual, psíquica e neurológica, podem estar presentes preco-
cemente. Também é comum a presença de estado de mal epiléptico, ocorrendo em 2/3
dos casos. Os anticonvulsivantes usados são os mesmos já descritos anteriormente,
porém, sendo discutível o uso de corticoides. Atualmente, resultados favoráveis são
descritos com lamotrigina e felbamato.
EPILEPSIA COM AUSÊNCIA MIOCLÔNICA – Clinicamente é caracterizada
por mioclonias rítmicas graves e difusas, associadas a descargas de complexos espículas-
ondas lentas generalizadas ao redor de 3Hz. Ocorre predomínio no sexo masculino e
início ao redor de 7 anos. O prognóstico é reservado, com crises resistentes ao trata-
mento medicamentoso, evoluindo para a deterioração mental, assemelhando-se à SLG.
Pode ocorrer remissão espontânea.
239
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Endocrinologia
José Augusto Sgarbi
I. Introdução
Endocrinologia é a ciência que estuda a comunicação e o controle de funções fisioló-
gicas de organismos vivos, através de mensageiros químicos, denominados de hormônios,
sintetizados no próprio organismo, em estruturas orgânicas que constituem as glândulas
endócrinas. Os hormônios são secretados para circulação sistêmica e desenvolverão
suas ações à distância, em parte ou em todos os tecidos orgânicos.
Os hormônios participam de todas as funções fisiológicas, como a reprodução,
hematopoiese e o crescimento. A insulina e os hormônios tiroidianos são de particular
interesse para os seres humanos, pois as alterações na biossíntese, secreção ou na ação
periférica desses hormônios, são as causas das endocrinopatias de maior prevalência e,
portanto, de maior relevância clínica em todo o mundo: diabetes mellitus e as disfunções
240
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
tiroidianas.
Diabetes mellitus pode ser definido como uma doença crônica resultante do metabo-
lismo alterado da glicose, devido à diminuída produção, secreção ou ação da insulina nos
tecidos periféricos. Constitui-se, hoje, em um dos principais problemas de saúde pública
em todo mundo, pois há um aumento global de sua prevalência, principalmente nos paí-
ses desenvolvidos e em desenvolvimento, provavelmente conseqüência da
“ocidentalização” dos hábitos alimentares, estilo de vida mais sedentário e aumento da
prevalência da obesidade. Em 1990, 118 milhões de indivíduos sofriam de diabetes em
todo o mundo, mas acredita-se que até o ano 2015, este número possa dobrar. No Brasil,
a prevalência encontrada da doença, pelo Ministério da Saúde, foi de 7,5%, sendo que
em alguns Estados, principalmente os da região sudoeste e sul, esta prevalência foi
maior, em torno de 8,5% a 9,0%. No entanto, um censo, recentemente realizado na
cidade de Ribeirão Preto, mostrou que a prevalência está em torno de 11,5%, indicando
para um aumento significativo e preocupante.
O aspecto epidêmico desta enfermidade é extremamente preocupante, pois é a prin-
cipal causa de cegueira adquirida em adultos e idosos e uma importante causa de insufi-
ciência renal resultando em necessidade de diálise ou transplante renal. Além disso,
constitui-se na mais importante condição associada às amputações não traumáticas de
membros inferiores e em fator de risco independente para infarto do miocárdio e aciden-
te vascular cerebral. Se não bastasse, os diabéticos ainda têm que enfrentar o conceito
generalizado na população de ser impossível evitar a progressão da doença e seus efei-
tos devastadores, o que, não raro, têm levado à depressão e à não-aderência aos precei-
tos do tratamento. Não obstante o sofrimento humano, o aumento da prevalência do
diabetes fará crescer, substancialmente, os gastos com o tratamento dessa enfermidade,
das suas complicações e com as políticas de saúde que objetivam a sua prevenção,
resultando, provavelmente, em uma limitação de recursos públicos para o tratamento e
prevenção de outras doenças, principalmente em países não desenvolvidos ou em de-
senvolvimento, como é o caso do Brasil.
De um ponto de vista prático, o aumento da prevalência do diabetes mellitus, mos-
trou, claramente, o que já era óbvio, mas não reconhecido, ou seja, que não há
endocrinologistas suficientes para o acompanhamento de todos os diabéticos. Dessa
forma, faz-se necessário que as recomendações para o tratamento do paciente diabético
sejam voltadas ao médico generalista, e não ao especialista, o qual acompanha somente
a minoria dos casos.
II. 1. Classificação
Recentemente, a Associação Americana de Diabetes, um comitê de especialistas da
Federação Internacional de Diabetes e a Organização Mundial de Saúde propuseram
uma nova classificação para o diabetes, com o intuito de atualizar os critérios existentes,
tornando-a mais apropriada, funcional e uniforme, levando-se em conta os novos conhe-
cimentos adquiridos nos últimos anos, em relação, principalmente, aos mecanismos de
desenvolvimento da doença.
241
SOERENSEN & BADINI MARULLI
242
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
II. Tirotoxicose
Tirotoxicose é um estado clínico e bioquímico resultante do aumento da oferta de
hormônios tiroidianos para os múltiplos tecidos, independentemente de sua origem. O
termo hipertiroidiano é utilizado quando a tirotoxicose ocorre por um aumento sustentado
da biossíntese e secreção de hormônios tiroidianos pela glândula tiróide. Portanto, pode-
mos ter um indivíduo com sinais de tirotoxicose, porém, sem hipertiroidismo. A Tabela 3
mostra as principais causas de tirotoxicose, com e sem hipertiroidismo.
243
SOERENSEN & BADINI MARULLI
244
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
IV. Hipotiroidismo
245
SOERENSEN & BADINI MARULLI
trações elevadas do TSH e normal do T4L, apresenta uma prevalência maior, de até
16%, em alguns estudos.
A importância clínica e de saúde pública do hipotiroidismo é bem conhecida, podendo
o mesmo estar associado ao aumento da morbidade e também da mortalidade. Em cri-
anças, pode retardar o desenvolvimento estatural, puberal e a maturação esquelética.
Além disso, pode estar associado à dificuldade de aprendizado e repetência escolar. Nos
recém-nascidos, o hipotiroidismo congênito pode ser devastador e de custo social eleva-
do e inaceitável, pois se não tratado até o terceiro mês de vida, provoca danos neuroló-
gicos irreversíveis levando ao cretinismo. Em adultos, está associado à diminuição da
produtividade, falta excessiva ao emprego, hiperlipidemia, acidentes coronarianos e
infertilidade e, nos idosos, à depressão. Em casos mais graves, o quadro pode evoluir
para o coma mixedematoso, no qual a mortalidade é muito elevada.
Como os hormônios tiroidianos influenciam diferentes células e tecidos, as manifes-
tações clínicas do hipotiroidismo são múltiplas e podem variar de severidade, de acordo
com o tempo de instalação da doença e a idade do paciente. Por isso, os sintomas do
hipotiroidismo podem ser confundidos com outros, associados a órgãos específicos, des-
viando a atenção do médico, que deixa de pensar na possibilidade, retardando portanto,
um diagnóstico de fácil comprovação e gratificante tratamento. Na Tabela 5 procura-
mos mostrar as principais confusões diagnosticadas em relação ao hipotiroidismo.
246
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Epidemiologia do câncer
Sérgio Antônio Nechar
247
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Conceitos e definições
Para se medir a freqüência das doenças e a mortalidade por elas provocada, utilizam-
se taxas ou coeficientes que têm três elementos essenciais:
- o grupo de população exposto ao risco de adoecer, ou morrer;
- o fator tempo;
- o número de casos, de doenças, ou de mortes ocorridas na população exposta, em
um certo período de tempo.
As taxas de mortalidade podem ser específicas para várias características, tais como
sexo, idade, tipo ou localização de tumores, etc., permitindo comparações entre diferen-
tes subgrupos de uma mesma população. A morbidade pode ser expressa pelas taxas de
incidência e prevalência.
A incidência expressa o risco de uma determinada população desenvolver uma doen-
ça. A prevalência é a quantidade de casos existentes de uma doença (casos novos e
antigos), relacionando-se, portanto, com a incidência e com a duração da doença. Doen-
ças agudas e fatais como a raiva, por exemplo, têm, assim, incidência e prevalência
semelhantes.
As taxas são utilizadas para comparar dados de diferentes populações. Entretanto, a
análise comparativa entre taxas deve ser cuidadosa. Diferenças entre elas podem refle-
tir, por exemplo, apenas diferenças na composição etária das populações estudadas. Por
esta razão, utiliza-se o recurso da padronização de taxas por idade, visando a anular o
efeito, neste caso, da diferença observada na estrutura etária das populações. A padro-
nização das taxas por idade permite a comparabilidade dos coeficientes de distintos
registros ou países, mesmo que as populações tenham diferentes distribuições etárias.
A Agência Internacional Para Pesquisa Sobre o Câncer (IARC, sigla em Inglês), em
suas publicações sobre a incidência do câncer nos cinco continentes, tem adotado três
248
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Homens Mulheres
Registro/Ano Mundial Truncada Mundial Truncada
(35-64 anos) Truncada (35-74 anos)
Brasil, Porto Alegre (1987) 461,4 645,1 292,4 292,4
Suíça, Genebra (1983-87) 394,5 541,9 274,5 475,2
Canadá, Quebec (1938-87) 370,9 484,6 268,6 463,7
Havaí (1983-87)
- branco 362,4 463,0 309,6 541,3
- japonês 243,5 296,9 186,9 318,4
- havaiano 392,6 443,0 278,9 510,9
- filipino 203,7 259,1 201,8 388,1
- chinês 207,9 247,8 255,1 415,2
EUA Connecticut (1983-87)
- branco 321,7 424,9 278,7 485,3
- negro 352,7 551,5 227,4 411,9
Espanha, Navarra (1983-86) 302,5 449,3 186,6 328,5
Finlândia (1982-86) 301,1 376,0 226,6 368,6
Brasil, Goiânia (1988-89) 293,6 419,1 328,5 564,6
Inglaterra, Oxford (1983-87) 286,6 356,2 242,2 415,5
Japão, Osaka (1983-87) 266,5 372,3 156,1 259,0
249
SOERENSEN & BADINI MARULLI
No cenário dos problemas de saúde, no Brasil, uma das questões que se destaca é o
envelhecimento da população. Em princípio essa informação é positiva. Revela que a
expectativa de vida aumentou para o país como um todo, apesar de todos os problemas
de ordem econômica e social, das disparidades regionais e de acesso a equipamentos
sociais básicos, tais como transporte, moradia, educação e saúde. A mudança, no entan-
to, oferece novos desafios para o setor saúde, porque há uma série de problemas co-
muns ao idoso, como as doenças crônico-degenerativas, dentre elas o câncer, que re-
querem adequação dos programas sanitários.
Na verdade, o Brasil vive hoje uma situação muito especial, pois precisa adequar
seus programas de saúde não só para o aumento das doenças crônico-degenerativas,
mas também para a existência, ainda, das doenças infecciosas e parasitárias.
Em vez da esperada transição epidemiológica presenciada nos países desenvolvi-
dos, onde as doenças crônico-degenerativas substituíram as doenças infecciosas e para-
sitárias, o Brasil apresenta um quadro onde coexistem, e muitas vezes se superpõem, as
doenças da modernidade com as doenças ditas do atraso.
As causas infecciosas e parasitárias vêm reduzindo sua importância relativa, de
modo constante, embora configurem-se ainda em um problema sério em algumas regi-
ões do Brasil, enquanto as doenças crônico-degenerativas só aumentaram sua participa-
ção proporcional entre os óbitos ocorridos.
A industrialização, a urbanização, a exposição freqüente a uma gama de produtos
potencialmente cancerígenos e a expectativa maior de vida contribuem para que o cân-
cer venha assumindo uma importância relativa cada vez maior entre as causas de morte
no país; em 1930 os neoplasmas representavam menos de 3% dos óbitos ocorridos; em
1998, passaram a representar 11,08% dos óbitos ocorridos, constituindo-se, então, na
terceira causa de morte por doença no Brasil (Tabela 3).
Tabela 3 – Brasil
Distribuição proporcional das principais causas de morte – 1998
Causa do Óbito Distribuição percentual (%)
Doenças Ap. Circulatório 27,36
Causas externas ** 12,85
250
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
NEOPLASMAS 11,08
Doenças Ap. Respiratório 9,32
Gland. Endócrinas 5,52
Doenças Infec. e Parasitárias 4,33
Outras 29,54
Total * 100
* Exclui sintomas, sinais e afecções mal definidas.
** As causas externas incluem os suicídios e homicídios.
*** O número de óbitos refere-se ao Brasil e não somente às capitais.
Fonte: SIM. Sistema de Informação sobre Mortalidade. DATASUS/MS.
251
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Tabela 4 - Números e taxas específicas de casos novos e óbitos por câncer estima-
dos para 1998, segundo localização primária e sexo.
O número esperado de óbitos por câncer no Brasil, para 1998, estimado a partir do
número médio de óbitos do período de 1980-95, foi calculado por topografia, sexo e faixa
etária. Este número foi dividido pela população média do período, o que gerou as taxas,
também médias, de óbitos por 100.000 habitantes, igualmente distribuídas por topografia,
sexo e faixa etária.
O número de óbitos esperados para 1998, dividido pela população padrão censitária
de 1991, originou a taxa estimada de mortalidade por câncer, para o Brasil, em 1998.
Supondo-se que o padrão de mortalidade por câncer do período de 1980-95 não se alte-
rará em 1998, obteve-se o número de óbitos estimado para este ano, multiplicando-se a
taxa média de óbitos daquele período pela população estimada para 1998.
252
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A população de 1998, por sua vez, foi estimada, baseando-se nas populações censitárias
de 1980 e 1991. E, pelo método geométrico, estimou-se a população residente no Brasil
em 1998, por sexo e faixa etária. A distribuição da população por região, segundo sexo,
foi baseada na proporcionalidade com relação à população censitária de 1991.
A taxa de mortalidade específica por localização e sexo resultou da divisão do núme-
ro total de óbitos, relativo a cada localização, pelo número correspondente de homens e
mulheres.
Os óbitos esperados para 1998 por neoplasia malignas são apresentados nas tabelas
abaixo, distribuídos por faixa etária, sexo e localizações primárias selecionadas. A dife-
rente subdivisão de faixas etárias abaixo de 29 anos apresentadas nas tabelas Brasil –
Homens e Brasil – Mulheres deve-se a que ou não se registraram óbitos entre 0 e 29
anos ou as topografias selecionadas são incompatíveis com esta faixa etária.
Número de óbitos por câncer estimado para 1998, segundo faixa etária e sexo. Brasil
- Faixa etária
(anos) Homens Mulheres Total
0a9 915 720 1.635
10 a 19 860 635 1.495
20 a 29 1.140 1.055 2.195
30 a 39 2.240 3.160 5.400
40 a 49 5.360 6.040 11.400
50 a 59 10.760 8.985 19.745
60 a 69 15.965 11.890 27.855
70 a 79 13.770 10.615 24.385
80 e mais 7.060 6.780 13.840
Total 58.070 49.880 107.950
Número de óbitos por câncer estimado para 1998, segundo faixa etária,
sexo e topografias selecionadas.
Brasil – Homens
Faixa etária (anos) Pulmão Estômago Próstata Esôfago Cólon e Reto
Menores de 29 60 50 10 10 70
30 a 39 180 250 10 80 130
40 a 49 730 775 45 480 230
50 a 59 2.015 1.660 290 1.015 430
60 a 69 3.230 2.590 1.170 1.225 730
70 a 79 2.345 2.295 2.015 795 735
80 e mais 840 1.060 1.655 355 420
Total 9.400 8.680 5.195 3.960 2.745
Número de óbitos por câncer estimado para 1998, segundo faixa etária,
sexo e topografias selecionadas.
Brasil – Mulheres
Faixa etária (anos) Mama Colo do Útero Estômago Pulmão Cólon e Reto
253
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Menores de 29 70 130 50 40 55
30 a 39 640 710 180 115 150
40 a 49 1.370 1.310 360 315 265
50 a 59 1.690 1.495 640 645 480
60 a 69 1.650 1.500 1.120 945 805
70 a 79 1.095 1.090 1.265 810 880
80 e mais 650 580 905 430 660
Total 7.165 6.815 4.520 3.300 3.295
Casos novos e taxa específica de incidência de câncer estimados para 1998, segundo
localização primária e sexo.
Brasil
Total Homens Mulheres
Localização Nº de % Nº de Taxa Nº de Taxa
254
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Casos novos e taxa específica de incidência de câncer estimados para 1998, segundo
localização primária e sexo.
Região Norte
Homens Mulheres
Localização Nº de Taxa Localização Nº de Taxa
Primária casos Esp.* primária casos Esp.**
Estômago (151) 1.310 25,6 Colo do Útero (180) 2.300 46,8
Pulmão (162) 720 14,1 Mama (174) 1.0802 2,0
Próstata (185) 530 10,4 Estômago (151) 510 10,4
Boca (140-5) 350 6,8 Cólon e Reto (153-4) 340 6,9
Cólon e Reto (153-4) 225 4,4 Pulmão (162) 220 4,5
Esôfago (150) 175 3,4 Boca (140-5) 1803,7
Bexiga (188) 140 2,7 Corpo do Útero (182) 100 2,0
Outras * 3.785 74,0 Esôfago (150) 40 0,8
Total 7.235 141,4 Bexiga (188) 350,7
Outras* 2,580 52,5
Total 7.385 150,3
Homens e Mulheres
Localização primária Número de casos
Colo do Útero (180) 2.300 15,73 %
Estômago (151) 1.820 12,45 %
Mama (174) 1.080 7,39 %
Pulmão (162) 940 6,43 %
Cólon e Reto (153-4) 565 3,86 %
Próstata (185) 530 3,62 %
Boca (140-5) 530 3,62 %
Esôfago (150) 215 1,47 %
255
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Casos novos e taxa específica de incidência de câncer estimados para 1998, segundo
localização primária e sexo.
Região Nordeste
Homens Mulheres
Localização Nº de Taxa Localização Nº de Taxa
Primária casos Esp.* primária casos Esp.**
Estômago (151) 5.280 25,3 Mama (174) 8.770 40,5
Próstata (185) 3.150 15,1 Colo do Útero (180) 8.210 37,9
Pulmão (162) 2.790 13,4 Estômago (151) 2.460 11,4
Cólon e Reto (153-4) 1.400 6,7 Cólon e Reto (153-4) 1.520 7,0
Esôfago (150) 1.180 5,7 Corpo do Útero (182) 1.280 5,9
Boca (140-5) 1.170 5,6 Pulmão (162) 1.000 4,6
Bexiga (188) 620 3,0 Boca (140-5) 710 3,3
Outras * 18.870 90,6 Esôfago (150) 480 2,2
Total 34.460 165,4 Bexiga (188) 220 1,0
Outras* 16.935 78,1
Total 41.585 191,9
Homens e Mulheres
Localização primária Número de casos
Mama (174) 8.770 11,53 %
Estômago (151) 8.210 10,80 %
Mama (174) 7.740 10,18 %
Pulmão (162) 3.790 5,0 %
Cólon e Reto (153-4) 3.150 4,14 %
Próstata (185) 2.920 3,84 %
Boca (140-5) 1.880 2,47 %
Esôfago (150) 1.660 2,18 %
Bexiga (188) 1.280 1,58 %
Corpo de Útero (182) 840 1,1 %
Outras * 35.805
Total 76.045
* por 100.000 homens
* por 100.000 mulheres
* inclui pele
256
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Homens e Mulheres
Localização primária Número de casos
Mama (174) 1.710 7,50 %
Colo do Útero (180) 1.525 6,69 %
Próstata (185) 1.105 4,85 %
Estômago (151) 1.020 4,48 %
Cólon e Reto (153-4) 960 4,21 %
Pulmão (162) 950 4,17 %
Boca (140-5) 465 2,04 %
Bexiga (188) 350 1,54 %
Esôfago 350 1,54%
Corpo de Útero (182) 155 0,68 %
Outras * 14.200
Total 22.790
* por 100.000 homens
** por 100.000 mulheres
* inclui pele
Fonte: MINISTÉRIO DA SAÚDE INCA/PRO-ONCO. Estimativa da incidência e
mortalidade por câncer no Brasil 1998. Rio de Janeiro, 1998.
257
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Homens e Mulheres
Localização primária Número de casos
Pulmão (162) 8.380 14,75 %
Mama 174) 8.250 14,52 %
Cólon e Reto (153-4) 5.460 9,61 %
Próstata (185) 3.670 6,46 %
Colo do Útero (180) 3.300 5,81 %
Estômago (151) 3.280 5,77 %
Esôfago 2.855 5,02 %
Bexiga (188) 1.975 3,40 %
Boca (140-5) 1.515 2,67 %
Corpo de Útero (182) 990 1,74 %
Outras * 17.155
Total 56.830
* por 100.000 homens
** por 100.000 mulheres
* inclui pele
Fonte: MINISTÉRIO DA SAÚDE INCA/PRO-ONCO. Estimativa da incidência e
mortalidade por câncer no Brasil 1998. Rio de Janeiro, 1998.
258
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Homens e Mulheres
Localização primária Número de casos
Mama (174) 12.885 13,05 %
Cólon e Reto (153-4) 9.645 9,77 %
Estômago (151) 6.805 6,89 %
Colo do Útero (180) 6.390 6,47 %
Próstata (185) 6.210 6,29 %
Pulmão (162) 5.940 6,02 %
Bexiga (188) 4.315 4,37 %
Boca (140-5) 3.755 3,80 %
Corpo do Útero (182) 3.160 3,20 %
Esôfago 2.060 2,10 %
Outras * 37.550
Total 98.715
* por 100.000 homens
** por 100.000 mulheres
* inclui pele
Fonte: MINISTÉRIO DA SAÚDE INCA/PRO-ONCO. Estimativa da incidência e
mortalidade por câncer no Brasil 1998. Rio de Janeiro, 1998.
Considerações finais
Os números de óbitos estimados e casos novos por câncer devem ser interpreta-
dos com cautela, quando utilizados para estudos comparativos e de tendências.
O número estimado de óbitos baseia-se na suposição de que o padrão de mortalidade
do período estudado se manterá o mesmo no período estimado. O mesmo raciocínio se
dá com o número de casos novos, cujo cálculo se baseia no pressuposto de que a distri-
buição desses casos, no período divulgado pelo registro, também se manterá no ano da
estimativa.
A estimativa anual do número de óbitos e de casos novos de câncer busca atualizar
os dados de morbi-mortalidade por câncer no Brasil. Por sua vez, a extrapolação dos
dados dos RCBP permite estimar a incidência do câncer em toda a população brasileira.
Quanto maior a extrapolação, menor a precisão dos dados estimados, daí a necessi-
dade de se continuar buscando ampliar a cobertura populacional dos registros de câncer.
À medida que estimativas anuas se sucederem, com dados mais completos, poder-
se-á contar, no Brasil, com informações cada vez mais próximas da realidade.
Além disso, o trabalho contínuo dos RCBP permitirá a análise de séries históricas da
259
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Câncer cutâneo
Eugênio Raul de Almeida Pimentel
260
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
da curetagem e eletrocoagulação.
- A Radioterapia é um método clássico menos usado atualmente e contra-indicado
nos doentes mais jovens.
- A Cirúrgica Micrográfica de Mohs é uma cirurgia mais trabalhosa pois envolve um
laboratório para exame por congelação, mas é a que tem mostrado maior índice de cura,
sendo indicada principalmente nos tumores recidivados, ou do tipo esclerodermiforme ou
naqueles com limites mal definidos.
Com relação ao Carcinoma Espinocelular, podem-se utilizar as mesmas modalidades
terapêuticas, com mais ênfase para Cirurgia Excisional ou Cirurgia Micrográfica de
Mohs, e a avaliação da presença de matástases principalmente em gânglios, pois este
tipo de tumor pode disseminar-se sobretudo quando localizado em mucosas ou extremi-
dades e quando não evolui de queratoses actínicas ou com até 6 mm de diâmetro.
Quanto ao Melanoma, o tratamento é essencialmente cirúrgico e é importante o exa-
me histopatológico para avaliar a profundidade de invasão, ou seja, os Níveis de Clark e
Breslow, pois assim poderá ser orientada a margem cirúrgica e a probabilidade de
metástase e poderá ser definido se a retirada de gânglios será realizada profilaticamente.
Como medida preventiva importante deve-se orientar a população, especialmente as
pessoas de pele clara, quanto à exposição ao sol, principalmente entre as 9 e 16 horas no
verão e uso de protetor contra a radiação ultravioleta, usando barreiras físicas como o
guarda-chuva, chapéus ou equivalentes.
Podem-se utilizar também os protetores químicos como os cremes ou loções com
substâncias fotoprotetoras.
É importante também o tratamento de lesões precursoras do câncer cutâneo. As
lesões precursoras do câncer cutâneo não melanomas são:
- Queratose Actínica e leucoplasias que podem evoluir para o carcinoma espinocelular.
- Cicatrizes de Queimaduras, radiodermatite crônica, úlceras crônicas que podem
evoluir para carcinoma basocelular ou espinocelular.
As lesões precursoras do melanoma são os nevos melanocíticos congênitos, princi-
palmente aqueles maiores do que 20 cm de diâmetro; os nevos melanocíticos adquiridos
que aparecerem na infância e adolescência; os nevos displásticos que surgem na infân-
cia, adolescência e no jovem adulto, sendo diferenciado dos anteriores por não apresen-
tarem a cor ou borda uniformes.
Por último, uma mancha pigmentada de crescimento lento, que aparece no idoso,
chamada Lentigo Maligno, pode evoluir para Melanoma em aproximadamente 30% dos
casos.
A importância quanto à saúde pública é esclarecer a população sobre as modifica-
ções destes nevos pigmentados, tais como o crescimento rápido, modificações na cor,
alterações das bordas, ou presença de halo eritemato, prurido, ulcerações e presença de
pequenos pontos escuros ao redor.
Resumindo, a prevenção do câncer cutâneo deve ser a conscientização da população
quanto à exposição ao sol e ao tratamento precoce das lesões pré-malignas ou malignas
em fase inicial por meio de orientação de grupos paramédicos e de campanhas de saúde
pública.
261
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Dermatite ocupacional
Eugênio Raul de Almeida Pimentel
262
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Cardiologia
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Endocrinologia
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WORLD HEALTH ORGANIZATION. National Cancer Control Programmes: Policies and
263
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Noções de Imunologia
Kathia Brienza Badini Marulli
Introdução
O termo “imunologia” tem sua origem no vocábulo grego “immunis”, que significa
“livre de”, “protegido contra”. Assim, pode-se concluir que o objeto de estudo desta
ciência é a maneira como ocorre a proteção do organismo.
Existem várias aplicações para os princípios e conhecimentos da Imunologia:
prevenção de doenças ou imunoprofilaxia: é feita principalmente por meio da apli-
cação de vacinas, que imunizam aqueles que as recebem, protegendo-os contra
doenças específicas;
diagnóstico: existem vários testes para diagnóstico que se baseiam nos princípios
das reações imunológicas (sorodiagnóstico, alergodiagnóstico, etc.);
tratamento das doenças: muitas vezes a intervenção terapêutica deve ser imedia-
ta, não havendo tempo para que o organismo produza sua própria defesa. Nestas
ocasiões, os pacientes necessitam receber soros hiperimunes, ou seja, com anticorpos
específicos já prontos, produzidos por outros indivíduos (soro antiofídico, antitoxina
botulínica e tetânica, por exemplo).
Para se entender como ocorre a proteção do organismo do homem e dos animais,
alguns dos fatores envolvidos na relação entre hospedeiro (animais domésticos, homem)
e parasitas (agentes patogênicos) devem ser recordados.
Agentes patogênicos (ou patógenos) são aqueles capazes de causar doenças, como
bactérias, vírus, fungos, protozoários, helmintos, etc.. Quando um agente patogênico
invade os tecidos do hospedeiro, neles se multiplicando, dizemos que está ocorrendo uma
infecção. Nem todas as infecções resultam em doença (algumas ficam subclínicas, por
exemplo); vários fatores determinarão se a enfermidade ocorrerá ou não, como, por
exemplo, a virulência do agente, o número de patógenos a que o hospedeiro é exposto e
a resistência do hospedeiro. Virulência é o grau de patogenicidade de um agente infec-
cioso, indicado pelas taxas de letalidade e pela sua capacidade para invadir e danificar os
tecidos do hospedeiro. A patogenicidade é a capacidade de o agente produzir doença.
Alguns microrganismos não afetam o homem (ou os animais) porque são incapazes
de ultrapassar as barreiras naturais do hospedeiro à infecção (ou seja, a defesa do orga-
nismo, nestes casos, é eficiente).
264
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
como proteção para diversos agentes. Não dependem do contato prévio com o agente
infeccioso (que passaremos a denominar ANTÍGENO). Estão presentes ao nascer ou
se desenvolvem naturalmente com o crescimento e/ou maturação do hospedeiro. A de-
fesa inespecífica é tão importante quanto a específica.
Estes mecanismos são constituídos por:
2. DEFESA HUMORAL:
Substâncias presentes no soro, que auxiliam na defesa do organismo:
- sistema complemento (conjunto de proteínas do soro);
- interferon (proteína produzida por células infectadas por vírus);
- interleucinas (ou citocinas).
3. DEFESA CELULAR:
Células responsáveis pela fagocitose, ou seja, pela englobação e destruição de partí-
culas sólidas. As células fagocitárias dividem-se em:
- polimorfonucleares: neutrófilos, eosinófilos, basófilos;
- mononucleares: monócitos e macrófagos (sistema retículo-endotelial).
4. RESPOSTA INFLAMATÓRIA:
Caracterizada por edema, eritema, dor e calor, a resposta inflamatória é uma respos-
ta do organismo a uma agressão externa. É composta por vários fenômenos, dentre eles
o acúmulo de polimorfonucleares e macrófagos no local.
FATORES QUE INFLUENCIAM A RESPOSTA NÃO ESPECÍFICA
idade;
sexo;
raça e espécie (fatores genéticos);
nutrição;
irradiação;
drogas supressoras (corticóides);
traumatismos;
estresse (aumenta a secreção de glicocorticóides, que limitam a produção de
linfócitos e a síntese de imunoglobulinas).
265
SOERENSEN & BADINI MARULLI
266
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
comentado a seguir.
A função primária da resposta imune é identificar elementos estranhos ao organismo
(microrganismos, enxertos, substâncias do meio ambiente). A discriminação entre o “pró-
prio” e o “não-próprio” é obtida por meio das moléculas do complexo principal de
histocompatibilidade (CPH ou MHC = major histocompatibility complex). O antígeno
só é reconhecido pelos linfócitos T quando está em conjunto com moléculas do CPH.
O CPH é um grupo de proteínas localizadas na superfície de várias células. Existem
duas classes diferentes de CPH, e cada uma delas é reconhecida por um tipo de linfócito
T. As moléculas de CPH de classe I são expressas virtualmente por todos os tipos de
células somáticas e são usadas para apresentar substâncias às células T-CD8, a maioria
das quais são citotóxicas. Praticamente qualquer célula pode apresentar antígenos às
células T-citotóxicas e assim servir como objeto de uma resposta citotóxica.
As proteínas CPH de classe II são expressas apenas por macrófagos (e por algu-
mas outras poucas células) e são necessárias para a apresentação do antígeno às célu-
las T-CD4 (células helper). Como a ativação dos linfócitos T-helper é necessária para a
ocorrência de todas as respostas imunes, as CPH de classe II ligadas à célula apresen-
tadora de antígeno (APC) desempenham um papel essencial no controle destas respos-
tas.
Os antígenos são capturados pelas células apresentadoras de antígeno, são proces-
sados e ficam expostos na superfície da célula, associados às moléculas de CPH de
classe II. Desta forma, podem ser detectados por células T-helper. Este processo é
denominado apresentação do antígeno. Um linfócito T-CD4 que entra em contato direto
com uma célula apresentadora de antígeno torna-se ativado (para que isso aconteça, o
linfócito deve possuir receptores em sua superfície que reconheçam e se liguem ao
complexo CPH-antígeno apresentado pela APC).
Linfócitos t
São as células responsáveis pela imunidade celular. Não produzem anticorpos. São
importantes na defesa contra fungos, enxertos, células neoplásicas, enfermidades infec-
ciosas crônicas (como, por exemplo, a Tuberculose).
Os linfócitos T agem pela liberação de fatores solúveis (interleucinas), que emitem
sinais para outras células, ou por interação direta célula a célula.
267
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Linfócitos B
São os responsáveis pela imunidade humoral.
Não possuem receptores CD4, nem CD8, em sua superfície. Apresentam receptores
para componentes do Sistema Complemento, para a Fc de imunoglobulinas e imunoglobulinas
na superfície.
Mediante a ação de interleucinas produzidas pelos linfócitos T, os linfócitos B dife-
renciam-se em células denominadas plasmócitos, cuja vida média é de 2 a 3 dias. A
principal função dos plasmócitos é a produção de proteínas denominadas imunoglobulinas
(anticorpos).
Interleucinas
As interleucinas (ou citocinas) são compostas por peptídeos ou glicoproteínas. Possuem a
função de mediadores, que atuam como reguladores positivos e negativos das respostas
imune e inflamatória e da resposta de reparo do hospedeiro a lesões.
As citocinas produzidas por linfócitos são conhecidas como LINFOCINAS e as pro-
duzidas por macrófagos e monócitos, como MONOCINAS.
268
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
tores de membrana das células NK ainda não foram identificados). São importantes na
destruição de células parasitadas por agentes intracelulares (por exemplo, em processos
virais) ou células anômalas (por exemplo, células tumorais).
As células NK constituem uma subpopulação de linfócitos que se originam de uma
célula precursora proveniente da medula óssea. Estas células não possuem especificidade
antigênica e não adquirem memória imunológica após exposição inicial a células infectadas
por vírus ou tumores.
Sistema complemento
Conjunto de proteínas presentes no soro dos vertebrados. O Sistema Complemento é
necessário para certas reações imunológicas ou as amplia.
O título (a quantidade) de Complemento no soro não aumenta pela imunização.
Pode ser inativado pelo aquecimento a 560C por 30 minutos (ou seja, é uma substân-
cia termo-lábil).
O Sistema Complemento é constituído por nove componentes, denominados C1 a C9
(sendo que o C1 possui 3 subcomponentes, perfazendo um total de 11 proteínas).
Certas reações requerem a interação dos nove componentes do Complemento:
bacteriólise específica, citólise específica ou hemólise específica e destruição específica
das células de tecidos. O Complemento também é responsável pelo controle do proces-
so inflamatório.
A reação em cadeia (em seqüência) dos nove componentes do Complemento é cha-
mada “cascata do Complemento” ou via clássica para ativação do Complemento. Após
a ativação, por reação de anticorpos (IgG ou IgM) com antígenos, o primeiro componen-
te adquire a capacidade de ativar o componente seguinte, este ativa o próximo e assim
sucessivamente. A ativação do Complemento por anticorpos ligados a antígenos é um
mecanismo de resposta específica.
A via alternativa começa com a ativação de C3. Algumas bactérias ativam o sistema
Complemento espontaneamente, pela via alternativa (mecanismo inespecífico). Ocorre
o revestimento da bactéria com moléculas do Sistema Complemento, facilitando sua
fagocitose. Este fenômeno recebe o nome de opsonização.
Com a lise da parede bacteriana, são liberados produtos do Sistema Complemento,
que atraem fagócitos para o local. Este fenômeno recebe o nome de quimiotaxia.
As imunoglobulinas IgG e IgM são as únicas que fixam Complemento pela via clássica.
O Complemento não é fixado quando há um extremo excesso de antígeno em relação aos
anticorpos ou quando há extremo excesso de anticorpos em relação ao antígeno.
Anticorpos
São proteínas encontradas no soro que reagem muito especificamente com o antígeno
que estimulou sua produção. A produção de anticorpos é um tipo de resposta imunológica.
Os anticorpos também são conhecidos como imunoglobulinas.
Existem cinco classes de imunoglobulinas: IgM, IgG, IgA, IgE e IgD. As
imunoglobulinas são termo-estáveis, ou seja, não são inativadas pelo aquecimento do
soro num banho-maria a 560C por 30 minutos. Exceção: IgE.
O feto, no útero, tem a capacidade de produzir IgM (por volta da 20a semana de
gestação). Ao nascimento, a quantidade de IgM é muito pequena (na ausência de infec-
269
SOERENSEN & BADINI MARULLI
ção). Por outro lado, ao nascer, a criança tem um nível de IgG igual ao do soro normal de
um adulto (adquiriu da mãe).
Nos primeiros meses de vida, os anticorpos recebidos da mãe são dissipados e, aos
dois meses de idade, a criança está com o menor nível de imunoglobulinas. Deve, então,
começar a produzir seus próprios anticorpos, por meio de estímulos antigênicos do meio
ambiente, vacinação, etc..
v IgG
Corresponde a cerca de 70-75% do total de imunoglobulinas do organismo. Alta
concentração no sangue (intravascular) e nos tecidos (extravascular). Consegue passar
através da placenta e é responsável pela imunidade passiva do recém-nascido. É a
principal imunoglobulina formada na resposta secundária.
v IgA
270
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
v IgE
Responsável por algumas reações de hipersensibilidade do tipo imediato, como por
exemplo a anafilaxia e a atopia. É termo-lábil. Precisa ser demonstrada por técnicas
especiais, pois não causa precipitação, aglutinação ou fixação de Complemento.
v IgD
Corresponde a menos de 1% do total. Sua função biológica ainda não está totalmente
esclarecida.
TIPOS DE IMUNIDADE
Podemos classificar os tipos de imunidade (resistência específica) em:
1. Imunidade Ativa: é quando o próprio organismo produz os anticorpos. Pode ser:
1.1. Naturalmente adquirida – quando o organismo tem contato com um microrganis-
mo de forma espontânea. Ex.: infecção.
1.2. Artificialmente adquirida – o antígeno é ministrado ao indivíduo. Ex.: vacinação.
2. Imunidade passiva: os anticorpos são produzidos num indivíduo e transferidos para
outro.
2.1. Naturalmente adquirida – passagem de anticorpos da mãe para o feto através da
placenta (IgG) ou passagem de anticorpos da mãe para o filho via colostro (cães: IgA,
IgM e IgG).
2.2. Artificialmente adquirida – aplicação de soros hiperimunes.
Tipos de vacina
Composição:
1. Vacina bacteriana morta. (Ex.: carbúnculo sintomático, gangrena gasosa);
2. Vacina bacteriana atenuada. (Ex.: brucelose);
A cepa atenuada está viva, mas está com a virulência diminuída, ou seja, está atenu-
ada a ponto de não ser mais capaz de causar doença, mas deve estar antigenicamente
inalterada. É melhor que a morta, porque a imunidade induzida pela atenuada persiste
por mais tempo.
271
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Hipersensibilidade
272
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Imunoprofilaxia
Bruno Soerensen
273
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Para a produção das vacinas inativadas é necessário que o microrganismo possa ser
cultivado “in vitro” em meio de cultura de preferência sintético, como no caso das vaci-
nas bacterianas, ou ainda em cultura celular ou no organismo vivo como com as vacinas
virais. Desta maneira pode-se preparar a vacina contra o sarampo cultivando o vírus em
fisioblastos de embrião de galinha, ou a vacina contra a raiva em cérebro de camundon-
gos lactantes (vacina Fuenzalida-Palácios) ou ainda a vacina anti-rábica preparada com
células diplóides humanas (HDCV).
Um caso muito especial é o das vacinas contra a Hepatite B que até o presente
momento são preparadas com antígeno de superfície do vírus da Hepatite B (HBs Ag),
tratando o antígeno de superfície viral o plasma humano para eliminar os componentes
indesejáveis do plasma e evitar, assim, qualquer risco de microrganismos patogênicos
contidos no plasma do doador, com destaque para a Síndrome de Imunodeficiência Ad-
quirida.
A proteção conferida pelas vacinas de microrganismos de virulência atenuada se
aproxima à obtida na infecção natural, podendo ocorrer manifestação clínica decorrente
da vacinação, mas sempre deverá ser de importância secundária, de maneira a não
comprometer a saúde dos vacinados.
As vacinas vivas contra a tuberculose, poliomielite, sarampo, rubéola, caxumba e
febre amarela são utilizadas amplamente.
Na preparação das vacinas de virulência atenuada devemos utilizar microrganismos
geneticamente estáveis para evitar reversões genéticas da cepa na preparação da vaci-
na ou no indivíduo vacinado, embora até o presente momento não tenha sido relatado
esse fenômeno. O acidente de Lübeks ocorrido na Alemanha em 1930, quando 72 crian-
ças morreram de 251 vacinadas com BCG administrada por via oral, foi devidamente
esclarecido pois, mediante rigoroso inquérito, foi verificado que o laboratório produtor da
vacina não tomou os devidos cuidados, utilizando ao invés de cepa BCG uma amostra
virulenta de M. tuberculosis.
Existem recomendações de utilização de cepas seguras, de características bem co-
nhecidas e, sempre que possível, sob a forma de lote semente Seed lot com a finalidade
de diminuir qualquer risco de modificação de suas características originais.
Embora nenhuma vacina possa ser considerada absolutamente inócua, o risco no seu
uso deverá ser muito menor do que aquele que apresenta a doença que se pretende
prevenir. No caso das vacinas vivas contra a poliomielite, para cada 3 milhões de doses
de vacina administrada pode-se esperar, aproximadamente, um caso de paralisia relaci-
onada à vacina, embora este fato não tenha tido confirmação.
Alguns vírus do herpes estão associados à transformação celular, existindo portanto
possibilidades de determinar neoplasia maligna, e deverá ser tomado o maior cuidado no
caso especial de vacinas atenuadas preparadas com esses agentes no sentido de rigoro-
sas provas de inocuidade.
A produção das vacinas inativadas e das vacinas vivas deverá obedecer a rigorosos
controles de processamento, assim como atender aos requisitos específicos para cada
vacina, no referente à segurança e à capacidade protetora.
Por meio de nova biotecnologia, podemos ter duas técnicas de grande importância:
1. Manipulação de seqüência de codificação definida do DNA e sua expressão con-
trolada em células hospedeiras apropriadas.
274
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
275
SOERENSEN & BADINI MARULLI
dade.
A produção em escala industrial de imunoglobulinas monoclonais antimicrobianas
definidas tem seu papel relevante na imunoprofilaxia, assim como na imunoterapia e
imunodiagnóstico, como, por exemplo, a imunoglobulina relacionada à toxinas
antimicrobianas ou anticelulares.
A preparação de clones de células imunocompetentes (células B, células T) desem-
penha uma função na pesquisa imunológica básica ou, ainda potencialmente no futuro
próximo, na luta contra doenças.
Por meio desta nova biotecnologia estão sendo preparadas, prioritariamente, vacinas
de difícil obtenção pelos métodos convencionais, como as da Hepatite B ou ainda outras
como a vacina contra Febre Hemorrágica Africana.
1 - Elaboração da vacina
1.1 - Deve-se evitar o uso de cepas não suficientemente antigênicas (impróprias).
