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T E R A P Ê U T I C A
FELÍCIO CINTR A DO PR A DO
JAIRO DE A L M EIDA R A MOS
JOSÉ R IBEIRO DO VA LLE
D I AG N Ó S T I CO E T R ATA M E N T O
26ª
EDIÇÃO
A886 Atualização terapêutica de Prado, Ramos e Valle : diagnóstico
e tratamento [recurso eletrônico] / Presidente da comissão
editorial, Emilia Inoue Sato. – 26. ed. – São Paulo : Artes
Médicas, 2018.
CDU 616-07-043.84
2018
@ Artes Médicas Ltda, 2018
Nota: A medicina é uma ciência em constante evolução. À medida que novas pesquisas e a própria
experiência clínica ampliam o nosso conhecimento, são necessárias modificações na terapêutica,
onde também se insere o uso de medicamentos. Os autores desta obra consultaram as fontes
consideradas confiáveis, em um esforço para oferecer informações completas e, geralmente, de
acordo com os padrões aceitos à época da publicação. Entretanto, tendo em vista a possibilidade
de falha humana ou de alterações nas ciências médicas, os leitores devem confirmar estas infor-
mações com outras fontes. Por exemplo, e em particular, os leitores são aconselhados a conferir a
bula completa de qualquer medicamento que pretendam administrar, para se certificar de que a
informação contida neste livro está correta e de que não houve alteração na dose recomendada
nem nas precauções e contraindicações para o seu uso. Esta recomendação é particularmente
importante em relação a medicamentos introduzidos recentemente no mercado farmacêutico ou
raramente utilizados.
COMISSÃO EDITORIAL
ARNALDO LOPES COLOMBO tologia pela University of London, Inglaterra. Livre-Docente em Geriatria pela
EPM/Unifesp.
Infectologista. Professor titular da Disciplina de Infectologia da EPM/Unifesp.
Pesquisador Nível IA do CNPq. Consultor sênior da Leading International Fungal LYDIA MASAKO FERREIRA
Education (LIFE) e do Global Action Fund for Fungal Infections (GAFFI). Membro
Cirurgiã plástica. Professora titular de Cirurgia Plástica da EPM/Unifesp. Pesqui-
do Conselho Diretor da International Immunocompromised Host Society (ICHS).
sadora CNPq 1A. Coordenadora da Medicina III da CAPES. Doutora em Cirurgia
DURVAL ROSA BORGES Plástica pela EPM/Unifesp. Pós-Doutora em Cirurgia Plástica pela University of
California, EUA. Diretora do Departamento Científico da Sociedade Brasileira de
Médico. Professor titular aposentado do Departamento de Medicina da EPM/
Cirurgia Plástica (SBCP).
Unifesp. Doutor e Livre-Docente pela EPM/Unifesp. Pós-Doutor pelo National
Institute for Medical Research, Londres. RUTH GUINSBURG
LUIZ ROBERTO RAMOS Pediatra especialista em Neonatologia. Professora titular do Departamento de
Pediatria da EPM/Unifesp.
Médico. Pesquisador 1C do CNPq. Mestre em Saúde Coletiva pela University of
London, Inglaterra. Pós-Doutor pela Harvard University, EUA. PhD em Geron-
COORDENADORES DE SEÇÃO
Abes M. Amed: Professor associado do Departa- fesp. Doutor em Cardiologia pela Faculdade de Medi- -Roussy de Villejuif. Diplôme de Carcinologie Clinique
mento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. cina da Universidade de São Paulo (FMUSP). pela Universitè de Paris, França. XI Laureato Dottore
Acácio Alves de Souza Lima Filho: Farmacêutico- Afonso Celso Pinto Nazario: Mastologista. Pro- in Medicina i Chirurgia pela Università Degli Studi Di
-bioquímico. Doutor em Ciências Visuais pela EPM/ fessor Livre-Docente da Disciplina de Mastologia do Padova, Itália. Doutor em Cirurgia Plástica Reparado-
Unifesp. Departamento de Ginecologia da EPM/Unifesp. Mes- ra pela EPM/Unifesp.
Acary Souza Bulle Oliveira: Neurologista. tre em Ginecologia e Doutor em Medicina pela EPM/ Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso: Geriatra. Médi-
Unifesp. ca assistente do Ambulatório de Longevos da Discipli-
Acioly Luiz Tavares de Lacerda: Psiquiatra. Profes- na de Geriatria e Gerontologia da EPM/Unifesp. Geria-
sor adjunto Livre-Docente do Departamento de Psi- Alana Santos: Geriatra. Professora da Residência em
Clínica Médica do Instituto de Pesquisa e Difusão Pre- tra da Sociedade Beneficente Israelita Albert Einstein.
quiatria da EPM/Unifesp. Doutor em Ciências Médicas
pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). vent Senior. Coordenadora do Ambulatório de Saúde Ana Carolina Rabachini Caetano: Ginecologista e
Pós-Doutor pelo Neurochemical Brain Imaging Labo- dos Ossos da Prevent Senior. Mestre em Tecnologia e obstetra especialista em Medicina Fetal. Mestre em
ratory da University of Pittsburgh. Atenção à Saúde pela Unifesp. Ciências pela Unifesp.
Adauto Castelo Filho: Infectologista. Professor as- Alberto Goldenberg: Médico. Professor titular da Ana Carolina Silva Chuery: Ginecologista. Respon-
sociado de Infectologia e chefe do Ambulatório de Disciplina de Gastrenterologia Cirúrgica do Departa- sável pelo Ambulatório de Doenças Vulvares do Nú-
Hepatites Virais da Disciplina de Infectologia da EPM/ mento de Medicina da EPM/Unifesp. Especialista em cleo de Prevenção de Doenças Ginecológicas da EPM/
Unifesp. Mestre pela McMaster University, Hamilton, Cirurgia Gastrenterológica pela EPM/Unifesp. Mestre Unifesp. Mestre em Ciências pela USP. Doutora pelo
Canadá. Doutor em Infectologia pela EPM/Unifesp. e Doutor em Ciências pela EPM/Unifesp. Departamento de Ginecologia da EPM/Unifesp.
Adrialdo José Santos: Neurologista. Doutorando Alcides Augusto Salzedas Neto: Cirurgião pediá- Ana Cecilia Petta Roselli Marques: Psiquiatra. Dou-
em Hematologia/Oncologia Experimental da EPM/ trico. Professor adjunto de Cirurgia Pediátrica da EPM/ tora em Ciências pela Unifesp.
Unifesp. Unifesp. Mestre em Cirurgia Pediátrica e Doutor em Ana Cristina de Castro Amaral: Médica assistente
Adriana Aparecida Siviero-Miachon: Professora Gastrenterologia Cirúrgica pela EPM/Unifesp. da Disciplina de Gastrenterologia da EPM/Unifesp.
adjunta do Departamento de Pediatria da EPM/Uni- Alcides Rocha de F. Júnior: Cardiologista. Douto- Doutora em Medicina pela EPM/Unifesp.
fesp. Médica do Setor de Endocrinologia Pediátrica da rando em Pneumologia da EPM/Unifesp. Ana Cristina Fontenele Soares: Gastrenterologista
Disciplina de Especialidades Pediátricas do Departa- Alessandra Casagrande: Endocrinologista. Mestre pediátrica. Médica assistente da Disciplina de Gas-
mento de Pediatria da EPM/Unifesp. em Endocrinologia pela Universidade Federal do Rio trenterologia Pediátrica da EPM/Unifesp. Mestre em
Adriana Berezovsky: Ortoptista. Professora associa- Grande do Sul (UFRGS). Doutora em Endocrinologia Ciências e Doutora em Pediatria pelo Departamento
da do Departamento de Oftalmologia e Ciências Vi- Clínica pela EPM/Unifesp. de Pediatria da EPM/Unifesp.
suais da EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em Ciências Ana Cristina Gimenes: Fisioterapeuta. Professora
Alessandra Maria Julião: Psiquiatra. Atua no Depar-
Visuais pela EPM/Unifesp. da Universidade São Judas Tadeu. Especialista em Fi-
tamento de Psiquiatria da EPM/Unifesp.
Adriana Macedo Dell‘Aquila: Infectologista da EPM/ sioterapia Cardiorrespiratória EPM/Unifesp. Mestre e
Alex Gonçalves Macedo: Pneumologista. Respon- Doutora em Ciências pela Unifesp.
Unifesp. Mestre e Doutora em Ciências pela Unifesp.
sável pelo Serviço de Pneumologia da Santa Casa
Adriana Maria Porro: Dermatologista. Professora de Santos, SP. Mestre em Pneumologia pela EPM/ Ana Fátima Salles: Cardiologista. Mestre e Doutora
adjunta do Departamento de Dermatologia da EPM/ Unifesp. em Cardiologia pela EPM/Unifesp.
Unifesp. Mestre em Dermatologia e Doutora em Ciên- Ana Flávia Araújo Litwinczuk: Ginecologista.
Alexandre Jose Reis Elias: Neurocirurgião. Mestre
cias da Saúde pela EPM/Unifesp.
em Neurocirurgia pela EPM/Unifesp. Ana Laura de Almeida Dias: Nutricionista especia-
Adriana Marques Damasco Penna: Hematologis- lista em Nutrição Clínica. Professora da Faculdade de
ta. Médica assistente do grupo de Linfomas da EPM/ Alexandre Kopelman: Ginecologista e obstetra.
Nutrição da Universidade de Cuiabá (Unic). Mestre em
Unifesp. Médica hematologista do Hospital Santa Ca- Doutor em Ciências Médicas pela EPM/Unifesp.
Ciências da Saúde pela Universidade Federal do Mato
tarina. Doutora em Hematologia e Hemoterapia pela Alexandre Wagner Silva de Souza: Médico assis- Grosso (UFMT).
EPM/Unifesp. tente da Disciplina de Reumatologia e responsável
Ana Lucia Farias de Azevedo Salgado: Gastrente-
Adriana Seber: Pediatra especialista em Transplante pelo Ambulatório de Vasculites da EPM/Unifesp. Mes-
tologista.
de Medula Óssea: Oncologia Clínica, em Hematologia tre e Doutor em Ciências da Saúde Aplicadas à Reu-
matologia pela Unifesp. Pós-Doutor pela Universidade Ana Lucia Goulart: Pediatra especialista em Neona-
Pediátrica e em Cancerologia Pediátrica. Mestre em
de Groningen, Holanda. tologia. Professora adjunta da Disciplina de Pediatria
Pediatria pela EPM/Unifesp.
Neonatal do Departamento de Pediatria da EPM/Uni-
Adriano Luiz Ammirati: Nefrologista. Mestre em Aline Moriyama: Oftalmologista especialista em
fesp. Mestre e Doutora em Ciências pela Unifesp.
Ciências Médicas e Doutor em Nefrologia pela EPM/ Córnea e Doenças Externas.
Ana Lucia Santos Abreu: Nefrologista pediátrica.
Unifesp. Álvaro Ancona de Faria: Psiquiatra. Coordenador
Médica da Nefrologista Pediátrica da EPM/Unifesp.
Adriano Miziara Gonzalez: Médico. Professor do Ambulatório de Transtorno de Personalidade Bor-
derline do Prove/EPM/Unifesp. Pós-Graduado em Psi- Ana Luisa Godoy Fernandes: Professora titular de
adjunto Livre-Docente da Disciplina de Gastrentero-
quiatria pela EPM/Unifesp. Pneumologia do Departamento de Medicina da EPM/
logia Cirúrgica da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em
Unifesp.
Medicina pela EPM/Unifesp. Amélia Miyashiro Nunes dos Santos: Pediatria es-
pecialista em Neonatologia. Professora titular Livre- Ana Luisa Höfling-Lima: Professora titular do De-
Adriano Resende Lima: Psiquiatra e psicanalista.
-Docente da Disciplina de Pediatria Neonatal da EPM/ partamento de Oftalmologia da EPM/Unifesp.
Pesquisador do Programa de Atendimento e Pesquisa
em Violência (Prove) da EPM/Unifesp. Mestre e Dou- Unifesp. Mestre em Pediatria e Doutora em Ciências Ana Maria Martins: Médica especialista em Pedia-
tor em Ciências pelo Departamento de Psiquiatria da pela Unifesp. tria e em Genética e Erros Inatos do Metabolismo.
EPM/Unifesp. An Wan Ching: Cirurgião plástico e mastologista. Professora adjunta da EPM/Unifesp. Diretora Médica
Aecio Flavio T. de Gois: Médico emergencista. Co- Coordenador do Setor de Transplantes Microvas- do Centro de Referência em Erros Inatos do Metabo-
ordenador do Curso de Graduação em Medicina e da culares da Disciplina de Cirurgia Plástica da EPM/ lismo. Mestre e Doutora em Pediatria e Ciências Apli-
Residência em Clínica Médica e Urgência da EPM/Uni- Unifesp. Chefe e regente do Serviço de Cirurgia Plás- cadas à Pediatria pela EPM/Unifesp. Pós-Doutora em
fesp. Chefe do Pronto-Socorro de Clínica Médica da tica do Hospital do Servidor Público Estadual de São Genética.
EPM/Unifesp. Coordenador da Unidade de Trtamento Paulo (HSPE). Ex-Fellow de Cirurgia Craniofacial e de Ana Paula Brecheret: Nefrologista pediátrica. Mé-
Intensivo (UTI) e da Enfermaria/Cuidados Paliativos do Microcirurgia do Hospital de Clínicas (HC) da FMUSP. dica do Setor de Nefrologia Pediátrica do HSP/EPM/
Pronto-Socorro do Hospital São Paulo (HSP) da Uni- Ex-Fellow de Cirurgia Oncológica do Institut Gustave- Unifesp. Mestre em Ciências pela Unifesp.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO vii
Ana Paula Curi Spadella: Ginecologista especialista Unifesp. Especialista em Aconselhamento Genético/ Antonio Pignatari: Infectologista. Professor titular
em Endocrinologia Ginecológica. Reprodutivo. Mestre em Morfologia e Doutora em da Disciplina de Infectologia do Departamento de Me-
Anamaria da Silva Facina: Dermatologista. Profes- Enfermagem pela Unifesp. dicina da EPM/Unifesp.
sora afiliada do Departamento de Dermatologia da Anete Colucci: Pediatra responsável pelo Projeto Antonio Sergio Petrilli: Pediatra especialista em on-
EPM/Unifesp. Mestre em Dermatologia e Doutora em Desenvolver no Município de Embu das Artes-SP e cologia pediátrica. Professor titular Livre-Docente da
Ciências pela EPM/Unifesp. pelo Ambulatório de Atenção Integral à Crianças com Disciplina de Especialidades Pediátricas do Setor de
Distúrbios do Desenvolvimento Neuropsicomotor da Oncologia do Departamento de Pediatria da EPM/Uni-
Anamaria Jones: Especialista em Reabilitação em
EPM/Unifesp. Mestre em Ciências pela Unifesp. fesp. Diretor técnico do IOP/GRAACC/Unifesp. Mem-
Reumatologia. Professora afiliada da Disciplina de
bro fundador e superintendente médico do GRAACC.
Reumatologia da EPM/Unifesp. Doutora em Reabilita- Ângela Cristina Gomes Borges Leal: Endocrino-
ção pela EPM/Unifesp. logista especialista em Osteometabolismo. Coorde- Arnaldo Lopes Colombo: Infectologista. Professor
nadora do Ambulatório de Osteometabolismo do titular da Disciplina de Infectologia da EPM/Unifesp.
André Fernandes Reis: Endocrinologista. Médico do
Hospital Universitário da Universidade Federal de Pesquisador Nível IA do CNPq. Consultor sênior da
Centro de Diabetes e Professor de Pós-Graduação da
Sergipe (HU/UFS). Mestranda em Osteometabolismo Leading International Fungal Education (LIFE) e do
Disciplina de Endocrinologia da EPM/Unifesp. Mestre
da Unifesp. Global Action Fund for Fungal Infections (GAFFI).
e Doutor em Endocrinologia pela EPM/Unifesp. Pós-
Membro do Conselho Diretor da ICHS.
-Doutor em Diabetes pelo Institut National de la Santé Angela Honda: Pneumologista do Departamento de
et de la Recherche Médicale, França. Reabilitação Pulmonar da Disciplina de Pneumologia Artur Beltrame Ribeiro: Professor titular aposenta-
da EPM/Unifesp. do da Disciplina de Nefrologia da EPM/Unifesp.
André Ivan Bradley dos Santos: Cirurgião pediá-
trico. Professor adjunto do Curso de Medicina da Angela Maria Spinola e Castro: Professora adjun- Artur Filhou José: Psiquiatra. Coordenador do Am-
Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em ta do Departamento de Pediatria da EPM/Unifesp. bulatório Longitudinal de Psiquiatria e supervisor do
Cirurgia Pediátrica e Doutor em Ciência Cirúrgica Chefe do Setor de Endocrinologia Pediátrica da EPM/ Setor de Interconsulta Psiquiátrica e Medicina Psicos-
Interdisciplinar pela EPM/Unifesp. Pós-Doutor pelo Unifesp. somática (Intermep) da EPM/Unifesp.
Center for Fetal Research, The Children´s Hospital of Ary Gadelha: Professor adjunto de Psiquiatria e co-
Angélica M. Claudino: Psiquiatra especialista em
Philadelphia, EUA. ordenador do Programa de Esquizofrenia (Proesq) da
Transtornos Alimentares. Professora orientadora do
André Pasin Corrente Rangel Roma: Cirurgião EPM/Unifesp.
Programa de Pós-Graduação em Psiquiatria da EPM/
geral e pediátrico. 2º Tenente do Quadro de Oficiais Unifesp. Mestre em Psiquiatria e Doutora em Ciências Audrien Furlan de Lucca: Cirurgião plástico. Precep-
Reservistas de 2ª classe (QOCon) da Escola de Espe- pela EPM/Unifesp. tor do Setor de Cirurgia Órbito-Palpebral da Disciplina
cialistas de Aeronáutica. de Cirurgia Plástica da EPM/Unifesp.
Angelo Amato V. de Paola: Cardiologista. Profes-
Andréa Bomura Rosato: Dermatologista. Mestre em sor titular Livre-Docente da Disciplina de Cardiolo- Auro del Giglio: Médico. Livre-Docente pela FMUSP.
Patologia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA)/ gia do Departamento de Medicina da EPM/Unifesp. Fellow do The American College of Physicians.
Centro de Pesquisas Gonçalo Moniz (CPqGM). Doutor em Medicina: Cardiologia pela EPM/Unifesp. Barbara Nascimento de Carvalho Klemz: Reuma-
Andrea Fernandes de Oliveira: Cirurgiã plástica. Pós-Doutor pela Universidade Hahnemann, Filadél- tologista. Professora da Disciplina de Habilidades
Coordenadora da Unidade de Tratamento de Quei- fia, EUA. Médicas da Faculdade Metropolitana da Amazônia.
maduras da Disciplina de Cirurgia Plástica da EPM/ Angelo Paulo Ferrari: Gastrenterologista. Livre- Mestre e Doutoranda em Ciências da Saúde Aplicadas
Unifesp. Mestre em Ciências da Saúde pelo Programa -Docente da Disciplina de Gastrenterologia da EPM/ à Reumatologia da EPM/Unifesp.
de Pós-Graduação em Cirurgia Translacional da EPM/ Unifesp. Médico do Serviço de Endoscopia do Hospital Beatriz Tavarez Costa-Carvalho: Professora Livre-
Unifesp. Albert Einstein. Mestre e Doutor em Gastrenterologia -Docente da Disciplina de Alergia, Reumatologia e
Andrea Maria Cappellano: Oncologista pediátrica pela Unifesp/EPM. Imunologia Clínica do Departamento de Pediatria da
do Instituto de Oncologia Pediátrica do Grupo de Antonio Carlos Carvalho: Cardiologista. Professor EPM/Unifesp.
Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer da Uni- titular Livre-Docente e chefe da Disciplina de Cardiolo- Benedito Herani Filho: Médico. Professor associado
fesp (IOP/GRAAC/Unifesp). Doutora em Pediatria pela gia da EPM/Unifesp. Doutor em Medicina: Cardiologia aposentado da Disciplina de Gastrenterologia Cirúr-
EPM/Unifesp pela EPM/Unifesp. gica do Departamento de Medicina da EPM/Unifesp.
Andrea P. Jackowski: Bióloga. Professora adjunta de Mestre e Doutor em Ciências pela Unifesp.
Antonio Eduardo Benedito Silva: Gastrenterologis-
Psiquiatria na EPM/Unifesp. Mestre em Neurociências ta. Professor associado de Gastrenterologia da EPM/ Benjamin Israel Kopelman: Professor titular emérito
e Doutora em Ciências Médicas pela UFRGS. Unifesp. Mestre em Gastrenterologia e Doutor em Me- do Departamento de Pediatria da EPM/Unifesp.
Andrea Peiyun Chi Sakai: Otorrinolaringologista es- dicina pela EPM/Unifesp. Bento C. Santos: Nefrologista. No Hospital Israelita
pecialista em Otorrinolaringologia Pediátrica. Mestre Antonio Fernandes Moron: Professor titular Livre- Albert Einsten atua no Grupo de Suporte Nefrológico,
em Ciências pela Unifesp. -Docente do Departamento de Obstetrícia da EPM/ como médico responsável pelo Centro de Diálise Eins-
Unifesp. Coordenador do Departamento de Medicina tein e como supervisor do Programa de Residência em
Andrei Borin: Otorrinolaringologista. Professor
Fetal do Hospital e Maternidade Santa Joana (Pro Ma- Nefrologia. Mestre e Doutor em Nefrologia pela EPM/
afiliado do Departamento de Otorrinolaringologia
tre). Diretor Científico do Centro Paulista de Medicina Unifesp. Pós-Doutor pela Renal Division, Brigham and
e Cirurgia de Cabeça e Pescoço (ORL-CCP) da EPM/
Fetal. Pós-Doutor pela University of Wisconsin Medi- Women’s Hospital, Harvard Medical School, EUA.
Unifesp. Mestre em Otorrinolaringologia e Doutor em
Ciências pela EPM/Unifesp. cal School, EUA. Bernardo Hochman (falecido): Cirurgião plástico.
Antonio J. L. Ferrari: Reumatologista. Mestre em Professor afiliado e coordenador do Setor de Cica-
Andréia Latanza Gomes Mathez: Endocrinologista.
Reumatologia e Doutor em Medicina pela EPM/Uni- trizes Patológicas da Disciplina de Cirurgia Plástica
Andressa Melina Severino Teixeira: Ginecologista fesp. da EPM/Unifesp. Vice-coordenador do Curso de
especialista em Ginecologia Oncológica. Médica as- Aperfeiçoamento: Pesquisa em Cirurgia da EPM/Uni-
sistente do Setor de Oncocirurgia do Hospital Pérola Antonio José Lapa: Médico. Professor titular Livre- fesp. Mestre em Medicina, Doutor em Ciências e Pós-
Byington. Doutora em Ciências pela Unifesp. -Docente afiliado da EPM/Unifesp. Professor sênior -Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Cirurgia
convidado da Universidade do Estado do Amazonas. Plástica da EPM/Unifesp.
Anelise Del Vecchio Gessullo: Professora assistente Professor orientador dos Cursos de Pós-Graduação
da Faculdade de Medicina do ABC (FMABC). Mestre e em Biotecnologia da Bionorte e do Programa de Pós- Bruna Maria Pereia Bornéo: Cardiologista.
Doutora em Nefrologia Pediátrica pela EPM/Unifesp. Graduação em Biotecnologia da Universidade Fede- Bruno Ribeiro Cruz: Farmacêutico-bioquímico. Es-
Anelise Riedel Abrahão: Enfermeira. Professora ral do Amazonas (UFAM). Doutor em Farmacologia pecialista em Hematologia e Hemoterapia. Professor
associada da Escola Paulista de Enfermagem (EPE) da pela EPM/Unifesp. colaborador do Departamento de Análises Clínicas e
Toxicológicas (DECLIN) da Universidade Estadual de nica Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Ciro Kirchenchtejn: Pneumologista. Mestre em Me-
Ponta Grossa (UEPG). Mestre e Doutor em Ciências Unicamp. dicina pela EPM/Unifesp.
pela Unifesp. Clarice Cavalero Nebuloni: Nutricionista da Disci-
Carolina Atallah Pontes da Silva: Dermatologista.
Caden Souccar: Biomédica. Professora titular plina de Geriatria e Gerontologia do Departamento de
Carolina dos Santos Lázari: Infectologista. Assesso-
Livre-Docente do Departamento de Farmacologia Medicina da EPM/Unifesp. Especialista em Nutrição
ra médica para Análises Clínicas em Doenças Infeccio-
e Orientadora credenciada pelo Programa de Pós- em Saúde Pública pela Unifesp, em Gerontologia pelo
sas do Grupo Fleury.
Graduação em Farmacologia da EPM/Unifesp. Mestre HC/FMUSP e em Gerontologia pela Sociedade Brasilei-
em Farmacologia e Doutora em Ciências pela EPM/ Carolina Toniolo Zenatti: Infectologista. ra de Geriatria e Gerontologia (SBGG).
Unifesp. Cassio Andreoni Ribeiro: Professor adjunto Livre- Claudia C. Naufel Terzian: Pediatra especialista em
Camila Arai Seque: Dermatologista. Médica do De- -Docente de Urologia da EPM/Unifesp. Hematologia Pediátrica. Médica hemoterapeuta res-
partamento de Dermatologia da EPM/Unifesp. ponsável pela Agência Transfusional do IOP/GRAACC/
Cassio José de Oliveira Rodrigues: Nefrologista.
Unifesp. Doutora em Ciências Médicas e Biológicas
Camila Hirotsu: Pesquisadora. Especialista em Me- Professor titular de Nefrologia da Faculdade de Medi-
pela EPM/Unifesp.
dicina Farmacêutica e Doutora em Ciências pelo De- cina da Universidade de Santo Amaro (Unisa). Médico
partamento de Psicobiologia da EPM/Unifesp. da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis da Unifesp. Claudia C. R. Bortoletto: Médica assistente da Dis-
Mestre e Doutor em Nefrologia pela EPM/Unifesp. ciplina de Ginecologia Oncológica da EPM/Unifesp.
Carina Cohen: Ortopedista especialista em Ombro e
Coordenadora do Ambulatório e do Centro Cirúrgico
Cotovelo. Doutoranda em Medicina Translacional da Cecilia Maria Draque: Pediatra especialista em Ne-
da Disciplina de Ginecologia Oncológica da EPM/Uni-
Unifesp. onatologia. Professora afiliada da Disciplina de Pedia-
fesp. Mestre em Ginecologia e Doutora em Medicina
Carina Mori F. Gomes: Reumatologista. tria Neonatal da EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em
pela EPM/Unifesp.
Ciências pela Unifesp.
Carla Renata P. Donato Macedo: Oncologista pe- Claudia Hasegawa: Pneumologista
diátrica. Mestre em Ciências pela Unifesp. Cecilia Micheletti: Pediatra e geneticista. Mestre em
Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria pela EPM/ Claudia Teresa Carvente: Química. Especialista em
Carlos Alberto de Castro Pereira: Médico. Coorde- Análises Clínicas. Mestre em Ciências pela Unifesp.
Unifesp.
nador do Grupo de Assistência e Pesquisa em Doenças
Claudio Arnaldo Len: Pediatra especialista em Reu-
Pulmonares Intersticiais da EPM/Unifesp. Doutor em Célia Maria Camelo Silva: Cardiologista pediátrica.
matologia Pediátrica. Professor ajunto Livre-Docente
Pneumologia pela EPM/Unifesp. Doutora em Cardiologia pela EPM/Unifesp.
do Departamento de Pediatria da EPM/Unifesp. Pe-
Carlos Alberto Pires Pereira: Infectologista. Médico Celso Arrais Rodrigues: Hematologista. Médico diatra do Hospital Israelita Albert Einstein. Mestre e
da Disciplina de Infectologia da EPM/Unifesp. Doutor hematologista do Centro de Oncologia do Hospital Doutor pela EPM/Unifesp.
em Medicina pela EPM/Unifesp. Sírio-Libanês. Doutor em Ciências: Hematologia pela
Claudio Cirenza: Cardilogista e eletrofisiologia.
EPM/Unifesp. Pós-Doutor pela Universidade de Paris
Carlos Alexandre Lemes de Oliveira: Cardiologista Mestre e Doutor em Cardiologia pela EPM/Unifesp.
VII, França.
especialista em Insuficiência Cardíaca e Transplante Claudio E. Kater: Professor associado de Medici-
Cardíaco. Celso F. H. Granato: Infectologista e patologista clí- na da EPM/Unifesp. Chefe da Unidade de Adrenal e
Carlos André Freitas dos Santos: Geriatra. Coorde- nico. Professor Livre-Docente da Disciplina de Infecto- Hipertensão da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em
nador do Ambulatório de Geriatria Esportiva do Cen- logia da EPM/Unifesp. Medicina: Endocrinologia pela EPM/Unifesp. Pós-
tro de Traumatologia do Esporte do Departamento de Charlles Heldan de Moura Castro: Professor assis- -Doutor em Endocrinologia Clínica pela University of
Ortopedia da EPM/Unifesp. Coordenador do Ambula- tente da Disciplina de Reumatologia da EPM/Unifesp. California, EUA.
tório de Promoção à Saúde e supervisor do Programa Mestre e Doutor em Reumatologia pela EPM/Unifesp. Claudio Emilio Bonduki: Ginecologista e obstetra.
de Residência Médica em Geriatria da EPM/Unifesp. Fellow Research da Divisão de Metabolismo Osteomi- Professor adjunto do Departamento de Ginecologia
Mestre em Ciências pela Unifesp. neral da Washington University in Saint Louis, EUA. da EPM/Unifesp. Mestre em Ginecologia e Doutor em
Carlos Eduardo da Silveira Franciozi: Ortopedista. Chefe do Setor de Ergometria e Exercício e do Ambu- Medicina pela EPM/Unifesp.
Professor afiliado do Departamento de Ortopedia e latório de Cardiologia do Esporte, ambos da Disciplina
Cláudio Jerônimo da Silva: Psiquiatra. Professor
Traumatologia (DOT) da EPM/Unifesp. Chefe da Pre- de Medicina Esportiva da EPM/Unifesp.
afiliado do Departamento de Psiquiatria da EPM/
ceptoria e supervisor do Programa de Residência Mé- Christian Ribas: Oncologista clínico do Setor de On- Unifesp. Diretor Técnico da Associação Paulista para
dica em Ortopedia Traumatologia da EPM/Unifesp. cologia Clínica da EPM/Unifesp. o Desenvolvimento da Medicna (SPDM). Especialista
Professor orientador do Mestrado Profissional Liga- em Dependência Química pela EPM/Unifesp. Doutor
Christiane Maria da Silva Pinto: Hematologista
do à Residência Médica da Unifesp. Co-orientador em Ciências pela Unifesp.
pediátrica.
do Programa Cirurgia Translacional da EPM/Unifesp.
Christiane Simioni: Ginecologista e obstetra es- Clélia Maria Erwenne: Oftalmologista. Professora
Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp. Pós-Doutor
pecialista em Medicina Fetal. Membro da Equipe de aposentada do Departamento de Oftalmologia da
em Ortopedia pela University of Southern California,
Medicina Fetal do Hospital Israelita Albert Einstein. EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em Oncologia Ocular
EUA.
Mestre em Ciências pela Unifesp. pela EPM/Unifesp.
Carlos Fischer de Toledo: Gastrenterologista. Mes-
Cleonice Hitomi Watashi Hirata: Otorrinolaringolo-
tre e Doutor em Gastrenterologia pela EPM/Unifesp. Christina Hajaj Gonzalez: Psiquiatra. Coordenadora
gista do Departamento de ORL-CCP da EPM/Unifesp.
geral do Centro de Assistência, Ensino e Pesquisa dos
Carlos R. V. Kiffer: Infectologista. Professor adjunto Coordenadora do Setor de Estomatologia do Departa-
Transtornos do Espectro Obsessivo-Compulsivo (Cen-
da Disciplina de Doenças Infeccciosas e Parasitárias mento de ORL-CCP da EPM/Unifesp. Mestre em Otor-
TOC) da EPM/Unifesp. Psiquiatra do Departamento de
do Departamento de Medicina da EPM/Unifesp. Res- rinolaringologia e Doutora em Medicina pela EPM/
Psiquiatria da EPM/Unifesp. Doutora em Medicina:
ponsável técnico do Laboratório GC-2 SA. Unifesp.
Psiquiatria pela EPM/Unifesp.
Carlos Roberto Bazzo: Pneumologista pediátrico. Clineu de Mello Almada Filho: Geriatra. Coorde-
Coordenador do Ambulatório de Lactente Sibilante do Cibele Isaac Saad Rodrigues: Nefrologista espe- nador da Unidade Hospitalar Geriátrica da Disciplina
Setor de Pneumologia Pediátrica do Departamento de cialista em Hipertensão Arterial. Professora titular de de Geriatria e Gerontologia da EPM/Unifesp. Mestre e
Pediatria da EPM/Unifesp. Nefrologia do Departamento de Medicina da Facul- Doutor pela Unifesp.
dade de Ciências Médicas e da Saúde da Pontifícia
Carlota V. Blassioli Moraes: Pediatria especialista Universidade Católica de São Paulo (FCMS/PUCSP). Clovis Eduardo Tadeu Gomes: Pneumologista
em Cancerologia Pediátrica e em Medicina Paliativa. Professora de Bioética do Mestrado Profissional da pediátrico.
Carmen Silvia Passos Lima: Oncologista clínica. FCMS/PUCSP. Mestre e Doutora em Nefrologia pela Clystenes Odyr Soares Silva: Pneumologia. Doutor
Professora Livre-Docente do Departamento de Clí- EPM/Unifesp. em Medicina: Pneumologia pela EPM/Unifesp.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO ix
Cristhine Kamamoto: Dermatologista. Mestre em Daniela Gerent Petry Piotto: Pediatra especialista Domingos Palma: Pediatria e nutrólogo. Professor
Dermatologia e Doutora em Ciências da Saúde pela em Reumatologia Pediátrica. Mestre em Ciências e adjunto e chefe do Setor de Nutrição Clínica da Dis-
EPM/Unifesp. Doutora em Pediatria pela Unifesp. ciplina de Nutrologia do Departamento de Pediatria
Daniela Tavares: Geriatra. Preceptora do Serviço de da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Pediatria pela
Cristiane Curi Abud: Psicóloga psicanalista espe-
Dor e Doenças Osteoarticulares do Ambulatório de EPM/Unifesp.
cialista em Psicossomática. Professora do Curso de
Psicossomática Psicanalítica do Instituto Sedes Sa- Geriatria e Gerontologia da EPM/Unifesp. Douglas Rodrigues: Médico especialista em Saúde
pientiae. Mestre em Psicologia Clínica pela PUCSP. Danyelle S. Reges: Neurologista especialista em Pública. Doutor em Saúde Coletiva pela EPM/Unifesp.
Doutora em Administração de Empresas pela Funda- Doenças Cerebrovasculares. Dulce Maria Fonseca Soares Martins: Cirurgiã
ção Getúlio Vargas (FGV/SP). Dartiu Xavier da Silveira: Psiquiatra. Professor Li- plástica. Professora associada da Disciplina de Cirur-
Cristiane Kayser: Reumatologista. Professora afi- vre-Docente de Psiquiatria da EPM/Unifesp. Mestre e gia Plástica do Departamento de Cirurgia da EPM/
liada da Disciplina de Reumatologia da EPM/Unifesp. Doutor em Psiquiatria pela Unifesp. Assessor da ONU, Unifesp. Doutora em Ortopedia e Cirurgia Plástica
da Secretaria Nacional de Drogas e do Ministério da Reparadora pela EPM/Unifesp.
Cristiano Dietrich: Cardiologista com atuação em
Saúde nas áreas de Prevenção e Tratamento do Uso Edgard Torres dos Reis Neto: Reumatologista.
Eletrofisiologia e Estimulação Cardíaca. Doutor em
Indevido de Drogas. Especialista em Toxicomanies Assistente Doutor da Disciplina de Reumatologia da
Cardiologia pela EPM/Unifesp. pelo Centre Medical Marmottan, Paris, França. EPM/Unifesp. Doutor em Ciências da Saúde Aplicadas
Cristiano Noto: Psiquiatra. Coordenador do Ambula- David Del Curto: Ortopedista especialista em Cirur- à Reumatologia pela EPM/Unifesp.
tório de Primeiro Episódio Psicótico da Santa Casa de gia da Coluna. Mestre em Ciências pela EPM/Unifesp. Edileia Bagatin: Dermatologista. Professora adjunta
São Paulo. Mestre e Doutora em Psiquiatria e Psicolo-
David Pares: Professor adjunto da Disciplina de e Pesquisadora do Departamento de Dermatologia da
gia Médica pela Unifesp.
Medicina Fetal da EPM/Unifesp. Chefe dos Setores de EPM/Unifesp. Orientadora do Programa de Pós-Gra-
Cristina Ap. Falbo Guazzelli: Ginecologista e obste- Rastreamento de Aneuploidias no Primeiro Trimestre duação em Medicina Translacional da EPM/Unifesp.
tra. Professora associada Livre-Docente de Obstetrícia da Gestação e de Acompanhamento da Gestante Aloi- Mestre em Dermatologia e Doutora em Ciências pela
e responsável pelo Setor de Atendimento ao Pré-Natal munizada da EPM/Unifesp. Chefe do Departamento Unifesp.
Adolescente do Setor de Planejamento Familiar da de Obstetrícia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor pelo Edison Roberto Parise: Médico. Mestre em Gastren-
EPM/Unifesp. Mestre em Ciências e Doutora em Me- Departamento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. terologia e Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp.
dicina pela EPM/Unifesp. David Salomão Lewi: Infectologista. Professor asso-
Edmund Chada Baracat: Professor titular da Disci-
Cristina Muccioli: Oftalmologista especialista em ciado da Disciplia de Infectologia do Departamento de
plina de Ginecologia do Departamento de Obstetrícia
Uveítes. Professora adjunta Livre-Docente da EPM/ Medicina da EPM/Unifesp. Infectologista do Hospital
e Ginecologia da FMUSP.
Unifesp. Mestre e Doutora em Oftalmologia pela EPM/ Albert Einstein.
Edson J. Lobo: Gastrocirurgião. Professor assistente
Unifesp. Dayse Maria Lourenço: Hematologista especialista
e chefe do grupo de Vias Biliares e Pâncreas da Disci-
Cynthia M. A. Brandão: Endocrinologista especialis- em Hematologia: Coagulação e Trombose. Coordena-
plina de Gastrenterologia Cirúrgica da EPM/Unifesp.
ta em Doenças Osteometabólicas. dora do Curso de Medicina da Faculdade São Camilo.
Mestre e Doutora em Medicina: Hematologia pela Edson Khodor Cury: Cirurgião pediátrico. Professor
Daiane Pereira Guimarães: Oncologista clínica. EPM/Unifesp. adjunto da EPM/Unifesp. Cirurgião pediátrico do Hos-
Preceptora administrativa do Programa de Residência pital Israelita Albert Einstein. Mestre e Doutor pela
Delcio Matos: Gastrocirurgião especialista em Colo-
Médica em Cancerologia Clínica da Unifesp. Mestre EPM/Unifesp.
proctologia. Professor titular Livre-Docente da Disci-
em Ciências pela Unifesp. Edson Stefanini: Cardiologista. Mestre e Doutor em
plina de Sistema Digestório da Faculdade de Ciências
Daisy Maria Machado: Infectologista pediátrica da da Saúde da Universidade Metropolitana de Santos Cardiologia pela EPM/Unifesp.
Disciplina de Infectologia Pediátrica da EPM/Unifesp. (Unimes). Revisor da Cochrane. Mestre em Ciências e Eduardo Alexandrino Servolo de Medeiros: Pro-
Doutor em Ciências da Saúde pela Unifesp. fessor da Disciplina de Infectologia do Departamento
Dalva Poyares: Neurologista. Professora Livre-
-Docente do Departamento de Psicobiologia da EPM/ Denise de Freitas: Oftalmologista. Professora de Medicina da EPM/Unifesp. Presidente da Comissão
Unifesp. Médica pesquisadora do Instituto do Sono de adjunta Livre-Docente do Departamento de Oftalmo- de Controle de Infecção Hospitalar do HSP/EPM/Uni-
São Paulo. Doutora em Ciências pela Unifesp. logista e Ciências Visuais da EPM/Unifesp e do HSP. fesp. Mestre e Doutor em Doenças Infecciosas e Para-
Diana B. Dock-Nascimento: Nutricionista espe- sitárias pela EPM/Unifesp.
Dalva Regina Neto Pimentel: Dermatologista. Pro-
cialista em Nutrição Clínica e em Terapia Nutricional Eduardo Antonio Cardoso: Geriatra.
fessora adjunta de Dermatologia da EPM/Unifesp.
Enteral e Parenteral. Professora adjunta da UFMT. Eduardo Baiochi: Ginecologista e obstetra contrata-
Mestre e Doutora em Ciências pela Unifesp.
Mestre em Gastrenterologia e Nutrição pela UFMT.
do da EPM/Unifesp. Mestre em Obstetrícia e Doutor
Daniel Born: Cardiologista. Responsável pelo Setor Doutora em Ciências: Cirurgia do Aparelho Digestivo
em Medicina pela EPM/Unifesp.
de Cardiopatia e Gravidez da EPM/Unifesp. pela USP.
Eduardo Barros Puertas: Ortopedista especialista
Daniel Feldman: Reumatologista. Mestre e Doutor Diego Costa Astur: Ortopedista especialista em Ci-
em Cirurgia da Coluna. Professor titular de Ortopedia
em Reumatologia pela EPM/Unifesp. rurgia do Joelho/Traumatologia do Esporte. Professor
da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Ortopedia pela
afiliado e coordenador do Grupo do Joelho do Centro
Daniel Guedes Tomedi: Neurologista. Mestre em EPM/Unifesp.
de Traumatologia do Esporte do DOT/EPM/Unifesp.
Neurologia Clínica pela University College London, Eduardo Büchele Rodrigues: Oftalmologista. Pro-
Doutor em Ciências: Cirurgia Translacional pela EPM/
Londres, Inglaterra. Pós-Graduando do Setor de In- fessor afiliado de Oftalmologia da EPM/Unifesp. Dou-
Unifesp.
vestigação e Tratamento de Cefaleia da EPM/Unifesp. tor e Pós-Doutor pela Unifesp. Ocular Oncology Fellow
Dirceu Rodrigues Almeida: Cardiologista. Professor
Daniel Wagner Santos: Infectologista. Mestre em da Thomas Jefferson University. Doctor thesis in
adjunto da Disciplina de Cardiologia e responsável
Infectologia pela EPM/Unifesp. Doutorando em Infec- Ophthalmology pela Philipps-Universität, Alemanha.
pela Divisão de Insuficiência Cardíaca e Transplante
tologia da Unifesp. Retina Fellow da Philipps-University/Marburg. Retina
Cardíaco da EPM/Unifesp. Doutor em Medicina: Car-
Fellow da Universidade Federal de Goiás (UFG).
Daniela Bordini: Psiquiatra especialista em Psi- diologia pela EPM/Unifesp.
quiatria da Infância e Adolescência. Coordenadora Dirceu Solé: Pediatra especialista em Alergia e Imu- Eduardo Canteiro Cruz: Geriatra. Médico assistente
do Ambulatório de Cognição Social Doutor Marcos T. nologia Clínica. Professor titular Livre-Docente da Dis- voluntário da Disciplina de Geriatria e Gerontologia
Mercadante (TEAMM) da Unifesp. Mestre em Psiquia- ciplina de Alergia, Imunologia Clínica e Reumatologia da EPM/Unifesp.
tria e Doutoranda em Psiquiatria e Psicologia Médica do Departamento de Pediatria da EPM/Unifesp. Dou- Eduardo de Souza: Obstetra. Mestre e Doutor em
da Unifesp. tor em Ciências pela Unifesp. Obstetrícia pela EPM/Unifesp.
x ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Eduardo Freitas Hatanaka: Pediatra e nefrologista Elza Márcia Targas Yacubian: Professora adjunta Fania Cristina Santos: Geriatra especialista em Dor.
pediátrico. Nefrologista da Unidade de Diálise Pediá- Livre-Docente do Departamento de Neurologia e Neu- Professora afiliada e chefe do Serviço de Dor e Doenças
trica do Hospital Infantil Darcy Vargas. rocirurgia da UNFESP. Osteoarticulares da Disciplina de Geriatria e Geronto-
Elze Maria Gomes de Oliveira: Gastrenterologista logia da EPM/Unifesp. Orientadora do Mestrado Pro-
Eduardo Iwanaga Leão: Médico assistente da Disci-
especialista em Hepatologia. Professora da Disciplina fissional associado à Residência Médica (Meparem) da
plina de Cirurgia Torácica do Departamento de Cirur-
de Gastrenterologia do Centro Universitário Lusíada EPM/Unifesp. Coordenadora do Comitê de Dor no Idoso
gia da EPM/Unifesp.
(Unilus). Doutora em Ciências pela Unifesp. da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED).
Eduardo L. A. Motta: Médico especialista em Repro- Mestre e Doutora em Medicina pela EPM/Unifesp.
dução Humana. Professor adjunto do Departamento Emilia Inoue Sato: Reumatologista. Professora titu-
lar Livre-Docente de Reumatologia da EPM/Unifesp. Fátima Ferreira Bortoletti: Psicóloga especialista
de Ginecologia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em
Especialista em Reumatologia: Doenças Autoimunes. em Psicologia Hospitalar, Psicologia Obstétrica e Psi-
Medicina pela EPM/Unifesp.
Doutora em Reumatologia pela EPM/Unifesp. coneuroendocrinoimunologia. Atua na Unifesp e no
Eduardo Schor: Médico. Professor afiliado Livre-Do- Hospital Santa Catarina. Mestre em Ciências da Saúde
cente e chefe do Setor de Algia Pélvica e Endometriose Emmanuel P. B. Magalhães: Dermatologista.
pela EPM/Unifesp.
do Departamento de Ginecologia da EPM/Unifesp. Enedina M. L. Oliveira: Neurologista. Mestre em
Fausto Miranda Jr.: Angiologista e cirurgião vas-
Neurologia e Doutora em Ciências Médicas pela EPM/
Edward Araujo Júnior: Ginecologista e obstetra cular. Professor titular Livre-Docente de Cirurgia
Unifesp.
especialista em Medicina Fetal. Professor adjunto Vascular e Endovascular da EPM/Unifesp. Professor
Livre-Docente da Disciplina de Medicina Fetal do De- Enilde Borges Costa: Dermatologista. Mestre em do Curso de Pós-Graduação em Ciência Cirúrgica
partamento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. Mestre e Dermatologia pela EPM/Unifesp. Interdisciplinar da EPM/Unifesp. Mestre em Cirurgia
Doutor em Ciências pela Unifesp. Erika Pereira Macedo: Gastrenterologista especia- Cardiovascular e Doutor em Cirurgia Cardiovascular
Elaine Cristina Soares Martins-Moura: Cirurgiã pe- lista em Endoscopia Digestiva. Mestre em Gastrente- da EPM/Unifesp.
diatra. Médica do Setor de Coloproctologia Pediátrica rologia pela EPM/Unifesp. Felipe C. Isoldi: Cirurgião plástico. Preceptor dos
da Disciplina de Cirurgia Pediátrica da EPM/Unifesp. Ermelindo Della Libera Jr.: Gastrenterologista e Residentes em Cirurgia Plástica e Colaborador do Se-
Doutora em Ciências pela Unifesp. endoscopista digestivo. Professor afiliado a Disciplina tor de Cicatrizes Patológicas da Disciplina de Cirurgia
de Gastrenterologia da Unifesp. Médico endoscopista Plástica da EPM/Unifesp.
Elaine Guadelupe Rodrigues: Farmacêutica-bio-
química especialista em Análises Clínicas. Professora do HSP/EPM/Unifesp. Doutor em Medicina pela EPM/ Felipe Favorette Campanharo: Ginecologista e
adjunta do Departamento de Microbiologia, Imunolo- Unifesp. obstetra especialista em Medicina Fetal. Médico do
gia e Parasitologia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutora Esdras Guerreiro Vasconcellos: Professor do Insti- Departamento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. Mestre
em Ciências pela Unifesp. tuto de Psicologia da USP. Doutor pela Ludwig Maxi- em Ciências da Saúde pela Unifesp/EPM.
milians Universität München, Alemanha. Pós-Douto- Felipe Guardini: Neurocirurgião vascular/oncológico.
Élcio Hirai: Otorrinolaringologista especialista em Ri-
rado em Psicossomática realizado na Alemanha.
nologia. Assistente voluntário do Setor de Rinologia – Felipe Salles Neves Machado: Psiquiatra da infân-
Base de Crânio do Departamento de ORL-CCP da EPM/ Fabianne Carlesse: Infectologista pediátrica. Pro- cia e adolescência. Mestre em Psiquiatria pela EPM/
Unifesp. Mestre em Ciências pela Unifesp. fessora adjunta de Pediatria da EPM/Unifesp. Chefe Unifesp.
do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar do IOP/
Eliana M. M. Caran: Oncologista pediátrica do GRA- Feres Chaddad-Neto: Professor adjunto de Neuroci-
GRAACC/Unifesp. Mestre em Ciências e Doutora em
AC. Professora adjunta da Disciplina de Especialida- rurgia Vascular da EPM/Unifesp. Chefe da Disciplina
Infectologia pela EPM/Unifesp.
des do Departamento de Pediatria da EPM/Unifesp. de Neurocirurgia e do Laboratório de Anatomia Micro-
Mestre em Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria Fabio Araujo: Professor adjunto de Ginecologia da cirúrgica da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Neuro-
e Doutora em Medicina pela EPM/Unifesp. EPM/Unifesp. logia pela Unicamp.
Eliane Reiko Alves: Cardiologista especialista em Fábio H. L. Pace: Gastrenterologista e hepatologista. Fernanda Couto Fernandes: Médica assistente do
Insuficiência Cardíaca. Professor associado de Gastrenterologia da Universi- Departamento de Obstetrícia da EPM/Unifesp.
dade Federal de Juiz de Fora. Mestre e Doutor pela
Eliete Chiconelli Faria Buratto: Neuropediatra. Pós- Fernanda Descio: Infectologista do Hospital Sírio-
Unifesp.
-Graduanda do Departamento de Neurologia e Neuro- -Libanês.
Fabio Jennings: Reumatologista. Preceptor dos Am-
cirurgia do Setor de Neurologia da EPM/Unifesp. Fernanda Guimarães Weiler: Endocrinologista es-
bulatórios de Coluna Vertebral, Reabilitação e Artrite
Elisa Brietzke: Psiquiatra. Professora adjunta do De- pecialista em Doenças Osteometabólicas. Doutora em
Reumatoide da Disciplina de Reumatologia da EPM/
partamento de Psiquiatria da EPM/Unifesp. Doutora Ciências pela EPM/Unifesp.
Unifesp. Mestre e Doutor em Reumatologia pela EPM/
em Psiquiatria pela UFRGS. Unifesp. Fernanda Luisa Ceragioli Oliveira: Pediatria espe-
Elisabete Kawakami Fores: Pediatra especialista cialista em Nutrologia Pediátrica e Nutrição Parente-
Fábio Luís Peterlini: Cirurgião pediátrico. Mestre e
em gastrenterologia pediátrica. Professora titular Doutor em Cirurgia Pediátrica pela EPM/Unifesp. ral e Enteral. Pediatra da Disciplina de Nutrologias e
Livre-Docente do Departamento de Pediatria da EPM/ chefe do Setor de Suporte Nutricional do Ambulatório
Fabio Roberto Kater: Oncologista clínico. de Dislipidemia da Disciplina de Nutrologia Pediátrica
Unifesp.
Fabíola Paula Galhardo Rizzatti: Pneumologista do Departamento de Pediatria da EPM/Unifesp. Pes-
Elisabeth Nogueira Martins: Oftalmologista. Mem- especialista em Medicina do Sono. Professora do De- quisadora da Pós-Graduação de Nutrição da Unifesp.
bro do Setor de Trauma Ocular e chefe de Enfermaria partamento de Medicina da Universidade Federal de Doutora em Pediatria pela EPM/Unifesp.
do Departamento de Oftalmologia da EPM/Unifesp. São Carlos (Ufscar). Doutora em Ciências Médicas pela Fernanda Prata Martins: Gastrenterologista e en-
Doutora em Ciências pela Unifesp. Pós-Doutora em Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da doscopista digestiva. Médica endoscopista do Hos-
Retina e Vítreo pela Universidade da Califórnia, EUA. USP. Pós-Doutoranda do Departamento de Psicologia, pital Israelita Albert Einstein e da Unidade Itaim do
Elizabete Ribeiro Barros: Médica. Mestre e Doutura Disciplina de Medicina e Biologia do Sono. Hospital Sírio Libanês. Doutora em Ciências pela EPM/
em Endocrinologia e Metabologia: Doença Osteome- Fabricio Ferreira de Oliveira: Médico. Professor afi- Unifesp.
tabólica pela EPM/Unifesp. liado do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia Fernanda Teresa de Lima: Geneticista clínica. Chefe
Eloara Vieira Machado Ferreira: Pneumologista es- da EPM/Unifesp. Mestre em Ciências Médicas (Neuro- do Setor de Oncogenética da Disciplina de Mastologia
pecialista em Doenças da Circulação Pulmonar e Fisio- logia) pela Unicamp. Doutor em Neurologia/Neuroci- do Departamento de Ginecologia da EPM/Unifesp.
logia do Exercício. Professora adjunta da Disciplina de ências pela EPM/Unifesp. Pós-Doutor pela Fundação Responsável pelo Ambulatório de Oncogenética do
Pneumologia da EPM/Unifesp. Doutora em Ciências de Amparo à Pesquisa de São Paulo (Fapesp). IOP/GRAACC/Unifesp. Geneticista clínica do Centro
pela EPM/Unifesp. Fabrício Nogueira Furtado: Cardiologista. de Aconselhamento Genético do Hospital Israelita
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO xi
Albert Einstein. Professora da Faculdade Israelita de Fernando Travaglini Penteado: Ortopedista especia- Gaspar de Jesus Lopes Filho: Professor titular Livre-
Ciências da Saúde Albert Einstein. Mestre e Doutora lista em Cirurgia da Mão. Médico colaborador da Dis- -Docente da Disciplina de Gastrenterologia Cirúrgica
em Ciências pela EPM/Unifesp. ciplina de Cirurgia da Mão e Membro Superior do DOT/ da EPM/Unifesp. Coordenador do Programa de Pós-
Fernando Antônio Cardoso Bignardi: Médico espe- EPM/Unifesp. Mestre em Medicina pela EPM/Unifesp. Graduação em Ciência Cirúrgica Interdisciplinar da
cialista em Homeopatia, Psicoterapia Psicodramática Flávia Calanca da Silva: Pediatra especialista em EPM/Unifesp.
e Corporal, Medicina Comportamental, Medicina Ti- Medicina do Adolescente. Vice-chefe do Centro de Geraldo Rodrigues de Lima: Professor aposentado
betana, Cuidados Integrativos, Gerontologia, Antro- Atendimento e Apoio ao Adolescente da Disciplina do Departamento de Ginecologia da EPM/Unifesp.
posofia e Biografia Humana e Constelação Sistêmicas. de Especialidades Pediátricas da EPM/Unifesp. Mestre Gerardo Maria de Araujo Filho: Psiquiatra. Profes-
Fernando Antonio de Almeida: Internista e nefrolo- em Ciências Aplicadas à Pediatria pela EPM/Unifesp. sor adjunto do Departamento de Psiquiatria e Psico-
gista. Professor titular de Nefrologia da FCMS/PUCSP. Flávia Martelli Marzagão: Dermatologista. Mestre logia Médica da Faculdade de Medicina de São José
Doutor em Nefrologia pela EPM/Unifesp. Pós-Doutor em Ciências da Saúde pela EPM/Unifesp. do Rio Preto (FAMERP). Mestre e Doutor em Neuro-
e Fellow do Department of Physiology da Cornell Uni- ciências pela Unifesp. Pós-Doutor em Psiquiatria pela
Flávia N. Ravelli: Dermatologista assistente do De-
versity Medical College, EUA. EPM/Unifesp.
partamento de Dermatologia da Unisa. Chefe do De-
Fernando Augusto de Almeida: Dermatologista. partamento de Dermatologia do Hospital Santa Joana Gianna Mastroianni Kirsztajn: Nefrologista. Profes-
Professor associado colaborador aposentado da EPM/ (Pro Matre). sora adjunta Livre-Docente da Disciplina de Nefrolo-
Unifesp. gia e coordenadora do Setor de Glomerulopatias da
Flavia Silveira Amato: Otorrinolaringologista pe-
Fernando Baldy dos Reis: Ortopedista e trauma- diátrica. EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em Nefrologia pela
tologista. Professor Livre-Docente da EPM/Unifesp. EPM/Unifesp.
Mestre e Doutor em Ortopedia e Traumatologia pela Flavia Sternberg: Dermatologista especialista em
Distúrbios Capilares e Cosmiatria. Médica voluntária Gil Facina: Ginecologista e mastologista. Professor
EPM/Unifesp.
do Departamento de Dermatologia da EPM/Unifesp. Livre-Docente orientador do Programa de Pós-Gra-
Fernando Cepollina Raduan: Ortopedista e trauma- duação do Departamento de Ginecologia da EPM/Uni-
tologista especialista em Traumatologia Esportiva e Flávia Vanesca Felix Leão: Pediatra especialista em
fesp. Chefe da Disciplina de Mastologia e supervisor
Cirurgia do Tornozelo e Pé Membro do Grupo de Tor- Nefrologia e Terapia Intensiva Pediátrica. Mestre em
da Residência Médica em Mastologia da EPM/Unifesp.
nozelo e Pé do DOT/EPM/Unifesp. Pediatria pela EPM/Unifesp.
Mestre em Ginecologia/Mastologia pela EPM/Unifesp.
Fernando Danelon Leonhardt: Otorrinolaringolo- Flavio A. Quilici: Gastrenterologista e cirurgião do Doutor em Ciências pela Unifesp.
gista e cirurgião de cabeça e pescoço. Mestre e Dou- aparelho digestivo. Professor titular de Gastrenterolo-
Gilberto Petty da Silva: Professor adjunto do De-
tor em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e gia da PUC-Campinas. Mestre em Ciências Médicas e
partamento de Pediatria da EPM/Unifesp, Disciplina
Pescoço pela EPM/Unifesp. Doutor em Ciências da Cirurgia pela Unicamp.
de Especialidades Pediátrica do Setor de Pneumologia
Fernando F. Ganança: Otorrinolaringologista. Pro- Flavio Augusto Luisi: Oncologista pediátrico do IOP/ Pediátrica.
fessor adjunto de Otorrinolaringologia da EPM/Uni- GRAACC/Unifesp. Mestre em Pediatria e Doutor em
Gilberto Szarf: Médico radiologista especialista em
fesp. Mestre em Otorrinolaringologia e Doutor em Ciências Aplicadas à Pediatria pela EPM/Unifesp.
Radiologia Torácica. Professor adjunto do Departa-
Ciências pela Unifesp. Pós-Doutor pela Unifesp. Flavio Faloppa: Professor titular Livre-Docente do mento de Diagnóstico por Imagem da EPM/Unifesp.
Fernando Flexa Ribeiro Filho: Endocrinologista. Departamento de Ortopedia e Traumatologia da EPM/ Doutor em Ciências pela Unifesp.
Professor adjunto da Universidade do Estado do Pará Unifesp.
Gilmar Fernandes do Prado: Professor associado
(UEPA). Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp. Flavio Ferlin Arbex: Pneumologista. Coordenador Livre-Docente de Neurologia da EPM/Unifesp.
Fernando Herbella: Cirurgião geral e gastrocirur- do Ambulatório de DPOC-IC da EPM/Unifesp. Profes-
Giovanna C. P. Abrahão: Endocrinologista.
gião. Mestre e Doutor pela EPM/Unifesp. sor de Pneumologia da Universidade de Araraquara
(Uniara). Doutor em Pneumologia pela EPM/Unifesp. Gisele Colleoni: Hematologista. Professora asso-
Fernando Luiz Affonso Fonseca: Farmacêutico-
ciada Livre-Docente do Departamento de Oncologia
-bioquímico especialista em Análises Clínicas e To- Francisco Antonio Helfenstein Fonseca: Cardio-
Clínica e Experimental da EPM/Unifesp. Mestre em
xicológicas. Professor adjunto do Departamento de logista. Livre -Docente da Disciplina de Cardiologia
Ciências Biológicas da Unifesp. Professor assistente Hematologia e Doutora em Ciências pela Unifesp.
da EPM/Unifesp. Doutor em Cardiologia pela EPM/
do Departamento Clínico-Cirurgico da FMABC. Doutor Unifesp. Pós-Doutor pela The Mount Sinai School of Gisele Cristina Gosuen: Infectologista especialista
em Medicina pela FMUSP. Pós-Doutor em Bioquímica Medicine, EUA. em Doenças Infecciosas e Parasitárias do Centro de
Clínica pela Roche Center for Medical Genomics e pelo Referência e Treinamento em ISTs, Aids e Hepatites
Francisco Irochima Pinheiro: Oftalmologista do
Instituto Israelita de Ensino e PEsquisa do Hospital Is- Virais. Mestre em Ciências pela Unifesp.
Serviço de Oftalmologia do Hospital Universitário
raelita Albert Einsten (IIEP/HIAE). Gisele Limongeli Gurgueira: Pediatra especialista
Onofre Lopes da Universidade Federal do Rio Grande
Fernando M. A. Giuffrida: Endocrinologista. Pro- do Norte (UFRN). Doutor em Ciências da Saúde pela em Terapia Intensiva Pediátrica. Mestre em Ciências
fessor auxiliar do Departamento de Ciências da Vida UFRN. pela Unifesp.
da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Professor
Franco L. Chazan: Ginecologista e obstetra espe- Gisele Sampaio Silva: Neurologista. Mestre em Saú-
colaborador do Programa de Pós-Graduação em En-
cialista em prematuridade. Médico materno-infantil de Pública pela Harvard School of Public Health, EUA.
docrinologia da EPM/Unifesp. Preceptor do Programa
do Hospital Israelita Albert Einstein. Doutorando em Doutora em Ciências pela Unifesp.
de Residência Médica em Endocrinologia do Centro de
Ginecologia da EPM/Unifesp. Glaura César Pedroso: Pediatra da Disciplina de
Diabetes e Endocrinologia do Estado da Bahia. Doutor
em Ciências pela EPM/Unifesp. Franz R. Apodaca-Torrez: Gastrocirurgião. Professor Pediatria Geral e Comunitária do Departamento de
adjunto da Disciplina de Gastrenterologia Cirúrgica do Pediatria da EPM/Unifesp. Mestre em Pediatria e Dou-
Fernando Marcondes Penha: Oftalmologista es-
Departamento de Cirurgia da EPM/Unifesp. Mestre e tora em Ciências pela Unifesp.
pecialista em Retina e Vítreo. Professor substituto na
Doutor em Ciências pela Unifesp. Grazzia Guglielmino: Otorrinolaringologista espe-
Fundação Universidade de Blumenau (FURB). Doutor
em Ciências pela Unifesp. Pós-Doutor em Oftalmo- Gabriel Trova Cuba: Infectologista. Mestre em In- cialista em Laringologia e Voz. Médica assistente do
logia pela EPM/Unifesp. Clinical Research Fellow da fectologia pela EPM/Unifesp. Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo e
Bascom Palmer Eye Institute, EUA. Gabriela Possa: Nutricionista. Mestre em Ciências do Hospital Mario Covas da FMABC. Mestre em Ciên-
Fernando Morgadinho Santos Coelho: Médico es- da Saúde pela Universidade Federal de Ciências da cias Médicas: Neurolaringologia pela Unifesp/EPM.
pecialista em Sono. Professor adjunto da Disciplina de Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). Doutoranda em Guilherme Bicudo Barbosa: Ginecologista especia-
Neurologia Clínica da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria da EPM/ lista em Ginecologia Oncológica. Médico assistente da
em Ciências pela Unifesp. Unifesp. Oncologia Cirúrgica do Hospital Péroloa Byington, SP.
xii ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Guilherme Bricks: Infectologista. da EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em Ciências pela logia pela EPM/Unifesp. Doutor em Ginecologia pela
Guilherme Fenelon: Professor afiliado Livre-Docen- Unifesp. EPM/Unifesp e Yale University, EUA. Pós-Doutor em
te da Disciplina de Cardiologia e responsável pelo Henrique Ballalai Ferraz: Neurologista. Professor Neurociência pela Yale University, EUA.
Laboratório de Eletrofisiologia Experimental da EPM/ adjunto Livre-Docente de Neurologia da EPM/Unifesp. Ivan Dunshee de Abranches Oliveira Santos Fi-
Unifesp. Coordenador do Centro de Arritmia do Hospi- Mestre em Neurologia e Doutor em Medicina pela lho: Cirurgião plástico. Doutorando do Programa de
tal Israelita Albert Einstein. EPM/Unifesp. Cirurgia Translacional da EPM/Unifesp. Fellow do Me-
Guilherme Henrique Campos Furtado: Infectolo- Henrique Pierotti Arantes: Endocrinologista. lanoma Institute Australia.
gista. Professor da Pós-Graduação da Disciplina de Mestre e Doutorando em Endocrinologia da EPM/ Ivan Dunshee de Abranches Oliveira Santos: Cirur-
Infectologia e coordenador do Grupo de Discussão Unifesp. Subcoordenador do Curso Medicina do Ins- gião oncológico. Professor Livre-Docente de Cirurgia
de Antimicrobianos em Doentes Críticos do HSP/EPM/ tituto Master de Ensino Presidente Antônio Carlos de Plástica da EPM/Unifesp. Orientador do Curso de Pós-
Unifesp. Mestre e Doutor em Infectologia pela EPM/ Araguari, MG. Graduação em Ciência, Tecnologia e Gestão Aplicadas
Unifesp. Henrique Pott Junior: Infectologista. Médico as- à Regeneração Tecidual da EPM/Unifesp. Mestre e
Guilherme Liausu Cherpak: Geriatra afiliado ao Am- sistente do Ambulatório de Hepatites Virais/Núcleo Doutor em Cirurgia Plástica pela EPM/Unifesp.
bulatório de Dor e Doenças Osteoarticulares da Dis- Multidisciplinar de Patologias Infecciosas da Gesta- Ivan Maynart Tavares: Oftalmologista especialista
ciplina de Geriatria e Gerontologia da EPM/Unifesp. ção (NUPAIG) da Disciplina de Infectologia da EPM/ em Glaucoma. Professor afiliado e da Pós-Graduação
Mestre Profissional em Tecnologias e Atenção à Saúde Unifesp. Doutorando em Infectologia da EPM/Unifesp. do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais
pela EPM/Unifesp. Henrique Tria Bianco: Cardiologista. Doutor em Car- da EPM/Unifesp. Doutor em Ciências: Oftalmologia
Guilherme Suarez-Kurtz: Médico. Professor titular diologia pela EPM/Unifesp. pela EPM/Unifesp. Pós-Doutor em Glaucoma pela Uni-
Livre-Docente de Farmacologia Básica e Clínica da versity of California, EUA, e pela EPM/Unifesp.
Hérbene José Figurinha Milani: Ginecologista e
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pesqui- obstetra especialista em Medicina Fetal. Médico co- Ivete Gianfaldoni Gattás: Psiquiatra da infância e
sador 1A do CNPq. Coordenador da Rede Nacional de laborador do Setor de Medicina Fetal da EPM/Unifesp. adolescência. Coordenadora da Unidade de Psiquia-
Farmacogenética. Doutor em Medicina. Médico da Equipe de Medicina Fetal e de Cirurgia tria da Infância e Adolescência da EPM/Unifesp.
Gustavo A. Moreira: Pediatra. Especialista em Me- Fetal do Centro Paulista de Medicina Fetal e do Hos- Ivone Minhoto Meinão: Reumatologista. Preceptora
dicina do Sono. Médico e Pesquisador do Instituto do pital e Maternidade Santa Joana (Pro Matre). Mestre aposentada de Reumatologia da EPM/Unifesp. Mestre
Sono do Departamento de Psicobiologia e do Setor em Ciências pela EPM/Unifesp. Fellow em Neurologia e Doutora em Reumatologia pela EPM/Unifesp.
de Pneumologia Pediátrica da EPM/Unifesp. Diretor Fetal da Universidade de Tel-Aviv, Israel.
Ivonete S. S. Silva: Gastrenterologista. Professora
Clínico do Serviço de Ventilação Mecânica em Doen- Iara Baldim Rabelo: Médica especialista em Clínica afiliada e Médica da Disciplina de Gastrenterologia.
ças Neuromusculares do Instituto de Tratamento de Médica e Hematologia e Hemoterapia. Professora da Mestre em Gastrenterologia e Doutora em Ciências
Doenças Neuromusculares da Associação Fundo de Universidade José do Rosário Vellano (Unifenas) e da da Saúde.
Incentivo à Pesquisa (TDN/Afip). Doutor em Ciências Universidade Federal de Alfenas (Unifal). Doutoranda
pela Unifesp. J. Alberto Neder: Pneumologista. Professor de Me-
em Hematologia da Unifesp.
dicina Respiratória e Terapia Intensiva da Quee’s Uni-
Gustavo Falbo Wandalsen: Pediatria e alergista. Ibrahim Ahmad Hussein El Bacha: Gastrenterolo- versity, Canadá. Diretor do Laboratório de Fisiologia
Professor adjunto da Disciplina de Alergia, Imunolo- gista especialista em Hepatologia. Médico do ambu- Clínica do Kingston General Hospital e do Laboratório
gia Clínica e Reumatologia do Departamento de Pe- latório de Doenças Hepáticas da EPM/Unifesp. Mestre de Função Pulmonar do Hotel Dieu Hospital, Kingston,
diatria da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Ciências em Ciências da Saúde pela EPM/Unifesp. Ontário, Canadá. Doutor em Medicina pela Unifesp.
pela Unifesp.
Ieda T. N. Verreschi: Endocrinologista especialista Pós-Doutor em Fisiologia Clínica do Exercício pela Uni-
Gustavo Henrique Johanson: Infectologista espe- em Gônadas e Desenvolvimento. Mestre em Far- versity of London e pela University of Glasgow, Rei-
cialista em Medicina Tropical e Higiene do Hospital macologia: Endocrinologia Experimental e Doutora no Unido. Livre-Docente em Pneumologia pela EPM/
Israelita Albert Einstein. Mestre em Medicina Tropical em Farmacologia: Modo de Ação de Drogas pela Unifesp.
e Saúde Internacional pela London School of Hygiene Unifesp/EPM. Jaime Lin: Neuropediatria. Professor de Neuropedia-
and Tropical Medicine, University of London, Ingla-
Ilka Lopes Santoro: Médica. Doutora em Ciências tria da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul).
terra.
pela Unifesp. Mestre em Neurologia e Neurociências pela EPM/
Gustavo Polacow Korn: Otorrinolaringologista. Unifesp.
Professor afiliado de Otorrinolaringologia da EPM/ Inês Cristina Camelo-Nunes: Alergista e imuno-
logista clínica. Pesquisadora associada da Disciplina Jair de Jesus Mari: Psiquiatra. Professor titular do
Unifesp. Mestre e Doutor pela Unifesp. Pós-Doutor
de Alergia da EPM/Unifesp. Professora titular de Imu- Departamento de Psiquiatria da EPM/Unifesp. PhD
pela Unifesp.
nologia da Unisa. Mestre em Pediatria e Doutora em pelo Instituto de Psiquiatria do Kings College, Lon-
Hakaru Tadokoro: Oncologista clínico. Chefe do Se- Medicina pela EPM/Unifesp. dres, Inglaterra.
tor de Oncologia Clínica da EPM/Unifesp. Doutor em
Iran Gonçalves Junior: Médico. Doutor em Cardiolo- Jamil Natour: Médico. Professor associado Livre-Do-
Medicina.
gia pela EPM/Unifesp. cente da Disciplina de Reumatologia da EPM/Unifesp.
Heitor Carvalho Gomes: Cirurgião plástico especia-
Ita Pfeferman Heilberg: Nefrologista. Professo- Jane Tomimori: Dermatologista. Professora asso-
lista em Câncer de Pele. Professor adjunto da Discipli-
ra associada da Disciplina de Nefrologia da EPM/ ciada Livre-Docente do Departamento de Dermato-
na de Cirurgia Plástica e Orientador do Mestrado Pro-
Unifesp. Mestre e Doutora em Nefrologia pela EPM/ logia da EPM/Unifesp. Assistente estrangeiro pela
fissional em Ciência, Tecnologia e Gestão em Saúde
Unifesp. Université Paris IV, França . Mestre e Doutora pela
da Unifesp. Mestre em Ciências e Doutor em Medicina
EPM/Unifesp. Pós-Doutora pela Universität Münster,
pela Unifesp. Italo Capraro Suriano: Neurocirurgião. Coordena-
Alemanha.
Helena Regina Comodo Segreto: Hematologista dor do Pronto-Socorro de Neurocirurgia do HSP/EPM/
Unifesp. Mestre em Ciências pela Unifesp. Japy Angelini Oliveira Filho: Professor associado
e radiobiologista. Professora associada do Setor de
Livre-Docente da EPM/Unifesp.
Radioterapia do Departamento de Oncologia Clínica Ival Peres Rosa: Professor colaborador do Departa-
e Experimental da Unifesp/EPM. Mestre em Ciências e mento de Dermatologia da EPM/Unifesp. Doutor em Jaquelina Ota-Arakaki: Professora adjunta da Dis-
Doutora em Medicina pela Unifesp. Ciências pela Unifesp. ciplina de Pneumologia e coordenadora do Setor de
Heloisa Helena Caovilla: Fonoaudióloga especia- Ivaldo Silva: Professor do Departamento de Gine- Circulação Pulmonar da EPM/Unifesp.
lista em Vestibulometria. Professora associada Livre- cologia e coordenador do Meparem em Tecnologia e João Aléssio Juliano Perfeito: Cirurgião torácico.
-Docente da Disciplina de Otologia e Otoneurologia Atenção à Saúde da EPM/Unifesp. Mestre em Gineco- Professor associado da Disciplina de Cirurgia Torácica
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO xiii
do Departamento de Cirurgia da EPM/Unifesp. Doutor Jorge Senise: Infectologista da EPM/Unifesp. José Maria Cordeiro Ruano: Ginecologista. Chefe
pela EPM/Unifesp. do Serviço de Endoscopia Ginecológica da Disciplina
José Alberto Del Porto: Psiquiatra. Professor titu-
João Amaro Ferrari Silva: Oftalmologista. Chefe de de Ginecologia Geral do Departamento de Ginecolo-
lar do Departamento de Psiquiatria da EPM/Unifesp.
Setor de Vias Lacrimais da EPM/Unifesp. gia da EPM/Unifesp. Doutor em Ciências pela Unifesp.
Mestre e Doutor em Psicofarmacologia pela EPM/
João Bortoletti Filho: Ginecologista e obstetra espe- Unifesp. José Mario Soares Junior: Professor associado Li-
cialista em Medicina Fetal. Responsável pelo Setor de vre-Docente da Disciplina de Ginecologia do Departa-
José Alvaro Pereira Gomes: Professor adjunto
Infecções Congênitas da Disciplina de Medicina Fetal mento de Ginecologia e Obstetrícia da USP. Supervisor
Livre-Docente do Departamento de Oftalmologia e
do Departamento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. Co- do Setor de Endométrio e Climatério da Disciplina de
Ciências Visuais da EPM/Unifesp. Coordenador do
-responsável pelo Setor de Medicina Fetal do Hospital Ginecologia do Departamento de Ginecologia e Obs-
Programa de Mestrado Profissional e da Residência
Santa Catarina de São Paulo/SP. Mestre em Ciências tetrícia do HC/USP. Vice-chefe do Departamento de
em Transplante de Córnea e diretor do Centro Avan-
pela EPM/Unifesp. Ginecologia e Obstetrícia da FMUSP.
çado de Superfície Ocular (CASO) do Departamento de
João Carlos Belloti: Ortopedista especialista em Oftalmologia e Ciências Visuais da EPM/Unifesp. José Medina Pestana: Nefrologista. Professor titular
Cirurgia da Mão. Professor adjunto do DOT/EPM/Uni- Livre-Docente do Departamento de Medicina da EPM/
José Antonio Gordillo de Souza: Cardiologista.
fesp. Mestre e Doutor em Ciências pela Unifesp. Unifesp. Superintendente do Hospital do Rim. Doutor
Médico da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da
em Medicina: Nefrologia pela EPM/Unifesp. Pós-Dou-
João Eduardo Nunes Salles: Professor da Disciplina EPM/Unifesp.
tor pela Cleveland Clinic, Estados Unidos.
de Endocrinologia da Faculdade de Ciências Médicas José Atilio Bombana: Psiquiatra e psicanalista. Dou-
da Santa Casa de São Paulo. José Orlando Bordin: Professor titular da Disciplina
tor em Psiquiatria pela EPM/Unifesp.
de Hematologia e Hemoterapia do Departamento de
João Massud Filho: Médico especialista em Medi- José Caporrino Neto: Otorrinolaringologista. Res- Oncologia Clínica e Experimental da EPM/Unifesp.
cina Farmacêutica. Professor e coordenador do Cur- ponsável pelo Ambulatório de Lesões Benignas da La-
so de Especialização em Medicina Farmacêutica do José Paulo Fiks: Psiquiatra especialista em Violência
ringe do Departamento de ORL-CCP da EPM/Unifesp. e Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). Profes-
Instituto Sírio-Libanês de Ensino e Pesquisa (IEP/HSL). Mestre e Doutor em Otorrinolaringologia e Cirurgia da
Fellow Honorário da Faculty of Pharmaceutical Medi- sor afiliado do Departamento de Psiquiatria da EPM/
Cabeça e Pescoço pela EPM/Unifesp. Unifesp. Pesquisador do Prove/EPM/Unifesp. Mestre
cine of London, Inglaterra.
Jose Carlos Costa Baptista Silva: Professor titular em Comunicação e Semiótica pela PUCSP. Doutor em
João Norberto Stávale: Professor associado do De- Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicação
Livre-Docente da Disciplina de Cirurgia Vascular e
partamento de Patologia da EPM/Unifesp e Artes da USP. Pós-Doutor em Ciências da Saúde pelo
Endovascular do Departamento de Cirurgia da EPM/
João Roberto de Sá: Endocrinologista. Médico assis- Unifesp. Departamento de Psiquiatria da EPM/Unifesp.
tente da Disciplina de Endocrinologia e Metabologia e Jose Pedro Areosa Ferreira: Gastrenterologista clí-
José Carlos Del Grande: Psiquiatra do HC/FMUSP.
supervisor do Programa de Residência Médica em En- nico. Médico colaborador do Setor de Dispepsias da
Pesquisador associado do Instituto Nacional de Ciên-
docrinologia e Metabologia da EPM/Unifesp. Mestre Disciplina de Gastrenterologia da EPM/Unifesp. Mes-
cias e Tecnologia para Políticas Públicas do Álcool e
em Endocrinologia e Doutor em Medicina pela EPM/ tre e Doutor em Gastrenterologia pela EPM/Unifesp.
Outras Drogas (INPAD).
Unifesp.
José Cássio do Nascimento Pitta: Psiquiatra. Pro- José R. Jardim: Professor de Pneumologia da EPM/
João Roberto M. Martins: Endocrinologista. Pro- Unifesp. Diretor da Unidade de Reabilitação Pulmonar
fessor assistente do Departamento de Psiquiatria
fessor dos Programas de Pós-Graduação em Endocri- da Disciplina de Pneumologia da EPM/Unifesp e do
da EPM/Unifesp. Mestre em Psiquiatria pela EPM/
nologia e Biologia Molecular e chefe do Ambulatório HSP/EPM/Unifesp.
Unifesp.
de Doenças Tiroidianas da EPM/Unifesp. Mestre em
Ciências e Doutor em Ciências: Endocrinologia Clínica José Eduardo de Aguilar-Nascimento: Médico es- José Ricardo Gurgel Testa: Otorrinolaringologista.
pela EPM/Unifesp. pecialista em Cirurgia Geral e Gastrenterologia Cirúr- Professor adjunto do Departamento de ORL-CCP/EPM/
gica. Diretor do Curso de Medicina do Centro Universi- Unifesp. Médico titular do Departamento de Cirurgia
João Tomas de Abreu Carvalhaes: Pediatra espe- de Cabeça e Pescoço do Hospital A.C. Camargo. Mes-
tário de Várzea Grande. Pesquisador Nível 2 do CNPq.
cialista em Nefrologia Pediátrica. Professor adjunto da tre e Doutor em Otorrinolaringologia e Cirurgia de
Mestre e Doutor pela Unifesp.
EPM/Unifesp. Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp. Cabeça e Pescoço pela EPM/Unifesp.
João Toniolo Neto: Médico especialista em Clíni- José Eduardo de Sá Pedroso: Coordenador do
Ambulatório de Laringe e Voz da Unifesp. Chefe do José Salvador Rodrigues de Olveira: Hematolo-
ca Médica e Geriatria. Doutor em Imunização pela gista. Professor associado de Hematologia e Hemo-
Unifesp. ambulatório de Tumores Iniciais de Laringe e Este-
nose Laringo-Traqueal. Mestre e Doutor pela EPM/ terapia da Unifesp. Mestre e Doutor em Hematologia
Joaquim Prado P. Moraes-Filho: Professor Livre- Unifesp. e Hemoterapia pela Unifesp. Pós-Doutor em Trans-
-Docente de Gastrenterologia da FMUSP. plante e Medula Óssea do Fred Hutchinson Cancer
Jose Eduardo Decico: Dermatologista. Research Center, EUA.
Joaquim Teodoro de Araujo Neto: Mastologista da
Disciplina de Mastologia da EPM/Unifesp e do Institu- José Ernesto Succi: Cirurgião torácico e cardiovas- Josefina Aparecida Pellegrini Braga: Pediatra e he-
to Brasileiro de Controle do Câncer (IBCC). Coordena- cular. Professor assistente da Disciplina de Tórax do matologista. Professora adjunta do Departamento de
dor do Ambulatório de Patologia Benigna e Alto Risco Departamento de Cirurgia da EPM/Unifesp. Chefe de Pediatria da EPM/Unifesp. Mestre em Medicina: He-
e da Graduação da Disciplina de Mastologia da EPM/ Clínica da Disciplina de Tórax da EPM/Unifesp. matogia e Doutora em Pediatria e Ciências Aplicadas
Unifesp. Supervisor da Residência Médica de Masto- José Gilberto Henriques Vieira: Médico. Professor à Pediatria pela EPM/Unifesp.
logia e coordenador do Centro de Estudos do IBCC. afiliado da Disciplina de Endocrinologia da EPM/ Judymara Lauzi Gozzani: Anestesiologista epe-
Mestre em Ciências pela Unifesp. Unifesp. cialista em Dor. Mestre em Biologia Molecular pela
Jorge Amorim: Cirurgião vascular e endovascular. José Luiz Martins: Médico especialista em Cirurgia Unifesp. Doutora em Cirurgia Cardiovascular: Aneste-
Professor adjunto da Disciplina de Cirurgia Vascular e Pediátrica. Professor titular Livre-Docente da Disci- siologia pela EPM/Unifesp.
Endovascular. Mestre em Cirurgia Vascular e Doutor plina de Cirurgia Pediátrica e chefe do Departamento Juliana Harumi Arita: Neuropediatra. Mestre em
em Medicina pela EPM/Unifesp. de Cirurgia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Gas- Neurologia e Neurociências pela EPM/Unifesp. Dou-
Jorge Kuhn: Ginecologista e obstetra. Professor as- trenterologia Cirúrgica pela EPM/Unifesp. toranda em Neurologia e Neurociências da EPM/
sistente do Departamento de Obstetrícia da EPM/Uni- José Luiz Pedroso: Professor afiliado do Departa- Unifesp.
fesp. Mestre em Obstetrícia pela EPM/Unifesp. mento de Neurologia e Neurocirurgia e vice-coorde- Juliana Maria Gazzola: Fisioterapeuta especialista
Jorge Nakatani: Professor adjunto de Pneumologia nador do Setor de Neurologia Geral e Ataxias da EPM/ em Gerontologia. Professora adjunta do Departamen-
da EPM/Unifesp. Unifesp. to de Fisioterapia, pesquisadora do Laboratório de
xiv ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Inovação Tecnológica em Saúde e professora do Pro- Laura de Sena Nogueira Maehara: Dermatologista Luci Corrêa: Infectologista. Médica da Disciplina de
grama de Pós-Graduação Strictu Sensu em Fisioterapia especialista em Dermatoses Bolhosas e Dermatope- Infectologia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em
da UFRN. Mestre e Doutora em Ciências pela Unifesp. diatria. Coordenadora da Disciplina de Dermatologia Infectologia pela EPM/Unifesp.
Juliana Mayumi Sumita: Dermatologista especialis- do Curso de Medicina da Unidade Campinas da Fa-
Luciana Camacho-Lobato: Gastrenterologista espe-
ta em Dermatologia Geriátrica e Fototerapia. Médica culdade São Leopoldo Mandic. Doutora em Ciências:
cialista em Motilidade Digestiva. Professora adjunta
colaboradora do Ambulatório de Geriatria do Depar- Medicina Translacional pela EPM/Unifesp.
de Gastrenterologia. Mestre e Doutora em Medicina:
tamento de Dermatologia da EPM/Unifesp. Leandro G. Peyneau: Pediatra especialista em Tera- Gastrenterologia pela EPM/Unifesp. Pós-Doutora
Juliana Oliveira da Silva: Infectologista especialista pia Intensiva e Infectologia Pediátrica. em Motilidade Digestiva pela University of Lon-
em Infectologia Hospitalar. Infectologista da Comis- Leisa Barbosa de Araújo: Psiquiatra e Psicogeriatra. don (Intestino Delgado), Graduate Hospital, EUA
são de Epidemiologia Hospitalar do HSP/EPM/Unifesp. (Esôfago) e pela University of Southern, California,
Leny Vieira Cavalheiro: Fisioterapeuta especialista
Infectologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz. EUA (Anorretal).
em Fisioterapia Respiratória e Terapia Intensiva Adul-
Doutoranda em Infectologia da EPM/Unifesp. to. Diretora de ensino da Pós-Graduação do Hospital Luciana Dias Chiavegato: Professora do Programa
Julieta Freitas Ramalho Da Silva: Médica especia- Israelita Albert Einstein. Mestre em Reabilitação em de Mestrado e Doutorado em Fisioterapia da Uni-
lista em Psicanálise e Psicoterapia. Mestre e Doutora Pneumologia pela EPM/Unifesp. versidade Cidade de São Paulo (Unicid). Especialista
em Ciências pela Unifesp. em Fisioterapia Respiratória pela Unifesp. Mestre em
Leonardo Haddad: Otorrinolaringologista e Ci-
Reabilitação e Doutora em Ciências: Pneumologia
Julio Abucham: Endocrinologista. Professor asso- rurgião de Cabeça e Pescoço. Professor adjunto do
pela Unifesp.
ciado de Endocrinologia da EPM/Unifesp. Mestre e Departamento de ORL-CCP/EPM/Unifesp. Mestre e
Doutor em Endocrinologia Clínica pela EPM/Unifesp. Doutor pela Unifesp. Luciana Fonseca da Silva: Cirurgiã cardiovascular
Pós-Doutor pela Tufts University, EUA. Lia Bittencourt: Pneumologista com área de atua- especialista em Cardiopatias Congênitas do Hospital
ção em Medicina do Sono. Professora associada Livre- Beneficência Portuguesa de São Paulo. Doutora em
Julio Elito Junior: Obstetra e ginecologista. Profes-
-Docente de Medicina do Sono da EPM/Unifesp. Medicina pela EPM/Unifesp.
sor associado Livre-Docente do Departamento de
Obstetrícia da EPM/Unifesp. Mestre em Ciências e Ligia A. Azzalis: Professora adjunta da Unifesp – Luciane B. C. Carvalho: Psicóloga. Professora afi-
Doutor em Obstetrícia pela EPM/Unifesp. Campus Diadema. Mestre e Doutora em Ciências: liada da Disciplina de Neurologia Clínica da EPM/
Julio Maria Fonseca Chebli: Gastrenterologista. Bioquímica pelo IQ/USP. Unifesp. Doutora em Psicologia pelo Instituto de Pis-
Professor titular da Disciplina de Gastrenterologia da cologia da USP. Pós-Doutora em Distúrbios do Sono
Liliam Cristine Rolo: Ginecologista e obstetra es-
Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Juiz pela EPM/Unifesp.
pecialista em Medicina Fetal. Professora adjunta de
de Fora (UFJF). Coordenador dos Ambulatórios de Pân- Obstetrícia na EPM/Unifesp. Mestre, Doutora e Pós- Luciane F. F. Botelho: Dermatologista. Professo-
creas e Vias Biliares e de Doenças Inflamatórias Intesti- -Doutora em Ciências pela EPM/Unifesp. ra assistente da Ufscar. Mestre em Ciências pela
nais do Hospital Universitário da UFJF. Pesquisador do Unifesp.
Lilian S. Ballini Caetano: Médica assistente da Dis-
CNPq. Doutor em Gastrenterologia pela EPM/Unifesp.
ciplina de Pneumologia e coordenadora do Ambulató- Luciano Lenz: Endoscopista. Médico assistente do
Julisa C. L. Ribalta: Ginecologista e oncologista rio de Asma da EPM/Unifesp. Doutora em Medicina: Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP).
clínica, qualificada em Patologia do Trato Genital In- Pneumologia pela EPM/Unifesp. Endoscopista do Fleury Medicina e Saúde. Doutor em
ferior. Doutora e Livre-Docente em Medicina: Gineco- Gastrenterologia pela EPM/Unifesp.
Lilian Tiemi Kuranishi: Pneumologista. Professora
logia pela EPM/Unifesp.
adjunta de Pneumologia no Centro Universitário Unin- Luciano Marcondes Machado Nardozza: Professor
Jullyana C. F. Toledo: Geriatra. Associada à Discipli- gá. Doutora em Ciências da Saúde pela EPM/Unifesp. associado Livre-Docente da Disciplina de Medicina
na de Geriatria e Gerontologia da EPM/Unifesp. Mes- Fetal da EPM/Unifesp. Chefe do Departamento de
Liliana Andrade Chebli: Gastrenterologista. Pro-
tre em Tecnologias da Saúde. Obstetrícia da EPM/Unifesp
fessora adjunta da Disciplina de Gastrenterologia da
Jussara Leiko Sato Tebet: Ginecologista. Mestre em Faculdade de Medicina da UFJF. Médica associada dos Lucila Bizari Fernandes do Prado: Médica com
Ciências pela Unifesp. Ambulatórios de Pâncreas e Vias Biliares e de Doenças atuação em Medicina do Sono e Neurofisiologia Clíni-
Karime Hassun: Mestre em Dermatologia pela EPM/ Inflamatórias Intestinais do HU/UFJF. Doutora em ca no setor de Neuro-Sono da Disciplina de Neurolo-
Unifesp. Ciências da Saúde pela UFJF. gia da EPM/Unifesp.
Karin Argenti Simon: Bióloga. Professora adjunta de Lily Yin Weckx: Pediatra especialista em Infectolo- Luís Arthur Flores Pelloso: Hematologista. Profes-
Bioquímica da Unifesp. Doutora em Bioquímica pelo gia Pediátrica e Vacinologia. Professora associada do sor afiliado da Disciplina de Hematologia e Hemotera-
Instituto de Química (IQ) da USP. Departamento de Pediatria da EPM/Unifesp. Mestre e pia do Departamento Oncologia Clínica e Experimen-
Doutora em Pediatria pela EPM/Unifesp. tal da EPM/Unifesp. Doutor em Ciências: Hematologia
Karina Takesaki Miyaji: Infectologista. Mestre em
Moléstias Infecciosas e Parasitárias pela FMUSP. Lisandra Quilici: Coloproctologista e endoscopista. e Hemoterapia. Pós-Doutor pela Universidade de
Lívia Nascimento de Matos: Médica especialista Chicago.
Kelly S. A. Cunegundes: Pediatra especialista em
Infectologia Pediátrica. Médica do Centro de Referên- em Clínica Médica e Cardiologia. Mestre em Ciências Luís Carlos Gregorio: Otorrinolaringologista espe-
cias para Imunobiológicos Especiais da Disciplina de pelo Instituto de Assistência Médica ao Servidor Públi- cialista em Medicina do Sono. Doutor pela Unifesp.
Infectologia Pediátrica da EPM/Unifesp. Mestre em co Estadual de São Paulo (IAMSPE).
Luís César Fernandes: Cirurgião geral e do aparelho
Ciências Aplicadas à Pediatria pela Unifesp. Livia Nasser Caetano: Dermatologista especialista digestivo. Médico assistente do Grupo de Coloproc-
Laercio Gomes Lourenço: Cirurgião do aparelho em Dermatoses. Doutora em Medicina Translacional tologia da Disciplina de Gastrenterologia Cirúrgica da
digestivo. Professor associado de Cirurgia e chefe do pela EPM/Unifesp. EPM/Unifesp. Coronel Médico do Exército Brasileiro,
Grupo de Esôfago, Estômago e Duodeno da Disciplina Lourdes de Fátima Gonçalves Gomes: Pediatra Chefe da Seção de Saúde Regional da 2ª Região Mili-
de Gastrenterologia Cirúrgica da EPM/Unifesp. Chefe especialista em Terapia Intensiva Pediátrica, Neonato- tar. Médico do Corpo Clínico e do Pronto Atendimento
do Serviço de Cirurgia do Aparelho Digestivo do Hos- logia e UTI Neonatal, Cardiologia Pediátrica e Congê- do Hospital Santa Catarina de São Paulo. Mestre em
pital do Rim da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Ci- nita e Ecocardiografia. Professora adjunta de Pediatria Gastrenterologia Cirúrgica e Doutor em Medicina pela
rurgia pela Unifesp. no HC da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). EPM/Unifesp.
Lara M. Quirino Araújo: Geriatra. Preceptora do am- Mestre e Doutora em Ciências: Cardiologia Pediátrica Luís Eduardo Coelho Andrade: Reumatologista.
bulatório dos Longevos e Psicogeriatria da Disciplina pela Unifesp. Doutor em Ciências Aplicadas à Reumatologia pela
de Geriatria da EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em Lucas Leite Cunha: Pesquisador. Mestre em Clínica EPM/Unifesp. Livre-Docente em Medicina pela EPM/
Ciências pela Unifesp. Médica e Doutor em Ciências pela Unicamp. Unifesp.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO xv
Luís Fabiano Marin: Nefrologista. Especialista em Luiz Roberto Ramos: Médico. Pesquisador 1C do Marcelo Corassa: Médico especialista em Clínica
Medicina do Sono. Doutor em Ciências pela Unifesp. CNPq. Mestre em Saúde Coletiva pela University of Médica.
London, Inglaterra. Pós-Doutor pela Harvard Univer- Marcelo Costa Batista: Professor adjunto Livre-
Luis Felipe Ensina: Alergista e imunologista. Profes-
sity, EUA. PhD em Gerontologia pela University of -Docente do Departamento de Medicina da Disciplina
sor adjunto da Faculdade de Medicina da Unisa. Mes-
London, Inglaterra. Livre-Docente em Geriatria pela de Nefrologia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em
tre em Imunologia pela USP. Doutorando em Pediatria
EPM/Unifesp. Medicina: Nefrologia pela EPM/Unifesp. Pós-Doutor
da EPM/Unifesp.
Luiza Helena Ribeiro: Reumatologista do Hospital pela Tufts University, EUA.
Luis Fernando Aranha Camargo: Médico. Chefe do
Cárdio Pulmonar. Professora de Reumatologia da Uni- Marcelo Feijó Mello: Psiquiatra. Professor Livre-
Grupo de Infecções em Transplantes da Disciplina de
versidade Salvador. Doutora em Reumatologia pela
Infectologia da EPM/Unifesp. -Docente pela EPM/Unifesp. Mestre em Psiquiatria
EPM/Unifesp.
pelo HSPE/IAMSPE. Doutor em Psiquiatria pela EPM/
Luiz Camano: Professor titular emérito do Departa- Lydia Masako Ferreira: Cirurgiã plástica. Professora Unifesp.
mento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. titular de Cirurgia Plástica da EPM/Unifesp. Pesquisa-
Marcelo M. Pinheiro: Reumatologia. Assistente da
Luiz Carlos Zeferino: Ginecologista especialista dora CNPq 1A. Coordenadora da Medicina III da CA-
Disciplina de Reumatologia da EPM/Unifesp. Mestre
em Ginecologia Oncológica. Professor titular de Gi- PES. Doutora em Cirurgia Plástica pela EPM/Unifesp.
em Reumatologia e Doutor em Medicina pela Unifesp/
necologia do Departamento de Tocoginecologia da Pós-Doutora em Cirurgia Plástica pela University of
EPM.
Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Diretor California, EUA. Diretora do Departamento Científico
da Divisão de Oncologia do Hospital da Mulher Prof. da SBCP. Marcelo Masruha Rodrigues: Neurologista infantil.
Dr. José Aristodemo Pinotti da Unicamp. Doutor pela Professor adjunto de Neurologia Infantil da EPM/Uni-
M. Luiza M. Fiore: Psiquiatra e psicanalista. Mestre e
Unicamp. fesp. Doutor em Neurologia pela EPM/Unifesp.
Doutora em Psiquiatria e Psicologia Médica pela EPM/
Unifesp. Marcelo Q. Hoexter: Psiquiatra. Doutor em Ciências
Luiz Cavalcanti de Albuquerque Neto: Professor
pela EPM/Unifesp.
adjunto Doutor do Departamento de Ginecologia da Magnus R. Dias da Silva: Endocrinologista. Profes-
EPM/Unifesp. Chefe do Setor de Histeroscopia do De- sor associado Livre-Docente da Disciplina de Endocri- Marcelo Ribeiro: Psiquiatra especialista em Depen-
partamento de Ginecologia da EPM/Unifesp. nologia da EPM/Unifesp. dência Química. Diretor do Centro de Referência de
Álcool, Tabaco e outras Drogas da Secretaria de Esta-
Luiz Celso Vilanova: Professor associado da Disci- Manoel Antonio de Paiva Neto: Neurocirurgião.
do da Saúde do Estado de São Paulo. Mestre e Doutor
plina de Neurologia e chefe do Setor de Neurologia Professor adjunto de Neurocirurgia da EPM/Unifesp.
Mestre em Ciências e Doutor em Medicina pela EPM/ em Ciências pela Unifesp.
Infantil da EPM/Unifesp.
Unifesp. Marcelo Simão Ferreira: Professor titular da Facul-
Luiz Chehter: Gastrenterologista especialista em
Manoel Girão: Professor titular do Departamento dade de Medicina da UFU. Diretor clínico do Hospital
Dispepsia. Professor adjunto de Gastrenterologia Clí-
de Ginecologia da EPM/Unifesp. Doutor em Medicina: das Clínicas e chefe do Serviço de Moléstias Infeccio-
nica da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Gastrente-
Ginecologia pela EPM/Unifesp. sas e Parasitárias.
rologia pela EPM/Unifesp.
Manoel Martins: Endocrinologista. Professor adjun- Marcelo Tanaka: Oncologista.
Luiz Cláudio Lacerda Rodrigues: Ortopedista es-
pecialista Cirurgia da Coluna Vertebral. Professor de to do Departamento de Medicina Clínica, pesquisador Márcia Carvalho Mallozi: Médica. Professora assis-
Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina do Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medica- tente do Departamento de Pediatria da FMABC. Coor-
Santa Marcelina. Mestre em Ciências pela Unifesp. mentos e professor orientador do Mestrado em Pato- denadora do Ambulatório de Alergia da EPM/Unifesp.
logia da UFC. Preceptor do Serviço de Endocrinologia Mestre e Doutora em Pediatria.
Luiz Claudio S. Bussamra: Ginecologista e obstetra e Diabetes do Hospital Universitário Walter Cantídio Márcia Costa dos Santos: Endocrinologista. Dou-
especialista em Medicina Fetal. Professor adjunto e da UFC. Mestre e Doutor em Medicina: Endocrinologia tora em Endocrinologia e Metabologia pela EPM/
chefe da Clínica de Medicina Fetal da Faculdade de Clínica pela EPM/Unifesp. Unifesp.
Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Mestre
Marair Gracio Ferreira Sartori: Professora associa-
e Doutor em Obstetrícia pela EPM/Unifesp. Marcia Gaspar Nunes: Ginecologista. Coordena-
da Livre-Docente do Departamento de Ginecologia e
dora do Ambulatório de Ginecologia da Infância e
Luiz Clemente S. P. Rolim: Médico pesquisador. vice-chefe do Departamento de Ginecologia da EPM/
Adolescência do Departamento de Ginecologia da
Responsável pelo Setor de Neuropatias e Pé Diabético Unifesp. Chefe da Enfermaria de Ginecologia do HSP/
EPM/Unifesp. Mestre em Ginecologia e Doutora em
da EPM/Unifesp. Mestre em Endocrinologia pela EPM/ EPM/Unifesp.
Ciências da Saúde pela EPM/Unifesp.
Unifesp. Maramelia Miranda: Neurologista colaboradora do
Marcia Keiko Uyeno Tabuse: Oftalmologista es-
Luiz Daniel Cetl: Neurocirurgião especialista em Ci- setor de Neurologia Vascular da Disciplina de Neuro-
pecialista em Oftalmologia Pediátrica e Estrabismo.
rurgia de Epilepsia e Cirurgias de Tumores do Sistema logia da EPM/Unifesp. Pós-Graduação em Neurorra-
Mestre e Doutora em Oftalmologia pela Unifesp.
Nervoso Central. diologia, Neurologia Vascular e Neurossonologia pela
EPM/Unifesp. Mestre em Neurociências pela Unifesp. Marcio Abrahão: Otorrinolaringologista e cirurgião
Luiz Eduardo Nery: Professor titular da EPM/Unifesp. de cabeça e pescoço. Professor Livre-Docente do
Marcel Jun Sugawara Tamaoki: Ortopedista e
Luiz Eduardo Villaça Leão: Médico. Professor titular Departamento de ORL-CCP/EPM/Unifesp. Doutor em
traumatologista especialista em Cirurgia de Ombro e
Livre-Docente da Disciplina de Cirurgia Torácica do Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço
Cotovelo. Professor adjunto de Ortopedia e Traumato-
Departamento de Cirurgia da EPM/Unifesp. Mestre e pela EPM/Unifesp.
logia da Disciplina de Mão e Membro Superior do Se-
Doutor em Cirurgia Torácica. tor de Cirurgia de Ombro e Cotovelo da EPM/Unifesp. Marcio Zanini: Psiquiatra com atuação em Medicina
Luiz Fernando Teixeira: Oftalmologista especialista Doutor em Cirurgia Translacional pela EPM/Unifesp. do Sono. Professor de Psicofarmacologia na Residên-
em Oncologia Ocular, Retina, Vítreo e Órbita. Médico cia Médica em Psiquiatria do HSPE/IAMPSE. Mestre
Marcela Duarte de Sillos: Pediatria especialista
assistente do Departamento de Oftalmologia da EPM/ em Ciências pelo Departamento de Psiquiatria e Psi-
em Gastrenterologia Pediátrica. Médica do Pronto-
Unifesp. Chefe do Serviço de Oncologia Ocular do IOP/ -Socorro de Pediatria do HSP/EPM/Unifesp. Pediatra cologia Médica da EPM/Unifesp.
GRAACC/Unifesp. Gastrenterologista do Ambulatório Multidisciplinar de Marco Alexandre Dias da Rocha: Dermatologista.
Luiz Hirotoshi Ota: Médico. Professor adjunto de Ci- Fibrose Cística do Departamento de Pediatria da EPM/ Médico voluntário do Ambulatório de Cosmiatria da
rurgia Torácica do Setor de Endoscopia Respiratória da Unifesp. Mestranda em Gastrenterologia Pediátrica da EPM/Unifesp. Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp.
EPM/Unifesp. Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp. EPM/Unifesp. Marco Antônio Bordón Riveros: Oftalmologista es-
Luiz Kulay Junior: Professor titular do Departamento Marcelino de Souza Durão Junior: Professor afilia- pecialista em Doenças Externas e da Córnea.
de Obstetrícia da EPM/Unifesp. Professor emérito da do da Disciplina de Nefrologia da EPM/Unifesp. Marco Antonio Pereira: Ginecologista e obstetra
Unifesp. Marcelo Annes: Neurologista. especialista em Ginecologia Oncológica.
xvi ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Marcos Boulos: Infectologista especialista em Mo- Fundação Oswaldo Ramos. Doutora em Nefrologia Maria Rita de Souza Mesquita: Ginecologista e
léstias Infecciosas e Parasitárias. Mestre e Doutor em pela EPM/Unifesp. obstetra. Médica técnico-administrativa em saúde do
Moléstias Infecciosas e Parasitárias pela FMUSP. Maria Conceição do Rosário: Médica. Adjunct pro- Departamento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. Mestre
Marcos César Floriano: Dermatologista com atua- fessor da Yale University, EUA. Professora da Unidade e Doutora em Ciências pela Unifesp.
ção em Hansenologia. Médico assistente e professor de Psiquiatria da Infância e Adolescência do Departa- Maria Stella Figueiredo: Professora associada Livre-
afiliado de Dermatologia da EPM/Unifesp. Professor mento de Psiquiatria da EPM/Unifesp. Mestre e Dou- -Docente da Disciplina de Hematologia e Hemoterapia
de Dermatologia e coordenador do Curso de Medicina tora em Ciências pela USP. do Departamento de Oncologia Clínica e Experimental
da Universidade Nove de Julho (Uninove). Mestre em da EPM/Unifesp.
Maria Cristina de Andrade: Nefrologista pediátrica.
Dermatologia e Doutor em Ciências pela EPM/Unifesp.
Professora adjunta do Setor de Nefrologia Pediátrica Maria Sylvia de Souza Vitalle: Professora adjunta
Marcos Luiz Antunes: Otorrinolaringologista. Pro- do Departamento de Pediatria da EPM/Unifesp. Mes- do Setor de Medicina do Adolescente do Departamen-
fessor adjunto do Departamento de ORL-CCP/EPM/ tre e Doutora em Pediatria pela EPM/Unifesp. to de Pediatria da EPM/Unifesp. Professora perma-
Unifesp. Mestre em Medicina e Doutor em Ciências da nente do Programa de Pós-Graduação em Educação e
Maria Cristina Izar: Cardiologista. Doutora em Me-
Saúde pela EPM/Unifesp. Saúde na Infância e Adolescência e em Saúde Coletiva
dicina pela EPM/Unifesp. Livre-Docente em Cardiolo-
Marcos Ribeiro: Psiquiatra da infância e adolescên- gia pela EPM/Unifesp. da Unifesp. Mestre em Pediatria e Doutora em Medici-
cia do Departamento de Psiquiatria da EPM/Unifesp. na pela EPM/Unifesp.
Maria Daniela Bergamasco: Infectologista. Médica
Marcos Schaper dos Santos Junior: Especialista em da Disciplina de Infectologia do HSP/EPM/Unifesp. Maria Teresa Nogueira Bombig: Cardiologista.
Nutrição e Saúde na Pobreza. Professor do Curso de Mestre em Ciências pela Unifesp. Mestre e Doutora em Cardiologia pela EPM/Unifesp.
Especialização em Saúde Indígena (EAD) da Universi- Maria Teresa Riggio de Lima-Landman: Professo-
Maria de Jesus Castro Sousa Harada: Enfermeira.
dade Aberta do Brasil (UAB)/Unifesp. ra associada do Departamento de Farmacologia da
Professora do Departamento de Enfermagem da Uni-
Marcus V. Sadi: Professor adjunto Livre-Docente de fesp. Mestre e Doutora em Enfermagem pela Unifesp. EPM/Unifesp. Mestre em Farmacologia e Doutora em
Urologia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Uro- Ciências pela EPM/Unifesp.
Maria de Lourdes Chauffaille: Médica.
logia pela EPM/Unifesp. Pós-Graduado pela Harvard Maria Teresa Terreri: Pediatra especialista em
Medical School e pelo The Jonhs Hopkins School of Maria do Carmo Friche Passos: Gastrenterologista. Reumatologia Pediátrica. Professora adjunta do De-
Medicine. Professora associada da Faculdade de Medicina da partamento de Pediatria da EPM/Unifesp. Mestre em
Universidade Federal de Minas Gerais (FM/UFMG). Ciências e Doutora em Pediatria pela EPM/Unifesp.
Marcus Vinicius Cristino Albuquerque: Neurolo-
Mestre em Gastrenterologia pela UFMG e pela Facul-
gista assistente do Setor de Ataxias da EPM/Unifesp. Maria Teresa Zanella: Professora titular de Endocri-
dade Autônoma de Barcelona, Espanha. Pós-Doutora
Margareth Pretti Dalcolmo: Médica. Pesquisadora em Gastrenterologia pela UFMG e pela Harvard Medi- nologia da EPM/Unifesp. Chefe do Setor de Diabetes e
Clínica da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Professo- cal School, EUA. Obesidade do Hospital do Rim.
ra da Pós-Graduação da PUCRJ. Doutora em Pneumo- Maria Wany Louzada Strufaldi: Professora adjunta
logia pela EPM/Unifesp. Maria Elisabeth M. R. Ferraz: Neurologista. Médica
da Disciplina de Neurologia e coordenadora do Pron- da Disciplina de Pediatria Geral e Comunitária do De-
Maria Aparecida de Paula Cançado: Nefrologista. to-Socorro de Neurologia da EPM/Unifesp. Mestre em partamento de Pediatria da EPM/Unifesp.
Responsável pelo Ambulatório de Nefrologia Pe- Neurologia pela EPM/Unifesp. Mariana Araújo Barbosa Tanaka: Nefrologista
diátrica da EPM/Unifesp. Mestre em Nefrologia pela pediátrica. Mestre em Ciências Aplicadas e Pediatria
EPM/Unifesp. Maria Emília Xavier dos Santos Araújo: Oftalmo-
logista especialista em Córnea e Doenças Externas pela EPM/Unifesp.
Maria Aparecida Gadiani Ferrarini: Pediatra espe- Ocular e Catarata do IAMSPE. Doutora em Medicina Mariana Dias Batista: Dermatologista. Mestre em
cialista em Infectologia Pediátrica. Mestre em Pedia- pela EPM/Unifesp. Ciências pela Unifesp. Doutora pela FMUSP.
tria e Doutora em Ciências pela Unifesp.
Maria Eugenia F. Canziani: Professora da Discipli- Mariana R. Gazzotti: Fisioterapeuta. Orientadora do
Maria Aparecida Shikanai Yasuda: Professora do
na de Nefrologia da EPM/Unifesp. Coordenadora do Programa de Pós-Graduação da Disciplina de Pneu-
Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias
Programa de Diálise da Fundação Oswaldo Ramos/ mologia da EPM/Unifesp. Doutora em Ciências pela
da FMUSP.
Hospital do Rim. Mestre e Doutora em Nefrologia pela Unifesp.
Maria Arlete Meil Schimith Escrivão: Pediatra EPM/Unifesp. Mariane Nunes Noto: Psiquiatra. Mestre em Psi-
com área de atuação em Nutrologia. Chefe do Setor
Maria Fernanda Branco de Almeida: Pediatria quiatria e Psicologia Médica pela EPM/Unifesp.
de Obesidade da Disciplina de Nutrologia do Depar-
especialista em Neonatologia. Professora associada Mariano Tamura Vieira Gomes: Ginecologista.
tamento de Pediatria e Orientadora do Programa de
da Disciplina de Pediatria Neonatal da EPM/Unifesp. Responsável pelo Setor de Mioma Uterino do Depar-
Pós-Graduação em Nutrição da Unifesp. Mestre e
Mestre e Doutora em Pediatria pela EPM/Unifesp. tamento de Ginecologia da EPM/Unifesp. Doutor em
Doutora em Pediatria pela Unifesp.
Maria Gabriela Baumgarten Kuster Uyeda: Médica. Ciências pela EPM/Unifesp.
Maria Beatriz M. Macedo Montaño: Geriatra. Pro-
fessora da Faculdade de Medicina de Sorocaba da Maria Gabriella Giusa: Ginecologista e obstetra. Marília Marufuji Ogawa: Dermatologista. Professo-
PUCSP. Mestre e Doutora em Ciências da Saúde pela Mestre e Doutora em Ginecologia pela EPM/Unifesp. ra afiliada de Dermatologia da EPM/Unifesp. Mestre
EPM/Unifesp. Maria Isabel de Moraes-Pinto: Pediatra especia- em Microbiologia pela Brigham Young University,
lista em Infectopediatria. Professora adjunta Livre- EUA. Mestre e Doutora pela Unifesp.
Maria Cecília Pignatari: Médica assistente do Setor
de Nefrologia Pediátrica da EPM/Unifesp. -Docente do Departamento de Pediatria da EPM/Uni- Marina Carvalho de Moraes Barros: Pediatra espe-
fesp. Chefe do Laboratório de Pesquisas da Disciplina cialista em Neonatologia. Professora afiliada da Disci-
Maria Christina Lombardi de Oliveira Macha-
de Infectologia Pediátrica da EPM/Unifesp. Mestre e plina de Pediatria Neonatal da EPM/Unifesp. Mestre
do: Pneumologista. Coordenadora do Ambulatório
Doutora em Ciências pela Unifesp. em Pediatria e Doutora em Medicina pela EPM/Uni-
de Doença Pulmonar Avançada/Oxigenoterapia Do-
Maria Lucia de Martino Lee: Médica hematologista fesp.
miciliar Prolongada da Disciplina de Pneumologia da
EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em Ciências da Saú- pediátrica do IOP/GRAACC/EPM/Unifesp. Mestre em Mario Kondo: Médico.
de: Pneumologia pela EPM/Unifesp. Pediatria pela EPM/Unifesp. Mario Luiz V. Castiglioni: Médico especialista em
Maria Clara Noman de Alencar: Cardiologista. Maria Lucia G. Ferraz: Hepatologista. Mestre e Dou- Medicina Nuclear. Chefe da Coordenadoria de Medi-
Doutora em Pneumologia pela EPM/Unifesp. tora em Gastrenterologia pela EPM/Unifesp. cina Nuclear da EPM/Unifesp.
Maria Claudia Cruz Andreoli: Coordenadora do Maria Nice Caly Kulay: Professora adjunta Doutora Marise Lazaretti-Castro: Professora adjunta Livre-
Programa de Diálise Peritoneal da EPM/Unifesp e da do Departamento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. -Docente e chefe do Setor de Doenças Osteometabó-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO xvii
licas da Disciplina de Endocrinologia e Metabologia Meyer Izbicki: Pneumologista. Coordenador do La- da EPM/Unifesp. Mestre em Epidemiologia pela EPM/
da EPM/Unifesp. boratório de Função Pulmonar da Disciplina de Pneu- Unifesp.
Marta Heloisa Lopes: Infectologista. Professora as- mologia da EPM/Unifesp. Mestre em Pneumologia Nacime Salomão Barbachan Mansur: Ortopedista
sociada do Departamento de Moléstias Infecciosas e pela EPM/Unifesp. e traumatologista especialista em Ortopedia e Trau-
Parasitárias da FMUSP. Mestre e Doutora em Doenças Michel Eid Farah: Professor associado Livre-Docente matologia do Esporte, Cirurgia do Pé e Tornozelo. In-
Infecciosas e Parasitárias pela FMUSP. e orientador da Pós-Graduação do Departamento de tegrante do Conselho de Graduação, chefe do Grupo
Mary Uchiyama Nakamura: Obstetra e ginecolo- Oftalmologia da EPM/Unifesp. Doutor em Medicina de Medicina e Cirurgia do Pé e Tornozelo, membro do
gista. Professora titular Livre-Docente da Disciplina pela EPM/Unifesp. Centro de Traumatologia do Esporte e do Grupo do Pé
de Obstetrícia Fisiológica e Experimental do Departa- da EPM/Unifesp. Pós-Graduando do Programa de Pós-
Michel Laks : Infectologista. Mestre em Ciências
mento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. Mestre e Dou- Graduação em Cirurgia Translacional da EPM/Unifesp.
pela EPM/Unifesp.
tora em Ciências pela Unifesp. Nancy Bellei: Infectologista especialista em Virolo-
Midori Hentona Osaki: Oftalmologista. Mestre em
Matheus Vescovi Gonçalves: Hematologista. Dou- gia Clínica. Professora afiliada da EPM/Unifesp. Mes-
Administração Oftálmica. Doutoranda em Oftalmolo-
tor em Ciências pela Unifesp. tre e Doutora em Medicina: Infectologia pela EPM/
gia da EPM/Unifesp.
Unifesp.
Mauricio Bagnato: Médico especialista em Medicina Miguel Montes Canteras: Neurocirurgião especia-
do Sono e Pneumologia. Preceptor do Ambulatório de Nasjla Saba da Silva: Oncologista pediátrica. Co-
lista em Radiocirurgia Neurológica. Mestre em Medi-
Pneumologia e Sono da Unifesp. Responsável médi- ordenadora da Área de Tumores do Sistema Nervoso
cina pela EPM/Unifesp.
co do Serviço de Medicina do Sono do Hospital Sírio Central do IOP/GRAACC/Unifesp. Mestre em Pediatria
Libanês. Mestre em Pneumologia pela EPM/Unifesp. Miguel Sabino Neto: Cirurgião plástico. Professor pela EPM/Unifesp.
adjunto Livre-Docente da Disciplina de Cirurgia Plásti-
Mauricio Bernstein: Cardiologista. Doutor em Car- Neila Maria de Góis Speck: Médica com atuação em
ca da EPM/Unifesp.
diologia pela FMUSP. Cirurgia a Laser. Professora adjunta do Departamento
Mihoko Yamamoto: Hematologista. Mestre e Dou- de Ginecologia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em
Mauricio Malavasi Ganança: Otorrinolaringologista
tora em Hematologia pela EPM/Unifesp. Ciências pela EPM/Unifesp.
especialista em Otologia. Professor titular Livre-Do-
cente de Otorrinolaringologia da EPM/Unifesp. Doutor Mila Torii Corrêa Leite: Médica assistente da Disci- Nelson Americo Hossne Junior: Cirurgião cardio-
em Otorrinolaringologia pela EPM/Unifesp. plina de Cirurgia Pediátrica da EPM/Unifesp. Médica vascular. Professor adjunto da Disciplina de Cirurgia
Maurício Mendes Barbosa: Doutor em Ciências: assistente de Cirurgia Pediátrica do HSPE. Doutora em Cardiovascular da EPM/Unifesp. Doutor em Ciências
Obstetrícia pela EPM/Unifesp. Ciências pela EPM/Unifesp. da Saúde pela EPM/Unifesp.
Mauricio Mendonça do Nascimento: Médico do Milton Miyoshi: Pediatra especialista em Neonato- Nelson Sass: Médico. Professor associado Livre-
Departamento de Dermatologia da EPM/Unifesp. logia. Professor assistente da Disciplina de Pediatria -Docente e coordenador do Setor de Hipertensão Ar-
Neonatal do Departamento de Pediatria da EPM/Uni- terial e Nefropatias do Departamento de Obstetrícia
Mauro Abi Haidar: Professor Livre-Docente do Setor
fesp. Mestre em Pediatria pela EPM/Unifesp. da EPM/Unifesp. Professor adjunto da Disciplina de
da Transição Menopausal e Ginecologia Endócrina do
Milton Yogi: Chefe do setor de Catarata do Depar- Ginecologia e Obstetrícia da Universidade de Mogi
Departamento de Ginecologia da EPM/Unifesp.
tamento de Oftalmologia do Hospital Beneficência das Cruzes. Coordenador da Clínica Obstétrica da Ma-
Mauro Batista de Morais: Pediatra gastrenterolo- ternidade Escola de Vila Nova Cachoeirinha.
Portuguesa, SP. Diretor técnico do Instituto da Visão.
gista. Professor associado Livre-Docente da Discipli-
Mestre Profissional e MBA pela Unifesp. Nestor Schor: Professor titular de Nefrologia da
na de Gastrenterologia Pediátrica da EPM/Unifesp.
EPM/Unifesp.
Mestre em Pediatria e Doutor em Ciências pela EPM/ Mirian A. Boim: Professor associado Livre-Docente
Unifesp. da Disciplina de Nefrologia da EPM/Unifesp. Mestre e Newton de Barros Junior: Cirurgião vascular. Pro-
Doutora em Biologia Molecular: Fisiologia. fessor associado da Disciplina de Cirurgia Vascular e
Mauro Fisberg: Pediatra nutrólogo. Professor asso-
Endovascular do Departamento de Cirurgia da EPM/
ciado Doutor do Departamento de Pediatria da EPM/ Mirlene Cecilia S. P. Cernach: Geneticista e pedia-
Unifesp. Mestre em Cirurgia Vascular e Doutor em Me-
Unifesp. Coordenador do Centro de Nutrologia e Difi- tra. Professora titular da Universidade Metropolitana
dicina pela EPM/Unifesp.
culdades Alimentares do Instituto PENSI do Hospital de Santos. Professora adjunta aposentada da Unifesp.
Infantil Sabará. Mestre em Histologia e Doutora em Pediatria pela Nilciza Maria de Carvalho Tavares Calux: Gineco-
Mauro Y. Enokihara: Dermatologista da EPM/Uni- EPM/Unifesp. logista e obstetra. Médica da Disciplina de Mastologia
fesp. Mestre e Doutor em Ciências da Saúde pela EPM/ do Departamento de Ginecologia da EPM/Unifesp.
Mirtes Midori Tanae: Farmacêutica. Mestre e Dou-
Unifesp. Mestre e Doutora em Ciências Médicas pela EPM/
tora em Ciências pela EPM/Unifesp.
Unifesp.
Max Domingues Pereira: Coordenador do Setor de Moisés Cohen: Ortopedista especialista em Cirurgia
Cirurgia Craniomaxilofacial e orientador do Programa Nilson Moura Gambero: Pneumologista.
de Joelho. Doutor em Ortopedia e Traumatologia.
em Cirurgia Translacional: Cirurgia Plástica da EPM/ Nilton Ferraro Oliveira: Pediatra especialista em
Unifesp. Coordenador do Pronto-Socorro do HSP/EPM/ Monica Cypriano: Oncologista pediátrica. Diretora
Medicina Intensiva. Chefe da Unidade de Cuidados
Unifesp em Trauma da Face. Mestre e Doutor em Cirur- Clínica do IOP/GRAACC/Unifesp.
Intensivos Pediátricos (UCIP) do HSP/EPM/Unifesp.
gia Plástica pela EPM/Unifesp. Mônica R. A. Vasconcellos: Médica assistente e Mestre em Pediatria e Doutor em Ciências pela EPM/
Maysa Seabra Cendoroglo: Geriatra. Professora coordenadora do Grupo de Colagenoses do Departa- Unifesp.
adjunta da Disciplina de Geriatria da EPM/Unifesp. mento de Dermatologia da EPM/Unifesp.
Nivaldo Silva Corrêa Rocha: Obstetra especialista
Mestre em Epidemiologia e Doutora em Ciências da Monike Lourenço Dias Rodrigues: Endocrinolo- em Obstetrícia Fisiológica e Experimental. Professor
Nutrição pela Unifesp. gista. Professora adjunta de Endocrinologia da UFG. assistente da EPM/Unifesp.
Meire Brasil Parada: Dermatologista. Doutora pela Unifesp.
Nívia L. Nonato: Fisioterapeuta especialista em Fi-
Melca M. O. Barros: Hematologista e hemoterapeu- Monique Nakayama Ohe: Endocrinologista es- sioterapia Respiratória. Mestre em Ciências e Doutora
ta. Médica da Disciplina de Hematologia e Hemote- pecialista em Osteometabolismo. Colaboradora do em Reabilitação Pulmonar pela EPM/Unifesp.
rapia da EPM/Unifesp. Doutora em Hematologia pela Grupo de Doenças Osteometabólicas da Disciplina de
Noemi Grigoletto de Biase: Ototrrinolaringologista.
EPM/Unifesp. Endocrinologia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em
Professora adjunta Livre-Docente de Departamento
Ciências da Saúde pela EPM/Unifesp.
Melissa M. Fraga: Pediatra especialista em Reu- de ORL-CCP da EPM/Unifesp. Professora associada
matologia Pediátrica. Mestre em Pediatria pela EPM/ Myrian Najas: Nutricionista especialista em Enve- da PUCSP. Mestre em Otorrinolaringologia pela USP/
Unifesp. lhecimento. Professora de Geriatria e Gerontologia FMRP. Doutora em Medicina pela EPM/Unifesp.
xviii ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Nora Manoukian Forones: Professora associada Li- Otelo Rigato Jr.: Infectologista. Mestre e Doutor em Pedro Luiz Lacordia: Oncoginecologista. Mestre em
vre-Docente da EPM/Unifesp. Coordenadora do setor Infectologia pela EPM/Unifesp. Ciências pela Unifesp.
de Oncologia do Aparelho Digestivo da Unifesp/EPM. Paola Cappellano: Infectologista. Coordenadora do Perla Vicari: Hematologista. Preceptora da Residên-
Norma de Oliveira Penido: Otorrinolaringologista Grupo de Infecções em Onco-Hematologia e Trans- cia Médica do Serviço de Hematologia do HSPE/IAMS-
especialista em Otologia. Professora adjunta e coor- plante de Medula Óssea da Disciplina de Infectologia PE. Doutora em Ciências pela EPM/Unifesp.
denadora do Programa de Pós-Graduação em Medi- da EPM/Unifesp. Doutora em Medicina pela EPM/ Priscila Ishioka: Dermatologista. Mestre e Douto-
cina: Otorrinolaringologia na EPM/Unifesp. Mestre Unifesp. randa em Ciências da Unifesp.
em Otorrinolaringologia e Doutora em Medicina pela Patrícia da Graça Leite Speridião: Nutricionista. Priscila Maximino: Nutricionista. Especialista em
EPM/Unifesp. Especialista em Farmacologia e em Nutrição Clínica. Adolescência. Pesquisadora do Instituto PENSI da
Nucelio Lemos: Responsável pelo Setor de Neuro- Professora associada do Curso de Nutrição da EPM/ Fundação José Luiz Egydio Setúbal. Professora convi-
disfunção Pélvica do Departamento de Ginecologia da Unifesp – Campus Santista. Nutricionista da Disciplina dada do Insira Educacional e da Sociedade Beneficen-
EPM/Unifesp. Doutor em Medicina pela Faculdade de de Gastrenterologia Pediátrica com atuação no Ambu- te Israelita Albert Einstein. Mestre em Ciências pela
Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Fellow latório de Alergia Alimentar da EPM/Unifesp. Mestre Unifesp.
em Neuropelveologia da Klinik Hirslanden, Zurique, em Nutrição e Doutora em Ciências pela EPM/Unifesp.
Priscila Pereira Dantas: Infectologista especialista
Suíça. Pós-Doutorando da EPM/Unifesp. Patricia da Silva Fucuta: Gastrenterologista e hepa- em Infectologia Hospitalar. Doutora em Infectologia
Octavio Marques Pontes-Neto: Neurologista. Pro- tologista. Médica e professora do Serviço de Gastro- pela EPM/Unifesp.
fessor da Divisão de Neurologia do Departamento -Hepatologia do Hospital de Base de São José do Rio
Raelson Rodrigues Miranda: Oncologista clínico.
de Neurociências e Ciências do Comportamento da Preto. Professora de Medicina da Faceres. Doutora em
Médico preceptor do Ambulatório de Gastro-Oncolo-
USP/FMRP. Chefe do Serviço de Neurologia Vascular e Ciências pela Unifesp.
gia da EPM/Unifesp. Mestre em Medicina Translacio-
Emergências Neurológicas do Hospital das Clínicas da Patricia Dualib: Endocrinologista especialista em nal: Biologia Molecular pela EPM/Unifesp.
USP/FMRP. Coordenador da Rede Nacional de Pesqui- Diabetes Gestacional. Coordenadora de Endocrinolo-
sa em AVC do Ministério da Saúde (DECIT/SCTIE/MS) Rafael de Oliveira Cavalcante: Ginecologista e obs-
gia do Ambulatório de Diabetes Gestacional do Cen-
e CNPq. Doutor em Neurologia pela USP. Pós-Doutor tetra especialista em Medicina Fetal. Mestre e Doutor
tro de Diabetes da Unifesp/EPM.
pelo Massachusetts General Hospital/Harvard Medi- em Ciências pela Unifesp.
cal School, EUA. Patricia Eiko Yamakawa: Hematologista e hemote-
Rafael Trindade: Infectologista. Pós-Graduando do
rapeuta.
Oliver A. Nascimento: Pneumologista. Médico da Grupo de Antimicrobianos em Doentes Críticos da
Disciplina de Pneumologia da EPM/Unifesp. Doutor Patricia Karla de Souza: Dermatologista. Colabora- EPM/Unifesp.
em Ciências: Pneumologia pela EPM/Unifesp. dora responsável pelo atendimento do Ambulatório Ramiro A. Azevedo: Pediatra especialista em Hepa-
de Urticária do Departamento de Dermatologista da tologia Pediátrica. Professor adjunto do Departamen-
Onivaldo Cervantes: Professor associado Livre- EPM/Unifesp. Mestre em Medicina pela EPM/Unifesp
-Docente do Departamento de ORL-CCP/EPM/Unifesp. to de Pediatria da EPM/Unifesp. Mestre em Epidemio-
Patricia Monteagudo: Endocrinologista. Médica logia e Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp.
Oreste Paulo Lanzoni: Neurocirurgião. Mestre e assistente da Disciplina de Endocrinologia da EPM/
Doutor em Neurocirurgia pela EPM/Unifesp. Ramiro Colleoni: Médico especialista em Cirurgia
Unifesp com atuação em Preceptoria de Alunos de Geral, Cirurgia Digestiva e Endoscopia Digestiva.
Orlando Ambrogini Junior: Professor afiliado da Medicina, Médicos Residentes e Pós-Graduandos nas Professor adjunto da Disciplina de Gastrenterologia
Disciplina de Gastrenterologia da EPM/Unifesp. áreas de Desenvolvimento e Ambulatório Translacio- Cirúrgica da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor pela EPM/
Orlando Campos Filho: Cardiologista e ecocardio- nal, Adrenal e Obesidade. Mestre e Doutora em Endo- Unifesp.
grafista. Professor associado de Cardiologia da EPM/ crinologia pela EPM/Unifesp.
Raquel Martins Arruda: Ginecologista. Mestre em
Unifesp. Mestre em Ciências Médicas e Doutor em Patrícia Nunes Bezerra Pinheiro: Hematologista. Ginecologia e Doutora em Ciências Médicas e Bioló-
Medicina pela EPM/Unifesp. Pós-Graduanda em Hematologia e Hemoterapia da gicas pela EPM/Unifesp.
Orlando G. P. Barsottini: Neurologista. Professor EPM/Unifesp.
Raul Cutait: Cirurgião do aparelho digestivo e colo-
Livre-Docente de Neurologia da EPM/Unifesp. Patricia Scherer: Nefrologista e intensivista. proctologista.
Orsine Valente: Professor titular da Disciplina de Paula Tuma: Infectologista. Mestre em HIV e Hepati- Regina Célia de Menezes Succi: Pediatra espe-
Medicina de Urgência da EPM/Unifesp. Professor titu- tes pela Universidad Complutense de Madri, Espanha. cialista em Infectologia. Professora associada Livre-
lar da Disciplina de Clínica Médica da FMABC. Doutor Mestre e Doutora em Infectologia pela EPM/Unifesp. -Docente de Pediatria da EPM/Unifesp. Mestre em
em Endocrinologia pela EPM/Unifesp. Paulo Augusto de Arruda Mello: Médico. Profes- Microbiologia e Imunologia e Doutora em Medicina
Oscar Pavão: Professor adjunto Livre-Docente de sor titular de Oftalmologia da EPM/Unifesp. Mestre e pela EPM/Unifesp.
Nefrologia da EPM/Unifesp. Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp. Regina do Carmo Silva: Endocrinologista. Médica
Osmar Rotta: Dermatologista. Professor associado Paulo Cezar Feldner Jr.: Professor afiliado Doutor do assistente da Disciplina de Endocrinologia da EPM/
da EPM/Unifesp. Mestre em Dermatologia pela USP. Departamento de Ginecologia da Unifesp/EPM. Unifesp. Mestre e Doutora em Medicina: Endocrino-
Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp. logia pela EPM/Unifesp.
Paulo Gois Manso: Professor assistente da Faculda-
Osvaldo Kohlmann Jr.: Nefrologista. Professor as- de de Medicina de Jundiaí. Chefe do Setor de Órbita Regina Gayoso: Médica. Mestre em Ciências pela
sociado de Nefrologia da EPM/Unifesp. Doutor em do Departamento de Oftalmologia e coordenador do Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca
Nefrologia pela EPM/Unifesp. Fellow em Hipertensão Setor de Pronto-Socorro de Oftalmologia do HSP/EPM/ (ENSP) da Fiocruz.
Arterial da Boston University School of Medicine- Unifesp. Mestre em Oftalmologia pela EPM/Unifesp. Regina Helena G. Motta Mattar: Médica do Ambu-
-Boston, EUA. Paulo H. F. Bertolucci: Neurologista. Professor asso- latório de Hepatologia Pediátrica do Departamento de
Oswaldo Laércio Mendonça Cruz: Otorrinolarin- ciado e chefe do Setor de Neurologia do Comporta- Pediatria da EPM/Unifesp. Mestre em Pediatria pela
gologista. Professor afiliado do Departamento de mento do Departamento de Neurologia e Neurocirur- EPM/Unifesp.
ORL-CCP da EPM/Unifesp. Doutor em Medicina pela gia da EPM/Unifesp. Mestre em Medicina e Doutor em Regina S. Moisés: Endocrinologista. Professora as-
FMUSP. Neurologia pela EPM/Unifesp. sociada Livre-Docente da Disciplina de Endocrinologia
Otavio Cesar Baiocchi: Hematologista e hemotera- Paulo Roberto Abrão Ferreira: Infectologista espe- da EPM/Unifesp. Mestre em Endocrinologia e Doutora
peuta especialista em Onco-Hematologia. Professor cialista em HIV e Hepatites Virais. Professor afiliado em Ciências pela EPM/Unifesp.
adjunto e coordenador do Grupo de Linfomas da EPM/ da Disciplina de Infectologia da EPM/Unifesp. Mestre Reginaldo Raimundo Fujita: Otorrinolaringologista
Unifesp. Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp. e Doutor pela Unifesp. especialista em Otorrinopediatria. Professor adjunto
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO xix
da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Otorrinolaringo- Ricardo Correa Barbuti: Gastrenterologista. Médico Doutor em Ciências: Otorrinolaringologia pela EPM/
logia pela EPM/Unifesp. assistente da Disciplina de Gastrenterologia Clínica e Unifesp.
Reinaldo P. Furlanetto: Endocrinologista. Professor Hepatologia do Departamento de Gastrenterologia do Roberto Rudge Ramos: Professor de Cirurgia Plás-
associado aposentado da Disciplina de Endocrinolo- HC/FMUSP. Doutor em Ciências Médicas. tica. Doutor em Ortopedia e Cirurgia Plástica Repara-
gia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Endocrinolo- Ricardo Silva Pinho: Neurologista e neurologista dora.
gia Clínica pela EPM/Unifesp. pediátrico. Mestre e Doutor em Neurociências pela Roberto Zamith: Professor adjunto do Departamen-
Unifesp. to de Ginecologia da EPM/Unifesp.
Reinaldo Salomão: Infectologista. Professor titular
da Disciplina de Infectologia do Departamento de Ricardo Sobhie Diaz: Infectologista. Professor asso- Robinson Esteves Santos Pires: Ortopedista e trau-
Medicina da EPM/Unifesp. Supervisor do Serviço de ciado Livre-Docente da Disciplina de Infectologia da matologista. Professor assistente do Departamento
Infectologia do Hospital Santa Marcelina. Mestre e EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Doenças Infeccio- do Aparelho Locomotor da UFMG. Traumatologista
Doutor pela EPM/Unifesp. sas pela EPM/Unifesp. dos Hospitais Felício Rocho, Risoleta Tolentino Neves
Reinaldo Teixeira Ribeiro: Neurologista. Responsá- Riguel Jun Inaoka: Hematologista. Doutor em Ciên- e HC/UFMG. Mestre em Ciências Aplicadas ao Apare-
vel pelo Ambulatório de Cefaleia da FMABC. cias pela Unifesp. lho Locomotor pela EPM/Unifesp.
Rioko Kimiko Sakata: Professora associada e coor- Rodrigo Affonseca Bressan: Psiquiatra. Professor
Renata Maria de Carvalho Cremaschi: Neurologis-
denadora do Setor de Dor da EPM/Unifesp. adjunto Livre-Docente do Departamento de Psiquia-
ta e neurofisiologista clínica. Doutoranda em Biologia
tria da EPM/Unifesp. Diretor do Y-Mind – Instituto de
e Medicina do Sono da EPM/Unifesp. Rita C. Dardes: Professora adjunta do Departamen- Prevenção de Transtornos Mentais. Mestre e Doutor
Renata Rigacci Abdalla: Psiquiatra especialista em to de Ginecologia e coordenadora do Ambulatório de em Psiquiatria pela Unifesp. PhD em Neurociências
Dependencia Química. Doutoranda em Psiquiatria da Alto Risco no Climatério da EPM/Unifesp. Doutora em pelo King’s College London, Inglaterra.
EPM/Unifesp. Medicina pela Northwestern University, Chicago, EUA.
Rodrigo Barbachan Mansur: Psiquiatra. Assistant
Renata Rodrigues Cocco: Pediatra, alergista e Rita N. V. Furtado: Reumatologista e fisiatra. Mé- Professor da University of Toronto, Canadá. Doutor
imunologista especialista em Alergia Alimentar. dica assistente e professora afiliada da Disciplina de em Psiquiatria pela EPM/Unifesp.
Pesquisadora associada da Disciplina de Alergia e Reumatologia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em
Rodrigo de A. Castro: Professor associado Livre-
Imunologia Clínica do Departamento de Pediatria Ciências da Saúde pela EPM/Unifesp.
-Docente e chefe do Setor de Uroginecologia e Cirur-
da EPM/Unifesp. Doutora em Ciências Médicas pela Rita Simone Lopes Moreira: Enfermeira. Professora gia Vaginal do Departamento de Ginecologia da EPM/
EPM/Unifesp. adjunta da EPE/Unifesp. Mestre e Doutora em Ciências Unifesp.
Renato de Ávila Kfouri: Pediatra e infectologista. em Saúde: Cardiologia pela Unifesp.
Rodrigo de Paiva Tangerina: Otorrinolaringologis-
Renato Duffles Martins: Médico assistente da Disci- Roberta de Lucena Ferretti: Nutricionista. Professo- ta. Mestre em Ciências pela Unifesp.
plina de Gastrenterologia da EPM/Unifesp. Doutor em ra do Curso de Nutrição da Universidade de Taubaté,
Rodrigo de Paula Santos: Otorrinolaringologista.
Medicina pela Unifesp/EPM. SP, e de Cursos de Pós-Graduação em Nutrição Clínica.
Mestre e Doutor em Otorrinolaringologia pela EPM/
Coordenadora do Curso de Aperfeiçoamento em Nu-
Renato Frota de Albuquerque Maranhão: Cirur- Unifesp. Fellow em Rinologia da Universidade de
trição Clínica Hospitalar do Hospital Universitário de
gião pediátrico. Professor assistente da Disciplina de Graz, Áustria.
Taubaté. Mestre em Pediatria e Ciências Aplicadas à
Cirurgia Pediátrica da EPM/Unifesp. Chefe do Setor Pediatria pela EPM/Unifesp. Doutoranda da Unifesp Rodrigo Oliveira Santos: Cirurgião de cabeça e
de Urologia Pediátrica da Disciplina de Cirurgia Pe- pescoço. Especialista em Hiperparatireoidismo. Pro-
diátrica da EPM/Unifesp e responsável pelo Setor de Roberta Pulcheri Ramos: Pneumologista. Doutora fessor adjunto do Departamento de ORL-CCP da EPM/
Distúrbios da Diferenciação Sexual: Intersexo. em Medicina: Pneumologia pela EPM/Unifesp. Unifesp. Mestre em Otorrinolaringologia e Cirurgia de
Renato Hiroshi Salvioni Ueta: Ortopedista especia- Roberto Araujo Segreto: Radio-oncologista. Profes- Cabeça e Pescoço e Doutor em Ciências pela Unifesp.
lista em Cirurgia da Coluna Vertebral. Chefe do Grupo sor associado Livre-Docente do Setor de Radioterapia Ronaldo Laranjeira: Professor titular do Departa-
da Coluna do DOT/EPM/Unifesp. Mestre em Ciências do Departamento de Oncologia Clínica e Experimen- mento de Psiquiatria e coordenador da Unidade de
pela Unifesp. tal da EPM/Unifesp. Médico assistente do Hospital Pesquisa em Álcool e Drogas (Uniad) da EPM/Unifesp.
Israelita Albert Eintein e do Hospital Alemão Oswaldo Investigador principal do Instituto Nacional de Políti-
Renato Lopes de Souza: Professor afiliado do De- Cruz. Mestre em Ciências e Doutor em Radioterapia cas do Alcool e Drogas (Inpad) do CNPq. PhD em Psi-
partamento de Pediatria da EPM/Unifesp. Mestre e pela Unifesp. quiatria pela University of London, Inglaterra.
doutor em Pediatria pela EPM/Unifesp.
Roberto Dias Batista Pereira: Fisioterapeuta espe- Roney Cesar Signorini Filho: Ginecologista. Médi-
Renato Martins Santana: Professor adjunto da Dis- cialista em Reabilitação nas Doenças Neuromuscula- co do Departamento de Obstetrícia da EPM/Unifesp.
ciplina de Medicina Fetal do Departamento de Obste- res. Mestre e Doutor em Ciências da Saúde: Neurolo- Chefe da Oncologia Cirúrgica do Centro de Referên-
trícia da EPM/Unifesp. gia/Neurocirurgia pela EPM/Unifesp. cia da Saúde da Mulher – Hospital Pérola Byington.
Renato Moretti Marques: Ginecologista especialis- Roberto Dischinger Miranda: Cardiologista e geria- Doutor em Ginecologia Oncológica pela EPM/Unifesp.
ta em Ginecologia Oncológica. Cirurgião Ginecológico tra. Chefe do Serviço de Cardiologia da Disciplina de Rosa Miranda Resegue: Pediatra da Disciplina de
do Centro de Oncologia do Hospital Israelita Albert Geriatria da EPM/Unifesp. Doutor em Cardiologia pela Pediatria Geral e Comunitária do Departamento de
Einstein. Doutor em Medicina: Ginecologia Oncológi- EPM/Unifesp. Pediatria da EPM/Unifesp. Mestre em Pediatria pela
ca pela EPM/Unifesp. FMUSP. Doutora em Ciências pela Unifesp.
Roberto E. Heymann: Reumatologista. Assistente
Renato Nabas Ventura: Pediatra. Mestre em Pedia- Doutor da Disciplina de Reumatologia da EPM/Uni- Rosa Paula Mello Biscolla: Endocrinologista. Res-
tria e Doutor em Ciências da Saúde pela EPM/Unifesp. fesp. Mestre e Doutor em Reumatologia pela EPM/ ponsável pelo Ambulatório de Tireoide da Disciplina
Renato Shintani Hikawa: Dermatologista do Depar- Unifesp. de Endocrinologia da EPM/Unifesp. Mestre em Ciên-
tamento de Dermatologia da EPM/Unifesp. Roberto José de Carvalho Filho: Gastrenterologis- cias e Doutora em Endocrinologia pela EPM/Unifesp.
Reynaldo Jesus-Garcia: Ortopedista especialista ta. Professor adjunto de Gastrenterologia da EPM/ Rosali Teixeira da Rocha: Pneumologista especialis-
em Ortopedia Oncológica. Professor titular do Depar- Unifesp. Doutor em Gastrenterologia. Pós-Doutor em ta em Pneumonia Adquirida na Comunidade. Médica
tamento de Ortopedia e chefe do Setor de Ortopedia Hepatologia pelo Service d’Hépatologie, Hôpital Be- assistente da Disciplina de Pneumologia da EPM/Uni-
Oncológica da EPM/Unifesp e do IOP/GRAACC/Uni- aujon, Université Denis Diderot-Paris 7, França. fesp. Doutora em Ciências Médicas pela EPM/Unifesp
fesp. Professor Orientador do Curso de Pós-Gradua- Roberto Massao Takimoto: Cirurgião. Médico assis- Rosana Fiorini Puccini: Pediatra. Professora titular
ção do IIEP/HIAE. Mestre em Ortopedia e Doutor em tente da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço Livre-Docente do Departamento de Pediatria da EPM/
Medicina pela EPM/Unifesp. do Departamento de ORL-CCP/EPM/Unifesp. Mestre e Unifesp. Doutora em Pediatria pela EPM/Unifesp.
xx ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Rosiane Mattar: Obstetra. Professora associada de Medicina da EPM/Unifesp. Doutor em Gastrente- Silvia Daher: Imunologista. Professora adjunta de
Livre-Docente do Departamento de Obstetrícia da rologia. Obstetrícia da EPM/Unifesp. Mestre em Imunologia,
EPM/Unifesp. Sérgio A. Draibe: Nefrologista. Professor titular de Microbiologia e Parasitologia e Doutora em Ciências
Rubens Belfort Neto: Médico. Diretor do Centro de Nefrologia da EPM/Unifesp. da Saúde pela EPM/Unifesp.
Oncologia Ocular do Instituto da Visão. Sergio Atala Dib: Endocrinologista. Professor asso- Sílvia Mansur Reimão: Endoscopista do Serviço de
Rufino Dominguez Lopez: Professor da Disciplina ciado Livre-Docente da Disciplina de Endocrinologia Endoscopia do Hospital Israelita Albert Einstein e do
de Obstetrícia Fisiológica e Experimental do Departa- da EPM/Unifesp. Mestre em Endocrinologia e Doutor Serviço de Endoscopia do Hospital Sírio Libanês.
mento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. em Ciências pela EPM/Unifesp. Silvia Marcondes Pereira: Responsável pelo atendi-
Rui M. B. Maciel: Endocrinologista especialista em Sérgio Barsanti Wey: Infectologista. Mestre e Dou- mento e coordenadora do Ambulatório de Dermatolo-
Endocrinologia Pediátrica. Professor titular Livre- tor pela EPM/Unifesp. gia Geriátrica do Departamento de Dermatologia da
-Docente de Endocrinologia da EPM/Unifesp. Mestre Unifesp. Mestre em Dermatologia pela Unifesp.
Sergio Cavalheiro: Neurocirurgião especialista
em Ciências e Doutor em Endocrinologia pela EPM/ em Neurocirurgia Pediátrica. Professor titular Livre- Silvio Kazuo Ogata: Pediatra especialista em Gas-
Unifesp. -Docente da Disciplina de Neurocirurgia e chefe do trenterologia Pediátrica. Mestre em Ciências da Saúde
Rui Póvoa: Cardiologista. Professor de Cardiologia e setor de Neurocirurgia Pediátrica da EPM/Unifesp. e Doutor em Medicina pela EPM/Unifesp.
chefe do Setor de Cardiopatia Hipertensiva da EPM/ Assistente Estrangeiro da Universidade de Marselha, Simone Brasil de Oliveira Iglesias: Pediatra espe-
Unifesp. Mestre e Doutor em Cardiologia pela EPM/ França. Chefe do setor de Neurocirurgia Pediátrica cialista em Terapia Intensiva Pediátrica e em Terapia
Unifesp. do Hospital e Maternidade Santa Joana (Pro Matre). Nutricional Enteral e Parenteral. Médica assistente da
Ruth Guinsburg: Pediatra especialista em Neonato- Mestre em Neurocirurgia e Doutor em Medicina pela Unidade de Cuidados Intensivos Pediátricos do HSP/
logia. Professora titular do Departamento de Pediatria EPM/Unifesp. EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em Pediatria e Ciên-
da EPM/Unifesp. Sergio Henrique Hirata: Dermatologista. Professor cias Aplicadas à Pediatria pela EPM/Unifesp.
Samir Dracoulakis: Pneumologista. Doutor em Me- adjunto do Departamento de Dermatologia da EPM/ Simone de Barros Tenore: Infectologista. Médica do
dicina: Pneumologia pela EPM/Unifesp. Unifesp. Mestre e Doutor em Dermatologia pela EPM/ Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids de
Unifesp. São Paulo. Mestre em Ciências pela Unifesp. Douto-
Samira Yarak: Dermatologista. Professora adjunta randa em Doenças Infecciosas da Unifesp.
de Dermatologia da EPM/Unifesp. Pesquisadora do Sergio Jamnik: Onco-pneumologista da Disciplina
CNPq. Mestre em Dermatologia e Doutora em Ciên- de Pneumologia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Simone de Campos Vieira Abib: Professora adjunta
cias da Saúde pela EPM/Unifesp. Pneumologia pela EPM/Unifesp. Livre-Docente do Departamento de Cirurgia Pediá-
Sergio Luis Blay: Psiquiatra. Professor titular do De- trica da EPM/Unifesp. Chefe do Serviço de Cirurgia
Sandra de Oliveira Campos: Pediatra infectologis- Oncológica Pediátrica do IOP/GRAACC/Unifesp. Presi-
ta. Professora assistente da Disciplina de Infectologia partamento de Psiquiatria da EPM/Unifesp.
dente da ONG Criança Segura – Safe Kids Brasil.
Pediátrica da EPM/Unifesp. Mestre em Pediatria pela Sérgio Mancini Nicolau: Ginecologista e obstetra.
EPM/Unifesp. Professor associado do Departamento de Ginecologia Simone Elias: Mastologista. Professora afiliada e
da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Ginecologia pela orientadora do Programa de Pós-Graduação em Gi-
Sandra Maria Alexandre: Ginecologista e obste- necologia da EPM/Unifesp. Coordenadora da Unidade
tra especialista em Saúde Materno-Fetal. Professora EPM/Unifesp.
Clínica e Diagnóstica do Ambulatório de Mastologia
adjunta de Obstetrícia do Departamento de Obstetrí- Sergio Setsuo Maeda: Endocrinologista especialista do Departamento de Ginecologia da EPM/Unifesp.
cia da EPM/Unifesp. Mestre em Obstetrícia e Doutora em Doenças Ósteo-Metabólicas. Médico assistente da Mestre e Doutora em Ciências, Pós-Doutora em Ra-
em Ciências pela Unifesp. Disciplina de Endocrinologia da EPM/Unifesp. Mestre diologia Clínica pela EPM/Unifesp.
Sandra Obikawa Kyosen: Pediatra e geneticista. e Doutor pela Unifesp.
Solange Miki Maeda: Dermatologista. Médica cola-
Mestre em Ciências pela Unifesp. Sérgio T. Schettini: Cirurgião geral e pediátrico. Pro- boradora do Departamento de Dermatologia da EPM/
Sandra Regina Loggeto: Hematologista pediátrica. fessor associado Livre-Docente aposentado de Cirur- Unifesp. Mestre em Dermatologia pela EPM/Unifesp.
Mestre em Pediatria: Hematologia Pediátrica pela gia Pediátrica da EPM/Unifesp. Professor de Cirurgia
da Faculdade de Medicina da Uninove. Mestre e Dou- Solange Rios Salomão: Ortoptista. Professora asso-
EPM/Unifesp. ciada Livre-Docente do Departamento de Oftalmolo-
tor em Gastrenterologia Cirúrgica pela EPM/Unifesp.
Sandra Serson Rohr: Médica especialista em Hema- gia e Ciências Visuais da EPM/Unifesp. Mestre em Psi-
tologia e Transplante de Medula Óssea. Membro da Sérgio Talarico-Filho: Dermatologista. Assistente cofarmacologia e Doutora em Ciências: Psicobiologia
Equipe de Transplante de Medula Óssea do Hospital estrangeiro da Université Paris – Hôpital Saint Louis, pela EPM/Unifesp.
Santa Marcelina. Doutoranda da EPM/Unifesp. França. Mestre em Dermatologia pela EPM/Unifesp.
Sonia Maria Cesar de Azevedo Silva: Neurologista.
Sandra Vallin Antunes: Hematologista. Coorde- Sergio Tufik: Médico. Professor titular aposentado Assistente do Ambulatório de Transtornos do Movi-
nadora do Serviço de Hemofilia da Disciplina de He- de Psicolobiologia – Disciplina de Medicina e Biolo- mento da Unifesp. Chefe do Ambulatório de Trans-
matologia e Hemoterapia da EPM/Unifesp. Mestre e gia do Sono da EPM/Unifesp. Professor orientador tornos do Movimento e do Serviço de Neurologia do
Doutora em Ciências pela Unifesp. do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da HSPE/IAMSPE. Mestre e Doutora pela Unifesp.
Unifesp. PhD.
Sandro Félix Perazzio: Reumatologista. Mestre e Sonia Maria G. P. Togeiro: Pneumologista espe-
Doutor em Reumatologia pela EPM/Unifesp. Pós-Dou- Sergio Yamada: Dermatologista. Mestre em Ciências cialista em Medicina do Sono. Professora afiliada da
tor pela University of Washington, EUA. da Saúde: Dermatologia. Disciplina da Medicina e Biologia do Sono da EPM/
Sandro Luiz A. Matas: Neurologista. Chefe do Se- Sheila C. Caetano: Médica. Unifesp. Doutora em Pneumologia.
tor de Neuroinfecção da Disciplina de Neurologia da Sheila R. Niskier: Pediatra. Médica assistente do Sonia Mayumi Chiba: Médica assistente de Setor de
EPM/Unifesp. Coordenador do Setor de Líquido Cefa- Ambulatório de Adolescência da EPM/Unifesp. Mestre Pneumologia Pediátrica e coordenadora do Ambula-
lorraquiano da Disciplina de Medicina Laboratorial do em Pediatria pela EPM/Unifesp. tório de Fibrose Cística da EPM/Unifesp. Doutora em
Departamento de Medicina da EPM/Unifesp. Mestre e Shirley Shizue Nagata Pignatari: Otorrinolarin- Pediatria pela EPM/Unifesp.
Doutor pela EPM/Unifesp. gologista. Mestre e Doutora em Medicina pela EPM/ Soraia Tahan: Gastrenterologista pediátrica. Profes-
Sarhan Sydney Saad: Professor associado Livre-Do- Unifesp. sora adjunta da Disciplina de Gastrenterologia Pediá-
cente e chefe do Grupo de Colo-Proctologia da Disci- Silmara Cestari: Dermatologista. Professora adjunta trica do Departamento de Pediatria da EPM/Unifesp.
plina de Gastrenterologia Cirúrgica da EPM/Unifesp. do Departamento de Dermatologia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutora em Ciências pela Unifesp.
Sender J. Miszputen: Gastrenterologista. Profes- Mestre em Dermatologia e Doutora em Medicina pela Stephan Geocze: Gastrenterologista clínico e endos-
sor associado de Gastrenterologia do Departamento EPM/Unifesp. copista. Professor associado Livre-Docente de Gas-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO xxi
trenterologia Clínica da EPM/Unifesp. Coordenador Thereza Christina Monteiro de Lima: Biomédica. somática e Iterconsulta pela Virginia Commonwealth
do Centro de Endoscopia Digestiva e Respiratória do Professora titular de Farmacologia da Universidade University, EUA.
HSP/EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em Ciências pela Federal de Santa Catarina. Mestre em Ciências e Dou- Vera Lucia Sdepanian: Pediatra especialista em
Unifesp. Pós-Doutor pela Friedrich-Alexander Univer- tora em Fisiologia Humana pela Unifesp. Gastrenterologia Pediátrica. Professora adjunta da
sitaet, Erlangen, Alemanha. Thiago Fernando Oyama: Infectologista. Disciplina de Gastrenterologia Pediátrica da EPM/
Sue Yazaki Sun: Professora adjunta do Departa- Thiago Marques Fidalgo: Psiquiatra. Doutor em Psi- Unifesp. Mestre em Ciências pela EPM/Unifesp e pela
mento de Obstetrícia da EPM/Unifesp. Doutora em quiatria pela EPM/Unifesp. Universidad Internacional de Andalucía, Espanha.
Ciências pela Unifesp. Doutora em Medicina pela EPM/Unifesp. Pós-Doutora
Thiago Zinsly Sampaio Camargo: Infectologista. em Gastrenterologia Pediátrica pela Universidade de
Suely Dornellas do Nascimento: Médica assistente Mestre pela Unifesp. Doutorando do IIEP/HIAE.
da Disciplina de Pediatria Neonatal da EPM/Unifesp. Maryland, EUA.
Médica Coordenadora da UTI Neonatal do Hospital Tiago Costa de Pádua: Oncologista. Especialista em Vera Lúcia Sjzenfeld: Reumatologista. Professora
e Maternidade Santa Joana (Pro Matre). Mestre em Clínica Médica e Cancerologia Clínica. adjunta e coordenadora do Setor de Doenças Osteo-
Ciências da Saúde pela EPM/Unifesp. Tiago da Silva Alexandre: Fisioterapeuta. Especia- metabólicas da Disciplina de Reumatologia da EPM/
Suely Miyuki Yashiro: Médica especialista em Saúde lista em Gerontologia. Professor adjunto do Depar- Unifesp. Mestre em Ciências e Doutora em Reumato-
Pública. Mestre em Ciências. tamento de Gerontologia e dos Programas de Pós- logia pela EPM/Unifesp.
Graduação em Fisioterapia e Gerontologia da Ufscar. Veruska Lastoria: Psiquiatra especialista em Trans-
Suely Roizenblatt: Reumatologista. Professora Pesquisador associado do Estudo SABE (Saúde, Bem-
adjunta de Clínica Médica da EPM/Unifesp. Mestre e tornos Alimentares. Médica assistente da Disciplina
-Estar e Envelhecimento). Mestre em Reabilitação pela de Endocrinologia da Irmandade da Santa Casa de
Doutora pela EPM/Unifesp. Unifesp. Doutor em Saúde Pública pela Faculdade de São Paulo. Psiquiatra do Programa de Atenção aos
Sung Woo Park: Otorrinolaringologista. Especialista Saúde Pública da USP. Pós-Doutor pelo Departamento Transtornos Alimentares da EPM/Unifesp.
em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pes- de Epidemiologia e Saúde Pública da University Colle-
coço. Mestre em Ciências Médicas pela EPM/Unifesp. ge London, Inglaterra. Victor Hugo Saucedo Sanchez: Médico do Centro
de Diabetes da EPM/Unifesp. Mestre em Obstetrícia
Susan Chow Lindsey: Endocrinologista. Doutora em Tiago E. Arantes: Oftalmologista especialista em pela EPM/Unifesp.
Endocrinologia pela EPM/Unifesp. Uveítes e em Retina Clínica. Preceptor do Departa-
mento de Uveítes da Fundação Altino Ventura. Doutor Vinicius Magalhães Suguri: Mestre e Doutor em
Suzana A. S. Lustosa: Cirurgiã oncológica do apare-
em Ciências pela Unifesp. Medicina pela EPM/Unifesp.
lho digestivo. Mestre e Doutora em Gastrenterologia
Cirúrgica pela EPM/Unifesp. Pós-Doutora em Gastren- Tiago Munhoz Vidotto: Clínico geral e endocrinolo- Vinícius Ynoe de Moraes: Ortopedista especialista
terologia Cirúrgica. gista. Chefe de Plantão do Pronto-Socorro da Clínica em Cirurgia de Mão. Doutor em Ciências pela Unifesp.
Suzana Maria Fleury Malheiros: Professora afiliada Médica do HSP/EPM/Unifesp. Virginia N. Santos: Gastrenterologista. Coordena-
do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Tsutomu Oguro: Hematologista e hemoterapeuta. dora do Ambulatório de Doença Hepática Gordurosa
EPM/Unifesp. Consultora do Programa de Neuro-On- Não Alcoólica da EPM/Unifesp. Mestre em Medicina e
Ulysses Fagundes Neto: Professor titular da Discipli-
cologia do Hospital Israelita Albert Einstein. Doutora em Ciências.
na de Gastrenterologia do Departamento de Pediatria
Tais S. Moriyama: Psiquiatria da infância e adoles- da EPM/Unifesp. Diretor médico do Instituto de Gas- Viviane Maria Guerreiro da Fonseca: Otorrino-
cência. Mestre e Doutora em Ciências pela Unifesp. trenterologia Pediátrica de São Paulo (I-Gastroped). laringologista especialista em Otorrinolaringologia
Pediátrica. Mestre em Ciências pela Unifesp.
Tammy Hentona Osaki: Professora afiliada e vice- Valdemar Ortiz: Urologia especialista em Oncologia.
-chefe do Setor de Oculoplástica do Departamento Professor titular Livre-Docente de Urologia pela Uni- Wagner José Gonçalves: Médico e professor Livre-
de Oftalmologia e Ciências Visuais da EPM/Unifesp. fesp. Mestre e Doutor em Ciências pela Unifesp. -Docente do Departamento de Ginecologia da EPM/
Doutora em Ciências pela EPM/Unifesp. Unifesp.
Valdir Ambrosio Moises: Cardiologista. Professor
Tatiana Del Debbio Vilanova: Fonoaudióloga espe- adjunto Livre-Docente da Disciplina de Cardiologia da Wagner Jou Hisada: Médico técnico-administrativo
cialista em Voz, Disfagia e Distúrbios da Comunicação EPM/Unifesp. Médico assessor em Cardiologia (Eco- da Disciplina de Medicina Fetal do Departamento
Humana. Doutora em Neurociências pela Unifesp. cardiografia) do Fleury Medicina e Saúde. Mestre e de Obstetrícia da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor em
Doutor em Cardiologia pela EPM/Unifesp. Ciências pela Unifesp.
Tatiana Ferreira dos Santos: Nefrologista pediá-
trica. Valéria Petri: Dermatologista. Professora titular Wallace Chamon: Oftalmologista especialista em
Livre-Docente da EPM/Unifesp. Mestre e Doutor pela Segmento Anterior. Professor do Departamento de
Tatiana Valente: Endocrinologista. Pós-Graduanda
Unifesp. Oftalmologia e Ciências Visuais da EPM/Unifesp.
em Endocrinologia da EPM/Unifesp.
Professor adjunto do Departamento de Oftalmologia
Telma Palomo: Endocrinologista. Doutora em Endo- Vamberto Oliveira de A. Maia Filho: Ginecologis-
e Ciências Visuais da University of Illinois, Chicago,
crinologia e Metabologia pela EPM/Unifesp. ta e obstetra especialista em Infertilidade Conjugal
EUA. Mestre e Doutor em Ciências pela Unifesp.
e Videolaparoscopia. Médico voluntário do Setor de
Teresa Cristina Piscitelli Bonanséa: Endocrinologis- Ginecologia Endócrina da EPM/Unifesp. Doutor em Walter J. Gomes: Professor titular da Disciplina de
ta. Mestre em Doenças Osteometabólicas pela EPM/ Medicina pela EPM/Unifesp. Cirurgia Cardiovascular da EPM/Unifesp. Doutor em
Unifesp. Cirurgia Cardiovascular pela EPM/Unifesp.
Vanderci Borges: Neurologista especialista em
Thaís Rodrigues Villa: Neurologista e neuropedia- Transtornos do Movimento. Professora afiliada do Walter Moisés Tobias Braga: Hematologista. Pro-
tra. Professora afiliada e chefe do Setor de Cefaleias Departemento de Neurologia e Neurocirurgia da EPM/ fessor afiliado da Disciplina de Hematologia e Hemo-
da EPM/Unifesp. Doutora em Ciências pela Unifesp. Unifesp. Mestre em Neurologia/Neurociências e Dou- terapia da EPM/Unifesp. Doutor em Hematologia pela
Pós-Doutora pela University of California, Los Ange- tora em Medicina pela EPM/Unifesp. EPM/Unifesp.
les, EUA.
Vanessa Bugni Miotto e Silva: Pediatra especialista Walton Nosé: Professor adjunto Livre-Docente e
Thauana Luiza de Oliveira: Reumatologista. Mes- em Reumatologia Pediátrica. Mestre e Doutora em chefe do Setor de Catarata e Cirurgia Refrativa (Óptica
tre em Ciências Aplicadas à Reumatologia pela EPM/ Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria pela EPM/ Cirúrgica) da EPM/Unifesp. Cirurgião da Eye Clinic Day
Unifesp. Unifesp. Hospital de São Paulo.
Thaysa Paschoalin: Biomédica. Doutora em Ciências Vanessa de Albuquerque Citero: Psiquiatra. Profes- Zsuzsanna Ilona Katalin de Jármy Di Bella: Gine-
pela Unifesp. sora afiliada do Departamento de Psiquiatria da EPM/ cologista e obstetra. Professora adjunta da EPM/Uni-
Theophilo Asfora Lins: Ortopedista especialista em Unifesp. Mestre e Doutora em Ciências: Psiquiatria fesp. Mestre em Ciências e Doutora em Ginecologia
Cirurgia da Coluna Vertebral. pela EPM/Unifesp. Pós-Doutora em Medicina Psicos- pela EPM/Unifesp.
HOMENAGENS
(1900-1972)
Como professor foi um dos fundadores da Escola Paulista de Medicina PRÊMIO JAIRO RAMOS
(EPM) e um incansável educador, incentivando a investigação clínica e a No dia 24 de abril de 2000 Jairo Ramos teria feito 100 anos e, juntamente
arte da terapêutica. com atos públicos de comemoração do centenário, foi instituído pela famí-
Como profissional esteve sempre preocupado com as questões da éti- lia o Prêmio Jairo Ramos.
ca médica, tendo participado intensamente da constituição dos Conselhos Este prêmio é concedido ao melhor residente de Clínica Médica da
de Medicina. Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), escolhido por uma comissão
Como político, por meio de sua atuação frente à Associação Paulista composta pelos chefes das diversas disciplinas.
de Medicina e à Associação Médica Brasileira, esteve sempre envolvido na O prêmio é proveniente do rendimento dos direitos autorais do livro
defesa da classe médica, preocupado com a situação econômica dos pro- Atualização terapêutica. Tem como finalidade incentivar os residentes no
fissionais. Combateu desde a década de 50 o que chamou de socialização estudo da Clínica Médica, por meio da investigação clínica e da arte da
do médico e privatização da medicina. terapêutica.
Enquanto médico, era visto por alguns de seus clientes como muito Em nome da família de Jairo Ramos gostaria de agradecer aos edi-
rígido e por outros como extremamente dedicado e carinhoso. Todos, po- tores e colaboradores pelo esforço e dedicação na condução desta obra
rém, são unânimes ao descrevê-lo como um médico extraordinário. O ca- existente há 54 anos. Temos a confiança que esta equipe a tornará cada
risma de Jairo Ramos é confirmado ainda hoje, no século XXI, quando vez mais importante tanto para os estudantes como para a classe médica,
seu nome é mencionado pelos descendentes e o interlocutor descobre a no Brasil e na América Latina.
relação de parentesco. Invariavelmente há uma história de algum membro
da família ou amigo próximo que foi seu paciente e nunca o esqueceu. – Jairo Luiz Ramos
SINOPSE BIOGRÁFICA
1900 Nascimento em Conservatória, Estado do Rio de Janeiro 1933 Funda a Escola Paulista de Medicina (EPM)
Assistente voluntário da Clínica Obstétrica da Faculdade de
1903 Muda-se para Avaré, onde cursa o Grupo Escolar Edmundo Trench Medicina de São Paulo – Especializado em Cardiologia
1911 Muda-se para São Paulo e ingressa no Ginásio do Estado 1936 Defende tese de livre-docente de Clínica Médica na Faculdade
de Medicina de São Paulo
1917 Forma-se no Ginásio do Estado
1937 Inauguração do Hospital São Paulo
1918 Ingressa na Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo
1945 Presidente da Associação Paulista de Medicina até 1952
1923 Forma-se em Medicina
É nomeado interno oficial da 1ª Cadeira de Clínica Médica 1951 Criação da Associação Médica Brasileira
1928 Torna-se médico adjunto do Hospital Médico da Santa Casa e do 1956 Presidente da Associação Paulista de Hospitais
Hospital São Luiz Gonzaga
1957 Publicação da 1ª edição do livro Atualização terapêutica
1929 Torna-se docente na Clínica Obstétrica, com especialização
em Cardiologia 1960 Vice-Presidente da Associação Paulista de Hospitais até sua morte
Funda a Associação Paulista de Medicina 1965 Aposenta-se compulsoriamente da Escola Paulista de Medicina
1931 Assistente de Clínica da Faculdade de Medicina 1966 Presidente da Sociedade Paulista para o Desenvolvimento
Auxiliar do Instituto de Higiene de São Paulo (1931 a 1938) da Medicina
1932 Chefe de Clínica Médica dos Hospitais de Cruzeiro e Taubaté 1972 Falecimento
FELÍCIO CINTRA DO PRADO
Nasceu em Amparo, a 20 de maio de 1900.
Diplomado pela Faculdade de Medicina de São Paulo em
1923, iniciou sua vida profissional no Setor de Neurologia,
sobre o qual versou sua tese de doutoramento. Entretanto,
tendo dedicado-se deliberadamente à clínica das moléstias do
aparelho digestivo e da nutrição, empreendeu viagem de estu-
dos à Europa, onde frequentou vários serviços hospitalares no
período de 1926-1928, especialmente em Viena e Berlim. Nesta (1900-1983)
De volta a São Paulo, começou, então, a trabalhar como clínico geral, de Medicina da Alemanha, da Sociedade Nacional da Gastrenterologia da
manifestando predileção por assuntos de gastrenterologia e terapêuticos. França e das Sociedades Médicas da Argentina, Uruguai, México e Cuba.
Foi um dos fundadores da Escola Paulista de Medicina (EPM), onde Foi representante do Brasil em diversos encontros médicos internacio-
tornou-se professor catedrático de Terapêutica Clínica (1937-1966). Foi, nais nos Estados Unidos e América Latina.
também, chefe do Serviço de Clínica Médica e membro do Conselho Dire- Recebeu o “Prêmio Alvarenga”, conferido pela Academia de Medicina
tor da Policlínica de São Paulo. de São Paulo, pela tese “Síndrome pirâmido-palidal”.
Dedicou-se a desenvolver o trabalho do médico na sociedade, tendo Publicou, além desses, inúmeros trabalhos e livros, entre eles: A me-
sido presidente de diversas entidades médicas, entre elas a Sociedade de dicina e o médico na sociedade contemporânea e Clínica das afecções do
Gastrenterologia e Nutrição de São Paulo, a Federação Brasileira de Gas- estômago.
trenterologia, a Academia de Medicina de São Paulo e o Sindicato dos Como um dos iniciadores da obra Atualização terapêutica, dedicou-se
Médicos de São Paulo. Foi membro da Academia Teuto-Ibero-Americana a ela até o ano de 1981.
Faleceu em 21 de fevereiro de 1983.
JOSÉ RIBEIRO DO VALLE
José Ribeiro do Valle morreu em 2000, após longa doença.
O breve relato a seguir certamente não fará jus à sua vasta obra
científica, à sua influência na formação de várias gerações de
cientistas e à colaboração que prestou a inúmeros projetos re-
lacionados ao desenvolvimento da Farmacologia no Brasil, para
citar apenas algumas de suas atividades. Talvez um único livro
não bastasse para tratar de tudo que lhe foi possível realizar.
(1908-2000)
José Ribeiro do Valle nasceu em 1908 em Guaxupé, MG. Veio cedo José Ribeiro do Valle foi fundador e assessor de quase todas as insti-
para São Paulo para fazer o curso ginasial no Colégio Arquidiocesano. Em tuições científicas nacionais na área da Farmacologia e desenvolvimento
seguida fez o curso de Medicina na Faculdade de Medicina e Cirurgia de de medicamentos: Central de Medicamentos (CEME), Comissão de Pro-
São Paulo, formando-se em 1932. Já durante seu tempo de estudante fre- dutos Naturais do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq), Comissão
quentava o Laboratório de Fisiologia, dirigido pelo Prof. Franklin Moura Estadual de Entorpecentes, Financiadora de Estudos e Projetos (Finep),
Campos. Em 1934 foi levado para a recém-fundada Escola Paulista de Me- Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, entre outros. Foi
dicina (EPM) pelas mãos dos Profs. Otto Bier e André Dreyfus, tornando-se membro titular da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Paulista
o primeiro catedrático de Farmacologia em 1939. de Ciências. Entre os prêmios e comendas que recebeu podem ser citados:
Nesses anos a sua atividade de pesquisa foi desenvolvida no Instituto Oficial da Ordem do Rio Branco, Prêmio Astra (1976) e Grã Cruz da Ordem
Butantan em colaboração com o Prof. Thales Martins, sobre endocrino- Nacional do Mérito (1994).
logia experimental. Como fellow da Guggenheim Memorial Foundation Em 1977, José Ribeiro do Valle criou o Instituto Nacional de Farma-
(1946-1948), fez estágios e treinamento em muitos centros internacionais: cologia (INFAR), reunindo os Departamentos de Biofísica, Bioquímica e
Universidade do Texas, da Califórnia, de Chicago, Memorial Hospital de Farmacologia da EPM em um prédio que hoje tem o seu nome.
Nova York, Clínica Mayo e Instituto de Biologia e Medicina Experimental Há mais de uma centena de trabalhos científicos e 10 livros publica-
de Buenos Aires. De volta ao Brasil, com os laboratórios do Instituto Bu- dos por José Ribeiro do Valle. Dentre os livros destacam-se a História da
tantan fechados, criou o primeiro Laboratório Experimental de Farmaco- farmacologia brasileira, publicada por ocasião do 1o Congresso Interna-
logia no Hospital-Escola da EPM. Em 1956 conseguiu organizar junto com cional de Farmacologia, realizado em 1966 em São Paulo, e Atualização
colegas bioquímicos um moderno Laboratório de Bioquímica e Farmaco- terapêutica, publicada a partir de 1957, em coautoria com Felício Cintra do
logia, que foi responsável pela formação de grande número de cientistas Prado e Jairo Ramos.
com vasta produção de trabalhos científicos. Na ocasião, José Ribeiro do No terreno pessoal, há unanimidade entre todos que o conheceram
Valle e seu colega bioquímico, José Leal Prado, conseguiram a construção que José Ribeiro do Valle era a pessoa mais afável, paciente, bondosa e
de um prédio de dois andares (hoje com o nome de José Leal Prado). No prestativa que se possa imaginar. Não media esforços para atender todas
andar térreo foi instalada a parte didática, com sala de aula e laboratórios, as pessoas que o procuravam, seja para resolver problemas científicos ou
e, no andar superior, os laboratórios de pesquisa, de bioquímica e de far- pessoais. Tinha grande senso de humor, cultura abrangente, era incansá-
macologia, com uma biblioteca modelar entre os dois.
vel “contador de casos” e, sobretudo, tinha amor ao próximo e compreen-
Entre as universidades com as quais José Ribeiro do Valle colaborou,
dia as fraquezas humanas. Já está fazendo grande falta.
ministrando cursos e treinando farmacologistas, podem-se citar as Univer-
sidades Federal do Ceará, da Paraíba e de Brasília. – Hanna A. Rothschild
OSWALDO LUIZ RAMOS
Oswaldo Luiz Ramos nasceu com o destino traçado. Ser mé-
dico para ele era mais que uma vocação, era uma predestina-
ção: seguir e multiplicar os passos de Jairo Ramos. Talvez sua
maior vitória, entre tantas possíveis de citar, tenha sido a de ter
escrito uma página da história da medicina brasileira, na se-
gunda metade do século XX, tão original e marcante quanto a
de seu pai, na primeira metade do século passado. É realmente
(1928-1999)
notável que duas gerações seguidas tenham assistido a dois
homens tão diferentes, pai e filho, gerarem tantos frutos igual-
mente benfazejos e duradouros na realidade médica do Brasil.
Oswaldo Ramos formou-se médico pela Escola Paulista de Medicina Foi da Comissão de Ensino Médico e da Comissão Nacional de Resi-
(EPM) em 1951 e lá realizou a parte mais importante de sua obra como dência Médica do Ministério da Educação, tendo também coordenado, na
pesquisador, educador e fomentador. Obteve o título de Master of Science década de 1980, o Sistema Integrado de Procedimentos de Alta Comple-
na McGill University de Montreal, Canadá, em 1955, e foi fellow da Co- xidade na área de nefrologia, normatizando os procedimentos de diálise e
lumbia University de Nova Iorque entre 1958 e 1959. Em 1961 tornou-se transplante no Brasil. Fundou e dirigiu a Sociedade Brasileira de Nefrolo-
livre-docente em Clínica Médica da EPM e, em 1971, professor titular da gia e a Sociedade Brasileira de Investigação Clínica e, em 1994, foi eleito
disciplina de Nefrologia do Departamento de Medicina da EPM. membro da Academia Brasileira de Medicina. Teve seu reconhecimento
Sua atuação de fomento no âmbito estadual começou na década internacional consolidado em 1980, quando foi convidado a participar
de 1950, quando esteve entre os que lutaram pela criação da residên- da seleta Chamber for High Blood Pressure Research, da American Heart
cia médica, coordenando, depois, a Comissão de Residência Médica da Association. Essa expressiva carreira de cientista e professor, perenizada
EPM entre 1965 e 1975. Na década de 1960 chefiou a disciplina de Meta- pela centena de artigos publicados em revistas internacionais, não impe-
bolismo e Nutrição da EPM, posteriormente renomeada de Nefrologia, e, diu o exercício, enquanto clínico, da profissão médica.
na década de 1970, participou decisivamente da instalação do programa O clínico Oswaldo Ramos era famoso pela argúcia do raciocínio, pela
de Pós-graduação da EPM, hoje o mais conceituado do país na área mé- simpatia irresistível e pela generosidade do diagnóstico. Nada além do
dica. Na década de 1980 implantou, e coordenou até 1993, com apoio que fora prognosticado por Jairo como características essenciais ao bom
da Fundação Rockfeller, o Programa de Epidemiologia Clínica da EPM. médico. Na prática do consultório, aliava a precisão do cientista biológico
Ainda na década de 1990, coordenou, por meio da Fundação Oswaldo com a curiosidade do investigador de almas, sempre em benefício da saú-
Ramos, a construção e implantação do Hospital do Rim, de São Paulo, de do paciente em um sentido global. Foi com essa experiência adquirida,
tendo sido, até falecer, o seu presidente honorário. Entre 1989 e 1993 e honrando a tradição paterna, que assumiu em 1988 a coordenação do
foi Presidente da Comissão de Pós-graduação e, de 1990 a 1998, chefe livro Atualização terapêutica, tendo sido responsável por todas as edições
do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Paulo publicadas desde então até a do ano de sua morte.
(Unifesp), antiga EPM.
– Luiz Fernando Ramos
Oswaldo Luiz Ramos tinha apenas 5 anos de idade quan-
do seu pai, Jairo Ramos (então com 33 anos), assinou a 1 de
junho de 1933 o manifesto de fundação da Escola Paulista de
Medicina (EPM).
Ao aposentar-se em 1996, em mensagem dirigida ao De-
partamento de Medicina, Oswaldo Ramos registrou sua “feliz
vivência de 45 anos como docente da EPM”.
Oswaldo Ramos diplomou-se médico pela EPM em 1951 (ano no qual, vem sendo um dos centros mundiais que mais realizam transplantes re-
de modo pioneiro no país, fora criado, nesta Escola, o Departamento de nais, fato registrado pela revista Lancet, em fevereiro de 2001.
Medicina). Obteve o título de Master of Science in Experimental Medicine Oswaldo Ramos teve atuação importante como educador e como for-
pela Universidade McGill, Canadá (1955) e, a seguir, foi research fellow da mulador de políticas educacionais: na EPM/Unifesp foi presidente da Co-
Columbia University de 1958 a 1959. Neste período estudou, experimen- missão de Pós-graduação; na Capes coordenou a área de Medicina e foi
talmente, a função hepática em cães e publicou dois trabalhos (Journal of membro de seu Conselho Técnico e Científico; no Ministério da Educação
Clinical Investigation 1960; 39: 161-170 e 1960; 39: 1570-1577) que conti- presidiu Comissão de Especialistas responsável pela primeira avaliação dos
nuam a receber citações na literatura científica internacional. Obteve na cursos de medicina do país. Símbolo de sua liderança na Unifesp é o “Cen-
EPM, em 1961, o título de livre-docente em Clínica Médica. O trabalho re- tro de Pesquisas Clínicas e Cirúrgicas”. Por iniciativa do Departamento de
sultante de sua tese (Portal hemodynamics and liver cell function in hepatic Medicina, o Conselho Universitário da Unifesp aprovou a ideia de transfor-
schistosomiasis. Gastroenterology 1964; 47: 241-247) colocou a hepatologia mar um edifício de seis andares, adquirido para abrigar a administração
brasileira no mapa-múndi. A partir desse ponto dedicou-se à nefrologia. da universidade, em edifício destinado a laboratórios de pesquisa básica
Membro ativo desde 1957 da Seção de Metabolismo e Nutrição, em de disciplinas das áreas clínicas e cirúrgicas. Com recursos da Sociedade
1967 era chefe da disciplina de Nefrologia, no Departamento de Medicina Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (mantenedora do Hospital
da EPM. Presidiu a Sociedade Brasileira de Nefrologia (fundada em 1960) São Paulo) e da Fapesp, decidido apoio do Reitor Hélio Egydio Nogueira e
no biênio 1968-1970. Em 1970 chegou a professor titular da disciplina de sob a liderança de Oswaldo Ramos (já formalmente aposentado), o edifício
Nefrologia; foi o primeiro professor titular do Departamento após a apo- foi aumentado até 16 andares, com área total construída de 5.500 m2. Ao
sentadoria de Jairo Ramos em 1965. Chefiou o Departamento de Medicina todo, 13 andares foram destinados a laboratórios de grupos de pesquisa,
nos períodos de 1970-1973 e 1990-1996. Sua contribuição para a criação e consolidados e emergentes. Inaugurado em novembro de 1997, o “Centro
desenvolvimento da disciplina de Nefrologia e sua liderança na condução de Pesquisas Clínicas e Cirúrgicas” teve seus laboratórios ocupados por
do Departamento de Medicina foram fundamentais. Participou da publi- grupos com comprovada produtividade científica, após avaliação por co-
cação de mais de uma centena de trabalhos em periódicos de circulação missão ad hoc de pesquisadores externos à Universidade.
internacional das áreas de nefrologia e de hipertensão e foi responsável Oswaldo Ramos foi editor do Atualização terapêutica desde sua 14ª edi-
direto pela orientação de vários dos atuais docentes da disciplina de Ne- ção (1988) até a 19ª edição, esta de 1999, ano de seu falecimento. Nas seis
frologia da Unifesp. edições sob sua responsabilidade, Oswaldo Ramos venceu o desafio de edi-
Em meados de 1983 os membros da disciplina de Nefrologia da tar o livro que, segundo suas palavras (prefácio da 16ª edição), “vem socor-
EPM fundaram o Instituto Paulista de Estudos e Pesquisas em Nefrologia e rendo o médico brasileiro no angustiante desafio de decidir qual a terapêu-
Hipertensão, com a finalidade de expandir o atendimento nefrológico na tica mais adequada para as principais síndromes médico-cirúrgicas, além de
área clínica e subsidiar pesquisas básicas e clínicas. O Instituto, transfor- resumir as bases etiofisiopatogênicas e o quadro clínico destas síndromes”.
mado em Fundação (Fundação Oswaldo Ramos), é hoje órgão suplementar Ao receber, em 1994, Oswaldo Ramos como membro titular da Aca-
da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e inaugurou, em setembro demia Brasileira de Medicina, Clementino Fraga Filho afirmou que naquele
de 1998, hospital de 11 andares, que abriga grupos de excelência que de- momento a Academia acolhia “um expoente da profissão médica no Brasil”.
senvolvem pesquisa nas áreas de hemodinâmica glomerular, hipertensão
arterial e transplante renal. O Hospital do Rim e Hipertensão desde 2000 – Durval Rosa Borges
APRESENTAÇÃO
Para se manter atualizado, o profissional da área da saúde, Agradecemos o trabalho e a dedicação dos coordenado-
principalmente o médico, deve acessar artigos científicos que res de áreas, autores e coautores, pois coordenar ou escre-
abordem o que há de mais atual, pois o conhecimento na ver um capítulo de livro é bastante trabalhoso, requerendo
área médica se renova com grande velocidade. Mas também muito tempo dedicado à revisão da literatura e nem sempre
é muito importante possuir um livro-texto que permita uma tem sido adequadamente valorizado. Entretanto, certamente
consulta rápida dos conhecimentos consolidados e avaliados todos reconhecemos o grande valor de um bom livro para a
por professores com experiência na área de atuação. formação de alunos na graduação e para a consulta de mé-
Atualização terapêutica: diagnóstico e tratamento, 26ª edi- dicos já formados.
ção, foi elaborado com esse objetivo, tendo sido escrito em Assim, esperamos que esta nova edição auxilie na forma-
linguagem clara e objetiva para refletir a experiência dos au- ção e atualização do médico, ou seja, independentemente da
tores, em sua grande maioria pertencentes à Escola Paulista especialidade, que possa utilizá-la para consulta rápida e para
de Medicina e ao Hospital São Paulo, ambos ligados à Univer- sugestões de referências, aprofundando o conhecimento no
sidade Federal de São Paulo. O livro (impresso e no formato tema específico.
e-book) aborda aspectos fisiopatológicos, manifestações clíni-
cas e de exames subsidiários que permitam o diagnóstico e o
tratamento baseado na melhor evidência científica disponível.
Profa. Dra. Emilia Inoue Sato
Completam o texto referências e leituras sugeridas indicadas
para aqueles que quiserem aprofundar o conhecimento sobre Diretora da EPM/Unifesp
o tema abordado. Presidente da Comissão Editorial do AT
LISTA DE SIGLAS
99mTc tecnécio-99m BRA bloqueadores do receptor de DNA ácido desoxirribonucleico (do FR frebre reumática (apenas no capí-
β-hCG β-gonadotrofina coriônica angiotensina inglês deoxyribonucleic acid) tulo 67)
humana BRD bloqueio de ramo direito DP derrame pleural FSC fluxo sanguíneo cerebral
ACD adenocarcinoma ductal BRE bloqueio de ramo esquerdo DP doença de Paget (apenas no capí- FSH hormônio folículo-estimulante
ACE aspiração de corpo estranho BSB balão de Sengstaken-Blakemore tulo 188) FTA-ABS teste de absorção do anticor-
ACh acetilcolina BT bilirrubina total DPOC doença pulmonar obstrutiva po antitreponêmico fluorescente
AChR receptores de acetilcolina pós- BVM bolsa-válvula-máscara crônica FV fibrilação ventricular
-sinápticos CAD cetoacidose diabética DPP descolamento prematuro de FvW fator de von Willebrand
ACOC anticoncepcional oral combi- CA-MRSA S. aureus resistente à metici- placenta G6PD glicose-6-fosfato-desidrogenase
nado lina adquirido na comunidade DRC doença renal crônica GA gasometria arterial
ACOs anticoncepcionais orais CBC carcinoma basocelular DRGE doença do refluxo gastreso- GASA gradiente soro-ascite de albu-
ACT água corporal total CCP complexo protrombínico fágico mina
ACTH hormônio adrenocorticotrófico CCR câncer colorretal DST doença sexualmente transmissível G-CSF fator estimulador de granu-
(do inglês adrenocorticotropic hormone) CDI cardiodesfibrilador implantável DTC doença do tecido conectivo lócitos
ADA adenosina deaminase CE corpo estranho DUM data da última menstruação GE gravidez ectópica
ADH hormônio antidiurético (do inglês CEC circulação extracorpórea DvW doença de von Willebrand GEST glomeruloesclerose segmentar
antidiuretic hormone) CEIO corpo estranho intraocular EAo estenose aórtica e focal
ADP difosfato de adenosina (do inglês CFTR regulador de condutância trans- EAP edema agudo pulmonar GGT gama-glutamiltransferase
adenosina diphosphate) membrana de fibrose cística EBV vírus Epstein-Barr GH hormônio de crescimento (do inglês
ADT antidepressivos tricíclicos CIM concentração inibitória mínima ECA enzima conversora de angioten- growth hormone)
AESP atividade elétrica sem pulso CIVD coagulação intravascular disse- sina GHRH hormônio liberador do hormônio
minada ECG eletrocardiograma do crescimento
AFP alfa-fetoproteína
CK creatinocinase ECG escala de coma de Glasgow GIG grande para a idade gestacional
Aids síndrome da imunodeficiência
CK-MB isoenzima MB da creatinoci- ECMO oxigenação de membrana ex- GIST tumores do estroma gastrintes-
adquirida (do inglês acquired immuno-
nase tracorpórea tinal
deficiency syndrome)
CMV citomegalovírus EDTA ácido etilenodiamino tetra- GNM glomerulonefrite membranosa
AIJ artrite idiopática juvenil
CPAP pressão positiva contínua na via -acético GNMP glomerulonefrite membrano-
AINE anti-inflamatório não esteroide
aérea (do inglês continuous positive EE estado epiléptico proliferativa
AINH anti-inflamatórios não hormonais
airway pressure) EEG eletrencefalograma GNPE glomerulonefrite pós-estrep-
AIT ataque isquêmico transitório CPK creatinofosfocinase tocócica
ALB albumina sérica EEH estado hiperglicêmico hiperos-
CPRE colangiopancreatografia retró- molar GnRH hormônio liberador de gona-
ALT alanina aminotransferase grada endoscópica dotrofina (do inglês gonadotropin-
AMIU aspiração materna intrauterina EGF fator de crescimento epidermal
Cr creatinina -releasing hormone)
EH encefalopatia hepática
AMP adenosina monofosfato CRF capacidade residual funcional HA hipertensão arterial
EH esteatose hepática (apenas no
AMPc adenosina monofosfato cíclico CRH hormônio liberador de cortico- HA hepatite alcoólica (apenas no
capítulo 209)
ANCA anticorpo anticitoplasma de trofina capítulo 207)
EI endocardite infecciosa
neutrófilo CRNM colangiorressonância magnética HA hiperandrogenismo (apenas no
EIMs erros inatos do metabolismo
Anti-AChR anticorpos contra AChR CrS creatinina sérica capítulo 90)
Elisa enzimaimunoensaio
Anti-MUSK antitirocinase musculoes- CVF capacidade vital forçada HA hiperplasias com atipias (apenas no
quelética EM esclerose múltipla capítulo 98)
DAC doença arterial coronariana
Anti-PR3 anticorpo antiproteinase 3 ENMG eletroneuromiografia HAART terapia antirretroviral altamen-
DBP displasia broncopulmonar
EP embolia pulmonar te ativa
AOS apneia obstrutiva do sono DC doença celíaca (apenas no capítulo
39) EPAP pressão positiva expiratória da HAS hipertensão arterial sistêmica
AR artrite reumatoide
via aérea HAV vírus da hepatite A
ARJ artrite reumatoide juvenil DC doença de Crohn (apenas no capí-
tulo 40) EPO eritropoietina Hb hemoglobina
ARV antirretroviral
DC débito cardíaco EQU exame qualitativo de urina HBeAg antígeno e para hepatite B
ASLO antiestreptolisina O
DCV doença cardiovascular EV endovenosa HBPM heparina de baixo peso mo-
AST aspartato aminotransferase
DDAVP 1-desamino-8-D-arginina FA fibrilação atrial/fosfatase alcalina lecular
ATM articulação temporomandibular
vasopressina FAN fator antinuclear HBsAg antígeno de superfície para
ATP adenosina trifosfato (do inglês
DEA desfibrilador externo automático FC fibrose cística (apenas no capítulo hepatite B
adenosine triphosphate)
DECH doença do enxerto contra hos- 49) HBV vírus da hepatite B
ATR acidose tubular renal
pedeiro FC frequência cardíaca HCC hepatocarcinoma
AVC acidente vascular cerebral
DHEA desidroepiandrosterona FCF frequência cardíaca fetal hCG gonadotrofina coriônica humana
AVCh acidente vascular cerebral he-
DHGNA doença hepática gordurosa FDA Food and Drug Administration (do inglês human chorionic gonado-
morrágico
não alcoólica Fe fração de ejeção tropin)
AVCi acidente vascular isquêmico
DHL desidrogenase láctica FENa fração de excreção de sódio HCV vírus da hepatite C
AVK antagonista da vitamina K
DHRF desidrofalato redutase (do inglês FEVE fração de ejeção de ventrículo HDA hemorragia digestiva alta
AZT zidovudina dihydrofolate reductase) esquerdo HDB hemorragia digestiva baixa
BAAR bacilo álcool-ácido resistente DI diabetes insípido FiO2 fração inspirada de oxigênio HDL lipoproteína de alta densidade
BAF biópsia com agulha fina DII doença inflamatória intestinal FISH hibridização in situ por fluores- HEV vírus da hepatite E
BAG biópsia com agulha grossa DIP doença inflamatória pélvica cência (do inglês fluorescence in situ HGT hemoglicoteste
BAV bloqueio atrioventricular DIU dispositivo intrauterino hybridization) HHV herpesvírus humano
BCC bloqueadores dos canais de cálcio DM dermatomiosite (apenas no capí- FIV fertilização in vitro HIC hipertensão intracraniana
BD bilirrubina direta tulo 158) FMMR febre maculosa das montanhas HIP hemorragia intraparenquimatosa
BHE barreira hematencefálica DM diabetes melito rochosas HIV vírus da imunodeficiência humana
BK bacilo de Koch DMG diabetes melito gestacional FMO falência múltipla de órgãos (do inglês human immunodeficiency
BNP peptídeo natriurético tipo B DMO densidade mineral óssea FR frequência respiratória virus)
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO xxix
HLA antígeno leucocitário humano IV intravenosa PAC pneumonia adquirida na comu- RT-PCR reação em cadeia da polimera-
HNF heparina não fracionada IVAS infecção em vias aéreas supe- nidade se transcriptase reversa
HP hipertensão porta riores PaCO2 pressão parcial arterial de gás RVP resistência vascular pulmonar
HPV papilomavírus humano IVIG imunoglobulina intravenosa carbônico RVS resistência vascular sistêmica
HSA hemorragia subaracnóidea JNM junção neuromuscular PAD pressão arterial diastólica SAF síndrome do anticorpo antifos-
HSRC hiperplasia suprarrenal con- LBA lavado broncoalveolar PAF polineuropatia amiloidótica fami- folípideo
gênita LCS líquido cerebrospinal liar (apenas no capítulo 213) SatO2 saturação de oxigênio
HSV vírus herpes simples LDL lipoproteína de baixa densidade PAF polipose adenomatosa familial SAVC suporte avançado de vida car-
Ht hematócrito LEC líquido extracelular (apenas no capítulo 215) diovascular
HTG hipertrigliceridemia LEMP leucoencefalopatia multifocal PAF punção com agulha fina (apenas SBG síndrome de Guillain-Barré
HTLV-1 vírus da leucemia de células T progressiva no capítulo 198) SBV suporte básico de vida
humanas tipo 1 LES lúpus eritematoso sistêmico PAM pressão arterial média SC subcutâneo
HVE hipertrofia de ventrículo esquerdo lg imunoglobulina PaO2 pressão parcial arterial de oxi- SCA síndrome coronariana aguda
IAH índice de apneia/hipopneia gênio SDHEA sulfato de desidroepiandros-
LGV linfogranuloma venéreo
IAM infarto agudo do miocárdio PAS pressão arterial sistólica terona
LH hormônio luteinizante
IAO insuficiência aórtica PAVM pneumonia associada à ventila- SDRA síndrome do desconforto respi-
LLA leucemia linfoide aguda
IAV isquemia aguda visceral ção mecânica ratório agudo
LLC leucemia linfoide crônica
IBP inserção baixa de placenta (apenas PBE peritonite bacteriana espontânea SF solução fisiológica
LMA leucemia mieloide aguda
no capítulo 111) PBF perfil biofísico fetal SHBG globulina ligadora de hormônio
IBPs inibidores da bomba de prótons LMC leucemia mieloide crônica
PBS peritonite bacteriana secundária sexual
IC idade cronológica (apenas nos capí- LPA leucemia promielocítica aguda
PCR reação em cadeia da polimerase SHR1 síndrome hepatorrenal tipo 1
tulos 64 e 178) LRA lesão renal aguda (do inglês polymerase chain reaction) SHU síndrome hemolítico-urêmica
IC insuficiência cardíaca LRC lesão renal crônica PCR-TR reação em cadeia da polimera- SIADH síndrome da secreção inapro-
ICC insuficiência cardíaca congestiva MAO monoaminoxidase se em tempo real priada de hormônio antidiurético
ICP intervenção coronariana percu- MAV malformação arteriovenosa PDGF fator de crescimento derivado SIRS síndrome da resposta inflamató-
tânea MCF metacarpofalângica de plaquetas ria sistêmica
IECA inibidores da enzima conversora MHC complexo de histocompatibilida- PEEP pressão positiva ao final da SLF síndrome de Li-Fraumeni
de angiotensina de principal expiração SMD síndrome mielodisplásica
IET intubação endotraqueal MMR medicamento multirresistente PESS potencial evocado somatossen- SMSI síndrome da morte súbita infantil
IFD imunofluorescência direta MNTB micobactérias não tuberculosas sitivo SMSL síndrome da morte súbita do
IFD interfalângica distal MOE musculatura ocular extrínseca PET-TC tomografia computadorizada lactente
IFI imunofluorescência indireta MPO mieloperoxidase por emissão de pósitrons SNA sistema nervoso autônomo
IFN interferon MRSA S. aureus resistente à meticilina PFC plasma fresco congelado SNC sistema nervoso central
IFP interfalângica proximal MSF metatarsofalângica PFH prova de função hepática SNG sonda nasogástrica
IG idade gestacional MTX metrotrexate PIA pressão intra-abdominal SNM síndrome neuroléptica maligna
IGF fator de crescimento insulina-símile NAATs testes de amplificação de áci- PIC pressão intracraniana SNP sistema nervoso periférico
IH insuficiência hepática dos nucleicos PIG pequeno para a idade gestacional SOP síndrome dos ovários policísticos
IHA insuficiência hepática aguda NAC N-acetilcisteína PIV pressão intravesical SPj síndrome de Peutz-Jeghers
IHF insuficiência hepática fulminante NAC neuropatia autonômica cardiovas- PL punção lombar SpO2 saturação periférica da hemoglo-
IL interleucina cular (apenas no capítulo 16) PMN polimorfonuclear bina pelo oxigênio
IM intramuscular NEM-1 neoplasia endócrina múltipla POAP pressão de oclusão da artéria SRAA sistema renina-angiotensina-
IMAOs inibidores da monoaminoxi- tipo 1 pulmonar -aldosterona
dase NF neurofibromatose PPC pressão de perfusão cerebral SS sintomas extrapiramidais
IMC índice de massa corporal NIC neoplasia intraepitelial de colo PPD derivado de proteína purificada SSj síndrome de Sjögren
IMEST infarto do miocárdio com eleva- NIV neoplasia intraepitelial de vulva PPO posição primária do olhar SUA sangramento uterino anormal
ção do segmento ST
NIVA neoplasia intraepitelial de vagina PRL prolactina SUS Sistema Único de Saúde
IMSEST infarto do miocárdio sem ele-
NMO neuromielite óptica PSA antígeno prostático específico SvcO2 saturação venosa mista central
vação do segmento ST
NMP neoplasias mieloproliferativas PTH paratormônio de oxigênio
INH isoniazida
NO óxido nítrico PTHrP peptídeo relacionado ao para- T3 tri-iodotironina
INR índice de normalização interna-
cional NOAC anticoagulante oral não antago- tormônio T4L tiroxina livre
IO intraósseo nista de vitamina K PtiO2 pressão tissular de oxigênio TA taquicardia atrial
IOT intubação orotraqueal NPO nada por via oral PV policitemia vera TAB transtorno afetivo-bipolar
IP inibidor de protease NPT nutrição parenteral total PVC pressão venosa central TAG transtorno de ansiedade gene-
IPAP pressão positiva inspiratória da NTA necrose tubular aguda RANK receptor ativador do fator ralizada
via aérea OEA otite média externa nuclear kappa TARV terapia antirretroviral
IR insuficiência renal OMA otite média aguda RCE retorno da circulação espontânea TAS transtorno de ansiedade social
IRpA insuficiência respiratória aguda OMS Organização Mundial da Saúde RCIU retardo de crescimento intrau- TAV taquicardia atrioventricular
IS incidentaloma suprarrenal (apenas OTC medicamentos de venda livre (do terino TB transtorno bipolar (apenas no capí-
no capítulo 180) inglês over the counter) RCP ressuscitação cardiopulmonar tulo 21.8)
IS insuficiência suprarrenal PA pancreatite aguda (apenas no RCU retocolite ulcerativa TB tuberculose
ISRS inibidores seletivos da recaptação capítulo 198) RHZ rifampicina-isoniazida-pirazina- TB-MMR medicamento multirresisten-
da serotonina PA pressão arterial mida te para tuberculose
ISRSN inibidores seletivos de recapta- PAAF punção aspirativa com agulha RM ressonância magnética TC tomografia computadorizada
ção de serotonina e norepinefrina fina RN recém-nascido TCC terapia cognitivo-comportamental
ITB índice tornozelo-braquial PAAG punção aspirativa com agulha R-tPA ativador do plasminogênio TCE trauma craniencefálico
ITU infecção do trato urinário grossa tecidual recombinante TCSC tecido celular subcutâneo
xxx ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
TDHA transtorno do déficit de atenção TNF fator de necrose tumoral (do in- US ultrassonografia VEGF fator de crescimento endotelial
e hiperatividade glês, tumor necrosis factor) USTV ultrassonografia transvaginal vascular
TEA transtorno de estresse agudo TnI troponina I UTI unidade de terapia intensiva VHL von Hippel-Lindau
TEP tromboembolia pulmonar TnT troponina UTIN unidade de terapia intensiva VHS velocidade de hemossedimen-
TEPT transtorno de estresse pós- TOC transtorno obsessivo-compulsivo neonatal tação
-traumático TOTG teste oral de tolerância à glicose UVA radiação ultravioleta A VLDL lipoproteína de muito baixa
TET tubo endotraqueal TP tempo de protrombina densidade
UVB radiação ultravioleta B
TEV tromboembolia venosa TPO tiroperoxidase VM ventilação mecânica
V/Q ventilação/perfusão
TFG taxa de filtração glomerular TPSV taquicardia paroxística supra- VMI ventilação mecânica invasiva
VAI via aérea inferior
TGF fator de crescimento transfor- ventricular VMNI ventilação mecânica não in-
VAS via aérea superior vasiva
mador (do inglês transforming growth TRH hormônio liberador de tirotrofina
factor) TRM trauma raquimedular VC volume corrente VNI ventilação não invasiva
TGI trato gastrintestinal TRN taquicardia por reentrada nodal VCI veia cava inferior VO via oral
TGO transaminase glutâmico-oxalética TRS terapia renal substitutiva VCS veia cava superior VPN valor preditivo negativo
TGP transaminase glutâmico-pirúvica TSH tirotrofina VD ventrículo direito VPP valor preditivo positivo
THE transplante hepático emergencial TSV taquicardia supraventricular VDRL Veneral disease research labo- VPP ventilação com pressão positiva
TIPS derivação portossistêmica TTPA tempo de tromboplastina parcial ratory VSR vírus sincicial respiratório
intra-hepática transjugular (do inglês ativada VE ventrículo esquerdo VVZ vírus da varicela-zóster
transjugular intrahepatic portosystemic TV taquicardia ventricular VEF1 volume expiratório forçado no
shunt) TVP trombose venosa profunda primeiro segundo
SUMÁRIO
NELSON SASS, JUSSARA LEIKO SATO TEBET, MARIA RITA 130 IATROGENIA 701
DE SOUZA MESQUITA
CLINEU DE MELLO ALMADA FILHO, EDUARDO CANTEIRO CRUZ
113 DISTÚRBIOS DO METABOLISMO NA GRAVIDEZ 633
131 SÍNDROME DA FRAGILIDADE 704
ROSIANE MATTAR, VICTOR HUGO SAUCEDO SANCHEZ
CLINEU DE MELLO ALMADA FILHO, JOÃO TONIOLO NETO
114 ÓBITO FETAL 637
132 CUIDADOS PALIATIVOS 707
EDWARD ARAUJO JÚNIOR, CHRISTIANE SIMIONI, DAVID PARES
MARCELO CORASSA, AECIO FLAVIO T. DE GOIS, DANIELA
115 ASSISTÊNCIA AO PARTO TRANSPÉLVICO 642 TAVARES
NIVALDO SILVA CORRÊA ROCHA, RUFINO DOMINGUEZ
LOPEZ, EDUARDO DE SOUZA
133 TRANSDISCIPLINARIDADE NO CUIDADO 716
FERNANDO ANTÔNIO CARDOSO BIGNARDI
116 CESARIANA 646
CRISTINA A. F. GUAZZELLI, SUE YAZAKI SUN 134 CUIDADOS PERIOPERATÓRIOS 720
JOSÉ EDUARDO DE AGUILAR-NASCIMENTO, ANA LAURA DE
117 ASSISTÊNCIA AO PUERPÉRIO E AO ALEITAMENTO 649 ALMEIDA DIAS, DIANA B. DOCK-NASCIMENTO, EDUARDO
SANDRA MARIA ALEXANDRE, JORGE KUHN ANTONIO CARDOSO
122 PROMOÇÃO DE SAÚDE E ENVELHECIMENTO ATIVO 668 136.3 QUELOIDE, CICATRIZES E ÚLCERAS 739
MAYSA SEABRA CENDOROGLO, CARLOS ANDRÉ FREITAS DOS BERNARDO HOCHMAN, ROBERTO RUDGE RAMOS,
SANTOS FELIPE C. ISOLDI, LYDIA MASAKO FERREIRA
138.2 CRANIOESTENOSE E FISSURAS FACIAIS RARAS 750 150.2 ANEURISMA DA AORTA ABDOMINAL E
MAX DOMINGUES PEREIRA, AUDRIEN FURLAN DE OUTRAS DOENÇAS ASSOCIADAS 846
LUCCA JOSE CARLOS COSTA BAPTISTA SILVA
139 TUMORES BENIGNOS 753 150.3 TRAUMA ARTERIAL DAS EXTREMIDADES 856
FAUSTO MIRANDA JR.
139.1 ABORDAGEM DA CIRURGIA PLÁSTICA 753
ANDREA FERNANDES DE OLIVEIRA, IVAN DUNSHEE 151 PARADA CARDIORRESPIRATÓRIA E
DE ABRANCHES OLIVEIRA SANTOS RESSUSCITAÇÃO CARDIOPULMONAR 858
139.2 ABORDAGEM DA DERMATOLOGIA 756 RITA SIMONE LOPES MOREIRA, DANIEL BORN, IRAN
GONÇALVES JUNIOR, FABRÍCIO NOGUEIRA FURTADO,
SILMARA CESTARI, SAMIRA YARAK, CAROLINA ANTONIO CARLOS CARVALHO
ATALLAH PONTES DA SILVA, SERGIO HENRIQUE
HIRATA
■■ DOENÇAS DERMATOLÓGICAS 866
■■ DOENÇAS CARDÍACAS E VASCULARES 761 152 ECZEMAS E DERMATITES 866
SILMARA CESTARI, RENATO SHINTANI HIKAWA
140 MÉTODOS DIAGNÓSTICOS 761
JAPY ANGELINI OLIVEIRA FILHO, ANA FÁTIMA SALLES, 153 DERMATOSES ERITÊMATO-DESCAMATIVAS 870
MARIO LUIZ V. CASTIGLIONI, ORLANDO CAMPOS FILHO, ADRIANA MARIA PORRO, KARIME HASSUN
GILBERTO SZARF
154 PRURIDOS E PRURIGOS 873
141 SÍNDROME CORONARIANA AGUDA 764
SILVIA MARCONDES PEREIRA, ANAMARIA DA SILVA FACINA,
ANTONIO CARLOS CARVALHO, IRAN GONÇALVES JUNIOR JULIANA MAYUMI SUMITA
144.1 TRATAMENTO CIRÚRGICO 797 158 MANIFESTAÇÕES CUTÂNEAS DAS COLAGENOSES 891
NELSON AMERICO HOSSNE JUNIOR, WALTER J. MÔNICA R. A. VASCONCELLOS, FLÁVIA N. RAVELLI
GOMES
159 ACNE E ERUPÇÕES ACNEIFORMES 895
145 MIOCARDIOPATIAS 802 EDILEIA BAGATIN, MARCO ALEXANDRE DIAS DA ROCHA
CARLOS ALEXANDRE LEMES DE OLIVEIRA, ELIANE REIKO ALVES,
DIRCEU RODRIGUES ALMEIDA, BRUNA MARIA PEREIA BORNÉO
160 INFECÇÕES CUTÂNEAS DE ORIGEM VIRAL 899
FLÁVIA MARTELLI MARZAGÃO, RENATO SHINTANI HIKAWA,
146 PERICARDITES AGUDAS 811 JANE TOMIMORI
RUI PÓVOA, MARIA TERESA NOGUEIRA BOMBIG
161 INFECÇÕES BACTERIANAS 903
147 DOENÇA VALVAR 816 SERGIO YAMADA, MEIRE BRASIL PARADA, MARIANA DIAS
BATISTA
147.1 ABORDAGEM CLÍNICA 816
VALDIR AMBROSIO MOISES 162 MICOBACTERIOSES 906
MARCOS CÉSAR FLORIANO, SOLANGE MIKI MAEDA
147.2 ABORDAGEM CIRÚRGICA 821
WALTER J. GOMES
163 MICOSES SUPERFICIAIS 910
CRISTHINE KAMAMOTO, DALVA REGINA NETO PIMENTEL,
148 ARRITMIAS CARDÍACAS 827 SÉRGIO TALARICO-FILHO
GUILHERME FENELON, CLAUDIO CIRENZA, CRISTIANO
164 MICOSES SUBCUTÂNEAS 915
DIETRICH, ANGELO AMATO V. DE PAOLA
MARCOS CÉSAR FLORIANO, MARÍLIA MARUFUJI OGAWA
149 DOENÇA VENOSA 833
165 ESCABIOSE E OUTRAS DOENÇAS PARASITÁRIAS 919
149.1 DOENÇA VENOSA CRÔNICA 833 EDILEIA BAGATIN, MAURO Y. ENOKIHARA
NEWTON DE BARROS JUNIOR
166 LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA 922
149.2 TROMBOSE VENOSA PROFUNDA 836 ANDRÉA BOMURA ROSATO, MARÍLIA MARUFUJI OGAWA
NEWTON DE BARROS JUNIOR, FAUSTO MIRANDA JR.
167 DOENÇAS SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS 926
150 DOENÇA ARTERIAL 841 OSMAR ROTTA, MAURICIO MENDONÇA DO NASCIMENTO
150.1 OBSTRUÇÃO ARTERIAL AGUDA PERIFÉRICA 841 168 DERMATOSES EM PACIENTES IMUNOCOMPROMETIDOS 932
JORGE AMORIM ADRIANA MARIA PORRO, JANE TOMIMORI, SAMIRA YARAK
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO xxxvii
169 AFECÇÕES DA CAVIDADE ORAL 935 188 DOENÇA DE PAGET, DISPLASIA FIBROSA ÓSSEA E
CLEONICE HITOMI WATASHI HIRATA, DALVA REGINA NETO OSTEOESCLEROSES 1009
PIMENTEL ELIZABETE RIBEIRO BARROS, TERESA CRISTINA PISCITELLI
BONANSÉA, JOSÉ GILBERTO HENRIQUES VIEIRA, MARISE
170 DERMATOSES DO COURO CABELUDO 939
LAZARETTI-CASTRO
FLAVIA STERNBERG, ENILDE BORGES COSTA
189 DEFICIÊNCIA DE VITAMINA D, RAQUITISMO E
171 MANIFESTAÇÕES CUTÂNEAS DE DOENÇAS OSTEOMALÁCIA 1013
SISTÊMICAS 942
CYNTHIA M. A. BRANDÃO, ÂNGELA CRISTINA GOMES
SERGIO HENRIQUE HIRATA, PRISCILA ISHIOKA, FERNANDO BORGES LEAL
AUGUSTO DE ALMEIDA
190 FEOCROMOCITOMAS E PARAGANGLIOMAS 1016
172 URTICÁRIA 945
REGINA DO CARMO SILVA, CLAUDIO E. KATER
PATRICIA KARLA DE SOUZA, OSMAR ROTTA
211.1 HEPATITES AGUDAS POR VÍRUS 1122 220.1 INDICAÇÃO CLÍNICA DE HEMOCOMPONENTES 1191
CELSO F. H. GRANATO, MARIA LUCIA G. FERRAZ, JOSÉ ORLANDO BORDIN, TSUTOMU OGURO
ANTONIO EDUARDO BENEDITO SILVA
220.2 REAÇÕES TRANSFUSIONAIS 1195
211.2 HEPATITE CRÔNICA PELO VÍRUS B 1124 MELCA M. O. BARROS, JOSÉ ORLANDO BORDIN
ANTONIO EDUARDO BENEDITO SILVA, IVONETE S. S.
SILVA, MARIA LUCIA G. FERRAZ ■■ DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS 1199
211.3 HEPATITE CRÔNICA PELO VÍRUS C 1128
221 SEPSE 1199
MARIA LUCIA G. FERRAZ, ANTONIO EDUARDO
OTELO RIGATO JR., REINALDO SALOMÃO
BENEDITO SILVA, PAULO ROBERTO ABRÃO FERREIRA
222 INFECÇÕES POR ESTREPTOCOCOS E
211.4 COINFECÇÃO HBV-HIV 1132
ESTAFILOCOCOS 1203
PAULO ROBERTO ABRÃO FERREIRA, ADAUTO
LUCI CORRÊA, ANTONIO PIGNATARI
CASTELO FILHO, CELSO F. H. GRANATO, PAULA
TUMA, HENRIQUE POTT JUNIOR 223 MENINGITE BACTERIANA AGUDA 1212
212 LESÕES HEPÁTICAS INDUZIDAS POR FÁRMACOS 1136 SANDRO LUIZ A. MATAS, REINALDO TEIXEIRA RIBEIRO
ROBERTO JOSÉ DE CARVALHO FILHO 224 MENINGITE CRÔNICA 1215
213 TRANSPLANTE HEPÁTICO 1142 SANDRO LUIZ A. MATAS, DANIEL WAGNER SANTOS,
REINALDO TEIXEIRA RIBEIRO
ANA CRISTINA DE CASTRO AMARAL, MARIO KONDO
225 INFECÇÕES POR ANAERÓBIOS 1223
214 PARASITOSES INTESTINAIS 1146
CLAUDIA TERESA CARVENTE, CARLOS FISCHER DE TOLEDO 225.1 DIARREIA CAUSADA POR CLOSTRIDIUM
DIFFICILE (COLITE PSEUDOMEMBRANOSA) 1223
215 TUMORES BENIGNOS DO FÍGADO, DO PÂNCREAS JULIANA OLIVEIRA DA SILVA
E DO TRATO GASTRINTESTINAL 1153
ERMELINDO DELLA LIBERA JR., IVONETE S. S. SILVA, 225.2 TÉTANO 1225
LUCIANO LENZ, RENATO DUFFLES MARTINS EDUARDO ALEXANDRINO SERVOLO DE MEDEIROS
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO xxxix
247 EPILEPSIAS E ESTADO DE MAL EPILÉPTICO 1378 261 TRAUMAS OCULARES 1453
ELZA MÁRCIA TARGAS YACUBIAN DENISE DE FREITAS, ELISABETH NOGUEIRA MARTINS
■■ DOENÇAS PULMONARES E DE VIAS AÉREAS 1661 330 LESÃO RENAL AGUDA 1745
MARCELINO DE SOUZA DURÃO JUNIOR, MIRIAN A. BOIM,
311 DISPNEIA 1661 OSCAR PAVÃO, NESTOR SCHOR
CARLOS ALBERTO DE CASTRO PEREIRA
331 LITÍASE RENAL: DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 1748
312 TOSSE 1664 ITA PFEFERMAN HEILBERG, NESTOR SCHOR
CIRO KIRCHENCHTEJN, MEYER IZBICKI
332 INTRODUÇÃO ÀS DOENÇAS GLOMERULARES 1751
313 NÓDULO PULMONAR SOLITÁRIO 1668 GIANNA MASTROIANNI KIRSZTAJN
LUIZ EDUARDO VILLAÇA LEÃO, EDUARDO IWANAGA LEÃO
333 INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO:
314 ESTENOSE TRAQUEAL 1671 FISIOPATOLOGIA E TRATAMENTO 1754
LUIZ HIROTOSHI OTA NESTOR SCHOR, ITA PFEFERMAN HEILBERG
315 CORPOS ESTRANHOS 1674 334 SÍNDROME NEFRÍTICA E GLOMERULONEFRITE
LUIZ HIROTOSHI OTA RAPIDAMENTE PROGRESSIVA 1758
316 DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA 1677 GIANNA MASTROIANNI KIRSZTAJN
350 DOENÇA DE BEHÇET 1840 365 CÂNCER DO OLHO E DOS ANEXOS OCULARES 1910
SANDRO FÉLIX PERAZZIO, ALEXANDRE WAGNER SILVA DE CLÉLIA MARIA ERWENNE, LUIZ FERNANDO TEIXEIRA
SOUZA, EMILIA INOUE SATO
366 CÂNCER DE TIROIDE 1914
351 SÍNDROME ANTIFOSFOLÍPIDE 1844 RUI M. B. MACIEL
ALEXANDRE WAGNER SILVA DE SOUZA, EMILIA INOUE SATO
367 CÂNCER DE PULMÃO 1919
352 REABILITAÇÃO 1847 ILKA LOPES SANTORO, SERGIO JAMNIK, JOÃO ALÉSSIO
ANAMARIA JONES, FABIO JENNINGS, JAMIL NATOUR JULIANO PERFEITO
FABIO ROBERTO KATER, REYNALDO JESUS-GARCIA 402 TUMORES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL 2083
388 TUMORES ÓSSEOS 2000 SERGIO CAVALHEIRO, NASJLA SABA DA SILVA,
ANDREA MARIA CAPPELLANO
REYNALDO JESUS-GARCIA, ANTONIO SERGIO PETRILLI
403 TUMORES ABDOMINAIS 2085
389 MIELOMA MÚLTIPLO 2006
ELIANA M. M. CARAN, MONICA CYPRIANO
WALTER MOISÉS TOBIAS BRAGA, GISELE COLLEONI
404 TUMORES ÓSSEOS 2089
390 LINFOMA DE HODGKIN 2012
ANTONIO SERGIO PETRILLI, CARLA RENATA P. DONATO
OTAVIO CESAR BAIOCCHI, ADRIANA MARQUES DAMASCO PENNA MACEDO
391 LINFOMAS NÃO HODGKIN 2016 405 TUMORES DE PARTES MOLES 2092
RIGUEL JUN INAOKA, GISELE COLLEONI ELIANA M. M. CARAN
392 CÂNCER DAS VIAS AERODIGESTIVAS SUPERIORES 2021 406 TUMORES DE CÉLULAS GERMINATIVAS 2094
FERNANDO DANELON LEONHARDT, ONIVALDO CERVANTES CARLA RENATA P. DONATO MACEDO
393 DOENÇAS MIELOPROLIFERATIVAS 2024 407 CARCINOMA DO CÓRTEX DA GLÂNDULA
393.1 LEUCEMIA MIELOIDE AGUDA 2024 SUPRARRENAL 2098
MARIA DE LOURDES CHAUFFAILLE, LUÍS ARTHUR ELIANA M. M. CARAN, SIMONE DE CAMPOS VIEIRA ABIB,
FLORES PELLOSO SÉRGIO T. SCHETTINI
todos eles. Por exemplo, uso de anti-hipertensivos com hipoglicemiantes to livre esclarecido, assegurando que compreende integralmente o
ou com anticoagulantes ou com redutores de lipídeos, etc. seu teor e tenha a liberdade de optar ou não em participar dela.
Todas as informações sobre o produto, desde a etapa não clínica até
a fase III, irão servir de base para a bula do medicamento que passará
a ser o seu documento oficial. À medida que novos estudos venham a ATENÇÃO!
ser desenvolvidos e novos conhecimentos surjam, a bula passará a ser
Todos os potenciais risco/benefícios devem ser amplamente dis-
atualizada periodicamente.
cutidos.
Fase IV
objetivo: expandir e confirmar segurança e eficácia O foco de toda pesquisa clínica é o sujeito da pesquisa, ou seja, o
considerar as necessidades para expansão do mercado (compara- voluntário ou paciente não pode ser considerado o objeto da in-
ção com líderes de mercado, investigar subpopulações) vestigação, mas o sujeito dela. Outro ponto a ser destacado é que,
novas indicações/formulações embora os padrões de pesquisa sejam os mesmo mundialmente,
As pesquisas da fase IV são realizadas após a comercialização do os cuidados médicos não são similares – daí a necessidade de uma
produto e visam, basicamente, a expandir o mercado, do ponto de vis- adaptação à nossa realidade.
ta comercial. Também são estudadas nesta fase a vigilância pós-comer- Fundamental é saber que as metas da pesquisa são sempre secun-
cialização e a detecção de novos eventos adversos e/ou confirmação da dárias ao bem-estar do sujeito da pesquisa.
frequência de surgimento dos já conhecidos. A pesquisa clínica é importante para conhecer melhor e precoce-
mente o produto, conhecer a resposta em diferentes etnias e apri-
morar o desenvolvimento científico. Seu desenvolvimento dentro
ATENÇÃO!
de uma metodologia adequada permitirá diferenciar a vivência de
Novas indicações, novos métodos de administração e estudos de asso- casos clínicos com a experimentação clínica.
ciação medicamentosa são feitos na fase IV. Nos dias atuais, há uma premência em desenvolver novos medica-
mentos e que sejam incorporados à prática clínica o mais rápido
possível (antes, esse tempo era em torno de 15 anos, e hoje, por
FASE CLÍNICA PARA PRODUTOS ONCOLÓGICOS volta de 7). As razões são econômicas e científicas, o que pode ser
exemplificado pela busca desesperada de medicamentos eficazes
O desenvolvimento de produtos oncológicos é igual na fase não clínica e
para a Aids, quando houve um encurtamento do tempo de desen-
diferente na clínica, sendo também dividida por fases:
volvimento clínico do AZT.
A fase I tem por objetivo definir a relação toxidade/dose e de-
A pesquisa clínica deve seguir metodologia estatística adequada
terminar a dose máxima tolerada. Os estudos não são feitos com
para que as informações obtidas sejam validadas e possam gerar
voluntários sadios e com pacientes previamente tratados, sem res-
evidências médicas.
posta terapêutica e naqueles sem outro tratamento efetivo a ser
Todos esses critérios devem ser seguidos para que se possa desenvol-
realizado. São incluídos pacientes com qualquer tipo histológico
ver adequadamente um novo produto farmacêutico.
de tumor desde que tenham funções renal e hepática satisfatórias.
A fase II objetiva identificar os tipos de tumor nos quais o trata-
mento pareça promissor. Também é conduzida em pacientes pré- REVISÃO
-tratados, exceto quando não existe tratamento conhecido que
prolongue a vida, por exemplo, câncer de pâncreas. O desenvolvimento clínico é a etapa final de um processo que dura
A fase III objetiva determinar a eficácia e segurança comparativa- cerca de 10 anos partindo-se de 10.000 moléculas até se atingir 1-2
mente em relação à história natural da doença e ao tratamento- produtos comercializáveis.
-padrão (maior eficácia ou eficácia similar associada a menor mor- A comercialização de um medicamento não encerra, por si só, todo
bidade). o processo, pois, como se verá no capítulo sobre Segurança dos
A fase IV, quando realizada, visa à expansão de mercado, do pon- Medicamentos e Farmacovigilância, à medida que aumenta a ex-
to de vista comercial. periência clínica, novos dados são acrescentados ao perfil daquele
produto – expandindo ou reduzindo indicações, posologia, doses,
interações medicamentosas e reações adversas.
■■ NORMATIZAÇÃO DOS ESTUDOS CLÍNICOS
O desenvolvimento de um estudo clínico deverá ser feito dentro de
maior rigor ético, científico e legal. ■■ LEITURAS SUGERIDAS
Existem normas internacionais que norteiam estas pesquisas: os Edwards LD, Fox AW, Stonier PD, editors. Principles and practice of
manuais de boas práticas clínica, a conferência internacional de pharmaceutical medicine. 3rd ed. Oxford: Blackwell; 2011.
harmonização e a declaração de Helsinki (e suas emendas). Além Graff S. Vigilância pós-comercialização: aprendendo a atender o consumidor com
dessas, a legislação própria de cada País deverá ser respeitada in- reação adversa. São Paulo: Scortecci; 2012.
Hulley SB, Cummings SR, Browner WS, Grady DG. Delineando a pesquisa clínica.
tegralmente: no Brasil, por exemplo, nenhuma pesquisa com seres
4. ed. Porto Alegre: Artmed; 2015.
humanos poderá ser iniciada sem aprovação do Comitê de Ética
Massud Filho J, organizador. Medicina farmacêutica: conceitos e aplicações.
em Pesquisa (CEP) da instituição, eventualmente, da Comissão Porto Alegre: Artmed; 2016.
Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) e da Agência Nacional de Moretto LD, Mastelaro R. Boas práticas de farmacovigilância. São Paulo:
Vigilância Sanitária (Anvisa). Sindusfarma; 2010.
Também é importante ressaltar que, antes de participar de uma pes- Robertson D, Williams GH. Clinical and translational science: principles of human
quisa, o voluntário ou paciente deve assinar o termo de consentimen- research. London: Elsevier; 2009.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 5
50% do efeito máximo, ou dose que produz o efeito desejado – end point – gresso científico na área mostrou que muitas proteínas estruturais, de am-
em 50% da população) e a obtenção da DE10 ou da DE95. pla distribuição e de importância funcional (enzimas intra e extracelulares,
canais iônicos, transportadores iônicos ou moleculares), podem ser alvos
(“receptores”) da ação de xenobióticos. Além de ampliar o conceito inicial
ATENÇÃO! de “receptor farmacológico”, mostrou-se também que a interação intermo-
lecular desses alvos com xenobióticos não é exclusivamente “ortostérica”
A adequação do modelo matemático à realidade depende da quali-
(no sítio de interação de ligantes fisiológicos) e que interações “alostéricas”
dade e da representatividade dos dados obtidos experimentalmente.
(na sua estrutura terciária ou quaternária) podem modular não competiti-
É preocupante pensar que essa seja uma causa comum do insucesso
vamente a fisiologia celular, originando efeitos de intensidade e cinética
atual da pesquisa translacional.
diferentes daqueles originados da transdução fisiológica “normal”. Dessa
forma, entende-se por que a seletividade da ação de alguns xenobióticos
é pequena, com efeitos colaterais frequentes e inevitáveis. As interações
alostéricas permitiram também antever a possibilidade de novas, múltiplas
■■ MECANISMO DE AÇÃO
e promissoras interferências moduladoras da atividade celular patológica,
O mecanismo de ação de um novo medicamento pode ser determinado interações talvez desejáveis, mas ainda hoje pouco conhecidas.
comparativamente a mediadores naturais ou a protótipos reconhecidos. Pode-se generalizar que, na terapêutica atual: 1) é essencial entender
É esperado, por exemplo, que agonistas de um mesmo sistema receptor o mecanismo de ação molecular dos xenobióticos na ação corretiva e no
apresentem potências relativas constantes em qualquer modelo biológico, resgate de pacientes hiper-reativos; 2) as interações moleculares podem
e que seus efeitos sejam inibidos de forma proporcional na presença de ser muitas, extra ou intracelulares, seletivas e competitivas, ou alostéricas
antagonistas competitivos. Para isso, é necessário medir a interação do e não competitivas; 3) as relações quantitativas dessas interações com os
novo composto com seus alvos proteicos. Essa interação molecular é evi- efeitos desencadeados devem ser consideradas na avaliação da eficiência
denciada em curvas dose-efeito, como dito. terapêutica; 4) a pesquisa translacional da ação de medicamentos precisa
A curva dose-resposta que descreve o efeito de um medicamento de marcadores que identifiquem precocemente essas interações.
permite muitas inferências quanto ao mecanismo de ação, por exemplo:
Indica a dose limiar (Dmin) e a dose que produz o efeito máximo
(Dmax); doses menores que a limiar são ineficazes e doses maiores ■■ ESTUDOS PRÉ-CLÍNICOS DE NOVOS MEDICAMENTOS
que a “máxima” não aumentam o efeito primário, mas podem de- Os estudos pré-clínicos de medicamentos, também chamados de “estudos
sencadear efeitos colaterais tóxicos. não humanos” porque são realizados em animais de laboratório, devem
A inclinação da curva dose-resposta – proporcionalidade da res- responder às seguintes questões:
posta em razão da dose – indica a segurança do fármaco frente à 1 | As ações do novo composto são úteis, definidas, reprodutíveis e rela-
janela terapêutica: quanto maior a inclinação, menor a possibilida- cionadas à dose?
de de escalonamento da dose e menor a segurança terapêutica. 2 | As ações são as mesmas em diferentes espécies? Existe espécie mais
No caso oposto, deve-se lembrar que a linearidade da curva dose- sensível?
-efeito é uma função logarítmica e que pequenas variações da dose 3 | A ação é específica ou existem efeitos colaterais importantes?
podem não refletir variação significativa do efeito terapêutico. 4 | O mecanismo de ação é único e desejável ou existem várias ações com
A curva dose-efeito permite calcular a potência relativa (afinidade) mecanismos diferentes?
de agonistas de um mesmo grupo terapêutico e a identificação de 5 | Existem efeitos tóxicos em órgãos específicos após tratamento pro-
“agonistas parciais” (com eficácia intrínseca baixa), que não con- longado?
seguem produzir grandes efeitos com o incremento da dose, mas 6 | Existe possibilidade de comprometimento de sistemas fisiológicos vitais?
que ocupam os receptores e podem exacerbar os efeitos colaterais. 7 | Qual é o IT em roedores e cães?
Do exposto, depreende-se que a obtenção de curvas dose-efeito das 8 | É seguro administrar o produto a seres humanos? Qual a dose equivalente?
ações primárias e secundárias de um novo composto é o objetivo primordial A finalidade dos estudos farmacodinâmicos e toxicológicos pré-clínicos
dos estudos farmacodinâmicos. Ao estabelecer a relação quantitativa entre é avaliar a relação risco/benefício de novos medicamentos. De modo geral,
as doses e as respostas clínicas, considerando a variação individual e a sele- os protocolos são eficientes, extensos e muito ligados a questões éticas, mas
tividade da ação, as curvas dose-efeito fornecem ao médico as bases cientí- aplicam-se indistintamente a xenobióticos naturais e aos análogos sintéticos.
ficas que permitem o controle da eficiência terapêutica. No entanto, as cur- É raro um novo composto chegar aos laboratórios de farmacologia
vas dose-efeito não explicam os mecanismos das ações dos medicamentos. sem indicação de atividade: análogos obtidos por síntese orientada vêm
As evidências científicas mostram que o efeito terapêutico e a ativi- precedidos do efeito do protótipo; e compostos naturais são conhecidos
dade tóxica resultam da interação entre o fármaco e as macromoléculas por seu uso popular. Nenhuma dessas informações, no entanto, elimina o
celulares (receptores); ao serem ativados, os receptores iniciam alterações rastreamento farmacológico sistemático estruturado nos ensaios farma-
biofísicas de membrana e reações bioquímicas intracelulares em cadeia codinâmicos, farmacocinéticos e toxicológicos em animais de laboratório.
(segundos-mensageiros e cascata de eventos intracelulares) que exacer-
bam ou inibem as funções celulares. Todas essas etapas intermediárias ex- ESTUDOS FARMACODINÂMICOS E FARMACOCINÉTICOS
põem “alvos” para interação com xenobióticos. A distribuição desses alvos Avaliam as propriedades do novo fármaco, suas características de absor-
e a intensidade da interação com os fármacos estabelecem a seletividade ção, distribuição, metabolismo e excreção, a interação com os alvos celu-
e as relações quantitativas características do efeito farmacológico, isto é, lares e o mecanismo de ação. Modelos apropriados permitem estabelecer
definem o mecanismo da ação farmacológica. a relação dose-efeito e identificar a dose eficaz mediana e a dose máxima
O conceito de “receptor farmacológico”, responsável pela ação de tolerada sem comprometimento do estado geral dos animais.
xenobióticos, permeou a evolução da farmacologia e da terapêutica, muito Nessa fase do estudo, ratos, camundongos, cobaias, hamsters,
antes do isolamento e da identificação molecular do primeiro deles. O pro- coelhos, cães e, às vezes, primatas não humanos são os animais mais uti-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 7
lizados. Durante a evolução biológica, cada uma dessas espécies adaptou co passa por múltiplos processos de equilíbrio dinâmico (metabolização,
funções orgânicas e respostas fisiológicas integradas (comportamentos) excreção e fixação em tecidos inertes) até interagir com os receptores na
para garantir a sobrevida. Essas adaptações espécie-específicas fazem biofase, inicialmente em concentrações crescentes a um máximo (Cmáx)
com que os animais respondam com intensidades diferentes à ação de seguidas de decaimento progressivo proporcional à velocidade de meta-
paradigmas terapêuticos; essas respostas caracterizam as espécies mais bolismo e excreção. A Cmáx e o tempo para sua obtenção (Tmáx) indicam
sensíveis e indicam as mais adequadas a um determinado modelo farma- a biodisponibilidade do fármaco relativamente à dose administrada. Por-
cológico. tanto, entende-se por biodisponibilidade a velocidade e a intensidade com
que uma substância é absorvida de uma formulação farmacêutica e se
Estudos farmacodinâmicos torna disponível na corrente sanguínea.
Medicamentos modificam funções, portanto não é esperado que a reação Na prática, a determinação da biodisponibilidade pode identificar a
humana consolidada seja igual à dos animais de laboratório. A experimen- melhor via de administração – comparativamente à concentração plasmá-
tação inovadora direta na espécie humana é antiética. Admite-se o estudo tica obtida após injeção endovenosa (biodisponibilidade absoluta) – ou a
em voluntários na comprovação de efeitos detectados na experimentação melhor formulação farmacêutica administrada por uma mesma via (bio-
animal (prova de conceito) apenas quando eles forem considerados segu- disponibilidade relativa ou bioequivalência). Permite, também, controlar
ros por uma comissão de ética independente. Depreende-se que utilizar as doses dentro da janela terapêutica sem o risco de ações tóxicas por
modelos inadequados – espécies não responsivas, ou animais de má qua- excesso de fármaco.
lidade – levará à extrapolação (translação) errônea dos efeitos ao homem
e, também, fica claro que nem todos os efeitos observados em animais de
laboratório podem ser extrapolados ao homem. É, portanto, imprescindí- QUADRO 2.1 ■ Parâmetros farmacocinéticos relativos a diferentes
vel comprovar a ação farmacológica de novos medicamentos na espécie etapas
humana (ensaios clínicos) antes da generalização do uso em comunidades
numerosas. ETAPAS PARÂMETROS
De modo geral, e pelas razões apresentadas, não é fácil determinar Absorção Constante de absorção Biodisponibilidade
o mecanismo de ação de um medicamento em organismos íntegros. No
entanto, a interação de fármacos com os alvos moleculares e a transdução Distribuição Volume aparente de Fração livre
para os efeitos celulares são comuns a várias espécies, fazendo com que distribuição*
muitas respostas farmacológicas sejam comparáveis, principalmente se
Eliminação Velocidade de eliminação Clearance*
não dependem da integralização da resposta. Em outras palavras, estu-
dos in vitro com órgãos isolados, células ou subestruturas celulares, são Constante de eliminação Meia-vida biológica
necessários para caracterizar a interação molecular e identificar os alvos
*Parâmetros primários.
da ação do medicamento. Nesse contexto, determinar de forma experi-
mental o mecanismo de ação molecular de medicamentos tem alto valor
agregado, porque permite a sua correção (resgate terapêutico) cientifica- Além das propriedades químicas da molécula, a farmacocinética do
mente fundamentada. medicamento depende de fatores inerentes aos pacientes: disfunções re-
nais e hepáticas, enfermidades hemodinâmicas, fatores genéticos e idade
Estudos farmacocinéticos podem alterar a farmacocinética. Na maioria dos casos de intoxicação
A farmacocinética determina quantitativamente os parâmetros que defi- leve, o ajuste empírico das doses terapêuticas com auxílio de tabelas cor-
nem as propriedades das vias de absorção de um medicamento, a inten- retivas (de fácil acesso) pode ser suficiente, mas doentes graves que fazem
sidade de sua passagem pelas barreiras biológicas (biodisponibilidade), a uso de medicamentos com baixo IT talvez precisem de monitoramento
forma de distribuição do medicamento através da corrente sanguínea, as plasmático para ajustes mais precisos e rápidos das doses.
reações químicas metabólicas que os preparam para sua eliminação e a
intensidade da excreção dos produtos ao longo do tempo (Quadro 2.1). A
farmacocinética humana é muito variável, com diferenças individuais tão ATENÇÃO!
grandes quanto as diferenças determinadas entre humanos e cães.
Na criança e no idoso, os parâmetros farmacocinéticos são fundamen-
A farmacocinética utiliza fórmulas para descrever matematicamente a
talmente diferentes do adulto. Nessas fases da vida, as intoxicações
inter-relação dinâmica dos diferentes processos que controlam o decurso
iatrogênicas são frequentes.
temporal de um xenobiótico no organismo e permite cálculos que estimam
o início, a intensidade e a duração da ação farmacológica. A farmacociné-
tica depende da estrutura química do xenobiótico e das condições fisioló- Em idosos, a massa hepática é menor e a capacidade metabólica do
gicas do paciente/animal de experimentação. sistema enzimático microssomal hepático (CYP450) pode estar reduzida
Esses estudos devem preceder os testes de segurança realizados em em 30% ou mais. A função renal, progressivamente mais deficiente no
animais não anestesiados e em voluntários sadios na fase I dos ensaios envelhecimento, favorece o aumento da vida média dos medicamentos
clínicos. Como já discutido, o efeito farmacológico é proporcional à con- não metabolizados no fígado. Em consequência, como em idosos a barrei-
centração do medicamento na biofase, e esta é altamente proporcional à ra hematencefálica é mais permeável aos fármacos, sinais de sonolência,
concentração plasmática do medicamento não ligado a proteínas. Nesses alterações do equilíbrio e alterações do comportamento e da cognição po-
dois momentos, o IT será redefinido em condições vantajosas, que permi- dem ser induzidos pelo excesso de medicação.
tem a integralização das respostas à ação farmacológica. Os estudos de farmacocinética em pediatria não são numerosos nem
Nos estudos in vitro, é possível manter constante a concentração do abrangentes. Os ensaios clínicos em pediatria foram recomendados nas
fármaco na biofase durante toda a análise das interações moleculares e Conferências Internacionais de Harmonização2 para darem suporte a for-
dos efeitos farmacodinâmicos. Administrado in vivo, no entanto, o fárma- mulações de uso exclusivo em crianças e para determinarem com parâme-
8 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
tros farmacocinéticos a dosagem que dê exposição sistêmica aproximada 10% ao longo do tratamento subagudo, e a dose mais baixa deve ser pró-
à eficaz e segura em adultos. Sabe-se que em neonatos e em crianças xima da dose eficaz média, a qual não deve produzir sinais de toxicidade.
de tenra idade, a farmacocinética pode estar alterada por muitos fatores, A legislação brasileira considera que a duração dos testes de toxicida-
realçando-se entre eles: elevada proporção da água corpórea e existência de deve guardar relação direta com a intenção de uso na espécie humana:
de proteínas plasmáticas qualitativamente diferentes; vias de administra- se em dose única, ou parcelada em 24 horas, a administração experimen-
ção desproporcionais à massa corpórea; mucosa gastrintestinal imatura; tal intermitente deverá ser de, no mínimo, 14 dias; se o tratamento hu-
flora bacteriana em formação; secreção, motilidade e comprimento intes- mano é previsto entre 14 dias e 6 meses de duração, os animais devem
tinal reduzidos. Também nessa idade, o sistema enzimático microssomal ser tratados ininterruptamente por período equivalente ao esperado do
hepático (CYP450) está parcialmente desenvolvido e o metabolismo de ensaio clínico. Tratamentos acima de seis meses devem ser precedidos de
medicamentos é insuficiente. Os estudos farmacocinéticos em pediatria testes pré-clínicos com duração de seis meses em roedores e nove meses
são ainda mais importantes e complexos, porque todos os parâmetros ci- em espécie não roedora.4 Protocolos antigos dividiam os testes pré-clíni-
néticos podem estar alterados em crianças enfermas de qualquer idade. cos com doses repetidas de acordo com essa duração em testes subagu-
dos (menos de 30 dias de tratamento); testes subcrônicos (mínimo de 30
ESTUDOS TOXICOLÓGICOS dias); ou testes crônicos (mínimo de 90 dias).
A toxicologia pré-clínica serve para indicar o grau de confiança a ser depo- No estudo de toxicidade aguda, os animais são tratados uma única
sitado em um medicamento que será administrado na espécie humana. Os vez em 24 horas. A avaliação dos resultados imediatamente após esse
protocolos existentes permitem boa avaliação da toxicidade potencial após período permitirá conhecer a espécie mais sensível e o índice de letalida-
exposição a doses excessivas do produto administrado acidentalmente, ou de; a causa da morte produzida pelo excesso do produto e os órgãos-alvo;
acumulado por um desequilíbrio entre a administração e a eliminação do as alterações comportamentais e os sinais que precedem a morte; e as
fármaco. Nos seus primórdios, o protocolo experimental de toxicologia prio- alterações hematológicas, da bioquímica plasmática e urinária. O exame
rizou alterações orgânicas definitivas (toxicologia orgânica clássica), acom- histopatológico indicará as lesões dos órgãos-alvo. A manutenção por 7 e
panhadas ou não de alterações enzimáticas e funcionais. Com o avanço tec- 14 dias de alguns desses animais tratados agudamente permitirá também
nológico que permitiu registrar distúrbios funcionais precoces, nem sempre verificar os efeitos tardios do tratamento e sua recuperação eventual. O
acompanhados de alterações orgânicas detectáveis, o estudo toxicológico teste agudo é obrigatório para todas as substâncias, independentemente
de medicamentos incorporou a análise de funções vitais (segurança farma- do tempo de uso proposto para a espécie humana, pois evidencia o ris-
cológica) relativas ao tempo e à intensidade de exposição aos fármacos. co de intoxicações agudas, inadvertidas ou não, e a forma de prevenção.
Além disso, os resultados obtidos dão suporte à escolha das doses para os
Toxicologia orgânica clássica demais testes de toxicidade.
A maioria das diferenças na toxicidade orgânica de xenobióticos entre as Nos estudos de toxicidade com doses repetidas por longo prazo, o
espécies de laboratório parece consequente de uma farmacocinética dis- produto em teste é administrado em intervalos regulares durante períodos
tinta, e não propriamente de diferenças qualitativas de reatividade. Por variáveis, de 14 dias a 9 meses. A finalidade desses testes com múltiplas
essa razão, estudos toxicológicos em espécies com processos metabólicos doses é descobrir ações qualitativa ou quantitativamente diferentes, pro-
e farmacocinéticos semelhantes aos da espécie humana, como cães e por- duzidas pelo maior tempo de exposição ao produto, permitindo também
cos, devem fazer parte do protocolo experimental para avaliar a segurança medir a latência para a instalação dos efeitos tóxicos e o acúmulo da subs-
de novos medicamentos. tância no organismo. Uma vez comprovada a relação entre doses e efeitos
Nos testes de toxicidade, as espécies mais utilizadas são camundon- tóxicos, é possível determinar a maior dose que não produz efeito tóxico
gos e ratos, machos e fêmeas, de linhagens heterogâmicas bem definidas detectável (NOAEL, do inglês no observed adverse effect level), parâmetro
e de características fisiológicas conhecidas. Das espécies não roedoras, o importante na avaliação da margem de segurança do fármaco e no qual
cão e o porco são preferidos pelo cabedal de conhecimento acumulado se baseia o cálculo da dose inicial a ser empregada nos testes clínicos
para as duas espécies e também pela semelhança com o metabolismo hu- (primeira vez no homem).
mano. Primatas não humanos são reservados para estudos complementa- Com esse protocolo, foi possível mostrar, ao longo dos anos, uma con-
res especiais, em geral envolvendo reações imunológicas. cordância de 43% entre os sinais de toxicidade detectados em roedores e
O número de animais em cada teste deve ser suficiente para garantir a toxicidade eventualmente detectada na espécie humana. Mais ainda,
a significância estatística dos resultados, mas sem exageros que infrinjam mostrou-se que a probabilidade de prever toxicidade aumenta para 71%
os Princípios Éticos da Experimentação Animal.3 A forma mais segura quando o protocolo considera também os testes em cães da raça Beagle.5
tem sido realizar testes sequenciais de valor preditivo cumulativo e pro- Alguns estudos de toxicidade de longo prazo têm características espe-
gressivo, ou seja, os testes crônicos utilizam informações dos testes suba- ciais e são considerados estudos complementares à parte: embriofetoto-
gudos que o precederam, e estes, dos testes agudos. Com a informação xicidade, fertilidade e capacidade reprodutiva, carcinogenicidade e muta-
acumulada, é possível prever o número de animais tratados e compensar genicidade. Esses testes têm variações inter e intraespecíficas importantes
os eventuais mortos, para que não prejudiquem os resultados e invalidem e, de modo geral, não guardam relação experimental estrita com a dose,
toda a experiência. Enfim, somente a qualidade da equipe executora e por isso, não permitem extrapolação de mesmo nível para a espécie hu-
dos animais de experimentação, a modernidade dos laboratórios e o rigor mana que os testes farmacodinâmicos. Por segurança, os compostos que
científico do protocolo experimental podem garantir inequivocamente que apresentam essas atividades tóxicas em animais de laboratório têm seu
os efeitos obtidos são devidos ao tratamento (relação causa-efeito). uso restrito àquelas patologias especiais, que não contam com alternativa
Em geral, grupos experimentais formados por ratos ou camundongos e terapêutica.
por cães ou porcos, machos e fêmeas, são tratados com o veículo, ou com 3 A talidomida, introduzida no início da década de 1960, demonstrou
a 4 doses do produto a ser testado. As doses devem ser escolhidas a partir tragicamente a possibilidade de fármacos interferirem com a embriofe-
da dose eficaz média estabelecida nos testes farmacodinâmicos e espaça- togênese; condenada mundialmente para uso em gestantes, o fármaco é
das geometricamente. Nos testes crônicos, a maior dose deve ser aquela preconizado para o tratamento da hanseníase. Ainda, deve ser salientado
que produziu sinais evidentes de toxicidade com letalidade menor do que que resultados experimentais negativos obtidos nesses testes complemen-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 9
ca, devido a polimorfismos do gene RyR1, que codifica o receptor de riano- ■■ FGx E INDIVIDUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
dina, uma proteína do retículo sarcoplasmático reguladora da concentração O objetivo primordial da FGx é promover a prescrição de medicamentos e
de cálcio intracelular; e ii) exposição a medicamentos, como a succinilcolina, de doses segundo as características individuais dos pacientes, com ênfase
que interagem com o receptor de rianodina e promovem a liberação do cál- especial na individualidade genética. Esse objetivo abrange variantes ger-
cio acumulado no retículo sarcoplasmático. O aumento da concentração de minativas, que afetam todas as células do organismo, bem como variantes
cálcio livre no citoplasma desencadeia a síndrome de hipertermia maligna. somáticas, em células tumorais, que constituem o principal alvo dos medica-
As duas síndromes farmacogenéticas supramencionadas são mono- mentos desenvolvidos nos últimos anos para o tratamento de diversos tipos
gênicas, isto é, um único gene, BCHE ou RyR1, é afetado em cada caso. de câncer. Essa individualização ou “personalização” da terapêutica me-
No entanto, a resposta farmacológica é multifatorial e poligênica, sendo dicamentosa conflita com o paradigma prevalente, de prescrição de uma
influenciada por vários genes (farmacogenes) codificadores de proteínas mesma dose para a maioria, se não para todos os pacientes com um mesmo
envolvidas nos processos farmacocinéticos e farmacodinâmicos. O reco- diagnóstico. A FGx valoriza a variabilidade interindividual na resposta aos
nhecimento desse aspecto multifatorial, acoplado às novas tecnologias medicamentos, seja em relação aos efeitos benéficos ou às reações adver-
de prospecção genética e aos resultados dos projetos Genoma Humano, sas, investiga as causas genéticas dessa variabilidade e propõe ajustes na
HapMap e 1.000 Genomas, entre outros, promoveram ampla expansão das escolha dos medicamentos e das doses, em razão das características gené-
áreas de atuação da farmacogenética. Com isso, foi criado um novo ter- ticas individuais. No entanto, os farmacogeneticistas estão cientes de que a
mo, farmacogenômica, que incorpora a ênfase atual no sufixo “ômico/a”. variabilidade na resposta aos medicamentos não resulta exclusivamente da
Não há concordância entre os autores quanto às diferenças e limites das individualidade genética e que variáveis demográficas, clínicas e ambientais
áreas de atuação da farmacogenética e da farmacogenômica. Neste capí- contribuem para a variabilidade interindividual (Figura 3.1). Admite-se que
tulo, os dois termos são usados como sinônimos e abreviados como FGx. extensão desta variabilidade, avaliada pela resposta clínica inadequeda,
possa oscilar entre 30% (p. ex.: na classe de anti-hipetensivos) a 75% (por
ex. entre quimioterápicos para tumores sólidos).
ATENÇÃO!
É intuitivo que, quanto maior a contribuição relativa dos fatores
O termo farmacogene é utilizado neste capítulo para designar genes genéticos (comparados aos fatores não genéticos) na modulação da
que codificam enzimas metabolizadoras de medicamentos, proteínas resposta farmacológica, maior será a importância da FGx na prescrição
transportadoras de medicamentos e receptores farmacológicos. individualizada de medicamentos. É também intuitivo que, quanto mais
poligênica for a resposta farmacológica, mais complexa serão a pesquisa e efetividade da implementação dessas diretrizes permanecem controversos,
a implementação clínica da FGx. Assim, os mais bem-sucedidos exemplos especialmente em face de resultados de estudos prospectivos recentes que
de aplicação prática da FGx se referem a associações monogênicas (p. ex. mostraram resultados contraditórios.
haplótipo HLA-B*1502 e toxicidade cutânea da carbamazepina ou haplóti-
po HLA-B*5701 e hipersensibilidade ao abacavir) ou oligogênicas, como é
■■ IMPACTO DA FGx NA PRESCRIÇÃO DE
o caso do anticoagulante varfarina, discutido a seguir.
MEDICAMENTOS
Em que medida o objetivo primordial da FGx está sendo alcançado? Ou,
■■ FGx DA VARFARINA
em outras palavras, quais os medicamentos cuja prescrição está sendo
A terapêutica com varfarina se caracteriza por ampla variabilidade inte- otimizada com base nas informações farmacogenéticas disponíveis na
rindividual das doses necessárias para obter a resposta clínica adequada, literatura? O Quadro 3.1 apresenta uma relação parcial desses medica-
obrigatoriedade de medidas repetidas da atividade anticoagulante (pa- mentos, que serão discutidos a seguir, à exceção da varfarina, analisada
dronizada pelo International Normalized Ratio, INR) e reduzido IT, ou seja, anteriormente.
margem estreita entre a dose eficaz e a tóxica. O antirretroviral abacavir, um inibidor da transcriptase reversa do ví-
A dificuldade de ajuste da dose adequada de varfarina motivou uma rus HIV-1, provoca reações de hipersensibilidade, caracterizadas por erup-
série de estudos farmacogenéticos em diferentes populações, inclusive a ções cutâneas, febre e outras manifestações sistêmicas em 5 a 8% dos
brasileira, nos quais foi repetidamente observado que a dose de varfarina indivíduos. Esses efeitos adversos estão fortemente associados a um ha-
está associada a polimorfismos em dois farmacogenes, CYP2C9 e VKORC1. plótipo do complexo HLA tipo 1 (HLA-B*5701). Estudo realizado na Austrá-
O CYP2C9 codifica a enzima CYP2C9, que é a principal via de biotransfor- lia mostrou que a identificação prévia dos portadores do HLA-B*5701 abo-
mação da S-varfarina, o isômero mais ativo da varfarina racêmica comu- liu a ocorrência de reações de hipersensibilidade ao abacavir. Esse é um
mente usada na clínica. Entre os inúmeros polimorfismos de CYP2C9, qua- dos exemplos mais convincentes da importância da FGx na “personaliza-
tro variantes, designadas CYP2C9*2, CYP2C9*3, CYP2C9*5 e CYP2C9*11, ção” da terapêutica medicamentosa.
codificam isoformas de CYP2C9 com atividade enzimática reduzida ou
nula. Esses alelos ocorrem com frequência de 10,8; 5,2; 0,5; e 0,8% na
população brasileira. O gene VKORC1, que codifica a enzima vitamina K
epóxido redutase (VKORC1) – alvo da varfarina no processo de coagulação QUADRO 3.1 ■ Marcadores farmacogenéticos de eficácia e
do sangue –, é polimórfico e um dos seus polimorfismos mais estudados é toxicidade de medicamentos*
o SNP 3673G>A (rs9923231). O alelo variante 3673A, que aumenta a sen- INDICAÇÃO
sibilidade do VKORC1 à varfarina, é observado em 27,5% dos brasileiros.* MEDICAMENTO GENE OU ALELO TERAPÊUTICA
Com o objetivo de estudar a influência de variáveis farmacogenéticas,
demográficas e clínicas na variação interindividual da dose de varfarina, Toxicidade
recrutamos 390 pacientes, do Instituto Nacional de Cardiologia Laranjei-
Abacavir** HLA-B*5701 Infecção por HIV
ras (INCL), em tratamento ambulatorial crônico com varfarina. A dose de
varfarina necessária para obter o efeito anticoagulante desejado (INR en- Carbamazepina*** HLA-B*1502 Anticonvulsivante
tre 2 e 3,5) nessa coorte variou entre 3 e 75 mg/semana, ou seja, uma va-
riação interindividual de 25 vezes. A metodologia estatística de regressão Irinotecano* UGT1A1 Câncer colorretal
múltipla mostrou que polimorfismos em VKORC1 e CYP2C9, idade, peso,
Tiopurinas* TPMT LLA, doença inflamatória
indicação terapêutica, cotratamento com sinvastatina ou amiodarona e
intestinal
quociente INR/dose de varfarina estavam significativamente associados
à dose prescrita de varfarina.1 A análise da contribuição relativa de cada Varfarina VKORC1; CYP2C9 Anticoagulante
variável mostrou que o genótipo de VKORC1 é o principal responsável pela
variabilidade interindividual da dose de varfarina e que, em conjunto, os Eficácia
polimorfismos em VKORC1 e em CYP2C9 explicavam cerca de 40% dessa
Tamoxifeno CYP2D6 Câncer de mama
variabilidade.
Com base nessa análise, derivamos uma equação (algoritmo) para es- Cetuximabe EGFR Câncer colorretal
timar a dose de varfarina adequada para cada paciente. A correlação entre
as doses estimadas e as doses efetivamente administradas revelou que o Gefitinibe EGFR Câncer de pulmão
nosso algoritmo explicava 61% da variabilidade das doses de varfarina na Imatinibe BCR-ABL,KIT, DGFRA LMC, LLA, GIST
coorte estudada. Esse percentual é equivalente ou superior à maioria dos
algoritmos publicados na literatura. O fato de nenhum algoritmo explicar Trastuzumabe**** ERBB2 Câncer de mama
100% da variabilidade interindividual nas doses de varfarina indica a exis-
GIST: tumor estromal gastrintestinal; LLA: leucemia linfoide aguda; LMC: leucemia
tência de outras variáveis genéticas e não genéticas, ainda não identifica- mieloide crônica.
das. A contribuição da FGx para a personalização da terapêutica com varfa- *A relação de biomarcadores farmacogenéticos nas bulas aprovadas pela FDA se
rina é reconhecida pela agência de vigilância sanitária dos Estados Unidos encontra em http://www.fda.gov/drugs/scienceresearch/researchareas/pharmaco-
(Food and Drug Administration, FDA), bem como pelo consórcio interna- genetics/ucm083378.htm
cional CPIC (Clinical Pharmacogenetics Implementation Consortium**), que **A FDA recomenda teste farmacogenético para orientar prescrição.
publicou diretrizes para a prescrição de varfarina com base nos genótipos ***A FDA recomenda teste farmacogenético para orientar prescrição somente em
de VKORC1 e de CYP2C9. No entanto, a utilidade clínica e a relação custo/ pacientes com ascendência asiática.
****A FDA e as agências de vigilância sanitária de outros países, inclusive a Anvisa,
exigem a aplicação de teste específico para documentar a superexpressão de ERBB2
*Disponível em: http://www.refargen.org.br no tumor antes da prescrição de trastuzumabe.
**Disponível em: http://www.pharmgkb.org/page/cpic.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 13
Outro medicamento cujos efeitos adversos estão associados ao ■■ A FGx NA PRÁTICA CLÍNICA:
complexo HLA é o anticonvulsivante carbamazepina. Os portadores do DESAFIOS E OPORTUNIDADES
haplótipo HLA-B*1502 têm risco grandemente aumentado de reações de
A implementação da FGx na prescrição dos medicamentos depende de um
hipersensibilidade à carbamazepina, com manifestações dermatológicas
conjunto de fatores (Quadro 3.2), discutidos a seguir.
graves, como a síndrome de Stevens-Johnson e a necrólise epidermal tóxi-
ca. O haplótipo HLA-B*1502 ocorre com maior frequência nas populações
do sudeste asiático(p. ex.: chineses da etnia Han e tailandeses), mas é raro
ou mesmo ausente naquelas de ascendência africana, europeia ou amerín- QUADRO 3.2 ■ Fatores que influenciam a implementação da FGx
dia, inclusive brasileiros. Esses dados fundamentam a recomendação da na prática clínica
FDA para que nos Estados Unidos a genotipagem prévia para detecção do
Características do medicamento
alelo HLA-B*1502, nos pacientes candidatos ao tratamento com carbama-
Índice terapêutico
zepina, seja restrita aos indivíduos categorizados como “asiáticos”.
Previsibilidade de efeitos benéficos e tóxicos
O irinotecano, usado no tratamento de tumores sólidos, é um Variabilidade interindividual da resposta farmacológica
profármaco, isto é, medicamento que na forma original é inerte e só exerce Disponibilidade de alternativas terapêuticas
efeito farmacológico após ser biotransformado no organismo em um me-
tabólito ativo, que, nesse caso, se denomina SN-38. O SN-38, por sua vez, Frequência dos polimorfismos farmacogenéticos
é bioinativado por ação da enzima UGT1A1, codificada pelo gene polimór- Diversidade populacional
fico, UGT1A1. Um polimorfismo na região promotora do UGT1A1, designa-
Características dos testes farmacogenéticos
do UGT1A1*28, presente em cerca de 30% dos brasileiros, reduz a expres-
Precisão, reprodutibilidade, sensibilidade e especificidade
são da enzima UGT1A1 e, assim, a capacidade de bioinativação do SN-38.
Momento em que o teste é solicitado
Como consequência, ocorre acúmulo desse metabólito ativo e maior risco
Tempo para obtenção dos resultados
de efeitos adversos gastrintestinais e hematológicos. A associação entre
Custo e reembolso
toxicidade hematológica e genótipo de UGT1A1*28 depende da dose de
Diretrizes para a prescrição individualizada
irinotecano, sendo significativa somente nos pacientes tratados com do-
2
ses acima de 150 mg/m (as doses mais comumente usadas são de 100 Adoção da FGx pelos profissionais da saúde
2
a 125 mg/m ). Embora a FDA tenha recomendado a genotipagem prévia Reversão de paradigma
de UGT1A1*28, nos candidatos à quimioterapia com irinotecano, não há Barreiras tecnológicas, operacionais e econômicas
consenso quanto à sua utilidade clínica. Educação dos profissionais de saúde
A associação entre polimorfismos no gene TPMT e a mielotoxicida- Validade e utilidade clínica
de das tiopurinas, utilizadas no tratamento de leucemias e da doença
inflamatória intestinal, está amplamente documentada desde a déca-
da de 1980. Em brasileiros, os alelos variantes mais comuns, designa-
CARACTERÍSTICAS DO MEDICAMENTO
dos TMPT*2, *3A e *3C, têm frequência global em torno de 4%. Esses
alelos codificam isoformas de TPMT com atividade enzimática reduzida As características que favorecem a implementação da FGx na prática clí-
ou nula e conferem maior risco de mielotoxicidade aos pacientes tratados nica são baixo IT (ver Quadro 3.2), ampla variabilidade de resposta e im-
com tiopurinas. Testes farmacogenéticos de fenotipagem (medida da ativi- previsibilidade dos efeitos benéficos e/ou tóxicos do medicamento. Outro
dade enzimática) ou genotipagem (detecção de alelos variantes) de TPMT fator que estimula a prescrição baseada no conhecimento farmacogenéti-
têm reconhecida utilidade clínica na escolha da dose inicial de tiopurinas. co é a falta de alternativas terapêuticas, ou seja, a inexistência de outro(s)
O tamoxifeno, um modulador do receptor de estrogênios, é um pró- medicamento(s) com a mesma indicação clínica dotado(s) de maior índice
terapêutico, menor variabilidade interindividual e/ou melhor previsibilida-
-fármaco e seu efeito terapêutico no câncer de mama se deve, primordial-
de de efeitos benéficos e tóxicos.
mente, ao metabólito endoxifeno. A conversão de tamoxifeno em endo-
xifeno é catalisada, predominantemente, pela enzima CYP2D6 e, assim,
pacientes com isoformas inativas de CYP2D6 (“metabolizadores lentos”) FREQUÊNCIA DOS POLIMORFISMOS
têm menor exposição ao endoxifeno, quando tratadas com tamoxifeno. FARMACOGENÉTICOS
Apesar dessa noção farmacogenética ter sido inserida na bula do tamo- Polimorfismos farmacogenéticos têm frequência variável entre as popu-
xifeno nos Estados Unidos, há controvérsia quanto à utilidade clínica da lações humanas: por exemplo, o alelo CYP3A5*3, que inativa a principal via
genotipagem prévia de CYP2D6 para orientar a prescrição de tamoxifeno de metabolização do imunossupressor tacrolimo, está presente em > 90%
no tratamento do câncer de mama. dos europeus e menos de 15% dos africanos subsaarianos. A frequência de
Quatro medicamentos do Quadro 3.1, cetuximabe, gefitinibe, imatinibe determinado polimorfismo irá se refletir na relação custo/benefício e na uti-
e trastuzumabe, ilustram outro aspecto da FGx: a ação seletiva em alvos lidade clínica de sua genotipagem em diferentes populações. Um exemplo,
moleculares bem definidos, notadamente proteína-cinases superexpressas já mencionado, é o da associação do haplótipo HLA-B*1502 com a hipersen-
em células cancerosas, ou seja, FGx de mutações adquiridas (somáticas) sibilidade cutânea à carbamazepina, observada em populações asiáticas.
no processo de transformação neoplásica. Essa forma de “terapêutica di- Outro exemplo de relevância clínica é o do alelo CYP2C9*8, observado em
rigida” (targeted therapy) se distingue da quimioterapia convencional com 10 a 15% dos africanos subsaarianos e seus descendentes (p. ex., brasilei-
agentes citotóxicos pela menor toxicidade sistêmica, resultante da afini- ros com ascendência africana e afroamericanos da América do Norte), mas
dade seletiva por alterações somáticas específicas das células tumorais. não é detectado em populações europeias e asiáticas. Assim, a aplicação
Em contrapartida, esses medicamentos somente têm efeito benéfico nos adequada de algoritmos preditivos da dose de varfarina em indivíduos com
pacientes que superexpressam os seus respectivos alvos, como o oncoge- ascendência subsaariana requer a genotipagem do alelo CYP2C9*8; no en-
ne ERBB2 nos tumores de mama sensíveis ao trastuzumabe. tanto, isto não se estende às populações europeias ou asiáticas.
14 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
4 ■■ INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS
Cada vez mais, presenciamos situações em que o paciente recebe a pres-
crição de mais de um medicamento – fato bem comum entre idosos ou
SEGURANÇA DOS MEDICAMENTOS mesmo quando o indivíduo é tratado por diferentes especialistas. Há tam-
E FARMACOVIGILÂNCIA bém os medicamentos associados à melhor qualidade de vida, tais como
para disfunção erétil, reposição hormonal, cosmiatria, etc.
O uso concomitante de mais de um fármaco pode levar a efeitos farma-
cológicos sinérgicos ou antagônicos. Daí a necessidade de conhecimentos
■■ JOÃO MASSUD FILHO básicos de farmacologia clínica. Isso pode ser visto nos exemplos a seguir:
Existem medicamentos que atuam no mesmo sítio de ação de ou-
tras substâncias, como os benzodiazepínicos e o consumo conco-
Como discutido no Capítulo 1, Desenvolvimento de um novo medicamen- mitante de álcool, podendo levar à depressão do sistema nervoso
to, a segurança dos medicamentos e farmacovigilância é um processo que central e a importantes distúrbios cognitivos.
demora muito tempo e envolve milhares de pacientes. No entanto, quan- Há fármacos que são metabolizados pelo mesmo sistema enzimático
do o produto é comercializado e passa a ser usado na população em geral, no fígado, como ocorre com o uso de ampicilina ou rifampicina con-
podem aparecer eventos adversos não observados anteriormente. comitante com anticoncepcionais, fazendo com que estes tenham
As razões para esse fato são: sua eficácia diminuída e levando a risco de gravidez não planejada.
1 | Mesmo envolvendo um grande número de pacientes, durante os es- Poderá haver interação já no período de absorção, tal como no uso
tudos clínicos, esse número é muito pequeno quando comparado à popu- de antiácidos, que diminui a absorção de prednisona.
lação que irá utilizá-lo. Por exemplo, se houver um evento adverso que Os diuréticos podem potencializar a nefrotoxicidade dos aminogli-
possa ocorrer a cada 20 mil pacientes, é muito provável que não tenha cosídeos.
sido detectado nas fases de desenvolvimento, quando o número total de Há de se considerar, também, a compatibilidade de fármacos quan-
estudados dificilmente ultrapassa 10 mil. do usados simultaneamente em soluções injetáveis.
2 | Os critérios de inclusão e exclusão dos pacientes na pesquisa clínica
são rigorosos, pela própria necessidade metodológica, e distante do pa-
ciente visto na clínica. ATENÇÃO!
3 | Existem terapias associadas na prática clínica que não foram estuda-
Como a gama de interações medicamentosas é muito grande, é sempre
das durante o desenvolvimento do produto.
aconselhável, quando houver a necessidade de uso de mais de um me-
4 | Algumas vezes, o medicamento foi prescrito fora do uso estabelecido dicamento, que se avalie a viabilidade ou não da prescrição múltipla.
e, portanto, não havia sido estudado antes.
O conhecimento básico da farmacovigilância é importante do ponto
de vista ético, científico e socioeconômico, pois pode impactar significati- Hoje, com o advento da internet, ficou mais fácil esta pesquisa, que
vamente no custo da saúde. Na realidade, o gasto com pacientes, vítimas poderá evitar grandes problemas relacionados aos efeitos adversos, in-
de iatrogenias ou simplesmente eventos adversos conhecidos, é muito cluindo a ineficácia dos medicamentos.
grande.
Não se pode negar que todo medicamento pode provocar efeitos
adversos. No entanto, vários estudos têm demonstrado que 1/3 dos efei- ■■ IMPLICAÇÕES CLÍNICAS DOS EVENTOS ADVERSOS
tos adversos está associado a erros da medicação. O grande número de DE MEDICAMENTOS
medicamentos disponíveis, a falta de tempo para estudo e o grande nú- Para que se possa avaliar as implicações clínicas dos eventos adversos de
mero de pacientes atendidos, entre outros fatores, podem contribuir para medicamentos, é preciso, em primeiro lugar, definir alguns conceitos bási-
erros de prescrição e/ou falta de advertência quanto ao seu uso. Ou seja, cos. Inicialmente, devemos ter em mente que todo medicamento pode pro-
nenhum medicamento deveria ser usado sem o devido conhecimento do duzir efeitos indesejáveis – e é quase impossível, na prática clínica, conhe-
seu perfil farmacológico. cer todos os problemas potenciais que um medicamento possa provocar.
Além desse importante aspecto, precisamos considerar ainda: Eventos adversos: são intercorrências surgidas durante o tratamento
Nos casos em que a medicação apresenta um significativo poten- medicamentoso do paciente, relacionadas ou não àquela terapia. Exem-
cial de risco, deve-se, obrigatoriamente, discuti-lo com o paciente, plos: 1) Diarreia na vigência do tratamento com amoxacilina. Dezenas de
que poderá aceitá-lo ou não. Sua anuência, nesses casos, é man- observações de farmacovigilância mostram que esta ocorrência é bastante
datória. frequente. 2) O paciente é atropelado. A pergunta que se faz é se o atro-
O fato de o paciente ter tomado o medicamento anteriormente não pelamento tem ou não relação com o medicamento utilizado. Este age no
invalida a possibilidade de que, a qualquer momento, possa ter um sistema nervoso central? Atua no equilíbrio e/ou na atenção?
efeito adverso. Efeitos adversos (reações adversas): são respostas indesejáveis a
Dezenas de exemplos, no decorrer dos últimos anos, demonstram um medicamento, quando utilizado nas indicações e doses preconizadas.
que o ato da prescrição de um medicamento não se encerra por si, Também se inclui nesta classificação a ineficácia terapêutica. Exemplo: li-
ou seja, há necessidade de um acompanhamento do paciente em podistrofia causada por algumas medicações para o tratamento da Aids.
relação aos efeitos da terapêutica. Muitos produtos tiveram suas Efeitos colaterais: são efeitos produzidos pelo medicamento além
bulas adaptadas ou foram retirados do mercado por haver se cons- de sua ação terapêutica. Não são, obrigatoriamente, nocivos. Exemplo: a
tatado o aparecimento de efeitos adversos ou restrições de uso. ciproeptadina (anti-histamínico) aumenta o apetite. Foi usada no passado,
Embora muitas vezes difícil, é preciso buscar a relação causa-efeito em muitos pacientes, devido ao seu efeito colateral.
do medicamento e sua reação adversa: algumas vezes, a interrup- Usos fora da bula: não é incomum que os médicos prescrevam o
ção por alguns dias e sua reintrodução já fecham o diagnóstico. medicamento em indicações e/ou posologia não recomendadas pelo fabri-
(Importante: essa ação poderá ser feita quando a reação adversa é cante e, também, não aprovadas pelas autoridades sanitárias. A não inclu-
leve a moderada, jamais em situações de risco à vida.) são de novas indicações e/ou diferente posologia certamente é decorrente
16 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
da falta de comprovação clínica consistente. O uso fora da bula (off-label) 7 | Houve interrupção do tratamento? Caso positivo, os efeitos desapa-
deveria ficar restrito à análise do custo-efetividade do tratamento. Há de receram?
se considerar, também, as implicações éticas e legais deste uso. O Conse- 8 | Houve troca, na farmácia, do medicamento por outro similar ou ge-
lho Federal de Medicina estabeleceu critérios para este uso que será de nérico? Neste caso, algum componente novo poderia justificar a reação.
inteira responsabilidade ética e legal do médico prescritor. 9 | Comunicar o efeito adverso ao fabricante e aos órgãos sanitários.
