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Citologia Clínica
Autoras: Profa. Juliana Alves Garcia
Profa. Márcia Cristina Pena Figueiredo
Profa. Erika Simone Lopes
Colaboradores: Prof. Flávio Buratti Gonçalves
Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano
Professoras conteudistas: Juliana Alves Garcia /
Márcia Cristina Pena Figueiredo / Erika Simone Lopes
Graduada em Biomedicina pelo Centro Universitário Barão de Mauá (2000-2003) e mestre em Ciências (área de concentração:
Infectologia em Saúde Pública) pelo Programa de Pós-graduação em Ciências da Coordenadoria de Controle de Doenças da Secretaria de
Estado da Saúde (PPG-CCD-SES). Possui habilitação nas áreas de Análise Ambiental, Citologia Oncótica e Patologia Clínica (Análises Clínicas).
Atuou no setor de Microbiologia e Parasitologia do Grupo Fleury (2006-2011), possui curso de Capacitação Profissional em Pesquisa
Clínica pela Invitare Pesquisa Clínica e de Gestão em Saúde pelo CRBM 1/SP (2010), além de formação de Auditor Interno ISO 9001:2008
pela Formato Clínico (2011).
Atualmente, é professora adjunta I e coordenadora auxiliar do curso de Biomedicina, campus Anchieta, na Universidade Paulista.
Desde 2015, leciona na Universidade Paulista para os cursos da graduação de Biomedicina, nas seguintes disciplinas: Biossegurança,
Parasitologia, Parasitologia Clínica, Coleta de Material Biológico, Métodos e Técnicas em Análises Clínicas, Gestão Laboratorial e Controle
de Qualidade, Microbiologia Básica e Interpretação Clínica e Laboratorial.
Biomédica formada pela Universidade de Marília, mestre em Pesquisa e Desenvolvimento (Biotecnologia Médica) pela Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2005) e doutora em Oncologia na Fundação Antônio Prudente - A. C. Camargo Cancer Center
(2014). Atualmente, é docente e coordenadora auxiliar do curso de Biomedicina (Campus Norte) na Universidade Paulista. Desde 2015,
leciona na Universidade Paulista para os cursos da graduação de Biomedicina, nas seguintes disciplinas: Hemoterapia, Hematologia,
Biossegurança, Citopatologia e Citologia Clínica, Biomedicina interdisciplinar, Métodos e Técnicas em Análises Clínicas.
Graduada em Ciências Biológicas (Modalidade Médica) pela Centro Universitário Barão de Mauá (1999), habilitada em Análises Clínicas
e Citologia Oncótica, mestre pela Universidade Estadual de Campinas (2007). Atuou como citologista no Laboratório de Citopatologia do
CAISM/Unicamp (2002/2008). Atualmente, é prestadora de serviço para o Laboratório de Patologia na área de citopatologia diagnóstica.
No ambiente universitário, foi coordenadora de curso de Biomedicina da Universidade Paulista, Campus Jundiaí (2007-2013). Como
docente universitária, ministra aulas nas disciplinas de Citologia, Histologia e Embriologia, Citopatologia, Fisiopatologia, Reprodução
Humana, Biossegurança.
CDU 576.385
U508.49 – 20
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Deise Alcantara Carreiro – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos
Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto
Revisão:
Talita Lo Ré
Giovanna Oliveira
Sumário
Citopatologia e Citologia Clínica
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................9
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................9
Unidade I
1 HISTÓRICO E IMPORTÂNCIA DA CITOPATOLOGIA EM MEDICINA PREVENTIVA.
CONTEXTUALIZAÇÃO DO LABORATÓRIO DE CITOPATOLOGIA............................................................ 11
1.1 Histórico e importância da citopatologia na biomedicina................................................... 11
1.2 Histórico e importância da citopatologia em medicina preventiva................................. 13
1.3 Contextualizando o laboratório de citopatologia.................................................................... 15
1.3.1 Controle de qualidade dos exames citopatológicos:
avaliação pré-analítica e tipos das amostras.......................................................................................... 23
1.3.2 Transporte................................................................................................................................................... 25
1.3.3 Critérios de aceitação e rejeição de amostras.............................................................................. 25
2 ANATOMIA DO APARELHO GENITAL FEMININO................................................................................... 28
2.1 Histologia do aparelho genital feminino..................................................................................... 30
2.1.1 Vulva............................................................................................................................................................. 30
2.1.2 Vagina........................................................................................................................................................... 30
2.1.3 Ovários e tubas uterinas....................................................................................................................... 31
2.1.4 Útero............................................................................................................................................................. 31
3 COLETA E PROCESSAMENTO DE MATERIAL PARA EXAME CITOPATOLÓGICO.......................... 34
3.1 Coleta de Papanicolau......................................................................................................................... 34
3.1.1 Preparação da lâmina para o exame citopatológico................................................................. 36
3.1.2 Coleta de material em meio líquido................................................................................................. 38
3.2 Colorações de Papanicolaou e coloração de Shorr................................................................. 40
4 ANÁLISE DA CITOPATOLOGIA CÉRVICO-VAGINAL EM DIVERSAS CONDIÇÕES....................... 41
4.1 Análise da citopatologia cérvico-vaginal em condições
hormonais basais, pré-menarca, gravidez e menopausa.............................................................. 42
4.1.1 Pré-menarca.............................................................................................................................................. 42
4.1.2 Gravidez....................................................................................................................................................... 44
4.1.3 Menopausa................................................................................................................................................. 44
4.2 Padrões citológicos nas diferentes fases da vida da mulher............................................... 45
4.3 Análise da citopatologia cérvico-vaginal em condições inflamatórias,
infecciosas (bacterianas, fúngicas, infecções por protozoários)................................................ 47
4.3.1 Infecções bacterianas............................................................................................................................. 48
4.4 Análise da citopatologia cérvico-vaginal em condições de
infecções virais (herpes, HPV).................................................................................................................. 51
4.4.1 Tipos de HPV.............................................................................................................................................. 52
4.4.2 Manifestações clínicas da infecção pelo HPV.............................................................................. 54
4.4.3 Características citológicas da infecção pelo HPV....................................................................... 55
4.4.4 Outros métodos diagnósticos na detecção pelo HPV............................................................... 56
4.4.5 HPV e vacinas............................................................................................................................................ 56
Unidade II
5 CLASSIFICAÇÕES DO EXAME CITOPATOLÓGICO CÉRVICO-VAGINAL........................................... 64
5.1 Classificação de Papanicolau............................................................................................................ 64
5.2 Classificação de Reagan..................................................................................................................... 64
5.3 Classificação de Richart...................................................................................................................... 64
5.4 Classificação de Bethesda.................................................................................................................. 65
5.5 Nomenclatura brasileira para laudos citopatológicos cervicais......................................... 69
5.5.1 Tipos de amostra...................................................................................................................................... 70
5.5.2 Adequabilidade da amostra................................................................................................................. 70
5.5.3 Material examinado, dentro dos limites de normalidade....................................................... 71
5.5.4 Alterações benignas das células (ativas ou reparativas).......................................................... 71
5.5.5 Presença de metaplasia escamosa imatura no resultado....................................................... 71
5.5.6 Anormalidades (atipias) celulares..................................................................................................... 71
5.5.7 Anormalidades de células escamosas.............................................................................................. 72
5.5.8 Anormalidades de células glandulares endocervicais............................................................... 72
5.5.9 Alterações em células escamosas...................................................................................................... 73
6 ACHADOS ENCONTRADOS NO EXAME CITOPATOLÓGICO CÉRVICO-VAGINAL....................... 75
6.1 Células escamosas atípicas................................................................................................................ 75
6.2 Células glandulares atípicas.............................................................................................................. 76
6.3 Graduação das lesões cérvico-vaginais........................................................................................ 77
6.3.1 Lesão intraepitelial escamosa de baixo grau................................................................................ 77
6.3.2 Lesão intraepitelial escamosa de alto grau (NIC 3/carcinoma in situ)............................... 78
6.4 Neoplasias malignas cérvico-vaginais.......................................................................................... 79
6.4.1 Carcinoma escamoso (epidermoide) invasor................................................................................ 79
6.4.2 Adenocarcinoma endocervical in situ............................................................................................. 80
6.4.3 Adenocarcinoma endocervical invasivo......................................................................................... 81
6.4.4 Adenocarcinoma endometrial............................................................................................................ 82
6.5 Outros métodos diagnósticos complementares à citopatologia cérvico-vaginal...... 83
6.5.1 Citologia em meio líquido.................................................................................................................... 83
6.5.2 Reação de cadeia de polimerase (PCR)........................................................................................... 85
6.5.3 Captura híbrida......................................................................................................................................... 86
6.5.4 Imuno histoquímica................................................................................................................................ 86
Unidade III
7 CITOPATOLOGIA E VIAS RESPIRATÓRIAS: ANATOMIA E HISTOLOGIA
DO SISTEMA RESPIRATÓRIO............................................................................................................................ 91
7.1 Células do pulmão................................................................................................................................ 92
7.2 Coleta e confecção dos esfregaços................................................................................................ 94
7.2.1 Punção......................................................................................................................................................... 94
7.2.2 Escovados.................................................................................................................................................... 96
7.2.3 Lavados........................................................................................................................................................ 97
7.2.4 Materiais obtidos espontaneamente............................................................................................... 97
7.3 Tipos de amostras.................................................................................................................................. 98
7.3.1 Adequabilidade das amostras............................................................................................................. 99
7.4 Análise da citologia normal do sistema respiratório e citopatologia
neoplásica do sistema respiratório........................................................................................................ 99
7.4.1 Cânceres pulmonares de pequenas células.................................................................................100
7.4.2 Cânceres pulmonares de células não pequenas........................................................................101
8 CITOPATOLOGIA DA MAMA: ANATOMIA E HISTOLOGIA DA MAMA...........................................103
8.1 Coleta e confecção dos esfregaços, análise da citologia normal da
mama e citopatologia neoplásica da mama....................................................................................106
8.1.1 Carcinoma in situ...................................................................................................................................108
8.1.2 Carcinoma invasor.................................................................................................................................109
8.1.3 Carcinoma ductal................................................................................................................................... 110
8.2 Citopatologia do trato urinário: anatomia e histologia do trato urinário..................110
8.2.1 Coleta e confecção dos esfregaços................................................................................................ 112
8.2.2 Análise da citologia normal do trato urinário e citopatologia
neoplásica do trato urinário......................................................................................................................... 113
APRESENTAÇÃO
Esta disciplina tem como objetivo atualizar você, aluno, possuindo grande aplicabilidade no diagnóstico
de doenças, especialmente na detecção de lesões cancerosas. A citologia oncótica tem por objetivo
analisar as células de forma individualizada, intervindo na detecção de células anormais. Para um
diagnóstico confiável, por meio da técnica de citologia, são fundamentais a realização de uma coleta
de material adequada, a preparação correta das lâminas e uma análise fidedigna do material. A área de
citologia oncótica é uma importante área de atuação, porém ainda é pouco difundida, o que justifica
nosso interesse no presente tema.
Bons estudos!
INTRODUÇÃO
A presente disciplina tem como base aprender os recursos de apoio diagnóstico em citopatologia e
de interpretação de exames patológicos e normais utilizados no laboratório.
Ao final desta disciplina, esperamos que você seja capaz de realizar uma análise dessas condutas e
interferir, de forma eficaz, na compreenção no processo de citopatologia clínica (esfoliativa ou oncótica)
nas diversas doenças que acometem os seres humanos, atuando de modo relevante na promoção e
orientação da saúde.
9
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
Unidade I
1 HISTÓRICO E IMPORTÂNCIA DA CITOPATOLOGIA EM MEDICINA PREVENTIVA.
CONTEXTUALIZAÇÃO DO LABORATÓRIO DE CITOPATOLOGIA
A Biomedicina começou no Brasil em 1966. Desde seu início, o curso passou por inúmeras mudanças
curriculares, ampliando as suas habilitações e qualificando seus profissionais na área de saúde. Pela
primeira vez, a categoria biomédica contribui para um projeto interministerial (MEC/MS), fundamental
para o sucesso dos programas de saúde no país e da própria formação profissional (CFBM, [s.d.]b).
Hoje a Biomedicina tem 30 habilitações, entre elas a citopatologia oncótica, conforme resoluções
n. 78 (CFBM, 2002a) e n. 83 (CFBM, 2002b), de 29/04/2002, do Conselho Federal de Biomedicina, e está
referendada como profissão da área da saúde de acordo com a Resolução n. 287 do Conselho Nacional
de Saúde/Ministério da Saúde e pelo Ministério da Educação (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1998).