Com esta finalidade, os microorganismos a serem usados na fabricação de vacinas são
fornecidos aos laboratórios fabricantes pela Organização Mundial da Saúde e pelo Mi-
nistério da Saúde para as vacinas de uso humano, e pelo Ministério da Agricultura, para
as de uso veterinário.
1.2 - A tecnologia de produção deverá garantir a obtenção de uma boa vacina.
1.3 - O laboratório produtor deverá submeter cada lote de vacina a provas de segu-
rança, inoculando-a em animais de laboratório, independentemente de testes químicos,
provas estas que têm como finalidade verificar se a vacina, quando inoculada, não irá
trazer problemas.
As provas de potência visam avaliar em animais de laboratório, em cultura celular,
276
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
em meios de cultura ou, ainda, por meio dos métodos imunológicos ou químicos, junto a
uma vacina Padrão Internacional, se a vacina está em condições de proteger especifica-
mente contra a moléstia.
1.4 - Devem ser feitas provas de termo-estabilidade, para verificar se a vacina sub-
metida a condições adversas de temperatura conserva a sua capacidade imunizante e
durante que período de tempo.
2 - Transporte e estocagem
2.1 - O transporte depende da labilidade térmica da vacina e deverá ser feito a baixa
temperatura (2-8ºC), em caixas de isopor apropriadas e acondicionadas com gelo reciclável.
Quando o tempo previsto para o transporte for de vários dias, e especialmente em zonas
tropicais com elevadas temperaturas, poderá ser acondicionada com gelo seco, toman-
do-se as devidas preocupações para se evitar o congelamento de vacinas líquidas, cuja
qualidade possa ser alterada, como a vacina tríplice humana contra a Difteria, Coquelu-
che e Tétano. As vacinas que contêm microorganismos de virulência atenuada geral-
mente são liofilizadas, isto é, desidratadas a baixa temperatura, pois na forma de pó os
microorganismos mantêm-se vivos durante longos períodos, alguns deles mesmo fora de
refrigeração, existindo entretanto, recomendações para sua manutenção a temperaturas
baixas (2-8 ºC).
2.2 - A estocagem de todas as vacinas, mesmo as liofilizadas, deverá ser feita a baixa
temperatura (2-8ºC), obedecendo-se assim as recomendações da bula que acompanha a
vacina. Somente desta maneira poderemos garantir a qualidade da mesma durante o
período de validade.
Os grandes centros de estocagem de vacinas deverão estar dotados de câmaras
frigoríficas e congeladores com sistemas de segurança para garantir a manutenção das
temperaturas recomendadas mesmo quando exista interrupção de energia elétrica na
cidade. Isto é conseguido com geradores de partida automática, que entram em ação
sempre que exista corte da corrente elétrica.
Doses de vacinas são inutilizadas em número elevado devido ao transporte ou
estocagem em condições inadequadas. Quando a estocagem é feita em centros peque-
nos, recomenda-se que os refrigeradores sejam usados somente para esta finalidade,
evitando-se de qualquer maneira que outros materiais, como alimentos, sejam guardados
na mesma geladeira.
3 - Prazo de validade
O prazo de validade refere-se ao período de tempo de estocagem da vacina durante
o qual a mesma poderá ser usada, sempre que sejam obedecidas rigorosamente as con-
dições de transporte e estocagem.
As vacinas deverão ser usadas no período compreendido no prazo de validade esti-
pulado na embalagem da vacina.
4 - Aplicação da vacina
277
SOERENSEN & BADINI MARULLI
278
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
6 - Acidentes vacinais
Os acidentes vacinais, raríssimos, são devido a erros graves na fabricação da vacina,
por falta de cuidados nos testes de segurança. Geralmente decorrem de uma inativação
incompleta dos microorganismos utilizados na elaboração da vacina, a qual, ao invés de
prevenir a moléstia para a qual está indicado o seu uso, muito pelo contrário, determina
a moléstia em toda a sua plenitude. Podem ainda ser decorrentes de toxinas residuais,
levando a processos graves.
Os adjuvantes (substâncias adicionadas a algumas vacinas com a finalidade de se
conseguir melhor efeito protetor), quando adicionados em quantidade exagerada, ou ain-
da, anti-sépticos (que têm por finalidade evitar a proliferação de bactérias e fungos
contaminantes, adicionados às vacinas), em quantidades além das permitidas, também
podem ser responsáveis por reações no local da vacinação. As vacinas contaminadas
durante sua elaboração ou no momento de sua aplicação podem ser responsáveis por
abscessos no ponto de inoculação, sendo possível o isolamento do microorganismo
contaminante responsável. Acidentes desta natureza são atualmente raros devido ao
rigoroso controle exercido pelos Ministérios da Saúde e da Agricultura, assessorados
pela Organização Mundial da Saúde. A verificação de número elevado de reações vacinais
provocadas por vacinas de um mesmo lote indica uma possível falha na fabricação da
vacina.
7 - Coberturas de vacinação
Finalmente, para se obter repercussões epidemiológicas, como o declínio da doença
nas populações, é necessária uma cobertura de vacinação ao redor de 80% da popula-
ção alvo; somente desta maneira, com a redução de suscetíveis (pessoas não imunes)
poderemos controlar e erradicar a doença.
Quanto maior for o número de crianças vacinadas, melhores serão os resultados. Da
mesma forma, se a população adulta de alto risco (grupo da população que devido à sua
condição sócio-econômica, hábitos ou atividade profissional se encontra exposto a con-
trair determinadas doenças) for protegida por meio da vacinação, teremos um declínio e
um controle das doenças preveníveis. Neste aspecto, a educação sanitária se reveste de
enorme importância.
279
SOERENSEN & BADINI MARULLI
ANTUNES, L.J e MATOS, K.T.F. Imunologia Médica. São Paulo: Atheneu, 1992.
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Imunoprofilaxia
SOERENSEN, B. Vacinas. São Paulo: Santos, 1995.
280
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
I Preâmbulo
A presente Resolução fundamenta-se nos principais documentos internacionais que
emanaram declarações e diretrizes sobre pesquisas que envolvem seres humanos: o
Código de Nuremberg (1947), a Declaração dos Direitos dos Homem (1948), a Decla-
ração de Helsinque (1964 e suas versões posteriores de 1975, 1983 e 1989), o Acordo
281
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (ONU, 1966, aprovado pelo Congresso
Nacional Brasileiro em 1992), as Propostas de Diretrizes Éticas Internacionais para
Pesquisas Biomédicas Envolvendo Seres Humanos (CIOMS/OMS 1982 e 1993) e as
Diretrizes Internacionais para Revisão Ética de Estudos Epidemiológicos (CIOMS, 1991).
Cumpre as disposições da Constituição da República Federativa do Brasil de 1998 e da
legislação brasileira correlata: Código de Direitos do Consumidor, Código Civil e Código
Penal, Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Orgânica da Saúde 8.080, de 19/09/90
(dispõe sobre as condições de atenção à saúde, a organização e o funcionamento dos
serviços correspondentes), Lei 8.142, de 28/12/90 (participação da comunidade na ges-
tão do Sistema Único de Saúde), Decreto 99.438, de 07/08/90 (organização e atribuições
do Conselho Nacional de Saúde), Decreto 98.830, de 15/01/90 (coleta por estrangeiros
de dados e materiais científicos no Brasil), Lei 8.489, de 18/11/92 e Decreto 879, de 22/
07/93 (dispõem sobre retirada de tecidos, órgãos e outras partes do corpo humano com
fins humanitários e científicos), Lei 8.501, de 30/11/92 (utilização de cadáver), Lei 8.974,
de 05/01/95 (uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente de
organismo geneticamente modificados), Lei 9.279, de 14/05/96 (regula direitos e obriga-
ções relativos à propriedade industrial), e outras.
Esta Resolução incorpora, sob a ótica do indivíduo e das coletividades, os quatro
referenciais básicos da bioética: autonomia, não maleficência, beneficência e justiça,
entre outros, e visa assegurar os direitos e deveres que dizem respeito à comunidade
científica, aos sujeitos da pesquisa e ao Estado.
O caráter contextual das considerações aqui desenvolvidas implica em revisões
periódicas desta Resolução, conforme necessidades nas áreas tecnocientífica e ética.
Ressalta-se, ainda, que cada área temática de investigação e cada modalidade de
pesquisa, além de respeitar os princípios emanados deste texto, deve cumprir com as
exigências setoriais e regulamentações específicas.
II Termos e definições
A presente Resolução adota no seu âmbito as seguintes definições:
II.1 – Pesquisa – classe de atividades cujo objetivo é desenvolver ou contribuir para
o conhecimento generalizável. O conhecimento generalizável consiste em teorias, rela-
ções ou princípios ou no acúmulo de informações sobre as quais estão baseados, que
possam ser corroborados por métodos científicos aceitos de observação e inferência.
II.2 – Pesquisa envolvendo seres humanos – pesquisa que, individual ou coletiva-
mente, envolva o ser humano, de forma direta ou indireta, em sua totalidade ou partes
dele, incluindo o manejo de informações ou materiais.
II.3 – Protocolo de Pesquisa – documento contemplando a descrição da pesquisa em
seus aspectos fundamentais, informações relativas ao sujeito da pesquisa, à qualificação
dos pesquisadores e a todas as instâncias responsáveis.
II.4 – Pesquisador responsável – pessoa responsável pela coordenação e realização
da pesquisa e pela integridade e bem-estar dos sujeitos da pesquisa.
II.5 – Instituição de pesquisa-organização, pública ou privada, legitimamente consti-
tuída e habilitada na qual são realizadas investigações científicas.
II.6 – Promotor – indivíduo ou instituição responsável pela promoção da pesquisa.
II.7 – Patrocinador – pessoa física ou jurídica que apoia financeiramente a pesquisa.
II.8 – Risco da pesquisa – possibilidade de danos à dimensão física, psíquica, moral,
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
intelectual, social, cultural ou espiritual do ser humano, em qualquer fase de uma pesqui-
sa e dela decorrente.
II.9 – Dano associado ou decorrente da pesquisa – agravo imediato ou tardio, ao
indivíduo ou à coletividade, com nexo causal comprovado, direto ou indireto, decorrente
do estudo científico.
II.10 – Sujeito da pesquisa – é o (a) participante pesquisado (a), individual ou coleti-
vamente, de caráter voluntário, vedada qualquer forma de remuneração.
II.11 – Consentimento livre e esclarecido – anuência do sujeito da pesquisa e/ou de
seu representante legal, livre de vícios (simulação, fraude ou erro), dependência, subor-
dinação ou intimidação, após explicação completa e pormenorizada sobre a natureza da
pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios previstos, potenciais riscos e o incômodo
que esta possa acarretar, formulada em um termo de consentimento, autorizando sua
participação voluntária na pesquisa.
II.12 – Indenização – cobertura material, em reparação a dano imediato ou tardio,
causado pela pesquisa ao ser humano a ela submetida.
II.13 – Ressarcimento – cobertura, em compensação, exclusiva de despesas decor-
rentes da participação do sujeito na pesquisa.
II.14 – Comitês de Ética em Pesquisa – CEP – colegiados interdisciplinares e inde-
pendentes, com “munus público”, de caráter consultivo, deliberativo e educativo, criados
para defender os interesses dos sujeitos da pesquisa em sua integridade e dignidade e
para contribuir no desenvolvimento da pesquisa dentro de padrões éticos.
II.15 – Vulnerabilidade – refere-se a estado de pessoas ou grupos que, por quaisquer
razões ou motivos, tenham a sua capacidade de autodeterminação reduzida, sobretudo
no que se refere ao consentimento livre e esclarecido.
II.16 – Incapacidade – refere-se ao possível sujeito da pesquisa que não tenha capa-
cidade civil para dar o seu consentimento livre e esclarecido, devendo ser assistido ou
representado, de acordo com a legislação brasileira vigente.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
tação não esteja ainda consagrada na literatura científica, será considerado como pes-
quisa e, portanto, deverá obedecer às diretrizes da presente Resolução. Os procedimen-
tos referidos incluem, entre outros, os de natureza instrumental, ambiental, nutricional,
educacional, sociológica, econômica, física, psíquica ou biológica, sejam eles
farmacológicos, clínicos ou cirúrgicos e de finalidade preventiva, diagnóstica ou terapêu-
tica.
III.3 – A pesquisa em qualquer área do conhecimento, envolvendo seres humanos
deverá observar as seguintes exigências:
a) ser adequada aos princípios científicos que a justifiquem e com possibilidades
concretas de responder a incertezas;
b) estar fundamentada na experimentação prévia realizada em laboratórios, animais
ou em outros fatos científicos;
c) ser realizada somente quando o conhecimento que se pretende obter não possa
ser obtido por outro meio;
d) prevalecer sempre as probabilidades dos benefícios esperados sobre os riscos
previsíveis;
e) obedecer à metodologia adequada. Se houver necessidade de distribuição aleató-
ria dos sujeitos da pesquisa em grupos experimentais e de controle, assegurar
que, a priori, não seja possível estabelecer as vantagens de um procedimento
sobre outro através de revisão de literatura, métodos observacionais ou métodos
que não envolvam seres humanos;
f) ter plenamente justificada, quando for o caso, a utilização de placebo, em termos
de não maleficiência e de necessidade metodológica;
g) contar com o consentimento livre e esclarecido do sujeito da pesquisa e/ou seu
representante legal;
h) contar com os recursos humanos e materiais necessários que garantam o bem-
estar do sujeito da pesquisa, devendo ainda haver adequação entre a competên-
cia do pesquisador e o projeto proposto;
i) prever procedimentos que assegurem a confidencialidade e a privacidade, a pro-
teção da imagem e a não estignatização, garantindo a não utilização das informa-
ções em prejuízo das pessoas e/ou das comunidades, inclusive em termos de
auto-estima, de prestígio e/ou econômico-financeiro;
j) ser desenvolvida prefencialmente em indivíduos com autonomia plena. Indivíduos
ou grupos vulneráveis não devem ser sujeitos de pesquisa quando a informação
desejada possa ser obtida através de sujeitos com plena autonomia, a menos que
a investigação possa trazer benefícios diretos aos vulneráveis. Nestes casos, o
direito dos indivíduos ou grupos que queiram participar da pesquisa deve ser as-
segurado, desde que seja garantida a proteção à sua vulnerabilidade e incapaci-
dade legalmente definida;
k) respeitar sempre os valores culturais, sociais, morais, religiosos e éticos, bem
como os hábitos e costumes quando as pesquisas envolvem comunidades;
l) garantir que as pesquisas em comunidades, sempre que possível, traduzir-se-ão
em benefícios cujos efeitos continuem a ser fazer sentir após sua conclusão. O
projeto deve analisar as necessidades de cada um dos membros da comunidade e
analisar as diferenças presentes entre eles, explicitando como será assegurado o
respeito às mesmas;
284
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
m) garantir o retorno dos benefícios obtidos através das pesquisas para as pessoas e
as comunidades onde as mesmas forem realizadas. Quando, no interesse da comu-
nidade, houver benefício real em incentivar ou estimular mudanças de costumes
ou comportamentos, o protocolo de pesquisa deve incluir, sempre que possível,
disposições para comunicar tal benefício às pessoas e/ou comunidades;
n) comunicar às autoridades sanitárias os resultados da pesquisa, sempre que os mes-
mos puderem contribuir para a melhoria das condições de saúde da coletividade,
preservando, porém, a imagem e assegurando que os sujeitos da pesquisa não sejam
estigmatizados ou percam a auto-estima;
o) assegurar aos sujeitos da pesquisa os benefícios resultantes do projeto, seja em
termos de retorno social, acesso aos procedimentos, produtos ou agentes da pes-
quisa;
p) assegurar aos sujeitos da pesquisa as condições de acompanhamento, tratamento
ou de orientação, conforme o caso, nas pesquisas de rastreamento; demonstrar a
preponderância de benefícios sobre riscos e custos;
q) assegurar a inexistência de conflito de interesse entre o pesquisador e os sujeitos
da pesquisa ou patrocinador do projeto;
r) comprovar, nas pesquisas conduzidas do exterior ou com cooperação estrangei-
ra, os compromissos e as vantagens, para os sujeitos das pesquisas e para o
Brasil, decorrentes de sua realização. Nestes casos devem ser identificado o
pesquisador e a instituição nacionais co-responsáveis pela pesquisa. O protocolo
deverá observar as exigências da Declaração de Helsinque e incluir documento
de aprovação, no país de origem, entre os apresentados para avaliação do Comi-
tê de Ética em Pesquisa da instituição brasileira, que exigirá o cumprimento de
seus próprios referenciais éticos. Os estudos patrocinados do exterior também
devem responder às necessidades de treinamento de pessoal no Brasil, para que
o país possa desenvolver projetos similares de forma independente;
s) utilizar o material biológico e os dados obtidos na pesquisa exclusivamente para a
finalidade prevista no seu protocolo;
t) levar em conta, nas pesquisas realizadas em mulheres em idade fértil ou em
mulheres grávidas, a avaliação de riscos e benefícios e as eventuais interferênci-
as sobre a fertilidade, a gravidez, o embrião ou o feto, o trabalho de parto, o
puerpério, a lactação e o recém-nascido;
u) considerar que as pesquisas em mulheres grávidas devem ser precedidas de pes-
quisas em mulheres fora do período gestacional, exceto quando a gravidez for o
objetivo fundamental da pesquisa;
v) propiciar, nos estudos multicêntricos, a participação dos pesquisadores que de-
senvolverão a pesquisa na elaboração do delineamento geral do projeto; e
w) descontinuar o estudo somente após análise das razões da descontinuidade pelo
CEP que a aprovou.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
286
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
V Riscos e benefícios
Considera-se que toda pesquisa envolvendo seres humanos envolve risco. O dano
eventual poderá ser imediato ou tardio, comprometendo o indivíduo ou a coletividade.
V.1 – Não obstante os riscos potenciais, as pesquisas envolvendo seres humanos
serão admissíveis quando:
a) oferecerem elevada possibilidade de gerar conhecimento para entender, prevenir
ou aliviar um problema que afete o bem-estar dos sujeitos da pesquisa e de outros
indivíduos;
b) o risco se justifique pela importância do benefício esperado;
c) o benefício seja maior, ou no mínimo igual, a outras alternativas já estabelecidas
para a prevenção, o diagnóstico e o tratamento.
V.2 – As pesquisas sem benefício direto ao indivíduo devem prever condições de
serem bem suportadas pelos sujeitos da pesquisa, considerando sua situação física, psi-
cológica, social e educacional.
V.3 – O pesquisador responsável é obrigado a suspender a pesquisa imediatamente
ao perceber algum risco ou dano à saúde do sujeito participante da pesquisa, consequente
à mesma, não previsto no termo de consentimento. Do mesmo modo, tão logo constata-
da a superioridade de um método em estudo sobre outro, o projeto deverá ser suspenso,
oferecendo-se a todos os sujeitos os benefícios do melhor regime.
V.4 – O Comitê de Ética em Pesquisa da instituição deverá ser informado de todos os
efeitos adversos ou fatos relevantes que alterem o curso normal do estudo.
V.5 – O pesquisador, o patrocinador e a instituição devem assumir a responsabilidade
de dar assistência integral às complicações e danos decorrentes dos riscos previstos.
V.6 – Os sujeitos da pesquisa que vierem a sofrer qualquer tipo de dano previsto ou
não no termo de consentimento e resultante de sua participação, além do direito à assis-
tência integral, têm direito à indenização.
V.7 – Jamais poderá ser exigido do sujeito da pesquisa, sob qualquer argumento,
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
VI Protocolo de pesquisa
O protocolo a ser submetido a revisão ética somente poderá ser apreciado se estiver
instruído com seguintes documentos em português:
V.I.1 – Folha de rosto: título do projeto, nome, número da carteira de identidade, CPF,
telefone e endereço para correspondência do pesquisador responsável e do patrocina-
dor, nome e assinatura dos dirigentes da instituição e/ou organização;
V.I 2 – descrição da pesquisa, compreendendo os seguintes itens:
a) descrição dos propósitos e das hipóteses a serem testadas;
b) antecedentes científicos e dados que justifiquem a pesquisa. Se o propósito for
testar um novo produto ou dispositivo para a saúde, de procedência estrangeira
ou não, deverá ser indicada a situação atual de registro junto a agências regulatórias
do país de origem;
c) descrição detalhada e ordenada do projeto de pesquisa (material e métodos,
casuística, resultados esperados e bibliografia);
d) análise crítica de riscos e benefícios;
e) duração total da pesquisa, a partir da aprovação;
f) explicitação das responsabilidade do pesquisador, da instituição, do promotor e do
patrocinador;
g) explicitação de critérios para suspender ou encerar a pesquisa;
h) local da pesquisa: detalhar as instalações dos serviços, centros, comunidades e
instituições nas quais se processarão as várias etapas da pesquisa;
i) demonstrativo da existência de infra-estrutura necessária ao desenvolvimento da
pesquisa e para atender eventuais problemas dela resultantes, com a concordân-
cia documentada da instituição;
j) orçamento financeiro detalhado da pesquisa: recursos, fontes e destinação, bem
como a forma e o valor da remuneração do pesquisador;
k) explicitação de acordo preexistente quanto à propriedade das informações gera-
das, demonstrando a inexistência de qualquer cláusula restritiva quanto à divulga-
ção pública dos resultados, a menos que se trate de caso de obtenção de
patenteamento; neste caso, os resultados devem se tornar públicos, tão logo se
encerre a etapa de patenteamento;
l) declaração de que os resultados da pesquisa serão tornados públicos, sejam eles
favoráveis ou não; e
m) declaração sobre o uso e destinação do material e/ou dados coletados;
V.I.3 – informações relativas ao sujeito da pesquisa:
a) descrever as características da população a estudar: tamanho, faixa etária, sexo,
cor (classificação do IBGE), estado geral de saúde, classes e grupos sociais, etc.
Expor as razões para a utilização de grupos vulneráveis;
b) descrever os métodos que afetem diretamente os sujeitos da pesquisa;
c) identificar as fontes de material de pesquisa, tais como espécimens, registros e
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
dados a serem obtidos de seres humanos. Indicar se esse material será obtido
especificamente para os propósitos da pesquisa ou será usado para outros fins;
d) descrever os planos para o recrutamento de indivíduos e os procedimentos a
serem seguidos. Fornecer critérios de inclusão e exclusão;
e) apresentar o formulário ou termo de consentimento, específico para a pesquisa,
para a apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa, incluindo informações sobre
as circunstâncias sob as quais o consentimento será obtido, quem irá tratar de
obtê-lo e a natureza da informação a ser fornecida aos sujeitos da pesquisa;
f) descrever qualquer risco, avaliando sua possibilidade e gravidade;
g) descrever as medidas para proteção ou minimização de qualquer risco eventual.
Quando apropriado, descrever as medidas para assegurar os necessários cuida-
dos à saúde, no caso de danos aos indivíduos. Descrever também os procedimen-
tos para monitoramento da coleta de dados para prover a segurança dos indivídu-
os, incluindo as medidas de proteção à confidencialidade; e
h) apresentar previsão de ressarcimento de gastos aos sujeitos da pesquisa. A im-
portância referente não poderá ser de tal monta que possa interferir na autono-
mia da decisão do indivíduo ou responsável de participar ou não da pesquisa.
V.I.4 – qualificação dos pesquisadores: “Curriculum vitae” do pesquisador responsá-
vel e dos demais participantes;
V.I.5 – termo de compromisso do pesquisador responsável e da instituição de cum-
prir os termos desta Resolução.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
deverá ser convidado um representante, como membro “ad hoc” do CEP, para participar
da análise do projeto específico.
VII.7 – Nas pesquisas em população indígena deverá participar um consultor famili-
arizado com os costumes e tradições da comunidade.
VII.8 – Os membros do CEP deverão se isentar de tomada de decisão, quando
diretamente envolvidos na pesquisa em análise.
VII.9 – Mandato e escolha dos membros – A composição de cada CEP deverá ser
definida a critério da instituição, sendo pelo menos metade dos membros com experiên-
cia em pesquisa, eleitos pelos seus pares. A escolha da coordenação de cada Comitê
deverá ser feita pelos membros que compõem o colegiado, durante a primeira reunião de
trabalho. Será de três anos a duração do mandato, sendo permitida recondução.
VII.10 – Remuneração – Os membros do CEP não poderão ser remunerados no
desempenho desta tarefa, sendo recomendável, porém, que sejam dispensados nos ho-
rários de trabalho do Comitê das outras obrigações nas instituições às quais prestam
serviço, podendo receber ressarcimento de despesas efetuadas com transportes, hospe-
dagem e alimentação.
VII.11 – Arquivo – O CEP deverá manter em arquivo o projeto, o protocolo e os
relatórios correspondentes, por 5 (cinco) anos após o encerramento do estudo.
VII.12 – Liberdade de trabalho – Os membros dos CEPs deverão ter total indepen-
dência na tomada das decisões no exercício das suas funções, mantendo sob caráter
confidencial as informações recebidas. Deste modo, não podem sofrer qualquer tipo de
pressão por parte de superiores hierárquicos ou pelos interessados em determinada pes-
quisa, devem isentar-se de envolvimento financeiro e não devem estar submetidos a
conflito de interesse.
VII.13 – Atribuições do CEP:
a) revisar todos os protocolos de pesquisas envolvendo seres humanos, inclusive os
multicêntricos, cabendo-lhe a responsabilidade primária pelas decisões sobre a
ética da pesquisa a ser desenvolvida na instituição, de modo a garantir e resguar-
dar a integridade e os direitos dos voluntários participantes nas referidas pesqui-
sas;
b) emitir parecer consubstanciado por escrito, no prazo máximo de 30 (trinta) dias,
identificando com clareza o ensaio, documentos estudados e data de revisão. A
revisão de cada protocolo culminará com seu enquadramento em uma das se-
guintes categorias;
aprovado;
com pendência: quando o Comitê considera o protocolo como aceitável, porém
identifica determinados problemas no protocolo, no formulário do consentimento
ou ambos, e recomenda uma revisão específica ou solicita uma modificação ou
informação relevante, que deverá ser atendida em 60 (sessenta) dias pelos pes-
quisadores;
retirado: quando, transcorrido o prazo, o protocolo permanece pendente;
não aprovado; e
aprovado e encaminhado, com o devido parecer, para apreciação pela Comissão
Nacional de Ética em Pesquisa – CONEP/MS, nos casos previstos no capítulo
VIII, item 4.c.
290
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
VIII.3 – O mandato dos membros da CONEP será de quatro anos com renovação
alternada a cada dois anos, de sete ou seis de seus membros.
VIII.4 – Atribuições da CONEP – Compete à CONEP o exame dos aspectos éticos
da pesquisa envolvendo seres humanos, bem como a adequação e atualização das nor-
mas atinentes. A CONEP consultará a sociedade sempre que julgar necessário, caben-
do-lhe, entre outras, as seguintes atribuições:
a) estimular a criação de CEPs institucionais e de outras instâncias;
b) registrar os CEPs institucionais e de outras instâncias;
c) aprovar, no prazo de 60 dias, e acompanhar os protocolos de pesquisa em áreas
temáticas especiais tais como:
1) genética humana;
2) reprodução humana;
3) farmácos, medicamentos, vacinas e testes diagnósticos novos (fases I, II, III) ou
não registrados no país (ainda que fase IV), ou quando a pesquisa for referente a
seu uso com modalidades, indicações, doses ou vias de administração diferentes
daquelas estabelecidas, incluindo seu emprego em combinações;
4) equipamentos, insumos e dispositivos para a saúde novos, ou não registrados no
país;
5) novos procedimentos ainda não consagrados na literatura;
6) populações indígenas;
7) projetos que envolvam aspectos de biossegurança;
8) pesquisas coordenadas do exterior ou com participação estrangeira e pesquisas
que envolvam remessa de material biológico para o exterior;
9) projetos que, a critério do CEP, devidamente justificado, sejam julgados merece-
dores de análise pela CONEP;
d) prover normas específicas no campo da ética em pesquisa, inclusive nas áreas
temáticas especiais, bem como recomendações para aplicação das mesmas;
e) funcionar como instância final de recursos, a partir de informações fornecidas
sistematicamente, em caráter ex-ofício ou a partir de denúncias ou de solicitação
de partes interessadas devendo manifestar-se em um prazo não superior a 60
(sessenta) dias;
f) rever responsabilidade, proibir ou interromper pesquisas, definitiva ou temporari-
amente, podendo requisitar protocolos para revisão ética inclusive, os já aprova-
dos pelo CEP;
g) constituir um sistema de informação e acompanhamento dos aspectos éticos das
pesquisas envolvendo seres humanos em todo o território nacional, mantendo
atualizados os bancos de dados;
h) informar e assessorar o MS, o CNS e outras instâncias do SUS, bem como do
governo e da sociedade, sobre questões éticas relativas à pesquisa em seres
humanos;
i) divulgar esta e outras normas relativas à ética em pesquisa envolvendo seres
humanos;
j) a CONEP, juntamente com outros setores do Ministério da Saúde, estabelecerá
normas e critérios para o credenciamento de Centros de Pesquisa. Este
credenciamento deverá ser proposto pelos setores do Ministério da Saúde, de
292
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
IX Operacionalização
IX.1 – Todo e qualquer projeto de pesquisa envolvendo seres humanos deverá obe-
decer às recomendações desta Resolução e dos documentos endossados em seu pre-
âmbulo. A responsabilidade do pesquisador é indelegável, indeclinável e compreende os
aspectos éticos e legais.
IX.2 – Ao pesquisador cabe:
a) apresentar o protocolo, devidamente instruído ao CEP, aguardando o pronuncia-
mento deste, antes de iniciar a pesquisa;
b) desenvolver o projeto conforme delineado;
c) elaborar e apresentar os relatórios parciais e final;
d) apresentar dados solicitados pelo CEP, a qualquer momento;
e) manter em arquivo, sob sua guarda, por 5 anos, os dados da pesquisa, contendo
fichas individuais e todos os demais documentos recomendados pelo CEP;
f) encaminhar os resultados para publicação, com os devidos créditos aos pesquisa-
dores associados e ao pessoal técnico participante do projeto;
g) justificar, perante o CEP, interrupção do projeto ou a não publicação dos resulta-
dos.
IX.3 – O Comitê de Ética em Pesquisa institucional deverá estar registrado junto à
CONEP/MS.
IX.4 – Uma vez aprovado o projeto, o CEP passa a ser co-responsável no que se
refere aos aspectos éticos da pesquisa.
IX.5 – Consideram-se autorizados para execução, os projetos aprovados pelo CEP,
exceto os que se enquadrarem nas áreas temáticas especiais, os quais, após aprovação
pelo CEP institucional deverão ser enviados à CONEP/MS, que dará o devido encami-
nhamento.
IX.6 – Pesquisas com novos medicamentos, vacinas, testes diagnósticos, equipa-
mentos e dispositivos para a saúde deverão ser encaminhados do CEP à CONEP/MS e
desta, após parecer, à Secretaria de Vigilância Sanitária.
IX.7 – As agências de fomento à pesquisa e o corpo editorial das revistas científica
deverão exigir documentação comprobatória de aprovação do projeto pelo CEP e/ou
CONEP, quando for o caso.
IX.8 – Os CEPs institucionais deverão encaminhar trimestralmente à CONEP/MS a
relação dos projetos de pesquisa analisados, aprovados e concluídos, bem como dos
projetos em andamento e, imediatamente, aqueles suspensos.
X. Disposições transitórias
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
6) Identificar, para cada área temática, as pessoas, sociedades, instituições etc., que
serão consultados e, eventualmente, poderão contribuir na elaboração das nor-
mas específicas. Período: janeiro e fevereiro de 1997.
7) Elaborar o plano de trabalho das áreas temáticas especiais priorizadas para apre-
sentação na Reunião Ordinária do CNS do mês de abril de 1997; e
8) Apresentar, na Reunião Ordinária do CNS do mês de abril de 1997, proposta de
estruturação da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, nos termos dos itens
1, 2 e 3 do Capítulo VIII e da letra a do item 1, Capítulo X, das Disposição
Transitórias da Resolução nº 196/96.
295
SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
297
SOERENSEN & BADINI MARULLI
7. Serão tomadas precauções para proteger o caráter confidencial dos dados e o anoni-
mato dos participantes:
Sim( ) Não( )
Se sim responda aos seguintes itens a fim de evidenciar as razões pelas quais o
estudo proposto estaria isento de revisão ética:
a)___________A pesquisa envolve apenas entrevistas ou procedimentos com base
em questionários e os fatores seguintes não estarão todos presentes:
_____________Os indivíduos só poderão ser identificados direta ou indiretamente
através de códigos conectados com o indivíduo
_____________O indivíduo estará correndo algum risco
_____________A pesquisa lida com aspectos delicados ligados ao comportamento
do indivíduo
b)___________A pesquisa inclui somente revisão de dados existentes (papeletas
ou outros documentos ou espécimes patológicos ou diagnósticos); adicionalmente, as
fontes de informação são disponíveis ao público em geral (ex: atestado de óbito) ou
informação está arquivada de tal maneira que é impossível identificar o indivíduo direta
ou indiretamente
c)___________A pesquisa inclui somente observação de comportamento público e
os seguintes fatores não estarão todos presentes:
_____________Os indivíduos não podem ser identificados direta ou indiretamente
através de códigos conectados com o indivíduo
_____________O indivíduo estará correndo algum risco
_____________A pesquisa lida com aspectos delicados ligados ao comportamento
do indivíduo
9. Verificar a existência dos seguintes documentos que devem ter sido anexados para
avaliação crítica do Comitê de Voluntários Humanos:
____________Sumário do protocolo
____________Descrição do protocolo a ser lida ou dada ao indivíduo participante
do estudo
____________Formulário para “consentimento informado” a ser assinado pelo in-
divíduo
____________Formulário para que o pai/mãe ou tutor consinta que a criança parti-
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
cipe do estudo
____________Descrição dos procedimentos a serem adotados para manter o cará-
ter confidencial
____________Aprovação do estudo pela instituição (instituição financiadora de
pesquisa)
299
SOERENSEN & BADINI MARULLI
1.000 habitantes em 1998, entretanto Costa Rica teve o menor índice de mortalidade de
3,8 por 1.000 habitantes. As tendências de nascimento e mortalidade resultam difíceis de
se definir pois a população flutuante e migratória geralmente foge ao controle.
O deslocamento das populações rurais para o meio urbano levou ao crescimento
vertiginoso, com destaque das cidades latino-americanas, constatando-se o crescimento
de 60% em alguns centros urbanos nos últimos 10 anos.
Na Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai aproximadamente 85% de seus habitantes
moram em zonas urbanas. A população de indígenas é estimada em 42 milhões que
moram em mais de 400 povoados ou aldeias. O México tem 12 milhões de indígenas,
Guatemala 5,3 milhões, Peru 9,3 milhões, Bolívia 4,9 milhões e Equador 4,1 milhões.
A saúde da população
Os coeficientes de Saúde Pública indicam uma melhora gradativa nas Américas.
Desde a década de 80 até a metade da década de 90, a esperança de vida ao nascer
aumentou de 68,7 para 71,1 anos. Em 1995 na América Latina a taxa foi de 70 anos e no
Caribe de 74,3 anos, constando-se sempre taxas superiores para o sexo feminino. A
diminuição das mortes prematuras, com menos de 75 anos de idade, teve como causa a
diminuição da mortalidade dos primeiros anos de vida, especialmente por doenças
transmissíveis. As não transmissíveis são ao redor de duas terças partes de toda a mor-
talidade na América Latina e o Caribe.
A mortalidade infantil na década de 50 na América Latina e no Caribe foi de 125
por 1000 nascidos vivos e no início da década de 80 foi de 59 por 1000. A taxa de
mortalidade infantil no Canadá e nos Estados Unidos passou de 29 por 1000 dos anos
50 para aproximadamente 8 por 1000 na década de 90. A Bolívia e Haiti no mesmo
período sofreram um decréscimo da metade na mortalidade infantil.
Fazendo um retrospecto, a Varíola foi erradicada da face da terra em 1979, a Polio-
mielite foi erradicada das Américas, o Sarampo se encontra sob controle e avançou-se
muito para o controle da Doença de Chagas.
Aproximadamente a metade dos 1,6 milhões dos casos notificados de AIDS no mun-
do, desde o início da epidemia, foi nas Américas. A partir de 1986 foram registrados
472.562 mortes decorrentes da AIDS. Até dezembro de 1997 foram notificados 808.540
casos de AIDS na Região das Américas, representando 47,5% do total de casos assina-
lados no mundo. Realmente, este número poderia duplicar se pensarmos nos casos sem
notificação.
O aspecto atual da AIDS nas Américas é a mudança do predomínio da transmissão
de homens homossexuais para os heterossexuais. O maior número de AIDS notificado
é no grupo de homens de 30 a 34 anos, seguido pelo de 25 a 29 anos de idade. No grupo
feminino, o maior número de notificações foi de 25 a 29 anos seguido pelo de 30 a 34
anos. Como decorrência do panorama da AIDS observa-se a prevalência de crianças
que nascem comprometidas pelo vírus HIV, constatando-se que, no fim de 1996, 6.911
casos foram com idade inferior a 14 anos e 5.095 casos perinatais.
Em 1991, após um silêncio epidemiológico de praticamente um século, a Cólera rea-
parece nas Américas comprometendo 21 países onde foram notificados 1,2 milhões de
casos desde o início da epidemia.
300
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Conquistas da medicina e os
novos problemas de saúde pública
301
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Bruno Soerensen
As Ciências evoluem dia a dia e nesta evolução são detectados mecanismos novos,
vários deles nunca imaginados. Na Ciência Médica o avanço, com destaque no fim do
século passado e neste século, contribuiu para uma verdadeira revolução de conheci-
mentos. Se nos atermos somente às áreas da Microbiologia e da Imunologia, as doenças
Infecciosas e suas repercussões para a Saúde Pública são realmente deslumbrantes. A
descoberta de agentes causadores de inúmeras doenças por eminentes pesquisadores
trouxe conhecimentos sólidos para o combate às seguintes doenças: Carbúnculo (Pollender
e Davaine, 1850); Pús Azul (Lucke, 1862); Lepra (Hansen, 1882); Clostridiose (Pasteur
e Joubert, 1877); Gonorréia (Neisser, 1879); Pneumonia Lobar (Pasteur, 1880);
Furunculose e Osteomielite (Pasteur, 1880); Febre Puerperal (Pasteur e Doléris, 1880);
Febre Tifóide (Eberth, 1880); Mormo (Loefler e Schiitz, 1882); Tuberculose (Koch, 1882);
Difteria (Klebs, 1883); Cólera (Koch, 1883); Tétano (Nicolaier, 1884); Meningite
Meningocócica (Weichselbaum, 1887); Intoxicação Alimentar por Salmonela (Gaertner,
1889); Gripe por Hemófilos (Pfeiffer, 1892); Peste (Yersin e Kitasato, 1894); Brucelose
(Bang, 1895); Febre Paratifóide (Achard e Bensaude, 1896); Botulismo (Van
Ermengem,1896); Disenteria Bacilar (Shiga, 1898); Coqueluche (Bordet e Gengou, 1900);
Sífilis (Schaudinn e Hoffmam,1905); Tularemia (McCoy e Chapin, 1910); Tifo
Exantemático (Rocha Lima, 1916).
No campo da imunoprofilaxia, da mesma maneira, foram descobertas inúmeras vaci-
nas, como a primeira de todas, a Vacina Antivaríolica (Jenner, 1796). Devem-se a Pasteur
a introdução científica do processo de imunização e o preparo das primeiras vacinas
vivas de virulência atenuada, como a vacina contra a Cólera Aviária em 1879, a do
Carbúnculo em 1881, da Erisipela dos suínos e finalmente da vacina contra a Raiva,
aplicada pela primeira vez no homem em 1885.
Os avanços no campo da imunoprofilaxia prosseguiram, conseguindo a atenuação da
virulência de vários microrganismos patogênicos como a vacina a BCG obtida por Calmette
e Guérin em 1924 ou ainda outras inativadas como a vacina antipestosa de Haffkine em
1895, a vacina antitifóidica de Wright em 1896, a vacina contra o Tifo Exantemático de
Weigl em 1932, a vacina contra a Coqueluche de Leslie e Gardner em 1933. Em 1923,
foram descobertas por Ramon as primeiras anatoxinas, a diftérica e a tetânica, constitu-
indo-se nas primeiras vacinas químicas.
A obtenção do cultivo dos vírus em animais de laboratório, em ovo embrionado e em
cultura celular, contribuiu sobremaneira para a obtenção das vacinas contra a Febre
Amarela por Sellard e Laigret em 1932 e Max Theiler em 1937, a vacina contra a
Poliomielite por Salk em 1953 e por Sabin em 1956, a vacina contra a Parotidite por
Smorodintvev em 1954, contra o Sarampo por Enders em 1958, contra a Rubéola por
Meyer e Parkman em 1966.
A substituição de células de origem animal por células diplóides humanas na obten-
ção de vacinas também representou considerável avanço.
As vacinas acelulares (extrativas) polissacarídicas de cápsulas bacterianas como a
pneumocóccica e a meningocóccica, obtidas em 1969 por Gotschlich e colaboradores,
as entéricas, contra a Cólera, Salmoneloses, e Shigeloses, de germes vivos de virulência
atenuada, também enriqueceram o capítulo das vacinas.
302
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
303
SOERENSEN & BADINI MARULLI
dos e no Caribe.
Os Arenavirus Sul-americanos, comprometendo o homem, se relacionam à explora-
ção de novas regiões de matas na atividade agrícola.
No caso da Síndrome Pulmonar por Hantavirus, a mesma se encontra relacionada
à exposição do homem a roedores infectados, comprometendo adultos jovens normais,
resultando numa mortalidade de 50%. Foram identificados mais de 100 casos em 22
estados dos Estados Unidos e no Canadá foram notificados 7 casos. Em outros países
do continente americano também foi notificado e se encontra aumentando o número
de casos desta doença como no Brasil com 3 casos confirmados e 2 óbitos. Na Argen-
tina, foi possível ter dados indicativos de que, nos anos de 1991 e 1995, aconteceram 3
surtos da Síndrome Pulmonar por Hantavirus.
O vírus Ebola, determinando a Febre Hemorrágica, foi assinalado pela primeira vez
no Zaire nos anos de 1976 e 1979, repetindo-se o surto a partir de 6 de maio de 1995
quando se registraram, somente neste ano, até junho, um total de 297 casos e 233 óbitos,
portanto 78% de letalidade. Os mecanismos referentes a reservatórios do vírus Ebola
ainda não se encontram bem definidos; entretanto, quanto ao quadro clínico, a doença é
bem conhecida. O período de incubação é de 2 a 21 dias, caracterizando-se por febre,
dores musculares, dor de cabeça, sudorese seguida por vômitos, diarréia, erupção, com-
prometimento dos rins, do fígado e hemorragia. Aproximadamente 50 a 90% dos que
apresentam estes sintomas morrem. A confirmação do diagnóstico é feita pelo isola-
mento do vírus responsável pela doença. Não existe ainda vacina ou tratamento especí-
fico. A Organização Mundial da Saúde (OMS) preocupada com esta nova doença, de
comum acordo com o Governo do Zaire, estabeleceu medidas para o controle do surto.