Medicamentos manipulados: vários médicos preferem prescrever 10 | É preciso deixar claro junto ao paciente que o eventual aparecimento
medicamentos manipulados para seus pacientes baseando-se no princípio de efeitos adversos não significa erro de prescrição ou defeito do produto.
da terapêutica individualizada. Além dos eventuais problemas já mencio- Simplesmente podem acontecer.
nados (interações medicamentosas e uso fora da bula), há de se ter em 11 | É importante que o paciente se sinta amparado em qualquer circuns-
mente que um produto farmacêutico acabado, disponível no mercado, tância.
passa por inúmeros testes antes de ser comercializado: estabilidade, pu- 12 | Avaliar, cuidadosamente, a viabilidade de substituir o medicamento.
reza, umidade, conservação, etc. Os medicamentos manipulados podem
apresentar deficiências nestes quesitos e, como consequência, provocar PONTOS A SEREM LEVADOS EM CONTA
efeitos adversos, incluindo a ineficácia terapêutica. 1 | Todo medicamento pode provocar efeitos adversos.
Populações de risco: o uso de medicamentos em pediatria exige um 2 | Há situações em que, mesmo com efeitos adversos, desde que não
grande cuidado, tendo em vista que o metabolismo da criança é diferente graves, a medicação precisa ser mantida: procura-se atenuar os efeitos
do adulto e, segundo alguns trabalhos, mesmo nos Estados Unidos, mais adversos da quimioterapia, mas não suspendê-la, na maioria das vezes.
de 50% dos produtos usados em crianças não foram avaliados adequa- 3 | Vários estudos mostram que 1/3 dos efeitos adversos estão associados
damente. com erros de medicação que poderiam ser preveníveis.
Idosos são mais sensíveis ao uso de medicamentos e, ironicamente, 4 | Não usar medicamento sem o devido conhecimento de seu perfil far-
são os que mais consomem remédios. Alguns trabalhos mostram que, macológico.
além de consumir mais, podem estar recebendo produtos inadequados. 5 | Quando a medicação apresenta um significativo potencial de risco,
Pacientes crônicos com frequência são medicados com mais de um deve-se, obrigatoriamente, discuti-lo com o paciente, que poderá aceitá-lo
remédio. Estudos de farmacovigilância demonstram que, à medida que se ou não. A sua anuência, nestes casos, é mandatória.
aumenta o número de produtos usados, também aumenta a possibilidade 6 | Por outro lado, os pacientes não podem ser prejudicados pela indeci-
de efeitos adversos. são do médico em usar medicamentos.
Pacientes hospitalizados, seja pela doença de base ou cirurgia, seja 7 | O fato do paciente já ter tomado o medicamento anteriormente não
pelo atendimento multidisciplinar ou mesmo pela necessidade de maior invalida que, a qualquer momento, possa desencadear um efeito adverso.
intervenção clínica, podem estar sujeitos a um número mais elevado de 8 | Dependendo da gravidade da doença, pode-se justificar o uso de
efeitos adversos. medicamentos de alto potencial de risco, sempre com a anuência do pa-
Mulheres em idade fértil devem ser avaliadas e orientadas quanto à ciente.
medicação prescrita. Sabe-se também que, pela variação hormonal a que 9 | O uso de medicamento pouco eficaz pode ser justificado nos casos em
são submetidas mensalmente, podem reagir à terapêutica de maneira di- que as alternativas terapêuticas são reduzidas.
ferente dos homens. 10 | Em casos extremos, de doenças muito graves ou fatais, o médico
Automedicação: este hábito, não exclusivo dos brasileiros, pode deve pensar na possibilidade de incluir o paciente em experimentações
complicar muito a avaliação de um paciente com efeitos adversos a clínicas, eventualmente em curso, desde que atendam os preceitos da de-
medicamentos. Muitas vezes, por receio da censura, o paciente omite os claração de Helsinque e as normais legais e éticas vigentes.
produtos que usa, ou mesmo, por achá-los inofensivos (chás, poções, etc.), Para finalizar, vem da OMS uma descrição de como devemos proceder
não os menciona. É preciso se certificar do que foi usado. acerca da segurança dos medicamentos e farmacovigilância:1
Alimentação: muitos alimentos interferem na absorção e no metabo-
lização de medicamentos. Exemplo clássico é a diminuição da absorção da [...] há uso racional de medicamentos quando pacientes recebem medica-
tetraciclina quando administrada junto com leite. O grapefruit interfere na mentos apropriados para suas condições clínicas, em doses adequadas às
suas necessidades individuais, por um período adequado e ao menor custo
metabolização de muitos medicamentos por atuar diretamente em proces-
para si e para a comunidade.
sos enzimáticos no fígado. O álcool sabidamente interage com produtos
do sistema nervoso central. Assim, o uso da terapêutica medicamentosa é fundamental, desde
Avaliação do custo/benefício: os medicamentos trouxeram um avan- que feito com critério, conhecimento, crítica e humildade para reavaliação
ço enorme para a medicina seja curando ou atenuando doenças. No en- de sua eficácia e eficiência no tratamento.
tanto, é sempre preciso avaliar se há, realmente, necessidade de seu uso.
Nenhum medicamento poderá substituir uma relação médico-paciente ade-
quada. Não existe a “pílula da felicidade”. Não existe remédio milagroso. REVISÃO
Não existe medicamento totalmente inócuo. Os medicamentos têm efeitos
farmacológicos, mas podem ser não eficazes por indicação e/ou uso inade- A segurança dos medicamentos e farmacovigilância é um processo
quados. Hoje com o grande avanço da medicina baseada em evidências, que demora muito tempo e envolve milhares de pacientes.
torna-se mais fácil ter uma atitude crítica em relação ao uso de fármacos. Cada vez mais, presenciamos situações em que o paciente recebe a
prescrição de mais de um medicamento.
O QUE FAZER DIANTE DE EFEITOS ADVERSOS? O uso concomitante de mais de um fármaco pode levar a efeitos
farmacológicos sinérgicos ou antagônicos. Daí a necessidade de co-
1 | Anamnese precisa para descartar outras intercorrências clínicas.
nhecimentos básicos de farmacologia clínica.
2 | Reavaliar a prescrição para se certificar que estava de acordo com as
Todo medicamento pode produzir efeitos indesejáveis – e é quase
recomendações do produto.
impossível, na prática clínica, conhecer todos os problemas poten-
3 | Confirmar com o paciente se o uso foi conforme a prescrição.
ciais que um medicamento possa provocar.
4 | Houve novos medicamentos utilizados?
É fundamental saber como proceder diante de um efeito adverso.
5 | Buscar a descrição completa dos efeitos atribuídos ao produto.
6 | Quais as consequências daqueles efeitos?
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 17
■■ ASPECTOS MICROBIOLÓGICOS
A avaliação da sensibilidade de micro-organismos aos antimicrobianos
é realizada in vitro, determinando-se a concentração inibitória mínima
(CIM) de cada micro-organismo para cada antimicrobiano, semeando-
-se a bactéria em presença de concentrações crescentes de determinado
antibiótico. Esse teste pode ser realizado por meio de diversas técnicas, CIM
embora o princípio seja sempre o mesmo. A CIM corresponde à menor
concentração do antibiótico capaz de inibir o desenvolvimento visível do
micro-organismo. A CIM, isoladamente, não define sensibilidade ou resis-
Tempo (horas)
tência dos patógenos frente aos antimicrobianos. Para que se definam as
CIM, relacionadas à sensibilidade ou à resistência, são necessários estudos
de correlação clínica, microbiológica e farmacocinética. FIGURA 6.1 ■ Exemplificação de curva de concentração versus
O Clinical Laboratory Standards Institute (CLSI) é um dos órgãos cien- tempo (sérica ou tecidual).
tíficos, com sede nos Estados Unidos da América, que estipulam valores
padronizados das CIM correlacionados com resistência e sensibilidade
dos micro-organismos aos antimicrobianos. Para que haja sensibilidade Os antibióticos estabelecem ligações proteicas em proporção variável
em um patógeno, é necessária que sua concentração inibitória mínima, (índice de ligação proteica), principalmente com a albumina plasmática, sa-
frente a um antibiótico, seja baixa (inferior à concentração sérica média bendo-se que só a fração livre do antibiótico é dotada de atividade antimi-
alcançada in vivo pelo antibiótico). Vários métodos podem ser utilizados crobiana. O resultado do tratamento de uma infecção pode sofrer variações
para avaliar a sensibilidade de micro-organismos a antimicrobianos, como segundo a afinidade do antibiótico pelas proteínas plasmáticas. A ligação
métodos diretos: a) macrodiluição em tubo, b) microdiluição manual, c) dos antibióticos com as proteínas plasmáticas exerce influência sobre a di-
E-test (teste epsilométrico), d) difusão em Ágar; e métodos indiretos: a) fusão desses fármacos nos tecidos e líquidos orgânicos, a rapidez com que
discodifusão, b) microdiluição automatizada. Todos esses testes apresen- ultrapassam as membranas celulares, a intensidade do seu efeito antimi-
tam algum tipo de correlação com a CIM determinada por macrodiluição crobiano e a sua velocidade de eliminação. Apenas o antibiótico livre de
(teste “padrão-ouro” para essa determinação). ligação com proteínas se distribui pelos tecidos, pois o complexo antibiótico
albumina não consegue penetrar na célula. O uso concomitante de medica-
mentos que competem com os antibióticos na ligação com a albumina induz
■■ ASPECTOS FARMACOLÓGICOS ao aumento na proporção de antibiótico livre e altera sua distribuição pelos
A indicação para o emprego de um antibiótico deve ser regida pelo co- tecidos e líquidos orgânicos. Em pediatria, é de fundamental importância
nhecimento de sua composição química e de seu mecanismo de ação; de conhecer quais os medicamentos (os antibióticos, em particular) capazes de
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 19
ligar-se com a albumina plasmática. Esse fato é especialmente relevante nos A partir de diversos tipos de estudos (in vitro, in vivo, ex vivo), é possí-
recém-nascidos, dada a influência exercida por esses medicamentos sobre a vel classificar os antimicrobianos em tempo-dependentes e concentração-
concentração sérica de bilirrubina indireta não ligada à albumina. -dependentes:
É contraditório o significado da ligação proteica dos antibióticos em Antimicrobianos tempo-dependentes: são aqueles que têm sua
relação ao resultado terapêutico final, pois, ao passo que já se demons- ação regida pelo tempo de exposição das bactérias às suas con-
trou que a ligação proteica prejudica o efeito do antibiótico em meios de centrações séricas e teciduais. A ação desses antimicrobianos inde-
cultura e, ao que parece, também in vivo, sua ocorrência pode favorecer o pende dos níveis séricos máximos que eles venham a atingir, mas
acesso do antimicrobiano às áreas infectadas e sua permanência na intimi- depende do tempo que permanecem acima das CIMs das bactérias,
dade dos tecidos. Com a instalação do processo inflamatório, verifica-se logo, tendo o tempo acima da CIM (T > CIM) como marcador de
aumento da permeabilidade capilar e afluxo acentuado de proteínas no potência preditivo de sucesso (Figura 6.2).
local da lesão, onde se encontram os micro-organismos que se pretende Antimicrobianos concentração-dependentes: são aqueles cujos
eliminar. Como a afinidade da ligação entre antibiótico e albumina é pe- efeitos de eliminação bacteriana dependem fundamentalmente
quena, o antibiótico é liberado nos líquidos infectados. Desde que manti- das concentrações mais altas (picos séricos ou áreas abaixo da cur-
da, a ligação pode também ser responsável pela retenção do antibiótico va com a CIM do patógeno em questão) que esses antimicrobianos
na intimidade dos tecidos a que teve acesso, prolongando seu efeito, que atinjam no soro e nos tecidos, logo, tendo as razões entre con-
persiste mesmo depois de suspensa sua administração e já se ter tornado centração máxima (Cmax) ou área abaixo da curva de concentração-
nula sua concentração sérica (efeito pós-antibiótico). -tempo (AAC) pela CIM (Cmax:CIM ou AAC:CIM) como marcadores
Além da ligação às proteínas plasmáticas, outros fatores interferem de potência preditivos de sucesso (Figura 6.3).
na velocidade com que um antibiótico deixa a circulação (solubilidade lipí-
dica, peso molecular e estado de agregação). Os capilares dos glomérulos
renais e dos sinusoides hepáticos são mais permeáveis do que os capilares
de outra localização à passagem dos antimicrobianos. De modo geral, com Concentração
exceção de cérebro, globo ocular e placenta, os antibióticos conseguem
passar livremente do espaço intravascular para o espaço intersticial, atra-
vés da parede capilar. A maioria dos antibióticos atinge concentrações
terapêuticas em líquido ascítico, pleural e pericárdico.
A meia-vida de um antibiótico corresponde ao tempo necessário
para que a concentração sérica máxima, alcançada com a administração
de uma dose, reduza-se à metade. Esse índice independe da intensidade
da concentração sérica máxima e é determinado pelo grau de excreção ou
CIM
metabolização e pela rapidez de difusão tecidual do antibiótico. Com base
no conhecimento da meia-vida de um antibiótico e outros fatores, é esta-
belecido o intervalo de tempo com que devem ser administradas as doses T >CIM
sucessivas. Em presença de insuficiência renal e, às vezes, de insuficiência
hepática, a meia-vida de determinados antimicrobianos torna-se maior,
Tempo (horas)
exigindo ajustes nos esquemas adotados, com aumento no intervalo de
administração e/ou redução das doses, a fim de evitar seu acúmulo no
sangue e a ocorrência de efeitos tóxicos. FIGURA 6.2 ■ Parâmetro farmacodinâmico preditivo de sucesso
A biodisponibilidade, expressa em porcentagem, e a fração do an- em antimicrobianos tempo-dependentes (T > CIM).
timicrobiano administrado que se encontra efetivamente disponível sob
forma ativa na circulação dependem, em parte, do seu índice de ligação às
proteínas plasmáticas.
Concentração
ATENÇÃO!
Cmax:CIM
A intensidade da penetração tecidual do antimicrobiano é tão mais AAC:CIM
alta quanto maiores forem sua biodisponibilidade e sua capacidade de
difusão no espaço intersticial e nas células.
FARMACODINÂMICA CIM
Os aspectos farmacodinâmicos vêm sendo estudados ao longo dos últimos
anos com o fim de estabelecer metas quantitativas bem definidas, sobre
as quais se devem traçar políticas de uso racional dos antimicrobianos. Es-
ses princípios têm servido para a otimização terapêutica baseada nas cor- Tempo (horas)
relações entre os marcadores de potência dos antimicrobianos (CIMs) e os
perfis farmacocinéticos desses fármacos (curvas de concentração-tempo FIGURA 6.3 ■ Parâmetros farmacodinâmicos preditivos de sucesso
séricas e teciduais) (Figura 6.1). Essas correlações farmacodinâmicas são
em antimicrobianos concentração-dependentes (Cmax:CIM e/ou
diferentes para cada classe de antimicrobianos e vêm sendo objeto de es-
AAC:CIM).
tudo nos últimos anos. Porém, deve-se realçar que, para essas correlações,
deve-se evitar o uso de métodos de determinação indireta das CIMs, como AAC: área abaixo da curva de concentração-tempo; Cmax: concentração plasmática
discodifusão e métodos automatizados. máxima.
20 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
No Quadro 6.1, encontram-se os parâmetros farmacodinâmicos de respeitadas as condições clínicas primordiais do paciente. Ou seja, deve-se
correlação com eficácia de diversas classes de antimicrobianos, com suas buscar selecionar os antimicrobianos para os quais historicamente as CIMs
respectivas formas de eliminação dos micro-organismos e com os objeti- sejam mais baixas. Essa escolha deve ser baseada em dados microbioló-
vos terapêuticos que devem ser seguidos para maximizar a ação deles. Al- gicos atuais (do paciente) ou históricos, por meio de evidência epidemio-
guns antimicrobianos podem apresentar característica mista de parâmetro lógica.
farmacodinâmico preditivo de sucesso, como o macrolídeo azitromicina.
Outros antimicrobianos, listados no Quadro 6.1, apresentam divergência DOSE
quanto à classificação de seus parâmetros farmacodinâmicos preditivos As doses de antibióticos variam de acordo com a via utilizada, com as
de sucesso devido a dados ainda contraditórios ou insuficientes, como os características da infecção que se pretende tratar e com as formas dispo-
glicopeptídeos (vancomicina e teicoplanina) e as polimixinas (polimixina níveis para maximizar as evoluções microbiológica e clínica pretendidas.
b e colistina). Nos pacientes com insuficiência renal (IR), as doses e/ou os intervalos de
Ainda em relação ao Quadro 6.1, para os antimicrobianos tempo- administração devem ser modificados conforme o valor do clearance de
-dependentes, deve-se procurar maximizar a duração da exposição do creatinina, assim como nos enfermos submetidos à diálise peritoneal ou
patógeno ao fármaco, por exemplo, aumentando o tempo de infusão de à hemodiálise.
antibióticos tempo-dependentes (p. ex.: betalactâmicos), associado ou As doses utilizadas de antimicrobianos variam segundo a gravidade
não a doses mais elevadas, particularmente em infecções graves causadas do caso e o sítio da infecção. Nos casos graves, para maior segurança e
por bactérias com CIMs mais elevadas. Contudo, para os antimicrobianos eficácia da terapêutica antimicrobiana, é possível monitorar o tratamento
concentração-dependentes, deve-se procurar otimizar a exposição do por meio da dosagem sérica do antibiótico em questão. Sua dosagem no
patógeno a concentrações mais elevadas do fármaco, alterando estraté- decorrer do tratamento constitui recurso útil em pacientes com IR que es-
gias de dosagens para permitir maiores picos de concentração sérica e tejam recebendo vancomicina ou aminoglicosídeos, ou em determinadas
tecidual, como é o caso dos aminoglicosídeos em dose única diária para situações clínicas (p. ex.: tratamento da endocardite infecciosa).
infecções hospitalares.
Uma das estratégias clínicas de fácil execução é o uso de doses mais
Deve-se buscar a maximização do efeito antimicrobiano em todas as
elevadas de antibióticos para patógenos com CIMs mais altas, em particu-
situações, com os instrumentos clínicos que estiverem à disposição. Al-
lar para os antimicrobianos tempo-dependentes. Todavia, deve-se realçar
guns desses instrumentos dependem exclusivamente de conhecimento
que, embora o aumento de dosagem possa ser uma estratégia adequada
sobre os fármacos, seus mecanismos de ação e o processo infeccioso em
para suplantar resistências, especialmente as de baixo nível, os aumentos
si. Entre as estratégias que estão ao alcance do clínico, para maximizar as
de dose devem ser criteriosos e associados a outras medidas de otimiza-
eficácias clínica e microbiológica dos antimicrobianos, estão as estraté-
ção terapêutica avaliadas caso a caso.
gias baseadas nos três “Dês”: Droga (medicamento), Dose e Duração da
infusão, relatadas sumariamente a seguir. Além disso, estão expostos, de
DURAÇÃO DA INFUSÃO
forma resumida, aspectos relevantes de vias e formas de administração e
tempo de tratamento. Também se deve considerar, em especial para os betalactâmicos, o au-
mento do tempo de infusão do antibiótico em questão. As evidências
sobre aumento do tempo de infusão para antimicrobianos tempo-de-
■■ MEDICAMENTO pendentes são antigas, datando já da década de 1980, porém, na prática
Como regra básica, deve-se procurar escolher o antimicrobiano dentro de diária, essas medidas nem sempre são incorporadas devido a aspectos
determinada classe com maior potência frente aos potenciais patógenos, vinculados à exequibilidade (diluições, preparos, uso de bombas de infu-
QUADRO 6.1 ■ Parâmetros farmacodinâmicos preditivos de evolução relacionados à eficácia (clínica e/ou microbiológica) por grupo
de antimicrobianos
PARÂMETROS ELIMINAÇÃO DO
CORRELACIONADOS À EFICÁCIA EXEMPLOS MICRO-ORGANISMO OBJETIVO TERAPÊUTICO
Concentração sérica
Concentração do
antimicrobiano > CIM
CIM
Tempo
FIGURA 6.4 ■ Comparação entre perfil de concentração sérica versus tempo para infusão intermitente e para infusão prolongada ou contínua de
antimicrobianos tempo-dependentes.
são etc.). Todavia, trata-se de estratégia útil e com confirmação clínica de nos (penicilinas e sulfamídicos) é formalmente contraindicada, devido à
superioridade frente a infusões clássicas em bólus para alguns antimicro- possibilidade de induzir sensibilização.
bianos (Figura 6.4).
TEMPO DO TRATAMENTO
VIAS E FORMAS DE ADMINISTRAÇÃO Como regra geral, a terapêutica antibiótica deve ser mantida durante um
A via oral deve ser a preferida, sempre que não houver risco de prejuízo período que se estenda até alguns dias depois do desaparecimento das
para o resultado final do tratamento. Diversos antibióticos, porém, não manifestações clínicas que justificaram a sua indicação. Para algumas
são utilizáveis por essa via, por sofrerem inativação ou não serem absor- doenças, encontram-se padronizados esquemas terapêuticos, que são
vidos no tubo digestivo. A benzilpenicilina, por exemplo, por ser inativada adotados com pequenas variações.
em meio ácido, não é eficaz quando administrada por via oral, ao passo Sabe-se, contudo, que o uso prolongado de antibióticos se associa
com: a) alterações da composição da microbiota; b) seleção de cepas
que muitas penicilinas, biossintéticas e semissintéticas, são resistentes ao
bacterianas resistentes; e c) efeitos adversos (febre, erupções cutâneas e
baixo pH do estômago e podem ser usadas por essa via. Alguns antibióti-
granulocitopenia, entre outros).
cos não são absorvidos no tubo digestório (aminoglicosídeos, anfotericina
B, nistatina, vancomicina etc.), embora conservem sua atividade antimi-
crobiana no lúmen intestinal. Outros antibióticos, embora bem absorvidos REVISÃO
no intestino, são mal tolerados pelos efeitos indesejáveis que provocam
(náuseas, vômitos, diarreia e/ou dores epigástricas). Selecionar antimicrobianos com base em:
A via intravenosa e a via intramuscular são utilizadas no tratamento aspectos clínicos relacionados do paciente;
de infecções moderadas e graves ou em processos infecciosos em que haja aspectos microbiológicos presuntivos ou comprovados;
suspeita de resistência não tratável por antimicrobianos disponíveis por aspectos farmacológicos, especialmente a otimização terapêutica
via oral. Como as concentrações séricas de antimicrobianos obtidas por por princípios farmacodinâmicos.
via intramuscular são em geral mais baixas e irregulares do que as obtidas Otimizar antimicrobianos com base em características do medicamen-
por via intravenosa, essa via deve ser utilizada fundamentalmente para to e/ou classe:
continuação de tratamento intravenoso em pacientes nos quais não haja se tempo-dependente, avaliar possibilidade de otimização da dura-
dúvidas clínicas sobre potenciais baixos níveis séricos atingidos. Essa via ção da exposição (tempo de infusão e dose);
também deve ser evitada em pessoas com tendência a sangramento, em se concentração-dependente, avaliar possibilidade de otimizar a
exposição (intervalo e dose).
uso de anticoagulantes ou em choque. No tratamento de infecções gra-
ves, recorre-se, sempre que possível, à via intravenosa; a administração
de antibióticos por essa via pode ser feita através de injeção direta ou por ■■ LEITURAS SUGERIDAS
gotejamento, diluídos em soro fisiológico ou glicosado, com velocidade
Amato Neto V, Nicodemo AC, Lopes HV. Antibióticos na prática médica. 6. ed. São
de infusão variável, de acordo com as características do antimicrobiano Paulo: Sarvier; 2007.
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Atualmente, a via intratecal é de utilização rara, para a administra- 2001;357(9265):1307-8.
ção de antibióticos em circunstâncias especiais, pois muitos dos dispo- Kiffer CR, Pignatari ACC. Pharmacodynamic evaluation of commonly prescribed
níveis alcançam concentrações terapêuticas no sistema nervoso central oral antibiotics against respiratory bacterial pathogens. BMC Infect Dis.
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Nicasio AM, Eagye K J, Nicolau DP, Shore E, Palter M, Pepe J, et al.
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Pharmacodynamic-based clinical pathway for empiric antibiotic choice in
O uso tópico de antibióticos tem indicações precisas em oftalmologia, patients with ventilator-associated pneumonia. J Crit Care. 2010;25(1):69-77.
otorrinolaringologia, ginecologia e, especialmente, em dermatologia. Não Nicolau DP. Optimizing outcomes with antimicrobial therapy through
se pode esquecer, porém, que a aplicação tópica de alguns antimicrobia- pharmacodynamic profiling. J Infect Chemother. 2003;9(4):292-6.
22 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
7 ■■ INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS
Os AINHs podem interagir com vários medicamentos, como anticoagulan-
ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO tes, antiplaquetários, anti-hipertensivos, inibidores da calcineurina (ciclos-
porina e tacrolimus), digoxina, diuréticos, glicocorticoides, lítio, inibidores
HORMONAIS seletivos da recaptação de serotonina (SSRIs), metotrexato (MTX) etc. A
interação de AINHs com MTX geralmente requer que se evite seu uso em
pacientes que recebem doses antineoplásicas de MTX, mas pode ser usa-
do concomitantemente em pacientes que usam doses baixas de MTX (por
■■ CHARLLES HELDAN DE MOURA CASTRO
exemplo, no tratamento de doenças reumatológicas).
■■ EMILIA INOUE SATO Podem ocorrer interações devido à redução da perfusão renal oca-
sionada pelos AINHs ou por toxicidade hemorrágica aditiva. Além disso,
alguns AINHs inibem a CYP-2C9 (ibuprofeno, cetoprofeno, flurbiprofeno,
Os anti-inflamatórios não hormonais (AINHs) são a classe de medicamen- indometacina, diclofenaco, meloxicam) ou a CYP-2C8/2D6 (celecoxibe), ou
tos mais comumente usada no mundo. Espera-se que com o envelheci- a glucuronidação, podendo aumentar as concentrações de fármacos cuja
mento da população haverá um aumento significativo na prevalência de metabolização seja dependente destas vias.
condições reumáticas degenerativas e inflamatórias e, com elas, aumento Inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA). Os
concomitante na utilização de AINHs. AINHs podem atenuar a eficácia dos IECA, bloqueando prostaglandinas
O salicilato de sódio, descoberto em 1763, foi o primeiro AINH. A vasodilatadoras e natriuréticas e potencializando o aparecimento da hi-
toxicidade gastrintestinal (particularmente dispepsia), associada ao uso percalemia.
de ácido acetilsalicílico (AAS), levou à introdução da fenilbutazona, um Baixas doses de AAS. O efeito cardioprotetor de AAS em baixa dose
derivado do ácido indol-acético, que é um fraco inibidor da prostaglan- pode ser bloqueado pelo uso concomitante de AINHs.
dina sintetase e tem feito uricosúrico. Este foi o primeiro AINH não sali- Glicocorticoides (CE). O risco de úlcera péptica aumenta significati-
cílico desenvolvido para uso em doenças inflamatórias. Foi demonstrado vamente quando CE são utilizados em combinação com AINH, em compa-
ser eficaz em pacientes com gota e espondilite anquilosante. Os riscos ração com o uso isolado de qualquer das medicações.
relacionados à toxicidade medular (aplasia), particularmente em mulheres Inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS). A utiliza-
maiores de 60 anos, levaram ao seu desuso. A indometacina, um outro ção de ISRSs em combinação com AINHs está associado a maior risco de
derivado do ácido indol-acético, foi desenvolvida como um substituto para toxicidade GI em comparação com o uso isolado de uma das medicações.
a fenilbutazona. Nos anos seguintes houve o desenvolvimento de uma Varfarina. Os AINHs podem aumentar o risco de sangramento em
enorme variedade de AINHs, em um esforço para melhorar a adesão do pacientes tratados com antagonistas da vitamina K por múltiplos meca-
paciente (facilidade posológica), reduzir a toxicidade e aumentar o efeito nismos, incluindo toxicidade GI, aumento da INR e interferência com a
anti-inflamatório. função plaquetária.
Atualmente existem pelo menos 20 AINHs disponíveis para uso clí-
nico, de seis diferentes classes, determinadas pelas estruturas químicas.
Essas medicações diferem em dose, interações medicamentosas e alguns ■■ MECANISMOS DE AÇÃO
efeitos colaterais. Uma comparação das medicações, organizada por agru- Existe uma variação individual na resposta aos AINHs. Alguns pacien-
pamento químico, é apresentada na Tabela 7.1. tes parecem responder melhor a uma determinada medicação do que a
A maioria dos AINHs são totalmente absorvidos no tubo digestório, outras. O risco de eventos adversos também parece ser individualizado.
têm insignificante metabolismo hepático de primeira passagem, são forte- Estas diferenças têm sido atribuídas a diferenças na absorção, na distribui-
mente ligados às proteínas séricas e têm pequenos volumes de distribui- ção e no metabolismo. Além disso, muitos mecanismos de ação têm sido
ção. Os AINHs podem sofrer transformações hepáticas mediadas pelas en- atribuídos aos AINHs.
zimas CYP-2C8, 2C9, 2C19 e/ou glucuronidação. As meias-vidas dos AINHs Inibição da ciclo-oxigenase (COX): o efeito primário dos AINHs
variam, mas, de modo geral, podem ser divididos em “de curta duração” é inibir a COX (sintase da prostaglandina), prejudicando a trans-
(menos de seis horas, incluindo ibuprofeno, diclofenaco, indometacina e formação final de ácido araquidônico em prostaglandinas, trom-
cetoprofeno) e “de longa duração” (mais de seis horas, incluindo napro- boxanos e prostaciclina.1 O grau de inibição da enzima varia entre
xeno, celecoxibe, meloxicam, nabumetona e piroxicam). Pacientes com os diferentes AINHs, mas não existem estudos comparando o grau
hipoalbuminemia podem ter maior concentração livre no soro. de inibição da COX com eficácia anti-inflamatória, em pacientes
A avaliação da toxicidade e da resposta terapêutica para um de- individuais.2
terminado AINH deve levar em conta o tempo necessário para atingir a Enzimas COX: duas isoformas relacionadas da enzima COX têm
concentração plasmática em estado estacionário (± 3 a 5 meias-vidas). sido descritas:3 a COX-1 (PGHS-1) e a COX-2 (PGHS-2). Os inibido-
A doença ulcerosa péptica sintomática causada pelos AINHs ocorre, res das isoformas COX-1 e COX-2 possuem 60% de homologia nas
principalmente, em consequência da inibição sistêmica da atividade da sequências de aminoácidos, aparentemente conservadas para a
ciclo-oxigenase (COX) na mucosa gastrintestinal. A escolha de um AINH lise do ácido araquidônico.4 Uma variante de splicing alternativo
deve levar em consideração fatores de risco específicos do paciente e a do gene da COX-1 foi descrita como COX-3, cuja importância ainda
maneira pela qual a medicação é metabolizada. Em pacientes mais ido- não está clara.5 Há diferenças importantes na regulação e expres-
sos, por exemplo, a possível vantagem de melhor facilidade posológica são destas enzimas em vários tecidos. A COX-1 é expressa na maio-
de medicações de ação mais prolongada, provavelmente, seja suplantada ria dos tecidos, com níveis variáveis, e é considerada enzima cons-
pela maior incidência de toxicidade gastrintestinal (GI) associada à maior titutiva, responsável pela regulação de processos celulares normais
circulação êntero-hepática dos metabólitos ativos. Os AINHs com meia- (como citoproteção gástrica, homeostase vascular, agregação de
-vida curta e sem circulação êntero-hepática podem ser a melhor escolha plaquetas e função renal), e é estimulada por hormônios ou fatores
para pacientes debilitados e idosos. de crescimento. A COX-2 geralmente não é detectável na maioria
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 23
dos tecidos, sendo sua expressão aumentada durante os estados dolac. Mas a maioria dos AINHs apresenta atividade contra a COX-1 em
de inflamação, ou experimentalmente, em resposta a estímulos mi- concentrações terapêuticas.10
togênicos. A COX-2 é constitutivamente expressa no cérebro, rins, Os salicilatos inibem apenas marginalmente a enzima COX em siste-
nos ossos e, provavelmente, no sistema reprodutor feminino.6 A mas enzimáticos de células puras, porém, em sistemas de células humanas
expressão da COX-2 é inibida pelos CEs e isso pode contribuir para totais, são potentes inibidores da COX-1 e COX-2.11
os seus efeitos anti-inflamatórios. Efeitos não mediados pelas prostaglandinas: vários mecanis-
As diferenças na eficácia com que um determinado AINH inibe a COX- mos de ação não mediados pelas prostaglandinas têm sido pos-
1 ou COX-2 pode influenciar sua eficácia e sua toxicidade. O efeito de ini- tulados para explicar as ações dos salicilatos não acetilados. Estes
bição da COX-2 sobre a inflamação não é completamente compreendido. mecanismos podem também aplicar-se, em grau variável, para
Camundongos knockout para o gene da COX-2 são tão suscetíveis à in- outros AINHs não acetilados:2 alterações no transporte de ânions
flamação quanto animais tipo selvagem.7 Por outro lado, camundongos transmembrana, fosforilação oxidativa e na captação de ácido
knockout para o gene da COX-1 apresentam menos ulceração após a araquidônico; inibição da função dos neutrófilos.12 O papel destes
administração da indometacina do que controles selvagens.8 Linfócitos T processos não mediados por prostaglandinas permanece obscuro.2
humanos expressam COX-2, a qual pode desempenhar papel importante Os AINHs in vitro inibem a transcrição dependente de NF-kB, levando
nos eventos precoces e tardios da ativação das células T, como produção à inibição da sintetase do óxido nítrico induzível (iNOS).13 A sintase do
de interleucina-2, fator de necrose tumoral alfa e interferon-gama. Embora oxido nítrico (NO), quando induzida por citocinas e outros mediadores pró-
a inibição seletiva da COX-2 possa produzir menos toxicidade gástrica, tem -inflamatório, produz NO em grandes quantidades, levando a aumento da
14
havido preocupação de que a inibição da COX-2 possa atrasar a cicatriza- inflamação. Os AAS em níveis terapêuticos inibem a expressão de iNOS e
13
ção das erosões gástricas e possa aumentar a lesão em tecido inflamado, consequente produção de NO in vitro.
9
como no modelo experimental de colite. Estas observações podem ter Apoptose: um novo efeito dos AINHs tem sido descrito e envolve a
relevância clínica em pacientes com doença inflamatória intestinal onde inibição das prostaglandinas. As prostaglandinas inibem a apopto-
os AINHs não seletivos podem exacerbar a doença. se celular in vivo e os AINHs, em um processo inflamatório, estabe-
Alguns AINHs mais antigos são também relativamente seletivos para lecem ciclo celular mais próximo do normal, através da inibição da
15
a COX-2 quando usados em baixas doses, como a nabumetona e o eto- síntese de prostaglandinas.
Derivados do Para-aminofenol
Paracetamol < 2.600 325-1.000 mg a 4.000 Para dor leve e estados febris. Ausência de efeito
cada 4 a 6 horas anti-inflamatório significativo. Complemento útil
para analgésicos opioides e AINHs. Ausência de
efeito antiplaquetário e toxicidade GI. Pode causar
hepatotoxicidade em superdosagem crônica ou aguda.
Evitar ou usar dose menor em idosos ou com maior
risco de hepatotoxicidade. Interage com varfarina,
prolongando INR, e com medicamentos indutores da
CYP-450, aumentando risco de lesão hepática.
Salicilatos (acetilados)
AAs 2.600 325-650 mg a cada 4.000 Atualmente pouco usado para dor crônica e inflamação,
4 a 6 horas devido ao risco de gastropatia grave. Ao contrário
de outros AINHs, inibe irreversivelmente a função
plaquetária (7 a 10 dias) e o salicismo pode ocorrer com
doses elevadas ou uso crônico em doses analgésicas.
Diflunisal 1.000 500 mg a cada 8 a 1.500 Para dor leve a moderada e condições inflamatórias
12 horas agudas ou crônicas. Menor risco de gastropatia em
comparação com AAS e possivelmente outros AINHs.
Salsalato 1.500 750-1.000 mg a 3.000 Geralmente tolerado pelos pacientes com asma. Início
cada 8 a 12 horas mais lento e, possivelmente, maior duração de ação
do que AAS ou paracetamol. Não inibem a função
plaquetária.
24 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Ácido Propiônico
Ibuprofeno 1.600 400 mg a cada 4 a 3.200 aguda, 2.400 Para dor leve a moderada, febre e condições
6 horas crônica inflamatórias agudas ou crônicas. Dose de 200 mg a
400 mg é comparável em efeito analgésico a 650 mg
de paracetamol ou AAS. Inibe reversivelmente a função
plaquetária e aumenta o tempo de sangramento. Pode
alterar efeito cardioprotetor da dose baixa de AAS.
Risco mínimo de gastropatia grave em dose diária
≤ 2.400 mg.
Naproxeno 500 250 mg a cada 8 1.250 aguda, 1.000 Para dor leve a moderada, febre e condições
(naproxeno base) horas ou 500 mg a crônica inflamatórias agudas e crônicas. Dose de 250 mg
cada 12 horas comparável em efeito analgésico a 650 mg de AAS.
Tratamento de doenças reumáticas, dose diária total
550 275 mg a cada 8 1.375 aguda, 1.100 pode ser aumentada para máximo de 1.500 mg
(naproxeno de horas ou 550 mg crônica (naproxeno (1.650 mg de naproxeno sódico), se necessário para
sódio) a cada 12 horas de sódio) um efeito adicional. Inibe reversivelmente função
(naproxeno de plaquetária e aumenta o tempo de sangramento. Pode
sódio) alterar o efeito cardioprotetor do AAS de baixa dose.
Parece ter o melhor perfil de segurança cardiovascular
entre os inibidores não seletivos da COX-2.
Cetoprofeno 100 25-50 mg a cada 6 300 Para dor leve a moderada e inflamação aguda ou
a 8 horas crônica. 25 mg de dose comparável ao efeito analgésico
de 400 mg de ibuprofeno.
Flurbiprofeno 100 50-100 mg a cada 6 300 Para dor leve a moderada e inflamação aguda ou
a 12 horas crônica. Em alguns países, também disponível
como pastilha para dor de garganta e como injeção
intravenosa.
Diclofenaco 75 ou 100 (uma vez 50 mg a cada 8 150 Para dor leve a moderada e inflamação aguda ou
ao dia) horas crônica. Também disponível como adesivo tópico para
aplicação local.
Etodolac 600 200-400 mg a cada 1.200 Para dor leve a moderada e inflamação aguda ou
6 a 8 horas crônica. Dose de 200 mg tem efeito analgésico
comparável a 400 mg de ibuprofeno.
Indometacina 75 25-50 mg a cada 8 150 Opção para dor leve a moderada e condições
a 12 horas inflamatórias agudas ou crônicas. Efeitos adversos no
sistema nervoso central e GI podem ser mais frequentes
ou graves do que com outros AINHs.
Meloxicam 7.5 7,5-15 mg a cada 24 15 Para dor crônica e inflamação, osteoartrite e artrite
horas reumatoide. Parece ser seletivo para a COX-2 em
dose mais baixa, mas os efeitos adversos globais são
semelhantes a outros AINHs. Facilidade posológica (uma
tomada diária)
Piroxicam 10 10-20 mg a cada 24 20 Opção para dor crônica e inflamação pouco responsiva
horas a outros AINHs. Elevada incidência de gastropatia
em dose diária > 20 mg e em idosos. É sugerida
gastroproteção farmacológica concomitante.
Meclofenamato 150 50 mg a cada 4 a 400 Para dor aguda ou crônica e inflamação, osteoartrite,
6 horas artrite reumatoide e dismenorreia.
Ácido Mefenâmico 500 250 mg a cada 6 1.000 Para dor aguda e dismenorreia. Eficácia anti-inflamatória
horas é comparativamente baixa.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 25
Nabumetona 1.000 500-750 mg a cada 2.000 Para dor crônica e inflamação, osteoartrite e artrite
8 a 12 horas ou reumatoide. Parece ser seletivo para a COX-2, mas
1.000-1.500 mg os efeitos adversos globais são semelhantes a outros
uma vez ao dia AINHs. Facilidade posológica.
Celecoxibe 400 200 mg uma vez 400 Opção para uso crônico de AINH em pacientes com risco
ao dia ou 100 mg a de gastropatia. Eficácia comprovada e menor risco de
cada 12 horas toxicidade GI em comparação com AINHs não seletivos.
Sem efeito sobre função plaquetária. Dosagem acima de
200 mg/dia associada a maior risco cardiovascular.
Etoricoxibe 30 30-90 mg uma vez 120 Para dor e inflamação aguda e crônica.
ao dia
Parecoxib (intravenoso e 40 20-40 mg a cada 6 80 Para dor pós-operatória, por curto prazo, em pacientes
intramuscular) a 12 horas que não possam receber AINH por via oral.
■■ USO CLÍNICO Muitos dos efeitos tóxicos dos AINHs estão relacionados com seu
modo de ação, a inibição da síntese de prostaglandina. No entanto, este
As indicações e a eficácia dos AINHs variam de acordo com o paciente
problema tornou-se um pouco mais complexo, com a disponibilidade de
individual e a doença. As variações observadas na resposta do pacien-
inibidores seletivos da COX-2, que possuem menor risco de toxicidade,
te podem resultar, em parte, da farmacodinâmica da medicação. Dessa
particularmente gastrintestinal e, possivelmente, maior risco de eventos
forma, se um paciente não consegue resposta terapêutica adequada com
adversos cardiovasculares.
um determinado AINH, a substituição por AINH de classe diferente é uma
Não há um AINH totalmente seguro em qualquer cenário clínico. Em-
opção terapêutica razoável.
bora o ibuprofeno seja bastante seguro quando administrado em baixa
Infelizmente, a mesma abordagem não é necessariamente reco- dose, em doses maiores, qualquer AINH está associado a risco aumenta-
mendada para pacientes que desenvolvem efeito tóxico com um AINH. do de evento adverso. Um inibidor seletivo da COX-2, ou a administração
Algumas toxicidades são exclusivas para determinadas classes de AINHs, concomitante de um inibidor de bomba de prótons ou de antagonista do
e outras estão relacionadas com o modo de ação e a inibição da síntese de receptor de histamina H2 pode ser preferível quando a toxicidade GI é um
prostaglandinas. Um exemplo é a insuficiência renal devido à vasoconstri- problema.
ção renal, a qual é mediada pela redução da produção de prostaglandinas
vasodilatadoras e podem ser semelhantes entre os diferentes fármacos.
Esquemas posológicos: muitos estudos sugerem que a adesão a ■■ REFERÊNCIAS
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A anamnese e a avaliação clínica adequada são importantes para a esco- 9. Reuter BK, Asfaha S, Buret A, Sharkey KA, Wallace JL. Exacerbation
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26 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
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Clin Inv. 1995;95(4):1756-65. do processo inflamatório, como o TNF-α, IL-6, IL-R1, IL-12/23, IL-17, RANKL
13. Amin AR, Vyas P, Attur M, Leszczynska-Piziak J, Patel IR, Weissmann G, et e eixo BLyS, mas também como moduladores da coestimulação (abatacep-
al. The mode of action of aspirin-like drugs: effect on inducible nitric oxide te) e contra células B (rituximabe). Recentemente, as pequenas moléculas,
synthase. Proc Natl Acad Sci U S A. 1995;92(17):7926-30. de natureza sintética, mas com ação sobre alvos intracelulares das vias de
14. Hawkey CJ. Future treatments for arthritis: new NSAIDs, NO NSAIDs, or no
sinalização inflamatória, como tofacitinibe, também foram incorporadas
NSAIDs? Gastroenterology. 1995;109(2):614-6.
ao arsenal terapêutico do reumatologista.
15. Lu X, Xie W, Reed D, Bradshaw WS, Simmons DL. Nonsteroidal
antiinflammatory drugs cause apoptosis and induce cyclooxygenases
in chicken embryo fibroblasts. Proceedings Natl Acad Sci U S A. ■■ PRECAUÇÕES E CUIDADOS ANTES DA PRESCRIÇÃO
1995;92(17):7961-5.
16. Catella-Lawson F, Reilly MP, Kapoor SC, Cucchiara AJ, DeMarco S, Tournier Caracterizar as manifestações articulares e extra-articulares das
B, et al. Cyclooxygenase inhibitors and the antiplatelet effects of aspirin. AIC e DRAI, pois auxiliam na tomada de decisão e na escolha do
NEJM. 2001;345(25):1809-17. agente imunobiológico mais adequado.
Verificar as comorbidades e peculiaridades de cada paciente, pois
os aspectos de segurança também são úteis para a tomada de de-
cisão.
Sorologias virais, particularmente anti-HIV e vírus da hepatite B e C.
Investigação de tuberculose latente, incluindo dados epidemioló-
8 gicos (antecedentes pessoais, familiares e profissionais; cicatriz de
BCG; contactantes), teste do derivado purificado proteico (PPD) e
IMUNOBIOLÓGICOS radiografia torácica.
Atualização do cartão vacinal, especialmente para pneumococo,
influenza sazonal e pandêmica (H1N1, sem adjuvante); difteria,
tétano e coqueluche (DTPa); Salk; papilomavírus humano (HPV);
■■ MARCELO M. PINHEIRO varicela-zoster; e vírus da hepatite A e B. Vacinas com vírus vivos
■■ EMILIA INOVE SATO atenuados (sarampo, caxumba, rubéola, raiva, varicela, febre ama-
rela, Sabin e rotavírus) podem ser administradas 3 a 4 semanas
antes e evitadas após o uso desses agentes.
Verificar métodos anticoncepcionais e lactação em mulheres em
O uso de imunobiológicos tem representado um grande avanço no ma-
idade reprodutiva. A maioria desses agentes atravessa a barreira
nuseio clínico e no tratamento de pacientes com artropatias inflamató-
placentária e são excretados pelo leite, pois se combinam às imu-
rias crônicas (AIC), como a artrite reumatoide (AR), a espondilite anqui-
noglobulinas da classe IgG. Em mulheres expostas aos bloquea-
losante (EA), a artrite psoriásica (APs) e a artrite idiopática juvenil (AIJ),
dores do TNF, foram descritos casos da VACTERL syndrome, que
bem como em outras doenças reumáticas autoimunes (DRAI), incluindo
inclui anormalidades Vertebrais, atresia Anal, malformações Car-
o lúpus eritematoso sistêmico (LES), a síndrome de Sjögren (SSj), a escle-
díacas, TraqueoEsofágicas, Renais e pulmonares (Lung). Portanto,
rose sistêmica (ES), as miopatias inflamatórias (MMI) e as vasculites sis-
essas medicações não devem ser usadas na gravidez ou lactação,
têmicas, sobretudo os anticorpos anticitoplasma de neutrófilos (ANCA)
embora a decisão compartilhada, ponderando riscos e benefícios,
relacionados e associados a crioglobulinas.
seja necessária em casos específicos.
Diferentemente dos agentes sintéticos, moléculas simples, consti-
De modo geral, não há dados consistentes de segurança para o
tuídas por poucos átomos, facilmente produzidos em grande escala, com
uso de terapia biológica em pacientes com neoplasias malignas
cópias idênticas (genéricos) e baixa imunogenicidade, a terapia imunobio-
nos últimos cinco anos. O rituximabe é o agente de escolha para
lógica é composta por moléculas complexas, com estrutura quaternária,
grande quantidade de átomos e elevada imunogenicidade. Possuem, ain- estes casos.
da, elevado custo de produção e são dificilmente copiados e não idênticos Hipersensibilidade prévia a qualquer um dos produtos deve ser ve-
(biossimilares). rificada, evitando-se sua administração em casos positivos.
Os imunobiológicos são produtos conhecidos há bastante tempo e, Verificar função hepática e renal, uma vez que não há dados de
por definição, são produzidos dentro de um ser vivo e administrados ex- eficácia e segurança em pacientes com disfunção nesses órgãos.
clusivamente por via parenteral. Entre eles, é possível citar as vacinas e A combinação de agentes imunobiológicos não é recomendada,
os soros hiperimunes, os hormônios (insulina, hormônio do crescimento, pois não é suportada por evidências de eficácia e segurança, ex-
teriparatida, eritropoietina), as imunoglobulinas, os hemoderivados, os ceto com relação ao denosumabe, que pode ser combinado aos
biomedicamentos (heparina, interferon, fator estimulador de crescimen- bloqueadores do TNF, tocilizumabe, rituximabe e abatacepte, sem
to de colônia de granulócitos [G-CSFJ]) e os anticorpos monoclonais. incremento do risco de infecções.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 27
CERTOLIZUMABE
INFLIXIMABE (IFX) ETANERCEPTE (ETN) ADALIMUMABE (ADA) GOLIMUMABE (GOL) PEGOL (CTP)
Molécula Quimérico (humano Proteína de fusão Totalmente humano Totalmente humano Humanizado
constante, murino solúvel (TNF-RII (fragmento Fab +
variável) p75, Fc IgG1 humana PEG)
Esquema 0-2-6 sem 1 ou 2 x/sem 15 dias 30/30 dias 0-2-4 sem (400)
8 sem 4/4 sem (200)
Via de administração EV SC SC SC SC
Ligação ao TNF-α Solúvel e membrana Solúvel Solúvel e membrana Solúvel e membrana Solúvel e membrana
Ligação ao TNF-β – + – – –
Lise celular + ? + + –
dependente de
complemento
Indução da apoptose + – + + –
28 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Doença pulmonar: são descritos casos de fibrose pulmonar inters- Não aumentou o risco cardiovascular e de neoplasias. A frequência
ticial e, de modo geral, esses agentes são evitados nesse cenário, de HAHAs é baixa, e fenômenos imunomediados são muito raros.
especialmente nos com AR.
Positivação de fatores antinucleares, anti-DNA nativo e antifosfolí- ■■ BLOQUEADOR DO EIXO IL-12/ IL-23
pides pode ocorrer, embora sem repercussão clínica ou surgimento (USTEQUINUMABE)
de outras DRAI. Raramente, alguns eventos paradoxais, como lesões
A IL-12 e a IL-23 são citocinas heterodiméricas secretadas pelas células
psoriasiformes, colite, uveíte e fenômenos imunomediados (LES in-
apresentadoras de antígeno ativadas, como macrófagos e células dendrí-
duzido por anti-TNF, vasculites digitais), podem ocorrer.
ticas. Ambas participam da ativação das células NK e da diferenciação e
Nos pacientes com falência secundária ou com eventos adversos a
ativação das células T CD4+, bem como são muito importantes na ativa-
algum dos bloqueadores do TNF (25 a 40%), pode haver resposta,
ção da via Th17.
boa a moderada em 40 a 60% dos pacientes, com a troca para
O ustequinumabe (UST) (STELARA®) é um anticorpo monoclo-
outro inibidor do TNF.
nal IgG1 totalmente humano que se liga, com elevada afinidade e espe-
Pacientes que apresentam falência primária ao primeiro anti-TNF
cificidade, à subunidade proteica p40 das IL-12/IL-23, inibindo suas ações
ou resposta inadequada ao segundo, a substituição para terapia
biológicas. Não se liga diretamente a IL-12 nem a IL-23 antes da ligação ao
imunobiológica com outros mecanismos de ação (RTX, tocilizuma-
receptor IL-12β1 e, dessa forma, não promove citotoxicidade mediada por
be, ABT) parece apresentar melhor resultado.
anticorpo ou complemento das células com esse receptor.
300 mg) para pacientes com mais de 7,5 kg, a cada quatro semanas. Cada com a ciclofosfamida. Houve melhor resposta em brancos e latino-ameri-
injeção tem 180 mg. canos do que em pretos.
EVENTOS ADVERSOS
■■ BLOQUEADOR DA IL-17 (SECUQUINUMABE) Infecções, náuseas, vômitos, diarreia, cefaleia, febre, leucopenia, insônia,
A IL-17 é uma citocina pró-inflamatória, produzida por células dendríti- depressão, reações infusionais e alérgicas e transtornos de comportamento.
cas, mastócitos, macrófagos, neutrófilos e linfócitos T ativados, mas com
ações efetoras em diversas outras linhagens celulares, como osteoblas-
tos, osteoclastos, fibroblastos, endoteliócitos e queratinócitos. Envolvi- ■■ BLOQUEADOR DO RANKL (DENOSUMABE)
®
da preferencialmente com a resposta a agentes extracelulares e fungos, O denosumabe (DNS) (Prolia ) é um anticorpo monoclonal totalmente
representa a citocina-chave da via Th17. Pertence a uma família com 6 humano dirigido contra o ligante do RANK (RANK-L), uma das principais
subfrações (A-F) com receptor comum (IL-17RA). O secuquinumabe (SEK) moléculas sinalizadoras da osteoclastogênese, e crucial para a reabsorção
®
(COSENTYX ) é um antagonista totalmente humano da IL-17A. Estudos óssea. Pode aumentar a densidade óssea da coluna lombar (6 a 8%) e fêmur
têm mostrado redução da progressão radiográfica de pacientes com es- (3 a 5%) e reduzir significativamente a chance de novas fraturas vertebrais
pondilose anquilosante em 24 meses, que o diferencia dos bloqueadores (70 a 75%) e não vertebrais (25%), incluindo quadril (40%). Diferentemente
do TNF. Foi aprovado pela Anvisa no final de 2015. dos bisfosfonatos, pode ocasionar incremento progressivo da densidade ós-
sea ao longo de 8 anos, mas o benefício é perdido com a sua interrupção.
INDICAÇÕES Recentemente, tem sido descrito aumento significativo da taxa de fraturas
com a menor adesão e suspensão da medicação. Sendo assim, a interrup-
Aprovado para o tratamento de pacientes com psoríase, artrite psoriásica
ção do seu uso deve ser avaliada criteriosamente, e outra medicação para
e espondilose anquilosante, com resposta inadequada ao tratamento-
bloquear o aumento da reabsorção óssea deve ser considerada.
-padrão com AINEs e FMCDs.
INDICAÇÕES
POSOLOGIA Osteoporose na pós-menopausa.
São indicados 150-300 mg SC a cada 4 semanas. A dose de 300 mg é Perda óssea em pacientes submetidos a tratamentos hormonais,
preferencialmente usada em pacientes com envolvimento cutâneo maior e que induzem hipogonadismo, para neoplasia maligna da próstata
mais grave, ou naqueles com resposta incompleta com 150 mg. e mama. Em pacientes com metástases ósseas de câncer de prósta-
ta e mama, houve redução das fraturas vertebrais.
EVENTOS ADVERSOS Osteoporose masculina.
Entre os eventos adversos são vistos diarreia, reações locais, infecções,
sobretudo as fúngicas.
POSOLOGIA
São indicados 60 mg, SC, a cada seis meses.
senta melhor resposta terapêutica quando combinados ao MTX ou célula apresentadora de antígeno, e ao CD 28, do linfócito T, promovendo
a outros FMCDs, bem como em indivíduos com fator reumatoide e bloqueio do segundo sinal e, consequentemente, inibição da célula T; sem
anti-CCP positivos. citotoxicidade dependente de complemento. Dessa forma, o abatacepte
Diversas DRAI, como LES, vasculites ANCA-relacionadas e crioglo- (ABA) (Orencia®) promove o bloqueio da resposta imunoinflamatória em
bulinemias, bem como em pacientes com SSj e miopatias inflama- fase mais inicial do que a inibição proporcionada pela terapia anti-TNF,
tórias graves e refratárias aos imunossupressores convencionais. sem ocasionar apoptose e depleção celular direta.
AIJ (formas sistêmicas ou poliarticulares): pode ser usado em casos
refratários aos FMCD e aos antagonistas do TNF-α. INDICAÇÕES
AR com resposta inadequada aos FMCDs e aos bloqueadores do TNF.
POSOLOGIA
Infusão EV de 1 g na semana 0 e após 14 dias. A velocidade de infusão POSOLOGIA
deve ser lenta (4-6h) e pré-medicação deve ser aplicada para minimizar Indicam-se 500 mg para pacientes com até 60 kg; 750 mg para pacientes
as reações infusionais. Recente trabalho mostrou que pode ser aplicada com peso entre 60 e 100 mg e 1.000 mg para os com mais de 100 kg. Cada
em 2h em pacientes que não tiveram nenhum problema na primeira in- frasco contém 250 mg. A indução é feita com três infusões a intervalos
fusão. Os ciclos podem ser repetidos a cada 6 a 12 meses, dependendo de duas semanas, seguidas de infusões a cada quatro semanas. Não há
da resposta. necessidade de pré-medicação.
Os ensaios clínicos mostraram alívio dos sintomas articulares, melho-
AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA ra da qualidade de vida e incapacidade e minimização do dano radiográfi-
Pode variar de acordo com a doença. Em AR, o efeito máximo ocorre entre co, especialmente se combinados ao MTX ou outros FMCDs.
as semanas 16 e 24. Em casos de plaquetopenia autoimune ou púrpura
trombocitopênica imunológica (PTI), a resposta é mais rápida, com média EVENTOS ADVERSOS
de 2 a 4 semanas. Embora não obrigatória, a dosagem de imunoglobuli-
Os mais comuns são relacionados a maior taxa de infecções quando com-
nas (IgG, IgM e IgA) pode ser feita, com objetivo de evitar casos de hipo-
parado ao placebo. As reações infusionais ocorrem em menos de 10% e
gamaglobulinemia. Em casos selecionados, a contagem de CD19 também
não há relatos de tuberculose ou infecções oportunistas como descritas
pode auxiliar a decisão clínica para a definição de novos ciclos.
nos usuários de anti-TNF. A formação de anticorpos neutralizantes, anti-
EVENTOS ADVERSOS nucleares e outros auto anticorpos é menos frequente do que a observada
com os bloqueadores do TNF.
Na maioria das vezes, são leves e toleráveis. As reações infusionais podem
Até o momento, não há evidências para o aumento do risco de neo-
ocorrer em cerca de 30% e tendem a diminuir com os ciclos sucessivos.
plasias. Parece haver pior resposta vacinal ao H1N1 em usuários de anti-
Além disso, podem ser atenuadas com as pré-medicações (anti-histamíni-
bióticos (ABT) do que com outros imunobiológicos.
cos e corticosteroides endovenosos) e a redução da velocidade de infusão.
Apesar de o número de infecções ser semelhante entre o RTX e os
outros imunobiológicos, a taxa de infecções graves parece ser menor entre
usuários de anti-CD20. Linfopenia pode ocorrer e é uma reação esperada, ATENÇÃO!
diante do mecanismo de ação. Pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) têm maior
Foram relatados alguns casos de leucoencefalopatia multifocal pro- chance de infecções respiratórias e de piora da dispneia. Nesses ca-
gressiva (LEMP), uma doença rara e frequentemente fatal, em pacientes sos, o ABA não é recomendado, e outros agentes podem ser esco-
com LES e AR em uso de rituximabe, em virtude da reativação do vírus JC lhidos.
no SNC, em indivíduos com grave imunossupressão.
Embora seja quimérico, o RTX tem menor potencial imunogênico do
que os bloqueadores do TNF-α, de modo que a presença de HACAs é ob-
servada em menos de 10% dos pacientes e não possuem significado clíni- ■■ TOFACITINIBE
co, na maioria das vezes. O Tofacitinibe (Xeljanz®) é uma pequena molécula sintética, e não bio-
De modo geral, o uso do RTX está relacionado à redução da resposta lógica, que inibe seletivamente a Jannus cinase (JAK), importante para a
vacinal de células T dependentes e independentes, especialmente pneu- ativação e sinalização intracelular de diversas citocinas pró-inflamatórias,
mococo, tétano e influenza. como TNF e IL-6.
INDICAÇÕES
ATENÇÃO!
AR com moderada a grave atividade e resposta inadequada a, pelo
O RTX demonstrou melhor resposta clínica, laboratorial e radiográfica menos, 2 FMCDs ou a um imunobiológico. Pode ser usado em mo-
em pacientes positivos para fator reumatoide e anticorpos antiproteí- noterapia ou combinado ao MTX.
nas citrulinadas (ACPA).
POSOLOGIA
Indica-se comprimido de 5 mg, 2 vezes ao dia, por via oral.
■■ TERAPIA DA MODULAÇÃO DA COESTIMULAÇÃO
(ABATACEPTE)
EVENTOS ADVERSOS
Proteína de fusão recombinante da proteína CTLA4 (cytotoxic T-lym-
phocyte antigen) combinada ao fragmento Fc da IgG1 humana modifica- Linfopenia, dislipidemia, alterações de enzimas hepáticas. Da forma seme-
da. O CTLA4 é expresso por linfócitos T ativados e se liga ao CD80/86, da lhante a outros biológicos, as infecções devem ser monitoradas e preve-
32 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
REVISÃO
MECANISMOS DE AÇÃO
O efeito é central e periférico, por bloqueio da síntese das prostaglandinas
Os imunobiológicos são compostos por moléculas complexas, o que (PG), redução de ácidos graxos livres, estabilização de membranas lisos-
dificulta a sua produção e torna seu custo elevado. sômicas, redução de bradicinina e inibição de radicais livres. A dipirona e
Existem cinco bloqueadores do TNF disponíveis no Brasil: inflixima- o paracetamol agem no SNC.
be, etarnercepte, adalimumabe, golimumabe e certolizumabe; ca-
pazes de reduzir atividade inflamatória e controlar sinais e sintomas INDICAÇÕES
das doenças. Os AINEs são indicados para: dor pós-operatória, trauma, dismenorreia,
Bloqueadores das interleucinas também são imunubiológicos im- cólica nefrética, lombalgia, lombociatalgia, cervicobraquialgia, síndrome
portantes, entre eles, podem ser citados: tocilizumabe, ustequinu- miofascial, tendinite, bursite, epicondilite, osteoartrite, AR, gota, cefaleia
mabe, secuquinumabe, canaquinumabe e anakinra. e dor oncológica.
Em reumatologia, são utilizados contra algumas citocinas-chave:
TNF-α, IL-6, IL-R1, IL-12/IL-23, IL-17, RANKL e eixo BLyS, mas também CAUTELA E CONTRAINDICAÇÕES
como moduladores da coestimulação (abatacepte) e contra células
Os AINEs devem ser evitados em pacientes com hipersensibilidade à medi-
B (rituximabe).
cação, história de úlcera péptica, varizes esofageanas, esofagite de reflu-
O tofacitinibe, uma molécula sintética que inibe a JAK, é uma recen-
xo, hipoalbuminemia, hipovolemia, cirrose hepática, insuficiência cardíaca
te incorporação no arsenal terapêutico no tratamento da AR.
(IC), hipertensão arterial e idosos. São contraindicados em pacientes com
úlcera ativa e hemorragia digestiva recente.
■■ LEITURAS SUGERIDAS
EFEITOS ADVERSOS
Josse R, Khan A, Ngui D, Shapiro M. Denosumab, a new pharmacotherapy option
for postmenopausal osteoporosis. Curr Med Res Opin. 2013;29(3):205-16. Os principais efeitos adversos dos AINEs são gastrintestinais e renais. No
Navarro-Millán I, Singh JA, Curtis JR. Systematic review of tocilizumab for trato digestório os AINEs podem causar úlcera, hemorragia e perfuração.
rheumatoid arthritis: a new biologic agent targeting the interleukin-6 Os fatores de risco são: pacientes com história de úlcera; antecedente de
receptor. Clin Ther. 2012;34(4):788-802. sangramento do trato digestório; doenças cardiovasculares; uso concomi-
Schoels M, Aletaha D, Smolen JS, Wong JB. Comparative effectiveness and tante de corticosteroides ou de anticoagulantes; idade maior do que 60
safety of biological treatment options after tumor necrosis factor α inhibitor anos; uso de álcool, fumo e grandes e múltiplas doses. Podem provocar
failure in rheumatoid arthritis: systematic review and indirect pairwise alteração na função renal. Os fatores de risco para lesão renal são: disfun-
meta-analysis. Ann Rheum Dis. 2012;71(8):1303-8. ção renal prévia, hipovolemia, hipotensão ou hipertensão arterial, idade
Silva-Fernández L, Loza E, Martínez-Taboada VM, et al. Therapy for systemic
avançada, associação de AINE, ICC e cirrose hepática. Os inibidores de
vasculitis: a systematic review. Semin Arthritis Rheum. 2014;43(4):542-57.
Singh JA, Hossain A, Tanjong Ghogomu E, Kotb A, Christensen R, Mudano AS,
COX-2 podem causar lesão renal, como os AINEs inibidores de ambas as
et al. Biologics or tofacitinib for for rheumatoid arthritis in incomplete ciclo-xigenases (COX-1 e COX-2). A dipirona e o paracetamol não causam
responders to methotrexate or other traditional disease-modifying anti- lesão renal. Os AINEs e o paracetamol podem causar lesão hepática. As
rheumatic drugs: a systematic review and network meta-analysis. Cochrane complicações hematológicas (raras)dos AINEs são: anemia hemolítica,
Database Syst Rev. 2016 May 13;5:CD012183. [Epub ahead of print]. agranulocitose, trombocitopenia e anemia aplástica.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 33
Faz uso, apesar dos efeitos adversos pela dose excessiva, sendo Maprotilina: 25 a 75 mg/d.
incapaz de prestar atenção para responsabilidades e obrigações. Fluoxetina: 20 a 40 mg/d.
Paroxetina: 40 mg/d.
APRESENTAÇÕES DISPONÍVEIS Citalopram: 20 a 40 mg/d.
Codeína: comprimidos de 30 e 60 mg; solução de 3 mg/mL. Escitalopram: 10 a 20 mg/d.
Tramadol: cp de 50 e 100 mg; solução de 50 mg/mL (20 gt) e 100 Sertralina: 50 a 100 mg/d.
mg/mL (40 gt); ampola 50 e 100 mg. Venlafaxina: 75 a 150 mg/d.
Morfina de liberação imediata: cp de 10 e 30 mg, solução de 10 Desvenlafaxina: 50 a 100 mg/d.
mg/mL; amp 0,2, 2, e 10 mg; Morfina LC: cápsulas de 30, 60, e Duloxetina: 60 a 120 mg/d.
100 mg. Bupropiona: 150 mg.
Metadona: cp de 5 e 10 mg; amp 10 mg.
Oxicodona LC: cp de 10, 20 e 40 mg. EFEITOS ADVERSOS
Fentanil TD: adesivos de 12, 25, 50, 75 e 100 µg/h. Os efeitos adversos dos antidepressivos são: boca seca, sonolência, se-
dação, constipação, náusea, diarreia, retenção urinária, astenia, tontura,
■■ ANTIDEPRESSIVOS cefaleia, visão borrada, arritmia cardíaca, leucopenia, alteração da função
hepática, disfunção sexual, tremor, anorexia, dor de cabeça, sudorese e
CLASSIFICAÇÃO síndrome serotoninérgica.
Tricíclicos: 1) aminas terciárias (amitriptilina, imipramina, desipra-
mina, clomipramina, trimipramina e doxepina); 2) aminas secundá- ■■ ANTICONVULSIVANTES
rias (nortriptilina e protriptilina).
Heterocíclicos: maprotilina. INDICAÇÕES
Tetracíclicos: mianserina. Os anticonvulsivantes são indicações para: dor neuropática (neuropatia
Inibidores seletivos da recaptação de serotonina atípicos (ISRSs): diabética, neuralgia do trigêmeo, neuropatia do HIV, dor central, síndrome
fluoxetina, paroxetina, sertralina, citalopram, fluvoxamina e tia- complexa de dor regional, neuralgia do trigêmeo, neurite traumática, sín-
neptina. drome do túnel do carpo, lombociatalgia, cervicobraquialgia), fibromial-
Inibidores da recaptação combinada de serotonina e norepinefrina gia, enxaqueca e dor pós-operatória.
(ISRSN): venlafaxina, nefazodona, duloxetina e milnaciprano.
Noradrenérgicos e serotoninérgicos específicos: mirtazapina. MECANISMOS DE AÇÃO
Inibidores seletivos da recaptação de norepinefrina (ISRN): reboxe-
Bloqueio de canais de sódio: carbamazepina, lamotrigina, ácido
tina, trazodona e bupropiona.
valproico, oxcarbazepina e topiramato.
Inibidores da monoaminoxidase (IMAOs): tranilcipromina e moclo-
Diminuição da liberação de glutamato das terminações nervosas:
bemida.
carbamazepina, fenitoína, lamotrigina e topiramato.
Outros: triptofano; Hypericum perfuratum.
Modulação de canais de cálcio: gabapentina e pregabalina.
Efeitos sobre receptores NMDA.
MECANISMOS DE AÇÃO
Aumento do efeito GABA: ácido valproico e topiramato.
ISRSN na sinapse medular. Inibição da anidrase carbônica: topiramato.
Bloqueio de canais de sódio e de cálcio.
Aumento da função de ácido gama-aminobutírico (GABA). DOSES HABITUAIS
Ativação dos canais de potássio.
Carbamazepina: 300 a 1.200 mg/d.
Diminuição de substância-P e de prostaglandinas.
Oxcarbazepina: 600 a 1.200 mg/d.
Bloqueio de receptores N-metil-O-aspartato (NMDA), alfa-1-adre-
Topiramato: 50 a 600 mg/d.
nérgico e histamínico-H1.
Fenitoína: 200 a 500 mg/d.
Gabapentina: 900 a 1.800 mg/d.
INDICAÇÕES
Lamotrigina: 50 a 400 mg/d.
Os antidepressivos são indicados para: herpes-zóster, neuralgia pós- Ácido valproico: 900 a 1.200 mg/d.
-herpética, neuropatia diabética, síndrome complexa de dor regional tipos Pregabalina: 75 a 300 mg/d.
I e II, dor central (após AVC, esclerose múltipla, lesão medular), neurite A carbamazepina é um medicamento de primeira linha para tra-
traumática, neuralgia do trigêmeo, enxaqueca, cefaleia tipo tensão, fi- tamento de neuralgia do trigêmeo. Deve ser usada com cautela em
bromialgia, síndrome miofascial, lombociatalgia, cervicobraquialgia, dor paciente com glaucoma, disfunção hepática e renal e alteração hema-
fantasma, dor oncológica, dor pós-operatória. tológica. Pode causar malformação fetal. Não é recomendada para os
pacientes com bloqueio atrioventricular e antecedente de depressão da
CONTRAINDICAÇÕES medula óssea. Deve ser feita monitoração periódica de função hemato-
Os tricíclicos, os duais e os que aumentam a norepinefrina na sinapse, lógica e hepática nos pacientes que utilizam carbamazepina. A oxcarba-
não devem ser usados em pacientes com: infarto do miocárdio recente, zepina é semelhante à carbamazepina e deve ser usada com cautela em
bloqueio de ramo, arritmia, glaucoma de ângulo agudo, miastenia grave pacientes com alteração das funções renal, hepática ou cardiovascular
e hipertiroidismo. e nos idosos. A fenitoína deve ser usada com cautela em paciente com
alteração da função hepática e renal. Pode causar malformação fetal. A
DOSES HABITUAIS gabapentina e a pregabalina são consideradas medicamentos de pri-
Amitriptilina: 25 a 75 mg/d. meira linha para tratamento de dor neuropática. A lamotrigina, o ácido
Imipramina: 25 a 150 mg/d. valproico e o topiramato são medicamento de terceira linha para dor
Clomipramina: 50 a 75 mg/d. neuropática. O topiramato é indicado como medicamento preventivo
Nortriptilina: 25 a 150 mg/d. para enxaqueca.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 35
EFEITOS ADVERSOS
Opioide é toda substância endógena ou exógena, natural ou sintéti-
São efeitos adversos dos anticonvulsivantes: sedação, ataxia, tontura, so- ca que se liga aos receptores opioides.
nolência, confusão, náusea, visão turva, tremor, confusão, vertigem, reten- Antidepressivos e anticonvulsivantes também são utilizados para o
ção de líquido, hiponatremia, alteração da função hepática e hematológica. tratamento da dor.
■■ RELAXANTES MUSCULARES
■■ LEITURAS SUGERIDAS
CLASSIFICAÇÃO Sakata RK. Analgesia pós-operatória. In: Melega JM, editor. Cirurgia plástica:
Anti-histamínico: Orfenadrina. fundamentos e arte. Rio de Janeiro: Medsi; 2002. p. 565-74.
Benzazolona: Clorzoxazona. Sakata RK. Tratamento da dor no doente com câncer. In: Teixeira MJ, Figueiró
JAB. Dor: epidemiologia, fisiopatologia, avaliação, síndromes dolorosas
Benzodiazepínico: Diazepam.
e tratamento. São Paulo: Moreira Jr; 2001. p. 201-7.
Carbamato: Carisoprodol. Sakata RK, Issy AM. Fármacos para tratamento da dor. São Paulo: Manole; 2008.
Tricíclico: Ciclobenzaprina.
Agonista α-2: Tizanidina.
Derivado GABA: Baclofeno.
MECANISMOS DE AÇÃO 10
Aumento da estimulação de neurônios gabaérgicos
Inibição do reflexo polissináptico e monossináptico. VITAMINAS ANTIOXIDANTES E
Inibição de prostaglandinas.
Ação noradrenérgica e serotoninérgica. ESTRESSE OXIDATIVO
Ação em receptores adrenérgicos alfa-2.
A suscetibilidade do organismo ao estresse oxidativo é dependente proteínas que protegem biomoléculas contra dano (inclusive dano
basicamente do equilíbrio entre a produção de espécies reativas e o po- oxidativo) por outros mecanismos, como as proteínas de choque
tencial antioxidante no nível tecidual. Entretanto, o envelhecimento per térmico; e
se e as doenças degenerativas relacionadas à idade podem induzir altera- substâncias de baixo peso molecular que sequestram ERO e ERN,
ções que favorecem o desequilíbrio desse sistema, desequilíbrio do qual como a glutationa, os tocoferois, os carotenoides, o ácido ascórbi-
eventualmente resulta perda funcional global do organismo em razão do co e, possivelmente, a bilirrubina e o ácido úrico.
estresse oxidativo. Alguns desses antioxidantes vêm da dieta, especialmente o ácido as-
2
Segundo Cutler e Rodriguez, espécies de vida longa têm mecanismos córbico, os carotenoides e o alfatocoferol, havendo uma relação estreita
de proteção antioxidante melhores em relação às velocidades de consumo entre a nutrição e o processo de defesa antioxidante.
de O2 do que espécies de vida curta. Estudos recentes sugerem que pelo
menos alguns dos genes que codificam as defesas antioxidantes podem ser
“genes que determinam o grau de longevidade”. Mostraram, também, que ■■ ANTIOXIDANTES
a maior expectativa de vida se correlaciona com maiores concentrações de A composição da defesa antioxidante difere de tecido para tecido, e de
2
ácido úrico, carotenoides e vitamina E (alfatocoferol) em tecidos de animais. tipo celular para tipo celular em um dado tecido. Os líquidos extracelu-
Assim, é necessário introduzir alguns conceitos sobre estresse oxida- lares possuem mecanismos protetores diferentes daqueles do ambiente
tivo e antioxidantes para que se possa entender a possível utilidade de intracelular. O sistema de defesa antioxidante, por sua vez, não é absoluto,
suplementos vitamínicos em benefício da saúde do idoso e no tratamento ou seja, ele não protege 100% contra os danos promovidos por ERO e ERN.
auxiliar de patologias degenerativas não transmissíveis. Entre os mais conhecidos, o ácido ascórbico (hidrossolúvel), a vitamina E e
os carotenoides (lipossolúveis) desempenham papel importante no que se
conhece como rede antioxidante, ou seja, nenhum deles age isoladamente.
■■ ESTRESSE OXIDATIVO É necessária a presença de todos para que o sistema funcione, sempre em
colaboração com sistemas enzimáticos capazes de metabolizar as ERO.
ATENÇÃO! Além de ter função antioxidante, o ácido ascórbico (vitamina C) é re-
querido in vivo, como cofator de pelo menos 8 enzimas, das quais as mais
Estresse oxidativo é um desequilíbrio oxidativo com potencial lesivo conhecidas são a prolina hidroxilase e a lisina hidroxilase, envolvidas na
às células e ao organismo, que ocorre por excesso de produção de oxi- biossíntese do colágeno. O colágeno sintetizado na ausência de ascorba-
dantes ou menor disponibilidade de antioxidantes. to é insuficientemente hidroxilado, formando fibras inadequadas e dando
origem a uma cicatrização prejudicada e fragilidade dos vasos sanguíneos.
Sabe-se que, embora todos os organismos aeróbios necessitem do oxi- In vivo, os níveis de ascorbato encontrados no plasma humano variam
gênio para sobreviver, essa molécula apresenta seu lado tóxico. Durante a de 30 a 100 micromolar (µm). Concentrações maiores são encontradas no
fosforilação oxidativa, mecanismo usado pelas células para produzir energia humor aquoso ocular, no suco gástrico e no líquido de revestimento do
química (trifosfato de adenosina [ATP]), parte dos elétrons é transferida para pulmão, chegando a níveis milimolares no interior de vários tipos celula-
o oxigênio, dando origem ao radical ânion superóxido. Esse radical integra, res, e são suficientes para exercer efeitos antioxidantes. O ascorbato se
com o peróxido de hidrogênio e o radical hidroxila, além de outros, as deno- oxida a ácido di-hidro-ascórbico (DHA) no líquido sinovial da articulação
minadas espécies reativas de oxigênio (ERO). Além disso, o NO exerce suas do joelho de pacientes com AR ativa e em pulmões de pacientes portado-
funções como fator de relaxamento do endotélio e molécula sinalizadora res de síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA). Possivelmente,
para distintas funções celulares e, também, reage com as ERO, dando ori- o ascorbato age sequestrando ERO/ERN derivadas dos vários fagócitos
gem a espécies reativas de nitrogênio (ERN). Ambas, as ERO e as ERN, são ativados aí presentes.
espécies oxidantes que agem sobre macromoléculas, podendo modificar o
DNA, as proteínas, os lipídeos e os açúcares, alterando estruturas celulares
ATENÇÃO!
em geral.
A defesa contra os danos provocados por ERO/ERN é realizada por Estudos recentes associam o ascorbato como cofator de enzimas res-
meio de antioxidantes presentes nas células e circulantes na corrente san- ponsáveis pela demetilação do DNA e de histonas. Assim, o ascorbato
guínea. A função primária dos antioxidantes é reduzir a velocidade de ini- pode estar envolvido na regulação epigenética do envelhecimento.
ciação e/ou de propagação das reações radicalares, minimizando o dano
oxidativo a moléculas e estruturas celulares. Assim, durante a vida, existe
um equilíbrio entre a produção de ERO/ERN e a ação de antioxidantes. O principal sequestrador de radicais do interior das membranas hu-
Toda vez em que há um excesso de produção de oxidantes ou uma me- manas, já que reage com radicais formados na peroxidação de lipídeos,
nor disponibilidade de antioxidantes acontece um desequilíbrio oxidativo é o d-alfatocoferol, mais conhecido como vitamina E. Na natureza, oito
potencialmente lesivo às células e ao organismo como um todo, o que se substâncias possuem atividade de vitamina E: d-alfa, d-beta, d-gama e
convencionou chamar de estresse oxidativo. d-delta-tocoferóis e d-alfa, d-beta, d-gama e d-delta-tocotrienóis. A forma
Antioxidante é um termo que define qualquer substância que, quan- mais eficiente como antioxidante, presente nas membranas biológicas, é
do presente em baixas concentrações, comparadas àquelas de um substra- a d-alfatocoferol, muitas vezes chamada de RRR-alfatocoferol. Sabe-se
to oxidável qualquer, evita ou atrasa significativamente a oxidação desse também que o alfatocoferol pode estimular a resposta imunológica, re-
substrato. O organismo humano conta com um exército de substâncias duzir a severidade das alterações mediadas por prostaglandinas e inibir a
antioxidantes, algumas endógenas e outras exógenas. As defesas antio- conversão de nitritos a nitrosaminas, que são fortes promotores de tumor.
xidantes incluem:
agentes que removem, cataliticamente, ERO/ERN, como as enzimas
ATENÇÃO!
superóxido dismutase, catalase e glutationa peroxidase;
proteínas que minimizam a biodisponibilidade de catalisadores A vitamina E sintética (dl-alfatocoferol) contém cerca de 12,5% de d-
de reações que produzem ERO/ERN (como os íons ferro e cobre), -alfatocoferol, com os outros sete tocoferóis que são biologicamente
como a ferritina, a transferrina, as haptoglobinas, a hemopexina e menos ativos (21 a 90%).
a metalotioneína;
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 37
Um dos compostos presentes em membranas, que pode atuar como Aproximadamente 40% dos fatores que influenciam a expectativa
um antioxidante bloqueador de reações em cadeia e recuperar o radical de vida podem ser controlados, sugerindo que não apenas a expectativa
tocoferoxil, é a forma reduzida da coenzima Q10, ou ubiquinol 10. Esse média de vida pode ser prolongada, mas também, e principalmente, que a
é o motivo pelo qual a coenzima Q está aparecendo ao lado da vitami- qualidade de vida, particularmente nos últimos anos, pode ser melhorada.
na E nas prateleiras das farmácias. O papel mais importante da coenzima Uma das áreas de pesquisa mais intensa sobre o envelhecimento procura
Q10 é no transporte de elétrons mitocondrial. A ubiquinona é encontrada implicar o dano celular mediado por espécies reativas no desenvolvimento
na membrana plasmática, em todas as membranas intracelulares e nas de alterações patológicas associadas à idade, como as doenças cardiovas-
lipoproteínas de baixa densidade. A ubiquinona já foi descrita como exer- culares, as demências, o diabetes e a catarata.
cendo uma atividade sequestradora de radicais e inibindo a peroxidação Dois grandes estudos clínicos controlados examinaram o efeito prote-
lipídica em lipossomas, membranas e em lipoproteínas. Sugeriram, tam- tor da suplementação de vitaminas antioxidantes na incidência e na mor-
bém, que a ação antioxidante direta pode ser uma importante função fi- talidade por doenças cardiovasculares, incluindo o AVC. Um desses estu-
siológica da coenzima Q10. Entretanto, ressaltaram a necessidade de altas dos incluiu apenas mulheres, profissionais acima de 40 anos (n = 8.000),
concentrações para que ela exiba atividade antioxidante. testando a combinação de vitamina E, vitamina C e betacaroteno contra
Os carotenoides não são oficialmente reconhecidos como nutrien- placebo. O outro incluiu homens e mulheres acima de 55 anos, testando
tes essenciais, mas alguns deles têm atividade pró-vitamina A, que é um a combinação de vitamina E e um dos IECA na prevenção da mortalidade
nutriente essencial. Entretanto, há crescente número de evidências mos- cardiovascular. Esses estudos não mostraram correlação entre consumo de
trando que os efeitos benéficos dos carotenoides são independentes da antioxidantes e diminuição dos riscos cardíacos. No entanto, estudos que
atividade pró-vitamina A. Como os outros antioxidantes mencionados, os investigam a eficácia da terapia antioxidante apresentam vários proble-
carotenoides aumentam a ação do sistema imunológico, são eficazes no mas, tais como desconhecimento sobre os dados epigenéticos dos pacien-
tratamento da protoporfiria eritropoiética e ativam a expressão de genes tes, bioviabilidade dos antioxidantes utilizados e efeitos não específicos
envolvidos na comunicação célula-célula. Entre os que possuem efetiva das vitaminas antioxidantes.
ação antioxidante, pode-se citar o licopeno e o betacaroteno, esse com Os efeitos dos antioxidantes sobre os níveis de produtos derivados
atividade de pró-vitamina A. da ação de espécies reativas sobre macromoléculas foram avaliados em
O licopeno, por outro lado, é um carotenoide que não possui ativida- estudo na Polônia, com cem pacientes idosos. Os níveis de malonildialdeí-
de pró-vitamina A e, da mesma forma que o betacaroteno, tem atividade do, um índice de peroxidação lipídica, diminuíram 26% nos pacientes que
antioxidante, protegendo a integridade celular e diminuindo o risco de de- receberam 200 UI de vitamina E, 13% no grupo suplementado com 400
senvolvimento de doenças degenerativas. O licopeno é considerado indica- mg de vitamina C e 25% naqueles em que foi administrada a combinação
dor de nutrição rica em frutas e verduras (fontes naturais de carotenoides). de vitaminas C e E.
A avaliação dos níveis plasmáticos desse carotenoide é importante, pois ele 4
Trabalhos de Tolonen e colaboradores mostraram que os níveis de
parece ser mais bem distribuído nas lipoproteínas do que o betacaroteno. produtos derivados da peroxidação de lipídeos, no plasma, são inicial-
mente elevados em um grupo de idosos institucionalizados, declinando a
■■ ENVELHECIMENTO E DOENÇAS CRÔNICAS concentrações semelhantes às de adultos jovens após suplementação com
Crescem as evidências que suportam o envolvimento de radicais livres em vitaminas E, C e B6, betacaroteno, selênio e zinco.
doenças, principalmente as chamadas crônicas não transmissíveis, embora Junqueira e colaboradores5 mostraram que é possível diminuir o
tenham encontrado limitações os esforços na utilização preditiva dessa estresse oxidativo sistêmico no idoso, utilizando uma suplementação
teoria objetivando aumentar a duração máxima de vida. combinada dos antioxidantes, vitamina C, vitamina E, betacaroteno e oli-
Mezzetti e colaboradores3 relataram a influência do estresse oxidativo goelementos. Nesse estudo, duplo-cego, randomizado e controlado por
durante o processo de envelhecimento, principalmente quando associado placebo, a decisão, sobre as doses de antioxidantes a serem ministradas,
a doenças crônicas. Outros pesquisadores também têm relatado tal asso- considerou os princípios que regem a rede antioxidante e as concentrações
ciação, e estudos vêm sendo conduzidos na tentativa de demonstrar as circulantes de vitaminas C e E após diferentes doses únicas deles.5
possibilidades de interferência nesse processo. As evidências experimentais mais contundentes são de que a mor-
Já em 1984, Wartanowicz havia demonstrado que a suplementação te neuronal pós-isquêmica é causada por um excesso de radicais livres,
com doses diárias de vitaminas E e C diminuía os níveis de peroxidação decorrente de uma cascata de eventos bioquímicos que se seguem à di-
lipídica em idosos. Outros estudos descreveram que a suplementação com minuição do aporte de oxigênio e glicose. A lógica de que substâncias an-
micronutrientes antioxidantes diminui os níveis de peróxido lipídico “quei- tioxidantes possam minimizar o dano celular e, com isso, evitar a apoptose
mado” em idosos e mesmo em adultos jovens. Outro estudo clínico, ran- neuronal, promovendo um melhor prognóstico funcional pós-AVC, tem
domizado e duplo-cego, demonstrou o benefício da suplementação com sido objeto de um crescente investimento em termos de pesquisa.
vitamina E na resposta imunológica de idosos saudáveis, confirmando Um estudo prospectivo mostrou que pacientes idosos, com níveis de
outros estudos do mesmo grupo. vitamina C circulante maiores do que 28 µm, tiveram seu risco de vida pós-
Muitos trabalhos mostram que durante o envelhecimento há um de- -AVC reduzido em 50%, depois de controlar por sexo, idade e outros fato-
clínio progressivo na biodisponibilidade dos antioxidantes moleculares, res de risco conhecidos. Outro estudo prospectivo mostrou que uma dieta
seja por um gasto aumentado para contrabalançar a ação deletéria de rica em flavonoides (um potente antioxidante presente em folhas de chá
ERO/ERN, seja por sua menor absorção pelo sistema digestório. Esse de- verde e maçã) tem efeito protetor contra o risco de AVC. Um estudo clínico
clínio é mais acentuado em indivíduos com funções cognitivas comprome- controlado demonstrou que a vitamina E associada ao AAS (comparado a
tidas. Também está descrito na literatura que a eficiência no reparo das apenas o AAS) previne episódios de isquemia recorrentes.
macromoléculas danificadas é menor com a idade avançada. Indivíduos idosos não demenciados apresentam altos índices de
Por outro lado, alguns autores referem um aumento compensatório oxidação proteica cerebral quando comparados a adultos jovens; aque-
na atividade das enzimas antioxidantes, em vista da menor biodisponibi- les pacientes portadores de doença de Alzheimer (DA) exibem ainda uma
lidade daqueles antioxidantes moleculares. É claro que, nessas condições, maior oxidação proteica do que os seus pares. Nesses últimos pacientes,
a eficiência do processo de antioxidação não pode ser a mesma. Como também, a oxidação do DNA é mais elevada.
resultado, muitas macromoléculas com funções importantes deixam de Em relação à DA, diversos estudos de observação têm procurado es-
funcionar adequadamente, alterando a fisiologia da célula, resultando em tabelecer se a suplementação com vitaminas antioxidantes na dieta teria
várias patologias degenerativas associadas ao envelhecimento. efeito protetor contra o desenvolvimento de déficit cognitivo. Os resul-
38 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Os diuréticos são classificados em três grupos de acordo com o meca- farmacodinâmicas de um diurético determinam qual a concentração mínima
nismo de ação no túbulo renal: do fármaco necessária para atingir o local de ação e ser efetivo. O conheci-
1 | Diuréticos tiazídicos e correlatos: hidroclorotiazida; clortalidona; e mento dessas características é de particular importância para os diuréticos
indapamida. de alça que são empregados no tratamento de estados edematosos e de
Mecanismo de ação diurética: diuréticos mais utilizados na tera- insuficiência cardíaca, permitindo, assim, prescrição mais precisa deles.
pia da hipertensão arterial, agem na porção inicial do túbulo con-
Mecanismo de ação anti-hipertensiva dos diuréticos
tornado proximal inibindo o cotransportador Na-K localizado na
membrana apical. A fração de reabsorção de sódio, relativamente Os mecanismos pelos quais os diuréticos reduzem a pressão arterial não
pequena nesse segmento tubular renal, explica a baixa potência são completamente conhecidos. Inicialmente a redução da pressão arterial
natriurética desse grupo de diuréticos. O efeito natriurético dos tia- é decorrente da ação natriurética e de uma modesta redução do volume
zídicos é perdido quando a taxa de filtração glomerular é inferior a plasmático e débito cardíaco, já que a ingestão de sal bloqueia esse efeito.
30 mL/minuto/1,73 m .
2 Os diuréticos tiazídicos são mais eficientes do que os diuréticos de alça no
2 | Diuréticos da alça: furosemida; bumetanida; piretanida. tratamento da hipertensão arterial porque mantêm a redução da volemia
Mecanismo de ação diurética: potentes natriuréticos, agem em por mais tempo. Contudo, o uso de diurético estimula o sistema renina-an-
uma porção do túbulo renal na qual ocorre uma grande reabsorção giotensina-aldosterona, o que pode impedir uma queda da pressão arterial
de sódio; por essa razão, são utilizados preferencialmente no trata- por aumento da resistência vascular sistêmica. Com o uso prolongado de
mento da hipertensão associada à doença renal crônica (DRC) e à diuréticos, a volemia e o débito cardíaco retornam aos níveis basais.
ICC. Diminuem a reabsorção tubular de sódio no ramo ascendente es- Apesar disso, a redução da pressão se mantém devido à redução da
pesso da alça de Henle, inibindo o transporte de sódio pelo cotrans- resistência vascular sistêmica atribuída a um mecanismo vasodilatador
portador Na-K-2Cl localizado na membrana apical do túbulo renal. dos diuréticos, ainda não completamente esclarecido. Hipóteses para ex-
3 | Diuréticos poupadores de potássio: amilorida; triantereno; espiro- plicar a redução da resistência vascular sistêmica dos diuréticos: a) os diu-
nolactona; e eplerenona. réticos reduziriam a secreção de um hormônio natriurético, similar ao di-
gital, mas distinto do peptídeo natriurético atrial, capaz de inibir a bomba
Mecanismo de ação diurética: de pouca potência natriurética.
Na-K-ATPase. Dessa forma, os diuréticos poderiam aumentar a atividade
Amilorida e triantereno agem bloqueando o canal de sódio da
da bomba, aumentar a saída de sódio da célula, facilitar o efluxo de cálcio
membrana apical da porção final do túbulo contorcido distal. Nes-
e, com isso, reduzir o cálcio intracelular induzindo vasodilatação; b) talvez
se segmento do túbulo renal, a reabsorção de sódio está associa-
uma ação direta inibitória dos canais de potássio; c) a diminuição crônica
da com a secreção de potássio pelos canais de potássio do lado
do sódio determinando dimininuição da atividade simpática.
apical e pela ação da Na-K-ATPase no lado basolateral, a qual é
Perfil de reações adversas: hipopotassemia, por vezes acompanha-
estimulada pela aldosterona. Espironolactona e eplerenona, este
da de hipomagnesemia, que pode induzir arritmias ventriculares e hiperu-
último ainda não comercializado no Brasil, são antagonistas com-
ricemia. O emprego de baixas doses diminui o risco de efeitos adversos,
petitivos do receptor da aldosterona e consequemente inibem a
sem prejuízo da eficácia anti-hipertensiva, especialmente quando em
atividade da Na-K-ATPase.
associação com outros anti-hipertensivos. Os diuréticos também podem
As características farmacocinéticas de um diurético – vias de metabolis-
provocar intolerância à glicose, aumentar o risco do aparecimento do dia-
mo, biodisponibilidade e meia-vida de eliminação – determinam o intervalo
betes melito, além de promover aumento de triglicerídeos, efeitos esses,
da administração do fármaco para manter o nível terapêutico. Os diuréticos
em geral, dependentes da dose.
tiazídicos em decorrência de uma meia-vida longa, principalmente a clor-
talidona, são administrados em dose única diária, o que facilita a adesão
INIBIDORES ADRENÉRGICOS
terapêutica – fator essencial para o sucesso do tratamento da hipertensão
arterial (Tabela 11.1). Os diuréticos de alça que têm meia-vida curta são ad- Ação central
ministrados em duas tomadas (Tabela 11.2). Os diuréticos poupadores de Atuam estimulando os receptores alfa-2 adrenérgicos pré-sinápticos no
potássio têm meia-vida longa, similar aos tiazídicos e com eles constituem SNC, reduzindo o tônus simpático, como fazem a alfametildopa, a cloni-
uma associação farmacologicamente correta (Tabela 11.3). As características dina e/ou os inibidores dos receptores imidazolidínicos, por exemplo, a
FARMACOCINÉTICA E
FARMACODINÂMICA HIDROCLOROTIAZIDA CLORTALIDONA INDAPAMIDA
FARMACOCINÉTICA E
FARMACODINÂMICA FUROSEMIDA BUMETANIDA PIRETANIDA
FARMACODINÂMICA E
FARMACOCINÉTICA AMILORIDA TRIANTERENO ESPIRONOLACTONA EPLERENONA
rilmenidina. Seu efeito hipotensor como monoterapia é, em geral, discreto. São eficazes no tratamento da hipertensão arterial. Entretanto, a
Entretanto, podem ser úteis em associação com medicamentos de outros redução da morbidade e da mortalidade cardiovasculares é bem docu-
grupos, particularmente quando há evidência de hiperatividade simpática. mentada apenas em grupos de pacientes com idade inferior a 60 anos.
A experiência favorável em relação à segurança do binômio materno-fetal Estudos e metanálises recentes não têm apontado redução de desfechos
recomenda a alfametildopa como agente de escolha para tratamento da relevantes, principalmente AVC, em pacientes com idade superior a 60
hipertensão das grávidas. Não interferem com a resistência periférica à anos, situação em que o uso dessa classe de medicamentos seria reserva-
insulina ou com perfil lipídico. do para situações especiais, como nos portadores de coronariopatia, com
Principais reações adversas: em geral, decorrentes da ação cen- disfunção sistólica, arritmias cardíacas ou infarto do miocárdio prévio. Es-
tral, como sonolência, sedação, boca seca, fadiga, hipotensão postural tudos de desfecho com carvedilol, metoprolol, bisoprolol e, recentemente,
e disfunção sexual. A frequência é um pouco menor com os inibidores de com nebivolol têm demonstrado que esses fármacos também são úteis
receptores imidazolidínicos. A alfametildopa pode provocar ainda, embora na redução de mortalidade e morbidade cardiovascular de pacientes com
com pequena frequência, galactorreia, anemia hemolítica e lesão hepá- insuficiência cardíaca, hipertensos ou não, independentemente da faixa
tica, sendo contraindicada se há insuficiência hepática (IH). No caso da etária. O propranolol se mostra também útil em pacientes com tremor es-
clonidina, destaca-se a hipertensão rebote, quando da suspensão brusca sencial, síndromes hipercinéticas, cefaleia de origem vascular e naqueles
da medicação e da ocorrência mais acentuada de boca seca. com hipertensão porta.
1 | Betabloqueadores: seu mecanismo anti-hipertensivo envolve dimi- Principais reações adversas: broncoespasmo, bradicardia,
nuição inicial do débito cardíaco, redução da secreção de renina, readap- distúrbios da condução atrioventricular, vasoconstrição periféri-
tação dos barorreceptores e diminuição das catecolaminas nas sinapses ca, insônia, pesadelos, depressão psíquica, astenia e disfunção
nervosas. Betabloqueadores de geração mais recente (3a geração) como sexual. Betabloqueadores de 1a e 2a geração podem acarretar
o carvedilol e o nebivolol, diferentemente dos betabloqueadores de 1a e também intolerância à glicose, induzir ao aparecimento de novos
2a gerações, também proporcionam vasodilatação que, no caso do car- casos de diabetes, hipertrigliceridemia com elevação do LDL-C
vedilol, decorre em grande parte do efeito de bloqueio concomitante do e redução da fração HDL-colesterol. O impacto sobre o meta-
receptor alfa-1 adrenérgico e, no caso de nebivolol, de aumento da síntese bolismo da glicose é potencializado quando são utilizados em
e liberação endotelial de NO). combinação com diuréticos. O efeito sobre o metabolismo lipí-
42 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
dico parece estar relacionado à dose e à seletividade, sendo de intrínseca ou por formulação galênica, que permita uma liberação contro-
pequena monta com o uso de baixas doses de betabloqueadores lada. Não são recomendados agentes de curta duração.
cardiosseletivos. Principais reações adversas: cefaleia, tontura, rubor facial – mais
Diferentemente, betabloqueadores de 3a geração, como o carvedilol frequente com di-hidropiridínicos de curta ação – e edema de extremi-
e o nebivolol, têm impacto neutro ou até podem melhorar o metabolismo dades, sobretudo maleolar. Esses efeitos adversos são, em geral, dose-
da glicose e lipídico, possivelmente em decorrência do efeito de vasodi- -dependentes. Raramente, podem induzir a hipertrofia gengival. Os di-hi-
latação com diminuição da resistência à insulina e melhora da captação dropiridínicos de ação curta provocam importante estimulação simpática
de glicose pelos tecidos periféricos. Estudos com o nebivolol também tem reflexa, sabidamente deletéria para o sistema cardiovascular. Verapamil
apontado para uma menor interferência na função sexual, possivelmente e diltiazem podem provocar depressão miocárdica e bloqueio atrioven-
em decorrência do efeito sobre a síntese de NO endotelial. tricular (BAV). Constipação intestinal é observada, particularmente, com
A suspensão brusca dos betabloqueadores pode provocar hiperati- verapamil.
vidade simpática, com hipertensão rebote e/ou manifestações de isque-
mia miocárdica, sobretudo em hipertensos com pressão arterial (PA) pré- INIBIDORES DA ENZIMA CONVERSORA
via muito elevada. Devem ser utilizados com cautela em pacientes com DA ANGIOTENSINA
doença vascular de extremidade. Agem fundamentalmente pela inibição da enzima conversora da angioten-
sina (ECA), bloqueando a transformação da angiotensina I em II no sangue
e nos tecidos, embora outros fatores possam estar envolvidos nesse me-
ATENÇÃO!
canismo de ação.
a a
Os betabloqueadores de 1 e 2 geração são formalmente contraindi- São eficazes no tratamento da HAS reduzindo a morbidade e a morta-
cados a pacientes com asma brônquica, DPOC e bloqueio atrioventri- lidade cardiovasculares nos hipertensos; pacientes com insuficiência car-
o o
cular de 2 e 3 graus. díaca, com infarto agudo do miocárdio, em especial quando apresentam
baixa fração de ejeção, de alto risco para doença aterosclerótica, sendo
também úteis na prevenção secundária do AVC. Quando administrados
2 | Alfabloqueadores: apresentam efeito hipotensor discreto a longo a longo prazo, os IECA retardam o declínio da função renal em pacientes
prazo como monoterapia, devendo, portanto, ser associados com outros com nefropatia diabética ou de outras etiologias.
anti-hipertensivos. Podem induzir ao aparecimento de tolerância, o que Principais reações adversas: tosse seca, alteração do paladar e,
exige o uso de doses gradativamente crescentes. Têm a vantagem de pro- raramente, reações de hipersensibilidade com erupção cutânea e edema
piciar melhora discreta no metabolismo lipídico e glicídico e dos sintomas angioneurótico.
de pacientes com hipertrofia prostática benigna. Em indivíduos com lesão renal crônica (LRC), podem eventualmente
Principais reações adversas: hipotensão postural, mais evidente agravar a hiperpotassemia. Em pacientes com hipertensão renovascular
com a primeira dose, sobretudo se a dose inicial for alta, palpita- bilateral ou unilateral associada a rim único, podem promover redução da
ções e, eventualmente, astenia. No estudo ALLHAT (do inglês anti- filtração glomerular com aumento dos níveis séricos de ureia e creatinina.
-hypertensive and lipid-lowering treatment to prevent heart attack Seu uso em pacientes com função renal reduzida pode causar aumen-
trial), a comparação entre o alfabloqueador doxazosina, com a clor- to de até 30% da creatininemia, mas, a longo prazo, prepondera seu efeito
talidona indicou a maior ocorrência de ICC, no grupo tratado com nefroprotetor.
a doxazosina. A partir dessas conclusões, estabeleceu-se a ideia de Seu uso é contraindicado na gravidez pelo risco de complicações
que o alfabloqueador testado nesse estudo não deva ser medica- fetais. Dessa forma, seu emprego deve ser cauteloso e frequentemente
mento de primeira escolha para o tratamento da hipertensão. monitorado em adolescentes e mulheres em idade fértil.
Alfabloqueadores
ATENÇÃO! Doxazosina 1 16 1
A posologia deve ser ajustada até que se consiga redução da pressão Prazosina 1 20 2-3
arterial, pelo menos a um nível inferior a 140/90 mmHg.
Prazosina XL 4 8 1
Terazosina 1 20 1-2
Os anti-hipertensivos comercialmente disponíveis no Brasil, por clas-
ses, para uso em monoterapia e combinações, são apresentados na Ta- Vasodilatadores diretos
bela 11.4.
Hidralazina 50 150 2-3
Felodipino 5 20 1-2
Terapêutica anti-hipertensiva combinada
Com base em evidências de vários estudos mostrando que em cerca de
Isradipino 2,5 20 2 dois terços dos casos a monoterapia não foi suficiente para atingir as re-
Lacidipino 2 6 1 duções de pressão previstas e diante da demonstração de que valores da
pressão arterial mais baixos (130/80 mmHg) podem ser benéficos para pa-
Lercarnidipino 10 30 1 cientes com características peculiares, como a) de alto e muito alto risco
Levanlodipino 2,5 5 1 cardiovascular; b) diabéticos; c) com DRC, mesmo que em fase incipiente;
d) em prevenção primária e secundária de AVC, as diretrizes recomendam
Manidipino 10 20 1 a introdução mais precoce de terapêutica combinada de anti-hipertensi-
Nifedipino Oros 30 60 1
vos, como primeira medida medicamentosa, sobretudo nos pacientes com
hipertensão em estágios 2 e 3 e para aqueles com hipertensão arterial
Nifedipino Retard 20 60 2 estágio 1, mas com risco cardiovascular alto e muito alto (Figura 11.1).
As combinações de anti-hipertensivos (Quadro 11.2) devem seguir a
Nisoldipino 10 40 1
lógica de não combinar medicamentos com mecanismos de ação simila-
Nitrendipino 10 40 2-3 res, com exceção da combinação de diuréticos tiazídicos e de alça com
poupadores de potássio. Essas associações de anti-hipertensivos podem
IECA
ser feitas por meio de medicamentos em separado ou por associações em
Benazepril 5 20 1 doses fixas.
A eficácia anti-hipertensiva dessas diferentes associações parece ser
Captopril 25 150 2-3
semelhante, embora sejam escassos os estudos que avaliaram de forma
Cilazapril 2,5 5 1 comparativa direta o tratamento com cada uma dessas combinações.
Recentemente, um estudo de desfechos relevantes avaliou de forma
Enalapril 5 40 1-2 comparativa, em pacientes de alto risco cardiovascular, o impacto do tra-
Fosinopril 10 20 1 tamento com a combinação fixa de um IECA com um diurético e com um
BCC, tendo sido demonstrado que, para o mesmo grau de redução de con-
Lisinopril 5 20 1 trole da pressão arterial, a combinação do IECA com o BCC foi mais eficaz
Perindopril 4 8 1 em reduzir a morbidade e mortalidade cardiovasculares e a progressão da
doença renal, independentemente do IMC e da presença ou ausência de
Quinapril 10 20 1 doença arterial coronariana.
Ramipril 2,5 10 1
ATENÇÃO!
Trandolapril 2 4 1
O emprego da combinação de betabloqueadores e diuréticos deve ser
BRA
cauteloso em pacientes com, ou altamente predispostos a apresentar,
Candesartana 8 32 1 distúrbios metabólicos, especialmente glicídicos.
Irbersartana 150 300 1
O uso da combinação de IECA/BRA II/inibidor direto da renina (duplo
Losartana 25 100 1 bloqueio do SRA), em pacientes hipertensos, além de não adicionar be-
nefício cardiovascular quando comparada aos medicamentos usados em
Olmesartana 20 40 1
separado, aumentou o risco de eventos adversos, não estando, portanto,
Telmisartana 40 160 1 indicado o seu uso.
Várias combinações destacadas na Tabela 11.5 também estão dis-
Valsartana 80 320 1
poníveis no mercado em doses fixas. Seu emprego, desde que criterioso,
Inibidor direto da renina pode ser útil por simplificar o esquema posológico, reduzindo o número de
comprimidos administrados e, assim, estimulando a adesão ao tratamento.
Alisquireno 150 300 1
Retard, SR, ZOK, Oros, XL, LA, AP, SR e CD: formas farmacêuticas de liberação pro-
longada ou controlada. QUADRO 11.2 ■ Associações reconhecidas como eficazes
MONOTERAPIA COMBINAÇÕES
Todas as classes de anti-hipertensivos Dois anti-hipertensivos de
com exceção dos vasodilatadores classes diferentes e em baixas doses
Resposta inadequada
Diurético + IECA
TABELA 11.5 ■ Combinações fixas de anti-hipertensivos disponíveis
no Brasil Hidroclorotiazida + Benazepril 6,25 + 5
12,5 + 10
COMBINAÇÕES POSOLOGIA (mg)
Hidroclorotiazida + Captopril 25 + 50
Diurético + diurético
Hidroclorotiazida + Cilazapril 12,5 + 5
Clortalidona + Amilorida 25 + 5
Hidroclorotiazida + Enalapril 12,5 + 20
Furosemida + Amilorida 40 + 10 25 + 10
25 + 50
Furosemida + Espironolactona 20 + 100
Hidroclorotiazida + Fosinopril 12,5 + 10
Hidroclorotiazida + Amilorida 25 + 2,5
50 + 5 Hidroclorotiazida + Lisinopril 12,5 + 10
12,5 + 20
Hidroclorotiazida + Espironolactona 50 + 50
Hidroclorotiazida + Ramipril 12, 5 + 5
Hidroclorotiazida + Triantereno 50 + 50
25 + 5
Diurético + inibidor adrenérgico de ação central
Indapamaida + Perindopril 1,2 + 4
Clortalidona + Reserpina 50+25
Diurético + BRA
Hidroclorotiazida + Alfametildopa 15+ 250
Hidroclorotiazida + Candesartana 12,5 + 8
Diurético + betabloqueador 12,5 + 16
Diuréticos
Inibidores adrenérgicos
Betabloqueadores Insulina e hipoglicemiantes orais Redução dos sinais de hipoglicemia e bloqueio da mobilização de
glicose
Dipiridamol Bradicardia
IECA
Hipoglicemiantes da classe dos inibidores da enzima DPP4 Aumento do risco de angioedema associado ao uso de IECA
BCCs
Moxonidina Hipotensão
BRA
12 ATENÇÃO!
BRONCODILATADORES Nas crises de broncoespasmo, o tratamento inicial de escolha é feito
com o salbutamol ou fenoterol por aerossol ou nebulização. A terbuta-
lina administrada via subcutânea pode ser usada como medida adicio-
nal em casos graves, sem melhora com as medidas iniciais.
■■ ANA LUISA GODOY FERNANDES
■■ LILIAN S. BALLINI CAETANO
■■ CLAUDIA HASEGAWA β2-AGONISTAS DE CURTA DURAÇÃO
Os β2-agonistas de curta duração (SABA) têm efeito broncodilatador
por um período curto e representam a primeira escolha para o alívio dos
Os agentes broncodilatadores são o pilar do tratamento da doença sintomas obstrutivos, devendo ser utilizados de forma intermitente, quan-
pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), sendo fundamentais no alívio dos do necessário. Seu uso como tratamento isolado de manutenção não é
sintomas da asma. Formam um grupo heterogêneo composto por diferen- recomendado, inclusive a frequente utilização desse fármaco indica a ne-
tes classes de medicamentos, como os β2-agonistas, os anticolinérgicos e cessidade de iniciar ou ajustar o tratamento de manutenção. Os fármacos
as xantinas. Essas três classes podem ser usadas individualmente ou em atualmente disponíveis são salbutamol, fenoterol e terbutalina.
combinação entre si ou com corticosteroides inalatórios. O salbutamol, ou albuterol, de ação β2-agonista seletiva, tem efeito
A via inalatória, quando disponível, é a preferencial por minimizar os broncodilatador máximo via inalatória em 15 minutos, contudo dura cerca
efeitos sistêmicos. A escolha do agente deve considerar a resposta indivi- de 4 a 6 horas, uma vez que o fármaco se liga fracamente ao receptor.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 49
Com duração pouco maior, o fenoterol tem a vantagem de permitir endócrino: o estímulo β2 no fígado induz a glicogenólise, aumen-
seu uso tanto na forma de aerossol como por nebulização, com a mesma tando-se o risco de descontrole dos níveis glicêmicos. Outro efeito
eficácia. A disponibilidade desses dois fármacos na forma de aerossol e possível é o aumento dos triglicérides;
o rápido início de ação são os principais motivos do seu amplo uso como eletrolítico: a estimulação da bomba sódio-potássio-ATPase do
medicação de resgate para as crises. músculo esquelético aumenta o influxo celular de potássio, poden-
A terbutalina é uma amina simpatomimética que pode ser usada por do ocorrer hipocalemia;
via oral, inalatória ou parenteral. Quando utilizado por via inalatória, tem muscular: tremores podem ser causados principalmente nas mãos,
eficácia semelhante ao fenoterol, porém, por via parenteral, perde-se mui- pelo aumento do potássio no interior das células musculares;
to a seletividade, aumentando os efeitos colaterais cardiovasculares. SNC: como essas medicações podem ultrapassar a barreira hema-
tencefálica (BHE), cefaleia e insônia são possíveis efeitos colaterais.
β2-AGONISTAS DE LONGA DURAÇÃO
Os β2-agonistas de longa duração (LABA) são representados pelo sal- ■■ ANTICOLINÉRGICOS
meterol e formoterol, têm um efeito broncodilatador com duração míni-
ma de 12 horas, os efeitos são mantidos com o uso regular e contínuo da Há séculos, os agentes anticolinérgicos são utilizados na medicina. Deri-
medicação. vados de alcaloides naturais de plantas, como a Atropa belladonna, eram
empregados na forma inalatória (fumo de folhas secas) para tratamento
As diferenças químicas e estruturais entre o salmeterol e o formoterol
de doenças respiratórias. A primeira molécula isolada foi a atropina.
conferem diferenças farmacológicas importantes entre esses dois bronco-
dilatadores. A molécula do salmeterol possui uma terminação lipofílica, Os cinco tipos de receptores muscarínicos, M1 a M5, fazem parte da
que se liga à membrana celular, responsável por sua ação mais prolonga- família da proteína G transmembrana. Nos pulmões, eles estão distribuí-
da, porém com início mais lento – cerca de 30 minutos. dos no músculo liso, nas glândulas e nas terminações parassimpáticas.
Os anticolinérgicos atuam inibindo a ação da acetilcolina (ACh) no
receptor M3 do músculo liso, impedindo a broncoconstrição. A secreção
ATENÇÃO! glandular também é mediada pelos receptores M3 das células da submu-
cosa, assim, também há redução da produção de muco.
Os LABA, em associação com os corticosteroides inalatórios, são fun- Os anticolinérgicos inalatórios, assim como os beta-agonistas, são
damentais no tratamento de manutenção da asma e da DPOC grave, divididos em curta duração e longa duração.
aliviam os sintomas, melhoram a função pulmonar e reduzem a hiper-
-responsividade brônquica. ANTICOLINÉRGICO DE CURTA DURAÇÃO
Um anticolinérgico de curta duração (SAMA), o ipratrópio, é um antago-
nista não seletivo M1, M2 e M3, com baixa absorção sistêmica, que resulta
O formoterol é um agente β2 altamente seletivo, menos lipofílico em em boa ação local quando utilizado por via inalatória, com efeitos colate-
relação ao salmeterol, e que se difunde rapidamente pelos tecidos pulmo- rais praticamente nulos. O início de ação ocorre em 15 a 30 minutos e tem
nares, culminando em um início de ação mais rápido. Sua ação prolonga- duração aproximada de 6 horas. O efeito broncodilatador é menor se com-
da, cerca de 12 horas, deve-se à formação de “depósitos” entre o meio parado aos beta-agonistas, porém a combinação de ambos potencializa o
aquoso e a membrana celular que vão sendo utilizados de forma gradativa efeito broncodilatador, sendo fundamentais nas crises de broncoespasmo.
– teoria da difusão microcinética.
ANTICOLINÉRGICO DE LONGA DURAÇÃO
β2-AGONISTAS DE DURAÇÃO ULTRALONGA Anticolinérgico de longa duração (LAMA), o tiotrópio tem ação anticoli-
A falta de aderência à terapia inalatória é a principal causa de exacerba- nérgica prolongada, que permite dose única diária. A molécula se liga aos
receptores M1, M2 e M3, porém se dissocia mais rapidamente dos recep-
ções em asma e DPOC: um dos motivos para a não adesão ao tratamento é
tores M2, o que confere certa seletividade M1 e M3. Esse fármaco tem sido
a dificuldade no uso dos dispositivos, outro, as múltiplas doses diárias. Na
amplamente utilizado no tratamento de DPOC por aumentar o VEF1 de
busca de comodidade posológica, dose única diária, outros agentes, com
forma sustentada, melhorar a qualidade de vida por alívio dos sintomas e
efeito mais prolongado, têm sido estudados.
reduzir o número de exacerbações.
O indacaterol, primeiro ultra-LABA disponível para comercialização, é
um agente lipofílico que apresenta alta seletividade β2, com rápido início de EFEITOS COLATERAIS DOS ANTICOLINÉRGICOS
ação, alta eficácia intrínseca e duração de 24 horas. Estudos mostram que Urinários: retenção urinária, principalmente em portadores de hi-
essa medicação reduz a hiperinsuflação pulmonar de pacientes portadores perplasia prostática.
de DPOC em três semanas de uso, reduz exacerbações e aumenta o volume Outros: boca seca, broncoespasmo paradoxal e cefaleia.
expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1). Dois novos anticolinérgicos de administração por via inalatória e de
ação prolongada (24 horas) já estão disponíveis no mercado: glicopirrônio
EFEITOS COLATERAIS DOS β2-AGONISTAS e umeclidínio.
Devido à presença de receptores β2-adrenérgicos em uma variedade de
tecidos, diversos efeitos colaterais podem ocorrer conforme a absorção ■■ XANTINAS
sistêmica, sendo maiores por via oral e parenteral.
Há décadas, as xantinas são empregadas no tratamento de doenças pul-
Os principais efeitos colaterais são: monares, inicialmente ingeridas na forma de café. A primeira molécula
cardiovascular: aumento da frequência cardíaca (FC), o que exige isolada foi a teofilina; no entanto, foi a aminofilina que difundiu o uso
cautela no uso desses medicamentos em pacientes portadores de desses medicamentos.
arritmia, intervalo QT prolongado e hipertiroidismo; Teofilina: os mecanismos de ação ainda não são bem elucidados,
pulmonar: vasodilatação pulmonar, com consequente queda tran- porém, nas doses recomendadas, tem atividade anti-inflamatória.
sitória da pressão de oxigênio por distúrbio V/Q. Geralmente esse Seu efeito broncodilatador é discreto e tem capacidade de reduzir a
efeito é discreto; hiper-responsividade brônquica, sendo utilizada como coadjuvante
50 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
■■ ANTI-HIPERGLICEMIANTES
REVISÃO
Asma e DPOC são doenças bastante prevalentes na população METFORMINA
mundial. A metformina deve ser introduzida ao diagnóstico, associada a dieta e
Os broncodilatadores são fundamentais no tratamento do DPOC e exercícios, salvo contraindicações. Leva a até 1,5% de queda na A1c e re-
no alívio dos sintomas da asma. duz em 20% a glicemia de jejum. Não gera aumento de peso e, em alguns
Os principais broncodilatadores são os β2-agonistas e os anticoli- casos, modesta redução. Pode ser associada com sucesso a todos os ou-
nérgicos. tros tratamentos para DM2 (orais e insulina).
Os SABA e os SAMA devem ser utilizados principalmente para aliviar Seu mecanismo de ação ainda não está totalmente compreendido,
os sintomas de broncoespasmo, sendo os LABA e os LAMA mais
mas parece ocorrer por meio da ativação da enzima AMPK pela proteína
adequados para o tratamento contínuo.
LKB1. Assim, age principalmente diminuindo a gliconeogênese hepática.
O uso contínuo dessas medicações melhora a qualidade de vida,
Ainda pela ativação da AMPK, inibe a via mTOR e pode suprimir a forma-
reduz as exacerbações e pode evitar o declínio da função pulmonar.
ção tumoral, assunto cada vez mais discutido. Os efeitos colaterais mais
comuns são os gastrintestinais, que desaparecem em cerca de 90% após
um mês de uso e menos de 5% dos pacientes necessitam abandonar o
■■ LEITURAS SUGERIDAS tratamento. Variam desde um gosto metálico na boca, a náuseas, cólicas
Cazzola M, Matera MG. Emerging inhaled bronchodilators: an update. Eur Respir e diarreia. Pode diminuir absorção de vitamina B12 em 10 a 30% e a de
J. 2009;34(3):757-69. ácido fólico em tratamento a longo prazo.
Cazzola M, Page CP, Calzetta L, Matera MG. Pharmacology and therapeutics of
O risco de acidose lática com a metformina é baixo, mas leva a alto
bronchodilators. Pharmacol Rev. 2012;64(3):450-504.
Fernandes FL, Pavezi VA, Dias SA Jr, Pinto RM, Stelmach R, Cukier A, et al. Short-
índice de letalidade (cerca de 50%). Assim, não se deve utilizar o fármaco em
term effect of tiotropium in COPD patients being treated with a β2 agonist. J insuficiência renal moderada à grave (clearance estimado < 30 a 45 mL/min),
Bras Pneumol. 2010;36(2):181-9. situações de instabilidade hemodinâmica, exames que usam contrastes ioda-
Matera MG, Page CP, Cazzola M. Novel bronchodilators for the treatment of chronic dos, procedimentos cirúrgicos de grande porte, insuficiência hepática (IH) ou
obstructive pulmonary disease. Trends Pharmacol Sci. 2011;32(8):495-506. cardíaca (IC) graves, sepse, desidratação e alcoolismo. Deve ser suspensa de
Moulton BC, Fryer AD. Muscarinic receptor antagonists, from folklore to 24 a 48 horas antes de se realizar exames que utilizam contrastes iodados.
pharmacology: finding drugs that actually work in asthma and COPD. Br J
Pharmacol. 2011;163(1):44-52.
Recomenda-se iniciar essa medicação em doses baixas, elevando-se a
Zafar MA, Droege C, Foertsch M, Panos RJ. Update on ultra-long-acting β agonists cada sete dias, em doses divididas em 2 a 3 vezes ao dia, às refeições (Tabe-
in chronic obstructive pulmonary disease. Expert Opin Investig Drugs. la 13.1). A dose máxima é de 2.550 mg. Em pacientes com clearance estima-
2014;23(12):1687-701. do de 30 a 45 mL/minuto, chega-se até 1 g ao dia, assim como em idosos.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 51
DOSE
(MÍNIMA-MÁXIMA,
O
TIPO CLASSE NOME GENÉRICO DURAÇÃO DE AÇÃO (H)* N TOMADAS AO DIA)
25-100 mg a dose, 3 x
Inibidores da Acarbose 2
Anti-hiperglicemiantes < 60 kg: 50 mg 3 x
α-glucosidase
Miglitol 2 25-100 mg a dose, 3 x
INIBIDORES DA ALFAGLICOSIDASE após oito semanas (Tabela 13.1). A pioglitazona é metabolizada no fígado e
pode induzir moderadamente o CIP3A4 e inibir o CIP2C8 e 2D6; pode então
No Brasil, dispõe-se da acarbose, que inibe por competição a hidrólise
diminuir os níveis de codeína e tramadol, elevar os de tamoxifeno e nebivo-
de carboidratos mais complexos pela alfa-amilase pancreática no lúmen
lol e interferir com os vários fármacos que são metabolizados no fígado no
intestinal e a hidrólise de oligo, tri e dissacarídeos pelas alfaglicosidases
CYP3A4. Pode causar ICC, edema, ganho de peso e, a longo prazo, fraturas.
nos enterócitos do delgado. Retarda a absorção da glicose e diminui a
amplitude da excursão glicêmica pós-prandial. Seus efeitos colaterais são
comumente gastrintestinais e frequentes, como flatulência, dores e cólicas ATENÇÃO!
abdominais, diarreia, e podem levar ao abandono do tratamento em até
As tiazolidinedionas são contraindicadas em pacientes com IC mode-
50% dos casos. Preconiza-se iniciar o tratamento em doses baixas, de 25
rada à grave, com elevação de enzimas hepáticas 2 a 3 vezes acima
mg antes da maior refeição, elevando-se em 25 mg a cada 4 semanas, atin-
do limite superior do método e com risco de osteoporose (devendo-se
gindo lentamente a dose terapêutica de 50 mg às refeições (Tabela 13.1).
monitorizar esses parâmetros periodicamente).
Na dose máxima de 300 mg/dia, faz-se necessário monitorar transaminase
glutâmico-oxalética (TGO) e transaminase glutâmico-pirúvica (TGP), a cada
três meses no primeiro ano de uso, periodicamente depois. Diminuem em Quanto ao ganho de peso, os estudos mostram que acontece mais
0,5 a 1% a A1c e, apesar de não serem hipoglicemiantes, podem retardar o pelo acúmulo de gordura subcutânea, havendo diminuição da gordura
tratamento de eventual hipoglicemia se for utilizado sacarose via oral (açú- marrom, e pela retenção de água.
car refinado); nesses casos, deve-se tratar a hipoglicemia com glicose pura.
Apresentam pequena absorção, 0,5 a 1,7%. São contraindicados em cirrose ■■ HIPOGLICEMIANTES
hepática, doenças inflamatórias intestinais (DIIs), ulcerações ou obstrução
intestinal, creatinina (Cr) superior a 2 mg/dL e sob aleitamento ou gestação. SULFONILUREIAS
Cerca de 60% dos pacientes diabéticos tipo 2 respondem bem às sul-
TIAZOLIDINEDIONAS (OU GLITAZONAS) fonilureias (SU), sendo que a A1c cai em média 1,5%. Se acrescenta-
Ativam os receptores nucleares PPAR-γ (do inglês peroxisome proliferators- das a tratamento prévio, como a metformina, deve diminuir a HbA1c em
-activated receptor gama) e alteram a transcrição de vários genes que regu- média 1%. Há várias SU no mercado e não existe uma clara vantagem
lam o metabolismo de lipídeos e carboidratos, melhorando a sensibilidade de uma sobre as outras, salvo situações específicas, como insuficiência
à insulina nos tecidos adiposo, muscular e hepático. Apenas a pioglitazona renal. As SU agem nos canais de ATP-potássio da célula beta pancreática,
está disponível no mercado. Reduz a A1c de 1 a 1,5% e melhora o perfil aumentando a secreção de insulina. As de segunda geração são mais
lipêmico. Inicia-se o tratamento com 15 mg, aumentando-se, se necessário, específicas e interferem menos com canais de K-ATP no coração. Porém,
52 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
o risco de aumento de infartos de miocárdio com o uso crônico dessas e baixa ocorrência de efeitos colaterais. Podem ser associadas a metfor-
medicações é controverso na literatura. Em pacientes idosos e com perda mina, sulfonilureias e glitazonas, mantendo sua efetividade. Podem levar a
de função renal ou hepática, deve-se ter cuidado: as SU de primeira ge- pequeno aumento do risco de infecções nas vias aéreas superiores (IVAS),
ração são proscritas, assim como a glibenclamida (por ter metabólito de infecção do trato urinário (ITU) e cefaleia. A monitoração de enzimas hepá-
pura excreção renal e 70% de atividade em relação ao sal original, além ticas se faz necessário no primeiro ano devido a relatos de hepatite aguda.
de alto índice de intoxicação e hipoglicemias nos pacientes com clearan- Todas as gliptinas devem ter a dose reduzida se houver redução do ritmo
ce estimado inferior a 50 mL/minuto). A glimepirida é oxidada no fígado de filtração glomerular. A exceção é a linagliptina, que sofre excreção he-
pelo CYP2C9, aos metabólitos M1 (que têm 33% de atividade) e M2, pática, é eliminada nas fezes praticamente inalterada (84,7% da dose oral)
que são excretados na urina e nas fezes, não recomendada em pacientes e não necessita de ajuste de dose, mesmo quando há DRC grau V (ClCr <
com clearance estimado inferior a 50 mL/minuto. As mais seguras nesses 15 mL/min).
casos são a glipizida (porém com metabólito com 5 a 10% de atividade)
e a gliclazida (sem relatos de metabólitos ativos). Mesmo assim, deve-se AGONISTAS DO RECEPTOR DO GLP-1
iniciar com a dose mínima, titulando de acordo com a resposta clínico-
Exenatida
-laboratorial.
Os efeitos colaterais mais comuns são hipoglicemia e aumento de Polipeptídeo sintético, com 53% de homologia com o GLP-1 endógeno
peso. Podem acentuar os efeitos adversos e tóxicos do álcool. Fármacos aprovado para o tratamento de pacientes com DM2. Sua aplicação é por
como cimetidina, ranitidina, cloranfenicol, antidepressivos tricíclicos, via subcutânea, até uma hora antes do almoço ou café da manhã e jantar.
fluconazol, AAS e quinolonas e nutrientes, como cromo e alho, podem Sua absorção é rápida e cerca de dez horas após a injeção ainda é detec-
acentuar o efeito hipoglicemiante das SU. Podem ocorrer alergias cruzadas tada na maioria dos pacientes. Pode ser prescrito associado à metformina,
entre as SU e sulfonamidas, diuréticos tiazídicos e de alça. à sulfonilureia ou à glitazona. A dose inicial é de 5 μg, duas vezes ao dia,
que, após um mês, poderá ser aumentada para 10 μg, duas vezes ao dia.
METIGLINIDAS Provoca retardo no tempo de esvaziamento gástrico e sensação de sacie-
dade, que contribuem para redução do peso, que ocorre em cerca de 67%
São a nateglinida e a repaglinida, voltadas para o tratamento da hi-
dos pacientes tratados. Os efeitos colaterais mais frequentes são náusea
perglicemia pós-prandial. São rapidamente absorvidas, metabolizadas no
e vômitos, que são tempo e dose-dependentes e responsáveis por menos
fígado e devem ser prescritas antes das refeições (Tabela 13.1).
de 5% de desistência do tratamento pelos pacientes. O metabolismo é por
Seus efeitos colaterais mais comuns são dor de cabeça, ganho de
hidrólise renal, e pacientes com doença renal crônica (DRC) avançada, em
peso, diarreia, tontura e hipoglicemias. A nateglinida é um substrato maior
geral, não toleram o medicamento.
dos CYPs 2C9 e 3A4 e tem metabólito de pura excreção renal, podendo
levar à intoxicação e hipoglicemias em pacientes com clearance inferior a Liraglutide
50 mL/minuto. A repaglinida não tem seu uso contraindicado por vários É análogo de GLP-1 modificado para ligar-se à albumina sérica de maneira
autores em pacientes com insuficiência renal, porém há estudo mostrando não covalente, retardando sua degradação e permitindo o uso uma vez
elevação significativa de sua concentração em pacientes com clearance de ao dia. A dose inicial é de 0,6 mg, subcutâneo, inefetiva para controle
20 a 40 mL/minuto. Antibióticos macrolídeos (exceto azitromicina) podem glicêmico, mas reduz efeitos adversos, principalmente gastrintestinais.
aumentar o efeito da repaglinida. No entanto, como além da metaboliza- Titulação semanal e dose máxima de 1,8 mg/dia. Permitido seu uso como
ção pelo CYP3A4, a repaglinida também é metabolizada pelo CYP2C8, a monoterapia ou em associação a um ou mais antidiabéticos orais (metfor-
associação com gemfibrosil é contraindicada (alto risco de hipoglicemias). mina, sulfonilurias ou glitazona), embora não seja considerada tratamento
de primeira linha. Ainda não foi liberada associação com insulinas.
■■ INCRETINOMIMÉTICOS SECRETAGOGOS Apesar de metabolizada por peptidases endógenas e não apresentar
DE INSULINA E TERAPIAS EMERGENTES excreção renal, há pouca experiência em estágios moderados de insufi-
ciência renal, e não deve ser utilizada em estágios avançados. Limitada
Os êntero-hormônios, ou incretinas, são peptídeos secretados após ali- informação na insuficiência hepática. Leva à redução média da glicemia de
mentação que promovem liberação de insulina e redução do glucagon, jejum entre 30 e 40 mg/dL, pós-prandial entre 32 e 50 mg/dL, A1c entre 1
de forma glicose-dependente, sendo responsáveis por até 70% da insuli- e 1,5% e peso entre 1 e 3,4 kg com doses de 1,2 ou 1,8 mg/dia. Pequena
nemia pós-prandial. As duas principais incretinas são o GLP-1 e o GIP (do redução da pressão arterial sistólica e ausência de efeito sobre a diastóli-
inglês glucose-dependent insulinotropic peptide) apresentam meia-vida ca. Efeitos colaterais mais comuns são gastrintestinais (náuseas, vômitos e
curta devido à inativação pela enzima DPP-4 (do inglês dipeptidyl pepti- diarreia), sendo náusea o mais frequente à semelhança de exenatida. Há
dadese-4). O GLP-1 (do inglês glucagon-like peptide-1), que tem sua ação risco pequeno de hipoglicemias, geralmente leves e quando associada a
e concentração reduzidas em diabéticos do tipo 2, é a principal incretina e sulfonilureias (8 a 27%). Como todas as incretinas, orais ou injetáveis, há
seu efeito agudo é a liberação de insulina glicose-dependente, seguida por possível relação causal com pancreatite aguda, mas informações são insu-
aumento da biossíntese e da estimulação do gene de transcrição da insuli- ficientes para confirmar ou excluir. Considerar em casos de dor abdominal
na. Leva ainda a aumento do tempo de esvaziamento gástrico, sensação de persistente e suspender seu uso. Houve aumento de risco de carcinoma me-
saciedade por mecanismo central e redução da secreção inapropriadamente dular de tiroide em ratos e camundongos. Esses animais apresentam den-
elevada de glucagon, que tem sua importância cada vez maior na fisiopa- sidade de receptores para GLP-1 entre 20 e 45 vezes maior do que em hu-
togenia da doença. manos. Apesar de não confirmado, em estudos com humanos ou macacos,
não é recomendado para pacientes com antecedente pessoal ou familiar de
INCRETINOMIMÉTICOS INIBIDORES DA DPP-4 carcinoma medular de tiroide ou neoplasia endócrina múltipla 2A ou 2B.
Fármacos de uso oral que aumentam os níveis de GLP-1 entre 1,8 e 3 vezes
devido à inibição de sua degradação pela enzima DPP-4. Neutros em rela- Lixisenatide
ção ao peso e baixo risco de hipoglicemia. Atuam principalmente na glice- Há pouco lançado em nosso país, é um dos agonistas mais potentes em
mia pós-prandial e há menor efeito na glicemia de jejum. Disponíveis em relação ao retardo do esvaziamento gástrico e no controle da glicemia
nosso país a sitagliptina, a vildagliptina, a saxagliptina e, mais recentemen- pós-prandial que ocorre após a sua aplicação, mas com menor ação na
te, a linagliptina. Poucos estudos head-to-head disponíveis e informações glicemia de jejum. Discute-se se o medicamento teria ação efetiva para ser
de metanálises sugerem eficácia semelhante, redução de A1c inferior a 1% aplicado apenas uma vez ao dia.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 53
SECRETAGOGOS ANÁLOGOS DA AMILINA lismo da glicose ainda não está elucidado, mas parece agir por meio do au-
mento da colecistocinina (CCK) e ação adicional a um atraso no esvaziamento
Pranlintida gástrico. Atua principalmente na glicemia pós-prandial, não causa hipogli-
A amilina é polipeptídeo de 37 aminoácidos, cossecretado com a insulina, cemia nem ganho de peso. Devido ao potencial aumento de triglicerídeos
que provoca redução na liberação do glucagon e retardo do esvaziamento (2 a 19%), deve ser evitado na hipertrigliceridemia grave. Pode interferir na
gástrico. O Pramlintide é um análogo sintético da aminilina, solúvel, que absorção de alguns medicamentos, sendo recomendado ingeri-los uma hora
não se precipita e que tem propriedades farmacocinética e farmacodinâ- antes ou quatro horas após o colesevelam. Os efeitos colaterais mais comuns
mica semelhante à amilina nativa. Sua aplicação é subcutânea, antes das são gastrintestinais, principalmente constipação, em geral leve à moderada.
refeições, sendo liberada pela FDA para DM1 e 2. Os efeitos colaterais
mais frequentes são náuseas e hipoglicemias. Devido a seu pH diferente
■■ HIPOLIPEMIANTES
da insulina, deve ser aplicado em injeções separadas.
O último consenso americano do American College of Cardiology e American
1
BROMOCRIPTINA Heart Association sobre o uso de hipolipemiantes, em 2013, acompanhado
pelas diretrizes do Reino Unido e Europa, trouxe mudanças drásticas em
Nova formulação de bromocriptina apresenta rápida absorção e ação. Au-
relação às diretrizes anteriores. O risco para AVC no cálculo do risco car-
menta o tônus dopaminérgico central, frequentemente reduzido em indiví-
diovascular (RCV) não era considerado. Outras mudanças de paradigma, as
duos resistentes à ação da insulina e consequente inibição do tônus simpá-
estatinas são indicadas nas doses utilizadas nos estudos que provaram seus
tico do SNC. Reduz principalmente a glicemia pós-prandial por supressão
efeitos, e não na dose inicial de bula, e o tratamento objetiva manutenção
da produção hepática de glicose, mas ainda não está disponível no Brasil.
ou otimização da dose, e não limiares a serem atingidos. Conforme o RCV
Redução média de HbA1c entre 0,5 e 0,7%, neutra no peso e não predispõe à
do paciente, se alto a dose de início é também alta com adequação poste-
hipoglicemia. Em estudo para avaliar sua segurança clínica e cardiovascular,
rior se efeito colateral, e não o contrário.
reduziu o risco relativo de desfechos cardiovasculares em 40% (HR: 0,6 [95%
IC 0,37-0,96]). Os efeitos adversos mais comuns são náuseas, fadiga, tontu-
ra, constipação, diarreia e rinite, mais frequentes no início do tratamento e ATENÇÃO!
na titulação da dose, mas tendem a desaparecer entre 1 e 2 semanas.
Para se prescrever um hipolipemiante, há de se considerar o RCV – as
COLESEVELAM indicações estão na Figura 13.1. A terapia inicial é com estatina em
Pertence à segunda geração de sequestradores de ácidos biliares, sendo dose moderada a intensiva e conforme o objetivo do tratamento, e as
única resina aprovada pela FDA como terapia adjuvante para o DM2 não opções estão listadas na Tabela 13.3 e Figura 13.1. A monitorização do
controlado com metformina, sulfonilureia ou insulina. Seu efeito no metabo- tratamento é feita para checar a aderência, e não metas.
Acesso online
Diabéticos entre 40 e 75 anos de idade e LDL-C
-3- entre 70 e 189 mg/dL = dose moderada de Escore de http://patient.info/doctor/
PREVENÇÃO 1ª. estatina; se RCV 7,5% em 10a. OU outros Framingham cardiovascular-risk-calculator
fatores = usar dose intensiva; ***
ACC/AHA RC http://www.cvriskcalculator.com/
TABELA 13.3 ■ Lista de fármacos hipolipemiantes segundo dose-bula, metabolismo de degradação e efeito sobre o colesterol
EFEITO PERCENTUAL
(DOSE MÁXIMA)
CLASSE FÁRMACO DOSE-BULA HORÁRIO METABOLISMO LDL HDL TG
Pravastatina 10-80 mg Vespertino Desconhecido ↓ 30% ↑ 6% ↓ 13%
Sinvastatina 5-40 mg Vespertino CYP3A4 +++ SLCO1B1 ↓ 46% ↑ 7% ↓ 18%
CYP3A4 +++ P-Gliprot. +++
Estatinas Atorvastatina 10-80 mg 1 x/dia ↓ 51% ↑ 2% ↓ 28%
SLCO1B1
Rosuvastatina 5-40 mg 1 x/dia CYP2C9 +; 3A4 + ↓ 55% ↑ 10% ↓ 26%
Pitavastatina 1-2 mg 1 x/dia CYP3A4 + hidrofílica ↓ 45% ↑ 6% ↓ 19%
Fenofibrato (micronizado) 160-250 mg 1 x à refeição CYP3A4 + 2A6/2C9 + ↓ 6-20% ↑ 5-20% ↓ 41-53%
Bezafibrato 400 mg Jantar CYP3A4 ++ ↓ 5% ↑ 12% ↓ 22%
Fibratos Ciprofibrato 100 mg Jantar CYP-450 ↓ 5% ↑ 25% ↓ 50%
30 min
Gemfibrosil 600 mg 2 x CYP3A4 + 2C9/2C8 +++ ↓ 10-15% ↑ 5-20% ↓ 35-50%
pré-refeição
Ácido nicotínico 1-2 g À refeição Desconhecido ↓ 10-25% ↑ 15-35% ↓ 25-30%
Sequestrante de ácido biliar 4-24 g 2 x/dia Desconhecido ↓ 10% ↑ 3-8% ↑ 0-20%
Ezetimibe 10 mg 1 x/dia SLCO1B1 ↓ 17% ↑ 1% ↓ 7-8%
Outros
Ácido ômega 3 1-4 g 1 x ou 2 x Desconhecido ↑ 4-49% ↑ 5-9% ↓ 23-45%
Inibidores* da PCSK9 Subcutâneo,
150 mg clearance de imunoglobulina
(proprotein convertase cada 15 a 30 ↓ 39-62% ↑ 6-8% ↓ 15-20%
420 mg pelo sistema retículoendotelial
subtilisin-kexin type 9) dias
Dose-bula é aquela recomendada pelo fabricante, porém as doses de estatinas são indicadas conforme o objetivo do tratamento e deve ser individualizada, conforme estão
listadas na Tabela 13.3 e Figura 13.1; +/+++ refere-se ao efeito leve a forte sobre as enzimas do sistema citocromo P-450. Assim como a duração do efeito, a potência das
estatinas também varia.
*Anticorpos monoclonais alirocumab e evolocumab foram aprovados pela FDA e estão em vias de lançamento no Brasil.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 55
xos que são eliminados nas fezes, impedindo sua recirculação. Secunda- fisiológica, pode aumentar a lipólise e a proteólise, apesar do aumento do
riamente, o fígado aumenta a conversão de colesterol em ácidos biliares, apetite (polifagia). Em pacientes com hipotiroidismo de longa duração ou
reduzindo a colesterolemia. Podem elevar TG e causam comumente efeitos com antecedentes de DCV, recomenda-se iniciar o tratamento com dose
gastrintestinais, como constipação, dor abdominal e flatulência. Impede menor, 25 µg/dia durante 2 a 3 semanas, aumentando em 25 µg a cada 2
absorção de vitaminas lipossolúveis e de várias medicações, devendo ser semanas até normalização de tirotrofina (TSH) como parâmetro de repo-
tomados 1 a 2 horas após e 4 horas antes. sição, excetuando-se os casos de hipotiroidismo central. Deve-se aguar-
dar 6 a 8 semanas para nova dosagem de TSH objetivando-se o reajuste
INIBIDORES DA ABSORÇÃO DO COLESTEROL de dose. Pacientes mais idosos frequentemente normalizam o TSH com
(EZETIMIBA) doses menores de tiroxina (T4); portanto, recomenda-se dose entre 0,75
O fármaco ezetimiba inibe a absorção de colesterol na borda em esco- a 1,5 µg/kg/dia. Veja posologia por grupos mais específicos no capítulo
va do intestino delgado via transportador de esterol, Niemann-Pick C1- sobre Doenças da Hipofunção da Tiroide.
-like1 (NPC1L1). Isso leva à redução no fornecimento de colesterol para
o fígado, à redução no acúmulo de colesterol hepático e ao aumento SAIS DE TESTOSTERONA (INJETÁVEL
do clearance do colesterol do sangue, diminuindo o colesterol total, o E PERCUTÂNEO)
colesterol-LDL, apolipoproteína-B e os TGs, ao passo que aumenta o HDL- Uma vez iniciada a reposição com testosterona, o paciente costuma apre-
-colesterol. A ezetimiba pode ser útil, se necessário, evitar-se altas doses sentar diminuição da massa gorda e aumento de massa muscular. Ainda,
de estatinas. a reposição de testosterona afeta vários domínios da função sexual, assim
como melhora o humor, a disposição e a força física. Existem apresenta-
ÁCIDO NICOTÍNICO ções comerciais de testosterona intramuscular, transdérmica e percutânea,
Age inibindo a produção hepática de VLDL e LDL, aumentando os níveis de além dos implantes e por via oral; no Brasil, estão disponíveis as apre-
HDL ao reduzir a transferência do colesterol do HDL para VLDL, retardando sentações de uso oral, em gel e intramuscular de curta (três semanas) e
o clearance de HDL; também diminui os níveis de fibrinogênio. longa duração (trimestral). Aquelas para uso oral não são recomendadas.
Os efeitos colaterais do ácido nicotínico são: baixa tolerabilidade, ru- Comercialmente, estão disponíveis os sais: cipionato de testosterona (De-
bor cutâneo mediado por prostaglandina, dores de cabeça, sensação de posteron, 200 mg, apresentação com 3 ampolas); mistura de enantato e
calor e prurido, hiperpigmentação (particularmente nas dobras cutâneas); outros ésteres (Durateston, 250 mg, apresentação com 2 ampolas); e un-
acantose nigricante, pele seca, náuseas, vómitos, diarreia e miosite. Deve decanoato de testosterona (Nebido, 1.000 mg, dose basal, outra após seis
ser prescrito com as refeições. Começar com 250 mg, uma vez ao dia, e semanas e, depois, trimestralmente). As duas primeiras apresentações de-
titular até 500 mg três vezes por dia. Depois de seis semanas, e então vem ser prescritas a cada 2 a 3 semanas, variando-se a dose de 150 a 200
semestralmente, devem-se verificar lipídeos, glicose, enzimas hepáticas mg (ou 50 a 75 mg semanais) conforme a necessidade do paciente. Antes
e ácido úrico, pois pode alterar esses parâmetros metabólicos . Se neces- da injeção seguinte, o paciente pode apresentar sintomas como adinamia,
sário, aumentar a dose. Em doses acima de 1 g/dia, aumenta os efeitos cefaleia e labilidade emocional transitória, geralmente devida às oscilações
adversos e tóxicos das estatinas. de testosterona sérica. A reposição fisiológica com testosterona recupera
e aumenta a massa muscular, sobretudo se associado à prática esportiva,
ÁCIDO ÔMEGA 3 e aumenta a lipólise. Entretanto, o abuso dessa reposição em esquemas
O tratamento com ácido ômega 3 deve ser considerado apenas quando os suprafisiológicos pode acarretar alterações metabólicas hepáticas graves.
níveis de TG permanecem superiores a 1.000 mg/dL, pois tanto diminui os
TG como eleva os níveis de LDL. Seu mecanismo de ação não está definido; SOMATROPINA OU HORMÔNIO DO CRESCIMENTO
pode reduzir a síntese hepática de TG, ou elevar a atividade plasmática da (GH HUMANO RECOMBINANTE)
lipase lipoproteica. Em 4% dos pacientes, pode provocar eructações, dis- Uma vez adequadamente indicada a reposição com hormônio do cresci-
pepsia ou perversão do apetite, além de alterações de enzimas hepáticas e mento (GH) nos casos de deficiência de GH, as doses usuais recomendadas
aumento do tempo de sangramento. É contraindicado se houver fibrilação para uso subcutâneo variam com a idade e quadro clínico, em geral em
atrial ou flutter, pois pode acentuar essas arritmias. E pode acentuar os crianças inicia-se com 0,07 a 0,1 UI/kg de peso corporal, ou 2 a 3 UI/m2 de
efeitos de anticoagulantes e antiadesivos plaquetários. superfície corporal, 6 a 7 vezes por semana. Em meninas com síndrome de
Inibidores da PCSK9: anticorpos monoclonais que inibem a pró-proteina Turner, a dose é elevada para 0,15 UI/kg/dia (4,5 UI/m2/dia) ou 1,0 UI/kg/
convertase de sublisina kexina 9 (PCSK9), a qual age no fígado levando à semana (30 UI/m2/sem). Naqueles com doença renal crônica, 0,1 a 0,15 UI/
degradação dos receptores de LDL nos hepatócitos, aumentando os níveis kg/dia (4,5 UI/m2/d) ou 1 UI/kg/semana (30 UI/m2/sem). Mesmo em adul-
de LDL. Diminui em 70% os níveis de LDL, tão eficaz mesmo em vigência tos, deve-se iniciar a terapia de reposição com uma dose mais baixa, como
de estatina. Injetáveis, ainda não disponíveis no Brasil. Aprovado pela FDA 0,5 UI/dia (3,5 UI/sem), ou não mais do que 0,02 UI/kg/dia (0,7 UI/m2/d) ou
em 2015. 0,125 UI/kg/semana (5,1 UI/m2/sem).
REVISÃO
A psicofarmacologia é a disciplina que se dedica ao estudo dos efeitos
A evolução no tratamento do DM2 nos últimos anos foi marcante, de substâncias com potencial de ação no funcionamento do SNC em di-
principalmente com o advento dos fármacos do grupo das incre- ferentes níveis de análise, incluindo estados psicológicos, comportamen-
tinas; no entanto, permanece como primeira linha a indicação da to, cognição, neurofisiologia, neuroquímica, expressão gênica e biologia
metformina. molecular. Data do século III a. C. o uso de substâncias preparadas para
Do ponto de vista estrito de controle glicêmico, o poder de redução aliviar manifestações anormais do comportamento. Esses componentes fi-
da glicemia pela insulina é maior, e ela deverá ser indicada sempre toterápicos tiveram seu uso estabelecido por vários séculos, independente
que o paciente apresentar sinais clínicos de catabolismo, glicemia e da completa ausência de comprovação de sua eficácia.
de A1c elevadas.
O controle glicêmico precisa ser considerado no contexto de re-
ATENÇÃO!
dução do risco das complicações crônicas vasculares, além de
segurança e eficácia individualizada para cada paciente. Além Com os importantes avanços nas neurociências registrados nas últimas
disso, as medicações que interferem na lipemia nem sempre agem décadas, a psicofarmacologia tem se dedicado ao estudo das complexas
em tantas frentes desejáveis como as estatinas. O ezetimibe, por interações de fatores genéticos e ambientais com a ação das substâncias
exemplo, diminui LDL e proteína C-reativa, mas não aumenta o psicoativas, tanto em estados normais como em estados patológicos.
lúmen vascular; fibratos, por sua vez, aumentam mais o HDL e
diminuem o estresse oxidativo, mas tampouco agem nos outros
Os princípios que determinam as características farmacocinéticas
aspectos vasculares.
(absorção, distribuição, biotransformação e eliminação) são os mesmos
Quanto maior os níveis de colesterol, maior é o risco de DCV e, por utilizados para outros fármacos, com uma única característica adicional:
conseguinte, a mortalidade relacionada. tanto o início do efeito quanto a eliminação dos psicofármacos dependem
Estatinas em terapia intensiva estão sempre indicadas na preven- da sua permeabilidade à barreira hematencefálica (BHE). Neste capítulo,
ção secundária de DCVs, e na prevenção primária, apenas se o risco será feita uma revisão das propriedades das principais classes dos psico-
calculado de morte cardiovascular em 10 anos for superior a 7,5%. fármacos atualmente comercializados no Brasil.
Considerar interação medicamentosa nos pacientes polimedicados.
■■ ANTICONVULSIVANTES
Os mecanismos de ação dos anticonvulsivantes se encontram na Tabela 14.1.
■■ REFERÊNCIA CARBAMAZEPINA
1. Stone NJ, Robinson JG, Lichtenstein AH, Bairey Merz CN, Blum CB, Eckel Embora o seu mecanismo de ação não tenha sido completamente elucida-
RH, et al. 2013 ACC/AHA guideline on the treatment of blood cholesterol to do, diferentes estudos mostraram de forma consistente que a carbamaze-
reduce atherosclerotic cardiovascular risk in adults: a report of the American pina bloqueia a subunidade alfa dos canais de sódio, também pode mo-
College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice dular os canais de cálcio e potássio em doses terapêuticas e inibe disparos
Guidelines. Circulation. 2014;129(25 Suppl 2):S1-45. repetitivos de alta frequência em neurônios in vitro. Além da estabilização
de membrana, a carbamazepina em níveis terapêuticos também provoca
uma redução da transmissão sináptica a partir de ação pré-sináptica. Há
■■ LEITURAS SUGERIDAS também evidência de que outros mecanismos podem ser relevantes na
ação psicotrópica da carbamazepina, incluindo uma ligação com recepto-
American Diabetes Association. Standards of Medical Care in Diabetes 2013.
Diabetes Care. 2013;36 Suppl 1:S11-66.
res adenosinérgicos, inibição da captura e liberação de norepinefrina de
Golightly LK, Drayna CC, McDermott MT. Comparative clinical pharmacokinetics
sinaptossomas e ação pós-sináptica no sistema GABAérgico.
of dipeptidyl peptidase-4 inhibitors. Clin Pharmacokinet. 2012;51(8):501-14. A carbamazepina é quase completamente absorvida após adminis-
Nathan DM, Buse JB, Davidson MB, Ferrannini E, Holman RR, Sherwin R, et al. tração via oral (VO). A ingestão de alimentos torna a absorção mais lenta,
Medical management of hyperglycemia in type 2 diabetes: a consensus mas não a prejudica. O pico plasmático ocorre entre 6 e 8 horas após a
algorithm for the initiation and adjustment of therapy: a consensus ingestão. O nível terapêutico recomendado é de 4 a 8 mg/mL de sangue.
statement of the American Diabetes Association and the European A carbamazepina é um potente indutor de isoenzimas, aumentando o
Association for the Study of Diabetes. Diabetes Care. 2009;32(1):193-203. seu próprio metabolismo e de vários outros medicamentos lipossolúveis.
Pratley RE, Nauck M, Bailey T, Montanya E, Cuddihy R, Filetti S, et al. Liraglutide É parcialmente metabolizada em carbamazepina-10,11-epóxido no fíga-
versus sitagliptin in patients with type 2 diabetes who did not have adequate do, um metabólito ativo que contribui para a sua ação anticonvulsivante.
glycaemic control with metformin: a 26-week, randomised, parallel-group, A meia-vida de eliminação é de cerca de 12 horas no uso crônico. A carba-
open-label trial. Lancet. 2010;375(9724):1447-56. mazepina acelera também o metabolismo dos contraceptivos orais.
58 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
POTENCIALIZAÇÃO BLOQUEIO DE
+
BLOQUEIO DE CANAIS DE NA DE MECANISMOS BLOQUEIO DE CANAIS DE MECANISMOS
2+
MEDICAMENTO VOLTAGEM-DEPENDENTES GABAÉRGICOS CA TIPO T TALÂMICOS GLUTAMATÉRGICOS
Carbamazepina ++ ± ? ±
Valproato de sódio + + ND ±
Lamotrigina ++ ND ND ±
+, ++: Mecanismo demonstrado; ±: dados inconsistentes; ND: mecanismo não demonstrado; ?: dados não disponíveis.
ÁCIDO VALPROICO/VALPROATO DE SÓDIO ISRSN e “outros”. As doses geralmente recomendadas para os diferentes
O ácido valproico apresenta uma biodisponibilidade superior a 80% após antidepressivos comercializados no Brasil se encontram compiladas na
administrado VO. A presença de alimentos torna a absorção mais lenta, Tabela 14.2.
mas não a prejudica. O pico plasmático ocorre cerca de duas horas após a
ingestão. Os níveis terapêuticos variam de 50 a 100 mg/mL. ANTIDEPRESSIVOS HETEROCÍCLICOS
A meia-vida de eliminação varia de 10 a 18 horas. Cerca de 20% do Os antidepressivos heterocíclicos são classificados, de acordo com sua
medicamento é excretado na forma de conjugado e 80% metabolizado (oxi- estrutura molecular, em tricíclicos (imipramina e clomipramina), tetracícli-
dação), que são posteriormente conjugados e excretados. O ácido valproico cos (maprotilina) e de amina segundária (nortriptilina).
inibe o seu próprio metabolismo e o de outros anticonvulsivantes, como car-
bamazepina, fenobarbital e fenitoína, aumentando o seu nível plasmático.
TABELA 14.2 ■ Doses terapêuticas de antidepressivos
LAMOTRIGINA
comercializados no Brasil
A lamotrigina é quase completamente absorvida após administração VO, é
metabolizada primariamente por glucuronidação e excretada na urina. A in- DOSE
gestão de alimentos não interfere na absorção. A sua meia-vida de eliminação DOSE INICIAL DOSE-ALVO MÁXIMA
é de cerca de 25 horas, a qual pode ser reduzida para 13 a 15 horas quando MEDICAMENTO (mg/d) (mg/d) (mg/d)
utilizada em associação com medicamentos indutores de enzimas hepáticas.
Agomelatina 25 50 50
A lamotrigina é bem tolerada, exceto por sua propensão em cau-
sar rash cutâneo, incluindo a síndrome de Stevens-Johnson, que ocorre rara- Amitriptilina 25 150 300
mente. O risco desse efeito adverso pode ser minimizado pela titulação lenta,
Bupropiona 150 300 450
com dose dividida em duas tomadas diárias, e evitando-se a associação com
medicamentos que potencializam esse risco, como o valproato. Em monote- Citalopram 20 40 60
rapia, a dose recomendada é de 100 a 200 mg/dia (máxima de 500 mg/dia).
Clomipramina 25 150 250
PREGABALINA Desvenlafaxina 50 100 200
A pregabalina é rapidamente absorvida no TGI após administração por
Duloxetina 30 60 120
VO e atravessa prontamente a BHE. Apresenta farmacocinética linear na
faixa de dose recomendada (150-600 mg/dia) quando administrada em Escitalopram 10 20 20
duas ou três tomadas diárias. Apresenta metabolismo hepático ínfimo e é
Fluoxetina 20 40 80
quase completamente eliminada via renal. A pregabalina não exige moni-
toramento rotineiro de níveis plasmáticos e não requer ajuste de dosagem Fluvoxamina 50 100 300
em pacientes com insuficiência hepática (IH). É, porém, necessário ajuste
de dose em pacientes com prejuízo na função renal e nos submetidos à Imipramina 75 150 300
hemodiálise. Maprotilina 75 150 300
Embora a pregabalina seja estruturalmente relacionada ao neuro-
transmissor inibitório GABA, os seus efeitos não estão relacionados à ati- Mirtazapina 15 30 60
vidade do sistema GABAérgico. A sua ação ansiolítica é atribuída a uma Nortriptilina 25 75 150
ligação fortemente seletiva com subunidades α2δ, particularmente a do
tipo 1 (α2δ-1). A ligação a receptores pré-sinápticos α2δ-1 reduz o influxo Paroxetina 20 40 60
de cálcio induzido por potencial de ação e, em consequência, diminui a
Reboxetina 4; 2 x/dia 5; 2 x/dia 5; 2 x/dia
liberação de diversos neurotransmissores excitatórios do terminal nervo-
so, incluindo glutamato e neurotransmissores monoaminérgicos, os quais Sertralina 50 100 200
parecem estar fortemente envolvidos na fisiopatologia da ansiedade (Ben-
-Menachem 2004, Frampton and Foster 2006, Mico and Prieto 2012). Tianeptina 12,5; 3 x/dia 12,5; 3 x/dia 12,5; 3 x/dia
Tranilcipromina 10 10; 2 x/dia 10; 2 x/dia
■■ ANTIDEPRESSIVOS Trazodona 150 300 600
Os antidepressivos são classicamente agrupados de acordo com seu
mecanismo de ação e estrutura molecular em heterocíclicos, IMAOs, ISRS, Venlafaxina 75 150 375
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 59
A absorção dos heterocíclicos é quase completa após administração adversos que compõem a chamada síndrome de descontinuação, a qual
VO e o pico plasmático ocorre entre 2 e 8 horas após a ingestão. Por apre- geralmente se inicia dois ou três dias após a redução da dose (ou suspen-
sentarem meia-vida de eliminação longa (20 a 70 horas), todos podem são) e é caracterizada por cefaleia, náusea, vertigem, parestesias, insônia,
ser administrados em tomada única diária. Todos os medicamentos desse pesadelos, ansiedade, tremores e sensação de desconforto. A síndrome de
grupo são metabolizados pelo sistema do citocromo P-450. descontinuação costuma ser mais importante quando do uso de ISRS com
Os heterocíclicos inibem de forma variável o transportador de sero- meia-vida mais curta (p. ex.: fluvoxamina e paroxetina) e ocorre também
tonina e norepinefrina, aumentando as concentrações desses neurotrans- em indivíduos tratados com outras classes de antidepressivos com ação
missores na fenda sináptica (Tabela 14.3). Em razão da não seletividade serotonérgica (heterocíclicos, IMAOs e ISRSN).
de sua ação, nesses sistemas de neurotransmissão, há importantes pro- Os ISRS são metabolizados por diferentes enzimas do sistema do cito-
blemas de tolerabilidade (efeitos anticolinérgicos, sedação e hipotensão cromo P-450 (CYP 1A2, 2C, 2D6 e 3A), o qual é inibido por esses medicamen-
ortostática) e segurança (convulsões e distúrbios de condução cardíaca) tos, provocando um aumento da concentração plasmática de medicamentos
associados ao uso de medicamentos dessa classe. Essas questões motiva- metabolizados pelas enzimas em uso concomitante com ISRS. As interações
ram uma drástica redução na sua prescrição após o advento dos chamados medicamentosas dessa natureza são mais preocupantes com o uso de fluvo-
antidepressivos de segunda geração. xamina e menos prováveis com citalopram, escitalopram e sertralina.
Os eventos adversos mais comumente observados com os ISRS in-
INIBIDORES DA MONOAMINOXIDASE cluem náusea, disfunção sexual (redução da libido, retardo no orgasmo
Os IMAOs inativam a enzima monoaminoxidase, um dos mecanismos ou anorgasmia parcial ou completa), cefaleia, insônia, sedação, fadiga e
responsáveis pelo metabolismo das monoaminas, aumentando, assim, as mioclonias), alterações de apetite e aumento de peso (mais comumente
concentrações desses neurotransmissores na fenda sináptica. Apresentam observado em pacientes tratados por longos períodos com paroxetina).
boa absorção após administração VO, atingindo pico plasmático em cerca
de 3 horas. A meia-vida de eliminação dos medicamentos dessa classe é
INIBIDORES DE RECAPTAÇÃO DE SEROTONINA
curta (2 a 5 horas), exigindo um fracionamento da dose diária. E NOREPINEFRINA
No Brasil, apenas um IMAO (tranilcipromina) é comercializado. Deve Os medicamentos dessa classe são inibidores potentes e seletivos de re-
ser administrado em duas ou três tomadas, em razão da sua meia-vida e captação da serotonina e norepinefrina.
de problemas de tolerabilidade. A reação adversa mais importante rela- A venlafaxina é bem absorvida após administração VO, atingindo pico
cionada ao uso da tranilcipromina é a ocorrência de crises hipertensivas plasmático cerca de seis horas depois. A sua meia-vida média de elimina-
graves desencadeadas pela ingestão de alimentos ricos em tiramina (p. ção é de 3 a 4 horas, mas a única apresentação disponível no mercado (de
ex.: queijos envelhecidos, cerveja, alimentos processados, carnes defuma- liberação prolongada) permite a sua administração em tomada única diária.
das, vinho, iogurtes, quantidades excessivas de café ou chocolate, feijão É predominantemente metabolizada no fígado em seu principal meta-
tipo fava, amendoim, bebidas destiladas e molho de soja). Problemas de bólito ativo (O-desmetilvenlafaxina, também chamado desvenlafaxina) e
tolerabilidade e segurança também motivaram uma drástica redução na em N-desmetilvenlafaxina. A CYP2D6 é principal enzima responsável pela
prescrição dessa classe de medicamentos após o lançamento de antide- O-desmetilação e a CYP3A4 está envolvida na N-desmetilação.
pressivos de segunda geração. A desvenlafaxina, o principal metabólito ativo da venlafaxina, com-
parada com ela, apresenta uma afinidade relativamente maior para o
INIBIDORES SELETIVOS DE RECAPTAÇÃO DA transportador de norepinefrina e menor para o transportador de seroto-
SEROTONINA nina. É lentamente absorvida após administração VO, apresentando pico
plasmático entre 7 e 8 horas após a ingestão e biodisponibilidade superior
Os ISRS se diferenciam dos antidepressivos de primeira geração não
a 80%. A ingestão com alimentos não altera de forma significativa a sua
pela eficácia, mas por um perfil de tolerabilidade e segurança significa-
absorção. Sua meia-vida de eliminação varia de 9 a 15 horas.
tivamente mais favorável. Atualmente, são comercializados no Brasil seis
A desvenlafaxina é primariamente metabolizada por glucuronidação
ISRS (fluoxetina, paroxetina, sertralina, fluvoxamina, citalopram e escita-
e, em menor proporção, por metabolismo oxidativo via CYP3A4. Aproxi-
lopram). A meia-vida de eliminação dos componentes dessa classe é bas-
madamente 45% da desvenlafaxina é excretada inalterada na urina.
tante heterogênea, variando de cerca de 15 horas (fluvoxamina) até cerca
A duloxetina é bem absorvida no TGI, atingindo pico plasmático cer-
de 72 horas (Fluoxetina), permitindo, porém, a administração em toma-
ca de seis horas após a ingestão. A ingestão de alimentos torna a absorção
da única diária para todos eles. De modo geral, a suspensão ou redução
mais lenta, mas não a altera. É rapidamente metabolizada (CYP2D6 e 1A2)
brusca da dose desses medicamentos é acompanhada de diversos eventos
após absorção, apresentando uma meia-vida de 12 a 17 horas. Cerca de
70% da excreção ocorre na forma de glucoronídeos conjugados na urina e
20% é excretado nas fezes.
TABELA 14.3 ■ Antidepressivos heterocíclicos: potência de Apresenta inibição de recaptação da serotonina e norepinefrina mais
inibição de recaptura de neurotransmissores balanceada quando comparada à venlafaxina e pode ser administrada em
dose única diária.
POTÊNCIA DE BLOQUEIO DE RECAPTAÇÃO
ANTAGONISTAS DE RECEPTORES SEROTONÉRGICOS
MEDICAMENTO SEROTONINA NOREPINEFRINA DOPAMINA
A trazodona e a nefazodona bloqueiam primariamente os receptores
Amitriptilina 23 2,9 0,031 serotonérgicos 5HT2A. A trazodona também é um potente antagonista
do receptor alfa-1 adrenérgico. Embora alguns estudos sugiram que esses
Clomipramina 360 2,6 0,046
medicamentos sejam tão efetivos quanto os ISRS, eles raramente são uti-
Imipramina 71 2,7 0,012 lizados como antidepressivos de primeira escolha. Atualmente, apenas a
trazodona é comercializada no Brasil.
Maprotilina 0,017 9 0,1 A trazodona é rapidamente absorvida após administração VO e atinge
Nortriptilina 5,6 23 0,088 seu pico plasmático em cerca de uma hora. É metabolizada no fígado, com
1
excreção de mais de 70% do medicamento na forma de metabólitos, via
Fonte: Adaptada de Tatsumi e colaboradores. urinária.
60 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
A buspirona é rapidamente absorvida após administração VO e sofre preendidas. Comparados com os antipsicóticos convencionais, apresen-
extensa metabolização de primeira passagem por meio de hidroxilação e tam uma elevada razão de bloqueio serotonérgico (receptor 5-HT2) em
dealquilação, resultando em diversos metabólitos ativos. A meia-vida de relação ao bloqueio dopaminérgico (receptor D2) e uma maior especifici-
eliminação varia de 2 a 5 horas. Indutores (p. ex.: rifampicina) e inibidores dade para o sistema dopaminérgico mesolímbico, em detrimento do es-
(p. ex.: cetoconazol) da enzima CYP34A alteram significativamente o seu triatal. Embora dados preliminares sugerissem uma maior efetividade dos
nível plasmático. Provavelmente em razão da ação noradrenérgica de meta- antipsicóticos atípicos que justificassem o seu custo mais elevado, estudos
bólitos ativos, eventos adversos cardiovasculares, como taquicardia e pal- independentes não demonstraram maior eficácia nem mesmo um melhor
pitações, ocorrem com mais frequência com a buspirona do que com BDZs. perfil de tolerabilidade quando da comparação com o uso de antipsicóti-
cos convencionais em doses baixas.
ZOLPIDEM Após administração VO, os antipsicóticos atípicos são bem absorvi-
O zolpidem é um hipnótico não benzodiazepínico que se liga seletiva- dos no TGI. Com as exceções da asenapina, da ziprasidona e da quetia-
mente ao receptor benzodiazepínico do subtipo ômega 1, potencializando pina, as quais devem ter a dose diária fracionada em duas tomadas, a
a inibição neuronal mediada pelo sistema GABAérgico. Ao contrário dos meia-vida longa permite a administração em uma única tomada diária
BDZs, o zolpidem apresenta efeitos relaxante muscular e anticonvulsivante (a apresentação de liberação prolongada da quetiapina também permite
clinicamente não significativos, mas tem sido descrito efeito depressor res- a administração em tomada única diária). Os antipsicóticos atípicos são
piratório em doses elevadas ou quando do uso em associação com outros primariamente metabolizados no fígado por vários mecanismos, incluin-
depressores do SNC. do desmetilação, oxidação e hidroxilação. A excreção é bastante variável
entre as diferentes moléculas, com três padrões principais: primariamente
O zolpidem é absorvido de forma rápida, após administração VO e é ex-
excretado inalterado, pela urina (paliperidona); primariamente excreta-
tensivamente metabolizado no fígado por meio de oxidação e hidroxilação.
do alterado, pela urina (clozapina, olanzapina, quetiapina, risperidona);
A meia-vida de eliminação é de 2,5 horas, com uma duração de ação curta
primariamente excretado alterado, pelas fezes (aripiprazol, ziprasidona).
(comparável ao midazolam). Embora não esteja estruturalmente relacionado
aos BDZs, o uso crônico de zolpidem tem sido associado ao desenvolvimen-
to de dependência, tolerância e efeitos amnésicos, como observado. NALTREXONA (ANTAGONISTA DE RECEPTOR OPIOIDE)
A naltrexona é um antagonista opioide inespecífico que se liga aos três
subtipos de receptores opioides, de modo dose-dependente, que apresen-
■■ ANTIPSICÓTICOS ta maior afinidade pelo receptor m. A administração em modelos animais
Tomando por base propriedades farmacológicas e a emergência de sinto- leva a uma redução dos níveis de dopamina no nucleus accumbens.
mas extrapiramidais relacionados ao tratamento, os antipsicóticos atual- A naltrexona é quase completamente absorvida VO, com pico plas-
mente comercializados são classificados em: convencionais (típicos ou de mático geralmente ocorrendo na primeira hora. O metabolismo ocorre
primeira geração) e atípicos (de segunda geração). primariamente no fígado por conjugação e metilação, e a eliminação é
feita primariamente pela urina e, em menor extensão, nas fezes. Estudos
ANTIPSICÓTICOS CONVENCIONAIS clínicos de fase III têm demonstrado a eficácia da naltrexona injetável de
ação prolongada. Porém, essa apresentação não está aprovada para co-
Há várias definições para antipsicóticos “típicos” e “atípicos”. Será adota-
mercialização no Brasil.
da a que, provavelmente, é mais relevante do ponto de vista clínico. Será
usado o termo antipsicóticos convencionais ou típicos para os medicamen-
tos com ação antipsicótica estabelecida com potencial elevado para de- DISSULFIRAM
sencadear sintomas extrapiramidais (SEP). O dissulfiram inibe a enzima hepática aldeído-desidrogenase, levando a
Classicamente, os bloqueadores mais potentes dos receptores D2, que um acúmulo de acetaldeído quando da ingestão concomitante de álcool.
não apresentam atividade anticolinérgica intrínseca (p. ex.: Haloperidol), A interação dissulfiram-álcool pode causar taquicardia, hiperpneia, rubor
apresentam o maior potencial de provocar SEP e, em geral, são eficazes no facial, náusea, vômito, hipotensão e mesmo parada cardiorrespiratória.
tratamento de sintomas positivos. Os bloqueadores D2 menos potentes (p. O uso não associado ao álcool pode estar associado a efeitos colaterais
ex.: clorpromazina, levomepromazina, tioridazina), por sua vez, costumam como fadiga, dermatite, neurite óptica, polineuropatia aguda e dano he-
ser mais sedativos, anticolinérgicos e hipotensivos. A ação em outros recep- pático (eventos dose-dependentes).
tores está associada à emergência de outros eventos adversos. O bloqueio O dissulfiram é quase completamente absorvido após administração
de receptores histaminérgicos H1 está associado à sedação e ao ganho de VO. É metabolizado no fígado por meio de glucuronidação e eliminado
peso; efeitos anticolinérgicos estão associados a xerostomia, à constipação primariamente via renal. A sua meia-vida de eliminação varia de 60 a 120
intestinal, à visão turva e à retenção urinária; bloqueio de receptores alfa- horas, permitindo a administração em tomada única diária.
-adrenérgicos está associado à hipotensão postural; o próprio antagonismo
dopaminérgico está associado à elevação da prolactinemia, podendo de- LÍTIO
sencadear eventos adversos como disfunção sexual e galactorreia. Comercializado no Brasil na forma de carbonato, o lítio é rapidamente
Os antipsicóticos convencionais são rapidamente absorvidos após absorvido (1 a 6 horas) no TGI após administração VO, atingindo pico plas-
administração VO e são primariamente metabolizadas no fígado, princi- mático entre 1 e 3 horas para a apresentação de liberação imediata, e de 4
palmente por meio das isoenzimas CYP2D6, CYP1A2 e CYP3A4. Adicional- a 12 horas para a apresentação de liberação lenta. O pico de concentração
mente, alguns deles, como clorpromazina, levomepromazina e tioridazina, cerebral ocorre cerca de 24 horas depois, em razão da baixa permeabili-
são potentes inibidores do CYP2D6. A duração de ação das moléculas dis- dade da barreira hematencefálica ao lítio. A eliminação do lítio inalterado
poníveis no mercado brasileiro (Tabela 14.5) permite a administração em é feita primariamente via renal.
tomada única diária. A administração de lítio deve ser monitorada de perto em razão do
seu perfil de tolerabilidade desfavorável. O uso crônico dessa molécula
ANTIPSICÓTICOS ATÍPICOS tem sido associado a hipotiroidismo (afetando até 20% dos pacientes),
Independentemente dos marcantes esforços, as propriedades farmacoló- diabetes insípido, hipercalcemia, hepatotoxicidade e insuficiência renal.
gicas que conferem o diferencial clínico dos antipsicóticos atípicos (baixa Embora os mecanismos precisos pelos quais o lítio exerce os seus
propensão para causar sintomas extrapiramidais) ainda são pouco com- diversos efeitos terapêuticos ainda não tenham sido completamente
62 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
15 RESPIRATÓRIAS
As crianças com obesidade grave podem apresentar a síndrome da apneia
OBESIDADE obstrutiva do sono, caracterizada por roncos, sono agitado, com múltiplos
despertares e pausas respiratórias. Além das manifestações que ocorrem
durante o período de sono, geralmente apresentam sonolência diurna e
déficits neurocognitivos. O diagnóstico é confirmado pela polissonografia.
■■ DIAGNÓSTICO
O diagnóstico da obesidade é clínico, com base no histórico e no exame fí-
sico, incluindo a avaliação antropométrica. Os exames complementares au-
ATENÇÃO!
xiliam na investigação das causas de obesidade secundária e das complica- Há necessidade de treinamento adequado do profissional que realizará
ções do excesso de peso, assim como na avaliação da composição corporal. essa medição, pois os erros são muito frequentes.
ANAMNESE
Na anamnese de uma criança obesa, alguns aspectos devem ser ressalta- Circunferência abdominal
dos: idade de início da obesidade; fatores desencadeantes; evolução da Parâmetro importante a ser avaliado no obeso, a circunferência abdominal
doença; tratamentos prévios para controle do peso; dados referentes à mede indiretamente os depósitos intra-abdominais de gordura. A adipo-
gestação e ao parto; peso e comprimento ao nascimento; ganho excessivo sidade central (abdominal) está relacionada ao maior risco para o desen-
de peso nos dois primeiros anos de vida; desenvolvimento neuropsico- volvimento de morbidades associadas à obesidade. A medida é realizada
motor; antecedentes mórbidos; uso de medicamentos que aumentam o com uma fita inextensível, no ponto médio entre a borda inferior da última
apetite (anti-histamínicos, corticosteroides); histórico alimentar (tempo costela e a borda superior da crista ilíaca. Valores elevados da circunferên-
de aleitamento materno, idade de introdução e qualidade da alimentação cia abdominal (a partir do percentil 90), em crianças e adolescentes, são
complementar, dia alimentar habitual, preferências alimentares, compor- associados a alterações metabólicas, como resistência insulínica, dislipide-
tamentos relacionados à alimentação, horários das refeições); atividade mias, hipertensão arterial, e ao maior risco cardiovascular.
4
física desenvolvida pela criança (aulas de educação física e atividades ex- A Tabela 15.2, derivada do Bogalusa Heart Study, apresenta os valo-
tracurriculares); tempo gasto com atividades sedentárias (televisão, video- res de circunferência abdominal, segundo idade, sexo e cor da pele, com
game, computador, tablet); horas de sono. ponto de corte no percentil 90.
No interrogatório sobre os diversos aparelhos, averiguar a presença
de dores articulares nos membros inferiores, lesões de pele, roncos e múl- Avaliação da composição corporal
tiplos despertares durante o sono e transtornos comportamentais. A avaliação da composição corporal (massa gorda e massa magra) pode
O histórico familiar deve incluir a obesidade e as morbidades associa- ser feita com grande precisão, utilizando-se a DXA (do inglês dual-energy
das, como diabetes tipo 2, hipertensão arterial, dislipidemias e doenças X–ray absorptiometry). Esse método é pouco invasivo, consiste na dupla
cardiovasculares. emissão de feixes de raio X, fornece a quantidade de massa magra e de
massa gorda, assim como a distribuição anatômica da gordura corporal.
EXAME FÍSICO
Antropometria ■■ TRATAMENTO
Peso e estatura A abordagem multidisciplinar é considerada a forma mais adequada para
O diagnóstico de obesidade é feito com a utilização de métodos antropo- o tratamento da obesidade. A equipe de atendimento deve ser formada
métricos de fácil aplicação e baixo custo. O peso e a estatura são os dados por pediatra, nutricionista, psicólogo e educador físico.
rotineiramente coletados. Com os dados de peso e estatura, calcula-se o Ao exame físico, possíveis complicações da obesidade, como altera-
IMC = peso (kg)/estatura2 (metros), que apresenta boa correlação com a ções ortopédicas e dermatológicas e hipertensão arterial, já podem ser
quantidade da gordura corporal. observadas.
O valor do IMC encontrado deverá ser analisado, utilizando-se um Os exames complementares são úteis para o diagnóstico das reper-
referencial internacional como o da OMS. O diagnóstico do excesso de cussões metabólicas (dislipidemias, alterações do metabolismo da glicose)
peso se baseia em percentis ou escores-z do IMC/idade, como mostrado e incluem a dosagem do colesterol total e das frações (HDL, LDL), dos TGs,
na Tabela 15.1. da glicemia e da insulinemia de jejum. Deve ser feita uma ultrassonografia
(US) para detectar esteatose hepática e avaliação da função hepática, por
Pregas cutâneas meio da atividade das enzimas alanina aminotransferase (ALT), aspartato
As pregas cutâneas, que fornecem indiretamente a quantidade de gordura aminotransferase (AST) e gamaglutamiltransferase (GGT), também devem
corporal, também podem ser mensuradas. As mais utilizadas em crianças ser realizadas.
são a tricipital e a subescapular. O acompanhamento nutricional visa à reeducação alimentar, que
A espessura da prega cutânea (em milímetros) é obtida por meio de deve ser feita de maneira gradativa. A orientação alimentar é individuali-
um plicômetro e deve ser comparada com valores de referência, como os zada, de acordo com a idade, o desenvolvimento puberal e a presença ou
da OMS. não de comorbidades.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 67
TABELA 15.2 ■ Distribuição em percentis da circunferência abdominal segundo sexo e idade, em crianças e adolescentes
BRANCOS PRETOS
IDADE (ANOS) n 50 90 n 50 90 n 50 90 n 50 90
5 28 52 59 34 51 57 36 52 56 34 52 56
6 44 54 61 60 53 60 42 54 60 52 53 59
7 54 55 61 55 54 64 53 56 61 52 56 67
8 95 59 75 75 58 73 54 58 67 54 58 65
9 53 62 77 84 60 73 53 60 74 56 61 78
10 72 64 88 67 63 75 53 64 79 49 62 79
11 97 68 90 95 66 83 58 64 79 67 67 87
12 102 70 89 89 67 83 60 68 87 73 67 84
13 82 77 95 78 69 94 49 68 87 64 67 81
14 88 73 99 54 69 96 62 72 85 51 68 92
15 58 73 99 58 69 88 44 72 81 54 72 85
16 41 77 97 58 68 93 41 75 91 34 75 90
17 22 79 90 42 66 86 31 78 101 35 71 105
4
Fonte: Freedman e colaboradores.
Inicialmente, devem ser feitas as seguintes orientações: estabelecer nú- e condimentos utilizados. Restringir o consumo de temperos industriali-
mero de refeições (5 a 6/dia): café da manhã, almoço, jantar e dois a três zados, embutidos, frios, alimentos em conserva, enlatados, congelados,
lanches; respeitar os horários das refeições e não comer nos intervalos entre salgadinhos de pacote, os quais são ricos em sódio.
elas; fazer as refeições, de preferência, sentando-se à mesa e em companhia Faz parte do tratamento da obesidade o aumento da atividade física,
dos pais; não comer assistindo à TV ou fazendo outras atividades que des- que tem a finalidade de contribuir para o gasto energético e também mo-
viem a atenção do alimento; estabelecer as porções dos alimentos e não fazer dificar o estilo de vida. A indicação do tipo de exercício físico dependerá
repetições; comer devagar; mastigar muito bem os alimentos; não utilizar das limitações e preferências da criança, para evitar a perda de motivação.
líquidos com o objetivo de auxiliar a deglutição de alimentos mal mastigados. O programa de exercícios deve ser desenvolvido paulatinamente, priorizan-
Uma vez incorporadas as orientações descritas, precisa ser iniciada a do as atividades aeróbias e de baixo impacto para as articulações. As ati-
redução gradativa da ingestão energética, ou seja, do excesso alimentar vidades sedentárias (p. ex.: horas gastas com TV, computador, videogame,
ingerido, respeitando as preferências da criança e mantendo os alimentos tablet) devem ser reduzidas para 2 horas/dia.
habitualmente consumidos por ela. Grandes restrições na ingestão energé- O psicólogo desempenha papel relevante na equipe, dando suporte
tica são contraindicadas, pois podem prejudicar o crescimento e o desen- ao paciente para a manutenção do tratamento, que, em geral, é demo-
volvimento. As mudanças na qualidade da dieta são posteriores, quando o rado e com muitos insucessos. Para os casos que apresentam distúrbios
ganho de peso já foi controlado com a restrição energética. Nessa fase, deve emocionais mais graves, deve ser avaliada a necessidade de psicoterapia
ser incentivada a ingestão dos alimentos pouco consumidos, como frutas, individual e/ou familiar e também de acompanhamento psiquiátrico.
verduras e legumes. Durante o tratamento da criança obesa, as consultas devem ser realiza-
Quando há aumento de TGs, é necessário controlar o consumo dos das em intervalos curtos (mensais, quinzenais ou semanais), de acordo com
alimentos ricos em carboidratos simples, como os produtos industrializa- a necessidade de cada caso. Associar, quando possível, grupos educativos
dos ou as preparações/bebidas que utilizam esses ingredientes (bolachas, ao atendimento individual e sempre valorizar as mudanças observadas.
bolos, pães, doces, balas, sucos, refrigerantes).
Em crianças com aumento da fração LDL-C, deve-se enfatizar o con-
trole dos alimentos ricos em gorduras saturadas, trans e colesterol, como ATENÇÃO!
carnes vermelhas, embutidos, frios, preparações fritas e produtos indus-
A participação da família, modificando estilo de vida e hábitos alimen-
trializados elaborados com gordura vegetal.
tares inadequados, é de fundamental importância para o sucesso do
Nos casos de hipertensão arterial, sempre avaliar a qualidade dos ali-
tratamento.
mentos consumidos dentro e fora de casa, a forma de preparo, os temperos
68 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA ficos com distribuição em percentil ou escores z, segundo sexo e idade.
Para a avaliação antropométrica do paciente com excesso de peso, é pre- O escore z, critério atualmente mais popularizado, expressará o grau de
ciso ter bom senso, a fim de não constranger o avaliado: durante a anam- obesidade de um indivíduo a partir do número de desvios-padrão que este
nese, o avaliador decidirá quais medidas serão realizadas, pois há casos está acima da média.
6
em que a fita métrica não é suficiente, ou o compasso para leitura das A OMS sugere a seguinte classificação do IMC (Figura 15.1):
medidas das dobras cutâneas também não comporta ou os acidentes ana- sobrepeso: valores situados entre +1 e +2 escore z;
tômicos para localização das dobras não são corretamente identificados. obesidade: valores acima do +2 escore z;
Dados como peso, estatura, dobras cutâneas tricipital e subescapular, cir- obesidade grave: valores acima do +3 escore z.
cunferências do braço, do quadril, da cintura e abdominal são comumente A medida da circunferência abdominal tem por objetivo avaliar indi-
coletados ao decorrer do tratamento para monitorar a diminuição do por- retamente a gordura visceral. Considera-se circunferência abdominal ele-
centual e depósito de gordura. De qualquer forma, essas medidas servem vada quando o valor obtido for superior ao percentil 90, segundo sexo e
mais para monitoramento da evolução do que no diagnóstico clínico. idade (Tabela 15.2, página 69).
2
O IMC, que utiliza as medidas de peso e da altura (peso/altura ), é um
método amplamente utilizado para a estimativa de sobrepeso e obesida- DADOS COMPLEMENTARES
de, pois apresenta grande associação com a adiposidade na infância e na O Departamento Científico de Nutrologia da SBP sugere a realização dos
adolescência. exames que completam os diagnósticos mostrados na Tabela 15.3 para
todas as crianças e adolescentes com excesso de peso. No protocolo clínico
ATENÇÃO! dos autores, associa-se sempre a insulina para o cálculo de Homa e, se hou-
ver obesidade abdominal, realiza-se US de abdome superior para avaliação
O IMC apresenta variação de acordo com a idade e o sexo, sendo ne- de possível esteatose hepática. Exames de análise da função tiroidiana são
cessária sua avaliação a partir de curvas.4 pedidos quando há suspeita clínica.
A B
FIGURA 15.1 ■ (A) IMC por idade (meninas). (B) IMC por idade (meninos).
Fonte: World Health Organization.4
70 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
TABELA 15.3 ■ Exames subsidiários sugeridos na avaliação inicial de crianças e adolescentes obesos
Perfil lipídico Colesterol total < 150 mg/dL Interpretação dos valores laboratoriais
(jejum de 12 h)
LDL-C < 100 mg/dL
HDL-C ≥ 45 mg/dL
Alanila aminotransferase < 40 UI/L Há alguns estudos que propõem valores inferiores,
(ALT, ou TGP) especialmente para crianças.
O acompanhamento longitudinal desses valores nesses
pacientes é importante
1
Fonte: Sociedade Brasileira de Pediatria.
pediátricos mostrou que a metformina baixou os níveis séricos de amino- avaliar causa primária ou secundária;
transferase e reduziu o conteúdo de gordura do fígado, mostrado por meio rastrear toda a família;
de RM espectroscópica.1 intervenção nutricional e clínica imediata;
meta: mínima < 130 mg/dL; ideal < 110 mg/dL.
ESTEATOSE HEPÁTICA NÃO ALCOÓLICA
Doença recentemente investigada em jovens, a esteatose hepática não
alcoólica (EHNA), até meados dos anos 1980, era pouco reconhecida. TABELA 15.4 ■ Valores de referência propostos para os lipídeos
Atualmente, sabe-se que o quadro histológico é semelhante ao da lesão séricos na adolescência
hepática induzida pelo uso de álcool, mas ocorre em indivíduos que não
DESEJÁVEIS LIMÍTROFES AUMENTADOS
apresentam uma ingestão de bebidas alcoólicas significativa. A EHNA
LIPÍDEOS (mg/dL) (mg/dL) (mg/dL)
representa um espectro de condições que varia desde uma esteatose
simples a esteato-hepatite, potencialmente fatal. Com o estabelecimento CT < 150 150-169 ≥ 170
da esteatose hepática, o fígado passa por uma série de alterações, como
LDL-C < 100 100-129 ≥ 130
estresse oxidativo, disfunção mitocondrial e desregulação das adipocinas.
Todas essas alterações determinam uma lesão contínua, o que permite o HDL-C ≥ 45
desenvolvimento de uma esteato-hepatite. Sabe-se que há indivíduos que
TG < 100 100-129 ≥ 130
não desenvolvem essa complicação; por isso, acredita-se que há fatores
genéticos e ambientais envolvidos. CT: colesterol total; HDL-C: colesterol de lipoproteína de alta intensidade; LDL-C:
A US, embora não seja o método de imagem mais confiável, tem colesterol de lipoproteína de baixa intensidade; TG: triglicerídeos.
muitas vantagens e, quando positiva, fornece um elevado grau de cer- Fonte: Sociedade Brasileira de Pediatria.1
teza diagnóstica. É também a técnica de imagem de menor custo, mais
segura e que não deixa o paciente desconfortável durante sua realização,
representando um método de rastreamento inicial para identificação. A HIPERTENSÃO ARTERIAL
US hepática deve ser o 1o exame de imagem solicitado para o diagnóstico Deve ser avaliada em todas as consultas, não somente para a definição
da EHNA, pois tem uma boa correlação com os achados histológicos de de tratamento, como também para determinar a possibilidade de uso ou
infiltração gordurosa, tendo sido proposta como um método de avaliação não de medicamentos e de condutas específicas. O Consenso Brasileiro
para diferentes graus de esteatose hepática. de Hipertensão determina a pressão de acordo com a estatura e os níveis
encontrados em diferentes ocasiões (Quadro 15.1).
DISLIPIDEMIAS
A dislipidemia relacionada com a obesidade é caracterizada por aumento SÍNDROME METABÓLICA
dos níveis de TGs, queda dos níveis de HDL-C e composição anormal de LDL-C Apesar de não existir ainda consenso sobre os critérios e os pontos de corte
(maior proporção de partículas pequenas e densas) (Tabela 15.4). de identificação da síndrome metabólica (SM) em crianças e adolescentes,
Para níveis de LDL-C > 130, algumas condutas devem ser adotadas o enfoque deve ser basicamente preventivo e de atenção. O Departamento
durante o monitoramento do adolescente com excesso de peso: de Nutrologia da Sociedade Brasileira de Pediatria adota o consenso pro-
reavaliar estilo de vida mensalmente; posto pela International Diabetes Federation (IDF), que define SM em ado-
repetir perfil lipídico a cada três meses; lescentes entre 10 e abaixo de 16 anos, com o aumento da circunferência
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 71
o de comer apenas verduras e frutas. É preciso explicar que não há É amplamente conhecido que a ingestão excessiva de sódio está corre-
alimentos proibidos e permitidos e que todos podem ser consumidos lacionada ao aumento das cifras pressóricas, bem como que esse excesso é
com moderação. É muito importante que o paciente e sua família bastante característico do hábito alimentar de adolescentes, representado
recebam todos os esclarecimentos possíveis, favorecendo, assim, a pelo alto consumo de produtos industrializados, fast-foods, refrigerantes e
adesão ao tratamento. Os pais ou responsáveis precisam assimilar doces. Na prevenção primária da hipertensão arterial sistêmica (HAS), prin-
os novos conceitos para que não se criem resistências. cipalmente nos indivíduos com PA limítrofe, as mudanças no estilo de vida
Etapa 2 – Avaliação do comportamento: antes de iniciar qual- também são essenciais. De acordo com as recomendações da Sociedade
quer mudança, é importante identificar alguns comportamentos Brasileira de Hipertensão, as principais recomendações não medicamento-
comuns entre esses pacientes, como mastigação rápida, comer sas para prevenção primária da HAS são: alimentação saudável; consumo
assistindo à TV ou escondido, ausência de horário de rotina para controlado de sódio; combate ao sedentarismo; e ingestão de potássio,
alimentar-se e não realização de algumas refeições. Devem ser es- magnésio e cálcio, nutrientes importantes para auxiliar na redução da PA
tabelecidas prioridades, iniciando-se, de preferência, com aquelas e que podem ser encontrados a parti de uma dieta equilibrada e saudável,
que o paciente e sua família consideram mais simples de mudar. como a DASH (do inglês dietary approaches to stop hypertension), preconi-
Resultados esperados nessa etapa são realização de seis refeições zada tanto para a prevenção quanto para o tratamento da HAS.
diárias (café da manhã, lanche da manhã, almoço, lanche da tarde,
jantar e ceia), com intervalo em torno de três horas, com duração
ATENÇÃO!
maior do que antes e em local adequado e tranquilo (paciente sen-
tado à mesa e na companhia dos familiares). Deve-se enfatizar não apenas a redução da ingestão de alimentos sal-
Etapa 3 – Quantidade: fase de redução gradativa da quantidade de gados, como também produtos industrializados de forma geral, pois
alimentos consumidos em excesso, com diminuição das porções e do muitos deles podem conter grande quantidade de sódio.
número de repetições. É importante que isso não seja feito de ma-
neira drástica, respeitando os limites de cada paciente. Nesse senti-
A utilização de outras estratégias no tratamento da obesidade em ado-
do, recomenda-se a adoção de medidas práticas e objetivas, como:
lescentes, como maior restrição calórica, tratamento medicamentoso ou
a | refrigerante ou suco: somente um copo por refeição;
cirurgia bariátrica, não está suficientemente descrita na literatura científi-
b | frituras: somente uma vez por semana;
ca para que se possa recomendá-las. Tais alternativas somente podem ser
c | doces: uma porção por dia;
consideradas quando o adolescente não estiver respondendo ao tratamen-
d | no almoço ou jantar, consumir somente um prato de comida;
to convencional e apresentar graves comorbidades associadas ao excesso
e | somente uma porção de carne por refeição (almoço e jantar);
de peso. A cirurgia bariátrica somente é considerada uma possibilidade de
f | utilizar uma ponta de faca de margarina em cada lado do pão.
tratamento em adolescentes que tenham terminado a fase de crescimento.
A utilização de estratégias educativas, como tabelas com o conteúdo
Já existem estudos sobre os efeitos de nutrientes como fitoesteróis
de gorduras, colesterol e sódio, pode ajudar o paciente e seus familiares
e fibras solúveis na redução do RCV. A principal ação dos fitoesteróis,
na escolha dos alimentos que serão consumidos.
componentes naturais encontrados em óleos vegetais como soja e girassol,
Etapa 4 – Qualidade: última etapa do tratamento dietético, quan-
é a de reduzir o LDL-C por inibição na absorção intestinal de colesterol.
do já se atingiu o controle do ganho de peso e se obteve a adequa-
As fibras solúveis, encontradas principalmente nas farinhas de aveia e de
ção entre quantidade e comportamentos alimentares. O objetivo
centeio integral, farelo de trigo, feijões, maçã, laranja e goiaba, retardam
é melhorar a qualidade da dieta, incentivando o consumo de ali-
o esvaziamento gástrico e o trânsito no intestino delgado, aumentam a
mentos de ingesta pouco frequente e de importância nutricional (p.
tolerância à glicose e reduzem níveis elevados de colesterol e LDL-C.
ex.: comer duas frutas todos os dias; consumir verduras/legumes,
No entanto, a realização de projetos mundiais de prevenção e trata-
na quantidade de uma travessa, todos os dias no almoço e jantar). mento da obesidade em crianças e adolescentes tem mostrado eficiência
Etapa 5 – Manutenção: nessa fase, o próprio paciente e sua fa- baixa e um custo/benefício inadequado, com a persistência das taxas de
mília utilizam as informações e os aprendizados adquiridos para se excesso de peso, início cada vez mais precoce da obesidade e resultados
adaptarem a situações diferentes, como festas e viagens, contro- pouco adequados ao investimento. Assim, medidas preventivas devem ser
lando os excessos. politicamente determinadas, e o diagnóstico e as medidas de intervenção
No entanto, quando o paciente já apresenta repercussões geradas também devem ser realizados de forma cada vez mais precoce.
pela obesidade, como dislipidemias e hipertensão arterial, indica-se que
as etapas sejam mescladas (controle precoce do consumo de alimentos
ricos em gordura saturada e trans, por exemplo, nos casos em que o pa- REVISÃO
ciente apresente LDL-C elevado).
A obesidade é uma doença crônica, complexa e de etiologia multifa-
Complementando tais orientações, as Diretrizes Brasileiras de Obesi-
torial, resultante de fatores genéticos, ambientais e comportamentais,
dade descrevem que o tratamento nutricional deve estar focado na ade-
cuja incidência está em torno de 5% entre os adolescentes no Brasil.
quação da ingestão calórica e no suprimento das necessidades nutricio-
Os adolescentes obesos devem ser avaliados quanto à história de
nais para a criança. A proporção calórica dos macronutrientes deve seguir
obesidade, antecedentes pessoais, antecedentes familiares, uso de
a recomendação das diretrizes nacionais e internacionais de alimentação
drogas, álcool e tabaco, dados alimentares, dados comportamen-
saudável. Do total de calorias da dieta, 15% devem provir de proteínas, 50
tais e antropometria.
a 55% dos carboidratos e 30% das gorduras:
A obesidade também pode estar associada a condições clínicas,
< 30% do total das calorias de lipídeos;
como resistência insulínica, EHNA, dislepidemias, hipertensão ar-
< 200 mg/dia de colesterol;
terial e SM.
< 7% do valor energético total (VET) de gorduras saturadas;
As medidas gerais de tratamento para obesidade são dieta balan-
< 1% do VET de gorduras trans.
ceada, exercícios físicos e apoio emocional.
aumentar o consumo de fibras solúveis.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 73
modulação das vias hipotalâmicas que estimulam a ingestão de alimentos. de abdominal. Os pontos de corte para a circunferência da cintura como
Os níveis séricos do neurotransmissor endocanabinoide se elevam em res- marcador de risco à saúde é de 102 cm para os homens e 88 cm para as
posta ao estresse e têm-se mostrado elevados na obesidade, sugerindo mulheres. Outra forma de analisar a centralização da gordura corporal é
que a ativação dos receptores CB1 possa estar envolvida no ganho de a determinação da razão cintura-quadril (RCQ), sendo que os valores de
peso. Esses conhecimentos levaram ao desenvolvimento do rimonabanto, corte são de 0,90 e 0,85 para homens e mulheres, respectivamente.
um antagonista do receptor CB1, para o tratamento da obesidade. Esse
agente se mostrou bastante eficaz para promover a perda de peso e me-
lhora do perfil metabólico em pacientes com SM. Entretanto, um aumento ATENÇÃO!
na incidência de transtornos do humor, particularmente depressão, ansie-
O papel da gordura abdominal é tão importante na fisiopatologia das
dade e agressividade, levaram à retirada do medicamento do mercado e
alterações metabólicas e hemodinâmicas associadas à obesidade, que
desestimularam o desenvolvimento de outros antagonistas do receptor
a medida da cintura é considerada o principal marcador do excesso de
CB1 para tratamento da obesidade.
peso em todas as definições de SM.
O aumento da liberação de serotonina causa hipofagia, ao passo que
a sua redução, hiperfagia. Esses efeitos são mediados por meio dos recep-
tores 5-HT2C e 5-HT1B localizados nos neurônios hipotalâmicos da POMC Outro método utilizado na avaliação da adiposidade corporal é a
e do NPY, respectivamente. Agindo pelos receptores 5-HT1B, a serotonina bioimpedanciometria, que se baseia na condução de corrente elétrica pela
inibe os neurônios NPY/Agrp, o que reduz a ingestão calórica; paralela- água corporal e através de equações permite estimar o percentual de mas-
mente, também ativa diretamente os neurônios POMC, por sua ação sobre sa magra e gordura corporal.
os receptores 5-HT2C.
■■ TRATAMENTO
■■ DIAGNÓSTICO
O tratamento da obesidade deve ser multidisciplinar, visto que se trata de
Em adultos, o limite percentual de gordura corporal é em torno de 20% uma doença crônica. Seus principais objetivos vão além da simples perda
para homens e 30% para mulheres – níveis de massa gorda superiores a de peso e devem incluir a prevenção ou o controle das anormalidades as-
esses já caracterizam o excesso de peso. Entretanto, vale ressaltar que o sociadas ao excesso de peso, mudanças no estilo e na qualidade de vida.
percentual de gordura corporal considerado normal varia conforme a etnia O paciente deve ser esclarecido de que a obesidade não tem cura; por-
e aumenta com a idade. A DEXA (do inglês dual energy x-ray absorptiome- tanto, o tratamento deve ser contínuo e as metas de peso precisam ser
try) é atualmente considerada o método padrão-ouro para a quantificação realísticas, pois na grande maioria das vezes o peso ideal não é alcançado.
do tecido adiposo corporal. todavia, Entretanto, devido à necessidade de De fato, as expectativas dos pacientes, em geral focadas principalmente
equipamento especializado, sua utilização é limitada na prática clínica. em parâmetros estéticos, são irreais e favorecem a decepção e o conse-
A antropometria é, sem dúvida, a forma mais utilizada para o diag- quente abandono do tratamento. A redução de 5 a 10% do peso inicial
nóstico e a classificação do excesso de peso e obesidade, sendo que o com o tratamento clínico, em um período de 3 a 6 meses, é considerada
IMC, obtido por meio da divisão do peso corporal (em quilos) pela altura uma boa resposta, ao passo que a perda de 15% do peso inicial é uma
(em metros) elevada ao quadrado, é o principal parâmetro aplicado na excelente resposta, mas frequentemente esta perda não é mantida nos
prática clínica. O risco da ocorrência de comorbidades relacionadas à obe- meses subsequentes.
sidade aumenta proporcionalmente com o IMC, conforme apresentado na O tratamento da obesidade pode ser não farmacológico, farmacoló-
Tabela 15.5. gico e cirúrgico, sendo ideal a combinação de modalidades. O tratamento
não farmacológico da obesidade é fundamentado no tripé composto por
dieta, atividade física e mudanças comportamentais.
TABELA 15.5 ■ Diagnóstico de sobrepeso e obesidade com base no Inúmeras dietas têm sido preconizadas para o tratamento da obesi-
IMC (kg/m²) dade, como as que restringem totalmente carboidratos ou gorduras, en-
tretanto o fundamento essencial da dieta para perda de peso é que seja
DIAGNÓSTICO IMC
hipocalórica. A orientação nutricional deve ser individualizada, variando
Baixo peso < 18,5 conforme idade, sexo e atividade física, e com foco nos princípios saudá-
veis da alimentação, respeitando fatores econômicos, culturais e, even-
Normal 18,5-24,9 tualmente, hábitos de vida do paciente. Pessoas com sobrepeso com dois
ou mais fatores de risco cardiovasculares e aquelas com obesidade classe
Sobrepeso 25-29,9
I devem reduzir a ingestão calórica em 500 kcal/dia, resultando em uma
Obesidade classe I 30-34,9 perda aproximada de 0,5 kg por semana e cerca de 10% do peso inicial
após seis meses. Pessoas com obesidade classe II ou III devem direcionar
Obesidade classe II 35-39,9 o tratamento para déficits calóricos mais agressivos (500 a 1.000 kcal/dia)
para conseguir perder cerca de 500 g a 1 kg por semana e atingir cerca de
Obesidade classe III ≥ 40
10% de perda de peso em um período de seis meses.
A atividade física isoladamente não é um método eficaz para perda
A determinação da adiposidade visceral é essencial na avaliação de peso, resultando em perda de apenas 0,1 kg por semana. Contudo,
da obesidade, visto que está diretamente relacionada às comorbidades facilita a manutenção do peso em longo prazo e melhora a saúde geral do
decorrentes do excesso de tecido adiposo. A tomografia computadorizada organismo. O gasto energético alcançado pela atividade física dependerá
(TC) considerada o método padrão-ouro para a avaliação, no entanto seu da frequência, da duração e da intensidade do exercício. Como exemplo,
alto custo limita seu uso. Na prática clínica, a circunferência da cintu- é recomendável realização de caminhada, 150 a 250 minutos por sema-
ra é o parâmetro antropométrico mais utilizado na aferição da obesida- na (≥ 30 minutos, 5 a 7 vezes por semana) que proporciona um gasto
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 75
energético em torno de 1.220 calorias por semana, ou seja, cerca de 150 culares ou morte em relação àqueles em uso do placebo (11,4 versus 10%),
calorias ao dia. Entretanto, os pacientes devem ser avaliados e orientados provavelmente pelo fato de o medicamento induzir aumentos na ativida-
previamente por profissionais capacitados e aumentar o nível de atividade de simpática. A Anvisa optou inicialmente por não suspender o fármaco,
física progressivamente, prevenindo complicações, especialmente osteo- emitindo um parecer que reforça as contraindicações da sibutramina e exi-
musculares. Os exercícios aeróbios de intensidade moderada são adequa- gindo as assinaturas de um termo de responsabilidade pelo médico, bem
dos para perda de peso e, ainda, apresentam benefícios adicionais, como como de um termo de consentimento, por parte do paciente.
a melhora do condicionamento cardiopulmonar, que independem da per-
da ponderal. Maior condicionamento físico está associado a um risco me-
nor de desenvolvimento de diabetes e de morte por doença cardiovascu- ATENÇÃO!
lar, ao passo que os exercícios de resistência, alternados com os aeróbios,
A sibutramina está contraindicada para pacientes diabéticos com
ajudam a diminuir a redução de massa muscular durante a perda de peso.
mais um fator de risco cardiovascular, pacientes com história prévia
A terapia comportamental deve fazer parte de todo programa de per-
de doença coronariana ou AVC, hipertensos com controle pressórico
da de peso para que o paciente identifique e vença suas barreiras psico-
inadequado e indivíduos com idade maior do que 65 anos.
lógicas. Os clínicos podem incorporar os princípios dessa terapia em sua
prática clínica da seguinte forma: (1) ajudando os pacientes a desenvolver
metas realistas; (2) estabelecendo um plano adequado de tratamento para O orlistate tem mecanismo de ação único, não sendo absorvido pelo
atingir metas pequenas e complementares em termos de dieta e atividade organismo; inibe a ação da lipase, enzima responsável pela digestão da
física; (3) incentivando o automonitoramento (fazendo registros diários dos gordura ingerida, impedindo a sua absorção no intestino delgado. Duran-
alimentos ingeridos e das atividades físicas praticadas); (4) ajudando os te seu uso, cerca de 30% da gordura ingerida é eliminada nas fezes. Em
pacientes a solucionar problemas que dificultam sua perda de peso; e (5) vários estudos multicêntricos com duração de dois anos ou mais, o uso
programando visitas regulares de acompanhamento com a equipe de trata- do orlistate, comparado ao de placebo, foi associado a maior perda de
mento para registrar o peso da pessoa, analisar os registros de alimentação peso. Em pacientes diabéticos, o uso do medicamento resultou não só em
e oferecer mais apoio e incentivo. Nem sempre é fácil para os médicos ofe- maior perda de peso, como também em melhora do controle glicêmico
recer uma boa terapia comportamental a pacientes obesos, especialmente e do perfil lipídico, com redução dos níveis de LDL-colesterol e TGs. Em
devido às limitações de tempo e capacitação. Portanto, deve-se contar com pacientes portadores de intolerância à glicose, o uso do orlistate mostrou-
a ajuda de profissionais locais capacitados, como psicólogos, conselheiros -se mais eficiente do que o placebo na prevenção do diabetes tipo 2. Os
e nutricionistas, além de programas de autoajuda, comerciais ou desenvol- efeitos colaterais observados incluem aumento do número de evacuações
vidos em hospitais. A terapia comportamental em grupo, quando disponí- com episódio de urgências, eliminação de gotículas de gordura nas fezes,
vel, deve ser considerada para pacientes que não foram capazes de perder esteatorreia e flatus com eliminação de material gorduroso. A gravidade
peso por meio de técnicas de tratamento menos agressivas. dos sintomas é proporcional à quantidade de gordura ingerida; assim,
No Brasil, desde outubro de 2011, quando a Agência Nacional de recomenda-se que a dieta durante o uso do orlistate não contenha mais
Vigilância Sanitária (Anvisa) proibiu a comercialização de medicamentos que 30% de gordura em sua composição. Existem também relatos de que
catecolaminérgicos (anfepramona, mazindol e femproporex), ficaram dis- o aumento de fibras na dieta reduz seus efeitos indesejáveis. Em virtude
poníveis apenas duas substâncias para o tratamento da obesidade: sibu- de tais efeitos colaterais, o orlistate está contraindicado para pacientes
tramina e orlistate. Recentemente, entretanto, a liraglutida foi aprovada com doenças inflamatórias intestinais e hemorroidas.
para o tratamento da obesidade Por falta de dados quanto à segurança e por diminuir a absorção de
A sibutramina atua inibindo a recaptação de serotonina e norepi- vitaminas lipossolúveis, o uso do orlistate também não é recomendado
nefrina, proporcionando aumento da saciedade e inibindo a ingestão ali- para crianças, para gestantes e durante a fase de lactação. A posologia é
mentar, além de estimular a termogênese em animais de experimentação de 120 mg, três vezes ao dia, antes ou durante a refeição, sendo que sua
(efeito não comprovado em humanos). Em vários estudos multicêntricos ação pode ser observada se a cápsula for ingerida até uma hora após a in-
com duração de um ano ou mais, o uso da sibutramina, quando compa- gestão de um alimento. O tratamento com orlistate se mostra útil particu-
rado ao de placebo, associou-se à maior perda de peso Nas doses de 10 larmente na manutenção do peso perdido, o que dificilmente se consegue
a 15 mg, a sibutramina é geralmente bem tolerada e seu uso não impõe apenas com a orientação dietética.
riscos clínicos relevantes, podendo assim ser utilizada no longo prazo. En- A liraglutida é um análogo do GLP1 de longa duração desenvolvido
tretanto, por ser um inibidor da recaptação de norepinefrina e aumentar para o tratamento do diabetes tipo2. Na dose de 1,8mg uma vez ao dia por
a atividade simpática, a sibutramina pode provocar elevação, em geral via subcutânea,a liraglutida, além de promover maior liberação de insulina
discreta, da pressão arterial (PA) e da frequência cardíaca (FC). A perda de em resposta à elevação dos níveis de glicose no sangue em pacientes dia-
peso inicial com a sibutramina prediz a resposta em longo prazo. Pacientes béticos e induzir melhor controle glicêmico, por meio de um mecanismo de
que perdem mais de dois quilos nas primeiras quatro semanas são mais ação no sistema nervoso, induz saciedade, menor esvaziamento gástrico e
propensos a perder mais que 10% do peso inicial em 12 meses. Os efeitos perda de peso. Recentemente, a dose de 3 mg/dia, já disponível na Euro-
colaterais mais comuns incluem secura na boca, dor de cabeça, constipa- pa e Estados Unidos, foi aprovada para uso no Brasil para tratamento da
2 2
ção intestinal, palpitações e náuseas, sendo esses, entretanto, de pouca obesidade em pacientes com IMC ≥ 30kg/m ou com IMC ≥25 kg/m na
importância clínica e, em geral, transitórios. presença de comorbidades, segundo as diretrizes da Associação Brasileira
4
Não podemos esquecer que a sibutramina é metabolizada no fígado para o Estudo da Obesidade (ABESO). Em um estudo de 20 semanas de
pelo sistema enzimático do citocromo p-450 (isoenzima CYP3A4) e pode duração, a administração diária de 3 mg de liraglutida, quando compara-
interferir no metabolismo da eritromicina e do cetoconazol. No segundo da a do placebo, promoveu maior perda de peso na dependência da dose
3
semestre de 2010, com base nos resultados do estudo SCOUT , ela foi re- utilizada. Em comparação ao uso do orlistate (120 mg três vezes ao dia), a
tirada do mercado norte-americano e europeu. Esse estudo demonstrou liraglutida nas doses de 2,4 e 3 mg promoveu maior redução de peso ( 4,1;
em pacientes acima de 55 anos com alto risco cardiovascular em uso da 6,3, 7,2kg respectivamente). Em estudo de 56 semanas de duração, que
5
sibutramina, no período de cinco anos, um aumento de eventos cardiovas- incluiu um número maior de pacientes (3731), dentro do programa SCALE,
76 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
REVISÃO
Sleeve gástrico Mudanças no estilo de vida devem ser sempre recomendadas no
Piloro tratamento da obesidade.
Para os pacientes que não conseguiram atingir as metas de perda
de peso por meio de dieta e exercício, indica-se a terapia farma-
cológica. No momento, no Brasil, o orlistate, a sibutramina e a li-
raglutida estão disponíveis para tratamento em longo prazo. Uma
vez que mecanismos compensatórios neurais são ativados para con-
servar energia durante as terapias antiobesidade, a combinação de
medicamentos tem sido cada vez mais considerada.
O fato de os centros neurais que regulam o apetite e a saciedade
estarem também envolvidos no controle da atividade simpática
FIGURA 15.5 ■ Gastrectomia vertical (sleeve).
e da pressão arterial tem provocado a não aprovação de alguns
Fonte: Adaptada de Jones e colaboradores.7 medicamentos novos por questões de segurança. Teme-se que o
aumento da atividade simpática aumente o risco cardiovascular em
indivíduos de risco, o que tem impedido avanços na farmacoterapia
Derivação biliopancreática laparoscópica (Figura 15.6): ci- da obesidade.
rurgia indicada e eficaz para a obesidade muito grave (IMC > Considerando-se que o tratamento da obesidade deve ser contínuo,
50,0 kg/m2). O procedimento consiste em uma gastrectomia parcial é importante que o medicamento a ser utilizado se mostre eficaz
e gastroileostomia com um longo segmento de Roux e um curto ca- para promover perda de peso de pelo menos 5% do peso inicial,
nal comum (parte do intestino delgado, que recebe os alimentos e a seja altamente seguro em relação aos efeitos adversos e promova
secreção biliopancreática), resultando em má absorção de gordura e redução das comorbidades.
amido. Tem sido relatada perda do excesso de peso de até 72% em 18 Para os portadores de obesidade mais grave, a cirurgia bariátrica
anos após a cirurgia. Seu uso tem sido limitado pelas elevadas taxas tem-se mostrado uma modalidade terapêutica satisfatória.
de desnutrição proteica, anemia e diarreia e ulceração do estômago.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 79
QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO Com esse critério diagnóstico, cerca de 17 a 18% das gestantes são
Sempre existiu dificuldade em se estabelecer critério único mundial para o classificadas como portadoras de DMG; o que ainda não se definiu é se o
diagnóstico de DMG e, embora não seja consenso, depende da realização tratamento dessas mulheres com um único valor alterado no TOTG 75 me-
de estudo dos níveis glicêmicos, pois inicialmente não há sintomas iden- lhorará o prognóstico neonatal e garantirá mudanças de vida que impe-
tificáveis. çam essas mulheres de, no futuro, serem diabéticas.
O diagnóstico se baseia na glicemia de jejum, na glicemia a qualquer
momento do dia e no teste oral de tolerância à glicose (TOTG).
TRATAMENTO
Até a realização do estudo HAPO (Hyperglycemia and Adverse Preg- Há evidências claras de que tratar o diabetes na gravidez traz benefícios
1
nancy Outcome), o diagnóstico do DMG se baseava no encontro de: para a mãe e o feto. O tratamento do DMG reduz a incidência de macros-
glicemia de jejum ≥ 126 mg/dL em duas ocasiões; somia, relacionada com o aumento da incidência de hipoglicemia neonatal
glicemia em qualquer horário ≥ 200 mg/dL, com sintomas; e de distocia de ombro (com lesão do plexo braquial).
1
TTOG alterado. O estudo HAPO, como mencionado, mostrou correlação direta linear
Para realização da curva glicêmica, como é mais conhecida no Brasil, em relação à glicemia materna e a todos os desfechos estudados (peso do
há necessidade de orientar a paciente a manter: atividade física normal RN acima do percentil 90, parto cesariana, hipoglicemia neonatal e nível
e dieta rica em carboidratos (150 g/dia) nos três dias que antecederem o de peptídeo C acima do percentil 90).
exame, evitar medicação hiperglicemiante (corticosteroides, betamiméti- Outro estudo que corrobora com o tratamento do DMG é o Australian
2
cos, tiazídicos) nos dias próximos ao teste. No dia do teste, há necessidade Carbohydrate Intolerance Study (ACHOIS), que avaliou 1.100 gestantes e
de jejum de 8 a 12 horas. A glicose deve ser ingerida em até 15 minutos e, as dividiu em dois grupos: o de tratamento de rotina e o intervencionista
durante o exame, a paciente deve ficar em repouso, sem fumar. (com nutricionista, monitoração de glicemias e insulina, se necessários).
Diferentes entidades propuseram TOTG com quantidades de glicose Houve menos complicações graves neonatais no grupo de intervenção, no
administradas, número e pontos de corte diferentes para diagnóstico (Ta- qual as mães tiveram menores taxas de depressão pós-parto.
bela 16.1). O estudo MFMU3 foi conduzido pelo National Institute of Child and
1
Em 2008, foram publicados os resultados do estudo HAPO, que ana- Human Development Fetal Medicine Unit e randomizou gestantes com
lisou cerca de 25 mil mulheres pela ocorrência de peso do recém-nascido DMG leve para cuidados de rotina ou intensivos. O grupo de cuidado
(RN) acima do percentil 90, parto cesariana, hipoglicemia neonatal e nível de rotina teve os neonatos com maior peso de nascimento, maior nú-
de peptídeo C acima do percentil 90. O estudo observou que, com um pon- mero de partos cesarianas, distocia de ombro e hipertensão materna/
to alterado de TOTG 75 e pontos de corte de jejum ≥ 92 mg/dL, 1 h ≥ 180 pré-eclâmpsia.
mg/dL e 2 h ≥ 153 mg/dL, já existia maior morbidade materna e fetal. Metas glicêmicas: os alvos para controle das glicemias durante a
A curva sugerida no estudo HAPO1 foi referendada pela International gravidez são: 60 a 90/95 mg/dL no jejum; pré-prandiais; < 130/140
Association of Diabetes and Pregnancy Study Group (IADPSG) e também mg/dL 1 hora pós-prandiais; e < 120 mg/dL 2 horas pós-prandiais.
pela OMS, embora não tenha sido adotada nos Estados Unidos e Canadá. Os alvos para glicemias uma hora pós-prandiais podem ser até me-
Na Escola Paulista de Medicina, temos utilizado esse critério para o nores (< 120 mg/dL) para evitar macrossomia. O controle glicêmico
diagnóstico de DMG. deve ser feito com uma glicemia de jejum e 2 a 3 pós-prandiais
Assim, na primeira consulta de pré-natal das pacientes sem diagnóstico diárias ou, no mínimo, semanais.
de diabetes prévio, solicita-se a glicemia de jejum. Se ela for ≥ 126 mg/
dL, faz-se diagnóstico de overt diabetes (diabetes prévio à gravidez, porém
não conhecido), e a paciente receberá os mesmos cuidados habitualmente ATENÇÃO!
dispensados às que iniciam a gravidez com diagnóstico de diabetes. Se a É importante que o controle dos níveis de glicemia seja alcançado sem
glicemia de jejum se mostrar ≥ 92 mg/dL e < 126 mg/dL, o diagnóstico de a ocorrência de hipoglicemia.
DMG fica estabelecido sem a necessidade da repetição de nenhuma outra
avaliação, e a paciente será orientada quanto aos riscos para si e para o con-
cepto; o tratamento será prescrito. No caso de a glicemia de jejum se mostrar Tratamento: inicialmente se baseia em orientação nutricional e
< 92 mg/dL, solicita-se o TOTG 75, a ser realizado entre 24 e 28 semanas em atividade física; se a gestante não conseguir atingir as metas
de gravidez, quando a evolução da gestação e suas alterações hormonais e glicêmicas, inicia-se a terapia medicamentosa.
metabólicas já aumentaram a resistência periférica à insulina. No último Con-
gresso da FIGO, em 2015, no Canadá, foi referendado, sempre que possível Terapia nutricional
pelas condições socioeconômicas, usar o critério HAPO, mas também fazer o Estima-se que 70% das gestantes com DMG atingem a meta de controle
melhor rastreamento e diagnóstico possível para aquele país. glicêmico com a terapia nutricional isolada. Existem várias abordagens nu-
TABELA 16.1 ■ TOTG para diagnóstico de DMG proposto por diferentes entidades
nos dados antropométricos neonatais entre os grupos, nem no risco de A orientação de método AHCO poderia ser limitada a mulheres dia-
pré-eclâmpsia. béticas controladas que não fumam, com menos de 35 anos e que não
A metformina é considerada classe C pela FDA para uso em gestantes. apresentam alterações vasculares.
Para mulheres com prole constituída ou com diabetes complicado, a
Conclusões ligadura tubárea definitiva pode ser uma alternativa adequada.
O número pequeno de estudos, comparando hipoglicemiantes orais e insu-
lina na gestação, limita as conclusões. Não há estudos a longo prazo das
crianças expostas a esses medicamentos durante a vida intrauterina. A FDA REVISÃO
ainda não aprova o uso de hipoglicemiantes orais durante a gestação. A
FIGO, em 2015, incluiu esses medicamentos em seu protocolo de tratamento. A intolerância a qualquer grau de glicose, detectada inicialmente
na gravidez, é classificada como diabetes melito gestacional (DMG).
O controle da glicemia e o tratamento (basicamente fundamenta-
■■ ANTICONCEPÇÃO EM MULHERES DIABÉTICAS do em orientação nutricional e atividade física) resultam em menos
As diabéticas necessitam de orientação anticoncepcional, pois a gravidez, complicações neonatais.
quando desejada por elas, deve ser postergada até o momento oportuno Mulheres com diabetes melito necessitam de orientação para de-
e, em algumas vezes, até mesmo contraindicada, por se associar a maior finição da possibilidade e do momento oportuno de gravidez, bem
incidência de morbimortalidade materna e fetal. Para essas pacientes, o como para os métodos anticoncepcionais a serem adotados em
planejamento da gestação garantirá diminuição de eventos adversos du- cada caso.
rante o ciclo gravídico puerperal e implicará positivamente a saúde e a
qualidade de vida pós-parto e a do concepto.
O uso dos contraceptivos em pacientes diabéticas deve levar em con- ■■ REFERÊNCIAS
sideração a gravidade e o tempo da moléstia, se há repercussão vascular, 1. HAPO Study Cooperative Research Group; Metzger BE, Lowe LP, Dyer AR,
nefropatia, retinopatia ou neuropatia. Trimble ER, Chaovarindr U, et al. Hyperglycemia and adverse pregnancy
A Tabela 16.3 resume a utilização dos métodos contraceptivos em outcomes. N Engl J Med. 2008;358(19):1991-2002.
diabéticas, segundo classificação padronizada pela OMS. 2. Crowther CA, Hiller JE, Moss JR, McPhee AJ, Jeffries WS, Robinson JS;
Entre os métodos anticoncepcionais, a inserção do dispositivo intrau- Australian Carbohydrate Intolerance Study in Pregnant Women (ACHOIS)
Trial Group. Effect of treatment of gestational diabetes mellitus on
terino (DIU) ou do sistema intrauterino (SIU) com levonorgestrel é uma
pregnancy outcomes. N Engl J Med. 2005;352(24):2477-86.
alternativa interessante para mulheres diabéticas, pois não interfere na
3. Landon MB, Thom E, Spong CY, Carpenter M, Mele L, Johnson F, Tillinghast
evolução da doença. No passado, houve preocupação quanto à diminui- J, et al. The National Institute of Child Health and Human Development
ção da efetividade do DIU e maior predisposição à doença inflamatória Maternal-Fetal Medicine Unit Network randomized clinical trial in progress:
pélvica (DIP), que não foram comprovadas. standard therapy versus no therapy for mild gestational diabetes. Diabetes
Em mulheres com antecedente de diabetes gestacional, qualquer mé- Care. 2007;30 Suppl 2:S194-9.
todo pode ser utilizado, e não há restrição na indicação dos anticoncepcio- 4. Barros MC, Lopes MA, Francisco RP, Sapienza AD, Zugaib M. Resistance
nais hormonais combinados orais (AHCO) ou de progestagênios isolados exercise and glycemic control in women with gestational diabetes mellitus.
(Categoria 1). Am J Obstet Gynecol. 2010;203(6):556.e1-6.
Para pacientes com diabetes sem complicações vasculares, tipo 1 ou 5. Langer O, Conway DL, Berkus MD, Xenakis EM, Gonzales O. A comparison
2, os métodos hormonais combinados ou apenas com progestagênios po- of glyburide and insulin in women with gestational diabetes mellitus. N
Engl J Med. 2000;343(16):1134-8.6. Singh AK, Singh R. Metformin in
dem ser prescritos com cautela (Categoria 2).
gestational diabetes: an emerging contender. Indian J Endocrinol Metab.
A presença de diabetes de longa duração, com mais de 20 anos ou 2015;19(2):236-44.
com complicações vasculares, neurológicas, renais ou oftálmicas, con- 7. World Health Organization. Medical eligibility criteria: reproductive
traindica a utilização de métodos hormonais combinados. Porém, os de- health and research [Internet]. 4th ed. Geneva: WHO; 2009
mais métodos, como os progestagênios isolados VO, o implante e o DIU [capturado em 31 out. 2016]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/
com levonorgestrel, podem ser utilizados. bitstream/10665/181468/1/9789241549158_eng.pdf.
TABELA 16.3 ■ Categorias dos métodos contraceptivos em mulheres diabéticas, segundo critérios de elegibilidade médica
PROGESTAGÊNIO PROGESTAGÊNIO
TIPO DE DIABETES AHCO INJETÁVEL ORAL IMPLANTE DIU SIU
Diabetes gestacional 1 1 1 1 1 1
3 meses de idade. Além do diabetes melito, alterações neuroló- tero e também pela integridade funcional das células β pancreáticas.
gicas estão presentes em cerca de 20% dos pacientes (síndrome Mutações em heterozigose causam MODY4 e mutações em homozi-
DEND ou DEND intermediária). A expressão do KCNJ11 em outros gose ou heterozigose composta foram reportadas em portadores de
tecidos além do pâncreas, como cérebro e nervos periféricos, expli- DN permanente e hipoplasia ou agenesia pancreática. A síndrome
ca as manifestações extrapancreáticas. Mutações funcionalmente de Wolcott-Rallison é uma alteração de herança autossômica re-
menos graves resultam em DN transitório, sendo a apresentação cessiva caracterizada por diabetes melito de início na infância (fre-
clínica em geral mais tardia, o peso ao nascimento maior e a remis- quentemente no período neonatal), displasia espondiloepifisária,
são mais tardia do que os casos associados com anormalidades no hepatomegalia e insuficiência renal. Está associada com mutações
cromossomo 6. A maioria dos indivíduos afetados não apresenta no gene EIF2AK3. Ainda, DN com hipoplasia pancreática e cerebelar
história familiar, uma vez que, em 90% dos casos, as mutações são ou agenesia pancreática isolada, de herança autossômica recessiva,
espontâneas, ocorrendo de novo. foi associada com mutações no gene PTF1A. Esse gene está envol-
Mutações no gene ABCC8: correspondem a cerca de 10 a 15% dos vido no desenvolvimento pancreático, sendo também expresso no
casos de DN permanente. O fenótipo associado com as mutações cerebelo. Mutações em heterozigose no gene HNF1B são causa de
ativadoras é variável, podendo ser DN transitório, DN permanente MODY5, caracterizado por diabetes melito de início na adolescên-
ou diabetes na infância ou no adulto. Entretanto, DN transitório cia associado com cistos renais. Porém, ocasionalmente, mutações
é mais comum do que o permanente, e a síndrome DEND é rara. nesse gene podem ser associadas com DN transitório. Síndrome de
Além das mutações em heterozigose, mutações em homozigose hipotiroidismo congênito, colestase e subsequente fibrose hepática,
ou heterozigose composta foram descritas. A maioria dos casos é rins policísticos e glaucoma congênito, além de DN, foram associados
esporádica, resultante de mutações de novo, porém, em cerca de com mutações no gene GLIS3.
40% dos casos, as mutações são herdadas.
Mutações no gene INS: mutações no gene que codifica a pré-
■■ TRATAMENTO
-proinsulina são a 2a causa mais comum de DN permanente isolado,
sendo responsáveis por cerca de 20% dos casos. Essas mutações Inicialmente, insulina é a terapia de escolha para se obter o controle me-
também podem ser responsáveis por diabetes diagnosticado fora tabólico em portadores de DN, uma vez que é efetiva na vigência de defi-
do período neonatal, porém com uma frequência estimada menor ciência insulínica. Nos casos de DN transitório, a insulina exógena deve ser
do que 2%. Os pacientes afetados com mutação em heterozigose cuidadosamente descontinuada quando a glicemia estabilizar em níveis
apresentam ao diagnóstico deficiência importante na função das não diabéticos durante o período de remissão.
células β com hiperglicemia sintomática e, por vezes, cetoacidose.
Verificou-se também baixo peso ao nascimento, indicando secreção
reduzida de insulina in utero. Os pacientes com mutação em homo-
ATENÇÃO!
zigose ou heterozigose composta apresentam importante retardo Durante o período de remissão, os pais devem ser alertados para a
do crescimento intrauterino, e o diabetes é diagnosticado nos pri- possibilidade de recorrência do diabetes, principalmente em meio a
meiros dias ou semanas de vida. O DN nos pacientes com mutação processos infecciosos.
em homozigose ou heterozigose composta pode ser permanente ou
transitório. Os portadores de mutações no gene INS não apresentam
manifestações extrapancreáticas, apenas diabetes melito. Presença de poliúria, polidipsia, emagrecimento ou infecções de re-
Mutações no gene da glicocinase (GCK): a glicocinase, enzima petição deve levar à avaliação dos níveis de glicemia. Na recorrência, o
da via glicolítica, é reguladora do metabolismo da glicose nas célu- tratamento com insulina é mais frequentemente utilizado do que apenas
las β, controlando a secreção de insulina. Mutações em heterozigo- dieta ou agentes orais, entretanto a dose utilizada tende a ser menor do
se no gene da GCK são causa de MODY 2, entretanto, quando pre- que a necessária no diabetes melito tipo 1 ou pode ser intermitente.
sentes em homozigose ou heterozigose composta, são uma causa A identificação de que mutações ativadoras em genes que codificam
+
bastante rara de DN permanente. Os indivíduos afetados apresen- as subunidades do canal de K ATP são causas de DN, sabendo-se que as
tam retardo no crescimento intrauterino e baixo peso ao nascimen- sulfonilureias causam o fechamento desses por um mecanismo indepen-
to, hiperglicemia importante nos primeiros dias de vida, algumas dente do ATP, levou à utilização dessa classe de medicamentos em porta-
vezes, com cetoacidose. Apesar de ser uma condição bastante rara, dores de DN. Cerca de 80% dos pacientes com mutações no K+ATP respon-
recomenda-se a pesquisa de mutações no gene da GCK em porta- dem adequadamente, podendo ter sua terapia transferida de insulina para
dores de DN permanente em que ambos os pais apresentam hiper- sulfonilureia. Nesses pacientes, as flutuações glicêmicas são reduzidas,
glicemia leve, particularmente se forem de famílias consanguíneas. os episódios de hipoglicemia são menos frequentes e ocorrem reduções
Formas sindrômicas de DN: além das condições discutidas, há ain- significativas nos níveis de HbA1c, diminuindo, assim, o risco de complica-
da doenças multissistêmicas, bastante raras, que incluem o DN como ções crônicas do diabetes.
um dos componentes. Entre essas síndromes, inclui-se a síndrome As doses de sulfonilureia necessárias para um bom controle glicêmico
IPEX (do inglês immunodysregulation polyendocrinopathy and ente- são geralmente mais elevadas do que as utilizadas no tratamento do dia-
ropathy X-linked syndrome), um distúrbio fatal, bastante raro, de he- betes melito tipo 2; para a glibenclamida, são doses de 0,4 a 0,8 mg/kg/
rança ligada ao cromossomo X e caracterizada por diarreia intratável dia. Entretanto, a dose necessária para manter o bom controle declina com
com atrofia das vilosidades intestinais, eczema, anemia hemolítica e o tempo após a transferência. Pacientes com mutações no gene ABCC8 ha-
diabetes melito de etiologia autoimune e hipotiroidismo. Essa síndro- bitualmente requerem doses menores do que os com mutação KCNJ11.
me está associada com mutações no gene FOXP3, que codifica uma A glibenclamida, além da ligação à subunidade SUR1 presente nas célu-
proteína denominada scurfina, importante para a homeostase imune las β pancreáticas, associa-se às subunidades SUR do K+ATP presente nos
normal. O PDX1 (do inglês pancreatic and duodenal homeobox) é um nervos, no músculo e no cérebro, promovendo melhora também nos sin-
gene envolvido no controle do desenvolvimento pancreático, sendo tomas neurológicos. Apesar de as sulfonilureias serem efetivas na maioria
responsável pelo desenvolvimento coordenado do pâncreas intraú- dos portadores de mutações KCNJ11 ou ABCC8, nem todos respondem
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 85
adequadamente. Quanto mais precoce a transferência para sulfonilureia, idade e que também estaria incluído no diagnóstico diferencial do diabe-
maior a chance de o medicamento ser efetivo. Além disso, pacientes com tes nessa faixa etária, será discutido em outro Capítulo.
a síndrome DEND geralmente não respondem à terapia com sulfonilureia. Tanto o DM1 quanto o DM2 têm herança poligênica. O diabetes de
herança monogênica é bastante raro na infância e se divide em alteração
nas células β pancreáticas (Maturaty onset diabetes of youth – MODY –
REVISÃO e DNA mitocondrial) ou por alteração na ação da insulina (síndrome de
Berardinelli-Seip, Rabson-Mendenhall e leprechaunismo).
Diabetes diagnosticado ≤ 6 meses de idade refere-se possivelmen-
te à forma monogênica da doença, e não à decorrente de processo
autoimune. ATENÇÃO!
DN pode ser transitório ou permanente. A forma transitória pode
apresentar em 50% dos casos recidiva na adolescência ou no adulto A incidência do DM1 está aumentando, fato mais pronunciado no gru-
jovem. po pré-escolar. Paralelamente a essa situação, está ocorrendo um con-
Em cerca de 70% dos casos de DN, é possível a identificação da trole mais intensivo da doença, conforme proposto pelo estudo Diabe-
1
mutação genética implicada. tes Control and Complications Trial (DCCT), cuja intenção é diminuir as
A maioria dos casos de DN transitório apresenta alterações no cro- complicações microvasculares, por meio de um controle mais rigoroso
mossomo 6q24. da hemoglobina glicosilada (HbA1C). Entretanto, ao mesmo tempo em
DN permanente é na maioria dos casos associado a mutações nos ge- que há esse controle mais intensivo, o risco potencial para hipoglice-
nes que codificam as subunidades do canal de potássio ATP-sensível. mia grave aumenta, fato muito importante no grupo pré-púbere, que
Muitos dos pacientes com mutações nos genes que codificam as não foi incluído no estudo DCCT.
subunidades do canal de potássio ATP-sensível podem ser efetiva-
mente tratados com sulfonilureia. Neste capítulo, serão discutidas as particularidades do DM1 na in-
fância, período com características específicas, que tornam mais difíceis o
diagnóstico e, especialmente, o controle e o acompanhamento.
■■ LEITURAS SUGERIDAS
Aguilar-Bryan L, Bryan J. Neonatal diabetes mellitus. Endocr Rev. 2008;29(3):265-91. ■■ FISIOPATOLOGIA
Gurgel LC, Moisés RS. Neonatal diabetes mellitus. Arq Bras Endocrinol Metabol.
2008;52(2):181-7. DIABETES MELITO TIPO 1
Murphy R1, Ellard S, Hattersley AT. Clinical implications of a molecular genetic
classification of monogenic beta-cell diabetes. Nat Clin Pract Endocrinol Doença considerada crônica, embora de início súbito, tem etiologia autoi-
Metab. 2008;4(4):200-13. mune, que cursa com destruição progressiva das células β pancreáticas e
Naylor RN, Greeley SA, Bell GI, Philipson LH. Genetics and pathophysiology of diminuição na produção de insulina, que se iniciam muito tempo antes do
neonatal diabetes mellitus. J Diabetes Investig. 2011;2(3):158-69 aparecimento dos primeiros sintomas. Em sua etiologia, há fatores gené-
Rubio-Cabezas O, Klupa T, Malecki MT; CEED3 Consortium. Permanent neonatal ticos, como a relação com as moléculas HLA (DR3 ou DR4), associados aos
diabetes mellitus--the importance of diabetes differential diagnosis in ambientais e imunológicos. Os fatores ambientais funcionam como gatilho
neonates and infants. Eur J Clin Invest. 2011;41(3):323-33. na reação autoimune, entre eles: alimentares (albumina sérica bovina e
Støy J, Steiner DF, Park SY, Ye H, Philipson LH, Bell GI. Clinical and molecular produtos defumados); medicamentos (aloxano e estreptozotocina); e vi-
genetics of neonatal diabetes due to mutations in the insulin gene. Rev
rais (rubéola, caxumba, citomegalovírus [CMV] e coxsackie). As alterações
Endocr Metab Disord. 2010;11(3):205–15.
Temple IK, Shield JP. 6q24 transient neonatal diabetes. Rev Endocr Metab Disord.
imunológicas características do DM1 se dão como resposta contra uma cé-
2010;11(3):199–204. lula afetada por um vírus que tem uma proteína com uma sequência seme-
Weedon MN, Cebola I, Patch AM, Flanagan SE, De Franco E, Caswell R, et al. lhante à da proteína da célula β pancreática. A célula apresenta o antígeno
Recessive mutations in a distal PTF1A enhancer cause isolated pancreatic viral ao linfócito T CD8, que o apresenta aos linfócitos T CD4, estimulando,
agenesis. Nat Genet. 2014:46(1):61-4. por sua vez, a produção de anticorpos contra as células β pancreáticas. O
processo de destruição das células β pancreáticas ocorre de forma lenta.
Após meses do diagnóstico da doença, há destruição maciça das células.
ATENÇÃO!
16.3 NA INFÂNCIA
Ao diagnóstico, cerca de 20% das células β estão normais (ocasião em
■■ ADRIANA APARECIDA SIVIERO-MIACHON que existe a fase de “lua de mel”, com melhor controle metabólico).
■■ ANGELA MARIA SPINOLA E CASTRO Caracteristicamente, crianças menores de 5 anos apresentam uma le-
são autoimune mais importante, o que contribui para manifestações
clínicas mais rápidas e graves nessa faixa etária.
O diabetes melito (DM) é uma síndrome clínica caracterizada por alte-
ração no metabolismo de carboidratos, proteínas e lipídeos, associada à
a a
deficiência absoluta da secreção e/ou da ação da insulina. A 1 e a 2 in- ■■ QUADRO CLÍNICO
fância englobam o período compreendido entre o nascimento e os 7 anos Os sintomas típicos de DM1, abruptos ou insidiosos, são poliúria, poli-
de idade, no qual predomina o DM1; entretanto, o DM2, classicamente dipsia, polifagia, desidratação e perda de peso. Durante a evolução, há
restrito aos adultos, está progressivamente sendo reconhecido em crian- períodos de hiperglicemia de duração variável, podendo ocorrer enurese
ças e adolescentes no mundo todo, mas é raro em menores de 10 anos. noturna e poliúria esporádica. Se o diagnóstico não é feito nessa fase, o
O diabetes neonatal, cujo diagnóstico ocorre em menores de 6 meses de indivíduo pode evoluir para cetoacidose diabética (CAD).
86 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Há três fases descritas após o diagnóstico de DM em crianças muito Está ocorrendo uma tentativa de normatização da disponibilização
jovens, caracterizadas por dor inicial, culpa e raiva no momento do diag- de análogos de insulina de ação prolongada e UR pelos serviços públi-
nóstico, seguida pela fase de cuidado excessivo da criança e, no final, da cos, obedecendo rigorosamente aos preceitos de necessidade terapêutica
fase de adaptação, em que os pais aprendem a confiar nos outros e a plenamente justificável e de compatibilidade com os princípios básicos da
construir sistemas de apoio. Isso torna necessário o acompanhamento economia da saúde, segundo os quais os investimentos em saúde pública
multiprofissional desses pais e crianças, com atenção especial ao aspecto deverão ser racionalmente aplicados em estratégias que apresentem efe-
psicológico. tividade de custo, no sentido amplo. A grande indicação desses análogos
Dependendo da faixa etária, o paciente deve ser alertado sobre sua são as hipoglicemias graves (glicemia ≤ 50 mg/dL, necessitando de ajuda
doença e, quando possível, deve participar da aplicação da insulina e dos de terceiros ou atendimento hospitalar) e/ou assintomáticas, além das hi-
seus controles domiciliares, mas sempre supervisionado por um respon- poglicemias noturnas e do mau controle metabólico (HbA1C ≥ 8,5%) ou
sável. A família deve estar ciente das complicações agudas e crônicas da controle instável com oscilações glicêmicas extremas e de difícil controle
doença e ajudar o paciente a ter uma vida mais adequada. (alternância de glicemias ≤ 60 mg/dL com glicemias ≥ 200 mg/dL, apesar
4 | Insulinoterapia: muitas crianças nessa faixa etária podem iniciar a do tratamento adequado com insulinas humanas tradicionais). As crianças
administração, após o diagnóstico, de insulina de ação intermediária uma menores de 6 anos, por sua ingestão alimentar imprevisível e pelo risco
vez por dia, dose que pode ser ajustada para 1 ou 2 vezes ao dia, por meio de hipoglicemia, também serão contempladas com essas normatizações.
de seringa (que permite a mistura livre) ou canetas de aplicação. Devido às A dose inicial proposta da insulina NPH é de 0,25 a 0,5 UI/kg/dia, que
dificuldades do controle glicêmico nessa idade, existe uma tendência cres- pode ser menor em lactentes. A dose é ajustada conforme a necessidade
cente em usar um regime de injeção múltipla (mais intensivo) ou terapia do paciente, podendo ser elevada em 10% a cada 2 a 3 dias. Normalmen-
com bomba de insulina (sistema de infusão contínuo de insulina – SICI). te, inicia-se com uma dose diária de NPH pela manhã, ajustando-se de
Considerando o uso de análogos de insulina de ação prolongada (in- acordo com o controle domiciliar para 2 ou 3 aplicações diárias, associa-
® ®
sulina glargina, Lantus e detemir, Levemir ), não existe nenhum ensaio da à insulina R ou análogo de insulina de ação UR, antes das refeições.
clínico, nessa faixa etária, que compare o seu uso uma vez ao dia versus Os análogos de insulina de ação prolongada, quando indicados, podem
terapia intensiva com múltiplas injeções de insulina de ação intermediária ser usados uma vez ao dia (pela manhã ou ao deitar), mas habitualmente
(NPH), em termos de controle clínico e metabólico. são empregados duas vezes ao dia, associados à UR antes das principais
refeições (em substituição à R), com contagem dos carboidratos. A dose
inicial é no geral dois terços do total da dose da insulina NPH. Mais recen-
®
temente, foi aprovada no Brasil a insulina degludeca (Tresiba ) para uso
ATENÇÃO!
na infância, que é uma insulina basal de ação ultralonga, com duração
Apesar de não haver benefícios metabólicos comprovados com o uso de até 42 h, permitindo a aplicação uma vez ao dia, com maior flexibili-
dos análogos de insulina de ação prolongada nessa faixa etária, sua dade de horários e menor possibilidade de hipoglicemias. Também estão
principal vantagem em relação às insulinas convencionais é a redução em desenvolvimento outras insulinas sem pico, que permitem uma maior
dos episódios de hipoglicemia. Dessa forma, a terapêutica com aná- flexibilidade de horários, diminuindo as hipoglicemias, principalmente as
logos de insulina de ação prolongada, incorporando a contagem de noturnas, sendo previsto ainda para este ano o lançamento da insulina
carboidratos, deve ser considerada para cada criança individualmente. glargina-U300 (Tabela 16.4).
A principal indicação é para os pacientes que apresentam tendência à
hipoglicemia nos períodos pós-prandiais tardios e noturnos.
TABELA 16.4 ■ Propriedades farmacocinéticas das insulinas
e análogos
Da mesma forma que os análogos de ação prolongada, o controle
glicêmico geral com a utilização dos análogos de ação ultrarrápida (UR) DURAÇÃO MÁXIMA
não é diferente quando comparado à insulina regular (R). São exemplos INSULINA INÍCIO DE PICO DE DO EFEITO
de análogos de insulina de ação UR, a insulina lispro (Humalog®); asparte HUMANA AÇÃO AÇÃO TERAPÊUTICO
® ®
(Novorapid ); ou glulisina (Apidra ). A administração adequada desses
Ação ultrarrápida: 5-15 min 30 min-2 h 3-5 h
análogos permite maior flexibilidade, em especial para as crianças que
lispro, aspart ou
apresentam alimentação irregular, pois podem ser aplicados imediata-
glulisina
mente após as refeições, quando a ingesta alimentar já foi bem quantifi-
cada. Para as poucas crianças nas quais doses unitárias causam hipoglice- Rápida (regular) 30 min-1 h 2-3 h 5-8 h
mias, existem disponíveis canetas de aplicação que permitem administrar
meia unidade (NovoPen3 Demi® e HumaPen Luxura HD®). Quando até Neutral protamine 2-4 h 4-10 h 10-18 h
mesmo com metade da dose recomendada ocorrer hipoglicemia, a di- Hagedorn
luição da insulina pode ser necessária. Entretanto, as insulinas diluídas
podem ser menos absorvidas. Devido a necessidade de diminuir o risco Ação prolongada: 1-4 h Não há 18-24 h
de hipoglicemia e maior flexibilidade de horários, estão em desenvolvi- glargina ou 6-8 h
mento insulinas cada vez mais rápidas, que possam ser administradas detemir
logo após as refeições em crianças pequenas (Linjeta®, Adocia®, Lispro-
Ação ultralonga: 1-2 h não há > 40 h
-PH20®, faster-acting insulin aspart).
degludeca
Outra indicação para a utilização desses análogos de ação UR são as hi-
poglicemias nos períodos pós-prandiais tardios e noturnos. Eles podem ser
utilizados em SICI e, também, por via endovenosa, em situações especiais e Com a utilização de insulina UR para a correção dos carboidratos in-
dentro do ambiente hospitalar. Os principais inconvenientes de seu uso são geridos, o paciente diabético consegue maior flexibilidade ao se alimentar.
o seu maior custo e a falta de cobertura nos estados pós-prandiais tardios (4 Em princípio, a dose de insulina basal é em média 50% da dose total de
a 6 horas após as refeições), necessitando, frequentemente, de um aumento insulina, sendo os outros 50% das doses para os bólus, divididos antes de
nas doses das insulinas basais. cada refeição.
88 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Faz-se importante ressaltar que a elegibilidade da família e do pa- situação de estresse, com aumento da produção de hormônios contrar-
ciente deve ser levada em conta, já que esse método de contagem dos reguladores e maior risco de hiperglicemia e CAD. Contudo, se a doença
carboidratos ingeridos exige aderência ao tratamento, responsabilidade e interfere na ingestão de alimentos, a criança pode estar em risco para
capacidade para realizar os cálculos. hipoglicemia grave.
5 | Hipoglicemia: apesar de não existirem dados que comprovem que A família pode seguir algumas regras simples em caso de infecção, como
crianças mais jovens com DM1 apresentem hipoglicemia mais grave se medir a glicemia capilar a cada quatro horas, garantir a aceitação da dieta e
comparadas a crianças mais velhas e adolescentes, a hipoglicemia é uma aumentar a ingestão de líquidos contendo glicose (suco ou leite), consideran-
causa de grande ansiedade para todos os pais de crianças com diabetes e, do o ajuste da dose de insulina, se necessário. A criança precisa ser vista pela
particularmente, para crianças muito pequenas, pois muitas vezes é difícil equipe médica, a fim de tratar adequadamente a infecção, com antibióticos,
reconhecer sintomas e, algumas vezes, ela pode ser assintomática. Sabe- se necessário. Alguns sinais requerem atenção imediata: a criança se recusa
-se que pacientes com DM têm uma perda da contrarregulação, ou seja a comer ou beber líquidos e vomita mais de duas vezes em um curto espaço
da resposta à hipoglicemia, se comparados com pacientes não diabéticos, de tempo; a glicose capilar se mantém baixa, apesar da ingestão adequada
e que o sono diminui a resposta adrenérgica à hipoglicemia. Além disso, e do ajuste de insulina; e a glicose capilar se mantém elevada com cetonúria
episódios repetidos de hipoglicemia podem levar a alterações cognitivas positiva, apesar do manejo adequado do quadro infeccioso.
ou déficits de aprendizagem. O ajuste da dose de insulina pode ser feito da seguinte forma, de
Os primeiros sintomas de alerta de hipoglicemia em recém-nascidos e acordo com a concentração sérica de glicose: a) se entre 100 e 200 mg/dL,
crianças com DM podem ser bastante sutis: mudança de comportamento na ausência de cetonas na urina, manter a mesma dose de insulina; b) se
(p. ex.: irritabilidade, mau humor, letargia ou moleza, birras); sudorese; entre 200 e 300 mg/dL, com cetonas negativas, aumentar a dose de insu-
palidez; terror noturno (p. ex.: acordar no meio da noite chorando ou gri- lina em 10 a 20% por dia, até que a meta glicêmica seja atingida; c) se se
tando). Se não for tratada rapidamente, a hipoglicemia grave pode resultar mantém acima de 200 mg/dL com cetonúria, ou a glicose sérica está acima
em coma ou convulsão. Como muitas vezes é difícil reconhecer a hipogli- de 300 mg/dL, independentemente da cetonúria, corrigir com insulina UR
cemia clinicamente, é importante que os pais ou responsáveis monitorem 10 a 20% da dose diária total de insulina a cada quatro horas até que a
as concentrações de glicose no sangue para sua confirmação. Se a glicose glicose atinja valores abaixo de 200 mg/dL e as cetonas se negativem ou
sérica estiver abaixo de 100 mg/dL (= 6 mmol/L), na presença de sinto- fiquem levemente positivas; d) se abaixo de 100 mg/dL, oferecer líquidos
mas, deve-se oferecer em torno de 60 a 120 mL de suco de laranja ou leite que contenham glicose (suco ou leite).
à criança e esperar de 10 a 15 minutos. Se os sintomas persistirem, o pro- 8 | Sistemas de infusão contínua de insulina (SICI): as chamadas bom-
cedimento deverá ser repetido. Uma boa alternativa é oferecer o suco com bas de insulina se aprimoraram bastante nos últimos anos. O objetivo des-
mais uma fonte de carboidratos complexos (p. ex.: biscoitos). Se o episódio se sistema é manter o basal da insulina, fazer a correção da alimentação
ocorrer imediatamente antes da refeição, esta deve ser adiantada e os car- e da glicemia. Hoje, elas também apresentam sistemas de aferição da gli-
boidratos simples oferecidos de início. Não se deve tratar excessivamente cemia simultânea à infusão (sensor de glicose), o que pode ser um instru-
a hipoglicemia leve. Existe uma tendência em oferecer alimentos, tanto mento muito importante naquelas crianças com tendência à hipoglicemia.
3
quanto possível, até que os sintomas diminuam; entretanto, essa medida A American Academic of Pediatrics (AAP) divulgou em 2006 um po-
conduzirá, inevitavelmente, à hiperglicemia. sicionamento oficial sobre o uso de SICI em crianças, especialmente em
Todas as famílias de crianças pequenas portadoras de DM devem ter pacientes com menos de 6 anos, já que representam uma população parti-
um kit de emergência com glucagon. Recomenda-se a dose de 0,5 mg de cularmente especial em razão da necessidade de opções terapêuticas que
glucagon, em crianças com menos de 5 anos, o que reverte rapidamente permitam uma maior flexibilidade. Além disso, as evidências indicam que
a hipoglicemia. Em muitos casos, os vômitos podem ser desencadeados a bomba de insulina é uma opção segura e efetiva nesse grupo etário,
pelo próprio episódio hipoglicêmico ou pelo uso do glucagon. Se isso ocor- especialmente naquelas crianças com tendência a hipoglicemias graves
rer, a criança deve ser levada à emergência do hospital mais próximo para (abaixo de 40 mg/dL) ou assintomáticas noturnas.
3
receber glicose intravenosa até que os vômitos cessem. Segundo a recomendação, todas as crianças portadoras de DM1,
Hipoglicemia noturna assintomática nessa faixa etária é um problema independentemente da idade, podem ser consideradas candidatas poten-
sério devido ao jejum prolongado e pode cursar com crise convulsiva. Não cialmente elegíveis à terapia com bomba de insulina. A decisão de imple-
se sabe com certeza qual o efeito da hipoglicemia grave no cérebro em ter- mentar a terapia com SICI em crianças deve ser de exclusiva responsabili-
mos de comprometimento cognitivo, mas acredita-se que crianças pequenas dade dos pais e dos médicos assistentes, sem qualquer interferência das
que experimentam hipoglicemia grave no início do curso do DM1 podem entidades pagadoras. Os critérios de elegibilidade incluem: pais motiva-
estar em risco para uma deficiência cognitiva mais tarde. Dessa maneira, dos com aderência adequada ao tratamento do DM e familiarizados com
uma abordagem mais suave e menos agressiva no controle glicêmico dessas a contagem de carboidratos; tratamento anterior com múltiplas injeções
crianças é encorajada, pois pode diminuir a ocorrência de hipoglicemia. diárias de insulina e aceitação da realização de 6 a 9 testes diários de
6 | Monitoração e meta de tratamento: a monitoração de glicose ca- glicemia. Os pais devem ser orientados dos prós e contras em relação a
pilar é uma ferramenta especialmente útil em crianças mais jovens com essa modalidade terapêutica e há necessidade de conduzir um período de
DM1. Porém, não deve ser feita de forma exagerada. Recomenda-se que treinamento prático.
seja realizada antes das refeições e ao deitar. Os testes adicionais de 2
horas após o lanche noturno ou no meio da madrugada também são úteis CONTROLES
para prevenir a hipoglicemia noturna, podendo ser realizados 2 a 3 vezes 1 | Domiciliar
na semana ou de acordo com o perfil de cada criança. Fitas de glicemia capilar: método de escolha. O controle deve ser
Sempre considerando os riscos potenciais de hipoglicemia grave, uma feito de 1 a 8 vezes por dia, antes do horário das refeições, duas
meta segura e realista deve ser estabelecida tanto para a glicose capilar quan- horas após, antes de dormir e de madrugada e, sempre, duas horas
to para os valores de HbA1C. Sugere-se uma glicose capilar entre 90 e 145 mg/ após realizar os bólus de correção.
dL antes das refeições e lanches e pós-prandial entre 90 e 180 mg/dL. Com Em 2015, foi lançado na Europa e, recentemente lançado no Brasil, um
esses valores de glicose capilar, a HbA1C deve se manter abaixo de 7,5%.2 ®
sistema flash de monitorização de glicose (FreeStyle Libre), que conta com
7 | Infecções: bebês e crianças com DM1 não são mais propensos a de- uma tecnologia inovadora que elimina a necessidade da rotina diária das
senvolver doenças agudas (respiratórias e gastrintestinais) se comparados picadas nos dedos. A princípio, foi aprovado para uso em maiores de 18
a crianças hígidas da mesma faixa etária. A infecção geralmente cria uma anos, mas espera-se que logo seja também liberado para uso nas crianças.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 89
1 | Defeitos genéticos na função da célula β 8 | Outras síndromes genéticas por vezes associadas com DM
MODY 1 (gene HNF-4α) Síndrome de Down
MODY 2 (gene da glicocinase) Síndrome de Kleinefelter
MODY 3 (gene HNF-1α) Síndrome de Turner
MODY 4 (gene IPF-1) Síndrome de Wolfram (DIDMOAD)
MODY 5 (gene HNF1β) Ataxia de Friedereich
MODY 6 (gene neuro D1) Coreia de Huntington
MODY 7 (Kruppel-like factor 11 – KLPFII) Síndrome de Laurence-Moon-Biedel
MODY 8 (gene carboxil-ester lipase – CEL) Distrofia miotônica
MODY 9 (gene paired box – PAX4) Síndrome de Prader-Willi
MODY 10 (gene insulina – INS) Porfiria
MODY 11 (gene específico tirosinocinase linfócito B – BLK ) Outras
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 91
por aumento da expressão do receptor Fas na superfície dessas células, da que apresentem alguma positividade com o HLA de risco para DM1. Ao
tornando-as mais sensíveis à apoptose mediada pelas células T. Recente- diagnóstico clínico, estes pacientes exibem alteração tanto na secreção
mente, verificou-se que algumas citocinas da resposta Th2 também po- de insulina como na sua ação. A função da célula β ou a sensibilidade
dem danificar as células β. insulínica podem melhorar significativamente com o tratamento intensivo
Esse processo autoimune é acompanhado pela produção de au- da hiperglicemia inicial e, com isso, resultar na descontinuação da insulina
toanticorpos anti-ilhotas. Os principais autoanticorpos (anticorpos anti- exógena alguns meses depois e na migração para o tratamento com anti-
-ilhotas, ou ICA) no DM1A reagem contra os quatro principais antígenos -hiperglicemiante oral.
das ilhotas: antígeno associado ao insulinoma-2 (IA-2, ICA512); insulina O diabetes fulminante caracteriza-se por um processo não autoimu-
(IAA); descarboxilase do ácido glutâmico-65 (GADA-65); e transportador ne, fulminante, com hiperglicemia significativa, tendência à cetoacidose e
de zinco-8 (ZnT8). ausência de insulite. O curto período de hiperglicemia se reflete na hemo-
Atualmente, existem 4 grandes estudos (2 alemães, 1finlandês e 1 globina glicada próxima dos valores normais ao diagnóstico clinico. Além
americano) de seguimento de indivíduos de risco para o desenvolvimento disso, esses pacientes também apresentam elevadas concentrações de
do DM1A, desde o nascimento, e com duração de 5 a 15 anos. Esses es- enzimas pancreáticas séricas ao diagnóstico. Até o momento, foi descrito
tudos concordam nos seguintes pontos: 1) os autoanticorpos anti-ilhotas em japoneses, especialmente em mulheres durante ou após a gestação.
podem ser detectados a partir dos 6 meses de idade; 2) os anticorpos
Outros tipos específicos de DM
anti-insulina surgem primeiro, seguidos quase que imediatamente pelos
anticorpos anti-GAD e, posteriormente, pelos anticorpos anti-IA2 e anti- Defeitos genéticos na função das células β
++
-transportador de Zn ; 3) a progressão para o diabetes é precedida por MODY
um aumento da reatividade contra vários antígenos das ilhotas; 4) a pro- Há várias formas monogênicas de diabetes associadas com defeitos na fun-
gressão para a produção dos vários autoanticorpos anti-ilhotas e diabetes ção das células β. O MODY (do inglês maturity-onset diabetes of the young),
é mais rápida nos mais jovens e com genótipos HLA de alto risco. a mais comum, caracteriza-se pela idade precoce de aparecimento, em geral
Estágio 4 — diminuição progressiva da antes dos 25 anos, e herança do tipo autossômica dominante, verificada
secreção de insulina pela presença de indivíduos afetados em pelo menos três gerações. Repre-
senta 1 a 5% de todos os casos de diabetes, e o defeito primário é uma
Observa-se diminuição progressiva da secreção de insulina durante um pe- diminuição da secreção de insulina. Clínica e geneticamente heterogênea,
ríodo variável de meses a anos antes da apresentação clínica da doença. A até o presente pelo menos 12 genes diferentes foram identificados como
a
perda da 1 fase de secreção de insulina nesse período leva a episódios de seus causadores, todos envolvidos no metabolismo e desenvolvimento das
hiperglicemias pós-prandiais subclínicos e em situações de estresse. Essas células betapancreáticas (com exceção do gene da glicocinase), ainda que
alterações evoluem com velocidades diferentes em cada indivíduo e são aproximadamente 25 a 45% das famílias com MODY apresentem mutações
inversamente proporcionais à sua idade cronológica. Nesse sentido, tem- em outros genes, sendo referidas como portadoras de MODY X.
-se o denominado diabetes autoimune latente do adulto (LADA), no qual a O gene do MODY-1 codifica o HNF 4-α (hepatocyte nuclear factor), um
velocidade de perda das células β é mais lenta e que pode apresentar uma membro da família de fatores de transcrição com papel importante na liga-
fase independente da necessidade de insulina exógena em um intervalo ção entre os sinais extracelulares e a resposta transcricional. Apresenta um
que varia em média dos primeiros 6 meses a 1 ano do diagnóstico clínico. papel crítico no desenvolvimento, na diferenciação celular e no metabolis-
mo do pâncreas endócrino e é essencial para a função normal do fígado,
Estágio 5 — diabetes clínico
do intestino e do rim. Regula a secreção de insulina pela manutenção da
Quando 60 a 90% das células betapancreáticas estão destruídas ou dis- transcrição dos genes da insulina, GLUT-2, aldolase B e UCP-2.
funcionais, observam-se os sintomas clássicos de polidipsia, poliúria, po- Mutações em heterozigose no gene da glicocinase levam ao MODY-2,
lifagia e emagrecimento. ao passo que aquelas em homozigose causam uma deficiência completa
dessa enzima, levando ao diabetes neonatal permanente. A glicocinase é
Estágio 6 — perda total da reserva insulínica
uma enzima que catalisa a fosforilação de glicose em glicose-6-fosfato, o
O período para a perda da secreção residual de insulina ocorre dentro dos 1o passo da via glicolítica. É expressa apenas no fígado e nas células beta-
três primeiros anos do diagnóstico clínico, em que se observa que o controle pancreáticas. Nas células β, o defeito na glicocinase provoca um aumento
glicêmico se torna mais difícil e instável e a secreção de peptídeo C ausente. do limiar dos níveis de glicose circulantes necessários para induzir a secre-
Recentemente foi proposto que essas 6 fases da história natural do ção de insulina, refletindo em hiperglicemia. No fígado, a diminuição da
DM1A teria um período inicial no qual haveria uma interação variável en- fosforilação da glicose diminui a síntese de glicogênio e aumenta a glico-
tre os fatores de risco genéticos e ambientais seguido de três estádios neogênese após as refeições, exacerbando a hiperglicemia pós-prandial.
assim caracterizados: Estádio 1 – Autoimunidade contra as células β pan- O MODY-3, gerado por mutações no gene HNF-1α, um fator de trans-
creáticas + Normoglicemia; Estádio 2: Autoimunidade contra as células β crição gênica, é expresso no fígado, no intestino, no rim e nas células
pancreáticas + Disglicemia; e Estádio 3: Autoimunidade contra as células betapancreáticas. Nas células β, regula a expressão do gene da insulina
β pancreáticas + Hiperglicemia, sendo os dois primeiros assintomáticos, e outros genes que codificam proteínas responsáveis pelo transporte e
e o terceiro, sintomático. metabolismo da glicose. A redução de sua atividade leva à disfunção das
células β, provavelmente como consequência da transcrição diminuída de
DM tipo 1B genes que codificam proteínas, que tem papel importante na regulação
Considerado DM1 idiopático, o DM1B corresponde a 4 a 7% dos casos de da secreção de insulina estimulada pela glicose. Uma característica dos
DM1 e caracteriza-se por ter um fenótipo igual ao do DM1 autoimune, mas pacientes com MODY-3 é sua hipersensibilidade às sulfonilureias, frequen-
sem detecção de autoanticorpos contra as células betapancreáticas. Pode temente apresentando hipoglicemia com o uso de doses convencionais
apresentar maior prevalência de obesidade e sobrepeso e melhor reserva desse hipoglicemiante.
de peptídeo C. MODY-4 é causado por mutações no gene do IPF-1 (insulin promoter
Nesse grupo, ainda se incluem os diabetes atípico (flatbush diabe- factor), também conhecido por IDX-1, PDX-1 ou STF-1 (somatostatin trans-
tes ou diabetes tipo 1½, ou diabetes do adulto com tendência à cetose) cription factor), um fator de transcrição necessário para o desenvolvimento
e fulminante. O flatbush diabetes, mais frequente em afrodescendentes, pancreático e para a expressão dos genes da insulina e de outros especí-
mas possível em brancos, tem autoanticorpos pancreáticos negativos, ain- ficos da célula β.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 93
MODY-5 é causado por mutações no gene HNF-1β, também designa- Outras associações presentes, mas não obrigatórias, são a surdez e o
do TCF-2 (transcription factor), um fator de transcrição, estruturalmente diabetes insípido de origem central. Quando essas quatro alterações es-
relacionado ao HNF-1α, ambos expressos e atuantes nas células β das tão presentes, tem-se o acrônimo DIDMOAD (diabetes insipidus, diabetes
ilhotas pancreáticas para regular a expressão gênica. Alterações renais, mellitus, optic atrophy e deafness). Além delas, a bexiga neurogênica, a
especialmente cistos renais, presentes em praticamente todos os pacien- ataxia, o nistagmo e as doenças psiquiátricas podem fazer parte do qua-
tes, podem ser diagnosticadas intraútero e precedem o desenvolvimento dro e dificultar as estratégias para o controle glicêmico. Outras alterações
do diabetes. Atualmente, essa condição é referida como síndrome de cis- endócrinas, como deficiência de GH e hipogonadismo por disfunção hi-
tos renais e diabetes, responsável por aproximadamente 6% das formas potálamo-hipofisária, também podem surgir. A prevalência de síndrome
monogênicas de diabetes no Reino Unido. Esses pacientes muitas vezes de Wolfram é de 1/100.000 a 770.000 e ela ocorre devido a mutações
procuram inicialmente os nefrologistas. no gene WFS-1ou wolframina, cuja função ainda não está completamente
MODY-6 é associado com mutações no gene neuro D1 (neurogenic definida.
differentiation), também conhecido como beta-2, também essencial para o
desenvolvimento pancreático, ativando a transcrição do gene da insulina. Defeitos genéticos na ação da insulina
É uma causa rara de MODY. Síndromes de resistência grave à insulina
É importante ressaltar que atualmente alem dos 6 genes relacionados Nas últimas décadas, tem-se demonstrado que várias síndromes associa-
a esse modo de apresentação do diabetes melito existem mais 6 outros das à resistência à insulina decorrem de mutações no gene do receptor de
genes nesse sentido, como relacionados no quadro e que, em vez de de- insulina. Clinicamente, há três apresentações: resistência à insulina tipo A,
nominá-los MODY 1 , 2, 3 etc., tem-se preferido denomina-los pelo gene definida pela presença da tríade de RI, acantose nigricante e hiperandro-
que os identifica. genismo, na ausência de obesidade ou lipoatrofia; a síndrome de Donohue
(leprechaunismo), caracterizada por retardo no crescimento intrauterino e
Diabetes mitocondrial
pós-natal, diminuição do tecido adiposo subcutâneo e acantose nigrican-
Várias anormalidades em DNA mitocondrial têm sido descritas associadas te; e a síndrome de Rabson-Mendenhall, associada com baixa estatura,
ao diabetes, porém a mais comumente reportada é a substituição de A por abdome protuberante, anormalidades em dentes e unhas e hiperplasia
G na posição 3243 no RNAt Leu (UUR). Como resultado, um subtipo de dia- pineal. As duas últimas são transmitidas de forma autossômica recessiva,
betes de herança materna associado com surdez, também referido como ou seja, os indivíduos afetados herdam os dois alelos mutantes. Mais de
MIDD (acrônimo de maternally inherited diabetes and deafness), tem sido 70 mutações já foram identificadas no gene do receptor de insulina, e a
reconhecido. O diabetes mitocondrial caracteriza-se por uma transmissão gravidade do defeito na função do receptor parece correlacionar-se com a
materna, e a maioria dos pacientes é classificada inicialmente como por- gravidade da síndrome clínica.
tadora de DM2. Porém, em geral, há uma tendência a serem mais jovens,
magros e necessitarem de tratamento com insulina com maior frequência Lipodistrofias
do que classicamente observado. Há, entretanto, relatos de casos inicial- Condições raras,caracterizam-se por uma perda seletiva do tecido adipo-
mente diagnosticados como DM1 devido ao início abrupto dos sintomas, à so. Geralmente, associam-se a complicações metabólicas, como DM, RI e
idade de aparecimento e à gravidade da doença. Na maioria dos casos, os dislipidemia, podendo ser adquiridas ou familiares, generalizadas ou par-
marcadores imunológicos do DM1 não estão presentes nesse tipo de DM. ciais. A lipodistrofia generalizada congênita, ou síndrome de Berardinelli-
A presença de surdez ou disacusia neurossensorial é um achado importan- -Seip, tem herança autossômica recessiva e caracteriza-se por ausência
te, sendo reportado em até 98% dos indivíduos afetados. Adicionalmente, quase completa de tecido adiposo desde o nascimento ou na infância.
esses pacientes podem exibir sinais e sintomas de envolvimento em outros O DM geralmente se desenvolve durante a adolescência. Pelo menos duas
órgãos, como miocardiopatia e distúrbios do sistema de condução, alte- alterações moleculares foram identificadas como suas causas: mutações no
rações neuromusculares e nefropatia. O defeito no diabetes mitocondrial gene AGPAT2 (1-acilglicerol-fosfato-aciltransferase-2), no cromossomo 9, e
reside nas células betapancreáticas. no gene seipina (também denominado Gng3lg), no cromossomo 11. As lipo-
distrofias parciais familiais são formas heterogêneas de herança autossômi-
ca dominante. A síndrome de Dunnigan, a mais comum, caracteriza-se pela
ATENÇÃO!
perda progressiva de gordura nos braços e nas pernas durante a puberdade
O diabetes mitocondrial é um dos únicos tipos de DM em que o uso da e, posteriormente, em regiões abdominal e torácica, com preservação ou
metformina está contraindicado. mesmo aumento de tecido adiposo na face e no pescoço. O DM geralmente
desenvolve-se após a 2a década de vida associado à RI e à dislipidemia.
