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ISSN: 1809-2950

FISIOTERAPIA e
PESQUISA
REVISTA DE FISIOTERAPIA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ÓRGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO


BRASIL

Volume 15 – número 2 Abril – Junho 2008


Fisioterapia e Pesquisa
em continuação a Revista de Fisioterapia da Universidade de São Paulo.

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO


Reitora
Profa. Dra. Suely Vilela Sampaio
Vice-Reitor
Prof. Dr. Franco Maria Lajolo
Faculdade de Medicina
Diretor
Prof. Dr. Marcos Boulos
Depto. Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional
Chefe
Profa. Dra. Claudia Regina Furquim de Andrade
Curso de Fisioterapia
Coordenadora
Profa. Dra. Silvia Maria Amado João

Fisioterapia e Pesquisa v.15, n.2, abr./jun. 2008

Fisioterapia e Pesquisa / (publicação do Curso de Fisioterapia


da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo)
v.1, n.1 (1994). – São Paulo, 2005.
v. : il.
Continuação a partir de v.12, n.1, 2005 de Revista de
Fisioterapia da Universidade de São Paulo.
Semestral: 1994-2004
Quadrimestral: a partir do v.12, n.1, 2005
Trimestral: a partir do v.15, n.1, 2008
Sumários em português e inglês
ISSN 1809-2950
1. FISIOTERAPIA/periódicos I. Curso de Fisioterapia da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo

Filiada à
ISSN: 1809-2950

FISIOTERAPIA e
PESQUISA
REVISTA DO CURSO DE FISIOTERAPIA DA FACULDADE
DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ÓRGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL

Volume 15 – número 2 Abril – Junho 2008


Fisioter Pesq. 2008;15(2) 113
Fisioterapia e Pesquisa
Publicação trimestral do Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da USP
Fisioterapia e Pesquisa visa disseminar conhecimento científico rigoroso de modo a subsidiar
tanto a docência e pesquisa na área quanto a fisioterapia clínica. Publica, além de artigos de
pesquisa originais, revisões de literatura, relatos de caso/s, bem como cartas ao Editor.
indexada em: LILACS – Latin American and Caribbean Health Sciences; LATINDEX –
Sistema Regional de Información en Línea para Revistas Cientifícas de Américas;
CINAHL – Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature; e SportDiscus.
EDITORAS-CHEFES EDITORES ESPECIALISTAS
Amélia Pasqual Marques Celso R. Fernandes de Carvalho – Fofito / FMUSP
Fofito / FMUSP – Depto. Fisioterapia,
Isabel de Camargo Neves Sacco – Fofito / FMUSP
Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional,
Faculdade de Medicina / USP Jefferson Rosa Cardoso – Depto. Fisioterapia / Univ. Estadual de Londrina
Débora Bevilaqua Grossi Raquel Simoni Pires – Laboratório de Neurociências / Univ. Cidade de São
Paulo
RAL/ FMRP/USP Depto. Biomecânica,
Medicina e Reabilitação do Aparelho Rosângela Corrêa Dias – EEFFTO – Escola Educ. Física, Fisioterapia e Terapia
Locomotor, Faculdade de Medicina de Ocupacional / Univ. Federal de Minas Gerais
Ribeirão Preto / USP Silvia Maria Amado João – Fofito / FMUSP
CORPO EDITORIAL
Anamaria Siriani de Oliveira RAL, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto / USP Ribeirão Preto SP Brasil
Depto. Engenharia Telecomunicações e Controle Escola
Andre Fabio Kohn São Paulo SP Brasil
Politécnica / USP
Anke Bergmann Curso de Fisioterapia / Centro Univ. Augusto Motta Rio de Janeiro RJ Brasil
Antonio Fernando Brunetto Depto. Fisioterapia / Univ. Estadual de Londrina Londrina PR Brasil
Armèle Dornelas de Andrade Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de Pernambuco Recife PE Brasil
Barbara M. Quaney Medical Center / University of Kansas Kansas City KA EUA
Clarice Tanaka Fofito / Faculdade de Medicina / USP São Paulo SP Brasil
Cláudia R. Furquim de Andrade Fofito / Faculdade de Medicina / USP São Paulo SP Brasil
School of Allied Health and Life Sciences / New York
Chukuka S. Enwemeka Nova Iorque NY EUA
Institute of Technology
École de Réadaptation et GRIS, Faculté de Médecine / Univ.
Debbie Feldman Montréal QC Canadá
de Montréal
Dirceu Costa Faculdade Ciências da Saúde/ Univ. Metodista de Piracicaba Piracicaba SP Brasil
Fátima A. Caromano Fofito / Faculdade de Medicina / USP São Paulo SP Brasil
Fay B. Horak Neurological Science Institute/ Oregon Health & Science Univ. Portland OR EUA
Laboratoire d’Automatique, de Méchanique et d’Informatique,
Franck Barbier Industrielles et Humaines / Univ. de Valenciennes Le Mont Houy França
Gil Lúcio Almeida Depto. Fisioterapia / Univ. de Ribeirão Preto Ribeirão Preto SP Brasil
Helenice Jane C. Gil Coury Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de São Carlos São Carlos SP Brasil
Jan Magnus Bjordal Dept. Public Health and Primary Health Care / Univ. of Bergen Bergen HD Noruega
João Carlos Ferrari Corrêa Depto. Ciências da Saúde / Univ. Nove de Julho São Paulo SP Brasil
Luci Fuscaldi Teixeira-Salmela EEFFTO / Univ. Federal de Minas Gerais Belo Horizonte MG Brasil
Marcelo Bigal Dept. of Neurology, Albert Einstein College of Medicine Bronx NY EUA
Marco Aurélio Vaz Escola de Educação Física / Univ. Federal do Rio Grande do Sul Porto Alegre RS Brasil
Marcos Duarte Escola de Educação Fisica e Esportes / USP São Paulo SP Brasil
Maria Ignêz Zanetti Feltrim Instituto do Coração, Faculdade de Medicina/ USP São Paulo SP Brasil
Mariano Rocabado Facultad de Odontología / Univ. Andres Bello Santiago RMS Chile
Raquel A. Casarotto Fofito / Faculdade de Medicina / USP São Paulo SP Brasil
Ricardo Oliveira Guerra Depto. Fisioterapia / Univ. Federal Rio Grande do Norte Natal RN Brasil
Rinaldo R. J. Guirro RAL / Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto / USP Ribeirão Preto SP Brasil
Sérgio Teixeira da Fonseca EEFFTO / Univ. Federal de Minas Gerais Belo Horizonte MG Brasil
Simone Dal Corso Depto. Ciências da Saúde / Univ. Nove de Julho São Paulo SP Brasil
Tânia de Fátima Salvini Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de São Carlos São Carlos SP Brasil
Vera Lúcia Israel Curso Fisioterapia / Univ. Federal do Paraná – Litoral Matinhos PR Brasil

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S UMÁRIO
C ONTENTS

Editorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117
Editorial
PESQUISA ORIGINAL
ORIGINAL RESEARCH
Comparação dos efeitos da estimulação elétrica nervosa transcutânea e da hidroterapia
na dor, flexibilidade e qualidade de vida de pacientes com fibromialgia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118
Comparison of transcutaneous electrical nerve stimulation and hydrotherapy effects on pain, flexibility and
quality of life on patients with fibromyalgia
Tatiana F. Gomes da Silva, Eneida Yuri Suda, Camila Aparecida Marçulo,
Fábio H. da Silva Paes, Gisele Targino Pinheiro
Impacto do grau de obesidade nos sintomas e na capacidade funcional de mulheres
com osteoartrite de joelhos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125
Impact of the degree of obesity on symptoms and functional capacity of women with knee osteoarthritis
Karina Simone de S. Vasconcelos, João Marcos D. Dias, Rosângela Corrêa Dias
Incidência de lesões na prática do rúgbi amador no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131
Incidence of injuries in the practice of amateur rugby in Brazil
Luciane Machado Alves, Renato Paranhos Soares, Richard Eloin Liebano
Efeitos da reabilitação aquática na sintomatologia e qualidade de vida de portadoras
de artrite reumatóide . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 136
Effects of aquatic rehabilitation on symptoms and quality of life in rheumatoid arthritis female patients
Luis Roberto F. Ferreira, Paulo Roberto Pestana, Jussara de Oliveira, Raquel A. Mesquita-Ferrari
Interferência mútua entre atividade visual e atividade motora em jovens e idosos . . . . . . . . . . . 142
Mutual interference between a visual and a motor task in young and elderly subjects
Patrícia P. dos Santos Teixeira, Mariana Callil Voos, Mariane S. Andrade Machado,
Lílian Zanchetta Castelli, Luiz Eduardo R. do Valle, Maria Elisa P. Piemonte
O preparo bioético na graduação de Fisioterapia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 149
Bioethical education in physical therapy undergraduate course
Fernanda Degilio Alves, Aline Bigongiari, Luis Mochizuki, William Saad Hossne, Marcos de Almeida
Atividade eletromiográfica do vasto medial oblíquo em portadoras da síndrome
da dor patelofemoral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157
Electromyographyc activity of the vastus medialis oblique muscle in female patients with patellofemoral syndrome
Sâmia Najara F. Bessa, Elielton Pedroza dos Santos, Renata A. Gomes Silveira,
Paulo Henrique B. Maia, Jamilson Simões Brasileiro

Fisioter Pesq. 2008;15(2) 115


Validação da versão para a língua portuguesa do questionário de Medida Funcional
para Amputados (Functional Measure for Amputees Questionnaire). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 164
Brazilian-Portuguese validation of the Functional Measure for Amputees Questionnaire
Eneida R. Ono Kageyama, Mariana Yogi, Celisa Tiemi N. Sera, Leda Shizuka Yogi,
André Pedrinelli, Olavo Pires de Camargo
Avaliação da amplitude de movimento e força da cintura escapular em pacientes de
pós-operatório tardio de mastectomia radical modificada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 172
Shoulder motion range and strength assessment in late post-operative patients having undergone modified
radical mastectomy
Priscila Fernandes Gouveia, Estela de Oliveira Gonzalez, Patrícia Arduino Grer,
Camila Amaro Fernandes, Maurício Corrêa Lima
Perfil de fisioterapeutas brasileiros que atuam em unidades de terapia intensiva . . . . . . . . . . . . 177
A profile of Brazilian physical therapists in intensive care units
Emilia Nozawa, George J. V. Sarmento, Joaquim M. Vega, Dirceu Costa, José Euclides P. Silva,
Maria Ignez Z. Feltrim
Correlação entre cefaléia e disfunção temporomandibular . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 183
Correlation between headache and temporomandibular joint dysfunction
Mariana Sampaio Menezes, Sandra Kalil Bussadori, Kristianne P. Santos Fernandes,
Daniela A. Biasotto-Gonzalez
Intervenção psicomotora em crianças de nível socioeconômico baixo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 188
Psychomotor intervention on children of low socioeconomic status
Ana Carolina de Campos, Luiz Henrique Silva, Karina Pereira, Nelci A. C. Ferreira Rocha, Eloisa Tudella
Comportamento quimiometabólico do músculo sóleo na fase aguda da imobilização articular. . 194
Chemical metabolic behaviour of the soleus muscle during the acute phase of joint immobilisation
Luciano Júlio Chingui, Rommel Padovan Braquinho, Maria Theresa M. Severi, Carlos Alberto da Silva
REVISÃO
REVIEW
Estabilização segmentar da coluna lombar nas lombalgias: uma revisão bibliográfica
e um programa de exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 200
Spinal segmental stabilisation in low-back pain: a literature review and an exercise program
Fábio Jorge R. França, Thomaz Nogueira Burke, Daniel Cristiano Claret, Amélia Pasqual Marques
Fatores de risco para linfedema após câncer de mama: uma revisão da literatura . . . . . . . . . . . . 207
Risk factors of arm lymphedema after breast cancer: a literature review
Anke Bergmann, Inês Echenique Mattos, Rosalina Jorge Koifman
Instruções para os autores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 214
Ficha de assinatura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 216

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E DITORIAL
E DITORIAL
A área da Fisioterapia vem apresentando nos últimos anos um
crescimento vertiginoso no país, tanto no número de cursos de graduação
e especialização quanto, principalmente, no número de programas de
pós-graduação. Hoje contam-se nove programas, dos quais três preparam
o doutorado. Além disso, docentes e pesquisadores se organizam nas
diferentes regiões do país para solicitar novos programas. Essa
intensificada atuação docente e de pesquisa pressiona ainda mais para
que haja canais de qualidade para a circulação do conhecimento
produzido.
O crescimento da Fisioterapia e sua inserção na comunidade científica
brasileira é um processo sem volta. O novo patamar atingido, com muito
empenho de muitos, tem sido cada vez mais reconhecido por todos. E
requer esforços de aprimoramento da qualidade, tanto dos produtores
de conhecimento quanto dos veículos que o publicam. Fisioterapia e
Pesquisa pretende cada vez mais crescer nos padrões de qualidade e
de indexação para melhor servir à crescente comunidade cientifica da
Fisioterapia no Brasil.
Desde 2005, quando iniciamos o processo de mudanças, fizemos muitos
avanços no sentido de atender aos padrões de qualidade exigidos. Dentre
as mudanças atuais, para adequar a Revista aos critérios de excelência
foi necessário alterar o corpo editorial, convidando pesquisadores de
renome de diferentes regiões geográficas, para ampliar nossa
abrangência. Também agregamos mais quatro membros estrangeiros ao
corpo editorial. Ainda, foram instituídos editores especialistas, que terão
como principal tarefa conferir agilidade e transparência ao processo de
julgamento dos manuscritos. Os membros do corpo editorial e os editores
especialistas terão participação ativa e irão contribuir permanentemente
com a Revista, citando-a, encorajando alunos ou pós-graduandos a
submeter artigos, submetendo eles próprios sua produção, além da
emissão de pareceres.
Finalmente, a partir deste número, a chefia de editoria será partilhada: à
anterior editora-chefe junta-se agora a Profa. Débora Bevilaqua Grossi,
unindo esforços para que a revista conquiste um lugar de destaque entre
as revistas de Fisioterapia e possa ser um veículo eficiente e de qualidade
para a circulação do conhecimento científico em nossa área, sempre
tendo em mira o aprimoramento da qualidade da pesquisa e da assistência
em Fisioterapia.
Agradecemos a todos que nos vêm dando apoio, com o qual contamos
para prosseguir aperfeiçoando Fisioterapia e Pesquisa.

Amélia Pasqual Marques


Débora Bevilaqua Grossi
Editoras-chefes

Fisioter Pesq.
Fisioter
2008;15(2)
Pesq. 2008;15(2) 117
Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.118-24, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Comparação dos efeitos da estimulação elétrica nervosa transcutânea e da


hidroterapia na dor, flexibilidade e qualidade de vida de pacientes com fibromialgia
Comparison of transcutaneous electrical nerve stimulation and hydrotherapy effects on
pain, flexibility and quality of life in patients with fibromyalgia
Tatiana Fernandes Gomes da Silva1, Eneida Yuri Suda2, Camila Aparecida Marçulo3,
Fábio Henrique da Silva Paes3, Gisele Targino Pinheiro3

Estudo desenvolvido na RESUMO: Este estudo visou comparar a eficácia da hidroterapia e da estimulação
Clínica de Fisioterapia do elétrica transcutânea do nervo (TENS) na melhora da sintomatologia de
Unicapital – Centro pacientes com fibromialgia Participaram do estudo 10 sujeitos com fibromialgia
Universitário Capital, São (48,8±9,8 anos) divididos em dois grupos: um tratado com hidroterapia e outro
Paulo, SP, Brasil com TENS. Todos foram avaliados antes e após o tratamento quanto à
1 flexibilidade (pelo índice terceiro dedo-solo), dor (por escala visual-analógica),
Fisioterapeuta da Irmandade qualidade de vida relacionada à saúde (pelos questionários SF-36 e Nottingham
da Santa Casa de Misericórdia, Health Profile – NHP) e tendência à depressão (pelo Inventário de Beck). Os
São Paulo, SP, Brasil
dados foram tratados estatisticamente, com nível de significância fixado em
2
Profa. Ms. do Curso de p<0,05. O grupo TENS obteve melhora estatisticamente significante na
Fisioterapia do Unicapital intensidade da dor, na qualidade de vida medida pelo SF-36 e em alguns
(Centro Universitário Capital, quesitos do NHP, enquanto a hidroterapia promoveu uma melhora na qualidade
São Paulo, SP, Brasil) de vida medida pelo SF-36. Ambos os tratamentos foram assim eficazes ao
melhorar o condicionamento físico, porém a TENS propiciou melhores
3
Graduandos em Fisioterapia no resultados quanto à dor e em maior número das variáveis analisadas do que a
Unicapital, São Paulo, SP, hidroterapia, sugerindo ser mais eficaz no tratamento da fibromialgia.
Brasil
DESCRITORES: Estimulação elétrica transcutânea do nervo; Fibromialgia/
ENDEREÇO PARA reabilitação; Hidroterapia
CORRESPONDÊNCIA
ABSTRACT: The purpose of this study was to compare the effects of hydrotherapy
Eneida Yuri Suda and of transcutaneous electric nerve stimulation (TENS) on symptomology of
R. Masuzo Naniwa 105 apto. patients with fibromyalgia. Ten subjects (aged 48.8±9.8 years) with fibromyalgia
TA84 Mogilar were divided into two groups, one treated with hydrotherapy, the other with
08773-535 Mogi das Cruzes SP TENS. All were evaluated before and after treatment as to flexibility (by means
e-mail: yurisuda@usp.br of the fingertip-to-floor test), pain (by visual analogue scale), health-related
quality of life (by the SF-36 and the Nottingham Health Profile – NHP –
questionnaires) and trend to depression (by the Beck’s Depression Inventory).
Data were statistically analysed, and significance level set at p<0.05. Results
show that patients treated with TENS had significant pain reduction and better
quality of life as measured by the SF-36 and some NHP items, while patients
treated with hydrotherapy showed improvement in SF-36 scores. It may hence
be said that both treatments were efficient in improving physical functioning,
APRESENTAÇÃO but TENS produced better results in relieving pain and in a greater number of
abr. 2007 variables, suggesting that it is more efficient for treating fibromyalgia.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Fibromyalgia/rehabilitation; Transcutaneous electric nerve
abr. 2008 stimulation; Hydrotherapy

118 Fisioter
Fisioter Pesq.
Pesq. 2008;15(2):118-24
2008;15(2)
Silva et al. TENS e hidroterapia na fibromialgia

INTRODUÇÃO destacar, ainda, a presença da sensa-


ção de rigidez articular. Ambos os fa-
é utilizada como medida do grau de
encurtamento dos músculos posterio-
A fibromialgia é uma patologia crô- tores limitam as atividades da vida res de membros inferiores e tronco6,15,18.
nica caracterizada por dor muscular diária em maior ou menor grau, de- Os pacientes também tiveram o nível
esquelética generalizada, distúrbios do pendendo do acometimento de cada de dor avaliado por escala analógica
sono, rigidez articular, alterações psi- indivíduo, afetando, também, os as- visual de dor (EVA)6,22,23 e, quanto à
cológicas e fadiga muscular, não apre- pectos emocionais e a qualidade de qualidade de vida relacionada à saú-
sentando sinais de inflamação 1-6 . vida. A TENS tem sido utilizada em de, pelo questionário SF-3624. Este é
Ocorre de forma isolada ou associada pacientes com fibromialgia como um um questionário multidimensional for-
a outras doenças reumáticas, como o recurso de analgesia local, diminuin- mado por 36 itens, agrupados em oito
lúpus eritematoso sistêmico e a artri- do a rigidez pela melhora da condição domínios: capacidade funcional, as-
te reumatóide, sendo mais prevalente dolorosa, melhorando o desempenho pectos físicos, dor, estado geral da
em mulheres da raça branca de 35 a 55 das atividades de vida diária e a qua- saúde, vitalidade, aspectos sociais,
anos6. Acomete 5% da população mun- lidade de vida17,20. aspectos emocionais e saúde mental.
dial e 8% da população brasileira6. O escore varia de zero a 100 e quan-
Assim, tanto a hidroterapia quanto
to maior o escore final, melhor a qua-
Pacientes com fibromialgia apre- a TENS trazem diminuição da dor em
lidade de vida relacionada à saúde24.
sentam níveis elevados de dor, ansie- pacientes fibromiálgicos. Este estudo
Aplicaram-se, ainda, o questionário
dade e depressão, apresentando uma tem como objetivo comparar a eficá-
Nottingham Health Profile (NHP)
piora na qualidade de vida7-11, apresen- cia da hidroterapia e da TENS na me-
adaptado25, que avalia o nível de ener-
tando, também, desordens compulsi- lhora da dor, flexibilidade, sono, con-
gia, reações emocionais, distúrbios do
vas e obsessivas 12 . É importante dições emocionais e qualidade de
sono, isolamento social e capacidade
lembrar que a fibromialgia é mais pre- vida em pacientes com fibromialgia.
física, e o Inventário de Beck para de-
valente entre as mulheres, que apre- pressão, que avalia a presença de alte-
sentam maior risco de desenvolverem METODOLOGIA rações psicológicas26. No questionário
quadros de dor e depressivos quando NHP, cada resposta positiva corres-
comparadas aos homens13. Este estudo teve delineamento de
ponde ao escore 1 e cada resposta ne-
pesquisa intervencional e foi aprova-
Vários programas de tratamento têm gativa, ao escore 0, perfazendo uma
do pelo Comitê de Ética do Centro
mostrado eficácia na melhora da fun- pontuação máxima de 38. Quanto
Universitário Capital.
ção e no autocontrole dos sintomas em mais alto o resultado final, pior a qua-
pacientes com fibromialgia. A hidro- Foram incluídos 10 pacientes clini- lidade de vida percebida pelo indiví-
terapia é relatada como um recurso camente diagnosticados como porta- duo. No Inventário de Beck, em que
terapêutico que promove relaxamen- dores de fibromialgia e que preenchi- a pontuação varia de 0 a 63, quanto
to muscular, diminuição dos espasmos am os critérios de fibromialgia do mais alto o escore, maior o nível de
musculares e redução da sensibilida- Colégio Americano de Reumato- depressão; um escore acima de 16
de à dor, proporcionando um aumen- logia 21 . Foram excluídos pacientes indicaria possível depressão27.
to da tolerância ao exercício e do que apresentavam doenças neurológi-
Os pacientes com fibromialgia fo-
nível de resistência física, ocorrendo cas, cardiovasculares, portadores de
ram divididos aleatoriamente em dois
a melhora do condicionamento geral. marca-passo cardíaco, gestantes e
grupos de tratamento: o grupo TENS
Quando se melhora o condicionamen- com afecções cutâneas6,16. Para a rea-
(GT, n=5) e o grupo Hidroterapia (GH,
to físico, ocorre simultaneamente a lização do estudo, todos os participan-
n=5), cujas características sociodemo-
melhora de sintomas como presença tes assinaram o termo de consentimen-
gráficas são apresentadas na Tabela 1.
de dor após esforço e a fraqueza mus- to livre e esclarecido.
cular6,14. O protocolo de tratamento com
estimulação elétrica nervosa trans-
O uso da estimulação elétrica ner- Material e procedimentos cutânea teve como recurso um apare-
vosa transcutânea (TENS) também é lho de TENS da marca Quark (Brasil),
Os voluntários foram inicialmente
relatado como sendo eficiente no alí- eletrodos de superfície e gel condutor
avaliados quanto à presença de tender
vio da dor em pacientes com fi- à base de água. Os eletrodos foram
points. Para tanto, manteve-se o pacien-
bromialgia15. Esse tipo de estimulação localizados nos tender points dos mús-
te sentado sobre a mesa de exame,
teria a capacidade de produzir informa- culos do trapézio, supra-espinhoso,
questionando-o sobre a sensação do-
ções sensitivas a partir de estímulos de glúteo e interlinha medial do joelho,
lorosa após a pesquisa de cada ponto
baixo limiar, inibindo a transmissão da bilateralmente. Os parâmetros utiliza-
padronizado, um a um, bilateralmen-
dor na medula espinhal através da ini- dos foram freqüência de pulso de 15 Hz
te em cada região, no sentido crânio-
bição das células T, via células da e tempo de pulso de 150 us, que cor-
caudal. Os sujeitos foram, então, ava-
substância gelatinosa1,16-18. respondem ao modo convencional. A
liados quanto à flexibilidade pelo tes-
Apesar de a característica mais mar- te terceiro dedo-solo. A medida da intensidade foi determinada pelo su-
cante da fibromialgia ser a dor19, vale distância entre o terceiro dedo e o solo jeito, devendo referir um formigamen-

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :118-24 119


Tabela 1 Características sociodemográficas dos sujeitos dos dois grupos questionários de avaliação antes e
após o tratamento em cada um dos
Grupos (n=5) grupos, a fim de identificar os aspec-
Variável Categoria
Hidroterapia TENS tos que estariam mais envolvidos nos
Idade (anos) 47,0±5,6 50,6±13,4 grupos avaliados. Para essas análises,
foram utilizados o teste t independen-
Masculino 0 1 te quando a distribuição era normal,
Sexo (n)
Feminino 5 4 e o teste de Mann-Whitney quando a
1º grau completo 2 3 distribuição não era normal. Foi ado-
Escolaridade (n) tado α=0,05 para considerar diferen-
2º grau completo 3 2
ças significativas.
Serviços domésticos 2 2
Trabalho manual 2 1
Ocupação (n)
Comércio 1 1 RESULTADOS
Desempregado 0 1
Inicialmente, os grupos mostraram-
Casado 2 3
se homogêneos quanto a todas as va-
Estado civil (n) Divorciado 2 1
riáveis exceto flexibilidade: o GH
Solteiro 1 1
(14,6±13,5 cm) apresentou maior fle-
xibilidade do que o GT (29,8±3,6;
to constante durante todo o tempo da ra fase, de 15 minutos, consistiu na p=0,016). Após o tratamento os grupos
aplicação. Gashu e Marques15 mostra- realização de exercícios aeróbicos – mantiveram a diferença de flexibilida-
ram que esses parâmetros são eficien- caminhada associada a movimentos de observada antes do tratamento,
tes para promover o alívio da dor, de membros superiores e inferiores. Os além de os indivíduos tratados com
melhorando a sintomatologia. O pro- exercícios aeróbicos contribuem para TENS apresentarem um nível menor
grama de tratamento com TENS foi a promoção de consciência corporal de dor.
realizado em dez sessões com dura- e para o aumento do limiar de dor,
As Tabelas 2 e 3 mostram, respecti-
ção de 40 minutos cada, na freqüên- melhorando a resistência à fadiga,
cia de três vezes por semana. reduzindo assim a gravidade dos sin- vamente, os resultados das avaliações
tomas da fibromialgia2,28. Esses exer- realizadas antes e após o tratamento
Cada sessão de atendimento da dos grupos Hidroterapia e TENS. O
cícios têm ainda como benefício a
hidroterapia compôs-se de quatro fa- grupo tratado com hidroterapia apre-
melhora do condicionamento físico,
ses. A primeira fase consistiu em cin- sentou melhora significante apenas
da eficiência cardiovascular, o aumen-
co minutos de aquecimento, por meio nos resultados do questionário SF-36
to do aporte de oxigênio aos múscu-
de caminhada pela extensão da pis- e no item reações emocionais do NHP,
los e da circulação periférica. Pacien-
cina, e mobilização ativa com flexão, apresentando apenas uma tendência
tes com fibromialgia têm descon-
extensão e inclinação da coluna cer- à melhora na dor e nos outros itens do
dicionamento físico, que acarreta re-
vical, circundução do ombro, flexão questionário NHP.
dução da capacidade cardiovascular29.
e extensão de quadril, flexão e exten-
são de joelho e flexão e extensão de Após o término do tratamento to- O grupo tratado com TENS apresen-
tou melhora estatisticamente signifi-
tornozelo6. A segunda fase, de 20 mi- dos os pacientes foram reavaliados
nutos, consistiu em exercícios de alon- utilizando-se os mesmos instrumentos cante em boa parte das variáveis
gamento muscular, que foram realiza- da avaliação inicial. analisadas; não houve melhora signi-
dos em três séries de 20 segundos cada, ficativa na flexibilidade, nos domíni-
os capacidade funcional, estado geral
nas posições de flexão máxima de
pescoço, inclinação lateral do pesco-
Análise estatística de saúde, vitalidade e saúde mental
do questionário SF-36, e nos itens
ço, semiflexão de ombro com exten- Para a análise estatística, foi utili-
são de cotovelo, punho e dedos, ab- sono, isolamento social e capacidade
zado o programa SPSS® versão 10.0.
dução de ombro com flexão de coto- funcional do NHP – embora se tenham
Foi realizada análise descritiva e tes-
velo levando as mãos atrás da cabe- registrado escores melhores em quase
tada a normalidade na distribuição das
ça, extensão e adução de quadril, todos esses itens.
variáveis por meio do teste de Shapiro-
flexão de quadril e joelho, extensão Wilks. Análises inferenciais foram fei-
de quadril com flexão de joelho e
abdução do quadril. A inclusão de
tas entre os grupos GT e GH antes e
após o tratamento para as variáveis
DISCUSSÃO
exercícios de alongamento se faz ne- flexibilidade, dor e escores do SF-36, O tratamento da fibromialgia tem
cessária uma vez que promovem a NHP e Inventário de Beck. As mes- como principais objetivos o alívio da
melhora da elasticidade muscular, mas análises foram feitas para os gru- dor, a melhora da qualidade do sono,
contribuindo para a diminuição da ri- pos GT e GH, comparados antes e após a manutenção ou restabelecimento do
gidez articular, que é uma das carac- o tratamento. Além disso, compara- equilíbrio emocional, e a melhora do
terísticas da fibromialgia2,15. A tercei- ram-se as categorias de cada um dos condicionamento físico e da fadiga,

120 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :118-24


Silva et al. TENS e hidroterapia na fibromialgia

Tabela 2 Grupo tratado com hidroterapia (n=5): resultados (média±desvio além do tratamento especifico de de-
padrão) da avaliação antes e após o tratamento e valores de p sordens associadas15.
Variável Antes Depois p O grupo tratado com TENS mostrou
Flexibilidade (cm) 14,6±13,5 13,8±12,7 0,345‡ uma tendência à melhora da flexibi-
lidade, embora não estatisticamente
Dor (cm na EVA) 8,0±0,7 6,6±1,5 0,076‡ significante, que pode ter ocorrido
SF-36 (escore total) 70,8±12,2 99,1±16,0* 0,007† devido à redução da sintomatologia
Capacidade funcional 33,0±18,2 37,0±14,4 0,355† dolorosa, que é o principal fator
Aspectos físicos 5,0±11,4 90,0±22,3* 0,002‡ limitante da amplitude de movimen-
Dor 20,6±12,2 53,8±20,5* 0,007† to15. Além disso, os grupos não eram
homogêneos em relação a essa variá-
Estado geral de saúde 30,8±14,8 45,6±14,9 0,084‡ vel antes do início do tratamento, o
Vitalidade 26,0±9,6 55,0±11,7* 0,001† que pode ter influenciado os resulta-
Aspectos sociais 38,2±18,9 62,4±21,6* 0,040‡ dos. Diferentemente do esperado, o
Aspectos emocionais 13,2±18,0 86,6±30,0* 0,005‡ grupo tratado com hidroterapia não
Saúde mental 32,8±21,7 56,0±17,4* 0,050† apresentou melhora da flexibilidade.
Provavelmente essa melhora não foi
NHP (escore total) 24,0±2,6 18,4±6,7 0,060† observada devido a dois aspectos. Em
Nível de energia 2,4±0,8 1,2±1,3 0,064‡ primeiro lugar, o grupo tratado com
Dor 7,0±2,2 5,8±2,2 0,165† hidroterapia já apresentava inicial-
Reações emocionais 4,2±0,8 2,6±1,5* 0,036† mente flexibilidade melhor, quando
Sono 3,4±1,1 3,0±1,5 0,329† comparado ao outro grupo, reduzindo
os possíveis ganhos que a piscina te-
Isolamento social 2,6±2,0 1,6±1,3 0,195‡
rapêutica poderia trazer. Além disso,
Capacidade funcional 4,4±1,1 4,2±1,3 0,401† mesmo após o tratamento o GH apre-
Beck 21,2±2,7 15,8±10,6 0,163† sentou melhor flexibilidade que o gru-
po TENS. Outro fator importante a ser
* Diferença estatisticamente significante; † Teste t independente; ‡Teste U de Mann-Whitney;
EVA = escala visual-analógica; NHP = questionário Nottingham Health Profile; levado em conta é que, no protocolo
Beck = escore no Inventário de depressão de Beck de tratamento utilizado na hidrote-
rapia, não foi feito exercício específi-
Tabela 3 Grupo tratado com TENS (n=5): resultados (média±desvio padrão) da
co que trabalhasse a flexibilidade dos
avaliação antes e após o tratamento e valores de p
grupos musculares avaliados pelo tes-
Variável Antes Depois p te terceiro dedo-solo.
Flexibilidade (cm) 29,8±3,6 24,6±5,9 0,065† Como esperado, houve melhora
Dor (cm na EVA) 7,6±0,9 3,4±2,2* 0,004‡ significante na intensidade da dor no
SF-36 (escore total) 74,6±10,0 99,2±13,7* 0,006 † grupo tratado com estimulação elétri-
Capacidade funcional 25,0±18,0 55,0±21,5* 0,018‡ ca, uma vez que a TENS produz um
efeito analgésico local e imediato.
Aspectos físicos 10,0±13,6 65,0±48,7* 0,038‡
Woolf17 sugere que o uso da TENS po-
Dor 18,2±8,7 64,8±17,9* 0,001† de distorcer o funcionamento do sis-
Estado geral de saúde 34,0±9,61 54,6±17,6 0,087‡ tema nervoso, ao interferir em algum
Vitalidade 35,0±13,6 54,0±24,0 0,082† de seus inputs ou informações, pois a
Aspectos sociais 34,8±16,4 79,8±18,8* 0,002† estimulação das fibras aferentes alfa
Aspectos emocionais 6,6±14,7 79,8±30,0* 0,004‡ e beta de rápida condução podem ini-
Saúde mental 45,6±21,4 51,2±14,8 0,322† bir a entrada do estímulo doloroso
conduzido pelas fibras C, não mielini-
NHP (escore total) 25,2±2,8 14,4±3,4* 0,001†
zadas e de condução mais lenta, an-
Nível de energia 2,2±0,8 0,8±0,4* 0,009‡ tes que o estímulo doloroso transite até
Dor 7,6±0,8 3,8±1,4* 0,004‡ a medula espinhal. Essa melhora da
Reações emocionais 5,6±1,1 2,2±1,7* 0,003† dor não foi observada de forma esta-
Sono 3,6±1,6 2,4±1,5 0,134† tisticamente significante no grupo tra-
Isolamento social 2,6±1,6 1,0±1,7 0,095‡ tado com hidroterapia, mostrando que
Capacidade funcional 3,6±1,1 3,8±1,0 0,392† essa modalidade terapêutica provavel-
mente não age diretamente no meca-
Beck 28,0±8,3 11,6±6,1* 0,004†
nismo de dor.
* Diferença estatisticamente significante; † Teste t independente; ‡Teste U de Mann-Whitney;
EVA = escala visual-analógica; NHP = questionário Nottingham Health Profile; Beck = Houve melhora estatisticamente
escore no Inventário de depressão de Beck significante da qualidade de vida em

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :118-24 121


ambos os grupos, constatada pelos re- po tratado com TENS, representada tado com hidroterapia apresentava
sultados do questionário SF-36. De pelos resultados do questionário SF-36, melhores escores antes do tratamen-
forma interessante, ambos os grupos pode ser analisada em conjunto com to, o que pode ter mascarado a pre-
apresentaram melhora nos mesmos outros resultados positivos observados sença de níveis de melhora.
aspectos, ou seja, na dor, na vitalida- após o tratamento. A melhora da dor,
de, nos aspectos físicos, sociais e Deve-se lembrar que a amostra des-
medida por EVA, provavelmente está
emocionais, embora apenas o grupo te estudo foi pequena e estes resulta-
relacionada à grande melhora obser-
tratado com hidroterapia tenha apre- dos devem, portanto, ser verificados
vada tanto no NHP quanto no Inven-
sentado melhora no domínio da saú- estudando-se um maior número de in-
tário de Beck. O NHP mostrou uma
de mental. Pacientes com fibromialgia divíduos. Os resultados aqui encontra-
melhora no nível de energia, na dor e
têm um nível de condição aeróbica dos não podem ser extrapolados para
nas reações emocionais. Com o alí-
ou cardiovascular menor que a média a população em geral. Uma amostra
vio da dor, espera-se que haja melho-
e seus músculos não utilizam o oxi- ra das habilidades funcionais efetivas mais significativa poderia, ainda, con-
gênio muito bem15,30. Como resultado, em casa ou no trabalho, além de me- firmar as tendências à melhora aqui
eles tendem a ficar descondicionados lhora na qualidade do sono e, conse- observadas. Sugere-se ainda, futuros
muito facilmente, o que diminui sua estudos para verificar o efeito de
qüentemente, uma diminuição dos
eficiência cardiovascular e circulação ambas as técnicas utilizadas não só
distúrbios emocionais.
periférica. Em muitos casos, a fi- em separado, mas também em con-
bromialgia leva à redução nas ativida- Outros aspectos que devem ser le- junto, uma vez que ambas apresen-
des habituais que, se sustentada, cau- vados em conta na fibromialgia são tam efeitos benéficos em diferentes
sa um ciclo de descondicionamento2. os níveis freqüentemente graves de aspectos avaliados.
Assim, provavelmente a melhora da ansiedade e depressão31. Goldenberg
qualidade de vida observada pelo et al.32 e Berber et al.33 relatam que se
questionário SF-36 no GH ocorreu de-
vido ao fato de a hidrocinesioterapia
forma um ciclo vicioso, em que alte- CONCLUSÃO
rações psicológicas e em alguns me-
trabalhar o condicionamento físico, canismos neuroendócrinos podem le- Tanto a hidroterapia como a TENS,
interferindo positivamente no estado var às manifestações clínicas de dor, neste estudo, mostraram-se eficazes
mental, melhorando a auto-estima e incapacidade para o trabalho, maior na melhora da sintomatologia dos pa-
a depressão. Assim, o condicionamen- limitação funcional nas atividades de cientes com fibromialgia, embora os
to aeróbico, com exercícios de baixo vida diária, fadiga, sono não-repara- indivíduos tratados com TENS tenham
impacto, somado aos efeitos hidrostá- dor e, conseqüentemente, a um qua- obtido mais ganhos em relação ao tra-
ticos da piscina e aos alongamentos dro depressivo. Assim, ao haver alí- tado com hidroterapia. Esse resultado
enfocados nos tender points, gera a vio da dor, como a observada no gru- sugere que a principal limitação dos
liberação de substâncias analgésicas, po TENS, era de se esperar que hou- pacientes com fibromialgia é a dor e,
melhorando as alterações isquêmicas vesse uma melhora dos distúrbios psi-
e metabólicas nos tender points, pro- se há alívio na intensidade da dor,
cológicos, como foi observado nos re-
movendo um relaxamento não apenas ocorre subseqüentemente melhora dos
sultados do Inventário de Beck. Além
físico, mas também mental, acarretan- sintomas secundários como distúrbios
disso, de forma interessante, ambos os
do quebra do ciclo vicioso de dor, es- do sono, condições emocionais e qua-
grupos apresentavam antes da inter-
tresse, depressão e distúrbio do sono. venção valores que correspondiam à lidade de vida relacionada à saúde.
A qualidade de vida está associada à presença de depressão e, após o trata- Talvez os pacientes tratados com hi-
maior ou menor intensidade dos sin- mento, ambos apresentaram valores droterapia pudessem ter mostrado re-
tomas e, portanto, a eliminação ou di- que não correspondem à presença de sultados mais positivos se o tempo de
minuição dos mesmos pode propiciar depressão, embora a melhora nesse tratamento fosse maior, uma vez que
sua melhora. a piscina terapêutica pode ter maior
quesito tenha sido estatisticamente
A melhora da qualidade de vida significante apenas no grupo tratado efeito no condicionamento e na ca-
relacionada à saúde observada no gru- com TENS. Mais uma vez, o grupo tra- pacidade funcional a longo prazo.

122 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :118-24


Silva et al. TENS e hidroterapia na fibromialgia

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124 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :118-24


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.125-30, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Impacto do grau de obesidade nos sintomas e na capacidade


funcional de mulheres com osteoartrite de joelhos
Impact of the degree of obesity on symptoms and functional capacity
of women with knee osteoarthritis
Karina Simone de Souza Vasconcelos1, João Marcos Domingues Dias2, Rosângela Correa Dias2

Estudo desenvolvido no RESUMO: As mulheres apresentam risco aumentado para a osteoartrite (OA) de
Programa de Pós-Graduação joelhos e obesidade. Associadas, essas doenças podem gerar dor e prejuízos
em Ciências da Reabilitação funcionais, principalmente em atividades de locomoção. Este estudo visou
da EEFFTO/UFMG – Escola de comparar o impacto do grau de obesidade nos sintomas e capacidade funcional
Educação Física, Fisioterapia e de mulheres com OA de joelhos. Foram selecionadas 13 mulheres obesas (com
Terapia Ocupacional da índice de massa corporal – IMC>30 kg/m 2) e 15 com obesidade mórbida
Universidade Federal de Minas (IMC>40 kg/m2), todas com OA bilateral de joelhos. Os sintomas de dor, rigidez
Gerais, Belo Horizonte, MG, e dificuldades funcionais foram avaliados pelo questionário The Western Ontario
Brasil and McMaster Osteoarthritis Index (Womac). A capacidade funcional foi
1
Fisioterapeuta Ms. verificada por quatro testes de velocidade: marcha usual, marcha rápida, subir
e descer escadas. Os dois grupos apresentaram um impacto moderado da
2
Profs. Drs. Adjuntos do obesidade na OA de joelhos, sem diferença quanto aos sintomas. As obesas se
Programa de Pós-Graduação saíram melhor do que as obesas mórbidas nos testes de marcha usual e subir
em Ciências da Reabilitação escadas, mas não nas atividades de marcha rápida e descer escadas, mais
da EEFFTO/UFMG complexas e estressantes para a articulação do joelho. Conclui-se que o grau
de obesidade não teve impacto nos sintomas de dor, rigidez e dificuldades
ENDEREÇO PARA funcionais associadas à OA de joelhos entre mulheres obesas e obesas mórbidas.
CORRESPONDÊNCIA E, em dois testes de capacidade funcional, as obesas dos dois grupos tiveram
Karina S. S. Vasconcelos desempenho semelhante, sugerindo que outros fatores podem influenciar o
R. Zenite 470 apto. 101 desempenho funcional de obesas com OA de joelhos.
Caiçara
30720-530 Belo Horizonte MG DESCRITORES: Análise e desempenho de tarefas; Obesidade; Obesidade
e-mail: mórbida; Osteoartrite do joelho
karinasimone@hotmail.com
A BSTRACT: Women are at higher risk to knee osteoarthritis (OA) and obesity.
Together, these diseases may ensue pain and functional limitations, mainly
during locomotion. The purpose of this study was to compare the impact of the
degree of obesity in symptoms and functional capacity of women with knee
osteoarthritis. The sample studied was made up by 13 obese women (body mass
index – BMI>30 kg/m2) and 15 morbid obese women (BMI>40 kg/m2), all with
bilateral knee OA. The symptoms of pain, stiffness and functional difficulty
were measured by the questionnaire The Western Ontario and McMaster
Osteoarthritis Index (Womac). Functional capacity was evaluated by four speed
tests: usual gait, fast gait, climbing and descending stairs. Both groups presented
a moderate impact of obesity on knee osteoarthritis, with no differences
between them concerning symptoms. Obese women had better results in the
usual gait and climbing stairs tests than morbid obese ones, but not in fast gait
and descending stairs, which are more complex and stressful tasks for the knee
joint. It may be said that the degree of obesity had no impact on knee OA
symptoms of pain, stiffness and functional difficulty; and, in two functional
capacity tests, both obese women and women with morbid obesity showed
APRESENTAÇÃO similar performances, thus suggesting that other factors may influence functional
jul. 2007 capacity of obese women with knee osteoarthritis.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Obesity; Obesity, morbid; Osteoarthritis, knee; Task performance
abr. 2008 and analysis

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 25-30 125


INTRODUÇÃO sa da Universidade. Todas as voluntá-
rias assinaram e receberam uma có-
Procedimentos
A prevalência de obesidade vem pia do termo de consentimento livre Sintomas da OA de joelhos: foi uti-
aumentando não só nos países desen- e esclarecido. lizado o questionário The Western
volvidos, mas também naqueles em Os dados referentes a este estudo Ontario and McMaster Osteoarthritis
transição socioeconômica como o Bra- são provenientes de uma pesquisa so- Index (Womac) para avaliar a inten-
sil, tornando-se um problema de saú- bre dor e capacidade funcional em sidade de dor, rigidez articular e difi-
de pública1,2. obesos com OA de joelhos11,12. A amos- culdades funcionais decorrentes da
tra foi selecionada por conveniência, OA de joelhos. O questionário, com
Além dos riscos cardiovasculares e
com pacientes de ambulatórios de tra- três seções, foi aplicado na sua ver-
metabólicos associados, indivíduos
tamento de obesidade ou de serviços são traduzida e validada para o Bra-
obesos são mais propensos a apresen-
de reabilitação de hospitais universi- sil14, por meio de entrevista assistida.
tar doenças articulares como a osteoar-
tários da cidade de Belo Horizonte, As respostas de cada seção foram as-
trite (OA) de joelhos 3. A OA é uma
MG. Para o presente estudo, foram sinaladas em uma escala do tipo likert,
doença degenerativa que acomete a
analisados os dados referentes a 28 nos níveis nenhuma, pouca, modera-
cartilagem sinovial e estruturas periar-
ticulares, associada a sintomas de dor, mulheres, de acordo com a ordem de da, intensa e muito intensa. Para aná-
rigidez articular e crepitações4. Tanto entrada no estudo, sem cálculo lise dos dados, esses níveis foram trans-
a obesidade 5,6 quanto a OA de joe- amostral específico. Elas foram divi- formados respectivamente nos esco-
lhos7 estão associadas a diversas in- didas em dois grupos: grupo I, 13 mu- res 0, 25, 50, 75 e 100. As respostas
capacidades funcionais, principalmen- lheres obesas (IMC>30 kg/m2); e gru- de cada seção eram somadas e obti-
te em atividades de locomoção como po II, 15 mulheres com obesidade nha-se uma média para cada sintoma
a marcha e o uso de escadas. Estudos mórbida (IMC>40 kg/m2). avaliado. A mesma escala likert do
apontam uma relação crescente en- Womac foi adaptada para avaliar a
Todas as mulheres apresentavam dor, sendo as voluntárias questionadas
tre o grau de excesso de peso e as in- diagnóstico clínico e radiográfico de
capacidades, levando a maiores pre- durante cada teste de capacidade fun-
OA em ambos os joelhos, segundo os cional. Foi registrado, ainda o tempo
juízos entre as pessoas com obesida- critérios do Colégio Americano de
de grave ou mórbida, isto é, com ín- de duração dos sintomas da OA de
Reumatologia 4 e deambulavam sem joelhos, considerando a época de apa-
dice de massa corporal (IMC) maior auxílios para a marcha. Foram exclu-
que 40 kg/cm2 8,9. recimento das dores articulares.
ídas as voluntárias que apresentassem:
Dentre a população em geral, as dor no joelho ou incapacidade funcio- Testes de capacidade funcional: a
mulheres apresentam maior risco para nal referente a essa articulação devi- capacidade funcional foi avaliada por
desenvolver tanto obesidade10 quanto do a lesões ligamentares, meniscais quatro testes de velocidade: marcha
OA de joelhos 3,7. Uma vez que não ou musculares não inerentes à OA; usual (MU), marcha rápida (MR), su-
há cura para essas doenças crônicas, prótese total ou parcial em um ou bir escadas (SE) e descer escadas (DE).
compreender suas inter-relações e ambos os joelhos ou quadris; artrite Os testes de marcha foram realizados
impactos sobre a capacidade funcio- reumatóide, fibromialgia, lúpus erite- em um corredor plano e sem obstácu-
nal é essencial para que os profissio- matoso sistêmico e doenças reumáti- los, com distância percorrida de 25 m.
nais de saúde possam direcionar suas cas sistêmicas; cardiopatias descom- Os três primeiros e os dois últimos
intervenções e planejar as estratégias pensadas; défices auditivos ou visuais metros foram desprezados como ace-
de tratamento mais adequadas a essa que impedissem a realização dos tes- leração e desaceleração. Para medir
população de risco. tes e medidas; agudização da OA de a velocidade foram utilizadas células
joelho; doenças neurológicas que afe- fotoelétricas que marcavam a passa-
O objetivo deste estudo foi compa- tassem a locomoção. gem da voluntária ao início e ao final
rar o impacto do grau de obesidade dos 20 metros mensurados (Kit
nos sintomas e capacidade funcional Para a classificação da OA das par-
Multisprint®, Inserra Ind. Mec. Ltda.,
de mulheres com OA de joelhos. Dois ticipantes, um examinador que des-
Belo Horizonte, MG). Para familiari-
grupos foram comparados: obesas e conhecia seu estado clínico examinou
zação, cada voluntária percorreu o
obesas mórbidas. A hipótese inicial era as radiografias das articulações tibio-
corredor uma vez. Para o teste MU,
de que o maior excesso de peso entre femorais em imagens anteroposterio-
elas eram orientadas a “caminhar em
as mulheres com obesidade mórbida res, com carga sobre os membros in-
um ritmo normal”. Para o teste MR, a
estaria associado a maiores prejuízos feriores, e classificou cada imagem de
“caminhar o mais rápido possível”, com
funcionais e sintomas mais intensos. acordo com os critérios de Kellgren-
o estímulo verbal “rápido, rápido”.
Lawrence (K-L), nos graus I a IV 13 .
Cada articulação do joelho era anali- Os outros testes foram realizados
METODOLOGIA sada separadamente e, para efeito de em uma escada comum de prédio, de
análise dos dados, considerava-se a seis degraus, com corrimão. Para
A realização deste estudo foi apro- classificação do joelho com o maior familiarização, cada voluntária subia
vada pelo Comitê de Ética em Pesqui- grau de acometimento. e descia os seis degraus uma vez. Para

