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Citopatologia e

Citologia Clínica
Autoras: Profa. Juliana Alves Garcia
Profa. Márcia Cristina Pena Figueiredo
Profa. Erika Simone Lopes
Colaboradores: Prof. Flávio Buratti Gonçalves
Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano
Professoras conteudistas: Juliana Alves Garcia /
Márcia Cristina Pena Figueiredo / Erika Simone Lopes

Juliana Alves Garcia

Graduada em Biomedicina pelo Centro Universitário Barão de Mauá (2000-2003) e mestre em Ciências (área de concentração:
Infectologia em Saúde Pública) pelo Programa de Pós-graduação em Ciências da Coordenadoria de Controle de Doenças da Secretaria de
Estado da Saúde (PPG-CCD-SES). Possui habilitação nas áreas de Análise Ambiental, Citologia Oncótica e Patologia Clínica (Análises Clínicas).

Atuou no setor de Microbiologia e Parasitologia do Grupo Fleury (2006-2011), possui curso de Capacitação Profissional em Pesquisa
Clínica pela Invitare Pesquisa Clínica e de Gestão em Saúde pelo CRBM 1/SP (2010), além de formação de Auditor Interno ISO 9001:2008
pela Formato Clínico (2011).

Atualmente, é professora adjunta I e coordenadora auxiliar do curso de Biomedicina, campus Anchieta, na Universidade Paulista.
Desde 2015, leciona na Universidade Paulista para os cursos da graduação de Biomedicina, nas seguintes disciplinas: Biossegurança,
Parasitologia, Parasitologia Clínica, Coleta de Material Biológico, Métodos e Técnicas em Análises Clínicas, Gestão Laboratorial e Controle
de Qualidade, Microbiologia Básica e Interpretação Clínica e Laboratorial.

Márcia Cristina Pena Figueiredo

Biomédica formada pela Universidade de Marília, mestre em Pesquisa e Desenvolvimento (Biotecnologia Médica) pela Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2005) e doutora em Oncologia na Fundação Antônio Prudente - A. C. Camargo Cancer Center
(2014). Atualmente, é docente e coordenadora auxiliar do curso de Biomedicina (Campus Norte) na Universidade Paulista. Desde 2015,
leciona na Universidade Paulista para os cursos da graduação de Biomedicina, nas seguintes disciplinas: Hemoterapia, Hematologia,
Biossegurança, Citopatologia e Citologia Clínica, Biomedicina interdisciplinar, Métodos e Técnicas em Análises Clínicas.

Erika Simone Lopes

Graduada em Ciências Biológicas (Modalidade Médica) pela Centro Universitário Barão de Mauá (1999), habilitada em Análises Clínicas
e Citologia Oncótica, mestre pela Universidade Estadual de Campinas (2007). Atuou como citologista no Laboratório de Citopatologia do
CAISM/Unicamp (2002/2008). Atualmente, é prestadora de serviço para o Laboratório de Patologia na área de citopatologia diagnóstica.
No ambiente universitário, foi coordenadora de curso de Biomedicina da Universidade Paulista, Campus Jundiaí (2007-2013). Como
docente universitária, ministra aulas nas disciplinas de Citologia, Histologia e Embriologia, Citopatologia, Fisiopatologia, Reprodução
Humana, Biossegurança.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

G216c Garcia, Juliana Alves.

Citopatologia e Citologia Clínica / Juliana Alves Garcia, Márcia Cristina


Pena Figueiredo, Erika Simone Lopes. – São Paulo: Editora Sol, 2020.

136 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230.

1. Citopatologia. 2. Cérvico-vaginal. 3. Vias respiratórias. I. Garcia,


Juliana Alves. II. Figueiredo, Márcia Cristina Pena. III. Lopes, Erika Simone.
IV. Título.

CDU 576.385

U508.49 – 20

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
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Vice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcello Vannini
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Deise Alcantara Carreiro – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Talita Lo Ré
Giovanna Oliveira
Sumário
Citopatologia e Citologia Clínica

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................9
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................9

Unidade I
1 HISTÓRICO E IMPORTÂNCIA DA CITOPATOLOGIA EM MEDICINA PREVENTIVA.
CONTEXTUALIZAÇÃO DO LABORATÓRIO DE CITOPATOLOGIA............................................................ 11
1.1 Histórico e importância da citopatologia na biomedicina................................................... 11
1.2 Histórico e importância da citopatologia em medicina preventiva................................. 13
1.3 Contextualizando o laboratório de citopatologia.................................................................... 15
1.3.1 Controle de qualidade dos exames citopatológicos:
avaliação pré-analítica e tipos das amostras.......................................................................................... 23
1.3.2 Transporte................................................................................................................................................... 25
1.3.3 Critérios de aceitação e rejeição de amostras.............................................................................. 25
2 ANATOMIA DO APARELHO GENITAL FEMININO................................................................................... 28
2.1 Histologia do aparelho genital feminino..................................................................................... 30
2.1.1 Vulva............................................................................................................................................................. 30
2.1.2 Vagina........................................................................................................................................................... 30
2.1.3 Ovários e tubas uterinas....................................................................................................................... 31
2.1.4 Útero............................................................................................................................................................. 31
3 COLETA E PROCESSAMENTO DE MATERIAL PARA EXAME CITOPATOLÓGICO.......................... 34
3.1 Coleta de Papanicolau......................................................................................................................... 34
3.1.1 Preparação da lâmina para o exame citopatológico................................................................. 36
3.1.2 Coleta de material em meio líquido................................................................................................. 38
3.2 Colorações de Papanicolaou e coloração de Shorr................................................................. 40
4 ANÁLISE DA CITOPATOLOGIA CÉRVICO-VAGINAL EM DIVERSAS CONDIÇÕES....................... 41
4.1 Análise da citopatologia cérvico-vaginal em condições
hormonais basais, pré-menarca, gravidez e menopausa.............................................................. 42
4.1.1 Pré-menarca.............................................................................................................................................. 42
4.1.2 Gravidez....................................................................................................................................................... 44
4.1.3 Menopausa................................................................................................................................................. 44
4.2 Padrões citológicos nas diferentes fases da vida da mulher............................................... 45
4.3 Análise da citopatologia cérvico-vaginal em condições inflamatórias,
infecciosas (bacterianas, fúngicas, infecções por protozoários)................................................ 47
4.3.1 Infecções bacterianas............................................................................................................................. 48
4.4 Análise da citopatologia cérvico-vaginal em condições de
infecções virais (herpes, HPV).................................................................................................................. 51
4.4.1 Tipos de HPV.............................................................................................................................................. 52
4.4.2 Manifestações clínicas da infecção pelo HPV.............................................................................. 54
4.4.3 Características citológicas da infecção pelo HPV....................................................................... 55
4.4.4 Outros métodos diagnósticos na detecção pelo HPV............................................................... 56
4.4.5 HPV e vacinas............................................................................................................................................ 56

Unidade II
5 CLASSIFICAÇÕES DO EXAME CITOPATOLÓGICO CÉRVICO-VAGINAL........................................... 64
5.1 Classificação de Papanicolau............................................................................................................ 64
5.2 Classificação de Reagan..................................................................................................................... 64
5.3 Classificação de Richart...................................................................................................................... 64
5.4 Classificação de Bethesda.................................................................................................................. 65
5.5 Nomenclatura brasileira para laudos citopatológicos cervicais......................................... 69
5.5.1 Tipos de amostra...................................................................................................................................... 70
5.5.2 Adequabilidade da amostra................................................................................................................. 70
5.5.3 Material examinado, dentro dos limites de normalidade....................................................... 71
5.5.4 Alterações benignas das células (ativas ou reparativas).......................................................... 71
5.5.5 Presença de metaplasia escamosa imatura no resultado....................................................... 71
5.5.6 Anormalidades (atipias) celulares..................................................................................................... 71
5.5.7 Anormalidades de células escamosas.............................................................................................. 72
5.5.8 Anormalidades de células glandulares endocervicais............................................................... 72
5.5.9 Alterações em células escamosas...................................................................................................... 73
6 ACHADOS ENCONTRADOS NO EXAME CITOPATOLÓGICO CÉRVICO-VAGINAL....................... 75
6.1 Células escamosas atípicas................................................................................................................ 75
6.2 Células glandulares atípicas.............................................................................................................. 76
6.3 Graduação das lesões cérvico-vaginais........................................................................................ 77
6.3.1 Lesão intraepitelial escamosa de baixo grau................................................................................ 77
6.3.2 Lesão intraepitelial escamosa de alto grau (NIC 3/carcinoma in situ)............................... 78
6.4 Neoplasias malignas cérvico-vaginais.......................................................................................... 79
6.4.1 Carcinoma escamoso (epidermoide) invasor................................................................................ 79
6.4.2 Adenocarcinoma endocervical in situ............................................................................................. 80
6.4.3 Adenocarcinoma endocervical invasivo......................................................................................... 81
6.4.4 Adenocarcinoma endometrial............................................................................................................ 82
6.5 Outros métodos diagnósticos complementares à citopatologia cérvico-vaginal...... 83
6.5.1 Citologia em meio líquido.................................................................................................................... 83
6.5.2 Reação de cadeia de polimerase (PCR)........................................................................................... 85
6.5.3 Captura híbrida......................................................................................................................................... 86
6.5.4 Imuno histoquímica................................................................................................................................ 86
Unidade III
7 CITOPATOLOGIA E VIAS RESPIRATÓRIAS: ANATOMIA E HISTOLOGIA
DO SISTEMA RESPIRATÓRIO............................................................................................................................ 91
7.1 Células do pulmão................................................................................................................................ 92
7.2 Coleta e confecção dos esfregaços................................................................................................ 94
7.2.1 Punção......................................................................................................................................................... 94
7.2.2 Escovados.................................................................................................................................................... 96
7.2.3 Lavados........................................................................................................................................................ 97
7.2.4 Materiais obtidos espontaneamente............................................................................................... 97
7.3 Tipos de amostras.................................................................................................................................. 98
7.3.1 Adequabilidade das amostras............................................................................................................. 99
7.4 Análise da citologia normal do sistema respiratório e citopatologia
neoplásica do sistema respiratório........................................................................................................ 99
7.4.1 Cânceres pulmonares de pequenas células.................................................................................100
7.4.2 Cânceres pulmonares de células não pequenas........................................................................101
8 CITOPATOLOGIA DA MAMA: ANATOMIA E HISTOLOGIA DA MAMA...........................................103
8.1 Coleta e confecção dos esfregaços, análise da citologia normal da
mama e citopatologia neoplásica da mama....................................................................................106
8.1.1 Carcinoma in situ...................................................................................................................................108
8.1.2 Carcinoma invasor.................................................................................................................................109
8.1.3 Carcinoma ductal................................................................................................................................... 110
8.2 Citopatologia do trato urinário: anatomia e histologia do trato urinário..................110
8.2.1 Coleta e confecção dos esfregaços................................................................................................ 112
8.2.2 Análise da citologia normal do trato urinário e citopatologia
neoplásica do trato urinário......................................................................................................................... 113
APRESENTAÇÃO

Esta disciplina tem como objetivo atualizar você, aluno, possuindo grande aplicabilidade no diagnóstico
de doenças, especialmente na detecção de lesões cancerosas. A citologia oncótica tem por objetivo
analisar as células de forma individualizada, intervindo na detecção de células anormais. Para um
diagnóstico confiável, por meio da técnica de citologia, são fundamentais a realização de uma coleta
de material adequada, a preparação correta das lâminas e uma análise fidedigna do material. A área de
citologia oncótica é uma importante área de atuação, porém ainda é pouco difundida, o que justifica
nosso interesse no presente tema.

Ao término deste estudo, o futuro graduado deverá: compreender o processo de citopatologia


clínica (esfoliativa ou oncótica) nas diversas doenças que acometem os seres humanos; identificar
e compreender o processo de coleta e as análises de material cérvico-vaginal e de outros materiais
celulares de qualquer tecido ou área do corpo humano por meio de métodos, marcações e colorações
padronizadas; compreender o diagnóstico das principais doenças infecciosas e as principais formas
malignas e benignas de lesões que ocorrem no trato genital feminino, bem como a prática laboratorial
de citologia esfoliativa.

Bons estudos!

INTRODUÇÃO

A presente disciplina tem como base aprender os recursos de apoio diagnóstico em citopatologia e
de interpretação de exames patológicos e normais utilizados no laboratório.

Este livro-texto disponibiliza, assim, o conhecimento de técnicas e orientações necessárias na rotina


em serviço de citopatologia, além de explicações referentes a uma adequada coleta de materiais e
interpretação de resultados e noções de escrutínio e interpretações dos exames citopatológicos dos
diversos sistemas estudados.

Ao final desta disciplina, esperamos que você seja capaz de realizar uma análise dessas condutas e
interferir, de forma eficaz, na compreenção no processo de citopatologia clínica (esfoliativa ou oncótica)
nas diversas doenças que acometem os seres humanos, atuando de modo relevante na promoção e
orientação da saúde.

9
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

Unidade I
1 HISTÓRICO E IMPORTÂNCIA DA CITOPATOLOGIA EM MEDICINA PREVENTIVA.
CONTEXTUALIZAÇÃO DO LABORATÓRIO DE CITOPATOLOGIA

1.1 Histórico e importância da citopatologia na biomedicina

A Biomedicina começou no Brasil em 1966. Desde seu início, o curso passou por inúmeras mudanças
curriculares, ampliando as suas habilitações e qualificando seus profissionais na área de saúde. Pela
primeira vez, a categoria biomédica contribui para um projeto interministerial (MEC/MS), fundamental
para o sucesso dos programas de saúde no país e da própria formação profissional (CFBM, [s.d.]b).

A atuação dos biomédicos com os órgãos governamentais (Ministério da Educação, Ministério do


Trabalho), a classe política (Câmara dos Deputados e Senado Federal) e a busca dos seus direitos culminou
na Exposição Interministerial (Saúde, Educação, Trabalho), que elaborou o Projeto de Lei n. 1660/75.
O resultado fez com que a categoria despontasse forte e coesa, vendo sua pretensão materializada nas
leis n. 6684/79 e n. 6686/79 (e sua posterior alteração com a Lei n. 7135/83, que permitiu a realização
de análises clínicas aos portadores de diploma de Ciências Biológicas – Modalidade Médica, bem como
aos diplomados que ingressaram no curso em vestibular realizado até julho de 1983); no Decreto
n. 88.394/83, que regulamentou a profissão e a atuação dos Conselhos Federal e Regionais de
Biomedicina; e na Resolução n. 86 do Senado Federal, de 24 de junho de 1986, ratificando o acordo
realizado no Supremo Tribunal Federal, assegurando definitivamente o direito do profissional biomédico
de exercer as análises clínico-laboratoriais.

Hoje a Biomedicina tem 30 habilitações, entre elas a citopatologia oncótica, conforme resoluções
n. 78 (CFBM, 2002a) e n. 83 (CFBM, 2002b), de 29/04/2002, do Conselho Federal de Biomedicina, e está
referendada como profissão da área da saúde de acordo com a Resolução n. 287 do Conselho Nacional
de Saúde/Ministério da Saúde e pelo Ministério da Educação (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1998).

Segundo o Manual do Biomédico (CRBM1, 2017) disponibilizado pelo Conselho Regional de


Biomedicina Primeira Região, a habilitação em citologia oncótica vem cada vez mais abrindo
possibilidades para o aprimoramento e crescimento profissional do biomédico. Para a área de citologia,
as disciplinas relacionadas são anatomia humana, anatomia patológica, fisiologia humana, embriologia,
citologia, biologia celular, histologia e química geral e para a competência profissional, realizar a
avaliação citológica do material esfoliativo (citologia esfoliativa), ou seja, realizar coleta de material
cérvico-vaginal/microflora e leitura da respectiva lâmina.

Na anatomia patológia, o biomédico tem condições de realizar os seguintes procedimentos:


macroscopia, microtomia, diagnósticos histoquímicos e imuno-histoquímicos, técnicas de biopsias de
congelação, técnicas de necropsia, diagnóstico molecular e processamento das amostras histopatológicas.
11
Unidade I

Na citologia esfoliativa, o estudo é das células esfoliadas ou desprendidas de um tecido de revestimento.


Trata-se de exame de alta especificidade, alta sensibilidade, baixo custo, rapidez e facilidade de execução,
dispensando anestesia prévia. Exemplo: a técnica de Papanicolau, aliada aos conhecimentos profissionais,
possibilita excelência na avaliação do grau de alteração do epitélio escamoso cervical e tem ajudado a
diminuir a incidência de câncer de colo uterino (CFBM, 2009).

A Resolução n. 78 (CFBM, 2002a), de 29 de abril de 2002, que dispõe sobre o ato profissional biomédico,
fixa o campo de atividade do Biomédico e cria normas de Responsabilidade Técnica. No Capítulo II,
artigos 2 e 3, é dito que, para o reconhecimento das habilitações elencadas, além da comprovação em
currículo, deverá o profissional comprovar a realização de estágio mínimo, com duração igual ou superior
a 500 horas, em instituições oficiais, ou particulares, reconhecidas pelo órgão competente do Ministério
da Educação ou em laboratórios conveniados com instituições de nível superior, ou especialização ou
curso de pós-graduação reconhecido pelo MEC. Segundo o artigo 7, os biomédicos poderão realizar
toda e qualquer coleta de amostras biológicas dos diversos exames, assim como supervisionar os
respectivos setores de coleta de material biológicos de qualquer estabelecimento a que isso se destine
– excetuam-se as biopsias, coleta de líquido céfalo-raquidiano (líquor) e punções para obtenção de
líquidos cavitários em qualquer situação. O texto dispõe ainda sobre o rol de atividades para fins
de inscrição e fiscalização dos profissionais biomédicos, técnicos, tecnólogos nas áreas de acupuntura,
estética, citologia e anatomia patológica e imagenologia, junto aos conselhos regionais de biomedicina.
Nessa normativa, estão descritas todas as atividades que o biomédico poderá realizar, entre elas:

• Metodologias em citopatologia:

— Colheita de cérvico-vaginal, preparo das amostras e metodologias de coloração.

— Técnicas avançadas em citopatologia.

— Citologia em meio líquido, imunocitoquímica, colorações especiais, biologia molecular (análise


genômica e proteômica).

• Diagnóstico citopatológico:

— Citologia cérvico-vaginal.

— Citologia mamária.

— Citologia de derrames cavitários e líquido cefalorraquiano.

— Citologia do trato respiratório (escarro e lavados).

— Citologias urinárias, citologia anal.

— Citologia de produto de punção aspirativa, raspados e escovados.

12
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

— Citologia de diversos sítios.

— Controle da qualidade interna e externa.

— Gestão em laboratório de citologia e anatomia patológica.

— Gerenciamento de programas de prevenção e saúde pública.

— O profissional biomédico tem responsabilidade pela análise das amostras citológicas, bem como
por firmar o respectivo laudo.