As medidas de controle incluem: bloqueio da epidemia, estudo das características do
vírus Ebola, como também de que maneira se dissemina a doença, como se manifesta e
se existe comprometimento de algum animal como reservatório. Foi estabelecida uma
Coordenação Técnico Científica por meio de uma Comissão Internacional em Kikwit,
incluindo-se ainda o alerta à população diante de Doenças Potencialmente Epidêmicas.
No momento, 1996, não parece existir maior risco de disseminação da doença no mun-
do.
A Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (AIDS), assinalada pela primeira vez nos
Estados Unidos em 1979 com apenas 8 casos, atingiu, em apenas 4 anos, 1.982 casos
projeta-se em progressão geométrica comprometendo o mundo todo e, se não for con-
trolada nos próximos anos, poderá transformar-se num dos maiores flagelos da humani-
dade. A Organização Mundial da Saúde calculou, em 1995, que ultrapassa atualmente
1,5 milhões o número de pessoas contaminadas pelo vírus HIV na América Latina e no
Caribe. A doença é transmitida preferentemente pelo contato sexual, pela transfusão
sangüínea e por agulhas contaminadas. É interessante destacar a constatação de que a
AIDS leva a maior suceptibilidade ao câncer, entre outros, ao câncer do colo uterino,
principal causa da morte das mulheres em países desenvolvidos.
Entre as Doenças Emergentes, temos a Criptosporidiose, assinalada com as caracte-
rísticas de surto em 1993 nos Estados Unidos. Esta doença, que tem como agente cau-
sador um parasita intestinal, o Cryptosporidium, teve como fonte de infecção o abaste-
cimento da água municipal de uma cidade e pode ser mortal, comprometendo
preferentemente os imunodeprimidos, como aidéticos. Também em 1993 uma bactéria
304
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Bacterioses
Cólera
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Bruno Soerensen
EPIDEMIOLOGIA
A Cólera é moléstia relacionada intimamente às condições precárias de saneamento
básico e à falta de educação sanitária da população. Porcentagem elevada da população
de nosso país apresenta elevado risco potencial para contrair a moléstia. Independente-
mente da água contaminada, desempenham papel relevante na propagação da cólera os
alimentos poluídos como verduras, frutas e, particularmente, mariscos e ostras que se
consomem cruas. O Vibrio cholerae se conserva viável ao longo do tempo, mais de
uma semana, especialmente em alimentos conservados na geladeira.
Por ocasião da segunda pandemia, entre 1829 e 1850, a Cólera comprometeu pela
primeira vez as Américas, tendo sido introduzida em 1832 por navios procedentes da
Europa, apesar das precauções de quarentena tomadas em Gross Island, perto de Quebec
no Canadá. A doença propagou-se ao longo do rio Saint Lawrence, comprometendo o
interior do país. Independentemente, apareceu nos Estados Unidos nas cidades de Nova
York e Filadélfia, avançando para o oeste até a costa do Pacífico. Nesta oportunidade
esta pandemia também comprometeu a América Latina e o Caribe e possivelmente,
conforme relatos, também Chile, Peru e Equador. Nos anos de 1833 e 1854 comprome-
teu o México. Em 1833 foi registrado em Cuba e nas Guianas em 1836 e 1837, embora
sem maiores conseqüências; entretanto na Guatemala e Nicarágua a epidemia foi de-
vastadora. Em 1848 a Cólera voltou a atacar os Estados Unidos e, a seguir, Canadá,
México, Panamá, Colômbia, Equador e novamente Cuba, este último país com violência.
A terceira pandemia nos anos de 1852-1860 comprometeu novamente Estados Uni-
dos, México e as Ilhas do Caribe. Nesta ocasião a Cólera também comprometeu Trinidad
e Tobago. Em 1854 e 1855 continuou a doença nos Estados Unidos, México e Ilhas do
Caribe, Uruguai, Colômbia, Venezuela. O Brasil foi comprometido pela primeira vez em
1854, embora existam referências a uma anterior no Estado do Paraná em 1851. Em
1856 foi relatada a doença na Argentina, Costa Rica, El Salvador, Honduras, Nicarágua
e Guatemala.
Nos anos de 1863 a 1875 (quarta pandemia) a doença comprometeu várias ilhas do
Caribe. A Cólera nesta oportunidade foi introduzida em Marselha, França, República
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
308
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Medidas preventivas
Até o presente momento, as medidas preventivas de maior valor para controlar a
epidemia de Cólera são a vigilância sanitária, os programas de tratamento dos pacientes,
a educação sanitária, o abastecimento de água e alimento não contaminados e um fim
adequado aos diferentes materiais (fezes e vômito) provenientes dos pacientes. Inde-
pendentemente, recomenda-se um tratamento também adequado do esgoto e do lixo,
pois existem, além da Cólera, pelo menos vinte doenças relacionadas ao saneamento
básico.
As cidades no nosso país, em sua maioria, são extremamente deficientes quanto a
saneamento básico.
Coqueluche
Bruno Soerensen
Etiologia
Um coco-bacilo Gram-negativo aeróbio a Bordetella pertussis com três espécies o B.
pertussis, B. parapertussis e a B. bronchiseptica, é o agente etiológico, embora a pri-
meira seja o mais importante.
Distribuição geográfica
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Epidemiologia
A contagiosidade é elevada nas populações de nível sócio-econômico baixo e densi-
dade demográfica elevada pois se transmite por via aerógena por contato direto com
material de nasofaringe da pessoa infectada. O período de transmissibilidade é de 7 dias
a 3 semanas depois de iniciada a sintomatologia.
Não foi descrita imunidade transplacentária, portanto a ocorrência é em crianças
com poucos meses de idade. Nas crianças com menos de um ano de idade a doença é
de maior gravidade levando a maior número de óbitos. A coqueluche leva a sólida imu-
nidade e atualmente devido à vacinação se encontra em declínio. A morbidade e a
letalidade, entretanto, já foram elevadas no passado, atribuindo-se seu declínio ao uso de
antibióticos e preferentemente à vacinação preventiva. A doença apresenta uma fase
catarral, uma paroxística e, finalmente, o período de convalescência.
As complicações respiratórias, neurológicas e hemorrágicas são as mais freqüentes,
revestindo-se de gravidade.
Diagnóstico
O diagnóstico é clínico, caracterizado pela presença da “tosse comprida” muito ca-
racterística. O quadro hematológico é de leucocitose (geralmente superior a 20.000 cé-
lulas por mm3 ) já na fase catarral.
Entretanto a confirmação diagnóstica é feita mediante isolamento da Bordetella no
meio de Bordet e Gengou. Os métodos sorológicos na pesquisa de anticorpos auxiliam o
diagnóstico, com destaque ao método ELISA.
É de importância o diagnóstico diferencial com processos causados por adenovírus, o
Haemophilus influenzae, o vírus sincicial respiratório, o vírus parainfluenza tipo 2, a
Bordetella parapertussis e a Bordetella bronchiseptica.
Tratamento
Consiste em isolamento e tratamento do doente e de seus contatos com eritromicina,
tetraciclina ou cloranfenicol. Crianças com mais de um ano geralmente podem ser trata-
das em casa, mas as menores de seis meses, dependendo do caso clínico, exigem
hospitalização. Paralelamente deve-se reduzir o risco de aspiração, colocando-se o paci-
ente de bruços, com a cabeça mais baixa que o corpo, durante os acessos paroxísticos,
melhorando com isso a drenagem do muco pela ação da gravidade. Poderá se recorrer
ao uso de gamaglobulina. Os casos graves devem ter tratamento médico.
Profilaxia
Em primeiro lugar, encontra-se o isolamento do paciente para impedir a disseminação
da doença. Soma-se o tratamento do doente com antibióticos e, se houver indicação,
gamaglobulina.
Entretanto, o controle da doença deverá ser feito com a vacinação em massa, mediante
a imunização ativa conseguida pela vacinação associada da DTP (Diftérica, Tétanica,
Pertussis) ou ainda associada a outros antígenos. A vacina tradicional contra a coqueluche
310
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
é a somática absorvida pelo hidróxido de alumínio. Outras vacinas estão sendo testadas.
Embora a vacina somática absorvida pelo hidróxido alumínio, associada à tetânica e diftérica,
nos testes de potência realizados em camundongos resulte pouco antigênica, os resultados
obtidos em crianças são satisfatórios diminuindo a doença em coletividade assim como
modificando o curso clínico.
Difteria
Kathia Brienza Badini-Marulli
Transmissão
O agente é transmitido através do contato direto, por gotículas respiratórias ou, mais
raramente, por meio de fômites como lenços e toalhas. As bactérias crescem no trato
respiratório superior e iniciam a produção da toxina que é a responsável pelo apareci-
mento dos sintomas.
A toxina diftérica é uma exotoxina de natureza protéica, composta por dois fragmen-
tos, A e B. O fragmento A é o responsável pelos efeitos tóxicos da molécula; o fragmen-
to B é o que promove a fixação a receptores da mucosa. A porção B é necessária para
que ocorra a entrada do fragmento A no citoplasma da célula. A ação do fragmento A
consiste no bloqueio da síntese protéica.
É uma enfermidade que ocorre mais freqüentemente no inverno, acometendo princi-
palmente crianças na faixa etária de 1 a 7 anos. Atualmente, é de ocorrência rara nos
países em que a vacinação é generalizada.
A incidência da Difteria vem apresentando um declínio no estado de São Paulo desde
1973, variando seu coeficiente de incidência de 5,45 casos por 100.000 habitantes em
1973 (1.504 casos) até 0,02 casos por 100.000 habitantes em 1994 (5 casos).
A doença no homem
O período de incubação dura geralmente de 3 a 6 dias.
A infecção geralmente inicia-se no trato respiratório superior, com os bacilos se mul-
tiplicando nas camadas superficiais das mucosas. Aí eles elaboram a toxina, que causa
necrose nos tecidos vizinhos. A resposta inflamatória resulta no acúmulo de um exsudato
acinzentado que, eventualmente, forma a pseudomembrana diftérica. Ela aparece inici-
almente nas amídalas ou na faringe, podendo então espalhar-se para cima, pelas fossas
nasais (Difteria Nasofarigeana), ou para baixo, para a laringe e traquéia (Difteria
Laringeana). Cerca de 10 dias depois, estas pseudomembranas regridem, são destruídas
ou se desprendem.
311
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Diagnóstico
O diagnóstico da Difteria é geralmente clínico. O exame bacteriológico direto é de
pouco valor, porque não permite diferenciar a espécie patogênica de outras corinebactérias
da flora normal da garganta. As culturas devem ser feitas com secreções colhidas no
local das lesões, no meio de Loeffler, e a identificação do agente deve ser feita mediante
testes bioquímicos.
Ao se isolar a bactéria, deve-se pesquisar sua virulência, a fim de determinar se a
cepa é ou não toxigênica. Para isso, inocula-se o material em duas cobaias, via subcutâ-
nea. Uma delas deve receber previamente o soro antidiftérico, via intraperitoneal. Caso
a cepa seja toxigênica, a outra cobaia morrerá em 1 a 4 dias.
Existe, ainda, o método de Elek, de acordo com o qual uma tira de papel de filtro
impregnada com antitoxina é colocada numa placa de ágar e as amostras suspeitas são
semeadas perpendicularmente à fita. Se aparecerem linhas de precipitação, será sinal
da produção de toxina diftérica.
Tratamento
Deve-se aplicar o soro antidiftérico (antitoxina) o mais brevemente possível, na dose
de 200 a 1000 U/Kg de peso. A precocidade da administração da antitoxina determinará
o prognóstico, podendo haver alta letalidade se houver demora para seu início (a antitoxina
só tem ação sobre a toxina circulante; depois de fixada às células, ela não é mais neutra-
lizada).
Associados ao uso da antitoxina devem ser empregados antibióticos (Penicilina,
Eritromicina ou Tetraciclinas), para acelerar a destruição dos microrganismos causado-
res da lesão primária.
Pessoas que se recuperaram completamente podem continuar a abrigar os microrganis-
mos no nariz ou na garganta durante semanas ou meses. Antigamente, eram estes portado-
res sãos que propagavam a doença, mantendo as bactérias toxigênicas na população; o
advento da imunização causou uma drástica redução na taxa de portadores.
Controle
A principal medida de controle é a imunização com o toxóide diftérico. Crianças
recém-nascidas, cujas mães são resistentes, adquirem imunidade temporária por meio
de anticorpos transplacentários, porém esta imunidade passiva dura apenas alguns me-
312
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
ses. A imunização ativa das crianças geralmente é feita com uma vacina combinada
contendo toxóide diftérico, toxóide tetânico e vacina anticoqueluche (DPT ou vacina
tríplice bacteriana). Atualmente, no Brasil, a primeira dose desta vacina está sendo feita
aos dois meses de idade, com doses de reforço aos 4, 6, 15 meses e 5 ou 6 anos. Aos 15
anos é recomendada mais uma dose, da vacina “dupla tipo adulto”, contra Difteria e
Tétano. Estima-se que cerca de 1-2% das pessoas não respondem à vacinação, perma-
necendo suscetíveis.
Enfermidade de lyme
Bruno Soerensen
Transmissão
Os estudos atribuem como vetores carrapatos de diferentes gêneros e espécies, como
os do gênero Ixodes e Amblyomma, conforme a região em que é estudada a enfermida-
de e a prevalência dos carrapatos. Foi atribuído como vetor por meio de isolamento das
espiroquetas com caracteres morfológicos e bioquímicos idênticos aos isolados de paci-
entes.
O isolamento de espiroquetas de carrapatos indicaria que teriam-se infectado em
algum reservatório animal, portanto a fonte de infecção seriam possivelmente animais
silvestres ou o próprio cão. A transfusão de sangue também desempenha papel de im-
portância na transmissão.
Sem nenhuma dúvida, os animais silvestres podem ser considerados como reservató-
rios do agente etiológico e o homem seria um hóspede acidental.
A doença no homem
Foram relatados no período de 1975 a 1979, 512 casos, sendo na Região de Lyme, no
mesmo período, 242 casos (47% do total) e dados mais recentes relacionam mais de 444
casos para a mesma Região. A enfermidade ocorre no verão, coincidindo com a abun-
dância e atividade dos carrapatos.
A lesão cutânea de Eritema Crônico Migratório (ECM) aparece de 3 a 20 dias após
a picada do carrapato, iniciando-se por uma mácula ou pápula vermelha que progride
313
SOERENSEN & BADINI MARULLI
gradativamente.
Os bordos são bem nítidos, a região central é mais pálida. O eritema pode desapare-
cer e voltar novamente acompanhando lesões secundárias em outras partes do corpo.
As lesões cutâneas são acompanhadas de mal estar, febre, cefalalgia, rigidez de nuca,
mialgias, astralgias e linfoadenopatia persistindo por várias semanas. Transcorridas se-
manas ou até mesmo meses, alguns pacientes manifestam menin-
goencefalite, neuropatias, miocardite e taquicardia atrioventricular. Pode-se observar
ainda, mais tarde, artrite das grandes articulações, que pode persistir por vários anos,
independentemente da sintomatologia referida acima, portanto aparentemente não rela-
cionada. Conforme os relatos, o tratamento com penicilina seria eficaz.
Diagnóstico e tratamento
A suspeita clínica deverá ser confirmada pela ocorrência da doença na região. O
isolamento do agente etiológico por meio de cultura, embora difícil, deverá ser tentada.
O teste sorológico pela imunofluorescência indireta com soros conjugadas IgG e IgM
fornece dados de grande valor em pacientes com evolução clínica de pelo menos 3
semanas. A prova de ELISA também é de grande utilidade para a confirmação
diagnóstica.
O tratamento com penicilina e tetracilina pode abreviar a evolução da enfermidade
com possibilidades de evitar as manifestações tardias. Os pacientes tratados precoce-
mente não apresentam títulos elevados nos exames sorológicos.
Controle
Recomenda-se evitar as áreas endêmicas e as picadas por carrapatos por meio do
uso de sapatos e de roupa protetora. Os repelentes contra carrapatos podem ser tam-
bém indicados e o uso de carrapaticidas em cães.
Febre tifóide
Kathia Brienza Badini Marulli
A Febre Tifóide é uma enfermidade infecciosa aguda que tem como agente etiológico
a Salmonella typhi. Quadros clínicos com sintomatologia semelhante, porém mais bran-
da, são geralmente causados pelas Salmonella paratyphi A, B e C e recebem o nome
de Febres Paratifóides.
A S. typhi causa doença natural apenas no homem; chimpanzés, camundodngos e
outros animais podem apresentar a infecção experimentalmente. Já a S. paratyphi pode,
ocasionalmente, causar a infecção natural também em animais.
314
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Transmissão
As Febres Tifóide e Paratifóide são doenças relacionadas com a água de má qualida-
de. Localidades com problemas em seus sistemas de tratamento, distribuição e abaste-
cimento de águas apresentam maior prevalência da doença.
As principais fontes de infecção são os doentes e portadores, por meio de suas
excreções (fezes e urina) e, em alguns casos, pelo vômito, expectoração ou pus. Após a
enfermidade clínica ou subclínica, as pessoas podem permanecer como portadores por
vários meses ou anos. Tornou-se famoso, no meio médico, o caso de “Maria Tifosa”
(“Typhoid Mary”), uma cozinheira americana que, ao longo de vários anos foi responsá-
vel por mais de 50 casos.
O homem se infecta pela ingestão de água ou alimentos contaminados. Os alimentos
mais envolvidos com a transmissão da Salmonella typhi são legumes e verduras irriga-
dos com água contaminada, leite, frutos do mar, alimentos enlatados e congelados não
pasteurizados, como sorvetes, por exemplo.
As mãos dos pacientes e seus objetos de uso pessoal (roupas, lençóis, etc.) também
podem servir como fontes de contaminação em situações de falta de higiene e promis-
cuidade.
A doença no homem
O período de incubação varia de poucos dias a semanas, sendo considerado como
período médio cerca de 10 dias. Inicialmente o paciente apresenta febre, dor abdomi-
nal, vômitos, anorexia e cefaléia. A partir da segunda semana, os sintomas intensifi-
cam-se; ocorre prostração e o estado de consciência altera-se progressivamente. O
paciente entra em estado de torpor, fica delirante e indiferente ao ambiente. Ocorre
desidratação, diarréia abundante e esverdeada, esplenomegalia, hepatomegalia. Po-
dem ocorrer hemorragia e perfuração intestinais. No abdômen e no tórax aparecem
sinais cutâneos característicos, de 2 a 5 mm de diâmetro, que desaparecem à pressão,
evoluem em dois ou três dias, e são denominadas “roseólas tíficas”. A partir da quarta
semana de estado, a febre começa a diminuir progressivamente e o paciente entra em
fase de recuperação, que é bastante demorada.
Pacientes no período de convalescença podem sofrer uma recaída, ou seja, o
reaparecimento dos sintomas durante dois dias ou mais. Isso ocorre em cerca de 3 a
20% dos casos, geralmente 15 dias após o término da febre. Em pacientes tratados entre
7 a 10 dias este fato é mais comum do que nos que recebem tratamento por períodos de
15 dias ou mais.
Antes do advento dos antibióticos, a letalidade ficava em torno de 10 a 20%; atual-
mente, varia de 0,2 a 3,8%.
Diagnóstico
Pode ser confirmado pelo isolamento e identificação da Salmonella, por meio da
hemocultura (principalmente na primeira semana da enfermidade), coprocultura ou urinocultura
(ambas com máxima positividade na terceira semana clínica), mielocultura, ou a partir de
outros materiais como as roséolas tíficas, secreções purulentas, bile, etc..
Como prova sorológica, é empregada a reação de Widal, prova de soroaglutinação de
315
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Tratamento
Os quimioterápicos mais indicados são: cloranfenicol, ampicilina, amoxacilina e
sulfametoxazol-trimetoprim. Para o tratamento dos portadores são recomendadas a
ampicilina ou a amoxacilina pelo período de duas a quatro semanas.
Controle
Deve-se realizar o controle e tratamento das fontes de água e sistemas de abasteci-
mento. Em locais onde a obtenção de água seja precária, pode-se lançar mão de artifíci-
os como a fervura ou cloração caseira da água. Deve-se dar um destino adequado às
excretas humanas e ao lixo e controlar moscas, que podem servir como vetores mecâni-
cos para as salmonelas.
Fervura ou pasteurização do leite; fiscalização sanitária dos alimentos; programas de
educação sanitária da população e dos manipuladores de alimentos; tratamento dos do-
entes e desinfecção concorrente de dejetos e utensílios são outras importantes medidas
de controle.
É extremamente importante a identificação e tratamento dos portadores que, muitas ve-
zes, são os responsáveis pela manutenção do agente e pela origem de surtos epidêmicos.
Portadores devem ser afastados de atividades relacionadas à manipulação de alimentos. O
critério de restabelecimento do portador consiste na negativação de coproculturas realizadas
durante três dias de cada semana por um período de um mês.
As vacinas existentes atualmente são recomendadas para pessoas altamente expos-
tas, que vivem ou viajam freqüentemente em regiões endêmicas de alta incidência da
doença e para aquelas que vivem em instituições com condições higiênicas insatisfatórias.
Meningites
Bruno Soerensen
316
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
O diagnóstico tem como base o quadro clínico que inclui febre, vômitos, rigidez da
nuca e alterações funcionais do Sistema Nervoso Central. A confirmação do agente
etiológico é feita pelo exame liquórico. O aspecto do liquor, a citologia, o exame químico,
o exame bacteriológico e micológico são imprescindíveis. A pesquisa de antígenos e
anticorpos pode ser feita pelas provas de latex, imunoenzimatico (ELISA),
radioimunoensaio e imunofluorescência, entre outras.
Epidemiologia
A meningite meningocóccica é de grande distribuição geográfica e se mantém de
maneira endêmica em várias regiões, produzindo casos esporádicos, principalmente em
crianças. Entretanto, periodicamente, independentemente da sua faixa de endemicidade,
pode apresentar caráter epizoótico como aquela que ocorreu em São Paulo em 1947 e
em 1971 a 1974 com maior incidência nos meses de inverno e no início da primavera.
Profilaxia
A profilaxia da meningite meningocóccica tem como base o isolamento dos doentes
e a imediata notificação, o tratamento do doente e de todos os familiares e comunicantes
de casos de meningite.
A vacinação com polissacárides purificados constitui o recurso prático que deve-se
impor, embora as vacinas polissacarídicas não apresentem a antigenicidade das vacinas
proteicas. Por este motivo a algumas vacinas polissacarídecas foram adicionadas prote-
ínas contidas no meningococo com o intuito de aumentar o seu resultado protetor. Diver-
sos experimentos realizados em grupos militares teriam fornecido resultados satisfatórios.
No surto observado em São Paulo, de 1971 a 1974, predominou o tipo C de meningococo
e daí por diante o tipo A. A epidemia se alastrou por todo o País, o que exigiu das
autoridades sanitárias a vacinação em massa indiscriminada de aproximadamente oiten-
ta milhões de adultos e crianças com uma vacina bivalente A-C em todo o território
brasileiro, em 1975.
Esta vacinação de grande extensão, entretanto, não foi controlada com bases cientí-
ficas como seria desejável, embora após a vacinação se tenha observado um declínio do
número de casos, sobretudo no que concerne ao tipo A em crianças acima de um ano.
Um detalhe que pode ter invalidado os aludidos bons resultados foi o fato de ter sido
implantada a vacinação somente no início do declínio da curva epidemiológica, momento
epidemiológico este em que é esperado obrigatoriamente o declínio de casos. Recente-
mente foram observados acidentes vacinais possivelmente pela presença de endotoxinas
na vacina utilizada.
Sífilis
317
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Enfermidade também conhecida como Lues Venérea, é causada por uma espiroqueta
denominada Treponema pallidum. O agente é anaeróbio obrigatório, possui baixa resis-
tência ao meio ambiente e aos desinfetantes, podendo sobreviver até 10 horas em obje-
tos úmidos.
O nome Sífilis vem do Grego, língua na qual Sys significa porco e philein, amar,
demonstrando que a ocorrência da enfermidade sempre esteve relacionada ao conceito
de que o amor (no caso, o sexo) é uma coisa suja. Já a palavra Lues vem do Latim e
quer dizer praga, peste, corrupção.
A enfermidade é extremamente antiga, havendo a descrição de sintomas compatí-
veis em documentos médicos chineses de 2.637 a.C.. Durante o século XV, ocorreu sob
a forma de epidemias em todo o continente europeu e era conhecida como “mal fran-
cês”, “mal alemão”, “napolitano”, “americano”, ou por inúmeros outros nomes, confor-
me o caso, cada nação tentando jogar a culpa de sua eclosão na Europa em outro povo.
Foi a doença “da moda” durante o período da Renascença, considerada uma moléstia de
natureza secreta, contagiosa, mortífera e causadora de lesões repugnantes.
Em 1905 Schaudinn consegue determinar o agente etiológico.
Transmissão
A Sífilis é uma enfermidade endêmica na maioria das regiões do mundo. É conside-
rada a segunda doença sexualmente transmissível mais grave, sendo suplantada apenas
pela AIDS.
O homem é a única fonte do agente. A transmissão pode ocorrer por meio do contato
sexual, por transfusões sangüíneas, inoculação direta acidental, ou mesmo pelo beijo, se
houver alguma lesão prévia na mucosa oral. Outra forma de transmissão bastante impor-
tante é a via transplacentária, ocasionando a Sífilis Congênita.
A doença no homem
A Sífilis desenvolve-se numa seqüência de três formas clínicas, denominadas primá-
ria, secundária e terciária. A Sífilis Primária é também conhecida como Cancro Duro. A
lesão, que varia de uma pequena erosão até uma úlcera profunda, aparece cerca de 10
a 20 dias após a contaminação. Como a principal via de transmissão da Sífilis é o contato
sexual, esta lesão inicial geralmente surge nos órgãos genitais, podendo, entretanto, loca-
lizar-se em outros órgãos. A lesão muitas vezes é única e oculta, principalmente nas
mulheres, o que dificulta o diagnóstico. Apresenta bordas duras, bem definidas, com a
base recoberta por exsudação purulenta e desencadeia uma linfoadenite regional. A
lesão cicatriza em 4 a 6 semanas, mesmo sem tratamento.
A Sífilis Secundária desenvolve-se aproximadamente de 2 a 10 semanas após o
surgimento do Cancro Duro. Ocorre linfoadenopatia generalizada, erupções cutâneas,
úlceras nas mucosas oral, vaginal e anal. Estas lesões cedem em poucas semanas.
A Sífilis Terciária pode acometer o paciente de 8 a 25 anos após a infecção original.
Nesta forma clínica as lesões desenvolvem-se em qualquer órgão ou tecido, sendo os
pontos preferenciais o sistema nervoso central, a porção ascendente da aorta e os ossos.
São lesões geralmente destrutivas e graves. Alguns grandes granulomas denominados
318
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
Deve ser feito pela demonstração do Treponema na secreção da lesão. Existe tam-
bém o diagnóstico sorológico, que deve ser feito em duas fases: a primeira por meio da
prova conhecida como VDRL (“Veneral Disease Research Laboratory”); a segunda,
pela imunofluorescência indireta com antígeno treponêmico (FTA-ABS, “Fluorescent
Treponemal Antibodies, Absorbed”), considerada como prova confirmatória.
Tratamento
O antibiótico de escolha é a Penicilina e, aparentemente, não existem cepas resisten-
tes até o momento. Também podem ser empregadas as Cefalosporinas, Tetraciclinas e
a Eritromicina. A cura completa às vezes requer vários anos.
Pode ocorrer uma reação ao tratamento, uma a duas horas após o início da
antibioticoterapia, em pacientes secundários ou terciários, denominada Reação de
Hersheimer, em que ocorre cefaléia, febre, calafrio, dores musculares e reativação das
lesões, devido à destruição intensa dos treponemas.
Controle
Tratamento dos doentes até a obtenção de cura completa. Impedir o contato da pele
ou mucosa dos doentes com pessoas sadias. Notificação dos casos às autoridades sani-
tárias (a Sífilis Congênita é de notificação compulsória no Brasil desde 1986). Durante o
acompanhamento pré-natal deve-se submeter as gestantes ao exame VDRL na primei-
ra consulta e no início do 3o trimestre de gestação.
Em função de alguns levantamentos sorológicos realizados no Brasil, o Ministério da
Saúde admitiu uma soroprevalência para o VDRL em gestantes atendidas em serviços
públicos de 3,5%. Considerando a porcentagem de gestantes na população total igual a
3% e estimando que a taxa média de transmissão vertical para a gestante não tratada é
de 85%, a estimativa para o Brasil para o ano de 1994 foi de 140.730 possíveis casos
conseqüentes de Sífilis na gestação. Para o Estado de São Paulo, a estimativa de casos
no ano de 1994 seria de 19.732 possíveis casos, considerando 2% de gestantes na popu-
lação geral, pois o índice de fertilidade do Estado é menor do índice de alguns outros
locais do país. Entretanto, em 1994, foram notificados 339 casos de Sífilis Congênita no
Estado de São Paulo. Esta disparidade pode ter várias hipóteses explicativas, entre elas
uma baixa sensibilização do sistema de Vigilância Epidemiológica para a questão da
Sífilis Congênita, levando a uma elevada subnotificação dos casos. Frente a estes dados
e visando diminuir a subnotificação e a ocorrência de casos, a Divisão de Epidemiologia
do Programa Estadual de DST/AIDS, a partir de 1994 passou a adotar uma nova defini-
ção de caso e a estabelecer novas estratégias de controle da doença, propondo a “elimi-
319
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Tuberculose
Bruno Soerensen
Etiologia
Os agentes etiológicos da Tuberculose são bactérias do gênero Mycobacterium. O
principal causador da tuberculose humana é o M. tuberculosis, na África Tropical o M.
africanum, nos bovinos o M. bovis. O M. africanum tem características intermediárias
entre o M. tuberculosis e o M. bovis.
Atualmente o M. avium, antigamente incluído como o agente da tuberculose nas
aves, é estudado no capítulo das doenças causadas pelas micobactérias não tuberculosas.
Distribuição geográfica
Mundial, embora há poucos anos já se encontra-sse erradicada em vários países,
atualmente é um exemplo de doença reemergente.
Ocorrência no homem
Trata-se de doença sócio-econômica em declínio lento no mundo, com predominân-
cia maior nas regiões pobres. Nos últimos anos está sendo constatado o resurgimento da
Tuberculose.
A maior incidência da Tuberculose Humana é pelo M. tuberculosis, constituindo-se
como agente etiológico de importância secundária o M. bovis. O M. bovis foi isolado
com maior freqüência em crianças na Inglaterra, constituindo-se em 1945 em 5% dos
casos fatais e em 30% dos casos da doença em crianças com menos de cinco anos de
idade. Com o controle da erradicação da Tuberculose Bovina, em vários países, os casos
humanos são atribuídos ao M.tuberculosis.
Nos países onde a Tuberculose Bovina é enzóotica, como em vários países da Amé-
rica Latina, os casos humanos geralmente são localizados, com comprometimento de
gânglios linfáticos da região cervical ou ainda de gânglios linfáticos mesentéricos e ex-
cepcionalmente comprometimento hepático. A transmissão é por meio do consumo de
leite cru. O leite não pasteurizado e não fervido, portanto, se constitui na fonte de infec-
ção humana. Deve-se considerar que uma vaca portadora de Tuberculose não necessita
do comprometimento da glândula mamária pela doença para que elimine o bacilo da
tuberculose pelo leite. O M. bovis é de virulência menor para o homem que o M.
tuberculosis.
Na Argentina, no período de 1978 a 1981, foram estudados 7.195 cepas de bactérias
isoladas de casos de Tuberculose Pulmonar, classificando-se 1,1% como M. bovis.
Anualmente morrem no mundo pelo menos 3 milhões de pessoas e surgem 4 a 5
milhões de novos casos de Tuberculose com baciloscopia positiva, que infectam outros
indivíduos. Paralelamente, outros 5 milhões de casos ativos com baciloscopia negativa
aparecem anualmente, dentre eles muitos somente com cultura positiva, outros com
Tuberculose extrapulmonar.
A taxa de incidência de Tuberculose declina gradativamente no mundo, mas é um
320
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
A infecção inicial, muitas vezes, é inaparente e a prova de tuberculina após algumas
semanas se torna positiva, as lesões iniciais regridem espontaneamente, como acontece
com freqüência nos pulmões, e uma adenopatia satélite pode-se detectar com fibrose e
calcificação da lesão pulmonar e dos gânglios que drenam a região. Esta primo-infecção
recebe o nome de “complexo primário tuberculoso” e a calcificação é considerada como
o sepultamento do bacilo de Tuberculose. Elevado número da população é portadora do
complexo primário tuberculoso (tuberculose infecção) que difere da Tuberculose Doen-
ça, podendo-se observar a Tuberculose Evolutiva, que progride lentamente levando à
morte se não tratada adequadamente. A Tuberculose pode comprometer todos os teci-
321
SOERENSEN & BADINI MARULLI
322
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
O diagnóstico da Tuberculose no homem tem como base a detecção clínica, radioló-
gica, bacteriológica e finalmente a reprodução experimental em cobaio. A prova
tuberculínica é de importância secundária como recurso no diagnóstico da tuberculose
no homem, entretanto nos animais se constitui em recurso de importância.
323
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Viroses
Dengue
Bruno Soerensen
Transmissão da doença
A Dengue é transmitida por pernilongos do gênero Aedes, sendo o vetor de maior
importância no continente americano o Aedes aegypti, que se reproduz com facilidade
em recipientes com águas paradas, dentro das casas ou nas suas proximidades. Outros
pernilongos, como o Aedes albopictus e o Aedes scutellaris, desempenham papel im-
portante na transmissão da doença, principalmente em outros continentes.
O pernilongo, ao sugar o sangue do doente no período virêmico (período febril, duran-
te 5 a 6 dias, em que o vírus se encontra no sangue circulante), se contamina e o vírus se
multiplica dentro dele migrando para suas glândulas salivares. Após aproximadamente
324
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
dez dias, estes pernilongos já transmitem o agente causador da doença para pessoas que
ainda não tiveram Dengue.
Os estudos referentes à transmissão da doença revelaram a importância para a Saú-
de Pública de um ciclo silvestre da Dengue, possivelmente tendo como vetor o Aedes
albopictus, originário da Ásia, de ocorrência freqüente na selva. Foi constatado ainda
que o Aedes albopictus, contaminado com o vírus, pode transmitir o vírus por via
transovariana a novas gerações de pernilongos, somando-se a este mecanismo o fato da
suscetibilidade de macacos ao vírus responsável pelo Dengue. Desta maneira, poderia
explicar-se a existência de um ciclo silvestre entre macacos, que justificaria a sobrevi-
vência do vírus em determinadas áreas geográficas nos períodos inter-epidêmicos. Em-
bora até a presente data não tenha sido isolado o vírus de primatas não-humanos (maca-
cos), a presença de anticorpos nestes animais indica que entraram em contato com o
vírus causador da Dengue.
A doença no homem
A Dengue é uma doença febril aguda e benigna, com um período de incubação de 5
a 8 dias. A febre é acompanhada de prostração, calafrios, dor de cabeça intensa, dor
retro-orbitária, dores musculares e articulares. Podem-se observar ainda náuseas, vômi-
tos, dor de garganta e aumento de volume dos linfonodos. Dificilmente são observados
óbitos. A Dengue hemorrágica (febre hemorrágica), entretanto, pode ter uma evolução
grave, inclusive levando à morte, especialmente em crianças.
Diagnóstico
O material a ser utilizado para o isolamento do vírus é o sangue, colhido do paciente
no período febril, semeado em cultura celular. As provas sorológicas podem ser úteis,
como a inibição da hemaglutinação, a fixação de complemento e a soroneutralização.
Controle
A prevenção da Dengue baseia-se, fundamentalmente, no controle e erradicação do
Aedes aegypti, evitando-se o acúmulo de água em recipientes, nos quais os pernilongos
poderiam proliferar.
Febre amarela
Kathia Brienza Badini Marulli
325
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Transmissão
A enfermidade é considerada ocupacional, acometendo principalmente homens que
trabalham em regiões de floresta, agricultores, extratores de látex (seringueiros), caça-
dores, etc..
Existem duas modalidades epidemiológicas da doença, a urbana e a silvestre. Na
modalidade urbana, o hospedeiro é o homem e a transmissão é feita pelo vetor biológico
Aedes aegypti. O agente pode ser transmitido a outro homem de 10 a 12 dias após o
mosquito sugar sangue de alguém enfermo.
No ciclo silvestre, o agente é mantido pelo hospedeiros, que são os macacos, e pelo
vetor, mosquitos do gênero Haemagogus. Neste caso, o homem é um hospedeiro aci-
dental, que se infecta quando se aproxima de regiões de floresta, em situações de traba-
lho ou de lazer.
Os ciclos urbano e silvestre são independentes e auto-suficientes, mas a infecção
pode passar de um ciclo a outro, dependendo das condições. Como fatores que influen-
ciam a extensão do ciclo silvestre às cidades, podem ser citados: título e duração da
viremia no homem; densidade da população de Aedes aegypti; freqüência da exposição
do vetor a pacientes virêmicos em áreas urbanas; nível de imunidade da população
urbana.
Nas Américas, foram notificados 710 casos de 1975 a 1980. Em 1981-1982, Brasil,
Bolívia, Colômbia, Equador e Peru notificaram um total de 368 casos com 183 óbitos.
Não ocorrem surtos de Febre Amarela urbana nas Américas desde 1942. Na África,
nos últimos 30 anos, têm ocorrido extensas epidemias da doença, principalmente nas
áreas de savana. Entre 1965 e 1983, foram notificados oficialmente 2.840 casos no
continente africano.
A doença no homem
A infecção no homem varia desde uma forma assintomática até enfermidade grave,
com desfecho fatal. O período de incubação da doença varia de 3 a 6 dias depois da
picada do mosquito infectado. A viremia ocorre nos primeiros quatro dias da enfermida-
de.
Os casos leves apresentam um quadro clínico indefinido, semelhante a outros esta-
dos febris. Os casos graves possuem três períodos clínicos: infecção, remissão e intoxi-
cação. O período de infecção começa repentinamente com febre, dor de cabeça, mal-
estar generalizado, fraqueza, dor na região lombo-sacral, náusea e vômitos. Esta fase
dura cerca de 3 dias e nesse período o vírus está circulando no sangue em altas concen-
trações e o paciente pode servir como fonte de infecção para os mosquitos. A febre e os
sintomas podem desaparecer por um período de 24 horas, retornando com maior inten-
sidade. O período de intoxicação é caracterizado por icterícia, albuminúria, oligúria, ins-
tabilidade cardiovascular e manifestações hemorrágicas, incluindo hematemese. Os sin-
tomas nervosos, como delírios, convulsões, estupor e coma antecedem a morte.
Nos casos gravíssimos, a morte ocorre entre o terceiro e o sétimo dia, existindo
relatos de óbitos no segundo ou terceiro dia. Se a enfermidade se prolonga por mais de
10 dias, existe tendência de recuperação do paciente. Pacientes que sobrevivem à fase
tóxica aguda podem apresentar sinais de falência renal. A convalescença é lenta, com
326
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
fraqueza e fadiga, durando cerca de 3 meses, e mortes tardias, durante este período, são
atribuídas à falência cardíaca. Em populações autóctones de áreas endêmicas, a letalidade
é menor que 5%; nos casos severos, aproxima-se de 50%.
Os casos de Febre Amarela que são notificados às autoridades oficiais são, geral-
mente, aqueles que levam o paciente a óbito. Estima-se que a verdadeira incidência da
enfermidade nas Américas é de, pelo menos, 10 a 20 vezes maior do que o notificado.
Contribuem para o problema da subnotificação o baixo índice de suspeita, acesso limita-
do aos serviços médicos em áreas remotas e dificuldade em obter testes diagnósticos
específicos.
Diagnóstico
Deve ser feito por meio do isolamento do vírus, pela inoculação em camundongos ou
em macacos Rhesus. Também pode ser realizado o diagnóstico sorológico (ELISA,
fixação de complemento, inibição da hemaglutinação e neutralização).
O exame histopatológico post-mortem de amostras de fígado é um importante méto-
do de vigilância epidemiológica.
Tratamento
Alguns trabalhos experimentais têm demonstrado a ação terapêutica de algumas dro-
gas antivirais, como o ribaverin, tiazofurin e os interferons humanos Alpha e Gama.
Entretanto, seu valor no tratamento da doença in vivo ainda não foi estabelecido. Assim,
o tratamento preconizado para a Febre Amarela consiste em dar condições de suporte
aos pacientes, por meio da reposição da volemia e do equilíbrio eletrolítico, administra-
ção de antieméticos e antiácidos, reposição sanguínea e tratamento do choque. Em al-
guns casos, torna-se necessário realizar diálise peritoneal e hemodiálise.
Controle
Vacinação de pessoas que moram ou vão viajar para zonas enzoóticas. A principal
vacina é conhecida como 17D e é constituída por vírus vivo atenuado. A revacinação
deve ser feita a cada 10 anos.
Outra importante medida de controle é a tentativa de erradicar o vetor Aedes aegypti.
Nas regiões onde este objetivo for alcançado, devem ser implementadas medidas de
vigilância, para que não ocorra o mesmo que aconteceu no continente americano: por
meio de campanhas contra o vetor, a partir de 1947, foi conseguida sua erradicação em
80% da área infestada nas Américas, em 1960. Entretanto, com o retrocesso da campa-
nha, ocorreu a reinfestação.
327
SOERENSEN & BADINI MARULLI
“Com a mesma velocidade com que a ciência consegue erradicar doenças no mundo,
aparecem outras novas como se fosse para substitui-las.”
A Varíola foi erradicada da face da terra em 1979 e neste ano (1995) foi erradicada a
Poliomielite nas Américas, embora seja ainda necessária a persistência da vacinação, pois
existem possibilidades da reintrodução da Paralisia Infantil de outras regiões do mundo
onde ainda é assinalada. A próxima meta é a erradicação do Sarampo.
É interessante destacar a substituição dos problemas. A cólera voltou em 1991 ao
Brasil após um século.
Uma nova doença, a AIDS, encontra-se em franca progressão.
Outras doenças emergentes como a Infecção Pulmonar por Hantavirus, nos Estados
Unidos, a Neuropatia Epidêmica em Cuba e a Febre Hemorrágica na Venezuela também
podem ser citadas.
Como se não fosse suficiente uma nova doença, a Febre Hemorrágica pelo vírus Ebola
apareceu no Zaire neste ano.
No dia 6 de maio de 1995 foi notificado à Organização Mundial da Saúde (OMS), pelas
autoridades de saúde do Zaire, um surto de Febre Hemorrágica Viral na região de Kikwit
(Bandundi-Zaire), tendo como agente causador o vírus Ebola. Esta doença, entretanto, já
tinha sido observada anteriormente pela primeira vez em 1976 na região Oeste Equatorial
do Sudán e no Zaire, e ainda pela segunda vez na mesma região em 1979.
