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Universidade Federal de Minas Gerais

Escola de Engenharia
Departamento de Engenharia Mecânica

PROCESSOS NÃO CONVENCIONAIS DE USINAGEM

Prof. Alexandre Abrão

Belo Horizonte, agosto de 2016


Processos Não Convencionais de Usinagem Prof. Alexandre Abrão

CONTEÚDO
Página
1. Introdução 3
1.1 Classificação dos processos não convencionais 5
2. Processos mecânicos 7
2.1 Jato abrasivo 7
2.2 Jato de água 13
2.3 Fluxo abrasivo 27
2.4 Usinagem ultrassônica 36
3. Processos elétricos 47
3.1 Usinagem eletroquímica 47
3.2 Outras operações 65
3.2.1 Retificação eletroquímica 65
3.2.2 Retificação por descarga eletroquímica 67
3.2.3 Furação por eletrofluxo e por capilaridade 71
3.2.4 Furação eletrolítica 73
4. Processos térmicos 76
4.1 Eletroerosão 76
4.1.1 Eletroerosão a fio 102
4.1.2 Retificação por eletroerosão 103
4.1.3 Texturização 105
4.2 Feixe de elétrons 107
4.3 Feixe de íons 116
4.4 Arco plasma 121
4.5 Feixe laser 128
5. Processos químicos 144
5.1 Usinagem química 144
5.2 Usinagem fotoquímica 153
6. Prototipagem rápida 157
6.1 Fotopolimerização ou estereolitografia 160
6.2 Deposição de plástico fundido 161
6.3 Sinterização a laser 162
6.4 Deposição por adesão 163
6.5 Deposição de lâminas 164
6.6 Ferramental rápido e manufatura rápida 166
7. Referências bibliográficas 170

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1 INTRODUÇÃO

Os processos de manufatura sempre acompanharam o Homem em sua constante busca por


melhores condições de vida. Há 2 milhões de anos eram utilizadas ferramentas manuais feitas
de ossos, pedras e madeira e há 1 milhão de anos as ferramentas metálicas passaram a ser
usadas. Até o século XVII, as operações eram realizadas manualmente ou utilizando
dispositivos rústicos, como o torno-árvore representado na Figura 1.1.

Figura 1.1: Torno-árvore (McGeough, 1988).

Somente a partir da Revolução Industrial é que surgiram as primeiras máquinas ferramentas:


em 1774, Wilkinson desenvolveu a máquina para mandrilar cilindros de máquinas a vapor e em
1797 Maudsley apresentou o torno com avanço automático para rosquear. Em seguida
surgiram a plaina limadora, furadeira, fresadora (1818) e, no final século XIX, a retificadora.

O desenvolvimento de novos materiais e ligas mais resistentes e, consequentemente, mais


difíceis de se usinar inviabiliza o uso da usinagem convencional (por cisalhamento) tanto do
ponto de vista técnico quanto econômico. Tais materiais combinam algumas das seguintes
propriedades: alta dureza e fragilidade, pobres propriedades térmicas, alta refratariedade,
reatividade química, microestrutura não-homogênea, etc. Dentre os segmentos industriais que
fazem uso de materiais com as características citadas, destacam-se as áreas biomédica e
aeroespacial. A Figura 1.2 mostra o aumento da temperatura do motor de aeronaves ao longo
do século XX (Ezugwu, 2005).

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Figura 1.2: Evolução da temperatura do motor de aeronaves ao longo do século XX (Ezugwu,


2005).

Assim, o termo não convencional (ou não tradicional) se refere ao fato de a energia ser aplicada
em sua forma mais direta, sem a necessidade, na grande maioria das vezes, de uma
ferramenta de corte. Ainda que a ferramenta seja necessária, arestas de corte afiadas não são
um requisto essencial. Tais processos vêm sendo aplicados com sucesso desde a Segunda
Guerra Mundial e, ao contrário dos processos convencionais, os processos não convencionais
se destinam a aplicações específicas, tanto no que diz respeito ao material da peça quanto a
forma, dimensões, tolerâncias e acabamento do componente usinado. Por outro lado, a
crescente popularização do comando numérico computadorizado tem permitido uma maior
flexibilização destes processos, com destaque para a usinagem a laser e por eletroerosão.

A maior parte desses equipamentos é comandada numericamente, o que permite o


monitoramento e controle da operação. Desta forma, o tempo e custo de fabricação são
reduzidos, viabilizando a utilização de tais processos em novos segmentos. A Figura 1.3 mostra
o grau de exatidão obtido por operações de usinagem ao longo do último século.