1.2 Histórico e importância da citopatologia em medicina preventiva

O desenvolvimento da citologia está associado com o desenvolvimento das lentes ópticas e sua combinação
para construir o microscópio composto. Em 1665, Robert Hooke, por meio de lentes de aumento, observou
que fragmentos de cortiça eram compostos de pequenas cavidades em formato poliédrico, as quais foram
denominadas células. Essa foi a primeira vez que tal terminologia foi utilizada. A partir das constatações de
Hooke, outros pesquisadores reproduziram a mesma informação (ROBERTIS; HIB, 2001).

A partir dessas descobertas, o avanço da citologia foi rápido. Quando observamos a história da
biologia celular no século passado e no início deste, vemos que o conhecimento se desenvolveu em
função de dois motivos principais: primeiro, pelo aumento do poder de resolução dos instrumentos
de análise e pelo desenvolvimento de novas tecnologias; segundo, pela convergência da citologia com
outros ramos de investigações biológicas, como genética, fisiologia, bioquímica e imunologia.

George Papanicolau nasceu em 13 de maio de 1883, na Grécia. Especializou-se em música e


humanidades pela Universidade de Antenas, mas seu pai, médico, estimulou-o a seguir medicina.
Formando-se na Faculdade de Medicina em 1904, após cumprir o serviço militar como cirurgião,
retornou à sua cidade natal para cuidar de pacientes com lepra. Apesar da carreira médica, sonhava
em se estabelecer como pesquisador e, em 1910, recebeu o título de PhD em Zoologia na Universidade
de Munique. No ano seguinte foi morar em Mônaco e trabalhou como fisiologista no famoso Instituto
Oceanográfico. Durante a Guerra dos Bálcãs, em 1912, retornou ao serviço militar. Em 1913, já casado,
emigrou com sua esposa para Nova York, com poucos recursos e sem dominar o inglês. A esposa foi
trabalhar como costureira, e o médico-cientista, como vendedor de tapetes. Posteriormente, trabalhou
num jornal grego e tocou violino em restaurantes até conseguir emprego na Faculdade de Medicina
da Cornell University. Estudou o ciclo reprodutivo, utilizando o esfregaço da secreção vaginal em
porquinhos-da-índia, tendo observado ao microscópio uma grande variedade de formas celulares
diretamente relacionadas à fase do ciclo. Em 1917, Papanicolau descobriu como ocorria o processo de
ovulação, o que também o levou a relatar que existiam variações de padrões e sequências citológicas
diferentes que determinavam o ciclo ovariano e menstrual. Em 1920, ele elaborou uma técnica para
estudar as células vaginais e do colo uterino, denominada método de citologia esfoliativa, a qual ainda
hoje é utilizada no combate ao câncer de colo uterino. Devido à época em que expôs seu trabalho,
apesar de a metodologia se mostrar eficaz, ela não foi completamente aceita, visto o preconceito e
o temor da exposição feminina. Anos depois, sua técnica passou a ser considerada uma ferramenta
13
Unidade I

excepcional para a detecção precoce do câncer cervical, o que se repete até os dias de hoje (CARVALHO;
QUEIROZ, 2010).

Em 1925 ele identificou células cancerígenas no esfregaço vaginal de uma voluntária. Diante da
relevância da descoberta, examinou outras mulheres sabidamente com câncer de útero, confirmando
esse diagnóstico no esfregaço vaginal. Apresentou sua técnica simples e eficaz em 1928, mas seu trabalho
foi desprezado pelos dez anos seguintes. Em 1939, conseguiu iniciar o exame do esfregaço vaginal
em mulheres no Hospital de Nova York, detectando um número considerável de cânceres precoces.
Papanicolau passou a próxima década lutando para provar o valor dos testes e treinando técnicos
e patologistas para interpretar esses esfregaços. No seu trabalho “O valor diagnóstico do esfregaço
vaginal no diagnóstico do câncer do útero”, publicado em 1941 no American Journal of Obstetrics
and Gynecology (PAPANICOLAOU; TRAUT, 1941), demonstrou os diferentes tipos de células malignas
encontrados em pacientes com câncer. Humildemente escreveu que ainda não tinha encontrado uma
prova diagnóstica infalível, mas sabia que sua experiência estava de acordo com o resultado das biopsias
(PAPANICOLAOU; TRAUT, 1941). Alguns eminentes ginecologistas reagiram à publicação, sugerindo que
o exame não estava sendo usado em nenhum serviço de ginecologia. Vida dura desse humanista, que
preferiu a penumbra de seu laboratório aos holofotes, isso porque ele buscava fazer algo digno de um
homem ético e forte, e não a riqueza. Nesse mesmo ano, Papanicolaou criou a primeira terminologia
(classe I, II, III, IV e V) para classificar células normais e diferentes tipos de alterações citológicas
encontradas na cérvice. Não desanimou e continuou ensinando a importância de um trabalho sério,
dedicado e baseado na disciplina. Escreveu mais de 150 artigos científicos, recebeu diversos prêmios,
tendo sido indicado por cinco vezes ao Nobel de Medicina, nunca tendo ficado clara a razão de jamais
ter sido o escolhido. Tornou-se professor emérito da Cornell, em 1951, e dez anos depois foi dirigir o
Instituto do Câncer de Miami, mas faleceu três meses após, devido a um infarto do miocárdio.

O teste de Papanicolau é um dos avanços mais consideraveis no controle do câncer, sendo 13 de


maio, dia do nascimento de Papanicolau, consagrado como o Dia Mundial do Citopatologista. Desde
a implantação do rastreamento do câncer de colo uterino pelo exame de Papanicolau, vários países,
entre eles o Brasil, conseguiram reduzir drasticamente a taxa de mortalidade. Na década de 1980, o
médico alemão Harald zur Hausen demonstrou a relação do papilomavírus humano (HPV) com o câncer
de colo do útero e, em 2008, ganhou o prêmio Nobel de Medicina. Devido a sua descoberta, surgiu
o desenvolvimento de vacinas profiláticas para o HPV. Na expectativa de diminuir a incidência e a
mortalidade pelo câncer de colo do útero, nos últimos anos o Ministério da Saúde implantou programas
voltados à saúde da mulher com foco na prevenção do câncer do colo uterino, através de diagnóstico
precoce, profilaxia e também da vacina contra HPV inserida no calendário nacional de vacina para
jovens. O câncer do colo do útero é causado pela infecção persistente por alguns tipos do HPV. No Brasil,
representa um grande problema de saúde pública e, segundo as estimativas do Instituto Nacional de
Câncer (Inca), é o terceiro tumor maligno mais frequente na população feminina e a quarta causa de
morte em mulheres. Ainda segundo dados do Inca, estima-se que ocorram no Brasil cerca de 20 mil novos
casos de câncer de colo uterino, com um índice de mortalidade estimado em 6 mil casos (INSTITUTO
NACIONAL DO CÂNCER, 2018). Apesar dos avanços no diagnóstico de lesões com potencial de evolução
cancerosa, o exame de citologia oncótica, popularmente conhecido como Papanicolau, continua a ser
o exame de melhor custo benefício para identificar casos que necessitam de encaminhamento para
colposcopia e biopsia (ELEUTÉRIO et al., 2004; TUON et al., 2002).
14
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

A citologia oncótica é a análise microscópica das características das células de nosso corpo em
qualquer localização, a fim de detectar lesões tumorais. É um método de rastreamento do câncer de
colo uterino utilizado desde 1950 em diversos países na busca de alterações cervicais em mulheres
sexualmente ativas (MÜLLER; MAZIERO, 2010). A citologia oncótica possui sua importância na prevenção
e no diagnóstico do câncer de colo uterino como um exame simples e barato que tem a capacidade de
detectar lesões pré-neoplásicas do colo do útero, possibilitando ao clínico intervir no desenvolvimento
do carcinoma invasor (ressaltando que a citologia oncótica também é utilizada para rastreamento de
outros tipos de cânceres que não o uterino).

1.3 Contextualizando o laboratório de citopatologia

O laboratório clínico que realiza exames citopatológigos deve estar limpo, bem iluminado e bem
ventilado. A área de preparação de amostras deve estar separada daquela onde espécimes são avaliados,
e os microscópicos binoculares devem ser de boa qualidade, em quantidade suficiente e sob um contrato
de serviço de manutenção periódica. A organização dos móveis, como mesas e cadeiras dos citologistas,
deve ser bem planejada para garantir conforto aos profissionais e preservá-los de riscos ergonômicos.
Todos os programas de estabelecimentos assistenciais de saúde devem ser compatíveis com a disposição
de normas – particularmente, a RDC n. 50/2002 (ANVISA, 2002) –, além de atender a todas as outras
prescrições adequadas ao objeto de uma padronização estabelecida em códigos, leis, decretos, portarias
e normas federais, estaduais e municipais (HINRICHSEN, 2018).

A RDC n. 302 (ANVISA, 2005) dispõe sobre o regulamento técnico para o funcionamento de
laboratórios clínicos. Do ponto de vista ético e legal, essa RDC é de grande importância para a área
laboratorial, pois normatiza e oferece uma diretriz mínima, a qual os laboratórios são obrigados a seguir.
Teoricamente, os laboratórios devem cumprir metas mínimas de qualidade, organização e preços.

A fase imediatamente anterior à coleta de sangue para exames laboratoriais, definida na RDC n. 302
como a fase que se inicia com a solicitação da análise, passando pela obtenção da amostra e finalizando
quando se inicia a análise propriamente dita, deve ser objeto de atenção por parte de todas as pessoas
envolvidas no atendimento dos pacientes, com a finalidade de prevenir a ocorrência de falhas ou a
introdução de variáveis que possam comprometer a exatidão dos resultados.

Agora, vamos aos pontos principais sobre a RDC n. 302. Essa resolução é aplicável a todos os serviços
públicos ou privados que realizam atividades laboratoriais na área de análises clínicas, patologia clínica
e citologia. Suas condições gerais são:

• Organização:

— O laboratório clínico e o posto de coleta devem possuir alvará atualizado expedido pelo órgão
sanitário competente.

— O laboratório e o posto de coleta devem possuir um responsável técnico legalmente habilitado


(farmacêutico, médico e biomédico).

15
Unidade I

— O profissional legalmente habilitado poderá ser o responsável técnico de apenas dois locais
(laboratório e posto de coleta).

— Todo laboratório clínico e posto de coleta deve estar inscrito no Cadastro Nacional de
Estabelecimentos de Saúde (CNES).

— Toda a supervisão e a responsabilidade pelo laboratório e pelo posto de coleta, em relação


à organização, à confidencialidade, ao treinamento de pessoal etc., caberão à direção e ao
responsável técnico.

— O laboratório e o posto de coleta devem dispor de instruções escritas das rotinas e informações
aos clientes.

• Recursos humanos:

— Devem ser mantidos os registros de formação e qualificação dos profissionais compatíveis com
as funções desempenhadas.

— O laboratório deve promover treinamento e educação permanente aos funcionários e manter


o registro.

— Os profissionais devem ser vacinados contra hepatite B, tétano e difteria.

— A admissão deve ser precedida do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO).

— Deve-se realizar anualmente o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA).

• Infraestrutura:

— A infraestrutura deve obedecer à RDC n. 50 (ANVISA, 2002) e à RDC n. 189 (ANVISA, 2003).

• Processos operacionais:

— O laboratório e o posto de coleta devem disponibilizar ao paciente instruções escritas ou


verbais, em linguagem acessível, orientando-o bem.

— O laboratório e o posto de coleta devem exigir um documento oficial com foto do paciente no
momento do atendimento.

— Devem ser estabelecidos critérios para aceitação e rejeição de amostras.

— São exigidas várias informações para o cadastro dos pacientes: nome, idade, sexo, telefone,
contato (quando menor de idade), anotação de medicamentos utilizados e data prevista para
entrega de resultados.
16
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

— É obrigatória a identificação do nome do funcionário que efetuou a coleta.

— Devem ser realizadas as instruções para o recebimento e a coleta de amostras.

— Devem ser realizadas as instruções escritas para o transporte das amostras.

— Deve-se evitar o transporte de amostras em áreas comuns de circulação.

— A terceirização do transporte deve ter contrato formal.

— O laboratório e o posto de coleta devem dispor de uma lista de exames e atividades realizados
naquela unidade.

— O laboratório deve monitorar a fase analítica por meio de controle interno e externo da qualidade.

— O laboratório deve manter o cadastro dos laboratórios de apoio, possuir contrato formal e
avaliar a sua qualidade.

— O laboratório deve manter contrato formal com os laboratórios de apoio, bem como indicar
quais exames são enviados.

— O laboratório de apoio deve estar de acordo com a resolução de responsabilidade de quem contrata.

— Os laudos devem ser arquivados por cinco anos.

— Os testes laboratoriais remotos (TLR) devem estar vinculados a um laboratório.

— O responsável técnico pelo laboratório é também responsável por todos os TLR realizados
dentro da instituição, mesmo em unidade móvel.

— A realização de TLR está condicionada à liberação do laudo.

• Equipamentos e instrumentos:

— O laboratório deve possuir equipamentos de acordo com a sua complexidade e sua demanda.

— Devem ser mantidas as instruções escritas referentes aos equipamentos em língua portuguesa.

— Deve haver o registro de manutenções preventivas e corretivas.

— Os equipamentos de medição devem ser calibrados.

— Deve haver o registro de temperatura.

17
Unidade I

— Deve ser registrada a compra de produtos para diagnósticos, a fim de garantir a rastreabilidade.

— Os produtos para diagnósticos devem estar registrados na Agência Nacional de Vigilância


Sanitária (Anvisa).

• Biossegurança:

— Devem ser disponibilizadas para os funcionários instruções escritas de biossegurança.

— Deve haver instruções de uso de equipamento de proteção individual (EPI) e equipamento de


proteção coletiva (EPC).

— Deve haver o manuseio e o transporte de material biológico.

— Instruções para limpeza e desinfecção devem ser escritas.

— Os saneantes usados para o processo de limpeza devem estar regularizados pela Anvisa.

• Controle de qualidade:

— Os controles de qualidade interno e externo devem ser documentados.

— O controle interno deve ser realizado com as amostras de soros, que são controles comerciais
e regularizados pela Anvisa.

— Formas alternativas são aceitas desde que descritas na literatura e que permitam a avaliação
da precisão do equipamento.

— O laboratório deve manter o registro dos controles internos.

• Controle externo:

— O laboratório deve participar dos ensaios de proficiência para todos os exames realizados na
sua rotina.

— Os resultados devem ser anotados, e devem ser tomadas providências quando houver
não conformidades.

— O laboratório clínico deve participar dos ensaios de proficiência para todos os exames realizados
na sua rotina.

— Para os exames não contemplados pelos programas do ensaio de proficiência, o laboratório deve
adotar formas alternativas de controle externo de qualidade descritas na literatura científica.

18
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

• Liberação de laudos:

— O laboratório deve possuir uma instrução escrita sobre a liberação de laudos.

— O laudo deve ser legível e assinado por um profissional legalmente habilitado (farmacêutico,
biomédico ou patologista).

— Um laudo deve conter dados mínimos: nome do exame, tipo de amostra, método analítico,
unidade de medição, valores de referência, limitações da técnica e dados para interpretação.

— Amostras com restrição devem constar no laudo.

A RDC n. 306/2004 (ANVISA, 2004b) é um regulamento técnico que dispõe sobre o gerenciamento
de resíduos de serviços de saúde, abrangendo não somente o lixo infectante, mas todas as categorias de
resíduos, inclusive os não infectantes.

O regulamento se aplica a todos os geradores de resíduos de serviços de saúde (RSS). Todo gerador
de resíduos deve elaborar, assim, um plano de gerenciamento de resíduos de serviços de saúde (PGRSS),
que deve ser baseado na característica dos resíduos gerados e na sua classificação. A seguir, destacamos
alguns pontos da RDC n. 306.

• O transporte interno de resíduos deve seguir o roteiro definido e ser feito em horários não
coincidentes com fluxo de pessoas ou atividades.

• O transporte deve ser feito de acordo com o grupo de resíduos.

• Os recipientes para o transporte de resíduos devem ser providos de tampa articulada ao próprio
corpo do equipamento e rodas, além de serem identificados com o símbolo de acordo com os
resíduos neles contidos.

• Compete aos serviços de saúde a elaboração do PGRSS.

• Deve ser requerida às empresas prestadoras de serviços terceirizadas (empresas de recolhimento


de resíduos) a apresentação de licença ambiental para o tratamento ou a disposição dos resíduos de
serviços de saúde.

• Devem ser solicitados aos órgãos públicos responsáveis pela execução da coleta: transporte,
tratamento ou disposição final dos resíduos e documentação que identifique a conformidade
com as orientações dos órgãos de meio ambiente.

• Deve ser mantido o registro de operações de venda e/ou doação dos resíduos destinados à reciclagem.

A RDC n. 306 classificou os resíduos em cinco grupos: A, B, C, D e E. Os resíduos do Grupo A são


separados em:
19
Unidade I

• A1: culturas e estoque de micro-organismos, meios de cultura, materiais para inoculação de


culturas, resíduos de vacinação, sobras de amostras de laboratórios, entre outros.

• A2: carcaças, peças anatômicas, vísceras e outros resíduos provenientes de animais, cadáveres de
animais, peças de anatomopatológicos, entre outros.

• A3: peças anatômicas humanas (membros), produto de fecundação sem sinais vitais com peso
menor que 500 gramas, estatura menor que 25 cm ou idade inferior a 20 semanas e que não
tenha sido requerido pelos seus familiares.

• A4: sobras de amostras de laboratórios, recipientes com fezes, urina, secreção, peças de
anatomopatológicos, peças anatômicas, vísceras e bolsas transfusionais vazias.

• A5: materiais biológicos de indivíduos ou animais com suspeita ou certeza de contaminação


com príons.

Já o Grupo B, de resíduos de produtos químicos, se organiza da seguinte forma:

• Resíduos químicos que apresentam risco à saúde ou ao meio ambiente, quando não forem
submetidos ao processo de reutilização, recuperação ou reciclagem, devem ser submetidos a
tratamento ou disposição final específicos.

• Resíduos químicos que não representam risco à saúde ou ao meio ambiente não necessitam
de tratamento, podendo ser submetidos a processos de reutilização, recuperação ou reciclagem.
Devem ser encaminhados para sistemas de disposição final de licenciamento.

• Resíduos no estado líquido podem ser lançados na rede coletora de esgoto ou em corpo receptor
desde que atendam às diretrizes estabelecidas pelos órgãos ambientais e gestores de recursos
hídricos e saneamento competentes.

• Os resíduos químicos dos equipamentos automáticos de laboratórios clínicos e dos reagentes


de laboratórios clínicos, quando misturados, devem ser analisados pelo maior risco ou conforme
as instruções contidas na ficha de informações de segurança de produtos químicos (FISPQ) e
tratados conforme o item 11.2 ou 11.18 da RDC.

Quanto ao Grupo C, cabe saber:

• Diz respeito a rejeitos radioativos, inclusive sobras de alimentos provenientes de pacientes


submetidos a terapia com iodo radioativo.

• O recipiente com rodas de transporte interno de rejeitos radioativos, além das especificações
contidas em RDC, deve possuir um sistema de blindagem com tampa para acomodação de sacos
de rejeitos radioativos, devendo ser monitorado a cada operação de transporte e submetido à
descontaminação, quando necessário. Independentemente de seu volume, não poderá possuir
20
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

válvula de drenagem no fundo. Deve, ainda, conter a identificação com inscrição, símbolo e cor
compatíveis com o resíduo do Grupo C.