A Resolução n. 78 (CFBM, 2002a), de 29 de abril de 2002, que dispõe sobre o ato profissional biomédico,
fixa o campo de atividade do Biomédico e cria normas de Responsabilidade Técnica. No Capítulo II,
artigos 2 e 3, é dito que, para o reconhecimento das habilitações elencadas, além da comprovação em
currículo, deverá o profissional comprovar a realização de estágio mínimo, com duração igual ou superior
a 500 horas, em instituições oficiais, ou particulares, reconhecidas pelo órgão competente do Ministério
da Educação ou em laboratórios conveniados com instituições de nível superior, ou especialização ou
curso de pós-graduação reconhecido pelo MEC. Segundo o artigo 7, os biomédicos poderão realizar
toda e qualquer coleta de amostras biológicas dos diversos exames, assim como supervisionar os
respectivos setores de coleta de material biológicos de qualquer estabelecimento a que isso se destine
– excetuam-se as biopsias, coleta de líquido céfalo-raquidiano (líquor) e punções para obtenção de
líquidos cavitários em qualquer situação. O texto dispõe ainda sobre o rol de atividades para fins
de inscrição e fiscalização dos profissionais biomédicos, técnicos, tecnólogos nas áreas de acupuntura,
estética, citologia e anatomia patológica e imagenologia, junto aos conselhos regionais de biomedicina.
Nessa normativa, estão descritas todas as atividades que o biomédico poderá realizar, entre elas:
• Metodologias em citopatologia:
• Diagnóstico citopatológico:
— Citologia cérvico-vaginal.
— Citologia mamária.
12
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
— O profissional biomédico tem responsabilidade pela análise das amostras citológicas, bem como
por firmar o respectivo laudo.
O desenvolvimento da citologia está associado com o desenvolvimento das lentes ópticas e sua combinação
para construir o microscópio composto. Em 1665, Robert Hooke, por meio de lentes de aumento, observou
que fragmentos de cortiça eram compostos de pequenas cavidades em formato poliédrico, as quais foram
denominadas células. Essa foi a primeira vez que tal terminologia foi utilizada. A partir das constatações de
Hooke, outros pesquisadores reproduziram a mesma informação (ROBERTIS; HIB, 2001).
A partir dessas descobertas, o avanço da citologia foi rápido. Quando observamos a história da
biologia celular no século passado e no início deste, vemos que o conhecimento se desenvolveu em
função de dois motivos principais: primeiro, pelo aumento do poder de resolução dos instrumentos
de análise e pelo desenvolvimento de novas tecnologias; segundo, pela convergência da citologia com
outros ramos de investigações biológicas, como genética, fisiologia, bioquímica e imunologia.
excepcional para a detecção precoce do câncer cervical, o que se repete até os dias de hoje (CARVALHO;
QUEIROZ, 2010).
Em 1925 ele identificou células cancerígenas no esfregaço vaginal de uma voluntária. Diante da
relevância da descoberta, examinou outras mulheres sabidamente com câncer de útero, confirmando
esse diagnóstico no esfregaço vaginal. Apresentou sua técnica simples e eficaz em 1928, mas seu trabalho
foi desprezado pelos dez anos seguintes. Em 1939, conseguiu iniciar o exame do esfregaço vaginal
em mulheres no Hospital de Nova York, detectando um número considerável de cânceres precoces.
Papanicolau passou a próxima década lutando para provar o valor dos testes e treinando técnicos
e patologistas para interpretar esses esfregaços. No seu trabalho “O valor diagnóstico do esfregaço
vaginal no diagnóstico do câncer do útero”, publicado em 1941 no American Journal of Obstetrics
and Gynecology (PAPANICOLAOU; TRAUT, 1941), demonstrou os diferentes tipos de células malignas
encontrados em pacientes com câncer. Humildemente escreveu que ainda não tinha encontrado uma
prova diagnóstica infalível, mas sabia que sua experiência estava de acordo com o resultado das biopsias
(PAPANICOLAOU; TRAUT, 1941). Alguns eminentes ginecologistas reagiram à publicação, sugerindo que
o exame não estava sendo usado em nenhum serviço de ginecologia. Vida dura desse humanista, que
preferiu a penumbra de seu laboratório aos holofotes, isso porque ele buscava fazer algo digno de um
homem ético e forte, e não a riqueza. Nesse mesmo ano, Papanicolaou criou a primeira terminologia
(classe I, II, III, IV e V) para classificar células normais e diferentes tipos de alterações citológicas
encontradas na cérvice. Não desanimou e continuou ensinando a importância de um trabalho sério,
dedicado e baseado na disciplina. Escreveu mais de 150 artigos científicos, recebeu diversos prêmios,
tendo sido indicado por cinco vezes ao Nobel de Medicina, nunca tendo ficado clara a razão de jamais
ter sido o escolhido. Tornou-se professor emérito da Cornell, em 1951, e dez anos depois foi dirigir o
Instituto do Câncer de Miami, mas faleceu três meses após, devido a um infarto do miocárdio.
A citologia oncótica é a análise microscópica das características das células de nosso corpo em
qualquer localização, a fim de detectar lesões tumorais. É um método de rastreamento do câncer de
colo uterino utilizado desde 1950 em diversos países na busca de alterações cervicais em mulheres
sexualmente ativas (MÜLLER; MAZIERO, 2010). A citologia oncótica possui sua importância na prevenção
e no diagnóstico do câncer de colo uterino como um exame simples e barato que tem a capacidade de
detectar lesões pré-neoplásicas do colo do útero, possibilitando ao clínico intervir no desenvolvimento
do carcinoma invasor (ressaltando que a citologia oncótica também é utilizada para rastreamento de
outros tipos de cânceres que não o uterino).
O laboratório clínico que realiza exames citopatológigos deve estar limpo, bem iluminado e bem
ventilado. A área de preparação de amostras deve estar separada daquela onde espécimes são avaliados,
e os microscópicos binoculares devem ser de boa qualidade, em quantidade suficiente e sob um contrato
de serviço de manutenção periódica. A organização dos móveis, como mesas e cadeiras dos citologistas,
deve ser bem planejada para garantir conforto aos profissionais e preservá-los de riscos ergonômicos.
Todos os programas de estabelecimentos assistenciais de saúde devem ser compatíveis com a disposição
de normas – particularmente, a RDC n. 50/2002 (ANVISA, 2002) –, além de atender a todas as outras
prescrições adequadas ao objeto de uma padronização estabelecida em códigos, leis, decretos, portarias
e normas federais, estaduais e municipais (HINRICHSEN, 2018).
A RDC n. 302 (ANVISA, 2005) dispõe sobre o regulamento técnico para o funcionamento de
laboratórios clínicos. Do ponto de vista ético e legal, essa RDC é de grande importância para a área
laboratorial, pois normatiza e oferece uma diretriz mínima, a qual os laboratórios são obrigados a seguir.
Teoricamente, os laboratórios devem cumprir metas mínimas de qualidade, organização e preços.
A fase imediatamente anterior à coleta de sangue para exames laboratoriais, definida na RDC n. 302
como a fase que se inicia com a solicitação da análise, passando pela obtenção da amostra e finalizando
quando se inicia a análise propriamente dita, deve ser objeto de atenção por parte de todas as pessoas
envolvidas no atendimento dos pacientes, com a finalidade de prevenir a ocorrência de falhas ou a
introdução de variáveis que possam comprometer a exatidão dos resultados.
Agora, vamos aos pontos principais sobre a RDC n. 302. Essa resolução é aplicável a todos os serviços
públicos ou privados que realizam atividades laboratoriais na área de análises clínicas, patologia clínica
e citologia. Suas condições gerais são:
• Organização:
— O laboratório clínico e o posto de coleta devem possuir alvará atualizado expedido pelo órgão
sanitário competente.
15
Unidade I
— O profissional legalmente habilitado poderá ser o responsável técnico de apenas dois locais
(laboratório e posto de coleta).
— Todo laboratório clínico e posto de coleta deve estar inscrito no Cadastro Nacional de
Estabelecimentos de Saúde (CNES).
— O laboratório e o posto de coleta devem dispor de instruções escritas das rotinas e informações
aos clientes.
• Recursos humanos:
— Devem ser mantidos os registros de formação e qualificação dos profissionais compatíveis com
as funções desempenhadas.
— A admissão deve ser precedida do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO).
• Infraestrutura:
— A infraestrutura deve obedecer à RDC n. 50 (ANVISA, 2002) e à RDC n. 189 (ANVISA, 2003).
• Processos operacionais:
— O laboratório e o posto de coleta devem exigir um documento oficial com foto do paciente no
momento do atendimento.
— São exigidas várias informações para o cadastro dos pacientes: nome, idade, sexo, telefone,
contato (quando menor de idade), anotação de medicamentos utilizados e data prevista para
entrega de resultados.
16
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
— O laboratório e o posto de coleta devem dispor de uma lista de exames e atividades realizados
naquela unidade.
— O laboratório deve monitorar a fase analítica por meio de controle interno e externo da qualidade.
— O laboratório deve manter o cadastro dos laboratórios de apoio, possuir contrato formal e
avaliar a sua qualidade.
— O laboratório deve manter contrato formal com os laboratórios de apoio, bem como indicar
quais exames são enviados.
— O laboratório de apoio deve estar de acordo com a resolução de responsabilidade de quem contrata.
— O responsável técnico pelo laboratório é também responsável por todos os TLR realizados
dentro da instituição, mesmo em unidade móvel.
• Equipamentos e instrumentos:
— O laboratório deve possuir equipamentos de acordo com a sua complexidade e sua demanda.
— Devem ser mantidas as instruções escritas referentes aos equipamentos em língua portuguesa.
17
Unidade I
— Deve ser registrada a compra de produtos para diagnósticos, a fim de garantir a rastreabilidade.
• Biossegurança:
— Os saneantes usados para o processo de limpeza devem estar regularizados pela Anvisa.
• Controle de qualidade:
— O controle interno deve ser realizado com as amostras de soros, que são controles comerciais
e regularizados pela Anvisa.
— Formas alternativas são aceitas desde que descritas na literatura e que permitam a avaliação
da precisão do equipamento.
• Controle externo:
— O laboratório deve participar dos ensaios de proficiência para todos os exames realizados na
sua rotina.
— Os resultados devem ser anotados, e devem ser tomadas providências quando houver
não conformidades.
— O laboratório clínico deve participar dos ensaios de proficiência para todos os exames realizados
na sua rotina.
— Para os exames não contemplados pelos programas do ensaio de proficiência, o laboratório deve
adotar formas alternativas de controle externo de qualidade descritas na literatura científica.
18
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
• Liberação de laudos:
— O laudo deve ser legível e assinado por um profissional legalmente habilitado (farmacêutico,
biomédico ou patologista).
— Um laudo deve conter dados mínimos: nome do exame, tipo de amostra, método analítico,
unidade de medição, valores de referência, limitações da técnica e dados para interpretação.
A RDC n. 306/2004 (ANVISA, 2004b) é um regulamento técnico que dispõe sobre o gerenciamento
de resíduos de serviços de saúde, abrangendo não somente o lixo infectante, mas todas as categorias de
resíduos, inclusive os não infectantes.
O regulamento se aplica a todos os geradores de resíduos de serviços de saúde (RSS). Todo gerador
de resíduos deve elaborar, assim, um plano de gerenciamento de resíduos de serviços de saúde (PGRSS),
que deve ser baseado na característica dos resíduos gerados e na sua classificação. A seguir, destacamos
alguns pontos da RDC n. 306.
• O transporte interno de resíduos deve seguir o roteiro definido e ser feito em horários não
coincidentes com fluxo de pessoas ou atividades.
• Os recipientes para o transporte de resíduos devem ser providos de tampa articulada ao próprio
corpo do equipamento e rodas, além de serem identificados com o símbolo de acordo com os
resíduos neles contidos.
• Devem ser solicitados aos órgãos públicos responsáveis pela execução da coleta: transporte,
tratamento ou disposição final dos resíduos e documentação que identifique a conformidade
com as orientações dos órgãos de meio ambiente.
• Deve ser mantido o registro de operações de venda e/ou doação dos resíduos destinados à reciclagem.
• A2: carcaças, peças anatômicas, vísceras e outros resíduos provenientes de animais, cadáveres de
animais, peças de anatomopatológicos, entre outros.
• A3: peças anatômicas humanas (membros), produto de fecundação sem sinais vitais com peso
menor que 500 gramas, estatura menor que 25 cm ou idade inferior a 20 semanas e que não
tenha sido requerido pelos seus familiares.
• A4: sobras de amostras de laboratórios, recipientes com fezes, urina, secreção, peças de
anatomopatológicos, peças anatômicas, vísceras e bolsas transfusionais vazias.
• Resíduos químicos que apresentam risco à saúde ou ao meio ambiente, quando não forem
submetidos ao processo de reutilização, recuperação ou reciclagem, devem ser submetidos a
tratamento ou disposição final específicos.
• Resíduos químicos que não representam risco à saúde ou ao meio ambiente não necessitam
de tratamento, podendo ser submetidos a processos de reutilização, recuperação ou reciclagem.
Devem ser encaminhados para sistemas de disposição final de licenciamento.
• Resíduos no estado líquido podem ser lançados na rede coletora de esgoto ou em corpo receptor
desde que atendam às diretrizes estabelecidas pelos órgãos ambientais e gestores de recursos
hídricos e saneamento competentes.