A partir de maio deste ano até o dia 28 de junho, foram notificados 297 casos pelo vírus
Ebola incluindo-se 233 óbito (78%); considera-se entretanto que o momento crítico se
encontra superado. Os mecanismos quanto a reservatórios do vírus ainda não se encon-
tram bem definidos; entretanto, quanto ao quadro clínico, a doença é bem conhecida. O
período de incubação (período da demora para o aparecimento dos primeiros sintomas
desde o momento da contaminação) é de 2 a 21 dias, caracterizando-se por febre, dores
musculares, dor de cabeça, sudorese seguida por vômitos, diarréia, erupção cutânea (man-
chas vermelhas na pela), comprometimento dos rins, do fígado e hemorragia.
Aproximadamente 50 a 90% dos que apresentam estes sintomas morrem. A confirma-
ção do diagnóstico é feita pelo isolamento do vírus responsável pela doença. Não existe
ainda vacina ou tratamento específico.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), preocupada com esta nova doença, de co-
mum acordo com o Governo do Zaire, estabeleceu medidas para o controle do surto.
As medidas de controle incluem: bloqueio da epidemia, estudo das características do
vírus Ebola, de que maneira se dissemina a doença, como se manifesta e se existe compro-
metimento de algum animal como reservatório. Foi estabelecida uma coordenação técni-
co-científica por meio de uma Comissão Internacional em Kikwit, incluindo-se ainda alerta
à população diante de Doenças Potencialmente Epidêmicas.
No momento, não parece existir maior risco de disseminação da doença no mundo.
328
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Transmissão
Os rotavírus têm distribuição universal. São classificados em subgrupos denomina-
dos I e II e em sorotipos, de acordo com seus determinantes antigênicos, que eram
supostamente espécie-específicos (a transmissão experimental interespécies já foi
conseguida, o que indica que a barreira de espécie animal não é estrita; entretanto, não
se conhece em que grau acontece este intercâmbio de vírus entre as diferentes espécies
na natureza).
No Brasil, os rotavírus foram detectados pela primeira vez em Belém (PA), em duas
crianças que apresentavam quadro diarréico agudo. Cerca de 30% das gastroenterites
agudas envolvendo crianças de baixa idade são causadas por esses agentes. O subgrupo
II é de ocorrência predominante em crianças, em relação ao I.
A epidemiologia da doença ainda não foi totalmente esclarecida. O vírus é resistente
e pode sobreviver meses nas fezes, à temperatura ambiente; assim, a contaminação do
ambiente pode ser uma fonte de contaminação para os animais. Em analogia com outras
infecções intestinais, parece que tanto no homem como nos animais o modo de transmis-
são é fecal-oral. Também existem várias indicações de que surtos de gastroenterite em
populações humanas ocorreram devido à contaminação da água corrente com rotavírus.
A doença no homem
O número de sorotipos do vírus para a espécie humana ainda é objeto de controvér-
sia: acredita-se que existam de 3 a 5 sorotipos, com distribuição geográfica uniforme.
Os rotavírus acometem principalmente crianças com idade entre zero e seis anos. O
período de incubação varia de 1 a 3 dias. A maior excreção de vírus ocorre no terceiro
ou quarto dia da doença (1.010 ou mais partículas por grama de fezes) e após o oitavo
dia, dificilmente são detectáveis. Em recém-nascidos e adultos podem ocorrer infecções
inaparentes.
O principal sintoma em crianças é a diarréia, que pode levar à desidratação e à
morte, principalmente quando ocorre em crianças subnutridas. Podem estar presentes
anorexia, cólicas abdominais, astenia e vômitos, sendo que alguns pacientes apresentam
apenas vômitos, sem diarréia. A febre pode ou não ocorrer. Às vezes, acompanhando o
processo gastrointestinal, as crianças apresentam comprometimento respiratório alto;
foram relatadas mortes súbitas em pacientes com este tipo de quadro clínico. Crianças
mais velhas (15 a 34 meses) podem apresentar diarréia com sangue. Em crianças
imunodeficientes pode-se estabelecer uma infecção crônica, com diarréia e excreção
viral por mais de seis semanas.
Nos países tropicais, 20 a 40% das diarréias de crianças hospitalizadas de até 5 anos
de idade são causadas por rotavírus; nos países de clima temperado a taxa seria de 40 a
329
SOERENSEN & BADINI MARULLI
60%.
A associação de rotavírus com bactérias enteropatogênicas é comum e acredita-se
que as infecções por esses vírus possam ser precursoras das gastroenterites por
coliformes. De acordo com algumas pesquisas, os rotavírus encontram-se associados a
outros enteropatógenos em 55% dos quadros diarréicos.
Cepas atípicas de rotavírus, destituídas do determinante antigênico comum ao grupo,
produzem extensos surtos epidêmicos, com envolvimento de adultos. O período de incu-
bação nestes casos é de 1 a 3 dias, a transmissão é fecal-oral e os sintomas permane-
cem geralmente por uma semana. A veiculação hídrica dos rotavírus já foi assinalada
por vários autores.
Diagnóstico
Pode ser realizado por meio da detecção de vírus ou antígenos virais nas fezes, com
o auxílio de microscópio eletrônico. Pode-se ainda empregar imunofluorescência, fixa-
ção de complemento e ELISA para detecção de rotavírus em espécimes fecais. O diag-
nóstico sorológico não é realizado como prova de rotina, mas também pode ser feito
pelas técnicas citadas acima, dentre outras.
Controle
Levando em consideração que a via de transmissão provavelmente é fecal-oral, a
prevenção deve se basear na educação sanitária e observação de regras de higiene
pessoal. A higiene também deverá ser rigorosamente observada em berçários e hospi-
tais, onde a ocorrência de surtos de diarréia por rotavírus são freqüentes e atingem alta
incidência.
O colostro contendo anticorpos específicos protege animais recém-nascidos contra a
enfermidade. O leite humano parece exercer papel importante principalmente quanto à
severidade do quadro clínico e as imunoglobulinas de origem humana também protegem
recém-nascidos contra as gastroenterites por rotavírus, durante certo tempo.
Existem várias tentativas de produção de vacinas eficazes, atualmente, a partir de
cepas humanas menos virulentas ou de cepas atenuadas de origem bovina. A vacina
deverá ser polivalente, com antígenos de diversos sorotipos que infectam o homem, e de
administração oral, para estimular a produção de IgA secretória específica na luz intes-
tinal.
330
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Hepatites virais
Bruno Soerensen
Etiologia
A hepatite viral tipo A (HVA), a hepatite viral tipo B (HVB), a hepatite viral não A,
não B (HVNANB), a hepatite viral delta (HVD), embora seus aspectos clínicos sejam
similares, diferem quanto a etiologia, epidemiologia e imunopatogênese.
A hepatite, chamada “infecciosa”, “epidêmica” é a que possui como agente etiológico
o do tipo A, reproduzível em macacos (Saguinus mystax) e detectável pela
imunoflurescência, radioimunoensaio, hibridação, etc.
Na “hepatite aguda benigna” pode-se considerar a fase prodrómica ou pré-ictérica, a
fase ictérica e a fase convalescente.
A “hepatite aguda fulminante” se caracteriza por necrose maciça de células hepáti-
cas, alterações mentais graves e progressivas, desde confusão, torpor, coma e morte. A
taxa de letalidade é elevada.
Entre as “hepatites crônicas” podem-se considerar a hepatite crônica lobular, a hepa-
tite crônica persistente e a hepatite crônica ativa.
Profilaxia
As hepatites virais podem ser evitadas ou minimizadas com vacinas (imunização
ativa), ou pelo uso de gamaglobulina humana (imunização passiva). A primeira é preven-
tiva e a segunda é destinada preferencialmente a contatos.
Somam-se às medidas acima referidas cuidados higiênico-sanitários como o isolamen-
to, cuidado na manipulação de fézes, urina e outras secreções do doente, abstinencia sexu-
al durante a fase aguda da doença especialmente nos tipos B e não A não B; esterilização
de instrumentos hospitalares e a desinfecção terminal como uso de detergentes e desinfe-
tante na higiene de superfícies contaminadas. Nos Bancos de Sangue, devem-se evitar
doadores profissionais e selecionar para uso os sangues a serem transfundidos sempre
negativos para reações sorológicas de radioimunoensaio ou ELISA. Pode ser usada ainda
a dosagem de transaminases séricas que permite selecionar os portadores assintomáticos
ou do vírus não A e não B.
Influenza
Bruno Soerensen
331
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Epidemiologia
A influença, doença de distribuição Mundial, foi responsável por várias pandemias
como as ocorridas em 1900, 1918, 1946, 1957 e 1968.
A pandemia de 1918 ocasionou ao redor de vinte milhões de mortes, constituindo-se
na maior pandemia de todos os tempos. Nos intervalos das pandemias ocorrem epidemi-
as regionais a intervalos anuais ou bianuais na dependência das variantes antigénicas do
vírus que não conferem imunidade.
A doença se transmite de pessoa a pessoa pelo contato íntimo ou por meio de aerossois
contendo vírus. A disseminação é rapidíssima, comprometendo crianças e adultos. As
complicações pulmonares bacterianas por pneumococos e estafilococos são frequentes.
A influenza dos suínos pode ocasionalmente ser transmitida ao homem.
Diagnóstico
O diagnóstico confirmando as características antigênicas do vírus é feito em labora-
tório pelo isolamento em cultura de tecido de embrião de galinha ou ainda por meio da
especificidade antigeno-anticorpo em soros de indivíduos convalescentes.
Profilaxia
A vacinação com vírus inativados da influenza tratados com formol administrada
pela via parenteral é a mais comumente usada. Vacinas de vírus vivo de virulência
atenuada também foram ensaiadas.
O maior problema da utilização das vacinas são as variantes do vírus que comprome-
tem cada epidemia, tendo sido observada uma determinada variante no início da curva
epidemiológica e o aparecimento de novas variantes no decorrer da mesma curva
epidemiológica, fato este que impede freqüentemente o êxito da vacinação.
A droga amantadina e a rimantadina são eficazes na prevenção da influenza por
vírus A. A vacinação e a administração das drogas acima referidas podem ser indicadas
nos grupos de maior risco como idosos, cardíacos, profissionais de saúde, serviços públi-
cos, forças armadas, etc.
Poliomielite
Bruno Soerensen
332
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
dem três grupos genéricos de interesse na patologia humana: 11, 22 os poliovírus (com três
sorotipos), os Coxsackie (A, com 24 sorotipos e B, com seis sorotipos) e os ECHO (com
30 sorotipos).1, 2, 7, 22, 24.
Dos três sorotipos do polivírus, o tipo 1 é o que mais freqüentemente causava doença
paralítica, 4 em endemias ou epidemias, enquanto o tipo 2 é o menos virulento.4
As cepas vacinais são capazes ainda de causar paralisia em macacos rhesus e
cynomolgus quando injetadas em altas doses diretamente no SNC. Vários métodos
distinguem cepas vacinais de cepas “selvagens”: sensibilidade à temperatura (as cepas
vacinais têm replicações diminuídas a 40°C); por marcadores antigênicos, testes nos
quais anticorpos preparados contra cepas vacinais são capazes de discriminar sutis dife-
renças antigênicas entre vírus homólogos e cepas “selvagens” do mesmo sorotipo.
Após penetrar no organismo humano pela via oral, o vírus atinge a orofaringe e o tubo
intestinal, onde inicia a sua proliferação, passando, a seguir, para os tecidos linfáticos
regionais. Nesta fase, pode ocorrer a viremia “minor”, pela qual tecidos retículo-endoteliais
(SRE) se tornam suscetíveis. Em poucas pessoas, depois, a replicação no SRE dá vazão
à viremia “major”, que corresponde temporariamente à “doença menor” conhecida como
“poliomielite abortiva”. Na maior parte das vezes, a infecção limita-se apenas à multipli-
cação viral no tubo digestivo e à invasão dos gânglios regionais, não ocorrendo a viremia.
Esta proliferação é, no entanto, suficiente para conferir ao infectado títulos de anticorpos
protetores para toda a vida.3, 22.
Formas clínicas
A poliomielite pode-se apresentar sob quatro formas: inaparente, abortiva, meningite
asséptica e paralítica. Esta última corresponde à forma mais grave e é um evento bas-
tante raro.3, 20, 24.
A forma inaparente não tem manifestação clínica e pode ser demonstrada de duas
formas: por meio de inquéritos sorológicos em populações e pela demonstração do
poliovírus na faringe ou nas fezes de pessoas clinicamente sadias. Esta forma, também
chamada de assintomática, ocorre em 99 por cento dos casos.3, 20, 22.
A forma abortiva, que incide em 0,9 por cento dos indivíduos suscetíveis contamina-
dos, caracteriza-se por quadro clínico inespecífico, tendo início de forma súbita, com
febre, cefaléia, dor da garganta, tosse, coriza e sintomas gastrintestinais como anorexia,
vômitos, dor abdominal e diarréia. É comumente confundida, em decorrência de sua
sintomatologia pouco específica, com episódios gripais e seu diagnóstico de certeza está
na dependência do isolamento do poliovírus nas fezes ou na orofaringe.3, 7, 20, 22, 24.
O comprometimento do SNC ocorre em 0,1 por cento dos casos e pode-se dar como
meningite asséptica ou como forma paralítica. Na primeira eventualidade, o início apre-
senta-se com as mesmas características da forma abortiva com sintomatologia
inespecífica. Ao exame clínico, o estado geral do paciente não se mostra tão comprome-
tido como nas meningites bacterianas; a orofaringe pode estar hiperemiada, existem
sinais evidentes de irritação radicular (sinais de Kerning e Brudzinski positivos) e obser-
va-se rigidez de nuca;3, 24. não há evidências de paresias e os reflexos miotáticos encon-
tram-se presentes.
Na forma paralítica da pólio podem ser observados diversos quadros clínicos refe-
rentes ao comprometimentos espinhal, bulbar ou encefálico, de forma isolada ou associ-
333
SOERENSEN & BADINI MARULLI
ada. O período de incubação, até se chegar à forma paralítica, pode variar de cinco a 35
dias (com média de 17 dias).
Epidemiologia
Modos de transmissão
Embora não se conheça com precisão a forma pela qual se dá a passagem do vírus
de uma pessoa infectada para uma suscetível, a maior parte dos estudiosos acredita que
a difusão se dê por meio do contato inter-humano, principalmente pelas fezes.7, 22, 24.
A capacidade de disseminação do vírus varia de acordo com a idade. Crianças abai-
xo de dois anos de idade, em decorrência de seus hábitos de higiene, são particularmente
propensas a transmitir os vírus.7
A hipótese da disseminação por via intestinal-oral é fortalecida pelo fato de saber-se
que a prevalência do vírus é maior em condições sanitárias inadequadas, pela coincidên-
cia do período de maior infectividade com o de maior eliminação fecal do vírus e pelo
fato de, raramente, se encontrar o vírus na orofaringe, após a primeira semana da doen-
ça. 7
O poliovírus já foi muitas vezes detectado em esgotos de áreas epidêmicas, embora
sua presença pareça ser muito mais uma repercussão da epidemia do que a sua causa.
Insetos já foram apontados como vetores da infecção, mas sua importância epidemiológica
é discutível.7
Comportamento epidemiológico
Podem-se distinguir três comportamentos epidemiológicos na poliomielite: o endêmico,
o epidêmico e o da era pós-vacinação.4, 9.
O comportamento endêmico existe nas áreas populosas dos países em desenvolvi-
mento, onde, caracteristicamente, crianças com menos de cinco anos de idade são aco-
metidas pela forma paralítica, constituindo as verdadeiras “paralisias infantis”. São paí-
ses geralmente com más condições de saneamento, baixa renda per capita e situados
em regiões tropicais, que apresentam alta prevalência dos enterovírus, inclusive o polivírus,
na sua população.9.
O número de casos notificados de poliomielite nesses países é, no entanto, pequeno, e dois
fatores são comumente aventados para explicar esse fenômeno. O primeiro deles é de que a
presença de anticorpos contra os três tipos de polivírus é quase universal nas gestantes e
existe passagem transplacentária dos mesmos para os fetos;2, 9 assim, caso o lactente entras-
se em contato com o poliovírus nos primeiros seis meses de vida, estaria parcialmente prote-
gido e não desenvolveria a forma paralítica da doença. O segundo fator é que a freqüencia de
infecções inaparentes é mais alta nas crianças de baixa idade do que nos adolescentes e
adultos. As populações desses países estariam em condições muito favoráveis para serem
contaminadas pelo poliovírus nos primeiros anos de vida, quando a infecção teria um curso
mais benigno.7, 9, 22.
Profilaxia
O controle da poliomielite foi conseguido, em grande parte, com o desenvolvimento
das vacinas de vírus inativados de Salk e de vírus atenuados de Sabion. A primeira é
aplicada por via intramuscular e, a segunda, por via oral.1, 7, 9.
334
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
LEITURA RECOMENDADA
1. Bell, W. E. & McCormick, W. F. – 1975 – Enterovirus. In: Neurologic Infections of Children. 1
st ed. Philadelphia: W. B. Saunders Company, p. 157.
2. Cherry, J. D. – 1976 – Enteroviruses. In: Infections Diseases of the Fetus Newborn Infant.
Remington, J. S. and Klein, J. O., editors, 1 st ed., Philadelphia: W. B. Saunders Company, p.
366.
3. Diament, A. J. – 1980 – Neuroviroses. In: Neurologia Infantil. Lefèvre, A. B. e Diament, A. J.,
editores, 1. ed., Sarvier, S. Paulo, p. 594.
4. Gaudin, O. G. – 1976 – La notion de risque dans la poliomyélite. Rev. Epidém. et Santé Publ.,
24:231.
5. Guyer, B.; Bisong, A. A. E.; Gould, J.; Brigalo, M. & Aymard, M. – 1980 – Infections and
paralytic poliomyelitis in tropical África. Bull. Word Health Organ., 58(2): 285.
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Adults. 6 th ed. St. Louis, C. V. Mosby Company.
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Bull. World Health Organ., 56 (1): 21.
10. Metsellar, D.; Mac Donald, K.; Gemert, W.; Van rens, M. M. & Muller, A.S. – 1977 – Poliomyelitis
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11. Modlin, J.F. – 1985 – Poliovirus. In: Mandell, G.L.; Douglas, R.G., Jr. & Bennett, J.E. – Principles
and Practice of Infectious Diseases. 2 nd edition. John Wiley & Sons. New York, p. 806.
12. Monif, G.R.S. – 1969 – Viral Infections of the Human Fetus. Toronto, MacMillan Co.
13. Mulder, D.W.; Rosenbaum, R.A. & Layton, D.D. Jr. – 1972 – Late progression of poliomyelitis
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14. Neves, W.E. – 1972 – Alguns aspectos da poliomielite no primeiro semestre de vida. Estudo
de 241 casos. Tese de doutoramento. Fac. Med. Univ. S. Paulo.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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18. Ofusu-Amaah, S.; Kratzer, J.H. & Nicholas, D.D. – 1977 – Is poliomyelitis a serious problem in
developing countries? Lameness in Ghanaian schools. Br. Med. J., 1: 1012.
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20. Prince, R.W. & Plum, F. – 1978 – Poliomyelitis. In: Handbook of Clinical Neurology. Infections
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Holland Biomedical Press, Amsterdam, p. 93.
21. Sabin, A.B. – 1980 – Vaccination against poliomyelitis in economically inderdeveloped countries.
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and Infectious Diseases. W.B. Saunders Company, Philadelphia, p. 1348.
23. Salk, J. & Salk, D. – 1955 –Control of Influenza and Poliomyelitis with killed virus vaccines.
Science, 195:834.
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elite em uma amostra de escolares do Mun. De São Paulo. Rev. Saúde Públ., 11(2): 270.
26. Volpi, A.; Raguna, G.; Biondi, W.; Rocchi, G. & Archetti, I. – 1976 – Seroimmunity to poliovirus
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27. Weekly Epidemiological Record. – 1978 – 53(32):237.
Rubéola
Bruno Soerensen
A Rubéola é uma doença exantemática com evolução de três a cinco dias compro-
metendo com maior frequência a infância e a adolescência. A doença exantemática
com um período de incubação de duas a três semanas pode apresentar um período
prodrômico caracterizado por discreta febre, arrepios de frio, cefaléia, dores generaliza-
das e aumento dos gânglios do pescoço mastóides e suboccipitais. Um dos graves pro-
blemas é que a incidência precoce na gravidez pode induzir malformações congênitas e
ainda poder ser transmitida ao feto.
Etiologia
O agente etiológico é um vírus da família Togaviridae gênero Rubivirus. Os testes
sorológicos podem ser utilizados.
Epidemiologia
As epidemias ocorrem com intervalo de 7 a 12 anos e principalmente na primavera
comprometendo especialmente crianças abaixo de 15 anos. Ocorre com maior frequência
336
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
Independentemente do diagnóstico clínico, realizam-se provas sorológicas em
convalescentes; durante longos períodos as provas positivas persistem. O método
rápido de aglutinação de látex e o método de ELISA são os mais utilizados.
Tratamento
Os casos mais graves são os de Rubéola congenita e de crianças acometidas por
múltiplas lesões congênitas. Nenhum medicamento tem ação antiviral e, conforme rela-
tos, o tratamento com imunoglobulinas não tem valor terapêutico. As crianças com rubé-
ola podem ser consideradas portadoras da infecção pelo período de seis meses e devem
ser tomados cuidados especialmente com mulheres grávidas.
Profilaxia
Há mais de vinte anos tem-se utilização a imunização ativa com vacinas com resulta-
dos alentadores, tendo como meta prioritária as crianças de 15 meses de idade. As
vacinações de rotina incluem sarampo, caxumba e rubéola. As mulheres sem anticorpos
devem ser vacinadas, evitando-se entretanto mulheres em gestação. A vacina pode ser
aplicada após o parto, com a recomendação de evitar uma gravidez durante os três
meses que se seguem.
A vacina protege durante um período de pelo menos três anos. O uso de imunoglobulina
pode ter indicação médica em casos especiais.
Sarampo
Bruno Soerensen
A doença no homem
Anteriormente ao uso da vacinação, esta doença comprometia com extrema fre-
qüência as crianças (90%) até chegarem aos dez anos de vida. O Sarampo era doença
endêmica e, com intervalos de aproximadamente dois anos, eram observadas as epide-
mias.
A vacinação utilizada na prevenção do Sarampo é de grande eficácia. É uma vacina
de vírus vivo, de virulência atenuada que, dependendo da virulência residual do vírus
utilizado na elaboração da vacina, pode, eventualmente, manifestar na criança vacinada
uma pequena reação à vacina, um “sarampinho” que, entretanto, não apresenta nenhum
risco para a criança (crianças de nove meses de idade), resultando em sólida imunidade.
É uma das vacinas que compõem o Plano Nacional de Imunização, e há expectativa de
337
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Sintomatologia
O período de incubação é de 8 a 13 dias. A doença inicia por febre, conjuntivite, coriza,
tosse e manchas localizadas na mucosa bucal. Com grande freqüência podem ser observa-
das inflamações da faringe e das vias aéreas superiores. Após 3 a 7 dias de evolução, inicia
uma erupção (manchas vermelhas, na pele do rosto e a seguir em todo o corpo), que após 4
a 7 dias regride com descamação da pele. O Sarampo é uma doença de importância em
Saúde Pública devido às complicações que podem sobrevir como otite média, pneumonia e
encefalite, levando à morte cerca de 10% das crianças doentes, especialmente aquelas que
se encontram desnutridas.
O Sarampo se transmite de pessoa a pessoa, pela via aerógena, especialmente pela
tosse. O período de transmissão se inicia já antes de qualquer sintomatologia, prolongan-
do-se até 4 dias após a erupção.
338
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
O vírus pode ser isolado em cultura de fibroblasto de embrião de galinha, a partir de
lavado faríngeo, sangue ou urina. Pode-se pesquisar a presença de anticorpos no soro do
paciente após convalescência, através de provas de laboratório como fixação de com-
plemento e inibição da hemaglutinação.
Prevenção e controle
Indiscutivelmente, a vacinação da população susceptível é a base fundamental para o
controle e erradicação do Sarampo. A recomendação de vacinação do PNI (Programa
Nacional de Imunização) do Brasil é de crianças de 9 meses a 9 anos de idade, com
índices de cobertura de vacinação superior a 80%. Em 1992 foi estabelecido no Brasil o
Plano Nacional de Saúde e Eliminação do Sarampo com uma estratégia de atualização
da vacinação da população de 9 meses a 14 anos e implementação da vigilância
epidemiológica, incluindo-se amostragem de sangue da população para verificar-se a
presença de anticorpos contra o sarampo e determinar a susceptibilidade à doença.
Durante a epidemia de sarampo nos anos 1996-1997, foi constatada a ocorrência, embo-
ra em proporção pequena, em adultos que possivelmente não teriam sido imunizados
quando crianças. A epidemia decorreu com grande possibilidade devido a uma cobertu-
ra de vacinação inferior à mínima recomendada de 80% da população infantil. A reco-
mendação inicial era da vacinação aos 7 meses e uma segunda dose aos 12 meses. Esta
recomendação não incluiria 15% das crianças que nascem sem anticorpo, pois pela via
transplacentária não receberiam anticorpo das mães. A este fato deve-se o adoecimento
prematuro de crianças antes de completarem o primeiro ano de vida. Entretanto, a partir
de 1983, foi iniciada uma única dose aos nove meses de vida. Em alguns Estados da
Federação foi recomendada uma segunda dose aos 15 meses de idade, ministrada na
vacina tríplice contra sarampo, parotidite e rubéola.
A vacinação ao nascimento não é recomendada pois a presença de anticorpo
transplacentário até os seis meses de idade prejudica o efeito da vacinação, pois a vaci-
na contém vírus vivos de virulência atenuada que são mortos pelos anticorpos
transplacentários presentes.
Apesar dos insucessos colhidos, o Sarampo é a próxima doença a ser erradicada da
face da Terra, pois, quando bem conduzida, a vacinação confere sólida imunidade soma-
da ao fato de não possuir reservatório no reino animal, pois os únicos susceptíveis são os
primatas não humanos.
339
SOERENSEN & BADINI MARULLI
sos, atingindo em quatro anos 1.982 casos e até a presente data milhões de casos e
milhares de óbitos.
Os primeiros casos, entretanto, comprometendo de maneira desapercebida milhares
de pessoas, teriam acontecido na África Equatorial. Através de Haiti e Ilhas do Caribe
por turistas ou trabalhadores e o vírus teria penetrado nos Estados Unidos. Acredita-se
ainda que o vírus da AIDS tenha passado do macaco para o homem por meio de contato
íntimo desses animais com os nativos africanos.
O agente etiológico é um vírus da família Retroviridae, vírus HTLV (“Human T
Lynphotropic Vírus”). Um retrovirus linfotrópico que ataca especificamente os linfócitos
T humanos “Helper” (Th) OKT4 + destruindo-os ou tornando-os funcionalmente insufi-
cientes. Um dos mais freqüentemente isolados é o HTLV – III que se multiplica em
laboratório em cultura celular de características próprias possibilitando a reprodução do
vírus.
Epidemiologia
Inicialmente foi verificada a ocorrência da doença em homossexuais masculinos em
aproximadamente 80% dos casos, em toxicômanos, hemofílicos, politransfundidos, imi-
grantes haitianos e em portadores do sarcoma de Kaposi, doença esta que ocorria ante-
riormente à AIDS somente na África Central.
Os novos aspectos epidemiológicos da AIDS, entretanto, mudaram, comprometendo
atualmente também os bissexuais masculinos, heterossexuais e, conseqüentemente,
mulheres e crianças.
Independentemente do contato sexual vaginal, a AIDS pode-se transmitir por meio
do contato sexual anal, oral, do beijo em casos da existência de solução de continuidade
da mucosa oral, transfusão sanguínea, agulhas contaminadas.
Em estudo realizado em prostitutas de Georgetown, Guyana no ano de 1993, consta-
tou-se que a soro positividade ao HIV era superior em prostitutas de condições sócio-
econômicas de baixo nível comparando-se com aquelas de nível melhor. As prostitutas
de condições sócio-econômicas piores usavam em menor proporção preservativo e en-
tre elas era mais freqüente o uso de cocaína.
Calcula-se que em homossexuais masculinos com comportamento sexual hiperativo
a probabilidade de desenvolver a doença num período de até três anos é de 70 a 90%,
entretanto em portadores assintemáticos não pertencentes a grupos de risco a possibili-
dade calculada é de 0 a 3%.
A tendência epidemiológica é de um aumento significativo da doença comprometen-
do grande parte da população do mundo. Os principais elementos epidemiológicos a
serem considerados são: idade, sexo, procedência, grupo de risco, estilo de vida, tipo de
prática sexual, transfusões de sangue nos últimos cinco anos, se hemofílico, se preso por
mais de um mês em ambiente promíscuo ou se é profissional de saúde. O uso de copos,
xícaras, talheres não oferece perigo de transmissão. A possível transmissão por artrópodos
está sendo estudada. O dentista portador de HIV poderá transmitir a doença em casos
de sangramento das mãos e a contaminação do intrumental em intervenções cruentas.
A doença leva a uma profunda imunodepressão imunológica e o organismo desprotegido
sofre com a associação de microrganismos, incluindo-se alguns oportunistas. As doen-
ças que com maior freqüência se associam são o sarcoma de Kaposi, a pneumonia por
Pneumocystis carinii e a tuberculose por Mycobacteriun tuberculosis.
340
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
Apresenta ampla variedade de formas clínicas, desde assintomáticas até formas clí-
nicas que evoluem para a morte. A soro positividade em populações de risco de indivídu-
os sintomáticos é relativamente elevada; portanto, eles constituem o grupo infectado. A
possibilidade do portador assintomático evoluir para doença não se encontra bem
esclarecida.
O período de inoculação da AIDS pode ser muito curto como seis a treze dias, embo-
ra geralmente seja longo, de vinte meses para crianças e trinta meses para adultos.
Uma das primeiras manifestações sugestivas da infecção pelo HIV são lesões orais
de placas esbranquiçadas nos bordos laterais da lingua que podem ter como agente
etiológico a Candida albicans ou um vírus como os correspondentes ao herpes simples,
citomegalovirus, vírus Epstein-Barr ou ainda serem relacionadas ao sarcoma de Kaposi,
carcinoma de células escamosas, linfomas não-Hodgkin, papilomas ou melanomas. Es-
tas manisfestações podem preceder a AIDS plenamente manifesta por um período de
um a 33 meses.
As manifestações clínicas decorrem da infecção pelo HIV e das infecções que se
associam devido à imunodepressão desencadeada pelo vírus. Pode-se observar
poliadenopatia com ausência de qualquer doença conhecida, lembrando o mononucleose
infecciosa. Há queda do estado geral e cansaço aos pequenos esforços, anorexia e
perda significativa do peso corporal, ressecamento da pele, sudorese noturna, febre,
diarréia crônica, tosse geralmente não produtiva, disturbios da esfera psíquica e neuroló-
gica. Associam-se com frequência histoplasmose disseminada, candidíase brônquica ou
pulmonar, isosporíase causando diarréia crônica, linfomas não-Hodgkin, sarcoma de
Kaposi, tuberculose.
No estado mais avançado da doença, instala-se uma série de infecções oportunistas
e neoplásicas apresentando quadro clínico correspondente à doença que estiver associ-
ada.
Diagnóstico
Independentemente do grupo de risco e do aspecto clínico, deverão ser considerados
aspectos epidemiológicos e laboratoriais. Entre os epidemiológicos, os grupos de risco,
embora com a disseminação atual da doença os grupos de risco tendam a desaparecer
comprometendo gradativamente a população.
Quanto ao diagnóstico laboratorial, revestem-se de grande importância os testes
sorológicos de grande sensibilidade e especificidade para a pesquisa de anticorpos como
o Western–blot que, quando bem conduzido, pode expressar grande segurança. O méto-
do imunoenzimático (ELISA), a imunofluorescência indireta, a radioimunoprecipitação
situam-se como de menor valor comparados ao Western-blot.
Outros novos testes já se encontram em experimentação, entre eles alguns que de-
tectam o antígeno viral a partir de duas semanas de infecção, portanto antecedendo a
formação de anticorpos HIV que somente aparecem de seis a oito semanas após a
341
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Tratamento e prevenção
Para o tratamento específico da infecção pelo HIV temos as drogas que impedem a
penetração do vírus na célula-alvo como os anticorpos monoclonais anti-gp., o peptídio T
o AL 721, os inibidores da transcriptase reversa como o Suramin o AZT, a Dideoxynosina,
o CD 4, a Rifabutina e o Ácido Fosfonofórmico.
Outras drogas atuam em etapas posteriores à síntese do DNA viral, como a Ribavisina,
o Interferon, o Ampligen e as associações de drogas que mostraram ação sinérgica
contra o HIV.
O tratamento inespecífico tem como finalidade o combate às infecções secundárias
que se associam.
Entre as medidas preventivas pode-se citar:
1. Evitar a promiscuidade e o sexo anônimo.
2. Limitar e selecionar os parceiros.
3. Higiene adequada após a prática sexual (lavagem com água e sabão).
4. Usar preservativos.
5. Evitar sexo oral, principalmente com grupos de risco.
6. Evitar ambientes promíscuos.
7. Para viciados em drogas injetáveis, usar seringa descartável.
8. As mulheres devem ter ciência da possibilidade da transmissão da AIDS por via
placentária.
9. Nos bancos de sangue evitar o uso de sangues soro positivos para AIDS.
10. Os profissionais de saúde (médicos, dentistas, enfermeiros, técnicos de laborató-
rio) devem adotar medidas que evitem a contaminação.
VACINAÇÃO
Diversas vacinas estão sendo ensaiadas em grupos de risco, incluindo-se prisioneiros
em penitenciária; entretanto, qualquer resultado deverá ter validade se os grupos de
vacinados e não vacinados forem observados por um período não inferior a cinco e a dez
anos e com um declínio significativo no grupo vacinado.
342
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Bacterioses:
Cólera
VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
Coqueluche
VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
Difteria
PERCI, R. D. Difteria. Akrôpolis – Revista da UNIPAR., 3 (9): 3-14, 1995.
VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
Enfermidade de lyme
VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
Febre tifóide
VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
Meningites
VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8a ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
Sífilis
FREGONESI, A, FERREIRA, U., ESTEVES, S.C. Doenças sexualmente transmissíveis. Ver. Bras.
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VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
Febre amarela
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VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
343
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Hepatites virais
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VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
Influenza
ACHA, P. & SZYFRES,B. Zoonosis y enfermidades transmisibles comunes al hombre y a los
animales. 2. ed. Washington: OPAS - OMS, 1989. (Publ. cient. n o 503).
VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
Rubéola
VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
Sarampo
ACHA, P. & SZYFRES,B. Zoonosis y enfermidades transmisibles comunes al hombre y a los
animales. 2. ed. Washington: OPAS - OMS, 1989. Publ. cient. n o 503.
VERONESI, R. Doenças infecciosas. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991.
344
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
1. Bacterioses
Actinomicose
Bruno Soerensen
345
SOERENSEN & BADINI MARULLI
A doença no homem
A porta de entrada do microorganismo no corpo humano é constituída por feridas
ou lesões cirúrgicas comprometendo os tecidos moles e os ossos. A infecção pelo
Actinomyces israelii determina um processo granulomatoso supurativo que, poste-
riormente, fistuliza. Quanto à sua localização, a cervico-facial é a mais freqüente,
seguida pela torácica (pulmonar), abdominal e generalizada.
A localização cérvico-facial possui um quadro clínico bem característico, iniciando
com um aumento de volume de consistência dura, ao nível da mandíbula e região cervical,
evoluindo gradativamente e apresentando áreas moles e drenagem ao exterior de pus
amarelado contendo grãos de cor amarela de aproximadamente meio milímetro de diâ-
metro, assemelhando-se a “grãos de enxofre”. Estes pequenos grãos não são outra
coisa que colônias do Actinomyces israelii, observáveis ao microscópio, e que recebem
o nome de “druzas actinomicóticas”, morfologia esta que serve para se diagnosticar a
doença.
Na clínica odontológica da Universidade de Marília, foi observado um caso raríssimo
de comprometimento do maxilar superior com grande destruição óssea, recuperado por
meio de tratamento adequado.
A forma pulmonar simula tuberculose e as formas características acima descritas
(“grãos de enxofre”) podem ser encontradas no exame de escarro. A forma abdominal
é sempre caracterizada por aumento de volume capsulado localizado no intestino ou,
ainda, na parede abdominal. Nos últimos anos tem-se observado a ocorrência da doença
no trato genital de mulheres que usam dispositivos intra-uterinos por longos períodos.
346
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico e controle
O quadro clínico no homem e nos animais é bem sugestivo. A demonstração micros-
cópica em material observado entre lâmina e lamínula da existência de formações radiadas
(“druzas actinomicóticas”) confirma o diagnóstico.
A identificação do tipo de actinomiceto é feita por meio de culturas em meios espe-
cíficos.
Quanto ao homem, é recomendável para a prevenção da doença, a higiene bucal e
cuidados após a extração dentária ou qualquer intervenção na cavidade bucal.
No que se refere à Actinomicose animal, ainda não foi encontrada nenhuma reco-
mendação prática.
Botulismo
Bruno Soerensen
347
SOERENSEN & BADINI MARULLI
A doença no homem
A intoxicação botulínica por alimentos é causada pelos tipos A,B,E e F.
O período de incubação é de 18 a 36 horas, entretanto, já foram registrados períodos
muito curtos, de poucas horas, ou ainda manifestação tardia, como 8 dias após a ingestão.
A sintomatologia pelos diferentes tipos de toxina botulínica é praticamente a mesma,
embora seja atribuída mortalidade maior à intoxicação pelo tipo A.
Os pacientes não apresentam febre, e sim sintomas gastrointestinais como náuseas,
vômitos, dores abdominais e, posteriormente, sintomas nervosos, como debilidade ou
paralisia descendente, dificuldade de visão e de deglutição, permanecendo presentes até
a morte a consciência e a sensibilidade. A morte é geralmente por parada respiratória.
As possibilidades de morte são altas, especialmente quando o período de incubação é de
poucas horas. Os pacientes que sobrevivem demoram muito tempo para chegar à recu-
peração total. Uma das pessoas que contraíram a doença a partir da ingestão de palmito
contaminado, uma jovem de 21 anos, permaneceu internada de fevereiro a agosto de
1997, tendo alta quase seis meses depois do início dos sintomas. Ela apresentou paralisia
total da musculatura e conseguiu recuperar-se completamente.
Nos casos de Botulismo Infantil, se inicia por constipação seguida de fraqueza, perda
de apetite, tosse, dificuldade de deglutição, fraqueza muscular e falta de controle muscu-
lar da cabeça. Existe paralisia dos nervos cranianos, da musculatura periférica e respira-
tória até por terminar com a morte da criança. É atribuída ao Botulismo a morte súbita
de muitos lactentes. O Botulismo por feridas, quanto à sintomatologia nervosa, é pratica-
348
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Controle
No referente ao homem, o controle consiste num rigor na regulamentação e inspeção
do envasamento dos alimentos e na educação sanitária quanto ao risco de consumo de
conservas de fabricação caseira ou de gosto alterado. Os pacientes portadores de
Botulismo devem ser tratados com urgência com soro anti-botulínico apropriado ao tipo
de toxina responsável pela intoxicação.
No Botulismo animal, como medida preventiva, é recomendada a administração de
suplementos contendo fosfato e a vacinação contra o Botulismo dos plantéis onde a
doença ocorre.
Brucelose
Kathia Brienza Badini Marulli
349
SOERENSEN & BADINI MARULLI
350
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
O homem adquire a infecção dos animais por contato direto ou indiretamente, pela
ingestão de produtos de origem animal ou, ainda, pela inalação de aerossóis infectantes.
Existem grupos de risco de ocupação profissional como a de tratadores de animais prin-
cipalmente de suínos, pois a incidência predominante da moléstia no homem no Brasil é
pela Brucella suis e, a seguir, pela Brucella abortus. São incluídos na população de
risco os trabalhadores de matadouros e médicos veterinários. O homem geralmente
contrai a moléstia ao manipular fetos e membranas fetais e ao entrar em contato com
secreção vaginal, excretas e produtos provenientes de animais infectados. O
microorganismo penetra através de soluções de continuidade da pele e também quando
se levam as mãos contaminadas até as conjuntivas. O homem também pode adquirir a
enfermidade de caprinos e ovinos contaminados.
Queijo fresco, leite cru e produtos lácteos de vaca e de cabra portadoras da doença
351
SOERENSEN & BADINI MARULLI
podem conter Brucella sp. Os leites acidificados, cremes e manteigas ácidas e queijos
fermentados conservados por mais de três meses dificilmente representam fonte de
contaminação. O leite deverá ser pasteurizado ou fervido.
O homem é suscetível à infeção pela B. melitensis, B. suis, B. abortus e B. canis. O
período de incubação é geralmente de uma a três semanas e, excepcionalmente, de
vários meses. É uma doença de caráter septicêmico apresentando febre contínua, inter-
mitente ou irregular. Na Brucelose aguda, como em outras doenças febris, os sintomas
consistem em calafrios, sudorese e elevação térmica. Um sintoma freqüente é a astenia,
cansaço ao menor esforço. A temperatura pode variar de normal, pela manhã, até 40º C
à tarde e os suores se apresentam à noite. É acompanhado de insônia, impotência sexu-
al, constipação, falta de apetite, dor de cabeça e dores generalizadas, irritação, nervosis-
mo e depressão.
Muitos pacientes apresentam os gânglios aumentados de volume e aumento de volu-
me do baço e do fígado. A doença pode se prolongar por algumas semanas, meses ou
ainda durante alguns anos. Podem ser observadas ainda complicações sérias como
encefalite, meningite, neurite, artrite e endocardite. Existe tratamento médico.
Como medidas preventivas para a população de alto risco podemos citar práticas de
higiene pessoal, o uso de desinfetantes e vestimentas protetoras. Na Rússia e na China
é utilizada como medida preventiva a vacinação desta população de risco com a vacina
19 BA de B. abortus (derivada da cepa 19 usada em bovinos), aplicada por escarificação
da pele. Na China também é usada para a vacinação humana a vacina viva de virulência
atenuada da cepa de B. abortus 104M, pela via percutânea, e ainda, na Rússia e na
França, com bons resultados, frações antigênicas de Brucella sp. Considerando-se que
os animais são os reservatórios da doença, o controle da doença nas populações animais
repercutirá favoravelmente na erradicação da Brucelose no homem.
Campilobacteriose
Bruno Soerensen
352
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Campylobacter jejuni
Esta espécie é responsável por enterite e diarréia no homem, especialmente nos
países desenvolvidos, onde a incidência é comparável à enterite pelo gênero Salmonella
ou ainda é superior. Na Inglaterra foi constatado que 20% dos casos de enterite estavam
relacionados à Campilobacteriose, embora também o agente possa ser isolado de pesso-
as sem diarréia. As epidemias de maior importância tiveram como fonte de contamina-
ção o leite e a água contaminada. A doença compromete especialmente as crianças nos
meses de temperatura elevada, sendo os mamíferos e aves domésticas e silvestres o
reservatório de maior importância do ponto de vista da Saúde Pública.