Com relação aos resíduos do Grupo D, vale ressaltar:

• Para os resíduos do Grupo D, destinados à reciclagem ou reutilização, a identificação deve ser


feita nos recipientes e nos abrigos de guarda de recipientes utilizando-se o código de cores e suas
correspondentes nomeações, baseadas na Resolução Conama n. 275/2001 (CONAMA, 2001), e
símbolos do tipo de material reciclável:

— Azul: papéis.

— Amarelo: metais.

— Verde: vidros.

— Vermelho: plásticos.

— Marrom: resíduos orgânicos.

• Para os demais resíduos do Grupo D, deve ser utilizada a cor cinza nos recipientes.

• Caso não exista processo de segregação para reciclagem, não haverá exigência para a padronização
de cor dos recipientes.

• São admissíveis outras formas de segregação, acondicionamento e identificação dos recipientes


desses resíduos para fins de reciclagem, de acordo com as características específicas das rotinas
de cada serviço, devendo estar contempladas no PGRSS.

Sobre os resíduos do Grupo E, é necessário saber:

• Trata-se de materiais perfurocortantes.

• Devem ser acondicionados em recipientes rígidos, resistentes à punctura, à ruptura e ao vazamento,


e com tampa, além de serem devidamente identificados.

• É proibido reencapar agulhas.

• O abrigo de resíduos deve ser de alvenaria, revestido de material liso, impermeável, lavável e de
fácil higienização, com aberturas para ventilação, com tela de proteção contra insetos, roedores
e vetores.

• Os serviços geradores de resíduos de saúde devem manter o programa de educação continuada.

21
Unidade I

A RDC n. 222/2018 (ANVISA, 2018) é a nova resolução que dispõe sobre o gerenciamento dos
resíduos de serviços de saúde, após ser revogada a RDC n. 306/2004 (ANVISA, 2004b), com a qual os
profissionais de saúde trabalharam nas instituições de saúde do país nos últimos 14 anos. Geralmente,
as mudanças impulsionadas no gerenciamento de RSS são relativas a uma gestão tanto mais didática
quanto mais objetiva em relação à RDC n. 306/2004, com menor citação de outros normativos. Vejamos,
resumidamente, alguns itens importantes.

No início, mais precisamente no Capítulo I, Seção I, Artigo 2º, em que se descreve a finalidade de
dimensão da Resolução, destaca-se:

Esta Resolução se aplica aos geradores de resíduos de serviços de saúde –


RSS cujas atividades envolvam qualquer etapa do gerenciamento dos RSS,
sejam eles públicos e privados, filantrópicos, civis ou militares, incluindo
aqueles que exercem ações de ensino e pesquisa (ANVISA, 2018).

Os tipos de serviços de saúde e de ensino, para os quais a legislação atua, não eram descritos na RDC
n. 306/2004 (ANVISA, 2004b).

Outro ponto de destaque, ainda nesse Artigo 2º, refere-se à amplitude de quem são os geradores
de RSS agora incluídos: “serviços de piercing e salões de beleza e estética” (ANVISA, 2018). É muito
oportuna a inclusão desses dois serviços, considerando que o risco à saúde é específico às atividades
que desenvolvem.

Agora, na nova RDC, pode ser compartilhado o local chamado expurgo para o armazenamento
temporário dos RSS. Porém, só é permitido para os resíduos dos Grupos A, D e E, e a área deverá ser
compatível com os três tipos de resíduos.

Outra novidade na atual RDC é a especificação dos tipos de resíduos armazenados nesse “abrigo
temporário de RSS” compartilhado com a “sala de utilidades” ou “expurgo”, os quais não eram citados
anteriormente. A RDC n. 222 traz algumas modificações, principalmente com relação ao Grupo A (mais
especificamente aos subgrupos A1, A2 e A3): todas as descrições de tratamento e acondicionamento desses
tipos de resíduos estão muito resumidas. Nesse sentido, a nova RDC apresenta um texto mais genérico.

Quanto ao Grupo B, a legislação exclui qualquer citação sobre a geração de resíduos das atividades
assistenciais domiciliares, item que era pontuado na RDC anterior (capítulo VI, “Manejo de RSS”).

No que concerne ao Grupo C, há a reestruturação de todos os itens sobre resíduo radioativo, e as


características dos recipientes para acondicionamento não são mais descritas na atual legislação.

No que se refere ao Grupo D, fica excluída a simbologia de cores para segregação dos diferentes tipos
de resíduos desse grupo, a qual era contemplada na RDC n. 306. Um ponto positivo, por outro lado, é
a inclusão, nesse grupo, do “descarte dos equipamentos de proteção individual (EPIs), desde que não
contaminados por matéria biológica, química ou radioativa” (ANVISA, 2018), algo que não era descrito
na RDC anterior.
22
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

Destaca-se, ainda, na nova resolução, a ampliação da lista dos tipos de resíduos que podem ser
classificados como tais, como as forrações de animais de biotérios sem risco biológico associado, os
resíduos recicláveis sem contaminação biológica, química e radiológica associada e os pelos de animais,
não citados na legislação anterior.

Por fim, no Grupo E, também eliminou-se qualquer citação sobre a geração de resíduos das
atividades assistenciais domiciliares, o que, mais uma vez, é um ponto muito negativo na assistência
de saúde domiciliar. Ainda nesse grupo dos perfurocortantes, a nova RDC retira o segundo critério
– “nível do preenchimento deve ficar a 5 cm de distância da boca do recipiente” –, estabelecido para o
nível de preenchimento dos recipientes de acondicionamento desse material (ANVISA, 2004b), ficando
apenas com um único critério e sendo alterado (era 2/3) aquele que menciona: “devem ser substituídos
de acordo com a demanda ou quando o nível de preenchimento atingir 3/4 (três quartos) da capacidade”
(ANVISA, 2018).

A RDC n. 222 também descreve que seringas e agulhas podem ser desconectadas, desde que com o
auxílio de dispositivo de segurança, mantendo a proibição anterior de desconexão de seringas e agulhas
de forma manual.

Em linhas gerais, a nova RDC (ANVISA, 2018) exclui a citação de todas as outras legislações paralelas
a ela, as quais eram referidas na RDC n. 306, como o Conama, a ABNT e o Ministério do Trabalho,
substituindo-as sempre pelo termo “conforme normas ambientais vigentes” etc. Quanto à disposição
final dos RSS, também genericamente se refere sempre ao termo “disposição final ambientalmente
adequada”. O capítulo relacionado à saúde ocupacional foi bastante resumido na atual legislação.

1.3.1 Controle de qualidade dos exames citopatológicos: avaliação pré-analítica e tipos


das amostras

O controle da qualidade nessa fase analisa o registro do material recebido, a preparação, a coloração
e a montagem das lâminas, a manutenção dos equipamentos e microscópios, bem como os registros de
informações de pessoal, sua qualificação e seu treinamento (CERVIX..., 2005).

O primeiro passo é o preenchimento correto do formulário de requisição do exame citopatológico


com letra legível e com todas as informações relacionadas aos dados pessoais e da Unidade de Saúde
corretos. Todas as amostras (ou materiais) dos pacientes devem ser identificadas de modo que se possa
fazer, se necessário, uma rastreabilidade (MOTTA; CORRÊA; MOTTA, 2001).

Para realizar o cadastro do paciente, é obrigatório solicitar um documento com foto que afirme a
sua identificação. O cadastro em questão deve conter as seguintes informações: número interno de
identificação do paciente no laboratório; nome do paciente; idade ou data de nascimento; procedência
(se paciente ambulatorial ou hospitalar); telefone; endereço; data e horário de cadastro; nome do
profissional solicitante; exames solicitados e tipo de amostras (SBPC/ML, 2010).

No setor de recepção e cadastro das amostras, deve-se observar cuidadosamente a compatibilidade


das informações do formulário de requisição de exame citopatológico, padronizado pelo Ministério da
23
Unidade I

Saúde para as ações de controle do câncer do colo do útero com a identificação obrigatória das lâminas
e, se possível, nos frascos ou recipientes contendo as amostras. Devem ser anotadas as condições do
material (lâmina quebrada, ausente, sem requisição etc.). As lâminas e as requisições devem ser entregues
juntamente com uma listagem em duas vias contendo o nome das mulheres. O profissional da recepção
deve conferir, datar e assinar as vias de listagem e devolver uma das vias ao portador para ser arquivada
(INCA, 2016).

Segundo o Manual de Gestão da Qualidade para Laboratório de Citopatologia, (INCA, 2016), as


amostras, após coletadas e fixadas de forma adequada, devem ser acondicionadas corretamente. Os
recipientes usados para a acomodação do material dependem do tipo do fixador utilizado, por exemplo:
caixas de papelão, madeira ou plástico são apropriadas para o transporte das lâminas fixadas com
fixador de cobertura e tubetes com tampa de rosca para os esfregaços fixados em álcool, com tubetes
individualizados para cada paciente, sendo desaconselhado o uso de recipientes contendo várias lâminas
separadas por clipes.

Tavares et al. (2007) recomendam, para garantir a rastreabilidade, que o laboratório deve dispor de
um sistema de informática que permita a identificação da hora do recebimento e também a da coleta
da amostra, além do nome do funcionário que realizou a coleta ou recebeu a amostra, identificando-a
por ordem numérica e anual, para localizar facilmente todo o seu caminho dentro do laboratório, desde
a recepção até a emissão do laudo. O sistema de qualidade deve conter os requisitos para avaliar a
qualidade desde a recepção até o tempo de entrega do resultado do exame. Por isso, é importante
observar o atendimento da recepção, realizar pesquisas de opinião sobre o atendimento, oferecer urnas
para coleta de informações sobre satisfação do cliente, utilizar gráficos para demonstrar a quantidade e
a fequência de solicitação de novas amotras de queixas sobre a clareza dos resultados.

A Sociedade Brasileira de Citologia Clínica e a Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (2001)


sugerem se devem se treinar os profissionais envolvidos no desenvolvimento de tarefas para facilitar
e garantir a qualidade do produto (laudo citopatológico), bem como o desempenho de todos aqueles
que coordenam e executam as tarefas, sendo necessário elaborar um conjunto de procedimentos e
instruções de trabalhos específicos da especialidade da citopatologia.

De acordo com a Resolução n. 1472/97 do Conselho Federal de Medicina (CFM, 2007), as lâminas
de exames citopatológicos (negativas ou positivas para malignidade) devem ser mantidas em arquivo
por cinco anos no próprio laboratório ou entregues ao paciente ou a seu responsável legal devidamente
orientados quanto a sua conservação e mediante comprovante que deverá ser arquivado durante o
período anteriormente mencionado. Quanto aos laudos diagnósticos, eles poderão ser arquivados
indefinidamente em arquivo informatizado. As lâminas devem ser arquivadas em ordem numérica,
sendo aconselhável um arquivo independente para lâminas positivas e negativas, para facilitar a sua
pesquisa e resgate quando solicitado pela paciente.

Para a segurança do arquivo, é necessário o acesso restrito a esse setor, com protocolo de entrada e
saída das lâminas. A solicitação das lâminas pela paciente deve ser atendida e registrada em documento
específico, no qual deve constar, de modo claro, a transferência e a responsabilidade pela guarda da lâmina.

24
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

1.3.2 Transporte

O laboratório deverá oferecer, por escrito, instruções para o transporte de amostras, respeitando
a especificidade de cada material biológico, com condições de temperatura, conservação, integridade
e estabilidade da amostra, bem como utilizar recipiente de amostras isotérmico, impermeável e
higienizável, identificado com a simbologia de risco biológico e com nome do laboratório ou posto de
coleta responsável. As amostras devem ser coletadas, fixadas corretamente e enviadas ao laboratório
para a realização dos exames citopatológicos. Antes da coleta, a retirada do excesso de secreção do colo
do útero evita o aparecimento de fatores ofuscados, como esfregaços com áreas espessas inadequadas
à avaliação citopatológica (MICKEE, 1997).

Para o transporte de esfregaços fixados com fixadores úmidos (etanol a 96%), esses devem permenecer
individualmente em seus respectivos tubetes, os quais devem ser acondicionados em embalagens que
garantam não derramar ou evaporar o fixador. As amostras fixadas com álcool a 96% mantêm-se em
boa conservação por uma ou mais semanas. Já aquelas que utilizam fixadores e camada (propilenoglicol
e etanol) conservam-se por apenas uma semana. As amostras em meio líquido podem ser armazenadas
em tempertura ambiente por até 60 dias, sendo o pellet estável por até 14 meses (TAKAHASHI, 1973;
DIGENE, 2002).

As amostras a serem enviadas a laboratórios distantes do local da coleta devem ser fixadas
com fixadores de cobertura (propilenoglicol ou smiliar) à temperatura ambiente e acondicionadas
individualmente em pequenas caixas de papelão, corretamente identificadas com o nome da paciente
e da unidade responsável pelo encaminhamento. Devem ser seguidas as normas de biossegurança
no transporte desses materiais, assim como em casos de intercorrências no transporte de amostras
biológicas devem-se seguir os protocolos de urgência e emergência (CONSOLARO; ENGLER, 2016).

Observação

Se houver algum acidente durante o transporte das caixas com o material


fixado, se o prejuízo for a perda do material por quebra da lâmina, por
exemplo, o funcionário deverá recolher as lâminas com luvas apropriadas
para evitar ferimento. As amostras líquidas devem ser transportadas em
caixas térmicas para evitar mudança de temperatura.

1.3.3 Critérios de aceitação e rejeição de amostras

Em caso de rejeição da amostra na fase pré-analítica, deve-se fazer o registro das inconformidades,
pois o relato da inadequação da amostra é um procedimento fundamental na busca da qualidade
(KHAWALI, 2012).

Devem ser rejeitadas as amostras que não estejam em conformidade com os critérios mínimos
necessários para a realização da análise do exame citopatológico, listados a seguir:

25
Unidade I

• Dados ilegíveis na identificação da amostra.

• Falta de identificação ou identificação incorreta da amostra.

• Divergência entre as informações da requisição e da lâmina.

• Lâminas quebradas.

• Requisições não padronizadas de acordo com as recomendações do Ministério da Saúde.

• Ausência de dados referente à anamnese e ao exame clínico.

• Ausência de identificação e assinatura do profissional responsável pela coleta.

• Ausência do nome e/ou CNES do serviço de saúde responsável pela coleta.

A descrição da rejeição da amostra é um procedimento fundamental, podendo, sempre que possível,


ser corrigido ou providenciada nova coleta. Deve ser destacado ainda que a rejeição de um material
significa um gasto sem resultado e que todo o esforço feito pela mulher para realizar o exame foi
perdido (MILLER et al., 2000).

Segundo o manual técnico para prevenção do câncer do colo do útero (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2002), a amostra colhida, ao ser examinada no laboratório, será classificada em: amostra insatisfatória;
amostra satisfatória, mas limitada; amostra satisfatória.

Uma amostra será considerada insatisfatória quando houver:

• ausência de identificação na lâmina ou na requisição;

• lâmina quebrada ou com material mal fixado;

• células escamosas bem preservadas cobrindo menos de 10% de superfície da lâmina;

• obscurecimento por sangue, inflamação, áreas espessas, má fixação, dessecamento etc., que
impeçam a interpretação de mais de 75% das células epiteliais.

Nesses casos, não é possível obter diagnóstico e por isso o exame deve ser repetido.

Uma amostra será considerada satisfatória, mas limitada, quando houver:

• falta de informações clínicas pertinentes;

• ausência ou escassez de células endocervicais ou metaplásicas representativas da junção


escamocolunar (JEC) ou da zona de tranformação;
26
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

• esfregaço purulento, obscurecido por sangue, áreas espessas, dessecamento etc., que impeçam a
interpretação de, aproximadamente, 50% a 70% das células epiteliais.

Para o Ministerio da Saúde (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013), a adequabilidade da amostra, na atual


nomenclatura citológica brasileira, é definida como satisfatória ou insatisfatória. O termo anteriormente
utilizado, “satisfatório, mas limitado”, foi abolido (INCA, 2006a).

É considerada insatisfatória a amostra cuja leitura esteja prejudicada pelas razões expostas a
seguir, algumas de natureza técnica e outras de amostragem celular, podendo ser assim classificada
(MARTIN‑HIRSCH, 2010):

• material acelular ou hipocelular (menos de 10% do esfregaço);

• leitura prejudicada (mais de 75% do esfregaço) por presença de: sangue, piócitos, artefatos de
dessecamento, contaminantes externos ou intensa superposição celular.

Nesse caso, a recomendação é que a mulher repita o exame entre 6 e 12 semanas com correção,
quando possível, do problema que motivou o resultado insatisfatório.

Segundo o Ministério da Saúde (2013), amostra satisfatória para avaliação corresponde à amostra
que apresenta células em quantidade representativa, bem distribuídas, fixadas e coradas, de tal modo que
sua observação permita uma conclusão diagnóstica. Podem estar presentes células representativas dos
epitélios do colo do útero: células escamosas; células glandulares (não inclui o epitélio endometrial);
células metaplásicas.

No caso de gestantes, mulheres na pós-menopausa, mulheres histerectomizadas, sem história de


atividade sexual ou imunossuprimidas, os critérios de aceitação e rejeição de amostras requerem outros
tipos de recomendações. Segundo as Diretrizes brasileiras para o rastreamento do câncer do colo do
útero (INCA, 2011b), as recomendações para gestantes (a periodicidade e faixa etária) são as mesmas
que para as demais mulheres, devendo sempre ser considerada uma oportunidade a procura ao serviço
de saúde para realização de pré-natal.

Para mulheres na pós-menopausa, recomenda-se serem rastreadas de acordo com as orientações


para as demais mulheres. Se necessário, deve-se proceder à estrogenização previamente à realização da
coleta. O rastreamento citológico em mulheres menopausadas pode levar a resultados falso-positivos
causados pela atrofia secundária ao hipoestrogenismo, gerando ansiedade na mulher e procedimentos
diagnósticos e terapêuticos desnecessários.

A recomendação para mulheres submetidas à histerectomia total por lesões benignas, sem história
prévia de diagnóstico ou tratamento de lesões cervicais de alto grau, pode ser excluída do rastreamento,
desde que apresentem exames anteriores normais. Em casos de histerectomia por lesão precursora ou
câncer do colo do útero, a mulher deverá ser acompanhada de acordo com a lesão tratada.

27
Unidade I

Lembrete

Quando se tem uma amostra insatisfatória, deve-se orientar a paciente


a repetir o exame entre 6 e 12 semanas com correção, quando possível, do
problema que motivou o resultado insatisfatório.

2 ANATOMIA DO APARELHO GENITAL FEMININO

O trato genital feminino é constituído pelos órgaõs genitais externos e pela vulva; os internos, pela
vagina, pelo útero, pelas tubas uterinas (trompas de Falópio) e pelos ovários, que estão especificados
no interior da cavidade pélvica. A genitália externa contém um conjunto de formações que protegem o
orifício externo da vagina e o meato uretral ou urinário. Pode ser dividido nas seguintes partes: clitóris,
vestíbulo, pequenos e grandes lábios.