126 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 25-30


Vasconcelos et al. Grau de obesidade e OA de joelhos

os testes, foram instruídas a realizar a Tabela 2 Resultados (média±desvio padrão) dos testes de velocidade segundo
atividade “em um ritmo normal, da os grupos
maneira como tivessem costume de
Velocidade (média±desvio padrão)
fazer no dia-a-dia“, sendo permitido
o uso do corrimão. Também era per- MU (m/s) MR (m/s) SE (degraus/s) DE (degraus/s)
mitido realizar os testes colocando os Grupo I (Obesas) 1,18±0,16 1,60±0,25 64,57±15,93 67,46±18,58
dois pés em cada degrau, ou alternan- Grupo II (Obesas graves) 1,02±0,13 1,44±0,23 51,35±14,94 53,52±22,00
do o apoio com cada pé em um de-
grau. O mesmo padrão quanto ao uso Diferença entre os grupos p=0,009* p=0,097 p=0,032* p=0,084
do corrimão e o tipo de apoio era uti- MU = Marcha usual; MR = Marcha rápida; SE = Subir escadas, em degraus por segundo;
lizado durante todo o teste. As volun- DE = Descer escadas,, em degraus por segundo; * diferença estatisticamente significante
tárias iniciavam os testes ao coman-
crita em termos de distribuição de fre- grupo II. Com o teste de Mann-Whitney,
do “já” do examinador, momento em
qüência. Foi utilizado o teste t para não foi observada diferença estatisti-
que era disparado o cronômetro. A
amostras não-relacionadas para com- camente significante entre a clas-
contagem de tempo era interrompida
parar os grupos I e II em termos de sificação dos dois grupos (p=0,433).
quando era alcançado o último degrau
idade, duração dos sintomas e resul-
com os dois pés, com a voluntária sem- Em relação aos sintomas da OA,
tados nos testes de velocidade. Para
pre olhando para frente. avaliados pelo Womac (onde o esco-
comparar os resultados da classifica-
A ordem dos testes foi aleatorizada ção radiográfica, do questionário re varia de 0, nenhum, a 100, muito
por sorteio e todas as voluntárias fo- Womac e do nível de dor durante a intenso), no grupo I os resultados mé-
ram instruídas a utilizar um calçado realização dos testes de capacidade dios foram: 47,3±17,9 de intensidade
usual, que considerassem confortável funcional, foi utilizado o teste de de dor, 32,7±22,6 de rigidez e
e seguro. Foram realizadas três medi- Mann-Whitney, não-paramétrico. O 32,4±21,6 de dificuldades funcionais.
das para cada teste, com intervalo de nível de significância foi estabeleci- No grupo II, a média da intensidade
15 a 30 segundos entre cada medida do como α=0,05. de dor foi de 41,0±18,9, da rigidez,
e 30 a 60 segundos entre cada tipo de 30,0±33,0 e a de dificuldades funcio-
teste. A coleta de dados foi realizada nais foi de 40,4±18,2. Não houve di-
em uma única sessão, no horário en- RESULTADOS ferença estatisticamente significante
tre as 14 e 17 horas. entre os grupos quanto aos sintomas
Os dois grupos não apresentaram avaliados pelo questionário Womac
diferença quanto à idade ou duração
Análise estatística dos sintomas (Tabela 1).
(p=0,487 para dor, p=0,619 para rigi-
dez e p=0,310 para dificuldades fun-
Foi realizada a análise descritiva Quanto à classificação da OA, a cionais).
da amostra, com medidas de tendên- maioria das mulheres apresentaram
cia central (média) e dispersão (des- O nível de dor durante os testes
nível II ou III na classificação K-L. No
vio padrão) das variáveis idade, dura- também não apresentou diferença es-
grupo I, quatro apresentavam nível II
ção dos sintomas e IMC, além dos sin- tatística entre os grupos. No teste MU,
e cinco, nível III. No grupo II, havia
tomas da OA de joelhos e resultados cinco mulheres com nível II e cinco os níveis médios de dor foram de
nos testes de capacidade funcional. com nível III. Não foi possível obter 25,0±27,0 no grupo I e 11,7±16,0 no
A classificação radiográfica foi des- as radiografias de duas mulheres do grupo II (p=0,196). No teste MR,
34,6±31,5 e 20,0±23,5 para os respec-
Tabela 1 Dados descritivos das participantes (n=28) segundo os grupos tivos grupos (p=0,216). No teste de
Grupo II Diferença subir escadas, os níveis médios de dor
Grupo I foram de 30,8±25,3 (grupo I) e
Variável Valores (Obesas entre os
(Obesas, n=13) graves, n=15) grupos 30,0±19,4 (grupo II), com p=0,941; e,
Mín. 29,5 36,6 no teste de descer escadas, 42,3±31,3
Idade (anos) (grupo I) e 33,3±22,5 (grupo II), com
Máx. 67,1 67,8 p=0,588
p=0,391.
Média±dp 51,27 ± 11,76 53,37 ± 8,44
Mín. 1,50 0,66 A Tabela 2 apresenta os resultados
Tempo de OA de cada grupo nos testes de capaci-
Máx. 15 17 p=0,86
(anos) dade funcional, avaliada pela veloci-
Média±dp 6,50 ± 4,56 6,78 ± 3,97
dade desenvolvida. Pode-se observar
Mín. 30,41 41,25 NA que o grupo I obteve melhor desem-
2
IMC (kg/m ) Máx. 37,31 59,83 NA penho nos testes MU e SE, alcançan-
Média±dp 33,39 ± 2,25 47,56 ± 5,76 NA do maior velocidade. Nos outros tes-
Mín.= Mínimo; Máx.= Máximo; dp = Desvio padrão; IMC = Índice de massa corporal; NA = tes, não houve diferença estatistica-
Não se aplica mente significante entre os grupos.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 25-30 127


DISCUSSÃO cidades de forma abrangente, consi-
derando as diferenças e necessidades
escadas parece ser mais complexa e
estressante para a articulação do joe-
Este estudo procurou compreender individuais dos pacientes. lho do que a de subir escadas, de for-
como o grau de obesidade pode influ- ma que a simples diferença de peso
Com relação à capacidade funcio-
enciar a capacidade funcional e o ní- corporal não favoreceu as mulheres
nal, os grupos apresentaram resulta-
vel de sintomas em dois grupos de obesas no teste de velocidade deste
dos diversos. Era esperado que as mu-
mulheres com OA de joelhos: obesas estudo. É possível que, se o teste SE
lheres com obesidade mórbida desen-
e obesas mórbidas. Considerando os fosse realizado de forma mais com-
volvessem as atividades em menor
sintomas da OA de joelhos, os resul- plexa, por exemplo, com maior núme-
velocidade, devido à maior massa
tados não confirmaram a hipótese ini- ro de degraus ou sem o uso do corri-
corporal a ser deslocada8. Browning e
cial. Ambos os grupos apresentaram mão, o desempenho das mulheres obe-
Kram 23 também observaram que as
nível moderado de dor, rigidez e difi- sas também não fosse melhor.
forças compressivas nos joelhos duran-
culdades funcionais e, na classifica- Os grupos deste estudo apresenta-
te a marcha são muito maiores em
ção radiográfica do grau de acometi- ram níveis semelhantes de dor duran-
indivíduos obesos que naqueles com
mento da articulação, sem diferenças te os testes de velocidade, de forma
peso normal. Assim, uma menor velo-
estatisticamente significantes. Duran- que as diferenças encontradas em al-
cidade de marcha pode ser uma es-
te os testes de capacidade funcional, guns testes parecem ser devidas a ou-
tratégia utilizada pelos obesos para di-
também não foram observadas dife- tros fatores. No entanto, os possíveis
minuir o impacto nessas articulações.
renças quanto ao nível de dor. efeitos analgésicos de medicamentos
Stenholm et al.24 confirmaram que o
Alguns estudos mostram que o IMC risco de limitações à velocidade de não foram controlados neste estudo.
pode influenciar os sintomas da OA marcha aumenta a cada grau de obe- Três mulheres do grupo II usavam
de joelhos, estando os obesos em mai- sidade, fato agravado pela presença antiinflamatórios não-esteróides no
or risco de apresentar dor15,16 e dificul- de OA de joelhos entre as mulheres. dia dos testes e as conseqüências dis-
dades funcionais17,18 quando compara- No presente estudo, o maior grau de so não podem ser avaliadas nos pre-
dos a indivíduos com peso normal. excesso de peso também teve impac- sentes resultados.
Marks19 observou que indivíduos com to negativo na capacidade funcional Sabia-se que duas mulheres do gru-
OA de joelhos e maiores níveis de IMC das mulheres obesas mórbidas com po I e quatro do grupo II praticavam
apresentam dor mais intensa em rela- OA de joelhos, considerando a velo- atividade física regular, não sendo
ção àqueles com menor IMC, utilizan- cidade de marcha usual. possível estabelecer o papel do con-
do uma escala analógica-visual e ou-
Quanto ao teste de marcha rápida, dicionamento físico nos resultados do
tro instrumento diverso do Womac.
por outro lado, as obesas não conse- presente estudo. Indivíduos obesos, em
Não foram encontrados na literatura
guiram alcançar melhores resultados geral, tendem a se exercitar pouco,
estudos que comparassem o nível dos
quando comparadas às obesas mórbi- apresentando baixos níveis de ativi-
sintomas da OA de joelhos entre indi-
das. A maior velocidade exigida nes- dade física. Os sintomas da OA de
víduos com obesidade e obesidade
se teste pode ter provocado força ex- joelhos podem fazer com que os indi-
mórbida utilizando o Womac.
cessiva nas articulações dos joelhos, víduos evitem atividades que provo-
No presente estudo, os resultados limitando seu desempenho. A marcha quem ou intensifiquem sua dor, o que
relativos aos sintomas apresentaram rápida também parece ser uma ativi- levaria à piora do condicionamento
altos valores de desvio-padrão em dade mais complexa e pouco comum físico e maior fraqueza muscular. Al-
ambos os grupos, o que já foi observa- no dia-a-dia dessas mulheres11, fato- terações biomecânicas, causadas pela
do em outros estudos que utilizaram o res que podem ter contribuído para obesidade e pela OA de joelhos, po-
questionário Womac20,21. Essa grande esse baixo desempenho. dem ainda aumentar os gastos ener-
variabilidade pode ter influenciado a géticos durante atividades de locomo-
ausência de diferenças entre os gru- Nas escadas, as obesas alcançaram ção, com maiores exigências de con-
pos. Clinicamente, esses achados re- maior velocidade no teste de subida, dicionamento físico. Sutbeyaz et al.30
fletem a diversidade de respostas a mas não no de descida. Atividades em observaram que, em relação a indiví-
doenças crônicas como a OA de joe- escadas exercem maior estresse me- duos obesos sem OA de joelhos, obe-
lhos e a obesidade. Segundo a Orga- cânico na articulação do joelho do que sos com OA de joelhos apresentam
nização Mundial de Saúde 22, as do- a marcha no plano25. Além disso, es- pior condicionamento físico geral e
enças podem impactar a qualidade de sas atividades estão associadas a al- pior desempenho de mobilidade com
vida e a capacidade funcional de di- tos níveis de dor e dificuldade funcio- os membros inferiores. Um menor con-
versas formas, com efeitos nas funções nal, tanto entre pessoas com OA de dicionamento físico entre as mulheres
e estruturas do corpo, atividades fun- joelhos 11,26 quanto entre obesos 27,28 . com obesidade mórbida pode ter con-
cionais e participação social. Fatores Descer ou subir escadas exigem tribuído para seu pior desempenho nos
pessoais e ambientais também podem angulações de movimento e produção testes MU e SE. Nesse caso, poder-se-
influenciar a funcionalidade e inca- de forças diferenciadas, o que pode ia concluir que, nos testes de marcha
pacidade22. Este estudo reforça a im- explicar os resultados diferentes para rápida e descida de escadas, o condi-
portância de se avaliarem as incapa- cada teste 29. A atividade de descer cionamento físico teria sido menos

128 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :125-30


Vasconcelos et al. Grau de obesidade e OA de joelhos

importante do que os efeitos deletéri- contamos com um pequeno número de tégias de tratamento mais específicas
os da OA de joelhos sobre a capaci- participantes. As participantes dos gru- e direcionadas às necessidades e pos-
dade funcional. Dessa forma, mesmo pos apresentavam heterogeneidade sibilidades dos pacientes.
que apresentassem melhor condicio- quanto à idade e tempo de sintomas
namento, as mulheres obesas não con- da OA de joelhos e não houve parea-
seguiriam alcançar melhores resulta- mento por essas variáveis. CONCLUSÃO
dos, como nos testes de marcha usual
e subida de escadas. Os resultados deste estudo demons- Os resultados permitem concluir
tram que as inter-relações entre obe- que o grau de obesidade não teve
O presente estudo analisou a obe- sidade e OA de joelhos são comple- impacto nos sintomas de dor, rigidez
sidade apenas em termos do IMC, uma xas e agem de diferentes formas so- e dificuldades funcionais associadas
medida do excesso de peso para uma bre a capacidade funcional de mulhe- à OA de joelho entre obesas e obesas
determinada altura. Outros fatores res. Estudos explorando a funcionali- mórbidas. No que se refere à capaci-
podem estar associados à obesidade, dade dessa população devem levar dade funcional, o grau de obesidade
influenciando os sintomas e incapa- em conta essas inter-relações e espe- teve influência diversa conforme o
cidades associadas à OA de joelhos, cificidades, a fim de contribuir para a tipo de atividade: nos testes de mar-
como a composição corporal de mas- compreensão dos impactos das doen- cha usual e subir escadas, as obesas
sa gorda e massa magra31,32 e altera- ças crônicas e os mecanismos de adap- mórbidas apresentaram pior desempe-
ções metabólicas ou inflamatórias33,34. tação e reação a seus efeitos. Ainda nho, confirmando a hipótese do estu-
A força muscular também interage há muito a ser explorado neste tema, do. No entanto, nos testes de marcha
com a obesidade, podendo ser consi- com a observação de outras variáveis rápida e descer escadas, atividades
derados os dois fatores mecânicos mais de influência e a ampliação das ma- mais complexas e estressantes para a
importantes na determinação da ca- neiras de se avaliar a capacidade fun- articulação do joelho, os dois grupos
pacidade funcional de indivíduos com cional, incluindo não só a velocida- tiveram desempenhos semelhantes,
OA de joelhos35,36. de, mas outras características. A com- sugerindo que outros fatores, além do
O presente estudo apresenta outras preensão dos impactos das doenças grau de obesidade, podem influenci-
limitações. A escolha da amostra não crônicas sobre a funcionalidade huma- ar o desempenho funcional de obesas
se baseou em cálculo específico e na pode levar à elaboração de estra- com OA de joelhos.

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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.131-5, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Incidência de lesões na prática do rúgbi amador no Brasil


Incidence of injuries in the practice of amateur rugby in Brazil
Luciane Machado Alves1, Renato Paranhos Soares2, Richard Eloin Liebano3

Estudo desenvolvido no Curso RESUMO: Este estudo visou verificar a incidência de lesões traumáticas na prática
de Fisioterapia do Centro esportiva do rúgbi amador no Brasil. A amostra constituiu-se de 42 praticantes
Universitário São Camilo, São amadores de duas equipes de rúgbi de São Paulo, do sexo masculino, com
Paulo, SP, Brasil idade entre 18 e 30 anos. Foi aplicado a cada jogador um questionário em
1
forma de entrevista para verificar a ocorrência de lesões após cada jogo de
Fisioterapeuta rúgbi disputado pela respectiva equipe durante cinco meses de 2006. Lesão
2
Prof. do Curso de Fisioterapia foi definida como alguma dor ou dano físico sofrido por um jogador durante o
do Centro Universitário São treino e durante ou imediatamente após uma partida de rúgbi. Os dados das
Camilo respostas dos jogadores foram analisados estatisticamente, com nível de
significância estabelecido em p≤0,05. A incidência total de lesões foi de 574,16
3
Prof. Dr. do Programa de por 1.000 horas de jogo. Houve predomínio de lesões nos membros inferiores
Mestrado em Fisioterapia da em ambas as equipes. A manobra conhecida como tackle foi a maior causa de
Universidade Cidade de São lesões. O segundo tempo foi o período do jogo em que a maioria das lesões
Paulo, São Paulo, SP, Brasil ocorreu. Atacantes foram mais freqüentemente lesionados quando comparados
aos defensores. A incidência de lesões traumáticas no rúgbi amador no Brasil
ENDEREÇO PARA mostrou-se extremamente alta, caracterizando uma importante diferença
CORRESPONDÊNCIA quando comparada à incidência de lesões em outros estudos feitos em países
Luciane M. Alves onde o rúgbi é um esporte mais popular.
R. Ângelo Alegro 76
02881-040 São Paulo SP DESCRITORES: Futebol americano; Incidência; Traumatismos em atletas
e-mail:
lucianemalves@hotmail.com ABSTRACT: This study aimed at estimating the incidence of traumatic injuries in
the practice of amateur rugby in Brazil. The sample consisted of 42 male, 18 to
30 year-old rugby amateur athletes from two different São Paulo teams. A
questionnaire (by means of interview) was applied to each player inquiring on
injuries suffered during and/or after every match (and training) his team played
along five months of 2006. An injury was defined as any pain or physical
impairment sustained by a player during or immediately after a rugby match
or training. Data from volunteers’ answers were statistically analysed, and
significance level set at p≤0.05. The total incidence of injuries was 574.16 per
1,000 match hours. Injuries were predominant in lower limbs. Tackling was
the major cause of injuries. The second half was the period when most injuries
occurred. Forwards were more often injured than backs. The incidence of
APRESENTAÇÃO traumatic injuries in rugby in Brazil were extremely high when compared to
set. 2007 the injury incidence found by studies made in countries where rugby is usually
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO practised.
abr. 2008 KEY WORDS: Athletic injuries; Football; Incidence

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 31-5 131


INTRODUÇÃO no rúgbi refere-se pois a esses países.
Como não foram encontrados estudos
foi disputado por cinco equipes, resul-
tando em oito jogos para cada equi-
O rúgbi é um esporte de colisão a respeito no Brasil, o objetivo deste pe, além da final entre duas destas,
jogado pelos níveis de jogador júnior, trabalho foi verificar a incidência de por clubes do Estado de São Paulo. A
amador, semiprofissional e profissio- lesões traumáticas na prática esporti- Liga Universitária foi disputada em
nal. Em um campo semelhante ao de va do rúgbi amador no país. 2006 por 10 equipes universitárias da
futebol (com 15 jogadores em cada cidade de São Paulo em duas fases,
time, no caso do rugby union ou con- resultando em seis jogos por equipe em
vencional), o objetivo é fazer passar METODOLOGIA média. Entretanto, durante o período
a bola, que pode ser carregada nas da pesquisa, foram disputadas apenas
O estudo foi aprovado pelo Comitê
mãos ou chutada, por entre dois pos- três partidas pela equipe universitária.
de Ética e Pesquisa com Seres Huma-
tes que delimitam a área de gol nos do Centro Universitário São Camilo. Os voluntários responderam a um
adversária, de modo a que ela toque Todos os voluntários foram previamen- questionário aplicado ao final de to-
no chão na área de gol. Diz-se “de te esclarecidos e orientados sobre os dos os jogos disputados por suas res-
colisão” porque o jogador que estiver procedimentos experimentais a que pectivas equipes.
com a bola pode ser derrubado; o ato seriam submetidos no presente estu-
de derrubá-lo chama-se tackle. Joga- do. No caso de aceitação plena, assi- Para a proposta deste estudo, uma
dores se envolvem na disputa que in- naram um termo de consentimento li- lesão foi definida como alguma dor
clui freqüentes períodos de atividade vre e esclarecido. ou dano físico sofrido por um jogador
de alta intensidade (corrida, trote, lan- durante o treino e durante ou imedia-
Dentre os entrevistados, foram se- tamente após uma partida de rúgbi.
çamento da bola, tackle) separados
lecionados 42 jogadores de rúgbi do Todas as lesões relatadas foram regis-
por períodos de baixa intensidade (ca-
sexo masculino, com idade entre 18 tradas indiferentemente de sua gravi-
minhando)1,2,3. As demandas fisiológi-
e 30 anos, saudáveis, com prática es- dade2,5,8,9. As lesões registradas foram
cas do jogo de rúgbi são complexas,
portiva referida de no mínimo uma classificadas de acordo com a região
exigindo jogadores que tenham agili-
vez por semana e participação em no anatômica, período do jogo em que
dade, velocidade altamente desenvol-
mínimo duas partidas por suas respec- ocorreram, a posição (atacante, defen-
vida, força e potência muscular e po- tivas equipes durante o período de re-
tência aeróbia máxima. O jogo é dis- sor) do jogador lesionado e a habili-
alização da pesquisa. Todos os volun- dade envolvida no momento da lesão:
putado em dois tempos de 30 a 40 tários eram amadores, ou seja, não
minutos cada (dependendo do nível corrida, tackle, choque, scrum (dispu-
recebiam qualquer pagamento para ta da bola lançada no meio de duas
da competição), separados por um in- jogar ou treinar, e atuavam nas posi-
tervalo de 10 minutos3. formações adversárias de oito jogado-
ções de atacantes e defensores. A Ta-
res cada), maul (disputa da bola por
Esse esporte impõe freqüente e po- bela 1 apresenta os dados de idade e
no mínimo três jogadores em pé), ruck
deroso contato corporal, expondo poten- características antropométricas da
(agrupamento de pelo menos um jo-
cialmente os jogadores a um grande amostra estudada.
gador de cada equipe, em pé, em tor-
número de lesões4. Considerando as di- Os jogadores integram duas equi- no da bola no chão).
ferenças nas aptidões e habilidades, pes diferentes. A coleta de dados foi
condições do solo, padrões de arbitra- feita aos finais dos jogos de suas res-
gem e atitudes de agressão e violência, pectivas equipes durante o Campeo-
Cálculo da incidência de lesões
as taxas de lesões podem ser mais ele- nato Paulista de rúgbi (Time A, n=23) A taxa de lesões (ou incidência) é
vadas em jogadores amadores de rúgbi, e a Liga Universitária (Time B, n=19), mais freqüentemente registrada por
segundo a literatura pesquisada5,6,7. no período de fevereiro a junho de 1.000 horas de jogo segundo a posi-
2006. O Campeonato Paulista de 2006 ção do jogador2,3,5,8,10-14. A incidência
É importante conhecer a incidên-
cia de lesões na prática do rúgbi em de lesões foi calculada dividindo-se
jogadores do esporte amador, pois pos- Tabela 1 Idade e características o número total de lesões sofridas pe-
sibilita classificar as lesões mais fre- antropométricas (média ± los jogadores do time pelo tempo de
qüentes quanto ao risco, situações as- desvio padrão) dos exposição a lesões, multiplicando-se
sociadas ou predisponentes, o que jogadores estudados esse resultado por 1000. Para calcular
permitirá elaborar programas de pre- o tempo de exposição a lesões (em
venção. O esporte é principalmente Variável Média±desvio padrão horas de jogo, segundo a posição do
praticado nas regiões do mundo de Idade (anos) 23,78±3,38 jogador), multiplica-se o número to-
forte influência inglesa (Austrália, Peso (kg) 85,92±12,01 tal de partidas disputadas pelo núme-
Nova Zelândia, África do Sul, além ro de jogadores em campo (em ge-
Altura (m) 1,78±0,072
do Reino Unido) e na França; na Amé- 2 ral, 15) e pelo tempo de duração da
rica do Sul, destacam-se a Argentina IMC (kg/m ) 26,78±2,67 partida (em média, 80 minutos, ou
e o Uruguai. A literatura sobre lesões IMC = Índice de massa corporal 1,33 horas)2,3,8,11.

132 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :131-5


Alves et al. Incidência de lesões no rúgbi amador no Brasil

Análise estatística Tabela 3 Comparação dois a dois (valores de p) entre as regiões anatômicas de
lesão durante os jogos de rúgbi (n de lesões=126)
Os dados obtidos das respostas ao Cabeça e
questionário foram organizados em Região do corpo Tronco MMSS MMII Face
pescoço
tabelas, utilizando os programas SPSS
v11.5®, Minitab 14® e Microsoft Excel MMSS 1,000
XP®. A análise estatística foi realiza- MMII 0,040* 0,040*
da mediante o teste de igualdade de Cabeça e pescoço <0,001* <0,001* <0,001*
duas proporções, um teste não-para- Face <0,001* <0,001* <0,001* 0,554
métrico que verifica se a proporção Outros <0,001* <0,001* <0,001* 0,776 0,758
de respostas de duas determinadas
MMSS = Membros superiores; MMII = Membros inferiores; * valores estatisticamente
variáveis são estatisticamente signifi- significantes
cantes. Para este estudo, foi conside-
rada estatisticamente significante a Tabela 4 Comparação dois a dois entre as situações em que ocorreram lesões
diferença ou correlação tal que p<0,05 (n=126) durante os jogos de rúgbi
(5%). Todos os intervalos de confian-
ça construídos ao longo da análise Situação Tackle Maul Ruck Scrum Corrida Choque Não lembra Outros
foram realizados com 95% de confi- Maul <0,001*
ança estatística. Ruck 0,452 <0,001*
Scrum 0,120 <0,001* 0,419
Corrida <0,001* 0,271 0,002* 0,020*
RESULTADOS Choque
Não
<0,001* 0,250 <0,001* <0,001* 0,031*
0,009* 0,020* 0,060# 0,280 0,198 0,001*
A incidência de lesões no Time A lembra
foi de 626,56 por 1.000 horas de jogo Outros 0,001* 0,079# 0,014* 0,093# 0,494 0,006* 0,541
por posição do jogador e, no Time B, Treino <0,001* 1,000 <0,001* <0,001* 0,271 0,250 0,020* 0,079#
de 434,42 por 1.000 horas. Entretan- * valores de p estatisticamente significantes; # valores de p que, pela proximidade do limite de
to, como o Time B jogou menos parti- aceitação, considera-se que tendem a ser significantes
das, sua exposição a lesões foi de
Tabela 5 Comparação dois a dois entre os períodos em que ocorreram lesões
59,85 horas, contra 159,6 horas do
durante os jogos de rúgbi (n de lesões=126)
Time A (Tabela 2). Além disso, o nú-
mero de jogadores entre as equipes Período 1 tempo 2 tempo Final do jogo Aquecimento
diferiu, sendo 23 voluntários do Time 2 tempo <0,001*
A e 19 do Time B.
Final do Jogo <0,001* <0,001*
Em relação às regiões anatômicas, Aquecimento <0,001* <0,001* 0,701
houve predomínio de lesões em mem-
bros inferiores (MMII), com 36,5% do
Treino <0,001* <0,001* 0,734 0,472
total de lesões, seguida de membros * valores de p estatisticamente significantes
superiores (MMSS) e tronco, com
24,6% das lesões. A Tabela 3 permite pode considerar esse percentual esta- 1o tempo, em que ocorreram 34,9%
ver que o percentual de lesões nos tisticamente diferente (Tabela 4) dos das lesões. A Tabela 5 permite ver que
MMII é significantemente maior do percentuais do ruck (20,6%) e do scrum o percentual do 2o tempo é significa-
que nas demais regiões do corpo. (16,7%). tivamente maior em relação aos de-
mais períodos.
A situação que levou ao maior nú- O período do jogo que levou ao
mero de lesões foi o tackle, em 24,6% maior número de lesões foi o 2o tem- Os atacantes foram mais freqüen-
do total de lesões. No entanto, não se po, com 55,6% do total, seguido do temente lesionados (58,7%) quando
comparados aos defensores (41,3%),
e essa diferença foi estatisticamente
Tabela 2 Exposição e incidência de lesões sofridas (n=126) pelos jogadores significante.
estudados

Equipe Partidas
N sofridas
Lesões
Exposição (h) Incidência*
DISCUSSÃO
Time A 8 100 159,60 626,57 A incidência total de lesões encon-
trada no presente estudo foi 574,16 por
Time B 3 26 59,85 434,42
1.000 horas de jogo (Tabela 2). Pode-
Total 11 126 219,45 574,16 se observar que a incidência de le-
Exposição: E = n de partidas X 15 X 1,33 h; * Incidência expressa em lesões por sões do Time A foi aproximadamente
1.000 horas de jogo 8 = N de lesões sofridas/E X 1000 quatro vezes maior do que a observa-

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 31-5 133


da no Time B. Porém, é válido desta- Vários estudos identificaram que a Gabbett 23 com 35 amadores da liga
car que a exposição a lesões no Time maioria das lesões ocorridas na liga australiana de rúgbi para verificar suas
A foi equivalente a aproximadamen- de rugby sevens*9, na Copa do Mundo características fisiológicas e antropo-
te o triplo da exposição do Time B, de 1995 (disputada na África do Sul)15, métricas, observou-se que jogadores
devido ao número de partidas reali- nas ligas de rúgbi da Nova Zelândia18 amadores têm aptidão aeróbia, velo-
zadas, justificando essa diferença nas e da Austrália 19 são causadas pelo cidade e potência muscular conside-
taxas entre as equipes. Quando com- tackle. O tackle pode ser descrito como ravelmente baixas e significante mai-
parada à encontrada por outros estu- um ato para impedir de qualquer for- or porcentagem de gordura no corpo,
dos4,5,9,13,15,16 realizados com jogadores ma que o portador da bola corra com quando comparados aos profissionais9.
de rúgbi amadores e das demais cate- a mesma, passe-a ou chute-a para
gorias, a taxa de incidência de lesões outro membro de seu time. A passa- Quanto à posição do jogador –
encontrada no presente estudo foi extre- gem da bola carregada pode ser im- como atacante ou defensor –, os re-
mamente alta. Os estudos de Gabbett5,9 pedida por qualquer jogador do time sultados aqui encontrados corroboram
com jogadores amadores, por exemplo, oposto20. Uma porcentagem que varia os da literatura no sentido de que ata-
encontraram incidências de 160,6 por de 46,3 a 91,0% das lesões tem mos- cantes são mais freqüentemente lesio-
1.0005 e de 238,5 por 1.000 horas de trado ocorrer nos tackles. Esses acha- nados quando comparados aos defen-
jogo9; no estudo de Jakoet e Noakes15, dos são esperados, dado que jogado- sores (58,7% contra 41,3% na soma
também com amadores, a taxa de in- res são envolvidos em uma média de total, respectivamente) 3,15,22. Na liga
cidência de lesões encontrada foi de 41 colisões físicas por partida21. Além amadora de rúgbi da Austrália, ata-
78 por 1.000 horas de jogo. disso, lesões também foram identifi- cantes e defensores têm em média 32
De maneira geral, o alto número de cadas3 por terem ocorrido devido ao e 19 confrontos físicos por partida, res-
colisões físicas nas quais os jogadores esforço excessivo (7,8%), colisões pectivamente 3 .
são envolvidos durante o decorrer do com jogadores adversários e/ou obje-
Vê-se pois que, à exceção da inci-
jogo justifica uma elevada incidência tos fixos (15,5%), quedas e tropeções
dência de lesões, as demais caracte-
de lesões11. Entre os jogadores estuda- (5,5%) e deslizamentos e escorregões
(0,3%). Neste estudo, também se ve- rísticas estudadas – posição do joga-
dos, porém, a falta de condicionamen- dor, região do corpo lesada, período e
to físico da maioria pode ter colabo- rificou que o tackle foi a maior causa
de lesões na soma total de ambos os situação do jogo em que a lesão ocor-
rado para a alta incidência de lesões reu – são similares às encontradas na
encontrada: segundo relataram nas res- times, corroborando os dados da lite-
ratura internacional9,15,18,19. O choque literatura sobre jogadores amadores de
postas ao questionário, não fazem
com outro jogador ou objeto fixo foi o rúgbi em outros países. É importante
condicionamento físico ou o fazem
mecanismo que levou ao menor nú- realizarem-se novos estudos para al-
apenas uma vez por semana. Além
mero de lesões. cançar maior precisão na definição de
disso, embora crescente, a literatura
“lesão”, bem como mais estudos so-
sobre lesões no rúgbi é pequena e so- O período do jogo em que a maio- bre jogadores brasileiros, para o de-
fre de falta de consistência e inde- ria das lesões (55,6%) ocorreu foi o
finição de diagnóstico do que seja le- senvolvimento e implementação de
segundo tempo, o que concorda com intervenções preventivas para reduzir
são, causando grande variabilidade na outros estudos realizados com jogado-
mensuração de incidência e preva- a taxa de lesões.
res amadores e de todas as categori-
lência de lesões17. as4,5. Esses achados sugerem que fadi-
Quanto à região anatômica de le- ga ou microtraumas acumulados, ou
ambos, podem contribuir para as le-
CONCLUSÃO
são, no presente estudo os resultados
mostraram nos dois times o predomí- sões em jogadores amadores de rúg- A incidência de lesões traumáticas
nio de lesões nos membros inferiores bi 5 . Em um estudo realizado por no rúgbi amador no Brasil mostrou-se
(36,5%), o que concorda com outros extremamente alta, caracterizando
estudos realizados com amadores e grande diferença quando comparada
jogadores das demais categorias na * Rugby sevens é uma modalidade do rúgbi à incidência de lesões em outros paí-
Argentina4, Nova Zelândia13,18 e Copa convencional jogada com apenas sete ses, sugerindo-se que isso talvez se de-
do Mundo de rúgbi (disputada na Áfri- jogadores em cada time, e em dois tempos va ao insuficiente preparo físico dos
ca do Sul)15. de 7 minutos cada. jogadores amadores brasileiros.

134 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :131-5


Alves et al. Incidência de lesões no rúgbi amador no Brasil

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Sports Med. 2001;35:157-66. este estudo não teria sido possível.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 31-5 135


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.136-41, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Efeitos da reabilitação aquática na sintomatologia e qualidade


de vida de portadoras de artrite reumatóide
Effects of aquatic rehabilitation on symptoms and quality of life
in rheumatoid arthritis female patients
Luis Roberto Fernandes Ferreira1, Paulo Roberto Pestana1, Jussara de Oliveira2, Raquel Agnelli Mesquita-Ferrari3

Estudo desenvolvido no Curso RESUMO : A artrite reumatóide (AR) tem manifestações articulares e extra-
de Fisioterapia da Uniara – articulares, afetando diretamente a qualidade de vida dos pacientes. A
Centro Universitário de hidroterapia é um recurso muito utilizado na reabilitação desses pacientes
Araraquara, Araraquara, SP, devido às propriedades físicas e efeitos fisiológicos da água. O objetivo do
Brasil trabalho foi avaliar o efeito da hidroterapia na sintomatologia e qualidade de
1 vida de portadoras de AR. Participaram do estudo oito voluntárias com média
Fisioterapeutas de idade 56,4±5,2 anos e diagnóstico clínico de AR. Antes e após o tratamento
2
Profa. Ms. do Curso de todas foram submetidas a avaliação fisioterapêutica, que incluiu a aplicação
Fisioterapia da Uniara do Questionário Short-Form 36 (SF-36) e avaliação da rigidez matinal, dor e
qualidade do sono, por escalas analógico-visuais. O protocolo de tratamento
3
Profa. Dra. do Programa de consistiu de 10 sessões de hidroterapia de 45 minutos cada, duas vezes por
Mestrado em Ciências da semana. Os dados coletados foram tratados estatisticamente, com nível de
Reabilitação da Universidade significância fixado em p≤0,05. Após o tratamento foi possível verificar redução
Nove de Julho, São Paulo, SP, da rigidez matinal (p=0,003) e da dor (p=0,004), além da melhora na qualidade
Brasil do sono (p=0,006). Também foi verificada melhora significativa (p≤0,05) na
maioria dos domínios do SF-36 após o tratamento. Conclui-se que o protocolo
ENDEREÇO PARA de hidroterapia proposto possibilitou melhora na qualidade de vida relacionada
CORRESPONDÊNCIA à saúde, redução dos sintomas de dor e rigidez matinal, além de melhora da
Raquel M. Ferrari qualidade do sono de portadoras de AR.
R. Vilela 239 Tatuapé
03068-000 São Paulo SP DESCRITORES: Artrite reumatóide; Hidroterapia; Qualidade de vida
e-mail:
raquel.mesquita@gmail.com ABSTRACT: Rheumatoid arthritis (RA) has both joint and extra-joint manifestations
and may directly affect patients‘ quality of life. Hydrotherapy is a very useful
resource for treating RA due the water physical properties and physiological
effects. The aim of this study was to evaluate the impact of a hydrotherapy
program on RA female patients’ symptoms and health-related quality of life.
Eight volunteers, aged 56,4±5.2 years old, were selected for this study, all
with RA diagnosis. Before and after treatment they were submitted to a physical
therapy evaluation that included application of the Short Form-36 Questionnaire
(SF-36) and assessment of pain, morning stiffness, and quality of sleep, by
means of visual analogue scales. The treatment consisted of ten 45-minute
hydrotherapy sessions, held twice a week. Collected data were statistically
analysed, and significance level set at p≤0.05. At the end of treatment results
showed significant decrease in pain (p=0.004) and morning stiffness (p=0.003),
and improvement in quality of sleep (p=0.006). Also, significant improvement
was detected in most SF-36 domains (p≤0.05). The proposed aquatic therapy
program may be thus said to having improved health-related quality of life,
APRESENTAÇÃO reduced pain and morning stiffness, and improved quality of sleep of women
out. 2007
with RA.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO
abr. 2008 KEY WORDS: Arthritis, rheumatoid; Hydrotherapy; Quality of life

136 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :136-41


Ferreira et al. Hidroterapia para artrite reumatóide

INTRODUÇÃO dos sete critérios definidos pelo Colé-


gio Americano de Reumatologia em
fícios do tratamento com exercícios
físicos regulares em pacientes com
Artrite reumatóide (AR) é uma de- 19981,9: 1, rigidez matinal por no mí- artrite são cada vez mais evidentes.
sordem auto-imune de etiologia des- nimo 60 minutos; 2, artrite em três ou Vários estudos pilotos utilizando dife-
conhecida caracterizada pela ocorrên- mais áreas articulares; 3, artrite nas rentes programas de tratamento vêm
cia de vários episódios de processos articulações das mãos; 4, artrite simétri- sendo realizados, porém existe gran-
inflamatórios reativos que podem afe- ca; 5, presença de nódulos reumatóides; de necessidade de padronização e
tar muitos tecidos e órgãos – pele, va- 6, positividade do fator reumatóide (80% controle dos protocolos propostos16.
sos sangüíneos, coração, pulmões e dos casos); e 7, alterações radiográfi-
Segundo Foley et al.13, que fizeram
músculos – mas que ataca principalmen- cas típicas.
um levantamento de trabalhos utili-
te as articulações (preferencialmente Tem-se recorrido cada vez mais à zando a hidroterapia no tratamento de
articulações periféricas e esqueleto fisioterapia para o tratamento de do- artrites, achados positivos foram de-
axial), produzindo uma sinovite prolife- enças reumáticas, em especial nos tectados na maioria dos trabalhos ava-
rativa não supurativa que progride casos de artrite reumatóide, normal- liados, mas em nenhum deles foi
freqüentemente para a destruição da mente associada ao tratamento medi- alcançada de maneira satisfatória uma
cartilagem articular e anquilose das camentoso, o que tem permitido re- conclusão baseada em evidências,
articulações1-4. sultados favoráveis8,10. quanto à eficácia da hidroterapia para
Acredita-se que a prevalência da pacientes com AR.
A hidroterapia é um dos recursos
AR seja em torno de 1 a 5 % da popu- mais antigos da fisioterapia, sendo Por ser uma doença crônica, a AR
lação mundial. Em adultos a AR é definida como o uso externo da água interfere diretamente na qualidade de
mais comum em mulheres numa pro- com propósitos terapêuticos. É um re- vida incluindo aspectos físicos, psico-
porção de 5:1 e ocorre especialmente curso muito utilizado no processo de lógicos e sociais; é tradicionalmente
na faixa de 40 a 60 anos; porém, quan- reabilitação especialmente em pacien- considerada a doença de maior impac-
do há acometimento masculino, o tes reumáticos, por possuir algumas to em todos os aspectos de qualidade
curso da doença tende a ser pior2,5,6. vantagens devido às propriedades fí- de vida. Assim, as intervenções tera-
A AR instala-se de maneira insidio- sicas e efeitos fisiológicos propiciados pêuticas propostas no tratamento des-
sa e progressiva. Suas manifestações pelo meio aquático 11,12. É freqüente- sa patologia visam a melhora na qua-
podem ser tanto articulares como extra- mente recomendada para pacientes lidade de vida dos pacientes6,17.
articulares. Em manifestações articula- com artrite, pois proporciona uma
O termo qualidade de vida relaci-
res apresentam-se dor e entumecimento, gama de benefícios incluindo redução
onada à saúde surgiu no final da dé-
derrames em grandes articulações, rigi- de edema, dor e da sobrecarga sobre
cada de 1940, quando a Organização
dez matinal, atrofia muscular periar- as articulações já lesionadas13.
Mundial da Saúde definiu saúde como
ticular, deformidades. Como manifes- A hidroterapia promove reações di- um estado de bem-estar físico, men-
tações extra-articulares na AR podem- ferentes daquelas experimentadas em tal e social, mais que simplesmente
se citar febre, astenia, fadiga, modifi- solo, melhorando a circulação perifé- ausência da doença ou enfermidade18.
cações cutâneas e vasculares, linfade- rica, beneficiando o retorno venoso, Em 1948, Karnofsky foi um dos pionei-
nopatia, esplenomegalia, manifesta- além de proporcionar um efeito mas- ros ao introduzir no campo médico
ções oculares, cardíacas, respiratórias, sageador e relaxante, atuando dessa uma escala para medir a qualidade de
neuropatias reumáticas, anemia e a forma nas principais queixas de pacien- vida de pacientes, que se chamava
presença de nódulos reumatóides sub- tes com AR. Os exercícios na água Karnofsky performance status scale.
cutâneos (em superfícies extensores são muito bem tolerados, especialmen- Vários questionários-escalas foram
principalmente) 7 . Todas as articula- te em água aquecida, pois o ambien- desenvolvidos e aperfeiçoados desde
ções sinoviais podem ser acometidas, te morno ajuda a reduzir a dor e es- então; atualmente, o questionário mais
mas é mais freqüente o acometimento pasmos musculares14. A água oferece utilizado para avaliar a qualidade de
das articulações metacarpofalangianas suave resistência durante os movimen- vida é o Short-Form-36 (SF-36), multi-
(MCF), interfalangianas proximais (IFP) tos e, ainda, a oportunidade de trei- dimensional, formado por 36 itens dis-
das mãos e dos pés, articulações namento em várias velocidades. Es- tribuídos em dois grandes componen-
carpais, articulação radioulnar distal ses componentes fazem com que o tes, físico e mental19.
e radiocarpal. As articulações acromio- exercício aquático seja um excelen-
Com base na escassa existência
clavicular, esternoclavicular, temporo- te método para aumento da resistên-
de estudos que avaliem recursos
mandibular, ombro, cotovelo, quadril, cia e força muscular15.
não-medicamentosos úteis para o tra-
joelho e tornozelo também podem ser
Por décadas o repouso foi, juntamen- tamento da AR, o presente estudo te-
afetadas; na coluna vertebral a região
te com a medicação, o tratamento ve como objetivo avaliar o efeito da
mais acometida é a cervical8.
predominante para AR em adultos e terapia aquática na sintomatologia
Um paciente é considerado porta- crianças (AR juvenil). Essa atitude e qualidade de vida de portadoras
dor de AR quando apresentar quatro vem mudando, uma vez que os bene- de AR.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :136-41 137


METODOLOGIA exclusão foram presença de contra-
indicações para realizar atividade
As EVAs utilizadas e os respectivos
graus foram as que se seguem. Para
Este estudo foi aprovado pelo Co- aquática, como ulcerações, febre, fo- dor e rigidez matinal: 1 ausente; 2 fra-
mitê de Ética em Pesquisa do Uniara. bia de água e incontinência urinária. ca; 3 moderada; 4 forte; 5 muito for-
As pacientes que participaram do estudo As voluntárias selecionadas foram te; e para qualidade do sono: 1 dorme
foram encaminhadas pela reumatologista convidadas a participar do programa bem, sem acordar durante a noite; 2
responsável pelo acompanhamento clí- de tratamento em piscina descrito a sono interrompido, acorda algumas
nico da doença, esclarecida quanto aos seguir. vezes durante a noite; 3 sono inter-
objetivos e protocolo de tratamento rompido, acorda várias vezes durante
aquático adotados no estudo e consul- Procedimentos a noite; 4 insônia20.
tada sobre eventuais contra-indicações.
Todas as pacientes mantiveram o acom- As pacientes foram submetidas a Protocolo de tratamento
panhamento médico durante a reali- uma avaliação fisioterapêutica con-
zação do estudo e assinaram um Ter- sistindo em anamnese, avaliação da As voluntárias foram submetidas a
mo de Consentimento Pré-informado, qualidade de vida por meio do Ques- um protocolo de hidroterapia, em pis-
após terem sido esclarecidas quanto aos tionário SF-36 e avaliação de rigidez cina com temperatura da água mantida
objetivos e métodos do estudo. matinal, dor e qualidade do sono por entre 28o e 32oC. O tratamento tota-
meio de escalas analógico-visuais lizou dez sessões de 45 minutos cada,
Foram avaliadas nove pacientes,
(EVAs) adaptadas de Rocha20. com freqüência de duas vezes semanais.
com idade de 56,4±5,2 anos, encami-
nhadas ao setor de fisioterapia com O Questionário SF-36 é formado por Cada sessão foi composta por aque-
diagnóstico médico de AR. Após a 36 itens, reunidos nos componentes cimento, condicionamento, alonga-
avaliação, oito voluntárias foram se- físico e mental. Cada componentes é mento e relaxamento. O aquecimen-
lecionadas para participar do estudo formado por quatro domínios consti- to (10 min) consistiu em caminhada
pois atenderam aos critérios de inclu- tuídos de itens que avaliam uma mes- na lateral da piscina, de frente e de
são: diagnóstico médico de AR ates- ma área da vida dos pacientes. O lado; no condicionamento (25 min)
tando por meio de exames labora- componente físico é composto pelos foram realizadas atividades enfatizan-
toriais que a doença não se encontrava seguintes domínios: capacidade fun- do movimentação de punho e mão,
em período de exacerbação, ausência cional (10 itens), aspectos físicos (4 pé e tornozelo, incluindo o “esqui
de patologias associadas como esta- itens) dor (2 itens) e estado geral de cross country” (movimentos de flexão
do depressivo severo, patologias car- saúde (5 itens); o componente mental e extensão dos membros inferiores
díacas ou pulmonares graves e doenças abrange domínios como vitalidade (4 para a frente, deslizando como nesse
metabólicas não-controladas (diabe- itens), aspectos sociais (2 itens), as- esporte), associada à utilização de
tes, dislipidimias), além de não estar pectos emocionais (3 itens) e saúde flutuadores, “bicicleta” com auxílio de
realizando qualquer outro tipo de tra- mental (5 itens)19, 21-25. Quanto mais alto flutuador e exercícios de propriocep-
tamento fisioterapêutico ou que envol- o escore obtido, melhor é a qualidade ção para membros inferiores (oscila-
vesse atividade física. Os critérios de de vida relacionada à saúde. ção de peso em apoio uni e bipodálico)
120
110
* Pré
100
* * Pós
Escore obtido no SF-36