Essa síndrome resulta de mutações em heterozigose no gene LMNA, que
Síndrome de Wolfram codifica as lamininas A e C, mapeado no cromossomo 1q21-q23. Recente-
mente, algumas famílias com lipodistrofia parcial e sequência normal do
Outro tipo de DM associado à deficiência de insulina de origem não au- gene LMNA foram identificadas com mutações no gene PPARg.
toimune, surge, em geral, na 1a década de vida, mas pode ter início na
idade adulta. Deve-se suspeitar desse tipo de diabetes nos jovens com DIABETES MELITO TIPO 2 NO ADOLESCENTE
DM e baixa reserva de insulina, que necessitem de insulina exógena para
o tratamento da hiperglicemia e com ausência de marcadores autoimunes Nas ultimas décadas, com o aumento da prevalência de obesidade entre
contra célula betapancreática, em associação à atrofia óptica, a qual, em as crianças e adolescentes, tem surgido os casos de DM2 no adolescente.
geral, sucede em aproximadamente uma década o aparecimento do DM. Estudos recentes têm demonstrado que nos Estados Unidos 1 em cada 3 ca-
sos de diabetes diagnosticados antes dos 18 anos é agora tipo 2. No Brasil,
entretanto, tem-se observado alguns casos de DM2 no adolescente, mas
ATENÇÃO! com uma frequência bem inferior à americana. Os fatores de risco para o
DM2 no adolescente são obesidade, história familiar de DM2, sedentarismo
Quando há um quadro de deficiência visual grave desproporcional ao e baixo peso ao nascer, a exposição intrauterina ao diabetes gestacional, a
tempo de evolução do DM e, eventualmente, na ausência de outras puberdade e outras condições relacionadas à resistência à insulina, como a
microngiopatias, deve-se suspeitar de atrofia óptica e da síndrome de síndrome dos ovários policísticos, agora denominada síndrome reprodutiva
Wolfram. metabólica. As características importantes para diferenciar o DM2 do ado-
94 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
lescente do DM1 são: início lento, assintomático (ao contrário com o início efeitos metabólicos pela ligação e ativação de um receptor específico de
agudo sintomático do DM1), sobrepeso ou obesidade, sinais de resistência à membrana com atividade tirosinocinase. Após essa ativação, os substratos
insulina, como a presença de acantose nigricante, ausência de marcadores celulares do receptor de insulina (IRS, do inglês insulin receptor substrate)
autoimunes contra as células β, ausência de cetose e presença variável de são fosforilados em resíduos tirosina levando à cascata de transmissão do
dislipidemia e hipertensão arterial. sinal insulínico. Nos estados de RI, em oposição ao efeito positivo da fos-
forilação em tirosina do receptor de insulina e de seus substratos, ocorrem
DIABETES MELITO NO ADULTO desfosforilação por proteínas tirosinas fosfatases, fosforilação em resíduos
DM tipo 2 serina e treonina e uma degradação acelerada do IRS-1. Outra alteração
presente na RI relaciona-se às ações da glicosamina (proveniente do meta-
DM2 é caracterizado pela clássica tríade de disfunção da célula betapan-
bolismo da glicose) tanto no nível do fígado como no músculo, dificultan-
creática, produção excessiva de glicose pelo fígado e resistência à ação da
do a ação da insulina. Um aspecto que tem sido muito estudado recente-
insulina definida pelo comprometimento do clearance de glicose mediado
mente é o papel da disfunção da mitocôndria muscular nessa resistência.
pela insulina no musculoesquelético.
Propõe-se que essas alterações podem explicar o acúmulo muscular de
Predisposição genética TGs e uma deficiência na captação de glicose que caracteriza a RI no DM2,
O DM2 é bastante conhecido como uma doença genética pelos clínicos devido a uma diminuição na oxidação dos ácidos graxos e na produção de
que observam seu aparecimento em famílias e grupos étnicos de risco ele- ATP. Outras alterações nesse sentido encontradas nos pacientes com DM2
vado para a doença. são diminuição na concentração de mitocôndrias musculares e aumento
Atualmente, é reconhecido como uma doença poligênica, ou seja, em no número de fibras musculares não oxidativas e na ativação de genes
um único indivíduo, a presença simultânea de vários genes alterados é ne- que regulam a biogênese das mitocôndrias. Por último, têm sido muito
cessária para o desenvolvimento da doença. Além disso, o DM2 é também estudados a resistência à insulina induzida pelos ácidos graxos e o papel
provavelmente multigênico, isto é, diferentes combinações de alterações da inflamação nessa condição.
genéticas podem existir entre os pacientes portadores dessa forma de DM. A obesidade visceral está fortemente correlacionada à RI, porém a
Apesar de a contribuição genética ser bem reconhecida, a influência de causa dessa relação ainda não é totalmente conhecida. Entretanto, sabe-
fatores ambientais e de estilo de vida é importante. -se atualmente que o tecido adiposo visceral é um órgão endócrino que
Nas últimas décadas, vários genes envolvidos na secreção de insulina, produz vários hormônios, como a resistina, a adiponectina e a leptina, e
na sensibilidade à insulina, no metabolismo e transporte de glicose têm peptídeos proinflamatórios, como o TNF-α, que possuem efeitos importan-
sido implicados como potenciais candidatos ao DM2. Entretanto, poucas tes no metabolismo da glicose e na ação da insulina.
associações gene-doença têm sido replicadas a um nível de significância Além da RI, no desenvolvimento do DM2, ocorre uma disfunção das
que possa sugerir um papel na etiologia da doença. Existe a possibilidade células betapancreáticas. Em estudo longitudinal realizado com os índios
de que os mesmos genes que causam as formas mendelianas mais raras de Pima, população de alto risco para o DM2, verificou-se que os indivíduos
diabetes, quando apresentam mudanças menos deletérias (e talvez mais que se tornaram diabéticos apresentaram diminuição da secreção de insu-
comuns), possam contribuir significativamente para a suscetibilidade para lina e piora na sensibilidade insulínica, ao passo que os que não evoluíram
as formas comuns de DM2. Variantes nos genes PPARg, Kir 6.2 e TCF7L2 para o DM exibiram diminuição semelhante na sensibilidade, porém com
parecem ser as que apresentam resultados mais consistentes entre os dife- aumento na secreção de insulina.
rentes estudos. Nas células betapancreáticas, o canal de potássio sensível Os mecanismos que levam aos defeitos de secreção de insulina nos
ao ATP, composto por duas subunidades – Kir 6.2 e o receptor de sulfo- indivíduos com DM2 não são conhecidos, mas sabe-se que a hiperglicemia
nilureia (SUR) –, controla a secreção de insulina. O TCF7L2 (transcription e o aumento dos ácidos graxos livres contribuem para essa disfunção, ha-
factor-7-like 2) é o mais importante gene de suscetibilidade para o DM2 vendo melhora após correção dessas alterações metabólicas.
identificado até o momento. Tem efeito regulador sobre o proglucagon, Em resumo, a disfunção das células betapancreáticas e a RI coexistem
o precursor do hormônio insulinotrópico GLP-1, que, por sua vez, exerce no DM2 manifesto.
um papel importante na homeostase glicêmica, por meio do aumento na
secreção de insulina e da diminuição da secreção de glucagon. LADA
Fatores ambientais Pertence ao grupo de DM com etiologia autoimune no qual os autoanti-
O conceito de que as mudanças ambientais promovem diabetes foi ressal- corpos pancreáticos mais frequentes são os anti-GAD e está associado à
tado há alguns anos, quando populações que mudaram seu estilo de vida presença dos alelos DQ2 e DQ8 da molécula de histocompatibilidade de
(índios Pima no sudeste dos Estados Unidos, tribos nômades do Saara, classe II, mas pode prescindir do uso de insulina exógena nos primeiros
aborígines australianos, entre outros) sofreram uma explosão na incidên- meses ou anos da doença. Representa uma forma de destruição autoimu-
cia de DM2 e, ao retornarem ao estilo de vida tradicional, conseguiram ne das células β lentamente progressiva, com maior reserva de peptídeo
reverter esse processo. Conclui-se, nesse sentido, que não é possível al- C que os indivíduos com DM1 nos primeiros anos, mas que progridem
terar a predisposição genética, mas inúmeros estudos têm demonstrado para uma perda marcante da função dessas células, o que resultará na
que o diabetes pode ser retardado ou prevenido por mudanças de hábitos dependência insulínica exógena. Acredita-se que 10% dos indivíduos clas-
alimentares e com exercícios físicos. sificados como DM2 sejam LADA.
Fisiopatologia
■■ DIAGNÓSTICO
A resistência insulínica (RI) precede e é o melhor preditor para o desen-
volvimento do DM2. Definida como uma resposta biológica subnormal à O DM pode ser diagnosticado, segundo as recomendações da American
insulina, manifesta-se por diminuição do transporte de glicose estimulado Diabetes Association, da OMS, e da Sociedade Brasileira de Diabetes, por
1
pela insulina em tecido adiposo e musculoesquelético e por uma supres- um dos quatro seguintes critérios:
são inadequada da produção hepática de glicose e da gliconeogênese nos 1 | Sintomas clássicos da doença que incluem poliúria, polidipsia e ema-
estados de jejum e pós-prandial. A sensibilidade insulínica é influenciada grecimento associados a uma glicemia ao acaso ≥ 200 mg/dL. Glicemia
por vários fatores, como idade, peso, raça, obesidade (especialmente a ao acaso é definida como aquela realizada em qualquer horário, indepen-
visceral), atividade física e alguns medicamentos. A insulina exerce seus dentemente do tempo decorrido desde a última refeição.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 95
■■ TRATAMENTO
TABELA 16.5 ■ Estimativa da necessidade calórica diária em jovens
OBJETIVOS e adultos
Os pacientes com DM1 devem ser submetidos à avaliação cardiovas- com DM2 deveriam realizar treinamento de resistência pelo menos duas
cular quando: idade > 35 anos; idade > 25 anos e mais de 15 anos de vezes por semana.
diagnóstico clínico da doença; presença de qualquer outro fator de risco
adicional para coronariopatia; presença de microangiopatia (retinopatia TRATAMENTO MEDICAMENTOSO
proliferativa ou nefropatia). Devem ainda ser avaliados quanto à presen- Anti-hiperglicemiantes e hipoglicemiantes orais e
ça de neuropatia periférica e autonômica, bem como de doença vascular análogos de GLP-1
periférica. Para os pacientes com retinopatia diabética proliferativa, exer-
cícios vigorosos podem precipitar hemorragia vítrea ou descolamento de Os medicamentos e seus mecanismos de ação, características farmacológi-
retina. Por isso, devem evitar exercícios anaeróbios e atividade física de cas e farmacocinéticas estão descritos no capítulo de Fármacos de Ação no
estiramento, de impacto ou que contenham manobras semelhantes à de Metabolismo. Por ora, em resumo, os agentes para o controle da glicemia
Valsalva. Deve haver boa monitoração da pressão arterial (PA) durante os podem:
exercícios naqueles com nefropatia clínica. 1 | aumentar a secreção de insulina por um mecanismo independente da
Um período de aquecimento entre 5 e 10 minutos precisa fazer parte glicose (sufonilureias e meglitinida);
de qualquer atividade física. Os pacientes com DM devem ser orientados 2 | aumentar a secreção de insulina por um mecanismo dependente da
a evitar a atividade física quando glicemia > 250 mg/dL com cetose, a glicose (inibidores da DPP4 (iDPP4) e agonistas dos receptores de GLP-1);
realizá-la com cautela se glicemia > 300 mg/dL na ausência de cetose e a 3 | diminuir a RI (metformina e glitazona);
ingerir uma quantidade extra de hidrato de carbono se a glicemia < 100 4 | suprimir a secreção de glucagon por um mecanismo dependente da
mg/dL. Pela monitoração da glicemia antes e após o exercício, o paciente glicose (iDPP4, agonistas dos receptores de GLP-1 e análogos da ami-
pode identificar as alterações na dose de insulina e na alimentação neces- lina);
sárias para aquela atividade e aprender sobre a resposta da glicemia aos 5 | atuar no sistema gastrintestinal para diminuir as oscilações da glicemia
diferentes tipos de exercício. (inibidores da alfaglucosidase-acarbose e miglitol e colesevelam);
Além dos efeitos sobre a glicemia, a atividade física pode melhorar o 6 | ativar os receptores cerebrais de dopamina D2, aumentar o tônus do-
perfil lipídico, reduzir a pressão arterial e melhorar o desempenho cardio- paminérgico e diminuir os níveis de glicemia (bromocriptina);
vascular. É recomendado que os jovens com DM realizem cerca de 30 mi- 7 | inibição seletiva do contratransporte sódio-glicose no túbulo proximal
nutos de atividade física moderada, cuja escolha é individual e naquela em renal (dapagliflozin, canagliflozin, empaglifozina);
que o indivíduo se sinta mais confortável, na maioria dos dias da semana. 8 | suplementação exógena de insulina (insulina humana ou análogos de
Os adultos com DM devem ser encorajados a realizar pelo menos 150 insulina de ação rápida, ultrarrápida, intermediária e lenta).
minutos de exercício físico aeróbio (50 a 70% da frequência cardíaca [FC] Neste capítulo, será discutida especificamente a utilização desses
máxima) por semana, em três sessões, não ficando mais do que dois dias medicamentos para o tratamento do diabetes no adolescente e no adulto
consecutivos sem exercício. Na ausência de contraindicações, os adultos (Tabela 16.6 e Quadro 16.8).
Glitazonas Jejum e pós-prandial 1-1,5 Aumento Baixo Edema, perda óssea, ICC, Médio
anemia
QUADRO 16.8 ■ Semelhanças e diferenças entre as terapias com base nas incretinas
Agentes Sitagliptina, vildagliptina, saxagliptina, linagliptina Exenatida, liraglutida, albiglutida, lixisenatida e dulaglutida
e alogliptina
Administração VO Injeção SC
e uma curta duração de sua ação em relação à insulina rápida (regular), A comparação entre as insulinas de ação ultrarrápida e de ação rápida
quando administrada por via subcutânea. Seu pico de ação é significati- no esquema bólus-basal tem mostrado uma redução nas hipoglicemias,
vamente maior e mais precoce que o da insulina rápida. Quando injetada principalmente as noturnas, em favor das ultrarrápidas e uma semelhança
imediatamente antes das refeições, a lispro restringe as flutuações da gli- no controle da hemoglobina glicada entre estas.
cemia pós-prandial de maneira mais eficaz do que a insulina rápida, aplica-
da 30 minutos antes da alimentação. Mesmo que o análogo seja injetado Insulina de ação intermediária
15 minutos após da refeição, os efeitos hipoglicemiantes são equivalentes A insulina de ação intermediária de que se dispõe é a humana NPH, com
aos da regular, aplicada 30 minutos antes da alimentação. Comparando os início de ação entre 1 e 3 horas, pico em 5 a 7 horas e duração entre 13 e 16
análogos de ação ultrarrápida com a insulina regular, eles mostram menor horas após a aplicação SC. Devido ao seu perfil farmacocinético, os modelos
variabilidade de absorção no local da injeção e menor variação intra ou terapêuticos convencionais (insulina NPH, 1 ou 2 vezes ao dia), em pacientes
entre pacientes. De acordo com sua farmacocinética, se o paciente se exer- sem reserva endógena de insulina, não conseguem simular um padrão ade-
citar no período pós-prandial imediato (1 a 3 horas), uma dose menor de quado de insulina basal, com risco de hipoglicemia no pico de ação da insuli-
análogo será necessária antes das refeições, ao passo que se exercitar no na e escapes de hiperglicemia após 10 a 14 horas da sua aplicação SC. Além
período tardio (3 a 5 horas após a refeição) requererá pouca ou nenhuma disso, no regime terapêutico com insulina NPH associada à regular antes do
mudança na dose de insulina. Quando administradas por via EV, os perfis jantar (entre 18 e 21 horas), há aumento do risco de hipoglicemia noturna e
farmacocinéticos das insulinas lispro e humana regular são semelhantes. hiperglicemia de jejum. Nesse sentido, como será discutido, quando se utiliza
a.
A afinidade da lispro pelo receptor do fator de crescimento insulina- um esquema com duas doses de NPH, é aconselhável que a 1 seja de manhã
a.
-símile I (IGF-I, do inglês insulin-like growth factor I) equivale em apro- e a 2 à noite, ao deitar.
ximadamente 1 a 1,5 vez à da insulina de ação regular e é aproximada- As insulinas intermediárias não conseguem fornecer o perfil de insuli-
mente mil vezes inferior à do próprio IGF-I. Estudos de mutagenicidade, na basal adequado quando aplicadas em dose única ou mesmo duas vezes
toxicidade e carcinogenicidade em animais não têm demonstrado efeitos ao dia. Em um trabalho, verificou-se que, em adolescentes, a introdução
diferentes dos encontrados na insulina regular humana. de doses adicionais de NPH no almoço melhorou a efetividade pós-pran-
A insulina aspart foi o 2o análogo da insulina humana de ação ultrar- dial dos análogos de ação ultrarrápida ou da regular no controle glicêmico
rápida disponível no mercado. Nele, o aminoácido aspartato substitui a em longo prazo, com menos flutuações da glicemia e menor frequência de
prolina na posição 28 da cadeia β, introduzindo uma carga negativa que hipoglicemias.
diminui a autoagregação das moléculas. A afinidade para o receptor de in-
sulina e a potência metabólica desse análogo são muito semelhantes às da
insulina humana, com afinidade para o receptor de IGF-I e potência mito- ATENÇÃO!
gênica reduzidas. As concentrações plasmáticas de lispro aumentam mais
Os análogos de ação lenta, usados como insulina basal, combinados
rapidamente que as de aspart, e o pico é mais precoce. A aspart apresenta
aos de ação ultrarrápida (lispro, aspart ou glulisina) nas refeições, são
um declínio na sua concentração um pouco mais lento. O uso clínico dos
provavelmente o modelo terapêutico mais fisiológico de reposição de
dois análogos é equivalente e suas doses e horários de aplicação devem
insulina disponível para pacientes que não utilizam bomba SC de infu-
ser sempre individualizados.
o são contínua de insulina.
O 3 análogo de insulina de ação ultrarrápida desenvolvido é a gluli-
sina, semelhante à insulina humana, com exceção da troca da asparagina
pela lisina na posição B3 e da lisina pelo ácido glutâmico na posição B29.
Avaliando comparativamente as três insulinas ultrarrápidas, apesar Insulina de ação longa
da glulisina mostrar uma absorção mais rápida comparada à lispro e à as- O primeiro análogo de insulina de ação longa desenvolvido foi a insulina
part, essa diferença permanece por no máximo uma hora, após isso os detemir(IDet). Nesse análogo de insulina, um ácido graxo alifático foi aci-
resultados se tornam semelhantes entre todas essas insulinas. lado ao aminoácido B29 (lisina), o aminoácido B30 (treonina) removido e
Em termos de eficácia e perfil de segurança, a glulisina se mostrou a insulina ligada à albumina. Essas alterações resultaram na possibilidade
semelhante à lispro no tratamento tanto em crianças e adolescentes como de ocorrer uma ligação reversível entre a albumina e o ácido graxo acilado
em adultos com a terapia bólus-basal. introduzido na molécula da insulina. Após a aplicação SC e sua passagem
Exceto no caso da bomba de infusão de insulina, os análogos de ação para a corrente sanguínea, 98% da detemir se liga à albumina e circula
ultrarrápida são utilizados apenas como insulina prandial (pela contagem ligada a essa proteína, quando somente a fração livre está disponível para
de carboidrato) ou suplementar (pelo fator de correção da glicemia). interagir com o receptor da insulina. A liberação gradual da sua fração
Quando se analisa qual a insulina ultrarrápida que melhor se apre- ligada da albumina permite a manutenção e o prolongamento da ação da
senta para uso em bomba de infusão quanto à precipitação e à oclusão, detemir. Seu perfil de ação é caracterizado por um pico de atividade entre
a aspart foi a que demonstrou a melhor estabilidade química com menor 6 e 8 horas e duração de ação em torno de 24 horas após sua aplicação SC.
taxa de oclusão em comparação às demais (aspart 9,2%; lispro 15,7%; Um estudo in vitro2 em células de osteossarcoma mostrou afinidade
glulisina 40,9%). pelo receptor de IGF-I e potencial mitogênico da detemir reduzido em re-
lação aos da insulina humana. A detemir é solúvel em pH neutro, por isso
Insulina de ação rápida seus depósitos no subcutâneo permanecem líquidos em contraste com os
a
A insulina de ação rápida, simples ou regular, foi a 1 insulina a ser utili- depósitos cristalinos da NPH e da glargina. Consequentemente, ocupam
zada. Tem um pico de ação entre 1 e 2 horas e retorno ao basal em 6 a uma maior área de superfície, o que reduz a variabilidade de absorção.
8 horas, após ser aplicada via SC. Recomenda-se que seja empregada de Comparada à insulina NPH, a detemir é absorvida mais lentamente e não
30 a 60 minutos antes das refeições, na tentativa de adequar a farmacoci- apresenta pico de ação pronunciado.
nética da absorção de insulina com o pico da absorção de hidrato de car- A necessidade de uma insulina basal, de perfil menos variável e mais
bono após a refeição. Desse modo, esse retardo na absorção da insulina consistente, com um período de ação prolongado, levou ao desenvolvi-
regular pode limitar sua efetividade em controlar a glicemia pós-prandial. mento da insulina glargina (IGlar). Nele, a molécula de insulina sofreu uma
Em alguns casos, tem-se observado que a associação da insulina rápida modificação com a substituição do aminoácido glicina na posição 21 da
com a ultrarrápida, nas refeições, é efetiva em controlar as glicemias dos cadeia α pela asparagina e a adição de duas moléculas de arginina na po-
períodos pós-prandiais e dos intervalos interprandiais. sição 30 da cadeia β. Essas alterações provocaram uma mudança no ponto
100 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
isoelétrico da insulina e no seu pH, que se tornou ácido. Por essas razões, comparando a IDeg com a IGlar , tanto em pacientes com DM1 como com
esse análogo se precipita quando entra em contato com o meio neutro do DM2, têm demonstrado que a IDeg tem uma flexibilidade no horário de
tecido celular SC do organismo humano e é liberado lentamente, condição aplicação, quando necessário, e menor risco de hipoglicemias noturnas.
responsável por seu longo tempo de ação. O ultimo análogo de insulina ultralonga introduzido na prática clíni-
Essa insulina se apresenta clara (transparente) em solução com pH ca foi a inslina glargina U-300 (Toujeo®). Uma liberação mais sustentada
ácido e não deve ser misturada a outras insulinas antes das aplicações. com o precipitado de insulina subcutânea visto com a I-Glar 300 U/mL
Diferentemente da insulina NPH, que é turva, tem pH neutro e pode ser comparada com a I-Glar 100 U/mL é devido ao fato de que o volume injeta-
misturada à insulina ultrarrápida ou regular antes de ser aplicada. A insu- do é reduzido em aproximadamente 2/3, ao de que resulta em uma menor
lina glargina tem a vantagem de não necessitar de ressuspensão, o que área de precipitado que está associada à uma menor velocidade de redis-
elimina um importante fator de variabilidade. No entanto, por ser uma solução. A meia-vida da I-Glar 300 U/mL após a sua aplicação subcutânea
formulação de pH ácido, alguns pacientes relatam dor no local da aplica- é de 18-19 horas independente da dose e duração da ação superior a 24
ção. Estudos com base em células de osteossarcoma demonstraram que a horas. A estabilização dos valores plasmáticos da I-Glar 300 U/mL demora
insulina glargina tem uma afinidade para o receptor de IGF-1, 6 a 8 vezes, pelo menos 5 dias em pacientes com DM1. Quando comparada à I-Glar
superior à da insulina humana nativa. Contudo, em cultura de células mus- 100 U/mL, a I-Glar 300 U/mL, em pacientes com DM1 ou DM2 relacionou-
culoesqueléticas humanas, a afinidade da glargina pelo receptor de IGF-1 -se a um menor risco de hipoglicemia noturna.
foi substancialmente (200 vezes) menor do que o ligante fisiológico, IGF-1.
No mesmo sentido, a insulina glargina não apresentou potencial carcino- Pré-misturas de insulinas
gênico em ratos e camundongos. Essas considerações, com a observação Com o objetivo de melhorar a aderência e a operacionalidade dos pacien-
de que a insulina glargina não demonstrou in vivo uma afinidade intrínse- tes que utilizam misturas de insulina (isto é, com diferentes períodos de
ca ao IGF-1 durante três semanas de tratamento, em pacientes com DM1 ação), há duas décadas surgiu outra categoria de preparações de insulina,
e DM2, sugerem fortemente que a maior afinidade pelo receptor de IGF-1 a das pré-misturadas.
em células de osteossarcoma não tenha significado clínico. A única formulação de pré-mistura de insulina NPH com a regular
Comparada à insulina NPH, a glargina resulta em uma absorção pro- disponível atualmente em nosso meio é a 70/30 (70% NPH/30% regular).
longada e mostra discreto pico de início da ação. A velocidade de absorção A Humalog Mix® 75/25 é constituída de 75% de NPL (do inglês neutral
da insulina nos diferentes locais de aplicação não se mostrou diferente, protamine lispro, equivalente a uma insulina monomérica com um per-
nem houve sinais de que se acumule após múltiplas injeções. Também fil de atividade semelhante ao da insulina NPH) e 25% de insulina lispro;
não há alteração do padrão de ação, independentemente dos horários de já a Humalog Mix® 50/50 é constituída de 50% de NPL e 50% de lispro.
aplicação (pela manhã, no jantar ou à noite, ao deitar). Estudos farmaco- A NovoMix® 70/30 apresenta 70% de PIA (do inglês protaminated insulin
dinâmicos mostram que a ação da glargina dura em média 22 a 24 horas. aspart) e 30% de aspart. Comparando essas novas pré-misturas com a
Apesar de os estudos não encontrarem diferenças significativas na HbA1c 70% NPH/30% regular, houve redução da hiperglicemia pós-prandial e
quando a glargina foi comparada à NPH (quatro injeções como reposição uma queda dos níveis de hipoglicemia noturna, entretanto não se verifica-
de insulina basal), houve uma redução expressiva no risco de hipoglicemia ram diferenças na hemoglobina glicada. O uso de pré-misturas de insulina
no horário noturno. diminui a operacionalidade de ajuste entre as necessidades nas refeições
Atualmente, não é recomendado colocar, em uma mesma seringa, a e os basais. As preparações de pré-misturas de insulinas podem ser con-
glargina com os análogos ultrarrápidos, como se faz com a NPH. Nesse sen- sideradas em adolescentes com problemas de adaptação ao preparo das
tido, em um dos estudos do autor, observou-se que a lispro, quando mistu- insulinas, para diminuir o tempo gasto diariamente em relação a essa ati-
rada à glargina na mesma seringa, perde sua característica de ultrarrápida. vidade. Do mesmo modo, quando a insulina é administrada por familiares
com dificuldades em compreender as etapas necessárias para a mistura
Insulina de ação ultra-longa adequada das insulinas. No DM2, a indicação das pré-misturas é mais am-
O 1º análogo de insulina de ação ultra-longa desenvolvido foi a insulina pla, principalmente quando as hiperglicemias pós-prandiais são as que
degludeca (IDeg). Esse análogo de insulina tem a mesma sequência de necessitam de correção, para os pacientes com dificuldades de manuseio
aminoácido da insulina humana, exceto pela remoção da treonina na po- para misturar as insulinas e melhorar a aderência.
sição 30 da cadeia β(Des-B30,”De”) e o acréscimo, via um ligante de ácido No Quadro 16.10, são apresentadas as preparações de insulina dis-
glutâmico(“glu”), de uma cadeia de 16 carbono diácida de ácido graxo poníveis no Brasil e, na Tabela 16.7, o perfil das diferentes preparações
(diácido hexadecanoico, “dec”) á lisina na posição 29 da cadeia β. Além de insulina.
dessa mudança na estrutura cadeia da IDeg, a presença de zinco e resor-
cinol determina a formação de hexâmeros, e a presença de zinco e fenol Terapia insulínica no DM1
determina a formação de di-hexâmeros, quando em solução. De modo O esquema terapêutico com insulina no paciente com DM1 deve ser indi-
que após a aplicação subcutânea de IDeg, a saída gradativa dos fenóis vidualizado, levando em consideração a idade, a fase de crescimento e o
promove a autoassociação de di-hexâmeros para uma formação linear de desenvolvimento, a frequência e intensidade da atividade física, o nível
multi-hexâmeros que se precipitam no tecido subcutâneo. A IDeg (pH7,4) socioeconômico e intelectual, o apoio familiar e os objetivos do tratamen-
apresenta-se em uma solução incolor com uma solubilidade pH depen- to. Antes de iniciá-lo, o paciente deve receber informações básicas sobre
dente e um ponto isoelétrico semelhante ao da insulina humana. A IDeg, tipos de insulina , aplicação e conservação das insulinas, sintomas e sinais
à semelhança da insulina detemir, também se liga à albumina circulante de hiperglicemia, cetose e hipoglicemia e conduta inicial nessas situações
(através da acilação da lisina B29), o que colabora também para a sua ação e em outras intercorrências agudas. Classicamente, é possível dividir o tra-
protraída. A dispersão lenta do zinco da dessa insulina depositada no sub- tamento com insulina no DM1 em convencional ou intensivo.
cutâneo permite uma dissociação gradual e altamente preditiva em mo-
nômeros de insulina e ligação aos receptores de insulina teciduais. Após a Tratamento insulínico convencional
injeção da IDeg subcutânea, as concentrações de insulina aumentam ime- No esquema convencional, incluem-se os pacientes que utilizam 1 a 2
diata e lentamente atingindo uma concentração plasmática máxima após aplicações de insulina basal (intermediária) ao dia, associada à insulina
10-12 horas com uma meia vida de 17-25 horas, quase duas vezes a da in- rápida. Esse modelo terapêutico pode ser suficiente durante os primeiros
sulina glargina. As concentrações de IDeg atingem a sua estabilidade após anos da doença, como será discutido a seguir, mas se torna ineficaz nos
2-3 dias de sua aplicação 1 vez ao dia. Os estudos clínicos, até o momento, pacientes sem reserva endógena de insulina.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 101
INSULINAS LABORATÓRIOS Infelizmente, não é possível repor insulina apenas com insulinas basais
(intermediária ou longa), apesar da maior facilidade e aceitabilidade
Aventis Lilly Novo Nordisk por clínicos e pacientes.
Ultrarrápida Glulisina Lispro Aspart
(Aprida®) (Humalog®) (Novo Rapid®) A necessidade média de insulina exógena para adolescentes e jovens
® ® é de 0,50 a 1 UI/kg/dia.
Rápida Humulin R Novolin R
Em um período de algumas semanas após o início da terapêutica com
Intermediária insulina nos pacientes DM1 de diagnóstico recente, é possível haver uma
redução acentuada nas necessidades de insulina, chegando a menos de
NPH (N) Humulin N® Novolin N® 0,5 UI/kg/dia, ou inferior a 0,25 UI/kg/dia, para se manter um bom controle
da glicemia (HbA1c < 7%). Essa fase é denominada “lua de mel” e está re-
Longa lacionada à melhora da ação da insulina, pela retirada dos efeitos tóxicos
da hiperglicemia e pela presença de uma secreção residual de insulina.
Glargina Detemir (Levemir®)
Dura em média seis meses, mas pode ser mais prolongada, com relato de
(Lantus®)
casos com duração de anos de remissão da doença. Nessa fase, é reco-
Pré-misturas mendado manter a insulina, mesmo que em pequenas doses, por questões
educativas e devido ao seu potencial efeito imunomodulador. Entretanto,
®
(N + R) Humulin 70/30 sabe-se que a destruição autoimune das células betapancreáticas pros-
70/30 segue e leva ao aumento dos valores da glicemia e das necessidades de
insulina exógena, em um período de semanas, meses ou anos, quando a
(N + UR) Novo Mix 30®
necessidade e o número de aplicações diárias de insulina aumentam.
70/30
Tratamento insulínico intensivo
75/25 Humalog Mix® 25
Estudos de seguimento de pacientes com DM1 mostram que a instituição
50/50 Humalog Mix® 50 do tratamento intensivo da glicemia desde o início da doença está as-
sociada com um menor risco para ocorrência de retinopatia e nefropatia
diabética (memória metabólica).
É importante considerar, entretanto, que, em determinados grupos,
como pacientes com tendência à hipoglicemia, em particular assintomá-
TABELA 16.7 ■ Período e tempo de ação das preparações
tica, com antecedentes de doença cardio ou cerebrovascular clinicamente
de insulina significativa, com doença renal terminal ou idosos, o tratamento intensivo
DURAÇÃO
com insulina deve ser analisado com cautela ou, eventualmente, contrain-
INSULINA INÍCIO PICO EFETIVA
dicado. Tem sido também relatado que a instituição do tratamento inten-
sivo com insulina em pacientes com retinopatia proliferativa ou não proli-
Ultrarrápida ferativa grave pode acelerar a progressão da retinopatia após o seu início.
Desse modo, uma avaliação da retina e, se necessário, um tratamento
Lispro 5-15 min 30-90 min 5h oftalmológico deveriam ser considerados antes de instituir o tratamento
intensivo nesses pacientes.
Aspart
O conceito de tratamento intensivo inclui, além de uma reposição
Glulisina mais fisiológica da insulina (bólus-basal ou infusão contínua), monitora-
ção da glicemia (pelo menos 3 a 4 vezes por dia), orientação nutricional
Rápida com a contagem de carboidratos, treinamento para o autoajuste das do-
ses de insulina e a solução dos problemas diários com a suplementação
Regular 30-60 min 2-3 h 5-8 h de insulina. A esse conceito, acrescenta-se a realização de um exercício
Intermediária físico regular.
a NPH no café da manhã e ao deitar; para o B, seguir o mesmo modelo, para determinado valor de glicemia acima do alvo glicêmico estipulado).
substituindo a regular pela lispro, aspart ou glulisina, às refeições; para o Além da quantidade de hidrato de carbono ingerida e do valor da glicemia
C, NPH + lispro/aspart/glulisina (ou regular), no café e no almoço, lispro/ no momento, é preciso levar em consideração o tipo de hidrato de carbono,
aspart ou glulisina, no jantar, e NPH, à noite, ao deitar; para o D, optar por a associação com gordura e a atividade física pregressa e futura do paciente.
NPH + lispro/aspart/glulisina, no café e no almoço, lispro/aspart/glulisina, A BIISC está indicada nos pacientes com hipoglicemia grave e recor-
no jantar, e NPH, à noite, ao deitar; e, finalmente, para o E, utilizar lispro/ rente, hipoglicemias assintomáticas, grande variabilidade glicêmica, pa-
aspart, às refeições, e glargina, detemir ou degludeca em dose única. cientes com fenômeno do alvorecer (grandes hiperglicemias no alvorecer)
Alguns trabalhos mostraram que, com a substituição da insulina regu- exacerbado, na pré e durante a gestação, no controle glicêmico inadequa-
lar pelas insulinas de ação ultrarrápida, apesar de haver uma diminuição do no pós-transplante de órgão, nas complicações crônicas precoces e em
significativa nas hipoglicemias, não se observou uma diferença significa- evolução do DM, na falência dos esquemas de múltiplas doses de insulina
tiva da HbA1c entre as duas preparações de insulina. A menor duração de em atingir os objetivos propostos e naqueles pacientes motivados que
ação dos análogos de ação ultrarrápida pode permitir um “escape hiper- desejam obter melhor controle glicêmico e flexibilidade no estilo de vida.
glicêmico” antes da próxima refeição, que pode ser evitado se adicionando Existe uma grande variedade de bombas de infusão de insulina dis-
um pouco de NPH à insulina de ação ultrarrápida, antes das refeições. poníveis no mercado internacional; no âmbito nacional, há dois fornece-
Os análogos de insulina de ação longa têm demonstrado algumas dores – um deles possui um glicossensor que, instalado paralelamente ao
vantagens como insulina basal. A conveniência da utilização em dose úni- dispositivo da BIISC, é capaz de monitorar e revelar os valores de glicose
ca (apesar de alguns pacientes com a detemir necessitarem de duas doses SC de 5 em 5 minutos, orientando o usuário.
diárias), o fato de não apresentarem pico de ação acentuado e, com isso, É importante acrescentar que recentemente foi introduzido no merca-
diminuírem de modo significativo a gravidade e a frequência das hipogli- do nacional um sistema de monitoração contínua (Free style®) da glicose
cemias, a vantagem da maior flexibilidade na utilização dessas insulinas subcutânea (não cruento), ou seja, não necessita de perfuração seriada
(o paciente pode omitir uma refeição ou atrasá-la sem riscos) associadas do subcutâneo que auxiliará de maneira significativa no ajuste das doses
às insulinas de ação ultrarrápida têm sido as razões para a preferência de diárias de insulina com repercussão no controle glicêmico.
muitos médicos e pacientes para esse modelo terapêutico.
Terapia insulínica no DM2
É importante salientar que, no esquema bólus-basal de insulina, a
proporção deve ser de 50% de insulina basal e de 50% de bólus (ultrarrá- A deficiência de insulina no DM2 tem caráter progressivo: após dez anos de
pida ou rápida), na maioria dos pacientes; em algumas situações, até 30% diagnóstico, a maioria dos pacientes necessitará de insulina. Vários estudos
basal e 70% bólus. mostram que a insulinização no DM2 tem sido tardia, quando o paciente já
está há vários anos com valores de HbA1c fora dos alvos de bom controle.
No Quadro 16.11, é apresentado um resumo dos esquemas que po-
dem ser utilizados na terapêutica com múltiplas doses de insulina. A utilização da insulina no tratamento da hiperglicemia em grande
parte dos pacientes com DM2 pode ser dividida em três fases: basal; ba-
sal-plus; e bólus-basal (Quadro 16.12).
QUADRO 16.11 ■ Sugestões de esquemas de aplicações diárias
múltiplas de insulina
QUADRO 16.12 ■ Fases da insulinotepia no DM2
ANTES DO DESJEJUM ANTES DO ANTES DO À NOITE AO
Otimização do estilo de vida e dos medicamentos orais (associações)
(MANHÃ) ALMOÇO JANTAR DEITAR
falham no controle da hiperglicemia
Bólus Bólus Bólus Basal**
1 | Iniciar insulina basal de ação longa, à noite, ao deitar, na dose de 10
Basal** + Bólus Bólus Bólus Basal* UI ou 0,2 UI/kg de peso corpóreo e titulá-la para atingir glicemia de
jejum 80 a 120 mg/dL (lembrar que, devido à RI hepática, pode haver
Basal* + Bólus Bólus Basal* necessidade de doses elevadas [> 50 UI] de insulina longa à noite)
Basal* + Bólus Basal*+ Bólus Bólus Basal* 2 | Alvo de glicemia de jejum obtido, mas persiste HbA1c elevada
Identificar qual a glicemia pós-prandial mais elevada
Bólus: insulina regular, lispro, aspart, gluisina. Iniciar a insulina de ação rápida para corrigir a glicemia pós-prandial
*Insulina NPH. (11/2-2 h; < 180 mg/dL) associada à insulina basal (insulina basal-
**Glargina, detemir ou degludeca. plus). Acrescentar 2a e 3a insulinas prandiais, se necessário
sintomas por alimentação. Na hipoglicemia grave (glicemia < 40 mg/dL), -histamínicos e, quando graves, com corticosteroides e posterior dessensi-
o paciente necessita de ajuda de outro indivíduo para corrigi-la e ocorrem bilização à insulina, de acordo com protocolos já estabelecidos.
distúrbios de conduta, perda de consciência acompanhada ou não de con- Edema insulínico pode ocorrer em pacientes com diagnóstico recente
vulsão, mas em alguns pacientes pode ser assintomática. de DM e valores elevados de glicemia quando iniciam a insulinoterapia
A hipoglicemia é a complicação mais frequente e temida do tratamen- ou naqueles cronicamente descompensados que iniciam um tratamento
to com insulina. A ocorrência de hipoglicemia grave é cerca de três vezes intensivo com insulina. Pode ser restrito aos pés e à área pré-tibial, mas se
maior durante o tratamento intensivo com insulina do que com o conven- generalizar, incluindo a face, e chegar à anasarca. O edema e a retenção
cional e está inversamente relacionada aos valores de HbA1c. de líquido geralmente são autolimitados e podem ser resolvidos em alguns
Nos pacientes que apresentam episódios frequentes de hipoglicemia dias, a não ser que sejam acompanhados de insuficiência cardíaca ou renal.
grave, deve-se fazer uma revisão cuidadosa da relação entre o esquema Os mecanismos de ocorrência do edema podem ser correção da de-
de insulina e o seu plano de alimentação e de exercício, da sua técnica de pleção crônica de volume pela reposição de insulina e hidratação, níveis
preparo e de aplicação de insulina, dos locais de aplicação e da sua função elevados de hormônio antidiurético associados à hiperglicemia crônica,
tiroidiana, suprarrenal e renal, além de pesquisar doença celíaca. ação renal direta da insulina levando à retenção de sódio e água livre e
queda dos níveis elevados de glucagon (associados ao mau controle glicê-
mico), que inibem os efeitos da aldosterona.
ATENÇÃO!
Perspectivas
Os pacientes com DM1 autoimune possuem um risco maior de desen- No momento, algumas vias de aplicação de insulina alternativas à injetá-
volver outras doenças autoimunes, como a tiroidite de Hashimoto, a vel encontram-se em fase clínica de estudo – entre elas, as vias inalatória,
insuficiência suprarrenal autoimune e a doença celíaca. perioral, sublingual, retal, nasal e transdérmica. A inalatória (pulmonar) é
a mais estudada até o momento. Uma formulação chegou inclusive a ser
®
lançada (Exubera ), porém foi retirada do mercado em outubro de 2007,
A hipoglicemia aguda com liberação secundária de fatores hiperglice-
segundo informações do fabricante, por razões econômicas. Outras formu-
miantes (cortisol, glucagon, catecolaminas) resulta em hiperglicemia com
lações de insulina inalável já estão em fase avançada de estudo e devem
glicosúrias e, às vezes, com cetonúria após a sua correção.
ser disponibilizadas brevemente para uso clínico.
A hipoglicemia deve ser sempre tratada de maneira controlada e sis-
Entre outras insulinas em desenvolvimento, têm-se: a smart insulin
tematizada, para que a ingestão excessiva de carboidratos e a consequen-
(atividade regulada pelos níveis de glicemia), isto é, atividade elevada
te hiperglicemia de rebote sejam evitadas. Com valores de glicemia capilar
quando os valores de glicemia estão altos e redução da ação no receptor
até 70 mg/dL, o paciente deve ser tratado com carboidratos complexos (15
de insulina quando os valores de glicemia estão baixos. Como também
a 20 g). Se a glicemia for ≤ 40 mg/dL, é preciso utilizar açúcar simples.
estão em estudos patch de insulina utilizando a técnica de microagulhas
Devem ser realizadas novas medidas a cada 15 minutos, e o tratamento
e vesículas de insulina sensíveis à hipóxia que propiciam a liberação de
precisa ser repetido de acordo com a glicemia, até que haja normalização.
insulina em resposta às variações glicêmicas.
Se uma das refeições estiver próxima, pode ser prudente adiantá-la e ajus-
tar a insulina ou medicação prandial, caso necessário. Nos casos de hipo-
TRANSPLANTE DE ILHOTAS, DE PÂNCREAS TOTAL
glicemia grave, deve-se aplicar glucagon por via IM (1 mg) e encaminhar o
indivíduo ao hospital para administração de glicose EV. OU DE CÉLULAS-TRONCO
Trata-se de três modalidades de transplante que têm sido utilizadas para
Lipoatrofia e lipo-hipertrofia o tratamento do DM. Os transplantes de ilhotas e o de pâncreas, que pode
A utilização atual de preparações insulínicas com elevado grau de pureza ser combinado ao transplante renal ou isolado, são aqueles empregados
diminuiu acentuadamente os casos de lipoatrofia nos locais de aplicação. há mais tempo.
Atualmente, os casos mais frequentes são de lipo-hipertrofia devido à O transplante de ilhotas é realizado com pâncreas de doador cada-
aplicação repetida de insulina no mesmo local. Esses locais, com as aplica- vérico, que passa por processo de digestão e separação das ilhotas. Es-
ções repetidas, vão se tornando menos dolorosos, pelo desenvolvimento tas (10.000 ilhotas/kg de peso corporal) são injetadas na veia porta e se
de tecido fibroso e ganham a preferência dos pacientes. No entanto, a alojam nos sinusoides hepáticos, nos quais passam a produzir insulina.
absorção de insulina neles pode se tornar errática e imprevisível. A rota- Entretanto, no momento, existem outras técnicas que injetam as ilhotas
tividade dos locais de aplicação pode impedir o desenvolvimento de lipo- no peritônio. Tem sido indicado para pacientes com DM1 há mais de cinco
-hiper/atrofia. Deixando-se de aplicar insulina nesses locais, o excesso de 2
anos, entre 18 e 65 anos, com IMC < 28 kg/m , controle subótimo devido
tecido adiposo pode regredir com o tempo. a hipoglicemias graves assintomáticas, necessidades de insulina abaixo de
0,7 UI/kg/dia e peptídeo C negativo.
Aumento do peso
Os efeitos lipogênicos da insulina associados à diminuição da glicosúria (per-
da de calorias na urina) e a ingestão de carboidratos para correção das hipo- ATENÇÃO!
glicemias são fatores que podem levar ao ganho de peso durante o uso da
insulina. Um programa regular de dieta e de exercícios pode colaborar para A indicação do transplante de ilhotas deve ser precedida da falha dos
evitar esse outro potencial efeito colateral do uso da insulina. Do mesmo outros recursos (controle intensivo com múltiplas doses ou bomba de
modo, uma redução da insulina basal pode provocar períodos com tendência infusão de insulina), pois a relação risco/benefício deve ser avaliada, já
à hipoglicemia, e o aumento do apetite colaborar com a diminuição do peso. que imunossupressão é necessária.
Outros
A hipersensibilidade retardada e as reações alérgicas à insulina são inco- O seguimento de cinco anos de 65 pacientes transplantados mostrou
muns atualmente. Embora a lispro represente uma insulina modificada, que a maioria (aproximadamente 80%) apresentava peptídeo C, mas ape-
não parece ser mais imunogênica do que a humana regular. Entretanto, nas 10% mantiveram independência de insulina exógena. O transplante
têm sido referidos casos de reações alérgicas com essa insulina (mediada de ilhotas tem ação principalmente sobre a instabilidade da glicemia e na
por IgE), as quais, quando moderadas, geralmente são tratadas com anti- prevenção de hipoglicemias graves.
104 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
na. No paciente com perda de peso, as sulfonilureias, as glinidas e insulina com excreção predominantemente renal (80%). Usa-se preferencialmente a
seriam as melhores opções (Figura 16.1). formulação de liberação lenta e progressiva da medicação (gliclazida MR-
comprimidos de 30 mg e 60 mg). A dose recomendada varia de 30 a 120
Sulfonilureias mg uma vez ao dia. As SUs devem ser iniciadas com a dose mínima, sendo
Sulfonilureias (SU) são uma opção eficaz para atingir os alvos glicêmicos, titulada gradualmente de acordo com a monitorização glicêmica.
quando utilizadas isoladamente ou em combinação com outros antidiabé-
ticos orais, sendo a associação com MTF a mais utilizada. Essas medicações Glinidas
têm como ação principal estimular a secreção de insulina pelas células β. A repaglinida e nateglinida são antidiabéticos orais de curta duração que
É importante ressaltar que estas medicações requerem células β funcio- agem de forma semelhante às SUs. São menos eficazes em diminuir a HbA1c
nantes para que possam atuar adequadamente. Promovem uma queda da e a glicemia de jejum, embora tenham algumas vantagens, como melhor
HbA1c ao redor de 1,5 a 2%. O efeito adverso mais comum que limita a controle da glicemia pós-prandial e menos episódios de hipoglicemia grave.
sua utilização é a hipoglicemia, especialmente em diabéticos mais idosos A repaglinida é uma medicação que pode ser indicada em pacientes
e com insuficiência renal (IR), disfunção hepática e aqueles com baixa in- diabéticos idosos com IR, já que é metabolizada no fígado e sua excreção
gestão alimentar. SU como clorpropamida e glibenclamida devem ser evi- é feita 90% por via biliar, com menos de 10% excretados por via renal. As-
tados em diabéticos idosos devido ao risco aumentado de hipoglicemia. sim, a repaglinida é uma opção terapêutica inicial em pacientes idosos com
As sulfas como gliclazida e glipizida são mais apropriadas para pacientes doença renal crônica, principalmente os pacientes que têm contraindicação
idosos. A gliclazida, a sulfonilureia mais utilizada atualmente, é metaboli- ao uso de MTF e SU. A repaglinida deve ser administrada antes das princi-
zada no fígado a metabólitos inativos, com baixo risco de hipoglicemia e pais refeições, e a dose diária varia de 0,5 a 4 mg/dia.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 107
Acarbose ou glinidas ou
Metformina iDPP-4 ou SU
insulina ou ISGLT-2 ou TZD
Opções Subsequentes
Inibidores de alfaglicosidase dose para IR leve a moderada. Os principais efeitos colaterais que restrin-
A acarbose atua inibindo a alfaglicosidase gastrintestinal, que converte gem o seu uso nos diabéticos idosos são retenção hídrica, ganho de peso,
o amido e outros hidratos de carbono complexos em monossacarídeos, além da incidência aumentada de fraturas e, possivelmente, câncer de be-
retardando assim a absorção de glicose, o que resulta em um aumento xiga. É contraindicado em pacientes com insuficiência cardíaca funcional
lento nas concentrações de glicemia pós-prandial. Estes fármacos podem classe III e IV e em pacientes com osteoporose.
ser utilizados isoladamente, ou em combinação com insulina ou outros Inibidores da DPP-4
agentes orais. A acarbose se mostra eficaz para pacientes idosos, prin-
Os iDPP-4 aumentam a ação do GLP-1 e GIP endógeno por bloqueio da sua
cipalmente aqueles com alto risco de hipoglicemia. Os principais efeitos
degradação. Esta classe de medicamentos parece ter muitas vantagens
colaterais que limitam seu uso são flatulência e diarreia, que são muito
sobre as SU em pacientes diabéticos idosos. Os IDPP-4 podem ser atraen-
comuns. Sendo assim, preconiza-se iniciar a medicação com baixas doses. tes para utilização nesses pacientes, já que não provocam hipoglicemia,
devido ao seu mecanismo de ação de liberação de insulina glicose depen-
Glitazona dente, e não aumentam o peso corporal. Os pacientes idosos apresentam
Ao se ligar aos receptores PPAR-gama, a glitazona (TZD) melhora a sensi- níveis de cortisol e GH menores que os adultos não idosos, havendo um
bilidade periférica à insulina no músculo e tecido adiposo. Essa classe de aumento compensatório do glucagon, o que explica uma queda de HbA1c
medicamentos está representada atualmente pela pioglitazona, que não mais acentuada no paciente idoso quando comparado com o diabético
aumenta o risco de hipoglicemia e tem ação mais duradoura no controle não idoso. Os iDPP-4 são moderadamente eficazes como monoterapia, ou
glicêmico, quando comparada com SU e MTF. Está disponível em compri- quando usados em combinação com a MTF, SU ou TZD. Em geral, ocorre
midos de 15, 30 e 45 mg, em dose única diária. Não é necessário ajuste da uma diminuição de HbA1c ao redor de 0,5 a 0,8%.
108 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
quência, surgimento de condição patológica que torna insuficiente a dose tão presentes em graus variados, como mucosas secas, perda de turgor da
de insulina utilizada, com destaque para as infecções. pele, taquicardia e hipotensão. O estado de consciência pode estar altera-
Apesar de ser situação muito mais frequente no diabetes tipo 1 (in- do, com obnubilação e coma podendo ocorrer em virtude da osmolaridade
clusive como quadro inaugural de diagnóstico da doença em até cerca de plasmática, sendo portanto mais frequentes na EHH. Sintomas neurológi-
30% dos casos), pode também ocorrer mais raramente em diabéticos tipo cos focais ou mesmo crise convulsiva podem estar presentes. A temperatu-
2. Em pacientes com diabetes diagnosticado, o risco é de 1 a 10%/paciente/ ra corporal pode estar normal ou baixa, mesmo se um quadro infeccioso for
ano, sendo maior naqueles com controle inadequado, episódios prévios de o fator precipitante. A hipertermia sugere fortemente infecção.
CAD e no período peripuberal. Não é possível o reconhecimento da causa
da CAD em cerca de 40% dos casos. O período de duração dos sintomas DIAGNÓSTICO
que precedem a CAD (ou o coma diabético) pode ser muito variável, desde O diagnóstico de CAD é confirmado pela presença de glicemia elevada,
horas (como nos casos de diabetes tipo 1) até dias (como nos de tipo 2). frequentemente acima de 250 mg/dL, podendo atingir níveis bem mais ele-
São fatores precipitantes/de risco para CAD e EHH: vados, presença em grande concentração de corpos cetônicos no sangue
infecções de qualquer natureza, principalmente as urinárias e as (cetonemia) com acidose e na urina (cetonúria). Sempre há aumento da os-
IVAS; molaridade sérica, e o pH do sangue arterial é baixo (< 7,3), podendo, em
distúrbios vasculares, tanto AVC como infarto do miocárdio; casos mais raros, ser inferior a 7, com redução dos níveis de bicarbonato,
uso de medicamentos, principalmente corticosteroides; geralmente abaixo de 15 mEq/L. O acúmulo de ácidos cetônicos gera aci-
problemas com BIICS, gerando interrupção da infusão; dose metabólica com ânion gap aumentado (> 7 a 9 mEq/L). É importante
pacientes idosos, sobretudo os institucionalizados, com ou sem salientar que na prática clínica esses critérios não devem ser observados ri-
diagnóstico prévio de DM, sem condições de ingerir líquidos para gidamente para instituir o tratamento ou nortear condutas, pois alguns pa-
correção da desidratação. cientes podem apresentar quadros incompletos, como cetonemia e apenas
Além dos fatores predisponentes clássicos, o uso de inibidores de discreta acidose metabólica sem hiperglicemia muito elevada. Em relação ao
SGLT2 no tratamento de pacientes com diabetes tipo 2 e insulinopenia diagnóstico diferencial (quando a história clínica é fundamental), é preciso
grave tem sido associado na literatura ao desencadeamento de CAD. Ape- lembrar da cetoacidose alcoólica, cujos níveis de glicose podem estar baixos
sar desse achado ainda precisar de confirmação por estudos prospectivos, (geralmente menores do que 250 mg/dL), em um indivíduo com histórico de
deve-se tomar especial cuidado devido à possibilidade da ocorrência de ingestão alcoólica. Outra causa de acidose que deve ser citada é a acido-
CAD normoglicêmica, que pode potencialmente mascarar o diagnóstico e se láctica, em que o lactato sérico está aumentado (em geral, acima de 5
atrasar a instituição de medidas terapêuticas. mmol/L). Ainda, deve-se lembrar da cetoacidose secundária à inanição (ou
A falta relativa ou absoluta de insulina traz como principais proble- privação alimentar), quando a concentração de bicarbonato sérico raramente
mas metabólicos os distúrbios dos metabolismos de hidratos de carbono é menor do que 18 mEq/L, caracterizando acidose leve com glicose normal.
e de lipídeos.
Metabolismo dos carboidratos: a falta de insulina diminui a utili- TRATAMENTO
zação de glicose pelos tecidos, ao mesmo tempo em que aumenta a
Está consagrado o esquema de tratamento da CAD e do EHH com peque-
neoglicogênese hepática. A hiperglicemia resultante, pela glicosú-
nas doses de insulina e tratamento da desidratação.
ria que produz, gera diurese osmótica. Se, por um lado, pela perda
de água, esta provoca desidratação e hemoconcentração (como Insulinoterapia
consequência pode levar à hipotensão, choque e coma), por outro, O tratamento insulínico para a CAD e o EHH é essencialmente o mesmo.
instala perda acentuada de eletrólitos (cloreto de sódio, potássio, A via preferencial de administração é a endovenosa (EV), por seu rápido
magnésio e cálcio). início de ação. Entretanto, na ausência de recursos adequados ou pessoal
Metabolismo de lipídeos: na CAD, a falta de insulina e o aumen- treinado (já que não existem diferenças nas taxas de morbimortalidade),
to de hormônios contrarregulatórios (catecolaminas, cortisol, glu- é possível empregar a via IM, mais rápida e preferível em relação à SC.
cagon, GH) aumentam a lipólise, com liberação de ácidos graxos Apenas em casos mais leves (ou em protocolos com uso de análogos de
não esterificados do tecido adiposo para a circulação. No fígado, insulina de ação rápida) é que a via SC também pode ser aceita, como de-
esses ácidos graxos são parcialmente oxidados para os corpos ce- talhado a seguir. A insulina de escolha é a regular, pela ampla experiência
tônicos (acetona, ácido betahidroxibutírico e ácido acetoacético), com seu uso e por estar disponível na maior parte dos hospitais. Mais re-
provocando acidose sanguínea em graus variados com cetonúria. centemente, alguns protocolos empregam os análogos de insulina de ação
Tanto a hiperventilação como os vômitos decorrentes (com perda rápida (ver a seguir).
de água, sódio, potássio e cloro) contribuem para o colapso car- Via IM (ou SC) – inicia-se com dose de ataque (bólus) de insulina
diocirculatório (choque), que fatalmente ocorrerá caso medidas regular (0,15 a 0,3 UI/kg ou de 10 a 20 UI). A seguir, 0,1 UI/kg/hora,
terapêuticas adequadas não sejam instituídas a tempo. No EHH, até que a glicemia chegue de 200 a 250 mg/dL (cerca de 300 mg/dL
há insulinopenia relativa, diferentemente da CAD. Acredita-se que na EHH). Nesse momento, é possível reduzir a dose de insulina para
a pequena quantidade de insulina presente nos pacientes com EHH cerca de metade, quando será adicionada ao esquema de hidrata-
seja suficiente para impedir a formação de corpos cetônicos, mes- ção a solução com glicose a 5 ou 10%, com objetivo de manter a
mo que insuficiente para diminuir significativamente a glicemia. glicemia de 150 a 200 mg/dL na CAD (250 até 300 mg/dL no EHH).
Em crianças, a dose é de 0,1 UI/ kg/hora (sem o uso de bólus), ini-
QUADRO CLÍNICO ciada após o recebimento de uma expansão de volume inicial (cer-
Em geral, a CAD instala-se rapidamente (~ 24 horas), ao passo que o EHH é ca de 1 a 2 horas após o início da hidratação). Nos casos de CAD
mais insidioso, com história de sintomas osmóticos e mesmo perda de peso em que não haja queda de pelo menos 50 mg/dL nas primeiras
por dias. A dor abdominal é frequente, configurando diagnóstico diferen- duas horas, deve-se dobrar a dose de insulina e rever a hidratação.
cial com abdome agudo. É preciso lembrar que alguns quadros abdominais, Via IV – dose de ataque com insulina regular de 0,15 UI/kg ou 10 UI
como pancreatite e apendicite, podem ser os fatores desencadeantes da seguida de infusão contínua de 0,1 UI/kg/hora. Quando a glicemia
CAD. A acidose leva à respiração de Kussmaul (rápida e profunda). É co- estiver entre 200 e 250 mg/dL (cerca de 300 mg/dL no EHH), a dose
mum o hálito cetônico devido à presença das cetonas voláteis, com odor pode ser reduzida para 0,05 UI/kg/hora. Nessa etapa, será adiciona-
típico de maçã podre ou removedor de esmalte. Sinais de desidratação es- da a solução com glicose a 5 ou 10%, com objetivo de manter a glice-
110 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
mia entre 150 e 200 mg/dL na CAD (250 até 300 mg/dL no EHH). Em locidade de infusão deve ser de cerca de 20 a 30 mEq/L de soro infundido
crianças, a dose inicial deve ser de 0,1 UI/kg/hora (sem o uso de bó- para manter os níveis entre 4 e 5 mEq/L, não excedendo 40 mEq/L na
lus), que deve ser iniciada após a criança ter recebido uma expansão primeira hora.
de volume inicial (cerca de 1 a 2 horas após o início da hidratação),
seguida por infusão contínua, preferencialmente sem exceder 3 UI/h. Bicarbonato de sódio
Os análogos de insulina de ação rápida (lispro e aspart) têm sido usa- A acidose é corrigida com a insulina e a hidratação. Assim, na prática, não
dos por alguns autores. Um esquema proposto para seu emprego é o de existe vantagem no uso de bicarbonato, a não ser na vigência de hiper-
dose via SC de ataque de 0,2 UI/kg seguida de 0,1 UI/kg/hora ou 0,3 UI/ calemia importante. Em razão dos sérios riscos de hipocalemia, alcalose
kg seguida de 0,2 UI/kg a cada duas horas. Quando a glicemia chegar a metabólica e queda do pH do líquido cerebrospinal (LCS), raramente, usa-
valores menores do que 200 mg/dL, diminui-se a dose para 0,05 UI/kg ou -se o bicarbonato nesses pacientes. Apenas quando o pH é menor do que
0,1 UI/kg a cada 1 a 2 horas, respectivamente, até a resolução do quadro. 7,0 ou quando há arritmia cardíaca, hipotensão ou choque, lança-se mão
Logo que o paciente estiver consciente e hidratado, e tiver obtido a dessa substância e, mesmo assim, em pequenas doses. Nessas situações,
normalização da acidose, deve-se alimentá-lo (dieta leve) e administrar recomenda-se o uso de solução de bicarbonato de sódio na dose de 50
uma dose (10 a 15 unidades) de insulina NPH (ou outra de ação basal), mEq, administrados durante 1 a 2 horas.
para que não se perpetue a acidose ou ocorra acidose de jejum posterior-
Cuidados gerais
mente. Mantém-se a infusão endovenosa (EV) por cerca de duas horas
após a aplicação de insulina SC para esperar seus efeitos e, em seguida, A presença permanente de médico e enfermeira à disposição do paciente
descontinuá-la. Pode-se considerar que a cetoacidose foi controlada quan- é importante. Nos idosos, pode ser útil a instalação de dispositivo para
do o pH estiver > 7,3, e o bicarbonato > 18 mEq/L. medida da pressão venosa central, para melhor controle da hidratação.
Sonda nasogástrica é útil nos que apresentam vômito. A cateterização ure-
Hidratação e reposição de eletrólitos tral só deve ser utilizada quando o nível de consciência está muito baixo.
É fundamental a rápida e adequada reposição de líquidos. A menos que Logo que o controle voluntário das micções seja possível, retira-se a sonda
a concentração plasmática de sódio esteja acima de 145 mEq/L, deve-se para evitar infecção urinária. Sempre que possível, dosar no início: glicose,
usar solução isotônica para, evitando-se rápida queda na osmolaridade, cetonúria, cetonemia, osmolaridade sérica, pH e pCO2 do sangue venoso
prevenir o edema cerebral. Infundem-se 1.000 a 1.500 mL de SF na primei- ou arterial (a critério clínico), bicarbonato plasmático, ureia, sódio e potás-
ra hora (eventualmente, a critério clínico, repetir essa infusão nas quatro sio no soro. Repetir, se viável, a cada duas horas.
primeiras horas); a seguir, 500 a 1.000 mL por hora até que a reidratação É possível simplificar esses esquemas sem que se perca muito em
se complete, o que pode ser avaliado pelo aspecto da pele e das muco- acuidade e segurança. Assim, pode-se fazer adequado controle com:
sas, frequência cardíaca (FC), pressão arterial (PA), diurese e mesmo pela fitas diagnósticas lidas com seus respectivos glicosímetros a cada
pressão venosa central. Em indivíduos idosos, com disfunção cardíaca e/ hora, inicialmente, e, depois, em tempos maiores (ponta de dedo
ou renal e em crianças, a hidratação deve ser feita com critério para evitar ou glicemia capilar);
sobrecarga de volume. Existe discussão sobre o momento e a necessidade cetonúria: com tiras diagnósticas;
de mudança da SF normal para a SF a 0,45%. cetonemia: alguns glicosímetros fazem também a leitura da ceto-
Em crianças em grave desidratação, pode-se iniciar com 10 a nemia capilar.
20 mL/kg/hora na primeira hora, geralmente não excedendo 50 mL/kg du- A osmolaridade efetiva pode ser calculada pela fórmula:
rante as primeiras quatro horas de tratamento. A velocidade de reposição Osmolaridade = 2 × (Na) + (K) + glicemia (mg/dL) /18
hídrica nesse grupo de pacientes é calculada de modo que o déficit de
líquidos seja reposto em 48 horas. Nesses pacientes, o risco de hidrata- Sempre que possível, deve-se proceder ao rápido tratamento da
ção excessiva e de edema cerebral é maior; desse modo, assim que eles causa precipitante da cetoacidose. O encontro de leucocitose na admis-
3
cessarem o vômito e tiverem bom nível de consciência, pode-se optar por são com valores entre 10.000 e 15.000 mm é comum na CAD e não é,
hidratação VO. Deve-se lembrar que, quando a glicemia chegar próximo a priori, necessariamente indicativo de infecção. Entretanto, leucocitose
3
de 250 mg/dL, acrescenta-se ao esquema de hidratação soro glicosado a 5 com valores > 25.000 m pode sugerir infecção e necessita de investiga-
ou 10%, objetivando manter a glicemia entre 150 e 200 mg/dL na CAD (va- ção. A leucocitose da CAD é atribuída ao estresse e aos níveis elevados
lores maiores no EHH, como 250 a 300 mg/dL). A administração de solução de cortisol e norepinefrina. Se identificada a causa, deve-se propor anti-
glicosada permite a manutenção da infusão (ou aplicação) de insulina para bioticoterapia segundo as condutas estabelecidas. Todavia, na suspeita
correta correção da cetonemia, evitando uma brusca redução da osmolari- de quadro infeccioso não identificado (p. ex.: origem de quadro febril
dade plasmática, o que pode se associar a edema cerebral, sobretudo em grave não identificado), antibióticos de amplo espectro devem ser inicia-
grupos de maior risco, como crianças. dos logo depois de coletados os exames basais, incluindo culturas de uri-
na e sangue. A manutenção de descompensação metabólica por muitas
Potássio horas, por não haver combate às suas causas, pode ser fatal. Deve-se ter
O aumento da glicemia e da osmolaridade promove deslocamento do um cuidado especial em relação ao edema cerebral em crianças, quando
potássio do espaço intracelular para o intravascular, resultando em do- o quadro clínico pode não ser tão evidente. Com o paciente consciente e
sagem normal ou mesmo aumentada. Além disso, a falta de insulina e a se alimentando, deve-se instituir o regime de insulinização plena (cerca
acidose potencializam esse comportamento. Assim, existe uma grande de 0,6 UI/kg/dia), segundo algum esquema, como NPH (2 a 3 aplicações/
depleção do potássio corporal, que pode ser acentuada por poliúria e vô- dia) + insulina rápida ou análogo rápido antes das refeições. Inúmeros
mitos. A perda só será totalmente recuperada após alguns dias. Contudo, esquemas são possíveis em virtude do perfil e das necessidades do pa-
ao se iniciar o tratamento, conforme melhora o estado de cetoacidose, ciente. Naqueles que já usavam esquema de insulina prévio ao episódio
o potássio extracelular tende a cair devido ao retorno desse íon para de CAD, pode-se propor sua continuidade. A prevenção de novos episó-
o espaço intracelular. Nos raros casos em que os valores iniciais já são dios de descompensação precisa ser priorizada com medidas educativas
menores do que 3,3 mEq/L, deve-se proceder à reposição imediata, e e suporte ao paciente, que deve ser orientado a monitorar as taxas, ter
somente após iniciar a insulinoterapia. Nos demais casos (maior parte), a percepção de sinais de alerta, como febre, e manter sempre hidrata-
recomenda-se que a reposição de potássio seja iniciada quando os níveis ção adequada, além de não omitir a aplicação de insulina sem indicação
estiverem abaixo de 5,5 mEq/L, na presença de diurese adequada. A ve- médica.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 111
Estado hiperglicêmico hiperosmolar ou coma complexa. No caso de pacientes inconscientes, ou apresentando convulsão, o
hiperglicêmico hiperosmolar não cetótico emprego de glucagon IM (ou SC) na dose de 1 mg é o tratamento de escolha.
O tratamento do EHH é semelhante ao recomendado para a CAD. Nes- Nos pacientes hospitalares, com inconsciência ou conscientes, porém impos-
sa condição, a ação residual da insulina previne a lipólise e a acidose sibilitados de ingestão oral (jejum devido à cirurgia, vômitos), administram-se
metabólica, levando a uma evolução mais lenta, com hiperglicemia (fre- 30 mL de glicose a 50% via EV. Assim que o paciente recuperar as condições
quentemente > 600 mg/dL) e desidratação mais graves. No quadro clí- clínicas, como estado de consciência, ofertar dieta oral. Independentemente
nico, náuseas, vômitos e dor abdominal são incomuns. A osmolaridade da gravidade do episódio, é sempre importante tentar identificar a sua causa,
é > 320 mOsm/kg com ânion gap < 12, bicarbonato > 15 mEq/L e pH começando pelo interrogatório alimentar, exercícios físicos e uso das medi-
cações e suas doses (principais causas). A adoção de medidas educacionais
> 7,3. No início do tratamento da desidratação, é possível infundir 1 a
preventivas é a estratégia mais importante para a maior parte dos pacientes.
1,5 L de solução isotônica a 0,9%. Contudo, pelas próprias características
desses casos (hiperosmolaridade com grande perda de líquidos, ausência
de acidose e de cetonúria, com hipernatremia), a hidratação a seguir pode
REVISÃO
ser feita com SFs hipotônicas (0,45% – portanto, diluídas ao meio) – 500
a 1.000 mL/hora – até que a osmolaridade plasmática chegue a níveis O diabetes pode causar graves complicações agudas, como a cetoa-
normais; daí em diante, a hidratação será feita com SF. Considera-se o cidose diabética (CAD), o estado hiperglicêmico hiperosmolar (EHH)
controle do quadro quando a osmolaridade plasmática chega a valores e a hipoglicemia.
< 315 mOsm/kg com recuperação do nível de consciência. No EHH, pode- A CAD é caracterizada por hiperglicemia, acidose metabólica e au-
-se iniciar a infusão com solução glicosada (5 ou 10%), quando as taxas mento de corpos cetônicos; o EHH apresenta hiperglicemia grave,
chegam a valores perto de 300 mg/dL. Esses pacientes geralmente reque- hiperosmolaridade e desidratação na ausência de acidose; e a hipo-
rem mais tempo para controle e, como consequência, recebem, ao final, glicemia ocorre quando houver glicemia < 70 mg/dL.
maiores quantidades de insulina e de líquidos. O tratamento consagrado de CAD e EHH se baseia no emprego de pe-
quenas doses de insulina e hidratação; já na hipoglicemia, além da cor-
reção do quadro agudo com carboidratos VO, glicose EV ou glucagon
ATENÇÃO! IM ou SC, medidas educacionais preventivas são fundamentais.
Sempre que possível, deve-se identificar a causa da descompensação.
Assim que o paciente estiver em condições clínicas, oferecer dieta para
não ocorrer cetose de jejum. Na alta, deixá-lo em esquema de insuli- ■■ LEITURAS SUGERIDAS
nização adequado. Kitabchi AE, Umpierrez GE, Miles JM, Fisher JN. Hyperglycemic crises in adult
patients with diabetes. Diabetes Care. 2009;32(7):1335-43.
Oliveira CSV, Reis AF. Cetoacidose e estado hiperosmolar hiperglicêmico
■■ HIPOGLICEMIA (EHH). In: Chacra AR, Schor N, editores. Guias de medicina ambulatorial e
hospitalar da Unifesp – EPM. São Paulo: Manole; 2009. p. 363-376.
Complicação aguda mais comum do diabetes, pode ser definida como gli-
Moisés RCMS, Abrahão GCP, Vendramini MF, Sá JR, Giuffrida FMA, Chacra AR, et
cemia < 70 mg/dL. Seu risco é maior em indivíduos idosos, com controle al. Diabetes melito. In: Lopes AC, editor. Tratado de clínica médica. 3. ed.
metabólico muito rigoroso e naqueles com diabetes de longa duração. São Paulo: Roca; 2016.
QUADRO CLÍNICO
Os sintomas podem surgir com intensidades variáveis, como: fome, diplo-
pia, sonolência, palidez, sudorese fria, tremores, taquicardia, agitação,
mudança de comportamento até convulsões e perda de consciência. 16.7 COMPLICAÇÕES CRÔNICAS
ETIOLOGIA E DIAGNÓSTICO ■■ SERGIO ATALA DIB
Decorre geralmente de erro alimentar ou do uso das medicações (princi- ■■ LUIZ CLEMENTE S. P. ROLIM
palmente insulina, mas também de hipoglicemiantes orais como as sul-
fonilureias). Além das causas de hipoglicemia inerentes ao tratamento, ■■ JOÃO ROBERTO DE SÁ
devem ser investigadas outras condições que podem cursar com hipogli-
cemia no diabetes, como hipotiroidismo, insuficiências suprarrenal (IS) e
hepática (IH) e, sobretudo, insuficiência renal (IR). ■■ FISIOPATOLOGIA
As alterações na homeostase decorrentes do diabetes melito (DM) resul-
ATENÇÃO! tam no desenvolvimento de um “meio” que inclui várias combinações de
alterações metabólicas, hormonais e fisiopatológicas, denominado meio
A identificação da causa da hipoglicemia é muito importante para es- diabético. Entre essas alterações, estão a hiper/hipoinsulinemia, a hipergli-
tabelecer correções necessárias. Quando possível, registrar a hipogli- cemia, a hiperlipidemia, as modificações no fluxo e na coagulação sanguí-
cemia com emprego de glicosímetros. nea e a formação de produtos de glicação que, no conjunto, caracterizam
a exposição ao DM. Em consequência a essa exposição, podem ocorrer
diversas alterações funcionais e morfológicas que levam às complicações
TRATAMENTO crônicas da doença. Uma hipótese unificadora para o desenvolvimento
Depende do nível de consciência do paciente. No paciente vigil, devem ser dessas complicações crônicas refere que, no paciente hiperglicêmico, há
administrados 15 g de carboidrato de absorção rápida (p. ex.: duas colhe- diminuição da nicotinamida adenina dinucleotidio fosfato (NADPH, do in-
res de sopa de açúcar diluídas em água), checando-se a glicemia capilar a glês nicotinamide adenine dinucleotide phosphate) e aumento do sorbitol,
cada 15 minutos e repetindo o ciclo até que sejam atingidos valores acima que é oxidado à frutose pela sorbitol desidrogenase, levando ao aumento
de 70 mg/dL. Após atingir esse nível, pode-se oferecer uma dieta sólida mais do poliol, que não apresenta fácil difusão pelas membranas celulares. Isso
112 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
provoca estresse osmótico, diminuição da atividade da Na+/K+/ATPase, brovascular, coronarianas e periféricas), e microangiopatias, que abran-
aumento citosólico do NADH/NAD e redução do NADPH. gem a retinopatia, a nefropatia e a neuropatia. Do ponto de vista clínico,
A ativação da proteína C cinase (CPK, do inglês C kinase protein) leva as complicações crônicas do DM podem ser divididas em oftalmológicas,
ao aumento da atividade da fosfolipase A2, com elevação de dois inibidores nefropáticas, neuropáticas e cardiovasculares (Quadro 16.13).1
+ +
da Na /K /ATPase, o ácido araquidônico e a prostaglandina E2. A formação
dos produtos finais da glicação (AGEs, do inglês advanced glycation end) ■■ RETINOPATIA DIABÉTICA
decorre de reação não enzimática, e a hiperglicemia intracelular é o evento
A retinopatia diabética (RD) é uma complicação microvascular específi-
primário. Os AGEs são produzidos por auto-oxidação de glicose para glioxal,
ca do DM cuja prevalência está fortemente correlacionada à duração da
decomposição de produtos de Amadori e fragmentação do gliceraldeído-3-
doença. Além desse elemento, outros fatores que aumentam o risco de
-fosfato em metilglioxal. A reação de dicarbonil intracelulares com grupos
desenvolvimento da RD são a hiperglicemia crônica, a hipertensão arterial,
aminas de proteínas intra e extracelulares forma os AGEs. A produção de
a nefropatia e a gestação. No caso da gestação, essa piora é transitória,
precursores dos AGEs pode induzir lesões por modificações das proprieda-
não havendo diferença entre pacientes que passaram ou não por gesta-
des de proteínas com alterações em suas funções, como a elasticidade dos
ções após algum tempo de seguimento. Estima-se que a retinopatia seja a
vasos. Outra via potencial de lesão seria pela ligação de proteínas modifi-
principal causa de novos casos de cegueira na população de 20 a 74 anos.
cadas com os receptores dos AGEs (RAGEs) em células endoteliais, mesan-
Glaucoma, catarata e outras alterações oculares podem ser mais frequen-
giais e macrófagos, com aumento de espécies reativas de oxigênio (ROS, do
tes e mais precoces nos pacientes com DM.
inglês reactive oxygen species) e ativação de fatores de transcrição nuclear,
Grandes estudos prospectivos demonstraram a importância do con-
como NFKB, citocinas (como TNF-α), fatores de crescimento (como TGF-β)
trole intensivo da glicemia, da pressão arterial e da dislipidemia na pre-
e maior expressão de procoagulantes e proinflamatórios pelas células en-
venção primária e secundária da RD.
doteliais. Além disso, ocorre aumento do diacilglicerol (DAG), um mensa-
geiro lipídico que provoca a ativação da CPK. Com isso, ocorrem alterações
do fluxo sanguíneo devido à redução da produção do NO, além de maior DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
expressão de TGF-β, fibronectina, PAI-1 (do inglês plasminogen activator As recomendações atuais são de que todos os DM1 com início após a
inhibitor-1) e VEGF (do inglês vascular endothelial growth fator). O excesso puberdade e os DM2 devem ter uma avaliação oftalmológica inicial com
de glicose intracelular produz maior formação da UDP-N acetilglicosamina midríase por um oftalmologista ou optometrista. Não havendo alterações
(UDPGIc-Nac), doadora de N-acetilglicosamina e que, ao se ligar a algumas nos exames anuais seguintes, o intervalo pode ser estendido para cada
proteínas, provoca alteração de sua função, como o aumento do PAI-1. A 2 a 3 anos. Em virtude da RD demorar pelo menos cinco anos para se
ativação da via hexosamina também está relacionada à maior oxidação da desenvolver após o início da hiperglicemia, pacientes com DM1 deveriam
enzima eNOS, fator contribuidor para a gênese das complicações. iniciar a avaliação da retina sob midríase após cinco anos do diagnóstico.
O aumento da atividade da aldose redutase, dos AGEs, da ativação da Apesar dessas recomendações, costuma-se solicitar também um exame
CPK e da via das hexosaminas não leva de imediato à parada na evolução oftalmológico inicial para as crianças com DM1, pois o encontro de altera-
das complicações crônicas com a normalização da glicemia, mecanismo ções, como a atrofia óptica, associado a outros dados da história clínica e
conhecido como “memória metabólica” ou “hiperglicêmica”. A alteração de exames laboratoriais, pode colaborar no diagnóstico etiológico do DM.
central nesses quatro processos seria o aumento da produção de superó- Pacientes com diabetes preexistente e que estão planejando engra-
xido pela cadeia de transporte de elétrons da mitocôndria, induzida pela vidar ou que engravidaram devem receber uma avaliação cuidadosa do
hiperglicemia. A oxidação intracelular da glicose propicia energia para a fundo de olho e ser orientadas com relação ao possível desenvolvimento
produção do ATP na fosforilação oxidativa por meio da cadeia de trans- ou piora transitória da RD. A avaliação do fundo de olho deve ser realizada
porte de elétrons. A modulação, ou seja, a forma de manter constante a durante o 1º trimestre da gestação, e o seguimento ser cuidadoso até o
produção de calor,é feita por proteínas desacopladoras, as UPC. Assim, final da gestação e um ano pós-parto.
em vigência de hiperglicemia, a inibição da produção de superóxido por Outras situações que devem ter um seguimento cuidadoso das altera-
aumento de UCP ou de SOD previne o aumento de ativação da via do ções na retina são hipertensão arterial, hemodiálise e coagulopatias. Entre-
sorbitol, o aumento intracelular da formação dos AGEs e a ativação da CPK tanto, a RD não é contraindicação ao uso do AAS para cardioproteção, pois
e da via da hexosamina, sugerindo que o aumento do ROS é o mecanismo essa terapia não aumenta o risco de hemorragia retiniana.
unificador na patogenia das complicações crônicas. Fotografias do fundo de olho de alta qualidade podem detectar a
maioria das retinopatias diabéticas clinicamente significativas, quando
interpretadas por profissional treinado. A fotografia retiniana, obtida
■■ CLASSIFICAÇÃO por meio de retinógrafos, com leitura remota por experts tem um grande
Na classificação atual, as complicações crônicas do DM são divididas em potencial em suprir as necessidades de regiões sem disponibilidade de
macroangiopatias, que compreendem as doenças cardiovasculares (cere- oftalmologistas.
3 Microalbuminúria, nefropatia incipiente Após 6-15 anos* Maior espessamento da MB e expansão mesangial
Controle glicêmico Pacientes jovens, bem informados, sem sinais ou sintomas de macroangiopatia: HbA1c < 6,5-7%
Pacientes idosos, com insuficiência renal avançada, doença cardiovascular: HbA1c: 7,5-8,5%
Sobrepeso e obesidade Controle para manter IMC < 25 kg/m2
Tabagismo Suspender
Exercícios Mínimo de 30 minutos 3 x/semana
Pressão arterial DM1 e DM2: PAS entre
120-130 mmHg
Albuminúria Iniciar o tratamento nos pacientes com albuminúria > 30 mg/dia persistente. Naqueles pacientes com proteinúria, o
objetivo é mantê-la inferior a 0,5 g/dia.
Intervenções:
1 | Restrição de sódio na dieta (< 1,5-2 g/dia)
2 | Iniciar bloqueio do SRAA com IECA ou antagonista do receptor de angiotensina 2
3 | Quando necessário: tiazídico (monitorar efeitos metabólicos, como dislipidemia e hiperglicemia) ou diuréticos de alça
4 | Quando o objetivo da proteinúria não for atingido: acrescentar bloqueador do receptor de aldosterona (monitoração do
potássio)
5 | Quando o objetivo da pressão arterial não for atingido: acrescentar bloqueador dos canais de cálcio, betabloqueadores
ou alfabloqueadores
2
Dislipidemia Colesterol total < 200 mg/dL. Quando RFG < 15 mL/min/1,73 m , avaliar os riscos e benefícios
SRAA: sistema renina-angiotensina-aldosterona.
Fonte: Adaptado de Waanders e colaboradores.4
DIAGNÓSTICO Nos pacientes com neuropatia diabética grave ou atípica, outras cau-
Recomenda-se que a pesquisa da neuropatia diabética seja realizada pelo sas, além da neuropatia diabética, devem ser consideradas. No Quadro
menos uma vez por ano nos pacientes com DM independentemente das 16.20, são listadas as principais causas no diagnóstico diferencial da poli-
queixas clínicas. A história e o exame clínico-neurológico sistemático e cui- neuropatia diabética (PNPD).
dadoso são fundamentais para sua detecção. Na grande maioria dos ca-
sos, não há necessidade de técnicas sofisticadas ou exames subsidiários, QUADRO 16.20 ■ Diagnóstico diferencial da polineuropatia diabética
como a eletroneuromiografia e os exames de imagem.
1 | Hipo ou hipertiroidismo
Polineuropatia simétrica distal 2 | Deficiência de vitamina B12 (especialmente DM1 e DM2 em uso
Os sintomas variam de acordo com a classe de fibras neurológicas envol- prolongado de metformina)
vidas. As fibras curtas (finas) são as mais frequentemente comprometidas, 3 | Hepatite infecciosa aguda
levando a sintomas como, dor, parestesias (adormecimento), disestesias 4 | Neoplasias
(sensação dolorosa). Deve-se distinguir a dor neuropática (piora à noite, 5 | Insuficiência renal crônica
melhora com atividade física, do tipo parestesia ou disestesia) da dor no- 6 | Estenose espinal e outras mielopatias
ciceptiva, como claudicação intermitente (vascular) e problemas ortopé- 7 | Drogas e medicamentos neurotóxicos: álcool, amiodarona,
dicos (metatarsalgia, calcaneodinia) ou reumatológicos (artralgias). As metronidazol, nitrofurantoína, hidantal, piridoxina (em doses acima de
mononeurites apresentam um início súbito e geralmente comprometem 250 mg/d), estatinas (raro), tacrolimo e cloroquina
um nervo (mas pode ser mais de um), sendo os principais o III, VI e VII 8 | Heredopolineuropatias: Charcot-Marie, Doença de Fabry e amiloidose
pares cranianos, e as mononeuropatias compressivas acometem os nervos familiar primária
mediano, ulnar, cubital e tibial posterior periféricos. As mononeurites não 9 | Vasculites
são progressivas e podem involuir espontaneamente, as compressivas são 10 | Neurinoma de Morton
crônicas e necessitam de tratamento com órteses (imobilização), diuréti- 11 | Outras (fasciite plantar e fibromialgia)
cos, infiltração com anti-inflamatórios e analgésicos e, mais raramente,
descompressão cirúrgica. Os sinais e sintomas da neuropatia autonômica diabética devem ser
É importante aliar as queixas (sintomas) dos pacientes aos dados do pesquisados por meio de história clínica e exame físico cuidadosos.
exame clínico, que deve consistir na avaliação das sensibilidades: Os principais sinais e sintomas que sugerem a presença de neuropatia
1 | vibratória (utilizando o diapasão de 128 Hz); alternativamente pode-se autonômica diabética são: taquicardia de repouso (FC > 100 bpm); intole-
utilizar o biotensiômetro (índice preditivo para úlcera); 0-15 V (baixo); 16- rância a exercício; hipotensão ortostática; períodos alternados de diarreia
25 V (intermediário) e > 25 V [alto risco (x 7)]; e de constipação intestinal; empachamento epigástrico (gastroparesia);
2 | dolorosa (palito com ponta fina); disfunção erétil; disfunção sudomotora (sudorese noturna ou gustatória);
3 | tátil (monofilamento de 10 g); comprometimento do controle neurovascular; e alterações na contrarregu-
4 | térmica (tubo de ensaio resfriado e morno) e dos reflexos tendinosos lação à hipoglicemia.
(Aquíleo e Patelar), durante o exame clínico geral.
Na prática, para o diagnóstico de PNP diabética, são necessárias duas Neuropatia autonômica cardiovascular
condições: haver pelo menos dois testes alterados entre os descritos; e A neuropatia autonômica cardiovascular (NAC)* é a mais estudada e cli-
serem afastadas as demais causas de neuropatia periférica. Em rotina, nicamente mais importante, por representar um risco de mortalidade
pode-se utilizar o Escore de Comprometimento Neuropático (ECN ou NDS, independentemente de outros fatores de risco cardiovasculares, evolui
do inglês neuropathy disability score), validado tanto para o DM1 quanto por muito tempo assintomática e pode ser detectada por alterações na
para o DM2 e apresentado no Quadro 16.19. variabilidade da FC e anormalidade nos testes de reflexo cardiovasculares.
Nos últimos anos, tornou-se factível a detecção mais precoce da
disfunção autonômica graças ao estudo da variabilidade da frequência
QUADRO 16.19 ■ Escore de comprometimento neuropático cardíaca (VFC) por análise espectral. Essa tecnologia atual utiliza um al-
goritmo matemático (transformação rápida de Fourier) para transformar
PÉ PÉ um sinal biológico complexo, como é o caso da VFC (resultado do balanço
DIREITO ESQUERDO simpático e vagal no nó sinusal), em seus componentes causadores, apre-
sentando-os segundo a frequência com que alteram a frequência cardíaca.
Sensibilidade vibratória O resultado (amplitude do espectro) é apresentado em um diagrama de
(hálux) amplitude (eixo Y) versus frequência (eixo X).
(diapasão ou No Quadro 16.21, há uma proposta de protocolo para pesquisa de NAC.
biotensiômetro)
Normal: 0 Dos cinco testes ambulatoriais descritos classicamente por Ewing,
Sensibilidade térmica Alterado: 1 três (teste de respiração profunda, teste de Valsalva e teste ortostático)
(tubos a 0 e 45oC) são atualmente recomendados pela American Diabetes Association e pela
American Academy of de Neurology e devem ser feitos ao diagnóstico para o
Sensibilidade dolorosa
DM2 e após cinco anos do diagnóstico para o DM1 após a puberdade ou em
(palito de dente japonês)
adultos . Após a 1a pesquisa, os testes devem ser repetidos anualmente. Esses
Reflexo Aquileu Presente: 0 três testes apresentam boa reprodutibilidade e especificidade (> 91%) e sen-
(martelo) Presente c/ sibilidade (respiração profunda e teste ortostático = 93% e Valsalva = 98%).
reforço: 1
Ausente: 2 Neuropatia autonômica gastrintestinal
Nesse sistema, a neuropatia pode envolver qualquer uma de suas partes,
ESCORE TOTAL (0 a 10)
como: esofagopatias; gastroparesias; constipação intestinal; diarreias; e
Soma de escores em ambos os pés:
NP (neuropatia periférica): 0-2: ausente; 3-5: leve; 6-8: moderada; e 9-10: grave. *Neste capítulo, onde consta NAC, leia-se neuropatia autonômica cardiovascular.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 117
QUADRO 16.21 ■ Protocolo para pesquisa de NAC* 5 | Estudo da VFC por análise espectral (amplitude espectral em três
bandas: FMB, FB e FA): paciente em repouso em DD (inclinação de 30º)
1 | Teste de Valsalva (razão de Valsalva): o paciente permanece em e respiração espontânea | Registra-se no computador, durante 300 s, o
decúbito dorsal (DD) em inclinação de 30º e, após 15 min de repouso, ECG, posteriormente analisado por um algoritmo matemático e expresso
realiza esforço expiratório para manter uma pressão de 40 mmHg, em uma em um diagrama de amplitude de oscilação (flutuações da frequência
coluna de mercúrio, durante 15 s. Em torno do 14º segundo, o paciente cardíaca por segundo) versus frequência (Hz)
apresenta uma taquicardia máxima fisiológica | Após esse esforço, a
* Todos os testes CV devem ser realizados pela manhã em jejum, com glicemia ca-
válvula do esfigmomanômetro é liberada, e o paciente é acompanhado
pilar menor < 180 mg/dL e após a suspensão, pelo menos 8 horas e idealmente
por eletrocardiografia durante 30 a 45 s, quando ocorre uma bradicardia
24 horas antes (pois dependerá da meia-vida de cada fármaco em particular), de
máxima fisiológica | A razão de Valsalva é a relação entre a taquicardia e
todos os medicamentos cardiovasculares, ansiolíticos, antidepressivos, cafeína e
a bradicardia ou entre o intervalo RR mais longo e o mais curto
descongestionantes. Os valores normais dependem da faixa etária do paciente e
2 | Teste ortostático (razão 30:15): consiste em realizar estão padronizados na literatura.
eletrocardiografia com o paciente em DD nas mesmas condições do
teste de Valsalva; após ele se levantar (ortostatismo), avalia-se a relação
entre as frequências cardíacas ou os intervalos RR correspondentes à
taquicardia máxima em torno do 15º batimento e à bradicardia máxima Os sintomas mais frequentes da neuropatia autonômica gastrintestinal são
em torno do 30º batimento empachamento epigástrico e períodos de constipação intestinal e diarreia.
3 | Teste da respiração profunda (razão E:I): consiste em realizar Neuropatia autonômica do sistema geniturinário
eletrocardiografia durante uma inspiração e expiração profundas com Nos homens, pode levar à disfunção erétil e/ou à ejaculação retrógrada.
duração mínima de 5 s cada uma e obter o índice “frequência cardíaca Em ambos os gêneros, pode causar infecções urinárias de repetição, pie-
máxima (inspiração) ÷ frequência mínima (expiração) ou RR mais longo lonefrite, incontinência (bexiga neurogênica espástica) ou bexiga palpável
(E) por RR mais curto (I)” (bexiga neurogênica flácida).
4 | Teste da hipotensão ortostática (HO): paciente em DD (inclinação
Neuropatia do sistema sudomotor
de 30º) durante 15 min de repouso. Afere-se a pressão arterial basal e,
após 3 min, realiza-se ortostatismo. Uma queda da PAS ≥ 20 mmHg é Nesse sistema, a neuropatia pode levar a períodos de sudorese noturna
considerada alterada; entre 10 e 19 mmHg, limítrofe e durante as alimentações (sudorese gustatória), bem como a anidrose
grave nos pés e pernas com alterações de fâneros. Na Figura 16.2, é apre-
sentado um fluxograma para prevenção das complicações que compõem
incontinência fecal. Uma instabilidade na glicemia pode estar relacionada o pé diabético.
à gastroparesia diabética e ser investigada por meio do teste de esvazia-
mento gástrico, utilizando alimento sólido, e da cintilografia gastrintesti- TRATAMENTO
nal. É preciso considerar, entretanto, que os resultados desse teste podem É possível dividir o tratamento das neuropatias diabéticas em patogênico
não apresentar uma boa correlação com os sinais e sintomas dos pacientes. e sintomático.
AVALIAÇÃO E CATEGORIZAÇÃO
DE RISCOS
Antidepressivos
Anticonvulsivantes
Antioxidantes
Ácido lipoico ou tióctico Parestesia não dolorosa 600 mg em jejum 600 mg em jejum
Derivados opioides
Tramadol 50 mg 400 mg
Oxicodona Dor grave 10 mg 20-80 mg
(ou resgate)
(nota na EVA > 7)
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 119
normal. Nesses casos, é importante manter os pacientes hidratados e com anos devem ser orientados a pesquisar essas alterações nos seus cuidados
um bom controle glicêmico, evitar medicações que piorem a hipotensão e, diários, pessoalmente, por seus familiares e cuidadores, periodicamente, e
muitas vezes, realizar tratamento farmacológico (inibidores dopaminérgi- por médico ou paramédico, pelo menos uma vez por ano. Pacientes com
cos e mineralocorticosteroides) e não farmacológico (meias elásticas até o deformidades ósseas, como dedos em martelo, proeminência do metatarso
abdome e cabeceira elevada a 30o para dormir). proximal e artropatia de Charcot, podem necessitar de sapatos especiais.
Na gastroparesia diabética, os sintomas podem melhorar com altera- As úlceras diabéticas também podem estar infectadas, casos em que
ções dietéticas (evitar alimentos fermentativos) e medicamentos prociné- as infecções são polimicrobianas com cocos gram-positivos, especialmen-
ticos, como a domperidona e a eritromicina. A metoclopamida, devido aos te os estafilococos, que devem ser abordados nos tratamentos empíricos
seus efeitos extrapiramidais, não deve ser utilizada por mais de cinco dias. com antibióticos de amplo espectro, debridação e táticas para melhora da
O tratamento da disfunção erétil por neuropatia autonômica diabética perfusão, se necessário. A abordagem multiprofissional, incluindo clínico,
inclui o uso de inibidores da fosfodiesterase tipo 5, prostaglandina intra- enfermeira(o), podiatra, fisioterapeuta, cirurgião vascular e ortopedista, é
corporal peniana ou intrauretral, sistemas de vácuo ou próteses penianas. ideal nessas condições. Na Figura 16.3, apresentamos um fluxograma de
Por último, é importante lembrar, sobre o denominado pé diabético, tratamento para o pé diabético.
que resulta de um conjunto de complicações de micro (ângio e neuropatia) e
macroangiopatias. O risco de úlceras ou amputações por diabetes nesses pa-
cientes aumenta nos indivíduos com: amputações prévias; história de úlcera ■■ DOENÇA CARDIOVASCULAR
no pé; neuropatia periférica; deformidades nos pés; doença vascular perifé- Principal causa de morte em indivíduos com DM1 e 2, a doença cardio-
rica; comprometimento visual; nefropatia diabética; mau controle glicêmico vascular (DCV) é mais grave e apresenta maior morbimortalidade nesses
e tabagismo. Desse modo, os pacientes com história de DM há mais de 10 casos quando comparados à da população geral.
Corte, Fissuras,
Hipertrofia Neuropática Neuroisquêmica Isquêmica
desbaste e Maceração interdígitos,
Onicogrifose
acabamento lesão intertrigo, bolhas
Onicólise
com lixa Calosidades
Calos
Calos hemorrágicos Sem infecção Sem infecção
Limpeza com
micromotor,
cuidados
Onicomicose Limpeza +
tópicos e Higiene, aplanamento e Limpeza +
Limpeza + desbaste
terapia umectação das regiões curativo +
desbaste hiperqueratose +
fotodinâmica com fissuras encaminhamento
hiperqueratose + curativo +
Orientação para higiene vascular via
curativo+ alívio encaminhamento
com água + agente de unidade básica de
Remoção da da carga + vascular via unidade
limpeza +pvpi tópico saúde
espícula, corte acompanhamento básica de saúde
entre os dedos + alta Acompanhamento Acompanhamento
Onicocriptose adequado + quinzenal
frequência semanal semanal
anteparo ou
Punção e proteção
órtese.
Desbaste das calosidades
Antibiótico, se
Desbaste dos calos +
necessário
esfoliação e lubrificação Com infecção Com infecção
profunda + calçados para
redistribuição da pressão
Avaliação urgente na
Unidade Básica de Saúde
Rastreamento de osteomielite (probe to bone, exames de imagens)
Avaliação se necessita de encaminhamento para Pronto-Socorro
Prescrição de antibióticos
Encaminhamento para seguimento na Unidade Básica de Saúde
e acompanhamento semanal em Ambulatório do Pé Diabético
Entretanto, a relação do controle glicêmico com a DCV não é tão ní- Os benefícios da utilização de IECA ou bloqueadores dos receptores
tida como no caso das microangiopatias nos indivíduos com DM, talvez de angiotensina nos pacientes com DCV na ausência de hipertensão ar-
devido à natureza multifatorial dessa patologia. Os estudos nesse sentido terial ou nefropatia também não são tão evidentes como nos pacientes
mostram que, para redução dos eventos cardiovasculares, é preciso haver com essas condições sem DCV, especialmente quando os valores de LDL-C
um controle glicêmico intensivo desde o início do DM, com manutenção estão dentro do controle.
por tempo prolongado. No entanto o estudo Diabetes Control and Com- Um estudo recente randomizado e observacional não encontrou be-
plications Trial (um dos maiores estudos de avaliação do tratamento glicê- nefício clínico na pesquisa de rotina de doença arterial coronariana (DAC)
mico de pacientes com DM1), em publicação recente, mostrou que o trata- em pacientes com DM2 assintomáticos e com ECG normal.7 Apesar da
mento intensivo da glicemia durante os primeiros 6,5 anos de diagnóstico maior frequência de alteração na perfusão do miocárdio em pacientes
tem um efeito benéfico da redução da incidência da doença cardiovascular (1 em 5), os desfechos clínicos foram praticamente iguais (e com baixa
do DM1 que pode persistir por até 30 anos. frequência) nos pacientes que fizeram a pesquisa e nos que não a fize-
Um ponto de discussão é se existe diferença entre a macroangiopatia ram. Desse modo, a efetividade e, especialmente, a relação custo/benefí-
diabética, e a aterosclerose não diabética tanto do ponto vista fisiopatoló- cio de um programa de pesquisa de DAC indiscriminado são atualmente
gico como clínico. O endotélio vascular de pacientes diabéticos apresenta questionáveis.
menor produção de NO, tanto pela hiperglicemia como pela RI no nível das A efetividade dos novos métodos não invasivos, como a TC coronária
células endoteliais, além de aumento na produção de vasoconstritores, e a angiotomografia, com o objetivo de identificar subgrupos de pacientes
como a endotelina-1. Anormalidades em células musculares lisas e na fun- para estratégias diferentes de tratamento ainda não é satisfatória. O uso
ção plaquetária também contribuem para essas diferenças. Clinicamente, dessas técnicas na rotina pode levar a uma exposição à radioatividade e,
a macroangiopatia diabética apresenta-se mais agressiva em diversos lo- talvez, a procedimentos invasivos, como a cinecoronarioangiografia e a
cais. A doença arterial periférica tende a ser mais distal em diabéticos (dis- revascularização do miocárdio, desnecessários.
tribuição poplíteo-tibial), limitando as possibilidades de revascularização, Em relação ao DM1, os protocolos atualmente disponíveis para a pre-
levando, por sua vez, à doença mais sintomática e à maior incidência de dição de DAC mostram uma relação baixa com os eventos e novas pesqui-
amputação, ao passo que a não diabética tem uma distribuição predomi- sas são necessárias nesse sentido para esse grupo pacientes.
nantemente aortofemoral. No momento, de modo geral, os candidatos para uma investigação
A aterosclerose coronária é mais grave em diabéticos e apresenta mais de DAC cardíaca mais refinada ou invasiva são os pacientes diabéticos
frequentemente necessidade de revascularização. A revascularização per- com sintomas típicos ou atípicos de DAC e os com alterações no ECG de
cutânea indica piores resultados do que a revascularização cirúrgica, devi- repouso. Além dessa recomendação geral, consideram-se os pacientes
do ao maior risco de reestenose e eventos adversos em pacientes com DM. DM1 com: idade > 35 anos; tempo de diagnóstico do diabetes superior
a 15 anos; HbA1c persistente acima de 8,5%; presença de albuminúria;
neuropatia autonômica; e retinopatia proliferativa como de alto risco para
ATENÇÃO! a presença de DAC.
Nos pacientes DM2 ou DM1 dos grupos citados, é possível prosse-
Pacientes portadores de DM podem apresentar todas as manifesta- guir a investigação da DAC com a determinação do escore de cálcio de
ções clínicas de DCV presentes nos não diabéticos, porém, entre eles, coronária [100 a 400 (risco moderado) e > 400 (risco alto)]; cintilografia
há considerável incidência de isquemia miocárdica silenciosa. miocárdica com MIBI associada ao estresse (físico-esteira) ou farmacoló-
gico (dipiridamol ou dobutamina). A ecocardigrafia sob estresse pode ser
realizada com esforço físico ou estímulo farmacológico com dobutamina
De acordo com as últimas recomendações da American Diabetes As- ou dipiridamol. É mais sensível e específica do que o teste ergométrico,
sociation7 em pacientes assintomáticos, a pesquisa de doença arterial tendo indicação e acurácia semelhantes às da cintilografia. Caso seja con-
coronariana na rotina clínica não está recomendada, pois estudos não firmada isquemia miocárdica na investigação não invasiva, impõe-se a
mostraram diferença no prognóstico entre os pacientes que fazem esse realização de cinecoronariografia com o objetivo de avaliar a extensão da
rastreamento ou não quando comparada ao tratamento dos fatores de lesão e realizar o planejamento terapêutico ou mesmo intervenções nesse
risco para doença cardiovascular. sentido. Geralmente, esses pacientes podem já ter um comprometimento
Desse modo, todos os pacientes com DM devem ter os demais fato- da função renal, portanto o uso e a quantidade de contraste utilizados na
res de risco cardiovascular, além da própria doença, como dislipidemia, cinecoronarioangiografia devem ser bem balanceados; os pacientes de-
hipertensão arterial, tabagismo, história familiar de doença coronariana vem estar bem hidratados e o procedimento estar associado à suspensão
precoce e presença de albuminúria, avaliados pelo menos uma vez por temporária do uso da metformina.
ano, e receber abordagem imediata, se necessário. Como discutido, até o momento, a abordagem da doença cardio-
O tratamento nos pacientes com DCV diagnosticada, nesse sentido, vascular é multifatorial; no paciente com DM os alvos para os diferentes
constitui no uso de IECA, AAS e estatina, quando não estão contraindica- parâmetros podem ser mais estritos do que nos indivíduos sem diabetes,
dos. Nos pacientes com história prévia de infarto do miocárdio, betablo- sugeridos no Quadro 16.23.
queadores deveriam ser utilizados pelo menos nos dois primeiros anos
após o evento. Nos pacientes com insuficiência cardíaca (IC) sintomática,
deve-se evitar o uso de glitazonas. Naqueles com IC estável, a metformina REVISÃO
pode ser titulada de acordo com o grau de função renal; no entanto, deve
Alterações relacionadas a hiper/hipoinsulinemia, hiperglicemia, hi-
ser evitada nos pacientes instáveis ou hospitalizados na fase aguda da
perlipidemia, modificações no fluxo e na coagulação sanguínea e a
insuficiência cardíaca.
8 formação de produtos de glicação caracterizam o meio diabético.
Em relação ao estilo de vida, o estudo Look AHEAD mostrou que a O meio diabético resulta no desenvolvimento das complicações
redução do peso (por meio de dieta restritiva e aumento da atividade físi- crônicas do diabetes melito que são divididas em macroangiopa-
ca) resultou na melhora do controle glicêmico, da performance e de alguns tias (doenças coronarianas ateroscleróticas, cerebrovasculares e
fatores de risco cardiovascular, entretanto não atingiu significância na re- periféricas) e microangiopatias (retinopatia, nefropatia e neuro-
dução dos eventos cardiovasculares em indivíduos com DM2 adultos com patia).
sobrepeso ou obesos.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 121
QUADRO 16.23 ■ Abordagem multifatorial para o controle da doença cardiovascular em indivíduos com DM
Pressão arterial Dieta hipossódica (< 1,5 g de sal/d) PAS < 140 mmHg; jovens (PAS < 130 mmHg)
Controle da ingesta de álcool PAD < 80 mmHg
Medicamentos
1 | IECA ou bloqueador do receptor de angiotensina
2 | BCC
3 | Betabloqueadores.
4 | Hidroclorotiazida ou clortalidona
2
5 | Diuréticos de alça (se RFG < 30 mL/min/m )
infância se associa a eventos cardiovasculares já na primeira década de Entre as dislipidemias que exigirão tratamento na infância e adoles-
vida e a sobrevida é muito encurtada. Nas formas heterozigóticas, em que cência se destaca a hipercolesterolemia familiar, por ser a forma de disli-
se apresenta LDL-C > 160 ou 200 mg/dL na infância, 50% dos homens pidemia herdada mais frequente. Com modo de herança monogênica de
e 25% das mulheres apresentarão um evento coronário até os 50 anos. caráter autossômico e dominante, na forma heterozigótica, metade dos
Por sua vez, na presença de polimorfismos genéticos associados a valores receptores está comprometida, e a outra é normal, ao passo que, na ho-
baixos de LDL-C ao longo da vida, existe maior expectativa de vida. Dados mozigótica, todos os receptores estão afetados.
semelhantes são observados para os demais fatores de risco quando pre-
sentes ou não desde a infância. Aspectos étnicos e socioeconômicos tam-
■■ DIAGNÓSTICO CLÍNICO DA
bém determinam diferenças na prevalência de fatores de risco e ocorrência
HIPERCOLESTEROLEMIA FAMILIAR
futura de DCVs. A agregação de fatores de risco na infância e o fenômeno
de trilha são aspectos também importantes e devem ser considerados na Os critérios clínicos e laboratoriais para o diagnóstico da hipercolesterole-
abordagem preventiva das DCVs em crianças e adolescentes. mia familiar (HF) são arbitrários e se baseiam nos seguintes dados:
sinais clínicos de depósitos extravasculares de colesterol;
taxas elevadas de LDL-C ou CT no plasma;
■■ DIAGNÓSTICO DA DISLIPIDEMIA história familiar de hipercolesterolemia e/ou doença aterosclerótica
NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA prematura;
Deve-se proceder ao rastreamento universal de crianças, em que é neces- identificação de mutações e polimorfismos genéticos que favore-
sário obter o seu perfil lipídico a partir dos dois anos de idade, segundo çam o desenvolvimento da HF.
os critérios descritos a seguir. Antes disso, os casos devem ser analisados Alguns critérios diagnósticos têm sido propostos na tentativa de uni-
individualmente, conforme a presença de doenças concomitantes, as tera- formizar e formalizar o diagnóstico de HF, como os da Dutch Lipid Clinic Ne-
pêuticas instituídas e a história familiar. É preciso triar o perfil lipídico em twork (Dutch MEDPED) (Tabela 17.2), os do US Make Early Diagnosis Prevent
crianças entre 2 e 10 anos quando: Early Death Program (USA MEDPED) e os do Simon Broome Register Group.
pais ou avós tenham história de doença arterial isquêmica (em ho-
mens < 55 anos; em mulheres < 65 anos);
pais tenham colesterol total (CT) superior a 240 mg/dL; TABELA 17.2 ■ Critérios diagnósticos da HF
apresentem outros fatores de risco, como hipertensão arterial sis- (com base na proposta da Dutch Lipid Clinic Network)
têmica (HAS), obesidade, tabagismo, diabetes melito (DM), baixo
peso ao nascimento para a idade gestacional (IG), dieta rica em PARÂMETRO PONTOS
gorduras saturadas e/ou ácidos graxos trans; História familiar
utilizem drogas ou sejam portadoras de doenças que cursam com
dislipidemia (síndrome da imunodeficiência humana, hipotiroidis- Familiar de 1º grau portador de doença vascular/coronariana 1
mo, doença de Cushing etc.); prematura (homem < 55 anos, mulher < 60 anos) ou
possuam manifestações clínicas de dislipidemias (xantomas, xan- Familiar adulto de 1º ou 2º grau com colesterol total >
telasma, arco corneal, dores abdominais recorrentes, pancreatites). 290 mg/dL*
Acima de 10 anos, toda criança deve ter dosado, ao menos uma vez,
Familiar de 1º grau portador de xantoma tendinoso e/ou 2
seu perfil lipídico, independentemente da presença de fatores de risco.
arco corneal OU
Os valores de referência para lipídeos e lipoproteínas em crianças e
Familiar de 1º grau < 16 anos com colesterol total >
adolescentes estão descritos na Tabela 17.1.
260 mg/dL*
História clínica
TABELA 17.1 ■ Valores de referência para lipídeos e lipoproteínas
em crianças e adolescentes Paciente portador de doença arterial coronariana 2
prematura (homem < 55 anos, mulher < 60 anos)
ALTO BAIXO
PARÂMETRO ACEITÁVEL LIMÍTROFE (PERCENTIL 95) (PERCENTIL 5) Paciente portador de doença arterial cerebral ou periférica 1
prematura (homem < 55 anos, mulher < 60 anos)
CT < 170 170-199 > 200
Exame físico
LDL-C < 110 110-129 > 130
Xantoma tendinoso 6
Não HDL-C 123 123-143 > 144
Arco corneal < 45 anos 4
TG (0-9a) < 75 75-99 > 100
Nível de LDL-C (mg/dL)
TG (9-19a) < 90 90-129 > 130
≥ 330 mg/dL 8
HDL-C > 45 35-45 < 35
250-329 mg/dL 5
Apo A1 > 120 110-120 < 110
190-249 mg/dL 3
Apo B < 90 90-109 > 110
155-189 mg/dL 1
HDL-C: lipoproteína de alta densidade-colesterol (do inglês high-density lipoprotein-
-cholesterol); TG: triglicérides; Apo: apolipoproteína.
124 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Análise do DNA
Diagnóstico de HF:
de rastreamento pode não ser essencial no diagnóstico ou na indicação do doses menores do que as usadas nos adultos e demonstraram atenuar o
tratamento clínico, mas pode ser útil quando o diagnóstico é incerto. espessamento médio-intimal, melhorar a função endotelial, e comparados
A identificação de uma mutação causal pode fornecer uma motiva- aos seus pais com HF, mudaram a sobrevida livre de eventos quando o tra-
ção adicional para alguns pacientes iniciarem o tratamento adequado. tamento foi instituído precocemente. As doses habitualmente utilizadas dos
O rastreamento genético é altamente custo-efetivo a partir de um caso- hipolipemiantes em crianças e adolescentes são descritas na Tabela 17.4.
-índice comprovado. Existe ampla superposição de valores de LDL-C entre
as formas heterozigóticas da HF, as formas poligênicas e a hipercolestero-
lemia ambiental. No entanto, nessas últimas, não se justifica a utilização TABELA 17.4 ■ Doses de medicamentos hipolipemiantes
do rastreamento genético. utilizadas para tratamento da hipercolesterolemia em crianças e
adolescentes (2-19 anos)
TRATAMENTO
DOSES (mg/d) EM CRIANÇAS
Recomenda-se, na HF que, seguindo rigorosamente os critérios descritos a FÁRMACO E ADOLESCENTES
seguir e após mudança de estilo de vida, a terapia hipolipemiante (Tabela
17.3) seja iniciada antes dos 5 anos de idade, salvo casos graves e com Lovastatina 10-40
avaliação individualizada. O tratamento tem como objetivo alcançar a
Pravastatina 10-40
meta de valores de 110 mg/dL de LDL-C – ou no mínimo 130 mg/dL – e
reduzir xantomatose e prevenir o aparecimento de doença arterial coro- Sinvastatina 10-40
nariana (DAC). Embora em crianças e adolescentes que apresentam a for-
ma familiar de hipercolesterolemia a resposta à orientação dietética seja Rosuvastatina 5-20
pequena, fundamenta-se na adoção de padrões alimentares adequados, Atorvastatina 10-20
de acordo com o desvio lipídico apresentado, mantendo-se a ingestão de
vitaminas e a quantidade de calorias necessárias para o desenvolvimento Pitavastatina –
e crescimento da criança ou adolescente. Para tanto, devem ser avaliados Colestiramina 4-16
os hábitos individuais e familiares. Para melhor conduzir a orientação die-
tética, torna-se valiosa a colaboração do pediatra e do nutricionista. Ezetimiba 10
O uso dos fitosteróis, compostos naturais com estrutura semelhante
ao colesterol tem indicação na hipercolesterolemia em geral e na forma fa- Doses maiores do que as descritas e combinação de dois ou mais fár-
miliar. O mecanismo clássico de ação dos fitosteróis é o deslocamento do macos podem ser utilizadas, após análise individual de risco.
colesterol da fase micelar. Na dieta, as micelas mistas têm uma capacidade
limitada de incorporar esteróis. A competição entre fitosteróis e colesterol
reduz o conteúdo de colesterol nas micelas e, consequentemente, dimi- ■■ HIPERTRIGLICERIDEMIAS NA INFÂNCIA
nui seu transporte para a membrana de borda em escova do intestino. Obesidade, sedentarismo, alcoolismo, diabetes e pré-diabetes são condi-
Fora da fase micelar, o colesterol não é mais solúvel, formando cocristais ções frequentemente associadas às hipertrigliceridemias, que podem ser
com fitosteróis, e é excretado, então, com os fitosteróis não absorvidos. primárias ou secundárias. A base genética das hipertrigliceridemias pri-
Com isso, observam-se efeitos na diminuição do colesterol, especialmente márias foi identificada em apenas 5% dos casos. Manifestada na infância,
LDL-C, ocasionados por fitosteróis. Outras ações dos fitosteróis incluem a quilomicronemia familiar é rara e seu diagnóstico é feito com base nos
menor expressão do transportador intestinal de colesterol NPC1L1 e maior elevados níveis de TG, decorrentes do deficiente catabolismo dos quilomí-
expressão dos transportadores acoplados ABCG5/G8, que favorecem a eli- crons (QM) e lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL, do inglês very
minação dos esteróis em geral. O consumo diário de 2 g de fitosteróis sob low density lipoprotein), em virtude da perda da atividade da lipoproteína
a forma de alimentos ou cápsulas contendo fitosteróis reduz a absorção de lipase (LPL) ou da apolipoproteína CII, além de outras mutações descri-
colesterol em aproximadamente 30 a 40%, diminuindo o LDL-C em cerca tas em poucas famílias. Nesses casos, o diagnóstico é feito, em geral, no
de 10%. A suplementação com fitosteróis é uma opção para diminuição do berçário, pelo aspecto cremoso do soro, e a suspensão do aleitamento
LDL-C em crianças com HF que ainda não podem receber tratamento far- e orientação nutricional apropriada devem ser indicadas para prevenção
macológico, mas pode potencializar a ação das estatinas e da ezetimiba. de pancreatite. A hiperlipidemia mista primária é mais frequente, porém
As estatinas diminuem significativamente o colesterol total, o LDL-C e manifesta-se mais comumente na idade adulta, fortemente influenciada
a apolipoproteína B, sem efeitos adversos (desenvolvimento sexual, toxi- por fatores ambientais. Os portadores de quilomicronemia familiar são
cidade muscular ou hepática) expressivos, podendo ser utilizadas a partir em geral pouco responsivos aos medicamentos, sendo necessárias asso-
dos oito anos de idade. O uso de estatinas em crianças é recomendado em ciações entre fibratos, ácidos graxo ômega-3 em doses de 3-4 g ao dia,
eventualmente com estatinas de meia-vida longa e ácido nicotínico.
De acordo com os dados da população norte-americana, 8,8% das
TABELA 17.3 ■ Valores de referência para tratamento meninas e 11,4% dos meninos adolescentes entre 12 e 18 anos apresen-
farmacológico hipolipemiante em crianças com idade ≥ 8 anos, tam níveis elevados de TG, casos em que se deve tentar corrigir ou elimi-
conforme condição clínica nar o fator desencadeante, como obesidade, sedentarismo ou diabetes
descontrolado. Também em estudos em norte-americanos, demonstrou-se
LDL-C (MG/DL) CONDIÇÃO CLÍNICA que o risco de hipertrigliceridemia em crianças obesas é sete vezes maior
> 190 Dislipidemia de base genética do que em não obesas. A resistência à insulina e a intolerância oral à glico-
se também estão fortemente associadas com a doença.
> 160 História familiar de DAC prematura ou dois ou mais Nos casos de hipetrigliceridemia primária, deve-se orientar mudança
fatores de risco (HDL< 35 mg/dL, fumo, hipertensão de estilo de vida, reservando-se medicamentos hipolipemiantes a partir
arterial, obesidade e diabetes melito)
dos 10 anos de idade nas situações mais graves. Havendo indicação de
126 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
tratamento medicamentoso, podem ser utilizados o fenofibrato e o cipro- ■■ O TRATAMENTO DA DISLIPIDEMIA SE JUSTIFICA?
fibrato em baixas doses e com cautela. Associação de medicamentos pode Na prevenção e no tratamento da DCV, houve benefícios pelo uso das
ser necessária, sendo seguro o uso de ácidos graxos ômega-3 em doses de estatinas mesmo em indivíduos que não apresentavam valores anor-
3-4 g ao dia, eventualmente estatinas de meia-vida longa. Maior atividade mais do LDL-C. De fato, metanálises desses estudos têm mostrado
física pode ser particularmente importante para redução da obesidade na que existe redução de desfechos de risco relativo de mesma magnitu-
hipertrigliceridemia secundária, além do tratamento da causa primária. de para todos os níveis de colesterol testados, embora com benefício
absoluto maior, quanto maior o valor basal do LDL-C. A Tabela 17.5
■■ DISLIPIDEMIA E DOENÇA ATEROSCLERÓTICA mostra os principais benefícios pela redução de 1 mmol (40 mg/dL)
NO IDOSO do LDL-C.
Uma vez que a dislipidemia contribui para a DCV do idoso, seu trata-
mento, sobretudo com estatinas, diminui as principais complicações da
TABELA 17.5 ■ Redução de desfechos cardiovasculares principais
enfermidade, como infarto agudo do miocárdio, AVC, etc. De fato, estudo
por 1 mmol (39 mg/dL) de diminuição do LDL-C com estatinas
observacional envolvendo 900 mil indivíduos mostrou que apresentar 39
mg/dL a menos de colesterol ao longo da vida diminui a mortalidade por RESULTADO DO
DAC (Quadro 17.2). Com base em 61 ensaios prospectivos, esse estudo DESFECHO TRATAMENTO
mostrou que, mesmo em muito idosos, o colesterol mais elevado se asso-
Mortalidade total –10% (p < 0,0001)
cia com maior mortalidade por doença isquêmica do coração. Esse fato é
ainda mais nítido com relação a colesterol/HDL-C ou com colesterol não Mortalidade por doença isquêmica do coração –20% (p < 0,0001)
HDL. A associação persiste mesmo após ajuste para a pressão arterial.
Mortalidade cardiovascular por outras causas –11% (p = 0,002)
Mortalidade por AVC –4% (ns)
QUADRO 17.2 ■ Mortalidade por doença isquêmica do coração
para um mmol (39 mg/dL) a menos no colesterol total em idosos Desfechos cardiovasculares principais –22% (p < 0,0001)
60-69 anos – redução de 28% Infarto do miocárdio não fatal –27% (p < 0,0001)
lerados. Para os intolerantes, para pacientes com alto risco residual, por não
TABELA 17.7 ■ Principais hipolipemiantes e suas indicações
atingirem metas de LDL-C, para as dislipidemias graves, como a hipercoles-
MEDICAMENTOS DOSES DIÁRIAS terolemia familiar, novos fármacos, como os inibidores de PCSK-9 constituem
uma perspectiva no tratamento da dislipidemia e aparentam reduzir eventos
Medicamentos para redução do LDL-C cardiovasculares quando os estudos de eficácia e segurança foram analisa-
Estatinas dos de forma agrupada. Resultados de estudos de longo prazo para avalia-
ção de desfechos clínicos e da segurança de valores de LDL-C muito baixos
Sinvastatina 10-40 mg estão em andamento e poderão modificar a prática clínica nas dislipidemias.
Lovastatina 10-40 mg Finalmente, o uso de estatinas a longo prazo não se associou com a
ocorrência de eventos adversos mais raros ou graves, como câncer ou al-
Pravastatina 20-40 mg terações cognitivas, a despeito de um alerta da agência regulatória norte-
-americana para possíveis, transitórios e raros casos de déficits cogniti-
Atorvastatina 10-80 mg
vos, que não foram comprovados em ensaios clínicos quando este foi um
Fluvastatina 20-80 mg objetivo pré-especificado. Além disso, o uso das estatinas isoladamente
ou combinadas com ezetimiba na IR não dialítica foi seguro e propiciou
Pitavastatina 2-4 mg
redução de desfechos cardiovasculares.
Rosuvastatina 5-40 mg
Gidding SS, Champagne MA, Ferranti SD, Defesche J, Ito MK, Knowles JW, et al. apresentadas a seguir e pode ser encontrado pelo aplicativo obtido no site
The agenda for familial hypercholesterolemia. A scientific statement from the do Departamento de Aterosclerose da SBC para os sistemas Android e IOS.
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disease: consensus statement of the European Atherosclerosis Society. Eur doença aterosclerótica significativa (coronária, cerebrovascular, vascular
Heart J. 2013;34(45):3478-90a. periférica (Grau de Recomendação: IIa; Nível de Evidência: B), com ou sem
Santos RD, Gagliardi ACM, Xavier HT, Casella Filho A, Araújo DB, Cesena FY, et al. eventos clínicos, ou obstrução ≥ 50% em qualquer território arterial (Grau
Sociedade Brasileira de Cardiologia. I Diretriz Brasileira de Hipercolesterolemia de Recomendação: IIa; Nível de Evidência: C).
Familiar (HF). Arq Bras Cardiol. 2012;99(2 Suppl 2):1-28.
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Wiegman A, Gidding SS, Watts GF, Chapman MJ, Ginsberg HN, Cuchel M, et al. Cálcio Arterial Coronariano (CAC) > 100 ou a presença de placas
Familial hypercholesterolaemia in children and adolescents: gaining decades of ateroscleróticas na angiotomografia (angio-CT) de coronárias.
life by optimizing detection and treatment. Eur Heart J. 2015; 36(36):2425-37. Aneurisma de aorta abdominal.
Doença renal crônica definida por Taxa de Filtração Glomerular
(TFG) < 60 mL/min, e em fase não dialítica.
Aqueles com concentrações de LDL-c ≥ 190 mg/dL.
17.2 NO JOVEM E NO ADULTO Presença de diabetes melito tipos 1 ou 2, e com LDL-c entre 70 e
189 mg/dL e presença de Estratificadores de Risco (ER) ou Doença
■■ FRANCISCO ANTONIO HELFENSTEIN FONSECA Aterosclerótica Subclínica (DASC).
Definem-se ER e DASC no diabetes como:
■■ MARIA CRISTINA IZAR
ER: idade ≥ 48 anos no homem e ≥ 54 anos na mulher; tempo de
■■ HENRIQUE TRIA BIANCO diagnóstico do diabetes > 10 anos; história familiar de parente de primei-
ro grau com DCV prematura (< 55 anos para homem e < 65 anos para
mulher); tabagismo (pelo menos um cigarro no último mês); hipertensão
A importância da hipercolesterolemia na cardiopatia isquêmica é mais arterial sistêmica; síndrome metabólica, de acordo com a International
evidente no adulto jovem e de meia-idade. De fato, metanálise de estudos Diabetes Federation; presença de albuminúria > 30 mg/g de creatinina e/
observacionais envolvendo 900 mil indivíduos mostrou que apresentar ou retinopatia; TFG < 60 mL/min.
1 mmol/L a menos (~ 39 mg/dL) no colesterol total significa uma redução DASC: ultrassonografia de carótidas com presença de placa > 1,5
de 56% na mortalidade por doença isquêmica do coração entre as idades mm; ITB < 0,9; escore de CAC > 10; presença de placas ateroscleróticas
de 40 a 49 anos e de 42% entre 50 e 59 anos.1 Estudo de base genética na angio-CT de coronárias.
encontrou benefícios similares com redução média de 1 mmol/L níveis de Pacientes com LDL-c entre 70 e 189 mg/dL, do sexo masculino com
LDL-C (54% de redução dos principais desfechos cardiovasculares).2 risco calculado pelo ERG > 20% e nas mulheres > 10%.
Assim, torna-se lógico que reduções de colesterol, principalmente (Grau de Recomendação: IIa; Nível de Evidência: C).
LDL-C, por mudanças no estilo de vida ou pelo uso de fármacos na ado-
lescência e ao longo da vida, tenham grande benefício na diminuição de RISCO INTERMEDIÁRIO
desfechos cardiovasculares na vida adulta.
São considerados de risco intermediário, os indivíduos com ERG entre 5 e
Embora o AVC não apresente a mesma relação epidemiológica com
20% no sexo masculino e entre 5 e 10% no sexo feminino (Grau de Reco-
o colesterol sérico, como na doença coronariana, o uso de estatinas por
mendação: I; Nível de Evidência: A), ou ainda os diabéticos sem os crité-
diversos mecanismos também determina sua redução. Os mecanismos
rios de DASC ou ER listados anteriormente.
envolvidos incluem discreta redução na pressão arterial (PA), aumento de
mobilização de células endoteliais progenitoras, redução do risco trombó-
BAIXO RISCO
tico, melhora da função endotelial e diminuição da inflamação para maior
estabilização de placas vulneráveis. São pacientes do sexo masculino e feminino com risco em 10 anos < 5%,
calculado pelo ERG (Grau de Recomendação: I; Nível de Evidência: A).
Observação: esta atualização não utiliza os fatores agravantes para
■■ ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO CARDIOVASCULAR reclassificação do risco cardiovascular.
O tratamento envolve metas primárias para o LDL-C, de acordo com o risco Para os pacientes em uso de estatinas propõe-se a utilização de um
cardiovascular, bem como metas secundárias, envolvendo principalmente fator de correção, para o CT para o cálculo do ERG em pacientes sob te-
o colesterol não HDL. rapia hipolipemiante. Assim, em pacientes em uso de estatina, deve-se
Dentre os diversos algoritmos existentes, esta atualização recomenda multiplicar o CT por 1,43, como utilizado em alguns ensaios clínicos que
3
a utilização do Escore de Risco Global (ERG) , que estima o risco de infarto tomam por base uma redução média de 30% do CT com estatinas. Este va-
do miocárdio, AVC, ou insuficiência cardíaca, fatais ou não fatais, ou insu- lor foi derivado de estudos que compararam a eficácia de várias estatinas
ficiência vascular periférica em 10 anos. Ele deve ser utilizado na avaliação nas doses utilizadas e que admitem uma redução média de LDL-c ~ 30%
inicial, ou mesmo em pacientes em uso de estatinas, entre os indivíduos com o tratamento. Isto se aplica à maior parte dos pacientes que usam
que não foram enquadrados nas condições de muito alto ou alto risco doses moderadas de estatinas.
130 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
As metas terapêuticas e a redução percentual do LDL-c e do não-HDL- manas, na dose de 75 mg ou 150 mg, enquanto o evolucumab com injeção
-c são apresentadas na Tabela 17.8. de 140 mg, a cada 2 semanas, ou 420 mg, uma vez ao mês. Esta classe
farmacológica reduz de forma bastante intensa as concentrações de LDL-c
em comparação ao placebo (redução média de 60%). Esses fármacos de-
TABELA 17.8 ■ Metas terapêuticas e redução percentual do LDL-c e monstraram benefícios sobre as outras frações lipídicas. Houve redução de
do não-HDL-c de acordo com o risco cardiovascular e o uso de estatinas eventos cardiovasculares com o evolocumabe em pacientes de muito alto
SEM ESTATINAS COM ESTATINAS risco, bem como regressão da aterosclerose. Os inibidores da PCSK9 (evo-
locumabe e alirocumabe) são indicados no tratamento das dislipidemias,
META DE LDL META DE NÃO HDL em pacientes com risco cardiovascular muito alto, em tratamento otimizado
RISCO REDUÇÃO(%) (MG/DL) (MG/DL) com estatinas na maior dose tolerada, associado ou não à ezetimiba, e que
Muito alto > 50 < 50 < 80 não tenham alcançado as metas de LDL-c ou não HDL-c recomendadas. O
uso dos inibidores da PCSK9 em geral é seguro e bem tolerado. Podem se
Alto > 50 < 70 < 100 observar a ocorrência de nasofaringite, náuseas, fadiga e reações no local
Intermediário 30-50 < 100 < 130 da injeção (vermelhidão, prurido, edema ou sensibilidade/dor).
Pacientes com dislipidemia mista (aumento do colesterol e de TGs) ou
Baixo > 30 < 130 < 160
com elevação isolada de TGs podem necessitar de outros hipolipemian-
tes, principalmente fibratos. Suas indicações recaem principalmente para
elevações acentuadas de TGs (> 500 mg/dL), mas podem ser associados
■■ TRATAMENTO a estatinas em dislipidemias mistas graves ou em pacientes em prevenção
Deve basear-se no nível de risco obtido e nos valores basais dos lipídeos. secundária da doença aterosclerótica que mantenham níveis de TGs >
Estudos de intervenção com estatinas apresentaram benefícios tanto maio- 204 mg/dL e de HDL-C < 34 mg/dL (com base em estudos controlados
res quanto mais efetivas fossem as reduções no LDL-C obtidas e mostraram e metanálises). Além disso, a redução de TGs para pacientes com níveis
que o tratamento com esses fármacos se revelou muito seguro e pode ser basais muito elevados previne a ocorrência de pancreatite. Muitos pacien-
aplicado em todos os níveis de risco cardiovascular, com os benefícios su- tes em tratamento com estatinas que mantenham níveis de TGs acima de
perando amplamente os riscos de sua administração. Entretanto, o benefí- níveis ideais (< 150 mg/dL) podem responder à restrição de gorduras, car-
cio absoluto foi tanto maior quanto maior o nível de risco basal, bem como boidratos simples e álcool.
o nível basal de colesterol. No caso de impossibilidade de se atingir os va-
lores de LDL-C com estatinas, é possível associar outros fármacos, como re-
sinas ou ezetimiba, que proporcionam aproximadamente 20% de redução ATENÇÃO!
adicional ao efeito obtido pela estatina. Em dislipidemias graves de base
Perda de peso, atividade física e melhor controle de distúrbios meta-
genética ou no caso de intolerância a hipolipemiantes, deve-se buscar ao
bólicos, como diabetes e insuficiência renal, também são importantes
menos 50% de redução nos níveis de LDL-C basais. Pacientes que apresen-
para atingir valores apropriados de TGs.
tem grave hipercolesterolemia e se mantenham com valores de LDL-C >
300 mg/dL (prevenção primária) ou LDL-C > 200 mg/dL (prevenção secun-
dária) no topo do tratamento hipolipemiante devem ser encaminhados a Para pacientes com valores baixos de HDL-c (< 40 mg/dL para ambos
centros de referência em dislipidemias para tratamentos adicionais. os sexos), ainda não se tem tratamento farmacológico efetivo definido
com base em estudos de desfechos cardiovasculares, mas mudanças de
INIBIDORES DA PCSK-9 estilo de vida (parar de fumar, realizar exercícios físicos, atingir peso ideal,
Sabe-se que a funcionalidade e o número de LDLR expressos na superfí- melhor controle metabólico etc.) podem contribuir para o alcance de valo-
cie dos hepatócitos constitui fator determinante dos níveis plasmáticos de res mais adequados do HDL-C. O uso de fibratos, de niacina ou mesmo de
LDL. A LDL circulante se liga aos LDLR na superfície do hepatócito, libera estatinas pode produzir elevações de HDL-C, e novos fármacos estão em
seu conteúdo para o endossoma e, posteriormente, o receptor é reciclado avaliação para futuro uso na prática clínica.
de volta à superfície do hepatócito, para captar mais partículas de LDL do A Tabela 17.9 contém fármacos, doses e reduções esperadas nos ní-
plasma. Em condições normais, o LDLR refaz este ciclo aproximadamente veis de colesterol ou de TGs.
150 vezes, até que seja degradado. A PCSK9 é uma enzima que desempe- Antes da introdução de tratamento farmacológico, deve-se avaliar a
nha um papel importante no metabolismo lipídico, modulando a densida- função hepática, renal e tiroidiana e verificar outros medicamentos em
de de LDLR. Sintetizada no núcleo celular e secretada pelos hepatócitos, uso que possam apresentar interações farmacocinéticas ou maior risco de
liga-se aos LDLR na circulação, favorecendo sua degradação. eventos adversos. (Ver Capítulo 17.1, em especial os critérios para inter-
Estudos realizados em animais e mutações em seres humanos demons- rupção ou modificação do tratamento instituído.)
traram que o ganho de função da PCSK9 ocasionava aumento da degrada- Além dos medicamentos citados, os ácidos graxos ômega 3 propiciam
ção dos LDLR com elevações dramáticas nas concentrações de LDL. Em con- reduções nos TGs (~ 25%), e os esteróis vegetais (fitosteróis e fitostanóis)
trapartida, mutações com perda de função da PCSK9 têm o efeito oposto: contribuem para redução adicional do colesterol.
aumentam a densidade do LDLR na superfície dos hepatócitos com conse- Além disso, fibras (ao redor de 25 g por dia), consumo de dieta até 30
quente aumento da remoção de partículas de LDL e redução do LDL-c. As- a 35% de gorduras (principalmente mono e poli-insaturadas), carboidratos
sim, a inibição da PCSK9 previne a ligação do LDLR à PCSK9 e a subsequente complexos e colesterol (< 200 mg/dia) também contribuem para redução
degradação lisossomal do LDLR, aumentando a densidade de receptor na do LDL-C. Deve ser estimulado o consumo de vegetais, frutas e carnes
superfície do hepatócito e a depuração das partículas circulantes de LDL. brancas, principalmente peixes. Além disso, deve-se evitar o consumo ex-
Dois inibidores da PCSK9 totalmente humanos foram aprovados no cessivo de sal (< 6 g/dia).
Brasil para comercialização em 2016, o alirocumabe e o evolocumabe, são A atividade física regular e diária (pelo menos 30 minutos/dia) aju-
aplicados por meio de injeção subcutânea − o alirocumabe a cada 2 se- da a controlar vários fatores de risco, como hipertensão arterial, obesi-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 131
■■ REFERÊNCIAS
TABELA 17.9 ■ Intensidade do tratamento hipolipemiante
1. Prospective Studies Collaboration, Lewington S, Whitlock G, Clarke R,
MEDICAMENTOS DOSES DIÁRIAS Sherliker P, Emberson J, et al. Blood cholesterol and vascular mortality by
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esperada com dose 1829-39.
diária, % 2. Ference BA, Yoo W, Alesh I, Mahajan N, Mirowska KK, Mewada A, et al.
Effect of long-term exposure to lower low-density lipoprotein cholesterol
Exemplos Baixa Moderada Alta
beginning early in life on the risk of coronary heart disease: a Mendelian
Sinvastatina 10 mg 20-40 mg 40 mg/ randomization analysis. J Am Coll Cardiol. 2012;60(25):2631-9.
ezetimiba 10 mg 3. Faludi AA, Izar MCO, Saraiva JFK, Chacra APM, Bianco HT, Afiune Neto A,
et al. Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da
Lovastatina 20 mg 40 mg Aterosclerose. Arq Bras Cardiol. 2017; 109(2Suppl1):1-76.
Pravastatina 10-20 mg 40-80 mg
Atorvastatina 10-20 mg 40-80 mg ■■ LEITURAS SUGERIDAS
Cholesterol Treatment Trialists’ (CTT) Collaborators, Mihaylova B, Emberson J,
Fluvastatina 20-40 mg 80 mg Blackwell L, Keech A, Simes J, et al. The effects of lowering LDL cholesterol
Pitavastatina 1 mg 2-4 mg with statin therapy in people at low risk of vascular disease: meta-analysis of
individual data from 27 randomised trials. Lancet. 2012;380(9841):581-90.
Rosuvastatina 5-10 mg 20-40 mg D’Agostino RB Sr, Vasan RS, Pencina MJ, Wolf PA, Cobain M, Massaro JM, et al.
General cardiovascular risk profile for use in primary care: the Framingham
Medicamentos para redução de TGs
Heart Study. Circulation. 2008;117(6):743-53.
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Ciprofibrato 100 mg Department of Atherosclerosis of Brazilian Society of Cardiology. Arq Bras
Cardiol. 2007;88 Suppl 1:2-19.
Bezafibrato 400-600 mg
Stone NJ, Robinson JG, Lichtenstein AH, Bairey Merz CN, Blum CB, Eckel RH, et
Genfibrozila 600-900 mg al. American College of Cardiology/American Heart Association Task Force
on Practice Guidelines. 2013 ACC/AHA guideline on the treatment of blood
Fenofibrato* 145-250 mg cholesterol to reduce atherosclerotic cardiovascular risk in adults: a report
Etofibrato 500 mg of the American College of Cardiology/American Heart Association Task
Force on Practice Guidelines. Circulation. 2014;129(25 Suppl 2):S1-45.
Acido nicotínico (redução TG ~ 30-50%, LDL-C 1-2 g
~ 15% e aumento de HDL-C ~20-30%)
Complementos alimentares/nutracêuticos
Ácidos graxos ômega 3 (redução TG ~ 25%) 1-4 g 18
Fitosteróis e fitostanóis (redução LDL-C ~ 10%) 1-2 g
LDL-c: colesterol da lipoproteína de baixa densidade.
HIPERTENSÃO ARTERIAL
*Reduções podem variar com base nos níveis basais, etnia e aspectos genéticos do
paciente.
18.1 NA INFÂNCIA
dade, diabetes, hipertrigliceridemia, bem como vários mecanismos de
■■ MARIA CRISTINA DE ANDRADE
aterosclerose.
■■ ANELISE DEL VECCHIO GESSULLO
e a classificação da hipertensão arterial se baseiam nos riscos de saúde hipertensão intracraniana (HIC);
atribuídos à elevação da pressão arterial (PA). uso de medicação crônica associada à elevação de PA.
A definição de hipertensão arterial nos adultos é epidemiológica,
estando o nível de elevação da PA associado com doença coronariana,
ATENÇÃO!
AVC ou doença renal. Em crianças e adolescentes, a definição é estatística
porque não existem estudos que determinem quais seriam os níveis pres- Medida da PA nas crianças é obrigatória, a partir de 3 anos de idade,
sóricos associados a doenças futuras. nas consultas de rotina e nos atendimentos de emergência.
Os valores normativos da PA na população pediátrica se baseiam nos
relatórios norte-americanos, conhecidos como Força Tarefa (Task Force),
realizados por especialistas por indicação do National Heart, Lung and TÉCNICAS DE MEDIDA DE PA
Blood Institute e pela Academia Americana de Pediatria. Deve-se medir a PA no braço direito. Em crianças acima de 2 anos, a me-
Em revisão publicada em 2004,2 estimou-se o valor normal da PA em dida será realizada com o paciente sentado, após repouso de 5 minutos;
crianças e adolescentes com base em seu percentis. Consideram-se nor- nos lactentes (até 2 anos), deve ser realizada com o paciente em decúbito
mais os valores inferiores ao do percentil 90 para idade, sexo e percentil dorsal horizontal – lembrando que seja evitado o uso prévio de alimentos ou
de estatura, conforme Tabela 18.1. medicamentos excitantes. O braço deve permanecer ao nível do precórdio
e bem apoiado. A largura do manguito a ser utilizado deverá ser em torno
de 40% da circunferência do braço, medida essa feita no ponto médio entre
TABELA 18.1 ■ Normatização dos valores de pressão arterial* o acrômio e o olecrano, e o comprimento da borracha do manguito (parte
Pressão arterial normal PAS e PAD < percentil 90 (P90) inflável) deverá ser 80 a 100% da circunferência do braço (Figuras 18.1 e
18.2). Em caso de dúvida quanto ao uso de um manguito um pouco maior
Pré-hipertensão PAS e/ou PAD ≥P90 e <P95 ou menor que o supracitado, deve-se optar por utilizar o maior, pois, se o
Hipertensão PAS e/ou PAD em ≥ P95 manguito for pequeno, serão obtidos valores pressóricos artificialmente mais
elevados. (Na Tabela 18.2 estão discriminados os tamanhos dos manguitos.)
Hipertensão, estágio 1 PAS e/ou PAD entre o P95 e P99 + 5 mmHg
Hipertensão, estágio 2 PAS e/ou PAD em ≥ P99 + 5 mmHg
*Adolescentes com pressão arterial ≥ 120x80 mmHg (mesmo abaixo do P90) são
considerados pré-hipertensos.
PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica.
Fonte: National High Blood Pressure Education Program Working Group on High
Blood Pressure in Children and Adolescents.2
■■ MEDIDA DA PA EM CRIANÇAS
A medida da PA é de fundamental importância para o estabelecimento do
diagnóstico de hipertensão arterial, assim como para avaliação da eficácia
do tratamento. FIGURA 18.1 ■ Determinação do tamanho do manguito. Medida do
2
É recomendável, de acordo diretrizes do estudo de 2004, a mensura- braço: distância do acrômio ao olécrano (calcular o ponto médio).
ção da PA na rotina em toda criança com idade superior a 3 anos, em todas
as consultas médicas. O método de escolha é o auscultatório, devendo-se
utilizar manguito adequado para o tamanho do braço da criança, confor-
me mostra a Tabela 18.2. PA elevada deverá ser confirmada por meio de
medidas repetidas (3 visitas), antes de se considerar a criança hipertensa.
Em crianças abaixo de 3 anos de idade, orienta-se a avaliação pressó-
rica nas situações a seguir citadas:
antecedentes e/ou história de prematuridade, baixo peso ao nas-
cer, ou outras complicações neonatais que tenham tido necessida-
de de cuidados intensivos;
criança portadora de cardiopatia congênita;
criança portadora de infecções urinárias de repetição, hematúria
ou proteinúria patológica, doença ou malformação nefrourológica,
história familiar de nefropatia congênita;
criança transplantada de órgão sólido; FIGURA 18.2 ■ Determinação do tamanho do manguito. Medida da
doenças oncológicas; circunferência do braço no ponto médio da distância do acrômio ao
doenças associadas à hipertensão arterial (neurofibromatose, es- olécrano.
clerose tuberosa etc.);
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 133
44 Adulto grande 16 38 Exemplo: Menina de 5 anos com altura no P50 terá PA considerada normal
se PAS <105 e PAD <68 mmHg
52 Medida na coxa 20 42 PAS (mmHg) PAD (mmHg)
Idade PA Percentil de altura Percentil de altura
(anos) Percentil P5 P10 P25 P50 P75 P90 P95 P5 P10 P25 P50 P75 P90 P95
P50 89 90 91 93 94 95 96 52 53 53 54 55 55 56
O pulso radial deverá ser palpado. Em seguida, insufla-se o manguito P90 103 103 105 105 107 109 109 66 67 67 68 69 69 70
5
até 20 mmHg acima do ponto do desaparecimento do pulso, para que P95 107 107 108 110 111 112 113 70 71 71 72 73 73 74
então o manguito seja desinsuflado lenta e gradativamente (2-3 mmHg/s), P99 114 114 116 117 118 120 120 78 78 79 79 80 81 81
até se auscultar o primeiro som audível, que corresponde à pressão sistó- Curvas de crescimento para cálculo do percentil de altura podem ser consul-
lica, sendo a diastólica aquela medida no momento do desaparecimento tadas em http://dab.saude.gov.br/portaldab/ape_vigilancia_alimentar.php?
dos sons de Korotkoff (K5). conteudo=curvas_de_crescimento.
TABELA 18.3 ■ Valores de pressão arterial para meninos de acordo com idade e percentil de estatura
7 50 92 94 95 97 99 100 101 55 55 56 57 58 59 59
90 106 107 109 111 113 114 115 70 70 71 72 72 74 74
95 110 111 113 115 117 118 119 74 74 75 76 77 78 78
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
8 50 94 95 97 99 100 102 102 56 57 58 59 60 60 61
90 107 109 110 112 114 115 116 71 72 72 73 74 75 76
95 111 112 114 116 11 119 120 75 76 77 78 79 79 80
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
9 50 95 96 96 100 102 103 104 57 58 59 60 61 61 62
90 109 110 112 114 115 117 118 72 73 74 75 76 76 77
95 113 114 116 118 119 121 121 76 77 78 79 80 81 81
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
10 50 97 98 100 102 103 105 106 58 59 60 61 61 62 63
90 111 112 114 115 117 119 119 73 73 74 75 76 77 78
95 115 116 117 119 121 122 123 77 78 79 80 81 81 82
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
11 50 99 100 102 104 105 107 107 59 59 60 61 62 63 63
90 113 114 115 117 119 150 121 74 74 75 76 77 78 78
95 117 118 119 121 123 124 125 78 78 79 80 81 82 82
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
12 50 101 102 104 106 108 109 110 59 60 61 62 63 63 64
90 115 116 118 120 121 123 123 74 75 75 76 77 78 79
95 119 120 122 123 125 127 127 78 79 80 81 82 82 83
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
13 50 104 105 106 108 110 111 112 60 60 61 62 63 64 64
90 117 118 120 122 124 125 126 75 5 76 77 78 79 79
95 121 122 124 126 128 129 130 79 79 80 81 82 83 83
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
14 50 106 107 109 111 113 114 115 60 61 62 63 64 65 65
90 120 121 123 125 126 128 128 75 76 77 78 79 79 80
95 124 125 127 128 130 132 132 80 80 81 82 83 84 84
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
15 50 109 110 112 113 115 117 117 61 62 63 64 65 66 66
90 122 124 125 127 129 130 131 76 77 78 79 80 80 81
95 126 127 129 131 133 134 135 81 81 82 83 84 85 85
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
16 50 111 112 114 116 118 119 120 63 63 64 65 66 67 67
90 125 126 128 130 131 133 134 78 78 79 80 81 82 82
95 129 130 132 134 135 137 137 82 83 83 84 85 86 87
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
17 50 114 115 116 118 120 121 122 65 66 66 67 68 69 70
90 127 128 130 132 134 135 136 80 80 81 82 83 84 84
95 131 132 134 136 138 139 140 84 85 86 87 87 88 89
99 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66
Fonte: National High Blood Pressure Education Program Working Group on High Blood Pressure in Children and Adolescents.2
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 135
TABELA 18.4 ■ Valores de pressão arterial para meninas de acordo com idade e percentil de estatura
■■ QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO a doença renal e doença renovascular as comorbidades mais frequentes.
Nessa idade, as crianças hipertensas são menos obesas e apresentam ní-
ETIOLOGIA veis pressóricos muito elevados.
Em crianças, a HAS é dividida em dois grupos, hipertensão essencial e
hipertensão secundária.
ATENÇÃO!
Hipertensão essencial
Quanto menor a idade e maior o nível pressórico, maior a probabilida-
É uma causa comum de HAS em adolescentes, mas geralmente na in- de de hipertensão arterial secundária.
fância é um diagnóstico de exclusão. É mais frequente nos adolescentes
com história familiar de HAS, com sobrepeso ou obesidade, apresentando
hipertensão leve. Pode haver associação de apneia do sono com HAS e A avaliação diagnóstica da hipertensão, tanto na criança como no
obesidade. adolescente, deve ser adequada ao quadro clínico, história familiar, valor
medido de PA e idade de apresentação. A possibilidade de se detectar
Hipertensão secundária uma causa secundária na avaliação da criança hipertensa está diretamen-
É mais comum em crianças que em adultos: se a HAS for confirmada, a te associada com a gravidade da hipertensão e inversamente relacionada
pressão arterial deve ser mensurada em ambos os braços e nas pernas. com a idade da criança.
Várias são as causas de HAS, e os sintomas específicos podem nos orien- Os objetivos da investigação clínico-laboratorial são:
tar para uma doença em particular. Na Tabela 18.5, é demonstrada a confirmar a elevação da PA e firmar o diagnóstico de hipertensão
frequência das possíveis causas de HAS. Entre as crianças hipertensas com arterial;
menos de 6 anos de vida, 83% apresentam hipertensão secundária, sendo identificar fatores de risco para doenças cardiovasculares;
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 137
Grave
Hipertensão arterial Tratamento anti-hipertensivo
Média ou Constante ou
Aguda ou crônica
moderada episódica
dicamentosa refere-se à associação de medidas para adequação do peso de órgão-alvo (hipertrofia de ventrículo esquerdo, microalbuminúria,
corpóreo, programação de exercício físico e intervenção dietética. A redu- retinopatia hipertensiva). Ainda, devem-se tratar com medicações anti-
ção de peso apresenta bons resultados no tratamento da criança obesa -hipertensivas as crianças hipertensas com diabetes melito tipo 1 ou 2 e
hipertensa. O exercício físico leva a uma sensível redução de peso e de PA aquelas com hipertensão persistente não responsiva à terapêutica não
(como já indicado, este efeito é mais efetivo sobre os valores da pressão sis- farmacológica.
tólica do que da diastólica). Recomenda-se atividade aeróbia regular – isto O objetivo na hipertensão não complicada é a redução da PA a valores
é, 30 a 60 min de exercício físico moderado, se possível diariamente –, com inferiores ao P95 para idade cronológica, sexo e percentil de estatura; e na
concomitante redução das atividades sedentárias de lazer, no sentido de hipertensão complicada, caracterizada por evidência de lesão de órgão-
prevenir obesidade, hipertensão e outros riscos cardiovasculares. -alvo, comorbidades ou presença de fatores de risco, como a dislipidemia,
a redução para valores abaixo do P90 para idade cronológica, sexo e per-
TERAPIA MEDICAMENTOSA centil de estatura.
A terapêutica medicamentosa deve ser iniciada em caso de hipertensão É recomendável o início da terapêutica com um agente anti-hiper-
sintomática, hipertensão secundária ou quando há evidências de lesão tensivo, otimizando-se sua dose: se o controle adequado da PA não for
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 139
obtido, adicionam-se outros grupos medicamentosos, em sequência, até pulmonar, lesão renal aguda (LRA), convulsões, infarto do miocárdio e
que o alvo de medida de pressão arterial seja atingido. Recomenda-se crise adrenérgica.
o emprego das seguintes classes de medicamentos anti-hipertensivos O tratamento objetiva a redução de 25% no nível da PA durante as
para uso pediátrico: bloqueadores de canal de cálcio, IECA, bloqueado- primeiras horas, sendo recomendável que a PA média não seja reduzida
res de receptor AT1 da angiotensina II, betabloqueadores, bloqueadores abaixo do P90 antes de 24 a 48 horas do início do quadro.
de canal de cálcio (BCC) e diuréticos.
A Tabela 18.7 reúne as doses pediátricas para os hipotensores mais ATENÇÃO!
prescritos para o tratamento da hipertensão crônica. No caso de crian-
ças com hipertensão secundária, a terapêutica medicamentosa deverá ser A redução rápida da PA deve ser evitada, pois pode levar à diminuição
adequada ao tratamento da doença de base. do fluxo sanguíneo cerebral, desencadeando síncope, podendo evoluir
para infarto do córtex cerebral, base do cérebro ou retina.
■■ EMERGÊNCIA HIPERTENSIVA
O medicamento mais utilizado em nosso meio para o tratamento da
Pacientes que apresentam hipertensão arterial grave (> P99) ou elevação
emergência hipertensiva é o nitroprussiato de sódio. É recomendável o
aguda da pressão arterial requerem intervenção imediata, por se tratar de
início com dose baixa de 0,5-1 µg/kg/min, com aumento progressivo até
possível urgência ou emergência hipertensiva. 8 µg/kg/min, quando necessário.
Ocorre emergência hipertensiva quando há elevação da pressão ar- A Tabela 18.8 demonstra as medicações e suas respectivas doses uti-
terial associada à lesão de órgão-alvo (cérebro, coração e/ou rins). As lizadas na emergência hipertensiva em pediatria.
manifestações clínicas nessas emergências incluem, entre outras, ence-
falopatia hipertensiva, insuficiência cardíaca congestiva (ICC), edema
TABELA 18.7 ■ Medicamentos orais mais utilizados para o tratamento da hipertensão arterial pediátrica
Bloqueador do receptor angiotensina Losartan 0,7 (máximo de 50 mg/dia) 1,4 (máximo de 100 mg/dia) 24h
Minoxidil
TABELA 18.8 ■ Principais medicamentos e doses pediátricas utilizados para controle da emergência hipertensiva
QUADRO 18.2 ■ Medicamentos e drogas, lícitas e ilícitas, relacionadas com o desenvolvimento ou agravamento da HA
Anti-inflamatórios
Glicocorticoide Variável e frequente Restrição salina, diuréticos, diminuir dose
Não esteroides (Inibidores da ciclo-oxigenase 1 e 2) Eventual, muito relevante com uso contínuo Observar função renal, uso por período curto
Anorexígenos/sacietógenos
Anfepramona e outros Intenso e frequente Suspensão ou redução da dose
Sibutramina Moderado, pouco relevante Avaliar redução da PA obtida com redução do peso
Vasoconstritores, incluindo derivados do Ergot Variável, transitório Usar por período curto determinado
Hormônios
Eritropoetina humana Variável e frequente Avaliar hematócrito e dose semanal
Anticoncepcionais orais Variável, prevalência de até 5% Avaliar substituição de método com especialista
Terapia de reposição estrogênica (estrogênios Variável Avaliar risco e custo/benefício
conjugados e estradiol) Variável, dose-dependente Suspensão
Hormônio de crescimento (adultos)
Antidepressivos
Inibidor da monoaminoxidase Intenso, infrequente Abordar como crise adrenérgica
Tricíclicos Variável e frequente Abordar como crise adrenérgica
NORMOTENSÃO HIPERTENSÃO
Nenhum fator de risco Risco basal Risco basal Risco basal Risco baixo Risco moderado Risco alto
1 ou 2 fatores de risco Risco baixo Risco baixo Risco baixo Risco moderado Risco moderado Risco muito alto
3 ou + fatores de risco Risco moderado Risco moderado Risco alto Risco alto Risco alto Risco muito alto
Lesões em órgãos-alvo
subclínica ou diabetes
melito ou síndrome
metabólica
Lesões em órgãos-alvo Risco muito alto Risco muito alto Risco muito alto Risco muito alto Risco muito alto Risco muito alto
estabelecidas: IM,
AVC, ICC, IRC, DAE
DAE: doença arterial de extremidades; ICC: insuficiência cardíaca congestiva; IM: infarto do miocárdio; IRC: insuficiência renal crônica.
1
Fonte: Sociedade Brasileira de Cardiologia e colaboradores.
de efeitos colaterais. Cada vez mais, em todo mundo, orienta-se um trata- A velocidade em atingir a meta tem relevância clínica, e, geralmen-
mento medicamentoso individualizado e associado a mudanças no estilo de te, será necessária a associação de medicamentos, de forma fixa ou não,
vida, utilizando o insubstituível juízo clínico para a meta a ser alcançada. desde que sejam eficazes e com diferentes e complementares mecanis-
mos de ação. A adesão ao tratamento é fundamental para o benefício, e
■■ TRATAMENTO o trabalho em equipe multiprofissional e interdisciplinar deve ser sempre
encorajado.
TRATAMENTO NÃO MEDICAMENTOSO OU
MUDANÇAS NO ESTILO DE VIDA ATENÇÃO!
Existem poucos estudos que comprovem suas eficácias, preconizando-se:
perda de peso: a cada perda de 10 kg, há uma diminuição esperada O principal objetivo do tratamento anti-hipertensivo é a redução da
de 6 mmHg na PA sistólica e 4,6 mmHg na diastólica; morbidade e mortalidade associadas à HA, e seu principal desafio é o
IMC: Meta de IMC < 25 kg/m2; cintura abdominal < 102 cm em controle adequado da PA, alcançando-se a meta pressórica. A redução
homens e < 88 cm em mulheres; da PA é benéfica para diminuir o risco de eventos cardiovasculares e
dieta hipossódica: correspondente a menos do que 100 mEq/dia de renais fatais ou não.
sódio; preferencialmente, utilizar a dieta denominada DASH (diet
approaches to stop hypertension), que, além de ser hipossódica
(< 5 g/dia), caracteriza-se por ter baixo teor de gorduras saturadas CLASSES DE ANTI-HIPERTENSIVOS
e ser rica em frutas, verduras e legumes; Existem sete classes de medicamentos que comprovadamente reduzem a
atividade física: exercícios físicos aeróbios por pelo menos 30 mi- PA e a incidência de complicações cardiovasculares:
nutos de forma contínua ou acumulada na maioria dos dias da se- 1 | diuréticos
mana (5 a 7 dias); 2 | inibidores adrenérgicos ou simpatolíticos:
moderado consumo de álcool: < 30 g para homens e 15 g para a | β-bloqueadores – bloqueadores β-adrenérgicos
mulheres. b | α-bloqueadores – bloqueadores α1-adrenérgicos
c | α-bloqueadores e β-bloqueadores
TRATAMENTO MEDICAMENTOSO d | β-bloqueadores com atividade vasodilatadora dependente de óxido
A escolha do medicamento anti-hipertensivo inicial deve levar em conta as nítrico
características do indivíduo, buscando sua adesão, o consequente contro- e | simpatolíticos de ação central
le pressórico estabelecido e a melhor proteção aos órgãos-alvo. 3 | bloqueadores dos canais lentos de cálcio (BCCa)
4 | IECA
5 | bloqueadores dos receptores AT1 da angiotensina II
ATENÇÃO! 6 | inibidores diretos de renina
A estratificação de risco cardiovascular é a base de decisão terapêu- 7 | vasodilatadores de ação direta
tica, e a escolha do anti-hipertensivo deve considerar a presença de Diuréticos
fatores de risco associados e de síndrome metabólica, presença de
diabetes ou de LOA. O mecanismo de ação comum a todos os diuréticos é a inibição da rea-
bsorção de sódio e água em diferentes segmentos dos túbulos renais. A
144 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
princípio, produzem diurese e natriurese, reduzindo a PA por diminuição do miocárdio e na presença de proteinúria. O eplerenone não está dispo-
do débito cardíaco, com aumento compensatório da resistência periférica. nível no Brasil.
Após 4 a 6 semanas, o volume plasmático praticamente se normaliza e a Os diuréticos utilizados no tratamento da HA disponíveis no Brasil são
resistência periférica passa a ser a responsável pela diminuição persistente apresentados na Tabela 18.10.
dos níveis pressóricos.
São quatro os tipos de diuréticos existentes: tiazídicos e seus simila-
res, em especial a clortalidona; diuréticos de alça; poupadores de potás- TABELA 18.10 ■ Diuréticos disponíveis no Brasil
sio; e osmóticos. Os tiazídicos e seus similares são os mais utilizados no
tratamento da HA; os diuréticos osmóticos não são empregados com essa DOSE DOSE NÚMERO DE
MÍNIMA MÁXIMA TOMADAS
finalidade e, portanto, não serão objeto de análise.
MEDICAMENTO (mg/dia) (mg/dia) (dia)
1 | Diuréticos tiazídicos e similares: agem na porção inicial do túbulo
contorcido distal (TCD) inibindo o cotransportador de Na+Cl- localizado na Tiazídicos e similares
membrana apical. Muito eficazes, têm boa tolerância em baixas doses,
estão disponíveis na rede pública, apresentam ação prolongada, permi- Hidroclorotiazida 12,5 25 1
tindo dose única diária, potencializam todas as demais classes de anti-
Clortalidona 12,5 25 1
-hipertensivos e podem ser opções de monoterapia. Seus efeitos colaterais
são proporcionais às doses, destacando-se: depleção de volume; hipopo- Indapamida 2,5 5 1
tassemia; hiponatremia; hipocloremia; hipercalcemia; hiperglicemia; hi-
percolesterolemia (LDL); hiperuricemia; hipomagnesemia; e hipertrigliceri- Indapamida SR 1,5 3 1
demia. Outros efeitos, como impotência, sintomas digestórios, hipotensão Diuréticos de alça
ortostática, podem ser observados.
Levando-se em conta custo, efetividade, segurança e redução de Furosemida 20 * 1-2
eventos e as complicações da HA, os diuréticos tiazídicos e seus similares
podem ser considerados 1a ou 2a escolha, visto que potencializam todos os Bumetamida 0,5 * 1-2
demais medicamentos. São preferenciais em obesos, pretos e idosos em Piretanida 6 12 1
baixas dosagens.
Poupadores de potássio
O efeito natriurético dos tiazídicos é muito reduzido quando o RFG se Amilorida (em associação) 2,5 10 1
2
reduz abaixo de 30 a 50 mL/min/1,73 m , ocasião em que deve ser Triantereno (em associação) 50 100 1
substituído por diurético de alça.
*Doses variáveis conforme indicação clínica.
SR: liberação lenta, do inglês slow release.
A melhor evidência científica disponível para que a clortalidona e, con-
sequentemente, os tiazídicos possam ser utilizados como anti-hipertensivos
de 1a escolha foi a publicação do estudo denominado ALLHAT The An- Inibidores adrenérgicos ou simpatolíticos
tihypertensive and Lipid-Lowering Treatment to Prevent Heart Attack Trial.
3
1 | β-bloqueadores ou bloqueadores β-adrenérgicos
Metanálises subsequentes demonstraram que os diuréticos são superiores a Os β-bloqueadores apresentam vários mecanismos de ação – são sim-
todos os outros medicamentos nos desfechos cardiovasculares primordiais. patolíticos de ação periférica, pois inibem os receptores β pré-sinápticos,
2 | Diuréticos de alça: agem inibindo o transporte de sódio pelo cotrans- promovem a readaptação dos barorreceptores e agem no SNC –, sendo
portador Na+, K+, 2 Cl- localizado na membrana apical do túbulo renal considerados igualmente simpatolíticos de ação central. Atuam ainda no
no ramo ascendente espesso da alça de Henle. Devem ser utilizados em aparelho justaglomerular, reduzindo à metade a liberação de renina, são
situações em que a HA se associa a estados edematosos com retenção inotrópicos e cronotrópicos negativos e alteram sistemas vasodilatadores,
2
hidrossalina, como doença renaI crônica (RFG < 30 a 50 mL/min/1,73 m ), como prostaglandinas e cininas.
ICC, síndromes nefrótica e nefrítica, em associação com vasodilatadores e Seus principais efeitos colaterais são:
na HA resistente. cardiovasculares: bradicardia, bloqueio atrioventricular, pareste-
3 | Diuréticos poupadores de potássio: suaves e pouco potentes, são sias, insuficiência arterial, fenômeno de Raynaud, hipotensão pos-
habitualmente utilizados em associação a outros diuréticos. Agem no final tural e “efeito rebote” quando suspensos abruptamente;
do TCD e no ducto coletor inibindo os canais de Na+ epiteliais (amilorida SNC: tonturas, insônia, depressão, sonhos vívidos, alucinações,
e triantereno) ou antagonizando a aldosterona. Seu uso se limita ao trata- labilidade emocional;
mento da HA associada à hipocalemia, na HA resistente e em indivíduos tubo digestório: náuseas, vômitos, peso epigástrico, diarreia, cons-
obesos. Podem determinar hiperpotassemia em pacientes com déficit de tipação e colite isquêmica;
função renal (RFG < 60 mL/min/1,73 m2) e/ou em uso de bloqueadores respiratório: broncoespasmo;
do sistema reticular ativado ascendente (SRAA). Apresentam efeitos an- gerais e metabólicos: fraqueza, fadiga, impotência, aumento de
tiandrogênicos que limitam sua utilização especialmente em pacientes do TGs e diminuição de HDL, intolerância à glicose.
sexo masculino. Os antagonistas dos receptores mineralocorticosteroides Estão indicados na HA hiperadrenérgica em jovens e em situações de
não seletivos (espironolactona) e específicos (eplerenone) são eficazes no estresse e ansiedade, na coronariopatia isquêmica, nas arritmias (taquicar-
tratamento do hiperaldosteronismo primário e secundário e também são dia e fibrilação atrial) e no pós-infarto do miocárdio. Também são úteis em
utilizados na prática clínica para prevenção de fibrose cardíaca pós-infarto pacientes portadores de enxaqueca, tremor essencial, hipertensão porta
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 145
e prolapso de válvula mitral. Metanálises demonstraram que um betablo- em monoterapia. A clonidina por VO pode ser usada no tratamento das
queador (atenolol) não reduz desfechos primordiais em pacientes idosos urgências e emergências hipertensivas, em doses de 0,100 a 0,200 mg/
(> 60 anos), devendo ser evitado nessa população, assim como em cho- dose, até o máximo de 0,600 mg. São inúmeros os efeitos colaterais pos-
que cardiogênico. Os betabloqueadores estão contraindicados em asma síveis, que dependem da dose e de sua ação central. Discute-se o uso da
brônquica e doença pulmonar com broncoespasmo, bloqueio atrioventri- clonidina como a 4 a medicação no tratamento da HA resistente, apesar de
cular > 1o grau, doença arterial obstrutiva de extremidades, bradicardia que a maioria das diretrizes existentes preconizem a espironolactona para
com frequência cardíaca (FC) < 50 bpm, diabetes melito (DM) descompen- esta condição, ao lado do tripé composto por um bloqueador do SRAA, um
sado e fenômeno de Raynaud. Os betabloqueadores disponíveis no Brasil BCCa e um diurético apropriado.
estão na Tabela 18.11. Os simpatolíticos de ação central disponíveis no Brasil estão na
Tabela 18.12.
TABELA 18.13 ■ Antagonistas de cálcio disponíveis no Brasil TABELA 18.14 ■ IECA disponíveis no Brasil
Benazepril 5 20 1
Nifedipino retard 20 60 2
Quinapril 10 20 1
Nifedipino oros 30 60 1
Cilazapril 2,5 5 1
Nifedipino GITS 30 90 1
Ramipril 2,5 10 1
Felodipino 5 20 1-2
Lisinopril 5 20 1
Isradipino 2,5 20 2
Fosinopril 10 20 1
Nisoldipino 5 40 1-2
Perindopril 4 8 1
Nitrendipino 10 40 2-3
Trandolapril 2 4 1
Anlodipino 2,5 10 1
cente nas comprovações de indicações de BRA em ICC, IAM, HVE, AVC e diazóxido, será abordado no capítulo sobre emergências hipertensivas.
em diabéticos com micro ou macroalbuminúria. Seus efeitos colaterais e Recomenda-se fortemente que, assim que possível, sejam associados
contraindicações são semelhantes aos dos IECA. a ele medicamentos anti-hipertensivos por VO, facilitando sua rápida
suspensão.
Inibidores diretos de renina
Trata-se de um único representante da classe – o alisquireno –, um me-
dicamento que se liga com alta afinidade ao sítio catalítico da renina, REVISÃO
impedindo que o angiotensinogênio seja clivado em angiotensina I, re-
Todo paciente deve ter confirmado o diagnóstico de HA por medidas
duzindo, assim, a formação de angiotensina II, responsável pela maioria
superiores aos valores considerados normais de forma sustentada.
dos efeitos da ativação do SRAA. A redução da AII, por sua vez, provoca
A medida da PA requer conhecimento da técnica correta e dos fa-
inibição do feedback negativo da liberação de renina, com aumento na
tores que podem levar a medidas super ou subestimadas. Embora
concentração plasmática de renina, mas não em sua atividade. Outra
cerca de 90% dos indivíduos tenham hipertensão primária, sempre
diferença é o fato de potencialmente diminuir o número de receptores
se devem afastar possíveis causas secundárias em pacientes sus-
na superfície celular dos órgãos-alvo da hipertensão (down regulation),
peitos ou encaminhá-los para um centro de referência com essa
diminuindo, assim, a sinalização para hipertrofia e/ou fibrose. É eficaz por
finalidade.
via oral em monoterapia, apresenta relação vale-pico de 98% na dose a
É preciso solicitar sempre na 1 consulta e pelo menos anualmente a
de 300 mg e meia-vida prolongada, o que possibilita dose única diária.
rotina laboratorial mínima para HA.
Provoca redução adicional da PA quando em associação com diuréticos
Estratificar o risco é imperioso, levando-se em conta os valores da
tiazídicos. A segurança e a tolerabilidade do medicamento foram ava-
PA, detecção dos fatores de risco, presença de doença cardiovas-
liadas de forma positiva. Não deve ser utilizado em associação a outros
cular e/ou renal, diabetes, LOA ou lesões subclínicas. É preciso con-
bloqueadores do SRAA.
trolar os fatores de risco evitáveis e prescrever mudanças no estilo
Vasodilatadores de ação direta de vida para todos os pacientes hipertensos, pois se beneficiarão
disso.
São medicamentos restritos ao tratamento da HA resistente, em associa-
Deve-se estabelecer meta pressórica e persegui-la, sem inércia.
ção, como 4a ou 5a escolha. O mecanismo de ação desses fármacos está
É importante trabalhar em equipe multiprofissional e interdiscipli-
relacionado a uma vasodilatação direta da musculatura lisa da parede
nar para melhor adesão ao tratamento. Deve-se escolher o melhor
vascular, o que determina hiperatividade simpática e do SRAA, com con-
medicamento ou associação de medicamentos, levando em conta
sequentes taquicardia reflexa e retenção hidrossalina. Sua melhor eficácia
o perfil do paciente e ajustando-os até o controle pressórico esta-
e segurança estão em sua associação a um diurético de alça e um beta-
belecido.
bloqueador. Os vasodilatadores podem desencadear efeitos indesejáveis
A HA geralmente é assintomática, não tem cura, mas tem controle,
devidos justamente à sua potente ação vascular (cefaleia, náuseas, rubor,
podendo-se evitar ou postergar suas complicações.
taquicardia e retenção de volume). Além disso, estão contraindicados em
casos de dissecção aguda de aorta, isquemia miocárdica, HVE e hemorra-
gia cerebral.
■■ REFERÊNCIAS
1 | Hidralazina: possui efeito vasodilatador predominantemente arterio-
1. Sociedade Brasileira de Cardiologia; Sociedade Brasileira de Hipertensão;
lar. É considerada de escolha no controle da doença hipertensiva espe-
Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão.
cífica da gravidez (pré-eclâmpsia e eclâmpsia), por VO ou IV, sendo esta Arq Bras Cardiol. 2010;95(1 Suppl):1-51.
última, continuamente ou em bólus. Nessa condição de exceção, pode 2. SPRINT Research Group, Wright JT Jr, Williamson JD, Whelton PK, Snyder
ser utilizada em monoterapia. O efeito colateral mais grave e específico JK, Sink KM, et al. A randomized trial of intensive versus standard blood-
desse medicamento é a possibilidade de alterações imunológicas, como pressure control. N Engl J Med. 2015;373(22):2103-16.
síndrome lúpus-like, anemia hemolítica, vasculite, doença do soro e glo- 3. ALLHAT Officers and Coordinators for the ALLHAT Collaborative Research
merulonefrite rapidamente progressiva. Em todos esses casos, deve ser Group. The Antihypertensive and Lipid-Lowering Treatment to Prevent
descontinuada imediatamente. A dose mínima é de 50 mg, e a máxima, de Heart Attack Trial. Major outcomes in high-risk hypertensive patients
randomized to angiotensin-converting enzyme inhibitor or calcium channel
200 mg ao dia, divididas em 2 a 3 tomadas.
blocker vs diuretic: The Antihypertensive and Lipid-Lowering Treatment to
2 | Minoxidil: potente vasodilatador arterial por VO. Utilizado em pacien-
Prevent Heart Attack Trial (ALLHAT). JAMA. 2002;288(23):2981-97.
tes portadores de hipertensão resistente, mesmo naqueles portadores de
doença renal crônica. Deve ser associado a diurético de alça e betabloque-
ador. Efeito colateral específico do minoxidil é a hipertricose, limitando ■■ LEITURAS SUGERIDAS
seu uso no sexo feminino. Rashes, síndrome de Stevens-Johnson, into- James PA, Oparil S, Carter BL, Cushman WC, Dennison-Himmelfarb C, Handler
lerância à glicose, formação de fatores antinucleares e trombocitopenia J, et al. 2014 evidence-based guideline for the management of high blood
também podem ocorrer eventualmente. A dose mínima é de 2,5 mg, e a pressure in adults: report from the panel members appointed to the Eighth
máxima, de 80 mg diárias, divididas em 2 a 3 tomadas. Joint National Committee (JNC 8). JAMA. 2014;311(5):507-20.
Krause T, Lovibond K, Caufield M, McCormack T, Williams B. Management of
3 | Diazóxido: anti-hipertensivo potente, de uso IV, em bólus ou conti-
hypertension: summary of NICE guidance. BMJ. 2011;343:d4891.
nuamente, em adultos e crianças com urgência ou emergência hipertensi-
Mancia G, Fagard R, Narkiewicz K, Redón J, Zanchetti A, Böhm M, et al. 2013
va (será discutido no capítulo pertinente). ESH/ESC Guidelines for the management of arterial hypertension: The Task
4 | Nitroprussiato de sódio: único vasodilatador intravenoso exclu- Force for the management of arterial hypertension of the European Society
sivo, com ações arteriolar e venular, diminuindo a pré e a pós-carga. of Hypertension (ESH) and of the European Society of Cardiology (ESC). J
É o principal aliado no tratamento do edema agudo hipertensivo e em Hypertens. 2013;31(7):1281-357.
outras formas de urgência e emergência hipertensivas. Assim como o
148 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
■■ QUADRO CLÍNICO
A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é uma das principais doenças A HAS é uma doença eminentemente assintomática. Sintomas inespecífi-
crônicas dos idosos. Sua prevalência aumenta progressivamente com a cos, tais como cefaleia, alterações visuais e tontura, podem ocorrer, sem
idade (Figura 18.5).1 Estudo epidemiológico com idosos residentes na porém colaborar muito para o diagnóstico correto. Pelo fato de ser uma
cidade de São Paulo encontrou prevalência de HAS de 62%, sendo que doença muito prevalente e assintomática, as medidas de rastreio popula-
mais de 60% destes eram portadores de hipertensão sistólica isolada cional da doença são importantes para o diagnóstico precoce e o início de
(HSI). Apenas 16% destes idosos hipertensos estavam com a pressão tratamento, evitando suas complicações.
controlada.2 Outra forma de apresentação clínica é o aparecimento de complica-
Na população idosa, a HAS também é o principal fator de risco car- ções ou lesões de órgãos-alvo, o que geralmente ocorre após um longo
diovascular e está associada à DAC, à doença cerebrovascular (DCeV), a tempo de evolução da doença. O diagnóstico realizado na vigência de uma
síndromes demenciais, à IC, à doença renal terminal, à doença arterial síndrome coronariana ou de um AVC é importante, porém revela a falha do
periférica, à HVE, à disfunção diastólica, além de distúrbios oftalmológi- diagnóstico precoce e na prevenção das complicações relacionadas com
cos, como retinopatia hipertensiva, oclusão da artéria central da retina e a doença.
degeneração macular. Tais condições estão intimamente relacionadas à
qualidade de vida do idoso. ■■ DIAGNÓSTICO
O diagnostico de HAS deve ser confirmado com pelo menos três medidas
■■ FISIOPATOLOGIA de PA realizadas em ao menos 2 visitas diferentes a profissionais de saúde,
Com o envelhecimento, os grandes vasos se tornam mais rígidos, menos médicos ou membros da equipe treinados.
complacentes ao volume ejetado pelo ventriculo na sístole, e, por isso, a
onda de pulso torna-se mais rápida. Essa alteração da velocidade, assim AFERIÇÃO DA PRESSÃO ARTERIAL
como a soma das duas ondas (de pulso e reflexa) geram um aumento da A técnica para aferição da pressão arterial (PA) deve ser seguida para to-
PAS e uma diminuição da PAD. dos os pacientes: paciente sentado em repouso por pelo menos 5 minutos,
100
90
80
Homens Mulheres
Porcentagem da população
70
60
50
40
30
20
10
Idade (anos)
com o dorso apoiado, com os pés no chão, braço apoiado e relaxado, man-
TABELA 18.17 ■ Peculiaridades na medida da PA e diagnóstico da
guito de tamanho adequado e no nível do coração. Inicialmente medir nos
HAS no idoso
dois braços e, caso haja diferença > 10 mm Hg entre eles, passar a utilizar
o braço de maior valor. PECULIARIDADE CARACTERÍSTICA COMO EVITAR ERRO
INVESTIGAÇÃO CLÍNICO-LABORATORIAL
Ao se medir a PA de um indivíduo idoso deve-se atentar para algumas
peculiaridades que possuem maior frequência entre os idosos, conforme A avaliação do idoso deve sempre incluir história clínica detalhada e exa-
descrito na Tabela 18.17. me físico minucioso. Os exames complementares no idoso hipertenso têm
Ainda sobre o diagnóstico, existem recursos complementares, com o intuito principal de:
a mesma aceitação e adesão pelos idosos que pelos adultos jovens. Me- Identificar e tratar causas reversíveis de hipertensão.
recem destaque a MAPA e a MRPA, as quais permitem o diagnóstico de Avaliar presença de lesão em órgão-alvo.
hipertensão do avental branco (prevalência de 30% em idosos), hiperten- Investigar a presença de outros fatores de risco cardiovascular, ou-
são mascarada, a avaliação da eficácia terapêutica, avaliação da hiperten- tras comorbidades e o prognóstico delas.
são arterial resistente e da suspeita de episódios sintomáticos ou não de As lesões de órgão-alvo, como alterações no fundo do olho, insufi-
hipotensão arterial. ciência renal, doença cardiovascular, HVE e aterosclerose periférica, são
150 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
mais frequentes nos idosos, seja pelo tempo mais longo de HAS ou pela Merece destaque ainda a dieta DASH, que não exige modificações
presença de outros fatores de risco. radicais dos hábitos (orienta a diminuição do consumo de gorduras satu-
Entre as causas de HAS secundária nos idosos destacamos a esteno- radas e colesterol e o aumento do aporte de proteínas, potássio, cálcio,
se de artéria renal, a apneia obstrutiva do sono, o hiperaldosteronismo magnésio e fibras), além de ser um tratamento simples, barato e eficaz
primário, os distúrbios tiroideanos, o uso de medicamentos que causam para prevenção e tratamento da HAS.
aumento da pressão arterial (p. ex., anti-inflamatórios não hormonais e Devemos ter cuidado no tratamento dietético de idosos para não
glicocorticoides) e o abuso de drogas, como tabaco ou álcool. orientar dietas com muitas restrições e estar atentos aos idosos com sar-
Na investigação laboratorial, recomenda-se: copenia ou obesidade sarcopênica para não agravar o quadro nutricional
Urinálise (urina tipo I). destes pacientes.
Microalbuminúria. A prática de atividade física nos idosos deve ser individualizada para
Bioquímica sérica. as limitações presentes em cada indivíduo. Consideramos que todo ido-
Perfil lipídico. so deve ser incentivado à prática de atividades físicas, sendo respeitadas
Glicemia. suas limitações e suas comorbidades.
Eletrocardiograma.
Ecocardiograma. ADESÃO À TERAPÊUTICA
Avaliação de comorbidades e síndromes geriátricas: com o intuito Um dos maiores desafios no tratamento da hipertensão consiste na ade-
de avaliar funcionalidade, qualidade de vida e prognóstico do idoso, deve- são do individuo, o que não é diferente nos de faixa etária mais avançada.
-se realizar Avaliação Geriátrica Ampla, utilizando escalas validadas. Entre A constante orientação e educação ao hipertenso sobre sua doença,
as comorbidades e os respectivos testes, destacam-se: com apoio da equipe multiprofissional e consultas médicas frequentes (a
depressão (GDS – Geriatric Depression Scale); cada 3 ou 4 semanas), principalmente no inicio do tratamento, facilitam o
déficit cognitivo (Mini-Exame do Estado Mental, Teste do Relógio, entendimento e comprometimento do idoso.
Teste de Fluência Verbal); A escolha do anti-hipertensivo deve ser cuidadosa, com especial aten-
avaliação funcional (Atividades de Vida Diária – básicas e instru- ção para meia-vida do medicamento (priorizar os que necessitem menores
mentais). tomadas diárias), sua interações e relações com problemas de saúde espe-
Tais testes são de aplicação relativamente rápida e simples, após trei- cialmente presentes no idoso, como cardiopatias, incontinência urinária e
namento e experiência. hipotensão ortostática.
A terapia combinada com doses baixas de dois ou mais medicamen-
tos, em geral, é mais eficaz e apresenta menos eventos adversos do que a
■■ TRATAMENTO
monoterapia em doses altas. A utilização, sempre que possível, de combi-
São claras as evidências a favor do tratamento da hipertensão no idoso. As nação fixa de anti-hipertensivos de tomada única diária é preferível, visan-
últimas diretrizes recomendam, para idosos hipertensos não complicados, do a uma melhor adesão terapêutica.
como meta de controle pressórico, uma PA ≤140/90 mmHg, desde que
bem tolerada, e naqueles acima dos 80 anos de idade, uma PAS abaixo de TRATAMENTO MEDICAMENTOSO
150 mmHg. Em pacientes com níveis muito elevados de PAS, valores de O tratamento da hipertensão no idoso, como demonstrado em diversos
até 160 mmHg podem ser tolerados inicialmente. ensaios clínicos controlados, reduz não somente a incidência de eventos
Após a publicação do estudo SPRINT (Systolic Blood Pressure Inter- cardiovasculares, como também de déficit cognitivo e demência.
vention Trial)5, no final de 2015, temos a tendência de ser mais agressivos Na Tabela 18.18, encontram-se dispostas as classes de anti-hiperten-
nas metas a serem atingidas nas PAS com o tratamento da hipertensão, sivos e quando sua escolha deve ser preferida conforme as diversas co-
já que este estudo mostrou benefícios robustos do controle mais rígido morbidades frequentemente encontradas nos idosos. Atentar para o fato
da pressão (PAS <120 mmHg). Os idosos com mais 75 anos de idade, que de que os idosos possuem em média 3 a 5 doenças crônicas e somente 6%
eram um subgrupo pré-especificado, apresentaram os mesmos benefícios se considera livre de doenças.
que os sujeitos abaixo desta idade. Esses benefícios se mantiveram até
mesmo nos idosos com baixa velocidade de marcha. Acreditamos, então,
que a individualização das metas com uma tendência a metas mais rí- ATENÇÃO!
gidas, desde que bem toleradas, seja o mais adequado, principalmente
naqueles com boa capacidade funcional. Preferir sempre a introdução e o ajuste gradual do anti-hipertensivo,
Nos idosos portadores de múltiplas comorbidades não cardiovascu- com doses baixas inicialmente, sem deixar de visar ao alvo pressórico.
lares ou frágeis, o tratamento anti-hipertensivo deve ser individualizado. Melhor controle e adesão iniciais são notados com retornos ambulato-
riais frequentes a cada 2 a 4 semanas.
TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO
Todos os pacientes hipertensos devem ser incentivados a realizar de forma Algumas orientações baseadas na análise crítica de ensaios clínicos,
correta o tratamento não farmacológico. Idosos portadores de HAS em como ALLHAT, ANBP-2, LIFE, VALUE e ASCOT-BPLA: a) os betabloqueado-
Estágio 1 podem ser tratados somente com mudanças no estilo de vida. res não representam opção anti-hipertensiva inicial para idosos, na ausên-
Estas incluem cessação do tabagismo, perda do peso em excesso (meta cia de indicação formal; b) 2 ou mais fármacos são necessários para con-
IMC < 27 kg/m2), redução do estresse mental, orientações dietéticas e trole pressórico adequado da maioria dos idosos; e c) controle pressórico
prática de atividade física. precoce apresenta importante papel na prevenção cardiovascular.
A dieta tem grande importância no controle da HAS, principalmente
as que incluem redução da ingestão de sal e álcool, maior consumo de Diuréticos
potássio e possivelmente aumento no consumo de alguns micronutrientes Os diuréticos tiazídicos (hidroclorotiazida, clortalidona) são recomenda-
como cálcio, assim como a dieta vegetariana. dos como terapia inicial, pois são bem tolerados, de baixo custo e compro-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 151
BETABLOQUEADORES
TABELA 18.18 ■ Perfil de efeito dos anti-hipertensivos em outras
doenças comuns no idoso Apesar de não serem indicados como monoterapia inicial nos idosos hí-
gidos, sabe-se que a prevalência de comorbidades que indicam seu uso
CLASSE DO aumenta progressivamente com a idade.
FÁRMACO PREFERIR EM EVITAR EM No idoso, evitar os betabloqueadores lipossolúveis, como o proprano-
lol, pelos efeitos adversos que envolvem o sistema nervoso central (sono-
Diuréticos tiazídicos ICC, osteoporose Incontinência urinária,
lência, depressão, confusão mental, dsiturbio do sono).
prostatismo, gota
Suas contra-indicações se limitam ao broncoespasmo grave, doença
Betabloqueadores ICC, doença coronária Bradiarritmias, arterial periférica grave ou IC descompensada. Portanto, devem ser usa-
(principalmente pós- broncoespasmo, dos em todos os idosos portadores de insuficiência coronariana (principal-
IAM), taquiarritmias, insuficiência arterial mente após infarto) ou insuficiência cardíaca.
migrânea, periférica grave
tremor essencial, BLOQUEADORES DO RECEPTOR DE ANGIOTENSINA II
hipertiroidismo As indicações dos antagosnistas da angiotensina II, assim como seus cui-
Antagonistas dos Insuficiência ICC (exceto anlodipino dados para o uso em idosos, são semelhantes às do IECA. Estudos clínicos,
canais de cálcio arterial periférica, e felodipino) com inclusão de grande número de idosos, demonstraram a segurança e
insuficiência o benefício desta classe em hipertensos. Merece destaque por ser a classe
coronariana de medicamentos que apresenta o menor risco de efeitos adversos.
sintomática, HSI
OUTRAS CLASSES
IECA e bloqueadores ICC, IAM ou AVC IRC severa, estenose
Devido ao risco de efeitos colaterais graves, outras classes de anti-hiper-
da Ag. II prévios, doença de artéria renal
tensivos têm seu uso limitado em idosos. Dentre eles os simpatolíticos de
meningocócica, bilateral
ação central, por causarem sonolência, déficit de memória, depressão e
microalbuminúria, IRC
alucinações, e os de ação periférica, pela grande incidência de hipotensão
Alfabloqueadores Prostatismo Pouco utilizados. ortostática.
Cuidado adicional
em hipotensão SITUAÇÕES ESPECIAIS EM IDOSOS
ortostática Muito idosos
Ag. II: angiotensina II. Indivíduos com mais de 80 anos de idade apresentam redução em even-
tos cardiovasculares, principalmente AVC, quando o controle pressórico é
mantido. O estudo HYVET (hypertension in the very elderly trial),7 principal
referência para indivíduos dessa faixa etária foi interrompido quando seus
vadamente reduzem o risco de eventos cardiovasculares, cerebrovascula-
resultados evidenciaram diminuição na incidência de AVC e queda da mor-
res e complicações renais em idosos.
talidade nos tratados com perindopril e indapamida.
A indapamida, um derivado das sulfonamidas, apresenta a vanta-
Para os muito idosos, a principal recomendação é individualizar o
gem de não interferir no perfil glicêmico e lipídico.
tratamento, levando sempre em conta a presença de lesões de órgãos-
Os diuréticos de alça devem ser a opção nos pacientes com insuficiên-
-alvo, comorbidades não cardiovasculares, condição geral e funcionalida-
cia renal e clearance menor do que 25-30 mL/min.
de do paciente, possibilidade de pseudo-hipertensão e de hipertensão do
avental branco, risco de hipotensão postural, severidade da HAS, além da
BLOQUEADORES DOS CANAIS DE CÁLCIO
autonomia do paciente.
São seguros e bem tolerados com benefícios comprovados em idosos.
Apresentam alguns efeitos adversos que podem intensificar problemas Distúrbio cognitivo e HAS
comuns dessa população, como obstipação intestinal, edema de membros A relação entre HAS e função cognitiva já foi demonstrada em ensaios clí-
inferiores e aumento do volume urinário. nicos, em que a hipertensão mal controlada na meia-idade está associada
A associação de IECA ou BRA, além do maior efeito anti-hipertensivo, à piora da cognição e à demência após os 65 anos.
pode reduzir o risco de edema periférico. Estudos publicados até o momento têm evidenciado a importância
No estudo ACCOMPLISH6, a combinação IECA/BCC demonstrou supe- do controle pressórico na prevenção de distúrbios cognitivos, não só em
rioridade a IECA/tiazídico na redução de desfechos cardiovasculares. relação à demência vascular, como também na prevenção da doença de
Alzheimer.
INIBIDORES DA ENZIMA O estudo SCOPE (study on cognition and prognosis in the elderly),8
CONVERSORA DA ANGIOTENSINA por exemplo, demonstrou menor declínio na função cognitiva no grupo
São eficazes nos idosos, apesar da redução fisiológica da reninemia. Redu- tratado com BRA quando comparado ao grupo tratado com outras classes
zem a mortalidade e a morbidade em coronariopatas pós-IAM, portadores de anti-hipertensivos.
9
de insuficiência cardíaca e retardam a progressão da nefroesclerose em O estudo systolic hypertension in Europe (Syst-Eur) avaliou pacientes
diabéticos. com idade de 60 anos ou mais, portadores de hipertensão sistólica isolada.
Atenção deve ser dada ao risco de hiperpotassemia, especialmente Seus resultados demonstraram que o tratamento com BCC, em associação
se associado a um diurético poupador de potássio ou em pacientes com ou não com enalapril e hidroclorotiazida, versus placebo, reduziu signifi-
IRC. Outros efeitos que podem limitar seu uso em idosos incluem tosse e cantemente a incidência não somente de AVC e complicações cardiovas-
alteração do paladar. culares, como também de demência vascular e da doença de Alzheimer.
152 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
O estudo perindopril protection against recurrent stroke study (PRO- 8. Skoog I, Lithell H, Hansson L, Elmfeldt D, Hofman A, Olofsson B,et al. Effect
GRESS)10 demonstrou redução de demência secundária a acidentes vascu- of baseline cognitive function and antihypertensive treatment on cognitive
lares cerebrais recorrentes. and cardiovascular outcomes: Study on Cognition and Prognosis in the
Elderly (SCOPE). Am J Hypertens. 2005;18(8):1052-9.
Pressão arterial diastólica na HSI 9. Staessen JA, Fagard R, Thijs L, Celis H, Arabidze GG, Birkenhäger WH, et
Muitas vezes, para o adequado controle da PAS, os níveis da PAD ficam al, for the Systolic Hypertension in Europe (Syst-Eur) Trial Investigators.
Randomised double-blind comparison of placebo and active treatment for
muito baixos. Valores abaixo de 65 mmHg identificam um grupo de pior
older patiente with isolated systolic hypertension. Lancet. 1997;350(9080):
prognóstico, devendo ser evitados principalmente nos portadores de
757-64.
doença coronária.
10. Tzourio C, Anderson C, Chapman N, Woodward M, Neal B, MacMahon S,
et al. Effects of blood pressure lowering with perindopril and indapamide
therapy on dementia and cognitive decline in patients with cerbrovascular
REVISÃO
disease. Arch Intern Med. 2003;163(9):1069-75.
A hipertensão arterial é o principal fator de risco cardiovascular em
idosos. Sua prevalência aumenta dramaticamente com a idade.
As alterações da anatomia e fisiologia vascular, assim como hábitos
de vida são determinantes importantes.
A elevação isolada da pressão sistólica e da pressão de pulso é mui- 18.4 NA GESTAÇÃO
to comum em idosos, sendo, ambas, fatores de risco cardiovascular
independentes. ■■ MARCELO COSTA BATISTA
O tratamento da hipertensão arterial em idosos comprovadamente ■■ CASSIO JOSÉ DE OLIVEIRA RODRIGUES
reduz a morbidade e a mortalidade cardiovascular.
Ao se aferir a pressão arterial de um indivíduo idoso, deve-se apli-
car a técnica correta e atentar para algumas peculiaridades que
Alterações profundas da função renal ocorrem na gestação normal. Carac-
possuem maior frequência nesta população (pseudo-hipertensão,
teristicamente ocorre uma elevação do volume plasmático e concomitante
hipertensão do avental branco, hiato auscultatório e hipotensão
ortostática). aumento de volume de glóbulos vermelhos. O débito cardíaco (DC) au-
As lesões de órgãos-alvo, doenças cardiovasculares e comorbidades menta a partir da quinta semana em paralelo à redução da resistência vas-
são mais frequentes em idosos e devem nortear a escolha do anti- cular sistêmica e da PA, devido a uma provável perda de responsividade a
-hipertensivo. vasoconstritores. Ocorre aumento da taxa de filtração glomerular e corres-
As metas pressóricas devem ser <140 × 90 até os 80 anos e < 150 pondente elevação (60%) do fluxo plasmático renal (FPR). Adicionalmente,
× 90 acima desta idade, podendo-se tentar metas mais baixas nos observa-se um balanço positivo de sódio, independente do incremento de
idosos hígidos, desde que bem toleradas. 30% da carga filtrada em função de um incremento na reabsorção tubular
Ainda existe falta de informações científicas sólidas em várias si- de sal. Paralelamente ocorre ativação do SRAA com a resistência à ação
tuações especiais em idosos, sendo fundamental a individualização. da angiotensina II em parte relacionada a incrementos de hormônios com
Entre elas, podemos destacar os idosos frágeis, demenciados ou propriedades natriuréticas, como a progesterona e o peptídeo natriurético
portadores de múltiplas comorbidades não cardiovasculares. atrial, independente desta contrarregulação com incremento na excreção
de sódio e água, a retenção hidrossalina prepondera na gestação em
graus variáveis. O denominador comum de todos estes ajustes fisiológicos
■■ REFERÊNCIAS é a expansão volêmica da gestante sem incremento da PA; ao contrário, a
1. Aronow WS, Fleg JL, Pepine CJ, Artinian NT, Bakris G, Brown AS,et al. ACCF/ PA decresce com o progredir da gestação.
AHA 2011 expert consensus document on hypertension in the elderly: a Os distúrbios hipertensivos representam a mais comum complicação
report of the American College of Cardiology Foundation Task Force on da gravidez, afetando 6 a 8% das gestações nos Estados Unidos, e se ca-
Clinical Expert Consensus Documents. Circulation. 2011;123(21):2434-506. racterizam pela segunda maior causa de óbito materno. Predominam em
2. Miranda RD, Perrotti TC, Bellinazzi VR, Nóbrega TM, Cendorogoo MS, Toniolo pretas, com idade acima de 45 anos e diabéticas, associando-se a diversas
Neto J. Hipertensão arterial no idoso:peculiaridades na fisiopatologia, no
complicações maternas e fetais, com aumento da incidência de hemorra-
diagnóstico e no tratamento. Rev Bras Hipertens. 2002;9(3):293-300.
3. Sociedade Brasileira de Cardiologia; Sociedade Brasileira de Hipertensão; gia intracraniana, placenta prévia, retardo de crescimento intra-uterino,
Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI diretrizes brasileiras de hipertensão. prematuridade e morte intra-uterina. Determinam maior risco de HAS e
Arq Bras Cardiol. 2010;95(1 Suppl):1-51. doenças cardiovasculares posteriores.
4. Gravina CF, Rosa RF, Franken RA, Freitas EV, Liberman A, Rich M, et al.
Sociedade Brasileira de Cardiologia. II Diretrizes Brasileiras em Cardiogeriatria.
Arq Bras Cardiol. 2010;95(3 Suppl 2):1-112. ■■ DIAGNÓSTICO
5. SPRINT Research Group, Wright JT Jr, Williamson JD, Whelton PK, Snyder Os distúrbios hipertensivos da gestação são divididos em quatro catego-
JK, Sink KM, et al. A randomized trial of intensive versus standard blood- rias: hipertensão crônica, hipertensão gestacional, pré-eclâmpsia-eclâmp-
pressure control. N Engl J Med. 2015;373(22):2103-16. sia e pré-eclâmpsia (PE) superimposta à hipertensão crônica. As definições
6. Kjeldsen SE, Weber M, Oparil S, Jamerson KA. Combining RAAS and calcium
de cada um destes grupos estão descritas na Tabela 18.19.
channel blockade: ACCOMPLISH in perspective. Blood Press. 2008;17(5-6):
260-9.
1 | Hipertensão crônica
7. Beckett NS, Peters R, Fletcher AE, Staessen JA, Liu L, Dumitrascu D, et al. Definida como PAS > 140 mmHg ou PAD > 90 mmHg que precede a
a
Treatment of hypertension in patients 80 years of age or older. N Engl J gestação ou está presente antes da 20 semana ou que persista por mais
Med. 2008;358(18):1887-98. de 12 semanas após o parto.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 153
gestação e/ou desenvolvimento de sinais/sintomas que configurem severi- De maneira geral, a redução da PA não afeta o curso da PE, e a tera-
dade da PE são critérios diagnósticos utilizados. pia farmacológica deve ser reservada para casos em que há PAS > 159
mmHg ou PAD > 95-100 mmHg. Em gestantes com PA > 170/110 mmHg,
especialmente na presença de sintomas, o tratamento visa a evitar compli-
■■ TRATAMENTO
cações cardiovasculares maternas. Neste caso, recomenda-se internação
A decisão de tratar a HAS deverá considerar potenciais riscos e benefícios em terapia intensiva e hidralazina ou labetalol EV.
para a mãe e o feto. De forma geral, mulheres com hipertensão crônica A redução abrupta da PA pode determinar baixo fluxo placentário
tendem a tolerar mais facilmente níveis mais elevados de PA. com sofrimento fetal. A PA média deve ser reduzida em no máximo 25%
nas primeiras duas horas, visando a obter uma PAS entre 130 e 150 mmHg
e PAD entre 80 e 100 mmHg. Medicações orais devem ser mantidas poste-
ATENÇÃO! riormente, com o objetivo de manter a PA < 140/90 mmHg.
De acordo com o American College of Obstetricians and Gynecologists A decisão em relação ao parto deve pesar os riscos associados à piora
1
(ACOG) Task Force on Hypertension in Pregnancy, gestantes com ní- do quadro de PE em relação aos associados à prematuridade. No caso de
veis de PAS ≥ 160 mmHg e/ou PAD ≥ 105 mmHg devem receber anti- PE leve, deve ocorrer em torno da 40ª semana. Pacientes com PE grave de-
-hipertensivos, e o objetivo é atingir valores de PA entre 120/80 mmHg vem ser internadas, receber sulfato de magnésio para prevenir convulsões
e 160/105 mmHg. Em mulheres com hipertensão estágios 1 e 2, não há (ou seja, prevenir eclâmpsia), tratamento anti-hipertensivo e indução do
evidências que permitam estabelecer que haja benefícios no tratamen- parto. No caso de fetos com mais de 34 semanas ou maturidade pulmonar
to. Nestes casos, o tratamento não é capaz nem de melhorar resultados documentada o parto deve ser imediato. No caso de gestações com 24 a
neonatais nem prevenir PE. 34 semanas, não há um consenso em relação à conduta obstétrica, que
deve ser individualizada de acordo com os riscos e benefícios relacionados
a condutas expectantes ou intervencionistas. Eclâmpsia indica interrupção
MEDIDAS GERAIS imediata da gestação
O repouso não é necessário na maioria das gestantes hipertensas des- HIPERTENSÃO CRÔNICA
de que as cifras de PA não configurem urgência/emergência hipertensi-
A HAS, com ou sem tratamento medicamentoso, está associada a maior
va, principalmente na HAS crônica. Uma vez que pode melhorar o fluxo
risco de complicações da gravidez e morbidade materna. O risco é maior
útero-placentário, pode ser particularmente útil no caso de pré-eclâmpsia.
quanto mais grave for a hipertensão, se há lesões de órgãos-alvo ou pré-
A restrição de sal deve ser estimulada, independentemente do tipo de
-eclâmpsia associada. Apesar disto, o tratamento anti-hipertensivo é con-
hipertensão associada à gestação.
troverso e os benefícios parecem ser restritos à morbidade materna. Uma
avaliação laboratorial básica, composta por urina 1, urocultura, creatinina
TERAPIA MEDICAMENTOSA
plasmática, eletrólitos, glicemia e proteinúria 24 horas, está indicada.
De forma geral, todas as medicações hipotensoras atravessam a placenta. Pacientes com HAS estágio 1 só devem receber tratamento medica-
A Metildopa tem sido utilizada há anos em gestações, com segurança mentoso se houver evidências de lesões de órgãos-alvo. Naquelas pacien-
demonstrada. Em monoterapia, é um anti-hipertensivo fraco, podendo tes em vigência de tratamento farmacológico, este deve ser descontinuado
se mostrar incapaz de obter adequação. Betabloqueadores com ação ou reduzido se PA < 120/80 mmHg. A presença de complicações asso-
alfa e beta-adrenérgica (pindolol e metoprolol) preservam a circulação ciadas à HAS, como dislipidemia, idade avançada, lesões de órgãos-alvo,
uteroplacentária e são efetivos e seguros. Betabloqueadores não sele- causa secundária, AVC prévio, DM e abortamento prévio, também carac-
tivos (propranolol) ou sem bloqueio alfa (atenolol) devem ser evitados. teriza indicação para tratamento medicamentoso. Recomenda-se tratar
Bloqueadores dos canais de cálcio di-hidropiridínicos (nifedipina e anlo- pacientes com HAS estágio 2 ou 3 visando a minimizar o risco materno,
dipina) também têm sido utilizados de forma segura. Medicações de ação embora não haja evidências de que este tratamento possa efetivamente
lenta são preferíveis, evitando reduções súbitas e intensas na PA. A hidra- reduzir o risco de complicações. O objetivo deve ser manter a PAS entre
lazina é uma medicação amplamente utilizada na hipertensão associada 140 mmHg e 150 mmHg e a PAD entre 90 mmHg e 100 mmHg, ou abaixo
à gestação, com a vantagem de ser disponível por via oral e endovenosa, de 140/90 mmHg na presença de lesões de órgãos-alvo.
embora com as desvantagens de se associar a possíveis efeitos colate-
rais, como retenção hídrica e taquicardia, que limitam seu uso. O uso de HIPERTENSÃO GESTACIONAL
diuréticos tiazídicos é controverso, em virtude da perda hídrica que pode
O tratamento não difere de maneira importante daquele estabelecido para
ocorrer na fase inicial de sua utilização. Em hipertensas sob uso crônico
a hipertensa crônica. Não há indicação do uso de hipotensores na HAS está-
anterior à gestação, não parece haver riscos importantes.
gio 1. Gestantes com PA > 160/100 mmHg devem receber tratamento anti-
É importante ressaltar que IECA, bloqueadores do receptor de an-
-hipertensivo para evitar complicações maternas. Nos casos severos, a ten-
giotensina II e inibidores diretos da renina são contraindicados em todas
dência é recomendar o parto com 34 a 36 semanas se há maturidade fetal.
as fases da gravidez, uma vez que sua utilização está associada a maior
risco de malformações cardíacas e renais. Em caso de uso prévio, devem
ser imediatamente suspensos logo que diagnosticada a gestação. Nitro- REVISÃO
prussiato de sódio também deve ser evitado, pelo risco de intoxicação
Os distúrbios hipertensivos da gravidez se associam a maior risco de
por cianeto, embora em raras situações possa representar a única medida
complicações da gestação, dentre elas a prematuridade e o retardo
efetiva para o controle de emergências hipertensivas.
de crescimento intra-uterino.
PRÉ-ECLÂMPSIA Existem quatro categorias de distúrbios hipertensivos na gravidez:
hipertensão crônica, hipertensão gestacional, pré-eclâmpsia e pré-
A remoção da placenta configura tratamento definitivo da PE, portanto -eclâmpsia superimposta à hipertensão crônica.
ponderação quando da interrupção da gestação deve ser pauta constante.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 155
100 (EAP), seu grau extremo. Um estudo publicado por Gandhi e colabo-
2
radores mostra que, durante o EAP associado à hipertensão arterial
(média da PA inicial 200/100 mmHg) e depois de seu controle com fu-
Fluxo sanguíneo cerebral
Tecido cerebral normal lica avaliada pela fração de ejeção e pelo índice de contração regional
50 Leve da parede ventricular esquerda (ECG) não está prejudicada na grande
maioria dos pacientes (n = 38). Depois do controle clínico estável (24
a 72 horas), novo ecocardiograma com Doppler mostra função sistólica
25 semelhante à da fase aguda do edema pulmonar e melhora indireta da
Tecido cerebral com isquemia
Intensa função diastólica avaliada pela melhora do fluxo mitral (aumento da
0 relação entre as ondas E/A e aumento do tempo de desaceleração da
20 60 100 140 180 onda E). Os autores concluem que o EAP associado à hipertensão ocorre
Pressão de perfusão cerebral (mmHg) por exacerbação da disfunção diastólica.
FIGURA 18.7 ■ Curvas de autorregulação do fluxo sanguíneo HIPERTENSÃO ASSOCIADA À ISQUEMIA MIOCÁRDICA
cerebral.
(ANGINA INSTÁVEL OU INFARTO)
Fonte: Adaptada de Blumenfeld e Laragh.1 O infarto ou a isquemia miocárdica grave compromete a função sistólica
e, no indivíduo hipertenso, pode provocar liberação adrenérgica e ati-
vação do SRAA, que elevam ainda mais a PA e o consumo de oxigênio,
jam superiores a 220 mmHg ou diastólicos > 120 mmHg, ou quando o em um ciclo vicioso que agrava progressivamente o quadro clínico. O
paciente é candidato ao uso de fibrinolíticos. Há estudos que mostram controle da pressão nesse momento é indispensável, pois reduzirá o
que o tratamento da hipertensão na fase aguda do AVC não traz bene- consumo de oxigênio e melhorará o prognóstico. É intuitivo que o uso
fícios a longo prazo e pode até piorar o prognóstico. A razão para isso de IECA e betabloqueadores nessa fase deve ser a decisão correta (ver
está representada nas curvas inferiores da Figura 18.7, exibindo que, no “Tratamento”).
tecido cerebral isquêmico (fase aguda do AVC), há quebra da autorregu-
lação, e a perfusão cerebral passa a ter relação direta com os valores da ANEURISMA DISSECANTE DA AORTA
PA. A explicação mais plausível para essa observação é de que o edema A hipertensão arterial está presente na quase totalidade dos pacientes no
cerebral, ao comprimir os vasos sanguíneos, dificulta o fluxo, impede a momento da dissecção aórtica. Independentemente da sua localização,
autorregulação e torna o fluxo dependente exclusivamente da PA. Dessa ou seja, se compromete a aorta ascendente (tipo A) ou não (tipo B), o
forma, acredita-se que a melhor conduta no indivíduo com hipertensão tratamento clínico inicial é comum, isto é, deve-se priorizar a redução da
durante a fase aguda do AVC deva ser o mais expectante possível, exceto principal força de dissecção, o ritmo de elevação da pressão de pulso (dP/
se outro(s) órgão(s)-alvo seja(m) comprometido(s) e exija(m) tratamento dt), o qual depende da contratilidade miocárdica, da frequência cardíaca
efetivo. É comum a redução espontânea da PA para níveis mais confor- e da PA. A partir dessas considerações, depreende-se que os betabloque-
táveis para o paciente e o médico nas primeiras 24 a 72 horas após o adores são os mais indicados para seu tratamento, pois reduzem o débito
estabelecimento do quadro. Entretanto, há relatos sugerindo que o uso cardíaco, a frequência cardíaca e a PA. Se a PA não puder ser controlada
de IECA ou de bloqueadores dos receptores AT1 da angiotensina pode apenas com betabloqueadores, pode-se associar, de preferência, o ni-
melhorar o prognóstico da lesão cerebral, mesmo sem reduzir a PA. No troprussiato de sódio, cujo início de ação é imediato e pode ser titula-
AVC hemorrágico, o edema cerebral é intenso, sendo comuns o acometi- do. Entretanto, o nitroprussiato não deve ser o medicamento inicial, pois
mento funcional dos centros reguladores da PA e a consequente instabi- aumenta a FC e pode piorar a dissecção aórtica. A PA deve ser mantida
lidade pressórica. em valores tão baixos quanto possíveis, garantindo, porém, a perfusão
tecidual adequada.
HIPERTENSÃO ASSOCIADA À INSUFICIÊNCIA
VENTRICULAR ESQUERDA OU EDEMA AGUDO GLOMERULONEFRITES AGUDAS
DE PULMÃO A hipertensão arterial, que acompanha os quadros de glomerulone-
Combinação comum nos centros de atendimento de urgência/emergên- frites agudas na quase totalidade dos casos, pode se transformar em
cia, em que a hipertensão arterial se associa à hipertrofia ventricular urgências e emergências hipertensivas, pois acomete, na maioria das
esquerda, cuja característica fisiopatológica é a disfunção diastólica. vezes, indivíduos jovens sem hipertensão prévia e cujo sistema vascular
De forma simplificada, o ventrículo hipertrofiado tem dificuldade para e miocárdio não estão preparados para a abrupta sobrecarga de volu-
relaxar completamente durante a diástole. Em situação de repouso ou me (pré-carga) e de pressão (pós-carga). Além da hipertensão arterial,
de pequeno estresse, essa alteração não compromete o débito cardíaco. as manifestações da hipervolemia podem incluir insuficiência cardíaca
Entretanto, em situações de grande estresse, como a elevação abrupta aguda e sinais e sintomas de encefalopatia hipertensiva. O exame do
da PA, a reserva funcional miocárdica reduzida não permite aumentar fundo de olho mostra vasoespasmo arteriolar difuso, edema de retina
o débito cardíaco de forma a atender às necessidades e sobrepor o au- (brilhante ou aspecto de “seda molhada”), às vezes o edema de papila
mento da pós-carga. Nessa condição, ocorrem acúmulo de sangue na e, raramente, exsudatos e hemorragias. O mecanismo fisiopatológico
circulação pulmonar, transudação e dispneia. Na tentativa de aumentar subjacente mais importante é a retenção de sódio e volume, e o trata-
o débito cardíaco (DC), há liberação adrenérgica, de efeito inotrópico mento deve envolver obrigatoriamente a redução do volume extracelu-
positivo, porém aumenta a frequência cardíaca (FC), o retorno venoso e lar. Entretanto, nem sempre os rins respondem ao uso de diuréticos e
o consumo de oxigênio, piorando a insuficiência cardíaca (IC) esquerda, hipotensores por VO, e o emprego de vasodilatadores por via IV pode
que pode, a qualquer momento, evoluir para edema agudo de pulmão ser necessário.
158 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
CRISES ADRENÉRGICAS ção clínica é a interrupção da gestação, que, muitas vezes, tem evolução
O protótipo da hiperatividade adrenérgica é o feocromocitoma. Aproxima- espontânea. Porém, para que se conduzam mãe e feto a um desfecho sa-
damente 50% dos casos evoluem para crises frequentes, que podem ou tisfatório, o controle da PA é indispensável.
não ter fatores desencadeantes. A metade restante, porém, mantém va-
lores pressóricos estáveis. Durante as crises, predominam os sintomas de ■■ TRATAMENTO
liberação adrenérgica, ou seja, palpitação (taquicardia), sudorese, palidez, Como visto, a primeira providência, diante de um paciente com níveis
mal-estar e cefaleia, os indícios clínicos da presença do tumor. Entretanto, pressóricos muito elevados, é fazer a anamnese e o exame físico cuida-
como a doença é incomum, tais casos são mais raros. Evidentemente, o dosos para caracterizar se há de fato uma urgência ou emergência ou se
melhor grupo de medicamentos para controlar as crises adrenérgicas é se trata de pseudoemergência hipertensiva. Não havendo sinais de lesões
o dos alfabloqueadores, preferencialmente por VO. Depois que o indiví- agudas em órgãos-alvo, independente dos valores da PA, o tratamento
duo estiver alfabloqueado, pode-se então associar os betabloqueadores. deve ser feito apenas com medicamentos sintomáticos, a medicação anti-
Quando há suspeita de crise adrenérgica por feocromocitoma, não se deve -hipertensiva de uso crônico ser (re)instituída e o acompanhamento deve
usar os betabloqueadores isoladamente, pois passariam a predominar os ser ambulatorial.
efeitos alfa-adrenérgicos e o quadro se agravaria. As maiores dificuldades Concluindo-se que se trata de fato de urgência ou emergência hi-
com o feocromocitoma ocorrem no intraoperatório, pois a manipulação pertensiva, deve-se planejar o tratamento levando-se em conta os se-
cirúrgica do tumor é altamente estimulante e as crises adrenérgicas, nessa guintes aspectos relevantes: idade; presença de vasculopatias; estados
situação, são muito difíceis de serem controladas, pioram o sangramento de hipovolemia; medicações em uso; e associação de comorbidades.
e dificultam a abordagem cirúrgica do tumor. Antes de encaminhar o pa- Nos casos de urgência hipertensiva, a PA deve ser reduzida em horas
ciente à cirurgia, este deve estar recebendo alfa e betabloqueadores por ou dias, caso para o qual os medicamentos administrados por VO são
VO; no momento da cirurgia, o anestesista deve dispor de fentolamina, mais apropriados (Tabela 18.20). Caso se trate de emergência ou haja
betabloqueador para uso intravenoso (metoprolol, esmolol) e nitroprus- limitações para o uso de medicamentos por VO, a escolha da via IV se
siato de sódio. impõe (Tabela 18.21).
As crises adrenérgicas causadas pela retirada abrupta de medicamen- Com as exceções apresentadas posteriormente, em princípio, qual-
tos que acumulam catecolaminas nas terminações nervosas são mais co- quer agente anti-hipertensivo poderá ser utilizado para reduzir a PA.
muns. A clonidina é o exemplo mais conhecido e frequente, porém, o mes- Entretanto, conhecendo o mecanismo fisiopatológico predominante em
mo pode ocorrer eventualmente na interrupção abrupta da metildopa e cada condição clínica, dá-se preferência a classes diferentes de medica-
de betabloqueadores. Nesses casos, os sintomas adrenérgicos são menos mentos (ver Tabelas 18.20 e 18.21). Alguns têm efeito imediato e outros
intensos e predomina a elevação da PA; por isso, a anamnese cuidadosa necessitam de algumas horas para começar a agir. Frequentemente,
revelará a suspensão do(s) medicamento(s). utilizam-se combinações de agentes para alcançar a meta de controle
Outra possível causa de crise adrenérgica é o uso de drogas ilícitas, pressórico. A redução inicial não deve ser superior a 20 ou 25% dos níveis
em particular a cocaína na sua forma pura (pó), crack, anfetaminas e LSD. da PA média (PAM). Um critério prático e seguro é não reduzir de ime-
Nessas condições, ocorrem intensa atividade simpatomimética com vaso- diato os níveis tensionais diastólicos para valores inferiores a 100 ou 110
constrição sistêmica, elevação da PA, isquemia miocárdica e encefalopatia mmHg. Desse modo, é possível evitar complicações sérias em pacientes
hipertensiva. Esse quadro deve ser tratado como as crises de feocromoci- com hipertensão grave, por quebra da autorregulação em órgãos vitais,
toma, ou seja, inicialmente com alfabloqueadores, depois com betablo- como coração, cérebro e rins.
queadores e, eventualmente, com nitroprussiato de sódio.
IECA
Captopril 150 mg 2/2 h (SN) 15 min 8-12 h Hipertensão maligna/acelerada,
EAP, ICC, encefalopatia hipertensiva, isquemia miocárdica,
Enalapril 20 mg 4/4 h (SN) 30 min 12-24 h AVC (quando indicado)
Ramipril 10 mg por dia 60 min 24 h
BCC
Nifedipina 20 mg 4/4 h (SN) 60 min 8-12 horas EAP, ICC, encefalopatia hipertensiva, insuficiência renal
Alfabloqueadores
Prazosina 1-2 mg 2/2 h 2-4 h 4-12 h Feocromocitoma; crises adrenérgicas e dissecção aórtica
Vasodilatadores
Hidralazina 25-50 mg 4/4 h 20-30 min 4-6 h Dissecção aórtica (após alfa e betabloqueio), feocromocitoma
(dose máxima 200 mg/dia) (após alfa e betabloqueio), perioperatório, insuficiência renal,
crises adrenérgicas
Minoxidil 10 mg 4/4 h (SN) 30-40 min 6-12 h
(dose máxima 40 mg/dia)
Diuréticos
Furosemida 40-80 mg 4/4 h 20 min 4-8 h Estados de hipervolemia (EAP, ICC, glomerulonefrite aguda,
insuficiência renal)
-se elevação da PA após a queda pressórica inicial. Deve-se então asso- fácil titulação (p. ex. nitroprussiato de sódio). Depois de estabilizado o
ciar outras classes de medicamentos anti-hipertensivos. Nesses casos, a quadro (24 a 72 horas), caso a PA persista elevada, deve-se reintroduzir a
retenção de sódio/volume e a hiper-reatividade simpática costumam ser medicação anti-hipertensiva por VO.
os mecanismos subjacentes. Por isso, prefere-se associar diuréticos mais No AVC hemorrágico (AVCh) com hipertensão arterial, o controle da
potentes (furosemida) e os simpatolíticos com ação central (metildopa PA é indispensável para estabilizar o quadro de sangramento cerebral e a
ou clonidina). hemodinâmica sistêmica. Para isso, o mais adequado é o uso de medica-
Na encefalopatia hipertensiva, a imediata redução da PA é indispen- mentos por via IV, como o nitroprussiato de sódio, pois seu efeito é ime-
sável para interromper o sofrimento cerebral em progressão. O uso de diato, titulável e desaparece rapidamente quando retirado (Tabela 18.21).
medicamentos por via IV (Tabela 18.21), principalmente quando o vômito Da mesma forma como no AVCi, quando houver estabilidade hemodinâmi-
está presente, ou por VO, em casos menos graves, é necessário e muito ca, deve-se reintroduzir os medicamentos por VO.
efetivo. Ao se optar por medicamentos por VO, deve-se dar preferência Tendo em vista as características fisiopatológicas da emergência
aos IECA (Tabela 18.20). hipertensiva associada ao EAP (exacerbação da disfunção diastólica, au-
No AVC isquêmico (AVCi), embora as evidências sejam escassas, mento da pré-carga e pós-carga), o uso de diurético de alça, para reduzir
os consensos de especialistas e diretrizes internacionais recomendam o o volume circulante e de vasodilatadores arteriolares e venosos (nitroprus-
tratamento anti-hipertensivo quando PAS for superior a 220 mmHg, PAD siato de sódio) ou predominantemente venosos (nitroglicerina), é a única
maior do que 120 mmHg, ou se houver indicação de trombolítico com PA conduta apropriada. Paralelamente, deve ser realizado o tratamento de
> 180/110 mmHg. Indica-se a redução da PAM em 15 a 25% nas primeiras base com medicação por VO, preferencialmente bloqueadores do SRAA
24 horas com medicamentos preferencialmente de uso IV que permitam (IECA ou BRA).
160 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Nitroprussiato 0,3-10 µg/kg/min Imediato 1-2 min EAP, ICC, encefalopatia hipertensiva;
de sódio feocromocitoma; dissecção da aorta; AVC
(vasodilatador) (quando indicado); perioperatório
Nitroglicerina 50-100 µg/min 2-4 min 5-10 min EAP, isquemia miocárdica, perioperatório, ICC
(vasodilatador)
Diazóxido 50-100 mg IV, repetir SN 2-4 min 2-12 h Encefalopatia hipertensiva, feocromocitoma,
(vasodilatador) pré-eclâmpsia/eclâmpsia
Esmolol 0,2-0,5 mg/kg IV + infusão 1-5 min 15-30 min Dissecção da aorta, feocromocitoma
(betabloqueador) 50-300 mg/kg/min (após alfabloqueio), perioperatório
Fentolamina 1-5 mg IV ou infusão contínua 1-2 min 3-5 min Feocromocitoma, crises adrenérgicas,
(alfabloqueador) perioperatório e dissecção da aorta
Furosemida 40-160 mg IV e a cada 4 h SN 10-20 min 4-8 h Estados de hipervolemia (EAP, ICC, glomerulonefrite
(diurético de alça) aguda, insuficiência renal)
*Medicamentos disponíveis no Brasil com as seguintes apresentações: nitroprussiato de sódio (ampolas liofilizadas de 50 mg: dissolver em 250 a 500 mL de soro glicosado a
5%); nitroglicerina (ampolas de 5 mL = 25 mg e 10 mL = 50 mg); hidralazina (ampolas 1 mL = 20 mg); diazóxido (ampola de 20 mL = 300 mg); metoprolol (ampola de 5 mL
= 5 mg); esmolol (ampolas de 10 mL = 10 mg e 10 mL = 250 mg); fentolamina (ampola de 5 mL = 5mg); furosemida (ampola 2 mL = 20 mg).
Há inúmeras evidências de que o uso de IECA melhora o prognósti- sódio e a nitroglicerina (particularmente em pós-operatório de revascu-
co a curto e longo prazos de indivíduos com IAM que apresentam sinais larização miocárdica). Bloqueios duradouros do SNS (com alfa ou beta-
de insuficiência ventricular esquerda. Os betabloqueadores também bloqueadores), do SRAA (com IECA ou BRA), devem ser evitados, pois a
foram amplamente utilizados com resultados favoráveis. Por sua vez, disponibilidade fisiológica destes sistemas pode ser indispensável para
o uso de medicamentos com efeito vasodilatador arterial intenso (nitro- o equilíbrio hemodinâmico em situações de estresse relacionadas ao ato
prussiato de sódio e antagonistas dos canais de cálcio) está associado cirúrgico ou no pós-operatório, tais como sangramentos volumosos, infec-
com pior prognóstico, provavelmente porque pioram o fluxo transmu- ções graves e outros.
ral agravando os sinais de isquemia e lesão miocárdica (elevação do Na pré-eclâmpsia/eclâmpsia, algumas condições de urgência podem
segmento ST). A nitroglicerina, cujo efeito é preferencialmente venular ser controladas com metildopa, betabloqueadores e antagonistas de
(reduzindo o retorno venoso e a pré-carga), tem sido usada com bons cálcio. Entretanto, as emergências hipertensivas associadas à eclâmpsia
resultados nesses casos. iminente e eclâmpsia devem ser tratadas com hidralazina e sulfato de
Nas crises adrenérgicas causadas pela retirada abrupta de medica- magnésio IV.
mentos que causam acúmulo de catecolaminas nas terminações nervosas,
a reintrodução do agente anteriormente utilizado restabelece em poucas
horas o controle pressórico. Esse efeito é mais comum com a retirada REVISÃO
abrupta da clonidina. Nas crises adrenérgicas por feocromocitoma e por A hipertensão arterial pode se apresentar como condição de urgên-
uso de drogas ilícitas, particularmente cocaína e seus derivados, deve- cia ou emergência, sendo doença das mais prevalentes.
-se iniciar o tratamento com alfabloqueadores (fentolamina ou prazosina), Deve ser avaliada com anamnese e exame clínico cuidadoso, com
depois com betabloqueadores por via IV e, finalmente, com os vasodila- ênfase no sistema cardiovascular. Exames complementares como
tadores, por VO ou IV. eletrocardiografia, radiografia torácica, creatinina e potássio são
As emergências hipertensivas associadas à glomerulonefrite aguda obrigatórios.
têm como principal mecanismo fisiopatogênico a hipervolemia. Além da A urgência ou emergência hipertensiva pode ter diversas apresen-
elevação pressórica, a sobrecarga de volume e, com frequência, IC e ence- tações: hipertensão arterial maligna ou acelerada, encefalopatia
falopatia hipertensiva. Dessa forma, a retirada de volume é o passo inicial hipertensiva, AVC associado à hipertensão arterial, hipertensão
do tratamento (furosemida IV). Em casos de emergência, deve-se utilizar associada à insuficiência ventricular esquerda ou edema agudo de
também os vasodilatadores por via IV (nitroprussiato de sódio) e associar pulmão, hipertensão associada à isquemia miocárdica (angina ins-
medicamentos por VO para garantir posteriormente a retirada dos vaso- tável ou infarto), aneurisma dissecante da aorta, glomerulonefrites
dilatadores. agudas, crises adrenérgicas, hipertensão arterial perioperatória,
Na hipertensão perioperatória, dá-se preferência a medicamentos pré-eclâmpsia e eclâmpsia.
com efeito rápido e titulável de uso IV, em particular o nitroprussiato de
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 161
Paralisia cerebral
Síndrome de Rett
Imobilização prolongada
19.1 NA INFÂNCIA E NA JUVENTUDE Distrofia muscular de Duchenne
Doenças crônicas
■■ TELMA PALOMO
■■ MARISE LAZARETTI-CASTRO Leucemias e outras neoplasias malignas da infância
Doenças reumatológicas
Distúrbios alimentares
Doença inflamatória intestinal, doença celíaca e síndromes de malabsorção
A osteoporose é uma doença sistêmica do esqueleto que se caracteriza Fibrose cística
por menor quantidade de tecido ósseo e deterioração de sua qualidade, Talassemia
levando a um maior risco de fraturas. Na infância, entretanto, é uma si- Cirrose biliar primária
tuação bastante rara. Nestas fases de vida, a densidade mineral óssea
(DMO) obtida pelos métodos convencionais que utilizam a densitometria Distúrbios endócrinos e reprodutivos
por raio X de dupla energia (DXA) não estão recomendados de rotina, pois Diabetes melito
não refletem o risco de fratura em indivíduos normais. As indicações para Doenças tiroidianas
realização deste exame nesta população específica devem ser restritas a Deficiência do hormônio de crescimento
grupos de risco ou na presença de fraturas por fragilidade. Distúrbios da puberdade
Diversas doenças podem estar associadas à maior fragilidade óssea Hiperparatiroidismo
na infância, variando desde causas primárias até causas secundárias, tais Síndrome de Cushing
como doenças neuromusculares, doenças crônicas, distúrbios endócrinos Hiperprolactinemia
162 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
OI
■■ DIAGNÓSTICO tipo I-IV AD/AR COL1A1/COL1A2
Na população pediátrica e adolescente (jovem), o diagnóstico de fra- tipo V AD IFTM5
gilidade óssea se baseia na presença de história de fraturas por fragi- tipo VI AR SERPINF1
lidade associada à baixa massa óssea (BMO) evidenciada por meio da tipo VII AR CRTAP
densitometria óssea. O achado de 1 ou mais fraturas por compressão tipo VIII AR LEPRE1
vertebral na ausência de doença local ou trauma de alto impacto é tipo IX AR PPIB
indicativo de fragilidade óssea. Na ausência de tais fraturas, o diag- tipo X AR SERPINH1
nóstico é dado pela presença de história de fraturas por fragilidade (2 Outros AR BMP1/WNT1
Osteoporose pseudoglioma AR LRP5
mais fraturas de ossos longos até os 10 anos ou 3 ou mais fraturas de
Síndrome de Bruck AR PLOD2/FKBP10
ossos longos até os 19 anos de idade) associado a uma DMO abaixo de
Osteoporose juvenil idiopática –--------- Desconhecida
2 ou mais desvios-padrão da média para idade e gênero (Z-score). Os
Hipofosfatasia AD/AR TNSALP
sítios esqueléticos de preferência para realizar a densitometria óssea
Ehlers-Danlos AD/AR COL5A1/COL5A2
na população pediátrica são a coluna lombar e o corpo inteiro (sem a Síndrome de Marfan AD FBN1/COL1A2 (raro)
cabeça). TGFBR2 (raro)
COL1A1: cadeia α1 do colágeno tipo I; COL1A2: cadeia α2 do colágeno tipo I; IFTM5:
ATENÇÃO! interferon-induced transmembrane protein 5; SERPINF1: serpin family of peptidase
inhibitors; CRTAP: Cartilage associated protein; BMP1: bone morphogenetic protein;
A análise de densidade mineral óssea em crianças, adolescentes, mu- WNT1: wingless-type: MMTV integration Site Family, Member 1; LRP5: low density
lheres no menacme e homens com menos de 50 anos deve-se basear lipoprotein receptor-related protein 7; PLOD2: procollagen-lysine,2-oxoglutarate 5
no Z-score, que é o número de desvios-padrão em relação à média para dioxygenase 2; FKBP10: FK506-binding protein 10; TNSALP: alcaline phosphatase,
a idade e sexo do paciente. Terminologias como “massa óssea abaixo tissue-nospecific; COL5A1: collagen, type V, alpha-1; COL5A2: collagen, type V, al-
do esperado para a idade” podem ser utilizadas quando o Z-score obti- pha-2, FBN1: fibrillin 1; TGFBR2: transforming growth fator-beta receptor, type II.
do no exame de densitometria óssea for ≤ –2,0.*
Diagnóstico
O diagnóstico de OI se baseia principalmente nos sinais e sintomas des-
A seguir, apresentaremos algumas doenças primárias e secundárias
critos, e é relativamente fácil em indivíduos com fenótipo clássico e his-
descritas no Quadro 19.1.
tória familiar positiva ou naqueles em que várias fraturas típicas estão
CAUSAS PRIMÁRIAS presentes. Entretanto, pode ser difícil na ausência de história familiar
e quando a fragilidade óssea não está associada com alterações extra-
Osteogênese imperfeita esqueléticas óbvias. Nesses casos, a análise genética do DNA está in-
A osteogênese imperfeita (OI) é a doença hereditária do tecido conectivo dicada, sendo mais sensível do que a biópsia de pele com cultura de
mais estudada na população pediátrica devido à sua maior frequência e às fibroblastos (95 e 90% de sensibilidade,respectivamente). Resultados
opções de tratamento disponíveis para as formas moderadas a graves. A positivos confirmam o diagnóstico, mas resultados negativos não o afas-
incidência e prevalência da OI varia entre os estudos, porém a incidência tam. O estudo genético em um caso-índice deve iniciar com o sequencia-
de 1 para 10 mil nascidos-vivos é a que mais tem sido descrita. mento dos genes COL1A1 e COL1A2 visando a identificar substituições,
deleções, inserções ou duplicações no gene do colágeno. Se a análise do
Quadro clínico colágeno for normal, deve-se sequenciar os outros genes relacionados
A OI é caracterizada por baixa massa óssea, fragilidade óssea e deformida- com as formas recessivas da doença.** A avaliação laboratorial é normal
des esqueléticas. Baixa estatura, esclera azulada, hiperextensibilidade de e os marcadores bioquímicos do metabolismo ósseo também não costu-
mam estar alterados.
*Disponível em: http://www.iscd.org/official-positions/2013-iscd-official-positions-
-pediatric/ **Disponível em: http://www.le.ac.uk/ge/collagen/
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 163
Osteoporose juvenil idiopática -HPP, HPP do adulto, HPP da infância/adolescente (após 6 meses de idade),
A osteoporose juvenil idiopática (OJI) é uma doença rara, autolimitada, de HPP do lactente (antes dos 6 meses de idade), HPP perinatal, pseudo-HPP
etiologia desconhecida e o seu diagnóstico é feito por exclusão de todas as e HPP pré-natal benigna.
outras causas de fragilidade óssea na infância e na adolescência. As crianças com as formas mais graves podem ter hipercalcemia e
hiperfosfatemia devido à inibição da entrada destes minerais no tecido ós-
Quadro clínico seo. Raquitismo ou osteomalácia com desmineralização da calota craniana
A OJI acomete crianças pré-púberes saudáveis (geralmente durante os 2 e do esqueleto, além de perda dentária precoce e nefrocalcinose também
a 3 anos que antecedem a puberdade), sem predileção por gênero. Do- foram descritos (Figura 19.1, C e D). Crises convulsivas no recém-nascido
res progressivas na região lombar, quadril, joelhos e pés podem levar à responsivas à vitamina B6 também sugerem fortemente a doença. O me-
dificuldade de deambulação e à incapacidade física. Tanto o esqueleto canismo proposto para estas crises convulsivas é a deficiência de Vitamina
axial quanto o apendicular podem ser afetados. Fraturas por compressão B6 no líquido cerebrospinal (LCS), decorrente de uma desfosforilação ex-
vertebral são frequentes e podem comprometer a estatura final. Fraturas tracelular deficiente do piridoxal 5-fosfato (forma circulante da vitamina
de ossos longos, mais especificamente na região metafisária, também po- B6), necessária para sua passagem pela barreira hematencefálica (BHE) e
dem estar presentes. A remissão espontânea ocorre em 2 a 5 anos após a consequente síntese de neurotransmissores.
instalação da puberdade. O controle da fragilidade óssea com fraturas é
fundamental para evitar sequelas após a remissão do quadro. Diagnóstico
O diagnóstico é dado pela presença de baixos níveis de atividade de fos-
Diagnóstico fatase alcalina plasmáticas corrigidas para idade e sexo, associado a algu-
A etiologia e patogênese da OJI ainda não foi elucidada. O diagnóstico é mas das manifestações clínicas descritas, desde que afastadas todas as
feito com base no quadro clínico descrito e exclusão de outras causas primá- outras causas que podem reduzir esta atividade (Quadro 19.3). A identifi-
rias e secundárias descritas no Quadro 19.1. O achado radiológico patogno- cação da mutação autossômica dominante ou recessiva na TNSALP con-
mônico é o novo osso formado nas áreas metafisárias (banda radioluscente firma o diagnóstico. As altas concentrações do piridoxal 5’-fosfato (forma
submetafisária) em ossos como tíbia ou adjacente às articulações de joelhos, circulante da vitamina B6) constituem um marcador bioquímico sensível e
cotovelos e quadril. Até o momento, não há achados laboratoriais típicos, e específico da doença. As dosagens elevadas dos níveis séricos ou urinários
os marcadores de remodelação óssea também não auxiliam no diagnóstico. da fosfoetanolamina também podem auxiliar no diagnóstico.
Tratamento
Fisioterapia supervisionada, exercícios isotônicos com resistência, hidro- QUADRO 19.3 ■ Causas de baixa atividade da fosfatase alcalina
terapia, suporte nutricional adequado e restrição de atividade física que
propiciem traumas ou quedas são medidas de suporte indicadas. A suple- Doença celíaca Osteogênese imperfeita tipo II
mentação com cálcio e vitamina D é recomendada. Os bisfosfonatos foram Hipofosfatasia Doença de Wilson
descritos empiricamente nos casos mais graves da doença mostrando um Síndrome de Cushing Desnutrição
aumento da DMO e melhora da dor. O uso dos bisfosfonatos pode ser Hipotirodismo Cirurgia de bypass cardíaco
justificado em alguns casos selecionados de OJI, quando a dor crônica por Transfusão sanguínea excessiva Displasia cleidocraniana
Mieloma múltiplo Síndrome do leite alcalino
fraturas vertebrais ou de membros estiver presente. A prescrição de hor-
Deficiência de zinco, magnésio ou Coleta de sangue inapropriada
mônios sexuais para induzir puberdade em pacientes impúberes entre 9
vitamina C (oxalato, EDTA)
e 10 anos de idade pode ser uma alternativa, uma vez que a remissão da
Anemia perniciosa ou anemia Exposição à radiação por metais
doença geralmente ocorre após a instalação da puberdade. grave pesados
Vale lembrar que a remissão completa da OJI ocorre 2 a 5 anos após o Intoxicação por vitamina D Terapia com clofibrato
início da doença e que o crescimento pode ser prejudicado na fase aguda
da doença, com recuperação posterior. EDTA: ácido etilenodiamino tetra-acético.
Hipofosfatasia
Tratamento
A hipofosfatasia (HPP) é um erro inato do metabolismo raro (que acomete
1 para cada 100.000 nascidos-vivos) que é caracterizada por uma baixa A terapia de reposição enzimática, TNSALP recombinante osso-específica
atividade da fosfatase alcalina sérica. É causada por uma mutação com (asfotase alfa), foi aprovada em 2015 para o tratamento dos casos graves
perda de função no gene que codifica a isoforma não tecido específica da da HPP no Japão, seguido do Canadá, União Europeia e Estados Unidos.
fosfatase alcalina (TNSALP). A TNSALP é expressa no esqueleto, fígado, rins Pacientes com hipofosfatasia infantil devem ser seguidos cuidadosa-
e nos dentes. Na HPP, ocorre um acúmulo dos substratos da TNSALP que mente para detectar as complicações neurológicas consequentes à “cra-
incluem o pirofosfato inorgânico, um potente inibidor da mineralização, niosinostose funcional”, que pode requerer craniotomia. A abordagem
explicando as complicações de perda dentária, raquitismo ou osteomalácia odontológica especializada é muito importante no acompanhamento da
e calcificações articulares. Sua prevalência é maior na região de Manitoba, perda dentária. O uso de naproxeno pode auxilar na dor esquelética. Os
no Canadá, onde 1 em cada 25 indivíduos são carreadores da mutação e 1 bisfosfonatos são contraindicados e podem piorar a mineralização do
em cada 2.500 nascidos-vivos apresentam a forma letal da hipofosfatasia. osso. A suplementação com cálcio e vitamina D também não está indica-
da, podendo exacerbar a hipercalcemia, hipercalciúria ou hiperfosfatemia
Quadro clínico em pacientes com HPP.
A HPP apresenta ampla expressão fenotípica com gravidade variável, des- Em 2012, Whyte e colaboradores3 publicaram o primeiro estudo do
de morte intra-uteriana, pela ausência de mineralização esquelética, até a uso de asfotase alfa em crianças com HPP. O tratamento consistiu em uma
forma adulta, que pode se apresentar apenas por perdas dentárias ou os- dose de 2 mg/kg SC 3 vezes por semana. A melhora musculoesquelética
teopenia. Atualmente, 7 tipos distintos de HPP têm sido descritos: odonto- ficou bem evidente 24 meses após o início da terapia.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 165
A B-1 B-2
C D
FIGURA 19.1 ■ (A) Ossos wormianos comumente encontrados em pacientes com OI; (B-1/2) Radiografias de coluna e mebros inferiores em um
paciente com OI mostrando fraturas vertebrais e fratura de fêmur D. (C) Hipomineralização da calota craniana em um paciente com hipofosfatasia, mais
proeminente na região posterior. (D) Hipomineralização e distorção da metáfise proximal e distal dos úmeros em um paciente com hipofosfatasia.
CAUSAS SECUNDÁRIAS -vivos – 70 a 80% dos casos são de origem pré-natal e a etiologia ainda é
O termo osteoporose secundária é utilizado para definir as formas de bai- desconhecida; 6% são decorrentes de complicações perinatal e 10 a 30%
xa massa óssea que são consequentes ou relacionadas a outras doenças são de origem pós-natal. A patogênese da baixa massa óssea na PC é
ou ao seu tratamento. complexa e multifatorial. O desuso muscular levando à perda de muscula-
Nos dias atuais, alterações do metabolismo ósseo, redução da DMO tura associado à diminuição de carga e imobilização forçada são os fatores
e até fraturas por fragilidade têm sido descritas em uma crescente lista mais importantes, além de dificuldades alimentares, refluxo gastresofági-
de doenças crônicas, especialmente naquelas em que novas opções de co (RGE), convulsões e contraturas musculares.
tratamento têm levado a maior sobrevida e melhores resultados no longo
Quadro clínico
prazo, tais como pacientes transplantados, leucemias, fibrose cística, pa-
ralisia cerebral e distrofia muscular de Duchenne. É caracterizada por uma alteração motora permanente e por diferentes
Neste capítulo, abordaremos algumas delas; entretanto, deve ser res- graus de deficiência física e mental (epilepsia, atraso cognitivo, atraso da
saltado que existem poucos estudos sobre o tratamento da maioria das for- fala e déficit sensorial). A PC é caracterizada por um número de complica-
mas de osteoporose secundária: embora encorajadores, a maioria destes ções esqueléticas dolorosas que incluem escoliose, subluxação articular,
estudos não foram randomizados, e o número de pacientes foi pequeno. deformidades ósseas e fraturas. Uma revisão recente relatou uma preva-
lência de fraturas de 12 a 23% nestes pacientes com PC.
Paralisia cerebral
A paralisia cerebral (PC) é a doença incapacitante da infância mais co- Diagnóstico
mum que acomete o movimento e a postura. É uma condição neurológica, O diagnóstico de baixa massa óssea na PC é geralmente feito após a
não progressiva, causada por uma lesão cerebral que ocorre durante os 2 ocorrência de uma fratura. A densitometria óssea é muitas vezes difícil de
primeiros anos de vida. Sua prevalência é de 2 para cada 1.000 nascidos- ser realizada nestes pacientes devido a dificuldades de posicionamento.
166 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Quadro clínico
REVISÃO
Dor musculoesquelética, anormalidades da marcha, baixa massa óssea e
fraturas têm sido descritos em crianças com LLA ao diagnóstico e durante A baixa massa óssea de causa primária é relativamente rara na in-
o tratamento. Em um estudo prévio, 65% das crianças com LLA tiveram fância e adolescência.
uma redução da DMO durante o tratamento, e 39% tiveram fraturas, prin- A baixa massa óssea de causas secundárias tem sido observada em
cipalmente em membros inferiores. Parece que o risco de fraturas é 6 vezes muitas doenças crônicas, particularmente nas que requerem uso
maior em pacientes com LLA quando comparados com controles saudáveis. prolongado de glicocorticoides e imunossupressores.
Fraturas por compressão vertebral são complicações graves em crianças A identificação de fatores de risco é essencial para prevenção e tra-
com LLA. Um estudo prévio mostrou que para cada redução de 1 desvio- tamento.
-padrão na DMO da coluna lombar aumenta o risco de fratura em 80%. Idade, estadiamento puberal, estado nutricional, estilo de vida e
Diferentes mecanismos têm sido propostos para a morbidade esquelética nível de atividade física devem ser sempre avaliados, e deficiências
da LLA, tais como infiltração óssea pelas células da leucemia, fatores para- hormonais devem ser tratadas.
neoplásicos e metabolismo mineral desorganizado. Poucos estudos avalia- O uso de glicocorticoides, quando necessário, deve ser utilizado na
ram as alterações esqueléticas precoces da LLA, entretanto, vários estudos menor dose e tempo possíveis.
descreveram a perda de massa óssea durante a quimioterapia. Medidas simples, como corrigir a ingestão de cálcio e proteínas,
além de suplementação de vitamina D quando necessário, são a
A maior perda de massa óssea ocorre nos primeiros 6 meses de trata-
primeira linha de tratamento de baixa massa óssea na infância.
mento, devido ao efeito dos glicocorticoides no osso – eles estão envolvi-
Tratamento medicamentoso específico para os ossos deve ser utili-
dos na redução da DMO através do seu efeito direto nas células ósseas e
zado somente em casos selecionados, após avaliação minuciosa do
seus efeitos indiretos no eixo GH/IGF1, na força muscular e no balanço de
risco/benefício, quando as outras medidas mais simples se mostra-
cálcio. O uso de metotrexate é citotóxico para o osteoblasto e pode agir
rem ineficazes.
sinergicamente com os glicocorticoides nestes pacientes. Fatores adicio-
Os bisfosfonatos são os fármacos mais estudados nesta popula-
nais para a baixa massa óssea na LLA são inatividade, deficiências nutri-
ção de pacientes, apresentando boa segurança e eficácia na baixa
cionais, distúrbio hidreletrolítico, radioterapia e doenças endocrinológicas massa óssea de causas primárias e secundárias tanto em crianças
induzidas pelo tratamento, tais como hipotiroidismo, hipogonadismo e quanto em adolescentes.
deficiência de GH.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 167
QUADRO 19.4 ■ Principais causas secundárias de osteoporose QUADRO 19.5 ■ Classificação da Organização Mundial da Saúde
em homens para homens acima de 50 anos
ATENÇÃO!
■■ DIAGNÓSTICO
Atentar para a idade do paciente para a adequada interpretação da
Existe um consenso quanto à indicação de realização de densitometria ós-
densitometria óssea. Homens acima de 50 anos, utilizar T-score. Ho-
sea por DXA (dual x-ray absorptiometry) no rastreamento da osteoporose
mens abaixo de 50 anos, utilizar o Z-score. Os pontos de corte são
masculina, pois claramente haverá benefício na identificação dos indiví-
diferentes! Lembrar e investigar causas secundárias de osteoporose
duos de maior risco para fraturas. Trata-se de um método sensível, preciso,
em homens, especialmente hipogonadismo, alcoolismo e excesso de
rápido e seguro. Os locais mais importantes a serem medidos são a coluna
glicocorticoide (endógeno ou exógeno).
lombar (L1-L4), o fêmur total e o colo do fêmur. O antebraço na dominante
(rádio 33%) é outro sítio que pode ser avaliado. Medem-se o Z-score, que é
o número de desvios-padrão (DP) distantes da média para a própria idade Marcadores bioquímicos de remodelação óssea são parâmetros adi-
do paciente, e o T-score, que corresponde ao número de DP distantes da cionais na avaliação do risco de fraturas, além de auxiliarem no monitora-
média da DMO em adultos jovens (20 a 29 anos). mento da aderência e eficácia do tratamento. Supressão dos marcadores
Para a interpretação do exame da DMO obtida por DXA, a classifi- após 3-6 meses de tratamento com terapia antirreabsortiva ou aumento
cação mais utilizada (descrita a seguir) é a da Organização Mundial da após 1-3 meses de terapia anabólica são preditivos de aumento da BMD e
Saúde (OMS), que utiliza o T-score como referência e deve ser utilizado de redução do risco de fraturas em grandes ensaios clínicos.
em homens com mais de 50 anos (Quadro 19.5). Para homens abaixo de
50 anos, o Z-score abaixo ou igual a –2 é caracterizado como massa óssea
abaixo do esperado para a faixa etária, e Z-score acima de –2, como dentro ■■ TRATAMENTO
do esperado para a faixa etária. Não é possível fechar o diagnóstico de O alvo do tratamento é reduzir o risco de fraturas. Entretanto, a maioria
osteoporose com base somente no exame de densitometria óssea na faixa dos estudos que avaliaram este desfecho foi em mulheres. Em homens, em
etária abaixo de 50 anos. geral, os estudos avaliam desfechos substitutos (bridging study), como o
As principais indicações para realização de densitometria ós- aumento da densidade mineral óssea e marcadores de remodelação ós-
sea segundo as posições oficiais da International Society for Clinical sea. Se o aumento da DMO é semelhante ao encontrado nas mulheres,
Densitometry (ISCD) 2015 são: infere-se equivalência terapêutica e eficácia contra as fraturas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 169
Importante frisar que a densidade mineral óssea não é o único de- Outro medicamento disponível e aprovado na Europa e Brasil é o ra-
terminante de fratura, devendo-se utilizar esta informação em conjunto nelato de estrôncio (2 g, 1 vez ao dia, IV) para o tratamento da osteopo-
com os fatores de risco clínico. Neste sentido, estudo demonstrou que rose em homens. O aumento de densidade mineral óssea em coluna e
apenas 21% dos pacientes que sofreram fraturas não vertebrais tinham fêmur foi semelhante ao encontrado em mulheres. Entretanto, em 2013,
osteoporose densitométrica. a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) publicou restrições ao uso
O tratamento não farmacológico tem alguns pilares, a saber: do ranelato de estrôncio devido ao aumento do risco cardiovascular com
Assegurar aporte nutricional adequado de cálcio (1.000 g de cálcio o medicamento.2 A indicação atual é para os pacientes com osteoporose
elementar entre 50-70 anos, 1.200 g para indivíduos com > 70 grave, nos quais outros tratamentos aprovados são ontraindicados ou os
anos), de preferência de fonte alimentar, especialmente leite de- pacientes apresentem intolerância.
rivados. Uma nova classe de medicamentos, um inibidor do RANK ligante (de-
Dieta balanceada e sem excesso de sal, uma vez que o excesso de nosumabe), já utilizado para tratamento da osteoporose em mulheres pós-
sal pode provocar hipercalciúria. -menopausadas, foi aprovada para o uso em homens, em 2012 pela FDA
Manter níveis de 25(OH) vitamina D acima de 30 ng/mL, através de e em 2016 pela Anvisa. O medicamento é dado por via SC a cada 6 meses
exposição solar ou de suplementação de 1.000 a 2.000 UI por dia na dose de 60 mg. No estudo ADAMO,3 o denosumabe foi comparado ao
de colecalciferol e, se constatada deficiência, pode ser necessária placebo no tratamento de 228 pacientes adultos com baixa massa óssea,
dose de ataque mais alta por 6 a 8 semanas. acompanhados por 2 anos, e observou-se significativo aumento da BMD
Estimular a atividade física, de acordo com o condicionamento físi- na supressão da reabsorção óssea avaliada pelos níveis de CTX, indepen-
co e a idade, com objetivo de aumentar a força muscular, melhorar dentemente dos valores de testosterona no basal, status densitométrico,
o equilíbrio e diminuir o risco de quedas. estimativa de risco de fratura ou idade. Denosumabe também está aprova-
Cessar uso de tabaco e excesso de álcool; do pela FDA para aumentar a massa óssea em pacientes em uso de terapia
Correção da acuidade visual e controle do uso de sedativos, que de deprivação androgênica por câncer de próstata não metastático.
podem elevar o risco de quedas; Com relação ao hipogonadismo masculino, este acarreta aumento
Medidas antiquedas, tais como retirar tapetes escorregadios em da remodelação óssea e aumento do risco de fraturas. Estudos observa-
casa, corrimão em escadas, piso ou faixa antiderrapante, cadeira cionais sugerem que reposição de testosterona nestes pacientes reduz os
para tomar banho e tapete de borracha e manter ambiente livre de marcadores de remodelação óssea e aumenta a densidade mineral óssea.
obstáculos que possam causar acidentes. Todavia eficácia antifraturas não está comprovada. Paciente com hipogo-
De acordo com a National Osteoporosis Foundation,1 o tratamento nadismo e alto risco de fratura deve receber medicamento aprovado para
medicamentoso deve ser indicado para todos os homens acima de 50 anos prevenção de fraturas, independentemente se a reposição de testosterona
que apresentem uma fratura de fragilidade, mesmo que diagnosticada aci- for iniciada.
dentalmente por exame de imagem, e/ou apresentem osteoporose densi- O manejo da osteoporose em homens está descrito na Figura 19.2
tométrica na coluna lombar ou fêmur proximal. Indivíduos com osteopenia Nenhuma terapia farmacológica deve ser instituída de forma indefi-
e outros fatores de risco associados podem eventualmente serem candida- nida em duração. Após um período inicial, que depende do agente farma-
tos à terapia medicamentosa. cológico, deve ser feita uma reavaliação do risco de fratura e a conduta
As opções farmacológicas incluem medicamentos antirreabsortivos individualizada. Não há nenhuma recomendação uniforme que se aplique
(bisfosfonatos e denosumabe) e a teriparatida, única medicação anábo- a todos os pacientes quanto à duração do tratamento.
lica disponível no momento, bem como medicamentos com ação mista
(ranelato de estrôncio). Na classe dos antirreabsortivos, os bisfosfonatos
podem ser de administração oral (alendronato, risedronato) ou endoveno-
REVISÃO
sa (ácido zoledrônico). A osteoporose em homens é subdiagnostica e subtratada, mesmo
Os bisfosfonatos com aprovação pela FDA e a Agência Nacional de Vi- com alta morbimortalidade. A mortalidade após fratura de quadril é
gilância Sanitária (Anvisa) para o tratamento da osteoporose em homens maior em homens comparado às mulheres.
são: alendrontato (70 mg semanal, VO), risedronato (35 mg semanal ou A investigação laboratorial mínima deve ser feita em todos os
150 mg mensal, VO) e ácido zoledrônico (4 ou 5 mg anual, IV). Outras pacientes, lembrando-se das causas secundárias, especialmente
indicações para uso dos bisfosfonatos são em pacientes com osteoporose alcoolismo, excesso endógeno ou exógeno de glicocorticoide e hi-
induzida por glicocorticoide e em homens com terapia de deprivação an- pogonadismo.
drogênica. O tratamento não farmacológico se baseia em consumo adequado
A teriparatida (20 μg diário, por até 24 meses, SC) é aprovada pelo de cálcio (1.000 a 1.200 mg/dia a depender da faixa etária), manu-
FDA e Anvisa para o tratamento de osteoporose em homens, bem como tenção da 25(OH) vitamina D >30 ng/mL, atividade física regular,
em osteoporose induzida por glicocorticoides. No Brasil, esta indicação bem como cuidados antiquedas. Para os pacientes com indicação de
é para o tratamento da osteoporose com alto risco para fraturas, sendo tratamento farmacológico, os bisfosfonatos (alendronato, risedro-
definido alto risco como os pacientes com história de fratura osteoporóti- nato e ácido zoledrônico) são os medicamentos de primeira linha.
ca, ou a presença de múltiplos fatores de risco para fraturas, ou falha ao Outra opção aprovada de antirreabsortivo é o denosumabe. Teripa-
tratamento prévio para osteoporose, conforme decisão médica. ratida é indicado em casos graves, e o ranelato de estrôncio é um
A combinação de teriparatida e alendronato foi avaliada em estudo medicamento de segunda linha.
com 83 homens com baixa massa óssea que randomizou os pacientes para
alendronato, teriparatida ou a combinação por 30 meses. Teriparatida
aumentou significativamente a DMO em coluna e fêmur comparado aos
■■ REFERÊNCIAS
outros 2 grupos. O mesmo achado para os marcadores de remodelação
1. Cosman F, de Beur SJ, LeBoff MS, Lewiecki EM, Tanner B, Randall S, et al.
óssea. Não há indicação desta terapia dupla para o tratamento da osteo-
Clinician’s guide to prevention and treatment of osteoporosis. Osteoporos
porose em homens.
170 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Observação
Investigação laboratorial mínima
e conforme a suspeita clínica
para causas secundárias
DISTÚRBIOS INFLAMATÓRIOS
TABELA 19.1 ■ Critérios diagnósticos para mulheres no climatério
Artrite reumatoide Doença pulmonar obstrutiva ou na transição menopausal
Lúpus eritematoso sistêmico crônica
Espondiloartropatias CLASSIFICAÇÃO T-SCORE
SÍNDROMES DE MÁ ABSORÇÃO
ATENÇÃO!
Doença celíaca Doença colestática
Doenças inflamatórias Hemocromatose A presença de fratura por fragilidade determina o diagnóstico de os-
intestinais Após cirurgia bariátrica teoporose, independentemente dos valores da DMO.
DISTÚRBIOS RENAIS
Insuficiência renal Acidose tubular renal O exame de DXA permite também a avaliação de fraturas vertebrais
1
Hipercalciúria (VFA, do inglês vertebral fracture assessment) e a estimativa da microar-
quitetura óssea (TBS, do inglês trabecular bone score), porém, para isso, é
DISTÚRBIOS NEUROPSIQUIÁTRICOS necessário adquirir softwares específicos.
Outras técnicas, como tomografia computadorizada periférica de alta
Anorexia Paralisia cerebral
resolução e ultrassonografia de calcâneo, podem ser realizadas para esti-
Depressão
mar o risco de fraturas, mas não estabelecem diagnóstico de osteoporose
DEFICIÊNCIAS NUTRICIONAIS ou osteopenia. Radiografia de coluna deve ser realizada para detecção de
possíveis fraturas, entretanto, não é adequada para avaliar a densidade
Cálcio Vitamina C óssea.
Vitamina D Proteína Exames laboratoriais devem ser solicitados para descartar as cau-
sas secundárias já descritas. Como rotina, recomenda-se realizar ao me-
DEFEITOS CONGÊNITOS
nos hemograma, creatinina, cálcio, fósforo, fosfatase alcalina e calciúria
Osteogênese imperfeita Doença de Gaucher de 24 horas. Investigação mais aprofundada deve ser realizada em ca-
Síndrome de Marfan Homocistinúria sos que chegam já com fraturas por fragilidades ou em quadros atípicos,
com dosagens de 25 hidroxivitamina D, PTH, TSH, cortisol, anticorpos
MEDICAMENTOS antiendomísio e antitransglutaminase, eletroforese de proteínas, entre
Glicocorticosteroides Levotiroxina em dose outros.
Anticonvulsivantes suprafisiológica Os marcadores bioquímicos de remodelação óssea, apesar de não for-
Lítio Glitazonas necerem o diagnóstico, traduzem o estado do metabolismo ósseo e auxi-
Inibidores da recaptação de Análogos de GnRH liam no seguimento. Podem ser dosados no sangue marcadores de forma-
serotonina Inibidores de aromatase ção óssea, como os pró-peptídeos amino ou carboxiterminais do colágeno
Heparina Antiácidos contendo alumínio tipo 1 (PINP e PICP, respectivamente) e também de reabsorção, como os
Quimioterápicos/ Inibidores da bomba de prótons produtos da degradação do colágeno tipo 1 (CTX e NTX). Entretanto, é
Imunossupressores (uso crônico) preciso considerar que cada medicamento determina um padrão diferente
de resposta nas concentrações destes marcadores.
■■ DIAGNÓSTICO ■■ TRATAMENTO
O método diagnóstico mais utilizado e validado é a medida da DMO por O tratamento ideal da osteoporose é ainda o preventivo e baseia-se na
absorciometria de raio X com dupla energia (DXA). O diagnóstico é deter- otimização do pico de massa óssea na juventude, redução das perdas ao
minado pelo menor valor encontrado em um dos sítios a seguir: coluna longo da vida e prevenção de quedas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 173
Intravenosa 3 mg trimestral NA NA NA
essencial para a diferenciação e atividade dos osteoclastos e, portanto, Estimulador da formação (anabólico)
a inibição dessa via reduz a reabsorção óssea. Estudos demonstraram
Teriparatida
que o uso de denosumabe leva à redução do risco de fraturas vertebrais,
não vertebrais e de quadril em mulheres pós-menopausadas com osteo- Este fármaco é um peptídeo constituído pelos primeiros 34 aminoácidos
porose. Infecções de pele, dermatite e rash cutâneo podem ocorrer e, da molécula do hormônio da paratiroide (PTH), produzido por DNA recom-
assim como é descrito com BF, raros casos de fratura atípica de fêmur binante. Elevações rápidas e intermitentes de PTH estimulam o osteoblas-
e osteonecrose de mandíbula foram relatados. Porém, ao contrário dos to a produzir osso novo. Esse é o princípio do uso da teriparatida no trata-
BFs, esta medicação pode ser prescrita para pacientes com função renal mento da osteoporose. Como a teriparatida possui meia-vida muito curta,
bastante comprometida, pois não é eliminada pelos rins. Em seguimento a aplicação 1 vez ao dia possibilita o estímulo intermitente necessário para
que chegou a 10 anos de tratamento desde o início do estudo, a proteção a formação óssea.
contra fraturas se manteve estável e não possui efeito cumulativo. En- Devido ao alto custo, este medicamento é reservado para os casos de
tretanto, a suspensão deste tratamento é acompanhada de perda óssea osteoporose grave com fraturas ou quando há falha no tratamento com
acelerada, o que pode aumentar o risco de fraturas imediato. Portanto, antirreabsortivos. Foi observada importante redução de fraturas verte-
neste caso, a suspensão temporária do tratamento, ao contrário do que brais e não vertebrais em estudo prévio, mas, devido ao pequeno número
se preconiza com os BFs, não está indicada e, quando necessária, deve de fraturas de quadril ocorridas, não foi possível demonstrar redução do
ser acompanhada de estratégias para prevenir a perda óssea associada à risco de fratura neste sítio.
retirada do denosumabe. Os principais efeitos colaterais são hipercalcemia e hipercalciúria,
elevação de ácido úrico, náuseas, câimbras e hipotensão postural. Os-
Calcitonina teossarcoma foi observado em animais de experimentação, porém tal
É um antirreabsortivo com efeitos antifratura modestos. Possui ação associação não foi constatada em humanos. Entretanto, por precaução,
analgésica de ação central, que pode ser interessante na terapêutica da esse medicamento é contraindicado em situações de risco para osteossar-
osteoporose em indivíduos com dores causadas por fraturas recentes. É coma, doenças ósseas metastáticas, doença de Paget, pós-radioterapia
pouco utilizada atualmente. óssea ou elevação inexplicável de fosfatase alcalina. Também não deve ser
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 175
administrado a crianças e adolescentes, gestantes e lactantes e pacien- 4. Pinto Neto AM, Soares A, Urbanetz AA, Souza ACA, Ferrari AEM, Amaral
tes com hipercalcemia. A duração máxima do tratamento é de 24 meses B, et al. Consenso Brasileiro de osteoporose 2002. Rev Bras Reumatol.
e, imediatamente após sua suspensão, deve ser iniciada uma medicação 2002;42:343-54.
antirreabsortiva para evitar a perda da massa óssea adquirida com esse
agente anabólico. ■■ LEITURAS SUGERIDAS
Medicamento de ação mista Black DM, Rosen CJ. Clinical Practice. Postmenopausal osteoporosis. N Engl J
Med. 2016;374(3):254-62.
Ranelato de estrôncio Maeda SS, Lazaretti-Castro M. An overview on the treatment of postmenopausal
Seu mecanismo de ação não está completamente elucidado, entretanto, osteoporosis. Arq Bras Endocrinol Metabol. 2014;58(2):162-71.
demonstrou reduzir o risco de fraturas vertebrais e não vertebrais. É um Pinheiro MM, Reis Neto ET, Machado FS, Omura F, Yang JH, Szejnfeld J, et al.
Risk factors for osteoporotic fractures and low bone density in pre and
cátion divalente como o cálcio e se deposita nas frentes de mineralização
postmenopausal women. Rev Saude Publica. 2010;44(3):479-85.
do tecido ósseo. Contudo, por possuir peso atômico superior ao do cálcio,
Zerbini CA, Szejnfeld VL, Abergaria BH, McCloskey EV, Johansson H, Kanis JA.
pode superestimar os resultados na DXA. Devido ao aumento do risco de Incidence of hip fracture in Brazil and the development of a FRAX model.
doenças cardiovasculares, essa medicação é contraindicada para pacien- Arch Osteoporos. 2015;10:28.
tes com doença cardíaca isquêmica, doença arterial periférica ou doença
cerebrovascular (atuais ou pregressas), tromboembolia, imobilização e
hipertensão não controlada e atualmente é considerado uma medicação
de segunda linha no tratamento da osteoporose.
19.4 NO IDOSO
■■ PERSPECTIVAS
Avanços na biologia molecular permitiram a identificação de uma varie- ■■ SERGIO SETSUO MAEDA
dade de alvos potenciais para novos medicamentos. Odanacatib, que age ■■ VERA LÚCIA SJZENFELD
inibindo a enzima catepsina K produzida pelos osteoclastos durante a rea-
bsorção, é um novo medicamento antirreabsortivo capaz de reduzir o risco
de fraturas vertebrais, não vertebrais e de quadril. Estudos clínicos de fase ■■ EPIDEMIOLOGIA
3 com anticorpos antiesclerostina (romosozumabe e blosozumabe) estão
em andamento. Esclerostina é uma proteína que inibe a formação óssea A OMS estima que o número de indivíduos com mais de 80 anos quadupli-
mediada por osteoblastos e, portanto, inibidores de esclerostina estimu- que entre 2000 e 2050. Com o aumento de expectativa de vida da popula-
lam a formação óssea. O uso de abaloparatida, um análogo da proteína ção, estima-se que a osteoporose afete 14 milhões, e a incidência anual de
relacionada ao PTH, por 18 meses, levou à redução de fraturas vertebrais fraturas por osteoporose ultrapasse três milhões em 2020. A perda óssea
e não vertebrais, e estudos comparativos com teriparatida evidenciaram ocorre em homens e mulheres com o avançar da idade, sendo que as fra-
menor incidência de hipercalcemia. turas vertebrais (que são as mais comuns) têm seu pico entre 75-84 anos,
e as de quadril aumentam exponencialmente após os 75 anos. Após os 85
anos, as fraturas de quadril representam um terço das fraturas maiores,
REVISÃO com diferenças de acordo com a região do planeta onde são avaliadas.
Na revisão sistemática feita por Zhu e colaboradores,1 em 23 estudos in-
A osteoporose é condição comum, de alta morbimortalidade, porém cluindo 2.168 pacientes com fraturas bilaterais de quadril, observou-se uma
subdiagnosticada. incidência de 8,54%, e 70,4% ocorreram nos primeiros três anos a partir da
É uma doença silenciosa e os sintomas só aparecem quando há primeira (36,3% no primeiro ano). Os pacientes de maior risco foram mu-
fratura. lheres, com fratura trocantérica, com idade mais avançada e osteoporose.
A identificação de fatores de risco é essencial para prevenção e tra- Em estudo de Bass e colaboradores,2 observou-se que a mortalidade
tamento. em homens (32%) com mais de 65 anos com fratura de quadril foi maior do
Devem ser excluídas causas secundárias, especialmente na presen- que a das mulheres (18%).
ça de fraturas por fragilidade. No Dubbo Osteoporosis Epidemiology Study (1989-2010), evidenciou-
O tratamento inclui medidas não medicamentosas e medicamen- -se que cinco anos após uma fratura inicial; 24% das mulheres e 20% dos
tosas, que são capazes de reduzir efetivamente o risco de fraturas. homens refraturam; e 26% das mulheres e 37% dos homens morreram.3
■■ REFERÊNCIAS ■■ DIAGNÓSTICO
1. Muszkat P, Camargo MB, Peters BS, Kunii LS, Lazaretti-Castro M. Digital Algumas particularidades devem ser levadas em conta na avaliação da
vertebral morphometry performed by DXA: a valuable opportunity for DXA nesta faixa etária. A presença mais comum de processos osteodege-
identifying fractures during bone mass assessment. Arch Endocrinol Metab. nerativos, calcificação de aorta, e, por vezes, de artefatos cirúrgicos que
2015;59(2):98-104. invalidam o sítio de análise deve ser levada em consideração. Na impossi-
2. Ross AC, Manson JE, Abrams SA, Aloia JF, Brannon PM, Clinton SK, et al. bilidade de se avaliar a coluna lombar ou fêmures, pode ser feita a análise
The 2011 report on dietary reference intakes for calcium and vitamin D from
do antebraço não dominante na região do rádio (33% para o diagnóstico;
the Institute of Medicine: what clinicians need to know. J Clin Endocrinol
Metab. 2011;96(1):53-8.
pode também estimar o risco de fraturas em outros sítios). Ressalta-se,
3. Maeda SS, Borba VZ, Camargo MB, Silva DM, Borges JL, Bandeira F, et al. contudo, que não é recomendado para o monitoramento segundo a In-
Recomendações da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metaboligia ternational Society for Clinical Densitometry (ISCD) e a Associação Bra-
(SBEM) para prevenção e tratamento da deficiência de Vitamina D. Arq Bras sileira para Avaliação Óssea e Osteometabolismo (ABrASSO). Vale ainda
Endocrinol Metabol. 2014;58(5):411-33. mencionar que a presença de fratura óssea por fragilidade (baixo impacto)
176 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
cações que mostraram evidências nessa faixa etária foram alendronato, ■■ REFERÊNCIAS
risedronato, ácido zoledrônico, ranelato de estrôncio, denosumabe e te- 1. Zhu Y, Chen W, Sun T, Zhang Q, Liu S, Zhang Y. Epidemiological characteristics
riparatida. Esses medicamentos reduziram significativamente o número and outcome in elderly patients sustaining non-simultaneous bilateral
de fraturas vertebrais. A redução de fraturas não vertebrais e de quadril hip fracture: a systematic review and meta-analysis. Geriatr Gerontol Int.
variou entre os medicamentos e foi menor que a observada nas fraturas 2015;15(1):11-8.
vertebrais. As dosagens, a forma de administração e o tempo necessário 2. Bass E, French DD, Bradham DD, Rubenstein LZ. Risk-adjusted mortality rates
para prevenir fraturas vertebrais e não vertebrais são as mesmas utilizadas of elderly veterans with hip fractures. Ann Epidemiol. 2007;17(7):514-9.
3. Bliuc D, Alarkawi D, Nguyen TV, Eisman JA, Center JR. Risk of subsequent
em pacientes mais jovens e estão listadas no Capítulo 19.3 (Osteoporose
fractures and mortality in elderly women and men with fragility fractures
na mulher, na pós-menopausa).
with and without osteoporotic bone density: the Dubbo Osteoporosis
Em geral, os medicamentos para o tratamento da osteoporose, mes- Epidemiology Study. J Bone Miner Res. 2015;30(4):637-46.
mo em longo prazo, mantêm sua eficácia e segurança. Um aspecto im- 4. Raynaud-Simon A, Revel-Delhom C, Hébuterne X; French Nutrition and
portante que deve ser sempre lembrado é a avaliação da função renal. A Health Program, French Health High Authority. Clinical practice guidelines
insuficiência renal é comum em pacientes idosos e cuidado especial deve from the French Health High Authority: nutritional support strategy in
ser tomado com o uso dos bisfosfonatos. Os bisfosfonatos são eliminados protein-energy malnutrition in the elderly. Clin Nutr. 2011;30(3):312-9.
pelos rins e não são recomendados, quer seja oral ou endovenoso, em pa- 5. Frisoli Jr A. Osteoporose no idoso. In: Szejnfeld VL, editora. Osteoporose:
cientes com clearance de creatinina < 30 a 35 mL/min. Por isso, recomen- diagnóstico e tratamento. São Paulo: Sarvier; 2000. cap. 13.
da-se o estudo da função renal antes da introdução desses medicamentos
em idosos. Há relatos de nefrotoxicidade em pacientes que receberam bis-
fosfonatos endovenosos. É um efeito adverso raro e ocorreu em pacientes
20
com câncer que utilizaram altas doses. O ranelato de estrôncio também é
contraindicado em pacientes com função renal reduzida.