• O recipiente com rodas de transporte interno de rejeitos radioativos, além das especificações
contidas em RDC, deve possuir um sistema de blindagem com tampa para acomodação de sacos
de rejeitos radioativos, devendo ser monitorado a cada operação de transporte e submetido à
descontaminação, quando necessário. Independentemente de seu volume, não poderá possuir
20
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
válvula de drenagem no fundo. Deve, ainda, conter a identificação com inscrição, símbolo e cor
compatíveis com o resíduo do Grupo C.
— Azul: papéis.
— Amarelo: metais.
— Verde: vidros.
— Vermelho: plásticos.
• Para os demais resíduos do Grupo D, deve ser utilizada a cor cinza nos recipientes.
• Caso não exista processo de segregação para reciclagem, não haverá exigência para a padronização
de cor dos recipientes.
• O abrigo de resíduos deve ser de alvenaria, revestido de material liso, impermeável, lavável e de
fácil higienização, com aberturas para ventilação, com tela de proteção contra insetos, roedores
e vetores.
21
Unidade I
A RDC n. 222/2018 (ANVISA, 2018) é a nova resolução que dispõe sobre o gerenciamento dos
resíduos de serviços de saúde, após ser revogada a RDC n. 306/2004 (ANVISA, 2004b), com a qual os
profissionais de saúde trabalharam nas instituições de saúde do país nos últimos 14 anos. Geralmente,
as mudanças impulsionadas no gerenciamento de RSS são relativas a uma gestão tanto mais didática
quanto mais objetiva em relação à RDC n. 306/2004, com menor citação de outros normativos. Vejamos,
resumidamente, alguns itens importantes.
No início, mais precisamente no Capítulo I, Seção I, Artigo 2º, em que se descreve a finalidade de
dimensão da Resolução, destaca-se:
Os tipos de serviços de saúde e de ensino, para os quais a legislação atua, não eram descritos na RDC
n. 306/2004 (ANVISA, 2004b).
Outro ponto de destaque, ainda nesse Artigo 2º, refere-se à amplitude de quem são os geradores
de RSS agora incluídos: “serviços de piercing e salões de beleza e estética” (ANVISA, 2018). É muito
oportuna a inclusão desses dois serviços, considerando que o risco à saúde é específico às atividades
que desenvolvem.
Agora, na nova RDC, pode ser compartilhado o local chamado expurgo para o armazenamento
temporário dos RSS. Porém, só é permitido para os resíduos dos Grupos A, D e E, e a área deverá ser
compatível com os três tipos de resíduos.
Outra novidade na atual RDC é a especificação dos tipos de resíduos armazenados nesse “abrigo
temporário de RSS” compartilhado com a “sala de utilidades” ou “expurgo”, os quais não eram citados
anteriormente. A RDC n. 222 traz algumas modificações, principalmente com relação ao Grupo A (mais
especificamente aos subgrupos A1, A2 e A3): todas as descrições de tratamento e acondicionamento desses
tipos de resíduos estão muito resumidas. Nesse sentido, a nova RDC apresenta um texto mais genérico.
Quanto ao Grupo B, a legislação exclui qualquer citação sobre a geração de resíduos das atividades
assistenciais domiciliares, item que era pontuado na RDC anterior (capítulo VI, “Manejo de RSS”).
No que se refere ao Grupo D, fica excluída a simbologia de cores para segregação dos diferentes tipos
de resíduos desse grupo, a qual era contemplada na RDC n. 306. Um ponto positivo, por outro lado, é
a inclusão, nesse grupo, do “descarte dos equipamentos de proteção individual (EPIs), desde que não
contaminados por matéria biológica, química ou radioativa” (ANVISA, 2018), algo que não era descrito
na RDC anterior.
22
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
Destaca-se, ainda, na nova resolução, a ampliação da lista dos tipos de resíduos que podem ser
classificados como tais, como as forrações de animais de biotérios sem risco biológico associado, os
resíduos recicláveis sem contaminação biológica, química e radiológica associada e os pelos de animais,
não citados na legislação anterior.
Por fim, no Grupo E, também eliminou-se qualquer citação sobre a geração de resíduos das
atividades assistenciais domiciliares, o que, mais uma vez, é um ponto muito negativo na assistência
de saúde domiciliar. Ainda nesse grupo dos perfurocortantes, a nova RDC retira o segundo critério
– “nível do preenchimento deve ficar a 5 cm de distância da boca do recipiente” –, estabelecido para o
nível de preenchimento dos recipientes de acondicionamento desse material (ANVISA, 2004b), ficando
apenas com um único critério e sendo alterado (era 2/3) aquele que menciona: “devem ser substituídos
de acordo com a demanda ou quando o nível de preenchimento atingir 3/4 (três quartos) da capacidade”
(ANVISA, 2018).
A RDC n. 222 também descreve que seringas e agulhas podem ser desconectadas, desde que com o
auxílio de dispositivo de segurança, mantendo a proibição anterior de desconexão de seringas e agulhas
de forma manual.
Em linhas gerais, a nova RDC (ANVISA, 2018) exclui a citação de todas as outras legislações paralelas
a ela, as quais eram referidas na RDC n. 306, como o Conama, a ABNT e o Ministério do Trabalho,
substituindo-as sempre pelo termo “conforme normas ambientais vigentes” etc. Quanto à disposição
final dos RSS, também genericamente se refere sempre ao termo “disposição final ambientalmente
adequada”. O capítulo relacionado à saúde ocupacional foi bastante resumido na atual legislação.
O controle da qualidade nessa fase analisa o registro do material recebido, a preparação, a coloração
e a montagem das lâminas, a manutenção dos equipamentos e microscópios, bem como os registros de
informações de pessoal, sua qualificação e seu treinamento (CERVIX..., 2005).
Para realizar o cadastro do paciente, é obrigatório solicitar um documento com foto que afirme a
sua identificação. O cadastro em questão deve conter as seguintes informações: número interno de
identificação do paciente no laboratório; nome do paciente; idade ou data de nascimento; procedência
(se paciente ambulatorial ou hospitalar); telefone; endereço; data e horário de cadastro; nome do
profissional solicitante; exames solicitados e tipo de amostras (SBPC/ML, 2010).
Saúde para as ações de controle do câncer do colo do útero com a identificação obrigatória das lâminas
e, se possível, nos frascos ou recipientes contendo as amostras. Devem ser anotadas as condições do
material (lâmina quebrada, ausente, sem requisição etc.). As lâminas e as requisições devem ser entregues
juntamente com uma listagem em duas vias contendo o nome das mulheres. O profissional da recepção
deve conferir, datar e assinar as vias de listagem e devolver uma das vias ao portador para ser arquivada
(INCA, 2016).
Tavares et al. (2007) recomendam, para garantir a rastreabilidade, que o laboratório deve dispor de
um sistema de informática que permita a identificação da hora do recebimento e também a da coleta
da amostra, além do nome do funcionário que realizou a coleta ou recebeu a amostra, identificando-a
por ordem numérica e anual, para localizar facilmente todo o seu caminho dentro do laboratório, desde
a recepção até a emissão do laudo. O sistema de qualidade deve conter os requisitos para avaliar a
qualidade desde a recepção até o tempo de entrega do resultado do exame. Por isso, é importante
observar o atendimento da recepção, realizar pesquisas de opinião sobre o atendimento, oferecer urnas
para coleta de informações sobre satisfação do cliente, utilizar gráficos para demonstrar a quantidade e
a fequência de solicitação de novas amotras de queixas sobre a clareza dos resultados.
De acordo com a Resolução n. 1472/97 do Conselho Federal de Medicina (CFM, 2007), as lâminas
de exames citopatológicos (negativas ou positivas para malignidade) devem ser mantidas em arquivo
por cinco anos no próprio laboratório ou entregues ao paciente ou a seu responsável legal devidamente
orientados quanto a sua conservação e mediante comprovante que deverá ser arquivado durante o
período anteriormente mencionado. Quanto aos laudos diagnósticos, eles poderão ser arquivados
indefinidamente em arquivo informatizado. As lâminas devem ser arquivadas em ordem numérica,
sendo aconselhável um arquivo independente para lâminas positivas e negativas, para facilitar a sua
pesquisa e resgate quando solicitado pela paciente.
Para a segurança do arquivo, é necessário o acesso restrito a esse setor, com protocolo de entrada e
saída das lâminas. A solicitação das lâminas pela paciente deve ser atendida e registrada em documento
específico, no qual deve constar, de modo claro, a transferência e a responsabilidade pela guarda da lâmina.
24
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
1.3.2 Transporte
O laboratório deverá oferecer, por escrito, instruções para o transporte de amostras, respeitando
a especificidade de cada material biológico, com condições de temperatura, conservação, integridade
e estabilidade da amostra, bem como utilizar recipiente de amostras isotérmico, impermeável e
higienizável, identificado com a simbologia de risco biológico e com nome do laboratório ou posto de
coleta responsável. As amostras devem ser coletadas, fixadas corretamente e enviadas ao laboratório
para a realização dos exames citopatológicos. Antes da coleta, a retirada do excesso de secreção do colo
do útero evita o aparecimento de fatores ofuscados, como esfregaços com áreas espessas inadequadas
à avaliação citopatológica (MICKEE, 1997).
Para o transporte de esfregaços fixados com fixadores úmidos (etanol a 96%), esses devem permenecer
individualmente em seus respectivos tubetes, os quais devem ser acondicionados em embalagens que
garantam não derramar ou evaporar o fixador. As amostras fixadas com álcool a 96% mantêm-se em
boa conservação por uma ou mais semanas. Já aquelas que utilizam fixadores e camada (propilenoglicol
e etanol) conservam-se por apenas uma semana. As amostras em meio líquido podem ser armazenadas
em tempertura ambiente por até 60 dias, sendo o pellet estável por até 14 meses (TAKAHASHI, 1973;
DIGENE, 2002).
As amostras a serem enviadas a laboratórios distantes do local da coleta devem ser fixadas
com fixadores de cobertura (propilenoglicol ou smiliar) à temperatura ambiente e acondicionadas
individualmente em pequenas caixas de papelão, corretamente identificadas com o nome da paciente
e da unidade responsável pelo encaminhamento. Devem ser seguidas as normas de biossegurança
no transporte desses materiais, assim como em casos de intercorrências no transporte de amostras
biológicas devem-se seguir os protocolos de urgência e emergência (CONSOLARO; ENGLER, 2016).
Observação
Em caso de rejeição da amostra na fase pré-analítica, deve-se fazer o registro das inconformidades,
pois o relato da inadequação da amostra é um procedimento fundamental na busca da qualidade
(KHAWALI, 2012).
Devem ser rejeitadas as amostras que não estejam em conformidade com os critérios mínimos
necessários para a realização da análise do exame citopatológico, listados a seguir:
25
Unidade I
• Lâminas quebradas.
Segundo o manual técnico para prevenção do câncer do colo do útero (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2002), a amostra colhida, ao ser examinada no laboratório, será classificada em: amostra insatisfatória;
amostra satisfatória, mas limitada; amostra satisfatória.
• obscurecimento por sangue, inflamação, áreas espessas, má fixação, dessecamento etc., que
impeçam a interpretação de mais de 75% das células epiteliais.
Nesses casos, não é possível obter diagnóstico e por isso o exame deve ser repetido.
• esfregaço purulento, obscurecido por sangue, áreas espessas, dessecamento etc., que impeçam a
interpretação de, aproximadamente, 50% a 70% das células epiteliais.
É considerada insatisfatória a amostra cuja leitura esteja prejudicada pelas razões expostas a
seguir, algumas de natureza técnica e outras de amostragem celular, podendo ser assim classificada
(MARTIN‑HIRSCH, 2010):
• leitura prejudicada (mais de 75% do esfregaço) por presença de: sangue, piócitos, artefatos de
dessecamento, contaminantes externos ou intensa superposição celular.
Nesse caso, a recomendação é que a mulher repita o exame entre 6 e 12 semanas com correção,
quando possível, do problema que motivou o resultado insatisfatório.
Segundo o Ministério da Saúde (2013), amostra satisfatória para avaliação corresponde à amostra
que apresenta células em quantidade representativa, bem distribuídas, fixadas e coradas, de tal modo que
sua observação permita uma conclusão diagnóstica. Podem estar presentes células representativas dos
epitélios do colo do útero: células escamosas; células glandulares (não inclui o epitélio endometrial);
células metaplásicas.
A recomendação para mulheres submetidas à histerectomia total por lesões benignas, sem história
prévia de diagnóstico ou tratamento de lesões cervicais de alto grau, pode ser excluída do rastreamento,
desde que apresentem exames anteriores normais. Em casos de histerectomia por lesão precursora ou
câncer do colo do útero, a mulher deverá ser acompanhada de acordo com a lesão tratada.
27
Unidade I
Lembrete
O trato genital feminino é constituído pelos órgaõs genitais externos e pela vulva; os internos, pela
vagina, pelo útero, pelas tubas uterinas (trompas de Falópio) e pelos ovários, que estão especificados
no interior da cavidade pélvica. A genitália externa contém um conjunto de formações que protegem o
orifício externo da vagina e o meato uretral ou urinário. Pode ser dividido nas seguintes partes: clitóris,
vestíbulo, pequenos e grandes lábios.