A doença no homem
Se manifesta por enterite de caráter agudo, com um período de incubação de dois a
cinco dias.
As manifestações clínicas são diarréia, febre, dor abdominal, vômito e sangue e muco
nas fezes em número elevado de pacientes. De maneira geral os pacientes se recupe-
ram num período de 10 dias. Há casos que simulam apendicite e outros podem levar à
septicemia, meningite e aborto.
Diagnóstico e controle
Na fase inicial da doença pode-se isolar o Campylobacter do sangue e, posterior-
mente, das fezes. Há necessidade do cultivo em meios seletivos incubando-se numa
atmosfera de 5% de oxigênio, 10% de C02 e 85% de nitrogênio, de preferência a uma
temperatura de 43º C. O diagnóstico sorológico pela imunofluorescência é de utilidade.
Quanto à prevenção da doença, recomenda-se evitar o consumo de água não trata-
da, de leite não pasteurizado ou ainda o consumo de frangos não suficientemente cozi-
dos. Os cães e gatos apresentando diarréia se constituem em fonte de contaminação e,
portanto, devem ser aplicadas medidas de higiene como:
1 - Manter os animais em boas condições de saúde, isolar os doentes, tratá-los ade-
353
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Campylobacter fetus
Este microorganismo é responsável, como foi referido anteriormente, por problemas
da reprodução, especialmente em bovinos e em ovinos.
A doença no homem
Independentemente de sua ocorrência rara, aparentemente não parece repre-
sentar problemas de Saúde Pública. A Campilobacteriose no homem se encontra
associada a fatores predisponentes que levam a uma queda de resistência como
gestação, alcoolismo crônico, neoplasias e doenças cardiovasculares. Tem-se isola-
do o Campylobacter fetus de gestantes, crianças prematuras e pessoas com mais
de 45 anos de idade. A Campilobacteriose pode ocasionar no homem processos
septicêmicos, podendo nestes casos ser isolado o Campylobacter do sangue circulante,
quando colhido no periodo febril. Também foi isolado do líquido sinovial, do líquor e
de fezes de pacientes com enterite aguda.
Diagnóstico e controle
354
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Carbúnculo
Kathia Brienza Badini Marulli
A doença no homem
A doença no homem apresenta um período de incubação de 2 a 5 dias, observando-
se três formas clínicas: a cutânea, a pulmonar e a gastro-intestinal. A cutânea é a mais
freqüente, devido ao contato com animais mortos por Carbúnculo ou ainda com lã e
couros contaminados (pincel de crina contaminado, usado para fazer barba, por exem-
plo). No local da pele lesada e contaminada observa-se prurido e, a seguir, uma pápula
355
SOERENSEN & BADINI MARULLI
que se transforma em escara deprimida e de cor preta. Esta lesão cutânea geralmente
não causa muita dor, contribuindo este fato a se evitar a consulta de um médico. Entre-
tanto, se o paciente não for tratado, a doença progride, levando a um processo septicêmico
e à morte em 5 a 20% dos casos.
A forma pulmonar decorre da inalação de esporos do Bacillus anthracis, especial-
mente em ambientes onde se manipulam lãs e pêlos de animais doentes. A sintomatologia
inicial pode ser confundida com uma infecção comum de vias respiratórias superiores;
entretanto, após 3 a 5 dias os sintomas pioram, observa-se febre e, posteriormente,
choque e elevada mortalidade.
Finalmente, o Carbúnculo intestinal é contraído pela ingestão de carne proveniente de
animais doentes abatidos de maneira clandestina. Nestes casos observa-se gastroenterite
hemorrágica, acompanhada de vômitos, causando uma letalidade que varia de 25 a 75%.
A bactéria Bacillus anthracis elabora uma toxina potente na qual se evidenciam três
frações: fator I, responsável pelo edema; fator II, responsável pela proteção (este fator
deverá estar contido nas vacinas destinadas à proteção contra a doença), e fator III,
também chamado de fator letal (responsável pela morte do paciente).
356
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico e controle
A confirmação do diagnóstico do Carbúnculo no homem e nos animais é feita por
meio de exame bacteriológico, inicialmente pelo exame microscópico do material (con-
teúdo líquido da lesão no homem e nos animais, líquido aspirado da pústula maligna e
sangue). Pode ser feita ainda a cultura do material e a inoculação experimental em
cobaia ou camundongo. A técnica de esfregaços de sangue diante de anticorpos fluores-
centes pode resultar em método útil.
A prova de Ascoli é de valor no exame de couros. Nos casos de Carbúnculo de
evolução lenta, podem ser de utilidade as provas de hemaglutinação indireta, imuno-
precipitação em ágar e a prova de Farr com antígeno marcado em iodo 131.
O controle da doença no homem tem como base a prevenção da infecção nos ani-
mais. Deve-se evitar o contato com animais infectados e produtos contaminados; pro-
mover a higiene ambiental e pessoal nos lugares onde se manipulam subprodutos de
origem animal; tratar as lesões cutâneas e, finalmente, desinfetar pêlos e lãs destinados
à comercialização. Os grupos populacionais de risco podem ser vacinados quando existe
indicação.
Nos animais, a melhor maneira de prevenir o Carbúnculo é por meio da vacinação
anual de todas as espécies onde foi assinalada a moléstia.
O diagnóstico precoce e o tratamento com antibióticos como a penicilina também são
recomendados. Os animais doentes devem ser isolados e, naqueles que vierem a morrer,
não se deve praticar a necrópsia. Se o cadáver não for aberto, entra em putrefação
rápida e a forma vegetativa do Bacillus anthracis é destruída em pouco tempo. O
diagnóstico laboratorial é feito colhendo-se sangue com seringa esterilizada e enviando
ao laboratório, onde serão realizadas a bacterioscopia e a cultura.
Os animais mortos devem ser incinerados no mesmo local onde morreram ou, então,
enterrados a dois metros de profundidade, cobrindo-se com cal.
Colibacilose
Bruno Soerensen
357
SOERENSEN & BADINI MARULLI
boram dois tipos de toxinas, uma termolábil e outra termoestável. Estas cepas
enteroxigênicas, para poderem produzir toxinas, fazem uso de suas fímbrias, que entram
em contato com as células epiteliais. As características antigênicas das fímbrias, adap-
tadas a bezerros e cordeiros, são predominantemente K99 embora possa ser isolado
também outro grupo antigênico como K88 e 987P. Nos leitões, as famílias relacionadas
à Colibacilose Enterotóxica são K88, K89 e 987P e, no homem, CEFA1 e CFA2.
As enteroinvasoras invadem a mucosa determinando uma sintomatologia disentérica,
à semelhança da determinada pelas bactérias do gênero Shigella. Estas cepas de E.
coli multiplicam-se na mucosa intestinal, causando um processo inflamatório e colite.
Quanto às enteropatogênicas, o mecanismo pelo qual determinam diarréia não se
encontra bem esclarecido.
A Colibacilose é de distribuição mundial, prevalecendo nos países em desenvolvi-
mento.
A doença no homem
A Escherichia coli enterotoxigênica compromete preferentemente crianças com
menos de dois anos de idade. Tem sido relatada também em viajantes (“Diarréia do
viajante”) quando estes visitam áreas endêmicas, indicando uma possível imunidade da
população que vive nessas regiões.
As cepas de E. coli enteroinvasoras são de ocorrência rara podendo ser responsá-
veis por surtos de diarréia em adultos, em crianças em idade escolar e ainda em hospi-
tais. Nestes casos foi constatada estar relacionada à ingestão de água e de queijo conta-
minados.
Quanto às cepas de E. coli enteropatogênicas, são responsáveis por epidemia de
enterite infantil, sendo raro o seu isolamento de surtos na comunidade.
O período de incubação da Colibacilose é de 12 a 72 horas e, quando se trata de
cepas enterotoxigênicas de E. coli, pode se apresentar com sintomatologia semelhante à
Cólera, com diarréia intensa aquosa, cólicas abdominais, vômitos, acidose e desidrata-
ção. As fezes não contêm muco nem sangue e pode ou não haver febre. Esta
sintomatologia, de maneira geral, desaparece em questão de dois dias.
As cepas enteroinvasoras determinam um quadro clínico disentérico, com diarréia
mucóide, acompanhada ou não de sangue.
As cepas enteropatogênicas têm sua importância especialmente em berçários, pro-
vocando surtos da doença.
A E. coli, paralelamente à sua atividade entérica, é de importância como responsável
por infecções urogenitais.
358
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
mais importantes, levando um número elevado de bezerros à morte por diarréia ou sep-
ticemia. Aqueles que sobrevivem podem apresentar artrite ou meningite.
A mastite por E. coli é de relativa freqüência em vacas velhas acompanhada de
processo febril, anorexia, interrupção da produção leiteira e perda de peso.
A doença foi assinalada também em cordeiros, manifestando-se por diarréia branca,
septicemia, sintomatologia nervosa, ascite e hidropericardite.
Em eqüinos, causa morte de recém-nascidos e abortos. Da mesma maneira, ocorre em
leitões, com as mesmas características da diarréia dos bezerros, considerando-se neste caso
a desmama como fator desencadeante, devido ao estresse que ocasiona.
Finalmente, foram isolados de aves sorotipos patogênicos de E. coli de casos de
salpingites e de pericardites. Foram verificadas em aves lesões granulomatosas no fíga-
do, no ceco, baço, medula óssea e pulmões. Estas lesões lembram Tuberculose, e delas
foram isoladas cepas mucóides de E. coli.
Diagnóstico e controle
O diagnóstico da Colibacilose é feito pelo isolamento da Escherichia coli em meios
de cultura seletivos. Pelo método de ELISA pode-se pesquisar a existência da proteína
K99 em fezes de bovinos, a proteína K88 em fezes de suínos ou ainda a enterotoxina TL
em fezes humanas.
Para o controle da doença, recomenda-se a higiene pessoal, destino sanitário de
excretas, saneamento ambiental, higiene materno-infantil, proteção dos alimentos, pas-
teurização do leite e inspeção veterinária de produtos de origem animal.
Para controle na área veterinária, aconselha-se a ingestão de colostro e a vacinação
de vacas. A vacina para bovinos deve conter antígenos K99 e para suínos, antígeno
K88. No caso de ovelhas, vacinar com a vacina de antígeno K99. São estudadas as
possibilidades de uso humano de vacinas de administração oral, tanto com toxóides da
toxina termoestável e termolábil de E.coli toxigênicas, assim como aquelas contendo
fatores anti-adesivos (fímbrias purificadas).
359
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Corinebacteriose
Bruno Soerensen
A doença no homem
Independentemente da difteria causada pelo Corynebacterium diphtheriae, doen-
ça que não compromete os animais, são raríssimos os casos de Corinebacteriose no
homem. São conhecidos somente 12 casos de infecção humana pelo C. equi (responsá-
vel por uma broncopneumonia altamente mortal em potros e que, nas éguas, pode causar
infecções uterinas), dos quais 11 pacientes se encontravam em tratamento com
imunodepressores. O comprometimento pulmonar foi o mais observado, com uma evo-
lução que durou de alguns dias a semanas, com febre, fadiga e tosse não produtiva. Em
um dos pacientes foram observados abscessos cerebrais múltiplos. A letalidade foi ele-
vada.
As infecções humanas pelo C. bovis (responsável por mastites em vacas e que pode
ser isolado com relativa frequência do leite), são extremamente raras, podendo causar
nefrite aguda, endocardite, afecção do sistema nervoso e otite crônica. Numa oportuni-
dade foi observado causando úlcera persistente na perna de um paciente.
Casos também esporádicos no homem podem ser observados pelo C.
pseudotuberculosis, por cepas intermediárias entre o C. pseudotuberculosis e o C.
ulcerans e ainda por outros, como uma cepa mutante do C. pyogenes, que podem ser
responsáveis por úlceras, linfadenites e amidalites. Estes microorganismos são também
responsáveis pela linfoadenite caseosa dos ovinos e caprinos, linfangite ulcerativa e abs-
cessos em eqüinos, especialmente pelo último deles, o C. pyogenes, que pode produzir,
em bovinos, abscessos e processos supurativos em diferentes órgãos e tecidos, endometrite,
piometra, artrite e mastite.
360
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico e controle
O isolamento da Corinebactéria pode ser feito em laboratório, no meio ágar sangue.
São bacilos Gram-positivos, com delicada granulação. Atualmente são usadas provas
sorológicas e cutâneas, com o objetivo de se detectar os animais portadores da doença.
No homem, o reduzido número de casos observados na literatura mundial não justifi-
ca nenhuma medida preventiva.
Nos animais, têm-se tentado vacinas preventivas; entretanto, até a presente data,
nenhuma apresentou resultado protetor. Devem-se evitar lesões em ovinos na oportuni-
dade da tosquia. As medidas higiênicas são recomendadas, especialmente contra a in-
fecção pelo C. equi, associadas à retirada de éguas prenhes de ambientes contamina-
dos.
Dermatofilose
Bruno Soerensen
361
SOERENSEN & BADINI MARULLI
A doença no homem
São raros os casos referidos no homem. Clinicamente se caracteriza por lesões
pustulosas múltiplas (2 a 25) nas mãos e no antebraço constituídas de exudato branco
amarelado deixando uma cavidade vermelha. As lesões evoluem num período de 3 a 14
dias, deixando uma escara vermelho-púrpura.
As principais referências da doença foram em 1961, em Nova York, Estados Unidos,
constatando-se em quatro pessoas que contraíram a doença após entrarem em contato
com um cervo portador de Dermatofilose. Logo a seguir num estudante da Universidade
de Kansas, Estados Unidos, três casos na Austrália e dois no Brasil.
Controle
Para a prevenção da Dermatofilose no homem, recomenda-se evitar manipular le-
362
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
Dos 13 casos registrados nos EUA desde 1958, 6 foram devidos à mordedura de
ratos de laboratório e 12 foram causados por S. moniliformis.
Geralmente ocorrem casos esporádicos, que têm início febril, semelhante a uma gri-
pe. A incubação varia de 2 a 14 dias. A ferida no local da mordedura tem cura espontâ-
nea, sem complicações. Exantema, linfadenite regional, artralgias migratórias e mialgias
são comuns. Nos casos mais graves, observa-se poliartrite e pode ocorrer endocardite.
Em casos não tratados a mortalidade chega a 10%.
363
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Em cobaias, pode desenvolver-se uma linfadenite cervical com abscessos dos gânglios
linfáticos da região. Foram descritos também surtos da doença em perus, cujo principal
sintoma foi artrite.
A Febre por mordedura de rato quando causada por Spirillum minus é também
conhecida como Sodoku. Esta enfermidade no homem é semelhante à anterior, sendo
que, neste caso, o período de incubação é geralmente maior, de uma semana a dois
meses.
A febre começa bruscamente, desaparece e retorna várias vezes, durante um a três
meses. Ocorre uma erupção exantemática generalizada que pode reaparecer a cada
ataque febril. A ferida ocasionada pela mordedura cicatriza no período de incubação,
apresentando uma infiltração edematosa e, muitas vezes, ulceração. Os linfonodos en-
contram-se hipertrofiados.
Em ratos, a infecção é inaparente e o agente pode ser isolado do sangue dos animais.
O reservatório da doença são os ratos e outros roedores. A saliva é a fonte de
contaminação para o homem e a transmissão se dá pela mordedura.
Existe a descrição de casos humanos devido à mordida de furões, cães, gatos e
outros carnívoros que possivelmente haviam-se contaminado ao apreender roedores e,
portanto, atuariam como transmissores mecânicos.
Diagnóstico
Para a enfermidade causada por S. moniliformis, deve-se isolar o agente em meios
enriquecidos com sangue ou soro, a partir do sangue ou de lesões articulares do indivíduo
suspeito.
No caso do Sodoku, deve-se proceder ao exame microscópico em campo escuro do
infiltrado da ferida. A inoculação intraperitoneal de camundongos com sangue ou infiltrado
da ferida e a observação microscópica do sangue e líquido peritoneal duas semanas após
a inoculação oferecem um diagnóstico bastante seguro. O Spirillum minus não se de-
senvolve em meios de cultura.
Controle
Controle da população de ratos e construção de habitações à prova destes animais.
No caso da Febre de Haverhill, recomenda-se a pasteurização do leite e proteção dos
alimentos contra roedores.
Ratos, camundongos e cobaias de laboratório devem ser alojados em ambientes dife-
rentes e o pessoal encarregado deve receber instruções sobre o manejo adequado dos
animais.
364
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Transmissão
O reservatório das borrelias da Febre Recorrente Endêmica são os animais silvestres e
os carrapatos do gênero Ornithodoros, que também são os vetores da infecção.
As borrelias sobrevivem muito tempo nos carrapatos que, por sua vez, são muito
resistentes à dessecação e a longos períodos de jejum em ambientes de pouca umidade
e alta temperatura.
A transmissão da doença ao homem acontece devido à picada de carrapatos infectados.
A doença no homem
A incidência é baixa. O homem contrai a infecção quando penetra nos focos naturais
da doença, onde existem carrapatos do gênero Ornithodoros infectados.
O período de incubação médio é de sete dias, podendo variar de dois a dez dias.
Ocorre uma pirexia inicial durante três-quatro dias, que se instala de forma brusca e
desaparece da mesma maneira. A febre está acompanhada de calafrios, transpiração
profusa, vertigens, dor de cabeça, dores musculares e vômitos. Às vezes podem-se
observar eritemas ou petéquias, epistaxis e icterícia de variados graus de gravidade.
Depois de vários dias sem febre, ela volta a ocorrer repetidas vezes, com duração maior
que no primeiro episódio. A letalidade varia de 2 a 5%.
A doença nos animais
Nos focos naturais da doença encontram-se muitas espécies de animais silvestres
infectados, entre eles, esquilos, gambás, raposas, morcegos e ratos. Pouco se sabe do
curso natural da infecção e seus sintomas nos animais silvestres. O agente etiológico
também foi isolado de eqüinos e bovinos.
A Borreliose das aves é uma enfermidade grave que acomete gansos, patos e fran-
gos, causada pela B. anserina e transmitida por Argus persicus e A. miniatus, sendo
que esta borrelia não acomete o homem.
Diagnóstico
O diagnóstico se baseia na demonstração da presença do agente etiológico no san-
gue do paciente, no período febril por meio da observação de preparações frescas em
campo escuro, inoculação em camundongos ou esfregaços corados por Giemsa ou Wright.
Controle
365
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Hanseníase
Bruno Soerensen
A doença no homem
O período de incubação é longo, até de anos. Do ponto de vista clínico, temos duas
formas de Lepra, a tuberculóide e a lepromatosa, incluindo-se as formas intermediárias.
A Lepra tuberculóide se caracteriza por lesões cutâneas e nervosas localizadas. Há
destruição nervosa ocasionando diminuição da sensibilidade térmica. Habitualmente ob-
serva-se uma úlcera plantar e mutilações dos membros.
A Lepra lepromatosa se caracteriza por lesões simétricas na pele, por máculas e
366
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico e controle
O diagnóstico no homem é feito pela pesquisa do agente causador por curetagem do
tabique nasal e coloração pelo método de Ziehl-Neelsen e observação microscópica. Os
bacilos álcool-ácido-resistentes são observados dispostos em paliçada e sempre retos,
não dispersos ou curvos como no caso do bacilo da tuberculose. A colheita de sangue do
lóbulo auricular ou de lesões de pele também resulta útil. As provas cutâneas não ser-
vem para o diagnóstico mas sim para o prognóstico; assim, os pacientes portadores de
Lepra tuberculóide, ou formas com pequeno número de bacilos, apresentam reações
positivas à prova intradérmica da lepromina ou de Mitsuda. Contrariamente, nos casos
de Lepra lepromatosa ou outras formas contendo grande quantidade de bacilos, as rea-
ções resultam negativas nestas provas. Atualmente, existe outra prova visando estabe-
lecer o prognóstico da doença, a prova sorológica de ELISA.
Quanto às medidas de controle, devem-se considerar o diagnóstico precoce da doen-
ça e o tratamento adequado com dapsona combinada com rifampicina na Lepra com
poucos bacilos e com clofacimina na Lepra com muitos bacilos. A rifampicina tem uma
ação bactericida rápida, suprimindo a infecciosidade dos pacientes após uma a duas
semanas. Atualmente, o isolamento dos pacientes (em leprosários) já não é mais neces-
sário, sendo indicado apenas o tratamento ambulatorial.
367
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Transmissão
Os clostrídios estão amplamente distribuídos na natureza, no solo e trato intestinal do
homem e dos animais. Os animais e o homem contaminam-se a partir do contato do solo
e materiais fecais contaminados com feridas traumáticas ou cirúrgicas.
A doença pode ocorrer na ausência de feridas (Gangrena gasosa endógena ou es-
pontânea), em pacientes debilitados por enfermidades malignas e com lesões ulcerativas
no trato gastrointestinal, biliar ou genitourinário.
Nos animais, pode instalar-se a partir de castrações, tosquias e caudectomias.
A doença no homem
A Gangrena gasosa é uma enfermidade relativamente rara. No passado, estava rela-
cionada com as guerras: 100.000 soldados alemães teriam morrido devido a esta infec-
ção durante a 1ª Guerra Mundial. Porém, nos oito anos de guerra do Vietnã, houve
apenas 22 casos de Gangrena gasosa.
Atualmente, a enfermidade ocorre principalmente em pessoas que sofreram aci-
dentes, de trânsito ou em indústrias; por ocasião de catástrofes naturais; após cirur-
gias (principalmente amputações em pessoas de idade avançada), ou como conse-
qüência de injeções intramusculares de medicamentos em veículo oleoso.
Após a contaminação da ferida, a bactéria multiplica-se e produz gás nos tecidos. É
um processo agudo e sério, cuja principal lesão é a miosite. O período de incubação varia
de seis horas a três dias.
Os sintomas consistem em dor na região traumatizada, taquicardia e queda de pres-
são. Ocorre ainda febre, edema, exsudato seroso da ferida e crepitação à palpação.
Finalmente, estupor, delírio e coma.
A doença pode ocorrer após aborto ou parto distócico, devido à infecção uterina.
Nestes casos, há septicemia, hemólise, nefrose, choque e anúria.
Na Gangrena gasosa humana o agente etiológico mais importante é o Clostridium
perfringens tipo A.
368
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
O diagnóstico é baseado na sintomatologia, porém, a presença de gás nem sempre
indica infecção clostridiana. O cultivo em casos humanos é de pouco valor, pelo tempo
que consome e a urgência do diagnóstico. Além disso, o isolamento de um anaeróbio de
uma ferida pode ser devido à contaminação e não à infecção ativa.
O uso da técnica de anticorpos fluorescentes permite a identificação dos clostrídios
patogênicos em poucas horas e pode ser de grande utilidade.
Controle
Deve-se proceder ao tratamento de feridas e à remoção de corpos estranhos e
tecidos necrótico. Deve-se tomar cuidado com o uso de torniquetes, que podem
interferir com a circulação e criar condições favoráveis à multiplicação anaeróbia.
Para a imunização ativa de bezerros e cordeiros utilizam-se vacinas combinadas de
C. chauvoei e C. septicum.
369
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Transmissão
O reservatório natural de C. perfringens tipo A é o solo e o intestino do homem
(considerado o principal reservatório) e dos animais. O homem infecta-se pela ingestão
de alimentos contaminados com esporos que resistem à cocção ou de alimentos conta-
minados após o cozimento. Os alimentos mais envolvidos são as carnes vermelhas ou de
aves, pois fornecem ao agente os aminoácidos e vitaminas que ele necessita. Outros
alimentos podem estar envolvidos, como purês e saladas de batatas, queijos, frutos do
mar, azeitonas, etc.. A imersão de carnes em molhos ou sua cocção em grandes peda-
ços criam condições anaeróbias favoráveis à multiplicação da bactéria durante o período
de esfriamento ou armazenamento. Os alimentos que causam a intoxicação geralmente
são aqueles preparados em grandes quantidades por restaurantes, por exemplo, e que
serão servidos depois de um tempo ou no dia seguinte.
O tratamento calórico do alimento induz a germinação dos esporos. As formas
vegetativas da bactéria se multiplicam no alimento quando este esfria à temperatura
ambiente e podem chegar a altas concentrações se a temperatura ambiente estiver
elevada e o tempo de permanência for prolongado. O reaquecimento da comida antes de
servi-la pode estimular a multiplicação bacteriana, se a temperatura de cocção não for
alta. Se a concentração das formas vegetativas de C. perfringens no alimento for gran-
de, a acidez do estômago não as destrói, e chegando ao intestino, ao esporular, produzem
a enterotoxina que provoca a enfermidade. Esta enterotoxina é resistente às enzimas
intestinais, exerce efeito citotóxico sobre o epitélio intestinal, afeta o sistema de trans-
porte eletrolítico e, consequentemente, causa diarréia.
Os animais não têm um papel direto na epidemiologia da intoxicação humana, pois o
agente etiológico é ubíquo e pode ser isolado do solo.
A doença no homem
O período de incubação é de 7 a 15 horas. A enfermidade tem início súbito, ocasio-
nando dores abdominais, diarréia, prostração; geralmente não ocorrem vômitos, nem
febre. O quadro clínico tem curta duração (um dia ou menos) e curso benigno.
Nos Estados Unidos, entre 1976 e 1980, ocorreram 62 surtos que afetaram 6.093
pessoas e representaram 7,4% de todos os surtos de toxinfecções alimentares de etiologia
conhecida.
A enterite necrótica é caracterizada por gangrena regional do intestino delgado, es-
pecialmente do jejuno. A incubação, geralmente, é de 24 horas. Pode ocorrer choque e
toxemia.
370
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
A sintomatologia permite que se suspeite de intoxicação clostridiana principalmente
pela ausência de vômito e febre. A confirmação laboratorial baseia-se no isolamento do
C. perfringens do alimento suspeito e das fezes do paciente (nas primeiras 48 horas). É
considerado significativo um valor de 105 células/grama de alimento e 106 /g de fezes.
Os métodos de detecção da enterotoxina nas fezes encontram-se em experimenta-
ção e devem ser avaliados na investigação dos surtos para se ter uma noção clara de seu
valor.
Nas enterotoxemias de animais o diagnóstico é feito pela demonstração da presença
de toxinas específicas, por meio da inoculação de camundongos, uns apenas com con-
teúdo intestinal e outros com conteúdo intestinal e antitoxina.
Controle
Para a prevenção da enfermidade no homem são recomendadas as seguintes medi-
das: pratos feitos com carne devem ser servidos quentes, logo após sua cocção, ou então
devem ser resfriados rapidamente. A carne deve ser cozida, se possível, em pequenas
porções e o molhos devem ser preparados separadamente. Se houver a necessidade de
esquentar o alimento, isso deve ser feito a uma temperatura suficientemente alta para
destruir as células vegetativas do agente.
Para os animais, o controle das enterotoxemias baseia-se em estabelecer um bom
manejo do rebanho, evitar mudanças bruscas de alimentação e imunizar os animais com
toxóides específicos (duas doses com um mês de intervalo e um reforço aos seis meses
- tipo D - ou um ano - tipo C).
A proteção dos cordeiros é conseguida por meio da vacinação das mães com duas
doses, sendo que a segunda dose é dada duas semanas antes da parição.
Os tipos B e C de C. perfringens proporcionam imunidade cruzada, porque em
ambos a toxina predominante é a mesma.
371
SOERENSEN & BADINI MARULLI
A doença no homem
O período de incubação é curto, variando de uma a seis horas, sendo mais comum o
aparecimento dos sintomas três horas após a ingestão do alimento. A quantidade de
toxina ingerida e a suscetibilidade do indivíduo podem causar variações no período de
incubação.
Os principais sintomas são náuseas, vômitos, dores abdominais e diarréia; algumas
vezes há uma ligeira hipertermia. Casos mais graves apresentam prostração e cefaléia.
Geralmente, o curso da enfermidade é benigno, e o paciente se restabelece sem medica-
ção em 24-72 horas.
Recentemente, foi descrita a Síndrome do Choque Tóxico, cujos sintomas são vômi-
tos, diarréia, febre alta, edema, insuficiência renal e choque tóxico. Acomete principal-
mente mulheres durante o período menstrual. Acredita-se que a enterotoxina tipo F está
relacionada a esta síndrome.
Os animais também são reservatórios do agente, porém quando ocorrem surtos epi-
dêmicos da doença, há predomínio das cepas de origem humana. Do ponto de vista de
Saúde Pública, têm grande importância as mastites bovinas por estafilococos. Inúmeros
surtos têm sido causados pela ingestão de leite proveniente de animais com este tipo de
372
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
O curto período de incubação é o critério mais importante para o diagnóstico. A
confirmação laboratorial consiste na demonstração da presença da toxina no alimento
suspeito. Os símios da espécie Macaca mulatta são suscetíveis à enterotoxina por via
digestiva e são usados como animais experimentais para a demonstração da presença
da toxina em alimentos. Gatos também são utilizados para este fim, por meio de inoculação
por via intravenosa ou peritoneal.
Também são usados métodos sorológicos para diagnóstico, como imunodifusão,
imunofluorescência, inibição da hemaglutinação e ELISA. O exame quantitativo de
estafilococos em alimentos processados serve como indicador das condições de higiene
da indústria.
Controle
Como, geralmente, os casos de intoxicação alimentar estafilocócica são brandos,
nem sempre os serviços médicos são procurados e, assim, fica difícil estabelecer a real
incidência da doença.
A prevenção e controle desta doença consiste, basicamente, em educar as pessoas
que manipulam alimentos para que as medidas de higiene pessoal sejam rigorosamente
observadas. Indivíduos com abscessos ou outras lesões cutâneas devem ser afastados
da manipulação de alimentos.
Deve-se evitar a manutenção de alimentos à temperatura ambiente, pois isso propor-
ciona condições para a multiplicação dos estafilococos. Assim, todo alimento deve ser
refrigerado, na tentativa de evitar-se a multiplicação bacteriana e conseqüente forma-
ção da toxina.
Os produtos de origem animal constituem excelente substrato para a multiplicação
estafilocócica. No caso das indústrias destes produtos, o Serviço de Inspeção Veteriná-
ria é o responsável pelas medidas preventivas a serem adotadas para diminuir o risco de
intoxicações alimentares.
373
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Leptospirose
Kathia Brienza Badini Marulli
A doença no homem
O período de incubação médio da doença é de uma a duas semanas. Os sintomas são
variáveis e com diferentes graus de severidade. O quadro denominado Doença de Weil
é o mais grave, apresentando dor de cabeça, conjuntivite, dores musculares, petéquias
na pele e hemorragias gastrointestinais. Pode ocorrer hepatomegalia, insuficiência renal
e icterícia. Os casos anictéricos têm sintomatologia mais leve. Os pacientes demoram
no mínimo um mês para se recuperarem. A leptospirúria pode persistir por uma semana
ou vários meses depois do desaparecimento dos sintomas.
Vários grupos ocupacionais estão particularmente expostos à Leptospirose, como os
trabalhadores de arrozais, canaviais, minas e matadouros, tratadores de animais e Médi-
cos Veterinários. O risco está associado à exposição à água contaminada, aos aerossóis
ou pelo contato direto com a urina de animais infectados.
Nas zonas urbanas, o maior número de casos ocorre em períodos de chuvas, e os
surtos epidêmicos estão relacionados à problemas ambientais, como inundações. Altas
temperaturas, umidade e abundância de ratos proporcionam as condições ideais para a
ocorrência de epidemias, como as de 1966 e 1970 em Recife, com 181 e 102 casos,
respectivamente. Nos meses de janeiro e fevereiro de 1997 foram registrados 489 casos
suspeitos da doença no Estado de São Paulo; no mesmo período, em 1998, o número de
casos suspeitos foi de 391 e, em 1999, 263.Atividades recreacionais, como a natação em
riachos ou lagoas contaminadas, podem causar pequenos surtos de Leptospirose.
374
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
urina por longos períodos, mesmo quando não apresentam sintomas da doença.
Em bovinos, a infecção pode provocar doença aguda, sub-aguda ou permanecer
inaparente. Os sintomas principais são febre, anorexia, conjuntivite, infertilidade e, nos
casos graves, icterícia. As leptospiras podem causar mastite atípica, com flacidez do
úbere, leite amarelado e viscoso e, às vezes, com sangue. Também podem ocorrer
abortos. As infecções em ovinos e caprinos não são muito freqüentes, mas quando
ocorrem apresentam sintomas semelhantes aos dos bovinos.
Em suínos ocorrem desde infecções sub-clínicas até casos com icterícia,
hemoglobinúria, convulsões, meningites e abortos. A leptospirúria nestes animais é abun-
dante e prolongada. Nos eqüinos, normalmente, a infecção é inaparente.
Em cães, a forma hemorrágica é a mais grave, sendo conhecida como Doença de
Stuttgart ou Tifo canino. Os animais apresentam febre, rigidez e dores nos membros
posteriores, hemorragias na cavidade bucal e nefrite aguda. A enfermidade nos gatos é
rara. Os animais silvestres, como muitos roedores, estão adaptados às leptospiras, e não
manifestam sintomas ou lesões.
Diagnóstico e controle
A leptospira pode ser isolada do sangue ou urina do doente. Pode-se fazer cultivo
direto ou inoculação em hamsters. A prova sorológica mais usada é a aglutinação mi-
croscópica. Pode-se ainda utilizar outras técnicas diagnósticas, como a imunofluorescência
indireta ou ELISA. O tratamento indicado é por meio de antibióticos.
O controle da enfermidade baseia-se em saneamento do meio, controle de roedores,
proteção dos alimentos para que não sofram contaminação, uso de roupas protetoras
pelos trabalhadores expostos ao risco e vacinação destes trabalhadores. Deve-se evitar
a natação em lagoas e riachos, pois podem estar contaminados. Controlar a infecção nos
animais domésticos é muito importante e, para isso, devem-se vacinar os cães, suínos e
bovinos, anualmente. As fêmeas devem ser vacinadas antes do período de reprodução,
para ficarem protegidas na gestação.
Listeriose
Bruno Soerensen
375
SOERENSEN & BADINI MARULLI
mundo.
A doença no homem
A Listeriose humana, nos países da Europa e nos Estados Unidos da América, é
relativamente comum. Nos anos de 1950 a 1959 foram registrados na Alemanha 500
casos de Listeriose e no período de 1960 a 1966, ao redor de 1.500 casos. Nos Estados
Unidos, de 1933 a 1958 foram registrados 184 casos e no período de 1959 a 1966 foram
registrados 547 casos.
A incidência nos países em desenvolvimento é baixa, entretanto, isto se deve possi-
velmente ao fato de se tratar de doença para a qual o médico clínico e o pessoal de
laboratório não têm dado a devida importância. Quando a hipótese de diagnóstico é de
Listeriose e no laboratório clínico os exames bacteriológicos são conduzidos adequada-
mente, as possibilidades de confirmação aumentam consideravelmente. Desta maneira,
num hospital do México, durante três meses foi praticada hemocultura de todas as crian-
ças cujas mães apresentavam sinais de infecção amniótica, isolando-se a Listeria
monocytogenes em quatro dos 33 recém-nascidos. No Peru, de três casos fatais de
Listeriose neonatal e de cinco fetos abortados, foi isolada a bactéria.
A Listeriose, independentemente de levar a abortos e ao comprometimento de crian-
ças recém-nascidas, também apresenta como população de risco os pacientes submeti-
dos a transplante renal; assim, no período de 1969 a 1980, foram registrados 102 casos
de Listeriose nestes pacientes. Outro grupo de risco é o de pessoas em idade avançada,
especialmente as que apresentam doenças que conduzem a uma queda de resistência
progressiva (caquexia cancerosa, alcoolismo, diabetes, pacientes tratados com corticóides
e antiblásticos).
É importante destacar que a maior epidemia de Listeriose assinalada nos Estados Uni-
dos, ocorrida de 30 de julho a 30 de agosto de 1983, se encontrava associada ao consumo
de leite pasteurizado, e teve um saldo de 49 pacientes hospitalizados e 14 óbitos. Evidente-
mente, o processo de pasteurização do leite, nesta oportunidade, não foi conduzido satisfa-
toriamente, indicando que o leite é a fonte de contaminação humana para a Listeriose.
Embora possa parecer inadequada nossa colocação, recomendamos que se evite o consu-
mo de leite não fervido, mesmo que este tenha sido submetido à pasteurização. Em todos
os Estados de nosso país, um dos maiores problemas na produção leiteira é a mastite
bovina, algumas vezes sub-clínica, podendo se tratar de mastite por Listeria, uma vez que
não existem trabalhos dimensionando o problema. Paralelamente, perguntamos: existe con-
trole rigoroso dos processos de pasteurização e da saúde dos animais submetidos à orde-
nha?
Na Universidade de Marília (UNIMAR), um dos projetos em andamento visa ao
estudo dos agentes microbianos causadores de mastite, incluindo-se o isolamento da
Listeria monocytogenes, que requer procedimento específico.
A mulher com Listeriose aborta, geralmente, depois do quarto mês de gestação, e os
sintomas que antecedem o aborto são: calafrios, febre, dor de cabeça e tontura. Pode
haver o nascimento de um feto morto ou de uma criança gravemente doente que irá
morrer em pouco tempo de septicemia listérica, com lesões principalmente de necrose
hepática focal com pequenos nódulos branco-acinzentados. Em alguns casos, observa-
se o nascimento de uma criança aparentemente com boa saúde, que adoece com menin-
376
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
gite após alguns dias ou até três semanas de vida. Pode-se observar hidrocefalia como
seqüela da meningite.
Nos adultos, especialmente naqueles acima de 50 anos, pode-se observar meningite
ou meningoencefalite, endocardite, abscessos internos e externos. Nos casos de Listeriose
não tratados a mortalidade é de 70%. O tratamento com tetraciclina e penicilina reduz
consideravelmente a mortalidade.
Em veterinários que manipulam fetos contaminados foram relatadas erupções cutâneas.
Diagnóstico
A Listeria monocytogenes pode ser isolada semeando-se o material como o sangue
(em casos de septicemia), secreção vaginal, fezes, fetos e líquor, pelo método de “enri-
377
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Prevenção e controle
São medidas necessárias a vigilância da qualidade do leite, o controle de roedores e a
higiene pessoal e ambiental.
Os animais com encefalite e aqueles que abortam devem ser isolados do rebanho de
animais saudáveis e as placentas e fetos abortados deverão ser destruídos. As medidas
de quarentena também deverão ser aplicadas.
Micobacteriose
Bruno Soerensen
378
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
A confirmação do diagnóstico depende do isolamento e tipificação do agente etiológico,
portanto, depende em grande parte da infraestrutura do laboratório. Na Austrália, a taxa
anual da Micobacteriose pulmonar no homem é de 1,7 a 4 por 100.000 habitantes em
Queensland e de 0,5 a 1,2 no restante do país.
Do ponto de vista clínico, pode se manifestar por comprometimento pulmonar, de
gânglios e de tecidos moles, podendo-se observar disseminação hematogênica. No com-
prometimento pulmonar, o quadro clínico e radiológico é idêntico à Tuberculose, obser-
vando-se inclusive cavernas nos pulmões. A doença é de maior freqüência em
imunodeprimidos. Atualmente, ocorre a infecção generalizada em pacientes portadores
de AIDS. No comprometimento ganglionar os mais comprometidos são os gânglios do
pescoço e da mandíbula, geralmente unilateral. O comprometimento da pele e do tecido
subcutâneo se apresenta sob a forma de abscessos, granulomas e úlceras. Foram des-
critos ainda comprometimento de articulações, coluna vertebral, osteomielite do esterno
(após intervenções do coração) e do aparelho genito-urinário.
Diagnósrico e controle
No homem, a imagem radiológica pulmonar pode sugerir comprometimento por
379
SOERENSEN & BADINI MARULLI
micobactérias não tuberculosas, entretanto o diagnóstico deverá ser feito por isolamento
da micobactéria e tipificação sorológica. A prova de tuberculina destinada ao diagnósti-
co da Tuberculose pode ser positiva também nos casos de Micobacteriose, portanto,
pode ser útil para o diagnóstico. Uma prova de tuberculina positiva pode ser interpretada
como animal portador de Tuberculose ou de Micobacteriose. A associação das duas
doenças também é observada.
Quanto ao controle da doença, recomenda-se a desinfecção de ferimentos, e evitar o
uso de água não potável. No caso dos suínos, a substituição da “cama” dos animais. O
M. avium-intracellulare é resistente ao arsenal terapêutico utilizado na Tuberculose. O
M. kansasii é sensível à rifampicina.
Necrobacilose
Kathia Brienza Badini Marulli
A doença no homem
Dentre as patologias provocadas pelo F. necrophorum temos lesões necróticas, abs-
cessos pulmonares, artrites, abscessos cerebrais e meningites. O agente ocasiona doen-
ças no homem geralmente em conseqüência de situações predisponentes, como proble-
mas vasculares, edemas, intervenções cirúrgicas e o frio. As septicemias em decorrên-
cia de amidalites anteriormente eram muito freqüentes, mas atualmente diminuíram muito;
os pacientes com septicemias geralmente apresentam faringite exsudativa ou abscesso
peritonsilar.
380
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Nocardiose
Bruno Soerensen
382
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
as mais comprometidas.
Os animais poderiam adquirir a Nocardiase de maneira semelhante ao homem e nos
casos de mastite possivelmente pelo uso de caracteres contaminados.
Não são conhecidos casos de transmissão inter-humano ou de um animal a outro. O
solo é o reservatório e a fonte de infecção.
Diagnóstico
A pesquisa da Nocardia deverá ser realizada no material patológico, em esfregaços
corados ou ainda na observação entre lâmina e lamínula e a confirmação pelo cultivo e
identificação. As provas sorológicas e os testes alérgicos não são utilizados rotineira-
mente.
Controle
Não existe medida específica. Recomenda-se evitar exposição à poeira, especial-
mente de pacientes imunologicamente comprometidos. A higiene e desinfecção ambiental,
incluindo-se do instrumental utilizado, são recomendáveis.
Pasteurelose
Kathia Brienza Badini Marulli
A doença no homem
Geralmente é causada pela P. multocida. Os primeiros sintomas são feridas infectadas,
devidas à mordeduras ou arranhões de gatos, cães ou outros animais; afecções do siste-
ma respiratório e afecções localizadas em diferentes órgãos ou tecidos. Os casos de
septicemia são excepcionais.
Nos casos de feridas infectadas, o processo inflamatório pode chegar ao periósteo e
produzir necrose. Como complicações, podem ocorrer artrite séptica e osteomielite. As
383
SOERENSEN & BADINI MARULLI
384
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico e controle
Nas infecções humanas, deve-se isolar e identificar o agente a partir de feridas ou
outras localizações.
Na Cólera Aviária o agente pode ser isolado do sangue ou vísceras. Nas pneumonias
dos animais domésticos, o cultivo pode identificar o agente, sem que se saiba, entretanto,
se as pasteurelas são os agentes primários ou secundários da doença.
Para o controle das infecções humanas, deve-se evitar mordeduras de animais.
Para os animais, o indicado é o manejo adequado de rebanhos e granjas avícolas. O
uso de vacinas apresenta resultados variáveis, sendo que as vacinas vivas atenuadas
dão melhor imunidade que as bacterinas. Algumas vacinas para aves podem ser admi-
nistradas na água de bebida.