O denosumabe não é excretado pelos rins e, por isso, tem sido indi-
cado para pacientes idosos com clearance de creatinina < 30 mL/min. No DEPRESSÃO
entanto, no estudo clínico, apenas 73 pacientes, com média de idade de
80 anos, receberam essa medicação. Os autores concluíram que o estudo
teve um poder limitado, pois dos 73 pacientes avaliados apenas quatro
tinham fraturas vertebrais e três fraturas não vertebrais. Além disso, o nú-
mero de fraturas de quadril foi muito pequeno e não foi significativamente
20.1 NA INFÂNCIA
inferior ao grupo placebo. Embora o uso de denosumabe nessa população ■■ MARCOS RIBEIRO
seja uma opção interessante, deve ser realizada com cautela.
■■ SHEILA C. CAETANO
Enfim, o risco de fraturas por fragilidade em pacientes geriátricos (≥
75 anos) e especificamente em pacientes muito idosos (≥ 85 anos) é ele-
vado e tem grande impacto na qualidade de vida, pois idosos indepen-
dentes, na vigência de fraturas, podem se tornar dependentes e frágeis. Apesar de a depressão, então denominada melancolia, ter sido classifi-
As evidências na literatura apontam que há benefícios em se tratar essa cada como doença no século V a.C. por Hipócrates, há raras descrições
população e que os resultados são observados em curto prazo. O desafio, científicas de casos de melancolia na infância e na adolescência até a me-
portanto, é diagnosticar e identificar aqueles com alto risco de fraturas e tade do século 19. Porém, a partir dessa época, a comunidade científica
tratar o mais precoce possível. começou a sistematizar estudos sobre depressão nessa faixa etária.
■■ EPIDEMIOLOGIA
REVISÃO
A depressão ocorre em todas as faixas etárias, com aumento de prevalên-
Com o aumento de expectativa de vida da população, estima-se cia conforme o aumento da idade: em torno de 0,3 a 2,5%, em pré-esco-
que a osteoporose afete 14 milhões, e a incidência anual de fraturas lares; 1 a 2,5% em crianças em idade escolar; e até 8% em adolescentes.
por osteoporose ultrapasse três milhões em 2020 (a perda óssea Não há diferenças significativas na ocorrência de episódios depressi-
ocorre em homens e mulheres com o avançar da idade). vos em crianças pré-escolares em relação ao sexo. Mas, após a puberdade,
Nessa faixa etária, há particularidades a serem consideradas na a depressão acomete 2 mulheres para cada 1 homem. Uma explicação
avaliação da densitometria óssea. para isso seria de que as alterações hormonais parecem aumentar a sensi-
Não somente as comorbidades comuns nessa idade, mas também bilidade aos estressores ambientais.
o declínio da função renal são fatores que interferem na decisão A depressão é a principal causa de incapacidade na faixa etária de
terapêutica. 10 a 24 anos de idade e é um dos maiores fatores de risco para suicídio.
A sarcopenia é definida como a perda gradual de massa muscular,
força e função relacionada com a idade, sendo outro aspecto impor-
■■ FISIOPATOLOLOGIA
tante dessa faixa etária.
Toda intervenção terapêutica em pacientes idosos com osteoporose Ainda não foi elucidada, mas a hipótese é de que a interação entre predis-
deve visar mais à prevenção de quedas e fraturas do que ao aumen- posição genética e situações psicossociais adversas predispõe ao surgi-
to da densidade óssea. mento, à manutenção e ao agravamento da depressão. De fato, pesquisas
A prescrição de atividade física nos idosos deve contemplar não apontam que há uma associação entre desenvolvimento de depressão na
apenas o ganho de massa óssea, como também o aumento da força infância e adolescência e fatores genéticos e ambientais, sendo os prin-
muscular, o equilíbrio, a coordenação e a propriocepção. cipais: história pregressa de algum transtorno de humor; história familiar
de transtorno psiquiátricos, principalmente de transtorno do humor e sui-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 179
Cox GR, Fisher CA, De Silva S, Phelan M, Akinwale OP, Simmons MB, et al.
ATENÇÃO! Interventions for preventing relapse and recurrence of a depressive disorder
in children and adolescents. Cochrane Database Syst Rev. 2012;11:CD007504.
A FDA não recomenda o uso de paroxetina (não há evidência em rela-
Sadock BJ, Sadock VA. Transtornos de humor. In: Sadock BJ, Sadock VA. Manual
ção ao placebo).
conciso de psiquiatria da infância e adolescência. Porto Alegre: Artmed; 2011.
Thapar A, Collishaw S, Pine DS, Thapar AK. Depression in adolescence. Lancet.
2012;379(9820):1056-67.
As doses utilizadas são semelhantes às prescritas para adultos.
A resposta a antidepressivos em crianças e adolescentes tem padrão di-
ferente da do adulto, como a não resposta a antidepressivos tricíclicos.
As medicações com maior evidência para tratamento de depressão em
crianças são fluoxetina e escitalopram (depois dos 12). Nas metanálises, 20.2 NO JOVEM E NO ADULTO
venlafaxina, mirtazapina e nefazodona também foram relatadas como
eficazes. ■■ ACIOLY LUIZ TAVARES DE LACERDA
■■ SHEILA C. CAETANO
PSICOTERAPIAS
Em relação à psicoterapia, as modalidades mais indicadas são as TCC, a di-
nâmica e a interpessoal, que podem ocorrer de forma individual, em grupo
A depressão é considerada um dos mais importantes desafios de saú-
ou em família. Em crianças e adolescentes com depressão, há evidência, de pública global da atualidade. Condição recorrente, muito prevalente
por meio de ensaios randomizados de respostas com tamanhos de efeito na população geral, está associada a um prejuízo no funcionamento e na
intermediários, a TCC e a terapia interpessoal (TIP). A TCC parece reduzir qualidade de vida, morbidade clínica e mortalidade. Em pesquisa, um de-
em oito vezes o risco de recaída nos primeiros seis meses de seguimento. safio constante é diversidade dos sintomas e fisiopatologia de pacientes
Na depressão, a internação psiquiátrica pode ser indicada se há risco classificados como portadores de depressão. Esse transtorno varia con-
de auto ou heteroagressividade grave ou de suicídio. sideravelmente em sua apresentação clínica, seu curso, sua resposta ao
tratamento, sua genética e neurobiologia. Uma possível explicação para
isso é que a depressão tem uma definição politética, ou seja, para ser
ATENÇÃO!
diagnosticado com depressão, o paciente precisa preencher alguns (pelo
Lembre-se de questionar sobre comorbidades clínicas e/ou psiquiátricas. menos cinco dos nove critérios operacionais, sendo pelo menos um deles
Caso existam, elas devem ser cuidadosamente avaliadas e tratadas. critério central – humor deprimido ou perda do interesse), mas não todos
os sintomas que fazem parte dos critérios diagnósticos.
Até recentemente, a depressão era vista apenas como uma patolo-
gia psiquiátrica com componentes ideativos e de humor. Porém, avanços
REVISÃO importantes registrados nas últimas décadas no campo das neurociências
A depressão apresenta importante prevalência na população pe- reformularam definitivamente o conceito de doença psiquiátrica.
diátrica. Nas últimas décadas, evidências de diferentes fontes têm demonstra-
Este quadro está associado a prejuízos ao longo da vida, por interfe- do que a depressão é uma patologia sistêmica, caracterizada pela ocorrên-
rir no desenvolvimento global da criança e do adolescente. cia de diferentes domínios sintomatológicos. Como observado com outros
Doenças crônicas, história familiar de doenças afetivas, queixas fí- transtornos de humor, os sintomas da depressão podem ser agrupados
sicas sem achados positivos ou baixa resposta ao tratamento de em quatro domínios (1) alterações no biorritmo, que podem ser manifes-
outra condição clínica preexistente são fatores que aumentam o tadas clinicamente (p. ex.: alterações no apetite e no sono); (2) prejuízos
risco de depressão. no processamento emocional, que podem se manifestar por sentimentos
O tratamento de escolha nos casos leves e moderados é a psico- de desesperança, de culpa, desamparo e ideação suicida; (3) prejuízos
terapia. neurocognitivos, manifestados clinicamente na forma de dificuldade em
Em casos graves, com risco de suicídio e sintomas psicóticos, deve- tomar decisões, dificuldade de memória e concentração; e (4) alterações
-se usar antidepressivo, sendo a fluoxetina a primeira escolha. da psicomotricidade, que podem se apresentar na forma de agitação ou
retardo psicomotor, falta de energia e mesmo sintomas parkinsonianos de
intensidade variável.
■■ REFERÊNCIAS
1. Organização Mundial da Saúde. Classificação de transtornos mentais e de ATENÇÃO!
comportamento da CID-10. Porto Alegre: Artmed; 1993.
2. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de A falta de energia é mais comumente observada em quadros de de-
transtornos mentais: DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed; 2014. pressão com sintomatologia melancólica intensa.
rentes alterações biológicas relacionadas a esse transtorno são apontadas A amígdala medeia pelo menos em parte a desinibição da liberação do
como potencialmente envolvidas, incluindo hiperatividade simpático-su- fator de liberação da corticotrofina (CRF) no núcleo hipotalâmico paraven-
prarrenal, aumento do fator de liberação da corticotrofina e aumento da tricular, a qual, por sua vez, explicaria a desregulação do eixo hipotálamo-
cortisolemia. Diferentes estudos têm mostrado um aumento da gordura -hipófise-suprarrenal (eixo HHS) observada na depressão. A hipersecreção
abdominal em pacientes deprimidos (cerca do dobro da encontrada em de cortisol nessa condição tem sido associada ao aumento da atividade
controles saudáveis), bem como uma correlação positiva entre os níveis metabólica na amígdala e à redução da substância cinzenta na parte ros-
basais de cortisol e o volume de gordura intra-abdominal, sugerindo um tral do córtex do cíngulo anterior. Glicocorticosteroides atravessam passi-
papel do cortisol nesse processo. vamente a barreira hematencefálica e ocupam prontamente os sítios de
receptores de glicocorticosteroides (GR) em regiões límbicas, como hipo-
campo, hipotálamo, locus ceruleus e núcleo dorsal da rafe. Translocação de
■■ EPIDEMIOLOGIA
núcleos celulares pela ocupação dos GR por glicocorticosteroides produz
A depressão em geral se inicia na adolescência ou no início da fase adulta, uma alteração na expressão de genes que controlam diferentes processos,
pode ser crônica ou episódica e é frequentemente recorrente e comórbi- incluindo excitabilidade, plasticidade estrutural e neuroquímica neuronal.
da com abuso de substâncias e outras doenças físicas e mentais. Embora Níveis cronicamente elevados de cortisol podem prejudicar o feedback ini-
dados diretos acerca de sua prevalência não estejam disponíveis para a bitório do eixo HHS pela sensibilização de GR que interagem com regiões
maior parte dos países, aqueles encontrados sugerem que cerca de 17% no SNC, incluindo o hipocampo. Consequências de longo prazo dessa ele-
da população geral apresentará pelo menos um episódio depressivo ao vação incluem comprometimento da transmissão sináptica, redução do
longo da vida, com uma prevalência duas vezes maior entre as mulheres. metabolismo energético, atrofia hipocampal com poda dendrítica e morte
Estudos epidemiológicos têm indicado que a idade média de início celular, eventos que têm sido descritos na depressão.
das doenças psiquiátricas de maneira geral ocorre na adolescência. O 1o Disfunções nos circuitos pré-frontais mediais podem prejudicar o
episódio depressivo ocorre um pouco depois disso, com uma mediana re- aprendizado de recompensa, contribuindo potencialmente para a anedo-
latada entre 20 e 25 anos. A quase totalidade desses estudos identificou nia e a desmotivação manifestadas na depressão. As alterações de neu-
que sexo, idade e status marital estão associados à depressão: mulheres roimagem estrutural relatadas na depressão têm sido correlacionadas a
geralmente apresentam o dobro do risco de desenvolvê-la; indivíduos se- achados histopatológicos de estudos post-mortem. Tais estudos relatam
parados ou divorciados apresentam taxas significativamente maiores do redução do volume de substância cinzenta de regiões pré-frontais, nucleus
que os casados; e a prevalência de depressão comumente diminui como accumbens e hipocampo. Os correlatos histopatológicos desses achados
função da idade. incluem redução da glia sem perda neuronal equivalente, redução de si-
napses e proteínas sinápticas e elevação da densidade neuronal em estru-
ATENÇÃO! turas pré-frontais. A densidade de neurônios não piramidais também se
encontra reduzida no córtex dorsal anterolateral pré-frontal
Os custos crescentes associados à depressão no mundo têm sido mo- Em suma, segundo o modelo neurobiológico mais aceito atualmente
tivo de preocupação em todos os órgãos internacionais. Em 2000, a (Figura 20.1), esse conjunto de alterações em nível molecular, celular e
depressão já era a principal causa de incapacidade, respondendo por tecidual descritas de forma consistente na depressão está associado a
13,4% YLD (do inglês years of life lived with a disability) nas mulheres importantes prejuízos neurofuncionais que têm as várias manifestações
e 8,3% nos homens. sintomatológicas da depressão como expressão.
■■ FISIOPATOLOGIA
SISTEMA ALTERAÇÕES
Até recentemente, havia pouca evidência empírica relacionada à fisiopa-
tologia da depressão, já que essa condição não está associada à patologia Neurotransmissão ↓ Tônus monoaminérgico (serotonérgico,
cerebral grosseira ou a modelos animais claros para episódios espontâne- noradrenérgico, dopaminérgico)
os recorrentes. A testagem de hipóteses em modelos animais específicos Neuroplasticidade ↓ Neurogênese, ↓ sinaptogênese, ↓ arborização
e, particularmente, o desenvolvimento de novas tecnologias que permi- dendrítica, ↓ crescimento e sobrevida neuronal,
tem a caracterização in vivo da anatomia, da fisiologia e a neuroquímica ↑ apoptose
em humanos com depressão possibilitaram importantes avanços no en-
tendimento da fisiopatologia da depressão nas últimas décadas. Mecanismos ↑ Marcadores inflamatórios (PGE2, proteína
A hipótese monoaminérgica da depressão tornou-se hegemônica inflamatórios C-reativa, TNF-α, IL-1β, IL-2, IL-6)
a partir da descoberta acidental, na década de 1950, de que diferentes Eixo hipotálamo- Ativação (↑ CRH, ↑ ACTH, ↑ cortisol)
medicamentos com ação monoaminérgica apresentavam ação antidepres- pituitária-adrenal
siva. Porém, a escassez de dados empíricos que confirmem tal hipótese
tem motivado veementes questionamentos acerca da importância do pa- Metabolismo ↑ Radicais de oxigênio e nitrogênio, os quais
oxidativo reagem com proteínas, ácidos graxos, DNA e
pel de alterações na neurotransmissão monoaminérgica na fisiopatologia
RNAmt, causando danos às moléculas e aos tecidos
da depressão. Diferentes fontes de evidência a partir de estudos com
correspondentes
animais e humanos sugerem fortemente que alterações anatomofuncio-
nais, envolvendo os circuitos límbico-cortical-estriato-pálido-talâmicos, FIGURA 20.1 ■ As anormalidades associadas à fisiopatologia da
desempenham papel central na fisiopatologia da depressão. Projeções depressão envolvem diversas vias.
anatômicas da região pré-frontal medial para núcleos autonômicos da
ACTH: hormônio adrenocorticotrófico; CRH: hormônio liberador de corticotrofina;
amígdala, do hipotálamo, do locus ceruleus, da rafe e do tronco encefálico
PGE2: prostaglandina E; TNF-α: fator de necrose tumoral α; IL: interleucina.
desempenham um papel marcante na organização de respostas viscerais e
Fonte: Adaptada de Lopresti e colaboradores.1
comportamentais a estressores e estímulos emocionais.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 183
Em um mês, de 60 a 70% dos sintomas depressivos melhoram com 2. Harald B, Gordon P. Meta-review of depressive subtyping models. J Affect
uso de antidepressivos, ao passo que a taxa de resposta ao placebo é em Disord. 2012;139(2):126-40.
torno de 30%. O NNT de antidepressivo na fase aguda em casos graves é 3. Cuijpers P, Berking M, Andersson G, Quigley L, Kleiboer A, Dobson KS. A
metaanalysis of cognitive-behavioural therapy for adult depression, alone
de 5 a 7. O adjuvante no tratamento com antidepressivo com mais evidên-
and in comparison with other treatments. Can J Psychiatry. 2013;58(7):
cia é o carbonato de lítio.
376-85.
A 2a linha é o uso de antipsicóticos atípicos, de eficácia demonstrada; 4. Gaynes BN, Warden D, Trivedi MH, Wisniewski SR, Fava M, Rush AJ. What
porém, os efeitos colaterais podem ser desfavoráveis para alguns pacien- did STAR*D teach us? Results from a large-scale, practical, clinical trial for
tes, como ganho de peso. patients with depression. Psychiatr Serv. 2009;60(11):1439-45.
Tendo em conta nove das principais diretrizes de tratamento para 5. Leadholm AK, Rothschild AJ, Nolen WA, Bech P, Munk-Jørgensen P,
depressão psicótica: 6 de 9 sugerem combinação de antidepressivo (AD) Ostergaard SD. The treatment of psychotic depression: is there consensus
e antipsicótico (AP); 3 de 9 recomendam AD em monoterapia; e 5 de 9 among guidelines and psychiatrists? J Affect Disord. 2013;145(2):214-20.
sugerem que a eletroconvulsoterapia (ECT) é apropriada como tratamento 6. Kuehner C, Huffziger S. Factors predicting the long-term illness course
in a cohort of depressed inpatients. Eur Arch Psychiatry Clin Neurosci.
de 1a linha.5
2013;263(5):413-23.
Baixos níveis de vitamina D são encontrados em pessoas com depres-
são, mas ainda faltam ensaios randomizados para prevenção e tratamento
desse transtorno com a vitamina.
Há tratamentos promissores testados com os antagonistas de recep-
tor glutamatérgico NMDA, quetamina e magnésio, visto que as vias gluta-
matérgicas estão associadas à depressão e há relação desse sistema com 20.3 NO IDOSO
a homeostase do estresse e o magnésio.
■■ SERGIO LUIS BLAY
ATENÇÃO!
A população acima de 65 anos vem crescendo em todo o mundo, princi-
Quanto à fase de manutenção do antidepressivo, a recomendação palmente nos países em desenvolvimento. No Brasil, esse fenômeno vem
deve ser de pelo menos seis meses após a remissão. Após o tratamen- ocorrendo há alguns anos e, atualmente, a proporção de idosos na popu-
to do 1o episódio depressivo, em torno de 50% das pessoas terão um lação geral é relevante. O impacto do envelhecimento populacional é mul-
novo episódio, geralmente em 2 a 3 anos. tifacetado, destacando-se o elevado consumo de serviços de saúde. Os
transtornos depressivos são frequentes nesse grupo etário e apresentam
A maioria dos pacientes tratados para transtorno depressivo recupe- uma gama extensa de manifestações clínicas. Observam-se desde sinto-
rou-se dentro dos primeiros meses de tratamento, mas aproximadamente mas depressivos ligados a dificuldades cotidianas até os distúrbios graves
40% permaneceram persistentemente deprimidos no 1o ano de seguimen- acompanhados de sintomas psicóticos e risco de suicídio. Os sintomas po-
to. As principais causas da falha de resposta são dosagens inadequadas dem resultar em limitações físicas e psicológicas com grande impacto na
e não adesão, sendo a última principalmente em virtude dos efeitos co- área médica, social e econômica.
laterais. O diagnóstico da depressão no idoso é muito difícil em virtude da
heterogeneidade clínica. Além disso, a maior parte desses pacientes não
Fatores preditores de maior duração do episódio depressivo são início
preenche completamente os critérios diagnósticos da Classificação Inter-
precoce e maior duração do episódio antes da avaliação. Fatores predito-
nacional de Doenças (CID-10) ou do Manual diagnóstico e estatístico de
res de tempo para recorrência incluíam número de internações anteriores e
transtornos mentais DSM-5). Evidências demonstram que a depressão no
falta de psicoterapia. Funcionamento psicossocial a longo prazo foi previs-
idoso é subdiagnosticada no atendimento primário, identificando-se cor-
to por número de internações anteriores e duração do episódio.6
retamente uma porcentagem pequena dos casos. Quando estes pacientes
são diagnosticados, o tratamento oferecido geralmente é o medicamento-
REVISÃO so. Em geral, a dosagem do antidepressivo administrado é baixa resultan-
do em uma pequena taxa de resposta ou remissão do quadro depressivo.
Antes considerada apenas uma patologia psiquiátrica com com- Além disso, não é raro encontrar-se a associação de antidepressivos asso-
ponentes ideativos e de humor, hoje a depressão é definida como ciados a um uso indiscriminado de benzodiazepínicos, que se constitui em
patologia sistêmica, caracterizada pela ocorrência de diferentes do- um risco adicional de efeitos colaterais na população idosa.
mínios sintomatológicos.
Em geral, tem início na adolescência e apresenta diferenças entre
os gêneros quanto ao seu quadro clínico. Seu diagnóstico é clínico e ■■ EPIDEMIOLOGIA
não há marcador que o auxilie. A prevalência dos transtornos depressivos varia muito entre os diversos
Pode ser tratada por psicoterapia, pelo uso de antidepressivos ou estudos, fato que pode ser explicado tanto pelas próprias amostras utili-
pela combinação de ambos. zadas quanto pelas diferentes metodologias adotadas nas investigações.
Em um estudo de revisão da prevalência dos transtornos depressivos
nos idosos vivendo na comunidade, encontrou-se uma variação de 0,4
■■ REFERÊNCIAS a 35%. Contudo, os casos mais graves, como a depressão maior, apre-
1. Lopresti AL, Hood SD, Drummond PD. Multiple antidepressant potential sentam números mais conservadores variando entre 2 a 4%. Observa-se
modes of action of curcumin: a review of its anti-inflammatory, maior prevalência em idosos mais jovens (65 a 75 anos) do que entre os
monoaminergic, antioxidant, immune-modulating and neuroprotective mais velhos (> 75 anos). Não há evidências de que a frequência do trans-
effects. J Psychopharmacol. 2012;26(12):1512-24. torno aumente com a idade.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 185
Quando os critérios para se definir depressão são estabelecidos por ■■ DIAGNÓSTICO E QUADRO CLÍNICO
critérios clínicos, isto é, pela presença de sintomas depressivos que neces- De forma geral, o diagnóstico dos transtornos de humor é feito por meio
sitam de tratamento, encontramos taxas de prevalência mais elevadas. da história clínica, não existindo exames laboratoriais, incluindo imagem,
No Brasil, observaram-se taxas de 22% em sujeitos acima de 60 anos de que possam fornecê-lo. Uma entrevista clínica, a fim de obter anteceden-
idade. tes pessoais e familiares, é fundamental para o sucesso do diagnóstico.
Exames complementares devem ser realizados com a finalidade de excluir
ETIOLOGIA E OUTROS FATORES CORRELATOS doenças orgânicas que possam simular depressão e/ou interferir no prog-
A depressão é um transtorno psiquiátrico associado não só a uma maior nóstico, tais como doenças endócrinas, vasculares, osteoarticulares, entre
vulnerabilidade genética e biológica, como também às dificuldades da outras.
vida cotidiana. Mulheres, separados ou viúvos apresentam maior chance Os critérios diagnósticos para o transtorno depressivo, segundo o
de desenvolver a doença. DSM, não diferem entre os idosos e os adultos mais jovens, caracterizan-
do-se pela presença de no mínimo cinco sintomas daqueles indicados no
Quadro 20.5. Deverão estar presentes pelo menos dois sintomas principais
ATENÇÃO! por um período de pelo menos duas semanas. Com relação à gravidade do
quadro, tanto o DSM-5 e a CID-10 classificam os episódios de depressão
Episódios depressivos prévios são importantes fatores de risco para 2,3
maior como:
depressão no idoso, bem como as reduções dos neurotransmissores e
leve: quando o paciente apresenta dois sintomas principais e qua-
as modificações neuroendócrinas que ocorrem com o envelhecimento.
tro sintomas adicionais;
moderado: quando o paciente apresenta dois sintomas principais
Recentemente, várias evidências demonstraram que comorbidades e seis sintomas adicionais;
com outras doenças clínicas, como câncer, fratura do colo do fêmur, insufi- grave: quando o paciente apresenta os três sintomas principais e
ciência coronariana, diabetes, hipertensão, fatores de risco vasculares, al- cinco sintomas adicionais. Além da subclassificação de psicótico ou
terações estruturais cerebrais, principalmente lesões na substância branca não psicótico, conforme a presença ou ausência desses sintomas.
e subcorticais da substância cinzenta, estão particularmente associadas à
depressão no idoso.
QUADRO 20.5 ■ Critérios diagnósticos para o transtorno
As condições socioambientais propriamente ligadas ao relógio social
depressivo maior segundo o DSM-5
da terceira idade, como luto, aposentadoria, entre outras, têm relevante
participação no desencadeamento de quadros depressivos nos idosos. No SINTOMAS PRINCIPAIS
Quadro 20.4, estão listados os eventos de maior impacto para o grupo
etário idoso documentado por extensa literatura. Humor deprimido
Comparativamente aos quadros depressivos de início precoce, a sus- Perda do interesse ou prazer nas atividades usuais
cetibilidade genética apresenta menor importância nos idosos que inicia-
SINTOMAS ADICIONAIS
ram tardiamente seus sintomas, isto é, com idade maior ou igual a 60
anos. Nessas circunstâncias, os aspectos vasculares ganham maior rele- Alteração do peso
vância etiopatogênica. Insônia ou excesso de sono
Agitação ou lentificação motora
Redução da energia e aumento da fadiga
QUADRO 20.4 ■ Eventos de vida e estressores crônicos associados Sentimento de culpa excessiva ou de desvalia
à depressão nos idosos Pensamentos recorrentes de morte, ideias ou comportamento suicida
Diminuição da concentração ou indecisão
EVENTOS DE VIDA ESTRESSORES CRÔNICOS
Fonte: American Psychiatric Association.2
Viuvez Declínio da saúde e da
Separação mobilidade
Entretanto, evidências epidemiológicas demonstram que a depres-
Doença física aguda Perda da audição ou da visão
são nos idosos pode apresentar algumas características específicas. Entre
Mudança de casa Relacionamentos interpessoais
elas, as queixas cognitivas (como diminuição da memória e dificuldade
Luto conflituosos
de concentração), somáticas (como fadiga e cansaço), hipocondria, sen-
Doença médica em pessoas Problemas afetando membros timentos de inutilidade, irritabilidade e pensamentos autodepreciativos,
próximas da família paranoides e recorrentes de suicídio. Além disso, somente um quarto dos
idosos que apresentam sintomas depressivos clinicamente relevantes e in-
Mudança para residência para Declínio socioeconômico capacitantes apresentam quadros que preenchem os critérios dos manuais
idosos (asilo) Isolamento social diagnósticos. Eles são, em geral, denominados depressão menor, subsin-
Crise financeira Dificuldades no casamento drômica, oligossintomática ou atípica. Os principais sintomas são a falta
Problemas com familiares e Problemas no trabalho ou com a de motivação, tristeza, anedonia, piora da concentração e da cognição.
amigos aposentadoria Essa apresentação clínica é a mais comum em atendimento ambulatorial.
Ser cuidador de alguém da Além disso, estão associados aos mesmos fatores de risco que os quadros
família de depressão maior.
Transtorno de personalidade A depressão cursa habitualmente associada a doenças clínicas, tais
como diabetes, hipertensão, artrose, queixas gastrintestinais, diminuição
Fonte: Adaptado de Baldwin.1
da acuidade visual e auditiva, entre outros problemas.
186 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Em geral, os transtornos depressivos têm início na adolescência ou na usados com maior cautela, posto que os sistemas colinérgicos nessa faixa
idade adulta e se prolongam até a velhice. Contudo, existe um grupo de etária estão acentuadamente comprometidos. Indivíduos deprimidos sem
pacientes cujo quadro depressivo aflora após os 60 anos de idade. Esse manifestar sintomatologia deficitária do ponto de vista cognitivo ou com-
quadro, denominado depressão de início tardio, frequentemente se carac- portamental, submetidos aos medicamentos desse tipo, podem rapida-
teriza por apresentar poucas ideias depressivas, redução do juízo crítico, mente desencadear quadros de desorientação temporoespacial, hipomné-
apatia, retardo psicomotor, alterações cognitivas e evidências neurológi- sia, perda do juízo crítico, muito semelhante aos encontrados nos quadros
cas nos exames de imagem de isquemia cerebral em áreas subcorticais ou demenciais. Com os benzodiazepínicos, contudo, podem ocorrer efeitos
de substância branca. semelhantes aos mencionados, acrescidos de efeitos sedativos acentua-
dos, ou reações paradoxais tipo hiperexcitabilidade, agitação psicomotora
e agressividade, resultadas de aproveitamento cerebral inadequado da
■■ TRATAMENTO
ação farmacológica.
A estratégia mais favorável para tratar o transtorno depressivo é a abor- Concomitantemente às manifestações cerebrais desses medicamen-
dagem multiprofissional, que envolve o tratamento físico, psicológico tos, efeitos sistêmicos podem comprometer o resultado do tratamento.
e social, com o objetivo de: remitir os sintomas, uma vez que sintomas Hipotensão ortostática, quedas, retenção urinária, arritmias cardíacas,
residuais aumentam o risco de cronicidade do quadro; prevenir recaídas distúrbios visuais, aumento da pressão intraocular, constipação intestinal,
ou recorrências; e reduzir o risco de suicídio. Ao instituir o tratamento, secura de boca, tremores, ansiedade, sonolência, nervosismo, náuseas,
deve-se levar em conta a fase da doença na qual o paciente se encontra: sudorese excessiva, diarreia, ganho de peso, cefaleia, disfunções sexuais,
fase aguda: que tem como objetivo a remissão dos sintomas; tontura, acatisia, entre outros, podem inviabilizar o tratamento.
fase de continuação: que tem como objetivo prevenir o retorno Doenças físicas concomitantes podem interferir indiretamente na fun-
do episódio; ção cerebral. Alterações metabólicas gerais, cardiovasculares, renais, he-
fase de manutenção: que previne a recorrência de futuros epi- páticas ou respiratórias, bem como estados infecciosos, podem modificar
sódios. a resposta aos fármacos.
Com relação às principais abordagens, têm-se a psicoterapia, a farma- Alterações farmacocinéticas, isto é, como o organismo processa os
coterapia, a eletroconvulsoterapia (ECT), a psicoeducação e a psicoterapia medicamentos administrados, costumam se manifestar no organismo ido-
familiar. so, em que se alteram sua absorção, transporte, metabolismo e excreção.
A maioria dos fármacos psicotrópicos, à exceção do lítio, é metabolizada
PSICOTERAPIAS no fígado. Problemas que venham a atingir o débito cardíaco e os siste-
A psicoterapia cognitivo-comportamental é a abordagem mais utilizada mas enzimáticos hepáticos afetam substancialmente as concentrações dos
entre as diversas estratégias à disposição. No entanto, outras técnicas medicamentos no organismo.
também são usadas, como o aconselhamento, a abordagem interpessoal, O tratamento das múltiplas doenças induz a associação dos psico-
as psicoterapias de resolução de problemas, psicodinâmica e breve, a mo- trópicos com outros medicamentos utilizados na prática clínica. O uso
dificação do ambiente, entre outras. concomitante de muitos remédios, portanto, é fenômeno frequente nessa
população e pode favorecer interações medicamentosas complexas. Essas
FARMACOTERAPIA interações podem ocorrer em direção favorável ou não, isto é, potencia-
Medicar pacientes idosos demanda conhecimento prévio das modifica- lizando efeito terapêutico ou levando a efeitos colaterais inesperados. A
ções farmacodinâmicas e farmacocinéticas presentes nesse grupo etário. metabolização dos medicamentos ocorre em diferentes sistemas enzimáti-
Alterações farmacodinâmicas, isto é, como o medicamento age no orga- cos hepáticos, denominados P450. É possível antecipar possível interação
nismo, estão habitualmente presentes em idosos. Essas alterações são de- medicamentosa quando se conhecem os sistemas enzimáticos envolvidos.
correntes, entre outras razões, dos processos normais do envelhecimento, Por exemplo, os níveis séricos de um antipsicótico podem ficar perigosa-
da presença de doenças físicas concomitantes e da utilização de múltiplas mente elevados caso outro medicamento, tomado conjuntamente, iniba
medicações. Essas circunstâncias, individualmente ou associadas, podem sua metabolização.
levar o idoso a obter respostas indesejadas ao tratamento proposto. Algu- Os psicotrópicos são excretados primordialmente via renal. A diminui-
mas transformações do cérebro desse indivíduo concorrem para as modi- ção da função renal pode modificar a meia-vida dos fármacos eliminados
ficações de suas respostas aos medicamentos. Acentuadas modificações por essa via. Nos idosos, em comparação com grupos etários mais jovens,
celulares ou subcelulares ocorrem com o aumento da idade. Há diminuição os medicamentos costumam apresentar meia-vida mais longa (p. ex., imi-
progressiva do número de neurônios (de forma geométrica), bem como da pramina 1,3 x; diazepam 4 x; lítio 2 x). As alterações do fluxo renal têm
arborização dendrítica e, consequentemente, do número de sinapses esta- implicações clínicas relevantes particularmente para o idoso usuário de
belecidas entre os neurônios. Ao lado disso, ocorrem modificações bioquí- lítio. Os cuidados devem ser redobrados nessas circunstâncias.
micas cerebrais que se refletem na diminuição da concentração de vários Levando-se em consideração esses fatores, alguns princípios gerais
neurotransmissores, bem como da atividade enzimática glicolítica do cére- devem ser seguidos ao medicar esses pacientes:
bro. Sistemas de neurotransmissores importantes para a função cognitiva 1 | iniciar o tratamento com doses inferiores às utilizadas com adultos. As
como um todo ou para as funções afetivas (colinérgicos, dopaminérgicos, dosagens devem ser aumentadas lentamente, o idoso tende a responder à
serotoninérgicos, noradrenérgicos, gabaérgicos) são particularmente afe- medicação psicotrópica de maneira mais potente e prolongada;
tados com o envelhecimento. As modificações geralmente apontam para 2 | fazer levantamento minucioso dos remédios utilizados no passado e
uma diminuição da atividade ou de resposta. verificar com quais se obteve êxito;
O cérebro, assim despojado de seus mecanismos de proteção e com- 3 | fazer levantamento minucioso dos remédios atualmente em uso e ava-
pensação, passa a apresentar reações desproporcionais ou até inespera- liar as possíveis interações medicamentosas;
das aos medicamentos. Dessa maneira, fármacos psicoativos com forte 4 | antes de iniciar o tratamento, fazer cuidadosa avaliação da saúde física
ação anticolinérgica (antidepressivos tricíclicos, neurolépticos) devem ser do paciente;
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 187
5 | a estratégia medicamentosa deve ser o mais simples possível: tanto na Estudos de revisão sistemática evidenciaram que a geração mais re-
quantidade quanto na farmacocinética dos produtos. cente de antidepressivos, os ISRS e os inibidores seletivos de recaptação
Recentemente, várias revisões e metanálises foram publicadas com o de serotonina e norepinefrina (ISRSN), são preferencialmente utilizados
objetivo de avaliar a eficácia dos antidepressivos nos idosos. Esses estu- aos tricíclicos devido ao perfil de maior tolerabilidade e menor frequência
dos demonstraram que os antidepressivos foram estaticamente mais efi- de efeitos colaterais. Não existe diferença relevante de eficácia entre os
cazes do que o placebo, com taxas de resposta de 48 versus 38,6% e taxas antidepressivos, deixando sua escolha individual pela preferência dos mé-
de remissão de 33,7 versus 27,2%, respectivamente. Estudos que compa- dicos e dos pacientes.
ram diferentes classes terapêuticas não encontraram diferenças significa-
tivas entre os tricíclicos e os ISRS e outros antidepressivos. Entretanto, o
tamanho do efeito nos idosos é menor do que quando comparado com ATENÇÃO!
a população adulta em virtude das características clínicas encontradas
Ao escolher o antidepressivo, deve-se sempre considerar a história
naquela faixa etária, como a presença simultânea de múltiplas doenças
prévia de resposta do paciente e de membros da família, o perfil de
físicas, o uso concomitante de outras medicações e o comprometimento
efeito colateral, a segurança com relação à overdose, as interações
das funções executivas que influenciam a administração e a adesão, bem
medicamentosas, a disponibilidade e o custo da medicação.
como a resposta ao tratamento. Estudos controlados demonstraram que
pacientes do sexo masculino, mais velhos, com longa duração do episódio
atual e apresentando depressão acompanhada de sintomas psicóticos fo- Por último, a fase de manutenção do tratamento com antidepressivos
ram os grupos que apresentaram as piores respostas aos antidepressivos. em idosos deve ser por um período mínimo de dois anos, como demons-
Contudo, estudos de seguimento de longo prazo indicam que o tratamen- tram evidências recentes.
to melhora o desfecho em outros aspectos de saúde do idoso e reduz a Uma parcela significativa dos pacientes não apresenta uma resposta
mortalidade. satisfatória ao tratamento, não chegando a alcançar a remissão dos sinto-
Mais de 20 antidepressivos estão hoje aprovados pela FDA, agência mas. Como estratégia, vários autores sugerem em primeiro lugar a troca
reguladora do licenciamento de medicamentos nos Estados Unidos, no da medicação inicial por outro com diferente mecanismo de ação, como,
tratamento da depressão nos idosos. Geralmente, essa população neces- por exemplo, trocar um ISRS por um ISRSN, isto é mantendo a monotera-
sita de doses menores do que os pacientes adultos devido às alterações pia. Em segundo lugar, acombinação de diferentes agentes, mas sempre
farmacocinéticas citadas no início deste capítulo. Entretanto, pacientes ressaltando o risco de interação medicamentosa e de surgimento de even-
com resposta parcial ao tratamento sem eventos adversos significativos tos adversos indesejáveis. Entre as principais estratégias de associação
podem usar as doses de referência de pacientes adultos, desde que o com alguma evidência, estão: ISRS e bupropiona; e ISRSN e bupropiona.
aumento seja gradativo. Os antidepressivos são eficazes em pacientes Contudo, a combinação de venlafaxina e mirtazapina, comumente utiliza-
idosos deprimidos com comorbidades clínicas, porém eles podem ser da na prática clínica, curiosamente, ainda precisa de estudos controlados
mais sensíveis a certos eventos adversos, como os anticolinérgicos dos para estabelecer sua eficácia. Os principais antidepressivos usados em
tricíclicos. idosos estão listados na Tabela 20.1. A vortioxetina é uma inclusão recente
TABELA 20.1 ■ Dosagens, meia-vida e perfil dos efeitos colaterais dos principais antidepressivos usados para tratar depressão nos idosos
ISRS
Fluoxetina 5 10-40 70-80 Ansiedade, náusea, vômito, boca seca, diarreia, cefaleia, agitação, disfunção sexual,
acatisia
Sertralina 12,5 50-200 25-30 Ansiedade, náusea, vômito, boca seca, diarreia, cefaleia, agitação, disfunção sexual
Citalopram 10 10-20 40-50 Ansiedade, náusea, vômito, boca seca, diarreia, cefaleia, agitação, disfunção sexual,
acatisia
Escitalopram 2,5 5-20 40-50 Ansiedade, náusea, vômito, boca seca, diarreia, cefaleia, agitação, disfunção sexual
Paroxetina 10 20-50 10-20 Boca seca, tontura, sonolência, fadiga, ganho de peso, disfunção sexual
Fluvoxamina 50 100-200 17-22 Náusea, vômito, boca seca, cefaleia, agitação, sonolência
ISRSN
Venlafaxina XR 37,5 75-150 5-9 Náusea, agitação, insônia, disfunção sexual, cefaleia
Duloxetina 20 20-60 8-17 Ansiedade, náusea, vômito, sonolência, diarreia, cefaleia, agitação
Desvenlafaxina 25 50-100 20 Ansiedade, náusea, vômito, boca seca, diarreia, cefaleia, disfunção sexual
188 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Outros antidepressivos
Tricíclicos
Nortriptilina 10 10-125 18-56 Sonolência, prisão de ventre, visão turva, retenção urinária
na lista já que foi aprovada para uso em nosso meio. Além da eficácia nos por estudos controlados. Além disso, existem evidências de que ativida-
quadros depressivos mostra resultados positivos no domínio cognitivo da des sociais e religiosas podem ser úteis para pacientes acostumados a
sintomatologia. essas práticas.
ELETROCONVULSOTERAPIA
A ECT continua sendo a forma mais eficaz no tratamento da depressão e REVISÃO
é utilizada nos quadros moderados e graves quando os antidepressivos Quadros de depressão no idoso são muito importantes e devem ser
falham. Evidências sugerem que a ECT é mais eficaz nos idosos do que nos diagnosticados e tratados com eficiência.
adultos jovens e tem como vantagem menor risco de efeitos colaterais. Idosos deprimidos têm ampla gama de alternativas terapêuticas.
A psicoterapia, a psicofarmacoterapia e a eletroconvulsoterapia são
PSICOEDUCAÇÃO procedimentos terapêuticos úteis e contam com o suporte de estu-
Consiste no fornecimento de informações sobre o quadro clínico, a evolu- dos controlados na literatura.
ção e o tratamento, para os pacientes e/ou familiares. Essa técnica melho-
ra a resposta terapêutica e a adesão à proposta de tratamento. Estudos
bem conduzidos nessa área têm apontado de forma consistente a relevân-
■■ REFERÊNCIAS
cia do procedimento.
1. Baldwin RC. Depression in later life. New York: Oxford University; 2010.
2. American Psychiatric Association. DSM-5: diagnostic and statistical manual
TERAPIA FAMILIAR
of mental disorders. 5th ed. Washington: APA; 2013.
Pode ser uma abordagem relevante e com diferentes propósitos. Inicial- 3. World Health Organization. Classificação de transtornos mentais e de
mente, tem um caráter pedagógico, municiando a família com informa- comportamento da CID-10: descrições clínicas e diretrizes diagnósticas.
ções sobre a doença e o tratamento. Outra função é a organização do Porto Alegre: Artmed; 1993.
ambiente, que pode se ajustar às dificuldades físicas e psíquicas dos pa-
cientes. Finalmente, visa à mediação de conflitos interpessoais, que pode
ser determinante para a atenuação das tensões. ■■ LEITURAS RECOMENDADAS
Blay SL, Andreoli SB, Fillenbaum GG, Gastal FL. Depression morbidity in later life:
ATIVIDADES COMPLEMENTARES prevalence and correlates in a developing country. Am J Geriatr Psychiatry.
2007;15(9):790-9.
Nem todos os pacientes respondem completamente aos tratamentos
Blay SL, Fillenbaum GG, Peluso ET. Differential characteristics of young and
propostos, isto é, não atingem a remissão. Além disso, há aqueles que
midlife adult users of psychotherapy, psychotropic medications, or both:
relutam em usar os medicamentos convencionais seja por concepção reli- information from a population representative sample in São Paulo, Brazil.
giosa ou de vida. Esses motivos, entre tantos outros, justificam o empre- BMC Psychiatry. 2015;15:268.
go de outras opções terapêuticas. O exercício físico pode trazer benefício Blay SL, Landerman LR, Fillenbaum GG. Is higher frequency of physical activity
sintomatológico para pacientes com depressão leve ou moderada. Ativi- associated with reduced prevalence of depression among older community
dade regular três ou mais vezes por semana tem benefícios apontados residents? A study from Brazil. J Amer Ger Soc. 2016;4(64):725..
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 189
IDADE
AUTORES PUBLICAÇÃO PAÍS MÉTODO N (ANOS) PREVALÊNCIA
Saarenpaa-Heikkila e J Sleep Res. 1995;4(3):173-82 Finlândia Questionário 574 7-17 Frequente ou sempre:
colaboradores 4%(H)/5%(M)
Algumas vezes:
61%(H)/57%(M)
Tynjälä e colaboradores Health Educ Res. 1993;8(1): Finlândia Questionário 40202 11-16 16,4%-33,2%
69-80
Partinen e Rimpelä The yearbook of health Finlândia Entrevista por telefone 2016 15-64 7%(H)/9%(M)
education research 1982 semanalmente
Ford e Kamerow JAMA. 1989;262(11):1479-84 Estados Entrevista direta 7954 >18 7,9%(H)/12,1%(M)
Unidos estruturada com
escala de diagnóstico
Weissman e colaboradores Gen Hosp Psychiatry. 1997; Estados Entrevista direta 10533 >18 11,9
19(4):245-50 Unidos estruturada com
escala de diagnóstico
Dodge e colaboradores Arch Intern Med. 1995; Estados Questionário e 1667 >18 22,8-36,4%(H)
155(16):1797-800 Unidos entrevista 30,0-47,6%(M)
Morgan e Clarke Br J Gen Pract. 1997;47(416): Inglaterra Questionário 1042 >65 11,2-33,2%(H)
166-9 30,8-44,4%(M)
Ohayon e Partinen J Sleep Res. 2002;11(4): Finlândia Entrevista por telefone 982 >18 DSM-IV: 11,7%
339-46 Outros: 37,6%
Kim e colaboradores Sleep. 2000;23(1):41-7 Coreia Entrevista domiciliar 3030 >20 22,3%(H)/20,5%(M)
Bixler e colaboradores J Psychosom Res. 2002;53(1): Estados Questionário 16583 20-100 7,50%
589-92 Unidos
Li e colaboradores J Psychosom Res. 2002;53(1): Hong Kong Entrevista por telefone 9851 18-65 11,90%
601-9
Morin e colaboradores Sleep Med. 2006;7(2):123-30 Canadá Entrevista por telefone 2001 18-91 Sintomas de insônia: 29,9%
DSM-IV: 15%
Castro e colaboradores Ann Neurol. 2013;74(4): Brasil Questionário e 1042 20-80 Sintomas de insônia:45%
537-46 polissonografia DSM-IV: 15%
Polissonografia: 32%
Nowicki e colaboradores Psychiatr Pol. 2016;50(1): Polônia Questionário 2413 18-79 26,4-60,2%
165-73
N: tamanho amostral; H: número de homens; M: número de mulheres.
de álcool e outros medicamentos para controle da insônia são bastante de casa (26,6%). Nas demais categorias de médicos e executivos homens,
comuns e estão associados ao estresse psicológico e somático decorrente bem como em mulheres enfermeiras e assistentes sociais, essas queixas
da alta prevalência de insônia. De fato, sintomas de estresse relacionados foram baixas (menor do que 10%).
ao trabalho e exaustão mental são associados à insônia. Outro fator que
também contribui com a insônia são os parâmetros sociais e ocupacio-
■■ DISTÚRBIOS RESPIRATÓRIOS RELACIONADOS
nais. Estar desempregado ou solteiro se associa a uma maior prevalência
de insônia. Em uma pesquisa com 6.268 adultos de diferentes ocupações AO SONO
profissionais, 18,9% dos motoristas de ônibus apresentaram queixas de Os distúrbios respiratórios relacionados ao sono englobam diversas alte-
ter alguma ou muita dificuldade em iniciar o sono. Entre os homens exe- rações no padrão respiratório durante o sono, sendo o ronco e a apneia
cutivos e médicos, 3,7 e 4,9% apresentaram as mesmas queixas, respecti- obstrutiva do sono (AOS) as condições clínicas mais frequentemente ob-
vamente. Os distúrbios do sono foram mais frequentes em trabalhadores servadas. Em alguns destes distúrbios, a respiração também é anormal
homens (28,1% acordavam mais de três vezes por noite) do que nas donas durante a vigília. Esses distúrbios são agrupados em:
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 191
Síndrome da apneia obstrutiva do sono. da obesidade e o avanço nas metodologias de estudo em sono, obser-
Síndrome da apneia central do sono (SACS). vou-se que a prevalência de SAOS é muito maior, atingindo 32,9% da
Síndrome da hipoventilação relacionada ao sono. população de São Paulo. Mais recentemente, um estudo realizado na
Síndrome da hipoxemia relacionada ao sono. população geral da Suíça, utilizando as regras atuais da Academia Ame-
No entanto, muitos pacientes irão satisfazer os critérios diagnósticos ricana de Medicina de Sono para o estagiamento de sono e marcação
para mais de um destes grupos. Em particular, a maioria possui uma com- de eventos, evidenciou que 49,7% dos homens e 23,4% das mulheres
binação de apneia obstrutiva e central durante o sono. Embora o diagnós- possuem SAOS moderada a grave (índice de apneia-hipopneia, [IAH] ≥
tico seja muitas vezes com base no distúrbio predominante, há variação 15/hora) em associação a maior risco de diabetes, síndrome metabólica
de noite para noite, bem como ao longo do tempo. Ocorre também uma e depressão.5
sobreposição na fisiopatologia, pois algumas apneias centrais estão as- O primeiro grande estudo polissonográfico sobre a prevalência de
sociadas a uma via aérea superior fechada e muitas apneias obstrutivas SAOS foi conduzido em Madison (Wisconsin).6 Nele, os autores estima-
começam após um tempo da queda no drive ventilatório. ram que 2% das mulheres e 4% dos homens de meia idade apresentavam
De acordo com diversos estudos transversais epidemiológicos, a critérios para o diagnóstico da SAOS definido pelo IAH ≥ 5/hora somado
menor prevalência encontrada para a SAOS em homens adultos foi de à hipersonolência diurna. Em outro estudo com a população dos EUA, a
1 a 4%, associada diretamente com a idade, uma vez que em homens SAOS foi definida clinicamente por IAH ≥ 10 somado a sintomas diurnos,
de 40 a 59 anos a prevalência passou para 4 a 8%. Com o aumento atingindo 3,9% dos homens e 1,2% das mulheres. A seguir, a Tabela 21.2
TABELA 21.2 ■ Histórico e comparação dos estudos de prevalência de síndrome da apneia obstrutiva do sono
IDADE
AUTORES PUBLICAÇÃO PAÍS MÉTODO N (ANOS) PREVALÊNCIA
Lavie Sleep/wake disorders. 1983 Israel Questionário 1262 (H) 18-67 3,5%
(1,0%-5,9%)
Telakivi e colaboradores Acta Neurol Scand. 1987; Finlândia Questionário, polissonografia e 1939 (H) 30-69 0,4%-1,4%
76(1):69-75 exame clínico
Gislason e colaboradores J Clin Epidemiol. 1988;41(6): Suécia Questionário, polissonografia e 3201 (H) 30-69 0,7%-1,9%
571-6 exame clínico
Young e colaboradores N Engl J Med. 1993;328(17): Estados Polissonografia e exame clínico 352 (H)/250(M) 30-60 4% (H)/
1230-5 Unidos 2% (M)
Olson e colaboradores Am J Respir Crit Care Med. Austrália Questionário e monitor portátil 1233 (H)/969(M) 35-69 4%-69%
1995;152(2):711-6
Marin e colaboradores Int J Epidemiol. 1997;26(2): Espanha Entrevista pessoal, exame 597 (H)/625(M) >18 2,2%(H)/
381-6 clínico e oximetria portátil 0,8%(M)
Bixler e colaboradores Am J Respir Crit Care Med. Estados Entrevista por telefone e 4364 (H) 20-100 3,3%
1998;157(1):144-8 Unidos polissonografia em subamostra 741 (subamostra)
Bixler e colaboradores Am J Respir Crit Care Med. Estados Entrevista por telefone e 12219 (H) 20-100 1,2%
2001;163(3 Pt 1):608-13. Unidos polissonografia em subamostra 1000 (subamostra)
Ip e colaboradores Chest. 2001;119(1):62-9 China e Questionário e polissonografia 784 (H) 30-60 3,1%-4,1%
Hong Kong em subamostra 53 (subamostra)
Ip e colaboradores Chest. 2004;125(1):127-34 China e Questionário e polissonografia 854 (H) 30-60 0,8%-2,1%
Hong Kong em subamostra 106 (subamostra)
Kim e colaboradores Am J Respir Crit Care Med. Coreia Exame clínico e polissonografia 5020 40-69 4,5%(H)/
2004;170(10):1108-13 do Sul em subamostra 457 (subamostra) 3,2%(M)
Reddy e colaboradores Sleep Med. 2009;10(8): Índia Questionário e polissonografia 360 ≥18 4,0%(H)/
913-8 1,5%(M)
Tufik e colaboradores Sleep Med. 2010;11(5): Brasil Questionário, polissonografia e 468 (H)/574(M) 20-80 40,6%(H)/
441-6 exame clínico 26,%(M)
Heinzer e colaboradores Lancet Respir Med. 2015; Suíça Questionário, polissonografia e 1024 (H)/1097 (M) 40-85 49,7%(H)/
3(4):310-8 exame clínico 23,4%(M)
N: tamanho amostral; H: número de homens; M: número de mulheres.
192 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
abrange os principais estudos epidemiológicos sobre a prevalência de avaliando sintomas de cataplexia e a tendência de iniciar o sono. Usando
SAOS em diferentes populações. a ENU, entrevistas por telefone e dados polissonográficos de confirmação
Essas variações observadas com relação à prevalência de distúrbios do diagnóstico da doença, a prevalência de narcolepsia com cataplexia
respiratórios de sono (Tabela 21.1) dependem, sobretudo, das caracterís- clinicamente significante foi quase a mesma encontrada em adultos fin-
ticas da população estudada. Sabe-se que a SAOS é mais frequente em landeses (26 a cada 100 mil), chineses de Hong Kong (34 a cada 100 mil),
pessoas na faixa de idade entre 40 e 65 anos, indivíduos obesos, hiperten- adolescentes coreanos (15 a cada 100 mil) e adultos noruegueses (22 a
sos, com diabetes e alterações craniofaciais. Em particular, após a faixa de cada 100 mil). Prevalências semelhantes também foram obtidas em euro-
70 anos, observa-se uma redução na prevalência de ronco e SAOS, bem peus por meio de entrevistas por telefone (questionário Sono EVAL) sem
como de sua gravidade, indicada pelo número de eventos e saturação mí- nenhum exame clínico (40-47 a cada 100 mil) e nos Estados Unidos por
nima de oxigênio. No entanto, sua significância é pouco compreendida e meio de uma revisão de registros médicos (36 a cada 100 mil) e diagnósti-
acredita-se que se deve à falta de ajuste dos critérios da doença para essa cos médicos (22 a cada 100 mil). A Tabela 21.3 ilustra os principais estudos
população. Em mulheres, o risco de SAOS aumenta após a menopausa. Por sobre prevalência de narcolepsia na população.
outro lado, a reposição hormonal está associada com a menor ocorrência Há poucos estudos sobre narcolepsia tipo 2. Relata-se uma preva-
de distúrbios respiratórios do sono. lência de 20 a cada 100 mil em adultos nos Estados Unidos e 34 a cada
A evolução da SAOS e os efeitos do seu tratamento também têm sido 100 mil em adolescentes na Coreia, que podem estar subestimadas. No
estudados. Há evidências de que o risco de eventos cardiovasculares e de entanto, é difícil avaliar a sua verdadeira prevalência devido aos critérios
mortalidade estejam aumentados em pacientes com apneia do sono mo- diagnósticos do teste das múltiplas latências do sono ser 100 vezes mais
derada a grave. No entanto, a mortalidade de indivíduos com apneia do prevalente na população do que a própria narcolepsia. Alguns estudos
sono leve (IAH<15) parece não diferir significativamente nos indivíduos também sugerem que a narcolepsia é levemente mais comum em homens
com distúrbios respiratórios do sono comparado com a população geral. do que em mulheres e possui associação com o IMC, respostas imunes e
Somado a isso, Santos-Silva e colaboradores2 identificaram após dois anos eventos estressantes da vida.
de seguimento de uma coorte representativa da cidade de São Paulo (EPI- Embora a cataplexia seja típica e patognomônica da narcolepsia, for-
SONO) que o gênero feminino, a idade acima de 40 anos, o diagnóstico mas leves são difíceis de separarem do fenômeno fisiológico semelhante.
de insônia (critério do DSM-IV) e o IAH superior ou igual a 15 foram consi- Relatos de sonolência excessiva são comuns na população. Na Finlândia,
derados fatores preditores de hospitalizações e demandas por serviço de 29,3% das pessoas relatam (ao menos uma vez durante sua vida) sentir
emergência, mostrando o impacto dos distúrbios de sono na saúde geral fraqueza nas pernas em associação a episódios de emoção. Se isto é con-
da população. siderado como uma evidência de cataplexia combinada à ocorrência de
episódios de sono durante o dia ao menos três vezes por semana, 6,5%
da população teriam preenchido os critérios mínimos para diagnóstico
■■ DISTÚRBIOS DAS HIPERSONOLÊNCIAS DE
de narcolepsia pela CIDS. Dessa maneira, o uso apenas de questionários
ORIGEM CENTRAL
em estudos populacionais pode aumentar o risco de taxas de prevalência
De acordo com o CIDS-3, os distúrbios de hipersonolência de origem cen- da doença, fazendo-se necessários estudos objetivos com registro polis-
1
tral são classificados em 8 tipos distintos: sonográfico.
Narcolepsia tipo 1 (com cataplexia).
Narcolepsia tipo 2 (sem cataplexia).
Hipersonia idiopática. ■■ DISTÚRBIOS DO SONO RELACIONADOS
Síndrome de Kleine-Levin. AO MOVIMENTO
Hipersonia devido a condições médicas. Os distúrbios do sono relacionados ao movimento são caracterizados prin-
Hipersonia devido a medicações ou substâncias. cipalmente por movimentos relativamente simples, em geral estereotipa-
Hipersonia associada com distúrbio psiquiátrico. dos, que perturbam o sono ou o seu início. A CIDS-3 divide esta classe de
Síndrome de sono insuficiente. distúrbios do sono nos seguintes tipos:1
Há mais de 30 estudos publicados na literatura sobre a prevalência da Síndrome das pernas inquietas (SPI).
narcolepsia (a maioria deles sobre a narcolepsia tipo 1, isto é, com cataple- Distúrbio de movimento periódico de membros.
xia) com diferenças consideráveis nas proporções. As maiores prevalências Cãibras nas pernas relacionadas ao sono.
(acima de 30%) são baseadas em dados provenientes de questionários Bruxismo do sono.
sem acompanhamento clínico ou ainda de diagnósticos autorrelatados. Distúrbio de movimento rítmico do corpo relacionado ao sono.
Na maioria dos estudos com avaliação clínica de indivíduos com suspei- Mioclonia benigna do sono na infância.
ta de narcolepsia, a prevalência de narcolepsia tipo 1 cai para 0,025 e Mioclonia propriospinal no início do sono.
0,05%, isto é, 25 a 50 a cada 100 mil habitantes. Há, no entanto, algu- Distúrbio de movimento relacionado ao sono devido a condições
mas exceções como o Japão, cuja prevalência de narcolepsia (baseada em médicas.
questionário e entrevista) é de 160 a cada 100 mil crianças na faixa escolar Distúrbio de movimento relacionado ao sono devido à medicação
somado à alta prevalência (7,6%) de ataques catapléticos confirmados por ou substância.
entrevistas. A menor frequência (0,23 em 100 mil) foi encontrada em ju- Distúrbio de movimento inespecífico relacionado ao sono.
deus israelenses, embora este dado tenha sido extrapolado de amostras A SPI pode estar relacionada a outras condições, como anemia ferro-
de uma clínica de sono e não representativas da população. priva e polineuropatia. A relação com a polineuropatia não é bem clara,
A prevalência de narcolepsia tipo 1 parece ser consistente, apesar dos podendo para alguns autores ser a causa da SPI. A prevalência da SPI é
diferentes métodos utilizados, da existência de grupos étnicos distintos variável e, de acordo com vários trabalhos, é estimada em 2,5 a 12%, de-
e das diversas frequências do alelo HLA-DQB1*0602. Como exemplo, há pendendo da metodologia empregada. É maior no sexo feminino (17%) em
três estudos que utilizaram um método de rastreamento simples denomi- relação ao masculino (13%) e maior na população idosa. A prevalência de
nado Escala de Narcolepsia Ullanllinna (ENU), que consiste em 11 itens SPI clinicamente significante ou também chamada síndrome de Ekbom en-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 193
FREQUÊNCIA
IDADE (A CADA
AUTORES PUBLICAÇÃO PAÍS MÉTODO N (ANOS) 100 MIL)
Dement e colaboradores Sleep Res. 1972;1:148 Estados Amostra populacional (entrevista por Indisponível Indisponível 50
Unidos telefone)
Dement e colaboradores Sleep Res. 1973:147 Estados Amostra populacional (entrevista por Indisponível Indisponível 67
Unidos telefone)
Honda e colaboradores Sleep/wake disorders, Japão Amostra populacional (entrevista pessoal 12.469 12-16 160
1983 e questionário)
Hublin e colaboradores Ann Neurol. 1994; Finlândia Amostra populacional (questionário, 11.354 33-60 26
35(6):709-16 Escala de Narcolepsia Ullanlina,
entrevista por telefone, polissonografia e
tipagem HLA)
Ohayon e colaboradores Br J Psychiatry. 1996; Reino Amostra populacional (entrevista por 4.972 15-100 40
169(4):459-67 Unido telefone e questionário de sono EVAL)
Silber e colaboradores Sleep. 2002;25(2): Estados Revisão de registros médicos durante o 97.667 0-109 36
197-202 Unidos período de 1960 e 1989
Wing e colaboradores Ann Neurol. 2002;51(5): Hong Amostra populacional (questionário, 9.851 18-65 34
578-84 Kong Escala de Narcolepsia Ullanlina,
entrevista por telefone, polissonografia e
tipagem HLA)
Shin e colaboradores Acta Neurol Scand. Coreia Amostra populacional (questionário, 20.407 14-19 15
2008;117(4):273-8 do Sul Escala de Narcolepsia Ullanlina,
entrevista por telefone, polissonografia e
tipagem HLA)
Longstreth e Sleep Med. 2009;10(4): Estados Diagnóstico médico entre 2001-2005 1.366.417 >18 22
colaboradores 422-6 Unidos
Heier e colaboradores Acta Neurol Scand. Noruega Amostra populacional (questionário, 8.992 20-60 22
2009;120(4):276-80 Escala de Narcolepsia Ullanlina,
entrevista por telefone, polissonografia e
tipagem HLA)
N: tamanho amostral; HLA: antígeno leucocitário humano.
tre adultos gira em torno de 2 a 3%. Em estudos iniciais, a SPI se mostrava um aumento muito pequeno no MPM com a idade, quando os indivíduos
menos frequente em países asiáticos comparado aos países ocidentais. No que têm SPI ou familiares de primeiro grau com SPI são excluídos. Os MPM
entanto, utilizando-se métodos de pesquisa semelhantes, observa-se que são menos comuns em adultos e crianças pretas do que em brancos. No
a prevalência de SPI é muito próxima em todo o mundo, variando entre 5 e entanto, nenhuma diferença entre os sexos foi descrita para esse distúrbio.
15%. Em alguns grupos de pacientes, como os portadores de doença renal O bruxismo é outro distúrbio do sono relacionado ao movimento defini-
crônica, ela pode afetar mais de 20%. Em mulheres grávidas, 20% também do como uma atividade repetitiva da musculatura mastigatória caracteriza-
sofrem de SPI. Somado a isso, frequentemente a SPI pode ser acompanhada da pelo apertamento ou ranger dos dentes e/ou movimentos da mandíbula.
do distúrbio de movimento periódico de membros (DMPM). Apesar dos sintomas bem definidos, a etiologia do bruxismo ainda é pouco
A prevalência de MPM > 15/hora na população foi estimada em 7,6% conhecida e muitos são os mecanismos propostos para explicar sua fisiopa-
em jovens de 18 a 65 anos de idade, com 4,5% do total da população rela- tologia. Esses mecanismos estão frequentemente relacionados aos desper-
tando também distúrbios do sono ou sonolência excessiva. No entanto, a tares, à ativação autonômica cardíaca simpática, a componentes neuroquí-
SPI e o MPM induzido por medicação não foram critérios de exclusão nesta micos, entre outras causas. Ainda, evidências sugerem uma contribuição
população, sugerindo taxas muito mais baixas para o DMPM. O aumento importante de fatores genéticos na etiologia do bruxismo do sono. Por
do MPM com a idade pode ocorrer como uma expressão parcial de fatores meio de estudos interfamiliares e com gêmeos monozigóticos e dizigóticos,
familiares ou genéticos associados à SPI, com base em dados que mostram estima-se que a herdabilidade do bruxismo do sono varie entre 39 e 52%.
194 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
A prevalência exata do bruxismo do sono na população é imprecisa A ocorrência de parassonias é bastante conhecida, sendo as mais co-
e subestimada. Isto ocorre porque os estudos epidemiológicos são basea- muns sonambulismo, sonilóquio, noctúria, pesadelos e terrores noturnos.
dos em populações e metodologias diferentes. Por exemplo, o relato de Elas também podem ocorrer com caráter familiar e de herança genética.
indivíduos que dormem sozinhos e não têm consciência dos sons produzi- Em crianças, as parassonias mais comuns são o sonambulismo e a noctúria
dos durante o seu sono pode ser diferente dos questionários preenchidos (cerca de dois terços), seguido de sonilóquio e pesadelos.
por portadores ou familiares com diferentes definições clínicas e sintoma- Há também algumas associações entre as parassonias e psicopato-
tologias. Embora existam estas limitações, estudos têm mostrado que a logias em nível populacional. Transtornos psiquiátricos graves (indicados
taxa de prevalência em crianças maiores de 11 anos de idade é a mais alta, por medicação antipsicótica em longo prazo e/ou hospitalizações psiquiá-
variando entre 14 e 20%. Nos adultos jovens, entre 18 e 29 anos de idade, tricas) são significativamente mais associados com pesadelos frequentes
é de 13%, diminuindo ao longo da vida para 3% em indivíduos acima de em crianças e adultos. Em geral, o sonilóquio tem uma prevalência de 17%
60 anos de idade. A prevalência na população idosa deve ser maior que a nas crianças, a qual decai para 3% em adultos. Os terrores noturnos afe-
estimada, já que as próteses totais em acrílico previnem os sons de ranger tam geralmente crianças entre 4 a 12 anos e apresentam uma prevalência
de dentes. Não tem sido encontrada diferença de gênero para a ocorrência estimada de 1 a 6,5% das crianças. Embora eles tendam a desaparecer
do bruxismo do sono. espontaneamente durante a adolescência, podem persistir em 4% da
Até o presente momento, apenas um estudo epidemiológico avaliou população adulta. Os pesadelos são também comuns, principalmente no
a prevalência do bruxismo do sono por métodos objetivos (polissono- sono REM e afetam cerca de 10 a 50% das crianças, sendo que até dois
grafia). Nesse estudo, a prevalência de bruxismo do sono indicada por terços da população geral podem se lembrar de um pesadelo ocasional,
questionários e confirmada por polissonografia foi de 5,5%. Apenas com e apenas 1% delas relata ter mais de um pesadelo ocasional por semana.
a polissonografia, essa prevalência foi de 7,4% independente das queixas Considerado uma parassonia do sono REM, o distúrbio comportamen-
relatadas. Por meio de questionários, no entanto, essa prevalência foi tal do sono REM (DCSR) é um distúrbio de sono caracterizado pela presen-
de 12,5%, semelhante ao encontrado por outros estudos que utilizaram ça de atividade motora durante os sonhos com episódios de agressividade
somente métodos subjetivos. Um estudo canadense por meio de ques- àqueles que estão ao lado e muitas vezes acompanhados de acidentes
tionários estimou a prevalência de bruxismo do sono em indivíduos de importantes.
18 a 80 anos de aproximadamente 8%. De maneira semelhante, outro Casos verídicos de julgamentos de assassinatos são vistos, e a ab-
estudo multicêntrico (Reino Unido, Alemanha e Itália) estimou em 8,2% solvição é dada após caracterização deste distúrbio. O DCSR é um tipo
a prevalência de bruxismo do sono, a mesma prevalência encontrada em de parassonia mais comum na segunda parte da noite e em pessoas com
um recente estudo do Japão, porém com critérios subjetivos para seu mais de 65 anos. Possui uma prevalência aumentada em pacientes com
diagnóstico. doenças neurodegenerativas, como é o caso da doença de Parkinson e
alfasinucleinopatias. Em estudos clínicos de seguimento, 30% ou mais
dos pacientes com DCSR desenvolveram doença de Parkinson dentro de 7
■■ PARASSONIAS
anos. O DCSR também está associado ao declínio cognitivo na doença de
As parassonias são eventos físicos ou experiências indesejáveis que ocor- Parkinson e geralmente está presente em atrofias multissistêmicas e de-
rem durante os períodos de transição do sono REM e NREM ou durante o mências. No presente momento, devido à falta de estudos populacionais
despertar. Elas englobam comportamentos anormais durante o sono e que não se sabe ao certo a prevalência do DCSR. No entanto, a prevalência es-
são relacionados a movimentos, emoções, percepções, sonhos e ativida- timada é de 0,5%, sendo mais frequente em homens do que em mulheres
de do sistema nervoso autônomo. As parassonias são distúrbios clínicos (razão 9:1) por razões desconhecidas.
devido às possíveis lesões resultantes, à perturbação do sono, a efeitos
adversos para a saúde e psicossociais adversos. As consequências clínicas
podem afetar o paciente, o parceiro de cama, ou ambos. ■■ DISTÚRBIO DE RITMO CIRCADIANO VIGÍLIA-SONO
1
De acordo com o CIDS-3, as parassonias são divididas nas seguintes A maioria dos distúrbios de ritmo circadiano surge quando ocorre um
categorias: desalinhamento substancial entre o marca-passo biológico e o tempo
Parassonias do sono NREM necessário para as atividades sociais, acadêmicas e ocupacionais. Por con-
Distúrbios de despertar seguinte, a medição do tempo circadiano endógeno é importante para o
Despertares confusionais diagnóstico preciso dos distúrbios de ritmo circadiano. Os sintomas mais
Sonambulismo comuns são dificuldade em iniciar e manter o sono e sonolência excessi-
Terror noturno va, mas o seu impacto estende-se a resultados adversos para a saúde,
Distúrbio alimentar relacionado ao sono deficiências no desempenho social, ocupacional e educacional. Avanços
Parassonias do sono REM importantes têm sido feitos na identificação de subtipos de distúrbios de
Distúrbio comportamental do sono REM ritmo circadiano, em particular na área da pediatria. No entanto, perma-
Paralisia do sono isolada recorrente nece o desafio de desenvolver ferramentas mais precisas e clinicamente
Distúrbio de pesadelo práticas para melhorar a precisão de diagnóstico desta classe de distúrbio
Outras parassonias de sono.
Síndrome da cabeça explodindo A CIDS-3 inclui os seguintes tipos de distúrbios de ritmo circadiano:1
Alucinações relacionadas ao sono Distúrbio de fase atrasada do ciclo vigília-sono.
Enurese do sono Distúrbio de fase avançada do ciclo vigília-sono.
Parassonia devido a condições médicas Distúrbio de ritmo irregular do ciclo vigília-sono.
Parassonia devido à medicação ou substância Distúrbio de jet lag.
Parassonia não especificada Distúrbio de ritmo não 24 horas do ciclo vigília-sono.
Sintomas isolados e outras variantes Trabalho em turno.
Sonilóquio Distúrbio circadiano do ciclo vigília-sono inespecífico.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 195
provocada por emoções intensas, tais como alegria, riso, raiva ou orgu- Em 1998, foi caracterizado um neuropeptídeo produzido no hipo-
lho. Os ataques de cataplexia podem acometer segmentos unilaterais ou tálamo lateral com função reguladora do sono e do apetite denominado
bilaterais do corpo, além de terem curta duração, cerca de segundos até 3 hipocretina ou orexina. A hipocretina possui dois receptores reconhecidos
minutos, geralmente. Nestes episódios, os pacientes se mantêm acorda- denominados 1 e 2 e modula o controle vigília-sono. A hipocretina-1 está
dos. As alucinações hipnagógicas são compreendidas como experiências baixa no LCS de pacientes com narcolepsia e cataplexia por morte celular
vívidas de conteúdo visual, táctil e de movimento que podem correspon- da região do Hipotálamo lateral. Com a diminuição ou ausência da hi-
der a imagens oníricas. A paralisia do sono é a sensação transitória e de pocretina-1 há uma instabilidade do ciclo sono-vigília com episódios de
curta duração que corresponde à incapacidade de se mover após des- ataques de sono, fragmentação do sono e cataplexia.
pertar do sono REM, porém tende a manter a função do diafragma na Recentemente, tem sido descrita a possível associação entre a narco-
ventilação lepsia e uma geração da vacina para controle do vírus H1N1.
Fenômenos como cataplexia, alucinações hipnagógicas e paralisia A maior prevalência do alelo HLA-DQB1*0602 e a diminuição da po-
do sono foram relacionados ao sono de Rapid Eyes Moviments (REM) pulação de células hipocretinérgicas no hipotálamo lateral direcionam
após estudos eletroencéfalográficos realizados por Rechschaffen em para um mecanismo imunológico. Mudanças em um ou mais dos compo-
1967. nentes do complexo formado por TCR, CHC e CD40L poderiam direcionar
Recentes avanços têm sido realizados no entendimento da fisiopato- para o ataque das células produtoras de hipocretina.
logia da narcolepsia. Entretanto, ainda não temos marcadores disponíveis Recentemente, foi descrita em pacientes com narcolepsia a presença
e suficientemente confiáveis para caracterizar a narcolepsia sem cata- de anticorpos específicos tribbles homolog 2. Não temos ainda comprova-
plexia. Associação de outras doenças e uso de medicamentos tornam o da relação destes anticorpos com as células hipocretinérgicas, mas indire-
diagnóstico diferencial difícil e muitas vezes impossível. Este cenário pode tamente este achado sugere autoagressão mediada por anticorpos nesta
trazer repercussões negativas para o paciente, nos aspectos pessoais, pro- população de pacientes com narcolepsia.
fissionais e até jurídicos.
TRATAMENTO
DIAGNÓSTICO O tratamento da narcolepsia pode ser dividido em duas distintas etapas: o
O diagnóstico da narcolepsia é estabelecido por critérios eletrofisiológicos tratamento comportamental e o tratamento farmacológico.
que consistem na análise de cinco cochilos diurnos por 20 minutos de- Aos pacientes com narcolepsia, a integração social e familiar deve ser
nominados TMLS, precedidos de uma polissonografia de noite inteira. A garantida. Há maior prevalência dos distúrbios do humor, como depressão
polissonografia prévia, que deve ser realizada considerando-se o mínimo e ansiedade em tais pacientes quando comparada à população em geral, o
de 6 horas de sono, é fundamental para afastar outros distúrbios do sono, que afeta significativamente a vida do paciente, bem como de seus fami-
além de privação aguda do sono. Segundo a ICSD-3,1 os pacientes com liares. Além do tratamento farmacológico, quando indicado, o suporte e a
narcolepsia devem apresentar no TMLS a média das latências menores educação continuada com informações para o pacientes, seus familiares e
ou iguais a oito minutos, além de dois ou mais cochilos com episódios de pessoas que do seu convívio são fundamentais.
sono REM. Horários regulares para as atividades de rotina e uma boa higiene
Interessantes contribuições têm sido relacionadas recentemente ao do sono são indicados. Os cochilos programados de cerca de 20 minutos
TMLS. Uma melhora na sensibilidade do diagnóstico em pacientes nar- durante o dia e as atividades físicas regulares melhoram o controle da
colépticos foi demonstrada com a repetição da TMLS em casos que não sonolência diurna. Deve ser evitado o consumo de bebidas alcoólicas, de
completaram formalmente os critérios diagnósticos. Foi demonstrado sedativos e de drogas que promovem o sono, fora do período noturno,
também, a relação entre os sono NREM e REM, onde episódios de sono como, por exemplo, os anti-histamínicos.
REM foram precedidos e seguidos de sono NREM, durante os cochilos na O risco aumentado de acidentes domésticos, trânsito e trabalho deve
TMLS. ser sempre destacado e evitado. O diagnóstico precoce, ainda durante a
A narcolepsia é dividida segundo a 3ª Classificação International de adolescência, proporciona melhor desempenho social e intelectual a estes
Distúrbio do Sono (ICSD-3)1 em: narcolepsia tipo 1; narcolepsia tipo 2. pacientes.
Caracteristicamente, narcolepsia tipo 1 é observada nos pacientes que O tratamento medicamentoso tem por objetivo controlar a sonolên-
possuem cataplexia e/ou os níveis de hipocretina-1 abaixo de 110 pg/ cia excessiva e os ataques de cataplexia. A sonolência excessiva tem sido
mL. Na narcolepsia tipo 2, os pacientes não apresentam cataplexia e pos- tratada com estimulantes típicos, como o metilfenidato, desde 1959. Na
suem geralmente níveis de hipocretina-1 maior do que 110 pg/mL ou não década de 1990, um estimulante atípico conhecido como modafinila des-
dosados. pontou como importante medicamento para o tratamento da narcolepsia,
melhorando a vigília porém com pouco efeito no controle da cataplexia,
FISIOPATOLOGIA nas doses de 100 a 400 mg. Mais recentemente, a armodafinila também
Mignot e colaboradores caracterizaram a presença do alelo HLA- DQB1*0602, foi aprovada para tratamento da sonolência em pacientes narcolépticos,
variante do gene HLA-DQB1, que possui uma prevalência muito alta em pa- não estando disponível em nosso meio.
ciente com cataplexia (95%), porém baixa (40%) em pacientes sem cataple- Em 1960, Akimoto e colaboradores3 já usavam a imipramina para o
xia. Recente estudo2 demonstrou a importância do alelo HLA-DQB1*0602 controle da cataplexia. Outros antidepressivos também podem ser usados
como potencial biomarcador na predição das diferenças individuais em con- eficientemente no controle da cataplexia, como o citalopram, a fluoxetina
dições de sono normais e em privação de sono. e a venlafaxina. Um fármaco que também tem sido usado, com sucesso,
Um padrão genético de transmissão autossômica recessiva foi com- no controle das crises de cataplexia é o oxibato de sódio ou ácido hidroxi-
provado em cães em 1999 e foi definida a ausência de receptores de hi- butírico (não disponível no Brasil).
pocretina-2 predispondo aos sintomas e sinais de narcolepsia. Entretanto, Recentemente, tem sido demonstrado melhora parcial dos sintomas
a narcolepsia encontrada em humanos não possui padrão de transmissão após tratamento com imunoglobulina no início dos sintomas. Outros auto-
genética mendeliana e se caracteriza por baixos níveis de hipocretina-1 res evidenciaram melhora sintomática após o uso de prednisona. Entretan-
após perda de células hipocretinérgicas no hipotálamo lateral. to, estes tratamentos são experimentais e estão em fase de investigação.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 197
É importante ressaltar que o tratamento da narcolepsia deve ser de SE podem durar de 2 a 31 dias. Durante os intervalos das crises, os
individualizado e deve seguir as normas recomendadas pelas diretrizes pacientes não têm sintomas. A prevalência da SKL é muito baixa e se mani-
nacionais e internacionais de sono. O acompanhamento regular destes pa- festa na adolescência, sendo mais frequente no sexo masculino. A fisiopa-
cientes garante o satisfatório resultado da opção terapêutica, bem como a tologia é desconhecida, entretanto autores demonstraram uma disfunção
rápida identificação e correção dos efeitos indesejados e danosos. hipotalâmica por um possível distúrbio autoimune pós-infeccioso. Os pa-
cientes costumam ter um IMC aumentado. O tratamento envolve medica-
HIPERSONOLÊNCIA IDIOPÁTICA ções com diferentes efeitos, mas não há uma terapia específica e efetiva.
A hipersonolência idiopática (HI) é uma doença do sono de origem neu- Medicamentos como carbonato de lítio, carbamazepina e outros têm sido
rológica, de causa desconhecida, que se caracteriza clinicamente por SE utilizados com reposta inconsistente. O curso da doença é variável, com
sem os achados comuns aos pacientes com narcolepsia, como cataple- remissões espontâneas frequentes com o avanço da idade.
xia, paralisia do sono ou alucinações hipnagógicas. A HI é mais preva-
lente em familiares de pacientes com narcolepsia. Não há marcadores
biológicos e o diagnóstico da HI consiste na exclusão de outras causas REVISÃO
de SE. Deve-se descartar a privação de sono, o uso de medicamentos
Em conjunto, as hipersonias do sistema nervoso central não são tão
sedativos, as doenças primárias do sono, as lesões no SNC, além dos
raras, podendo levar à redução significante da qualidade de vida, bem
distúrbios do humor e do ritmo circadiano. O diagnóstico com PSG se-
como a outras consequências na saúde, acidentes e profissionais.
guida por TMLS deve ser realizado. Um achado frequente no estudo
O diagnóstico constitui-se um grande desafio em todo o mundo: a
eletrofisiológico nesses pacientes é a presença do sono de ondas lentas
demora de mais de dez anos para o diagnóstico impacta significati-
no TMLS. O tratamento segue os mesmos princípios do tratamento da
vamente na qualidade de vida destes pacientes.
SE dos pacientes com narcolepsia com abordagem comportamental e
A SE de origem central deve ser suspeitada quando, na história clí-
farmacológica. Na polissonografia, os achados podem ser inespecíficos,
nica do paciente, não há evidências de privação de sono, distúrbio
entretanto, o TMLS mostra geralmente média das latências pra início do
de ritmo, uso de medicamento com mecanismo de ação no sistema
sono baixas, porém com menos de 2 inícios de sono REM nas 5 oportu-
nervoso central, além de doenças clínicas e psiquiátricas.
nidades de cochilo.
Há ainda dificuldade de acesso aos exames eletrofisiológicos neces-
sários para a obtenção dos critérios de diagnóstico. É fundamental
SÍNDROME DE KLEINE-LEVIN
que os profissionais de saúde estejam bem preparados e motivados
A síndrome de Kleine-Levin (SKL) é caracterizada por ataques prolongados para realizarem os diagnósticos dessas doenças raras, muitas vezes
e inexplicável de SE associados a hiperfagia, hipersexualidade, alteração associadas a outras mais prevalentes.
comportamental com agressividade, coprolalia ou copropraxia. As crises
FIGURA 21.1 ■ Época de registro de sono REM em paciente de 20 anos com narcolepsia. Ocorreram 3 episódios de sono REM em 3 oportunidades
de cochilos, com início nos 5 primeiros minutos após o início do sono (Sono REM precoce). Note que, no teste de latência múltipla do sono, utlizam-se
menos canais de registro, quando comparado à polissonografia noturna.
198 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
QUADRO CLÍNICO
21.3 DISTÚRBIOS DO SONO NA Apesar de parecer similar à síndrome descrita em adultos, a SAOS em
CRIANÇA E NO ADOLESCENTE crianças difere em relação à fisiopatologia, quadro clínico, critério diag-
nóstico e tratamento.
■■ GUSTAVO A. MOREIRA Os sintomas noturnos das crianças e adolescentes com SAOS são
ronco alto e frequente, desconforto respiratório, pausas respiratórias, ron-
co ressuscitativo, movimento paradoxal da caixa torácica, cianose, sudo-
Durante o sono, crianças e adolescentes podem apresentar alterações rese profusa, enurese e sono agitado.
comportamentais, movimentos anormais, insônia e problemas respira- Os sintomas diurnos incluem respiração oral, obstrução nasal, cefaleia
tórios. Os distúrbios respiratórios e a insônia são os mais frequentes e matinal, dificuldade de acordar pela manhã, dormir em locais inadequados,
potencialmente causadores de complicações. A SAOS e a insônia com- humor lábil, hiperatividade, falta de atenção e problemas cognitivos.
portamental serão abordadas neste capítulo. O exame físico pode evidenciar desnutrição ou baixa estatura, que
podem ser decorrentes da doença, ou obesidade, que pode ser um fator
predisponente da SAOS. Fácies adenoideana, palato ogival, hipoplasia
■■ SÍNDROME DA APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO maxilar, micro ou retrognatia, desvio de septo, hipertrofia de cornetos,
A SAOS é caracterizada por aumento de resistência e obstrução periódica hipertrofia de amígdalas, espaço retrofaríngeo diminuído e macroglossia
nas vias aéreas superiores durante o sono. Esse distúrbio respiratório leva são sinais importantes. A condição neuromuscular deve ser avaliada. Afe-
ao aumento da pressão negativa inspiratória intratorácica, à hipóxia e hi- rir a pressão arterial é importante, pois hipertensão arterial sistêmica é
percapnia intermitentes e à interrupções do sono (despertares). A maior uma das complicações da SAOS.
variação da pressão intratorácica, as alterações dos gases sanguíneos e a Os principais fatores de risco para SAOS em crianças e adolescentes
fragmentação do sono, com a correspondente hiperatividade do sistema são a hipertrofia adenotonsilar, a obesidade, as malformações craniofa-
nervoso simpático, constituem os fundamentos fisiopatológicos das princi- ciais, as doenças neuromusculares, a prematuridade e algumas síndromes
pais anormalidades observadas na da SAOS: sonolência excessiva diurna, genéticas. Qualquer fator que obstrua o lúmen das vias aéreas superiores
hiperatividade, déficit de atenção, distúrbios do aprendizado, problemas (VAS) ou reduza o tônus da musculatura da faringe são potencialmente de
de comportamento, hipertensão arterial sistêmica e pulmonar, alterações risco para a SAOS. Outras condições que também se associam à SAOS em
metabólicas e comprometimento do crescimento. Essas crianças apresen- crianças e adolescentes incluem: afrodescendência, obesidade, prematuri-
tam maior frequência de visitas aos serviços de emergência e têm maior dade, afecções crônicas em VAS e asma. O impacto cognitivo e cardiovas-
risco de morte. cular é mais intenso nas crianças e adolescentes obesos, pela somatória
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 199
de agravos, tais como obesidade, hipóxia intermitente, fragmentação do é a soma das apneias obstrutivas e mistas divididas pelo tempo total de
sono e inflamação. sono, e o IAH obstrutivo é a soma das apneias obstrutivas, mistas e hi-
popneias divididas pelo tempo total de sono (apneias centrais não são
DIAGNÓSTICO computadas).
O diagnóstico da SAOS se baseia na suspeita clínica, história, exame físico O diagnóstico polissonográfico da SAOS é feito quando o índice de
e confirmação através da polissonografia (PSG). A história clínica, isolada- apneia obstrutiva (apneias obstrutivas + apneias mistas/tempo de sono)
mente, tem um valor preditivo positivo baixo (64%) quando comparada à for maior que 1 evento/hora de sono e houver dessaturação da oxi-he-
PSG. Outras medidas objetivas para avaliar o sono (registro de áudio ou moglobina (< 92%) e/ou retenção de gás carbônico (pico do PETCO2 >
vídeo, oximetria noturna, testes cardiorrespiratórios abreviados) também 53 mmHg). Também é aceito para diagnóstico o IAH obstrutivo (IAHO)
apresentam sensibilidade e/ou especificidades baixas. A PSG é conside- maior do que 2,0 eventos/hora de sono. A Academia America de Medi-
rada o padrão-ouro para o diagnóstico dos distúrbios respiratórios do cina do Sono recomenda que os critérios de estagiamento dos eventos
sono, podendo ser realizada em crianças de qualquer idade, desde que se respiratórios sejam utilizados em crianças e adolescentes até 18 anos.
utilizem equipamentos adequados e seja realizada por profissionais habi- O diagnóstico e a classificação de gravidade da SAOS são baseados no
litados. Na PSG, avaliamos diversas variáveis biológicas, tais como: ele- conjunto de achados clínicos (presença ou não de complicação) e polisso-
trencefalograma, eletro-oculograma, eletromiograma submentoniano e nográficos (Quadro 21.1). O diagnóstico de ronco primário ocorre quando
tibial, medidas de fluxo aéreo oral e nasal, medida de esforço respiratório é observado ronco durante o exame, mas não são preenchidos os critérios
torácico e abdominal, medida da saturação percutânea de oxigênio (SpO2) para SAOS.
e do gás carbônico exalado (PETCO2), posição no leito, microfone para re-
gistro de ronco, além de gravação em áudio e vídeo. Em situações selecio- TRATAMENTO
nadas também se utiliza o balão esofágico para medir pressão esofágica O tratamento inicial da SAOS em crianças e adolescentes é a adenotonsi-
(pressão intratorácica), uma medida mais acurada do esforço respiratório. lectomia, independentemente do fator de risco. As complicações periope-
Em crianças, a PSG deve ser estagiada e interpretada utilizando-se ratórias da adenotonsilectomia em crianças com SAOS são mais frequentes
critério específico para idade. Considera-se anormal um evento respira- do que em crianças sem SAOS. Apneia na indução anestésica, episódios
tório com duração de dois ou mais ciclos respiratórios. Os eventos res- de dessaturação da oxi-hemoglobina, dificuldade de intubação e edema
piratórios são classificados em apneia obstrutiva, apneia central, apneia pulmonar são frequentes. São fatores de risco para complicações perio-
mista, hipopneia, hipoventilação obstrutiva e aumento do esforço respi- peratórios: hipertensão pulmonar, idade menor do que três anos, SAOS
ratório associado a despertar (Figura 21.2).1 O índice de apneia obstrutiva acentuada, obesidade, anormalidades craniofaciais, hipotonia, prematu-
Tórax Tórax
Abdome Abdome
Pressão Pressão
0 0
Esofágica –20 Esofágica –20
(cmH2O) –40 (cmH2O) –40
–60 –60
Saturação de 100
75
Saturação de 100
75
Oxigênio (%) 50
10 seg Oxigênio (%) 50
10 seg
Tórax Tórax
Abdome Abdome
Pressão Pressão
0 0
Esofágica –20 Esofágica –20
–40 –40
(cmH2O) –60 (cmH2O) –60
ridade e desnutrição. Pacientes de risco devem passar por rastreamento (mamadeira, embalar). As associações negativas também incluem estímu-
pré-operatório, cuidados anestésicos específicos e monitorização cardior- los externos (TV, carrinho) ou situações diferentes (cama dos pais, andar
respiratória por mais de 24 horas após a cirurgia. As contraindicações para de carro). Como todas as crianças despertam em geral de três a seis vezes
adenotonsilectomia incluem tecido linfoide mínimo, distúrbio hemorrágico por noite, qualquer condição de esteja presente no início do sono será
refratário ao tratamento, instabilidade clínica e elevado risco cirúrgico. necessária novamente em cada despertar. Quando a condição associada
Pacientes com idade maior de 7 anos, obesidade, asma, IAHO eleva- ao sono está presente, a criança adormece rapidamente. Se a condição
do, síndromes genéticas ou alterações craniofaciais podem persistir com associada com o sono não está presente, a criança apresenta despertares
SAOS a despeito da cirurgia. Outras opções de tratamento são necessárias. noturnos prolongados e frequentes.
O uso de CPAP nasal está indicado nas crianças com sintomas diurnos e O distúrbio de associação acomete crianças entre 6 meses a 3 anos
IAHO > 5/hora. As crianças com SAOS leve (IAHO < 5/hora) podem se de idade. Esses despertares noturnos frequentes irão continuar por vários
beneficiar com corticoterapia nasal e/ou inibidores do leucotrieno. Outras anos se não houver intervenção. A frequência dos despertares noturnos
modalidades de tratamento da SAOS em crianças e adolescentes incluem: tende a reduzir após três anos de idade, porém o distúrbio de associação
– perda de peso, terapia posicional (evitar decúbito dorsal), fonoterapia, pode perdurar até a vida adulta nas crianças com problemas de desenvol-
distração maxilar rápida, distração osteogênica de mandíbula e traqueos- vimento importantes, como o autismo.
tomia. A indicação desses tratamentos está na dependência de situações O distúrbio da falta de limites se apresenta como esquiva ou recusa
específicas. O manejo de crianças e adolescentes com SAOS pode ser difícil de ir para a cama no horário de dormir (Tabela 21.4). A recusa caracteriza-
e frequentemente requer uma avaliação multidisciplinar (pediatra, espe- -se por não ficar pronto para dormir, não ir para a cama, ou não ficar na
cialista do sono, otorrinolaringologista, nutricionista, pneumologista, fo- cama. Por outro lado, a esquiva é uma tentativa de prorrogar o horário de
noaudiólogo, etc.) para a melhor decisão terapêutica. dormir. As táticas de esquiva incluem diversos pedidos (sede, fome, ba-
nheiro) ou atividades adicionais no horário de dormir (ver TV, ler mais uma
■■ INSÔNIA COMPORTAMENTAL história). Uma vez que a criança adormece, a qualidade do sono é normal
Pais de lactentes e crianças pré-escolares frequentemente reclamam que e ela tende a ter poucos despertares.
seus filhos têm dificuldade para ir para cama (choro, birra, recusa de ficar O distúrbio da falta de limites correlaciona-se com os estágios do de-
no berço) ou múltiplos despertares noturnos. Os pais ficam cansados, frus- senvolvimento da criança. As crianças pré-escolares, que estão aprenden-
trados e estressados com esses problemas noturnos. Em muitas famílias, do a se tornar mais independentes durante o dia, em geral, irão testar essa
a recusa de ir para cama e os despertares noturnos podem ser facilmente nova independência no horário de dormir. À medida que a criança amadu-
corrigidos com atitudes maternas consistentes, encorajando a criança a rece, o envolvimento materno com o horário de dormir diminui, reduzindo
adormecer sozinha no horário de dormir. os comportamentos problemáticos.
A insônia comportamental ocorre em 10 a 30% das crianças pré-esco- No distúrbio da falta de limites, há dois padrões de comportamento
lares. A característica essencial da insônia comportamental é a dificuldade problemáticos: (1) pais que colocam pouco ou nenhum limite no compor-
de uma criança em adormecer e/ou manter o sono. Esses problemas estão tamento de seus filhos (por exemplo, os pais podem deixar que a criança
associados com determinadas atitudes da criança ou dos pais e podem ser determine o horário de dormir ou permitam que durmam assistindo à TV
classificados em dois tipos: (1) distúrbio de associação e (2) distúrbio da no quarto dos pais, prolongando o tempo para início do sono); (2) pais que
falta de limites. estabelecem limites imprevisíveis e irregulares, enviando mensagens con-
No distúrbio de associação existe uma combinação de fatores que fusas para a criança. Isso resulta na manutenção ou aumento dos compor-
levam aos despertares noturnos frequentes. O aprendizado da criança tamentos indesejáveis (por exemplo, pais que toleram “birras” em algu-
está associado a ações e objetos presentes no início do sono que são ne- mas noites, como atender ao pedido para contar histórias adicionais, e em
cessárias para a criança adormecer no horário de dormir e voltar a ador- outras noites permanecem firmes em ler somente uma história no horário
mecer após cada despertar noturno. Associações positivas são aquelas de dormir. Em geral, isso irá promover a continuidade do comportamento
que a criança pode prover a si mesma (chupeta, bicho de pelúcia), ao pas- problemático). Uma forma de descobrir se o comportamento dos pais está
so que associações negativas necessitam de assistência de outra pessoa contribuindo para a dificuldade da criança dormir é perguntar se a criança
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 201
tem dificuldade em adormecer na presença de outros cuidadores (escola, a rotina para o horário de dormir deve ser curta e agradável, sempre se
creche, casa da avó) ou se a criança dorme espontaneamente no horário direcionando para a cama; e as crianças necessitam aprender a adormecer
de dormir, mas em local indesejado (no quarto dos pais ou em frente à TV). sozinhas no próprio berço ou cama.
O horário de dormir apropriado para uma criança dormir deve ser
entre 19:00 e 20:30 horas. Quando o horário de dormir é mais tarde, as
TABELA 21.4 ■ Critério diagnóstico de insônica comportamental crianças ficam exaustas e são incapazes de adormecer. O horário de dor-
mir não deve variar entre dias de semanas e fins de semana. As sonecas
I | Os sintomas de insônia são baseados em relatos dos pais ou outros
cuidadores
diurnas são essenciais para a criança. Quando a criança perde uma sone-
ca, ela tende a ficar mais exausta, dificultando iniciar o sono à noite. A
II | O padrão de sono segue um dos descritos a seguir: necessidade de soneca diurna tende a desaparecer entre três e seis anos
A | Distúrbio de associação de idade. É importante que o horário da soneca seja regular todos os dias
1 | Adormecer é um processo lento e requer condições especiais e que o horário de acordar não ultrapasse às 16:00 horas, de forma a não
2 | As associações com inicio do sono são problemáticas e dificultar o sono noturno.
requerem muito esforço A rotina no horário de dormir é essencial, ela pode ser iniciada aos
3 | Na ausência de elementos da associação, o início do sono está
6 meses de idade, através de um horário constante de dormir, geralmen-
significantemente atrasado ou o sono está fragmentado
te terminado com atividade calma (música, história). A rotina deve ser
4 | Os despertares noturnos requerem intervenção do cuidador
curta e agradável, não mais do que 20 minutos, e deve sempre se mover
para que a criança retorne a adormecer
B | Distúrbio de falta de limites em direção ao quarto da criança. Por exemplo, lanche na cozinha, banho
1 | Dificuldade de iniciar ou manter o sono e escovar os dentes no banheiro, colocar pijamas e ler uma história no
2 | Protela ou recusa para ir para cama no horário apropriado ou quarto da criança. Então, deve-se desligar a luz e dizer boa noite. Os
recusa em retornar para cama após os despertares noturnos eletroeletrônicos (TV, rádio, celular, tablet) são altamente estimulantes
3 | O cuidador demonstra incapacidade de estabelecer e devem ser desligados antes do início da rotina para dormir, de prefe-
comportamento de sono apropriado para a criança rência ao anoitecer.
Ensinar a criança a adormecer sozinha é a chave para o sucesso.
III | O distúrbio do sono não é explicado por outro distúrbio, médico,
Crianças com insônia não são capazes de adormecer sem a intervenção
neurológico mental ou uso de medicação.
materna, tais como embalar ou amamentar (distúrbio de associação) e
necessidade de atender as barganhas noturnas (distúrbio de falta de limi-
DIAGNÓSTICO tes). As crianças devem ser colocadas no berço ou ir para cama quando
estiverem sonolentas, mas acordadas, e então adormecer sozinhas. Uma
O diagnóstico da insônia comportamental requer uma história minuciosa.
As principais perguntas nos distúrbios do sono incluem questões sobre o vez que a criança com despertar frequente aprenda a adormecer sozinha
horário de sono (horário de dormir e acordar nos dias de semana e fins no começo da noite, esse comportamento se generaliza para o restante
de semana), rotinas para dormir (história, música), comportamento no- da noite em torno de duas semanas, pois a criança aprende a dormir no-
turno (ronco, apneia, despertares, terror noturno), comportamento diurno vamente após os despertares que normalmente ocorrem durante a noite.
(soneca, fadiga, refeições, ingestão de cafeína e medicações), humor e Existe diversos métodos que auxiliam a criança a adormecer sozinha, tais
funcionamento (irritabilidade, hiperatividade). Também é essencial conhe- como: rotinas positivas, extinção gradativa, retirada gradativa da pre-
cer eventos significantes da vida (doenças, divórcio dos pais, mudança de sença materna.
casa ou escola, nascimento de irmãos), já que esses eventos podem ter As rotinas positivas têm como objetivo criar um ambiente agradável
impacto significante no padrão de sono da criança. e positivo tanto para a criança como para os pais. Procura-se criar uma
O diário de sono por 2 semanas sempre é útil para se conhecer melhor rotina no horário de dormir que inclua uma ou duas atividades favoritas
o padrão de sono e para fazer um acompanhamento após intervenção. Em da criança. Se a criança começar com birra, a rotina acaba e a criança deve
geral, pede-se para que os pais registrem por escrito: que hora a criança ir imediatamente para a cama. Essa intervenção tende a prevenir choro,
foi para cama, quanto tempo a criança levou para adormecer, frequência birra e as barganhas noturnas, além de aliviar a ansiedade paterna. Por
e duração dos despertares noturnos, qual é o horário de acordar pela ma- outro lado, requer respostas maternas regulares e reforço positivo verbal
nhã, tempo total de sono, duração e horário das sonecas diurnas. Caso os frequente.
pais não relatem adequadamente uma história de sono ou não registrem A extinção gradativa consiste em deixar a criança chorar por períodos
bem o diário do sono, pode-se utilizar o actígrafo. O actígrafo é um apare- gradativamente mais longos. A extinção é baseada na teoria de que os
lho do tamanho de um relógio de pulso, que possui sensor de luz e movi- comportamentos que são reforçados aumentam em frequência, ao passo
mento, possibilitando estimativas no início do sono, fim do sono e tempo que aqueles que são ignorados irão desaparecer com o tempo. O método
total de sono. A polissonografia não tem utilidade na criança com insônia, de extinção gradativa é eficaz e duradouro, em geral melhora o padrão
ela somente será útil se houver suspeita de outro distúrbio, como AOS ou de sono entre 2 e 4 semanas. O método consiste em colocar a criança no
movimento periódico de pernas. berço sonolenta, mas acordada, e então ignorar as chamadas ou choro
por períodos gradativamente maiores (2, 5, 7, 10, 15 minutos). Quando for
TRATAMENTO checar a criança à noite, a visita deve ser curta (< 1 minuto) e uniforme.
Diversos estudos já demonstram que a terapia comportamental para a O objetivo da visita é assegurar aos pais de que o pé da criança não está
insônia em crianças é efetivo e duradouro. As terapias alternativas ou preso na grade do berço ou se a criança realmente necessita de atenção
medicamentosas podem ter um bom resultado na primeira semana, mas (fralda molhada). Durante a visita, os pais não devem acender a luz, falar
raramente têm efeito prolongado. Para que o tratamento seja adequado, alto ou pegar a criança no colo. Nas visitas, procura-se realizar a menor
é importante seguir alguns preceitos mínimos: as crianças necessitam de interação possível, além de ter um discurso breve, coerente e monotônico.
horário de dormir e horários diurnos regulares e apropriados para a idade; Por exemplo: “Mamãe te ama, volte a dormir”.
202 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
A retirada gradativa da presença materna é outro método possível de Mindell JA, Owens JA. A clinical guide to pediatric sleep: diagnosis and
se utilizar, principalmente para os pais que não toleram a extinção grada- management of sleep problems. 2nd ed. Philadelphia: Wolters Kluwer –
tiva. De início reduz-se o contato físico na hora de dormir. Então, a mãe Lippincott; 2010.
Richardson MA, Friedman NR. Clinician´s guide to pediatric sleep disorders. New
que amamenta na hora de dormir deve deslocar essa atividade para mais
York: Informa Healthcare; 2007.
cedo em outro cômodo e apenas embalar a criança para dormir. Uma vez Mindel JA, Kuhl B, Lewin DS, Meltzer LJ, Sadeh A. Behavioral bed problems and
que essa estratégia teve sucesso, a criança deve ser colocada no berço, e a night waking in infants and young children. Sleep. 2006;29(10):1263-76.
mãe deve acariciar a cabeça ou braço da criança até que ela adormeça. Na
segunda etapa, deve-se reduzir a presença materna no quarto. A mãe que
está deitada na cama com o filho deve primeiro sentar na cama da criança
por várias noite, em seguida sentar no chão do quarto por várias noites, e
então continuar o movimento em direção à porta do quarto, 1/2 metro a 21.4 SÍNDROME DA APNEIA
cada 2 noites. A terceira etapa da redução da presença materna é diminuir CENTRAL, SÍNDROME DA
o tempo entre cada visita, que deve ser aumentado regularmente a cada
três noites (5, 10, 15 minutos).
HIPOVENTILAÇÃO E SÍNDROME
DA HIPOXEMIA E SONO
REVISÃO ■■ FABÍOLA PAULA GALHARDO RIZZATTI
■■ MAURICIO BAGNATO
A SAOS é frequente em crianças e adolescentes (1 a 4%).
Suspeita-se de SAOS quando há relato de ronco frequente (> 3x/ ■■ SONIA MARIA G. P. TOGEIRO
sem) e intenso. Desconforto respiratório e apneias durante o sono
corroboram suspeita clínica, mas não são necessários.
A polissonografia é o padrão-ouro para o diagnóstico e deve ser A transição vigília/sono acompanha-se de mudanças fisiológicas que in-
interpretada a partir de critérios pediátricos. fluenciam o controle ventilatório (CV)* e podem resultar em instabilidade
Déficit de crescimento, atraso do desenvolvimento, problemas de respiratória. Ocorre, assim, redução da resposta ventilatória à hipóxia e hi-
comportamento, mau aproveitamento escolar, hipertensão arterial percapnia, aumento da resistência da via área superior (VAS) e diminuição
são complicações da SAOS. do tônus da musculatura respiratória, levando a um padrão respiratório
A adenotonsilectomia é o principal tratamento da SAOS em crianças instável e apneias centrais no início do sono e hipoventilação fisiológica
e adolescentes. no decorrer do sono mais profundo. Essas mudanças fisiológicas podem
Se a SAOS persistir após adenotonsilectomia, isso pode indicar corti- contribuir para um aparecimento e/a piora de quadros de apneias centrais,
coterapia nasal, tratamento ortodôntico e/ou CPAP nasal. hipoventilação e hipoxemia ainda não detectáveis na vigília.
A insônia comportamental é frequente (10-30%) em lactentes e
crianças pré-escolares. ■■ SÍNDROME DA APNEIA CENTRAL DO SONO
O problema de sono da criança repercute na qualidade do sono e no A apneia central do sono (ACS) é caracterizada por episódios recorrentes
desempenho diurno dos adultos. de redução ou abolição do fluxo respiratório devido à queda ou cessação
O diagnóstico do problema de sono depende somente de história temporária do comando ventilatório. Os principais tipos descritos de ACS
clinica detalhada. são: respiração de Cheyne-Stokes (RCS), apneia central das grandes altitu-
A terapia comportamental para a insônia em crianças é efetiva e des, as secundárias ao consumo de opioides e as emergentes após o uso
duradoura. de ventilação não invasiva (ou apneia complexa).
Distúrbio Resposta
A: LG = 0,5 Distúrbio
Resposta
VT
Resposta Resposta
Distúrbio
Distúrbio Distúrbio
B: LG = 1
VT
FIGURA 21.3 ■ A resposta ventilatória a uma apneia (primeiro evento em cada figura) é demonstrada pela figura (A) um indivíduo com loop gain (LG)
de 0,5 e (B) um indivíduo com LG de 1. Em A, a ventilação retorna rapidamente à regularidade, e, em B, a oscilação permanece sustentada.
Fonte: White.1
Em grandes altitudes, acima de 4.000 metros, a hipóxia estimula a terapêutica, pois estabiliza e reduz a fragmentação do sono, responsável
hiperventilação e redução da PaCO2, com indução de eventos centrais du- pela alternância do limiar de CO2 (vigília/sono) na gênese das ACS: as de
rante o sono em indivíduos com tendência à elevação do loop gain (res- tipo complexo podem ser transitórias e de resolução espontânea conforme
posta ventilatória exarcebada a estímulos ventilatórios). a adaptação do CV durante o tratamento; quando do tipo refratário, res-
Na insuficiência cardíaca (IC), é comum a coexistência de eventos pondem muito bem ao BiPAP servo-assistido. Nas ACS da IC, tem-se como
respiratórios obstrutivos e centrais durante o sono. Eventos centrais po- base a otimização do tratamento desta. Caso haja ACS residuais ou refra-
dem apresentar-se como RCS, que consiste em um padrão crescendo e tárias, tem-se a opção terapêutica com uso de CPAP, BiPAP-ST ou BiPAP
decrescendo do fluxo e do esforço respiratório preenchendo os seguintes servo-assistido, este último com indicação sendo reavaliada no momento,
critérios: devido a resultados de aumento de mortalidade a ele associados.
a | ≥ três apneias ou hipopneias centrais consecutivas separadas pelo
padrão crescendo e decrescendo com ciclos de duração ≥ 40 segundos;
■■ SÍNDROME DA HIPOVENTILAÇÃO RELACIONADA
b | ≥ cinco apneias ou hipopneias centrais por hora de sono associadas
ao padrão crescendo e decrescendo por ≥ 2h ou mais de registro. AO SONO
Apenas pacientes com IC com alto loop gain, muitas vezes associados As síndromes de hipoventilação crônica caracterizam-se por redução da
ao edema pulmonar, à baixa reserva de CO2 e à lentificação hemodinâ- ventilação alveolar com hipercapnia diurna (elevação da PaCO2 acima de
mica, têm tendência a desenvolver RCS enquanto dormem. Esse padrão 45 mmHg) e valores de pH no limite da normalidade, com acúmulo de
respiratório é indicador de gravidade da IC bicarbonato (compensação metabólica). Podem resultar de problemas
A ACS pode ser idiopática, sem correlação neurológica ou cardíaca. no comando ventilatório central (drive ventilatório), na transmissão peri-
O principal mecanismo é a elevação do loop gain e redução da reserva de férica do estímulo ventilatório (medula espinal, nervos periféricos) ou de
CO2. As ACS emergentes após o início de ventilação não invasiva noturna anormalidades do sistema musculoesquelético torácico. Acredita-se que a
ocorrem em portadores de AOS que iniciaram o tratamento geralmente hipoventilação do sono possa representar um estágio inicial de hipoven-
com pressão positiva contínua em vias aéreas (CPAP). Podem ser transi- tilação, que pode evoluir para a hipoventilação crônica com hipercapnia
tórias e desaparecerem logo após o início do tratamento, perdurar por diurna.
alguns meses ou manterem-se durante o tempo em que o paciente estiver A hipoventilação relacionada ao sono é definida por ventilação in-
sob tratamento. Sua patogênese é multifatorial e dependente da sensi- suficiente durante o sono, com hipercapnia noturna documentada pela
bilidade do CV, assim como a ACS idiopática. Tem uma ótima resposta à gasometria arterial ou por medidas de PCO2 no final da expiração ou trans-
ventilação servo-assistida quando duradoura cutâneo.
As ACS podem resultar em dessaturação da oxiemoglobina, fragmen-
tação do sono e sonolência diurna, e, em alguns casos, associar-se à ele-
vação do risco cardiovascular. ATENÇÃO!
Caso exista hipoxemia sustentada durante o sono (SpO2 ≤ 88% por ≥
TRATAMENTO
5 minutos) na ausência de registro do PCO2, o diagnóstico deverá ser
O tratamento das ACS deve basear-se no reconhecimento da fisiopatoge- de distúrbio de hipoxemia relacionada ao sono, e não de hipoventila-
nia específica. Na ACS idiopática, a terapia com ventilação não invasiva ção relacionada ao sono.
(CPAP, BiPAP-ST e BiPAP servo-assistido) pode ser implementada devido
ao potencial de resolução de eventos centrais, pela facilidade do manu-
seio e pelos baixos efeitos colaterais. A acetazolamida e a teofilina têm As síndromes da hipoventilação relacionadas ao sono são subdividi-
suas prescrições limitadas; contudo, podem ser recomendadas por curtos das, de acordo com a 3ª edição da Classificação Internacional de Distúr-
períodos em casos de ACS das grandes altitudes. O zolpidem é uma opção bios de Sono (CIDS 3),2 em:
204 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
posta pela obesidade resulta em redução do volume corrente e no aumento Pacientes sintomáticos sem hipoventilação diurna e pacientes assinto-
da resistência e do trabalho respiratório. A mecânica respiratória prejudi- máticos, mas com doenças reconhecidamente de caráter progressivo, de-
cada pela obesidade e a resposta ventilatória diminuída à hipercapnia e à vem ser tratados com ventilação não invasiva (VNI) com pressão positiva
hipóxia também contribuem para a hipoventilação. Podem ocorrer distúr- em vias aéreas durante o sono. Se a dependência da ventilação aumentar
bios da relação ventilação/perfusão e anormalidades das trocas gasosas. com o tempo, ou em caso de hipoventilação diurna associada, pode ocor-
rer progressão da ventilação para o período diurno também. A modalida-
de de VNI indicada é o BiPAP, e a diferença gerada entre a pressão inspi-
ATENÇÃO!
ratória e a pressão expiratória é que garante o volume corrente adequado
Embora seu papel ainda não esteja bem definido, tem sido aventado para corrigir a hipoventilação. O uso de frequência respiratória auxiliar
que a leptina – hormônio produzido pelos adipócitos e que age no hi- (modo S/T), principalmente no sono REM, garante a ventilação quando o
potálamo suprimindo o apetite – estaria implicado na gênese da SHO, estímulo e o esforço inspiratório diminuem.
já que sua deficiência ou resistência acarretaria a hipoventilação. Em casos de SHO e AOS, o tratamento apenas com CPAP costuma
ser efetivo em mais da metade dos casos. Se houver falha na norma-
lização dos gases arteriais após 2 meses, indica-se o tratamento com
A síndrome de hipoventilação do sono associada a condições médicas BiPAP.
é diagnosticada em pacientes que apresentam doença do parênquima, da A pressão positiva com volume garantido (AVAPS) é um modo venti-
vasculatura pulmonar, das vias aéreas, caixa torácica, doença neurológi- latório híbrido limitados à pressão e volume. O aparelho avalia o volume
ca ou musculoesqueléticas subjacentes e que justificam a hipoventilação corrente ofertado no ciclo respiratório através de um pneumotacógrafo e
do sono. Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), cifoescoliose, lesão automaticamente ajusta a pressão inspiratória ciclo a ciclo para fornecer
medular, esclerose lateral amiotrófica, miopatias metabólicas e tóxicas, um volume corrente próximo ao previamente estabelecido. O alto custo do
dentre outras, são exemplos de doenças que podem cursar com hipoven- aparelho inviabiliza seu uso rotineiro.
tilação do sono. A mecânica respiratória pode mudar durante o sono e
piorar a troca gasosa nas doenças pulmonares obstrutivas e neuromus-
culares. Além disso, durante o sono REM, existe paralisia dos músculos ATENÇÃO!
acessórios da ventilação (escalenos, intercostais, esternocleidomastóideo
e musculatura abdominal), com menor comprometimento do movimento Antes do advento da terapia com pressão positiva, a traqueostomia foi
diafragmático. Nesse período do sono, com a paralisia muscular, a troca amplamente utilizada, sendo hoje reservada para casos refratários à
gasosa pode ser prejudicada naqueles indivíduos que precisam da mus- correção da hipoventilação ou intolerância ao tratamento.
culatura ventilatória acessória para manutenção da ventilação alveolar.
As síndromes de hipoventilação envolvem diferentes doenças e meca-
nismos fisiopatológicos; portanto, não existe um único conjunto de sinais ■■ SÍNDROME DA HIPOXEMIA RELACIONADA
e sintomas típicos que podem indicar seguramente ou predizer a presença
AO SONO
de hipoventilação alveolar crônica ou relacionada ao sono. A hipoventi-
lação alveolar pode ser evidente primeiramente durante o sono, sendo A hipoxemia relacionada ao sono ou hipoxemia noturna também foi re-
2
que sintomas relacionados ao tipo noturno incluem redução da capaci- centemente definida pela CIDS3 e envolve a presença de queda sus-
dade de exercício, dispneia, ortopneia, sono não reparador, sonolência tentada da saturação de oxigênio na oximetria de pulso (SpO2) durante
diurna excessiva e cefaleia noturna ou matinal. Alguns pacientes são oligo o sono, sem que exista hipoventilação alveolar concomitantemente do-
ou assintomáticos. Pacientes com SHO podem apresentar poliglobulia, cumentada ou sabida. A hipoxemia durante o sono é definida por SpO2
hipertensão arterial pulmonar e cor pulmonale, além de comorbidades re- ≤ 88% em adultos ou ≤ 90% em crianças, por período ≥ a 5 minutos,
lacionadas à obesidade, como síndrome metabólica, hipertensão, diabetes avaliada durante a monitorização noturna por meio de PSG completa em
e hipotiroidismo. laboratório de sono, por aparelho portátil de PSG ou por SpO2 noturna.
É necessário que a hipoventilação alveolar não tenha sido demonstra-
DIAGNÓSTICO da ou documentada por medidas de PaCO2 ou pela avaliação do CO2
Os critérios diagnósticos da hipoventilação relacionada ao sono podem ser transcutâneo ou exalado. Caso a hipoventilação alveolar esteja presente,
visualizados no Quadro 21.23 A PSG é o padrão-ouro para monitorização o distúrbio será denominado hipoventilação relacionada ao sono e não
concomitante do sono e da respiração. Se não puder ser realizada, a PSG hipoxemia relacionada ao sono.
portátil aliada à actigrafia também será capaz de diferenciar os períodos No Quadro 21.3, podem ser visualizados os critérios diagnósticos que
de sono e vigília. A documentação da hipercapnia durante o sono pode ser definem a hipoxemia relacionada ao sono.
realizada por gasometria arterial (GA) (a coleta pode despertar o paciente
do sono e promover hiperventilação) ou por monitorização do CO2 exalado
ou transcutâneo. QUADRO 21.3 ■ Critérios diagnósticos da hipoxemia relacionada
A investigação diagnóstica sobre a causa da hipoventilação do sono ao sono
deve incluir também: exames de imagem do tórax, GA em vigília, testes de
Critérios necessários para diagnóstico
função pulmonar, medidas da força muscular respiratória, ecocardiograma
e hemograma. SpO2 ≤ 88% em adultos ou ≤ 90% em crianças
≥ a 5 minutos
TRATAMENTO Avaliação da SpO2 por polissonografia completa, aparelho portátil de
Estimulantes respiratórios (progesterona, acetazolamida, almitrina e ami- polissonografia ou oximetria de pulso noturnos
nofilina) foram utilizados no passado, mas, frente à fraca evidência dos
Hipoventilação do sono não presente ou não documentada
seus benefícios, não estão indicados para tratamento.
206 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
A hipoxemia relacionada ao sono pode estar presente em várias condi- poxemia noturna. A evolução clínica pode ser para desenvolvimento de
ções clínicas e neurológicas. A prevalência, as características demográficas insuficiência respiratória crônica, hipertensão pulmonar, cor pulmonale,
e a fisiopatologia dependerão do distúrbio clínico e ou neurológico subja- arritmias cardíacas, policitemia secundária e disfunção neurocognitiva.
centes. Exemplos de condições clínicas e neurológicas que podem cursar Também podem estar presentes sintomas como insônia, sono não repa-
com hipoxemia relacionada ao sono podem ser visualizadas no Quadro 21.4. rador e sonolência diurna.
A gravidade e a duração da hipoxemia noturna isolada necessárias
para resultar em consequências adversas como hipertensão arterial pul-
QUADRO 21.4 ■ Condições clínicas e neurológicas que podem monar, em casos individualizados, não estão definidas.
associar-se à hipoxemia relacionada ao sono
DIAGNÓSTICO
Doenças pulmonares DPOC, asma noturna
obstrutivas O diagnóstico é habitualmente realizado com oximetria noturna, realizada
somente com oxímetro de pulso ou em conjunto com PSG laboratorial ou
Doenças pulmonares Fibrose cística, doenças pulmonares domiciliar. A gasometria arterial é menos utilizada para o diagnóstico, a
parenquimatosas ou intersticiais, hipertensão pulmonar e doença não ser que se suspeite de hipoventilação alveolar. No Quadro 21.3, podem
vasculares pulmonar tromboembólica crônica ser observados os critérios diagnósticos da hipoxemia noturna relaciona-
da ao sono. Na apneia ou hipopneia do sono, o padrão de dessaturação
Distúrbios da caixa Cifoescoliose, espondilite anquilosante,
pode ser em dente de serra, com períodos de dessaturações episódicas e
torácica doenças pleurais
breves (em geral, com durações menores do que 1 minuto), coincidentes
Doenças Esclerose lateral amiotrófica, lesão medular, com a ocorrência dos eventos respiratórios. A ocorrência de baixa SpO2
neuromusculares paralisia diafragmática, miastenia gravis, basal intercalada com quedas episódicas e breves da saturação periférica
síndrome miastênica de Eaton-Lambert, de oxigênio pode ocorrer na hipoxemia noturna relacionada ao sono, mas
miopatias metabólicas e tóxicas, síndrome não é o padrão predominante de dessaturação observada nessa condição
pós-poliomielite clínica. As medidas de PaO2 e/ou saturação devem ser realizadas com o
paciente com quadro o mais estável possível e com tratamento otimizado.
Hemoglobinopatias Anemia falciforme
Doenças que podem cursar com hipoxemia durante o sono devem ser
investigadas, como doenças pulmonares parenquimatosas, de vias aéreas
Exacerbações agudas de doenças respiratórias crônicas também po- ou vasculares, doenças neuromusculares ou da caixa torácica. Exames
dem cursar ou acentuar a gravidade de hipoxemia noturna anteriormente complementares, como radiografia torácica, provas de função pulmonar,
presente. força muscular respiratória, PSG, ecocardiograma e hemograma, podem
A prevalência da hipoxemia relacionada ao sono pode ser mais eleva- ser solicitados.
da em pacientes com maior comprometimento da função respiratória ou
maior fraqueza neuromuscular. No entanto, não existe um limite a partir TRATAMENTO
do qual o comprometimento do parênquima, da vasculatura pulmonar ou O tratamento dos pacientes portadores de hipoxemia crônica e grave du-
da musculatura possa predizer adequadamente o risco de ocorrência da rante a vigília (PaO2 ≤ 55 mmHg) é bem estabelecido e se baseia em dois
4
hipoxemia relacionada ao sono. Pacientes hipoxêmicos em vigília habitual- estudos clássicos: o Nocturnal Oxygen Therapy Trial (NOTT) e o britânico
5
mente apresentarão piora da hipoxemia durante o sono, particularmente Medical Research Council (MRC), publicados no início dos anos 1980. A hi-
durante o sono REM. poxemia documentada exclusivamente durante o sono, por sua vez, ainda
A hipoxemia relacionada ao sono pode estar presente em associação não constitui justificativa para a prescrição de oxigênio de forma contínua,
à apneia obstrutiva ou central do sono. Contudo, os padrões de dessatu- a menos que associada à hipoxemia em vigília e em repouso. As indicações
ração noturna diferem nesses dois casos. Na hipoxemia relacionada ao de oxigenoterapia durante o sono podem ser visualizadas no Quadro 21.5.
sono, a dessaturação da oxiemoglobina é mantida e sustentada por vários
minutos (ou mais) durante o sono, ao passo que, nas apneias obstrutiva
QUADRO 21.5 ■ Indicações de oxigenoterapia noturna
ou central do sono, o padrão de dessaturação é episódico e assume flutua-
ções de acordo com a ocorrência dos eventos apneicos. SpO2 ≤ 88% ou PaO2 ≤ 55 mmHg durante o sono com evidência de cor
pulmonale, policitemia, ou outro distúrbio físico ou mental atribuído à
hipoxemia
ATENÇÃO!
PaO2 ≤ 55 mmHg ou saturação ≤ 88% durante o sono; associada a
A apneia do sono, isoladamente, não é capaz de explicar a hipoxemia
episódios agudos e recorrentes de broncoespasmo, cor pulmonale,
persistente e não coincidente com os eventos respiratórios. ou outra enfermidade cardiopulmonar, em pacientes com frequente
desestabilização clínica
As medidas de PaO2 e/ou saturação devem ser realizadas em pacien- ■■ LEITURAS SUGERIDAS
tes com doença estável, com a terapêutica medicamentosa otimizada e Böing S, Randerath WJ. Chronic hypoventilation syndromes and sleep-related
deve ser reavaliada em 60 a 90 dias; eliminando-se a possibilidade da hypoventilation. J Thorac Dis. 2015;7(8):1273-85.
prescrição ter sido realizada durante uma agudização não detectada. Casey KR, Cantillo KO, Brown LK. Sleep-related hypoventilation/hypoxemic
Salienta-se que as consequências da hipoxemia noturna relacionada syndromes. Chest. 2007;131(6):1936-48.
ao sono observada de maneira isolada, bem como a necessidade de oxi- Hernandez AB, Patil SP. Pathophysiology of central sleep apneas. Sleep Breath.
genoterapia suplementar quando não existe alteração da oxigenação em 2016;20(2):467-82.
vigília, não são claramente conhecidas. Mais estudos são necessários para Naughton MT. Respiratory sleep disorders in patients with congestive heart
failure. J Thorac Dis. 2015;7(8):1298-310.
que se determine quando se deve iniciar a oxigenoterapia suplementar e
quais serão as subpopulações específicas de pacientes que se beneficiarão
da suplementação de oxigênio caso a hipoxemia relacionada ao sono te-
nha sido detectada isoladamente.
A SAOS é prevalente e nem sempre diagnosticada adequadamente. to, a ausência do fluxo aéreo persiste mesmo após a retomada do
Estudos epidemiológicos mostraram que a prevalência da AOS em adultos esforço respiratório.
pode variar de 1,2 a 7,5%, considerando como critérios diagnósticos a pre- 2 | Hipopneia (regra recomendada):
sença do IAH acima de 5 eventos por hora de sono e sonolência excessiva Queda da amplitude do registro de fluxo da cânula nasal acoplada
diurna (SED). Porém estudos mais recentes apontam taxas de prevalência a pneumotacógrafo maior ou igual a 30% da linha de base, com ou
mais altas. Um estudo epidemiológico realizado na cidade de São Paulo sem a transformação do sinal pela raiz quadrada.
observou que a prevalência da AOS foi de 32,9%.1 Um outro estudo, utili- Duração da queda ≥ 10 segundos.
zando os dados do Wisconsin Sleep Cohort Study,2 mostrou que a preva- Dessaturação da oxiemoglobina ≥ 3% da linha de base antes do
lência geral da SAOS foi de 10%, e para homens entre 30 e 49 anos foi de evento ou um despertar.
17%. Houve um aumento de 14 a 55% na prevalência da SAOS nos dois As hipopneias também podem ser classificadas em obstrutivas e cen-
períodos estudados (1988-1994 e 2007-2010), dependendo do subgrupo trais. Essa classificação é opcional e segue os seguintes critérios:
analisado. Mais recentemente, um estudo feito em Lausanne (Suíça) entre Hipopneia obstrutiva: quando apresentar ronco, achatamento da
2009 e 2013 e denominado HypnoLaus veio a corroborar essas altas taxas curva de fluxo ou respiração paradoxal durante o período de queda
de prevalência da SAOS, observando 23,4% em mulheres e 49,7% em ho- do fluxo respiratório.
mens, com gravidade entre moderada a grave
.3 Hipopneia central: quando não apresentar ronco, achatamento da
curva de fluxo ou respiração paradoxal durante o período de queda
do fluxo respiratório.
■■ QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO Como opcional, a análise da PSG pode incluir a marcação do RERA,
Na Classificação Internacional de Distúrbios do Sono, publicada em 2014 que consiste em:
4
(CIDS-3) , os critérios diagnósticos da SAOS foram modificados, tendo sido Aumento do esforço respiratório, mensurado pela pressão esofágica,
acrescentado um critério que engloba as comorbidades frequentemente ou achatamento da curva de fluxo nasal, com duração maior ou igual
associadas a essa doença, sendo assim definida pela presença dos itens a 10 segundos, que leve a um despertar do EEG (quando o evento
A e B ou C: não encontrar critérios para marcação de apneia ou hipopneia).
A | Presença de um ou mais dos seguintes itens: A SAOS leva à sonolência diurna excessiva (SDE) com risco de aciden-
1 | Queixa de sonolência, sono não reparador, fadiga ou sintomas de tes de trabalho, no trânsito, e tem sido demonstrado que contribuir para
insônia. o desenvolvimento de hipertensão arterial sistêmica (HAS). Está associada
2 | Despertar com suspensão da respiração, ofegante ou asfixia. a alterações de humor, cognição, piora da qualidade de vida, distúrbio
3 | Parceiro de cama ou outro observador relatar ronco habitual, inter- do metabolismo da glicose e outras doenças cardiovasculares, como AVC,
rupções de respiração ou ambos durante o sono do paciente. DAC, ICC e FA. Sendo assim, estudos observacionais apontam para uma
4 | Diagnóstico de hipertensão, distúrbio do humor, disfunção cogniti- maior taxa de morbidade e mortalidade cardiovascular nos pacientes por-
va, doença arterial coronariana (DAC), acidente vascular cerebral (AVC), tadores de SAOS grave e não tratados.
insuficiência cardíaca congestiva (ICC), fibrilação atrial (FA) ou diabetes
melito tipo 2 (DM 2). ■■ TRATAMENTO
B | Polissonografia ou poligrafo portátil apresentando:
1 | Medidas gerais: medidas de higiene do sono e comportamentais,
Cinco ou mais eventos respiratórios obstrutivos predominantes (obstrutivo
como evitar privação do sono, perda de peso, retirada de álcool e medica-
e apneias mistas ou esforço respiratório relacionado a despertar [RERA,
ções sedativas e evitar decúbito dorsal, tratar doenças otorrinolaringoló-
do inglês respiratory-effort related arousal]) por horas de sono durante a
gicas e exercício físico devem ser incentivadas.
polissonografia ou por horas da monitorização. 2 | Aparelhos de pressão positiva
C | Polissonografia ou poligrafo portátil apresentando: Os aparelhos de pressão positiva são geradores de fluxo de ar que cria
Quinze ou mais eventos obstrutivos predominantes (apneias, hipopneias uma pressão positiva indireta na VAS quando esse fluxo é direcionado a
ou RERAs) por hora de sono durante a polissonografia ou por hora na uma máscara aderida ao nariz ou nariz e boca do paciente. Essa pressão
monitorização. na VAS a expande, permitindo uma passagem livre do ar. Outro meca-
Na polissonografia, os eventos respiratórios são atualmente definidos nismo de ação refere-se à elevação dos volumes pulmonares que leva à
como: tração caudal da VAS e consequente aumento da sua área transversa.
1 | Apneia Atualmente existem inovações tecnológicas, como uso de rampas de tem-
Queda da amplitude do registro do termístor maior ou igual a 90% po para atingir a pressão estabelecida, alívio inspiratório e expiratório no
da linha de base. início de cada fase do ciclo respiratório, autoajuste pressórico, diversos
A duração mínima do evento é de 10 segundos. modelos de máscaras nasais (mais indicadas), oronasais e além de progra-
Pelo menos 90% da duração do evento deve encontrar o critério de mas embutidos nos aparelhos de registro de horas de uso, valores de IAH
redução da amplitude. e vazamento para controle objetivo de adesão ao tratamento. Porém, es-
A presença de dessaturação da oxiemoglobina e/ou despertar não tas inovações mostraram-se pouco eficazes no aumento da adesão ao uso
são critérios para marcação de apneias. Baseando-se no esforço inspirató- desses aparelhos comparativamente a um eficaz programa de educação e
rio, a apneia do sono pode ser classificada em: acompanhamento dos pacientes.
Apneia obstrutiva: ausência do fluxo aéreo e manutenção do esfor- 2.1 | O CPAP é considerado a terapêutica ideal para SAOS de grau mo-
ço respiratório durante toda a duração do evento. derado a acentuado, porque elimina as apneias, hipopneias, RERAS e
Apneia central: ausência do fluxo aéreo e ausência do esforço res- roncos. Ocorre normalização da saturação da oxiemoglobina e da es-
piratório durante toda a duração do evento. trutura do sono, melhorando as queixas clinicas. Recomenda-se que a
Apneia mista: o início do evento respiratório apresenta ausência do o ajuste pressórico do CPAP seja estabelecido por meio da polissono-
fluxo aéreo e ausência do esforço respiratório e, no final do even- grafia completa de noite inteira sob supervisão no laboratório de sono.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 209
Porém, o registro de noite parcial de diagnóstico e de ajuste de pressão cos pode ser indicada pelo médico. As contraindicações incluem pacien-
de CPAP (split night) ou mesmo o uso de autoCPAP por determinado tes com apneia central, pacientes com condições dentais inapropriadas
período em domicílio, com ajuste subsequente da pressão adequada e disfunção temporomandibular grave. A taxa de sucesso é da ordem de
(percentil 90%), são condutas aceitáveis quando a polissonografia 64%, ao ser comparado a um placebo ou ao CPAP. Sua eficácia está re-
completa não pode ser realizada e a condição clínica do paciente é de lacionada ao menor valor do IAH, idade mais jovem e menor peso. Os
forte suspeita de SAOS sem outra comorbidade. Estudos duplo-cego, efeitos colaterais de curto e médio prazo incluem salivação excessiva,
randomizados, placebo-controlados confirmam que o CPAP melhora a sensação de boca seca ou xerostomia, dor ou desconforto nos dentes
sonolência diurna de forma subjetiva e objetiva. Estudos desse porte de apoio, dor nos tecidos moles intrabucal, sensação de não ocluir os
estão em curso para afirmar se o CPAP teria impacto benéfico na HAS dentes após a remoção do AIO, e dor ou desconforto nos músculos da
e outras comorbidades cardiovasculares, metabolismo, cognição, hu- mastigação e/ou nas articulações temporomandibulares (ATM), que na
mor e qualidade de vida relacionados a SAOS. Estudos observacionais maioria das vezes são transitórios. Os efeitos colaterais de longo prazo
mostram redução da mortalidade em pacientes com SAOS tratados com englobam alterações dentais e esqueléticas, que podem ser progressivas
CPAP comparados aqueles sem tratamento. Contudo, faltam estudos e se manifestam principalmente por movimentação dentária. Atualmente
randomizados e longitudinais para confirmar tais achados. A despeito nos estudos comparativos apontam uma não inferioridade do tratamento
da sua eficácia, os pacientes apresentam dificuldade em usar o CPAP: com AIOs comparado ao CPAP, já que os primeiros são mais usados, ou
sugere-se que o mesmo seja usado por mais de 7 horas e, preferen- seja mais efetivos, ao passo que o CPAP, apesar de mais eficaz, é pouco
cialmente, a noite toda, para melhora da SDE subjetiva e objetiva e usado, ou seja, não tão efetivos.
da qualidade de vida. Entretanto, quando avaliada objetivamente, sua 4 | Cirurgias
adesão varia entre 40 a 46%, embora existam evidências consistentes A indicação do tratamento cirúrgico é baseada principalmente na abor-
de que o uso de umidificadores melhora a adesão ao CPAP naqueles dagem das alterações anatômicas das VAS. Os principais procedimentos
pacientes com queixas nasais. Um programa de acompanhamento e são as cirurgias nasais, faríngeas, craniofaciais e a traqueostomia. As ci-
educação para o uso do CPAP é considerado a melhor intervenção para rurgias nasais incluem septoplastia, turbinectomia e cauterização linear
aumento da adesão ao tratamento. Os efeitos adversos do CPAP em ou radiofrequência de conchas nasais inferiores. As cirurgias faríngeas
geral são mínimos e se referem ao ressecamento nasal, dificuldade de incluem a uvulopalatofaringoplastia (UPFP) e suas variações a laser de
adaptação à máscara ou dificuldade expiratória. Solução fisiológica (SF) CO2 (LAUP), radiofrequência de palato mole e base de língua, implantes
e/ou corticoides nasais podem ser prescritos como adjuvante ao umidi- palatais, aplicação de substâncias esclerosantes no palato mole, glos-
ficador para melhora das queixas nasais. Uso de máscaras nasais mais sectomia mediana. As cirurgias craniofaciais consistem principalmente
anatômicas e confortáveis podem resolver tais problemas. na osteotomia mandibular com avanço do genioglosso e no avanço ma-
2.2 | Bilevel ou aparelhos com dois níveis de pressão, inspiratória xilomandibular (AMM). A maioria desses procedimentos ainda contam
(IPAP) e expiratória (EPAP): essa modalidade de aparelho fornece uma com taxa de sucesso inferior aos demais tratamentos acima citados. Es-
pressão de suporte ventilatório e tem sua indicação mais precisa no tudos com boa evidência científica são escassos pela natureza dos pro-
tratamento da hipoventilação, embora tenha sido sugerido em casos cedimentos que dificultam randomização, uso de controles ou placebo,
nos quais há necessidade de utilizar o CPAP com altos níveis de pressão desenho duplo cego, número suficiente de pacientes e acompanhamento
positiva devido a desconforto expiratório relatado pelo paciente. Essa a longo prazo.
modalidade terapêutica não tem demonstrado superioridade na eficá- Dentre os procedimentos o AMM tem sucesso mais expressivo na
cia e nem na adesão terapêutica em relação ao CPAP nos pacientes com redução do IAH e dos sintomas clínicos da SAOS, podendo ser indicado,
SAOS isoladamente. principalmente, na presença de alteração craniofacial, como primeira for-
2.3 | AutoCPAP ou autoBilevel são aparelhos que, dependendo de cada ma de tratamento cirúrgico em pacientes com SAOS grave que não tenham
marca e seu respectivo algoritmo, ajustam automaticamente a pressão se adaptado ao CPAP ou que não tenham respondido satisfatoriamente à
na tentativa de abolir todos os eventos respiratório obstrutivos. Apesar terapia com AIOS.
de propiciar uma pressão média menor na VAS e propiciar um aumento 5 | Outros tratamentos:
discreto no tempo de uso do que os aparelhos com pressão fixa, estu- O uso de estimulantes da ventilação, os antidepressivos e os fármacos com
dos até o momento não demonstraram superioridade dessa modalida- ação em musculatura de VAS não se mostraram eficazes no tratamento
de na eficácia e adesão ao tratamento. São utilizados durante curto definitivo da SAOS. A reposição hormonal (estrogênio-progesterona) em
espaço de tempo para se estabelecer a seguir a pressão fixa mais ade- mulheres no climatério, os hormônios tiroideanos no hipotiroidismo e a
quada para tratamento a longo prazo. São contraindicados na presença bromocriptina na acromegalia são indicados como coadjuvantes aos trata-
de hipoventilação e apneias centrais. mentos convencionais da SAOS.
3 | Aparelhos intraorais (AIOs) Recentes estudos com estimulação elétrica do músculo genioglosso,
São dispositivos colocados na cavidade oral, os principais sendo os fonoterapia, fonoterapia, canto e uso de instrumento de sopro apontam
aparelhos reposicionadores mandibulares (ARM), que, ao tracionarem a resultados favoráveis na SAOS de grau leve, porém necessitando de mais
mandíbula anteriormente, previnem o colapso da VAS durante o sono estudos para que sejam indicados como opção terapêutica.
e constituem uma abordagem de tratamento reversível e simples, com
melhor aceitação e tolerância por parte dos pacientes. Entre esses, os
mais usados são KlearwayTM , PM Positioner, Herbst, TAP III, Silencer e REVISÃO
Somnomed, além do aparelho desenvolvido no Brasil, chamado brazilian
A SAOS é uma doença com fisiopatogenia complexa que acarreta
dental appliance (BRD). A indicação principal deste tratamento inclui os
obstruções da VAS, levando à hipoxemia e despertares.
pacientes com ronco primário e SAOS leve a moderada. São ainda reco-
Ela é prevalente e tem consequências adversas à saúde.
mendados para indivíduos com SAOS moderada a grave que são intole-
O diagnóstico é clinico e confirmado com o registro dos eventos
rantes ou que não tiveram resposta ao uso do CPAP. Em alguns casos, a
respiratórios durante o sono.
combinação do AIO à perda de peso ou outros procedimentos terapêuti-
210 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
■■ REFERÊNCIAS
1. Tufik S, Santos-Silva R, Taddei JA, Bittencourt LRA. Obstructive sleep apnea
■■ QUADRO CLÍNICO
syndrome in the São Paulo epidemiologic sleep study. Sleep Med. 2010; Quanto à gravidade, a insônia pode ser considerada leve, moderada e
11(5):441-6. grave. A insônia leve apresenta pequeno impacto sobre as atividades diur-
2. Peppard PE, Young T, Barnet JH, Palta M, Hagen EW, Hla KM. Increased nas com irritabilidade, ansiedade ou fadiga. A insônia moderada mostra
prevalence of sleep-disordered breathing in adults. Am J Epidemiol. 2013; sensível alteração de humor, cansaço e prejudica as atividades diurnas.
177(9):1006-14.
Na insônia grave, há alterações de humor (irritação, inquietude, ansieda-
3. Heinzer R, Vat S, Marques-Vidal P, Marti-Soler H, Andries D, Tobback N, et
al. Prevalence of sleep-disordered breathing in the general population: the
de), com cansaço ou fadiga intensa, não conseguindo desempenhar suas
HypnoLaus study. Lancet Respir Med. 2015;3(4):310-8. atividades de forma adequada, apresentando disfunção cognitiva e dese-
4. American Academy of Sleep Medicine. International classification of sleep quilíbrio emocional.
disorders. 3rd ed. Darien: AASM; 2014. Entre os sintomas diurnos, temos disfunção de memória e concentração,
alterações no humor, irritabilidade, dificuldade de relacionamento familiar e
social, dificuldade em interagir socialmente e em obter prazer naquilo que se
■■ LEITURAS SUGERIDAS
faz, sentimentos de baixa-estima e incompetência, sonolência diurna, cansa-
Berry RB, Brooks R, Gamaldo CE, Harding SM, Lloyd RM, Marcus CL, et al.
ço excessivo e fadiga e experiência de falta de controle sobre o sono.
The AASM manual for the scoring of sleep and associated events: rules,
Quanto ao período de insônia durante a noite, temos insônia inicial,
terminology and technical specifications, version 2.3. Darien: AASM; 2016.
Jordan AS, McSharry DG, Malhotra A. Adult obstructive sleep apnoea. Lancet. de manutenção e do fim da noite. Na insônia inicial, há uma dificuldade
2014;383(9918):736-47. em iniciar o sono à custa de ansiedade, preocupação e inabilidade em
“parar de pensar”. Na insônia de manutenção, desperta-se diversas vezes
durante a noite com dificuldade em retornar a dormir. E na insônia de fim
de noite, o acordar acontece antes do que se gostaria e, na maior parte
das vezes, está associado a sintomas depressivos.
21.6 INSÔNIA A ICSD-3 divide a insônia em:1 aguda (sintomas presentes menos que
três vezes na semana e há menos de três meses), crônica (mais de três me-
■■ LUCILA BIZARI FERNANDES DO PRADO ses), outras insônias (cujos sintomas não se encaixam em insônia crônica
■■ LUCIANE B. C. CARVALHO ou aguda) e sintomas isolados e outras variantes normais.
Insônia crônica é aquela em que há dificuldade para iniciar e/ou para
manter o sono, com latência do sono maior do que trinta minutos (tempo
Insônia é caracterizada por percepção de sono insuficiente, relacionada à que um indivíduo demora para dormir), pelo menos três vezes por semana,
quantidade ou qualidade do sono, apesar da oportunidade de tempo para há mais de três meses, na presença de oportunidade para dormir, com
dormir adequada, que resulta, de alguma forma, em sintomas diurnos. O prejuízo no funcionamento diurno e que apresenta ou não comorbidades.
termo insônia pode ser utilizado em diferentes contextos, desde o distúr- São consideradas insônia crônica: insônia psicofisiológica (ou aprendida e
bio do sono específico até como sintoma relacionado a outras doenças. perpetuada), paradoxal (ou impercepção do sono), idiopática, por higiene
Quase todos os seres humanos ao longo da vida experimentam pelo inadequada de sono, devido a uso de drogas e substâncias, devido a con-
menos uma noite de insônia. A prevalência de insônia na população adul- dições médicas e psiquiátricas. Atualmente há poucas evidências de que
ta varia de 33 a 50%, sendo 50% com insônia grave, 10% com uso de esses subtipos possam ser distintos na prática clínica e seus achados se
medicação prescrita. sobrepõem. Sugere-se abandonar os termos insônia primária e secundária
Dentre os fatores de risco para insônia temos idade (mais frequente e adotar-se o termo insônia comórbida quando a insônia é associada a
no idoso), sexo (feminino 4:3), comorbidades (médicas, psiquiátricas ou outras condições.
por uso de substâncias), regime de trabalho (desemprego, trabalho em Fatores predisponentes. Embora qualquer pessoa possa ter insônia,
turno) e baixo status socioeconômico. algumas estão mais predispostas por fatores genéticos. São indivíduos
A insônia apresenta impacto considerável na vida do paciente. Na mais preocupados, metódicos, ansiosos e hiperalertas.
área da saúde, aumenta o risco para doenças metabólicas, AVC e infarto Fatores precipitantes. A pessoa predisposta a ter insônia pode iniciar
do miocárdio. Na área social, relaciona-se à desestruturação das relações sua dificuldade para dormir em várias oportunidades ao longo da vida. Al-
por instabilidade emocional. Na área econômica, traz baixo desempenho guns eventos da história do paciente são bastante compreensíveis, quanto
das atividades profissionais por disfunção cognitiva; aumento de absen- ao potencial de provocar hiperalerta, e outros são bastante particulares
teísmo e afastamentos; acidentes de trabalho, acidentes automotivos; au- e dependentes da estrutura psicológica de cada indivíduo. Os fatores
mento de gastos em consultas médicas, psicológicas e com medicamentos. precipitantes mais comuns são as perdas, por morte ou perigo de morte,
Pacientes com quadro de insônia não conseguem se acalmar para doenças ou acidentes.
dormir, mantêm o estado de ansiedade que lhes acompanhou durante o Fatores perpetuantes. São comportamentos que mantêm a dificuldade
dia e não conseguem relaxar. Muitas vezes referem que estão sonolentos, de dormir. Dentre eles, temos o uso de alimentos estimulantes próximo ao
mas, ao chegar à cama, despertam completamente. Antes de se deitarem, horário de dormir, atividade física no período noturno, horários irregulares
já imaginam que não vão conseguir dormir e começam a prever suas di- de ir para cama a fim de dormir, uso do quarto para outras finalidades que
ficuldades. Já no leito, ficam ruminando em seu dia a dia, pensando, re- não o sexo e o sono. É frequente que estes pacientes tenham televisão no
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 211
quarto, computador, celular e utilizem o leito para planejar o dia seguinte mais rápida para reduzir os sintomas de insônia, e a TCC tem efeito mais
ou mesmo para se alimentar. Estas práticas mantêm o estado de alerta e duradouro.
desfavorecem o relaxamento necessário para iniciar o sono. As técnicas mais comumente utilizadas são controle de estímulos, re-
Na insônia aguda, o paciente apresenta dificuldade em iniciar e man- laxamento, restrição do sono e reestruturação cognitiva.
ter o sono menos que três vezes na semana e há menos de três meses, na A técnica de controle de estímulos tem como objetivo enfraquecer os
presença de oportunidade para dormir, com prejuízo no funcionamento estímulos que fazem o paciente ficar acordado à noite e reforçar os estímu-
diurno, acompanhando ou não comorbidades. los que associem a cama e o quarto a um adormecer rápido, por meio da
Dentre os sintomas isolados e outras variantes normais temos tempo criação de novos hábitos e comportamentos de uma rotina adequada para
excessivo na cama e dormidor curto: no tipo tempo excessivo na cama, os dormir, devendo-se ir para a cama com a intenção de dormir, sem usá-la
indivíduos não apresentam nenhum sintoma de insônia, mas acreditam para outras atividades (com exceção para a atividade sexual) e, principal-
que deveriam dormir mais tempo e, para isso, ficam na cama por mais mente, não ficar na cama sem sono. Caso o paciente não durma em pouco
tempo do que necessitam. apresentam aumento da latência do sono e tempo, deve-se orientá-lo a levantar da cama e ir para outro cômodo, a
diminuição da eficiência do sono (relação entre o tempo que permanece fim de realizar atividade compatível com sua rotina da hora de dormir.
dormindo pelo tempo em que ficou na cama), ou seja, dorme pouco e fica O objetivo do relaxamento é diminuir a tensão e ansiedade da hora de
muito tempo acordado na cama. O dormidor curto precisa de pouco tempo dormir com técnicas que promovam relaxamento muscular e distração dos
de sono (entre 3 e 4 horas) para se sentir restaurado. pensamentos e da preocupação. Técnicas, como biofeedback, treino ima-
ginário, relaxamento progressivo ou até mesmo meditação e yoga, podem
ser utilizadas com boa melhora clínica.
■■ DIAGNÓSTICO
A técnica de restrição do sono tem como objetivo aumentar a eficiên-
Os critérios diagnósticos segundo o ICSD-3 são:1 a) dificuldade em iniciar o cia do sono, diminuindo o tempo em que o paciente permanece na cama
sono, dificuldade em manter o sono, despertar muito precoce ou sono que acordado.
é cronicamente não restaurador ou é pobre em qualidade; b) as dificulda- A reestruturação cognitiva tem como objetivo alterar as crenças e o
des descritas ocorrem apesar da adequada oportunidade e circunstâncias conhecimento que o paciente tem em relação ao sono, como: o que é sono
para dormir; c) pelo menos uma das seguintes dificuldades durante o dia: normal, quantas horas de sono são necessárias, a que horas se deve dor-
fadiga ou mal-estar, dificuldade de atenção, concentração ou memória, mir, quais são os sinais de sono, qual a rotina de um bom dormidor.
disfunção social ou vocacional ou pobre desempenho escolar, distúrbio do A higiene do sono não é uma técnica de TCC, mas é utilizada em todos
humor ou irritabilidade, sonolência diurna, redução na motivação, energia os tipos de tratamento, não só para insônia, como também para outros
ou iniciativa, propensão ao erro ou acidentes no trabalho ou na condução distúrbios do sono. Tem como objetivo evitar comportamentos perpetua-
de veículos, tensão, dor de cabeça ou sintomas gastrintestinais em resposta dores de sono inadequado, como ficar na cama tentando dormir, realizar
à perda de sono, preocupação ou medos a respeito do sono. comportamentos incompatíveis com o sono (falar ao telefone, assistir à TV,
O diagnóstico da insônia baseia-se em acurada anamnese. A polis- usar computador, comer, fumar), atividade física rigorosa antes de dormir,
sonografia é indicada quando há suspeita de distúrbios respiratórios do uso de álcool ou cigarro como indutor de sono, medicamentos sem orien-
sono ou movimentos periódicos dos membros, ou quando o diagnóstico tação médica, ingesta de alimentos e substâncias estimulantes (café, chá,
inicial é incerto. chocolate) antes da hora de dormir.
O diagnóstico diferencial deve afastar: 1) privação de sono, em que o
indivíduo permanece acordado propositalmente, 2) síndrome do atraso de FARMACOLÓGICO
fase de sono, em que o indivíduo dorme mais tarde e acorda mais tarde
do que a maioria da população, mas, por compromissos que o faz acordar
antes do horário que gostaria, torna a duração do sono insuficiente. ATENÇÃO!
Instrumentos para avaliação da insônia e seu seguimento baseiam-se
no diário de sono e questionários para depressão, ansiedade e qualidade Medicamentos para a insônia devem ser usados de maneira racional e
de vida. por um período determinado.
Ramelteon* 8 30 30-90
Agonistas Melatonina Agomelatina 25-50 90 2-2,4 Ganho de peso,
Reduz latência do sono
disfunção sexual
paciente e visando à sua retirada em um período menor de tempo. Na fase médicos. Quanto à frequência, os sintomas podem variar de uma vez no
aguda da insônia, a combinação medicamentos e de TCC é mais eficiente e, mês ou no ano até diariamente. Os sintomas podem remitir por longos
em longo prazo, o seguimento com TCC só é recomendado. períodos de tempo. É caracterizada por urgência, quase que irresistível,
em mover os membros. Esta urgência está frequentemente associada,
mas nem sempre acompanhada, por sensações desagradáveis e profun-
REVISÃO das em membros, difíceis de serem descritas. Embora o acometimento
seja predominantemente nas pernas, o termo “pernas inquietas” é um
A insônia aumenta o risco para doenças metabólicas, acidente vas-
nome inadequado, já que 21 a 57% dos pacientes referem sensações nos
cular cerebral e infarto do miocárdio.
braços ou pescoço, daí a preferência atual por doença de Willis-Ekbom.
Tem impacto importante na área social, econômica e emocional.
O diagnóstico baseia-se em acurada anamnese. A polissonografia é EPIDEMIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
indicada quando há suspeita de distúrbios respiratórios do sono ou
movimento periódico dos membros. A prevalência varia de 5 a 10% em estudos americanos e europeus. A
A associação de medicamentos e de TCC é benéfica na maioria dos prevalência em uma cidade brasileira foi de 6,4%. A prevalência da SPI/
casos de insônia, reduzindo o tempo e a quantidade de medica- DWE aumenta de 2 a 5 vezes em pacientes com falência renal crônica que
mentos. melhora um mês após transplante renal,
Há relação da doença com sexo feminino e com o aumento da idade.
Privação de sono, neuropatia periférica, radiculopatias, dor, uso de
■■ REFERÊNCIA cafeína, tabaco ou álcool podem exacerbar os sintomas.
A fisiopatologia envolve deficiência de ferro e alterações dos neuro-
1. American Academy of Sleep Medicine. International classification of sleep
transmissores dopaminérgicos no SNC, além de mecanismos genéticos.
disorders. 3rd ed. Darien: American Academy of Sleep Medicine; 2014.
O ferro é importante cofator na produção de dopamina, na formação das
sinapses, na síntese de mielina e na produção de energia. A conexão entre
■■ LEITURAS SUGERIDAS SPI/DWE e baixa quantidade de ferro no SNC é baseada em dados de ne-
Kryger MH, Roth T, Dement WC. Principles and practice of sleep medicine. 6th ed. cropsia, ressonância magnética, tomografia cerebral e análise de líquido
Philadelphia: WB Saunders; 2015. cerebrospinal (LCS).
Mitchell MD, Gehrman P, Perlis M, Umscheid CA. Comparative effectiveness of Vários genes estão envolvidos, sendo os principais BTBD9, MEIS1,
cognitive behavioral therapy for insomnia: a systematic review. BMC Farm MAP2K5/LBXCOR e PTPRD.
Pract. 2012;13:40.
Morgan K, Kucharczyk E, Gregory P. Insomnia: evidence-based approaches to QUADRO CLÍNICO
assessment and management. Clin Med (Lond). 2011;11(3):278-81.
Pinto Jr LR, Alves RC, Caixeta E, Fontenelle JA, Bacellar A, Poyares D, et al. New É caracterizado por uma sensação desagradável nas pernas (na maioria
guidelines for diagnosis and treatment of insomnia. Arq Neuropsiquiatr. das vezes) que aparece no repouso, que causa uma urgência em movimen-
2010;68(4):666-75. tá-las, que melhora ou desaparece com o movimento e que predomina no
Roehrs T, Roth T. Insomnia pharmacotherapy. Neurotherapeutics. 2012;9(4):728-38. final do dia.
Siebern AT, Suh S, Nwakowski S. Non-Pharmacological treatment of insomnia. Metade dos pacientes se expressam por sensação de dor profunda.
Neurotherapeutics 2012;9(4):717-27. Na língua portuguesa, os termos referindo as sensações incluem “friagem,
aflição, dor no osso, choque, ruindade, comichão, fisgada, formigas an-
dando pelos ossos, queimação, gastura, cansaço, coceira, formigamento,
cócegas, casca de abacaxi nos ossos, irritação”, entre outros.
Os sintomas de SPI/DWE provocam stress, prejuízo social, ocupacio-
21.7 DISTÚRBIOS DO MOVIMENTO nal, educacional pelo seu impacto no sono, na atividade diária, no com-
RELACIONADOS AO SONO: portamento, na cognição e no humor.
Entre os medicamentos que precipitam ou agravam os sintomas de
SÍNDROME DAS PERNAS INQUIETAS, SPI/DWE temos os anti-histamínicos sedativos, alguns antagonistas do-
DISTÚRBIO DOS MOVIMENTOS paminérgicos (os de atividade em receptores centrais) e muitos antide-
pressivos, com exceção da bupropiona, que é promotora da atividade
PERIÓDICOS DE MEMBROS dopaminérgica.
DURANTE O SONO E BRUXISMO
DIAGNÓSTICO
■■ GILMAR FERNANDES DO PRADO O diagnóstico é essencialmente clínico e segue os cinco critérios essen-
■■ LUÍS FABIANO MARIN ciais:
1 | Urgência em mover os membros, acompanhada por sensação ou des-
■■ LUCIANE B. C. CARVALHO
conforto nos membros.
■■ LUCILA BIZARI FERNANDES DO PRADO 2 | Urgência em movimentar os membros, e as sensações desconfortáveis
começam ou pioram durante períodos de descanso ou de inatividade.
3 | Urgência em se movimentar os membros, e as sensações desconfor-
■■ SÍNDROME DAS PERNAS INQUIETAS táveis são aliviadas por movimento, como andar, esfregar ou massagear
(DOENÇA DE WILLIS-EKBOM) os membros.
Síndrome das pernas inquietas (SPI), ou doença de Willis-Ekbom (DWE), 4 | Urgência em se movimentar os membros, e as sensações desconfor-
é uma doença neurológica sensorial e motora que interfere no sono e táveis, durante o repouso ou inatividade, ocorrem ou pioram no final da
na qualidade de vida, influenciada por fatores genéticos, ambientais e tarde ou à noite.
214 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
5 | A ocorrência dos sintomas descritos não é melhor explicada por ou- tica ocorre 1 a 2 horas após sua ingestão com meia-vida de 6 horas. Ainda
tras condições clínicas ou comportamentais, como mialgia, estase venosa, não está disponível no Brasil.
edema de membros, artrite, cãibras, desconforto posicional. 4 | Rotigotina. Agonista atuando em receptores D1, D2, D3, D4 e D5, além
Os critérios de suporte para o diagnóstico de SPI/DWE são: história do se agonista do receptor de serotonina 1A e alfa 2 adrenérgico. Sua
familiar positiva para a doença (parentesco de primeiro grau), resposta ao utilização é transdérmica uma vez ao dia na dose de 2 a 4 mg. Ainda não
tratamento dopaminérgico, curso clínico da doença, índice elevado de mo- disponível no Brasil.
vimentos periódicos de membros (PLMS, do inglês period limb movement 5 | Pergolide. Tem alta afinidade por receptores D1 e D2. Possui também
during sleep) na polissonografia. efeito nos receptores de serotonina 1A, 1B, 2A, 2B, 2C. Embora seja efetivo
O teste da imobilização sugerida avalia o componente sensorial da no tratamento da SPI/DWE, há risco de valvulopatia cardíaca, o que fez
SPI/DWE durante o repouso na vigília. abandonar seu uso nos Estados Unidos.
A escala de gravidade do grupo internacional de SPI/DWE ajuda a 6 | Bromocriptina. Agonista dopaminérgico com ação nos receptores D1
quantificar os sintomas relacionados à doença. e D2 com grande afinidade pelo D2 e receptor de serotonina 2B, além de
O diagnóstico diferencial deve ser feito com acatisia hipotensiva, efeito adrenérgico. A maior concentração plasmática ocorre em 70 minu-
acatisia induzida por neurolépticos, neuropatia periférica, radiculopatias tos após ingesta via oral e a meia-vida é de 6 a 8 horas. Também aumenta
lombar, claudicação neurogênica, claudicação vascular, síndrome da dor o risco de fibrose valvular cardíaca.
crônica, fibromialgia, artrite dos membros inferiores, desconforto posicio- 7 | Lisuride. Agonista dopaminérgico com ação nos receptores D2, D3 e
nal, cãibras noturnas, mioclonias do sono, depressão com sintomas somá- D4, agonista de receptor de serotonina 1A e 2A e antagonista de 2B. A
ticos, movimentos voluntários, insuficiência vascular periférica, prurido, maior concentração plasmática ocorre em 1,1 a 1,3 horas e sua meia-vida
síndrome das pernas dolorosas e movimentos dos artelhos, maldição de é de uma 1 a 3 horas. Não é comercializado no Brasil.
Vésper e delírio de infestação parasitária cutânea. 8 | Cabergolina. Agonista preferencial de receptor D2 e agonista de recep-
tor de serotonina 2B. Sua meia-vida é longa, de 65 horas, e tem pico de
TRATAMENTO nível plasmático em 3 horas após ingesta.
1) Levodopa 4) Opioides
É efetiva por curto período de tempo, sendo utilizada, quando necessário, Os mais utilizados são codeína, metadona (5 a 40 mg), tramadol (50 a 400
em situações pontuais em que há maior chance dos sintomas ocorrerem, mg), oxicodona (média de 10 mg, duas horas antes dos sintomas) e propo-
como viagens, espetáculos, sala de espera, dentre outras. Quando utili- xifeno. O efeito colateral mais comum é a obstipação intestinal, sedação e
zada por longos períodos, há maior chance do fenômeno de aumentação possível risco de apneia central.
(augmentation) (os sintomas ocorrem mais cedo que o habitual, com maior
gravidade e expansão para regiões do corpo não atingidas previamente.
5) Clonazepam
Aparece com aumento da dose e melhora com sua redução. Aumento o tempo total de sono e sua eficiência, reduz o número de micro-
despertares e o tempo acordado após o início do sono. Há também melho-
2) Agonistas dopaminérgicos ra subjetiva do desconforto e diminuição dos movimentos periódicos dos
São os agentes farmacológicos de primeira linha no tratamento da SPI/ membros durante o sono.
DWE, podendo ser divididos em dois grupos: os derivados não ergot (pra-
6) Ferro
mipexol, piribedil, ropirinol, rotigotina) e os derivados ergot (pergolide,
lisuride, cabergolina e bromocriptina). Embora não haja evidência robusta na utilização de ferro para SPI/DWE, vá-
Os derivados não ergot são bem tolerados, podendo ser usados em rios pacientes se beneficiam de seu uso, tanto na diminuição dos sintomas
doses muito baixas, Seu efeito colateral principal é a aumentação). No como coadjuvante com outros medicamentos. O tratamento, seja por via
caso dos derivados ergot, o principal efeito colateral é a fibrose (da válvula oral ou endovenosa, é indicado para manter os níveis de ferritina sérica aci-
cardíaca pulmonar, da pleura, do pericárdio e do retroperitônio), motivo ma de 100 mg/dL. A dose de ferro elementar via oral é de 50 a 60 mg, divi-
pelo qual não são indicados com frequência. dida em 1 a 2 doses ao dia. Para o tratamento endovenoso, utiliza-se o ferro
1 | Pramipexol. É um agonista de receptor dopaminérgico D1, D2 e D3, III na forma de sacarato de hidróxido férrico, na dose de 200 mg diluída em
com grande afinidade pelo D3. Sua meia-vida é de 8 a 12 horas, com início 500 mL de solução fisiológica, em dias alternados, em um total de 3 doses.
de ação 1 a 2 horas após sua ingesta. Recomenda-se 0,125 mg duas horas
Tratamento não farmacológico
antes do início dos sintomas, podendo aumentar-se gradualmente a dose
de acordo com a resposta terapêutica. 1) Exercícios físicos
2 | Piribedil. É um agonista de receptor D2/D3 e antagonista alfa 2 adre- Embora não existam ensaios clínicos a respeito dos exercícios ou atividade
nérgico. Alcança a máxima concentração plasmática em uma hora após física, são utilizados como auxiliares ao tratamento de SPI/DWE. A ativi-
ingesta, com meia-vida de 1,7 a 6,9 horas. dade e o exercício físico podem ser importantes na diminuição do apare-
3 | Ropirinol. É um agonista dopaminérgico que atua principalmente em cimento dos sintomas, na redução dos riscos de comorbidades, além do
receptor D2 e D3 com afinidade em D3. Sua concentração máxima plasmá- alívio dos sintomas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 215
■■ LEITURAS SUGERIDAS
Allen RP, Picchietti DL, Garcia-Borreguero D, Ondo WG, Walters AS, Winkelman ■■ ALTERAÇÕES DO SONO NA ESQUIZOFRENIA
JW, et al. Restless legs syndrome/Willis–Ekbom disease diagnostic criteria: Alterações no ciclo sono-vigília são comuns nos portadores de esquizofre-
updated International Restless Legs Syndrome Study Group (IRLSSG) nia, afetando de 30 a 80% dos doentes. A tendência ao retraimento social
consensus criteria – history, rationale, description, and significance. Sleep dos doentes com esquizofrenia faz com que eles fiquem muito tempo sem
Med. 2014;5:860-73. sair de casa: expondo-se menos à luz solar, perdem as pistas ambientais
American Academy of Sleep Medicine. International classification of sleep
e sofrem dessincronização com o ritmo circadiano. Como resultado, é co-
disorders. 3rd ed. Darien: American Academy of Sleep Medicine; 2014.
mum o atraso para o início do sono e, muitas vezes, inversão total do
Berry RB, Brooks R, Gamaldo CE, Harding SM, Lloyd RM, Marcus CL, et al. The
AASM manual for scoring of sleep associated events: rules, terminology ciclo sono-vigília, fazendo com que os pacientes durmam durante o dia e
and technical specifications. Darien: American Academy of Sleep Medicine; fiquem acordados à noite.
2016. Versão 2.3. Dificuldades para adormecer ou para manter-se dormindo, redução
Fröhlich AC, Eckeli AL, Bacelar A, Poyares D, Pachito DV, Stelzer FG, et al. no tempo total de sono (TTS), múltiplos despertares noturnos, pesade-
Brazilian consensus on guidelines for diagnosis and treatment for restless los, sono pouco reparador, sonolência diurna e necessidade de cochilos
legs syndrome. Arq Neuropsiquiatr. 2015;73:260-80. são as queixas mais relatadas pelos pacientes com esquizofrenia em fases
Masuko AH, Carvalho LB, Machado MA, Morais JF, Prado LB, Prado GF. estáveis. Na psicose aguda, há períodos de total falta de sono e, mesmo
Translation and validation into the Brazilian Portuguese of the restless legs
quando o paciente apresenta melhora nos sintomas, é comum persistir a
syndrome rating scale of the International Restless Legs Syndrome Study
insônia, com o posterior estabelecimento de uma inversão completa do
Group. Arq Neuropsiquiatr. 2008;66:832-6.
Varela MJ, Coin-Carvalho JE, Carvalho LB, Varela MV, Potasz C, Prado LB, et al. ciclo sono-vigília.
Restless legs syndrome: a qualitative analysis of psychosocial suffering and No exame de PSG, os pacientes esquizofrênicos apresentam latência do
interdisciplinary attention. J Health Psychol. 2013;18:1341-52. sono (LS) aumentada, sono fragmentado por múltiplos despertares, aumen-
to no tempo total de sono (TTS), redução na eficiência do sono (ES), redução
da latência do sono REM (LREM) e diminuição no sono de ondas lentas (N3).
Alterações no ciclo sono-vigília e na arquitetura do sono são os achados
mais frequentes nos indivíduos em estado mental de risco para psicose:
21.8 TRANSTORNOS nessa população, é comum a dificuldade para adormecer, o aumento nos
despertares noturnos, o sono não reparador e a sonolência diurna.
PSIQUIÁTRICOS E SONO
MANEJO DAS ALTERAÇÕES DO SONO
■■ MARCIO ZANINI
Os antipsicóticos são os medicamentos de escolha no tratamento da es-
■■ ARTUR FILHOU JOSÉ quizofrenia. Naqueles com alterações do ciclo sono-vigília, a escolha de
agentes antipsicóticos mais sedativos – como clorpromazina (300 mg a
800 mg/dia), olanzapina (5 mg a 20 mg/dia), quetiapina (300 mg a 800 mg/
Nos seres humanos, o ritmo circadiano é responsável tanto por manter dia) e risperidona (4 mg a 10 mg/dia) –, além de tratar os sintomas psicó-
os ritmos biológicos internos sincronizados com as mudanças cíclicas am- ticos, tende a melhorar o sono dos pacientes, já que esses agentes atuam
bientais da terra como por restabelecê-los após mudanças externas que reduzindo a LS e aumentando o TTS. Agentes atípicos, como olanzapina,
podem alterá-lo. Além das alterações de luminosidade que correm durante quetiapina e risperidona, parecem também aumentar o sono de ondas
as 24 horas do dia, mudanças comportamentais, eventos sociais, fome, lentas (N3). Técnicas de psicoeducação, com o estabelecimento de uma
privação de sono, oscilações de temperatura e estresse físico podem alte- rotina diária de atividades ao ar livre e redução de estímulos ao entardecer,
rar o ritmo circadiano, desencadeando irritabilidade e labilidade emocio- podem colaborar no restabelecimento do ritmo circadiano dos pacientes.
nal. A relação entre as alterações de sono e de humor é uma via de mão
dupla, visto que alto nível de agitação, situações estressantes e mudanças
■■ ALTERAÇÕES DO SONO NOS
na rotina afetam a qualidade do sono, podendo levar a um ciclo vicioso
TRANSTORNOS DO HUMOR
entre distúrbio do sono e desregulação emocional. A perda de sono tende
a intensificar o impacto emocional das experiências negativas, minimizar Há mais de 20 anos as alterações do ritmo circadiano têm sido descritas
os afetos positivos e prejudicar a forma como o indivíduo compreende, como um dos possíveis fatores desencadeantes de episódios maníacos ou
processa e expressa tais experiências. Aproximadamente um terço dos depressivos no transtorno bipolar (TB).* Insônia ou hipersonia são sinto-
indivíduos com queixas relativas ao ciclo sono-vigília preenche critérios mas listados nos critérios diagnósticos para episódio depressivo maior do
diagnósticos para algum transtorno psiquiátrico, e 63% dos pacientes com DSM-51, e a necessidade reduzida de sono faz parte dos sintomas listados
transtorno mental relatam perda significativa de sono quando compara-
dos a 20% da população geral. *Neste capítulo, onde consta TB, leia-se transtorno bipolar.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 217
para os episódios de mania ou hipomania. Em pacientes bipolares eutími- A PSG de pacientes deprimidos mostra aumento na LS, aumento dos
cos, é frequente o relato de dificuldade para adormecer, sono fragmenta- despertares, redução no estágio N3 e anormalidades no sono REM, como
do por múltiplos despertares e preocupação quanto ao sono. O Early Pha- latência reduzida, aumento na duração e na densidade, principalmente na
se Inventory for Bipolar Disorders (EPIbipolar), um inventário com fatores primeira parte da noite.
de risco, sinais e sintomas prodrômicos para o TB, cita as alterações de
sono e do ritmo circadiano como sinais precoces de adoecimento. MANEJO DAS ALTERAÇÕES DO SONO
O tratamento da depressão resulta em melhora na qualidade do sono em
aproximadamente 60% dos pacientes. O uso de antidepressivos sedativos,
ATENÇÃO!
como mirtazapina (30 a 45 mg/dia) e trazodona (150 a 450 mg/dia), me-
As alterações do ciclo sono-vigília são importantes indicadores de lhora o sono desses pacientes tanto nas doses terapêuticas em monotera-
adoecimento em pacientes psiquiátricos, sendo o sintoma preditivo pia quanto em doses mais baixas, como 15 mg de mirtazapina e 50 a 100
mais comum para episódios de mania. mg de trazodona, associados a outros antidepressivos. O zolpidem – um
hipnótico agonista seletivo do receptor GABA A, na dose de 10 mg ao
deitar – reduz a LS e aumenta o TTS: é uma opção segura e bem tolerada,
para ser usada por até 4 semanas no manejo da insônia em pacientes
■■ MANIA/HIPOMANIA deprimidos. A persistência da insônia após remissão dos sintomas depres-
A privação de sono, a necessidade reduzida de sono e o sono fragmentado sivos aumenta o risco de recidiva e deve ser tratada. Higiene do sono,
por múltiplos despertares são sinais precoces de adoecimento e fatores restrição de sono, terapia de controle de estímulos, técnicas de relaxamen-
de risco para a eclosão de episódios de mania em pacientes bipolares. Na to, meditação e TCC para insônia são os tratamentos não farmacológicos
vigência de um episódio de mania ou hipomania, o paciente experimenta disponíveis quando há insônia em casos de depressão.
aumento no nível de energia, com necessidade reduzida do sono e sensa-
ção de sono reparador mesmo após poucas horas na cama. Alguns pacien-
■■ ALTERAÇÕES DO SONO NOS
tes se sentem totalmente restaurados mesmo após poucas horas de sono,
e outros podem permanecer acordados mais de 24 horas sem se sentir TRANSTORNOS ANSIOSOS
cansados. A falta de sono agrava a labilidade afetiva, a impulsividade e Alterações do sono e ansiedade são mais comumente encontradas asso-
pode predispor ao surgimento de sintomas psicóticos. ciadas do que separadas. Insônia chega afetar de 70 a 90% dos pacientes
com transtornos ansiosos. Pessoas com insônia, relatam maiores níveis de
ansiedade, tendência a pensamentos intrusivos, mais medos e irritabilida-
ATENÇÃO! de que a população geral.
A PSG de pacientes em mania mostra redução no TTS, no estágio N3,
na LREM e na densidade do sono REM. ATENÇÃO!
Nos transtornos ansiosos, além do tratamento medicamentoso, é fun-
MANEJO DAS ALTERAÇÕES DO SONO damental a normalização do ritmo biológico dos pacientes por meio
O restabelecimento do ritmo circadiano é fundamental no tratamento de da higiene do sono, do controle de estímulos e da TCC para insônia.
um episódio de mania, bem como o emprego de técnicas de psicoeduca-
ção, com redução de estímulos e higiene do sono adequada. O uso de anti-
psicóticos atípicos com propriedades sedativas, como quetiapina (300 mg a ■■ TRANSTORNO DE ANSIEDADE GENERALIZADA
800 mg/dia), olanzapina (5 a 20 mg/dia) e risperidona (4 a 10 mg/dia), além
Pacientes que sofrem de transtorno de ansiedade generalizada (TAG) têm
de aprovado para o tratamento de episódios de mania, pode restabelecer
dificuldade para relaxar e parar de se preocupar com seus problemas, que
o sono desses pacientes em função de suas propriedades sedativas. A as-
geralmente se intensificam quando tentam dormir. Dificuldade para iniciar
sociação de benzodiazepínicos, como clonazepam na dose de 2 a 6 mg/dia
e manter o sono, além de sono pouco reparador, são queixas usuais destes
ou dizepam 5 a 10 mg/dia, com doses maiores à noite, pode ser útil para o
pacientes.
manejo da exaltação maníaca e da insônia, nas primeiras semanas de trata-
Exames de PSG registram aumento da LS, aumento no índice de des-
mento, quando os antipsicóticos isoladamente não se mostrarem efetivos.
pertares, aumento do tempo acordado após o início do sono, diminuição
da ES e de N3.
■■ DEPRESSÃO
Durante os episódios depressivos, alterações no padrão de sono são co- MANEJO DAS ALTERAÇÕES DO SONO
muns, e a privação de sono induzida leva à melhora transitória dos sin- O manejo da insônia no TAG inicia com uma adequada higiene do sono,
tomas, possivelmente por aumento na transmissão serotoninérgica. Um com redução de estímulos, e tem na TCC para a insônia os melhores resul-
episódio depressivo frequentemente é precedido por insônia, e pacientes tados. O tratamento medicamentoso do TAG com ISRS, como sertralina
com insônia crônica apresentam risco 4 a 10 vezes maior de desenvol- 100 a 200 mg/dia, paroxetina 20 a 60 mg/dia e escitalopram 10 a 20 mg/
verem depressão recorrente do que aqueles com insônia aguda ou sem dia, pode inicialmente piorar o sono e a ansiedade dos pacientes, sendo
insônia. Após a remissão de um episódio depressivo, insônia é o sintoma nesses casos indicado associar medicamentos benzodiazepínicos. Alpra-
residual mais comum, e sua persistência parece aumentar o risco de reci- zolam 1 mg a 4 mg/dia, clonazepam 1 mg a 6 mg/dia e bromazepam 6
diva da depressão. Na vigência de um episódio depressivo, em torno de mg a 12 mg/dia são ansiolíticos eficazes tanto na redução dos sintomas
80% dos pacientes apresentam alterações de sono, sendo fragmentação e ansiosos quanto na melhora do sono durante as primeiras semanas de
despertar precoce as mais frequentes. tratamento.
218 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
■■ TRANSTORNO DE ESTRESSE PÓS-TRAUMÁTICO Apesar de serem utilizados para o controle dos sintomas de abstinên-
cia, os benzodiazepínicos devem ser evitados a longo prazo, pelo risco
Insônia e pesadelos são os sintomas centrais do transtorno de estresse
de dependência e abuso.
pós-traumático (TEPT), podendo inclusive constituir um fator central no
desenvolvimento e manutenção do transtorno. Até 90% dos pacientes
com TEPT apresentam insônia, e entre 57 a 87% sofrem de pesadelos re- Alguns estudos obtiveram resultados positivos no uso de trazodona
correntes. A PSG dos pacientes com TEPT registra aumento do N1, redu- com doses entre 50 mg e 150 mg ao deitar, gabapentina 300 mg a 800 mg
ção de N3, aumento na LREM e aumento na densidade do sono REM. As ao deitar e quetiapina 50 a 150 mg ao deitar, com melhora do padrão de
alterações na estrutura do sono REM parecem ser as responsáveis pelos sono de alcoolistas insones em abstinência. A quetiapina se mostrou útil,
pesadelos recorrentes, e o processamento emocional deficiente tem como também, na restauração do sono em usuários de outras drogas. Técnicas
consequência a persistência do medo e agravamento do quadro.
comportamentais com higiene do sono, redução de estímulos e TCC para
insônia ajudam na melhora do sono dos pacientes em abstinência.
MANEJO DAS ALTERAÇÕES DO SONO
O tratamento do TEPT com ISRS parece ser eficaz na redução da severida-
de dos sintomas e na prevenção de recidivas, mas aproximadamente 20 REVISÃO
a 30% dos pacientes atingirão a remissão. Nos últimos anos vem aumen-
tando o uso do prasozin, um antagonista do receptor alfa-1 adrenérgico, Na esquizofrenia, é comum que os pacientes invertam o ciclo sono-
como tratamento dos pesadelos associados ao TEPT; a dose recomendada -vigília, ficando acordados a noite toda e dormindo durante o dia.
é de 1 mg ao deitar, com incrementos de 1 mg a cada 5 dias conforme Antipsicóticos sedativos, como clorpromazina, quetiapina, olanzapi-
tolerância do paciente, até atingir a dose de 5 a 10 mg. O tratamento não na e risperidona, são indicados para esquizofrênicos com alterações
farmacológico para o TEPT inclui terapia do ensaio imaginário, uma mo- do sono.
dificação da TCC que envolve rememorar o pesadelo, escrever conteúdo e Alterações no padrão de sono são preditores de descompensação
reescrevê-lo de modo menos angustiante e então ensaiar o novo cenário. em pacientes bipolares.
No transtorno bipolar, a estabilização dos ritmos biológicos é fun-
damental na prevenção de recaídas e no tratamento dos episódios
■■ ALTERAÇÕES DO SONO NO ABUSO E de humor.
ABSTINÊNCIA DE SUBSTÂNCIAS Insônia residual é preditor de recidiva de episódio depressivo.
Álcool: alterações do ciclo sono-vigília, síndrome da apneia Antidepressivos sedativos, como mirtazapina e trazodona, são efe-
obstrutiva do sono e insônia são comuns entre os alcoolistas, tivos na melhora do sono de pacientes deprimidos.
estando presente em até 72% dos casos. Os achados de PSG na Higiene do sono, terapia de controle de estímulos e TCC para insô-
intoxicação aguda incluem redução na ES, no TTS, no estágio N3 nia são tratamentos não farmacológicos mais eficazes para estabili-
e na latência do sono REM. A abstinência de álcool está associada zar o padrão de sono nos transtornos de ansiedade.
à diminuição da ES, do TTS, do estágio N3 e à potencialização do
sono REM.
Cocaína: redução no TTS, aumento na LS e supressão do sono REM ■■ REFERÊNCIAS
geralmente ocorrem após o consumo de uma única dose de co- 1. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de
caína. Estudos que avaliaram o sono de pacientes em abstinência transtornos mentais: DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 219
Nas doenças inflamatórias intestinais e na síndrome do colo irritá- dependente da idade e da obesidade. A redução da quantidade ou da
vel, as queixas de cólicas abdominais e a flatulência persistem durante o qualidade do sono e as alterações respiratórias prejudicam a homeostase
sono, o que acarreta despertares intermitentes. A relação entre atividade da glicose, e o uso de CPAP auxilia no controle da secreção de insulina e
da doença e fragmentação do sono pode ser explicada pela disfunção au- na redução de lipídeos sanguíneos em diabéticos com apneia moderada
tonômica, com aumento do tônus simpático, em especial durante o sono ou grave.
REM. O sono precário, por sua vez, favorece agravamento da sintomato-
logia intestinal. NEOPLASIAS
Na cirrose hepática, toxinas derivadas da circulação portal, altera- A combinação de dor, fadiga e distúrbios do sono ocorre em mais de 40%
ções endócrinas e retardo no pico de secreção de melatonina interferem dos pacientes com câncer. As diferentes formas de insônia são a queixa
no ciclo vigília-sono, o que acarreta atraso de fase. A inversão do ciclo mais frequente, dependendo do tipo de câncer, do estádio, da modalidade
vigília-sono e a sonolência diurna excessiva ocorrem precocemente na en-
de tratamentos e dos efeitos secundários relacionados com o tratamento.
cefalopatia hepática. A ascite contribui para o aumento do IAH mais por
A fadiga afeta a maior parte dos pacientes, em especial após cirurgia, qui-
associar-se a edema nas VAS do que pelo aumento do volume abdominal.
mioterapia, imunoterapia ou radioterapia. Sonolência excessiva diurna e
Indivíduos com cirrose hepática apresentam aumento na produção gástri-
síndrome das pernas inquietas associadas à anemia ferropriva ocorrem,
ca de grelina. Apesar de haver resistência ao seu efeito anabólico, a ação
em especial, nos tumores de pulmão, de mama, trato geniturinário e gas-
da grelina como promotora do sono profundo permanece preservada nas
trintestinal. Distúrbios respiratórios do sono, por sua vez, têm sido descri-
fases iniciais da falência hepática.
tos em associação com tumores de cabeça e pescoço e em lesões ósseas
DOENÇAS RENAIS na base do crânio.
A morfina é o analgésico mais prescrito para o controle da dor onco-
A prevalência de distúrbios do sono em pacientes com doença renal em
lógica, no entanto, diminui a porcentagem de sono de ondas lentas e do
fase terminal chega a 80% dos casos, e a sonolência excessiva diurna
sono REM, fragmenta o sono e propicia a apneia central durante o sono.
acomete pelo menos 50% dos pacientes. Estão implicados fatores como
Os corticosteroides, usados em altas doses no controle da sintomatologia
a ativação de citocinas pró-inflamatórias e as alterações metabólicas
do câncer, diminuem o sono REM e aumentam a porcentagem do sono de
decorrentes do processo de diálise. O aumento da atividade de ondas
ondas lentas. Os efeitos da dexametasona sobre a fragmentação do sono
lentas no EEG mesmo durante a vigília tem sido atribuído ao efeito neu-
rotóxico tanto da uremia como dos níveis elevados de hormônio da pa- são mais acentuados que os da prednisona.
ratiroide.
A anemia em decorrência da deficiência de eritropoietina está rela- ■■ SONO E ENVELHECIMENTO
cionada a movimentos periódicos de membros, que acomete aproxima- Queixas relacionadas ao sono são frequentes entre os pacientes idosos,
damente 20% dos pacientes com doença renal terminal e constitui um
embora o sono precário não seja inerente à senescência. A precocidade na
preditor de prognóstico ruim. A síndrome das pernas inquietas na uremia
identificação das alterações do sono em idosos se justifica pela possibili-
tende a ser refratária ao tratamento convencional e à suplementação de
dade de se diagnosticar condições neurológicas, psiquiátricas ou clínicas.
ferro, e deteriora a qualidade de vida do paciente. Com o transplante renal
Ademais, o sono alterado em idosos favorece a fragilidade nos domínios
pode-se obter melhora na arquitetura do sono e na síndrome das pernas
físico, psicológico e social, aumenta o risco de quedas e corrobora para a
inquietas.
morbimortalidade.
A presença de respiração de Cheyne-Stokes é frequente em porta-
Alterações fisiológicas do sono em idosos podem decorrer de al-
dores de insuficiência renal (IR). Em casos de AOS, picos de hipertensão
terações circadianas, como avanço de fase, o que faz com que o idoso
arterial têm sido descritos; a realização de hemodiálise à noite e o uso
passe a despertar antes do nadir da curva de oscilação da temperatura
de CPAP têm-se mostrado benéficos em pacientes com doença renal
terminal. corpórea durante o sono. O sono de ondas lentas é o primeiro a sofrer
redução, e o tempo acordado após o início do sono tende a aumentar.
DOENÇAS ENDÓCRINAS Observa-se aumento da latência do sono, fragmentação e redução da
eficiência do sono.
Aumento da resistência das VAS e AOS são frequentes no hipotiroidismo
Cochilos fisiológicos aumentam com o avançar da idade. Cochilos bre-
e na acromegalia. O mixedema no hipotiroidismo e a macroglossia na
acromegalia contribuem para o aumento das partes moles na faringe. ves favorecem a função cognitiva na senescência, e cochilos com duração
Apneia central do sono ocorre em até um terço dos pacientes com acro- maior do que 15 minutos refletem alterações quantitativas ou qualitativas
megalia. do sono e estão relacionados a doença cardiovascular e aumento de mor-
A fadiga é um sintoma importante do hipotiroidismo, e algum grau bimortalidade.
de AOS foi descrita em 50% dos casos. No hipertiroidismo, no entanto, a Quanto à noctúria, estima-se que até 60% dos indivíduos com mais
insônia e a sudorese noturna são características. de 70 anos urinem duas ou mais vezes durante o período de sono noturno,
No diabetes melito (DM), por sua vez, o ronco habitual e os distúrbios o que pode comprometer a qualidade do sono e acarretar fadiga diurna.
respiratórios do sono ocorrem em até 34% dos pacientes, inclusive em Dentre as condições clínicas que propiciam a noctúria, destaca-se hiper-
mulheres e homens jovens, em especial quando a neuropatia autonômica trofia benigna da próstata no homem e a deficiência de estrogênio na mu-
se faz presente. Além da disautonomia, os distúrbios do sono podem se lher. A noctúria no idoso pode ainda ser manifestação de infecção urinária,
associar a anormalidades no controle central da ventilação, que se expres- calculose renal, hipercalcemia, DM, IR, bexiga hiperativa ou neurogênica.
sam por hipoventilação periódica. A desmopressina tem sido cogitada como opção terapêutica, uma
Indivíduos idosos e obesos que apresentam menor proporção de vez que a noctúria em idosos se associa à redução na secreção de ar-
sono profundo apresentam maior risco para o diabetes tipo 2. A AOS ginina-vasopressina durante o sono – no entanto, seu uso pode levar à
contribui para o aumento da resistência periférica à glicose de forma in- hiponatremia.
222 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
imunização mais rápida. É também o esquema recomendado para pacientes pode ser utilizada até 6 anos e 11 meses. Doses de reforço a cada 10 anos
com doença renal crônica, hemodialisados, imunocomprometidos, inclusive devem ser mantidas com a vacina dupla adulto (dT), por toda a vida. A via
aqueles que vivem com HIV/Aids, porém com o dobro da dose habitual. de administração é intramuscular profunda.
A vacina é recomendada na rotina para gestantes de qualquer faixa
etária, não imunizadas previamente, em qualquer idade gestacional. O es- EVENTO ADVERSO
quema é de três doses, devendo-se considerar o histórico vacinal anterior. As vacinas tríplice de células inteiras são seguras, embora induzam com fre-
A apresentação pediátrica (0,5 mL) é recomendada até 19 anos e a quência uma série de eventos indesejáveis, geralmente de leve a moderada
adulta (1 mL) acima de 20 anos. A vacina é aplicada via intramuscular (IM) intensidade, relacionados ao componente pertussis. São frequentes dor,
profunda, de preferência no vasto lateral da coxa, até dois anos de idade, hiperemia, edema e enduração no local da aplicação, além de febre baixa.
e no deltoide em crianças maiores e adultos. A região glútea deve ser evi- Mais raramente, podem-se desenvolver sintomas mais intensos, como cho-
tada (principalmente em adultos) por suscitar resposta imune diminuída. ro persistente e febre alta (<1%). Esses eventos não contraindicam doses
Sabe-se que pessoas imunocompetentes, imunizadas adequadamen- subsequentes da vacina, devendo-se ter precaução na administração da
te, não necessitam de doses de reforço da vacina contra a hepatite B. Nos próxima dose, com uso de antitérmicos nas primeiras 24 a 48 horas.
hemodialisados, os níveis de anticorpos anti-HBs devem ser monitorados
periodicamente, e uma dose de reforço deve ser administrada quando as CONTRAINDICAÇÕES
concentrações de anti-HBs forem menores do que 10 mUI/mL. Constituem contraindicações da vacina DTP:
crianças com quadro neurológico em atividade;
■■ ROTAVÍRUS crianças que tenham apresentado qualquer uma das seguintes
manifestações, após sua aplicação: convulsões até 72 horas; epi-
Dois tipos de vacina rotavírus estão disponíveis: uma preparada com vírus
sódio hipotônico-hiporresponsivo até 48 horas; encefalopatia nos
humanos atenuados (monovalente); e outra por reagrupamento de rota-
primeiros sete dias; reação anafilática.
vírus bovino e humano (pentavalente). A vacina utilizada na rotina do ser-
Nos casos de convulsões e episódio hipotônico-hiporresponsivo, a
viço público no Brasil é a de rotavírus humano, monovalente, G1P[8], que
DTP pode ser substituída por DT (dupla infantil) ou DTP do tipo acelular.
demonstrou proteção cruzada em relação a outros sorotipos não G1. No
Nos casos de encefalopatia, utilizar somente DT. Naqueles casos de reação
setor privado, está disponível também a vacina pentavalente, G1,G2, G3,
anafilática, é contraindicada a utilização de todos os componentes da DTP
G4, P[8], Ambas as vacinas são bem toleradas e seguras.
ou DTP acelular.
A vacina rotavírus é administrada por via oral. O esquema recomen-
As vacinas acelulares contra a coqueluche contêm apenas componen-
dado da vacina rotavírus monovalente é de duas doses, aos 2 e 4 meses
tes antigênicos de B. pertussis altamente purificados. Possuem eficácia
de idade, simultaneamente com as vacinas pentavalente (DTP/Hib/HepB),
comparável à de células inteiras, porém apresentam um melhor perfil de
pneumocócica conjugada e pólio inativada. O intervalo mínimo entre as
reatogenicidade. Podem ser utilizadas como alternativa à vacina de célu-
duas doses da vacina rotavírus é de quatro semanas.
las inteiras, seguindo o mesmo esquema, ou em substituição à DTP em
a 1ª dose deve ser aplicada aos 2 meses de idade: idade mínima 1
crianças que apresentaram eventos adversos, como convulsão e episódio
mês e 15 dias; idade máxima 3 meses e 15 dias;
hipotônico-hiporresponsivo.
a 2ª dose deve ser aplicada aos 4 meses de idade: idade mínima 3
A vacina para coqueluche em adultos, na forma de tríplice bacteriana
meses e 7 dias; idade máxima 7 meses e 29 dias.
acelular tipo adulto (dTpa), tem sido utilizada como estratégia para contro-
A vacina rotavírus pentavalente é administrada em três doses, aos 2,
le dos casos graves de coqueluche em lactentes jovens, já que, na maior
4 e 6 meses. A idade máxima para a terceira dose é de 8 meses e 0 dia.
parte das vezes, a fonte de infecção deles é o adulto com quem convivem.
Ambas as vacinas não devem ser aplicadas fora desses prazos. Tam-
A vacinação da gestante, entre 27 e 36 semanas de idade gestacional, traz
bém, caso ocorram vômitos ou regurgitação logo após a administração da
benefícios adicionais por meio da proteção materna e pela passagem de
vacina, não deverá ser dada uma nova dose.
anticorpos transplacentários ao recém-nascido. O PNI introduziu em 2014
A vacina rotavírus não deve ser administrada em pessoas com reação
a vacina dTpa para grávidas, que deve ser aplicada em todas as gestações.
anafilática aos componentes da vacina em dose anterior e também está
contraindicada para pacientes com imunodeficiência grave (imunodefi-
ciência combinada espontânea [SCID]). ■■ HAEMOPHILUS INFLUENZAE TIPO B
A vacinação contra o Haemophilus influenzae tipo b (Hib) é indicada para
todas as crianças até cinco anos de idade. Acima dessa idade, a vacina é
ATENÇÃO!
recomendada apenas para pessoas com risco aumentado para a infecção:
O uso da vacina rotavírus está contraindicado em crianças e recém- imunodeficientes, incluindo aqueles que vivem com HIV/Aids, asplenia
-nascidos hospitalizados, pelo risco teórico de disseminação do vírus anatômica ou funcional, deficiência de complemento, hemoglobinopa-
vacinal no ambiente hospitalar. tias, diabetes melito, nefropatias, cardiopatias e pneumopatias crônicas
(incluindo asma moderada ou grave), fístula do LCS, fibrose cística, im-
plante de cóclea, doenças de depósito, doença neurológica incapacitante
e transplantados. Para essas indicações, a vacina está disponível nos CRIEs
■■ DIFTERIA, TÉTANO E PERTUSSIS (COQUELUCHE) até 19 anos de idade.
A prevenção da difteria, do tétano e da coqueluche é realizada na roti- O Ministério da Saúde recomenda na rotina o esquema de três do-
na com a vacina tríplice (DTP), inativada e composta de toxoide diftérico, ses no primeiro ano de vida, dispensando o reforço para crianças hígidas,
toxoide tetânico e suspensão de Bordetella pertussis mortas, de células mantido, no entanto, para crianças com risco aumentado para infecção,
inteiras. A vacinação consiste em três doses para imunização primária, aos incluindo prematuros nascidos com menos de 33 semanas de gestação.
2, 4 e 6 meses de idade, além de um reforço aos 15 a 18 meses e, adicio- Atualmente, utiliza-se na rotina vacina Hib combinada com a vacina
nalmente, um segundo reforço entre 4 e 6 anos de idade. A vacina DTP DTP e hepatite B (quíntupla ou “pentavalente”), o que permite facilitar o
226 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
emprego racional na rotina. Outras combinações da Hib com DTP acelular Com o intuito de reduzir o risco de eventos adversos graves relaciona-
e pólio inativada (quíntupla ou “pentavalente”) ou acrescida de hepatite dos à VOP, o Brasil, desde 2012, adotou o esquema sequencial de imuniza-
B (sêxtupla ou “hexavalente”) também estão disponíveis no setor privado. ção, utilizando nas duas primeiras doses (2 e 4 meses) a vacina inativada
De modo geral, vacinas combinadas com DTP acelular apresentam uma (VIP) e, nas doses subsequentes (6 e 15 meses), a vacina oral (VOP). A
resposta diminuída para o componente haemophilus. Assim, crianças que partir de 2016, todo o esquema primário é feito com a VIP (2, 4 e 6 meses),
fazem uso dessas vacinas combinadas (pentavalente ou hexavalente), com mantendo-se os reforços aos 15 meses e 4 anos com a VOP bivalente.
pertussis acelular, devem receber dose de reforço da vacina Hib após um
ano de idade. PNEUMOCOCO
Dispõe-se atualmente de dois tipos de vacinas pneumocócicas: a polissa-
■■ POLIOMIELITE carídica 23 valente; e as conjugadas 10 e 13 valentes.
Existem dois tipos de vacinas licenciadas contra poliomielite: a oral ate- VACINA PNEUMOCÓCICA POLISSACARÍDICA 23
nuada (Sabin) e a injetável, inativada (Salk). Para ambas, recomenda-se o
VALENTE
esquema de três doses, iniciando-se aos dois meses, com intervalo de dois
meses (2, 4 e 6 meses) seguido de duas doses de reforço, aos 15 meses e Contém polissacarídeos capsulares de 23 sorotipos (1, 2, 3, 4, 5, 6B, 7F,
um segundo reforço entre 4 e 6 anos. 8, 9N, 9V, 10A, 11A, 12F, 14, 15B, 17F, 18C, 19A, 19F, 20, 22F, 23F e 33F),
responsáveis por aproximadamente 90% dos sorotipos causadores de
doença invasiva em países desenvolvidos.
■■ VACINA ORAL CONTRA POLIOMIELITE É administrada em dose única (0,5 mL) via IM ou SC, acima dos dois
A partir de 2016, a vacina oral utilizada passou a ser a bivalente, contendo anos de idade. É recomendada somente para os seguintes grupos de risco:
concentrações apropriadas dos poliovírus I e III, atenuados (VOP). Com a anemia falciforme, asplenia anatômica ou funcional, síndrome ne-
erradicação global do poliovírus tipo II, a Organização Mundial da Saúde frótica ou insuficiência renal crônica, imunodeficiências, hemoglo-
(OMS) recomendou que todos os países, simultaneamente, passassem a binopatias, indivíduos vivendo com HIV/Aids, fístula do LCS;
utilizar vacinas orais sem este componente. Habitualmente, duas gotas doenças crônicas: cardiovascular, pulmonar e hepática; diabetes
correspondem a uma dose. Não há necessidade de jejum prévio e nenhu- melito;
ma restrição deve ser feita ao aleitamento materno. Deve-se adiar a vaci- adultos acima de 60 a 65 anos.
nação caso a criança apresente vômitos ou diarreia e aplicar nova dose se No caso de esplenectomias eletivas ou pacientes que se submeterão à
houver regurgitação ou vômito após a vacinação. quimioterapia, a vacina deve ser aplicada pelo menos duas semanas antes
da intervenção. Após o procedimento quimioterápico, deve-se aguardar
EVENTOS ADVERSOS três meses para vacinação.
Por se tratar de uma vacina de vírus vivo atenuado, pode ocasionar, Crianças vacinadas antes dos 10 anos de idade devem ser revacinadas
eventualmente, raros casos de paralisia em pessoas vacinadas ou em seus após 3 a 5 anos. A revacinação é indicada após cinco anos para pessoas
contactantes, por reversão da virulência do vírus vacinal, especialmente que continuam em condição de risco, sendo recomendada uma única re-
nas primeiras doses. Assim, constituem contraindicações para a VOP pa- vacinação.
cientes imunodeficientes ou crianças hígidas em contato domiciliar com
imunodeficientes.
LIMITAÇÕES
Por se tratar de vacina polissacarídica, não induz resposta imune eficiente
em crianças abaixo de dois anos de idade, não é capaz de gerar resposta-
■■ VACINA INATIVADA CONTRA A POLIOMIELITE -dependente de linfócitos T e, portanto, não produz efeito de memória.
Vacina trivalente composta por cepas inativadas de poliovírus tipo I, II e III Não há também, entre os vacinados, redução no estado de portador do
(VIP). Deve ser administrada via IM, isolada ou em combinação com vaci- pneumococo em nasofaringe.
nas acelulares, hemófilos e hepatite B. O uso da vacina inativada elimina o
risco de paralisia associada à vacina.
■■ VACINAS PNEUMOCÓCICAS CONJUGADAS
A conjugação de polissacarídeos capsulares a proteínas carreadoras foi ca-
■■ ESQUEMA VIP E VOP paz de modificar a resposta imune e superar algumas limitações da vacina
No Brasil, a vacinação contra a poliomielite por muitos anos foi realizada 23 valente. Vacinas conjugadas induzem resposta imune já em lactentes
com uso exclusivo da vacina pólio oral atenuada trivalente (VOP) na rotina, jovens, a partir de dois meses de idade, geram memória imunológica e
acrescida de duas campanhas de vacinação contra poliomielite ao ano, em reduzem o estado de portador da bactéria, levando, portanto, a uma re-
crianças menores de cinco anos. dução dos casos da doença não só na população vacinada, como também
As elevadas coberturas vacinais obtidas com essa estratégia permi- em outros grupos etários (proteção coletiva).
tiram a erradicação da doença no Brasil, com o último caso ocorrido em No Brasil, dispõem-se de duas vacinas pneumocócicas conjugadas:
1989. Poucos países ainda mantêm a circulação endêmica do vírus, com vacina pneumocócica 10 valente – adotada no PNI, contempla
risco de sua exportação, o que nos obriga a manter sempre elevadas co- dez dos principais sorotipos causadores de doenças invasivas:
berturas vacinais, evitando o risco de reintrodução da doença. 1, 4, 5, 6B, 7F, 9V, 14, 18C, 19F e 23F. Tem licenciamento para
Entretanto, apesar do sucesso obtido com a VOP, eventos indesejá- uso em crianças menores de cinco anos. Na rotina do PNI, é ad-
veis evidenciados comprometem a segurança do uso continuado da vacina ministrada para crianças de até dois anos de idade, porém está
oral. Além da paralisia associada à vacina, surtos de pólio paralítica por disponível até os 4 anos para aqueles que não receberam a vacina
poliovírus derivados da vacina (vírus vacinais que sofreram mutação gené- previamente;
tica – VDPV) estão sendo identificados a cada ano, sobretudo em regiões vacina pneumocócica 13 valente – disponível apenas nos serviços
com baixa cobertura vacinal. privados de imunização, acrescenta, em sua composição, os so-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 227
rotipos 3, 6A e 19A, além dos dez sorotipos da vacina 10 valente. A vacina meningocócica C conjugada ao CRM 197 está disponível no
Pode ser aplicada em crianças e adolescentes de até 17 anos de PNI desde 2010 para todas as crianças menores de dois anos de idade e
idade. deve ser aplicada via IM de rotina, no esquema 3, 5 e 12 meses de idade.
Crianças acima de um ano de idade recebem dose única. Embora ainda
ESQUEMA não adotadas pelo PNI, as sociedades científicas recomendam doses de
Ambas as vacinas conjugadas devem ser aplicadas via IM segundo o es- reforço aos cinco e 10 anos de idade, devido à queda de anticorpos.
quema apresentado na Tabela 22.2. Estão disponíveis também, apenas no setor privado, vacinas menin-
gocócicas conjugadas quadrivalentes contendo os sorogrupos ACYW.
Uma delas, que utiliza o CRM 197 como carreador proteico, está licenciada
TABELA 22.2 ■ Esquema para administração das vacinas no Brasil a partir de dois meses de idade no esquema 3, 5, 7 e 15 meses,
pneumocócicas e outra, conjugada ao TT, está licenciada somente a partir de um ano de
vida em dose única. Seu uso é recomendado preferencialmente, sempre
IDADE NA 1ª DOSE SÉRIE PRIMÁRIA REFORÇO que possível, pelas sociedades científicas, sobretudo para crianças e ado-
lescentes que se dirigem para locais com circulação de outros sorogrupos
2-6 meses 3 doses, intervalo de 1 dose, entre
contidos na vacina. É administrada via IM.
2 meses ou 12-15 meses
2 doses, intervalo de A vacina contra o meningococo B, desenvolvida através da tecnologia
2 meses da vacinologia reversa, também é recomendada pelas sociedades cientí-
ficas, idealmente no primeiro ano de vida, no esquema de quatro doses:
7-11 meses 2 doses, intervalo de 1 dose, entre 3, 5, 7 e 15 meses de idade. Crianças maiores de um ano e adolescentes
2 meses 12-15 meses devem receber duas doses da vacina com intervalo de um a dois meses
entre elas.
12-23 meses 2 doses, intervalo de —
2 meses
■■ SARAMPO, CAXUMBA E RUBÉOLA
24-60 meses 1 dose —
Em 2003, foi introduzida no calendário do PNI a vacina tríplice viral (SCR),
24-72 meses em dose única, administrada aos 12 meses de idade, para imunização con-
Saudáveis 1 dose — tra sarampo, caxumba e rubéola. Em 2004, incluiu-se a segunda dose da
Doença de base 2 doses, intervalo de — vacina tríplice viral no calendário, entre 4 e 6 anos de idade, para suprir as
2 meses falhas primárias da vacina e evitar o aparecimento de surtos com acúmulo
de suscetíveis. Em 2013, o PNI antecipou a segunda dose da vacina tríplice
viral para 15 meses, preparando o calendário para a introdução da vacina
Crianças de risco, após dois anos de idade, vacinadas com vacina
varicela, combinada com sarampo, caxumba e rubéola (tetraviral – SCRV)
pneumocócica conjugada 10V ou 13V, devem receber uma dose da vacina
em 2014. Portanto, o esquema recomendado atualmente é de duas doses:
polissacarídica 23 valente dois meses após a vacina conjugada, com o in-
12 meses (SCR) e 15 meses (SCRV).
tuito de ampliar a cobertura de sorotipos.
A vacina tríplice viral contém vírus vivos atenuados. As cepas vacinais
A vacina pneumocócica conjugada 13 valente foi também licencia-
do sarampo e da caxumba são cultivadas em fibroblastos de embrião de
da para uso em adultos acima de 50 anos de idade. Para imunização de
5 galinha, ao passo que a cepa RA 27/3 da rubéola, em células diploides
pacientes de risco, o Centers for Disease Control and Prevention (CDC)
humanas. Além de estabilizadores, apresenta na sua composição, antibió-
recomenda seu uso em associação com a polissacarídica 23 valente. Deve-
ticos como neomicina ou kanamicina. É administrada via SC.
-se aplicar inicialmente uma dose da vacina conjugada e, após dois meses,
Graças a extensos programas de vacinação, o Brasil recebeu o certi-
uma da vacina 23 valente. Uma segunda dose da vacina 23 valente, quan-
ficado de eliminação do sarampo, da rubéola e da síndrome da rubéola
do indicada, deverá ser administrada cinco anos depois.
congênita.
■■ FEBRE AMARELA com um ou mais fatores de risco, quais sejam, asma, fibrose cística ou
A vacina febre amarela contém vírus vivo atenuado, cepa 17DD, cultivado outras doenças pulmonares crônicas; cardiopatia hemodinamicamente
em embrião de galinha. É aplicada em dose única, via SC, a partir dos significativa; doenças ou terapêutica imunossupressora; infecção pelo
nove meses de idade (mínimo seis meses). Cerca de 2 a 5% dos vacinados HIV; anemia falciforme e outras hemoglobinopatias; doenças que reque-
podem apresentar, a partir do sexto dia, febre, cefaleia e mialgia. Raros rem terapia prolongada com ácido acetilsalicílico (AAS) (artrite reumatoide
casos de eventos adversos graves, com manifestações neurológicas ou [AR], doença de Kawasaki) pelo risco aumentado de desenvolverem sín-
viscerotrópicas, foram descritos, incluindo óbitos. drome de Reye pós-influenza; disfunção renal crônica; doença metabólica
Assim, a recomendação de vacinação do Ministério da Saúde tem crônica, incluindo DM; hepatopatia crônica; doença neurológica crônica
como foco áreas de risco de aquisição da doença e viajantes que se diri- incapacitante; e trissomias.
gem a esses locais: Indivíduos de qualquer idade portadores de doenças crônicas, ges-
vacinar a população residente nas áreas endêmicas com indicação tantes, puérperas, profissionais da saúde e idosos constituem grupo de
de vacinação a partir dos nove meses de idade com um único refor- risco para influenza e devem também ser vacinados anualmente.
ço aos 4 anos; para aqueles maiores de cinco anos, não previamen- Além dessas indicações, a vacinação de crianças, adolescentes e adul-
te vacinados, estão indicadas duas doses com intervalo de 10 anos; tos sadios pode ser feita quando desejada.
viajantes que se dirigirem para regiões endêmicas devem ser vaci- Nos últimos anos, tornou-se disponível, em clínicas privadas, vacinas
nados a partir dos nove meses de idade e uma segunda dose deve quadrivalentes, que contemplam duas linhagens de vírus influenza B, au-
ser dada após 10 anos se o risco permanecer; a vacinação deve mentando a proteção da vacina.
ocorrer no mínimo dez dias antes da viagem.
deve-se evitar a administração simultânea das vacinas febre ama- ■■ VARICELA
rela e tríplice viral, por prejuízo da imunogenicidade. De forma ge-
A vacina varicela é uma vacina de vírus vivo atenuado que contém a cepa
ral, vacinas de vírus vivos, quando não administradas no mesmo
OKA, desenvolvida no Japão em 1974. É indicada a partir de um ano
dia, devem observar um intervalo mínimo de quatro semanas, à
de idade, com taxa de soroconversão para crianças saudáveis acima de
exceção da vacina oral contra a poliomielite;
95%. Espera-se uma eficácia de 70 a 80% na proteção de formas leves
como qualquer vacina de vírus vivos, deve-se ter precauções, ava-
da doença, e de 95 a 100% na de formas moderadas a graves. É reco-
liando o risco/benefício para uso em gestantes e portadores de
mendada uma segunda dose da vacina contra varicela, com o intuito de
imunodeficiência congênita ou adquirida.
reduzir falhas vacinais primárias e secundárias. Para essa segunda dose,
Há descrição de casos de passagem do vírus vacinal da febre amarela
deve-se respeitar um intervalo mínimo de três meses após a primeira
por meio do leite materno; por isso, a vacina está contraindicada em mu-
dose.
lheres que estejam amamentando crianças abaixo de seis meses de idade.
Na pós-exposição, a vacina é efetiva em contactantes suscetíveis
Se a vacinação não puder ser adiada e houver necessidade de vacinar uma
quando aplicada até 3 a 5 dias após o contágio, podendo evitar a doença
nutriz no primeiro semestre de vida do bebê, deve-se suspender o aleita-
ou propiciar a ocorrência de formas mais brandas. Nessas situações, tem-
mento materno por pelo menos 15 dias.
-se a opção de antecipar a aplicação da vacina para crianças já a partir de
nove meses, com vacina específica de um dos produtores (GSK).
■■ INFLUENZA
As vacinas contra influenza utilizadas no Brasil são constituídas de vírus EVENTOS ADVERSOS
inativados cultivados em ovo (split ou subunitária) contendo duas cepas Pouco frequentes, ocorrem em aproximadamente 4 a 5% das crianças sau-
de influenza A e uma de influenza B. A composição da vacina é determi- dáveis e em cerca de 10% dos adultos. Pode haver febre e aparecimento
nada anualmente pela OMS, de acordo com as cepas de vírus circulantes. de exantema vesicular discreto.
A vacina está contraindicada para pessoas com imunodeficiência
ESQUEMA (principalmente do tipo celular), HIV sintomático, indivíduos em uso de
A vacina é aplicada via IM a partir dos seis meses de idade segundo o imunossupressores e gestantes.
esquema da Tabela 22.3. Havendo disponibilidade, a vacina contra varicela deve ser recomen-
dada a todas as crianças, conforme calendários da SBP e SBIm.
Influenza Dose única anual de rotina Disponível apenas a vacina trivalente, oferecida
Os maiores de 60 anos fazem parte do grupo de risco aumentado para anualmente em campanha de vacinação
as complicações e óbitos por influenza. Desde que disponível, a vacina
influenza quadrivalente é preferível à vacina influenza trivalente, por
conferir maior cobertura das cepas circulantes
Pneumocócica Iniciar com uma dose da vacina conjugada 13-valente seguida de uma Vacina polissacarídica 23-valente dose única em
dose da vacina polissacarídica 23-valente seis a doze meses depois, e Campanha e reforço após 5 anos, para pacientes
uma segunda dose de 23-valente cinco anos depois da primeira acamados ou institucionalizados
Triplice bacteriana Com esquema de vacinação básico para tétano completo: reforço com Disponível apenas a dT (dupla bacteriana do tipo adulto)
do tipo adulto tríplice bacteriana acelular (dTpa) a cada 10 anos Com esquema de vacinação básico para tétano
Com esquema de vacinação básico para tétano incompleto: uma dose incompleto: uma dose de dT qualquer momento e
de dTpa a qualquer momento e completar a vacinação básica com completar a vacinação básica com uma ou duas doses de
uma ou duas doses de dT (dupla bacteriana do tipo adulto) de forma a dT de forma a totalizar três doses de vacina contendo o
totalizar três doses de vacina contendo o componente tetânico componente tetânico
Hepatite A Após avaliação sorológica, duas doses no esquema de 2 a 6 meses Na população com mais de 60 anos, é incomum encontrar
indivíduos suscetíveis. Para esse grupo, portanto, a
vacinação não é prioritária e não está disponível de rotina
Febre amarela Uma dose para residentes ou viajantes para áreas de vacinação (de Mesma indicação
acordo com classificação do MS e da OMS). Se persistir o risco, fazer
uma segunda dose 10 anos após a primeira. Vacinar pelo menos 10
dias antes da viagem
Meningocócica Surtos e viagens para área de risco. Uma dose da vacina conjugada Não disponível
ACWY
Triplice viral É considerado protegido o indivíduo que tenha recebido, em algum Não disponivel
momento da vida, duas doses da vacina tríplice viral acima de 1 ano de
idade, e com intervalo mínimo de um mês entre elas. Está indicada em
situações de risco aumentado, já que a maioria das pessoas nessa faixa
etária não é suscetível a essas doenças
Herpes-zóster Dose única em maiores de 50 anos, inclusive aqueles que já Não disponível
apresentaram a doença
Em seguida, de maneira resumida, serão apresentadas as características camada de polissacarídeos complexos que protege o micro-organismo da
específicas de algumas das vacinas utilizadas na população idosa. fagocitose. Os pneumococos são subdivididos em 90 tipos sorológicos de
acordo com a estrutura química dos polissacarídeos, pois estes são os an-
■■ VACINA CONTRA O PNEUMOCOCO tígenos que induzem a formação de anticorpos protetores específicos. Os
sorotipos mais frequentemente associados à doença invasiva nos Estados
As síndromes clínicas mais importantes causadas pelo pneumococo são a
Unidos são 4, 6B, 9V, 14, 18C, 19F e 23F. No Brasil, além desses, são im-
pneumonia, a bacteremia e a meningite. A doença pneumocócica invasiva
portantes os sorotipos 1 e 5.
é definida pelo isolamento do pneumococo em locais normalmente esté-
reis, como sangue, líquido pleural ou LCS.
VACINA
As infecções pneumocócicas são mais comuns nos extremos da vida
(em menores de 2 anos e maiores de 65 anos). É importante salientar que Existem atualmente duas opções estabelecidas para a vacina pneumocóci-
doenças crônicas cardiovasculares, pulmonares, hepáticas ou renais, bem ca: as vacinas polissacarídicas e as conjugadas.
como as neurológicas e a imunodepressão são fatores de risco bem esta- As primeiras são compostas por antígenos purificados de 23 soroti-
belecidos. pos, indicadas pelo Ministério da Saúde para indivíduos com mais de 60
Assim, em comparação com adultos saudáveis, pessoas com doenças anos que vivem acamados ou em instituições fechadas (clínicas geriátri-
cardíacas, pulmonares crônicas ou diabetes mellitus têm risco de 3 a 6 cas, hospitais, asilos, casas de repouso). É administrada em dose única
vezes maior de doença pneumocócica invasiva. É evidente, portanto, a durante a Campanha Nacional de Vacinação contra a gripe, com uma dose
importância de vacinar idosos. adicional após cinco anos da dose inicial.
O S. pneumoniae pertence ao gênero Streptococcus, família Strepto- Apesar da cobertura ampla dos principais sorotipos, essa vacina induz
coccaceae. Tratam-se de bactérias gram-positivas, encapsuladas por uma resposta imunológica dependente de linfócitos B (T independente), por-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 231
tanto com memória de curta duração. Em idosos e pessoas com doenças ■■ VACINA CONTRA DIFTERIA, TÉTANO E
crônicas, a resposta sorológica à vacina é ainda pior do que os adultos, po- COQUELUCHE
rém a recomendação da vacinação é mantida pelo alto risco para doença
pneumocócica grave. TÉTANO
As vacinas pneumocócicas conjugadas proporcionam maiores níveis
O tétano é doença infecciosa, não contagiosa, geralmente de início agudo,
de anticorpos e resposta mais duradoura. A conjugação dos polissacaríde-
resultante da solução de continuidade de pele ou mucosa, com conse-
os do pneumococo a uma proteína transportadora resulta em um antígeno
quente contaminação pelo bacilo Clostridium tetani. Caracteriza-se por
que pode induzir uma resposta imunológica T dependente, estimulando
espasmos dolorosos, rigidez muscular e disautonomia, causados pela te-
a produção de anticorpos e a indução de memória, portanto capaz de
tanospasmina, potente neurotoxina bacilar.
gerar resposta booster de longa duração. No entanto, alguns sorotipos
A contaminação do homem se dá pelo contato de ferimentos com
identificados em infecções pneumocócicas em adultos acima de 50 anos,
locais em que existem esporos. Não ocorre disseminação da doença por
na Vigilância Epidemiológica de Streptococcus pneumoniae, na América
contato com pessoa infectada. Na presença de baixas concentrações de
Latina (Sireva), não fazem parte da constituição das vacinas conjugadas
oxigênio, como em tecidos necróticos, os esporos germinam e produzem
hoje disponíveis no Brasil, mas estão contidos na vacina polissacarídica
uma neurotoxina responsável pelas manifestações clínicas.
23-valente.
A letalidade é bastante elevada, principalmente na faixa etária geriá-
Duas vacinas conjugadas estão licenciadas no Brasil, a 10 e a 13-va-
lente. No calendário do Ministério da Saúde, a vacina conjugada (10 va- trica, devido à diminuição da resposta imunológica própria da imunosse-
lente) é recomendada apenas para crianças. A Sociedade Brasileira de nescência e ao fato do idoso apresentar maiores taxas de déficit psico-
1
Geriatria e Gerontologia e a Sociedade Brasileira de Imunizações seguem motor e de percepção do espaço e, nesse sentido, estar mais propenso a
as recomendações americanas do CDC e do Advisory Committee on Immu- acidentes.
2
nization Practices (ACIP), que preconizam que o uso da vacina conjugada, Os casos atuais ocorrem em adultos que nunca foram vacinados ou
quando seguida de uma aplicação da vacina polissacarídica, permite uma não receberam reforço adequadamente 5 ou 10 anos antes da lesão (de-
resposta de reforço, conforme mostrado no Quadro 22.2. pendendo da gravidade do caso).
Tanto a vacina polissacarídica quanto a conjugada são administradas
por via intramuscular. São bem toleradas, e os eventos adversos mais co- DIFTERIA
muns são os locais (dor, eritema), que regridem rapidamente e são mais A difteria é uma doença infecciosa aguda, causada pelo bacilo toxigênico
comuns na revacinação. Essa evidencia fez com que o CDC ampliasse o Corynebacterium diphtheriae. Caracteriza-se por placas pseudomembra-
intervalo entre as doses. nosas típicas que frequentemente se alojam nas tonsilas, na faringe, na
laringe, no nariz, em outras mucosas e na pele. A principal forma de trans-
missão ocorre por contato direto com pessoa acometida ou de portadores
ATENÇÃO! com pessoa suscetível pelas secreções oronasais eliminadas por tosse,
Efeitos graves como anafilaxia são raros, mas são motivo para con- espirro ou ao falar. A transmissão indireta por fômites é pouco frequente,
traindicar a vacinação. mas pode ocorrer.
O número de casos notificados no Brasil vem diminuindo progressiva-
mente ao longo dos anos em decorrência do aumento do uso da vacina.
QUADRO 22.2 ■ O uso da vacina conjugada, quando seguida de uma aplicação da vacina polissacarídica, permite uma resposta de reforço
≥ 6 a 12 meses
≥ 6 a 12 meses
Pneumo 23V antes de 65 anos de idade Pneumo 13V ≥ 65 anos de idade Pneumo 23V
≥ 6 a 12 meses ≥ 6 a 12 meses
≥ 5 anos
232 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Baixa, a letalidade é maior nas faixas etárias abaixo de 5 e acima dos 40 O vírus influenza pode ser classificado em três tipos imunológicos (A,
anos. A maioria dos casos se dá em não imunizados. Um dos fatores para B e C), mas apenas os tipos A e B têm relevância clínica em humanos.
que casos graves de difteria ainda ocorram em várias partes do mundo é O envelope do vírus é composto por uma dupla camada lipídica e
a falta de vacinação de rotina. Alguns dados sugerem que na idade senil pelas glicoproteínas hemaglutinina (HA) e neuraminidase (NA). Esses dois
existe maior proporção de pessoas com título sorológico inadequado de antígenos desempenham funções fundamentais durante o ciclo replicativo
anticorpos para proteção contra a doença. do vírus e podem sofrer intensas alterações estruturais, propiciando as
mutações virais que auxiliam o vírus a escapar de anticorpos desenvol-
COQUELUCHE vidos pela vacinação prévia ou infecções e são responsáveis pelos surtos
A coqueluche é uma doença que acomete as vias respiratórias, causada periódicos da doença.
pela bactéria Bordetella pertussis. As pandemias por influenza têm sido constantes na história e, apesar
A transmissão se da pelo contato direto da pessoa infectada com de todo o avanço tecnológico, continua sendo uma ameaça. A gripe é uma
indivíduos suscetíveis e evolui em três fases. A fase catarral inicia-se com das últimas doenças com potencial epidêmico/pandêmico que ainda per-
manifestações que podem ser confundidas com uma gripe (febre, coriza, manece sem controle adequado e, assim, novas epidemias são possíveis
mal-estar e tosse seca). Em seguida, a tosse se torna contínua e em crises, e esperadas.
e esses acessos são finalizados por inspiração forçada e prolongada ou A última pandemia de influenza ocorreu em 2009, na qual o influenza
vômitos. Na convalescença, os acessos de tosse desaparecem e dão lugar vírus A H1N1/09 responsável por milhões de mortes em todo mundo. Em
à tosse comum. 2016, observa-se já um aumento do número de casos de síndrome respira-
O número de casos vem aumentando em diversos países, inclusive tória aguda grave (SRAG), iniciado já no mês de março com predomínio de
no Brasil, em adolescentes e adultos jovens, porém a maior preocupação casos confirmados pelo mesmo vírus da pandemia de 2009.
são com os lactentes que costuma desenvolver as formas mais graves da
doença. VACINA
No Brasil, as vacinas disponíveis são constituídas por vírus inativados e
VACINA
fragmentados, portanto sem risco de infectar o paciente. Para a produção
Não existe vacina monovalente contra a difteria ou coqueluche. As vacinas dessas vacinas, o vírus é inoculado em ovos embrionados de galinha, puri-
hoje disponíveis para idosos são a combinação do toxoide tetânico com ficado e inativado pelo formaldeído. As vacinas são trivalentes, compostas
o diftérico (dT), disponíveis apenas na rede pública, e a a vacina acelular de três cepas influenza: dois subtipos e um subtipo de B, conforme orien-
com o componente pertusis (dTpa), disponível apenas na rede privada. tação da OMS das cepas mais prevalentes no ano anterior.
A recomendação para idosos nunca vacinados, com esquema incom- Vacinas quadrivalentes, com duas linhagens do influenza vírus B (ate-
pleto ou sem história vacinal conhecida é de três doses, sendo a primeira nuada e inativada), já estão disponíveis no sistema privado, com a vanta-
com a dTpa seguida de duas doses de dT (dois e de quatro a oito meses gem de oferecer maior cobertura.
depois). Na rede pública, são feitas três doses da dT. A vacina com adjuvante pode ser utilizada na população de idosos
Para todos os idosos já vacinados com três doses, indica-se uma dose com boa resposta imune, o que compensaria a resposta imune deficien-
de reforço a cada 10 anos (dTpa ou dT). Em casos de ferimentos graves, te pela própria imunossenescência. As vacinas utilizadas pelo Programa
deve-se antecipar a dose de reforço quando a última dose administrada Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde não contêm adjuvantes,
foi há mais de cinco anos. A dose preconizada é de 0,5 mL, aplicada via disponíveis apenas no sistema privado.
intramuscular profunda. A composição viral da vacina para ser utilizada no ano de 2016 é um
A vacina está recomendada inclusive para aqueles que já tiveram al-
vírus similar ao vírus influenza A/California/7/2009 (H1N1) pdm09, um ví-
guma das três doenças, uma vez que a proteção conferida pela infecção
rus similar ao vírus influenza A/Hong Kong/4801/2014 (H3N2) e um vírus
não é permanente.
similar ao vírus influenza B/Brisbane/60/2008. As vacinas influenza qua-
As reações locais, como eritema e enduração, geralmente são leves
drivalentes deverão apresentar também um vírus similar ao influenza B/
e não necessitam de tratamento. Eventualmente, em pessoas com relatos
Phuket/3073/2013.
de vacinações frequentes ou altos títulos de anticorpos, podem ocorrer
Os anticorpos protetores são detectados, geralmente, cerca de duas
reações locais exageradas. Sintomas sistêmicos e reações alérgicas gra-
semanas após a vacinação, e o pico máximo do título de anticorpos, de 4
ves são incomuns. Foram descritos alguns casos de síndrome de Guillain-
a 6 semanas. A proteção conferida pela vacinação é de, aproximadamen-
-Barré e neurite braquial após vacinação com o toxoide tetânico, porém
te, um ano. Em idosos, estima-se que a prevenção de doença respiratória
são situações muito raras.
aguda seja de, aproximadamente, 60%, no entanto os reais benefícios
Para aqueles com trombocitopenia ou qualquer distúrbio de coagula-
da vacina estão na capacidade de prevenir a pneumonia viral primária
ção, há risco de sangramento pela via de administração da vacina intra-
ou bacteriana secundária, a hospitalização e a morte, principalmente em
muscular, casos em que a via subcutânea deve ser considerada.
pessoas com doenças crônicas cardiovasculares e pulmonares.
No Brasil, o Ministério da Saúde realiza a Campanha Nacional de
■■ VACINA CONTRA INFLUENZA Vacinação contra Influenza, contemplando os grupos de risco, entre eles
A gripe é uma infecção do trato respiratório caracterizada por estabele- idosos acima de 60 anos.
cimento repentino de febre, indisposição, dores de cabeça, mialgia e tos-
se. O quadro geralmente é autolimitado e o indivíduo com influenza não
complicada apresenta melhora progressiva dos sintomas em 2 a 5 dias. No ATENÇÃO!
entanto, em idosos, essa doença passa a ter grande importância, uma vez A revacinação anual é recomendada devido à queda da imunidade e à
que essa faixa etária é de risco para infecções graves, aumentando a morbi- variedade de cepas predominantes.
mortalidade em uma população que já tem de lidar com doenças crônicas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 233
(proteção individual) e não é fonte de disseminação da infecção na comu- entre eles o Brasil, mas continua ocorrendo em alguns países europeus,
nidade (proteção coletiva).5 asiáticos e africanos. A vacina de SCR deve ser administrada para os viajan-
De acordo com a OMS a vacinação de viajantes compreende as vaci- tes não previamente vacinados, a fim de evitar que estes indivíduos adqui-
nas de rotina, recomendadas para todos os indivíduos, de acordo com a ram essas infecções e reintroduzam os vírus em locais já sob controle.5 Para
faixa etária, independente da viagem; as vacinas obrigatórias e as vacinas crianças que viajam para áreas de alto risco, a vacinação pode ser feita a
de uso seletivo para viajantes. partir de seis meses de idade. Neste caso, se vacinada antes dos 12 meses
de idade, a criança deve ser revacinada aos 12 meses de vida.
Por ser vacina de vírus vivos atenuados a vacina de sarampo é contrain-
■■ VACINAS DE ROTINA
6
dicada em pacientes imunocomprometidos. Mas pode ser dada, com míni-
As vacinas de rotina recomendadas pela Organização Mundial de Saúde mo risco, se o viajante não estiver usando medicações imunossupressoras.7
para os viajantes compreendem: difteria; tétano; coqueluche; hepatite B; Essas vacinas podem ser oferecidas a pessoas vivendo com HIV/Aids se a
Haemophilus influenzae tipo b; poliomielite; rotavirus; tuberculose (BCG); contagem de células CD4 for ≥25% da contagem específica para a idade.
sarampo; caxumba; rubéola; varicela; papilomavirus humano (HPV); in- Ainda em relação à vacinação de sarampo, é importante enfatizar a
fluenza sazonal e vacina pneumocócica (Tabela 22.4). necessidade da vacinação de profissionais que atuam no setor de turismo,
Antes do início da viagem, tanto crianças quanto adultos devem estar motoristas de táxis, funcionários de hotéis e restaurantes, e outros que
com o calendário vacinal de rotina, para a idade, atualizado. A consulta mantenham contato com viajantes.
pré-viagem é um bom momento para atualizar as vacinas dos viajantes. As vacinas pólio são recomendadas para viajantes que se dirijam
Se houver necessidade de atualizar o calendário vacinal, as vacinas a regiões onde estejam ocorrendo casos de poliomielite. Pessoas já pre-
devem ser aplicadas no mínimo 10 a 15 dias antes da viagem, para asse- viamente vacinadas com a vacina oral pólio (VOP), de vírus vivos, devem
gurar que o viajante chegue ao seu destino com níveis de proteção ade- tomar uma dose de reforço. Adultos não vacinados previamente com VOP
quados. No caso de doses de reforço, a proteção é imediata. 6
preferentemente devem receber a vacina inativada pólio (VIP). Gestantes,
Algumas vacinas de rotina merecem considerações particulares, como, viajantes imunodeprimidos e seus contatos devem sempre receber VIP. A
por exemplo, a vacina sarampo, caxumba e rubéola (SCR). A transmis- vacinação desses viajantes, além da proteção individual, previne a reintro-
são dos vírus do sarampo e da rubéola está interrompida em vários países, dução do vírus selvagem, que já não circula em todas as Américas.
TABELA 22.4 ■ Vacinação de rotina indicada para todos os viajantes, independentemente do destino
Difteria, Tétano e Coqueluche Toxoides diftérico e tetânico e células inteiras de Esquema básico de três doses e uma dose de reforço a
(DTP, DTPa, dTpa) Bordetella pertussis infantil (DTP) cada 10 anos
Difteria e Tétano ou
(Dupla adulto ou dT) Toxoides diftérico e tetânico e antígenos de Bordetella
pertussis (acelular) infantil (DTPa)
Toxoides diftérico e tetânico com hidróxido de alumínio
como adjuvante adulto (dT)
ou
Toxoides diftérico e tetânico e antígenos de Bordetella
pertussis (acelular) adulto (dTpa)
Sarampo, Caxumba e Rubéola Vírus vivos atenuados Até 19 anos: duas doses com intervalo mínimo de 28 dias
(SCR ou Tríplice Viral ou MMR) Nos maiores de 19 anos: uma dose
Haemophilus influenzae tipo b Vacina polissacarídica conjugada com proteína Para crianças: esquema de acordo com a idade
Varicela Vírus vivos atenuados Uma ou duas doses de acordo com a idade
Poliomielite Vírus vivos atenuados (VOP) Para crianças: esquema de acordo com a idade
ou
Vírus inativados (VIP)
Rotavirus Vírus vivos atenuados Para crianças: esquema de acordo com a idade
HPV Vacina obtida por engenharia genética Esquema de acordo com a idade
Vacina pneumocócica Vacina polissacarídica conjugada com proteína Esquema de acordo com a idade
ou
Vacina polissacarídica
Fonte: World Health Organization.6
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 235
Em especial para adultos, que frequentemente não estão com esque- Os viajantes devem ser vacinados se:
ma de vacinação atualizado, deve ser lembrada a vacina de tétano, com- São provenientes de regiões endêmicas para febre amarela e visi-
binada com difteria (dT) ou combinada com difteria e pertussis acelular tam um país que exige vacinação como condição de entrada. Esta
(dTpa). Devem ser enfatizadas para viajantes que irão realizar atividades exigência ocorre em países onde circulam vetores transmissores do
de ecoturismo ou turismo de aventura pelo risco de trauma e acidentes. vírus da febre amarela, mas não há circulação do vírus selvagem.
A vacina Hepatite B é recomendada para todos e, particularmente, Com a vacinação de viajantes provenientes de regiões endêmicas
para viajantes missionários, profissionais de saúde, trabalhadores voluntá- esses países evitam a entrada do vírus da febre amarela em seu
rios, professores, estudantes de longa permanência em áreas de risco (trau- território, sendo essa uma medida de proteção coletiva. Nessa
mas/acidentes) e os que fazem turismo de aventura e sexual. Esquema alter- situação, para entrada nesses países, a vacinação é obrigatória.
nativo com três doses nos dias 0 – 7 – 21 e uma quarta dose após 12 meses Alguns países endêmicos para febre amarela, na África, também
pode ser administrado aos viajantes de “último minuto”, como são chama- exigem vacinação. Desde 11/07/2016, o certificado internacional
dos os viajantes que procuram orientação pouco tempo antes da viagem. de vacinação de uma dose de vacina de febre amarela é válido
A vacina Influenza deve ser considerada para todas as crianças por toda a vida da pessoa.6 A lista de países que exigem vacina
maiores de seis meses de idade que viajam durante a estação da influen- de febre amarela deve ser consultada no site da World Health Or-
za. É recomendada particularmente para viajantes internacionais que vão ganization* por aqueles que visitarão uma região onde há risco de
realizar viagem aérea prolongada; permanecer em locais fechados com exposição à febre amarela. Mesmo não sendo medida obrigatória
aglomeração de pessoas; fazer viagens de negócio de um hemisfério para os viajantes devem ser vacinados, para proteção individual. A Fi-
outro. É enfaticamente recomendada para passageiros e tripulação de cru- gura 22.1 mostra as áreas no Brasil com recomendação de vacina
8
zeiros marítimos. de febre amarela , e a Figura 22.2, áreas no mundo com risco de
9,10
aquisição de febre amarela.
Por ser vacina de vírus vivos atenuados, deve ser evitada em pacien-
■■ VACINAS OBRIGATÓRIAS
tes imunocomprometidos e gestantes. Viajantes imunodeprimidos e ges-
A Tabela 22.5 reúne as vacinas obrigatórias necessárias ao viajante.' tantes devem ser alertados dos riscos de visitar áreas de transmissão ativa
6
de febre amarela.
Embora as vacinas de vírus vivos não devam ser administradas em
TABELA 22.5 ■ Vacinas de uso seletivo para viajantes disponíveis viajantes imunodeprimidos, há exceção para as vacinas de febre amarela
no Brasil 11
e SCR, em determinadas circunstâncias. Essas vacinas podem ser ofereci-
VACINA COMPOSIÇÃO DOSES das a pessoas vivendo com HIV/Aids se a contagem de células CD4 for ≥
25% da contagem específica para a idade.
Hepatite A Vírus inativados Duas doses com intervalo As vacinas FA e SCR não devem ser administradas simultaneamente
de seis meses em crianças ≤ 2 anos de idade, devendo-se observar um intervalo de 30
dias entre elas. Em pessoas > 2 anos de idade, podem ser administradas
Meningocócica Conjugada C Esquema de acordo com 12
juntas. Devem ser aplicadas no mínimo 10 a 15 dias antes da viagem,
(polissacarídeo capsular a idade
para assegurar que o viajante chegue ao seu destino com níveis de prote-
conjugado a proteína),
ção adequados.
Conjugada ACWY e
Idosos de 60 anos ou mais podem ser vacinados para febre amarela
Polissacarídica AC
Proteica meningocócica B com segurança. Antes da vacinação deve-se perguntar cuidadosamente
sobre condições que possam comprometer a resposta imune e o risco de
13
Raiva Vírus inativados Pré exposição: 3 doses exposição ao vírus.
(0, 7 e 21 a 28 dias) Viajantes gravemente imunodeprimidos podem receber certificado
internacional de isenção da vacinação da febre amarela e devem seguir
Febre amarela Vírus vivos atenuados OMS – 1 dose
rigorosamente as medidas de proteção contra os mosquitos.
Ministério da Saúde: 2
doses: aos 9 meses e 4
anos de idade ATENÇÃO!
> 4 anos: duas doses
com intervalo de 10 anos Vacinas meningocócicas ACYW e pólio. São exigidas pela Arábia
Saudita para peregrinos (Hajj e Umrah), e atualizações sobre essa exi-
Febre tifoide Polissacarídica de Inativada: uma dose IM
gência devem consultadas no site da World Health Organization**.
antígeno Vi de Salmonella ou
typhi purificado Bactérias vivas: orais,
ou 03 comprimidos ou 04
Bactéria viva atenuada doses (líquida) em dias ■■ VACINAS DE USO SELETIVO PARA VIAJANTES
cepa Ty21a (comprimido alternados
A indicação de vacinação do viajante deve sempre levar em consideração,
ou solução)
além do(s) local(ais) de destino, a duração da viagem, o tipo de acomoda-
Fonte: World Health Organization.6 ção e transporte e as condições de saúde do indivíduo.
As seguintes vacinas de uso seletivo para viajantes estão atualmente VACINA HEPATITE A
disponíveis no Brasil: Hepatite A; Doença Meningocócica; Raiva; Febre Vacina de vírus inativados. Recomendada para crianças e adultos que via-
amarela; Febre Tifoide (Tabela 22.6). Entre as vacinas não disponíveis no jam para países em desenvolvimento ou regiões com saneamento básico
Brasil, (na saúde pública ou na saúde suplementar), citam-se: Cólera; He- deficitário.
patite E; Encefalite Japonesa. Esquema vacinal recomendado para crianças > 12 meses de idade
e adultos: duas doses com intervalo de 6 meses entre elas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 237
Não está indicada para viagens de curta duração mesmo para áreas 5. Chinwa Lo S, Mascheretti M, Chaves Tdo S, Lopes MH. Vacinação dos
endêmicas. viajantes: experiência do Ambulatório dos Viajantes do Hospital das
Esquema de vacinação: Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Rev Soc
Dukoral®: para crianças > seis anos de idade e adultos: duas do- Bras Med Trop. 2008;41(5):474-8.
ses, por via oral, com intervalo de sete a 42 dias. Para crianças de 6. World Health Organization. International travel and health: vaccines
[Internet]. Geneva: WHO; c2016 [capturado em 29 nov. 2016]. Disponível
dois a cinco anos de idade, são recomendadas três doses.
em: http://www.who.int/ith/vaccines/en/.
Shanchol®: a partir de 2 anos de idade; duas doses com intervalo
7. Committee to Advise on Tropical Medicine and Travel (CATMAT). The
de 14 dias. Recomendado reforço após 2 anos.
immunocompromised traveller. An Advisory Committee Statement (ACS).
Can Commun Dis Rep. 2007;33(ACS-4):1-24.
VACINA HEPATITE E 8. Brasil. Ministério da Saúde. Orientações quanto à vacinação contra a
Vacina constituída de uma proteína recombinante do capsídeo viral. Licen- febre amarela [Internet]. Brasília: MS; 2014 [capturado em 29 nov. 2016].
6
ciada e só disponível na China. Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/o-ministerio/
principal/leia-mais-o-ministerio/427-secretaria-svs/vigilancia-de-a-a-z/
VACINA ENCEFALITE JAPONESA febre-amarela/l1-febre-amarela/10771-vacinacao-febre-amarela.
9. World Health Organization. Yellow fever vaccination recommendations in
Vacina inativada (nova): JE IC-51 (Jespect/Ixiaro): cultivada em células
the Americas, 2013 [Internet]. Geneva: WHO; 2013 [capturado em 29 nov.
Vero. Indicada para > 18 anos de idade, por via IM. Não há relatos de
6 2016]. Disponível em: http://gamapserver.who.int/mapLibrary/Files/Maps/
eventos adversos graves. ITH_YF_vaccination_americas.png?ua=1.
Vacina Chimerivax – JE (Sanofi Pasteur): liofilizada, recombinan- 10. World Health Organization. Yellow fever vaccination recommendations in
te, atenuada. Incorpora genes do vírus da Encefalite Japonesa em cepa Africa, 2015 [Internet]. Geneva: WHO; 2015 [capturado em 29 nov. 2016].
atenuada do vírus da febre amarela. Considerada, nos estudos pré-lan- Disponível em: http://gamapserver.who.int/mapLibrary/Files/Maps/ITH_YF_
çamento, altamente imunogênica e segura. Recentemente licenciada na vaccination_africa.png?ua=1.
6
Austrália e na Tailândia. 11. Rubin LG, Levin MJ, Ljungman P, Davies EG, Avery R, Tomblyn M, et al. 2013
A vacina Encefalite Japonesa é recomendada em viagens de longa IDSA clinical practice guideline for vaccination of the immunocompromised
duração para áreas rurais (especialmente fazendas com criação de suínos), host. Clin Infect Dis. 2014;58(3):309-18.
durante a estação de transmissão da doença pelo mosquito Culex. Na 12. Nascimento Silva JR, Camacho LA, Siqueira MM, Freire Mde S, Castro YP,
Austrália, a transmissão ocorre predominantemente de dezembro a maio, Maia Mde L, et al. Mutual interference on the immune response to yellow
e no Japão, India e China, de maio a outubro. fever vaccine and a combined vaccine against measles, mumps and rubella.
Vaccine. 2011;29(37):6327-34.
Sua indicação deve ser considerada para viajantes com extensa ativi-
13. Miyaji KT, Luiz AM, Lara AN, Chaves TSS, Piorelli RO, Lopes MH, et al. Active
dade ao ar livre, que inclui acampamento, ciclismo, por tempo prolongado.
assessment of adverse events following yellow fever vaccination of persons
aged 60 years and more. Hum Vaccin Immunother. 2013;9(2):277-82.
REVISÃO 14. World Health Organization. Meningococcal meningitis, countries or areas
at risk, 2014 [Internet]. Geneva: WHO; 2015 [capturado em 29 nov. 2016].
Tendo surgido em países desenvolvidos, a medicina de viagem se pre- Disponível em: http://gamapserver.who.int/mapLibrary/Files/Maps/Global_
ocupava inicialmente com o deslocamento de cidadãos desses países MeningitisRisk_ITHRiskMap.png?ua=1&ua=1&ua=1.
para áreas menos desenvolvidas do mundo. Atualmente, sua prática 15. Health conditions for travellers to Saudi Arabia for the pilgrimage to Mecca
fundamenta-se na redução de riscos individuais e coletivos, para via- (Hajj), 2016. Wkly Epidemiol Rec. 2016;91(26-27):331-5.
jantes tanto de países desenvolvidos como em desenvolvimento.
A prevenção de agravos à saúde e o controle da disseminação de
doenças são os principais objetivos da medicina de viagem.
23
A vacinação do viajante tem como finalidade não só a proteção in-
dividual, mas também a coletiva: o indivíduo imunizado não contrai
a infecção (proteção individual) e não é fonte de disseminação da
infecção na comunidade (proteção coletiva). SAÚDE DOS POVOS
De acordo com a OMS, a vacinação de viajantes compreende as va-
cinas de rotina (recomendadas para todos os indivíduos, de acordo
INDÍGENAS NO BRASIL
com a faixa etária, independente da viagem), as vacinas obrigató-
rias e as vacinas de uso seletivo para viajantes.
■■ DOUGLAS RODRIGUES
■■ MARCOS SCHAPER DOS SANTOS JUNIOR
■■ REFERÊNCIAS
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Microbiol Infect. 2010;16(3):201-2.
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Aconselhamento pré-viagem aos voluntários com destino ao Haiti. Relato ciações que baixaram em cerca de 50 metros o nível do mar, colonizando
da experiência do Ambulatório dos Viajantes do Hospital das Clínicas da inicialmente o Alasca e a América do Norte e, posteriormente, ocupando o
FMUSP. Rev Med (São Paulo).2014;90(2):90-3. restante do continente americano.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 239
TABELA 23.1 ■ Distribuição da população indígena de acordo com as regiões administrativas, 2010, Brasil
Contudo, nem todas as pesquisas consideram essa migração a única A população indígena residente em áreas urbanas representa quase
fonte de povoamento das Américas. Sítios arqueológicos no sudeste do a metade dos indígenas recenseados em 2010. A emigração das aldeias
Piauí, na Bahia e em Minas Gerais mostram indícios de ocupação humana para as cidades e a reemergência de etnias que se mantiveram invisíveis
no Brasil com datações de até 25.000 anos. Assim, a presença humana até poucos anos contribuem para o aumento da presença indígena nas
na América do Sul pode ser da mesma época que a da América do Nor- cidades. Existem no Brasil 50 municípios em que a maioria da população
te, sugerindo que possam ter ocorrido outras formas de migração, além é indígena (Tabela 23.2).
da terrestre pelo estreito de Bering e Alasca. A travessia do Pacífico com
barcos, por navegação costeira e entre ilhas não está descartada, à se- ■■ PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DOS POVOS
melhança do que teria ocorrido na ocupação da Austrália há 50 mil anos.
INDÍGENAS NO BRASIL
Embora possam divergir nos números e nas rotas migratórias, há consenso
de que o continente americano era intensamente povoado por ocasião da Os povos indígenas apresentam, em geral, precárias condições de vida e
chegada dos europeus àquela região. saúde, diretamente relacionadas aos processos históricos de mudanças
sociais, culturais, econômicas e ambientais que vivenciaram. Seus indica-
Estudos que estimaram a população das Américas, devido à chegada
dores de saúde demonstram iniquidade e refletem a exclusão social que
dos europeus ao continente, em 1492, caracterizam-se pela grande va-
marca sua relação com a sociedade envolvente. Essa situação repercute no
riabilidade de estimativas que vão de 1 a 8,5 milhões de habitantes nas
perfil epidemiológico pela emergência de doenças crônicas não transmis-
terras baixas da América do Sul. Em virtude da chegada dos portugueses,
havia, no Brasil, entre 1 milhão e 6,8 milhões de pessoas na Amazônia, no
Brasil Central e costa do Nordeste, o que equipararia a densidade demo-
gráfica do Brasil à da Península Ibérica em 1500. TABELA 23.2 ■ Municípios brasileiros com mais de 50% da
população composta por indígenas, 2010
60,00
50,00
40,00 Brasil
Indígenas
30,00
20,00
10,00
0,00
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
FIGURA 23.1 ■ Coeficiente de mortalidade infantil (CMI) na população indígena no Brasil (2000 a 2012).*
*Dados mais atuais disponíveis.
Fonte: Ministério da Saúde – Sistema de informação sobre mortalidade (SIM).
síveis, em especial o diabetes tipo 2, em consequência das mudanças na crianças menores de dois anos, chegando, em alguns casos, à prevalência
forma tradicional de viver, coexistindo com altas prevalências de doenças de 92%, como mostrou uma investigação na população infantil da etnia
infecciosas e parasitárias. Suruí de Rondônia. O principal determinante da anemia entre as crianças é
Independente da situação de exclusão, a população indígena total a deficiência de nutrientes na alimentação, em especial o ferro, associada
vem crescendo em ritmo acelerado, acima da média nacional, em virtude a uma elevação da necessidade desse mineral em virtude do crescimento.
de elevadas taxas de fecundidade e queda da mortalidade infantil. Tais Também merecem destaque as doenças infectoparasitárias, sobretudo as
características são consequência de vários fatores, como diminuição das parasitoses intestinais, as diarreias e a malária, na Amazônia. Entre as mu-
epidemias, maior acesso aos serviços de assistência à saúde e demarcação lheres, a anemia interfere nas gestações e nas condições do parto.
de terras indígenas.
As fontes de informação sobre a saúde dos povos indígenas no Brasil ATENÇÃO!
são poucas e dispersas. De acordo com os dados do Ministério da Saúde,2
apesar da redução observada na última década, o Coeficiente de Morta- Apesar de a população indígena apresentar importantes alterações
lidade Infantil (CMI) mantém-se cerca de duas vezes e meia maior entre no perfil de morbimortalidade, as doenças infecciosas e parasitárias
as crianças indígenas (Figura 23.1) do que na população geral do Brasil. continuam sendo uma das principais causas de adoecimento e morte,
Ao contrário das crianças de outra etnia/cor, em que predominam as com destaque para as infecções respiratórias, diarreias, malária, hepa-
causas neonatais, os óbitos em menores de um ano entre as crianças indí- tite e tuberculose.
genas ocorrem por causas pós-neonatais em mais da metade dos casos.
infecções respiratórias agudas (IRpAs), diarreias e desnutrição estão entre Cardoso e colaboradores4 constataram que a taxa anual padronizada
as principais causas de óbitos dessas crianças. de hospitalização global dos Guarani (8,8/100 pessoas), no Sul e no Sudes-
Os estudos sobre as condições nutricionais das crianças indígenas mos- te do Brasil, superou em 70% a correspondente verificada no país (5,2/100
tram prevalências elevadas de desnutrição, acima da média nacional. Entre pessoas). O estudo revela que as infecções respiratórias e diarreias são as
os poucos estudos que avaliaram o peso de nascimento das crianças, encon- principais causas de internação entre as crianças Guarani dessas regiões.
tram-se prevalências que chegam a 30,4%, ao passo que a média nacional As condições de saneamento das áreas indígenas são precárias. A
é de 8,2%. A despeito disso, análises também apontam sobrepeso infantil. falta de locais apropriados para destino dos dejetos leva à alta contami-
Pesquisas sugerem que as alterações do estilo de vida dos indígenas, nação do meio ambiente, e a inexistência de água de boa qualidade para
com a mudança da dieta tradicional, com carboidratos complexos, absor- o consumo, comum em grande número de aldeias, favorece a transmissão
ção rápida dos alimentos industrializados e diminuição da atividade física, de helmintos e protozoários e a contaminação por enterobactérias.
levaram ao surgimento de doenças crônicas, como a obesidade, diabetes A relevância histórica da tuberculose (TB) como causa de óbito entre
tipo II e, doenças cardiovasculares. Entre os Xavante de Mato Grosso, a as populações indígenas é conhecida. Embora revele uma diminuição na
prevalência de DM2 em adultos pode chegar a cerca de 30%.3 taxa de incidência da doença, em relação ao ano de 2000, quando atingiu
Em relação à deficiência de micronutrientes, os estudos limitam-se à 299,8/100.000 habitantes, a Figura 23.2 ilustra a gravidade do problema
avaliação da anemia, que afeta, em especial, mulheres em idade fértil e entre os indígenas no Brasil.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 241
110
Por 100.000 hab.
90
70
50
30
10
2008 2009 2010 2011
Branca Preta Amarela Parda Indígena Total
FIGURA 23.2 ■ Taxa de incidência de tuberculose por 100.000 habitantes segundo a raça/cor, Brasil, 2008 a 2011.*
*Dados mais atuais disponíveis.
Estudos conduzidos em várias regiões do país com diferentes grupos coolismo, drogadição, transtornos psiquiátricos, suicídio e mortes por cau-
5
étnicos revelam altas taxas de incidência de tuberculose. Viana analisou sas externas que são reportados, de forma crescente, em várias regiões.
os registros de tuberculose no Brasil entre 2008 e 2011 e concluiu que,
segundo o critério etnia/cor, revelaram que os indígenas apresentaram as
maiores taxas de incidência. Segundo o autor, houve um crescimento de
■■ ASSISTÊNCIA À SAÚDE DOS INDÍGENAS NO BRASIL
95,4/100.000 em 2008 para 104/100.000 em 2011 (aumento de aproxi- Até o início do século passado, a atenção à saúde dos indígenas no Brasil
madamente 10%). era feita por missionários e religiosos. A partir de 1910, com a criação do
Segundo o Ministério da Saúde,6 no ano de 2007, áreas indígenas Serviço de Proteção ao Índio, substituído em 1967 pela Fundação Nacional
de cinco dos Estados da Amazônia Legal apresentaram índice anual de do Índio (Funai), a assistência aos índios, incluindo a saúde, passou a ser
malária (IPA) acima de 50/1.000 habitantes, fator considerado pela OMS tarefa governamental.
como alto risco de transmissão da doença. No período de 2003 a 2007, A partir de 1999, o Ministério da Saúde implantou uma rede de servi-
houve um aumento de 10.875 para 33.693 casos de malária entre os indí- ços de atenção primária no interior das terras indígenas. Desde 2010, essa
genas da região. Esses números corroboram a importância da malária no rede de serviços conhecida como subsistema de saúde indígena (SasiSUS)
perfil de morbimortalidade da população indígena. São mais vulneráveis está sob a gestão da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), no Mi-
os grupos expostos às frentes de expansão no Norte e no Centro-Oeste, nistério da Saúde. Esse subsistema é formado por 34 territórios sanitários
especialmente no que diz respeito a atividades de mineração e garimpos denominados Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), distribuídos
ilegais, construção de hidrelétricas e aberturas de estradas. por todo o país (Figura 23.3).
Pela relevância do problema, chama atenção a precariedade de infor- Essa rede de serviços tem como finalidade a oferta de serviços de
mações sistematizadas sobre as hepatites virais. Em dezembro de 2006, atenção primária nas aldeias indígenas, tais como: imunização, seguimen-
um inquérito realizado pelo Hospital de Medicina Tropical do Amazonas, to pré-natal, acompanhamento do desenvolvimento das crianças e sanea-
com 10% da população indígena do vale do Javari, encontrou 56% de mento ambiental.
portadores do vírus da hepatite B e 25% portadores da hepatite Delta, Quando indígenas demandam serviços de saúde de maior complexi-
além de quatro indivíduos portadores de hepatite C, vírus anteriormente dade, são encaminhados por um dos distritos sanitários indígenas para
não encontrado na população indígena daquela região. uma referência regional do SUS. As Casas de Saúde do Índio (Casai) exis-
7
Braga e colaboradores avaliaram a presença dos marcadores soroló- tentes em algumas cidades são responsáveis pela hospedagem e presta-
gicos em sete etnias indígenas do Oeste da Amazônia: Apurinã, Kanamari, ção de cuidados de enfermagem a pacientes indígenas e seus acompa-
Deni, Jamamadi. Kulina, Mura-Pirahã, e Paumari. O estudo mostrou uma nhantes durante todo o tratamento médico.
variação entre as etnias de 19,7 a 78,6% (média de 54,5%) de positividade Em virtude do maior acesso dos indígenas aos serviços de saúde con-
de anti-HBc, que indica infecção prévia pelo HBV, e positividade média sequente à implantação do subsistema de saúde indígena, médicos que
de portadores de HBsAg de 9,7%. Os resultados confirmaram o caráter vivem e trabalham em municípios que compõem a área de abrangência
endêmico da infecção pelo HBV na população estudada. de um distrito sanitário indígena ou mesmo em cidades maiores, onde
No panorama de transição epidemiológica rápida que os povos indí- se concentram os serviços especializados, passaram a atender pacientes
genas estão vivenciando, também merecem destaque a ocorrência de al- indígenas com frequência cada vez maior.
242 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
dina e nevirapina, o mais rápido possível (Ver capítulo de Diagnós- coleta de sangue capilar em papel de filtro (exame do pezinho)
tico diferencial de infecções congênitas). Além disso, nesse caso, após 48 horas de vida e antes da alta hospitalar para detecção de
o aleitamento materno deve ser contraindicado até que se afaste fenilcetonúria, hipotiroidismo congênito, doença falciforme e ou-
definitivamente o diagnóstico de infecção materna. tras hemoglobinopatias, fibrose cística, deficiência de biotinidase e
deficiência de 21-hidroxilase;
rastreamento auditivo nos primeiros três meses de idade, de prefe-
■■ IDENTIFICAÇÃO DO RECÉM-NASCIDO
rência antes da alta hospitalar, realizando-se a emissão otoacústi-
Para identificar o RN, deve-se colocar duas pulseiras no RN e uma na mãe, ca e o reflexo coclear;
constando o nome da mãe, o registro hospitalar, a data e hora do nasci- rastreamento de cardiopatia congênita canal-dependente em RN
mento e o sexo do RN. saudável com idade gestacional maior ou igual a 34 semanas,
com 24 a 48 horas de vida, medindo-se a saturação de oxigênio
■■ ALEITAMENTO MATERNO NA 1a HORA DE VIDA no membro superior direito (pré-ductal) e um dos membros infe-
riores (pós-ductal). Espera-se que o RN apresente saturação maior
A amamentação deve ser iniciada, de preferência, na 1a hora após o parto. ou igual a 95% em ambos os membros, com uma diferença de sa-
O contato pele a pele logo após o parto é importante, pois está associado turação entre os dois membros inferior a 3%. Nesse caso, o RN
a maior período de amamentação, melhor interação mãe-bebê e controle pode ser encaminhado para seguimento de rotina. Se a saturação
térmico, além de menor risco de hemorragia materna. for inferior a 95% em qualquer um dos membros e/ou a diferença
A presença de um acompanhante da mãe durante o parto e no de saturação entre os membros for maior ou igual a 3%, realiza-se
pós-parto também auxilia no apoio ao aleitamento, lembrando que uma nova avaliação uma hora depois. Se o resultado for normal, enca-
Lei Federal de 20051 e uma Lei Estadual de 2008 (São Paulo)2 garantem às minha-se o RN para seguimento de rotina e, se o resultado persistir
parturientes o direito à presença de acompanhante durante o trabalho de alterado, solicita-se avaliação ecocardiográfica e do cardiologista.
parto, parto e pós-parto imediato.
ATENÇÃO!
■■ ALOJAMENTO CONJUNTO
O encaminhamento para o alojamento conjunto é indicado nas seguintes Para afastar a cardiopatia canal-dependente, é importante que o exa-
situações: me seja realizado após 24 horas, que é quando aumentam as chances
mãe: ausência de doença que impossibilite ou contraindique o con- de o canal estar fechado. Além disso, é importante que a diferença
tato com o RN; entre a saturação medida nos dois membros (pré e pós-ductal) seja
RN: peso > 2.000 g, IG > 35 semanas com boa vitalidade, capaci- menor do que 3%, indicando que o canal está fechado.
dade de sucção e deglutição e controle térmico.
No alojamento conjunto, devem ser realizados os seguintes cuidados
ao RN: ■■ ALTA HOSPITALAR DO RECÉM-NASCIDO
posicionamento em decúbito dorsal horizontal no berço ao lado
A Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda:3
do leito da mãe;
alta hospitalar de RN a termo, estável, sem intercorrências, após
estímulo e apoio ao aleitamento materno sob livre demanda,
48 horas de vida;
sem restrição de horário com orientação da mãe em suas difi-
retorno ambulatorial 48 a 72 horas após a alta, para avaliar as
culdades; condições de amamentação, evolução de icterícia ou outras inter-
monitoração dos sinais vitais e condições clínicas; corrências.
manipulação com luvas até o primeiro banho, sendo a limpeza feita A extensão da estadia é baseada nas condições clínicas da mãe e do
com água morna e sabão neutro individual, evitando-se a retirada RN, habilidade e confiança da mãe para cuidar de si e de seu filho, suporte
do vérnix caseoso, principalmente em dobras; domiciliar adequado. Todos os esforços devem ser feitos para que mãe e o
primeiro exame físico minucioso, com determinação da idade ges- bebê tenham a alta hospitalar em conjunto.
tacional3 e da adequação do peso à IG;4 É obrigatório preencher a “Declaração de Nascido Vivo” do Ministé-
exame clínico diário, com peso e inspeção do coto umbilical, que rio da Saúde em três vias, fornecendo a via amarela à mãe para regis-
deve ser higienizado com álcool etílico 70% ou clorexidina alcoó- tro da criança no Cartório de Registro Civil. O cartão de alta do RN deve
lica 0,5%, pelo menos três vezes ao dia; conter informações sobre as condições de nascimento, a evolução clíni-
controle da temperatura corpórea, da eliminação de mecônio, diu- ca, os resultados de exames, as hipóteses diagnósticas e os tratamentos
rese e de intercorrências; realizados. A Caderneta de Saúde da Criança,4,5 elaborada e distribuída
aplicação da primeira dose da vacina contra hepatite B antes de 12 pelo Ministério da Saúde, contém orientações sobre o registro gratuito de
horas de vida e, se possível, da BCG (bacilo de Calmette-Guérin) nascimento, o aleitamento materno e os primeiros cuidados após a alta
intradérmica antes da alta hospitalar; hospitalar, além dos aspectos da vacinação, do crescimento e do desen-
exame oftalmológico de rastreamento para catarata congênita ou volvimento da criança.
retinoblastoma: deve ser feito em ambiente escuro, com a luz do
oftalmoscópio incidindo diretamente sobre a pupila, obtendo-se
“reflexo vermelho” semelhante ao observado em fotografias; REVISÃO
teste da linguinha com exame do frênulo lingual para verificar se
Antes do nascimento da criança:
este encontra-se livre. Caso contrário, pode dificultar o aleitamento realizar a anamnese materna com coleta de dados sobre anteceden-
materno e/ou o desenvolvimento da linguagem. Se o frênulo lin- tes clínicos, obstétricos e história da gestação atual;
gual for curto, encaminhar a criança para correção cirúrgica.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 247
grande superfície corpórea em relação ao peso e à pele pouco desenvolvida. sempre que possível, devem receber aleitamento materno em livre deman-
Esses fatores tornam o RNPT suscetível à desidratação e à hipertonicidade. da. Quando a força de sucção não é suficiente para aleitamento materno,
Na Tabela 25.1, constam os volumes hídricos recomendados para adminis- complementa-se com leite da própria mãe, leite humano de banco de leite
tração parenteral, que devem ser ajustados de acordo com balanço hídrico, ou fórmula láctea para prematuros, oferecidos em mamadeira a cada três
volume urinário, controle de gasometria, hematócrito e sódio sérico. horas.
Crianças com idade gestacional < 34 semanas, peso < 1.500 g ou
que apresentem contraindicações para alimentação por VO são alimenta-
TABELA 25.1 ■ Necessidades hídricas diárias (mL/kg/dia) do RNPT das por via gástrica intermitente. O leite administrado é o da própria mãe,
de acordo com a idade gestacional leite humano de banco de leite ou fórmula especial para prematuros. O lei-
te materno deve ser acrescido de aditivos, com o objetivo de aumentar a
IDADE GESTACIONAL oferta de calorias, proteínas e minerais, quando o volume de oferta é igual
(SEMANAS) OFERTA INICIAL 1-2 DIAS > 3 DIAS
ou superior a 100 mL/kg/dia.
< 26 80-90 80-120 120-160 Os volumes iniciais e os incrementos da oferta de leite são de 20 mL/
kg/dia, administrados com intervalos de três horas. A progressão da dieta
26-28 70-80 70-90 100-150 também depende das condições da criança, das necessidades nutricionais
e da presença ou não de resíduo gástrico. O controle de resíduo gástrico é
≥ 28 60-70 60-70 100-150
feito antes de toda alimentação, o volume é de aproximadamente 2 mL e
não deve ter aspecto de líquido de estase.
Anormalidades eletrolíticas, como hipernatremia, hiponatremia e hi- O aumento de volume da dieta é feito até que sejam alcançadas as
perpotassemia, são comuns no pré-termo. A hipernatremia resulta da per- ofertas necessárias para crescimento adequado, ou seja, 120 a 140 kcal/
da excessiva de água ou da administração exagerada de sódio, podendo kg/dia e 3 a 4 g/kg/dia de proteínas. O aditivo do leite humano e a fórmula
ser prevenida ou tratada com oferta hidreletrolítica adequada. A hipona- para pré-termo são mantidos até que a criança atinja peso de pelo menos
tremia pode ser dilucional, por sobrecarga hídrica, ou decorrente da perda 2.000 g, ou até próximo da alta hospitalar. A transição para a VO é gradual
excessiva de sódio, secundária à fração de excreção de sódio aumentada. e se inicia quando a criança está com idade corrigida > 34 semanas, peso
O tratamento é feito com restrição hídrica ou aumento da oferta de sódio, > 1.500 g e boa vitalidade.
dependendo da etiologia. A oferta inicial de sódio é de 3 a 4 mEq/kg/dia, As vitaminas, administradas por VO ou sonda gástrica, são introduzi-
iniciada quando o sódio sérico for inferior a 140 mEq/L. das no 7o dia de vida, sob a forma de polivitamínicos, e mantidas até os 6
A hiperpotassemia (K >7 mEq/L) decorre da baixa taxa de filtração meses. As vitaminas A e D são administradas até 1 ano. A suplementação
glomerular, hipoaldosteronismo relativo, imaturidade dos túbulos renais de ferro é iniciada no 28o dia de vida, por VO ou sonda gástrica, até 2 anos
distais e desvio do K do espaço intra para o extracelular. É tratada com: de idade, com dose de ferro elementar dependendo do peso ao nascer,
administração de gluconato de cálcio 10%, 1 a 2 mL/kg, IV em 5 a 10 sendo de 4 mg/kg/dia para os com peso de nascimento inferior a 1.000
minutos; ou bicarbonato de sódio 3%, 1 a 3 mEq/kg, IV em 10 minutos; ou gramas, 3 mg/kg/dia para os com peso entre 1.000 e 1.500 gramas e 2
insulina simples, 0,2 UI/g de glicose (0,5 g/kg de glicose), IV em pelo me- mg/kg/dia para aqueles com peso entre 1.500 e 2.000 gramas.
nos duas horas; ou furosemida, 2 a 4 mg/kg/dia. As resinas permutadoras
têm baixa eficácia no RN. Recomenda-se diálise peritoneal em situações ■■ CONTROLE DE OUTRAS DOENÇAS
de urgência. A administração de K é iniciada quando o nível sérico é < 4,5
mEq/L, na dose de 1 a 3 mEq/kg/dia. ICTERÍCIA NEONATAL
O RNPT pode apresentar icterícia de início tardio, porém mais prolongada
■■ SUPORTE NUTRICIONAL que o RN a termo e com menor capacidade de ligação da bilirrubina, que
As necessidades nutricionais do RNPT devem ser supridas por via enteral acarreta maior risco de neurotoxicidade pela bilirrubina. Por esses moti-
e/ou parenteral. As crianças com doenças que contraindiquem ou limitem vos, a fototerapia é indicada mais precocemente em RNPT.
a alimentação enteral (desconforto respiratório, enterocolite necrosante,
asfixia perinatal, infecção e malformação congênita graves) devem rece- ANEMIA
ber nutrição parenteral nas primeiras horas de vida, desde que apresen- A anemia é frequente em RNPT, sendo fatores predisponentes: espoliação
tem condições metabólicas e cardiocirculatórias estáveis. sanguínea; perda de sangue por hemorragia ou hemólise; déficit de eritro-
A oferta calórica necessária para manter o crescimento semelhante poetina; baixos depósitos de ferro; e crescimento rápido.
ao intrauterino é de 90 kcal/kg/dia, sendo o mínimo desejável 60 kcal/kg/
dia. A velocidade de infusão de glicose varia de 7 a 14 mg/kg/minuto, para
manter a glicemia entre 40 e 150 mg/dL. As soluções de aminoácidos são ATENÇÃO!
administradas em doses iniciais de 3 g/kg/dia, com incrementos diários
Medidas preventivas da anemia da prematuridade incluem limitação das
até o máximo de 3,5 a 4 g/kg/dia. As emulsões de gordura são infundidas
análises sanguíneas, uso de microtécnicas e uso de oxímetro de pulso.
nas doses iniciais 1 g/kg e com incrementos diários de 0,5 a 1 g/kg até o
máximo de 4 g/kg/dia, de acordo com a trigliceridemia. Também são admi-
nistrados minerais, vitaminas e oligoelementos. Para avaliar a anemia, é feito controle de hematócrito por micromé-
RNPT sem contraindicação para alimentação enteral deve recebê-la todo, todos os dias nos RNs clinicamente instáveis, 2 a 3 vezes por sema-
precocemente. Quando não é possível a nutrição enteral plena, adminis- na em um período intermediário, e toda semana nas crianças em fase de
tram-se pequenos volumes de leite (10 mL/kg/dia) a cada três horas. crescimento.
Crianças com idade gestacional > 34 semanas, peso > 1.500 g e A transfusão de concentrado de glóbulos (15 mL/kg) no período neo-
que apresentam boa vitalidade estão aptas a receber alimentação por VO; natal é indicada para manter hematócrito (Htc) > 42% nos RN com cardio-
250 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
patia congênita cianótica, choque hipovolêmico refratário à expansão de da doença. A retinopatia da prematuridade pode causar comprometimen-
volume, insuficiência cardíaca congestiva (ICC) refratária a fármacos; Htc to da acuidade visual, associando-se à miopia e a estrabismo.
> 36% nos RN com ventilação mandatória intermitente (IMV) e pressão
média de vias aéreas (MAP) (> 8 cmH2O, ICC, cirurgia de grande porte; Htc DEFICIÊNCIA AUDITIVA
> 30% em RN com IMV e MAP ≤ 8 cmH2O, FiO2 > 0,35, cirurgias de mé- RNPT apresenta maior número de intercorrências e procedimentos asso-
dio ou pequeno porte; Htc > 27% nos RN com fração inspirada de oxigê- ciados a risco para deficiência auditiva (asfixia perinatal, hiperbilirrubi-
nio (FiO2), ≤ 0,35, RN com mais de seis episódios de apneia em 12 horas; nemia, processos infecciosos, uso de fármacos ototóxicos, exposição a
taquicardia ou taquipneia sem causa aparente, ganho de peso < 10 g/kg/ ruídos). Recomenda-se avaliação auditiva pelo método de emissão otoa-
dia com oferta calórica adequada; Htc > 23% em RN com clínica de ane- cústica logo após a saída do RN da incubadora e pelo potencial evocado
3
mia ou assintomáticos com reticulócitos < 100.000 UI/mm ou < 2%. Não auditivo de tronco encefálico, para o pré-termo com peso de nascimento
existe recomendação de uso rotineiro de eritropoetina em prematuros. < 1.500 g ou com qualquer fator de risco para perda auditiva.
NASCIMENTO
Gestação a termo? Sim Cuidados de rotina junto à mãe:
Respirando ou chorando? prover calor, manter vias aéreas pérvias e avaliar
Tônus muscular em flexão? a vitalidade de maneira contínua
Não
Prover calor
Posicionar cabeça
Aspirar vias aéreas s/n
Secar
Sim Sim
VPP
60 segundos Monitorar SatO2 pré-ductal
Monitorar SatO2
(Minuto de Ouro) Considerar CPAP
Considerar monitor para avaliar FC
FC < 60 bpm?
Sim
Intubação traqueal
Massagem cardíaca coordenada com ventilação
adequada (3:1)
Considerar O2 a 100%
Avaliar FC contínua com monitor
Considerar cateterismo venoso
FC < 60 bpm?
Sim
Adrenalina endovenosa
Considerar hipovolemia
MANTER NORMOTERMIA
■■ ASSISTÊNCIA AO RN DE TERMO COM BOA mento favorece o início precoce da amamentação e aumenta a chance
VITALIDADE AO NASCER do aleitamento materno exclusivo ser bem-sucedido nos primeiros me-
ses de vida.
Se, ao nascimento, o RN é de termo (idade gestacional 37-41 semanas),
está respirando ou chorando e com tônus muscular em flexão, indepen-
dentemente do aspecto do líquido amniótico, ele apresenta boa vitali- ■■ PASSOS INICIAIS DA ESTABILIZAÇÃO/REANIMAÇÃO
dade e deve continuar junto de sua mãe depois do clampeamento do E AVALIAÇÃO NO RN ≥ 34 SEMANAS
cordão umbilical. Na sala de parto, enquanto o RN está junto à mãe, Os pacientes com idade gestacional diferente do termo, recém-nascidos
prover calor, manter as vias aéreas pérvias e avaliar a sua vitalidade de que não iniciam movimentos respiratórios regulares e/ou aqueles em que
maneira continuada. O contato pele-a-pele entre mãe e bebê ao nasci- o tônus muscular está flácido precisam ser conduzidos à mesa de reani-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 253
mação, indicando-se os passos iniciais da estabilização na seguinte se- cerca de 1-2 minutos após o nascimento, desde que haja débito cardíaco
quência: prover calor, posicionar a cabeça em leve extensão, aspirar boca suficiente, com perfusão periférica. Os valores desejáveis de SatO2 variam
e narinas (se necessário) e secar o corpo e o polo cefálico, desprezando de acordo com os minutos de vida e encontram-se no Quadro 26.1. Quan-
os campos úmidos. Tais passos devem ser executados em, no máximo, do o RN não melhora e/ou não atinge os valores desejáveis de SatO2 com
30 segundos. a VPP em ar ambiente, recomenda-se sempre verificar e corrigir a técnica
Recomenda-se que a temperatura axilar do RN seja mantida entre da ventilação antes de oferecer oxigênio suplementar. A necessidade de
36,5-37,5ºC (normotermia) desde o nascimento até a internação no alo- oxigênio suplementar é excepcional em RN ≥ 34 semanas, se a VPP é feita
jamento conjunto ou na unidade neonatal. Para diminuir a perda de calor com a técnica adequada.
nesses pacientes, é importante pré-aquecer a sala de parto e a sala onde Para ventilar o RN na sala de parto, é preciso sempre contar com o
serão realizados os procedimentos de estabilização/reanimação, com tem- balão autoinflável. Trata-se do único equipamento de ventilação em sala
peratura ambiente de 23-26ºC. de parto que não necessita de fonte de gás comprimido para funcionar.