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Figura 1.3: Evolução da exatidão em máquinas ferramentas e instrumentos de medição


(Tanigushi, 1983).

Entretanto, é importante deixar claro que os processos não convencionais não substituirão os
processos ditos convencionais e que um processo não convencional considerado mais
apropriado para usinar um material sob determinada condição pode não ser igualmente
eficiente no corte do mesmo material sob condição distinta, principalmente no que se refere à
qualidade da superfície usinada e taxa de remoção de material.

1.1 Classificação dos processos não convencionais

A classificação dos processos não convencionais de usinagem é arbitrária e não consensual. A


classificação mais frequentemente utilizada leva em conta a forma de aplicação da energia, que
pode ser mecânica, elétrica, térmica ou química. A Tabela 1.1 mostra os principais processos
não convencionais de usinagem e suas características mais relevantes (Pandey e Shan, 1980),
isto é, o mecanismo responsável pela remoção de material, o meio de transferência e a fonte de
energia. Nota-se que os processos térmicos são os que apresentam maior variabilidade em
termos de meio de transferência e fonte de energia.

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Tabela 1.1: Classificação dos processos não convencionais de usinagem.

Forma de
Mecânica Elétrica Térmica Química
energia:
Jato abrasivo
Eletroerosão
Jato de água
Feixe elétrons
Jato de água Eletroquímica Química
Processo: Feixe íons
com abrasivo e derivados Fotoquímica
Feixe laser
Fluxo abrasivo
Arco plasma
Ultrassom
Mecanismo de Deslocamento Fusão e
Erosão Ablação
remoção: de íons vaporização
Gás aquecido,
elétrons,
Meio de Partículas a alta Ambiente
Eletrólito radiação ou
transferência: velocidade reativo
corrente de
íons
Material
Pressão
Fonte de Corrente ionizado, alta Agente
pneumática ou
energia: elétrica tensão, luz corrosivo
hidráulica
amplificada.

Entretanto, uma tendência que tem sido observada é o desenvolvimento de processos híbridos,
ou seja, a combinação de duas operações de naturezas distintas em um novo processo, como
por exemplo, a usinagem por eletroerosão e a eletroquímica, eletroerosão e usinagem
ultrassônica, ou mesmo a combinação de um processo não convencional com outro
considerado convencional (eletroquímica e retificação,usinagem ultrassônica e fresamento,
arco plasma e torneamento, etc.).

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2. PROCESSOS MECÂNICOS

Neste grupo de operações o material é removido pela ação abrasiva. Normalmente são
empregados quando os processos convencionais apresentam dificuldades associadas à
dureza, tenacidade ou fragilidade da peça (materiais cerâmicos, compósitos, etc.). Dentre as
principais vantagens deste grupo se destacam o fato de o material da peça não precisar ser
condutor elétrico (o que restringe a utilização de diversas operações não convencionais), a
viabilidade de se usinar materiais frágeis tais como vidro, quartzo e cerâmicas (inexequível para
a maioria das operações convencionais) e a operação não provocar danos térmicos.

2.1 Usinagem por jato abrasivo

Nesta operação partículas abrasivas - normalmente óxido de alumínio (Al2O3) ou carboneto


de silício (SiC) - são arremessadas contra a peça por meio de um gás sob pressão. A
remoção do material ocorre por microlascamento e pode ser controlada para corte, limpeza,
rebarbação, polimento, etc. A Figura 2.1 representa o processo de remoção de material
(Slikkerveer et al. apud Park et al., 2004): quando um penetrador é pressionada contra a
peça uma zona de deformação plástica se forma logo abaixo da ponta do penetrador devido
à força compressiva. Eventualmente trincas surgem nas direções radial e paralela em
relação à superfície da peça. As trincas laterais (paralelas às superfície) estão associadas ao
mecanismo de remoção de material na usinagem por jato abrasivo.

Figura 2.1: Propagação de microtrincas por indentação

Assim, este processo é mais eficiente em materiais duros e frágeis, tais como vidro, silício,
tugstênio, cerâmicas, etc. Difere do jateamento convencional pelo fato dos grãos serem

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menores (diâmetro médio entre 10 e 50 µm), pelo maior controle de impurezas e do jato. A
Figura 2.2 apresenta um diagrama esquemático da operação.