Tuba uterina Epitélio do


endométrio
Ovário

Útero

Epitélio
Canal endocervical
endocervical
Ectocérvice
Vagina

Epitélio
Junção escamoso
escamocolunar

Figura 1 – Estruturas do sistema reprodutor feminino

A vulva forma os genitais externos do trato genital feminino, e se estende desde o monte de Vênus
até a região do períneo. É formada pelo monte de Vênus, pelos grandes e pequenos lábios, pelo clitóris,
prepúcio, vestíbulo, meato uretral, glândulas de Bartholin e de Skene (parauretrais) e pelo introito (óstio)
vaginal, onde está localizado o hímen (CONSOLARO; ENGLER, 2016).

A vagina é um órgão tubular musculomembranoso que se estende do óstio externo do útero até o
vestíbulo da genitália externa, com comprimento que varia de 7 cm a 9 cm. Tem como missão concender
a passagem do feto durante o parto, a descamação do sangue do fluxo menstrual mensal e a penetração
do pênis na relação sexual. Estruturalmente é formada por uma parede composta de três camadas: a
mucosa, a muscular e a adventícia. O clitóris, o bulbo do vestíbulo e as glândulas anexas são estruturas
acessórias que compõem o sistema genital feminino e são de vital importância na sexulidade feminina
e na produção das secreções mucocervicais.
28
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

Os ovários são as gônadas femininas, que mostram variações de tamanho de acordo com cada
indivíduo ou com a fase do ciclo menstrual em que se encontram. Estão situados na cavidade pélvica,
um de cada lado do útero, e interligados pelas trompas uterinas. São incumbidos da produção dos
hormônios sexuais femininos (progesterona e estrógeno), assim como da produção do gameta feminino.

As tubas uterinas são as estruturas que ligam o útero aos ovários, através das fímbrias. Podem
ser distribuídas em quatro partes: a intramural, o istmo, a ampola e o infundíbulo. Suas paredes são
formadas por três camadas: a mucosa, a muscular e a serosa, que irão promover sua função de captar o
ovócito liberado pelo ovário e conduzi-lo na direção do útero.

O útero é o órgão responsável por receber o óvulo fecundado, nutri-lo e protegê-lo para que o feto
se desenvolva apropriadamente. O útero é formado por três camadas: a mais interna, ou endométrio,
que é revestida por uma mucosa responsável pela produção do muco; a média, ou miométrio, que é
constítuida por uma espessa parede, rica em fibras musculares lisas e em fibras colágenas; e a mais
externa, ou perimétrio, que é uma camada serosa (BARROS et al., 2012).

Fundo do útero Tuba uterina

Corpo do útero

Endométrio

Ovário

Colo do útero

Figura 2 – Estrutura do útero

O colo uterino é definido por dois orifícios conhecidos como: óstio interno, que fica em contato com
o istmo do útero, e o óstio externo, que se liga com o canal vaginal. A parede do colo do útero é formada
por duas camadas: a endocérvice e a ectocérvice. Internamente, o útero é um órgão oco, fibromuscular,
e suas dimensões variam de acordo com idade, estimulação hormonal e número de gestações.

O útero é dividido em: corpo do útero, região que demonstra maior volume e apresenta forma triangular;
colo do útero, região mais estreita, em forma de canal, conhecida como canal cervical ou cérvice; istmo do
útero, que é a região que se encontra na parte inferior do corpo do útero; fundo do útero, região que fica
acima do eixo que liga as duas implantações das tubas uterinas (BARROS et al., 2012).

29
Unidade I

Colo do útero

Área de Parede
ampliação vaginal Visão do
Abertura no examinador
Ovário direito Ovário esquerdo cervix para (inferior) do
o útero colo do útero

Miométrio
Endométrio

Útero
Colo do
útero
Vagina

Figura 3 – Esturtura do útero

2.1 Histologia do aparelho genital feminino

2.1.1 Vulva

O monte de Vênus, localizado à frente pubiana, é rico em tecido adiposo e recoberto por pelos.
Os grandes lábios são formados por duas pregas espessas de pele, também cobertos por pelos, e se
expandem do monte de Vênus até o períneo. Os pequenos lábios estão localizados entre os grandes
lábios e duas pregas menores de pele, demonstrando ausência de pelos. Seu epitélio é estratificado
pavimentoso queratinizado, assim como a face interna dos grandes lábios e o clitóris, estrutura erétil
e que apresenta inúmeras terminações nervosas. O vestíbulo é onde se localiza a entrada da vagina. As
glândulas Skene estão localizadas em ambos os lados do meato urinário. Por fim, localizadas, uma a
cada lado do vestíbulo, existem as glândulas de Bartholin, também chamadas de glândulas vestibulares
menores (CONSOLARO; ENGLER, 2016).

2.1.2 Vagina

A parede vaginal é formada por três camadas: mucosa interna; constituída de epitélio
pavimentoso estratificado; uma mucosa muscular intermediária, composta de musculo liso; e uma
camada externa, de tecido conjuntivo denso. O epitélio da camada mucosa contém glicogênio e
está dividido nas seguintes camadas: basal (uma camada de células), parabasal (de duas a cinco
camadas de células), intermediária e superficial, com número de camadas variável. Abaixo desse
epitélio, localiza-se a lâmina própria, formada por tecido conjuntivo, fibras elásticas, nervos e
alguns vasos sanguíneos. Durante o período de amamanetação e na pós-menopausa, esse epitélio
sofre atrofia e tem seu número de camada celulares reduzido. A parede não possui glândulas,
mas a superfície da mucosa é mantida úmida pelo muco secretado pelas glândulas uterinas, pelas
glândulas endocervicais e pelas glândulas de Bartholin, no vestíbulo. O epitélio vaginal responde

30
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

às mudanças cíclicas durante o ciclo menstrual, sendo a diferenciação estimulada por estrógenos
(JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2008).

2.1.3 Ovários e tubas uterinas

Os ovários são revestidos por um epitélio simples cúbico intercalado com áreas de epitélio
pavimentoso. A túnica albugínea fica logo abaixo desse epitélio e se define pela presença de tecido
conjuntivo denso sem vasos, pois são nessas estruturas medulares e corticais que encontramos as células
intersticiais (ou de Leydig) responsáveis pela produção dos hormônios sexuais através dos estímulos das
gonadotrofinas. A região medular do ovário é formada por tecido conjuntivo frouxo, vasos sanguíneos
e células hilares (intersticiais); e a região cortical é rica em folículos ovarianos (ovócitos), corpo-lúteo e
células intersticiais (BARROS et al., 2012).

A parede das tubas é formada por uma camada mucosa, sustentada pela própria lâmina, uma
camada muscular e uma camada serosa. O epitélio de revestimento das tubas uterinas é cilíndrico,
simples, com células ciliadas e secretoras, que respondem ao controle hormonal. A presença de cílios,
junto com os movimentos peristálticos das tubas uterinas, auxilia no impulso do ovócito em direção ao
útero (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2008).

2.1.4 Útero

O colo uterino é revestido por epitélios escamosos e colunares estratificados não queratinizados.
Esses dois tipos de epitélio ficam na junção escamocolunar. A parede do colo do útero é formada
por duas camadas: a endocérvice e a ectocérvice. A endocérvice é uma camada mucosa, formada por
um epitélio colunar simples mucossecretor, que é responsável pela produção do muco cervical; e a
ectocérvice é constituída por um epitélio escamoso estratificado não queratinizado, que se assemelha
ao da vagina. A ligação da ectocérvice e da endocérvice recebe o nome de junção escamocolunar (JEC),
podendo ter sua localização alterada de acordo com o estado hormonal, gestacional, parto vaginal e/ou
trauma (BARROS et al., 2012).

Epitélio escamoso estratificado não queratinizado

Frequentemente, uma área grande da ectocérvice está recoberta por um epitélio escamoso
estratificado não queratinizado que contém glicogênio. É opaco, tem múltiplas (de 15 a 20) camadas de
células e é de coloração rosa pálido. Esse epitélio é nativo da área formada durante a vida embrionária,
e é denominado epitélio escamoso original ou nativo, ou pode ter sido recém-formado como epitélio
escamoso metaplásico no início da vida adulta.

A composição histológica do epitélio escamoso do colo uterino revela, ao fundo, uma única camada
de células basais arredondadas com grandes núcleos de coloração escura e citoplasma escasso, unida à
membrana basal. As células basais dividem-se e maturam para formar as próximas camadas chamadas de células
parabasais, que também têm núcleos relativamente grandes. As células das camadas intermediária e superficial
possuem grande quantidade de glicogênio em seu citoplasma (SELLORS; SANKARANARAYANAN, 2004).

31
Unidade I

Epitélio colunar

O canal endocervical é recoberto pelo epitélio colunar (às vezes denominado epitélio glandular). É constítuido
por uma única camada de células altas com núcleos de coloração escura próxima à membrana basal. Por ter uma
só camada de células, tem uma altura menor que o epitélio escamoso estratificado do colo uterino (SELLORS;
SANKARANARAYANAN, 2004; BARROS et al., 2012).

Junção escamocolunar

A junção escamocolunar apresenta-se como uma linha bem definida com um degrau, em razão
da distinção de altura dos epitélios escamoso e colunar. A localização da junção escamocolunar com
associação ao orifício cervical externo varia durante a vida da mulher por motivos como idade, estado
hormonal, trauma ao nascimento, uso de anticoncepcionais orais e certas condições fisiológicas, como
gravidez. A junção escamocolunar visível durante a infância, a perimenarca, após a puberdade e o início
do período reprodutivo, é denominada junção escamocolunar original, porque reproduz a junção entre
o epitélio colunar e o epitélio escamoso “original” formado durante a embriogênese a e vida intrauterina
(CONSOLARO; ENGLER, 2016; BARROS et al., 2012).

Zona de transformação

A região que se estende entre a JEC original e a funcional denomina-se zona transformação. Esse
espaço é revestido por epitélio escamoso metaplásico, produtor de glicogênio que se forma a partir da
proliferação das células de reserva. As células metaplásicas são cuboides, subcolunares e indiferenciadas.
Sua origem não está bem estabelecida, mas acredita-se que se formem a partir do epitélio cilíndrico,
em resposta ao pH ácido vaginal. A identificação da zona de transformação durante a coleta do exame
citológico é de grande importância, pois é nessa região que se estabelece a maioria das lesões precursoras
do câncer de colo do útero (CONSOLARO; ENGLER, 2016).

A seguir são explicitadas as características das células do epitélio escamoso quando observadas nos
esfregaços cérvico-vaginais (BARROS et al., 2012).

Células basais

Essas células são diferentemente vistas nos esfregaços cérvico-vaginais de mulheres com atrofia
intensa na pós-menopausa ou quando há ulceração da mucosa. As células basais correspondem às
menores células epiteliais, tendo mais ou menos o tamanho de um leucócito. A sua forma é redonda ou
oval, com citoplasma escasso, corado fortemente em azul ou verde. O núcleo é redondo, central, com
cromatina grosseiramente granular igualmente distribuída, às vezes revelando um pequeno nucléolo.
Essas células usualmente descamam em pequenos agrupamentos.

Células parabasais

Essas células são raras nos esfregaços de mulheres na fase reprodutiva, é possível ocorrerem distúrbios
hormonais e casos de erosão ou ulceração da mucosa. Por outro lado, prevalecem em situações de
32
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

deficiência estrogênica (epitélio atrófico), como na infância, na lactação e na menopausa. As células


parabasais com 15 a 20 micrômetros são bem maiores que as células basais, arredondadas ou ovaladas,
com citoplasma denso, cianofílico (corado em azul ou verde), parcialmente escasso. O núcleo redondo
ou ovalado mede entre 8 e 13 micrômetros, ocupando cerca de metade do volume da célula. A cromatina
é granular, sem evidência de nucléolo.

Células intermediárias

São as células mais gerais nos esfregaços cérvico-vaginais no período pós-ovulatório do ciclo
menstrual, durante a gravidez e no início da menopausa. A sua ascendência é relacionada à ação da
progesterona ou aos hormônios adenocorticais. O tamanho das células intermediárias varia de
30 a 60 micrômetros, e o citoplasma é abundante, transparente, poligonal e cianofílico, com uma
coloração menos intensa do que aquela observada nas células parabasais. As células intermediárias
mostram tendência a pregueamento das bordas citoplasmáticas. Os núcleos dessas células são vesiculares,
medindo cerca de 10 a 12 micrômetros, redondos ou ovais, com membrana cromatínica ou borda
nuclear claramente visível e cromatina finamente granular regularmente distribuída com cromocentros.
O corpúsculo de Barr (cromatina sexual) é eventualmente identificado.

As células naviculares representam uma variante das células intermediárias. Elas são elipsoides, com
bordas citoplasmáticas espessadas e ricas em glicogênio, que se cora habitualmente em castanho. Os
núcleos são excêntricos. As células naviculares são comuns na gravidez e podem aparecer em outras
condições em que há acentuado estímulo progestacional.

Células superficiais

Representam as células mais comuns em esfregaços cérvico-vaginais no período ovulatório do ciclo


menstrual, após terapêutica estrogênica e nas pacientes com tumor ovariano funcionante (produtor
de estrógeno). O tamanho dessas células varia de 40 a 60 micrômetros, são poligonais, o citoplasma
é transparente, eosinofílico, e apresentam núcleo picnótico. O núcleo picnótico é caracterizado pela
condensação da cromatina que se torna escura. O diâmetro nuclear raramente excede 5 micrômetros.
Logo que a total maturação do epitélio ocorre como resultado da atuação dos estrógenos, a picnose
nuclear em células maduras superficiais representa a evidência morfológica da atividade estrogênica.
A propriedade do citoplasma de corar em rosa é relacionada a sua afinidade química com a eosina, um
corante ácido utilizado na técnica de Papanicolau. Contudo, a coloração eosinofílica não é específica,
e o citoplasma pode assumir as cores azul ou verde. No citoplasma das células superficiais, podem ser
vistos grânulos pequenos (grânulos querato-hialinos) escuros, considerados precursores de queratina,
que, contudo, não é produzida em condições normais.

Para diferenciar uma célula intermediária de uma superficial é fundamental a análise da estrutura
nuclear. Enquanto o núcleo da célula intermediária é vesicular com cromatina delicada uniformemente
distribuída e cromocentros (condensações de cromatina), o núcleo da célula superficial é picnótico, ou
seja, com cromatina condensada, sem evidência de granulação.

33
Unidade I

Superficial

Intermediária

Parabasal

Basal

Figura 4 – Epitélio escamoso estratificado da ectocérvice

3 COLETA E PROCESSAMENTO DE MATERIAL PARA EXAME CITOPATOLÓGICO

3.1 Coleta de Papanicolau

Segundo o Manual de Citopatologia Diagnóstica (GAMBONI; MIZIARA, 2013), as condições para a


coleta de uma amostra citológica que apresente requisitos ideais de avaliação são: o exame não deve
ser efetuado durante a menstruação ou antes de 3 dias após o fim do último período menstrual; nas
48 horas anteriores ao exame, a paciente não deve ter feito duchas vaginais, ter tido relações sexuais
ou ter utilizado absorventes internos, cremes, espermicidas ou medicamentos pela via vaginal, assim
como não deve ter sido submetida a procedimentos ginecológicos (colposcopia, ecografia transvaginal,
endoscopia ginecológica ou histeroscopia). Se a paciente estiver com amenorreia ou na menopausa,
o exame pode ser executado a qualquer momento. Em caso de realização de biópsia ou outro tipo de
manobra no colo uterino, é preciso esperar, pelo menos, 20 dias antes de efetuar a coleta.

O Manual Técnico para o Cuidado do Câncer do Colo do Útero (BRASIL, 2002), sugere que o primeiro
passo é o preenchimento apropriado da ficha do pedido do exame citopatológico com letra legível
e com todos os dados pertinentes da paciente e da Unidade de Saúde. A técnica de coleta deve ser
adequadamente executada na ectocérvice e na endocérvice, com o uso da espátula de Ayres e da
escovinha tipo Campos da Paz, representadas, respectivamente, na figura a seguir.

Figura 5 – Espátula de Ayres e escovinha tipo Campos da Paz

34
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

Segundo o procedimento de coleta do espécime proposto pelo Manual de Citopatologia Diagnóstica


(GAMBONI; MIZIARA, 2013), antes da coleta, é necessário contar com o pedido para o estudo, no qual deve
constar a identidade da paciente e os dados clínicos relevantes. Também é preciso ter lâminas rotuladas. A
paciente deve estar em posição ginecológica, permitindo a colocação do espéculo para visualizar todo o colo
do útero sem o uso de lubrificantes. A zona de transformação pode ser prontamente visualizada ou estar
muito alta e não ser visível; isso varia de pessoa para pessoa e resulta de mudanças hormonais, como a atrofia.

O epitélio endocervical deslocado ou invertido, que invade a ectocérvice, fica sujeito a condições adversas
presentes na cavidade vaginal, podendo sofrer agressão por agentes biológicos, como bactérias, fungos e vírus
ou por agentes físicos ou químicos, transformando-se, aos poucos, em epitélio escamoso. Esse procedimento
é chamado de metaplasia, e a área que passou por esse processo chama-se zona de transformação.

O espéculo vaginal sem lubrificante (para evitar contaminação da amostra) é introduzido para a
visualização do colo. Depois de retirar com algodão o excesso de muco, secreção ou sangue, a espátula
de Ayres é apoiada no canal endocervical, sendo executado um raspado na junção escamocolunar
através de movimento de rotação de 360º. A amostra do fundo de saco posterior da vagina também
é obtida através de raspado, com a extremidade romba da espátula de Ayres. A espátula é deixada em
repouso sobre o espéculo e imediatamente é realizada a colheita do material endocervical. A escovinha
designada especialmente para essa finalidade é inserida através do orifício cervical externo, sendo
executada uma rotação completa no canal que pode ser finalizada com um movimento de vai e vem,
com cuidado para não traumatizar a mucosa, evitando sangramento (BARROS et al., 2012).

Figura 6 – Materiais necessários para coleta do citopatológico

A) B) C)

Figura 7 – Etapas da colheita tríplice de amostras cérvico-vaginais: a) colheita do fundo


de saco posterior da vagina, b) colheita da ectocérvice, c) colheita da endocérvice

35
Unidade I

Saiba mais

Conheça mais sobre métodos de diagnóstico tradicionais e modernos


por meio dos documentos indicados a seguir.

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n. 63, de 12 de dezembro de 2019.


Torna pública a decisão de incorporar a citologia em meio líquido para o
rastreamento de câncer de colo de útero e lesões precursoras, no âmbito do
Sistema Único de Saúde - SUS. Brasília: Ministério da Saúde, 2019. Disponível em:
https://www.cosemsrn.org.br/wp-content/uploads/2019/12/portaria
63.pdf. Acesso em: 30 maio 2020.