90 * *
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Capacidade Aspecto Dor Estado Vitalidade Aspectos Aspecto Saúde
funcional físico geral da sociais emocional mental
saúde
Domínios do SF-36
Grafico 1 Escores (média±desvio padrão) nos domínios do SF-36, antes (pré) e após (pós) tratamento aquático, obtidos
pelas voluntárias com artrite reumatóide (* p≤0,05)

138 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 36-41


Ferreira et al. Hidroterapia para artrite reumatóide

e superiores (submersão de objetos matinal (p=0,003) e dor (p=0,004) e Os escores do SF-36 obtidos ao tér-
freando seu retorno à superfície) com melhora significativa na qualidade do mino do tratamento aquático propos-
auxílio de flutuadores, entre outros; sono (p=0,006) das voluntárias após o to foram significantemente maiores
alongamento – geral e específico para tratamento (Gráfico 2). para os domínios capacidade funcio-
as articulações periféricas – e relaxa- nal, dor, estado geral de saúde, vitali-
mento, como flutuação associada à dade e saúde mental, indicando me-
respiração diafragmática, ocupava os DISCUSSÃO lhora na qualidade de vida após a te-
10 minutos finais da sessão11. rapia proposta. Nos demais domínios,
Há atualmente grande preocupação houve uma tendência à melhora, po-
em determinar possibilidades de tra-
Análise estatística tamento que possam auxiliar portado-
rém não significante. Isso aponta para
o fato de que o exercício regular, além
res de doenças inflamatórias crônicas do incremento na condição física e
As médias e desvios padrões foram
como a AR. Também é crescente a no bem-estar, também influencia fa-
calculados para os escores obtidos nos
preocupação em determinar a eficá- tores emocionais e sociais, uma vez
domínios do SF-36 e para os valores
cia dos tratamentos propostos. A utili- que foi verificada influência direta nos
obtidos pelas EVAs de rigidez, dor e
zação de questionários como o SF-36 domínios que avaliam esses aspectos8.
sono, antes e após o protocolo de
tem sido intensificada na pesquisa cientí-
hidroterapia. O teste t de Student não- Antes da realização do tratamento
fica nos últimos anos em decorrência
pareado (para o SF-36) e pareado (para aquático, os escores obtidos nos do-
do interesse em métodos subjetivos de
as EVAs) foi aplicado aos dados obti- mínios do SF-36 capacidade funcio-
avaliação clínica que valorizam a
dos antes e após o tratamento, para nal, aspecto físico, dor, estado geral
opinião do paciente sobre sua condi-
verificar diferenças significativas, con-
ção de saúde26. de saúde e vitalidade foram maiores
siderando-se significante se p≤0,05. que os encontrados por Talamo27 em
Estudos mostraram que programas mulheres portadoras de AR. Isso signi-
de treinamento físico trazem benefí-
RESULTADOS cios a pacientes com AR, como o au-
fica que as voluntárias do presente
estudo apresentavam qualidade de
mento da força muscular e capacida- vida relacionada à saúde melhor que
Ao término do tratamento foi de aeróbica, redução da dor e infla-
verificada melhora significativa nos as estudadas por esse autor. Wiles28 e
mação, e incremento na função, re- Roux29, que avaliaram por meio desse
domínios capacidade funcional fletindo-se diretamente na qualidade
(p=0,004), dor (p=0,022), vitalidade mesmo questionário pacientes com
de vida e na realização das ativida- AR, porém sem distinguir sexo, encon-
(p=0,015), estado geral de saúde
des diárias dos sujeitos5,8,13. O intuito traram valores diferentes: Roux29 evi-
(p=0,027) e saúde mental (p=0,05) do presente estudo foi avaliar o efeito
(Gráfico 1), além de uma tendência a denciou valores superiores aos de
de um tratamento hidroterapêutico na Wiles28 e aos encontrados no presente
melhores escores em todos os domí- qualidade de vida e sintomatologia de
nios do SF-36. estudo na maioria dos domínios. Isso
portadores de artrite reumatóide por pode ter ocorrido em função da hete-
Além disso, foi possível verificar meio do Questionário SF-36 e de EVAs rogeneidade da amostra quanto à dis-
uma redução significativa da rigidez para rigidez, dor e qualidade do sono. tinção entre sexos. Essa interferência
pôde ser também evidenciada no es-
4,5 tudo de Talamo27 que encontrou esco-
Pré
4 res maiores em seis dos oito domínios
Pós
3,5 * no sexo masculino em comparação
Valor obtido por EVA

*
3 com o sexo feminino, especialmente
* nos domínios dos aspectos sociais,
2,5
emocionais e na saúde mental. Assim,
2 um ponto importante a ser ressaltado
1,5 é o fato de alguns estudos utilizarem
1 amostras de pacientes sem fazer dis-
tinção de sexo, o que pode interferir e
0,5
dificultar a comparação de dados da
0
literatura e dados encontrados em no-
Rigidez matinal Dor Qualidade do sono vos estudos.
Grafico 2 Escores (média±desvio padrão) nas EVAs de rigidez matinal, dor e A avaliação da rigidez matinal, dor
qualidade do sono, antes (pré) e após (pós) tratamento aquático, obtidos e qualidade do sono antes e após o
pelas voluntárias com artrite reumatóide. Graduação de dor e rigidez tratamento permitiu verificar uma me-
matinal: 1 ausente; 2 fraca; 3 moderada; 4 forte; 5 muito forte; graduação lhora em todos esses aspectos. Com
de qualidade do dono: 1 dorme bem, sem acordar durante a noite; 2 sono relação à rigidez e dor, verificou-se
interrompido, acorda algumas vezes durante a noite; 3 sono interrompido, que antes do tratamento o grau médio
acorda várias vezes durante a noite; 4 insônia (* p≤0,05) obtido foi “moderado a forte” e, ao

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :136-41 139


término do tratamento, “fraco a mo- outras, é uma ferramenta útil para redu- peso, relaxamento muscular pelo au-
derado”. Quanto à qualidade do sono, zir a dor e rigidez, além de propiciar mento do fluxo sanguíneo e liberação
também foi possível verificar melho- melhora na qualidade do sono em de endorfinas11,31,32. Em concordância
ra, pois antes do tratamento o grau pacientes portadoras de AR30,31. Esses com esses fatores, foi constatada, pelo
obtido ficou entre “sono interrompido, achados foram similares aos encontra- SF-36, melhora significativa no domí-
dos por Santoni et al. 30, que utiliza- nio saúde mental após o tratamento.
acorda algumas vezes durante a noite”
e “sono interrompido, acorda várias ram o tratamento aquático para um
vezes durante a noite” e, após o trata- portador de artrite reumatóide juvenil. CONCLUSÃO
mento, passou a ser “sono interrompi- Um dos fatores que pode ter contri- Com base nos resultados obtidos,
do, acorda algumas vezes durante a buído para a melhora da sintomato- pode-se afirmar que o protocolo de tra-
noite”. Isso sugere fortemente que a logia das voluntárias foi o estabeleci- tamento aquático utilizado neste es-
terapia aquática, por seus efeitos fisi- mento da prática regular de atividade tudo foi eficaz em promover a melho-
ológicos e físicos, que induzem res- física, especialmente por esta ser rea- ra na qualidade de vida relacionada
postas como melhora do condiciona- lizada em piscina terapêutica. A água à saúde, além de propiciar redução de
mento físico, relaxamento muscular, torna algumas atividades mais pra- dor e rigidez matinal e melhora do sono
redução de sobrecarga articular entre zerosas pela redução de descarga de em portadoras de artrite reumatóide.

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Fisioter Pesq. 2008;15(2) :136-41 141


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.142-8, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Interferência mútua entre atividade visual e atividade


motora em jovens e idosos
Mutual interference between a visual and a motor task in young and elderly subjects
Patrícia Pereira dos Santos Teixeira1, Mariana Callil Voos2, Mariane Silva Andrade Machado1,
Lílian Zanchetta Castelli1, Luiz Eduardo Ribeiro do Valle3, Maria Elisa Pimentel Piemonte4

Estudo desenvolvido no ICB/ RESUMO: Como o envelhecimento provoca dificuldade na capacidade de dividir
USP – Instituto de Ciências a atenção, este estudo visou verificar, em jovens e idosos: (1) a eventual
Biomédicas da Universidade interferência entre uma tarefa visual e uma motora; (2) se essa interferência
de São Paulo, São Paulo, SP, (caso exista) ocorre de forma diferente no desempenho de jovens e idosos; (3)
Brasil se as tarefas propostas têm correlação com testes validados, de seqüência
1 alfanumérica (TMT) e de levantar e caminhar cronometrado (TLCC). A tarefa
Fisioterapeutas visual consistiu na verbalização do reconhecimento de duas figuras iguais ou
2
Doutoranda em Neurociências diferentes apresentadas rapidamente. A tarefa motora consistiu na alternância
e Comportamento no Instituto de passos do chão a uma plataforma fixa de 10 cm de altura. As tarefas foram
de Psicologia da USP avaliadas isoladas (tarefa-simples) e associadas (tarefa-dupla) em dois grupos:
10 jovens (23±2,8 anos) e 10 idosos (68,8±8,6 anos). Na tarefa visual, os jovens
3
Prof. Dr. do ICB/USP fizeram menos erros que os idosos (p<0,001); nos dois grupos não houve maior
4
número de erros na tarefa-simples quando comparada à tarefa-dupla. Na tarefa
Profa. Dra. do Depto. de motora, os idosos tiveram pior desempenho na tarefa-dupla em relação à tarefa-
Fisioterapia, Fonoaudiologia e simples (p=0,009). Houve correlação positiva entre o TMT e o número de
Terapia Ocupacional da alternâncias de passos (p<0,05) e correlação negativa entre o número de
Faculdade de Medicina da
alternâncias de passos e o TLCC (p<0,05). A tarefa motora não interferiu na
USP tarefa visual em jovens nem em idosos, mas a tarefa visual diminuiu a
ENDEREÇO PARA velocidade da tarefa motora dos idosos. A proposição das tarefas sem atribuir
CORRESPONDÊNCIA
primariedade a uma ou outra permitiu detectar essas interferências.
Mariana C. Voos DESCRITORES: Análise e desempenho de tarefas; Atividade motora;
Fofito/ FMUSP Envelhecimento; Percepção visual
Rua Cipotânea 51 Cidade
Universitária ABSTRACT: Since aging brings about difficulty in dividing attention, this study
05360-160 São Paulo SP aimed at verifying, in youth and aged: (1) the possible interference between a
e-mail: marivoos@usp.br visual and a motor task; (2) whether such interference varies between young
and elderly subjects; (3) whether there is correlation between the proposed
tasks and the trail making test (TMT) and the timed up-and-go test (TUGT). The
visual task measured the ability to state whether two quickly presented figures
were same or different. The motor task consisted on alternating steps from the
ground to a 10 cm-high platform. Tasks were assessed both as single-task
(isolated) and dual-task (simultaneous) in two groups: 10 young people (aged
23±2.8) and 10 elderly (aged 68.8±8.6). In the visual task, young volunteers
presented less errors than the elderly (p<0.001); in both groups no increase in
the number of errors was detected at dual-task when compared to the single-
task. At the motor task the elderly presented lower speed in dual-task as
compared to the single-task (p=0.009). TMT correlated positively to the number
of alternations of step (p<0.05) and TUGT correlated negatively to the number
of alternations of step (p<0.05). For both young and elderly, the motor task did
not interfere on the visual task; however, the elderly showed lesser speed in
APRESENTAÇÃO the motor task when associated to the visual task. The non-assignment of
out. 2007 primality to either task proved useful to detect these interferences.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Aging; Motor activity; Task performance and analysis; Visual
abr. 2008 perception

142 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 42-8


Teixeira et al. Tarefa visual-motora em jovens e idosos

INTRODUÇÃO lo10,17, ou redução da habilidade de pla-


nejamento e seleção de estratégias
também envolvidas em tarefas cogni-
tivas. Logo, a interferência causada
A associação entre tarefas visuais motoras 8 , principalmente quando é pela competição de demandas de
e motoras é comum e necessária nas solicitada a associação a tarefas cogni- atenção é mais evidente em idosos11.
atividades diárias, como dirigir, atra- tivas5,13,18; ou ainda a perda de memória Além de alterações na marcha, ido-
vessar a rua, tomar conta de crianças, de longo prazo e memória operacional19. sos têm dificuldades em outras tare-
usar o computador, passear com o ca- fas cotidianas que requerem divisão
Alterações de memória operacio-
chorro… Muitos trabalhos discutem o de atenção, como dirigir 16 e deam-
nal, atenção e flexibilidade mental
desempenho visual-motor em experi- bular em ambientes externos9,12,24.
são bem detectadas pelo teste de se-
mentos com tarefa-dupla1-4. Uma ta- qüência alfanumérica, também conhe- Estudos sobre associação de tarefas
refa primária é apresentada ao volun- cido como teste das trilhas (TMT, si- costumam determinar arbitrariamen-
tário e testada na condição isolada e, gla do inglês trail making test)20,21, que te uma tarefa como primária e outra
posteriormente, associada a uma ta- mede o tempo necessário para o su- como secundária; nesses casos, a ge-
refa secundária. A tarefa secundária jeito ligar em seqüência 25 círculos neralização dos achados para ativida-
pode evidenciar mudanças na tarefa contendo números ou letras e núme- des diárias poderia não ser adequada,
primária. ros. Foi encontrada correlação entre já que não parece possível estipular
Quando duas tarefas são associa- desempenho no TMT, mobilidade fun- peso maior, por exemplo, para uma
das, há maior probabilidade de uma cional e risco de quedas em idosos21, tarefa motora em relação a uma tare-
ou ambas serem realizadas com me- o que também se relaciona à veloci- fa visual; para atravessar a rua, a alter-
nor velocidade e maior número de dade de realização do teste de levan- nância de passos e o equilíbrio dinâ-
erros, o que é chamado de interferên- tar e caminhar cronometrado (TLCC, mico são tão importantes quanto a
cia mútua negativa 3 . Quanto mais em inglês TUGT) 22. O TLCC é uma detecção de obstáculos e veículos em
complexa for a tarefa secundária, medida de mobilidade funcional que nosso trajeto. Para melhor compreen-
maior será a interferência negativa, quantifica em segundos o tempo que são dos mecanismos envolvidos em
ou seja, a piora na tarefa primária2,5. o indivíduo leva para levantar de uma tarefas-duplas, seria necessário o es-
Por outro lado, se a tarefa primária for cadeira (com assento a cerca de 46 tudo da interação entre tarefas motora
de alta complexidade, a adição de cm do solo), caminha três metros, vira, e visual sem atribuir primazia a uma
uma tarefa secundária simples pode- volta e se senta novamente. O paci- ou outra. E, para avaliar o desempe-
rá acarretar perda de desempenho. ente é instruído a realizar o trajeto o nho de idosos, é útil compará-lo ao
mais rápido possível. Indivíduos com de jovens. Além disso, para avaliar o
Quando há interferência negativa tempo de realização acima de 13 se- desempenho em tarefa-dupla é con-
entre tarefas, assume-se que ambas gundos apresentam maior risco de que- veniente verificar se este apresenta
competem para a mesma classe de da23. O TMT20 e o TLCC22 são ampla- correlação com o de testes funcionais
recursos de processamento de informa- mente utilizados em idosos e apresen- validados na literatura, que medem a
ção no sistema nervoso, pois processar tam grande confiabilidade e validade capacidade de realizar tarefas visual-
recursos é algo limitado e comparti- inter e intra-observadores20-22. motoras. Frente ao exposto, os objeti-
lhado. A demanda de atenção reflete vos deste estudo foram verificar:
o grau de competição de resposta en- Um estudo17 analisou idosos atra-
tre representações corticais sobrepos- vessando a rua e concluiu que a difi- (1) a eventual interferência entre
tas que participam das duas tarefas culdade de associar o ato motor de uma tarefa visual de detecção,
associadas6. Se duas tarefas são me- atravessar a rua ao de olhar os carros discriminação e comparação de
diadas pela mesma área cortical, há que se aproximam ocorre devido à dois estímulos e uma tarefa
piora de desempenho quando são rea- redução da capacidade de dividir a motora de alternância de passos
lizadas ao mesmo tempo (hipótese do atenção. Idosos são dependentes da do chão a uma plataforma;
campo cortical). Se uma população de visão quando andam e olham mais
(2) se essa interferência (caso exis-
neurônios está engajada em uma ati- para o chão durante a marcha. Pedes-
ta) ocorre de forma diferente no
vidade específica, não estará dispo- tres idosos têm maior dificuldade de
desempenho de jovens e idosos;
nível para desempenhar uma ativida- atravessar a rua em segurança17.
de concorrente 7. A interferência irá (3) se o desempenho nos testes rea-
A marcha apresenta alto custo de
ocorrer quando a capacidade de re- lizados apresenta correlação
atenção, porém, como é uma prática
cursos centrais disponíveis for exce- com o desempenho em outros
comum no dia-a-dia, não inibe a ca-
dida 4. dois testes, o TMT e o TLCC.
pacidade de realizar outras atividades
Muitos artigos mostram que idosos ao mesmo tempo, tendo caráter auto-
apresentam dificuldade de dividir a
atenção entre duas tarefas 5,8-15. Isso
mático 14. Com o envelhecimento, o
controle rítmico de passos deixa de
METODOLOGIA
ocorre devido a défices sensoriais e ser realizado predominantemente por Participaram deste estudo dez vo-
perceptuais16, aumento do tempo de regiões subcorticais e espinhais e passa luntários idosos saudáveis (cinco ho-
reação da resposta frente ao estímu- a ser gerenciado por regiões corticais, mens), com 60 a 85 anos (68,8±8,6

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 42-8 143


anos de idade), pareados com dez
voluntários jovens (cinco homens) com
Procedimentos Os voluntários mantinham-se em
bipedestação a 70 cm da tela do com-
20 a 35 anos (23±2,8 anos de idade). A tarefa visual foi realizada com putador. A altura da tela foi ajustada
Foram adotados como critérios de in- base na parte 2 do teste UFOV (Useful para que os olhos ficassem no nível
clusão: escolaridade de 8 a 16 anos, field of view test)16. Consistia na no- da cruz, no centro da tela. Foram orien-
pontuação no miniexame do estado meação de dois estímulos simultâne- tados a manter os olhos na cruz durante
mental (MEEM)26 maior que 25 e vi- os, um apresentado no centro da tela todo o experimento, deixando sua
são normal ou corrigida com lentes do computador e outro na periferia (a atenção difusa para conseguir reco-
(acuidade visual de longe medida dez graus do centro, em uma das oito nhecer os estímulos apresentados no
pelo teste de Snellen, visão de perto possíveis posições demarcadas em centro e na periferia da tela. Os parti-
sentido horário), ambos com duração cipantes deviam falar em voz alta se
medida pelo teste de leitura e presen-
de 150 ms. A atividade era constituí- os estímulos eram iguais ou diferen-
ça de escotoma avaliada pela grade
da por 32 tentativas, com duração to- tes. Após a exibição dos dois alvos, o
de Amsler)27. Os critérios de exclusão
tal média de 2,5 minutos. A tela do programa era interrompido até que o/
foram: uso habitual de jogos eletrôni- computador, de fundo cor cinza, tra- a participante respondesse (“iguais” ou
cos, participação prévia em outros zia no centro uma cruz de fixação e “diferentes”). Foi proporcionada retro-
experimentos semelhantes a este e pro- oito retângulos brancos circundando- alimentação auditiva (beep) a cada
blemas musculoesqueléticos, cardiovas- a (luminância de 20 cd/m2 , 2,2º de resposta correta. Após cada tentativa,
culares, respiratórios ou neurológicos. altura por 3,6º de largura e 0,04º de um examinador, que não tinha acesso
Os participantes foram esclarecidos borda). Após 1750 ms aparecia um à tela do teste, registrava a resposta
quanto aos objetivos do estudo e os estímulo de duração de 150 ms no com o mouse e uma nova tentativa
centro da tela (sobre a cruz) e, simul- era iniciada. Caso não houvesse res-
que consentiram em participar assina-
taneamente, outro dentro de um dos posta em 10 segundos, o programa
ram um termo de consentimento livre
retângulos periféricos. Os estímulos emitia um novo estímulo e a resposta
e esclarecido. O estudo foi aprovado
podiam ser um caminhão (1,5º de lar- era considerada errada. O programa
pela Comissão de Ética do Instituto de gura, 0,5º de altura anterior, 0,9º de
Ciências Biomédicas da Universida- fornece o número de erros de cada
altura posterior) ou um ônibus (1,5º de participante.
de de São Paulo (ICB/USP). O estudo largura, 0,5º de altura), ambos com
foi conduzido em uma sala com iso- luminância de 20/m2. As possibilida- A tarefa motora consistia na alter-
lamento acústico e iluminação redu- des de aparecimento dos estímulos nância de passos do chão a uma plata-
zida, no laboratório de Psicofisiologia eram: ônibus no centro e na periferia; forma com superfície antiderrapante,
do ICB/USP. Foram feitas investiga- ônibus no centro e caminhão na peri- de 10 cm de altura, fixa ao solo, loca-
ções clínicas nos voluntários sobre os feria; caminhão no centro e na perife- lizada à frente dos voluntários. Foi
critérios de inclusão e exclusão. ria; e caminhão no centro e ônibus na solicitado que realizassem a tarefa o
periferia. O estímulo da periferia po- mais rápido possível e olhassem para
dia aparecer em qualquer um dos oito frente durante a atividade. O tempo
Materiais retângulos (Figura 1). da atividade motora era igual ao tem-
Foram utilizados: um computador
com o aplicativo MEL2 ®; uma plata-
forma de 10 cm de altura, fixa no chão;
e anteparos para ajuste da altura do
monitor conforme a altura dos volun-
tários. Foram aplicados dois instrumen-
tos, o miniexame do estado mental
(MEEM) 26 e o teste de seqüência
alfanumérica (TMT); este é dividido
em duas partes: na parte A, o voluntá-
rio deve conectar em ordem crescen-
te, traçando retas, círculos contendo
25 números espalhados randomica-
mente (1,2,3...); na parte B, há maior
demanda cognitiva, pois o voluntário
deve seguir uma seqüência crescente
de números e letras (1,A,2,B,3,C...). Figura 1 Tarefa visual: imagem apresentada na tela do computador; um ônibus
A pontuação é dada pela subtração do ou um caminhão apareciam no centro e em um dos oito retângulos
tempo gasto na parte B menos tempo (estímulos simultâneos, de 150 ms) (Parte 2 do UFOV adaptada de
gasto na parte A. Ball & Owsley16)

144 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 42-8


Teixeira et al. Tarefa visual-motora em jovens e idosos

po que os voluntários haviam levado nho de jovens e idosos. Também fo- fa-simples (TV) e na tarefa-dupla (Fi-
para realizar a atividade visual. As ram feitos testes de correlação de gura 2).
alternâncias dos passos sobre a plata- Spearman para verificar se o desem-
Quanto à tarefa motora, os idosos
forma foram filmadas e posteriormen- penho na tarefa motora apresentou
apresentaram uma média de 1,06±0,4
te contadas e registradas pelo exami- correlação com o TLCC e se o desem-
passos por segundo e os jovens, 1,47±0,3
nador. penho na tarefa visual apresentou cor-
passos por segundo [F1,18=10,31;
relação com o TMT. O nível de
Todos os voluntários receberam de- p=0,005]. Houve diferença entre os
significância adotado foi de 5%
talhada explicação sobre o experi- testes [F=3,54=9,01; p<0,001]: a com-
(α=0,05).
mento. Foram aplicados então, nesta paração post hoc mostrou que o de-
ordem, 1o o teste TLCC, 2o treino da sempenho no treino da tarefa motora
tarefa visual (TVtr), 3o treino da tarefa
motora (TMtr), 4o TMT–parte A, 5o ta-
RESULTADOS (TMtr) foi pior do que na própria tare-
fa TM (p<0,001), evidenciando apren-
refa visual (TV), 6o tarefa motora (TM), A análise dos resultados na tarefa dizado (Figura 3). O desempenho na
7 o TMT–parte B, 8 o tarefas visual e visual evidenciou que os jovens apre- tarefa-dupla (motora associada à vi-
motora associadas (TD, tarefa-dupla), sentaram menor número de erros sual) também foi pior do que na TM-
9 o MEEM, 10 o repetição da tarefa (6,6±3,5) que os idosos (14,8±4,1) simples (p=0,002). Houve interação
motora (TMrep). [F1,18=56,16; p<0,001]. Houve dife- entre grupos e testes [F3,54=4,47;
rença entre os testes [F2,36=3,89; p=0,007]. A comparação post hoc
Foram alternadas tarefas mais aeró-
p=0,030]: a comparação post hoc mostrou que, entre os jovens, o desem-
bicas (motora e tarefa-dupla) com ta-
mostrou que o resultado no treino da penho no treino da tarefa-simples
refas menos cansativas (tarefa visual,
tarefa visual isolada (TVtr) foi pior (TMtr) foi pior que na última (teste de
TMT partes A e B, MEEM), para maior
(p=0,034) que na tarefa visual associa- fadiga) (p<0,001). Nos idosos, o de-
conforto dos voluntários. Por isso, ape-
da à motora (TD); mas não houve me- sempenho foi melhor na tarefa-simples
sar de a pontuação no MEEM ter sido
nor número de erros na tarefa-simples (TM) quando comparada à tarefa-du-
usada como critério de inclusão, o
quando comparada à tarefa-dupla, pla (p=0,047), e pior na tarefa-dupla
teste foi o nono da seqüência. Se ti-
portanto não ocorreu interferência quando comparada à última realiza-
vesse havido algum voluntário com
negativa da tarefa motora sobre a vi- ção da tarefa motora (TMrep, teste de
pontuação abaixo de 25, teria reali-
sual. Não foi encontrada relação en- fadiga) (p=0,009) (Figura 3). Enquan-
zado todo o experimento normalmen-
tre grupos e testes [F2,36=0,42; to os jovens melhoraram o desempe-
te, mas seus dados seriam descarta-
p=0,660]: os grupos de jovens e de nho na tarefa motora na condição ta-
dos da análise estatística. A tarefa
idosos apresentaram comportamento refa-dupla, os idosos apresentaram
motora foi repetida ao final do expe-
semelhante no treino (TVtr), na tare- menor número de alternâncias de pas-
rimento para avaliar se o cansaço in-
terferiu no desempenho; em caso afir-
mativo, seria observada diminuição do Desempenho de jovens e idosos na tarefa visual
número de alternâncias de passo por 200
segundo.
188
A pressão arterial dos voluntários foi
mensurada em repouso e após as tare-
166
fas motoras e a tarefa dupla. Caso a
pressão arterial de algum dos volun- 144
tários tivesse chegado a 150 x 100
Número de erros

mmHg, o experimento teria sido in- 122


terrompido por segurança, mas isso
não aconteceu. Jovens
100 Idosos

Análise estatística 88

Para testar a possibilidade de ocor- 66


rência de interferência negativa mú-
tua entre as tarefas, o número de pas- 44
sos por segundo na ausência e na pre-
sença da tarefa visual e o número de 22
erros na tarefa visual na ausência e TVtr TV TD
na presença da tarefa motora foram
submetidos a análises de variância Figura 2 Desempenho médio de jovens e idosos na tarefa visual. TVtr = treino
(ANOVAs). As mesmas análises foram da tarefa visual; TV = tarefa visual; TD = tarefa visual associada à
utilizadas para comparar o desempe- tarefa motora (tarefa-dupla)

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 42-8 145


Desempenho de jovens e idosos na tarefa motora portanto não houve interferência ne-
2,0
gativa da tarefa motora sobre a tarefa
visual. Mas, embora a tarefa visual
não tenha prejudicado o desempenho
Número de alternâncias de passos por segundo

1,8 dos jovens na tarefa motora, esse pre-


juízo ocorreu para os idosos.
1,6
Assim como andar demanda alto
custo de atenção em idosos13,14, a alter-
1,4
nância de passos também parece ter
essa característica. Como os idosos
1,2 apresentam redução da habilidade de
manter a postura estável, devido ao
1,0 declínio da capacidade sensorial 12 ,
cognitiva e motora5,8,13,18, precisam alo-
0,8 car mais atenção ao controle postural,
prejudicando assim a tarefa motora,
Jovens sobretudo quando esta é associada à
0,6
Idosos visual.

0,4 É importante mencionar o fato de,


TMtr TM TD TMrep com a idade, ocorrer um aumento na
dependência visual para atividades do
Figura 3 Desempenho médio de jovens e idosos na tarefa motora. TMtr = dia-a-dia, como a marcha12. Foi soli-
treino da tarefa motora; TM = tarefa motora; TD = tarefa motora citada a manutenção do olhar na tela
associada à tarefa visual (tarefa-dupla); TMrep = repetição da tarefa do monitor durante todo o experimen-
motora para avaliar interferência do cansaço no desempenho to e os idosos podem ter sido prejudi-
cados por não terem podido usar a
sos nessa situação. Logo, houve inter- com essa tarefa) foi relacionado ao estratégia visual compensatória duran-
ferência negativa da tarefa visual so- desempenho no TLCC, por meio do te as tarefas motoras, tanto na isolada
bre a tarefa motora para idosos, mas teste de correlação de Spearman. quanto na associada à visual.
não para jovens. Houve correlação negativa entre o Idosos apresentam prejuízo das fun-
número de alternâncias e o TLCC (r= - ções executivas 10,17, o que explica o
Correlações 0,649; p<0,05), ou seja, os indivíduos
que precisaram de menos tempo para
fato de terem cometido mais erros na
tarefa visual. Por outro lado, já que os
Foi criado um índice para verificar realizar o TLCC deram maior número idosos foram mais lentos na execução
a interferência da tarefa visual sobre de alternâncias de passos – ou, como
da tarefa motora na condição tarefa-
a tarefa motora: número de alter- era de se esperar, maior rapidez no dupla, tiveram mais tempo entre cada
nâncias de passos dados na TM me- TLCC coincide com maior rapidez na alternância para realizar a tarefa vi-
nos o número de alternâncias na TD, tarefa motora. sual. Por isso, mesmo tendo mais difi-
tarefa motora associada à visual (ín- culdade em dividir a atenção, conse-
dice 1). Esse índice foi correlacionado
com o tempo-delta do TMT (tempo DISCUSSÃO guiram manter o mesmo número de
erros na tarefa visual nas condições
gasto na parte B menos tempo gasto tarefa-simples e tarefa-dupla.
Foi importante não ter sido atribuí-
na parte A), aqui chamado índice 2,
da relevância diferente a cada tarefa.
pelo teste de correlação de Spearman. Tanto jovens quanto idosos apresen-
Se uma tarefa tivesse sido estabele-
Foi observada correlação significati- taram melhora na última tarefa motora,
cida como primária e outra como se-
va entre os índices (r=0,451, p<0,05), que visava verificar se o cansaço ha-
cundária, não teria sido possível estu-
ou seja: quanto menos passos o indi- via interferido no experimento: caso
dar a interferência da tarefa motora
víduo tiver alternado durante a tare- nessa tarefa (TMrep) apresentassem
sobre a visual e vice-versa. O primei-
fa-dupla do que na tarefa motora iso- desempenho pior que nas anteriores,
ro objetivo do presente estudo foi ve-
lada, menor o tempo a mais necessá- o cansaço do voluntário poderia ter
rificar eventual interferência negati-
rio para alternar números e letras no interferido no resultado. Com a me-
va mútua entre as tarefas visual e
TMT–parte B do que o tempo requeri- lhora no desempenho, constata-se que
motora. O segundo objetivo foi verifi-
do para seguir apenas a seqüência houve aprendizado durante a realiza-
car diferenças no desempenho de jo-
numérica no TMT–parte A. ção da tarefa motora e que o cansaço
vens e idosos. Quanto aos dois objeti-
não interferiu no resultado.
O número de alternâncias de cada vos, verificamos que a tarefa motora
indivíduo no treino da tarefa motora não prejudicou o desempenho da ta- Nas execuções da tarefa motora sim-
(que foi o primeiro contato do sujeito refa visual dos jovens nem dos idosos, ples (TMtr e TM), podem ter sido

146 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 42-8


Teixeira et al. Tarefa visual-motora em jovens e idosos

ativadas tanto as estruturas corticais Este estudo teve como terceiro ob- Por terem sido avaliadas nesse es-
como as subcorticais11. Ao ser associa- jetivo verificar se os testes realizados tudo apenas três vezes a tarefa visual,
da à tarefa visual (tarefa-dupla), é pos- tinham correlação com testes valida- contra quatro vezes a tarefa motora,
sível que a tarefa motora tenha solici- dos que avaliam o mesmo comporta- pode-se supor que, se tivesse havido
tado menos das estruturas corticais, mento, como o TMT e o TLCC. Quan- uma quarta etapa visual, talvez fosse
conforme sugerido por Dubost et al.11, to ao TMT, foi observada correlação possível ter observado melhora no
tendo utilizados circuitos subcorticais com a tarefa-dupla: quanto menor o desempenho visual após a realização
para deixar livre maior número de re- impacto da perturbação no TMT (ligar
des neuronais corticais para a tarefa da tarefa-dupla, assim como foi ob-
letras e números na parte B, ao invés
visual. Assim, criaram-se novas estra- servado na tarefa motora. Estudos futu-
de só números na parte A), menor o
tégias e novos esquemas neurais para impacto da perturbação da tarefa vi- ros terão como objetivo investigar essa
lidar com a situação de tarefa-dupla sual sobre a motora (executar apenas questão.
e novas áreas corticais podem ter sido a alternância de passos ou executá-la
ativadas para gerenciar simultanea- simultaneamente à discriminação de
mente as tarefas visual e motora 28 . estímulos visuais). Essa correlação CONCLUSÃO
Portanto, ao realizar novamente a pode ser explicada pelo fato de os dois
tarefa-simples motora, o indivíduo testes exigirem divisão de atenção, A tarefa motora não interferiu no
teria contado com maior número de memória operacional e flexibilidade desempenho da tarefa visual em jo-
estratégias neurais. Isso pode com- cognitiva. vens nem em idosos, mas a tarefa vi-
plementar a explicação de melhor sual diminuiu a velocidade da tarefa
desempenho de jovens e idosos na úl- A alternância de passos corre-
motora entre os idosos; portanto, hou-
tima repetição da tarefa motora sim- lacionou-se ao TLCC pelo fato de am-
bos exigirem fatores em comum, como ve diferença entre o desempenho de
ples, após executá-la na condição ta-
refa-dupla. Embora a diferença de de- velocidade, habilidade de recrutar jovens e idosos. Verificou-se ainda
sempenho na tarefa motora antes e sinergias musculares alternadas e ajus- correlação entre os desempenhos nos
depois da tarefa-dupla não tenha al- tes antecipatórios. Quanto mais rápi- testes de seqüência alfanumérica e
cançado nível significativo, houve do o indivíduo conseguiu completar o levantar e caminhar cronometrado
maior velocidade na última realiza- TLCC, maior foi sua velocidade de (TMT e TLCC) e nas tarefas propostas
ção da tarefa motora. alternância de passos. neste experimento.

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148 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 42-8


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.149-56, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

O preparo bioético na graduação de Fisioterapia


Bioethical education in physical therapy undergraduate course
Fernanda Degilio Alves1, Aline Bigongiari2, Luis Mochizuki3, William Saad Hossne4, Marcos de Almeida5

Estudo desenvolvido no Centro RESUMO: O desenvolvimento da Fisioterapia, aliado às mudanças na educação e


Universitário São Camilo, São na saúde, faz com que a autonomia e os dilemas éticos do fisioterapeuta
Paulo, SP, Brasil sejam maiores a cada dia, expandindo seu papel no cuidado do paciente. Para
1
além do Código de Ética, as noções de Bioética são centrais no preparo de
Profa. Ms. do Curso de graduandos para os desafios profissionais. Este estudo verificou a capacidade
Fisioterapia da Universidade de tomar decisões éticas de alunos no último ano de Fisioterapia de duas
Nove de Julho, São Paulo, SP, universidades na cidade de São Paulo, das quais uma oferece no currículo a
Brasil
disciplina Bioética e a outra não. Cinqüenta alunos de cada universidade
2
Profa. Ms. Curso de responderam a um questionário sobre dilemas éticos correspondentes a artigos
Fisioterapia na Universidade do Código de Ética; cada questão oferecia três alternativas de resposta: uma
São Judas Tadeu, São Paulo, SP, bioética, outra referente ao Código e uma não-ética. As respostas foram
Brasil analisadas estatisticamente. Os resultados mostraram um bom preparo ético
em pouco mais de metade dos alunos das duas universidades, sugerindo que
3
Prof. Dr. da Escola de ambas oferecem preparo ético similar aos graduandos, independente da
Educação Física e Esporte da diferença curricular. No entanto, os alunos da universidade que oferece Bioética
Universidade de São Paulo, tiveram resultados significantemente melhores nos quesitos referentes à relação
São Paulo, SP, Brasil com outros profissionais da saúde, sugerindo que essa disciplina oferece
4 melhores condições para o relacionamento interprofissional, fator importante
Prof. Livre-Docente do
Mestrado em Bioética do tanto na prática clínica quanto para elevar o status da Fisioterapia.
Centro Universitário São D ESCRITORES: Bioética; Ética profissional; Fisioterapia/educação
Camilo
ABSTRACT: Physical therapy recent expansion, along with changes in education
5 and health, enhance physical therapists’ role in patient care, while increasing
Prof. Livre-Docente de Ética
do Curso de Medicina da both their autonomy and the ethical challenges they face in daily clinic. In
Universidade Federal de São addition to knowledge of the professional ethical code, notions of Bioethics
Paulo, São Paulo, SP, Brasil are thought to be central to students training. This study analysed the ability to
make ethical decisions among 100 physical therapy undergraduate students at
ENDEREÇO PARA two universities in São Paulo, of which only one offers the discipline Bioethics.
CORRESPONDÊNCIA Fifty students of each university answered a questionnaire of dilemmas related
Fernanda D. Alves to items of the Physical Therapy Code of Ethics; for each question there was a
R. Profa. M. José Barone choice between three answers, bioethical, in accordance with the ethical
Fernandes 300 Vila Maria code, or non-ethical. Answers were statistically analysed. About half the students
02117-020 São Paulo SP of both universities seemed to be satisfactorily prepared to act ethically, thus
e-mail: ferdegilio@uninove.br suggesting that both offer similar ethical training, regardless of curricula
differences. However, students from the university that offers Bioethics had
significantly better results in questions concerning the relationship with other
APRESENTAÇÃO health providers, thereby suggesting that this discipline may provide better
out. 2007 student training for inter-professional relationship, which is important both to
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO clinical practice and to raise physical therapy status.
abr. 2008 KEY WORDS: Bioethics; Ethics, professional; Physical therapy/education

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :149-56 149


INTRODUÇÃO Código de Ética, o referencial bioético
é incorporado ao ensino? O aluno apli-
pectos gerais da gestão em fisiotera-
pia, dentre outros.
O desenvolvimento da Fisioterapia ca o conteúdo na prática clínica? Esse
tema é pouco explorado e, para res- Foi adotado como critério de inclu-
está associado à evolução de proce-
ponder essas questões, o objetivo des- são estar regularmente matriculado no
dimentos e métodos de ensino-apren-
ta pesquisa é analisar a formação 7o semestre do curso de bacharelado
dizagem de conteúdos curriculares e
aos avanços clínico-científicos da saú- bioética de estudantes de Fisioterapia em Fisioterapia nas duas universidades.
de. Em decorrência dessa evolução, de duas universidades privadas da ci- O semestre foi escolhido para garantir
aumentou a expectativa por resulta- dade de São Paulo, sendo que uma que o aluno estivesse iniciando o con-
dos positivos pós-tratamento e, tam- oferece a disciplina de Bioética na tato direto com pacientes, no estágio
bém, a responsabilidade no ato de grade curricular e a outra não. supervisionado. Foram excluídos alu-
cuidar do paciente1-4. Exige-se do pro- nos matriculados no 8 o semestre ou
fissional, assim, uma formação gene- com dependência no estágio supervi-
ralista, humanista, crítica, reflexiva, METODOLOGIA sionado, pois já teriam tido contato
autônoma, responsável e balizada em com pacientes e vivenciado dilemas
princípios éticos5. Esta pesquisa é prospectiva e quan- éticos durante o atendimento.
titativo-controlada, realizada por meio
O investimento de instituições de da aplicação de um questionário. O
ensino superior em cursos de Fisiote- estudo foi aprovado pelo Comitê de Éti- Instrumento
rapia, especialmente em São Paulo6, ca nas duas universidades, cujas identi-
levou ao aumento no número de ficações foram mantidas em sigilo. O questionário (Quadro 1) com 12
fisioterapeutas no mercado de traba- questões de múltipla escolha está ba-
lho. E à transformação do ato de cui- seado no Código de Ética Profissional
dar, que atualmente enfatiza o vín- Amostra de Fisioterapia e Terapia Ocupacional
culo terapeuta-paciente 2,3,7, mas ca- aprovado pela Resolução Coffito (Con-
Participaram 100 universitários divi-
rece de desenvoltura ética e moral6,7. selho Federal de Fisioterapia e Tera-
didos igualmente em dois grupos: Uni1,
pia Ocupacional) n.10 de 3 de julho
A disciplina Ética e Deontologia é sem a disciplina de Bioética, e Uni2,
com a disciplina de Bioética. A Uni1 não de 197813. A coleta de dados ocorreu
obrigatória no ensino superior na área
oferece disciplina exclusiva de Bioéti- no início do ano letivo.
da saúde, mas o foco e extensão variam
entre cursos, podendo levar a lacunas ca e ministra no conteúdo programá- As três primeiras questões são intro-
na formação6,8. A Bioética oferece sub- tico da disciplina Ética em Filosofia o dutórias e as demais referem-se à práti-
sídios para decisões referentes à saú- tópico de Bioética, além de ética e ca da fisioterapia. Destas, cinco refe-
de, vida, morte, dignidade, solidarie- moral; deontologia; código e comis- rem-se ao relacionamento do terapeuta
dade, confidencialidade, privacidade, sões de ética; direitos dos pacientes; com o paciente e quatro a seu relacio-
vulnerabilidade, responsabilidade, qua- deveres do fisioterapeuta, postura pro- namento com colegas e com outros
lidade de vida 9,10 e defende a huma- fissional e outros. Na Uni2 é oferecida
profissionais de saúde. Para cada ques-
nização do atendimento na saúde11. a disciplina Bioética com o seguinte
tão, há três alternativas de resposta:
conteúdo programático: ética e moral;
O processo de identificar questões, uma correspondente à conduta bioéti-
gênese, desenvolvimento e abrangência
tomar decisões e agir requer habilida- ca (que incorpora os referenciais de
da Bioética; princípios da Bioética;
des e conhecimentos de ética8. Pouco beneficência*, não-maleficência, justi-
bioética e tecnologia, meio ambien-
se sabe sobre o nível de desenvolvi- ça e respeito à autonomia do paciente
te, início e fim da vida; experimenta-
mento moral e os efeitos da educa- e/ou de demais profissionais da saú-
ção em seres vivos; comitês de ética
ção na tomada de decisão ética na de); uma baseada no Código de Éti-
em pesquisa; resolução 196/96;
fisioterapia1,2, ao contrário da quanti- ca, que aborda apenas o aspecto
bioética do cotidiano e interdiscipli-
dade maior de estudos em outras áreas deontológico e moral do relaciona-
naridade; dilemas da bioética. Além
da saúde, como medicina e enferma- mento terapeuta-paciente; e a tercei-
disso, a disciplina História e Funda-
gem 1,2,12. Especialmente, não foi en- ra é considerada não-ética.
mentos de Fisioterapia apresenta os
contrada informação sobre o preparo
temas: história da Fisioterapia e reabi-
bioético do estudante de Fisioterapia.
litação; habilidades e competências da *
Em Bioética, o termo beneficência,
O Código de Ética Profissional é a Fisioterapia; modelo de capacidade considerado um princípio da disciplina, é
base para a boa conduta e requisito funcional; população que usa os ser- definido como a promoção do bem a si
mínimo de incorporação dos valores viços de fisioterapia; a relação te- próprio, aos semelhantes ou ao meio
da profissão. O aluno tem conheci- rapeuta-paciente e o código de ética ambiente, sem qualquer relação com o
significado de seu uso comum, de
mento suficiente do Código para a profissional; conceito de multidis- filantropia. Na área da saúde, implica
escolha da conduta moral adequada? ciplinaridade, interdisciplinaridade e buscar o melhor para o paciente, tanto
Além dos subsídios oferecidos pelo transdisciplinaridade; liderança e as- técnica quanto eticamente.