Figura 2.2: Esquema da usinagem por jato abrasivo (ASM, 1995).

O equipamento trabalha com um gás que pode ser ar (menor custo), nitrogênio (N2), dióxido de
carbono (CO2) ou outro gás inerte pressurizado, seco e livre de contaminantes. A pressão varia
de a 520 a 830 kPa, porém pressões acima de 600 kPa são raramente empregadas porque
provocam o desgaste prematuro do bocal. O gás passa por uma câmara onde é feita a mistura
com os abrasivos. Em seguida a mistura passa por uma válvula liga/desliga e chega ao bocal.
Ao passar pelo bocal o jato atinge velocidades na faixa de 150 - 300 m/s (Benedict, 1987). Uma
cabine evita o contato do operador com o pó. Este equipamento apresenta um dos menores
custos dentre os processos não convencionais de usinagem, muito embora frequentemente
seja controlado manualmente.

O bocal é geralmente feito em metal duro (WC+Co), também podendo ser em safira (mais
durável, porém mais caro). As dimensões da seção do bocal variam de Ø 0,13 a 1,25 mm ou de
0,08 x 0,5 mm até 0,18 x 3,8 mm. A vida do bocal depende do seu material e do abrasivo
usado: para o metal duro ela pode chegar a 35 horas enquanto o de safira pode durar até 300
horas.

A velocidade de avanço pode alcançar 2 mm/s e a taxa de remoção de material é de


aproximadamente 16 mm3/min para o vidro e varia de 1,6 a 4,1 mm3/min para metais. No caso
de cerâmicas duras a taxa de remoção é de 50% da do vidro. Os principais fatores que afetam
a taxa de remoção são:
• material da peça

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• vazão do jato abrasivo (desbaste: 10 - 20 g/min e acabamento: 3 - 5 g/min)


• tamanho e tipo de abrasivo
• distância entre bocal e peça.

A Figura 2.3 mostra a influência da vazão e do tamanho das partículas abrasivas sobre a taxa
de remoção de material. A taxa de remoção aumenta com a vazão de abrasivo, porém se esta
for muito elevada, há um decréscimo na velocidade dos grãos abrasivos e, consequentemente,
na taxa de remoção de material. Observa-se que para as condições empregadas (corte de
vidro) existe uma vazão ótima em torno de 10 g/min que resulta em taxa de remoção máxima.
Além disso, a taxa de remoção de material aumenta com o tamanho das partículas abrasivas
devido à maior capacidade de microlascamento dos abrasivos com dimensões maiores.

Figura 2.3: Influência da vazão e tamanho do abrasivo sobre a taxa de remoção de material
(ASM, 1995).

O abrasivo não deve ser reutilizado, pois perde a capacidade de corte. Além disso, seu custo é
baixo e os cavacos misturados aos abrasivos podem entupir o bocal. Os tipos de abrasivo mais
comumente utilizados são:
• óxido de alumínio (Al2O3): operações pesadas
• carboneto de silício (SiC): operações pesadas em materiais mais duros
• carbonato de magnésio: limpeza e gravação
• bicarbonato de sódio: limpeza e corte de metais macios

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• vidro: polimento.

A Figura 2.4 mostra a influência da distância bocal-peça sobre a taxa de remoção, que
apresenta uma região ótima. Distâncias muito pequenas causam a redução da taxa de remoção
devido à queda de pressão, enquanto distâncias muito elevadas prejudicam o processo devido
à redução da velocidade do jato. Além disso, quanto maior a distância bocal-peça, maior será a
dispersão do jato, que a partir de 1,6 mm torna-se cônico com inclinação de 7o.

Figura 2.4: Influência da distância bocal-peça sobre a taxa de remoção de material


(ASM, 1995).

Via de regra recomenda-se uma distância entre 2 e 15 mm para corte. Distâncias curtas
(menores que 1 mm) são empregadas quando se deseja elevada exatidão (às expensas de
baixa taxa de remoção), ao passo que o aumento da distância provoca a dispersão do jato, o
que é indicado para operações de limpeza (distância entre 5 e 13 mm) e texturização de vidro
(de 25 a 75 mm).

O processo produz uma superfície granular e opaca com rugosidade Ra entre 0,15 e 1,5 µm,
tolerâncias de ±0,13 mm (típicas) a ±0,05 mm (sob condições especiais) e o raio mínimo é de
2 mm. A influência da distância bocal-peça sobre a dimensão e forma do furo é ilustrada na

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Figura 2.4. Nota-se um aumento do diâmetro médio do furo com a elevação da distância bocal-
peça, acompanhado da elevação do desvio de circularidade.