CONSELHO NACIONAL DE INCORPORAÇÃO DE TECNOLOGIA NO SUS


(CONITEC). Citologia em meio líquido para rastreamento de câncer de colo
do útero e lesões precursoras. Brasília: Ministério da Saúde, 2019. Disponível
em: http://conitec.gov.br/images/Relatorios/2019/Relatrio-Citologia-em-
Meio-Lquido_FINAL_497_2019.pdf. Acesso em: 31 maio 2020.

3.1.1 Preparação da lâmina para o exame citopatológico

Segundo o Controle dos cânceres do colo do útero e da mama (BRASIL, 2013), para coleta na
ectocérvice, utiliza-se a espátula de Ayres do lado que apresenta reentrância. Deve-se encaixar a ponta
mais longa da espátula no orifício externo do colo, apoiando-a firmemente, fazendo uma raspagem em
movimento rotativo de 360° em torno de todo o orifício cervical, para que toda superfície do colo seja
raspada e representada na lâmina, procurando exercer uma pressão firme, mas delicada, sem agredir
o colo, para não prejudicar a qualidade da amostra. Para a coleta na endocérvice, utiliza-se a escova
endocervical. Deve-se recolher o material introduzindo a escova endocervical e fazendo um movimento
giratório de 360°, percorrendo todo o contorno do orifício cervical.

Posteriormente, deve-se estender o material sobre a lâmina de maneira delicada para a obtenção de
um esfregaço uniformemente distribuído, fino e sem destruição celular. A amostra ectocervical deve ser
disposta no sentido transversal, na metade superior da lâmina, próximo da região fosca, previamente
identificada com as iniciais da mulher e o número do registro. O material retirado da endocérvice
deve ser colocado na metade inferior da lâmina, no sentido longitudinal. O esfregaço obtido deve ser
imediatamente fixado para evitar o dessecamento do material (BARROS et al., 2012).

Vale destacar que é importante observar a validade do fixador. Na fixação com álcool a 96%,
considerada mundialmente como a melhor para os esfregaços citológicos, a lâmina deve ser colocada
dentro do frasco com álcool em quantidade suficiente para que todo o esfregaço seja coberto, depois,
deve-se fechar o recipiente cuidadosamente e envolvê-lo com a requisição. Na fixação com spray de
polietilenoglicol, borrifa-se a lâmina, que deve estar em posição horizontal, imediatamente após a coleta,
com o spray fixador, a uma distância de 20 cm. Acondiciona-se cuidadosamente a lâmina em uma caixa
36
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

de lâminas revestida com espuma de náilon e papel, a fim de evitar a quebra, para o transporte ao
laboratório, lacrando-se a tampa da caixa com fita gomada. Os passos seguintes são:

• Fechar o espéculo, mas não totalmente, evitando beliscar a mulher.

• Retirar o espéculo delicadamente, inclinando levemente para cima, observando as paredes vaginais.

• Retirar as luvas.

• Auxiliar a mulher a descer da mesa.

• Solicitar que ela troque de roupa.

• Informar sobre a possibilidade de um pequeno sangramento que poderá ocorrer depois da coleta,
tranquilizando-a e avisando que cessará sozinho.

• Enfatizar a importância do retorno para o resultado e se possível agendar conforme rotina da


unidade básica de saúde.

O Ministério da Saúde (BRASIL, 2013) recomenda que as lâminas sejam enviadas para o laboratório
devidamente acondicionadas e acompanhadas dos formulários de requisição. O formulário deve estar
devidamente preenchido e a identificação coincidente com a do frasco ou da caixa de porta-lâmina e
as iniciais da lâmina. Deve ainda ser preparada uma listagem de remessa, preferencialmente em duas
vias (uma para a unidade e outra para o laboratório), com a identificação da unidade e a relação de
nomes e números de registro das mulheres que tiveram seus exames encaminhados. Os exames devem
ser enviados ao laboratório o mais breve possível, para que o tempo entre a coleta e o resultado não
seja desnecessariamente prolongado. O envio das lâminas pode ser semanal, mas é fundamental a
racionalização do sistema de transporte utilizado: no momento da entrega de uma remessa de exames
no laboratório devem ser apanhados os resultados de outros exames deixados anteriormente.

A)
ME
NO

B)
ME
NO

C)
ME
NO

Figura 8 – Modelo recomendado para a distribuição das amostras citológicas na lâmina de vidro:
a) distribuição da amostra da endocérvice, b) distribuição do material obtido do raspado ectocervical,
c) distribuição da amostra do fundo de saco posterior da vagina

37
Unidade I

Existem diversos instrumentos usados na obtenção de amostras da ectocérvice, da zona de


transformação e do canal endocervical, entre os quais as espátulas de madeira, as plásticas e as escovas
endocervicais. Logo em seguida da coleta, a fixação desse material na lâmina deve ser imediata. É essencial
não esquecer que a lâmina e a caixa (ou frasco) devem estar identificadas corretamente, da mesma
forma que a ficha de requisição de exames deve estar preenchida, todas a lápis grafite. Para a fixação dos
esfregaços, após a dispersão sobre a lâmina, as amostras devem ser fixadas imediatamente, enquanto
molhadas, em etanol por pelo menos 15 minutos, ou deve-se usar spray fixador. É recomendável que a
fixação ocorra em tempo menor que 10 segundos após a coleta, para preservar a morfologia celular, suas
afinidades tintoriais, facilitar a permeabilidade dos corantes nas células e preservar a amostra contra o
ressecamento. Os fixadores mais utilizados são o álcool etílico ou equivalentes, em uma graduação que
pode variar entre 70% e 95%, e solução alcoólica de polietilenoglicol a 2%.

A fixação em álcool é feita por imersão; a fixação com solução de polietilenoglicol pode ser feita
em gotas ou com spray. Se a solução é spray, deve-se respeitar uma distância mínima de 15 cm, para
evitar dispersão, sobreposição ou perda de material celular, e máxima de 30 cm, para que ocorra fixação
adequada. Nessas soluções, o álcool atua como fixador, desnaturando as proteínas e os ácidos nucleicos,
tornando-os insolúveis e estáveis. A solução de polietilenoglicol promove a formação de um filme opaco
sobre a lâmina, impedidino o ressecamento do material (BIBBO; WILBUR, 2010).

Observação

O fixador mais utilizado é o etanol a 95%. Outros menos utilizados são


o isopropanol a 80% e o metanol a 100%, além dos fixados com aerossol.
A maioria desses fixadores é à base de polietilenoglicol em uma base de
álcool, fornecendo às células uma camada protetora. Essas lâminas precisam
ser submersas em etanol a 95% durante 30 minutos, em um primeiro
recipiente, e durante 15 minutos em outro, para remover completamente o
polietilenoglicol e prosseguir com a técnica de coloração.

Qualquer mulher que teve ou mantém vida sexual deve realizar o exame preventivo periódico,
principalmente as que têm entre 25 e 59 anos. De preferência, o exame deve ser feito anualmente.
Após dois exames consecutivos (com um intervalo de um ano) com resultado normal, o preventivo pode
ocorrer a cada três anos (INCA, 1988).

No caso de mulheres histerectomizadas, aconselha-se constatar se o colo foi preservado.


Permanecendo o colo, o exame deve ser feito regularmente. Na situação de pacientes grávidas, a
coleta não é contraindicada, mas deve ser feita de maneira cautelosa, podendo ocorrer um pequeno
sangramento (INCA, 2011b).

3.1.2 Coleta de material em meio líquido

Na década de 1990 foi desenvolvida e implantada uma nova metodologia para a realização da
citopatologia do colo uterino: a citologia em meio líquido (LBC). A implementação da metodologia em
38
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

meio líquido, associada a novas tecnologias, permitiu a melhoria na acurácia e na identificação dessas
alerações, além de diminuir, quase na sua totalidade, possíveis interferentes presentes nos esfregaços,
dificultando a análise da amostra.

O método de citologia em meio líquido, aprovado para uso clínico desde 1996, veio aperfeiçoar a
coleta de material de colo de útero para o exame citopatológico, o pode trazer benefícios em termos
de diminuição de amostras insatisfatórias. A metodologia é capaz de diminuir interferentes, como o
excesso de muco, restos celulares, exsudato inflamatório intenso, hemácias, espermatozoides e outros
interferentes e artefatos capazes de mascarar os achados citológicos (CONITEC, 2019).

A coleta de material celular em meio líquido é relizada com uma escova de cerdas plásticas ou
com uma espátula de Ayres plástica, capaz de destacar as respectivas cabeças removíveis, utilizadas
para a realização do raspado celular. Os instrumentos são introduzidos no canal vaginal até atingir o
orifício externo do canal endocervical. A porção alongada da escova é fixada dentro do canal e com dois
movimentos de rotação em 360 °C.

As amostras celulares das regiões endocervical, JEC e ectocérvice devem ser coletadas e, em seguida,
depositadas em um frasco com líquido conservante. Após a coleta, o material é destinado, com a cabeça
da escova, dentro do recipiente com líquido conservante. A totalidade da amostra celular coletada é
mantida em condições ideais para análises citológicas e moleculares. Uma das grandes vantagens dessa
metodologia é que a amostra pode ser acondicionada por um período médio de 15 dias em temperatura
ambiente, 6 meses refrigerado a 4 °C ou até 2 anos a -20 °C (CONSOLARO; ENGLER, 2016).

A adequabilidade da amostra é um dos principais fatores que condicionam a realização correta


do exame de citologia cérvico-vaginal. A representação celular das regiões de ectocérvice, JEC e canal
endocervical permite a completa avaliação das possíveis alterações celulares que acometem essas
regiões, responsáveis pelo desenvolvimento e pela evolução do câncer do colo uterino em 99% dos casos.
A metodologia em meio líquido permite a maior distribuição das células na lâmina. Essa composição
celular é obtida após um processo de homogeneização (vórtex) das células, conservadas no frasco, e
um processo de enriquecimento, permitindo o aumento da concentração celular por centrifugação
(CONSOLARO; ENGLER, 2016).

Figura 9 – Material de coleta em meio líquido

39
Unidade I

3.2 Colorações de Papanicolaou e coloração de Shorr

A coloração de esfregaços citopatológicos pode ser realizada pelas técnicas de Papanicolaou ou


Shorr, que são colorações policrômicas, ou seja, utilizam vários corantes, permitindo a diferença das
células em cianófilas e/ou eosinófilas.

Segundo Bibbo e Wilbur (2010), a coloração de Papanicolaou é utilizada pela maioria dos laboratórios
de citologia, sendo referência mundial. É constituída por etapas de coloração do núcleo e do citoplasma,
fases de desidratação, hidratação e diafanização. Essa bateria de coloração pode ser composta de 12 a
17 cubas, de acordo com as adaptações de cada laboratório. Apesar de permitidas, as adaptações devem
manter o objetivo principal, que é a coloração adequada do núcleo e dos componentes do citoplasma,
sendo capaz de indicar a maturidade celular.

A hematoxilina é um corante básico de solução aquosa que atua sobre estruturas ácidas
(basofílicas/cianófilas) e interage com os ácidos nucleicos, resultando em uma coloração azul-escuro
do núcleo celular. Possui afinidade por parede celular de lactobacilos e outras bactérias que podem estar
presentes no esfregaço e reagir delicadamente com o citoplasma das células escamosas. O orange G é um
corante ácido de base alcoólica que cora os componentes básicos (acidófilos /basófilos) do citoplamas das
células escamosas maduras (diferenciadas) de amarelo ou alaranjado, incluindo proteínas pré‑queratínicas
das células superficias eosinofílicas. Cora também parcialmente hifas fúngicas. Já o EA é um corante de base
alcoólica, com afinidade por estruturas basofilícas/ácidas (cianofilícas) e acidófilas/básicas (eosinofílicas).
A coloração tem finalidade de corar grânulos oxifílicos dos citoplasmas de células escamosas menos
maduras e de células glandulares, além de corar o citoplasma de Trichomonas vaginalis. Vale destacar que
EA-36 e EA-65 variam entre si apenas na concentração do corante verde-luz, que, na solução EA-36, é 50%
maior do que na solução EA-65.

Os objetivos da coloração de Papanicolau são: permitir a definição de detalhes estruturais do núcleo;


determinar transparência celular (obtida com a passagem dos esfregaços em várias cubas com álcool em
diferentes concentrações e pelo álcool etílico presente nos corantes EA e orange G); diferenciar os elementos
celulares cianófilos e eosinófilos, permitindo a melhor identificação de determinados tipos celulares.

A coloração de Papanicolau é composta de uma sucessão de três soluções corantes e fases de


hidaratação, desidaratação e diafanização da amostra, como descrito a seguir.

• Hidratação: processo no qual o material citológico é hidratado em banho de água corrente para
facilitar a interação com o primeiro corante, que é de base aquosa.

• Coloração com hematoxilina.

• Desidratação: processo realizado pela imersão do material citológico em concentrações crescentes


de álcool para que as células se combinem com o próximo corante, que é de base alcoólica.
A desidratação também elimina traços de água que poderiam prejudicar a transparência de
preparação pela formação de gotas opalescentes. A passagem por esses álcoois também auxilia
na remoção do excesso de hematoxilina.
40
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

• Coloração com orange G; coloração com EA – 36 ou EA – 65.

• Diafanização: nessa etapa, é fundamental que o material seja intensamente desidratado. Esse
processo é realizado por imersão em xilol, um agente clarificante e solvente que diminui a
opacificação das células, criando uma condição de transparência necessária para a visualização
de detalhes celulares.

• Montagem das lâminas com meio de montagem (bálsamo do Canadá sintético) ou verniz
automativo (CONSOLARO; ENGLER, 2016; STORTI-FILHO et al., 2008; BIBBO; WILBUR, 2010).

A coloração de Shorr, somada a uma etapa com hematoxilina de Harris, é denominada coloração
de Harris-Shorr ou Shorr modificado. Apesar de a coloração de Papanicolau ser absolutamente a mais
utilizada na citologia clínica, em vários serviços brasileiros a coloração de Shorr modificado é uma opção
de coloração alternativa. Assim como na coloração de Papanicolau, a coloração de Shorr modificado
(Pundell) é composta de uma fase de coloração do núcleo, realizada pela hematoxilina, e uma única
fase para a coloração de citoplasma, feita pelo corante de Shorr (universalmemte usado para avaliação
hormonal por sua sensibilidade em corar e representar a maturidade celular). Possui também as fases
de hidratação, desidratação e diafanização, mas sua bateria, em comparação com a de Papanicolau, é
menor: entre 7 e 9 cubas. Como consequência, o custo e o tempo para a realização do processo são
menores, sem deixar de atender as expectativas das características morfotintoriais.

O xilol utilizado nas colorações citológicas alternativamente poderá ser substituído por secagem em
estufa por 20 minutos e a 60 °C, procedimento igualmente eficiente no processo de desidratação. Existem
inúmeras vantagens de retirada do xilol da bateria de coloração, como a preservação do ambiente, a
diminuição de exposição a substâncias tóxicas, a desoneração do laboratório na aquisição e no descarte
desse componente químico, entre outras (CONSOLARO; ENGLER, 2016).

Observação

Para se obter uma coloração de qualidade, é necessário realizar uma


checagem diária (mediante análise microscópica), fazendo as correções
necessárias: por exemplo, a troca de soluções (corantes) da bateria, que
dependerá do número de lâminas processadas diariamente. Um dado
importante: recomenda-se que a troca dos corantes seja feita após a
coloração de, mais ou menos, 2.000 lâminas.

4 ANÁLISE DA CITOPATOLOGIA CÉRVICO-VAGINAL EM DIVERSAS CONDIÇÕES

O início básico da citologia é identificar as alterações da morfologia celular, observando-se o citoplasma


e o núcleo das células coradas pela técnica de Papanicolau. As características citoplasmáticas indicam
o grau de diferenciação celular, que, quando se altera, pode mostrar diferenças em quantidade e forma,
coloração, presença de vacuolizações, depósitos anormais de proteínas como queratina, entre outras
coisas. O núcleo, quando se analisa o aspecto, a coloração, o tamanho e a forma da membrana nuclear,
41
Unidade I

indica se a célula está normal, saudável ou se está sofrendo alterações inflamatórias, pré‑neoplásicas e
até neoplásicas.

4.1 Análise da citopatologia cérvico-vaginal em condições hormonais basais,


pré-menarca, gravidez e menopausa

A citologia hormonal é definida como avaliação das condições endócrinas das pacientes por meio de
estudos morfológicos das células vaginais, sendo uma das primeiras aplicações diagnósticas da citologia
clinica. Além de estabelecer a condição hormonal da paciente, é apropriado, para avaliar a função
ovárica normal e patológica da puberdade até a menopausa, estimular o tempo da ovulação, avaliar a
função placentária e disfunções obstétricas, auxiliar na seleção da terapia hormonal e acompanhar os
resultados de tratamentos hormonais. Algumas informações sobre o estado hormonal da mulher podem
ser obtidas por avaliação dos esfregaços cervicais de rotina (CONSOLARO; ENGLER, 2016).

Vários estudos recomendam que, para que os resultados da citologia hormonal sejam confiáveis,
coletas repetidas devem ser feitas e comparadas no mesmo ciclo ou no decurso de um tratamento
hormonal. Além disso, o citologista também deve ser informado sobre dados clínicos da paciente, como
idade, dia do ciclo menstrual, situações fisiológicas ou patológicas do aparelho genital e utilização de
tratamento hormonal, pois não há interpretação hormonal válida sem essas informações.

Ciclo sexual mensal ou ciclo menstrual é definido como as alterações mensais nas taxas de secreção
dos hormônios femininos, que promovem mudanças nos ovários e em outros órgãos sexuais, durante os
anos reprodutivos hormonais (GUYTON et al., 2006).

No sistema genital feminino, os ovários são incitados por um hormônio produzido pela placenta,
a gonadotrofina coriônica humana (hCG), e começam a funcionar ainda na fase embrionária. O hCG
é um hormônio muito semelhante ao hormônio luteinizante (LH). Ao nascer, uma mulher possui,
aproximadamente, um milhão de folículos primários, também chamados de primordiais, em cada ovário.
A maioria desses folículos se degenera, e a mulher chega à puberdade com cerca de 400 mil folículos em
cada ovário (GUYTON et al., 2006; VERAS; NARDI, 2005; MORAES, [s.d.])

4.1.1 Pré-menarca

É na puberdade que começam a ser prouzidos os principais hormônios sexuais femininos, que são o
estrógeno e a progesterona. O estrógeno é formado nas células do folículo ovariano em desenvolvimento, e
ele é o incumbido pelo surgimento das características sexuais secundárias na mulher, como aparecimento
das mamas, alargamento dos quadris, distribuição de pelos pelo corpo etc. O estrógeno também motiva
o amadurecimento dos órgãos genitais, além de promover o impulso sexual. A progesterona é outro
hormônio sexual feminino que é formado basicamente pelo corpo amarelo, também chamado de corpo
lúteo do ovário. Esse hormônio incentiva o desenvolvimento dos vasos sanguíneos e das glândulas do
endométrio, tornando-o espesso e preparando o útero para receber o embrião (VERAS; NARDI, 2005;
MORAES, [s.d.]).