150 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :149-56


Alves et al. Bioética na Fisioterapia

Quadro 1 Questionário aplicado a graduandos em Fisioterapia

[Nesta versão as alternativas para cada resposta foram ordenadas e está indicado, entre parênteses, se correspondem a
padrões bioéticos, ao Código de Ética, ou se são consideradas não-éticas; também foram omitidas as menções à Terapia
Ocupacional. Para a aplicação aos graduandos essas menções foram mantidas, não havia, claro, as indicações entre
parênteses e a ordem das alternativas era aleatória.]
1 Na graduação você teve aulas de Ética Profissional? ( ) sim ( ) não
2 Você conhece o Código de Ética da sua profissão? ( ) sim ( ) não
3 Quantifique seu conhecimento sobre o Código de Ética: ( ) baixo ( ) médio ( ) alto
As questões seguintes são precedidas dos artigos correspondentes do Código de Ética Profissional de Fisioterapia e
Terapia Ocupacional, aprovado pela Resolução Coffito (Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional) n.10
de 3 de julho de 1978.
4 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 7º, item V - respeitar o natural pudor e a intimidade do cliente.
Questão: Durante a terapia, ao realizar um determinado manuseio, de grande importância ao tratamento, o
paciente relata estar intimamente desconfortável nessa posição. Você:
explica a importância do mesmo, porém não mais o realiza até que o paciente dê o consentimento
novamente; (Bioética)
pára imediatamente e não o realiza mais, respeitando o pudor do paciente; (Código de É tica)
explica a importância do mesmo e continua a realizá-lo, por considerar que esse manuseio trará benefícios
para ele. (Não-ética)
5 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 7º, item VI - respeitar o direito do cliente de decidir sobre sua pessoa e seu bem-
estar.
Questão: Você variou a conduta rotineira com um paciente usando, numa sessão, um recurso fisioterapêutico de
ótima qualidade para a patologia em questão. Na sessão seguinte, porém, ele lhe diz que não gostaria de usá-lo
novamente, pois não se sentiu bem, apresentando dores durante toda a semana. Diante dessa situação, você:
explica os benefícios, mas dá autonomia ao paciente para decidir por si mesmo o que ele julga melhor;
(Bioética)
não mais utiliza o recurso, respeitando o direito do paciente de decidir sobre seu bem-estar; (Código de É
tica)
explica os benefícios do recurso e combina com o paciente de empregar tal método mais uma vez, para
realmente ter certeza de que o mesmo foi o causador do mal-estar. Sendo a resposta negativa, você
continuará com essa nova forma de tratamento. (Não-ética)
6 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 7º, item VII - informar ao cliente quanto ao diagnóstico e prognóstico fisioterápico
(…) e objetivos do tratamento, salvo quando tais informações possam causar-lhe dano.
Questão: Você considera como seu DEVER, informar seu paciente e/ou familiares quanto ao diagnóstico e
prognóstico fisioterapêutico, mesmo que essas informações possam acarretar sérios danos para o paciente?
sim, já que todos têm o direito de saber a verdade a respeito da sua própria vida, independente de trazer
pioras significativas ao quadro; (Bioética)
não, pois estando certo que isso prejudicaria muito o quadro do paciente, a omissão da informação seria
benéfica; (Código de É tica)
não considera um dever, pois estas informações são responsabilidades do médico. (Não-ética)
7 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 7º, item VIII - manter segredo sobre fato sigiloso de que tenha conhecimento em
razão de sua atividade profissional e exigir o mesmo comportamento do pessoal sob sua direção.
Questão: O paciente lhe relata confidencialmente o que ocorreu com ele, para estar requerendo fisioterapia, e
pede para esse fato não ser revelado a ninguém. Você acredita ser seu DEVER manter sigilo ABSOLUTO sobre
o assunto?
só seria permitido quebrar o sigilo se houvesse um imperativo categórico de consciência moral para fazê-lo, ou
se as circunstâncias indicassem uma necessidade inevitável para tal; (Bioética)
sim, pois a confidencialidade, sigilo e fidelidade deve ser mantida no relacionamento fisioterapeuta-
paciente; (Código de É tica)
não, já que revelar essas informações a outras pessoas não irá alterar ou prejudicar o quadro de saúde do
paciente. (Não-ética)

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :149-56 151


Quadro 1 Questionário aplicado a graduandos em Fisioterapia (continuação)

8 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 8º, item XXII - desviar, para clínica particular, cliente que tenha atendido em
razão do exercício de cargo, função ou emprego.
Questão: Seu colega de trabalho, atuante com você em uma instituição, pede demissão e convida alguns dos
pacientes dele para acompanhá-lo para seu consultório particular. Do ponto de vista ético, sua opinião é:
só seria adequado eticamente se ele tivesse mais recursos terapêuticos para oferecer; (Bioética)
não julga adequado; (Código de É tica)
julga esse procedimento adequado do ponto de vista ético. (Não-ética)
9 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 10º - O fisioterapeuta (…) reprova quem infringe postulado ético ou dispositivo
legal e representa à chefia imediata e à instituição, quando for o caso; em seguida, se necessário, ao Conselho Regional de
Fisioterapia e Terapia Ocupacional.
Questão: Você presencia, de um grande companheiro de trabalho, um delito do ponto de vista ético durante o
expediente. Você:
conversa seriamente com seu colega, aponta seus erros e explica os princípios éticos profissionais
envolvidos, para que o fato não se repita; (Bioética)
informa imediatamente seu superior e/ou encarregado, já que atitudes assim podem causar danos sérios às
pessoas envolvidas; (Código de É tica)
não toma qualquer providência, pois conversar diretamente com ele seria intromissão na sua vida
profissional e informar ao superior seria anti-ético. (Não-ética)
10 Capítulo II (do exercício profissional); Art. 13º - O fisioterapeuta (…), à vista de parecer diagnóstico recebido e após buscar
as informações complementares que julgar convenientes, avalia e decide quanto à necessidade de submeter o cliente à
fisioterapia (…), mesmo quando o tratamento é solicitado por outro profissional.
Questão: Paciente chega ao seu consultório com encaminhamento médico, solicitando tratamento
fisioterapêutico. Ao avaliar o caso, você conclui que esse paciente não necessita de fisioterapia. Você:
entra em contato com o médico, explica as razões pelas quais a fisioterapia não irá funcionar e põe-se à
disposição para informar o paciente; (Bioética)
não atende e explica ao paciente que ele não necessita do tratamento, já que a fisioterapia não irá melhorar
seu problema; (Código de É tica)
atende o paciente mesmo assim, e realiza o tratamento, pois ele possui indicação médica para tal. (Não-
ética)
11 Capítulo IV; Art. 24º - O fisioterapeuta e/ou terapeuta ocupacional que solicita, para cliente sob sua assistência, os serviços
especializados de colega, não indica a este a conduta profissional a observar.
Questão: Você precisa encaminhar seu paciente a um colega de trabalho, já que, no seu local de atuação, falta
um recurso fundamental ao tratamento do mesmo. Ao fazer isso, você:
explica o caso ao fisioterapeuta e sugere uma conduta a ser seguida com o propósito de continuidade da
reabilitação, associada ao recurso em questão; (Bioética)
explica o caso ao fisioterapeuta e deixa que ele mesmo estabeleça a conduta que achar adequada,
associada ao recurso que possui; (Código de É tica)
explica o caso para o fisioterapeuta e estabelece a conduta fisioterapêutica a ser realizada, além do recurso
em questão. (Não-ética)
12 Capítulo IV; Art. 25º - O fisioterapeuta (…) que recebe cliente confiado por colega, em razão de impedimento eventual
deste, reencaminha o cliente ao colega uma vez cessado o impedimento.
Questão: Outro fisioterapeuta lhe encaminha seus pacientes, pois está afastado do trabalho temporariamente.
Você os atende por um certo período de tempo, até que o fisioterapeuta retorna apto a trabalhar novamente.
Nesta situação, você:
informa os pacientes do retorno do fisioterapeuta e só mantém os que se manifestarem expressamente
desejosos de ficar sob sua assistência; (Bioética)
imediatamente reencaminha os pacientes ao fisioterapeuta responsável; (Código de É tica)
aguarda um contato do fisioterapeuta para fazer o reencaminhamento. (Não-ética)

152 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :149-56


Alves et al. Bioética na Fisioterapia

Análise dos dados Tabela 1 Distribuição (%) das respostas às questões referentes ao relacionamento
terapeuta-paciente pelos alunos das duas universidades
Na análise descritiva calcularam-se
os percentuais de alternativas marcadas Alternativa assinalada (%)
pelos respondentes das duas universi- correspondente a
N. da questão e conceito Grupo
dades. Foram atribuídas às alternativas, Código de
Bioética Não-ética
previamente classificadas segundo seu Ética
significado ético – bioética, ética ou 4 Pudor e intimidade do Uni1 84 6 10
não-ética – respectivamente as pon- paciente Uni2 82 4 14
tuações: três pontos, um ponto e zero.
O escore máximo do questionário é 5 Direito de decidir sobre si Uni1 42 10 48
27. Foi adotado o critério de 70% do mesmo e seu bem- estar Uni2 44 6 50
escore máximo como referente a um 6 Informar o paciente sobre o
bom preparo, por corresponder à avalia-
Uni1 52 38 10
diagnóstico e prognóstico
ção mínima aceita para aprovação nas fisioterapêutico Uni2 67 20 13
disciplinas nas universidades. Foi as-
sumida a seguinte classificação, se- 7 Confidencialidade das Uni1 54 40 6
gundo a pontuação obtida pelo respon- informações Uni2 54 44 2
dente: 8 Beneficência ao paciente X Uni1 38 46 16
ƒ preparo bom - resultado acima benefício do terapeuta Uni2 22 62 16
de 70% da pontuação (de 19 até Uni1 = alunos da Universidade 1; Uni2 = alunos da Universidade 2 (que oferece a disciplina Bioética)
27 pontos);
ƒ preparo razoável – resultado Quanto ao direito do paciente de de- Relacionamento com colegas
cidir sobre seu bem-estar, cerca de
entre 50 e 70% da pontuação
metade não o respeitariam. No que se
da profissão e outros
(de 14 até 18 pontos);
refere à transmissão de informações profissionais da saúde
ƒ preparo ruim – resultado inferi- ao paciente sobre o diagnóstico e
or a 50% (13 pontos ou menos). Como mostra a Tabela 2, há maior
prognóstico fisioterapêutico, mais alu-
concentração de respostas revelando
A análise estatística dessa classifica- nos (67%) da Uni2 (que oferece a dis-
opção pela conduta bioética, exceto
ção foi feita por meio do teste Kruskal- ciplina Bioética), optaram pela alter-
no que se refere à justiça aplicada a
Wallis nos dois agrupamentos de ques- nativa bioética do que os alunos da outro fisioterapeuta, em que 70% dos
tões: relacionamento fisioterapeuta- Uni1 (52%); inversamente, quanto à alunos da Uni1 e 58% da Uni2 opta-
paciente e relacionamento do fisiote- beneficência ao paciente versus be- ram pelo Código de Ética. É de se notar
rapeuta com colegas e outros profissio- nefício do terapeuta, mais alunos da que, sobre o relacionamento do fisio-
nais da saúde. Uni1 optaram pela alternativa bioéti- terapeuta com outros profissionais da
ca, tendo a maioria dos respondentes saúde, ninguém optou pela alternati-
optado pelo Código de Ética. va não-ética nos dois grupos.
RESULTADOS
Tabela 2 Distribuição (%) das respostas às questões referentes ao relacionamento
Sobre o conhecimento do Código
com outros profissionais da saúde pelos alunos das duas universidades
de Ética do fisioterapeuta, na Uni1
48% dos alunos afirmam conhecê-lo Alternativa assinalada (%)
(e 52% não). Na Uni2, 78% dos alu- correspondente a
nos o conhecem. Ninguém quantificou N. da questão e conceito Grupo
Código de
seu conhecimento sobre esse docu- Bioética Não-ética
Ética
mento como alto.
9 Omissão de responsabilidade Uni1 78 6 16
com colegas de profissão Uni2 98 2 0
Relacionamento
10 Relacionamento do Uni1 78 22 2
fisioterapeuta-paciente fisioterapeuta com outros
profissionais da saúde Uni2 80 18 2
Nas respostas referentes ao relaci-
onamento fisioterapeuta-paciente (Ta- 11 Imposição de conduta Uni1 18 70 12
bela 1), nota-se similaridade entre os terapêutica a colega Uni2 32 58 10
alunos das duas universidades. Sobre
12 Justiça aplicada a outro Uni1 92 8 0
o pudor e intimidade do paciente, a
fisioterapeuta Uni2 90 10 0
maior parte dos respondentes dos dois
grupos optou pela alternativa bioética. Uni1 = alunos da Universidade 1; Uni2 = alunos da Universidade 2 (que oferece a disciplina Bioética)

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :149-56 153


Universidade 11
Universidade Universidade
Universidade 2 2 apropriada dos serviços, comunicação
com o paciente e promoção de cui-
preparo ruim preparo ruim dado adequado8. A interiorização de
14% 2% princípios e de valores humanos são
aspectos do ensino cuja relevância tem
preparo
aumentado na graduação7,8.
preparo bom preparo bom
razoável
preparo 54%
46% 52% Autonomia: O relacionamento de
razoável cuidado com o paciente requer uma
32% atitude de sensibilidade7. O graduan-
do que percebe o desconforto do pa-
Gráfico 1 Nível de preparo bioético nas duas universidades ciente respeita seus sentimentos e sua
autonomia. Nas duas universidades, a
Escores nas questões 9 a 12

maioria dos estudantes optou pela res-


posta bioética, o que sugere a incor-
15
poração de valores para situações es-
pecíficas (Tabela 1, questão 4). O pa-
10
ciente tem o direito de decidir sobre
5 seu bem-estar e o fisioterapeuta pre-
cisa ser sensível aos sentimentos do
0 paciente, respeitá-lo e não impor sua
Universidade 1 Universidade 2 vontade ou ser paternalista. Na atitu-
de paternalista, o fisioterapeuta pode
Gráfico 2 Escore médio obtido pelos alunos das universidades 1 e 2 nas exercer autoridade demasiada com os
questões referentes ao relacionamento do fisioterapeuta com colegas pacientes, gerando um desequilíbrio
e com outros profissionais da saúde (questões 9 a 12 do questionário; que pode impedir um bom relaciona-
escore máximo = 12 pontos) mento, devendo pois ser evitado7. Em
outra situação (Tab.1, q.5), apenas
Classificação pia com a mesma carga horária, e na
disciplina Bioética, no 5 o semestre,
metade em cada grupo indica saber
que, apesar da intenção de promover
Considerando os escores obtidos com 40h/aula. o bem-estar, é preciso antes respeitar
pelos respectivos alunos, a classifica- O conhecimento do Código de Éti- a autonomia do paciente. A conduta
ção das duas universidades é mostra- ca e o bom caráter moral são neces- fora do contexto ético pode ser justificada
da no Gráfico 1. As pontuações total sários para o comportamento profissi- pelo fato de a alusão ao benefício ao
(H=0,1, p=0,71) e a referente ao rela- onal8. Os educadores precisam valo- paciente estar explícita na resposta.
cionamento do fisioterapeuta com o rizar a ética e os componentes do com- Embora a motivação mais comum dos
paciente (H=1,9, p=0,31) são simila- portamento por meio da estruturação fisioterapeutas seja o desejo de aju-
res nas duas universidades. Já a pon- curricular adequada7,8. Na opinião dos dar e cuidar das pessoas14, os alunos
tuação referente ao relacionamento do respondentes, nenhum deles, dos dois que optaram pela alternativa não-ética
fisioterapeuta com colegas e outros grupos, julga conhecer bem o Código mostram não estarem preparados para
profissionais da saúde (Gráfico 2) é de Ética. E, segundo os escores obti- ouvir o paciente e respeitar sua von-
diferente entre as universidades dos, um número maior de não-conhe- tade. O fisioterapeuta precisa ser recep-
(H=5,5, p=0,01), tendo a Uni2 apre- cedores do Código foi encontrado na tivo ao que o paciente requer em ter-
sentado maior pontuação. Uni1. É provável que o enfoque didá- mos de reabilitação, para ser o sujeito
tico dado ao Código tenha pontos fa- do processo e não mais o objeto7.

DISCUSSÃO lhos, que precisam ser identificados.


Sugere-se que ministrar uma discipli-
Veracidade e confidencialidade: A
veracidade e a confiança são impor-
A disciplina Ética e Deontologia é na que discute os dilemas éticos da tantes no relacionamento terapeuta-
obrigatória nos cursos de Fisioterapia profissão, a Bioética, pode permitir paciente. De acordo com o Código de
e está inserida no currículo mínimo aos alunos estabelecer melhor relação Ética, a veracidade só não é primor-
proposto pelo MEC5, mas a aborda- entre os problemas enfrentados e o que dial quando as informações podem
gem desse conteúdo difere entre as é estabelecido pelo Código. causar danos. A maioria dos dois gru-
instituições6,14. Para a amostra da Uni1, pos (Tab.1, q.6) acredita que a veraci-
a disciplina de Ética em Filosofia foi A Bioética no relacionamento dade sempre é a base da confiança
oferecida no 1 o semestre com carga
horária de 40h/aula. Na Uni2, o con-
terapeuta-paciente no relacionamento e, agindo assim,
serão justos com o paciente. A com-
teúdo de ética foi ministrado também A maioria dos dilemas enfrentados plexidade da decisão ética apresenta-
no 1o semestre do curso, na disciplina na prática refere-se à interação do se quando há dois pontos relevantes e
História e Fundamentos da Fisiotera- paciente com o profissional: utilização ações opostas: a veracidade e a com-

154 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :149-56


Alves et al. Bioética na Fisioterapia

paixão, a honra da confidencialidade que não lhes diz respeito. Tais alunos vel, e bem menos com preparo ruim
e a revelação de informação que en- podem carecer de coragem moral, por na Uni2 (Gráfico 1). Como os alunos
volve riscos15. A confiança e a confi- meio da qual o profissional é capaz da Uni2 têm a disciplina Bioética,
dencialidade estão presentes quando de agir com motivação e segurança sugere-se que o estudo da disciplina
uma pessoa revela uma informação à dentro dos valores humanos para a funcione como um aprimoramento
outra, que promete não a divulgar a promoção do bem-estar de todos os para enfrentar dilemas éticos mais
um terceiro sem permissão16. O terapeu- envolvidos15. Na Uni2, ninguém op- complexos, que o Código de Ética não
ta pode aceitar a quebra de sigilo quan- tou pela conduta não-ética. aborda.
do houver um imperativo categórico
Respeitar a autonomia do colega de Por outro lado, de forma geral os
de consciência moral para fazê-lo, ou trabalho para traçar conduta de trata- escores das duas universidades foram
quando as circunstâncias forem ine- mento mediante encaminhamento de semelhantes. Ambas oferecem prepa-
vitáveis. Os resultados mostram que pacientes é defendido pelo Código13. ro ético aos graduandos de forma si-
mais da metade dos dois grupos ado- Mas a sugestão de linhas de tratamen- milar, independente da diferença
tam a alternativa bioética (Tab.1, q.7), to é benéfica ao paciente para conti- curricular. As noções de Bioética ofe-
assumindo postura reflexiva diante do nuar a evolução clínica. Nessa ques- recidas no conteúdo programático da
fato. Manter a confidencialidade 17 tão (Tab.2, q.11), mais de 3/4 dos alu- disciplina Ética em Filosofia da Uni1
para os fisioterapeutas é um proble- nos de ambas as universidades adota- foram capazes de promover um pre-
ma complexo, pois o ambiente e o sis- riam essa conduta. A justiça com ou- paro básico semelhante ao da Uni2.
tema de trabalho, em hospitais ou am- tro profissional deve ser aplicada em
bulatórios, não favorecem o sigilo das todas as situações, como se vê pelas Entretanto, vale lembrar que, além
informações, tampouco o Código ofe- respostas da grande maioria dos dois dos valores adquiridos ao longo do
rece auxílio nesse tópico. grupos à última questão (Tab.2, q.12), curso, os alunos guardam suas carac-
diante do dilema apresentado. terísticas inviduais no que se refere a
Beneficência ao paciente x benefí-
princípios éticos, valores humanos,
cio do terapeuta: o Código de Ética Relacionamento do fisioterapeuta caráter moral e índole. E, ainda, ou-
postula que desviar paciente de uma com outros profissionais da saúde: O tros fatores, além do próprio pacien-
Instituição em benefício próprio não fisioterapeuta é autônomo para avali- te, são considerados polêmicos na prá-
é adequado nem permitido. Embora ar e decidir a prescrição terapêutica, tica clínica, tais como a equipe de
46% dos alunos da Uni1 e 62% da mesmo que o serviço seja feito por profissionais da saúde, a família e a
Uni2 sigam o instrumento (Tab.1, q.8), outro profissional. A autonomia do fi- sociedade19 .
16% nos dois grupos optaram pela sioterapeuta eleva o status da profis-
conduta não-ética, visando o benefí- são18. A maciça maioria dos alunos de Sobre o relacionamento do fisiote-
cio do fisioterapeuta, revelando estar ambas as universidades escolhem a rapeuta com colegas de profissão ou
na fase imatura de tomadas de deci- conduta bioética (Tab.2, q.10), fator outros profissionais da saúde, foi evi-
sões éticas. No desenvolvimento éti- importante para o crescimento e re- denciado que na Uni2 os escores fo-
co e moral, os indivíduos agem na fase conhecimento da profissão; e ninguém ram mais altos nesse grupo de ques-
inicial priorizando a autoridade ou si optou pela alternativa não-ética, o que tões, sugerindo que esses graduandos
próprios; em estágios mais avançados, mostra que os graduandos agiriam com têm um preparo melhor para o relacio-
interiorizam os princípios universais, veracidade e justiça, sem tirar proveito namento interprofissional. Na grade
o que muda a perspectiva de benefí- ou benefício próprio diante da situação. curricular dessa instituição, nas disci-
cio próprio8. plinas Bioética e História e Fundamen-
Como a maior parte das respostas
tos da Fisioterapia, há um enfoque
optam pela conduta bioética, pode-
A Bioética no relacionamento se ponderar que o Código não parece
importante sobre o relacionamento
interprofissional, abordando-se concei-
interprofissional ser suficiente para guiar os fisiotera-
peutas na complexidade dos dilemas
tos como interdisciplinaridade20, que
oferece base para ação em equipe,
Relacionamento do fisioterapeuta sugeridos, mas que os graduandos in-
respeitosa e solidária. Na Uni1, não
com colegas da profissão: Orientar e corporam valores fundamentais ao re-
constam esses temas no conteúdo pro-
explicar as regras deontológicas que lacionamento com os colegas de pro-
gramático disciplinar, o que justifica-
regem a profissão ao colega que er- fissão e de outras áreas da saúde.
ria o melhor preparo dos graduandos
rou para que o fato não se repita é
da Uni2.
uma atitude de compaixão e respei-
to. Mais de 75% dos alunos de ambas
Diferenças entre universidades Não houve diferença entre os gru-
as universidades concordam com isso Percebe-se uma diferença importan- pos quanto ao relacionamento do fisi-
(Tab.2, q.9). A falta de responsabili- te entre as universidades quanto ao oterapeuta com o paciente. Apesar das
dade do fisioterapeuta diante de uma preparo dos alunos em Bioética. Em- diferenças de formação, os resultados
conduta antiética é vista em 16% dos bora a porcentagem de bem prepara- sugerem que outros mecanismos, for-
graduandos na Uni1, que preferem o dos seja semelhante, encontraram-se mais ou não-formais, contribuem para
não-envolvimento em uma situação bem mais alunos com preparo razoá- a formação bioética do aluno. A se-

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :149-56 155


melhança no relacionamento com o paro bioético para o exercício de sua interprofissional, fator importante para
paciente também pode refletir a inerente profissão. Como mais alunos da uni- a elevação do status da Fisioterapia.
preocupação com este e sua saúde. versidade 2, que oferece a disciplina No entanto, em uma parcela de graduan-
Bioética, revelaram um preparo razoá-
dos de Fisioterapia, persiste carência
vel, sugere-se que essa disciplina ofe-
CONCLUSÃO rece melhores condições para desenvol-
ver os valores e virtudes requeridas na
de conhecimento do Código de Ética,
bem como dificuldade para a tomada
Cerca de metade dos alunos das profissão, além de estabelecer bases de decisões frente aos dilemas éticos
duas universidades têm um bom pre- mais adequadas para o relacionamento da prática clínica.

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156 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :149-56


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.157-63, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Atividade eletromiográfica do vasto medial oblíquo em portadoras da


síndrome da dor patelofemoral
Electromyographyc activity of the vastus medialis oblique muscle in female patients
with patellofemoral syndrome
Sâmia Najara Freitas Bessa1, Elielton Pedroza dos Santos1, Renata Augusta Gomes Silveira2,
Paulo Henrique Barros Maia2, Jamilson Simões Brasileiro3

Estudo desenvolvido no RESUMO: A síndrome da dor patelofemoral (SDPF) é uma das afecções que mais
Programa de Pós-Graduação acometem a articulação do joelho. Embora sua etiologia não seja
em Fisioterapia da UFRN – completamente conhecida, uma disfunção do músculo vasto medial oblíquo
Universidade Federal do Rio (VMO) tem sido apontada como possível fator desencadeante. Este estudo
Grande do Norte, Natal, RN, visou avaliar, por meio de eletromiografia, se algum exercício, dentre dez
Brasil exercícios resistidos usuais, produz ativação seletiva do VMO, com vistas a
1 sua utilização clínica. Vinte voluntárias do sexo feminino, sendo dez com
Fisioterapeutas
SDPF (24,7±4,35 anos) e dez saudáveis, controle (22,5±1,58 anos), foram
2
Graduandos em Fisioterapia na submetidas à avaliação eletromiográfica dos músculos VMO, vasto lateral
UFRN longo e vasto lateral oblíquo (VLO) durante a realização de 10 exercícios,
incluindo cadeia cinética aberta e fechada, em diferentes angulações do joelho
3
Prof. Dr. do Curso de Pós- e posições do quadril. Os resultados mostram que nenhum dos exercícios se
Graduação em Fisioterapia da revelou seletivo para o VMO, tendo alguns mostrado ativação seletiva do
UFRN VLO. No grupo com SDPF observou-se menor atividade eletromiográfica de
todos os vastos em oito dos dez exercícios propostos, quando comparado ao
ENDEREÇO PARA controle; observou-se ainda, no grupo SDPF, menor relação VMO/VLO (0,63)
CORRESPONDÊNCIA do que no grupo controle (0,82, p<0,05). Embora, dentre os propostos, nenhum
Sâmia N. F. Bessa exercício tenha se mostrado eficaz para promover a ativação seletiva do VMO,
R. Joca Soares 1858 Parque os exercícios de agachamento unipodal com rotação medial e lateral da tíbia
das Colinas mostraram-se mais indicados para sujeitos com SDPF.
59066-070 Natal RN DESCRITORES: Eletromiografia; Exercício; Músculo quadríceps; Síndrome da dor
e-mail: patelofemural
samianajara@yahoo.com.br
ABSTRACT: The patellofemoral pain syndrome (PFPS) is among the most common
knee pathologies. Although its etiology is not fully known, a dysfunction of
the vastus medialis oblique (VMO) muscle has been pointed out as a possible
cause. This study aimed at assessing, by means of electromyography, whether
one or more, among ten usual resisted exercises, might produce VMO selective
activation, in view of its clinic application. Twenty female volunteers, ten
with PFPS (aged 24.7±4.35) and ten healthy ones (aged 22.5±1.58) were
submitted to electromyographic evaluation of VMO, vastus lateralis longus
and vastus lateralis oblique (VLO) muscles during ten exercises, including
open and closed kinetic chain, at different degrees of knee flexion and of hip
positions. None of the exercises showed to be selective for VMO activation,
but some showed selective activation of the VLO. In the PFPS group all vastii
showed lesser electromyographic activity than control group, in eight of the
ten exercises; the VMO/VLO ratio was also lower (0.63) in PFPS group than in
control (0.82, p<0.05). Although none of the proposed exercises showed efficient
APRESENTAÇÃO to promote VMO selective activation, squatting on one foot, with medial and
dez. 2007 lateral tibia rotation, seemed appropriate for treating PFPS.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO K EY WORDS : Electromyography; Exercise; Quadriceps muscle; Patellofemoral
abr. 2008 pain syndrome

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :157-63 157


INTRODUÇÃO diferentes ângulos de flexão de joe-
lho e posicionamento da perna2,8,12-15.
Optou-se por estudar voluntárias do
sexo feminino devido às grandes dife-
A síndrome da dor patelofemoral No entanto, poucos autores11,16 estuda- renças biomecânicas entre os sexos9
(SDPF) é umas das desordens mais ram a atividade eletromiográfica dos e a maior incidência dessa patologia
comuns no joelho, sendo geralmente músculos VMO e VLO em indivíduos entre mulheres8. Foram selecionadas
manifestada por dor localizada na re- normais, encontrando diferenças na dez mulheres saudáveis entre as estu-
gião anterior e/ou retropatelar1. Essa ativação dessas porções. dantes do curso de Fisioterapia para o
patologia, comum em adolescentes e Na tentativa de restabelecer o equi- grupo controle e dez pacientes de um
atletas de ambos os sexos 2,3, é mais líbrio da estabilização patelar, diver- hospital e clínicas locais para o grupo
freqüente no sexo feminino: represen- sos estudos vêm sendo desenvolvidos experimental. As voluntárias do gru-
ta 33% das patologias de joelho entre para encontrar um exercício capaz de po controle não podiam referir histó-
mulheres e 17% dessas patologias no promover ativação seletiva do VMO ria de dor na articulação do joelho,
sexo masculino4. A dor pode ser desen- e, assim, poder ser utilizado no trata- nenhuma história de doença, cirurgia,
cadeada por alguma atividade da vida mento clínico da SDPF5,7,17,18,20. Porém trauma ou lesão do sistema osteomioar-
diária, como ajoelhar-se ou sentar-se tais estudos mostram divergência nos ticular do membro inferior 21 . Cada
por tempo prolongado, subir e descer resultados: alguns relatam não haver voluntária foi submetida à avaliação
escadas e agachar-se. Em todos esses seletividade do VMO durante a reali- física para se descartar a presença de
casos ocorre uma força compressiva zação de exercícios resistidos, como dor e outras patologias na articulação
na articulação patelofemoral, respon- os estudos de Serrão et al.5 e Gramani- do joelho, sendo o membro inferior
sável pela sensação dolorosa5. Say et al.(2006) 19 – que avaliaram a dominante avaliado nesse grupo. Os
ativação desses músculos durante critérios de inclusão no grupo experi-
Apesar de bastante comum, a SDPF mental foram diagnóstico médico de
ainda tem etiologia desconhecida, exercícios resistidos com diferentes
posicionamentos de rotação do quadril; SDPF, sem lesões associadas de joe-
embora alguns autores relatem alte- lho; e relatar dor em pelo menos duas
e outros, como o estudo de Coqueiro
rações biomecânicas dos membros in- das seguintes atividades: subir e des-
et al.18, não encontraram ativação se-
feriores como principal causa. Dentre cer escadas, agachar, ajoelhar-se, per-
letiva do VMO nos exercícios de semi-
essas alterações destacam-se as rela- manecer sentada por tempo prolonga-
agachamento com e sem adução do
cionadas ao equilíbrio estático, como do, pular e correr. A dor deveria ser
quadril, ocorrendo, no entanto, maior
pronação subtalar excessiva, aumen- de início insidiosa, não-traumática e
equilíbrio entre a ativação do VM e
to do ângulo Q, torção tibial externa, referida, na articulação femoropatelar
do VL no agachamento associado com
retração do retináculo lateral e com- na última semana, como pelo menos 2
adução do quadril.
portamento patelar inadequado6. Al- cm em escala visual analógica. Caso
guns autores apontam ainda a relação Pesquisas envolvendo sujeitos com apresentassem dor no joelho bilateral-
da rotação do quadril na atividade do e sem SDPF avaliando a atividade mente, o joelho com maior dor referi-
vasto medial oblíquo (VMO) e vasto eletromiográfica do VMO e VLO po- da subjetivamente foi avaliado. Não
lateral (VL)5,7. Umas das características deriam apresentar resultados mais pre- foram incluídas voluntárias com his-
mais comuns da SDPF é a insuficiência cisos quanto ao tratamento dessa pa-
tória de cirurgia no membro inferior,
ou desequilíbrio entre os estabilizadores tologia, uma vez que esses músculos
subluxação ou deslocamento patelar,
dinâmicos mediais e laterais da pate- são apontados em alguns estudos como
evidência clínica de lesão meniscal,
la, causando um deslizamento e mau antagonistas na estabilização patelar11.
patelar e/ou ligamentar, ou que haviam
alinhamento patelar8,9. Levando em consideração a falta de
realizado tratamento fisioterápico pré-
consenso na literatura sobre a ação dos
Sabe-se que o vasto medial (VM) é vio no último semestre.
exercícios resistidos no recrutamento
dividido em duas porções, o vasto seletivo do VMO, o presente estudo As 20 voluntárias formaram assim
medial longo (VML) e o vasto medial visou avaliar, por meio de eletromio- dois grupos: o grupo controle com 10
oblíquo (VMO), sendo este inserido no grafia, se algum exercício, dentre dez mulheres saudáveis (média de idade
bordo súpero-medial da patela, atuan- exercícios comumente usados na prá- 22,5±1,58 anos; peso médio 52,1±7,18
do assim na medialização desta10. O tica clínica, era capaz de produzir em Kg e altura média 1,61±0,06 m); e o
vasto lateral (VL), por sua vez, tam- indivíduos com SDPF uma ativação experimental, com 10 mulheres com
bém é apresentado em alguns estudos seletiva do VMO. SDFP (média de idade 24,7±4,35 anos;
com duas divisões: o vasto lateral lon- peso médio 61,6±12,27 Kg e altura
go (VLL) e o obliquo (VLO)5,6. As fibras média 1,66±0,06 m). A análise esta-
do VLO têm sua inserção inferior e METODOLOGIA tística utilizando o teste t de Student
lateral ao tendão do VLL, unindo-se não revelou diferenças antropométri-
O estudo foi um ensaio clínico
com este na borda súpero-lateral da cas entre os grupos.
randomizado controlado cego, reali-
patela 11.
zado entre os meses de dezembro de Todas as voluntárias foram previa-
A atividade eletromiográfica dos 2006 e abril de 2007, no Hospital mente informadas sobre os objetivos
músculos VMO e VLL tem sido bas- Universitário da UFRN (Universidade da pesquisa e assinaram um termo de
tante estudada em cadeia aberta nos Federal do Rio Grande do Norte). consentimento livre e esclarecido; o

158 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :157-63


Bessa et al. Atividade do VMO na síndrome da dor patelofemoral

estudo foi aprovado pelo Comitê de Antes da avaliação eletromiográfica 6 Extensão isocinética de joelho
Ética em Pesquisa do Hospital Univer- as voluntárias foram submetidas à pre- dos últimos 90º em CCA com tí-
sitário Onofre Lopes, da UFRN. paração da pele com tricotomização bia em rotação neutra;
e limpeza da área com álcool a 70%. 7 Agachamento unipodal (sobre o
Instrumentos Os eletrodos foram untados com gel
condutor e fixados sobre os pontos
membro a ser testado) apoiado
na bola-suíça até 45º de flexão
Foi utilizado um módulo condicio- motores do VMO, VLO e VLL com fita do joelho, com tíbia em rotação
nador de sinais de 4 canais (EMG adesiva e reforçados com tiras de neutra;
System do Brasil Ltda.) interfaceado velcro, para evitar seu deslocamento
com um microcomputador, que rece- durante a realização dos procedimen- 8 Agachamento unipodal (sobre o
beu o sinal eletromiográfico e o arma- tos. Os eletrodos para o VMO e para membro a ser testado) apoiado
o VLL foram posicionados segundo os na bola-suíça até 45º de flexão
zenou em arquivo, além do software
critérios do Seniam *22. O posiciona- do joelho, com rotação medial
AqDados® (v. 5.0) para análise digital
mento dos eletrodos no VLO foi o de tíbia;
de sinais. Foram utilizados, para a
captação da atividade elétrica dos mesmo utilizado por Bevilaqua-Grossi 9 Agachamento unipodal (sobre o
músculos, eletrodos ativos de superfí- et al.11, a 2,2 cm do epicôndilo lateral membro a ser testado) apoiado
cie diferencial simples (EMG System do fêmur entre o início e meio do ven- na bola-suíça até 45º de flexão
do Brasil Ltda.), compostos por duas bar- tre muscular do VLO, com uma incli- do joelho, com rotação lateral
ras paralelas retangulares de Ag/AgCl, e nação de 50º. O eletrodo de referên- de tíbia;
um eletrodo de referência tipo garra. cia, também untado com gel condu-
10 Agachamento com bola-suíça
O ganho foi de 1000 vezes, sendo 20 tor, foi posicionado sobre o maléolo
sustentado até 45º de flexão do
no eletrodo ativo e 50 no conversor medial do membro contralateral.
joelho, posição neutra, com
A/D. A taxa de aquisição do sinal foi As voluntárias realizaram cada adução isométrica contra resis-
de 1000 Hz, sendo passado um filtro exercício uma única vez, para evitar tência de uma bola.
entre 20-500 Hz. Um goniômetro uni- os efeitos de fadiga e/ou aprendiza-
versal foi utilizado para monitorar a O sinal eletromiográfico foi norma-
gem motora, sendo a posição mantida
amplitude da articulação do joelho lizado em cadeia cinética aberta pela
por cinco segundos, com um interva-
em todos os exercícios propostos no contração voluntária máxima (CVM),
lo de um minuto entre os exercícios.
estudo. Um dinamômetro isocinético com o joelho da participante posicio-
Foram desprezados o primeiro e o úl-
nado a 60º de flexão (considerando-
(Medisa ®, Espanha) foi utilizado na timo segundo de coleta visando me-
se zero a extensão completa), já que
realização dos exercícios de cadeia lhor análise do sinal com a respectiva esse ângulo tem demonstrado gerar o
cinética aberta (CCA). atividade elétrica. Os exercícios pro- maior torque isométrico do joelho23.
postos foram:
Procedimentos 1 Extensão isométrica voluntária
Após ampla revisão da literatura, os
exercícios foram selecionados e con-
máxima com o joelho a 60º, tí- frontados com a prática clínica, sen-
Todas as voluntárias foram subme-
bia em rotação neutra; do avaliados como os mais usados
tidas a uma avaliação clínica prévia,
considerando os critérios de inclusão. 2 Extensão isocinética de joelho para se obter uma ativação seletiva
O estudo consistiu em propor à volun- dos últimos 30º em CCA, com do VMO em sujeitos com SDFP. A or-
tária um exercício uma vez, solicitar- tíbia em rotação neutra; dem destes foi aleatória para cada
lhe que mantivesse a posição em con- voluntária, com o intuito de não gerar
3 Extensão isocinética de joelho
tração voluntária máxima durante 5 fadiga nem aprendizado motor, sendo
dos últimos 30º em CCA, com
os exercícios em CCA realizados no
segundos e medir a atividade ele- rotação medial de tíbia;
dinamômetro isocinético (a 30º/s); as
tromiográfica dos músculos VMO, 4 Extensão isocinética de joelho voluntárias foram estabilizadas na
VLO e VLL nessa posição. dos últimos 30º em CCA, com cadeira por meio de cintos de velcro
Antes da realização dos exercícios rotação lateral de tíbia; nas regiões torácica e pélvica. Os
as voluntárias foram submetidas a 5 Extensão isocinética de joelho exercícios de agachamento foram rea-
aquecimento em bicicleta estacionária dos últimos 60º em CCA, com lizados com auxílio da bola-suíça, vi-
por cinco minutos, com selim posicio- tíbia em rotação neutra; sando aumentar a instabilidade e fa-
nado na altura do trocânter maior do cilitar o deslizamento do sujeito até a
fêmur e sem resistência; em seguida angulação desejada, o que aumenta
foi realizado alongamento passivo do * Seniam, ou Surface electromyography for
o nível de atividade muscular nos
quadríceps femoral, isquiotibiais, tríceps the non-invasive assessment of muscles membros inferiores.
sural e adutores (duas séries de alon- (Eletromiografia de superfície para
avaliação não-invasiva de músculos), é um
Todas as voluntárias foram instruí-
gamentos sustentados por 30 segundos, projeto da União Européia para das sobre a forma de realizar cada
com intervalo entre as séries de um padronização da metodologia de utilização exercício e receberam um comando
minuto). de eletromiografia. para iniciar a contração logo após o

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :157-63 159


Grupo com SDPF eletromiógrafo ser acionado. Durante
VMO
* VLL todo o experimento foi oferecido co-
100 * VLO
100 mando verbal solicitando contração
voluntária máxima.
80
80
Análise estatística
Percentual da CVM
Percentual da CVM

60
60 Para a análise estatística foi utili-
zado o software SPSS® 14.0. A norma-
lização dos dados foi verificada pelos
40 procedimentos da estatística descriti-
va utilizando-se o teste de Shapiro-
Wilks. A relação VMO/VLO expressa
20
a média entre os valores obtidos em
todos os exercícios avaliados; foi cal-
0 culada para cada grupo. A análise foi
Ex 1 Ex 2 Ex 3 Ex 4 Ex 5 Ex 6 Ex 7 Ex 8 Ex 9 Ex10 realizada por testes paramétricos. A
diferença entre os vastos foi calcula-
Gráfico 1 Atividade eletromiográfica dos músculos VMO, VLL e VLO no grupo da utilizando-se uma ANOVA com o
controle durante os exercícios propostos (*p<0,05). valor de RMS normalizado, seguido
CVM = Contração voluntária máxima; Ex = Exercício; pelo teste de Tukey, quando indicado.
Ex 1= Extensão isométrica máxima com joelho a 60º; Em todas as análises foi adotado o ní-
Exs 2,3 e 4 = Extensão isocinética de joelho dos últimos 30º, com vel de significância p=0,05.
tíbia em rotação neutra, medial e lateral; Exs 5 e 6 = Extensão
isocinética de joelho dos últimos 60º e 90º, tíbia neutra;
Exs 7, 8 e 9 = Agachamento unipodal com tíbia em rotação neutra, RESULTADOS
medial e lateral; Ex 10 = Agachamento com adução isométrica.
O estudo mostrou que a atividade
eletromiográfica dos músculos VMO
140
140 Grupo controle VMO
VLL
e VLO é menor no grupo com SDPF
VLO em oito dos dez exercícios avaliados
*
** (Gráfico 1), quando comparada à do
120
120 grupo controle (Gráfico 2).

100
Observando-se os gráficos, perce-
be-se que não foi encontrado, em qual-
quer dos exercícios avaliados, um que
Percentual da CVM
Percentual da CVM

80 proporcionasse recrutamento seletivo


para o VMO. Houve porém ativação
60 seletiva do VLO nos exercícios 2
(p=0,02) e 10 (p=0,004) no grupo con-
40 trole e nos exercícios 3 (p=0,05) e 4
(p=0,03) entre as voluntárias com
SDPF.
20
Constatou-se ainda que há maior
ativação do VLO em relação ao VMO
0
entre sujeitos saudáveis e com SDPF:
Ex 1 Ex 2 Ex 3 Ex 4 Ex 5 Ex 6 Ex 7 Ex 8 Ex 9 Ex 10
a razão VMO/VLO no grupo controle
foi de 0,82±0,12 e, no grupo SDPF,
Gráfico 2 Atividade eletromiográfica dos músculos VMO, VLL e VLO no grupo 0,63±0,10 (p=0,002, Gráfico 3).
com SDPF durante os exercícios propostos (*p<0,05; **p<0,01).
SDPF = Síndrome da dor patelofemoral; CVM = Contração voluntária A relação VMO/VLL encontra-se
máxima; Ex = Exercício; Ex 1= Extensão isométrica máxima com próxima de um, sendo de 1,10±0,2
joelho a 60º; Exs 2,3 e 4 = Extensão isocinética de joelho dos últimos para os sujeitos saudáveis e de
30º, com tíbia em rotação neutra, medial e lateral; Exs 5 e 6 = Extensão 1,01±0,17 para os portadores de SDPF,
isocinética de joelho dos últimos 60º e 90º, tíbia neutra; não se encontrando resultado estatis-
Exs 7, 8 e 9 = Agachamento unipodal com tíbia em rotação neutra, ticamente significativo para a ativa-
medial e lateral; Ex 10 = Agachamento com adução isométrica. ção seletiva desses músculos.

160 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :157-63


Bessa et al. Atividade do VMO na síndrome da dor patelofemoral

1 benéfico quando estudado em pesso-


0,9
0,9 as saudáveis, na verdade iria aumen-
0,8
0,8
** tar o desequilíbrio muscular na pre-
sença de uma patologia.
Relação VMO/VLO

0,7
0,7
Relação VMO/VLO

0,6
0,6 Bevilaqua-Grossi et al.11, ao avaliar
sujeitos saudáveis, encontraram uma
0,5
0,5
maior ativação do VMO e VLO quan-
0,4
0,4 do comparados ao VLL durante exer-
0,3
0,3 cício resistido, dado este que apóia o
0,2
0,2 presente estudo, onde foi encontrada
0,1 a mesma relação nos sujeitos saudá-
0,1
veis. Porém, em portadores da SDPF,
00
Controle Com SDPF
a ativação do VMO é próxima à do
VLL; e a do VLO encontra-se estatisti-
Gráfico 3 Relação VMO/VLO (média entre os valores obtidos em todos os camente mais elevada. Isso reforça a
exercícios) no grupo controle e no grupo com síndrome da dor idéia do VLO como estabilizador la-
patelofemoral (SDPF) (**p<0,01) teral da patela, em virtude de sua
maior atividade quando comparado às
demais porções dos vastos em pesso-
DISCUSSÃO com rotação medial e lateral da tíbia
– coincidem com os de Mirzabeigi et as com SDPF, sendo responsável pelo
al.17 e de Bevilaqua-Grossi et al.11, se- o mau alinhamento patelar.
Segundo Sperandei 24 , a ativação
seletiva do VMO é entendida como gundo os quais os últimos graus de O presente estudo também sugere
uma maior solicitação desse músculo extensão não promovem a ativação que, mesmo em sujeitos assintomáti-
em relação ao vasto lateral durante a seletiva do VMO, o que contribui para cos, a relação VMO/VLO é menor que
execução de um dado exercício. Neste um mau alinhamento patelar – o que, um (0,82), apresentando-se uma rela-
estudo, não foi encontrado exercício no presente estudo, foi acentuado pela ção ainda menor (0,69) nos portado-
algum, dentre os propostos, que pro- maior ativação do VLO. Assim, refor- res da SDPF. Sugerimos que novos es-
porcionasse ativação seletiva do ça-se a idéia de que os exercícios de tudos sejam realizados, com uma
VMO. Esse achado coincide com o de extensão do joelho nos últimos graus, amostra maior, para verificar o valor
Ribeiro et al.25 que, ao utilizarem exer- por promoverem maior ativação do da relação VMO/VLO em diversas ati-
cícios resistidos de extensão de joe- VLO, não devam ser utilizados no tra- vidades, de modo a se poder estabe-
lho em diferentes velocidades, não tamento de pacientes com SDFP. lecer a real relação entre esses mús-
encontraram maior ativação do VMO Observaram-se ainda valores mais culos na dinâmica normal de estabili-
em caso algum. baixos da relação VMO/VLO no gru- zação patelar.
po experimental, o que é reforçado por
No presente estudo foi observada,
outros estudos segundo os quais o dese-
em alguns exercícios, ativação sele-
quilíbrio muscular entre os estabi- CONCLUSÃO
tiva do VLO (no grupo controle os exer-
lizadores dinâmicos da patela poderiam O presente estudo mostrou não ha-
cícios 2 e 10 e, no experimental, os
predispor à SDPF26-30. Nos exercícios 8 e ver exercício seletivo para o VMO
exercícios 3 e 4). Com relação à maior 9 – de agachamento com rotação medial
ativação do VLO no exercício 10, há dentre os avaliados. No entanto, enfa-
e lateral da tíbia –, a relação VMO/ tizou a ação do VLO como antagonis-
uma discordância com os achados de VLO nas voluntárias com SDPF foi
Coqueiro et al.18, que também avalia- ta do VMO na estabilização da pate-
próxima àquela encontrada nas sau-
ram mulheres com a síndrome e en- la, sendo este um importante fator no
dáveis, mostrando esses exercícios
contraram maior ativação do VMO surgimento da SDPF. Assim, para o tra-
com melhor relação VMO/VLO (levan-
e VLL durante realização do mesmo tamento da SDPF o que se deve pro-
do-se em consideração a média de
exercício, comparado ao agachamen- curar não é o exercício em que o VMO
0,81 como normal) serem os mais in-
to sem adução. É provável que essa apresente maior amplitude de ativa-
dicados para o tratamento de pacien-
diferença se deva ao posicionamento ção e sim aquele que ofereça uma
tes com SDFP.
dos eletrodos no VMO e VLL ou, ain- razão VMO/VLO mais próxima de um,
A diferença entre os valores encon- com conseqüente maior estabilidade
da, pelo fato de o referido estudo não
trados para os dois grupos sugere que ativa da patela. Dessa forma, dentre
ter avaliado a atividade eletromiográ-
não há validade em aplicar conheci- os exercícios propostos, os de agacha-
fica do VLO.
mentos retirados de pesquisas com mento unipodal com rotação medial
No presente estudo em portadoras sujeitos saudáveis em portadores da e lateral da tíbia foram os que mais se
da síndrome, o achado de exercícios SDPF. Isso ocorre devido à diferença aproximaram dessa relação, sugerin-
que priorizaram o recrutamento do de comportamento de ativação mus- do que sejam os mais recomendados
VLO – 3 e 4, de extensão do joelho cular: um exercício que pareceria ser para o tratamento da SDPF.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :157-63 161


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Fisioter Pesq. 2008;15(2) :157-63 163


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.164-71, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Validação da versão para a língua portuguesa do questionário de Medida


Funcional para Amputados (Functional Measure for Amputees Questionnaire)
Brazilian-Portuguese validation of the Functional Measure
for Amputees Questionnaire
Eneida Ritsuko Ono Kageyama1, Mariana Yogi2, Celisa Tiemi Nakagawa Sera3, Leda Shizuka Yogi1,
André Pedrinelli4, Olavo Pires de Camargo5

Estudo desenvolvido no RESUMO: O objetivo deste estudo foi traduzir e adaptar culturalmente o Functional
Instituto de Ortopedia e Measure for Amputees Questionnaire (FMA) para a população brasileira e
Traumatologia do Hospital das analisar sua validade e eficácia quando aplicado em pacientes amputados de
Clínicas da FMUSP – membro inferior. O procedimento seguiu as etapas de tradução, retro-tradução,
Faculdade de Medicina da análise das versões português e inglês por um comitê multidisciplinar, e pré-
Universidade de São Paulo, teste. O questionário traduzido foi aplicado em 44 pacientes (39 homens e 5
São Paulo, SP, Brasil mulheres) com amputação em nível transtibial (N=27) e transfemoral (N=17),
1 com idade média de 47,5±17,2 anos. No estudo da confiabilidade, em média,
Fisioterapeutas Ms. do Instituto
de Ortopedia e Traumatologia os coeficientes Kappa foram superiores a 0,80; e 25% deles foram iguais a 1,0,
da FMUSP indicando haver excelente concordância inter e intra-entrevistadores. Na
análise da consistência interna, o valor do coeficiente para a questão sobre o
2
Graduanda na Faculdade de Índice de Capacidade Locomotora foi igual a 0,79, demonstrando haver
Medicina do ABC, Santo consistência no bloco de questões relacionadas à mobilidade. A adaptação
André, SP, Brasil transcultural foi satisfatória; algumas modificações foram necessárias, porém
sem implicar mudança na estrutura ou no conteúdo do questionário original.
3
Profa. Dra. do Depto. de Os resultados sugerem que a versão brasileira do FMA, MFA – questionário de
Fisioterapia, Fonoaudiologia e Medida Funcional para Amputados pode ser um instrumento confiável para
Terapia Ocupacional da medir o resultado funcional de pacientes brasileiros reabilitados após
FMUSP amputação de membro inferior.
4
Prof. Dr. do Instituto de DESCRITORES: Amputação/reabilitação; Estudos de validação; Questionários
Ortopedia e Traumatologia da
FMUSP ABSTRACT: The aim of this study was to translate into Brazilian-Portuguese and
5
culturally adapt the Functional Measure for Amputees Questionnaire (FMA),
Prof. Titular do Instituto de also testing its reliability and validity for assessing lower-limb amputees
Ortopedia e Traumatologia da functional capacity. The FMA was translated, back-translated, evaluated by a
FMUSP multidisciplinary committee, and pre-tested. The final version was submitted
to field test on a group made up of 44 subjects (39 men and 5 women) with
ENDEREÇO PARA transtibial (N= 27) and transfemoral (N=17) amputation level. The inter- and
CORRESPONDÊNCIA
intra-examiner test showed high reliability; Kappa mean values were higher
Eneida R. O. Kageyama
than 0.80; and in 25% of the items values reached 1.0, thus suggesting excellent
R Ovídio Pires de Campos, 333
Cerqueira César examiner agreement. Question 2 (which determines the Locomotor Capabilities
05403-010 São Paulo SP Index) internal consistency value found was 0.79, showing consistency as to
e-mail: mobility assessment. The FMA cultural adaptation was satisfactory; a few
eneidaono@yahoo.com.br; changes were needed, without altering the original structure or content. Results
ledasyogi@hotmail.com suggest that the FMA Brazilian-Portuguese version is a reliable instrument to
measure functional outcomes of Brazilian lower limb amputees having
Esta é uma versão abreviada undergone rehabilitation.
da dissertação da autora 1, KEY WORDS: Amputation/rehabilitation; Questionnaires; Validation studies
apresentada à FMUSP para
obtenção do título de Mestre
em Ciências, sob orientação
do autor 5.