Gás: ar
Pressão: 30 kPa
Abrasivo: Al2O3 (40 µm)
Peça: vidro

Figura 2.5: Influência da distância bocal-peça sobre os desvios dimensional e geométrico


(Pandney e Shan, 1980).

Aplicações típicas da usinagem por jato abrasivo em materiais cerâmicos, plásticos rígidos e
metais endurecidos compreendem:
• corte e furação de pequenas seções
• gravação em peças metálicas, plásticas e de vidro (número de chassis).
• rebarbação
• corte de perfis intrincados em materiais duros e frágeis (espessura inferior a 1,5 mm para
aços e 6 mm para vidros)
• limpeza e remoção de camadas oxidadas
• acabamento de componentes eletrônicos.

As principais vantagens da usinagem por jato abrasivo são:


• boa dissipação do calor gerado pelo gás
• corte de materiais frágeis e de seções finas
• eficaz para materiais duros
• o bocal atinge locais de difícil acesso
• baixo consumo de energia
• equipamento de baixo custo.

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Por outro lado, este processo apresenta as seguintes desvantagens:


• taxa de remoção de material dentre as mais baixas
• inviável para materiais dúcteis
• elevado desgaste do bocal
• dispersão do jato
• possível alojamento de partículas abrasivas na peça
• baixa exatidão (especialmente conicidade em cortes profundos).

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2.2 Usinagem por jato de água

Esta operação emprega um jato de água colimado a alta velocidade como ferramenta cortante.
No caso de peças não metálicas, utiliza-se o jato de água sem abrasivo, entretanto, para o corte
de materiais mais duros e densos (tais como metais, vidros e cerâmicas), deve-se acrescentar
partículas abrasivas à água. No caso específico de materiais compósitos, o jato de água com
abrasivo é dez vezes mais rápido que o corte convencional.

No início do século XX, trabalhadores de usinas de geração de vapor observaram que


pequenos furos na tubulação de vapor sob alta pressão geravam um jato capaz de cortar
madeira. Entretanto, somente em 1960 Norman Franz patenteou a técnica de produção de uma
jato de água coerente a alta velocidade e em meados de 1980 foi anunciado um sistema para
corte de aço.

Ao atingir a superfície da peça, a velocidade do jato (de até 900 m/s conforme McGeough,
1988) torna-se nula e, por conseguinte, a energia cinética é convertida em pressão hidráulica.
De acordo com Pandney e Shan (1980), nos primeiros milissegundos após o contato inicial a
pressão transiente pode chegar ao triplo da pressão hidrostática, sendo que a remoção de
material ocorrerá onde a pressão do jato exceder a força de ligação dos átomos que compõem
o material da peça.

As principais aplicações do jato de água sem abrasivo são:


• corte de materiais não metálicos (madeira, papel, placas de circuito impresso, etc.)
• corte de compósitos poliméricos (plástico reforçado com fibras)
• decapagem de fios
• corte de materiais inflamáveis (tecidos) e de alimentos (sem quebrar ou trincar)
• corte sem a produção de partículas suspensas em materiais como carvão e rocha.

Por sua vez, o jato de água com abrasivo permite:


• corte de metais ferrosos, como aço ferramenta, sem resíduos
• corte de ligas resistentes ao calor
• corte de compósitos poliméricos reforçados com fibras de carbono e de vidro
• remoção de rebarbas em peças de aço usinadas.

A Figura 2.6 mostra o corte por jato de água com abrasivo de um disco maciço de Inconel (liga
Ni-Cr) para a produção de rotores de turbina (Ø760 x 45 mm) em 48 horas.

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Figura 2.6: Usinagem por jato de água com abrasivo de rotor de turbina (ASM, 1995).

O equipamento consiste de uma unidade hidráulica completa com motor para acionamento da
bomba com potência de 15 a 37 kW, linha de transmissão, bocal e coletor, vide Figura 2.7. A
pressão da bomba hidráulica (20 MPa) é elevada pelo intensificador (Figura 2.8) para até
380 MPa dependendo da razão entre as áreas dos pistões de óleo e de água, enquanto o
acumulador garante a uniformidade de pressão e velocidade do jato graças à compressibilidade
da água (cerca de 12% a 380 MPa).