Útero
Epitélio
Canal endocervical
endocervical
Ectocérvice
Vagina
Epitélio
Junção escamoso
escamocolunar
A vulva forma os genitais externos do trato genital feminino, e se estende desde o monte de Vênus
até a região do períneo. É formada pelo monte de Vênus, pelos grandes e pequenos lábios, pelo clitóris,
prepúcio, vestíbulo, meato uretral, glândulas de Bartholin e de Skene (parauretrais) e pelo introito (óstio)
vaginal, onde está localizado o hímen (CONSOLARO; ENGLER, 2016).
A vagina é um órgão tubular musculomembranoso que se estende do óstio externo do útero até o
vestíbulo da genitália externa, com comprimento que varia de 7 cm a 9 cm. Tem como missão concender
a passagem do feto durante o parto, a descamação do sangue do fluxo menstrual mensal e a penetração
do pênis na relação sexual. Estruturalmente é formada por uma parede composta de três camadas: a
mucosa, a muscular e a adventícia. O clitóris, o bulbo do vestíbulo e as glândulas anexas são estruturas
acessórias que compõem o sistema genital feminino e são de vital importância na sexulidade feminina
e na produção das secreções mucocervicais.
28
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
Os ovários são as gônadas femininas, que mostram variações de tamanho de acordo com cada
indivíduo ou com a fase do ciclo menstrual em que se encontram. Estão situados na cavidade pélvica,
um de cada lado do útero, e interligados pelas trompas uterinas. São incumbidos da produção dos
hormônios sexuais femininos (progesterona e estrógeno), assim como da produção do gameta feminino.
As tubas uterinas são as estruturas que ligam o útero aos ovários, através das fímbrias. Podem
ser distribuídas em quatro partes: a intramural, o istmo, a ampola e o infundíbulo. Suas paredes são
formadas por três camadas: a mucosa, a muscular e a serosa, que irão promover sua função de captar o
ovócito liberado pelo ovário e conduzi-lo na direção do útero.
O útero é o órgão responsável por receber o óvulo fecundado, nutri-lo e protegê-lo para que o feto
se desenvolva apropriadamente. O útero é formado por três camadas: a mais interna, ou endométrio,
que é revestida por uma mucosa responsável pela produção do muco; a média, ou miométrio, que é
constítuida por uma espessa parede, rica em fibras musculares lisas e em fibras colágenas; e a mais
externa, ou perimétrio, que é uma camada serosa (BARROS et al., 2012).
Corpo do útero
Endométrio
Ovário
Colo do útero
O colo uterino é definido por dois orifícios conhecidos como: óstio interno, que fica em contato com
o istmo do útero, e o óstio externo, que se liga com o canal vaginal. A parede do colo do útero é formada
por duas camadas: a endocérvice e a ectocérvice. Internamente, o útero é um órgão oco, fibromuscular,
e suas dimensões variam de acordo com idade, estimulação hormonal e número de gestações.
O útero é dividido em: corpo do útero, região que demonstra maior volume e apresenta forma triangular;
colo do útero, região mais estreita, em forma de canal, conhecida como canal cervical ou cérvice; istmo do
útero, que é a região que se encontra na parte inferior do corpo do útero; fundo do útero, região que fica
acima do eixo que liga as duas implantações das tubas uterinas (BARROS et al., 2012).
29
Unidade I
Colo do útero
Área de Parede
ampliação vaginal Visão do
Abertura no examinador
Ovário direito Ovário esquerdo cervix para (inferior) do
o útero colo do útero
Miométrio
Endométrio
Útero
Colo do
útero
Vagina
2.1.1 Vulva
O monte de Vênus, localizado à frente pubiana, é rico em tecido adiposo e recoberto por pelos.
Os grandes lábios são formados por duas pregas espessas de pele, também cobertos por pelos, e se
expandem do monte de Vênus até o períneo. Os pequenos lábios estão localizados entre os grandes
lábios e duas pregas menores de pele, demonstrando ausência de pelos. Seu epitélio é estratificado
pavimentoso queratinizado, assim como a face interna dos grandes lábios e o clitóris, estrutura erétil
e que apresenta inúmeras terminações nervosas. O vestíbulo é onde se localiza a entrada da vagina. As
glândulas Skene estão localizadas em ambos os lados do meato urinário. Por fim, localizadas, uma a
cada lado do vestíbulo, existem as glândulas de Bartholin, também chamadas de glândulas vestibulares
menores (CONSOLARO; ENGLER, 2016).
2.1.2 Vagina
A parede vaginal é formada por três camadas: mucosa interna; constituída de epitélio
pavimentoso estratificado; uma mucosa muscular intermediária, composta de musculo liso; e uma
camada externa, de tecido conjuntivo denso. O epitélio da camada mucosa contém glicogênio e
está dividido nas seguintes camadas: basal (uma camada de células), parabasal (de duas a cinco
camadas de células), intermediária e superficial, com número de camadas variável. Abaixo desse
epitélio, localiza-se a lâmina própria, formada por tecido conjuntivo, fibras elásticas, nervos e
alguns vasos sanguíneos. Durante o período de amamanetação e na pós-menopausa, esse epitélio
sofre atrofia e tem seu número de camada celulares reduzido. A parede não possui glândulas,
mas a superfície da mucosa é mantida úmida pelo muco secretado pelas glândulas uterinas, pelas
glândulas endocervicais e pelas glândulas de Bartholin, no vestíbulo. O epitélio vaginal responde
30
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
às mudanças cíclicas durante o ciclo menstrual, sendo a diferenciação estimulada por estrógenos
(JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2008).
Os ovários são revestidos por um epitélio simples cúbico intercalado com áreas de epitélio
pavimentoso. A túnica albugínea fica logo abaixo desse epitélio e se define pela presença de tecido
conjuntivo denso sem vasos, pois são nessas estruturas medulares e corticais que encontramos as células
intersticiais (ou de Leydig) responsáveis pela produção dos hormônios sexuais através dos estímulos das
gonadotrofinas. A região medular do ovário é formada por tecido conjuntivo frouxo, vasos sanguíneos
e células hilares (intersticiais); e a região cortical é rica em folículos ovarianos (ovócitos), corpo-lúteo e
células intersticiais (BARROS et al., 2012).
A parede das tubas é formada por uma camada mucosa, sustentada pela própria lâmina, uma
camada muscular e uma camada serosa. O epitélio de revestimento das tubas uterinas é cilíndrico,
simples, com células ciliadas e secretoras, que respondem ao controle hormonal. A presença de cílios,
junto com os movimentos peristálticos das tubas uterinas, auxilia no impulso do ovócito em direção ao
útero (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2008).
2.1.4 Útero
O colo uterino é revestido por epitélios escamosos e colunares estratificados não queratinizados.
Esses dois tipos de epitélio ficam na junção escamocolunar. A parede do colo do útero é formada
por duas camadas: a endocérvice e a ectocérvice. A endocérvice é uma camada mucosa, formada por
um epitélio colunar simples mucossecretor, que é responsável pela produção do muco cervical; e a
ectocérvice é constituída por um epitélio escamoso estratificado não queratinizado, que se assemelha
ao da vagina. A ligação da ectocérvice e da endocérvice recebe o nome de junção escamocolunar (JEC),
podendo ter sua localização alterada de acordo com o estado hormonal, gestacional, parto vaginal e/ou
trauma (BARROS et al., 2012).
Frequentemente, uma área grande da ectocérvice está recoberta por um epitélio escamoso
estratificado não queratinizado que contém glicogênio. É opaco, tem múltiplas (de 15 a 20) camadas de
células e é de coloração rosa pálido. Esse epitélio é nativo da área formada durante a vida embrionária,
e é denominado epitélio escamoso original ou nativo, ou pode ter sido recém-formado como epitélio
escamoso metaplásico no início da vida adulta.
A composição histológica do epitélio escamoso do colo uterino revela, ao fundo, uma única camada
de células basais arredondadas com grandes núcleos de coloração escura e citoplasma escasso, unida à
membrana basal. As células basais dividem-se e maturam para formar as próximas camadas chamadas de células
parabasais, que também têm núcleos relativamente grandes. As células das camadas intermediária e superficial
possuem grande quantidade de glicogênio em seu citoplasma (SELLORS; SANKARANARAYANAN, 2004).
31
Unidade I
Epitélio colunar
O canal endocervical é recoberto pelo epitélio colunar (às vezes denominado epitélio glandular). É constítuido
por uma única camada de células altas com núcleos de coloração escura próxima à membrana basal. Por ter uma
só camada de células, tem uma altura menor que o epitélio escamoso estratificado do colo uterino (SELLORS;
SANKARANARAYANAN, 2004; BARROS et al., 2012).
Junção escamocolunar
A junção escamocolunar apresenta-se como uma linha bem definida com um degrau, em razão
da distinção de altura dos epitélios escamoso e colunar. A localização da junção escamocolunar com
associação ao orifício cervical externo varia durante a vida da mulher por motivos como idade, estado
hormonal, trauma ao nascimento, uso de anticoncepcionais orais e certas condições fisiológicas, como
gravidez. A junção escamocolunar visível durante a infância, a perimenarca, após a puberdade e o início
do período reprodutivo, é denominada junção escamocolunar original, porque reproduz a junção entre
o epitélio colunar e o epitélio escamoso “original” formado durante a embriogênese a e vida intrauterina
(CONSOLARO; ENGLER, 2016; BARROS et al., 2012).
Zona de transformação
A região que se estende entre a JEC original e a funcional denomina-se zona transformação. Esse
espaço é revestido por epitélio escamoso metaplásico, produtor de glicogênio que se forma a partir da
proliferação das células de reserva. As células metaplásicas são cuboides, subcolunares e indiferenciadas.
Sua origem não está bem estabelecida, mas acredita-se que se formem a partir do epitélio cilíndrico,
em resposta ao pH ácido vaginal. A identificação da zona de transformação durante a coleta do exame
citológico é de grande importância, pois é nessa região que se estabelece a maioria das lesões precursoras
do câncer de colo do útero (CONSOLARO; ENGLER, 2016).
A seguir são explicitadas as características das células do epitélio escamoso quando observadas nos
esfregaços cérvico-vaginais (BARROS et al., 2012).
Células basais
Essas células são diferentemente vistas nos esfregaços cérvico-vaginais de mulheres com atrofia
intensa na pós-menopausa ou quando há ulceração da mucosa. As células basais correspondem às
menores células epiteliais, tendo mais ou menos o tamanho de um leucócito. A sua forma é redonda ou
oval, com citoplasma escasso, corado fortemente em azul ou verde. O núcleo é redondo, central, com
cromatina grosseiramente granular igualmente distribuída, às vezes revelando um pequeno nucléolo.
Essas células usualmente descamam em pequenos agrupamentos.
Células parabasais
Essas células são raras nos esfregaços de mulheres na fase reprodutiva, é possível ocorrerem distúrbios
hormonais e casos de erosão ou ulceração da mucosa. Por outro lado, prevalecem em situações de
32
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
Células intermediárias
São as células mais gerais nos esfregaços cérvico-vaginais no período pós-ovulatório do ciclo
menstrual, durante a gravidez e no início da menopausa. A sua ascendência é relacionada à ação da
progesterona ou aos hormônios adenocorticais. O tamanho das células intermediárias varia de
30 a 60 micrômetros, e o citoplasma é abundante, transparente, poligonal e cianofílico, com uma
coloração menos intensa do que aquela observada nas células parabasais. As células intermediárias
mostram tendência a pregueamento das bordas citoplasmáticas. Os núcleos dessas células são vesiculares,
medindo cerca de 10 a 12 micrômetros, redondos ou ovais, com membrana cromatínica ou borda
nuclear claramente visível e cromatina finamente granular regularmente distribuída com cromocentros.
O corpúsculo de Barr (cromatina sexual) é eventualmente identificado.
As células naviculares representam uma variante das células intermediárias. Elas são elipsoides, com
bordas citoplasmáticas espessadas e ricas em glicogênio, que se cora habitualmente em castanho. Os
núcleos são excêntricos. As células naviculares são comuns na gravidez e podem aparecer em outras
condições em que há acentuado estímulo progestacional.
Células superficiais
Para diferenciar uma célula intermediária de uma superficial é fundamental a análise da estrutura
nuclear. Enquanto o núcleo da célula intermediária é vesicular com cromatina delicada uniformemente
distribuída e cromocentros (condensações de cromatina), o núcleo da célula superficial é picnótico, ou
seja, com cromatina condensada, sem evidência de granulação.
33
Unidade I
Superficial
Intermediária
Parabasal
Basal
O Manual Técnico para o Cuidado do Câncer do Colo do Útero (BRASIL, 2002), sugere que o primeiro
passo é o preenchimento apropriado da ficha do pedido do exame citopatológico com letra legível
e com todos os dados pertinentes da paciente e da Unidade de Saúde. A técnica de coleta deve ser
adequadamente executada na ectocérvice e na endocérvice, com o uso da espátula de Ayres e da
escovinha tipo Campos da Paz, representadas, respectivamente, na figura a seguir.