APRESENTAÇÃO
fev. 2008
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO
maio 2008

164 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :164-71


Kageyama et al. Validação de questionário para amputados

INTRODUÇÃO nas parcialmente comparáveis uns


com os outros.
a 18 anos; amputação no nível trans-
tibial ou transfemoral; ter completa-
A perda da capacidade de realizar do o processo de reabilitação há pelo
O objetivo deste estudo foi desen-
a marcha normal é a principal limita- menos seis meses, com prótese; ter
volver uma versão transcultural do
ção do indivíduo com amputação de capacidade para compreender as ins-
Functional Measure for Amputees
membro inferior, dificultando a reali- truções e responder verbalmente o
Questionnaire para a língua portugue-
zação das atividades funcionais ne- questionário. Critérios para exclusão:
sa e analisar sua confiabilidade quan-
cessárias à independência pessoal. A foram excluídos os pacientes que, após
do aplicado, após a reabilitação, em
reabilitação visa evitar que a condi- a primeira e a segunda aplicações do
pacientes amputados de membro in-
ção física se deteriore e que o indiví- questionário, não retornaram para a
ferior.
duo com amputação possa ser reinte- terceira entrevista. Todos os sujeitos
grado à sociedade. Isso envolve a assinaram o termo de consentimento
melhora da mobilidade, capacitação
para o uso da prótese e realização das
METODOLOGIA livre e esclarecido, aprovado pela
Comissão de Ética para Análise de
atividades de vida diária e prática, res- O procedimento seguiu as etapas: Projetos de Pesquisa do Hospital das
tabelecendo todo o seu potencial funcio- tradução para o português, retro-tra- Clínicas da FMUSP.
nal. A avaliação funcional é de grande dução, análise das versões por um A primeira e a terceira entrevistas
importância para mensurar o resulta- comitê multidisciplinar e pré-teste. A foram realizadas pela pesquisadora
do do processo de reabilitação e dos tradução do Functional Measure for (entrevistador 1) e a segunda por um
programas de tratamentos propostos. Amputees Questionnaire (FMA) foi profissional que atuava na mesma
Ao avaliar a população de pacientes realizada separadamente pela pesqui- área (entrevistador 2). Todas as entre-
com amputação, é importante consi- sadora e por dois professores de inglês, vistas foram conduzidas individual-
derar todos os aspectos: idade, sexo, brasileiros e cientes da finalidade da mente, sendo permitida a presença de
biótipo, nível da amputação, causa, pesquisa. A tradução considerou os um acompanhante sempre que o pa-
existência de doença associada, con- aspectos lingüísticos e o significado ciente desejasse, porém sem interfe-
dição socioeconômica e cultural e, atribuído aos termos de acordo com a rência na resposta. Para avaliação da
também, as expectativas do sujeito. realidade da população brasileira. As confiabilidade teste-reteste, os entre-
Em geral, os protocolos de avaliação três versões foram analisadas em con- vistadores 1 e 2 aplicaram o questio-
usados levam em consideração ape- junto, gerando a versão 1. Esta foi nário no mesmo dia, com um intervalo
nas a força muscular e a amplitude retro-traduzida por dois professores de de 45 minutos entre uma entrevista e
de movimento dos segmentos envol- inglês nativos, para averiguar se exis- outra. Posteriormente, uma nova apli-
vidos, bem como o padrão de marcha tia divergência no significado e no cação, com intervalo médio de 18,5
após a protetização. Pouco se sabe se conteúdo entre as versões original e dias (7 a 30 dias) foi realizada pelo
os pacientes, após a alta, continuam traduzida. Dessa forma gerou-se a entrevistador 1.
a usar a prótese; tampouco se tem in- versão 2, que foi avaliada por um co-
formação acerca do impacto dos di- mitê multidisciplinar constituído por Os dados das respostas foram trata-
ferentes programas de tratamento so- cinco profissionais com conhecimen- dos estatisticamente Para análise da
bre a recuperação da função ou dos tos da área abordada (dois fisiotera- confiabilidade inter e intra-entrevista-
fatores que podem predizer o uso ou peutas, um médico, um enfermeiro e dor foi utilizado o coeficiente Kappa8.
não da prótese. um professor de inglês). Foram reali- Para as variáveis ordinais foi calcula-
zadas análise de equivalência semân- do o coeficiente Kappa ponderado9.
Não existe um padrão ouro de ava- Para a 4a questão (número de horas de
tica e idiomática e análise cultural e
liação funcional para pacientes com uso da prótese), foram criadas cate-
conceitual. A análise de todos os itens
amputação de membro inferior e, no gorias delimitadas por seus quartis: (0
gerou a versão 3, que foi aplicada em
Brasil, não há qualquer instrumento a 7), (8 a 10), (11 e 12) e (13 a 20). O
um pré-teste com 10 pacientes, utili-
desenvolvido ou traduzido. Muitos auto- escore obtido na questão 2, que in-
zando-se a técnica da prova7.
res buscam definir um método ideal uti- quire sobre 14 movimentos do dia-a-
lizando escalas ou questionários para Após o pré-teste, a versão consoli- dia, fornece o Índice de Capacidade
outras doenças e os adaptam a seus es- dada do questionário (Anexo 1) foi Locomotora; sua consistência interna
tudos; outros desenvolvem instrumentos aplicada em entrevista, três vezes a foi testada pelo coeficiente alfa de
e avaliam suas propriedades psicomé- uma amostra de 44 pacientes, com Cronbach10.
tricas, como o Functional Independence predominância do sexo masculino
Measure (FIM), Reintegration Normal (88,6%), média de idade 47,5±17,2
Living (RNL), Prosthetic Profile of the
Amputee (PPA), Prosthesis Evaluation
anos, matriculados no Grupo de
Próteses e Órteses do Instituto de Or-
RESULTADOS
Questionnaire (PEQ), Functional Measure topedia e Traumatologia do Hospital Os valores do coeficiente Kappa
for Amputees Questionnaire (FMA), das Clínicas da FMUSP – Faculdade para as variáveis do estudo podem ser
Índice de Barthel e outros1-6. As es- de Medicina da Universidade de São observados na Tabela 1, tanto para a
calas e questionários diferem na for- Paulo. Os critérios utilizados para in- concordância inter- como intra-
ma de medir os resultados e são ape- clusão foram: idade igual ou superior entrevistador.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :164-71 165


Considerando somente os valores de Tabela 2 Valores observados (média, desvio padrão DP, mínimo, 1o quartil,
Kappa inter- e intra-entrevistador mai- mediana, 3o quartil e máximo) para os coeficientes Kappa obtidos na
ores do que zero (Tabela 1), foram análise de confiabilidade interentrevistador e intra-entrevistador
calculados a média, desvio padrão,
Confiabilidade N Média DP Mínimo 1o quartil Mediana 3 o quartil Máximo
mínimo, 1o quartil, mediana, 3o quartil
Inter-entrevistador 38 0,81 0,24 0,21 0,67 0,88 1,00 1,00
Tabela 1 Valores do coeficiente Kappa
(média e erro padrão, EP) Intra-entrevistador 36 0,82 0,21 0,25 0,67 0,87 1,00 1,00
obtidos em cada questão, no
estudo da concordância e máximo. Verificou-se que, em mé-
dia, os coeficientes Kappa foram su-
DISCUSSÃO
interentrevistador (Inter) e
intra-entrevistador (Intra) periores a 0,80; e, ainda, 75% dos Após a reabilitação, o objetivo prin-
coeficientes calculados foram superi- cipal dos pacientes com amputação
Questão Inter Intra ores a 0,67, mostrando que a concor- é obter uma deambulação ativa, in-
* Kappa EP Kappa EP dância foi pelo menos moderada. dependente e o mais fisiológica possí-
1 Além disso, mais de 25% foi igual a vel, com o uso de prótese. O resultado
2a 0,66 0,01 um, indicando uma concordância ex- funcional dos amputados protetizados
2b 0,88 0,07 0,56 0,23 celente. Esses resultados são represen- é multifatorial, ou seja, depende de
2c 0,72 0,13 0,86 0,07 tados na Tabela 2. fatores físicos, emocionais, sociais e
2e 1 0 Para análise da consistência inter- do tipo de prótese prescrita. A vi-
2f 0,21 0,22 0,88 0,13 na da questão 2 foi calculado o coefi- vência dos autores na área que envol-
2g 0,95 0,06 0,51 0,25 ciente a de Cronbach. O Gráfico 1 ve as amputações levou a questionar
2k 1 0 mostra os dados referentes ao Índice os métodos habituais de avaliação
2l 0,84 0,1 0,74 0,14 da Capacidade Locomotora, ou seja, funcional, pois verifica-se que, quan-
2m 0,84 0,1 0,74 0,14 a soma dos valores de cada item da do reavaliados seis meses após a alta
2n 0,94 0,05 0,34 0,24 questão 2 nas três entrevistas, repre- da fisioterapia, alguns apresentavam
3a 1 0 1 0 sentando a escala de mobilidade de melhor padrão de deambulação e re-
3b 0,72 0,17 0,67 0,17 cada paciente. torno às atividades sociais, enquanto
3c 0,58 0,17 0,63 0,17 outros queixavam-se de dor ou descon-
Considerando as respostas obtidas
4a 0,84 0,06 0,81 0,07 forto, necessitando de meio auxiliar
pelo entrevistador 1, o valor do coefi-
4b 0,87 0,09 0,81 0,07 para deambular, e continuavam afas-
ciente para a questão 2 foi igual a 0,79;
5a 1 0 0,91 0,89 tados do convívio social.
o intervalo de confiança de 95% foi
5b 0,25 0,41 0,25 0,41 de 0,69 a 0,87. O coeficiente a de Os estudos disponíveis em geral
5c 0,25 0,41 1 0 Cronbach varia de 0 a 1; valores maiores utilizam escalas de avaliação desen-
5d 1 0 1 0 ou iguais a 0,70 indicam consistência volvidas para medir a função nas ati-
5e 1 0 1 0 interna, portanto pode-se afirmar que vidades de vida diária e prática, dor,
5f 0,67 0,29 1 0 houve consistência no bloco de ques- lazer e transporte. Na busca por um
5g 0,4 0,28 0,67 0,29 tões relacionadas à mobilidade. instrumento de avaliação funcional
5h 0,57 0,35
5i 1 0 1 0
6a 1 0 1 0 42
6b 0,64 0,22 0,78 0,16 *
40 *
6c 0,85 0,15 0,54 0,24
Índice da capacidade locomotora

7a 0,88 0,12 0,73 0,18 38


7b 1 0 1 0 *
*
7c 1 0 36 * *
7d 1 0 1 0
7e 0,5 0,38 34
7g 0,5 0,38 1 0 * *
32 *
7h 1 0 1 0
7i 1 0 1 0 *
30 *
8 0,83 0,08 0,68 0,09 *
9 0,88 0,06 0,81 0,08 28
10D 0,98 0,02 0,98 0,02 * *
26
10F 1 0 1 0
13 1 0 1 0
1a entrevista 2a entrevista 3a entrevista
* Os itens e questões que não aparecem na
Tabela correspondem a respostas Gráfico 1 Escore total na questão 2 (índice da capacidade locomotora) nas
insuficientes para tratamento estatístico. três entrevistas (* = outliers)

166 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :164-71


Kageyama et al. Validação de questionário para amputados

capaz de mensurar resultados, não foi dades que requerem uso da perna: o ori- 42 pontos), foi considerada adequada
encontrado consenso sobre a melhor ginal cita os exemplos de atividade para análise da consistência interna,
maneira de avaliar os fatores que in- gardening, walking the dog, golfing, obtendo-se coeficiente igual a 0,79 –
terferem no uso ou desuso da prótese bowling, riding, racket sports, curling*, demonstrando haver consistência in-
pelos pacientes quando desligados da não comuns no Brasil, muito menos terna. Esse resultado indica que é pos-
reabilitação 11 . na população atendida pela institui- sível avaliar a mobilidade dos paci-
ção. Os exemplos, considerados ina- entes que usam prótese por meio do
Além do FMA – Functional Measure
dequados, foram excluídos. Após o pré- Índice da Capacidade Locomotora.
for Amputees, os questionários como
teste e avaliação, observou-se que Na amostra, todos os participantes
Prosthetic Profile of the Amputee (PPA)
ocorreu grande heterogeneidade nas usavam a prótese regularmente e o
e Prosthesis Evaluation Questionnaire
respostas à questão nas três entrevis- resultado foi acima de 40 pontos, con-
(PEQ) foram criados especificamente
tas, possivelmente por dificuldade de siderado um bom índice de mobilida-
para pacientes amputados, mas ne- compreensão. Após reformulação, a de, assim como encontrado por
nhum foi validado para a língua portu- questão foi testada em outros 10 paci- Franchignoni et al.14.
guesa. Para a escolha de uma escala a entes e o resultado mostrou-se aplicá-
ser traduzida e utilizada em nosso meio, Nas questões 5, 7, 11 e 12, consti-
vel, porém a amostra deve ser ampli-
considerou-se a facilidade de aplica- tuídas de vários itens de possíveis res-
ada para sua confirmação. As respos-
ção, rapidez e avaliação de aspectos postas para o não-uso da prótese, hou-
tas não foram coerentes com o estado
relevantes referentes ao uso da prótese. ve um reduzido número de respostas,
funcional, por exemplo: alguns respon-
O questionário FMA apresentava as pois todos a utilizavam, situação tam-
deram que tinham abandonado todas
características ideais, enquanto o PPA bém observada por Callaghan et al.1.
as atividades habituais após a ampu-
foi excluído por ser muito extenso e o tação mas, ao mesmo tempo, eram Os instrumentos descritos na litera-
PEQ foi descartado principalmente pela totalmente independentes com a tura, inclusive o questionário original
utilização de respostas baseadas em prótese e realizavam todas as ativi- FMA, são auto-aplicáveis e em geral
escala visual analógica, não muito bem dades da vida diária. No questionário enviados pelo correio1,14,15. Consideran-
compreendida em nossa população – original, os próprios autores sugerem do que a população usuária do siste-
dadas as características de baixa esco- a reestruturação da questão 13 com ma de saúde pública em nosso país
laridade e nível socioeconômico – po- um índice similar ao da Capacidade apresenta baixo nível socioeconômico
dendo levar a respostas contraditórias. Locomotora, que representaria a ex- e educacional, além de freqüente
Traduzir simplesmente o original tensão com que as atividades e os in- mudança de endereço, optamos pela
inglês para outra língua não é adequa- teresses dos amputados foram afeta- entrevista, garantindo não só a com-
do devido às diferenças lingüísticas e dos pela amputação e uso da prótese1. preensão das perguntas como a obten-
culturais. A adaptação transcultural ção das respostas.
Quanto à reprodutibilidade, em
inclui tradução, ajustamento das pa- média os coeficientes Kappa foram Este estudo limitou-se a pacientes
lavras, do idioma e do contexto, pos- superiores a 0,80; e 75% dos coefici- do Hospital das Clínicas. É importan-
sivelmente envolvendo uma comple- entes calculados foram superiores a te salientar a necessidade de conti-
ta transformação de alguns itens, de 0,67; e 25% foram igual a 1, indican- nuidade desta pesquisa, aplicando o
maneira a manter o mesmo concei- do concordância perfeita intra e inter- questionário em uma amostra mais
to12. Muitos questionários traduzidos entrevistador. Houve um período de ampla, buscando identificar melhor os
apresentam erros devido à tradução até 30 dias entre as avaliações, po- fatores que interferem no resultado
inadequada de frases coloquiais, jar- dendo ter-se alterado nesse entre- funcional desses pacientes. Expandir
gões, expressões idiomáticas comu- tempo a capacidade funcional do pa- o conhecimentos na área da reabili-
mente usadas em inglês, que pode ciente, tanto positivamente, pela me- tação de amputados poderá contribuir
afetar sua validade 13 . Foram então lhora da capacidade no uso da prótese, para analisar o custo e benefício da
necessárias modificações nos enunci- quanto negativamente, por alguma protetização, bem como possibilitar a
ados de algumas questões, substituin- complicação no estado geral. Dessa diminuição do ônus social e financei-
do-se termos e situações mais comu- forma, o resultado da concordância ro do sistema de saúde e do próprio
mente utilizados e vivenciados pela intra-entrevistador pode ter sofrido in- paciente.
população alvo. Algumas palavras, fluência das alterações nas respostas.
como na questão 1, artificial leg e O intervalo entre avaliações deu-se
supervision from another person, tra- principalmente devido à dificuldade CONCLUSÃO
duzidos literalmente por perna artifi- dos pacientes em comparecer ao hos-
Os resultados sugerem que a ver-
cial e supervisão de outra pessoa, fo- pital num curto período de tempo; al-
são brasileira do FMA, Medida Funci-
ram substituídas por “prótese” e “ou- guns trabalhavam, outros dependiam
onal de Amputados, aqui proposta,
tra pessoa orientando”. de transporte ou de acompanhantes.
pode ser um instrumento confiável para
A modificação mais relevante feita A questão 2 (que gera o Índice da medir o resultado funcional, após a
no questionário foi referente à questão Capacidade Locomotora), única a reabilitação, de pacientes brasileiros
13, sobre o interesse nas diversas ativi- apresentar um índice ou escore (0 a com amputação de membro inferior.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :164-71 167


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168 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :164-71


Kageyama et al. Validação de questionário para amputados

Anexo 1 Questionário de Medida Funcional para Amputados


Algumas pessoas decidem não usar sua prótese por várias Este questionário é absolutamente
razões. Ao responder este questionário, por favor, lembre-se confidencial; suas respostas não irão
que não importa se você usa ou não a sua prótese, comprometer seu benefício da
contanto que se sinta feliz com a decisão. Previdência Social.

1 Você diria que é capaz de colocar a sua prótese...


a sozinho, sem qualquer dificuldade? †
b sozinho, mas com dificuldade? †
c sozinho, mas com uma outra pessoa o orientando? †
d somente se tiver ajuda de outra pessoa? †
2 (escore 0 a 42 pontos:)
Atualmente, você consegue realizar as seguintes atividades usando a sua prótese? Mesmo
que, para isso, tenha que usar uma bengala ou qualquer outro auxílio para realizá-las?
NÃO = 0; SIM, se alguém me ajudar = 1; SIM, se alguém estiver próximo = 2; SIM, sozinho = 3
0 1 2 3
a Levantar-se de uma cadeira?
b Pegar um objeto do chão quando você está em pé com a sua prótese?
c Levantar-se do chão? (por exemplo, se você tivesse caído)
d Andar pela casa?
e Andar fora de casa em piso liso?
Andar fora de casa em piso irregular ou acidentado? (por exemplo, grama,
f cascalho, ladeira)
g Andar fora de casa com mau tempo, por exemplo, com chuva?
h Subir escadas segurando um corrimão?
i Descer escadas segurando um corrimão?
j Subir na calçada?
k Descer da calçada?
l Subir alguns degraus sem um corrimão?
m Descer alguns degraus sem um corrimão?
n Andar enquanto carrega um objeto ? (por exemplo, xícara ou copo, bolsa ou sacola)
3 Quando você precisa se locomover dentro de casa, aproximadamente
quanto das suas atividades são feitas... Quase nenhuma Metade Quase todas
a Na cadeira de rodas?
b Andando com sua prótese? (mesmo que precise usar bengala ou
andador)
c Andando sem sua prótese, mas usando um auxílio para andar, como
muletas ou andador?
4 Quantas horas por dia você usa sua prótese?
Quantos dias por semana você usa sua prótese?
5 O que o impede de usar sua prótese para se locomover dentro de casa: Concordo Discordo
a Eu sempre uso a minha prótese para me locomover dentro de casa
Se o paciente responder que concorda, ignore os itens seguintes e passe para a questão 6; se
responder que não concorda, então complete o restante desta questão, até o item i.
b Eu não me locomovo rápido o suficiente com a minha prótese dentro de casa
c Eu acho muito cansativo me locomover com a minha prótese dentro de casa
d Usar a minha prótese para me locomover dentro de casa causa problemas para
a minha perna não amputada (por ex. cansaço, dor, inchaço etc.)
e Quando uso a minha prótese para me locomover dentro de casa, ela me causa
problemas (por ex: desconforto, transpiração, má circulação etc.)
f Usar a minha prótese para me locomover dentro de casa causa problemas para
o meu coto (por ex., irritação da pele, desconforto, dor, feridas etc.)
g Usar a minha prótese para me locomover dentro de casa me faz sentir inseguro
h Eu não uso a minha prótese para me locomover dentro de casa, porque sinto
que ela precisa de ajustes (por ex., o cartucho está muito apertado ou muito
largo; ou é muito pesada, não há espaço suficiente em casa etc.)
i Eu não uso a minha prótese para me locomover dentro de casa por outras razões

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :164-71 169


6 Quando você precisa se locomover fora de casa, aproximadamente quanto das suas
atividades são feitas... Quase nenhuma Metade Quase todas
a Na cadeira de rodas?
b Andando com sua prótese, mesmo se usando bengala ou andador?
c Andando sem sua prótese, mas usando muletas ou andador?
7 O que o impede de usar a sua prótese para se locomover fora de casa: Concordo Discordo
a Eu sempre uso a minha prótese para me locomover fora de casa
Se o paciente responder que concorda, ignore os itens seguintes e passe para a questão 8; se
responder que não concorda, então complete o restante desta questão, até o item i.
b Eu não me locomovo rápido o suficiente com a minha prótese fora de casa
c Eu acho muito cansativo usar minha prótese fora de casa
d Usar a minha prótese para me locomover fora de casa causa problemas para a
minha perna não amputada (por ex. cansaço, dor, inchaço etc.)
e Quando uso a minha prótese para me locomover fora de casa, ela me causa
problemas (por ex: desconforto, transpiração, má circulação, etc.)
f Usar a minha prótese para me locomover fora de casa causa problemas para o
meu coto (por ex., irritação da pele, desconforto, dor, feridas etc.)
g Quando uso minha prótese fora de casa tenho medo de cair
h Não uso a minha prótese fora de casa quando a distância a percorrer é muito longa
i Eu não uso a minha prótese para me locomover fora de casa por outras razões
por ex., é muito pesada, por dificuldade de acesso fora de casa etc.)
8 Quando você anda com a sua prótese, aproximadamente, qual a distância que consegue
percorrer sem parar?
a Eu posso andar o quanto eu quiser.
b Eu posso andar aproximadamente 100 passos sem parar.
c Eu posso andar mais que 30 passos de uma vez, mas menos do que 100 passos sem parar.
d Eu posso andar entre 10 e 30 passos sem parar.
e Eu posso andar menos de 10 passos sem parar.
f Eu não consigo andar com a minha prótese.
9 Desde que você recebeu alta, você caiu enquanto usava a sua prótese?
Sim † Quantas vezes no último mês? _____ Não †
10 Que tipo de auxílio(s) para andar você mais usa para realizar as atividades com a prótese?
(por ex., levantar-se, andar, subir escadas etc.) Dentro de casa Fora de casa
a Nenhum
b 1 bengala
c 2 bengalas
d 1 bengala com 4 pés
e Muletas
f Andador
g Outros (especificar)
As duas próximas questões, 11 e 12, só serão feitas se o paciente não estiver usando a prótese. Se
o paciente usa a prótese, passe para a questão 13.
11 Quando você parou de usar a sua prótese?
a Há menos de 1 mês † e Há menos de 3 anos †
b Há menos de 6 meses † f Há menos de 4 anos †
c Há menos de 1 ano † g Há 4 anos ou mais †
d Há menos de 2 anos † h Eu nunca a usei †

12 Por que você parou de usar a sua prótese?


a O cartucho da minha prótese estava muito largo para o meu coto. †
b O cartucho da minha prótese estava muito apertado para o meu coto. †
c Era muito cansativo. †
d Foi realizada uma nova cirurgia no meu coto (por ex., nova amputação, outra cirurgia). †
e Outros motivos (especificar)

170 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :164-71


Kageyama et al. Validação de questionário para amputados

13 (Reformulada)
Nas suas atividades do dia-a-dia, dentro e fora de casa, qual a resposta que melhor
descreve o grau de dificuldade que você apresenta depois da amputação?
a Eu não era uma pessoa muito ativa antes da minha perna ser amputada.
b Eu deixei de fazer a maioria das minhas atividades após a amputação da minha perna.
c Eu só consigo realizar as atividades dentro de casa.
d Eu faço todas as atividades dentro de casa e só consigo fazer algumas fora de casa.
e Eu retornei às minhas atividades exatamente como antes da amputação.

14 Você tem algum comentário a fazer a respeito da sua amputação, da prótese ou da


reabilitação?

Obrigado por responder este questionário.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :164-71 171


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.172-6, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Avaliação da amplitude de movimento e força da cintura escapular em


pacientes de pós-operatório tardio de mastectomia radical modificada
Shoulder motion range and strength assessment in late post-operative
patients having undergone modified radical mastectomy
Priscila Fernandes Gouveia1, Estela de Oliveira Gonzalez1, Patrícia Arduino Grer1,
Camila Amaro Fernandes1, Maurício Corrêa Lima2

Estudo desenvolvido na RESUMO: O câncer de mama é a neoplasia que mais afeta as mulheres e a
Clínica de Fisioterapia do cirurgia tem sido o tratamento de escolha, que pode assumir vários graus, até
Unicapital – Centro mastectomia radical modificada e alargada. Após a cirurgia, podem surgir
Universitário Capital, São seqüelas como alterações na amplitude articular do ombro homolateral,
Paulo, SP, Brasil diminuição da força muscular, linfedema e aderências. O objetivo deste estudo
1 foi avaliar a amplitude de movimento e força muscular da cintura escapular
Fisioterapeutas em mulheres submetidas à mastectomia radical modificada em pós-operatório
2
Prof. Especialista do Curso de tardio. Foram avaliadas nove mulheres, em pós-operatório de 2 a 7 anos, com
Fisioterapia do Unicapital média de idade de 53,22±6,5 anos. A amplitude de movimento e força muscular
do lado da cirurgia foram avaliadas em relação ao membro contralateral,
ENDEREÇO PARA tomado como parâmetro normal. Os dados foram tratados estatisticamente e o
CORRESPONDÊNCIA nível de signifcância fixado em p<0,05. Os resultados mostraram redução
Priscila F. Gouveia significativa na amplitude de movimento do ombro acometido em todas as
R. Prof. Jorge Meyer 25 Vila pacientes, principalmente nos movimentos de flexão e abdução ativas e
Graciosa passivas, bem como na força muscular, principalmente nos músculos trapézio
03160-090 São Paulo SP médio e supra-espinhal, em comparação com o membro saudável. Isso enfatiza
e-mail: pfgouveia@hotmail.com a necessidade da intervenção fisioterapêutica desde o primeiro dia pós-
operatório, para minimizar essas possíveis seqüelas e melhorar a qualidade de
vida das pacientes.
DESCRITORES: Amplitude de movimento articular; Força muscular; Mastectomia/
reabilitação; Ombro

ABSTRACT : Breast cancer is the most frequent neoplasm among women; it is


traditionally treated by surgery ranging from quadrantectomy to widened
modified radical mastectomy, of which common sequels are changes in articular
range of motion, muscle strength decrease, lymphedema, and adherences.
The aim of this work is to evaluate shoulder motion range and muscle strength
in late post-operative patients having undergone radical modified mastectomy.
Nine women, mean aged 53.22±6,5 years, in 2-to-7 year post-operative span,
were evaluated as to shoulder motion range and muscle strength of the surgery
side, considering the contralateral shoulder and limb as the standard reference
for comparison. Data were statistically analysed and significance level set at
p=0.05. Results showed significant reduction in shoulder range of motion in all
patients, mainly in active and passive flexion and abduction, as well as lesser
muscle strength, especially in Middle Trapezius and Supraspinatus muscles, as
compared to the healthy limb. Findings stress the need to physical therapy to
APRESENTAÇÃO be onset at immediate post-operative, in order to minimize possible sequels
dez. 2006 and improve women’s quality of life.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Mastectomy/rehabilitation; Muscle strength; Range of motion,
maio 2008 articular; Shoulder

172 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :172-6


Gouveia et al. ADM e força muscular de mastectomizadas

INTRODUÇÃO pacientes, porém causava danos psi-


cológicos e físicos desnecessários às
vimento (ADM) e força muscular (FM)
dos músculos da cintura escapular bi-
O câncer de mama é a neoplasia pacientes com tumores em estágio lateralmente. O estudo foi desenvol-
maligna que mais afeta as mulheres pouco avançado. Há também a mas- vido no período de setembro a outu-
brasileiras 1. A mortalidade vem au- tectomia total, onde se retira toda a bro de 2006, nos Laboratórios Multi-
mentando significativamente nos úl- mama, preservando as demais estru- disciplinares de Fisioterapia I e II e
timos 20 anos, acentuando-se a partir turas; a mastectomia subcutânea, na na Clínica de Fisioterapia do Centro
da década de 1990. Estudos verifica- qual se retiram as glândulas mamárias, Universitário Capital (Unicapital). Este
ram que a avaliação percentual rela- preservando a aréola e a papila ma- estudo foi aprovado pelo Comitê de
tiva de 64% na taxa bruta de mortali- mária; e a quadrantectomia, na qual Ética da Unicapital, adotando-se os
dade, passando de 5,77% em 1979 se retira o quadrante da mama onde o princípios éticos da privacidade e do
para 9,75% em 1999, para cada tumor estava localizado. Em mulhe- anonimato das participantes, que as-
100.000 mulheres, é compatível com res com risco elevado para desenvol- sinaram o termo de livre consentimen-
outros países no mesmo estágio de ver a doença, mas que nunca tiveram to informado.
desenvolvimento e urbanização; e os câncer de mama, ou em mulheres que
A avaliação foi aplicada a nove
fatores que levaram ao aumento da já trataram câncer em uma das ma-
pacientes, selecionadas dentre as que
prevalência da exposição ao risco de mas, remove-se a mama normal – ou, tinham sido submetidas à mastec-
câncer de mama seriam histórico fa- no segundo caso, a mama contralateral tomia radical modificada unilateral no
miliar, obesidade (20% das pacientes – para prevenir futura ocorrência de Hospital Ipiranga, em São Paulo, es-
que fazem quimioterapia adjuvante malignidade, na chamada mastec- tando num pós-operatório de dois a
têm um aumento de peso de aproxi- tomia profilática5-8. sete anos, com idades de 40 a 65
madamente 10 kg) 2 e gravidez após As cirurgias de mama levam a al- anos12. Foram adotados como critérios
os 35 anos1. Em contrapartida, os fa- terações funcionais, sociais e psico- de exclusão: paciente submetida à
tores protetores para o câncer de mama lógicas na paciente, incidindo sobre cirurgia bilateral ou a outro tipo de
seriam menarca tardia, gravidez en- a auto-estima. Portanto, a reabilitação cirurgia da mama que não a radical
tre os 20 e 28 anos, de 3 a 12 meses funcional é fundamental 9 . Segundo modificada; portadora de outros tipos
de amamentação e menopausa pre- Kisner e Colby10, as alterações na am- de carcinomas; portadora de qualquer
coce 3 . plitude articular e força muscular do outra doença que pudesse comprome-
Desde o final do século XIX, a cirurgia ombro do lado envolvido surgem como ter a ADM do membro superior homo-
tem sido o tratamento tradicional do uma das seqüelas de grande incidência, lateral à mastectomia, como por
câncer de mama. A mastectomia radi- além da dor, linfedemas e aderências exemplo síndrome do impacto, bursite
cal clássica descrita por Halsted per- na parede torácica, que interferem etc.)12; e apresentando um estado de
maneceu como tratamento de escolha negativamente na vida da mulher confusão mental ou inabilidade para
por aproximadamente 60 anos. A téc- mastectomizada. O tratamento fisio- compreender os comandos solicitados
nica cirúrgica consiste na retirada to- terapêutico desempenha um papel pelo fisioterapeuta13.
tal do tecido mamário, músculo pei- fundamental nessa etapa da vida da A avaliação da força muscular ba-
toral maior e menor e linfadenectomia paciente, por ser susceptível de pro- seou-se no estudo de Kendall et al.13,
axilar completa, podendo ocorrer tam- piciar desde a recuperação funcional sendo avaliados os músculos flexores
bém a retirada dos linfonodos paraes- da cintura escapular e membros supe- de ombro (deltóide anterior, coraco-
ternais (mamários internos), caso o riores até a profilaxia de complicações braquial e bíceps braquial); extensores
tumor esteja localizado nos quadran- como retração, aderência cicatricial, de ombro (deltóide posterior, tríceps
tes mediais da mama, e dos linfonodos fibrose, linfedema, que são responsá- braquial, grande dorsal, rombóides
supraclaviculares. Quando esses linfono- veis pela dificuldade das pacientes em maior e menor); abdutores do ombro
dos são retirados, a cirurgia é chamada realizar as atividades de vida diária11. (deltóide médio e supra-espinhal); adu-
de mastectomia radical alargada4. Na O objetivo deste estudo foi avaliar tores de ombro (peitoral maior e gran-
segunda metade do século XX, algumas a amplitude de movimento e força de dorsal); rotadores medial (redondo
alterações foram introduzidas na muscular da cintura escapular em maior, subescapular e grande dorsal)
mastectomia clássica: técnicas com mulheres submetidas à mastectomia e lateral (redondo menor, infra-espi-
preservação do músculo peitoral mai- radical modificada em pós-operatório nhal, além dos músculos serrátil ante-
or ou de ambos os peitorais, descritas tardio. rior e abdutor da escápula); peitoral
respectivamente por Patey & Dyson e menor, protrador de ombro; trapézio
por Madden, passaram a ser conheci- superior, médio e inferior, elevador,
das como mastectomia radical modi-
ficada 4-6, sendo uma cirurgia menos
METODOLOGIA adutor e depressor da escápula, respec-
tivamente. Para avaliação da amplitu-
agressiva, porém com resultados simi- Foi conduzido um estudo retrospec- de de movimento (ADM) utilizou-se um
lares aos da radical. A mastectomia tivo, em mulheres submetidas a mas- goniômetro simples, seguindo o padrão
radical clássica representava um pro- tectomia radical modificada, sendo de angulação de Kapandji14, mensurado
cesso curativo para boa parcela das avaliadas quanto à amplitude de mo- de maneira ativa e passiva15.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :172-6 173


Para avaliação da ADM, foi consi- Tabela 1 Amplitude de movimentos da cintura escapular (em °): média, desvio
derada a diferença de amplitude entre padrão e valor de p da comparação entre os membros homolateral e
o membro envolvido e o membro con- contralateral à mastectomia
tralateral à cirurgia nos movimentos de
Movimento Ombro homolateral Ombro contralateral p
flexão/extensão, abdução/adução e ro-
tação medial/lateral da articulação do Flexão ativa 153,33 (19,20) * 170,00 (9,01) 0,04
ombro. Flexão passiva 160,11 (15,98) * 174,67 (7,48) 0,04
Para a avaliação da FM, foi men- Extensão ativa 45,33 (16,42) 51,78 (14,39) 0,17
surado o grau de força de 0 a 5 seguin-
Extensão passiva 50,78 (21,16) 56,56 (17,80) 0,31
do o sistema de graduação modificada
para avaliação da força segundo Abdução ativa 135,67 (23,43) * 162,78 (13,94) 0,01
O’Sullivan16, sendo 0 (zero) ausência Abdução passiva 141,89 (19,45) * 171,11 (10,16) 0,01
de contração muscular palpável ou
observável, 1 contração perceptível à Adução ativa 27,56 (11,71) 33,89 (12,87) 0,05
palpação, sem movimento articular; Adução passiva 31,33 (9,98) 38,56 (13,41) 0,05
2 movimento parcialmente realizado,
Rotação medial ativa 72,22 (19,86) 77,89 (22,44) 0,27
sem vencer a ação da gravidade; 3
movimento completo realizado con- Rotação medial passiva 75,89 (18,39) 81,11 (22,04) 0,31
tra a ação da gravidade; 4 movimen- Rotação lateral ativa 74,56 (24,06) 76,89 (22,53) 0,72
to completo realizado contra a ação
da gravidade com pequena resistên- Rotação lateral passiva 76,78 (20,63) 80,67 (23,56) 0,14
cia; 5 movimento realizado contra a * diferença signficativa em relação ao ombro contralateral
ação da gravidade com máximo de grau de parentesco, três pacientes. tas, uma é etilista. Apenas uma parti-
resistência. Também foram questionados hábitos cipante referiu dificuldade funcional
Também foi feita avaliação da cin- e vícios: cinco delas praticam es- nas atividades da vida diária (AVD)
tura escapular, que consistia na ins- portes, quatro são sedentárias e, des- quanto à higiene.
peção das escápulas a fim de verifi-
car se eram abduzidas, aladas, ou se Tabela 2 Força de músculos da cintura escapular (grau de 0 a 516): média,
não havia alteração. desvio padrão e valor de p da comparação entre os lados homolateral
e contralateral à mastectomia
Os dados foram analisados usando
o programa estatístico SPSS para Músculo Homolateral Contralateral p
Windows v.15.01. Foram realizados Peitoral maior 4,22 (0,83) 4,67 (0,50) 0,21
testes não-paramétricos de Wilcoxon Peitoral menor 4,56(0,72) 4,78 (0,44) 0,32
(teste de postos sinalizados de Wilcoxon
que leva em consideração as grande- Redondo maior 4,33 (0,50) 4,56 (0,72) 0,41
zas das diferenças, assim como seus Serrátil 4,44 (0,88) 4,89 (0,33) 0,19
sinais); o nível de significância ado- Trapézio médio 3,44 (0,52) * 4,22 (0,66) 0,02
tado foi p<0,05 (5%). Trapézio inferior 3,44 (0,52) 3,89 (0,78) 0,16
Redondo menor 4,56 (0,52) 4,67 (0,50) 0,32
RESULTADOS Subescapular 4,33 (0,50) 4,78 (0,44) 0,05
Infraespinhal 4,67 (0,50) 4,78 (0,44) 0,32
A média das idades das nove paci-
Rombóide maior 4,00 (0,70) 4,67 (0,50) 0,06
entes foi 53,22±6,5 anos (mínima 43,
máxima 63). Sete pacientes apresen- Rombóide menor 4,00 (0,70) 4,67 (0,50) 0,06
tavam acometimento na mama direi- Grande dorsal 4,44 (0,52) 4,44 (0,72) 1,00
ta. Quanto ao estado civil, quatro são Tríceps braquial 4,44 (0,72) 4,56 (0,72) 0,65
casadas, três solteiras, uma viúva e Trapézio superior 4,78 (0,44) 5,00 (0,00) 0,16
uma em união consensual. Cinco não
tinham filhos, uma tinha um, e três Deltóide anterior 4,44 (0,52) 4,89 (0,33) 0,05
tinham dois filhos; destas, três ama- Deltóide médio 4,44 (0,72) 4,89 (0,33) 0,05
mentaram até seis meses e uma ama- Deltóide posterior 4,22 (0,83) 4,67 (0,50) 0,10
mentou durante um ano. Quanto ao Coracobraquial 4,56 (0,52) 4,89 (0,33) 0,08
histórico familiar de câncer, os resul-
Bíceps braquial 4,56 (0,52) 5,00 (0,00) 0,05
tados foram: primeiro caso na família,
duas mulheres; câncer em familiares Supra-espinhal 0,00 (0,86) * 3,50 (0,50) 0,01
de primeiro grau, quatro; e em outro *
diferença signficativa em relação ao ombro contralateral

174 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :172-6


Gouveia et al. ADM e força muscular de mastectomizadas

Três pacientes relataram não terem incidência de escápulas aladas em brecarga emocional, segundo vários
recebido tratamento fisioterapêutico pacientes que sofreram o esvaziamen- estudos citados por Manaia et al. 17.
no pós-operatório imediato, duas tive- to axilar na mastectomia radical mo- Segundo Box et al.4 , a fisioterapia é
ram-no até oito meses, duas até qua- dificada. Nas cirurgias oncológicas, muito eficaz, principalmente até os
tro meses e duas logo após a cirurgia. além da retirada do tumor, é necessá- dois anos de pós-operatório, quanto ao
Questionadas acerca de doenças as- ria a ressecção de nódulos e vasos lin- ganho de ADM; esses autores sugerem
sociadas, as pacientes indicaram que fáticos para a definição do estádio da que o fisioterapeuta deva estar inseri-
quatro eram hipertensas, das quais uma doença e o tratamento pós-operatório. No do nos hospitais logo no primeiro dia
era diabética e duas apresentavam entanto, essas ressecções constituem obs- pós-mastectomia.
disfunção hormonal (hipertireoidismo táculos à circulação linfática local, cul-
Com relação ao tratamento fisiote-
e/ou hipotireoidismo); as demais não minando em linfedema6-9. Neste estu-
rapêutico no pós-operatório, o grupo
referiram doenças associadas. do, quatro pacientes apresentavam o
não foi homogêneo. Seis pacientes
membro edemaciado, porém não foi
As Tabelas 1 e 2 apresentam des- relataram ter tido acompanhamento
objetivo avaliar o linfedema.
critivamente os resultados (média ± fisioterapêutico, porém não se sabe
desvio padrão) da mensuração da am- Os resultados em relação à ADM quais os tipos de exercícios realiza-
plitude de movimento e força muscu- concordam parcialmente com os dos, sua intensidade, e se receberam
lar, da cintura escapular contralateral achados de Baraúna et al.19, que ava- ou não alta da fisioterapia. Além dis-
e homolateral à mastectomia. Os va- liaram quantitativamente a ADM do so, dado o reduzido tamanho da amos-
lores médios da amplitude de todos ombro nos movimentos de flexão, ex- tra, não foi possível fazer compara-
os movimentos avaliados foram infe- tensão e abdução em mulheres mastec- ções quanto ao tratamento fisiote-
riores no ombro homolateral à cirur- tomizadas, comparando-o com o lado rapêutico.
gia, mas a diferença em relação ao contralateral à cirurgia e, nas 29 pa-
Segundo Henscher 9, o tratamento
ombro contralateral só foi significati- cientes avaliadas por biofotogrametria
cuidadoso durante o pós-operatório
va nos movimentos de flexão e abdu- computadorizada, encontraram dife-
imediato, até o limite da dor, assim
ção, tanto no movimento ativo quanto renças significantes nos movimentos
como sua continuação dosada duran-
passivo. de flexão do ombro 19; neste estudo,
te a rádio e quimioterapia, aumentam
além da flexão, foi encontrada limi-
Quanto à força muscular, de forma a mobilidade articular, favorecem o
tação significativa também na abdu-
semelhante, os valores médios de to- sistema imunológico e reduzem os
ção do ombro.
dos os músculos avaliados foram infe- efeitos colaterais do tratamento mé-
riores no ombro homolateral à cirurgia, A mastectomia radical modificada dico. Além disso, o treinamento mo-
mas a diferença em relação ao ombro é uma cirurgia invasiva; conseqüen- derado a regular do condicionamento
contralateral só foi significativa nos temente as pacientes avaliadas apre- físico reduz a fadiga, melhora a mo-
músculos trapézio médio e supra-espi- sentaram, além da redução de ampli- bilidade articular, combate as restri-
nhal. tude do movimento do membro supe- ções motoras, melhora a percepção do
rior, comprometimento da força dos próprio corpo, aumenta a capacidade
músculos do lado acometido. Desta- de relaxamento e favorece uma atitu-
DISCUSSÃO ca-se aqui a necessidade de estudos de positiva diante da vida9.
sobre a força muscular de pacientes
As mulheres com história de cân- Estudo prospectivo20 realizado no
submetidas à mastectomia, visto que
cer de mama em familiares de primeiro Setor de Oncomastologia do Hospital
são escassos na área fisioterapêutica,
grau (mãe e irmã) apresentam risco São Paulo da Universidade Federal de
o que limita a presente discussão.
relativo aproximadamente duas vezes São Paulo, cujos objetivos eram veri-
maior para câncer de mama, em rela- Na paciente submetida ao trata- ficar a adesão de mulheres mastecto-
ção às que não têm antecedentes 8 . mento cirúrgico do câncer de mama, mizadas ao início precoce de um pro-
Neste estudo, quatro das nove pacien- o estigma da doença, a mutilação, a grama de reabilitação da amplitude
tes mastectomizadas tinham história de estética, a limitação das atividades da de movimento do ombro homolateral
câncer em parentes de primeiro grau. vida diária após a cirurgia, a rotina à cirurgia e identificar as dificulda-
Uma das pacientes é etilista e, segun- de exames, os tratamentos (quimiote- des na realização de exercícios e das
rapia, radioterapia) e as seqüelas de atividades de vida diária, contou com
do a literatura, há uma forte associa-
curto e médio prazo não são os úni- 28 mulheres que participaram do pro-
ção entre consumo de álcool e cân-
cos problemas apresentados. A ausên- grama de reabilitação desde a alta
cer de mama8.
cia ou alteração da mama traz efeitos hospitalar até o primeiro retorno
Na avaliação postural da cintura físicos, psicossociais, sexuais e emocio- ambulatorial. As pacientes receberam
escapular quatro pacientes apresenta- nais que irão afetar diretamente sua um folheto explicativo com orienta-
ram escápulas abduzidas e apenas uma qualidade de vida. Tais alterações su- ções de exercícios que deveriam fa-
alada, bilateralmente, contradizendo peram o marco individual e estendem- zer três vezes ao dia. Das 28 partici-
os achados de Campos e Vilela18, cuja se aos familiares, amigos e às rela- pantes, 82% referiram dificuldade para
revisão bibliográfica mostrou maior ções profissionais, o que implica so- execução dos exercícios, principal-

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :172-6 175


mente devido à dor. A maioria reali-
zou as atividades de vida diária sem
CONCLUSÃO sim como menor força dos músculos
trapézio médio e supra-espinhal, o que
dificuldades. Segundo as autoras, faz- Neste estudo, as mulheres mastecto- enfatiza a necessidade de intervenção
se necessário um melhor controle da mizadas em pós-operatório tardio
fisioterapêutica desde o primeiro dia
dor pós-operatória e reforço das orien- apresentaram reduzida amplitude ar-
tações para incrementar a adesão ticular nos movimentos ativo e passi- pós-operatório, para minimizar essas
das pacientes ao programa de rea- vo de flexão e abdução do ombro em possíveis seqüelas e melhorar a quali-
bilitação 20 . relação ao contralateral à cirurgia, as- dade de vida das pacientes.