A fim de assegurar a permeabilidade das vias aéreas, manter o pesco- A pressão inspiratória máxima é variável, podendo ser monitorada por
ço do RN em leve extensão. A aspiração está reservada aos pacientes que manômetro nos modelos em que este é disponível, sendo limitada pela
apresentam obstrução em vias aéreas por excesso de secreções. No caso válvula de escape, que deve estar ativada em 30-40 cmH2O para evitar
de RN que foram levados à mesa de reanimação por não serem de termo o barotrauma. O equipamento não provê CPAP nem pressão positiva ao
ou por não apresentarem respiração regular ou por hipotonia, se o líquido final da expiração (PEEP) confiável, mesmo que tenha uma válvula de PEEP.
amniótico for meconial, é prudente, durante a realização dos passos ini- O balão autoinflável fornece concentração de oxigênio de 21% (quando
ciais, aspirar a boca e as narinas. não está conectado à fonte de oxigênio e ao reservatório) ou de 90-100%
Uma vez feitos os passos iniciais, avalia-se a respiração e a frequência (conectado à fonte de oxigênio a 5L/minuto e ao reservatório). A oferta de
cardíaca (FC). A respiração espontânea está adequada se os movimentos concentrações intermediárias de oxigênio varia de acordo com o fabrican-
respiratórios são regulares e suficientes para manter a FC > 100 bpm. Se te do balão, o fluxo de oxigênio, a pressão exercida no balão, o tempo de
o paciente não apresentar movimentos respiratórios, se eles forem irregu- compressão e a frequência aplicada.
lares ou o padrão for tipo gasping (suspiros profundos entremeados por Quanto à interface entre o equipamento para ventilação e o pacien-
apneias), a respiração está inadequada. A FC é o principal determinante da te, pode-se utilizar a máscara facial, a máscara laríngea ou a cânula tra-
decisão de indicar as diversas manobras de reanimação. Fazer a avaliação queal. No Brasil, as salas de parto dispõem, em geral, da máscara facial e
inicial da FC, logo após os passos iniciais, por meio da ausculta do precór- da cânula traqueal. O emprego de máscara de tamanho adequado, de tal
dio com o estetoscópio, considerando-se adequada a FC > 100 bpm. Se a forma que cubra a ponta do queixo, a boca e o nariz, é fundamental para
FC for < 100 bpm ou o RN não apresenta movimentos respiratórios regu- obter um bom ajuste entre face e máscara. O selo entre face e máscara é
lares, enquanto um profissional de saúde inicia a ventilação com pressão crítico para o sucesso da ventilação. As cânulas traqueais devem ser de
positiva (VPP), o outro fixa os três eletrodos do monitor cardíaco para a diâmetro uniforme, sem balão, com linha radiopaca e marcador de corda
monitoração subsequente da FC e o sensor do oxímetro para a monitora- vocal. Em neonatos com idade gestacional entre 34-38 semanas e peso
ção da saturação de oxigênio. Vale ressaltar que, na avaliação feita pelo de 2.000-3.000 g, indica-se a cânula de diâmetro interno de 3,5 mm; e
monitor cardíaco nos minutos iniciais depois do nascimento, o objetivo para os > 38 semanas ou > 3.000 g, a cânula de 3,5-4,0 mm. Deixar
primário é o acompanhamento da FC e não a detecção de ritmos anômalos sempre à disposição uma cânula de diâmetro superior e outra inferior
no traçado eletrocardiográfico. àquela escolhida.
Nos RN em que foram realizados os passos iniciais da estabilização
e a avaliação mostrou respiração espontânea e regular e FC > 100 bpm, VPP COM MÁSCARA FACIAL
sempre que possível, ainda na sala de parto, deixá-lo em contato pele-a- A ventilação pulmonar é o procedimento mais importante e efetivo na
-pele com a mãe. Naqueles RNs em que foram realizados os passos iniciais reanimação do RN em sala de parto. A VPP está indicada na presença de
da estabilização e a avaliação a seguir mostrou respiração ausente ou ir- apneia, respiração irregular e/ou FC <100 bpm, após os passos iniciais. A
regular ou FC < 100 bpm, iniciar a VPP nos primeiros 60 segundos após ventilação com balão autoinflável deve, de maneira geral, ser iniciada por
o nascimento e acompanhar a FC pelo monitor cardíaco, e a SatO2, pelo meio de máscara facial.
oxímetro de pulso. Antes de iniciar a ventilação propriamente dita, sempre verificar se o
pescoço do RN está em leve extensão e aplicar a máscara na face, no sen-
tido do queixo para o nariz. Envolver as bordas da máscara com os dedos
■■ VENTILAÇÃO COM PRESSÃO POSITIVA indicador e polegar, formando a letra “C”, para fixá-la na região correta.
O ponto crítico para o sucesso da reanimação é a ventilação adequada, O ajuste adequado é obtido por uma leve pressão na sua borda. Os dedos
fazendo com que os pulmões se inflem e, com isso, haja dilatação da médio, anular e mínimo formam a letra “E”. O selo entre face e máscara é
vasculatura pulmonar e hematose apropriada. Assim, após os cuidados crítico para o sucesso da ventilação.
para manter a temperatura e a permeabilidade das vias aéreas do RN, a O emprego da VPP com balão autoinflável e máscara é feito na
presença de apneia, respiração irregular e/ou FC < 100 bpm indica a VPP. frequência de 40-60 movimentos/minuto, de acordo com a regra práti-
Esta precisa ser iniciada nos primeiros 60 segundos de vida (minuto de ca aperta/solta/solta, aperta/solta/solta.... Quanto à pressão a ser aplica-
ouro). A ventilação pulmonar é o procedimento mais importante e efetivo da, esta deve ser individualizada para que o RN alcance e mantenha FC
na reanimação do RN em sala de parto. >100 bpm. De modo geral, iniciar com pressão inspiratória ao redor de
Quando a VPP é indicada no RN ≥ 34 semanas, iniciar com ar ambien- 20 cmH2O, sendo raramente necessário alcançar 30-40 cmH2O naqueles
te (oxigênio a 21%). Uma vez iniciada a ventilação, recomenda-se o uso pacientes com pulmões imaturos ou doentes. Após as cinco primeiras ven-
da oximetria de pulso para monitorar a oferta do oxigênio suplementar. tilações, reajustar a pressão inspiratória de modo a visualizar o movimento
Aplicar sempre o sensor neonatal no membro superior direito, na região torácico leve e auscultar a entrada de ar nos pulmões. Durante a VPP, ob-
do pulso radial, para monitorar a SatO2 pré-ductal. Após posicionar o sen- servar a adaptação da máscara à face, a permeabilidade das vias aéreas e
sor, conectá-lo ao cabo do oxímetro. A leitura confiável da SatO2 demora a expansibilidade pulmonar.
254 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
que a VPP, durante a massagem cardíaca, deve ser ministrada através da que a absorção por via pulmonar é lenta, imprevisível e a resposta, em
cânula traqueal para garantir a expansão plena pulmonar. geral, é insatisfatória.
Considera-se a falha do procedimento se, após 60 segundos de VPP
com cânula traqueal e oxigênio a 100% acompanhada de massagem
cardíaca, o RN mantém FC < 60 bpm. Nesse caso, verificar a posição da ATENÇÃO!
cânula, a permeabilidade das vias aéreas e a técnica da ventilação e da
Apenas 1 RN em cada 1.000 requer procedimentos avançados de rea-
massagem, corrigindo o que for necessário. Se, após a correção da técnica
nimação (ventilação acompanhada de massagem e/ou medicações),
da VPP e massagem, não há melhora, considera-se o cateterismo venoso
quando a VPP é aplicada de maneira rápida e efetiva.
umbilical de urgência e indica-se a adrenalina.
■■ MEDICAÇÕES
■■ CONSIDERAÇÃO FINAL
A bradicardia neonatal é, em geral, resultado da insuflação pulmonar in-
As diretrizes mencionadas são uma orientação geral para a conduta
suficiente e/ou da hipoxemia profunda. A ventilação adequada é o passo
neonatal na sala de parto. Mais importante do que um protocolo rígido,
mais importante para corrigir a bradicardia. Quando a FC permanece <60
é a experiência e a prática com a educação e o treinamento continuado
bpm, a despeito de ventilação efetiva por cânula traqueal com oxigênio a
dos profissionais de saúde que participam do cuidado ao RN, além da
100% e acompanhada de massagem cardíaca adequada, o uso de epine-
conscientização da comunidade para a importância da assistência nesse
frina, expansor de volume ou ambos está indicado. A diluição, o preparo, a
período crítico de transição para o ambiente extrauterino.
dose e a via de administração estão descritos no Quadro 26.3. Bicarbonato
de sódio, naloxone, atropina, albumina e vasopressores não são recomen-
dados na reanimação do RN em sala de parto. REVISÃO
A necessidade de procedimentos de reanimação é maior quanto
QUADRO 26.3 ■ Medicações para reanimação neonatal na sala menor a idade gestacional e/ou peso ao nascer.
de parto É necessário contar com uma equipe de profissionais de saúde trei-
nada em reanimação neonatal antes do nascimento de qualquer RN.
EPINEFRINA EPINEFRINA EXPANSOR DE É fundamental que pelo menos um profissional de saúde capaz de
ENDOVENOSA ENDOTRAQUEAL VOLUME realizar os passos iniciais e a ventilação com pressão positiva por meio
Diluição 1:10.000 1:10.000 SF 0,9% de máscara facial esteja presente em todo parto, dedicando-se ao RN.
1 mL epinefrina 1 mL epinefrina Os próximos passos são definidos a partir das condições do RN e
1:1000 em 9 mL 1:1000 em 9 mL dos recursos disponíveis na hora do parto.
de SF 0,9% de SF 0,9%
3 kg 0,3-0,9 mL 1,5-3,0 mL 30 mL
■■ LEITURAS RECOMENDADAS
4 kg 0,4-1,2 mL 2,0-4,0 mL 40 mL
Almeida MFB, Guinsburg R. Reanimação do recém-nascido ≥34 semanas
Velocidade e Infundir rápido Infundir Infundir o em sala de parto: diretrizes 2016 da Sociedade Brasileira de Pediatria
Precauções na veia umbilical diretamente na expansor de [Internet]. Rio de Janeiro: SBP; 2016 [capturado em 13 set. 2016]. Disponível
e, a seguir, cânula traqueal e volume na em: http://www.sbp.com.br/reanimacao/wp-content/uploads/2016/01/
DiretrizesSBPReanimacaoRNMaior34semanas26jan2016.pdf.
infundir 0,5-1,0 ventilar a seguir veia umbilical
Perlman JM, Wyllie J, Kattwinkel J, Wyckoff MH, Aziz K, Guinsburg R, et al. Part 7:
mL de SF 0,9% USO ÚNICO lentamente, em
Neonatal resuscitation: 2015 international consensus on cardiopulmonary
5 a 10 minutos
resuscitation and emergency cardiovascular care science with treatment
recommendations. Circulation. 2015;132(16 Suppl 1):S204-41.
A via preferencial para a infusão de medicações na sala de parto é a Wyckoff MH, Aziz K, Escobedo MB, Kapadia VS, Kattwinkel J, Perlman JM, et
al. Part 13: Neonatal Resuscitation: 2015 American Heart Association
endovenosa, sendo a veia umbilical de acesso fácil e rápido. O cateter ve-
guidelines update for cardiopulmonary resuscitation and emergency
noso umbilical deve ser inserido de emergência, assim que há indicação do cardiovascular care. Circulation. 2015;132(18 Suppl 2):S543-60.
uso de medicações na sala de parto. Introduzir o cateter na veia e progre- Wyllie J, Bruinenberg J, Roehr CC, Rüdiger M, Trevisanuto D, Urlesberger B.
dir apenas 1-2 cm após o ânulo, mantendo-o periférico, de modo a evitar European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015: section
sua localização em nível hepático. A administração de medicações por via 7. Resuscitation and support of transition of babies at birth. Resuscitation.
traqueal só pode ser usada para a adrenalina e uma única vez, sabendo-se 2015;95:249-63.
256 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
■■ HIPERBILIRRUBINEMIA INDIRETA EM Coletar BT, se a icterícia for detectada antes de 24 a 36 horas, iden-
RECÉM-NASCIDOS ≥ 35 SEMANAS tificar o nível de risco (maior, intermediário ou mínimo) (Figura 27.1)
e considerar o uso de fototerapia (Tabela 27.1).
A história clínica dos RN com idade gestacional ≥ 35 semanas e peso ao
nascer ≥ 2.000 g, internados em alojamento conjunto, permite detectar o
a
risco de desenvolvimento de hiperbilirrubinemia significante na 1 semana TABELA 27.1 ■ Bilirrubinemia total (mg/dL) para indicação de
de vida, sendo necessário: fototerapia e exsanguinotransfusão em RN ≥ 35 semanas de idade
Avaliar os fatores epidemiológicos de risco (Quadro 27.2). gestacional ao nascer
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0 12 24 36 48 60 72 84 96 108 120 132 144
Idade pós-natal (horas)
FIGURA 27.1 ■ Nomograma com percentis 40, 75 e 95 de bilirrubinemia sérica total (mg/dL) segundo a idade pós-natal em horas, em RN ≥ 35
semanas e peso ao nascer ≥ 2.000 g. Este nomograma não representa a história natural da hiperbilirrubinemia neonatal.
Fonte: Bhutani e colaboradores.1
258 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
A irradiância de cada aparelho de fototerapia deve ser prescrita e A realização de EST acompanha-se de elevada morbidade, incluindo
avaliada antes do uso e diariamente para a determinação do seu declínio complicações metabólicas, hemodinâmicas, infecciosas, vasculares, he-
e a consequente troca de lâmpadas. Atualmente, considera-se a irradi- matológicas, além de reações pós-transfusionais e de enxerto-hospedeiro.
ância de 10 a 12 mW/cm2/nm como standard e a de 30 mW/cm2/nm, dis- Portanto, esse tipo de procedimento deve ser indicado com precisão e pra-
ponível na maior superfície corporal possível, como fototerapia de “alta ticado exclusivamente por uma equipe habilitada em cuidados intensivos
intensidade”. Uma vez que a irradiância é inversamente proporcional à neonatais.
distância entre as lâmpadas e o paciente, quanto menor a distância entre
a luz e o paciente, maiores são a irradiância e a eficácia da fototerapia.
Adicionalmente, quanto maior a superfície corpórea exposta à luz, maior REVISÃO
é a eficácia da fototerapia. Portanto, RN que recebe a luz na parte an-
terior e posterior do tronco e membros e permanece sem fraldas recebe A hiperbilirrubinemia indireta constitui-se em um dos problemas
maior irradiância espectral e uma fototerapia mais eficaz, desde que a mais frequentes no período neonatal, refletindo, na maioria das ve-
irradiância seja adequada. zes, em uma adaptação ao metabolismo da bilirrubina, entretanto,
Existem diversos aparelhos de fototerapia disponíveis no mercado outras vezes, decorre de um processo patológico, que pode levar
nacional com diferentes lâmpadas. Em RN com peso ao nascer > 2.000 à encefalopatia bilirrubínica com risco de vida e sequelas neuro-
g, que permanecem em berço comum, recomenda-se a fototerapia con- lógicas.
vencional, superior ou inferior (reversa) com 6 a 8 lâmpadas fluorescen- Os pacientes de maior risco compreendem os portadores de doença
tes brancas e/ou azuis especiais ou 17 lâmpadas LED (lighting-emitting hemolítica e os prematuros, contudo, nos últimos 20 anos, houve
2
diodes) com irradiância mínima de 10 a 12 µW/cm /nm. Nos casos de o ressurgimento dessa doença, principalmente em RN próximos ao
BT ≥ 17 mg/dL, é necessária a aplicação de fototerapia de alta intensi- termo ou a termo em aleitamento materno e que recebem alta antes
dade com 6 a 8 lâmpadas fluorescentes brancas e/ou azuis especiais em de 48 horas de vida.
nível superior e também inferior (reversa). Nos prematuros, com peso Qualquer RN ictérico necessita de determinação dos fatores epide-
ao nascer < 2.000 g que permanecem em incubadoras, além da foto- miológicos e dosagem da bilirrubina total (BT), com a finalidade de
terapia convencional superior, é possível utilizar aparelhos com 5 ou 15 identificar o risco de desenvolvimento de hiperbilirrubinemia sig-
lâmpadas LED, localizados acima da parede da incubadora ou o colchão nificante (BT ≥ 17 mg/dL), sempre antes da saída da maternidade,
de fibra óptica sob o dorso da criança, possibilitando a utilização de fo- que deve ocorrer após as 48 horas de vida. Além disso, qualquer
toterapia dupla, se necessária. Ressalta-se que o uso de fototerapia de RN deve ser reavaliado no período máximo de 48 a 72 horas, após
2
alta intensidade (próximo a 30 µW/cm /nm) deve ser evitada em RN de a alta hospitalar.
extremo baixo, e que as fototerapias LED, quando desligadas, retornam Valores de BT superiores a 12 mg/dL alertam para a investigação
à potência máxima de 100%. das causas da icterícia. Quanto aos RN de peso muito baixo, pratica-
Alguns cuidados devem ser seguidos durante o uso de fototerapia, mente todos evoluem com hiperbilirrubinemia, que pode ser agra-
como: vada por fatores facilitadores da impregnação cerebral.
verificar a temperatura corporal de 3 em 3 horas e o peso diaria- A terapêutica específica é a fototerapia, indicada conforme o nível
mente; de BT, a idade gestacional, a idade pós-natal e a presença dos fato-
aumentar a oferta hídrica, pois a fototerapia com lâmpada fluores- res agravantes. Atualmente, a escolha do aparelho e das lâmpadas
cente pode provocar elevação da temperatura, com consequente para fototerapia depende da etiologia e da velocidade de declínio
aumento do consumo de oxigênio, da frequência respiratória e do da BT, necessária para controlar a hiperbilirrubinemia indireta de
fluxo sanguíneo na pele, culminando em maior perda insensível de maneira individualizada.
água; contudo, a fototerapia LED pode levar à hipotermia e não
altera a perda insensível de água;
proteger os olhos com cobertura radiopaca; ■■ REFERÊNCIAS
cobrir a solução parenteral e o equipo com papel alumínio, ou usar
1. Bhutani VK, Johnson L, Sivieri EM. Predictive ability of a predischarge hour-
extensores impermeáveis à luz; specific serum bilirubin for subsequent significant hyperbilirubinemia in
desligar o aparelho durante a amamentação, inclusive com a retira- healthy-term and near-term newborns. Pediatrics. 1999;103(1):6-14.
da da cobertura dos olhos. 2. American Academy of Pediatrics. Subcommittee on hyperbilirubinemia.
Atualmente, a maioria dos casos de hiperbilirrubinemia indire- Management of hyperbilirrubinemia in the newborn infant 35 or more
ta é controlada com administração adequada da fototerapia, sendo weeks of gestation. Pediatrics. 2004;114(1):297-316.
a doença hemolítica grave por incompatibilidade Rh uma das únicas 3. Maisels MJ, Watchko JF, Bhutani VK, Stevenson DK. An approach to the
indicações de EST. Nesses casos, pode ser realizada logo após o nasci- management of hyperbilirubinemia in the preterm infant less than 35 weeks
of gestation. J Perinatol. 2012;32(9):660-4.
mento, quando BI > 4 mg/dL e/ou hemoglobina < 12 g/dL em sangue
de cordão. Além disso, a BT é determinada a cada 6 a 8 horas, e a EST,
realizada se houver elevação da BT ≥ 0,5 a 1 mg/dL/hora, nas primeiras ■■ LEITURAS SUGERIDAS
36 horas de vida; ou, ainda, conforme os níveis de BT, peso ao nascer e
Almeida MFB, Draque CM, Nader PJH. Icterícia neonatal. In: Lopez FA, Campos
presença de fatores agravantes da lesão bilirrubínica neuronal (Tabelas
Jr D, editores. Tratado de pediatria. 3. ed. São Paulo: Manole; 2014.
27.1 e 27.2). Nas doenças hemolíticas imunes, se houver aumento da BT, p. 1873-86.
apesar da fototerapia de alta intensidade, ou se a BT se aproximar 2 a Almeida MFB, Draque CM. Icterícia no recém-nascido com idade gestacional ≥
3 mg/dL do nível de indicação de EST, pode-se administrar “imunoglo- 35 semanas [Internet]. São Paulo: SBP; 2012 [capturado em 13 set. 2016].
bulina-padrão” endovenosa 0,5 a 1 g/kg em 2 horas e repetir após 12 Disponível em: http://www.sbp.com.br/src/uploads/2015/02/Ictericia_sem-
horas, se necessário. DeptoNeoSBP-11nov12.pdf
260 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
28 ATENÇÃO!
O desconforto respiratório pode representar uma condição benigna,
DOENÇAS RESPIRATÓRIAS como retardo na adaptação cardiorrespiratória, mas também pode ser o
NO PERÍODO NEONATAL 1o sinal de uma infecção grave e potencialmente letal, sendo fundamen-
tais o reconhecimento e a avaliação precoces de todo bebê acometido.
■■ MILTON MIYOSHI
■■ SÍNDROME DO DESCONFORTO RESPIRATÓRIO
■■ SUELY DORNELLAS DO NASCIMENTO
A SDR é a principal afecção respiratória nos prematuros abaixo de 28 se-
■■ BENJAMIN ISRAEL KOPELMAN manas. A deficiência quantitativa e qualitativa do surfactante alveolar,
decorrentes da imaturidade pulmonar, é a sua principal causa.
Etiologia Deficiência de surfactante por Inflamação, obstrução mecânica Retardo na absorção do líquido
imaturidade pulmonar e inativação do surfactante pela pulmonar
aspiração do mecônio
Fatores de risco Diabetes materno Sofrimento fetal Cesariana eletiva sem trabalho de
RCIU Asfixia perinatal parto
Trabalho de parto prematuro Líquido amniótico meconial
Quadro clínico Desconforto respiratório desde o Desconforto respiratório desde o Desconforto respiratório leve com
nascimento nascimento predomínio da taquipneia
Cianose Cianose
Prevenção Corticoide antenatal Monitoração fetal adequada Evitar cesariana eletiva sem trabalho
Partograma de parto
■■ SÍNDROME DE ASPIRAÇÃO DE MECÔNIO evoluem com SAM e necessitem de ventilação invasiva. Se após 3
Cerca de 10 a 20% das gestações apresentam líquido amniótico meconial, dias não houver indícios de infecção, considerar a suspensão da
e 1 a 2% desses conceptos exibirão a SAM; em geral, aqueles com idade antibioticoterapia.
gestacional maior do que 40 semanas e que sofreram asfixia ao nasci- CPAP:
mento. O diagnóstico deve ser considerado quando o RN obedecer aos a | Indicar nos pacientes que cursam com desconforto respiratório,
seguintes critérios: a fim de estabilizar as vias aéreas terminais e evitar a formação de
história de líquido amniótico meconial; atelectasias.
presença de mecônio na traqueia do RN; b | Iniciar com pressão entre 4 e 6 cm H2O e FiO2 de 0,40 a 0,60.
Logo após a sua instalação, a qualquer sinal de piora da oxigena-
início do desconforto respiratório nas primeiras horas de vida;
ção ou das condições hemodinâmicas, deve-se optar pela institui-
radiografia torácica com aspecto granular grosseiro alternado
ção da ventilação invasiva.
com áreas de hiperinsuflação em ambos os campos pulmonares
c | Nos casos de suspeita de hipertensão pulmonar, a CPAP deve
(Figura 28.2).
ser utilizada com cautela, para não postergar o início de terapêuti-
cas mais apropriadas para o seu controle.
Ventilação invasiva: iniciar a ventilação com os aparelhos de fluxo
contínuo no modo A/C e, logo após a estabilização, passar para o
modo SIMV associado com PS.
Instalar a ventilação invasiva se PaCO2 > 60 mmHg, falha da CPAP,
acidose ou na presença de apneias recorrentes.
Os parâmetros iniciais são semelhantes aos da SDR, tomando-se
cuidado com o tempo expiratório (Te) e a PIP. Procurar manter o
Te em torno de 0,5 segundos, para prevenir o aprisionamento de
ar nas vias aéreas parcialmente obstruídas (autoPEEP) e utilizar o
menor pico de pressão possível para obter uma expansão pulmo-
nar adequada e volume corrente entre 4 a 6 mL/kg. Muitas vezes,
apesar de todos os recursos da ventilação convencional, não se
obtém a melhora clínica esperada. Nesses casos, é frequente a as-
sociação da SAM com a hipertensão pulmonar. A terapêutica ven-
tilatória disponível é a ventilação de alta frequência e o oxigenador
de membrana extracorpórea.
Surfactante exógeno: a reposição do surfactante é indicada nos
RN que necessitem de ventilação invasiva. Sua utilização deve ser
precoce e em altas doses, devido ao intenso processo inflamató-
FIGURA 28.2 ■ Aspecto radiológico típico da síndrome de aspiração rio pulmonar que tende a inibir a ação do surfactante ofertado.
de mecônio. Utilizar dose de 150 a 200 mg/kg de fosfolípides e, se necessário,
repetir a dose.
Óxido nítrico inalatório (NOi): o NOi é um potente vasodilatador
PREVENÇÃO do leito vascular pulmonar. Indicar o NOi nos RN > 34 semanas
que evoluem com SAM associada à hipertensão pulmonar e que
A SAM pode ser evitada na grande maioria dos casos, com o acom-
mantêm os valores de índice de oxigenação (IO = MAP × FiO2
panhamento pré-natal cuidadoso das gestantes de risco. Como
× 100/PaO2), em que MAP acima de 25. Iniciar com dose de 5
a asfixia parece ser o fator fundamental no desencadeamento
partes por milhão (ppm) e, se necessário, aumentar no máximo
da aspiração, em qualquer sinal de alteração da vitalidade fetal,
até 20 ppm.
acompanhada de líquido amniótico meconial, deve-se considerar a
resolução da gestação.
A aspiração rotineira nas vias aéreas superiores do concepto pelo ■■ TAQUIPNEIA TRANSITÓRIA DO RECÉM-NASCIDO
obstetra não é recomendada. A TTRN é a principal causa de insuficiência respiratória no período neona-
Ao nascimento, se o paciente se apresentar em apneia ou com tal. Acomete com maior frequência o prematuro tardio e é caracterizada
respiração irregular, hipotônico ou com FC < 100 bpm, aspirar por um desconforto respiratório leve a moderado, geralmente de evolução
imediatamente a hipofaringe e a traqueia. A aspiração deve ser benigna, decorrente do retardo na absorção do líquido pulmonar após o
realizada apenas uma vez, por meio da laringoscopia direta com nascimento. Considerar seu diagnóstico quando o RN obedecer aos se-
cânula traqueal ligada ao vácuo de parede, com pressão máxima guintes critérios:
de 100 mmHg. Início do desconforto respiratório nas primeiras horas de vida, com
predomínio da taquipneia;
TRATAMENTO Grupo de risco: prematuros tardios que nasceram de cesariana ele-
Cuidados gerais: o controle da temperatura, da pressão arterial, do tiva, sem trabalho de parto;
hematócrito e dos balanços hidreletrolítico, acidobásico e metabó- Imagem radiológica com congestão peri-hilar radiada e simétrica,
lico é fundamental para o sucesso da terapêutica. Pelo alto risco espessamento de cisuras interlobares, hiperinsuflação pulmonar
de infecção da árvore respiratória preenchida por mecônio, indicar e, ocasionalmente, discreta cardiomegalia e/ou derrame pleural
antibioticoterapia (penicilina e aminoglicosídeo) nos pacientes que (Figura 28.3).
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 263
■■ LEITURAS SUGERIDAS
Agrons GA, Courtney SE, Stocker JT, Markowitz RI. Lung disease in premature
neonates: radiologic-pathologic correlation. Radiographics. 2005;25(4):
1047-73.
Carlo W, Polin RA; American Academy of Pediatrics, Committee on fetus and
newborn. Respiratory support in preterm infants at birth. Pediatrics. 2014;
133(1):171-4.
Edwards MO, Kotecha SJ, Kotecha S. Respiratory distress of the term newborn
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Hermansen CL, Lorah KN. Respiratory distress in the newborn. Am Fam Physician.
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Pramanik AK, Rangaswamy N, Gates T. Neonatal respiratory distress: a practical
approach to its diagnosis and management. Pediatr Clin North Am.
2015;62(2):453-69.
29
FIGURA 28.3 ■ Aspecto radiológico típico da taquipneia
transitória do recém-nascido. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL E
TRATAMENTO DAS INFECÇÕES
PREVENÇÃO CONGÊNITAS
Deve-se evitar a resolução da gestação por cesariana eletiva sem trabalho
de parto antes de 39 semanas de idade gestacional.
■■ ANA LUCIA GOULART
TRATAMENTO ■■ AMÉLIA MIYASHIRO NUNES DOS SANTOS
De modo geral, a TTRN apresenta evolução favorável. O tratamento visa a
evitar as agressões ao RN, como hipotermia e distúrbios do equilíbrio aci-
dobásico e metabólico. A maioria dos casos resolve-se somente com o uso O termo infecção congênita é atribuído às infecções adquiridas pelo feto
de oxigênio inalatório. Oferecer oxigênio para manter a SpO2 entre 90 e via transplacentária durante a gestação, e são denominadas infecções pe-
95%. Naqueles com desconforto respiratório importante acompanhado de rinatais aquelas transmitidas próximo ao parto. As infecções a seguir serão
SpO2 < 90% em FiO2 de 0,40, instalar a CPAP. Iniciar com pressão de 4 a abordadas por sua importância e por terem seus aspectos diagnósticos e
6 cm H2O e FiO2 de 0,40 a 0,60. Após a instalação da CPAP, é fundamental terapêuticos bem estabelecidos.
a monitoração rigorosa dos gases sanguíneos.
■■ QUADRO CLÍNICO
REVISÃO As manifestações clínicas no recém-nascido (RN) podem auxiliar no diag-
nóstico, porém 90% das crianças com citomegalovírus (CMV) e sífilis,
A maioria das doenças respiratórias neonatais manifesta-se nas pri-
75% das com toxoplasmose, 65% das com rubéola e praticamente 100%
meiras horas de vida de forma inespecífica e, muitas vezes, os sinais
daquelas com hepatite B e HIV são assintomáticas no período neonatal.
e sintomas se sobrepõem.
Ao contrário, o herpes simples vírus (HSV) é sempre sintomático.
É possível alcançar o diagnóstico correto a partir da análise cui-
dadosa da história clínica materna e do parto, do exame clínico
minucioso em conjunto com a propedêutica de diagnóstico por ATENÇÃO!
imagem.
A SDR é a principal afecção respiratória nos prematuros abaixo de Como a maioria das infecções congênitas é assintomática ao nasci-
28 semanas. mento, é importante realizar o rastreamento no pré-natal e também ao
A administração materna de corticosteroide previne e modifica a nascimento, caso tenha havido suspeita de infecção na gestação ou no
evolução da SDR e otimiza os efeitos da terapia com o surfactante caso de sífilis, que precisa ser rastreado também no parto.
após o nascimento.
A SAM pode ser evitada, na grande maioria dos casos, pelo acom-
panhamento pré-natal cuidadoso das gestantes de risco. Algumas infecções congênitas podem causar prematuridade, restri-
A aspiração rotineira nas vias aéreas superiores do concepto pelo ção de crescimento intrauterino e óbito fetal. Os sinais e sintomas mais
obstetra não é recomendada. importantes presentes em várias doenças são: hepatomegalia, espleno-
A TTRN é a principal causa de insuficiência respiratória no período megalia, adenopatia, anemia, trombocitopenia, icterícia, púrpura, pneu-
neonatal, acometendo principalmente os prematuros tardios que monite, miocardite, hidropsia fetal, microcefalia, hidrocefalia, convulsões
nasceram de cesariana eletiva, sem trabalho de parto. e alterações oftalmológicas (coriorretinite, catarata, glaucoma, microftal-
mia, entre outras).
264 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Algumas manifestações são comumente associadas a algum pató- As alterações radiológicas na sífilis congênita podem não ser eviden-
geno específico, como: microcefalia com calcificações periventriculares, tes no 1o mês de vida, embora a osteíte esteja quase sempre presente nos
no CMV; catarata, retinopatia pigmentar e cardiopatias (persistência do neonatos sintomáticos. As alterações mais precoces, geralmente, ocorrem
canal arterial, estenose pulmonar), na rubéola; vesículas em pele, cera- nas metáfises, com áreas radiopacas e radiotransparentes, com fragmen-
toconjuntivite, meningoencefalite aguda, no HSV; cicatrizes cutâneas tação e destruição. Alterações diafisárias consistem, principalmente, na
distribuídas em dermátomos, atrofia muscular assimétrica, hipoplasia de deposição periostal de osso novo (periostite).
membros, convulsões, calcificações intracranianas, síndrome de Horner ou O diagnóstico de sífilis congênita deve ser realizado nas seguintes
vesículas cutâneo-mucosas na varicela-zóster; hidrocefalia, calcificações situações:
intracranianas generalizadas e coriorretinite, na toxoplasmose; exantema Sífilis congênita confirmada na presença de espiroquetas em
maculopapular, pênfigo palmoplantar, coriza piossanguinolenta e pseudo- fluidos, secreções ou tecidos, demonstradas por microscopia em
paralisia de Parrot, na sífilis. campo escuro, imunofluorescência direta ou coloração pela prata.
As crianças assintomáticas no período neonatal podem apresentar Sífilis congênita provável:
manifestações tardias da doença por persistência e/ou recorrência da in- RN de mãe com sorologia positiva para sífilis que não foi trata-
fecção. Os achados clínicos tardios mais comuns no CMV, na rubéola, na da adequadamente durante a gestação.
toxoplasmose e na sífilis congênita são: deficiências auditiva e visual e RN com teste não treponêmico positivo e/ou qualquer uma das
retardo mental e motor. Nas doenças causadas pelos herpes-vírus sim- alterações: qualquer evidência clínica ou radiológica de sífilis
ples e herpes-zóster, podem ocorrer deficiência visual e retardo motor e congênita, VDRL positivo no LCS, LCS alterado sem causa apa-
mental. Na hepatite B adquirida no período perinatal, a evolução para rente, títulos de VDRL do RN quatro vezes maiores que os da
a forma crônica pode ocorrer em cerca de 90% dos casos, com possí- mãe, títulos de VDRL da criança com elevação progressiva nos
vel evolução para cirrose hepática ou para carcinoma hepatocelular no 3 primeiros meses de vida ou persistência de títulos positivos
o
adulto. de VDRL após o 6 mês de vida.
As crianças com infecção vertical pelo HIV são geralmente assintomá- Óbito fetal por sífilis: todo caso de morte fetal ocorrido após 20
ticas nos primeiros meses de vida. A maioria desenvolve a doença após os semanas de gestação ou peso maior de 500 g, cuja mãe é por-
5 anos, porém 10 a 15% das crianças infectadas morrem antes dos 4 anos. tadora de sífilis não tratada ou tratada de maneira inadequada
durante a gestação.
O diagnóstico de neurossífilis confirmado é feito na presença de
■■ DIAGNÓSTICO VDRL positivo no LCS, independentemente da alteração de celularidade
Em virtude da inespecificidade das manifestações clínicas das infecções ou bioquímica do LCS, e neurossífilis possível quando ocorrem as seguin-
congênitas, o diagnóstico dessas doenças requer exames microbiológicos tes situações: elevação da celularidade (maior do que 25 células/mm ) e/
3
e sorológicos, que devem ser realizados o mais precocemente possível. ou proteínas (maior 150 mg/dL) no LCS em RN com sífilis confirmada ou
provável; RN com diagnóstico de sífilis congênita no qual não foi possível
SÍFILIS realizar o exame do LCS.
O diagnóstico de sífilis congênita deve ser feito por sorologia materna
realizada durante a gestação e no dia do parto. Na prática clínica, estão TOXOPLASMOSE
disponíveis testes sorológicos não treponêmicos e quantitativos, o VDRL O diagnóstico intrauterino de infecção congênita pode ser feito na ges-
(do inglês venereal disease research laboratory) ou a reagina plasmática tante que apresenta soroconversão, sendo indicada amniocentese e a
rápida (RPR). Eles devem ser acompanhados de um teste sérico específico, técnica de reação em cadeia da polimerase (PCR, do inglês reaction chain
o FTA-Abs (do inglês fluorescent treponemal antibody absorption test) ou a polymerase) para o T. gondii no líquido amniótico, que apresenta sensibi-
micro-hemaglutinação (MHA), para melhorar a sensibilidade e a especifici- lidade de 85%. O diagnóstico sorológico de infecção congênita na criança
dade do diagnóstico. A realização desses testes no sangue do cordão um- é realizado pela detecção de IgM ou IgA no sangue ao nascimento ou no
bilical ou do RN não é recomendada. O Ministério da Saúde1 recomenda acompanhamento sorológico por pelo menos 1 ano. Também pode ser
que seja realizado o teste rápido para sífilis na primeira consulta do pré- feito pela presença de IgG persistentemente positiva após 12 meses de
-natal para identificar e tratar mais rapidamente a sífilis na gestação. Tra- idade. Alguns RNs com infecção congênita podem ter IgM positiva nos pri-
ta-se de um teste treponêmico que quando positivo indica possibilidade meiros dias de vida, que persiste por meses ou desaparece precocemente,
de doença em qualquer uma das fases ou cicatriz sorológica. Se a gestante ao passo que outros podem ter IgM negativa, permanecendo negativa no
apresentar risco epidemiológico como estar com mais de 20 semanas de primeiro ano ou se tornando positiva em intervalos de tempo variáveis.
gestação ou ser vulnerável (moradora de rua, presidiária, usuária de dro- Na criança infectada, os títulos de IgG podem sofrer leve declínio nos pri-
gas), recomenda-se tratamento para a gestante e parceiro ainda nessa meiros meses, mas voltam a aumentar, encontrando-se títulos elevados
primeira consulta, com avaliação posterior do teste não treponêmico. no final do primeiro ano. Na criança não infectada, ocorre um declínio
O exame do líquido cerebrospinal (LCS) é obrigatório na sífilis constante dos títulos de IgG, que geralmente se torna indetectável entre
congênita. O VDRL positivo no LCS indica infecção sifilítica do SNC, 6 e 12 meses de idade. A sensibilidade dos métodos enzimaimunoensaio
entretanto sua sensibilidade é ao redor de 20 a 70%. Outros testes (Elisa) por duplo-sanduíche ou imunoabsorção é de 75 a 80%, e da imu-
sorológicos não devem ser utilizados no LCS, pois apresentam sensibi- nofiltração, é de 85%.
lidade ainda menor.
RUBÉOLA
A rubéola congênita é mais facilmente diagnosticada pela detecção de
ATENÇÃO! IgM específica por meio de Elisa por imunocaptura em sangue obtido nos
O exame de LCS na sífilis congênita determina a terapêutica e o segui- primeiros 3 meses de idade; um resultado negativo exclui a infecção con-
mento da criança. gênita. O diagnóstico também pode ser feito pela persistência de anticor-
pos IgG específicos entre 6 e 12 meses de idade.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 265
A rubéola congênita também pode ser diagnosticada pelo isolamento embora apenas parte delas seja infectada. A criança não infectada per-
do vírus ou detecção do RNA viral com a técnica de PCR, em material obti- de os anticorpos transferidos passivamente entre 6 e 12 meses de idade
do de nasofaringe, urina, LCS, cristalino ou sangue. (75%), mas a persistência de anticorpos maternos até os 18 meses foi do-
cumentada em 2% dos casos. Portanto, para se estabelecer o diagnósti-
CITOMEGALIA co da doença em crianças abaixo de 18 meses de idade, são necessários
O isolamento do vírus por meio da cultura em tecidos tem sido conside- exames adicionais.
rado o método mais sensível e específico para o diagnóstico da infecção Para o diagnóstico de infecção da transmissão vertical do HIV, reco-
congênita pelo CMV, geralmente realizado em urina e/ou saliva, além de menda-se a realização de testes de quantificação de RNA viral após 30 dias
outros tecidos, como fígado ou pulmão, obtidos por biópsia ou necropsia. de vida. Se o primeiro exame for detectável, coleta-se a segunda amostra
A urina é considerada o material preferível porque contém maior quan- imediatamente. Se o segundo teste for detectável, a criança está infectada.
tidade de vírus e maior estabilidade. A viabilidade do CMV é muito boa, Se o segundo teste estiver abaixo do limite de detecção, repetir após dois
quando as amostras são estocadas de maneira adequada (temperatura meses (3o teste). Se, então, o teste for detectável, a criança está infectada,
de 4oC), mas a estocagem e o transporte em temperatura ambiente ou se estiver abaixo do limite de detecção, a criança, provavelmente, não está
sob congelamento diminuem a infectividade rápida e significativamente. infectada. Se, no primeiro teste, a carga viral está abaixo do limite de detec-
A detecção do DNA viral na saliva (fluida ou seca) do RN pela técnica ção, repetir o teste após dois meses (2o teste). Se for detectável, repetir com
da PCR está substituindo de forma rápida a cultura do vírus e, atualmente, nova amostra (3o teste). Se for detectável, a criança está infectada; se abai-
é considerada o método de escolha para investigação do CMV. A obtenção xo do limite de detecção, provavelmente não está infectada. Se o 2o teste
da saliva é simples e prática, podendo ser estocada e transportada para o estiver abaixo do limite de detecção, a criança não deve estar infectada.
laboratório com facilidade. Avaliar com cuidado carga viral < 5.000 cópias, pois podem ser falso-
Para confirmar a infecção congênita, o isolamento do vírus deve ser -positivos. O diagnóstico de criança não infectada é dado por dois testes
obtido nas três primeiras semanas de vida. A detecção do vírus em amos- de quantificação de RNA viral indetectável entre 1 e 18 meses de idade,
tras coletadas após esse período pode ser por infecção adquirida no parto recomendando-se realizar a sorologia para HIV após 12 meses de idade
ou pós-natal. para confirmar sororeversão.
A detecção de anticorpos específicos não é recomendada para o diag- A avaliação do RN com sífilis, toxoplasmose, CMV, rubéola, herpes
nóstico de CMV. A detecção de anticorpos IgM no período neonatal é uma simples ou varicela congênita implica uma investigação ampla, descrita
evidência forte de infecção congênita, porém os métodos disponíveis até a seguir.
o momento não são confiáveis, podendo mostrar resultado falso-positivo
ou negativo. HEMOGRAMA COM CONTAGEM DE PLAQUETAS
Com exceção da hepatite B, todas as infecções congênitas citadas podem
HERPES SIMPLES apresentar anemia e trombocitopenia. Além disso, a infecção por CMV pode
O método ideal para o diagnóstico de infecção pelo HSV é a cultura do estar acompanhada de leucocitose com atipia linfocitária, toxoplasmose de
vírus. O material preferencial é aquele obtido da escarificação de lesões eosinofilia, sífilis de leucopenia, leucocitose ou reação leucemoide.
de pele ou de membranas mucosas (conjuntiva, boca, nasofaringe e reto),
que deve ser transferido para o laboratório em material especial e com ANÁLISE DO LCS
gelo. A sensibilidade da PCR em amostras de superfícies não foi estudada As alterações do LCS presentes nas infecções congênitas descritas, exceto
e o método não é recomendado, isoladamente, para o diagnóstico. A PCR na hepatite B e na Aids, incluem hipercelularidade à custa de linfócitos ou
para identificação do DNA do HSV no LCS é o método de escolha para do- monócitos e hiperproteinorraquia.
cumentar o envolvimento do SNC, sendo utilizada para definir a duração
do tratamento. A PCR no sangue também tem sido considerada para o ULTRASSONOGRAFIA, TOMOGRAFIA E
diagnóstico da infecção congênita pelo HSV, mas a detecção de anticorpos RESSONÂNCIA MAGNÉTICA DE CRÂNIO
específicos não é recomendada. Além de serem métodos adequados para detectar as calcificações intra-
cranianas, podem fornecer informações sobre outras alterações encefá-
VARICELA licas presentes nas infecções congênitas, como atrofia cortical, dilatação
O diagnóstico de varicela congênita pode ser confirmado pela identifica- ventricular, coleções subdurais e encefalomalácia.
ção do vírus por PCR no líquido vesicular ou material obtido pela escari-
ficação da lesão. A cultura do vírus não é tão sensível quanto a PCR, e os EXAME OFTALMOLÓGICO
métodos para detecção de IgG e IgM não são recomendados. A presença de coriorretinite é observada no CMV, rubéola, herpes, varice-
la, toxoplasmose e sífilis. A catarata uni ou bilateral aparece na rubéola,
HEPATITE B herpes, varicela e toxoplasmose. O glaucoma pode surgir na rubéola, toxo-
O diagnóstico da hepatite B aguda ou do estado de portadora crônica plasmose e sífilis. A microftalmia pode ser observada na rubéola, herpes,
deve ser feito na gestante, com o objetivo de adotar medidas para dimi- varicela e toxoplasmose. Também podem ser encontradas: atrofia óptica
nuir a transmissão perinatal do vírus. No RN, a detecção de antígenos do (CMV, varicela, toxoplasmose); opacificações de córnea (rubéola, varicela);
HBV pode ser feita por métodos imunoenzimáticos, em amostra de sangue uveíte (sífilis); enoftalmia, anisocoria e nistagmo (varicela). A ceratocon-
periférico. Entretanto, essa pesquisa só é positiva ao nascimento nos ca- juntivite herpética pode ser a única manifestação da doença e evoluir para
sos de aquisição durante a gestação. coriorretinite, catarata e descolamento de retina.
infecção congênita. No entanto, a perda auditiva pode surgir mais tarde, e O tratamento inclui pirimetamina na dose de 2 mg/kg/dia por dois
a avaliação auditiva deve ser repetida a cada 6 meses até os 3 anos. dias e, após, 1 mg/kg/dia por seis meses, diariamente. A mesma dose é
mantida por mais seis meses, porém administrada três vezes por semana.
A sulfadiazina é administrada diariamente, 100 mg/kg/dia, dividida em
■■ TRATAMENTO
duas doses, durante um ano. O ácido folínico, na dose de 10 mg três vezes
SÍFILIS por semana, é administrado durante e até uma semana após o tratamento
com pirimetamina; a dose pode ser aumentada até 20 mg diariamente
O tratamento deve ser realizado com penicilina, de acordo com o diagnós- para reverter os efeitos tóxicos da pirimetamina. O ácido folínico não pode
tico estabelecido: ser substituído pelo ácido fólico, porque o último inibe a ação da pirime-
Em RN de mães com sífilis inadequadamente tratada, realizar VDRL tamina nas formas proliferativas do T. gondii. A prednisona (1 mg/kg/dia,
de sangue periférico, radiografia de ossos longos, hemograma e punção dividida em duas doses) é recomendada quando a proteína no LCS é > 1
lombar: g/dL ou quando existe coriorretinite ativa, devendo ser mantida até que
Se RN apresentar VDRL positivo (qualquer titulação) e/ou existirem essas condições melhorem.
alterações clínicas, radiológicas e/ou hematológicas, mas não hou-
A pirimetamina produz depressão gradual e reversível da medula ós-
ver acometimento neurológico, tratar com penicilina cristalina via
sea, tornando necessário o controle de hemograma 1 a 2 vezes por sema-
endovenosa (EV) por 10 dias, na dose de 50.000 unidades/kg/dose
na, enquanto a criança recebe pirimetamina diariamente, e 1 a 2 vezes por
a cada 12 horas na 1a semana de vida e a cada 8 horas após a 1ase-
mês, quando ela recebe a pirimetamina três vezes por semana.
mana ou com penicilina procaína 50.000 unidade/kg/dose a cada
24 horas, via intramuscular (IM), por 10 dias.
CITOMEGALOVÍRUS
Se houver alteração de LCS ou se não foi possível coletá-lo, em-
pregar a penicilina cristalina via EV por 10 dias, na dose de 50.000 O tratamento com ganciclovir via EV, na dose de 12 mg/kg/dia, dividido a
unidades/kg/dose a cada 12 horas na 1a semana de vida e a cada 8 cada 12 horas por seis semanas, é recomendado para crianças que apre-
horas após a 1a semana. sentam infecção congênita sintomática por CMV com envolvimento do
Se o RN for VDRL negativo, sem alterações clínicas, radiológicas, SNC, como microcefalia, calcificações intracranianas, alterações do LCS,
hematológicas e de LCS, aplicar a penicilina benzatina, na dose coriorretinite ou perda auditiva neurossensorial. O tratamento também
única de 50.000 unidades/kg via IM. O acompanhamento é obriga- pode ser indicado para crianças com comprometimento sistêmico, incluin-
tório, incluindo o VDRL sérico seriado. Sendo impossível garantir o do restrição de crescimento intrauterino, hepatomegalia, esplenomegalia,
acompanhamento, tratar com penicilina cristalina ou procaína nas hepatite, pneumonia, petéquias e trombocitopenia. Deve ser iniciado no
doses recomendadas acima por 10 dias. 1o mês de vida, e há necessidade de monitoração de toxicidade, especial-
Em RN de mães com sífilis adequadamente tratada, realizar VDRL de mente de neutropenia. O tratamento com valganciclovir (16 mg/kg, via
sangue periférico e: oral, duas vezes ao dia) por 6 semanas também é uma opção terapêutica e
Se o RN apresentar VDRL positivo com título superior ao materno, sua administração por 6 meses parece melhorar ainda mais a audição e o
procurar alterações clínicas, radiológicas, hematológicas e/ou de neurodesenvolvimento em longo prazo.
LCS e tratar. Se não houver alterações no LCS, tratar com penicilina
cristalina via EV por 10 dias, na dose de 50.000 unidades/kg/dose HERPES SIMPLES
a cada 12 horas na 1a semana de vida e a cada 8 horas após a pri- Há indicação de cultura do vírus em material de pele e mucosa e PCR no
meira semana, ou com penicilina procaína 50.000 unidade/kg/dose sangue, com 24 horas de vida, nos RN de mães com lesão genital por HSV
a cada 24 horas via IM por 10 dias. Se o LCS estiver alterado, usar no momento do parto. Nos casos positivos, deve ser feita PCR no LCS.
apenas a penicilina cristalina nas doses acima, via EV por 10 dias. Crianças assintomáticas devem ser tratadas por dez dias para prevenir a
Se o RN for assintomático (exame clínico, hemograma, radiografia progressão da infecção para doença. A duração da terapia é de 14 dias
de ossos longos e LCS normais) e apresentar VDRL com titulação nos casos limitados à boca, aos olhos e à pele e 21 dias quando a doença
igual ou inferior à materna, pode-se proceder apenas ao seguimen- é disseminada ou envolve o SNC. Se a PCR inicial do LCS é positiva, é
to ambulatorial. Diante da impossibilidade de garantir o seguimen- necessário um segundo exame e, quando esse é positivo, a terapia deve
to ambulatorial, avaliar hemograma, radiografia e LCS. Se exames ser continuada por mais sete dias, com nova coleta para determinar a in-
normais, encaminhar o RN para seguimento, e, se alterado, tratar. terrupção da terapia. O tratamento é feito com aciclovir via EV, na dose de
Se o RN for assintomático, com VDRL negativo, seguir. Se não tem 60 mg/kg/dia, a cada 8 horas. Após o tratamento parenteral para a doença
garantia de seguimento, aplicar a penicilina benzatina na dose úni- 2
congênita, a criança deve receber aciclovir oral (300 mg/m /dose, 3 vezes
ca de 50.000 unidades/kg via IM. ao dia) por mais seis meses.
VARICELA CONGÊNITA
ATENÇÃO!
Recém-nascidos de mães com quadro clínico de varicela entre 5 dias antes
O seguimento ambulatorial de todas as crianças com sífilis congênita e 2 dias após o parto devem receber, via IM, 125 unidades de imunoglo-
é fundamental para certificar-se de que o tratamento foi adequado e bulina hiperimune zóster, o mais precocemente possível, até 96 horas de
para acompanhar as sequelas da sífilis congênita tardia. vida. Em RNs sintomáticos, é indicado tratamento com aciclovir na dose
de 10 a 15 mg/kg a cada 8 horas, via EV, mantido por 48 horas após o
aparecimento da última lesão nova; em geral, sete dias são suficientes.
TOXOPLASMOSE Todos os RNs que desenvolveram varicela devem ser isolados e rece-
Toda criança com toxoplasmose congênita deve ser tratada, mesmo que ber monitoração rigorosa. Quando a mãe desenvolve as lesões da varicela
não apresente manifestações clínicas. O tratamento deve ser iniciado o entre 5 dias antes e 2 dias depois do parto, e o RN não apresenta lesões de
mais precocemente possível. pele, deve-se isolar a mãe e a criança em ambientes separados.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 267
Considera-se neurossífilis possível quando há aumento de células e/ O tratamento da toxoplasmose congênita tem duração de 1 ano e
ou proteínas no LCS em RN com sífilis ou no RN com diagnóstico de inclui o uso de pirimetamina, sulfadiazina e ácido folínico.
sífilis congênita, no qual não foi possível realizar o exame do LCS. O tratamento do CMV pode ser feito com ganciclovir (EV) ou val-
O diagnóstico de toxoplasmose pode ser feito intraútero pela iden- ganciclovir (VO) por 6 semanas. O uso do valganciclovir por 6 meses
tificação do T. gondii no líquido amniótico e no RN por meio da parece melhorar ainda mais o desenvolvimento auditivo e neuro-
detecção de IgM e IgA específicas no sangue. lógico.
O diagnóstico de CMV pode ser feito pela cultura do vírus ou PCR O tratamento do HSV é feito com aciclovir endovenoso por 14 a 21
na saliva ou na urina coletadas nas primeiras 3 semanas de vida. dias, dependendo da manifestação clínica. Posteriormente deve ser
Deve ser feita cultura do vírus em material de pele e mucosa e cul- administrado aciclovir por via oral por mais 6 meses.
tura ou PCR no sangue, com 24 horas de vida, nos RN de mães com RN com quadro clínico de varicela deve receber aciclovir na dose
lesão genital por HSV no momento do parto. Nos casos positivos, de 10 a 15 mg/kg a cada oito horas, via endovenosa, por sete
deve ser feita PCR no LCS. dias.
O diagnóstico de varicela congênita pode ser feito por PCR no líqui- Recém-nascidos de mães com varicela entre 5 dias antes e 2 dias
do vesicular ou material obtido pela escarificação da lesão de pele. após o parto devem receber, via intramuscular, 125 unidades de
O estado de portadora crônica do vírus da hepatite B deve ser pes- imunoglobulina hiperimune zóster o mais precocemente possível,
quisado na gestante. A presença de antígenos HBs ou HBe no san- até 96 horas de vida.
gue materno indica risco de transmissão do vírus da hepatite B para RN de gestante portadora crônica do vírus da hepatite B deve rece-
o feto ou RN. ber vacina contra hepatite B e imunoglobulina hiperimune contra
o o
Toda gestante deve ser rastreada para o HIV no 1 e no 3 trimes- hepatite B, o mais precocemente possível, de preferência antes de
tres da gestação. Caso não se conheça a sorologia materna, deve-se 12 horas de vida.
realizar o teste de HIV rápido na internação na maternidade. No RN de mãe HIV-positiva, deve-se administrar zidovudina solução
Todo RN de mãe com HIV-positivo apresenta sorologia positiva para oral, 4 mg/kg/dose, de 12 em 12 horas, iniciando-se nas primeiras 2
o HIV, razão porque não deve ser solicitado ao nascimento. horas de vida, devendo ser mantido por quatro semanas.
Considera-se criança não infectada por transmissão vertical de HIV Se a gestante não recebeu profilaxia antirretroviral combinada
quando apresenta dois testes de quantificação de RNA viral inde- durante a gestação, independentemente de ter feito profilaxia
tectável realizado entre 1 e 18 meses de idade, sendo um teste de- no parto, ou apresenta carga viral desconhecida ou superior a
pois de 4 meses de idade. Recomenda-se realizar sorologia anti-HIV 1.000 cópias/mL com 34 semanas ou mais de gestação, além da
com mais de 12 meses para confirmação da sororeversão. Valores zidovudina, administram-se três doses de nevirapina via oral.
de carga viral até 5.000 cópias/ml sugerem resultados falso-positi- a a
A 1 dose deve ser aplicada até 48 horas de vida, a 2 , 48 horas
vos, sendo necessária nova avaliação. a a a
após a 1 dose, e a 3 , 96 horas após a 2 dose. A dose recomenda-
Além dos testes específicos, outros exames podem auxiliar no diag- da é de 8 mg/dose (0,8 mL) para RN com peso ao nascer de 1.500
nóstico ou na orientação terapêutica das infecções congênitas. a 2.000 g e de 12 mg/dose (1,2 mL) para RN com peso maior do
Com exceção da hepatite B, todas as infecções congênitas citadas que 2.000 g.
podem apresentar anemia e trombocitopenia. A infecção por CMV O aleitamento materno está contraindicado no RN de mãe HIV-
pode estar acompanhada de leucocitose com atipia linfocitária, -positivo.
toxoplasmose de eosinofilia, sífilis de leucopenia, leucocitose ou
reação leucemoide.
Com exceção da hepatite B e da Aids, nas infecções congênitas,
ocorre aumento do número de células e proteínas no LCS. ■■ REFERÊNCIA
Calcificações intracranianas, atrofia cortical, dilatação ventricular, 1. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Protocolo
coleções subdurais e encefalomalácia podem ser observadas na US clínico e diretrizes terapêuticas para prevenção da transmissão vertical
e na RM de crânio. de HIV, Sífilis e hepatites virais [Internet]. Brasília: MS; 2015. [capturado
em 13 set. 2016]. Disponível em: http://www.aids.gov.br/sites/default/
O exame oftalmológico é importante para o diagnóstico de corior-
files/anexos/publicacao/2015/58572/pcdt_transm_vertical_091215_
retinite no CMV, rubéola, herpes, varicela, toxoplasmose e sífilis;
pdf_12930.pdf.
catarata, na rubéola, herpes, varicela e toxoplasmose; glaucoma, na
rubéola, toxoplasmose, sífilis; e microftalmia, na rubéola, herpes,
varicela e toxoplasmose.
■■ LEITURAS SUGERIDAS
A avaliação auditiva seriada deve ser feita em toda criança com sus-
Kadambari S, Williams EJ, Luck S, Griffiths PD, Sharland M. Evidence based
peita de infecção congênita.
management guidelines for the detection and treatment of congenital CMV.
O tratamento da sífilis congênita deve ser feito sempre com penicilina.
Early Hum Dev. 2011;87(11):723-8.
Quando existe comprometimento do LCS, deve-se administrar peni- Kimberlin DW, Baley J. Guidance on management of asymptomatic neonates
cilina cristalina. Se não existe alteração do LCS, o tratamento pode born to women with active general herpes lesions. Pediatrics. 2013;131(2):
ser feito com penicilina procaína ou cristalina. e635-46.
A penicilina benzatina pode ser aplicada quando a gestante não foi Kimberlin DW, Jester PM, Sánchez PJ, Ahmed A, Arav-Boger R, Michaels MG, et
adequadamente tratada e o RN for VDRL negativo, sem alterações al. Valganciclovir for symptomatic congenital cytomegalovirus disease. N
clínicas, radiológicas, hematológicas e do LCS, e for garantido o se- Engl J Med. 2015;372(10):933-43.
guimento. A benzatina também deve ser utilizada quando a gestan- Lamont RF, Sobel JD, Carrington D, Mazaki-Tovi S, Kusanovic JP, Vaisbuch E,
te foi adequadamente tratada, o RN for assintomático, com VDRL Romero R. Varicella-zoster virus (chickenpox) infection in pregnancy. BJOG.
negativo, mas o seguimento ambulatorial não for garantido. 2011;118(10):1155-62.
Neu N, Duchon J, Zachriah P. TORCH Infections. Clin Perinatol. 2015;42:77-103.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 269
a definição do diagnóstico estabelece a evolução, baseada na história na- exemplos de síndromes que apresentam esse mecanismo de herança as
tural da doença, e orienta a família quanto ao risco de recorrência. síndromes de Prader-Willi e de Angelman e as síndromes de Beckwith e
Síndromes malformativas de causa cromossômica: geralmente de Silver-Russell.
apresentam como principais sinais clínicos: retardo de crescimen- Antecipação gênica consiste no mecanismo básico de algumas doen-
to intrauterino; baixa estatura; atraso no desenvolvimento; sinais ças monogênicas, como síndrome do X frágil, coreia de Huntington, distro-
menores em face; e alguma anomalia maior. As anomalias cromos- fia muscular de Steinert e ataxias espinocerebelares. Entre essas, apenas
sômicas podem ser do tipo numérica ou estrutural, e essa definição a distrofia muscular de Steinert pode manifestar-se no período neonatal.
é importante para a determinação do diagnóstico e do risco de Em geral, os genes associados a essas doenças apresentam unidades re-
recorrência familial. Atualmente, com a utilização de técnicas de petidas de três ou mais nucleotídeos de forma adjacente. Quando o gene é
citogenética molecular, é possível identificar pequenos desarranjos passado de uma geração à outra, o número de repetições pode aumentar
genômicos, microdeleções ou microduplicações cromossômicas, além do limite polimórfico normal, levando a anomalias de expressão do
denominadas variações do número de cópias (CNVs). Alguns estu- gene.
dos demonstraram que a utilização da técnica de CGHarray (hibri- Quando o paciente apresenta um conjunto de anomalias decorren-
dização genômica comparativa) identifica entre 14 a 18% de CNVs tes de um único defeito, este é denominado sequência malformativa, por
em neonatos apresentando anomalias congênitas. exemplo, obstrução de vias urinárias levando à hipoplasia pulmonar e
Síndromes malformativas de causa monogênica: geralmente anomalias de face e algumas vezes artrogripose.
apresentam um fenótipo específico e nem sempre exibem atraso As associações consistem em um conjunto de anomalias que apare-
no desenvolvimento. São causadas por mutações em um único cem juntas, em uma frequência maior do que seria esperado para uma
gene e classificadas, de acordo com a localização do gene, em associação casual e não correspondem a nenhuma síndrome conhecida,
doenças autossômicas ou ligadas ao cromossomo X. Quando as como as associações VACTERL e MURCS.
alterações fenotípicas são produzidas pela dose única de determi- As sequências e associações em geral apresentam baixo risco de re-
nado gene, são denominadas dominantes. Quando os fenótipos corrência na prole do casal.
requerem dose dupla de determinado gene, são chamados de re-
cessivos. A determinação do padrão de herança tem implicação ANOMALIAS CONGÊNITAS E ERROS
direta no risco de recorrência da mesma anomalia na irmanda- INATOS DO METABOLISMO
de do propósito. Nesse caso, é possível atualmente determinar
Algumas anomalias congênitas, isoladas ou associadas, embora cons-
a variante genética presente no propósito por meio de métodos
tituam alterações dismórficas, podem ser causadas por erros inatos do
de genética molecular, sequenciamento gênico ou painel genéti-
metabolismo (EIM). Nesse caso, o diagnóstico correto tem implicância no
co por sequenciamento de nova geração (NGS) nas doenças com
tratamento e na evolução do paciente. No Quadro 30.2, estão demonstra-
heterogeneidade genética – ou seja, causada por vários genes. No
dos essas doenças, as anomalias frequentes, os métodos diagnósticos e os
entanto, em ambos os casos, deve ser indicado quando o fenótipo
respectivos tratamentos.
for indicativo de diagnóstico específico, o que nem sempre acon-
tece no neonato.
O quadro clínico das doenças monogênicas é bastante variado, e as ATENÇÃO!
principais manifestações podem ser classificadas dentro de grupos noso-
lógicos específicos. A classificação do paciente dentro dos grupos especí- No paciente com anomalias congênitas, o diagnóstico diferencial com
ficos orienta a investigação etiológica. São eles: erro inato do metabolismo é importante para determinar o tratamento
síndromes com baixa estatura; e a melhor evolução do paciente.
síndromes macrossômicas;
síndromes com defeitos faciais como principais características;
síndromes com defeitos de membros e face;
■■ DIAGNÓSTICO
síndromes com defeitos em membros;
osteocondrodisplasias; Para o diagnóstico dos pacientes com malformações congênitas e/ou
síndromes com cranioestenoses; doenças genéticas, deve-se aplicar a propedêutica em genética médica,
doenças do tecido conectivo; que inclui os métodos gerais em clínica médica mais os procedimentos
harmatoses; específicos, que devem sempre ser executados por um geneticista clínico.
displasias ectodérmicas.
Algumas síndromes malformativas podem ser causadas por mecanis- ANAMNESE
mos de herança denominados não clássicos. Constituir história clínica abrangendo: história familial, do pré-natal e
As doenças de herança mitocondrial são causadas por mutações em evolução neonatal, incluindo dados de nascimento e evolução no período
genes do DNA mitocondrial. As manifestações clínicas sempre envolvem pós-natal.
os sistemas nervoso e muscular, apresentando hipotonia importante. A Na história familial, são informações importantes: presença de con-
herança é materna, e o quadro clínico pode ser extremamente variável, sanguinidade, outros afetados e o grau de parentesco desses afetados
devido à heteroplasmia – distribuição aleatória das mitocôndrias dentro com o propósito. A história reprodutiva também deve ser obtida, incluindo
das células. a ocorrência de abortamentos frequentes ou óbitos neonatais em gesta-
Imprinting ou impressão genômica consiste na expressão de um ções anteriores. Devem ser construídos heredogramas com as informações
gene dependente de sua origem parental, ou seja, a expressão do gene obtidas. O principal objetivo da história é, muitas vezes, definir o padrão
é diferente se ele foi herdado no cromossomo paterno ou materno. Se de herança da anomalia.
o paciente apresentar dois cromossomos herdados de um único genitor História do pré-natal: deve-se questionar sobre atividade e
(dissomia uniparental – DUP), o equilíbrio pode ser alterado. Constituem crescimento fetal. Exposição materna a infecções, doenças, fe-
272 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Catarata congênita Galactosemia Dosagem enzimática (GALT, GALE, Retirada da galactose; introdução
GALK) de fórmula de soja ou hidrolisados
sem lactose
Agenesia de corpo caloso, Acidúria D-2-hidroxiglutárica Dosagem de ácidos orgânicos Alguma melhora com cofatores:
hemorragia intracraniana e urinários (aumento da excreção de riboflavina e L-carnitina
anomalias faciais ácido D-2-hidroxiglutárico
Microcefalia congênita Acidúria 2-cetoglutárica Dosagem de ácidos orgânicos Algumas formas podem ser
urinários (aumento da excreção de responsivas à tiamina
ácido 2-cetoglutárico)
Fenótipo marfanoide, alta estatura, Homocistinúria por deficiência de Dosagem de homocisteína Piridoxina (vitamina B6) nas formas
aracnodactilia, alta miopia e cistationa-β-sintase responsivas
subluxação do cristalino Dieta específica +
vitamina B6, ácido fólico e betaína
Ptose, oftalmoplegia, miopatia Doenças mitocondriais Biópsia muscular com histologia, Tratamento das manifestações
proximal, miocardiopatia, surdez imuno-histoquímica, dosagem de apresentadas
neurossensorial, atrofia óptica, atividade enzimática dos diversos Adição de cofatores: riboflavina,
retinopatia pigmentar e anomalias complexos da cadeia respiratória tiamina, L-carnitina e coenzima Q10
de sistema nervoso e/ou pesquisa molecular
Microcefalia, anomalias de SNC, face Deficiência do complexo piruvato- Dosagem do complexo enzimático Dieta cetogênica
semelhante à síndrome fetal alcoólica -desidrogenase e/ou pesquisa molecular
Anomalias de sistema nervoso, Doenças peroximais: Perfil de ácidos graxos de cadeia Tratamento das manifestações
renais, esqueléticas doença de Zellweger e variantes, muito longa clínicas
condrodisplasia punctata
Anomalias genitais, esqueléticas e Defeitos na síntese de colesterol: Hipocolesterolemia, elevação do Suplementação de colesterol
de sistema nervoso síndrome Smith-Lemli-Opitz precursor do colesterol
síndrome Conradi-Hünermann-Happle;
CHILD
displasia esquelética de Greenberg,
dermosterolose
Anomalias afetando múltiplos Defeitos da glicosilação congênita Focalização isoelétrica da Tratamento das manifestações
sistemas (CDG) transferrina e pesquisa molecular clínicas, dieta hipercalórica e na CDG
tipo Ib, suplementação com manose
bres altas, uso de medicações, exames radiológicos; utilização de Evolução pós-neonatal: questionar sobre intercorrências clínicas
substâncias com ou sem prescrição, álcool e fumo. Todos os dados e cirúrgicas, internações hospitalares. Obter dados sobre os marcos
devem ser investigados e anotados. de aquisição motora e cognitiva.
História neonatal: informações sobre idade gestacional, escore de
Apgar, medidas antropométricas (peso, comprimento e perímetro EXAME FÍSICO
cefálico), quantidade e aspecto do líquido amniótico, alterações na Deve-ser proceder ao exame físico geral, ao exame especial genético-
placenta. -clínico, com descrição detalhada do fenótipo, e ao exame antropométri-
Evolução neonatal: interrogar sobre intercorrências apresentadas co. A impressão visual geral do paciente (gestalt) serve para direcionar o
no berçário, presença de sucção. raciocínio clínico.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 273
Na antropometria, são obtidas várias medidas corporais, que são Esse exame é indicado em todos os quadros de anomalias
comparadas com valores de referência em gráficos e tabelas específi- associadas.
cas de acordo com o gênero e a idade. São obtidas as seguintes me- 2 | Técnicas de citogenética molecular:
didas: peso; estatura (ou comprimento); perímetro cefálico; distâncias Hibridação in situ por fluorescência (FISH): combina a análise
intercantais; distância interpupilar; comprimento da orelha; perímetro cromossômica com o uso de marcadores (probes) moleculares
torácico; distância intermamilar; envergadura; distância púbis-plantar, fluorescentes, que são adicionados à preparação dos cromosso-
segmentos superior e inferior; comprimento da mão, do dedo médio e mos. Esse método baseia-se no fenômeno da hibridação de fitas
dos pés. complementares de DNA. FISH é uma ferramenta fundamental na
Se uma síndrome específica foi identificada, deve, então, ser inves- identificação de microdeleções ou microduplicações específicas,
tigada na literatura médica e suas características comparadas com as do bem como na identificação da origem de material cromossômico
paciente. Quando o diagnóstico for desconhecido, todas as características extra.
maiores e menores podem ser listadas e servir como ponto de partida para Hibridação genômica comparativa (CGH) microarray: permite
a investigação do diagnóstico. a detecção de desequilíbrios citogenéticos muito pequenos para
A Figura 30.1 mostra o fluxograma para determinação do diagnóstico serem evidenciados pelas técnicas de análise cromossômica de
em pacientes com malformações múltiplas. rotina. O teste pode detectar perda (deleção) ou ganho (duplica-
ção) de regiões cromossômicas. É indicado nos casos de síndromes
malformativas sem diagnóstico clínico definido e estudo cromos-
sômico normal. Os resultados devem ser analisados e comparados
CRIANÇA COM ANOMALIAS MÚLTIPLAS com arquivos específicos para definição de CNVs patogênicas ou
não patogênicas.
História Escolhe 1 a 3 | Técnicas de biologia molecular
3 sinais
Exame
morfológico ATENÇÃO!
Pesquisa na
literatura A pesquisa de mutação especifica somente poderá ser solicitada após
Reconhece criteriosa análise clínica e laboratorial e determinação da hipóte-
uma síndrome
se diagnostica, o que direcionará a pesquisa para uma determinada
Reconhece doença monogênica. Algumas metodologias diferentes podem ser em-
Sim Não uma síndrome pregadas para esse fim.
■■ TRATAMENTO
Uma vez estabelecido o diagnóstico, é possível determinar:
31
prognóstico individual do paciente com base na história natural
da doença. De acordo com cada caso, o paciente deve ser encami-
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DOS
nhado para acompanhamento clínico ou cirúrgico em outras espe- ERROS INATOS DO METABOLISMO
cialidades e, quando necessário, para terapias de estimulação do
desenvolvimento;
risco de recorrência: de acordo com o diagnóstico estabelecido e ■■ ANA MARIA MARTINS
seu padrão de herança, é possível determinar o risco da família em
futuras gestações, assim como a possibilidade de outros procedi- ■■ SANDRA OBIKAWA KYOSEN
mentos, como métodos de reprodução assistida;
a confirmação diagnóstica de um erro inato do metabolismo pode
implicar a introdução de terapêutica específica imediata (Quadro O conceito de erros inatos de metabolismo (EIM) foi proposto pela pri-
30.2) para evitar progressão da doença e, em alguns casos, para meira vez há mais de cem anos por Garrod, que também sugeriu serem
correção da anomalia congênita encontrada (p.ex., a catarata, na esses erros apenas a ponta emergente de um grande iceberg, composto
galactosemia, pode ser revertida com o uso da dieta isenta de ga- por pequenos erros individuais que afetariam diversas vias metabólicas.
lactose); Segundo Garrod, os organismos são caracterizados por uma individuali-
em algumas situações, o diagnóstico não pode ser estabelecido e o dade química; cada pessoa é única do ponto de vista bioquímico, pois é
resultado da atividade de muitas enzimas que contribuirão, em maior ou
paciente deverá ser acompanhado clinicamente;
menor grau, para as diferenças entre os indivíduos. Apesar da importância
em alguns casos, apesar de toda a investigação realizada, clínica
das observações feitas por Garrod, elas foram praticamente ignoradas por
e laboratorial, o diagnóstico não pode ser estabelecido, mesmo
cerca de 50 anos, quando os avanços tecnológicos permitiram que se de-
após um período de seguimento clínico. Nesse caso, deve-se
senvolvessem técnicas capazes de comprovar a teoria dos EIM.
orientar o paciente e sua família em relação à impossibilidade de
Os EIM são deficiências enzimáticas que interrompem uma via meta-
determinação do diagnóstico. No entanto, é importante ressaltar
bólica específica, podendo resultar em alterações de diversas etapas do
que, mesmo que o diagnóstico não tenha sido estabelecido, é
metabolismo. Muitos EIM são pleiotrópicos e, por esse motivo, podem
possível orientar quanto às terapias necessárias para estímulo do
comprometer o funcionamento de células, tecidos ou órgãos, resultando
desenvolvimento e tratamento das malformações apresentadas.
em sintomatologia complexa e dificultando o diagnóstico. Além disso,
etapas metabólicas posteriores e secundárias podem ser alteradas, ge-
rando comprometimento bioquímico e celular característico que leva a
REVISÃO outros tipos de disfunções celulares e teciduais. Toda essa complexidade
Em pacientes com anomalia congênita, deve-se realizar exame físico faz dessa classe de doenças genéticas um grupo importante a ser estu-
minucioso, para determinar a presença de anomalias menores as- dado, reconhecido e tratado, mas sobre o qual o conhecimento ainda é
sociadas, e investigação da presença de outras anomalias internas limitado.
maiores associadas. Os EIM são, na sua grande maioria, de herança autossômica recessi-
No caso de anomalia isolada, a investigação familial constitui um va, ou seja, têm um risco de recorrência de 25% a cada gestação de pais
aspecto importante para determinação do risco de recorrência heterozigotos. Algumas doenças são de herança ligada ao X, e quando a
familial. mutação está no X materno, o risco de recorrência é de 50% a cada gesta-
No caso de anomalias associadas, a determinação do quadro clínico ção para os gêneros masculino e feminino. Quando a mutação se encontra
e fenótipo morfológico pode levar a uma suspeita diagnóstica e a no X paterno, irá para 100% das filhas.
escolha dos exames específicos a serem realizados. Há, ainda, as chamadas doenças mitocondriais, causadas por muta-
Mesmo que o diagnóstico não seja estabelecido, o encaminha- ção no DNA mitocondrial, que correspondem a cerca de 20% das doenças
mento do paciente para terapias de estímulo do desenvolvimento mitocondriais; nelas, o risco de recorrência é de 100% de comprometimen-
é importante para melhorar seu desenvolvimento neuropsicomotor to dos filhos de ambos os sexos. As doenças mitocondriais, na sua maioria,
e possibilitar sua inclusão na comunidade. têm herança autossômica recessiva.
Os EIM são doenças genéticas raras com uma incidência acumulativa,
que é de 1 para 2.500; a prevalência de cada doença é bastante variável,
principalmente de acordo com a raça. No Brasil, não há dados sobre a
■■ LEITURAS SUGERIDAS
prevalência da maioria dos EIM.
Brunoni D, Martins AM, Cavalcanti DP, Cernach MCSP. Avaliação genética do
São conhecidas, hoje, mais de 700 doenças humanas causadas por
recém-nascido. Brasília: AMB/CFM; 2007.
EIM, número que cresce constantemente devido às novas técnicas de iden-
Brunoni D, Perez ABA. Guia de genética médica. São Paulo: Manole; 2013.
tificação dos diversos fenótipos bioquímicos. Entretanto, a incidência dos
Jones KL, Adam MP. Evaluation and diagnosis of the dysmorphic infant. Clin
Perinatol. 2015;42(2):243-61. EIM não tem acompanhado esses acréscimos, provavelmente porque o seu
Saudubray JM, van den Berghe G, Walter JH, editors. Inborn metabolic diseases. diagnóstico está sendo subestimado.
diagnosis and treatment. 5th ed. Berlin: Springer; 2012. A falha no diagnóstico nos EIM decorre de uma série de fatores:
Schiefelbein JH, Cheeseman SE. Principles of genetics and their clinical são considerados individualmente raros, levando muitos médicos à
application in the neonatal intensive care unit. Crit Care Nurs Clin North pesquisa dessa etiologia somente quando as causas mais frequen-
Am. 2009;21(1):67-85. tes forem afastadas;
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 275
as amostras de urina e sangue para investigar um erro metabóli- cos e esse acúmulo pode desorganizar, de forma generalizada, os
co têm momento certo, com relação à doença aguda, para serem componentes celulares. Atualmente, sabe-se que as DDL podem
coletadas; e ser causadas não apenas pelo simples acúmulo do substrato, mas
muitos EIMs produzem anormalidades intermitentes. também resultar da alteração de complexos mecanismos de sina-
lização celular. Essa disfunção no processo de sinalização celular
leva a alterações bioquímicas e estruturais secundárias, que contri-
■■ CLASSIFICAÇÃO
buem para a fisiopatologia das DDL. Os tecidos mais afetados são
Muitas são as formas de classificar os EIMs, uma vez que são doenças aqueles nos quais a substância é normalmente catabolizada em
caracterizadas por extrema diversidade. Muitos sistemas de classificação grandes quantidades.
já foram propostos, mas, em geral, os EIMs podem ser categorizados de
acordo com o principal órgão envolvido (como nas doenças neurológicas e
hepáticas), a organela afetada (mitocôndrias, peroxissomos, lisossomos), ■■ QUADRO CLÍNICO
a idade de apresentação (formas neonatal, adulta), o tipo de molécula en- Os primeiros sintomas dos EIMs aparecem com maior frequência durante a
volvida (macromoléculas ou moléculas difusíveis), entre outros. Contudo, infância, ainda que, muitas vezes, não sejam reconhecidos pelo pediatra,
todas essas abordagens são informativas e não existe um sistema univer- mas também podem aparecer na adolescência ou até na vida adulta.
sal de classificação. Considerando a perspectiva terapêutica, as doenças A proporção de pacientes que têm o primeiro sintoma de um EIM na
metabólicas podem ser divididas em três grupos principais: faixa etária adulta ainda é desconhecida, tendo como principais manifes-
Grupo 1 – Doenças que cursam com sintomas de intoxicação: tações neurológicas as emergências (encefalopatias agudas e AVC), os
inclui EIM intermediário que levam a intoxicações agudas ou pro- distúrbios do movimento, as neuropatias periféricas, a paresia espástica,
gressivas em razão do acúmulo de compostos potencialmente as ataxias cerebelares, os transtornos psiquiátricos, a epilepsia e as leuco-
tóxicos próximo à etapa metabólica interrompida. Nesse grupo, encefalopatias, além das alterações endócrinas e hipoglicêmicas.
estão os erros inatos do catabolismo de aminoácidos (fenilcetonú- Várias alterações clínicas e laboratoriais podem ser associadas com
ria, doença do xarope de bordo, homocistinúria, tirosinemia, entre os EIMs, sendo algumas delas raras e distintas, mas que podem estar
outros), a maioria das acidúrias orgânicas (acidemia metilmalônica, presentes no mesmo paciente, como nos casos da luxação de cristalino e
propiônica, isovalérica etc.), defeitos do ciclo da ureia, intolerância fenômenos tromboembólicos nos pacientes com homocistinúria. Há outras
a açúcares (galactosemia, intolerância hereditária à frutose), intoxi- manifestações relativamente frequentes e inespecíficas na prática diária,
cações por metais (doença de Wilson, hemocromatose) e porfirias. como hepatomegalia, convulsões e retardo mental.
A maioria das doenças nesse grupo compartilha sinais clínicos, No Grupo 1 (Quadro 31.1), as manifestações podem ocorrer em qual-
não interferem no desenvolvimento embriofetal e se apresentam quer faixa etária (neonato, criança, adolescente ou adulto) e ser decor-
com períodos livres de sintomas intercalados por sinais clínicos de rentes de intoxicação aguda, apresentando quadro de recusa alimentar,
intoxicação aguda (vômito, coma, complicações tromboembólicas, hipoatividade, letargia, vômitos recorrentes, desidratação, acidose meta-
falhas hepáticas) e crônica (falha em ganhar peso, atraso de desen- bólica, aumento de amônia, hipoglicemia, hiperglicemia, que pode lem-
volvimento, luxação do cristalino, miocardiopatia). brar o quadro clínico da septicemia. É importante avaliar os fatores de
Grupo 2 – Doenças que envolvem o metabolismo energético: risco para sepse, principalmente quando sem confirmação laboratorial, e
consiste em erros no metabolismo intermediário com sintomas, lembrar que pode ser um EIM.
pelo menos em parte, devidos à deficiência na produção ou utili- A intoxicação crônica pode levar à dificuldade de ganho de peso
zação de energia, com comprometimento de órgãos como fígado, e crescimento, transtornos do comportamento, atraso do desenvolvi-
cérebro, coração, músculos, entre outros. Esse grupo inclui EIM mento neuropsicomotor (DNPM), retardo mental e alterações oculares
intermediário, que afeta o processo energético citoplasmático ou e hepáticas.
mitocondrial. Entre os que envolvem o processo citosólico, estão os
defeitos que afetam a glicólise, a glicogenose e a gliconeogênese,
as hiperinsulinemias, bem como as vias das pentoses e creatina QUADRO 31.1 ■ Manifestações clínicas de intoxicação aguda e
fosfato. Defeitos mitocondriais incluem distúrbios relacionados à crônica das doenças do Grupo 1
cadeia respiratória, ao ciclo de Krebs e à oxidação do piruvato, e
AGUDAS CRÔNICAS
defeitos de oxidação dos ácidos graxos e corpos cetônicos.
Grupo 3 – Doenças que envolvem moléculas complexas: nesse Acidose metabólica Atraso progressivo do
grupo, encontram-se doenças que envolvem organelas celulares, Alcalose respiratória desenvolvimento
incluindo lisossomos, peroxissomos e defeitos no retículo endo- Hiperamonemia Transtornos do comportamento
plasmático/complexo de Golgi (glicosilação e síntese de colesterol). Hipoglicemia Retardo de crescimento
Inclui doenças em que ocorrem alterações na síntese ou no cata- Insuficiência hepática Hipotonia, hipertonia
bolismo de moléculas complexas. Os sintomas são permanentes, Complicações tromboembólicas Macrocefalia, microcefalia
progressivos, independentes de eventos intercorrentes e não estão Desidratação Epilepsia de difícil controle
relacionados com a ingestão de alimentos. Vômitos Alterações oculares
As doenças de depósito lisossômico (DDL) – EIMs causados Letargia, coma
Cetose
pela deficiência de enzimas lisossômicas envolvidas na degradação
Icterícia
de macromoléculas – estão incluídas nesse grupo. A diminuição
Hepatomegalia
ou ausência de atividade dessas enzimas causa um progressivo
Odor anormal
acúmulo intracelular de substratos, geralmente polímeros que não
podem ser hidrolisados. Além disso, os substratos podem ser tóxi-
276 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
A classificação descrita tem sido muito útil na prática diária, por auxiliar Reação do cianeto- Homocisitinúria, cistinúria
a visualização dos EIMs como um todo, dirigindo o raciocínio diagnóstico -nitroprussiato
para os grupos de doenças, o que é possível com a clínica e os testes
Teste do Homocistinúria, cistinúria
laboratoriais disponíveis.
nitroprussiato
De acordo com as características da doença, presença de hepato-
de prata
megalia, acidose metabólica, hipoglicemia ou outro sintoma, é possível
determinar o grupo ao qual a doença pertence e trilhar o caminho do diag- Reação de azul de Mucopolissacaridoses; positivo também para
nóstico. toluidina síndrome de Marfan, mastocitose, artrite
A rotina no serviço médico é solicitar rastreamento urinário para EIM reumatoide e carcinomatose
(Quadro 31.3), que são testes colorimétricos qualitativos, e rastreamento
Reação de Erlich Porfiria
sanguíneo – exames realizados rotineiramente em laboratórios de análises
clínicas, sempre com um período de jejum variável de acordo com a idade, Cromatografia de Detecção de aminoacidopatias
que inclui os seguintes exames: gasometria venosa, lactato sérico em je- aminoácidos
jum e após 1 hora e meia de alimentação com sobrecarga de carboidrato,
CTMA: brometo de cetiltrimetilamônio.
sódio, potássio, cloro, glicemia, hemograma, amônia, enzimas hepáticas,
colesterol total e frações, TGs, ácido úrico, creatinocinase (CK), aldolase e
desidrogenase láctica (DHL). Os rastreamentos urinários e sanguíneos são indicados nos Grupos 1
e 2, e na suspeita de EIM sem grupo definido. Quando a suspeita é do Gru-
po 3, a investigação poderá incluir exames subsidiários, como radiografia,
ATENÇÃO! RM cerebral, dosagens de metabólitos urinários específicos e dosagem de
É importante salientar que quando a hipótese de EIM é aventada, os atividade enzimática na dependência do quadro clínico do paciente.
rastreamentos urinários e sanguíneos devem ser solicitados juntos, A análise dos resultados dos rastreamentos urinário e sanguíneo
porque muitas vezes o rastreamento urinário é negativo, e o médico determinará a necessidade de exames subsequentes para se chegar ao
erroneamente pode concluir que o diagnóstico foi afastado. diagnóstico, como dosagem de ácidos orgânicos e cromatografia de ami-
noácidos. A dosagem de ácidos orgânicos na urina tem se mostrado muito
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 277
mentos complementares ou de transição. Alimentação complementar em oferecê-los em pequenas quantidades a partir do 6o mês até o 7o mês
é o conjunto de alimentos, além do leite materno, oferecidos durante o de vida.
período de aleitamento. A introdução de alimentos complementares visa a A fruta, sob a forma de papa amassada ou raspada, consiste no 1o
fornecer energia, proteínas, vitaminas e sais minerais que complementem alimento complementar que deve ser oferecido ao lactente, segundo a
os nutrientes fornecidos pelo leite humano. SBP. Ao adquirir as frutas, é preciso respeitar sua regionalidade e sazo-
nalidade, pois, além de mais saborosas e nutritivas, apresentarão menor
custo. Papas de frutas devem ser preparados próximos ao momento do
ATENÇÃO! consumo, sem adição de açúcar. Segundo a SBP3 e a AAP,4 o consumo
de suco de frutas tem sido preconizado após o 6o mês de vida, prefe-
A inadequação da alimentação complementar na saúde da criança
rencialmente por meio de copos, limitado a 100 mL por dia. Sabe-se dos
está associada ao desequilíbrio entre o consumo e as necessidades
benefícios do consumo de suco de frutas, alimento fonte de vitaminas,
energéticas e/ou de nutrientes, que poderá repercutir no crescimento
principalmente a vitamina C, mas há desvantagem quanto ao excesso de
e no desenvolvimento, na suscetibilidade às infecções e no desenvolvi-
volume oferecido – por ser muito saboroso, passa a ser consumido em
mento do comportamento alimentar.
detrimento da ingestão de outros alimentos, prejudicando a variedade
da dieta, contribuindo para a deficiência de micronutrientes e favore-
Após o 6o mês de vida, o lactente necessita de alimentos comple- cendo a obesidade e o aparecimento de cáries dentárias. O suco de fruta
mentares para atingir completamente as suas necessidades nutricionais. apresenta grande quantidade de água e carboidratos (frutose, glicose,
Ao iniciar a alimentação complementar, deve-se considerar a maturidade sacarose, sorbitol) e baixa quantidade de proteínas e minerais. Assim, a
a
fisiológica e neurológica da criança e suas necessidades nutricionais. A 1 opção de fornecimento de frutas ao lactente torna-se a papa de frutas,
velocidade de ganho ponderoestatural do lactente diminui no 2o semestre por sua maior densidade energética por volume, por sua melhor qualida-
em relação ao 1o. Deve-se manter o aleitamento materno, pois o lactente de nutricional, como as fibras, além de que somente requer a utilização
necessita de um período de adaptação entre a dieta exclusivamente láctea da colher.
e a boa aceitação dos alimentos complementares. O leite materno ou o A papa de legumes com carne para almoço e jantar será iniciada
uso de fórmulas infantis modificadas deve contribuir para a quantidade de logo após a criança estabelecer o controle da deglutição e aceitação das
energia e de macro e micronutrientes nessrepla fase de transição. frutas, entre 7 e 15 dias do início da alimentação complementar, ofe-
Atualmente, para as crianças em uso de fórmulas infantis, a introdu- recendo-a no horário da mamada do almoço. Para mantê-la consisten-
ção da alimentação complementar deve seguir o mesmo esquema preco- te, será elaborada com alimentos cozidos, amassados com garfo e com
nizado para aquelas em aleitamento materno exclusivo, ou seja, a partir quantidade mínima da água do cozimento. Após o cozimento, a carne
o
do 6 mês de vida. utilizada pode ser oferecida na forma moída, picada ou desfiada, res-
A alimentação complementar compreende alimentação variada e co- peitando-se a capacidade de mastigação. Esse alimento contribui para a
lorida, preparada em condições apropriadas de higiene, com quantidades oferta de energia e nutrientes essenciais para o crescimento e desenvol-
adequadas de energia, macro e micronutrientes. Deve ser de fácil preparo, vimento, como o ferro e os ácidos graxos essenciais. Para o seu preparo,
utilizando alimentos habituais da família, com custo aceitável, sem exces- não se deve utilizar sal, nem refogar com óleo vegetal. Os condimentos
so de sal ou condimentos e que tenha boa aceitação pela criança. Não devem ser caseiros e frescos (cebola, alho e salsinha). Não se devem usar
está determinado qual alimento deva ser iniciado primeiro, o importante condimentos prontos industrializados. No início, a quantidade ingerida é
é que a introdução de alimentos seja gradual em quantidade e qualidade, pequena, como 2 a 3 colheres de sopa rasas, que devem ser aumentadas
respeitando a aceitação da criança, pois ela determinará a quantidade e gradualmente até 15 a 20 colheres de sopa rasas, segundo a aceitação
o ritmo de sua refeição. O esquema da introdução dos alimentos comple- de cada lactente.
mentares está descrito no Quadro 32.1. A refeição de crianças com idade entre 6 e 12 meses de idade deve
incluir: cereais/tubérculos/raízes (carboidratos complexos); gorduras (ener-
gia, ácidos graxos essenciais); carnes em geral (proteínas de alto valor
QUADRO 32.1 ■ Introdução de alimentos e faixa etária biológico, ferro hemínico, zinco, cobre); leguminosas (proteínas de baixo
valor biológico ferro não hemínico, fibras e vitaminas); legumes e verduras
FAIXA ETÁRIA TIPO DE ALIMENTO (vitaminas, minerais e fibras). É preciso lavar cuidadosamente os legumes
o e as verduras com água corrente e deixá-los de molho por 20 minutos em
Até 6 mês Leite materno
solução de água com hipoclorito de sódio (1 colher de sopa em 1 litro de
o
6 mês Introdução de frutas (papa) água). Para reduzir a quantidade de agrotóxicos, recomenda-se deixar os
alimentos imersos em bicarbonato de sódio por 20 minutos (1 colher de
6o-7o mês Introdução da 1a papa de legumes com carne sopa em 1 litro de água). Nunca os enxaguar com água após as imersões,
o o a apenas os deixe secar em um recipiente limpo. Esses grupos de alimentos
7 -8 mês Introdução da 2 papa de legumes com carne no
almoço e no jantar
estão descritos no Quadro 32.2.
O ovo inteiro cozido (gema e clara) pode ser introduzido após o 6o mês
de vida, porém não se deve utilizá-lo mole, devido ao risco de salmone-
lose. O ovo é um alimento que oferecerá uma opção de fonte proteica de
alta qualidade, mas não tem a mesma biodisponibilidade de micronutrien-
o
tes como ferro e zinco. O mel é proibido no 1 ano de vida, pois os esporos
de Clostridium botulinum podem causar botulismo.
As repetidas ofertas de alimentos colaboram para a formação de há-
bito e auxiliam na distinção do alimento não tolerado. A partir do momen-
to em que a criança aumentar a quantidade consumida e apresentar boa
o o
aceitação, será possível incluir o jantar, geralmente entre o 7 e o 8 mês
de vida.
A pirâmide alimentar é uma ferramenta prática que permite a seleção
de uma alimentação variada e saudável. Ela ilustra a variedade, a mode-
ração e a proporcionalidade entre os componentes da alimentação diária
(Tabela 32.1 e Figura 32.1).
QUADRO 32.3 ■ Suplementação de vitaminas e ferro Passo 6 | Oferecer à criança diferentes alimentos todos os dias. Uma
alimentação variada é, também, uma alimentação colorida.
VITAMINAS E MINERAIS NÃO SUPLEMENTAÇÃO Passo 7 | Estimular o consumo diário de frutas, verduras e legumes
Vitamina D nas refeições.
Passo 8 | Evitar açúcar, café, enlatados, frituras, refrigerantes, balas,
Necessidade diária de suplementação: 400 UI Aleitamento materno salgadinhos e outras guloseimas nos primeiros anos de vida. Usar sal
em vigência de aleitamento materno com exposição com moderação.
Ad-til® 2 gotas/d regular de sol* Passo 9 | Cuidar da higiene no preparo e manuseio dos alimentos;
(1 ml = 40 gotas → 10.000 UI/mL → Lactentes com garantir armazenamento e conservação adequados.
250 UI/gota) ingestão maior ou Passo 10 | Estimular a criança doente e convalescente a se alimentar,
Addera D3® 3 gotas/d igual a 500 mL de oferecendo a alimentação habitual e seus alimentos preferidos e res-
(1 mL = 25 gotas → 3.300 UI → 132 UI/gota) fórmula infantil diária peitando sua aceitação.
Ferro
Polivitamínicos
■■ LEITURAS SUGERIDAS
Utilização de leite de vaca Aleitamento materno Brasil. Ministério da Saúde. Saúde da criança: aleitamento materno e alimentação
Lactentes com ingestão complementar. 2. ed. Brasília: MS; 2015.
maior ou igual a 500 mL Koletzko B, Baker S, Cleghorn G, Fagundes Neto U, Gopalan S, Hernell O, et al.
de fórmula infantil diária Global standart for composition of infant formula: recommendations of an
ESPGHAN coordinated international expert group. J Pediatr Gastroenterol
*Atenção aos fatores de risco. Nutr. 2005;41(5):584-99.
REVISÃO
Os 10 passos da alimentação saudável do lactente, a seguir elencados, 33
refletem os principais pontos da alimentação do lactente:
Passo 1 | Dar somente leite materno até os 6 meses, sem oferecer AVALIAÇÃO E DISTÚRBIOS
água, chás ou quaisquer outros alimentos.
Passo 2 | A partir dos 6 meses, introduzir de forma lenta e gradual
DO CRESCIMENTO
outros alimentos, mantendo-se o leite materno até os 2 anos de idade
ou mais.
Passo 3 | Após os 6 meses, dar alimentos complementares (cereais, ■■ ROSANA FIORINI PUCCINI
tubérculos, carnes, leguminosas, frutas e legumes) três vezes ao dia,
■■ MARIA WANY LOUZADA STRUFALDI
se a criança receber leite materno, e cinco vezes ao dia, se estiver des-
mamada.
Passo 4 | A alimentação complementar deverá ser oferecida sem rigi-
dez de horários, respeitando-se sempre a vontade da criança. O crescimento é um processo complexo que integra, desde a vida intrau-
Passo 5 | A alimentação complementar deve ser espessa desde o iní- terina, fatores como a ação hormonal, a herança genética e o aporte nutri-
cio e oferecida com colher; começar com consistência pastosa (papas/ cional, relacionados ao ambiente socioeconômico e emocional. O acompa-
purês) e, gradativamente, aumentar a consistência até chegar à ali- nhamento do crescimento resulta da observação da estatura, considerada
mentação habitual da família. a expressão fenotípica da interação dos fatores genéticos com o meio
ambiente e essencial para a avaliação de possíveis inadequações nesse
282 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
processo. Vários elementos podem ser utilizados para elaborar a avaliação como o IMC, baseando-se em curvas de referência ou padrão, como as
do crescimento de uma criança, dentre os quais se destacam: avaliação curvas da OMS, também recomendadas pelo Ministério da Saúde.1
clínica (anamnese, exame físico), antropometria e estado nutricional, velo-
cidade de crescimento e maturação esquelética. VELOCIDADE DE CRESCIMENTO
Complementando a abordagem, é importante conhecer a velocidade e o
■■ ANAMNESE canal de crescimento de cada criança. Em geral, calcula-se a velocidade
de crescimento após seis meses de seguimento. Como o crescimento é
A história clínica deve conter dados sobre condições da gestação, inter- um processo contínuo, mas não linear no tempo, é caracterizado por sal-
corrências no período neonatal, antecedentes pessoais, desenvolvimento tos intercalados e períodos de “parada” de crescimento. O Quadro 33.2
neuropsicomotor, alimentação, uso crônico de medicações, estatura dos apresenta a velocidade de crescimento anual esperada para crianças pré-
pais e irmãos. As informações sobre o peso ao nascer e a idade gestacional -púberes, considerando-se uma velocidade inferior a 4 cm/ano como ina-
são importantes na avaliação do crescimento, pois, para os nascidos pe- dequada em qualquer faixa etária. Para os adolescentes, a velocidade de
quenos para a idade gestacional, a recuperação do canal de crescimento crescimento variará de acordo com o sexo e o início do aparecimento dos
(catch up) pode ocorrer até os dois anos de idade ou até os quatro anos em caracteres sexuais secundários (estadiamento puberal). Considerando-se
crianças nascidas prematuras. Deve-se destacar, ainda, que cerca de 10 a que o pico da velocidade de crescimento – estirão puberal – ocorrerá em
15% dessas crianças continuarão a apresentar um comprometimento da diferentes idades, existem curvas específicas de velocidade de crescimen-
estatura durante a infância e mesmo na vida adulta. to para essa faixa etária.
Para melhor caracterização da estatura de uma criança e avaliação
sobre a influência do potencial genético no seu crescimento, uma das
abordagens mais utilizadas para a previsão da estatura é a estatura-alvo, QUADRO 33.2 ■ Velocidade de crescimento anual na infância
que considera a média de estatura dos pais segundo a fórmula de Tanner.
O Quadro 33.1 apresenta a fórmula de cálculo da estatura-alvo, a partir da IDADE CRESCIMENTO (cm/ano)
qual se pode projetar o “canal familiar”, que será composto pela soma de
Até 1 ano 25
9 cm (2 DP) à estatura-alvo para cima e 9 cm para baixo. Essa forma da
previsão deve ser utilizada de forma criteriosa, apresenta algumas limi- 1-2 anos 12-13
tações, especialmente para crianças com grandes diferenças de estatura
entre os pais. 2-3 anos 8
3-anos 7
QUADRO 33.1 ■ Previsão de estatura-alvo conforme Tanner 4-9 anos (pré-púberes) 4-6
neuropsicomotor e estatura dos pais) e o exame físico detalhado (presença As outras causas de BE podem ser agrupadas de acordo com a pro-
de desvios fenotípicos, proporção corporal e estadiamento puberal) con- porcionalidade corporal, avaliada por meio das relações segmento supe-
tribuem para a elucidação da etiologia. A seguir, estão descritas as causas rior/inferior (SS/SI) e envergadura-estatura. Entre as causas de BE propor-
mais observadas de alta estatura: cionada, observam-se:
alta estatura constitucional; origem pré-natal: restrição de crescimento intrauterino (RCIU):
síndrome de Klinefelter; síndromes dismórficas (Noonan, Russel-Silver, Seckel, Aarskog);
síndrome de Marfan; aberrações cromossômicas (trissomias 13, 18 e 21 [síndrome de
síndrome de Sotos; Down], síndrome de Turner [45X]);
síndrome XYY; origem pós-natal: desnutrição; insuficiência renal; doenças pul-
tirotoxicose; monares; doenças cardíacas; doenças gastrintestinais; depriva-
gigantismo hipofisário. ção psicossocial; alterações hormonais. Entre as causas de origem
pós-natal, as doenças sistêmicas que interferem no crescimento
BAIXA ESTATURA são as mais frequentes, com baixa prevalência de desnutrição.
A baixa estatura (BE) é definida como uma condição na qual a estatura As alterações hormonais correspondem a cerca de 3 a 5% dos
de um indivíduo está abaixo de dois DP em relação à média de estatura casos de BE.
correspondente para determinada idade e sexo de uma população de refe- As causas de BE em crianças com desproporção corporal incluem
rência. É considerada um indicador sensível da qualidade de vida de uma as displasias esqueléticas (p. ex., acondroplasias, hipocondroplasias), as
população e pode representar um sinal clínico de doenças de diferentes doenças ósseas metabólicas (p. ex., mucopolissacaridoses) e o raquitismo.
etiologias.
As causas mais comuns de baixa estatura encontram-se dentro da EXAMES SUBSIDIÁRIOS E ACOMPANHAMENTO
variabilidade normal do crescimento e não requerem ampliação na inves- Ao término da primeira consulta, podem ser solicitados exames subsidiá
tigação. Por sua vez, algumas afecções, como deficiência de GH, doença rios gerais, como hemograma e urina I, além da IO, factíveis em quase
celíaca ou síndrome de Turner, são exemplos de situações em que a BE todos os serviços e que trazem uma visão geral do paciente. Embora
pode ser o único achado clínico. O diagnóstico precoce e a terapêutica não seja mandatória a solicitação de cariótipo para todas as meninas
adequada modificarão o potencial de crescimento dessas crianças, embo- que apresentam baixa estatura, o fato de o diagnóstico precoce de
ra a pesquisa dessas doenças seja invasiva e dispendiosa. síndrome de Turner potencialmente modificar o prognóstico estatural
dessas pacientes aponta para a pertinência da realização desse exame,
frente às situações em que se observa associação de desvios fenotípi-
ATENÇÃO!
cos e baixa estatura sem etiologia definida. Atualmente, o rastreamento
Não estão definitivamente estabelecidos protocolos ou fluxogramas para pesquisa de doença celíaca por meio da dosagem de anticorpos
de investigação etiológica que apresentem alta especificidade e sen- antitransglutaminase é recomendado, pois a baixa estatura pode repre-
sibilidade. Assim, é necessário somar elementos na análise para evitar sentar forma atípica da doença. Outros exames devem ser solicitados
um excesso na solicitação de exames e procedimentos sem, contudo, de acordo com cada caso, tais como: gasometria, dosagens de cálcio,
deixar de realizar diagnósticos no momento oportuno. fósforo, fosfatase alcalina, ureia, creatinina, glicemia, função tiroidiana,
IGF-I, IGF-BP3.
Quadro clínico
A alta estatura é definida quando a criança está acima de dois DP da
curva de referência adotada, e suas principais causas são alta estatu- Na PHS, as lesões em geral são simétricas e variam desde a própria púr-
ra constitucional, síndrome de Klinefelter, síndrome de Marfan, sín- pura palpável até pápulas urticariformes ou bolhas hemorrágicas que po-
drome de Sotos, síndrome XYY, tirotoxicose e gigantismo hipofisário. dem evoluir para lesões necróticas. Acomete preferencialmente nádegas,
A baixa estatura é uma condição na qual a estatura de uma pessoa superfícies extensoras dos membros inferiores e cotovelos, raramente o
está abaixo de dois DP em relação à média de estatura correspon- tronco. O paciente pode apresentar dor abdominal, artralgia e/ou artrite e
dente para determinada idade e sexo, e suas causas mais comuns doença renal, caracterizada por proteinúria e hematúria.
estão relacionadas às variantes da normalidade do crescimento. A púrpura frequentemente se apresenta como uma condição autoli-
mitada, mas, em alguns pacientes, a doença renal pode ser progressiva,
evoluindo para falência renal. As lesões cutâneas em geral não necessitam
■■ REFERÊNCIA de tratamento e tendem a se resolver de forma espontânea, no prazo de
1. Brasil. Ministério da Saúde. Orientações para a coleta e análise de dados
1 a 2 meses.
antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de
Diagnóstico
Vigilância Alimentar e Nutricional – SISVAN [Internet]. Brasília: MS; 2011
[capturado em 15 set. 2016]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ Essencialmente clínico.
publicacoes/orientacoes_coleta_analise_dados_antropometricos.pdf.
Tratamento
Depende da apresentação clínica. O paracetamol ou o naproxeno podem
■■ LEITURAS SUGERIDAS ser indicados na vigência do quadro de artrite e/ou artralgia. Na ocor-
Argente J. Challenges in the management of short stature. Horm Res Paediatr. rência de nefrite ou quadro intestinal grave (risco de intussuscepção), o
2016;85(1):2-10. corticosteroide é a opção terapêutica. O tratamento com imunoglobulina
Boguszewski MC, Mericq V, Bergada I, Damiani D, Belgorosky A, Gunczler P, et
intravenosa, imunossupressores ou plasmaferese pode ser necessário na
al. Latin American Consensus: children born small for gestational age. BMC
vigência de doença renal grave.
Pediatr. 2011;11:66.Nwosu BU, Lee MM. Evaluation of short and tall stature
in children. Am Fam Physician. 2008;78(5):597-604.
Rogol AD, Hayden GF. Etiologies and early diagnosis of short stature and growth ■■ DISTÚRBIOS PLAQUETÁRIOS HEREDITÁRIOS
failure in children and adolescents. J Pediatr. 2014;164(5 Suppl):S1-14.e6.
DISTÚRBIOS PLAQUETÁRIOS
HEREDITÁRIOS QUALITATIVOS
Decorrem de defeitos nas plaquetas, produzindo distúrbios nas diferentes
34 fases que levam à formação do tampão hemostático plaquetário.
Trombastenia de Glanzmann
PÚRPURAS Doença hereditária de padrão autossômico recessivo, decorrente da de-
ficiência das glicoproteínas de membrana GIIb e GIIIa, que atuam como
receptores do fibrinogênio, levando consequentemente à falência da agre-
■■ JOSEFINA APARECIDA PELLEGRINI BRAGA gação primária da plaqueta.
Tratamento
■■ PÚRPURAS VASCULARES Envolve medidas profiláticas, como higiene dentária e evitar o uso de
Grupo heterogêneo de doenças caracterizadas por equimoses e sangra- medicamentos antiplaquetários. Nas ocorrências hemorrágicas de peque-
mento espontâneo de pequenos vasos. na intensidade, pode ser administrado acetato de desmopressina (DDA-
VP®). O controle do sangramento, nos casos de hemorragia grave, pode
PÚRPURA DE HENOCH-SCHÖNLEIN ser feito com a transfusão de plaquetas. Se necessário, fazer controle local
Púrpura vascular mais frequente na infância, a púrpura de Henoch- da hemorragia, como tampão nasal no caso de epistaxe. A utilização do
-Schönlein (PHS) caracteriza-se por púrpura palpável, correspondendo a ácido aminocaproico ou do ácido tranexâmico, em virtude da ação antifi-
uma vasculite leucocitoclástica envolvendo vasos pré-capilares, capilares brinolítica, pode auxiliar em situações de sangramentos leves, mas devem
e pós-capilares. ser utilizados por curto período.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 285
Síndrome de Bernard-Soulier precoce é fundamental para que sequelas possam ser prevenidas, como a
Doença hereditária de transmissão autossômica recessiva, a síndrome doença pulmonar crônica.
de Bernard-Soulier também pode ser transmitida de forma autossômica Tratamento
dominante. Caracteriza-se pela presença de plaquetas gigantes, e o de-
Deve ser feito com o uso profilático de imunoglobulina intravenosa, tera-
feito principal é a ausência ou alteração na expressão do complexo das
pia antimicrobiana e suporte nutricional. Na vigência de infecção, deve-se
glicoproteínas Ib-IX-V, ocorrendo um defeito na ligação ao fator de von
coletar as culturas e iniciar a antibioticoterapia enquanto as culturas são
Willebrand e alterando a adesão da plaqueta ao endotélio.
aguardadas. O transplante de medula óssea está indicado para o paciente
Quadro clínico que tiver doador de medula óssea compatível.
Manifesta-se com a presença de equimoses e sangramento gengival, e,
nas meninas, menorragia por ocasião da menarca. ■■ PÚRPURAS TROMBOCITOPÊNICAS
Diagnóstico TROMBOCITOPENIA IMUNE PRIMÁRIA
No diagnóstico laboratorial, pode haver trombocitopenia em graus variados,
Em 2009, foi sugerida a mudança do nome da púrpura trombocitopênica
com presença de macroplaquetas (plaquetas gigantes). A agregação das
idiopática para trombocitopenia imune primária (PTI) porque a etiologia
plaquetas é normal, porém a agregação com a ristocetina é deficiente, não
imune é bem conhecida (não é mais considerada idiopática) e nem todos
sendo corrigida com o acréscimo de plasma normal no teste laboratorial.
os pacientes têm sangramentos (púrpura). Como, em algumas populações,
Tratamento tem-se como contagem de plaquetas normal entre 100.000 e 150.000/
mm3, na PTI, por definição, plaquetopenia é considerada quando a con-
Semelhante ao da trombastenia de Glanzmann.
tagem de plaquetas é menor do que 100.000/mm3 na ausência de outras
DISTÚRBIOS PLAQUETÁRIOS causas de plaquetopenia. Quando o paciente for assintomático, a plaque-
topenia deve ser confirmada com duas novas coletas e com seguimento
HEREDITÁRIOS QUANTITATIVOS
clínico entre 2 e 6 meses.
Síndrome de Wiskott-Aldrich Outra mudança em relação à PTI foi quanto à temporalidade da dura-
Doença determinada pela mutação do gene WASP (proteína da síndrome ção da plaquetopenia. O termo PTI aguda (até seis meses de plaquetope-
de Wiskott-Aldrich [SWA]), sua transmissão é ligada ao cromossomo X. As nia) foi substituído por PTI recém-diagnosticada, definida por plaquetope-
plaquetas têm tamanho reduzido, e os pacientes apresentam plaquetope- nia por um período de até três meses. Como cerca de 50% dos pacientes
nia, infecções de repetição, sangramento mucocutâneo e eczema. normalizam as plaquetas de forma espontânea entre 6 e 12 meses, a PTI
crônica passou a ser considerada quando o paciente não remite do qua-
Quadro clínico e diagnóstico dro ou não mantém a resposta terapêutica após 12 meses de evolução. A
As manifestações clínicas e laboratoriais podem não ser evidentes nos pri- PTI persistente é aquela em que a plaquetopenia se mantém entre 3 e 12
meiros anos de vida, mas as alterações plaquetárias já estão presentes. meses do diagnóstico.
A SWA está associada à imunodeficiência combinada e a um risco maior A incidência estimada de PTI em crianças é 2,2 a 5,5 casos por 100
de desenvolvimento de doenças autoimunes e neoplasias. O diagnóstico mil crianças por ano.
286 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Contagem de plaquetas
Normal Diminuída
Congênita: Congênita:
Adquirida: Adquirida:
Síndrome Ehlers- Trombastenia de
PHS? Medicamentosa?
-Danlos? Telangiectasia Glanzmann?
Púrpura fulminante? Uremia?
hemorrágica Doença do pool
Púrpura factícia? Infecção viral?
hereditária? plaquetário?
principalmente no inverno e na primavera, quando as infecções virais apa- como tromboembolia venosa (TEV) e que os dados de segurança a longo
recem com maior frequência. Nas crianças com idade acima de 10 anos, prazo ainda são desconhecidos. Estudos em pediatria estão em andamento.
plaquetas maiores de 50.000/mm3, sangramentos leves (pele e mucosas) e Dessa forma, nos casos de PTI crônica com sangramento recorrente
início insidioso dos sintomas (mais de duas semanas), há maior chance de e refratário ao tratamento medicamentoso por mais de um ano, pode-se
evolução para a forma crônica. indicar a esplenectomia, com a qual se espera recuperação total ou parcial
A intensidade do sangramento na PTI é inversamente proporcional à das plaquetas em 80% dos casos.
contagem plaquetária, sendo que as maiores complicações hemorrágicas
3
podem ocorrer com contagem de plaquetas menor ou igual a 20.000/mm .
A incidência de hemorragia intracraniana (HIC) em crianças com PTI ATENÇÃO!
recém-diagnosticada é de cerca de 0,1 a 0,5%. Trauma craniano, presença
A PTI na infância geralmente é autolimitada e costuma não apresentar
de hematúria e o uso inadvertido de medicamentos antiagregantes pla-
sangramentos importantes, apesar da contagem plaquetária baixa, de
quetários parecem definir o grupo de alto risco para HIC na PTI.
modo que, para a maioria das crianças, a conduta pode ser expectante.
Diagnóstico
A história clínica e o exame físico são suficientes para o diagnóstico de A vacinação contra Streptococcus pneumoniae, Haemophilus influen-
PTI, exceto em casos em que se têm outros sinais/sintomas diferentes de zae e Neisseria meningitidis deve ser feita em todos os pacientes pelo me-
sangramento (como, por exemplo, esplenomegalia), alterações das outras nos duas semanas antes da esplenectomia; após a cirurgia, devem receber
séries do hemograma (anemia, alterações nos leucócitos ou neutrófilos) ou penicilina oral ou benzatina profilática por pelo menos dois anos para pre-
antes de iniciar o uso de corticosteroide. Nessas situações, o mielograma venir sepse por pneumococo. A vacinação anual contra os vírus influenza e
deve ser coletado. O mielograma permite o diagnóstico diferencial entre H1N1 também é recomendada.
causa medular (leucose, infiltração tumoral, aplasia de medula) e não me-
dular de plaquetopenia e PTI.
Pseudotrombocitopenia e satelismo plaquetário precisam ser afasta- REVISÃO
dos. Deve-se ter o cuidado para não diagnosticar como PTI as trombocito-
Henoch-Schönlein é a púrpura vascular mais frequente na infância e
penias hereditárias.
caracteriza-se por púrpura palpável.
PTI recém-diagnosticada não é vista em neonatos. Nesta faixa etária,
A púrpura de Henoch-Schönlein frequentemente se apresenta como
é importante avaliar a contagem de plaquetas da mãe, uma vez que a
uma condição autolimitada, mas em alguns pacientes, a doença re-
prevalência de plaquetopenia em recém-nascido de mães com PTI variou
nal pode ser progressiva, evoluindo para falência renal.
entre 15-50%, quando plaquetas maternas entre 50.000, e 100.000/mm3
Trombocitopenia imune primária é a principal causa de plaqueto-
e entre 4,9-44%, quando a plaquetopenia era grave (< 50.000/mm3).
penia na infância; a história clínica e o exame físico são suficientes
Tratamento para o diagnóstico.
A coleta do mielograma na trombocitopenia imune primária é im-
A família deve ser orientada sobre a PTI e ter fácil acesso ao hospital em
perativa nos casos em que se têm alterações das outras séries do
caso de sangramentos. Os pacientes com sangramento moderado a grave
hemograma, esplenomegalia, sinais/sintomas diferentes de sangra-
devem ser internados. É preciso evitar o uso de antiagregantes plaque-
mento, ou antes de iniciar o uso de corticosteroide.
tários (AAS, AINH, anti-histamínicos) ou anticoagulantes, além de não
realizar atividades físicas com risco de trauma craniano. O anti-histamínico
difenidramina pode ser utilizado.
■■ LEITURAS SUGERIDAS
A PTI na infância geralmente é autolimitada e costuma não apresen-
tar sangramentos importantes, apesar da contagem plaquetária baixa, de Braga JAP, Loggetto SR, Hoepers ATC, Bernardo WM, Medeiros L, Veríssimo MPA.
modo que, para a maioria das crianças, a conduta pode ser expectante. Guidelines on the diagnosis of primary imune thrombocytopenia in children
and adolescents: Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e
O tratamento da PTI deve ser instituído em caso de sangramento ativo.
Terapia Celular. Guidelines Project: Associação Médica Brasileira – 2012.
Na PTI recém-diagnosticada, a terapia inicial pode ser feita com imu- Rev Bras Hematol Hemoter. 2013;35(5):358-65.
noglobulina intravenosa, corticosteroides ou imunoglobulina anti-D. A Ig Bruniera P, Pizza M, Campanaro CM. Defeitos de qualidade e produção das
anti-D só pode ser utilizada em pacientes Rh positivos com teste de an- plaquetas. In: Loggetto SR, Braga JAP, Tone LG, editores. Hematologia e
tiglobulina direto (Coombs Direto) negativo e não esplenectomizados. O hemoterapia pediátrica. São Paulo: Atheneu; 2014.
sangramento em SNC pode ocorrer mesmo na vigência do tratamento. Kühne T, Berchtold W, Michaels LA, Wu R, Donato H, Espina B, et al. Newly
Caso seja necessário um aumento mais rápido da contagem plaquetária e diagnosed immune thrombocytopenia in children and adults: a comparative
não se tenha acesso à imunoglobulina intravenosa, a metilprednisolona in- prospective observational registry of the Intercontinental Cooperative
travenosa pode ser mais eficaz do que o corticosteroide oral (Tabela 34.1). Immune Thrombocytopenia Study Group. Haematologica. 2011;96(12):1831-7.
Na PTI crônica sem sangramento ativo, a conduta também é expec- Loggetto SR, Braga JAP, Veríssimo MPA, Bernardo WM, Medeiros L, Hoepers ATC.
tante. Porém, se houver sangramento persistente, pode-se administrar Guidelines on the treatment of primary imune thrombocytopenia in children
and adolescentes: Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e
corticosteroide. A dexametasona pode ser uma opção terapêutica antes
Terapia Celular. Guidelines Project: Associação Médica Brasileira – 2012.
de se indicar a esplenectomia. (Quadro 34.1, no início deste capítulo).
Rev Bras Hematol Hemoter. 2013;35(6):417-27.
Recentemente um agonista do receptor da trombopoietina (TPO) foi Loggetto SR, Magalhães IQ, Werneck FA. Trombocitopenia imune primária. In:
aprovado para o tratamento de pacientes adultos que apresentam PTI crôni- Loggetto SR, Braga JAP, Tone LG, editores. Hematologia e hemoterapia
ca com risco aumentado de sangramento e resposta insuficiente a corticoide pediátrica. São Paulo: Atheneu; 2014.
ou esplenectomia e mantêm sangramento ou têm contraindicação para a Neunert C, Lim W, Crowther M, Cohen A, Solberg L Jr, Crowther MA, et al. The
esplenectomia. Embora a taxa de sucesso seja reconhecida, ainda é impor- American Society of Hematology 2011 evidence-based practice guideline
tante ressaltar que o tratamento pode estar associado a eventos adversos, for immune thrombocytopenia. Blood. 2011;117(16):4190-207.
288 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
AUMENTO DAS
TRATAMENTO TAXA DE RESPOSTA PLAQUETAS EVENTOS ADVERSOS
Prednisona (via oral) Até 75% > 7 dias Alteração de humor; gastrite; ganho de
1-2 mg/kg/dia (máximo 14 dias) peso; hipertensão arterial; hiperglicemia;
ou sangramento gastrintestinal
4 mg/kg/dia, por 3-4 dias
+
Em pacientes Rh e não esplenectomizados
Doenças de depósito
QUADRO 35.1 ■ Diagnóstico diferencial da colestase neonatal
Doença de Gaucher
CAUSAS INTRA-HEPÁTICAS
Fármacos e toxinas (tóxicas)
Colestase associada à infecção Endotoxemia, colestase associada à nutrição parenteral, hidrato de
Vírus (CMV, HSV, hepatite B, HIV, parvovírus B19, outros) cloral, antibióticos, outros fármacos
Bactérias (infecção do trato urinário, sepse, listeria, sífilis e outros) Hipóxia/hipoperfusão
Protozoários (toxoplasmose) Outras
Doenças metabólicas Lúpus neonatal, doença de Caroli, síndrome da bile espessa, histiocitose
X, síndrome de ativação macrofágica (linfo-histiocitose hemofagocítica)
Defeito no ciclo da ureia (colestase associada à deficiência de citrina
ou arginase) Idiopáticas
Distúrbios do metabolismo de metais (hemocromatose neonatal,
sobrecarga infantil de cobre – não wilsonina) Hepatite neonatal idiopática, ductopenia não sindrômica
Distúrbios do metabolismo de lipídeos (doença de Niemann-Pick tipo
CAUSAS EXTRA-HEPÁTICAS
C, doença de Wolman, doença de depósito de éster de colesterol)
Distúrbios do metabolismo do carboidrato (galactosemia, frutosemia, Atresia de vias biliares extra-hepáticas
glicogenose) Cisto de colédoco
Distúrbios do metabolismo de aminoácidos (tirosinemia, leucinose) Perfuração espontânea das vias biliares
Hepatopatias mitocondriais Coledocolitíase
Colangite esclerosante neonatal
Formas hereditárias da colestase intra-hepática
Estenose das vias biliares
Distúrbios dos transportadores de membrana ou de secreção Compressão externa das vias biliares (massas ou tumores)
I | Deficiência de FIC1 (colestase progressiva e persistente: PFIC1 e BSEP: bomba de transporte dos sais biliares; MDR3: proteína de resistência multifár-
doença de Byler; colestase benigna e recorrente: BRIC1) macos 3; PFIC: colestase intra-hepática familiar progressiva; BRIC: colestase intra-
II | Deficiência dos transportadores dos ácidos biliares – deficiência de -hepática benigna recorrente; CFTR: regulador transmembrana da fibrose cística;
BSEP (progressiva e persistente: PFIC2; benigna e recorrente: BRIC2) ADPLD: doença hepática policística autossômica dominante; ARPKD: doença renal
III | Deficiência dos transportadores de fosfolípideo – deficiência do policística autossômica recessiva.
MDR3 (PFIC3) Fonte: Adaptado de Balistreri e colaboradores.1
Deficiência do transportador de íons – CFTR (fibrose cística)
Ictiose neonatal – síndrome da colangite esclerosante
Artrogripose ATENÇÃO!
Síndrome de Aagenaes (síndrome da colestase com linfedema)
Deficiência de α1-antitripsina O reconhecimento precoce e preciso da colestase é extremamente im-
portante para se identificar as etiologias passíveis de tratamento clíni-
Distúrbios da biossíntese ou conjugação dos ácidos biliares co ou cirúrgico e para prevenir as complicações decorrentes da doença
Deficiência da 3 β-hidroxiesteroide Δ5-C27 esteroide desidrogenase/
hepática. As prioridades na avaliação de um neonato com colestase
isomerase são: investigar se a colestase é secundária a uma doença sistêmica,
Deficiência da 3-oxosteroide 5β-redutase como as infeções ou alterações metabólicas, que necessitam de tra-
Deficiência da oxisterol 7 α-hidrolase tamento clínico; ou a uma malformação anatômica das vias biliares,
Hipercolanemia familiar como a atresia de vias biliares extra-hepáticas, que exige correção
Deficiências secundárias (distúrbios peroxissomais: síndrome de cirúrgica precoce; bem como o grau do comprometimento da função
Zellweger) hepática ou o status metabólico do fígado.
290 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
O tratamento da atresia de vias biliares deve ser inicialmente cirúr- Prurido e xantomas: acúmulo na circulação e em sistemas extra-
gico com a realização da derivação de vias biliares proposta por Kasai, -hepáticos de substâncias normalmente excretadas na bile, como
conhecida como portoenterostomia, que realizada antes dos 60 dias de os ácidos biliares e o colesterol.
vida, restabelece o fluxo biliar em até 82% dos pacientes, e, no entanto, A colestase no período neonatal é uma manifestação clínica frequen-
se realizada entre 90 e 120 dias, o índice de sucesso no restabelecimento te, e o seu diagnóstico diferencial é amplo, englobando doenças com di-
do fluxo biliar cai para 10 a 28%. A maioria dos cistos de colédoco são ferentes prognósticos.
pouco sintomáticos no período neonatal, mas, se não diagnosticados, po-
dem ocasionar doença hepática progressiva, por processo obstrutivo. O
■■ DIAGNÓSTICO
tratamento de doenças infecciosas causadoras de hepatite neonatal é da
maior importância para evitar complicações (infecções urinárias, pneumo-
HISTÓRIA CLÍNICA DA COLESTASE NEONATAL
nias, meningites, sífilis, toxoplasmose, CMV). Nas doenças metabólicas, é
importante que a hipótese e o diagnóstico da doença sejam feitos o mais Os RN ou lactentes com colestase de causas extra-hepáticas, cujo principal
precocemente possível, visto que, em algumas doenças, podemos iniciar diagnóstico é a atresia de vias biliares (AVB), são, de forma geral, nascidos
tratamento medicamentoso (reposição de hormônios no hipotiroidismo de parto a termo, sem intercorrências de berçário, sem outras queixas e com
ou hipopituitarismo congênitos) ou manipulação dietética (galactosemia, ganho de peso adequado. A icterícia e a colúria são notadas pela mãe ou
frutosemia, tirosinemia, leucinose), prevenindo a insuficiência hepática e pediatra desde o nascimento ou após 2 a 3 semanas de vida. A alteração na
óbito, ou atenuando as alterações neurológicas irreversíveis. Além disso, cor das fezes (hipocolia ou acolia fecal), como já mencionado, nem sempre é
a confirmação do diagnóstico é importante no aconselhamento genético notada pelos pais, devendo o pediatra observar ele mesmo a cor das fezes,
das famílias, com prevenção de novos afetados. mesmo que para isso seja necessária a estimulação da evacuação no mo-
Assim, constatada a colestase, deve-se iniciar, o mais breve possível, mento do exame clínico. A acolia, quando aparece, é duradoura (> 7 dias). A
a investigação para identificar sua etiologia. tríade clássica para diagnóstico de cisto de colédoco, caracterizada por dor
Diferenciar a colestase de causas intra-hepáticas das extra-hepáticas abdominal intermitente, icterícia e massa epigástrica ou no quadrante supe-
continua sendo o grande desafio dos médicos que assistem essas crian- rior direito, é mais comumente observada nas crianças maiores e pode não
ças. Infelizmente, não há sinal ou sintoma patognomônico para distinguir estar presente no neonato, no qual a icterícia e a irritabilidade podem ser os
atresia de vias biliares da hepatite neonatal, embora alguns dados clínicos únicos sintomas. A ruptura espontânea do colédoco é uma doença rara com
possam auxiliar na discriminação entre ambas. Dessa forma, uma rígida ruptura parcial da junção dos ductos cístico e colédoco, de etiologia prova-
história do pré e perinatal acompanhada de exame físico detalhado mos- velmente isquêmica. O quadro clínico pode iniciar-se da 2a à 14a semana
tram-se muito importantes na avaliação da criança com colestase neonatal. de vida, caracterizado por letargia, icterícia leve, vômito não bilioso, acolia
fecal, distensão abdominal progressiva, peritonite, ascite biliosa, hérnias
inguinal e umbilical. O diagnóstico é feito pela punção do líquido ascítico.
■■ QUADRO CLÍNICO
Nos pacientes com etiologia de origem intra-hepática, tem-se mais
Icterícia: normalmente é notada em esclera e mucosas quando o frequentemente uma história de RN prematuro ou com peso ao nasci-
nível sérico de bilirrubina direta (BD) é maior do que 2 a 3 mg/dL. O mento, pequeno para a idade gestacional, evoluindo com ganho de peso
diagnóstico clínico da icterícia no RN pode ser mais difícil, necessi- inadequado. A icterícia pode ser de aparecimento mais tardio durante a
tando de níveis mais elevados de BD. internação em berçário devido a intercorrências (distúrbios respiratórios,
Colúria: devido à diurese mais abundante e menor densidade uri- infecciosos, metabólicos). A hipocolia fecal ou, em alguns casos, acolia
nária nesse período, a colúria pode não ser tão acentuada. fecal pode ser flutuante. A infecção neonatal com necessidade de uso
Acolia fecal: pode ser de aparecimento precoce, tardio, intermitente de antibióticos antifúngicos pode estar associada à hepatite tóxica me-
ou duração prolongada (> 7 dias). Em alguns casos, apesar de obs-
dicamentosa.
trução completa das vias biliares, é possível que as fezes se apresen-
Os erros inatos do metabolismo são individualmente raros, com grande
tem de cor amarelada, devido ao extravasamento de linfa, plasma
parte causando alta morbidade e mortalidade. As manifestações clínicas
ou mesmo descamação do epitélio intestinal impregnado de bile.
podem aparecer logo no período neonatal, principalmente pela perda da
É de extrema importância que o pediatra veja ele mesmo a cor das
função dializadora da placenta materna, ou, após, desencadeadas por con-
fezes, confirmando hipocolia ou acolia, uma vez que, com frequên-
tato com substâncias exógenas (p. ex.: ingestão de açúcares ou proteínas).
cia, os pais não sabem referir corretamente a esse respeito. Por esse
É possível encontrar um RN ictérico com estado geral comprometido, com
motivo, o Ministério da Saúde e a Sociedade Brasileira de Pediatria
irritabilidade, hipotonia, vômitos, taquipneia, apneia e taquicardia, até le-
estão utilizando a escala colorimétrica das fezes2 incluída na Cader-
targia, convulsões e coma, que pode alertar o clínico para a possibilidade de
neta da Criança para seguimento dos RN e lactentes (Figura 35.1).
infecções congênitas ou doenças causadas por erros inatos do metabolismo.
Nos RN, em geral nos prematuros, que requerem nutrição parenteral
Fezes normais Fezes suspeitas prolongada, pode evoluir com colestase cuja etiologia ainda não está to-
talmente elucidada.
Sexo: a atresia de vias biliares e o cisto de colédoco têm discre-
ta predominância no sexo feminino (F:M = 1,4:1), ao passo que
a hepatite neonatal é mais comum em meninos.
FIGURA 35.1 ■ Escala cromática das cores das fezes. Estabelece História familiar: semelhante na família pode estar associada a
as cores de fezes normais e as suspeitas em relação à presença de doenças autossômicas dominantes ou recorrência de padrão não
colestase neonatal.* genético (deficiência de alfa-1-antitripsina, fibrose cística, coles-
tase intra-hepática progressiva familiar, síndrome de Alagille).
*N. de E.: No site www.grupoa.com.br, na página deste livro, acesse a versão co- História familiar de consanguinidade: pode estar associada a
lorida da figura.
doenças autossômicas recessivas (galactosemia, frutosemia).
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 291
mente, a sobrevida a longo prazo das crianças transplantadas portadoras Nos casos de colestase associados à nutrição parenteral, deve-
de atresia atinge 80 a 90%. -se, se admissível, iniciar nutrição enteral assim que possível; evitar
Novas perspectivas relacionadas ao tratamento se baseiam especial- infecções associadas; rever as soluções parenterais; utilizar nutrientes
mente no papel da disfunção imune na obstrução das vias biliares, o que específicos como taurina e colina; prescrever fármacos, como o ácido
ainda hoje não é completamente entendido, apesar de constituir o foco de ursodesoxicólico; e tratar a doença de base. Nos casos de colesta-
várias pesquisas. se intra-hepáticas progressiva familiar (PFIC) com cirrose, poderia ser
realizada a cirurgia de diversão parcial do fluxo biliar, que consiste na
Cisto de colédoco construção de uma fístula biliocutânea, usando o segmento do jejuno
Indicação cirúrgica. pró-peristáltico, anastomosado com a vesícula biliar. Essa cirurgia é
pouco realizada, pois pode causar alterações graves de pele, distúrbios
Ruptura espontânea de colédoco metabólicos e não apresenta bons resultados. Hoje, a mais utilizada é
O tratamento, na maioria das vezes, consiste em jejum oral e nutrição pa- a cirurgia de exclusão do íleo terminal que diminui a reabsorção de sais
renteral prolongada até a diminuição da ascite e cicatrização da ruptura. biliares.
COLESTASE
↑ Colesterol Xantomatose
Má absorção
↑ Bilirrubina Icterícia
Deficiência de Esteatorreia
↑ Cobre Hepatotoxicidade vitaminas lipossolúveis
Varizes esofágicas
Hiperesplenismo
Ascite
Insuficiência hepática
Síndrome hepatorrenal
Síndrome hepatopulmonar
esfíncter não relacionado à deglutição. No entanto, a sua patogênese é Os sinais e sintomas da DRGE sem complicação impõem diagnóstico
multifatorial e complexa, e envolve as características do refluxo, esvazia- diferencial com outras doenças se a regurgitação adquire características
mento gástrico, mecanismo de depuração esofágica, resistência da muco- de vômitos do tipo projétil, ou seja, com esforço, ou com conteúdo biliar
sa esofágica, hipersensibilidade visceral e hiper-reatividade ao refluxo das ou sangue, associado ou não a retardo ponderal, ou na presença de diar-
vias aéreas superiores, entre outras. reia, constipação, febre, letargia, hepatoesplenomegalia, micro/macroce-
A patogenicidade é determinada pela duração e composição do reflu- falia, fontanela abaulada, distensão abdominal, sensibilidade abdominal,
xo (ácido, pepsina e sais biliares). Lactentes prematuros de 24 semanas de sinais de doença genética/metabólica e convulsões.
gestação já apresentam pH basal ácido a partir do 1o dia de vida; a produ- Diante de vômitos intensos, não ocasionais – não precedidos de náu-
ção de pepsinogênio já é observada com 31 semanas de gestação, assim o
seas e de perda de peso – geralmente no fim do 1 mês –, a radiografia
como a motilidade esofágica não peristáltica, que provoca menor clarea- do trato digestório superior para afastar malformações deve ser solicitada,
mento do material refluído e maior risco de complicações. Esvaziamento
particularmente a estenose hipertrófica do piloro.
gástrico retardado foi observado em lactentes com alergia à proteína do
leite de vaca (APLV).
ATENÇÃO!
■■ QUADRO CLÍNICO
Quando os vômitos estão associados a ganho insuficiente de peso,
A maioria dos lactentes apresentam regurgitações frequentes sem compli- deve-se estabelecer diagnóstico diferencial, particularmente com as
cações. Regurgitação e vômitos ocasionais após amamentação em quan- anormalidades anatômicas do trato digestório superior (estenose piló-
tidade variada, que diminuem com alimentos mais sólidos e postura ele- rica, pâncreas anular, outras estenoses congênitas e anéis, má rotação
vada, são sintomas comuns do RGE fisiológico. Anamnese e exame físico intestinal), alergia à proteína do leite de vaca e esofagite eosinofílica.
detalhado são suficientes para o diagnóstico.
Lactentes saudáveis reclamam ou choram em média duas horas/dia,
com variações individuais, mas a percepção do choro pode ser erronea- A esofagite não erosiva é a forma mais comum de esofagite em crian-
mente considerada anormal pelos pais. Sintomas inespecíficos no primei- ças, e a esofagite erosiva é incomum no lactente sem doença neurológi-
ro trimestre de vida, particularmente, a irritabilidade e o choro contínuo, ca, mas deve ser investigada, em especial diante de episódios de vômitos
podem estar associados à cólica do lactente (choro mais no fim de tarde), sem causa aparente associada ou não a hematêmese, anemia ferropriva
problemas psicoafetivos ou distúrbio alimentar (recusa, aversão), sono in- e sangue oculto positivo, déficit ponderal e irritabilidade. A irritabilidade
terrompido, que podem coexistir com a regurgitação. com o arqueamento do dorso pode equivaler a sintoma de queimação re-
Sinais e sintomas associados com a DRGE no lactente estão listados troesternal, mas no lactente geralmente está acompanhada de vômitos.
no Quadro 36.1 A estenose esofágica, complicação da esofagite erosiva de extensão cir-
cunferencial, ocorre em geral após o 1o ano de vida; há recusa alimentar,
irritabilidade, disfagia, impactação de alimentos sólidos e anemia. His-
QUADRO 36.1 ■ Sinais e sintomas associados com a DRGE
tórico familiar de hérnia hiatal e esofagite de refluxo devem ser sempre
no lactente
questionados, pela influência de fatores genéticos. Esôfago de Barrett é
Regurgitação recorrente, vômitos raro em lactentes.
Perda de peso ou baixo ganho ponderal
Irritabilidade, recusa alimentar ■■ DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Hematêmese, anemia
Ruminação Recomenda-se para lactentes alimentados artificialmente, a substituição
Broncoespasmo, estridor laríngeo, rouquidão, tosse de fórmula à base de leite de vaca por proteína extensamente hidrolisada
Engasgo, sufocação, crises de apneia ou de aminoácidos como prova terapêutica para APLV por período de 1 a
Distúrbio do sono 2 semanas – se os sintomas diminuem de maneira significativa, deve ser
Soluços mantida pelo menos até 6 a 12 meses – e para lactentes em aleitamento
Postura anormal do tronco (síndrome de Sandifer) materno, devem ser eliminados da dieta materna, leite e derivados.
1
Erosão dentária
Síndrome de Sandifer
ATENÇÃO!
Os sintomas da DRGE são similares aos da APLV (geralmente não há re-
ATENÇÃO! ferência de diarreia); cerca de metade dos lactentes com DRGE podem
A irritabilidade pode regredir espontaneamente no final do 1o trimes- apresentar APLV.
tre, e a terapia com inibidores de bomba de prótons por suposta DRGE
não apresenta benefícios, conforme estudos randomizados controla-
Exames subsidiários para afastar outras doenças devem ser solicita-
dos com placebo.
dos diante da persistência de ganho insuficiente de peso, particularmente
infecção do trato urinário – exame de urina, urocultura, eletrólitos, ureia
Quando o RGE se associa a ganho insuficiente de peso, deve-se afas- e creatinina séricos. Se negativos, prosseguir com testes de sangue oculto
tar, em primeiro lugar, o aporte calórico inadequado por meio de história nas fezes, hemograma completo, eletrólitos, provas de função hepática,
dietética detalhada. amônia no soro, glicose, exame de urina, cetona na urina e substâncias
296 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
redutoras, e revisão dos resultados de testes de triagem neonatal para xa sensibilidade e especificidade; útil para anormalidades anatômicas do
doenças metabólicas. trato digestório. A cintilografia gastresofágica em lactentes é feita com
Sintomas similares à DRGE em lactentes – vômitos ou regurgitação, líquido (leite, água) adicionando-se Tecnécio-99m; permite avaliar o es-
déficit ponderal, aversão ou recusa alimentar – ocorrem na esofagite eo- vaziamento gástrico, ocorrência de refluxo não ácido e microaspiração
sinofílica (EE) e quando associado a histórico pessoal e familiar de alergia pulmonar com imagens escaneadas de esôfago, estômago e pulmão. A
a alimentos e aeroalérgenos – rinite alérgica, asma, dermatite atópica – falta de padronização técnica e a ausência de dados relacionados à idade
apesar de pouco frequente, deve-se solicitar o exame endoscópico com limitam o valor desse teste em relação aos parâmetros de refluxo.
biópsias múltiplas de esôfago proximal e distal. Esse distúrbio, que atinge A monitoração do pH intraesofágico de 24 horas quantifica a frequên-
preferencialmente o sexo masculino (3:1), à semelhança da esofagite ero- cia de refluxo ácido e sua duração no esôfago distal e a correlaciona com
siva, caracteriza-se por hipereosinofilia esofágica e ausência deste achado eventos (refeição, decúbito e sintomas), mas não é mais considerada pa-
em mucosa gástrica e duodenal. drão-ouro (detecta apenas refluxos ácidos). Está indicada quando os sinto-
mas são extraesofágicos ou atípicos – refluxo oculto – e para avaliação da
■■ MANIFESTAÇÃO EXTRADIGESTIVA eficácia nos casos não responsivos com a terapia antissecretora e após a
cirurgia antirrefluxo. A porcentagem de tempo em 24 horas com pH < 4, o
OU ATÍPICA DA DRGE
índice de refluxo (IR), é considerado o parâmetro mais válido, já que reflete
Embora vários sintomas extradigestivos sejam associados com a DRGE, o tempo de exposição esofágica ao ácido. Consideram-se aumentados: IR
apenas a asma persistente e/ou noturna, a tosse cônica e a erosão dentária o
> 10% no 1 ano e IR > 7% para crianças maiores.
apresentam evidência científica que comprovam esta associação. A impedâncio-pHmetria esofágica (IIM-pH) detecta os episódios e
Há recomendação para tratamento com antissecretores (três meses), extensão do refluxo líquido, gasoso, misto, ácidos ou fracamente ácidos,
nos pacientes com asma noturna ou de difícil controle que tenham sinto- além de estudar o movimento do bolo alimentar durante a deglutição, o
mas digestivos como queimação.1 Nos pacientes sem manifestações diges-
fluxo anterógrado, ou durante o refluxo, o fluxo retrógrado. Valores nor-
tivas, antes de tratar, recomenda-se a pHmetria esofágica ou impedâncio-
mais de IIM-pH são relatados em lactentes (p95, 98 episódios de refluxo/
-pHmetria. Ingestão concomitante de medicamentos beta-adrenérgicos e
dia, 67 fracamente ácidos e 48 ácidos) e crianças (p95, 55 episódios de
xantinas favorece o refluxo pela diminuição da pressão do EEI e aumento
refluxo/dia, 34 fracamente ácidos e 55 ácidos). Os lactentes prematuros
da secreção ácida. Outros fatores que causam RGE são o uso de sonda
saudáveis apresentam mais refluxo fracamente ácido, em relação a reflu-
nasogástrica, ventilação pulmonar mecânica ou fisioterapia respiratória
xo ácido (média de 71 episódios de refluxo/dia, 73% fracamente ácidos e
ou fumo (mesmo passivo).
25% ácidos), talvez relacionado à frequência maior de alimentação, por
Não existe evidência cientifica que comprove a associação de RGE e
este motivo a impedâncio-pHmetria é considerada o melhor exame na
crises de apneia. Episódios de apneia nos primeiros meses de vida são em
investigação de DRGE nos menores de 1 ano.2 O problema enfrentado na
geral transitórios e relacionados, provavelmente à imaturidade dos tratos
indicação desse exame é a alta variação diária nos parâmetros avaliados
digestório e respiratório; nos lactentes prematuros, a alimentação é um
e a falta de padronização dos valores de normalidade para os vários gru-
importante desencadeador, no entanto, a hipoxemia observada após a
pos etários pediátricos, o que limita a utilidade da IIM-pH em crianças.
alimentação raramente é devida ao RGE. A apneia por RGE é obstrutiva
Avaliação endoscópica está indicada diante de suspeita de esofa-
(laringospasmo completo ou incompleto com estridor), há esforço respi-
gite péptica e suas complicações, EE e para controle pós-tratamento da
ratório, postura rígida, fácies pletórica, cianose ou palidez; não há tosse,
esofagite erosiva de caráter circunferencial. A hiperemia observada no
engasgo ou aspiração. Estudo com impedanciometria esofágica – já que
esôfago distal em lactentes jovens é um achado normal, devido a maior
a maioria dos refluxos é alcalino – mostra a relação de RGE com as crises
vascularização no cárdia gástrico; lesões macroscópicas incluem erosões,
de apneia e bradicardia, ao contrário de estudos com a pHmetria intra-
exsudato, úlceras, estenoses, hérnia hiatal, essas duas com radiografia
esofágica, que detecta apenas refluxo ácido. Recomenda-se pesquisar
contrastada prévia ao exame endoscópico para avaliação da extensão do
DRGE com pHmetria esofágica ou impedâncio- pHmetria, antes de tratar.
estreitamento e da herniação. Na EE, observam-se desde mucosa normal
Há resposta com o tratamento clínico, e uma minoria tem indicação para
até estreitamento (mais em adolescentes), sulcos longitudinais, edema por
a cirurgia antirrefluxo.
friabilidade, aspecto de papel crepe, pontos esbranquiçados (abscesso eo-
Não existem evidências cientificas que comprovem associação de RGE
sinofílico), ondas terciárias e erosões. Biópsias múltiplas da porção distal
com as doenças otorrinolaringológicas, como estridor laríngeo, laringos-
e proximal do esôfago devem ser solicitadas, pois a hipereosinofilia (> 15
pasmo, rouquidão, laringite, estenose subglótica, granuloma laríngeo,
nódulo em prega vocal, otite média de repetição ou rinossinusite crôni- eosinófilos/campo de grande aumento) pode ser focal, além de biópsias do
ca. A tosse crônica é o único sintoma que pode estar associado ao RGE. estômago e duodeno sem eosinofilia. Podem coexistir achados histológi-
Nestes casos, recomenda-se pesquisar DRGE com pHmetria esofágica ou cos, como hiperplasia de células basais, aumento do comprimento papilar,
impedâncio-pHmetria. espongiose da camada basal, erosão e ulceração.
A síndrome de Sandifer caracteriza-se por distonia espasmódica com
arqueamento do dorso e postura em opistótono, e, embora incomum, é
ATENÇÃO!
uma apresentação típica da DRGE e responde bem à terapia antirrefluxo.
Especula-se que resulte de reflexo vagal em resposta à acidez esofágica. No momento, não há evidências suficientes para apoiar o uso de his-
Outros distúrbios neurológicos, incluindo convulsões, espasmo infantil e tologia para diagnosticar ou excluir a DRGE, exceto para diferenciá-la
distonias, devem ser descartados. da esofagite eosinofílica.
O esomeprazol na forma de sachês para suspensão oral não é co- dose de manutenção após cura da lesão – metade da dose de ataque por
mercializado no país, devendo-se dissolver o conteúdo em recipiente com 3 a 6 meses – quando há lesões confluentes que atingem a circunferência
água (ou seringa, 5 mL de água para 2,5 mg ou 5 mg; 15 mL de água para do esôfago – graus C < 75%; D >75% – para evitar a recidiva. A me-
10 mg, 20 ou 40 mg), mexer suavemente com pá de plástico, esperar 2 a 3 lhor opção para o tratamento a longo prazo das crianças com esofagite
minutos em repouso, mexer de novo e administrar no máximo até 30 mi- erosiva – graus C,D – se cirurgia ou tratamento clínico, ainda não está
nutos do preparo, e adicionando mais água, caso sobre algum resíduo do definida. O tratamento clínico exige adesão particularmente na fase de
medicamento no recipiente. A confecção de solução contendo omeprazol manutenção, o custo é elevado, necessita compreensão da família, além
em farmácia de manipulação é uma opção que carece de testagem quanto de ter efeitos colaterais associados. Desta forma, com a finalidade de pre-
à sua eficácia. venir complicações como a estenose, a opção terapêutica deve ser sempre
Quando há esofagite, o grau de esofagite (não erosiva, graus A, B, C individualizada e o acompanhamento clínico regular, de preferência com
e D da classificação de Los Angeles) vai determinar a escolha do fármaco o gastrenterologista pediátrico. Quando há doenças crônicas associadas,
e o tempo de tratamento – 1 a 3 meses, assim como na necessidade de particularmente doença neurológica, o risco de estenose aumenta.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 299
CIRURGIA ANTIRREFLUXO
Em recém-nascidos e lactentes jovens, não está claro o benefício da
37
cirurgia antirrefluxo, que deve ser indicada somente diante de terapia
clínica irresponsiva de sintomas intratáveis com retardo ponderal e se
DIARREIA AGUDA E PERSISTENTE
há complicações com risco de vida. Embora a cirurgia antirrefluxo seja
altamente eficaz, o índice de complicação com esse procedimento não é
baixo e há perda da continência após alguns anos (pacientes com doença ■■ VERA LUCIA SDEPANIAN
neurológica e pneumopatias crônicas apresentam alta taxa de insucesso ■■ SORAIA TAHAN
cirúrgico). A cirurgia apresenta, além do custo elevado, altas taxas de
recidiva. ■■ ULYSSES FAGUNDES NETO
QUADRO 37.1 ■ Classificação do estado de hidratação conforme os critérios propostos pelo Ministério da Saúde do Brasil e pela OMS
OBSERVE
Sede Bebe normalmente Sedento, bebe rápido e avidamente Bebe mal ou não é capaz de beber*
EXAMINE
Enchimento capilar** Normal (até 3 s) Prejudicado (de 3-5 s) Muito prejudicado* (mais de 5 s)
CONCLUSÃO Não tem sinal de desidratação Se apresentar dois ou mais sinais tem Se apresentar dois ou mais sinais, incluindo
desidratação pelo menos um sinal,* tem desidratação grave
TRATAMENTO Tratamento domiciliar Terapia de reidratação no serviço de saúde Terapia de reidratação parenteral
*A avaliação periférica é muito importante para as crianças, principalmente as desnutridas, em que os outros sinais de desidratação (elasticidade da pele, olhos) são de difícil
avaliação.
**O examinador comprime, com a própria mão, a mão fechada da criança durante 15 segundos. O examinador retira sua mão e observa o tempo para a volta da coloração
normal da palma da mão da criança.
1 2
Fonte: Brasil e World Health Organization.
lidade no caso de lactente de tenra idade, desnutrido, imunodeprimido ou assim que a diarreia se instalar, independentemente da sua etiologia.
hospitalizado. Nesses casos, o agente pode ser identificado por pesquisa A quantidade de soro de reidratação oral, nesse momento, deve ser de
nas fezes, enzima-imunoensaio (Elisa) para vírus, coprocultura com soro- aproximadamente 50 a 100 mL, após cada episódio de diarreia ou vômito,
tipagem para bactérias e emprego de técnicas de biologia molecular com nas crianças menores de 1 ano; de 100 a 200 mL após cada episódio de
ensaios moleculares de PCR, empregando-se primers específicos para a diarreia ou vômito, nas crianças entre 1 e 10 anos; e para as maiores de 10
identificação dos enteropatógenos. anos, à vontade. Deve-se oferecer a maior quantidade de líquidos possí-
vel, por exemplo, água, sucos, chás sem cafeína. O leite materno deve ser
TRATAMENTO mantido, e a alimentação habitual também.
Os objetivos do tratamento da diarreia incluem: evitar a ocorrência de de- Com respeito à composição dos sais de reidratação oral, o Ministério
1 2
sidratação (se não houver sinais de desidratação); tratar a desidratação da Saúde e a OMS recomendavam a utilização de uma única solução,
(quando estiver presente); evitar distúrbios nutricionais por meio da ali- com a seguinte composição: 90 mmol/L de sódio; 80 mmol/L de cloro; 10
mentação durante e após a diarreia; e reduzir a duração e a gravidade da mmol/L de citrato; 20 mmol/L de potássio; e 111 mmol/L de glicose. A par-
4
diarreia e a ocorrência de novos episódios. tir de 2001, a OMS preconiza o soro de reidratação oral de osmolaridade
O estado de hidratação pode ser classificado conforme a porcenta- reduzida que, de acordo com estudos randomizados controlados e meta-
2,3
gem de perda de peso, de acordo com a OMS e o CDC: paciente hidrata- nálises, associou-se com menor perda fecal, menor duração da diarreia e
do ou com desidratação mínima (perda de peso < 3%); desidratação leve menor frequência de vômitos, quando comparado com o soro-padrão, até
ou moderada (perda de peso entre 3 e 9%); e desidratação grave (perda então preconizado. A composição do soro de osmolaridade reduzida cor-
de peso > 9%). Para isso, é importante saber o peso logo antes da ocor- responde a: 75 mmol/L de sódio; 65 mmol/L de cloro; 10 mmol/L de citrato;
rência do episódio diarreico atual. 20 mmol/L de potássio; e 75 mmol/L de glicose. Esta nova composição dos
Os primeiros sinais de desidratação serão aparentes em uma variação Sais de Reidratação Oral foi incorporada pelo Ministério da Saúde, descrito
de perda de peso, entre 3 e 9%. Para facilitar a operacionalização do tra- no Formulário Terapêutico Nacional de 2010.5
2 a a
tamento da desidratação por diarreia, a OMS propôs uma classificação Os vômitos em geral ocorrem na 1 ou 2 hora de tratamento, espe-
simplificada da desidratação, também adotada pelo Ministério da Saúde cialmente quando a criança ingere o soro rápido, mas isso não impede o
1
do Brasil, descrita no Quadro 37.1. Essa classificação distribui os pacientes sucesso da terapia da solução oral. Se a criança vomitar, deve-se esperar 5
portadores da doença diarreica em três categorias: ausência de desidra- a 10 minutos e reiniciar a terapia de reidratação oral, um pouco mais lenta
tação; algum grau de desidratação; e desidratação grave. A partir da de- (uma colher cheia a cada 2 a 3 minutos).
finição do estado de hidratação do paciente, escolhe-se a modalidade de Recomenda-se que lactentes e crianças sejam conduzidas ao Serviço de
terapia de reidratação a ser prescrita. Nesse sentido, consultar, também, o Saúde para avaliação médica quando a frequência das evacuações for eleva-
capítulo de Terapia de reidratação. da (> 8 episódios em 24 horas), os vômitos forem persistentes, menores de 2
O tratamento da diarreia deve ser iniciado no domicílio, isto é, a fa- meses, febre alta (> 39oC) e houver presença de sangue nas fezes ou doença
mília deve ser orientada a iniciar a terapia de reidratação oral em casa, de base grave (desnutrição, doença renal, diabetes, imunodeficiências).
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 301
A OMS2 recomenda a administração de zinco nas crianças com diar- tação mais próxima do habitual, desde que nutricionalmente adequada,
reia. Nos países em desenvolvimento, essa recomendação se associou à deve ser continuada. Nos lactentes, o aleitamento materno deve, sempre
redução da gravidade e da duração da diarreia em menores de 5 anos, que possível, ser mantido e estimulado.
assim como à redução da incidência de diarreia nos 2 a 3 meses subse-
quentes, quando administrado concomitantemente à terapia de reidrata-
■■ DIARREIA PERSISTENTE
ção oral. A dose preconizada é de 10 mg/dia, durante 10 a 14 dias nos
lactentes menores de 6 meses, e de 20 mg/dia para os maiores de 6 me- QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO
ses. O Ministério da Saúde1 recentemente também adotou esta medida no
manejo da diarreia aguda. A diarreia persistente é definida como aquela que se origina a partir de
O uso de antimicrobianos não deve ser rotineiro nos casos de diar- um episódio de diarreia aguda (aquosa ou sanguinolenta) e se estende
reia aguda e persistente, pois, além desses fármacos não serem efetivos, por mais de 14 dias, em crianças menores de 5 anos. Suas principais com-
podem ser prejudiciais, causando desequilíbrio da microbiota intestinal e plicações são desnutrição e infecção extraintestinal grave. A desidratação
podendo contribuir para a perpetuação do quadro diarreico. também pode ocorrer.
A diarreia persistente apresenta letalidade elevada, e metade des-
o
sas mortes ocorre no 1 ano de vida. A persistência do quadro diarreico
ATENÇÃO! ocasiona agravo nutricional importante, o que aumenta sua relevância
epidemiológica. Crianças desnutridas e imunodeficientes, especialmente
Não se recomenda antimicrobiano para diarreia aquosa, exceto para aquelas com Aids, estão mais sujeitas a desenvolver diarreia persistente, o
casos de cólera. Antibióticos são recomendados nos casos de diarreia que piora a sua condição nutricional, formando um círculo vicioso.
invasiva, definida como início agudo de diarreia sanguinolenta e com Outros fatores de risco para diarreia persistente incluem: condições
muco e febre alta. Nos casos de diarreia com sangue, porém com febre precárias de habitação, saneamento e higiene; retardo de crescimento in-
baixa ou sem febre (típico de E.coli produtora de Shiga toxina), não se trauterino; baixo peso ao nascer; ausência de aleitamento materno ou des-
recomenda antibiótico, exceto se a epidemiologia sugerir shigellose. mame precoce; deficiência de zinco; sexo masculino; antecedente de infec-
ções respiratórias e gastrintestinais; e diarreia ocasionada por patógenos,
A Shigella causa a maioria dos casos de diarreia com sangue em crian- como E. coli enteropatogênica, E. coli enteroagregativa e Cryptosporidium.
ças, quase todos graves. O uso de antimicrobiano efetivo contra a Shigella A diarreia persistente ocorre com frequência em crianças infectadas
alivia os sintomas da disenteria, interrompe a disseminação da doença pelo HIV, nas quais a mortalidade por esse tipo de diarreia é 11 vezes
e reduz o risco de potenciais complicações. O uso de antimicrobianos maior do que as crianças não infectadas. Nessas crianças, podem ocorrer
inapropriados (com resistência) para Shigella pode favorecer a síndrome má-absorção associada ao HIV, manifestação intestinal de tuberculose e
2
hemolítico-urêmica. A OMS recomenda o uso do ciprofloxacina ou uso de infecções intestinais por patógenos como Cryptosporidium parvum, Cyclos-
antimicrobiano de acordo com a epidemiologia e dados locais de sensibi- pora cayetanensis, Isospora belli, Microsporidium e CMV.
lidade da Shigella. Revisão recente mostra que é elevada a resistência da A fisiopatologia da diarreia persistente envolve a lesão da mucosa
Shigella a sulfametoxazol-trimetropim no Brasil e que o ceftriaxone pode causada pelo enteropatógeno, com consequente atrofia vilositária. Isso
ser uma boa opção. acarreta diminuição da superfície absortiva, aumento do infiltrado da lâ-
O uso do racecadotril, inibidor da encefalinase, pode ser considerado mina própria e ruptura da barreira de permeabilidade intestinal, favore-
na diarreia aguda, entretanto novos estudos prospectivos para avaliar sua cendo a penetração de proteínas heterológas potencialmente alergênicas,
eficácia e segurança são necessários em crianças tratadas ambulatorial- com consequente aumento da probabilidade da persistência do processo
mente. diarreico devido ao surgimento de intolerâncias alimentares múltiplas.
Em relação aos probióticos, somente dois tipos têm eficácia compro- Na diarreia persistente, também é frequente a ocorrência de sobre-
vada na diarreia aguda, segundo trabalhos de metanálise com estudos crescimento bacteriano do intestino delgado – condição clínica na qual há
randomizados controlados – Lactobacillus GG e Saccharomyces boulardii um aumento anormal do número de bactérias colônicas no intestino del-
–, recomendados por demonstrarem efeitos benéficos e por apresentarem gado. As bactérias envolvidas são as cepas gram-negativas, os anaeróbios
eficácia comprovada, tanto no consenso de diarreia aguda da European estritos e o enterococo. Esse aumento de bactérias no intestino delgado
Society of Pediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition6 como na pode ocasionar desconjugação de sais biliares no duodeno, os quais, nes-
guia Ibero-Latino-americana. sa condição, perdem a capacidade de formar micelas, com consequen-
te má absorção de gorduras e esteatorreia. Além disso, os metabólitos
bacterianos e os ácidos biliares agridem diretamente o epitélio intestinal,
ATENÇÃO! ocasionando alterações estruturais da mucosa intestinal e podendo acar-
retar má absorção de carboidratos. Pode também ocorrer má absorção de
Deve-se ressaltar que nenhum medicamento substitui a terapia de
gorduras, vitaminas lipossolúveis e vitamina B12.
reidratação oral, que é fundamental, tanto na prevenção como no tra-
A investigação laboratorial inclui pesquisa de agentes bacterianos, ví-
tamento da desidratação. Portanto, o probiótico deve ser usado em
rus e parasitas nas fezes. Pode-se também verificar o pH fecal e pesquisar
associação com a terapia de reidratação oral.
substâncias redutoras nas fezes para definição de intolerância aos carboi-
dratos. Em alguns casos, a biópsia de intestino delgado pode ser realizada
Quanto à terapia nutricional na diarreia aguda, quando não associada como avaliação complementar. Também é importante realizar pesquisa de
com desidratação grave, o retorno à alimentação é bem tolerado nas pri- infecção pelo HIV em toda criança com diarreia persistente.
meiras 3 a 4 horas após a reidratação. A realimentação precoce favorece a
rápida recuperação da função digestiva-absortiva normal, incluindo a ha- TRATAMENTO
bilidade na digestão e a absorção dos variados nutrientes e, dessa forma, O tratamento da desidratação na diarreia persistente segue as mesmas
a garantia na continuidade do crescimento e do ganho ponderal. A alimen- recomendações da diarreia aguda.
302 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Quanto ao manejo dietético, para crianças que não estão mais sendo
amamentadas, inicia-se com o uso de fórmulas isentas de lactose, conside Quanto ao manejo dietético na diarreia persistente, para crianças
que não estão mais sendo amamentadas, a mudança dietética se
rando que a lesão mucosa existente favorece primeiro a deficiência de lac-
inicia com o uso de fórmulas isentas de lactose, considerando que
tase. Caso não haja melhora clínica com o uso de fórmulas sem lactose,
a lesão mucosa existente favorece primeiro a deficiência de lactose.
deve-se pensar que a criança esteja apresentando alergia a proteínas da
Com relação à via de alimentação, a enteral é a mais indicada por
dieta secundária a lesões do intestino delgado, indicando-se a utilização
ser a mais fisiológica. Caso não haja boa aceitação por VO, a sonda
das fórmulas semielementares, constituídas por hidrolisados proteicos, que
nasogástrica pode ser a escolha.
deve ser mantida por, no mínimo, seis semanas, para posterior tentativa
de desencadeamento. Nos casos de maior gravidade, a introdução de die-
ta elementar baseada em aminoácidos pode ser necessária. Em crianças ■■ REFERÊNCIAS
com desnutrição e diarreia grave, o restabelecimento da hidratação e o
1. Brasil. Ministério da Saúde. Manejo do paciente com diarreia [Internet].
tratamento de infecções oportunistas devem ser priorizados. Após a rei- Brasília: MS; 2015 [capturado em 15 set. 2016]. Disponível em: http://
dratação, a alimentação deve ocorrer a cada 2 ou 3 horas do dia e da noite por talsaude.saude.gov.br/images/pdf/2015/dezembro/11/CARTAZ---
(aproximadamente oito refeições diárias), e o valor energético das refeições MANEJO-PACIENTE-DIARREIA-AGUDA.pdf.
diárias deve ser aumentado com cautela, conforme tolerância da criança, 2. World Health Organization. The treatment of diarrhea: a manual for
de forma a evitar prejuízos ocasionais relacionados à realimentação. physicians and other senior health workers. 4th ed. rev. Geneva: WHO; 2005.
3. Duggan C, Santosham M, Glass RI. The management of acute diarrhea in
Com relação à via de alimentação, a enteral é a mais indicada por ser
children: oral rehydration, maintenance, and nutritional therapy. Centers for
a mais fisiológica. Caso não haja boa aceitação por VO, a sonda nasogás- Disease Control and Prevention. MMWR Recomm Rep. 1992;41(RR-16): 1-20.
trica pode ser a de escolha. A via parenteral, por ser de maior risco, deve 4. World Health Organization. Reduced Osmolarity Oral Rehydration Salts
ser utilizada apenas em último caso, somente para pacientes com intole- (ORS) formulation. Geneva: WHO; 2001.
rância alimentar múltipla, inclusive a monossacarídeos. 5. Brasil. Ministério da Saúde. Formulário terapêutico nacional 2010: Rename
O retorno à alimentação normal deve ser o mais precoce possível, 2010. 2. ed. Brasília: MS; 2010.
6. Guarino A, Albano F, Ashkenazi S, Gendrel D, Hoekstra JH, Shamir R, et
porém de acordo com a tolerância da criança, sendo indicados alimentos
al. European Society for Paediatric Gastroenterology, Hepatology, and
que forneçam aporte nutricional adequado, alimentos hipoalergênicos e
Nutrition/European Society for Paediatric Infectious Diseases evidence-
de fácil aceitação. A OMS preconiza terapia nutricional com utilização de based guidelines for the management of acute gastroenteritis in children in
alimentos disponíveis e de baixo custo, com suplementação mineral e vi- Europe. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2008;46 Suppl 2:S81-122.
tamínica. A OMS também indica a administração de zinco, para crianças
com diarreia aguda e persistente. Nos países em desenvolvimento, essa
■■ LEITURAS SUGERIDAS
recomendação se associou à redução da gravidade e duração da diarreia
Andrade JA, Moreira C, Fagundes Neto U. Persistent diarrhea. J Pediatr (Rio J).
em menores de 5 anos, assim como à redução da incidência de diarreia
2000;76 Suppl 1:S119-26.
nos 2 a 3 meses subsequentes, quando administrado concomitantemente Carrari MHC, Tahan S, Morais MB. Antibioticoterapia na diarréia aguda por
à terapia de reidratação oral. A dose preconizada é de 10 mg/dia durante Shigella: qual a melhor opção? J Pediatr (Rio J) 2012;88 (4):366-367.
10 a 14 dias nos lactentes menores de 6 meses e 20 mg/dia para os maio- World Health Organization. Diarrhoea: why children are still dying and what can
res de 6 meses. O Ministério da Saúde também recomenda essa medida no be done. Geneva: WHO; 2009.
manejo da diarreia aguda.
PREVENÇÃO
A UNICEF e a OMS propõem as seguintes medidas para o controle da
doença diarreica no mundo: reposição de líquidos para prevenção de 38
desidratação; utilização de zinco; vacinação contra sarampo e rotavírus;
promoção do aleitamento materno e de suplementação de vitamina A; ALERGIA À PROTEÍNA DO
estímulo à lavagem de mãos com sabão; melhoria do suprimento de água LEITE DE VACA
em quantidade e qualidade, incluindo estocagem segura das residências;
e promoção de saneamento básico amplo. Ressalta-se que, no Brasil, a
imunização contra o rotavírus, iniciada em 2006, causou importante im-
■■ MAURO BATISTA DE MORAIS
pacto na diminuição da diarreia por rotavírus.
■■ PATRÍCIA DA GRAÇA LEITE SPERIDIÃO
REVISÃO
A desidratação é a complicação mais frequente da diarreia aguda. Em lactentes, a alergia à proteína do leite de vaca (APLV) é a alergia ali-
O tratamento da diarreia deve ser iniciado no domicílio, isto é, a mentar mais comum e ocorre em uma fase na qual se observam crescimen-
família deve ser orientada a iniciar a terapia de reidratação oral em to e desenvolvimento rápidos. Assim, os lactentes com APLV necessitam
casa, assim que a diarreia se instalar, independentemente da sua de alternativas alimentares apropriadas. A alergia alimentar está incluída
etiologia. nas reações adversas aos alimentos, que podem ser classificadas em:
A diarreia persistente apresenta letalidade elevada. tóxicas;
O manejo da desidratação na diarreia persistente segue as mesmas de intolerância;
recomendações da diarreia aguda. de hipersensibilidade (alergia).
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 303
As reações tóxicas ocorrem quando uma quantidade suficiente de de infecções intestinais, entre outros. Provavelmente, a microbiota intesti-
toxina para provocar manifestações clínicas é ingerida por qualquer indi- nal participa deste processo.
víduo (todos são suscetíveis). Um exemplo é a ingestão de alimento com
toxina produzida pelo Staphylococcus aureus ou Bacillus cereus. Por sua
■■ QUADRO CLÍNICO
vez, a intolerância depende de suscetibilidade individual, como a intole-
rância à lactose em pessoas com hipolactasia do tipo adulto. Vale ressaltar O foco deste texto é a alergia às proteínas do leite de vaca com apareci-
que os indivíduos com hipolactasia do tipo adulto podem ingerir as pro- mento nos 2 primeiros anos de vida.
teínas do leite de vaca. Quanto às reações de hipersensibilidade (alergia), As manifestações clínicas são diferentes na dependência dos meca-
são determinadas por proteínas dos alimentos que desencadeiam reação nismos imunológicos predominantes e podem envolver reações imunoló-
imunológica, podendo determinar várias síndromes clínicas. Segundo o gicas tardias mediadas por células, reações imediatas mediadas pela IgE e
mecanismo imunológico presumivelmente predominante, as reações de reações mistas envolvendo a imunidade celular e, também, reação imedia-
hipersensibilidade são divididas em: ta do tipo I mediada por IgE. No Quadro 38.1, são apresentadas as princi-
reações tardias mediadas por células; pais síndromes clínicas decorrentes da alergia à proteína do leite de vaca.
reações imediatas mediadas por IgE; e O refluxo gastresofágico secundário à alergia à proteína apresenta
reações mistas nas quais participam os dois mecanismos (reação similaridades clínicas com a doença do refluxo gastresofágico, ou seja,
por células e IgE). irritabilidade, dificuldade para ganhar peso, dificuldade nas mamadas,
O teste de desafio, de desencadeamento ou exposição oral é con- regurgitações e vômitos. Ressalte-se que essas manifestações podem ser
siderado o mais adequado para o diagnóstico de alergia alimentar. No consequência tanto da alergia ao leite de vaca como da doença do refluxo
entanto, muitos estudos não se baseiam nesse preceito, razão pela qual gastresofágico.
dados de prevalência e incidência de alergia alimentar apresentam grande A cólica do lactente pode ser definida pela ocorrência de crises de
variabilidade, desde 35%, de acordo com a percepção de pais a respeito irritabilidade, choro e agitação, sem uma explicação plausível, por mais
de alergia alimentar em seus filhos com menos de 2 anos, até menos de de três horas diárias em mais de três dias da semana por mais de uma
1%, quando o teste de desafio duplo-cego controlado por placebo é usado semana. Existe possibilidade da cólica do lactente ser secundária à alergia
como instrumento de investigação. É possível que cerca de 15% dos lac- à proteína do leite de vaca, mesmo em lactentes em aleitamento natural,
tentes apresentem manifestações clínicas atribuíveis à alergia ao leite de entretanto esses pacientes correspondem, ao que tudo indica, a uma pe-
vaca, porém, se for realizado teste de desencadeamento, essa taxa prova- quena parcela daqueles que apresentam cólica do lactente. A associação
velmente diminuirá para aproximadamente 3 a 5%. entre cólica do lactente e alergia ao leite de vaca foi identificada em en-
saios nos quais se observou melhora da cólica com o emprego de fórmu-
las com proteínas extensamente hidrolisadas ou de aminoácidos. Não foi
■■ FISIOPATOLOGIA observado quando se utilizou fórmula sem lactose ou de soja. Conside-
Os mecanismos envolvidos na fisiopatologia da alergia alimentar foram rando que a cólica do lactente desaparece por volta dos 3 a 4 meses, é
revisados recentemente. Observa-se falha na supressão da resposta imu- imprescindível a realização de teste de desencadeamento para confirmar
nológica a, pelo menos, uma proteína, ou seja, nessa situação, não se ou descartar o diagnóstico de cólica por alergia ao leite de vaca e evitar
desenvolve de forma fisiológica o mecanismo de tolerância. Ainda não se a utilização de dieta de exclusão desnecessária por tempo prolongado.
sabe de forma exata qual o motivo pelo qual ocorre a alergia, em vez da Colite ou proctocolite eosinofílica inicia-se, em geral, no 1o trimestre
tolerância oral. Nesse processo, existe a interação de inúmeros fatores: ge- de vida. Presença de sangue nas fezes normais ou diarreicas é a principal
néticos, características dos alergênios nos alimentos, fatores ambientais, manifestação. Pode ocorrer na vigência de aleitamento natural exclusivo.
como tipo de parto e alimentação nos primeiros meses de vida, ocorrência Em metade dos casos, observa-se eosinofilia. A longo prazo, dependen-
QUADRO 38.1 ■ Síndromes clínicas secundárias à alergia alimentar com ênfase na alergia ao leite de vaca em lactentes
REAÇÃO TARDIA MEDIADA POR CÉLULAS REAÇÃO PARCIALMENTE MEDIADA POR IgE REAÇÃO IMEDIATA MEDIADA POR IgE
constantemente ao alergênio alimentar. O Quadro 38.2 apresenta uma re- zado. Quanto à fonte lipídica, destacam-se óleos vegetais, óleo de peixe
lação de expressões que podem indicar a presença de leite na composição e gordura láctea. A densidade energética varia de 68 a 102 kcal/100 mL.
dos alimentos. A Sociedade Europeia de Gastrenterologia, Hepatologia e Nutrição
Pediátrica (ESPGHAN, do inglês European Society of Paediatric Gastroen-
terology, Hepatology and Nutrition) não recomenda o uso das fórmulas
QUADRO 38.2 ■ Expressões que podem indicar a presença de de soja no tratamento da alergia alimentar, independentemente do me-
leite de vaca nos alimentos canismo envolvido, porém a Academia Americana de Pediatria (AAP, do
inglês American Academic of Pediatrics) considera que as fórmulas de soja
Expressões muito comuns: leite integral, leite semidesnatado, leite
constituem uma alternativa para a substituição do leite de vaca, nos casos
desnatado, leite em pó, leite em pó desnatado o
de alergia mediada por IgE em lactentes no 2 semestre de vida.
Expressões comuns: soro do leite, traços do leite, formulação láctea,
As fórmulas de soja devem ser à base de proteína isolada de soja, as
preparação láctea, laticínios, proteína do leite de vaca, fermento lácteo
quais são mais purificadas, suplementadas em cálcio e ferro. Essas fórmu-
Expressões pouco comuns: caseína, caseinato, lactoalbumina,
lactoglobulina
las de soja são encontradas na forma em pó e sua densidade energética
varia de 68 a 71 kcal/100 mL. Quanto à fonte proteica, destaca-se a pro-
2
Fonte: Weber e colaboradores. teína isolada de soja, acrescida de metionina, além de carnitina e taurina,
conforme o fabricante. A fonte de carboidratos é composta de maltodex-
As dietas de exclusão podem ser utilizadas por curto ou longo período trina, polímeros de glicose e sacarose. A fonte de gorduras dessas fórmu-
de tempo, contudo devem ser adotadas com muita cautela, principalmen- las constitui-se de óleos vegetais, como o de palma, canola, coco, girassol,
te se um número significante de alimentos ou grupos de alimentos é proi- entre outros. Fórmulas à base de soja, cuja proteína não é isolada (extrato
bido, podendo implicar a inadequação da ingestão alimentar e o déficit no de soja), não têm indicação terapêutica para a alergia à proteína do leite
estado nutricional. Destaque deve ser dado à abordagem multidisciplinar de vaca. São alimentos destinados para crianças, adolescentes e adultos,
que o manejo da alergia alimentar requer, incluindo, principalmente, a não atendendo às necessidades nutricionais do lactente.
participação do nutricionista em conjunto com o médico, durante todo Monitoramento da ingestão de cálcio e
o acompanhamento. Cabem ao nutricionista uma avaliação criteriosa e
outros nutrientes na dieta de exclusão do
detalhada do estado nutricional e da ingestão alimentar, além do esta-
belecimento da conduta dietética individualizada, devendo incluir infor-
leite de vaca e derivados
mação necessária para os responsáveis da criança. Os alimentos a serem Aspecto não menos importante no manejo dietético da alergia à proteína
oferecidos devem proporcionar oferta adequada de nutrientes e seguran- do leite de vaca é o monitoramento do estado nutricional, que apontará
ça quanto à ausência da proteína alergênica. as necessidades de energia e nutrientes. Carboidratos, proteínas, lipídeos,
História dietética bem detalhada permite identificar sintomas relacio- vitaminas A, C, D, complexo B, zinco, cálcio e ferro, entre outros nutrien-
nados ao alimento e suspeitar de outros alimentos ou ingredientes que tes, também são extremamente importantes e devem ser contemplados
podem levar o paciente a fazer transgressões da dieta de exclusão, de de forma adequada na dieta para garantir crescimento e desenvolvimento
forma voluntária ou involuntária. esperados.
■■ REFERÊNCIAS
QUADRO 38.3 ■ Recomendação de cálcio, fósforo e vitamina D
de acordo com as DRI, de 2010 1. American Academy of Pediatrics. Committee on Nutrition. Hipoallergenic
infant formulas. Pediatrics. 2000;106(2):346-9.
CÁLCIO FÓSFORO VITAMINA D 2. Weber TK, Speridião PGL, Sdepanian VL, Fagundes Neto U, Morais MB.
FAIXA ETÁRIA (MG/DIA) (MG/DIA) (UI/DIA) The performance of parents of children receiving cow’s Milk free diets at
identification of commercial food products with and without cow’s milk. J
1 a 3 anos 700* 460 600 Pediatr (Rio J). 2007;83(5):459-64.
3. Institute of Medicine. Report Release: dietary reference intakes for calcium
4 a 8 anos 1.000* 500 600 and vitamin D. [S. l.: s. n.]; 2010.
Lactato de cálcio 13
Gluconato de cálcio 9
39
Nos casos em que se tem certeza de não haver qualquer tipo de DOENÇA CELÍACA
erro na dieta e que esta não tenha sensibilizado o paciente, é recomen-
dável reavaliar o diagnóstico, pois, possivelmente, não se trata de aler-
gia à proteína do leite de vaca. Para finalizar, deve ser ressaltado que ■■ VERA LUCIA SDEPANIAN
grande parte dos lactentes com alergia ao leite de vaca, não mediada
pela IgE, desenvolve tolerância até os 12 a 24 meses de vida. Algumas
crianças podem persistir sintomáticas por um período um pouco mais A doença celíaca (DC)* não deve ser considerada doença rara no Brasil,
prolongado. já que os quatro estudos de sua prevalência em doadores de sangue (ou
seja, na população geral brasileira) demonstraram prevalência igual a
1:214 (um indivíduo com DC para cada 214 doadores de sangue), 1:273,
REVISÃO 1:417 e 1:681, nas cidades de São Paulo, Ribeirão Preto, Curitiba e Brasília,
respectivamente. Sabe-se que essa doença é muito prevalente na Europa e
A alergia à proteína do leite de vaca é a alergia alimentar mais co-
nos Estados Unidos, acometendo cerca de 1 em cada 100 a 200 indivíduos
mum em lactentes.
da população geral.
Os lactentes necessitam de alternativas alimentares apropriadas
A Portaria nº 1.149, de 11 de novembro de 2015, aprovou o Protocolo
para assegurar pleno crescimento e desenvolvimento. 1
Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Doença Celíaca **, o qual contempla
Cólica, refluxo gastresofágico, colite, constipação, enteropatia, en-
o conceito geral da doença celíaca, critérios de diagnóstico, tratamento
terocolopatia, urticária e hipersensibilidade gastrintestinal imediata
e mecanismos de regulação, controle e avaliação; é de caráter nacional e
são as manifestações clínicas mais conhecidas da alergia à proteína
deve ser utilizado pelas Secretarias de Saúde dos Estados, Distrito Federal
do leite de vaca em lactentes.
e Municípios na regulação do acesso assistencial, autorização, registro e
O teste de desencadeamento é utilizado para confirmar ou descar-
ressarcimento dos procedimentos correspondentes.
tar o diagnóstico de alergia ao leite de vaca no lactente.
Embora rara, a manifestação mais grave da alergia alimentar
(mediada pela IgE) é o choque anafilático, que requer tratamento
■■ CONCEITO
imediato. A DC é uma intolerância permanente induzida pelo glúten – principal
A escolha do produto que possa proporcionar eficácia terapêuti- fração proteica presente no trigo, no centeio e na cevada – que se ex-
ca e cobertura das necessidades nutricionais é um dos tópicos de
maior importância na assistência ao lactente com alergia ao leite *Neste capítulo, onde consta DC leia-se doença celíaca.
de vaca. **Acesse <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/sas/2015/prt1149_11_11_2015.
html>.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 307
pressa por enteropatia mediada por linfócitos T em indivíduos geneti- 3 | Forma assintomática ou silenciosa: caracteriza-se por alterações so-
camente predispostos. rológicas e histológicas da mucosa do intestino delgado, compatíveis com
DC associada à ausência de manifestações clínicas. Essa situação pode
ser comprovada principalmente entre grupos de risco para a DC, como
■■ ETIOLOGIA
familiares de 1o grau de pacientes com DC, e vem sendo reconhecida com
Com base nos conhecimentos atuais, para apresentar a DC, é fundamen- maior frequência nas últimas duas décadas após o desenvolvimento dos
tal a presença de pelo menos dois fatores: predisposição genética para a marcadores sorológicos para a DC.
doença e consumo de glúten. Com respeito ao fator genético, há presença São os considerados grupos de risco para a DC, isto é, aqueles que
de genes do complexo antígeno leucocitário humano (HLA), em que 90% têm mais chance de apresentar a doença: familiares de 1o de pacientes
dos pacientes apresentam uma variante do heterodímero DQ2 e 5 a 10% com DC; pacientes com doenças autoimunes, como diabetes melito insu-
DQ8. DQ2 é a designação para os alelos DQA1*0501 e DQB1*0201, ao lino-dependente, tiroidite autoimune, deficiência seletiva de imunoglobu-
passo que DQ8 se refere aos alelos DQA1*0301 e DQB1*0302. É impor- lina A, síndrome de Sjögren, colestase autoimune, miocardite autoimune;
tante mencionar que cerca de 40% da população geral apresenta esse aqueles com síndromes de Down, de Turner e de Williams; e pacientes com
haplótipo. A gliadina, porção solúvel em etanol do glúten, corresponde dermatite herpetiforme.
à fração tóxica para o indivíduo com predisposição genética desenvolver
a DC. Assim, peptídeos específicos da gliadina são responsáveis por res- ■■ DIAGNÓSTICO
posta Th1 e Th2.
Os indivíduos que apresentam a forma clássica ou não clássica da DC, ou
Em consequência à reação Th1, há secreção de citocinas, que exer-
aqueles pertencentes aos grupos de risco, devem, em um primeiro mo-
cem papel fundamental no processo de atrofia vilositária e hiperplasia
mento, realizar sorologia específica para a DC. Os testes sorológicos para
das células da cripta da mucosa intestinal. A resposta do tipo Th2 é res-
DC são anticorpo antigliadina, anticorpo antiendomísio, anticorpo anti-
ponsável pela maturação e expansão de plasmócitos que produzem os
transglutaminase e, o mais recente, anticorpo antigliadina desamidada.
anticorpos da classe IgA contra gliadina, transglutaminase e complexos
Com relação ao anticorpo antigliadina, determinado pela técnica de
gliadina-transglutaminase. Além disso, a resposta imune iniciada no intes-
enzimaimunoensaio (Elisa), deve-se mencionar que a especificidade do anti-
tino delgado, envolvendo células T, pode acarretar lesão de outros órgãos
corpo da classe IgA (71 a 97% nos adultos e 92 a 97% nas crianças) é maior
associados a doenças autoimunes. do que a da classe IgG (50%), e que a sensibilidade é extremamente variável
em ambas as classes. O anticorpo antiendomísio da classe IgA, com base na
■■ QUADRO CLÍNICO técnica de imunofluorescência indireta (IFI), apresenta alta sensibilidade (en-
Três formas de apresentação clínica da DC são reconhecidas: clássica ou tre 88 e 100% nas crianças e 87 a 89% no adulto), sendo baixa em crianças
menores de 2 anos; a especificidade também é alta (91 a 100% nas crianças
típica; não clássica ou atípica; e assintomática ou silenciosa.
e 99% nos adultos). No entanto, a imunofluorescência indireta é um teste
1 | Forma clássica: caracterizada pela presença de diarreia crônica, em
que depende da experiência do examinador, com custo relativamente alto e
geral acompanhada de distensão abdominal e perda de peso. O paciente
técnica mais trabalhosa do que a de enzimaimunoensaio.
também pode apresentar diminuição do tecido celular subcutâneo, atrofia
Com relação ao anticorpo antitransglutaminase da classe IgA, obtido
da musculatura glútea, falta de apetite, alteração de humor (irritabilidade
pelo método de Elisa, observam-se elevadas sensibilidade (92 a 100% em
ou apatia), vômitos e anemia.
crianças e adultos) e especificidade (91 a 100%). Dessa forma, os anti-
2 | Forma atípica: os pacientes desse grupo podem apresentar as
corpos antiendomísio da classe IgA e antitransglutaminase da classe IgA
seguintes manifestações, isoladas ou em conjunto, cujos sinais e/ou são superiores ao anticorpo antigliadina. Quanto à utilidade do anticorpo
sintomas gastrintestinais estão ausentes ou, se presentes, ocupam antigliadina desamidada, um estudo de metanálise concluiu que o anticor-
um segundo plano – baixa estatura, anemia por deficiência de ferro po antitransglutaminase é mais sensível (93% antitransglutaminase versus
refratária à ferroterapia oral, anemia por deficiência de folato e vita- 88% antigliadina desamidada), e que a especificidade desses dois anticor-
mina B12, osteoporose, hipoplasia do esmalte dentário, artralgias ou pos é semelhante (96% antitransglutaminase versus 94% antigliadina de-
artrites, constipação intestinal refratária ao tratamento, atraso pube- samidada). Portanto, há superioridade do anticorpo antitransglutaminase
ral, irregularidade do ciclo menstrual, esterilidade, abortos de repe- em relação ao anticorpo antigliadina desamidada no rastreamento soroló-
tição, ataxia, epilepsia (isolada ou associada à calcificação cerebral), gico. Até o momento, os marcadores sorológicos para DC não substituem
neuropatia periférica, miopatia, manifestações psiquiátricas – depres- a biópsia de intestino delgado, que continua sendo o padrão-ouro para o
são, autismo, esquizofrenia –, úlcera aftosa recorrente, elevação das diagnóstico de DC.
enzimas hepáticas sem causa aparente, fraqueza, perda de peso sem
causa aparente, edema de aparição abrupta após infecção ou cirurgia
e dispepsia não ulcerosa. ATENÇÃO!
No Brasil, deve-se manter a importância de realizar a biópsia de intes-
ATENÇÃO! tino delgado para o diagnóstico da DC.
Para o diagnóstico da DC, é imprescindível a realização da biópsia de quiátricos. Entre as complicações malignas, estão linfoma, carcinoma de
intestino delgado, que pode ser obtida por pinça de biópsia de endoscopia esôfago e faringe e adenocarcinoma de intestino delgado. O risco de com-
gastrintestinal (pelo menos quatro fragmentos da porção mais distal do plicações está associado com a não obediência à dieta isenta de glúten.
a a
duodeno) pelo menos 2 ou 3 porção. A alteração de mucosa intestinal, Por isso, a necessidade da prescrição de dieta totalmente isenta de glúten,
na qual há presença de atrofia vilositária (Marsh III), seja leve, moderada durante toda a vida, a todos os pacientes com DC.
ou total, demonstra evidência de DC, embora não seja lesão patognomô- Portanto, deve-se efetivamente buscar o diagnóstico dos pacientes
nica dessa doença. com DC com base em todas as formas de apresentação clínica. A dieta
A European Society of Paediatric Gastroenterology (ESPGHAN) tem isenta de glúten não deve ser iniciada apenas a partir do quadro clíni-
valorizado o teste genético HLA-DQ2 e HLA-DQ8 como ferramenta para o co. Apenas com o estabelecimento preciso do diagnóstico é que se deve
diagnóstico dos pacientes com DC. No Brasil, esse exame ainda tem pouco iniciar uma dieta totalmente sem glúten, por toda a vida. Aqueles que
acesso e custo extremamente alto. Contudo, deve-se destacar que apre- seguem a dieta têm a doença controlada, sem risco de apresentarem com-
senta elevado valor preditivo negativo, isto é, se o teste é negativo, a plicações.
chance de o indivíduo ter a doença é mínima. A presença de HLA-DQ2 e/
ou HLA-DQ8 indica predisposição genética, e não a presença de doença.
REVISÃO
■■ TRATAMENTO
A DC não deve mais ser considerada doença rara no Brasil.
Consiste, basicamente, na eliminação do glúten da dieta, durante toda Não se deve retirar o glúten da dieta sem a realização de exames
a vida. Essa tarefa que, parece ser simples, entretanto, requer mudança subsidiários para estabelecer o diagnóstico da DC.
importante dos hábitos alimentares dos pacientes com DC, que devem Há marcadores sorológicos específicos para DC, como o anticorpo
excluir de sua alimentação o trigo, o centeio, a cevada e o malte (subpro- antitransglutaminase tecidual da classe IgA e o anticorpo antiendo-
duto da cevada), assim como seus derivados. A aveia também deve ser mísio da classe IgA.
excluída da dieta, uma vez que esse cereal, em geral, está contaminado A presença de atrofia vilositária da biópsia de intestino delgado
com o trigo. confirma o diagnóstico de DC.
Nunca se deve instituir a dieta sem glúten sem que o diagnóstico da
doença seja estabelecido. A alimentação permitida ao celíaco consiste
em arroz, grãos (feijão, lentilha, soja, ervilha, grão-de-bico), óleo, azeite,
■■ REFERÊNCIAS
vegetais, hortaliças, frutas, tubérculos (batata, mandioca, cará, inhame),
1. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.149, de 11 de novembro de 2015.
ovos, carnes (bovina, suína, peixes e aves), leite e derivados.
Aprova o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Doença Celíaca.
O glúten pode ser substituído pelas farinhas dos seguintes alimentos:
Brasília: MS, 2015. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/
milho (farinha de milho, amido de milho, fubá); arroz (farinha de arroz); saudelegis/sas/2015/prt1149_11_11_2015.html>. Acesso em: 16 set. 2016.
batata (fécula de batata); mandioca (farinha de mandioca, polvilho doce, 2. Brasil. Presidência da República. Casa Civil. Lei nº 8.543, de 23 de dezembro
polvilho azedo, tapioca). Milete, quinoa e amaranto também são permiti- de 1992. Determina a impressão de advertência em rótulos e embalagens
dos. Embora o trigo sarraceno não contenha glúten, pode estar contami- de alimentos industrializados que contenham glúten, a fim de evitar a
nado com glúten. Essa contaminação pode ocorrer no campo, na colheita doença celíaca ou síndrome celíaca [Internet]. Brasília: Casa Civil; 1992
ou na moagem, porque o trigo sarraceno geralmente está próximo da [capturado em 15 set. 2016]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/
plantação do trigo. ccivil_03/Leis/1989_1994/L8543.htm.
Com respeito aos produtos industrializados, os pacientes com DC de- 3. Brasil. Presidência da República. Casa Civil. Lei nº 10.674, de 16 de maio
vem sempre ler os rótulos para certificar-se de que o produto não contém de 2003. Obriga a que os produtos alimentícios comercializados informem
2
glúten. No Brasil, em 1992, foi promulgada uma Lei Federal que determi- sobre a presença de glúten, como medida preventiva e de controle da
doença celíaca [Internet]. Brasília: Casa Civil; 2003 [capturado em 15 set.
nava a impressão de advertência “contém glúten” nos rótulos e nas emba-
2016]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/
lagens de alimentos industrializados que apresentassem em sua composi-
L10.674.htm.
ção trigo, centeio, cevada, aveia e seus derivados. Em maio de 2003, a Lei 4. Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Federal no 10.6743 foi promulgada, determinando que todos os alimentos RDC nº 137, de 29 de maio de 2003. registro/renovação de registro de
industrializados devessem conter a expressão “contém glúten” ou “não medicamentos pertencentes às classes/ princípios ativos relacionadas
o
contém glúten”, conforme o caso. Há, também, a Resolução – RDC n 137, em ANEXO, só serão autorizados se as bulas e embalagens contiverem a
de maio de 2003,4 para os produtos farmacêuticos, que devem conter a advertência pertinente, conforme relação anexa. Brasília: Anvisa; 2003.
expressão “contém glúten” quando apresentarem essa proteína.
As Associações dos Celíacos do Brasil (Acelbra)* – distribuídas em 15
Estados do Brasil –, assim como a Federação Nacional das Associações de ■■ LEITURAS SUGERIDAS
Celíacos do Brasil (Fenacelbra), que congrega as associações de celíacos Hill ID, Dirks MH, Liptak GS, Colletti RB, Fasano A, Guandalini S, et al. Guideline for
do Brasil, são fundamentais para oferecer suporte aos pacientes, divulgar the diagnosis and treatment of celiac disease in children: recommendations
a doença e promover atividades políticas em prol dos celíacos. of the North American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology
Com a instituição de dieta totalmente sem glúten, há completa nor- and Nutrition. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2005;40(1):1-19.
malização da mucosa intestinal, bem como desaparecimento das manifes- Melo SB, Fernandes MI, Peres LC, Troncon LE, Galvão LC. Prevalence and
demographic characteristics of celiac disease among blood donors in
tações clínicas.
Ribeirão Preto, State of São Paulo, Brazil. Dig Dis Sci. 2006;51(5):1020-5.
Há uma série de complicações não malignas da DC, como osteopo-
Oliveira RP, Sdepanian VL, Barreto JA, Cortez AJ, Carvalho FO, Bordin JO, et
rose, doenças autoimunes, esterilidade, distúrbios neurológicos e psi- al. High prevalence of celiac disease in Brazilian blood donor volunteers
based on screening by IgA antitissue transglutaminase antibody. Eur J
*Para mais informações, acesse: http://www.acelbra.org.br/2004/index.php Gastroenterol Hepatol. 2007;19(1):43-9.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 309
Etiologia
As DII resultam da interação complexa entre fatores genéticos, ambientais
■■ VERA LUCIA SDEPANIAN e imunes. Há associação entre o gene NOD2 e a DC.
Essas doenças são mais prevalentes em países desenvolvidos, como
os da Europa e os Estados Unidos. Entretanto, atualmente, países emer-
gentes, como o Brasil, constatam aumento da prevalência dessas enfer-
Não há um consenso a respeito da significação de diarreia crônica, mas
midades. Na realidade, estudos de prevalência na faixa etária pediátrica
pode ser definida como um processo diarreico com duração superior a 30
são escassos e estima-se que 20 a 30% dos pacientes com DII iniciam os
dias ou quando ocorrerem três episódios de curta duração em um período
sintomas com idade inferior a 20 anos.
de dois meses. Assim, quatro semanas corresponderiam ao menor período
de duração que poderia ser considerado no caso da diarreia crônica. Quadro clínico
Doença de Crohn
■■ ETIOLOGIA Como o envolvimento do tubo digestório pode ser em qualquer parte nes-
sa doença, as manifestações são diversas. A maioria dos pacientes com DC
A diarreia crônica é de etiologia não infecciosa – portanto, não autoli-
apresenta a tríade: dor abdominal; diarreia; e perda de peso.
mitada; as diarreias aguda e persistente, por sua vez, são de etiologia
Há basicamente três formas de apresentação da doença:
presumivelmente infecciosa.
1 | Inflamatória, também chamada de não fistulizante não esteno-
sante: quando a doença se caracteriza por inflamação sem presença de
■■ CLASSIFICAÇÃO fístulas nem estenoses. Nesse caso, em geral, a dor abdominal e a diarreia
estão presentes.
A variabilidade de quadros clínicos e de doenças relacionadas à diarreia
A dor abdominal é variável na dependência da localização e da gravi-
crônica determinou vários modos de classificá-la. Um deles, descrito no
dade da inflamação:
Quadro 40.1, utiliza os critérios anatômicos e funcionais: doenças rela-
os pacientes que apresentam acometimento de todo o colo podem
cionadas com o tubo digestório; doenças relacionadas aos anexos do sentir dor abdominal difusa;
tubo digestório; e doenças não relacionadas ao tubo digestório ou a seus caso a inflamação ocorra em colo distal, a dor pode ser de locali-
anexos. zação pélvica;
Deve-se destacar o aumento da frequência de duas doenças no Brasil: se o colo transverso estiver comprometido, a dor pode ser epigás-
a doença celíaca; e as doenças inflamatórias intestinais. Uma vez que a trica;
doença celíaca é abordada neste livro no capítulo de mesmo nome, serão
abordadas aqui as doenças inflamatórias intestinais. *Neste capítulo, onde consta DC leia-se doença de Crohn.
se o ceco estiver inflamado, o paciente pode se queixar de dor em redução de consumo alimentar em decorrência da anorexia media-
fossa ilíaca direita; da pelas citocinas e do receio de piora dos sintomas gastrintesti-
quando o intestino delgado estiver inflamado, a dor tende a ser nais posterior à refeição;
periumbilical, ou pode ser em quadrante inferior direito, se o íleo diminuição da função absortiva devido ao comprometimento do
estiver alterado; intestino delgado; e
caso o estômago esteja inflamado, pode haver dor epigástrica acom- tratamento com corticosteroide.
panhada por náusea, vômitos ou sensação de plenitude gástrica; Com respeito ao desenvolvimento puberal, as DII podem causar:
se houver comprometimento do esôfago, pode ocorrer dor retro- atraso do início do desenvolvimento puberal;
esternal ou disfagia. diminuição ou parada da maturação sexual;
Em relação à diarreia: amenorreia secundária, uma complicação causada pela desnu-
se a inflamação for predominantemente colônica, a diarreia é de trição.
pouco volume, de frequência aumentada, com presença de sangue Portanto, deve-se considerar a DC como um possível diagnóstico em
e muco nas fezes, urgência para evacuar, tenesmo retal e o pacien- pacientes com déficit de crescimento e/ou atraso do desenvolvimento pu-
te desperta para evacuar. O sangue é vivo, se a inflamação for de beral. Em relação à DC, quando se compara a doença da criança com a que
segmento colônico distal, e escuro, se segmento de colo proximal se iniciou na idade adulta, observa-se doença mais grave na criança, o que
envolvido; sugere que a DC está associada a fenótipo mais grave nessa faixa etária.
se a inflamação for de intestino delgado, a evacuação é volumosa, Quanto à ocorrência de DII na idade pediátrica muito precoce, idade
com frequência menor do que quando o colo está acometido. inferior a 1 ano, com colite grave (Crohn’s-like colitis), observou-se associa-
2 | Estenosante: no caso de ocorrência de estreitamentos intestinais ou ção com deficiência da interleucina-10.
anorretais de repetição documentados por exames radiológicos, endoscó- Colite ulcerativa
picos ou cirúrgico-patológicos, com dilatação pré-estenótica ou com sinais
ou sintomas de obstrução, sem a presença de fístulas. Caracteriza-se por quadro clínico que pode ser classificado como leve, mo-
A sintomatologia quando a doença é do tipo estenosante é caracte- derado e grave.
rizada, na dependência da gravidade, de sintomas de suboclusão. Nesse Leve: início insidioso, como diarreia, sangramento retal e dor abdo-
caso, a dor abdominal é do tipo cólica, acompanhada por náusea e vômi- minal, sem apresentar sinais sistêmicos. Nesses casos, a inflama-
tos. A perda de peso costuma ser importante na medida em que a doença ção está geralmente localizada no colo distal.
progride sem diagnóstico. Moderado: diarreia sanguinolenta, cólicas e sensibilidade abdomi-
3 | Penetrante ou fistulizante: nos casos de ocorrência de fístulas peria- nal, associados a sinais sistêmicos, como anorexia, perda de peso,
nais ou intra-abdominais. febre intermitente e anemia leve.
Fístulas correspondem a comunicações anormais entre diferentes es- Grave: mais de seis evacuações sanguinolentas por dia, dor abdomi-
nal, febre, perda de peso, anemia, leucocitose e hipoalbuminemia.
truturas do organismo.
Esses pacientes podem apresentar sinais de megacolo tóxico, uma
Na DC, as fístulas mais comumente presentes são:
complicação da CU que se caracteriza por colo dilatado, dor abdo-
perianais, que se exteriorizam nas proximidades do ânus, acar-
minal importante, vômitos, ausência de ruídos aéreos e toxemia.
retando saída de secreção, como pus e fezes, na dependência
do trajeto fistuloso. Essas fístulas podem ser complexas, isto é, Manifestações extraintestinais presentes na
o trajeto fistuloso é complexo, podendo ser acompanhado por doença de Crohn e na colite ulcerativa
abscessos;
Em relação a manifestações extraintestinais, na faixa etária pediátrica, dé-
as fístulas que não são perianais podem ser, por exemplo, da va-
ficit de crescimento e atraso do desenvolvimento puberal, mencionados,
gina, das vias urinárias e, nesses casos, pode haver saída de fezes
são as manifestações mais importantes.
pela vagina, ou pela via urinária, respectivamente.
Entre as demais manifestações extraintestinais:
Essas três formas de apresentação da DC (inflamatória, estenosante,
as manifestações articulares são as mais frequentes – a artralgia
penetrante ou fistulizante) podem ocorrer:
mais comum e, em seguida, a artrite –, presentes em cerca de 25%
de forma isolada, ou seja, o paciente apresenta apenas uma das
das crianças com DII, mais prevalentes na DC do que na CU;
formas de apresentação; a diminuição da densidade mineral óssea também pode estar pre-
o mesmo paciente pode apresentar várias formas de apresentação. sente na população pediátrica com DII. A autora demonstrou que
Na faixa etária pediátrica, deve-se dar especial atenção ao déficit de 25% dos pacientes com DII na faixa etária pediátrica apresentavam
crescimento e ao retardo de desenvolvimento puberal, que podem ser ma- baixa densidade mineral óssea (escore Z < 2);
nifestações clínicas das DII, em especial com DC, conforme descrito a seguir. Entre as demais manifestações extraintestinais, estão:
O déficit de crescimento é uma característica exclusiva da faixa etária lesões orais aftosas recorrentes;
pediátrica, ocorrendo em 10 a 40% dos pacientes no momento do diag- lesões de pele, como eritema nodoso e pioderma gangrenoso;
nóstico, e, em alguns pacientes, pode ser o sintoma inicial da DC na ausên- lesões oculares, como episclerite e uveítes;
cia de diarreia ou dor abdominal. A ocorrência de déficit de crescimento na doenças hepáticas, como colangite esclerosante primária, que está
CU é menos comum quando comparada com DC. mais frequentemente associada à CU do que à DC.
Assim, é importante a obtenção de dados de peso e estatura prévios
para a construção da curva de crescimento quando se avalia a possiblida- Classificação
de diagnóstica de DII na criança ou no adolescente. A proposta mais recente para classificação das DII é a de Paris, que se
Os principais fatores responsáveis pelo déficit de crescimento se re- refere à classificação de Montreal modificada para a faixa etária pediátrica
ferem a: tanto para a DC quanto para a CU (Quadros 40.2 e 40.3, respectivamente).
ação de citocinas proinflamatórias, que interferem diretamente A gravidade das DII pode ser monitorada com emprego dos índi-
com fator de crescimento insulina-símile I (IGF-1); ces de atividade da doença, como o Perianal Crohn‘s Disease Activity
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 311
Index (PCDAI), na DC, e o Pediatric Ulcerative Colitis Activity Index exame físico;
(PUCAI), na CU. exames laboratoriais, como hemograma, VHS, reação em cadeia
da polimerase, plaquetas, eletroforese de proteínas, coprocultura,
QUADRO 40.2 ■ Classificação de Paris para doença de Crohn calprotectina fecal;
endoscopias: ileocolonoscopia e endoscopia digestiva alta;
IDADE DO DIAGNÓSTICO
No exame do abdome, pode: Para manutenção da remissão da DC, os corticosteroides não pa-
haver distensão abdominal e dor à palpação; recem ter utilidade. Tampouco se encontrou evidência de a mesalazina
evidenciar massa palpável, por exemplo, no quadrante inferior di- manter a remissão da DC. Por sua vez, azatioprina e 6-mercaptopurina são
reito, que indicaria a presença de alteração ileocecal que ocorre efetivas na manutenção da remissão da DC. Assim, nos casos de recaída
na DC; da DC, os pacientes corticodependentes têm indicação de usar azatioprina
observar circulação colateral, hepatomegalia, esplenomegalia ou 6-mercaptopurina. O efeito tóxico associado a essa terapia imunossu-
presentes no paciente com hipertensão porta quando há colangite pressora, a longo prazo, ainda é incerto.
esclerosante primária ou hepatite autoimune. Para o tratamento da DC perianal, abscesso ou fístula, está indicada
As alterações decorrentes das manifestações extraintestinais podem a antibioticoterapia, metronidazol e ciprofloxacina, drenagem cirúrgica e
estar presentes, como: colocação de seton. Em seguida, indica-se a terapia biológica tanto nos
artrite; pacientes com doença perianal refratária quanto naqueles com DC fistu-
eritema nodoso; e lizante.
alterações oculares. Os benefícios da terapia anti-TNF em crianças com DC compreendem:
suspender/reduzir corticosteroide; postergar cirurgia; favorecer o cresci-
Tratamento mento; curar a lesão da mucosa; e promover o fechamento de fístulas. Os
O tratamento dos pacientes com DII depende da gravidade e da locali- efeitos adversos da terapia anti-TNF são: reação durante a infusão (p. ex.:
zação da doença e consiste na indução da remissão e na manutenção da dor no peito, aperto na garganta, dificuldade para respirar, elevação ou
remissão da doença objetivando a cura da lesão da mucosa. redução da pressão arterial, febre e tremor); infecção oportunista; linfoma;
Discute-se qual seria a terapia mais indicada: a terapia convencional, e doença desmielinizante. O risco de infecção oportunista com a terapia
também conhecida como step-up, em que a sequência das medicações anti-TNF aumenta quando se utilizam dois ou mais fármacos para tratar a
introduzidas na medida em que ocorre recaída da doença é mesalazina, DC. Houve relato de casos de um tipo raro e grave de doença linfoprolife-
corticosteroide, azatioprina ou 6-mercaptopurina, terapia biológica; ou a rativa – hepatoslenic T cell lymphoma (HSTCL) – em pacientes com DC que
terapia top-down, que utiliza, em um primeiro momento, medicação mais receberam concomitantemente imunomodulador e infliximabe.
agressiva, como a terapia biológica. As consequências do uso do corticos- Recomenda-se cirurgia na DC nas seguintes situações: estenose,
teroide na faixa etária pediátrica, em especial o déficit de crescimento e o doença fistulizante, drenagem de abscessos, assim como as mesmas in-
retardo puberal, além dos outros efeitos adversos, incluindo as alterações dicações de urgência cirúrgica da retocolite ulcerativa, como megacolo
estéticas da criança e dos adolescentes, estimulam estratégias para evitar tóxico, perfuração intestinal e hemorragia maciça.
o uso abusivo de corticosteroide. Como a maioria das crianças com CU apresenta pancolite, a terapêu-
Embora a grande maioria dos gastrenterologistas pediátricos utili- tica na maioria dos pacientes dependerá da gravidade da doença. Uma
zem a terapia convencional no momento da indução da remissão, alguns terapêutica efetiva nos pacientes com colite leve consiste na administra-
centros, especialmente europeus, recomendam para a DC uma nutrição ção de aminossalicilato por VO. Nesse grupo de medicamentos, estão a
enteral (dieta polimérica com eficácia semelhante à semielementar e à ele- sulfassalazina e a mesalazina. A sulfassalazina é composta pela sulfapiri-
mentar) com suspensão da alimentação habitual e consumo de fórmula dina e pelo ácido 5-aminosalicílico (5-ASA ou mesalazina). A sulfapiridina,
enteral administrada VO ou sonda nasogástrica durante cerca de oito se- porção sem atividade terapêutica, que atua no transporte da mesalazina,
manas, como monoterapia de primeira linha, a qual seria capaz de induzir é responsável pelos efeitos adversos da sulfassalazina. A mesalazina, en-
a remissão da DC, promover o crescimento e reduzir a necessidade do uso contrada no mercado sob diferentes formas de liberação dessa substância
de corticosteroide. ativa, tem menos efeitos adversos. A mesalazina com microgrânulos de
®
Os corticosteroides (prednisona, prednisolona, hidrocortisona) são liberação prolongada (Pentasa ), que contém a etilcelulose para proteger
efetivos na indução da remissão da DC, desde leve a grave, de qualquer a mesalazina da degradação gástrica, permite que a substância ativa seja
localização, assim como no tratamento das manifestações extraintestinais. liberada de forma contínua e prolongada, desde o intestino delgado proxi-
A dose da prednisona oral indicada para indução da remissão é de 1 a mal até as porções mais distais do intestino grosso.
2 mg/kg/dia, não ultrapassando 40 mg/dia. A hidrocortisona intravenosa Os pacientes com CU moderada a grave devem receber, além da me-
pode ser utilizada nos casos graves. Não há evidência de que o prosse- salazina, corticosteroide, prednisona ou prednisolona, na dose de 1 a 2
guimento desse tratamento por mais do que quatro semanas influenciará mg/kg/dia durante cerca de quatro semanas e posterior redução, lenta e
na remissão. A retirada do corticosteroide deve ser gradual, até a retirada gradual, até retirada completa em um período entre 4 e 8 semanas. Aque-
completa de forma rápida, em quatro semanas, ou lenta, até 12 semanas, les que não respondem à corticoideterapia oral se beneficiam com a metil-
o que não parece influenciar na proporção da remissão. prednisolona via parenteral na dose de 1 a 2 mg/kg/dia. Aqueles com CU
grave devem ser internados para receberem corticosteroide IV e antibioti-
coterapia de amplo espectro e serem monitorados quanto à ocorrência de
ATENÇÃO! perfuração intestinal e ocorrência de megacolo tóxico. Cerca de 50% dos
É importante saber que os corticosteroides não são efetivos na manu- pacientes com colite grave não respondem ao corticosteroide, devendo-se
tenção da remissão. optar, nesse caso, pela colectomia ou pelo uso de agentes imunomodula-
dores potentes, como é o caso da ciclosporina ou tacrolimo.
Pacientes que apresentam envolvimento restrito ao reto (proctite) ou
Assim, na DC ativa, tanto a nutrição enteral exclusiva quanto os cor- colo esquerdo podem se beneficiar com fármacos de uso tópico, como me-
ticosteroides podem ser utilizados, devendo-se enfatizar que a terapia en- salazina na forma de supositório e de enema ou enema de corticosteroide.
teral exclusiva acarreta menor proporção de efeitos adversos e possibilita Em relação à terapia de manutenção da CU, os agentes imunomo-
impacto positivo na velocidade de crescimento. duladores, como azatioprina ou 6-mercaptopurina, são úteis quando há
A terapia biológica com anticorpo monoclonal anti-TNF tem-se mos- recaída da doença, lembrando que o início da ação desses medicamentos
trado útil tanto para induzir quanto para manter a remissão da DC. ocorre em 6 a 10 semanas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 313
PRINCÍPIO ATIVO E
TIPO DE FÁRMACO NOMES COMERCIAIS FORMAS DE APRESENTAÇÃO POSOLOGIA
®
Sulfassalazina Azulfin Cp. 500 mg VO: 50-70 mg/kg/dia dividido em 2 a 3 doses
A terapia biológica com anticorpo monoclonal anti-TNF pode ser uma Markowitz J. Current treatment of inflammatory bowel disease in children. Dig
possibilidade terapêutica na CU de atividade intensa. Liver Dis. 2008;40(1):16-21.
A Tabela 40.1 apresenta os principais medicamentos que podem ser Zachos M, Tondeur M, Griffiths AM. Enteral nutritional therapy for induction
utilizados nas DII. of remission in Crohn’s disease. Cochrane Database Syst Rev. 2007;(1):
CD000542.
O procedimento cirúrgico, colectomia, deve ser considerado na CU
quando há hemorragia maciça, doença ativa que não responde ao trata-
mento clínico, à perfuração e ao megacolo tóxico. Como a atividade da
doença na CU está limitada ao colo, a colectomia é curativa.
REVISÃO
41
Em geral, a diarreia crônica é caracterizada como processo diarreico CONSTIPAÇÃO INTESTINAL E
com duração superior a 30 dias. INCONTINÊNCIA FECAL
DC e CU são doenças inflamatórias intestinais, resultado da intera-
ção complexa entre fatores genéticos, ambientais e imunes.
Os sintomas mais comuns de DC e CU são diarreia e dor abdominal.
O tratamento das DII varia de acordo com a gravidade e a locali- ■■ MAURO BATISTA DE MORAIS
zação das doenças e consiste em induzir a remissão da doença e ■■ SORAIA TAHAN
manutenção da remissão da doença, objetivando a cura da mucosa.
■■ LEITURAS SUGERIDAS
■■ QUADRO CLÍNICO
Dubinsky M. Special issues in pediatric inflammatory bowel disease. World J
Gastroenterol. 2008;14(3):413-20. Na infância, aumento no intervalo entre as evacuações não é manifesta-
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Hamilton JR, Walker-Smith JA, Watkins JB, editors. Pediatric gastrointestinal cal são manifestações peculiares da constipação intestinal na população
disease. 3rd ed. St. Louis: Mosby; 2000. p. 613-64. pediátrica. O comportamento de retenção caracteriza-se pela contração
314 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
do esfíncter anal e da musculatura pélvica e glútea para evitar a defeca- mais novas com constipação intestinal, especialmente os lactentes, e os
ção. Incontinência fecal retentiva (escape fecal ou soiling) indica a perda casos não complicados. O reconhecimento e o início precoce do tratamen-
involuntária de parcela de conteúdo retal por portadores de constipação to podem associar-se com melhor prognóstico.
intestinal crônica, consequente da presença de fezes impactadas no reto.
Essas manifestações fazem parte da constipação intestinal funcional, que
■■ ETIOPATOGENIA
inclui mais de 90% dos casos na faixa etária pediátrica. Outros distúr-
bios da defecação, não relacionados à constipação intestinal funcional, A etiopatogenia da constipação intestinal funcional envolve a interação
são a encoprese e a incontinência fecal não retentiva. De acordo com a de múltiplos fatores:
conceituação adotada em nosso meio, encoprese pode ser entendida, em 1 | fatores hereditários e constitucionais;
analogia com enurese, como o ato completo da defecação em sua plena 2 | fatores alimentares (desmame precoce e consumo insuficiente de fibra
sequência fisiológica, entretanto em local e/ou momento inapropriado, alimentar);
sendo, em geral, secundária a transtornos psicológicos ou psiquiátricos 3 | episódios de evacuação dolorosa que determinam o comportamento
(incontinência fecal não retentiva). Incontinência fecal pode ser decor- de retenção;
rente, também, de falta de controle do esfíncter em razão de causas or- 4 | fatores emocionais; e
gânicas, como anomalias anorretais, e disfunções neurológicas, como a 5 | alteração na motilidade colônica.
meningomielocele. Em pediatria, a ocorrência de episódios de evacuação dolorosas apre-
senta uma importante função no processo fisiopatológico, desencadean-
do o círculo vicioso apresentado na Figura 41.1.
■■ CLASSIFICAÇÃO
O critério de Roma IV, editado em 2016, recomenda as definições apresen-
tadas no Quadro 41.1 para constipação funcional em pediatria.1 Deve ser
Anorexia Fibra Fissura
ressaltado que essas definições não identificam grande parte das crianças
rio. Nesses casos, pode ser utilizado tampo auxiliar (redutor do assento ■■ LEITURAS SUGERIDAS
do vaso sanitário), próprio para crianças, e/ou colocado apoio com altura Benninga MA, Nurko S, Faure C, Hyman PE, Roberts ISJ, Schechter N. Childhood
suficiente para que os pés possam ficar apoiados. functional gastrointestinal disorders: neonate/toddler. Gastroenterology.
Para as crianças em idade de treinamento esfincteriano, deve-se reco- 2016;150(6):1443-55.
mendar à mãe que suspenda o treinamento até que o paciente apresente Constipation Guideline Committee of the North American Society for Pediatric
controle da constipação. Gastroenterology, Hepatology and Nutrition. Evaluation and treatment
Por fim, deve ser lembrado que a constipação intestinal funcional com of constipation in infants and children: recommendations of the North
incontinência fecal retentiva, em geral, requer tratamento de manuten- American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition.
J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2006;43(3):e1-13.
ção por pelo menos três meses. Muitos pacientes necessitam tratamento
Hyams JS, Di Lorenzo C, Saps M, Schulman RJ, Staiano A, van Tilburg M. Childhood
mais prolongado. A longo prazo e na idade adulta, ao que tudo indica, é
functional gastrointestinal disorders: child/adolescent. Gastroenterology.
fundamental a adoção de um estilo de vida que favoreça a manutenção 2016;150(6):1456-68.
do hábito intestinal normal, incluindo utilização de dieta rica em fibras Morais MB, Maffei HVL. Constipação intestinal. J Pediatr (Rio J). 2000;76 Supl
alimentares, ingestão adequada de líquidos e atividade física regular. 2:S147-56.
Considera-se que as principais causas de insucesso do tratamento Tabbers MM, DiLorenzo C, Berger MY, Faure C, Langendam MW, Nurko S, et al.
da constipação são: tratamento prescrito ou realizado de maneira incor- Evaluation and treatment of functional constipation in infants and children:
reta; anismo (dissinergia do soalho pélvico); e doença de Hirschsprung. evidence-based recommendations from ESPGHAN and NASPGHAN. J
No diagnóstico diferencial, deve ser considerada a possibilidade de cons- Pediatr Gastroenterol Nutr. 2014;58(2):258-74.
tipação intestinal secundária à alergia ao leite de vaca, mais frequente
em pacientes com constipação intestinal refratária ao tratamento. Assim,
dieta de exclusão do leite de vaca seguida de teste de desencadeamento
pode ser considerada alternativa na abordagem da criança com consti-
pação intestinal de difícil controle. Apesar de não existirem informações 42
suficientes, esses casos parecerem predominar nos primeiros anos de vida
associando-se com fissuras anais recorrentes e hiperemia da região peria- DERMATITE ATÓPICA E URTICÁRIA
nal, além de história de associação do início da constipação logo após a
introdução do leite de vaca na dieta.
Uma série de anormalidades imunes sistêmicas e da pele foi observa- A hidratação da pele é mantida com a aplicação de hidratantes com
da, incluindo aumento dos níveis séricos de IgE e sensibilização a alergê- base hidrofílica, duas vezes ao dia. O uso de emolientes melhora a se-
nios; expressão das citocinas Th2 aumentadas nas lesões agudas; aumento cura e, subsequentemente, o prurido, bem como a função da barreira
do número de células T, que expressam linfócitos cutâneos antígeno-as- cutânea.
sociados; aumento da expressão de FceRI em células de Langerhans e em O controle da inflamação é frequentemente obtido com os corticoste-
células dendríticas epidérmicas inflamatórias; e diminuição da expressão roides e inibidores de calcineurina tópicos. Os glicocorticosteroides tópi-
a
de peptídeos antimicrobianos. Vários estudos demonstraram uma associa- cos constituem a 1 linha do tratamento anti-inflamatório, aplicado sobre
ção significativa entre anormalidades na barreira epidérmica e o risco de a pele inflamada de acordo com as necessidades (prurido, insônia, novo
DA de aparecimento precoce, grave e persistente. surto). Numerosas substâncias estão disponíveis em uma variedade de
Em virtude de vários mecanismos, o Staphylococcus aureus e os seus formulações. A melhor forma de poupar esteroides e evitar os efeitos cola-
produtos fornecem sinais de sensibilização que favorecem a inflamação. terais relacionados não é poupá-los durante as crises agudas, mas com a
O S. aureus ceramidase-derivado aumenta a permeabilidade do estrato manutenção da terapia básica e com o uso de emoliente combinado, com
córneo, e a capacidade superantigênica das suas enterotoxinas ativa as a intervenção anti-inflamatória precoce.
células T de forma independente do alergênio. Eles também contribuem
para a resistência aos corticosteroides nas células T e alteram a atividade
de regulação delas. IgE específica para o S. aureus, gerado pelo sistema ATENÇÃO!
imunológico, pode ligar-se a receptores de FceRI em células dendríticas e
A hidratação da pele, com o uso de emolientes, é fator determinante
iniciar uma reação mediada por IgE a esse micro-organismo.
no controle do prurido.
QUADRO CLÍNICO
O prurido é o sintoma fundamental, com um ritmo diário mínimo ao Os dois inibidores tópicos da calcineurina, tacrolimo pomada e pime-
meio-dia e máximo à noite. Nos primeiros meses de vida, a descama- crolimo creme, são licenciados para o tratamento da DA. Em contraste com
ção amarelada no couro cabeludo pode ser uma apresentação da DA. os corticosteroides, nenhum dos inibidores tópicos da calcineurina induz
A doença pode, então, se espalhar para a face e as superfícies exten- a atrofia de pele, o que favorece seu uso em áreas delicadas do corpo,
soras dos braços e pernas da criança, às vezes mostrando exsudação como a região das pálpebras, a pele perioral, a área genital, a axila ou a
intensa e crostas. Mais tarde, um padrão preferencial típico aparece com dobra inguinal.
eczema envolvendo zonas de flexão, pescoço e mãos, acompanhado por Os anti-histamínicos sistêmicos (anti-H1) são amplamente utilizados
pele seca e disfunção de barreira da pele refletida por um aumento da em erupções agudas, podendo ser úteis na diminuição do prurido e per-
perda de água transepidérmica. Liquenificação é o resultado de coçar e mitir o sono durante as agudizações. Nesse cenário, as moléculas anti-H1
esfregar, e as exacerbações, muitas vezes, começam com o aumento da sedantes, como hidroxizina, são frequentemente consideradas mais úteis
coceira sem lesões visíveis na pele, ou seja, seguido por eritema, pápulas do que os anti-H1 não sedantes.
e infiltração. A colonização e a superinfecção podem induzir a exacerbação da
doença e justificar terapia antimicrobiana, sendo benéfico o uso de fárma-
cos antiestafilocócicos.
ATENÇÃO! O tratamento anti-inflamatório sistêmico é uma opção para os casos
O prurido é o sintoma central da DA e tem como fator contribuidor a refratários graves, em que o potencial de tratamento tópico (ou da adesão
pele seca. do paciente) foi esgotado. Os corticosteroides sistêmicos são rapidamente
eficazes, mas só devem ser usados por algumas semanas, por exacerbação
aguda grave, devido aos muitos efeitos colaterais a longo prazo. A utilida-
DIAGNÓSTICO de da ciclosporina (3 a 5 mg/kg/dia) e azatioprina (2,5 mg/kg/dia) foi bem
documentada em ensaios clínicos com crianças e adultos.
Essencialmente clínico, com a observação de algumas características: A fototerapia, irradiação UV, é parte de um plano de tratamento to-
prurido, morfologia e distribuição típica das lesões, evolução crônica ou tal, ou seja, um tratamento de segundo nível utilizado especialmente em
cronicamente recidivante, pele seca generalizada e história pessoal ou
adultos.
familiar de atopia.
A imunoterapia alergênio-específica para aeroalergênios pode ser
A dosagem de IgE com valores bastante elevados, acima de 2.000
útil em casos selecionados. Nas exacerbações induzidas pelo estresse, o
kUI/L, pode estar relacionada com a gravidade do quadro. Os testes cutâ-
acompanhamento psicológico é recomendado.
neos de resposta imediata e a dosagem de IgE específica de diferentes
alérgenos, quando positivos, identificam a presença de sensibilização aos
mesmos, mas a relação causa-efeito deve obrigatoriamente ser observada ■■ URTICÁRIA
para o diagnóstico. A sensibilização a alérgenos alimentares, mais comu- Urticária e/ou angioedema (U/A) são vistos com frequência na prática mé-
mente ovo, leite de vaca, soja, trigo, pode estar relacionada com a DA nos dica. Estima-se que 15 a 20% da população apresente pelo menos um
2 primeiros anos de vida, e os alérgenos inalantes também poderão ser episódio agudo da(s) doença(s) na vida. Cerca de 50% dos pacientes mani-
identificados. festam unicamente lesões urticariformes, 10% apenas angioedema e 40%
ambos.
TRATAMENTO Na urticária, ocorrem vasodilatação e aumento da permeabilidade
A terapia básica inclui programas educacionais, aplicação de emolientes, vascular na derme superficial com súbito aparecimento de urticas – pápu-
óleos de banho, dieta de exclusão em pacientes com alergia alimentar las com edema central de diferentes tamanhos, com bordas irregulares e
comprovada e evitar alérgenos inalantes, quando identificados. sobrelevadas, circundadas por eritema reflexo, pruriginosas, de natureza
318 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
efêmera com a pele retornando ao aspecto normal em período que va- mecanismos não imunológicos: promovem degranulação inespe-
ria, geralmente, de 1 a 24 horas. No angioedema, ocorre edema súbito e cífica, sem a participação do sistema imunológico: fármacos (p.
pronunciado da derme profunda e do tecido celular subcutâneo, podendo ex., morfina, tiamina), alimentos (p. ex., morango, amora) e alguns
atingir mucosas e submucosas. Acomete principalmente mãos, pés, geni- fatores físicos. Alguns alimentos e bebidas (p. ex., peixes, toma-
tália, pálpebras, lábios, laringe e trato gastrintestinal. Os pacientes costu- te, queijos e vinhos), por serem ricos em histamina, também de-
mam referir desconforto, dor e ardor no local da lesão, em vez de prurido. flagram U/A sem a participação de mecanismos imunológicos. O
A resolução do processo é mais lenta, em torno de 72 horas. metabolismo do ácido araquidônico encontra-se alterado em U/A
causados por analgésicos e AINH.
CLASSIFICAÇÃO
O espectro de manifestações clínicas dos diferentes subtipos de U/A é bas- ATENÇÃO!
tante amplo e variável. Além disso, dois ou mais subtipos de U/A podem
coexistir em um mesmo paciente. U/A agudo é definido pela ocorrência No U/A crônico idiopático, o estímulo específico não pode ser deter-
espontânea de pápulas, angioedemas, ou ambos, que regridem em menos minado e os mecanismos envolvidos continuam desconhecidos. A
de seis semanas; nas formas crônicas, as lesões surgem na maioria dos presença, em alguns pacientes, de anticorpos antirreceptores para IgE
dias da semana, por um período igual ou superior a seis semanas. U/A ou anti-IgE e contra a tiroide torna o conceito de urticária associada à
agudo ocorre mais comumente em crianças e adultos jovens, é autolimi- autoimunidade cada vez mais reconhecido.
tado, geralmente de natureza alérgica, e, na maioria das vezes, o agente
etiológico pode ser identificado. U/A crônico, por sua vez, apresenta pico
a a
de incidência nas 3 e 4 décadas da vida, predomina em mulheres, tem DIAGNÓSTICO
caráter recidivante e o agente etiológico não pode ser identificado na As manifestações clínicas características facilitam o diagnóstico de U/A,
maioria dos casos. porém a identificação do fator etiológico nem sempre é fácil. Vale ressaltar
O Quadro 42.1 apresenta a classificação de U/A crônicos, mais reco- que estratégias ou programas extensos e dispendiosos para rastreio das
mendada para uso clínico, na atualidade, pois supera algumas inconsis- causas de U/A são fortemente desaconselhados. O diagnóstico do tipo/
tências apontadas na classificação anterior: o exemplo clássico diz res- subtipo de U/A se inicia com anamnese e exame físico completos. A histó-
peito às urticárias físicas, que, apesar de serem condições crônicas, eram ria clínica deve ser abordada por diversos aspectos:
habitualmente separadas na classificação, tendo em vista a natureza par- tempo de início;
ticular de seus fatores desencadeantes. frequência e duração dos sintomas;
variação diária;
forma, tamanho e distribuição das lesões;
QUADRO 42.1 ■ Classificação dos subtipos de urticária crônica associação com angioedema;
(manifestando-se com pápulas, angioedema ou ambos) intensidade do prurido e existência, ou não, de outros sintomas
associados;
URTICÁRIA CRÔNICA ESPONTÂNEA URTICÁRIAS “INDUZIDAS” história familiar de atopia;
história pregressa ou atual de alergias, infecções, doenças de base;
Surgimento espontâneo de pápulas, Urticárias físicas
angioedema, ou ambos por 6 semanas Dermografismo sintomático associação com exercício e agentes físicos;
ou mais devido a causas conhecidas Urticária ao frio uso de medicamentos (p. ex., AINEs, IECA);
ou por causas desconhecidas Urticária de pressão tardia correlação com alimentos (proteínas, aditivos alimentares);
Urticária solar profissão, hobbies;
Urticária ao calor reações a picadas de insetos;
Angioedema vibratório relação com ciclo menstrual;
Urticária colinérgica exposição cirúrgica prévia e eventos durante procedimentos;
Urticária de contato resposta a eventual(ais) terapia(s) já utilizada(s);
Urticária aquagênica relação com estresse emocional;
qualidade de vida em relação a U/A e seu impacto emocional.
Fonte: Adaptado de Zuberbier e colaboradores.1
O exame físico, dependendo da história, poderá incluir um teste de
provocação diagnóstico (p. ex., pesquisa de dermografismo). As etapas
FISIOPATOLOGIA subsequentes também dependerão muito da história e da natureza do
subtipo de U/A, como resumido no Quadro 42.2. Vale ressaltar que quais-
Na maioria dos tipos de U/A, a via final, que leva ao aumento localizado
quer testes laboratoriais e de provocação devem ser considerados de for-
da permeabilidade vascular, ocorre devido à degranulação de mastócitos
ma individual.
com liberação de substâncias vasoativas. Essa degranulação pode ser oca-
sionada por: Investigação complementar
mecanismos imunológicos: envolvidos, principalmente, nos qua- Para a maioria dos pacientes com doença leve, não é indicada investiga-
dros agudos. Participam as reações de hipersensibilidade do tipo I ção complementar extensa. Naqueles com doença mais grave refratária e
(IgE mediada) e III (por imunocomplexos) e causam U/A por meca- persistente, deve-se iniciar investigação com: hemograma completo e do-
nismo IgE-dependente: venenos de abelhas e vespas, aeroalérge- sagem de proteína C-reativa e VHS. A pesquisa de autoanticorpos da tiroide
nos, alguns fármacos (p. ex., penicilina e cefalosporina) e alimentos e a avaliação da função tiroidiana podem ser indicadas, e a pesquisa de
(p. ex., crustáceos, leite de vaca, nozes e amendoim). Alguns exem- IgE específica não tem utilidade na imensa maioria dos casos. A biópsia
plos de fatores que atuam mediante formação de imunocomplexos cutânea deve ser reservada para alguns quadros crônicos, visando à confir-
são fármacos (p. ex., penicilina), radiocontrastes e infecções; mação da suspeita de urticária vasculite ou de outras doenças associadas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 319
QUADRO 42.2 ■ Investigação diagnóstica recomendada nos diferentes subtipos de urticária (manifestando-se com urticas e/ou angioedema)
Urticária Urticária de contato ao frio Teste de provocação com frio (cubo de Hemograma, VHS, proteína C-reativa, crioglobulinas,
induzida gelo, água fria, vento frio) crioaglutininas, excluir outras doenças, principalmente
infecções
Urticária solar Aplicação de raios UV ou luz visível de Excluir outras dermatoses luz-induzidas
diferentes comprimentos de onda
Nas urticárias físicas, deve-se pesquisar e tentar comprovar a participação desencadear sintomas, como também agravar quadros de U/A crônicos
dos estímulos físicos que provocam o surgimento das lesões (Quadro 42.2). espontâneos (nesse caso, a eliminação do agente vai apenas melhorar os
sintomas de alguns pacientes).
TRATAMENTO b | Estímulos físicos: muitos pacientes manifestam sintomas desencadea-
Duas devem ser as abordagens na busca do alívio completo dos sintomas: dos ou agravados por estímulos físicos que devem ser evitados (p. ex., ba-
1º Identificar e eliminar ou evitar os fatores desencadeantes ou nhos quentes): embora o ideal seja evitar o fator físico desencadeante, isso
agravantes nem sempre é simples ou possível. Assim, aos pacientes devem ser forne-
cidas informações detalhadas sobre as propriedades físicas do estímulo
Essa abordagem depende claramente do diagnóstico preciso da causa
implicado em suas manifestações, de forma a capacitá-los a reconhecer e
de U/A. Assim, quando se identifica ou se suspeita de determinado fator
controlar a exposição na vida real, no dia a dia.
desencadeante, deve-se afastá-lo – em geral, isso é mais viável nos qua-
c | Erradicação de agentes infecciosos e tratamento de doenças inflamató-
dros agudos. Por outro lado, identificar a causa de U/A crônicos é bastante
rias: U/A crônicos espontâneos são com frequência associados a doenças
difícil na maioria das vezes. Exemplo clássico dessa dificuldade, diz respei-
infecciosas e a uma variedade de processos inflamatórios que devem ser
to às infecções que podem atuar como causa de U/A, fator agravante ou adequadamente tratados e controlados, apesar de existirem resultados
meras espectadoras não associadas às manifestações clínicas. Importante conflitantes em diferentes estudos que avaliaram esses aspectos.
ter em mente, ainda, que é possível a remissão espontânea da urticária – d | Manipulações dietéticas: se for constatada alergia alimentar IgE me-
assim, se houver desaparecimento dos sintomas após eliminação do agen- diada como desencadeante de U/A crônico espontâneo, o alérgeno im-
te suspeito, a prova definitiva da natureza causal desse agente dependerá plicado deve ser evitado. Nas reações de hipersensibilidade não IgE me-
de uma provocação (reexposição) que resulte positiva. diadas, semelhante ao que ocorre com os fármacos, os pseudoalérgenos
a | Fármacos: quando se suspeita da participação de fármacos na mani- alimentares podem tanto causar quanto agravar esse tipo de U/A. Nesses
festação de U/A, eles devem ser suspensos e, quando necessário, subs- casos, deve ser instituída e mantida por período prolongado (pelo menos
tituídos por compostos de outra classe. Fármacos que causam reações 3 a 6 meses) uma dieta contendo baixos níveis de pseudoalérgenos ali-
de hipersensibilidade não alérgica (p. ex., os AINEs) podem não apenas mentares, naturais e artificiais.
320 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
43 As reações mediadas por IgE são caracterizadas pelo início rápido dos
sintomas (até duas horas após a ingestão), ao passo que as mediadas por
células (linfócitos T) são geralmente tardias (dias ou semanas após a in-
ALERGIA A ALIMENTOS, A gestão), dificultando a correlação entre o alimento suspeito e os sintomas.
CORANTES E A MEDICAMENTOS Alguns quadros clínicos, representados especialmente pela dermatite ató-
pica e pela esofagite eosinofílica, apresentam o envolvimento de ambos
os mecanismos (manifestações imediatas e tardias).
Outro aspecto que difere os mecanismos I e IV, de Gel e Coombs, é o
■■ RENATA RODRIGUES COCCO número de alimentos responsáveis pelas reações. Alergias mediadas por
■■ INÊS CRISTINA CAMELO-NUNES IgE são geralmente únicas ou com dois alimentos envolvidos, ao passo
que as definidas por células são quase sempre múltiplas.
■■ LUIS FELIPE ENSINA Entre as alergias não mediadas por IgE, a síndrome da enterocoli-
te induzida por proteínas alimentares (FPIES) destaca-se pela gravidade
das reações. Na fase aguda, a FPIES em geral caracterizada por vômitos
■■ ALERGIA A ALIMENTOS E A CORANTES profusos, letargia e desidratação grave, que pode culminar em choque
Alergia alimentar (AA) é uma resposta anormal do sistema imunológico hipovolêmico. Na forma crônica, os mesmos sintomas aparecem de forma
frente a proteínas presentes em alguns alimentos. Indivíduos genetica- mais intermitente após algumas semanas da introdução dos alimentos e
mente predispostos reconhecem alguns componentes proteicos como cor- podem repercutir no estado nutricional da criança.
pos estranhos, o que acarreta na produção de uma série de mediadores
inflamatórios responsáveis pelas reações clínicas. DIAGNÓSTICO
A maioria das AA envolvem reações de hipersensibilidade imediata (tipo A detalhada anamnese e um minucioso exame físico são imprescindíveis
I, de Gell & Coombs), dependentes de mastócitos e mediadas pela IgE. Na para se estabelecer corretamente o diagnóstico de AA. Ao exame físico,
presença do alérgeno específico, a desgranulação de mastócitos, com libe- deve-se atentar para outros sinais de atopia (rinite, dermatite) e para o
ração de mediadores químicos, provoca aumento da permeabilidade vas- estado nutricional do paciente como fatores de repercussão da doença
cular, produção de muco, contração da musculatura lisa e recrutamento de sobre o indivíduo.
células inflamatórias ao local da reação. Pode ocorrer, ainda, aumento da
permeabilidade da mucosa, levando à maior absorção de antígenos, com
consequente ativação de mastócitos em sítios distantes da reação inicial. QUADRO 43.1 ■ Manifestações clínicas das alergias alimentares
Vários fatores participam no desenvolvimento da AA, entre os quais
MEDIADAS POR IgE
as características próprias do alérgeno, as características da barreira do
trato gastrintestinal e a predisposição individual. Trato gastrintestinal Prurido labial e de orofaringe, anafilaxia
Alérgenos alimentares são geralmente proteínas específicas capazes gastrintestinal
de estimular o organismo a produzir respostas imunológicas anômalas.
Em tese, qualquer alimento pode ser potencialmente alergênico, mas as Cutâneas Urticária, angioedema
características estruturais das proteínas, sua estabilidade em altas tem-
Trato respiratório Rinoconjuntivite aguda, broncoespasmo
peraturas e processos digestivos e a forma como são processados para o
consumo são alguns dos fatores que permitem que alguns alimentos se- Sistêmico Choque anafilático
jam mais alergênicos do que outros. Um grupo de oito alimentos responde
por cerca de 90% das AA: leite de vaca, ovo, soja, trigo, amendoim, cas- MISTAS
tanhas, peixes e frutos do mar. No entanto, diferentes hábitos alimentares
Trato gastrintestinal Esofagite eosinofílica
regionais permitem que o perfil de sensibilização a alimentos seja variável
de acordo com a população estudada. Cutâneas Dermatite atópica
O avanço da biologia molecular nas últimas décadas permitiu melhor
caracterização das proteínas alimentares, possibilitando melhor conheci- MEDIADAS POR CÉLULAS
mento acerca das principais frações alergênicas e adicionando informa- Trato gastrintestinal Enterocolite e proctocolites induzidas por
ções sobre gravidade de reações, história natural da doença e chance de proteínas; FPIES
reatividade cruzada.
Cutâneas Dermatite herpetiforme; dermatite de contato
QUADRO CLÍNICO
Respiratórias Hemossiderose induzida por alimentos
O espectro clínico da AA é amplo e individualmente variável, compreen- (síndrome de Heiner)
dendo sintomas que incluem os tratos cutâneo, respiratório, gastrintes-
tinal e, por vezes, estendendo-se a reações sistêmicas graves (choque
anafilático) (Quadro 43.1). Vários fatores respondem pelas características Existem alguns testes laboratoriais que podem corroborar (nunca
das reações clínicas, entre eles os relacionados ao hospedeiro e peculiari- substituir) a história clínica. Nos casos de alergias mediadas por IgE, a
dades das proteínas alergênicas. A dificuldade na discriminação entre AA mensuração da IgE específica para o alimento suspeito pode ser realizada
e outras reações adversas a alimentos e aditivos (p. ex., toxicidade, idios- de duas maneiras:
sincrasia, reação farmacológica e reações metabólicas) torna seu diagnós- teste cutâneo de hipersensibilidade imediata (prick teste):
tico superestimado. Os aditivos alimentares, apesar de frequentemente extratos do alimento, disponíveis comercialmente, são deposita-
relacionados com reações alérgicas, respondem por pouco mais de 2% do dos em forma de gotas no antebraço do paciente. A escarificação
total das AA. da epiderme, com a utilização de um puntor, faz os mastócitos
322 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
teciduais entrarem em contato com o antígeno e, nos indivíduos Nos casos mais graves de reações anafiláticas, deve-se orientar o uso
predispostos, há a formação de uma pápula, traduzida pela libera- imediato de epinefrina intramuscular e observação por pelo menos quatro
ção de histamina dessas células. Pápulas maiores do que 3 mm de horas, pela chance de ocorrer reação bifásica. Algumas linhas de pesquisa
diâmetro são consideradas positivas; têm demonstrado eficácia com imunoterapia específica e dessensibiliza-
determinação de IgE sérica específica: direcionada especial- ção oral. Apesar disso, até o momento, não existe disponível qualquer
mente a lactentes com baixa reatividade cutânea, pacientes em outro tratamento para as AA que não seja a restrição absoluta do alérgeno
uso de anti-histamínicos ou com lesões cutâneas extensas. A ava- da dieta.
liação sérica também permite acompanhamento dos valores ab-
solutos que servem como parâmetro de persistência e tolerância ■■ ALERGIA A MEDICAMENTOS
da alergia.
Reações de hipersensibilidade por medicamentos são efeitos adversos de
O conhecimento das diferentes proteínas alergênicas (CRD ou compo-
formulações farmacêuticas que clinicamente se assemelham a uma alergia.
nentes para diagnóstico) e a possibilidade da mensuração das respectivas
As reações de hipersensibilidade correspondem a 15 a 20% de todas as rea-
IgE específicas aumentam a acurácia do diagnóstico e fornecem informa-
ções adversas por medicamentos, afetando mais de 7% da população geral.
ções sobre prognóstico, história natural da doença e chance de reações
Pode-se classificar essas reações como alérgicas apenas quando um
cruzadas.
mecanismo imunológico definido é demonstrado. De forma geral, quando
uma reação alérgica por medicamento é suspeita, o termo hipersensibili-
ATENÇÃO! dade deve ser preferido, uma vez que clinicamente as reações alérgicas
verdadeiras e não alérgicas são muito semelhantes.
A presença de anticorpos não significa reatividade clínica, ou seja, As reações de hipersensibilidade podem ser classificadas em imedia-
teste positivo não implica exclusão do alimento, a menos que haja tas e não imediatas, dependendo de quando se manifestam durante o
história clínica convincente. Os testes laboratoriais devem servir como tratamento. As reações imediatas ocorrem geralmente na primeira hora
um instrumento para estabelecer diagnóstico, mas nunca devem ser após o uso da medicação e são em boa parte das vezes mediadas por IgE.
avaliados isoladamente. Em nosso meio, no entanto, a maior parte das reações imediatas é desen-
cadeada por anti-inflamatórios não esteroides. Nestes casos, o início dos
sintomas pode ocorrer em até 24 horas após o uso do medicamento, uma
Os testes de contato (patch testes) parecem ter boa correlação com vez que o mecanismo não é imunológico, mas sim relacionado ao meca-
reações tardias, mas ainda não foi estabelecida padronização de leitura nismo de ação do fármaco (inibição da cicloxigenase). Outras medicações
que permita seu uso disseminado. frequentemente relacionadas a reações imediatas são os antibióticos em
Até o momento, o único método fidedigno para o diagnóstico de geral, bloqueadores neuromusculares, contrastes radiológicos, quimiote-
alergia alimentar é o teste de provocação oral, que consiste na oferta do rápicos e anestésicos locais (embora estes últimos raramente sejam confir-
alimento suspeito, em doses crescentes e sob supervisão médica, para a mados como causa de hipersensibilidade).
avaliação de possíveis reações. As reações não imediatas ocorrem a partir de uma hora da exposi-
Caso seja descartada a hipótese de alergia, a avaliação de intolerân- ção ao medicamento. Em geral, iniciam após alguns dias de tratamento e
cia ou outras alterações fisiológicas/anatômicas deve ser realizada por na maior parte das vezes estão relacionadas a uma resposta imunológica
meio de exames específicos. do tipo celular (linfócitos T). Geralmente as reações não imediatas estão
relacionadas com o uso de antibióticos betalactâmicos, sulfonamidas, an-
TRATAMENTO ticonvulsivantes e antirretrovirais.
Apesar do risco de reações alérgicas graves, que podem culminar em mor-
te, até o momento não existem outras medidas terapêuticas além da eli- QUADRO CLÍNICO
minação absoluta dos alérgenos responsáveis e do uso de medicamentos O quadro clínico na hipersensibilidade a medicamentos é bastante variá-
sintomáticos para as crises. vel, podendo haver acometimento de diversos órgãos e sistemas, princi-
O tratamento dietético do paciente com AA consiste na exclusão do palmente a pele.
alimento comprovadamente implicado no desencadeamento dos sinto- As manifestações obedecem à fisiopatologia do processo. Assim, as
mas. Nessa fase, é muito importante a avaliação nutricional, capaz de in- reações imediatas se manifestam, em geral, como urticária, angioedema,
dicar possíveis substitutos para que a dieta continue nutritiva e palatável. anafilaxia e asma. As manifestações clínicas das reações não imediatas
Além disso, uma vez que o alérgeno pode estar presente de forma oculta incluem exantemas maculopapulares, eritema pigmentar fixo, síndrome de
em vários alimentos e outras fontes (produtos de higiene pessoal, hidra- Stevens-Johnson (SSJ), necrólise epidérmica tóxica (NET), pustulose exan-
tantes etc.), pacientes e familiares devem ser orientados a ler atentamente temática generalizada aguda, erupção a medicamento com eosinofilia e
os rótulos dos produtos industrializados. sintomas sistêmicos, ou síndrome de hipersensibilidade a medicamentos
Com relação ao tratamento medicamentoso, as manifestações clínicas (DRESS, do inglês drug rash with eosinophilia and systemic symptoms), en-
devem ser abordadas da forma comum. Assim, asma, urticária e rinite de- tre outras. Quadros sistêmicos, de início tardio, podem ocorrer com alguns
vem ser tratadas como de rotina, sem medidas especiais para a AA. medicamentos e são potencialmente graves (p. ex., nefrite intersticial,
Os anti-histamínicos anti-H1 podem ser utilizados para o alívio do pru- pneumonite e meningite asséptica).
rido e para o tratamento dos sintomas gastrintestinais que surgirem após
a ingestão do alimento desencadeante. DIAGNÓSTICO
O tratamento da esofagite eosinofílica consiste na eliminação dos O diagnóstico de RH a medicamentos se baseia no quadro clínico, na rela-
alimentos suspeitos da dieta e no uso de corticosteroides inalatórios de ção entre exposição e aparecimento dos sintomas, no tempo até o início
forma deglutida, não inalada. A fluticasona e a budesonida são as medica- das manifestações e em sua reprodutibilidade. Entretanto, por vezes, é
ções mais relatadas para esse propósito. necessário lançar mão de outros testes para complementação diagnóstica.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 323
Exames
Testes cutâneos ou individualizados
Moderada-grave dosagem de IgE
Leve (um ou mais itens) específica sérica
Sono normal Distúrbio do sono
Endoscopia
Atividades diárias normais Interferência + –
Métodos de imagem
Sem sintomas incômodos nas atividades diárias
Citologia
Com sintomas incômodos Provocação Bacterioscopia
nasal Pesquisa de fungos
+ (quando
FIGURA 44.1 ■ Classificação da rinite alérgica. Culturas
disponível) Função mucociliar
Fonte: Adaptada de Bousquet e colaboradores.1 – Biópsia
POSOLOGIA
Hidroxizina Xarope (2 mg/mL) ou Até 6 anos: até 50 mg/dia Até 150 mg/dia
comprimidos (10 e 25 mg) Maiores de 6 anos: até 100 mg/dia
Prometazina Xarope: 5 mg/5mL 2-5 anos: 5-15 mg/dia em 1-2 doses divididas 20-60 mg/dia
Comprimidos: 25 mg 5-10 anos: 10-25 mg/dia em 1-2 doses divididas
326 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
POSOLOGIA
Levocetirizina Gotas: 2,5 mg/10 gotas 2-6 anos: 1,25 (5 gotas) 2 x/dia 5 mg/dia
Comprimidos: 5 mg Acima de 6 anos: 5 mg/dia
Loratadina Solução oral: 1 mg/mL a 5 mg/mL Maiores de 2 anos, menores de 30 kg: 5 mg/dia 10 mg/dia
Comprimidos: 10 mg Maiores de 30 kg: 10 mg/dia
Essas associações, por diminuírem a obstrução nasal, facilitam o sono comendadas, é mínima, com evidências de supressão do eixo hipotálamo-
e evitam o abandono do tratamento. Uma vez atingido o controle sinto- -hipófise-suprarrenal em raríssimos casos, porém não há consenso sobre
mático, recomenda-se reduzir a dosagem do CE tópico nasal e retorno aos sua ação sobre o crescimento, principalmente quando empregado conco-
estágios iniciais do tratamento. mitantemente com os CE inalados para asma. Uma vez atingido o controle
As evidências indicam que os CE intranasais são mais eficazes no con- sintomático, recomenda-se reduzir a dosagem do CE tópico nasal e retor-
trole dos sintomas de RA do que os anti-H1 (orais e intranasais). Em casos nar aos estágios iniciais do tratamento.
graves e urgentes ou, ainda, na presença de sinusite crônica ou de exacer- Recentemente, foi disponibilizada no Brasil a associação de cloridra-
bações intensas da RA, podem ser usados ciclos curtos de CE sistêmicos to de azelastina (137 µg/jato) e propionato de fluticasona (50 µg/jato)
orais sempre com precaução e desde que não haja contraindicações ab- (Dymista®), uso tópico nasal, para pacientes com rinite alérgica moderada-
solutas. Assim, quando necessário, os CE mais indicados são os de meia- -grave e maiores de 12 anos. Os resultados têm sido muito animadores, so-
-vida intermediária, como: prednisona, prednisolona, metilprednisolona bretudo para os pacientes com baixa resposta aos tratamentos habituais.
e deflazacorte. Sempre dar preferência ao esquema em dose única, pela A Figura 44.3 reúne propostas terapêuticas para os pacientes com RA
manhã, no máximo 5 a 7 dias. com base na intensidade clínica.
Embora os CE tópicos nasais sejam eficazes e seguros, podem ocorrer, Os descongestionantes são agentes alfa-adrenérgicos e, portanto, re-
após o uso prolongado, efeitos colaterais locais (irritação local, sangra- duzem a obstrução nasal, porém não têm qualquer atuação sobre a coriza,
mento nasal, espirros, ressecamento, ardência, formação de crostas e, os espirros e o prurido. Podem ser administrados topicamente, em gotas ou
muito raramente, perfuração septal). A absorção sistêmica, nas doses re- spray nasal (p. ex.: epinefrina, nafazolina e oximetazolina) ou via oral (efe-
Se conjuntivite,
adicionar
Anti-H1 oral ou
Anti-H1 ocular ou
Cromona ocular
drina, pseudoefedrina). Esses medicamentos não devem ser empregados aos anti-H1 isoladamente. Existem muitos medicamentos combinando
de forma isolada no tratamento da RA e são mais recomendados para uso anti-histamínicos clássicos com descongestionantes, o que não é reco-
curto e sintomático nas exacerbações. Apresentam diversos efeitos adver- mendado, tendo em vista os efeitos colaterais de ambos os componentes,
sos, como taquicardia, arritmias, tremor, irritabilidade e insônia. Os de uso em especial a sedação.
tópico podem causar ainda ressecamento da mucosa nasal, sangramen- As cromonas são fármacos anti-inflamatórios com eficácia relativa em
tos, úlceras e perfuração septal, e não devem ser ministrados por tempo quadros leves de RA. São seguros, porém apresentam como grande des-
superior a cinco dias, pois obstrução por efeito rebote pode ocorrer após vantagem a necessidade de várias aplicações ao dia para se manter o efei-
o uso prolongado e ser seguida por rinite medicamentosa. Em lactentes e to desejado, o que implica, quase sempre, baixa aderência ao tratamento.
crianças pequenas, os derivados imidazólicos (nafazolina, oximetazolina) Disponível no Brasil existe a solução nasal de cromoglicato dissódico a 2
podem ser absorvidos e ocasionar depressão do sistema nervoso central ou 4%, que pode ser utilizada desde a lactância, nas doses de 2 gotas/
(SNC), coma e hipotermia e, portanto, não devem ser empregados. Em narina ou 1 a 2 jatos/narina a cada 4 ou 6 horas.
crianças maiores, é possível utilizá-los apenas para facilitar o sono durante
as exacerbações da RA e para permitir a introdução dos CE intranasais. Pa-
cientes com glaucoma e hipertiroidismo e idosos com hipertrofia prostática ATENÇÃO!
são considerados de risco para o uso de descongestionantes sistêmicos. Os antagonistas de receptores de leucotrienos cisteínicos competem
No Brasil, os descongestionantes sistêmicos só estão disponíveis em com os leucotrienos, importantes mediadores inflamatórios da respos-
associação aos anti-H1 (Tabela 44.4). O principal objetivo dessa combina- ta alérgica, pelos receptores, justificando a sua ação.
ção é reduzir a obstrução nasal que não respondeu de forma satisfatória
POSOLOGIA
Clássicos ou sedantes
Bromofeniramina + Xarope 5 mL c/ 2 mg bromofeniramina + 5 mg fenilefrina > 2 anos: 2,5-5 mL 4 x/dia 15-30 mL 4 x/dia
fenilefrina
Gotas 1 mL c/ 2 mg bromoferiramina + 2,5 mg fenilefrina > 2 anos: 2 gotas por kg
divididas em 3 x/dia
Triprolidina + Xarope: cada 5 mL 1,25 mg triprolidina + 30 mg pseudoefedrina 2-5 anos: 2,5 mL 4 x/dia 10 mL 4 x/dia
pseudoefedrina 6-12 anos: 5 mL 4 x/dia
A complicação mais frequente da sinusite bacteriana aguda é a ce- Pacientes com comprometimento do estado geral, sépticos ou com
lulite periorbitária, em que se observa edema palpebral, eritema e febre, falha do tratamento com antibióticos por via oral devem ser internados
sem sinais oculares. e medicados com antibiótico por via parenteral, devendo ser submetidos
Na celulite pós-septal, pode-se observar edema conjuntival, proptose a investigações diagnosticas de complicações e avaliação por otorrinola-
e movimentação ocular reduzida e dolorosa. ringologista.
Abscesso subperiostal ou orbitário é pouco comum e acomete princi- A utilização de anti-histamínicos sistêmicos, descongestionantes e
palmente indivíduos imunodeprimidos. mucolíticos não são eficazes e não devem ser prescritos. Os corticoides por
via oral, por curtos períodos, como adjuvante dos antibióticos por via oral
ETIOLOGIA são úteis para o alívio dos sintomas.
A maioria das infecções sinusais é de etiologia viral. Dentre as bactérias, Corticoides intranasais são benéficos nos pacientes portadores de
as mais frequentemente envolvidas são S. pneumoniae, H. influenzae, M. rinite alérgica. Os seios maxilares e etmoidais são os mais comumente
catharralis, S. pyogenes. Os micro-organismos anaeróbios são pouco vistos. envolvidos quando a drenagem das secreções está diminuída, em razão
de IVAS.
DIAGNÓSTICO
A persistência de sintomas como rinorreia purulenta, tosse persistente e
ATENÇÃO!
cefaleia, por 10 a 14 dias, na evolução de um quadro de infecção aguda
de vias aéreas superiores, é o critério mais utilizado no diagnóstico de É importante ressaltar que os seios etmoidais são os únicos desenvol-
sinusite aguda. vidos ao nascimento. Os seios maxilares se tornam visíveis à radiogra-
A radiografia dos seios da face é um exame pouco especifico no diag- fia no 6omês, e o seio frontal não é visível até 3 a 9 anos.
nóstico em crianças, devendo ser solicitado quando houver suspeita de
complicações. A tomografia deve ser solicitada com urgência, em caso de
proptose, alteração dos movimentos oculares, alteração do sensório, vô- QUADRO CLÍNICO
mitos repetidos, cefaleia intensa e convulsões. A evolução dos sintomas na sinusite aguda pode ser insidiosa ou ter início
súbito. Nos casos com evolução insidiosa, é referida persistência de rinor-
TRATAMENTO reia anterior ou posterior, acompanhada de tosse intratável, diuturna, por
mais de 10 dias, resultante da evolução de um quadro de rinofaringite. A
febre é, geralmente, de baixa intensidade, e a dor com edema periorbital
ATENÇÃO!
ao acordar é, com frequência, sintoma presente. Crianças maiores podem
O tratamento com antibióticos é controverso, pois cerca de 60 a 80% se queixar de dor de cabeça e nos seios da face envolvidos. Pode também
sinusites aguda apresentam cura espontânea. evoluir de forma súbita, com febre alta, e com a dor ou a inflamação pe-
riorbital mais intensa.
Etmoidite causa dor retro-orbital; sinusite maxilar, dor na região do
Em crianças, o tratamento de escolha é a amoxicilina ou a amoxicili- arco zigomático ou na região acima dos molares; e na sinusite frontal, a
na associada ao clavulanato, principalmente nas menores de 2 anos com dor é referida na região das sobrancelhas.
quadro de sinusite complicada. Alternativamente, podem ser utilizadas Os patógenos que causam sinusite são o pneumococo, o hemófilo não
cefalosporinas de segunda ou terceira geração. (Os macrolídeos e o levo- tipável, a Moraxella e o estreptococo betahemolítico.
floxacino são opções terapêuticas no casos de alergia à penicilina.) As sinusites etmoidais podem evoluir com complicações graves, como
Antibióticos empregados: as celulites pré-septal, pós-septal, abscesso subperiostal ou orbital e
Amoxicilina-ácido clavulânico: 80-90 mg/kg/dia, de 8/8 h, por 10 trombose do seio cavernoso. Essas complicações são associadas com a
dias. diminuição do movimento ocular, a proptose e a alteração da acuidade
Cefuroxima: 30 mg/kg/dia, de 12/12 h, por 10 dias. visual. Meningite e abscesso subdural, epidural ou cerebral são também
Claritromicina: 15 mg/kg/dia, de 12/12 h, por 7 dias. complicações possíveis.
Azitromicina: 10 mg/kg/dia, a cada 24 h, durante 3 dias, ou 10 mg/
kg/dia no primeiro dia e 5 mg/kg/dia por mais 4 dias. TRATAMENTO
Levofloxacino: 10-20 mg/kg/ dia, a cada 12 ou 24 h, durante 10 dias.
Pacientes com sinais de envolvimento do sistema nervoso ou de doença
Ceftriaxona intramuscular: 50 mg/kg/dia, a cada 24 h, durante 1
invasiva devem ser hospitalizados. Casos menos graves devem receber
a 3 dias, seguida de qualquer dos antibióticos citados por mais
amoxicilina na dose de 50 mg/kg/dia, dividida em duas doses, a cada 12
7 dias.
horas, por 10 dias. Falha terapêutica após 48 horas de tratamento suge-
Os antibióticos devem ser prescritos por 7 a 14 dias, ou por até 7 dias
re resistência bacteriana ou complicação, sendo recomendada a troca do
após a melhora clínica. Em crianças, pode-se estender o tratamento por
antibiótico conforme recomendação nos casos de otite média não respon-
até 3 semanas.
siva ao tratamento.
Analgésico, anti-inflamatórios, descongestionantes tópicos e sedativos
ATENÇÃO! da tosse podem ser prescritos, até que se inicie a drenagem das secreções.
QUADRO CLÍNICO vista respiratório e receberem oxigênio e inalação com epinefrina. Dexa-
Nas amigdalites purulentas, o quadro clínico típico tem início com dor de metasona, na dose única de 0,6 mg/kg, por via IM, ou 0,15 mg/kg, por VO,
°
garganta intensa, febre alta (39/40 C), de início súbito, frequentemente e a budesonida inalatória têm demonstrado eficácia em melhorar os sinto-
acompanhado de cefaleia e vômito. Ao exame, as tonsilas encontram- mas e diminuir a necessidade de internação. A epiglotite é uma emergên-
-se hiperemiadas e hipertrofiadas, com presença de secreção purulenta cia respiratória, sendo necessário o tratamento em ambiente hospitalar.
e petéquias no palato mole. Os gânglios na região do ângulo mandibular
podem estar aumentados e dolorosos.
Faringite com exsudato e adenite cervical são pouco frequentes nas REVISÃO
crianças menores de 3 anos, nas quais se observa um quadro clínico mais A etiologia das rinofaringites (infecções em geral benignas e auto-
insidioso, com febre baixa, coriza concomitante e palidez. Nessa faixa etá- limitadas) é predominantemente viral e, portanto, seu tratamento
ria, a etiologia viral é predominante. é sintomático.
As principais complicações das rinofaringites são a otite média agu-
■■ TRATAMENTO da e as sinusites.
O tratamento tem como objetivos a erradicação da infecção e a prevenção Os principais agentes das otites média são o pneumococo, o hemó-
da febre reumática. filo e a Moraxella.
A penicilina benzatina na dose de 600.000 UI, para crianças de até 30 O fármaco de escolha para iniciar o tratamento das otites é a amo-
kg, e de 1.200.000 UI, para maiores de 30 kg, em dose única e por via IM xicilina.
pode ser uma opção terapêutica. Amoxicilina na dose de 50 mg/kg/dia, di- Nas otites com efusão, o tratamento deve ser ampliado para 10 a
vidida em duas tomadas, por 7 a 10 dias, é uma boa opção de tratamento. 14 dias.
As cefalosporinas podem, também, ser utilizadas, entretanto apresentam Os principais patógenos das sinusites são o pneumococo, o hemófi-
custo mais elevado do que as penicilinas. lo não tipável, a Moraxella e o estreptococo betahemolítico.
Pacientes alérgicos à penicilina podem ser medicados com succinato As sinusites etmoidais podem evoluir com complicações graves, en-
de eritromicina, na dose de 40 a 50 mg/kg/dia, em quatro tomadas, a cada volvendo o SNC, sendo necessária hospitalização.
seis horas, por 10 dias; ou claritromicina, na dose de 15 mg/kg/dia, por 10 Casos de sinusite menos graves devem receber amoxicilina.
dias; ou, ainda, azitromicina, na dose de 12 mg/kg/dia, uma vez ao dia, O estreptococo betahemolítico do grupo A é o principal agente das
por cinco dias. amigdalites.
O sulfametoxazol/trimetropim não é eficaz para o tratamento das in- A amoxicilina e penicilina benzatina, em dose única e por via IM,
fecções por estreptococos. são boas opções terapêuticas nas amigdalites.
O vírus parainfluenza é o agente mais frequentemente envolvido
nos casos de laringite.
■■ LARINGITE E LARINGOTRAQUEOBRONQUITE Na epiglotite, os agentes etiológicos responsáveis são o hemófilo, o
(CRUPE) Streptococcus pyogenes e o pneumococo.
A inflamação da laringe se apresenta com os quadros de crupe viral (larin- O tratamento do crupe viral sem estridor em repouso consiste em
gotraqueobronquite) e epiglotite. hidratação oral e mínimo manuseio.
Os pacientes com estridor em repouso devem ser encaminhados ao
QUADRO CLÍNICO hospital.
O quadro clínico da laringotraqueobronquite apresenta sintomas iniciais
de IVAS, especialmente em crianças pequenas, que evoluem com a carac-
terística de “tosse de cachorro”, rouquidão e estridor laríngeo. O estridor, ■■ LEITURAS SUGERIDAS
nos casos leves, só é percebido quando a criança se agita, porém pode Bakshi SS. Occurrence of otitis media in children and assessment of treatment
ser audível mesmo em repouso, acompanhado de falta de ar, retrações e options. J Laryngol Otol. 2015;129(12):1253.
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Na epiglotite, os pacientes apresentam um quadro súbito de febre, Curr Opin Pediatr. 2014;26(1):114-8.
dispneia, disfagia, salivação abundante, voz abafada, retração inspira- El-Anwar MV, Hassan MR. The efficacy of nasal steriods in treatmenr of otitis
tória, cianose e estridor suave; esse quadro é grave e pode evoluir para media with effusion: a comparative study. Int Arch Otorhinolaryngol. 2015;
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O tratamento do crupe viral depende da gravidade do quadro. Os casos le- patient. JAAPA. 2012;25(12):43-7.
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ção oral e mínimo manuseio. Os pacientes com estridor em repouso devem setting: a performance improvement Project. Appl Clin Inform. 2016;7(2):
ser encaminhados ao hospital, a fim de serem monitorados do ponto de 299-307.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 333
46 ATENÇÃO!
Na prática pediátrica, antes dos três anos de idade, sibilância com ca-
SIBILÂNCIA ráter de recorrência em geral é causada por doenças sibilantes recidi-
vantes de etiologia viral (sibilância episódica viral) e asma.
radiológicas persistentes com traves fibróticas, císticas e evidên- sibilância –, o tratamento deve ser orientado com intervenções pertinen-
cias de aprisionamento de ar. tes para doenças em questão. Um plano geral de cuidados e ações deve
Cardiopatias congênitas com hiperfluxo pulmonar: malforma- ser adotado, como medidas preventivas, aliado às indicações terapêuticas
ções cardíacas com padrão de shunt esquerda-direita, provocando medicamentosas e não medicamentosas, tais como as a seguir abordadas.
aumento de volemia na circulação pulmonar: comunicação intera-
trial, comunicação interventricular e persistência do canal arterial. INTERVENÇÕES DENTRO DO AMBIENTE DOMICILIAR
Investigação: radiografia torácica revela acentuação das imagens As intervenções dentro do ambiente domiciliar objetivam a redução de
vasculares. Complementação diagnóstica com a realização do ele- exposição a substâncias e produtos nocivos ao aparelho respiratório (ta-
trocardiografia e ecocardiografia. bagismo domiciliar, retirada de objetos propícios ao acúmulo de pó, evitar
Compressão brônquica extrínseca: provocada por adenopatias produtos de limpeza com odores acentuados, perfumes e talcos, elimi-
hilares, tumores, cisto broncogênico, anéis vasculares ou enfisema nação da umidade, desestimular a convivência com animais domésticos).
lobar congênito.
Malformações brônquicas: a broncomalácia pertence a esse gru- MEDIDAS GERAIS
po de anomalias. Entre as medidas gerais, a alimentação com técnica adequada, não se ad-
Síndrome de Loeffler: sibilância e infiltrados pulmonares recor- mitindo a posição deitada para mamar, é muito importante. Na impossibi-
rentes, eosinofilia maciça, incomuns em lactentes. lidade de aleitamento natural, devem ser utilizados bicos apropriados para
mamadeiras ou o uso de copos após o devido treinamento.
PROCESSOS AGUDOS OU AUTOLIMITADOS
Bronquiolite viral aguda: costuma se apresentar como primei- EMPREGO DE MEDICAMENTOS
ra crise de sibilância no lactente, sendo o agente infeccioso mais O Quadro 46.2 reúne informações sobre medicamentos utilizados nessas
frequente o vírus sincicial respiratório, com comportamento clínico situações. A seguir, são abordadas a intervenção nas exacerbações e o
progressivo, geralmente episódio único, fase inicial com caracte- tratamento de manutenção.
rísticas de resfriado comum, evolui com comprometimento pos-
terior dos bronquíolos, expressando-se com hipóxia, desconforto Intervenção nas exacerbações
respiratório com gravidade variável. Pode permanecer processo de (crises de broncoconstrição — sibilância)
hiper-reatividade brônquica com duração diversificada, semanas Broncodilatadores (beta-2-agonistas de curta duração: salbu-
ou meses, deixando o paciente mais propenso a apresentar proces- tamol ou fenoterol) e substância anticolinérgica (brometo de ipra-
sos recorrentes de sibilância. trópio) Via de administração por aparelhos nebulizadores (a jato
Traqueobronquite ou laringotraqueobronquite aguda: provo- – uso hospitalar, ultrassônicos ou compressores – domiciliares)
cada por infecção viral, com predomínio do parainfluenza. Proces- ou nebulímetros pressurizados (sprays). beta-2-agonistas de curta
so de curso agudo, sendo mais comum o acometimento dos pré-es- duração devem ser administrados isoladamente ou em associação
colares. Observam-se, além dos pródromos infecciosos, estridor, com brometo de ipratrópio, cujo efeito terapêutico aditivo é con-
roncos, estertores e sibilos. troverso. Os anti-inflamatórios hormonais, corticosteroides orais
Pneumonia por Chlamydia trachomatis: o lactente infectado (prednisolona, prednisona, dexametasona e betametasona) e ina-
apresenta sintomas até três meses de idade. Tosse em estacato, latórios (beclometasona, fluticasona e budesonida (administrados
processo de conjuntivite com frequência, desconforto respirató- por nebulizadores ou spray) – também estão indicados, duração de
rio com graduações diversificadas. A radiografia torácica mostra 5 a 7 dias, com controvérsias na ação do corticosteroide inalatório
imagens de pneumonia intersticial; no hemograma, pode-se ob- para tratamento da crise (broncoconstrição).
servar eosinofilia. Investigação: pesquisa do agente nas secreções
Tratamento de manutenção
e métodos sorológicos (imunofluorescência indireta [IFI], fixação
de complemento e radioimunoensaio). Corticosteroides inalatórios: fluticasona, budesonida e beclo-
Pneumonia por Mycoplasma pneumoniae: patógeno responsá- metasona – empregados isoladamente ou em associação com os
vel por acometimento da via aérea, tanto superior como inferior, ou beta-2-agonistas de longa duração, restrição de uso para crianças
em outros órgãos ou sistemas, sendo que as manifestações clínicas com idade inferior a 4 anos: salmeterol ou formoterol, estão indi-
mais graves ocorrem nos grupos etários compreendidos pelos es- cados como medicamentos de manutenção para pacientes porta-
colares, adolescentes e adultos jovens. Os sintomas caracterizam- dores de asma, levando-se em conta a gravidade da doença. A via
-se por tosse seca na fase inicial, progredindo para levemente pro- de administração inalatória deve ser priorizada, em substituição
dutiva, podendo ter caráter paroxístico. Simultaneamente, podem ao uso oral, com a vantagem de promover redução das doses da
ser observados febre, cefaleia, odinofagia, otalgia, com menos substância ativa e atenuação dos efeitos colaterais.
frequência mialgia, artralgia e rash cutâneo. Ausculta pulmonar Montelucaste: antagonista dos receptores de leucotrienos, indica-
com roncos, estertores e sibilos em alguns casos. Padrão radio- do como medicamento de manutenção para crianças com quadros
lógico: infiltrado intersticial, broncopneumônico ou de consolida- leves de asma ou terapêutica adicional à corticoterapia inalatória.