34
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
O epitélio endocervical deslocado ou invertido, que invade a ectocérvice, fica sujeito a condições adversas
presentes na cavidade vaginal, podendo sofrer agressão por agentes biológicos, como bactérias, fungos e vírus
ou por agentes físicos ou químicos, transformando-se, aos poucos, em epitélio escamoso. Esse procedimento
é chamado de metaplasia, e a área que passou por esse processo chama-se zona de transformação.
O espéculo vaginal sem lubrificante (para evitar contaminação da amostra) é introduzido para a
visualização do colo. Depois de retirar com algodão o excesso de muco, secreção ou sangue, a espátula
de Ayres é apoiada no canal endocervical, sendo executado um raspado na junção escamocolunar
através de movimento de rotação de 360º. A amostra do fundo de saco posterior da vagina também
é obtida através de raspado, com a extremidade romba da espátula de Ayres. A espátula é deixada em
repouso sobre o espéculo e imediatamente é realizada a colheita do material endocervical. A escovinha
designada especialmente para essa finalidade é inserida através do orifício cervical externo, sendo
executada uma rotação completa no canal que pode ser finalizada com um movimento de vai e vem,
com cuidado para não traumatizar a mucosa, evitando sangramento (BARROS et al., 2012).
A) B) C)
35
Unidade I
Saiba mais
Segundo o Controle dos cânceres do colo do útero e da mama (BRASIL, 2013), para coleta na
ectocérvice, utiliza-se a espátula de Ayres do lado que apresenta reentrância. Deve-se encaixar a ponta
mais longa da espátula no orifício externo do colo, apoiando-a firmemente, fazendo uma raspagem em
movimento rotativo de 360° em torno de todo o orifício cervical, para que toda superfície do colo seja
raspada e representada na lâmina, procurando exercer uma pressão firme, mas delicada, sem agredir
o colo, para não prejudicar a qualidade da amostra. Para a coleta na endocérvice, utiliza-se a escova
endocervical. Deve-se recolher o material introduzindo a escova endocervical e fazendo um movimento
giratório de 360°, percorrendo todo o contorno do orifício cervical.
Posteriormente, deve-se estender o material sobre a lâmina de maneira delicada para a obtenção de
um esfregaço uniformemente distribuído, fino e sem destruição celular. A amostra ectocervical deve ser
disposta no sentido transversal, na metade superior da lâmina, próximo da região fosca, previamente
identificada com as iniciais da mulher e o número do registro. O material retirado da endocérvice
deve ser colocado na metade inferior da lâmina, no sentido longitudinal. O esfregaço obtido deve ser
imediatamente fixado para evitar o dessecamento do material (BARROS et al., 2012).
Vale destacar que é importante observar a validade do fixador. Na fixação com álcool a 96%,
considerada mundialmente como a melhor para os esfregaços citológicos, a lâmina deve ser colocada
dentro do frasco com álcool em quantidade suficiente para que todo o esfregaço seja coberto, depois,
deve-se fechar o recipiente cuidadosamente e envolvê-lo com a requisição. Na fixação com spray de
polietilenoglicol, borrifa-se a lâmina, que deve estar em posição horizontal, imediatamente após a coleta,
com o spray fixador, a uma distância de 20 cm. Acondiciona-se cuidadosamente a lâmina em uma caixa
36
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
de lâminas revestida com espuma de náilon e papel, a fim de evitar a quebra, para o transporte ao
laboratório, lacrando-se a tampa da caixa com fita gomada. Os passos seguintes são:
• Retirar o espéculo delicadamente, inclinando levemente para cima, observando as paredes vaginais.
• Retirar as luvas.
• Informar sobre a possibilidade de um pequeno sangramento que poderá ocorrer depois da coleta,
tranquilizando-a e avisando que cessará sozinho.
O Ministério da Saúde (BRASIL, 2013) recomenda que as lâminas sejam enviadas para o laboratório
devidamente acondicionadas e acompanhadas dos formulários de requisição. O formulário deve estar
devidamente preenchido e a identificação coincidente com a do frasco ou da caixa de porta-lâmina e
as iniciais da lâmina. Deve ainda ser preparada uma listagem de remessa, preferencialmente em duas
vias (uma para a unidade e outra para o laboratório), com a identificação da unidade e a relação de
nomes e números de registro das mulheres que tiveram seus exames encaminhados. Os exames devem
ser enviados ao laboratório o mais breve possível, para que o tempo entre a coleta e o resultado não
seja desnecessariamente prolongado. O envio das lâminas pode ser semanal, mas é fundamental a
racionalização do sistema de transporte utilizado: no momento da entrega de uma remessa de exames
no laboratório devem ser apanhados os resultados de outros exames deixados anteriormente.
A)
ME
NO
B)
ME
NO
C)
ME
NO
Figura 8 – Modelo recomendado para a distribuição das amostras citológicas na lâmina de vidro:
a) distribuição da amostra da endocérvice, b) distribuição do material obtido do raspado ectocervical,
c) distribuição da amostra do fundo de saco posterior da vagina
37
Unidade I
A fixação em álcool é feita por imersão; a fixação com solução de polietilenoglicol pode ser feita
em gotas ou com spray. Se a solução é spray, deve-se respeitar uma distância mínima de 15 cm, para
evitar dispersão, sobreposição ou perda de material celular, e máxima de 30 cm, para que ocorra fixação
adequada. Nessas soluções, o álcool atua como fixador, desnaturando as proteínas e os ácidos nucleicos,
tornando-os insolúveis e estáveis. A solução de polietilenoglicol promove a formação de um filme opaco
sobre a lâmina, impedidino o ressecamento do material (BIBBO; WILBUR, 2010).
Observação
Qualquer mulher que teve ou mantém vida sexual deve realizar o exame preventivo periódico,
principalmente as que têm entre 25 e 59 anos. De preferência, o exame deve ser feito anualmente.
Após dois exames consecutivos (com um intervalo de um ano) com resultado normal, o preventivo pode
ocorrer a cada três anos (INCA, 1988).
Na década de 1990 foi desenvolvida e implantada uma nova metodologia para a realização da
citopatologia do colo uterino: a citologia em meio líquido (LBC). A implementação da metodologia em
38
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
meio líquido, associada a novas tecnologias, permitiu a melhoria na acurácia e na identificação dessas
alerações, além de diminuir, quase na sua totalidade, possíveis interferentes presentes nos esfregaços,
dificultando a análise da amostra.
O método de citologia em meio líquido, aprovado para uso clínico desde 1996, veio aperfeiçoar a
coleta de material de colo de útero para o exame citopatológico, o pode trazer benefícios em termos
de diminuição de amostras insatisfatórias. A metodologia é capaz de diminuir interferentes, como o
excesso de muco, restos celulares, exsudato inflamatório intenso, hemácias, espermatozoides e outros
interferentes e artefatos capazes de mascarar os achados citológicos (CONITEC, 2019).
A coleta de material celular em meio líquido é relizada com uma escova de cerdas plásticas ou
com uma espátula de Ayres plástica, capaz de destacar as respectivas cabeças removíveis, utilizadas
para a realização do raspado celular. Os instrumentos são introduzidos no canal vaginal até atingir o
orifício externo do canal endocervical. A porção alongada da escova é fixada dentro do canal e com dois
movimentos de rotação em 360 °C.
As amostras celulares das regiões endocervical, JEC e ectocérvice devem ser coletadas e, em seguida,
depositadas em um frasco com líquido conservante. Após a coleta, o material é destinado, com a cabeça
da escova, dentro do recipiente com líquido conservante. A totalidade da amostra celular coletada é
mantida em condições ideais para análises citológicas e moleculares. Uma das grandes vantagens dessa
metodologia é que a amostra pode ser acondicionada por um período médio de 15 dias em temperatura
ambiente, 6 meses refrigerado a 4 °C ou até 2 anos a -20 °C (CONSOLARO; ENGLER, 2016).
39
Unidade I
Segundo Bibbo e Wilbur (2010), a coloração de Papanicolaou é utilizada pela maioria dos laboratórios
de citologia, sendo referência mundial. É constituída por etapas de coloração do núcleo e do citoplasma,
fases de desidratação, hidratação e diafanização. Essa bateria de coloração pode ser composta de 12 a
17 cubas, de acordo com as adaptações de cada laboratório. Apesar de permitidas, as adaptações devem
manter o objetivo principal, que é a coloração adequada do núcleo e dos componentes do citoplasma,
sendo capaz de indicar a maturidade celular.
A hematoxilina é um corante básico de solução aquosa que atua sobre estruturas ácidas
(basofílicas/cianófilas) e interage com os ácidos nucleicos, resultando em uma coloração azul-escuro
do núcleo celular. Possui afinidade por parede celular de lactobacilos e outras bactérias que podem estar
presentes no esfregaço e reagir delicadamente com o citoplasma das células escamosas. O orange G é um
corante ácido de base alcoólica que cora os componentes básicos (acidófilos /basófilos) do citoplamas das
células escamosas maduras (diferenciadas) de amarelo ou alaranjado, incluindo proteínas pré‑queratínicas
das células superficias eosinofílicas. Cora também parcialmente hifas fúngicas. Já o EA é um corante de base
alcoólica, com afinidade por estruturas basofilícas/ácidas (cianofilícas) e acidófilas/básicas (eosinofílicas).
A coloração tem finalidade de corar grânulos oxifílicos dos citoplasmas de células escamosas menos
maduras e de células glandulares, além de corar o citoplasma de Trichomonas vaginalis. Vale destacar que
EA-36 e EA-65 variam entre si apenas na concentração do corante verde-luz, que, na solução EA-36, é 50%
maior do que na solução EA-65.
• Hidratação: processo no qual o material citológico é hidratado em banho de água corrente para
facilitar a interação com o primeiro corante, que é de base aquosa.
• Diafanização: nessa etapa, é fundamental que o material seja intensamente desidratado. Esse
processo é realizado por imersão em xilol, um agente clarificante e solvente que diminui a
opacificação das células, criando uma condição de transparência necessária para a visualização
de detalhes celulares.
• Montagem das lâminas com meio de montagem (bálsamo do Canadá sintético) ou verniz
automativo (CONSOLARO; ENGLER, 2016; STORTI-FILHO et al., 2008; BIBBO; WILBUR, 2010).
A coloração de Shorr, somada a uma etapa com hematoxilina de Harris, é denominada coloração
de Harris-Shorr ou Shorr modificado. Apesar de a coloração de Papanicolau ser absolutamente a mais
utilizada na citologia clínica, em vários serviços brasileiros a coloração de Shorr modificado é uma opção
de coloração alternativa. Assim como na coloração de Papanicolau, a coloração de Shorr modificado
(Pundell) é composta de uma fase de coloração do núcleo, realizada pela hematoxilina, e uma única
fase para a coloração de citoplasma, feita pelo corante de Shorr (universalmemte usado para avaliação
hormonal por sua sensibilidade em corar e representar a maturidade celular). Possui também as fases
de hidratação, desidratação e diafanização, mas sua bateria, em comparação com a de Papanicolau, é
menor: entre 7 e 9 cubas. Como consequência, o custo e o tempo para a realização do processo são
menores, sem deixar de atender as expectativas das características morfotintoriais.
O xilol utilizado nas colorações citológicas alternativamente poderá ser substituído por secagem em
estufa por 20 minutos e a 60 °C, procedimento igualmente eficiente no processo de desidratação. Existem
inúmeras vantagens de retirada do xilol da bateria de coloração, como a preservação do ambiente, a
diminuição de exposição a substâncias tóxicas, a desoneração do laboratório na aquisição e no descarte
desse componente químico, entre outras (CONSOLARO; ENGLER, 2016).
Observação
indica se a célula está normal, saudável ou se está sofrendo alterações inflamatórias, pré‑neoplásicas e
até neoplásicas.
A citologia hormonal é definida como avaliação das condições endócrinas das pacientes por meio de
estudos morfológicos das células vaginais, sendo uma das primeiras aplicações diagnósticas da citologia
clinica. Além de estabelecer a condição hormonal da paciente, é apropriado, para avaliar a função
ovárica normal e patológica da puberdade até a menopausa, estimular o tempo da ovulação, avaliar a
função placentária e disfunções obstétricas, auxiliar na seleção da terapia hormonal e acompanhar os
resultados de tratamentos hormonais. Algumas informações sobre o estado hormonal da mulher podem
ser obtidas por avaliação dos esfregaços cervicais de rotina (CONSOLARO; ENGLER, 2016).
Vários estudos recomendam que, para que os resultados da citologia hormonal sejam confiáveis,
coletas repetidas devem ser feitas e comparadas no mesmo ciclo ou no decurso de um tratamento
hormonal. Além disso, o citologista também deve ser informado sobre dados clínicos da paciente, como
idade, dia do ciclo menstrual, situações fisiológicas ou patológicas do aparelho genital e utilização de
tratamento hormonal, pois não há interpretação hormonal válida sem essas informações.
Ciclo sexual mensal ou ciclo menstrual é definido como as alterações mensais nas taxas de secreção
dos hormônios femininos, que promovem mudanças nos ovários e em outros órgãos sexuais, durante os
anos reprodutivos hormonais (GUYTON et al., 2006).
