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Exame de Economia Política I

21 de Janeiro de 2022
(cada grupo vale 5 valores)

I
Indique a resposta certa, justificando adequadamente:
1. As curvas de indiferença e as isoquantas diferem porque
a. As curvas de indiferença são ordinais e podem tocar nos eixos, e as
isoquantas são cardinais e podem tocar nos eixos;
b. As curvas de indiferença são cardinais e podem tocar nos eixos e as
isoquantas são ordinais e podem tocar nos eixos;
c. As curvas de indiferença são ordinais e não podem tocar nos eixos e as
isoquantas são cardinais e não podem tocar nos eixos;
d. As curvas de indiferença são cardinais e não podem tocar nos eixos e as
isoquantas são ordinais e podem tocar nos eixos;
e. As curvas de indiferença são ordinais e podem tocar nos eixos, e as
isoquantas são cardinais e não podem tocar nos eixos.

A resposta certa é e.
As curvas de indiferença não registam valores quantitativos, mas sim uma ordem de
precedência – logo, são ordinais. E podem tocar nos eixos, porque pode haver uma quantidade tal
de um dos bens que permita dispensar o outro, mantendo a mesma satisfação que os cabazes
alternativos de ambos os bens representados nessa curva.
As isoquantas registam valores quantitativos – são cardinais. E não podem tocar nos eixos
porque, representando-se nestes os factores de produção capital e trabalho, não há processos
produtivos em que seja possível garantir a mesma quantidade produzida nos outros pontos dessa
curva sacrificando inteiramente um desses factores de produção, por muito que se aumente a
quantidade do outro.

2. A subida de preço de um bem que implique a sua substituição por outro,


sucedâneo e mais barato, implica, no conjunto desses bens:
a. A manutenção do excedente do consumidor;
b. O aumento do excedente do consumidor;
c. A diminuição do excedente do consumidor;
d. A impossibilidade de aferir essa variação;
e. Nenhuma das alternativas anteriores.
A resposta certa é c.
Se o bem é sucedâneo, a satisfação da mesma necessidade faz-se com alguma perda de
satisfação (ao contrário do que aconteceria se o bem fosse fungível). Quer dizer que quando se
substitui um bem que era preferido por um outro que não o era (mesmo sendo mais barato), o
excedente (a diferença entre o preço de reserva e o preço de mercado) tem de diminuir.

3. Com dois jogadores, a estratégia dominada de A supõe que


a. A estratégia do outro é sempre melhor;
b. A estratégia do outro é indiferente;
c. A estratégia do outro é dominante;
d. A melhor escolha de A depende da escolha do outro;
e. A melhor escolha do outro depende da escolha de A.
A resposta certa é d.
Uma estratégia dominada de um jogador não implica uma estratégia dominante do outro;
depende, isso sim, da escolha que o outro jogador faça (variando com esta, ao contrário do que
sucederia com uma estratégia dominante, que implicaria sempre a mesma opção, qualquer que
fosse a opção do outro jogador).

4. Para um homo economicus as perdas


a. Contam mais do que os ganhos;
b. Contam menos do que os ganhos;
c. Contam o mesmo que os ganhos;
d. Dependem do contexto: umas vezes contam mais, outras contam menos;
e. Varia de homo economicus para homo economicus.
A resposta certa é c.
Para um ser puramente racional (de que o protótipo é o homo economicus), 1 euro é 1
euro é 1 euro. Uma das críticas que a Economia Comportamental dirigiu à Economia Neo-
Clássica teve a ver com a assimetria entre ganhos e perdas: a aversão à perda é um traço
psicológico humano, que faz com que 1 euro não valha sempre o mesmo – os euros ganhos não
têm a mesma avaliação que os euros perdidos.

5. A existência de externalidades no consumo e na produção


a. É internalizada nos preços;
b. Pode ser internalizada só com impostos;
c. Pode ser internalizada só com subsídios;
d. Pode ser internalizada com impostos e, ou, subsídios;
e. Não pode ser internalizada de modo algum.
A resposta certa é d.
Sendo as externalidades positivas, uma forma de as incorporar nos preços é através de
subsídios. Sendo as externalidades negativas, uma forma de as incorporar nos preços é através de
impostos. Portanto, nem só impostos, nem só subsídios, poderiam internalizá-las.

II
Considerando o diagrama abaixo, identifique o tipo de mercado, a condição que
deve ser preenchida para a fixação do preço de equilíbrio, cada uma das curvas que aí
está representada e o volume dos lucros, referindo ainda as possibilidades de os aumentar:
Deveriam ser abordados, pelo menos, os seguintes tópicos:
- identificação do mercado: monopólio;

- condição para a fixação do preço de equilíbrio: E – o preço que ajusta a procura à oferta
(B) cujo custo marginal é igual à receita marginal (e que se determina projectando até à curva
da procura a vertical do cruzamento de ambas estas curvas (K));

- explicação da diferença entre preço (E) e receita marginal (K): componente de perda na
redução do anterior preço de monopólio (número de unidades anteriormente vendidas vezes a
diferença entre o anterior e o novo preço) como custo para a obtenção da componente de ganho
do novo preço de monopólio (número de novas unidades vendidas vezes novo preço);

- identificação das curvas:


DD’ – curva da procura
SMC – curva do custo marginal
SAC – curva do custo médio
MR – curva da receita marginal

- identificação do volume de lucros: ETNF (multiplicação das quantidades B pela


diferença entre o preço E e o custo médio F – que corresponde à produção de uma quantidade B,
como decorre da intercepção da curva do custo médio pela projecção vertical das quantidades B);

- possibilidade de aumentar os lucros: práticas de discriminação de preços de 1.º grau


(quando se consegue fazer coincidir o preço de venda de cada unidade com o preço de reserva de
cada adquirente), 2.º grau (quando o preço das unidades que se vendem difere consoante a sua
quantidade), ou 3.º grau (quando o preço das unidades que se vendem difere com as características
do comprador, do local ou do tempo de compra).