ção. Algumas vezes, pode-se observar derrame pleural. Métodos
FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA
sorológicos: enzimaimunoensaio (Elisa), fixação de complemento
e crioaglutinação. No que diz respeito à fisioterapia respiratória, é importante incentivar a
adoção desse recurso, principalmente para pacientes portadores de dis-
túrbios que cursam com acúmulo acentuado de secreções intrabrônquicas:
■■ TRATAMENTO fibrose cística, pacientes prematuros ou encefalopatas. Manobras de per-
Tendo por princípio fundamental considerar que esse tema agrega inúme- cussão, técnicas vibratórias e medidas de drenagem postural podem ser
ros distúrbios, cuja evidência comum é a sua principal expressão clínica, a empregadas para facilitar a depuração mucociliar.
336 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
beta-2-agonistas de curta duração (SABA) Salbutamol Quadros de exacerbação – crise asmática Inalatória:
Fenoterol Nebulização
Nebulímetro com ou sem espaçador
ASMA PARCIALMENTE
(1 EM QUALQUER NÃO
PARÂMETRO CONTROLADO SEMANA) CONTROLADO
Entre as doenças crônicas pulmonares, a asma é a mais comum, atingindo Medicação Ausentes ≥ 2 x/semana
pacientes de todas as idades. É de difícil definição, mas pode ser con- de resgate
siderada situação de hiper-responsividade e processo inflamatório crôni-
Limitação de Ausentes Presente em qualquer
co da árvore brônquica, levando à obstrução das vias aéreas, reversível
atividades momento
espontaneamente ou após tratamento. Em conjunto, há o processo de
remodelamento das vias aéreas com diferentes alterações, como o espes- PFE ou VEF1 Normal ou < 80% previsto ou
samento da membrana basal, a hipertrofia da musculatura lisa e a fibrose próximo pessoal
subepitelial.
*Avaliação das últimas quatro semanas.
o
PFE: pico de fluxo expiratório; VEF1: volume expiratório forçado no 1 segundo.
■■ QUADRO CLÍNICO
As manifestações clínicas da exacerbação aguda da asma caracterizam-se Dos exames subsidiários, a radiografia torácica pode ser útil na sus-
por tosse, sibilância e dispneia. Nas exacerbações mais graves, podem ser peita de pneumonia e atelectasia. Na exacerbação aguda da asma não
encontradas dificuldade de fala, agitação e dor torácica. complicada, a radiografia mostra sinais de hiperinsuflação e não deve
A crise de asma pode ser desencadeada por diferentes estímulos, ser solicitada de rotina, sendo reservada para os quadros graves e não
como por contato com alérgenos, infecções virais, exercício, emoções, responsivos ao tratamento-padrão. Pequenas áreas de atelectasia por ro-
irritantes (poluição atmosférica), medicamentos (inibidores da prostaglan- lhas de muco são comuns e, às vezes, podem ser confundidas com áreas
dina sintetase e betabloqueadores) e estímulos colinérgicos (mudanças de condensação pneumônica. Em pacientes cooperativos e que realizam
bruscas de temperatura). espirometria de modo adequado, a avaliação de parâmetros de função
A asma induzida por alérgenos é modulada pela liberação de ami- pulmonar, antes e após a inalação de um agente broncodilatador, é muito
nas vasoativas, após união antígeno-anticorpo (IgE), na superfície de importante, não só para o diagnóstico, como também para o acompanha-
mastócitos e basófilos. Esses mediadores, histamina, leucotrienos, fator mento do tratamento.
quimiotático para eosinófilos e fator quimiotático para neutrófilos, cau- Como o quadro clínico obstrutivo da asma pode ser comum a outras
sam broncoespasmo imediato ou tardio e alterações inflamatórias da doenças, é necessário um cuidadoso diagnóstico diferencial, particular-
mucosa brônquica. A quantidade dos mediadores farmacologicamente mente em crianças.
ativos liberados depende da concentração de adenosina monofosfato
cíclico (AMPc) intracelular, e o processo necessário à liberação depende
■■ MEDICAMENTOS UTILIZADOS NO
da entrada de Ca++ no interior da célula.
TRATAMENTO DA ASMA
Os medicamentos para asma são divididos em duas categorias: de alívio,
■■ DIAGNÓSTICO usados para melhora dos sintomas agudos e exacerbações; e de controle,
A anamnese do paciente asmático é fundamental para estabelecer as pro- utilizados para obter e manter o controle da doença.
váveis causas desencadeantes. O conhecimento da frequência, da duração Medicamentos de alívio: agentes beta-adrenérgicos, corticoste-
e da intensidade das exarcebações, bem como dos sintomas no período roides, metilxantinas, anticolinérgicos e sulfato de magnésio.
intercrise, permite a avaliação da gravidade e do controle da asma, funda- Medicamentos de controle: corticosteroides inalados, associação
mentais para orientar o esquema terapêutico (Quadro 47.1). Os alérgenos de corticosteroides inalados com broncodilatadores de longa du-
inalantes identificados pela história, frequentemente pó domiciliar, fungos ração, antagonistas de leucotrienos, teofilina de liberação lenta e
do ar e pelos de animais, são confirmados por testes alérgicos cutâneos. A anti-IgE.
identificação dos componentes alérgenos, assim como a obtenção de seus
extratos padronizados têm possibilitado testes cutâneos mais fidedignos ADRENÉRGICOS
e melhor imunoterapia. Funcionam como alfa e beta-agonistas. Para o tratamento da asma, a
melhor opção é a dos beta-2-agonistas (relaxamento da musculatura lisa
do brônquio, tremor do músculo esquelético e indução de glicogenólise
ATENÇÃO! e glicólise); a ação dos beta-1-agonistas leva à contração do músculo
Em adultos, é importante considerar agentes ocupacionais e indus- cardíaco e à taquicardia. O estímulo dos receptores alfa-adrenérgicos
triais como agravantes ou desencadeantes da asma. leva à vasoconstrição, ao relaxamento do músculo liso do intestino e à
contração do esfíncter e dilatação pupilar. Devido à ação farmacológica
338 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Terbutalina Não disponível no Brasil Turbuhaler Sol. nebulização a 1% 1 comp. = 2,5 mg Solução a 0,1%
0,5 mg/dose 1 gota/3 kg – máx. 20 gotas 5 mL = 1,5 mg 0,01 mL/kg
1 dose 4 x/d 6-8 h 0,075 mg/kg/dose (máx. 0,25 mL)
(máx. 2,5 mg) a cada 15 minutos até 3 vezes
6-8 h
Salmeterol 1 jato = 25 mg
2 jatos – 12/12 h
Formoterol 1 cápsula de 12 mg
a cada 12 horas
Turbuhaler 6 mg e
12 mg/dose
1 dose 2 x/d
ATENÇÃO! ANTICOLINÉRGICOS
O brometo de ipratrópio, um dos representantes dessa classe, é usado por
O uso isolado dos broncodilatadores de longa ação não é recomen- via inalatória sob a forma de spray ou solução para nebulização, tem ação
dado. local com mínima absorção e a broncodilatação máxima é observada após
duas horas. A dose recomendada é de 20 a 40 µg, três vezes ao dia; os efei-
tos colaterais são praticamente ausentes, e a queixa mais comum é do gosto
TABELA 47.3 ■ Corticosteroides utilizados na asma amargo. O brometo de ipratrópio pode ter efeito broncodilatador aditivo ao
dos beta-2-agonistas e das metilxantinas em pacientes com quadros graves
FÁRMACO DOSE de exacerbação aguda. Os pacientes com asma apresentam variação na res-
posta ao brometo de ipratrópio, e não é possível prever qual paciente res-
Dipropionato de beclometasona ponderá melhor ao fármaco. Metanálise confirmou que o uso do brometo de
Aerossol 50 µg/jato 1-2 jatos cada 6, 8 ou 12 h ipratrópio é recomendado apenas em exacerbações graves de asma. O tio-
Aerossol 250 µg/jato (adultos 2-4 jatos) trópio representa um avanço na terapia anticolinérgica, pois é de uso uma
Cápsulas para inalações 200 ou 400 µg 1 jato 4 a 6 x/d vez ao dia. Disponível sob a forma de cápsulas para inalar (18 µg), tem sido
(adolescentes/adultos)
muito usado em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC).
Propionato de fluticasona
Aerossol 50 µg/jato 1 a 2 jatos 2x/d
ANTAGONISTAS DE RECEPTORES DE LEUCOTRIENOS
Aerossol 250 µg/jato 1 a 2 jatos 2 x/d Medicamentos com ação anti-inflamatória e broncodilatadora leve. Podem
Diskus 50, 250, 500 µg (adolescentes/adultos) ser indicados como medicação controladora de 1a linha, como alternativa
1 inalação 2 x/d aos corticosteroides inalados ou medicação adicional em casos mais graves.
Previnem a asma induzida por intolerância ao ácido acetilsalicílico (AAS) e
Associação salmeterol/fluticasona atenuam o broncoespasmo induzido por ar frio e exercício (fases imediata
Aerossol 25/50, 25/125 e 25/250 µg 2 jatos 2 x/d e tardia). No Brasil, o montelucaste é o único disponível para administração
Diskus 50/100, 50/250 e 50/500 µg 1 inalação 2 x/d oral. O anticorpo monoconal recombinante humanizado anti-IgE (omalizu-
mabe) é indicado para pacientes acima de 6 anos que apresentem asma
Budesonida
alérgica de difícil controle. É administrado por via SC a cada 15 ou 30 dias,
Cápsulas para inalação – 100/200/400 µg
Flaconetes para nebulização 0,25 mg e
dependendo dos níveis séricos de IgE (devem ser inferiores a 1.500 UI/mL).
0,50 mg
■■ TRATAMENTO
Associação formoterol/budesonida
Turbohaler – 6/200 e 12/400 1 inalação 2 x/d EXACERBAÇÃO AGUDA
Cápsulas para inalação 6/200 e 1 inalação 2 x/d Pode ser iniciado no domicílio com a administração de agente beta-2-
12/400 µg 2 jatos 2 x/d
-agonista (Tabela 47.1), sob a forma de aerossol (spray) ou nebulização.
Aerossol – 6/100 e 6/200 µg
Duas aplicações, com intervalo de 1 a 2 minutos entre si, garantem alívio
Ciclesonida em curto tempo, na maioria dos pacientes. Podem ser repetidas mais duas
Aerossol 80 ou 160 µg 1 a 2 jatos 2 x/d vezes, com intervalo de 30 minutos (máximo de 12 jatos).
O tratamento domiciliar com corticosteroides orais (prednisona, pred-
Mometasona nisolona [0,5 a 1 mg/kg] ou deflazacorte [0,75 a 1,5 mg/kg], uma a duas
Cápsulas para inalação – 200/400 µg 1 a 2 cápsulas 1 x/d vezes ao dia) deve ser iniciado se: a crise for intensa; não houver resposta
aos broncodilatadores; o paciente usou corticosteroide recentemente; ou
Associação formoterol/mometasona já foi hospitalizado por estado de mal asmático.
Aerrosol 5/100 e 5/200 µg 2 jatos 2 x/d Não havendo melhora, o paciente deverá ser atendido em serviço mé-
dico de urgência (Figura 47.1).
Prednisona
Comprimidos *1-2 mg/kg/d, 1 dose
MANUTENÇÃO
matinal ou
**2-4 mg/kg a cada 2 d De acordo com o Global Iniciative for Asthma (GINA),1 o tratamento farma-
cológico é feito escalonadamente, segundo o nível de controle da doença.
Prednisolona
Solução oral 1 mL = 1 mg *1 a 2 mg/kg/d, 1 dose CLASSIFICAÇÃO DO CONTROLE DA ASMA
1 mL = 3 mg matinal ou A classificação do controle da asma é apresentada no Quadro 47.1.
Comprimidos 2 a 4 mg/kg a cada 2 d
PRINCÍPIOS DE TRATAMENTO
Deflazacorte
Comprimidos Gotas – 1 gota = 1 mg O tratamento de controle da asma deve ser direcionado segundo a sua
Gotas (1 gota = 1 mg) * 1 mg/kg/d, 1 dose intensidade. No Quadro 47.2, os planos de tratamento da asma para pa-
matinal cientes maiores de 5 anos são apresentados. Para os pacientes sem trata-
mento, recomenda-se início pela etapa 3 ou, eventualmente, pela etapa
*Essas doses devem ser gradualmente diminuídas até o mínimo necessário para 2. Havendo controle após período de 1 a 3 meses de seguimento, o nível
controle dos sintomas. de tratamento deverá ser reduzido para a etapa inferior. Caso não haja
**Dose máxima = 60 mg/dia.
controle, deve-se ascender às etapas superiores (4, e se necessário 5).
340 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Avaliação inicial:
História, exame físico, PFE e SaO2
Tratamento inicial:
Oxigênio para manter SaO2 ≥ 90% (95% nas crianças)
beta-2-agonista: 2-4 jatos a cada 20 minutos
Corticosteroide sistêmico se ausência de resposta imediata, paciente de risco ou crise grave
Crise moderada: PFE: 60%-80%, sintomas moderados, Crise grave: PFE: < 60%, sintomas intensos, história de asma
uso de musculatura acessória quase fatal, ausência de resposta ao tratamento
Tratamento: Oxigênio; beta-2-agonista + Tratamento: Oxigênio; beta-2-agonista + anticolinérgico a cada hora;
anticolinérgico a cada hora; corticosteroide oral corticosteroide sistêmico; sulfato de magnésio IV
Opção preferencial β2 curta se necessário CI baixa dose CI baixa dose + LABA CI dose alta ou moderada + LABA CI dose alta + LABA
Princípios que devem ser observados no Igualmente, faltam dados definitivos demonstrando que o tratamento
tratamento da asma anti-inflamatório protege contra lesões irreversíveis das vias aéreas. Como
resultado, o tratamento atual é dirigido para controlar os sintomas e pre-
1 | A evidência é forte argumento na recomendação de que a terapia deva venir as exacerbações.
focalizar, de forma especial, a redução da inflamação, evitando o contato 2 | Nas formas persistentes, deve-se administrar o tratamento no nível
com alérgenos e enfatizando o uso precoce de agentes anti-inflamatórios. mais elevado em relação à gravidade, para conseguir controle rápido. Isso
Subjacente a esses achados, existe a ideia de que o remodelamento das pode ser obtido por curso breve de corticosteroide sistêmico, com corti-
vias aéreas pode resultar em lesões irreversíveis. Contudo, a asma leve costeroide inalado (CI), ou iniciando CI em doses médias ou altas, associa-
pode assim permanecer por muitos anos. Estudos longitudinais definitivos dos ou não a beta-2-agonistas de longa duração (LABA). Uma vez obtido
são necessários, pois alguns pacientes certamente desenvolvem obstru- o controle, reduzir o tratamento. Isso resultará em suspensão mais rápida
ção irreversível após muitos anos de atividade da doença. A porcentagem da inflamação, restauração de função pulmonar, maior confiança no trata-
é pequena e é provável que os pacientes mais graves tenham risco maior. mento e alívio rápido dos sintomas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 341
RADIOLÓGICO HOSPITALAR
A radiografia torácica confirma o diagnóstico de pneumonia, avalia a ex- Indicações de tratamento hospitalar
tensão do processo e identifica complicações, porém as radiografias obti- O tratamento hospitalar deve ser recomendado de acordo com os critérios
das nas fases mais precoces da doença podem não sugerir o diagnóstico e de gravidade.
eventualmente não serem necessárias. O Consenso Britânico valoriza também os sinais e sintomas preconi-
zados pela OMS, mas estabelece que as principais indicações para a hos-
LABORATORIAL
pitalização sejam:
A cultura de secreções de VAS não deve ser realizada, visto que a flora hipoxemia;
que normalmente coloniza essa região pode incluir agentes causadores saturação de O2 < 92%, cianose;
de pneumonia. FR > 70 rpm;
Hemocultura – devem ser coletadas pelo menos três, com variável dificuldade respiratória;
taxa de identificação, segundo o agente etiológico.
apneia intermitente, gemido;
Cultura, bacterioscopia e bioquímica do derrame pleural (DP),
impossibilidade de se alimentar;
broncoscopia com espécime traqueal protegido ou lavado bronco-
incapacidade da família em tratar o paciente no domicílio.
alveolar (LBA) fornecem boa taxa de recuperação, sendo medidas
importantes em todos os casos em que apresentem indicação. Lactentes com menos de 2 meses
Punções traqueal e pulmonar têm indicação em estudos epidemio-
Os lactentes com menos de 2 meses representam um grupo especial para
lógicos e em condições especiais.
o qual está indicada a internação, devido ao risco de agentes gram-nega-
Outros exames laboratoriais, tipo sorológico-específico, contraimu-
tivos, estreptococos betahemolíticos e Staphylococcus aureus, causadores
noeletroforese e culturas de outros locais, orientados em razão da
de pneumonia. Nessa faixa etária, qualquer pneumonia é considerada
história e do quadro clínico.
grave.
Pesquisa de vírus respiratórios
Crianças de 2 meses a 5 anos
O diagnóstico de infecção viral em pacientes hospitalizados é benéfico
Além dos sinais de gravidade descritos, outros critérios para internação do
para orientar as precauções de controle de infecção hospitalar e limitar o
lactente de 2 meses a 5 anos com pneumonia são:
uso inapropriado de antibióticos. É importante salientar que, para a detec-
ção do vírus, o material deve ser coletado o mais precocemente possível falha da terapêutica ambulatorial;
após o início da infecção. doença grave concomitante;
Teste de imunofluorescência para vírus-painéis virais. sinais radiológicos de gravidade (DP, pneumatoceles, abscesso).
Teste Elisa para vírus. A radiografia torácica é indicada nos casos de internação. Os porta-
Reação em cadeia da polimerase (PCR). dores de pneumonia complicada com DP, pneumotórax e pneumatoceles
3
Outros: a contagem de leucócitos superior a 15.000/mm pode su- devem ser internados.
gerir pneumonia bacteriana. Eosinofilia nos casos de pneumonia A presença de condensação radiológica extensa tem potencial de
afebril pode indicar infecção por Chlamydia trachomatis. evoluir para DP e, portanto, serve como um preditivo de gravidade.
A hipoxemia deve ser utilizada como indicativo de internação também
Proteína C-reativa nessa faixa etária.
A dosagem de proteína C-reativa ainda esbarra na definição do ponto de As crianças maiores de 2 meses podem ser tratadas em ambulatório.
corte para sua concentração sérica; entretanto, valores mais altos têm sido Se houver falha terapêutica, ou na presença de sinais de gravidade, a in-
associados às pneumonias bacterianas. ternação deve ser imediata.
344 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
rer resposta, procurar os motivos de falha, como complicações da pneu- Na pneumonia por Klebsiella (suspeita em berçários e por abaulamen-
monia, escolha inadequada do antibiótico e dose errada. to de cissura na radiografia), recomendam-se os aminoglicosídeos e as
cefalosporinas, de preferência em associação, ou as cefalosporinas de 3a
ou 4a gerações.
ATENÇÃO! Nas pneumonias por Pseudomonas, usam-se cefalosporinas de 3a ou
a
4 gerações associadas a aminoglicosídeos ou imipenen.
Se a criança permanece com febre ou clinicamente instável após 48 a
72 horas da internação por pneumonia, devem-se pesquisar complica-
ções, sendo a mais frequente o DP. ATENÇÃO!
No período neonatal, além dos gram-negativos entéricos e estafiloco-
A antibioticoterapia por via oral (VO) é segura e eficiente para o tra- cos, é importante suspeitar dos estreptococos tipo B, que podem pro-
tamento de crianças com pneumonia comunitária. A via parenteral deve duzir pneumonias precoces confundíveis com a doença de membrana
ser reservada quando há impossibilidade de absorção oral desses medica- hialina. Para esse quadro grave e de alta letalidade, além de medidas
mentos. Outras indicações para a antibioticoterapia por via parenteral são de suporte, indica-se o uso de penicilinas.
os sinais e sintomas indicativos de pneumonia grave.
A amoxicilina é o antibiótico de escolha para pacientes menores de 5
a a
anos. Alternativamente, podem ser utilizados amoxicilina combinada ao No período compreendido entre 3 e 12 semanas de vida, é possível
ácido clavulânico, cefaclor, eritromicina, claritromicina e azitromicina. A haver pneumonia por Chlamydia trachomatis, com as seguintes caracte-
a
amoxicilina é indicada como antibiótico de 1 linha em crianças, de qual- rísticas gerais:
quer idade, em que o S. pneumoniae seja o agente etiológico mais prová- parto vaginal; presença de corrimento na gestação;
vel. Os antibióticos macrolídeos podem ser usados na suspeita diagnóstica conjuntivite no período neonatal em metade dos casos;
de pneumonia por micoplasma ou clamídia. Nos casos em que a antibioti- tosse em estacato, dificuldade para ganhar peso, palidez, taquip-
coterapia venosa é necessária, a amoxicilina associada a clavulanato, cef- neia, com semiologia relativamente pobre;
triaxona, cefuroxima e cefotaxima inclui-se entre as medicações indicadas. radiografia torácica com infiltração intersticial e hiperinsuflação;
Se dados microbiológicos sugerirem o S. pneumoniae como agente eosinofilia no hemograma em metade dos casos;
etiológico, amoxicilina, ampicilina e penicilina podem ser usadas, isolada- recuperação do agente por cultura, imunofluorescência ou sorolo-
mente, por VO, ou penicilina G procaína, por via IM. gia com IgM específica maior do que 1/32;
tratamento com eritromicina por 10 a 14 dias.
Em crianças maiores e adolescentes, o perfil etiológico compreende
■■ ALGUMAS PNEUMONIAS ESPECÍFICAS vírus, pneumococos e o Mycoplasma pneumoniae; a Chlamydia pneumo-
niae tem sido encontrada em vários estudos.
PNEUMONIA ESTAFILOCÓCICA
As pneumonias por micoplasma apresentam características com pe-
Pode ser primária ou secundária e atinge em geral crianças nos 2 primeiros ríodo de disseminação entre grupos específicos e sintomas gripais, como
anos de vida com predomínio nos 6 primeiros meses, desnutridos, outros febre, tosse com pouca secreção, calafrios, fraqueza, adinamia, cefaleia e
imunodeficientes e em ambiente hospitalar. dor de garganta, nesta ordem de frequência.
No início, o diagnóstico, apesar do quadro mais grave, é difícil de ser Na radiologia, imagens reticulares finas, inicialmente seguidas por
confirmado. A presença de piodermites na criança ou em pessoas da família condensação, nodulares, predominantemente, nos lobos inferiores, são as
e as imagens radiológicas (pneumatoceles) são dados úteis no diagnóstico. mais encontradas.
No tratamento, utilizar uma das opções: A suspeita é confirmada pelo achado de crioglutininas (micoplasma)
1 | oxacilina, 100 a 200 mg/kg/dia IV, dividida em 4 a 6 vezes; e pela sorologia específica. O uso de macrolídeos (eritromicina e outros) é
2 | cefalotina, 100 mg/kg/dia IV, dividida em quatro vezes; o tratamento de escolha.
3 | lincomicina, 10 a 20 mg/kg/dia IV, dividida em quatro doses;
4 | vancomicina, 40 mg/kg/dia IV, dividida em três doses;
■■ PREVENÇÃO
5 | teicoplanina, 10 mg/kg/dia IV, dividida em duas doses;
6 | linezolida, 10 mg/kg/dia IV, dividida em duas doses (até o máximo de A OMS recomenda que os programas de imunização incluam quatro vaci-
600 mg/dia). nas para a prevenção de pneumonias, por seu potencial de reduzir, subs-
Pode-se potencializar o tratamento com associação antibiótica. tancialmente, as mortes de menores de 5 anos: antissarampo; antiper-
tussis; anti-Haemophilus inflenzae tipo B conjugada; e antipneumocócica
OUTRAS PNEUMONIAS POR GRAM-NEGATIVOS conjugada.
Outras medidas, como controle da desnutrição, melhoria das condi-
Os agentes patogênicos dessas pneumonias são Klebsiella pneumoniae,
ções de moradia e saneamento, redução da exposição a poluentes am-
Pseudomonas, E. coli e Proteus. Nos últimos anos, tem sido observado um
bientais e acesso à imunização básica, também são fundamentais para a
aumento de seus casos, devido a:
prevenção da pneumonia.
maior sobrevida de pacientes imunodeficientes (desnutrido,
doença tumoral etc.);
maior concentração de pacientes de alto risco em UTI;
uso indiscriminado de fármacos antibióticos.
REVISÃO
O diagnóstico etiológico é difícil de ser estabelecido, podendo ser fei- A doença cursa com uma inflamação que resulta da invasão de bac-
to pelo isolamento do agente etiológico em hemocultura, por cultura de térias, vírus ou fungos, embora também possa advir de uma lesão
líquido pleural e da secreção purulenta da traqueia de material obtido por química.
método invasivo.
346 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
■■ DIAGNÓSTICO
Pseudomonas aeruginosa Os critérios utilizados para o diagnóstico da FC estão representados no
É a principal bactéria responsável pela doença pulmonar progressiva. Quadro 49.2.
Em até 30% dos lactentes fibrocísticos, a Pseudomonas aeruginosa
pode ser o primeiro patógeno recuperado das secreções respiratórias
e aumenta para 80% nos maiores de 18 anos. A infecção inicial pela QUADRO 49.2 ■ Critérios diagnósticos para fibrose cística
Pseudomonas aeruginosa nas vias aéreas geralmente é por cepas não
mucoides originárias do meio ambiente, que se convertem no fenótipo Manifestações clínicas:
mucoide na via endobrônquica, tornando-se predominantes na coloni- Uma ou mais características do quadro fenotípico (Quadro 49.1)
e/ou história familiar de FC (irmão) e/ou
zação/infecção crônica. As cepas mucoides da bactéria caracterizam-se
Teste de triagem neonatal positiva e
pela formação de biofilme (comunidades bacterianas) e pela aparência
Alteração da função da proteína CFTR
viscosa, decorrente da produção do alginato, um mucopolissacarídeo,
Teste do suor positivo e/ou
que forma uma matriz ao redor do micro-organismo. O alginato protege
Presença de duas mutações para FC conhecidas e/ou
a bactéria contra a fagocitose, e a opsonização dificulta a chegada do Alteração no diferencial de potencial nasal ou quantificação da
antibiótico e reduz a eficácia mecânica mucociliar. A expressão mucoide atividade do canal CFTR intestinal em biópsia retal
da Pseudomonas aeruginosa é a principal responsável pela cronicida-
de da infeçcão. A conversão da Pseudomonas aeruginosa não mucoide
(NM) para forma mucoide (M), na via endobrônquica, correlaciona-se O teste do suor por meio de iontoforese com pilocarpina, método
com o declínio da função pulmonar e o aumento da taxa de interna- padronizado por Gibson e Cooke,1 em 1959, realizado em duas ou mais
ções e da mortalidade. O principal interesse em detectar precocemen- ocasiões, representa o padrão-ouro no diagnóstico da disfunção da
te a Pseudomonas aeruginosa no pulmão dos fibrocísticos consiste em proteína CFTR. Nos fibrocísticos, as concentrações de sódio e cloreto no
retardar a infecção crônica responsável pela persistente e irreversível suor são elevadas. A concentração do íon cloreto (Cl-) maior ou igual a
lesão pulmonar. 60 mEq/L é consistente com diagnóstico de FC (Tabela 49.1). A concentra-
348 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
ção do Cl – pode ser normal em 1 a 2% dos fibrocísticos. O teste do suor Outra forma de avaliar a disfunção do CFTR é a diferença de potencial
a
é realizado a partir da 2 semana de vida e em lactentes com mais de 3 nasal ou quantificação da atividade do canal CFTR intestinal por biópsia
kg de peso. Os exames com valores intermediários devem ser repetidos retal ou jejunal. O transporte ativo de íons gera uma diferença de potencial
ou, se o resultado continuar indefinido, outros exames adicionais devem elétrico transepitelial que pode ser medido in vivo. A diferença de poten-
2
ser avaliados. A Cystic Fibrosis Foundation recomenda os parâmetros cial na superfície da mucosa nasal pode ser medida pela passagem do
citados na Tabela 49.1 para concentração de cloro no suor. Pacientes cateter sob turbinado nasal inferior e um eletrodo de referência dentro do
com valores intermediários devem repetir o teste do suor e serem sub- tecido subcutâneo do antebraço. Na FC, a diferença de potencial basal é
metidos a uma avaliação clínica detalhada e, se possível, a uma análise muito maior, isto é, mais negativa.
genética, além de seguimento a cada 6 a 12 meses, até o esclarecimento
DIAGNÓSTICO POR TRIAGEM NEONATAL
diagnóstico.
A triagem neonatal identifica apenas recém-nascidos (RN) com risco de ter
FC. Baseia-se na dosagem sérica do tripsinogênio imunorreativo (IRT), um
TABELA 49.1 ■ Parâmetros para avaliação da concentração de precursor de enzima pancreática. Nos RNs fibrocísticos, ocorre a elevação
cloro no suor segundo a Cystic Fibrosis Foundation dessa enzima, com normalização gradual em 4 a 6 semanas de vida. O au-
mento da enzima decorre, provavelmente, da obstrução dos ductos pan-
IDADE NORMAL INTERMEDIÁRIO FC creáticos na vida intrauterina, com seu refluxo para a circulação sanguí-
nea. Se a 1a amostra do IRT ao nascimento for positiva (IRT ≥ 80 ng/mL),
Lactentes ≤ 6 m ≤ 29 mmol/L 30-59 mmol/L ≥ 60 mmol/L
deve-se repetir uma 2a amostra, após 15 a 30 dias (IRT/IRT). Se ambos os
Lactentes ≥ 6 m ≤ 39 mmol/L 40-59 mmol/L ≥ 60 mmol/L valores forem elevados (IRT ≥ 80 ng/mL), confirmar o diagnóstico de FC
2
com teste do suor ou pesquisa genética (Figura 49.1). A análise das mu-
Fonte: Cystic Fibrosis Foundation. a
tações genéticas mais comuns constitui uma alternativa após a 1 coleta
elevada do IRT (IRT/DNA). A criança com teste de triagem positivo deve ser
Um método alternativo para análise do suor consiste na medida da encaminhada para uma avaliação diagnóstica.
condutividade com coleta do suor por Macroduct. Coleta-se o suor para
dentro de uma espiral de plástico, após estimulação por meio de iontofo-
rese pela pilocarpina (volume mínimo de 15 mcgL) e coloca-se o material 1ª amostra do IRT
obtido no analisador de condutividade (Sweat-Chek-Wescor). Os valores (coleta na 1a semana de vida)
são correspondentes ao cloreto de sódio (NaCl) em mmol/L. Os valores
de NaCl de referência para o teste da condutividade são: valores normais
< 60 mmol/L, diagnóstico de FC > 80 mmol/L e intermediários entre 60 Descartar FC Positivo
e 80 mmol/L. O consenso da Cystic Fibrosis Foundation2 reconhece os Convocar para
valores do Macroduct como teste de rastreamento, recomendando que 2ª coleta (15-30 dias)
os testes positivos ou valores de sódio e cloro superiores a 50 mmol/L
sejam confirmados pelo método de Gibson e Cooke.1 Na literatura, vários
trabalhos demonstraram que a análise do suor pelo método da condutivi- Descartar FC Positivo
dade apresenta uma correlação adequada, quando comparada com a da
1 Obrigatório realizar teste
técnica de Gibson e Cooke. do suor ou teste genético
DIAGNÓSTICO DA INSUFICIÊNCIA PANCREÁTICA de dessa bactéria, embora a infecção não seja erradicada. Seu objetivo
EXÓCRINA consiste em diminuir o declínio da função pulmonar e reduzir a frequência
e a morbidade das agudizações pulmonares.
Em pediatria, os métodos diagnósticos indiretos (excreção de gordura fe-
3 | Nos períodos de agudizações dos sintomas pulmonares.
cal de 72 horas e elastase-1 fecal) são os mais utilizados, porém possuem
baixa especificidade e sensibilidade.
O padrão-ouro no diagnóstico de esteatorreia é a excreção de gordu- TRATAMENTO DA P. AERUGINOSA
ra fecal com sobrecarga de gordura de 72 horas, cujos valores normais são Em pacientes internados, é importante a associação de dois fármacos
< 4 a 5 g/dia (2 a 10 anos) e < 7 g/dia (> 10 anos). endovenosos anti-Pseudomonas pelo sinergismo e pela diminuição do
A dosagem de elastase-1, em amostra fecal isolada, permite classifi- surgimento de resistência. Geralmente, o uso de um aminoglicosídeo e
car os pacientes em: de um betalactâmico (cefalosporina, carbapênemicos) são recomendados.
suficientes pancreáticos > 200 µg/g; No tratamento ambulatorial, o fármaco de escolha por VO é a ciproflo-
borderline 80 a 200 µg/g; xacina, com um antibiótico inalatório (aminoglicosídeo ou polimixina E).
IPE leve a moderada 15 a 80 µg/g; e Trabalhos recentes sugerem o uso de tobramicina inalatória por 28 dias
IPE grave < 15 µg/g. para erradicação da P. aeruginosa. Há vários protocolos de erradicação
dessa bactéria, incluindo por VO, via EV e inalatória, mas uma terapêutica
ideal ainda é desconhecida. O uso de tobramicina por via inalatória, em
■■ TRATAMENTO
meses alternados, nos fibrocísticos colonizados crônicos pela P. aerugi-
Deve ser abordado por uma equipe multidisciplinar. Torna-se essencial nosa, estabilizou o quadro pulmonar e provocou uma menor necessidade
a assistência aos pacientes e suas famílias no entendimento da doença de antibiótico por via EV. Todos os pacientes com colonização/infecção
e na otimização das intervenções do tratamento, cujos princípios são: crônica pela Pseudomonas aeruginosa devem ser considerados para o uso
controle e tratamento das infecções pulmonares; medidas de alívio da de antibioticoterapia inalatória, com tobramicina ou polimixina E (colomi-
obstrução brônquica; tratamento da IPE; correção do déficit nutricional; cina), por tempo prolongado.
e tratamento de problemas físicos, psicossociais e das complicações da
doença.
TRATAMENTO DO S. AUREUS/H. INFLUENZAE
CONTROLE E TRATAMENTO DAS Recomenda-se o tratamento com antiestafilococos por 2 a 4 semanas.
INFECÇÕES PULMONARES Alguns pacientes tornam-se colonizados cronicamente pela bactéria. No
pulmão de alguns fibrocísticos, o S. aureus persiste intracelularmente em
A escolha do antibiótico apropriado apoia-se na revisão de culturas re-
pequenas colônias. Essas variantes nem sempre estão presentes nas cul-
centes das secreções das vias aéreas. São recomendadas altas doses de
turas de rotina e podem reverter para cepas normais, após o término dos
antibióticos por pelo menos 10 a 14 dias.
antibióticos.
A farmacocinética de antimicrobianos sistêmicos mostra-se alterada.
O Haemophilus influenzae associa-se aos fibrocísticos com o aumento
Os fibrocísticos têm maior volume de distribuição, e a eliminação renal de
dos sintomas pulmonares. Deve ser tratado quando isolado das secreções
alguns fármacos, como os aminoglicosídeos e os betalactâmicos (cefalos-
respiratórias. Recomenda-se terapia de erradicação por 2 a 4 semanas
porina e penicilina), é mais rápida. Por esse motivo, devem ser usados em
com antibióticos específicos.
doses maiores.
O antibiótico inalatório pode ser útil como suporte ou em substi-
tuição à terapia sistêmica (amicacina, gentamicina, tobramicina, poli- TRATAMENTO DO COMPLEXO B. CEPACIA,
mixina E). S. MALTOPHILIA E A. XYLOXIDANS
Geralmente, são bactérias multirresistentes e, muitas vezes, necessitam da
associação de antimicrobianos. Mais estudos são necessários para otimi-
ATENÇÃO!
zar uma melhor terapêutica.
São sintomas e sinais de infecção pulmonar aguda: aumento da tos-
se; aumento na produção de escarro e/ou mudança na coloração; MEDIDAS DE ALÍVIO DA OBSTRUÇÃO BRÔNQUICA
aumento da dificuldade respiratória e diminuição da tolerância à ati- Fisioterapia respiratória
vidade física; hemoptise; anorexia, fadiga, perda de peso; sensação
Parte fundamental do tratamento, deve ser feita com frequência de no
de “congestão torácica”; febre de 38oC em mais de uma ocasião na
mínimo duas vezes ao dia, com duração de 20 a 30 minutos, ou mais nas
semana anterior; piora do FEV1 > 10% (espirometria) do basal obtido
agudizações.
nos últimos três meses; piora da SatO2 > 10% do basal obtido nos
últimos três meses; mudança na ausculta pulmonar; aumento do apri- Mucolíticos inalatórios
sionamento aéreo ou aparecimento de novos infiltrados na radiografia
1 | Inalação DNA recombinante humana alfadornase: a alfadorna-
torácica.
se degrada o DNA livre no meio extracelular que se acumula dentro das
secreções brônquicas e reduz a viscoelasticidade no escarro, facilitando
No manejo das infecções pulmonares, o tratamento antibiótico con- a fisioterapia. Os trabalhos demonstraram diminuição das internações e
tra os patógenos isolados das secreções respiratórias adquire importância melhora da função pulmonar. Dose: 2,5 mg/dia.
fundamental. A maioria dos antimicrobianos é prescrita em três situações: 2 | Inalação hipertônica: a SF hipertônica tem um efeito favorável so-
1 | Tratamento agressivo da Pseudomonas aeruginosa, para retardar a bre a reologia do muco in vitro. Melhora a função pulmonar e diminui as
colonização/infecção crônica pela bactéria. agudizações pulmonares. NaCl 6% ou 7%: sempre deve ser precedido com
2 | Tratamento de manutenção nos fibrocísticos com colonização/infecção inalação de um broncodilatador para prevenção da hiper-responsividade
crônica por Pseudomonas aeruginosa, para suprimir o número e a ativida- brônquica.
350 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
TRATAMENTO DA IPE
São possíveis efeitos colaterais da TREP: úlceras orais; erosões na
A terapia de reposição de enzimas pancreáticas (TREP) com pancrelipases boca e no seio materno; irritação anal; constipação intestinal; hiperurice-
de origem suína (lipase, amilase e protease) deve ser iniciada assim que o mia; hiperuricosúria; reações alérgicas; e colonopatia fibrosante (possivel-
diagnóstico da IPE estiver confirmado. mente relacionada ao uso de altas doses e à toxicidade do Eudragit L30
®
As enzimas pancreáticas devem ser administradas com todos os D-55, copolímero do ácido metacrílico tipo C).
alimentos contendo gorduras, inclusive suplementos orais, fórmulas
lácteas, dietas enterais e o leite materno, sempre no início das refeições. TRATAMENTO DA DOENÇA HEPÁTICA
Em festas, dar metade da dose no início e outra metade no meio da ASSOCIADA À FC
refeição.
O ácido ursodesoxicólico vem sendo utilizado para diminuir a viscosida-
As cápsulas devem ser engolidas inteiras o mais cedo possível (3 a 4
de da secreção intracanalicular e facilitar o fluxo biliar (20 a 30 mg/kg/dia
anos). Caso contrário, as microesferas devem ser misturadas na colher em
em duas tomadas).
pequena quantidade de fórmula, ou leite materno ou papa, e engolidas de
uma só vez, sem esmagá-las ou mastigá-las.
SUPORTE NUTRICIONAL
Os pacientes com FC devem consumir uma dieta hipercalórica (120 a 150%
ATENÇÃO! das necessidades calóricas), sendo 35 a 40% das calorias na forma de gordu-
ras. Além disso, devem receber suplementação de vitaminas lipossolúveis.
As doses de enzimas pancreáticas utilizadas na prática clínica de acor- Lactentes e crianças com FC estão sob risco de desidratação hipo-
do com as diferentes faixas etárias são: natrêmica/hipoclorêmica com alcalose metabólica por perda de sal pelo
1 | Lactentes suor, sendo recomendada a suplementação de sódio (soluções de NaCl)
400 a 800 UI lipase para cada grama de gordura da dieta ou nas seguintes quantidades:
2.000 a 4.000 UI lipase para cada 120 mL de fórmula láctea ou leite lactentes não expostos ao calor: 4 mEq/kg/dia;
materno. lactentes que ainda não estão recebendo alimentos sólidos ou que
2 | Menores de 4 anos estão expostos a clima quente: 11 mEq/kg/dia.
500-4.000 UI lipase para cada grama de gordura da dieta ou
Refeições principais: 1.000 UI lipase para cada kg de peso da criança e FÁRMACOS EM ESTUDO
Lanches: 500 UI lipase para cada kg de peso da criança.
Vários tipos de abordagem terapêutica estão sendo investigados, como
3 | Maiores de 4 anos
corretores ou potenciadores da função da proteína CFTR, restauração do
500 a 4.000 UI lipase para cada grama de gordura da dieta ou
transporte de sal (hidratando a secreção brônquica) nos pulmões, outras
Refeições principais: 500 a 2.500 UI lipase para cada kg de peso da
medicações anti-inflamatórias e medicações para uso inalatório em pó
criança e
(tobramicina, ciprofloxina) e em aerossol (aztreonam).
Lanches: 250 a 1.250 UI lipase para cada kg de peso da criança.
Terapias específicas para mutações da FC
Os principais objetivos da TREP são controlar os sintomas de má As estratégias baseadas no tipo de mutação encontram-se em fase ex-
absorção intestinal e manter um bom ganho ponderoestatural. É ideal perimental ou de ensaio clínico, mas, em 2012, o ivacaftor (VX-770) foi
promover um coeficiente de absorção de gorduras > 85 a 90% e manter aprovado nos Estados Unidos.
a dose de enzima pancreática < 10.000 UI/kg/dia. São causas de falha Trata-se de um fármaco que potencializa o CFTR, para tratamento dos
do tratamento: dose baixa de lipase; horário inadequado da ingestão da fibrocísticos, maiores de 6 anos, que tenham pelo menos uma mutação
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 351
Os pacientes que apresentam IPE devem receber TREP para contro- internação hospitalar de menores de 5 anos. Na literatura médica mundial,
lar os sintomas de má absorção intestinal e para manter um bom ga- a
a IRpA é a 1 causa de internação em UTI pediátrica (UTIP). Estima-se que
nho ponderoestatural. Recomenda-se ainda uma dieta hipercalórica dois terços dos casos de IRpA acometam menores de 5 anos, metade deles
e suplementação de vitaminas lipossolúveis. o
no 1 ano de vida.
Lactentes e crianças pequenas devem receber suplementação de Os motivos para essa frequência elevada de IRA em menores de 1
sódio, principalmente durante os meses de verão e em locais de ano incluem:
clima quente. peculiaridades anatômicas – diâmetro de pequenas vias aéreas,
inexistência de ventilação colateral (poros de Kohn e canais de
Lambert), pequeno diâmetro de via aérea em região cricoide, vias
■■ REFERÊNCIAS aéreas colapsáveis por não serem totalmente cartilaginosas e me-
1. Gibson LE, Cooke RE. A test for concentration of electrolytes in sweat in nor superfície alveolar;
cystic fibrosis of the pancreas utilizing pilocarpine by iontophoresis. peculiaridades fisiológicas – coordenação da deglutição, sono
Pediatrics. 1959;23(3):545-9. REM versus não REM (rapid eye movement – “movimento rápido
2. Cystic Fibrosis Foundation. Sweat test [Internet]. Bethesda: CFF; c2016 dos olhos”), pecentual diferente de fibras musculares tipo I e II,
[capturado em 11 ago. 2016]. Disponível em: https://www.cff.org/What-is- alterações na distribuição de V/Q nos pulmões, maior dependência
CF/Testing/Sweat-Test/. da respiração abdominal versus torácica, maior suscetibilidade a
fenômenos de aprisionamento dinâmico de ar (autopeep), menor
■■ LEITURAS SUGERIDAS complacência torácica, imaturidade pulmonar e do sistema imu-
nológico.
Borowitz D, Baker RD, Stallings V. Consensus report on nutrition for pediatric
patients with cystic fibrosis. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2002;35(3):
246-59. ■■ QUADRO CLÍNICO
Farrel PM, Rosenstein BJ, White TB, Accurso FJ, Castellani C, Cutting GR et
al. Guidelines for diagnosis of cystic fibrosis in newborns through older A IRpA é classificada como:
adults: Cystic Fibrosis Foundation consensus report. J Pediatr. 2008;153(2): aguda ou crônica – quanto ao tempo de instalação e desenvolvi-
S4-S14. mento;
Littlewood JM, Wolfe SP, Conway SP. Diagnosis and treatment of intestinal alta ou baixa – quanto à localização da patologia subjacente;
malabsorption in cystic fibrosis. Pediatr Pulmonol. 2006;41(1):35-49. obstrutiva ou restritiva – quanto ao padrão predominante das alte-
Mogayzel PJ, Naureckas ET, Robinson KA, Gary Mueller G, Hadjiliadis D, Hoag rações de mecânica respiratória.
JB, et al. Cystic fibrosis pulmonary guidelines. Chronic medications for A melhor classificação da IRpA é de acordo com o tipo predominante
maintenance of lung health. Am J Respir Crit Care Med. 2013;187(7):680-9. de distúrbio de troca gasosa. Dessa forma, pode ser classificada como
Rogers GB, Hoffman LC, Döring G. Novel concepts in evaluating antimicrobial tipo I, ou hipoxêmica, e tipo II, ou hipercápnica, o que permite suposições
therapy for bacterial lung infections in patients with cystic fibrosis. J Cyst
quanto às alterações fisiopatológicas envolvidas e às doenças associadas.
Fibros. 2011;10(6):387-400.
Na Quadro 50.1, são mostradas as principais causas de IRpA.
352 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Fernandes JC, Hirschheimer MR, Nobrega RF. Insuficiência respiratória aguda. In:
100 Carvalho WB, Hirschheimer MR, Matsumoto T, editores. Terapia intensiva
pediátrica. 3. ed. São Paulo: Atheneu; 2006. p. 383-424.
80 Oliveira NF. Insuficiência respiratória aguda. In: Carvalho WB, Souza N, Souza
PaCO2
RL. Emergência e terapia intensiva pediátrica. 2. ed. São Paulo: Atheneu;
60 2006. p. 158-63.
mmHg
20
Fase I Fase II Fase III Fase IV
0
Tempo e progressão da doença
51
FIGURA 50.1 ■ Fases evolutivas da IRpA.
FEBRE SEM SINAIS LOCALIZATÓRIOS
tipo II, realiza-se oxigenoterapia e/ou ventilação não invasiva (VNI), nas
fases iniciais 1 e 2, e VPM, nas fases tardias 3 e 4. ■■ LEANDRO G. PEYNEAU
São regras para uso de oxigenoterapia:
oferecer a menor FiO2 que resulte em uma PaO2 adequada;
FiO2 acima de 60% é tóxica e deve ser evitada;
A febre é uma das principais causas de atendimento médico dos pacien-
não usar oxigênio além do tempo necessário;
tes na faixa etária pediátrica. A fobia da febre em si, especialmente em
uso deve ser constante e não intermitente;
altas temperaturas, a aquisição de conceitos equivocados, de mitos e a
introdução e retirada do oxigênio devem ser graduais;
preocupação exagerada quanto aos perigos desse quadro são uma rotina
oxigênio deve ser fornecido na forma úmida e aquecida;
na prática pediátrica.
oferecer por meio de métodos com pouca variabilidade (p. ex.:
A febre é caracterizada por elevação anormal da temperatura corpó-
máscara Venturi);
rea em resposta a um estímulo patológico (pirógeno exógeno), com produ-
alguns métodos de oxigenoterapia podem resultar em grande varia-
ção de pirógeno endógeno, que atua no centro termorregulador.
bilidade na FiO2 oferecida, como capacetes e tendas, portanto, deve-
São diversas as opniões quanto ao melhor local para medida da tem-
-se monitorar a FiO2 realmente oferecida por sensores de oxigênio;
peratura corporal. Referências norte americanas (Bright Futures Guidelines
considerar a instalação de ventilação mecânica não invasiva 1
for Health Supervision) sugerem a temperatura retal para crianças meno-
(VMNI), ou invasiva (VMI) em pacientes com agravo progressivo da
res de 4 anos. Em contraste, referências inglesas (National Institute for
IRpA, apesar das medidas terapêuticas anteriores.
Health and Care Excellence)2 recomendam termometria axilar eletrônica
As principais indicações de suporte ventilatório avançado são:
para crianças menores de 4 semanas e termometria axilar ou termometria
indicação absoluta: apneia; parada cardiorrespiratória; insuficiên-
infravermelha de membrana timpânica para crianças entre 4 semanas e 5
cia respiratória progressiva evoluindo para falência respiratória;
anos de idade. A temperatura axilar é menor do que a retal, mas a varia-
terapia de suporte: choques graves (séptico, hipovolêmico, car-
ção da diferença entre elas é tão grande que impossibilita uma conversão
diogênico) e pós-operatórios de grandes cirurgias (cardíaca, neu-
padronizada. Algumas referências relatam a diferença de 0,5°C entre a
rológica, abdominal);
temperatura retal e axilar. No Brasil, a avaliação de temperatura mais ro-
necessidade de hiperventilação: tratamento de hipertensão pul-
tineira é a axilar, mas, na literatura, a mais comum é a retal. A maioria
monar e de hipertensão intracraniana (HIC).
dos estudos que estabelecem risco infeccioso em crianças febris tem como
referência para febre a temperatura retal acima de 38°C.
REVISÃO Cerca de 60% dos pacientes pediátricos serão levados ao atendimen-
to médico devido a quadro febril antes de completarem 3 anos. Em torno
A IRpA é definida pela incapacidade do sistema respiratório em de 25% dos atendimentos em serviços de emergência pediátrica se dão
manter trocas gasosas pulmonares adequadas frente à necessidade por queixa única preponderante de febre; destes, até 20% dos casos se
metabólica do organismo. apresentarão com febre sem sinais localizatórios evidentes. A febre sem
A IRpA é a 1a causa de internação hospitalar em menores de 5 anos. sinais localizatórios define-se por presença de quadro febril agudo, há me-
A IRpA pode ser classificada em aguda ou crônica, alta ou baixa, nos de 7 dias, em que a história e o exame físico minuciosos não revelam
obstrutiva ou restritiva e hipoxêmica ou hipercápnica. a causa da febre. Na maioria dos casos, uma infecção benigna é diagnosti-
O tratamento da IRpA deve incluir: controle específico da doença cada após história clínica e exame físico minuciosos. Em uma porcentagem
subjacente e/ou controle paliativo, quando não houver medida es- desses pacientes, especialmente nos lactentes mais jovens, as diversas
pecífica disponível. infecções podem manifestar-se apenas por febre e sinais clínicos vagos
e inespecíficos – a febre sem sinais localizatórios. Poucas crianças com
febre sem sinais localizatórios têm uma infecção bacteriana grave, como a
■■ LEITURAS SUGERIDAS bacteremia oculta, a pielonefrite e a meningite.
Barbosa AP. Fisiopatologia e diagnóstico da insuficiência ventilatória. In: Barbosa Um grande desafio médico, que atravessa gerações, consiste na di-
AP, Johnston C, Carvalho WB, editores. Insuficiência ventilatória aguda. São ferenciação correta e precoce dos pacientes com febre sem sinais locali-
Paulo: Atheneu; 2010. p. 49-67. zatórios e alto risco de doença bacteriana grave, com suas elevadas taxas
354 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
de morbimortalidade, daqueles com doença benigna não invasiva, que na e proteína C-reativa pode identificar lactentes de 29 a 90 dias de idade
constituem a vasta maioria. como baixo risco para doença bacteriana invasiva (meningite e bactere-
Durante a década de 1970, surgiram os primeiros relatos de que algu- mia) sem necessidade de coleta de LCS.
mas crianças febris, menores de 3 anos, em bom estado geral e com pouco Também lembramos que, nesse sentido, a prevalência de meningite
ou nenhum achado clínico, tinham hemocultura positiva. Isso acarretou bacteriana parece estar declinando com taxas de 0 a 0,5% em estudos
uma intensa busca dos fatores de risco para identificação precoce dessas após a rotina de imunização com as vacinas conjugadas.
crianças. Outra mudança que permite condutas mais conservadoras é a dispo-
Arbitrariamente, diferentes abordagens têm sido realizadas em lac- nibilidade de monitorização contínua de hemoculturas permitindo a iden-
tentes e crianças febris sem foco infeccioso aparente, conforme a faixa tificação mais rápida de bacteremia e assim intervenção precoce antes da
etária: neonatos (0 a 28 dias); lactentes jovens (29 a 60 dias); lactentes deterioração clínica. Esse sistema de monitorização identifica entre 77 e
mais velhos(60 a 90 dias); e crianças mais novas (3 a 36 meses). Em parte, 87% de todas as culturas com patógenos e 95% dos patógenos críticos
isso se deve à diferença no perfil de bactérias causadoras de infecções (pneumococo, Salmonella e outras Enterobactérias, meningococo, Streto-
neonatais (estreptococos grupo B, Enterobacteriaceae e Listeria monocyto- coccus dos grupos A e B) dentro de 24 horas.
genes), à dificuldade na avaliação clínica de neonatos e lactentes jovens Apesar disso, lembramos que crianças (3 meses a 3 anos) não imu-
e à imunização para bactérias invasivas já nos primeiros meses de vida. nizadas ainda estão sob o risco de bacteremia da era anterior às vacinas
Devido a essa dificuldade na avaliação clínica, à função imunológica conjugadas (5%). Com os seguintes fatores de risco: temperatura retal ≥
diminuída e à alta frequência de infecções bacterianas graves, em lacten- 39 °C e leucograma ≥ 15.000/micromol. No caso desses fatores serem
tes menores de 2 meses, tradicionalmente se utilizavam avaliação labora- presentes, o risco aumenta para acima de 10%. Para crianças (3 a 36 me-
torial completa (urina, sangue e líquido cerebrospinal [LCS]) , antibiotico- ses), com vacinação conjugada, o risco cai para menos de 1 % – assim,
terapia e internação. Porém, em 1985, um grupo de Rochester questionou uma abordagem menos agressiva é razoável.
essa conduta e desenvolveu critérios de baixo risco para infecção bacteria- A infecção urinaria é o local mais comum de infecções bacterianas
na grave, em lactentes com menos de 60 dias, que poderiam ser acompa- ocultas entre crianças conforme dois grandes estudos prospectivos. A
nhados ambulatorialmente sem antibioticoterapia. Assim, outros grupos, prevalência é maior em meninas após os 3 a 6 meses de idade. Entre
em Boston, Milwaukee e na Filadélfia, também estabeleceram critérios de os meninos, é mais prevalente nos não circuncidados febris antes dos 3
baixo risco para infecções bacterianas graves, permitindo acompanha- meses de idade. A baixa incidência entre meninos circuncidados fortale-
mento ambulatorial com ou sem antibiótico. ce a prática de não coletar rotineiramente nesses com mais de 6 meses
Apesar do sucesso desses critérios em identificar o grupo de baixo de idade.
risco para infecções bacterianas graves quando o acompanhamento am-
bulatorial era assegurado, eles foram criados anteriormente à introdução
rotineira das vacinas conjugadas (pneumocócica e Hib), apresentando hoje
■■ ABORDAGEM
algumas limitações:
HISTÓRIA CLÍNICA
Apesar de altos valores preditos negativos e sensibilidade, a espe-
cificidade é baixa. Assim, muitos pacientes sem doença bacteriana O histórico é um componente essencial para abordagem de crianças febris
são considerados alto risco, recebem antibióticos de amplo espec- e deve avaliar os seguintes aspectos:
tro e podem ser hospitalizados. Identificar fatores que aumentam o risco de infecção bacte-
Todos os critérios requerem exames laboratoriais, aumentando o riana invasiva
desconforto do paciente e os custos. Alteração do comportamento.
Estudos realizados após a disponibilidade dos testes rápidos para Temperatura retal 38°C.
doenças virais sugerem modificações das estratégias em determi- Antibioticoterapia nos últimos 7 dias.
nados pacientes. Prematuridade.
Estudos subsequentes demonstraram que esses critérios ocasional- Risco de infecção vertical (aplicável aos menores de 28 dias de
mente não só falharam no diagnóstico de neonatos com infecção vida): febre materna, colonização materna por Streptococcus do
urinária e bacteremia, mas também de alguns com meningite ocul- grupo B e e/ou profilaxia antimicrobiana, história materna de
ta (foram os seguintes percentuais de neonatos com febre sem si- doença sexualmente transmissível (DST), ruptura prolongada
nais localizatórios, caracterizadas como baixo risco, que evoluíram de membranas.
com infecção bacteriana grave: 3,2 a 3,5%; 4,6%; e 3,4%). Comorbidades.
Não imunizados (não receberam a primeira dose das vacinas
para Hib e pneumococo).
ATENÇÃO! Sintomas associados: rinorreia, tosse, sibilos, vômitos, diarreia,
sangue ou muco nas fezes e exantemas
Esses critérios foram desenvolvidos e testados em serviços de emer-
Exposição a contatos doentes
gência e podem não ser aplicáveis em locais de cuidados primários.
Barreiras sociais ao acompanhamento ambulatorial
Assim, vários fatores sugerem que estratégias menos agressivas são EXAME FÍSICO
razoáveis em lactentes com bom estado geral e baixo risco de infecção Lactentes e crianças com comprometimento cardiorrespiratório devem ser
bacteriana invasiva que tenham assegurada a reavaliação clínica dentro rapidamente identificados e tratados conforme protocolos para sepse e
de 12 a 24 horas. choque séptico.
Desde o desenvolvimento dos critérios de baixo risco e a publicação Apesar de algumas crianças e lactentes não apresentarem foco infec-
de protocolos em 1993, evidências sugerem que a avaliação com uma cioso aparente ao exame físico inicial, alguns focos infecciosos devem ser
combinação de leucograma, contagem absoluta de bastões, procalcitoni- lembrados, conforme descrito a seguir.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 355
■■ LEITURAS SUGERIDAS
TABELA 52.1 ■ Agentes etiológicos de meningite bacteriana
Gomez B, Mintegi S, Bressan S, Da Dalt L, Gervaix A, Lacroix L. Validation of segundo a faixa etária
the “step-by-step” approach in the management of young febrile infants.
Pediatrics. 2016;138(2). pii: e20154381. IDADE AGENTES ETIOLÓGICOS FREQUENTES
Hui C, Neto G, Tsertsvadze A, Yazdi F, Tricco AC, Tsouros S, Skidmore B, Daniel
R. Diagnosis and management of febrile infants (0-3 months). Evid Rep 0 a 2 meses Enterobactérias (E. coli, Klebsiella sp., Proteus sp.,
Technol Assess (Full Rep). 2012;(205):1-297. Salmonella sp.)
Nijman RG, Moll HA, Smit FJ, Gervaix A, Weerkamp F, Vergouwe Y, et al. Streptococcus agalactiae (β hemolítico do grupo B)
C-reactive protein, procalcitonin and the lab-score for detecting serious Streptococcus pneumoniae
bacterial infections in febrile children at the emergency department: a Listeria monocytogenes*
prospective observational study. Pediatr Infect Dis J. 2014;33(11):e273-9.
Wilkinson M, Bulloch B, Smith M. Prevalence of occult bacteremia in children 2 meses a 5 anos Neisseria meningitidis#
aged 3 to 36 months presenting to the emergency department with Haemophilus influenzae tipo b **
fever in the postpneumococcal conjugate vaccine era. Acad Emerg Med. Streptococcus pneumoniae
2009;16(3):220-5.
#
Acima de 5 anos Neisseria meningitidis
Streptococcus pneumoniae
*Raramente isolada no nosso meio.
52
**Redução de 95% na incidência de meningite após introdução da vacina conjugada
rotineira.
#
Sorogrupo C mais prevalente que sorogrupo B – a partir de 2002 (Estado de São
MENINGITES Paulo).
ATENÇÃO!
■■ MARIA APARECIDA GADIANI FERRARINI
Embora a incidência da meningite bacteriana tenha diminuído nos últi-
■■ SANDRA DE OLIVEIRA CAMPOS
mos anos, ainda permanece com significativa morbidade e mortalida-
de, sendo o reconhecimento precoce e o tratamento adequado cruciais
para uma evolução favorável.
■■ MENINGITE BACTERIANA AGUDA
A meningite bacteriana apresenta-se como um quadro agudo, grave, que
requer imediata atenção médica, pois, mesmo com tratamento apropria- QUADRO CLÍNICO
do, pode apresentar significativa morbidade e mortalidade. A doença instala-se de forma aguda, em horas ou poucos dias, e a sinto-
Definida como a inflamação das leptomeninges que recobrem o cére- matologia varia, sendo menos especifica quanto menor a idade da criança
bro e a medula espinal, ocorre reação purulenta no espaço subaracnoide, (Tabela 52.2). A tríade clássica: “febre persistente, cefaleia e vômitos em
resultante da invasão do sistema nervoso central por bactérias, as quais se jato” encontrada no adulto é pouco frequente na infância. Sinais de irrita-
propagam principalmente por disseminação hematogênica primária, após ção meníngea, como rigidez de nuca, Kernig e Brudzinski, estão presentes
colonização de nasofaringe e invasão, ou secundária a focos de infecção em crianças maiores.
distantes e mais raramente por contiguidade. Pode ocorrer em qualquer
idade, sendo mais frequente entre os menores de cinco anos, principal-
mente entre 6 a 12 meses de idade. TABELA 52.2 ■ Quadro clínico de meningite, segundo a faixa etária
A etiologia varia conforme a faixa etária (Tabela 52.1), região geo-
gráfica e também ao longo dos anos em um mesmo local. Após o período FAIXA ETÁRIA QUADRO CLÍNICO
neonatal, três bactérias (Neisseria meningitidis, Streptococcus pneumoniae Neonatal Febre ou hipotermia, hipoatividade, sucção débil,
e Haemophilus influenzae tipo b (Hib) são os agentes etiológicos princi- abaulamento de fontanela, cianose, apneia, convulsões
pais, sendo atualmente a N. meningitidis a mais prevalente no nosso meio.
Com a introdução das vacinas conjugadas para o Haemophilus influenzae Lactentes Febre, prostração, vômitos, irritabilidade, gemência,
tipo b e S. pneumoniae, nos últimos anos, houve mudanças na epidemio- recusa alimentar, abaulamento de fontanela, convulsões
logia das meningites bacterianas da criança, com diminuição da sua in-
Pré-escolares Febre, cefaleia, fotofobia, vômitos, presença de sinais de
cidência global. O Hib é raramente isolado, e, quanto ao pneumococo,
e escolares irritação meníngea (rigidez de nuca, Kernig e Brudzinski),
apesar da diminuição das taxas de doença invasiva por esse agente, houve
tríade de Cushing (hipertensão, bradicardia e depressão
o aparecimento de sorotipos não cobertos pela vacina, principalmente o respiratória) achado tardio na hipertensão intracraniana
sorotipo 19 A. Nos países desenvolvidos, essa diminuição da incidência
tem ocorrido em todos as faixas etárias, exceto em crianças menores de
2 meses cujos agentes etiológicos diferem daqueles que causam doenças Outras manifestações clínicas incluem as convulsões, que podem ocor-
em crianças maiores. Além disso, tem sido observado o deslocamento da rer em 20 a 50% dos casos em lactentes e crianças maiores, e exantema
doença para faixas etárias mais avançadas. A transmissão acontece por petequial ou purpúrico, classicamente associado ao meningococo (menin-
via respiratória e o período de incubação varia entre um a 10 dias confor- gococcemia) e menos frequentemente ao H. influenzae e S. pneumoniae.
me o agente etiológico, em geral menor de quatro dias para o meningoco- A meningococcemia (sepse pelo meningococo) pode ocorrer isolada-
co, desconhecido para o hemófilo, e de um a três dias para pneumococo. mente ou concomitante à meningite. O exantema petequial ou purpúrico
358 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015*
GRÁFICO 52.1 ■ Algoritmo da etiologia das meningites bacterianas no Estado de São Paulo.
Fonte: Governo do Estado de São Paulo.1
em geral inicia-se em extremidades inferiores podendo também estar pre- presença de coagulopatias, instabilidade respiratória ou hemodinâmica,
sente nas mucosas e na esclera. É um quadro extremamente grave em que presença de infecção de pele no local da punção e quando o paciente
o doente manifesta sinais clínicos de choque e coagulação intravascular apresentar sinais neurológicos focais ou de HIC, devido ao risco de hernia-
disseminada (CIVD), algumas vezes com evolução fulminante, caracteri- ção da amígdala cerebelar decorrente da punção.
zando a síndrome de Watherhouse-Friederichsen. O líquido cerebrospinal (LCS) deve ser analisado quanto à celularida-
de e bioquímica e, independente de seu aspecto macroscópico (límpido,
DIAGNÓSTICO turvo ou purulento), deve ser encaminhado para bacterioscópico e cultura.
Quando há suspeita de meningite por meio da história e do exame físico, Testes rápidos para pesquisa de antígenos bacterianos, como contraimu-
deve-se proceder à punção líquórica lombar para confirmação do diagnós- noeletroforese (CIE) e teste de aglutinação de partículas de látex, podem
tico. A coleta deve ser feita ser feita com a criança deitada em decúbito ser empregados, principalmente quando houve o uso de antimicrobianos
lateral esquerdo, fletida, com a inserção da agulha no espaço interverte- prévios. A reação em cadeia de polimerase (PCR) é de grande utilidade
bral entre L3 e L4 ou L4 e L5. Esse procedimento está contraindicado na em pacientes pré-tratados com antibióticos no qual a cultura pode ser
Lactato 9 a 19 Aumentado
Medidas gerais: a meningite bacteriana é uma doença grave e 2 meses a Ceftriaxona** 100 mg/kg/dia IV de 12/12 horas***
deve ser monitorada em UTI nas primeiras 24 horas ou mais, depen- 5 anos
dendo das complicações que podem surgir, como hipotensão, infar-
Maiores Ceftriaxona 100 mg/kg/dia IV de 12/12
tos cerebrais, convulsões e aumento da pressão intracraniana (PIC).
de 5 anos Ou 300 mg/kg/dia horas***
A criança deve ser mantida em jejum, até estabilização do qua-
Ampicilina IV de 6/6 horas
dro neurológico, com boa permeabilidade de vias aéreas e oxigênio
se necessário. Deve ser monitorada quanto à frequência cardíaca, *Pneumococo resistente à penicilina e à cefalosporina: associar vancomicina (60 mg/
frequência respiratória, pressão arterial e diurese. O perímetro kg/dia, de 6/6 horas, com controle de nível sérico). Em locais em que a resistência é
cefálico deve ser medido diariamente nas crianças menores de 18 conhecida como elevada, iniciar com vancomicina e ceftriaxona e retirar a vancomi-
cina se o pneumococo apresentar sensibilidade à cefalosporina.
meses. Avaliação neurológica periódica (reflexos pupilares, nível
**Ceftriaxona: evitar no período neonatal por sua competição com a bilirrubina na
de consciência, tônus, pares cranianos, convulsões) é necessária
sua ligação proteica
durante as primeiras 72 horas, quando o risco de complicações é ***Pode ser utilizada também dose única diária.
maior. A hidratação deve ser feita corrigindo-se os distúrbios hidre-
letrolíticos e do equilíbrio acidobásico.
Nos pacientes não desidratados, com sinais da síndrome da um subgrupo de 2.511 crianças, encontrou que a dexametasona
secreção inapropriada do hormônio antidiurético (SIADH) (hipo- reduziu significantemente a perda de audição associada à menin-
natremia, aumento da concentração do sódio urinário, diminuição gite por Haemophilus influenzae tipo b, mas não para meningites
da osmolaridade sérica, que se torna menor do que a urinária), causadas por outras bactérias.2
recomenda-se monitorar o sódio sérico a cada 8 a 12 horas, nos Antimicrobianos: devem ser iniciados prontamente logo após a
primeiros 1 ou 2 dias, e a restringir o volume para cerca de 1.000 a coleta do LCS e/ou hemocultura, de forma empírica, baseados na
1.200 mL/m2/24horas (dois terços da necessidade diária de água) epidemiologia local, na faixa etária do paciente, na presença de fa-
com controle do sódio plasmático, do volume e densidade urinários tores de risco ou doença de base, podendo ser modificado quando
e da osmolaridade sérica e urinária. Assim que houver normaliza- o agente etiológico é identificado.
ção da hiponatremia, em geral ainda no primeiro dia, o volume Duração do tratamento: embora recente metanálise3 não de-
pode ser liberado progressivamente até os níveis normais de 1.500 monstrasse diferença em termos de efetividade clínica e segurança
2
a 1.700 mL/m /24 horas. A restrição hídrica não é recomendada do esquema curto de antibiótico, 7 dias ou menos, em crianças
na presença de hipotensão, pois pode levar à baixa perfusão e à sem doença severa ou patógenos resistentes, ainda permanece a
isquemia cerebral. Pacientes em choque devem receber reposição seguinte recomendação: quando a etiologia for meningocócica, 7
de volume em grande quantidade para manutenção da pressão dias; para hemófilos, 10 dias; para pneumococo, 10 a 14 dias; e
arterial e adequada perfusão tecidual e, quando necessário, fárma- para meningite neonatal, 21 dias.
cos vasoativos. Na vigência de sinais de HIC (apneia, bradicardia Quimiprofilaxia: está indicada preferencialmente dentro das 24
hipertensão, pupilas pouco responsivas ou dilatadas), o seu con- horas do diagnóstico do caso primário.
trole deve ser feito com emprego de medicamentos como o manitol Na doença meningocócica: para comunicantes domiciliares ou de
e hiperventilação. instituições fechadas no mesmo alojamento (que comem ou dor-
Corticosteroides: dexametasona tem sido usada como terapia mem no mesmo local), com relação íntima e prolongada; comuni-
adjunta para modular a resposta inflamatória e prevenir compli- cantes de creche e pré-escola (< 7 anos) que entraram em contato
cações neurológicas da meningite bacteriana, principalmente a durante 7 dias antes da doença.
perda de audição. A Academia Americana de Pediatria reconhece Na meningite por Hib: para comunicantes domiciliares quando,
o potencial efeito benéfico da dexametasona para pacientes com além do caso-índice, houver crianças menores de 4 anos incomple-
meningite por Haemophilus influenzae tipo b, e o emprego empí- tamente ou não vacinadas, ou com imunodeficiência independente
rico pode ser considerado na suspeita de meningite bacteriana, do estado vacinal residentes no domicílio, em creches e pré-esco-
avaliando-se risco e benefício, em lactentes maiores de seis sema- las, a partir do segundo caso, em crianças não vacinadas, confir-
nas de idade, na dose de 0,6 mg/kg/dia, IV, dividido de seis em 6 mado dentro de 60 dias.
horas (0,15mg/kg/dose) por dois dias devendo ser iniciada 15 a 20 A escolha para ambas as situações é a rifampicina, empregada de
minutos antes da primeira dose do antimicrobiano. Atualmente, acordo com a Tabela 52.5.
devido à raridade das meningites causadas por Haemophilus in- Outros fármacos alternativos para quimioprofilaxia são:
fluenzae tipo b, principalmente em países desenvolvidos, fica difí- Ceftriaxona: dose única, 250 mg IM (adultos).
cil justificar seu emprego empírico. Recente metanálise, ao avaliar Dose única, 125 mg IM (< 12 anos).
360 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Ciprofloxacino: dose única, 500 mg VO (> 18 anos). O diagnóstico se baseia no LCS, que apresenta pleiocitose moderada
Rifampicina e ciprofloxacina não devem ser utilizadas em gestantes. com média de 100 a 500 células/mm³, com predomínio de linfomononu-
cleares. No início do quadro, pode haver predomínio de neutrófilos, porém
em aproximadamente 12 a 24 horas ocorre a mudança para o predomínio
TABELA 52.5 ■ Emprego da rifampicina nos contatos de meningite linfomononuclear. A proteína e a glicose liquóricas geralmente estão nor-
mais, a bacterioscopia e a cultura são negativas. Em infecções por ente-
Idade do comunicante Meningococo – Hemófilos – durante 4 dias
rovírus são descritos casos com ausência de pleiocitose, principalmente
durante 2 dias
em neonatos, ou quando o LCS foi coletado nas primeiras 24 horas do
Adultos* 600 mg a cada 600 mg/dia – dose única início dos sintomas. Atualmente o diagnóstico etiológico é realizado atra-
12 horas vés do RT-PCR, que apresenta alta sensibilidade (maior do que a cultura) e
é altamente específico. Com o resultado mais precoce através do RT-PCR,
Crianças 10 mg/kg/dose 20 mg/kg/dia – dose única
evitam-se investigações desnecessárias, diminui-se o uso de antimicrobia-
(1mês a 12 anos)** de 12/12 horas
nos e abrevia-se a permanência hospitalar.
Menores de 1 mês 5 mg/kg/dose de 10 mg/kg/dia – dose única O tratamento da meningite viral é sintomático. Em geral, a criança
12/12 horas melhora após a punção liquórica devido ao alívio da PIC. Nesse caso, pode
ser dada a alta hospitalar, com a devida orientação dos pais quanto à
*Dose máxima: 1.200 mg/dia.
evolução do quadro.
**Dose máxima: 600 mg/dia.
REVISÃO
ATENÇÃO!
O maior coeficiente de incidência da meningite bacteriana no nosso
Pacientes tratados com ceftriaxona têm erradicação de meningococo meio é encontrado em crianças menores de 5 anos.
e hemófilos em orofaringe; quando tratados com outros fármacos, de- A epidemiologia da meningite bacteriana na criança vem se mo-
vem receber rifampicina ao final do tratamento. dificando após a inclusão de novas vacinas contra seus agentes
etiológicos.
A doença tem evolução aguda, e aproximadamente um terço dos
pacientes pediátricos, principalmente os de baixa idade, não apre-
■■ MENINGITE NÃO PURULENTA
sentam quadro clínico típico como nos adultos.
É o processo inflamatório das meninges devido a diversos fatores etiológi- O diagnóstico deve ser precoce. Na suspeita de meningite, deve-se
cos, geralmente com evolução autolimitada. Às vezes, resulta em doença proceder a punção liquórica para confirmação diagnóstica.
progressiva e grave. O tratamento deve ser rapidamente iniciado com administração do
Vírus, algumas bactérias (M. tuberculosis, B. henselae, Brucella sp., antimicrobiano de forma empírica, com base na epidemiologia lo-
Leptospira sp.), parasitas, Rickettsias, Mycoplasma, Chlamydia, Ureaplas- cal, na faixa etária do paciente, na presença de fatores de risco ou
ma, fungos, doenças malignas, doenças imunológicas, doenças autoinfla- doença de base, podendo ser modificado quando o agente etioló-
matórias, medicações, miscelânea podem ser a etiologia de meningite não gico é identificado.
purulenta. A maioria dos casos de meningite não purulenta são causadas
pelos enterovírus e parechovírus, este último recentemente reconhecido
como causa de sintomas que vão desde leve diarreia até meningite e ■■ REFERÊNCIAS
sepse, particularmente entre lactentes e crianças de baixa idade.
1. Governo do Estado de São Paulo. Secretaria da Saúde. Centro de Vigilância
Em regiões de clima temperado, as enteroviroses costumam ocorrer
Epidemiológica Prof. Alexandre Vranjac [Internet]. São Paulo: CEV; 2015
no verão e outono, lactentes apresentam maior susceptibilidade, a trans- [capturado em 25 set. 2016]. Disponível em: http://www.saude.sp.gov.br/
missão é direta de pessoa a pessoa (fecal-oral, oral-oral e respiratória) cve-centro-de-vigilancia-epidemiologica-prof.-alexandre-vranjac/.
e o período de incubação em geral é de 4 a 6 dias. Além de meningite, 2. Brouwer MC, McIntyre P, Prasad K, van de Beek D. Corticosteroids for acute
outras manifestações do enterovírus incluem febre sem foco aparente em bacterial meningitis. Cochrane Database Syst Rev. 2015;(9):CD004405.
lactentes jovens, quadros respiratórios, gastrenterites, faringite, exante- 3. Karageorgopoulos DE, Valkimadi PE, Kapaskelis A, Rafailidis PI, Falagas ME.
ma e “síndrome mão-pé-boca”. Os seguintes enterovírus são associados Short versus long duration of antibiotic therapy for bacterial meningitis: a
à meningite não purulenta: pólio 1 a 3, coxsakie A 1 a 14, 16 a 18, 21, 22 meta-analysis of randomised controlled trials in children. Arch Dis Child.
e 24; coxsakie B 1 a 6; echovírus 1 a 9, 11 a 21, 24 a 27, 29 a 33, enteroví- 2009;94(8):607-14.
rus 71 e parechovírus 1 e 2. Outros vírus implicados são arbovírus, vírus
do sarampo, caxumba, vírus da imunodeficiência humana, adenovírus, ■■ LEITURAS SUGERIDAS
herpes simples 1 e 2, varicela-zóster, vírus Epstein Barr (EBV), citomega-
Bosis S, Mayer A, Esposito S. Meningococcal disease in childhood: epidemiology,
lovírus (CMV).
clinical features and prevention. J Prev Med Hyg. 2015;56(3):E121-4.
Nas meningites virais, geralmente, o início é agudo, com febre alta. Feigin RD, Cherry JD, Demmler-Harrison GJ, Kaplan SL, editors. Feigin and
As crianças maiores apresentam-se prostradas, com cefaleia, dor retro- Cherry’s textbook of pediatric infectious diseases. 6th ed. Philadelphia:
-orbitária ou frontal e fotofobia. Anorexia e vômitos são comuns, e os si- Saunders; 2009. p. 439-65, 494.
nais meníngeos geralmente estão presentes. Os lactentes apresentam-se Swanson D. Meningitis. Pediatr Rev. 2015;36(12):514-24.
irritados e com a fontanela tensa. O quadro é semelhante à meningite bac- van de Beek D, Brouwer MC, Thwaites GE, Tunkel AR. Advances in treatment of
teriana, porém o paciente não evolui para o choque e nem para o coma. bacterial meningitis. Lancet. 2012;380(9854):1693-702.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 361
febril; 2) pode ser considerada em lactentes e crianças com infecção uriná- 2. Subcommittee on Urinary Tract Infection, Steering Committee on Quality
ria recorrente; e 3) não deverá ser prescrita em lactentes e crianças com Improvement and Management. Urinary tract infection: clinical practice
bacteriúria assintomática. guideline for diagnosis and management of the initial UTI in febrile infants
Estudo de metanálise de dados individuais em crianças de 2 a 24 me- and children e to 24 months. Pediatrics. 2011;128(3):595-610.
3. Sillen U, Brandström P, Jodal U, Holmdahl G, Sandin A, Sjöberg I, et al. The
ses de idade sem e com refluxo vesicoureteral de graus I a IV não detectou
Swedish reflux trial in children: v. Bladder dysfunction. J Urol 2010;184(1):
efeito benéfico da profilaxia com antibióticos na prevenção da recorrência
298-304.
da infecção urinária.2 4. National Institute for Health and Clinical Excellence. Urinary tract infection
O estudo de intervenção randomizado para crianças com refluxo ve- in children (CG54) [Internet]. London: NICE; 2007 [capturado em 2 set.
5
sicoureteral – RIVUR, duplo-cego, incluiu dois grupos: 305 e 302 crianças 2016]. Disponível em: http://www.nice.org.uk/CG54.
em placebo e profilaxia (sulfametoxazol-trimetoprim), respectivamente, 5. Cara-Fuentes G, Gupta N, Garin EH. The RIVUR study: a review of its
identificou que a profilaxia antimicrobiana reduz o risco de ITU recorrente, findings. Pediatr Nephrol. 2015;30(5):703-6.
mas não evita a formação de novas cicatrizes renais. As crianças apresen-
tavam idade de 2 a 72 meses, sendo 66% com idade inferior a 2 anos.
■■ LEITURAS SUGERIDAS
Todos os pacientes eram diagnosticados com RVU grau I-IV após primeiro
Bensman A, Dunand O, Ulinski T. Urinary tract infection. In: Avner ED, Harmon WE,
ou segundo episódio de ITU febril. Uma das principais preocupações so-
Niadet P, Yoshikawa N, editors. Pediatric nephrology. 6th ed. Heidelberg:
bre o uso de profilaxia antibiótica de longo prazo é o desenvolvimento
Springer; 2009. p. 1299-310.
de agentes patógenos resistentes. O estudo RIVUR5 encontrou uma maior Willians G, Graig JC. Diagnosis and management of urinary tract infections.
incidência de ITU causada por patógenos resistentes em pacientes em pro- In: Geary DF, Schaefer F, editors. Comprehensive pediatric nephrology.
filaxia quando comparado aos que receberam placebo. Assim. O estudo Philadelphia: Elsevier; 2008. p. 539-48.
5 1
RIVUR apoia a recomendação da American Academy of Pediatric de que Guidoni EBM, Toporovski J. Infecções do trato urinário. In: Andrade MC,
o uso de profilaxia com antibióticos após a primeira infecção urinária febril Carvalhaes JTA, editores. Nefrologia para pediatras. São Paulo: Atheneu;
em crianças de 2 a 24 meses não deve ser rotineira. 2010. p. 393-405.
O estudo enfatizou ainda que a pielonefrite aguda e o dano renal po-
dem ocorrer sem a presença de RVU; dessa forma, existe um papel para a
quimioprofilaxia urinária no seguimento de pacientes selecionados, parti-
cularmente naqueles que apresentam episódios recorrentes de pielonefrite
aguda, independente da presença ou ausência de RVU. Nesse sentido, o uso 54
ou não de profilaxia com antimicrobianos na infecção urinária na criança
deverá ser cuidadosa e individual, com base na experiência do pediatra. INFECÇÃO
DE REPETIÇÃO
■■ PROGNÓSTICO
Infecção urinária recorrente é um fator de risco para formação de cicatrizes
renais.
■■ BEATRIZ TAVARES COSTA-CARVALHO
A pielonefrite crônica representa 5 a 10% das causas de insuficiência
renal crônica na infância, e 6 a 13% das crianças com cicatrizes renais ■■ MARIA ISABEL DE MORAES-PINTO
desenvolveram hipertensão arterial sistêmica. Entre crianças menores de
6 anos, o risco de recorrência de ITU é maior naquelas de raça branca, de
idade entre 3 e 5 anos e nas com RVU graus IV a V. Os pais de lactentes e Ao nascimento, o sistema imunológico está imaturo, o que faz o recém-
crianças que receberam tratamento para infecção urinária febril e de crian- nascido e os lactentes jovens serem bastante vulneráveis a infecções.
ças com disfunção intestinal e vesical deverão ser instruídos para imediata Por isso, estas são um dos maiores motivos de consultas a pediatras nos
avaliação de subsequente doença febril, para assegurar rápido reconheci- primeiros anos de vida. Na medida em que a criança cresce, o número
mento e tratamento de infecção urinária recorrente. de processos infecciosos diminui, em decorrência do amadurecimento do
sistema imunológico.
Por sua vez, fatores relacionados ao meio ambiente – exposição à
REVISÃO fumaça de cigarro, presença de irmãos mais velhos na família, frequência
ITU é diagnóstico frequente na faixa etária pediátrica. a creches e hábitos alimentares que induzem a deficiência de vitaminas e
No lactente, pode se apresentar como febre sem foco aparente. oligoelementos – estão associados a maior frequência de infecções das
O diagnóstico de certeza é sempre laboratorial pela urina I e urocul- vias aéreas superiores (IVAS). Além disso, infecção pelo HIV, alterações
tura em amostra de urina coletada adequadamente. anatômicas e presença de corpo estranho em árvore respiratória também
Deve ser realizado controle de recidiva de ITU (48 horas de febre). podem estar associados a infecções.
É necessário seguir um protocolo de investigação por imagem do Entre os fatores de risco para infecção de repetição, neste capítulo,
trato urinário nas crianças com ITU. pretende-se dar mais ênfase aos relacionados a defeitos primários do fun-
cionamento do sistema imunológico.
A imunidade humoral, mediada pelos linfócitos B, é representada pe-
■■ REFERÊNCIAS las imunoglobulinas, fundamentais na defesa contra bactérias extracelu-
1. American Academy of Pediatrics, Committee on Quality Improvement, lares. O recém-nascido apresenta níveis de imunoglobulina G (IgG) seme-
Subcommittee on Urinary Tract Infection. Practice parameter: the diagnosis, lhantes aos de um adulto saudável, devido à passagem transplacentária
treatment, and evaluation of the initial urinary tract infection in febrile dessa Ig durante a gestação. Os anticorpos transferidos representam a
infants and young children. Pediatrics. 1999;103(4):843-52. experiência imunológica materna adquirida com antígenos selvagens e va-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 365
precoce da vida. A síndrome do IPEX (immune dysregulation, polyendocri- O Quadro 54.5 resume as características das imunodeficiências pri-
nopathy, enteropathy, X-linked) é muito grave, com evolução fatal se não márias.
for tratada de forma agressiva e precoce. Em estágios iniciais, a criança
apresenta diferentes manifestações autoimunes, que acometem pâncreas,
tiroide, etc., associadas ao quadro diarreico, a alterações cutâneas e a ga- QUADRO 54.2 ■ Exames laboratoriais de rastreamento para
nho ponderoestatural insuficiente. A causa dessa doença é uma alteração investigação de imunodeficiência primária
na produção das células T regulatórias, de forma que o indivíduo produz
1 | Hemograma
autoanticorpos dirigidos a vários órgãos.
2 | Imunoglobulinas séricas
O exame físico fornece dados que muitas vezes direcionam ou quase
3 | CH50
confirmam o diagnóstico. Isso é particularmente comum quando há as-
4 | Teste de DHR
sociação com uma síndrome genética, como a presença de telangiecta-
sias na ataxia-telangiectasia, albinismo parcial na síndrome de Chediak- DHR: di-hidrorrodamina.
-Higashi, baixa estatura na hipoplasia cartilagem-cabelo, etc. A ausência
ou hipodesenvolvimento de órgãos linfoides, como tonsilas e linfonodos,
é observada nas deficiências graves de anticorpos e de linfócitos T. Entre- QUADRO 54.3 ■ Exames laboratoriais para avaliação de
tanto, um exame físico normal não afasta a suspeita de imunodeficiência deficiências predominantemente humorais
primária.
1 | Imunoglobulinas séricas
AVALIAÇÃO LABORATORIAL 2 | Produção de anticorpos para antígenos proteicos: sarampo, pólio,
Os achados da anamnese e do exame físico direcionam para o tipo de rubéola, tétano
imunodeficiência primária e para os exames laboratoriais a serem so- 3 | Produção de anticorpos para antígenos polissacarídicos (pneumococo)
após imunização:
licitados para a confirmação diagnóstica. Os exames devem ser cuida-
4 | Dosagem de iso-hemaglutininas
dosamente analisados, e os valores de normalidade, comparados com
5 | Quantificação de linfócitos B (CD19)
controles de mesma idade. O diagnóstico de algumas imunodeficiências
pode ser afastado, com pequeno custo, se forem utilizadas as provas
de rastreamento bem selecionadas. Um hemograma é certamente um
dos exames mais informativos e de maior relação custo/benefício. Es- QUADRO 54.4 ■ Exames para avaliação de deficiências celulares
tando a contagem de neutrófilos normal, pode-se afastar a hipótese de
neutropenias congênitas ou adquiridas e defeitos graves de adesão leu- 1 | Hemograma
2 | Quantificação de linfócitos T (CD3) e subpopulações (T CD4 e T CD8)
cocitária (neutrofilia). Número de linfócitos normal para a idade exclui
3 | Quantificação de células NK (CD3-/CD16+/56+)
a imunodeficiência grave combinada e os defeitos graves de células T.
4 | Cultura de linfócitos com mitógenos
É importante ter em mente que o número de linfócitos no primeiro ano
de vida é mais que o dobro do que se tem na idade adulta. A plaqueto-
penia com plaquetas de tamanho pequeno é característico da síndrome ■■ TRATAMENTO
de Wiskott-Aldrich.
Para todo e qualquer imunodeficiente, recomendações de ordem geral são
muito eficazes, como higiene corporal e bucal, evitar contato com pessoas
ATENÇÃO! doentes, evitar aglomerações, instituir cuidados na alimentação e evitar
vacinas de agentes vivos.
É importante salientar que nos primeiros anos de vida, o número de Além disso, cada imunodeficiência tem tratamento específico, que
3
linfócitos é elevado (cerca de 4.000/mm ) quando comparado ao do deve ser introduzido.
adulto. Por isso, a comparação dos resultados do paciente com os va- O prognóstico, na maioria dos casos, é bom se a imunodeficiência for
lores de normalidade para a idade faz-se sempre necessária. diagnosticada precocemente e se o paciente não apresentar sequelas por
ocasião do diagnóstico.
Idade de início Precoce: 2-6 meses Precoce, após os anticorpos Precoce Qualquer idade
maternos serem catabolizados:
5-12 meses, final da infância
ou adulto
Patógenos mais frequentes Micobactérias, pseudomonas, S. pneumoniae, H. S. aureus, Pseudomonas, Neisseria, E. coli
CMV, EBV, varicela, influenzae tipo b, S. aureus, Serratia, Klebsiella, cândida,
enterovírus, cândida, Campylobacter, enterovírus, Nocardia, Aspergillus
P. jiroveci Giardia, Criptosporidium
Órgãos mais afetados Crescimento inadequado, Infecções sinopulmonares, Celulite, abscessos, adenite, Meningite, artrite,
diarreia, candidíase sintomas gastrintestinais, periodontite, osteomielite septicemia, infecções
síndrome de má-absorção, sinopulmonares
artrites, meningoencefalite
Características especiais Doença do enxerto versus Autoimunidade, linfoma, Retardo na queda do coto Vasculites, LES,
hospedeiro causada pelas timoma, paralisia pela vacina umbilical, dificuldade de dermatomiosite,
células maternas, ou da poliomielite cicatrização glomerulonefrite,
transfusão de sangue não angioedema
irradiado, evento adverso à
BCG, tetania hipocalcêmica
CMV: citomegalovírus; EBV: vírus Epstein-Barr; LES: lúpus eritematoso sistêmico.
Fonte: Adaptado de Woroniecka e Ballow.2
Maculopapular Vírus: sarampo, rubéola, exantema súbito, eritema infeccioso, EBV, CMV, enterovírus (coxsackie A e B, ecovírus), adenovírus, rinovírus,
arbovírus, dengue, caxumba, HIV
Bactérias: escarlatina, listeriose, Ieptospirose, febre tifoide, síndrome de choque tóxico estatilocócico, sífilis, doença de Lyme,
hanseníase, bartonelose, Iegionelose, doença da mordida do rato, septicemia bacteriana (meningococo, pneumococo, H. influenzae),
endocardite bacteriana, doença da arranhadura do gato, brucelose, Arcanobacterium haemolyticum
Riquétsias: febre maculosa
Fungos: candidíase sistêmica, criptococose, histoplasmose, coccidioidomicose
Outros: doença de Kawasaki, toxoplasmose, psitacose, Mycoplasma pneumoniae, malária
Petequial ou Vírus: sarampo atípico, rubéola congênita, CMV, dengue, enterovírus (coxsackie A e B, ecovírus), EBV, adenovírus, febres hemorrágicas
purpúrico virais (hantavírus), febre amarela, parvovírus B-19
Bactérias: septicemias bacterianas (meningococo, gonococo, pneumococo, L. monocytogenes, H. influenzae, estreptococo,
estafilococo), endocardite bacteriana, febre tifoide, escarlatina, sífilis, febre purpúrica brasileira, endocardite bacteriana
Nodular ou Bactérias: nocardiose, tuberculose cutânea, difteria cutânea, micobacteriose atípica, endocardite bacteriana
ulceroso Fungos: candidíase sistêmica, histoplasmose, esporotricose, blastomicose, coccidioidomicose
Outros: psitacose
gococcemia, riquetsioses, doença causada por micoplasma, entre outras. didas profiláticas e terapêuticas apropriadas para proteger o paciente, sua
A prevalência das doenças exantemáticas é variável em relação ao tempo família e a comunidade. Assim, na avaliação inicial de um paciente com
e à região geográfica, dependente de variações sazonais, ocorrência de doença exantemática, o pediatra deve considerar, além da sazonalidade
epidemias e utilização de medidas profiláticas, particularmente as vacinas. e da ocorrência das doenças na região geográfica considerada, todos os
Para suspeitar de determinada doença exantemática, o médico pre- seguintes aspectos: anamnese (incluindo vacinação prévia, viagens recen-
cisa estar atento aos agentes etiológicos prevalentes em determinado tes e contato com doentes); características do exantema; sinais e sintomas
momento e região. No Brasil, algumas doenças exantemáticas estão sob que precedem ou acompanham o exantema; sinais característicos e/ou
controle, em virtude da vacinação eficaz (sarampo e rubéola), mas a den- patognomônicos; e exames laboratoriais (Figura 55.1).
gue, em virtude da disseminação do mosquito transmissor, deve ser consi- Na anamnese, deve-se levar em conta a faixa etária, pois algumas
derada um diagnóstico deferencial importante das doenças exantemáticas doenças ocorrem com mais frequência em lactentes (exantema súbito e
em quase todo o país atualmente. enteroviroses) ou pré-escolares e escolares (sarampo, eritema infeccioso,
escarlatina, febre maculosa, síndrome de Kawasaki, enteroviroses e exan-
■■ QUADRO CLÍNICO tema laterotorácico unilateral ou periflexural assimétrico). Outras, entre-
tanto, ocorrem mais em adolescentes e adultos jovens (rubéola, sarampo
A apresentação do exantema pode ser similar em várias infecções e agen-
modificado, Mycoplasma pneumoniae, leptospirose, síndrome luva-meia
tes infecciosos (Quadro 55.2). Algumas doenças têm apresentação bas-
papular-purpúrica, sífilis secundária e mononucleose infecciosa).
tante característica (como o sarampo clássico, a varicela, a escarlatina), o
O exame físico deve ser realizado com o paciente totalmente despido,
que permite um diagnóstico clínico razoavelmente fácil para profissionais
de preferência sob a luz natural, permitindo boa avaliação dos aspectos
experientes. Com frequência, entretanto, mesmo a experiência clínica e a
morfológicos, topográficos e evolutivos do exantema, bem como a presen-
utilização de todos os dados disponíveis (história epidemiológica de con-
ça de sinais diagnósticos ou patognomônicos. A presença de prostração,
tato com doentes ou animais, aspecto e distribuição do exantema, sinais
febre elevada e comprometimento do estado geral na vigência de exante-
e sintomas que precedem ou acompanham as lesões de pele) não são su-
ma maculopapular pode sugerir o diagnóstico de sarampo, ao passo que
ficientes para fazer o diagnóstico, definindo-se a etiologia do exantema
a manutenção do estado geral aponta para rubéola e exantema súbito.
tardiamente, por meio de testes sorológicos.
Pacientes toxemiados, com má perfusão periférica ou choque, exigem que
se afaste o diagnóstico de dengue hemorrágica e septicemia bacteriana
■■ DIAGNÓSTICO (particularmente a meningococcemia).
A maioria das doenças exantemáticas tem etiologia viral, evolução be- Alguns sinais clínicos, associados ao exantema, podem ser úteis para
nigna e não requer tratamento específico; portanto, um diagnóstico sin- pensar na suspeita diagnóstica:
drômico de doença exantemática seguido de terapêutica sintomática manifestações catarrais (rinorreia, tosse e conjuntivite) sugerem
não acarreta prejuízos ao paciente. Outras denças, entretanto, podem ter sarampo;
evolução mais grave, exigindo diagnóstico rápido e preciso, além de me- adenomegalia retroauricular e suboccipital sugerem rubéola;
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 369
QUADRO 55.2 ■ Doenças exantemáticas – segundo faixa etária, pródromos, exantema e sinais característicos
FAIXA ETÁRIA
DOENÇA MAIS ACOMETIDA PRÓDROMOS EXANTEMA SINAIS CARACTERÍSTICOS
Rubéola Escolar, Febre baixa e Maculopapular, centrífugo, não Linfonodos cervicais posteriores
adolescente, adenomegalia ausente ou conflui, não descama aumentados (sinal de Theodor),
adulto jovem discreta em crianças petéquias no palato (manchas de
Forscheimer)
Artralgia
Exantema súbito 6 meses-3 anos Febre alta, irritabilidade, Maculopapular fugaz Não tem
convulsão
Eritema infeccioso 5-12 anos Em geral ausente Maculopapular recorrente “Face esbofeteada”
Bifásico
Escarlatina Pré-escolar e Febre alta, adenomegalia, Micropapular “pele em lixa”, Amidalite purulenta, língua em
escolar dor de garganta descamação lamelar framboesa, sinal de Pastia e sinal
de Filatov
Dengue Qualquer 1-5 dias, dores no corpo Maculopapular, recrudescente Não tem
Petequial ou purpúrico no
segundo episódio
Doença de Kawasaki < 5 anos Conjuntivite, adenopatia Escarlatiniforme, descamação Edema de mãos e pés, alterações
cervical, febre alta lamelar das mucosas, comprometimento
articular cardíaco
Meningococcemia Pré-escolar e Em geral < 24 h febre, Petequial e purpúrico Sinais meníngeos, toxemia, choque
escolar quadro respiratório alto,
vômitos
Febre maculosa Pré-escolar e 3-4 dias febre, cefaleia, Petequial e purpúrico Picada de carrapato, exantema em
escolar mialgia palmas e plantas
Exantema associado à Adolescente Faringite exsudativa Maculopapular em tronco e Pode apresentar quadro “difteria-
faringite por Arcnobacterium extremidades símile”
haemolyticum Microvesículas em palmas e
plantas
Exantema laterotorácico 2-3 anos Febre, rinofaringite, Eczematoso ou escarlatiniforme Axilar unilateral ou em dobras
unilateral ou periflexural conjuntivite, diarreia
assimétrico
Síndrome luva-meia Adolescente Febre, aftas orais Eritematopapaular seguido de Início súbito bem delimitado em
papular-purpúrica petéquias e púrpuras mãos e pés
Varicela 5-9 anos Pode ser ausente em Papulovesicular acomete couro Polimorfismo regional, distribuição
crianças cabeludo e mucosas centrípeta, evolução em surtos
Herpes-zóster > 10 anos 2-3 dias: febre, fenômenos Papulovesicular localizado Acomete um dermátomo,
parestésicos unilateral, recorrente, hiperestesia
cutânea
Varíola Qualquer Intenso por 2-4 dias, febre Papulovesicular Isomorfismo regional acomete
alta, raquialgia palmas e plantas, distribuição
centrífuga
Herpes simples Qualquer 1-2 dias, febre que pode Papulovesicular, localizado Recorrente
ser ausente na repetição ou generalizado
370 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
ATENÇÃO!
Sinais e sintomas de envolvimento neurológico associados à doença ■■ LEITURAS SUGERIDAS
exantemática podem ocorrer em várias situações, mas o diagnóstico Cherry JD. Cutaneous manifestations of systemic infections. ln: Feigin RD,
diferencial mais importante nesse grupo de doenças deve ser feito en- Cherry JD, Demmler GJ, Kaplan SL, editors. Textbook of pediatric infectious
tre as infecções por enterovírus e meningococcemia. diseases. 5th ed. Philadelphia: Saunders; 2004. p. 713-37.
Garg V, Mishra K, Sarkar R. Fever with rash in a child in India. Indian J Dermatol
Venerol Leprol. 2012;78(3):251-8.
Algumas doenças exantemáticas podem apresentar sinais caracterís- Marques SR, Succi RCM. Diagnóstico diferencial das doenças exantemáticas. In:
ticos úteis para orientar o diagnóstico: as manchas de Koplik (enantema Farhat CK, Carvalho LHF, Succi RCM, editores. Infectologia pediátrica. 3. ed.
São Paulo: Atheneu; 2007. p. 239-52.
da mucosa oral) antes ou concomitantemente ao quadro do exantema no
Tonelli E, Freire LMS, Freire HBM. Diagnóstico diferencial das doenças
sarampo; adenomegalia retroauricular e suboccipital (sinal de Theodor)
exantemáticas agudas. In: Tonelli E, Freire LMS. Doenças infecciosas na
e manchas de Forscheimer (petéquias em pálato) na rubéola; amidalite infância. 2. ed. Rio de Janeiro: Medsi; 2009. p. 1837-49.
purulenta, língua em framboesa, sinal de Pastia (acentuação do exantema Weber DJ, Cohen MS, Rutala WA. The acutely ill patient with fever and rash. In:
nas dobras, no cotovelo e nos quadris) e sinal de Filatov (palidez perioral) Mandell GL, Bennet JE, Dolin R, editors. Principles and practice of infectious
na escarlatina; edema de mãos e pés, língua em framboesa na doença diseases. 6th ed. New York: Churchill Livingstone; 2005. p. 729-46.
de Kawasaki; lesões petequiais e purpúricas na meningococcemia, febre
maculosa, febre purpúrica brasileira, enteroviroses, dengue, infecções por
parvovívus B19; faringite exsudativa concomitante ao exantema na infec-
ção por Arcanobacterium haemolyticum; lesões vesiculares em mucosa
oral na varicela, na síndrome mão-pé-boca e no herpes simples; aspecto
de “face esbofetada” no eritema infeccioso. 56
COQUELUCHE
Idade, pródromos, história vacinal,
Anamnese
história epidemiológica,
cuidadosa
contato, viagens ■■ KELLY S.A. CUNEGUNDES
■■ MARIA ISABEL DE MORAES-PINTO
Duração, presença de febre,
Avaliar
manifestações (respiratórias,
pródromos
gastrintestinal, neurológica, outras)
A coqueluche ou tosse comprida é uma doença infecciosa aguda, muito
contagiosa, que acomete predominantemente o trato respiratório e se
Exame físico minucioso Tipo, progressão, caracteriza por tosse seca de curso prolongado. É uma doença imunopre-
Avaliar exantema distribuição, descamação venível e pode apresentar variações cíclicas com picos epidêmicos a cada
três ou quatro anos. Acomete mais gravemente os menores de seis meses
Manchas de Koplik, sinal de de idade, ou seja, crianças não imunizadas ou parcialmente imunizadas.
Sinais O agente causal é a Bordetella pertussis, um pequeno cocobacilo
Pastia, língua em framboesa,
característicos gram-negativo, aeróbio, imóvel, cuja forma virulenta é capsulada e apre-
adenomegalia retroauricular, etc.
senta acentuado tropismo pelo epitélio respiratório humano. A transmis-
são é respiratória e ocorre através do contato direto com gotículas de sali-
FIGURA 55.1 ■ Avaliação da criança com exantema.
va de pessoas infectadas.
Os mecanismos de patogênese ainda não foram completamente
elucidados, mas acredita-se que as manifestações clínicas resultem da
■■ TRATAMENTO complexa interação de inúmeros fatores de virulência, que podem ser di-
A conduta nas doenças exantemáticas é expectante, na maioria das vezes, vididos em adesinas e toxinas. As adesinas (hemaglutinina filamentosa,
com tratamento dos sintomas. Nas doenças exantemáticas de etiologia fímbrias, pertactina, fator de resistência à destruição bacteriana, fator de
bacteriana (escarlatina, meningococcemia), o tratamento antimicrobiano colonização traqueal) promovem a adesão da bactéria ao epitélio ciliado,
deve ser específico. facilitando a sua proliferação. As toxinas (toxina pertussis, adenilciclase,
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 371
toxina dermonecrótica e citotoxina traqueal) são responsáveis pela pa- e podem ocorrer alterações radiológicas. A mais típica, conhecida
ralisia ciliar e aumento de secreção mucosa, fatores importantes para o como “coração felpudo” ou “coração franjado”, é caracterizada por
desencadeamento dos acessos de tosse. A toxina pertussis é reconhecida hipotransparência heterogênea ao redor da silhueta cardíaca. A
como um dos principais fatores de virulência, responsável por alterações febre em geral está ausente ou é baixa, e a sua ocorrência pode
locais e sistêmicas. sugerir complicação bacteriana.
A vacina para coqueluche, combinada com os toxoides tetânico e dif- Fase de convalescença: verifica-se paulatina diminuição da fre-
térico (DTP), passou a ser amplamente utilizada em países desenvolvidos quência e da intensidade da tosse. A duração total da doença é
como medida de prevenção da doença a partir da década de 1940. No de 6 a 10 semanas, sendo por isto também conhecida como tosse
Brasil, a exemplo do observado em outros países em desenvolvimento, dos cem dias.
o uso desta vacina se acentuou no final da década de 1970. A partir da As complicações, as internações e os óbitos ocorrem mais frequente-
década de 1990, com o desenvolvimento da formulação infantil das vaci- mente em menores de seis meses de idade. Pneumonia é a complicação
nas acelulares para coqueluche, muitos países desenvolvidos passaram a mais frequente e a principal causa de óbito em pacientes com coqueluche,
adotá-la em seus calendários de imunização da infância. Observou-se um podendo-se observar também convulsão, infecção conjuntival, otite média
decréscimo significativo na morbimortalidade da doença, com drástica aguda e perda de peso.
redução do número de casos em todo o mundo. Apesar dos resultados A infecção por Bordetella pertussis em lactentes muito jovens, ado-
positivos obtidos com a vacinação, a coqueluche continua sendo uma lescentes e adultos pode ter uma apresentação menos típica, o que pode
doença grave em lactentes muito jovens, cuja imunização primária ainda prejudicar a suspeita diagnóstica e a investigação nestes casos. Em lacten-
não foi iniciada ou está incompleta. Além disto, a Organização Mundial tes muito jovens, podem ocorrer apneia e cianose sem tosse. Em crianças
de Saúde1 estima que a coqueluche seja a causa de cerca de 90.000 mor- maiores, adolescentes e adultos, o guincho inspiratório e o paroxismo mui-
tes por ano no mundo. Nas últimas duas décadas, diversos países desen- tas vezes não ocorrem. Além da idade, outros fatores podem influenciar
volvidos com programas de vacinação estabelecidos há muitas décadas as manifestações clínicas da doença, tais como: estado vacinal, episódios
e altas coberturas vacinais têm relatado aumento do número de casos anteriores da doença e coinfecções.
de coqueluche. Embora os maiores coeficientes de incidência continuem Outros agentes também podem causar a “síndrome coqueluchoide”,
ocorrendo em menores de um ano de idade, tem sido descrito aumento dificultando o diagnóstico diferencial, entre os quais Bordetella parapertus-
significativo da incidência da doença em adultos e adolescentes. Adul- sis, Mycoplasma pneumoniae, Chlamydia trachomatis, Chlamydia pneumo-
tos e adolescentes previamente vacinados na infância podem apresentar niae e Adenovírus (1, 2, 3 e 5). No Quadro 56.1, são descritos alguns diag-
apenas quadros de tosse prolongada, o que dificulta o diagnóstico da nósticos diferenciais para coqueluche de acordo com a duração da tosse.
doença nestes indivíduos. Estes indivíduos representam a principal fonte
de transmissão da doença para crianças não imunizadas ou parcialmente
imunizadas. Como as vacinas para coqueluche, tanto as de células inteiras QUADRO 56.1 ■ Diagnóstico diferencial de coqueluche de acordo
quanto as acelulares, não conferem proteção duradoura (4 a 10 anos), a com a duração da tosse
partir de 2005 foi licenciada uma formulação para adultos e adolescentes AGUDA SUBAGUDA CRÔNICA
da vacina para coqueluche combinada com os toxoides tetânico e difté- (< 3 SEMANAS) (3-8 SEMANAS) (> 8 SEMANAS)
rico (dTpa).
Diversos fatores podem estar contribuindo para esta mudança na Infecção de vias aéreas Tosse pós- Asma
epidemiologia da coqueluche: perda da imunidade adquirida após a va- superiores -infecciosa Drenagem pós-nasal
cinação, métodos diagnósticos mais sensíveis, melhora dos sistemas de Pneumonia atípica Sinusite Doença pulmonar
vigilância epidemiológica, além de mudanças genéticas na bactéria que Exacerbação de bacteriana obstrutiva crônica
poderiam comprometer a efetividade da vacina. doença pulmonar Asma Refluxo gastro-
obstrutiva crônica -esofágico
Exacerbação de Uso de inibidores de
■■ QUADRO CLÍNICO insuficiência cardíaca enzima conversora
Em geral, na primoinfecção, a doença se desenvolve em três fases: catar- congestiva de angiotensina
ral, paroxística e de convalescença. Sinusite bacteriana
Fase catarral: após um período de incubação que pode variar de 7 Rinite alérgica
Pneumonia bacteriana
a 10 dias, inicia-se a fase catarral que dura de 1 a 2 semanas, e este
Exacerbação de asma
é o período mais infectante. Caracteriza-se por uma infecção ines-
pecífica do via aérea superior (VAS), com tosse, coriza e ausência
de febre ou febre baixa.
Fase paroxística: pode durar de 2 a 6 semanas, observando-se ■■ DIAGNÓSTICO
acentuação da tosse, que se manifesta em paroxismos (crise de A coqueluche é uma doença de notificação compulsória em todo território
tosse súbita, incontrolável, rápida e curta). Durante estes acessos, nacional, e todo caso suspeito deve ser notificado por meio do Sistema
o paciente não consegue inspirar, apresenta protrusão da língua, Nacional de Agravos de Notificação (SINAN). Os casos atendidos em uni-
congestão facial, e eventualmente, cianose que pode ser seguida dades sentinelas devem ser imediatamente notificados ao serviço de vigi-
de apneia e vômitos. Os acessos de tosse são seguidos de um es- lância local, a fim de se proceder à coleta de material para investigação
forço inspiratório que pode produzir um estridor característico, o de agente etiológico.
guincho inspiratório, decorrente da passagem forçada de ar através O diagnóstico de coqueluche é complexo, não apenas pelo amplo
da glote estreitada. Além disto, podem ocorrer vômitos pós-tosse, espectro clínico da doença, mas também por limitações dos testes labora-
cianose, hemorragia conjuntival, convulsões. Nesta fase observa- toriais disponíveis. Vários fatores podem influenciar a sensibilidade destes
-se a leucocitose característica (acima de 20.000 leucócitos/mm3) testes, incluindo o estágio da doença, a administração de antimicrobianos,
372 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
vacinação prévia, tipo de técnica usada para coleta de material, condições Sorologia: nos últimos anos, o ensaio imunoenzimático (Elisa) tem
de transporte do material para laboratório, contaminação da amostra e sido o método sorológico adotado para diagnóstico de coqueluche,
uso de testes não padronizados. avaliação de resposta imune humoral após vacinação e em estudos
Como a Bordetella pertussis apresenta acentuado tropismo pelo epité- soroepidemiológicos para mensurar a prevalência de infecção pela
lio respiratório ciliado, a cultura e a reação em cadeia de polimerase (PCR) Bordetella pertussis em determinadas populações. Na prática clíni-
devem ser realizadas a partir de secreção de nasofaringe. A Figura 56.1 ca, o diagnóstico sorológico se baseia mais frequentemente na de-
ilustra a técnica de coleta deste material. monstração de títulos de anticorpos IgG anti-PT elevados em uma
Cultura: o isolamento da bactéria por meio de cultura de secre- única amostra de soro coletada a partir de 4 semanas após a data
ção de nasofaringe é considerado o padrão-ouro para diagnóstico do início da tosse, desde que o paciente não tenha sido vacinado
laboratorial de coqueluche. Entretanto, apresenta limitações, pois para coqueluche nos últimos 6 meses. Este método é particular-
necessita de meio específico e imediata inoculação no meio de cul- mente útil no diagnóstico de infecção por Bordetella pertussis em
tura após a coleta. É um método com baixa sensibilidade, porém adolescentes e adultos, pois nestes grupos a investigação diag-
com 100% de especificidade e que permite a realização de teste de nóstica em geral é mais tardia, época em que os outros métodos
sensibilidade aos antimicrobianos. A positividade é maior quando diagnósticos, como cultura e PCR, não podem mais ser realizados.
o exame é realizado na fase catarral; no entanto, a suspeita diag- Entretanto, poucos países dispõem deste método diagnóstico na
nóstica e investigação raramente são feitas nesta fase. A coleta do rotina de investigação.
material de nasofaringe pode ser realizada através de aspirado de Na Figura 56.2, os métodos diagnósticos disponíveis são demonstra-
nasofaringe ou swab pernasal profundo, pois a bactéria coloniza dos em relação à fase da doença em que apresentam maior sensibilidade.
o epitélio ciliado da VAS e da VAI. A cultura pode ser negativa em Considera-se investigação oportuna quando a coleta de material de na-
pessoas previamente imunizadas, após o início do tratamento com sofaringe é realizada até 3 dias após introdução de antibiótico específico.
antibiótico específico ou se a coleta for feita após três semanas da Resultados negativos em amostras coletadas fora do período ideal não
data do início da tosse paroxística. Considera-se coleta oportuna excluem o diagnóstico de coqueluche.
quando o material é obtido até 3 dias após o início do tratamento
antimicrobiano específico.
PCR: é um exame que vem sendo cada vez mais adotado em vários ATENÇÃO!
países, inclusive no Brasil, pois melhora a sensibilidade do diag-
Resultados negativos de cultura ou PCR em amostras de secreção de
nóstico laboratorial de coqueluche. Não é influenciado pelo uso
nasofaringe coletadas fora do período ideal não excluem o diagnóstico
prévio de antibióticos e o resultado é obtido mais rapidamente.
de coqueluche.
Entretanto, em relação à especificidade, apresenta a desvantagem
de resultados falso-positivos, pois pode detectar diferentes tipos
de Bordetellas, principalmente a B. parapertussis. A confirmação do diagnóstico de coqueluche deve atender aos se-
guintes critérios:
Definição de caso em situação endêmica e em casos isolados:
Caso suspeito:
Indivíduo com menos de 6 meses de idade:
Todo indivíduo independente do estado vacinal que apre-
sente tosse há 10 dias ou mais associado a um dos seguin-
tes sintomas: tosse paroxística; guincho inspiratório; vômi-
tos pós-tosse; cianose; apneia; engasgo.
Indivíduo com idade igual ou superior a 6 meses:
Todo indivíduo independente do estado vacinal que apre-
sente tosse de qualquer tipo há 14 dias ou mais associada a
um ou mais dos seguintes sintomas: tosse paroxística; guin-
cho inspiratório e vômitos pós-tosse.
Utilizar swab com haste flexível, ultrafina, estéril com algodão Tempo de início da tosse
alginatado na extremidade. (semanas)
Introduzir o swab na narina até encontrar resistência na parede
Início da tosse
posterior da nasofarínge. Manter o swab por cerca de 10 segundos
e em seguida retirá-lo.
Após a coleta, introduzir o swab na base do tubo de ensaio com 0 2 4 6 8 10 12
meio de transporte específico (meio de Regan-Lowe).
Cultura
O material deverá ser encaminhado ao laboratório, em temperatura
ambiente, imediatamente após a coleta. PRC
Sorologia
FIGURA 56.1 ■ Procedimento de coleta de material de nasofaringe
para investigação laboratorial de coqueluche. FIGURA 56.2 ■ Período de maior sensibilidade dos métodos
diagnósticos disponíveis para coqueluche de acordo com o tempo, em
Fonte: VPD Surveillance Manual. Pertussis, 2011. semanas, de início da tosse.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 373
PROFILAXIA PÓS-EXPOSIÇÃO
ATENÇÃO! É medida recomendada para pessoas que foram expostas a um paciente
Considerando-se que a principal fonte de transmissão da doença para com coqueluche até 21 dias após o aparecimento da tosse do caso-índice.
crianças menores são comunicantes domiciliares adultos, devem ser Os antimicrobianos usados na quimioprofilaxia são os mesmos emprega-
investigados todos os comunicantes domiciliares com tosse, sobretudo dos no tratamento (Tabela 56.1).
mães, nas quais a taxa de transmissão é maior.
INDICAÇÕES DE QUIMIOPROFILAXIA
Comunicantes íntimos menores de 1 ano de idade, independente
da situação vacinal e de apresentarem quadro de tosse.
■■ TRATAMENTO Comunicantes íntimos menores de 7 anos não vacinados, com
O tratamento antimicrobiano deve ser iniciado o mais rápido possível, situação vacinal desconhecida ou que tenham recebido menos de 4
preferencialmente na fase catarral, quando pode ser efetivo na preven- doses da vacina DTP ou DTPa.
ção de complicações e na redução da duração dos sintomas. Depois Comunicantes adultos que trabalham em profissões que envolvem
desta fase, o uso de antimicrobianos justifica-se visando à erradica- o contato direto e frequente com menores de 1 ano de idade ou
ção da Bordetella pertussis na secreção de nasofaringe e, portanto, à imunodeprimidos.
redução da transmissão do agente. A eritromicina era considerado o Comunicantes domiciliares adultos de crianças menores de 1 ano
antimicrobiano de escolha, no entanto, algumas limitações deste ma- de idade.
crolídeo, como dificuldade de adesão ao tratamento, efeitos colaterais Comunicantes íntimos que são pacientes imunodeprimidos.
ANTIMICROBIANO RECOMENDADO
ADOLESCENTES 2 g /dia, 4 doses, 500 mg no 1º dia e 250 mg/dia do 1 g/dia/2 doses, 7 dias TMP 320 mg;
E ADULTOS 14 dias 2º ao 5º dia SMX 1.600 mg/dia, 2 doses, 14 dias
*Risco de estenose hipertrófica de piloro
Fonte: American Academy of Pediatrics, 2015.
374 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
■■ PREVENÇÃO
Recomenda-se a imunização ativa para coqueluche de todas as crian-
57
ças até os sete anos de idade. Atualmente, no Brasil, a recomendação
2
INFECÇÃO
do PNI é que a vacinação para coqueluche seja feita com três doses da
vacina pentavalente (Difteria, Tétano, Bordetella pertussis de células in- PELO HIV/AIDS
teiras, Haemophilus Influenzae tipo b e Hepatite B). A formulação para
adultos desta vacina, a tríplice bacteriana acelular de adultos (dTpa),
está disponível para reforço em adolescentes e adultos, podendo subs- ■■ DAISY MARIA MACHADO
tituir uma dose da vacina dupla adulto (dT). É particularmente relevan-
■■ REGINA CÉLIA DE MENEZES SUCCI
te a vacinação de grupos específicos que têm contato com recém-nas-
cidos e lactentes jovens, a fim de diminuir a transmissão domiciliar para
crianças com maior risco de formas graves e óbitos. São considerados
O sucesso na prevenção da transmissão vertical, principal via de aquisição
grupos especiais, ou seja, prioritários para receber esta vacina: comu- do HIV em pediatria, proporcionaram significativa redução de novos casos.
nicantes domiciliares de recém-nascidos (cocoon strategy ou estratégia Após três décadas, desde os primeiros relatos da Aids, os progressos
do casulo), profissionais de saúde, profissionais de creche e gestantes. no desenvolvimento da terapia antirretroviral combinada (TARVc) propor-
cionaram a mudança de uma doença grave para uma infecção crônica e
controlável.
REVISÃO
A transmissão do HIV na criança é secundária à transmissão materno-
A coqueluche é uma doença imunoprevenível que, apesar das altas -infantil (ou vertical) em mais de 90% dos casos, podendo ocorrer durante a
coberturas vacinais, ainda é um grave problema de saúde pública. gestação, no parto ou pelo leite materno. Contudo, outros tipos de exposi-
Um aumento da incidência da doença em adolescentes e adultos tem ção (contato sexual e exposição a sangue contaminado ou seus derivados)
sido descrito em países desenvolvidos nas duas últimas décadas. também podem acontecer. Entre adolescentes e adultos, as relações sexuais
Deve-se notificar e investigar todo indivíduo que, independente- desprotegidas representam a categoria de transmissão mais frequente. O
mente da idade ou situação vacinal, apresentar tosse há pelo menos controle da transmissão vertical do vírus, no Brasil, tem sido obtido com su-
duas semanas com pelo menos um dos seguintes sintomas: guincho cesso por meio do rastreamento sorológico para o HIV (após aconselhamen-
inspiratório, vômitos pós-tosse ou paroxismo. to) oferecido a todas as gestantes, visando à profilaxia antirretroviral duran-
O tratamento com antimicrobiano específico deve ser instituído o te a gestação e no parto, associada à utilização do antirretroviral (ARV) para
mais rápido possível, preferencialmente na fase catarral ou no início o recém-nascido (RNs) e suspensão do aleitamento materno.
da fase paroxística. A partir de outubro de 1996, o Programa Nacional, hoje Departa-
Uma das principais estratégias para reduzir a mortalidade de crian- mento de DST/Aids e hepatites virais do Ministério da Saúde, adotou a
ças em faixas etárias mais vulneráveis é a vacinação de adultos que indicação da profilaxia da transmissão vertical para todas as gestantes so-
têm contato com crianças menores de 1 ano de idade, profissionais ropositivas e os RNs expostos ao HIV. Desde 2002, houve um decréscimo
de saúde, profissionais de creche e gestantes. importante dos casos de Aids por transmissão vertical, mas, nos últimos
anos, verifica-se uma estabilização em patamares insatisfatórios, em tor-
no de 750 casos novos/ano em menores de 5 anos.
■■ REFERÊNCIAS Em 2014, foram notificados 389 casos de Aids em menores de 5 anos,
sendo o maior número de casos nas regiões nordeste (125) e sudeste (105).
1. World Health Organization. Module 4: pertussis update [Internet]. Geneva:
A transmissão vertical foi a forma de exposição ao HIV em 99,5% dos me-
WHO; 2010 [capturado em 11 ago. 2016]. Disponível em: http://whqlibdoc.
who.int/publications/2010/9789241599337_eng.pdf.
nores de 13 anos. Em crianças abaixo de 5 anos, considera-se a transmis-
2. Brasil. Ministério da Saúde. Coordenação do Programa de Imunização. Guia são vertical responsável por aproximadamente 100% dos casos de Aids.*
prático de normas e procedimentos de vacinação [Internet]. Brasília: MS; O alvo do HIV, nos primeiros dias após a infecção da criança é a po-
2013 [capturado em 11 ago. 2016]. Disponível em: http://www.rio.rj.gov.br/ pulação de células TCD4+ no tecido linfoide associado ao intestino (GALT,
dlstatic/10112/3740546/4116237/guiaimunizacao_miolo_final.pdf. do inglês gut associated linfoid tissue). Há uma depleção rápida e maciça
de células TCD4+ CCR5+ no GALT e a ruptura física da barreira mucosa,
o que torna o intestino permeável, permitindo a passagem de bactérias
■■ LEITURAS SUGERIDAS intestinais e produtos bacterianos para a circulação sistêmica (translo-
American Academy of Pediatrics. Pertussis (whooping cough). In: Kimberlin cação bacteriana). Segue-se um estado de ativação imune generalizado,
DW, Brady MT, Jackson MA, Long SS, editors. Red Book 2015 report of the caracterizado por ativação de células T e B, níveis elevados de citocinas
committee on infectious diseases. 30th ed. Elk Grove Village: AAP; 2015. proinflamatórias e quimiocinas, com diminuição nas células TCD4+, por
p. 608-21. meio de três mecanismos principais:
Brasil. Ministério da Saúde. Guia de vigilância em saúde. 7. ed. Brasília: MS;
1 | efeito citopático das proteínas virais;
2014. Capítulo 2, Coqueluche; [capturado em 11 ago. 2016]; p. 87-104.
2 | morte das células infectadas por aumento da apoptose (morte celular
Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_vigilancia_
programada);
epidemiologica_7ed.pdf.
3 | morte das células infectadas por células TCD8+ citotóxicas.
Guimarães LM, Carneiro ELNC, Carvalho-Costa FA. Increasing incidence of
pertussis in Brazil: a retrospective study in surveillance data. BMC Infect A interação entre a fisiopatologia da infecção pelo HIV e os efeitos
Dis. 2015; 15:442. adversos dos medicamentos componentes da TARV trouxeram mudanças
Spector TB, Maziarz EK. Pertussis. Med Clin North Am. 2013;97(4):537-52.
World Health Organization. Pertussis vaccines: WHO position paper. Wkly *Dados epidemiológicos mais detalhados e em constante atualização, sobre adolescen-
Epidemiol Rec. 2010;85(40):385-400. tes e jovens com HIV/Aids, podem ser encontrados no endereço http://www.aids.gov.br.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 375
clínicas evidentes e desafios aos profissionais da medicina. Diversos dis- O diagnóstico laboratorial da criança abaixo de 18 meses de vida é
túrbios orgânicos e mentais, que acometem o metabolismo de lipídeos e feito da seguinte maneira:
carboidratos, a mineralização óssea, a composição corporal e as funções A primeira carga viral deve ser coletada com 4 semanas ou, prefe-
hepática e renal podem ocasionar aumento do risco de doenças dege- rencialmente, 6 semanas de vida, quando a criança recebeu profi-
nerativas, principalmente do sistema cardiovascular, inflamação crônica e laxia antirretroviral.
envelhecimento celular precoce. Em vista disso, novas rotinas de cuidado,
visando à prevenção e ao tratamento dessas condições, estão sendo incor-
ATENÇÃO!
poradas à prática clínica.
a
Caso a 1 carga viral tenha um resultado indetectável, deve ser repeti-
o a
■■ QUADRO CLÍNICO da após o 4 mês de vida. Se a 2 carga viral também for indetectável,
O espectro clínico da infecção pelo HIV na criança é muito variável, desde considera-se que a criança não está infectada.
formas totalmente assintomáticas até a apresentação completa da síndrome.
O curso clínico da Aids é mais rápido na criança em relação ao adulto, devido Os resultados são interpretados conforme algoritmo do Ministério da
à imaturidade imunológica. A infecção é assintomática no período neonatal, Saúde (Figura 57.1). Em recém-nascidos sintomáticos, a carga viral pode
e a distinção do momento em que ocorre a transmissão se baseia no período ser coletada em qualquer momento.
de vida do RN em que a infecção é detectada por método laboratorial. Para as crianças maiores de 18 meses, as Figuras 57.2 e 57.3 sinteti-
Foram descritos três padrões distintos de evolução da doença em zam as etapas do diagnóstico laboratorial. Serão consideradas “não in-
crianças, antes da disponibilidade da TARVc: fectadas” quando houver uma amostra não reagente, ao se utilizar uma
1 | Progressão rápida: ocorre em cerca de 20 a 30% das crianças não das metodologias da etapa I (rastreamento), que detecta anticorpos anti-
o
tratadas que evoluem com quadros graves no 1 ano de vida, sendo possí- -HIV-1, incluindo o tipo O, e anticorpos anti-HIV-2. Persistindo a suspeita
vel a morte antes dos 4 anos. No início do quadro, os sinais e os sintomas de infecção, uma nova amostra deve ser coletada após 30 dias. De modo
são inespecíficos e incluem, de forma isolada ou associada, dificuldade em geral, uma “nova amostra” é coletada após 30 dias, ao passo que a “se-
ganhar peso, adenomegalia, hepatoesplenomegalia, febre, anemia, pla- gunda amostra” é coletada o mais rápido possível.
quetopenia, diarreia prolongada, anormalidades neurológicas, candidíase Em crianças acima de 18 meses de vida, o diagnóstico também pode
oral de difícil controle e infecções bacterianas de repetição. As infecções ser realizado utilizando o fluxograma para o diagnóstico rápido da infec-
oportunistas, como pneumonia por Pneumocysitis jiroveci, micobacteriose ção pelo HIV.
atípica, candidíase oral ou sistêmica, infecções crônicas ou recorrentes por
CMV, toxoplasma, vírus varicela-zóster e herpes simples, ocorrem princi-
■■ PROFILAXIA DA TRANSMISSÃO VERTICAL DO HIV
palmente entre as crianças com imunodeficiência grave.
2 | Progressão normal: é mais lento e abrange a maioria (70 a 80%) dos QUIMIOPROFILAXIA ANTIRRETROVIRAL
casos. Nesses pacientes, o desenvolvimento dos sintomas pode se iniciar NO RECÉM-NASCIDO
na idade escolar ou na adolescência, com tempo médio de sobrevida de 9
RNs de mulheres infectadas pelo HIV devem receber profilaxia com zidovu-
a 10 anos, segundo dados prévios à disponibilidade de terapia específica.1
dina (AZT), de preferência imediatamente após o nascimento (nas primei-
3 | Progressão lenta: ocorre em uma porcentagem pequena (< 5%) das
ras 4 horas de vida), e a indicação da associação com a nevirapina (NVP),
crianças infectadas no período perinatal. As crianças apresentam progres-
+ com início nas primeiras 48 horas de vida, deve ser avaliada conforme
são mínima ou nula da doença com contagem normal de LT-CD4 .
as situações de exposição (Tabela 57.1). Não há estudos que comprovem
benefício do início da quimioprofilaxia após 48 horas do nascimento – a
■■ DIAGNÓSTICO indicação da quimioprofilaxia após esse período deve ser discutida caso a
A passagem transplacentária de anticorpos maternos do tipo imunoglobu- caso, preferencialmente com o especialista.
o
lina G (IgG) anti-HIV, principalmente no 3 trimestre de gestação, interfere Quando a criança não tiver condições de receber o medicamento por
no diagnóstico da infecção vertical, uma vez que esses anticorpos podem VO ou sonda enteral, o AZT injetável pode ser utilizado. Nesse caso, não
persistir até os 18 meses de idade. Por isso, a detecção de anticorpos anti- se associa a nevirapina, mesmo quando indicada, pois só está disponível
-HIV não é suficiente para o diagnóstico em crianças menores de 18 me- em apresentação oral.
ses de idade, sendo necessária a realização de testes virológicos, como a
quantificação do RNA viral (carga viral), disponibilizado pelo Ministério da TRATAMENTO ANTIRRETROVIRAL
Saúde. A carga viral é um teste quantitativo, permitindo a quantificação O tratamento antirretroviral de crianças e adolescentes tem como objeti-
de partículas virais dos subtipos do HIV circulantes no país. vos principais:
reduzir a morbimortalidade e melhorar a qualidade de vida;
propiciar crescimento e desenvolvimento adequados;
ATENÇÃO! preservar, melhorar ou reconstituir o funcionamento do sistema
Se a carga viral for detectável nas primeiras 48 horas de vida, houve imunológico, reduzindo a ocorrência de complicações infecciosas
infecção intraútero. A transmissão no momento do parto é caracte- e não infecciosas;
rizada quando, após um resultado indetectável da carga viral (< 50 proporcionar supressão máxima e prolongada da replicação do
cópias/mL) na 1a semana de vida, segue-se o encontro do vírus em HIV, reduzindo o risco de resistência aos ARVs.
exame realizado entre 7 e 90 dias de vida, em RNs não amamentados. Nos últimos anos, uma série de evidências determinaram mudanças
No entanto, essa distinção não é feita rotineiramente, uma vez que a na TARV, com consequente publicação de novas recomendações pela Or-
recomendação do Ministério da Saúde é de que os serviços solicitem a ganização Mundial da Saúde (OMS), em 2015. Passou-se a recomendar a
1a medida da carga viral após 30 dias de vida. TARV para todas as crianças e adolescentes infectadas pelo HIV, indepen-
dentemente da sintomatologia clínica, da classificação imunológica ou da
376 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
SITUAÇÃO 1 SITUAÇÃO 2
CV DETECTÁVEL NO 1o TESTE CV ABAIXO DO LIMITE DE DETECÇÃO NO 1o TESTE
Criança infectada Repetir após 4 meses Repetir o teste com Criança provavelmente
de idade (3º teste) nova amostra** (3º teste) não infectada
FIGURA 57.1 ■ Algoritmos de testes para quantificação de RNA viral – carga viral em crianças entre 1 e 18 meses.
*Este algoritmo foi elaborado para o uso de testes de quantificação do RNA viral plasmático – carga viral. Valores até 5.000 cópias/mL sugerem resultados falso-positivos e
devem ser cuidadosamente analisados dentro do contexto clínico, demandando nova determinação assim que possível.
**Para garantir a qualidade dos procedimentos e considerando a possibilidade de contaminação e/ou troca de amostra, bem como a necessidade de confirmação do resultado
obtido, recomendam-se a coleta de nova amostra e a priorização da repetição do teste no menor espaço de tempo possível.
***Manter o acompanhamento clínico nas crianças consideradas como provavelmente não infectadas, de acordo com as recomendações estabelecidas e fazer sorologia anti-
-HIV naquelas com mais de 12 meses.
Fonte: Brasil.1
carga viral. Apesar da recomendação ser o tratamento para todas as fai- crianças experimenta uma excelente resposta terapêutica, com ganho de
xas etárias, há variações nos graus de evidências de acordo com algumas peso e recuperação do crescimento e desenvolvimento.
situações (Quadro 57.1). É importante estar atento para a ocorrência da síndrome inflamató-
Atualmente, a maioria das crianças com aquisição vertical da infecção ria da reconstituição imune (SIR), que surge em pacientes com infecção
pelo HIV tem histórico de exposição aos antirretrovirais na vida intrauteri- pelo HIV que iniciaram a TARV. Resulta do processo de recuperação da
na, perinatal e/ou pós-natal. Assim, recomenda-se que, antes do início da imunidade, tanto para agentes infecciosos específicos como para antí-
TARV em crianças, seja sempre solicitado o teste de genotipagem do HIV, genos não infecciosos, mas sua etiopatogenia ainda não foi totalmente
para detecção de resistência transmitida. esclarecida.
a
Os esquemas preferenciais (Quadro 57.2) para o início da TARV são A SIR pode apresentar-se clinicamente de duas formas: a 1 , chama-
regimes compostos por dois inibidores da transcriptase reversa análogos da de SIR desmascarada, caracteriza-se por infecção oportunista oculta
a
de nucleosídeos (ITRN), associados a um inibidor da transcriptase reversa e subclínica e com patógeno geralmente detectável. A 2 , SIR paradoxal,
não análogo de nucleosídeo (ITRNN) ou a um inibidor de protease (IP). A caracteriza-se por recrudescência ou relapso de infecção tratada com su-
recomendação desses esquemas está sendo revista, com a possibilidade cesso anteriormente e marcada ativação imune induzida por antígeno com
de inibidores da integrase (raltegravir e dolutegravir) comporem, em bre- nenhum ou poucos patógenos detectáveis.
ve, os esquemas de primeira linha. Nos esquemas com ITRNN, a maior Na forma desmascarada, o diagnóstico e o tratamento da infecção
vantagem é o menor risco de dislipidemia e lipodistrofia, ao passo que a oportunista que se apresenta inicialmente de forma oculta e depois subclí-
de esquemas com IP/r é a maior barreira genética, que implica menor risco nica são o recomendado e isso é suficiente. Na forma paradoxal, o manejo
de desenvolvimento de resistência. Como essas recomendações sofrem deve basear-se em medidas anti-inflamatórias e específicas (p. ex.: anti-
constantes atualizações, recomenda-se o acesso frequente à página do bioticoterapia na ocorrência de infecções bacterianas). Esse quadro não
Ministério da Saúde para dados atualizados. deve ser considerado falha terapêutica clínica, uma vez que faz parte do
Após o início da TARV e da supressão máxima da replicação viral, a processo de reconstituição imunológica imediata, com duração média de
recuperação imune ocorre, geralmente, de maneira rápida, e a maioria das 4 a 12 semanas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 377
Coletar 2a amostra –
Realizar apenas etapa 1
FIGURA 57.2 ■ Fluxograma das etapas do diagnóstico laboratorial para crianças maiores de 18 meses.
Fonte: Brasil.1
carga viral > 200 cópias/mL de RNA do HIV após seis meses de A falha imunológica pode ocorrer como uma resposta imunológica
tratamento. incompleta à terapia antirretroviral ou uma deterioração imunológica du-
2 | Rebote virológico rante a terapia:
quando, após a resposta ao tratamento com carga viral indetectá- 1 | Resposta imunológica incompleta
vel, ocorre detecção repetida de RNA do HIV no plasma; quando não se consegue um aumento ≥ 5% do percentual de
os chamados “blips”, ou seja, episódios isolados de detecção de LT-CD4+ basal em pacientes menores de 5 anos com imunossu-
cargas virais baixas (< 1.000 cópias/mL), seguidos de indetecção, pressão grave (LT-CD4+ < 15%) após 12 meses de tratamento; ou
são, em geral, comuns e não refletem necessariamente falha vi- aumento de 50 células/mm3 em maiores de 5 anos com imunossu-
rológica. pressão grave (LT-CD4+ < 200 células/mm3).
TABELA 57.1 ■ Indicações de profilaxia para o neonato de acordo com a terapia antirretroviral de uso da mãe
Uso de TARVc no pré-natal e periparto, com carga viral < 1.000 cp/mL AZT (VO) 4 mg/kg/dose, de 12/12 h 4 semanas
no 3otrimestre (neonatos com 35 semanas de
gestação ou mais)
Não utilização de terapia TARVc durante a gestação, independente do AZT (VO) 4 mg/kg/dose, de 12/12 h 4 semanas
a
uso de AZT periparto + Peso de nascimento 1,5 a 2 kg: 1 dose: primeiras 48 h
Uso de TARVc na gestação, mas carga viral desconhecida ou maior ou NVP (VO) 8 mg/dose (0,8 mL) de vida
o a a
igual a 1.000 cópias/mL no 3 trimestre Peso de nascimento > 2 kg: 2 dose: 48 h após 1 dose
a a
12 mg/dose (1,2 mL) 3 dose: 96 h após 2 dose
1
Fonte: Brasil.
< 12 meses Independentemente da sintomatologia clínica, da Tratamento imediatoa (AI em crianças ≥ 6 semanas a ≤ 12 meses;
classificação imunológica ou da carga viral AII nos casos restantes)
Crianças ≥ 2 anos a <3 anos Dois ITRN + LPV/r A solicitação do teste de genotipagem é importante já na primeira
Dois ITRN + RALb falha, pois orienta escolhas de esquemas de resgate mais efetivos, evita
Crianças ≥ 3 anos a <12 anos Dois ITRN + ATZ/r trocas desnecessárias, propiciando o uso de fármacos ativos por períodos
Dois ITRN + DRV/r 12/12h mais prolongados, bem como evita a toxicidade por fármacos inativos.
Dois ITRN + EFV A probabilidade de alcançar e manter uma carga viral indetectável de-
Dois ITRN + LPV/r pende do grau de resistência aos ARVs, do número e das classes de ARVs
Dois ITRN + RALb ativos e, fundamentalmente, da adesão ao novo esquema.
O esquema inicial com 2 ITRN + ITRNN permite abordar a primeira
Adolescentes ≥ 12 anos e sem caracteres Dois ITRN + ATZ/r falha com a troca por 2 ITRN + lopinavir/r (LPV/r). Da mesma forma, o es-
sexuais maduros (Tanner 1 a 3) Dois ITRN + DTG
e quema inicial com 2 ITRN + IP/r permite a troca pra ITRNN (Quadro 57.3).
Dois ITRN + DRV/r 1 vez/dia
f
Adolescentes ≥ 12 anos e com caracteres Tratamento como de adultos
sexuais maduros (Tanner 4 e 5) Dois ITRN + II
QUADRO 57.3 ■ Orientações sobre escolha de esquema ARV
Dois ITRN + IP/r de resgate
vacina varicela: deve ser aplicada nas crianças com idade superior
a 12 meses que não apresentem manifestações graves da doença 58
ou linfócitos TCD4 < 15%. Uma 2a dose deve ser aplicada três me-
ses depois; HEMATÚRIA
vacina hepatite A: duas doses a partir dos 12 meses, com intervalo
de seis meses entre elas.
vacina HPV: três doses a partir dos 9 anos de idade para as meninas
■■ MARIA CECÍLIA PIGNATARI
■■ JOÃO TOMAS DE ABREU CARVALHAES
REVISÃO
A transmissão vertical é a principal forma de aquisição do HIV pelas
A hematúria assintomática é comum em crianças e adolescentes. A preva-
crianças.
lência de hematúria microscópica, ou seja, a presença de cinco ou mais he-
O rastreamento sorológico de todas as gestantes e a profilaxia com
mácias por campo ou mais que 10 mil por mL no exame de urina é de 0,4 a
ARV em mães e recém-nascidos, além da suspensão do aleitamen-
4%. A hematúria macroscópica, vista a olho nu, tem prevalência de 0,15%.
to materno, têm tido grande sucesso na prevenção da transmissão
vertical do HIV. Esse sinal clínico pode ocorrer devido a doenças nos rins, nos ure-
A interação entre a fisiopatologia da infecção pelo HIV e os efeitos teres, na bexiga ou na uretra. O momento em que ocorre a hematúria
adversos dos medicamentos componentes da TARV determinam dis- durante a micção é importante para a investigação relacionada à sua cau-
túrbios orgânicos, mentais e alterações metabólicas que podem au- sa, por exemplo, em lesões de uretra, o sangramento ocorre no início da
mentar o risco de doenças degenerativas nesse grupo de pacientes. micção e, em lesões na bexiga, ao término da micção. Em lesões renais
O curso clínico da Aids é mais rápido em crianças do que em adul- e ureterais, a hematúria ocorre de forma homogênea durante a micção.
tos, e a doença pode ter diferentes padrões de progressão: rápido, A seguir, uma lista das patologias que podem levar à hematúria divi-
normal e lento. didas em: causas glomerulares e extraglomerulares.
O diagnóstico da infecção pode ser feito por métodos sorológicos
para crianças com mais de 18 meses, mas só pode ser realizado ■■ ETIOLOGIA
por métodos virológicos naquelas com idade abaixo dos 18 meses.
A TARV visa a suprimir a replicação viral e a diminuir a morbimorta- CAUSAS DE HEMATÚRIA GLOMERULAR
lidade da infecção, preservando o sistema imune, devendo ser feito Glomerulonefrite membranosa.
sempre com combinação de fármacos. Glomerulonefrite membranoproliferativa.
A resposta terapêutica aos antirretrovirais deve ser monitorada Glomerulonefrite difusa aguda.
constantemente. Glomerulonefrite rapidamente progressiva.
A vacinação deve ser feita precocemente. Hematúria familiar benigna.
Lúpus eritematoso sistêmico (LES).
Nefropatia por IgA (doença de Berger).
■■ REFERÊNCIAS Púrpura de Henoch-Schönlein.
1. Brasil. Ministério da Saúde. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para Síndrome de Alport.
manejo da infecção pelo HIV em crianças e adolescentes. Brasília: MS; 2014. Síndrome hemolítico-urêmica (SHU).
2. World Health Organization. Consolidated guidelines on the use of antiretroviral
drugs for treating and preventing HIV infection: recommendations for a
CAUSAS DE HEMATÚRIA EXTRAGLOMERULAR
public health approach. 2nd ed. Geneva: WHO; 2016.3. Brasil. Ministério da
Saúde. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção Angiomiolipoma.
pelo HIV em adultos [Internet]. Brasília: MS; 2013 [capturado em 22 out. Coagulopatias.
2016]. Disponível em: http://www.aids.gov.br/sites/default/files/anexos/ Doença cística renal.
publicacao/2013/55308/protocolo_13_3_2014_pdf_28003.pdf. Anemia falciforme.
Traço falciforme.
■■ LEITURAS SUGERIDAS Estenose da junção ureteropiélica.
Exercício.
Barnhat HX, Caldwell MB, Thomas P, Mascola L, Ortiz I, Hsu HW, et al. Natural
history of human immunodeficiency virus disease in perinatally infected Hipercalciúria.
children: an analysis from the Pediatric Spectrum on Disease Project. Hiperuricosúria.
Pediatrics. 1996;97(5):710-6. Infecção do trato urinário (ITU).
Features of children perinatally infected with HIV-1 surviving longer than 5 years. Malformações vasculares.
Italian register for HIV infection in children. Lancet. 1994;343(8891):191-5. Medicamentos (anti-inflamatórios não hormonais [AINH] e ciclo-
Ofori-Mante JA, Kaul A, Rigaud M, Fidelia A, Rochford G, Krasinski K, et al. Natural fosfamida, entre outros).
history of HIV infected pediatric long term or slow progressor population Necrose tubular aguda (NTA).
after the first decade of life. Pediatr Infect Dis J. 2007;26(3):217-20.
Nefrolitíase.
Violari A, Cotton MF, Gibb DM, Babiker AG, Steyn J, Madhi SA, et al. Early
Síndrome de quebra-nozes (nutcracker syndrome).
antiretroviral therapy and mortality among HIV infected infants. N Engl J
Med. 2008;359(21):2233-44. Trauma.
Penazzato M, Prendergast AJ, Muhe LM,Denis Tindyebwa D and Abrams EJ. Trombose de veia renal.
Optimization of antiretroviral therapy in HIV-infected children under 3 years Trombose de artéria renal.
of age: a systematic review. AIDS. 2014;28(Suppl 2):S137–S146. Tuberculose renal.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 381
Tumor de bexiga.
ATENÇÃO!
Tumor de Wilms.
Queimaduras. A hematúria pode ocorrer devido a diversas alterações nos rins, nos
ureteres, na bexiga e na uretra. Para o diagnóstico correto da sua cau-
sa, é fundamental a história e o exame físico detalhados.
■■ QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO
O trato urinário da criança é menos protegido que o de adultos e, assim,
mais vulnerável a traumas. As anormalidades congênitas, como obstru- EXAMES SUBSIDIÁRIOS
ções e hidronefroses ou alterações da forma, também podem tornar os
A hematúria é considerada quando esse sinal ocorre em três amostras de
rins mais vulneráveis aos traumas. Assim, a existência de trauma anterior é urina, com intervalo de pelo menos uma semana entre as coletas. A pre-
importante para o diagnóstico da causa da hematúria. Algumas alterações sença de dismorfismo eritrocitário, ou seja, hemácias que apresentam
clínicas, como infecções de vias aéreas antecedendo episódios de hematú- alterações de sua forma ao serem filtradas no glomérulo, em amostra
ria, lesões de pele, dor abdominal, artralgias, outros sangramentos, febre, de urina, indica lesão glomerular, contudo não há um consenso sobre a
artrites e alterações auditivas e oftalmológicas, auxiliam no diagnóstico porcentagem de hemácias dismórficas para considerar a hematúria como
correto da causa da hematúria. glomerular. Grande parte dos autores considera como 80% de hemácias
A doença de Berger ou nefropatia por IgA cursa com episódios de dismórficas. Um estudo publicado em 2008 sugere sensibilidade de 59,2%
hematúria após infecções de vias aéreas ou exercício extenuante. Entre para 40% ou mais de hemácias dismórficas. A presença de 30% ou mais
os adolescentes, a nefropatia por IgA é uma das mais frequentes cau- de hemácias dismórficas ou acantocitose maior do que 5% é altamente
sas de hematúria, podendo apresentar sedimento urinário normal en- sugestiva de hematúria glomerular.
tre os episódios. É possível, ainda, ocorrer, proteinúria sem se atingir
níveis nefróticos. Ao longo de 20 anos, a doença de Berger pode levar
à lesão renal crônica (LRC) em até 30% dos pacientes. Atualmente, a ATENÇÃO!
PHS é considerada uma forma sistêmica da nefropatia por IgA. Apesar de não existir um consenso sobre a porcentagem de hemácias
A história de hematúria após infecção de pele ou vias aéreas supe- dismórficas para considerar a hematúria como glomerular, a presença
riores (VAS), podendo vir acompanhada de edema (85%) e hipertensão do dismorfismo eritrocitário é importante para dividir as causas de he-
(85%), indica o diagnóstico de glomerulonefrite difusa aguda, que cursa matúria em dois grandes grupos e, assim, proceder ao diagnóstico e ao
com queda do complemento sérico, passível de normalização em 6 a 8 se- tratamento adequados.
manas. A hematúria microscópica pode persistir até 12 meses e é doença
de evolução benigna e com recorrência rara.
A presença de proteinúria e cilindros hemáticos em amostra de uri-
A presença de surdez neurossensorial, alterações oftalmológicas no
na sugere lesão glomerular. No caso de proteína em amostra isolada,
paciente ou seus familiares e LRC na família indica o diagnóstico de
deve-se solicitar proteinúria de 24 horas. Em relação à hipercalciúria ou
síndrome de Alport, uma glomerulopatia hereditária, na qual ocorrem
hiperuricosúria, relacionadas ou não à litíase, faz parte da investigação
alterações na membrana basal glomerular cujo principal componente é
a pesquisa de cálcio e/ou ácido úrico na urina de 24 horas. Uma vez
o colágeno tipo IV. Essa glomerulopatia é uma das causas de hematúria, que as ITUs podem estar associadas à hematúria, a urocultura deve ser
que evolui para LRC na maioria dos pacientes. Entre as glomerulopatias solicitada.
hereditárias, há também a hematúria familiar benigna, caracterizada A função renal é solicitada de rotina durante o acompanhamento do
por hematúria microscópica, sendo incomuns a proteinúria e a hiper- paciente. O hemograma e a eletroforese de hemoglobina fazem parte da
tensão. investigação do paciente com anemia falciforme e traço falciforme, bem
A ITU pode levar à hematúria, e os sintomas dependem da faixa etá- como o coagulograma para as coagulopatias. As provas reumatológicas
ria do paciente. Os sintomas clássicos como disúria, urgência miccional e e a dosagem de complemento serão solicitadas de acordo com a hipótese
polaciúria, são mais frequentes nas crianças maiores e adolescentes. Os diagnóstica.
lactentes podem apresentar sintomas gerais, como febre, apatia ou irrita- A US auxiliará no diagnóstico de tumores, litíases, malformações císti-
bilidade, diminuição do apetite e vômitos, e os pacientes em idade escolar cas e dilatações do trato urinário; e o estudo com Doppler ampliará a inves-
podem referir dor abdominal. tigação na suspeita de alterações vasculares e "síndrome de quebra-nozes"
As alterações hematológicas que mais comumente podem cursar com (nutcracker syndrome). Essa clássica síndrome é causada pela compressão
hematúria são a anemia falciforme e o traço falciforme. Faz parte da inves- da veia renal esquerda entre a artéria mesentérica superior e a aorta, po-
tigação clínica questionar sobre anemias e coagulopatias. dendo levar à hematúria e até proteinúria por aumento da pressão venosa.
A litíase urinária é menos frequente na faixa etária pediátrica, apro- O pedido de TC, RM e exames mais invasivos, como uretrocistografia
ximadamente 1:5.000 em comparação aos adultos aproximadamente miccional e cistoscopia, se dará conforme as alterações nos exames ini-
1:100. As crianças podem apresentar dor abdominal, irritabilidade, có- ciais. Será indicada a biópsia renal em pacientes com hematúria no caso
lica renal além da hematúria. Pode-se associar litíase urinária com in- de apresentarem proteinúria, perda de função renal, aumento da pressão
arterial com hematúria persistente, alterações auditivas e/ou oftalmológi-
fecção urinária. Em muitos pacientes com hematúria e dor abdominal,
cas e antecedentes familiares de glomerulopatias.
a existência de história familiar de litíase urinária é fundamental para o
diagnóstico.
Ao examinar o paciente, deve-se observar a presença de anemia ■■ TRATAMENTO
(anemia falciforme), lesões de pele (PHS), edema, sinais de hipervolemia, O tratamento instituído dependerá da causa da hematúria. Ressalta-se a
hipertensão (GNDA) e massa abdominal palpável. A medida da pressão importância da história e do exame físico para direcionar os exames subsi-
arterial faz parte da rotina do exame físico. diários, solicitados para se atingir o diagnóstico correto. O prognóstico dos
382 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
pacientes com hematúria isolada é bom, não havendo progressão para mutação podocitária ou mutações em proteínas da fenda diafrag-
doença renal terminal, e eles devem ser acompanhados ambulatorialmen- mática (CD2AP, podocina, nefrina).
te com exames de rotina.
Desnutrição
Alterações em fatores do Aumento da excreção Albuminúria
sistema de coagulação urinária de vitaminas,
Calciúria
hormônios e suas
proteínas transportadoras
Hipercoagulabilidade
Aumento da reabsorção Hipoalbuminemia Hipocalcemia
tubular de proteínas
Fenômenos filtradas
tromboembólicos
Edema Aumento da
Alterações tubulares
síntese hepática
de lipoproteínas
Aumento da
Lesão tubular reabsorção
distal de sódio Hiperlipidemia
GLOMERULONEFRITE AGUDA
PÓS-ESTREPTOCÓCICA
Definição
É uma das mais antigas doenças renais conhecidas, atinge todos os glo-
mérulos e é considerada sequela tardia não supurativa de uma infecção
estreptocócica. Foi descrita pela primeira vez, em meados do século XIX,
como entidade pós-escarlatina, mas somente a partir de 1950 foi relacio-
nada com as faringites e as infecções estreptocócicas de pele. É a segun-
da causa mais comum de hematúria macroscópica em crianças, superada
apenas pela nefropatia por IgA.
Epidemiologia
Sua prevalência ainda não está bem estabelecida, porém condições so-
cioeconômicas e de higiene precárias são fatores epidemiológicos conhe- FIGURA 60.1 ■ Microscopia óptica. Todos os glomérulos estão
cidos. É incomum antes dos 2 anos, com pico de incidência aos 7 anos. afetados, com proliferação difusa de células mesangiais e endoteliais
e infiltração de polimorfonucleares.
Etiologia e patologia
A GNPE é desencadeada após infecção pelo SβGA de Lancefield, mas tam-
bém pode ser secundária a infecções pelos estreptococos dos grupos C e
G. Esses cocos gram-positivos, agrupados em cadeia com aspecto de “con-
ta de rosários”, são as bactérias que mais causam infecções no homem.
A nefritogenicidade está correlacionada com fatores presentes na parede
da bactéria. Os sorotipos nefritogênicos 1, 4, 12 e 25 estão associados às
faringites, e os sorotipos 2, 42, 49, 56 e 60, a infecções cutâneas (impeti-
go). Todavia, fatores do hospedeiro também têm sido estudados, uma vez
que é a formação do complexo imune dentro do glomérulo que determina
a lesão renal.
O processo inflamatório provoca queda da filtração glomerular, po-
rém a reabsorção de sódio pelos túbulos permanece preservada. Isso
permite a expansão dos líquidos extracelulares e a supressão do sistema
renina-angiotensina-aldosterona (SRAA). Com isso, aparecem o edema e a
HAS secundária à hipervolemia.
Anatomia patológica
FIGURA 60.2 ■ Imunofluorescência. Deposição glanular de C3 e de
A microscopia óptica mostra proliferação de células endoteliais e me-
IgG nas paredes capilares.
sangiais, com tumefação dos tufos capilares, colapso do lúmen vascular
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 387
Tratamento
O tratamento dos pacientes com GNPE é basicamente sintomático e depen-
dente da gravidade do quadro clínico inicial. Seu principal objetivo é reduzir
a expansão volêmica que provoca hipertensão, edema e congestão circula-
FIGURA 60.3 ■ Microscopia eletrônica. Presença de humps. tória. Muitos pacientes podem ser tratados ambulatorialmente, se houver
condições de seguimento médico regular, e com boa condição clínica.
Não há terapia específica para GNPE, porém algumas recomendações
encefalopatia hipertensiva e lesão renal aguda (LRA). A internação está devem ser seguidas:
indicada nas situações de hipertensão sintomática, ICC, hipercalemia e repouso relativo, na primeira semana da doença, para redução do
convulsões. desconforto físico provocado pelo edema;
restrição hídrica: 400 mL/m² ou 20 mL/kg/dia mais o volume da
diurese do dia anterior;
ATENÇÃO! uso de diuréticos de alça (furosemida) quando houver edema e
hipertensão arterial não responsiva à restrição salina e hídrica.
É preciso cuidado com período de latência de 2 a 3 semanas entre o
Essa medicação deve ser mantida até normalização da pressão ar-
processo infeccioso e o quadro nefrítico (edema, hematúria, hiperten-
terial, que é secundária à hipervolemia (dose: 1 mg/kg/dose a cada
são arterial). Hematúria em vigência de infecção de orofaringe sugere 6, 8, 12 ou 24 horas, por via oral, sendo habitualmente desneces-
outra glomerulopatia, como nefropatia por IgA. sário exceder 4 mg/kg/dia);
uso da furosemida por via intravenosa é indicado, na dose de 1 a
2 mg/kg/dose a cada 6 a 12 horas ou por infusão contínua na dose
Diagnóstico
de 0,05 mg/kg/hora em casos de anasarca, congestão pulmonar e
Achados laboratoriais (Quadro 60.2) HAS secundária à hipervolemia. Com essas medidas (uso de diu-
Urina I: hematúria macro ou microscópica com dismorfismo eritro- réticos associados com restrição hídrica e salina) raramente se faz
citário positivo, presença eventual de cilindros hemáticos, leucoci- necessário o uso de hipotensores, como hidralazina e nitroprussia-
tários e hialinos, proteinúria em grau variável. to de sódio parenteral (hidralazina: 0,1 a 0,2 mg/kg/dose – [não
Proteinúria de 24 horas: < 50 mg/kg/dia, raramente em níveis exceder 20 mg a cada 4 a 6 horas] e nitroprussiato de sódio: 0,3 a
nefróticos. 0,5 µg/kg/minuto – dose máxima: 8 a 10 µg/kg/minuto);
Complemento sérico: C3 e CH50, estão significativamente dimi- nos pacientes hipertensos, que não necessitam de internação em
nuídos nas 2 primeiras semanas da doença e deverão estar norma- unidade de terapia intensiva (UTI) ou tratados ambulatoriamente,
lizados em até 8 semanas. que se mostram refratários à restrição de sódio e água e também
Sorologias: títulos elevados de anticorpos para os produtos extra- ao uso de diuréticos; faz-se necessário o uso de hipotensores como
celulares do estreptococo (estreptolisina O, desoxirribonuclease B e nifedipina dose inicial de 0,25 a 0,5 mg/kg/dia, VO, dividida em 2
nicotinamida-adenina de nucleotidase) são evidências de infecção tomadas, não ultrapassando 3 mg/kg/dia. Outro hipotensor (blo-
recente por essa bactéria, todavia podem ocorrer exames falso-ne- queador de canal de cálcio) que pode ser utilizado é a amlodipina,
gativos. que deve ser iniciado com dose de 0,1 mg/kg/dia e aumentado gra-
dativamente até dose máxima de 0,6 mg/kg/dia (20 mg/dia).
Biópsia renal dieta deve ser pobre em sódio, enquanto durar o edema, a oligúria
A biópsia renal não é realizada na maioria dos casos, sendo, porém, bas- e a hipertensão;
tante útil no diagnóstico diferencial das causas mais prováveis de evolu- administrar 600.000 UI de penicilina benzatina em menores de
ção para LRA: necrose tubular aguda (NTA), nefrite túbulo-intersticial (NTI) 25 kg e 1.200.000 UI em maiores de 25 kg por via intramuscular,
e GNRP ou crescêntica. As principais indicações de biópsia renal são: em dose única, sempre que houver suspeita de infecção estrepto-
alteração da função renal com evolução para LRA; cócica, com o objetivo de erradicar a bactéria. Nos pacientes hi-
complemento persistentemente baixo por mais de 8 semanas; persensíveis à penicilina, está indicada a eritromicina na dose de
associação com proteinúria nefrótica (síndrome mista) por mais de 30 mg/kg/dia, por 10 dias. Não está indicada a antibioticoprofila-
4 semanas. xia, já que os casos recidivantes são raros;
388 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
1 | Redução do volume intravascular (perdas) 1 | NTA (lesão hipóxico-isquêmica, induzida por 1 | Obstrução em rim único
Diarreia medicamentos ou toxinas) 2 | Obstrução bilateral de ureter
Desidratação 2 | NTI (idiopática ou induzida por medicamentos) 3 | Obstrução de uretra
Hemorragias 3 | Síndrome de lise tumoral
Perdas para o 3o espaço 4 | Glomerulonefrites (GNRP, LES, GNDA)
2 | Diminuição da função cardíaca 5 | Lesões vasculares (SHU, trombose de vasos renais,
3 | Vasodilatação periférica (sepse, anafilaxia) necrose cortical)
4 | Hipoperfusão renal (indometacina, IECA) 6 | Displasias renais
GNDA: glomerulonefrite difusa aguda; GNRP: glomerulonefrite rapidamente progressiva; NTA: necrose tubular aguda; NTI: nefrite túbulo-intersticial; SHU: síndrome hemolí-
tico-urêmica; IECA: inibidores da enzima conversora da angiotensiva.
390 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
CRITÉRIOS DE PRIFLE TFG DÉBITO URINÁRIO FENa (%)= Nau × Crs × 100
Nas × Cru
Risk – Risco de disfunção eClCr* diminuído < 0,5 mL/kg/h por 8 h
renal 25% Nau: sódio urinário; Cr s: creatinina sérica; Nas: sódio sérico; Cru:
creatinina urinária.
Injury – Lesão renal eClCr diminuído < 0,5 ml/kg/h por 16 h
50%
Quando elevada, a osmolaridade urinária sugere dano pré-renal, se
baixa, é marcadora de NTA. A osmolaridade e a densidade urinária têm
Failure –Insuficiência eClCr diminuído < 0,3 mL/kg/h por 24 h valor limitado para estabelecer a etiologia da LRA.
renal 75% eClCr < ou anúria por 12 h O volume urinário está baixo na LRA de causa pré-renal; também
35 mL/min/1,73 pode estar baixo ou normal em pacientes com NTA.
A razão ureia: creatinina sérica apresenta-se normal na doença renal
Loss – Perda da Função TRS** > 4 sem a
intrínseca (10 20:1) e está elevada (> 20:1) na LRA de etiologia pré-renal.
renal
Os níveis séricos de creatinina estão elevados por ocasião do diagnós-
End – Doença terminal TRS* > 3 meses tico e continuam aumentando. Na Tabela 61.3, é possível observar alguns
índices urinários usados para diferenciar a etiologia da LRA em pré-renal
*eClCr: Clearance estimado de creatinina.
**TRS: terapia renal substitutiva.
e renal.
2
Fonte: Akcan-Arikan e colaboradores.
A cistatina C é considerada um bom marcador, pois sua concentração TERAPIA RENAL SUBSTITUTIVA
sérica não é afetada pela massa muscular e não sofre secreção no túbulo
Indicada na LRA, por meio da avaliação clínica e laboratorial, e baseada
renal, mas não é um marcador direto de lesão tubular, e sim um marcador
também na evolução presumível da LRA. Sua recomendação deve ser pre-
alternativo de RFG.
coce, de preferência antecipando os efeitos deletérios rápidos e progressi-
FGF-2 é uma proteína com atividade proliferativa e de diferenciação.
vos da evolução natural da doença.
Atua como fator angiogênico e reparador de tecidos e está aumentada na
A TRS pode ser realizada por meio da diálise peritoneal (DP), hemo-
urina de pacientes com LRA. EGF é um polipeptídeo que está aumentado
diálise intermitente (HI) e das modalidades contínuas: hemodiálise ve-
na urina de pacientes com LRA. Isolado, não tem muita especificidade,
novenosa contínua (CVVHD); hemofiltração venonosa contínua (CVVH);
mas, quando em associação com NGAL e FGF-2 urinários, mostra alta sen-
e hemodiafiltração venovenosa contínua (CVVHDF). Antes de iniciar a
sibilidade e especificidade para identificar crianças com LRA.
diálise, deve-se ajustar o método escolhido às necessidades do paciente:
O papel dos biomarcadores de LRA aguarda estudos adicionais que
disponibilidade de acesso venoso, condições hemodinâmicas, remoção de
elucidem em quais cenários clínicos ajudariam no diagnóstico, fornecendo
volume e/ou clearance de soluto. As principais indicações de diálise na
informações reais sobre lesão tubular renal.
criança com LRA são:
1 | Sobrecarga hídrica:
■■ TRATAMENTO anasarca;
O objetivo principal do tratamento é manter o balanço nitrogenado, hídri- hipertensão arterial;
co, eletrolítico e acidobásico, por meio de terapia conservadora ou substi- insuficiência cardíaca;
tutiva, dependendo da gravidade das alterações. edema agudo de pulmão.
2 | Alterações eletrolíticas sintomáticas ou refratárias ao tratamento clínico.
3 | Hipertensão arterial grave/sintomática.
ATENÇÃO!
4 | Oligoanúria > 24 horas e que o limite da oferta hídrica/nutricional.
Sempre que possível, deve-se procurar terapia específica de acordo 5 | Acidose metabólica refratária.
com a causa da LRA. 6 | Aumento progressivo de ureia e creatinina.
7 | Sintomas urêmicos: pericardite, alterações neurológicas.
Nos casos de LRA pré-renal, devem-se restituir o equilíbrio hemo- 8 | Suporte nutricional.
dinâmico e a perfusão renal com volume, e melhorar o débito cardíaco Apesar das técnicas modernas de diagnóstico e tratamento da LRA,
com o uso de fármacos vasoativos, se necessário. Nas glomerulopatias, é a taxa de mortalidade de pacientes com a doença que necessitam de TRS
preciso individualizar o tratamento, pois algumas delas respondem bem à continua alta. O prognóstico a longo prazo depende da gravidade da LRA
pulsoterapia com glicocorticosteroides. No caso de LRA pós-renal, a de- e pode incluir hipertensão arterial, diminuição da capacidade de concen-
sobstrução do trato urinário é o tratamento, devendo ser efetuado o mais tração urinária, outros sinais de comprometimento da função tubular e,
rápido possível. em alguns casos, doença renal crônica.
Quando a volemia está restituída, é prudente iniciar restrição hídrica
2
de 400 mL/m somada ao volume de diurese que o paciente apresenta,
pelo risco de desenvolver sobrecarga hídrica, principalmente nos casos REVISÃO
de oligoanúria.
A LRA é definida como uma alteração abrupta na função renal, le-
O uso de diuréticos (furosemida, manitol) e/ou doses baixas de dopa-
vando à diminuição no RFG.
mina para estimular diurese (0,5 a 3 µg/kg/minuto) não previne nem muda
A etiologia multifatorial predomina nas causas secundárias, princi-
o curso da LRA.
palmente em crianças hospitalizadas, como lesões hipóxico-isquê-
Quando presente hipertensão, dá-se preferência ao nitroprussianto
micas, sepse e nefrotoxicidades.
de sódio, à hidralazina ou aos bloqueadores dos canais de cálcio. É preciso
É classificada em pré-renal, renal ou pós-renal, conforme a região
respeitar a velocidade de queda dos níveis pressóricos, principalmente nos
anatômica comprometida.
casos de emergência hipertensiva. O nitroprussiato de sódio é um medica-
Quando o tempo de reperfusão renal é muito prolongado, o rim
mento de ação rápida, cujo efeito é interrompido em até 10 minutos após
pode evoluir com lesões estruturais e bioquímicas que resultam em
a suspensão; porém, o seu metabólito final, tiocianato, tem excreção lenta
comprometimento vascular e celular.
e pode levar à intoxicação grave em pacientes com LRA.
O critério pRIFLE para o diagnóstico precoce de LRA é representado
por graus crescentes de gravidade de acordo com reduções especí-
ATENÇÃO! ficas no RFG e débito urinário.
O critério de diagnóstico AKIN e outros critérios vêm sendo usados
A hipercalemia é o distúrbio eletrolítico mais temido, por seu potencial na pediatria com sucesso para mostrar o curso da LRA e sua associa-
de causar arritmias em alguns casos fatais, mas outros distúrbios tam- ção com mortalidade e tempo de internação hospitalar.
bém preocupam, como hiperfosfatemia, hipocalemia e hiponatremia. Anamnese, exame físico, ureia e creatinina séricas, análise do
exame de urina e identificação de fatores de risco são os passos
para o diagnóstico. Alguns achados encontrados são diminuição
Terapias específicas estão em desenvolvimento, como: medicamentos do débito urinário, edema, hematúria macroscópica e/ou hiper-
antioxidantes, terapia com molécula antiadesão, administração de media- tensão.
dores vasculares e células-tronco mesenquimais. O fenoldopam e o pep- Novos biomarcadores vêm sendo estudados na tentativa de se fazer
tídeo natriurético atrial vêm apresentando efeito benéfico em modelos um diagnóstico precoce (NGAL, IL-18, Kim-1, CysC, etc.).
animais.
392 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
62 PRINCIPAIS CAUSAS DE HC
Causas permanentes
HIPOTIROIDISMO CONGÊNITO 1 | Hipotiroidismo primário:
Disgenesia tiroidiana: responsável por 85% dos casos. Com-
preende a agenesia, a ectopia (sendo a posição lingual a mais fre-
quente) e a hipoplasia tiroidianas. Acreditava-se, até recentemen-
■■ ADRIANA APARECIDA SIVIERO-MIACHON
te, que a disgenesia tiroidiana era uma entidade esporádica, porém
■■ ANGELA MARIA SPINOLA E CASTRO alguns casos familiares foram relatados. Existe heterogeneidade
genética, mas a herança é provavelmente autossômica dominante,
com penetrância variável. A patogênese envolve: a) mutações em
O hipotiroidismo congênito (HC) é uma das causas mais frequentes e pre- genes que codificam fatores de transcrição envolvidos no desen-
viníveis de deficiência mental. Sua incidência é de 1:4.000 recém-nascidos volvimento tiroidiano (fator de transcrição tiroidiano 1 e 2, [TTF-1 e
(HC primário). Os hormônios tiroidianos, tri-iodotironina (T3) e tiroxina (T4), TTF-2], ou gene box-pareado 8 [PAX8]) e no crescimento (receptor
são fundamentais para o crescimento normal durante a infância, assim da tirotrofina [TSH-R]), podendo associar-se a patologias pulmo-
como para o desenvolvimento cerebral durante a vida embrionária e nos nares, cerebrais e do palato; b) modificações epigenéticas; c) mu-
2 primeiros anos de vida. Os sinais e sintomas do HC resultam da altera- tações somáticas que ocorrem precocemente na embriogênese da
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 393
célula folicular tiroidiana; ou d) eventos esporádicos. Clinicamente, grave, associado a T3 elevado, T4 baixo, além de concentrações nor-
apresenta-se sem bócio. mais a moderadamente elevadas de TSH.
Defeito na síntese hormonal tiroidiana (disormoniogênese):
corresponde a 15% dos casos. Bócio pode estar presente em in-
divíduos mais velhos, mas não necessariamente no neonato. Re- ATENÇÃO!
sulta de um defeito em uma das etapas envolvidas na biossíntese
Em meninos com deficiência mental grave, é importante a dosagem do
dos hormônios tiroidianos, de herança autossômica recessiva (fa-
T3 total para afastar a deficiência do MCT8. Ainda não há tratamento
miliar), sendo os possíveis defeitos: a) cotransportador de sódio/
disponível, mas há possibilidade de aconselhamento genético.
iodeto (NIS), responsável pelo transporte de iodeto pela membrana
basolateral da célula folicular tiroidiana; b) pendrina, responsável
pelo transporte do iodeto do interior da célula para o lúmen (que Resistência aos hormônios tiroidianos: caracteriza-se por TSH
contém coloide), caracterizando a síndrome de Pendred (causa normal ou elevado, na presença de concentrações elevadas de
mais comum de surdez neurossensorial hereditária não progressi- T4 e T3 livres e resposta variável dos diferentes tecidos à ação do
va); c) oxidase tiroidiana 2 (THOX2), responsável pela geração de hormônio tiroidiano. Três fenótipos clínicos são habitualmente des-
H2O2, essencial para a atividade da tiroperoxidase (TPO); d) TPO, critos: 1) resistência generalizada; 2) resistência hipofisária predo-
responsável pelo acoplamento e pela organificação do iodeto minante, que pode se apresentar clinicamente como tirotoxicose; e
(defeito mais comum); e) síntese de tiroglobulina; e f) iodotirosina 3) resistência periférica, em geral devido a mutações inativadoras
deiodinase. do receptor de T3 tipo β (TRβ1), embora 15% dos casos se devam a
Defeito no receptor do TSH (TSHR): deve-se a mutações inativa- mutações em genes ainda não identificados. Essa forma apresen-
doras no TSH-R, sendo o espectro fenotípico muito amplo, varian- ta-se clinicamente como hipotiroidismo.
do desde elevações assintomáticas de TSH até hipotiroidismo gra-
ve. Pacientes com pseudo-hipoparatiroidismo tipo 1a e resistência Causas transitórias
ao TSH podem ser ocasionalmente identificados por elevação do Hipertirotropinemia transitória (elevação transitória do TSH):
TSH na triagem neonatal. tem como etiologia causas ambientais, iatrogênicas ou maternas.
Síndrome de Down: os pacientes exibem uma elevação nas con- A deficiência grave endêmica de iodo ainda é uma causa importan-
centrações de TSH. Os mecanismos que levam a essas alterações te de hipotiroidismo transitório em neonatos. A sobrecarga aguda
são ainda pouco entendidos, mas não existe evidência de que a de iodo, em particular pelo uso de antissépticos que contêm iodo
disgenesia tiroidiana seja mais frequente na síndrome de Down e (povidine), em neonatos, mulheres grávidas ou lactantes, princi-
há apenas alguns relatos sobre HC em razão de defeito de síntese. palmente nas áreas em que a ingesta de iodo não é adequada,
As principais evidências são de que exista uma alteração dopami- pode resultar em hipotiroidismo transitório, com maior incidência
nérgica no controle de TSH, fazendo suas concentrações estarem em prematuros que já têm baixos estoques de iodo. Nas áreas sufi-
sempre mais elevadas, se comparadas à população normal. cientes em iodo, a causa mais frequente é o uso de medicação an-
2 | Hipotiroidismo central: titiroidiana pela mãe. A passagem transplacentária de anticorpos
Pode ser secundário (por alteração hipofisária) ou terciário (por maternos que bloqueiam o TSH é muito rara, sendo responsável
alteração hipotalâmica). O quadro clínico é menos intenso e, ge- por apenas 2% dos casos de HC. Essas alterações, em geral, nor-
ralmente, existem sinais e sintomas de deficiências de outros hor- malizam de forma espontânea, em alguns dias ou semanas, dis-
mônios associadas. A forma isolada, causada por mutações do pensando tratamento. Porém, considera-se terapia hormonal curta
gene da subunidade β do TSH, é muito rara. O hipotiroidismo é um naquelas crianças que apresentam alterações mais prolongadas,
sintoma clínico importante, associado à baixa estatura e ao déficit habitualmente mais que 4 a 6 semanas.
de crescimento nos pacientes com mutação nos fatores de transcri- Hipotiroxinemia transitória (diminuição transitória do T4): pre-
ção hipofisários, sejam eles: HESX1, LHX3, LHX4, PROP1 ou PIT1. sente em recém-nascidos com baixo peso ao nascer, pequenos para
Nesses casos, a complementação diagnóstica com ressonância a idade gestacional, prematuros ou anoxiados. Existem dúvidas
magnética (RM) de crânio faz-se necessária. Nos quadros de hipo- a respeito de quanto o tratamento com levotiroxina sódica possa
pituitarismo, é comum a hipoglicemia neonatal por deficiência de melhorar a evolução a curto e longo prazos; ainda não existem evi-
hormônio do crescimento e hormônio adrenocorticotrófico (ACTH)/ dências a favor. Parece haver uma evolução positiva em pacientes
cortisol, além da associação com micropênis, no sexo masculino. prematuros extremos (< 27 semanas de gestação). Não existe su-
3 | Hipotiroidismo periférico: porte para o uso de levotiroxina sódica com a intenção de reduzir a
Hipotebegenemia: de herança ligada ao X (acomete o sexo mas- mortalidade neonatal, melhorar a evolução neuropsicomotora ou a
culino), deve-se a uma deficiência na globulina carreadora de ti- gravidade da síndrome de estresse respiratório. A hipotiroxinemia
roxina (TBG), principal proteína transportadora dos hormônios da prematuridade representa muito mais uma adaptação ao parto
tiroidianos, que leva a uma diminuição na fração total do T4, com prematuro do que um hipotiroidismo central (T4 baixo e TSH normal).
frações livres normais, dispensando qualquer tipo de tratamento. Causas genéticas: mutações de THOX2 podem acarretar altera-
O diagnóstico, em geral, é feito por meio da triagem neonatal, con- ções transitórias na função tiroidiana.
firmada pela dosagem sérica de TBG. Outras: hemangiomas hepáticos de grandes dimensões (aumento
Mutações no transportador monocarboxilado 8 (MCT8): o da atividade da deiodinase tipo 3).
MCT8 foi recentemente identificado como um transportador de Pacientes portadores de HC transitório, acompanhados por três anos,
membrana específico para o hormônio tiroidiano nos neurônios, evoluíram com hipotiroidismo permanente em 47% dos casos. Dessa for-
com afinidade elevada pelo T3. Mutações nesse transportador po- ma, recomenda-se a reavaliação aos 3 anos, para definir a permanência
dem levar a uma síndrome ligada ao X, com retardo psicomotor ou não da doença.
394 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
TSH NEONATAL
Tratamento imediato
T4 livre normal + T4 livre normal + T4 livre baixo + TSH normal
TSH normal TSH elevado (>10mUI/L) Hipotiroidismo central Considerar:
Teste do TRH deficiência endêmica de iodo,
RM sela túrcica uso de medicação ou doença
Normal Tratamento
tiroidiana materna (transitório)
FIGURA 62.1 ■ Triagem neonatal para hipotiroidismo congênito – dosagem exclusiva de TSH.
TSH: tirotrofina; TRH: hormônio liberador de TSH; RM: ressonância magnética.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 395
vida, mesmo com T4 na faixa da normalidade, sugere-se o tratamento com ficação de iodo, a concentração do radiotraçador diminui em mais de 10%
reavaliação após os 3 anos. em relação ao seu valor basal.
Entretanto, nos casos em que foi comprovada a presença da tiroide
tópica (por meio de ultrassonografia (US) de tiroide realizada por médi- Testes genéticos
co habilitado em realizar exame em crianças pequenas), em que o TSH Apenas para efeitos de pesquisa ou reservado àqueles pacientes com his-
sérico se mantém elevado (6-20 mUI/L), mas com T4 livre sérico normal, tória familiar positiva ou fenótipo clássico.
em criança com mais de 20 dias de vida e assintomática (deve-se tratar,
portanto, de um caso de hipotiroidismo transitório), o Consenso das prin-
■■ TRATAMENTO
cipais Sociedades de Endocrinologia Pediátrica1,2 orienta que esta criança
possa ser acompanhada sem tratamento, repetindo-se o exame para de- Constitui uma emergência endocrinológica e se baseia na reposição hor-
cisão terapêutica em, no máximo, 15 dias; ou esta criança deverá receber monal. A terapia deve ser iniciada nos primeiros dias de vida, com dose
levotiroxina sódica (LT4) e poderá ser reavaliada para decisão da persistên- elevada de LT4, em tomada única, em jejum (administrar com água), mes-
cia do tratamento antes do preconizado, considerando-se o término do mo na ausência de sintomas, a fim de se atingir rapidamente as concen-
desenvolvimento cerebral (antes dos 3 anos de vida). trações de T4 consideradas ideais para minimizar os danos cerebrais. As
Crianças prematuras ou criticamente doentes (síndrome do eutiroi- necessidades hormonais decrescem com a faixa etária, sendo em média
2
diano doente) poderão apresentar T4 total ou livre baixo com TSH normal; de 100 µg/m /dia. Não se devem utilizar preparações líquidas, pois são
entretanto, não se recomenda o tratamento, a não ser que se apresentem instáveis, mas sim comprimidos (Tabela 62.1).
evidências de doença hipotalâmica ou hipofisária.
EXAMES DE IMAGEM E LABORATORIAIS TABELA 62.1 ■ Posologia de levotiroxina sódica (LT4) relativa à
idade cronológica
Radiografia do esqueleto
Ao nascimento, a radiografia anteroposterior do joelho, com ausência dos IDADE LT4 (µG/KG/DIA)
centros de ossificação epifisários do fêmur e da tíbia (disgenesia epifisária
0-3 meses 10-15
cretinoide) em recém-nascidos a termo, sugere hipotiroidismo de instala-
ção pré-natal, o que é um risco para retardo de desenvolvimento neurop- 3-6 meses 7-10
sicomotor, mesmo na era da triagem neonatal. Outras alterações esque-
léticas passíveis de serem encontradas são o desenvolvimento pobre da 6-12 meses 6-8
base do crânio, o fechamento tardio das fontanelas com suturas alargadas
1-5 anos 4-6
e ossos intersuturais, a sela turca arredondada, a pneumatização tardia e
incompleta dos seios paranasais e o osso nasal plano. Há atraso da idade 6-12 anos 3-5
óssea em relação à idade cronológica. As placas de crescimento são alar-
gadas e irregulares, sugerindo raquitismo, podendo permanecer abertas > 12 anos 2-4
por muito tempo. As vértebras podem mostrar deformidades.
As recomendações em relação ao tratamento e à monitoração das
Cintilografia de tiroide
99m 123
crianças estão resumidas no Quadro 62.2. Deve-se manter T4 no limite
Realizada com pertecnetato de sódio ( Tc) ou iodeto de sódio ( I). Em superior da normalidade e TSH baixo, mas não suprimido, evitando o
neonatos, não deve atrasar o início da terapia com levotiroxina sódica, excesso de T4, que pode promover sintomas clínicos de hipertiroidismo,
nos casos confirmados ou suspeitos. Geralmente, é realizada após os 2 avanço de idade óssea e fechamento prematuro da sutura craniana (cra-
ou 3 anos, quando a medicação pode ser suspensa por 4 a 6 semanas, niossinostose). Em neonatos sem intercorrências, iniciar com dose total, e
sem prejuízo ao desenvolvimento neurológico. A ausência de captação na aqueles com quadro clínico grave (cardiomegalia, derrame pericárdico ou
cintilografia sugere agenesia tiroidiana, passagem de anticorpos maternos
cardiopatia) devem ser internados no início do tratamento para monitora-
antirreceptor de TSH ou defeito na captação de iodo.
ção, iniciando com metade da dose, ajustando-a semanalmente, devido
Ultrassonografia de tiroide com Doppler colorido ao risco de arritmias, insuficiência cardíaca, cor anêmica ou insuficiência
suprarrenal aguda (aumento na síntese e, principalmente, da degradação
Avalia a existência ou não de tecido tiroidiano, seu volume e sua topografia.
do cortisol, com o início do tratamento). Após alguns dias do início da me-
Anticorpos antitiroidianos dicação, espera-se melhora da atividade física, mas os sinais clínicos mais
Podem eventualmente estar presentes em recém-nascidos. evidentes só desaparecem após 3 ou 4 semanas. O objetivo do tratamento
é manter o crescimento e o desenvolvimento neuropsicomotor dentro da
Dosagem de tiroglobulina normalidade.
Existe uma grande sobreposição de valores de tiroglobulina nas diferen- As crianças com diagnóstico tardio necessitam de acompanhamento
tes etiologias de HC e, portanto, ela é utilizada em situações especiais. fisioterápico e por equipe multidisciplinar: endocrinologista pediátrico;
A associação entre a tiroglobulina e a US pode distinguir entre a atireose psicólogo; fonoaudiólogo; neurologista; e assistente social. Com o ad-
e a ectopia glandular. Se nenhum tecido tiroidiano é visualizado em loca- vento dos programas de triagem neonatal, houve acentuada melhora no
lização normal e as concentrações de T4 e tiroglobulina são mensuráveis, prognóstico dos lactentes afetados. Os pacientes tratados até 2 a 3 se-
provavelmente existe um tecido funcional ectópico. manas de vida e a maioria das crianças tratadas até 6 semanas de vida
apresentam desenvolvimento neurológico normal. Apesar disso, mesmo
Teste do perclorato com tratamento correto e iniciado precocemente, disfunções cerebrais mí-
131
Útil no diagnóstico dos defeitos de síntese. Administra-se I e, após 2 nimas ainda podem ocorrer em alguns casos. Outra orientação importante
horas, perclorato de potássio (KClO4) por VO. Quando há defeito de organi- é realizar a dosagem de hormônio tiroidiano precocemente na gestação,
396 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Colesterol
P450scc (StAR)
P450c17 (17α-OH) P450c17 (17,20 liase)
Pregnenolona 17α-OH – Pregnenolona DHEA
3β-HSD-II 3β-HSD-II 3β-HSD-II
P450c17 (17α-OH) P450c17 (17,20 liase)
Progesterona 17α-OH – Progesterona Androstenediona
P450c21 P450c21 17β-HSD-III
11 – Desoxicorticosterona 11 – Desoxicortisol Testosterona
P450c11AS (11 β-OH) P450c11β (11 β-OH)
Corticosterona Cortisol
P450c11AS (18-OH)
18-0H – Corticosterona
P450c11AS (18-oxidase)
Aldosterona
Apresentação clínica
Infância e Virilização e Adrenarca precoce, Adrenarca precoce, 46,XX sem 46,XX sem Malformações
adolescência aceleração do aceleração do aceleração do puberdade puberdade esqueléticas
crescimento crescimento, crescimento, 46,XY fenótipo Alta
hiperandrogenismo hiperandrogenismo feminino mortalidade
(SOP) (SOP)
Achados laboratoriais
Cortisol ↓= ↓ ↓ ↓ ↓ ↓=
Aldosterona ↓= ↓ ↓ ↓ ↓ ↓=
Androgênios ↑ ↑ ↓ em 46,XY ↓ ↓ ↓=
↑ em 46,XX
Na ↓= ↑ ↓ ↑ ↓ ↑=
K ↑= ↓ ↑ ↓ ↑ ↓=
APR ↑= ↓ ↑ ↓ ↑ ↓=
DEFICIÊNCIA DA 21α-HIDROXILASE (P450C21) repletas de depósitos de lipídeos. Os pacientes do sexo masculino apresen-
A apresentação clínica varia de acordo com a atividade da 21α-OH. Ho- tam testículos ectópicos, e existe produção deficiente de testosterona pelo
mens afetados pela forma clássica virilizante simples da deficiência da acúmulo lipídico, de forma que não entram na puberdade e apresentam in-
21α-OH podem não ser diagnosticados ao nascimento, pois não apresen- fertilidade. Por sua vez, as mulheres afetadas podem entrar na puberdade,
tam ambiguidade genital, exceto hiperpigmentação escrotal e aumento do pois, como os ovários são relativamente inativos na vida fetal e na infância,
falo. Esses pacientes apresentam aos 2 anos de vida (ou mais tardiamen- apesar do acúmulo lipídico, conseguem manter determinada produção de
te) desenvolvimento de pilificação pubiana, axilar ou facial, odor axilar, estradiol para iniciar a puberdade e, em alguns casos, até menarca; porém,
aumento peniano, aceleração do crescimento e avanço de idade óssea, acabam evoluindo com menopausa precoce e anovulação.
caracterizando um quadro de puberdade precoce periférica. Pacientes não
diagnosticados e não tratados apresentam fusão epifisária precoce, com-
DEFICIÊNCIA DA P450 OXIDORREDUTASE (POR)
prometimento da estatura final, testículos diminuídos e infertilidade. Os Os meninos afetados são subvirilizados, e as meninas apresentam ge-
portadores da forma perdedora de sal, igualmente, podem não ser diag- nitália ambígua, indicando excesso de androgênios intraútero, porém
nosticados ao nascer, mas, em geral, apresentam crise de perda de sal 2 a não existe progressão pós-natal do grau de virilização, o que a difere da
3 semanas mais tarde. deficiência da 21α-OH. A explicação do excesso de androgênios na vida
Mulheres afetadas pela forma clássica (perdedora de sal ou virilizante fetal se deve a uma via alternativa da síntese de androgênios, além de um
simples) da deficiência da 21α-OH apresentam virilização da genitália ao defeito na atividade da aromatase placentária. As mães desses pacientes,
nascer, em graus variáveis. Pacientes não diagnosticadas ou inadequa- durante a gestação, podem apresentar virilização (acne ou hirsutismo),
damente tratadas podem desenvolver um quadro de hiperandrogenismo, que se resolve rapidamente após o parto.
caracterizado por aumento de clitóris e acne, clinicamente semelhante A maioria dos pacientes apresenta anormalidades esqueléticas, ca-
ao da síndrome dos ovários policísticos (SOP), incluindo cistos ovarianos, racterísticas da síndrome de Antley-Bixler, associadas à ambiguidade ge-
anovulação, amenorreia ou ciclos menstruais irregulares, infertilidade e nital. O mecanismo pelo qual ocorrem essas malformações esqueléticas
resistência à insulina. ainda não está elucidado, mas, possivelmente, está ligado aos distúrbios
A forma não clássica não apresenta sintomas ao nascer. A apresen- da síntese do colesterol. As malformações esqueléticas incluem: malfor-
tação clínica na infância inclui pilificação pubiana precoce (adrenarca mações craniofaciais; hipoplasia da face; nariz piriforme; estenose ou
precoce), aceleração do crescimento e avanço da maturação óssea, além atresia de coanas; estenose do canal auditivo externo; orelhas displásicas;
de hirsutismo, ciclos menstruais irregulares, acne e infertilidade, quadro cranioestenose em vários graus; clinodactilia; sinostose radioumeral ou ra-
clínico muito semelhante ao da SOP. dioulnar; aracnodactilia; contraturas articulares; e arqueamento femoral.
Diagnóstico genético e aconselhamento vos ocorrem, de maneira geral, em aproximadamente 1% dos testes e são
A análise molecular pode determinar a forma da HSRC, já que existe uma atribuídos, principalmente, ao estresse neonatal por doença coexistente, à
boa correlação entre genótipo e fenótipo. Diversas mutações no gene prematuridade e ao baixo peso ao nascimento; as duas últimas condições
CYP21 foram descritas, e podem ser agrupadas em três categorias: dele- contribuem para cerca de 70% desses resultados.
ções ou mutações nonsense, que determinam a perda total da atividade O ponto de corte para 17α-OHP na triagem neonatal pode variar de
enzimática, normalmente associadas às formas com perda de sal; muta- centro para centro, dependendo da técnica utilizada (recomenda-se o en-
ções que preservam 1 a 2% da atividade enzimática e permitem síntese saio imunofluorimétrico quantitativo), da etnia, do peso ao nascimento,
adequada de aldosterona, resultando na HSRC virilizante simples; ou mu- tempo da coleta e das intercorrências perinatais. Entretanto, recomenda-
tações que preservam a atividade enzimática em 20 a 60%, sendo as mais -se que o ponto de corte seja estabelecido, independentemente da técnica
frequentes aquelas associadas à forma não clássica da HSRC. utilizada, próximo ao percentil 99 de uma curva normal de neonatos em
Heterozigose composta para duas diferentes mutações de CYP21, em sangue de papel de filtro. Os valores de 17α-OHP são invariavelmente mais
geral, resulta em um fenótipo compatível com a presença de defeito mais elevados em RN com baixo peso (< 2.000 g) e prematuros (< 34 semanas
leve. As mutações splicing apresentam uma variabilidade genótipo-fenó- de idade gestacional). Isso decorre da inabilidade do fígado imaturo em
tipo, desde a forma perdedora de sal até a virilizante simples. Mais da metabolizar de forma adequada a 17α-OHP e/ou ao estresse causado por
metade das formas não clássicas em mulheres consiste em heterozigose intercorrências agudas comuns nessas situações.
composta, carreando uma mutação grave do gene CYP21, que, se com- Para os casos identificados como suspeitos pela triagem neonatal,
binada com outra mutação grave carreada pelo pai, pode gerar um feto realizam-se os exames hormonais confirmatórios no soro. Os RN afeta-
afetado pela forma clássica. dos pela forma clássica apresentam valores muito elevados de 17α-OHP.
Entretanto, 7 a 17% dos casos com resultados falso-positivos no 1o teste
DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL DA DEFICIÊNCIA DA não apresentam normalização de 17α-OHP, apesar de assintomáticos, e
21α-HIDROXILASE (P450C21) necessitarão de seguimento clínico e laboratorial até que haja definição
diagnóstica ou normalização da 17α-OHP. Para esses casos, a pesquisa de
Por ser de herança autossômica recessiva, a probabilidade de a família mutações no gene CYP21A2 tem sido proposta como teste confirmatório
ter um novo filho com HSRC é de 25%. O objetivo principal do diagnóstico em análise de amostras de DNA de sangue periférico, já que 90 a 95%
pré-natal é evitar a virilização da genitália externa feminina e tem sido dos RN afetados são heterozigotos compostos ou homozigotos para um
realizada por meio da dosagem da 17α-OHP no líquido amniótico e da número limitado de mutações, o que diminuiria os custos do acompanha-
a a
tipificação do HLA nas células amnióticas, durante a 16 a 20 semana de mento a longo prazo (em criança sem definição diagnóstica) e a ansiedade
gestação, além da biópsia do vilo corial (9a semana de gestação), em que das famílias.
se podem realizar o cariótipo e a análise do DNA. O tratamento consiste no
uso de dexametasona pela mãe, na dose de 20 μg/kg/dia (1 a 1,5 mg/dia), DEFICIÊNCIA DA 11β-HIDROXILASE (P450C11)
a a
dividida em 2 a 3 tomadas, iniciada antes da 6 a 7 semana de gestação,
As anormalidades bioquímicas incluem excesso de produção de precur-
impedindo que haja elevação dos androgênios suprarrenais e a virilização
sores, 11-deoxicorticosterona na zona fasciculada (DOC, com efeito mi-
da genitália externa das pacientes 46,XX.
neralocorticosteroide) e 11-deoxicortisol na zona glomerulosa (composto
Triagem neonatal para deficiência da 21 α-hidroxilase S), assim como aumento na síntese de androgênios na zona reticulada. A
A HSRC é uma doença elegível para inclusão no Programa Nacional de renina está suprimida, a produção de aldosterona está baixa (pelo efeito
Triagem Neonatal (PNTN) pelos seguintes motivos: mineralocorticosteroide da DOC) e a produção de cortisol deficiente. As
é uma doença de alta prevalência e elevada morbimortalidade, concentrações de 17α-OHP podem estar moderadamente elevadas, o que
cujo diagnóstico e tratamento precoces são disponíveis e melho- pode confundir com a deficiência de 21α-OH, nos casos em que DOC e
ram a evolução; composto S não são avaliados.
a introdução precoce da terapia de reposição hormonal é capaz
DEFICIÊNCIA DA 3β-HIDROXIDESIDROGENASE TIPO II
não só de prevenir a morte do recém-nascido (RN) e as compli-
cações pós-natais, como diminuir o impacto psicológico e finan- As concentrações basais de esteroides ∆ 5, como a pregnenolona, a
ceiro para os indivíduos afetados e para o sistema de saúde. Tem 17α-hidroxipregnenolona (17α-OH-pregnenolona) e a DHEA estão eleva-
especial importância nos neonatos do sexo masculino, uma vez das em indivíduos afetados, e a razão ∆5:∆4, também. As concentrações de
que eles não seriam diagnosticados precocemente, já que não 17α-OH-pregnenolona pós-estímulo com ACTH parecem ser mais adequa-
exibem a ambiguidade genital, que permite o diagnóstico no sexo das para o diagnóstico dessa forma de HSRC, se comparadas às concentra-
feminino. ções basais de DHEA ou à razão DHEA:∆4A (androstenediona).
A triagem neonatal para HSRC teve início em 1997 e, atualmente, é
realizada em diversos países, inclusive no Brasil, sendo recomendada a DEFICIÊNCIA DA 17α-HIDROXILASE — 17,20 LIASE
coleta da 17α-OHP após 48 a 72 horas de vida. A partir de 2013, a pesqui- (P450C17)
sa de HSRC (e deficiência de biotinidase) foi introduzida no PNTN, sendo Todos os esteroides que necessitam da atividade enzimática da P450c17
obrigatória por lei, estando acoplada à triagem neonatal de hipotiroidis- estão diminuídos ou ausentes (17α-OH-pregnenolona, 17α-OHP, 11-deo-
mo congênito, fenilcetonúria, fibrose cística, doença falciforme e outras xicortisol, cortisol, DHEA, androstenediona e testosterona). As concen-
hemoglobinopatias. trações de progesterona, basais e pós-estímulo, estão significativamente
Apesar da eficácia da triagem neonatal da HSRC, um de seus grandes elevadas, o que, em conjunto com baixas concentrações de 17α-OHP e
problemas é a elevada frequência de resultados falso-positivos ou falso- 11-deoxicortisol e a ausência de virilização da genitália externa, dife-
-negativos. Os principais fatores associados a resultados falso-negativos rencia a deficiência da 21α-OH ou 11β-OH da deficiência da P450c17. As
são a coleta precoce da amostra de sangue, antes das 48 horas de vida, e concentrações de DOC estão elevadas (> 100 ng/dL), e a renina pode
o uso de corticosteroide pela mãe no periparto. Os resultados falso-positi- estar diminuída ou normal, na presença de hipertensão. As gonado-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 401
trofinas (LH e FSH) estão elevadas, devido à diminuição dos esteroides desenvolvimento de uma insuficiência suprarrenal. No período neonatal
sexuais (androgênios e estrogênios). As baixas concentrações de cortisol e no 1o ano de vida, doses mais elevadas de glicocorticosteroide podem
e androgênios suprarrenais (DHEA e ∆4A) não se elevam após estímulo 2
ser necessárias (até 25 mg/m /dia). Como alternativa à hidrocortisona,
com ACTH. especialmente nos adolescentes, após cessar o crescimento, e em adul-
2
tos, pode-se utilizar a prednisolona na dose de 3 a 6 mg/m /dia, dividida
DEFICIÊNCIA DA P450SCC (STAR) em duas tomadas; prednisona na dose de 5 a 7,5 mg/dia, dividida em
Resulta em deficiência de aldosterona, cortisol e esteroides sexuais. La- duas tomadas; ou dexametasona na dose de 0,25 a 0,5 mg/dia, dividida
boratorialmente, todos os esteroides têm concentrações inferiores ao nor- em 1 ou 2 tomadas.
mal, com aumento da APR e das concentrações de ACTH. Nas crianças com perda de sal, utiliza-se o mineralocorticosteroide
sintético, 9α-fludrocortisona, na dose de 0,05 a 0,2 mg/dia, por meio de
DEFICIÊNCIA DA P450 OXIDORREDUTASE (POR) cápsulas. Nessas crianças, deve ser feita também a suplementação do só-
Como afeta inúmeras enzimas, pode levar a um perfil variável de secre- dio na dose de 1 a 2 g de cloreto de sódio, diariamente, durante o período
ção dos esteroides nos pacientes acometidos. Pode existir elevação de neonatal. Em situação de estresse, é necessário duplicar (ou triplicar) a
17α-OHP (embora não tão elevada quanto na deficiência de 21α-OH), seja dose de manutenção do corticosteroide e do mineralocorticosteroide.
basal ou após estímulo com ACTH, elevação de progesterona, pregnenolo- Os parâmetros clínicos e bioquímicos para a avaliação do trata-
na e 17α-OH-pregnenolona, cortisol basal normal (mas sem resposta após mento são: remissão dos sinais de virilização; ritmo de crescimento
teste do ACTH), androgênios suprarrenais (DHEA e ∆4A), concentração de linear; idade óssea adequada; ausência de sinais de hipercortisolismo;
testosterona normal ou baixa e aumento do DOC (nos pacientes que cur- concentrações plasmáticas normais de ∆4A (principalmente), testostero-
sam com hipertensão). na e 17α-OHP (esta última deve ser mantida entre 100 e 1.000 ng/dL).
Essas concentrações, assim como as de aldosterona e a APR, podem
■■ TRATAMENTO não normalizar com o uso isolado de glicocorticosteroide. A utiliza-
A meta do tratamento clínico e cirúrgico da HSRC é obter boa qualidade de ção de mineralocorticosteroide, nessas condições, mesmo sem perda
vida, crescimento normal, maturação sexual durante a infância e adoles- de sal comprovada, tem sido benéfica, porque diminui as doses ne-
cência, função sexual normal e, se possível, fertilidade na vida adulta. Os cessárias de glicocorticosteroide, melhorando o crescimento linear.
princípios do tratamento envolvem reposição apropriada dos hormônios A 9α-fludrocortisona tem sido usada na dose de 0,1 mg/dia nas formas
suprarrenais e dos esteroides gonadais, se produzidos inadequadamente. não perdedoras de sal.
Também requer correta definição sexual dos neonatos com ambiguidade O tratamento tradicional da HSRC pode implicar hipercortisolismo e/
genital e terapia psicológica para os casos com diagnóstico tardio ou tra- ou hiperandrogenismo, por isso, em alguns casos, preconiza-se o uso de
tamento inadequado. medicamentos antiandrogênicos (acetato de ciproterona ou flutamida) e
O tratamento cirúrgico tem como objetivo promover um reparo estéti- inibidor da aromatase, responsável pela conversão de androgênio a es-
co e funcional de acordo com o sexo estabelecido. Deve ser precoce (antes trogênio (testolactona, anastrazol ou letrozol). Essa associação permite a
dos 18 meses de vida) para permitir a identificação sexual e a adequação redução das doses de glicocorticosteroide. Nos casos que evoluem com
psicológica da criança. Na puberdade, realiza-se a correção definitiva após puberdade precoce central, deve-se considerar a associação do análogo
rigoroso estudo anatômico com os métodos de diagnóstico por imagem. de gonadotrofinas (GnRHa).
Em todas as formas de HSRC, a terapia com glicocorticosteroide é
essencial para a reposição de cortisol e para suprimir a produção excessi-
va de ACTH, prevenindo também hipoglicemia e sintomas do excesso de REVISÃO
androgênios. Nos casos dos perdedores de sal, a reposição com minera-
A forma mais frequente de HSRC é a deficiência de 21α-OH, cujo
locorticosteroide e sódio é necessária para normalizar e manter o balanço
marcador laboratorial é a elevação da 17α-OHP.
hidreletrolítico. Nas deficiências da 3β-HSD-II, StAR, 17α-OH – 17,20 liase,
Todas as formas de HSRC cursam com perda de sal, com exceção das
deve-se também fazer a reposição dos esteroides sexuais na ocasião da
deficiências de 11β-OH (que pode cursar com hipertensão arterial),
puberdade, de acordo com o sexo de criação.
de 17α-OH – 17,20-liase e da POR.
TRATAMENTO CLÁSSICO Clinicamente, pensa-se na deficiência de 21α-OH em RN sem gô-
nadas palpáveis (46,XX) e com genitália ambígua. No sexo mas-
Todos os RN suspeitos para HSRC, com base na presença de ambiguida- culino (46,XY), não há sinais clínicos ao nascer ou estes são pouco
de genital, diagnóstico pré-natal, triagem neonatal ou concentrações de expressivos.
17α-OHP, devem ser tratados com doses farmacológicas de glicocorticos- A perda de sal, em geral, ocorre por volta da 3a semana de vida.
teroides até a confirmação do diagnóstico, independentemente da pre- Dessa forma, eletrólitos normais ao nascimento não afastam defi-
sença de perda de sal. Em RN, os sintomas de insuficiência suprarrenal ciência de 21α-OH forma perdedora de sal.
não são evidentes, as concentrações de sódio não atingem 125 mEq/L e, A forma não clássica (tardia) da deficiência de 21α-OH não apresen-
geralmente, as crises de perda de sal ocorrem por volta da 2a ou 3a semana ta sintomas ao nascer, aparece como adrenarca precoce na infância,
de vida. Portanto, dosagem de sódio normal ao nascer não afasta o diag- além de aceleração do crescimento e avanço da maturação óssea,
nóstico da doença. hirsutismo, ciclos menstruais irregulares, acne e infertilidade, qua-
Em crianças, a terapia de reposição do cortisol é realizada com so- dro clínico muito semelhante ao da SOP.
lução de hidrocortisona na dose de 8 a 12 mg/m2/dia, dividida em 2 a O tratamento da HSRC deve ser realizado com glicocorticosteroide e
3 tomadas. Essas doses excedem as concentrações fisiológicas de se- mineralocorticosteroide. Nas deficiências da 3β-HSD-II, StAR, 17α-
creção do cortisol (6 a 7 mg/m2/dia em crianças e adolescentes e 7 a OH – 17,20 liase, deve-se também fazer a reposição dos esteroides
9 mg/m2/dia em neonatos) com o intuito de suprimir adequadamente a sexuais na ocasião da puberdade.
produção dos androgênios suprarrenais e minimizar a possibilidade do
402 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Além da puberdade precoce completa, existem variantes da normalida- endometrial) e a citologia hormonal vaginal, que avalia a ação estrogê-
de, como a ACCP, e variantes incompletas, que incluem a telarca precoce e a nica pelo índice de maturação das células intermediárias e superficiais
adrenarca precoce. Essas condições também serão discutidas neste capítulo. do epitélio vaginal.
■■ DIAGNÓSTICO ATENÇÃO!
Clínico, com base na presença dos caracteres sexuais secundários. No Na puberdade precoce periférica, como não ocorre ativação do eixo
entanto, o critério idade não deve ser utilizado isoladamente, sendo de HHG, os testículos não estão estimulados, e existe uma desproporção
fundamental importância avaliar os outros aspectos do desenvolvimento, entre os tamanhos do testículo e do pênis e os valores de testosterona
como ritmo de progressão dos caracteres sexuais, velocidade de cresci- sérica, devendo-se pensar em outras fontes de estimulação, indepen-
mento e ritmo de maturação óssea. É necessário estabelecer a relação dentes do eixo HHG.
entre idade cronológica (IC)*, idade estatural (IE) e idade óssea (IO).
Clinicamente, em geral no sexo feminino, é difícil diferenciar a puber-
dade precoce dependente da independente de gonadotrofinas, visto que A comprovação hormonal da puberdade precoce dependente de
ambas evoluem com aceleração do crescimento e da maturação óssea, gonadotrofinas implica a demonstração de ativação do eixo HHG e das
assim como sinais de excesso de produção de estrogênios, que estimula concentrações de gonadotrofinas características da puberdade (LH, FSH).
o desenvolvimento das mamas. A produção androgênica nas meninas é Quando as concentrações basais de gonadotrofinas estão elevadas,
sempre de origem periférica, suprarrenal ou ovariana. No sexo masculino, pode-se concluir que o eixo HHG está ativado. No entanto, nem sem-
o desenvolvimento testicular, ou melhor, a proporção entre as concentra- pre essa avaliação permite caracterizar o início da puberdade e, muitas
ções séricas de testosterona e o tamanho do testículo, são sinais impor- vezes, são necessários testes de estímulo com o GnRH, ou seu análogo
tantes de ativação do eixo HHG, que orientam o diagnóstico diferencial (GNRHa), para comprovar um padrão puberal de produção hormonal de
entre as duas condições. origem central.
A IO, nas crianças com puberdade precoce, geralmente está avan-
çada em relação à IC e à IE, caracterizando a perda estatural. Em rela- ATENÇÃO!
ção às dosagens de esteroides sexuais, a testosterona total sérica, no
sexo masculino, apesar das críticas aos ensaios, é um bom exame, ao Em todos os casos em que existe estimulação do eixo HHG, deve-se
contrário da dosagem de estradiol no sexo feminino. Neste último caso, realizar RM de sela túrcica, para afastar possíveis patologias tumorais
avalia-se a ação indireta do estrogênio por meio de exames subsidiários, na região, em especial no sexo masculino.
entre os quais a própria maturação óssea (avançada em relação à IC), a
US pélvica (avaliando tamanho de útero e ovários, se existe presença
de cistos foliculares indicativos de funcionamento do eixo HHG, e ECO ■■ ETIOLOGIA
Nas Figuras 64.1 e 64.2, está descrita a etiologia da puberdade precoce
*Neste capítulo, onde consta IC, leia-se idade cronológica. nos sexos feminino e masculino, respectivamente.
Idiopática
Endógeno Exógeno Orgânica
Testosterona creme Tumor cerebral
Hamartoma hipotalâmico
Fonte suprarrenal Glioma
Fonte testicular Hiperplasia suprarrenal Anomalia congênita
Tumor suprarrenal Hidrocefalia
Cisto aracnoide
Disgenesia cerebral
Excesso de LH aparente Lesão ao SNC
Autônomo Síndrome de McCune Albright Infecção
Tumor testicular Testotoxicose Trauma
Tumor produzindo hCG Cirurgia
Exposição à radiação
PUBERDADE PRECOCE DEPENDENTE DE dade precoce limitada ao sexo masculino, também chamada de testoto-
GONADOTROFINAS xicose).
Os tumores suprarrenocorticais mais frequentes na infância são os
A etiologia idiopática é a mais comum no sexo feminino e inclui todos
carcinomas produtores de androgênios, que também podem produzir gli-
os casos de precocidade cuja investigação cuidadosa não identifica uma
cocorticosteroides, com manifestações clínicas associadas de virilização
causa. É, portanto, um diagnóstico de exclusão. Entretanto, com a evolu-
e síndrome de Cushing. Os hormônios esteroides, produzidos na região
ção dos métodos diagnósticos, especialmente da RM, demonstrou-se que
reticular, de-hidroepiandrosterona (DHEA) e, principalmente, sua forma
várias crianças, antes com diagnóstico de puberdade idiopática, apresen-
sulfatada (S-DHEA), são considerados marcadores tumorais, embora, em
tavam lesões no SNC, principalmente hamartomas hipotalâmicos.
alguns casos de adenocarcinoma, valores normais já tenham sido descri-
As causas neurogênicas incluem todas as anormalidades do SNC,
tos. A HCSR é causada por deficiência de diversas enzimas envolvidas na
congênitas ou adquiridas, e são mais frequentes em pacientes do sexo
esteroidogênese suprarrenal, principalmente da 21-hidroxilase, da 11-hi-
masculino. Entre os tumores associados à puberdade precoce, os mais
droxilase e da 3-β-desidrogenase.
comuns estão geralmente localizados na região suprasselar, destacando-
Os cistos ou os tumores ovarianos podem secretar estrogênios em
-se: hamartomas; gliomas; ependimomas; astrocitomas; e teratomas. Os
quantidades suficientes para desencadear o desenvolvimento mamário e
hamartomas são classificados como malformações congênitas benig-
até o sangramento vaginal, sendo o mais frequente o tumor das células
nas e, em alguns casos, secretam um fator hipotalâmico, que estimula
da granulosa.
a secreção das gonadotrofinas hipofisárias. Esses tumores podem es-
A síndrome de McCune-Albright predomina no sexo feminino e se ca-
tar associados ao quadro de epilepsia gelástica, caracterizada por cri-
racteriza pela tríade manchas café com leite, puberdade precoce e displa-
ses convulsivas generalizadas, acompanhadas de risco de retardo do
sia fibrosa poliostótica dos ossos longos e do crânio. A doença é resultante
desenvolvimento motor e cognitivo. Na presença de outras lesões do de mutação somática ativadora do gene da subunidade alfa da proteína G,
SNC, gliomas ópticos (presentes na neurofibromatose), displasia septo- com consequente hiperfunção glandular autônoma, podendo estar asso-
-óptica, meningomielocele, hidrocefalia e após traumas, a precocidade ciada a gigantismo, acromegalia, hipertiroidismo e síndrome de Cushing.
sexual pode resultar da ruptura da inibição tônica hipotalâmica, ou da Os tumores testiculares, raros na infância, são, na sua maioria, tumo-
ativação do eixo HHG, com aumento na secreção pulsátil do GnRH e das res de células de Leydig. Caracterizam-se por rápida evolução dos sinais
gonadotrofinas. clínicos dependentes de androgênios, com assimetria testicular e tumor
palpável. As concentrações de testosterona estão bastante elevadas.
PUBERDADE PRECOCE INDEPENDENTE DE Massas intraescrotais uni ou bilaterais podem representar resto de tecido
GONADOTROFINAS suprarrenal em meninos com HCSR tratada de forma inadequada. Na tes-
Nessa condição, o processo de desenvolvimento puberal ocorre indepen- totoxicose, que resulta de uma mutação ativadora do receptor de LH gene-
dentemente do controle do eixo HHG e não obedece à cronologia dos ticamente herdada, as células de Leydig produzem testosterona de forma
eventos puberais normais, sendo totalmente imprevisível. As causas mais incondicional, independente do eixo HHG, e o volume testicular pode estar
frequentes são de origem suprarrenal (HCSR e tumores suprarrenocorti- discretamente aumentado, porém desproporcional às concentrações de
cais) ou gonadal (tumores, cistos, síndrome de McCune-Albright e puber- testosterona, em geral bastante elevadas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 405
■■ TRATAMENTO E PROGNÓSTICO
QUADRO 65.2 ■ Principais doenças incluídas no diagnóstico
diferencial da criança com dor musculoesquelética O primeiro passo para um tratamento bem-sucedido é a educação dos
pacientes e dos familiares. Apesar da ausência de alterações orgânicas, a
Neoplásicas: leucemia, neuroblastoma, linfoma, tumores ósseos e de dor existe e pode ser atenuada por meio da prática regular de exercícios
partes moles aeróbios, como caminhadas e natação (5 a 6 vezes por semana, por um
Hematológicas: doença falciforme, hemofilia e talassemia mínimo de 30 minutos), além de medidas simples, como a orientação
Infecciosas: osteomielite, artrites reativas, tuberculose, discite, para um sono adequado. Algumas modalidades complementares, como
miosites virais e bacterianas a terapia cognitivo-comportamental (TCC), a acupuntura, o relaxamento
Inflamatórias/reumáticas: AIJ, dermatomiosite juvenil, febre reumática,
e o biofeedback, auxiliam no controle da dor, o que reforça a importância
LES, arterite de Takayasu
de uma equipe multiprofissional. Os analgésicos e/ou anti-inflamatórios
Ortopédicas: necrose asséptica da cabeça do fêmur, epifisiólise,
não têm indicação na DMEI. Alguns pacientes podem se beneficiar de
fraturas de estresse, osteocondrites, sinovite transitória de quadril
Metabólicas: hipo/hipertiroidismo, diabetes, hipo/hiperparatiroidismo.
medicamentos que melhoram a qualidade do sono, como a amitriptilina
Entre as causas de dor musculoesquelética idiopática, estão a e a ciclobenzaprina.
fibromialgia juvenil e as síndromes da hipermobilidade articular, a
dor complexa regional, a dor em membros (“dor de crescimento”) e a
síndrome miofascial ATENÇÃO!
AIJ: artrite idiopática juvenil; LES: lúpus eritematoso sistêmco. Cerca de 70% dos pacientes melhoram dos sintomas álgicos quando
seguem as orientações descritas. No entanto, as recidivas são fre-
quentes, bem como a presença de dores recorrentes em outras lo-
■■ DIAGNÓSTICO calizações.
A anamnese deve ser realizada segundo o descrito para a abordagem das
dores de outras localizações. Também é muito importante a realização de
exame físico do aparelho locomotor, em virtude do quadro clínico apre-
REVISÃO
sentado: postura e marcha; força muscular; reflexos; semiologia articular,
incluindo a procura da hipermobilidade articular (9 pontos); palpação dos A dor musculoesquelética, queixa comum na infância e na adoles-
pulsos; palpação dos grupos musculares; avaliação da coluna; e medida cência, pode ser idiopática ou estar relacionada a doenças orgâni-
do comprimento dos membros. cas, como infecções ou neoplasias.
O diagnóstico se baseia na anamnese, com ênfase no padrão da dor
e na presença de manifestações em outros sistemas e aparelhos.
QUADRO 65.3 ■ Sinais de alerta para dor crônica que sugerem Os exames laboratoriais básicos são o hemograma e as provas de
presença de doença orgânica atividade inflamatória (proteína C-reativa e VHS). Os exames ASLO e
FAN só devem ser solicitados na suspeita de febre reumática ou de
Dor localizada e fixa doença autoimune, como AIJ e LES.
Persistência da dor, com piora da intensidade É necessária uma abordagem terapêutica nos casos sem causa
Dor com irradiação para quadril, joelho ou região lombossacral orgânica aparente, uma vez que a dor tem um impacto negativo
Dor acompanhada de parestesias, câimbras ou fraqueza
na qualidade de vida, especialmente nos aspectos social e escolar.
Dor à palpação dos grupos musculares
A orientação para hábitos de vida saudáveis, como a prática de es-
Dor à movimentação passiva
portes e horário de sono adequado, auxilia no controle dos sinto-
Diminuição da força muscular
mas álgicos em crianças com DMEI.
Alterações na marcha ou recusa para andar
Manifestações sistêmicas associadas, como febre, anemia,
rash cutâneo, perda de peso, presença de visceromegalias e/ou
linfonodomegalias ■■ LEITURAS SUGERIDAS
Mudança no padrão da dor
Buskila D, Ablin J. Pediatric fibromyalgia. Reumatismo. 2012;64(4):230-7.
Cunningham NR, Kashikar-Zuck S. Nonpharmacological treatment of pain
Quando a anamnese e o exame físico não indicam a presença de uma in rheumatic diseases and other musculoskeletal pain conditions. Curr
Rheumatol Rep. 2013;15(2):306.
doença específica, realiza-se uma investigação laboratorial inicial com he-
Molina J, Silva SGL, Teles FM, Fraga MM, Paulo LTSP, Bugni V, et al. Dor
mograma completo e provas de atividade inflamatória (velocidade de he-
musculoesquelética idiopática difusa na infância e na adolescência. Rev
mossedimentação [VHS] e proteína C-reativa). No caso de diminuição da Paul Pediatr. 2011;29(2): 294-9.
força muscular, devem ser solicitadas as enzimas musculares: creatinofos- Sherry DD, Brake L, Tress JL, Sherker J, Fash K, Ferry K, Weiss P. The treatment of
focinase, aldolase, transaminases e lactato desidrogenase. Não havendo juvenile fibromyalgia with na intensive physical and psychosocial program.
suspeita de doença reumática, não é necessária a solicitação de fator an- J Pediatr. 2015;167(3):731-7.
tinuclear (FAN), fator reumatoide e antiestreptolisina-O (ASLO). Nos casos Sherry DD. Pain Amplification Syndromes. In: Petty RE, Laxer RM, Lindsley CB,
de dor localizada, recomenda-se a solicitação de exames de imagem (prefe- Wedderburn L. Textbook of pediatric rheumatology. 7th ed. Philadelphia:
rencialmente bilateral, para comparação, e em posição ortostática, quando Elsevier; 2015. p. 681-92.
for o caso).
408 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
1 | Trauma
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL 2 | Artrite relacionada com infecção
DAS ARTRITES Séptica:
Bacteriana, gonocócica, tuberculosa
Fúngica
Viral (rubéola, eritrovírus, hepatite B e C, herpesvírus)
■■ MARIA TERESA TERRERI Pós-infecciosa
■■ VANESSA BUGNI MIOTTO E SILVA Por bypass
Endocardite bacteriana
Meningococcemia
Artrite é um processo inflamatório articular caracterizado pela presença de Artrite reativa
derrame articular ou, em sua ausência, pela presença de pelo menos dois Bacteriana
dos seguintes sinais flogísticos: dor; calor; hiperemia e limitação funcional. Febre reumática/artrite pós-estreptocócica
De maneira didática, define-se artrite aguda quando os sinais e sin- Infecção entérica
Viral
tomas duram até seis semanas, e artrite crônica, nos casos de inflamação
Parasitoses intestinais
persistente por mais de seis semanas. No entanto, na prática clínica, essa
3 | Doenças linfoproliferativas
diferenciação nem sempre é possível.
Leucemias
Linfomas
■■ ARTRITES AGUDAS Tumores ósseos
4 | Doenças hematológicas
ETIOLOGIA Anemia falciforme
Existem várias causas de artrite aguda que devem ser lembradas pelo pe- Talassemia
diatra e pelo reumatologista. Algumas necessitam de diagnóstico precoce, Hemofilia
devido à necessidade de tratamento imediato diretamente ligado ao seu 5 | Vasculites
prognóstico, como a artrite séptica, a artrite da febre reumática e a artrite Eritema nodoso
das doenças linfoproliferativas. Púrpura de Henoch-Schönlein
Doença de Kawasaki
6 | Doenças reumáticas autoimunes
ATENÇÃO! 1
Fonte: Petty e colaboradores.
As artrites séptica, da febre reumática e das doenças linfoproliferativas
são urgências no diagnóstico das artrites agudas.
de neutrófilos. A cultura é positiva em cerca de 70% dos casos. No hemo-
As causas de artrite aguda são: trauma, artrite séptica, artrite reativa, grama, observam-se leucocitose com neutrofilia e aumento de provas infla-
doenças linfoproliferativas, doenças hematológicas (anemia falciforme, ta- matórias. A radiografia é de pouca ajuda na fase inicial. A ultrassonografia
lassemia e hemofilia), vasculites e doenças reumáticas do tecido conectivo (US) auxilia na detecção de derrame articular, especialmente no quadril.
(Quadro 66.1). A ressonância magnética (RM) pode auxiliar no diagnóstico.
O tratamento é inicialmente endovenoso, e a drenagem aberta com
Artrite traumática lavagem da articulação é recomendada. A duração da antibioticoterapia
Mais comum em meninos em idade escolar e adolescentes. Nem sempre a é de 6 a 8 semanas. O prognóstico depende de diagnóstico e tratamento
história de trauma está presente. O derrame articular é geralmente hemor- precoces (menos de 2 a 5 dias do início dos sintomas).
rágico e decorrente de sangramento intra-articular consequente ou não à A artrite viral é causada principalmente pela família dos togavírus (ru-
fratura. A evolução costuma ser boa com regressão em poucos dias. béola), mas pode ocorrer também devido a parvoviroses (eritrovírus B19),
as hepatites (hepatite B e C) e, mais raramente, por adenovírus, herpesvírus
Artrite séptica Epstein-Barr vírus (EBV), citomegalovírus (CMV), varicela-zóster, herpes-
Ocorre quando o agente infeccioso é encontrado na articulação. Ocorre -simples, vírus do sarampo etc. Ocorre mais em adolescentes e adultos do
mais em meninos, recém-nascidos e lactentes. As bactérias são o agente que em crianças. A artralgia ou artrite aguda associa-se a febre e exantema
etiológico mais frequente, porém vírus, espiroquetas e fungos também po- e costuma ser migratória e de curta duração. As pequenas articulações são
dem causar artrite séptica. O agente etiológico mais comum em qualquer mais afetadas na rubéola e hepatite B, ao passo que as grandes articula-
idade é o Staphylococcus aureus. As vias de disseminação da infecção são ções (especialmente joelhos) são mais afetadas na varicela, no sarampo e
hematogênica, por contiguidade ou trauma. em outras viroses.
Geralmente, é monoarticular, e o comprometimento de quadril é o
Artrite das doenças linfoproliferativas
mais comum, seguido do joelho. Sintomas clínicos de infecção, como fe-
bre, prostração e queda do estado geral, são comuns, embora possam A leucemia aguda é a neoplasia mais frequente na infância e pode se apre-
estar ausentes. Ao exame físico, observa-se articulação com aumento de sentar apenas com manifestações musculoesqueléticas antes mesmo das
volume, dor intensa, limitação, calor e rubor. A osteomielite com frequên- alterações laboratoriais. A dor leva à recusa a andar, pode ser difusa de
cia acompanha a artrite séptica. membros, geralmente em região metafisária dos ossos longos. A artrite
O diagnóstico é confirmado pela punção articular para análise do líqui- ou artralgia ocorre em grandes articulações, em geral, em poucas articula-
do sinovial, que apresenta aumento de número de células com predomínio ções e principalmente em joelhos. A dor noturna, a queda progressiva da
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 409
seis meses de doença. No início, podem ocorrer sintomas constitucionais, oligoarticular: leucemias, artrite tuberculosa, hanseníase, tumo-
como fadiga, anorexia, perda de peso, anemia e febre baixa. A artrite ge- res osteoarticulares, hemofilia, anemia falciforme, sinovite vilono-
ralmente envolve as grandes e pequenas articulações de membros supe- dular, sarcoidose etc.;
riores e inferiores, embora o esqueleto axial, incluindo a coluna cervical e poliarticular: leucemias, doença de Lyme, doenças genéticas (mu-
as articulações temporomandibulares (ATMs), possam ser afetadas. copolissacaridoses), dermatomiosite juvenil, esclerodermia, lúpus
Divide-se em subtipo fator reumatoide (FR) positivo e subtipo FR ne- eritematoso sistêmico (LES) juvenil etc.;
gativo, ambos afetando mais meninas do que meninos. sistêmico: leucemias, infecções exantemáticas virais, LES juvenil,
O FR positivo ocorre em menos de 10% dos pacientes, especialmen- vasculites, doença de Castelman, doenças autoinflamatórias (febre
te em meninas adolescentes, com envolvimento simétrico de pequenas familiar do mediterrâneo, síndrome hiperIgD, doença inflamatória
articulações, sinovite erosiva de início precoce, nódulos reumatoides e multissistêmica de início neonatal/síndrome infantil crônica neuro-
deformidades clássicas, semelhantes à artrite reumatoide (AR) do adulto. lógica, cutânea e articular – NOMID/CINCA), etc.
Pacientes com FR negativo constituem 30% das AIJ e, frequentemen-
te, desenvolvem artrite na primeira infância, entre 1 e 3 anos de idade,
com prognóstico variável. ATENÇÃO!
FLUXOGRAMA 66.1 ■ Tratamento da AIJ de acordo com o acometimento articular e a atividade da doença.
AINH: anti-inflamatórios não hormonais; GC: glicocorticoides; GCIA: glicocorticoides intra-articulares; MTX: metotrexato; LFN: leflunomide; SFZ: sulfasalazina; TNFα: fator de
necrose tumoral alfa; FMP: fator de mau prognóstico.
*AINH e GCIA como adjuvantes.
412 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
67
T, é reservado para pacientes com má resposta ao uso dos inibidores
do TNF-α. O tocilizumabe está indicado nos casos poliarticulares e sis-
têmicos (com ou sem artrite ativa). O rituximabe – antilinfócitos B (EV)
está indicado nos casos poliarticulares com FR positivo (acima de 18 FEBRE REUMÁTICA
anos). A mudança de um imunobiológico para outro é indicada no caso
de resposta parcial ou não resposta, com persistência da atividade in-
flamatória.
Os principais eventos adversos dos imunobiológicos são infecções, ■■ MARIA TERESA TERRERI
reações infusionais, produção de anticorpos anti-quiméricos humanos ■■ DANIELA GERENT PETRY PIOTTO
(HACA), maliginidades, entre outros, específicos de cada medicação.
O teste de tuberculose e a radiografia torácica devem ser realizados
para todos os pacientes previamente ao uso dos imunobiológicos. Febre reumática (FR)* é uma complicação inflamatória tardia, não supura-
No tratamento inicial da SAM, estão indicados os GC (EV), inibido- tiva, de infecção em vias aéreas superiores (IVAS) causada pelo estrepto-
res da calcineurina (ciclosporina [EV ou VO]) e anakinra (indisponível no coco β-hemolítico do Grupo A, de Lancefield (EβGA). É a principal causa
Brasil). Como tratamento de segunda linha (casos refratários) podem ser de cardiopatia adquirida na infância e na adolescência, muitas vezes inca-
indicados o canakinumabe, inibidores do TNF-α, a imunoglobulina huma- pacitante, gerando elevado custo social e econômico.
na e o etoposide. A FR possui distribuição universal, com diferentes taxas de incidência
Cerca de 70 a 90% das crianças com AIJ apresentam boa evolução, e prevalência entre os países. Fatores como clima frio e umidade, condi-
sem incapacidade física, se receberem tratamento precoce e adequado.
Atrasos no encaminhamento ao especialista e no início da terapia adequa-
da estão associados a mau prognóstico funcional. *Neste capítulo, onde consta FR, leia-se frebre reumática.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 413
ções socioeconômicas e ambientais desfavoráveis, desnutrição, falta de Comprometimento cardíaco: ocorre em cerca de 40 a 50% dos
higiene, ambientes fechados e conglomerados favorecem o aparecimento pacientes no primeiro surto, é o mais grave e dele depende o prog-
da estreptococcia e, consequentemente, da FR. nóstico do paciente. Os três folhetos (endocárdio, miocárdio e pe-
Embora a incidência da FR tenha diminuído, ainda representa um pro- ricárdio) podem ser acometidos simultaneamente, caracterizando a
blema de saúde pública com alta morbidade e mortalidade nos países em pancardite, porém a endocardite, isolada ou não, é a manifestação
desenvolvimento. Nestes, a incidência anual varia de 100 a 206 por 100 mais encontrada e a que determinará o aparecimento de sequelas.
mil crianças, representando um sério problema de saúde pública com alto A endocardite pode ser assintomática ou se manifestar por meio
impacto socioeconômico. Estudos realizados em algumas capitais brasilei- de sopro cardíaco. O sopro é geralmente sistólico, apical e reflete
ras estimam a prevalência de cardite reumática em 1 a 7 casos por 1.000 a insuficiência mitral. As valvas mais acometidas, em ordem de fre-
escolares. A coreia de Sydenham, apesar da incidência reduzida nos últi- quência, são: mitral, mitral e aórtica e aórtica. É incomum o envol-
mos anos, principalmente em países desenvolvidos, ainda constitui, no vimento isolado de valvas direitas ou da valva aórtica. A estenose
Brasil, a principal causa de coreia adquirida na infância. mitral é rara na faixa etária pediátrica e, quando presente, indica
A FR afeta especialmente crianças e adultos jovens. É rara antes dos comprometimento cardíaco prévio. A presença de sopro cardíaco ou
5 e após os 25 anos, com maior incidência entre 5 e 15 anos, idade que a mudança de características de sopro preexistente são sinais im-
coincide com a maior frequência de infecção estreptocócica. Ocorre um portantes do envolvimento valvar, que pode manifestar-se até a 6a
leve predomínio no sexo feminino e não há predisposição racial. semana de evolução do surto agudo. Pacientes com provas inflama-
tórias alteradas devem ser acompanhados semanalmente durante
■■ ETIOPATOGENIA toda a fase aguda. Em 40 a 60% dos casos, ocorre desaparecimento
da lesão valvar tanto na ausculta como no ecocardiograma. Nos
O desenvolvimento da FR está sempre associado à infecção de orofaringe
últimos anos, têm-se descrito casos de pacientes com cardite as-
pelo EβGA, responsável por 15 a 20% das faringoamigdalites e pela qua-
sintomática (subclínica) sem sopro cardíaco, porém com alteração
se totalidade daquelas de origem bacteriana. Em situações epidêmicas,
valvar ao ecocardiograma. Muitos desses pacientes persistem com
3% dos pacientes com faringoamigdalite estreptocócica desenvolvem a
a lesão durante a evolução. Embora a cardite subclínica não faça
doença e, nas endêmicas, a taxa é reduzida para 0,3%.
parte dos critérios de Jones, alguns autores defendem que ela deva
Os pacientes com FR aguda apresentam altos títulos de anticorpos
ser abordada como a cardite clínica (em relação ao tratamento com
contra a proteína M, que tem propriedades de superantígeno, provocando
corticosteroides na fase aguda e duração da profilaxia secundária).
resposta imune exagerada e autoimunidade. Fatores genéticos de susceti-
Coreia de Sydenham: ocorre em 15 a 35% dos casos e se carac-
bilidade à doença vêm sendo estudados com o intuito de elucidar o desen-
teriza por ser uma síndrome neurológica hipotônica e hipercinética
cadeamento da FR e, talvez, futuramente, auxiliar na sua prevenção por
decorrente de uma alteração do sistema nervoso extrapiramidal.
meio de vacinas em famílias com maior predisposição genética.
Inicialmente, o paciente apresenta labilidade emocional e fraqueza
O mecanismo patogênico ainda é pouco conhecido. Acredita-se que,
muscular e, depois, movimentos involuntários e incoordenados.
após uma fase de aparente convalescença de uma faringoamigdalite
Todos os músculos podem ser afetados, porém os movimentos
estreptocócica não tratada, produtos degradados do estreptococo com
das mãos, braços, pés e pernas, além de lábios, língua e face, são
semelhança molecular com tecidos humanos (mimetismo molecular) são
mais evidentes. Esses movimentos geralmente são bilaterais, rá-
reconhecidos pelo sistema imune iniciando a resposta autoimune.
pidos, arrítmicos, se agravam durante o exame, aumentam com o
Quanto à população de linfócitos T e ao seu papel na patogenia da
estresse e desaparecem durante o sono. Podem ocorrer disartria,
doença, sabe-se que os linfócitos auxiliadores (CD4+) estão aumentados
dificuldade de concentração e escrita, voz arrastada e distúrbios
na fase aguda da doença, associados à elevação das interleucinas e dimi-
neuropsiquiátricos. É autolimitada, com duração de 2 a 3 meses.
nuição dos linfócitos CD8+.
Geralmente, o aparecimento costuma ser tardio, como manifes-
tação isolada, meses após uma infecção estreptocócica; por isso,
■■ QUADRO CLÍNICO não ocorre elevação das provas inflamatórias e não é possível
Os sinais e sintomas da FR ocorrem após 1 a 3 semanas do aparecimento detectar evidência de infecção estreptocócica recente. É a terceira
da infecção estreptocócica da orofaringe. Entretanto, em apenas metade manifestação mais frequente, ocorrendo em 15 a 35% dos casos.
dos casos, essa infecção é sintomática, podendo ser relatada na anamnese Transtornos neuropsiquiátricos surgem como sequela da coreia e
com a tríade clássica de exsudato purulento, febre e adenomegalia. incluem transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), depressão, tiques
Manifestações gerais como febre, perda de apetite e adinamia podem e dificuldade de concentração.
não estar presentes. O surto dura de 8 a 14 semanas. Eritema marginado: ocorre em menos de 3% dos casos e se ca-
Comprometimento articular: ocorre já na primeira semana, em 60 racteriza por lesões cutâneas não pruriginosas, com bordas eleva-
a 80% dos pacientes no primeiro surto. Embora muito frequente, é das e hiperemiadas e com palidez central, localizadas em tronco e
a manifestação menos específica. Caracteriza-se por artrite poliarti- raiz proximal dos membros. Está associado à cardite.
cular, de grandes articulações (joelhos, tornozelos, cotovelos e pu- Nódulos subcutâneos: são raros, ocorrem em 2 a 5% dos pacien-
nhos), assimétrica e migratória, autolimitada, que permanece por 2 tes, e aparecem, em geral, nos pacientes com surtos recorrentes e
ou 3 dias em cada articulação e desaparece espontaneamente sem com cardite grave. Caracteristicamente, os nódulos são arredonda-
deixar sequelas em 2 a 3 semanas. A dor intensa, desproporcional dos, firmes, móveis, indolores, de tamanhos variados (0,5 a 2 cm)
aos sinais flogísticos, que muitas vezes impede a deambulação, é e presentes em superfícies extensoras das articulações, principal-
uma característica importante da artrite da FR, assim como a exce- mente em cotovelos, joelhos e tornozelos. Regridem de forma rápi-
lente resposta ao ácido acetilsalicílico (AAS). Entretanto, quadros da com o tratamento e raramente persistem por mais de um mês.
articulares atípicos podem ocorrer, como: monoartrite ou oligoar- Outras manifestações clínicas raras: dor abdominal, epista-
trite, artrite aditiva, acometimento de pequenas articulações e qua- xe, pneumonite, pleurite, encefalite, glomerulonefrite e eritema
dris, duração maior do que seis semanas e falta de resposta ao AAS. nodoso.
414 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
provados de alergia à penicilina, a eritromicina. Antibióticos por -se ter cuidado especial com os efeitos adversos desses medica-
via oral são menos eficazes, devido à baixa adesão ao tratamento mentos. O uso de corticosteroides como prednisona (1 mg/kg/dia,
e também à variabilidade de absorção. Os derivados da sulfa não VO) pode ser útil em determinados pacientes com sintomas graves.
são eficazes na prevenção primária (Tabela 67.1). Também estão indicados repouso e permanência em ambiente cal-
mo, evitando-se estímulos externos.
Profilaxia secundária: penicilina benzatina é o fármaco de esco-
TABELA 67.1 ■ Recomendações para profilaxia primária na febre lha. O intervalo recomendado entre as doses nas populações de
reumática alto risco (como no Brasil) é a cada 21 dias. No caso de uso de me-
dicação via oral, a administração deve ser diária e contínua (Tabela
MEDICAMENTO ESQUEMA DURAÇÃO
67.2). As recomendações na duração da profilaxia estão descritas
Penicilina G Peso < 20 kg, 600.000 UI IM Dose única no Quadro 67.2. Pacientes submetidos a tratamentos cirúrgicos de-
benzatina Peso ≥ 20 kg, 1.200.000 UI IM vem receber dose adicional de profilaxia.
68 Doenças parenquimatosas
Síndrome de aspiração de mecônio, síndrome do desconforto
respiratório, pneumonia congênita
ABORDAGEM DAS Doenças extraparenquimatosas
CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Pneumotórax, hérnia congênita diafragmática
Primária
■■ CÉLIA MARIA CAMELO SILVA
Secundária
■■ LOURDES DE FÁTIMA GONÇALVES GOMES Síndrome de aspiração de mecônio
■■ LUCIANA FONSECA DA SILVA Asfixia perinatal, hérnia diafragmática congênita
Policitemia congênita
Meta-hemoglobina
As formas mais frequentes de apresentação clínica das cardiopatias são: III | ARRITMIAS
cianose, insuficiência cardíaca (IC), choque cardiogênico ou achado de so-
pro (ver Quadros 68.1, 68.2 e 68.3). Taquicardia supraventricular, flutter atrial, BAV total
Cianose central: resultante de hipoxemia arterial, devido a shunt
IV | EXTRACARDÍACA
direito-esquerda e/ou hipofluxo pulmonar.
Crise de hipóxia: episódios súbitos de cianose severa, hiperpneia, Anemia importante
acidose metabólica, que ocorrem em pacientes com fisiologia de Tirotoxicose neonatal
tetralogia de Fallot. O mecanismo provável é o de espasmo do in- Sepse
fundíbulo do ventrículo direito (VD). Ocorrem principalmente entre VD: ventrículo esquerdo; EAo: estenose aótica; CoAo: coarctação de aorta; PCA:
3 a 6 meses, pela manhã, e pode ser precipitada pelo choro, ali- persistência do canal arterial; CIV: comunicação interventricular; BAV: bloqueio
mentação e ato de evacuar (ver Quadros 68.4 e 68.5). atrioventricular.
IC: é definida como a incapacidade do coração em prover débito
cardíaco (DC) adequado para atender a demanda metabólica do
organismo. As CCs representam as causas mais frequentes de IC na
QUADRO 68.3 ■ Cardiopatias congênitas que podem se
infância e o seu quadro clínico varia com a idade de apresentação.
manifestar com quadro de choque cardiogênico
Nos recém-nascidos e lactentes, caracteriza-se por: dificuldade para
alimentação: tempo prolongado e interrupção frequente das mama- CIRCULAÇÃO SISTÊMICA DEPENDENTE DO CANAL ARTERIAL
das, diaforese, infecções respiratórias recorrentes e hipodesenvol-
vimento. Nas crianças maiores, predomina a queixa de dispneia e CoAo, EAo crítica, síndrome hipoplásica do coração esquerdo, interrupção
cansaço aos esforços. do arco aórtico
Choque cardiogênico: caracteriza-se por hipotensão, cianose, aci- CIRCULAÇÃO PULMONAR DEPENDENTE DO CANAL ARTERIAL
dose metabólica e oligúria. Pode ser difícil diferenciar entre sepse
e distúrbios metabólicos. Atresia pulmonar, estenose pulmonar crítica, atresia tricúspide com
atresia pulmonar, ventrículo único com atresia pulmonar
Posição genopeitoral
QUADRO 68.4 ■ Crise de hipoxia Medidas gerais
Temperatura adequada Vaporjet
Ventilação
Fatores predisponentes Fatores desencadeadores Oxigênio
Morfina ou mecânica se
Meperidina EV, IM Sedação necessário
Piora da obstrução da Choro ou SC se necessário
via de saída do VD Esforço para evacuar Hidratação
Quadro infeccioso Punções venosas
Taquicardia Febre Uso de betabloqueadores
Desidratação Uso de inotrópicos Em casos refratários, pode-se
Anemia tentar cloridrato de fenilefrina
Quadro clínico
e evolução
balão com ou sem implante de stent no canal arterial. Casos com ventrí- Manifesta-se com quadro de cianose importante.
culo direito bi ou unipartite requerem cirurgia para confecção de shunt Habitualmente requerem shunt Blalock-Taussig, seguido por cirur-
sistêmico-pulmonar (Blalock-Taussig) e em casos selecionados ampliação gia de Rastelli ou da translocação da valva pulmonar.
da via de saída do ventrículo direito.
3 | CoAo Tronco arterioso
Coarctação severa do recém-nascido: correção cirúrgica preco- Necessita correção cirúrgica precoce antes dos três meses de vida – fecha-
ce, seja para correção da CoA e fechamento da CIV quando presen- mento da CIV e tubo VD-TP, quando necessário comissurotomia ou plastia
te (correção primária), ou em dois estágios correção da CoAo com da valva truncal, frequente com disfunção.
ou sem cerclagem da artéria pulmonar, seguida pelo fechamento
posterior da CIV.
Coração univentricular
Crianças maiores com coarctação localizada (assintomáticas) Inclue dupla via de entrada de VE, VD ou ventrículo indeterminado e co-
a | Achado incidental de hipertensão arterial ou de sopro nexão atrioventricular atrésica ou estenótica – em comum estas cardiopa-
b | Opções terapêuticas – aortoplastia primária por balão, implan- tias apresentam hipoplasia de um ventrículo ou outras associações que
te de stent ou correção cirúrgica. A escolha depende da morfologia impedem a correção biventricular. Necessitam de tratamento estagiado
da CoAo e da idade da apresentação. A opção cirúrgica é a de es- Pacientes com hiperfluxo pulmonar necessitam cerclagem pulmonar nos
colha no primeiro ano de vida. primeiros dias de vida, e aqueles com estenose pulmonar importante ou
atresia necessitam shunt Blalock-Taussig.
Cardiopatias cianogênicas No futuro, estes pacientes serão submetidos à cirurgia de Glenn bidi-
1 | Tetralogia de Fallot recional, habitualmente a partir do sexto mês de vida, e complementação
A maioria dos casos são elegíveis para correção primária entre os seis para Fontan, entre os 2 e 4 anos.
meses e 2 anos de vida. Indicações para cirurgia paliativa (shunt Blalock-
Síndrome hipoplásica do coração esquerdo
-Taussig) são raras. Está indicada em situações especiais:
Crises de hipóxia ou cianose importante em crianças menores de Não existe consenso quanto ao melhor tratamento para recém-nascidos
6 meses. com síndrome hipoplásica do coração esquerdo. Intervenções cirúrgicas
Artérias pulmonares pequenas, no intuito de promover o seu cres- múltiplas – cirurgia de Norwood e suas variantes ou procedimento híbrido
cimento. inicialmente, seguido de Glenn bidirecional e após complementação para
Trajeto anômalo de artéria coronária cruzando a via de saída do VD. Fontan e transplante cardíaco são opções disponíveis.
Após a correção total, os pacientes necessitam acompanhamento, Drenagem anômala total de veias pulmonares
devido ao risco de disfunção tardia do ventrículo direito, arritmias e al-
guns podem necessitar de troca da valva pulmonar devido à insuficiência A época do tratamento cirúrgico depende da presença ou não de obstrução
pulmonar. ao retorno das veias pulmonares. Quando obstrutiva, comum na forma infra-
2 | Tetralogia de Fallot com atresia pulmonar cardíaca, a correção cirúrgica deve ser de imediato após estabilização inicial,
e na forma não obstrutiva, pode ser realizada nos primeiros meses de vida.
Estratégias de tratamentos futuros dependem da anatomia das artérias
pulmonares e da presença de artérias colaterais sistêmico-pulmonares e
consiste em cirurgia paliativa inicial – shunt Blalock-Taussig isolado ou as- REVISÃO
sociado à unifocalização A cirurgia definitiva consiste no fechamento da
CIV e implante de tubo VD-TP. A abordagem diagnóstica das cardiopatias congênitas, particular-
3 | Atresia pulmonar com septo ventricular íntegro mente no neonato, deve ser realizada de forma sistemática.
Estratégias futuras dependem do grau de hipoplasia do ventrículo direito. O exame ideal para diagnosticar a cardiopatia congênita é, sem dú-
Em casos com ventrículo direito bem desenvolvido, está indicada a perfu- vida, a ecocardiografia. Todavia, realizá-la em todo recém-nascido
ração da valva pulmonar por radiofrequência seguida por valvoplastia pul- é inviável.
monar com balão com ou sem implante de stent no canal arterial. Casos O teste da oximetria de pulso é simples e apresenta alta especifici-
com ventrículo direito desfavorável, requer cirurgia para confecção de shunt dade e moderada sensibilidade, características que o habilitam para
sistêmico-pulmonar e em casos selecionados ampliação da via de saída do o rastreamento das cardiopatias.
ventrículo direito. Nos casos com circulação coronária dependente do ven-
trículo direito,está contraindicada a descompressão do ventrículo direito.
■■ LEITURAS SUGERIDAS
Transposição das grandes artérias
Bacha EA, Hijazi ZM. Hybrid procedures in pediatric cardiac surgery. Semin
1 | Transposição das grandes artérias (TGA) simples (septo ventri- Thorac Cardiovasc Surg Pediatr Card Surg Annu. 2005:78-85.
cular íntegro) Ewer AK, Middleton LJ, Furmston AT, Bhoyar A, Daniels JP, Thangaratinam S,
Infusão endovenosa de prostaglandina para promover mistura in- et al. PulseOx Study Group. Pulse oximetry screening for congenital heart
tercirculatória no nível do canal arterial. defects in newborn infants (PulseOx): a test accuracy study. Lancet.
Atriosseptostomia por balão nos casos de CIA restritiva. 2011;378(9793):785-94.
Cirurgia de escolha: cirurgia de Jatene, preferencialmente nas duas Marelli AJ, Mackie AS, Ionescu-Ittu R, Rahme E, Pilote L. Congenital heart disease
in the general population: changing prevalence and age distribution.
primeiras semanas de vida.
Circulation. 2007;115(2):163-72.
2 | TGA com CIV
Severin PN, Awad S, Shields, B, Hoffman J, Bonney W, Cortez E, et al. The
Geralmente não necessita de cirurgia precocemente no período neonatal, pediatric cardiology pharmacopeia: 2013 update. Pediatr Cardiol. 2013;
é comum desenvolver sianais de IC entre 4 a 8 semanas de vida, e a cirur- 34(1):1-29.
gia primária deve ser realizada nos primeiros meses de vida. Tweddle JS, Spray TL. Newborn heart surgery: reasonable expectations and
3 | TGA com CIV e EP outcomes. Pediatr Clin North Am. 2004;51(6):1611-23.
420 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
relacionado à estenose dos ramos pulmonares; em dois terços dos ca- diagnóstico de sopro inocente quando feito por um cardiologista bem trei-
sos, o sopro desaparece por volta de seis semanas de vida e os demais nado em ausculta. Todavia, existem situações, como, por exemplo, criança
desaparecem por volta de seis meses. A etiologia deste sopro se deve à pouco cooperativa, ambiente barulhento que prejudicam a ausculta e con-
hipoplasia relativa dos ramos das artérias pulmonares e sua discrepância sequemente o diagnöstico.
com o tronco pulmonar, em associação com a angulação na sua origem. Para tomada de decisão quanto ao encaminhamento ao especialista,
Após o nascimento, com aumento de fluxo através da árvore pulmonar e levam-se em conta vários fatores, como o diagnóstico presumido, a expe-
mudança na estrutura da sua parede, a angulação desaparece e ocorre riência do examinador, o nível de ansiedade dos pais e a disponibilidade
aumento do diâmetro do vaso, o que justificaria o desaparecimento do do paciente para o acompanhamento.
sopro. O sopro é suave grau 1+ a 2+ /6+, de ejeção, melhor audível Os efeitos das mudanças hemodinâmicas que ocorrem nas diferentes
na borda esternal esquerda e direita altas e com irradiação para axila fases do desenvolvimento da criança são importantes para o entendimen-
e dorso. to da história natural e apresentação do sopro específica para a idade.
4 | Sopro sistólico aórtico ou sistêmico inocente: rude, de alta inten- Para o agendamento da consulta com o especialista, a idade do paciente
sidade, causado por fluxo sanguíneo normal através da aorta e dos vasos deve ser levada em conta: assim os neonatos devem ser avaliados com
da base. São melhores audíveis na porção superior do tórax e região su- mais celeridade, lactentes em dias e crianças maiores em semanas.
praclavicular. Eles são transmitidos para os vasos da base e audíveis sobre A relação custo/benefício de realizar ecocardiograma de rotina em
as carótidas. todas as crianças portadoras de sopro é desfavorável. Além disso, a de-
5 | Zumbido venoso: sopro contínuo de baixa intensidade, com acentu- tecção de doenças cardíacas irrelevantes pelo ecocardiograma, ou seja,
ação diastólica, devido ao retorno sanguíneo através das grandes veias aquelas cujo diagnóstico não terá influência nenhuma no decorrer da vida
para o coração, ou seja, surge na junção entre a veia jugular e a cava da criança (como os achados de insuficiência tricúspide discreta ou peque-
superior. É audível na porção inferior e anterior do pescoço, mais frequen- no forâmen oval patente), pode inclusive se tornar um problema e exercer
temente a direita. O sopro é mais alto com o paciente na posição sentada e grande impacto na vida da criança se o diagnóstico for mal interpretado
desaparece ou diminui com o paciente deitado. Habitualmente o zumbido e explicado de forma inadequada aos pais.Ao concluir que se trata de um
venoso é acentuado ao girar a cabeça do paciente para o lado do sopro sopro inocente, o médico deve explicar os achados aos pais e à criança,
e levantar o queixo. Ao pressionar na área das veias jugulares, o fluxo se deixando claro que sopros são ruídos e não são sinônimos de cardiopatia
altera e o sopro modifica ou desaparece. Este é o único sopro inocente (Quadro 69.1), esclarecendo que a grande maioria das crianças apresen-
contínuo e que pode apresentar frêmito. tam sopros, e muitos destes irão desaparecer no decorrer do tempo, que
nem todos desaparecem e, acima de tudo, o importante é que a criança
tem o coração normal. O ecocardiograma, por ser um exame não invasi-
■■ HISTÓRIA CLÍNICA
vo, de alta especificidade e sensibilidade, dá ao pediatra mais segurança.
Na criança com sopro, a avaliação do sistema cardiovascular deve incluir: Vale lembrar que o seu resultado depende de fatores como experiência
história do pré-natal e do nascimento, padrão alimentar, presença ou do operador, qualidade do aparelho e condições do paciente (agitação,
não de desconforto respiratório e cianose, estado do desenvolvimento choro e deformidade torácica). Por isto, o ecocardiograma não substitui
pôndero-estatural, nível de atividade física, além da história familiar para o exame físico cardiovascular e deve ser avaliado em associação com o
cardiopatias congênitas e morte súbita. quadro clínico.
São fatores de risco para cardiopatia história materna de diabetes
melito, lúpus eritematoso sistêmico (LES), infecções (rubéola, toxoplasmo-
se, CMV, etc), exposição a substâncias ilícitas, como álcool, e medicações QUADRO 69.1 ■ Características dos sopros
usadas pela mãe durante a gestação.
SOPRO INOCENTE
tes. Os achados de ausculta são discretos e caracterizados por desdo- Quando houver suspeita de estenose pulmonar, a criança deve ser
bramento amplo e fixo da segunda bulha e sopro sistólico ejetivo ++ a encaminhada ao cardiologista pediátrico, Para os casos moderados, está
+++/6+, melhor audível em borda esternal esquerda alta, que reflete o indicada a valvoplastia pulmonar por balão. Neste capítulo, não discuti-
aumento de fluxo através da valva pulmonar-estenose relativa. É impor- mos os casos de estenose pulmonar crítica, por se tratar de cardiopatia
tatante salientar que aproximadamente 60% das CIAs ostium secundum dependente do canal arterial, reconhecida e tratada no berçário.
menores do que 6 mm terão fechamento espontâneo no decorrer dos
primeiros anos de vida. ESTENOSE AÓRTICA
É caracterizada por sopro ejetivo auscultado no berçário em criança de
Comunicação interventricular aparência saudável, exceto as crianças portadoras de estenose aórtica crí-
A CIV isolada é a cardiopatia congênita mais comum. Sopro sistólico tica que já nascem com o débito cardíaco comprometido, com disfunção
com carcterísticas de patológico em recém-nascido a termo tem gran- importante do VE, ICC, e neste paciente o sopro é discreto.
de propabilidade de se tratar de CIV. O sopro pode ser auscultado no Na estenose aórtica, é comum palpar frêmito em fúrcula e carótidas.
berçário quando a CIV for pequena e a queda da resistência pulmonar O click de ejeção é melhor audível no ápice. O sopro é mais intenso no
for normal, porém o mais comum é sua detecção entre 2 a 6 semanas segundo espaço intercostal à direita com irradiação para fúrcula, pescoço
de vida. e ápice.
CIV mínima e pequena: nas CIVs musculares mínimas, o sopro é
suave, musical e protossistólico, porque o defeito é obliterado na TETRALOGIA DE FALLOT
metade da sístole devido à contração do septo ventricular e auscul- Trata-se da cardiopatia cianogênica mais comum após o período neonatal.
tado em borda esternal esquerda média ou baixa. A cianose é a principal característica. Nas crianças com moderada obs-
CIV moderada: o sopro costuma ser holossistólico intenso e às trução, observa-se a ausculta, segunda bulha habitualmente única, sopro
vezes acompanhado de frêmito. sistólico ejetivo rude. É importante lembrar que o sopro na tetralogia de
CIV grande: a criança com CIV grande apresenta quadro clínico Fallot se origina na região de estenose, e não através da CIV. O sopro
mais significativo de IC, o sopro sistólico é mais suave, em geral pode ser intenso, mas reduz de intensidade e encurta à medida que piora
++/¨6+. a obstrução. Muitas crianças com Tetralogia de Fallot se apresentam com
Evolução do paciente com CIV: pacientes com CIV pequena têm cianose discreta, por isto a oximetria de pulso é útil.
prongóstico excelente, quando a probabilidade de fechamento
espontâneo nos primeiros anos de vida chega até 80%. Pacien-
tes com CIV moderada a grande precisam de tratamento clínico
REVISÃO
e fechamento do defeito e devem ser encaminhados ao cardiolo- História clínica e exame físico cardiovascular detalhados ajudam no
gista com certa urgência. Todos os tipos de CIV são passiveis de diagnóstico diferencial entre os sopros.
fechamento cirúrgico, casos selecionados podem ser ocluídos por O uso de exames complementares não se sobrepõe ao poder de
via percutânea. uma boa ausculta em distinguir um sopro inocente de um sopro
patológico.
CANAL ARTERIAL PÉRVIO Nas crianças com diagnóstico de sopro inocente, é de suma impor-
O canal arterial funcionalmente fecha em aproximadamente 90% dos RNs tância reafirmar à família a sua benignidade, e de que não se trata
a termo por volta de 48 horas. Nos RNs que apresentam desconforto res- de uma cardiopatia, uma vez que o estigma de cardiopata pode
piratório ou instabilidade hemodinâmica, o canal arterial pode persistir exercer efeito adverso na vida da criança e da família.
patente por até 10 dias. A maioria das crianças portadoras de PCA são O encaminhamento ao cardiologista pediátrico deve ser realizado
assintomáticas, e o diagnóstico é um achado de exame ou encontrado quando houver suspeita de sopro patológico e com maior urgência
casualmente em ecocardiograma realizado por motivos não cardíacos, nas crianças sintomáticas e recém-nascidos.
como em avaliação pré-operatória ou para quimioterapia.
No PCA mínimo, a ausculta pode ser normal (PCA silencioso); no pe-
queno, ausculta-se sopro sistólico; e no moderado; encontra-se o sopro ■■ LEITURAS SUGERIDAS
contínuo clássico em maquinaria, com acentuação por volta da segunda Advani N, Menahem S, Wilkinson JL. The diagnosis of innocent murmurs in
bulha na região infraclavicular esquerda. No PCA grande com hipertensão childhood. Cardiol Young. 2000;10(4):340-2.
pulmonar, o sopro geralmente é sistólico suave ou ausente e a segunda Arlettaz R, Archer N, Wilkinson AR. Natural history of innocent heart murmurs in
newborn babies: Controlled echocardiographic study. Arch Dis Child Fetal
bulha pulmonar é hiperfonética. Os pulsos periféricos são amplos, e a di-
Neonatal Ed. 1998;78(3):F166-70.
ferencial pressórica é ampla. Biancaniello T. Innocent murmurs. Circulation. 2005;111(3):e20-2.
Frias PA, Oster M, Daly PA, Boris JR. Outpatient echocardiography in the
ESTENOSE PULMONAR evaluation of innocent murmurs in children: benchmarking. Cardiol Young.
O sopro característico é sistólico ejetivo rude e detectado precocemen- 2016;26(3):499-505.
te, muitas vezes no berçário O sopro é precedido por um click proto- Frommelt MA. Differential diagnosis and approach to a heart murmur in term
infants. Pediatr Clin North Am. 2004;51(4):1023-32
sistólico de ejeção. A intensidade do sopro depende da gravidade da
Kang g, Xiao J, Wang Y, Wang J, Wang J, Chen Y, Liu Q, et al. Prevalence and
obstrução. Do ponto de vista clínico a criança encontra-se bem, com clinical significance of cardiac murmurs in schoolchildren. Arch Dis Child.
desenvolvimento adequado. Nos casos moderados e graves, pode-se 2015;100(11):1028-31.
detectar frêmito. O componente pulmonar da segunda bulha pode estar Sackey AH. Prevalence and diagnostic accuracy of heart disease in children with
hipofonético. asymptomatic murmurs. Cardiol Young. 2016;26(3):446-50.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 423
COMPRESSÕES TORÁCICAS
Por alterações de pressões intratorácicas e/ou compressão direta do co-
■■ GISELE LIMONGELI GURGUEIRA ração, o sangue é enviado aos órgãos vitais. A compressão deve produzir
■■ RENATO LOPES DE SOUZA um pulso palpável. Deve-se evitar a compressão sobre o apêndice xifoide.
A vítima deve ser colocada sobre uma superfície rígida e plana.
Administre 1 choque.
Recomece RCP imediatamente por 2 minutos
Recomece RCP imediatamente por 2 minutos
(até que o DEA reanalise o ritmo).
(até que o DEA reanalise o ritmo).
Continuar até a chegada do SAVP
Continuar até a chegada do SAVP
ou a vítima recuperar
ou a vítima recuperar
1
FIGURA 70.2 ■ Algoritmo de suporte básico de vida pediátrico para profissionais de saúde de acordo com a American Heart Association .
DEA: desfibrilador externo automático; SAVP: suporte avançado de vida pediátrico.
Fonte: Atkins e colaboradores.1
A manobra de extensão de pescoço e elevação de mandíbula con- A posição de recuperação é o posicionamento ideal que mantém a via
siste em: colocar uma das mãos na fronte da vítima e realizar a extensão aérea patente, a estabilidade da coluna cervical e garante o menor risco
do pescoço e, com a outra, posicionar dedos na parte óssea do mento, e de aspiração, permitindo visualizar o esforço respiratório e possibilitando
realizar o movimento de elevação e direcionamento inferior da mandíbula o acesso adequado para intervenção.
para abrir a via aérea. A ventilação deve ser realizada com duas respirações lentas e profun-
Na manobra de elevação de mandíbula, utilizada para os casos sus- das, com duração de 1 segundo cada, com pausa para que o reanimador
peitos de lesão cervical, posicionam-se os 4o e 5o dedos das mãos no ân- possa maximizar o oxigênio e diminuir o gás carbônico oferecido à vítima.
gulo da mandíbula e os 2o e 3o dedos no ramo da mandíbula, realizando Observar a expansibilidade torácica.
sua elevação, sem movimentar a região cervical.
Técnicas de ventilação
Respiração Boca-nariz-boca: usada em lactentes; o resgatador deve colocar
É importante verificar se a vítima apresenta respiração espontânea e se a boca cobrindo a boca e o nariz da vítima, com ajuste adequado,
ela é efetiva. Observar gasping ou ventilações inefetivas ou obstruídas. Se caso não seja possível executar a técnica boca-nariz com o fecha-
presente e efetiva, colocar o paciente em posição de recuperação. mento da boca da vítima.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 425
Boca a boca: usada em crianças; o resgatador coloca a boca sobre Crianças maiores e adolescentes inconscientes: colocar a vítima
a boca da vítima e, durante a respiração de resgate, realiza o pin- em uma superfície rígida e iniciar as manobras de RCP, tomando o
çamento do nariz. cuidado de avaliar a orofaringe antes das ventilações para visuali-
Se oxigênio e equipamentos estiverem disponíveis, usar alto fluxo zar o corpo estranho; se visível, retirá-lo.
para vítimas inconscientes, de preferência umidificado, podendo ser uti-
lizados máscaras, cateteres e cânulas nasais.
■■ SUPORTE AVANÇADO DE VIDA PEDIÁTRICO
A utilização de dispositivos de barreiras, como uma válvula unidire-
cional, evita o risco de transmissão de infecções (raro), mas não se deve MANEJO DAS VIAS AÉREAS
postergar a ventilação em caso de falta destes.
O dispositivo mais utilizado é a máscara-bolsa autoinflável, que per- É importante que todos os fluidos dos pacientes sejam tratados como po-
mite o uso de altas pressões nos casos de aumento da resistência das tencialmente infectantes. Utilizar sempre luvas e anteparos de proteção
vias aéreas e/ou diminuição da complacência da caixa torácica. Deve ser durante os procedimentos nos quais há probabilidade de exposição a res-
observado atentamente o tamanho apropriado de máscara e bolsa para pingos de sangue, saliva ou outros fluidos corpóreos.
cada grupo etário. Pode ser acrescido oxigênio suplementar, atingindo 30 Administração de oxigênio
a 80% da fração de oxigênio na ausência de reservatório; 60 a 85% com
É preciso administrar oxigênio a todo paciente gravemente enfermo ou
o uso de reservatório; e 21% ao ar ambiente. No caso da ventilação boca
traumatizado, com IRpA, choque ou trauma. Deve ser, também, umidifi-
a boca, são oferecidos 16 a 17% de fração de oxigênio. A máscara deve
cado, para prevenir o ressecamento e espessamento das secreções pul-
cobrir a boca e o nariz da vítima, não cobrindo os olhos e nem ultrapas-
monares.
sando o mento, mantendo a máscara pressionada com o polegar e o dedo
As formas de administração são:
indicador (formando a letra C), e com os 3º, 4º e 5º dedos posicionados na
mandíbula (formando a letra E). Máscaras
a | Simples: oferecem concentração de O2 de 30 a 50%.
Efetividade da ventilação b | Não reinalantes: com fluxo de até 15 L/min oferecem concen-
O volume e a pressão necessários para a ventilação são difíceis de mensu- tração de O2 > 50%.
rar; o volume utilizado deve ser o suficiente para elevar a caixa torácica da Cânulas nasais: utilizadas para fornecer oxigênio suplementar à
vítima. Caso não haja a elevação do tórax, reposicionar a cabeça da vítima criança com respiração espontânea. Fluxos > 4 L/minuto não são
verificando a adequada retificação da via aérea. Outra possibilidade é a tolerados, devido ao ressecamento da mucosa nasal.
presença de resistência elevada à entrada de ar nas vítimas pequenas, Via aérea orofaríngea: indicada para lactentes e crianças incons-
necessitando de maiores volumes e/ou pressão, ou pela existência de uma cientes. Em criança consciente, não é bem tolerada e pode provo-
obstrução. A utilização da pressão da cricoide, para evitar a distensão gás- car vômitos.
trica, não é recomendada de rotina. Via aérea nasofaríngea: consiste em tubos macios de plástico ou
borracha, podendo ser utilizada em pacientes conscientes ou com
Retirada de corpo estranho em via aérea obstruída diminuição de consciência.
É necessário reconhecer a situação de obstrução e retirar o corpo estra- Via aérea máscara laríngea: utilizada para assegurar as vias aé-
nho. Na maioria dos casos, pode ser causada por pedaços de alimentos, reas pérvias em pacientes inconscientes. Consiste em um tubo com
e os sinais mais comuns são: dificuldade respiratória súbita acompanhada balonete em formato semelhante a uma máscara em sua porção
de tosse, estridor e engasgo. terminal. É introduzido pela faringe e deslocado até que uma resis-
Quando ocorrer obstrução parcial e a vítima estiver tossindo, interferir tência seja sentida, quando o tubo atinge a hipofaringe. O balonete
somente se houver piora da dificuldade respiratória ou se a mesma se é insuflado selando a hipofaringe e deixando uma abertura distal
tornar inconsciente. do tubo logo acima da abertura glótica, garantindo uma via aérea
Lactentes conscientes: realizar golpes com a região tênar da mão segura e pérvia. É contraindicada em lactentes e crianças com re-
nas costas do lactente em posição prona, com a cabeça mais bai- flexo de vômito.
xa que o tronco, sobre o antebraço do reanimador. Desferir cinco
golpes nas costas e, se o objeto não for expelido, colocar a vítima Ventilação bolsa-máscara
em posição supina e iniciar cinco compressões torácicas, como na A ventilação pode ser realizada por oferta de volume de ar pela boca ou
reanimação cardiopulmonar. Usar o antebraço e a coxa como apoio pela ventilação com bolsa-máscara, que requer mais habilidade e deve ser
enquanto a mão mantém a cabeça da vítima em posição neutra e realizada por pessoal adequadamente treinado.
a via aérea aberta. Repetir essa sequência até obter a permeabili- Há dois tipos básicos de ressuscitadores manuais: o autoinflável; e o
zação da via aérea. fluxo dependente. Na ressuscitação, as bolsas utilizadas devem ser autoin-
Lactentes inconscientes: iniciar as manobras de RCP, tomando o fláveis e com tamanhos adequados às diferentes faixas etárias.
cuidado de avaliar a orofaringe antes das ventilações para visuali- Independentemente do tamanho do ressuscitador manual, deve-se
zar o corpo estranho; se visível, retirá-lo com a pinça de Magill ou utilizar apenas a força e o volume corrente necessários para promover
com o dedo indicador em gancho. uma visível expansibilidade torácica. Quando a ventilação é realizada
Crianças maiores e adolescentes conscientes: a vítima pode es- com duas pessoas, a qualidade da ventilação é melhor, pois, enquan-
tar sentada ou em pé; o reanimador posiciona-se atrás da vítima e to uma pessoa utiliza ambas as mãos para abrir a via aérea e man-
passa os braços ao redor do tronco abaixo das axilas e, com uma ter a máscara fortemente aderida à face, a outra comprime a bolsa de
mão fechada na linha média abaixo do apêndice xifoide e a outra ventilação.
mão sobre a primeira, realiza cinco compressões abdominais dirigi- Para reduzir a distensão gástrica em pacientes inconscientes, pode-se
das para trás e para cima, simultaneamente. Continuar até a vítima aplicar pressão sobre a cartilagem cricoide, evitando, assim, a regurgita-
expelir o corpo estranho ou perder a consciência. ção do conteúdo gástrico e a possível aspiração.
426 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
TABELA 70.1 ■ Medicações utilizadas na parada cardíaca e nas arritmias sintomáticas em pediatria
Taquicardia
Com pulso e perfusão ruim
Identificar as possíveis causas tratáveis
Provável Comprometimento
Provável TSV hemodinâmico?
taquicardia sinusal
Alteração do nível de consciência
Sinais de choque
Identificar e Manobra vagal Hipotensão arterial
tratar a causa Não atrasar Sim Não
FIGURA 70.4 ■ Algoritmo de taquicardia em pediatria de acordo com a American Heart Association.
TSV: taquicardia supraventricular.
3
Fonte: Kleinman e colaboradores.
Cardioversor/desfibrilador manual
QUADRO 70.2 ■ Tratamento elétrico
Os aparelhos manuais são os preferíveis nos ambientes hospitalares, pois
a quantidade de energia aplicada é determinada pelo tipo de distúrbio CARDIOVERSÃO DESFIBRILAÇÃO
e pelo peso do paciente. A indicação de cardioversão ou desfibrilação é
descrita no Quadro 70.2. Para aplicação da carga elétrica, alguns passos Indicada em distúrbios de ritmo Indicada em distúrbios de ritmo
devem ser observados: que geram pulso e possuem que não geram pulso = parada
ainda certa organização do cardiorrespiratória
Tamanho das pás: utilizam-se as pás pediátricas para lactentes
ritmo TV
com peso inferior a 10 kg (aproximadamente 1 ano), e as de adulto
TSV FV
(8 a 10 cm) nas crianças maiores ou na ausência das pás pediátricas.
TV com pulso
Posicionamento das pás: recomenda-se a colocação das pás, confor-
FA
me orientação, na região infraclavicular direita (em geral, denomina- Flutter atrial
da esterno) e na região do ápice do coração (em geral, denominada
ápex). É importante que permaneça uma distância mínima de 3 cm É importante a sincronização É importante desligar o modo
entre uma pá e outra. A colocação das pás anteroposteriores não com o eletrocardiograma sincronizado do aparelho
tem vantagem, mas pode ser utilizada em crianças pequenas. (QRS), para que a descarga
Interface: a superfície das pás deve estar totalmente recoberta com elétrica não ocorra durante o
gel para desfibrilação, nenhuma outra substância é recomendada. período refratário das células
A aplicação de uma pressão firme durante a descarga é necessária miocárdicas
para que a condução do estímulo elétrico seja adequada. Em al-
guns aparelhos, existem pás autoadesivas, que facilitam a coloca- Doses recomendadas: Doses recomendadas:
ção e a aplicação do choque. 1a dose: 0,5-1 J/kg 1a dose: 2 J/kg
2a dose: 2 J/kg 2a dose e doses subsequentes:
Durante a aplicação do choque elétrico, é importante avisar a equipe
Considerar: 4 J/kg
para não encostar no paciente. O comando verbal deve ser dado pelo rea-
Cardioversão química antes da
nimador que fará a aplicação da carga.
3adose ser aplicada, sedação
Carga: Em pacientes pediátricos com parada cardiorrespiratória, a
e analgesia em pacientes
carga inicial deve ser de 2J/kg e as subsequentes 4J/kg, podendo chegar conscientes
a 10J/kg nas TVs sem pulso ou FVs refratárias, desde que não ultrapasse
a carga máxima de adulto. FA: fibrilação atrial.