No sistema genital feminino, os ovários são incitados por um hormônio produzido pela placenta,
a gonadotrofina coriônica humana (hCG), e começam a funcionar ainda na fase embrionária. O hCG
é um hormônio muito semelhante ao hormônio luteinizante (LH). Ao nascer, uma mulher possui,
aproximadamente, um milhão de folículos primários, também chamados de primordiais, em cada ovário.
A maioria desses folículos se degenera, e a mulher chega à puberdade com cerca de 400 mil folículos em
cada ovário (GUYTON et al., 2006; VERAS; NARDI, 2005; MORAES, [s.d.])
4.1.1 Pré-menarca
É na puberdade que começam a ser prouzidos os principais hormônios sexuais femininos, que são o
estrógeno e a progesterona. O estrógeno é formado nas células do folículo ovariano em desenvolvimento, e
ele é o incumbido pelo surgimento das características sexuais secundárias na mulher, como aparecimento
das mamas, alargamento dos quadris, distribuição de pelos pelo corpo etc. O estrógeno também motiva
o amadurecimento dos órgãos genitais, além de promover o impulso sexual. A progesterona é outro
hormônio sexual feminino que é formado basicamente pelo corpo amarelo, também chamado de corpo
lúteo do ovário. Esse hormônio incentiva o desenvolvimento dos vasos sanguíneos e das glândulas do
endométrio, tornando-o espesso e preparando o útero para receber o embrião (VERAS; NARDI, 2005;
MORAES, [s.d.]).
42
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
Hormônios basais
Desde o instante em que a menina começa a gerar esses hormônios sexuais, uma vez por mês ela
irá ovular, desde o princípio do seu ciclo menstrual, que ocorrerá a cada 28 dias aproximadamente.
O ovário, no instante da ovulação, lança um ovócito secundário ao mesmo tempo em que o útero
se prepara para receber o embrião. Caso ocorra a fecundação do ovócito secundário, o embrião se
implantará no útero e se desenvolverá, caso contrário, ele se degenera e é eliminado juntamente com a
parede interna do útero, em um processo chamado de menstruação. Todos esses processos, que ocorrem
tanto no útero quanto no ovário, são controlados pelos hormônios FSH (hormônio folículo-estimulante)
e LH (hormônio luteinizante). A menstruação acontece quando as taxas de todos os hormônios ficam
muito baixas no sangue da mulher, marcando o início de um ciclo menstrual (GUYTON et al., 2006;
VERAS; NARDI, 2005; MORAES, [s.d.]).
Para fins didáticos, dividiremos o ciclo menstrual em três fases: a fase proliferativa, a fase de secreção
e a fase menstrual.
Na fase proliferativa, também chamada de fase folicular, o folículo cresce e se alinha para a ovulação.
Esse crescimento é incentivado pelo hormônio FSH, e, à medida que o folículo cresce, começa a produzir
estrógenos, um grupo de hormônios que incentivam o desenvolvimento do endométrio. Nesse processo,
vários folículos são incentivados, mas apenas um deles termina o crescimento, acumulando líquido em
seu interior e transformando-se em folículo maduro (ou folículo de Graaf). Ao atingir um estabelecido
nível no sangue, o estrógeno começa a impulsionar a hipófise a liberar grandes quantidades de LH e FSH,
os quais irão induzir a ovulação, que normalmente ocorre no décimo quarto dia após o início do ciclo
menstrual (VERAS; NARDI, 2005).
Na fase secretória, também conhecida como fase lútea, o LH incentiva as células do folículo ovariano
extinto a se transformarem em corpo amarelo, também chamado de corpo lúteo. É no corpo lúteo
que acontecerá a produção de estrógeno e progesterona. Caso não ocorra a fecundação do ovócito
secundário, acontecerá a fase menstrual (VERAS; NARDI, 2005).
Nessa fase, o corpo lúteo se declina, parando de produzir progesterona e estrógeno. A queda na
produção desses hormônios faz com que o útero sofra descamação, acontecendo a menstruação, que
pode durar de três a sete dias, dependendo da mulher e de suas condições fisiológicas. Essa queda nas
taxas de progesterona e estrógeno, por sua vez, faz com que a hipófise volte a produzir FSH, reiniciando
o ciclo menstrual.
43
Unidade I
FSH
LH
Hipófise
Estrógeno
Progesterona
Ovários
Corpo
Ovulação lúteo
Folículos em crescimento
Útero
Ciclo menstrual
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29
4.1.2 Gravidez
4.1.3 Menopausa
O climatério (ou perimenopausa) é uma fase fisiológica da vida, e não um processo patológico.
Trata‑se da mudança entre o período reprodutivo e o não reprodutivo da vida da mulher, quando surgem
as irregularidades menstruais e as queixas vasomotoras, antecedendo a menopausa. A menopausa é o
marco dessa fase, referindo-se ao último ciclo menstrual seguido por doze meses de amenorreia (ou
seja, é a parada permanente da menstruação).
44
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
A menopausa tem como consequência a diminuição da secreção dos hormônios ovarianos, estrogênio
e progesterona, devido à perda definitiva da atividade folicular ovariana. A redução da função ovariana
e, assim, do feedback negativo, resulta na elevação das concentrações do FSH, sendo esta a primeira
indicação laboratorial do climatério inicial. Estudos populacionais sugerem que o fumo e a condição
socioeconômica baixa estão relacionaods com o fim precoce dos períodos menstruais. Outros fatores
podem afetar a idade em que as mulheres têm seu período menstrual finalizado, como: menarca, paridade,
uso prévio de contraceptivos orais, índice de massa corpórea, etnia e histórico familiar (PANTALEÃO et
al., 2009; BLAKE, 2006).
Carvalho (2008) relata que os esfregaços com atividade estrogênica podem ser divididos nas fases
pré-ovulatória e ovulatória. Na fase pré-ovulatória, as células, inteiramente intermediárias, identificam
a fase e indicam o início da maturação provocada pela influência estrogênica no epitélio escamoso
antes de atingirem seu máximo amadurecimento, representado pelas células superficiais. As células
pré-ovulatórias apresentam citoplasma bastante aumentado e núcleo com diâmetro reduzido (porém,
este ainda não se tornou picnótico), coram-se fracamente em cianofilia, embora, algumas vezes, leves
tonalidades eosinófilas possam aparecer na porção média das células (outras vezes, no entanto, são
acentuadamente eosinófilas, sendo a cor rosa a mais encontrada).
Os esfregaços com atividade luteínica ou progesterônica são divididos nas fases pós-ovultória,
pré-menstrual e menstrual. Na fase pós-ovulatória, as células superficiais e intermediárias diminuem
de tamanho, sendo chamadas de células regressivas. Essas células são submetidas a um processo de
reabsorção, e não a um processo de citólise. Nessa fase, analisando a supressão da ação estrogênica
sobre a mucosa vaginal, também se verifica que as células superficiais e intermediárias alongadas
aumentam de número.
Já a fase pré-menstrual tem um padrão muito típico, sendo composta de células pré-menstruais
que são, na maioria, células intermediárias com citoplasma acentuadamente cianofílico e núcleos
aumentados de tamanho, apresentando-se agrupadas, formando grandes aglomerados, sendo maiores
que os grupos observados nas outras fases. Uma aparência comum dessas células é a irregularidade da
forma citoplasmática, uma vez que o contorno citoplasmático é menos nítido e, não raro, indica citólise
45
Unidade I
inicial. Na fase menstrual, além do grande número de eritrócitos presentes no esfregaço, há uma grande
escamação de células epiteliais.
Os esfregaços com atividade estrogênica podem ser divididos nas fases pré-ovulatória e ovulatória.
Na fase pré-ovulatória, as células, absolutamente intermediárias, identificam a fase e indicam o início
da maturação provocada pela influência estrogênica no epitélio escamoso antes de atingirem seu
máximo amadurecimento, representado pelas células superficiais. As células pré-ovulatórias apresentam
citoplasma bastante aumentado e núcleo com diâmetro reduzido (porém este ainda não se tornou
picnótico), coram-se fracamente em cianofilia, embora, algumas vezes, leves tonalidades eosinófilas
possam aparecer na porção média das células; outras vezes, são acentuadamente eosinófilas, sendo a
cor rosa a mais encontrada.
Os esfregaços com atividade luteínica ou progesterônica são divididos nas fases pós-ovulatória,
pré-menstrual e menstrual. Na fase pós-ovulatória, as células superficiais e intermediárias diminuem
de tamanho, sendo chamadas de células regressivas. Essas células são submetidas a um processo de
reabsorção, e não a um processo de citólise. Nessa fase é também observado que as células superficiais
e intermediárias alongadas aumentam de número, refletindo a supressão da ação estrogênica sobre
a mucosa vaginal. Já a fase pré-menstrual tem um padrão muito típico, sendo composta de células
pré‑menstruais que são, na maioria, células intermediárias com citoplasma acentuadamente cianofílico
e núcleos aumentados de tamanho, apresentando-se agrupados, formando grandes aglomerados, sendo
maiores que os grupos observados nas outras fases. Um aspecto comum dessas células é a irregularidade
da forma citoplasmática, uma vez que o contorno citoplasmático é menos nítido e, não raro, indica
citólise inicial. Na fase menstrual, além do grande número de eritrócitos presentes no esfregaço, há uma
abundante escamação de células epiteliais (CARVALHO, 2008).
Durante a gestação, a citologia vaginal deixa de mostrar modificações cílcicas, de modo que ao
epitélio se atribui um padrão característico pela intensa estimulação hormonal do tipo progestacional.
No início da gravidez, nas primeiras 6 semanas, os esfregaços vaginais apresentam aspectos semelhantes
ao pré-menstrual, podendo demonstrar um leve efeito estrogênico. Assim, existe a presença de células
escamosas intermediárias, mas pode haver células superficiais. O esfregaço dito gestacional é constatado a
partir do segundo ou terceiro trimestre de gravidez e é composto de células escamosas intermediárias, incluindo
células ricas em glicogênio, com núcleo periférico e bordas bem definidas, conhecidas como naviculares,
e também lactobacilos e citólise. A camada superficial é muito fina e reduzida, podendo estar ausente.
Esse padrão citológico não é observado exclusivamente na gravidez, mas padrões parecidos podem ser
verificados no início da menopausa ou em alguns casos de amenorreia (KOSS; GOMPEL; BERGERON, 2006).
Podem ser observados três padrões citológicos na menopausa. Com a dimunição da secreção de
estrógenos, ocorre a inibição gradativa da proliferação das células epiteliais escamosas. Consolaro e
Engler (2016) citam que, no início, predominam as células epiteliais escamosas intermediárias, porém
46
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
algumas células superficiais podem estar presentes, caracterizando baixa atividade estrogênica. Com
o tempo, que pode variar de poucos meses até vários anos, há uma queda progressiva da atividade
estrogênica, passando a haver predomínio de células escamosas parabasais, representando o epitélio
hipotrófico. Por fim, é possível observar a presença de células escamosas parabasais, indicando baixíssima
produção estrogênica. O epitélio atrófico é mais suscetível a infecções em razão do menor número de
camadas celulares, por isso, geralmente é possível observar a presença de processo inflamatório intenso
(SILVA FILHO, 2000).
Vale esclarecer que a menopausa clínica e a citológica podem não coincidir, ou seja, a paciente pode
apresentar ciclos menstruais regulares e esfregaços citológicos, já mostrando o início de menopausa.
Por outro lado, em mulheres com menopausa clínica, o tempo para instalação da atrofia também pode
variar, acontecendo em poucos meses após a última menstruação ou jamais ocorrendo, persistindo o
predomínio de células epiteliais escamosas intermediárias por toda a vida, como nas que continuam
sexualmente ativas ou que mantêm certa produção de esteroides adrenais (BIBBO, 1997).
Silva Filho (2000) e Koss, Gompel e Bergeron (2006) evidenciam que nos epitélios glandulares
endocervical e endometrial também se observa uma regressão progressiva, com escassez das glândulas
e, consequentemente, menor produção de muco, o que costuma levar ao dessecamento do epitélio
escamoso vaginal. O dessecamento faz com que as células apresentem aspecto achatado, com variação
do tamanho e da forma, eosinofilia citoplasmática, cariorrexe e picnocitose nuclear que pode sugerir
hipercromasia. Essas características celulares podem sugerir carcinoma escamoso e criar problemas
diagnósticos, que podem ser esclarecidos pela administração de estrogênio, que, por sua vez, é capaz
de melhorar a maturação do epitélio escamoso, de modo que as anormalidades causadas pela atrofia
desapareçam; por outro lado, se houver malignidade, as alterações celulares persistirão. Nesse epitélio,
as células endocervicais são normalmente escassas ou ausentes nos esfregaços cervicais.