42
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

Hormônios basais

Desde o instante em que a menina começa a gerar esses hormônios sexuais, uma vez por mês ela
irá ovular, desde o princípio do seu ciclo menstrual, que ocorrerá a cada 28 dias aproximadamente.
O ovário, no instante da ovulação, lança um ovócito secundário ao mesmo tempo em que o útero
se prepara para receber o embrião. Caso ocorra a fecundação do ovócito secundário, o embrião se
implantará no útero e se desenvolverá, caso contrário, ele se degenera e é eliminado juntamente com a
parede interna do útero, em um processo chamado de menstruação. Todos esses processos, que ocorrem
tanto no útero quanto no ovário, são controlados pelos hormônios FSH (hormônio folículo-estimulante)
e LH (hormônio luteinizante). A menstruação acontece quando as taxas de todos os hormônios ficam
muito baixas no sangue da mulher, marcando o início de um ciclo menstrual (GUYTON et al., 2006;
VERAS; NARDI, 2005; MORAES, [s.d.]).

Para fins didáticos, dividiremos o ciclo menstrual em três fases: a fase proliferativa, a fase de secreção
e a fase menstrual.

Na fase proliferativa, também chamada de fase folicular, o folículo cresce e se alinha para a ovulação.
Esse crescimento é incentivado pelo hormônio FSH, e, à medida que o folículo cresce, começa a produzir
estrógenos, um grupo de hormônios que incentivam o desenvolvimento do endométrio. Nesse processo,
vários folículos são incentivados, mas apenas um deles termina o crescimento, acumulando líquido em
seu interior e transformando-se em folículo maduro (ou folículo de Graaf). Ao atingir um estabelecido
nível no sangue, o estrógeno começa a impulsionar a hipófise a liberar grandes quantidades de LH e FSH,
os quais irão induzir a ovulação, que normalmente ocorre no décimo quarto dia após o início do ciclo
menstrual (VERAS; NARDI, 2005).

Na fase secretória, também conhecida como fase lútea, o LH incentiva as células do folículo ovariano
extinto a se transformarem em corpo amarelo, também chamado de corpo lúteo. É no corpo lúteo
que acontecerá a produção de estrógeno e progesterona. Caso não ocorra a fecundação do ovócito
secundário, acontecerá a fase menstrual (VERAS; NARDI, 2005).

Nessa fase, o corpo lúteo se declina, parando de produzir progesterona e estrógeno. A queda na
produção desses hormônios faz com que o útero sofra descamação, acontecendo a menstruação, que
pode durar de três a sete dias, dependendo da mulher e de suas condições fisiológicas. Essa queda nas
taxas de progesterona e estrógeno, por sua vez, faz com que a hipófise volte a produzir FSH, reiniciando
o ciclo menstrual.

A primeira menstruação ocorre na puberdade e é chamada de menarca. Após os 50 anos de idade,


a produção de hormônios sexuais femininos declina, a ovulação e os ciclos menstruais se tornam
irregulares até cessarem completamente. Nessa fase, conhecida como menopausa, não há mais atividade
reprodutiva no corpo da mulher (MORAES, [s.d]).

43
Unidade I

FSH
LH
Hipófise

Estrógeno
Progesterona
Ovários

Corpo
Ovulação lúteo
Folículos em crescimento
Útero

Ciclo menstrual

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29

Figura 10 – Representação das fases do ciclo menstrual

4.1.2 Gravidez

Quando ocorre a gravidez, a placenta secreta grande quantidade de hCG, somatomamotropina


coriônica humana, estrógeno e progesterona. A hCG tem como a função evitar a involução do corpo
lúteo, de modo que a secreção de estrógeno e progesterona continue pelos próximos meses, impedindo
a menstruação e fazendo com que o endométrio continue a crescer e armazenar grandes quantidades
de nutrientes. Após algumas semanas, a placenta secreta quantidades suficientes de progesterona e
estrogênios para manter a gravidez até o fim do período gestacional, e o corpo lúteo involui lentamente.
Após o parto, na maioria das mães que estão amamentando, sinais neurais que chegam ao hipotálamo,
promovendo a secreção de prolactina, atuam sobre a liberação de GnRH, suprimindo a formação do FSH
e LH, de modo que o ciclo sexual mensal não retorna até que a frequência da amamentação diminua
ou pare por completo e a hipófise volte a secretar os hormônios gonadotróficos (CONCEIÇÃO, 2006;
GUYTON et al.,2006).

4.1.3 Menopausa

O climatério (ou perimenopausa) é uma fase fisiológica da vida, e não um processo patológico.
Trata‑se da mudança entre o período reprodutivo e o não reprodutivo da vida da mulher, quando surgem
as irregularidades menstruais e as queixas vasomotoras, antecedendo a menopausa. A menopausa é o
marco dessa fase, referindo-se ao último ciclo menstrual seguido por doze meses de amenorreia (ou
seja, é a parada permanente da menstruação).

44
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

A menopausa tem como consequência a diminuição da secreção dos hormônios ovarianos, estrogênio
e progesterona, devido à perda definitiva da atividade folicular ovariana. A redução da função ovariana
e, assim, do feedback negativo, resulta na elevação das concentrações do FSH, sendo esta a primeira
indicação laboratorial do climatério inicial. Estudos populacionais sugerem que o fumo e a condição
socioeconômica baixa estão relacionaods com o fim precoce dos períodos menstruais. Outros fatores
podem afetar a idade em que as mulheres têm seu período menstrual finalizado, como: menarca, paridade,
uso prévio de contraceptivos orais, índice de massa corpórea, etnia e histórico familiar (PANTALEÃO et
al., 2009; BLAKE, 2006).

4.2 Padrões citológicos nas diferentes fases da vida da mulher

Anatomicamente, o colo do útero divide-se em duas porções chamadas de ectocérvice e endocérvice.


O epitélio que recobre a cavidade endocervical é formado por uma única camada de células cilíndricas
endocervicais, com função secretora e locomotora. A ectocérvice, histologicamente, apresenta três
extratos de células escamosas: camada profunda, formado por uma camada de células basais e várias de
células parabasais; extrato intermediário, formada por várias camadas de células intermediárias; e extrato
superficial, formado por várias camadas de células superficiais. O processo de maturação e diferenciação
desse epitélio é diretamente dependente de ação hormonal cíclica de estrogênio e progesterona, estabelecido
o predomínio de células de determinado grau de diferenciação celular de acordo com a faixa etária e a
fase do ciclo menstrual em que a mulher se encontra. Esse processo de maturação é caracterizado por um
aumento do tamanho do citoplasma e pela diminuição do núcleo (PLEWKA, 2007; TAPIA, 2008).

Carvalho (2008) relata que os esfregaços com atividade estrogênica podem ser divididos nas fases
pré-ovulatória e ovulatória. Na fase pré-ovulatória, as células, inteiramente intermediárias, identificam
a fase e indicam o início da maturação provocada pela influência estrogênica no epitélio escamoso
antes de atingirem seu máximo amadurecimento, representado pelas células superficiais. As células
pré-ovulatórias apresentam citoplasma bastante aumentado e núcleo com diâmetro reduzido (porém,
este ainda não se tornou picnótico), coram-se fracamente em cianofilia, embora, algumas vezes, leves
tonalidades eosinófilas possam aparecer na porção média das células (outras vezes, no entanto, são
acentuadamente eosinófilas, sendo a cor rosa a mais encontrada).

Os esfregaços com atividade luteínica ou progesterônica são divididos nas fases pós-ovultória,
pré-menstrual e menstrual. Na fase pós-ovulatória, as células superficiais e intermediárias diminuem
de tamanho, sendo chamadas de células regressivas. Essas células são submetidas a um processo de
reabsorção, e não a um processo de citólise. Nessa fase, analisando a supressão da ação estrogênica
sobre a mucosa vaginal, também se verifica que as células superficiais e intermediárias alongadas
aumentam de número.

Já a fase pré-menstrual tem um padrão muito típico, sendo composta de células pré-menstruais
que são, na maioria, células intermediárias com citoplasma acentuadamente cianofílico e núcleos
aumentados de tamanho, apresentando-se agrupadas, formando grandes aglomerados, sendo maiores
que os grupos observados nas outras fases. Uma aparência comum dessas células é a irregularidade da
forma citoplasmática, uma vez que o contorno citoplasmático é menos nítido e, não raro, indica citólise
45
Unidade I

inicial. Na fase menstrual, além do grande número de eritrócitos presentes no esfregaço, há uma grande
escamação de células epiteliais.

Os esfregaços com atividade estrogênica podem ser divididos nas fases pré-ovulatória e ovulatória.
Na fase pré-ovulatória, as células, absolutamente intermediárias, identificam a fase e indicam o início
da maturação provocada pela influência estrogênica no epitélio escamoso antes de atingirem seu
máximo amadurecimento, representado pelas células superficiais. As células pré-ovulatórias apresentam
citoplasma bastante aumentado e núcleo com diâmetro reduzido (porém este ainda não se tornou
picnótico), coram-se fracamente em cianofilia, embora, algumas vezes, leves tonalidades eosinófilas
possam aparecer na porção média das células; outras vezes, são acentuadamente eosinófilas, sendo a
cor rosa a mais encontrada.

Na fase ovulatória, há predomínio de células superficiais que atingem o máximo de maturação e


esfoliação e chegarão à metade dos elementos celulares do esfregaço. A coloração de seu citoplasma
é nitidamente rósea ou vermelha com algumas células amareladas ou alaranjadas tipicamente eosinofílicas,
com núcleo extremamente picnótico (CARVALHO, 2008; ATKINSON, 2005).

Os esfregaços com atividade luteínica ou progesterônica são divididos nas fases pós-ovulatória,
pré-menstrual e menstrual. Na fase pós-ovulatória, as células superficiais e intermediárias diminuem
de tamanho, sendo chamadas de células regressivas. Essas células são submetidas a um processo de
reabsorção, e não a um processo de citólise. Nessa fase é também observado que as células superficiais
e intermediárias alongadas aumentam de número, refletindo a supressão da ação estrogênica sobre
a mucosa vaginal. Já a fase pré-menstrual tem um padrão muito típico, sendo composta de células
pré‑menstruais que são, na maioria, células intermediárias com citoplasma acentuadamente cianofílico
e núcleos aumentados de tamanho, apresentando-se agrupados, formando grandes aglomerados, sendo
maiores que os grupos observados nas outras fases. Um aspecto comum dessas células é a irregularidade
da forma citoplasmática, uma vez que o contorno citoplasmático é menos nítido e, não raro, indica
citólise inicial. Na fase menstrual, além do grande número de eritrócitos presentes no esfregaço, há uma
abundante escamação de células epiteliais (CARVALHO, 2008).

Durante a gestação, a citologia vaginal deixa de mostrar modificações cílcicas, de modo que ao
epitélio se atribui um padrão característico pela intensa estimulação hormonal do tipo progestacional.
No início da gravidez, nas primeiras 6 semanas, os esfregaços vaginais apresentam aspectos semelhantes
ao pré-menstrual, podendo demonstrar um leve efeito estrogênico. Assim, existe a presença de células
escamosas intermediárias, mas pode haver células superficiais. O esfregaço dito gestacional é constatado a
partir do segundo ou terceiro trimestre de gravidez e é composto de células escamosas intermediárias, incluindo
células ricas em glicogênio, com núcleo periférico e bordas bem definidas, conhecidas como naviculares,
e também lactobacilos e citólise. A camada superficial é muito fina e reduzida, podendo estar ausente.
Esse padrão citológico não é observado exclusivamente na gravidez, mas padrões parecidos podem ser
verificados no início da menopausa ou em alguns casos de amenorreia (KOSS; GOMPEL; BERGERON, 2006).

Podem ser observados três padrões citológicos na menopausa. Com a dimunição da secreção de
estrógenos, ocorre a inibição gradativa da proliferação das células epiteliais escamosas. Consolaro e
Engler (2016) citam que, no início, predominam as células epiteliais escamosas intermediárias, porém
46
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

algumas células superficiais podem estar presentes, caracterizando baixa atividade estrogênica. Com
o tempo, que pode variar de poucos meses até vários anos, há uma queda progressiva da atividade
estrogênica, passando a haver predomínio de células escamosas parabasais, representando o epitélio
hipotrófico. Por fim, é possível observar a presença de células escamosas parabasais, indicando baixíssima
produção estrogênica. O epitélio atrófico é mais suscetível a infecções em razão do menor número de
camadas celulares, por isso, geralmente é possível observar a presença de processo inflamatório intenso
(SILVA FILHO, 2000).

Vale esclarecer que a menopausa clínica e a citológica podem não coincidir, ou seja, a paciente pode
apresentar ciclos menstruais regulares e esfregaços citológicos, já mostrando o início de menopausa.
Por outro lado, em mulheres com menopausa clínica, o tempo para instalação da atrofia também pode
variar, acontecendo em poucos meses após a última menstruação ou jamais ocorrendo, persistindo o
predomínio de células epiteliais escamosas intermediárias por toda a vida, como nas que continuam
sexualmente ativas ou que mantêm certa produção de esteroides adrenais (BIBBO, 1997).

Silva Filho (2000) e Koss, Gompel e Bergeron (2006) evidenciam que nos epitélios glandulares
endocervical e endometrial também se observa uma regressão progressiva, com escassez das glândulas
e, consequentemente, menor produção de muco, o que costuma levar ao dessecamento do epitélio
escamoso vaginal. O dessecamento faz com que as células apresentem aspecto achatado, com variação
do tamanho e da forma, eosinofilia citoplasmática, cariorrexe e picnocitose nuclear que pode sugerir
hipercromasia. Essas características celulares podem sugerir carcinoma escamoso e criar problemas
diagnósticos, que podem ser esclarecidos pela administração de estrogênio, que, por sua vez, é capaz
de melhorar a maturação do epitélio escamoso, de modo que as anormalidades causadas pela atrofia
desapareçam; por outro lado, se houver malignidade, as alterações celulares persistirão. Nesse epitélio,
as células endocervicais são normalmente escassas ou ausentes nos esfregaços cervicais.

4.3 Análise da citopatologia cérvico-vaginal em condições inflamatórias,


infecciosas (bacterianas, fúngicas, infecções por protozoários)

O conteúdo cérvico-vaginal nomal é constituído de células epiteliais escamosas, células colunares,


endocervicais em pequeno número, células endometriais no período menstrual, detritos celulares, muco
cervical, microbiota bacteriana variada, leucócitos em pequeno número, água e ácido láctico. A vagina
e o colo formam um ecossistema complexo com numerosas espécies bacterianas, que podem ser, em
circunstâncias particulares, a causa de cérvico-vaginites. Deve ser encontrada uma série de alterações
gerais e citológicas no corte histológico e/ou esfregaço citológico.

As microbiotas vaginal e cervical são diferentes, mas se superpõem no conteúdo vaginal. As glândulas
de Bartholin e Skene, a cavidade uterina, as tubas uterinas, ovários e estruturas anexas são estéreis em
condições de normalidade. Os órgãos genitais externos apresentam microbiota da própria pele mais
alguns componentes da microbiota intestinal. O trato genital inferior apresenta comunicação com o
meio ambiente externo, o que propricia o desenvolvimento de reações inflamatórias infecciosas e não
infecciosas. Na continuidade desses processos inflamatórios, existem muitas mulheres assintomáticas.
Quando sintomáticas, os principais sintomas apresentados são leucorreia, irritação vulvovaginal, coceira,
dor, ulceração e sangramento (CONSOLARO; ENGLER, 2016).
47
Unidade I

4.3.1 Infecções bacterianas

Lactobacillus vaginalis (bacilos de Döderlein)

Representam bacilos gram-positivos que fazem parte da flora vaginal normal. As enzimas desses
microrganismos influenciam a destruição proteolítica (citólise) das células epiteliais escamosas
intermediárias que contêm glicogênio. O glicogênio citoplasmático é, então, metabolizado em ácido
lático, que mantém o pH vaginal entre 3 e 4.2, o qual exerce um mecanismo de defesa contra a
proliferação de microrganismos patógenos. A citólise é identificada nos esfregaços pela presença de
restos citoplasmáticos e núcleos desnudos de células intermediárias tendo na vizinhança numerosos
bacilos. Quando a citólise é intensa, pode complicar ou mesmo impedir a graduação das lesões
pré‑cancerosas, uma vez que é necessária a manutenção do citoplasma íntegro para calcular a relação
nucleocitoplasmática, um critério importante para a classificação dessas lesões. O predomínio de
lactobacilos acontece na fase luteínica do ciclo menstrual, na gravidez, na menopausa precoce e durante
a administração de hormônios, especialmente progestágenos. Bactérias mistas constituem uma mistura
de bacilos e cocos, que só podem ser identificados pela cultura microbiológica. Em mulheres adultas
assintomáticas, essas bactérias são consideradas um achado normal (LIMA, 2012).

Figura 11 – Numerosos bacilos, restos citoplasmáticos e núcleos desnudos (setas), representando citólise

Gardnerella vaginalis

São representados por cocobacilos gram-negativos ou gram-variáveis. Quando o pH vaginal é maior


que 4.5, a Gardnerella pode se ligar a várias outras bactérias aeróbicas e anaeróbicas, especialmente
Mobiluncus, bacteroides e Mycoplasma hominis. Essa infecção por múltiplas bactérias é chamada de
vaginose bacteriana. A Gardnerella vaginalis é isolada na maioria dos casos, confirmando-se a sua relação
etiológica com a doença. Clinicamente, a condição é associada a corrimento vaginal branco-acinzentado
ou amarelado, fluido, homogêneo, com odor de peixe estragado, às vezes com aspecto bolhoso.

O odor característico da secreção se intensifica por ocasião da menstruação e após relações sexuais
devido ao aumento do pH e da consequente liberação pelos microrganismos de aminas responsáveis pelo

48
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

cheiro. No esfregaço citológico, a Gardnerella vaginalis tem a propriedade de ligar-se ao citoplasma das
células escamosas superficiais e intermediárias conferindo-lhes uma aparência granular (células‑guia).
É também característico o aspecto nublado, turvo, do fundo, especialmente na proximidade das
células, devido a uma maior concentração de bactérias. Habitualmente há discretas alterações celulares
degenerativas, e os neutrófilos são raros. Em raras ocasiões, bacilos ou cocos se sobrepõem às células
escamosas, dando a falsa impressão de células-guia. Porém, nesse caso, o fundo não tem a aparência
turva associada à infecção por Gardnerella (CATLIN, 1992).

Chlamydia trachomatis

É uma bactéria gram-negativa, intracelular obrigatória que depende, para o seu metabolismo, dos
nutrientes e da energia da célula hospedeira. Ainda que em muitos casos a infecção pelo microrganismo
seja assintomática, pode determinar processos inflamatórios na vulva, vagina, no colo, endométrio e
nas trompas. A infecção por Chlamydia aumenta o risco de aborto espontâneo e morte fetal e pode se
disseminar ao neonato durante o parto, provocando conjuntivite de inclusão e pneumonia. Em homens,
o microrganismo é causa comum de uretrite não gonocócica e epididimite.