III
Diga, justificando devidamente, se são verdadeiras ou falsas as seguintes
afirmações:
a. A opção entre bens ou cabazes de bens tem uma representação diagramática
idêntica tanto no consumo como na produção;
Falso.
Na representação diagramática das escolhas do consumidor entre dois bens ou cabazes de
bens – curvas de indiferença – encontramos curvas convexas em relação à origem (ou seja, curvas
com taxas marginais de substituição decrescentes). Na representação diagramática das escolhas
de produção entre dois bens ou cabazes de bens (de uma empresa ou sociedade) – curvas de
possibilidades de produção – encontramos curvas côncavas em relação à origem (ou seja, curvas
com taxas marginais de transformação crescentes).

b. A heurística da ancoragem pode ser vista como uma versão aguda da heurística
da disponibilidade (ou esta como uma versão crónica daquela);
Verdadeiro.
Supondo que se conhece a distinção entre algo agudo (curto no tempo e mais intenso) e
crónico (longo no tempo e menos intenso), e a distinção entre ancoragem (influência do ponto de
partida) e disponibilidade (influência do nosso arquivo pessoal de informação), a lógica da
comparação é óbvia: a ancoragem ocorre quando usamos a informação (concentrada) que nos foi
fornecida imediatamente antes do processo de decisão, a disponibilidade quando recorremos à
informação (difusa) que conhecemos ou acumulámos previamente.

c. Um óptimo de Pareto pode não ser uma situação óptima;


Verdadeiro.
Uma situação diz-se de óptimo de Pareto quando os que nela participam chegam a uma
posição tal que a melhoria da situação de um (ou uns) só pode ser obtida à custa do sacrifício da
situação de outro (ou de outros). Não quer dizer que essa solução seja a melhor possível: só quer
dizer que é uma situação em que deixou de haver desperdício na afectação dos recursos
(desperdício que existia quando se podia melhorar a situação de um sem sacrifício da situação de
outro). Bastaria, aliás, pensar em outros arranjos em que os que ganham podem compensar os que
perdem (critério de Kaldor-Hicks).

d. A Economia austríaca tem a mesma abordagem aos problemas económicos


que a Economia mainstream;
Falso.
Para a Economia mainstream, os problemas económicos são problemas de maximização
(de maximização de utilidade, de maximização de lucro, de maximização de eficiência
alocativa,… sujeita a restrições conhecidas – orçamental, física, técnica,…). Trata-se, portanto,
de decidir problemas técnicos recorrendo a cálculos. Para a Economia austríaca os problemas
técnicos são triviais: trata-se antes de um processo de descoberta da informação num processo
dinâmico e indeterminado: não se podem fazer cálculos de maximização sem conhecer os dados,
e os dados que importa são gerados pela acção humana.

e. O problema do método indutivo são os cisnes negros.


Verdadeiro.
O método indutivo vai do particular para o geral através da acumulação de dados. A valia
da generalização que se consegue depende da fiabilidade dos dados que são recolhidos – e da sua
representatividade. Até à descoberta de cisnes negros na Austrália, no Século XVII, julgava-se
que todos os cisnes eram brancos – e a designação passou a designar eventos inesperados (em
face do conhecimento adquirido por métodos indutivos).

IV
Exponha a teoria da evolução dos sistemas económicos de Karl Marx, referindo
as diferenças em relação às demais teorias sobre a sucessão desses sistemas e a sua
eventual actualidade.
Deveriam ser abordados, pelo menos, os seguintes tópicos:
- explicação endógena e dinâmica da sucessão de modos-de-produção por contraste com
a mera distinção de sistemas nos autores das demais escolas;
- lei da correspondência necessária entre o desenvolvimento das forças produtivas
materiais e das relações de produção (tal como exposto no Prefácio à Contribuição para a Crítica
da Economia Política);
- aplicação da dita lei na passagem do comunismo primitivo para o esclavagismo, deste
para o feudalismo, deste para o capitalismo e deste, supostamente, para o socialismo;
- tendência diagnosticada (em meados do Século XIX) para a concentração do capital, o
aumento das desigualdades e para o crescimento do proletariado à custa da redução do número
dos produtores independentes, por confronto com a tendência actual para a concentração do
capital, o aumento das desigualdades e a substituição do proletariado pelo precariado (ou o
gigariado);
- tendência para a continuação – rectius: para a acentuação exponencial – do
desenvolvimento das forças produtivas materiais (tecnologia, métodos de produção e de
organização) e para a crescente imposição de limites a esse desenvolvimento pelas relações
sociais de produção (direitos laborais, de propriedade intelectual, de privacidade, de segurança
social, …).

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