As microbiotas vaginal e cervical são diferentes, mas se superpõem no conteúdo vaginal. As glândulas
de Bartholin e Skene, a cavidade uterina, as tubas uterinas, ovários e estruturas anexas são estéreis em
condições de normalidade. Os órgãos genitais externos apresentam microbiota da própria pele mais
alguns componentes da microbiota intestinal. O trato genital inferior apresenta comunicação com o
meio ambiente externo, o que propricia o desenvolvimento de reações inflamatórias infecciosas e não
infecciosas. Na continuidade desses processos inflamatórios, existem muitas mulheres assintomáticas.
Quando sintomáticas, os principais sintomas apresentados são leucorreia, irritação vulvovaginal, coceira,
dor, ulceração e sangramento (CONSOLARO; ENGLER, 2016).
47
Unidade I
Representam bacilos gram-positivos que fazem parte da flora vaginal normal. As enzimas desses
microrganismos influenciam a destruição proteolítica (citólise) das células epiteliais escamosas
intermediárias que contêm glicogênio. O glicogênio citoplasmático é, então, metabolizado em ácido
lático, que mantém o pH vaginal entre 3 e 4.2, o qual exerce um mecanismo de defesa contra a
proliferação de microrganismos patógenos. A citólise é identificada nos esfregaços pela presença de
restos citoplasmáticos e núcleos desnudos de células intermediárias tendo na vizinhança numerosos
bacilos. Quando a citólise é intensa, pode complicar ou mesmo impedir a graduação das lesões
pré‑cancerosas, uma vez que é necessária a manutenção do citoplasma íntegro para calcular a relação
nucleocitoplasmática, um critério importante para a classificação dessas lesões. O predomínio de
lactobacilos acontece na fase luteínica do ciclo menstrual, na gravidez, na menopausa precoce e durante
a administração de hormônios, especialmente progestágenos. Bactérias mistas constituem uma mistura
de bacilos e cocos, que só podem ser identificados pela cultura microbiológica. Em mulheres adultas
assintomáticas, essas bactérias são consideradas um achado normal (LIMA, 2012).
Figura 11 – Numerosos bacilos, restos citoplasmáticos e núcleos desnudos (setas), representando citólise
Gardnerella vaginalis
O odor característico da secreção se intensifica por ocasião da menstruação e após relações sexuais
devido ao aumento do pH e da consequente liberação pelos microrganismos de aminas responsáveis pelo
48
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
cheiro. No esfregaço citológico, a Gardnerella vaginalis tem a propriedade de ligar-se ao citoplasma das
células escamosas superficiais e intermediárias conferindo-lhes uma aparência granular (células‑guia).
É também característico o aspecto nublado, turvo, do fundo, especialmente na proximidade das
células, devido a uma maior concentração de bactérias. Habitualmente há discretas alterações celulares
degenerativas, e os neutrófilos são raros. Em raras ocasiões, bacilos ou cocos se sobrepõem às células
escamosas, dando a falsa impressão de células-guia. Porém, nesse caso, o fundo não tem a aparência
turva associada à infecção por Gardnerella (CATLIN, 1992).
Chlamydia trachomatis
É uma bactéria gram-negativa, intracelular obrigatória que depende, para o seu metabolismo, dos
nutrientes e da energia da célula hospedeira. Ainda que em muitos casos a infecção pelo microrganismo
seja assintomática, pode determinar processos inflamatórios na vulva, vagina, no colo, endométrio e
nas trompas. A infecção por Chlamydia aumenta o risco de aborto espontâneo e morte fetal e pode se
disseminar ao neonato durante o parto, provocando conjuntivite de inclusão e pneumonia. Em homens,
o microrganismo é causa comum de uretrite não gonocócica e epididimite.
Alguns autores acreditam que Chlamydia trachomatis se apresenta nos esfregaços cérvico-vaginais sob
a forma de inclusões citoplasmáticas de diferentes tipos, dependendo de suas etapas de desenvolvimento.
Classicamente, são descritos três tipos de inclusões: corpos elementares, corpos reticulares e corpos
agregados. Os corpos elementares aparecem como grânulos cocoides finos, eosinofílicos ou basofílicos.
Eles são difusamente distribuídos no citoplasma finamente poroso ou são localizados na zona perinuclear.
Esse estágio é seguido pela condensação e pela transformação dessas partículas em inclusões maiores
circundadas por vacúolos de paredes finas (inclusões em alvo), que tendem a ser cianofílicas e maiores que
os corpos elementares. Essas inclusões clamídicas geralmente revelam tamanho uniforme e distribuição
perinuclear. O terceiro tipo, os corpos agregados, aparecem como grandes conjuntos de partículas finamente
granulares eosinofílicas ou cianofílicas, dentro de grandes vacúolos citoplasmáticos. Esses vacúolos, que
podem ocupar a maior parte do citoplasma, têm bordas distintas e se amoldam contra o núcleo.
Recentemente, considera-se a citologia um método pouco preciso, com taxas baixas de sensibilidade
e especificidade na detecção de infecção por Chlamydia. Por outro lado, a cervicite crônica folicular é
atribuída formalmente à infecção por Chlamydia em quase 50% dos casos. Nos esfregaços cervicais,
a condição é representada por numerosos linfócitos em diferentes estágios de maturação,
predominantemente inativados (de pequeno tamanho). Podem ser vistas mitoses e raros capilares.
A chave para o diagnóstico é a presença de macrófagos de corpos tingíveis (macrófagos fagocitando
linfócitos degenerados). A frequente associação desse tipo de cervicite com Chlamydia autoriza o
citopatologista a sugerir a realização dos exames de imunofluorescência e cultura para a investigação
desse microrganismo (VIGIL et al., 2002; SMITH et al.,1991).
Leptothrix vaginalis
Correspondem a bactérias anaeróbicas. Elas são comuns na cavidade oral, no intestino e, ocasionalmente,
na vagina. Aparecem como estruturas filamentosas, em forma de “S”, “U” ou enoveladas. Há associação
desse microrganismo com Trichomonas vaginalis de 75% a 80% dos casos (BARROS et al., 2012).
49
Unidade I
As infecções micóticas representam a causa mais comum de vaginite nas regiões tropicais, sendo que
a cultura biológica de 85% a 90% dos casos demonstra Candida albicans. É mais comum em mulheres
imunossuprimidas, como aquelas sob tratamento com corticoides, quimioterapia ou com diabetes.
Ocorre também mais frequentemente na gravidez. A infecção geralmente envolve a vulva, a vagina e,
algumas vezes, o colo uterino.
As portadoras de Candida sp. são assintomáticas ou referem secreção vaginal espessa, branca, associada
a prurido e ardor. No esfregaço vaginal identificam-se hifas, pseudo-hifas e esporos redondos ou ovais de
3 a 7 micrômetros de diâmetro. Essas estruturas coram habitualmente em vermelho ou marrom. Nas hifas
verdadeiras, o protoplasma é contínuo entre o eixo principal e as ramificações. A Candida se reproduz por
brotamento. Os brotos se alongam formando as pseudo-hifas. Alguns esporos podem invadir o citoplasma
das células epiteliais escamosas aparentemente intactas. Em um grande número de amostras citológicas,
evidenciam-se halos perinucleares, vacuolização citoplasmática e cromatina agrupada. É frequente o
encontro de neutrófilos degenerados. Em algumas ocasiões, o aumento nuclear é significativo e, quando
associado à pseudoeosinofilia e halos perinucleares, pode ser difícil a diferenciação com alterações
citopáticas pelo HPV. Contudo, na infecção micótica as alterações são difusas. Às vezes é necessária uma
busca minuciosa pelo agente etiológico, nem sempre fácil de identificar. O exame das extremidades do
esfregaço pode ser útil, pois a leve dessecação comum nessas áreas facilita o reconhecimento especialmente
dos esporos que se mostram maiores que aqueles presentes nos setores bem fixados da amostra.
Lembrete
Corresponde a um protozoário flagelado, transmitido sexualmente. Quase 50% das mulheres com
Trichomonas são assintomáticas. Contudo, podem se associar a corrimento vaginal abundante de cor
verde-amarelada e odor desagradável. Nos esfregaços citológicos, devido à degeneração, raramente
se identificam os flagelos do parasita. Trichomonas variam de tamanho, entre 5 e 20 micrômetros,
e são piriformes, com limites mal definidos, às vezes contendo grânulos intracitoplasmáticos
50
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
Os herpes-vírus simples podem ser de dois tipos: HSV-1 e HSV-2. Ambos compartilham vários
antígenos, mas possuem glicoproteínas específicas. O HSV-1 acomete, principalmente, lábios e face.
Aproximadamente 90% da população apresenta anticorpos contra esse vírus, uma vez que pode
ter sido infectada na infância sem apresentar sintomas. Já o HSV-2 acomete predominantemente a
região genital, e a infecção ocorre, principalmente, no início da atividade sexual, entre 18 e 25 anos.
Raramente o HSV-1 acomete os genitais; o HSV-2, a face e os lábios. As lesões permanecem infectantes,
aproximadamente, de 10 a 12 dias. O HSV-2 é transmitido por contato sexual com parceiro infectado
ou, raramente, por contato orogenital, com portador de herpes labial em atividade. A contaminação
por assentos ou toalhas contaminados é improvável, pois o vírus não consegue sobreviver fora do
organismo. A inoculação direta pode ocorrer em profissionais de saúde, após exposição a secreções
infectantes. A contaminação é grande na presença de lesões na fase de vesículas.
Há dois tipos de infecção celular pelo HSV. A infecção produtiva, na qual ocorre a replicação viral
aguda em células epiteliais e fibroblastos, e a infecção latente, na qual o vírus migra e permanece nas
terminações nervosas. O vírus penetra no corpo por infecção das mucosas ou soluções de continuidade
da pele, causando infecção localizada, inaparente ou com produção de vesículas, que representa a
fase produtiva e promove lise e morte celulares. O vírus dissemina-se para células adjacentes e para
o neurônio responsável pela inervação, onde não se replica. Após situações específicas, como estresse,
imunossupressão ou outras, retorna de forma retrógrada via neurônio para o local inicial de infecção,
causando a infecção produtiva. Características citológicas: as alterações desencadeadas pelo vírus
afetam as células escamosas parabasais, metaplásicas imaturas e endocervicais.
Há mais de 150 tipos de HPV, embora somente cerca de 30 tipos sejam relacionados com o aumento
do risco para câncer cervical. Comumente, o HPV é classificado nos tipos de baixo e de alto risco,
de acordo com a sua menor ou maior associação com o câncer de colo. Os primeiros compreendem
especialmente o HPV 6 e 11, e os de alto risco são representados mais frequentemente pelos tipos
16, 18, 31 e 45, que contribuem para mais de 80% dos cânceres cervicais. Praticamente nenhuma
das mulheres infectadas com HPV de baixo risco apresenta lesão progressiva. Por outro lado, entre
aquelas infectadas com o HPV de alto risco, pelo menos 75% nunca desenvolverão lesões. Há fatores
imunológicos e moleculares que interferem na evolução de uma lesão. Aproximadamente um terço
de todas as lesões intraepiteliais escamosas regridem, 41% persistem e 25% progridem. Das lesões
progressivas, 10% evoluem para carcinoma in situ e 1% para câncer invasivo. Dessa forma, três quartos
das lesões intraepiteliais escamosas de todos os graus não progridem.
Estudos mostram que muitas das infecções pelo HPV são transitórias, a maioria desaparecendo depois de
um ou dois anos. Há uma tendência de persistência das infecções por HPVs de alto risco. Os raros casos de
câncer cervical em que o HPV não é encontrado poderiam ser explicados pelo desaparecimento do vírus após
a lesão celular ou pela participação de outro tipo de HPV não identificado pelos testes moleculares de rotina.
O HPV, assim como outros vírus, é incapaz de replicar independentemente o seu próprio DNA.
Assim, para completar o seu ciclo de vida, o HPV depende do metabolismo das células hospedeiras
infectadas. Durante o contato sexual e através de microerosões da mucosa, o vírus penetra na zona de
transformação do colo, infectando inicialmente as células basais ou as células de reserva (que podem se
diferenciar em epitélio escamoso ou glandular). O vírus, ao penetrar na célula, perde o seu capsídeo e é
transportado para o núcleo, onde permanece inicialmente no estado epissomal (na forma circular, não
integrado ao genoma da célula hospedeira).
A replicação do DNA epissomal é restrita nessa fase a uma replicação por ciclo celular. As células
imaturas infectadas são conhecidas como não permissivas, e, como nenhuma alteração histológica
específica ocorre nesse estágio, a infecção é chamada latente. O aumento dramático da replicação
viral (replicação do DNA viral), assim como a expressão dos genes tardios que codificam as proteínas
52
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
do capsídeo com a formação dos vírions, manifesta-se simultaneamente à diferenciação das células
escamosas hospedeiras. Só depois que as células basais se diferenciam em células intermediárias e
superficiais é que o vírus pode se desenvolver completamente. Dessa forma, nessas células escamosas
diferenciadas a multiplicação do vírus completo é possível, sendo, por isso, tais células conhecidas como
células permissivas. Finalmente, ocorre a lise e a ruptura celular, com liberação dos vírions capazes de
infectar novas células.