Peste
Kathia Brienza Badini Marulli
É uma enfermidade que aflige a humanidade há milhares de anos e que foi erronea-
mente considerada por alguns como extinta. Também denominada Morte Negra, é cau-
sada pela bactéria Yersinia pseudotuberculosis subsp. pestis, anteriormente conhecida
como Yersinia pestis. Existem três variedades biológicas do agente: Orientalis (ou oce-
ânica), Antiqua (ou continental) e Medievalis. Estas variedades não são diferentes em
seu poder patogênico.
Segundo os historiadores da Medicina, a primeira pandemia de Peste foi a do século
VI, a Peste de Justiniano. Por volta do ano 542 d.C., durante o domínio do Imperador
Romano Justiniano, um surto de Peste iniciou-se no Egito e dali espalhou-se, atingindo
todo o império romano da época, e dizimando quase 50% da população do império,
estimando-se 100 milhões de mortes.
A segunda pandemia ocorreu no século XIV. Seu início foi em 1346, quando mari-
nheiros italianos doentes vindos da Criméia desembarcaram na Sicília, trazendo a Morte
Negra. A enfermidade alastrou-se por toda a Europa, durou três séculos e aniquilou
entre ¼ e 1/3 da população européia (cerca de 25 a 40 milhões de mortos).
A terceira e última pandemia teve início em Hong-Kong, em 1894, e irradiou-se a
todos os continentes por meio do comércio marítimo.
No Brasil, o primeiro ponto do território atingido pela Peste foi a cidade de Santos,
declarada infectada em 18 de outubro de 1899. Dali, a doença estendeu-se para São
Paulo, Rio de Janeiro, Campos, Niterói, S. João da Barra, Petrópolis, Fortaleza, Porto
Alegre, Paranaguá, Recife (em 1902), Vitória, Aracaju, Belém, São Luiz e Salvador. No
Rio de Janeiro, o primeiro caso ocorreu em 7 ou 8 de janeiro de 1900, sendo que até
385
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Transmissão
O reservatório natural do agente é constituído pelos roedores silvestres. Geralmente
são espécies pouco suscetíveis, ou seja, se infectam mas não morrem da enfermidade.
O bacilo da Peste se perpetua em focos naturais, onde o agente possui condições
para sobreviver durante longos períodos quiescentes, até irromper em nova epizootia e
propagar-se a área adjacentes.
Num foco natural, a infecção se transmite de um indivíduo a outro por meio de
pulgas. A perpetuação da Peste nos focos naturais ocorre na galeria dos roedores,
onde existem fatores que permitem a conservação do agente, seja no organismo do
roedor, no organismo da pulga ou na terra contaminada dessas galerias.
A circulação do bacilo da Peste, tanto no ciclo silvestre como no doméstico é: ROE-
DOR-PULGA-ROEDOR. O homem é acidentalmente envolvido na cadeia de trans-
missão. Podem ocorrer, excepcionalmente, casos de transmissão HOMEM-PULGA-
HOMEM, quando há grandes infestações de Pulex irritans no local. Os focos domés-
ticos de Peste são temporários, tendendo para inativação.
As epidemias de Peste humana são sempre precedidas de epizootias nos ratos, prin-
cipalmente nos do gênero Rattus.
A doença no homem
A Peste apresenta-se sob três formas clínicas: bubônica, pulmonar e septicêmica.
A Peste bubônica é a mais freqüente. O período de incubação varia de três a cinco
dias. Os principais sintomas são calafrios, febre, cefaléia, mal-estar geral. Ocorre rea-
ção intensa dos linfonodos da região do ponto de entrada do bacilo pestoso, com o apa-
recimento de um “bubão”, que é uma tumefação dos gânglios linfáticos periféricos, duro
e muito doloroso, e que pode atingir o tamanho de um ovo de galinha. A pele da região
fica distendida e abaulada pela infiltração do edema. Bubões múltiplos são pouco fre-
qüentes.
Pode ocorrer hipertrofia do baço e do fígado, taquicardia, toxemia intensa, prostra-
ção, delírios, coma e morte em quatro a sete dias. A letalidade em casos não tratados
varia de 25 a 60%.
Quando evolui para a cura, a febre cai, os sintomas cedem, o bubão pode reabsorver,
porém geralmente rompe e o pus nessa fase apresenta raros bacilos pestosos.
No Nordeste do Brasil costumam ocorrer casos atípicos, benignos, conhecidos como
“íngua de frio” (o poder invasivo está diminuído, porém há conservação da capacidade
toxigênica).
A forma pulmonar da doença pode ser secundária, devido à complicação em caso
bubônico, ou primitiva, por contágio direto de caso pneumônico secundário, iniciando
surto epidêmico de Peste pulmonar primitiva. A incubação é de dois a três dias e as
pessoas apresentam dor no peito, tosse, expectoração sanguínea, dispnéia, cefaléia e
morte em dois a cinco dias.
386
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Esta forma apresenta extrema letalidade, sendo que 95% dos casos secundários
morrem antes de chegarem a transmitir o agente. A pequena parcela dos pacientes que
não morrem, se não for tratada, pode dar origem a novos casos por via aerógena.
A forma septicêmica primária é rara. Só é observada no pico da epidemia e sua
evolução é fulminante. O doente apresenta toxemia, prostração e morte em 24-72 horas.
A forma septicêmica secundária é observada no término de casos bubônicos graves.
Ocorrem sintomas nervosos, hematúria, petéquias, epistaxis e evacuações involuntárias.
A enfermidade é de curso rápido (um a três dias) e a letalidade pode chegar a 100%.
Diagnóstico
Deve-se realizar o isolamento da Y. pestis a partir de material como sangue, escarro,
bubão, fígado, baço ou medula óssea.
O diagnóstico sorológico é realizado pela imunofluorescência e pela hemaglutinação
passiva.
Controle
Em áreas de foco, deve-se proceder vigilância contínua. É necessário verificar a
densidade populacional de roedores, de pulgas e o isolamento de Y. pestis. Os cães têm
sido utilizados com sucesso como animais sentinelas.
Durante surtos, deve-se realizar o tratamento dos doentes (com estreptomicina e
sulfas) e a quimioprofilaxia dos comunicantes. Inicialmente, deve-se controlar as pulgas
e, em segundo lugar, fazer o controle da população de ratos. Quando existem pulgas do
homem em grandes quantidades, pode ocorrer a transmissão homem a homem, e o
controle dos casos deve ser mais rigoroso, atentando inclusive para os velórios de mor-
tos por Peste, onde pode ocorrer a transmissão.
387
SOERENSEN & BADINI MARULLI
A vacina inativada confere uma proteção menor ou igual a seis meses. É aconselha-
da somente em áreas de alta incidência, em pessoal de laboratório que trabalha com
Peste, ou ainda, para pessoas que entram em focos de Peste.
Os países que possuem focos ativos de Peste devem cumprir o Regulamento Sanitá-
rio Internacional (O.M.S., 1969), quanto à notificação de ocorrência de casos humanos,
de epizootias específicas e de registro da área infectada, bem como realizar medidas
para controle de ratos nos portos e aeroportos internacionais.
Salmonelose
Kathia Brienza Badini Marulli
Transmissão
Geralmente, o homem contrai a infecção ao ingerir alimentos contaminados. Os ali-
mentos mais comumente envolvidos na transmissão da doença são as carnes contami-
nadas de aves, suínos e bovinos, os ovos, o leite e seus derivados. Os grandes surtos de
Salmonelose se devem invariavelmente ao manejo inadequado de alimentos em restau-
rantes e refeitórios institucionais. A água é uma importante fonte de contaminação na
Febre Tifóide (S. typhi) e, com menor freqüência, nas outras Salmoneloses.
O homem pode contrair a infecção de forma direta, de animais domésticos como
cães, tartarugas, hamsters e outros. A transmissão interhumana é importante em hospi-
tais, sendo as crianças as principais atingidas. Os insetos, principalmente a mosca do-
méstica, podem ter certa participação como vetores mecânicos em ambientes muito
contaminados.
O ciclo de animal a animal é mantido pelos animais portadores, por meio de suas
388
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
excretas e por ovos contaminados, no caso das aves. As rações contaminadas, princi-
palmente as que contêm farinha de ossos, de carne ou de pescado, desempenham papel
como veículos do agente. A criação intensiva de gado favorece a ocorrência de surtos,
devido ao contato íntimo entre os animais e ao uso de rações contaminadas.
A contaminação dos animais pode ocorrer em todas as etapas da criação, inclusive
durante o transporte. Após o abate dos animais, a carne pode ser contaminada por
equipamentos e instalações contaminadas.
A doença no homem
Excluindo-se a Salmonella typhi e os sorotipos paratíficos, que são espécie-espe-
cíficos para o homem, todas as demais infecções causadas por salmonelas podem ser
consideradas como zoonoses. A Salmonelose é uma doença muito comum no homem,
sendo que a incidência verdadeira é difícil de ser estabelecida, pois muitos países não
possuem um sistema de Vigilância Epidemiológica e, onde o sistema existe, os casos
esporádicos e leves geralmente não são notificados. No período de 1973 a 1978, a
Salmonelose correspondeu a 40% dos casos de enfermidades de origem alimentar e a
23% dos surtos ocorridos nos Estados Unidos.
O período de incubação varia de 6 a 72 horas e os principais sintomas são febre,
dores abdominais, náuseas, vômitos e diarréia. Geralmente a infecção tem curso benig-
no e a recuperação ocorre em dois a quatro dias. O portador convalescente pode elimi-
nar salmonelas durante semanas ou, mais raramente, durante alguns meses. A
Salmonelose pode ocorrer em pessoas de qualquer idade, mas a incidência é maior em
crianças e idosos e, nestes casos, a desidratação pode ser grave.
A S. cholerae-suis causa enfermidade grave, com septicemia, esplenomegalia e
febre alta alguns dias ou semanas após a ocorrência da gastroenterite, alcançando uma
letalidade de até 20%.
389
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Diagnóstico
Deve ser feito por meio do isolamento do agente a partir de materiais fecais, tipificação
sorológica e, se necessário, tipificação por fago.
Nas infecções por S. pullorum e gallinarum, nas aves, é importante o diagnóstico
sorológico, para individualizar e eliminar os portadores. Nos exames post-mortem dos
animais, procede-se, sobretudo, ao cultivo dos gânglios mesentéricos.
Na vigilância do processamento de alimentos, deve-se realizar uma amostragem para
cultivo do produto nas diferentes etapas de elaboração, assim como dos utensílios e
superfícies que entram em contato com o alimento produzido.
Tratamento
Nas gastroenterites por Salmonella sem complicações, o tratamento com antibióti-
cos não é recomendado, exceto nos casos de febre prolongada ou de septicemia, princi-
palmente em crianças pequenas ou idosos. Esta contra-indicação deve-se ao fato que os
antibióticos podem prolongar o estado de portador e originar cepas antibiótico-resisten-
tes. A automedicação e o fácil acesso da população aos antibióticos sem prescrição
médica também são fatores que têm contribuído para o aparecimento de cepas
multirresistentes.
Controle
O controle está dirigido principalmente à proteção do homem e à tentativa de diminuir
a prevalência nos animais, o que é difícil, devido às condições em que eles são criados,
transportados e comercializados. A inspeção veterinária de carnes e do sacrifício de
aves, a supervisão da pasteurização do leite e de produtos que contêm ovos, são etapas
importantes do controle.
390
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Shigelose
Kathia Brienza Badini Marulli
A doença no homem
O período de incubação é de aproximadamente quatro dias. Os primeiros sintomas
são febre e dores abdominais e, a seguir, diarréia e desidratação, por um a três dias.
Pode ocorrer uma segunda fase, que dura várias semanas, e cujo principal sintoma é
o tenesmo. Nos casos graves, as fezes podem conter sangue, muco e pus. A sintomatologia
pode variar.
Existem casos registrados da doença em humanos contraída de primatas não-huma-
nos, porém para o homem a principal fonte de infecção é o próprio homem, doente ou
391
SOERENSEN & BADINI MARULLI
portador.
Em 1969-1970 ocorreu uma extensa epidemia por S. dysenteriae 1 na América
Central e México, com altas morbidade e mortalidade, principalmente em crianças, pro-
vocando mais de 13.000 mortes. A infecção atingiu os Estados Unidos da América,
gerando 140 casos de 1970 a 1972.
Diagnóstico
Deve-se isolar o agente a partir das fezes. A identificação e tipificação sorológica
são importantes do ponto de vista epidemiológico.
Controle
Devem ser adotadas várias medidas de controle, entre elas a higiene ambiental, prin-
cipalmente no que se refere à eliminação das fezes humanas e provisão de água potável.
A higiene pessoal e a educação do público e dos manipuladores de alimentos quanto à
transmissão da doença também devem ser observadas. Deve-se supervisionar a sanida-
de no preparo e conservação dos alimentos. Realizar o controle de moscas e proteger os
alimentos contra os insetos. São importantes ainda a notificação dos casos, o isolamento
dos doentes e desinfecção das fezes e a investigação epidemiológica.
Existe uma vacina viva, administrada em 3-4 doses via oral, que tem dado bons resul-
tados e proteção por 6 a 12 meses. Seu uso é indicado em locais onde a doença é
endêmica.
O uso indiscriminado de antibióticos deve ser evitado para que não surjam cepas
multirresistentes.
Nos animais, o controle deve ser feito por meio do isolamento e tratamento dos en-
fermos e portadores; limpeza e esterilização das jaulas; evitar a aglomeração de muitos
macacos numa mesma jaula; eliminação dos dejetos e controle de insetos.
392
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Tétano
Bruno Soerensen
O Tétano tem como agente etiológico uma bactéria, o Clostridium tetani, que so-
mente prolifera na ausência de oxigênio livre, sendo necessário para o seu desenvolvi-
mento pequena quantidade de oxigênio combinado, contido na água. Elabora uma
neurotoxina na porta de entrada (ferimento), não possui capacidade invasora e, portanto,
não se dissemina pelo organismo.
O Clostridium tetani, se encontra habitualmente na terra ou ainda nas fezes dos
animais e do homem sendo, entretanto, as fezes de eqüinos as que apresentam maior
risco de contaminação pelo bacilo do Tétano.
O Tétano é registrado em todos os países do mundo, comprometendo o homem e
diversas espécies animais como eqüinos, ovinos e bovinos, sendo os eqüinos os mais
suscetíveis à doença. O bacilo do Tetáno penetra através de ferimentos da pele, portan-
to, é de relevante importância a higiene e a desinfecção de qualquer ferimento.
A sua ocorrência no homem, nos países industrializados, é baixa, porque existe me-
nor contato do homem com a terra, devido à mecanização, sendo menor o risco de
contaminação.
A doença no homem
Caracteriza-se por contrações dolorosas dos músculos da mandíbula (masseteres) e
do pescoço, ou ainda, de outros músculos do corpo, predominando os correspondentes à
localização do ferimento contaminado pelo agente causador. O período de incubação é
de aproximadamente seis dias podendo ser de até três semanas. Se o ferimento não
apresentar contaminação por outras bactérias, a doença pode não apresentar febre ou
somente uma febre moderada. Os sinais mais evidentes nos casos de Tétano são os
reflexos extremamente exagerados, sendo comum a rigidez dos músculos abdominais, a
retenção urinária e a constipação. A contratura muscular é tão acentuada que, quando
compromete uma criança, pode-se observar seu corpo formando um arco, apoiado so-
mente nos calcanhares e na nuca.
A letalidade é muito elevada, sendo maior quando aparecem convulsões precoce-
mente, ou ainda, quando o intervalo das convulsões e a intensidade e duração das mes-
mas forem acentuadas.
A porta de entrada do bacilo do Tétano nos recém-nascidos é a umbilical, como
conseqüência da falta de tratamento do umbigo com desinfetante, ou ainda, do antigo
costume de se colocar fezes de animais ou teias de aranha no umbigo do recém-nascido,
por total falta de educação sanitária. O Tétano nos bebês recebe o nome de “mal de sete
dias”, porque acontece após sete dias de transcorrido o nascimento. Em outras idades, a
via de entrada é um ferimento, sendo os de maior risco as feridas traumáticas. Interven-
ções cirúrgicas e os abortos provocados, realizados sem maiores cuidados, também po-
dem levar a contrair a doença. Ocorrem cerca de 500.000 mortes anuais, por Tétano, no
mundo, sendo o maior número delas em recém-nascidos. A literatura médica registra
que, nos Estados Unidos da América e no Canadá, no período de 1.951 a 1.960, a mor-
393
SOERENSEN & BADINI MARULLI
talidade por Tétano foi de 0,16 por 100 mil habitantes e nos países latino-americanos,
excluindo-se a Argentina e o Brasil, foi de 8,5 mortes para cada 100.000 habitantes.
Diagnóstico e controle
O diagnóstico do Tétano é clínico, isto é, por meio da sintomatologia que é bem
característica, embora seja de interesse a confirmação laboratorial.
O controle do Tétano se baseia fundamentalmente na vacinação preventiva. As cri-
anças com idade de dois a três meses devem receber a primeira dose da vacina DPT
(Difteria, Pertussis, Tétano) e a seguir completar doses com intervalos de um mês e uma
dose de reforço 18 meses após a última dose. As crianças vacinadas ficam protegidas
durante aproximadamente 10 anos.
Quando existe risco de contaminação devido à atividade ocupacional, é recomendá-
vel uma revacinação em períodos de 10 anos.
A vacinação antitetânica (toxóide tetânico) é a mais eficaz na prevenção do Tétano.
Para se prevenir o Tétano no recém-nascido é recomendada a vacinação primária na
mulher a partir do quarto mês de gestação com três doses de toxóide, administradas a
um intervalo de um mês. Por meio deste procedimento, foi reduzida, substancialmente, a
ocorrrência do Tétano umbilical.
O uso do soro antitetânico é recomendado nos casos de ocorrência de ferimentos de
risco em pacientes não vacinados previamente. As pessoas já vacinadas contra o Téta-
no, na ocasião de um ferimento de risco, receberão somente mais uma dose de vacina
(reforço). Paralelamente à vacinação, o ferimento deverá ser limpo e, se necessário,
será realizado o debridamento, seguido de desinfecção.
Nos animais, especialmente nos eqüinos, é recomendável a vacinação sistemática
com duas doses de vacina, com intervalo de um mês, iniciando-se aos três meses de
idade. De maneira geral, não há necessidade de nenhuma revacinação na vida do ani-
mal.
394
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Tularemia
Kathia Brienza Badini Marulli
A doença no homem
Os países que possuem melhores dados sobre a ocorrência da Tularemia são os
Estados Unidos e os países da antiga União Soviética; nos dois casos, o número de casos
humanos parece estar em franca regressão.
Existem diversas formas da enfermidade, sendo a mais comum a ulceroganglionar. A
enfermidade apresenta-se com início brusco, febre ondulante, calafrios, dores muscula-
res e articulares, vômitos e dores de cabeça. A forma pulmonar ocorre principalmente
em trabalhadores rurais ou de laboratórios, que se contaminam por meio de aerossóis.
A broncopneumonia ocorre em aproximadamente 30% de todos os pacientes de
Tularemia, independente da via de infecção. Geralmente a bactéria penetra no organis-
mo através da pele, por meio de picadas de insetos hematófagos ou cortes com objetos
contaminados. O agente também pode entrar no organismo pela conjuntiva, por meio de
respingos ou contato com mãos sujas e, ainda, pelas vias respiratória e oral.
Quando a doença ocorre pela ingestão de água ou alimentos contaminados é classi-
ficada como forma tifóide da Tularemia. Esta forma é pouco comum, porém quando
ocorre e não é feito tratamento, tem curso curto e fatal. Os pacientes apresentam febre,
gastroenterite, lesões na mucosa bucal, faringe e intestinos. O principal alimento
incriminado é a carne de coelhos silvestres infectados, principalmente quando ingerida
“mal passada”. A água normalmente é contaminada por animais mortos ou pela urina e
fezes de animais infectados.
O homem é um hóspede acidental da F. tularensis, e geralmente se infecta ao pene-
trar nos focos naturais da doença. Os caçadores são um grupo ocupacional exposto ao
risco da Tularemia.
395
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Diagnóstico e tratamento
O diagnóstico deve ser feito baseado na história e sintomas. A confirmação deve ser
laboratorial, por meio do isolamento do agente, de provas cutâneas ou sorológicas. O
tratamento é feito com estreptomicina.
Controle
Como medidas de controle podem ser citadas a Educação Sanitária, as modificações
sobre o meio ambiente e a luta contra os vetores. Pode-se usar repelentes e roupas
apropriadas para evitar infestações de carrapatos e outros artrópodes. Deve-se evitar a
ingestão de água ou alimentos suspeitos, como carnes de animais silvestres mal cozidas.
As pessoas expostas ao risco podem ser imunizadas com vacinas vivas atenuadas.
Para os ovinos, são recomendados banhos ou aspersões com carrapaticidas, e em
caso de surto, uso de antibióticos.
Yersiniose
Kathia Brienza Badini Marulli
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
Afeta principalmente crianças, sendo o principal sintoma uma enterite aguda com diar-
réia aquosa de 3 a 14 dias e sangue nas fezes em 5% dos casos. Em crianças maiores ou
adolescentes, os sintomas são semelhantes à apendicite aguda, com dor na fossa ilíaca
direita, febre e moderada leucocitose. Em adultos, podem ocorrer complicações após a
enterite, como eritema nodoso, artrites ou septicemia.
Os casos, na maioria, são esporádicos ou se apresentam como pequenos surtos fami-
liares, porém também são descritas epidemias. Três surtos ocorridos no Japão em 1972
afetaram crianças e adolescentes, sendo 189 casos no primeiro, 198 no segundo e 544
no terceiro. A fonte de contaminação não foi descoberta.
Dos 172 casos ocorridos em 1982 nos Estados Unidos, 86% dos pacientes apresen-
taram enterite e 14%, infecções extraintestinais, localizadas na garganta, sangue, trato
urinário, peritônio, sistema nervoso central e feridas. As infecções extraintestinais foram
mais freqüentes em adultos.
397
SOERENSEN & BADINI MARULLI
nosticados por não se ter tentado o isolamento. Em dois casos descritos recentemente,
os cães não apresentaram febre, nem dores abdominais, e sim, evacuações freqüentes
cobertas de muco e sangue.
A Y. enterocolitica também foi isolada de gatos aparentemente sadios.
Diagnóstico e controle
O agente pode ser isolado das fezes de pessoas doentes e deve-se identificar o biotipo
e o sorotipo. A técnica de enriquecimento pelo frio (três a sete dias a 4º C) é útil para
favorecer o crescimento da Yersinia enterocolitica e suprimir o de outras bactérias.
Podem-se utilizar ainda as provas de soroaglutinação e ELISA. Podem ocorrer reações
cruzadas entre o sorotipo 9 de Y. enterocolitica e a Brucella, devendo-se utilizar a
prova com antígenos flagelares para diferenciar-se estes casos.
As medidas de controle resumem-se em observar as regras de higiene dos alimentos.
2. Viroses
Coriomeningite linfocitária
Bruno Soerensen
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
cer que não são todos os animais que transmitem a doença, mas somente as colônias
contaminadas. Portanto, podem ser mantidos hamsters como animais de estimação,
sempre que a origem seja confiável no sentido de não estarem contaminados com o
vírus responsável pela Coriomeningite Linfocitária. Somente laboratórios especializados
poderão indicar quais as criações comprometidas.
Também foram observados casos de Coriomeningite Linfocitária em pessoal que
trabalha em laboratórios. Nestes casos, novamente deve-se esclarecer que somente
apresentam riscos animais contaminados, o que rotineiramente não ocorre. Atualmente,
com os biotérios modernos, é mais fácil que o tratador transmita uma doença a um
camundongo, do que este ao tratador.
A doença no homem
A doença pode se apresentar sob a forma inaparente, ou ainda, pode levar à morte,
embora em número reduzido. De maneira geral é uma enfermidade benigna. A sintomatologia
é semelhante a um processo gripal. O período de incubação é relativamente mais longo. Os
sintomas são rigidez de nuca, febre, dor de cabeça, mal-estar geral e dores musculares. São
raros os casos em que pode observar-se meningoencefalite, com alteração dos reflexos
profundos como paralisia, anestesia cutânea e sonolência. Dificilmente as seqüelas são per-
manentes ou evoluem para a morte.
A mulher grávida pode sofrer em decorrência da infecção, e podem ocorrer danos à
criança que irá nascer como encefalite, hidrocefalia, etc.
Diagnóstico
Diversos métodos podem ser utilizados no diagnóstico nos homens e nos roedores
como: fixação de complemento, imunofluorescência, etc..
399
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Controle
As medidas preventivas consistem em controlar a população de camundongos do-
mésticos somada à higiene do ambiente. Os camundongos mortos devem ser manipula-
dos com muito cuidado. Na oportunidade de adquirir camundongos ou hamsters, investi-
gar a procedência dos animais. As mulheres gestantes não devem manter em seus lares
hamsters ou outros roedores.
Ectima
Kathia Brienza Badini Marulli
A doença no homem
A doença é de ocorrência rara no homem. Tem sido relatada na Nova Zelândia, onde
em 1979 foram registrados 143 casos, principalmente entre funcionários de frigoríficos.
O período de incubação é de três a sete dias. No local da penetração do vírus, apare-
ce uma lesão papular, que se transforma em vesícula ou pústula, acompanhada ou não
de adenopatia satélite. Esta lesão, que se localiza preferentemente no dedo ou na mão
(local que entrou em contato com o material infectante), evolui num período de duas a
quatro semanas, caindo a escara, sem deixar cicatriz. Raramente observa-se generali-
zação do processo ou ainda lesões oculares.
400
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
ção é de dois a três dias. As lesões localizadas nos lábios, boca, aberturas nasais, pálpebras
e orelhas se caracterizam por pápulas, vesículas e pústulas. Após aproximadamente onze
dias, formam-se crostas de cor marrom, persistindo por uma a duas semanas. Aqui no
Brasil, tivemos a oportunidade de observar lesões localizadas nos lábios, impedindo a ali-
mentação e apresentando, em porcentagem elevada, complicações como miíases. A
morbidade é elevada e a mortalidade baixa.
Diagnóstico e controle
A sintomatologia característica é suficiente para se estabelecer o diagnóstico nos ani-
mais. No homem, há necessidade de confirmação laboratorial pela reação de fixação de
complemento, ou mediante o isolamento do vírus em cultura celular de rim de feto ovino.
Outros recursos de diagnóstico são a prova de imunofluorescência, a imunodifusão, a
neutralização do vírus e a aglutinação capilar.
Quanto ao controle, recomenda-se a vacinação dos cordeiros. A vacina empregada
é preparada a partir de crostas trituradas contendo o vírus. Esta vacina pode ser utilizada
em cordeiros com um ou dois dias de idade, aplicando-se por escarificação na região da
axila. Existe ainda outra vacina viva atenuada em cultura celular e administrada pela via
subcutânea. A vacinação surte bons resultados.
No homem, recomenda-se a proteção de qualquer ferimento quando entra em conta-
to com ovinos e a utilização de luvas ao aplicar a vacina nos animais, pois ele pode
contaminar-se.
Encefalites
Kathia Brienza Badini Marulli
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
402
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
403
SOERENSEN & BADINI MARULLI
A doença nos animais: existem vários hospedeiros do vírus, mas ele só se mani-
festa clinicamente em eqüinos. O período de incubação varia de um a três semanas. O
primeiro sintoma é a febre; quando os sintomas nervosos se manifestam, a viremia e a
febre já desapareceram. Os principais sintomas nervosos são inquietude, andar irregular,
falta de coordenação e sonolência. O animal doente investe contra obstáculos, anda em
círculos e perde todo o sentido de orientação. Na fase paralítica, o animal é incapaz de
levantar-se, quando cai, apresenta o lábio inferior pendente e tem dificuldade de engolir.
A morte pode ocorrer um dia ou dois após o surgimento dos sintomas nervosos. Nos
animais que sobrevivem, as seqüelas nervosas são freqüentes, principalmente a anorma-
lidade dos reflexos. A letalidade geralmente fica em torno de 20 a 30%, podendo chegar
a 50%.
Controle: deve-se realizar o controle dos vetores. Como medidas de proteção indi-
vidual, são recomendadas o uso de roupa protetora, repelentes, mosquiteiros e telas nas
habitações.
404
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Para a proteção dos eqüinos existe uma vacina inativada que pode ser monovalente,
bivalente ou trivalente, protegendo também contra as Encefalites Eqüinas do Leste e
Venezuelana. A vacina deve ser aplicada anualmente durante a primavera, em doses
intradérmicas com 7 a 10 dias de intervalo. A imunidade se desenvolve cerca de duas
semanas após a primeira dose. Outros tipos de vacina vêm sendo desenvolvidos, porém
seu uso ainda não está autorizado. Um surto da enfermidade entre os eqüinos pode
servir como alerta para as autoridades sanitárias, pois pode estar antecedendo em uma
ou mais semanas ao aparecimento de casos humanos.
405
SOERENSEN & BADINI MARULLI
com letalidade de 5 a 75%. Os sintomas foram febre, depressão, diarréia profusa, tre-
mores, movimentos em círculo, paralisia parcial ou completa.
406
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
ção do vírus ocorre por meio de mosquitos (e até mesmo moscas hematófagas) equinófilos,
que transmitem a infecção de um eqüino a outro, como também ao homem e a outros
vertebrados.
Diferentemente das epizootias das Encefalites Eqüinas do Leste e do Oeste, que
começam e terminam bruscamente em poucos meses, as de EEV podem seguir propa-
gando-se durante vários anos. Aparentemente não existe relação entre os vírus enzoóticos
dos focos naturais e os vírus responsáveis pelas epizoodemias. As epizootias ocorrem
com maior freqüência em regiões áridas ou semi-áridas, ou naquelas com precipitações
pluviais moderadas mas estacionais. As epizoodemias se iniciam sempre por um surto
nos eqüídeos e depois de umas semanas começam as epidemias. A transmissão ao
homem ocorre por meio dos mosquitos, mas também são conhecidos inúmeros casos de
infecção contraída a partir de moscas sugadoras de sangue ou em laboratórios, pela
inoculação do vírus.
407
SOERENSEN & BADINI MARULLI
sentando sintomas, a viremia já pode haver desaparecido. Por isso, é aconselhável tomar
amostras de sangue de animais assintomáticos que estejam em contato com os doentes
ou dos que tenham iniciado o período febril há pouco tempo. O isolamento do vírus de
cérebro de animais mortos depois de enfermidade prolongada também pode ser difícil de
ser conseguido.
Encefalomiocardite
Bruno Soerensen
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
É de ocorrência rara e sem maior gravidade. Se manifesta por surtos epidêmicos,
como o acontecido nas Filipinas nos anos de 1945-1946, em soldados dos Estados Uni-
dos. O vírus também foi isolado de crianças na Holanda e Alemanha. A sintomatologia
é variável. Nas crianças, foi observado febre e comprometimento do sistema nervoso
central, com reação linfocitária, e, em alguns casos, paralisia. A doença compromete
bruscamente, manifestando-se por forte dor de cabeça e febre que desaparece dois a
três dias após. Pode-se observar, com certa freqüência, faringite, rigidez de nuca e
transtorno nos reflexos. Os pacientes recuperam-se sem nenhuma seqüela quatro a
cinco dias depois.
Estomatite vesicular
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Bruno Soerensen
Distribuição geográfica
Somente ocorre no hemisfério ocidental. Desta maneira foi descrito nos EUA, Méxi-
co, América Central, Panamá, Venezuela, Colômbia, Equador e Perú. Conforme o tipo
do agente causador da Estomatite Vesicular pode ocorrer em Trinidá, em Belém (Bra-
sil). Na Argentina, nas Províncias de Salta e Buenos Aires foi relatado em cavalos. Em
1964 foi descrito pela primeira vez, no Brasil, no Estado de Alagoas, em eqüinos, bovinos
e no homem. São estudados no Brasil casos pelos vírus Indiana 3 nos estados de Alagoas
e Minas Gerais e Indiana 2 em São Paulo e Rio Grande do Sul.
A doença no homem
A ocorrência no homem não se encontra bem determinada pois é de evolução benig-
na e pode-se confundir clinicamente com a Influenza. O homem, entretanto, é suscetível
aos dois tipos de vírus. A enfermidade compromete predominantemente a população de
risco que tem contato com material ou animais contaminados. No Panamá, onde a doen-
ça é enzoótica, foi relatado o comprometimento sorológico de 90% numa população
rural.
O período de incubação é de um a dois dias e se caracteriza por cefaléia, dor retroorbitária
e mialgias. Excepcionalmente podem-se observar vesículas na boca, faringe e mãos, náuse-
as, vômito e diarréia. De maneira geral os doentes se recuperam em poucos dias, sendo raro
os casos em que há indicação de tratamento hospitalar.
410
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
O diagnóstico da Estomatite Vesicular no homem é feito por meio de provas sorológicas
como as de fixação de complemento e da soronentralização comparando-se os títulos no
início da doença e duas semanas após. Os títulos obtidos após a segunda semana devem
ser bem superiores aos da primeira amostra. A viremia, no homem é curta e portanto o
isolamento do vírus resulta difícil.
Nos animais, o diagnóstico diferencial com Febre Aftosa é importante. A prova mais
indicada é a de fixação de complemento, utilizando-se o epitelio das vesículas como
antígeno. O isolamento do vírus é fácil nos animais, utilizando-se como material as
vesículas.
Controle
A prevenção da doença no homem é por meio das normas de segurança e, em espe-
cial, nos laboratórios, evitando-se a produção de aerossol.
O pessoal que trabalha com animais doentes, no campo, como médicos veterinários,
ordenhadores e trabalhadores, deve usar roupas protetoras e luvas e qualquer ferimento
deve ser tratado adequadamente.
Embora não seja bem conhecida a epidemiologia da doença, se recomenda o isola-
mento dos animais doentes. Não existe proteção cruzada de um tipo de vírus a outro,
portanto pode-se observar mais de uma vez por ano, no mesmo animal. Possivelmente a
imunidade conferida pela doença é por período curto; desta maneira, um animal pode
apanhar a doença pelo mesmo tipo de vírus em período curto. As vacinas preventivas
411
SOERENSEN & BADINI MARULLI
preparadas com vírus inativado e adjuvantes podem ser tentadas nos casos enzoóticos
ou epizoóticos.
Febre aftosa
Kathia Brienza Badini Marulli
A Febre Aftosa é causada por um RNA vírus do gênero Aphtovirus. Existem sete
tipos diferentes deste vírus e numerosos subtipos, o que às vezes interfere na eficácia
das vacinações.
Muitos países já erradicaram a doença, entre eles o Chile, Japão, Austrália e Nova
Zelândia. Também estão livres da enfermidade os países da América do Norte e Central
e alguns países europeus.
Os hospedeiros do vírus são os próprios animais doentes. O animal infectado elimina
o vírus em todas as secreções e excreções, principalmente por meio da salivação abun-
dante. A transmissão da doença ocorre tanto por via direta como indireta. Aerossóis,
água e alimentos contaminados, objetos e vetores mecânicos veiculam o vírus, que con-
segue sobreviver muito tempo fora do organismo animal.
A doença no homem
412
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
O homem se infecta por meio do contato direto com animais enfermos ou material
infectante, seja pela contaminação de feridas ou pela ingestão de leite. A infecção pode
causar enfermidade clínica ou assintomática. O período de incubação é de 2 a 8 dias.
Os sintomas iniciais são perda de apetite, dores de cabeça e taquicardia. No local de
penetração do vírus aparece a vesícula primária e a enfermidade se generaliza com a
formação de aftas secundárias na boca, mãos e pés. O paciente se recupera totalmente
em aproximadamente 2 semanas, a menos que ocorra contaminação bacteriana das
úlceras aftosas.
O diagnóstico da doença deve ser confirmado laboratorialmente, tanto para animais
como para o homem, principalmente por meio das provas de fixação de complemento. O
material a ser colhido é o líquido de vesículas recentes ou epitélio lingual.
Uma enfermidade muito semelhante à Febre Aftosa e que também ocorre em
bovinos é a Estomatite Vesicular. A diferença básica entre elas é que a Estomatite
Vesicular também acomete eqüinos e não chega a atingir um número tão grande de
animais numa propriedade, como nos casos de Aftosa. Devido à semelhança com
essa e com outras doenças é que se faz necessário o diagnóstico laboratorial.
Prevenção e controle
As propriedades acometidas pela Febre Aftosa devem ser interditadas pelas autori-
dades sanitárias. O transporte de animais doentes não pode ser permitido em hipótese
nenhuma, pois é um dos meios mais comuns de difusão da doença. Deve-se dar especial
atenção à desinfecção de veículos, materiais e equipamentos contaminados.
A Aftosa é considerada uma doença “econômica”, pois os países desenvolvidos não
compram carne dos que a têm em seus rebanhos.
A principal medida de prevenção da doença é a vacinação de todos os bovinos. A
vacinação contra a Febre Aftosa é obrigatória no Brasil há mais de 30 anos e, em 1992,
foi realizada duas vezes, nos meses de março e setembro. Todos os animais a partir de
três meses de idade devem ser vacinados. Em regiões onde a criação de ovinos é nume-
ricamente importante, eles também devem ser vacinados.
Uma das grandes vitórias obtidas pelo Brasil com relação à Febre Aftosa foi a ad-
missão, por parte da Organização Internacional de Epizootias (OIE), da possibilidade de
o País ter apenas uma parte de seu rebanho com certificado de área livre da doença, o
que possibilitou a criação de “circuitos de bovinos”. Assim, o Circuito Sul (composto
pelos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul) já é considerado livre de Febre
Aftosa. O certificado da OIE possibilita o aumento da exportação de carne para a Euro-
pa. Hoje, a carne brasileira destinada à exportação é inspecionada por missões dos
países compradores e dificultada pela falta do atestado de sanidade. O Circuito Centro-
Oeste, que inclui São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do
Sul e Distrito Federal, conta com um rebanho de 90 milhões de bovinos e pretendia
pleitear o certificado de área livre à OIE em maio de 2000. Entretanto, um foco de Febre
Aftosa descoberto no Mato Grosso do Sul em janeiro de 1999, com 70 casos confirma-
dos e cerca de 450 animais abatidos, veio a atrapalhar o cronograma para a obtenção do
certificado. Somados, o Circuito Centro-Oeste e o Circuito Sul representarão o maior
bloco de produção de bovinos do mundo, com 105 milhões de cabeças, 5 milhões a mais
que os Estados Unidos. Os Estados do Circuito Centro-Oeste vacinaram os animais de
413
SOERENSEN & BADINI MARULLI
até um ano de idade em fevereiro, dando uma segunda dose da vacina em maio e outra
em novembro. Em 2000, estes animais serão vacinados em maio e novembro e, em
2001, apenas em novembro, esquema que tem demonstrado eficiência.
Segundo a Divisão de Febre Aftosa do Ministério da Agricultura, a incidência da
doença está diminuindo no rebanho bovino brasileiro: em 1997, foram diagnosticados 24
focos e, em 1998, apenas 6. O Estado do Mato Grosso do Sul tem o maior rebanho
bovino do Brasil, com 22 milhões de animais, e apresentou dois focos de Aftosa em 1998
e um em janeiro de 1999, na cidade de Naviraí. Por isso, o Ministério da Agricultura
resolveu fechar a fronteira do Estado de MS para trânsito de animais a partir de 01/07/
99. O trânsito na fronteira MS/SP está estimado em 2 milhões de cabeças/ano.
A prevenção da enfermidade no homem está intimamente relacionada com o contro-
le da doença nos animais. As pessoas que têm contato direto com animais enfermos ou
com materiais contaminados pelo vírus devem proteger eventuais ferimentos. Outra
medida a ser adotada é consumir apenas leite pasteurizado ou então fervê-lo previamen-
te.
Devido à importância desta enfermidade, todos os esforços devem ser feitos, pelos
produtores e pelas autoridades, no sentido de controlá-la e erradicá-la.
Febre de Ilhéus
Kathia Brienza Badini Marulli
Transmissão
O homem adquire a infecção por meio da picada de mosquitos infectados. Aparente-
mente, os principais vetores do vírus são os mosquitos dos gêneros Psorophora e Aedes.
As poucas pesquisas realizadas até o momento não permitem afirmar com certeza qual
o reservatório do agente. As aves são o reservatório mais provável, sendo que o vírus foi
isolado de várias espécies de aves, no Panamá e em Trinidad. Em mamíferos são encon-
trados anticorpos, porém não foi possível o isolamento.
A doença no homem
Na maioria das vezes a infecção no homem parece transcorrer de forma clinicamen-
te inaparente ou como uma enfermidade febril indiferenciada e leve. Em áreas endêmicas,
a taxa de soropositivos reagentes pode ser alta.
414
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
O vírus foi isolado em cinco casos com febre ligeira, de um caso de encefalite e de
duas pessoas assintomáticas. Num levantamento sorológico realizado numa colônia pe-
nal no sudeste da Colômbia, 76 (21%) de 368 soros resultaram positivos às provas de
neutralização e inibição da hemaglutinação.
Diagnóstico e controle
O vírus pode ser isolado do soro dos pacientes, por inoculação em camundongos.
Devido à baixa incidência da enfermidade, não é necessária a adoção de medidas
especiais de controle.
Raiva
Bruno Soerensen
415
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Distribuição geográfica
A Raiva se apresenta em todos os continentes, com exceção da maior parte da Oceania.
Atualmente vários países se encontram livres da infecção, entre eles Uruguai, Barbados,
Jamaica e outras Ilhas do Caribe nas Américas, Japão na Ásia, vários países escandinavos,
Irlanda, Gran Bretanha, Holanda, Bulgária, Espanha e Portugal na Europa. A Raiva não
tem uma distribuição uniforme nos países comprometidos; em cada um deles, existem
regiões de baixa ou elevada endemicidade e outros com surtos epidêmicos. A enfermidade
também é denominada Hidrofobia.
Ocorrência
Podem ser consideradas a “Raiva Urbana” e a “Raiva Rural”. A primeira, comprome-
tendo especialmente o homem, é transmitida por cães, na sua maioria vadios, que nas campa-
nhas de vacinação não são vacinados; a segunda representada preferencialmente por mor-
cegos hematófagos ou não, que perpetuam a Raiva geralmente entre bovinos e animais
silvestres. A importância da Raiva é pela elevadíssima letalidade, que se aproxima a 100%,
quando a vacinação não é instituída precocemente.
Sem dúvida o cão e, em segundo lugar, o gato são responsáveis pela grande maioria
dos acidentes humanos, seguidos por outros animais.
A Raiva silvestre é de importância na Europa, destacando-se, como fonte de trans-
missão, a raposa.
O vírus rábico já foi isolado de camundongos e outros roedores silvestres; portanto,
este detalhe não pode ser esquecido. A Raiva em morcegos é limitada na América
Latina, a Trinidad e Tobago.
É difícil dimensionar a importância da Raiva bovina transmitida especialmente por
morcegos; entretanto, pode-se afirmar que se eleva a dezenas de milhares anualmente.