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submetidas a um programa de exercícios de Agradecimentos: À equipe do Hospital Ipiranga,
alongamentos musculares. Fisioter Bras. 2006;7(1):30-5. representada pela assistente social Maria Elci da
12 Alcântara PSM, Pereira CMA, Vieira EORY. Cunha e pela psicóloga Rose Hernandes Katz, por
Avaliação de protocolo de fisioterapia aplicada a terem gentilmente cedido informações sobre as
pacientes mastectomizadas a Madden. Rev Bras pacientes mastectomizadas, bem como à Profa.
Cancerol. 2005;51(2):143-8. Magali Alves Zanini pelo auxílio.

176 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :172-6


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.177-82, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Perfil de fisioterapeutas brasileiros que atuam em unidades


de terapia intensiva
A profile of Brazilian physical therapists in intensive care units
Emilia Nozawa1, George J.V. Sarmento2, Joaquim M. Vega3, Dirceu Costa4,
José Euclides P. Silva5, Maria Ignez Z. Feltrim1

Estudo desenvolvido pela RESUMO: Este estudo visou investigar o perfil dos fisioterapeutas que atuam nas
Assobrafir – Associação unidades de terapia intensiva (UTIs) no Brasil, focalizando a direção do serviço,
Brasileira de Fisioterapia técnicas fisioterapêuticas empregadas e nível de autonomia em relação à
Respiratória e Terapia ventilação mecânica invasiva e não-invasiva. Questionários foram enviados
Intensiva, São Paulo, SP, Brasil aos chefes dos serviços de fisioterapia de 1.192 hospitais registrados na
1 Associação Médica de Terapia Intensiva, com retorno de 461 (39%) UTIs. Em
Fisioterapeutas Dras. do Serviço
de Fisioterapia do Instituto do 88% destas, os serviços são chefiados por fisioterapeutas; em 78%, compostos
Coração do Hospital das por até oito fisioterapeutas; 44,4% dos fisioterapeutas trabalham em regime
Clínicas da Faculdade de de 30 horas semanais e 46,1% têm contrato de trabalho. Há assistência
Medicina da Universidade de fisioterapêutica durante 24 horas em 33,6% das UTIs; 88% delas mantêm
São Paulo, São Paulo, SP, Brasil assistência nos finais de semana. Quanto às técnicas fisioterapêuticas, todos
realizam mobilização, posicionamento e aspiração; 91,5% atuam na ventilação
2
Fisioterapeuta do Hospital N.S. não-invasiva, sendo que 43% trabalham com total autonomia. Em relação à
de Lourdes, São Paulo, SP, Brasil ventilação mecânica invasiva, 80% realizam extubação; 79,2% realizam
3 regulagem e desmame do ventilador; entretanto, só 22% têm total autonomia
Prof. Dr. do Depto. de (78% necessitam de protocolo ou opinião da equipe médica). Os fisioterapeutas
Fisioterapia da Universidade
Metodista de São Paulo, São brasileiros atuam, em sua maioria, em instituições privadas e assistenciais,
Bernardo do Campo, SP, Brasil cujos serviços são chefiados por fisioterapeutas. Têm relativa autonomia quanto
às técnicas fisioterapêuticas e o manuseio da ventilação mecânica não-invasiva
4
Prof. Dr. do Programa de Pós- mas, no caso da invasiva, atuam sob diretiva da equipe médica.
graduação em Fisioterapia da DESCRITORES: Serviço hospitalar de fisioterapia/estatística & dados numéricos;
Universidade Metodista de Unidades de terapia intensiva
Piracicaba, Piracicaba, SP, Brasil
5 ABSTRACT: The purpose of this study was to outline a profile of physical therapists
Presidente do Conselho Federal who work in intensive care units (ICU) in Brazil, focusing on service
de Fisioterapia e Terapia
Ocupacional, Brasília, DF, Brasil management, techniques used, and the degree of therapists’ autonomy regarding
invasive and non-invasive mechanical ventilation. Questionnaires were sent
ENDEREÇO PARA to the heads of physical therapy (PT) services of 1,192 hospitals registered at
CORRESPONDÊNCIA the Brazilian Intensive Care Medicine Association and 461 (39%) ICUs replied.
Dra. Emilia Nozawa In 88% of these, PT services are headed by physical therapists and up to eight
Av. Enéas de Carvalho Aguiar therapists work in 78% of the ICUs. Therapists work 30 hours a week in 44.4%
44 2o andar of the units; 46.1% are formally hired. PT 24-hour assistance is available in
05403-000 São Paulo SP 32.8% of the ICUs and on weekends, in 88%. Concerning PT techniques, all
e-mail: fis_emilia@incor.usp.br therapists perform mobilization, positioning, and aspiration; 91.5% play an
active role in non-invasive ventilation, with 42.5% working with full autonomy.
Pesquisa elaborada pela As to invasive mechanical ventilation, 80% perform extubation, 79.2%
Assobrafir com apoio do adjusting and weaning; however, only 22% have full autonomy (the others
Conselho Federal de Fisioterapia
e Terapia Ocupacional requiring physicians’ protocol). Brazilian physical therapists work mostly in
Uma versão deste estudo foi private institution ICUs, in services headed by physiotherapists, and have
apresentada ao 17th European relative autonomy in handling PT techniques and non-invasive mechanical
Respiratory Society Annual ventilation; as to invasive mechanical ventilation, most depend on protocols
Congress, Estocolmo, Suécia, or discussions with a physician.
set 2007. KEY WORDS: Intensive care units; Physical therapy department, hospital/
statistics & numerical data
APRESENTAÇÃO
ago. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO
maio 2008

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 77-82 177


INTRODUÇÃO dicina Intensiva Brasileira (Amib),
com diferentes características e, pos-
sobre o paciente em relação à venti-
lação mecânica invasiva e não-inva-
Nas últimas décadas as unidades de sivelmente, com fisioterapeutas aí tra- siva e procedimentos que o fisiotera-
terapia intensiva (UTIs) têm se torna- balhando. Porém, é difícil analisar as peuta decide dentro da UTI. Além das
do uma concentração não somente de práticas assistenciais fisioterapêuticas 20 questões, foi acrescentada uma
pacientes críticos e de tecnologia e as responsabilidades assumidas por questão livre para que o questionado
avançada, mas também de uma equi- esse profissional sem dimensionar e pudesse externar eventuais informa-
pe multiprofissional experiente com caracterizar as condições da fisiote- ções relevantes ao estudo. Para efeito
competências específicas 1. O profis- rapia nas várias UTIs brasileiras. de possíveis ajustes metodológicos,
sional fisioterapeuta, como integran- realizou-se um estudo piloto junto aos
Assim, justifica-se a realização des-
te desta equipe, necessita cada vez fisioterapeutas chefes de uma UTI de
te estudo sobre o perfil do fisiotera-
mais de aprimoramento e educação cada estado da federação, sendo um
peuta que atua nesse ambiente hospi-
especializada para fazer frente ao hospital público e outro privado, sele-
talar para que, com base na realidade
avanço dos cuidados intensivos. Em cionados por randomização prévia.
constatada, possam ser postas em práti-
países desenvolvidos, a função do fi- ca perspectivas quanto à profissiona- Após o estudo piloto foram realiza-
sioterapeuta depende de muitos fato- lização e à educação na área da Fisiote- dos ajustes no questionário e o mes-
res, como a própria característica da rapia em Terapia Intensiva. O objeti- mo foi encaminhado, via correio, aos
inserção da Fisioterapia em cada país, vo deste estudo foi delinear o perfil chefes dos Serviços de Fisioterapia de
a tradição, o nível do curso de gradu- dos fisioterapeutas que atuam nas uni- todos os hospitais cadastrados na Amib,
ação, treinamento e competência 2 . dades de terapia intensiva, focalizan- em envelope contendo: carta de apre-
Embora existam poucos relatos na li- do aspectos administrativos, as técni- sentação com explicação dos objeti-
teratura sobre o perfil e a atuação pro- cas fisioterapêuticas empregadas e o vos do estudo e procedimentos ado-
fissional fisioterapêutica em UTIs, nível de autonomia em relação à ven- tados para a coleta de dados, Termo
Norremberg et al.1 estudaram esse as- tilação mecânica invasiva e não- de Consentimento Livre e Esclareci-
sunto em 17 países da Europa Ociden- invasiva, bem como características das do; o questionário e um envelope se-
tal e, apesar do número pequeno de UTIs. lado para envio das respostas. Os hos-
respostas, constataram que havia di- pitais onde havia mais de uma UTI
versidade quanto à função do fisiote- foram orientados a fazer cópias extras
rapeuta e às técnicas empregadas. METODOLOGIA dos questionários. Passados 30 dias do
Outros estudos demonstraram que es- envio, todos os hospitais foram conta-
sas diferenças dependem também do Este estudo foi aprovado pelo Co- tados por telefone para confirmação
número de profissionais fisioterapeu- mitê de Ética em Pesquisa da Divisão de recebimento do material. Estipu-
tas exercendo funções 2-4. No Brasil, Clínica do Hospital das Clínicas da lou-se o prazo de dois meses (60 dias)
embora os fisioterapeutas estejam Faculdade de Medicina da Universi- para encerramento do recebimento
cada vez mais presentes nas UTIs, sua dade de São Paulo. Caracteriza-se das respostas.
atuação difere em cada instituição, como uma pesquisa de campo, pros-
pectiva, transversal, com abordagem As variáveis quantitativas estão
não estando suas competências bem
predominantemente quantitativa. apresentadas de forma descritiva, por
definidas. Diferentemente de outros
meio de média e desvio padrão, le-
profissionais, como médicos e enfer- O instrumento utilizado para a cole- vando-se em consideração a nature-
meiros que, tradicionalmente têm suas ta de dados constou de um questionário za e especificidade dos dados.
funções já consagradas devido à his- elaborado para este fim, contendo 20
tórica existência 5,6 , a fisioterapia é questões fechadas versando sobre três
uma profissão que só recentemente foi
reconhecida no Brasil. Em nosso meio,
temas principais: a) características da
instituição, envolvendo dados demo-
RESULTADOS
a inserção do fisioterapeuta em UTI gráficos, tipo e tamanho da institui- Dos questionários enviados a 1.192
começou no final da década de 1970 ção, áreas de atuação do fisioterapeuta hospitais, obtiveram-se respostas de
e sua afirmação como integrante da dentro da instituição, categoria de 356 instituições (29,9%) corresponden-
equipe de assistência intensiva tem pacientes por unidade, número de lei- do a 461 UTIs (38,6% dos questionári-
sido progressiva. Embora a aplicação tos e horário de atendimento fisiote- os enviados). Essas UTIs estão aloca-
das técnicas fisioterapêuticas se faça rapêutico da unidade; b) perfil do das em instituições privadas (54,6%)
por profissionais da área e o processo fisioterapeuta que atua nas UTIs, envol- e públicas da administração estadual
educacional e de treinamento em te- vendo formação do fisioterapeuta, vín- (16,7%), municipal (10,7%) ou outra
rapia intensiva seja divulgado em todo culo empregatício, estrutura administra- (16,2%). Os números de leitos no hos-
o país, não se conhece a real inser- tiva em que está inserido, jornada de pital e nas UTIs são apresentados na
ção do fisioterapeuta nessa área de trabalho, existência de programas de Tabela 1. O maior número de respos-
especialidade. Existem no Brasil mais treinamento e educação continuada; tas proveio de serviços que atuam junto
de 1.500 unidades de terapia intensi- c) tipo de técnicas fisioterapêuticas a UTIs de pacientes adultos denomi-
va cadastradas na Associação de Me- utilizadas, incluindo nível de decisão nadas “geral” por admitirem casos de

178 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :177-82


Nozawa et al. Fisioterapeutas em terapia intensiva

Tabela 1 Distribuição das UTIs (%) que 60% dos fisioterapeutas estão A atuação fisioterapêutica caracte-
segundo características e alocados nas UTIs e o restante atua riza-se predominantemente pela apli-
especialidade possivelmente em unidades de inter- cação de técnicas de remoção de se-
nação geral e ambulatório. O número creção brônquica e de reexpansão
Característica % de fisioterapeutas que trabalham ex- pulmonar (99,3%); a preocupação
Números de leitos no hospital clusivamente em UTI varia de acordo com a mobilização do paciente é tão
50 8,3 com a dimensão do hospital: em qua- importante quanto as técnicas de te-
51-150 30,1 se metade dos casos trabalham entre rapia respiratória (91,5%). A utiliza-
151 – 300 39,5 um e três fisioterapeutas, como mos- ção de dispositivos instrumentais como
> 300 22,1 tra a Tabela 2; e em apenas 13 casos incentivador inspiratório, exercício
Especialidade da UTI as UTIs comportavam mais de 30 pro- com pressão positiva e flutter têm
Adulto geral 64,9 fissionais. menor aplicação, como pode ser ob-
Adulto cirúrgico 54,4 servado na Tabela 3. A tomada de
As funções exercidas pelos fisiote-
Adulto neurológico 29,5 decisão sobre os procedimentos
rapeutas que atuam nas UTIs são pre-
Pediátrica 34,4 fisioterapêuticos é de responsabilida-
dominantemente (52,4%) de assistên-
Neonatal 29,1 de do profissional fisioterapeuta de
cia (Tabela 2). Para a maioria (64,4%),
Coronariana 25,4 forma preponderante em mais de 90%
a jornada de trabalho é de 30 horas
Queimados 8,2 dos casos. Quanto aos procedimentos
semanais; a jornada de 20 horas e com
Oncológica 2,8 de assistência ventilatória, cerca de
plantões de 12 horas por 60 horas de
Outros 11,1 80% dos fisioterapeutas realizam os
descanso aparecem ocasionalmente.
Número de leitos na UTI procedimentos de extubação, regula-
Os Serviços estão organizados a pres-
gem dos parâmetros ventilatórios e as
1-5 7,2 tar assistência durante 24 horas somen-
etapas do desmame, como mostra a
6-10 41,3 te em 1/3 das UTIs, porém, a maioria
Tabela 3.
11-15 22,3 (88,8%) apresenta cobertura nos finais
16-20 12,7 de semana (Tabela 2). Em relação à ventilação não-
21-30 11,6 invasiva (VNI), 42,5% deles têm total
Os fisioterapeutas estão se aprimo-
>31 5,0 autonomia em sua indicação e apli-
rando cada vez mais nessa área: veri-
cação e 49% realizam esse procedi-
UTI = unidade de terapia intensiva ficou-se que 71% dos fisioterapeutas
mento com base em protocolo discu-
atuantes possuem curso de especiali-
etiopatogenia variada (64,5%), segui- tido com a equipe médica; são raros
zação em Fisioterapia Cardiorrespira-
do de UTIs de caráter cirúrgico os fisioterapeutas que não têm auto-
tória ou em terapia intensiva; 67%
(54,4%), de pediatria (34,4%), nomia, como mostra o Gráfico 1.
responderam que seguiram programas
neonatal (29,1%) e coronariana Quanto aos procedimentos de venti-
de treinamento e desenvolvimento.
(25,4%).
De acordo com as informações re- Tabela 2 Distribuição (%) dos Serviços de Fisioterapia segundo características
cebidas, constata-se que a organiza- administrativas
ção da atuação dos fisioterapeutas é Funções exercidas % Atendimento nos finais de semana %
exercida por uma estrutura administra- Assistência 52,4 Sim 88,8
tiva denominada de Serviço (70,9%), Assistência e ensino 28,5 Não 7,2
seguida de Setor (21,2%), Unidade Assistência e pesquisa 5,7 Raramente 4,
(2,6%) ou outras (5,4%). Para unifor- Assistência, ensino e pesquisa 13,4
mizar a terminologia e com base nes-
N. de Fts que compõem o Serviço N. de Fts exclusivos na UTI
sa informação, tal estrutura é aqui re-
1-3 1,0 1a3 45,0
ferida como Serviço de Fisioterapia.
Esta estrutura administrativa é lidera- 4-8 29,9 4a8 33,6
da por fisioterapeuta em 91,9% dos 6-10 21,0 9 a 12 13,2
casos, embora outros profissionais exer- 11-20 20,3 13 a 20 5,9
çam o cargo de chefia, entre eles um 21-30 10,7 21 a 30 2,0
médico (5,6%), psicólogo (1,1%) ou 31-40 10,2 + de 30 0,3
outros profissionais (1,4%). O vínculo >40 6,9
que os fisioterapeutas mantêm com os Horário de atendimento Jornada de trabalho
Serviços é trabalhista (contratado) em Raramente 3,3 20 horas 5,2
46,1% dos casos; terceirizado, 29,9%; < 12 horas 22,9 30 horas 64,4
profissional autônomo, 26,2%; e em 12 horas 34,2 40 horas 17,6
cooperativas, 3,7%. 18 horas 5,8 12 x 60 horas 7,8
Em relação à força de trabalho no 24 horas 33,6 Mediante solicitação médica 5,0
Serviço de Fisioterapia, verificou-se UTI = unidade de terapia intensiva; Fts = fisioterapeutas

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 77-82 179


Tabela 3 Distribuição dos fisioterapeutas (%) segundo os procedimentos que instituições públicas. Esse fato pode
realizam ser atribuído a um maior número de
Procedimento % hospitais privados, enquanto a melhor
Remoção de secreção 99,5 estruturação hierárquica do Serviço aí
Exercícios de expansão pulmonar 99,3 pode ter propiciado maior retorno dos
Aspiração orotraqueal 99,0 questionários. Nas instituições públi-
cas, os poucos fisioterapeutas atendem
Posicionamento 98,0
a uma demanda expressiva de paci-
Mobilização 91,5
entes sem a organização de uma equi-
Bag squeezing 78,1
pe para a assistência exclusiva em
Inspirometria de incentivo 76,3 UTI.
Treinamento muscular respiratório 76,3
Exercícios com pressão positiva intermitente 64,8 Os resultados mostram que os Servi-
Flutter 53,1 ços de Fisioterapia atendem principal-
Medidas de pressão dos músculos respiratórios 51,6 mente pacientes adultos em vários ti-
Extubação 80,0 pos de terapia intensiva, o que revela
Ajuste do ventilador mecânico 79,2 a importância da atuação específica
Desmame da ventilação mecânica 79,2 junto ao paciente crítico. Por outro
Auxílio na intubação 73,6 lado, é expressiva a percentagem de
atendimento na área de neonatologia
Transporte intra-hospitalar 37,2
e pediatria, que foi o segmento no
Auxílio na PCR 66,9
qual a fisioterapia conquistou espaço
PCR = Parada cardiorrespiratória
mais recentemente, devido à comple-
100 xidade e especificidade desses pacien-
VMI VNI tes e/ou à resistência à presença do
90 fisioterapeuta.
80 A atuação fisioterapêutica nas UTIs
70 no Brasil ocorre no âmbito de uma
62
estrutura administrativa denominada
60 Serviço, tendo na liderança um fisio-
49
50 43 terapeuta. Esse dado justifica políti-
cas de investimentos educacionais a
40 serem destinados à gestão de proces-
30 sos, visando melhor preparo de lide-
22
ranças administrativas de fisioterapeu-
20 16
tas para gerir processos, resultados e
10 8 capital intelectual.

0 Na dinâmica de trabalho das equi-


pes destaca-se o percentual discreto
Total autonomia Mediante protocolo Sem autonomia (33,6%) da assistência 24 horas, em-
Gráfico 1 Distribuição percentual dos fisioterapeutas segundo o grau de bora haja ampla cobertura diurna, in-
autonomia em relação à ventilação mecânica invasiva (VMI) e à cluindo finais de semana (88,8%).
ventilação mecânica não-invasiva (VNI) Vários fatores podem justificar esse
dado: a) na maioria das instituições,
lação mecânica invasiva, somente mas três décadas, mas até o presente o reduzido número de fisioterapeutas
22% dos fisioterapeutas gozam de to- momento não foi realizado um levan- vinculados (Tabela 2) pode não ser
tal autonomia sobre a condução do tamento para descrever essa ação nas suficiente para a assistência ideal,
processo ventilatório e 62% necessi- UTIs brasileiras; este é o primeiro es- particularmente na unidade de tera-
tam, previamente, discutir com a tudo de abrangência nacional. O per- pia intensiva, pois no atendimento 24
equipe médica para determinar a con- centual de respostas recebidas (30%) horas torna-se necessária a criação de
duta (Gráfico 1). possibilitou descrever as tendências três turnos (manhã, tarde, noite), o que
dessa atuação, considerando que estu- equivale a, no mínimo, seis profissio-
dos semelhantes, realizados na Europa1 nais, mesmo para UTIs de pequeno
DISCUSSÃO e na França7, obtiveram percentuais porte; b) a jornada de trabalho de 30
semelhantes, respectivamente 22% e horas reduz o total de horas vezes
A atuação dos fisioterapeutas nas 21%. Este estudo mostrou que os Ser- número de fisioterapeutas, levando
UTIs no Brasil vem aumentando de viços de Fisioterapia de instituições necessariamente ao aumento no qua-
forma sistemática e gradual nas últi- privadas prevalecem em relação às dro de pessoal, o que pode onerar a

180 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :177-82


Nozawa et al. Fisioterapeutas em terapia intensiva

folha de pagamento; c) a limitação siva. Marques et al., em 199810, reali- relação das diferentes equipes que tra-
do número de atendimentos por pacien- zaram uma pesquisa sobre o perfil e balham na UTI. Gestões que incenti-
te, imposta pelos prestadores de saú- as expectativas dos fisioterapeutas do vem essa comunicação e intercâmbio
de, independente das condições da Complexo Hospital das Clinicas da de habilidades e competências devem
fisioterapia, cria um sistema que en- Faculdade de Medicina da Universi- ser propostas no âmbito local de tra-
foca atendimentos somente diurnos, dade de São Paulo e verificaram que balho, como também entre as insti-
deixando esses pacientes muitas ve- 98% dos fisioterapeutas demonstravam tuições de representatividade dessas
zes com um longo período sem inter- interesse em participar de eventos cientí- categorias.
venção. ficos, sugerindo que programas de
atualização e reciclagem encontram O grau de autonomia do fisioterapeu-
Na caracterização da ação tera- um público constante. ta aumenta na VNI: no Brasil, 43,8%
pêutica junto aos pacientes críticos, dos fisioterapeutas têm total autonomia
há total concordância no emprego de A área concernente à ventilação em relação à indicação e execução do
técnicas de remoção de secreção mecânica invasiva, nos procedimen- procedimento. Estudos que mostram
brônquica e de reexpansão pulmonar tos de manuseio, regulagem e inter- essa realidade enfatizam a necessida-
realizada de forma manual. O dispo- rupção, merece atenção especial. de de treinamento apropriado e expe-
sitivo mecânico para tais fins vem Nota-se que essas práticas são riência para se obter sucesso com a
secundariamente e pode ser devido ao exercidas amplamente por fisiotera- técnica 14,15.
custo adicional desses recursos. Este peutas, seja nos pacientes intubados
estudo não objetivou conhecer as téc- ou com suporte ventilatório não- Os achados deste estudo mostram
nicas mais empregadas, dada a gran- invasivo. No entanto, a tomada de que os pacientes de terapia intensiva
de variedade de técnicas existentes e decisão que envolve iniciar, alterar e no Brasil recebem cuidados de fisio-
a relação de seu uso com o treinamen- interromper a ventilação mecânica terapia de forma rotineira por fisiote-
to recebido. Nos últimos anos foram invasiva é realizada sob protocolo rapeutas, organizados e treinados para
desenvolvidas novas técnicas manuais8, (62%) ou sob ordem médica (16%). As esse fim. A reflexão sobre esses resul-
porém ainda sem ampla divulgação e instituições estão cada vez mais ado- tados por parte de nossos órgãos e pe-
treinamento. O importante é que os tando protocolos preestabelecidos pe- los próprios fisioterapeutas poderá ge-
fisioterapeutas brasileiros desenvol- los membros da equipe multipro- rar diretrizes e metas que propiciem
vem, em seus locais de trabalho, fissional que atua nas UTIs, com base recomendações de ações terapêuticas,
ações de remoção de secreções brôn- nas condições clínicas dos pacientes normatização da estrutura administrati-
quicas, reexpansão pulmonar, posicio- e nas recomendações adotadas mun- va, treinamentos técnicos e gerenciais,
namento e mobilização. Essas são as dialmente. Estudos randomizados de- definições das relações de trabalho,
principais ações necessárias aos pa- monstram que protocolos bem estru- efetividade no custo-saúde e remune-
cientes críticos, conforme o Consen- turados para descontinuar a ventilação ração qualificada, com resultados mais
so Europeu de Fisioterapia de Pacien- mecânica realizados por fisioterapeu- eficientes junto à população de pacien-
tes Críticos da European Respiratory tas adequadamente habilitados não tes críticos.
Society 9 . requerem a presença do médico, po-
dendo inclusive reduzir a duração da
O estudo mostra ainda que 71% dos ventilação mecânica e melhorar os re- CONCLUSÃO
fisioterapeutas em ação foram treina- sultados11-13. Norremberg et al. 1 rela-
dos por meio de cursos de especiali- tam que na Europa Ocidental o ajuste Pode-se concluir que o perfil dos
zação em fisioterapia cardiorrespira- e desmame da ventilação mecânica fisioterapeutas brasileiros em unidades
tória ou em terapia intensiva, vincula- realizado por fisioterapeutas difere de de terapia intensiva caracteriza-se por
dos à ação desenvolvida. Embora a país para país: enquanto na Bélgica profissionais qualificados, que aplicam
dimensão geográfica do Brasil cause 57% dos fisioterapeutas realizam pro- técnicas fisioterapêuticas especializa-
problemas quanto à uniformidade e cedimentos de ventilação mecânica, das com autonomia e estão envolvi-
acessibilidade aos programas de edu- na Suécia estes raramente são reali- dos em ventilação mecânica invasiva
cação continuada, percebe-se clara- zados. Portanto, é possível ampliar a e não-invasiva. A estrutura adminis-
mente a preocupação de tornar mais participação do fisioterapeuta na ven- trativa está relativamente bem orga-
específica a formação do fisioterapeu- tilação mecânica invasiva, dependen- nizada e promissora para o processo
ta para sua atuação em terapia inten- do da organização e do grau de inter- evolutivo profissional.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 77-82 181


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182 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :177-82


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.183-7, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Correlação entre cefaléia e disfunção temporomandibular


Correlation between headache and temporomandibular joint dysfunction
Mariana Sampaio Menezes1, Sandra Kalil Bussadori2,
Kristianne Porta Santos Fernandes2, Daniela Aparecida Biasotto-Gonzalez2

Estudo desenvolvido no RESUMO: A relação entre disfunções temporomandibulares (DTM) e os diferentes


Programa de Mestrado em tipos de cefaléias ainda não está bem compreendida, mas a dor de cabeça é
Ciências da Reabilitação da provavelmente o sintoma mais comum da DTM. O objetivo deste estudo foi
Uninove – Universidade Nove correlacionar cefaléia com o índice clínico de Fonseca de avaliação da DTM.
de Julho, São Paulo, SP, Brasil Participaram 160 voluntários estudantes da Universidade Nove de Julho na
faixa dos 18 aos 36 anos, sendo 80 mulheres e 80 homens. Foram aplicados
1 Fisioterapeuta dois questionários: o índice clínico de Fonseca e um questionário sobre cefaléia.
2 Profas. Dras. do Programa de Os dados foram analisados estatisticamente e o nível de significância fixado
Mestrado em Ciências da em p≤0,05. Os resultados mostram maior prevalência de DTM entre as mulheres
Reabilitação da Uninove com cefaléia, mas não foi possível verificar uma relação direta entre cefaléia
e nível de gravidade da disfunção da articulação temporomandibular.
ENDEREÇO PARA DESCRITORES: Cefaléia; Índice de gravidade de doença; Transtornos da
CORRESPONDÊNCIA articulação temporomandibular
Daniela A. Biasotto-Gonzalez
Condomínio Aruã – Estrada do ABSTRACT: The relationship between temporomandibular joint disorders (TMD)
Itapeti, 100 Quadra 79A Lote 01 and different kinds of headaches is still not well understood, though headache
08771-910 Mogi das Cruzes SP is probably the most common symptom of TMD. The aim of this study was to
e-mail: dani_atm@uninove.br correlate headache with Fonseca’s TMD clinical index. A total of 160 university
students aged 18 to 36 years old were selected, half women, half men. Two
Este estudo recebeu apoio questionnaires were applied to them: the Fonseca clinical questionnaire and
financeiro da Fapic/Uninove. one on headache. Data were statistically analysed and significance level set
at p≤0.05. Results showed a higher prevalence of TMD among female
APRESENTAÇÃO individuals with headache, but a direct relationship between headache and
set. 2007 degree of temporomandibular joint dysfunction could not be found.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Headache; Severity of illness index; Temporomandibular joint
maio 2008 disorders

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :183- 7 183


INTRODUÇÃO tivos da aproximação entre essas duas
afecções 6,8,12-14.
• Aperta ou range os dentes?
Só foram incluídos os voluntários
A articulação temporomandibular As cefaléias relacionadas à DTM e que responderam afirmativamente à
(ATM) é parte do sistema estomatogná- estruturas do crânio são consideradas primeira pergunta, com dor na região
tico, capaz de realizar movimentos na classificação da International temporal; e afirmativamente à segun-
complexos. A função e a estabilidade Headache Society (IHS) de 1988; em da e a uma das outras duas perguntas.
dessa articulação regem a mastigação, 2004, foram incluídas na categoria
deglutição, fonação e a própria pos- O questionário de Fonseca é compos-
IHS.11: Cefaléia ou dor facial associa-
tura mandibular1. to por dez questões, com três alternati-
da com distúrbios do crânio, pescoço,
vas cada (não, sim ou às vezes), onde o
A disfunção temporomandibular desordens da ATM, músculos masti-
sujeito deve assinalar apenas uma. De-
(DTM) corresponde a um conjunto de gatórios e outras estruturas cranio-
pendendo do escore (que varia de 0 a
condições articulares e musculares na faciais (apud Gomes et al.10).
100), permite classificar os respondentes
região crânio-orofacial que pode de- Este estudo teve por objetivo verificar, por grau de severidade da DTM.
sencadear sinais e sintomas como do- em uma população de universitários, se
res na região da ATM, cefaléia, dor As instruções necessárias para o
há correlação entre a presença de cefaléia
nos músculos da mastigação, otalgia, preenchimento dos questionários fo-
e de DTM, esta determinada pelos
dor facial, limitação funcional, dor cer- ram dadas até que os sujeitos as com-
parâmetros do índice clínico de Fonseca.
vical, cansaço, limitação de abertura preendessem completamente. Os par-
de boca, dor durante a mastigação, ticipantes os responderam enquanto o
zumbido, dor na mandíbula, dentre METODOLOGIA pesquisador permaneceu à disposição
outros. A somatória ou a exacerbação para qualquer esclarecimento. Não
desses sinais e sintomas acaba por li- Este estudo foi aprovado pelo Co- houve controle de tempo para respon-
mitar ou mesmo incapacitar o indiví- mitê de Ética em Pesquisa da Uninove. der, para minimizar a chance de indu-
duo em suas atividades fisiológicas2-6. Para ser incluído/a na pesquisa, cada ção a respostas imprecisas.
participante assinou um termo de con-
Embora a etiologia da DTM não es- sentimento livre e esclarecido. Ao término do preenchimento do
teja totalmente elucidada, em geral tem questionário de Fonseca, foi realiza-
caráter multifatorial e pode envolver Foram selecionados por meio de da a somatória das respostas e a clas-
alterações na oclusão, restaurações ou randomização (por um programa que sificação nas categorias: ausência de
próteses mal-adaptadas; lesões traumá- gera números aleatórios sem reposição) disfunção temporomandibular (0 a 15
ticas ou degenerativas da ATM; altera- 160 estudantes da Universidade Nove pontos); disfunção leve (20 a 40 pon-
ções esqueléticas; fatores psicológicos de Julho (campus Vila Maria), em São tos); moderada (45 a 65 pontos) e gra-
e emocionais; ausências dentárias, Paulo, na faixa etária de 18 a 36 anos, ve (70 a 100 pontos)15.
mastigação unilateral; má-postura e há- sendo 80 do sexo feminino e 80 do sexo
masculino. Os sujeitos responderam, no Para a análise estatística utilizou-
bitos orais inadequados. Geralmente, se o teste qui-quadrado para avaliar a
apenas um fator isolado não é desen- mesmo dia, a dois questionários: o
questionário do índice clínico de Fon- associação entre os escores, tendo
cadeante da disfunção, mas sim a asso- como objetivo comparar as divergên-
ciação entre eles 2,4,7,8. As disfunções seca e um questionário de triagem,
consistindo nas seguintes questões: cias entre as freqüências observadas.
podem ser classificadas em extra e intra-
articulares, ou disfunções dos músculos • Apresenta dor de cabeça? Se
mastigatórios e disfunções intra-arti- sim, em qual região? RESULTADOS
culares e podem envolver uma aborda-
• Apresenta cansaço na muscula- Do total de voluntários, 18 mulheres
gem interdisciplinar para seu tratamento4,9.
tura mastigatória? (22,5%) e 31 homens (38,8%) não apre-
A cefaléia consiste em qualquer • Apresenta dor na articulação sentaram qualquer sintoma. A Tabela 1
dor referida no segmento cefálico, temporomandibular? mostra os dados relativos à presença ou
sendo uma manifestação extrema-
mente comum. Na população geral,
durante o curso da vida, a prevalência Tabela 1 Distribuição das voluntárias do sexo feminino (%) segundo a presença
de cefaléia é maior que 90%, repre- ou não de cefaléia e de DTM, e classificação de Fonseca da DTM
sentando o terceiro diagnóstico mais Mulheres Com cefaléia (%) Sem cefaléia (%) Total (%)
comum (10,3%) nos ambulatórios de
neurologia10,11. Ainda não é bem com- DTM leve 26,25 12,50 38,75
preendida a relação entre a DTM e DTM moderada 15,00 6,25 21,25
os diferentes tipos de cefaléias, mas DTM severa 8,75 0,00 8,75
a dor de cabeça é provavelmente o Total com DTM 50 18,75 68,75
sintoma mais comum e a queixa mais
relatada pelos portadores de DTM; in- Sem DTM 8,75 22,50 31,25
dícios clínicos são fortemente suges- Total 58,75 41,25 100,00

184 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :183- 7


Menezes et al. Cefaléia e disfunção temporomandibular

Tabela 2 Distribuição dos voluntários do sexo masculino (%) segundo a centagem de indivíduos universitári-
presença ou não de cefaléia e de DTM, e classificação de Fonseca os portadores de DTM concordam com
da DTM os obtidos por Garcia et al.16, que ava-
liaram 200 estudantes universitários
Homens Com cefaléia (%) Sem cefaléia (%) Total (%) com idades entre 17 e 25 anos, por
DTM leve 21,25 25,00 46,25 meio do questionário de Fonseca15 e
DTM moderada 5,00 2,50 7,50 pela medida da amplitude de movi-
mento mandibular; os autores encon-
DTM grave 1,25 0,00 1,25
traram que 61% dos indivíduos apre-
Total com DTM 27,50 27,50 55,00 sentavam algum grau de DTM. No
Sem DTM 21,25 38,75 45,00 presente estudo, 61,9% dos indivídu-
Total 33,75 66,25 100,00 os foram assim classificados. Com re-
lação à gravidade da disfunção, os
resultados obtidos pelos autores tam-
não de cefaléia e de gravidade da DTM dois sexos segundo tivessem ou não bém são semelhantes, tendo sido en-
segundo o índice anamnésico de Fon- cefaléia. Pode-se observar que há uma contrada prevalência da DTM leve
seca nas voluntárias do sexo femini- relação direta entre DTM e cefaléia sobre as DTM moderada e grave.
no. É possível observar, naquelas com apenas no sexo feminino.
cefaléia, que não há relação direta Nossos dados também foram seme-
Com a aplicação do teste qui- lhantes aos obtidos por Tomacheski et
com os níveis de disfunção, mas en-
quadrado, foi possível observar que al.4 que, avaliando estudantes, encon-
tre as que não têm cefaléia, pode ser
há uma relação direta entre as variá- traram 46,1% portadores de DTM leve,
estabelecida uma relação linear inver-
veis estudadas (DTM X presença ou 4,4% de moderada, nenhum apresen-
sa com o grau de severidade da DTM.
ausência de cefaléia), com um alto tou DTM grave; e 48,7% não eram
Na Tabela 2 são apresentados os poder significativo em ambos os se- portadores de DTM (sic); respectiva-
dados relativos à correlação entre xos (feminino: 0,0008; masculino: mente, os achados do presente estudo
cefaléia e gravidade da DTM nos vo- 0,003), ou seja, os indivíduos com foram 42,5%, 14,4%, 5,0%; e 38,1%
luntários do sexo masculino. Também DTM leve e sem DTM (segundo a clas- não eram portadores de DTM.
nesse caso há uma relação linear in- sificação do índice clinico de Fonse-
versa entre o grau de disfunção em ca) não apresentam cefaléia. A prevalência de DTM no sexo fe-
indivíduos sem cefaléia e, naqueles minino, aqui encontrada, também
com cefaléia, não há relação direta coincide com os dados da literatura
desta com os níveis de disfunção. DISCUSSÃO segundo os quais a DTM é mais co-
mum entre mulheres2,4,17-19. A variação
Do total de participantes, 74 (46,3%) O índice clínico de Fonseca foi es- em relação às porcentagens encontra-
relataram cefaléia e 99 (55% do to- colhido para este estudo por ter sido das nos diferentes estudos está ligada
tal, sendo 55 mulheres e 44 homens,) idealizado para a população brasilei- a diferentes tipos de populações e a
foram classificados como portadores ra e ser sensível na determinação da variações de metodologia e de leitu-
de DTM. O Gráfico 1 representa a dis- gravidade de portadores de DTM 15. ra de resultados20-22.
tribuição dos portadores de DTM nos Nossos resultados com relação à por- Segundo Okeson8, a prevalência de
DTM no sexo feminino pode estar re-
50%
lacionada a uma maior flacidez dos
45% Mulheres tecidos nas mulheres, relacionada ao
Homens aumento do nível de estrógeno. As
40%
articulações das mulheres são geral-
35% mente mais flexíveis e menos densas
30% que as dos homens. Gage et al.23 en-
contraram nas mulheres aproximada-
25% mente o dobro de colágeno tipo III no
20% ligamento posterior da ATM, indican-
do que, nelas, esses tecidos são menos
15% capazes de suportar pressão funcional.
10% Para Rieder et al.24, a mulher é mais
freqüentemente acometida por estresse
5%
que o homem e apresenta maior índi-
0% ce de doenças com envolvimento psi-
Com cefaléia Sem cefaléia cossomático. A soma dos fatores ana-
tômicos e psicossomáticos poderia ex-
Gráfico 1 Distribuição percentual, dentre os portadores de DTM, dos que plicar a maior prevalência de DTM no
apresentam ou não cefaléia, segundo o sexo gênero feminino. No presente estudo,

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 83- 7 185


ao avaliar a relação entre DTM e por sexo revelou que uma parcela sig- ligados à DTM ou já foram diagnosti-
cefaléia, os dados mostram que, den- nificativa dos sinais e sintomas estu- cados como portadores de DTM e que
tre as mulheres portadoras de DTM, dados tinha maior prevalência nas a correlação positiva desses dois fato-
50% apresentam cefaléia, enquanto no mulheres que nos homens. res pode indicar maior agravamento
sexo masculino essa proporção cai no quadro clínico de dor30-33.
Magnusson e Carlsson13 analisaram
para 27,5%.
a relação entre cefaléia e sintomas O presente estudo pôde observar
No estudo realizado por Maciel25, clínicos relatados por 80 pacientes que em indivíduos não-portadores de
80% de todas as dores de cabeça re- com DTM. Os resultados mostraram cefaléia, de ambos os sexos, é menor
latadas estavam associadas a fontes que 70% dos sujeitos apresentavam a presença de DTM grave; em con-
musculares. Acredita-se que as ativi- cefaléia recorrente e que a relação trapartida, nos indivíduos portadores
dades musculares da cabeça e do pes- entre dor articular e cefaléia existia de cefaléia, não foi possível estabe-
coço provavelmente desempenham somente quando associada ao compro- lecer uma relação direta com os ní-
um papel importante na etiologia de metimento muscular. Os pacientes veis de disfunção. A compreensão da
muitas dores de cabeça, sendo este o com DTM apresentaram maior fre- relação entre cefaléia e DTM ainda
sintoma mais comum e a queixa mais qüência e gravidade de dor de cabe- carece de estudos que determinem
relatada dentre os sintomas da disfunção ça do que os participantes do grupo novos critérios de classificação e abor-
temporomandibular. Garcia e Souza26 controle e, em ambos os grupos, as dagem multidisciplinar, a fim de sub-
analisaram 34 pacientes portadores de mulheres eram mais afetadas pela sidiar o diagnóstico e tratamento des-
disfunção temporomandibular e cons- cefaléia. Montal e Guimarães28, ava- sas patologias.
tataram que 53,9% apresentavam dor liando 121 pacientes com DTM, en-
de cabeça; o sintoma mais comum en- contraram que a cefaléia foi relatada
tre seus pacientes foi o mioespasmo. como queixa principal por 82,2% dos CONCLUSÃO
participantes, seguida de dor na região
Rocha et al.27, examinando mil pa- A porcentagem de universitários
mandibular (68,0%) e otalgia (62,3%).
cientes portadores de DTM, demons- portadores de DTM e a prevalência
Bove et al.29 avaliaram 150 indivíduos
traram presença significativa de desta no sexo feminino, encontrados
com DTM e a maioria referiu dor de
cefaléia em quase todos os grupos neste estudo, corroboram os descritos
cabeça (84%).
etários. Foram apontadas como prin- na literatura. A relação entre DTM e
cipais queixas: cefaléia (70,1%), Vários outros estudos corroboram a cefaléia foi mais prevalente no sexo
artralgia (75,7%), estalos articulares relação entre DTM e cefaléia, apon- feminino. Não foi encontrada uma
(72,7%) e mialgias (71,7%). A análi- tando que pacientes com cefaléia têm relação direta entre a gravidade da
se da distribuição da sintomatologia freqüentemente três ou mais sintomas DTM e a presença de cefaléia.

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Fisioter Pesq. 2008;15(2) :183- 7 187


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.188-93, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Intervenção psicomotora em crianças de nível socioeconômico baixo


Psychomotor intervention on children of low socioeconomic status
Ana Carolina de Campos1, Luiz Henrique Silva2, Karina Pereira3,
Nelci Adriana Cicuto Ferreira Rocha4, Eloisa Tudella4

Estudo desenvolvido no Depto. RESUMO: Visou-se identificar o perfil psicomotor de crianças de baixo nível
de Fisioterapia da UFSCar – socioeconômico e verificar o efeito nelas de um programa de intervenção
Universidade Federal de São psicomotora. Participaram do estudo seis crianças do sexo masculino, na faixa
Carlos, São Carlos, SP, Brasil de 10 a 12 anos (11,5±0,92). Os participantes foram avaliados utilizando-se
1
uma bateria psicomotora que avalia sete fatores psicomotores: tonicidade,
Fisioterapeuta; mestranda no equilibração, lateralização, noção do corpo, estruturação espaço-temporal,
Programa de PG-FT – Pós- praxia global e fina; de acordo com o desempenho da criança, os fatores são
Graduação em Fisioterapia da
pontuados de 1 a 4; o escore 1 refere-se ao perfil apráxico, 2 ao dispráxico, 3
UFSCar
ao eupráxico e 4 ao hiperpráxico. Com base nas dificuldades detectadas foi
2
Fisioterapeuta; aprimorando elaborado um programa de intervenção psicomotora, aplicado durante três
em Ortopedia e Traumatologia meses, em 16 sessões de uma hora de duração, duas vezes por semana. Ao
no Hospital das Clínicas da término da intervenção os participantes foram reavaliados. Pela avaliação
Faculdade de Medicina de inicial, o perfil dos participantes foi predominantemente eupráxico nos fatores
Ribeirão Preto/USP, Ribeirão equilibração, lateralização, noção do corpo, praxia global e praxia fina; nos
Preto, SP, Brasil fatores tonicidade e estruturação espaço-temporal o perfil foi
3
predominantemente dispráxico. Após o programa de intervenção houve
Profa. Dra. do Curso de aumento estatisticamente significativo (p<0.05) na pontuação nos fatores
Fisioterapia do Centro tonicidade, equilibração, estruturação espaço-temporal, praxia global e praxia
Universitário de Araraquara, fina, sugerindo que o programa de intervenção psicomotora aplicado beneficiou
Araraquara, SP, Brasil o desempenho psicomotor de crianças de baixo nível socioeconômico.
4
Profas. Dras. do Programa de DESCRITORES: Criança; Desempenho psicomotor; Fatores socioeconômicos
PG-FT da UFSCar
A BSTRACT : This study aimed at outlining the psychomotor profile of
ENDEREÇO PARA socioeconomically disadvantaged children and at verifying the effect on them
CORRESPONDÊNCIA of an assessment-based psychomotor training program. Participants were six
Ana Carolina de Campos 10-to-12 year-old children (mean age 11.5±0.92), who were evaluated before
R. Dona Alexandrina 1106 Centro and after the program by means of a psychomotor battery which assesses seven
13566-290 São Carlos SP categories: tonus, equilibrium, lateralisation, body perception, time-space
e-mail: orientation, gross and fine praxis; scores range from 1 to 4, determining the
campos.anacarol@gmail.com following profiles: 1, apraxic; 2, dyspraxic; 3, eupraxic; 4, hyperpraxic. By
drawing on children’s difficulties, a psychomotor playing program was applied
Este estudo teve apoio de Bolsa during 3 months, in 16 one-hour sessions, twice a week. The initial evaluation
de Iniciação Científica da
showed participants profile to be predominantly eupraxic in equilibrium,
Fapesp – Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo. lateralisation, body perception, gross and fine praxis; profile was mostly
dyspraxic as to tonus and time-space orientation. After the program, scores
Trabalho apresentado no XIII significantly improved in tonus, equilibration, time-space orientation, gross,
Congresso de Iniciação and fine praxis (p<0.05), thus suggesting that the program applied was able to
Científica da UFSCar e no XIII benefit psychomotor performance of low socioeconomic status children.
Simpósio de Fisioterapia da KEY WORDS: Child; Psychomotor performance; Socioeconomic factors
UFSCar, com publicação de
resumo.