A produção das proteínas do capsídeo viral com a formação dos vírions é resultante da infecção produtiva e
é mais comum nas verrugas genitais e nas lesões pré-cancerosas de baixo grau. É nessa fase que se observam os
coilócitos que selam o diagnóstico citológico da infecção pelo HPV. Além de aspectos relacionados ao próprio
HPV (tipo e carga viral, infecção única ou múltipla), os estudos epidemiológicos enfatizam a importância dos
cofatores na história natural das infecções pelo HPV e das lesões associadas. Entre os cofatores são incluídos a
multiparidade, o uso prolongado de contraceptivos orais, o tabagismo e outras doenças de transmissão sexual
– particularmente a síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS). Dependendo da inter-relação entre esses
vários fatores, a infecção pelo HPV pode ser transitória, com regressão em aproximadamente 90% dos casos
dentro de 1 a 2 anos, ou persistente, nesse caso, associada a um maior risco de desenvolvimento de lesão
pré‑cancerosa de alto grau e câncer invasivo (RABACHINI; SICHERO, 2016).
Epitélio HPV
escamoso Ferimento
Membrana Célula
basal epitelial
basal
53
Unidade I
Liberação Queratinócitos
HPV do vírus diferenciados
Síntese da estrutura
e liberação
(L1, L2, E4)
Proliferação celular
e alto nível de
replicação epissomal
(E1, E2, E4, E5, E6, E7)
Infecção latente
e baixo nível de
replicação epissomal
(E1, E2)
DNA epissomal
Membrana Células do HPV
Derme basal basais
Inicialmente, como mostrado na figura anterior, o vírus permanece em estado epissomal nas células
basais da camada germinativa do epitélio escamoso (infecção latente) com baixo nível de replicação
viral. Com o amadurecimento das células escamosas, há uma intensa replicação viral. Há finalmente a
expressão dos genes com a produção das proteínas do capsídeo viral e a liberação das partículas virais
completas (vírions), que a partir daí infectam outras células
As manifestações clínicas da infecção pelo HPV são documentadas em 30% dos casos, sob a forma
de condiloma acuminado (verrugas) visível macroscopicamente, geralmente observado na vulva e
no períneo. A infecção latente não é detectada pelas técnicas convencionais de diagnóstico como
colposcopia, citologia e histopatologia, sendo demonstrada pelo encontro de DNA do HPV, através
de métodos de biologia molecular, em epitélios aparentemente normais. A infecção subclínica, ou
condiloma plano, corresponde a aproximadamente 70% das infecções pelo HPV, com a aplicação de
diferentes critérios para o seu diagnóstico. De um modo geral, é aceito que as lesões são evidenciadas
pelo exame colposcópico apenas após a aplicação do ácido acético, sendo também detectadas através
das alterações celulares nos esfregaços citológicos e na histologia.
Saiba mais
Você pode saber mais sobre o papilomavírus humano (HPV) por meio
dos textos indicados a seguir.
54
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
Segundo Solomon e Nayar (2005), a infecção pelo HPV é incluída no sistema Bethesda como lesão
intraepitelial escamosa de baixo grau. A prevalência da infecção pelo HPV diagnosticada citologicamente
varia entre 0,5 a 3% em mulheres da população geral, com ascensão desses percentuais para 8% a 13%
das pacientes atendidas em clínicas de doenças sexualmente transmissíveis.
• Coilocitose: apesar de específica da infecção produzida pelo HPV, é observada nos esfregaços
citológicos apenas entre 20% a 33% dos casos. Ocorre em células escamosas superficiais e
intermediárias que exibem cavitação perinuclear bem demarcada com condensação periférica do
citoplasma, acompanhada de aumento do tamanho e hipercromasia nuclear, às vezes binucleação
e multinucleação, além de cromatina de aspecto borrado ou granular. É importante distinguir
o coilócito de células naviculares, células com halos inflamatórios e células metaplásicas com
citoplasma diferenciado em endo e ectoplasma. Apesar de grosseiramente apresentarem
semelhanças com o coilócito, neste último o clareamento perinuclear é maior, bem demarcado e
associado a núcleo anormal.
• Disqueratose: na infecção pelo HPV, disqueratócitos podem surgir na superfície do epitélio. Todavia,
tais células não são específicas da infecção. Disqueratócitos representam células escamosas em
miniatura ou do tamanho padrão com queratinização anormal revelando aumento nuclear,
hipercromasia, cromatina condensada e leves irregularidades da borda nuclear.
Observação
55
Unidade I
Os exames mais sensíveis e específicos na detecção das infecções pelo HPV são os testes moleculares,
incluindo várias técnicas que detectam o DNA ou RNA do vírus. Entre eles, temos: southern blot, dot blot,
hibridização in situ, PCR e captura híbrida. O PCR é considerado a técnica mais sensível na identificação
do HPV, porém não tão específica, devido à maior possibilidade de diagnósticos falso-positivos gerados
especialmente pela manipulação inadequada das amostras no laboratório. O teste de captura híbrida é o
mais difundido no nosso meio devido a sua praticidade e efetividade: além de detectar o DNA do vírus,
identifica o grupo ao qual ele pertence (baixo risco ou alto risco) e estabelece a carga viral. É importante
ressaltar que esses testes moleculares não são diagnósticos das lesões associadas ao HPV, ou seja, a
detecção do DNA viral não indica necessariamente que a paciente seja portadora de lesão intraepitelial
escamosa (BARROS et al., 2012).
Considerando que o HPV é condição necessária para o câncer cervical, a vacinação para prevenção
do HPV apresenta potencial para reduzir a carga de doença cervical e lesões precursoras. O Ministério
da Saúde adotou a vacina quadrivalente contra HPV que confere proteção contra HPV de baixo risco
(HPV 6 e 11) e de alto risco (HPV 16 e 18). Essa vacina previne infecções pelos tipos virais presentes na
vacina e, consequentemente, o câncer do colo do útero, além de reduzir a carga da doença. Tem maior
evidência de proteção e indicação para pessoas que nunca tiveram contato com o vírus.
O objetivo da vacinação contra HPV no Brasil é prevenir o câncer do colo do útero, refletindo na
redução da incidência e da mortalidade por essa enfermidade. Desfechos como prevenção de outros
tipos de câncer induzidos pelo HPV e verrugas genitais são considerados desfechos secundários. A
população-alvo da vacinação com a vacina HPV é composta de adolescentes do sexo feminino na faixa
etária entre 11 e 13 anos no ano da introdução da vacina em 2014. A população-alvo, em 2015, foi a
faixa etária de 9 a 11 anos, no segundo ano de introdução da vacina, e de 9 anos de idade do terceiro
ano em diante, em 2016.
A vacina HPV é indicada para a imunização ativa contra os genótipos de baixo risco HPV 6 e 11 e de
alto risco HPV 16 e 18. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS ou WHO, na sigla em ingês), a
prevenção secundária compõe as estratégias para a detecção precoce do câncer do colo do útero. As
principais são o diagnóstico precoce, através da abordagem de pessoas com sinais e/ou sintomas, e o
rastreamento, pela realização do exame na população assintomática (aparentemente saudável), com o
objetivo de identificar precocemente lesões precursoras ou sugestivas de câncer (WHO, 2013).
Segundo as Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do Câncer do Colo do Útero (INCA, 2011a),
o rastreamento deve ser realizado através do exame citopatológico de esfregaço cérvico-vaginal,
conhecido como exame Papanicolau, por todas as mulheres entre 25 e 64 anos de idade, a cada três
anos (após dois exames anuais consecutivos negativos).
Até o momento, os componentes mais importantes para redução da morbimortalidade pelo câncer
do colo do útero são a alta cobertura do rastreamento na população-alvo e o tratamento de lesões
56
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
Alguns aspectos importantes quanto ao controle do câncer do colo do útero são destacados a seguir.
• Realização de estudos de monitoramento dos genótipos de HPV a médio e longo prazo. Para tanto,
é necessária uma nova infraestrutura operacional e de vigilância epidemiológica no país, incluindo
suporte laboratorial para identificação e monitoramento da circulação dos subtipos virais.
Resumo
57
Unidade I
Herpes genitalis (tipo 1 e 2): esse vírus pode infectar células escamosas
intermediárias, metaplásicas ou endocervicais. São visualizadas células
multinucleadas, com núcleos amoldados, pálidos (aspecto de “vidro fosco”)
e contendo inclusões eosinofílicas envoltas por halo claro.
Exercícios
Questão 1. (Enade 2013) A vacina quadrivalente contra o HPV é comercializada no Brasil desde
2006 e é formulada contra os subtipos 6 e 11, os principais causadores de verrugas genitais, e contra
os subtipos 16 e 18, responsáveis por 70% dos casos de câncer de colo uterino. Para produção dessa
vacina são utilizadas técnicas moleculares avançadas nas quais a proteína viral L1 de cada tipo de vírus
é produzida em laboratório. Essas proteínas se organizam espontaneamente formando os capsômeros e, em
seguida, uma estrutura semelhante ao vírus inteiro que é chamada de Partícula Semelhante a Vírus
(VLP, de virus like particules). As VLPs são mais imunogênicas que as proteínas solúveis utilizadas nas
vacinas convencionais e não apresentam potencial infeccioso nem oncogênico, pois não possuem
material genético viral.
VESPA JR., N. Vacina quadrivalente contra HPV 6, 11, 16, 18: a mais nova ferramenta de prevenção.
Jornal Brasileiro de Doenças Sexualmente Transmissíveis, v. 18, n. 4, p. 220-223, 2006 (adaptado).
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CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
I - A produção das VLPs foi realizada por meio do cultivo do vírus em laboratório e posterior
purificação das proteínas L1 e união espontânea para formação das VLPs.
II - Para produção das VLPs, foi feito inicialmente cultivo do HPV de interesse em laboratório, clonagem
do gene L1 de cada tipo de HPV e, em seguida, foi feita a expressão de cada uma das proteínas L1
recombinantes, e posterior purificação da VLP.
III - As VLPs dos diferentes tipos de HPV foram produzidas e mantidas em laboratório para posterior
purificação e utilização como vacina.
A) I, apenas.
B) II, apenas.
C) I e III, apenas.
D) II e III, apenas.
E) I, II e III.
I - Assertiva incorreta.
II - Assertiva correta.
Justificativa: com o avanço da biologia molecular e da engenharia genética, temos hoje uma nova
realidade, a vacina contra HPV. Consegue-se em laboratório a realização da vacina a partir da proteína
de L1, principal proteína da capa externa do vírus. E, através de um autoarranjo das proteínas L1, serão
formadas as VLPs (Virus Like-Particles ou Partículas Semelhantes a Vírus). Essas partículas demonstraram
induzir uma forte resposta à produção de anticorpos quando administradas em humanos, fazendo com
que o organismo identifique as VLPs como um invasor e produza uma resposta imunitária.
61
Unidade I
Questão 2. (Enade 2013) A detecção precoce do câncer de colo uterino é feita por um exame
tecnicamente simples e de baixo custo, a partir do esfregaço cérvico-vaginal. Esse exame também é
conhecido como exame citológico, de lâmina, citopatológico ou citologia cérvico-vaginal. Embora o
principal propósito da citologia cérvico-vaginal seja a detecção das lesões precursoras do câncer cervical,
o achado de condições infecciosas/reativas também pode contribuir para a saúde da mulher. Um dos
fatores de risco para o câncer de colo uterino é o histórico de infecções sexualmente transmissíveis, sendo
comprovada essa relação por vários estudos epidemiológicos realizados no Brasil. Dessa forma, tem
crescido o interesse na utilização do exame preventivo do câncer de colo uterino para o reconhecimento
de infecções cérvico-vaginais, como uma importante alternativa diagnóstica.
Coilocitose Binucleação
A) B)
A) As figuras A e B revelam características celulares que indicam provável infecção pelo Papiloma
Vírus Humano (HPV), visto que a coilocitose e a binucleação observadas em células da figura
A, assim como a presença de “células-guia”, recobertas por densas colônias de microrganismos,
observadas na figura B, são características da infeção por HPV.
B) As figuras A e B revelam características celulares que indicam provável infecção por Gardnerella
vaginalis, visto que a coilocitose e a binucleação observadas em células da figura A, assim como a
presença de “células-guia” recobertas por densas colônias de microrganismos, são observadas na
figura B, características da infecção por Gardnerella vaginalis.
D) A figura B revela características celulares indicativas da infecção por HPV, visto que a presença
de “células-guia”, recobertas por densas colônias de microrganismos, é característica da infeção
por esse vírus.
62
CITOPATOLOGIA E CITOLOGIA CLÍNICA
E) A figura A revela características celulares indicativas de provável infeção pelo Papiloma Vírus
Humano (HPV), visto que a coilocitose e a binucleação observadas em células desse esfregaço
são típicas da infecção por HPV. A figura B revela características celulares indicativas de provável
infecção por Gardnerella vaginalis.
A) Alternativa incorreta.
B) Alternativa incorreta.
C) Alternativa incorreta.
Justificativa: a figura B revela características celulares indicativas de provável infecção por Gardnerella
vaginalis. Coilocitose e binucleação são típicas da infecção por HPV.
D) Alternativa incorreta.
E) Alternativa correta.
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