Figura 2.7: Diagrama da usinagem por jato abrasivo (McGeough, 1988).

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Figura 2.8: Esquema de funcionamento do intensificador (ASM, 1995).

A linha de transmissão é normalmente feita em aço inoxidável (Øext/Øint=5-10) e a válvula


liga/desliga deve apresentar tempo de resposta curto e impedir vazamentos. O coletor deve
conter algum material (esferas de aço, pellets cerâmicos ou água) capaz de absorver a energia
do jato abrasivo.

Dois aspectos críticos a serem considerados no projeto da bomba e intensificador dizem


respeito à vedação dos elementos que atuam sob alta pressão e ao desgaste por fadiga dos
componentes mecânicos.

A distância entre o bocal e a peça varia de 2 a 25 mm de acordo com o material a ser cortado,
entretanto, a forma e o diâmetro do jato sofrem alterações mínimas dentro desta faixa de
distância. O bocal para o corte sem abrasivo possui um orifício em safira ou diamante sintético
cujo diâmetro mínimo é de 0,075 mm. Embora o bocal de diamante seja de 7 a 10 vezes mais
caro, ele garante uma vida 10 vezes mais longa e não se desgasta durante a limpeza. A Figura
2.9 mostra bocais para as operações: (a) sem abrasivo e (b) com abrasivo.

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(a) corte sem abrasivo (b) corte com abrasivo

Figura 2.9: Bocais para usinagem por jato de água: (a) sem abrasivo (McGeough, 1988) e (b)
com abrasivo (El-Hofy, 2014).

No caso do jato de água com abrasivo, o bocal difere do anterior basicamente por apresentar
uma entrada adicional para o abrasivo e uma câmara para mistura. O diâmetro do orifício varia
de 0,75 a 2,5 mm, de modo a garantir que seja pelo menos 5 vezes o diâmetro do abrasivo. A
potência na saída do bocal varia de 7 a 45 kW. Os principais abrasivos naturais empregados
são a granada [Fe3Al2(SiO4)2)], crisólita [(MgFe)2SiO4] e quartzo (SiO2). Os abrasivos sintéticos
são extremamente agressivos e provocam o desgaste prematuro do bocal (Kulekci, 2002). A
dureza do abrasivo a ser utilizado deve aumentar com a dureza da peça.

De acordo com Kulekci (2002), a natureza turbulenta do processo e o tamanho das partículas
abrasivas dificultam o estudo do fenômeno. Aparentemente, no início as partículas têm
velocidade nula, sendo aceleradas e arremessadas constantemente pelo jato contra as paredes
internas do bocal, até que a direção da velocidade do abrasivo seja paralela à do jato. Além
disso, é possível que após o primeiro impacto os abrasivos sejam reintroduzidos no fluxo,
permitindo cortes profundos. A adição à água de 1% de um polímero de cadeia longa (por
exemplo, óxido de polietileno) auxilia na manutenção da coerência do jato por uma distância
mais longa.

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Os principais parâmetros que afetam o desempenho da operação são:


• pressão e vazão do jato
• diâmetro do bocal
• distância bocal-peça (2,5 - 25 mm)
• velocidade de avanço
• tipo e tamanho de abrasivo.

A Figura 2.10 apresenta um nomograma no qual é possível determinar, a partir da vazão e


pressão do jato e do diâmetro interno do bocal, a potência disponível para o corte (ASM, 1995).
Alternativamente, a partir a equação de Bernoulli para fluidos incompressíveis é possível
determinar a velocidade (Equação 2.1) e a vazão (Equação 2.2) do jato:

2p
v=  Eq.(2.1)
ρ

Q = C D ( p ) D 2 2 p  Eq.(2.2)
4 ρ

Onde,
v: velocidade do jato.
p: pressão do fluido.
ρ: densidade do fluido.
Q: vazão.
CD: coeficiente do orifício (aproximadamente 0,7).
D: diâmetro do orifício.

Para a operação sem abrasivo, Konig et al. (apud McGeough, 1988) afirmam que velocidades
de avanço máximas de 4 e 6 m/min podem ser empregadas para o corte de plásticos
reforçados com fibras de aramida e de vidro, respectivamente. A Tabela 2.1 apresenta as
velocidades de avanço indicadas para outros materiais.

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Figura 2.10: Nomograma para determinação da potência de corte do jato abrasivo (CD=1).

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Tabela 2.1: Velocidades de avanço recomendadas para o corte com jato de água sem abrasivo
(Olsen apud Benedict, 1987).