APRESENTAÇÃO
jan. 2008
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO
maio 2008

188 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 88-93


Campos et al. Intervenção psicomotora em crianças

INTRODUÇÃO A identificação de fatores deficitá-


rios pela avaliação do perfil psicomo-
que podem ocorrer por meio da inter-
venção psicomotora pode auxiliar edu-
Na criança, a motricidade e a inteli- tor é importante para traçar diretrizes cadores e terapeutas a elaborar estraté-
gência se desenvolvem como resulta- de intervenção direcionadas à popu- gias de intervenção adequadas para es-
do da interação de fatores genéticos, lação em questão, seja para fins de timular seu desenvolvimento.
culturais, ambientais e psicossociais. Um prevenção ou de reeducação, no am- Diante do exposto, o presente estu-
dos modos de avaliar o resultado da biente escolar ou terapêutico. Com do teve como objetivo identificar o
ação conjunta desses fatores é deter- base no perfil, podem ser elaborados perfil psicomotor e verificar o efeito
minar o perfil psicomotor da criança, programas de educação ou reeduca- de uma intervenção psicomotora em
que indica a qualidade do desenvol- ção psicomotora, visando proporcio- crianças de baixo nível socioeconômi-
vimento psicomotor, especificando as nar motricidade espontânea, coorde- co na faixa de 10 a 12 anos.
habilidades motoras mais e menos ela- nada e rítmica e tornar o cérebro da
boradas adquiridas até o momento1. criança um órgão com maior capaci-

A organização do sistema nervoso


dade para captar, integrar, armazenar,
elaborar e expressar informações1.
METODOLOGIA
é ricamente estimulada pela intera- O estudo foi desenvolvido com 22
ção entre o indivíduo e o ambiente, A intervenção psicomotora foi efi-
cazmente aplicada em diversos estu- crianças que freqüentam o Projeto SOS
que proporciona sensações de origem Bombeiros no Resgate da Cidadania,
interoceptiva, proprioceptiva e extero- dos. Rintala et al. 7 , utilizando para
avaliação o teste de desenvolvimen- dedicado ao atendimento socioeduca-
ceptiva. No entanto, caso a integração tivo de crianças e adolescentes de
to motor global, compararam os efei-
com o meio não forneça os estímulos baixo nível socioeconômico. Todos os
tos da educação física convencional
sensório-motores suficientes, é possí- participantes tinham passado por ava-
e de um programa de intervenção
vel que a motricidade apresente de- liação socioeconômica prévia para
psicomotora durante dez semanas,
senvolvimento insatisfatório 1. poder freqüentar a instituição. Do to-
aplicados a crianças de 6 a 12 anos
Diversos autores apontam que fato- com desordens de linguagem. Os au- tal, apenas seis crianças do sexo mas-
res socioculturais exercem influência tores relatam aprimoramento das ha- culino, com idade média de 11 anos
negativa sobre o desenvolvimento da bilidades motoras globais após ambos e 6 meses, concluíram o programa de
criança 2-5. Barros et al. 2 destacam a os programas, mas a intervenção psi- intervenção psicomotora, sendo qua-
baixa condição socioeconômica da comotora exerceu maior influência tro pertencentes ao nível socioeconô-
família como aspecto fortemente pre- sobre o resultado encontrado. mico C e dois ao nível D, de acordo
judicial. Para Bowman e Wallace3, o com o critério da Abipeme – Associa-
De acordo com Taneja et al.8, um ção Brasileira de Pesquisa de Mercado.
ambiente pode influenciar negativa- programa de intervenção com duração
mente o desenvolvimento da função Foram incluídas no estudo as crianças
de três meses é capaz de acelerar o com idades entre 10 e 12 anos que
vestibular, da integração visomotora, desenvolvimento motor, mental e so- participassem do Projeto acima men-
da força manual e da praxia. O nível cial de bebês e crianças institucionali- cionado e cujos responsáveis consen-
de educação materno, o envolvimen- zados. Kelly et al.9 e Connor-Kuntz & tissem com sua participação no estu-
to dos pais e a estruturação familiar Dummer 10 verificaram aprimoramen- do, assinando o Termo de Consenti-
são outros itens que afetam o desen- to de habilidades motoras globais em mento Livre e Esclarecido. Além da-
volvimento psicomotor da criança4-6. pré-escolares após a intervenção quelas que apresentassem transtornos
O efeito das condições ambientais motora. As habilidades motoras finas no desenvolvimento, foram excluídas
sobre o desenvolvimento psicomotor também podem ser significativamen- as crianças cujos responsáveis não
é um objeto de estudo bastante ex- te aprimoradas em pré-escolares com assinaram o termo de consentimento,
plorado, porém ainda com diversas la- atraso no desenvolvimento11. ou as que deixaram de freqüentar o
cunas. É consenso na literatura que o Os relatos encontrados na literatura Projeto SOS no período de interven-
ambiente tem influência sobre a qua- concentram-se no efeito da interven- ção psicomotora proposto neste estu-
lidade das aquisições da criança, uma ção realizada precocemente, possivel- do. O estudo foi aprovado pelo Comi-
vez que pode limitar suas possibilida- mente porque se verifica que, quanto tê de Ética da Universidade Federal
des de interação. No entanto, o perío- menor a idade das crianças, maior é o de São Carlos.
do de 10 a 12 anos permanece pouco efeito positivo da estimulação8-11. Po-
discutido na literatura, tanto no que
concerne à forma como o ambiente –
rém, poucos estudos esclarecem se Instrumento de avaliação
crianças que não tiveram oportunida-
especificamente, as condições socioe- de de estabelecer desenvolvimento O instrumento de avaliação aplica-
conômicas – podem afetar o desenvol- psicomotor adequado no início da in- do foi a Bateria Psicomotora (BPM) de
vimento psicomotor das crianças nes- fância podem ser estimuladas posterior- Fonseca 1 . Esse instrumento, o mais
sa faixa5 quanto às possibilidades de mente ou estão fadadas a conviver com adequado para atingir os objetivos aqui
atuação sobre as dificuldades apresen- dificuldades. Conhecer o perfil psico- propostos, é de baixo custo e fácil
tadas por essas crianças. motor dessas crianças e as modificações aplicação, tendo sido empregado em

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :188- 93 189


alguns estudos visando caracterizar o res interagiam com a criança, expli- Fase 3 (10 minutos), retorno à con-
perfil psicomotor e verificar efeitos de cando o que aconteceria durante a dição de repouso: as crian-
intervenção 12,13. avaliação, para que ficasse familiari- ças eram conduzidas em ati-
zada e tranqüila. A criança deveria vidades de alongamento e
Trata-se de um conjunto de testes que
estar vestida com roupas confortáveis relaxamento visando contro-
avalia o desenvolvimento da criança
e as tarefas da BPM eram apresenta- le tônico e emocional, me-
em sete fatores psicomotores: toni-
das de forma lúdica, a fim de obter lhora da concentração e da
cidade, equilibração, lateralização,
maior interesse e participação por par- auto-imagem.
noção do corpo, estruturação espaço-
te da criança.
temporal, praxia global e praxia fina, Reavaliação: ao final do programa
constituindo no total 42 tarefas. Cada Intervenção: após a análise do perfil de intervenção psicomotora, as crian-
fator é pontuado de 1 a 4 de acordo obtido pela BPM, foi elaborado um pro- ças foram reavaliadas empregando-se
com o desempenho da criança, sendo grama de intervenção psicomotora, de a mesma bateria de testes.
1 referente ao perfil apráxico, 2 ao atividades que pudessem favorecer o
dispráxico, 3 ao eupráxico e 4 ao hiper-
práxico. Somando-se as pontuações
aprimoramento das dificuldades detec-
tadas.
Análise estatística
dos sete fatores, obtém-se o escore que Para verificar o efeito do programa
O programa de intervenção psico-
permite classificar o perfil psicomotor de intervenção psicomotora, compa-
motora teve a duração de três meses,
geral em deficitário (7 a 8 pontos), rou-se a pontuação obtida na reavalia-
aplicado em duas sessões semanais de
dispráxico (9 a 13 pontos), normal (14 ção com aquela obtida na avaliação
uma hora de duração (total de 16 ses-
a 21 pontos), bom (22 a 26 pontos) ou inicial, por meio do teste t de Student
sões). Cada sessão foi subdividida em
superior (27 a 28 pontos), ou seja, para a pontuação em cada fator psico-
três fases: preparação, atividades mo-
quanto maior o escore, melhor é o motor e à somatória da pontuação em
toras e retorno às condições de repou-
perfil psicomotor da criança. todos os fatores (p=0,05). Também foi
so. As atividades eram desenvolvidas
de forma lúdica para envolver e moti- feita uma análise descritiva, incluin-
Procedimentos var os participantes: do valores percentuais, para observa-
ção da distribuição dos perfis
Previamente, foram coletados dados Fase 1 (10 minutos), preparação: nes- psicomotores pré e pós-intervenção.
sobre o desenvolvimento neurossen- sa etapa eram realizados
sório-motor dos participantes utilizan- alongamentos preparatórios
do-se ficha de avaliação elaborada gerais, incluindo da muscula- RESULTADOS
especificamente para este estudo, e tura de membros superiores,
dados sobre o nível socioeconômico membros inferiores e tronco; Na avaliação inicial, constatou-se
da família por meio do questionário predomínio do perfil psicomotor
Fase 2 (40 minutos), atividades moto- eupráxico nos fatores equilibração
da Abipeme. O estudo consistiu em ras: realizavam-se aí ativi-
avaliação Inicial, intervenção e (84%), lateralização (67%), noção do
dades lúdicas, incluindo jogos corpo (84%), praxia global (84%) e
reavaliação, como exposto a seguir. individuais ou em grupo, ela- praxia fina (67%). Por outro lado, cons-
Avaliação individual: consistiu na boradas com base na literatura tatou-se perfil psicomotor dispráxico
aplicação da BPM a cada criança, referente à intervenção psico- nos fatores tonicidade (50%) e estru-
com duração de 50 minutos, em uma motora14,15. O Quadro 1 sinte- turação espaço-temporal (67%).
sala oferecida pelo Projeto SOS. Antes tiza as atividades para cada
do início da avaliação, os pesquisado- fator psicomotor. Na reavaliação, ou seja, após o pro-
grama de intervenção, constatou-se
Quadro 1 Atividades motoras propostas para cada categoria psicomotora que no fator equilibração manteve-se
o predomínio do perfil eupráxico
Fator psicomotor Atividades motoras (67%), porém não houve participantes
Tonicidade Alongamentos, exercícios de suporte de peso com perfil dispráxico (como anterior-
Brincadeiras envolvendo equilíbrio dinâmico e estático, mente), e sim participantes apresen-
Equilibração
com apoio uni e bipodal tando perfil hiperpráxico (33%). No
Lateralização Conscientização dos hemicorpos fator lateralização, a reavaliação re-
Noção do corpo Relaxamento e vivências corporais velou aumento na porcentagem de
participantes com perfil hiperpráxico
Estruturação Brincadeiras envolvendo músicas e gestos,
espaço-temporal atividades de planejamento espacial (50%). No fator noção do corpo não
se verificou alteração na distribuição
Jogos para coordenação óculo-manual e óculo- dos perfis. O fator praxia global o per-
Praxia global pedal, dissociação de membros superiores e
fil evoluiu de predominantemente
inferiores, agilidade e velocidade
eupráxico para predominantemente
Recorte e dobraduras; manuseio de objetos hiperpráxico (67%); no fator praxia
Praxia fina
pequenos fina, embora o perfil tenha permane-

190 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :188- 93


Campos et al. Intervenção psicomotora em crianças

100
% * * Dispráxico
Eupráxico
DISCUSSÃO
90 Hiperpráxico
O presente estudo buscou verificar
80 o efeito de intervenção psicomotora
70 * * *
em crianças de baixo nível socioeco-
60 nômico, constatando diferenças no per-
50 fil após a intervenção. Na avaliação
40 inicial, predominou o perfil eupráxico
30 na maioria dos fatores, exceto toni-
20 cidade e estruturação espaço-temporal,
10 em que as crianças apresentaram per-
0 fil dispráxico, ou seja, abaixo do es-
A R A R A R A R A R A R A R perado para a faixa etária. No estudo
de Pereira16, o perfil psicomotor euprá-
T E L NC EET PG PF
xico predominou em crianças saudáveis
Perfil constatato nos fatores psicomotores de 7 anos de idade, freqüentadoras da
rede particular de ensino. Assim, seria
Gráfico 1 Distribuição (em %) dos perfis psicomotores observados nos esperado que na faixa de 10 a 12 anos
participantes na avaliação e reavaliação psicomotora. A: avaliação; houvesse predomínio do perfil hiper-
R: reavaliação; T: tonicidade; E: equilibração; L: lateralização; NC: práxico, ou que, ao menos, crianças
noção do corpo; EET: estruturação espaço-temporal; PG: praxia nessa idade estivessem passando por
global; PF: praxia fina; * diferença estatisticamente significativa uma transição do perfil eupráxico para
o hiperpráxico.
cido eupráxico, nenhum participante (p=0,05), praxia global (p=0,0006) e
revelou perfil dispráxico, e outros pas- praxia fina (p=0,03). Na reavaliação, manteve-se o pre-
saram a apresentar perfil hiperpráxico domínio do perfil eupráxico na maio-
O perfil psicomotor geral (escore
(33%). Quanto aos fatores tonicidade ria dos fatores, porém já delineando
correspondente à soma das pontuações
e estruturação espaço-temporal, a uma transição para o perfil hiperprá-
nos sete fatores) foi significativamen-
xico, visto que nos fatores equilibra-
reavaliação permitiu constatar que to- te diferente após o programa de inter-
ção e praxia fina houve participantes
dos os participantes atingiram o perfil venção psicomotora (t=7,52, gl=6,
p<0,001), conforme se observa no Grá- que passaram a apresentar perfil
eupráxico. O Gráfico 1 sumariza os
fico 2. A média da pontuação antes hiperpráxico e, no fator praxia global,
resultados da avaliação inicial e da
da intervenção psicomotora foi 19,46 passou a haver predomínio do perfil
reavaliação.
pontos (±1,7), classificando o perfil hiperpráxico. No fator tonicidade to-
As diferenças de pontuação foram geral como normal e, após o progra- dos os participantes passaram a apre-
estatisticamente significativas nos fato- ma de intervenção psicomotora, foi sentar perfil eupráxico, o que pode
res tonicidade (p=0,008), equilibração 22,83 pontos (±1,1), classificando o proporcionar uma base estável para o
(p=0,01), estruturação espaço-temporal perfil geral como bom. desempenho psicomotor nos outros
fatores, uma vez que a organização
* tônica é um suporte para toda a ativi-
25
dade motora 1 . Da mesma forma, o
24 aprimoramento da equilibração favo-
23 rece que o indivíduo possa realizar
Pontuação média na BPM

atividades motoras com baixo gasto


22
energético. Com isso, o desempenho
21 motor de forma geral é favorecido1.
20 Após a intervenção psicomotora, a
19 Máximo
maior diferença foi notada no desem-
penho no fator estruturação espaço-
18 Desvio padrão
temporal. Este era o fator com maior
17 Média
porcentagem de participantes com
16 Mínimo perfil dispráxico e todos evoluíram
para o perfil eupráxico. O aprimora-
15
mento observado nas habilidades de
Avaliação Reavaliação
estruturação espaço-temporal permi-
Gráfico 2 Pontuação média dos participantes na avaliação e reavaliação te movimentos rítmicos e organizados,
psicomotora. BPM = bateria psicomotora; * diferença sendo crucial no desempenho coorde-
estatisticamente significativa nado de qualquer ato motor17. O re-

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :188- 93 191


sultado observado pode, ainda, favo- especificamente direcionada para a socioeconômico, acrescenta-se a pos-
recer a capacidade de aprendizagem noção corporal possa resultar em apri- sibilidade de promover maior inclu-
das crianças, uma vez que a má estru- moramento. são social, contribuindo para reduzir
turação espaço-temporal está associa- as barreiras sociais que interferem em
Considerando-se a pontuação geral,
da com dificuldades de aprendizagem seu desenvolvimento.
verificou-se que a intervenção psico-
escolar 18.
motora aplicada favoreceu significa- Os resultados obtidos sugerem que
Na praxia global, o perfil médio tivamente o aprimoramento do perfil a amostra estudada apresentava de-
das crianças evoluiu de predominan- psicomotor dos participantes, que pas- sempenho inadequado para a faixa
temente eupráxico para hiperpráxico, sou de normal para bom. Diversos es- etária, pois espera-se que crianças a
favorecendo a habilidade na execução tudos confirmam o fato de que pro- partir de 8 anos não tenham dificul-
das atividades motoras. Este resulta- gramas de intervenção psicomotora dades com habilidades psicomotoras
do concorda com o de Valentini19, que exercem importante contribuição no básicas 1,17, mas que o programa de
também verificou, após intervenção desenvolvimento de crianças expos- intervenção foi capaz de induzir mu-
motora, ganho qualitativo nas habi- tas a fatores de risco. Para Goodway e danças em seu perfil psicomotor. Ten-
lidades motoras globais, como chutar Branta22 as habilidades de locomoção do em vista que nesta faixa etária as
e arremessar, em crianças em idade e controle de objetos (como lançar e mudanças não são tão rápidas como
escolar que apresentavam atraso mo- chutar a bola) podem ser aprimoradas as ocorridas em crianças mais jo-
tor em relação a sua faixa etária. O com programas de intervenção dire- vens17, considera-se que os resultados
resultado observado quanto à praxia cionados a pré-escolares com atraso observados em tão curto período de
fina sugere transição para o perfil motor. Pré-escolares típicos também tempo refletem efeitos positivos do
hiperpráxico, fato que pode ter impac-
podem se beneficiar da intervenção, programa de intervenção.
to positivo no desempenho escolar dos
como relatado por Kelly et al.9, o que
participantes 18. Além disso, de acor-
sugere que a reeducação é viável e
do com Piek et al.20, crianças com de-
sempenho motor fraco estão em risco
benéfica no ambiente escolar, onde CONCLUSÃO
se encontram tanto crianças expostas
de dificuldades sociais, emocionais e Os resultados sugerem que o pro-
comportamentais, o que justifica a a fatores de risco quanto crianças com
grama de intervenção foi capaz de
importância de intervir nas dificulda- desenvolvimento saudável.
beneficiar o desempenho psicomotor
des motoras apresentadas. Além dos benefícios citados, a ex- dos participantes. Novos estudos são
Quanto ao fator lateralização, ape- pansão das habilidades promovida necessários, com amostra maior e mai-
sar de não se ter observado diferença pela intervenção psicomotora repre- or período de intervenção psicomotora,
estatisticamente significativa, obser- senta um resultado importante também porém o fato de os participantes te-
vou-se evolução no perfil psicomotor pelos efeitos psicossociais proporcio- rem apresentado evolução no perfil
dos participantes. Com relação ao fa- nados à criança. De acordo com psicomotor sugere que, na faixa de 10
tor noção do corpo, não se verificou Miller et al.23, dificuldades motoras na a 12 anos, ainda é possível intervir,
alteração com o programa de interven- infância podem ter impacto negativo promovendo aprimoramento no perfil
ção. Macedo et al.21 observaram, em sobre a autopercepção de competên- psicomotor das crianças. Desse modo,
escolares de baixo nível socioeconô- cia, resultando em prejuízo ao auto- programas de intervenção psicomotora
mico, grande prevalência de dificul- conceito, baixa auto-estima, problemas devem ser incentivados, principalmen-
dade na formação do esquema corpo- comportamentais e desajuste social. te em comunidades de baixo nível
ral, independentemente da participa- Como as dificuldades motoras são po- socioeconômico, a fim de permitir as
ção em programas de estimulação. No tencialmente modificáveis, a identi- melhores oportunidades possíveis para
entanto, considerando-se que essa ficação e tratamento dos défices mo- um desenvolvimento saudável e ame-
habilidade está em constante adapta- tores são importantes para amenizar os nizar os efeitos desfavoráveis das con-
ção ao longo da vida do indivíduo, possíveis efeitos negativos dessas difi- dições socioeconômicas sobre o de-
sugere-se que uma intervenção mais culdades. Para crianças de baixo nível senvolvimento infantil.

192 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 88-93


Campos et al. Intervenção psicomotora em crianças

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Fisioter Pesq. 2008;15(2) :188- 93 193


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.194-9, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Comportamento quimiometabólico do músculo sóleo na


fase aguda da imobilização articular
Chemical metabolic behaviour of the soleus muscle during the acute
phase of joint immobilisation
Luciano Júlio Chingui1, Rommel Padovan Braquinho1, Maria Theresa Munhoz Severi1, Carlos Alberto da Silva2

Estudo desenvolvido no RESUMO: O objetivo foi avaliar o perfil fisiológico do músculo sóleo na fase
Programa de Pós-Graduação aguda da imobilização articular na posição de 90o. Ratos Wistar foram divididos
em Fisioterapia da Unimep – em 4 grupos (n=6 cada): controle (C), imobilizado por 1 (Im1), 2 (Im2) e 3 dias
Universidade Metodista de (Im3). Após o período experimental, o músculo sóleo foi retirado e foram
Piracicaba, Piracicaba, SP, mensurados: o peso muscular, o índice de hidratação, a concentração de
Brasil glicogênio e a concentração de DNA/proteínas totais. Os dados foram
1
Fisioterapeutas Ms. submetidos a análise estatística, com nível de significância fixado em p<0,05.
No primeiro dia não houve alterações nas reservas glicogênicas, sendo
2
Prof. Dr. do Programa de Pós- observada redução progressiva das reservas: 53% no segundo dia e 65% no
Graduação em Fisioterapia da terceiro dia de imobilização. O peso muscular sofreu redução de 28,57% apenas
Unimep no terceiro dia; o índice de hidratação aumentou 6,44% no segundo e 8,58%
no terceiro dia. As concentrações de DNA tiveram elevação de 43,18% no
ENDEREÇO PARA primeiro dia, 59,09% no segundo e 75% no terceiro. Quanto à concentração
CORRESPONDÊNCIA de proteínas totais, houve elevação de 45,9% no primeiro dia, 32,25% no
Luciano J. Chingui segundo e 58,95% no terceiro dia. Os resultados sugerem que a hipotrofia
R. São Sebastião 125 Vila muscular é um processo desencadeado precocemente, envolvendo alterações
Monteiro quimiofisiológicas que são deflagradas na fase aguda da imobilização.
13418-485 Piracicaba SP DESCRITORES: Atrofia muscular; Imobilização; Músculo esquelético/metabolismo
e-mail:
ljchingui@yahoo.com.br
ABSTRACT: The purpose of this study was to outline a physiological profile of the
Este estudo contou com apoio soleus muscle during the acute phase of joint immobilization at a 90º position.
financeiro da Capes – Male Wistar rats were divided into four groups (n=6): Control (C), immobilised
Coordenação de for 1 (Im1), 2 (Im2), and 3 (Im3) days. After the experimental period, the soleus
Aperfeiçoamento de Pessoal de muscle was obtained in order to assess: glycogen content, muscle weight,
Nível Superior. hydration index, and protein-DNA interactions. Data were statistically analysed
and significance level set at p<0.05. On the first day, no changes were observed
on glycogen content, but progressive reduction was witnessed along the
following days –53% on the second day and 65% on the third day of
immobilization. Muscle weight suffered a reduction of 28.57% only on the
third day, while hydration index increased 6.44% on the second day and 8.58%
on the third day. Concentrations of DNA raised 43.18% on the first day, 59.09%
on the second, and 75% on the third day. Protein concentrations also increased,
reaching values of 45.9% on the first day, 32.25% on the second day, and
APRESENTAÇÃO 58.95% on the third day. These results suggest that muscular hypotrophy is an
set. 2007 early-developing process, involving chemical-physiological alterations that
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO are launched during the acute phase of immobilization.
jun. 2008 KEY WORDS: Immobilisation; Muscle, skeletal/metabolism; Muscular atrophy

194 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 94-9


Chingui et al. Efeito da imobilização no músculo sóleo

INTRODUÇÃO uma redução na expressão de proteí-


nas nos músculos hipotrofiados e a
água ad libitum, submetidos a ciclos
de 12 h claro/escuro e distribuídos em
A musculatura esquelética consti- correlacionaram à degradação da pro- quatro grupos experimentais com seis
tui um dos principais tecidos alvos da teína IRS-1; e, ainda observaram uma animais, a saber: controle (C) e imo-
fisioterapêutica, uma vez que está en- redução na atividade da Akt. Esses bilizados 1 dia (Im1), 2 dias (Im2) e 3
volvida com diversas afecções, em achados evidenciam uma redução na dias (Im3). O trabalho foi aprovado
especial as ortopédicas. No âmbito da efetividade da sinalização insulínica. pelo comitê de ética em experimen-
ortopedia, a imobilização é um recur- Diversas pesquisas encontraram tação animal da UFSCar.
so terapêutico eficiente e amplamen- perdas de massa muscular em perío-
te utilizado, mas que acarreta diversos Após anestesia com pentobarbital
dos de imobilização. Ohira et al. 10 sódico (50 mg/kg, i.p), a pata poste-
efeitos indesejados, como o compro- observaram em ratos a implantação
metimento da homeostasia das fibras rior esquerda dos animais foi imobili-
rápida da hipotrofia em períodos de zada com o modelo de órtese de resi-
musculares. A literatura científica mos- sete e dez dias de imobilização por
tra que, simultaneamente ao desuso, na acrílica proposto por Silva et al.16.
suspensão, sendo evidenciado que,
ocorrem alterações como hipotrofia após o 10o dia, a perda de massa ocor- Após a fase de imobilização, os
muscular, fibrose intramuscular, redu- re com menor velocidade. animais foram sacrificados por deslo-
ção da extensibilidade muscular, além camento cervical e o músculo sóleo
de limitação de movimento articular1. Outros estudos indicam que longos
(S) foi retirado e preparado para a de-
períodos de imobilização promovem
Nesse contexto, tem-se caracteriza- redução nas fibras musculares, mere- terminação de reservas glicogênicas,
do a hipotrofia como um processo es- cendo destaque o estudo de Veldhuizen peso seco, porcentagem de hidratação
pecífico em cada tipo de músculo 2 . et al. 11, que verificaram, através de e concentrações de DNA e proteínas
As fibras do tipo I têm menor capaci- biópsia muscular, redução de 16% no totais.
dade de adaptação do que as fibras diâmetro da fibra do músculo vasto
do tipo II, sendo conseqüentemente Para a determinação do glicogênio,
lateral após quatro semanas de imo- as amostras dos músculos foram dige-
mais afetadas pelo desuso3. Isso é ra- bilização. Chakravarthy et al. 12 de-
tificado por Caiozzo et al.4, segundo ridas em KOH 30% a 100°C e o glico-
monstraram uma significativa redução gênio precipitado a partir da passagem
os quais músculos cuja ação é na massa do músculo sóleo e no po-
antigravitacional têm maior grau de por etanol a quente. Entre uma fase e
tencial de proliferação das células sa- outra da precipitação, a amostra foi
hipotrofia em situações de desuso. télites residentes após três semanas de
Kasper et al.5 observaram maior sus- centrifugada a 3.000 rpm durante 10
imobilização.
ceptibilidade à hipotrofia em fibras minutos. O glicogênio precipitado foi
lentas oxidativas e Tanaka et al.6 ob- Outros estudos, como os realizados submetido à hidrólise ácida na presen-
servaram no músculo sóleo maior com- por Ohira et al. 10 , Kano et al. 13 , ça de fenol, segundo a proposta de Siu
prometimento em situação de desuso, Edgerton et al.14 e Morris et al.15, tam- et al.17, estando os valores expressos
por ser predominantemente formado bém observaram implantação da hipo- em mg/100mg de peso úmido.
por fibras do tipo I, ao passo que o trofia muscular em períodos de imo-
bilização que variam de cinco dias a Para a obtenção do índice de hidra-
extensor longo dos dedos, que tem pre-
várias semanas. tação e do peso seco, imediatamente
domínio de fibras do tipo II, é menos
após a retirada do músculo, o mesmo
comprometido. Observou-se ainda que Vale salientar que não há na litera- foi pesado em balança semi-analítica
as fibras lentas em situação de desuso tura estudos direcionados à compre-
apresentam marcantes alterações his- e em seguida colocado em uma estu-
ensão dos mecanismos fisiológicos fa a 60ºC. Subseqüentemente, o mús-
tofisiológicas como irregularidades no deflagrados nos primeiros dias de imo-
retículo sarcoplasmático, fibrilas de- culo foi pesado a cada 1 hora até per-
bilização, sendo esse considerado o manecer com peso constante (em mg).
sintegradas, lesão mitocondrial, linhas período agudo do desuso.
Z estendidas, bem como condensação Assim, pela diferença entre o peso
e fragmentação da cromatina nuclear e Diante do exposto, o objetivo des- inicial (peso úmido) e o peso final, foi
redução de sarcômeros em paralelo5,7,8. te trabalho foi avaliar o perfil meta- determinado tanto o índice de hidra-
bólico do músculo sóleo na fase agu- tação muscular (em %) como o peso
Alguns estudos vêm tentando eluci- da da imobilização do tornozelo de seco (em mg).
dar as alterações metabólicas geradas ratos na posição de 90o, com foco no
pela imobilização. Assim, Hilder et A determinação das proteínas totais
período que se estende do primeiro ao
al.9 em estudo realizado com suspen- foi realizada com kit laboratorial da
terceiro dia de desuso.
são de membros posteriores de ratos, marca BioDiagnóstica ® , e do DNA
demonstraram que a resistência à insu- pela metodologia proposta por Giles
lina acompanha o processo de atrofia
muscular induzida pelo desuso em
METODOLOGIA e Myers18. Assim, para a determina-
ção do DNA muscular foi preparado
músculos esqueléticos de contração Foram utilizados ratos albinos Wistar inicialmente o homogenato compos-
lenta, como o músculo sóleo. Simul- com 3 meses de idade, alimentados to por 100 mg de músculo e 1 ml de
taneamente, esses autores observaram com ração (Purina® para roedores) e HclO 4 , misturando-se em seguida o

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :194-9 195


homogenato com solução de difeni-
lamina e HclO4, seguido de agitação
Os valores estão representados pe-
las médias ± erro padrão (média±ep).
RESULTADOS
e banho-maria a 30°C durante 12 ho- Na análise estatística foi utilizado o tes- Em relação às reservas glicogênicas
ras; após esse período foi realizada te de normalidade de Kolmogorov- (Gráfico 1), a imobilização não pro-
leitura espectrofotométrica a 595 nm; Smirnov, seguido da análise de variância vocou alterações significativas nas
os valores estão expressos em mg/ ANOVA e teste de Tukey, com nível primeira 24 horas, sendo observados
100mg. de significância de 5% (p<0,05). os seguintes valores: C, 0,52±0,07 e
Im1, 0,46±0,04 mg/100mg (p>0,05).
Por outro lado, houve redução signifi-
0,7 cativa progressiva no segundo e ter-
0,6 ceiro dias, de 53% no grupo imobili-
0,5 zado 2 dias (C, 0,52±0,07 e Im2,
Glicogênio
mg/100mg

0,4 0,24±0,06 mg/100mg, p<0,05) e 65%


* no grupo imobilizado 3 dias (C,
0,3
* 0,52±0,07 e Im3, 0,18±0,03 mg/
0,2 100mg, p<0,05).
0,1
A avaliação do peso muscular re-
0
velou diferença significativa apenas
C Im1 Im2 Im3 no terceiro dia de desuso, quando foi
Grupos experimentais observada redução de 28,57% (C,
Gráfico 1 Conteúdo de glicogênio (mg/100mg) nos grupos controle (C) e 35±2 e Im3, 25±1 mg, p<0,05 – Grá-
imobilizados um dia (I1), dois dias (I2) e três dias (I3); valores em fico 2). O Gráfico 3 ilustra o índice
média±epm; n=5; *p<0,05 comparado ao controle (C) de hidratação, observando-se aumen-

40 80
Hidratação muscular (%)

35 *
Peso muscular (mg)

78 *
30
76
25
20 74
15 *
72
10
5 70
0 68
C Im1 Im2 Im3 C Im1 Im2 Im3
Grupos experimentais Grupos experimentais
Gráfico 2 Peso muscular (mg) nos grupos controle (C) e Gráfico 3 Índice de hidratação muscular (%) nos grupos
imobilizados um dia (Im1), dois dias (Im2) e três controle (C) e imobilizados um dia (Im1), dois dias
dias (Im3); valores em média±epm; n=5; *p<0,05 (Im2) e três dias (Im3); valores em média±epm;
comparado ao controle (C) n=5; *p<0,05 comparado ao controle (C)

0,1 10
* *
0,08 * 8 *
*
DNA muscular

Proteínas totais

*
(mg/100mg)

(mg/100mg)

0,06 6
0,04 4
0,02 2
0 0
C Im1 Im2 Im3 C Im1 Im2 Im3
Grupos experimentais Grupos experimentais

Gráfico 4 Concentração de DNA muscular (mg/100mg) Gráfico 5 Concentração de proteína total muscular (mg/
nos grupos controle (C) e imobilizados um dia 100mg) nos grupos controle (C) e imobilizados um
(Im1), dois dias (Im2) e três dias (Im3); valores dia (Im1), dois dias (Im2) e três dias (Im3); valores
em média±epm; n=5; *p<0,05 comparado ao em média±epm; n=5; *p<0,05 comparado ao
controle (C) controle (C)

196 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :1 94-9


Chingui et al. Efeito da imobilização no músculo sóleo

to de 6,44% no segundo dia (C, No presente estudo iniciou-se avali- Após evidenciar a perda de massa
71,42±0,42 e Im2, 76,02±1%, p<0,05); ando o conteúdo glicogênico muscular, muscular, avaliou-se a concentração
de 8,58% no terceiro dia (C, 71,42±0,35 uma vez que esta reserva é marcadora de DNA e proteína total, sendo obser-
e Im3, 77,55±0,38%, p<0,05). tanto das condições energéticas quanto vado que os músculos apresentaram
da condição de performance do múscu- elevação progressiva nas concentra-
A avaliação das concentrações de
lo esquelético27. Ao avaliar as reservas ções. Alguns pontos a esse respeito
DNA (Gráfico 4) mostra elevação de
de glicogênio, observa-se que, no pri- merecem destaque, como por exem-
43,18% (C, 0,044±0,0017 e Im1,
meiro dia de desuso, não houve alte- plo o fato de que as medidas de prote-
0,063±0,0061 mg/100mg, p<0,05) no
ração significativa; mas na progressão ína e DNA têm sido muito utilizadas
primeiro dia; de 59,09% no segundo dia
da análise, observou-se redução no em diferentes estudos para indicar ta-
(C, 0,44±0,0017 e Im2, 0,070±0,0047
conteúdo, que foi intensificada no se- manho e número de células em um
mg/100mg, p<0,05); e 75% no terceiro
gundo e terceiro dias. tecido 35.
dia (C, 0,044±0,0017 e Im3, 0,077±0,011
mg/100mg, p<0,05). O músculo sóleo é composto por O desenvolvimento de hipotrofia
84% de fibras tipo I. Por essa razão, a observado nos resultados tem relação
Quanto ao conteúdo de proteínas
redução no conteúdo glicogênico direta com o balanço entre a taxa de
totais, foi observada no primeiro dia
pode dever-se ao fato de os músculos síntese e degradação das proteínas36.
elevação de 45,90% (C, 5,058±0,26
vermelhos apresentarem uma maior Por outro lado, por haver elevação no
e Im1, 7,38±0,27 mg/100mg, p<0,05);
população de receptores de insulina; índice de hidratação, é sugestivo o fato
de 32,25%, no segundo (C, 5,58±0,26
dessa maneira, esse trabalho ratifica de neste estudo ter se verificado com-
e Im2, 7,38±0,78 mg/100mg, p<0,05);
estudos que sugerem que, entre a ter- prometimento de outros sistemas
e de 58,95% no terceiro dia (C,
ceira e oitava hora após a imobiliza- ativados, concomitante à elevação na
5,058±0,26 e Im3, 8,04±0,7 mg/100mg,
ção, já há significante redução na po- permeabilidade capilar, como por
p<0,05), como mostra o Gráfico 5.
pulação dos receptores insulínicos, exemplo a elevação no extravasa-
comprometendo a cascata sinaliza- mento de proteínas plasmáticas. Le-
DISCUSSÃO dora da insulina, principalmente no
que se refere às vias citosólicas liga-
vanta-se aqui uma hipótese explicati-
va. De acordo com observações de
Desde a década de 1970, não se das à síntese de glicogênio, predispon- Durigan37, o modelo de órtese aqui uti-
obtém um consenso frente às altera- do ao quadro de resistência à insulina lizado geraria redução na deambulação
ções histo-quimiofisiológicas induzi- e concomitante redução nas reservas logo no primeiro dia do desuso. Assim,
das pelo desuso muscular, sendo ob- glicogênicas 28-30. sincronicamente à imobilização tam-
servados resultados contraditórios, que Quanto ao comportamento do peso bém ocorre edema leve, contribuindo
descrevem graus diferenciados de sus- muscular, foi observado que somente ainda mais para a redução na movimen-
ceptibilidade à atrofia e relações fun- no terceiro dia de imobilização o peso tação exploratória. Possivelmente, os re-
cionais diferenciadas de acordo com mostrou-se reduzido, fato que pode ter sultados da mensuração da concentra-
o tipo da fibra muscular e o local em relações com a redução na síntese ção de DNA e proteínas totais podem
que esta se encontra19-22. proteica simultânea à elevação na representar um somatório do conteúdo
proteólise26,31-33. pertencente às fibras musculares in situ
Alguns estudos sugeriram que as e do proveniente de outros fatores de-
alterações mais evidentes da atrofia Optou-se por também avaliar o índi-
correntes do maior índice de hidrata-
ocorrem nos dias iniciais do desuso, ce de hidratação, sendo verificado que
ção, como um possível infiltrado de
indicando a possibilidade de haver no segundo e terceiro dia da imobiliza-
células do sistema imunológico e/ou
certa temporização nas alterações da ção a hidratação foi significativamente
de outras estruturas.
homeostasia das fibras musculares maior. Esse aumento da hidratação pode
quando submetidas à imobilização23,24. ser reflexo da liberação local de subs-
Nesse sentido, entende-se que os maio-
res comprometimentos homeostásicos
tâncias vasoativas na tentativa de me-
lhorar a perfusão tecidual e assim mo-
CONCLUSÃO
ocorram na fase inicial do desuso, de dificar o padrão de oferecimento de Durante a imobilização, uma diver-
modo que, à medida que a situação de substratos ou oxigênio34. Assim, a redu- sidade de fatores compromete a
desuso torna-se crônica, o declínio das ção no peso observado no terceiro dia homeostasia do tecido muscular de-
funções metabólicas ocorre de forma de desuso é resultante de um processo sencadeando hipotrofia. Tais fatores
mais rápida25, como evidenciado em de proteólise que ocorre simultaneamen- são ativados logo nos primeiros três
trabalho recente26. te à elevação no índice de hidratação. dias do desuso.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :194-9 197


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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.200-6, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Estabilização segmentar da coluna lombar nas lombalgias: uma revisão


bibliográfica e um programa de exercícios
Spinal segmental stabilisation in low-back pain: a literature review
and an exercise program
Fábio Jorge Renovato França1, Thomaz Nogueira Burke1, Daniel Cristiano Claret2, Amélia Pasqual Marques3

Estudo desenvolvido no RESUMO: No tratamento de lombalgias, exercícios tradicionais de fortalecimento


Programa de Pós-Graduação dos músculos abdominais e extensores do tronco têm sido alvo de críticas por
em Ciências da Reabilitação submeter a coluna vertebral a altas cargas de trabalho, aumentando o risco de
do Fofito/ FMUSP – Depto. de nova lesão. Estudos recentes comprovam a eficácia da estabilização segmentar
Fisioterapia, Fonoaudiologia e como tratamento para a lombalgia, sendo menos lesiva por ser realizada em
Terapia Ocupacional da posição neutra. Pesquisas sugerem que, sem a ativação correta dos estabilizadores
Faculdade de Medicina da profundos do tronco, as recidivas do quadro álgico são notadas com muita
Universidade de São Paulo, freqüência. Este estudo procedeu à revisão da literatura sobre o tratamento
São Paulo, SP, Brasil das lombalgias mediante estabilização da coluna e propõe exercícios para
1
Mestrandos no Programa de seu tratamento baseados na estabilização segmentar lombar. Na base PubMed,
Ciências da Reabilitação do por meio dos descritores estabilização lombar, multífido lombar, transverso do
Fofito/FMUSP abdome e os equivalentes em inglês, foram selecionados 47 artigos e livros
publicados entre 1984 e 2006. A literatura estabelece um elo entre lombalgia
2
Fisioterapeuta Ms. e escasso controle dos músculos profundos do tronco, em especial o multífido
lombar e o transverso do abdome; estudos também indicam os músculos
3
Profa. Livre-Docente do Fofito/ quadrado lombar e diafragma como estabilizadores lombares. Propõem-se assim
FMUSP exercícios de contrações isométricas sincronizadas, sutis e específicas, que
atuam diretamente no alívio da dor por meio do aumento da estabilidade do
ENDEREÇO PARA segmento vertebral.
CORRESPONDÊNCIA
Fábio J. R. França DESCRITORES: Dor lombar/reabilitação; Terapia por exercício; Multífido lombar;
Fofito/FMUSP Transverso do abdome; Revisão
Rua Cipotânea 51 Cidade
Universitária ABSTRACT: When treating low-back pain, traditional exercises for strengthening
05360-160 São Paulo SP abdomen and trunk erector muscles have been criticised for their submitting
e-mail: fabiojrf@usp.br spinal structures to high loads, thereby increasing the risk of new injury. Recent
studies have pointed to the effectiveness of segmental stabilisation in treating
low-back pain, less damaging since it is done in neutral position. Current
research suggests that, unless the trunk deep stabilizers are correctly activated,
recurrence of pain is more often noticed. This is a review of 47 articles and
books published between 1984 and 2006, resulting from a search in PubMed
database by means of key words lumbar stabilization, lumbar multifidus and
transversus abdominis muscles. Literature has established a link between low-
back pain and poor control of deep trunk muscles, particularly the lumbar
multifidus and transversus abdominis muscles; some studies also point out the
quadratus lumborum and diaphragm muscles as lumbar stabilizers. By drawing
on the reviewed material, we suggest exercises of subtle and specific
APRESENTAÇÃO synchronized isometric contractions for these lumbar stabilisers, which act
nov. 2006 directly upon pain relief by increasing lumbar spine stability.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Low-back pain/rehabilitation; Lumbar Multifidus; Transversus
ago. 2007 Abdominis; Review

200 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :200-6


França et al. Estabilização segmentar lombar na lombalgia

INTRODUÇÃO monstrem a eficácia da ESL no alívio


da dor e na recorrência, além de propor
Barr et al.11 definiram a estabilida-
de como um processo dinâmico que
A lombalgia está hoje presente em exercícios para os músculos profundos inclui posições estáticas e movimen-
todas as nações industrializadas1. Afe- do tronco, em vista da estabilização da to controlado. Isso inclui um alinha-
ta de 70% a 80% da população adul- coluna lombar, para prevenção e/ou tra- mento em posições sustentadas e pa-
ta em algum momento da vida2, com tamento da lombagia. drões de movimento que reduzam a
predileção por adultos jovens, em fase tensão tecidual, evitem causas de trau-
ativa3. É uma das causas mais freqüen- ma para as articulações ou tecidos
tes de atendimento médico, e a segun- METODOLOGIA moles, e forneçam ação muscular efi-
da causa de afastamento do trabalho4. ciente.
Procedeu-se à busca na base de da-
Citam-se como causas processos dos PubMed mediante os descritores Bergmark 12 propôs o conceito de
degenerativos, inflamatórios e altera- estabilização lombar, multífido lombar, vários músculos com diferentes papéis
ções congênitas e mecânico-posturais. transverso do abdome e os correspon- na estabilidade dinâmica. A hipótese
Estas últimas são responsáveis por gran- dentes em inglês lumbar stabilization, é que há dois sistemas atuando na es-
de parte das dores. Nelas ocorre um lumbar multifidus, transversus abdominis, tabilidade. O global consiste de gran-
desequilíbrio entre a carga funcional tendo sido selecionados 47 artigos e des músculos produtores de torque,
(esforço requerido para atividades do livros publicados entre 1984 e 2006. atuando no tronco e na coluna sem
trabalho e da vida diária) e a capaci- Os principais achados são a seguir co- serem diretamente ligados a ela. São
dade funcional, que é o potencial para mentados discutindo-se a estabilida- eles o reto do abdome (RA), o oblíquo
a execução 2. de da coluna, o papel dos principais externo (OE) e a parte torácica do
músculos em sua estabilização, os iliocostal lombar. Fornecem estabili-
Um grande número de intervenções
mecanismos compensatórios, para, fi- dade ao tronco, não sendo capazes de
fisioterapêuticas tem sido utilizadas,
nalmente, propor um programa de influenciar diretamente a coluna. O
como exercícios aeróbios, de flexão
exercícios com base nesses achados. sistema local é formado por músculos
e extensão da coluna para o tronco,
ligados diretamente à vértebra e res-
realizados com os membros inferiores,
ponsáveis pela estabilidade e controle
de inclinação pélvica, órteses e alon- ESTABILIDADE DA segmentar. Tais músculos são o mul-
gamentos5. O exercício realizado em
prono com extensão do tronco e dos COLUNA tífido lombar (ML), o transverso do
abdome (TA) e as fibras posteriores do
membros inferiores é contra-indicado, oblíquo interno (OI). O quadrado lom-
Segundo Panjabi10, a estabilidade da
pois há risco de lesão ou recidiva. bar (QL) também tem funções estabili-
coluna decorre da interação de três
Nessa tarefa, a região lombar subme- zadoras, discutidas abaixo.
sistemas: passivo, ativo e neural. O
te-se a carga maior que 4000 N, trans-
sistema passivo compõe-se das vérte-
ferindo-a para as facetas, podendo
oprimir o ligamento interespinhoso6. A
bras, discos intervertebrais, articula- Multífido lombar na
ções e ligamentos, que fornecem a
aplicação de terapias passivas superio- maior parte da estabilidade pela limi- estabilidade
res a seis semanas, além de ocasionar tação passiva no final do movimento.
custos, é pouco eficaz 7. Mesmo na Os músculos lombares estabilizam
O segundo, ativo, constitui-se dos
melhora da dor, é difícil precisar quais o segmento lombar12. Alguns, contudo,
músculos e tendões, que fornecem
características dos exercícios são res- têm um potencial maior e contribuem
suporte e rigidez no nível interverte-
ponsáveis pelo sucesso do tratamento8. mais especificamente na estabilidade.
bral, para sustentar forças exercidas
Um estudo mostrou que o ML é capaz
Entre as técnicas utilizadas, encon- no dia-a-dia. Em situações normais,
de fornecer rigidez e controle de mo-
tra-se o conceito da estabilização seg- apenas uma pequena quantidade de
vimento na zona neutra13. Consiste em
mentar lombar (ESL), caracterizada por co-ativação muscular, cerca de 10%
pequenos feixes dirigidos do sacro à
isometria, baixa intensidade e sincronia da contração máxima, é necessária
C2, atingindo seu máximo desenvol-
dos músculos profundos do tronco, com para a estabilidade. Em um segmento
vimento na lombar. No sacro, origi-
o objetivo de estabilizar a coluna lom- lesado pela frouxidão ligamentar ou
na-se da superfície posterior e medial
bar, protegendo sua estrutura do des- pela lesão discal, um pouco mais de
da espinha ilíaca póstero-superior e
gaste excessivo 8 . O´Sullivan et al. 9 co-ativação pode ser necessária. O
ligamentos sacroilíacos posteriores. Na
observaram que exercícios para o mús- último sistema, o neural, é composto
inserção, abrange duas a quatro vér-
culo multífido lombar eram efetivos pelos sistemas nervosos central e pe-
tebras, inserindo-se no processo espi-
riférico, que coordenam a atividade
na redução da dor e da disfunção lom- nhoso de uma vértebra acima14.
muscular em resposta a forças espera-
bar causada por espondilólise ou
das ou não, fornecendo assim estabi- Wilke et al.15 observaram que, pró-
espondilolistese, mesmo após 30 me-
lidade dinâmica. Esse sistema deve ximo à L4-L5, o ML contribui com 2/3
ses do término do tratamento.
ativar os músculos corretos no tempo do aumento da rigidez segmentar re-
Este trabalho objetivou reunir evi- certo, para proteger a coluna de le- sultante da contração. Assim, qualquer
dências em ensaios clínicos que de- sões e permitir o movimento. lesão no segmento pode comprome-