430 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Checar o ritmo
Ritmo chocável?
TV/FV Assistolia/AESP
FIGURA 70.5 ■ Algoritmo de parada cardiorrespiratória em pediatria de acordo com a American Heart Association.
AESP: atividade elétrica sem pulso; FV: fibrilação ventricular; IO: intraósseo; IT: intratraqueal; IV: intravenoso; RCP: reanimação cardiopulmonar; TV: taquicardia ventricular.
2
Fonte: de Caen e colaboradores.
TABELA 70.2 ■ Medicações utilizadas no SVAP para manutenção do débito cardíaco e para estabilização pós-ressuscitação
Dobutamina Infusão IV/IO: Inotrópico; 6 × peso (em kg) = nº de mg diluídas para um total
2-20 µg/kg/min vasodilatador de 100 mL; assim 1 mL/h oferece 1µg/kg/min
Dopamina Infusão IV/IO: Inotrópico, cronotrópico vasodilatador 6 × peso (em kg) = nº de mg diluídas para um total
2-20 µg/kg/min renal e esplâncnico em baixas doses; de 100 mL; assim 1 mL/h oferece 1µg/kg/min
vasopressor em altas doses
Epinefrina Infusão IV/IO: Inotrópico, cronotrópico, vasodilatador 0,6 × peso (em kg) = nº de mg diluídas para um total
0,1-1 µg/kg/min em doses baixas e vasopressor em de 100 mL; assim 1 mL/h oferece 0,1µg/kg/min
altas doses
Milrinona Dose de ataque: 50-75µg/kg Inodilatador 0,6 × peso (em kg) = nº de mg diluídas para um total
Infusão IV/IO: 0,5-0,75µg/kg/min de 100 mL; assim 1 mL/h oferece 0,1µg/kg/min
Norepinefrina Infusão IV/IO: Vasopressor 0,6 × peso (em kg) = nº de mg diluídas para um total
0,1-2 µg/kg/min de 100 mL; assim 1 mL/h oferece 0,1µg/kg/min
Prostaglandina E1 Infusão IV/IO: Mantém o ducto arterioso aberto 0,3 × peso (em kg) = nº de mg diluídas para um
0,05-0,1 µg/kg/min em doença cardíaca congênita total de 50 mL; assim 1 mL/h oferece 0,1µg/kg/min
cianogênica; monitorar para apneia,
hipotensão e hipoglicemia
Nitroprussiato de Infusão IV/IO: Vasodilatador 6 × peso (em kg) = nº de mg diluídas para um total
sódio 1-8 µg/kg/min Preparar somente em soro glicosado de 100 mL; assim 1 mL/h oferece 1µg/kg/min
IO: intraósseo; IV: intravenoso.
■■ REFERÊNCIAS
REVISÃO 1. Atkins DL, Berger S, Duff JP, Gonzales JC, Hunt EA, Joyner BL, et al. Part
11: pediatric basic life support and cardiopulmonary resuscitation quality:
A parada cardiorrespiratória em pediatria, na maioria das vezes, é 2015 American Heart Association guidelines update for cardiopulmonary
secundária a outros distúrbios e/ou doenças associadas, e o ritmo resuscitation and emergency cardiovascular care. Circulation. 2015;132
mais frequente é a assistolia. (suppl 2):S519–S525.
Na cadeia de sobrevivência, o elo mais importante é a prevenção da 2. de Caen AR, Berg MD, Chameides L, Gooden CK, Hickey RW, Scott HF, et al.
parada cardiorrespiratória. Part 12: pediatric advanced life support: 2015 American Heart Association
A qualidade da RCP é primordial no atendimento. guidelines update for cardiopulmonary resuscitation and emergency
cardiovascular care. Circulation. 2015; 132 (suppl 2):S526–S542.
432 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
3. Kleinman ME, Chameides L, Schexnayder SM, Samson RA, Hazinski MF, Atkins O exame físico geral e neurológico, a avaliação sensorial e a avaliação
DL, et al. Part 14: pediatric advanced life support: 2010 American Heart das aquisições da criança compõem o tripé da avaliação do seu desenvol-
Association guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency vimento. No Quadro 71.1, encontram-se alterações do exame físico asso-
cardiovascular care. Circulation. 2010;122(18 Suppl 3):S876-908. ciadas a doenças que cursam com alterações no desenvolvimento.
Alguns dados são fundamentais na avaliação neurológica da criança:
■■ LEITURAS SUGERIDAS atitude (assimétrica, simétrica e ativa espontânea); tônus muscular (hipo
Janeczek M, Rice C, Aitchison R, Aitchison P, Wang E, Kharasch M. Pediatric ou hipertonia); força muscular (prova do echarpe, manobra de rejeição
resuscitation guidelines. Dis Mon. 2013;59(5):182-95. dos membros inferiores, manobra à beira do leito); coordenação (prova
Part 12: pediatric advanced life support. Web-based Integrated 2010 & 2015 mão-objeto); pesquisa de reflexos miotáticos clônicos (patelares, bicipital
American Heart Association Guidelines for Cardiopulmonary Resuscitation e tricipital são os mais facilmente realizáveis e constantes), reflexos exte-
and Emergency Cardiovascular Care [Internet]. Dallas: AHA; 2015 roceptivos (cutâneo-plantar), reflexos primitivos (presença e cronologia de
[capturado em 22 out. 2016]. Disponível em: < https://eccguidelines.heart. desaparecimento); pares cranianos (mímica, sorriso, motricidade ocular,
org/index.php/circulation/cpr-ecc-guidelines-2/part-12-pediatric-advanced- da orofaringe e da língua). A avaliação do sistema sensorial, principalmen-
life-support/>.Topjian AA, Berg RA, Nadkarni VM. Advances in recognition,
te da audição e visão, deve ser feita desde os primeiros meses, verificando
resuscitation, and stabilization of the critically ill child. Pediatr Clin North
Am. 2013;60(3):605-20.
focalização do olhar e seguimento (desde as primeiras horas de vida, o
recém-nascido é capaz de focalizar um objeto colocado a poucos centíme-
tros de seu campo visual, sendo nítida sua preferência pelo rosto humano).
71 ATENÇÃO!
A avaliação objetiva da audição deve ser feita com testes específicos.
AVALIAÇÃO DE DISTÚRBIOS DO Ressalte-se que independentemente do resultado dos testes de tria-
DESENVOLVIMENTO gem neonatal, essa avaliação deve ser repetida sempre que houver
suspeita.
CAUSAS PERINATAIS Ressalte-se que não há uma correlação direta entre as alterações mo-
toras e o desenvolvimento cognitivo, o que nem sempre é evidenciado
Encefalopatia hipóxico-isquêmica, icterícia grave, distúrbios metabólicos
em decorrência do acesso inadequado à tecnologia assistiva apropria-
sintomáticos, prematuridade.
da ao problema da criança.
CAUSAS PÓS-NATAIS
Traumas craniencefálicos (TCEs), meningoencefalites bacterianas ou virais, De acordo com a característica clínica dominante, o quadro pode ser
encefalopatias desmilienizantes (pós-infecciosas ou pós-vacinais). classificado da seguinte maneira:
Entre Relação completa de dependência, percepção da mãe e de outros objetos como parte Sorriso social, controle da musculatura ocular,
0-3 meses de si mesmo, movimentos reflexos e em bloco – movimentos voluntários, coordenação controle cervical em posição ortostática e jogo
ocular, postura simétrica, controle da musculatura do pescoço e relação pré-objetal (a das mãos
mãe ainda não se transformou no objeto definido de amor da criança)
Entre A mãe estabelece-se definitivamente como objeto de amor; é comum o apego com Transfere objetos de uma mão para outra,
6-9 meses objetos transicionais, surge o estranhamento, há a hipotonia fisiológica, as reações de pinça radial-digital, balbucia, senta sem apoio,
equilíbrio laterais e a reação do paraquedas estranhamento, brinca de esconde-achou
Entre Maior organização interna, padrões instintivos vão sendo substituídos gradativamente Vocaliza, controle completo da musculatura
3-6 meses por ações volitivas, há aprimoramento do contato social, inicia o aprendizado de que cervical, rola de forma completa, agarra um objeto
os objetos têm vida própria, há diminuição do tônus flexor das extremidades quando colocado em sua mão, vira-se na direção
de um som
Entre Adquire maior capacidade de locomoção, noções espaciais de distância e limites, Posição ortostática, duplica sílabas, pinça inferior,
9-12 meses executa planos de ações para atingir objetivos bate palmas, dá tchau
Entre Aumenta o papel da função paterna, a linguagem torna-se racional e o pensamento Pinça completa, primeiras palavras, primeiros
12-18 meses verbal, inicia o controle de esfincteres passos
434 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Forma espástica: associada a danos no sistema piramidal, é a for- nais nas quais aquela se encontra inserida. Para que a criança se constitua
ma mais frequentemente observada. Pode haver hipotonia inicial como sujeito, é fundamental a existência de um lugar no imaginário das
seguida da espasticidade, que é mais evidente ao final do 1º ano outras pessoas de seu convívio.
de vida. De acordo com sua distribuição anatômica, essa forma
pode ser classificada em unilateral, que abarca as formas anterior-
mente denominadas hemiplégica e monoplégica, e em bilateral, ATENÇÃO!
que engloba as formas antes conhecidas como diplégicas, triplégi-
O fator mais importante para a construção da reciprocidade entre a
cas, tetraplégicas ou dupla hemiplegia.
criança e as demais pessoas ao seu redor está estabelecido na relação
Forma discinética: engloba a coreoatetose e a distonia e ca-
com sua mãe ou substituta.
racteriza-se pela presença de movimentos e posturas atípicos,
em geral evidenciados ao iniciar um movimento voluntário. De-
corre de danos no sistema extrapiramidal, predominantemente A observação do vínculo estabelecido entre a criança e sua mãe ou
nos núcleos da base, sendo a forma mais associada à icterícia cuidadora é parte da avaliação do desenvolvimento da criança. O olhar, o
neonatal grave. sorriso, a curiosidade e o estranhamento são marcadores importantes do
Forma atáxica: mais rara, decorre de alterações cerebelares. Ca- desenvolvimento relacional e afetivo do bebê.
racteriza-se pela descoordenação dos movimentos decorrente da Os transtornos do desenvolvimento comportam uma série de altera-
dissinergia, ocasionando uma marcha com aumento da base e a ções que se iniciam na infância e se caracterizam por distúrbios na inte-
presença de tremor intencional. ração social, comunicação, atividade imaginativa e no repertório de ativi-
Formas mistas: quando há a presença de associação das formas dades de interesse, sendo o transtorno do espectro autista inserido nesse
anteriormente descritas. amplo espectro de entidades, cuja etiologia aponta para fortes evidências
Nos últimos anos, foram desenvolvidos alguns sistemas de classifica- de doença genética. Embora o diagnóstico do transtorno do espectro autis-
ção direcionados à funcionalidade dos movimentos. Essas classificações ta seja confirmado apenas ao redor dos 3 anos de idade, há evidências de
buscam a compreensão dos agravos no indivíduo afetado, avaliando sua indicadores precoces desse processo, que podem auxiliar para uma inter-
autonomia e suas necessidades de apoio e de adaptações ambientais, venção mais oportuna da criança. Os transtornos do espectro autista per-
sendo, portanto, consideradas um avanço, por considerarem o indivíduo tencem à categoria dos transtornos do desenvolvimento, termo introduzido
afetado, e não a sua doença. Nessa perspectiva, pode-se citar (GMFS, do para os transtornos mentais da infância de início precoce e com tendência
inglês Gross Motor Function Classification System o sistema de classifica- evolutiva crônica. As crianças com risco de apresentarem esse transtorno
ção da função motora grossa, já traduzida e adaptada para o Brasil, que muitas vezes exibem evolução normal das habilidades motoras e compro-
avalia especificamente os movimentos voluntários, como o ato de sentar, metimento da linguagem e de outras habilidades relacionais.
as transferências de posturas e a mobilidade da criança, a qual pode ser
classificada em cinco níveis, sendo o nível I o de maior independência e o TRATAMENTO
nível V o de total dependência externa para a realização do movimento. O Com exceção de alguns EIMs e algumas infecções congênitas, não há tra-
Sistema de Classificação da Habilidade Manual (MACS, do inglês Manual tamento específico para grande número de causas de distúrbios do desen-
Ability Classification System) é uma ferramenta auxiliar utilizada na mesma volvimento. Os novos conhecimentos sobre a plasticidade cerebral huma-
perspectiva, mas voltada para a função manual das crianças afetadas. Os na apenas reiteram a necessidade da instituição precoce de terapêutica
conhecimentos atuais acerca da neuroplasticidade impulsionaram as pes- multidisciplinar, focada no paciente, e de não profetizar prognósticos para
quisas para a detecção mais precoce de todas as patologias do desenvolvi- esses pacientes, sendo a inclusão dessas crianças na comunidade parte
mento. Nessa perspectiva, as crianças com paralisia cerebral apresentam fundamental de sua terapêutica.
alterações, como padrões posturais e repertório de movimentos, que já
podem ser detectadas entre 3 e 5 meses.
REVISÃO
QUANDO PREDOMINA A DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
A avaliação do desenvolvimento deve ser realizada em toda con-
A deficiência intelectual é uma situação que se origina no período de de-
sulta pediátrica. Trata-se de processo dinâmico e compartilhado
senvolvimento e dificulta o ajustamento social independente. A causa pré-
com a criança e sua família realizado por anamnese, exame físico
-natal mais frequente é a síndrome de Down. Em meninos, deve-se lem-
(geral e neurológico), avaliação sensorial e das aquisições da crian-
brar da possibilidade da síndrome do X frágil. O Transtorno do espectro
ça, podendo ser necessárias várias consultas para a definição do
do álcool deve ser aventado em toda criança com baixo ganho pondero-
diagnóstico.
estatural, microcefalia, filtro nasolabial hipoplásico, lábio superior afilado,
As principais causas de alterações do desenvolvimento, em conjun-
retrognatia, fenda palpebral estreita e microcefalia.
to ou isoladamente, são as pré-natais (genéticas ou hereditárias,
Na mesma perspectiva, de ampliação do enfoque restrito às doenças
fatores maternos, malformações cerebrais), as perinatais (p. ex.:
para a compreensão das repercussões no indivíduo afetado, a OMS publi-
prematuridade) e as pós-natais (p. ex.: TCEs); elas ainda podem ser
cou a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde
desconhecidas.
(CIF), que utiliza dois eixos de avaliação: função/estrutura do corpo e ativi-
É possível identificar as principais síndromes clínicas ligadas ao
dade e participação. A CIF trabalha com os conceitos de funcionalidade e
crescimento a partir do predomínio de alterações de determinado
de incapacidade, relacionando-os com os fatores ambientais e contextuais
setor do desenvolvimento, como as motoras, de deficiência intelec-
da vida dos indivíduos.
tual e as relacionais.
A intervenção oportuna é mandatória em toda criança com suspeita
QUANDO PREDOMINAM AS ALTERAÇÕES RELACIONAIS
de alteração do desenvolvimento, independentemente da confirma-
A construção da subjetividade só é possível pela interação que se estabe- ção etiológica.
lece entre a criança, seus cuidadores e as instâncias coletivas e institucio-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 435
QUADRO 72.2 ■ Fatores de risco para recorrência de crises febris Ácido valproico 20-50 mg/kg/d, de 12/12 h ou 8/8 h
*A partir do início do quadro febril ou infeccioso incipiente. Manter até o último dia
Idade < 15 meses do quadro febril (geralmente após 48 a 72 horas).
História familiar positiva de crise febril ou epilepsia em familiares de
1o grau
Febre frequente
Crise em vigência de febre baixa ■■ EPILEPSIA
Curto intervalo entre o início da febre e a crise Epilepsia é uma doença do cérebro caracterizada por uma das seguintes
condições:
Pelo menos duas crises não provocadas (ou duas crises reflexas)
CLASSIFICAÇÃO ocorrendo em um intervalo superior a 24 horas.
Simples: generalizada, geralmente com componente tônico-clôni- Uma crise não provocada (ou uma crise reflexa) e chance de uma
co, duração inferior a 15 minutos, sem recorrência em menos de 24 nova crise estimada em pelo menos 60%.
horas (ou no mesmo episódio febril). Diagnóstico de uma síndrome epiléptica.
436 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
* A epilepsia é considerada resolvida naqueles indivíduos que tiveram de 10 anos e estão há pelo menos 5 anos sem usar medicações antiepi-
uma epilepsia relacionada a uma determinada faixa etária e que agora lépticas
ultrapassaram essa idade ou naqueles que tiveram a última crise há mais Os principais medicamentos antiepilépticos são descritos na Tabela 72.2.
Fenobarbital Comprimidos 50 e 100 mg CP, CGTC Crianças: 3-5 mg/kg/d (dose única noturna)
Solução 4% (1 mg/gota) Adultos: 100-200 mg/d (dose única noturna)
Injetável – 200 mg/mL
Fenitoína Cápsulas e comprimidos 100 mg CP, CGTC Crianças: 5 mg/kg/d ÷ 2-3 x
Suspensão oral 100 mg/5 mL Adultos: 200-300 mg/d ÷ 2-3 x
Clobazam Comprimidos 10 e 20 mg CA, CAt, M, CP e CGTC Crianças: 0,5-1 mg/kg/d ÷ 2-3 x
Adultos: 10-40 mg/kg/d ÷ 2-3 x (máx. 60 mg/d)
Clonazepam Comprimidos 0,5 e 2 mg CA, CAt, M, CP e CGTC Crianças: 0,05-0,1 mg/kg/d ÷ 2-3 x
Solução oral – 2,5 mg/mL (0,1 mg/gota) Adultos: 4-12 mg/d ÷ 2-3 x (máx. 20 mg/d)
Nitrazepam Comprimido 5 mg CA, CAt, M, CP e CGTC Crianças: 5-20 mg/d ÷ 2-3 x
Adultos: 5-10 mg/d ÷ 2-3 x
Ácido valproico Cápsula 250 mg CGTC, CA, E, M, CP Crianças: 20-50 mg/kg/d ÷ 2-3 x (máx. 60 mg/kg/d)
Comprimidos 250, 300, 500 mg Adultos: 500-3.000 mg/d ÷ 2-3 x
Xarope 250 mg/5 mL
Xarope 200 mg/mL
Divalproato de sódio Comprimidos 250 e 500 mg CGTC, CA, E, M, CP Crianças: 20-50 mg/kg/d ÷ 2-3 x (máx. 60 mg/kg/d)
Comprimido sprinkle – 125 mg Adultos: 500-3.000 mg/d ÷ 2-3 x
ER (liberação lenta): 1 tomada diária
Carbamazepina Comprimidos 200 e 400 mg CP, CGTC Crianças: 10-30 mg/kg/d ÷ 2-3 x
Suspensão oral – 20 mg/mL Adultos: 400-1.800 mg/d ÷ 2-3 x
Oxcarbazepina Comprimidos 300 e 600 mg CP, CGTC Crianças: 20-30 mg/kg/d ÷ 2-3 x
Suspensão oral – 60 mg/mL Adultos: 600-2.400 mg ÷ 2 x
Topiramato Cápsulas (sprinkle) 15 e 25 mg CGTC, CA, E, M, CP Crianças: 7-9 mg/kg/dia ÷ 2-3 x
Comprimidos 25, 50 e 100 mg Adultos: 150-1.600 mg ÷ 2-3 x
Lamotrigina Comprimidos 25, 50 e 100 mg CGTC, CA, M, CP Crianças:
Em uso de valproato: 1-5 mg/kg/d – início gradual
Sem uso de valproato: 5-15 mg/kg/d
Adultos:
Em uso de valproato: 100-200 mg/d – início gradual
Sem uso de valproato: 200-400 mg/kg/d
Etossuximida Solução oral 50 mg/mL CA 3-6 anos: 15-40 mg/kg/d ÷ 2-3 x
> 6 anos: 500-1500 mg/d
Vigabatrina Comprimido 500 mg E, CP, CGTC Crianças: 50-150 mg/kg/d ÷ 2-3 x
Adultos: 2-6 g/dia ÷ 1-2 x
Levetiracetam Comprimidos 250, 500, 750 mg CPC, M, EGI Crianças: 10-20 mg/kg/d (máx. 60 mg/kg/d – ajuste
Solução 100 mg/mL de acordo com o clearance de creatinina)
Adultos: 500 mg-3 g/d ÷ 2
Gabapentina Capsulas 100, 300 e 400 mg CPC Criancas > 12 anos/adultos: 900-3600mg/dia
Comprimidos 600 e 800 mg
Solucao oral 50 mg/mL
Pregabalina Comprimidos 75 e 150 mg CPC Maiores de 17 anos:150 – 600 mg/dia ÷ 2 – 3 doses
Lacosamida Comprimidos 50,100, 150 e 200 mg CPC Crianças 1-3 mg/kg/dia
Xarope 10 mg/mL Adultos 200-400mg/dia ÷ 2 doses
Adulto 200-400 mg/dia
CP: crises parciais; CGTC: crises generalizadas tônico-clônicas; CA: crises de ausência; CAt: crises atônicas; CT: crises tônicas; CC: crises clônicas; M: mioclonias; E: espasmos;
EGI: epilepsias generalizadas idiopáticas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 437
EPILEPSIAS COM EVOLUÇÃO BENIGNA 4 | Prognóstico: não há remissão espontânea, mas tende a melhorar com
a idade.
Epilepsia rolândica (epilepsia benigna da infância
com espículas centrotemporais) EPILEPSIAS COM EVOLUÇÃO CATASTRÓFICA
1 | Quadro clínico: início entre 1 a 14 anos, com pico entre 8 e 9 anos.
Síndrome de West (espasmos infantis)
Clonias em hemiface que eventualmente se propagam para o membro
superior ipsilateral, parestesias orais, sialorreia, vocalizações, disartria ou 1 | Quadro clínico: início entre 4 e 6 meses, raramente antes dos 3 meses
anartria. Costuma ocorrer durante o sono ou ao despertar, havendo possi- ou após um 1 ano de idade. Caracteriza-se pela tríade: espasmos; hip-
bilidade de evoluir com generalização secundária. sarritmia no EEG; e atraso ou involução do desenvolvimento neurológico.
2 | Diagnóstico: no EEG, encontram-se espículas e ondas agudas nas Espasmos: contrações tônicas, breves e repentinas da musculatura axial
regiões centrotemporais, bilaterais síncronas ou independentes, acentua e dos membros, simétricos ou assimétricos, em salvas de 1 a 30 por dia,
das no sono. sendo cada salva composta por 20 a 200 espasmos, às vezes seguida de
choro. Ocorrem predominantemente ao despertar ou sonolência, mas é
raro durante o sono.
ATENÇÃO! 2 | Diagnóstico: no EEG, encontra-se hipsarritmia – traçado de alta volta-
gem, grafoelementos de morfologia variada, caóticos, sem ritmo de base
O tratamento da epilepsia rolândica não é obrigatório, sobretudo se reconhecível.
as crises são raras, apenas noturnas ou se não há história de gene- 3 | Tratamento: deve ser rapidamente instituído. Não há consenso quan-
ralização secundária. Se se optar por ela, os fármacos de escolha são a
to ao melhor tratamento. Fármacos de 1 linha: ACTH; prednisona; vigaba-
carbamazepina, oxcarbazepina ou sulthiame (ainda não disponível no trina; e piridoxina em altas doses. Outros medicamentos: ácido valproico;
Brasil). Ácido valproico, gabapentina e levetiracetam também podem nitrazepam; lamotrigina; topiramato. Se optado pela corticoterapia, vigiar
ser eficazes. os principais efeitos colaterais: irritabilidade; imunodepressão; hiperten-
são arterial; hipocalemia; e ganho de peso. Tratamento cirúrgico pode
controlar os espasmos em casos sintomáticos específicos.
3 | Prognóstico: remissão espontânea dentro de 2 a 4 anos do início e
4 | Prognóstico: depende da etiologia e da duração da síndrome de
antes dos 16 anos.
West. Aqueles que têm remissão podem evoluir para a síndrome de
Epilepsia de ausência da infância Lennox-Gastaut ou epilepsia focal refratária. Raramente há remissão com
prejuízo mínimo no desenvolvimento neurológico.
1 | Quadro clínico: início entre 4 e 10 anos, com pico entre 5 e 7 anos.
Ausência típica: episódios breves de comprometimento da consciência, Síndrome de Lennox-Gastaut
com início e término abruptos, que podem ser acompanhados por ma-
1 | Quadro clínico: início entre 1 a 7 anos, com pico entre 3 e 5 anos. De
nifestações motoras discretas, como automatismos orais e manuais, pis-
20 a 60% dos pacientes já apresentam anormalidades cognitivas prévias.
camentos, alterações discretas do tônus muscular e sinais autonômicos. Crises tônicas: ocorrem predominantemente durante o sono; a ausência
Características marcantes: elevada frequência ao longo do dia e fácil de- destas exclui o diagnóstico. Ausências atípicas: estreitamento do nível de
sencadeamento da crise por hiperventilação. consciência com início e término difíceis de serem reconhecidos, às vezes
2 | Diagnóstico: no EEG, encontram-se complexos generalizados de espí- acompanhadas de alteração discreta do tônus e mioclonias palpebrais ou
cula-onda, ritmados a 3/segundo. periorais. Crises atônicas: perda súbita e intensa do tônus postural de todo
a
3 | Tratamento: 1 escolha: ácido valproico ou etossuximida. Outros fár- o corpo ou apenas da cabeça. As crises de queda (drop attack ou drop neck)
macos: lamotrigina e clonazepam. podem ser por crises tônicas, atônicas ou mioclônicas. EME ocorre em 50%
4 | Prognóstico: remissão espontânea antes dos 12 anos. dos pacientes e pode derivar de todos os tipos de crise da síndrome.
Epilepsia mioclônica juvenil 2 | Diagnóstico: no EEG, encontram-se complexos de onda aguda-onda
lenta < 2,5/segundos e ritmo recrutante durante o sono.
1 | Quadro clínico: as ausências iniciam-se entre 5 e 16 anos, e as mioclo- 3 | Tratamento: ácido valproico, clonazepam, lamotrigina, levetiracetam,
nias de 1 a 9 anos depois, por volta de 14 a 15 anos. Geralmente, em segui- etossuximida, fenitoína, topiramato. Outros tratamentos são hormônio
da, iniciam-se as crises generalizadas tônico-clônicas (CGTC). As mioclonias adrenocorticotrófico (ACTH), imunoglobulina, dieta cetogênica. Calosoto-
são as manifestações mais proeminentes e tendem a ocorrer pela manhã. mia ou estimulador vagal são opções cirúrgicas para tentar diminuir as
As CGTC ocorrem em quase todos os pacientes e podem ser precedidas por crises com queda.
mioclonias. As ausências são típicas, mas menos frequentes do que na infân- 4 | Prognóstico: a maioria permanece com prejuízo intelectual e compor-
cia. História familiar positiva para mioclonias, e CGTC sugere o diagnóstico. tamental e continua a ter crises epilépticas na vida adulta.
2 | EME generalizado
QUADRO 72.3 ■ Etiologia do estado de mal epiléptico
Subtipos: ausência, tônico, clônico, tônico-clônico, mioclônico e
atônico. RECÉM- LACTENTES E
EME não convulsivo: há atividade epileptiforme característica de -NASCIDOS PRÉ-ESCOLARES ESCOLARES ADOLESCENTES
um EME no EEG, porém esta não se traduz clinicamente em ativi-
dade motora. Asfixia Crises febris Infecções Infecções do
EME generalizado tônico-clônico: apresenta maior potencial para perinatal Infecções do do SNC SNC
produzir complicações e levar à morte. Neste capítulo, será enfati- Infecções do SNC ECNP Intoxicações
zado o tratamento apenas desta entidade. SNC Distúrbios ECP exógenas
Distúrbios metabólicos Trauma (álcool, drogas,
ETIOLOGIA metabólicos ECNP tentativa de
Hipoglicemia ECP suicídio)
No Quadro 72.3, está resumida a etiologia do EME.
Malformações Trauma ECNP
do SNC Intoxicações ECP
TRATAMENTO Trauma exógenas Trauma
As medidas de suporte de vida e reanimação (quando necessário), o uso acidentais
de medicamentos antiepilépticos e os procedimentos diagnósticos devem Encefalomielite
ser conduzidos de modo simultâneo. disseminada
Deve-se manter o paciente com proteção lateral para evitar quedas e aguda
trauma craniano.
ECNP: encefalopatias crônicas não progressivas; ECP: encefalopatias crônicas pro-
gressivas.
ATENÇÃO!
Prover suporte ventilatório, controlar possível instabilidade circulató- Exames complementares poderão determinar o fator etiológico e dire-
ria, alterações da glicemia e manter o equilíbrio acidobásico são medi- cionar um tratamento mais específico (Quadro 72.4 e Figura 72.1).
das essenciais para prevenir danos neurológicos no EME. Em lactentes menores de 4 meses e em recém-nascidos, recomenda-
-se, como 1a opção, o fenobarbital. Se as crises não forem controladas
Pesquisa para EIMs Se há encefalopatia neonatal ou atraso no desenvolvimento neurológico inexplicáveis, regressão neurológica,
deterioração neurológica em evento agudo, coma e acidose
EIMs que levam ao EME: dependência de piridoxina, aminoacidopatias, distúrbios do ciclo da ureia, acidúrias
orgânicas, doenças mitocondriais
EEG Na impossibilidade de monitoração contínua, um EEG prolongado deve ser solicitado diariamente
Indicações de monitoração contínua: coma persistente, história de estado de mal não convulsivo, suspeita de
“pseudoestado de mal epiléptico”, monitoração de EME refratário em tratamento com uso de anestésicos
INTERVENÇÃO MEDICAMENTOSA*
Sim Não
A crise continua?
Escolha uma das seguintes opções de segunda linha e dê em dose única Se paciente estável,
Fosfenitoína IV (20 mg/kg, máx. 1.500 mg/dose, dose única) OU suporte clínico
Ácido valproico IV (40 mg/kg, máx. 3.000 mg/dose, dose única) OU
20-40 min
Levetiracetam IV (60 mg/kg, máx. 4.500 mg/dose, dose única)
Segunda fase
Se nenhuma das opções estiver disponível, escolha uma das seguintes (se já não tiver
sido administrada)
Fenobarbital IV (15 mg/kg, dose máxima)
Sim Não
A crise continua?
Fisher RS, van Emde Boas W, Blume W, Elger C, Genton P, Lee P, et al. Epileptic queca: depressão, transtornos de ansiedade, epilepsia, distúrbios do sono.
seizures and epilepsy: definitions proposed by the International League Identificar possível abuso de analgésicos e determinar a frequência de uti-
Against Epilepsy (ILAE) and the International Bureau for Epilepsy (IBE). lização de bebidas cafeinadas (inclusive refrigerantes). A determinação do
Epilepsia. 2005;46(4):470-2. padrão evolutivo é fundamental para o diagnóstico (Quadro 73.1).
Kälviäinen R. Status epilepticus treatment guidelines. Epilepsia. 2007;48 Suppl
8:99-102.
EXAME FÍSICO
Krumholz A, Wiebe S, Gronseth G, Shinnar S, Levisohn P, Ting T, et al. Practice
parameter: evaluating an apparent unprovoked first seizure in adults (an Nunca se deve negligenciar o exame físico, mesmo que a história seja típi-
evidence-based review). Report of the quality standards subcommittee of ca de enxaqueca. Realizar exame neurológico com especial atenção para o
the American Academy of Neurology and the American Epilepsy Society. fundo de olho (observar pulso venoso), movimentação ocular extrínseca e
Neurology. 2007;69(21):1996-2007. sinais de irritação meníngea.
Riviello JJ, Ashwal S, Hirtz D, Glauser T, Ballaban-Gill K, Kelley K, et al. Practice
parameter: diagnostic assessment of the child with status epilepticus (an
evidence-based review). Neurology. 2006;67(9):1542-50. QUADRO 73.1 ■ Padrão evolutivo das cefaleias
A | Pelo menos cinco crises preenchendo os critérios de B a E QUADRO 73.5 ■ Abordagem dos fatores desencadeantes e de
B | Cefaleia durando de 1 a 72 horas (sem tratamento ou com tratamento comportamentos relacionados às crises de enxaqueca
ineficaz)*
Fornecer informações para o paciente e para a família sobre a
C | A cefaleia preenche ao menos duas das seguintes características:
enxaqueca e assegurar que a causa da cefaleia não é uma doença
localização unilateral ou bilateral
intracraniana grave, potencialmente letal
caráter pulsátil
Higiene do sono (os horários deverão ser mantidos até mesmo nos
intensidade moderada ou forte
finais de semana, feriados e nas férias escolares)
exacerbada por ou levando o indivíduo a evitar atividades físicas
Alimentação em horários regulares
rotineiras (p. ex.: caminhar ou subir escada)
Recomendar atividade física regular (prática de esportes) para crianças
D | Durante a cefaleia, pelo menos um dos seguintes:
em idade escolar e adolescentes (é fundamental que a criança sinta
náusea e/ou vômitos
prazer em realizar tal atividade)
fotofobia e/ou fonofobia (podem ser inferidas pelo comportamento
Indicar perda de peso para crianças com sobrepeso ou obesas –
da criança)
solicitar acompanhamento conjunto de nutricionista e pediatra
E | Não atribuída a outro transtorno
Sobretudo para os casos de enxaqueca crônica, averiguar possíveis
*Trata-se de um dos itens mais controversos da classificação, haja vista que crianças situações que estejam ocasionando estresse emocional: ansiedade de
com enxaqueca podem apresentar crises de duração ainda mais curta. Entretanto, separação, divórcio parental, brigas conjugais, nascimento de irmão
quanto menor o critério de duração, menor a especificidade dessa ferramenta diag- menor, bullying, troca de turno escolar ou de escola, baixo desempenho
nóstica, apesar do aumento de sua sensibilidade. Se a frequência da dor for igual escolar ou cobrança exagerada por desempenho. Quando necessário,
ou superior a 15 dias por mês, há pelo menos três meses, o indivíduo apresenta solicitar acompanhamento conjunto de psiquiatra infantil e psicólogo
enxaqueca crônica. Não há indicação para restrição dietética sistemática, entretanto,
1
Fonte: Headache Classification Subcommittee of the International Headache Society. sempre que for identificado um fator alimentar potencialmente
relacionado, a criança deverá abster-se dele
Utilizar bebidas cafeinadas com moderação e evitar produtos dietéticos
QUADRO 73.4 ■ Indicações para realização de exames de Especial atenção deve ser dada aos adolescentes, particularmente para
neuroimagem a possível relação com o uso de álcool ou tabaco, também descritos
como fatores desencadeantes de cefaleia recorrente
Cefaleia de instalação súbita (cefaleia de caráter explosivo) Em adolescentes do sexo feminino, questionar se há utilização de
Alteração na frequência, gravidade ou características clínicas de uma contracepção hormonal
cefaleia preexistente Se houver abuso de analgésicos, seu uso deverá ser descontinuado
Exame neurológico anormal e/ou presença de outros sinais ou
sintomas neurológicos, críticos ou intercríticos, como ataxia, diplopia,
papiledema, afasia, parestesias, exceto aura visual O tratamento agudo da enxaqueca tem como objetivo o alívio com-
Cefaleia progressiva ou cefaleia muito frequente de início recente pleto da dor, propiciando ao paciente o pronto restabelecimento de suas
Hemicrania fixa, isto é, cefaleia que sempre recorre do mesmo lado do atividades normais. Deve ser feito rapidamente e de forma eficaz, visando
crânio a não recorrência em curto período de tempo. É importante ressaltar que,
Dificuldade escolar recente, distúrbios agudos do comportamento, para muitas crianças, o sono é suficiente para abortar o quadro doloroso,
redução do ritmo de crescimento sendo o repouso em ambiente escuro e silencioso indicado em todos os
Despertar noturno por cefaleia ou sua ocorrência pela manhã ao casos. Se o médico conseguir fazer a criança dormir, ela provavelmente
despertar acordará sem dor. O médico deverá transmitir ao paciente os seguintes
Cefaleia associada a crises epilépticas fundamentos do tratamento agudo:
Cefaleia após trauma de crânio a medicação deverá ser tomada tão logo comece a crise de enxa-
Ausência de resposta terapêutica queca (preferencialmente nos primeiros 20 minutos);
Cefaleia em pacientes com doenças sistêmicas que façam suspeitar o paciente deverá tomar a dose apropriada (diga que ele não pode
de complicações intracranianas, como síndrome nefrótica, Aids, utilizar subdoses, com medo de estar se “intoxicando”);
neoplasias, colagenoses etc.
evitar abuso de analgésicos (uso por três ou mais vezes por semana).
Existem poucos estudos controlados sobre o tratamento agudo das
Uma ferramenta importante, utilizada para a terapêutica e o acompa- crises de enxaqueca na faixa etária pediátrica. Com base neles, as seguin-
nhamento de pacientes com cefaleia, é o registro dos episódios dolorosos tes recomendações podem ser feitas:
(diário da dor). Deve-se orientar os familiares ou as próprias crianças para o paracetamol e o ibuprofeno são medicações eficazes e seguras;
que anotem o dia e horário de suas dores, as características, os possíveis entre os triptanos (agonistas de receptores 5-HT1), somente o suma-
fatores desencadeantes e as medidas utilizadas para melhora do quadro. triptano e o zolmitriptano, utilizados sob a forma de spray nasal, e o
442 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Dipirona (EV)
Pré-escolar Escolar/adolescente
Pré-escolar/escolar Ibuprofeno
Resposta Resposta
insatisfatória Clorpromazina (EV)
Adolescente insatisfatória
Tenoxicam (EV)
> 14 anos
FIGURA 73.1 ■ Algoritmo para tratamento das crises de enxaqueca em crianças e adolescentes.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 443
Flunarizina 20-40 kg: 5 mg/dia Dose única, antes Síndromes parkinsonianas Ganho ponderal, parkinsonismo,
> 40 kg: 10 mg/dia de dormir depressão
Propranolol 20-40 kg: 10 mg, 12/12 h 12/12 h Asma, depressão, insuficiência cardíaca, Sonolência, letargia, fadiga, depressão,
> 40 kg: 20 mg, 12/12 h diabetes, hipotensão ortostática hipotensão ortostática
Amitriptilina 20-40 kg: 12,5 mg/dia Dose única, antes Mania, retenção urinária, arritmia Ganho ponderal, xerostomia, sonolência,
> 40 kg: 25 mg/dia de dormir cardíaca hipotensão ortostática
Divalproato > 20 kg: 500 mg/dia* Dose única, após o Hepatopatia, diátese hemorrágica Náusea, alopecia, tremores, dispepsia,
de sódio jantar ganho ponderal, pancreatite, hepatite
Topiramato 20-40 kg: 50 mg/dia Introdução lenta e Litíase renal, glaucoma, depressão Náusea, diminuição do apetite,
> 40 kg: 100 mg/dia gradual, fracionada parestesia, glaucoma agudo, litíase
de 12/12 h renal, depressão, disfunção da memória
*Dose indicada para utilização da formulação de liberação lenta (ER).
uma vez ao dia, ao passo que o propranolol necessita de pelo me- ■■ REFERÊNCIA
nos duas administrações diárias; 1. Headache Classification Subcommittee of the International Headache
adolescentes sem comorbidades: propranolol ou amitriptilina; Society. The International Classification of Headache Disorders: 2nd edition.
crianças e adolescentes que apresentam como comorbidades Cephalalgia. 2004;24 Suppl 1:9-160.
insônia, atraso de fase do sono, depressão e transtornos de
ansiedade: amitriptilina;
■■ LEITURAS SUGERIDAS
escolares e adolescentes obesos: topiramato.
Damen L, Bruijn J, Koes BW, Berger MY, Passchier J, Verhagen AP. Prophylactic
treatment of migraine in children. Part 1. A systematic review of non-
pharmacological trials. Cephalalgia. 2006;26(4):373-83.
ATENÇÃO! Damen L, Bruijn J, Verhagen AP, Berger MY, Passchier J, Koes BW. Prophylactic
treatment of migraine in children. Part 2. A systematic review of
É importante lembrar que a flunarizina induz aumento do apetite, com
pharmacological trials. Cephalalgia. 2006;26(5):497-505.
frequente ganho ponderal. Damen L, Bruijn JK, Verhagen AP, Berger MY, Passchier J, Koes BW. Symptomatic
treatment of migraine in children: a systematic review of medication trials.
Pediatrics. 2005;116(2):e295-302.
Os estudos disponíveis que avaliam terapias comportamentais em Lewis D, Ashwal S, Hershey A, Hirtz D, Yonker M, Silberstein S. Practice
crianças, como terapia cognitivo-comportamental (TCC), técnicas de rela- parameter: pharmacological treatment of migraine headache in children
xamento e biofeedback térmico, são, em geral, mal conduzidos e levam a and adolescents: report of the American Academy of Neurology Quality
resultados conflitantes. Entretanto, parece haver algum benefício relacio- Standards Subcommittee and the Practice Committee of the Child Neurology
nado à utilização de técnicas de relaxamento. Na prática, recomendamos Society. Neurology. 2004;63(12):2215-24.
esse tipo de abordagem apenas para adolescentes com altos níveis de
ansiedade e crises muito frequentes.
Apenas um estudo com número pequeno de pacientes avaliou a acu-
puntura no tratamento de crianças com enxaqueca. Os resultados apon-
tam para um possível benefício, podendo ser utilizada como terapia adju- 74
vante em escolares e adolescentes com crises frequentes.
VIOLÊNCIA E MAUS-TRATOS
REVISÃO
■■ RENATO NABAS VENTURA
A enxaqueca é a principal causa de cefaleia na criança.
A história clínica e o exame físico são fundamentais para o diagnós- ■■ SORAIA TAHAN
tico, visto que a cefaleia pode estar relacionada a outras doenças, ■■ GLAURA CÉSAR PEDROSO
como um tumor.
O registro dos episódios de dor (diário da dor) é importante para o
acompanhamento do paciente com cefaleia. Segundo a OMS,1 a violência é a imposição de um grau significativo de
O tratamento da cefaleia, além das intervenções medicamentosas dor e sofrimento evitáveis. Os atos violentos podem ser classificados em:
(para crises e profiláticas), deve considerar os fatores desencadean- violência autoinfligida: inclui o comportamento suicida (desde
tes e o comportamento relacionado à crise de enxaqueca. pensamentos até a busca de meios e planejamentos de suicídio) e
autolesões (automutilações);
444 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
violência interpessoal: infligida por outro indivíduo ou grupo de das, não planejadas; prematuros ou crianças hospitalizadas por longos
indivíduos. Divide-se em intrafamiliar, aquela que se produz entre períodos; criança de sexo diferente da expectativa dos pais; crianças e
os membros da família, e comunitária, a que ocorre fora do lar en- adolescentes com nível intelectual ou estilo de vida diferente dos pais;
tre indivíduos com algum tipo de relação (p. ex.: na escola); filhos criados por outras pessoas ou com pais distantes física ou emocio-
violência coletiva: infligida por grupos maiores, como Estados, nalmente; filhos de outros relacionamentos; crianças e adolescentes que
milícias, organizações terroristas, crime organizado e outros. não aprenderam a respeitar limites, hiperativos ou com transtornos de
A violência contra criança ou adolescente pode ser compreendida conduta; portadores de deficiência ou doenças crônicas; filhos adotivos.
como qualquer ação ou omissão que provoque danos, lesões ou Os profissionais de saúde devem ficar atentos, também, a algumas
transtornos a seu desenvolvimento. Pressupõe uma relação de po- situações familiares de risco que sugerem a existência de um adulto agres-
der desigual e assimétrica entre o agressor e a criança ou adoles- sor: cuidadores imaturos; cuidadores dominadores ou autoritários, que
cente. Incluem-se nessa categoria: mantêm o domínio de toda a família, limitando o convívio social; pessoas
violência estrutural: que aparece devido às condições de vida, oriundas de famílias com histórico de violência e com histórico de violência
econômicas e sociais das crianças e adolescentes, tornando vul- na sua vida pessoal; pessoas com dificuldades de socialização; mães por-
nerável o seu crescimento e desenvolvimento (p. ex.: trabalho tadoras ou com histórico de depressão pós-parto; pessoas dependentes de
infantil e prostituição); álcool e/ou drogas; pessoas com transtornos do comportamento ou doença
bullying (violência entre iguais): todas as formas de atitudes mental.
agressivas, intencionais e repetidas, executadas entre iguais O reconhecimento de que uma criança ou um adolescente esteja sen-
(estudantes, colegas de trabalho), em uma relação desigual de do vitimizado (pelos pais, familiares ou até mesmo colegas) é difícil, já
poder, sem motivação evidente, causando dor e angústia; que a violência, na maior parte das vezes, não deixa marcas físicas. Então,
violência intrafamiliar: todo ato ou omissão de pais, familia- na atenção à saúde da criança e do adolescente, é fundamental, além de
res ou responsáveis capaz de causar dano físico, sexual e/ou identificar situações de risco, observar quadros que podem estar associa-
psicológico a crianças ou adolescentes. De um lado, implica dos à violência (que não pode ser dita), mas se expressa por um com-
uma transgressão do poder/dever de proteção do adulto e, de portamento extremo de apatia, agressividade, isolamento, irritabilidade
outro, negação do direito que crianças e adolescentes têm de ou choro frequente, sem causa aparente; sinais de ansiedade ou medo
serem tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar constantes; baixas autoestima e autoconfiança; dificuldade na fala, ga-
de desenvolvimento. gueira, tiques ou manias; depressão; afecções de pele frequentes sem cau-
Como a criança vive basicamente no ambiente doméstico, a violência sa aparente; aumento injustificável da incidência de infecções ou doenças
intrafamiliar é mais frequente e implica a posição de poder do mais forte, alérgicas; enurese noturna, encoprese; recusa alimentar em menores de 1
com invasão do corpo da criança ou adolescente. A criança e o adoles- ano, obesidade, anorexia nervosa, bulimia ou outros transtornos alimen-
cente são transformados em objetos de uso do adulto, que deveria agir tares; desnutrição ou má nutrição por falta de ingestão alimentar; má hi-
como protetor; não se trata de uma escolha da vítima. Essa violência que giene corporal, contrastando com o aspecto dos pais; roupas inadequadas
acomete, normalmente, mais de uma criança ou adolescente, é garantida ou desconfortáveis; acompanhamento de saúde inadequado ou precário;
e fortalecida pelo “Pacto do silêncio”, fruto da ameaça do agressor e da atraso vacinal, sem justificativa; despreocupação dos pais ou cuidadores
conivência de outros familiares. Ocorre em todas as classes sociais, credos, com os locais que as crianças ou adolescentes frequentam; atraso no de-
raças ou etnias. senvolvimento psicomotor e de linguagem; atraso na escolaridade; difi-
São definidos quatro tipos de maus-tratos contra crianças e adoles- culdades escolares; acidentes frequentes; problemas de adaptação social;
centes: destrutividade ou autodestrutividade – uso de drogas, comportamento
negligência: omissão dos responsáveis pelas crianças e adoles- delinquente e tentativa de suicídio.
centes, ao deixarem de prover suas necessidades básicas (abando- Crianças e adolescentes vítimas de violência física podem chegar ao
no é a forma extrema de negligência); atendimento de rotina apresentando lesões em várias partes do corpo,
violência física: uso da força física intencional, inclusive com fins em regiões cobertas, não relatadas, mas percebidas ao exame físico (arra-
disciplinares – desde um simples tapa até agressões com instru- nhões, marcas de instrumentos, como cintas, fivelas; hematomas em vá-
mentos vários, armas brancas e de fogo, podendo levar à morte; rios estágios de evolução; cicatrizes de queimaduras; lesões puntiformes
violência psicológica: toda forma de rejeição, depreciação, discri- por queimaduras com pontas de cigarros), bem como lesões ou fraturas
minação, desrespeito, cobrança exagerada e humilhação; em estágios diferentes de cicatrização ou cura. Por isso, durante qualquer
violência sexual: qualquer forma de prática sexual ou erótica com procedimento ou exame físico (sempre que possível, despindo a criança ou
crianças e adolescentes por agressor com desenvolvimento psicos- adolescente), é preciso que o profissional esteja atento a essas alterações
social mais adiantado. que podem indicar uma situação de violência.
No Brasil, há poucos dados sobre a violência intrafamiliar contra Nos casos de violência sexual, a presença de alterações ao exame físi-
crianças e adolescentes. Em sua maioria, as informações são provenientes co é bastante rara. Os sintomas físicos mais comuns são: distúrbios diges-
de registros de atendimento em Conselhos Tutelares, Delegacias e Centros tivos; inflamações, equimoses, fissuras e hemorragias vulvares ou anais;
de Referência para crianças e adolescentes vitimizados, em que a negli- infecções urinárias e vaginais recorrentes; doenças sexualmente transmissí-
gência figura como a principal violência notificada (cerca de 40 a 45%), veis (DSTs), gravidez, aborto e morte por tentativa de aborto ou suicídio. Os
seguida pela violência física (cerca de 30 a 35%), psicológica (cerca de sintomas psicológicos, porém, são mais expressivos: agressividade frente a
10%) e sexual (5 a 8%). pessoas do sexo do agressor, inibição, ansiedade, angústia, distúrbios do
sono, transtornos alimentares, enurese, encoprese, transtorno de estresse
pós-traumático (TEPT), fobias, pânico, transtorno obsessivo-compulsivo
■■ QUADRO CLÍNICO E FATORES DE RISCO (TOC), fracasso escolar, condutas que levam à submissão, à revitimização
Algumas situações de risco indicam maior vulnerabilidade da criança ou ou à conduta abusiva, baixa autoestima, impotência, depressão, tentativa
adolescente a vivenciar uma experiência violenta: crianças não deseja- de suicídio, conduta sexualizada, masturbação compulsiva.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 445
melhança do atendimento ao acidente ocupacional para trabalhadores de O artigo 13 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)* adverte
saúde. Quando indicada (casos de penetração anal ou vaginal e levando que os profissionais de saúde têm o dever de comunicar os casos de que
em conta o status sorológico do agressor, quando conhecido), deve ser tenham conhecimento, suspeitos ou confirmados, fundamentando-se em
iniciada, no máximo, 72 horas após a exposição e mantida por período de evidências e fatos consistentes e sustentáveis: “Os casos de suspeita ou
28 dias (Tabelas 74.3 e 74.4). A contracepção de emergência é um direito confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigato-
da vítima e está normatizada pelo Ministério da Saúde (Tabela 74.5). riamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem
Todos os casos, agudos ou crônicos, devem ser submetidos a rastrea- prejuízo de outras providências legais”.
mento sorológico periódico por pelo menos seis meses. Pacientes com Cabe à equipe de saúde avaliar o melhor momento para a notificação.
gestações decorrentes do abuso devem ter garantido o acesso a servi- Mesmo que a família não queira ou não aceite a notificação, o profissional
ços que ofereçam o aborto legal. Os acompanhamentos psicoterapêutico, de saúde deverá informá-la de que notificará aos orgãos competentes,
psiquiátrico e de serviço social, destinados à vítima, ao agressor e à família amparado pelo ECA (artigos 13 e 245).*
também são fundamentais. O atendimento deve ser multidisciplinar e com A obrigatoriedade da notificação está assegurada também pelo Con-
respaldo institucional, para proteger os membros da equipe e atuar em selho Federal de Medicina e por alguns Conselhos Regionais. O Processo
rede com outras instituições. Consulta nº 815/1997 PC/CFM/nº 13/1999** dispõe que “[...] obrigatorieda-
Para definir as medidas de proteção da criança e adolescente, o pro- de de o médico denunciar às autoridades competentes abusos sexuais e
fissional não deve agir prematura ou impulsivamente, mas buscar informa- maus-tratos, a lei penal obriga o médico a comunicar crime de ação pú-
ções complementares e refletir, com a equipe, sobre os encaminhamentos blica que independa de representação, conhecido no exercício da profis-
necessários. são”. Enfatiza-se também a importância do setor da saúde para trabalhos
A notificação ao Conselho Tutelar tem o objetivo de promover cui- preventivos e tratamento médico e psicossocial.
dados sociossanitários, iniciando um processo que visa a interromper as Existem ainda as Portarias do Ministério da Saúde, que dispõem so-
atitudes e os comportamentos violentos no âmbito da família e por parte bre a obrigatoriedade de notificação de violência. A Portaria MS/GM nº
de qualquer agressor. É um direito da criança, do adolescente e da família 1.968/2001*** dispõe sobre a Notificação Obrigatória de Violência contra
viver em um ambiente que promova bem-estar físico, social e emocional, Crianças e Adolescentes pelos serviços do SUS, e a Portaria nº 1.969/2001****
livre de qualquer forma de violência, opressão ou negligência. trata de inclusão de campos de notificação obrigatória para acidentes e
violências na autorização de internação hospitalar-AIH/SUS. A notifica-
ção, no âmbito da saúde, é obrigatória e deve ser feita em três vias, sem
ATENÇÃO!
prejuízo de outras providências legais.
Informar uma situação de violência significa dizer ao Conselho Tutelar: Além da notificação aos órgãos judiciais (Conselho Tutelar e/ou Vara
“esta criança ou este adolescente e sua família precisam de ajuda!”. Ao da Infância e Juventude e autoridades policiais), a equipe multiprofis-
registrar a possibilidade ou ocorrência de maus-tratos, o profissional sional deve também encaminhar as vítimas e suas famílias para Centros
atua em dois sentidos: reconhece as demandas especiais e urgentes
da vítima; e chama o poder público à sua responsabilidade. Trata-se *Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8609.htm
de uma medida importante de proteção à criança, não de punição. O **Disponível em: www.portalmedico.org.br/pareceres/cfm/1999/13_1999.htm.
cuidado institucional e profissional é um direito da criança e do adoles- ***Disponível em: /proweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/cgvs/usu_doc/ev_vio_
cente. Para o profissional, prover a assistência e notificar são deveres. leg_portaria_1968_2001_notificacao_compulsoria_violencia_contra_crianca.pdf.
****Disponível em: drt2001.saude.gov.br/sas/PORTARIAS/Port2001/GM/GM_1969.htm.
Lopinavir/ritonavir Solução oral: 80 mg/20 mg/mL (LPV/r) Oral Crianças < 2 anos
300 mg/m2 de 12/12 h
2. Peso em kg = 2 × idade + 8
4
Fonte: Brasil.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 447
Não deixar a criança sozinha, sem grades ou cintos de segurança, Manter produtos tóxicos em suas embalagens originais, evitando o
em berços, sofás, carrinhos e cadeirinhas de alimentação. Afivelar uso de recipientes de refrigerante ou outros alimentos.
corretamente o cinto de segurança em todos os equipamentos que Nunca deixar bebidas alcoólicas ao alcance das crianças.
o possuírem. Evitar plantas tóxicas dentro de casa e conhecer as plantas existen-
Instalar grades ou redes de proteção em janelas, escadas, sacadas tes no entorno, ensinando que não devem ser colocadas na boca,
e lajes; manter travas e fechaduras para limitar a abertura de jane- assim como adereços feitos com sementes.
las e portões; limitar o acesso a lajes e escadas. Somente usar tintas, solventes e colas em locais arejados.
Manter pisos limpos e secos, sem encerá-los; retirar os tapetes ou Ler as instruções dos produtos químicos antes de usá-los.
fixá-los com antiderrapantes e dar preferência a calçados que não Não fazer aspersão de inseticidas perto das crianças.
deslizem; retirar objetos e brinquedos das áreas de circulação. Comprar medicamentos somente quando prescritos pelo médico e
Não usar andadores. não substituí-los sem autorização dele.
Não colocar móveis perto de janelas. Jogar medicamentos vencidos fora, de forma a impedir sua ma-
Verificar a segurança de móveis e equipamentos para crianças an- nipulação por crianças (se possível, entregar para descarte em
tes de comprá-los, dando preferência aos já certificados, e seguir farmácias ou postos de coleta autorizados). O descarte seguro de
as instruções do fabricante. medicamentos tem sido discutido com o objetivo de se definir uma
Não deixar no berço travesseiros, brinquedos ou outros objetos política nacional que evite seu uso indevido e também sua libera-
que possam ser usados para pular. ção no ambiente.
Abaixar o estrado e o colchão do berço quando a criança começar Nunca dar medicamentos em local escuro; sempre verificar a re-
a mostrar capacidade de sentar ou ficar em pé. ceita e o rótulo.
Usar patins, skates e bicicletas em local apropriado e com equipa- Preferir medicamentos com tampas de segurança.
mentos de proteção. Adotar precauções em relação a anéis, brincos e pulseiras de brinque-
do, que, frequentemente, apresentam níveis elevados de chumbo.
ASFIXIA
Evitar travesseiros macios e cobertores pesados. CHOQUE ELÉTRICO
Manter o berço longe de cortinas, cordas de persianas e fios soltos. Usar protetores apropriados para tomadas elétricas.
Não deixar sacos plásticos ou impermeáveis ao alcance de crianças. Quando possível, instalar dispositivos de segurança na rede elé-
Escolher berços com vãos pequenos (até cerca de 6 cm) entre as trica (p. ex.: tomadas que evitem a passagem de corrente ao se
grades. introduzir objetos de maneira inadequada).
Evitar correntes, fitas ou fios ao redor do pescoço da criança. Manter equipamentos elétricos fora do alcance da criança; evitar o
Evitar roupas de dormir com cordões no pescoço. uso de aparelhos elétricos em local molhado.
ASPIRAÇÃO OU INGESTÃO DE CORPO ESTRANHO Evitar brincadeiras com pipas próximo à rede elétrica.
Ensinar às crianças, desde pequenas, precauções de segurança
Remover espinhas de peixes e ossos pequenos; oferecer alimentos com eletricidade.
em tamanho e consistência apropriados à idade e ao desenvolvi-
mento da criança, com especial atenção a crianças com problemas ATROPELAMENTO
de deglutição.
Sempre segurar a criança pelo punho quando estiver na calçada ou
Manter objetos pequenos longe do alcance da criança.
atravessando a rua.
Não oferecer balas duras, pipocas e gomas de mascar a crianças
Ensinar segurança de tráfego para as crianças.
menores de 3 anos.
Sempre usar bicicletas, velocípedes e brinquedos de corrida em
Selecionar brinquedos adequados à idade, às habilidades, à capa-
locais apropriados.
cidade e ao interesse da criança, seguindo as recomendações do
Manter supervisão sobre as crianças quando na rua.
fabricante. No caso de brinquedos artesanais, observar se há par-
Reforçar as normas de segurança de trânsito por meio do exemplo
tes pequenas e evitar materiais tóxicos na sua construção.
dos adultos, em especial dos pais ou responsáveis.
Supervisionar de perto os lactentes durante as brincadeiras.
Crianças até 10 anos devem atravessar a rua acompanhadas de um
Inspecionar os brinquedos regularmente, verificando a presença de
adulto. Além da menor habilidade da criança em prever a trajetó-
partes soltas ou outros riscos potenciais; repará-los imediatamente
ria e a velocidade dos veículos, crianças pequenas podem não ser
ou tirar do alcance das crianças.
vistas pelos motoristas.
Atenção especial deve ser dada a brinquedos com ímãs, pois a pre-
sença de duas ou mais dessas peças em alças intestinais diferentes
ACIDENTES COM MATERIAIS PERFUROCORTANTES
pode levar à adesão dos ímãs, aprisionando as alças e levando a
complicações cirúrgicas por isquemia ou obstrução. Manter ferramentas e instrumentos perfurocortantes longe de crianças
Remover e descartar imediatamente embalagens de brinquedos e pequenas e ensinar as precauções necessárias ao uso por crianças mais
envoltórios plásticos. velhas e adolescentes.
Não permitir que a criança mastigue ou chupe objetos como bexi-
gas e seus fragmentos. SEGURANÇA DE TRÂNSITO
Virar a criança em situações de vômito, de modo a impedir a as- A Resolução no 277 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), de 28
piração. de maio de 2008,* regulamenta o uso de equipamentos de segurança de
trânsito para crianças com idade inferior a 10 anos:
INTOXICAÇÕES
Manter produtos de limpeza, higiene e medicamentos fora do al-
cance das crianças, de preferência em armários fechados e longe *Para mais informações, acesse: www.denatran.gov.br/download/Resolucoes/RESO-
dos alimentos. LUCAO_CONTRAN_277.pdf
450 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
REVISÃO
A partir do 2º ano de vida, os acidentes e violências (causas exter- 76
nas) representam a principal causa de internação e óbito em crian-
ças e adolescentes brasileiros. PARTICULARIDADES DA
Define-se lesão como um “dano corporal produzido por trocas de
energia com efeitos discerníveis e relativamente súbitos, que pode
CONSULTA DO ADOLESCENTE
apresentar-se como uma lesão física (...) ou como um prejuízo de
função”.
O Ministério da Saúde1 define acidente como “evento não intencio- ■■ MARIA SYLVIA DE SOUZA VITALLE
nal e evitável, causador de lesões físicas ou emocionais no âmbito
■■ MAURO FISBERG
doméstico ou nos outros ambientes sociais, como o do trabalho, do
trânsito, da escola, de esportes e o de lazer”. ■■ FLÁVIA CALANCA DA SILVA
Diante de um suposto acidente, é fundamental avaliar a possibilida- ■■ SHEILA R. NISKIER
de de se tratar de negligência ou lesão intencional.
tificar a adolescência como uma fase crítica. É nesse momento da vida 3 | O adolescente, desde que identificado como capaz de avaliar seu pro-
que ocorrem definições da identidade sexual, profissional, de valores; blema e de conduzir-se por seus próprios meios para solucioná-lo, tem o
adaptação às mudanças fisiológicas e anatômicas do corpo (crescimento direito de ser atendido sem a presença dos pais ou responsáveis no am-
somático, maturação sexual, aquisição das funções do corpo adulto); e biente da consulta, garantindo-se a confidencialidade e a execução dos
que os indivíduos estão mais expostos a situações de risco, como gravidez procedimentos diagnósticos e terapêuticos necessários. Dessa forma, o
não desejada, acidentes, violência, maus-tratos, uso e abuso de drogas, jovem tem o direito de fazer opções sobre procedimentos diagnósticos,
evasão escolar e aquisição de DSTs/Aids. terapêuticos ou profiláticos, assumindo integralmente seu tratamento.
Quando se considera a grande vulnerabilidade desta população e a Os pais ou responsáveis somente serão informados sobre o conteúdo da
importância demográfica desse grupo, entende-se a necessidade desses consulta, como nas questões relacionadas à sexualidade e à prescrição de
indivíduos receberem atenção integral à saúde, observando suas peculia- métodos contraceptivos, com o expresso consentimento do adolescente.
ridades e determinando a necessidade de ações específicas e abrangentes. 4 | A participação da família no processo de atendimento do adolescente
A experiência do adolescer exige da família, dos profissionais de saúde e é altamente desejável, porém os limites desse envolvimento devem ficar
educação atenção especial para esse indivíduo, ajudando-o a lidar com claros para a família e para o jovem. O adolescente deve ser incentivado a
situações e problemas que possam provocar danos e agravos à saúde. envolver a família no acompanhamento dos seus problemas.
5 | A ausência dos pais ou responsáveis não deve impedir o atendimento
■■ ASPECTOS ÉTICOS DO ATENDIMENTO médico do jovem, seja em consulta de matrícula ou nos retornos.
MÉDICO DO ADOLESCENTE 6 | Limites da confidencialidade – em situações consideradas de risco
(gravidez, abuso de drogas, não adesão a tratamentos recomendados,
Os princípios éticos no atendimento de adolescentes nos serviços de saú-
doenças graves, risco de vida ou à saúde de terceiros), frente à realização
de se referem especialmente à privacidade, à confidencialidade, ao sigilo
de procedimentos de maior complexidade (biópsias e intervenções cirúr-
e à autonomia. O respeito a esses preceitos encoraja rapazes e moças a
gicas), tornam-se necessários a participação e o consentimento dos pais
procurarem ajuda quando necessário. Pesquisa realizada nos Estados Uni-
ou responsáveis.
dos mostrou que a maioria dos jovens não revelaria certas informações se
a confidencialidade não fosse garantida. 7 | Todas as situações em que se caracterizar a necessidade da quebra do
No Brasil, o sigilo é regulamentado pelo artigo 103 do Código de Ética sigilo médico, o adolescente deve ser informado, justificando-se os moti-
3
Médica, que diz: “É vedado ao médico revelar segredo profissional re- vos para essa atitude.
ferente a paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou responsáveis O desafio do profissional de saúde que atende adolescentes é com-
legais, desde que o menor tenha capacidade de avaliar seu problema e de patibilizar o direito do adolescente de receber assistência individual com o
conduzir-se por seus próprios meios para solucioná-lo, salvo quando a não direito da família de cuidar da saúde e bem-estar de seu filho.
revelação possa acarretar danos ao paciente”.
A confidencialidade não é um princípio com base no “escondido”, mas ■■ A CONSULTA
sim o reforço do reconhecimento do indivíduo como sujeito, protagonista
O ambiente físico onde ocorrerá a consulta e a sala de espera devem ser
de suas ações apoiadas em escolhas responsáveis. A família é grande alia-
preparados especificamente para o adolescente, não podendo ser de-
da para a sustentação dessa abordagem, entendendo-a como oportunida-
corados com motivos infantis e devendo ser exclusivos para a utilização
de de aprendizado e exercício de cidadania.
por essa população nos horários de atendimento. Idealmente, deve haver
A privacidade é direito do adolescente, independentemente da idade,
um espaço informativo, com quadros de avisos com matérias atrativas e
de ser atendido sozinho, em espaço privado de consulta, em que são re-
atuais para adolescentes sobre drogas, sexo, educação, família, esporte
conhecidas suas autonomia e individualidade. Essa privacidade é mantida
etc. Caso um ambulatório de pediatria funcione no mesmo espaço físico
durante todo o exame físico, a menos que o adolescente não a deseje
do ambulatório de adolescentes, sugere-se que horários distintos sejam
ou em situações específicas (déficit intelectual importante, incapacidade
agendados para esses dois grupos.
para assumir o tratamento, indicação cirúrgica, transtornos psiquiátricos,
Embora o adolescente tenha o direito de se apresentar à consulta sem
referência explícita ou suspeita de abuso sexual e violência). Não está
a presença de um adulto, na grande maioria das vezes ele se abstém deste
obrigatoriamente ligada à confidencialidade, trata-se de “contrato” feito
direito e, ao contrário, deseja ser acompanhado por um familiar, no geral
entre adolescente-família-médico e não objetiva diluir a responsabilidade
a mãe ou o pai. A primeira consulta do adolescente deve ocorrer em três
da família, com a qual o diálogo constante deve ser sempre estimulado.
tempos:
Tempo 1: é desejável que o adolescente entre na consulta com
ATENÇÃO! o acompanhante, pois raramente o jovem sabe informar sobre os
dados referentes à saúde de sua família, ao seu nascimento e aos
Optar pela privacidade não é sonegar aos pais o direito de participar primeiros anos de sua vida. Nessa oportunidade, os familiares são
das vivências do adolescente. orientados sobre a dinâmica da consulta, sigilo, confidencialidade
e os temas que serão abordados. A entrevista com a família tam-
Os Departamentos de Bioética e Adolescência da Sociedade de Pe- bém é fundamental para o entendimento da dinâmica e estrutura
diatria de São Paulo e da Sociedade Brasileira de Pediatria adotaram as familiar.
seguintes recomendações sobre algumas questões éticas relacionadas ao Tempo 2: o adolescente é atendido sozinho, se assim desejar, para
atendimento médico do adolescente: que tenha liberdade de exteriorizar seus sentimentos e suas quei-
1 | O médico deve reconhecer o adolescente como indivíduo progressiva- xas. Nesse momento, ele tem a liberdade de expor sua percepção
mente capaz e atendê-lo de forma diferenciada. sobre o que está acontecendo e de abordar alguns assuntos sigi-
2 | O médico deve respeitar a individualidade de cada adolescente, man- losos que o estejam preocupando. Esse momento é fundamental,
tendo uma postura de acolhimento, centrada em valores de saúde e bem- pois faz o adolescente, de forma progressiva, se tornar responsável
-estar do jovem. pela sua saúde e pela condução de sua vida.
452 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Tempo 3: o acompanhante novamente entra no ambiente da con- Terminado o exame, o jovem deve ser esclarecido de sua situação
sulta para ser informado sobre as conclusões, hipóteses diagnós- geral, das hipóteses diagnósticas levantadas, da necessidade ou não de
ticas, exames laboratoriais necessários e medidas a serem insti- exames complementares ou de encaminhamento a outros profissionais.
tuídas. O adolescente será informado do que será transmitido ao Por fim, o adolescente e o familiar que o acompanha devem ser informa-
acompanhante, respeitando o seu consentimento. dos por escrito e esclarecidos sobre a terapêutica curativa e preventiva
O roteiro de anamnese, em linhas gerais, deve obedecer ao que é pra- cabíveis. Se for pertinente, o adolescente deve ser novamente informado
ticado em clínica médica ou pediatria, destacando-se as questões referen- sobre o sigilo de alguns dados, cabendo a ele a autorização para que algu-
tes ao crescimento e desenvolvimento orgânico, psicoemocional e sexual mas informações sejam transmitidas aos que o acompanham ou aos que
nos diversos períodos da adolescência e as patologias mais frequentes nos sejam responsáveis por ele.
diversos períodos de seu crescimento. É importante começar a consulta A necessidade de retorno, em prazo curto ou longo, para acompanhar
valorizando suas queixas iniciais, bem como abordar os marcos do desen- a evolução de uma patologia e/ou normalidade, deve ser informada. Na
volvimento familiar, como estatura do pai, mãe e irmãos, desenvolvimento ausência de situações que justifiquem o breve retorno, deve comparecer
pubertário materno e paterno e idade da menarca materna. Quanto ao de- após um ano. Os retornos devem ser agendados, mas o jovem será infor-
senvolvimento puberal pessoal, ficar atento à telarca, pubarca, menarca, mado da possibilidade de antecipação da consulta em caso de necessida-
ao ciclo menstrual (intervalo, duração e quantidade, presença ou não de de significativa.
dismenorreia), à espermarca, ao surgimento de pelos e crescimento geni-
Muitos médicos consideram o adolescente como um paciente difícil
tal. É necessário saber sobre seu passado; a maneira como o adolescen-
de ser atendido, uma vez que ao mesmo tempo que questiona recorre
te vive; o relacionamento com integrantes da família, colegas e amigos;
ao acompanhante, fantasia, apresenta alterações de humor e mudanças
escolaridade; trabalho; alimentação; sono; atividade física (esportes) e
comportamentais próprios desta fase da vida. O adolescente precisa,
recreativa; vivência com jovens do sexo oposto (amizade, namoro, “ficar”,
muitas vezes, do intercâmbio com a mãe e, ao mesmo tempo, dela se
relacionamento sexual) ou do mesmo sexo; e uso de álcool e/ou drogas,
afastar em momentos estratégicos, para a consulta e criação de víncu-
bem como convivência com usuários. Na entrevista, deve-se incluir per-
los. Portanto, o profissional que atende o adolescente precisa dispor de
guntas sobre vacinação (exigir documento que comprove a situação vaci-
tempo, saber ouvir sem julgar, sentir-se cômodo com seus pacientes e
nal), comportamentos de risco, autoestima, objetivos e perspectivas para
familiares. O médico não deve impor suas normas morais ou de conduta
o futuro, projeto de vida.
nem julgar, tentando sempre entender e acolher o jeito de ser do ado-
lescente, não necessitando copiar suas maneiras, mas respeitando sua
ATENÇÃO! individualidade. Na consulta do adolescente, devem-se detectar as situa-
ções de riscos, orientar em relação à prevenção, harmonizar as relações
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),* artigos 60 a 69, proíbe interpessoais e familiares, estimular o adolescente a assumir responsabi-
o trabalho a menores de 14 anos, salvo na condição de aprendiz. lidades consigo e com a sociedade, enfim, ajudá-lo a crescer e se tornar
um adulto estruturado.
Para a realização do exame físico, é necessário respeitar o grau de O atendimento integral do adolescente requer uma equipe multidis-
recato ou pudor manifestado pelo adolescente, convencendo-o da neces- ciplinar capaz de avaliar todos os aspectos que possam surgir durante a
sidade do exame completo, inclusive dos genitais, para avaliar seu estado consulta, porque é dessa forma, total e indivisível, que o jovem precisa
de saúde, sua maturidade e seu desenvolvimento sexual e. Deve-se aferir/ ser atendido.
avaliar:
pressão arterial (ao menos uma vez por ano);
peso e estatura para cálculo do índice de massa corporal (IMC) – e REVISÃO
circunferência da cintura;
A adolescência é período de grande vulnerabilidade, razão pela
estado de conservação dos dentes e problemas ortodônticos;
qual o adolescente deve receber atenção integral à saúde por pro-
pele – presença de acne, nevos, cicatrizes;
fissionais capacitados.
tiroide – tamanho, consistência, presença de nodulações;
Os princípios éticos que permeiam a consulta do adolescente se re-
coluna vertebral – por meio do “teste de um minuto”, que apresen-
ferem à confidencialidade, ao sigilo, à privacidade e à autonomia.
ta especificidade muito boa para escoliose;
É desejável que a consulta do adolescente seja realizada em três
desenvolvimento pubertário na menina e no menino, utilizando os
tempos: adolescente-médico-família; adolescente-médico; adoles-
os critérios propostos por Tanner para classificação dos estágios
cente-médico-família.
puberais. Verificam-se as mamas e os pelos pubianos nas meninas;
Na anamnese, além dos aspectos gerais, típicos da consulta pediá-
e os genitais e os pelos pubianos nos meninos, classificando-os de
trica, incluir: marcos do desenvolvimento familiar e dados antropo-
1 a 5, sendo 1 a ausência de maturação sexual (genitais ou mamas
métricos da família, idade da menarca materna, desenvolvimento
infantis) ou pelos, e 5, maturação completa ou pilificação típica
puberal pessoal, ciclo menstrual; relacionamento familiar, com cole-
de adultos.
gas e amigos, escolaridade, trabalho, alimentação, sono, atividade
Para o profissional em formação, ou para aqueles que não se sentem
física (esportes) e recreativa, vivência com o sexo oposto (amizade,
à vontade para realizar o exame físico, pode-se recorrer à presença de ou-
namoro, “ficar”, relacionamento sexual) ou do mesmo sexo; uso de
tro profissional da equipe como observador nesse momento da consulta.
álcool e/ou drogas, comportamentos de risco, autoestima, objetivos
A explicação prévia para o adolescente de como será realizado o exame
e perspectivas para o futuro.
físico é importante para tranquilizar o paciente.
No exame físico, verificar dados antropométricos, pressão arterial,
pele, problemas odontológicos, tiroide, coluna vertebral e matura-
ção sexual.
*Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/18069.htm.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 453
77 TRATAMENTO
O peso ao nascimento, a associação com outras malformações congênitas
AFECÇÕES CIRÚRGICAS e a presença de quadro pulmonar, decorrente da aspiração de conteúdo
gástrico, pioram sensivelmente o prognóstico.
Os cuidados pré-operatórios obrigatórios são:
aspiração do coto esofágico proximal com sonda nasoesofágicaca-
77.1 NO RECÉM-NASCIDO librosa, para evitar pneumonia aspirativa;
manutenção da temperatura da incubadora a 32oC, para evitar a
■■ JOSÉ LUIZ MARTINS hipotermia;
oxigenoterapia;
■■ FÁBIO LUÍS PETERLINI
postura em decúbito lateral direito elevado, para facilitar a elimi-
nação de secreção pulmonar, diminuir o refluxo gastresôfago-pul-
monar, através da fístula, e favorecer melhor ventilação alveolar,
O conhecimento das afecções cirúrgicas no recém-nascido (RN) é de ex- permitindo melhor excursão do diafragma. Nos casos de AE sem
trema importância para o médico, qualquer seja a especialidade por ele fístula, a criança deve ser mantida e transportada em posição de
abraçada, tanto para conhecimento da fisiopatologia quanto para com- Trendelemburg;
preensão das manifestações pós-operatórias na vida adulta. As mais im- acesso venoso com hidratação e oferta calórica adequada;
portantes serão vistas neste capítulo. antibioticoterapia introduzida precocemente (penicilina e amica-
cina);
vitamina K (1 mg IM).
■■ ATRESIA DO ESÔFAGO
A atresia do esôfago (AE) é uma malformação congênita caracterizada
pela interrupção do lúmen esofágico, com distância variada entre os seg- ATENÇÃO!
mentos proximal e distal. Sua incidência varia de 1:4.000 para 1:10.000 A AE não é uma cirurgia de emergência; por isso, a instituição desses
nascidos-vivos, sendo mais comum no sexo masculino e em prematuros cuidados pré-operatórios é de extrema importância na sobrevida.
(35% dos casos).
454 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
que as estenoses, 5% dos casos, correspondem à interrupção apenas par- são deiscências de anastomose e fístulas entéricas. Por sua vez, as causas
cial do lúmen intestinal. As atresias intestinais ocorrem praticamente com de óbito mais comuns são as peritonites, as pneumonias e a sepse.
a mesma frequência no jejuno e no íleo, aí sendo, entretanto, duas vezes
mais frequentes do que no duodeno e muito raras no colo. Sua incidência
■■ DUPLICIDADE INTESTINAL
é de 1:330 a 1:500 RN vivos, igual em ambos os sexos. São únicas em
90% dos casos e múltiplas em 10% deles, e têm associação frequente com As duplicidades do tubo digestório são afecções congênitas incomuns,
gastrosquise e vícios de rotação intestinal. que podem aparecer em qualquer parte do trato gastrintestinal (TGI).
As atresias intestinais são classificadas em cinco tipos: Possuem túnica mucosa, muscular e serosa, assumindo forma esférica ou
Tipo 1: membrana mucosa obstrutora. tubular. Sua localização mais frequente é o íleo terminal.
Tipo 2: os cotos atrésicos são separados por um cordão fibroso.
Tipo 3A: os cotos atrésicos são separados por um intervalo em QUADRO CLÍNICO
forma de V no mesentério. Geralmente, apresentam mucosa gástrica no seu interior, e a secreção
Tipo 3B: atresia tipo applepeel (casca de maçã) ou christmastree ácida produzida pela mucosa ectópica provoca ulceração no intestino ad-
(árvore de Natal), com a presença da atresia associada ao fato de o jacente, determinando quadro de hemorragia digestiva. Nos casos em que
intestino delgado estar sem fixação, enrodilhado ao redor da arté- não há comunicação da duplicidade com o lúmen intestinal, sua dilatação
ria mesentérica superior. progressiva pode determinar obstrução da alça intestinal adjacente. Geral-
Tipo 4: presença de atresias múltiplas em forma de salsicha. mente, não há manifestação clínica específica.
O divertículo de Meckel pode ser sintomático ou assintomático (a longada. As complicações pulmonares, como as infecções pulmonares de
grande maioria), e seus sintomas mais comuns são a hemorragia, a obs- repetição e a doença pulmonar progressiva, são comumente observadas.
trução intestinal e a inflamação. Quando assintomático, é, em geral, des- O íleo meconial apresenta alta mortalidade e prognóstico incerto, mesmo
coberto acidentalmente durante um procedimento cirúrgico; quando sin- nos dias atuais.
tomático, embora possa ser suspeitado, seu diagnóstico às vezes é difícil.
Raramente se manifesta no período neonatal.
■■ ENTEROCOLITE NECROSANTE
DIAGNÓSTICO A enterocolite necrosante (ECN) corresponde a um espectro de graus va-
Pode ser realizado mapeamento do divertículo de Meckel com 99mTC. riáveis da necrose isquêmica dos intestinos delgado e grosso na criança.
Até a década de 1960, poucos casos eram relatados na literatura. Com os
TRATAMENTO progressos das unidades de cuidados intensivos neonatais e a consequen-
te melhoria acentuada na sobrevida de RN e prematuros, ela é, hoje, a
Feito pela ressecção cirúrgica do divertículo, seguida de enteroanas- emergência cirúrgica mais comum do RN.
tomose.
Afeta principalmente os prematuros (90% dos casos), embora possa
ocorrer nos RN a termo, comumente no 10o dia de vida, mas também se
■■ ÍLEO MECONIAL iniciando no 1o dia de vida, em crianças com várias semanas ou mesmo
Corresponde à obstrução intraluminar intestinal por mecônio, associada à meses após o nascimento. A ECN apresenta-se em surtos epidêmicos, res-
fibrose cística do pâncreas, que ocorre em cerca de 1:1.500 a 1:2.500 RN tritos e isolados.
vivos, sendo mais comum em brancos e muito rara em pretos e asiáticos; As complicações são mais comuns, e a taxa de mortalidade é mais
ocorre igualmente nos dois sexos. Por sua vez, somente 15% dos pacientes alta em pacientes nos quais o início da doença é mais precoce. Quanto
com fibrose cística desenvolvem o íleo meconial. maior o desenvolvimento intra e extrauterino, menor a suscetibilidade
Entre todas as causas de obstrução intestinal de delgado no RN, a frequên- à ECN.
cia de íleo meconial varia entre 9 e 33%; é raro em prematuros. Em 33% A etiopatogenia da ECN ainda não está totalmente esclarecida, porém
dos casos, existe história familiar de fibrose cística. dois fatores se apresentam na grande maioria dos casos: a prematuridade
e a alimentação enteral. A prematuridade parece ser o fator-chave com-
QUADRO CLÍNICO prometedor da barreira defensiva nos pacientes com ECN. Ainda que a
alimentação seja considerada fator para ECN, há casos de manifestação
O início dos sintomas ocorre de 24 a 48 horas após o nascimento, sendo
de ECN em crianças que não foram alimentadas. A ECN é desencadeada
semelhantes aos de uma obstrução no nível do íleo (distensão abdominal,
com lesão da mucosa intestinal após estados indutores de hipóxia, baixo
vômitos biliosos, ausência de eliminação de gases e fezes). O íleo pode ser
fluxo e invasão bacteriana secundária. Esses estados são complicações no
palpável; e o ânus e o reto podem ser estreitos, observando-se pequena
parto ou pré-natal, rotura prematura de membranas, infecção materna,
quantidade de mecônio cinza na região anal. Quando complicado, o início
problemas na ressuscitação ao nascer, cateterização umbilical, hipoten-
é agudo, ocorrendo piora acentuada do estado geral devido à perfuração
são, Apgar baixo, exsanguineotransfusão (EST), entre outros; várias delas
intestinal e pneumoperitônio. É possível palpar, também, um pseudocisto
podem coexistir.
no abdome.
Esses estados podem lesar a barreira mucosa intestinal protetora,
DIAGNÓSTICO permitindo a invasão bacteriana a partir do lúmen intestinal, desencade-
ando uma reação inflamatória em cascata e necrose intestinal.
O enema opaco revela um microcolo de desuso preenchido por imagens de
concreções de mecônio. QUADRO CLÍNICO
TRATAMENTO Distensão abdominal, vômitos, apatia, letargia, parada de eliminação de
gases e fezes e sangramento anal são as apresentações de EN.
Nos casos em que não há complicação, o tratamento é eminentemente
clínico, por meio de enemas com SF, solução de pancreatina, polissorbato
DIAGNÓSTICO
80 (Tween 80), N-acetilcisteína (NAC) (Mucomist ou Fluidmucil) e gastro-
grafina hiperosmolar (método de escolha), associados à hidratação e à Radiografia simples de abdome pode mostrar distensão de alças, níveis
antibioticoterapia EV. líquidos, “pneumatose intestinal” e pneumoperitônio.
Nos casos de falhas de tratamento clínico ou nos íleos meconiais com-
plicados, visando à evacuação completa do mecônio espessado, é indica- TRATAMENTO
do o tratamento cirúrgico. Realizam-se incisão transversa supraumbilical, Eminentemente clínico, de suporte, com antibioticoterapia, nutrição pa-
enterotomia e lavagem do íleo terminal com NAC. Os segmentos intesti- renteral prolongada e cuidados de terapia intensiva pediátrica. O trata-
nais em sofrimento devem ser ressecados, podendo-se usar anastomose mento cirúrgico é restrito às complicações, como perfurações ou estenoses
íleo-ileal término-terminal tipo Swenson; enterostomia distal em “chami- pós-ECN.
né” tipo Bishop-Koop; enterostomia proximal em “chaminé” tipo Santulli;
ou enterostomia tipo Mikulicz.
A conduta cirúrgica é individualizada. No pós-operatório, é possível ■■ ONFALOCELE
associar irrigação da sonda nasogástrica com NAC, enzimas pancreáticas, Resultado da formação incompleta da parede abdominal anterior, du-
corrigir os desvios metabólicos e utilizar antibioticoterapia. rante o desenvolvimento fetal, ocorre em 1:3.000 a 10.000 nascimen-
a
As complicações gastrintestinais, mais frequentemente observadas, tos. Na 3 semana de vida intrauterina, surgem quatro pregas somáticas
são a obstrução persistente, a ocorrência de aderências e bridas, a sín- que definem as paredes torácica e abdominal. Essas pregas migram e
drome de malabsorção, a intolerância aos dissacarídeos e a icterícia pro- fundem-se no anel umbilical por volta da 18a semana de gestação. A
458 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
alteração desse processo resulta em um defeito da parede anterior, que com suporte de terapia intensiva e equipe cirúrgica para correção imediata
caracteriza a onfalocele. após o nascimento, minimizando contaminação das alças, perdas hídricas
e de calor.
QUADRO CLÍNICO
Na onfalocele, as alças estão protegidas do líquido amniótico pelo peri- TRATAMENTO
tônio e pela membrana amniótica, o cordão umbilical insere-se no saco Os cuidados após o nascimento são semelhantes aos prestados aos RN
amniótico e a musculatura abdominal é normal. O grau de desenvolvimen- portadores de onfalocele, no que diz respeito à reposição hidreletrolítica,
to da cavidade abdominal depende do tamanho da onfalocele, e defeitos à descompressão das alças por meio de sondas e à diminuição das perdas
grandes, contendo muitas vísceras, são acompanhados de um hipodesen- hídricas e de calor por meio da cobertura do conteúdo herniado com filme
volvimento da cavidade, o que pode dificultar a correção cirúrgica. plástico.
Após os cuidados iniciais, procede-se ao fechamento da lesão. A
DIAGNÓSTICO alta pressão intra-abdominal é causa rotineira de falha na filtração re-
O diagnóstico da anomalia é precoce, por meio da US no período gesta- nal, perda intestinal e mortalidade, por isso o fechamento primário só
cional, que evidencia a falha na parede abdominal. Diante do diagnóstico será possível quando a pressão intracavitária for inferior a 20 mmHg,
de onfalocele, realiza-se pesquisa de outras alterações estruturais, análise o que pode ser medido por uma sonda vesical conectada ao esfigmo-
cromossômica e ecocardiografia fetal. Cerca de 80% dos casos detecta- manômetro. Na impossibilidade da realização do fechamento primário,
dos no período pré-natal têm anomalias associadas, que incluem defeitos procede-se ao fechamento estagiado, semelhante ao realizado nas
cromossômicos (48%), cardíacos (28%), geniturinários (20%), craniofaciais onfaloceles gigantes. Em geral, é necessária assistência ventilatória no
(20%) e anomalias diafragmáticas (12%), todos apresentando vícios de pós-operatório, mantendo-se sedação e curarização até ser possível o
rotação intestinal. Não há contraindicação formal para o parto vaginal desmame do ventilador.
nesses casos, desde que preferencialmente em hospital com equipe multi- RN com gastrosquise corrigida apresentam, com frequência, disfun-
disciplinar treinada para o atendimento. ção intestinal prolongada (mesmo na ausência de atresias), sendo neces-
sário uso de nutrição parenteral prolongada, por acesso venoso central,
TRATAMENTO até que o trânsito se restabeleça adequadamente.
ganglionar e aganglionar estão localizados no nível da região retossigmoi- se, com hiperplasia e hipertrofia das fibras nervosas não mieliniza-
de (variedade clássica, 77% dos casos), acima dela nos colos descenden- das do colo, nos casos de MC.
te, transverso ou ascendente (variedade longa), no nível do íleo terminal Diagnósticos imuno-histoquímicos: podem ser realizados, como
(variedade total, 10% dos casos), no nível retal (variedade curta) e dos a enolase neurônio-específica, com a qual as células ganglionares
últimos centímetros do reto (variedade ultracurta). se coram especialmente em sua membrana nuclear, mesmo quando
imaturas. Os axônios coram-se tanto no colo aganglionar como no
ganglionar. Outros métodos descritos são a utilização de anticorpos
ATENÇÃO!
monoclonais, policlonais e de antineurofilamentos, que coram os
É importante lembrar que a aganglionose pode estender-se para den- axônios hiperplasiados e hipertrofiados no colo aganglionar.
tro do cone de transição macroscopicamente visível. A manometria anorretal é um método de diagnóstico diferencial da
DH de outros tipos de constipação intestinal, especialmente daquela com
componente psicogênico importante na criança. O reflexo retoesfincteriano
QUADRO CLÍNICO (RRE) constitui a viga-mestra do exame manométrico, sendo representado
Retenção de fezes por longos períodos, dias e semanas. O 1º sinal clínico é pela queda de pressão no nível do esfíncter interno do ânus, quando ocorre
a não eliminação de mecônio nas primeiras 24 horas de vida. Sabe-se que distensão da ampola retal no indivíduo normal. O RRE está ausente no MC.
93% dos RNs normais eliminam mecônio nas primeiras 24 horas, e que
93% dos portadores de DH não o fazem nesse período. Esses pacientes TRATAMENTO
passam a ter vômitos biliosos e distensão abdominal, muitas vezes com A complicação mais importante do MC é uma enterocolite grave, deno-
movimentos peristálticos visíveis. minada megacolo tóxico, que ocorre em 15 a 44% dos casos e é carac-
Ao toque retal, apresentam deflação explosiva de gases e fezes líqui- terizada por distensão abdominal importante de evolução muito rápida,
das. Há um quadro paradoxal, com sintomatologia de suboclusão intesti- acompanhada de vômitos esverdeados e fezes líquidas extremamente
nal associada à presença de fezes diarreicas e gases ao toque retal. fétidas, muitas vezes com sangue. Ocorre uma desidratação rápida, di-
A ocorrência de perfuração cecal, com pneumoperitônio, pode ser a fícil de controlar, mesmo com a administração adequada de líquidos via
1ª manifestação observada na DH. A ocorrência de apendicite aguda no EV, especialmente nos RN e em sepse grave. Não existe correlação clíni-
RN está frequentemente associada com MC. ca entre a extensão do segmento aganglionar e a incidência de megaco-
Nos segmentos curtos e ultracurtos de MC, as manifestações clíni- lo tóxico, podendo esse quadro ocorrer antes ou depois da cirurgia defi-
cas se iniciam mais tardiamente, geralmente entre 2 e 3 anos. O paciente nitiva para tratamento do MC. Na radiografia simples, pode-se observar
apresenta constipação intestinal de dias ou semanas, acompanhada de pneumatose intestinal e pneumoperitônio por perfurações intestinais,
grandes distensões abdominais. Nesses casos, ao toque retal, observam- e o enema baritado pode mostrar o aspecto de pseudopólipos na mu-
-se fecalomas, muitas vezes de grandes dimensões, contrariamente ao que cosa ou de múltiplas ulcerações, correspondentes à necrose isquêmica
se nota no período neonatal. Embora o soiling, ou o manchar das roupas da mucosa, que poderá evoluir para abscessos pericólicos, perfurações,
íntimas, seja mais frequente na constipação com componente psicogênico, septicemia e óbito.
em alguns casos, é possível observá-lo em portadores de MC de segmen- O tratamento é feito por meio do jejum oral, sonda nasogástrica des-
tos aganglionares curtos e ultracurtos. compressiva, sonda retal descompressiva ou toques retais de repetição,
hidratação EV e antibioticoterapia (amicacina + metronidazol).
DIAGNÓSTICO
Diagnóstico radiológico: por enema baritado, sem preparo intes-
ATENÇÃO!
tinal prévio para identificação do cone de transição. Uma radio-
grafia em perfil avalia a distância existente entre o reto e o sacro A nutrição parenteral prolongada melhora muito o prognóstico para
(avaliação de hipertrofia muscular da parede do reto). O cone de esses pacientes, mas a colostomia descompressiva em duas bocas,
transição só é visível após o 18o dia de vida. Os casos de aganglio- acima das zonas aganglionar e hipoganglionar, é o procedimento mais
nose total do colo apresentam-se com obstruções do intestino del- importante.
gado, com o colo mais fino no enema, perda de haustrações e com
a clássica forma de ponto de interrogação. A radiografia realizada
24 horas após o enema avalia os graus de retenção baritada e o da Nos casos de aganglionose total do colo, usa-se a ileostomia em duas
constipação apresentados pelo paciente. bocas para descompressão.
Diagnóstico anatomopatológico: por demonstração da agan- O tratamento definitivo do MC dependerá fundamentalmente da ex-
glionose e aumento de fibras não mielinizadas na parte distal tensão do segmento aganglionar. Nos casos de DH de segmentos ultra-
estreitada do colo aganglionar. A técnica clássica retira biópsia curtos e curtos de aganglionose, indica-se a anorretomiectomia, que cor-
muscular intestinal para avaliação histológica dos plexos mioenté- responde à retirada de fita da musculatura do esfíncter interno do ânus.
ricos, sob anestesia geral. Em casos com indicação de colostomia, Em MC de segmentos aganglionares longos, o tratamento é realizado
biópsias seriadas do colo podem ser realizadas por laparotomia com a ressecção do segmento aganglionar e a cirurgia de abaixamento
transversa direita, demarcando-se com fios de colorações variadas do colo ganglionar, com anastomose colo-anal o mais baixa possível. Nos
as diferentes biópsias colônicas, no intuito de permitir e facilitar a casos de abaixamento eletivo, utiliza-se a retossigmoidectomiatransana-
identificação correta da zona aganglionar, na cirurgia de abaixa- lendorretal sem colostomia.
mento posterior. Esse procedimento também pode ser realizado Nos casos de aganglionose total do colo, realizam-se ileostomiades-
por cirurgia videolaparoscópica. compressiva ao nascimento e, por volta de 1 ano de vida, ressecção total
Diagnóstico histoquímico: por teste da acetilcolinesterase, de- do colo, mantendo a borda mesentérica do sigmoide, que é anastomosada
monstra um aumento acentuado da atividade da acetilcolinestera- ao íleo, de forma laterolateral.
460 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
tograma, urografia excretora, RM e outros exames necessários, na depen- Holcomb GW 3rd, Murhy JP, editors. Ashcraft’s pediatric surgery. 5th ed.
dência de cada caso. É também indicada a anorretovaginouretroplastia Philadelphia: Saunders Elsevier; 2010.
sagital posterior (ARVUPSP), ou abaixamento do seio urogenital, que deve Lakhoo, K. Overview on necrotising enterocolitis. Early Hum Dev. 2016;97:15.
ser realizada, de preferência, após o 6o mês de vida em razão das melhores Martins EC, Peterlini FL, Fagundes DJ, Martins JL. Clinical, manometric
and profilometric evaluation after surgery for Hirschsprung’s disease:
condições anatômicas.
comparison between the modified Duhamel and the transanal
As fístulas retovaginais, mais raras, são tratadas pela colostomia no rectosigmoidectomy techniques. Acta Cir Bras. 2009;24(5):416-22.
colo descendente, seguida de anorretoplastia sagital posterior, dilatações Puri P, Hollwarth M, editors. Pediatric surgery: diagnosis and treatment. Berlin:
anais e fechamento da colostomia, alguns meses depois. Springer; 2009.
Na anorretoplastia sagital posterior, sob anestesia geral e intuba- Vital Júnior PF, Martins JL, Peterlini FL. Posterior sagittal anorectoplasty in
ção orotraqueal, posiciona-se o paciene em decúbito ventral e utiliza-se anorectal anomalies: clinical, manometric and profilometric evaluation. Sao
estimulador elétrico na pele da região para identificar o centro de maior Paulo Med J. 2007;125(3):1.
atuação do complexo muscular esfincteriano anorretal, demarcando-se o Wetherill C, Sutcliffe J. Hirschsprung disease and anorectal malformations. Early
Hum Dev. 2014;90(12):927-32.
local para posterior identificação e fixação do coto retal.
Os resultados dependem da modalidade de AAR, da presença de
anomalias sacrais associadas, da técnica empregada pelo cirurgião e do
esmero com que o procedimento foi realizado. Anomalias vertebrais, espe-
cialmente sacrais, comprometem o prognóstico, aumentando o índice de
incontinência pós-operatória. As AARs baixas têm um prognóstico muito 77.2 NA CRIANÇA
melhor do que as AARs altas e do que as cloacas.
■■ ELAINE CRISTINA SOARES MARTINS-MOURA
As complicações da anorretoplastia sagital posterior podem ser clas-
sificadas em precoces e tardias: ■■ EDSON KHODOR CURY
Precoces: infecção local, deiscência de suturas, aparecimento de
bexiga neurogênica, lesão de uretra e de ductos deferentes e ne-
crose da vagina mobilizada. Crianças são seres em formação. Corpo e mente evoluem em fases. Muitas
Tardias: estenose das anastomoses do neoânus ou da vagina, es- são as doenças e as possibilidades cirúrgicas em cada etapa do desen-
treitamento do introito vaginal, presença de fístulas uretrovaginais volvimento. Algumas são mais prevalentes, independentemente da idade.
ou retrouretrais, prolapso de intestino e desgarramento do reto.
As anomalias anorretais baixas, em ambos os sexos, e aquelas com ■■ PERSISTÊNCIAS DO CONDUTO
fístulas retovestibulares no sexo feminino apresentam índice maior de con-
PERITONEOVAGINAL
tinência fecal no pós-operatório, mas podem ter graus variados de consti-
pação intestinal em sua evolução. Doenças cirúrgicas frequentes que acometem em maior proporção o sexo
As anomalias anorretais altas, em ambos os sexos, e as cloacas no masculino (4:1). O conduto peritoneovaginal é uma evaginação em “dedo
sexo feminino, especialmente quando associadas com malformações sa- de luva” que acompanha a descida da gônada, adentrando o canal ingui-
crais, apresentam como principal complicação a incontinência fecal parcial nal e permitindo que o testículo chegue até o escroto. Nesse trajeto, envol-
ou total. ve o testículo e reveste os dois terços medial e anterior do canal inguinal.
Após a descida completa da gônada, o conduto oblitera. Sua persistência,
A anorretoplastia sagital posterior também pode ser usada para
em graus variáveis, resulta em várias anomalias congênitas, incluindo a
reoperação de correções de anomalias anorretais com outras técnicas
hérnia inguinal, a hérnia inguinoescrotal, a hidrocele comunicante, o cisto
e com maus resultados, sempre precedida de colostomia protetora em
de cordão e a hidrocele não comunicante.
duas bocas.
Na menina, existe a formação de um conduto semelhante, denomina-
do canal de Nuck, adjacente ao ligamento redondo. A falha na obliteração
REVISÃO desse canal dá origem à hérnia inguinal na menina.
TRATAMENTO
Hérnias inguinais, hérnias inguinoescrotais, cistos de cordão e hidroce-
les comunicantes devem ser tratados cirurgicamente assim que o diag-
nóstico for confirmado, se possível, eletivamente. Nas meninas até os 4
anos e nos meninos menores de 2 anos de idade, a intervenção deverá
ser bilateral.
FIGURA 77.1 ■ Hérnia inguinoscrotal. A diferença entre uma hidrocele comunicante e uma hérnia inguinal
está no diâmetro do processo vaginal e no conteúdo exteriorizado. Logo,
Hidrocele hidrocele comunicante também tem indicação cirúrgica ao diagnóstico.
Hidroceles não comunicantes devem ser observadas clinicamente até
Presença de coleção líquida entre as membranas da túnica vaginal, ca-
os 6 meses de idade. Após esse período, caso não haja reabsorção do
racterizando-se por aumento do volume escrotal, de consistência cística,
líquido, estará indicada a cirurgia.
presente ao nascimento em alguns recém-nascidos (RNs). Frequentemente
A via de acesso cirúrgica é comum a todas as variantes. Por meio de
ocorre reabsorção espontânea nos primeiros meses de vida.
uma inguinotomia transversa, é possível isolar o conduto peritoneovaginal
Alguns casos são associados à persistência completa do conduto
patente dos elementos do cordão. Após descartar a presença de isquemia
peritoneovaginal, nos quais há passagem de líquido peritoneal para a
e necrose do conteúdo herniado, promove-se a redução da hérnia para a
túnica vaginal, e vice-versa. Há variações do volume ao longo do dia,
cavidade. Nas hérnias exclusivamente indiretas, o tratamento consiste na
principalmente às manobras de esforço, quadro denominado hidrocele
ligadura do conduto peritoneovaginal.
comunicante.
Diante de hérnias diretas ou mistas, é necessária a realização de re-
Cisto de cordão forço muscular, feito, em crianças, pela técnica de Ferguson.
Lesão cística, geralmente no terço médio do cordão, não acompanhada de
dor ou de variação do volume, mas que pode promover compressão vas- ■■ DISTOPIAS TESTICULARES
cular extrínseca ao plexo pampiniforme. Resulta da reabsorção proximal e Termo utilizado para caracterizar o testículo não localizado adequada-
distal do conduto peritoneovaginal, mantendo uma porção central patente mente na bolsa. Mais frequente em prematuros, com discreta tendência
que contém líquido (Figura 77.2). familiar.
A descida testicular se dá em três fases. A 1ª, intracavitária, independe
DIAGNÓSTICO de androgênios, sendo controlada pelo hormônio antimulleriano. A 2ª, in-
Com base em dados clínicos. O exame físico evidencia abaulamento guinoscrotal, corresponde à migração da gônada para o canal inguinal. Na
inguinal ou inguinoescrotal às manobras de esforço (choro, tosse, eva- 3ª, dependente do gubernáculo, o testículo e o epidídimo permanecem en-
cuações). voltos por peritônio, que alonga na medida em que o gubernáculo alonga.
É possível palpar o cordão após retificação do funículo espermático Falhas nesse processo levam às alterações de posicionamento do testículo.
com uma das mãos, buscando a confirmação da presença do conduto pe-
ritoneovaginal patente, que se caracteriza pelo espessamento anormal do CLASSIFICAÇÃO E QUADRO CLÍNICO
funículo. A presença do folheto peritoneal em “dedo de luva” pode provo- As distopias podem ser classificadas em:
car a sensação de atrito entre os dedos (“sinal da seda”), patognomônica Criptorquidia verdadeira: testículo em seu trajeto habitual, porém
da persistência do conduto levando à hérnia inguinal. fora da bolsa.
A hidrocele pode ser facilmente confirmada por meio de manobra de Ectopia testicular: testículo em posição anômala, fora de seu traje-
transiluminação. to (raiz de coxa, períneo, pube).
A ultrassonografia pode ser empregada, em alguns casos, se existir Testículo retrátil: testículo que, devido a um reflexo cremastérico
dúvida quanto ao diagnóstico diferencial. exacerbado, não permanece o tempo todo na bolsa.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 463
DIAGNÓSTICO
Feito por meio do exame físico, com caracterização do tipo de defeito, de
acordo com a classificação referida. Nos casos não palpáveis, pode ser
necessário o uso de métodos de imagem, como ultrassonografia e res-
sonância.
Diante da bilateralidade ou de suspeita de ambiguidade genital, a FIGURA 77.3 ■ Parafimose.
laparoscopia diagnóstica deve ser indicada, além da coleta de cariótipo.
TRATAMENTO
Orquidopexia nos casos palpáveis, preferencialmente entre 6 meses e 1
ano de idade. Nos casos bilaterais, a laparoscopia é indicada não somente
para diagnóstico, como também para tratamento.
ATENÇÃO!
Vale lembrar que é necessário acompanhamento frequente dos pa-
cientes, já que testículos distópicos estão associados a um risco 40
vezes maior de neoplasia da gônada, das quais a mais frequente é o
seminoma. FIGURA 77.4 ■ Parafimose reduzida.
TRATAMENTO
A reposição hidreletrolítica parenteral e a descompressão com sonda na-
sogástrica são os pilares do tratamento inicial das síndromes obstrutivas,
77.3 ABDOME AGUDO NO independentemente de sua etiologia ou faixa etária.
LACTENTE E NA CRIANÇA
HÉRNIA INGUINAL ENCARCERADA
■■ ALCIDES AUGUSTO SALZEDAS NETO Etiologia mais frequente de obstrução intestinal no período de lactância,
■■ ANDRÉ IVAN BRADLEY DOS SANTOS pode ocorrer em todas as faixas pediátricas.
■■ ANDRÉ PASIN CORRENTE RANGEL ROMA Quadro clínico
A hérnia inguinal encarcerada leva ao aprisionamento de segmento intes-
tinal (geralmente íleo) no conduto peritoneovaginal pérvio da criança. Em
■■ INTRODUÇÃO meninas, às vezes, há o encarceramento de ovário com risco de isquemia e
Os quadros abdominais têm frequência elevada na prática clínica pediá- necrose, porém sem instalação de quadro obstrutivo abdominal. No sexo
trica de emergência. masculino, o encarceramento de segmento intestinal na hérnia leva à obs-
Sua definição não é absolutamente precisa, mas podem ser entendi- trução intestinal, isquemia e/ou necrose do testículo por compressão do
dos, em linhas gerais, como um conjunto de sinais e sintomas sistêmicos, funículo.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 465
Diagnóstico
ATENÇÃO! O exame físico evidencia desidratação de intensidade variável, distensão
abdominal leve, palpação da fossa ilíaca direita vazia (sinal de Dance) e tu-
A necrose do testículo por compressão do funículo é 4 a 5 vezes mais mor abdominal parcialmente móvel com consistência e forma de chouriço
frequente do que a necrose intestinal. disposto em um segmento da projeção da moldura cólica.
O toque retal pode constatar resíduo de muco e sangue na ampola
retal e, eventualmente, tocar a cabeça de invaginação.
Tratamento
O diagnóstico pode ser confirmado pelo exame ultrassonográfico,
Em uma criança com poucas horas de história da afecção e sem hiperemia sendo os sinais de pseudo-rim e imagem “em alvo” característicos da in-
inguinal, pode-se tentar a redução incruenta para retirá-la do quadro de vaginação.
o
obstrução e programar-se a cirurgia após o 2 dia da redução. Diminuem-
-se, assim, riscos pertinentes à aspiração de conteúdo gástrico na indução Tratamento
anestésica e tem-se uma cirurgia tecnicamente mais fácil em virtude da Após as adequadas medidas de suporte (correção hidreletrolítica, descom-
redução do edema local. Caso não se consiga a redução incruenta, indica- pressão nasogástrica e analgesia), pode-se realizar o tratamento incruento
-se a cirurgia de urgência. Nessa situação, deve-se atentar para o risco de por redução hidrostática, infundindo-se solução fisiológica (SF) ou Ringer
aspiração pulmonar durante a indução anestésica, procedendo-se a uma por meio de uma sonda retal calibrosa acompanhando-se a redução
sequência rápida de intubação (SRI) e manobra de Selick até a intubação por US.
orotraqueal (IOT).
Se houver indícios de isquemia (longo tempo de encarceramento com
hiperemia inguinal), está indicado o tratamento cirúrgico de emergência ATENÇÃO!
sem tentativa prévia de redução incruenta. Na cirurgia, avalia-se a viabi-
Quando não se obtém redução incruenta, está indicado o tratamento
lidade do intestino encarcerado. Se necessário, realizam-se ressecção de
cirúrgico, que deverá ser a 1a opção em crianças maiores e em quadros
segmento intestinal desvitalizado e anastomose, preferencialmente pela
com mais de dois dias de evolução, pelo risco de haver outra etiologia
própria inguinotomia, seguida pela herniorrafia.
para a invaginação (p. ex.: linfoma não Hodgkin) e pelo risco de já
Algumas hérnias podem conter quantidade volumosa de intestino em
existir necrose intestinal.
topografia inguinoscrotal, sendo ou não facilmente redutíveis à cavidade
abdominal, porém sem componente obstrutivo ou isquêmico. Nesse caso,
diz-se que a hérnia é habitada (e não encarcerada) e se pode encaminhar o
paciente para tratamento cirúrgico eletivo. BRIDAS PÓS-OPERATÓRIAS
Bridas são bandas cicatriciais na cavidade peritoneal que capciosamente
INVAGINAÇÃO INTESTINAL podem provocar obstrução por compressão extrínseca de segmento intes-
Também conhecida como intussuscepção intestinal, trata-se da penetra- tinal com formação de hérnia interna.
ção de uma alça intestinal dentro do segmento imediatamente distal por A cirurgia abdominal que mais frequentemente resulta em bridas for-
uma telescopagem. madoras de obstrução é a colectomia por doença inflamatória intestinal.
o o o
A maioria dos casos ocorre durante o 1 ano, entre o 3 e 9 meses de Na prática clínica pediátrica, vê-se com certa frequência a obstrução após
vida. Nessa faixa etária, geralmente é “idiopática”, ou seja, sem um ponto cirurgias antirrefluxo gastresofágico (fundoplicaturas) e, às vezes, depois
desencadeante macroscopicamente definido. Na extremidade do segmen- de apendicectomias.
to invaginante (cabeça de invaginação), observa-se um fator desencade-
Quadro clínico
ante em 10% dos casos, sendo os mais comuns em ordem decrescente:
Nódulo linfoide submucoso hipertrofiado – o mais frequente em A instalação do quadro clínico varia com o nível de instalação da doença,
todas as faixas etárias pediátricas, sendo o mais importante no como descrito.
lactente.
Diagnóstico
Divertículo de Meckel – em geral em crianças a partir dos 2 anos
de vida. O diagnóstico é suposto pela presença de um quadro abdominal obstruti-
Linfoma não Hodgkin – mais comum na criança maior, tem rápido vo e uma história de cirurgia abdominal prévia.
crescimento, levando à obstrução intestinal por efeito de massa,
porém, eventualmente, pode servir como cabeça de invaginação.
Tratamento
Pólipos, nódulos de tecido pancreático ectópico, hemangiomas, Inicialmente clínico, com as medidas de suporte hidreletrolítico e sonda-
lipomas, cistos de duplicação entérica e hematomas submucosos gem nasogástrica. Podem-se administrar medicações anticolinérgicas e
por discrasia sanguínea – todos são entidades possíveis, porém antiespasmódicos. Espera-se que o paciente evolua progressivamente
raras etiologias da invaginação. com resolução do quadro em até 48 horas, com melhora da cólica e
redução do volume e clareamento do material drenado pela sonda na-
Quadro clínico sogástrica.
Um lactente eutrófico tem início súbito de dores abdominais em cólica e A não resolução após esse período ou, antes, com a presença de si-
intensas, entremeadas por períodos de acalmia, em que a criança fica lívi- nais de irritação peritoneal (dor à palpação, rigidez muscular abdominal,
da. Antecedente recente de quadro viral de vias aéreas é comum. Podem dor à descompressão brusca, edema da parede e hiperemia periumbilical),
ocorrer vômitos alimentares, seguidos de eliminação de muco e sangue torna a indicação cirúrgica mandatória.
466 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
OBSTRUÇÃO POR ÁSCARIS Deve-se ter em mente que em algumas situações, como uso prévio
A melhoria nas condições de saneamento tiveram forte impacto na e recente de antibióticos e crianças menores de 2 anos, o quadro clínico
incidência das complicações da ascaridíase nas últimas décadas em pode ser frustrante e se apresentar com sinais de infecção sistêmica quan-
nosso meio. Hoje, a obstrução intestinal por ascaridíase é uma afecção do da complicação.
rara nos centros urbanos dotados de adequada rede de água e esgoto. A leucocitose e o aumento de proteína C-reativa são comumente ob-
Ocorre em crianças com precária condição social e com algum grau de servados, exceto nos quadros muito incipientes.
desnutrição.
ATENÇÃO!
Quadro clínico e diagnóstico
Inicia-se de forma insidiosa, com cólicas abdominais de intensidade pro- A leucocitúria nunca exclui o diagnóstico de apendicite, sendo sua
gressiva, vômitos que evoluem de aspecto alimentar, podendo chegar até ocorrência um motivo comum de retardo da definição do diagnóstico.
a fecaloide e à distensão abdominal. A eliminação pregressa nas fezes e no
quadro instalado nos vômitos de vermes sugere a etiologia. Existem preditores clínicos, como o Escore de Alvorado e o PAS (Pe-
O quadro pode ser iniciado com uma suboclusão, na qual há a ma- diatric Appendicitis Score), para aumentar a chance de diagnóstico de
nutenção da eliminação de flato e fezes, estas muitas vezes diarreicas. A apendicite aguda, porém não são testes específicos. O diagnóstico dife-
radiografia simples de abdome confirma o diagnóstico pela imagem su- rencial se dá com outras patologias abdominais, como constipação, volvo
gestiva do aglomerado de áscaris (imagem com aspecto de miolo de pão) intestinal, púrpura de Henoch-Schönlein (PHS), cólica ureteral, doença de
com dilatação intestinal proximal. Presença de gás distal (moldura cólica Crohn, invaginação, adenite mesentérica e cólica biliar.
e reto) infere no diagnóstico de suboclusão. Uma piora súbita do quadro O diagnóstico radiológico de apendicite pode ser obtido com auxílio
clínico pode ocorrer devido à volvulação do segmento intestinal que con- da ultrassonografia (US) com imagem tubular em fundo cego com mais
tém o novelo de vermes. de 6 mm de diâmetro e mais de 2 mm de espessura da parede ou, ainda,
pela incompressibilidade de seu lúmen. Outros sinais, como apendicolito
Tratamento visível, massa complexa, linfonodomegalia periapendicular, alterações da
O tratamento clínico é resolutivo na maioria dos casos iniciais, quando a gordura em volta do apêndice e ausência de gás em seu interior, também
obstrução completa ainda não está instalada. É feito com a administração podem estar presentes na apendicite aguda. Como método diagnóstico, a
de óleo mineral (20 mL de 4 em 4 horas) e piperazina (75 mg/kg/dia) para US atinge sensibilidade de 98,7% e especificidade de 95,4%.
facilitar a progressão do novelo e inibir a motilidade dos vermes. A tomografia computadorizada (TC) de abdome pode ser realizada
Quando o componente obstrutivo já é maior, denotado pela presen- com contraste venoso e oral ou, ainda, venoso e retal. Seu resultado é
ça de vômitos constantes, deve-se inicialmente descomprimir o estômago positivo quando não ocorrem enchimento do lúmen apendicular com con-
com sonda nasogástrica. O óleo mineral será administrado pela sonda, traste, borramento da gordura na fossa ilíaca direita, espessamento da
que permanecerá fechada por meia hora e, em seguida, aberta por três parede do apêndice superior a 6 mm ou aumento do diâmetro apendicular.
horas e meia. A piperazina será administrada uma vez ao dia. Esse cuidado Não possui limitações em relação ao tamanho do paciente ou à posição do
visa a minimizar o risco de vômito e a aspiração de óleo mineral, que se apêndice na cavidade peritoneal. Apresenta 97% de sensibilidade, 99%
constitui em quadro de extrema gravidade. de especificidade, valor preditivo positivo (VPP) de 98%, valor preditivo
A obstrução intestinal total demanda tratamento cirúrgico de ur- negativo (VPN) de 98% e acurácia de 96%. A não visualização do apêndice
gência, no qual será feita a ordenha do novelo de áscaris para o reto. tem 98,7% de valor preditivo negativo no método. É preciso considerar
Caso haja necessidade de ressecção intestinal por necrose, deve-se que um bom exame clínico precedido de uma anamnese primorosa dis-
proceder à enterostomia. A anastomose deve ser evitada pelo risco pensa a realização de TC na maioria dos casos, evitando, além da radiação
de deiscência provocada pelos vermes residuais na região da sutura ionizante, o contraste endovenoso e a anestesia geral muitas vezes neces-
intestinal. sária para a realização do exame.
A US apresenta uma grande disponibilidade frente à TC, além do bai-
xo custo e da não exposição à radiação. Embora sem resultados uniformes,
■■ ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO vários estudos apontam para um aumento significativo na incidência de
neoplasias em crianças previamente submetidas à TC. Havendo necessi-
APENDICITE dade de exames de imagem e na indisponibilidade da US, a radiografia
Trata-se de uma inflamação do apêndice cecal, órgão localizado na fossa simples de abdome geralmente fornece informações valiosas: presença de
ilíaca direita. É estimada a ocorrência de 86 casos por 100 mil habitantes/ fecalito na fossa ilíaca direita (FID), na qual também podem ser observa-
a
ano, com um pico de incidência na 2 década de vida, na proporção de dos acúmulo de alças com níveis hidroaéreos e borramento do músculo
1,4/1 masculino/feminino. psoas e da gordura pré-peritoneal à direita.
As fases da apendicite são apresentadas no Quadro 77.2.
Quadro clínico e diagnóstico
O quadro clínico de dor abdominal difusa que, após algumas horas, locali- Tratamento
za-se na fossa ilíaca direita, especificamente no ponto de McBurney, suge- Inclui antibioticoterapia e cirurgia. Por mais de 30 anos, os cirurgiões
re o diagnóstico de apendicite. A presença de inapetência, vômitos, febre, pediátricos empregaram o tratamento com esquema tríplice de ampicilina
taquicardia, diarreia e a queda do estado geral também podem estar as- visando aos gram-positivos, um aminoglicosídeo para cobertura de gram-
sociadas. Ao exame físico, pode-se perceber taquicardia, diferentes graus -negativos e um antibiótico para anaeróbios. Estudos epidemiológicos
de desidratação e recurvamento ventral antálgico à marcha. No abdome, mostram que os micro-organismos mais encontrados são E. coli, estrep-
uma tensão muscular involuntária no quadrante inferior direito associada tococos grupo Milleri, anaeróbios e Pseudomonas aeruginosas. Cefoxitina
à dor, à descompressão brusca no ponto de McBurney, é patognomônica e piperacilina/tazobactam mostraram-se tão eficientes quanto o esque-
da apendicite. ma tríplice e diminuíram o tempo de internação e os custos hospitalares.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 467
úlcera péptica apresenta outras condições associadas, como traumas gra- Tratamento
ves ou doenças sistêmicas, que necessitam de tratamento com medicações O tratamento do volvo é cirúrgico, com o chamado procedimento de
anti-inflamatórias. Devem ser considerados diagnósticos na criança em Ladd, que consiste em redução do volvo, lise das bandas mesenteriais,
vigência de abdome agudo hemorragia digestiva e choque. A radiografia acomodação do intestino delgado em região direita do abdome e colo à
simples de abdome demonstra pneumoperitônio e necessidade de cirurgia. esquerda, com apendicectomia tática para todos os casos, uma vez que o
O tratamento inicial deve ser de suporte à vida, com reposição hídrica e apêndice cecal fora de posição pode causar confusão diagnóstica em caso
eletrolítica até que seja possível o tratamento cirúrgico. O pós-operatório de apendicite futura.
deve conter terapia antiácida e erradicação de Helicobacter pylori.
CORPO ESTRANHO
REVISÃO
A ingestão de corpo estranho é um problema comum para o cirurgião pe-
diátrico. De incidência de 1.500 casos por ano nos Estados Unidos, pode Os quadros abdominais têm frequência elevada na prática clínica
acarretar até 1% de morbidade. Mais de 40% das ingestões de corpo es- pediátrica de emergência.
tranho não são diagnosticadas, já que as crianças ficam assintomáticas. A Caracteristicamente, há uma predileção por determinadas entida-
maioria dos corpos estranhos ingeridos sai do tubo digestório dentro de des nosológicas, por suas respectivas faixas etárias pediátricas de
uma semana sem causar complicações; apenas 20% dos casos necessitam incidência.
de endoscopia para remoção, e menos de 1% apresenta-se como perfu- A anamnese e o exame físico apresentam indicativos do tipo
ração, a qual, quando ocorre, surge com mais frequência em regiões de de abdome agudo – obstrutivo, inflamatório, vascular, hemor-
angulações, como válvula ileocecal e retossigmoide. O quadro clínico pode rágico e perfurativo –, podendo também indicar fortemente o
ser de peritonite, espessamento de alças intestinais, bloqueio na cavidade diagnóstico.
ou ar livre na radiografia de abdome ou TC sem contraste. Os exames complementares, laboratoriais ou de imagem devem
ser indicados na definição e na quantificação de complicações
■■ ABDOME AGUDO HEMORRÁGICO associadas (alterações eletrolíticas, acidose, infecção etc.) ou
como auxiliares na confirmação de uma hipótese diagnóstica.
CISTO ROTO DE OVÁRIO Não se deve, entretanto, perder-se de vista seu caráter comple-
mentar.
Distúrbios ovarianos, como ruptura e torção de ovário, devem ser conside-
O tratamento deve ser, via de regra, iniciado por medidas de
radas em meninas com dor abdominal súbita. Dor abdominal intermitente
estabilização e suporte, como correção hidreletrolítica e acido-
e recorrente e acompanhada de vômitos, dor migratória, febre, descom-
básica, descompressão gástrica e antibioticoterapia, quando
pressão brusca dolorosa, leucocitose e elevação da proteína C-reativa
indicadas.
estão presentes nas doenças pélvicas, mas com frequência menor do que
na apendicite aguda. A US é um bom método de imagem para investigar
distúrbios da pelve. A intervenção poderá ser feita por laparoscopia em
uma eventual torção do ovário; a ooforectomia fica reservada apenas para ■■ LEITURA SUGERIDA
casos de suspeita de malignidade, já que a coloração azulada do ovário Schettini ST. Abdome agudo em pediatria. São Paulo: Atheneu; 2006.
após a destorção não significa necessariamente necrose.
de insuficiência respiratória devido à hipoplasia pulmonar ocasionada pelo ■■ MEGAURETER OBSTRUTIVO PRIMÁRIO
oligoâmnio. Nos casos mais severos de oligoâmnio, além da hipoplasia pul- Todo ureter com diâmetro maior do que 7 mm é considerado um megaure-
monar, os neonatos podem apresentar deformidades esqueléticas e faciais, ter. Pode ser por RVU, obstrução distal por septo intraluminar, compressão
estigmas do “Fascies de Potter”, descrita para a agenesia renal bilateral. extrínseca (como ureter retrocava por ex.) ou dismotilidade. O megaure-
ter obstrutivo primário (MOP) apresenta segmento ureteral intravesical
DIAGNÓSTICO adinâmico, promovendo dilatação à montante da junção ureterovesical
associado à dismotilidade e estase urinaria no segmento ureteral afetado.
ATENÇÃO! É doença progressiva, com fisiopatologia ainda não esclarecida e de alta
morbidade.
A maioria das malformações urológicas é detectada na ultrassonogra-
fia (US) pré-natal. QUADRO CLÍNICO
Apresenta-se com infecção urinária de repetição.
O diâmetro ântero-posterior da pelve renal tem sido o parâmetro
prognóstico nas hidronefroses antenatais. Rins com DAP maiores que 4 DIAGNÓSTICO
mm no segundo trimestre e 7 mm no terceiro trimestre têm valor diagnós- A US revela ureter dilatado, podendo ser classificado como MOP distal
tico e deverão ser investigados no período pós-natal. (acomete o segmento pélvico do ureter); subtotal (acomete todo o ureter
abaixo da junção pieloureteral) e total (dilatação completa do sistema co-
TRATAMENTO letor da pelve e cálices renais em graus variados). A urografia excretora
A US indicando hidronefrose progressiva fetal deverá ser repetida no RN, (UGE) pode apresentar afilamento do ureter intravesical característico da
duas semanas após o parto, passado o período de desidratação fetal que anomalia (sinal da ponta do lápis).
poderia levar a um falso diagnóstico negativo. Nos casos de rim único,
hidronefrose bilateral ou piora clínica e laboratorial do RN, a US deve ser TRATAMENTO
antecipada. As hidronefroses leves devem ser seguidas com USs seriadas. O tratamento é conservador na maioria dos casos e não há conduta cirúr-
Hidronefrose de moderada a severa intensidade indicam a necessidade de gica no período neonatal, exceto nos casos graves e bilaterais, em que a
antibioticoterapia profilática até a realização da uretrocistografia miccio- derivação urinaria alta pode ser considerada, alguns pacientes podendo
nal (UCM) que pode diagnosticar refluxo vesicoureteral (RVU) e válvula de necessitar de diálise peritoneal. Deverão ser mantidos com antibiotico-
uretra posterior, condições de alto risco para ITU. As cintilografias renais terapia. Nas crianças maiores, o reimplante ureteral (com ou sem mode-
estática (DMSA) e dinâmica (DTPA) deverão ser realizadas após a segunda lagem do ureter) ou ureterocutaneostomias descompressivas podem ser
semana de vida. indicados na piora da dilatação das vias urinárias, perda de função renal e
pielonefrites de repetição.
■■ OBSTRUÇÃO DA JUNÇÃO URETEROPIÉLICA
A obstrução da junção ureteropiélica (JUP) caracteriza-se por uma obs- ■■ URETEROCELE
trução congênita ao fluxo de urina da pelve para o ureter. Ocorre com A ureterocele consiste em uma dilatação cística do ureter intravesical, le-
maior frequência no sexo masculino. O rim esquerdo é o mais afetado e a vando à obstrução completa ou parcial do fluxo urinário com dilatação a
bilateralidade ocorre em 10-25% dos casos. montante do ureter acometido. É mais frequente no sexo feminino e pode
ser bilateral em 10%. Está relacionada ao pólo superior de uma duplicida-
QUADRO CLÍNICO de pieloureteral em 80% dos casos. As ureteroceles em sistema único são
Massa palpável em flanco é a apresentação clínica mais comum. Hematúria, mais comuns no sexo masculino.
infecções urinárias de repetição, dor lombar e déficit de crescimento são
sintomas menos comuns e presentes em crianças maiores. A maioria tem QUADRO CLÍNICO
evolução silenciosa e assintomática, com perda progressiva da função renal. Apresenta-se com infecção urinária. O prolapso da ureterocele, através do
colo vesical, pode promover sua obstrução e ocasionar retenção urinária.
DIAGNÓSTICO
A estenose da JUP representa a causa mais frequente de hidronefrose an- DIAGNÓSTICO
tenatal. A cintilografia renal dinâmica com padrão obstrutivo confirma o É detectada na US pré e pós-natal como lesão cística bem definida na pare-
diagnóstico. A UCM deve ser realizada para a exclusão de RVU associado. de vesical posterior. Na UCM, apresenta-se como imagem esférica em nega-
tivo no assoalho vesical e pode estar associado a RVU para o pólo inferior,
TRATAMENTO nos sistemas duplos. Na urografia excretora, apresenta-se como imagem
O tratamento cirúrgico da JUP é pouco praticado no período neonatal. em duplo contraste denominado “cabeça de cobra” ou em “casca de cebo-
No acometimento bilateral, com déficit importante da função renal, pode la” (quando a unidade renal associada é funcionante). A uretrocistoscopia é
ser necessária a realização de nefrostomia por punção dirigida por US diagnóstica e terapêutica à medida que permite a abertura da ureterocele.
unilateral no rim mais acometido com o intuito de descomprimir o siste-
ma pielocalicial e proporcionar melhora da função renal. A nefrostomia TRATAMENTO
também pode ser conduta de exceção em casos severos de pionefrose. Nos RN ou lactentes com urosepse por hidroureteronefrose associada à
A pieloplastia (aberta ou laparoscópica) é indicada nos casos em que há ureterocele ou naquelas que ocasionam retenção urinária, a fulguração
aumento progressivo da dilatação pielocalicial, perda de função renal ou endoscópica deve ser indicada, propiciando drenagem da unidade renal
infecção urinária de repetição. A nefrectomia será indicada na exclusão obstrutiva (podendo curar o RVU associado ao pólo inferior do sistema
renal funcional. duplo e ser o tratamento definitivo). A heminefroureterectomia do pólo
470 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
superior (nos casos com exclusão renal funcional do pólo correspondente) DIAGNÓSTICO
e o reimplante ureteral (função renal preservada ou persistência de RVU) A maioria das VUP apresenta diagnóstico pré-natal com hidroureterone-
também são cirurgias a serem consideradas nas crianças maiores. frose, bexiga distendida e com paredes espessadas. A UCM é o exame de
imagem mais importante no diagnóstico de VUP e identifica a dilatação
■■ URETER ECTÓPICO da uretra posterior, bexiga com paredes trabeculadas, associada ou não
com RVU uni ou bilateral. É comum a presença de RVU associado à perda
O ureter ectópico apresenta abertura mais caudal à sua posição habitual
da função do rim ipsilateral com a preservação da função renal do rim
no trígono ou no colo vesical. Estão relacionados ao pólo superior na du-
contralateral (mecanismo de “Pop-Off”). As disfunções vesicais devem ser
plicidade pieloureteral em 80% dos casos; 10% são bilaterais. É mais fre-
diagnosticadas com estudo urodinâmico.
quente no sexo feminino (associado à duplicidade pieloureteral), no sexo
masculino, incide mais em sistema único.
TRATAMENTO
QUADRO CLÍNICO O tratamento da VUP deve ser iniciado com a sondagem vesical que pode
solucionar a ascite ocasionada por ruptura do fórnix renal. A fulguração
Apresenta-se como infecção urinária de repetição. A incontinência uriná-
endoscópica da VUP é indicada assim que o RN estiver estável e com o
ria paradoxal (perda urinária constante após micção voluntária comple-
diagnóstico confirmado pela UCM. Nas crianças muito pequenas, nas
ta) quando a criança adquire a continência voluntaria, chama a atenção
quais a instrumentalização da uretra com cistoscópio não é possível, é
para o diagnóstico. É mais frequente no sexo feminino; no sexo masculino,
indicada a vesicostomia que será temporária até a ablação da VUP. Em
pode ocorrer orquiepididimite de repetição no período pré-puberal (quan-
alguns pacientes, a ureterocutaneostomia bilateral pode ser necessária,
do o ureter anômalo está implantado na vesícula seminal).
caso a sondagem vesical não seja efetiva na diminuição da hidrourete-
DIAGNÓSTICO ronefrose ou ocorra piora progressiva da função renal indicando que a
vesicostomia também não será. O tratamento das disfunções vesicais as-
O orifício ureteral ectópico pode ser observado no vestíbulo no exame sociadas é necessáriao no seguimento clínico.
genital minucioso no sexo feminino. Apresenta-se como hidroureterone-
frose à US pré e pós-natal. A UGE e a urorressonância podem confirmar
■■ REFLUXO VESICOURETERAL
a implantação anômala do ureter. A uretrocistoscopia e a vaginoscopia
podem ser necessárias para firmar o diagnóstico. O RVU constitui o fluxo retrógrado de urina da bexiga para os rins, promo-
vendo infecções de urina e deterioração da função renal. É uma patologia
TRATAMENTO prevalente, mais frequente no sexo feminino e que deve ser investigada na
incidência de ITU em ambos os sexos. O RVU pode ser primário (deficiência
As condutas cirúrgicas não são realizadas no período neonatal. Devem
dos mecanismos antirrefluxivos anatômicos na junção ureterovesical) ou
ser mantidos em antibioticoterapia profilática. O reimplante ureteral (nos
secundário (disfunção vesical). Pode ser passivo (durante o enchimento
casos com função renal preservada) e a heminefroureterectomia polar su-
vesical na UCM) ou ativo (durante a fase miccional da UCM). Os RVU ativos
perior (exclusão funcional) são condutas cirúrgicas indicadas nos pacientes
são os mais lesivos para o parênquima renal.
com infecção do trato urinário (ITU) de difícil controle, na pionefrose e nas
crianças maiores.
QUADRO CLÍNICO
Apresenta-se com infecção urinária de repetição. Em crianças maiores, as
■■ VÁLVULA DE URETRA POSTERIOR disfunções miccionais devem ser sempre investigadas.
A válvula de uretra posterior (VUP) constitui obstrução congênita por
membrana intraluminar na transição da uretra membranosa para a bulbar DIAGNÓSTICO
a partir do veru-montanum, o que impede o livre fluxo da urina da bexiga A UCM confirma a presença e o grau do RVU. A UCM deverá ser realizada
para a uretra. Como é uma anomalia que se instala em período muito no período neonatal nos casos de hidroureteronefroses bilaterais, para
precoce do desenvolvimento embrionário, leva à dilatação da uretra pos- excluir a presença de VUP. Em crianças maiores, o estudo urodinâmico
terior, ao espessamento e à hipertrofia do músculo detrusor com bexiga de deve ser realizado para o diagnóstico das disfunções vesicais associadas.
baixa capacidade e distorção da fisiologia do trígono vesical (“bexiga de
válvula”) que leva tanto à dificuldade de esvasiamento ureteral como ao TRATAMENTO
RVU associado à displasia renal em graus variáveis, com alta morbidade
Em casos graves e bilaterais de RVU, com perda progressiva da função re-
no recém-nascido. Cerca de 35% dos casos apresenta insuficiência renal
nal, a vesicostomia ou ureterocutaneostomia descompressivas podem ser
na evolução clínica. É a causa mais frequente de obstrução infravesical na
necessárias no período neonatal, na tentativa de evitar a deterioração do
criança do sexo masculino.
parênquima renal. São mantidos em antibioticoterapia profilática e segui-
mento ambulatorial com exames séricos de função renal e de imagem. A
QUADRO CLÍNICO
resolução espontânea é de 80% nos RVU grau I e II e de 30-50% nos graus
A insuficiência respiratória devido à hipoplasia pulmonar é o quadro clíni- III-V. O tratamento cirúrgico (injeção endoscópica subureteral de políme-
co mais grave da VUP, decorrente de oligoâmnio por displasia renal. Estes ros ou de reimplantes ureterais abertos ou laparoscópicos) estará indicado
pacientes podem nascer com “Fáscies de Potter” e anomalias esqueléticas. nos casos de falha do tratamento clínico, em anomalias associadas (dupli-
Podem apresentar ascite, ocasionada por ruptura do fórnix renal devido cidade pieloureteral, divertículo de Hutch) e em graus IV-V.
à alta pressão hídrica no sistema. No exame físico, os achados de globo
vesical palpável, jato urinário em gotejamento ou interrompido e ereção
durante a micção tem importância diagnóstica. ITU de repetição, urge- ■■ RIM MULTICÍSTICO
-incontinência, sensação de repleção vesical pós-miccional são observa- Representa uma forma extrema de displasia renal associada com atresia
dos nas crianças maiores. ureteral, quando o broto ureteral perde a capacidade indutora da dife-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 471
renciação do metanefro. Pode ser raramente bilateral e será incompatível abdome em ameixa-seca) e criptorquidia bilateral, podendo ou não estar
com a vida (o RN terá estigmas do “fácies de Potter”) já que o parênquima associado a megalouretra peniana. Podem apresentar oligoâmnio e ascite
renal não se diferencia e os néfrons não se formam. O rim multicístico não fetal nos casos mais graves.
é funcionante.
DIAGNÓSTICO
QUADRO CLÍNICO É feito pelos achados do exame físico e confirmado pela US com dilatação
Apresenta-se como massa abdominal lobulada, palpável em flanco no das vias excretoras.
período neonatal, de tamanhos variados.
TRATAMENTO
DIAGNÓSTICO O RN pode apresentar complicações respiratórias graves devido à hipo-
A ultrossonografia evidencia múltiplos cistos não comunicantes e confirma plasia pulmonar associadas ou não à insuficiência renal. Deve ser evi-
o diagnóstico. tada qualquer instrumentação do trato urinário como sondas vesicais e
exames invasivos devido ao risco de ITU de difícil controle. Introduz-se
TRATAMENTO antibioticoterapia profilática para evitar as ITU. A conduta cirúrgica é
Não há conduta cirúrgica no período neonatal. A nefrectomia será indi- de exceção mesmo nas crianças maiores, em casos de infecção de difícil
cada raramente em casos de dúvida diagnóstica ou de persistência de controle e em geral limitadas à vesicostomia ou mais raramente urete-
massa renal muito grande, dando sintomatologia compressiva de vísceras rocutaneostomia. Como a maioria destes pacientes são obstipados pela
vizinhas. ausência da prensa abdominal no momento da evacuação e pelo risco
de trauma em vísceras abdominais parenquimatosas, realizamos a plas-
tia da fáscia abdominal não muscularizada (cirurgia de Monfort), para
■■ RINS POLICÍSTICOS conter as vísceras e melhorar a prensa abdominal nas crianças maiores
A policistose renal infantil se manifesta por renomegalia bilateral, ge- (idade pré-escolar).
ralmente simétrica, associada à insuficiência renal. Evoluem com fa-
lência progressiva da função renal e está associada, com frequência,
■■ NEFROMA MESOBLÁSTICO CONGÊNITO
a cistos em outros órgãos, como fígado, baço, pâncreas, pulmões, e
a dilatações aneurismáticas das artérias cerebrais renais e esplênicas É o tumor renal mais diagnosticado na US pré-natal, também conhecido
(síndrome de Carolli). É doença autossômica recessiva, ocorrendo di- como tumor de Bolante. Trata-se de tumor benigno com substituição do
latação progressiva dos túbulos coletores, com destruição dos néfrons parenquima renal por lóbulos de tecido fibroso. São tumores grandes com
correlacionados. fração lenta de crescimento e devem ser diferenciados do tumor de Wilms
que não incide no RN.
posterior não se forma e por isso apresentam anomalia anorretal asso- Diagnóstico
ciada. A sínfise púbica é bastante separada, com os tubérculos genitais A US é utilizada para confirmar o diagnóstico. Devem ser colhidos marca-
totalmente afastados da linha média, dificultando o diagnóstico de gênero dores tumorais, como alfafetoproteína e gonadotrofina coriônica humana
com genitália ambígua. (β-HCG).
Na epispádia, a placa uretral encontra-se aberta na face dorsal do
pênis em maior ou menor grau, acompanhada de curvatura dorsal e ca- Tratamento
puchão ventral. Podendo ser continente ou incontinente (se a abertura da A orquiectomia deve ser realizada através de incisão inguinal. A cirurgia
uretra seguir até o colo da bexiga). pode ser o único tratamento a ser realizado a depender do estadiamento
do tumor. O seguimento é realizado com dosagem seriada de marcadores
DIAGNÓSTICO tumorais.
O diagnóstico é clínico. A extrofia de cloaca pode ser acompanhada de
outras malformações intestinais, esqueléticas, cardíacas, neurológicas e HÉRNIA INGUINAL E HIDROCELE
urológicas, as quais devem ser pesquisadas. Hidrocele é definida como coleção de líquidos entre a túnica parietal e
visceral da túnica vaginal, sendo muito comum nos RN prematuros. A hi-
TRATAMENTO drocele é dita não comunicante, quando não existe variação do volume
No período neonatal, a reconstrução vesical deve ser realizada preferencial- escrotal durante o dia, e comunicante, quando há variação de volume
mente nas primeiras 72 horas de vida, permitindo uma aproximação dos devido à persistência do conduto peritônio vaginal (CPV). Na hérnia ingui-
ossos púbicos sem necessidade de oteotomia. Realiza-se o fechamento da nal, poderá haver escorregamento de alça intestinal para o CPV, podendo
placa vesical, plástica umbilical e aproximação dos ossos púbicos, manten- acarretar encarceramento e estrangulamento da alça (hérnia encarcerada).
do a epispádia incontinente nos meninos. No sexo feminino, a correção da
bifidez do clitóris permite um resultado estético mais definitivo. Na extrofia
Quadro clínico
de cloaca, as placas vesicais são unidas e a placa intestinal é separada é A hidrocele apresenta-se como aumento do volume escrotal, de consis-
convertida em uma ileostomia ou colostomia terminal; realiza-se, então, tência cística, com transiluminação positiva. Na hérnia inguinal, palpa-se
a correção da onfalocele. As cirurgias para aquisição da continência uri- conteúdo intestinal (ou ovário na menina) no canal inguinal que pode ser
nária e para correção da epispádia serão realizadas em tempos cirúrgicos facilmente reduzido. Palpa-se o espessamento do conduto peritônio vagi-
posteriores. nal no exame bimanual do canal inguinal (“sinal do roçar da seda”).
Diagnóstico
■■ PATOLOGIAS ESCROTAIS E TESTICULARES O diagnóstico se baseia na história clinica, no exame físico e na trasilumi-
nação escrotal.
TORÇÃO DO TESTÍCULO
A torção testicular do recém-nascido ocorre devido à deficiência de fixação Tratamento
da túnica vaginal ao gubernáculo e ao dartos, permitindo uma rotação to- A correção cirúrgica da hérnia inguinal deve ser realizada o mais breve
tal do testículo, comprometendo sua vascularização (torção extravaginal), possível devido ao risco de encarceramento das alças intestinais, causa de
o que rapidamente leva à necrose da gônada. abdome agudo obstrutivo muito frequente no período neonatal (período
da cólica do primeiro trimestre, quando o lactente faz muito esforço abdo-
Quadro clínico minal, projetando alças intestinais para dentro do saco herniario). A con-
Apresenta-se como anorquia, quando ocorre torção em fase precoce do duta deve ser expectante na hidrocele não comunicante, pois a maioria
desenvolvimento testicular ou como gônada aumentada de tamanho, en- apresenta resolução no primeiro ano de vida. O tratamento da hidrocele
durecida, com ou sem sinais flogísticos e normalmente indolor ou pouco comunicante também é cirúrgico e é realizada através de incisão inguinal,
dolorosa à palpação, quando a torção ocorre próximo ao nascimento. semelhante ao tratamento da hérnia inguinal devido à persistência do CPV.
falo normal (até mesmo com fimose), porém com escroto pequeno, não
REVISÃO
ocupado por gônada à palpação. A HCSR na forma perdedora de sal (por
deficiência das enzimas 21 hidroxilase; 3β-desidrogenase e 11 hidroxila- As anomalias urológicas são detectadas na US realizada no pré-
se) deve ser sempre lembrada diante de RN com quadro de desidratação, -natal. Seguimento adequado diminui a sua morbidade.
vômitos e tendência ao choque a partir da primeira semana de vida, com Sinais de alerta para anomalias urológicas: oligoâmnio, artéria um-
ambiguidade genital simétrica. bilical única, massas abdominais palpáveis em flanco, retardo na
eliminação de urina após 48h, diminuição do jato urinário, globo
Diagnóstico
vesical palpável e genitália ambígua.
A confirmação se dará a partir dos achados de exame físico. A dosagem A estenose da JUP representa a causa mais frequente de hidrone-
dos esteroides (urinários e séricos), US dos órgãos pélvicos, genitograma, frose antenatal.
laparoscopia e biópsia de gônadas são exames a serem utilizados para O RVU é uma patologia prevalente e que deve ser investigada como
esclarecimento diagnóstico nas DDS. No entanto, o diagnóstico definitivo causa de ITU.
não poderá ser dado sem a realização do cariótipo. A análise de todos os Os distúrbios miccionais no neonato chamam a atenção para o diag-
dados por equipe multidisciplinar definirá o gênero e só então o paciente nóstico de VUP que necessita investigação imediata.
poderá ser registrado. A tríade da síndrome de Prune Belly consiste na aplasia ou hipopla-
sia da musculatura abdominal, criptorquidia bilateral e dilatação do
Tratamento
trato urinário.
Inclui abordagem clínica e cirúrgica na dependência do tipo da DDS firma- Extrofia de bexiga, extrofia de cloaca e epispádia constituem mal-
da. Na HCSR, deve-se inibir a liberação do hormônio adrenocorticotrófico formações urológicas raras com tratamento cirúrgico desafiador.
(ACTH) pela hipófise com o emprego de glicocorticoides. Quando ocorre A torção testicular é uma emergência urológica que deve ser pronta-
perda de sal, podemos utilizar o 9α-fluoridrocortisona com ação minera- mente identificada ou afastada como causa de escroto agudo.
locorticoide. O tratamento cirúrgico promoverá feminilização do genital As hérnias inguinais e hidrocele são patologias frequentes e seu
em idade oportuna. Na síndrome da resistência periférica à testosterona, diagnóstico se baseia na história clinica e no exame físico.
forma completa, o tratamento cirúrgico visará à extirpação das gônadas Genitália ambígua pode significar urgência clínica nos casos de hi-
(testículos) antes da idade puberal, pelo alta incidência de tumores (gona- perplasia congênita da suprarrenal forma perdedora de sal.
doblastoma). As formas parciais também incluirão a genitoplastia. Estes
pacientes são, na maioria absoluta dos casos, designados como mulheres.
A reposição hormonal estrogênica estará indicada para o desenvolvimen-
to dos caracteres sexuais secundários femininos. ■■ LEITURAS SUGERIDAS
Gillenwater JY, Howards SS, Grayhack JT, Mitchell ME, editors. Adult and
pediatric urology. 4th ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2002.
Wein AJ, Kavoussi LR, Novick AC, Partin AW, Peters CA, editors. Campbell-Walsh
urology. 10th ed. Philadelphia: Saunders; 2012.
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PARTE
SAÚDE DA
MULHER
4
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GINECOLOGIA
COMPLICAÇÕES
QUADRO 78.2 ■ Indicações de videolaparoscopia terapêutica
Como em qualquer outro procedimento cirúrgico, as complicações da vi-
Útero deo-laparoscopia devem ser corrigidas no intraoperatório. Algumas delas
Miomectomia (nódulo seroso ou intramural) são inerentes a esse procedimento: em cada passo dele, há riscos. Entre
Histerectomia total laparoscópica essas complicações, as mais graves estão ligadas à 1ª punção: lesões vas-
Histerectomia vaginal assistida por laparoscopia culares e viscerais. Porém, aquelas relacionadas ao instrumental, como
Histerectomia supracervical (subtotal) lesões térmicas de vísceras por eletrocoagulação monopolar ou bipolar,
Tuba uterina devem determinar remoção do seguimento de alça lesado, ou mesmo co-
Salpingectomia: gravidez ectópica, hidrossalpinge, envolvimento lostomia, quando envolve intestino grosso.
inflamatório Em relação às contraindicações, estas obedecem aos mesmos critérios
Salpingosplastia, salpingostomia
atribuídos à cirurgia convencional.
Salpingoneostomia (na hidrossalpinge)
O abdome agudo tem, na laparoscopia, uma indicação diagnóstica
Fimbrioplastia
e terapêutica. Porém, diante de choque, insuficiência respiratória aguda
Laqueadura tubária (eletrocoagulacão bipolar, monopolar, “clipes” de
(IRpA), distensão abdominal excessiva que impossibilite a realização de
Hulka, anéis de Yoon)
Salpingólise: lise de aderências anexiais pneumoperitônio, obstrução intestinal e hérnia diafragmática grande, a
Gravidez ectópica: salpingotomia linear, salpingectomia indicação deve avaliada.
Ovário Algumas condições, como gravidez, envolvem complicações maternas
Biópsia ovariana e fetais. O CO2 pode levar a risco de acidose fetal.
Ooforectomia As afecções anexiais inflamatórias apendiculares, colecistopatias,
Ooforoplatia (exérese de cisto ovariano) também podem comprometer a gestação. A indicação cirúrgica deve levar
Outras indicações em conta o período de gestação.
Correção da retroversão uterina
Retirada de DIU da cavidade abdominal após perfuração uterina CIRURGIA ROBÓTICA
Dor pélvica crônica: O desenvolvimento de tecnologias ligadas a instrumental e técnicas cirúr-
a | ablação de ligamentos uterossacros na dismenorreia gicas culminou nesses últimos anos na aplicação da videolaparoscopia a
b | neurectomia pressacral sistemas robóticos, criados com a finalidade de reduzir morbidade; am-
c | endometriose em seus diferentes estágios, dissecção de obliteração
pliar a precisão cirúrgica e, indiretamente, possibilitar aos médicos não
de fundo de saco de Douglas até sigmoidectomia nas lesões
acostumados a técnicas de videocirurgia experimentarem essa nova fron-
envolvendo septo retovaginal, na endometriose profunda
teira do conhecimento. Tais aparelhos surgiram nos anos 1990 e têm sido
Correção de incontinência de esforço pela técnica de Burch
aperfeiçoados desde então. A obtenção de imagens em 3D e a ampliação
Distopias genitais:
a | procidência da parede vaginal anterior (defeito paravaginal)
da capacidade do cirurgião de executar movimentos precisos são pontos
b | prolapso de cúpula vaginal pós-histerectomia cruciais em procedimentos laparoscópicos mais complexos. O manuseio de
c | enterocele estruturas delicadas e nobres, como nervos, artérias, veias e tubas uteri-
Cirurgias de bexiga: cistectomias parciais: retiradas de nódulos nas, para preservar e/ou reparar, sua função, por meio de movimentos tri-
(endometriose ou mioma) em parede vesical dimensionais guiados à braços robotizados, difere da visão bidimensional
Cirurgia em ureter: dissecção retroperitoneal de ureter e anastomose fornecida pela laparoscopia convencional. Isso amplia o conforto do cirur-
Malformações genitais: gião, melhorando sensivelmente a ergonomia da equipe e aumentando o
a | diagnóstico do tipo de malformação mulleriana e terapêutica grau de liberdade de tempo de cirurgia, além do cansaço causado pelo uso
(p. ex.: hemi-histerectomia em hemiútero bicorno não comunicante das pinças laparoscópicas comuns, que dificultam o sucesso e restringem
com a vagina na hematometra) sua aplicação em algumas cirurgias complexas.
b | neovagina nas agenesias vaginais (técnica de Vecchietti ou A robótica tem sido utilizada em alguns procedimentos ginecológi-
Davyoff) (p. ex.: síndrome de Mayer-Roktanski-Kuster-Hauser) cos, como histerectomia, linfadenectomia, miomectomia, reanastomose
Oncologia tubária e sacrocolpofixação, parecendo colaborar com bons resultados.
a | carcinoma de endométrio: histerectomia radical e linfadenectomia No entanto, para que seja amplamente aceita, tem de se provar de fácil
pélvica como procedimento terapêutico e prognóstico nos estádios manuseio por toda a equipe multiprofissional que lida com o aparelho e
iniciais de aprendizado factível para o cirurgião, sem aumento da exposição do
b | carcinoma de colo: histerectomia radical, linfadenectomia pélvica,
paciente a riscos ou desconforto, comparativamente a outras técnicas dis-
terço superior da vagina
poníveis. No momento, o aspecto negativo se dá em virtude de seu alto
c | carcinoma de ovário: second look após cirurgias de neoplasias
custo, limitando sua instalação a centros com maiores recursos.
ovarianas
OUTROS ACESSOS
O desenvolvimento técnico se dá em paralelo com novos conceitos de ci-
rurgia minimamente invasiva visando ao acesso à cavidade abdominal e
ATENÇÃO! pélvica por orifícios naturais, como boca, ânus e vagina, abrindo um novo
As indicações para via laparoscópica devem ser precisas. O tratamento campo de pesquisa.
cirúrgico não pode ser influenciado pela via de acesso. São inegáveis O acesso à cavidade abdominal pela vagina por meio da culdoscopia,
as vantagens dessa via de acesso, e seus benefícios sempre devem ser conhecida desde 1946, vem sendo retomado em seres humanos, por sis-
respeitados. temas ópticos flexíveis. No entanto, outras vias, como a transgástrica, têm
sido estudadas.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 479
A cirurgia transgástrica é realizada com a introdução de um endoscó- ce as informações acerca dos fatores cervical e uterino: permeabilidade do
pio pela parede gástrica, que permite acessar as cavidades abdominal e orifício externo e do canal endocervical; presença ou não de tumorações
pélvica. Suas vantagens são eliminação de cicatrizes abdominais, redução (pólipos, sinéquias, miomas, neoplasias); e observação de aspectos liga-
do risco pós-operatório, como hérnias e aderências, e menor risco de infec- dos à fisiologia do ciclo (pela avaliação do muco cervical).
ção e de dor pós-operatória. Quanto ao fator uterino, com a histeroscopia é possível obter dados a
respeito da permeabilidade do orifício interno e das alterações anatômicas
encontradas na cavidade uterina. A histeroscopia confirma e complementa
ATENÇÃO! com detalhes o que, às vezes, já foi diagnosticado pela US transvaginal
(USTV), histerossalpingografia, pela laparoscopia ou pela RM. Nas pacien-
O advento de novas tecnologias para as cirurgias minimamente inva-
tes em programa de fertilização in vitro (FIV), deve ser obrigatória a avali-
sivas obriga o cirurgião ginecologista a uma constante atualização do
ção prévia da cavidade uterina por histeroscopia.
saber. A videolaparoscopia é um claro exemplo de procedimento ino-
É indicação precisa na localização de corpos estranhos, como meta-
vador em constante evolução.
plasia óssea e DIU, perdidos na cavidade uterina.
Deve ser utilizada no diagnóstico diferencial de doenças intracavitá-
rias suspeitas e não definidas por outras técnicas. O exemplo mais comum
■■ VÍDEO-HISTEROSCOPIA é o diagnóstico ultrassonográfico de espessamento endometrial (> 5 mm),
A histeroscopia foi um dos primeiros métodos desenvolvidos para visua- que requer avaliação direta e morfológica. Algumas vezes, o endométrio
lização e estudo direto da cavidade uterina. Com o passar dos anos e a espessado visto à US pode corresponder a pólipo endometrial. Outros
partir das inovações ocorridas na área, a histeroscopia abriu novas pos- exemplos são as “falhas de enchimento” à histerossalpingografia, que re-
sibilidades diagnósticas para o canal cervical e a cavidade uterina, reve- querem avaliação complementar para melhor definição.
lando limites para a curetagem uterina. Agora, é possível a execução de As indicações histeroscópicas não se restringem à ginecologia. Há
exame endoscópico no próprio consultório sem o uso de qualquer tipo indicação também na obstetrícia, na avaliação de restos placentários ou
de anestésico ou dilatação do canal cervical. A histeroscopia é um exame abortivos e no diagnóstico e acompanhamento da involução da neopla-
ambulatorial que não requer preparo prévio, dispensa anestesia e antibio- sia trofoblástica gestacional e histeroembrioscopia. Como se observa, a
ticoterapia e é reprodutível. histeroscopia é a arma fundamental e indispensável na propedêutica da
No começo da década de 1990, diversos histeroscopistas deixaram mulher.
de utilizar o espéculo, a pinça de Pozzi e o CO2 na realização das histeros-
1
copias. Em 1997, Bettocchi e Selvaggi introduziram a camisa diagnóstica CONTRAINDICAÇÕES
(3,7 mm) e a cirúrgica (3,2 × 5,3 mm de diâmetro), de formato ovalado, e São poucas, o que já representa uma vantagem do método. As contrain-
novos elementos acessórios, como agulha monopolar. dicações são gestação, infecção genital e metrorragia. Teme-se a infecção
Agora, a histeroscopia ambulatorial pode ser subdividida em diag- genital pela possibilidade de disseminação. Sugere-se tratamento prévio
nóstica e cirúrgica. Não requer anestesia, sedação nem dilatação cervical, para, após a cura, as pacientes serem submetidas ao exame endoscópico.
permitindo ser realizada no ambulatório em 95% dos casos. O meio de
distensão é o líquido, e podem ser usados manitol, sorbitol, glicina para a COMPLICAÇÕES
corrente monopolar e solução fisiológica (SF) a 0,9% para os casos em que Surgem quando as contraindicações são ignoradas, o instrumental for ina-
a energia utilizada for a bipolar. dequado e o endoscopista não apresentar experiência suficiente. As pri-
Dessa forma, no ambulatório, são possíveis a realização da extração meiras complicações ocorrem quando há obstrução do orifício externo do
de pólipos pequenos, da liberação de sinéquias, de biópsias dirigidas e colo do útero, podendo ocorrer falso trajeto e perfuração uterina. Sensação
extrações de corpo estranho (DIU, metaplasia óssea). Isso torna o método de náusea e até vômitos podem ocorrer por estímulo vagal ou hipotensão,
imprescindível na prática ginecológica. preconizando-se, nesses casos, a utilização de atropina 0,5 mg sublingual
ou IM. São consideradas complicações os traumas provenientes do choque
INDICAÇÕES entre a óptica e o tecido, que não só podem provocar sangramentos inde-
Qualquer processo patológico intracavitário pode beneficiar-se do diag- sejados, como até perfuração uterina. Diagnosticada a perfuração, avalia-
nóstico endoscópico. -se a existência de sangramento importante ou lesão de algum outro órgão
A indicação mais frequente é o sangramento uterino anormal. No adjacente, o que é muito raro. Retira-se a óptica lentamente, observando-
menacme, os pólipos endocervicais e endometriais, as endometrites e as -se o seu trajeto, e a paciente permanece em observação por três horas,
disfunções endócrinas podem ser responsabilizados por eventuais sangra- sob controle dos sinais vitais. É excepcional que venha a necessitar de lapa-
mentos uterinos anormais. Na peri e na pós-menopausa, o endométrio roscopia ou laparotomia na avaliação da cavidade abdominal.
atrófico, o carcinoma do colo do útero, o carcinoma do endométrio, os A endometrite e a doença inflamatória pélvica (DIP) são complicações
pólipos endocervicais e endometriais e os sangramentos iatrogênicos pro- raras, pertinentes às falhas na assepsia da vagina e na esterilização do
vocados pela inadequada utilização da terapia de reposição hormonal são material utilizado no exame.
responsáveis pelo maior contingente de casos.
A atrofia endometrial é uma das causas mais frequentes de sangra- BIÓPSIA
mento uterino na pós-menopausa. O estado hipoestrogênico propicia Após a realização da histeroscopia ambulatorial diagnóstica, pode-se e, na
atrofia, superficialização e maior delicadeza das paredes vasculares, daí a maioria dos casos, deve-se realizar a biópsia histeroscópica. Agora, com a
eritrodiapedese e o progressivo acúmulo de sangue na cavidade consubs- utilização da camisa de Bettocchi ovalada, é possível sempre adaptar a óp-
tanciando o sangramento anormal. tica à posição do orifício interno. Com isso, durante a penetração da óptica
Pacientes inférteis ou estéreis formam a 2ª maior indicação da histe- já existe a possibilidade de acesso das pinças (graspinge tesouras) ao úte-
roscopia diagnóstica. Na avaliação desses casos, a histeroscopia enrique- ro, facilitando e permitindo sempre a realização da biópsia dirigida.É uma
480 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
deficientes do organismo e a agressividade bacteriana encontram-se entre das pacientes com urocultura com mais de 100 mil unidades formadoras
as causas de recidivas. de colônias/mL de urina têm piúria e apenas 7% das mulheres com infec-
Para que se desenvolva infecção urinária, os uropatógenos devem ção urinária não têm piúria.
colonizar o introito vaginal, ascender ao trato urinário e aderir ao urotélio, Outro aspecto importante da análise do sedimento urinário é a hema-
ultrapassando os mecanismos de defesa do organismo. túria microscópica e a proteinúria, presentes em parcela significativa dos
Realçam-se, entre os principais elementos de defesa, o pH da vagina exames de mulheres com infecção urinária e ausentes nas outras causas
e da urina, a flora vaginal normal, assim como os anticorpos e o fluxo de disúria, como vaginites ou uretrites por clamídia.
normal de muco e de urina. Vários métodos foram propostos para agilizar e baratear o custo do
Entre os aspectos patogênicos das bactérias, destacam-se os pili (ou diagnóstico dessa infecção, como a pesquisa da atividade das esterases
fímbrias), a produção de hemolisinas, de aerobactinas e os fatores uretero- leucocitárias e a conversão de nitratos em nitritos pelas bactérias, porém
plégicos e os citotóxico-necrosantes. a sensibilidade desses testes é diretamente proporcional ao número de
Entre os principais determinantes da agressividade da E. coli, so- bactérias presentes na urina. O valor preditivo positivo (VPP) do teste das
bressaem-se as fímbrias ou pili e os apêndices bacterianos. As fímbrias P esterases é da ordem de 94 a 98%, ao passo que o falso-negativo oscila
ligam-se aos glicolipídeos da membrana de células uroteliais. entre 4 e 26%.
Da parte do hospedeiro, inúmeros mecanismos atuam para que o O exame considerado padrão-ouro para o diagnóstico é, sem dúvida,
trato urinário permaneça estéril, entre os quais: erradicação da bactéria a urocultura, pois identifica o patógeno envolvido e sua sensibilidade aos
pelo fluxo de urina e de muco; atividade bactericida do urotélio; secreção antimicrobianos.
urinária de IgA e de antígenos de grupos sanguíneos que dificultam a ade-
rência bacteriana.
A maior suscetibilidade de algumas mulheres à infecção urinária não ATENÇÃO!
é de todo explicada; sabe-se, contudo, que existe maior facilidade de co- É indispensável conhecer a forma de coleta da urina, ou seja, se foi
lonização do introito vaginal e diminuição da resposta imunológica aos coletada com adequada assepsia, de primeiro jato, de jato médio, por
uropatógenos. cateterismo, punção suprapúbica ou em coletor; e deve-se considerar
A supressão do crescimento bacteriano depende, aparentemente, a sintomatologia da paciente e o tipo de bactéria isolada.
do contato direto da bactéria com o urotélio. Tal fato sugere que a ação
bactericida do epitélio é ativada por sinais transmembrana oriundos da
ligação da bactéria com receptores específicos das células uroteliais, por No entanto, alguns aspectos devem ser comentados: é indispensável
meio da ativação da adenilciclase. conhecer a forma de coleta da urina, ou seja, se foi coletada com ade-
Outro aspecto a ser considerado é a interação da flora bacteriana nor- quada assepsia, de primeiro jato, de jato médio, por cateterismo, punção
mal com as bactérias uropatogênicas. Além de competir com as bactérias suprapúbica ou em coletor; e deve-se considerar a sintomatologia da pa-
agressoras por alimento e de produzir acidificação do pH vaginal, os lacto- ciente e o tipo de bactéria isolada.
bacilos diminuem a aderência dos uropatógenos ao urotélio, em particular O conceito clássico de bacteriúria significante corresponde à identifi-
as cepas de lactobacilos produtoras de substâncias biossurfactantes. cação de pelo menos 100 mil unidades formadoras de colônias por mililitro
Os eventos da imunidade celular, ligados à inflamação local, depen- de urina, na urocultura. Embora esse critério tenha alta especificidade, a
dem de controle genético e são iniciados pelos polissacarídeos das bac- sensibilidade é relativamente baixa. Hoje, admitem-se valores superiores
térias gram-negativas. Relata-se que ratos com déficit funcional do gene a 100 unidades formadoras de colônias/mL de urina como positivos em
LPS são mais suscetíveis à infecção por E. coli do que animais normais, pacientes com sintomas típicos e quando a bactéria isolada for uropató-
sugerindo haver alteração genética. geno conhecido.
A diminuição da atividade das células T e da produção de interleuci- Muito se discute, no momento, sobre a real necessidade da urocultura
nas, portanto da imunidade, está associada com o aumento da letalidade para diagnóstico e confirmação de cura em todas as pacientes. Conside-
das infecções urinárias e com a reativação de infecções lactentes. rando-se o custo e a possível demora no início do tratamento decorrente
Tentativas iniciais de desenvolvimento de vacinas para o tratamento do atraso na coleta da urina, concorda-se com a não necessidade de soli-
de pacientes com infecção recorrente vêm sendo descritas. Para tanto, ex- citar urocultura pré-tratamento em mulheres jovens, com sintomas típicos,
tratos de componentes da E. coli têm sido utilizados como estimuladores sem fatores de risco e com piúria.
da imunidade específica e ativadores não específicos dos leucócitos. Após Contudo, em algumas situações clínicas, julga-se adequada a solici-
múltiplas aplicações parenterais do extrato bacteriano, observou-se au- tação de urocultura antes da introdução do tratamento, como: diabetes;
mento dos anticorpos séricos, em especial de IgG. Tais observações abrem doenças consumptivas; pacientes hospitalizadas e/ou cateterizadas, trans-
a perspectiva real de desenvolvimento de vacinas para as mulheres com plantadas; infecção urinária recorrente; ou sinais de infecção alta. Porém,
quadros de infecção urinária recorrente. como regra geral, não se aguarda o resultado da urocultura para não pos-
tergar o início do tratamento e, com isso, aumentar o desconforto e o risco
de complicações.
■■ DIAGNÓSTICO Tal postura encontra-se embasada no fato de que, em mulheres jo-
Muito se discute sobre as várias estratégias adotadas para a confirmação vens sem fatores de risco, o agente etiológico da infecção urinária e sua
do diagnóstico inicial e controle de cura pós-tratamento. A solicitação de sensibilidade antimicrobiana são previsíveis.
exames laboratoriais deve ser encarada de forma racional, para não gerar Outro ponto a ser considerado é a necessidade ou não de fazer cultura
custo e desconforto desnecessários. A seguir, serão analisados os princi- de urina como controle de cura pós-tratamento. Importante relatar estudo
pais métodos laboratoriais disponíveis para pesquisa de infecção urinária. que analisou 80 pacientes tratadas por infecção urinária que identificou
A análise do sedimento urinário reveste-se de importância ímpar, por três mulheres com persistência da bacteriúria, porém sem sintomas. Des-
permitir a contagem do número de leucócitos. A piúria ou leucocitúria, em tas, apenas uma desenvolveu novo quadro de infecção urinária sintomáti-
paciente sintomática, tem alto valor preditivo, sendo que entre 90 e 95% ca pela mesma bactéria. Notou-se, ainda, que dos 12 casos de recorrência,
482 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
11 tiveram urocultura negativa pós-tratamento, ou seja, urina estéril não dos exames, das doenças associadas e, especialmente, da evolução. Nesse
excluiu o risco de recidiva. Portanto, não é sempre necessária. sentido, a US e a urografia excretora são os exames de escolha.
Acredita-se que a bacteriúria assintomática tenha pouco significado
em mulheres jovens e saudáveis, ao contrário de idosas, crianças, pacien-
tes com fatores predisponentes, como obstrução ou transplante renal, cál- REVISÃO
culos, doenças consumptivas ou internadas.
A infecção urinária, doença bastante comum entre as mulheres, tem
a relação sexual como principal fator predisponente.
■■ TRATAMENTO Seu diagnóstico se baseia no quadro clínico, e em alguns casos,
Quanto ao tratamento, devem-se sugerir medidas gerais associadas com a pode ser necessária a realização de exames laboratoriais, como a
antibioticoterapia, como hidratação adequada (1,5 a 2 litros por dia), pois urocultura, que identifica o patógeno e sua sensibilidade ao anti-
urina muito diluída perde fatores de defesa local, como a osmolaridade e a microbiano.
diluição de fatores inibidores de crescimento bacteriano. É interessante o Cuidados gerais, como a hidratação e urinar após as relações se-
hábito de urinar após as relações sexuais (limpa a uretra). A administração xuais, fazem parte do tratamento, contudo essas medidas devem
de alcalinizantes pode reduzir o processo irritativo da urina ácida sobre o ser associadas à antibioticoterapia.
urotélio inflamado, porém com cautela, pois pH ácido é fator inibidor da
proliferação bacteriana.
Considerando-se que as cistites são, em geral, processos não com- ■■ LEITURAS SUGERIDAS
plicados e que as bactérias mais frequentemente associadas são sensíveis Franco AV. Recurrent urinary tract infections. Best Pract Res Clin Obstet Gynaecol.
a maior parte dos antimicrobianos, utilizam-se aqueles com elevada ex- 2005;19(6):861-73.
Ha US, Cho YH. Immunostimulation with Escherichia coli extract: prevention of
creção urinária, com menor frequência de efeitos colaterais e com menor
recurrent urinary tract infections. Int J Antimicrob Agents. 2008;31 Suppl
chance de resistência aos germes habituais.
1:S63-7.
As penicilinas sintéticas, as sulfas, as nitrofurantoínas, as cefalospo- Jepson RG, Williams G, Craig JC. Cranberries for preventing urinary tract
rinas e as quinolonas estão entre os antimicrobianos com indicação mais infections. Sao Paulo Med J. 2013;131(5):363.
adequada. Schito GC, Naber KG, Botto H, Palou J, Mazzei T, Gualco L, et al. The ARESC
Aspecto fundamental é a eficácia desses medicamentos em atuar na study: an international survey on the antimicrobial resistance of pathogens
flora aeróbia gram-negativa intestinal e vaginal sem interferir na anaeró- involved in uncomplicated urinary tract infections. Int J Antimicrob Agents.
bia. De maneira geral, os antimicrobianos que satisfazem essas condições 2009;34(5):407-13.
são as quinolonas, que, além de elevada sensibilidade aos agentes habi- Tenke P, Kovacs B, Jackel M, Nagy E. The role of biofilm infection in urology.
World J Urol. 2006;24(1):13-20.
tuais, são capazes de reduzir substancialmente (quando não erradicam) a
flora de germes gram-negativos entéricos patogênicos que havia coloniza-
do a vagina e as regiões anal e periuretral.
A duração do tratamento da cistite é, tradicionalmente, de sete dias.
Entretanto, como trata-se de infecção superficial do urotélio, tratamento
com duração menor é adequado. Assim, vários estudos foram realizados, 80
avaliando a relação custo/benefício entre as diferentes durações dos trata-
mentos; dose única, três e sete dias. DOENÇA INFLAMATÓRIA PÉLVICA
Para a escolha do tratamento em dose única com fosfomicina trome-
tamol, deve-se levar em conta a idade da paciente, infecção do trato uri-
nário (ITU) nos seis meses anteriores, uso de diafragma com espermicida,
■■ ROBERTO ZAMITH
presença de sintomas há mais de três dias e o tipo provável de agente
etiológico. Mulheres jovens (< 40 anos) têm 90% de chance de cura nesse ■■ MANOEL GIRÃO
esquema de dose única, diferenciando-se daquelas com mais de 40 anos,
que têm apenas 46%.
A terapêutica da cistite não complicada, com três dias de duração, é O trato genital feminino é sede de numerosos processos infecciosos, de
mais eficiente do que com dose única ou mesmo do que esquemas mais etiologia viral, bacteriana, fúngica ou até mesmo protozoária. Essa diver-
prolongados, nas pacientes sem fatores potenciais de agravo. sidade de agentes infecciosos deve-se a algumas peculiaridades desse
Nas infecções urinárias de repetição, sugere-se manter a terapêutica trato: a proximidade com o ânus; a umidade habitual; a comunicação da
com dose única diária (nitrofurantoína ou quinolonas), no período noturno cavidade abdominal com o meio exterior; e, principalmente, ser o local da
(maior permanência do antimicrobiano na bexiga), ou, então, dose única cópula. Entende-se, assim, o porquê de a maior parte das infecções dessa
(um comprimido) após a relação sexual. Esse tratamento deve se prolon- área ser sexualmente transmissível.
gar por, pelo menos, 3 a 6 meses. A norfloxacina, durante períodos pro- É possível classificar as infecções genitais pela etiologia ou pela topo-
longados reduz significativamente a flora coliforme sem, contudo, induzir grafia. Julga-se mais útil a classificação topográfica, na qual temos inicial-
resistência. mente dois grandes grupos:
A necessidade de cultura após três dias de tratamento em paciente infecções genitais baixas;
assintomática é discutível; deve ser solicitada nas pielonefrites agudas ou infecções genitais altas.
quando os sintomas persistirem. A posterior avaliação do trato urinário em Considera-se o óstio interno do útero como o limite anatômico entre
mulheres com ITU recorrente é controversa, pois apenas 5% delas apre- os dois grupos. No grupo das infecções baixas, é possível ter acometi-
sentam alguma alteração. É claro que a indicação de investigação deverá mento da vulva, vagina ou colo (isolada ou simultaneamente). No das
ser individualizada para cada paciente, dependendo da história clínica, infecções altas, endometrites, salpingites, ooforites, parametrites e pel-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 483
viperitonites, as quais podem ocorrer isoladamente ou em qualquer tipo tal inferior, notadamente as cervicites, também criam condições propícias
de combinação. para a ascensão de agentes patogênicos ao trato genital superior. Merece
Geralmente, é utilizado o termo doença inflamatória pélvica (DIP) menção especial a vaginose bacteriana (VB), cujas alterações da flora va-
para se referir ao amplo espectro dos distúrbios inflamatórios que acome- ginal estão associadas ao desenvolvimento de DIP.
tem o trato genital alto da mulher. Conceitua-se DIP como uma síndrome Há um predomínio nas classes sociais menos favorecidas, fato que
clínica decorrente da disseminação de micro-organismos que ascendem não se deve apenas à iniciação sexual precoce e à promiscuidade, já que
da vagina e da cérvice uterina às tubas e/ou estruturas contíguas, não es- fatores também presentes entre a população de maior renda em face da
tando relacionada ao ciclo grávido puerperal ou a cirurgias ginecológicas. maior liberalidade nos costumes sexuais. Aceita-se que o fator preponde-
Assim, a tuberculose genital, por suas peculiaridades clinicopatológicas, rante seja a maior dificuldade de acesso aos serviços de saúde, o que faz
não deve ser considerada uma variedade da doença. Sustentou-se no pas- as queixas mais corriqueiras, como corrimentos vaginais e irregularidades
sado que as infecções ocorriam somente na forma aguda. No início da menstruais, serem esquecidas.
década de 1980, porém, constatou-se que a Chlamydia trachomatis e os No que tange aos métodos contraceptivos, observa-se que os méto-
micoplasmas (Mycoplasma hominis, Ureaplasma urealyticum e Mycoplas- dos de barreira exercem papel protetor. Quanto ao DIU, apontou-se que
ma genitalium) podem infectar cronicamente o trato genital superior, de os diferentes tipos de fio poderiam predispor ao aparecimento da doença
modo que o termo “doença aguda” deve ser suprimido. por interferirem na integridade do tampão mucoso. Outrossim, nas usuá-
Entre os agentes primários, além da clamídia e dos micoplasmas, me- rias de DIU, citava-se ser mais comum a infecção por Actinomices israelli,
rece destaque a Neisseria gonorrhoeae. Esses agentes recebem a qualifi- fato este que não se conseguiu comprovar posteriormente. Atualmente,
cação de primários, pois alcançam primeiramente o trato genital superior. aceita-se que o DIU não tenha tanta importância como facilitador de infec-
Eles ocasionam alterações imunológicas e bioquímicas, como menor pro- ções genitais altas, desde que sejam observados certos cuidados na sua
dução de radicais livres e a diminuição do potencial de oxidorredução e do inserção, pois percebe-se que o risco aumenta apenas nas três primeiras
pH, que favorecem a chegada, a instalação e a manutenção dos agentes semanas da sua colocação e, a seguir, retorna à linha de base.
secundários, que alteram ainda mais o meio ambiente, tornando-o hostil No tocante aos anticoncepcionais orais, há controvérsias quanto ao
para o agente primário, causando, assim, o seu desaparecimento.
seu papel. Aceita-se, atualmente, que exerceria papel protetor frente às in-
Os agentes secundários são os anaeróbios, Gardnerella vaginalis,
fecções gonocócicas por causarem alterações no muco cervical que dificul-
Haemophilus influenzae, bacilos gram-negativos entéricos e Streptococcus
tariam a ascensão dos micro-organismos ao trato genital superior. Quanto
agalactiae, constituintes da flora vaginal ou provenientes do meio externo.
às infecções por clamídia, os anticoncepcionais orais poderiam ser agentes
Assim, conclui-se que DIP é de etiologia polimicrobiana.
facilitadores devido à ectopia cervical associada ao seu uso.
Quanto à propagação de germes ao trato superior, a principal forma
O hábito de realizar duchas vaginais eleva o risco de DIP, pois contri-
é por continuidade (propagação planimétrica ascendente). É o mecanismo
bui para alterações na flora vagina, dano epitelial e disrupção do tampão
segundo o qual ocorre a disseminação da clamídia e do gonococo. Mais ra-
mucoso cervical, fatores que facilitam o desenvolvimento de DIP.
ramente, os germes da endocérvice e do endométrio podem propagar-se
via linfática, como se verifica com o Actinomices israelli e algumas cepas
de estreptococos. ■■ QUADRO CLÍNICO
A sintomatologia apresentada varia muito, desde casos assintomáticos até
■■ EPIDEMIOLOGIA situações em que há dores excruciantes. Assim, deve-se suspeitar de DIP
em toda mulher sexualmente ativa que apresente dor abdominal baixa e
Entre os vários aspectos epidemiológicos, serão analisados aqueles mais
de início recente. Outras queixas, embora inespecíficas, como irregulari-
relevantes com a intenção primária de traçar o perfil da paciente de alto
risco. Esses dados são necessários, em particular, nos casos em que o dade menstrual, dispareunia ou secreção vaginal intensa, também devem
diagnóstico se confunde com outras entidades mórbidas, mormente as do alertar para a possibilidade de DIP.
trato gastrintestinal (TGI). Assinalam-se, entre os principais fatores, a ida- Para o diagnóstico, de acordo com as orientações do Centers for Dise-
de, a atividade sexual, os métodos anticoncepcionais, a história pregressa ase Control and Prevention (CDC), empregam-se os seguintes parâmetros:1
de doença sexualmente transmissível (DST) ou de DIP, o estado socioeco- 1 | Parâmetro mínimo para suspeição de salpingite: presença de descon-
nômico e a manipulação inadequada do trato genital. forto no exame pélvico ao mobilizar o colo uterino, o útero ou os anexos
A idade constitui um dos principais fatores de risco para o seu desen- uterinos.
volvimento. Verifica-se que cerca de 70% das mulheres com DIP têm 25 2 | Se um dos seguintes parâmetros complementares está presente, a
anos ou menos e que 33% têm sua primeira infecção antes dos 19 anos. A especificidade do diagnóstico aumenta:
o
adolescência representa o maior fator de risco, não apenas pelas elevadas temperatura oral acima de 38,3 C;
incidências de gonococcia e infecções clamidianas nesse segmento, como corrimento vaginal mucopurulento ou purulento;
também por adolescente apresentar frequentemente uma ectopia cervical aumento de leucócitos no esfregaço cervical;
fisiológica que permite maior aderência dos micro-organismos infeciosos elevação das provas de atividade inflamatória (velocidade de he-
à cérvice uterina. Uma adolescente sexualmente ativa de 15 anos de idade mossedimentação [VHS] ou proteína C-reativa);
apresenta um risco de adquirir DIP de 1:8, ao passo que uma mulher acima identificação de infecção cervical por Neisseria gonorrhoeae ou
de 24 anos de idade, de 1:80. Chlamydia trachomatis.
Como, na grande maioria dos casos, o agente etiológico encontra-se 3 | Critérios específicos:
ligado às DST, epidemiologicamente, a DIP comporta-se como tal. Por isso, sinais de endometrite na avaliação histomorfológica de amostra
a mulher com múltiplos parceiros apresenta risco 4 a 6 vezes maior de endometrial;
desenvolver DIP do que a monogâmica. A história de episódio anterior da exames de imagem (RM, TC ou US transvaginal) mostrando espes-
doença eleva em 2 a 3 vezes o risco de aparecimento de um novo episódio, samento tubário ou achado de piossalpinge, com ou sem líquido
pelo dano que o epitélio mucoso da tuba sofre. As infecções do trato geni- livre na cavidade ou presença de abscesso tubo-ovariano;
484 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
ATENÇÃO!
■■ RAQUEL MARTINS ARRUDA
Como a DIP é considerada uma doença adquirida por contato sexual,
■■ RODRIGO DE A. CASTRO
o(s) parceiro(s) com o(s) qual(is) a paciente teve contato nos 60 dias
que antecederam o diagnóstico deve(m) receber cobertura antibiótica
para clamídia e gonococcia. Por esse mesmo motivo, outras DSTs de-
vem ser investigadas, enfatizando-se as hepatites B e C, a lues e o HIV. A síndrome da bexiga hiperativa é definida como presença de urgência
miccional, geralmente acompanhada de noctúria e aumento de frequência
486 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Nas pacientes com bexiga hiperativa neurogênica, é obrigatória a in- contrair a musculatura do soalho pélvico, reduzindo a sensação de urgên-
vestigação do trato urinário alto, além dos exames específicos para cada cia e adquirindo a capacidade de alcançar o banheiro.
afecção. A melhora sintomática pode demorar até cerca de três meses para
Os questionários de qualidade de vida constituem-se no método de ser percebida e os fatores preditivos mais importantes para o sucesso de
escolha para avaliar presença, severidade e impacto dos sintomas, visto tratamento são a motivação e a aderência da paciente. Apesar da ausên-
que a anamnese, além da baixa acurácia, não é reprodutível. Além disso, cia de complicações e de efeitos colaterais, a taxa de desistência é de até
a identificação e a caracterização de fatores relacionados à qualidade de 37%. Os exercícios perineais são contraindicados em pacientes com com-
vida em pacientes com diversos sintomas do trato urinário baixo podem prometimento da cognição.
auxiliar no desenvolvimento de medidas preventivas, diagnósticas e te- A eletroestimulação envolve a aplicação de estímulos elétricos no
rapêuticas. soalho pélvico, seja por meio de eletrodos externos (vaginais, retais, ti-
biais etc.) ou internos (implantados por cirurgia). A inibição vesical se faz à
custa de dois reflexos medulares, ambos com fibras aferentes dos nervos
ATENÇÃO! pudendos. Há ativação de fibras eferentes dos nervos hipogástricos para o
detrusor e para os gânglios pélvicos e, ao mesmo tempo, inibição de fibras
Como a bexiga hiperativa é uma síndrome, seu diagnóstico é clínico. A
eferentes dos nervos pélvicos no núcleo sacral da micção.
hiperatividade do detrusor é um diagnóstico urodinâmico.
Pulsos bifásicos, alternados e de curta duração (1,5 ± 1 ms), são
preferíveis, por minimizar o risco de cauterização da mucosa e diminuir o
Tal exame não é indicado de rotina nas pacientes com bexiga hipe- consumo de energia. A frequência deve ser entre 5 e 25 Hz.
rativa. As taxas de cura e melhora a curto prazo variam de 50 a 90%. Os
índices de sucesso após um ano ou mais do término do tratamento variam
de 30 a 80%. Os principais efeitos colaterais são dor, irritação vaginal,
■■ TRATAMENTO infecção urinária e vaginal.
O tratamento da bexiga hiperativa e da hiperatividade do detrusor é es- A eletroestimulação é contraindicada em casos de incontinência uri-
sencialmente clínico, e este, por sua vez, divide-se em não farmacológico e nária por defeito esfincteriano, usuárias de marca-passo cardíaco, durante
farmacológico. Assim, tratamentos invasivos e cirúrgicos devem ser reser- a gravidez, na presença de distopias acentuadas e em mulheres com de-
vados a casos selecionados, refratários às terapêuticas habituais. nervação completa do soalho pélvico.
As pacientes devem ser orientadas de que o objetivo da terapêutica
é amenizar os sintomas e promover melhora na qualidade de vida, visto TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
que, na maioria das vezes, não há cura. Os princípios do tratamento são: Constitui a segunda linha de tratamento da bexiga hiperativa. Idealmente
aumentar o volume urinado por micção; e reduzir episódios de urgência e deve ser indicado como adjuvante ao tratamento comportamental e fisio-
de urgeincontinência e a frequência miccional. terapêutico.
Outros medicamentos (ainda não disponíveis no Brasil) nuir o risco de desenvolvimento de anticorpos, recomenda-se um intervalo
Cloridrato de trospium: anticolinérgico com estrutura de amina de pelo menos três meses entre as aplicações e a utilização da menor dose
quaternária; dessa forma, não atravessa a barreira hematencefá- possível.
lica. Como seu metabolismo é mínimo, o risco de interações me- Os efeitos colaterais descritos são: dor; infecção urinária (13 a 15%);
dicamentosas é bem baixo, o que facilita em casos de pacientes retenção urinária (mais comum nos casos neurogênicos); hematúria; boca
que utilizam vários medicamentos. Apresenta eficácia e segurança seca; constipação; e incontinência fecal. Raramente podem aparecer fra-
semelhante aos outros anticolinérgicos. Os principais efeitos cola- queza muscular generalizada e dificuldade respiratória.
terais são a boca seca (10,7%) e a constipação (8,5%). O procedimento deve ser contraindicado em pacientes que não acei-
Fumarato de fesoterodina: liberado pela FDA em outubro de 2008. tem ou que não consigam realizar autocateterismo. Também são contrain-
Após absorção oral, é rápido e extensivamente metabolizado por dicações infecção urinária, hipersensibilidade à toxina, gravidez, lactação,
esterases plasmáticas, de tal forma que apenas o seu metabólito obstrução infravesical e afecções neuromusculares (p. ex.: miastenia grave).
ativo é detectado no plasma. Esse metabólito é a 5-hidroximetil
NEUROMODULAÇÃO SACRAL
tolterodina (mesmo metabólito de tolterodina), responsável por
toda a sua ação antimuscarínica. A fesoterodina está disponível em Consiste no implante cirúrgico de eletrodos na raiz nervosa sacral S3 e de
comprimidos de 4 mg e de 8 mg. um gerador de impulsos elétricos, implantado no subcutâneo.
Trata-se de uma alternativa terapêutica reservada para casos graves
refratários aos tratamentos convencionais. Menos invasiva do que o trata-
ATENÇÃO! mento cirúrgico convencional, preserva a integridade anatômica do trato
urinário.
A paciente deve ser orientada de que o objetivo do tratamento é a O mecanismo de ação não está completamente conhecido, mas acre-
melhora da qualidade de vida (na grande maioria das vezes não há dita-se que os impulsos elétricos atuem tanto em fibras aferentes quanto
cura). O tratamento farmacológico deve ser, idealmente, um adjuvante em eferentes.
às terapias comportamental e fisioterapêutica. A implantação do eletrodo é realizada em duas etapas. A primeira é a
fase de teste, em que se implanta o eletrodo permanente, o que contribuiu
para diminuir as complicações e taxas de falso-negativo do procedimento.
TOXINA BOTULÍNICA O eletrodo é posicionado com auxílio de radioscopia. Às pacientes que
Neurotoxina produzida pela bactéria anaeróbia Clostridium botulinum, a apresentam resposta positiva após 1 a 4 semanas (melhora subjetiva e
toxina botulínica tem sido indicada, em casos de bexiga hiperativa, para melhora > 50% no diário miccional) é oferecido o implante definitivo. As
pacientes refratários aos tratamentos convencionais, tanto neurogênicos taxas de sucesso variam de 60 a 75%.
quanto idiopáticos. As complicações mais comumente descritas são: dor no local do im-
O mecanismo de ação não é completamente conhecido. Sabe-se que plante (21 a 25%); dor no local de implantação do gerador (17%); migra-
a toxina atua na proteína SNAP-25, inibindo a exocitose de vesículas pré- ção do eletrodo (9 a 16%); infecção (7%); e retenção urinária (2%).
-sinápticas que contêm acetilcolina, com consequente denervação química
local e reversível, que, por sua vez, leva a uma paralisia flácida e à atrofia TRATAMENTO CIRÚRGICO
muscular. Além dessa ação principal, estudos demonstraram que a toxina Opção de exceção, reservada aos casos intratáveis por outros métodos
botulínica atua em fibras nervosas aferentes, bloqueando a liberação de conservadores. Há cinco classes:
trifosfato de adenosina (ATP), peptídeo relacionado ao gene calcitonina 1 | Ressecção da inervação sacral da bexiga, por meio de secção bilateral
(CGRP), substância P, receptor vaniloide V1, entre outros. do nervo hipogástrico.
Entre os sete subtipos de toxina botulínica existentes (A a G), são 2 | Distensão vesical com destruição dos nervos e gânglios da parede da
utilizados clinicamente os subtipos A e B, em especial o A. A aplicação, bexiga. Trata-se de método utilizado no tratamento da cistite intersticial
realizada com cistoscópio (rígido ou flexível), é um procedimento minima- crônica, porém verificou-se que promove diminuição da espasticidade ve-
mente invasivo, que pode ser realizado ambulatorialmente, com anestesia sical por períodos variáveis de tempo.
local. 3 | Ressecção parcial dos gânglios hipogástricos e dos nervos do para-
Segundo a Revisão Cochrane publicada em 2007, a utilização da to- métrio.
xina botulínica no tratamento da bexiga hiperativa é extremamente pro- 4 | Injeção de fenol no trígono vesical ou nos paramétrios, como alter-
missora. Na revisão, todos os estudos randomizados (oito) apresentaram nativa à ressecção de gânglios e nervos. Os sintomas costumam retornar
resultados favoráveis ao uso da toxina. Diversos autores relataram me- após um ano.
lhora significativa na qualidade de vida, com redução dos episódios de 5 | Aumento cirúrgico da capacidade vesical, com interposição de seg-
urgência miccional (70 a 75%), urgeincontinência (42 a 87%), noctúria e mento intestinal ou autoampliações vesicais.
frequência urinária. Alguns estudiosos também referem melhora impor-
tante dos parâmetros urodinâmicos, como as capacidades cistométricas,
o volume urinado, a complacência vesical e o volume de aparecimento de REVISÃO
contrações involuntárias do detrusor. Afecção muito comum, a prevalência da bexiga hiperativa, caracte-
A maioria dos autores utiliza a dose de 200 a 300 unidades, mas a risticamente, aumenta com o avançar da idade.
dose ideal não está estabelecida. Também não existe consenso com rela- A incontinência urinária está presente em apenas um terço à meta-
ção à diluição ótima, ao número e à frequência de injeções e segurança a de dos casos.
longo prazo. O estudo urodinâmico não está indicado para todas as pacientes.
A melhora sintomática, dura, em média, nove meses (6 a 14 meses). O tratamento inicial deve ser, sempre que possível, a adoção de me-
Aplicações repetidas parecem ser tão eficazes quanto à primeira, aparen- didas gerais associada com o treinamento vesical e a fisioterapia.
temente sem aumento no risco de efeitos colaterais. Entretanto, para dimi-
490 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Ainda na inspeção, é preciso analisar a presença de distopias genitais, O primeiro está indicado nos casos de ausência de defeito esfincteria-
a integridade dos músculos do soalho pélvico, o trofismo e a presença de no e de distopia genital leve. As opções são medicamentos ou fisioterapia
dermatite amoniacal. do soalho pélvico.
Perda ao esforço +
VLPP entre
VLPP > 90 cm/H2O VLPP < 60 cm/H2O urgência ou contração
60-90 cm/H2O
não inibida
vertidamente a manobra de Valsalva, o cone é expulso. Desse modo, a As indicações de sling sintético são cirurgia primária para IUE, recor-
paciente se conscientiza sobre a contração correta da musculatura. Em se- rências, defeito esfincteriano e incontinência tipo mista. As taxas de cura
guida, os pesos são aumentados progressivamente. A sensação de perda variam entre 80 e 98%. Atualmente, são considerados padrão-ouro no
do cone vaginal durante a deambulação estimula a contração involuntária tratamento da IUE.
dos músculos do soalho pélvico, fortalecendo-os. As complicações intraoperatórias dos slings sintéticos retropúbicos
são perfuração vesical (ao redor de 6%) e, mais raramente, sangramento
Eletroestimulação com formação de hematoma, perfuração da mucosa vaginal, lesão de tra-
Acarreta a contração do esfincter externo da uretra e a contração dos mús- to urinário, intestinal ou de grandes vasos. As pós-operatórias são reten-
culos levantadores do ânus. É empregada por meio de sonda vaginal, com ção urinária, urgência miccional ou urgeincontinência, hematoma pélvico,
alta frequência (50 a 100 Hz) e alta amperagem (> 25 mA). Deve-se lem- ITU e erosões vaginal, uretral ou vesical.
brar que as contrações realizadas voluntariamente pela paciente são mais Os slings transobturatórios podem evitar as cicatrizes retropúbicas
eficazes do que as obtidas por estímulo elétrico. No entanto, nem sempre de correções prévias de incontinência urinária; têm baixo risco de lesões
a paciente é capaz de contrair voluntariamente seus músculos. Nesses ca- vesicais, intestinais ou vasculares e reduzem a disfunção urinária pós-
sos, a eletroestimulação torna-se uma opção válida. -operatória. No entanto, têm eficácia menor do que os retropúbicos, parti-
cularmente nos casos de defeito esfincteriano intrínseco. As complicações
TRATAMENTO CIRÚRGICO desse tipo de sling são perfuração da mucosa vaginal, retenção urinária,
Embora o tratamento clínico possa ser indicado em parte das pacientes, urgência miccional de novo, erosão vagina e dor em raiz da coxa.
nos casos de incontinência urinária moderada ou grave e naquelas com A mais nova geração de slings heterólogos são os chamados mini-
distopias genitais, o tratamento cirúrgico se impõe. -slings, compostos pela mesma faixa, porém de menor comprimento, que
Entre as várias técnicas descritas, descrevem-se as cirurgias de colpo- se situa, desse modo, apenas na região suburetral, evitando o forame ob-
fixação (ou colpossuspensão) retropúbica, pelas técnicas de Burch ou de turador e o espaço retropúbico. No momento, esse tipo de sling vem sendo
Marshall-Marchetti-Krantz, e as de alça, também conhecidas como slings pouco utilizado, por estudos terem comprovando sua baixa eficácia.
(autólogos, heterólogos ou sintéticos). Nos casos de uretra sem mobilida-
de, existem ainda as injeções periuretrais. ATENÇÃO!
Colpofixação retropúbica Deve-se sempre corrigir as lesões do soalho pélvico que promovem a
Consiste na fixação do tecido paravaginal no ligamento ileopectíneo, por distopia urogenital associada à incontinência urinária de esforço. As
laparotomia ou laparoscopia. Durante muitos anos, foi o padrão-ouro no roturas perineais, quando não tratadas corretamente, pioram os resul-
tratamento da IUE, tendo sido substituída por técnicas minimamente inva- tados cirúrgicos em longo prazo.
sivas, como os slings. Atualmente, só é empregada em casos de IUE sem
defeito esfincteriano, particularmente quando há indicação de outra ci-
rurgia via abdominal, como histerectomia, ooforoplastia ou ooforectomia. Injeções periuretrais
De gordura autóloga ou de colágeno, teflon ou silicone, as injeções periu-
Slings treais devem ser reservadas apenas aos casos refratários às demais técni-
Os slings autólogos podem ser de parede vaginal ou de aponeurose, em cas, em particular quando há lesão esfincteriana sem hipermobilidade do
que se utilizam, respectivamente, faixa de mucosa vaginal ou aponeurose colo vesical. A injeção pode ser efetuada via trans ou periuretral, com 1
do músculo reto do abdome (ou de fáscia lata), criando-se um novo su- ou 2 mL às 3, 6 e 9 horas, logo abaixo na submucosa da uretra, sob visão
porte para a uretra, que funcionará como mecanismo esfincteriano. A cis- uretrocistoscópica.
toscopia é um passo obrigatório da cirurgia para confirmação de que não
houve passagem de fio inabsorvível no lúmen vesical.
REVISÃO
As taxas de sucesso nos slings de mucosa vaginal variam de 35% a
93%. Nos slings aponeuróticos, giram em torno de 85%. Entre as com- A incontinência urinária de esforço significa perda involuntária de
plicações pós-operatórias mais frequentes, citam-se a retenção urinária urina, causando danos econômico, social e psicológico às mulheres;
e a hiperatividade do detrusor, e em menor grau, infecção de ferida ab- suas três apresentações são: hipermobilidade do colo vesical, defei-
dominal, infecção urinária e prolapso genital. No entanto, a retirada da to esfincteriano intrínseco da uretra e incontinência urinária mista.
faixa de aponeurose aumenta o tempo operatório e pode predispor ao O diagnóstico da incontinência urinária deve ter anamnese e exame
aparecimento de hérnias incisionais. físico detalhados, buscando caracterizar volume de perda, diminui-
Assim, outros materiais foram desenvolvidos na forma de kits cirúrgi- ção de força muscular e presença de distopias genitais, bem como
cos, utilizando materiais sintéticos, mais empregados atualmente. análise de sedimento urinário e urocultura.
O material ideal para fabricação do sling sintético deve ser quími- Os tratamentos para IUE podem ser: medicamentoso (com a utiliza-
ca e fisicamente inerte, não carcinógeno e mecanicamente forte; não ção de estrogênios); fisioterapêutico (exercícios perineais, biofeed-
causar reações inflamatórias ou alérgicas; ser esterilizável; não ser fi- back, cones vaginais e eletroestimulação); ou cirúrgico (slings, col-
sicamente modificado pelo tecido vivo; e ter formato conveniente para pofixação retropúbica, injeções periuretrais).
o uso clínico.
Em geral, os slings são compostos por faixa de polipropileno monofi-
lamentar, macroporosa, em forma de kits cirúrgicos com dispositivos para ■■ LEITURAS SUGERIDAS
sua inserção. Requerem dissecção vaginal mínima, com a faixa colocada Bianchi-Ferraro AM, Jarmy-DiBella ZI, de Aquino Castro R, Bortolini MA, Sartori
sem tensão sob a uretra média, sem necessidade de fixação e possibilitan- MG, Girão MJ. Randomized controlled trial comparing TVT-O and TVT-S for
do que a cirurgia seja realizada com anestesia local. Podem ser inseridos the treatment of stress urinary incontinence: 2-year results. Int Urogynecol
de modo retropúbico ou transobturatório. J. 2014;25(10):1343-8.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 493
Bo K. Pelvic floor muscle training is effective in treatment of female stress urinary ■■ QUADRO CLÍNICO
incontinence, but how does it work? Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct.
Algumas mulheres apresentam prolapso genital ao exame físico, porém
2004;15(2):76-84.
de Leval J, Waltregny D. New surgical technique for treatment of stress urinary são assintomáticas. A maioria das pacientes refere sensação de peso va-
incontinence TVT-Obturator: new developments and results. Surg Technol ginal ou massa exteriorizando-se pela vagina, acompanhada ou não de
Int. 2005;14:212-21. dor no baixo ventre, ocasionada pela distensão dos tecidos pélvicos. Os
Petros P, Ulmsten U. An integral theory and its method for the diagnosis and sintomas são progressivos, agravando-se com a idade e com a progressão
management of female urinary incontinence. Scand J Urol Nephrol Suppl. do prolapso. Algumas vezes, o prolapso genital se apresenta com úlceras e
1993;153:1-93. sangramentos, devido a pequenos traumas com as vestes, além da atrofia
Ulmsten U, Henriksson L, Johnson P, Varhos G. An ambulatory surgical procedure tecidual.
under local anesthesia for treatment of female urinary incontinence. Int
Sintomas urinários – como disúria, polaciúria, urgência miccional,
Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 1996;7(2):81-5.
incontinência ou retenção urinária, isolados ou associados – dependem
da idade, da duração e do grau de prolapso; e é comum associá-los a
sintomas intestinais. A incontinência urinária de esforço é mais frequente
nos casos de prolapso genital inicial. Os prolapsos maiores dificultam o
83 esvaziamento vesical, por compressão da uretra, por excessiva angulação
uretrovesical ou pela posição extrabdominal da bexiga. Muitas vezes,
torna-se necessária a redução manual do prolapso para que a paciente
DISTOPIA GENITAL consiga urinar.
Algumas mulheres com prolapso genital têm incontinência urinária
oculta, aquela detectada após a redução do prolapso, ou, em outras pa-
■■ ZSUZSANNA ILONA KATALIN DE JÁRMY DI BELLA lavras, após a recolocação do colo vesical em sua posição correta utili-
zando-se pessários ou pinças durante a manobra de Valsalva no exame
■■ MARAIR GRACIO FERREIRA SARTORI
ginecológico. É considerada oculta, pois a paciente não tem os sintomas
de perda urinária aos esforços que, por vezes, se manifesta apenas no
pós-operatório da distopia genital. Portanto, é fundamental esclarecer a
Embora não seja uma afecção grave, a distopia genital afeta intensamente paciente que ela pode vir a ficar incontinente após uma cirurgia de corre-
a qualidade de vida, causando impacto psicológico, social e higiênico na ção de prolapso genital.
maioria das mulheres acometidas. Os sintomas intestinais incluem tenesmo; incontinência de flatos, lí-
A definição de distopia genital, também denominada prolapso geni- quidos ou fezes; constipação; e necessidade de manobras digitais para a
tal, refere-se ao deslocamento dos órgãos pélvicos femininos ocasionado evacuação.
por enfraquecimento dos seus sistemas de suspensão e sustentação. As queixas sexuais raramente são espontâneas, mas sabe-se que o
O suporte dos órgãos pélvicos se dá pelos sistemas de suspensão prolapso genital pode atrapalhar a atividade sexual em razão de constran-
constituídos por ligamentos (paramétrios anterior, lateral e posterior) e de gimento de algumas mulheres, além de causar desconforto.
sustentação formados por fáscias e músculos, particularmente o levantador
do ânus com os seus feixes puborretal, pubococcígeo e ileococcígeo. Quan-
do ocorre enfraquecimento da fáscia endopélvica, os músculos do soalho ■■ DIAGNÓSTICO
pélvico são solicitados e, gradativamente, instala-se a distopia genital. Eminentemente clínico, baseia-se na anamnese, no exame físico realizado
Quando acomete a parede vaginal anterior, ocorre descenso da uretra e/ ao repouso e na manobra de Valsalva. Os exames de imagem, como a ul-
ou da bexiga, denominados uretrocele e cistocele. Por sua vez, o enfraque- trassonografia (US) do soalho pélvico tridimensional e a ressonância mag-
cimento da parede vaginal posterior levará à retocele e à enterorretocele nética (RM) dinâmica, são interessantes para a avaliação dos comparti-
e, por fim, a descida do ápice da vagina se manifestará clinicamente pelo mentos prolapsados, porém não são necessários na maior parte dos casos
prolapso uterino ou de cúpula vaginal. O mais comum é que exista associa- para a conduta terapêutica. O estudo urodinâmico pode ser realizado nas
ção dos compartimentos danificados, por exemplo, procedência da parede mulheres com queixas urinárias concomitantes.
vaginal anterior e apical, ou apical e posterior. Nas situações de eversão Para fins de padronização do prolapso genital, adotou-se a classifi-
completa da vagina, todos os compartimentos estão prolapsados. cação POP-Q, que de forma objetiva permite o estadiamento do prolapso,
Estima-se que cerca de 50% das mulheres que tiveram ao menos um informando-se os compartimentos afetados. Para tanto, mensuram-se os
parto vaginal desenvolvam algum grau de prolapso genital ao longo da seguintes pontos:
vida. O risco de uma paciente se submeter à cirurgia para o tratamento de Aa – mensuração do deslocamento na manobra de Valsalva do
prolapso genital até os 80 anos de idade é de 11%. ponto preestabelecido a 3 cm para dentro do anel himenal da pa-
Embora a distopia genital seja uma condição multifatorial, existem rede vaginal anterior. É um ponto teórico que varia de –3 a +3,
fatores de risco bem estabelecidos para o desenvolvimento do prolapso onde –3 significa ausência de prolapso; 0, prolapso na altura do
genital, que são: anel himenal; e +3, o grau máximo possível de prolapso;
idade; Ap – mensuração do deslocamento na manobra de Valsalva do
paridade; ponto preestabelecido a 3 cm para dentro do anel himenal da pa-
histerectomia prévia; rede vaginal posterior. É um ponto teórico que varia de –3 a +3,
cirurgias prévias para a correção de distopia genital; onde –3 significa ausência de prolapso; 0, prolapso na altura do
alterações do colágeno. anel himenal; e +3, o grau máximo possível de prolapso;
Outras condições potenciais seriam o parto vaginal, a obesidade, Ba – mensuração do deslocamento na manobra de Valsalva do
peso do maior filho ao nascer, a ocorrência de tosse crônica e o histórico ponto de maior prolapso da parede vaginal anterior. Este ponto
familiar de prolapso genital. pode ser igual ao Aa ou é mais prolapsado. Em um prolapso muito
494 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Obesidade, com aumento do risco em 20% a cada 10 kg de ganho polaciúria, noctúria, retenção urinária e até incontinência (talvez pelo
ponderal, em virtude da diminuição da síntese hepática de globu- deslocamento da junção uretrovesical). Essa neoplasia pode, raramente,
lina ligadora de hormônio sexual (SHBG) e do aumento da estrona gerar poliglobulia e hipoglicemia, por mecanismos ainda não totalmen-
circulante, fruto da conversão periférica da androstenediona pela te esclarecidos.
aromatase do tecido gorduroso.
Entre os fatores de proteção, destacam-se:
Paridade, com diminuição do risco de desenvolver mioma a cada ATENÇÃO!
gravidez, reduzindo-se a 1/5 após cinco gestações.
Grande parte das pacientes permanece assintomática e os leiomio-
Anticoncepcional oral combinado, por mecanismos não totalmen-
mas são achados de exame ginecológico ou ultrassonográfico. Nas
te esclarecidos, com redução de 17% para o risco de leiomioma a
sintomáticas, os principais sinais e sintomas são sangramento uterino
cada cinco anos de uso.
anormal (menorragia, hipermenorragia, polimenorreia, metrorragia),
Tabagismo, com diminuição em 18% no risco de desenvolver mio-
dismenorreia secundária, dor ou sensação de pressão pélvica, aumen-
mas com o consumo de 10 cigarros por dia, uma vez que o tabagis-
to do volume abdominal, tumor palpável, sintomas urinários ou gas-
mo cria um estado hipoestrogênico.
trintestinais, infertilidade e abortamento.
■■ FISIOPATOLOGIA
O leiomioma pode causar infertilidade se obstruir ambas as tubas ou
A transformação neoplásica ocorre em etapas, nas quais as células adqui-
se tiver componente submucoso, ocupando o leito de implantação ovular
rem um novo fenótipo, decorrente de alterações genômicas que levam à
na cavidade uterina, impedindo-a ou causando perda precoce. Com a mio-
perda de controle do seu crescimento. Os esteroides sexuais atuam local-
mectomia nessas situações, há uma queda pela metade na incidência de
mente e medeiam o crescimento tumoral pela ligação aos seus receptores
abortamento, de 40 para 20%. Vale lembrar que, em face da infertilidade
(ER, PR), seguida da ativação de proto-oncogenes, fatores de crescimento
conjugal, deve-se investigar todos os outros fatores antes de assumir o
(fator de crescimento insulina-símile I [IGF-I], fator de crescimento endo-
mioma como responsável; isso porque só em 2 a 5% dos casos não há
telial vascular [VEGF], fator de crescimento epidermal [EGF] e fator de
outras causas associadas.
crescimento transformador beta [TGF-β], entre outros) e seus receptores.
Embora o estradiol seja apontado como o principal responsável nesse pro-
cesso, evidências bioquímicas, patológicas e clínicas demonstram que a ■■ DIAGNÓSTICO
progesterona, agindo por meio dos seus receptores celulares, promove Baseia-se nos sintomas mencionados e nos dados obtidos no exame físi-
proliferação tumoral. Parece concebível, portanto, que estradiol e proges- co, salientando-se a percepção de tumor hipogástrico, bocelado, de con-
terona atuem em sinergia, estimulando a proliferação celular e o cresci- sistência fibroelástica e com alguma mobilidade laterolateral. No toque
mento do tecido neoplásico. No entanto, até o momento não se conhecem vaginal, identifica-se útero aumentado de volume, por vezes irregular,
os mecanismos fisiopatológicos moleculares dessa afecção e permanece e confirma-se tratar de tumor do corpo uterino quando os movimentos
incerto se a ação dos esteroides sexuais estaria relacionada com a inicia- realizados no colo, digitalmente ou com instrumentos, são transmitidos
ção neoplásica ou se apenas promoveria o crescimento do tumor, iniciado ao tumor abdominal. Tal manobra é muito útil na diferenciação entre
por outros mecanismos. tumor ovariano e uterino, porém falha nos casos de leiomiomas subse-
É interessante, ainda, notar que a resposta dos miomas à privação
rosos pediculados e nos tumores ovarianos aderidos ao corpo do útero.
hormonal não é uniforme, ou seja, os tumores não têm graus semelhantes
Entre os exames complementares que podem auxiliar no diagnós-
de regressão, provavelmente em virtude de diferenças de vascularização,
tico, a ultrassonografia (US) ocupa lugar de realce. Deve ser sempre
composição celular e comportamento biológico.
solicitada, para esclarecimento diagnóstico e seguimento. O exame
ultrassonográfico transvaginal tem maior capacidade de detecção que
■■ QUADRO CLÍNICO o transabdominal, salvo para miomas subserosos com pedículo longo,
A hipermenorragia, um dos sintomas da afecção, relacionada com os leio- sendo melhor na identificação de nódulos submucosos e intramurais.
miomas intramurais, é explicada por quatro mecanismos básicos: aumento Porém, a US perde precisão em pacientes com úteros grandes e/ou com
da cavidade sangrante; prejuízo da contratilidade das fibras miometriais; múltiplos nódulos.
estase venosa endometrial; maior produção de prostaciclinas no endomé- A ressonância magnética (RM) é excelente método de imagem para
trio adjacente ao nódulo, fato que prejudic aria a formação de trombos e diagnóstico de leiomiomas, considerada mais precisa para sua detecção
a vasoconstrição endometrial, tão necessários para o controle do sangra- e localização. Tem, contudo, desvantagens no custo e no tempo gasto
mento menstrual. O mioma submucoso relaciona-se, em geral, a episódios para execução. Sua principal indicação, no momento, é para diferenciar
de metrorragia, que decorrem de erosões na superfície do nódulo, pelo nódulos subserosos de tumores ovarianos sólidos e para a avaliação pré-
atrito e eventual isquemia. Os nódulos subserosos não alteram os padrões -operatória de miomectomia ou embolização das artérias uterinas (EAU).
menstruais, sendo frequentemente assintomáticos ou causadores de sin- A imagem obtida varia de acordo com o grau de degeneração, necrose e
tomas de compressão pélvica. calcificação. Permite diferenciar, quando necessário, o leiomioma da ade-
O leiomioma causa, quase sempre, dismenorreia secundária de ca- nomiose e sugerir a possibilidade de leiomiossarcoma quando há perda
ráter progressivo. A dor aguda pode decorrer de degeneração vermelha de limites; porém, ainda não há exame com alta acurácia para diagnóstico
ou, também, de torção de nódulos pediculados e expulsão de nódulos pré-operatório dessa afecção.
submucosos (mioma parido). Quando o útero estiver em retroversão, Contudo, a US continua sendo o método de escolha para avaliação
mesmo que o tumor não seja muito grande, pode causar lombossa- inicial da pelve e, em muitos casos, é a única técnica subsidiária utilizada.
cralgia, que, em geral, piora no período pré-menstrual. O leiomioma, Merecem ainda ser consideradas a histerossalpingografia e a histerosco-
por seu tamanho e sua posição, pode comprimir a bexiga e provocar pia. A primeira poderá detectar falhas de enchimento da cavidade uterina
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 497
e oferecer informações quanto à normalidade ou não das tubas, fato de após o término do tratamento. Os efeitos adversos habituais dos a-GnRH
suma importância nas pacientes com queixa de infertilidade. A histerosco- são provenientes do hipoestrogenismo criado (sintomas vasomotores,
pia tem a vantagem de identificar com clareza a topografia, vascularização alteração do humor, vagina seca e osteopenia), que, às vezes intensos,
e demais características dos nódulos submucosos. podem ser parcialmente minimizados com terapia de acréscimo (add-back)
com estrogênios, combinações estroprogestativas ou tibolona. O uso de
a-GnRH se faz de maneira selecionada no pré-operatório de cirurgias uteri-
■■ TRATAMENTO
nas, buscando-se melhorar os níveis de hemoglobina e diminuir o sangra-
A terapêutica depende da idade da paciente, do tipo e da intensidade dos mento intraoperatório; porém, questiona-se se seus efeitos colaterais se-
sintomas, do desejo reprodutivo, do tamanho e da localização dos nó riam maiores que os possíveis benefícios, muitas vezes não confirmados,
dulos. Pode ser clínica (expectante ou medicamentosa) e intervencionista em especial no que se refere à melhora das condições intraoperatórias. Por
ou cirúrgica (conservadora ou radical). isso, sua indicação é restrita.
O dispositivo intrauterino liberador de levonorgestrel (LNG-IUS –
Mirena®), além de ser considerado um método contraceptivo de grande
ATENÇÃO!
eficácia, apresenta efeito adicional de redução do fluxo menstrual, com
Entre as principais indicações de tratamento salient am-se as quei- ações sobre o endométrio e o nódulo tumoral. O LNG-IUS pode melhorar
xas de sangramento (em especial quando associado à anemia), de a qualidade de vida e os parâmetros hematológicos, sendo uma alterna-
dor e de infertilidade, assim como quando há comprometimento de tiva à histerectomia, porém pode ter resultados limitados e ser deslocado
órgãos adjacentes. Contudo, indica-se conduta expectante em mu- ou mal posicionado na presença de miomas submucosos.
lheres assintomáticas ou quando a intensidade dos sintomas não Há alternativas ainda em avaliação, como antagonistas do GnRH,
justifica tratamento mais agressivo, em particular quando próxima inibidores da aromatase, antiprogestogênios, moduladores seletivos dos
à menopausa. receptores de estrogênio (SERM) e de progesterona (SPRM), inibidores da
angiogênese, assim como se espera por terapêuticas genéticas. No mo-
mento, destacamos o ulipristal, um SPRM com resultados muito semelhan-
Algumas justificativas para tratamento devem ser encaradas com cau- tes ao a-GnRH, mas com menos efeitos colaterais. No entanto, tal substan-
tela, para não dizer com restrição: cia ainda não se encontra liberada para uso no Brasil.
1 | Facilitar terapia hormonal na pós-menopausa. Não se justifica indicar Cumpre enfatizar que a reposição hormonal na pós-menopausa não
histerectomia para prevenir o crescimento dos nódulos durante terapia está contraindicada. Geralmente, pequenas doses de estrogênio (p. ex.:
hormonal, já que alguns medicamentos (tibolona, raloxifeno), bem como estradiol, 1 mg/dia) associadas ou não a pequenas doses de progestogênio
os estrogênios em pequenas doses, não aumentam o volume nem o nú- (p. ex.: noretisterona, 1 mg/dia) não fazem o mioma crescer. Porém, se isso
mero de nódulos. acontecer, pode-se interromper periodicamente a medicação para permitir
2 | Aumento do volume tumoral. Essa justificativa baseia-se na possibi- a regressão tumoral. Outra possibilidade é administrar tibolona, que, em
lidade de ser um leiomiossarcoma; porém, não se estabeleceu qual a ve- geral, não altera o volume do nódulo, ou raloxifeno, que, com frequência,
locidade habitual de crescimento do leiomioma. Portanto, salvo situações o diminui. Não se cogita, pois, nessas condições, indicação de cirurgia,
de crescimento muito rápido, confirmado em avaliações sucessivas, essa mas apenas modificar a hormonioterapia. A propósito, é muito comum o
indicação deve ser encarada com cuidado. achado de pequenos nódulos que não merecem consideração especial, em
3 | Grandes dimensões do mioma ou do útero. Embora seja critério popu- exames ultrassonográficos de mulheres na pós-menopausa tardia, com ou
lar, não deve ser utilizado isoladamente, mas sim em situações extremas, sem hormonioterapia.
quando há comprometimento de outros órgãos, como compressão de vias O tratamento cirúrgico pode ser subdividido em conservador e
urinárias e hidronefrose, por exemplo. radical. O tratamento radical tem suas principais modalidades nas his-
Quando o tratamento clínico medicamentoso é necessário, um gru- terectomias subtotal e total, pela via vaginal ou abdominal. Quando
po farmacológico interessante é o dos anti-inflamatórios não hormonais a via é abdominal, a técnica pode ser laparotômica, laparoscópica ou
(AINH), que podem auxiliar no controle do sangramento menstrual, por laparoscópica robô-assistida (daVinci Surgical System®), com múltiplas
inibir a síntese de prostaciclinas. No geral, diminuem em cerca de 30% o ou única incisão. Associamos sempre a salpingectomia bilateral como
sangramento, embora essa afirmação não se aplique aos compostos com forma de prevenir o câncer de ovário, uma vez que boa parte dos tumo-
ácido acetilsalicílico. Outro grupo a ser citado é o dos antifibrinolíticos, res epiteliais desses órgãos se originam nas tubas uterinas. Em tempo,
que podem ser utilizados isoladamente ou associados aos AINH, inibin- vale reforçar que a histerectomia subtotal, do ponto de vista menstrual
do a fibrinólise na superfície endometrial, com consequente redução do e reprodutivo, é considerada radical por não preservar essas funções.
sangramento menstrual. Combinações estroprogestativas, anticoncep- Também, que não há vantagens do ponto de vista sexual ou de susten-
cionais combinados e progestagênios podem ser usados para controle tação do soalho pélvico com a preservação do colo uterino. Por isso,
do fluxo menstrual, sem alterar a história natural de crescimento dos acredita-se que sua principal indicação seja a dificuldade intraoperató
miomas. Poucos autores analisaram a resposta aos androgênios. Porém, ria por aderências ou distorções anatômicas extremas, a necessidade
alinham-se entre os efeitos colaterais a acne, o hirsutismo, a seborreia de intervenção em pacientes com valores limítrofes de hemoglobina ou
e o ganho de peso. Assim, não são medicamentos usados na prática em obesas com pelve profunda. Em casos selecionados, com a certe
clínica diária. za de que se fará adequado seguimento pós-operatório e quando os
Os análogos agonistas do GnRH (a-GnRH) reduzem o volume dos nó- exames de rastreamento cervical prévios são sucessivamente normais,
dulos e do útero em até 50% e causam amenorreia. São administrados na pode-se, sempre de acordo com a paciente, optar de saída pela histe-
forma de depósito, uma vez por mês por três meses, ou uma ampola de rectomia subtotal.
efeito trimestral. Seu resultado máximo é atingido, em geral, entre 8 e 12 Quando se pensa em tratamento conservador e se propõe miomec-
semanas e o mioma retorna aos padrões iniciais em cerca de quatro meses tomia, alguns pontos devem ser considerados. Como os leiomiomas, em
498 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
dois terços dos casos, são múltiplos, as recidivas não são desprezíveis. e em pacientes com alergia ao contraste ou contraindicação clínica para a
Estima-se em 25%, em 10 anos, a necessidade de novas terapêuticas, e a realização de arteriografia (insuficiência renal, coagulopatia, entre outras).
recidiva será menor quando o nódulo for único. A miomectomia múltipla Falha de tratamento parece ocorrer nos casos de adenomiose associada.
é procedimento difícil e de maior tempo cirúrgico do que a histerectomia, Realiza-se RM para planejamento da EAU, avaliando com precisão a loca-
além de sangrar mais, haver maior risco de aderências e necessidade de lização de nódulos, tamanho, relação com a cavidade uterina e presença
nova intervenção para tratamento das complicações, como a obstrução de adenomiose.
intestinal. As indicações de miomectomia, segundo o American College Outro método para tratamento do mioma uterino, porém ainda pouco
of Obstetricians and Gynecologists (ACOG), são: pacientes com desejo re- ®
incorporado à prática terapêutica no Brasil, é o ExAblate . Trata-se da apli-
produtivo e/ou infertilidade; e aquelas que querem preservar o útero por cação de ultrassom focalizado guiado por RM (HIFU), método que empre-
outras razões. Pode ser executada por laparotomia, histeroscopia, laparos- ga feixes ultrassônicos de alta intensidade (500 a 700 W/cm²) direcionados
copia ou laparoscopia robô-assistida (daVinci Surgical System®). Quando a determinado ponto por poucos segundos, aumentando a temperatura
realizada a laparoscopia, os nódulos são retirados da cavidade abdomi- no tecido alvo (de 55 a 90˚C), com consequente necrose de coagulação.
nal por culdotomia, minilaparotomia ou fatiamento por diversas técnicas. Em estudos iniciais, com casuística limitada, 71% das mulheres apresen-
Capítulo especial entre as miomectomias deve ser reservado à cirurgia his- taram melhora dos sintomas após seis meses e 50% após um ano. Entre-
teroscópica, em especial para pacientes jovens, com miomas submucosos, tanto, houve necessidade de complementação com tratamento cirúrgico
sintomáticas e com desejo reprodutivo. A histeroscopia permite avaliar a em 21% das pacientes avaliadas. Os eventos adversos encontrados foram
cavidade uterina antes da cirurgia, assim como, por meio de ressectoscó- leves e dizem respeito à febre, dor abdominal, náusea, dor lombar ou em
pios, proceder à remoção dos nódulos submucosos com mínimo dano ao membros inferiores, infecção urinária ou genital, além da possibilidade de
endométrio. Destaca-se que o índice de gestação após miomectomia em queimaduras na pele (principalmente em cicatrizes). Recomenda-se cuida-
pacientes inférteis se situaem torno de 50%, com índices de 70% para do com nódulos muito próximos ao intestino ou à bexiga, pelo risco de le-
pacientes sem fatores associados (85% de gestações espontâneas) e de 33 são térmica. Até o momento, não se sabe se o tratamento pode prejudicar
a 45% para casais com outros fatores. a função do miométrio adjacente e a extensão de aplicação e, por isso, seu
Atenção deve ser dada à correção da anemia pré-operatória. Para uso não é indicado para mulheres com desejo reprodutivo.
tanto, tenta-se bloquear a menstruação, durante algum tempo, enquanto
se faz suplementação de ferro. Quando a escolha para tal fim recair sobre
a pílula anticoncepcional, alguns cuidados se fazem necessários. Parar a REVISÃO
medicação dois dias antes do ato operatório, de tal forma a não haver san-
gramento por privação (economia de hemoglobina). Aconselha-se a profi- O leiomioma do útero é o tumor mais comum do trato genital femi-
laxia da tromboembolia venosa (TEV), seja com meia elástica e bomba de nino, acometendo até 50% das mulheres no menacme.
compressão pneumática, deambulação precoce e/ou heparinas de baixo Mulheres assintomáticas, em que os miomas são apenas achados
peso molecular (HBPM) no perioperatório. É importante que o patologista de exame, devem ser acompanhadas e monitoradas em conduta
seja avisado sobre o uso de hormônios, para que possa interpretar com expectante.
maior exatidão os achados histopatológicos. Nas sintomáticas, as queixas mais frequentes relacionam-se a san-
Outras opções terapêuticas incluem a miólise, a ablação endometrial gramento uterino anormal, dismenorreia, pressão pélvica, infertili-
e a embolização das artérias uterinas (EAU). A última, técnica multidis- dade e abortamento.
ciplinar conservadora para tratamento de leiomiomas sintomáticos, Entre as alternativas de tratamento conservador, a miomectomia é
consiste na oclusão da irrigação sanguínea para os tumores por meio a principal alternativa para as pacientes com desejo reprodutivo.
da injeção de micropartículas (microesferas, álcool polivinílico ou espon- A histerectomia é o tratamento definitivo do leiomioma, que, por
jas) até a obstrução do fluxo sanguíneo arterial, levando à necrose e à sua vez, é a mais frequente indicação para a retirada do útero.
redução volumétrica dos leiomiomas (30 a 50%), com desenvolvimen-
to de circulação colateral para o miométrio adjacente. Apresenta alívio
dos sintomas a curto prazo em 75 a 90% dos casos, porém com 25% de ■■ LEITURAS SUGERIDAS
reintervenções por recorrência em até 10 anos, com maior probabilidade Bosteels J, Weyers S, Puttemans P, Panayotidis C, Van Herendael B, Gomel V,
quanto mais nova for a paciente. As possíveis complicações são rela- et al. The effectiveness of hysteroscopy in improving pregnancy rates in
cionadas à arteriografia (hematomas, lesão e trombose arterial, reação subfertile women without other gynaecological symptoms: a systematic
anafilática ao contraste) ou à embolização (dor abdominal, endometrite, review. Hum Reprod Update. 2010;16(1):1-11.
piometra, necrose séptica, febre, mialgia, amenorreia e falência ovariana Islam MS, Protic O, Giannubilo SR, Toti P, Tranquilli AL, Petraglia F, et al. Uterine
prematura). leiomyoma: available medical treatments and new possible therapeutic
options. J Clin Endocrinol Metab. 2013;98(3):921-34.
Relata-se taxa de gestação de 40% após EAU, porém sem diferen-
Gomes MTV, Castro RA, Silva IDCG, Baracat EC, Lima GR, Girão MJBC. Análise da
ciar casais previamente férteis de inférteis. Além disso, há risco de ame-
patogênese do leiomioma do útero. Femina 2006; 34 (6): 381-7.
norreia por prejuízo endometrial, possível redução da reserva ovariana,
Levy G, Hill MJ, Beall S, Zarek SM, Segars JH, Catherino WH. Leiomyoma:
assim como aumento da taxa de abortamento e de placentação anôma-
genetics, assisted reproduction, pregnancy and therapeutic advances. J
la em gestações pós-embolização, associada a acretismo e hemorragia Assist Reprod Genet. 2012;29(8):703-12.
pós-parto. Por isso, sua indicação para mulheres com desejo reprodutivo Munro MG. Uterine leiomyomas, current concepts: pathogenesis, impact on
é conduta de exceção, quando os riscos da miomectomia são muito eleva- reproductive health, and medical, procedural, and surgical management.
dos. Sua utilização como técnica adjuvante prévia à miomectomia, redu- Obstet Gynecol Clin North Am. 2011;38(4):703-31.
zindo volume tumoral e sangramento intraoperatório, pode ser útil, mas Sami Walid M, Heaton RL. The role of laparoscopic myomectomy in the
apenas em casos selecionados. É contraindicada em leiomiomas subsero- management of uterine fibroids. Curr Opin Obstet Gynecol. 2011;23(4):
sos pediculados e submucosos, pelo risco de necrose e desprendimento, 273-7.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 499
Músculo
bulbocavernoso
A B
Músculo
obturador interno
C D
FIGURA 85.1 ■ (A) Palpação do músculo bulbocavernoso. (B) Palpação dos músculos pubococcígio, puborretal e íliococcígio. (C) Manobra para
a palpação do músculo obturador interno: solicita-se à paciente que cruze a perna homolateral ao músculo que se deseja palpar, força-se a adução
do joelho e solicita-se à paciente que resista ao movimento; o músculo contrairá e ficará evidente à palpação. (D) Palpação da placa do músculo
levantador do ânus, na parede posterior da vagina, justalateralmente ao reto.
Entretanto, se os sintomas forem intensos ou estiverem associados a vagi- ■■ ATENDIMENTO À MULHER COM DOR
nismo, endometriose profunda, vulvodínea, espasmo de soalho pélvico, as PÉLVICA CRÔNICA
pacientes devem ser seguidas por equipes multidisciplinares especializadas,
Uma vez que a paciente se apresenta a avaliação médica com a queixa
compostas por ginecologistas, fisioterapeutas, psicólogos e sexólogos.
de dor pélvica crônica, anamnese minuciosa, associada a exame físico
completo, direcionado aos sintomas são fundamentais. Para a elucida-
DISMENORREIA ISOLADA
ção do quadro, o profissional, seja ele ginecologista ou de qualquer
Se a dismenorreia for um sintoma primário, sem outras causas aparentes, outra especialidade, deve conhecer e investigar bem as causas relacio-
de características cíclicas e de intensidade leve a moderada, podem ser nadas à DPC, para que se ofereça a conduta inicial adequada ou para
acompanhadas em serviços primários e respondem bem à associação de que se encaminhe a paciente a especialidade ou serviço de maior com-
anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) e contraceptivos hormonais, se plexidade.
não houver o desejo de gestação no momento. Na ausência de resposta clí-
nica ou sinais de gravidade, um serviço especializado deve ser procurado.
ATENÇÃO!
CONDIÇÕES PSICOLÓGICAS: DEPRESSÃO,
ANSIEDADE E SOMATIZAÇÃO Além de realizar o encaminhamento conforme a demanda do quadro e
as características dos sintomas da mulher, é fundamental levar-se em
A associação de condições psicológicas e DPC é muito frequente, podendo
conta seu desejo reprodutivo.
sua prevalência chegar até 60-70%. Não há evidência de que estas se-
jam a causa principal da dor, sendo atribuída, na literatura mundial, como
consequência da dor, na maioria dos casos. No entanto, há evidências Importante salientar que diversas afecções podem coexistir, sendo
concretas de que a depressão pode ser uma causa primária de dor crônica. uma decorrente da outra ou independentes. A compreensão de todas
O rastreamento inicial pode ser feito de forma objetiva, com auxílio as possíveis causas de DPC é fundamental para que haja atendimento
de questionários simples e validados, que auxilia na seleção das pacientes adequado, evitando propedêutica desnecessária e tratamentos empíricos
que devem ser encaminhadas à avaliação psicológica. Outros instrumen- inócuos.
tos diagnósticos, como SRQ, podem servir para identificar somatização e Sugere-se, a seguir, dois fluxogramas para facilitar a compreensão e
transtornos psicóticos, para identificação do quadro e início de tratamento organizar a condução dos casos, considerando, inicialmente dores pélvicas
específico. crônicas de características cíclicas e acíclicas (Fluxogramas 85.1 e 85.2).
502 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
CÍCLICA
Desejo gestacional?
Sim Não
Pré-natal e Serviço de
incentivo ao reprodução
aleitamento de baixa
materno complexidade
ACÍCLICA
Sim Não
Fisioterapia, Dismenorreia
Endometrioma ≥ 4 cm; relaxante ou dispareunia
lesões de íleo, apêndice muscular, AINE
ou ureter; lesões e ACH
suboclusivas
de retossigmoide,
endometrioma de parede Sim Não
abdominal
Sucesso Falha
Seguimento com
Centro Outros dados proctologia
especializado positivos ou Seguimento em Centro de
Marcadores de
em EDT e DPC exame negativo UBS referência
gravidade
(Referência terciário
terciária)
Prova
terapêutica US
com ACH Positivo Negativo
especializada
Prova
Endometrioma ≥ 4 cm;
terapêutica
Sucesso Falha lesões de íleo, apêndice
com ACH
ou ureter; lesões
suboclusivas
Seguimento Centro de retossigmoide,
especializado endometrioma de parede
em EDT e DPC abdominal Sucesso Falha
(Referência
terciária)
Centro Seguimento Centro
especializado especializado
em EDT e DPC em EDT e DPC
(Referência (Referência
terciária) terciária)
por vezes incapacitantes, quando analgésicos opioides se fazem necessá- O uso de contraceptivo hormonal com o objetivo de combater quadro
rios para a manutenção da qualidade de vida. de cólica menstrual está relacionado à endometriose e deve servir como
Outra queixa clínica frequente é a dispareunia de profundidade, que alerta nessa população, principalmente nas jovens em que esta medicação
prejudica sobremaneira a vida sexual do casal. Resulta da presença de se mostrar ineficiente no alívio das dores.
lesões em região retrocervical, ligamentos uterossacrais e escavação reto- Até o momento, nenhum marcador foi capaz de ajudar de forma signi-
-uterina. Esses pontos anatômicos são atingidos durante o ato sexual pro- ficante no diagnóstico da endometriose. O Ca-125, usado por muito anos
vocando intenso desconforto. Com frequência, dor ao coito é progressiva, com esse objetivo, mostrou reduzida especificidade e sensibilidade e, por-
levando à deterioração significativa da qualidade de vida sexual e conju- tanto, já não é recomendado. O diagnóstico deve, então, ser elaborado a
gal. Encontramos, com frequência, secundários a doença, espasmos da partir do quadro clínico e confirmado por exame físico. Os exames subsi-
musculatura de soalho pélvico, que devem ser diagnosticados e tratados, diários devem ser solicitados para auxiliar no estadiamento da doença, o
a fim de se restabelecer a vida sexual. que será determinante na escolha terapêutica. De acordo com o resultado
Outro sinal característico é a infertilidade. Decorre principalmente de do exame físico, podemos suspeitar de doença superficial, profunda ou
alterações anatômicas que modificam a anatomia pélvica, comprometen- ovariana.
do a relação entre tubas e ovários dificultando, portanto, a fecundação. Solicitamos a ultrassonografia transvaginal (USTV) para auxiliar no
Outros eventos envolvidos na doença colaboram com a perda do potencial diagnóstico do endometrioma de ovário. Para este fim, mostrou elevada
reprodutivo. A intensa atividade inflamatória peritoneal próxima às lesões sensibilidade e especificidade. Quando existe suspeita de doença profun-
endometrióticas tornam o ambiente peritoneal hostil aos gametas e está da, é essencial pedirmos uma ressonância magnética (RM) de pelve, ou
relacionada a distúrbios de ovulação. Além disso, estudos encontraram, ultrassonografia (US) especializada (com preparo intestinal) que permite
nas mulheres com a doença, menor expressão de genes endometriais topografar as lesões e determinar a profundidade da invasão. A USTV, com
(HOXA-10 e HOXA-11) fundamentais para uma adequada implantação em- preparo intestinal feita por médico com ampla experiência, demonstrou
brionária. sensibilidade e especificidade semelhante à ressonância na avaliação das
Lesões implantadas na escavação vesicouterina podem provocar sin- lesões intestinais. Outro exame, menos solicitado, é a ecocolonoscopia,
tomas irritativos vesicais, como disúria, dor à repleção vesical, urgência capaz de determinar com precisão a profundidade de lesões em reto e
miccional e hematúria cíclica, quando invadem a mucosa vesical. Da mes- sigmoide.
ma forma, quando as lesões atingem o trato gastrintestinal (TGI) observa-
mos sintomas como diarreia cíclica (em geral, coincidente com o período ■■ TRATAMENTO
menstrual), dor à eliminação de gases ou evacuação (disquezia), alteração O tratamento deve ser escolhido de acordo com a queixa principal da pa-
de calibre das fezes e mais raramente enterorragia quando alcançam a ciente: dor pélvica ou infertilidade.
mucosa intestinal. Quando o objetivo for atenuar o quadro álgico, devemos considerar
Raramente a endometriose atinge órgãos distantes provocando sinto- as três formas da doença: peritoneal superficial, profunda ou ovariana.
mas relacionados aos locais afetados, como derrame pleural (DP) na endo- Diante das formas peritoneais da doença, iniciamos o tratamento de
metriose pulmonar e sintomas neurológicos na forma cerebral. forma conservadora, ou seja, pelo tratamento medicamentoso, desde
O exame físico é etapa fundamental na avaliação. O toque bimanual que afastada a possibilidade de obstrução intestinal ou ureteral. O ob-
revela dor à mobilização do colo uterino e útero com mobilidade reduzi- jetivo é atenuar ao máximo o estímulo exercido pelos estrogênios, seja
da. Retroversão fixa e nodulações em fórnice vaginal posterior são forte- reduzindo seus níveis séricos ou bloqueando os receptores estrogênicos
mente sugestivas de doença profunda. Ovários podem ser palpados com celulares. Os contraceptivos hormonais possuem em sua fórmula pro-
volume aumentado, fixos e com consistência cística quando envolvidos gestagênios, hormônio que atua de forma inibitória sobre receptores
por endometrioma. Vale ressaltar que a forma ovariana mostrou ser um estrogênicos além de favorecer a transformação do estradiol em uma
marcador da doença profunda, pois 50% das mulheres com endometrio- molécula mais fraca, a estrona. No caso da endometriose superficial,
ma podem apresentar lesões peritoneais, e eventualmente lesões intes- iniciamos o tratamento medicamentoso com esses compostos, utiliza-
tinais concomitantes. dos de forma contínua. Até o momento, nenhum estudo demonstrou
superioridade de algum contraceptivo no combate à endometriose. Ou-
tra alternativa aos contraceptivos combinados são os progestagênios
■■ DIAGNÓSTICO
como acetato de medroxiprogesterona, noretisterona ou dienogeste.
Estudos realizados em muitos países (Brasil, Inglaterra, EUA, Espanha, Itá- Outros métodos hormonais, os injetáveis, anel vaginal, adesivo e o
lia) indicam que o tempo médio para que o diagnóstico de endometriose, DIU liberador de levonorgestrel, podem ser utilizados da mesma forma.
desde os primeiros indícios clínicos, seja feito é de aproximadamente sete Em revisões sistemáticas e metanálise, a literatura é clara em afirmar
anos. Este atraso dificulta o combate à doença, pois permite que lesões que não há superioridade de nenhum composto em relação a outro,
pequenas e superficiais progridam até doenças profundas. Nestes está- sendo a escolha baseada nas características pessoais da paciente, nos
dios avançados, encontramos deterioração importante na qualidade de efeitos colaterais e no custo. Após seis meses de tratamento, caso haja
vida das mulheres, sendo, também, o tratamento menos eficaz, de maior persistência do quadro, optamos pelo tratamento cirúrgico. Quando a
morbidade e maior probabilidade de recidiva. paciente apresenta doença profunda, os análogos de GnRH (gosserre-
lina, acetato de leuprolide e nafarrelina), que provocam bloqueio sobre
os receptores de GnRH hipofisários, levando o organismo a um estado
ATENÇÃO! de hipoestrogenismo severo, devem ser utilizados como medicação de
Para impedir este atraso no diagnóstico da endometriose, devemos primeira escolha. Deve ser utilizada pelo período máximo de seis meses,
valorizar os sintomas iniciais na adolescência. sempre associado à terapia de adição hormonal, que alivia os efeitos
colaterais similares aos da menopausa, minimizam a perda óssea e não
506 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
interferem no resultado terapêutico. No Setor de Algia Pélvica e En- sucesso. Dessa forma, o casal pode decidir junto ao médico o melhor tra-
dometriose da UNIFESP utilizamos os estrogênios equinos conjugados tamento a ser utilizado em cada caso.
(0,625) ou a tibolona (2,5 mg). Caso não haja melhora clínica após três
meses, indica-se o tratamento cirúrgico.
ATENÇÃO!
As pacientes com endometrioma de ovário apresentam pouca res- Qualidade tubária e o espermograma do parceiro precisam ser ava-
posta ao tratamento medicamentoso e, portanto, são encaminhadas com liados. Diante de condições tubárias desfavoráveis ou espermograma
frequência para laparoscopia. Da mesma forma, diante de lesões vesicais alterado, melhor utilizar as técnicas de reprodução assistida, deixando a
profundas, ureterais e intestinais oclusiva, indicamos tratamento cirúrgico laparoscopia como segunda opção. Quando existe dor pélvica concomi-
imediato. tante, optamos pela laparoscopia, que permite tratarmos as cólicas e a
O objetivo cirúrgico é a eliminação completa das lesões. Quando su- infertilidade ao mesmo tempo.
perficiais, podemos optar por remoção ou cauterização dos focos. O en- A conduta frente a um casal com indicação de fertilização in vitro
dometrioma de ovário deve ser removido através de cistectomia, realizada (FIV), na qual existe endometrioma é controversa. Alguns autores advo-
com máximo cuidado e mínima utilização de corrente elétrica para minimi- gam a exérese prévia ao procedimento, já outros acreditam que não há
zar a diminuição de reserva ovariana. prejuízo à taxa de sucesso da FIV na vigência de endometrioma. Entre-
Caso haja lesão intestinal, é recomendada equipe da gastrocirurgia tanto, não há dados na literatura que suportem a exérese sistemática dos
no ato cirúrgico. A exérese pode ser conservadora restrita ao nódulo en- endometriomas, previamente à FIV, sendo a cirurgia indicada apenas em
dometriótico (nodulectomia ou shaving) ou extensa (ressecção linear ou casos de falha sucessiva na fertilização. As opções para tratamento da in-
segmentar). Quando a lesão atinge as camadas musculares, é frequente fertilidade relacionada à endometriose profunda são a ressecção cirúrgica
que mais de 40% da circunferência intestinal esteja comprometida. Nesses dos focos endometrióticos e a FIV. Até agora nenhum estudo conseguiu
casos, a ressecção conservadora com rafia intestinal leva a significante esclarecer qual dessas opções é mais eficaz ou ainda se a associação das
redução do lúmen intestinal, favorecendo quadros oclusivos – realiza-se, duas supera os resultados atingidos por cada uma isoladamente, sendo a
então, uma ressecção segmentar. O mesmo princípio se aplica quando conduta extremamente individualizada.
há mais de uma lesão intestinal. Considerando a impossibilidade técnica
de eliminar completamente focos microscópicos nas doenças avançadas,
indicamos tratamento medicamentoso pós-cirúrgico por três meses com REVISÃO
análogos de GnRH. Endometriose é caracterizada pela presença de tecido semelhante
Quando alcançado o alívio dos sintomas, devemos reunir esforços ao endométrio fora do útero.
para evitar a recidiva da doença. A única forma de impedir a formação A cólica menstrual característica da endometriose diferencia-se da
de novos focos endometrióticos, uma vez que a paciente mantém os fa- dismenorreia habitual por ser progressiva, refratária ao tratamento
tores predisponentes à doença, é eliminar o fluxo retrógrado através do com antiespasmódicos e anti-inflamatórios, e por vezes incapaci-
bloqueio menstrual. Para isso, indica-se qualquer método contraceptivo tantes.
hormonal de forma contínua. Podemos optar, também, por ciclos longos, O tratamento deve ser escolhido de acordo com a queixa principal
orientando a paciente a interromper a pílula a cada três ou quatro meses, da paciente: dor pélvica ou infertilidade.
o que leva a menores taxas de sangramentos irregulares. Cumpre salientar A conduta frente a um casal com indicação de fertilização in vitro na
que o sistema intrauterino de levonorgestrel não deve ser utilizado em qual existe endometrioma é controversa.
mulheres operadas por endometrioma, já que este dispositivo não inibe
completamente a ovulação, permanecendo, portanto, ambiente estrogê-
nico no ovário, predispondo à recidiva. ■■ LEITURAS SUGERIDAS
Diante de formas avançadas da doença, quando não há mais dese-
Abrão MS, Petraglia F, Falcone T, Keckstein J, Osuga Y, Chapron C. Deep
jo reprodutivo, principalmente após cirurgias sucessivas, podemos optar endometriosis infiltrating the recto-sigmoid: critical factors to consider
pela remoção das lesões associada à histerectomia. A retirada das gô- before management. Hum Reprod Update. 2015;21(3):329-39.
nadas deve ser analisada criteriosamente, pesando os prós e contras da Burney R, Giudice LC. Pathogenesis and pathophysiology of endometriosis. Fertil
menopausa iatrogênica e a possibilidade de recidiva (a manutenção do Steril. 2012;98(3):511-9.
ovário aumenta em 7 vezes o risco). Dunselman GA, Vermeulen N, Becker C, Calhaz-Jorge C, D’Hooghe T, De Bie B,
Outra forma da doença de fisiopatologia distinta das manifestações et al. ESHRE guideline: management of women with endometriosis. Hum
peritoneais e ovarianas são os nódulos de parede sob cicatriz de cesárea Reprod. 2014;29(3):400-12.
ou miomectomia. Causam dor local e crescimento durante o catamênio. O Hudelist G, Fritzer N, Thomas A, Niehues C, Oppelt P, Haas D, et al. Diagnostic
delay for endometriosis in Austria and Germany: causes and possible
tratamento é exclusivamente cirúrgico e consiste na remoção do nódulo
consequences. Hum Reprod. 2012;27(12):3412-6.
com margem de segurança.
Streuli I, de Ziegler D, Santulli P, Marcellin L, Borghese B, Batteux F, et al. An
O tratamento das mulheres com endometriose e infertilidade deverá update on the pharmacological management of endometriosis. Expert Opin
ser pautado na idade da mulher, tempo de infertilidade, tratamentos já Pharmacother. 2013;14(3):291-305.
realizados e história familiar. Além disso, devemos ponderar, também, os Tosti C, Pinzauti S, Santulli P, Chapron C, Petraglia F. Pathogenetic mechanisms of
riscos do procedimento escolhido, assim como o custo e as chances de deep infiltrating endometriosis. Reprod Sci. 2015;22(9):1053-9.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 507
A possível participação etiopatogênica dos baixos teores das vitami- Deve ser enfatizada a importância do estado emocional sobre a insta-
nas A, E e B6 e o envolvimento do zinco, do cobre, do magnésio e do cálcio, lação, a persistência e a magnitude das queixas. O prognóstico, em geral,
que regulam a produção dos neurotransmissores e a regulação sanguínea é bom, havendo quem admita que tais pacientes são mais predispostas a
para o tecido nervoso, ainda são motivos de controvérsia. Em geral, a su- quadros depressivos.
plementação vitamínica, por si, não é superior ao tratamento farmacoló-
gico da síndrome. Contudo, a administração de cálcio e vitamina B6 em TRANSTORNO DISFÓRICO PRÉ-MENSTRUAL
pacientes com SPM teria bons resultados segundo metanálise de 2009 que Segundo o National Institute of Mental Health nos Estados Unidos, para
1
envolveu trabalhos da literatura. Contudo, há ainda necessidade de mais que a mulher apresente esse quadro, deve ter pelo menos cinco dos se-
estudos para comprovar a eficiência dessas substâncias na SPM. guintes sintomas na maioria dos ciclos menstruais do último ano:2
Aceita-se, então, que a SPM seja afecção psiconeuroendócrina com- 1 | humor deprimido, falta de perspectivas ou pensamentos autodepre-
plexa. Os fatores psicológicos participam também da síndrome. Em estudo ciativos;
clínico com uso de placebo para tratar pacientes com SPM, os autores ob- 2 | ansiedade ou tensão exacerbada;
servaram que quase 60% tiveram melhora dos sintomas após três meses 3 | labilidade emocional (p. ex., tristeza acentuada ou maior sensibilidade
de tratamento, correlacionando-a com a melhora do estado psicológico, à rejeição);
que influencia muito a sintomatologia da SPM. 4 | irritabilidade acentuada e persistente, ou problemas de relacionamen-
to pessoal;
5 | perda do interesse em atividades habituais (trabalho, escola, amigos
■■ QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO e lazer);
Apesar de relacionarem muitos sintomas com a síndrome, nenhum deles 6 | dificuldade de concentração;
é patognomônico. A manifestação do quadro clínico é bastante variada 7 | letargia, fadiga ou perda de energia;
e pode aparecer até 10 dias antes do catamênio, em geral. Desaparece 8 | alterações do apetite, com alimentação excessiva ou fissura por certos
quase sempre repentinamente ao se instalar o fluxo menstrual. A intensi- alimentos;
dade dos sintomas também é variável, desde exuberante em um ciclo até 9 | hipersônia ou insônia;
inexistente em outro. 10 | sensação de perda do autocontrole;
O diagnóstico da SPM é essencialmente clínico, com base na época de 11 | outros sintomas físicos, como hipersensibilidade ou aumento de vo-
aparecimento dos sintomas e em sua intensidade, não sendo necessários lume das mamas, cefaleia, dores musculares ou articulares, sensação de
exames subsidiários. Os exames clínicos geral e ginecológico, mesmo quan- “empachamento” ou ganho de peso.
do realizados no período de incidência dos sintomas, são pouco expressivos.
Os principais sintomas estão resumidos no Quadro 87.1. Segundo a Asso- DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
ciação Americana de Obstetrícia e Ginecologia, o principal critério de diag- Deve ser feito com distúrbios psicológicos e psiquiátricos, efeitos cola-
nóstico é quando os sintomas aparecem cinco dias antes da menstruação. terais de medicamentos, distúrbios neurológicos, distúrbios endócrinos,
NEUROPSÍQUICOS
MISCELÂNEA
doenças da mama, doenças ginecológicas, distúrbios gastrintestinais, fa- durante a fase lútea, mas que somente pode aliviar esse sintoma. Esse
diga crônica e estresse excessivo e contínuo. fármaco é análogo triazólico 1,4 benzodiazepínico que se liga com alta afi-
nidade ao complexo receptor GABA-benzodiazepina. Pode causar depen-
dência, mas restringir o agente apenas ao período lúteo pode ajudar um
■■ TRATAMENTO
subgrupo de mulheres. Deve ser ministrado com cautela em pacientes com
Não há tratamento farmacológico específico para SPM devido ao desco- miastenia grave, insuficiência respiratória ou apneia do sono. É preciso ter
nhecimento de sua causa exata. cuidado com a interrupção do medicamento, devido ao efeito rebote, e
Como se trata de um distúrbio do ciclo ovulatório, a inibição da ovu- seu uso não é recomendado quando a paciente deseja engravidar devido
lação pode ser a primeira escolha de tratamento. Para isso, podem ser aos relatos de malformações congênitas a partir de seu emprego. Outros
usados os anticoncepcionais hormonais combinados, principalmente nos fármacos desse grupo são lorazepam, midazolam, diazepam, clomaze-
esquemas de 24 comprimidos com quatro dias de pausa ou nos esquemas pam, bromazepam, etc. Recomenda-se o acompanhamento das pacientes
estendidos ou contínuos. O acetato de medroxiprogesterona injetável não sob uso desses medicamentos também com o psiquiatra.
deve ser utilizado como primeira escolha devido aos seus possíveis efei- A prática de exercícios físicos aeróbicos e regulares, que liberam as
tos depressivos, aumento de peso e retenção hídrica. Salienta-se que, sob tensões emocionais e ativam o sistema de endorfinas, deve ser estimu-
uso de anticoncepcionais hormonais, dependendo do progestagênio, as lada. A partir da observação de que a atividade da melatonina pode ser
pacientes podem ter efeitos similares aos da SPM. É possível empregar modulada por estímulos luminosos, há quem proponha, como medida
combinados por VO, injetável ou anel vaginal. Deve-se ainda mencionar terapêutica auxiliar, o encurtamento do sono na fase lútea, pois a perma-
que é possível empregar os progestagênios isoladamente, por VO (deso- nência de mais tempo na claridade desativaria a enzima conversora 5-hi-
norgetrel) ou implante subcutâneo. Contudo, estudo de revisão sistemáti- droxi-indolmetiltransferase, determinando, com isso, maior quantidade de
ca e meta-análise da Cochrane mostrou que a progesterona isoladamente serotonina e menor de melatonina, e melhorando os quadros depressivos.
não seria efetiva no tratamento da SPM. O DIU com liberação do levonor- A enxaqueca menstrual pode ser tratada com AINHs, como indometa-
gestrel pode, no início, melhorar os sintomas (primeiros meses), mas, pos- cina, mefenamato, ibuprofeno, naproxeno, nimessulida, tenoxicam, melo-
teriormente, com a atrofia endometrial e a redução dos níveis circulatórios xicam ou piroxicam. Deve-se iniciar a medicação uma semana antes do dia
desse progestagênio (30% das mulheres podem ter anovulação), muitas o o
em que habitualmente surge a dor até o 2 ou o 3 dia do fluxo menstrual.
mulheres podem referir o retorno dos sintomas da SPM após o primeiro Recomenda-se à paciente utilizar método de anticoncepção durante esse
ano de uso. esquema de tratamento com anti-inflamatórios. Contudo, o seu uso a lon-
go prazo torna-se inviável devido aos efeitos colaterais.
A ergotamina (1 a 6 mg ao dia) e o sumatriptano (50 a 100 mg ao
ATENÇÃO! dia) são excelentes medicações para a fase aguda, já que reduzem a va-
Nos casos mais leves, analisar psicoterapia com o objetivo de ade- sodilatação responsável pela crise de dor. O sumatriptano pode, ainda,
rência ao tratamento e diminuição da sintomatologia. Nos casos mais ser ministrado via subcutânea (ampola com 6 mg). Para a profilaxia da
graves (síndrome disfórica), há necessidade do acompanhamento pelo crise de enxaqueca, pode-se empregar metisergida por quatro meses,
psiquiatra. na dose de 4 a 6 mg ao dia, por 20 dias, seguidos por pausa de uma
semana, betabloqueadores (propranolol), na dose de 80 mg ao dia, ou,
ainda, flunarizina (25 mg ao dia). A administração de estrogênios (p. ex.,
Quadro de depressão profunda exigiria medicação psicotrópica, prin- o o
estradiol transdérmico 50 µg no 26 ou 27 dia do ciclo) na tentativa
cipalmente os inibidores seletivos de recaptação da serotonina (ISRS), au- de abrandar a queda hormonal, que seria a responsável pela vasocons-
mentando a disponibilidade desse hormônio pelo neurônio pós-sináptico trição-vasodilatação e, portanto, pelo quadro doloroso, apresenta bons
e melhorando, assim, a sintomatologia. Vários estudos clínicos randomi- resultados. Alternativa seria o uso de progestagênios isolados continua-
zados mostraram que o uso de ISRS como terapêutica é altamente eficaz mente ou pílula combinada em esquema de 24 com quatro dias de pausa
para o transtorno psíquico da SPM. Foram avaliadas mais de 300 mulheres ou contínuo.
durante a fase lútea do ciclo menstrual, levando-se em conta os seguintes No caso da mastalgia, há relatos de bons resultados com carbegolina
sintomas: tensão; irritabilidade; labilidade emocional; inchaço; sensibilida- e bromoergocriptina, que visam a reduzir a prolactina na fase lútea, dimi-
de mamária; e cefaleia. As mulheres receberam fluoxetina 20 mg, fluoxeti- nuindo a sintomatologia. Outros trabalhos mostram que o tamoxifeno ou
na 60 mg ou placebo, continuamente, durante seis ciclos menstruais, sendo o uso de ácidos graxos do tipo ômega 3 poderiam ter benefícios nesses
que a fluoxetina, em ambos os regimes de dose, foi superior ao placebo na sintomas. Contudo, muitas mulheres melhoram com os tratamentos ante-
redução dos sintomas desde o primeiro ciclo de tratamento. Outros ISRS riores (ISRS ou contraceptivo hormonal).
são paroxetina (20 a 60 mg ao dia), fluvoxamina (100 mg ao dia), citalo- Os sintomas físicos relacionados com a retenção hídrica podem ser
pram (20 a 40 mg ao dia) e sertralina (50 mg ao dia), substâncias que, em tratados com diuréticos. Salienta-se que a espirolactona (50 a 100 mg ao
metanálise recente,3 mostraram ser muito efetivas nos sintomas da SPM, dia) apresenta os melhores resultados. Contudo, algumas mulheres po-
tanto que alguns investigadores sugerem que deveriam ser a primeira linha dem referir mastalgia com o uso da espirolactona, o que pode restringir
de tratamento na SPM, incluindo a síndrome disfórica. Não devem ser as- o tratamento com esse fármaco. Alguns estudos mais antigos sugerem o
sociados com os inibidores da monoaminoxidase (IMOs), como fenelzina, uso de tiazídicos para o tratamento, como a bendroflumetiazida na dose
iproniazida, isocarboxazida, harmalina, nialamida, pargilina, moclobemida, de 2,5 mg ao dia. Contudo, não há trabalhos controlados e randomiza-
selegilina, toloxatona, tranilcipromina e outros. A associação pode resultar dos que mostrem os benefícios com esse tipo de fármaco. O emprego da
em efeitos colaterais que comprometem o sistema cardiovascular. A clomi- drosperinona em forma de pílula teria bons efeitos na retenção hídrica e
pramina (100 mg ao dia), apesar de ser um antidepressivo tricíclico, possui melhora da SPM.
atividade serotoninérgica superior à da sua classe. Apiridoxina (vitamina B6), na dose de 100 a 600 mg ao dia, pode au-
Quando os sintomas predominantes forem de ansiedade, uma boa xiliar no tratamento da SPM. Cofator na biossíntese de dopamina e de
alternativa é o alprazolam (0,25 a 0,50 mg, três vezes ao dia) ministrado serotonina a partir do triptofano, essa vitamina atua como reguladora da
510 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Etiologia
A causa da amenorreia secundaria pode estar situada no SNC, na hipófise,
Entre as causas uterinas destacam-se as adquiridas por infecções, irradia-
no ovário, no útero ou no trato genital inferior. Quando presente no SNC, a
ção e refratariedade endometrial.
amenorreia pode ser causada por lesão tumoral ou infiltrativa no hipotála-
As doenças granulomatosas e o hipotiroidismo com hiperprolacti-
mo ou ser de origem psicogênica, como anorexia nervosa, pesudociese,
nemia também podem ser causa de amenorreia. Outras causas referidas
amenorreia pós-pílula, hiperprolactinemia funcional e anovulação crônica,
são os tumores produtores de androgênio, uso crônico de corticoide ou
alem de poder aparecer após longos períodos de exercício físico intenso
doença de Cushing e doenças sistêmicas.
(amenorreia do atleta)
Diagnóstico Entre as causas de origem hipofisária, assinalam-se a síndrome da
Na anamnese de mulheres com amenorreia primária, devem-se coletar da- sela túrcica vazia (congênita ou após cirurgia, irradiação ou tratamento
dos sobre o desenvolvimento das mamas e dos caracteres sexuais secun- medicamentoso), a necrose da glândula (síndrome de Sheehan), os tu-
dários, bem como do aparecimento de pelos axilares e púbicos. Deve-se mores funcionantes, não funcionantes e secretores de hormônios protei-
também, questionar a paciente sobre nódulos nas regiões inguinais, que cos (hormônio do crescimento [GH], TSH, hormônio adrenocorticotrófico
podem representar as gônadas de indivíduos com a síndrome de Morris ou [ACTH], prolactina [PRL]), além dos craniofaringiomas.
feminização testicular (síndrome de insensibilidade androgênica) Em relação às causas ovarianas, as principais são síndrome dos ová-
A avaliação do desenvolvimento ponderoestatural é importante, prin- rios policísticos (SOP), falência ovariana prematura, síndrome do corpo lúteo
cipalmente quando há suspeita de disgenesia gonadal. Devem-se, ainda, persistente e tumores ovarianos produtores de androgênios. Entre as causas
pesquisar os antecedentes prévios de traumas, cirurgias e químio ou ra- uterinas, deve-se mencionar a síndrome de Asherman e a endometrite tu-
dioterapia. berculosa. O uso de substâncias cáusticas na vagina ou no útero, como mé-
todo abortivo ou de esterilização, pode ser também causa de amenorreia.
512 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Há, ainda, os chamados fatores xenotópicos ou extragenitais, como rante 10 dias (teste provocativo por progestagênios). Podem-se observar
alterações da tiroide e da suprarrenal, diabetes melito (DM) e iatrogêni- dois tipos de respostas: após 2 a 7 dias, surge (resposta positiva) ou não
ca (hormonal). Não se deve esquecer a forma tardia de defeito de síntese (negativa) o fluxo endometrial por deprivação progestacional.
da suprarrenal e das causas não endócrinas, como moléstias consuptivas, Se a resposta for positiva, pressupõe-se que:
hepatopatias, cardiopatias, nefropatias, processos infecciosos crônicos, a | Não há obstrução da drenagem do fluxo (amenorreia verdadeira).
queimaduras, quimioterapia antiblástica, radioterapia, choque elétrico e b | A cavidade do útero está livre.
desnutrição. c | O endométrio é responsável pela ação hormonal.
d | Há estrogênios circulantes, pois só há descamação endometrial por
Diagnóstico deprivação progesterônica se o endométrio for prévia e adequadamen-
Na investigação das amenorreias secundárias, deve-se pesquisar o uso de te sensibilizado ou trabalhado pelos estrogênios (proliferação). Com isso,
medicamentos e drogas e antecedentes de abortamentos ou de sangra- aparecem receptores de progesterona.
mento intenso pós-parto em que foi necessária a realização de cureta- e | Há certo funcionamento gonadal, mas não processo ovulatório do qual
gem uterina. È necessário inquirir, também, sobre a presença de secreção resulte a síntese de progesterona e o catamênio (menstruação).
mamária espontânea fora do período de gestação e amamentação. Além Se a resposta ao teste da progesterona for negativa, as seguintes hi-
disso, a presença de sintomas climatéricos precoces, como fogachos, pode póteses podem ser feitas:
fazer parte do quadro de falência ovariana precoce. a | Obstrução das vias de drenagem (amenorreia oculta).
Ainda na anamnese, deve-s e indagar sobre o desenvolvimento das b | Ausência de útero.
características sexuais secundárias e de sinais de hiperandrogenismo c | Útero presente com cavidade ocupada (gestação).
e avaliar a história menstrual. O conhecimento de antecedentes de tra- d | Inexistência de endométrio ou ausência de receptores de estrogênio;
tamento cirúrgico, químio e radioterápico, o uso prévio de substâncias portanto, não há resposta à progesterona.
cáusticas na vagina ou no útero e o registro de doenças crônicas, como a e | Ausência de atividade estrogênica prévia e/ou concomitante.
tuberculose, podem auxiliar no diagnóstico. Uma vez afastadas as primeiras possibilidades pelo exame minucioso
No exame físico, deve-se aferir o peso e a estatura da paciente para da genitália e por outros procedimentos (histerometria, histerografia, US,
o calculo do índice de massa corporal (IMC), pois a obesidade mórbida ou histerossonografia e histeroscopia), prossegue-se com o tempo nº 2.
o emagrecimento excessivo ligado à anorexia nervosa podem ser causas
da amenorreia. Tempo nº 2
Em geral, devem-se procurar estrias, acne e pilificação, que apare- Ministrar estrogênios em dose suficiente e por tempo adequado para proli-
cem, em especial na SOP e na doença de Cushing e na forma tardia da ferar o endométrio, ou seja,1,25 a 2,5 mg de estrogênios conjugados por 20
hiperplasia congênita da suprarrenal. dias. Associar progestagênios (nas mesmas doses utilizadas no Tempo nº1)
nos 7 ou 10 últimos dias de tratamento. Dois tipos de resposta podem acon-
tecer: positiva, quando ocorrer fluxo menstrual, e negativa, quando após 2 a
ATENÇÃO! 10 dias, não houver qualquer evidência de descamação endometrial.
Ressalta-se que os sinais de virilização com presença de alopecia, alte- A resposta negativa confirma as possibilidades listadas no tempo nº 1
ração da voz e pilificação excessiva estão associados tumores ovaria- (com exceção do último item). Se a resposta for positiva, porém, conclui-se
nos ou de suprarrenal. que não existem estrogênios circulantes nessas mulheres, pelo menos não
o necessário para proliferar o endométrio. Essa resposta implica sediar a
causa da amenorreia no setor ovariano ou central (córtex cerebral, hipo-
No exame ginecológico específico, deve-se realizar expressão mamá- tálamo e hipófise) do aparelho reprodutor.
ria para avaliar a presença de descarga láctea. Além disso, o grau de tro- As disfunções ovarianas podem ser primárias ou secundárias. Na
fismo da vulva, da vagina e do útero, bem como o volume dos ovários, são primária, perante estímulos gonadotroficos normais, as gônadas não se
importantes para estabelecer a causa da amenorreia. A comprovação de manifestam. Na secundária, os ovários podem estar absolutamente nor-
permeabilidade da vagina pelo exame especular e da passagem do histe- mais, mas a disfunção se prende à falta de estímulo apropriado (alteração
rômetro pelo colo do útero também são úteis na avaliação da amenorreia. central). Para resolver essa dúvida, procede-se ao Tempo nº 3.
Em muitos casos de amenorreia, principalmente naqueles com pouca
sintomatologia, a dosagem hormonal é essencial. Logo, devem-se efetuar Tempo nº 3
as dosagens séricas de beta-hCG, prolactina, FSH, hormônio luteinizante Recorre-se a duas modalidades de procedimentos: a primeira correspon-
(LH), TSH, hormônios tiroidianos, glicemia de jejum e hemograma completo. de ao emprego de gonadotrofinas exógenas (FSH+LH ou FSH purificado)
A tomografia computadorizada (TC) e a RM são importantes nos qua- para observar a resposta ovariana mediante a dosagem dos estrogênios e
dros de adenoma de hipófise; a histerossalpingografia, a histerossono- mediante as modificações do muco cervical, do endométrio e das células
grafia ou a histeroscopia são utilizadas quando se suspeita de sinéquias esfoliadas da vagina. Eventualmente, quando a resposta é positiva, pode
uterinas. A US pélvica e da suprarrenal pode auxiliar na procura da causa haver perda sanguínea. A segunda é mais simples, porém exige mais re-
da amenorreia. cursos laboratoriais, uma vez que determina o teor das gonadotrofinas
Em alguns casos, é necessário utilizar recursos propedêuticos mais circulantes (FSH e LH). O achado de taxas elevadas sugere insuficiência
singelos, como a administração de hormônios, para localizar a causa da funcional dos ovários. Valores baixos, ao contrário, são coniventes com
amenorreia nos diversos setores do aparelho reprodutivo. Assim, reco- disfunção hipotálamo-hipofisária, sendo necessário saber qual o compar-
menda-se a seguinte metodologia na investigação da amenorreia primaria timento defeituoso. Para tanto, procede-se ao tempo nº 4.
e secundária.
Tempo nº4
Tempo nº 1 Ministram-se fatores de liberação hipotalâmicas (GnRH) ou seu análogo
Ministrar substâncias progestacionais puras (sem estrogênios), como o agonista (a-GnRH). Se surgirem sinais de estímulo gonadal após o uso de
acetato de medroxiprogesterona ou di-idogesterona, VO, 10 mg/dia du- GnRH ou de a-GnRH, a anormalidade pode estar no sistema córtico-límbi-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 513
co-hipotalâmico, e não na hipófise; caso contrário, o problema se restrin- A síndrome da sela túrcica vazia deve ser tratada com terapia es-
ge, exclusivamente à hipófise. O emprego de GnRH ou a-GnRH determina troprogestativa e antiprolactinêmicos. É possível empregar indutores de
rápida liberação de LH e FSH. ovulação, desde que a paciente deseje engravidar. A mesma terapêutica
A administração de insulina faz aumentar o GH, o ACTH e também deve ser administrada para as pacientes com hipogonadismo hipogonado-
o cortisol, a prolactina, etc., em razão da hipoglicemia. Assim, é possível trófico (eunucoidismo).
empregar um teste dinâmico e integral de reserva das funções hipofisárias Na amenorreia pós-parto, é possível usar antiprolactinêmicos ou hor-
– o megateste –, muito útil para diferenciar o comprometimento córtico- monioterapia estropogestativa. Na pós-pílula, a disfunção costuma ser au-
-límbico-hipotalâmico do hipofisário. tolimitada. Todavia, quando há pressa no retorno da função hipotálamo-
-hipofisária, indica-se citrato de clomifeno ou similar.
TRATAMENTO Nos casos de amenorreia relacionada aos exercícios, a readequação
O tratamento pode ser específico ou inespecífico, quando não se diagnos- da atividade física e do peso corpóreo pode levar à normalização dos
tica a causa. O tratamento é inespecífico quando a amenorreia, geralmen- fluxos menstruais. As pacientes com SOP também são beneficiadas pelo
te secundária, não tem qualquer diagnóstico de base e a paciente precisa aumento de atividades físicas e pela perda de peso.
ser medicada. Assim, recomenda-se a ministração cíclica de estrogênio e Na menopausa prematura, a terapêutica se assemelha à fisiológica,
progestagênio e apoio psicológico à paciente. ou seja, administração cíclica estroprogestativa com os controles necessá-
Quando a causa é anatômica, o tratamento geralmente é cirúrgico. rios. Nessas pacientes, pode haver associação com doenças autoimunes
Nos casos de defeitos de drenagem do fluxo menstrual (amenorreia oculta, (como tiroidite, doença de Addison, artrite reumatoide e miastenia grave),
criptomenorreia ou pseudoamenorreia), o tratamento deve ser de correção por isso, há necessidade de avaliação anual.
cirúrgica do trajeto (himenotomia, ressecção de septo vaginal transversal, Nos casos de amenorreia de origem tiroidiana e suprarrenal ou nas
neovagina, dilatação vaginal, lise de sinéquias vaginais ou desobstrução pacientes diabéticas, recomenda-se o tratamento específico para a corre-
do canal do colo do útero). ção da disfunção.
Nos casos de agenesia mulleriana, pode-se realizar a neovagina por Ressalta-se, ainda, que o apoio psicológico é fundamental para o êxi-
técnicas não cruentas (método de Frank), cruentas (métodos de Davidov to do tratamento.
ou McIndoe), por dilatação vaginal ou outras técnicas. Contudo, nos casos
de agenesia uterina, não há tratamento.
Nas sinéquias uterinas (síndrome de Asherman), o tratamento asso- ■■ SÍNDROME DA ANOVULAÇÃO CRÔNICA
ciado à hormonioterapia é a dilatação cervical com lise das sinéquias por A síndrome de anovulação (SAC) caracteriza-se pela ausência persistente
vídeo-histeroscopia e colocação de dispositivo intrauterino. Nas causas da ovulação. Manifesta-se, clinicamente, por amenorreia ou sangramento
ovarianas, como nas ovulações crônicas, caso a paciente deseje engravi- irregular e pode surgir tanto na menarca como tardiamente. A SAC acome-
dar, recomenda-se induzir a ovulação. Caso contrário, pode-se empregar a te 15 a 20% da população feminina em idade fértil e pode ser, primaria-
hormonioterapia estroprogestativa. mente, consequência de defeitos do córtex cerebral-hipotálamo-hipófise
Nas disgenesias gonadais, independentemente do cariótipo, deve-se e retroalimentação anômala ou secundariamente de disfunção endócrina
administrar hormônios com a finalidade de desenvolver os caracteres se- periférica que altere a correta estimulação gonadal.
xuais secundários em um esquema que se asssemelha ao da hormoniologia Observa-se em geral, inadequada produção extra glandular de estro-
da puberdade. Dessa forma, inicia-se com dose mais baixas e, posterior- gênios, contribuindo para os erros na retroalimentação junto ao eixo hipo-
mente, aumenta-se a quantidade até atingir valores de 2,5 mg/dia de es- tálamo hipofisário, determinando, assim, secreção alterada de FSH e LH, o
trogênios equinos conjugados ou de 2 a 4 mg/dia de valerato de estradiol, que produz queda na concentração de proteína carregadora de hormônios
continuamente. Todavia, após 3 a 6 meses, dependendo do desenvolvi- sexuais (SHBG) e corrobora para alterar o metabolismo dos estrogênios e
mento das mamas e dos pelos púbicos, passa-se a administrar estrogênios elevar a fração livre dos androgênios.
e progestagênios ciclicamente, para que haja descamação endometrial re-
Em determinadas condições fisiopatológicas, pode ocorrer excessiva
gular. Com a presença do cromossomo Y, impõe-se a exérese das gônadas.
produção extraglandular de estrogênios, como aumento dos precursores
(Alguns autores recomendam a exérese de todas as gônadas independen-
da suprarrenal ou do ovário, da atividade das aromatases no tecido adipo-
temente do cariótipo, em razão do elevado potencial de malignização.)
so, do tecido extraglandular e alterações de SHBG e da depuração meta-
Na síndrome de feminização testicular, a conduta consiste na retirada
bólica dos androgênios e estrogênios.
das gônadas (testículos) após o desenvolvimento dos caracteres sexuais
Deve-se ressaltar, ainda, que também existem condições fisiológicas
secundários (após 18 ou 20 anos), pois a partir desta idade o risco de
para que ocorra anovulação, como o início da puberdade, a perimenopau-
malignização se torna mais elevado. Após a cirurgia, administram-se es-
sa, a amamentação, o puerpério e os pós-abortamentos. Nos primeiros
trogênios e progestagênios ciclicamente, com a finalidade de corrigir a de-
meses após a menarca (puberdade), a anovulação pode ser temporária ou
ficiência estrogênica causada pela ablação das gônadas. A vagina dessas
pacientes, apesar de curta, permite o ato sexual e, com o tempo, alonga- persistir por aproximadamente 2 anos, em decorrência da imaturidade do
-se com essa prática ou, se necessário, com o uso de moldes. eixo córtico-hipotálamo-hipófise-gonadal.