Alguns autores acreditam que Chlamydia trachomatis se apresenta nos esfregaços cérvico-vaginais sob
a forma de inclusões citoplasmáticas de diferentes tipos, dependendo de suas etapas de desenvolvimento.
Classicamente, são descritos três tipos de inclusões: corpos elementares, corpos reticulares e corpos
agregados. Os corpos elementares aparecem como grânulos cocoides finos, eosinofílicos ou basofílicos.
Eles são difusamente distribuídos no citoplasma finamente poroso ou são localizados na zona perinuclear.
Esse estágio é seguido pela condensação e pela transformação dessas partículas em inclusões maiores
circundadas por vacúolos de paredes finas (inclusões em alvo), que tendem a ser cianofílicas e maiores que
os corpos elementares. Essas inclusões clamídicas geralmente revelam tamanho uniforme e distribuição
perinuclear. O terceiro tipo, os corpos agregados, aparecem como grandes conjuntos de partículas finamente
granulares eosinofílicas ou cianofílicas, dentro de grandes vacúolos citoplasmáticos. Esses vacúolos, que
podem ocupar a maior parte do citoplasma, têm bordas distintas e se amoldam contra o núcleo.

Recentemente, considera-se a citologia um método pouco preciso, com taxas baixas de sensibilidade
e especificidade na detecção de infecção por Chlamydia. Por outro lado, a cervicite crônica folicular é
atribuída formalmente à infecção por Chlamydia em quase 50% dos casos. Nos esfregaços cervicais,
a condição é representada por numerosos linfócitos em diferentes estágios de maturação,
predominantemente inativados (de pequeno tamanho). Podem ser vistas mitoses e raros capilares.
A chave para o diagnóstico é a presença de macrófagos de corpos tingíveis (macrófagos fagocitando
linfócitos degenerados). A frequente associação desse tipo de cervicite com Chlamydia autoriza o
citopatologista a sugerir a realização dos exames de imunofluorescência e cultura para a investigação
desse microrganismo (VIGIL et al., 2002; SMITH et al.,1991).

Leptothrix vaginalis

Correspondem a bactérias anaeróbicas. Elas são comuns na cavidade oral, no intestino e, ocasionalmente,
na vagina. Aparecem como estruturas filamentosas, em forma de “S”, “U” ou enoveladas. Há associação
desse microrganismo com Trichomonas vaginalis de 75% a 80% dos casos (BARROS et al., 2012).
49
Unidade I

Infecções micóticas (Candida sp.)

As infecções micóticas representam a causa mais comum de vaginite nas regiões tropicais, sendo que
a cultura biológica de 85% a 90% dos casos demonstra Candida albicans. É mais comum em mulheres
imunossuprimidas, como aquelas sob tratamento com corticoides, quimioterapia ou com diabetes.
Ocorre também mais frequentemente na gravidez. A infecção geralmente envolve a vulva, a vagina e,
algumas vezes, o colo uterino.

As portadoras de Candida sp. são assintomáticas ou referem secreção vaginal espessa, branca, associada
a prurido e ardor. No esfregaço vaginal identificam-se hifas, pseudo-hifas e esporos redondos ou ovais de
3 a 7 micrômetros de diâmetro. Essas estruturas coram habitualmente em vermelho ou marrom. Nas hifas
verdadeiras, o protoplasma é contínuo entre o eixo principal e as ramificações. A Candida se reproduz por
brotamento. Os brotos se alongam formando as pseudo-hifas. Alguns esporos podem invadir o citoplasma
das células epiteliais escamosas aparentemente intactas. Em um grande número de amostras citológicas,
evidenciam-se halos perinucleares, vacuolização citoplasmática e cromatina agrupada. É frequente o
encontro de neutrófilos degenerados. Em algumas ocasiões, o aumento nuclear é significativo e, quando
associado à pseudoeosinofilia e halos perinucleares, pode ser difícil a diferenciação com alterações
citopáticas pelo HPV. Contudo, na infecção micótica as alterações são difusas. Às vezes é necessária uma
busca minuciosa pelo agente etiológico, nem sempre fácil de identificar. O exame das extremidades do
esfregaço pode ser útil, pois a leve dessecação comum nessas áreas facilita o reconhecimento especialmente
dos esporos que se mostram maiores que aqueles presentes nos setores bem fixados da amostra.

A Candida glabrata se segue em frequência à Candida albicans, e não é dimorfa, apresentando‑se


apenas sob a forma de macroconídias (esporos). É a única espécie de Candida que não forma pseudo‑hifas.
Não é possível a diferenciação citológica confiável entre as espécies de Candida albicans e Candida
glabrata: esta se apresenta exclusivamente sob a forma de esporos pequenos, menores que aqueles da
Candida albicans, com tendência a se agrupar (MURTA et al., 2000).

Lembrete

A candidíase vulvovaginal é a infecção da vulva e vagina que acomete


um terço das mulheres em idade reprodutiva. É causada por fungos do
gênero Candida, sendo que a espécie Candida albicans é responsável pela
maioria dos casos. Clinicamente, é caracterizada pela presença de corrimento
esbranquiçado, prurido, ardor, disúria, edema e eritema vulvovaginal.

Protozoários - Trichomonas vaginalis

Corresponde a um protozoário flagelado, transmitido sexualmente. Quase 50% das mulheres com
Trichomonas são assintomáticas. Contudo, podem se associar a corrimento vaginal abundante de cor
verde-amarelada e odor desagradável. Nos esfregaços citológicos, devido à degeneração, raramente
se identificam os flagelos do parasita. Trichomonas variam de tamanho, entre 5 e 20 micrômetros,
e são piriformes, com limites mal definidos, às vezes contendo grânulos intracitoplasmáticos
50
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

castanho‑avermelhados indicando uma leve capacidade fagocitária. O seu núcleo é pequeno,


excêntrico, redondo ou oval, levemente basofílico, de difícil identificação. Para a diferenciação com
restos citoplasmáticos, a visualização do núcleo do parasita é essencial. Apenas o núcleo e, raramente, o
axostilo são vistos no esfregaço cérvico-vaginal corado pela técnica de Papanicolau.

Na infecção por Trichomonas vaginalis, o fundo dos esfregaços geralmente é purulento, às


vezes sob a forma de acúmulos focais de neutrófilos, que são conhecidos como balas de canhão.
Há pseudo‑eosinofilia citoplasmática pronunciada, e são comuns os halos perinucleares. Os núcleos
podem ser volumosos e pode haver cariólise e cariorrexe. É frequente a associação de Trichomonas com
Leptothrix vaginalis (MURRAY; ROSENTHAL; PFALLER, 2006).

4.4 Análise da citopatologia cérvico-vaginal em condições de infecções virais


(herpes, HPV)

Os herpes-vírus simples podem ser de dois tipos: HSV-1 e HSV-2. Ambos compartilham vários
antígenos, mas possuem glicoproteínas específicas. O HSV-1 acomete, principalmente, lábios e face.
Aproximadamente 90% da população apresenta anticorpos contra esse vírus, uma vez que pode
ter sido infectada na infância sem apresentar sintomas. Já o HSV-2 acomete predominantemente a
região genital, e a infecção ocorre, principalmente, no início da atividade sexual, entre 18 e 25 anos.
Raramente o HSV-1 acomete os genitais; o HSV-2, a face e os lábios. As lesões permanecem infectantes,
aproximadamente, de 10 a 12 dias. O HSV-2 é transmitido por contato sexual com parceiro infectado
ou, raramente, por contato orogenital, com portador de herpes labial em atividade. A contaminação
por assentos ou toalhas contaminados é improvável, pois o vírus não consegue sobreviver fora do
organismo. A inoculação direta pode ocorrer em profissionais de saúde, após exposição a secreções
infectantes. A contaminação é grande na presença de lesões na fase de vesículas.

Há dois tipos de infecção celular pelo HSV. A infecção produtiva, na qual ocorre a replicação viral
aguda em células epiteliais e fibroblastos, e a infecção latente, na qual o vírus migra e permanece nas
terminações nervosas. O vírus penetra no corpo por infecção das mucosas ou soluções de continuidade
da pele, causando infecção localizada, inaparente ou com produção de vesículas, que representa a
fase produtiva e promove lise e morte celulares. O vírus dissemina-se para células adjacentes e para
o neurônio responsável pela inervação, onde não se replica. Após situações específicas, como estresse,
imunossupressão ou outras, retorna de forma retrógrada via neurônio para o local inicial de infecção,
causando a infecção produtiva. Características citológicas: as alterações desencadeadas pelo vírus
afetam as células escamosas parabasais, metaplásicas imaturas e endocervicais.

Inicialmente se evidenciam citomegalia e cariomegalia. A seguir, devido à degeneração, a cromatina


se torna rarefeita e os núcleos assumem um aspecto fosco, homogêneo. Simultaneamente, restos
persistentes de cromatina se depositam contra o folheto interno da membrana nuclear, resultando na
aparência de borda nuclear espessada. É frequente a multinucleação em que os núcleos se amoldam
uns aos outros. Em alguns casos, inclusões intranucleares grandes podem ser observadas, não devendo
ser confundidas com nucléolos, estes últimos geralmente menores e esféricos. O citoplasma das células
acometidas é denso, opaco, devido a alterações da estrutura do citoesqueleto e à necrose por coagulação
das proteínas (CONSOLARO, ENGLER, 2016).
51
Unidade I

As evidências epidemiológicas e laboratoriais apontam a estreita relação entre o HPV e o câncer


anogenital. Os tumores mais frequentes compreendem o carcinoma cervical, vulvar, vaginal, de pênis
e ânus. No câncer de colo, a prevalência de infecção pelo HPV varia entre 75% e 100%. A maioria
dos carcinomas escamosos do colo uterino se origina do epitélio metaplásico escamoso na zona de
transformação, que é mais suscetível à ação do papiloma vírus humano (HPV).

Dados clínicos e obtidos através de estudos anatomopatológicos comprovam o conceito do


desenvolvimento dessa neoplasia através de estágios precursores, as lesões intraepiteliais escamosas
e o carcinoma escamoso microinvasivo. O HPV é transmitido nas relações sexuais, com um pico de
prevalência da infecção em mulheres no grupo etário entre 22 e 25 anos. A sua prevalência diminui
com a idade, sugerindo que a maioria das infecções é suprimida pela resposta imunitária do hospedeiro
(LIMA, 2012).

4.4.1 Tipos de HPV

Há mais de 150 tipos de HPV, embora somente cerca de 30 tipos sejam relacionados com o aumento
do risco para câncer cervical. Comumente, o HPV é classificado nos tipos de baixo e de alto risco,
de acordo com a sua menor ou maior associação com o câncer de colo. Os primeiros compreendem
especialmente o HPV 6 e 11, e os de alto risco são representados mais frequentemente pelos tipos
16, 18, 31 e 45, que contribuem para mais de 80% dos cânceres cervicais. Praticamente nenhuma
das mulheres infectadas com HPV de baixo risco apresenta lesão progressiva. Por outro lado, entre
aquelas infectadas com o HPV de alto risco, pelo menos 75% nunca desenvolverão lesões. Há fatores
imunológicos e moleculares que interferem na evolução de uma lesão. Aproximadamente um terço
de todas as lesões intraepiteliais escamosas regridem, 41% persistem e 25% progridem. Das lesões
progressivas, 10% evoluem para carcinoma in situ e 1% para câncer invasivo. Dessa forma, três quartos
das lesões intraepiteliais escamosas de todos os graus não progridem.

Estudos mostram que muitas das infecções pelo HPV são transitórias, a maioria desaparecendo depois de
um ou dois anos. Há uma tendência de persistência das infecções por HPVs de alto risco. Os raros casos de
câncer cervical em que o HPV não é encontrado poderiam ser explicados pelo desaparecimento do vírus após
a lesão celular ou pela participação de outro tipo de HPV não identificado pelos testes moleculares de rotina.

O HPV, assim como outros vírus, é incapaz de replicar independentemente o seu próprio DNA.
Assim, para completar o seu ciclo de vida, o HPV depende do metabolismo das células hospedeiras
infectadas. Durante o contato sexual e através de microerosões da mucosa, o vírus penetra na zona de
transformação do colo, infectando inicialmente as células basais ou as células de reserva (que podem se
diferenciar em epitélio escamoso ou glandular). O vírus, ao penetrar na célula, perde o seu capsídeo e é
transportado para o núcleo, onde permanece inicialmente no estado epissomal (na forma circular, não
integrado ao genoma da célula hospedeira).

A replicação do DNA epissomal é restrita nessa fase a uma replicação por ciclo celular. As células
imaturas infectadas são conhecidas como não permissivas, e, como nenhuma alteração histológica
específica ocorre nesse estágio, a infecção é chamada latente. O aumento dramático da replicação
viral (replicação do DNA viral), assim como a expressão dos genes tardios que codificam as proteínas
52
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

do capsídeo com a formação dos vírions, manifesta-se simultaneamente à diferenciação das células
escamosas hospedeiras. Só depois que as células basais se diferenciam em células intermediárias e
superficiais é que o vírus pode se desenvolver completamente. Dessa forma, nessas células escamosas
diferenciadas a multiplicação do vírus completo é possível, sendo, por isso, tais células conhecidas como
células permissivas. Finalmente, ocorre a lise e a ruptura celular, com liberação dos vírions capazes de
infectar novas células.

A produção das proteínas do capsídeo viral com a formação dos vírions é resultante da infecção produtiva e
é mais comum nas verrugas genitais e nas lesões pré-cancerosas de baixo grau. É nessa fase que se observam os
coilócitos que selam o diagnóstico citológico da infecção pelo HPV. Além de aspectos relacionados ao próprio
HPV (tipo e carga viral, infecção única ou múltipla), os estudos epidemiológicos enfatizam a importância dos
cofatores na história natural das infecções pelo HPV e das lesões associadas. Entre os cofatores são incluídos a
multiparidade, o uso prolongado de contraceptivos orais, o tabagismo e outras doenças de transmissão sexual
– particularmente a síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS). Dependendo da inter-relação entre esses
vários fatores, a infecção pelo HPV pode ser transitória, com regressão em aproximadamente 90% dos casos
dentro de 1 a 2 anos, ou persistente, nesse caso, associada a um maior risco de desenvolvimento de lesão
pré‑cancerosa de alto grau e câncer invasivo (RABACHINI; SICHERO, 2016).

Epitélio HPV
escamoso Ferimento

Membrana Célula
basal epitelial
basal

Figura 12 – Esquema representando a penetração do vírus durante a atividade sexual através


de microerosões da vulva ou da vagina. As células basais do epitélio escamoso são infectadas e,
nessa etapa, o DNA do HPV permanece no estado epissomal (não integrado ao genoma da célula hospedeira)

53
Unidade I

Liberação Queratinócitos
HPV do vírus diferenciados

Síntese da estrutura
e liberação
(L1, L2, E4)

Proliferação celular
e alto nível de
replicação epissomal
(E1, E2, E4, E5, E6, E7)

Infecção latente
e baixo nível de
replicação epissomal
(E1, E2)
DNA epissomal
Membrana Células do HPV
Derme basal basais

Figura 13 – Desenho representando a replicação do HPV no epitélio escamoso

Inicialmente, como mostrado na figura anterior, o vírus permanece em estado epissomal nas células
basais da camada germinativa do epitélio escamoso (infecção latente) com baixo nível de replicação
viral. Com o amadurecimento das células escamosas, há uma intensa replicação viral. Há finalmente a
expressão dos genes com a produção das proteínas do capsídeo viral e a liberação das partículas virais
completas (vírions), que a partir daí infectam outras células

4.4.2 Manifestações clínicas da infecção pelo HPV

As manifestações clínicas da infecção pelo HPV são documentadas em 30% dos casos, sob a forma
de condiloma acuminado (verrugas) visível macroscopicamente, geralmente observado na vulva e
no períneo. A infecção latente não é detectada pelas técnicas convencionais de diagnóstico como
colposcopia, citologia e histopatologia, sendo demonstrada pelo encontro de DNA do HPV, através
de métodos de biologia molecular, em epitélios aparentemente normais. A infecção subclínica, ou
condiloma plano, corresponde a aproximadamente 70% das infecções pelo HPV, com a aplicação de
diferentes critérios para o seu diagnóstico. De um modo geral, é aceito que as lesões são evidenciadas
pelo exame colposcópico apenas após a aplicação do ácido acético, sendo também detectadas através
das alterações celulares nos esfregaços citológicos e na histologia.

Saiba mais

Você pode saber mais sobre o papilomavírus humano (HPV) por meio
dos textos indicados a seguir.

HAMMES, L. S.; NAUD, P. V.; MATOS, J. C. Reconhecimento pela


descoberta do Papiloma Vírus Humano (HPV). Revista HCPA, Porto Alegre,
v. 28, n. 3, p. 202-204, 2008. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/hcpa/
article/download/7246/4592. Acesso em: 31 maio 2020.

54
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde.


Departamento de Vigilância de Doenças Transmissíveis. Coordenação
Geral do Programa Nacional de Imunizações. Guia prático sobre HPV:
perguntas e respostas. Brasília: Ministério da Saúde, 2017. Disponível em:
https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2017/dezembro/07/
Perguntas-e-respostas-HPV-.pdf. Acesso em: 31 maio 2020.

4.4.3 Características citológicas da infecção pelo HPV

Segundo Solomon e Nayar (2005), a infecção pelo HPV é incluída no sistema Bethesda como lesão
intraepitelial escamosa de baixo grau. A prevalência da infecção pelo HPV diagnosticada citologicamente
varia entre 0,5 a 3% em mulheres da população geral, com ascensão desses percentuais para 8% a 13%
das pacientes atendidas em clínicas de doenças sexualmente transmissíveis.

As alterações citopáticas associadas à infecção pelo vírus incluem as descritas a seguir.

• Coilocitose: apesar de específica da infecção produzida pelo HPV, é observada nos esfregaços
citológicos apenas entre 20% a 33% dos casos. Ocorre em células escamosas superficiais e
intermediárias que exibem cavitação perinuclear bem demarcada com condensação periférica do
citoplasma, acompanhada de aumento do tamanho e hipercromasia nuclear, às vezes binucleação
e multinucleação, além de cromatina de aspecto borrado ou granular. É importante distinguir
o coilócito de células naviculares, células com halos inflamatórios e células metaplásicas com
citoplasma diferenciado em endo e ectoplasma. Apesar de grosseiramente apresentarem
semelhanças com o coilócito, neste último o clareamento perinuclear é maior, bem demarcado e
associado a núcleo anormal.

• Disqueratose: na infecção pelo HPV, disqueratócitos podem surgir na superfície do epitélio. Todavia,
tais células não são específicas da infecção. Disqueratócitos representam células escamosas em
miniatura ou do tamanho padrão com queratinização anormal revelando aumento nuclear,
hipercromasia, cromatina condensada e leves irregularidades da borda nuclear.

• Macrócitos: correspondem a células muito grandes, com citoplasma eosinofílico, cianofílico


ou policromático, contendo às vezes neutrófilos ou outras células escamosas. Os núcleos são
geralmente múltiplos, aumentados de volume, hipercromáticos. Não há alteração da relação
nucleocitoplasmática. Tais células não são específicas da infecção pelo HPV, podendo ser
encontradas também na deficiência de ácido fólico/vitamina B12 ou como efeito de radioterapia
e quimioterapia.