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :200-6 201


ter a estabilidade16. Evidenciou-se uma
forte relação entre a má funcionali-
bar (FTL) 21 . As fibras do TA correm
horizontalmente ao redor do abdome,
Papel de outros músculos na
dade do ML e a recorrência da dor ligando-se via FTL ao processo trans- estabilidade
após cirurgia discal17. verso de cada vértebra lombar 22. O
aumento na PIA e na tensão da FTL foi A estabilidade lombar não depen-
Estudos16,18,19 mostraram que ocorre de apenas do ML e TA. Um cilindro
inicialmente atribuído à diminuição da
uma disfunção do ML após um primei- de músculos profundos ao redor da
carga na coluna por meio da produ-
ro episódio de lombalgia unilateral. coluna fornece estabilidade11. O mús-
ção de um momento extensor do tron-
Uma rápida atrofia no ML foi demons- culo QL atua como estabilizador la-
co23. Essa teoria foi largamente refu-
trada ipsilateralmente ao local de dor teral lombar da coluna6. Como teto, o
tada 24 e, subseqüentemente, cresceu
por meio de ultra-som18. Hides et al.16 diafragma é o principal contribuinte
a idéia de que a contração do TA pu-
notaram que a recuperação do ML não para a pressão intra-abdominal. Para
desse aumentar a estabilização 25 .
ocorre espontaneamente na remissão que o TA aumente sua tensão na FTL,
McGill e Norman25 sugeriram que a
da dor. Acredita-se que possíveis me- a atividade do diafragma é requerida
contração do TA cria um cilindro, re-
canismos para a atrofia sejam a inibi- para prevenir descolamento da víscera
sultando em rigidez espinhal. Do mes-
ção reflexa ou a inibição da dor via abdominal 32. O diafragma contribui
mo modo, espera-se que a tensão la-
arco reflexo18. Em virtude dos efeitos para o aumento da PIA previamente
teral por meio do processo transverso
indiretos da inibição terem sido vistos ao início de grandes movimentos dos
da vértebra resulte em limitação da
na ausência de dor, o mecanismo mais membros, contribuindo para a estabi-
translação e da rotação vertebral26.
provável foi o reflexo de inibição19. lidade 4.
Há evidencias de que o TA e os
Uma das explicações para a alta
músculos profundos lombares são pre-
taxa de recidivas em lombálgicos
ferencialmente afetados na presença Fáscia toracolombar
pode ser o fato de o ML não recuperar
de lombalgia16, dor lombar crônica27 e A FTL cobre os músculos profundos
o volume mesmo após a redução da
instabilidade28. Hodges e Richardson29 lombares e do tronco. Na região lom-
dor, comprometendo a estabilidade16.
observaram que o TA se ativa antes bar a fáscia possui três camadas. A
Hides et al.20 mostraram que os exer-
do deltóide na flexão, extensão e posterior é ligada ao processo espinho-
cícios específicos de ESL para o ML
abdução do ombro em indivíduos sem so, crista mediana do sacro, e ligamento
podem aumentar seu volume em
lombalgia, demonstrando a antecipa- supra-espinhoso; a média é ligada ao
lombálgicos, diminuindo a atrofia.
ção desse músculo na região lombar processo transverso e aos ligamentos
Nesse estudo, indivíduos com o pri-
para os movimentos do membro supe- intertransversais, abaixo da crista ilíaca
meiro episódio de lombalgia unilate-
rior. Em sujeitos lombálgicos, a ativa- e acima da borda inferior da décima
ral com atrofia do ML foram divididos
ção do TA foi mais lenta que o deltóide segunda costela e do ligamento lom-
em grupo controle, recebendo orien-
nos mesmos movimentos. Notou-se bocostal; a anterior cobre o QL e é
tação postural e cuidados, e tratados
que o RA, OE e OI raramente prece- ligada medialmente à face anterior do
realizando treinamento específico
diam o movimento do membro. Hou- processo transverso, dorsalmente à
para o ML. Nos dois grupos notaram-
ve então fortes indicativos de que há região lateral do músculo psoas maior4.
se melhoras na dor em quatro sema-
diferença de função entre os abdomi- As camadas posterior e média unem-
nas. No controle, a área de secção
nais superficiais e profundos no senti- se na margem lateral do eretor da co-
transversa (AST) do ML permaneceu
do da ESL. luna e na borda lateral do QL. São
inalterada após quatro semanas, ao
passo que, no tratado, a AST voltou O TA tem um papel fundamental na unidas pela camada anterior, originan-
aos níveis normais após quatro sema- antecipação. Previamente à execução do a aponeurose do TA. A contração
nas de tratamento. Um acompanha- de movimentos gerais, esse músculo do OE e TA aumenta a tensão na FTL,
mento em longo prazo revelou que ativa-se, evitando perturbações pos- elevando a pressão dentro da fáscia,
84% dos pacientes do controle tive- turais. Essas respostas que antecedem o que pode resultar em rigidez aumen-
ram recorrência dolorosa em um ano, o movimento podem ser pré-programa- tada da coluna lombar, contribuindo
contrastando com 30% do tratado. das pelo sistema nervoso central e ini- para melhor estabilidade, somada aos
Ainda, o controle mostrou nove vezes ciadas como parte de um comando mecanismos posturais paravertebrais
mais chances de recidiva do que o motor para a ação. e abdominais33.
grupo submetido à ESL, após três anos.
Hides et al. observaram, correlacio-
nando ultra-som e ressonância mag-
Mecanismos compensatórios
Transverso do abdome como nética, que a correta contração do TA Sugere-se que os três sistemas de
estabilizador melhorava a estabilidade lombar30. Em
outro trabalho, a ativação do TA dimi-
estabilização, passivo, ativo e neural,
sejam interdependentes, e que um sis-
O TA atua primariamente na manu- nuiu significativamente a lassidão tema possa compensar défices em
tenção da pressão intra-abdominal sacroilíaca, o que não foi observado outro. A instabilidade poderia ser o
(PIA), ao conferir tensão à vértebra quando os outros músculos abdominais resultado de uma lesão tecidual, tor-
lombar por meio da fáscia toracolom- se contraíram31. nando o segmento mais instável, com

202 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :200- 6


França et al. Estabilização segmentar lombar na lombalgia

força ou resistência (endurance) insu- e QL na estabilização, assim como possíveis causas de desordens agudas
ficientes, ou fraco controle muscular10. suas disfunções em episódios de lom- e crônicas44. McDonald et al.45 ques-
Instabilidade pode ser definida como balgia, sugere-se focar a atenção nes- tionam a falta de evidências da co-
diminuição na capacidade de estabi- ses músculos8. O desenvolvimento de contração do TA e do ML durante ati-
lizar os sistemas da coluna para man- testes e exercícios reprodutíveis na vidades abdominais.
ter as zonas neutras dentro de limites clínica estabeleceu a ESL como práti-
fisiológicos, sem deformidade, sem ca no tratamento de disfunções lomba-
deficit neurológico ou sem dor incapa-
citante.
res37. O treino de estabilização local tem EXERCÍCIOS
A instabilidade lombar tem sido
sido aplicado também na reabilitação
do ombro por meio de exercícios para
ESTABILIZADORES
sugerida como causa de desordens os músculos da bainha rotatória e Em virtude das diferenças funcionais
funcionais e tensões, assim como dor. escápula 39 , bem como dos flexores entre os músculos locais e globais, os
A força de deformação dos ligamen- profundos do pescoço40. exercícios devem ser feitos de formas
tos e dos discos induzida por cargas
passivas da coluna dessensibiliza os O papel dos estabilizadores seg- diferentes quando se objetiva o trata-
mecanoceptores teciduais, diminuin- mentares consiste em fornecer prote- mento das disfunções e das dores. Há
do ou eliminando a força estabiliza- ção e suporte às articulações por meio pacientes em que os globais mais ati-
dora muscular reflexa no ML34. Panjabi do controle fisiológico e translacional vos predominam nos exercícios gerais.
propôs que a disfunção muscular ao excessivo do movimento 41. Os mús- É difícil detectar se a ativação dos
longo do tempo pode levar à lom- culos globais atuam encurtando-se ou locais ocorre durante esses exercícios.
balgia crônica via lesão adicional de alongando-se e gerando torque e mo- Por isso, são propostos exercícios es-
mecanoceptores e inflamação do te- vimento às articulações. Os locais li- pecíficos que isolam os músculos lo-
cido neural35. gam-se de vértebra a vértebra e são cais dos globais. A ESL não coloca a
responsáveis pela manutenção da po- estrutura lesada em risco, principal-
Exercícios específicos para os sição dos segmentos lombares durante mente no início da reabilitação, re-
movimentos funcionais. Essas deman- duzindo a carga externa e mantendo
estabilizadores lombares das indicam que exercícios isométricos a coluna em posição neutra. Os exer-
Há evidências de que os exercícios são mais benéficos por atuarem na re- cícios são sutis, específicos e preci-
tradicionais prescritos para a lombalgia educação dos músculos profundos. Em sos, reduzindo a chance de dor ou re-
tenham um importante componente um estágio mais avançado de treino, flexo de inibição. Para um máximo
lesivo 34. Um exemplo é a realização a isometria pode ser combinada com benefício, precisam ser repetidos tan-
de retroversão da pelve durante exer- exercícios dinâmicos para outras par- tas vezes quantas forem necessárias8.
cícios para a coluna lombar, que au- tes do corpo8. A progressão pode ser realizada em
menta o risco de lesão por comprimir inúmeros estágios. As séries podem ser
as articulações e aumentar a carga nas A co-contração e a estabilidade progredidas de cargas baixas com peso
estruturas passivas. McGill6 concluiu mínimo até posições mais funcionais
que exercícios em série para a lom- A co-contração é outro mecanismo
com aumento gradual de carga.
bar, realizados em aparelhos com car- que pode fornecer rigidez por meio de
ga, podem produzir herniações. músculos antagonistas e, assim, man- Para pacientes com disfunção local,
ter a estabilidade na presença de car- o isolamento do ML e TA não é uma
Músculos mais fortes parecem não gas externas e internas nas articula- tarefa fácil. Em virtude disso, Richardson
ter valor profilático na redução de pro- ções42. e Jull8 desenvolveram estratégias in-
blemas lombares. Os músculos de re-
Há posições em que a co-contra- cluindo palpação, observação de mu-
sistência (endurance) têm sido eviden-
ção dos músculos profundos pode ser danças na forma do corpo e retroali-
ciados como protetores. Maior mobi-
realizada enquanto se mantêm os glo- mentação (biofeedback).
lidade da coluna lombar, ao contrário
bais relaxados e a coluna em posição
do que se pensava, aumenta as chan- Comerford e Mottram46 propuseram
neutra8. A co-ativação pode ser alcan-
ces de problemas no segmento 36 . um guia clínico para o re-treino dos
çada pela inibição ativa dos interneu-
McGill 6 sugeriu que o mais seguro estabilizadores. Segundo eles, a pal-
rônios em vias recíprocas43. A co-con-
modelo de estabilização lombar não pação deve estimular a correta ativa-
tração dos antagonistas do tronco é
seria o exercício de força, mas sim o ção. É necessário observar o padrão
necessária para manter o equilíbrio
de resistência, que manteria a coluna de controle correto e o recrutamento
mecânico estável4. O controle do equi-
em uma posição neutra, enquanto tônico das fibras, sem que se note fa-
líbrio e estabilidade mecânica requer
encorajaria o paciente a co-contrações diga. O paciente não deve sentir dor
recrutamento muscular apropriado e tem-
dos estabilizadores.
po ótimo de recrutamento muscular e a respiração deve ser normal. A con-
Em virtude das evidências da im- (timing). Disfunção muscular e erros no tração deve se manter por 10 segun-
portância dos músculos locais TA, ML controle motor têm sido sugeridos como dos e ser repetida 10 vezes.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :200-6 203


Dada a importância do QL como
a b estabilizador lateral, a técnica ideal
para maximizar a ativação e minimi-
zar a carga parece ser a ponte lateral
e, para aprimorar o controle motor, há
a técnica avançada da ponte em de-
cúbito lateral (ver Figuras a seguir)6.

Reeducação em quatro apoios


para o transverso do abdome
Figura 1 Reeducação do transverso do abdome (TA) em quatro apoios: a, note-se Há posições em que se consegue
o relaxamento da parede abdominal; b, contração do TA isolar os músculos específicos em
isometria, ao mesmo tempo que se
relaxam os globais, mantendo a colu-
a b na em posição neutra. Preconiza-se
que a posição inicial no aprendizado
seja a posição em quatro apoios (Fi-
gura 1). Richardson e Jull8 sugerem que
esse exercício seja o ideal para o
aprendizado mais fácil da contração
da parede abdominal e para a manu-
tenção dessa posição em isometria.
Ensina-se ao paciente como localizar
e manter as curvas torácica e lombar
Figura 2 Ponte lateral: em a, o suporte do peso do corpo inferior com os joelhos em posições normais para a execução
sobre a plataforma (nos casos de maior preocupação com a de exercícios. A partir da posição ini-
segurança do segmento lombar, nesta posição há redução da cial, é necessário treinar esse mesmo
demanda adicional); em b, o suporte inferior com os pés aumenta o exercício em decúbito dorsal, em pé e
recrutamento muscular, mas também aumenta a carga na coluna sentado. A contração do TA pode ser

a b c

Figura 3 Ponte lateral avançada: após a manutenção da ponte lateral (a), girar de um cotovelo a outro (b, c) com o
abdome em contração, mantendo a estabilidade da pelve e da caixa torácica
palpada medialmente à espinha ilíaca
ântero-superior e inferiormente à cica-
a b
triz umbilical.
Treinamento do quadrado lombar: a
ponte lateral é a técnica escolhida para
ativação do estabilizador lateral, qua-
drado lombar, em virtude de otimizar
a ativação e de minimizar a sobrecar-
ga na coluna lombar (Figura 2). Na
Figura 4 Co-contração dos multífidos e do transverso do abdome: em a, nota-se a ponte inicial, o apoio inferior é reali-
parede abdominal relaxada; em b, observa-se a co-contração zado com o joelho, evoluindo para os

204 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :200- 6


França et al. Estabilização segmentar lombar na lombalgia

pés. Em um exercício mais avançado, mantém por 10 segundos. Repete-se pode ser palpada medialmente à es-
ponte lateral avançada (Figura 3), o 10 vezes. O terapeuta deve sentir com pinha ilíaca ântero-superior (Figura 4).
paciente começa da posição lateral da seus polegares a contração no local
ponte, isto é, com apoio inferior dos
pés e gira sobre os cotovelos enquanto
palpado e verificar a capacidade de
execução de uma contração simétri-
CONCLUSÃO
o abdome realiza o suporte segmentar ca e bilateral por parte do paciente, A revisão permitiu constatar a efi-
“travando” a pelve e a caixa torácica. assim como a intensidade e a capaci- cácia da estabilização segmentar nas
dade da manutenção de forma homo- lombalgias e, principalmente, na pre-
Exercícios para o multífido lombar: venção de sua recidiva, por atuar dire-
gênea, sem compensações 47.
deita-se em prono, com os joelhos es- tamente no controle motor, devolven-
tendidos e os braços ao longo do cor- A co-contração dos músculos TA e do a função protetora dos músculos pro-
po. O terapeuta toca com seus pole- ML começa preferencialmente nas fundos. Os exercícios propostos, por se-
gares os ML adjacentes ao processo posições em pé e sentada. Em ambas, rem sutis, específicos e em posição
espinhoso. Solicita então que o paci- o paciente realiza exatamente os mes- neutra, são adequados para o início da
ente realize uma contração leve como mos exercícios para o TA e o ML ao terapia, por submeterem as estruturas
se quisesse empurrar os dedos, e a mesmo tempo. A contração do TA articulares lesadas a sobrecarga leve.

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206 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :200- 6


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.2, p.207-13, abr./jun. 2008 ISSN 1809-2950

Fatores de risco para linfedema após câncer de mama:


uma revisão da literatura
Risk factors of arm lymphedema after breast cancer: a literature review
Anke Bergmann1, Inês Echenique Mattos2, Rosalina Jorge Koifman2

Estudo desenvolvido no RESUMO: O linfedema representa uma das principais seqüelas do câncer de mama.
DEMQS/Ensp/Fiocruz – Depto. Esta revisão da literatura visou discutir os principais fatores associados ao
de Epidemiologia e Métodos linfedema após o tratamento do câncer de mama. Foram selecionados 26 artigos
Quantitativos em Saúde, publicados entre janeiro de 2000 e março de 2008 nas bases Medline e Lilacs,
Escola Nacional de Saúde utilizando os descritores breast neoplasms, lymphedema, upper extremity, arm
Pública, Fundação Oswaldo e risk factors. Sua revisão permitiu discutir os fatores relacionados ao linfedema,
Cruz, Rio de Janeiro, RJ, Brasil quanto a: clínica e paciente (tabagismo, escolaridade, etnia, comorbidades,
1 hipertensão arterial, diabetes melito, menopausa, idade, peso corporal, índice
Fisioterapeuta Dra. do Grupo
de Pesquisa em Fisioterapia do de massa corporal, atividade física, membro dominante, restrição articular,
Unisuam – Centro infecção, seroma e trauma no membro superior); tratamento do câncer de
Universitário Augusto Motta, mama (cirurgia, reconstrução mamária, número de linfonodos retirados, nível
Rio de Janeiro, RJ, Brasil da linfadenectomia axilar, radioterapia, quimioterapia, hormonioterapia e tempo
transcorrido após o tratamento); tumor (tamanho, grau, localização,
2 comprometimento dos linfonodos axilares e estadiamento). A revisão feita
Profas. Dras. do DEMQS/Ensp/
Fiocruz indica que a linfadenectomia axilar, a radioterapia em cadeias de drenagem
e a obesidade são fatores preponderantes do risco para desenvolvimento do
ENDEREÇO PARA linfedema.
CORRESPONDÊNCIA DESCRITORES: Fatores de risco; Linfedema; Neoplasias da mama/complicações
Anke Bergmann
Seção de Fisioterapia / HC III ABSTRACT: Arm lymphedema is one of the most frequent sequelae of breast cancer
R. Visconde de Santa Izabel 274 treatment. The purpose of this literature review was to discuss main risk factors
20560-120 Rio de Janeiro RJ of lymphedema after breast cancer treatment. The search in Medline and Lilacs
e-mail: abergmann@inca.gov.br
databases, by means of key words breast neoplasms, lymphedema, upper
extremity, arm, and risk factors, allowed selecting 26 studies published between
January, 2000, and March, 2008. This review discusses factors linked to: clinic
and the patient (smoking, education level, race/ethnicity, comorbidity,
hypertension, diabetes, menopause, age, weight, body mass index, physical
activity, handedness, impaired range of motion, infection, seroma and arm
injuries); breast cancer treatment (type of surgery, breast reconstruction, number
of axillary lymph nodes removed, level of axillary surgery, radiotherapy,
chemotherapy, tamoxifen treatment, and time-span after axillary lymph node
APRESENTAÇÃO dissection); tumour (size, grade, location, node status, number of positive nodes
out. 2006 and stage of the tumour). This review shows that the axillary surgery, axillary
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO radiotherapy and obesity are important risk factors of lymphedema.
abr. 2008 KEY WORDS: Breast neoplasms/complications; Lymphedema; Risk factors

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :207-13 207


INTRODUÇÃO RESULTADOS E O aumento do peso corporal após o
diagnóstico do câncer de mama foi
O câncer de mama representa um DISCUSSÃO considerado fator de risco para o
importante foco de atenção mundial linfedema11,15-19,23,25,28,36,39. A diminuição
devido ao crescente aumento de sua Os estudos de prevalência11-28 (Qua- da taxa de fluxo sangüíneo e linfático
incidência 1. Uma das principais se- dro 1) coletam as informações em um é considerada uma das condições para
qüelas do seu tratamento é o linfedema único momento, tornando difícil esta- a lipogênese e posterior depósito de
de membro superior que, após sua ins- belecer a temporalidade entre as ex- gordura, levando à hipertrofia do te-
talação, se torna uma condição crô- posições. Os estudos de coorte 31-37 cido adiposo43,44. Além disso, a obesi-
nica e incapacitante, causando impor- (Quadro 2) acompanham os indivíduos dade é fator de risco para infecção e
tantes problemas físicos, sociais e psi- durante um período de tempo, sendo in- retardo do processo de cicatrização45,
cológicos2,3. Entretanto, nem todas as dicados para verificar fatores de risco38. recidiva tumoral e co-morbidades 46,
mulheres submetidas ao tratamento Sendo o linfedema uma patologia crôni- além de outras complicações pós-ope-
para câncer de mama desenvolvem ca e freqüente, o estudo de coorte é o ratórias como seroma47, hematoma48
linfedema, em decorrência da instala- mais indicado para avaliar seus fatores e síndrome da rede axilar 49. Parece,
ção de mecanismos compensatórios de risco, o que não exclui a importância portanto, que há uma associação po-
entre o sistema linfático e sanguíneo4. dos outros tipos, mas os resultados destes sitiva entre linfedema e sobrepeso,
Algumas características relacionadas à devem ser interpretados com cautela. O mas o mecanismo biológico dessa re-
mulher, as complicações pós-operató- estudo caso-controle é especialmente in- lação ainda não está claro.
rias, as atividades desenvolvidas e a dicado para doenças raras ou com longo
período de latência, sendo vulnerável a As atividades realizadas com o bra-
exposição a traumas e temperaturas
vários erros sistemáticos38 *. ço e os exercícios vigorosos não fo-
elevadas5 podem desencadear o dese-
ram associados ao linfedema15,27,28,39,
quilíbrio entre esses sistemas. O co- Nesta revisão, as variáveis foram tampouco a dominância11,36, mas re-
nhecimento dos fatores de risco para agrupadas segundo fatores relaciona- sultado diferente foi obtido por Veen
o desenvolvimento do linfedema é pri- dos à clínica e à paciente; ao trata- et al. 25 . Essa variável merece maior
mordial para o estabelecimento de mento oncológico; e ao tumor40. atenção, uma vez que exercícios vi-
condutas preventivas, sejam elas pré,
gorosos podem atuar como fatores pro-
intra ou pós-operatórias. Este artigo A etnia18,28, escolaridade13,15,27, taba-
motores do desequilíbrio entre o siste-
tem como objetivo discutir, através de gismo13,15, idade da menopausa18,25,27,28,32
ma linfático e sangüíneo, levando ao
uma revisão bibliográfica sistemática, e a presença de comorbidades19,22,23,28
linfedema 50 .
os principais fatores associados ao parecem não influenciar a ocorrência
linfedema após o tratamento do cân- de linfedema, sendo relatados resul- A restrição articular foi associada
cer de mama. tados divergentes entre os autores. ao linfedema17,18 e pode ser conside-
rada decorrência de lesão nervosa,
A idade não foi associada ao linfe-
radioterápica, alterações ortopédicas
METODOLOGIA dema na maioria dos estudos11,12,15,17-
20,22,23,25,27,32-36
; apenas Meeske et al.28
ou reumatológicas50-52. A infecção pa-
rece ser conseqüência do linfedema,
Esta foi uma revisão bibliográfica relataram associação com as mulhe-
uma vez que foi associada nos estu-
de artigos originais disponíveis nas res mais jovens. A relação da idade
dos de prevalência11,15,17, mas não nos
bases de dados Medline e Lilacs, no com o linfedema precisa ser melhor de incidência 31,35. O seroma não foi
período de janeiro de 2000 a março estudada pois, com o processo de en- associado ao linfedema 15,23,31,35,39. A
de 2008, publicados em inglês, fran- velhecimento, ocorre diminuição do história de traumatismos no membro
cês, português e espanhol, utilizando mecanismo de abertura das anasto- superior homolateral ao câncer de
as palavras chaves: breast neoplasms; moses linfovenosas41,42, podendo levar mama foi associada ao linfedema em
lymphedema; upper extremity; arm; e ao aumento do risco13,14,16. dois estudos de prevalência18,25.
risk factors. Foram identificados 31
estudos, sendo 5 excluídos3,6-9 por in- O tipo de cirurgia mamária e a re-
cluírem mulheres com edema transi- * O único estudo desse tipo encontrado nesta construção não mostraram associação
revisão examinou 142 mulheres
tório, não caracterizando, portanto, com linfedema12,15-18,25,27,28,31,32,34. Entre-
mastectomizadas, das quais 71 com
uma condição crônica 10. Esta revisão linfedema e 71 controle, pareadas segundo tanto, considerando as diferenças
contemplou pois 26 artigos. Foi reali- a idade e outras variáveis, buscando fatores metodológicas dos estudos consulta-
zada uma análise crítica dos artigos para o desenvolvimento do linfedema, dos e seus resultados, acreditamos que
localizados segundo o tipo de estudo como o tipo de tratamento após a cirurgia, a abordagem axilar do primeiro nível
ocupação e estilo de vida das mulheres; e
(prevalência, incidência e caso-controle) dos linfonodos axilares já possa acar-
encontrou que apenas um elevado índice
e as variáveis aí estudadas (caracterís- de massa corporal (medido antes da cirurgia retar risco de linfedema, devido à
ticas das mulheres, do tratamento e e por ocasião do estudo) aumenta o risco de maior rede linfática disposta nesse ní-
do tumor). linfedema39. vel12,13,17,20,26,28,32. Isso pode ser observado

208 Fisioter Pesq. 2008;15(2) :207-13


Quadro 1 Principais características dos estudos de prevalência
Variáveis estudadas e resultados
Bergmann et al.

Autoria, data, país População N Tempo Diagnóstico do linfedema


* médio*** Fatores associados ao linfedema Fatores não associados ao linfedema
Volumetria > 10 % IMC (na avaliação), Tipo de
Edwards 2000 11 Idade, peso, altura, dominância, lateralidade,
ñ/ espec 201 37 meses cirurgia, Cirurgia axilar, Tamanho
Austrália Subjetivo infecção, RXT axila, QT, HMT, tempo de edema
do tumor, Grau do tumor
Kuehn et al. 2000 12 Subjetivo Idade, cirurgia, nível da LA, nº LFN retirados e
ñ/ espec 396 34 meses Nenhum
Alemanha Vol indireto (10%) positivos, QT, tempo de PO
Hojris et al. 2000 13 MRM c/ LA 84 Tabagismo, obesidade, RXT axila, QT, HMT, nº LFN
9 anos Vol indireto (> 200 ml) Idade, nº LFN retirados
Dinamarca NB I e II positivos, tamanho do tumor
Johansen et al. 200014 CC c/ LA 266 6,6 anos Perimetria (> 2,0 cm) Idade avançada, no LFN retirados,
No de LFN positivos
Dinamarca NB I e II RXT em cadeias de drenagem
Auto-perimetria < 1,27 cm Escolaridade, idade, atividade física, laboral e de
Petrek et al. 200115 MRM e
263 20 anos associado a edema subjetivo ou Ganho de peso, Infecção no MS lazer, tipo de mastectomia, nº LFN retirados, LA
EUA MR
perimetria > 1,27 cm do MS contra-lateral, volume e duração da drenagem PO
Freitas et al. 200116
MRM 109 S/info Perimetria (> 2,0 cm) Idade > 45 anos, Peso > 50 kg Tipo de MRM
Brasil
Meric et al. 2002 17 CCc/LA NB 294 1 a 120 Perimetria < 3 cm no antebraço, ou Peso corporal, CC+LA, Infecção no Idade, nº de LFN retirados e positivos, RXT axila, QT,
EUA II + RXT meses > 3 cm no braço MS tamanho do tumor
Etnia não-branca, IMC, nº de LFN
Beaulac et al. 200218 CC c/ RXT Idade, menopausa, tipo de cirurgia, reconstrução, RXT
e MRM s/ 151 4,8 anos Vol. direto (200 cm3) retirados, Volume axilar retirado,
EUA RXT + CC, QT, estadiamento
AIM, Trauma MS
Deustch et al. 2003 19 CC c/ ou s/ 265 61 meses Exame clínico Etnia, idade, HAS, diabetes, RXT tangencial, energia
Ganho de peso, LA, TMX sem QT
EUA LA + RXT do feixe de radiação, QT, QT+ HMT, tempo de PO
Yap et al. 2003 20 CC e LFN 370 3.3 anos Subjetivo LA, RXT mamária Idade , IMC
Canadá negativos
Relato (de prontuário ou paciente) Nº de LFN retirados
Goffman et al. 2004 21 Mínimo Etnia, IMC, irradiação multifield, nº de LFN
RXT 240 de edema em MS ou mama,
EUA 1,5 anos Tamanho do tumor positivos, local do tumor
hiperemia, alterações cutâneas
Deo et al. 2004 22
LA NB II 299 2,5 anos Perimetria (> 3,0 cm) Comorbidade, RXT axila Idade, obesidade, RXT, QT, HMT, estádio
Índia
Ozaslan & Kuru MRM LA Idade, tabagismo, HAS, diabetes, nº LFN retirados,
18 a 43
2004 23 NB III, QT 240 Perimetria (>2,0 cm) IMC > 25, RXT axila total de drenagem (sucção), QT, HMT, status LFN,
meses
Turquia e/ou RXT estadiamento
Armer et al. 2004 24 LA e/ou
100 28 meses Perimetria (> 2,0 cm) Nenhum Peso corporal, LA, RXT
EUA BLS
* Características de tratamento e estadiamento da população estudada; N = número de mulheres estudadas; ** Tempo médio decorrido desde a cirurgia até a avaliação do linfedema
CC = Cirurgia conservadora; MRM = Mastectomia radical modificada; MR = Mastectomia radical; LA = Linfadenectomia axilar; BLS = Biópsia do linfonodo sentinela;
NB = Nível axilar de Berg; QT = Quimioterapia; HMT = Hormonioterapia; RXT = Radioterapia; TMX = Tratamento com tamoxifeno; IMC = Índice de massa corporal;
LFN = Linfonodos; PO = pós-operatório; MS = Membro superior; HAS = Hipertensão arterial sistêmica; AIM = Amplitude incompleta de movimento; FO = Ferida
operatória; nº = número; Vol= volume; c/ = com; s/ = sem; ñ/ espec = várias ou não especificadas.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :207-13


Risco de linfedema após câncer de mama

209
Quadro 1 Principais características dos estudos de prevalência (continuação)
População Tempo Variáveis estudadas e resultados
Autoria, data, país N Diagnóstico do linfedema
* médio** Fatores associados ao linfedema Fatores não associados ao linfedema
Veen et al. 2004 25 Idade, tabagismo, lado e tipo de cirurgia, no de LFN
Menopausa, IMC >25, Dominância,
LA, NB III 245 S/info. Perimetria (>2,5 cm) retirados e positivos, RXT mama ou plastrão, Dose
Bélgica Trauma, RXT axila, Status LFN
RXT, QT, tamanho e local do tumor
Mathew et al. 200626 Mínimo 2
CC e RXT 504 anos Perimetria (> 2,0 cm) Tipo de cirurgia axilar
Inglaterra
Tempo após PO, RXT, Escolaridade, Idade, tamanho do tumor, status dos linfonodos, QT,
Bani et al. 2007 27
ñ/ espec 1123 4,3 anos Relato de edema (subjetivo) Dor na mama, plastrão, axila ou braço, HMT, tipo de cirurgia, menopausa, estado civil,
Alemanha
Restrição articular, Parestesia no braço ocupação
Etnia, história familiar, menopausa, uso de CO,
Meeske et al. 200828 Idade, HAS, Obesidade (IMC>30), 10 diabetes, artrite, cefaléia, flebite, etilismo, atividade
ñ/ espec 494 50 meses Relato de edema (subjetivo)
EUA ou + LFN retirados física, tipo de cirurgia, reconstrução imediata, No de
LFN positivos, RXT, QT, HMT
Quadro 2 Principais características dos estudos de incidência
População Tempo Variáveis estudadas e resultados
Autoria, data, país N Diagnóstico do linfedema
* médio ** Fatores associados ao linfedema Fatores não associados ao linfedema
Duff et al. 200131 Vol. opto-eletrônica Tipo de cirurgia, nº de LFN retirados, infecção da FO,
LA 100 1 ano Nenhum
Irlanda (> 200 ml) seroma, status LFN
Heard-Smith et Nº LFN retirados (>30) RXT em Idade, menopausa, tratamento, QT, status dos
ñ/ espec 1278 56 meses Perimetria (> 5%)
al.200132 Itália cadeias de drenagem linfonodos, tamanho do tumor, estadiamento
Coen et al.2003 33 CC com RXT cadeias drenagem, LA NB I e Idade, nível da LA, QT, TMX, nº LFN positivos,
727 72 meses Perimetria (>2,0 cm)
EUA RXT II + RXT axilar tamanho tumor
Silberman et al. 2004 1 a 14 Perimetria (>2,0 cm) Idade, IMC, Tipo de cirurgia, nº LFN retirados, RXT axilar,
34 ñ/ espec 94 Nenhum
EUA anos Subjetivo QT, HMT, nº LFN positivos, tamanho do tumor, tempo PO
Hinrichs et al. Idade, IMC, nº LFN retirados, infecção, nº dias com
Dose total RXT > 60 Gy, boost
200435 MRM dreno, RXT FSC, dose FSC, RXT mamária int., boost em
105 741 dias Anotação prontuário axilar, RXT antes de 1999, Reforço
com RXT plastrão, dose em plastrão, tangência parede torácica,
EUA RXT
QT, TMX, status dos LFN, estadiamento
Clark et al.2005 36 IMC >26, Mastectomia c/ LA NB II,
ñ/ espec 188 3 anos Vol. indireto (>5%) Idade, dominância, RXT, status LFN
Inglaterra Punção MS afetado

Fisioter Pesq. 2008;15(2) :207-13


Purushotham et al.
LA 212 12 meses Vol. indireto (média) LFN positivos Nenhum
200737 Inglaterra
* Características de tratamento e estadiamento da população estudada; N = número de mulheres estudadas; ** Tempo médio decorrido desde a cirurgia até a avaliação do linfedema
CC = Cirurgia conservadora; MRM= Mastectomia radical modificada; MR = Mastectomia radical; LA = Linfadenectomia axilar; BLS = Biópsia do linfonodo sentinela;
NB=Nível axilar de Berg; QT= Quimioterapia; HMT=Hormonioterapia; RXT=Radioterapia; TMX = Tratamento com tamoxifeno; IMC= Índice de massa corporal; LFN=
Linfonodos; PO = pós-operatório; MS = Membro superior; HAS = Hipertensão arterial sistêmica; AIM = Amplitude incompleta de movimento; FO = Ferida operatória;
FSC= Fossa supra-clavicular; TC = Tomografia computadorizada; CO = Contraceptivo oral; nº = número; Vol= volume; c/ = com; s/ = sem; ñ/ espec = várias ou não especificadas.

210
Bergmann et al. Risco de linfedema após câncer de mama

nos estudos que compararam a ocorrên-


cia de linfedema em mulheres submeti-
O tempo transcorrido após o trata-
mento do câncer não apresentou as-
CONCLUSÃO
das à biópsia do linfonodo sentinela (BLS) sociação com linfedema11,12,19,34. É de A revisão e análise crítica indicam
e à linfadenectomia (LA)53-56. se esperar que, quanto maior o tem-
que a lifadenectomia axilar, a radio-
po, maior seja o risco de linfedema.
A RXT não foi fator de risco para o terapia em cadeias de drenagem e a
Para melhor definição da incidência
linfedema quando realizada em mama de linfedema nos diferentes momen- obesidade são fatores preponderantes
residual ou em plastrão22,24,25,28, mas sim tos após o tratamento do câncer de de risco de linfedema. Entretanto, a
em cadeias de drenagem 14,22,23,25,35 , mama, faz-se necessária a realização ocorrência do linfedema não é total-
possivelmente pelo aumento da de estudo com longo período de se- mente explicada, provavelmente de-
permeabilidade58, redução da regene- guimento. vido à gênese multifatorial envolvida
ração linfática 59 , fibrose e cicatriz O tamanho do tumor, sua localiza- na estase linfática. São necessários
tecidual 60 . O tratamento sistêmico ção, o comprometimento dos linfonodos estudos de seguimento que contem-
com quimioterapia e/ou hormoniote- axilares e o estadiamento não foram as- plem outras exposições, assim como
rapia não influenciou a ocorrência de sociados ao linfedema na maioria dos as condições prévias do sistema linfá-
linfedema11,13,17,18,22,23,25,27,28,32-35. estudos consultados12-14,17,18,21-23,25,27,28,32-36. tico e sangüíneo.

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Fisioter Pesq. 2008;15(2) :207-13 213


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214 Fisioter Pesq. 2008;15(2)


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–cuidando tanto para não remeter o leitor unicamente a
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estes quanto para não repetir no texto todos os dados dos
a) título do trabalho (preciso e conciso) e sua versão elementos gráficos; d) na Discussão, comentar os achados
para o inglês; mais importantes, discutindo os resultados alcançados
b) título condensado (máximo de 50 caracteres) comparando-os com os de estudos anteriores; e) a Conclu-
c) nome completo dos autores, com números sobrescri- são sumariza as deduções lógicas e fundamentadas dos
tos remetendo à afiliação institucional e vínculo; Resultados e Discussão.
d) instituição que sediou, ou em que foi desenvolvido o
5 Tabelas, gráficos, quadros, figuras, diagramas – são
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país;
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números sobrescritos); no caso de docência, informar
que os gráficos só se justificam para permitir rápida apre-
título; se em instituição diferente da que sediou o
ensão do comportamento de variáveis complexas, e não
estudo, fornecer informação completa, como em
para ilustrar, por exemplo, diferença entre duas variáveis.
“d)”; no caso de não-inserção institucional atual, in-
Todos devem ser fornecidos no final do texto, mantendo-
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d) endereços postal e eletrônico do autor principal;
cos) na ordem de menção no texto; decimais são separa-
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tífico; Figuras, gráficos, fotografias e diagramas trazem os tí-
g) no caso de estudos com seres humanos, indicação tulos na parte inferior, devendo ser igualmente numerados
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caso de ensaio clínico, o número de registro interna- informações vêm em legenda, a seguir ao título.
cional.
6 Remissões e referências bibliográficas – Para as re-
3 Resumo, abstract, descritores e key words – A se- missões no texto a obras de outros autores adota-se o siste-
gunda página deve conter os resumos do conteúdo em ma de numeração seqüencial, por ordem de menção no
português e inglês. Recomenda-se seguir a norma NBR- texto. Assim, a lista de referências ao final não vem em
68, da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) ordem alfabética. Visando adequar-se a padrões internacio-
para redação e apresentação dos resumos: quanto à ex- nais de indexação, para apresentação das referências a
tensão, com o máximo de 1.500 caracteres com espaços Revista adota a norma conhecida como de Vancouver,
(cerca de 240 palavras), em um único parágrafo; quanto elaborada pelo Comitê Internacional de Editores de Re-
ao conteúdo, seguindo a estrutura formal do texto, ou seja, vistas Médicas (www.icmje.org), também disponível em
indicando objetivo, procedimentos básicos, resultados mais www.nlm.nih.gov/bsd/uniform_ requirements.html. Alguns
importantes e principais conclusões; quanto à redação, exemplos:
buscar o máximo de precisão e concisão. O resumo e o
Forattini OP. Ecologia, epidemiologia e sociedade.
abstract são seguidos, respectivamente, da lista de até
São Paulo: Edusp; 1992.
cinco descritores e key words (sugere-se a consulta aos
DeCS – Descritores em Ciências da Saúde da Biblioteca Laurenti R. A medida das doenças. In: Forattini OP,
Virtual em Saúde do Lilacs (http://decs.bvs.br) e ao MeSH editor. Epidemiologia geral. São Paulo: Artes
– Medical Subject Headings do Medline (www.nlm.nih.gov/ Médicas; 1996. p.64-85.
mesh/meshhome.html). Simões MJS, Farache Filho A. Consumo de
4 Estrutura do texto – Sugere-se que os trabalhos se- medicamentos em região do Estado de São Paulo
(Brasil), 1988. Rev Saude Publica. 1988;32:71-8.
jam organizados mediante a seguinte estrutura formal: a)
Introdução, estabelecendo o objetivo do artigo, justifican- Riera HS, Rubio TM, Ruiz FO, Ramos PC, Castillo
do sua relevância frente ao estado atual em que se encon- DD, Hernandez TE, et al. Inspiratory muscle training
tra o objeto investigado; b) em Metodologia, descrever in patients with COPD: effect on dyspnea and
em detalhe a seleção da amostra, os procedimentos e ma- exercise performance. Chest. 2001;120:748–56.
teriais utilizados, de modo a permitir a reprodução dos [nomear até seis autores antes de “et al”]
resultados, além dos métodos usados na análise estatísti- Rocha JSY, Simões BJG, Guedes GLM. Assistência
ca – lembrando que apoiar-se unicamente nos testes esta- hospitalar como indicador da desigualdade social. Rev
tísticos (como no valor de p) pode levar a negligenciar Saude Publica [periódico on-line] 1997 [citado 23 mar
importantes informações quantitativas; c) os Resultados 1998];31(5). Disponível em: http://www.fsp.usp.br/ ~rsp.

Fisioter Pesq. 2008;15(2) 215


Correia FAS. Prevalência da sintomatologia nas • inversamente, use programa apropriado (como
disfunções da articulação temporomandibular e suas Microsoft® Excel) para elaborar gráficos, e não o re-
relações com idade, sexo e perdas dentais curso “Gráficos” do processador de texto;
[dissertação]. São Paulo: Faculdade de Odontologia, • no caso de gráficos ou diagramas elaborados por
Universidade de São Paulo; 1991. softwares específicos, devem ser convertidos (expor-
Sacco ICN, Costa PHL, Denadai RC, Amadio AC. tados) em formatos que possam ser abertos por progra-
Avaliação biomecânica de parâmetros mas de uso comum (verifique os tipos de arquivos que
antropométricos e dinâmicos durante a marcha em podem ser abertos no Adobe Photoshop®, para figuras
crianças obesas. In: VII Congresso Brasileiro de em escala de cinza, no CorelDraw®, para desenhos,
Biomecânica, Campinas, 28-30 maio 1997. Anais. ou no Excel® ou Origin®, para gráficos), para permitir
Campinas: Ed. Unicamp; 1997. p.447-52. eventuais ajustes, adequação de fonte etc.;
• forneça fotografias ou outras ilustrações com resolu-
7 Agradecimentos – Quando pertinentes, dirigidos a ção mínima de 300 dpi, e em tamanho compatível;
pessoas ou instituições que contribuíram para a elaboração • em qualquer caso, forneça simultaneamente um ar-
do trabalho, são apresentados ao final das referências.
quivo em TIFF do elemento gráfico, para permitir
Apresentação eletrônica da versão final visualização e conferência.
Após a comunicação do aceite do artigo, o autor deve- Envio dos arquivos
rá proceder aos eventuais ajustes sugeridos pelos pare-
Os dados de texto (em Word ou compatível) e de ilus-
ceristas, para o quê terá o prazo de quatro semanas (findo
esse prazo, se a versão final não tiver sido enviada à Re- trações devem ser enviados em arquivos separados. Os
vista, será considerada desistência). A versão final será dados devem ser acompanhados da informação precisa
ainda editada, ocasião em que o editor poderá solicitar de todos os programas utilizados, inclusive de compres-
novos ajustes e esclarecimentos – e, nesse caso, o prazo são, se for o caso; sugere-se que os nomes dos arquivos
para os ajustes será de apenas duas semanas. sejam curtos e permitam rápida identificação (por exem-
plo, “sobrenome do autor fig1....”).
Solicita-se que, na preparação da versão final, o autor:
Exemplares dos autores
• use fonte comum, simples; use itálico apenas para
títulos de obras e palavras em língua estrangeira; o Serão enviados ao autor principal dois exemplares do
negrito é reservado a títulos e intertítulos, claramen- número da Revista em que seu artigo for publicado, mais
te diferenciados; um exemplar para cada co-autor.
• não use a barra de espaço para recuos nem a tecla ***
“tab”, apenas recursos de formatação do processador
No bojo do processo de aprimoramento de FISIOTERAPIA
de texto;
E PESQUISA, estas normas estão em construção, podendo so-
• não separe parágrafos com sinal de parágrafo adicional;
frer alterações. Para informação atualizada, sugere-se a con-
• use o próprio processador de texto (e não planilhas)
sulta ao site da Revista (http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/
para elaborar tabelas;
revista.php) ou às instruções do último número publicado. Para
• use o próprio processador de texto (recurso “Desenho”)
contato com a secretaria da Revista, use revfisio@usp.br.
para elaborar diagramas simples, organogramas etc.
(não insira figuras ou organogramas do Microsoft O endereço completo da Revista encontra-se na terceira
PowerPoint®); capa, a seguir.

Assinatura
Para assinar Fisioterapia e Pesquisa, preencha o cupom abaixo e envie-o à revista (ver endereço página 2), junto com um
cheque nominal à Fundação Faculdade de Medicina (ver endereço ao lado, na 3a capa) no valor de R$ 64,00 ou recibo de
depósito no Banespa (banco 033), agência 0201, cc 13004086-7. A ficha de assinatura está disponível no site da revista:
<http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/revista.php>. Números anteriores solicitar à revista. Valor unitário: R$ 16,00.

FICHA DE ASSINATURA

Assinatura anual (quatro números) de Fisioterapia e Pesquisa a contar de (data) _____________________

Nome: _______________________________________________________________________________________

Endereço: ____________________________________________________________________________________

CEP: _____________ Cidade: ___________________________________________________ Estado: _______

e-mail: _______________________________________________________________________________________

Instituição (opcional): _________________________________________________________________________

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Fisioterapia e Pesquisa
Revista do Curso de Fisioterapia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e
Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo -
Fofito/FMUSP

SECRETARIA
Patrícia Pereira Alfredo

INDEXAÇÃO E NORMALIZAÇÃO BIBLIOGÁFICA


Serviço de Biblioteca e Documentação da FMUSP
e-mail: sbd@biblioteca.fm.usp.br

EDIÇÃO DE TEXTO, PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO


Tina Amado, Alba A. G. Cerdeira Rodrigues e Daniel Carvalho
Pixeletra ME
IMPRESSÃO
Gráfica UNINOVE

Tiragem: 800 exemplares

FISIOTERAPIA E PESQUISA
Curso de Fisioterapia
Fofito/FM/USP
R. Cipotânea 51 Cidade Universitária
05360-160 São Paulo SP
e-mail: revfisio@edu.usp.br
http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/revista.php
Telefone: 55 xx 11 3091 8416

INSTITUIÇÕES PARCEIRAS INSTITUIÇÕES COLABORADORAS

ASSOCIAÇÃO DE FACULDADE DE MEDICINA


FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL DE RIBEIRÃO PRETO / USP
APOIO

FACULDADE DE MEDICINA
DA UNIVERSIDADE
DE SÃO PAULO

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