Nas pacientes com ovários resistentes, que pode cursar com amenor-
reia primária ou secundária, a terapêutica também consiste na adminis-
CLASSIFICAÇÃO
tração cíclica estroprogestativa para corrigir a amenorreia e desenvolver e A anovulação crônica pode ser classificada em primária e secundária. A
manter os caracteres sexuais secundários. SAC primária inicia-se por ocasião da menarca, ou logo após, e tem como
Nas amenorreias de origem hipofisária (síndrome de Sheehan), reco- causa principal as alterações da retroalimentação, destacando-se a SOP
menda-se a terapia hormonal (suprarrenal e ovário). Em caso de desejo de e deficiência enzimática da suprarrenal (deficiência da 21-hidroxilase).
nova gestação, recomenda-se a indução de ovulação. Nos casos de ade- Menos frequentemente, salienta-se ainda nessa fase, hiperprolactinemia,
nomas hipofisários, o tratamento pode ser medicamentoso (dopaminér- hipo ou hipertiroidismo, obesidade, resistência periférica à insulina asso-
gicos), cirúrgico ou radioterapia, dependendo do tamanho do adenoma. ciada ou não à obesidade.
514 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
devem ser pedidos aleatoriamente, mas individualizados para cada pa- dose de 200 a 400 mg VO, por 6 a 12 meses, mas não é considerada tra-
ciente. A dosagem de LH e FSH não são critérios para diagnóstico da SOP. tamento rotineiro.
A dosagem da insulina é muito importante. Taxa em jejum acima de 15 Adotam-se, ainda, medidas de ordem geral para combater o hirsu-
mcU/mL ou relação glicose /insulina menor do que 4,5 são indicativas de tismo, como a depilação, descoloração com água oxigenada e eletrocoa-
resistência periférica à insulina. gulação do folículo piloso. A terapêutica cirúrgica, por meio de ressecção
Em casos de suspeita de deficiência da 21-hidroxilase, deve-se sub- cuneiforme e parcial de ambas as gônadas (operação de Thaler) ou por
meter a paciente ao teste funcional com administração de ACTH. múltiplas perfurações (drilling), é cada vez menos indicada.
Nas pacientes que querem engravidar, deve-se estimular a ovula-
TRATAMENTO ção, após a avaliação de outras causas de infertilidade de seu parceiro.
Como medida primária, deve-se realizar controle nutricional e exercícios Há diversos medicamentos para estimular a ovulação, bem como vários
para as pacientes obesas, de forma que haja consumo energético maior esquemas terapêuticos; os mais utilizados são o citrato de clomifeno,
do que a ingesta, culminando em perda de peso. Para melhorar a resis- gonadotrofina de mulher menopausada, o FSH humano purificado ou
tência periférica à insulina, o exercício é melhor do que a dieta. O apoio recombinante e coriônico, podendo ser utilizados isoladamente ou em
psicológico a essas pacientes é fundamental para essa terapia. Acredita-se combinação. O citrato de clomifeno (CC) deve ser utilizado nas pacien-
que a perda de 5% ou mais do peso corpóreo total é capaz de revereter tes que apresentarem até 10 microcistos, fazendo com que a ovulação
os sintomas. ocorra em 94 a 100% dos casos, e a taxa de gravidez, em 50 a 64%. O
O tratamento medicamentoso da SAC baseia-se em combater o hi- CC deve ser ministrado inicialmente na dose mínima (ou seja, 50 mg/
perandrogenismo, particularmente os efeitos dermatológicos androgêni- dia VO, do 5º ao 9º dia do ciclo) e não ocorrendo gravidez após 3 ci-
cos e suas complicações psicológicas (autoestima). Deve, ainda, reduzir clos, pode-se aumentar a dose até no máximo 200 mg/dia para evitar
o risco de adenocarcinoma de endométrio pela administração periódica a síndrome da hiperestimulação ovariana. Essas pacientes devem ser
de progestagênios. Quando há o desejo de gravidez, devem-se corrigir os monitoradas utilizando-se USTV, avaliando o crescimento do folículo e,
distúrbios primários, como alteração da tiroide e hiperprolactinemia, e/ou eventualmente, as dosagens séricas do estradiol (quando atingir 18 mm,
realizar a indução da ovulação nos casos em que não se conhece a causa. é indicativo da necessidade de ministração de 5.000 UI de hCG para que
ocorra a postura ovular). Alternativamente, pode-se administrar 250 µg
Na disfunção da tiroide, o hipotiroidismo pode ser tratado com repo-
sição de T4 sintético ou levotiroxina. A orientação terapêutica para hiperti- de hCG recombinante por via subcutânea.
roidismo varia de acordo com sua etiologia. O FSH altamente purificado e o recombinante (FSH-r) apresentam
ação mais específica sobre as células da granulosa e o crescimento foli-
As pacientes candidatas à metformina (ou outro agente sensibilizador
cular na anovulação crônica e, consequentemente, tendem a apresentar
dos receptores de insulina, como as glitazonas) devem apresentar funções
menores efeitos secundários, como a síndrome do hiperestímulo ova-
hepáticas e renais normais. Deve-se iniciar o tratamento com a dose mais
riano. É importante ressaltar que, qualquer que seja a gonadotrofina
baixa (500 mg/dia) e ir aumentando progressivamente conforme o peso e
utilizada, deve-se sempre monitorar o crescimento folicular pela US e,
a reposta. A utilização da metformina isolada promove a ovulação em 78
ao final, administrar hCG urinário (5.000 UI) ou recombinante (250 µg),
a 96% das pacientes e, por alguns autores, deve ser mantida na gestação,
para promover o estabelecimento da meiose oocitária.
pois previne o aborto e o diabetes melito gestacional; outros autores a
contraindicam formalmente por não prevenir a toxemia e o diabetes ges- O estímulo dos ovários com gonadotrofinas exógenas é o tratamento
tacional. mais aceitável para as pacientes com SOP resistente ao citrato de clomi-
feno. No que diz respeito às doses de gonadotrofinas a serem utilizadas,
A hiperprolactinemia pode ser tratada com bromoergocriptina ou
deve-se considerar, inicialmente, o uso de doses mais baixas, aumentan-
carbegolina. Em macroadenomas de hipófise, deve-se obter a avaliação
do-se de acordo com a necessidade.
do neurocirurgião. Nos casos em que o hiperandrogenismo decorrer fun-
A estimulação dos ovários pode ser melhorada nas pacientes que
damentalmente da suprarrenal, deve-se empregar a corticoterapia, que
apresentam resistência insulínica apenas com a metformina (por 6 meses).
promove o bloqueio do ACTH e, consequentemente, há inibição da suprar-
Alguns pesquisadores acreditam em melhores resultados com a associa-
renal. Utiliza-se dexametasona 0,5 mg/m² superfície corpórea em dose
única, ou prednisona 5 mg/m² superfície corpórea, VO, em dose fraciona- ção de metformina e citrato de clomifeno.
das, à noite e pela manhã, por 21 dias, durante pelo menos 3 ciclos. A Figura 88.2 resume o diagnóstico e o tratamento da amenorreia.
Nas pacientes com SOP, nas quais os atrasos menstruais não são mui-
to longos (de 1 a 3 meses) e que não desejam engravidar, é possível utili-
zar somente progestagênios na segunda fase do ciclo por 14 dias. Quan- DIAGNÓSTICO
do não ocorrer sangramento genital após a pausa dos progestagênios,
devem-se ministrar estrogênios naturais e progestagênios de maneira se- Anovulação Hiperandrogenismo Resistência à
quencial para que ocorra sangramento genital regular. Nas pacientes que insulina
têm vida sexual, deve-se fazer uso de anticoncepcionais orais.
A combinação acetato de ciproterona (progesterona sintética com
efeito antigonadotrofico e antiandrogênico) com etinilestradiol acarreta Indução da Psicoterapia de Agentes Agentes
supressão do hiperandrogenismo e a melhora dos sintomas da SOP. ovulação orientação antiandrogênicos sensibilizadores do
nutricional e receptor de insulina
A espironolactona, antagonista da aldosterona, também tem ação
exercícios físicos
antiandrogênica e pode ser ministrada em casos de hirsutismo, na dose
de 50 a 200 mg/dia, por período mínimo de 12 meses. A cimetidina tem
FIGURA 88.2 ■ Fluxograma de diagnóstico e tratamento da
igualmente atividade antiandrogênica, pois impede a translocação da DHT
amenorreia.
(metabólito androgênico) ao receptor de androgênio, sendo ministrada na
516 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Na degradação inapropriada, o leucócito possui lisossomos que li- tabagismo (acelera o metabolismo dos estrogênios), uso de substâncias
beram em grande quantidade enzimas hidrolíticas (aumento da degra- anticonvulsivantes, antidepressivos, diazepínicos e outros, bem como se a
dação endometrial). O aumento de metaloproteinases da matriz é outro paciente tem doenças crônicas graves, como lúpus eritematoso sistêmico
fator importante que intensifica a degradação. Concomitantemente, há (LES). A doença inflamatória pélvica (DIP) crônica e a endometriose provo-
alteração nas moléculas de adesão, facilitando a degradação mais in- cam aumento do sangramento por congestão vascular devido à alteração
tensa do endométrio. Além disso, há falta de regeneração endometrial em prostaglandinas e em fatores de crescimento local.
por deterioração nos fatores teciduais específicos e nos vários fatores de Exames subsidiários incluem hemograma (hematimetria), ferro, fer-
crescimento. ritina e coagulograma. Na suspeita de anovulação crônica (SOP), solicitar
A fibrinólise excessiva também pode ser a causa do SUA. Alterações prolactina, androgênios, tirotrofina (TSH)-Tiroxina livre (T4L), 17OH-pro-
na proporção de substâncias vasodilatoras (óxido nítrico, PGI e PGE) ou gesterona e US pélvica. A biópsia endometrial só deve ser indicada em
vasoconstritoras (endotelinas, PGF2-alfa). A menor concentração de pro- casos mais graves com sangramentos importantes (para excluir maligni-
gesterona local permite o predomínio de substâncias vasodilatoras sobre dades).
as constritoras. A falta de ação local da progesterona pode ser devido à
diminuição ou ao defeito de seu receptor (problema ocasionado na pri-
meira fase do ciclo). As substâncias vasodilatadoras inibem a agregação ATENÇÃO!
de plaquetas, bem como a formação de trombos, tão importantes para a
É importante saber que, quando não se descobre a causa do sangra-
hemostasia no endométrio.
mento, não se encaixando nas outras classificações do sangramento
Outras moléculas, como histamina, porfirinas, heparina, citocinas (in-
uterino anormal não estrutural, pode ser considerado como idiopático.
terleucinas), interferon e fator de necrose tumoral (TNF), podem interferir
na vasconstrição, na angiogênese e na formação de trombos (Quadro 89.1).
■■ TRATAMENTO
QUADRO 89.1 ■ Causas de sangramento ovulatório Quando há perda sanguínea acentuada, em que a paciente se encontra
anêmica e hipovolêmica, é necessário estabilizá-la com soluções crista-
1 | Insuficiência luteínica (ovulação imperfeita)
loide e coloide para bom equilíbrio hemodinâmico (até transfusão san-
2 | Endometriólise excessiva (proteases, metaloproteases e outras)
guínea), bem como com a introdução de substâncias antifibrinolíticas via
3 | Diminuição de substâncias vasoconstritoras
endovenosa. Nessas condições mais graves, é importante a resolução bre-
4 | Formação inadequada do trombo
5 | Trombólise excessiva ve pela curetagem uterina (que também permite o conhecimento da his-
6 | Regeneração endometrial lenta (alteração do fator tecidual e fatores tologia endometrial e possibilita a parada de sangue por se retirar quase
de crescimento e de estrogênio) todo o endométrio e estimular sua reepitelização).
7 | Aumento da vasculatura venosa Se, entretanto, a situação for dramática e a perda não é tão súbita,
pois já dura dias, deve-se fazer o tratamento hormonal. Isso pode ser efe-
tuado de várias maneiras. Antes, a mais rápida e também mais resolutiva,
®
era a administração endovenosa de altas doses de estrogênios (Premarin
■■ DIAGNÓSTICO 20 mg, de 6 em 6 horas). O sangramento é interrompido logo após a 5a
Sobretudo clínico, obtido por anamnese, perguntas direcionadas a esse tó- hora. Não se dispõe mais dessa substância por esta via. Contudo, ainda
pico e exames subsidiários (US pélvica e, ocasionalmente, a histeroscopia). podem ser dados por VO, na forma de estrogênios conjugados. Além de-
É oportuno cogitar sobre a RM, porém não deve ser o primeiro exame, já les, é possível ministrar 17 betaestradiol, valerato de estradiol e etiniles-
que não é melhor do que a US via vaginal para o diagnóstico. tradiol, bem como em associação com progestogênios.
A queixa principal é a perda excessiva de sangue, porém observa-se Aconselha-se, todavia, o emprego da pílula anticoncepcional, de pre-
que muitas mulheres (50%) a reportam, embora não seja verdadeira e não ferência com 50 µg de etinilestradiol e 0,25 mg de levonorgesterel. Usa-
tenha necessidade de tratamento. mos muito o Evanor® e o Anovlar®, embora seja possível empregar outros
Na prática, tem-se boa ideia da perda sanguínea perdida ao pedir à contraceptivos com 35 µg de etinilestradiol e gestodeno, 0,075mg (Gyne-
paciente que a compare com fluxos anteriores e diga se houve real mudan- ra®). Deve-se tomar 1 a 2 pílulas de saída e, depois, uma de 6 em 6 horas
ça para mais; ao se investigar a frequência com que troca os absorventes; (raramente de 4 em 4 horas) até cessar o fluxo, o que ocorre logo após
se o sangue vasa na calcinha, na saia e na roupa de cama; e se há coágu- seis horas (quando os níveis de estrogênio estão altos); depois, as doses
los (não houve tempo suficiente para fibrinólise). O tipo de absorvente (se são espaçadas para 8 em 8 horas (± dois dias), e, em seguida, para 12 em
tampão ou pads) varia de tamanho e de capacidade para absorver o fluxo. 12 horas (± um dia) e a cada 24 horas (± 10 dias). Esse esquema pode ser
Se cada tampão puder fixar até 1,5 mL de sangue e a paciente precisar agressivo, mas está indicado nas formas mais intensas de sangramento.
trocá-lo a cada duas horas ou mais, há excesso de sangramento. A paciente pode se queixar de náuseas e vômitos, condições às quais
Ciclos de intervalos bem regulares, acompanhados também de tensão se aconselha o uso de antieméticos, como a ondasetrona via sublingual
pré-menstrual, dismenorreia e síndrome do meio (corrimento, sangramen- (Vonau flush®), intramuscular (Zofran®, Vonau®, metoclopramida intra-
to ou dor), indicam que se trata de SUA-E (ovulatório). muscular – Dramin-B6®) ou em supositórios (Eucil®).
Se for ovulatório, a causa do excessivo sangramento pode ser o uso O esquema poderá ser mais flexibilizado em virtude da resposta ini-
de ácido acetilsalicílico (AAS), dicumarínicos, Ginkgo biloba, ginseng e ou- cial, baixando-se as doses ou alongando-se o espaço entre elas.
tras substâncias que agem na vasodilação ou na agregação plaquetária. Podem-se usar também doses menores de etinilestradiol (35 µg de
Indaga-se, ainda, sobre perda ou ganho de peso, principalmente se re- etinilestradiol com gestodeno 0,075 mg) ou somente progestagênio com
pentino (anorexia, cirurgia bariátrica), exercícios físicos extenuantes (com- pequenas doses de etinilestradiol (Primosiston®), ou só progestagênio
petições), alcoolismo (aumenta as concentrações de estrogênio séricas), com nortistetorona 5 a 10 mg (Primolut-nor®) ou medroxiprogesterona 10
518 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
a 20 mg (Provera®) ao dia, também benéficos; se voltar o sangramento, é monais estroprogestativas do ciclo e, assim, descamar-se no processo
melhor examinar a cavidade por histeroscopia. habitual da menstruação.
No esquema das pílulas, o ótimo resultado se deve às mesmas ações Nos raros casos em que não se obtêm resultados, deve-se fazer a
da progesterona e do estrogênio nas inúmeras moléculas envolvidas no histerectomia (total ou subtotal), o padrão-ouro de tratamento, e, se a
controle da menstruação normal. paciente rejeitá-la, é possível tentar a ablação endometrial (endometrec-
Após cessar a medicação (± 15 dias de tratamento), a paciente volta tomia). Contudo, essa técnica não tem êxito em muitas mulheres, que aca-
a “menstruar”. O fluxo endometrial é bem menor (por 1 ou 2 dias, acom- bam sendo histerectomizadas.
panhado quase sempre de muita cólica). Por isso, é conveniente, junto às Não é vista muita indicação para o análogo do GnRH, bem como não
últimas pílulas, começar a tomar substâncias anti-inflamatórias, de prefe- são aconselhados os progestogênios de depósito (Depoprovera®).
rência derivados do ácido arilpropriônico e do enólico. Se esse sangramen- O sangramento periovulatório desaparece com a pílula contraceptiva.
to não tiver essas características, provavelmente o diagnóstico está errado Se a paciente deseja engravidar, pode-se tratá-la com AINHs.
e se trata de sangramento estrutural. As manchas pré-menstruais ou pós-menstruais não necessitam de
A paciente deverá tomar a mesma pílula do 16o ao 26o dia por 3 a qualquer tratamento se as pacientes as aceitarem. Caso contrário, pro-
4 ciclos, intervalo em que fará uma investigação melhor do útero (US), gestagênios na seguida fase para as manchas pré-menstruais; nos casos
checando as causas de anovulação e, eventualmente, a histeroscopia de menstruação prolongada por muitos dias, dar estrogênios já durante o
diagnóstica. fluxo para acelerar a reestruturação morfofuncional da mucosa uterina e
Não há nenhum exame que diagnostique qual ou quais as moléculas regularizar a menstruação.
endometriais que estariam alteradas no sangramento de natureza ovula- Em conclusão, o tratamento padrão-ouro é a histerectomia (100%).
tória. Apenas tem-se a biópsia (que deve ser refeita) para diagnosticar e Quando não pode ser feita, recorre-se ao DIU-levonorgestrel ou à ablação
excluir causas orgânicas. Empiricamente, é mais comum que existam for- endometrial (melhora em 80%), à pílula anticoncepcional contínua (me-
mações inespecíficas de trombos ou trombólise excessiva do que outras lhora em 80%) – somente na segunda fase – ou aos anti-inflamatórios e
causas que justifiquem o sangramento em mulheres que ovulam. antifibrinolíticos (resultados em 60%).
Quando o sangramento é crônico, a maior parte das vezes é ovulató-
rio. Nesse caso, a administração de progestagênios na segunda fase do
ciclo nunca surte o efeito desejado que muitos propalam, uma vez que REVISÃO
pode haver problemas com os receptores de progesterona.
O sangramento uterino não estrutural é um sangramento prove-
Usam-se, aqui, os anti-inflamatórios não hormonais (AINHs) e/ou an-
niente da descamação e/ou da reepitelização inapropriada do en-
tifibrinolíticos. Dá-se preferência, em relação aos primeiros medicamen-
® dométrio, ocorre principalmente em mulheres mais jovens e têm
tos, aos fenamatos (Ponstan 3 a 4 comprimidos por dia) – bloqueiam a
como causa alterações de algum fator de coagulação ou hormonal
síntese de prostaglandinas e a ligação da PGE2 aos receptores e inibem
(ovulatória, anovulatória e iatrogênica).
a ciclo-oxigenase. Assim, haverá aumento do ácido aracdônico e, con-
Manifesta-se como menstruações muito frequentes, quantidade
sequentemente, dos leucotrienos, potentes vasoconstritores. O trombo
volumosa e fluxos mais prolongados. Anamnese, perguntas dire-
também fica mais firme pela melhor atividade de plaquetas. Os fibrino-
® ® cionadas a esse tópico e exames subsidiários são necessários para
líticos, em especial o ácido tranexâmico (Transamin , Hemoblock ), 6 g
o diagnóstico.
por dia no primeiro dia e, depois, 4, 3, 2 e 1 g nos dias subsequentes,
Em condições muito graves, quando não há tempo para a terapia
causarão redução de 70% da perda de sangue. Pode-se usar os dois tipos
hormonal parar o sangramento, a curetagem uterina deve ser em-
de medicamentos associados, reforçando o resultado.
pregada. Em geral, o tratamento hormonal pode ser indicado para o
No sangramento anovulatório, administrar progesterona ou proges-
o o sangramento uterino não estrutural do tipo anovulatório.
tagênio sintético isolado ou sob a forma de pílula do 16 ao 26 dia. Há
regulação no intervalo dos fluxos, que são de pequeno volume.
Quando houver necessidade da ovulação, tratar a causa quando
■■ LEITURAS SUGERIDAS
possível e, se não, induzi-la. Ausente o desejo de gravidez, a pílula an-
ticoncepcional tomada de forma habitual (é melhor a de 24 comprimidos American College of Obstetricians and Gynecologists. ACOG committee opinion
no. 557: Management of acute abnormal uterine bleeding in nonpregnant
por quatro de pausa) ou só de progestagênio (desonorgestrel 75 µg) é de
reproductive-aged women. Obstet Gynecol. 2013;121(4):891-6.
grande valia. Deligeoroglou E, Karountzos V, Creatsas G. Abnormal uterine bleeding and
Da mesma forma, a prescrição dessas pílulas de maneira contínua dysfunctional uterine bleeding in pediatric and adolescent gynecology.
até por 12 meses ou de progestagênio isolado, como o desogestrel 75 µg Gynecol Endocrinol. 2013;29(1):74-8.
ao dia (Cerazetti®, Nactáli® e Kelly®), pode ser boa opção. Neste parti- Deneris A. PALM-COEIN nomenclature for abnormal uterine bleeding. J
cular, lembrar sempre do DIU com levonorgestrel (Mirena®), excepcional Midwifery Wom Heal. 2016;61(3):376-9.
por sua ação em qualquer tipo de SUA e até quando há aumento leve do Schatz F, Guzeloglu-Kayisli O, Arlier S, Kayisli UA, Lockwood CJ. The role of
útero por adenomiose ou pequenos leiomiomas submucosos. Esse DIU decidual cells in uterine hemostasis, menstruation, inflammation, adverse
contém 52 mg de levonorgestrel liberado na dose de 20 µg por dia, por pregnancy outcomes and abnormal uterine bleeding. Hum Reprod Update.
2016;22(4):497-515.
cinco ou mais anos. O endométrio sofre atrofia porque há supressão de
Töz E, Sancı M, Özcan A, Beyan E, İnan AH. Comparison of classic terminology
vários fatores de crescimento, havendo reforço da apoptose independen-
with the FIGO PALM-COEIN system for classification of the underlying
temente da ação no receptor; a atrofia permite que o endométrio não se causes of abnormal uterine bleeding. Int J Gynaecol Obstet. 2016;133(3):
descame (não há perda de sangue), o que ocorre em 70% das pacientes. 325-8.
Em 30%, há menstruação porque nem sempre há bloqueio da ovulação. Whitaker L, Critchley HO. Abnormal uterine bleeding. Best Pract Res Clin Obstet
A parte mais distal do dispositivo (istmo) pode sofrer as variações hor- Gynaecol. 2015 25. pii: S1521-6934(15)00226-6.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 519
SÍNDROMES HIPERANDROGÊNICA E
HIPERPROLACTINÊMICA Ovários Suprarrenais
■■ SÍNDROME HIPERANDROGÊNICA
Os distúrbios endócrinos que envolvem a produção androgênica são ca- FIGURA 90.1 ■ Fontes de androgênios.
racterizados pela excessiva produção nos ovários ou nas suprarrenais,
pela alteração na concentração da proteína carreadora de hormônios
sexuais (SHBG), pela conversão periférica de androgênios fracos em mais A síntese SHBG é estimulada pelos estrogênios e inibida por androgê-
potentes e pela sensibilidade da unidade pilossebácea ao androgênio, nios. Saliente-se que nas mulheres em geral, 80% da testosterona circula
podendo afetar a distribuição e a densidade dos folículos pilosos e das combinada à SHBG, 19% se ligam à albumina e só 1% é livre. Em mulheres
glândulas sebáceas. hirsutas, observa-se aumento da testosterona livre (2%), com consequente
O crescimento e a distribuição dos pelos no corpo ocorrem de três diminuição da ligada à proteína SHBG (79%). No caso do hirsutismo idio-
formas: pático, não há evidência de maior síntese glandular de androgênios ou
1 | os independentes do sexo e com características específicas, familiares da menor ligação da testosterona às proteínas carreadoras. Portanto, não
e raciais (pálpebras, sobrancelhas e couro cabeludo); há aumento do número de receptores cutâneos de androgênios, nem de
2 | os ambissexuais que aparecem na puberdade em ambos os sexos (nas sua função, mas há hiperatividade da enzima 5 alfaredutase, elevando o
axilas e no púbis); androgênio intracelular mais potente à DHT.
3 | os androgênicos que constituem características secundárias mascu- Sob o aspecto etiológico (Quadro 90.1), o hirsutismo pode ser de cau-
linas (face, tórax, dorso, abdome, região suprapúbica, braços e raiz das sa exógena, suprarrenal, ovariana ou idiopática.
coxas). Estes últimos caracterizam o hirsutismo nas mulheres, isto é, pre-
sença de pelos hormônio-dependentes em locais considerados caracterís-
tica sexual secundária masculina. Em casos graves de hiperandrogenismo, QUADRO 90.1 ■ Causas de hirsutismo
pode ocorrer a virilização, uma progressiva masculinização caracterizada
Distúrbios ovarianos
por calvície temporal, diminuição de tecido mamário, aumento de massa SOP
muscular e hipertrofia do clitóris. Hipertecose
A testosterona é o androgênio sérico mais potente, circula ligada à Neoplasias
proteína transportadora dos esteroides sexuais, a SHBG; contudo, apenas Deficiência enzimática
a forma biologicamente ativa do hormônio é a livre.
Ao entrar na célula, a testosterona é transformada em di-hidrotestos- Distúrbios da suprarrenal
terona (DHT), por ação de enzima citoplasmática 5 alfaredutase. A DHT, Deficiência enzimática (21-hidroxilase, 11-11-hidroxilase e
por sua vez, liga-se ao receptor. O complexo hormônio-receptor formado 3 betahidroxilase
Doença de Cushing
transloca-se para o núcleo, onde promove a transcrição de genes espe-
Neoplasias
cíficos.
Na unidade pilossebácea, a DHT estimula o crescimento e a pigmen- IDIOPÁTICA
tação dos pelos (formando os chamados pelos terminais), a produção de
ácidos graxos saturados (sebo) e o aumento do conteúdo de colágeno da Medicamentos (feniltoína, danazol, minoxidil, glicocorticosteroides,
pele. Assim, facilita a formação de culturas de micro-organismos cutâne- androgênios e pílulas anticoncepcionais que contêm derivados
os, levando ao aparecimento de acne, que comumente está associada ao 19-noresteroides)
Gravidez
hirsutismo. Outros androgênios, como a androstenediona e a deidroepian-
Hipotiroidismo
drosterona (DHEA), são metabolizados em testosterona no próprio folícu-
Trauma no SNC
lo. Especificamente, há evidências da aromatização de androstenediona
Estresse
em estrona, o que parece ser fundamental para o controle local de cresci- Anorexia nervosa
mento dos pelos induzidos pelos androgênios. Má nutrição
Resistência insulínica – DM
ETIOLOGIA Pseudo-hermafroditismo masculino
Na mulher, a produção de androstenediona é dividida igualitariamente entre Disgenesia gonadal mista
o ovário e a suprarrenal. A testosterona circulante, 50%, provém de con- SOP: síndrome dos ovários policísticos; DM: diabetes melito; SNC: sistema nervoso
versão periférica da androstenediona, 25% originam-se de secreção direta central.
520 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Sinais de
Hirsutismo Sem virilização
virilização
DHEAS, Ttotal
DHEAS, Ttotal, Aumento de
170 HP, cortisol,
17-OHP, cortisol testosterona
SHBG, TSH, PRL
Tumor suprarrenal Funcional < 200 ng/dL > 200 ng/dL Aumento de Aumento de
ou ovariano DHEAS 17-OHP
Tumor
Bloqueador fonte Anovulação < 700 g/dL > 700 µg/dL < 200 ng/dL > 200 ng/dL
Cirurgia ovariano
produtora Hiperfunção Tumor de
suprarrenal suprarrenal
Hiperfunção Teste da
suprarrenal cortrosina
Para diagnosticar outras alterações enzimáticas raras, é necessário acentuados, pelo período mínimo de seis meses, podendo estender-se
dosar a pregnenolona, a 17-hidroxipregnenolona, a 11-desoxicortisol e o a 12 meses. O esquema sequencial inverso de Hammerstein, compreen-
cortisol. Se a relação 17-hidroxipregnenolona/17-hidroxiprogesterona for dendo do 5o ao 14o dia do ciclo, pode ser utilizado. Além disso, deve-se
superior a 6, sugere defeito da 3 betahidroxiesteroide desidrogenase (3 associar pílula anticoncepcional para evitar sangramento irregular do
betaol), de manifestação tardia. Na deficiência de 11-beta, há aumento de endométrio. Dessa forma, obtêm-se adequadas concentrações plasmá-
11-desoxicortisol (composto S). ticas desse hormônio desde a fase inicial do ciclo. O regime terapêutico
de baixa dose tem sido indicado com sucesso em outras manifestações
TRATAMENTO do hiperandrogenismo cutâneo, como acne, seborreia e alguns casos de
Nos casos específicos, como defeitos de síntese da suprarrenal, utiliza-se queda de cabelo (alopecia).
a corticoterapia (hidrocortisona, fluoro-hidrocortisona, dexametasona e Outros progestagênios, como a drosperinona e o desogestrel, podem
prednisona). Usa-se dexametasona na dose 0,25 mg a 0,75 mg ou predni- ser utilizados em associação ao etinilestradiol nos casos de hiperandroge-
sona na dose de 2,5 a 7,5 mg à noite, durante seis meses, prolongando-se nismo cutâneo de leve intensidade.
até dois anos, em algumas situações. A cirurgia é indicada no caso de A espirolactona é diurético antagonista da aldosterona e bastante
tumores. usada para o hirsutismo. Seu efeito antiandrogênico ocorre pela compe-
Várias substâncias são usadas no tratamento medicamentoso do hir- tição com os receptores de testosterona e di-hidrotestosterona na célula-
sutismo: associação estroprogestativa, espironolactona, acetato de cipro- -alvo. Há também supressão da síntese androgênica, quando administra-
terona, análogos do GnRH, flutamida, cimetidina, cetoconazol, citrato de da em altas doses, por ação direta no citocromo P-450. Usam-se doses de
clomifeno, corticosteroides e, mais recentemente, a finasterida e a eflorni- 100 a 200 mg/dia, geralmente em associação às pílulas anticoncepcionais
tina. Nos casos de resistência insulínica associada, recomendam-se como e ao acetato de ciproterona. Após seis meses de tratamento e melhora
primeira escolha os agentes sensibilizadores dos receptores de insulina clínica, pode-se reduzir a concentração para 25 a 50 mg/dia.
(metformina e rosiglitazona). A flutamida é agente antiandrogênico não esteroide que bloqueia o
Do ponto de vista fisiológico, tanto os estrogênios quanto os pro- receptor androgênico. Atua também na diminuição dos androgênios livres
gestagênios são considerados antagonistas dos androgênios. Apesar ao aumentar os níveis de SHBG. Geralmente, usam-se doses de 250 a 500
de os primeiros aumentarem os níveis de SHBG (diminui testosterona mg/dia durante seis meses. Quando associada aos anticoncepcionais ou
livre) e também inibirem a 5 alfaredutase, não devem ser utilizados agentes sensibilizadores do receptor de insulina, doses menores de 125
isoladamente. Os progestagênios inibem a síntese e a secreção de go- mg/dia também são eficientes. Os efeitos colaterais mais frequentes são
nadotrofinas hipofisárias, assim como a atividade da 5 alfaredutase. intolerância gastrintestinal, cefaleia, fadiga e irregularidade menstrual.
Isoladamente, são indicados nos casos de hiperandrogenismo cutâneo Durante a terapia, deve-se monitorar a função hepática.
de início recente, em geral ao redor da menarca, em jovens com ciclos A finasterida inibe, por competição, a enzima 5 alfaredutase, impe-
ainda unifásicos. A ciproterona atua como antagonista periférico, ini- dindo a conversão de testosterona em di-hidrotestosterona, diminuindo o
bindo a enzima 5 alfaredutase. A dose recomendada varia de 2 a 10 mg efeito androgênico. A dose preconizada é de 2,5 a 5 mg/dia, podendo ser
ao dia nos casos leves a moderados, e 50 a 100 mg diários nos casos associada aos anticoncepcionais orais.
522 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
O citrato de clomifeno pode ser utilizado nas pacientes desejosas de maturação suprarrenal e coagulação. Sua secreção é controlada por
o o o o
gravidez, na dose de 50 a 200 mg/dia, do 5 ao 9 ou do 2 ao 5 dia do fatores inibidores e estimuladores e, diferentemente dos outros hor-
ciclo. Quando as pacientes tiverem resistência insulínica, a associação com mônios hipofisários, o controle da sua secreção é predominantemente
a metformina ou a rosiglitazona apresenta maiores índices de ovulação e inibidor. O hipotálamo elabora uma série de fatores inibidores (PIF) e
de taxa de gestação. liberadores (PRF) de PRL.
Fatores inibidores de PRL (PIF): dopamina; GABA; somatostatina;
acetilcolina; calcitonina; neuropeptídeo Y (NPY); peptídeo atrial na-
ATENÇÃO! triurético (PAN); e neurotensina.
Fatores liberadores de PRL (PRF): TRH; VIP; serotonina (5-
O uso de agonistas do GnRH, ao promover a supressão hipofisária,
HT); peptídeo liberador de PRL (PrRP); ocitocina; estrogênios;
diminui a produção androgênica, que é dependente de LH. A dose ne-
histamina; vasopressina (AVP); GnRH; opioides; PHI, PACAP;
cessária não está bem estabelecida, mas é maior do que a usada para
angiotensina II (AgII); substância P; galanina; bombesina; e in-
a supressão estrogênica e não deve ser empregada por mais de seis
terleucinas.
meses.
A hiperprolactinemia tem prevalência de 0,4% na população adulta
geral, variando de 9 a 17% em mulheres com distúrbios reprodutivos. Os
O cetoconazol age diretamente no citocromo P-450, inibindo a pro- prolactinomas compreendem 50% das etiologias da hiperprolactinemia.
dução de esteroides. É prescrito na dose de 400 a 1.200 mg/dia. Propicia São os mais comuns, podendo representar 50% dos tumores hipofisários
bons resultados, mas com efeitos colaterais relevantes, em especial hepa- secretores de hormônios. São classificados como microprolactinomas
totoxicidade. (diâmetro menor do que 10 mm) ou macroprolactinomas (diâmetro maior
Quanto à síndrome HAIR-AN, o tratamento consiste em dieta hipoca- do que 10 mm). São quase sempre benignos e, em geral, de crescimento
lórica e prática regular de exercícios quando existe obesidade, com o ob- lento. Ocorrem mais frequentemente em mulheres, entre 20 e 50 anos
jetivo de diminuir a resistência insulínica e, consequentemente, os níveis de idade. A maioria (95%) dos prolactinomas em mulheres são microa-
circulantes de insulina. Podem-se administrar substâncias que aumentam denomas.
a sensibilidade periférica à insulina e reduzem a insulinemia e os níveis
séricos de testosterona livre e total, de androstenediona e de colesterol.
ETIOLOGIA
Ressaltam-se, entre elas, a metformina (500 mg, três vezes ao dia) e a Causas fisiológicas: gravidez e lactação; estimulação do mamilo;
rosiglitazona (2 a 8 mg/dia). estresse; período neonatal (“leite-de-bruxa”); e sono.
A aplicação local de eflornitina (inibidor da L-ornitina descarboxilase, Causas farmacológicas: antidepressivos e ansiolíticos (alprazo-
enzima para a divisão celular e o crescimento do folículo piloso) pode ser lam, buspirona, inibidores da monoaminoxidase (IMOs), inibido-
útil. O crescimento do pelo se torna mais lento e de forma miniaturizada. res seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), antidepressivos
A melhora ocorre em oito semanas (60% dos casos) com a aplicação de tricíclicos); anti-hipertensivos (atenolol, alfametildopa, reserpina,
2 a 3 vezes/dia. Os efeitos colaterais são mínimos e incluem irritação e verapamil); antipsicóticos; bloqueadores dos receptores H2 da
eritema cutâneo. histamina; hormônios (estrogênios, progestagênios, TH); outros
fármacos (clorpromazina, anfetaminas, anestésicos, arginina, cisa-
Medidas estéticas (depilação e clareamento) prida, metoclopramida, ácido valproico, opiáceos, domperidona,
A depilação pode ser realizada com cera quente ou fria; e a secção, com isoniazida etc.).
lâmina, eletrocauterização ou laser. Causas patológicas: distúrbios hipotalâmicos e da haste hipo-
A eletrocauterização é método definitivo, mas pode manchar a pele. fisária (craniofaringioma, sarcoidose, tuberculose, irradiação cra-
Atualmente, a terapia com laser propicia depilação mais duradoura. É feita niana, secção da haste, síndrome da sela vazia, esclerose múltipla,
na face, no pescoço, nas axilas, virilhas e coxas, não tendo o inconve- carcinoma metastático, hipofisite linfocítica); tumores hipofisários
niente de manchar a pele. Essas técnicas devem ser recomendadas após 4 (prolactinomas, adenomas mistos secretantes de GH e PRL, ade-
a 6 meses da terapia antiandrogênica para obtenção de bons resultados nomas secretantes de ACTH – doença de Cushing e síndrome de
cosméticos. Nelson); doenças sistêmicas (hipotiroidismo primário, lesão renal
crônica (LRC), cirrose, lúpus); irritação da parede torácica (cirur-
Cuidados gerais gia, herpes-zóster, queimaduras, esofagite, refluxo esofágico);
A perda de peso é importante no tratamento do hirsutismo, já que a obesi- malignidades não hipofisárias (carcinoma broncogênico, adeno-
dade aumenta a conversão periférica de androstenediona em testosterona carcinoma renal, linfomas, hipernefroma); aneurisma de carótida;
e aumenta a resistência insulínica. Além disso, é importante a prática re- e gangliocitoma.
gular de exercícios físicos, em especial os anaeróbios para perda de peso. Causas idiopáticas: a denominação hiperprolactinemia idiopática
A psicoterapia é também indicada em casos selecionados, pois o estresse tem sido reservada para pacientes sem uma causa óbvia para o dis-
pode aumentar a produção de ACTH, estimulando a síntese de androgênios. túrbio hormonal. Na maioria das vezes, trata-se de microadenomas
muito pequenos que não foram visualizados por RM.
HIPERPROLACTINEMIA SINTOMÁTICA
Hipotiroidismo, medicamentos,
TC/RM de sela túrcica
hepatopatia, LRC e SOP
6 | Agonistas dopaminérgicos: atuam sobre os receptores D2 da dopami- anos) e há risco elevado de hipopituitarismo (30 a 50% dos pacientes) e
na nos lactótrofos, inibindo a síntese e a secreção de PRL e diminuindo a carcinogênse cerebral. A dose utilizada é de 4.500 cGy.
síntese de DNA celular e crescimento do tumor. 10 | Radiocirurgia gamma-knife (administração de altas doses de ra-
7 |Principais fármacos: Bromocriptina (BRC) – Parlodel®, Bagren®; Lisurida diação guiada esteotaticamente por imagem): remissão em 30 a 40% das
– Dopergin®; Pergolida – Permax®; Cabergolina – Dostinex®; Quinagolida pacientes em dois anos.
– Norprolac®. 11 | Análogos da somatostatina: são promissores como uma nova te-
rapêutica medicamentosa, principalmente quando houver intolerância ou
resistência ao AD.
ATENÇÃO! 12 | Prolactinomas e gestação: na gestação (controle com campimetria
e fundo de olho), o tratamento pode ser mantido nos casos de macropro-
Agonistas dopaminérgicos (AD) reduzem em torno de 80% o tamanho
lactinoma (ocorre aumento tumoral em 16 a 25% dos casos) e mais rara-
do tumor.
mente nos microprolactinomas (aumento tumoral em 1,4 a 6% dos casos).
O resumo do tratamento da síndrome hiperprolactinêmica é apresen-
Bromocriptina (BRC) tado na Figura 90.5.
a | Eficácia e tolerabilidade: normalização da PRL (70 a 80%); re-
torno de menstruações ovulatórias (80 a 90%); redução tumoral REVISÃO
(75%); efeitos colaterais (até 30%); intolerância (5 a 10%); resis-
tência (5 a 18%). A alteração característica da síndrome hiperandrogênica é o hisur-
b | Efeitos colaterais: náuseas, vômitos, cefaleia, fadiga, conges- tismo, que afeta a distribuição e a densidade dos folículos pilosos.
tão nasal, hipotensão postural, constipação, dor abdominal. Raros: Involução mamária, atrofia do aparelho genital, disfunção mens-
depressão, psicose, rinoliquorreia. trual e processo de androgenização estão presentes no quadro clí-
c | Posologia: 5 a 7,5 mg/dia. Iniciar com doses pequenas, 1/4 do nico da síndrome hiperandrogênica e são sinais indicativos para o
comprimido (0,625 mg) à noite. No prolactinoma gigante, são ne- diagnóstico.
cessárias doses maiores, em torno de 15 mg/dia, e a resposta de A hiperprolactemia é caracterizada pelo excesso de produção de
tais tumores é lenta. Bromocriptina LAR: 50 a 250 mg/IM/mensal. prolactina, que pode causar galactorreia, amenorreia, oligomenor-
Cabergolina reia, infertilidade, diminuição da libido, dispareunia, osteoporose,
a | Maior afinidade pelos receptores D2 nas células lactotróficas acne/hisurtismo e ganho de peso.
e meia-vida prolongada, podendo ser administrada uma ou duas
vezes por semana.
b | Opção nos casos de intolerância ou resistência à BRC ou a ou- ■■ LEITURAS SUGERIDAS
tros AD. Dumesic DA, Oberfield SE, Stener-Victorin E, Marshall JC, Laven JS, Legro RS.
c |Efeitos colaterais: semelhantes aos da BRC, porém com frequên- Scientific statement on the diagnostic criteria, epidemiology, pathophysiology,
cia significativamente menor (3 a 4% dos pacientes). and molecular genetics of polycystic ovary syndrome. Endocr Rev. 2015;36(5):
d | Posologia: iniciar com 0,25 mg, uma ou duas vezes por sema- 487-525.
Goodman NF, Cobin RH, Futterweit W, Glueck JS, Legro RS, Carmina E. American
na, com reajustes de dose e frequência de acordo com a resposta
Association of Clinical Endocrinologists, American College of Endocrinology,
do paciente.
and Androgen Excess and PCOS Society Disease State Clinical Review: guide
e | Desvantagem: custo elevado. to the best practices in the evaluation and treatment of polycystic ovary
8 | Cirurgia (transesfenoidal): as indicações cirúrgicas compreendem syndrome. Endocr Pract. 2015;21(12):1415-26.
intolerância ou resistência à terapia medicamentosa, apoplexia hipofi- Hohl A, Ronsoni MF, Oliveira MD. Hirsutism: diagnosis and treatment. Arq Bras
sária com manifestações neurológicas, fluxo do líquido cerebrospinal Endocrinol Metabol. 2014;58(2):97-107.
(LCS) decorrente de redução tumoral após tratamento clínico em macro- Kaiser UB. Hyperprolactinemia and infertility: new insights. J Clin Invest. 2012;
prolactinomas invasivos para o seio esfenoidal e crescimento tumoral na 122(10):3667-8.
vigência de tratamento clínico. Melmed S, Casanueva FF, Hoffman AR, Kleinberg DL, Montori VM, Schlechte JA.
9 | Radioterapia: nos casos de intolerância ou resistência ao AD, quando Endrocine Society. J Clin Endocrinol Metab. 2011;96(2):273-88.
Paepegaey AC, Veron L, Wimmer MC, Christin-Maitre S. Misleading diagnosis
a cirurgia não foi bem-sucedida. A resposta é lenta ou incompleta (2 a 15
of hyperprolactinemia in women. Gynecol Obstet Fertil. 2016;44(3):181-6.
TRATAMENTO
TRANSIÇÃO MENOPAUSAL
MENOPAUSA
Dieta
Atividade física
Prática de relaxamento e bem-estar
ANOMALIAS CONGÊNITAS Quando a formação cística se localiza na região paracervical, pode expan-
Condições pouco frequentes. A agenesia e a hipoplasia da vagina caracte- dir-se para o ureter e, quando próximo ao introito, exteriorizar-se através
rizam-se por ausência dos terços proximal e médio de vagina e do útero. da fenda vulvar. Em geral, é assintomático e pode passar despercebido.
Os septos vaginais ocorrem quando há fusão incompleta dos ductos de Os cistos volumosos podem se associar com desconforto, principalmente
Müller. São divididos em longitudinais ou transversais. Os transversais durante a relação sexual. Queixas de polaciúria e de retenção urinária são
são mais comuns no terço proximal da vagina e podem obstruir parcial ou passíveis de observação quando o tumor comprime a bexiga. O diagnós-
completamente o canal vaginal. De modo geral, a obstrução ocasionada tico é clínico e o tratamento se dá com a excisão cirúrgica, feita apenas se
por essas anomalias é responsável pelo acúmulo de menstruação na va- houver sintomas. Nos casos assintomáticos, a conduta é expectante.
gina e, clinicamente, a paciente queixa-se de falta de menstruação. Pode
apresentar também desconforto ou dor no baixo ventre e massa pélvica.
LEIOMIOMA
O tratamento é cirúrgico, variando da ressecção do septo à reconstrução Neoplasia benigna das fibras musculares lisas pouco frequente, geral-
vaginal. mente localizada no terço distal da vagina. Apresenta-se como tumor que
ocupa o lúmen vaginal, com forma globosa, superfície lisa ou bocelada,
ATROFIA consistência elástica e volume variável (poucos milímetros a grandes vo-
Ocorre em situações de hipoestrogenismo, principalmente após a meno- lumes). O diagnóstico é clínico, com confirmação histopatológica. O trata-
pausa. É considerada uma reação inflamatória e, com frequência, há infec- mento se dá com excisão cirúrgica.
ções secundárias associadas. Os sintomas incluem ressecamento vaginal,
dispareunia, prurido e irritação ou ardência. O tratamento geralmente é ■■ AFECÇÕES NÃO NEOPLÁSICAS DA VULVA
local com estriol ou promestrieno, uma aplicação ao dia via vaginal duran-
Várias condições benignas podem acometer a vulva, inclusive doenças
te 21 dias, seguindo-se a dose de manutenção de 2 a 3 vezes por semana.
dermatológicas observadas em outros locais do corpo ou lesões asso-
ciadas a doenças sistêmicas. Além do tecido tegumentar, a vulva contém
ATENÇÃO! folículos pilosos e glândulas sudoríparas e sebáceas, que podem ser sedes
de enfermidades. Afecções não neoplásicas vistas com certa frequência na
No climatério, as ondas de calor tendem a melhorar com o tempo, ao vulva são as dermatoses, das quais as mais comuns são líquen escleroso,
passo que a atrofia aparece principalmente após três anos da meno- líquen simples crônico e líquen plano.
pausa e tende a piorar à medida que a idade avança.
LÍQUEN ESCLEROSO
Doença inflamatória crônica que acomete a pele, sem atingir a mucosa, in-
PROLAPSOS DE PAREDES VAGINAIS cide em 1% das mulheres e corresponde a 40% das doenças epiteliais não
Correspondem à cistocele, à retocele e à enterocele. Geralmente, ocorrem neoplásicas da vulva. Não apresenta etiologia definida, mas está asso-
após múltiplos partos vaginais ou pela maior predisposição observada em ciado a doenças autoimunes, como tiroidite, vitiligo e anemia perniciosa.
algumas pacientes. Prolapsos pequenos são assintomáticos. O tratamento Acomete mulheres de todas as idades, mas com dois picos de incidência
é cirúrgico. – na infância e após a menopausa. Tem potencial para desenvolver câncer
da vulva de 3 a 5%.
ENDOMETRIOSE O diagnóstico é clínico, sendo o principal sintoma o prurido vulvar
Condição pouco frequente. Na maioria dos casos, é assintomática, mas geralmente de longa data. Outros sintomas incluem ardor e dor vulvar,
pode causar dismenorreia ou sangramento pré-menstrual ou pós-coital. O dispareunia e disúria, e cerca de 15% dos casos são assintomáticos. Ao
tratamento se dá por excisão ou eletrocauterização, porém, se a lesão for exame, observa-se placa hipocrômica, brilhante, com limites nítidos, ge-
pequena e assintomática, não é necessário tratar. ralmente bilateral, que acomete desde a região periclitoridiana até a re-
gião perianal. À medida que a doença evolui, a pele começa a ter aspecto
ADENOSE de pergaminho e se inicia alteração da arquitetura vulvar, com apagamen-
Presença de tecido glandular ectópico na vagina. Há duas variedades – to dos pequenos lábios, do freio e do prepúcio do clitóris e estreitamento
uma, mais frequente, relacionada à exposição ao dietilestilbestrol (DES) in do introito vaginal. Em casos de dúvida ou de falha ao tratamento inicial,
utero; e a outra, pouco frequente, não relacionada a essa exposição. Em realiza-se biópsia para confirmação diagnóstica.
geral, é assintomática e a maioria regride espontaneamente. A adenose
pode se desenvolver após o uso de 5-fluorouracil (5FU) para tratamento de
ATENÇÃO!
infecção vaginal por papilomavírus humano (HPV). Em casos muito raros,
pode haver transformação em adenocarcinoma de células claras de vagina. Na histopatologia, um aspecto característico do líquen escleroso é a
presença de hialinização da derme superficial.
■■ AFECÇÕES NEOPLÁSICAS DA VAGINA
Entre as neoplasias benignas, as mais frequentes são os cistos derivados O tratamento de escolha é feito com corticosteroides tópicos de alta
de restos paramesonéfricos, mesonéfricos (cistos de Gartner) e do seio potência, como o propionato de clobetasol 0,05%, pomada, na dose de
urogenital, e os cistos de inclusão. Outros tumores incluem os pólipos fi- uma vez ao dia por 30 dias, reduzindo-se gradualmente com a melhora
broepiteliais e os leiomiomas. do quadro clínico. Outros tratamentos tópicos incluem o corticosteroide
de média potência, furoato de mometasona 0,1%, pomada, utilizado da
CISTO DE GARTNER mesma forma que o clobetasol, e imunomoduladores (tacrolimo e pime-
Tumor que se origina no trajeto do ducto mesonéfrico (de Wolff), poden- crolimo), usados duas vezes por dia por três meses ou até uma semana
do situar-se em qualquer local entre o colo do útero e o introito vaginal. após o desaparecimento dos sintomas.
530 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
SIRINGOMA
Entre as afecções neoplásicas benignas da vulva, observam-se mais
Também conhecido como hidroadenoma, é originado das glândulas sudo- frequentemente os cistos epidérmicos, o cisto do ducto da glândula
ríparas écrinas e raro na vulva. Acomete mulheres jovens após a puberda- maior (de Bartholin) e o fibroma.
de. Geralmente, é assintomático, mas pode associar-se com prurido local. De modo geral, as afecções neoplásicas benignas da vulva e vagina
Apresenta-se como pápulas amarelo-acastanhadas ou esbranquiçadas, são assintomáticas e podem ocasionar desconforto quando atingem
achatadas, de 1 a 3 mm de diâmetro, geralmente múltiplas e bilaterais. O grandes volumes.
diagnóstico é clínico com confirmação histopatológica. O tratamento é ex-
pectante nas lesões assintomáticas. Nas sintomáticas, podem-se realizar
excisão das lesões, eletrocirurgia, crioterapia ou laserterapia. ■■ LEITURAS SUGERIDAS
FIBROMA Corazza M, Borghi A, Minghetti S, Toni G, Virgill A. Clobetasol propionate vs.
mometasone furoate in 1-year proactive maintenance therapy of vulvar
Também conhecido como fibroma mole ou acrocórdon, origina-se na ex- lichen sclerosus: results from a comparative trial. J Eur Acad Dermatol
tremidade do ligamento redondo do útero que se insere na região anterior Venereol. 2016;30(6):956-61.
da vulva ou se desenvolve a partir de fibroblastos da derme ou do tecido Lev-Sagie A. Vulvar and vaginal atrophy: physiology, clinical presentation and
conectivo. Não apresenta sintomas, mas a paciente pode referir o apare- treatment considerations. Clin Obstet Gynecol. 2015;58(3):476-91.
cimento de tumor na região vulvar. Quando atinge volumes maiores, ge- Hacker NF, Eifel PJ, van der Velden J. Cancer of the vulva. Int J Gynaecol Obstet.
ralmente ocasiona desconforto à deambulação, ao sentar-se ou durante a 2012;119 Suppl 2:S90-6.
relação sexual. Ao exame físico, observa-se massa séssil ou pediculada, de Maldonado VA. Benign vulvar tumors. Best Pract Res Clin Obstet Gynaecol.
forma globosa ou ovoide, superfície lisa ou levemente bocelada e consis- 2014;28(7):1088-97.
tência elástica, da cor da pele ou acastanhada. O diagnóstico é clínico com Martins NV, Ribalta JCL, editores. Patologia do trato genital inferior. São Paulo:
confirmação histopatológica. Em tumores de pequeno volume, pode-se Roca; 2005.
adotar conduta expectante e/ou eletrocoagulação. Em tumores maiores,
indica-se a remoção cirúrgica.
LIPOMA
Tumor do tecido gorduroso, raro na vulva. Acomete mulheres adultas e 93
mostra-se como tumor séssil ou pediculado, de consistência amolecida e
volume variável, principalmente nos grandes lábios e ao redor do clitóris. NEOPLASIAS INTRAEPITELIAIS DO
O crescimento é lento e raramente causa sintomas. O diagnóstico é clíni-
co com confirmação histopatológica. O tratamento se dá com remoção
TRATO GENITAL INFERIOR
cirúrgica.
A história natural dessas lesões caracteriza-se pela persistência da até as regiões perianal e inguinal e as nádegas. O prurido é o sintoma
infecção viral além do período habitual de 18 a 24 meses, característica predominante. Contudo, lesão hiperpigmentada, assimétrica e de bordas
do clareamento das infecções virais de baixo grau. Embora a infecção viral irregulares pode corresponder a melanoma in situ. Em geral, lesão única,
seja apanágio de populações jovens, de início precoce de atividade sexual, acomete com maior frequência os pequenos lábios e o clitóris.
a média de idade das portadoras de lesões precursoras costuma ser maior
em aproximadamente uma década, entre 25 e 35 anos.
■■ DIAGNÓSTICO
À semelhança do que ocorre com as neoplasias intraepiteliais de
baixo grau, melhor chamadas de infecção viral pelo HPV, as lesões pre- Diante da sintomatologia pouco significativa das neoplasias intraepite-
cursoras NIE II e III também podem apresentar remissão espontânea, con- liais, uma vez mais realça-se o valor da busca dos fatores de risco para
tudo em menor frequência. A persistência dessas lesões, em especial em infecção por HPV, seu principal agente etiológico. Destacando-se aqueles
mulheres com resistência imunológica rebaixada, é fator preponderante fatores que favorecem a persistência da infecção e permitem a sua pro-
para sua evolução em tempo variável de meses a anos, em decorrência da gressão, como presença de vírus de alto risco oncogênico, situações de
agressividade do agente e da pouca resistência imposta pelas condições imunossupressão, predisposição orgânica intrínseca para quadros evolu-
gerais do organismo comprometido. tivos, entre outros.
A realização do exame citopatológico esfoliativo das lesões pode ser es-
clarecedor desde o início, mostrando as atipias celulares sugestivas de cada
ATENÇÃO! etapa, porém também pode esconder o verdadeiro teor da afecção, por pou-
ca representatividade de células atípicas, defeitos de coleta ou presença de
Mulheres com acentuada imunossupressão, como naquelas com infec-
outros elementos passíveis de confusão. Esse exame será referido como com-
ção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), apresentam maior
patível com lesão de alto grau, eventualmente sugerindo atipia moderada ou
frequência, persistência, comprometimento recidivante e evolutivo das
neoplasias intraepiteliais escamosas de alto grau. acentuada. Obedecidos os rigores técnicos que o método exige, mais de 90%
das neoplasias intraepiteliais do colo uterino são diagnosticadas. Essas cifras
são menores para as lesões situadas na vagina, e, para as lesões vulvares, o
2 | Neoplasias intraepiteliais da linhagem glandular: nas últimas dé- método é de pouca aplicabilidade, em decorrência da pequena descamação
cadas, foi possível observar aumento de diagnósticos de neoplasias glan- celular oferecida por este segmento de genitália inferior.
dulares intraepiteliais do colo uterino, possivelmente relacionadas ao HPV A alteração do exame citopatológico dirige o caso obrigatoriamente
tipo 18. para a realização da colposcopia, que, por sua vez, localizará e definirá o
Ao contrário do que ocorre com a lesão de células escamosas, trata-se tipo de imagem e possível biópsia. Até então, só se tem a suspeição de
de desarranjo do epitélio glandular endocervical que passa a ser estrati- área alterada, porém sem identificação de sua gravidade.
ficado e a exibir alterações na distribuição de cromatina nuclear. Como A análise do exame histopatológico descreverá, então, as alterações
essas lesões envolvem as criptas glandulares situadas profundamente no atípicas de cada etapa evolutiva das neoplasias intaepiteliais de alto grau,
estroma cervical, condicionam atitudes terapêuticas excisionais. escamosas, glandulares ou de outra linhagem.
A vulva também é sede de neoplasia intraepitelial de linhagem glan- As neoplasias intraepiteliais de grau II, chamadas displasias modera-
a a
dular, a doença de Paget, entidade rara, que incide na 6 e 7 décadas de das, apresentam comprometimento de atipias da espessura epitelial, não
vida cujo comportamento se assemelha àquele que ocorre na mama. só da região correspondente à camada mais profunda, como também das
Como neoplasias intraepiteliais de outras linhagens celulares se ci- camadas intermediárias do epitélio. As mitoses atípicas são relativamente
tam os quadros de melanoma in situ, neoplasia também pouco frequen- frequentes e as células epiteliais descamadas exibem notória alteração da
te, encontrado na vulva, embora possa ocorrer nas paredes vaginais e na relação núcleo-citoplasma, além de alteração nuclear facilmente percep-
ectocérvice. tível, com sinais de hipercromasia nuclear e de distribuição irregular da
cromatina. Os efeitos citopáticos determinados pelo HPV podem ser iden-
■■ QUADRO CLÍNICO tificados eventualmente.
As neoplasias intraepiteliais escamosas de alto grau costumam ser assin- As neoplasias intraepiteliais de grau III, conhecidas como displasia
tomáticas, com exceção das lesões vulvares, que podem manifestar al- grave ou carcinoma in situ, por sua vez, são as que apresentam o maior
guns sintomas inespecíficos de ardor, prurido ou apenas desconforto das comprometimento do epitélio. Todas as camadas encontram-se ocupadas
regiões afetadas. por células atípicas, na maioria das vezes pequenas, com evidentes alte-
As lesões cervicais assintomáticas manifestam-se por espessamentos rações nucleares e da relação núcleo-citoplasmática. São frequentes as
epiteliais detectados colposcopicamente, como áreas acetorreagentes de mitoses atípicas. Ocorrem despolarização e desdiferenciação das várias
grau maior, comprometendo de 1 a 4 quadrantes da área periorificial do camadas epiteliais. No entanto, é da competência do anatomopatologista
colo, com bordas bem delimitadas e de superfícies irregulares, muitas ve- a caracterização final da presença de atipia e de seu grau histológico.
zes acompanhadas de alterações vasculares por vezes atípicas. A infecção pelo HPV não é evidente ao microscópio, como nos dois
As lesões vaginais seguem os mesmos padrões cervicais, quiçá pouco graus anteriores de neoplasias. A neoplasia intraepitelial de grau III apre-
mais salientes em superfície e com pontilhados e aspectos mosaiciformes. senta acentuado potencial evolutivo para o carcinoma invasor, sobretudo
As lesões vulvares têm aspecto mais variado de placas acetorreagentes, do colo uterino, sendo excepcional a sua remissão.
máculas e pápulas acinzentadas ou ligeiramente enegrecidas dispersas As neoplasias intraepiteliais de linhagem glandular serão suspeitadas
pelas diferentes áreas glabras da vulva. pelo exame citopatológico, na maior parte das vezes. Nas imagens colpos-
Em relação à doença de Paget, apresenta-se clinicamente sob a for- cópicas que adentram o canal endocervical, nas quais não se consegue
ma de lesões hiperêmicas, espessadas, de limites nítidos e com focos de visualizar o limite cranial, também é possível suspeitar de lesões glandu-
escarificação. Não raramente, áreas esbranquiçadas completam o quadro. lares. Esfoliação seletiva do canal ou a sua curetagem poderão mostrar
Pode comprometer parcial ou totalmente a vulva; às vezes, estende-se neoplasia de linhagem glandular. A coexistência de neoplasias glandulares
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 533
com as escamosas é frequente, daí ser de grande valia qualquer suspeita Para as lesões de alto grau do colo do útero, é preferencial o trata-
de sua existência. mento excisional, para o qual haverá material para estudo histopatológico
No caso da doença de Paget vulvar, histologicamente a pele apresen- que confirmará o diagnóstico final da paciente. Eventualmente, é possível
ta acantose e toda a espessura do epitélio se encontra ocupada por ninhos lançar mão da destruição da lesão em diagnóstico de NIC II, obedecendo
de células atípicas, muitas das quais com citoplasma claro e granular, ca- a alguns critérios rígidos, a saber: lesões completamente visíveis com a
racterísticas dessa doença. junção escamocolunar (JEC) visualizada e com os resultados citológicos,
Em virtude da estreita relação existente entre as neoplasias intrae- colposcópicos e histopatológicos concordes entre si. Esta opção não se
piteliais da genitália inferior e a infecção pelo HPV, os testes de biologia presta para as lesões que se localizam dentro do canal cervical. Entre os
molecular mostram maior frequência de HPV de alto risco oncogênico, na tratamentos destrutivos disponíveis, o que melhor se adapta para colo
gênese das lesões de pior prognóstico. A identificação do DNA viral será uterino é a vaporização a laser, técnica que consegue destruir a zona de
obtida por captura híbrida® ou reação em cadeia da polimerase (PCR), transformação em extensão e profundidade, atingindo o fundo da cripta
que favorecerá a identificação para a genotipagem. Recentemente, mé- glandular, que pode chegar a 5 mm no estroma cervical. A cicatrização é
todos mais avançados de técnicas biomoleculares procuram identificar a de boa qualidade, com mínimas sequelas cicatriciais, e a JEC mantém-se
expressão dos RNA-mensageiros dos oncogenes E6 e E7 dos HPV 16 e 18 visível em 90% dos casos. A crioterapia é descrita na literatura para trata-
como recurso para definir quais lesões estariam mais propensas a evoluir, mento da NIC, porém é pouca utilizada no Brasil. A eletrocoagulação pode
necessitando, portanto, de maior cuidado no seguimento. ser utilizada, tomando-se cuidado com o uso de eletrodo em agulha para
Esses métodos, embora disponíveis no mercado, precisam ser rigoro- destruição dos orifícios glandulares, técnica que deve ser realizada sob
samente avaliados, no tocante à avaliação e à utilidade, para não onerar, visão colposcópica e analgesia. A eletrocoagulação convencional não deve
sobremaneira, as pacientes e os serviços médicos mais populares. ser utilizada para lesões de alto grau, pois não atinge a cripta glandular e
A abordagem diagnóstica das neoplasias intraepiteliais de colo, vagi- pode sepultar neoplasia no fundo da cripta.
na e vulva está resumida na Figura 93.1. A técnica mais utilizada para excisão das lesões cervicais é a cirur-
gia por ondas de alta frequência (CORAF), em que a alça de excisão é
adaptada ao tamanho da lesão e à extensão ao canal endocervical. Para
NEOPLASIA lesões completamente ectocervicais (zona de transformação – ZT tipo
INTRAEPITELIAL 1), fazem-se excisões rasas, retirando mais o componente ectocervical.
(COLO, VAGINA, VULVA)
Para lesões que adentram parcialmente o canal endocervical, em que
se visualiza o limite cranial (ZT tipo 2), faz-se a excisão retirando mais
profundamente o canal; para aquelas que se perdem no canal e não se
Colposcopia identifica o limite superior (ZT tipo 3), é necessária a técnica de coniza-
Citologia Histologia
Vulvoscopia
ção, tanto com alta frequência, pelo eletrodo em agulha, como com laser
ou bisturi.
Neoplasia graus II e III Em virtude da suspeita de lesão glandular ou achado de microinva-
Lesão de Achados (colo, vagina), usual e são, a recomendação é a conização a bisturi. Teoricamente é mais indica-
alto grau maiores diferenciada (vulva) da, por retirar mais tecido, por ser de melhor interpretação histológica, por
não apresentar carbonização de margens. De acordo com o diagnóstico
FIGURA 93.1 ■ Abordagem diagnóstica das neoplasias final e a idade da paciente, pode ser considerada o tratamento definitivo
intraepiteliais de colo, vagina e vulva. para o caso. Como há comprometimento da estrutura cervical por meio
dessa técnica, poderá acarretar, em futuras gestações, abortamento, rotu-
ra prematura de membranas e trabalho de parto prematuro.
■■ TRATAMENTO Em lesões de alto grau em paredes vaginais, ou neoplasias intrae-
O tratamento das neoplasias intraepiteliais do trato genital inferior piteliais de vagina (NIVA), o método de excelência é vaporização a laser
depende de inúmeros fatores, além, obviamente, do órgão acometido – de CO2. O epitélio vaginal apresenta espessura muito fina e o laser tem a
vulva, vagina ou colo uterino. Entre eles, merecem destaque: precisão de atingir toda a área afetada. Demarca-se a lesão com o uso do
grau histológico e extensão da lesão; lugol, facilitando, assim, a orientação do feixe do laser. Em casos de lesões
idade da paciente; muito extensas, recidivantes e em imunossuprimidas, tem sido associa-
desejo reprodutivo; do o uso do 5-fluorouracil a 5% neoadjuvante ou adjuvante, na forma
concomitância com outras ginecopatias; de creme. Utilizam-se 2,5 gramas intravaginal com frequência quinzenal,
concomitância com gestação. perfazendo um total de até 10 ciclos, adequando o número de ciclos de
acordo com a resposta clínica. Tem sido também utilizado o imiquimode
intravaginal, porém sua indicação de uso em mucosas é off-label. A litera-
ATENÇÃO! tura mostra vários esquemas posológicos com bons resultados em relatos
As lesões de alto grau, por apresentarem potencial evolutivo para de caso, com remissão da lesão em situações de persistência e recidiva
câncer, devem ser sistematicamente tratadas. Exceção se faz frente ao após outras formas de tratamento. A excisão de lesão vaginal estaria indi-
diagnóstico de neoplasia intraepitelial de colo nível II (NIC II) em adoles- cada principalmente para aquelas localizadas na cicatriz de cúpula vaginal
centes, para o qual a maioria dos consensos atuais recomenda a condu- em mulheres submetidas à histerectomia por neoplasia cervical prévia.
ta expectante, em virtude da alta taxa de remissão espontânea – acima Nessa situação, em que há risco de lesão residual na linha de sutura, ou
de 60% em até dois anos de seguimento. Nessas jovens, deve-se fazer nos ângulos da cúpula, é indicada a colpectomia via vaginal ou abdomi-
controle citocolposcópico semestralmente, indicando-se conduta ativa nal. A eletrocirurgia (CORAF) pode ser realizada, desde que por cirurgião
somente se houver agravamento do quadro ou diante da persistência com habilidade, sendo reservada apenas para lesões em paredes laterais,
de lesão após os dois anos de seguimento. jamais em parede vaginal anterior ou posterior.
534 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
REVISÃO
■■ VAMBERTO OLIVEIRA DE A. MAIA FILHO
As neoplasias intraepiteliais de colo (NIC), de vagina (NIVA) e da
■■ EDUARDO L. A. MOTTA
vulva (NIV) são diagnosticadas pelo tripé da citologia, colposcopia
e histopatologia.
Firmado o diagnóstico de lesão de alto grau (graus II e III), é indica-
do o tratamento pelo risco de evolução para câncer. Com o contínuo adiamento pelos casais em ter filhos, observa-se o cres-
Em colo uterino, o tratamento preferencial é a excisão com alças cente interesse nos temas relacionados à infertilidade, um problema com-
de ondas de alta frequência; em vagina, vaporização a laser; e, em plexo e com claras e importantes repercussões médicas, psicossociais e
vulva, excisão quando do tipo diferenciado e vaporização a laser, econômicas. De acordo com a American Society for Reproductive Medicine
1
quando do tipo usual. (ASRM), aproximadamente 6,1 milhões de casais americanos, ou seja,
Outras modalidades terapêuticas são indicadas de acordo com a aproximadamente 10% da população em período fértil, necessitaram de
extensão, a multicentricidade e o estado imunológico da paciente. alguma intervenção no tocante à fertilidade. A eficiência reprodutiva hu-
mana é diretamente relacionada à idade dos gametas, sobretudo a quali-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 535
dade ovular, e a idade da mulher apenas acentua esse fato, pois é nítida a número aproximado de 6 a 7 milhões. Essas unidades primordiais
queda reprodutiva a partir dos 35 anos e dramática após os 40. Ademais, iniciam sua divisão meiótica, mas a interrompem na prófase I. Ao
com o tempo, a mulher também está mais sujeita aos problemas tubários, nascimento, ocorre a perda, por atresia, de grande parte dessas
infecções, endometriose, entre outras afecções. células germinativas, e este número já cai para algo em torno de
Conceitua-se classicamente infertilidade como a ausência de gravidez 1 a 2 milhões de oócitos; na puberdade, são encontrados cerca
após um ano de relações sexuais desprotegidas e com ciclos menstruais de 300 mil. Durante a vida reprodutiva, ou menacme, os folículos
regulares. Contudo, esses conceitos estão sujeitos a modificações de acor- ovarianos serão recrutados para reassumir a meiose, por mecanis-
do com a idade do casal, principalmente no tocante à idade da mulher. É mos ainda não completamente esclarecidos, mas dependentes, no
possível ainda separá-la em primária, quando a gestação nunca ocorreu, início, de fatores intrínsecos (autócrinos e parácrinos) e, após, das
ou secundária, quando a gestação já ocorreu. gonadotrofinas. Desse modo, é inerente estabelecer que os folí-
Diante desse cenário, importantes avanços médicos ocorreram, so- culos mais sensíveis à ativação serão os inicialmente disponibili-
bretudo pelo advento da manipulação e fertilização dos gametas em labo- zados, permanecendo os mais resistentes para a fase reprodutiva
ratórios apropriados, ou fertilização in vitro (FIV), propiciando a oportuni- final. Logo, após os 35 anos, há necessidade de maiores doses de
dade de se obter uma gravidez em situações não imaginadas uma geração gonadotrofinas para sensibilizar uma menor coorte de folículos
atrás, contribuindo para tal a queda de barreiras econômicas e culturais. disponíveis, possivelmente contribuindo, dessa forma, para erros
na recuperação da divisão meiótica, atribuindo menor qualidade
aos oócitos.
■■ FISIOPATOLOGIA
A OMS tem concentrado esforços na análise e no diagnóstico das condi-
ções médicas que determinam a infertilidade. Em países desenvolvidos, ATENÇÃO!
fatores femininos são responsáveis por cerca de 37% da infertilidade con-
Mulheres na transição menopausal podem continuar a ovular regu-
jugal, e os masculinos, 13% dos casos de infertilidade. Ambos são res-
larmente, mas a gestação é exceção, face à inabilidade de restituir a
ponsáveis por 35%. Em 15%, não se encontra a causa para o problema.
meiose oocitária, levando a altas taxas de aneuploidias nos oócitos
Entende-se que avaliação do casal é a chave para o preciso diagnóstico e
remanescentes. Fatores adicionais, como tabagismo, radiação, quimio-
a melhor terapia visando à gestação.
terapia e doenças autoimunes, também contribuem de forma desfavo-
Ainda segundo a OMS,2 as causas mais comuns de problemas, no
rável ao processo de fertilidade.
sexo feminino, são: ovulatórios (25%); endometriose (15%); aderências
pélvicas (12%); obstrução tubária (11%); alterações tubárias diversas
(11%); e hiperprolactinemia (7%). Fatores tuboperitoneais e aderências pélvicas: problemas nas
Distúrbios ovulatórios: a anovulia crônica, sobretudo nas mulhe- tubas uterinas e aderências pélvicas prejudicam o transporte nor-
res jovens, decorrente da síndrome dos ovários policísticos (SOP), mal do oócito e dos espermatozoides. As principais causas de in-
é a principal condição da infertilidade, embora outras condições fertilidade por fator tubário são as doenças inflamatórias pélvicas
também devam ser lembradas. Ciclos ovulatórios são observados (DIPs) provocadas por patógenos como a clamídia e a gonorreia,
quando há menstruação cíclica e mensal. além de infecções secundárias, como por apendicite, diverticulites
A OMS classificou a anovulação em grupos, conforme o e tuberculose (TB) pélvica. Entre as causas não infecciosas, desta-
Quadro 94.1. cam-se a endometriose e as aderências pélvicas consequentes a
processos cirúrgicos prévios.
Pacientes com obstrução tubária distal podem desenvolver
QUADRO 94.1 ■ Classificação da anovulação segundo a OMS hidrossalpinge, que, além de ser um fator impeditivo mecânico de
encontro dos gametas, decresce os resultados da FIV por criar um
1 | Anovulação hipogonádica hipogonadotrófica: mulheres com níveis de ambiente hostil para a nidação, além do fator mecânico, com o
hormônio folículo-estimulante (FSH) baixo ou normal/baixo e estrogênio
líquido lavando a cavidade uterina (wash out). A salpingectomia,
baixo devido à baixa liberação de hormônio liberador de gonadotrofina
nesses casos, aumenta as chances de sucesso da FIV.
(GnRH) ou irresponsividade ao GnRH
Miomatose uterina: o mioma uterino é um tumor benigno fre-
2 | Anovulação normogonadotrófica e normoestrogênica: os níveis de quentemente observado em exames de rotina em mulheres saudá-
gonadotrofinas e estrogênio são normais, contudo a secreção durante a veis. Muitos são os trabalhos que tentam avaliar o prejuízo causado
fase folicular é anormal. A SOP é o principal grupo pelos miomas, mas, em concreto, apenas os miomas intracavitários
ou de grandes dimensões (+ 4 cm) representariam um problema à
3 | Anovulação hipogonádica hipergonadotrófica: níveis de FSH alto e nidação dos embriões. Quando estes miomas intracavitários são
de estrogênio baixo. A principal causa é a falência ovariana prematura ou
removidos, as taxas de gestação aumentam significativamente.
resistência ovariana
O pólipo uterino de grande dimensão poderia propiciar a mesma
4 | Hiperprolactinemia: inibe a secreção regular de gonadotrofinas e, dificuldade.
consequentemente, a secreção de estrogênio. Gonadotrofinas geralmente Anormalidades uterinas: as malformações congênitas e/ou ad-
estão normais quiridas, além de deturparem a anatomia da cavidade, estão re-
lacionadas a distúrbios da proliferação endometrial, prejudicando
Fonte: World Health Organization.2
a implantação normal. Malformações são normalmente ligadas a
abortos de repetição ou partos prematuros. Nesses casos, a com-
Idade oocitária: um importante fator que afeta a fertilidade fe- petência do colo uterino deve ser sempre avaliada, e procedimen-
minina é a idade. O número máximo de oogônias é atingido ainda tos como cerclagem ou colocação de pessários devem ser conside-
a
na vida intrauterina, ao redor da 20 semana de gestação, com um rados como forma de prevenir perdas gestacionais.
536 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Avaliação uterina: a US é o método mais empregado para identi- gem sanguínea de LH e/ou progesterona, observação do muco cervical,
ficar a integridade da cavidade uterina. Simples, prático, inócuo e aferição da temperatura basal, entre outros.
cada vez mais popular este deve ser o método inicial de avaliação De todos os métodos empregados nas técnicas de baixa complexida-
uterina. Embora outros métodos também possam ser realizados, de, inquestionavelmente o estímulo medicamentoso da ovulação é o mais
como a histeroscopia diagnóstica ou a histerossonografia, estes eficaz. É realizado pela maior liberação do FSH, no caso endógeno, por
com mais efeitos colaterais e desconforto a paciente. meio do uso de antiestrogênicos, como o citrato de clomifeno, ou mesmo
De acordo com a suspeita diagnóstica, são requisitadas outras inibidores da aromatase, como o letrozole. Ambos diminuem a atividade
formas de avaliação, como: pesquisa de anticorpos antifosfolípi- deste esteroide na hipófise, acarretando maior secreção do FSH, como me-
des, trombofílias herdadas/adquiridas, cariotipagem, além da pes- canismo compensatório.
quisa da endometriose, por US específica com preparo intestinal ou O citrato de clomifeno pode ser utilizado em doses que variam de 50
RM da pelve podem ser necessários. a 200 mg ao dia, durante cinco dias consecutivos, iniciando do 2o ao 5o dia
do ciclo. Quanto mais cedo o início do uso desses medicamentos, maior
■■ TRATAMENTO a liberação do FSH endógeno e maior o recrutamento folicular; porém,
se o intuito for apenas promover um crescimento mais coordenado do(s)
Didaticamente, é possível dividir os inúmeros tratamentos por técnicas de
folículo(s) naturalmente selecionado(s), mais tardio deve ser seu emprego.
reprodução assistida em dois grandes grupos: os de baixa complexidade,
O letrozole é utilizado de forma semelhante em doses de 2,5 a 5 mg.
em que os gametas são encontrados dentro do organismo, ou fertilização
A administração exógena de gonadotrofinas apresenta maior eficá-
in vivo; e os de alta complexidade, que se baseiam no encontro laborato-
cia. Essas preparações podem ser de origem urinária (FSH purificado ou
rial do ovócito e do espermatozoide, ou FIV.
hMG) ou recombinante (FSH recombinante). São comumente utilizadas em
BAIXA COMPLEXIDADE doses que variam de 75 a 150 UI ao dia, em aplicações subcutâneas (SC).
Não são recomendadas doses maiores do que estas para tratamentos de
Para esse grupo, são reservados geralmente casais nos quais a etiologia
baixa complexidade pelo risco de seleção de numerosos folículos e, con-
da infertilidade não é tão grave, isto é, existe boa reserva ovular, ao me-
sequentemente, indesejáveis gestações múltiplas, além do hiperestímulo
nos uma tuba patente e análise de sêmen adequada.
ovariano. Quando da administração exógena de FSH ou hMG, é imperativo
As principais indicações para essa classe de tratamentos incluem
mimetizar o pico do LH, por meio da administração da gonadotrofina co-
mulheres com anovulação crônica, fator cervical, endometriose de está-
riônica humana (hCG).
dios clínicos I ou II (mínima ou leve), ISCA e fator masculino leve (a con-
tagem seminal apresenta concentração superior a 5 milhões de esperma-
tozoides móveis após o processamento). Vale ressaltar a necessidade de ATENÇÃO!
que sejam móveis progressivos, pois as demais categorias (móveis não
progressivos ou imóveis) não oferecem condições para uma fertilização É mandatório controle ultrassonográfico quando se realiza a estimula-
in vivo adequada. ção controlada dos ovários. O objetivo é controlar o número de folícu-
Os tratamentos in vivo englobam uma série de intervenções, que los recrutados para que não seja superior a três (ou quatro); caso esse
se iniciam com uma simples orientação do período fértil do casal e do número seja ultrapassado, tem-se alto risco de gestação múltipla, o
número mínimo de relações sexuais necessárias para uma boa taxa de ciclo deve ser convertido para FIV ou cancelado, e o casal aconselhado
fecundidade. Considera-se que duas relações sexuais por semana trazem a manter relações com preservativo até a próxima menstruação.
uma boa perspectiva de gestação, não se observando um aumento signi-
ficativo quando se passa a três relações por semana, o que justifica não
Após a estimulação controlada dos ovários e indução da ovulação,
aconselhar o casal a mudar sua rotina sexual caso já cumpra a frequência
é possível definir um intervalo recomendável para que o casal tenha re-
de duas relações. É possível visualizar esses dados na Tabela 94.2.
lações sexuais, que deve ser compreendido entre 36 e 42 horas após a
administração do hCG. Esse tipo de conduta é chamado de coito progra-
TABELA 94.2 ■ Taxa de concepção em menos de 6 meses, de mado (CP).
acordo com a frequência semanal de relações sexuais Outra forma de ofertar o gameta masculino após a rotura folicular é
por meio da inseminação intrauterina (IIU), que consiste em coletar uma
FREQUÊNCIA DE RELAÇÕES CONCEPÇÃO EM MENOS amostra de sêmen, realizar uma seleção dos espermatozoides com maior
POR SEMANA DE 6 MESES (%) motilidade e concentrá-los em volume de 0,5 a 1 mL em meio de cultura,
a serem colocados em uma seringa acoplada a um cateter próprio, que é
Menos que uma vez 17
introduzido pelo orifício do colo uterino e injetado 36 a 42 horas após a
Uma vez 32 administração do hCG.
Qualquer que seja o método empregado, as melhores taxas de suces-
Duas vezes 46 so são observadas nos três meses iniciais, ou seja, a repetição desses tra-
Três vezes 51
tamentos por longos períodos, além de ineficaz, apenas desgasta o casal
e a relação médica.
1
Fonte: American Society for Reproductive Medicine.
ALTA COMPLEXIDADE
O aconselhamento pode se sofisticar quando se determina o dia da A FIV surgiu com o intuito de solucionar o fator tubário. O primeiro caso de
ovulação ou se provoca esse evento. É possível lançar mão de testes para sucesso dessa técnica, relatado por Steptoe e Edwards em 1978, propiciou
verificar a ovulação, como dosagem de hormônio luteinizante (LH, do in- uma revolução na infertilidade conjugal e contribuiu para o surgimento
glês luteinizing hormone) na urina, seguimento ultrassonográfico, dosa- dessa nova área de atuação.
538 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Nos anos 1980, a criopreservação de embriões obteve grande desta- um embrião. Essa preocupação visa a reduzir a iatrogenia verificada quan-
que, mas ainda faltava solucionar o fator masculino grave. Em 1992, Paler- do se tem uma gestação múltipla resultante de tratamentos por técnicas
mo, acidentalmente, “injetou” um espermatozoide no citoplasma ovular, de reprodução assistida. O futuro caminha para a adoção da SET como a
observando sinais de fertilização no dia seguinte.4 Surgiu a injeção intraci- escolha definitiva, mas para tanto as taxas de sucesso precisam aumentar
toplasmática de espermatozoide (ICSI) e a fase de manipulação celular nos e atingir um nível satisfatório para esta medida ser universal.
gametas e nos embriões. Desse modo existem duas formas de produzir a As taxas de sucesso dos tratamentos de FIV também dependem da ida-
fertilização laboratorial: a forma clássica e a ICSI. de da mulher. Dados do Centers for Disease Control and Prevention (CDC)6
A FIV clássica tem como condições mínimas a qualidade seminal. Ne- nos Estados Unidos revelam que 40% dos ciclos iniciados em mulheres com
cessita-se de ao menos 3 milhões de espermatozoides móveis progressi- menos de 35 anos resultaram em crianças nascidas vivas, taxa reduzida a
vos por mL no processamento seminal e com morfologia estrita de Krüger somente 30% em mulheres entre 35 e 37 anos, 20% naquelas entre 38 e 40,
maior ou igual a 4%. Sêmen com qualidade inferior não deve ser utilizado 12% entre 41 e 42 e 4% em mulheres com mais de 43 anos.
para esse tipo de tratamento.
Têm-se, então, como principais indicações da FIV clássica o fator tu- DOAÇÃO DE GAMETAS
boperitoneal (por sequela de DIP, laqueadura tubária ou endometriose
Surgiu para solucionar os problemas encontrados em pacientes com falên-
avançada) e casos com falhas repetidas em tratamentos com baixa com-
cia ovariana prematura, com baixa resposta à estimulação controlada dos
plexidade ou de infertilidade sem causa aparente.
ovários e menopausadas e também em homens com azoospermia.
Para a ICSI, as indicações fundamentalmente são os casos de fator
masculino grave, com concentração de espermatozoides móveis progres- O Conselho Federal de Medicina (Resolução no 1.352/98)7 determina
sivos menor do que 3 milhões por mL e/ou morfologia estrita de Krüger que a doação de gametas deve ser anônima e não pode envolver aspectos
menor do que 4% de formas normais. Além disso, pode-se incluir como in- financeiros.
dicações nesse tipo de tratamento a endometriose de estádios clínicos III e
IV (moderada e grave), mulheres com mais de 35 anos (pelo espessamento ÚTERO DE SUBSTITUIÇÃO
da zona pelúcida e dificuldade de penetração natural do espermatozoide) Mulheres com impedimento para gestar, por não terem mais útero ou por
e falhas em tratamentos anteriores. terem doenças que tragam risco à vida, podem valer-se dessa técnica, na
Os tratamentos de FIV, clássica ou ICSI, são chamados de alta comple- qual os embriões de um casal são transferidos para o útero de uma mulher
xidade por exigirem a presença de um laboratório de FIV e alta tecnologia. que os gestará.
A FIV é idealmente realizada em ciclos com a estimulação ovariana O Conselho Federal de Medicina determina normas específicas e que
medicamentosa, sendo diversos os protocolos existentes. Contudo, resu- não haja envolvimento comercial no tratamento.
midamente, todos se baseiam na administração, desde os dias iniciais, de
altas doses de gonadotrofinas, acima de 150 unidades ao dia e chegando MICROCIRURGIAS
a doses de 450 UI. Em qualquer ciclo estimulado, é mandatório o bloqueio Nessa modalidade, têm-se basicamente as recanalizações tubárias ou de
da atividade hipofisária, como forma de impedir a liberação prematura do deferentes para pacientes com ligadura tubária ou homens vasectomiza-
LH, e, com isso, evitar a ovulação espontânea precoce, o que liberaria os dos, além de técnicas para a obtenção de espermatozoides.
óvulos, impedindo a sua captação. Para tal finalidade, utilizam-se análogos Para que a recanalização tubária seja feita, é obrigatório que a ampo-
do GnRH, que ocupam os receptores de membrana da hipófise e impedem
la e as fímbrias estejam intactas e haja uma tuba com comprimento final
sua ativação. Se forem utilizados análogos agonistas (a-GnRH), esse blo-
pós-recanalização maior do que 5 cm de extensão. O tempo de ligadura
queio é mais tardio e haveria a necessidade de utilizar esses fármacos antes
tubária não interfere nos resultados, e o mais importante para o prognós-
de iniciar o ciclo de estimulação propriamente dito (fase lútea média do
tico é a idade da paciente.
ciclo antecessor), denotando o chamado ciclo longo. Contudo, se forem uti-
A ausência de espermatozoides no ejaculado, por causas obstrutivas
lizados os análogos antagonistas (antag-GnRH) de ação quase imediata, o
ou não, pode ser ultrapassada pela obtenção do gameta masculino direta-
bloqueio se dará durante a fase estimulatória final e os ciclos serão curtos.
mente no seu sítio de produção (testículo) ou armazenamento (epidídimo).
Seja no protocolo longo ou curto, o hCG é administrado para mime-
tizar o pico de LH, responsável por restituir a divisão meiótica nos óvulos. Quando se busca no epidídimo, tem-se o procedimento chamado de PESA
Aproximadamente 35 horas após a administração do hCG, os ovócitos re- (percutaneous sperm aspiration) ou o MESA (microsurgical epididymal
assumem a meiose e são captados por punção e aspiração dos folículos sperm aspiration); quando no testículo, há o TESA (testicular sperm aspira-
ovarianos guiadas por US. O procedimento é rápido, com duração de 15 tion) ou TESE (testicular sperm extraction).
minutos, e preferencialmente feito com a paciente sedada. Finalizando, os tratamentos por técnicas de reprodução assistida de-
De 3 a 4 horas após a recuperação dos oócitos, é feita a fertilização vem ser individualizados, procurando sempre obter o melhor resultado,
laboratorial, clássica ou ICSI. Os embriões resultantes são mantidos em um com o menor grau de invasão possível. Diante da dificuldade de se estabe-
meio de cultura próprio e em incubadora com temperatura e concentração lecer, muitas vezes, um diagnóstico preciso, cabe ao especialista aconselhar
de gases controladas durante 3 a 5 dias. os casais inférteis sobre os benefícios e complicações de cada tecnologia.
Após esse período, são selecionados os embriões de melhor divisão ce-
lular ao longo do cultivo para a transferência na cavidade uterina. Esse pro-
cedimento consiste em inserir um cateter contendo os embriões pelo orifício REVISÃO
interno do colo uterino e acoplado a ele uma seringa com meio de cultura. Os problemas mais comuns de infertilidade feminina são: idade ovu-
A legislação brasileira não define um número de embriões permitidos lar, distúrbios ovulatórios, endometriose, aderências pélvicas, obs-
para serem repostos ao útero, mas a Resolução CFM no 2.121/20155 nor- trução tubária, alterações tubárias diversas e hiperprolactinemia.
matiza essa prática e o limita a 02 (dois) embriões até os 35 anos, 03 (três) A investigação do casal infértil deve passar pela análise seminal,
entre 36 e 39 anos e até 04 (quatro) apos os 40. Alguns centros já realizam histerossalpingografia, avaliação ovulatória e avaliação uterina.
a SET (do inglês single embryo transfer), transferência eletiva de apenas
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 539
Nenhum método 85 85 –
privação hormonal, mimetizando ciclos menstruais regulares com perda giram os de baixíssima dose (15 ou 20 µg). O objetivo é diminuir os efeitos
4,5
sanguínea em menor quantidade. colaterais, podendo acarretar aumento de sangramentos irregulares em
Quanto aos progestagênios, são compostos sintéticos derivados da algumas usuárias.
progesterona, da testosterona ou da espironalactona. Os derivados da As principais queixas são náuseas, ganho de peso, alteração de hu-
progesterona, os pregnanos, provêm da 17-hidroxiprogesterona, sem mor, mastalgia, cefaleia e sangramento irregular.
ação androgênica. Fazem parte deste grupo o acetato de ciproterona, ace-
tato de medroxiprogesterona e o acetato de clormadinona. 4,5
ATENÇÃO!
Os derivados da testosterona provêm da etiniltestosterona, com a re-
tirada de um radical metil no carbono 19 e, por isso, são chamados de As usuárias dos contraceptivos hormonais devem ser orientadas do
19-nortestosterona. Entre eles, está o levonorgestrel, o mais potente e com fato de que, no início da sua utilização, alguns sintomas podem apa-
menos efeito antiandrogênico, porém menos associado a fenômenos trom- recer e na grande maioria das vezes estas queixas tendem a diminuir
bóticos. Outros componentes deste grupo são o desogestrel e seu derivado após três meses.
ativo, o etonorgestrel, o norgestimato e seu derivado ativo norelgestromi-
na. Cita-se ainda a drospirenona, um derivado da espironalactona, que tem
Alguns efeitos são atribuídos à dose de estrogênio, como o sangra-
propriedades antimineralocorticosteroide e antiandrogênica. Por sua vez,
mento irregular que ocorre em 10-30% das usuárias no primeiro mês de
o dienogeste é um composto híbrido a partir da noretindrona e o proges-
uso, sendo uma causa frequente de descontinuidade.
tagênio mais recente o nomegestrel, conhecido por sua meia vida longa.6
Os contraceptivos hormonais têm indicação adicional na endometrio-
Os progestagênios inibem a secreção do hormônio luteinizante
se, na dismenorreia, na síndrome da tensão pré-menstrual, na mastalgia
(LH) que atua sobre o eixo hipotálamo-hipófisário, tornando o ciclo
cíclica, na adequação da data do sangramento, no sangramento uterino
anovulatório. Apresenta ainda outras ações importantes, como a al- disfuncional e nos cistos ovarianos funcionais, além de controle de ane-
teração do muco cervical que se torna hostil à passagem dos esper- mia. Secundariamente, esses métodos diminuem a incidência de câncer de
matozoides, a atrofia endometrial e a diminuição da motilidade das ovário, de endométrio e, possivelmente, colorretal.6
tubas uterinas. As principais contraindicações para os métodos hormonais combina-
Os contraceptivos hormonais combinados orais podem ser classifica- dos são as associadas com o aumento de risco de trombose (tabagismo
dos, a partir da dose estrogênica em alta (> 50 µg de etiniestradiol), mé- após 35 anos, imobilização prolongada, doenças cardiovasculares), hiper-
dia (= 50 µg de etinilestradiol) e baixa dose (< 50 µg). Hoje, prevalecem tensão arterial, enxaqueca com aura, alterações hepáticas, neoplasias
no mercado os métodos de baixa dose (30 µg) e, mais recentemente, sur- hormônio-dependentes e interação medicamentosa.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 541
QUADRO 95.2 ■ Principais condições clínicas e os critérios de elegibilidade para contraceptivos hormonais da Organização Mundial da Saúde.
Em negrito, as condições recém-atualizadas na última edição
ASSOCIAÇÃO DE
ESTROGÊNIO E
PROGESTAGÊNIO PROGESTAGÊNIO ISOLADO
PÍLULAS,
ADESIVO, ANEL INJE-
VAGINAL, INJE- TÁVEL IM- DIA- ESPER-
CONDIÇÕES ADESIVO TÁVEL PÍLULAS DMPA PLANTE SIU DIU CONDOM FRAGMA MICIDA
Idade
Menarca – 40 anos 1 1 1 1 1
> 40 anos 2 2 1 1 1
Menarca – 18 anos 1 2 1
18 aos 45 anos 1 1 1
> 45 anos 1 2 1
Menarca – 20 anos 2 2
> 20 anos 1 1
Paridade
2 dias – 4 semanas 3 3
> 4 sem 1 1
Sepse puerperal 4 4
Pós-aborto
1º trimestre 1 1 1 1 1 1 1
2º trimestre 1 1 1 1 1 2 2
Séptico 1 1 1 1 1 4 4
Tabagismo
< 35 anos 2 2 1 1 1 1 1
Obesidade
ASSOCIAÇÃO DE
ESTROGÊNIO E
PROGESTAGÊNIO PROGESTAGÊNIO ISOLADO
PÍLULAS,
ADESIVO, ANEL INJE-
VAGINAL, INJE- TÁVEL IM- DIA- ESPER-
CONDIÇÕES ADESIVO TÁVEL PÍLULAS DMPA PLANTE SIU DIU CONDOM FRAGMA MICIDA
Hipertensão arterial 1 1 1
Hipertensão controlada 1 2 1 1 1 1 1 1
TVP/EP
História pessoal 4 4 2 2 2 2 1 1 1 1
Doença aguda 4 4 3 3 3 3 1 1 1 1
Cirurgia maior
a. imobilização prolongada 4 4 2 2 2 2 1 1 1 1
b. sem imobilização 2 2 1 1 1 1 1 1 1 1
Veias varicosas 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
Valvulopatias
Não complicadas 2 2 1 1 1 1 1 1 1 1
LES
Cefaleia
Enxaqueca sem aura e idade < 35 I=2 I=2 I=1 I=2 I=2 2 1 1 1 1
anos C=3 C=3 C=2 C=2 C=2
Enxaqueca sem aura e idade > 35 I=3 I=3 I=1 I=2 I=2 2 1 1 1 1
anos C =4 C=4 C=2 C=2 C=2
Epilepsia 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
Transtornos depressivos 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
Endometriose 1 1 1 1 1 1 2 1 1 1
Dismenorreia intensa 1 1 1 1 1 1 2 1 1 1
Ectopia cervical 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
Afecções mamárias
Mioma uterino
ASSOCIAÇÃO DE
ESTROGÊNIO E
PROGESTAGÊNIO PROGESTAGÊNIO ISOLADO
PÍLULAS,
ADESIVO, ANEL INJE-
VAGINAL, INJE- TÁVEL IM- DIA- ESPER-
CONDIÇÕES ADESIVO TÁVEL PÍLULAS DMPA PLANTE SIU DIU CONDOM FRAGMA MICIDA
Congênitas ou adquiridas 4 4 1 1 1
deformando a cavidade
ASSOCIAÇÃO DE
ESTROGÊNIO E
PROGESTAGÊNIO PROGESTAGÊNIO ISOLADO
PÍLULAS,
ADESIVO, ANEL INJE-
VAGINAL, INJE- TÁVEL IM- DIA- ESPER-
CONDIÇÕES ADESIVO TÁVEL PÍLULAS DMPA PLANTE SIU DIU CONDOM FRAGMA MICIDA
2. Medicamentos
anticonvulsivantes
Fenitoína, carbamazepina, 3 2 3 1 2 1 1 1 1 1
barbitúricos, primidona, topiramato,
oxcarbazepina
Lamotrigina 3 3 1 1 1 1 1 1 1 1
3. Terapia antimicrobiana
a. Antibióticos 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
b. Antifúngicos 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
c. Antiparasitários 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
d. Rifampicina 3 2 3 1 2 1 1 1 1 1
Alergia ao látex 3 1 3
I: início do método; C: continuidade do método; MC: índice de massa corporal; TVP: trombose venosa profunda; EP: embolia pulmonar; AVC: acidente vascular cerebral; LES:
lúpus eritematoso sistêmico; DIP: doença inflamatória pélvica; DST: doença sexualmente transmissível; ITU: infecção do trato urinário; DM: diabetes melito.
7
Fonte: World Health Organization.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 549
QUADRO 95.3 ■ Critérios de elegibilidade para métodos Trauma obstétrico colo/vagina importante D
comportamentais pela OMS
Perfuração ou rotura uterina S
MÉTODOS MÉTODOS
Pós-aborto
COM BASE COM BASE
CONDIÇÕES SINTOMAS CALENDÁRIO Não complicado A
Faixa hormonal Sepse ou febre pós-aborto D
Pós-menarca C C Hemorragia importante pós-aborto D
Perimenopausa C C Trauma colo/vagina importante D
Pós-parto sem aleitamento materno Perfuração uterina S
< 4 semanas D D Hematometra agudo D
> 4 semanas A D Histórico de gestação ectópica A
Pós-aborto C D Tabagismo A
Sangramento vaginal irregular D D Obesidade C
Corrimento vaginal D A Múltiplos fatores de risco arterial para doenças S
cardiovasculares (idade avançada, cigarro, diabetes,
Uso medicações que afetam a C/D C/D
hipertensão, dislipidemia)
regularidade do ciclo (hormônios)
Hipertensão
Doenças que cursam com C A
elevação da temperatura Controlada C
Doenças agudas D A PAS 140-159 mmHg ou PAD 90-99 mmHg C
A: aceito; C: precaução; D: postergar o método.
PAS > 160 mmHg ou PAD ≥ 100 mmHg S
Fonte: World Health Organization.7
Doença vascular S
Sepse puerperal ou febre puerperal D Dislipidemia sem outros fatores de risco cardiovascular A
Endometriose S DM
Compensada A Diabetes C
Hérnia diafragmática C
Eletiva C
Espontâneo
Uniductal Fluxo papilar patológico
Unilateral
Hemorrágico,
sero-hemorrágico Exérese seletiva
Mamografia
ou aquoso do ducto
Exérese seletiva
do ducto Seguimento
não são suficientes para diferenciar as variantes benignas das malignas Taniguchi CK, Pellegrini JR. Fluxos papilares. In: Elias S, Facina G, Araujo Neto
do tumor filoide. JT, organizadores. Mastologia: condutas atuais. São Paulo: Manole; 2014.
(Série Mastologia).
Diagnóstico Watanabe A, Fenile R. Neoplasias Benignas da Mama. In: Elias S, Facina G,
Araujo Neto JT, organizadores. Mastologia: condutas atuais. São Paulo:
O diagnóstico é clínico e a mamografia é inespecífica. A PAAF/PAAG apre-
Manole; 2014. (Série Mastologia).
senta baixo valor preditivo, provavelmente pelo fato de o tumor ser bas-
tante volumoso e apresentar, com frequência, em seu interior, áreas de
infarto hemorrágico, o que dificulta o diagnóstico. Entretanto, a punção
por agulha grossa permite o diagnóstico diferencial com algumas formas
de carcinoma que simulam tumores fusocelulares, como o carcinoma me-
taplásico. 97
O diagnóstico diferencial principal é feito com o fibroadenoma juve-
nil, que também atinge grandes dimensões, mas apresenta consistência DOR MAMÁRIA
fibroelástica e incide, em geral, na adolescência, com o sarcoma e com o
carcinoma metaplásico, como mencionado.
mento para dias alternados por mais três meses. Caso não haja melhora, brose e formação de cistos mamários. Assim, fatores como menarca preco-
aumenta-se a dose para 20 mg/dia. ce, menopausa tardia, nuliparidade, oligoparidade, primiparidade tardia e
Na falha absoluta de todas as medidas apontadas, indicam-se os ago- amamentação curta ou ausente são agravantes da AFBM.
nistas do hormônio liberador de gonadotrofina (a-GnRH). Apesar da alta Além do estímulo estroprogestativo cíclico, alinha-se, como fator
eficácia, apresentam custo elevado e alta taxa de efeitos colaterais, como hormonal envolvido na gênese da AFBM, a secreção inapropriada de
fogachos, secura vaginal, depressão e alopecia, constituindo-se medida prolactina.
de exceção. Embora os níveis séricos basais de prolactina em pacientes com AFBM
sejam normais, observou-se alteração no ritmo circadiano de liberação
desse hormônio. De fato, os medicamentos dopaminérgicos diminuem os
■■ ALTERAÇÕES FUNCIONAIS BENIGNAS DAS MAMAS
níveis de prolactina e melhoram a sintomatologia.
O termo alterações funcionais benignas da mama (AFBM) define uma con- Outros fatores etiopatogênicos, como a ingestão reduzida de ácidos
dição clínica caracterizada por dor e nodularidade mamária que aparece graxos essenciais ou excessiva de metilxantinas, carecem de comprovação
no início do menacme, intensifica-se no período pré-menstrual e tende a científica.
desaparecer após a menopausa. Foi proposto em 1994 pela Sociedade
Brasileira de Mastologia e é considerada a terminologia mais adequada QUADRO CLÍNICO
para descrever esse quadro, evitando-se expressões inapropriadas, como As manifestações clínicas das AFBM são a mastalgia cíclica, o fluxo papi-
displasia mamária e alteração fibrocística, que confundiam e ainda con- lar, as nodularidades (espessamentos) e os cistos.
fundem muitos ginecologistas e pacientes. As nodularidades são isoladas ou difusas à palpação, em geral no qua-
drante superolateral, com exacerbação no período pré-menstrual e melho-
FISIOPATOLOGIA ra clínica ou desaparecimento após a menstruação, associadas à mastalgia.
Esse quadro clínico representa a resposta funcional efetora do tecido ma- O ginecologista deve estar especialmente atento às nodularidades
mário às variações cíclica hormonais. São inúmeras as teorias que tentam isoladas que persistem após 2 a 3 fluxos menstruais, caracterizando os
explicar a fisiopatologia do conjunto das alterações benignas de origem nódulos dominantes, que fazem parte do diagnóstico diferencial do câncer
hormonal que acometem o lóbulo mamário e caracterizam a AFBM. Con- de mama, além do fibroadenoma.
siderando-se o entendimento atual da cinética celular do lóbulo, o estí- Os cistos mamários são muito comuns, incidindo principalmente
mulo estroprogestativo cíclico parece ser de fundamental importância na na faixa etária de 35 a 55 anos e coincidindo, pois, com a fase invo-
regulação de atividade proliferativa de mama e, em última análise, nas lutiva dos lóbulos mamários. Podem ser únicos ou múltiplos, uni ou
alterações funcionais que culminariam na AFBM. bilaterais. Manifestam-se clinicamente como nódulos de aparecimento
Assim, o estímulo sinérgico de estradiol e progesterona na unidade súbito, de contornos regulares, móveis e dolorosos. A consistência é
ductal lobular terminal leva à proliferação do epitélio e do estroma, pro- amolecida ou, quando o líquido intracístico se encontra sob tensão, a
duzindo nodularidade e dor na fase pré-menstrual (Figura 97.2). No fim da sensação palpatória é fibroelástica. Todos os cistos decorrem de pro-
fase lútea, com a redução dos níveis de estradiol e de progesterona, há cessos involutivos da mama. Em alguns casos, entretanto, a parede do
regressão do epitélio lobular por apoptose e também do estroma intralo- cisto sofre metaplasia apócrina, com produção ativa de líquido, cau-
bular com melhora da sintomatologia no início do fluxo menstrual. sando recidivas frequentes.
DIAGNÓSTICO
Mastalgia cíclica – fatores etiológicos Essencialmente clínico, bastando a anamnese detalhada das manifesta-
ções da doença correlacionada ao ciclo menstrual.
Fase lútea inicial
TRATAMENTO
Ativação do Estímulo sinérgico Ativação do No tratamento das AFBM, é fundamental a orientação da paciente. Deve-
epitélio lobular Estradiol/progesterona estroma intralobular -se explicar a natureza benigna das manifestações clínicas, pois a maior
Proliferação
angústia das pacientes é de que tenham câncer. A orientação é resolutiva
Fibroblasto na maioria dos casos. A dor refratária e intensa já foi abordada no tópico
epitelial (leve)
Progesterona: ação de dor mamária.
“histamínica” na ↑ Síntese de Nos cistos mamários, quando palpáveis, a punção com agulha fina,
Secreção microcirculação colágeno além de diagnóstica, é terapêutica, já que suas paredes colabam e tendem
a se aderir. Não se realiza o estudo citológico dos líquidos intracísticos,
Fluxo Vasodilatação
↑ Síntese de visto que sua correlação com o câncer é extremamente rara.
papilar
proteoglicanos O estudo citopatológico apenas está indicado quando o volume aspi-
Edema
Nodularidade rado for maior do que 50 mL ou de aspecto sanguinolento.
Espessamento Dor Poder osmótico Se, após o esvaziamento do cisto, persistir tumor residual, este deve
ser puncionado, procedendo-se ao estudo citológico. As pacientes devem
ser reexaminadas após 30 dias para surpreender recidivas. Nos cistos ma-
FIGURA 97.2 ■ Fisiopatologia das alterações funcionais benignas
mários impalpáveis e assintomáticos, não é necessária qualquer interven-
da mama.
ção. Nos sintomáticos, pratica-se a punção aspirativa guiada pela US. Os
cistos complexos, (com áreas sólidas em seu interior) devem ser tratados
Os ciclos ovulatórios sucessivos, tão frequentes nos dias de hoje pelo cirurgicamente. Da mesma forma, quando o aspirado for hemorrágico, o
estilo de vida da mulher moderna, levariam à manutenção do estímulo esvaziamento do cisto deve ser parcial para que facilite sua exérese poste-
estroprogestativo sobre o lóbulo, resultando em doenças proliferativas, fi- rior, obrigatória nessa condição (Figuras 97.3 e 97.4).
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 559
CISTO MAMÁRIO PALPÁVEL Nas mastalgias cíclicas intensas, podem ser utilizados os seguintes
medicamentos: anti-inflamatórios não hormonais; anticoncepcio-
PAAF nais; e tamoxifeno.
Líquido seroso, Líquido hemorrágico As mastalgias extramamárias são também frequentes, principal-
esverdeado ou marrom mente após os 40 anos, tendo como principais etiologias a espondi-
Esvaziamento loartrose dorsal e as contraturas musculares.
Reavaliação parcial US O uso de sutiã de tamanho inadequado pode ser causa de mastalgia
em um mês extramamária.
Estudo Entre as mastalgias acíclicas, destacam-se os cistos mamários, que
Recidiva Resolução citológico provocam dor súbita e associada a nódulo palpável.
Nos cistos volumosos e dolorosos, a PAAF está indicada para alívio
Nova Segmento Ressecção dos sintomas.
punção habitual cirúrgica
Cisto gigante (> 50 mL)
Tumor residual pós-punção
Recidivante ■■ REFERÊNCIA
(4 ou mais recidivas)
1. British Chiropractic Association. Mind your posture: bra fitting [Internet].
BCA; 2013 [capturado em 13 jul. 2016]. Disponível em: http://www.
FIGURA 97.3 ■ Fluxograma da conduta nos cistos mamários chiropractic-uk.co.uk/gfx/uploads/member%20area/New%20posture%20
palpáveis. sheets/Mind%20your%20posture-bra%20fitting.pdf
Por fim, os nódulos dominantes devem ser investigados por meio de ■■ LEITURAS SUGERIDAS
exames de imagem e/ou de PAAF ou agulha grossa (PAAG), ou mesmo por Breast Cancer Care. Breast pain [Internet]. BCC; 2015 [capturado em 13 jul. 2016].
meio da exérese cirúrgica, pois podem ser sedes de hiperplasias atípicas Disponível em: https://www.breastcancercare.org.uk/sites/default/files/
ou carcinomas. publications/pdf/bcc71_breast_pain_web.pdf
Delfan B, Zarei F, Iravani S, Ebrahimzadeh F, Adineh A, Sepahvand R. Vitamin E
and omega-3, 6 and 9 combinations versus vitamin E in the treatment of
REVISÃO mastodynia. J Nat Pharm Prod. 2015;10(2):e18659
Hueb AS. Alterações funcionais benignas da mama. In: Elias S, Facina G, Araujo
A dor mamária é classificada em cíclica, acíclica e extramamária. Neto JT. Mastologia: condutas atuais. São Paulo: Manole; 2014. p. 83-88.
A mastalgia cíclica é o principal sintoma das alterações funcionais (Série Mastologia).
benignas das mamas e está intimamente relacionada com o estímu- Hueb AS. Cistos mamários. In: Elias S, Facina G, Araujo Neto JT. Mastologia:
lo sinérgico estroprogestativo cíclico sobre o lóbulo mamário. Seu condutas atuais. São Paulo: Manole; 2014. p. 89-93. (Série Mastologia).
diagnóstico é clínico, e a orientação verbal é suficiente na maioria National Health Service. Breast pain [Internet]. NHS; 2016 [capturado em 13 jul.
dos casos. 2016]. Disponível em: http://www.nhs.uk/conditions/breastpaincyclical/
Pages/Introduction.aspx
Persistência Segmento
da dor habitual
Nova
punção
TABELA 98.2 ■ Riscos relativos para o câncer de mama nas QUADRO 98.1 ■ Fluxograma das condutas referentes aos achados
pacientes portadoras de hiperplasia com atipia, de acordo com a pré histológicos das BPF da disciplina de mastologia da Escola Paulista de
ou pós-menopausa Medicina (Unifesp)
ATENÇÃO!
Dentre as CRR, alinham-se a prevenção medicamentosa com tamoxi-
As AEP, HDA, HLA e CLIS, quando diagnosticados por BPF, as pacien- feno (TMX), raloxifeno (RLX), exemestano (EXE) e o anastrozol (ANZ); bem
tes deverão ser submetidas às exéreses cirúrgicas, devido ao risco de como as cirurgias redutoras de risco: salpingo-ooforectomia bilateral (SOB)
subdiagnóstico.
e as mastectomias redutoras de riscos (MRR).
O TMX é um SERM de primeira geração, usado como endocrinoterapia
adjuvante do câncer de mama há 40 anos. A endocrinoprevenção com
■■ MUTAÇÕES NOS GENES SUPRESSORES DE tamoxifeno para pacientes com risco aumentado para o câncer de mama
TUMORES BRCA 1 E BRCA 2 ficou bem estabelecida no ensaio clínico NSABP-P1, que comparou o uso
de TMX, na dose de 20 mg/dia por 5 anos, com o uso de placebo nas
Os genes supressores de tumores mais comumente associados com o CM
pacientes com idade ≥ 35 anos e com risco aumentado para a doença
hereditário são o BRCA 1 e o BRCA 2, localizados nos cromossomos 17 e 13,
(índice de Gail ≥ 1,66% de chance de desenvolver a doença nos próximos
respectivamente. As mulheres que têm mutações no gene BRCA 1 apresen-
5 anos), e evidenciou redução de risco de 49% para o câncer de mama
tam riscos de desenvolver o CM entre 47 a 66%, sendo que esses cânceres
invasivo e de 50% para o câncer de mama in situ, em 5 anos de seguimen-
são, em aproximadamente 70% das vezes, receptores de estrogênio, pro-
to. O subgrupo de melhor benefício foi das pacientes com diagnóstico de
gesterona e HER-2 negativos (triplo-negativos) no estudo imuno-histoquí-
hiperplasias atípicas, com redução de risco de 86%.
mico. Para as portadoras de mutações do gene BRCA 2, há 40 a 57% de
Metanálise mais recente confirmou a eficácia do TMX como endo-
risco de desenvolverem CM durante a vida, sendo aproximadamente 70%
crinoprevenção para o câncer de mama, com redução do risco de 38%
dos casos com receptores de estrogênio e progesterona positivos no estudo
(grau A de recomendação).5 Além da diminuição da probabilidade de de-
imuno-histoquímico. As mutações nesses dois genes também aumentam o
senvolver o câncer de mama, o TMX acarreta benefícios como as melhoras
risco de desenvolvimento do câncer de ovário, sendo de 35 a 46% para o
da massa óssea na pós-menopausa e do perfil lipídico, pois no osso e no
BRCA 1 e de 13 a 23% para o BRCA 2. No entanto, a probabilidade de uma
fígado, ele apresenta efeito agonista do estrogênio. Os principais efeitos
mulher ter a mutação do BRCA 1 ou BRCA 2 depende da frequência da
colaterais do TMX são as ondas de calor, os aumentos dos riscos dos fenô-
doença na família, idade de início da doença, órgãos e gêneros afetados
menos tromboembólicos e do câncer de endométrio. No entanto, os seus
como as mamas e/ou os ovários nas mulheres e mamas nos homens, esse
benefícios superam os efeitos adversos.
último mais relacionado com as mutações no gene BRCA 2.
A Figura 98.1 apresenta um fluxograma da assistência para pacientes
com risco aumentado para câncer de mama da disciplina de mastologia da
■■ MÉTODOS DE PREVENÇÃO DO CÂNCER DA MAMA Escola Paulista de Medicina (UNIFESP).
As pacientes com diagnóstico de HDA, HLA e CLIS são consideradas de O RLX, SERM de segunda geração, foi aprovado inicialmente pela FDA
alto risco pessoal ou histológico para o desenvolvimento do câncer de para prevenir e tratar a osteoporose nas mulheres na pós-menopausa.
mama, bem como as pacientes submetidas à radioterapia de parede to- Contudo, foram observadas reduções no risco de câncer de mama inva-
rácica antes dos 30 anos e as com mutações nos genes supressores de sivo receptor de estrogênio positivo de 76, 66 e 44% nas mulheres na
tumores BRCA 1 e BRCA 2, devendo ser submetidas às condutas redutoras pós-menopausa com osteoporose em três grandes ensaios clínicos. Sendo
de riscos (CRR). assim, foi idealizado o NSABP Study of Tamoxifen and Raloxifene (STAR)
562 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
ALTO RISCO1
PESSOAL2 OU HEREDITÁRIO3
Endocrinoprevenção4
Idade ≥ 35 anos
FIGURA 98.1 ■ Fluxograma da assistência para pacientes com risco aumentado para câncer de mama da disciplina de mastologia da Escola
Paulista de Medicina (Unifesp).
1 2 3
Alto risco: RR ≥ 4; Alto risco pessoal (histopatológico): HDA, HLA e CLIS; Alto risco hereditário: mãe, irmã ou filha com câncer de mama ≤ 45 anos ou câncer de ovário em
4
qualquer idade, câncer de mama bilateral, masculino ou triplo negativo; TMX 20 mg/dia por 5 anos na pré ou pós-menopausa; RLX 60 mg/dia por 5 anos na pós-menopausa;
5
EXE 25 mg/dia por 5 anos na pós-menopausa; ANZ 1,0 mg/dia por 5 anos na pós-menopausa. A partir dos 30 anos as mamografias e as ressonâncias magnéticas serão
6
intercaladas semestralmente. As pacientes com idades ≤ 35 anos, radioterapias de parede torácica, mutações nos genes BRCA 1 e 2 as condutas serão particularizadas.
P-2 Trial, que constatou que o RLX é tão efetivo quanto o TMX na redução pacientes com história prévia de neoplasia lobular in situ. O tamoxifeno
do risco de câncer de mama invasivo (Tabela 98.3).6 Assim, o TMX e o levou a um maior número de trombose venosa profunda (TVP), hiperplasia
RLX apresentam grau de recomendação A, como medicações redutoras de atípica endometrial, carcinoma de endométrio e catarata (Tabela 98.4). Os
risco para o câncer de mama, sendo o TMX empregado na dose de 20 mg/ resultados mostraram que o RLX apresentou 76% da eficácia do TMX na
dia por 5 anos a partir dos 35 anos de idade (na pré e na pós-menopausa) prevenção do carcinoma invasivo de mama; logo, ambos os medicamen-
e o RLX na dose de 60 mg/dia por 5 anos na pós-menopausa. tos podem ser utilizados para esse fim. A escolha poderá ser baseada na
O estudo STAR foi atualizado em 2010, com 81 meses de seguimento presença ou não de útero e no risco individual de tromboembolismo.
médio. O TMX foi significantemente mais efetivo do que o RLX na profi- O EXE é um esteroide inibidor da enzima aromatase que é utilizado
laxia do carcinoma invasivo nas pacientes que tinham história prévia de no tratamento adjuvante do câncer de mama receptor hormonal positivo
hiperplasia atípica e no grupo de risco elevado (Gail ≥ 1,66%).6 A eficácia em mulheres menopausadas. O seu benefício como medicação redutora
foi semelhante para a prevenção do carcinoma in situ de mama e para as do risco foi comprovado em estudo aleatorizado, duplo-cego, placebo-
TABELA 98.3 ■ Estudos prospectivos, randomizados, placebo-controlado, do raloxifeno e a redução do risco do câncer de mama
População estudada Mulheres Continuação do Mulheres menopausadas com história Mulheres menopausadas com aumento
menopausadas estudo MORE ou risco de doença coronariana do risco de câncer de mama
com fratura por
osteoporose
Primário endpoint Fraturas Fraturas Doença coronariana e câncer de mama Câncer invasivo de mama
Secundário endpoint Câncer de mama Câncer de mama Morte e tromboembolia Fratura e doença coronariana
TABELA 98.4 ■ Comparações entre os riscos relativos do tamoxifeno e raloxifeno do estudo STAR
NÚMERO DE EVENTOS
3. Gobbi H. Classificação dos tumores da mama: atualização baseada na nova Agente de tropismo específico por pele e mucosas, o HPV não promo-
classificação da Organização Mundial da Saúde de 2012. J Bras Palol Med ve infecção sistêmica. Para que se inicie a infecção, é necessária solução
Lab. 2012;48(6):463-74. de continuidade no epitélio, expondo as células alvo da camada basal nas
4. Collins LC, Baer HJ, Tamimi RM, Connolly JL, Colditz GA, Schnitt SJ. Magnitude
quais o HPV se instalará para sobreviver e esconder-se dos mecanismos de
and laterality of breast cancer risk according to histologic type of atypical
resistência imunológica do organismo hospedeiro.
hyperplasia: results from the Nurses’ Health Study. Cancer. 2007;109(2):180-7.
5. Cuzick J, Powles T, Veronesi U, Forbes J, Edwards R, Ashley S, et al. Overview of A infecção epitelial mantém a transcrição de DNA e a replicação em
the main outcomes in breast cancer prevention trials. Lancet. 2003;361(9354): níveis baixos nas células em proliferação, até alcançar as camadas inter-
296-300. mediárias do epitélio. É no ambiente terminal de diferenciação celular que
6. Vogel VG, Constantino JP, Wickerham DL, Cronin WM, Cecchini RS, Atkins os vírus recrutam o conjunto de fatores celulares necessários para sua
JN, et al. Update of the National Surgical Breast and Bowel Project Study of replicação.
Tamoxifen and Raloxifen (STAR) P-2 Trial: preventing breast cancer. Cancer Descrevem-se hoje mais de 200 tipos virais, dos quais pouco mais de
Prev Res (Phila). 2010;3(6):696-706. 20 podem causar infecção genital. Um novo tipo de HPV passa a ser aceito
7. Goss PE, Ingle JN, Alés-Martinez JE, Cheung AM, Chlebowski RT, Wactawski- quando seu genoma apresenta, na sequência dos nucleotídeos dos genes
Wende J, et al. Exemestane for breast-cancer prevention in postmenopausal
E6, E7 e L1, diferença maior do que 10% em relação aos tipos já descritos.
women. N Engl J Med. 2011;364(25):2381-91.
8. Hartmann LC, Schaid DJ, Woods JE, Crotty TP, Myers JL, Arnold PG, et A infecção por HPV promove, em sua maioria, lesões benignas e, mais
al. Efficacy of bilateral prophylactic mastectomy in women with a family raramente, lesões transformadas de características pré-neoplásicas. De
history of breast cancer. N Engl J Med. 1999;340(2):77-84. acordo com a capacidade de induzir lesões transformadas de caracterís-
9. Meijers-Heijboer H, van Geel B, van Putten WLJ, Henzen-Logmans SC, ticas pré-neoplásicas, os tipos de HPV são classificados em vírus de baixo
Seynaeve C, Menke-Pluymers MB, et al. Breast cancer after prophylactic risco oncogênico (6, 11, 40, 42, 43, 44, 54, 61, 70, 72, 81 e CP6108), de
bilateral mastectomy in women with a BRCA 1 or BRCA 2 mutations. N Engl alto risco (16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56, 58, 59, 68, 73, e 82) e
J Med. 2001;345:159-64. possivelmente de alto risco (26, 53, 66 e 82).
A prevalência da infecção por papilomavírus em suas formas clínicas e
■■ LEITURAS SUGERIDAS subclínicas, nos diferentes grupos populacionais, oscila entre 0,5 e 2,5%,
Boecker W, editor. Preneoplasia of the breast: a new conceptual approach to com sensíveis variações regionais. Em estudo da Unifesp, a incidência foi
proliferative breast disease. Munich: Elsevier Saunders; 2006. de 2,4%. Na atualidade, a infecção do colo uterino apresenta maior inci-
Elias S, Facina G, Araujo Neto JT, organizadores. Mastologia: condutas atuais. dência do que a neoplasia intraepitelial e o carcinoma invasor, tendo sido
Barueri: Manole; 2016. (Série Mastologia, v. 1). encontrada proporção de 40 condilomas para 4 neoplasias intraepiteliais
Harris JR, Lippman ME, Morrow M, Osborne CK, editors. Diseases of the breast. e 1 carcinoma invasor. O HPV 16 é o mais prevalente no mundo e, com o
5th ed. Philadelphia: Wolters Kluwer Health; 2014.
HPV 18, responde por mais de 70% dos casos de câncer de colo do útero.
Hartmann LC, Degnim AC, Santen RJ, Dupont WD, Ghosh K. Atypical hyperplasia
of the breast: risk assessment and management options – special report. N
Os fatores de risco são os mesmos para homens e mulheres, como
Engl J Med. 2015;372(1):78-89. início precoce da atividade sexual, número elevado de parceiros, compor-
tamento de risco, hábito de fumar e condições de imunossupressão.
A infecção por HPV é a doença sexualmente transmissível (DST) mais
comum, estimando-se que de 20 a 40% dos jovens sexualmente ativos
99
sejam portadores da infecção de forma pontual.
■■ QUADRO CLÍNICO
INFECÇÃO GENITAL POR
A infecção por HPV pode se apresentar clinicamente sob três formas: clíni-
PAPILOMAVÍRUS HUMANO ca; subclínica e latente. Na primeira, as lesões são identificáveis a olho nu,
em geral como verrugas genitais. A superfície é irregular, com projeções
digitiformes, contendo alça capilar central e apresenta pedículo único. Na
■■ JULISA C. L. RIBALTA mulher, são, com frequência, encontradas nos grandes e pequenos lábios,
■■ NEILA MARIA DE GÓIS SPECK no vestíbulo vaginal e nas regiões perineal, perianal e anal; menos comu-
mente, na vagina; e vista raramente no ectocérvice.
Na forma subclínica, as lesões são identificáveis por meio das altera-
No passado, a hipótese diagnóstica de infecção pelo papilomavírus hu- ções citológicas, colposcópicas e/ou anatomopatológicas. Expressam-se
mano (HPV) era só aventada na presença de lesões verrucosas que com- como áreas de espessamento epitelial, de imagens acetorreagentes planas
prometessem os genitais externos, facilmente observáveis a olho nu. As e saliências nas paredes vaginais e cervicais, como pequenas espículas,
verrugas genitais eram conhecidas como lesões adquiridas por contato não perceptíveis a olho nu. As espículas constituem projeções digitifor-
sexual, fato confirmado por estudos epidemiológicos desde os anos de mes, sugerindo, no conjunto, aspecto colposcópico de pontilhado em rele-
1950. Posteriormente, comprovou-se, por estudos de microscopia eletrôni- vo. Hiperqueratose também pode estar presente e, por vezes, com relevo,
ca, a presença de agente etiológico viral. Os primeiros artigos relacionan- exibir aspecto mosaiciforme ou cerebroide. Observam-se, ainda, imagens
do a infecção por HPV com o carcinoma do colo de útero intensificaram o numulares, de tamanhos e formas diversas planas, acetorreagentes, em
interesse pelo tema. mosaico e pontilhadas. Localizam-se próximo à junção escamocolunar, na
A observação de inúmeras outras formas de apresentação, que não zona de transformação, ou afastadas do orifício uterino.
as verrucosas, por meio de exames citopatológicos e colposcópicos, de- Na forma latente, a presença viral somente é demonstrada por meio
finiu as chamadas formas subclínicas, presentes ao longo de todo o trato de testes de biologia molecular, sem alterações morfológicas do epitélio.
anogenital. Esfregaços celulares do colo uterino, em que se aplicou a hibridização mo-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 565
lecular como método diagnóstico, indicaram a presença de DNA viral em Técnica de amplificação e ciclagens, a PCR permite multiplicar o DNA
30% das mulheres sem alterações colposcópicas ou citológicas. viral presente no material em estudo. Com isso, um fragmento de DNA
A infecção viral é autolimitante, isto é, após alguns ciclos de prolife- será multiplicado em mais de um milhão de cópias, o que requer muitos
ração celular para ocorrer replicação viral, o processo cessa espontanea- cuidados técnicos, pois poderá haver contaminação e induzir a resultado
mente, variando de tipo para tipo viral. É possível a coparticipação da falso-positivo. Além disso, não permite resultados quantitativos, fato com-
resposta imunológica do organismo hospedeiro que, ao longo do tempo, pensado pela possibilidade de genotipagem, única ou múltipla, segundo
consegue desenvolver anticorpos neutralizantes anti-HPV. as sondas utilizadas na replicação dos fragmentos nucleicos.
Caso o processo proliferativo viral não cesse, em intervalo variável de Múltiplas outras técnicas biomoleculares existem; entretanto, são
18 a 24 meses, há a possibilidade de persistência por tipos de HPV de alto preferencialmente utilizáveis no desenvolver de pesquisas relacionadas ao
risco que poderá evoluir para a transformação oncogênica, dando origem agente viral e a seu desempenho clínico e epidemiológico.
às chamadas lesões precursoras, as neoplasias intraepiteliais de alto grau. As aplicações práticas atuais da biologia molecular têm sido: rastrea-
mento para estratificar risco para o desenvolvimento de lesão cancerosa;
seguimento após tratamento das lesões de alto grau com valor prognós-
■■ DIAGNÓSTICO
tico e, frente a alterações citológicas, com achado de atipias de células
Primeiro passo em qualquer procedimento médico, a anamnese, caso não escamosas com significado indeterminado (ASCUS), para diferenciar de
haja queixas de verrugas genitais, fica limitada à procura de fatores de processos reativos não induzidos pelo HPV.
risco: faixa etária, antecedentes ginecológicos e sexuais, especialmente A abordagem diagnóstica da infecção por HPV está resumida na
início da atividade sexual e número de parceiros sexuais, métodos de con- Figura 99.1.
tracepção, comportamento de risco, de exposição a DSTs, comorbidades,
com destaque para situações de imunossupressão, estados depressivos,
hábitos como tabagismo, drogas ilícitas ou não. DIAGNÓSTICO
O exame citopatológico de células esfoliadas das diferentes regiões
do trato genital inferior pode sugerir a presença da infecção por HPV caso
o efeito citopático da infecção, a coilocitose, esteja presente; ou, se ausen- Infecção clínica Infecção subclínica Infecção latente
te, houver um conjunto de atipias celulares sugestivas de infecção viral, Condiloma Lesões
como multinucleação, discariose, disqueratose, anfofilia citoplasmática, intraepiteliais
entre outros. Será descrito como presença de infecção por HPV ou de lesão
de baixo grau. Citologia
Biologia
A atipia celular apresentada pelo exame citopatológico indicará a Exame visual Colposcopia
molecular
necessidade de realizar exame colposcópico, com magnificação de ima- Histopatologia
gens, que buscará localizar áreas sugestivas de lesão subclínica, como
espessamentos epiteliais com acetorreação, pontilhados vasculares defi- FIGURA 99.1 ■ Esquema para abordagem diagnóstica nas três
nidos, áreas mosaiciformes, micropapilomatoses não visíveis a olho nu, formas de infecção pelo HPV.
áreas de alterações vasculares e eventuais áreas de iodo não coradas ou
parcialmente coradas. As imagens assim detectadas, de acordo com suas
características, localização e agressividade, são escolhidas para biópsia. ■■ TRATAMENTO
Os fragmentos obtidos pelas diferentes biópsias são avaliados do A abordagem terapêutica visa à eliminação da lesão com o objetivo de
ponto de vista histopatológico, tendo-se ou não o diagnóstico compatí- reduzir carga viral atrelada à resposta imunológica no clareamento da
vel com infecção por HPV. Em caso positivo, serão descritas hiperplasia infecção.
de camadas basal e parabasal, acantose com presença de coilocitose e
outras atipias nucleocitoplasmáticas discretas ou não em camadas celu-
lares intermediárias e superficiais. O laudo histopatológico referenciará a ATENÇÃO!
possibilidade de infecção por HPV ou presença de neoplasia intraepitelial
O objetivo do tratamento da infecção por HPV é eliminar os sintomas,
de baixo grau
prevenir a evolução maligna e interromper a possiblilidade de trans-
Os métodos descritos até agora apenas direcionam para a suspeição
missão. As técnicas disponíveis não erradicam o agente, por isso, há,
do diagnóstico de infecção por HPV. Se, entretanto, houver a necessidade
frequentemente, recidiva.
de confirmação do agente, isso só será possível com a utilização de téc-
nicas de biologia molecular, como, por exemplo, a captura de híbridos e
reação em cadeia da polimerase (PCR). A maioria das infecções provocadas pelo HPV apresenta resolução
A captura hibrida®, técnica bastante sensível, vale-se de hibridização espontânea em virtude da resposta imunológica do hospedeiro contra o
de fragmentos de DNA viral com anticorpos monoclonais conhecidos e re- vírus, fato particularmente verdadeiro para condilomas genitais e lesões de
velados por leitura luminométrica. Os resultados são expressos em grupos baixo grau e, eventualmente, em lesões de alto grau. O aumento dessa res-
de vírus que apresentam homologia para as sondas utilizadas (p. ex.: gru- posta imunológica é possível com abstinência do tabagismo e melhora da
po B, conjunto de 13 vírus HPV de alto risco oncogênico). A sensibilidade qualidade de vida e alimentar, com maiores taxas de regressão da doença.
desta técnica depende do número de cópias virais por células esfoliadas As formas de tratar a lesão podem ser por excisão, destruição ou imu-
e examinadas. A estimativa de baixo número de cópias virais pode suge- noterapia.
rir infecção inicial, ou em remissão, ou, ainda, coleta de material pouco O tratamento excisional consiste em retirar a lesão por meio de cor-
expressivo. te, com bisturi frio, por cirurgia com alças de ondas de alta frequência
566 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
(CORAF) ou com laser focalizado. Para lesões verrucosas vulvares exten- anos; isto decorrente das altas taxas de remissão espontânea e pelos
sas, a ressecção pode acarretar cicatrizes e comprometer a anatomia do tratamentos vigentes alterarem a qualidade do colo em relação ao futuro
órgão. obstétrico. Caso haja persistência da lesão após esse prazo, o seguimen-
Entre os métodos destrutivos, lança-se mão de técnica física e/ou tra- to ainda pode ser mantido ou a conduta ativa ser instituída. Na indicação
tamento químico. A destruição física é obtida pela cauterização elétrica, de tratamento, é possível realizar crioterapia ou eletrocoagulação sob vi-
que destrói a lesão por meio do calor, ainda que possa acarretar fibrose, são colposcópica e para imagens totalmente visibilizadas na ectocérvice
cicatriz, perda de pelos e hipocromia, na pele da vulva; ou por laser de ou na parede vaginal. O mesmo serve para o uso de vaporização a laser
CO2, método de excelência, visto que vaporiza os tecidos sem condução das lesões, seja em vulva, vagina ou superfície cervical, com resultados
térmica na profundidade estromal, técnica em que nenhum ou mínimos excelentes e recuperação dos tecidos de forma adequada e praticamente
efeitos cicatriciais são observados. Na destruição por agentes químicos, sem sequelas.
várias opções estão à disposição: ácido tricloracético (ATA), 5-fluorouracil O esquema terapêutico para lesões condilomatosas e/ou subclínicas
(FU), podofilina e podofilotoxina. em colo do útero, vagina e vulva está resumido na Figura 99.2.
Potente agente cáustico que destrói a lesão por necrose, o ATA é uti-
lizado na concentração de 50 a 80%, com aplicações semanais, com pe-
queno chumaço de algodão levemente embebido, sobre a lesão, no total Colo uterino Vulva
de 4 a 6 aplicações. Vagina
Tem limitações nas lesões muito queratinizadas, onde não há absor-
ção adequada do fármaco, com diminuição, assim, de sua eficácia. Não Químico-
há absorção sistêmica, podendo ser usado em crianças e gestantes. Seu Químico Físico imunoterápico
emprego é recomendado em lesões pequenas. A taxa de resolução é de
81% para os condilomas.
Excisional Destrutivo ATA
O 5-FU 5% na forma de creme é medicação quimioterápica com efeito
ATA Bisturi Crioterapia 5-FU
antiproliferativo, antiviral e imunoestimulante, hoje utilizado apenas em
5-FU Coraf Eletrocauterização Podofilotoxina
algumas situações, como nas lesões difusas, multicêntricas e multifocais,
Laser focalizado Vaporização a laser Imiquimode
comuns em mulheres com comprometimento imunológico. A posolo-
gia para vulva é de aplicação de fina camada duas vezes por semana,
FIGURA 99.2 ■ Esquema terapêutico para lesões condilomatosas e/
lavando-se após duas horas, e, para a vagina, 2,5 g intravaginais, com
ou subclínicas em colo do útero, vagina e vulva.
frequência quinzenal em até 10 ciclos. Efeitos colaterais como intensa ir-
ritação local e úlceras são frequentes e devem ser mediados com uso de
creme contendo acetato de clostebol e vigilância constante. Ao mínimo
sinal de ulceração, a medicação deve ser descontinuada. ■■ PROGNÓSTICO
A podofilina em solução oleosa a 20% tem sido pouco utilizada por Mesmo em indivíduos não tratados, a maioria das lesões provocadas pelo
baixos resultados e efeitos colaterais intensos, como neurotoxicidade, HPV desaparecerá devido à resposta imunológica. A imunocompetência
mielotoxicidade e nefrotoxicidade. Recomenda-se a manipulação em base tem significativo impacto no clareamento da infecção, que, em algumas
vaselina sólida, aplicando semanalmente sobre a lesão e tomando o cui- vezes, pode ser lento e cerca de 10 a 20% dos casos não se resolverão,
dado de lavar após 4 horas. Atualmente é melhor o uso do seu derivado mesmo com métodos efetivos de tratamento.
purificado, a podofilotoxina, a 0,15% na forma de creme, cuja posologia é
de duas aplicações diárias por três dias, seguidas de quatro dias de pausa,
perfazendo um total de quatro ciclos. Lavar após 6 horas da aplicação. ■■ PREVENÇÃO
Não pode ser usado em gestantes. Utilizado apenas em pele, é contrain- A infecção por HPV é autolimitada em considerável número de vezes, com
dicado para aplicação em mucosas. As taxas de resolução variam de 45 clareamento espontâneo, mas pode persistir e evoluir para o desenvolvi-
a 88%. mento de lesões precursoras de neoplasias, segundo as características do
Na opção de terapêutica imunológica, tem-se o imiquimode a 5%, agente viral e do organismo hospedeiro. Assim, visando a bloquear a pos-
que induz a liberação local de citocinas. Não produz a destruição física da sibilidade de desenvolvimento de neoplasias, especificamente as de colo
lesão, mas ajuda a erradicar o agente. A posologia é de aplicação de um de útero, e, ainda, evitar o desenvolvimento de lesões condilomatosas,
sachê de 250 mg sobre a lesão, em três dias da semana intercalados, no surgiram no meio cientifico duas versões de vacinas profiláticas.
total de 4 a 16 semanas. Efeitos colaterais como hiperemia e queimação A vacina quadrivalente contêm virus-like particle (VLP) corresponden-
ocorrem e são desejáveis, demonstrando a atividade inflamatória induzi- te às estruturas da proteína L1 dos HPV tipos 16, 18, 6 e 11. A bivalente
da, um benefício na eliminação da lesão. A taxa para condilomas acumi- contém as VLP de L1 dos HPV tipos 16 e 18. Essas vacinas também diferem
nados é de 72 a 84%, com recidiva entre 5 e 19%. A resposta em mulheres na composição das substâncias adjuvantes – alume, na quadrivalente, e
é maior do que nos homens e seu uso está indicado nas lesões externas. alume e monofosforilipídeo na bivalente. Ambas são aplicadas em três
Relatos de casos mostram também eficácia no tratamento de neopla- doses IM, nos 1º e 60º dias e no 6º mês (sequência da quadrivalente); e no
sias intraepiteliais de vagina. 1º e 30ºdias e no 6º mês (bivalente). Esquema alternativo de duas doses,
A maioria dos protocolos atuais tem recomendado a conduta ex- no momento zero e 6 meses, tem sido utilizado para meninas e meninos
pectante nas infecções subclínicas com lesão intraepitelial de baixo grau abaixo de 14 anos, pois os estudos demonstraram que a formação de an-
ou neoplasia intraepitelial de grau I, em colo do útero e na vagina, em ticorpos anti-VLP nesta faixa etária é semelhante à esquema de três doses
virtude da alta taxa de regressão espontânea no prazo de até dois anos. acima de 14 anos.
As neoplasias de grau II no colo uterino para mulheres jovens abaixo de As duas vacinas encontram-se liberadas pelos órgãos controladores
24 anos, na atualidade, a conduta também tem sido expectante por dois internacionais e nacionais (FDA e Agência Nacional de Vigilância Sanitá-
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 567
Os índices de cura são superiores a 90%. contraceptivos hormonais com altas doses de estrogênio; diabetes melito;
Quando o Mobiluncus curtis está envolvido, costuma haver resistência utilização de antibióticos sistêmicos de largo espectro; vestuário inade-
aos nitroimidazólicos; nessa situação, pode ser utilizado como alternativa quado com a utilização de fios sintéticos; desodorantes íntimos ou absor-
o tratamento apresentado na Tabela 100.2. ventes perfumados, que predispõem à reação alérgica local.
CLASSIFICAÇÃO
TABELA 100.2 ■ Tratamento alternativo da vaginose bacteriana É importante a classificação em simples ou complicada, pois implica ma-
nejo terapêutico diferenciado:
VIA DE
FÁRMACO POSOLOGIA ADMINISTRAÇÃO não complicada (simples) – ocorre fora da gravidez, em mulheres
sadias que apresentam episódios isolados e manifestações clínicas
Tianfenicol 2,5 g/dia durante 2 dias Oral leves ou moderadas, e está associada à C. albicans;
complicada – engloba a candidíase vulvovagianal recorrente (três
Clindamicina 300 mg, de 12/12 h, por 7 dias Oral
ou mais episódios no período de 12 meses), os episódios com ma-
Clindamicina 100 mg ao deitar/3 dias Vaginal nifestações clínicas severas e outras espécies que não a C. albicans
(óvulos) ou candidíase na presença de alguma alteração, como diabetes,
imunodepressão ou gravidez.
DIAGNÓSTICO
ATENÇÃO!
A falta de especificidade impede o diagnóstico com base apenas na his-
Quando se opta pela utilização de metronidazol, os efeitos colate- tória e no exame físico, sendo necessária a complementação por meio da
rais mais intensos são gastrintestinais (náuseas e sabor metálico). A microscopia do conteúdo vaginal. Também a simples identificação do fun-
interação com o álcool decorre da capacidade dos nitroimidazólicos go no material vaginal não faz o diagnóstico, podendo tratar-se apenas de
de inibir a enzima álcool-desidrogenase. Desse modo, o consumo de colonização. Portanto, para o correto diagnóstico, é necessário comprovar
álcool deve ser evitado durante o tratamento e nas 24 horas seguintes. a presença da cândida na paciente sintomática.
Potencialização de anticonvulsivantes e anticoagulantes varfarínicos O exame do conteúdo vaginal pode ser corado (Gram, Papanicolaou,
pode ser observada. Shorr, lugol ou azul brilhante de cresil a 1%) ou a fresco. No exame a fres-
co, o material é coletado da vagina com espátula de Ayre e colocado dire-
tamente sobre lâmina, onde é diluído com uma gota de solução fisiológica
É preciso lembrar que a clindamicina em creme tem base oleosa e
(SF), visando a obter-se um esfregaço mais fino. Essa preparação é, então,
pode favorecer o rompimento de preservativos de látex e diafragmas por
observada, inicialmente em pequeno aumento e, a seguir, em grande au-
até cinco dias após o uso.
mento. Os principais achados são a presença de filamentos ramificados
O tratamento de rotina do parceiro não é recomendado, tendo em
(pseudo-hifas) e de seus brotamentos (esporos), indicando infecção ativa.
vista que não há diferença nos índices de recidivas em sua parceira.
Ao fundo, observam-se nítido predomínio de bacilos de Döderlein e
pequeno número de polimorfonucleares. Esse exame também tem utilida-
■■ CANDIDÍASE VULVOVAGINAL de no diagnóstico diferencial das vulvovaginites, podendo excluir a pre-
A cândida é um fungo gram-positivo, saprófita, responsável por 20 a 25% sença de Trichomonas vaginalis e células-alvo.
dos corrimentos genitais de natureza infecciosa. A mais comum é a espécie O exame do material colhido da vagina pode ser facilitado pela mistu-
Candida albicans, e, em 15 a 20% dos casos, outras espécies, como a Can- ra com solução de NaOH ou KOH a 10%. Com isso, clarifica-se o esfregaço,
dida glabrata e a Candida tropicalis, podem estar envolvidas. pois os leucócitos e as hemácias sofrem lise; as células epiteliais que con-
têm queratina se tornam translúcidas ou transparentes, mas, por algum
QUADRO CLÍNICO tempo, ainda é possível visibilizar o seu contorno, como se fossem “células
O quadro clínico típico caracteriza-se por corrimento branco, em placas, fantasmas”. Os esporos e as hifas, resistentes aos álcalis, passam a ser
aderente, com aspecto de leite coalhado. O prurido é, habitualmente, in- notados com muito mais nitidez.
tenso, determinando hiperemia, maceração e escoriações na região vulvar. O pH vaginal é ácido (entre 4 e 4,5) na candidíase vaginal. Diferen-
Às vezes, só há rágades na vulva. Esses sintomas devem-se à reação alér- temente, registra-se pH maior ou igual a 5, em geral, na tricomoníase, na
gica à toxina da levedura (candidina). Surgem ou intensificam-se na fase vaginose bacteriana ou na infecção mista.
pré-menstrual e podem ser acompanhados de disúria e dispareunia. Ao Geralmente, a microscopia é suficiente para a comprovação da pre-
exame especular, evidencia-se conteúdo vaginal anormal associado à col- sença da cândida, entretanto, quando se depara com paciente sintomática
pite difusa. Observa-se, com certa frequência, forma ulcerativa difusa que cujo exame microscópico mostrou-se negativo, mister se faz a realização
se acompanha de muito ardor, em particular à micção. Essa forma clínica de culturas. Também há indicação da execução de culturas seletivas, uti-
pode levar à confusão com lesão herpética. lizando-se os meios de Sabouraud ou Nickerson, para a identificação da
Geralmente, os fungos do gênero cândida provenientes do trato espécie de cândida, quando há falha com a terapêutica habitual.
gastrintestinal (TGI) atingem a vagina e podem ser encontrados em 20%
das mulheres assintomáticas e sadias. Na dependência das condições do TRATAMENTO
hospedeiro, a cândida deixa de ser um saprófita e passa a ser um agente A cândida, por ser um micro-organismo que pode ser um comensal ou um
agressor, quando se instala uma infecção sintomática. Apenas uma mi- patógeno verdadeiro, no ambiente vaginal, causa uma infeção que pode
noria das mulheres com infecção clínica apresenta um dos fatores con- apresentar várias gradações e nuances de acordo com as características do
siderados facilitadores da doença, quais sejam: gravidez; utilização de hospedeiro e do agente infeccioso. Assim, o tratamento mais adequado é
570 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
aquele que leva em consideração esses fatores, baseando-se na classifica- mg, VO, em dose única, ou itraconazol, VO, 200 mg, a cada 12 horas,
ção da doença, em episódios infecciosos complicados ou simples. por um dia, e repete-se a prescrição após 5 a 7 dias. Nessa situação, é
Além de classificar o tipo de infecção por cândida, também se deve conveniente a associação com anti-inflamatórios não hormonais (AINH)
considerar que, para o tratamento, se pode dispor de medidas gerais e ou anti-histamínicos, pois, além do alívio na sintomatologia, melhoram
específicas. a resposta imune do hospedeiro contra os antígenos da cândida. Além
1 | Medidas gerais: das medidas adjuvantes citadas, a utilização de corticosteroides tópicos
vestuário geral e íntimo adequados, evitando-se roupas justas ou de baixa potência pode propiciar alívio mais rápido da sintomatologia.
sintéticas; Os corticosteroides tópicos de maior potência devem ser evitados, pois
hábito higiênico correto, evitando-se duchas vaginais ou desodo- podem piorar o ardor vulvovaginal. Quando se quiser utilizar o tratamento
rantes íntimos; tópico, os melhores resultados imediatos são obtidos com o emprego de
identificar e corrigir fatores predisponentes, como o diabetes e nistatina 100.000 UI por 14 noites associada à alcalinização vaginal.
hábitos alimentares inconvenientes, como a dieta com excesso de Nos casos recorrentes, na fase aguda, o tratamento tem como finali-
açúcares, derivados lácteos e pobre em zinco; dade garantir a remissão clínica e micológica da doença. Utiliza-se o mes-
alcalinização do meio vaginal com bicarbonato de sódio: 30 a 60 g mo esquema de tratamento de infecção fúngica com comprometimento
dissolvidas em 1 litro de água; vulvar grave. Na etapa seguinte, tendo em vista o período de recorrências,
embrocação vulvovaginal com violeta de genciana a 1%. o tratamento supressivo deve perdurar por seis meses. Se a opção for pela
2 | Tratamento específico: para o tratamento mais adequado da can- via tópica, a escolha recai sobre o clotrimazol em comprimidos vaginais de
didíase, é importante levar em consideração a classificação da doença. 500 mg/semana. Se a opção for pela via sistêmica, pode ser utilizado flu-
Com essa finalidade, na Figura 100.1, é apresentado um algoritmo do conazol 150 mg/semana ou itraconazol 50 a 100 mg/dia. Quando é nítida
tratamento. a ocorrência das recidivas no período pré-menstrual, é possível optar-se
Nos casos de candidíase simples, todos os esquemas terapêuticos são pelo tratamento de manutenção com fluconazol 150 mg em dose única
altamente eficazes. Entre as opções disponíveis, destaca-se o fluconazol ou itraconazol 200 mg, de 12 em 12 horas, por um dia, no pré-menstrual
150 mg, via oral (VO), em dose única, ou itraconazol, VO, 200 mg, a cada por seis meses.
12 horas, por um dia. O tratamento via vaginal, de eficácia um pouco me- Nessa fase de manutenção, deve-se identificar e excluir fatores aler-
nor, pode ser empregado em esquemas de dose única (terconazol 240 mg; gênicos (alimentar, vaginal ou proveniente do parceiro), além de associar o
tioconazol 300 mg; isoconazol 600 mg ou butoconazol 2%) ou por período uso de preservativo, se necessário ou indicado. E o mais importante e tam-
mais prolongado (terconazol 0,8% por 5 dias, sendo 5 g de creme em cada bém mais dificil de obter: regularizar a imunidade e estimular a autoestima
aplicação; nitrato de fenticonazol a 2% por 7 dias, sendo 5 g a cada apli- da paciente.
cação uma vez ao dia; nitrato de miconazol a 2% por 10 dias, sendo uma
aplicação ao dia por meio de óvulos ou cremes vaginais.
Quanto aos casos de candidíase complicada, devido à intensidade da ATENÇÃO!
sintomatologia, deve-se considerar que, nos casos de comprometimento Rotineiramente, não cabe o tratamento do parceiro, a não ser que
vulvar grave, os agentes azólicos tópicos podem exacerbar os sintomas apresente sintomatologia, situação na qual passa a ser considerado
de queimação e prurido. Opta-se preferencialmente pela via sistêmica, também paciente.
evitando-se os tratamentos em dose única. Utiliza-se o fluconazol 150
DIAGNÓSTICO DE CANDIDÍASE
Episódio esporádico,
com sintomatologia Sintomas de Espécie não Recidivante Alteração de
leve e causado por intensidade severa albicans > 3 episódios ao ano imunidade (HIV)
Candida albicans
Náuseas Anti-histamínicos, doxilamina com vitamina B6, A Refeições mais frequentes (a cada 2-3 h), sem líquidos às refeições;
gengibre Vit. B6 (10-25 mg/3xdia); Cápsula de gengibre (250 mg/4xdia),
Acupuntura (ponto PC6)
Constipação Fibras vegetais A Laxativos estimulantes são mais efetivos do que os formadores de
volume
Câimbras Lactato ou citrato de magnésio A Citrato de magnésio (120 mg / manhã e 240 mg/ noite)
Cuidados estéticos Evitar tintura e tratamentos estéticos de cabelo. C O couro cabeludo é muito vascularizado, podendo ter uma absorção
com cabelo e pele Não existem estudos de dismorfose nos fetos maior dos produtos
expostos Proteção de melasma com filtros solares (FPS 30)
Prevenção de estrias com hidratantes
Intercurso sexual Não aumenta prematuridade nem mortalidade B/A Diferenciar o aumento fisiológico da umidade vaginal de infecção
perinatal vaginal (que deve ser tratada)
Local de trabalho Não ficar em pé > 7 h, não se expor a substâncias B Recomendável emprego com características comportamentais e
químicas, exercício mental exagerado, estresse demográficas favoráveis
Atividade física Cuidados com quedas, traumas abdominais e C Pelo menos 30 minutos de exercício moderado. na maioria dos dias
temperaturas > 38,9ºC da semana
(Mergulho deve ser evitado)
Viagens aéreas Após 35 semanas: risco de parto, pela hipóxia C Considerar a disponibilidade de socorro médico no local de destino
Tratamento Exame e higiene bucal: focos de infecção C Pode ser utilizado anestésico local sem vasoconstritor
dentário aumenta risco de prematuridade
Tabagismo Informar os efeitos adversos para o feto. Evitar A Assistência comportamental antitabagismo reduz risco neonatal
ambiente com fumaça (fumo passivo) Não existe segurança estabelecida em relação ao uso de drogas
antifumo
Bebidas alcoólicas Evitar abuso (> 28,5 mL). Não há dose segura B/A O aconselhamento é uma intervenção efetiva em suspender o
para evitar síndrome alcoólica fetal consumo alcoólico na gestação e puerpério
Drogas ilícitas Informar sobre os potenciais efeitos adversos C Requer intervenção especial (unidade de desintoxicação)
fetais
Cocaína: risco de DPP e RPM A DPP: descolamento prematuro da placenta; RPM: rotura prematura
das membranas
Medicamentos Poucos tem comprovação de segurança na C Avaliar risco x benefício, principalmente no primeiro trimestre
gravidez
Imunização Vacina de vírus vivos estão contraindicadas C Não há efeitos adversos com vacinas de vírus mortos
Aplicar antitetânica (dT) no terceiro trimestre C Intervalo mínimo de 1 mês entre as doses. Se completa: nada a
fazer; há > 5anos: 1 dose de reforço; se incompleta: completar
DTPA (pertussis acelular): 28ª.semana
Vacina para influenza (H1N1 e sazonal) C Contraindicação: hipersensibilidade à proteína do ovo da galinha
em qualquer IG, nas estações de gripe
(outono/inverno)
574 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Rubéola (IgG negativo): vacinar no puerpério C IgG reagente: já é imune (nada a fazer)
Trabalho de parto Alertar sobre ruptura de membranas, sinais de C Dar orientação quanto a mudanças psicológicas durante a gravidez,
e parto trabalho de parto, estratégias para alívio da dor e preparação para o processo do nascimento e sobre o aleitamento
do suporte psicofísico materno
ANAMNESE/
EXAME FÍSICO RECOMENDAÇÕES NÍVEL COMENTÁRIOS
Peso materno Determinar o IMC na 1ª consulta, para planejar o ganho B Baixo ou sobrepeso: risco gestacional aumentado
de peso gestacional
Medir em todas as consultas para monitorar o B Técnica adequada aumenta a sensibilidade inter e intra-
Altura uterina crescimento observador
Avaliar em todas as consultas; confirma feto vivo, mas C Observar cardioaceleração ao movimento fetal espontâneo
Ausculta fetal não tem valor preditivo ou com estímulo vibroacústico simplificado
Segurança psicológica
Toque vaginal Não deve ser rotineira C Quando risco de prematuridade (identificação de
cervicodilatação ou esvaecimento precoces) ou queixa
Auxilia no diagnóstico de vulvovaginites
Preparo para exames repetidos durante o trabalho de parto
Edema de membros “Sinal de Godet” (após 12 h de repouso) ou ganho de C Sinal de alerta para diagnostico de pré-eclâmpsia
inferiores peso > 2,3 kg/semana
NE: nível de evidência; A: grandes ensaios clínicos aleatorizados e metanálises; B: estudos clínicos e observacionais bem desenhados; C: publicações baseadas em consenso
e opiniões de especialistas; IMC: índice de massa corporal.
tantes suscetíveis e de alto risco; além da realização das sorologias de e Clamidia trachomatis) deve ser realizada nas grávidas de alto risco. No
sífilis e anti-HIV, no parto. O exame de urina tipo I e urocultura com anti- terceiro trimestre, recomenda-se a cultura vaginal e perianal para pesquisa
biograma (A) devem ser trimestrais, e o exame parasitológico de fezes (D) de estreptococos do grupo β-hemolítico, entre 35 e 37 semanas, pelo risco
é solicitado na primeira consulta A análise de conteúdo vaginal, através da de infecção neonatal.
bacterioscopia ou cultura (para vaginose bacteriana, Neisseria Gonorrhea
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 575
Frutos do mar Evitar peixe espada, cavala e atum B Exposição a altos níveis de mercúrio, com neuropatia
Limitar peixe (sardinha) para 2-3 refeições/semana Excesso de consumo: risco de cardiopatia e hemorragia
Quando não consumir peixe: suplementação com ômega
3 (200-500 mg/dia)
Lavar com sabão e água quente tanto as mãos como os C Risco de toxoplasmose
utensílios domésticos
Cafeína Consumir moderadamente (150-300 mg/dia) B Em excesso: risco de abortamento e baixo peso
Chá de erva Limitar (por desconhecer riscos) C Existem poucos estudos sobre a segurança dos
Chás com gengibre, casca de cítrico, limão são seguros preparados de ervas, sendo consideradas não seguras
(com moderação) para consumo na gravidez)
Evitar camomila, alcaçuz, hortelã-pimenta e folha de
framboesa
Cálcio RDI: 1,0 a 2,0 g Fontes alimentares: leite e derivados, soja A Suplementação de cálcio diminui a pressão arterial e
Suplementação é benéfica se risco para DHEG ou baixo pré-eclâmpsia, mas não a mortalidade perinatal
consumo de cálcio
Ácido fólico RDI: 0,6 mg da dieta (além do suplemento) B Suplementação previne DTN
Fontes alimentares: legumes, folhas verdes, fígado, frutas Deficiência de folato está associada a abortamento, DPP,
cítricas, cereais integrais defeitos orofaciais, CC e baixo peso ao nascer
Ferro Suplementação 30-60 mg/dia (ferro elementar). A(Br)C Anemia ferropriva está associada com parto prematuro e
Tratamento de anemia: 180-300 mg/dia baixo peso do RN
Fontes alimentares: Feijão e verduras escuras
Vitamina A Limitar para menos de 10.000 UI/dia ou 25.000 U/semana B >10.000 UI: risco de defeitos cranial e nervoso para o
feto
Vitamina D Suplementação nas pacientes que não se expõem ao sol C Deficiência rara: risco de hipocalcemia e osteomalácia
RDI: 5 µg ou 200 UI/dia Doses elevadas: tóxico
Enkin M, Keirse MJNC, Neilson J, Crowther C, Duley L, Hodnett E, et al. Guia para
atenção efetiva na gravidez e no parto. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan; 2005. Adoçantes artificiais: em mulheres portadoras de fenilcetonúria
Melo VH, Pires do Rio SM. Assistência pré-natal. Associação Médica Brasileira e homozigóticas (1/15.000), o aspartame é contraindicado; entre as
Conselho Federal de Medicina; 2006. Projeto Diretrizes. heterozigóticas e a população normal, é compatível. Quanto à sa-
Villar J, Carroli G, Khan-Neelofur D, Piaggio G, Gülmezoglu M. Patterns of carina e ao ciclamato, não possuem estudos controlados. Uma vez
routine antenatal care for low-risk pregnancy. Cochrane Database Syst Rev. que a sucralose e o acessulfame-K não sejam absorvidos, não há
2001;(4):CD000934.
nada que os contraindique.
World Health Organization. Provision of effective antenatal care [Internet].
Aminoglicosídeos: amicacina, estreptomicina, gentamicina, ne-
WHO; 2006 [capturado em 13 jul. 2016]. Disponível em: http://www.who.
int/reproductivehealth/publications/maternal_perinatal_health/effective_ tilmicina e tobramicina são conhecidos pela toxicidade específica
antenatal_care.pdf sobre o oitavo par de nervos cranianos; a neomicina é compatível.
Analgésicos: não opioides, como ácido acetilsalicílico (AAS) di-
pirona e paracetamol, são seguros. Entre os opioides, codeína,
meperidina, metadona, morfina, propoxifeno e tramadol podem
ser utilizados em doses terapêuticas por pouco tempo; longos
102 períodos de uso e próximo à parturição podem causar síndrome de
privação e depressão respiratória no recém-nascido (RN).
PRESCRIÇÃO Androgênios: metiltestosterona e danazol são contraindicados no
ciclo gravídico puerperal.
Anfenicóis: cloranfenicol ministrado próximo ao parto prematuro
pode determinar síndrome cinzenta do RN – cianose, letargia e de-
■■ LUIZ KULAY JUNIOR pressão. Quanto ao tianfenicol, não há estudos controlados.
■■ MARIA NICE CALY KULAY Anorexígenos: anfetamina, anfepramona, femproporex, mazildol
■■ MARY UCHIYAMA NAKAMURA
e sibutramina são contraindicados. Há relatos de crescimento in-
trauterino restrito, parto prematuro e aumento do índice de morta-
lidade materna e perinatal.
Hoje, há aproximadamente 1.600 princípios ativos, 40 mil preparações e Ansiolíticos e hipnóticos: bromazepam, clorazepato, clordiazepó-
100 mil produtos no comércio farmacêutico. xido, flunitrazepam, lorazepam, midazolam e nitrazepam podem
Esse enorme arsenal terapêutico, porém, tem pouco significado se ser utilizados, porém apresentaram resultados controversos na
o médico – principalmente o pré-natalista – não tiver conhecimento da literatura. Os neonatos expostos podem apresentar síndrome de
farmacocinética frente às modificações gerais do organismo materno, bem Floppy – hipotonia, letargia e sucção fraca – ou, posteriormente,
como da farmacocinética e da farmacodinâmica durante a evolução do síndrome de privação – tremor, irritabilidade, hipertonicidade,
produto conceptual. diarreia/vômito, sucção vigorosa. Deve-se avaliar o risco/benefício.
É preciso, também, ter experiência com a eficácia terapêutica em Quanto aos medicamentos buspirona, cloxazolam, etomidato, za-
áreas de especialidades paramédicas, como acupuntura, fisioterapia, leplom e zolpidem, não há estudos controlados.
578 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Antagonistas dos receptores de angiotensinas: bloqueiam os Antienxaquecoso: derivados do ergot e metisergida estão con-
receptores de angiotensina II. Candesartana, irbesartana, losar- traindicados, ao passo que isometepteno deve ser evitado no
tana, telmisartana e valsartana estão contraindicados a partir do primeiro trimestre; noratriptano, risatriptano, sumatriptano, zolmi-
2o trimestre, pois há risco de anemia, hipotensão, insuficiência re- triptano não têm estudos controlados.
nal, oligoâmnio, dismorfoses, contratura de membros e até óbito Antiepilépticos: a incidência de malformações entre as gestantes
do RN. Quanto às associações candesartana/hidroclorotiazida, epilépticas é três vezes maior do que na população normal, devido
ubesartana/clorotiazida, losartana/hidroclorotiazida, valsartana/ às próprias intercorrências e pode atingir 10% entre as tratadas.
hidroclorotiazida e valsartana/anlodipino, estão contraindicadas Ácido valproico, carbamazepina, clonazepam, fenitoína, primidona
na gestação. e trimetadiona determinam malformações múltiplas; fenobarbital
Antiácidos: sais de magnésio podem favorecer diarreia, ao pas- promove doença hemorrágica do RN, e o clonazepam pode causar
so que os de cálcio e alumínio, constipação intestinal. Omeprazol, hipotonia no RN. Entre os mais recentes, barbexaclona, felbamato,
esomeprazol, lanzoparazol e pantoprazol não têm estudos contro- gabapentina, lamotrigina, levetiracetam, oxicarbazepina, topira-
lados. mato e vigabatina, não há estudos controlados.
Antiagregantes plaquetários: buflomedil, dipiridamol, pentoxifi- Antiespasmódicos: atropina, homatropina e N-butil escopolami-
lina e tirofibano não têm estudos controlados na gravidez. na são seguras.
Antiarrítmicos: amiodarona é potente teratógeno em animais Antiflatulento: dimeticona é compatível.
de experimentação; é preciso avaliar risco/benefício. Adenosina, Antifúngicos: ciclopiroxolamina, clotrimazol, nistatina, oxiconazol
mexiletina e propafenona não têm estudos controlados; digoxina, e butenafina são compatíveis. Anfotericina B, anfotericina B lipos-
disopiramida e quinidina não têm contraindicação. somal, miconazol, sertaconazol, terconazol, tioconazol, griseoful-
Antiartríticos: abatacepte e aurotiomalato não possuem estudos vina, secnidazol e itrazonazol não possuem estudos controlados,
controlados, ao passo que a glicosamina/condroitina é contrain- ao passo que fluconazol e metronidazol são contraindicados no
dicada. primeiro trimestre.
Antiblásticos: Anti-helmínticos: albendazol, mebendazol, piperazina e tiaben-
a | agentes alquilantes e compostos correlatos: mostardas ni- dazol estão liberados, quando houver indicação formal, após o
trogenadas (ciclofosfamida, clorambucil, melfalano), nitrosoureias segundo trimestre; ivermectina, levamizol, niclosamida, oxamni-
(lomustina, carmustina), bussulfano, cisplatina, carboplatina, da- quina, pirantel, pirvínio e praziquantel não possuem estudos con-
carbazina; trolados. A ivermectina é contraindicada.
b | antimetabólitos: antagonistas dos folatos (metotrexato), Anti-heparínico: a protanina não tem estudos controlados.
análogos da pirimidina (fluorouracila, citarabina, gencitabina) e Anti-histamínicos: ácido cromoglícico, azatadina, loratadina são
da purina (fludarabina, pentostatina, mercaptopurina, tioguanina, compatíveis com a gestação. Buclizina, clemastina, desloratadina,
azatioprina, alopurinol); dexclorfeniramina, ebastina, feniramina, fenoxedina, fexofenadina,
c | antibióticos citotóxicos: antraciclinas (idarrubicina, doxor- hidroxizina e pirilamina não têm estudos controlados; o uso de an-
rubicina, epirrubicina, mitoxantrona, dactinomicina, bleomicinas, ti-histamínicos duas semanas antes da parturição pode determinar
mitomicina); fibroplasia retrolental em prematuros. O uso da clorfeniramina e da
d | derivados vegetais: alcaloides da vinca (vimblastina, vincristi- terfenadina envolve avaliação de risco/benefício.
na, vinorrelbina, etoposídeo), taxanos (paclitaxel, docetaxel), com- Anti-inflamatórios:
potecinas (irinotecano, topotecano); a | não hormonais: sejam eles derivados dos salicilatos (AAS),
e | produtos biofarmacêuticos: beracizumabe, bortezomide, ce- do indol (benzidamina, glucametacina, indometacina), do ácido
tuximabe, dasatinibe, erlotinibe, lapatinibe, pemetrexede, sorafeni- propiônico (cetoprofeno, ibuprofeno, neroxeno) do ácido fenila-
be, todos são em princípio contraindicados, pois impedem a síntese cético (diclofenaco sódico e potássico, fentiazac), do ácido antra-
e/ou replicação do DNA e também a divisão celular nos mamíferos nílico (ácido mefenâmico), dos pirazolônicos (butazona cálcica,
por meio da intervenção na formação do fuso mitótico. A indicação fenilbutazona, feprazona, oxifembutazona) dos oxicans (melo-
formal do uso desse grupo de medicamentos depende do risco/be- xicam, piroxicam, tanoxicam) dos sulfamídicos (nimesulida) ou
nefício, avaliado pelo obstetra, neonatologista e oncologista. da nabumetona, não são teratogênicos. Ministrados, porém, no
Anticoagulantes: heparina é compatível e deve substituir varfa- terceiro trimestre, podem promover: gravidez prolongada por
rina tanto durante o período embriogênico, pois pode determinar inibição do trabalho de parto, disfunção renal, oligoâmnio, oclu-
um conjunto de efeitos deletérios chamado síndrome da varfarina são precoce do ducto arterioso, levando à hipertensão pulmonar
(hipoplasia nasal, depressão do septo nasal, hipoplasia das unhas, primária do RN.
crescimento intrauterino restrito e retardo mental), quanto próxi- b | derivados coxibes: celecoxib, etoricoxibe, lumiracoxibe, rofe-
mo ao termo da gestação, já que pode determinar sangramento, coxibe e valdecoxibe, por não terem especificidade exclusiva para
microcefalia, atrofia do nervo óptico e surdez no RN. As heparinas a ciclooxigenase-2, também estão contraindicados após a 32ª se-
de baixo peso molecular (HBPM), enoxaparina, dalteparina e na- mana, a exemplo dos demais.
droparina, assim como apixabana e ribaroxabana não têm estu- Antimaláricos: artemeter, artesunato e quinino estão contraindi-
dos controlados. cados, ao passo que cloroquina, hidroxicloroquina, mefloquina e
Antidiarreicos: loperamida é compatível, ao passo que racecado- primaquina ainda não possuem estudos controlados.
tril, furazolidona e atropina/difenoxilato não têm estudos contro- Antipsicóticos: clorpromazina, clozapina, flufenazina e pipotia-
lados. zina envolvem a avaliação de risco/benefício, em virtude do po-
Antieméticos: clorpromazina é controvertida; alisaprida, cisapri- tencial teratogênico. Contudo, droperidol, fentanila, haloperidol,
da, difenidol, domperidona, metoclopramida, ondazetrona e tropi- mirtazapina, nefazodona, olanzapina, pimozida, risperidona, tiori-
setrona não têm estudos controlados. dazida e trifluoroperazina não possuem estudos controlados.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 579
Antitiroidianos: propiltiuracila é o fármaco de escolha para o tra- Expectorantes: guaifenezina deve ser evitada no primeiro trimes-
tamento do hipertiroidismo na gestação; não é teratogênico, con- tre; uso prolongado de iodeto de potássio é contraindicado a par-
trola bem as crises e, eventualmente, o concepto pode apresentar tir da 20ª semana. O mentol, por sua vez, não apresenta estudos
somente leve hipotiroidismo. controlados.
Antiulcerosos: cimetidina, famotidina, nizatidina, pantoprazol, Fitoterápicos: os laxativos Peumus boldus e Psyllium plantago são
rabeprazol e ranitidina são compatíveis; lanzoprazol e omeprazol compatíveis com a gravidez, ao passo que a associação Plantago
não possuem estudos controlados. O misoprostol é contraindicado ovata Forsk + Byllium husk é contraindicada no primeiro trimes-
em virtude da intensa ação ocitócica. tre. Melissa officinalis, Piper methysticum F. Passiflora incarnata L.
Antivirais: saquinavir e tenofovir são compatíveis; amantadina, + Crataegus oxyacantha L. + Salix alba L., Hipericum perfora-
estavudina, abacavir, aciclovir, amprenavir, didanosina, efavirenz, tum, Matytenus ilicifolia Martius celastraceae, Sena alexandria, Car-
foscarnet, ganciclovir, idoxuridina, indinavir, lamivudina, nelfinavir, duus marianus, Equinacea purpúrea (L), Petasites hybridus (L)
nevirapina, penciclocir, valaciclovir, zalcitabina, zidovudina, cedo- Gaetern, Cordia verbenacea DC, Carduus marianus e Schinus tere-
vir, entecavir, enfuvirtide e fosamprenavir não possuem estudos binthifolius raddi não têm estudos controlados. São formalmente
controlados. Ritonavir envolve avaliação de risco/benefício, e riba- contraindicados Capsicum annuun L, Tenacetum parthenium, Gly-
virina é contraindicada. cine max L., Rosmarinus officinalis L., Vitex agnus-castus L., Oriza
Bloqueadores adrenérgicos: entre os alfa-adrenérgicos, metildo- sativa, Humulus lupulus L., Oenotrera biennis, Rosmarinus offici-
pa é compatível, ao passo que guanabenzo, prazosina e terazosi- nalis L., Borago officinalis, Boswella harpagophyton, Pelargonium
na não têm estudos controlados. Quanto aos betabloqueadores, sidoides e Ananás comosus L.
atenolol, bisoprolol, carvedilol, metoprolol, nadolol, propranolol,
Hanseniostáticos: clofazimina e dapsona não têm estudos con-
pindolol, sotalol, timolol e bisoprolol/hidroclorotiazida, ministrados
trolados. Quanto à talidomida, seu uso é proscrito no período pré-
durante o segundo trimestre, promovem redução do peso da pla-
-concepcional e durante todo o ciclo gravídico puerperal.
centa e crescimento intrauterino restrito, ao passo que, no curso do
Hemostáticos: fitomenadiona é compatível, ao passo que a me-
terceiro trimestre, somente reduzem o peso da placenta; avaliar ris-
nadiona e a terlipressina são contraindicadas no terceiro trimestre;
co/benefício. A associação atenolol/clortalidona é contraindicada.
aprotilina e etansilato não apresentam estudos controlados.
Bloqueadores de canais de cálcio: amilodipina, diltiazem, felo-
dipina, isradipina, lacidipina, lercandipina, manidipina, nefidipina, Hipoglicemiantes: insulina é recomendada para o tratamento do
nimodipina, nitrendipina, verapamil, bem como anlodipino/ateno- diabetes pelo Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas.
lol, não possuem estudos controlados. As associações anlodipino/ Os hipoglicemiantes orais acarbose, clorpropamida, fenformina,
benazepril, anlodipino/enalapril, anlodipino/losartana e nifedipino/ glimepirida, glipisida, metformina, repaglinida e rosiglitasona são
atenolol são contraindicadas. contraindicados. A glibenclamida é compatível, pois não ultrapas-
Bloqueadores neuromusculares/curarizantes: o uso de rocurô- sa a placenta e não produz efeitos deletérios no feto.
nio é compatível, ao passo que atracúrio, pancurônio, vencurônio, Hipolipemiantes: probucol é compatível, porém o clofibrato re-
galamina e succilcolina não possuem estudos controlados. quer avaliação do risco/benefício. Atorvastatina, cerivastatina,
Broncodilatadores: fenoterol e terbutalina são compatíveis; os fluvastatina, genfibrosila, lovastatina, pravastatina e sinvastatina,
demais, ambufilina, acebrofilina, bamifilina, budezonida, carbocis- sinvastatina/AAS, são todas contraindicadas.
teína, cetotifeno, formoterol, ipratrópio, montelucasto, salbutamol, Hormônios hipofisários: desmopressina e somatotrofina não têm
teofilina e zafirlucasto, não têm estudos controlados. estudos referentes ao uso na gravidez, e a leuprolida é contrain-
Carbapenemans: imipenema e meropenema não têm estudos dicada.
controlados. Hormônios tiroidianos: levotiroxina e liotiroxina são compatíveis,
Cardiotônicos de ação inotrópica: digitoxina é compatível com pois não ultrapassam a placenta; quanto à calcitonina e protirreli-
a gravidez; dobutamina, dopamina e milrinona têm poucas refe- na, não há dados disponíveis.
rências. Imunomoduladores: uso da timomodulina deve ser evitado no
Corticosteroides: beclometasona, betametasona, cortisona, de- primeiro trimestre, ao passo que a leflunomida, durante toda a
xametasona, prednisolona e prednisona atualmente são compa- gravidez; glatirâmer, por sua vez, não possui estudos conclusivos.
tíveis. O emprego prolongado pode, entretanto, determinar agra-
Imunossupressores: tanto os mais recentes, basiliximab, dacli-
vamento da síndrome do desconforto respiratório, hipoplasia e
zumab, sirolimus, tacrolimo, quanto os mais antigos, azatioprina
insuficiência da suprarrenal.
e ciclosporina, não possuem estudos controlados. O basiliximab é
Descongestionantes nasais: fenilefrina deve ser evitada no pri-
contraindicado.
meiro trimestre, ao passo que a fenoxazolina, nafazolina, oximeta-
zolina e xilometazolina não possuem estudos controlados. Inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA): alis-
Diuréticos: em geral, são contraindicados devido a efeitos dele- quireno, captopril, enalapril, benazepril, cilazapril, fosinopril,
térios sobre o concepto: hipoglicemia, hiponatremia, oligoâmnio. lisinopril, perindopril, quinapril, ramipril, trandolapril, ramipril/
Estão aqui incluídos os tiazídicos (clortalidona, hidroclorotiazida e hidroclorotiazida, delapril/manidipino, enalapril/hidroclorotiazida,
indapamina); os diuréticos de alça (ácido etacrínico, bumetanida, perindopril/indapamida, ministrados no primeiro trimestre, promo-
furosemida e piretanida); e os poupadores de potássio (amilorida, vem 3 a 4 vezes mais malformações cardiovasculares e do SNC.
esporonolactona e triantereno). A partir do segundo trimestre, são contraindicados.
Estimulantes do sistema nervoso central (SNC): anfetamina e si- Leishmaniose/tripanossomíase: benzonidazol, meglumina e
butramina são contraindicadas. Citicolina e metilfenidato não têm pentamidina não possuem estudos controlados; quando não hou-
estudos controlados. ver opção, avaliar risco/benefício.
Estrogênios: anticoncepcionais orais, dietilestilbestrol, estradiol, Macrolídeos: clindamicina, eritromicina, espiramicina e lincomici-
estrogênios conjugados, etinilestradiol e mestranol são contraindi- na não apresentam contraindicações; azitromicina, claritromicina,
cados por promoverem malformações múltiplas. miocamicina e roxitromicina não têm estudos controlados.
580 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
■■ MÉTODOS BIOQUÍMICOS
ATENÇÃO!
DOSAGENS BIOQUÍMICAS NO SANGUE MATERNO
É preciso sempre se atentar para o conhecimento obrigatório da ti-
A alfafetoproteína (AFP) encontra-se elevada no soro materno, nos fetos pagem materna (sendo indicada a administração de imunoglobulina
com defeitos do tubo neural (DTNs) e da parede abdominal (gastrosquise anti-D, quando necessária) e das sorologias, particularmente para o HIV.
e onfalocele).
582 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
valor preditivo positivo (VPP) baixo. Pode ser realizado a partir da 2a metade mínima – quando a amplitude é menor do que 6 bpm;
da gestação e se correlaciona com a função neurológica do concepto. Exis- moderada – quando a amplitude está entre 6 e 25 bpm;
tem vários protocolos de avaliação pelo mobilograma, porém um dos mais acentuada – quando a amplitude é maior do que 25 bpm;
utilizados e recomendados pelo Ministério da Saúde consiste em contar os padrão sinusoidal – embora não seja um tipo de variabilidade, foi
movimentos fetais durante uma hora após uma refeição. É preciso conside- incluída neste tópico pela característica especial de apresentar on-
rar sinal de alarme se a contagem for menor ou igual a seis movimentos. dulações da linha de base com ausência de variabilidade.
3 | Acelerações transitórias: definidas como o incremento do nível da li-
Batimentos cardíacos fetais nha de base de no mínimo 15 bpm com duração mínima de 15 segundos.
Na metade do século XVII, surgiu um dos primeiros parâmetros de ava- Quando a gestação estiver com menos de 32 semanas, admite-se ace-
liação de vitalidade – a ausculta dos batimentos cardíacos fetais –, que leração transitória ou reatividade a um incremento da linha de base de
permitiu aferir se o feto está vivo ou morto. A ausculta dos batimentos no mínimo 10 bpm com duração de 10 segundos. Na atualidade, essas
cardíacos fetais durante a consulta de pré-natal é bastante difundida e acelerações da FCF são também conhecidas como reatividades, uma vez
de baixo custo. Pode ser realizada com estetoscópio de Pinard ou sonar- que aparecem como uma reação aos movimentos fetais.
-Doppler. A faixa de normalidade se encontra entre 110 e 160 batimentos 4 | Desacelerações: representam a queda do nível da linha de base. Exis-
por minuto (bpm). Para obter avaliação tranquilizadora, há a necessidade tem quatro tipos de desacelerações:
de auscultar pelo menos uma aceleração dos batimentos cardíacos fetais, precoces – definidas como a queda gradual (atinge seu mínimo
com aumento de 15 bpm e duração mínima de 15 segundos. Na ausência de frequência cardíaca em 30 segundos ou mais) do nível da li-
desse sinal, é possível, ainda, realizar o estímulo vibratório. Na ausência nha de base de fundo concomitante ao pico da contração que a
da resposta citada, o teste é dito anormal e é necessária avaliação pelos originou;
métodos biofísicos, já que apenas a ausculta dos batimentos cardíacos tardias – definidas como a queda gradual (atinge seu mínimo de
fetais tem valor preditivo ruim para avaliar o sofrimento fetal. frequência cardíaca em 30 segundos ou mais) do nível da linha de
base de fundo com um lapso de tempo (decalagem) em relação ao
Avaliação do líquido amniótico — amnioscopia pico da contração que a originou;
A amnioscopia para a detecção de mecônio é método que, embora de fácil variáveis – definidas como a queda abrupta (atinge seu mínimo de
realização, requer que a paciente tenha pelo menos 2 cm de dilatação cer- frequência cardíaca em menos de 30 segundos) do nível da linha
vical, para a inserção do tubo transparente. Método subjetivo, que exige de base. Deve perdurar no mínimo 15 segundos e ter uma ampli-
experiência do examinador. O achado de líquido meconial somente é omi- tude de 15 ou mais bpm. Essas desacelerações não têm forma de-
noso para o nascituro quando acompanhado de alterações na frequência finida e não precisam estar relacionadas com contrações uterinas;
cardíaca fetal (FCF). Atualmente, como método de avaliação ambulatorial prolongadas – definidas como a queda do nível da linha de base
em gestações com pós-datismo, também tem seu valor questionado, já que perdura dois minutos ou mais e menos que dez minutos.
que o perfil biofísico fetal (PBF) tem melhores valores preditivos, ficando A mudança de linha de base é definida quando ocorre uma queda ou
reservado a casos em que a US não está disponível. ascensão do nível da linha de base que perdure mais de 10 minutos, não
devendo ser confundida com desaceleração ou aceleração.
MÉTODOS BIOQUÍMICOS
Cardiotocografia anteparto
A análise gasométrica do sangue fetal do couro cabeludo melhora a es-
A CTG pode ser iniciada, na maioria dos casos, a partir de 32 a 34 semanas;
pecificidade da monitoração da FCF, embora seja método pouco habitual
entretanto, em gestações com múltiplos fatores de risco, a avaliação pode
entre os obstetras. A amostragem de sangue fetal é limitada à pele que
começar precocemente, com 26 a 28 semanas de gestação. São indicações
reveste a parte fetal apresentada, tendo que haver ruptura das membra-
da propedêutica biofísica, entre outras, as destacadas no Quadro 104.1.
nas e no mínimo 2 a 3 cm de dilatação. Deve-se lembrar que edema altera
a interpretação dos resultados. As amostras devem ser coletadas com a
mãe em decúbito lateral. Considera-se alterado o pH da artéria umbilical
QUADRO 104.1 ■ Indicações para utilização dos métodos biofísicos
menor que 7,15.
CONDIÇÕES MATERNAS CONDIÇÕES RELACIONADAS À GRAVIDEZ
MÉTODOS BIOFÍSICOS
Condição hipertensiva Aloimunização
Cardiotocografia Diabetes Gestação prolongada
A cardiotocografia (CTG) onsiste no registro, eletronicamente, da FCF em Síndrome Oligoidrâmnia/polidrâmnia
concomitância com a dinâmica uterina e a movimentação fetal. Trata-se antifosfolipídica Restrição de crescimento fetal
de método de fácil execução e de baixo custo. Foi inicialmente valorizada Hemopatias Antecedentes de óbito fetal
durante o trabalho de parto e, posteriormente, no período anteparto (pois Colagenoses Diminuição dos movimentos fetais
mais de 65% das mortes fetais ocorrem nesse período). A CTG intraparto Cardiopatias Doença hipertensiva específica da
foi introduzida na prática obstétrica na década de 1960 como método de Nefropatias gravidez
avaliação do bem-estar fetal e foi rapidamente difundida, tornando-se o Outras endocrinopatias Alteração dopplervelocimétrica
procedimento obstétrico mais comum nos Estados Unidos. Para o estudo Gestação múltipla
da CTG, vários parâmetros observados no registro da FCF foram enfatiza-
dos pelos criadores da metodologia, destacando-se: 1 | Propósito: obter traçado que apresente, no mínimo, duas acelerações
1 | Nível da linha de base, determinado pela FCF, considerado normal da FCF dentro de um período de 20 minutos. Devem ser analisados todos
entre 110 e 160 bpm. os outros parâmetros da cardiotocografia, como nível da linha de base, va-
2 | Variabilidade da linha de base, classificada em quatro tipos: riabilidade da linha de base e presença ou não de desacelerações, porém o
ausente – quando a amplitude não é detectável; objetivo principal do teste é a verificação da presença de duas acelerações
584 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
transitórias da FCF, que devem ter amplitude de subida da linha de base j | desacelerações variáveis com outras características, como lento
e duração mínimas de 15 bpm e 15 segundos, respectivamente; em IGs retorno à linha de base, desacelerações em ombro.
inferiores a 32 semanas, bastam 10 bpm e 10 segundos. Categoria III – traçado anormal: está associado com um estado aci-
2 | Interpretação: dobásico fetal anormal no momento da observação. Necessita de
reativo: duas ou mais acelerações em 20 minutos de registro; avaliação e conduta imediata e inclui:
não reativo: nenhuma ou uma aceleração em 20 minutos de re- a | variabilidade ausente com uma das seguintes características:
gistro; desacelerações tardias recorrentes, desacelerações variáveis recor-
caso o traçado não exiba duas acelerações em 20 minutos de regis- rentes ou bradicardia;
tro, deve-se prolongar o registro por mais 20 minutos e/ou utilizar b | padrão sinusoidal.
estímulos (mudança de posição materna, estímulo mecânico, vibra-
tório), apenas com o objetivo de despertar o feto que se encontre
em sono profundo. Ausentes as duas acelerações transitórias, mes- ATENÇÃO!
mo com as tentativas de estímulos, o teste deve ser considerado
A CTG informa o estado metabólico fetal apenas no momento do exa-
não reativo, o que demanda maior rigorosidade na avaliação fetal
me – os traçados mudarão no decorrer do tempo. O traçado da FCF
com propedêutica subsequente.
pode variar entre as categorias dependendo da situação clínica e das
Cardiotocografia intraparto condutas adotadas. A presença de acelerações geralmente assegura
que o feto não está em acidemia. Na maioria dos casos, uma variabili-
Sua interpretação, obviamente, deve levar em consideração o caso em es-
dade normal assegura o estado fetal e a ausência de acidemia.
tudo, valorizando todos os dados clínicos pertinentes ao trabalho de parto
e as informações dos antecedentes.
Em relação às contrações uterinas, são quantificadas pelo número de
contrações em um intervalo de 10 minutos, em um período de no mínimo Perfil biofísico fetal
30 minutos de observação. Método descrito em 1980 por Manning,1 o PBF pode ser realizado a par-
Normal: cinco ou menos contrações em 10 minutos, avaliados em tir de 26 semanas. Tem demonstrado eficácia na avaliação do bem-estar
um período de pelo menos 30 minutos. fetal, apresentando alta especificidade, baixo falso-negativo e permitindo
Taquissistolia: mais do que cinco contrações em 10 minutos, avalia- uma redução da morbimortalidade perinatal.
dos em um período de pelo menos 30 minutos. São avaliados quatro parâmetros ultrassonográficos e um cardioto-
Os parâmetros de linha de base, variabilidade, acelerações, desace- cográfico.
lerações precoces, tardias, variáveis e prolongadas e o padrão sinusoidal Para cada uma das variáveis avaliadas, é dada nota 0 ou 2. Feita a
são os mesmos já descritos. soma, a nota final varia entre 0 e 10 (Quadro 104.2).
Em 2008, uma nova classificação para CTG intraparto foi elaborada, Os marcadores ultrassonográficos fetais são os movimentos respi-
visando a padronizar a interpretação e diminuir a variabilidade intra e in- ratórios e corpóreos, o tônus e a quantidade de líquido amniótico (dito
terobservador. marcador crônico de sofrimento fetal). Os três primeiros e o parâmetro
Categoria I – traçado normal: cardiotocográfico são denominados marcadores agudos. Na vigência de
a | linha de base entre 110 e 160 bpm; hipóxia aguda, o 1o item a ser alterado é o parâmetro da cardiotocogra-
b | variabilidade moderada; fia, seguido dos movimentos respiratórios e corpóreos e, por último, o
c | desacelerações tardias ou variáveis ausentes; tônus.
d | desacelerações precoces presentes ou ausentes; De forma geral, escores em 10/10 ou 8/10 com líquido amniótico nor-
e | acelerações presentes ou ausentes. mal são satisfatórios, e não há a necessidade de intervenção. Se o líquido
Categoria II – traçado indeterminado: não é preditivo de estado amniótico está reduzido, provavelmente se trata de hipoxemia crônica
acidobásico alterado, mas, no momento, não tem critérios para ser compensada e risco para descompensação aguda, caso que merece maior
classificado na categoria I ou III. Necessita de avaliação, vigilância atenção. Abaixo de 4/10, o resultado é positivo, e há a necessidade de
contínua e reavaliação, levando em conta as circunstâncias clínicas intervenção obstétrica. Especial atenção se dá ao resultado de 6/10 (sus-
envolvidas. Em alguns casos, até testes auxiliares devem ser feitos peito), caso em que, dependendo da idade gestacional, é preciso repetir o
para certificar o bem-estar fetal. Inclui os traçados que não podem exame em 24 horas.
ser classificados nas categorias I ou III. Exemplos de categoria II A Tabela 104.1 discorre sobre cada escore e suas implicações.
incluem:
a | linha de base: bradicardia com variabilidade presente;
b | taquicardia; ATENÇÃO!
c | variabilidade: variabilidade mínima;
Diante de um PBF alterado, deve-se descartar períodos de sono fetal e
d | variabilidade ausente sem desacelerações recorrentes;
uso de medicamentos depressores e sedativos antes que se presuma o
e | variabilidade acentuada;
diagnóstico de hipóxia fetal.
f | acelerações: ausência de acelerações induzidas por estímulo
fetal;
g | desacelerações periódicas ou episódicas: desacelerações re-
correntes variáveis acompanhadas de mínima ou moderada varia- Dopplervelocimetria
bilidade; Método não invasivo da avaliação do fluxo sanguíneo, tem demons-
h | desaceleração prolongada maior do que 2 minutos e menor do trado, em vários trabalhos e metanálises, diminuir a morbimortalidade
que 10 minutos; perinatal em gestações de alto risco. O princípio técnico é o estudo da
i | desacelerações tardias com variabilidade moderada; velocidade do sangue dentro de determinado vaso. Se houver aumento
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 585
Tônus fetal Movimentos da extremidade de flexão e extensão e rápido retorno Feto em posição de extensão do membro sem
à flexão retorno à flexão
Episódios de abertura e fechamento de mãos; flexão e extensão da A ausência de movimentação fetal é considerada
coluna; permanência da mão fechada por mais de 30 minutos ausência de tônus
Movimentos corporais Ocorrência de 1 movimento rápido e amplo ou 3 lentos em 30 Não ocorrência de um movimento rápido ou de 2 ou
minutos menos movimentos lentos em 30 minutos
Movimentos simultâneos dos membros e do tronco são
considerados um único movimento
Movimentos respiratórios Pelo menos 1 episódio de 30 segundos em 30 minutos Ausência de 1 episódio de 30 segundos em 30
minutos
Reatividade cardíaca fetal Ocorrência de pelo menos 2 acelerações de no mínimo 15 bpm e 15 Uma ou nenhuma aceleração 15 bpm e 15 segundos
segundos, associada à movimentação fetal, em 20 minutos em 20 minutos
Líquido amniótico Um bolsão de líquido amniótico mede, no mínimo, 2 cm com o Maior bolsão menor do que 2 cm com o transdutor
transdutor perpendicular à mesa perpendicular à mesa
8/10 (LA alterado) Provável sofrimento fetal crônico 89/1.000 Resolução de acordo com a maturidade
6/10 (LA normal) Teste suspeito, possível asfixia fetal Variável Parto, se maturidade pulmonar presente (caso
contrário, aguardar 24 h e, se persistir 06/10, parto)
da resistência, é registrada velocidade baixa e, se resistência diminuída, menor relacionada à diástole. A avaliação da artéria umbilical reflete a
velocidade alta. resistência vascular placentária e está fortemente correlacionada à insu-
A avaliação, geralmente, é feita por Doppler das artérias uterinas (cir- ficiência placentária. Em condições normais, a resistência da artéria um-
culação materna), umbilical (circulação fetoplacentária) e cerebral média e bilical diminui progressivamente durante a gestação; na insuficiência pla-
do ducto venoso (circulação fetal). centária; ocorre o inverso. O perfil hemodinâmico fetal pode encontrar-se
A avaliação das artérias uterinas auxilia no diagnóstico de implan- normal mesmo com comprometimento de até 50% dos vasos placentários.
tação placentária anormal, identificando as gestações de risco para pré- A redução do fluxo placentário, com diminuição da perfusão da artéria
-eclâmpsia e restrição do crescimento fetal. O Doppler das artérias uteri- umbilical, é o 1o sinal hemodinâmico da existência de lesão placentária.
nas permite a detecção da invasão trofoblástica deficiente antes mesmo A centralização hemodinâmica fetal é o próximo passo na deteriora-
do aparecimento das manifestações clínicas. Os sinais típicos dessa pla- ção fetal em resposta à insuficiência placentária. Existe uma vasodilatação
centação inadequada são aumento da resistência (índice de pulsatilidade seletiva para preservação de órgãos nobres (cérebro, coração e glândulas
e índice de resistência), bem como a presença de incisura protodiastólica suprarrenais) e vasoconstrição de outros órgãos (rins, pulmões, intestino,
nas artérias uterinas. pele e esqueleto) nos fetos sob processo de hipoxemia. Esse processo de
A artéria umbilical, que representa a circulação placentária, é o vaso centralização hemodinâmica passa por algumas etapas, em que há piora
que tem apresentado resultados mais expressivos no diagnóstico de com- progressiva do fluxo das artérias umbilicais com perda do seu componente
prometimento fetal. A onda de velocidade de fluxo caracteriza-se por ter diastólico até que este se torna reverso e há diminuição da resistência na
um pico de maior velocidade durante a sístole cardíaca e uma velocidade artéria cerebral média. A artéria cerebral média deve ser estudada conjun-
586 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
1| Alterações cromossômicas 1| Patologias clínicas (hipertensão, diabetes melito 1| Placentação inadequada (ausência de destruição
(trissomias do 13, 18 e 21) com vasculopatia, cardiopatias cianóticas, pneumonias da porção musculoesquelética das artérias
2| Síndromes gênicas restritivas, doenças renais graves, doenças autoimunes, espiraladas na migração trofoblástica, gerando um
3| Infecções intrauterinas como colagenoses e síndrome do anticorpo território com alta resistência ao fluxo sanguíneo)
(CMV, rubéola, varicela-zóster antifosfolipídico, trombofilias hereditárias e adquiridas, 2| Alterações estruturais e de implantação (placenta
e Toxoplasma gondii) hiper-homocisteinemia e anemias graves) bilobada, de inserção baixa, corioangioma, inserção
4| Gestações múltiplas 2| Distúrbios de nutrição (desnutrição) velamentosa do cordão e artéria umbilical única)
5| EIMs 3| Uso de drogas ilícitas, fumo e substâncias teratogênicas
(anticonvulsivantes, anticoagulantes do tipo varfarínicos,
antineoplásicos e antagonistas do ácido fólico)
4| Outros fatores (constitucionais, raça, estresse, depressão)
Tipo III: associação entre os mecanismos anteriores (tipos I e II). A biparietal (DBP) e medida do fêmur (F). Esse é o melhor teste para rastrear
o
alteração ocorreria no 2 trimestre de gestação, portanto na fase e diagnosticar RCF, além de fornecer dados para pesquisa da etiologia.
de hiperplasia e hipertrofia. Pode ser detectado em fases mais pre- Observa-se que a CA é menor na presença de RCF em virtude da dimi-
coces da gestação, cujos fetos demonstram crescimento semi-har- nuição do tamanho do fígado, pela redução do glicogênio acumulado e da
mônico com aparência hipotrófica. A etiopatogenia relaciona-se depleção do tecido adiposo da região abdominal. Além disso, as relações
a infecções embrionárias (rubéola, CMV, toxoplasmose e outras), biométricas auxiliam no diagnóstico da RCF. A relação CC/CA e F/CA tem
além de agentes tóxicos que afetam o embrião (medicamentos, uma acurácia maior para detecção de fetos com crescimento restrito asso-
drogas ilícitas e toxinas). ciado à insuficiência placentária e à RCF do tipo assimétrica.
A RCF também pode ser classificada, cronologicamente, em precoce, A US também é capaz de avaliar a vitalidade fetal por meio do perfil
que se estabelece antes de 34 semanas e acarreta mais agravos para o biofísico fetal (PBF). As atividades biofísicas fetais frente à hipóxia obede-
concepto, e tardia, que ocorre mais próxima do termo. cem à ordem inversa de sua instalação durante a embriogênese, deterio-
rando de maneira sequencial a reatividade da frequência cardíaca fetal,
QUADRO CLÍNICO seguida do padrão dos movimentos respiratórios, corporais e, por último,
A anamnese pré-natal cuidadosa pode identificar fatores de risco para RCF, do tônus. Esses três parâmetros são considerados marcadores agudos da
como intercorrências maternas, história obstétrica pregressa (ocorrência de vitalidade fetal. Em resposta à hipoxemia crônica, há redistribuição do flu-
recém-nascidos de baixo peso, com crescimento restrito e/ou malformações) xo sanguíneo fetal e diminuição progressiva do volume do líquido amnióti-
e atual (com eventual exposição a algum fator etiológico envolvido na RCF). co, sendo este considerado marcador crônico da vitalidade fetal.
No exame físico, a medida seriada da altura uterina e até mesmo o con- Dopplervelocimetria
trole do ganho ponderal materno poderão contribuir para o rastreamento
da RCF. Medidas menores da altura uterina em relação à medida esperada Permite a detecção, de forma não invasiva, dos sinais de insuficiência pla-
para determinada idade gestacional sugerem a RCF. A palpação obstétrica centária e de alterações hemodinâmicas fetais que ocorrem em resposta à
também faz parte da avaliação subjetiva do tamanho fetal e da quantida- deficiência de oxigênio. Essa análise pode ser feita por meio das artérias
de do líquido amniótico, mas com sensibilidade e especificidade inferiores uterinas (circulação materna), das artérias umbilicais (circulação fetopla-
à medida uterina, em vista de variações relacionadas a biotipo materno, centária) e dos demais vasos fetais (cerebral média, aorta abdominal, re-
paridade, volume da bexiga no momento da medida, etnia, situação do nais, ducto venoso, seio transverso).
feto, gestações múltiplas, alterações do volume do líquido amniótico, etc. Dessa forma, a dopplervelocimetria identifica fetos restritos com ris-
co de hipóxia (aproximadamente 40% dos casos) e permite o diagnóstico
DIAGNÓSTICO diferencial entre a restrição patológica (ou seja, com déficit de nutrientes
e hipoxemia) e fetos constitucionalmente pequenos, além de auxiliar na
Informações clínicas investigação de outros fatores etiológicos envolvidos, como aneuploidias
Para o diagnóstico mais acurado da RCF, é primordial a confirmação da e síndromes congênitas.
idade gestacional, sempre mais bem determinada por meio da data da A avaliação das artérias uterinas busca rastrear gestações que apre-
última mentruação em conjunto com parâmetros ultrassonográficos pre- sentem maior risco de insuficiência placentária e pré-eclâmpsia, as quais
coces. No entanto, a data da última menstruação (DUM) informada pela elevam a incidência da RCF. Tal alteração pode ser identificada pelo au-
gestante pode ter erro de 14 a 28 dias. Durante o 1o trimestre, o com- mento da resistência, gerando maiores valores de índice de pulsatilidade
primento craniocaudal ou cabeça-nádega (CCN) pode ter um erro de 5 a (IP) e de resistência (IR), com ou sem a presença de incisura protodiastólica
7 dias na determinação da idade gestacional, assim como a medida do (notch) uni ou bilateral.
diâmetro biparietal até a 28a semana. Analisando-se o padrão da artéria umbilical, observa-se que, em con-
dições normais, sua resistência diminui progressivamente durante a ges-
Ultrassonografia tação, diferentemente do que acontece na insuficiência placentária, em
Permite a estimativa de peso fetal, utilizando, na equação, as medidas que há um aumento de sua resistência. A redução do fluxo placentário,
de circunferência abdominal (CA), circunferência craniana (CC), diâmetro habitualmente, é o 1o sinal hemodinâmico observável da existência de le-
588 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
são placentária e comprometimento da microcirculação vilositária. A lesão manas, quando os riscos inerentes à prematuridade se tornam inferiores
placentária causa diminuição da perfusão da artéria umbilical, gerando di- àqueles relacionados à hipóxia.
ástole ausente e/ou reversa da umbilical nos casos críticos da hipóxia fetal. O diagnóstico de diástole ausente nem sempre coincide com o da in-
A insuficiência placentária causa deterioração fetal progressiva, po- terrupção da gravidez, porém há consenso da necessidade de seguimento
dendo atingir o quadro de centralização fetal, em que se observam a va- intensivo dessas gestações, objetivando o melhor momento possível e
sodilatação seletiva para preservação de órgãos nobres (cérebro, coração levando-se em conta a influência dos fatores de decisão de parto citados
e glândulas suprarrenais) e a vasoconstrição de outros órgãos (rins, pul- anteriormente.
mões, intestino, pele e esqueleto) nesses fetos com hipoxemia. A possibilidade de utilização da corticoterapia antenatal para acelerar
Os fetos que sofrem hipóxia e com centralização hemodinâmica têm a maturidade pulmonar e reduzir o risco de hemorragias intracranianas
alterações progressivas também no fluxo do território venoso. O ducto ve- deve sempre ser cogitada. Logo, após o uso de corticosteroide, é comum a
noso é amplamente utilizado para avaliação venosa fetal, apresentando- melhora transitória dos índices de dopplervelocimetria (resposta habitual
-se como uma onda de velocidade de fluxo claramente pulsátil, com três ao uso da medicação), mas deverá ser mantida a proposta de resolução
componentes: sístole (onda S) e diástole (onda D), ambas ventriculares, da gravidez.
e contração atrial (onda A). A onda de fluxo do ducto venoso (DV) pode Na RCF tardia, o parto está indicado quando há sinais de sofrimen-
ser modificada com a onda A, a qual correspondente à contração atrial, to agudo ou idade gestacional superior a 36 / 37 semanas. Em conjunto,
tornando-se reversa. avaliam-se as condições maternas objetivando o tratamento clínico das
O DV é um importante fator prognóstico dos resultados perinatais ad- possíveis doenças associadas (como a hipertensão arterial).
versos em fetos com RCF e prematuros, visto que a mortalidade perinatal A via de parto deve ser individualizada para cada gestante em virtude
é evidentemente maior na centralização de fluxo fetal, atingindo até 41% da RCF presente. Algumas considerações são importantes na escolha da
quando a onda A está reversa no DV. A acidemia fetal está presente diante via de parto, pois o feto com restrição apresenta maior suscetibilidade a
do DV alterado, aumentando a incidência de complicações neonatais. O mudanças bruscas de fluxo uteroplacentário, elevando o risco de hipóxia,
seio transverso também pode colaborar na identificação da acidemia fetal acidose, aspiração de mecônio e óbito intraparto. Se o oligoâmnio esti-
pela avaliação do IP. ver presente, as desacelerações umbilicais graves e frequentes durante o
trabalho de parto podem ser favorecidas e revertidas com a realização da
TRATAMENTO âmnio-infusão.
Não existe nenhuma intervenção terapêutica intrauterina que reverta Portanto, se a opção de parto for pela via vaginal, é necessário rigoro-
ou interrompa o curso progressivo da insuficiência placentária. Por isso, so controle da vitalidade fetal durante todo o trabalho de parto por meio
quando a RCF está presente, o maior desafio obstétrico é a decisão do da cardiotocografia contínua, com atenção especial ao período expulsivo.
momento apropriado do parto, confrontando riscos inerentes à prematuri- A aplicação do fórcipe deve ser feita de forma criteriosa, devido ao maior
dade e aqueles decorrentes da acidemia com a permanência intrauterina, risco de tocotraumas, que podem causar hemorragias intracranianas.
que podem determinar a morte e a lesão de múltiplos órgãos.
A idade gestacional, a etiologia do retardo de crescimento, o grau de
comprometimento da vitalidade fetal e o nível de experiência e recursos ATENÇÃO!
tecnológicos disponíveis na instituição de tratamento preferencialmente
A via baixa é sempre bem indicada nas malformações incompatíveis
terciário são os principais fatores sobre a decisão do momento do parto.
com a vida.
ATENÇÃO!
Diante de acidose fetal antes do trabalho de parto ou presença de
Prevenir ou tratar possíveis fatores de risco envolvidos na etiologia, mecônio espesso no período de dilatação, o parto cesariano está indicado.
como o tabagismo, são medidas eficazes diante da RCF. Porém, a possibilidade de hemorragia cerebral também existe, devendo-se
estar atento no intraoperatório para a realização adequada da histeroto-
mia, de modo a proporcionar menor trauma à extração fetal.
Direcionar a investigação para possíveis anormalidades estruturais ou Durante a assistência ao parto, analgésicos, tranquilizantes e seda-
cromossômicas de infecções fetais e de má adaptação circulatória utero- tivos devem ser evitados, pois determinam maior risco de depressão res-
-placentária é importante quando a restrição se instala precocemente, piratória. No período expulsivo, a raquianestesia é de eleição para ambas
mas, infelizmente, não há terapêutica. as vias de parto (vaginal e abdominal). Recomenda-se o clampeamento
Medidas gerais, como limitação da atividade física diária e repouso imediato do cordão umbilical após o nascimento para evitar a hipervisco-
em decúbito lateral esquerdo, embora amplamente recomendadas, não sidade sanguínea pós-natal. Dessa forma, o neonatologista pode avaliar
dispõem de evidências científicas que demonstrem seus benefícios. Há rapidamente o grau de hipóxia e oferecer as medidas de oxigenação ne-
vários estudos multicêntricos que mostram o não benefício de maneira es- cessárias ao recém-nascido.
tatisticamente significativa do uso indiscriminado de ácido acetilsalicílico
em baixas doses na prevenção e no tratamento da RCF.
Se a insuficiência placentária estiver presente, opta-se pela conduta
■■ MACROSSOMIA FETAL
obstétrica expectante, monitorando-se a maturidade e a vitalidade fetais, Na literatura, existem diferentes definições para macrossomia fetal, que
com antecipação do parto quando a primeira estiver presente ou a segun- está presente em cerca de 10% dos partos. A mais aceita é aquela que
da, comprometida. Por esses motivos, preconiza-se a internação em todos inclui fetos que estejam acima do percentil 90 para a idade gestacional, o
os casos, para monitoração adequada das condições clínicas maternas e GIG. Entretanto, a confirmação diagnóstica da macrossomia fetal somente
vigilância fetal intensiva e diária, com realização de cardiotocografia, US, poderá ser determinada ao nascimento, no momento da mensuração real
PBF e dopplervelocimetria. Esses fetos restritos serão seguidos até 37 se- do peso, que deverá estar acima de 4.000 g.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 589
ETIOLOGIA TRATAMENTO
Os fatores etiológicos que resultam na macrossomia fetal são o constitu- A intervenção no curso da macrossomia somente é possível quando sua
cional (incluindo raça, etnia e herança genética), a duração da gestação origem é a hiperglicemia materna. Por isso, na maioria dos casos, a única
(gestações prolongadas, pós-datismo), o ganho de peso excessivo na conduta viável frente à macrossomia é o adequado planejamento do parto.
gestação, a multiparidade, a obesidade e o diabetes materno (gestacio- Nos partos que ocorrem sem a prévia suspeita de macrossomia, a dis-
nal ou melito tipos 1 e 2). A macrossomia surge em mais de 40% das tocia fetal por desproporção cefalopélvica pode estar presente, gerando um
gestantes diabéticas. No entanto, cerca de 60% das gestantes com feto quadro emergencial angustiante para o obstetra. Por isso, nessa situação,
macrossômico não apresentam nenhum fator de risco detectável. manobras recomendadas na sua correção devem ser executadas, como epi-
A importância do diagnóstico e/ou suspeita da macrossomia deve- siotomia ampla, posicionamento adequado da parturiente na mesa cirúr-
-se à elevação considerável do risco de complicações gestacionais e, por gica e as manobras clássicas descritas no capítulo de Assistência ao parto
consequência, da morbimortalidade materna e perinatal. Entre as com- transpélvico (MacRoberts, Rubin, Jacquemier, clidotomia e Zavanelli).
plicações perinatais, destacam-se asfixia, distocia de ombros com possí- Pelos riscos maternos e perinatais já referidos, a indução eletiva do
vel lesão de plexo braquial, hipoglicemia e óbito. As complicações mater- parto e a cesariana eletiva são as principais opções de conduta na ma-
nas incluem elevação da taxa de cesariana, maior risco de rotura uterina crossomia fetal.
espontânea, em especial nas gestantes com cesariana prévia e/ou mioe- A indução eletiva do parto nas gestantes diabéticas deve ser realizada
mectomizadas, parto prolongado, hemorragia e traumas perineais. no termo, em geral a partir da 38 a semana de gestação. Dessa forma,
a interrupção do crescimento fetal exagerado pode ser determinada. No
QUADRO CLÍNICO entanto, vale enfatizar que a indução eletiva se comporta como fator iso-
lado de elevação de risco para cesariana. Além disso, os tocotraumas nem
A anamnese permite identificar os principais fatores de risco para macros-
sempre poderão ser evitados caso o feto seja realmente macrossômico.
somia, incluindo fatores constitucionais maternos (raça, etnia e herança
genética), história obstétrica pregressa (ocorrência de recém-nascidos Na literatura atual, a cesariana eletiva na macrossomia, principalmen-
macrossômicos, traumas perineais ou indicação de cesariana prévia por te para mães diabéticas, parece ser a melhor opção para reduzir os riscos
desproporção cefalopélvica e diabetes materno) e atual (obesidade, ganho de trocotraumas maternos e fetais, apesar dos riscos embutidos no parto
de peso excessivo na gestação, diabetes e outros fatores que possam ter operatório (hemorragia, infecção, trombose venosa e óbito).
correlação com a etiologia da macrossomia fetal).
No exame físico, a medida seriada da altura uterina e o controle
do ganho ponderal materno poderão contribuir para o rastreamento da REVISÃO
macrossomia. Medidas superiores da altura uterina em relação à medida A restrição do crescimento fetal e a macrossomia são as duas princi-
esperada para determinada idade gestacional sugerem a macrossomia pais representações dos desvios de crescimento fetal.
fetal, assim como a palpação obstétrica na avaliação subjetiva do tama- Para as duas vertentes, o diagnóstico pode ser suspeitado simples-
nho fetal. Além disso, o ganho excessivo na gestação pode favorecer o mente pelo exame obstétrico, confirmado por meio da US.
desenvolvimento do diabetes gestacional e da macrossomia fetal. O tratamento de ambas também chama a atenção pela busca de um
fator de risco ou doença materna associada e pelo controle rigoroso
DIAGNÓSTICO dessa possível patologia. No caso da RCF, a pesquisa de doenças
Informações clínicas hipertensivas, trombofilias e infecções congênitas são obrigatórias.
Deve-se ser fazer um rastreio ultrassonográfico para pesquisa de
A confirmação da idade gestacional sempre deve ser preconizada, com a
o alterações genéticas ou cromossômicas. Particularmente, no outro
utilização da US de 1 trimestre, como mencionado para a RCF.
eixo dos desvios de crescimento, a macrossomia fetal pode ser cau-
Diante da suspeita de diabetes, é preciso prosseguir com a investi- sada por obesidade ou diabetes materno.
gação laboratorial para confirmação por glicemia de jejum e curva glicê- É preciso um acompanhamento rigoroso com provas de vitalidade
mica (definida no capítulo de Distúrbios do Metabolismo na Gravidez), fetal para os dois desvios do crescimento, por meio de US, doppler-
ou verificar os controles glicêmicos nas gestantes com diabetes já diag- -velocimetria, perfil biofísico fetal ou cardiotocografia, dependendo
nosticado. da idade gestacional.
Em relação ao parto, para a macrossomia fetal, o parto de eleição
Ultrassonografia
é a cesariana pelo risco de tocotraumas; em relação ao feto restrito
Na macrossomia fetal, o peso fetal encontra-se acima do percentil 90 com boa vitalidade, deve-se tentar o parto vaginal com boa monito-
para a idade gestacional, apresentando medidas biométricas superiores à ração do concepto durante todo o procedimento.
idade gestacional. Alguns estudos mostram que fetos de mães diabéticas
apresentam maior quantidade de gordura corporal total, repercutindo em
uma medida de circunferência abdominal superior à esperada pelo acú-
■■ LEITURAS SUGERIDAS
mulo do tecido adiposo da região abdominal. Dessa forma, as relações
biométricas citadas na restrição de crescimento também se mostram alte- Botsis D, Vrachnis N, Christodoulakos G. Doppler assessment of the intrauterine
radas na macrossomia fetal (CC/CA e F/CA). growth-restricted fetus. Ann N Y Acad Sci. 2006;1092:297-303.
Hackmon R, Bornstein E, Ferber A, Horani J, O’Reilly Green CP, Divon MY.
O líquido amniótico também deve ser avaliado pela US, visto que o
Combined analysis with amniotic fluid index and estimated fetal weight
poli-hidrâmnio é frequentemente associado ao desequilíbrio metabólico for prediction of severe macrosomia at birth. Am J Obstet Gynecol.
materno, principalmente nas diabéticas descompensadas (hiperglicemia 2007;196(4):333.e1-4.
materna). No entanto, estudos mais recentes mostram que o índice do Koyanagi A, Zhang J, Dagvadorj A, Hirayama F, Shibuya K, Souza JP, et al.
líquido amniótico (ILA), já acima do percentil 60 para idade gestacional, Macrosomia in 23 developing countries: an analysis of a multicountry,
pode também apresentar associação com macrossomia. facility-based, crosssectional survey. Lancet. 2013;381(9865):476-83.
590 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Najafian M, Cheraghi M. Occurrence of fetal macrosomia rate and its maternal massa embrionária comum. Caso a divisão ocorra nas primeiras 72 horas
and neonatal complications: a 5-year cohort study. ISRN Obstet Gynecol. após a fertilização, haverá a formação de duas placentas e dois sacos am-
2012;2012:353791. nióticos (gestação dicoriônica, diamniótica). Se entre o 4o e o 8o dias, ou
Oteng-Ntim E, Kopeika J, Seed P, Wandiembe S, Doyle P. Impact of obesity on seja, nas fases de blástula ou blastocisto (74% dos casos), as células que
pregnancy outcome in different ethnic groups: calculating population
originam o córion já terão se diferenciado e, portanto, existirão apenas
attributable fractions. PLoS One. 2013;8(1):e53749.
uma placenta e duas cavidades amnióticas (monocoriônica, diamniótica).
Em 1% dos casos, a divisão do blastocisto ocorre entre o 8o e o 12o dias,
resultando em gestações monocoriônicas, monoamnióticas, pois o saco
amniótico já está também formado. Menos de 1% dos casos resultam de
106 falhas na divisão do blastocisto, havendo uma divisão após o 13o dia, ori-
ginando a gemelaridade imperfecta (gêmeos unidos).
GESTAÇÃO MÚLTIPLA
ATENÇÃO!
No exame obstétrico, nota-se edema dos grandes lábios e da região tam-se novas sorologias para as quais a gestante é suscetível. Ao redor da
suprapúbica. As estrias tornam-se mais exuberantes e adquirem brilho de 33a semana, efetua-se a cultura específica para Streptococcus agalactiae.
madrepérola. O abdome mostra-se mais globoso e, por vezes, identificam-
-se sulcos uterinos. Ao palpar, a mensuração do fundo uterino apresenta ULTRASSONOGRAFIA
valores maiores do que o esperado para a idade gestacional (IG). É de A US tem papel fundamental na determinação da corionicidade. O exame
grande importância o palpar de dois polos homônimos. Na ausculta, realizado no primeiro trimestre, especialmente entre 8 e 15 semanas de
identificam-se dois focos separados por uma área de silêncio, de cerca atraso menstrual, é capaz de visibilizar a membrana interâmnica e veri-
de 10 cm. Valoriza-se quando a diferença dos batimentos é maior do que ficar se, no seu ponto final adjacente, a placenta adquire o formato de
15 por minuto. Ao toque vaginal, com muita frequência, depara-se com o lambda, dado patognômonico de gravidez dicoriônica; na gestação mono
colo uterino esvaecido e mostras de dilatação precoce. Recomenda-se a coriônica, o sinal presente na US é o do T. A US é recomendada a partir da
realização do toque vaginal em toda consulta pré-natal com o intuito de a
16 semana a cada duas semanas nas gestações monocoriônicas e a cada
tentar reduzir a prematuridade. a
quatro semanas após a 20 semana nas dicoriônicas.
O diagnóstico subsidiário da gestação múltipla evoluiu de forma notá-
vel devido à US, que permite identificar muito precocemente dois ou mais
sacos gestacionais. ATENÇÃO!
o
A US do 1 trimestre é de grande valia para obter as seguintes informa-
ATENÇÃO! ções: corionicidade, idade gestacional e número de fetos; a US morfo-
lógica do 1o trimestre é usada para avaliar a translucência nucal, osso
Apesar de a maioria dos casos evoluir satisfatoriamente, a atenção nasal, e o Doppler de ducto venoso deve ser realizado entre a 11a e a
do obstetra deve ser redobrada. Na condição de gestação múltipla, 14a semana da gestação.
apura-se maior propensão a uma série de intercorrências, como: hipe-
rêmese; aborto;prematuridade; anemia; infecção rinária;polidrâmnio;
amniorrexe prematura; pré-eclâmpsia; inserção baixa da placenta; Entre 20 e 22 semanas, realiza-se a US com o intuito de analisar a
DPP; restrição de crescimento fetal; e óbito intrauterino. Dessa forma morfologia fetal, aferindo-se a medida do colo uterino (US transvaginal).
o tocólogo deve voltar-se a diminuir esses eventos. Em alguns, sua A ecocardiografia deve ser solicitada de rotina entre a 24ª e a 28ª
intervenção é notória, em outros, menos manifesta. semanas, especialmente nos casos de STFF.
■■ TRATAMENTO
ASSISTÊNCIA À GEMELIGESTA
Uma das principais preocupações no pré-natal está dirigida ao diagnósti- PREVENÇÃO DO PARTO PREMATURO
co da corionicidade, uma vez que as gestações monocoriônicas apresen- NA GRAVIDEZ GEMELAR
tam maiores complicações, entre elas a síndrome de transfusão feto-fetal As causas que determinam o trabalho de parto prematuro na gestação
(STFF) (em 15% dos casos) ou a restrição seletiva do crescimento fetal (15% múltipla são desconhecidas; entretanto, a limitada adaptabilidade do úte-
dos casos). Outra preocupação é a presença de doenças preexistentes, já ro humano para acomodar vários fetos é, provavelmente, um dos fatores
que a idade materna é mais avançada e pode haver maior risco de diabe- responsáveis pela ocorrência da prematuridade. A marcante distensão das
tes, hipertensão e trombofilias. Atenção especial deve ser dada para algu- fibras uterinas, provocando seu precoce amadurecimento e estiramento
mas situações, como hiperêmese, anemia, pré-eclâmpsia, discordância de do segmento inferior, justifica a elevada incidência de prematuridade nas
peso (RCF), prematuridade e diagnóstico das aneuploidias. gestações múltiplas.
A frequência das consultas dependerá do diagnóstico da corionici-
dade. Nas gestações dicoriônicas, de melhor prognóstico, recomenda-se
consulta mensal até a 24a semana, quinzenal até a 34a semana e semanal ATENÇÃO!
até o parto. Nas monocoriônicas, em virtude do risco de STFF (15% dos
casos), recomendam-se consultas quinzenais a partir da 16a semana de A prematuridade é a temida complicação da gravidez múltipla, não só
gestação até a 34ª, e, depois, semanais até o parto. O diagnóstico de STFF pela frequência, como também por representar a causa mais impor-
geralmente é realizado no 2o trimestre, em média entre a 20a e a 21a se- tante da elevada mortalidade perinatal. A prematuridade na gestação
mana de gestação. gemelar é 3 a 4 vezes maior, representando 12% dos prematuros. A
partir de vários estudos, concebeu-se que, à medida que o número de
EXAMES DE PRÉ-NATAL fetos aumenta, a duração da gravidez diminui; aproximadamente 50%
a
dos gêmeos nascem antes ou na 36a semana e 50% dos trigêmeos ou
Os exames solicitados na 1 consulta de pré-natal da gravidez gemelar são de gravidezes com número superior a três fetos, antes de 32 semanas;
semelhantes aos da gravidez única. Nos casos de hiperêmese, é possível e a idade gestacional média de nascimento de gêmeos é 36 semanas,
acrescentar as dosagens de tirotrofina (TSH), tri-iodotironina (T3) e tiroxina a de trigêmeos, 32 a 33, e a de quadrigêmeos, aproximadamente 31.
livre (T4L). Os exames de urina tipo I e urocultura devem ser solicitados
frequentemente durante o pré-natal, já que a infecção do trato urinário é
importante causa de parto prematuro. Atenção especial deve ser dada às Para reduzir significativamente a morbidade e a mortalidade peri-
secreções vaginais para evitar a corioamnionite, uma vez que a cervicodi- natais, é imperativo que se evite ou seja bloqueado o trabalho de parto
latação precoce é evento comum na gravidez múltipla, portanto a análi- prematuro por meio do uso precoce de medidas terapêuticas. Persistem,
se do bacterioscópio da secreção vaginal deve ser requisitada durante o contudo, as dificuldades de identificação das pacientes com gestações
a
pré-natal. Por volta da 26 semana, repete-se o hemograma, realiza-se a gemelares que terão trabalho de parto prematuro. Diversas abordagens
curva glicêmica de duas horas com sobrecarga de 75 g de glicose e solici- e intervenções foram feitas na tentativa de evitar a ocorrência da prematu-
592 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
ridade em gestações gemelares. Dessas destacam-se a análise dos fatores Progesterona micronizada
de risco, o toque vaginal, a medida do colo uterino na US transvaginal Estudo multicêntrico demonstrou não reduzir a prematuridade. Dessa for-
(USTV) e a fibronectina fetal. ma, utilizou-se de rotina a progesterona micronizada, na dose de 200 µg,
São considerados fatores de risco os hábitos de vida, o estado nutri- via vaginal, por dia nos casos de colo curto.
cional e a história pregressa de prematuridade, para objetivar as orienta-
ções quanto à restrição do consumo de cigarros, à redução do estresse, ao TRABALHO DE PARTO PREMATURO
tratamento de bacteriúria assintomática e ao alerta sobre os sinais preco-
Pode-se tentar a inibição do trabalho de parto no período gestacional, que
ces de trabalho de parto.
compreende a 22a e a 34a semana, caso os fetos não apresentem altera-
Repouso ção da vitalidade. Diversos são os medicamentos indicados para isso, no
entanto, na gemiligesta, os efeitos colaterais são mais intensos em virtude
Há muita controvérsia sobre o valor profilático do repouso na prevenção do
da magnitude das modificações maternas. Dessa forma, os bloqueadores
parto prematuro – em que período deve ser iniciado, o tempo necessário e
dos canais de cálcio apresentam-se como opção segura na gravidez múl-
a possível hospitalização. Estudos que avaliaram o repouso hospitalar não
tipla, devendo ser utilizados na dose de 10 mg, via sublingual, a cada
mostraram qualquer benefício. Em uma metanálise da Cochrane, Crowther
20 minutos e manutenção com 10 mg, a cada seis horas, por três dias.
concluiu, em relação à hospitalização e ao repouso: não há evidência que
Outra opção são os antagonistas da ocitocina (atosiban), que apresentam
diminua a prematuridade e não reduza a mortalidade perinatal.
poucos efeitos colaterais, mas têm, como fator limitante, custo elevado.
Acredita-se neste trabalho que algumas mudanças de hábito de vida
O atosiban (Tractocile®) é utilizado via endovenosa (EV) em três estágios:
sejam favoráveis para reduzir a prematuridade. O repouso não é uma ga-
dose inicial de 6,75 mg em bólus durante um minuto; seguida de infusão
rantia para a gestante de que não ocorrerá a prematuridade, no entanto é
IV na qual se acrescentam 75 mg de atosiban (duas ampolas de 5 mL com
benéfico em casos selecionados, principalmente na vigência de cervicodi-
7,5 mg/mL) a 100 mL de solução glicosada a 5% para infusão em três horas
latação precoce. O afastamento das atividades profissionais dependerá de
(24 mL/h correspondente a 18 mg/h ou 300 µg/mL); seguida de nova in-
caso para caso, sendo instituído da 24a a 34a semana, conforme a evolu-
fusão via EV de manutenção em baixa dose de 8 mL/h (ou 100 µg/mL) por
ção do pré-natal.
mais 45 horas. A duração do tratamento não deve exceder 48 horas. Os
Medida do colo uterino betamiméticos apresentam relativa contraindicação em razão do aumento
da volemia no gemelar. Inibidores das prostaglandinas apresentam risco
O advento da US transvaginal tornou mais precisa a avaliação do compri-
de fechamento precoce do ducto arterioso, quando utilizados, na dose de
mento do colo relacionado ao parto pré-termo. O exame é realizado entre
100 mg supositório via retal de 12 em 12 horas por três dias.
20 e 24 semanas, e o colo é considerado curto quando menor ou igual a
25 mm.
NEUROPROTEÇÃO DO PREMATURO
Fibronectina fetal O sulfato de magnésio pode ser usado para neuroproteção nos casos de
A fibronectina fetal está presente nos fluidos cervicovaginais durante as prematuridade extrema antes de 32 semanas. A dose utilizada é de 4 g de
primeiras 20 semanas de gestação, sugerindo que os componentes da ataque e 2 g via EV por hora por até 24 horas.
matriz extracelular, incluindo a fibronectina fetal, são liberados durante
a fase proliferativa do desenvolvimento das membranas. Após a fusão do CORTICOSTEROIDES
âmnio com o córion, a fibronectina fetal não é mais encontrada nos fluidos Quando há risco efetivo da prematuridade, preconizam-se os corticoste-
cervicovaginais de gestações não comprometidas. Após a 24a semana, a roides com o desiderato de promover a aceleração da maturidade pul-
presença da fibronectina fetal na secreção vaginal é um importante mar- monar fetal, entre a 24a e a 34a semanas. O uso profilático semanal nos
cador do início da cascata de eventos que antecedem ao parto, pois qual- protocolos com múltiplas doses não demonstrou benefício na síndrome do
quer problema na interface materno-fetal – como infecção ascendente, desconforto respiratório, além de apresentar efeitos adversos nos fetos.
contrações mecânicas e isquemia, antes do parto – pode causar liberação Ministra-se, portanto, a betametasona IM, na dose diária de 12 mg, por
da fibronectina fetal para a vagina. dois dias consecutivos, em apenas um ciclo; excepcionalmente, dois.
da filtração glomerular ocasionando poliúria e assim polidrâmnio neste ou rotura prematura de membranas. A fotocoagulação a laser dos
gemelar. O doador neste caso, apresenta-se hipovolêmico com oligúria vasos que atravessam a membrana interâmnica, segundo alguns
e, portanto, oligoâmnio.3 Nesses casos, há uma incidência aumentada autores, tem uma taxa de 53% de sobrevida em relação a 37%
de doenças cardíacas no feto receptor, incluindo hipertrofia ventricular, dos pacientes tratados com amniorreduções sequenciais. Essa
cardiomegalia, regurgitação atrioventricular, anormalidades no ducto taxa de sobrevida tem aumentado com a experiência das equipes
venoso e diminuição da função sistólica, que podem evoluir ou regredir na realização do procedimento ao redor do mundo. Eles também
após o nascimento. Sem tratamento, o prognóstico perinatal é bastante relatam uma melhora nos achados das US transfontanelas dos
reservado, com uma taxa de mortalidade de 70-90%. O diagnóstico de recém-nascidos submetidos à terapia a laser. A fotocoagulação
STFF pode ser suspeitado desde o primeiro trimestre, com discrepância do a laser não seletiva, com a coagulação do equador da placenta
crescimento entre os fetos, do volume de líquido amniótico ou diferença (Técnica Solomon) reduz as taxas de recorrência da STFF, além do
importante entre a translucência nucal; porém, na maioria das vezes, é aparecimento da SAP sem aumentar a mortalidade ou morbidade
feito ao redor da 20a semana em exames de rotina. O diagnóstico se ba- neonatal em relação à técnica seletiva. Existe a necessidade do
seia principalmente na gestação gemelar monocoriônica complicada por aprimoramento das técnicas de seleção das anastomoses profun-
polidrâmnio de 8 cm ou mais no maior bolsão vertical do feto receptor das artéria-veia, para evitar a fulguração de anastomoses prote-
(poliúrico) e por oligoâmnio de 2 cm ou menos no maior bolsão vertical toras, podendo levar à insuficiência placentária, principalmente
do feto doador (oligúrico). Como a STFF costuma surgir de forma aguda, é do lado do doador.
importante o acompanhamento quinzenal das gestações monocoriônicas.
O primeiro estudo prospectivo randomizado foi realizado pelo grupo
A avaliação inicial inclui US morfológica, dopplervelocimetria, medida do
Eurofetus comparando tratamento com laser e amniorredução sequen-
comprimento do colo uterino e ecocardiografia fetal. Critérios de exclusão
cial em gestações com STFF, entre 15 a 26 semanas de gestação, 52%
para o diagnóstico de STFF seriam: anomalia fetal, patologia cromosso-
em estágio I e II de Quintero, 47% em estágio III e 1% em estágio IV. A
mial e ruptura de membranas amnióticas. Quintero classificarou a STFF em
3 sobrevida de pelo menos um gemelar foi maior no período neonatal do
cinco estágios de acordo com os prognósticos perinatais. No estágio I, há
grupo submetido à laserterapia (76%) em relação ao grupo submetido à
uma discrepância entre a quantidade de líquido amniótico nas duas câma-
ras amnióticas (doador com maior bolsão de líquido amniótico menor do amniorredução (56%). As alterações neurológicas também apareceram em
que 2 cm; receptor com maior bolsão de líquido amniótico maior do que 8 menor quantidade (31% versus 52%) no grupo submetido à laserterapia
cm). No estágio II, o feto doador apresenta a bexiga vazia e com oligoâm- em relação ao grupo de amniorreduções sequenciais.
nio importante, podendo até apresentar anidrâmnio, e no receptor, pode
ser evidenciado bexiga distendida e polidrâmnio. No estágio III, aparecem SEQUÊNCIA ANEMIA POLICITEMIA
alterações dopplervelocimétricas em um ou ambos os fetos, por exemplo, Considerada uma variante da STFF, sendo que nestes casos ocorre uma
aumento de resistência da artéria umbilical do doador, aumento no índice discrepância entre os níveis de hemoglobina dos fetos, sem que haja dife-
de pulsatilidade/ausência ou inversão de fluxo na contração atrial no duc- rença importante no volume dos líquidos amnióticos. Um dos fatores de
to venoso do receptor. No estágio IV, o receptor desenvolve hidropsia. No risco seria o próprio tratamento a laser da STFF. Nesta sequência também
3
estágio V, há óbito de um ou ambos os fetos. A ocorrência de morte de há anastomoses arteriovenosas, porém, em menor proporção, que fazem
um dos gêmeos varia de 2,2 a 8,0%. Quando um dos fetos não sobrevive, com que haja uma transfusão gradual do sangue do doador (anêmico)
o outro tem um risco muito alto de desenvolver danos cerebrais devido à para o receptor (policitêmico). O diagnóstico no pré-natal é realizado pelo
isquemia-hipoxemia. Isso ocorre devido à queda pressórica no feto morto índice de pulsatilidade da artéria cerebral média do feto (PS-ACM >1,5
que induz a um shunt sanguíneo através das anastomoses placentárias, MoM no doador e PS-ACM <1,0 MoM no receptor). A transfusão fetal
resultando em uma anemia aguda ou subaguda e hipovolemia no feto intrauterina seria uma opção de tratamento, sendo que a via intraperi-
sobrevivente. Além disso, fatores tromboplásticos, produto da degradação toneal tem melhores resultados que a via IV. De qualquer modo, a taxa
da fibrina, provenientes do feto morto também podem causar sequelas de sobrevida na conduta expectante é de 75 e de 100% nos casos pós-
neurológicas no outro feto. O manejo da situação irá depender da idade
-transfusão.
gestacional, da gravidade do acometimento dos fetos e do comprimento
do colo uterino.
RESTRIÇÃO DE CRESCIMENTO
Opções de tratamento FETAL SELETIVA
Amniodrenagem: é um procedimento não específico, apenas pa- Ocorre em 10 a 15% das gestações monocoriônicas e é definida quando
liativo. Neste procedimento, é retirado o excesso de líquido amnió- um feto tem peso abaixo do percentil 10, sendo que há uma diferença de
tico da cavidade em que há polidrâmnio, no intuito de prolongar a peso maior do que 20% entre os fetos em 50% dos casos. A causa para
gestação e evitar o abortamento. O ideal é que seja feita de modo que ocorra esta restrição, na maioria das vezes, é o comprometimento na
seriado, a cada sete a 15 dias. Há risco de corioamnionite, rotura invasão trofoblástica de um gemelar por fatores intrínsecos ou extrínse-
prematura de membranas e abortamento. cos, provocando o aumento da pressão nas artérias espiraladas. Nesses
Septostomia: tem a mesma função da amniodrenagem, pois casos, podem ser encontradas lesões trombóticas vasculares, infartos,
equilibra o volume de líquido amniótico, uma vez que transforma hematomas intraplacentários ou depósito de fibrina perivilositário. Ocor-
a gestação em monoamniótica, porém aumenta os riscos de entre- re, então, a distribuição assimétrica do território placentário, sendo que a
laçamento do cordão. inserção velamentosa da placenta acompanha mais de 45% dos casos. A
Fetoscopia com coagulação a laser: trata-se de um procedi- presença de RCFs está associada a um aumento importante na morbimor-
mento específico, visto que é feita a coagulação das anastomo- talidade perinatal. Os casos com RCFs são classificados, de acordo com a
ses placentárias no intuito de interromper o desequilíbrio entre dopplervelocimetria da artéria umbilical: diástole presente (grau I), diás-
as circulações, tornando a gestação semelhante a uma gestação tole ausente ou reversa persistente (grau II) e diástole ausente ou reversa
dicoriônica. Neste procedimento, há o risco de DPP, abortamento intermitente (grau III). O acompanhamento dos casos de RCFs na Unifesp
594 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
é realizado utilizando a US para avaliar o peso fetal e o líquido amniótico, O diagnóstico pode ser feito em pré-natal por US, e os principais si-
o perfil biofísico fetal e a dopplervelocimetria na seguinte periodicidade: nais de gemelaridade imperfeita são: contornos fetais com pouca nitidez,
a cada 15 dias no ambulatório na presença de vitalidade fetal pre- movimentação dos fetos em bloco, colunas vertebrais opostas ou parale-
servada (grau I); las e a ausência de separação das outras estruturas fetais, mesmo quando
a cada 7 dias no ambulatório nas gestações com índice de pulsa- há movimentação fetal. O polidrâmnio está associado a estes casos em
tilidade aumentada da artéria umbilical e idade gestacional < 26 50% das vezes. O diagnóstico pode ser complementado com ressonância
semanas; nuclear magnética, sendo utilizada para detectar lesões não visíveis ao
duas vezes por semana no ambulatório nas gestações com IP au- ultrassom, principalmente as cerebrais e cervicais, além de fornecer da-
mentada da artéria umbilical e idade gestacional > 26 semanas; dos mais precisos a cerca dos órgãos unidos. Deve ser realizada a partir
a
duas vezes por semana no ambulatório nas gestações com fluxo da 24 semana, pois a movimentação fetal é maior e há a possibilidade
o
diastólico intermitente, diástole ausente e reversa e idade gesta- do uso do gadolínio, proscrito no 1 trimestre. A separação dos gêmeos
cional < 26 semanas ou seja antes do limite da viabilidade (grau II unidos é um procedimento complicado que requer uma equipe multidisci-
e III) e diariamente em regime de internação hospitalar nas gesta- plinar, e o prognóstico é predeterminado pela gravidade do acolamento.
ções com fluxo diastólico intermitente, diástole ausente ou reversa
e idade gestacional > 26 semanas (grau II e III). MORTE UNIFETAL NA GESTAÇÃO MÚLTIPLA
A resolução da gestação deve ser indicada quando: a idade gestacio-
A incidência de óbito de um dos fetos é de 6%. A morte de ambos os
nal > 36 semanas; cardiotocografia categoria III; perfil biofísico fetal < 6;
conceptos não costuma prejudicar o diagnóstico e a conduta (semelhante
e ducto venoso > 0,76.
à adotada no óbito intrauterino na gravidez única).
GESTAÇÃO ACÁRDICA É possível dizer que o passamento de um dos conceptos no início da
gestação – the vanishing twin – não repercute, normalmente, na evolu-
A gestação acárdica ou a sequência de perfusão arterial inversa gemelar
ção do outro feto. Em contraposição, decesso mais tardio, em especial na
(SPAIG) é um fenômeno raro que ocorre em 1% das gestações gemelares a
2 metade da gravidez, determina preocupações quanto às consequências
monocoriônicas, estando presente em cerca de 1 a cada 35.000 gesta-
maternas. Entre os riscos maternos, sobressai a coagulopatia, teorica-
ções. Caracteriza-se pelo circuito de perfusão anômala que envolve a pre-
mente viável após retenção do feto morto por mais de quatro semanas.
sença de um gêmeo doador perfundindo o gêmeo receptor (gêmeo acárdi-
Em nossa experiência, este é evento raro e a conduta expectante não deve
co) por meio de anastomoses arterioarteriais, determinando fluxo reverso
ser limitada por esse aspecto.
de sangue pobremente oxigenado para o receptor. O padrão retrógado
A principal preocupação está dirigida ao feto vivo remanescente pe-
de perfusão leva a efeito devastador no gêmeo perfundido, que, além
da ausência do desenvolvimento cardíaco, apresentará anormalidades los riscos que o envolvem. Assume importância básica, nesses casos, o
morfológicas envolvendo outras estruturas, especialmente cabeça, tórax determinismo envolvido no óbito intrauterino. As principais causas fetais
e membros superiores. O abdome e os membros inferiores são mais comu- de óbito são: infecção; cromossomopatia; acidente de cordão; e causas
mente identificados em virtude do fato de essas estruturas serem supridas placentárias, como a STFF e a RCF seletiva. As causas maternas são hiper-
pelas artérias ilíacas e aorta abdominal, que recebem fluxo sanguíneo tensão (pré-eclâmpsia), trombofilias e diabetes.
oriundo do fluxo retrógado na artéria uterina. O gêmeo normal pode de- Na gravidez monocoriônica, a presença de anastomoses vasculares,
senvolver sequelas cardiovasculares graves decorrentes da sobrecarga de responsáveis pela síndrome da transfusão feto-fetal, acarreta distúrbio he-
volume, então começa a desenvolver insuficiência cardíaca, polidrâmnio e modinâmico entre os fetos. Com o óbito do primeiro, é possível observar
hidropsia, levando a índices de mortalidade perinatal em torno de 50%. O inúmeros agravos transmitidos ao segundo, desde anoxia até coagulação
diagnóstico pode ser realizado na US morfológica de 1o trimestre e inclui intravascular e, por vezes, morte. As repetidas quedas de pressão arterial
alguns critérios: gestação gemelar monocoriônica, fluxo reverso no cordão do transfusor determinam modificações hemodinâmicas no transfundido,
umbilical e aorta descendente, presença de anastomoses arterio-arteriais que culminam com a queda brusca da pressão e da oxigenação, por oca-
e ausência cardíaca parcial ou completa de um dos fetos. Às vezes, o gê- sião do óbito do primeiro feto. Tal fato é comprovado pela frequência das
meo acárdico é confundido com um teratoma; fatores de diferenciação se- seguintes lesões cerebrais, encontradas no transfundido: hipóxica-isquê-
riam a presença de cordão umbilical e uma certa organização corporal do mica, hemorragias e malformações. Valorizam-se bastante as alterações
feto acárdico. A conduta expectante está associada a uma mortalidade de hemodinâmicas imediatas à morte unifetal, relacionando-a à gênese da
50 a 75%. O objetivo principal do tratamento é a interrupção da circulação multiplicidade de infartos que evoluem para lesões císticas, principal-
do feto acárdico. As principais técnicas cirúrgicas são baseadas na oclusão mente no cérebro e nos rins. Quando o óbito se dá no início da gestação,
do cordão umbilical, com pinça bipolar, fotocoagulação a laser; ligadura e apresenta pouca repercussão. Mas, quando tardiamente, pode levar a al-
secção do cordão ou obliteração da circulação com álcool absoluto, ou ain- terações hemodinâmicas – hipóxia-isquêmica (infartos – lesão cística no
da com uso da radiofrequência. Quando utilizadas as técnicas cirúrgicas, cérebro e nos rins) e passagem de êmbolos de material necrótico –, dupli-
as taxas de sobrevida são de cerca de 75%. cando o risco de óbito do sobrevivente. Na monocoriônica, o óbito é seis
vezes maior do que na dicoriônica. Devido ao risco de comprometimento
GEMELARIDADE IMPERFEITA neurológico, recomenda-se realizar a RM três semanas após o óbito fetal.
A gemelaridade imperfeita é rara e acomete 1:52.000 dos nascidos-vivos. Quanto à conduta obstétrica, em particular no último trimestre, de-
Acredita-se que a etiologia esteja na falha de divisão do blastocisto que pende, em geral, da causa envolvida no decesso do feto.
ocorre apenas a partir da 14o dia após a fertilização. Essa falha pode levar Atribuída às anastomoses vasculares, características das placentas
a múltiplos tipos de fusão, incluindo compartilhamento de órgãos inter- monocoriônicas, é possível eventualmente estabelecer conduta expectan-
nos. A gemelaridade imperfeita também está associada a outras mal- te, em virtude da idade gestacional prematura e do agravo já ter desen-
formações, como cardíaca e do trato gastrintestinal (TGI). A maioria dos cadeado sequelas no feto vivo. O grande desafio do obstetra é indicar o
casos nascem prematuros, sendo que apenas 40% são nativivos, e destes, parto antes do decesso de um dos fetos na STFF, mesmo que, para isso,
35% morrem dentro das primeiras 24 horas. A taxa de sobrevida é de 25%. tenha de arcar com o ônus da prematuridade.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 595
TERMO NO GEMELAR
107
No que se refere à idade da gestação no gemelar, é interessante salientar INFECÇÕES CONGÊNITAS
que é preciso considerar como término 38 semanas, e não 40, como na
gravidez única. O zênite de crescimento é atingido com cerca de 39 sema-
nas, sugerindo que a gestação dupla pode ser biologicamente mais curta
do que a única. Consideramos o término da gravidez gemelar dicoriônica ■■ JOÃO BORTOLETTI FILHO
por volta da 38a semana; na monocoriônica, na 37ª; e, na monoamniótica, ■■ RENATO MARTINS SANTANA
na 34ª, já que, a partir dessa data, muitos relatam aumento da morbidade
■■ ABES M. AMED
e da mortalidade perinatais.
ASSISTÊNCIA AO PERÍODO DE DEQUITAÇÃO Este capítulo chamará a atenção para a importância das patologias infec-
E AO 4° PERÍODO ciosas maternas mais comuns que podem levar a diversas alterações fetais
Em geral, verifica-se primeiro a expulsão dos fetos, seguindo-se o secun- ou à gestante.
o
damento. Eventualmente, a dequitação ocorre após o parto do 1 gemelar, Estamos vivenciando no momento atual o impacto de um grave surto
a
ou a 2 placenta se exterioriza antes do nascimento do respectivo feto. A de microcefalia fetal secundária à contaminação por Zika vírus (ZIKV), razão
hemorragia por atonia uterina é frequente, recomendando-se o uso de pela qual daremos ênfase à esta patologia, sem, entretanto, desdenhar das
ocitócicos após a expulsão do último concepto e das placentas. infecções congênitas que podem impactar o binômio materno-fetal.
596 ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA
Nosso enfoque será dado às ações profiláticas e terapêuticas, por Observa-se na Figura 107.1 um resumo da história natural da infecção
meio de protocolos atualizados elaborados com base em criteriosa análise congênita por CMV.
da literatura internacional. Acreditamos, deste modo, que estaremos pres-
tando grande auxílio ao clínico obstetra, diminuindo com isso o risco de
eventual perda fetal ou o nascimento de bebê com graves lesões, mesmo
que não letais. GESTANTES COM ALTO
NÍVEL ECONÔMICO
■■ CITOMEGALOVIROSE
O citomegalovírus (CMV) é um dos agentes etiológicos mais comuns entre Gestantes com baixo
os causadores de infecção congênita e perinatal. Trata-se de um herpes- nível econômico
-vírus formado por uma dupla hélice de DNA, transmitido pelo contato
com sangue, saliva, urina ou por contato sexual com pessoas infectadas e
15% suscetíveis 85% imunes
que é a segunda maior causa de acometimento viral em humanos, perden-
do apenas para o vírus da gripe.
1-4% 0,5-1%
Os herpes-vírus são conhecidos por sua habilidade em causar infec- infecção primária infecção congênita
ções latentes e de serem, subsequentemente, reativados. Tal fato tem (forma recorrente)
grande importância para melhor entender a história natural e eventuais
complicações tardias de alguns subtipos deste agente infeccioso. 40% transmitem 0-1% das crianças
para o feto com sequelas
QUADRO CLÍNICO
10-15% dos fetos
O período de incubação do CMV é de 28 a 60 dias, com uma média de 40
têm doença sintomática
dias. As infecções primárias produzem uma resposta humoral por imuno-
globulina M (IgM) que desaparece em média em 30 a 60 dias, podendo 90%
ser detectada em kits comerciais do teste enzyme linked immunosorbent desenvolvem sequelas
assay (Elisa) ultrassensíveis por até 300 dias. A viremia costuma ocorrer
em 2 a 3 semanas após a inoculação. A infecção primária em adultos 10% evoluem normais
geralmente é assintomática, mas podem ocorrer febre, mal-estar, mialgia
e calafrios, além de leucocitose, linfocitose e testes de função hepática 85-90% dos fetos
são assintomáticos 55% imunes 45% suscetíveis
anormais.
Em 5 a 15% dos indivíduos acometidos, pode ocorrer reativação pos-
terior da doença, e a excreção viral do CMV durar anos após a primoin- 5-15% 0,15% infecção congênita 1-4%
desenvolvem sequelas (forma recorrente) infecção primária
fecção.
Entretanto, a infecção recorrente materna tem efeitos menos devas-
tadores, restrita apenas a um quadro clínico similar ao das viroses mais 85-95% 0-1% das
evoluem normais crianças com sequelas
comuns e autolimitado, como o da gripe comum.
Dos fetos com infecção congênita decorrente de infecção primária
materna, 10 a 15% apresentam sintomas ao nascimento, sendo as mani- FIGURA 107.1 ■ História natural da infecção congênita por CMV.
festações clínicas mais comuns hepatoesplenomegalia, calcificações intra-
cranianas periventriculares, ventriculomegalia, icterícia, restrição de cres-
cimento geralmente simétrica, microcefalia, coriorretinite e perda auditiva.
DIAGNÓSTICO
EPIDEMIOLOGIA O diagnóstico de CMV congênito pode ser obtido pela sorologia compa-
A infecção por CMV é endêmica, sem variação sazonal, e até o final da tível com infecção primária ou recorrente materna, mas, principalmente,
2a década de vida a maioria dos adultos já possui anticorpos contra o ví- após a detecção de achados ultrassonográficos sugestivos de infecção,
rus. De forma geral, a prevalência da colonização por CMV é maior em apontados no Quadro 107.1.
países em desenvolvimento e nas populações de menor nível socioeco- A infecção primária materna é definido pela soroconversão de IgM
nômico. Também são fatores de risco promiscuidade, história de citologia anti-CMV, detectada pelo teste Elisa, ou pela presença de IgG anti-CMV
cervicovaginal alterada, 1a gravidez antes dos 15 anos, multiparidade e em pacientes sabidamente negativas antes da gravidez. O diagnóstico da
antecedente de doença sexualmente transmissível (DST). infecção recorrente é suspeitado quando há aumento dos títulos de IgG
anti-CMV ou nova soroconversão de IgM, na presença de IgG positiva
previamente.
ATENÇÃO! O uso do teste de avidez IgG específica anti-CMV permite datar o
Nas gestantes com infecção primária, 40 a 50% dos fetos serão in- provável momento da infecção primária, em que os anticorpos de baixa
fectados por transmissão vertical, cuja probabilidade de ocorrência avidez, com índice < 30%, estão presentes no sangue materno até 20 se-
1
no concepto é diretamente proporcional à idade gestacional. Em con- manas após o contato com o vírus. Baccard-Longere e colaboradores pro-
trapartida, as lesões malformativas são inversamente proporcionais à puseram aumentar o índice de alta avidez para 80%, como critério para
idade gestacional. excluir com certeza a infecção por CMV até as 12 semanas anteriores à
data do exame.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 597
TRATAMENTO EPIDEMIOLOGIA
Embora existam medicamentos antivirais específicos para o tratamento Cerca de 50% dos adultos apresentam sorologia positiva para infecção
da citomegalovirose, como ganciclovir e foscarnet, seu uso para o trata- pregressa pelo eritrovírus, representada pelo anticorpo sérico IgG anti-
mento da infecção por CMV congênito é controverso. Atualmente, apenas -B19, cuja prevalência aumenta desde os 5 anos de idade na população
é indicado tratamento desta patologia em pacientes imunodeficientes, em em geral. Sua via mais provável de transmissão é a respiratória, mas pode
risco de vida ou perda da visão. Foscarnet é um competidor do pirofos- ocorrer por via parenteral resultante de admnistração de derivados san-
fato, ao passo que o ganciclovir age como um competidor da guanosina guíneos. A transmissão vertical para o feto por via transplacentária se dá
durante a síntese de DNA viral. Porém, efeitos colaterais provocados pelos em um terço dos casos. É recomendável, portanto, que gestantes sorone-
medicamentos devem ser considerados cuidadosamente, em especial a gativas evitem contatos com populações escolares que estejam vivendo
toxicidade renal e a pancitopenia, provocadas pelo uso de ganciclovir e surtos de eritema infeccioso.
foscarnet, respectivamente.
Jacquemard e colaboradores2 realizaram estudo observacional no QUADRO CLÍNICO
qual propuseram a administração materna do antiviral valaciclovir na dose
O parvovírus B19 é o agente causador do eritema infeccioso, também co-
de 8 mg/dia, em gestações de fetos comprovadamente infectados por a
nhecido como a 5 doença da infância.
CMV, sugerindo, no entanto, novos estudos randomizados para avaliar a
Logo após a ocorrência da primoinfecção, comumente surgem sinto-
eficácia terapêutica desse medicamento.
mas inespecíficos, como cefaleia, mialgia, febre, calafrios e prurido cutâ-
Outros autores, como Kimberlim e colaboradores,3 têm sugerido o
neo, seguidos de quadro clínico mimetizando artrite reumatoide.
tratamento imediato do recém-nascido (RN) contaminado com CMV com
ganciclovir, tentando prevenir perda da audição.
Tem sido proposta na literatura a alternativa terapêutica com o uso ATENÇÃO!
de Ig anti-CMV específica para a gestante, administrada por via en-
dovenosa em dose unimensal até o termo da gravidez, tentando com Durante a gravidez, se o feto for infectado, este frequentemente evolui
isso diminuir o risco as disrrupções fetais. Entretanto este tratamento é para miocardite, além de ter sua eritropoiese diminuída de modo dramá-
muito custoso, além de somente poder ser administrado em ambiente tico, desenvolvendo grave anemia e insuficiência cardíaca, culminando
hospitalar, o que inviabiliza sua aplicabilidade em larga escala, sendo com hidropisia fetal não imune e óbito em cerca de 50% dos casos.
acessível apenas a uma pequena parcela da população com alto nível
socioeconômico.
DIAGNÓSTICO
■■ ERITROVIROSE O diagnóstico sorológico é geralmente realizado pela pesquisa dos anti-
O parvovírus B19, também conhecido como eritrovírus, é um agente in- corpos IgG e IgM específicos antiparvovírus B19, utilizando-se kits comer-
feccioso viral de hélice simples de DNA, de filamento único icosaédrico e ciais Elisa disponíveis. A reação em cadeia da polimerase (PCR) pode ser
sem envoltório, com capsídeo externo contendo duas proteínas estruturais. realizada para a detecção de DNA viral no soro ou nos tecidos infectados.
Esse vírus apresenta tropismo para as células progenitoras de eri- O diagnóstico de suspeita da infecção aguda pode feito pela sintoma-
troides e outras do sistema hematológico, como neutrófilos e plaquetas. tologia clássica do eritema infeccioso, além dos outros aspectos clínicos
Ocorrida a primoinfecção, o anticorpo IgM anti-B19 permanece indetectá- citados neste capítulo, como a artropatia.
vel por alguns meses. Entretanto, os anticorpos da classe IgG surgem em Na crise de anemia aplástica transitória, principalmente em portado-
poucos dias. res de anemia falciforme, é mandatória a realização da sorologia especí-
fica para a parvovirose B19. Nessas pacientes, a pesquisa do DNA do eri- TRATAMENTO
trovírus em soro, por meio da técnica de PCR, resulta comumente positiva. Tem sido preconizada a administração intravenosa de imunoglobulina hu-
mana durante a viremia, nas doses diárias de 400 mg/kg, por cinco dias,
com boa resposta terapêutica. Se houver recidiva da patologia, esse es-
ATENÇÃO!
quema pode ser repetido.
Diante do diagnóstico da primoinfecção pelo eritrovírus na gravidez, As pacientes que evoluem para anemia grave ou crise aplástica transi-
a possibilidade da transmissão vertical para o feto e de consequente tória podem ser beneficiadas por transfusão de hemoderivados.
anemia deste por hemólise maciça deve ser considerada.
ATENÇÃO!
Um método relativamente simples e efetivo para diagnóstico não in-
vasivo da anemia fetal moderada ou grave em casos de aloimunização Rh O tratamento da infecção fetal pelo parvovírus B19, complicada com
4
foi descrito por Mari e colaboradores, o qual consiste na avaliação do pico anemia grave e hidropisia, pode ser feito pela transfusão sanguínea
da velocidade sistólica da artéria cerebral média do feto pelo método dop- intraútero por meio de cordocentese.
plervelocimétrico a cores. São realizadas três curvas espectrais no Doppler
dessa artéria, sendo considerado o maior valor do índice de pulsatilida-
de dos três obtidos para o pico da velocidade sistólica como parâmetro ■■ RUBÉOLA
preditor da anemia fetal. Se este exceder 1,5 múltiplos da mediana da
4 A rubéola tem como agente etiológico RNA vírus da família Togaviridae,
curva construída por Mari e colaboradores para cada idade gestacional
cujo hospedeiro único é o homem. O trato respiratório é o meio de con-
em semanas, fica confirmada anemia fetal moderada ou grave, devendo o
tágio e o período de transmissão vai de 7 dias antes até 7 dias após o
concepto ser submetido à transfusão sanguínea intraútero por cordocen-
aparecimento do rash cutâneo.
tese, tentando, com isso, evitar sua evolução para o quadro de hidropisia.
A soropositividade em gestantes paulistanas, por exemplo, está pró-
A Figura 107.2 mostra o gráfico que relaciona os picos de velocidade
xima de 85%. Portanto, 15% delas suscetíveis à infecção pelo vírus.
sistólica da artéria cerebral média entre 16 e 36 semanas de idade gesta-
cional com suas respectivas medianas e o programa para cálculo do múlti-
QUADRO CLÍNICO
plo da mediana*, ambos construídos por Mari G.
Os casos nos quais as lesões do concepto são mais graves estão relacio-
nados ao contágio materno no início da gestação, notadamente até a
a
11 semana da gravidez, quando ocorre transmissão vertical em 100% dos
casos, podendo levar à temida síndrome da rubéola congênita (SRC). Entre
a a
a 12 e a 18 semana, o quadro clínico costuma ser bem mais leve, mas é
possível haver surdez e alteração do desenvolvimento neuropsicomotor
a
(DNPM). Após a 18 semana, geralmente, não ocorrem repercussões fetais.
DIAGNÓSTICO
Diante de quadro clínico suspeito, o diagnóstico é realizado por sorologia
para detecção de anticorpos IgG e IgM específicos por meio do método
FIGURA 107.2 ■ Método originalmente proposto por Mari G. Para Elisa e imunofluorescência. A soroconversão ou o aumento dos títulos dos
detalhes, ver texto. anticorpos em quatro vezes após 3 ou 4 semanas da suspeita do contágio
ou 10 a 14 dias após o início do exantema confirmam o diagnóstico de
Fonte: Mari e colaboradores.4
rubéola aguda.
Após a 16a semana da gravidez, pode ser feita amniocentese para
Embora originariamente o método descrito tenha sido proposto para pesquisa do DNA do agente etiológico pela técnica de PCR no líquido am-
obtenção do grau de anemia fetal em casos de aloimunização Rh, é perfei- niótico.
tamente factível sua utilização em todas as demais patologias que possam A Figura 107.3 descreve o fluxograma para avaliação da rubéola na
conduzir à hemólise do concepto e para indicação do recurso terapêutico gravidez.
adequado, como no caso da eritrovirose.
ATENÇÃO!
ATENÇÃO!
A síndrome da rubéola congênita se constitui em grave complicação
A pesquisa do DNA do parvovírus B19 no líquido amniótico ou no san- neonatal e deve, portanto, ser prevenida por vacinação materna pré-
gue fetal detectada pela técnica de PCR, associada a anticorpos IgM -concepcional.
maternos específicos, é importante para a busca do diagnóstico causal
da hidropisia do concepto.
TRATAMENTO
Como ainda não há tratamento para a rubéola congênita, é importante a
vacinação na infância e das puérperas suscetíveis 48 horas após o parto.
*Obtido on-line no site Perinatology.com No entanto, há possibilidade de eventual revacinação, uma vez que são
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 599
A reação de VDRL com titulações elevadas, na ausência de lesões na. Sua etiologia provavelmente está relacionada à liberação de antígenos
cutâneas características do secundarismo luético, é indício de forte sus- treponêmicos na circulação da paciente durante o tratamento; desaparece
peita de lues terciária, sendo impositiva a pesquisa dos sintomas e sinais após 24 horas.
dessa fase da doença.
Testes treponêmicos específicos são excelentes alternativas para o
diagnóstico diferencial e das fases de latência da patologia: o FTA-ABS ATENÇÃO!
(fluorescent treponemal antigen absorbent) com detecção de IgM e IgG,
Gestantes alérgicas à penicilina devem ser submetidas preferen-
o MHA-TP (microhemaglutination assay for Treponema pallidum); Elisa
cialmente a tratamento de dessensibilização a esse medicamento.
(enzyme-linked immunossorbent assay); e a PCR.
Naquelas em que o risco de anafilaxia provocada pela penicilina for
Convém ressaltar que o FTA-Abs permanece positivo por toda a vida
muito alto, a alternativa terapêutica é o estearato de eritromicina,
da paciente, mesmo tendo sido realizado o tratamento da patologia, ca-
na dose de 500 mg VO, a cada seis horas, por 15 dias, nas fases re-
racterizando cicatriz sorológica.
centes, e 30, nas fases tardias da moléstia. Entretanto, a eritromicina
Nos casos de suspeita de neurossífilis, pode ser realizado o teste de
não atinge níveis séricos suficientes na circulação fetal que permi-
VDRL no líquido cerebrospinal (LCS).
tam efetiva proteção contra o espiroqueta. Nesse caso, o RN deve
TRATAMENTO ser submetido à acurada avaliação clínica e sorológica e à eventual
terapêutica necessária.
O medicamento de escolha para o tratamento da sífilis é a penicilina G
benzatina, cuja dose e esquema terapêuticos variam conforme a fase da
doença.
■■ REPERCUSSÕES FETAIS
Entre elas, é possível citar óbito fetal, crescimento restrito tipo I, hidropi-
ATENÇÃO!
sia, hepatoesplenomegalia agravada por hepatite sifilítica, hidrocefalia,
Na sífilis primária, geralmente se consegue excelente resultado tera- porencefalia, microcefalia e lesões ósseas, entre outras.
pêutico com dose única de 2.400.000 UI de penicilina G benzatina via A taxa de transmissão vertical nas gestantes não tratadas é de 70%
IM, com metade da dose aplicada em cada glúteo. nas fases primária e secundária e de 30% nas fases latente e terciária,
segundo o Ministério da Saúde.
O RN infectado pode apresentar sinais precoces, como exantema,
A azitromicina se constitui em eventual escolha para o tratamento
hepatoesplenomegalia, coriorretinite, linfadenopatia, icterícia grave e
da sífilis primária em gestantes sensíveis à penicilina. Alguns estudos de-
pneumonia, e tardios, como surdez, retardo mental e alterações dentárias
monstraram a efetividade do medicamento na dose de 1 g por semana,
e ósseas.
por três semanas, com remissão total da patologia e ausência de transmis-
são vertical para o feto, além de ausência de efeitos adversos para o feto
e à grávida. Na sífilis latente recente e secundária, a dose recomendada ■■ TOXOPLASMOSE
é de 4.800.000 UI, via IM, administrada em duas doses de 2.400.000 UI, A toxoplasmose é causada pelo protozoário intracelular Toxoplasma gon-
com intervalo de sete dias. Declínio de quatro vezes no título da reação de dii, cujo hospedeiro primário é o gato, e sua transmissão para os hospedei-
VDRL indica sucesso no tratamento. ros secundários ocorre por meio do contato com terra ou areia e ingestão
Na sífilis latente tardia ou de duração ignorada e na sífilis terciária, de alimentos que tenham sido contaminados pelos oocistos do deposita-
deve-se administrar 2.400.000 UI, via IM, por semana, com injeção de dos no meio ambiente.
meia-dose em cada glúteo, por três semanas. Alternativamente, as pa- Os hospedeiros secundários são, em geral, seres humanos, roedo-
cientes com neurossífilis podem ser medicadas com penicilina cristalina res, aves, crustáceos, animais domésticos e todos os outros animais de
EV por 10 a 14 dias. sangue quente, o que explica a razão pela qual o consumo de carne
Convém ressaltar que pode ocorrer falha no tratamento em torno de 5 crua ou com pouca cocção pode resultar em contaminação de outros
a 14% das pacientes, o que pode ser facilmente constatado se não ocorrer indivíduos.
decréscimo significativo na titulação do VDRL. Tal fato pode ocorrer por
A contaminação com o parasita ocorre principalmente por meio da
não observância da dose adequada da penicilina ou por reinfestação com
ingestão de frutas ou vegetais mal lavados, manipulação de jardins sem
o espiroqueta.
luvas, contato íntimo com gatos contaminados ou com indivíduos sujos de
É de suma importância que se repita a investigação sorológica da
terra ou areia (Figura 107.4).
gestante a cada mês, com os objetivos de investigar falha no tratamento
ou eventual recidiva da doença, representada pelo aumento do título do
VDRL para duas diluições ou mais, comum nas pacientes com sorologia ATENÇÃO!
positiva para HIV.
Após 6 a 12 horas do início do tratamento, quase a totalidade das O risco de transmissão vertical do parasita ao feto aumenta com a ida-
pacientes com sífilis primária e em torno da metade daquelas com sífilis de gestacional da seguinte maneira: no 1o trimestre é de 10 a 25%; no
secundária apresentam sintomatologia caracterizada por febre, sudorese, 2o, é de 30 a 50%; e, no 3o, de 60 a 90%.
cefaleia, tremores, sensação de mal-estar, além de aumento transitório
das lesões cutâneas da sífilis. Nas grávidas, concomitantemente a esses
sintomas, podem ocorrer contrações uterinas, demandando terapêutica
uterolítica, além de alterações dopplervelocimétricas transitórias, de- DIAGNÓSTICO
correntes de aumento da resistência vascular. Tal fato é conhecido como O diagnóstico sorológico da patologia é realizado por meio da investiga-
reação de Jarisch-Herxheimer e pode ser confundida com alergia à penicili- ção rotineira dos níveis de IgG e IgM específicos.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 601
contaminados
Oo
por oocistos forma, se for considerado que o ciclo gravídico determina certa imu-
tos
izoí nossupressão em gestantes, seria razoável considerar que a reativação
brad
do da toxoplasmose latente pode ocorrer em algumas delas.
ten
os con
d
Teci
Taquizoítos TRATAMENTO
transmitidos para o feto via transplacentária
Quando a infecção por toxoplasmose aguda materna é diagnosticada,
FIGURA 107.4 ■ Ciclo vital do Toxoplasma gondii. deve-se administrar espiramicina imediatamente na mãe, na dose de 3 g
ao dia. Essa medicação não ultrapassa a barreira placentária, mas diminui
o risco de transmissão vertical para o feto em 70 a 60%.
Entretanto, se a PCR no líquido amniótico é positiva, a instituição de
ATENÇÃO! terapêutica fetal que atravessa a barreira placentária é essencial, com o
objetivo de diminuir as malformações fetais resultantes da toxoplasmo-
O estudo de eventual infecção aguda ou crônica por T. gondii se ba-
se aguda. Os medicamentos a serem administrados são sulfadiazina, na
seia na detecção dos seus anticorpos específicos. A presença de IgM
dose de 3 g ao dia, e pirimetamina, na dose de 50 mg ao dia, as quais
específica para toxoplasmose reagente, com IgG não reagente, indi-
diminuem o risco de alterações fetais em até 70%. No entanto, ambos têm
ca a ocorrência de uma infecção aguda. Convém ressaltar que a IgM
elevado potencial teratogênico, uma vez que alteram o ciclo metabólico
permanecerá reagente no soro materno entre 1 semana e 18 meses
do ácido fólico, diminuindo a concentração da enzima metiltetra-hidrofo-
após a data da invasão primária dos taquizoítos. A IgG aparece no soro
latorredutase, que atua no meio celular transformando homocisteína, um
materno em média 45 dias após a infecção.
agente citotóxico e teratogênico, em metionina, um aminoácido essencial
(Figura 107.5). Com o objetivo de contornar esse efeito adverso, deve ser
A avidez de IgG é o recurso laboratorial atualmente aceito para o administrado um precursor da síntese de folato e da metiltetra-hidrofola-
diagnóstico do momento aproximado da primoinfecção. Esse exame de- torredutase no soro, o ácido folínico, na dose de 10 a 20 mg, 2 a 3 vezes
monstra a afinidade da IgG para se ligar aos antígenos do T. gondii, que por semana, em conjunto com pirimetamina e sulfadiazina. Entretanto, a
tende a aumentar com o tempo decorrido desde a infecção inicial. administração de pirimetamina e sulfadiazina não pode ser contínua. O
O resultado de até 30 % do teste de avidez sugere que a primoinfec- esquema proposto é alternar esses medicamentos com a espiramicina a
ção ocorreu no máximo há quatro meses. Por sua vez, quando superior a cada três semanas, até a 37a semana da gestação (esquema tríplice al-
60%, sugere infecção pelo menos quatro meses antes. Resultados entre ternado). A partir daí, deverá ser utilizada apenas a espiramicina até o
30 e 60% não são conclusivos em relação ao momento da infecção. momento do parto.
Sintetase Transferase
Homocisteína Metionina
Redutase
V. B6 Sintetase Metil-THFA* THFA* Síntese de DNA
Proliferação celular
Cistationina
Obviamente assume importância cabal o risco de transmissão vertical O que mais tem chamado a atenção em nível mundial é o elevado
por via transplacentária para o feto, a qual pode levar a graves altera- e desproporcional surto de microcefalia fetal em zonas endêmicas para
ções dismorfológicas para o concepto, notadamente a microcefalia. Acre- ZIKV, quando comparado à incidência histórica desta dissrrupção do sis-
ditamos, porém, ser esta patologia apenas a “ponta do iceberg” de um tema nervoso central.
eventual espectro de anomalias fetais, uma vez que vários estudos clínicos O diagnóstico da microcefalia pode ser realizado no feto através do
e epidemiológicos têm sugerido o envolvimento causal do ZIKV na gênese ultrassom e no recém-nascido. A medida do perímetro cefálico (PC) abaixo
de outras alterações estruturais para o concepto, como, por exemplo, ar- de 2 desvios-padrão (DP) da média das curvas clássicas para sexo e idade
trogripose secundária às alterações neurológicas, entre outras. gestacional confirma o diagnóstico dessa patologia. No RN, utiliza-se a
Tem sido sugerido nos estudos epidemiológicos aumento da incidên- medida direta com fita métrica.
cia da síndrome de Guillain-Barré (SGB) em populações com alta circulação Para o diagnóstico ecográfico da microcefalia durante a gravidez, po-
so ZIKV, na qual a bainha de mielina dos nervos periféricos sofre agressão de-se considerar o PC abaixo do percentil 3 segundo a curva de Fenton,
autoimune, provavelmente associada ao neurotropismo do vírus, o qual se publicada em 2013 (Figura 107.6), de acordo com sexo e tempo de gestação.
instala também nos nervos periféricos do hospedeiro. A gravidade desta De modo prático, o médico fetal pode verificar se a circunferência
patologia é extremamente variável, oscilando entre sintomas como paresia cefálica do feto (PC) está abaixo de 2 desvios-padrão para a idade gesta-
fraqueza muscular leve e transitória até situações dramáticas, como, por cional por meio da consulta da tabela de normalidade para este parâmetro
exemplo, paralisia definitiva e insuficiência respiratória grave causada pos descrita na Figura 107.7
atonia do músculo diafragmático. Em alguns casos, pode ocorrer êxito letal
associado a complicações secundárias ao estado parético.
Um estudo publicado em 29 de fevereiro de 2016 encontrou evidên- ATENÇÃO!
cias de que o ZIKV pode estar relacionado a casos de SGB. A pesquisa,
De modo prático, podemos utilizar os seguintes critérios para o diag-
liderada pelo Instituto Pasteur de Paris e divulgada na revista científica
nóstico de microcefalia:
The Lancet, avaliou amostras de sangue de 42 pessoas portadoras de
1-PC menor que dois ou mais (DP) do que a referência para o sexo
Guillain-Barré no Centro Hospitalar da Polinésia Francesa (CHPF) durante
e idade.
o surto de ZIKAV que afetou o território do Pacífico Sul entre outubro de
7 2-Desenvolvimento do PC abaixo do percentil 3, segundo a curva de
2013 e abril de 2014. Todos os 4