O homem também, no meio rural, pode adquirir a Raiva transmitida por morcegos.
No Brasil, o número elevado de cães vadios constitui fator importante para o controle
da Raiva Urbana e Rural.
A doença no homem
O período de incubação é de duas a oito semanas, podendo variar de 10 dias a 8 meses
ou ainda se estender por período maior. O tempo de incubação depende da quantidade de
vírus injetada na ocasião da mordedura, do local da mordedura e da gravidade de laceração
de tecidos. De qualquer maneira, o período de incubação é tanto mais prolongado quanto
416
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
417
SOERENSEN & BADINI MARULLI
ção flutuando entre 25 a 150 dias. Existem relatos de períodos de incubação superior a
150 dias. Predomina nos bovinos a Raiva paralítica caracterizando-se, do ponto de vista
clínico, inicialmente pelo afastamento expontâneo do grupo dos animais comprometidos,
alguns apresentando pupilas dilatadas, pêlo eriçado, sonolência e depressão. Podem-se
observar movimentos anormais das extremidades posteriores, lacrimejamento e secre-
ção nasal. Os casos de Raiva furiosa são raros nos bovinos, entretanto podem-se notar
tremores musculares, inquietação, priapismo e hipersensibilidade no local da mordida
pelo morcego; muitos se coçam até provocar ulcerações. Com o avanço da doença
observam-se incoordenação motora e contrações dos músculos do pescoço, tronco e
extremidades. Os animais com dificuldade de deglutição param a ruminação, finalmente
deitam e a morte se segue, num período de 2 a 5 dias de evolução da doença. A ausência
de cães no local pode sugerir que a transmissão seja devida a morcegos.
Em eqüídeos, caprinos e ovinos a sintomatologia é semelhante à dos bovinos. Nos
suínos a doença se inicia por uma exitação violenta, assemelhando-se a de cães. A Raiva
em caprinos, ovinos e suínos não é freqüente e a doença adquirida naturalmente em aves
é extremamente rara.
Nos animais silvestres (canídeos e outros mamíferos) pode ocorrer a Raiva sob a
forma furiosa ou muda e leva à morte num período de 4 a 9 dias.
418
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
A imunofluorescência direta é o método mais utilizado, considerando-se a sensibilidade
e a especificidade. A inoculação experimental intracerebral com triturado de cérebro de
animal suspeito em camundongos lactentes de até três dias de idade é de extrema utilidade
para instituir tratamento profilático precoce em pessoas expostas. A inoculação intracerebral
de camundongos é também útil para o isolamento do vírus.
Outro método indicado é a pesquisa de corpúsculos de Negri, em lâminas coradas
pelo método de Sellers, May – Grunwald, ou Mann, procedimentos estes simples, rápidos
e econômicos, embora não sejam de grande sensibilidade.
As provas sorológicas (pesquisa de anticorpos) são muito utilizadas para averiguar a
resposta imune de vacinas em laboratórios produtores de vacina ou ainda a resposta
imune de pessoas submetidas a um regime de pré ou pós-imunização.
Pode-se preceder também à inoculação intracerebral em camundongos lactentes, de
triturado de glândulas salivares, especialmente das submaxilares com a finalidade de
investigar a presença do vírus rábico neste material.
Controle
Programas de controle
O controle da raiva nos animais é fundamental. Na oportunidade da erradicação da
raiva nos animais a doença no homem deverá desaparecer.
419
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Recomenda-se o sacrifício dos cães de rua ou ainda a castração pois estes animais
não são vacinados nas campanhas de vacinação e são responsáveis pela manutenção da
Raiva Urbana.
Um critério recomendável é que cada animal leve uma coleira onde exista a identifi-
cação do dono do animal, com endereço e telefone. Desta maneira o cão com dono
responsável poderá ser localizado de imediato, evitando-se que o animal fique perdido na
rua.
420
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
portanto sem conter mielina, fator este responsável pelos acidentes vacinais. Com esta
vacinação prévia à exposição são administradas três doses de 2ml em dias alternados,
completando-se o esquema de imunização em cinco dias. Após três semanas ou após um
mês da última dose, deve-se determinar o nível de anticorpos e, se o resultado for
insatisfatório, administrar mais uma dose repetindo a vacinação cada ano ou a cada três
anos. As pessoas com título de anticorpo satisfatório devem receber pelo menos mais
uma dose de vacina na oportunidade de uma exposição à infecção.
A prevenção da Raiva após exposição deve obedecer a um tratamento local da feri-
da, à imunização passiva com soro anti-rábico e à imunização ativa pela vacinação. Re-
comenda-se lavar a ferida o mais rapidamente possível com jato de água e sabonete ou
detergente e, a seguir, aplicar álcool a 40-70%, tintura de iodo, álcool iodado ou compos-
tos quaternários de amônio a 0,1%. A vacinação deve-se iniciar o mais rapidamente
possível à exposição, impedindo qualquer risco do vírus alcançar o sistema nervoso cen-
tral. A vacinação será diária com uma dose por 14 a 21 dias conforme as normas do país
ou ainda, em outros, de 7 a 10 dias. Nos casos da utilização de número inferior de doses
recomenda-se administrar doses de reforço aos 10, 20 e 90 dias após a última dose da
série. O critério da utilização de uma dose do soro anti-rábico nos casos de ferimentos
graves, simultaneamente à vacinação resulta numa segurança de tratamento. A introdu-
ção de novas vacinas para uso humano, como a preparada em células diplóides humanas
(HDCV), de excelente tolerância, e uma redução do número de doses contribuirão para
o controle e a futura erradicação da Raiva no mundo. Esta vacina foi testada em cin-
qüenta países, entre eles por nós no Brasil.
Conforme o tipo de acidente, a vacinação anti-rábica deverá ser associada a soroterapia,
considerando-se sempre as limitações da utilização de soros heterólogos em pessoas que
já receberam anteriormente soros fabricados em eqüinos como o tetânico, diftérico,
botulínico, gangrenoso ou mesmo o soro anti-rábico de origem animal.
3. Micoses
421
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Distribuição geográfica
Um importante conceito para a compreensão das infecções devidas a dermatófitos é
a sua distribuição geográfica.
Um exemplo disto é a infecção inflamatória freqüentemente provocada por um
dermatófito (T. mentagrophytes) encontrada em muitos soldados americanos no Vietnã.
Estes adquiriram esta infecção que afetava os membros inferiores impedindo-os de lo-
comoção, mas os soldados sul-vietnamitas nas mesmas condições ambientais, não eram
infectados por este microrganismo.
Presume-se, por esta razão, que os vietnamitas adultos tivessem adquirido resistên-
cia a essa infecção, a qual era originária de uma cepa única encontrada naquela área e
não nos Estados Unidos. Isto leva a crer que as infecções foram adquiridas no Vietnã e
não nos Estados Unidos.
Este achado foi de grande valia para os estudos epidemiológicos.
A distribuição geográfica pode ser apreciada na Tabela I.
422
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
inflamatória.
As espécies zoofílicas infectam principalmente os animais, mas às vezes podem ser
transmitidas ao homem.
Animais domésticos e de estimação estão-se tornando, cada vez, mais fonte destas
infecções em áreas urbanas, devido a uma afinidade especial dos zoófitos à queratina
destes (Tabela II).
A transmissão ocorre pelo contato direto com o animal ou indiretamente por meio de
pêlos infectados, encontrados nas roupas, coxeiras ou rações contaminadas.
Este tipo de infecção ocorre em áreas expostas do corpo, como couro cabeludo,
barba, face e braços. Geralmente são inflamatórias supurativas, embora em alguns ca-
sos isto não aconteça.
As espécies antropofílicas têm-se adaptado para infectar o homem. São transmitidas
de pessoa para pessoa ou por contato direto ou indireto com fomites. As infecções são
relativamente não inflamatórias e freqüentemente localizadas nas partes cobertas do
corpo (pés e virilhas).
É importante ressaltar que diferentes hospedeiros desempenham um relevante papel
na epidemiologia das infecções antropofílicas, pois as dermatofitoses podem ser mais
severas ou resistentes à terapêutica em pacientes com diabetes mellitus, tumores linfóides,
comprometimento imunológico ou síndrome de Cushing.
Com relação à ecologia, sabe-se que as dermatofitoses variam, sendo influenciadas
por fatores como: sexo (mais comum no masculino); idade (a tinha do couro cabeludo é
mais comum em crianças, a tinha crural e do pé mais incidentes em adultos); imunidade
(maior incidência em imunocomprometido); hábitos (sociais, culturais, religiosos e eco-
nômicos); populações fechadas (tripulações de navios e creches têm maior incidência
de dermatofitoses); migrações (T. violaceum teve incidência no Brasil, na década de 30,
devido à migração da orla do Mediterrâneo e Portugal).
Os fatores temporais, como a sazonalidade, têm influência na distribuição das
dermatofitoses, pois estas são mais comuns no verão e no outono.
Quanto à distribuição no ecossistema, observou-se que as tinhas por T. violaceum
423
SOERENSEN & BADINI MARULLI
eram frequentes na década de 30, como acima referido, e são raras atualmente.
Os fatores geográficos, como intensidade solar, movimentação da camada atmosfé-
rica, índice pluviométrico, regime pluvial, constituição do solo, tipos de vegetação, densi-
dade e variedade de animais e densidade populacional humana, também influenciam na
distribuição das dermatoses.
Finalmente, cabe ressaltar que os dermatófitos antropofílicos também sofrem influ-
ência de fatores étnicos, sociológicos, ambientais e antropogênicos (higiene e modo de
vestir) estando em equilíbrio como o hospedeiro o homem (Tabela III).
T. cruris 42 03 -
T. pedis 30 17 -
T. corporis - - 02
T. capitis - - 06
TOTAL 72 20 08
Aspergilose
Bruno Soerensen
424
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
É uma doença com tendência ao aumento de sua ocorrência, pois está relacionada a
ambientes com elevada poluição ambiental.
A doença no homem
A população de risco está constituída pelas pessoas que têm como ocupação o traba-
lho diário com feno, grãos, lã, algodão, etc., especialmente em ambientes fechados, ou
ainda os portadores de diabetes, câncer, AIDS, tuberculose, doenças do sistema
imunocompetente ou tratados com drogas imunodepressoras.
A Aspergilose, do ponto de vista clínico, pode se apresentar localizada ou dissemina-
da, comprometendo no primeiro caso preferencialmente o aparelho respiratório e cau-
sando uma broncopneumonia, e na forma disseminada ou invasora, que é de evolução
grave, compromete o miocárdio, cérebro e tireóides.
Especialmente na França foram descritos casos em pacientes portadores de tuber-
culose pulmonar, onde a caverna provocada pela tuberculose é ocupada pelo fungo
Aspergillus agravando o quadro clínico.
Pode-se observar ainda, em pessoas predisponentes, um quadro clínico de natureza
alérgica, chamado de “Aspergilose Alérgica”, determinado pela inalação de poeira com
formas microscópicas do fungo, que recebem o nome de “conídios”.
Diagnostico e controle
A demonstração do agente em material patológico ou em corte histológico se reveste
de grande importância. Já os métodos culturais são de importância secundária, pelo fato
425
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Candidíase
Bruno Soerensen
A doença no homem
O fungo pode se manter num indivíduo durante anos sem causar nenhum dano ao
organismo. Outras vezes, é o responsável por vaginites, que são extremamente comuns,
caracterizadas por corrimento branco acompanhado de prurido.
A mãe portadora de vaginite causada por este fungo pode transmiti-lo ao filho, na
oportunidade do parto, determinando neste o aparecimento de membranas esbranquiçadas
na mucosa bucal, alteração conhecida popularmente por “sapinho”. O fungo também é
responsável, no adulto, por elevado número de infecção que compromete o leito das unhas,
ou mais comumente, a borda, chamada de “micose das lavadeiras”, e que tem como fator
predisponente o contato diário e persistente das mãos com água e sabão. Interrompendo-
se este contato, os sintomas desaparecem, embora também exista tratamento paralelo que
pode ser indicado.
Numerosos casos de dermatites em lactentes, ocasionados pela persistência da umi-
dade devido ao uso de fraldas, tem como responsável o fungo Candida albicans. Estes
fungos podem causar infecções em casos de lesões ocasionadas por sondas ou como
decorrentes de intervenções cirúrgicas.
Como já vimos, este fungo que provoca infecções banais no ser humano, também
pode ser responsável por processos graves, sempre que existirem condições
predisponentes debilitantes como diabetes, sífilis, tuberculose, câncer, AIDS ou trata-
mento prolongado com corticóides, radioterapia ou o uso de drogas antiblásticas
426
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico e prevenção
A doença é de fácil diagnóstico, tanto do ponto de vista clínico como laboratorial. O
diagnóstico em laboratório é feito por meio de pesquisa microscópica do fungo, utilizan-
do-se métodos culturais ou ainda sorológicos, como a imunodifusão, aglutinação,
imunofluorescência.
Quanto à prevenção, deve-se tratar com nistatina a Candidíase vaginal da mãe, antes
do parto. Pode-se indicar ainda o tratamento antimicótico em pacientes tratados prolon-
gadamente com antibióticos. Devem-se prevenir deficiências nutricionais, pois a
Candidíase é freqüente em pessoas com deficiência vitamínica.
Na Candidíase animal, especialmente em surtos em aves, recomenda-se a elimina-
ção de todos os doentes, associada à administração de sulfato de cobre (1:2.000) na
427
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Cigomicose
Bruno Soerensen
A doença no homem
São registrados casos isolados em pacientes debilitados ou com diabetes.
Nos últimos anos, tem se elevado o número de casos, devido ao aumento de vida dos
diabéticos, ao aumento de pacientes imunodeprimidos, isto é, de pacientes com suas
defesas orgânicas diminuídas em decorrência de outras doenças ou da administração de
medicamentos utilizados no tratamento do câncer e, ainda, devido ao uso de corticóides.
Os fungos responsáveis são considerados oportunistas, pois aproveitam estas situações
para se instalarem.
A Cigomicose ocorre com maior freqüência na região tropical. Até 1975, foram des-
critos 170 casos, dos quais 112 na África. Foram relatados casos também no sudeste da
Ásia e alguns na América Latina e Estados Unidos. Foi verificado que 40% dos casos
da doença ocorrem em diabéticos (Diabetes mellitus).
No homem, a região comprometida geralmente é a nádega ou a coxa; nestes casos,
geralmente é de evolução benigna, entretanto, pode se disseminar e levar à morte. Este
quadro clínico geralmente tem como agente causador o fungo Basidiobolus ranarum.
Quando o quadro clínico é caracterizado pelo comprometimento das fossas nasais, inva-
dindo a região facial subcutânea e os seios paranasais, os fungos responsáveis são o
Conidiobolus coronatus e o Conidiobolus incongruens. A doença pode se dissemi-
nar rapidamente a partir das fossas nasais para as órbitas oculares, meninges e cérebro,
e esta localização é a mais comum em diabéticos. Podem-se observar ainda as formas
de comprometimento pulmonar e gastrointestinal.
428
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico e controle
O diagnóstico é simples, por meio de biópsia da região afetada, submetida a corte
histológico ou à cultura para o isolamento do fungo. No primeiro caso, o arranjo histológico
é bem característico, observando-se a presença do fungo com suas formas próprias.
A Cigomicose humana pode ser prevenida da seguinte maneira: pelo tratamento ade-
quado dos diabéticos e limitando-se no possível a administração de antibióticos, corticóides
e de drogas imunodepressoras. Para a prevenção da doença nos animais, recomenda-se
evitar a administração de fenos que se apresentarem mofados.
Coccidioidomicose
Bruno Soerensen
Enfermidade causada por um fungo, o Coccidioides immitis, cujo ciclo possui duas fases,
uma no meio ambiente (solo de regiões semidesérticas) e outra, parasitária, num hospedeiro
mamífero.
A doença ocorre apenas nas Américas, dos Estados Unidos à Argentina, não haven-
do casos registrados no Brasil, até o momento.
A infecção ocorre nos animais e no homem pela inalação de esporos do fungo que
são transportados pelo vento. Também pode ocorrer no laboratório, pela inalação de
esporos dos cultivos do fungo.
429
SOERENSEN & BADINI MARULLI
A doença no homem
O período de incubação é de uma a quatro semanas. Cerca de 60% das infecções
são assintomáticas, somente sendo detectadas pela prova intradérmica. Nos outros ca-
sos, observa-se enfermidade respiratória, com sintomatologia aguda semelhante à gripe,
a qual, em geral, tem cura sem seqüelas. Em alguns pacientes pode haver pneumonia
que persiste por seis a oito semanas. A letalidade, nestes casos, é alta, quando em
pacientes imunossuprimidos. A forma crônica pode ser confundida com tuberculose.
Pode ocorrer disseminação, ocasionando osteomielite, meningite, tenosinovite, etc..
Diagnóstico e controle
O exame direto entre lâmina e lamínula do material como escarro, pus, líquido pleural,
lavado gástrico (tratados com hidróxido de potássio a 10%), é a maneira correta de se
estabelecer o diagnóstico. Nos casos positivos, observam-se esférulas contendo
endosporos, podendo-se completar o diagnóstico pela cultura do material, ou ainda,
inoculação pela via intratesticular de cobaias ou por meio de cortes histopatológicos.
Do ponto de vista epidemiológico, a coccidioidina inoculada intradermicamente no
volume de 0,1 ml, com leitura após 24 a 48 horas (diâmetro superior a 5 mm), pode ser
útil para a delimitação de áreas endêmicas, entretanto deve-se considerar que esta pro-
va pode dar reações cruzadas com outros antígenos como com a histoplasmina.
Quanto ao diagnóstico sorológico, as provas de fixação de complemento, precipita-
ção, imunodifusão, aglutinação de látex e radioimunoensaio, são de importância. Os
anticorpos IgM podem ser demonstrados por meio destas provas nas duas primeiras
semanas da doença, entretanto, os anticorpos IgG se detectam mais tardiamente pelas
provas de fixação de complemento e imunodifusão.
As medidas de controle, nas regiões endêmicas, se fazem evitando-se ao máximo a
inalação de pó. Nos Estados Unidos (Califórnia e Arizona) foram ensaiadas vacinas
inativadas. É indicado no tratamento da Coccidioidomicose o ketoconazole.
Criptococose
Bruno Soerensen
430
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
O Cryptococcus neoformans é considerado um fungo oportunista, ocorrendo prin-
cipalmente em pacientes com imunodepressão, especialmente nos portadores de AIDS
ou, ainda, associado à moléstia de Hodgkin ou em pacientes medicados com drogas
antiblásticas e corticóides. É uma micose com localização preferencial no sistema ner-
voso central, predominantemente nas meninges, embora possa comprometer outros ór-
gãos e tecidos, incluindo-se a pele, onde o fungo pode permanecer durante anos, causan-
do uma pequena úlcera e, na oportunidade de uma queda de resistência, devido a seu
neurotropismo, provocar uma meningite ou uma meningoencefalite, geralmente mortal.
Pode-se observar também o comprometimento dos pulmões, podendo evoluir à cura
espontânea ou a uma disseminação pela via hematógena. O quadro clínico pulmonar se
caracteriza por febre, tosse, dor torácica e hemoptise. Na imagem radiológica observa-
se nódulo único ou múltiplo, ou ainda, grandes massas de comprometimento, que rece-
bem o nome de “criptococoma”.
A sintomatologia no comprometimento meníngeo inclui dor de cabeça, rigidez de nuca
e distúrbios visuais, podendo ainda acompanhar confusão mental, mudanças de personali-
dade e agitação. A evolução da meningite criptococósica leva de algumas semanas a
meses. Pode-se observar ainda a Criptococose assintomática. Nos Estados Unidos esti-
mam-se aproximadamente 100 óbitos anuais por Criptococose.
O tratamento de escolha na Criptococose é a anfotericina B e a flucitocina.
431
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Diagnóstico e prevenção
O diagnóstico laboratorial é simples e consiste em primeiro lugar, na observação
microscópica do fungo no material patológico como líquor, líquidos de espectoração, pus,
ou ainda, através de cultura em meios específicos ou inoculação experimental em ca-
mundongos e ratos pela via intracerebral.
A sorotipagem pode ser feita em laboratório. A imunofluorescência é também de
utilidade. Atualmente o método imunoenzimático (ELISA) para detectar o antígeno
polissacarídeo contido na cápsula que rodeia o fungo é o mais indicado para um diagnós-
tico precoce.
Quanto às medidas preventivas, pode-se recomendar o controle da população de
pombos e evitar a inalação de pó resultante de acúmulo de fezes de pombos, especial-
mente em janelas, ninhos e pombais. As fezes de pombos contêm creatinina, que serve
como fonte de nitrogênio, favorecendo o desenvolvimento do fungo e prolongando a
sobrevivência do C. neoformans no solo.
Dermatomicose
Bruno Soerensen
A doença no homem
A Tinha foi doença comum nas comunidades de pouca higiene, em especial nas
populações infantis e com destaque em creches. A doença, do ponto de vista clínico, é
de fácil diagnóstico, caracterizando-se pelo comprometimento do couro cabeludo, em
áreas geralmente circulares, iniciando-se por pequena pápula. Os cabelos tornam-se
quebradiços, deixando placas descamativas e ocorrendo sua queda. É transmissível de
uma criança a outra, mas também pode ocorrer transmissão de um animal doente para o
homem, dependendo do tipo de fungo responsável pelo processo. Assim, a Tinha causa-
432
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
Nos casos de suspeita clínica, deve ser colhido material da lesão de pele para ser
observado ao microscópio, como pêlos e escamas obtidos por raspagem. O uso da luz de
Wood (luz ultravioleta filtrada) permite, nos casos de micose, o aparecimento de uma
fluorescência verde-azulada brilhante. Finalmente, utiliza-se o método de cultivo em meios
de cultura específicos.
Considerando-se que o reservatório para o homem são os animais, a prevenção ba-
seia-se no controle da infecção nos animais. Esta micose se transmite raramente na
espécie humana e também raramente entre os animais. Os animais devem ser isolados
e tratados com antibióticos de aplicação local, dando-se importância ao tratamento com
griseofulvina via oral. Restos de pêlos e escamas devem ser incinerados. Uma das
medidas preventivas nos bovinos e eqüinos é a vacinação.
433
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Esporotricose
Bruno Soerensen
A doença no homem
O período de incubação da Esporotricose é de três semanas a três meses. Indepen-
dentemente do quadro clínico acima referido, a Esporotricose pode comprometer dife-
rentes órgãos, incluindo-se as articulações e os pulmões.
Na atividade ocupacional, incluem-se os agricultores, jardineiros e floricultores como
os mais expostos a contraírem a doença.
434
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
vam-se nódulos subcutâneos que supuram e, após perda de pêlo, cicatrizam ao longo do
tempo. Nos cães, além da forma cutâneo-linfática, é freqüente o comprometimento dos
ossos, fígado e pulmão.
Diagnóstico
Com a suspeita clínica da Esporotricose, deve-se proceder a exames laboratoriais de
confirmação de diagnóstico, como a demonstração microscópica do fungo, o isolamento
e a identificação em meios de cultura. Paralelamente são de utilidade as provas de
imunofluorescência e de aglutinação de látex.
Prevenção e controle
Como medida preventiva, deve-se evitar qualquer ferimento com madeira e, caso
aconteça, lavar a ferida e desinfetar. Foram descritos alguns casos de transmissão de
Esporotricose de animais ao homem, entretanto, de importância secundária. Nas indús-
trias de madeira onde ocorre a doença, recomenda-se tratar a madeira com fungicidas.
Histoplasmose
Bruno Soerensen
A doença no homem
A Histoplasmose no homem tem um período de incubação de cinco a oito dias e a
435
SOERENSEN & BADINI MARULLI
doença pode se apresentar sob três formas clínicas diferentes: a forma pulmonar aguda,
a pulmonar cavitária e disseminada. A forma pulmonar aguda, a mais freqüente, pode
ser confundida com um simples processo gripal, com febre que pode durar de um dia a
várias semanas, podendo apresentar manifestações cutâneas eritematosas nodulares ou
multiformes, geralmente sem importância, que podem evoluir para a cura espontânea,
podendo deixar ou não pontos de calcificação nos pulmões, detectados por meio de
imagem radiológica. A forma crônica é geralmente observada em adultos do sexo mas-
culino, especialmente em pessoas que já apresentaram, anteriormente, processos pul-
monares por outras causas. Nestes casos, do ponto de vista clínico, pode-se confundir
com uma Tuberculose pulmonar, formando também cavidades. A doença pode evoluir
durante meses e até anos e pode apresentar cura espontânea. A última, a forma disse-
minada, é observada freqüentemente em crianças e anciãos. A forma disseminada da
Histoplasmose pode ser de evolução aguda, especialmente em crianças lactentes, que
apresentam hepatoesplenomegalia, acompanhada de febre e prostração, confundindo-
se com Tuberculose miliar; se não for tratada, geralmente evolui para a morte. A forma
disseminada de evolução crônica da Histoplasmose, mais comum nos anciãos, pode apre-
sentar sintomatologia diversa dependendo do órgão comprometido, como pulmão, fíga-
do, coração, etc.. Apresenta também hepatoesplenomegalia e evolui durante anos, po-
dendo levar a óbito se a moléstia não for tratada.
A doença é de maior freqüência nos Estados Unidos da América, onde se concentra
junto aos rios Missouri, Ohio, e Mississipi, com uma população infectada de aproximada-
mente 30 milhões de habitantes, sendo que aproximadamente 500 mil pessoas, anual-
mente, entram em contato com o fungo. No mesmo país, em 1980, foram notificados 138
casos de Histoplasmose pulmonar aguda, em trabalhadores de uma mina de cal, ao norte
de Michigan, e ainda um surto da doença, próximo ao Campus da Universidade da
Indianápolis, com 51 casos, e outro surto, com 435 casos de Histoplasmose, dentro da
própria Universidade.
Na América Latina existem áreas endêmicas na Guatemala, Venezuela e Peru. No
Brasil existe também a doença, já estudada nos diferentes estados da Federação.
A porcentagem de positividade da reação de histoplasmina varia consideravelmente
mas, geralmente, se situa ao redor de 25% numa população de pessoas normais, signifi-
cando que um número elevado de pessoas já teve contato com o fungo, embora não
tenha apresentado a doença.
O Histoplasma capsulatum pode ser isolado com relativa freqüência nas fezes de
morcego, assim como nas fezes de aves. O nome “Doença das cavernas” é devido a
que numerosos turistas nos Estados Unidos contraíram a doença visitando cavernas
onde foi possível revelar a existência de acúmulo de fezes de morcegos. A doença
também ocorre com certa freqüência em pessoas que trabalham em minas e túneis onde
são encontradas excretas de morcegos.
A doença no homem
Mamíferos domésticos e silvestres são suscetíveis à doença, especialmente bovinos,
ovinos e eqüinos. O cão é dos animais suscetíveis, com muitos casos já publicados de
Histoplasmose evolutiva e também de Histoplasmose assintomática, como foi assinalada
no homem. No cão, na Histoplasmose disseminada, é observada perda de peso e diar-
436
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico e controle
A confirmação da Histoplasmose é feita por meio de isolamento do fungo em meios
de cultura especiais ou pela técnica da imunofluorescência de materiais como escarro,
pus e outros líquidos biológicos. Podem ser utilizadas, ainda, a inoculação experimental
em camundongos, a histopatologia, a intradermorreação de histoplasmina, as provas
sorológicas como fixação de complemento, precipitação, aglutinação de látex. Conside-
rando-se que estas provas podem fornecer resultados não muito específicos (reações
cruzadas com outras doenças, determinadas por outros fungos) deverá ser feito o diag-
nóstico diferencial com Blastomicose e Coccidioidomicose.
Como medida preventiva é recomendado reduzir a exposição das pessoas ao pó
quando são limpos galinheiros e outros locais que podem estar contaminados.
437
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Nos animais, a doença predomina, como já foi referido, em bovinos e cães, embora
seja de ocorrência esporádica, tendo sido relatada em rebanhos de vacas leiteiras, com
comprometimento das mamas, e também em ovinos.
A doença no homem
A infecção por algas no homem se manifesta em duas formas clínicas: comprome-
tendo a pele e tecido subcutâneo ou sob a forma de bursite crônica, com dor e tumefação.
A doença pode se disseminar.
Diagnóstico
O diagnóstico laboratorial pode ser feito por meio de corte histológico do tecido afe-
tado, corado pelos métodos de Gomori, Gridley e PAS. Quando se pretende conhecer o
tipo de algas responsável, há necessidade de se proceder à cultura das algas, somada ao
método da imunofluorescência com reagentes específicos. Um detalhe importante é que
as culturas de algas que elaboram clorofila são de coloração verde, fato este que deve
chamar a atenção do microbiologista.
Controle
Considerando-se os conhecimentos atuais sobre o assunto, o controle é difícil; entre-
tanto, deve-se evitar o contato com águas paradas de coloração esverdeada.
438
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Rinosporidiose
Bruno Soerensen
Diagnóstico e controle
O fungo não prolifera em meios de cultura, entretanto, o diagnóstico pode ser feito
pelo aspecto clínico bem característico, assim como pelo encontro do fungo nas lesões
através de cortes histológicos. Considerando-se que a fonte de contaminação não se
encontra esclarecida, é difícil estabelecer medidas preventivas de controle.
4. Rickettisioses
Febre maculosa
Bruno Soerensen
439
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Também conhecida como Febre Maculosa das Montanhas Rochosas, Febre de Man-
chas, Febre Petequial, Tifo Transmitido por Carrapatos, Febre Maculosa do Novo Mundo,
tem como agente etiológico a Rickettsia rickettsii (Dermacentroxenus rickettsii).
A enfermidade já foi descrita na região oeste do Canadá, EUA, México, Costa Rica,
Panamá, Colômbia e Brasil (São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro).
A doença no homem
Ocorre na América Latina. Não se dispõe de dados da ocorrência, entretanto nos
EUA no período de 1977 a 1980 foram registrados 4.411 casos, com predominância nos
Estados sub-orientais. A doença é mais freqüente em crianças e adultos jovens, predo-
minando no sexo masculino.
A doença tem um período de incubação de 2 a 14 dias, transcorrendo este período
após a picada do vetor, o carrapato. A doença se inicia subitamente manifestando-se por
febre, calafrios, dores musculares, articulares e ósseas. Durante uma semana a febre se
mantém ao redor de 40º C. Paralelamente à febre, aparece uma erupção maculosa
generalizada, similar ao sarampo, evoluindo em determinados casos a uma reação petequial.
Após este período podem-se registrar sintomas nervosos, insônia, delírio e coma. Na
segunda semana pode ocorrer complicações circulatórias e pulmonares. A doença não
tratada persiste por semanas ou meses. O tratamento com tetraciclinas ou cloranfenicol
é satisfatório. Nos EUA a letalidade por Febre Maculosa é de 4,5%.
440
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
O homem se infecta por meio da picada do carrapato, entretanto existe detalhe im-
portante, como a necessidade de o carrapato estar preso à pele humana por um período
de pelo menos dez a 20 horas. Neste período ocorreria uma reativação da rickettsia de
um estado de avirulento a virulento. É menor a possibilidade de um homem contrair a
doença pelo ferimento contaminado com as fezes do carrapato ou quando o homem,
tentando desprendê-lo, o esfacela na pele.
O homem pode contrair a doença, portanto, penetrando em áreas infestadas por carra-
patos ou pelo contato de cães portadores da doença, parasitados por carrapatos.
O homem é um hospede acidental. O ciclo natural se faz entre pequenos roedores
silvestres por meio dos carrapatos. Entretanto, o cão leva até o ambiente do homem os
carrapatos contaminados, como o D. variabilis, o Amblyomma cajennense e o
Rhipicephalus sanguineus.
Diagnóstico
A confirmação da doença, diante de uma suspeita clínica de Febre Maculosa, é feita
pelo isolamento da R. rickettsii do sangue do paciente, colhido na fase febril, inoculan-
do-se em cobaias machos ou em ovos embrionados. Após transcorridos de quatro a seis
dias, pode-se fazer uma pesquisa microscópica em esfregaços da túnica vaginal. Um
diagnóstico presuntivo precoce pode ser feito pela prova de Weil-Felix com as cepas de
Proteus OX-19 ou OX-2 medicante a qual títulos de 1/320 são expressivos. Pode-se
lançar mão de outras provas sorológicas como a de fixação de complemento,
imunofluorescência, hemaglutinação, aglutinação de látex ou da microaglutinação. É tam-
bém de valor a prova de ELISA para detecção dos anticorpos IgM e IgG. As provas
sorológicas somente são de valor quando praticadas após seis dias de evolução da doen-
ça.
Controle
A prevenção inclui o uso de carrapaticidas, o uso de roupa protetora, o uso de repe-
lentes como a dietiltoluamida e o dimetilftalato, o exame da roupa quanto à presença de
carrapatos e a retirada, com cuidado, daqueles fixados à pele. As vacinas são indicadas
em pessoas expostas ao risco como laboratoristas e ecologistas. Embora a proteção
conferida não seja boa, os vacinados apresentam a doença com uma evolução benigna.
Febre Q
Kathia Brienza Badini Marulli
O nome Febre Q (“Query fever” - febre com dúvida, febre com interrogação) foi
441
SOERENSEN & BADINI MARULLI
dado a esta doença porque, inicialmente, sua origem era desconhecida. A enfermidade
foi descrita pela primeira vez em 1937, na Austrália. Também é conhecida como Coxielose
ou Febre dos matadouros.
O microorganismo causador da Febre Q é a Coxiella burnetti, uma rickéttsia alta-
mente resistente. A doença ocorre em todo o mundo, exceto nos países nórdicos da
Europa. Pode acontecer sob a forma de surtos ou casos esporádicos. Em 1976, no
Uruguai, houve um surto num frigorífico, e, no período de um mês, de um total de 630
funcionários, 310 ficaram doentes.
Existem dois ciclos de infecção na natureza, um que ocorre em focos naturais da
doença, onde o agente circula entre animais silvestres e seus ectoparasitas, sobretudo
carrapatos. O outro ciclo ocorre em animais domésticos, principalmente ruminantes.
A relação entre os dois ciclos não está bem estudada. Animais aparentemente sadios
podem estar eliminando rickéttsias nas fezes, urina, leite e placenta.
A doença no homem
O homem pode se infectar por via aerógena, pela via digestiva ao ingerir alimentos
contaminados ou através de vetores como carrapatos, percevejos e piolhos. Os surtos
da doença ocorrem principalmente entre trabalhadores de matadouros, frigoríficos, fá-
bricas de processamento de lã e trabalhadores de fazendas de criação de gado.
O período de incubação da doença dura de duas semanas a um mês. A enfermidade
instala-se bruscamente com febre, calafrios, sudorese intensa, mal-estar, dores muscu-
lares e, às vezes, náuseas e vômitos. Ocorrem, ainda, dor de cabeça e, freqüentemente,
dor retro-orbital. A gravidade da enfermidade é variável, sendo benigna na maioria das
vezes. Menos de 1% dos doentes chegam a morrer.
A infecção no homem muitas vezes é assintomática ou confunde-se com outras en-
fermidades febris.
Prevenção e controle
Os doentes devem ser tratados com antibióticos como as tetraciclinas e o cloranfenicol.
Nas regiões onde a doença estiver ocorrendo ou nos grupos ocupacionais expostos a
alto risco, a vacinação é recomendada. Placentas e envoltórios fetais dos animais devem
ser incinerados ou enterrados. O leite deve ser fervido antes de ser consumido pois,
442
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Tifo exantemático
Kathia Brienza Badini Marulli
Também denominado Tifo epidêmico, clássico, das prisões ou dos navios, é o Tifo
transmitido por piolhos e é causado pela Rickettsia prowazeki.
Entre as rickettsioses, é a única enfermidade capaz de gerar epidemia explosiva.
Transmissão
A Rickettsia prowazeki é transmitida pelo piolho do corpo humano, Pediculus
humanus humanus.
O piolho se infecta ao sugar o sangue de pacientes durante o período de rickettsemia.
Após dois a seis dias, o agente é eliminado através das fezes do piolho, que são deposi-
tadas sobre a pele ou roupas. A rickéttsia penetra no organismo humano por escoriações
provocadas pelo prurido. A enfermidade não é transmitida de pessoa a pessoa.
Quando as infestações por piolhos atingem grande parte da população, como durante
guerras, catástrofes, ou outras situações em que ocorram a fome e a prosmicuidade, o
tifo alastra-se na forma de epidemia.
Alguns casos esporádicos de Tifo ocorridos nos últimos anos apresentam um caráter
zoonótico, diferente do Tifo clássico transmitido por piolhos. Entre 1976 e 1979, oito
pessoas apresentaram sorologia positiva para R. prowazeki, nos Estados Unidos. Ne-
nhuma delas havia sido parasitada por piolhos e dois dos pacientes declararam ter con-
tato com esquilos voadores da Flórida (Glaucomys volans volans), considerado atual-
mente como único reservatório do Tifo silvestre. Ainda não se sabe como ocorre a
transmissão nestes casos. O piolho dos esquilos não se alimenta sobre o homem. Pode
ser que a pulga dos esquilos (Orchopeas howardii) seja o vetor ou que o homem se
infecte através da inalação de aerossóis originados das fezes dos piolhos dos esquilos. A
época em que ocorreram os casos humanos (novembro a março) coincide com o perío-
do de transmissão mais intensa entre os esquilos. Entre julho de 1977 e janeiro de 1980,
outros sete casos foram diagnosticados nos Estados Unidos e também não estavam
associados a piolhos humanos.
A doença no homem
O período de incubação é de uma a duas semanas. A sintomatologia consiste em
febre, cefaléia, dores generalizadas e prostração. Cinco ou seis dias depois do início da
febre, aparece erupção macular, no tronco, flancos e raiz dos membros, que não afeta,
443
SOERENSEN & BADINI MARULLI
porém, a palma das mãos nem a sola dos pés, o pescoço ou a face. Ocorrem também
confusão mental e sinais neurológicos variados. A letalidade varia de 10 a 40%.
Anos após a apresentação da doença, pode ocorrer o Tifo recrudescente ou doença de
Brill-Zinsser, encontrando-se novamente a rickéttsia no sangue do indivíduo, sem que haja
novo contato com piolhos. Esta recorrência ocorre quando a pessoa sofre imunodepressão
ou outras situações agravantes, e foi observada em sobreviventes de campos de concen-
tração e em imigrantes de países da Europa oriental.
O Tifo silvestre, contraído a partir de esquilos, parece mais benigno que o Tifo epidê-
mico transmitido por piolhos. Alguns pacientes apresentam náuseas, vômitos e diarréia.
Em pacientes não tratados o curso da enfermidade variou de duas a três semanas.
Diagnóstico
O agente pode ser isolado durante o período febril por inoculação de sangue do paci-
ente em cobaias machos e ovos embrionados.
A prova de fixação de complemento é a mais utilizada para a identificação da rickéttsia.
Podem-se utilizar ainda as provas de microaglutinação e de imunofluorescência.
Prevenção e controle
No tratamento dos doentes são empregados antibióticos, principalmente o cloranfenicol
e as tetraciclinas.
Existem vacinas inativadas, que oferecem proteção parcial, e são indicadas para
funcionários de laboratórios ou moradores de áreas endêmicas. Em situações em que
existem infestações de piolhos humanos, deve-se combater este vetor com o uso de
inseticidas e repelentes. Deve-se evitar o contato com os esquilos voadores, apesar de o
número reduzido de casos comprovados não justificar a adoção de medidas especiais.
Tifo murino
444
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Também denominada Tifo endêmico, Tifo urbano ou Tifo transmitido por pulgas, esta
enfermidade é causada pela Rickettsia typhi (R. mooseri).
É uma doença de ocorrência esporádica, existindo áreas endêmicas em todo o mun-
do. Sua ocorrência está associada com a infestação de ratos, sendo a maior incidência
no verão e outono, quando as pulgas dos roedores estão mais ativas.
Entre 1963 a 1967 foram notificados nas Américas cerca de 241 casos anuais da
doença. Os países que notificaram nesse período foram: Argentina, Brasil, Colômbia,
Costa Rica, Chile, Equador, Estados Unidos, México, Peru e Venezuela. Nos Estados
Unidos foram registrados 42.000 casos de 1931 a 1946; a partir de 1946 a incidência
começou a declinar e desde 1961 são registrados menos de 50 casos por ano.
Transmissão
O reservatório mais importante do agente é o rato doméstico (Rattus rattus e R.
norvegicus), e o principal vetor é sua pulga, Xenopsylla cheopis. A pulga se infecta ao
alimentar-se no período de rickettsemia. O agente se multiplica no intestino da pulga,
eliminado através das fezes por toda a vida, porém não há eliminação pela saliva. Não há
transmissão vertical da infecção nas pulgas; as novas gerações de X. cheopis se infectam
através de seus hospedeiros.
O ciclo básico da transmissão da enfermidade é rato-pulga-rato e, acidentalmente,
rato-pulga-homem.
A infecção é transmitida de rato a rato por meio de sua pulga ou do piolho Polyplax
spinulosa. O homem é infectado quando a pulga do rato (ou outra pulga, como
Ctenocephalides felis) o pica e defeca sobre sua pele. Ao coçar-se, o homem introduz
o material fecal contaminado através da picada ou outra lesão da pele. É possível que o
homem possa adquirir a infecção por outras vias, como a conjuntival ou por inalação,
porém estes modos de transmissão são pouco importantes.
Outros animais, silvestres e domésticos, assim como vários de seus ectoparasitas,
são encontrados naturalmente infectados ou experimentalmente suscetíveis, porém sua
importância na epidemiologia do Tifo Murino não parece ter destaque.
A doença no homem
O período de incubação é de 6 a 14 dias. A sintomatologia é semelhante à do Tifo
epidêmico transmitido por piolhos, porém é de curso mais curto e benigno. Ocorre febre,
cefaléia intensa e dores generalizadas. Cinco ou seis dias depois do início da febre apa-
rece erupção macular, primeiro no tronco e logo depois nas extremidades, que não afeta,
porém, a palma das mãos nem a planta dos pés ou o rosto. A sintomatologia inclui, ainda,
tosse, irritação, náusea e vômito. As complicações são raras. Em pacientes não tratados
a convalescência pode durar vários meses. A letalidade é menor que 2%.
A infecção não se transmite de homem a homem.
445
SOERENSEN & BADINI MARULLI
semana. O agente pode manter-se viável durante longos períodos no cérebro e outros
órgãos.
Diagnóstico
O agente pode ser isolado durante o período febril por inoculação de sangue do paci-
ente em cobaias machos e ovos embrionados. Nas cobaias, a infecção produz a reação
de Neil-Mooser (aderências da túnica vaginal que não permitem a reintrodução dos
testículos ao abdômen). Esta reação ocorre também com os agentes das febres maculosas.
A prova de fixação de complemento é a mais utilizada. Os anticorpos para esta prova
aparecem ao final da segunda semana da enfermidade e chegam ao máximo nas duas
semanas seguintes, declinando lentamente, a seguir. Podem-se utilizar ainda as provas
de microaglutinação e de imunofluorescência.
Prevenção e controle
No tratamento, são empregados antibióticos, principalmente o cloranfenicol e as
tetraciclinas.