Observação

O termo disqueratose é alvo de discussão: para alguns autores, pode


representar células anormalmente queratinizadas sem atipia nuclear.

55
Unidade I

4.4.4 Outros métodos diagnósticos na detecção pelo HPV

Os exames mais sensíveis e específicos na detecção das infecções pelo HPV são os testes moleculares,
incluindo várias técnicas que detectam o DNA ou RNA do vírus. Entre eles, temos: southern blot, dot blot,
hibridização in situ, PCR e captura híbrida. O PCR é considerado a técnica mais sensível na identificação
do HPV, porém não tão específica, devido à maior possibilidade de diagnósticos falso-positivos gerados
especialmente pela manipulação inadequada das amostras no laboratório. O teste de captura híbrida é o
mais difundido no nosso meio devido a sua praticidade e efetividade: além de detectar o DNA do vírus,
identifica o grupo ao qual ele pertence (baixo risco ou alto risco) e estabelece a carga viral. É importante
ressaltar que esses testes moleculares não são diagnósticos das lesões associadas ao HPV, ou seja, a
detecção do DNA viral não indica necessariamente que a paciente seja portadora de lesão intraepitelial
escamosa (BARROS et al., 2012).

4.4.5 HPV e vacinas

Considerando que o HPV é condição necessária para o câncer cervical, a vacinação para prevenção
do HPV apresenta potencial para reduzir a carga de doença cervical e lesões precursoras. O Ministério
da Saúde adotou a vacina quadrivalente contra HPV que confere proteção contra HPV de baixo risco
(HPV 6 e 11) e de alto risco (HPV 16 e 18). Essa vacina previne infecções pelos tipos virais presentes na
vacina e, consequentemente, o câncer do colo do útero, além de reduzir a carga da doença. Tem maior
evidência de proteção e indicação para pessoas que nunca tiveram contato com o vírus.

O objetivo da vacinação contra HPV no Brasil é prevenir o câncer do colo do útero, refletindo na
redução da incidência e da mortalidade por essa enfermidade. Desfechos como prevenção de outros
tipos de câncer induzidos pelo HPV e verrugas genitais são considerados desfechos secundários. A
população-alvo da vacinação com a vacina HPV é composta de adolescentes do sexo feminino na faixa
etária entre 11 e 13 anos no ano da introdução da vacina em 2014. A população-alvo, em 2015, foi a
faixa etária de 9 a 11 anos, no segundo ano de introdução da vacina, e de 9 anos de idade do terceiro
ano em diante, em 2016.

A vacina HPV é indicada para a imunização ativa contra os genótipos de baixo risco HPV 6 e 11 e de
alto risco HPV 16 e 18. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS ou WHO, na sigla em ingês), a
prevenção secundária compõe as estratégias para a detecção precoce do câncer do colo do útero. As
principais são o diagnóstico precoce, através da abordagem de pessoas com sinais e/ou sintomas, e o
rastreamento, pela realização do exame na população assintomática (aparentemente saudável), com o
objetivo de identificar precocemente lesões precursoras ou sugestivas de câncer (WHO, 2013).

Segundo as Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do Câncer do Colo do Útero (INCA, 2011a),
o rastreamento deve ser realizado através do exame citopatológico de esfregaço cérvico-vaginal,
conhecido como exame Papanicolau, por todas as mulheres entre 25 e 64 anos de idade, a cada três
anos (após dois exames anuais consecutivos negativos).

Até o momento, os componentes mais importantes para redução da morbimortalidade pelo câncer
do colo do útero são a alta cobertura do rastreamento na população-alvo e o tratamento de lesões
56
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

precursoras quando diagnosticadas. Com a introdução da vacina HPV no Brasil, as recomendações


vigentes para o rastreamento do câncer o colo do útero não deverão ser alteradas, uma vez que não há
evidências que justifiquem qualquer mudança.

Alguns aspectos importantes quanto ao controle do câncer do colo do útero são destacados a seguir.

• Realização do rastreamento nas adolescentes vacinadas quando atingirem a idade recomendada.

• Acompanhamento da qualidade e da sensibilidade do exame citopatológico. Nesse sentido, o


Ministério da Saúde implantou a Qualificação Nacional em Citopatologia na Prevenção do câncer
do colo do útero (QualiCito), através da Portaria MS/GM n. 1.504/2013, definindo ações de controle
de qualidade laboratorial e de gestão.

• Implantação do Sistema de Informação do Câncer (Siscan) em substituição ao Sistema de Informação


do Câncer do Colo do Útero (Siscolo). O Siscan está integrado ao cartão do SUS, permitindo a
identificação da mulher atendida e a futura inclusão da informação de vacinação contra HPV.

• Realização de estudos de monitoramento dos genótipos de HPV a médio e longo prazo. Para tanto,
é necessária uma nova infraestrutura operacional e de vigilância epidemiológica no país, incluindo
suporte laboratorial para identificação e monitoramento da circulação dos subtipos virais.

Resumo

O diagnóstico precoce do câncer de colo uterino é mundialmente


realizado por intermédio do exame citopatológico ou exame de
Papanicolaou, como é mais conhecido. O Ministério da Saúde vem
incentivando a realização do exame citopatológico por meio de campanhas
de saúde pública a fim de reduzir a incidência de câncer de colo uterino. Tal
exame consiste em analisar as células provenientes da ectocérvice (células
escamosas superficiais, intermediárias, parabasais e basais) e endocérvice
(células endocervicais e endometriais) do colo uterino, particularmente da
junção escamocolunar (JEC) (células metaplásicas), porque esse é o local
em que se origina a maioria das neoplasias.

O exame citopatológico, amplamente utilizado para o rastreamento do


câncer de colo uterino, depende uma boa técnica de coleta na qual todos
os epitélios devem estar representados e com uma grande quantidade de
células, fixação adequada na amostra toda. Além disso, o recebimento e o
processamento da amostra devem ser realizados com qualidade, assim como
a interpretação das alterações citopatológicas necessita escrutínio. Com isso,
conseguimos identificar não somente as lesões precursoras e o câncer, como
também auxiliar na detecção de infecções sexualmente transmissíveis.

57
Unidade I

Na coleta de material para o exame citopatológico (Papanicolau), o


primeiro passo é o preenchimento adequado do formulário de requisição do
exame com letra legível e com todos os dados pessoais e da unidade de saúde
corretos. O procedimento de coleta propriamente dito deve ser realizado na
ectocérvice e na endocérvice, usando-se a espátula de Ayres e a escovinha
tipo Campos da Paz. Após a coleta, a fixação desse material na lâmina deve ser
imediata. É fundamental não esquecer que essa lâmina e a caixa (ou frasco)
devem estar corretamente identificadas, da mesma forma que o formulário
de requisição de exames deve estar preenchido, todos a lápis grafite.

Outros pontos que merecem atenção são: registro do exame no


laboratório; conferência de todos os dados e identificação da amostra;
observação das condições do esfregaço citológico ao chegar no laboratório
(se possível registrar); identificação dos esfregaços citológicos comparando
com a requisição de pedido do exame (no qual deverão constar dados
pessoais da paciente, tipo de exame, dados clínicos pertinentes); cadastro
em banco de dados para gerar um número de registro da amostra.

Na fase proliferativa, também chamada de fase folicular, o folículo


cresce e se prepara para a ovulação. Esse crescimento é estimulado pelo
hormônio FSH, e, à medida que cresce, o folículo começa a produzir
estrógenos, um grupo de hormônios que estimulam o desenvolvimento do
endométrio. Nesse processo, vários folículos são estimulados, mas apenas
um deles termina o crescimento, acumulando líquido em seu interior e se
transformando em um folículo maduro (ou folículo de Graaf). Ao atingir
um determinado nível no sangue, o estrógeno começa a estimular a
hipófise a liberar grandes quantidades de LH e FSH, os quais irão induzir
a ovulação, que geralmente ocorre no décimo quarto dia após o início do
ciclo menstrual.

Na fase secretória, também conhecida como fase lútea, o LH estimula


as células do folículo ovariano rompido a se transformarem em corpo
amarelo (também chamado de corpo lúteo). É no corpo lúteo que ocorrerá
a produção de estrógeno e progesterona. Caso não ocorra a fecundação
do ovócito secundário, ocorrerá a fase menstrual. Nessa fase, o corpo
lúteo se degenera, parando de produzir progesterona e estrógeno. A queda
na produção desses hormônios faz com que o útero sofra descamação,
ocorrendo a menstruação, que pode durar de três a sete dias, dependendo
da mulher e de suas condições fisiológicas. Essa queda nas taxas de
progesterona e estrógeno faz com que a hipófise volte a produzir FSH,
reiniciando o ciclo menstrual.

A primeira menstruação ocorre na puberdade (menarca). Após os 50 anos


de idade, a produção de hormônios sexuais femininos declina, a ovulação
58
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

e os ciclos menstruais se tornam irregulares, até cessarem completamente.


Nessa fase, conhecida como menopausa, não há mais atividade reprodutiva
no corpo da mulher.

Citologia cérvico-vaginal normal: células escamosas superficiais são


células maduras, com núcleo denso e picnótico que pode ou não ser
circundado por um halo, já o citoplasma apresenta formato poligonal,
achatado e costuma ter uma coloração eosinofílica.

Células escamosas intermediárias são células que descamam


isoladamente ou em aglomerados, os núcleos têm a forma redonda
ou ovalada, com a cromatina nuclear finamente granulada na qual
conseguimos identificar os cromocentros da cromatina sexual (os nucléolos
são invisíveis). Já o citoplasma tem o seu formato elíptico ou esférico, rico
em glicogênio, podendo conter vacúolos ou não.

Células escamosas parabasais são células em formato ovalado ou


esférico, com núcleos vesiculosos, com cromatina finamente granular e
citoplasma cianofílico bem delimitado. Aparecem predominantemente na
menopausa, por vezes em esfregaços de mulheres jovens com processo
infeccioso ou traumático.

Células endocervicais apresentam formas variadas conforme seu


posicionamento no esfregaço; no seu formato colunar, possuem citoplasma
transparente e núcleo esférico. No seu formato achatado, são visualizados
grupos de células que descamam em lençóis, chamados “favo de mel”, com
seus núcleos centrais circundados por citoplasma transparente e claro.

As células endometriais de origem glandular são cilíndricas ou cuboides


e apresentam-se de forma isolada ou em pequenos agrupamentos, seus
núcleos são esféricos ou ovalados, a cromatina se apresenta finamente
granular, pequenos nucléolos são ocasionalmente visíveis e seu citoplasma
geralmente é cianofílico e vacuolizado. As células endometriais de
origem estromal são células isoladas de difícil identificação ou pequenos
agrupamentos chamados êxodos.

A microbiota vaginal é formada principalmente por lactobacilos,


entre outras espécies de microrganismos saprófitos. Quando ocorre
um desequilíbrio, podemos observar reações inflamatórias ou não
causando alterações nas células epiteliais e evidenciando a presença
de bactérias, fungos, vírus e protozoários. Há a presença de uma reação
inflamatória quando ocorre o aumento de células no local da inflamação
como macrófagos e leucócitos e, com isso, pode haver o aumento ou a
diminuição do pH, na qual ocorre uma substituição dos lactobacilos por
59
Unidade I

bactérias anaeróbias facultativas como Gardnerella vaginalis, Bacteroides


sp. Mobiluncus sp. e Mycoplasma sp.

Candida sp. (C. albicans e não albicans: C. glabrata e C. tropicalis):


na presença desse fungo, encontramos as estruturas de hifas e esporos,
além de algumas alterações celulares inflamatórias como aumento do
volume e hipercromasia nuclear, binucleações, hiperceratinização, halos
perinucleares, eosinofilia e aumento de leucócitos.

Trichomonas vaginalis (protozoário flagelado anaeróbio facultativo): no


exame de Papanicolau, encontramos organismos verde-acizentados, ovais
ou em forma de pera, com um núcleo pequeno excentricamente localizado.
Pode ocorrer aumento de leucócitos, de células parabasais e alterações
celulares inflamatórias, como halos perinucleares frequentes.

Herpes genitalis (tipo 1 e 2): esse vírus pode infectar células escamosas
intermediárias, metaplásicas ou endocervicais. São visualizadas células
multinucleadas, com núcleos amoldados, pálidos (aspecto de “vidro fosco”)
e contendo inclusões eosinofílicas envoltas por halo claro.

É de extrema importância para o estudante da área o conhecimento


e a correta diferenciação das células, das alterações citopatológicas e dos
agentes microbiológicos presentes nas amostras, bem como a interpretação
do laudo para um bom diagnóstico, diminuindo, assim, as altas incidências
de câncer de colo uterino.

Exercícios

Questão 1. (Enade 2013) A vacina quadrivalente contra o HPV é comercializada no Brasil desde
2006 e é formulada contra os subtipos 6 e 11, os principais causadores de verrugas genitais, e contra
os subtipos 16 e 18, responsáveis por 70% dos casos de câncer de colo uterino. Para produção dessa
vacina são utilizadas técnicas moleculares avançadas nas quais a proteína viral L1 de cada tipo de vírus
é produzida em laboratório. Essas proteínas se organizam espontaneamente formando os capsômeros e, em
seguida, uma estrutura semelhante ao vírus inteiro que é chamada de Partícula Semelhante a Vírus
(VLP, de virus like particules). As VLPs são mais imunogênicas que as proteínas solúveis utilizadas nas
vacinas convencionais e não apresentam potencial infeccioso nem oncogênico, pois não possuem
material genético viral.

VESPA JR., N. Vacina quadrivalente contra HPV 6, 11, 16, 18: a mais nova ferramenta de prevenção.
Jornal Brasileiro de Doenças Sexualmente Transmissíveis, v. 18, n. 4, p. 220-223, 2006 (adaptado).

Com base no texto anterior, avalie as afirmações seguintes.

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CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

I - A produção das VLPs foi realizada por meio do cultivo do vírus em laboratório e posterior
purificação das proteínas L1 e união espontânea para formação das VLPs.

II - Para produção das VLPs, foi feito inicialmente cultivo do HPV de interesse em laboratório, clonagem
do gene L1 de cada tipo de HPV e, em seguida, foi feita a expressão de cada uma das proteínas L1
recombinantes, e posterior purificação da VLP.

III - As VLPs dos diferentes tipos de HPV foram produzidas e mantidas em laboratório para posterior
purificação e utilização como vacina.

É correto o que se afirma em:

A) I, apenas.

B) II, apenas.

C) I e III, apenas.

D) II e III, apenas.

E) I, II e III.

Resposta correta: alternativa B.

Análise das assertivas

I - Assertiva incorreta.

Justificativa: as VLPs são produzidas a partir das proteínas L1.

II - Assertiva correta.

Justificativa: com o avanço da biologia molecular e da engenharia genética, temos hoje uma nova
realidade, a vacina contra HPV. Consegue-se em laboratório a realização da vacina a partir da proteína
de L1, principal proteína da capa externa do vírus. E, através de um autoarranjo das proteínas L1, serão
formadas as VLPs (Virus Like-Particles ou Partículas Semelhantes a Vírus). Essas partículas demonstraram
induzir uma forte resposta à produção de anticorpos quando administradas em humanos, fazendo com
que o organismo identifique as VLPs como um invasor e produza uma resposta imunitária.

III - Assertiva incorreta.

Justificativa: trata-se de uma vacina recombinante, sendo necessária a clonagem do L1.

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Unidade I

Questão 2. (Enade 2013) A detecção precoce do câncer de colo uterino é feita por um exame
tecnicamente simples e de baixo custo, a partir do esfregaço cérvico-vaginal. Esse exame também é
conhecido como exame citológico, de lâmina, citopatológico ou citologia cérvico-vaginal. Embora o
principal propósito da citologia cérvico-vaginal seja a detecção das lesões precursoras do câncer cervical,
o achado de condições infecciosas/reativas também pode contribuir para a saúde da mulher. Um dos
fatores de risco para o câncer de colo uterino é o histórico de infecções sexualmente transmissíveis, sendo
comprovada essa relação por vários estudos epidemiológicos realizados no Brasil. Dessa forma, tem
crescido o interesse na utilização do exame preventivo do câncer de colo uterino para o reconhecimento
de infecções cérvico-vaginais, como uma importante alternativa diagnóstica.

Coilocitose Binucleação
A) B)

Figura 14 - Esfregaço cérvico-vaginal indicando características celulares de coilocitose e binucleação


(à esquerda) e esfregaço cérvico-vaginal mostrando células-guia, sendo que as setas indicam células
escamosas recobertas por densas colônias de microrganismos (à direita)

Considerando o texto e a figura anterior, é correto afirmar que:

A) As figuras A e B revelam características celulares que indicam provável infecção pelo Papiloma
Vírus Humano (HPV), visto que a coilocitose e a binucleação observadas em células da figura
A, assim como a presença de “células-guia”, recobertas por densas colônias de microrganismos,
observadas na figura B, são características da infeção por HPV.

B) As figuras A e B revelam características celulares que indicam provável infecção por Gardnerella
vaginalis, visto que a coilocitose e a binucleação observadas em células da figura A, assim como a
presença de “células-guia” recobertas por densas colônias de microrganismos, são observadas na
figura B, características da infecção por Gardnerella vaginalis.

C) A figura A revela características celulares indicativas de provável infecção por Gardnerella


vaginalis, visto que a coilocitose e a binucleação observadas em células desse esfregaço são típicas
da infecção por essa bactéria.

D) A figura B revela características celulares indicativas da infecção por HPV, visto que a presença
de “células-guia”, recobertas por densas colônias de microrganismos, é característica da infeção
por esse vírus.

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CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA

E) A figura A revela características celulares indicativas de provável infeção pelo Papiloma Vírus
Humano (HPV), visto que a coilocitose e a binucleação observadas em células desse esfregaço
são típicas da infecção por HPV. A figura B revela características celulares indicativas de provável
infecção por Gardnerella vaginalis.

Resposta correta: alternativa E.

Análise das alternativas

A) Alternativa incorreta.

Justificativa: a figura B aparece recoberta por colônias de microrganismos, indicando Gardnerella


vaginalis, um cocobacilo que adere ao citoplasma das células superficiais e intermediárias (células-guia).
A infecção por HPV está associada aos coilócitos.

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: Gardnerella vaginalis está associada à figura A, apenas.

C) Alternativa incorreta.

Justificativa: a figura B revela características celulares indicativas de provável infecção por Gardnerella
vaginalis. Coilocitose e binucleação são típicas da infecção por HPV.

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: a figura B revela somente características indicativas de Gardnerella vaginalis.

E) Alternativa correta.

Justificativa: a figura A revela características celulares indicativas de provável infecção pelo


Papiloma Vírus Humano (HPV), visto que a coilocitose e a binucleação observadas em células desse
esfregaço são típicas da infecção por HPV. A figura B revela características celulares indicativas de
provável infecção por Gardnerella vaginalis. De fato, o sinal clássico de infecção pelo HPV observado nos
esfregaços cérvico‑vaginais são os coilócitos e as características de infecção por Gardnerella vaginalis
são as células-guia recobertas por cocos e bacilos.

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