Existem vacinas inativadas que oferecem proteção parcial e são indicadas para fun-
cionários de laboratórios ou moradores de áreas endêmicas.
Primeiramente deve ser feito o combate ao vetor e, posteriormente, aos roedores.
Para reduzir o índice de pulgas são aplicados inseticidas de ação residual (DDT ou
outros compostos). Depois, deve-se proceder o controle da população de ratos, por meio
da aplicação de raticidas. Também devem-se adotar medidas de saneamento ambiental,
como eliminação de fontes de alimentação e abrigo e edificações à prova de ratos.
5. Protozoonoses
Amebíase
Kathia Brienza Badini Marulli
446
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
para o meio ambiente junto com as fezes do hospedeiro. Posteriormente são ingeridos
com água ou alimentos contaminados e se “desenquistam” devido à ação dos sucos
digestivos do intestino delgado; neste momento, a ameba multinucleada (metacisto)
divide-se em 4 amebas. Elas passam ao intestino grosso, onde se alimentam e se
multiplicam. Finalmente, colonizam a mucosa e o ciclo se completa.
Os cistos são bem mais resistentes aos fatores ambientais do que os trofozoítos,
podendo permanecer viáveis por duas semanas nas fezes e por até cinco semanas na
água à temperatura ambiente; a dessecação, entretanto, os destrói rapidamente.
Duas espécies do gênero Entamoeba são de interesse como zoonoses: E. histolytica
e E. polecki. A E. histolytica é um parasita essencialmente humano, que pode transmi-
tir-se a animais inferiores e a E. polecki parasita principalmente o porco e pode transmi-
tir-se ao homem.
Transmissão
A transmissão das amebas se dá por meio da via fecal-oral. O cisto é o elemento
infectante e o reservatório é o homem. As fontes de infecção são a água e os alimentos
contaminados com fezes que contêm cistos.
Os portadores assintomáticos ou que têm diarréia intermitente eliminam cistos que
contaminam o meio ambiente; os enfermos diarréicos normalmente eliminam trofozoítos,
que são destruídos pelo suco gástrico.
Os animais contraem a infecção por E. histolityca, a partir da fonte humana. A
infecção de um cão a outro ou do cão ao homem não ocorre ou é rara, pois no intestino
do cão encontram-se apenas trofozoítos e não cistos.
Entre os primatas não humanos a situação é diferente e a infecção se propaga entre
eles, podendo ser transmitida ao homem.
O principal reservatório de E. polecki é o porco e a infecção humana ocorre por
meio das mãos sujas ou da ingestão de água ou alimentos contaminados com cistos.
Aparentemente pode ocorrer a transmissão inter-humana: de três casos diagnosticados
na Venezuela, dois não haviam tido contato com animais.
A doença no homem
A E. histolytica pode ser assintomática. Formas pequenas, saprófitas, do protozoário
podem permanecer no cólon, em nível subclínico, por muitos anos, mas existe o risco
potencial de se transformarem em enfermidade progressiva e invasora com formas gran-
des de E. histolytica. Assim, toda infecção deve ser considerada como potencialmente
patogênica.
A infecção por E. histolytica no homem é de maior ocorrência em países em desen-
volvimento do que nos industrializados. Na América Latina, a amebíase é um grave
problema de Saúde Pública. Enquanto a prevalência da doença no Canadá, Estados
Unidos e Europa varia de 2 a 5%, na Ásia e África atinge mais de 30% da população.
A infecção por E. histolytica pode ser assintomática ou, quando se manifesta clini-
camente, aguda, crônica, benigna ou grave. O quadro clínico pode ser composto por
disenteria aguda, febre, calafrios e diarréia sanguinolenta ou mucóide (“disenteria
amebiana”) ou dor abdominal leve com diarréia com sangue e muco, com períodos alter-
nados de constipação e diarréia.
447
SOERENSEN & BADINI MARULLI
Diagnóstico
É feito mediante exames parasitológicos e provas sorológicas.
O exame direto de fezes deve ser realizado logo após a colheita das amostras, pois os
trofozoítos se destroem com facilidade.
As provas sorológicas dão resultado positivo quando há invasão de tecidos, por-
que a E. histolytica em estado de comensal não induz a produção de anticorpos.
Os poucos pacientes de amebíase por E. polecki examinados com antígenos de E.
histolytica deram resultados negativos.
Controle
A profilaxia está baseada sobretudo no saneamento ambiental, provisão de água
potável, eliminação sanitária das fezes, higiene pessoal e higiene dos alimentos. É reco-
mendável o tratamento (com metronidazol) dos portadores, principalmente se forem
manipuladores de alimentos.
448
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Criptosporidiose
Bruno Soerensen
A doença no homem
A Criptosporidiose é uma doença que ocorre especialmente em pessoas
imunodeprimidas, entre outros, aidéticos ou medicados com drogas que levam a uma
queda da resistência orgânica. Nos Estados Unidos, é uma das doenças que levam ao
maior número de óbitos de aidéticos, manifestando-se por intensa diarréia, podendo-se
encontrar o parasita na vesícula biliar.
Nos pacientes imunologicamente normais, especialmente em crianças, a doença se
manifesta por diarréia aquosa, que pode persistir de 3 a 14 dias, com dores abdominais,
náuseas e mal-estar geral.
Diagnóstico e controle
O exame parasitológico de fezes em esfregaços corados pelo método de Giemsa é o
mais indicado. As técnicas de flutuação, biópsia da mucosa intestinal e histologia são
também de importância. A prova de imunofluorescência indireta também é de grande
valor.
Quanto ao controle da Criptosporidiose, é recomendada a higiene pessoal e a higiene
dos alimentos. A população de risco está constituída pelos pacientes imunodeficientes e
imunodeprimidos, entre outros os aidéticos, e recomenda-se a essas pessoas que evitem
o contato com animais ou pessoas com diarréia. Não foi obtido ainda tratamento
449
SOERENSEN & BADINI MARULLI
satisfatório.
Doença de Chagas
Bruno Soerensen
450
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
Podemos observar três fases da doença: aguda, indeterminada e crônica. A fase
aguda pode ser desde assintomática a uma doença grave fatal. Compromete especial-
mente as crianças, caracterizando-se por febre elevada contínua ou intermitente. Em
aproximadamente 50% das crianças observa-se um edema das pálpebras, relacionado
com a porta de entrada. O edema palpebral é acompanhado de conjuntivite, comprome-
tendo os gânglios da região. Se a picada pela “chupança” não foi no rosto, pode-se
observar no local da picada a pele com lesão semelhante a um furúnculo. O aumento do
baço e do fígado são habitualmente observados em crianças comprometidas com a
Moléstia de Chagas. A febre pode estar acompanhada de comprometimento circulatório
(miocardite, dilatação cardíaca, baixa pressão arterial e batimento cardíaco acelerado)
e, ainda, de comprometimento do sistema nervoso central, com encefalomielite e
meningoencefalite, sendo raros os casos de comprometimento do aparelho digestivo,
com vômitos e diarréia. Estas manifestações se prolongam por três a quatro semanas.
Segue-se a esta fase uma infecção latente (fase indeterminada) que não apresenta nun-
ca mais sintomas clínicos, embora com comprometimento cardíaco.
A forma crônica, apresentada em 10 a 30% dos indivíduos infectados, é a cardiopatia
chagásica, que pode ser confirmada pelo eletrocardiograma. Outra manifestação da
moléstia é o megaesôfago e o megacólon.
Não existe vacina ou tratamento satisfatório no combate à doença e número elevado
das pessoas, especialmente crianças, terminam morrendo, principalmente na fase aguda
da moléstia. As pessoas com a doença crônica poderão ir a óbito a qualquer momento,
dependendo somente do grau de comprometimento pela moléstia.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Diagnóstico
O diagnóstico de laboratório é feito por meio de exames sorológicos (reação de Ma-
chado-Guerreiro), imunofluorescência, hemaglutinação passiva, ELISA, cultura do
Trypanosoma cruzi a partir de sangue proveniente de pessoas doentes ou por meio de
xenodiagnóstico, que consiste em se fazer sugar o sangue da pessoa suspeita pela
“chupança” não contaminada e observar posteriormente o T. cruzi nas fezes do inseto
transmissor.
Controle
A Doença de Chagas é basicamente um problema sócio-econômico, e o objetivo a
longo prazo deve ser a melhoria das condições das habitações, principalmente nas zonas
rurais, cujas condições insalubres são a causa primordial da manutenção das endemias.
Os programas de controle consistem essencialmente em medidas contra os vetores.
O inseticida de eleição é o hexacloro de bonzeno (gamexano), de baixo custo e pouco
tóxico para o homem. A adição de piretrinas ao inseticida melhora seu efeito, pois ajuda
a desalojar o vetor de seus esconderijos.
O uso de inseticidas de ação residual, a educação sanitária, o melhoramento das
habitações rurais e a promoção de projetos de desenvolvimento de um programa de
controle da Doença de Chagas são fatores fundamentais.
Além disso, os doadores de sangue devem ser submetidos a exames sorológicos,
para prevenir a transmissão por transfusões sanguíneas. Onde não for possível realizar
o dignóstico, pode-se agregar cristal violeta (1:4000) ao sangue e mantê-lo sob refrigera-
ção por 24 horas.
Atualmente não existem vacinas contra a doença.
Giardíase
Bruno Soerensen
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
Geralmente a infecção é inaparente. Já nos indivíduos que apresentam sintomatologia,
o período de incubação é de uma a três semanas. A sintomatologia se caracteriza por
diarréia, constipação, acompanhadas de dor abdominal e, raramente, são descritas náu-
seas e vômitos.
Diagnóstico e controle
Por meio de exame parasitológico de fezes pode-se diagnosticar a doença pela pre-
sença do parasita na forma de trofozoíto ou de cisto. Entretanto, em alguns pacientes, há
necessidade de se repetir o exame por várias vezes. A prova de imunofluorescência é
muito específica, porém pouco sensível.
Quanto ao controle da Giardíase, o abastecimento de água deve ser protegido contra
contaminação fecal humana ou animal. O cuidado com a higiene pessoal é importante,
especialmente em creches. Os animais parasitados, como cães e gatos, que possam
manter contato com crianças, devem ser tratados com quinacrina ou metromidazol.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
A doença no homem
O período de incubação é de alguns dias a meses, comprometendo somente a pele,
ou ainda a pele e as mucosas quando se trata da Leishmaniose Cutânea preferentemente
do pavilhão e do tabique nasal. Entretanto, na Leishmaniose Visceral (Calazar), o para-
sita penetra na corrente circulatória, levando inicialmente a uma esplenomegalia e,
posteriomente, a uma hepatomegalia. São freqüentes o aparecimento de petéquias e
hemorragias das mucosas. A sintomatologia varia conforme o agente responsável. A
população que corre risco de contrair a doença, tanto a Cutânea como a Visceral, é
aquela relacionada às atividades dentro da mata, como a exploração de madeira, borra-
cha, etc. Recentemente (1999) foi constatada em níveis elevados a doença em cães e na
população humana na cidade de Araçatuba, SP., Brasil.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Transmissão
Nas Américas, o reservatório da Leishmaniose Cutânea está representada pelos
animais silvestres, transmitindo-se de um animal a outro, como acontece com o roedor
silvestre Ototylomys phyllotis por meio da picada do pernilongo Lutzomyia, um flebótomo
que pode picar outro roedor ou mesmo o homem. A transmissão do Calazar (Leishmaniose
Visceral) é feita do cão picado por um pernilongo a outro cão ou ao homem, e de um
homem a outro.
Diagnóstico
O diagnóstico tem como base a demonstração do parasita nas lesões, colhendo-se
material destinado a esfregaço, preferentemente das bordas da lesão (nódulo ou úlcera
da pele ou mucosas). Deve-se corar pelo método de Giemsa e a seguir fazer a observa-
ção microscópica. O isolamento do parasita pode ser feito no meio de Novy, MacNeal e
Nicolle (NNN) ou, ainda, mediante inoculação intradérmica em hamster. As reações
sorológicas para o diagnóstico da Leishmaniose Cutânea, como a imunofluorescência,
aglutinação direta, aglutinação em látex, imunodifusão em gel e ELISA, são de grande
valor. Na infecção por L. braziliensis, a reação cutânea de Montenegro se revela útil no
diagnóstico.
É interessante destacar que na Leishmaniose Visceral o esfregaço sanguíneo cora-
do pelo método de Giemsa pode ser de utilidade. A punção esplênica ou da medula
óssea esternal ou ilíaca pode comprovar a presença do parasita em 54 a 86% dos
casos e a aspiração ganglionar, em 64% dos casos. No caso do diagnóstico da
Leishmaniose Cutânea a cultura no meio de NNN ou a inoculação experimental em
hamster também são úteis. A prova de ELISA é também de importância.
Controle
Como medida de controle, os doentes deverão ser tratados precocemente com
antimoniacais pentavalentes. É indicado o uso de inseticidas em acampamentos ou em
residências comprometidas pelo pernilongo, e o controle dos animais reservatórios.
Em abril de 1999 foi confirmado o primeiro caso autóctone de Leishmaniose Visceral
no Estado de São Paulo, na cidade de Araçatuba. Até junho, eram três os casos, com um
óbito. A cidade vinha registrando uma epizootia da doença, quando foi confirmado o
caso humano. Além da pulverização de inseticidas em todas as casas num raio de 200
metros da casa da pessoa infectada, a Prefeitura Municipal sacrificou, de março a junho
de 1999, cerca de 1.200 animais. Estima-se que cerca de 25% dos cães estariam doen-
tes; entretanto, um a cada cinco proprietários recusa-se a entregar seus animais.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Malária
Bruno Soerensen
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
O período de incubação é de 12 dias para o P. falciparum; 14 para o P. vivax e 30
dias para o P. malariae, embora este período possa aumentar especialmente em áreas
temperadas.
A doença se manifesta por mal-estar seguido de calafrios intensos e rápido aumento da
temperatura, geralmente acompanhado por cefaléia, terminando por intensa sudorese. Este
quadro clínico se repete diariamente, em dias alternados ou a cada três dias. Os sintomas
se prolongam pelo menos por 30 dias. Podem-se observar recaídas mesmo após vários
anos, quando não tratada.
Diagnóstico
O diagnóstico de laboratório é feito pela observação microscópica de uma gota de
sangue corada pelo método de Giemsa. No que se refere a plasmodios que comprome-
tem os macacos, pode se afirmar que o encontro do agente é mais difícil devido à baixa
parasitemia, indicando-se portanto a inoculação do sangue em macacos susceptíveis à
doença.
Controle
Os programas regionais incrementam a cobertura da vigilância epidemiológica nas áreas
de risco, destacando-se o diagnóstico de laboratório. O tratamento imediato da população
exposta a risco elevado e as medidas de controle dos vetores nas Américas, reduziram a
utilização de inseticidas clorados como o DDT em detrimento de medidas seletivas utilizan-
do-se o malation e o fenitthrotion.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
6. Helmintíases
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Transmissão
Os ovos do Schistosoma mansoni são eliminados pela fezes. Quando num meio
líquido, preferentemente em lagoas, dão origem a uma larva chamada “miracídio”, que
nada na água até encontrar um caramujo do gênero Biomphalaria, no qual penetra e
sofre multiplicações e modificações, dando origem a uma forma infestante chamada
“cercária”, de cauda bifurcada. Este ciclo do Schistosoma mansoni, desde a penetra-
ção no caramujo pelo “miracídio” até a eliminação das formas infectantes leva aproxi-
madamente 30 dias, podendo um único “miracídio” dar origem a 100.000 “cercárias”
dentro do caramujo. Quando uma pessoa toma banho numa lagoa contaminada, entra
em contato com as “cercárias”, que se encontram na água. A “cercária” penetra ativa-
mente na pele do homem, sofre uma transformação, entra no sistema linfático, penetra
na circulação sanguínea, chegando aos pulmões e migrando para o fígado. No fígado o
parasita alcança a maturidade sexual, se acasala, penetra no sistema venoso e deposita
os ovos na mucosa intestinal, passando a seguir à luz intestinal e sendo eliminado pelas
fezes, completando o seu ciclo. Este ciclo, desde a penetração da “cercária” do
Schistosoma mansoni na pele do homem até, finalmente,a colocação dos ovos na mucosa
intestinal, leva de 40 a 60 dias.
No Yemen calcula-se haver um milhão de pessoas com Esquistossomose; na China,
aproximadamente dez milhões e nas Filipinas, seiscentas mil pessoas contaminadas.
Nos últimos anos foram relatados casos de Esquistossomose em numerosos animais
na América do Sul e na África. No Brasil, foi comprovada a moléstia em muitas espéci-
es de roedores, em animais silvestres e em bovinos; na África Oriental, em roedores,
cães e macacos.
A doença no homem
A gravidade da Esquistossomose depende da quantidade de parasitas que penetra-
ram. Os pescadores, que permanecem muito tempo e com freqüência em águas conta-
minadas, podem manifestar a doença de maneira mais intensa. Nos casos de contamina-
ção baixa não se observa nenhum sintoma.
A sintomatologia da Esquistossomose pode ser dividida em quatro fases, atendendo a
evolução da doença. Na primeira fase, que corresponde à penetração das cercárias,
pode-se manifestar por dermatite; na segunda, que corresponde à invasão do parasita,
pode ser assintomática ou manifestar-se por tosse e crise asmatiforme, quando da pas-
sagem do parasita pelos capilares pulmonares. A terceira fase corresponde à maturação
do parasita e ao início da ovoposição e se caracteriza por febre, prostração, inapetência,
diarréia. Ao exame laboratorial hematológico, aparece pronunciada eosinofilia e, final-
mente, pode-se observar discreto aumento de volume do fígado e do baço. A última
fase, também chamada de crônica, corresponde à reação do organismo aos ovos depo-
sitados em diferentes órgãos, dando origem a nódulos que determinam transtornos rela-
cionados à sua localização, assim como ao número de ovos depositados. Entretanto, a
parede intestinal é que se encontra comprometida com maior intensidade, a seguir o
fígado e o baço e acúmulo de líquido na cavidade peritoneal. Independentemente das
alterações assinaladas, na fase crônica podem existir manifestações pulmonares.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Diagnóstico
No exame parasitológico de fezes podem ser encontrados os ovos de Schistosoma
mansoni. Quando este exame é negativo e persiste a suspeita clínica de Esquistossomose,
é indicado o raspado retal. Pode-se recorrer ainda à provas sorológicas, como as provas
de fixação de complemento, precipitação, floculação, hemaglutinação, imunofluorescência
e imunoensaio; entretanto, estas são de maior aplicação em estudos epidemiológicos,
devido às limitações dos métodos quanto à especificidade.
Controle
As medidas consistem em: a) educação sanitária (evitar que o homem entre em
contato com água contaminada); b) tratamento quimioterápico (oxamniquima ou
praziquantel) da população comprometida; c) prevenção da contaminação da água com
excretas humanas; d) modificações ecológicas (introduzindo-se outras espécies de
caramujos, como a Biomphalaria glabrata, e ainda peixes que se alimentam do caramujo
transmissor); e) aplicação de molusquecidas como a niclosamida e o N-tritilmorfolina, no
controle dos caramujos, que desempenham o papel de hospedeiro intercalado, na cadeia
epidemiológica.
Os estudos experimentais de imunização de bovinos e ovinos contra o Schistosoma
bovis, de ovinos contra o Schistosoma mattheei e de bovinos contra o Schistosoma
japonicum com cercárias irradiadas, vão possibilitar, num futuro próximo, a obtenção de
vacinas de utilização humana no combate à Esquistossomose.
Existem várias doenças que podem ser transmitidas ao homem por meio dos alimen-
tos, causadas por microorganismos, substâncias tóxicas ou parasitas. Dentre as enfer-
midades parasitárias veiculadas pelos alimentos, a Teníase e a Cisticercose são as mais
importantes.
Transmissão
As Taenia, vulgarmente conhecidas como “solitárias”, necessitam de dois hospedei-
ros para completarem seu ciclo evolutivo. O hospedeiro definitivo destes vermes é o
homem. O hospedeiro intermediário é o porco, no caso da Taenia solium, ou o boi, no
caso da Taenia saginata.
Os parasitas vivem no intestino delgado do homem e seus ovos são eliminados atra-
vés das fezes. Às vezes ocorre a eliminação de proglotes, que são segmentos do corpo
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
da tênia repletos de ovos do parasita. No meio externo, quando existem boas condições
de temperatura e umidade, os ovos podem resistir por até dois meses.
Os animais, suínos ou bovinos, se infectam por meio da ingestão de alimentos conta-
minados ou mesmo da ingestão de fezes que contenham ovos do parasita. Dentro do
organismo do animal, os ovos se rompem e são liberadas larvas que se fixam nos múscu-
los, formando pequenos cistos, do tamanho aproximado de uma cabeça de alfinete. Es-
tes cistos, com a forma de pequenas bolinhas brancas, são denominados cisticercos e
popularmente conhecidos como “canjiquinha” ou “pipoca”. Sua localização preferencial
é no coração, língua, paleta, costelas e musculatura que recobre a mandíbula.
Quando o homem ingere carne de porco ou de bovinos parasitados, crua ou mal
cozida, contendo cisticercos, estará contraindo a Teníase, ou seja, o verme se desenvol-
verá em seu organismo. A pessoa com Teníase pode não apresentar sintomas ou ter
dores abdominais, problemas digestivos, diarréia e constipação intestinal alternadamente.
Irritabilidade e convulsões também podem ocorrer.
O homem pode ainda ser parasitado pela forma larvária ou cística das tênias e, neste
caso, dizemos que ele está com Cisticercose. A infecção ocorre em portadores de Teníase,
seja por refluxo do conteúdo intestinal, trazendo ovos para o estômago do indivíduo, ou
pelo ato de levar as mãos contaminadas pelas fezes à boca. As pessoas também podem
se infectar por meio da ingestão de alimentos, principalmente verduras e frutas, contami-
nadas com fezes humanas que contenham ovos de tênias.
A doença no homem
Os sintomas da Cisticercose dependem da localização do cisticerco, sendo que às
vezes não há qualquer perturbação. Porém, quando o cisticerco se instala no globo ocu-
lar, por exemplo, pode provocar perda total ou parcial da visão. Quando o cisticerco se
localiza no cérebro, o paciente apresenta transtornos nervosos, principalmente convul-
sões.
O diagnóstico da Neurocisticercose pode ser feito por meio do exame do líquido
cefalorraquidiano, radiografias do crânio ou tomografia axial computadorizada. Às ve-
zes o cisticerco só é descoberto após a morte do paciente, durante a necrópsia. Depen-
dendo da localização do cisticerco, é possível o tratamento cirúrgico.
Controle
A educação sanitária da população é de extrema importância, principalmente se con-
siderarmos que, em algumas regiões, a carne com “canjiquinha” é considerada mais
saborosa. Deve-se informar às pessoas sobre o risco da doença, fornecer orientações
461
SOERENSEN & BADINI MARULLI
sobre higiene pessoal e destino adequado das excretas humanas. As pessoas com Teníase
devem ser tratadas. Água contaminada ou esgoto não devem ser utilizados para a irriga-
ção de produtos hortifrutícolas, bem como a adubação destes produtos com fezes huma-
nas deve ser descartada.
Os animais, principalmente os porcos, devem ser criados em condições adequadas,
sendo imprescindível impedir o acesso destes animais aos “lixões” municipais.
As pessoas devem evitar consumir carnes malpassadas, pois a cocção adequada
destrói os cisticercos. Também só devem ser consumidas as carnes que passaram por
inspeção sanitária, realizada por Médico Veterinário. As carnes oriundas de abates clan-
destinos e as lingüiças de fabricação caseira representam um grande risco para os con-
sumidores, não só em relação à Cisticercose, como também quanto a várias outras
doenças.
Transmissão
A fonte de contaminação para o homem está constituída por solos contaminados
com fezes de cães e gatos doentes. Nos casos de solos úmidos, a sobrevivência das
larvas é maior, e elas podem infectar o homem pela via dérmica ou oral.
A infecção pode ocorrer pela via cutânea ou digestiva. Quando a via de infestação
for a cutânea, como acontece no homem pelo A. duodenale e o N. americanus, os
parasitas penetram nos vasos linfáticos e capilares sangüíneos indo até os pulmões, onde
através dos capilares caem no sistema respiratório, chegam à epiglote e são deglutidos.
462
MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
No intestino sofrem uma nova muda chegando à maturidade e, após um a dois meses da
infestação, as fêmeas iniciam a ovoposição. Quando a infestação é pela via oral, como
pode acontecer pelo A. caninum, o desenvolvimento do parasita é feito no aparelho
gastrointestinal.
Podem-se observar, embora raramente, infestações em animais pelos ancilóstomas
de origem humana. Na Europa, China e Austrália, foram observados animais de zoológi-
cos contaminados por Ancylostoma duodenalis, sendo também encontrados o Necator
americanus e um parasita muito semelhante no intestino de várias espécies de maca-
cos.
Constatou-se ainda uma espécie muito semelhante ao Necator americanus, já adap-
tada aos suínos, o N. suillus.
Quanto à distribuição geográfica, o A. ceylanicum é comum em gatos domésti-
cos, felinos silvestres e cães, entretanto a infestação humana por este parasita não
é freqüente, embora seja encontrada na Tailândia, Ásia Sudoriental, Suriname, Ja-
pão, Índia, Sri Lanka, África Oriental, Libéria, Madagascar, Brasil e Guiana.
O Ancylostoma caninum é um parasita cosmopolita comprometendo cães, raposas
e outros carnívoros silvestres. O comprometimento intestinal pelo A. caninum no ho-
mem é raro e pelas outras espécies animais como o N. suillus, N. argentinus e A.
malayanum é ainda mais raro.
A doença no homem
As infestações de maior freqüência são pelos A. duodenalis e Necator americanus
separados ou simultaneamente, e são raras pelo A. ceylanicum. O sintoma da
Ancilostomíase de maior evidência é a anemia. Voluntários que receberam larvas pela
via percutânea desenvolveram pápulas no local das inoculações 15 a 20 dias depois e
sentiram dor de cabeça, fadiga e, ao exame hematológico, foi detectada eosinofilia.
Diagnóstico e controle
O diagnóstico é feito mediante exame parasitológico de fezes no qual podem ser
observados os ovos. O tratamento é feito pela administração de um antihelmíntico como
o hidroxinaftoato de befenio, pamoato de pirantel, mebendazol ou tiabendazol. Paralela-
mente, as medidas higiênico-sanitárias devem ser obedecidas para que se consiga o
controle da enfermidade.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Ascaridíase
Bruno Soerensen
A doença no homem
Compromete especialmente as crianças e manifesta-se por sintomatologia respirató-
ria, que é uma conseqüência da migração pulmonar, traduzindo-se por respiração irregu-
lar assemelhando-se a processo asmático, acompanhado de febre. Localizações erráticas
das larvas podem ocorrer no cérebro, olhos e rins. As manifestações da parasitose
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
intestinal são diarréia, dores abdominais e vômitos. Pode-se observar, ainda, em crianças
obstrução intestinal devido ao acúmulo de larvas.
Transmissão
A fonte de contaminação é constituída pelo solo ou alimentos contendo ovos de
Ascaris. A infecção é pela via digestiva e excepcionalmente pela via pulmonar, median-
te a inalação de ovos. A transmissão nos suínos é idêntica à do homem, e os ovos não
embrionados são depositados com as fezes no solo onde se transformam em ovos
embrionados. Embora existam evidências de contaminação cruzada entre o homem e os
suínos, no homem predomina o Ascaris lumbricoides e nos suínos, o Ascaris suum.
Diagnóstico e controle
O material de escolha são as fezes e, por meio de exame parasitológico, é estabele-
cido o diagnóstico.
Quanto ao controle da Ascaridíase, como foi referido anteriormente, as medidas de
saneamento ambiental (destino adequado das fezes, fornecimento de água potável, etc.),
e educação sanitária são fundamentais. Nos países desenvolvidos praticamente já não
existe Ascaridíase.
O tratamento da Ascaridíase pode ser feito pela administração de mebendazol,
flubendazol ou albendazol de maneira periódica e sistemática na população humana.
Nas criações de suínos, deve-se praticar a redução da parasitose pelo tratamento com
fenbendazol, cambendazol ou diclorvos adicionados aos alimentos.
Estrongiloidose
Bruno Soerensen
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
A doença no homem por S. stercoralis e geralmente de evolução crônica, sendo
geralmente inaparente, entretanto foram observadas formas generalizadas simulando
tumores gastro-intestinais com manifestações pulmonares, incluindo-se casos mortais.
Indubitavelmente, os casos graves encontram-se relacionados a uma diminuição da re-
sistência orgânica, às vezes relacionadas a pacientes medicados com corticóides ou
antiblásticos.
Na fase de penetração das larvas filariformes pela pele, podem-se observar uma
pequena pápula e reações alérgicas com urticária e prurido, especialmente em pacientes
sensibilizados por exposições anteriores. Em determinados casos, esta reação pode cor-
rer paralelamente a manifestações diarreicas.
Durante a migração pulmonar das larvas, a sintomatologia pode se constituir somente
de uma tosse simplesmente do tipo irritativo ou ainda até de uma franca broncopneumonia.
De qualquer maneira, a sintomatologia habitual é quadro clínico intestinal de enterite
catarral edematosa, com espessamento da parede intestinal ou ainda ulcerativa. Entre
os sintomas destacam-se dores na região epigástrica, diarréia, dispepsia, náuseas e vô-
mitos que podem ocorrer de maneira intermitente.
A sintomatologia da doença provocada pelo S. fuelleborni, embora pouco estudada,
assemelha-se à do S. stercoralis.
A doença no homem
A doença compromete prevalentemente cães e gatos. O Strongyloides stercoralis cau-
sa doença clínica nos animais jovens, entretanto nos adultos é assintomática. A larva penetra
facilmente na pele dos animais jovens por ser mais delicada. Contrastando com a Estrongiloidose
humana que é de evolução crônica, nos animais induz certa imunidade tornando os animais
467
SOERENSEN & BADINI MARULLI
adultos resistentes. A sintomatologia nos cães leva à perda de apetite, conjuntivite purulenta,
tosse e, em certos casos, a broncopneumonia. Na fase de penetração das larvas, podem-se
observar prurido violento, eritema e alopecia. Após um período aproximado de dez dias, inicia
a manifestação intestinal, caracterizada por diarréia, dores abdominais e vômitos. Nos casos
graves, há desidratação, diarréia sanguinolenta, anemia, podendo levar a óbito.
Nos primatas não humanos o S. fuelleborni pode determinar diarréia intensa, que
pode ser hemorrágica.
Diagnóstico e controle
O encontro de larvas rabditiformes de S. stercoralis nas fézes do homem ou do cão
fecham o diagnóstico. Foi constatada a eliminação intermitente das larvas, portanto,
recomenda-se repetir o exame.
Nos casos graves, de Estrongiloidose generalizada, podem-se observar larvas no exame
direto de escarro; nestes casos há manifestação de tosse e o encontro de larvas de S.
stercoralis no escarro é acompanhado da presença de hemácias.
Quando a infestação é por S. fuelleborni, nas fezes frescas são encontrados ovos
embrionados ao invés de larvas.
A medida de maior importância no controle da doença consiste em reduzir a fonte de
infecção, pelo tratamento adequado do esgoto e de fezes depositadas no solo. O trata-
mento dos pacientes com tiabendazol também se impõe, paralelamente ao uso de calça-
dos e da higiene pessoal.
Qualquer tratamento com imunosupressor deve ser precedido de um exame
parasitológico de fezes e, se o resultado for positivo, será feito o tratamento com
tiabendazol. Os cães, gatos e macacos que se encontrem em contato direto com o ho-
mem devem ser examinados e tratados quando positivos.
Triquinelose
Bruno Soerensen
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Distribuição geográfica
A doença tem distribuição cosmopolita, embora não tenha sido descrita na Austrália
e em vários países latino-americanos, asiáticos e africanos; entretanto, acredita-se que
este fato seja devido simplesmente à ausência de investigação, pois os estudos se limi-
tam somente ao ciclo doméstico como a suínos, rato e homem, esquecendo-se a infec-
ção em animais silvestres.
Ocorrência no homem
Considerando-se que a doença não sempre apresenta manifestação clínica, acredita-
se que a ocorrência seja bem mais ampla. Atualmente tanto a taxa de infecção como a
de morbidade encontram-se em declínio nos países da Europa e das Américas.
Nas Américas a doença foi descrita no Canadá, EUA, México, Venezuela, Chile,
Argentina e Uruguai. Independente dos estudos realizados nos países acima citados,
periodicamente ocorrem surtos de triquinelose na Argentina e no Chile, sendo os
únicos países latino-americanos onde a doença tem importância em Saúde Pública.
A taxa de infestação por 100.000 habitantes em 1976, conforme relato da OPS, foi
de 0,1 na Argentina e 0,5 para o Chile, no Uruguai, no ano de 1943, foi de 3 em
100.000 cadáveres examinados. A morbidade tem diminuído nas últimas décadas e
de maneira geral pode-se afirmar que a triquinelose humana é assinalada em diver-
sos países do mundo, embora com taxas de baixa morbidade.
Ocorrência em animais
A doença foi assinalada em 104 espécies de diferentes mamíferos, sendo 58 em
carnívoros, 27 em roedores, 7 em insetívoros e 12 em outros animais.
Indubitavelmente, os suínos são os de maior interesse do ponto da Saúde Pública,
pois a sua carne e subprodutos são a fonte de infecção para o homem, especialmente
quando os suinos são alimentados com restos de alimento, sem nenhum cozimento tanto
domiciliares como de matadouros.
No Brasil, Paraguai, Equador, Colômbia e Venezuela não foi encontrado o parasita
por meio de exames triquinoscópicos. Na Argentina e no Chile os exames triquinoscópicos
assinalaram índices que variam de 0,14 a 0,33%.
O ciclo doméstico compromete os cães e gatos que, por serem animais carnívoros,
têm maior oportunidade de contaminação; entretanto a sua maior prevalência é em suí-
nos. Os ratos também constituem reservatórios de importância, especialmente aqueles
das áreas rurais quando se alimentam de lixo.
Como reservatórios do T. spiralis, entre carnívoros silvestres, são assinalados no
mundo raposas, lobos, linces, javalies, urso polar, morsas, visões. Na América Latina,
somente na Argentina e no Chile foram realizados estudos em animais silvestres.
A doença no homem
A doença de maneira geral é subclínica ou com manifestações clínicas sem maior
importância.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Diagnóstico
No homem, independentemente do diagnóstico clínico, o apoio laboratorial pode-se cons-
tituir em importante auxílio, assim no quadro hematológico, a eosinofilia, o aumento de
enzimas musculares e eritrosedimentação normal contribuem para o diagnóstico.
A biopsia muscular e a observação das larvas confirmam o diagnóstico.
Atualmente o diagnóstico sorológico com o do floculação com bentonita, a floculação
com colesterol, a aglutinação de látex, a fixação de complemento, a imunofluorescencia
indireta, a hemaglutinação indireta e o sistema imunoenzimático (ELISA) contribuem
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Controle
Consiste no controle e erradicação do problema na suinocultura, exigindo-se que os
alimentos fornecidos aos animais sejam submetidos a 100º C de temperatura. Deve-se
evitar que os suínos se alimentem com desperdício de alimentos e lixo, quando não
submetidos a cozimento.
A carne suína pode-se submeter a cozimento de 77º C ou, ainda, ao congelamento a
-15º C por 20 dias ou a -30º C por 6 dias. As carnes defumadas e desidratadas com sal
não apresentam métodos seguros. Nos países latino-americanos, entre outras formas,
recomenda-se o combate a roedores.
Sarna zoonótica
Bruno Soerensen
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
A doença no homem
Os ácaros instalam-se em galerias no estrato córneo da pele medindo de poucos
milímetros até 2 cm de comprimento, podendo ser observados com lupa, e se situam
preferentemente nos espaços interdigitais, dorso da mão, cotovelos, axilas, região inguinal,
peito, pênis e umbigo. Como sinal importante sempre presente temos o prurido intenso,
especialmente à noite, que obriga o paciente a se coçar predispondo-o a infecções se-
cundárias purulentas.
Nos casos de infestação humana por sarcoptes animais, a evolução é benigna e de
recuperação expontânea. Os casos persistentes podem ser atribuídos a novas
reinfestações.
Diagnóstico e controle
O diagnóstico é feito pelo encontro ao microscópio, do ácaro em raspados de lesões.
É recomendado adicionar ao material de estudo uma gota de uma solução de hidróxido
de potássio que tem como finalidade dar maior transparência às células de descamação.
O diagnóstico específico das infestações homólogas (ácaros próprios da espécie animal)
resulta fácil, entretanto nos casos de infestações heterólogas (ácaros de animal para o
homem) o número de parasitas é extremamente pequeno, portanto, o seu encontro se
torna mais difícil.
O controle da sarna humana de origem animal radica no controle da Sarna nos ani-
mais, com banhos de imersões ou por aspersão. O tratamento com lindano, benzoato de
benzila, entre outros, resulta eficiente tanto no homem como nos animais. O lindano deve
ser aplicado também nos locais onde se albergam os animais.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
Tunguíase
Bruno Soerensen
É uma doença que tende a desaparecer, mas muito conhecida no passado nas
zonas rurais, comprometendo especialmente o homem, o porco e o macaco. O agente
causador é uma pequena pulga com o nome científico de Tunga penetrans. A fêmea
é parasita obrigatório de animais de sangue quente. Esta pequenina pulga penetra na
pele, de preferência nos dedos dos pés, junto às unhas, ou ainda, entre os dedos,
embora possa se localizar em qualquer parte do corpo. A penetração da pulga provoca
um leve e persistente prurido. O parasita se alimenta de sangue e deposita ovos, que
são expulsos pelo orifício que ficou na pele. A seguir, morre e é eliminado, deixando
uma pequena úlcera em forma de cratera que pode sofrer infecções secundárias pu-
rulentas, incluindo-se o Tétano, a Gangrena Gasosa e a Blastomicose. Existem casos
de infestações comprometendo praticamente todos os dedos, levando a uma deforma-
ção dos pés. Os ovos, já expulsos pela abertura da pele, caem ao solo e, se este for
arenoso, dão origem a larvas três a quatro dias depois. Estas larvas sofrem duas mu-
das em aproximadamente 10 a 14 dias e penetram mais profundamente no solo, para
se transformarem em pupas, demorando período igual ao anterior para se transforma-
rem em pulgas adultas. Os novos machos e fêmeas vão parasitar o homem ou os
animais, alimentando-se de sangue. Após a cópula, o macho morre e a fêmea penetra
na pele reiniciando o ciclo.
Distribuição geográfica
A Tunga penetrans é originária das regiões tropicais e subtropicais da América do
Sul, América Central e Caribe. Atualmente, com o uso de inseticidas, a ocorrência da
doença tornou-se rara. É assinalada a introdução da doença em 1872 na África, por um
navio inglês que partiu da América do Sul e descarregou areia nas praias de Angola.
Dali a pulga alcançou a África e Madagascar. A Tunga penetrans também está pre-
sente na Índia e no Paquistão, introduzida possivelmente por trabalhadores que voltaram
a seus lares provenientes da África.
A doença no homem
A doença compromete especialmente as crianças. Os adultos, devido à maior espes-
sura da pele ou, ainda, pelo uso habitual de calçados, são menos comprometidos.
Na Nigéria, num estudo realizado em 373 crianças de 6 a 14 anos, foram encontradas
41,5% infestadas.
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Controle
No homem, há indicação da extração da pulga utilizando-se uma agulha limpa, segui-
da da desinfecção do local. O uso de sapatos diminui consideravelmente a ocorrência da
doença. A aplicação de inseticidas como o DDT elimina as larvas e as pulgas adultas.
Transmissão
A partícula infectante (príon) é composta por moléculas de proteína ou PrP (protein
particles). Estas proteínas são as menores unidades infectantes do príon e são 100 vezes
menores do que o menor vírus conhecido. Os príons são extremamente estáveis e resis-
tentes ao calor, desinfetantes e produtos químicos convencionais. Algumas cepas resis-
tem à aplicação de calor seco de 3600 C por uma hora ou a 1000 C por 8 horas.
Existem várias encefalopatias espongiformes transmissíveis. Todas são infecções
lentas, com períodos de incubação prolongados. Uma vez estabelecidos os sintomas, o
curso da doença é progressivo e sempre fatal. Como exemplos de encefalopatias
espongiformes transmissíveis podem ser citadas: “scrapie” (paraplegia endêmica dos
ovinos e caprinos), FSE (encefalopatia espongiforme dos felinos), Kuru (degeneração
espino-cerebelar, que ocorre em humanos) e CJD (doença de Creutzfeld-Jacob, ou
encefalopatia espongiforme crônica, também de ocorrência no homem), entre outras.
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SOERENSEN & BADINI MARULLI
A doença no homem
Ainda não foi possível, até o momento, demonstrar que uma encefalopatia espongiforme
transmissível humana tivesse origem animal. Pesquisas realizadas na França para esta-
belecer uma relação entre os casos de CJD e “scrapie” não confirmaram nem descar-
taram a possibilidade da contaminação a partir do consumo de carne ou do contato com
ovinos. Sabe-se que a CJD é transmissível, mas o modo natural da infecção é totalmente
desconhecido. A CJD provoca demência progressiva e degeneração dos vacúolos cere-
brais. Sua incidência é de um a dois casos para 1 milhão de pessoas, por ano.
Entre 1994 e 1995 ocorreram 10 casos de doença de Creutzfeld-Jacob em pacientes
com idade média de 27,5 anos, bem menor que a média de idade dos outros pacientes, e
com neuropatologia também diferente da dos outros pacientes. Embora não exista ne-
nhuma evidência científica ligando a encefalopatia espongiforme bovina à CJD, alguns
pesquisadores afirmaram que estes casos estavam interligados. Outros cientistas, no
entanto, discordam e concluem que os casos não estão relacionados.
Diagnóstico
É de suspeita pelo exame clínico dos animais e pelos dados epidemiológicos existen-
tes. A confirmação é feita por meio das lesões características no Sistema Nervoso
Central, observadas no exame anátomo-patológico, ou pelo isolamento da proteína (PrP)
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MANUAL DE SAÚDE PÚBLICA
Controle
Não existe tratamento, nem a perspectiva do desenvolvimento de vacinas.
O risco de transmissão da BSE para o homem parece ser remoto. Entretanto, esta
possibilidade não deve ser inteiramente afastada e as medidas preventivas cabíveis de-
vem ser adotadas. A destruição das vísceras bovinas onde o agente é encontrado (baço,
tecidos linfóides, intestino, cérebro e tecidos nervosos) e a proibição de sua utilização
como matéria-prima para a fabricação de alimentos de uso humano ou animal é a prin-
cipal medida preventiva.
Na Grã-Bretanha, os animais suspeitos são abatidos e, posteriormente, incinerados.
A proibição do uso de carne, ossos e vísceras de ruminantes no processamento de
farinhas utilizadas para a alimentação animal reduziu drasticamente a ocorrência de
novos casos nos últimos anos, o que demonstra a origem alimentar da doença.
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