Velocidade de avanço
Material Espessura (mm)
(m/min)
Alumínio 1,3 0,15
Vidro 12,7 1,5
Papel 25 6
Espuma 50 152
Papel corrugado 6,3 183

A Figura 2.11 apresenta a relação entre pressão do jato abrasivo e velocidade de avanço para
diversos tipos, vazões e tamanhos de abrasivos (ASM, 1995). Nota-se que a velocidade de
avanço necessária para garantir o corte pode ser aumentada com a elevação da pressão do
jato, da vazão de abrasivo acrescentado à água e/ou do tamanho das partículas abrasivas.

Figura 2.11: Relação entre pressão do jato abrasivo e velocidade de avanço


(abrasivo: granada).

De modo análogo, a Figura 2.12(a) ilustra a relação entre velocidade de avanço e espessura de
corte para diversos materiais (Ohman, apud Kulekci, 2002) e a Figura 2.12(b) representa a
relação entre vazão de abrasivos e espessura de corte (El-Hofy, 2014).

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(a)

(b)
Figura 2.12: (a) Relação entre velocidade de avanço e espessura de corte para diversos
materiais (pressão de 2500 bar, distância de 2 mm (Ohman, apud Kulekci, 2002) e (b) relação
entre vazão de abrasivos e espessura de corte para diversos materiais (El-Hofy, 2014).

A influência da pressão de água e do tamanho do abrasivo sobre a espessura do corte está


representada na Figura 2.13 (Kulekci, 2002). Observa-se nas Figuras 2.13(a) e 2.13(b) que
uma maior profundidade de corte pode ser atingida durante o corte de alumínio em comparação
com o aço inoxidável. Além disso, espessura de corte máxima é obtida quando o tamanho das
partículas abrasivas de granada situa-se em torno de 200 µm para o corte de aço inoxidável e
250 µm para o alumínio.

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Figura 2.13: (a) Influência da pressão de água sobre a espessura de corte.


(b) Influência do tamanho do abrasivo sobre a espessura de corte.

A influência da vazão de abrasivos sobre a taxa de remoção de material é mostrada na Figura


2.14 (Hocheng et al., 2013), onde se observa que este efeito é mais pronunciado sob alta
pressão e utilizando grãos abrasivos maiores.

Figura 2.14: Influência da vazão de abrasivos sobre a taxa de remoção de material

Uma das desvantagens da usinagem por jato abrasivo está associada à textura irregular da
seção de corte provocada pela deflexão do jato, representada de forma esquemática na Figura
2.15. Além disso, quando o jato executa cortes em arco ou cantos, tem-se uma forma cônica de
corte, como mostra a Figura 2.16(a). O corte com perfil inclinado, ilustrado na Figura 2.16(b),

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também é frequente e pode ser eliminado pelo aumento da potência ou redução da velocidade
de avanço.

Figura 2.15: Deflexão do jato durante o corte (Kulekci, 2002).

Figura 2.16: Desvios geométricos observados no corte por jato de água com abrasivos (Kulekci,
2002).

A Figura 2.17 (Hascalik et al., 2006) mostra: (a) a seção transversal de uma peça de Ti-6Al-4V
cortada por jato de água abrasivo, na qual são identificadas três regiões distintas (IDR, SCD e
RCR) e (b) a vista lateral mostrando a variação na largura de corte. A região IDR representa a
zona de ataque primária resultante da expansão do jato, anterior ao choque. Nessa região os
materiais mais dúcteis estão sujeitos à deformação plástica devido à energia cinética do jato de
água abrasivo. A região SCR representa a zona intermediária de ataque, onde se observa
melhor acabamento superficial e onde a energia é consumida na remoção de material.
Finalmente, RCR é a zona de deflexão do jato abrasivo, onde estrias são geradas na peça.

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(a) Seção transversal (b) Vista lateral

Figura 2.17: Superfície de Ti-6Al-4V usinada por jato de água abrasivo


(velocidade de avanço: 60 mm/min).

A inclinação do corte é afetada principalmente pela velocidade de avanço e pela pressão do


fluido, conforme mostra a Figura 2.18 (Hocheng et al., 20013). Sob alta velocidade de avanço, a
borda inferior do material não recebe energia suficiente para que a fenda produzinda apresente
largura constante. Por outro lado, altas pressões do jato fornecem energia cinética suficiente
para que a largura da fenda seja uniforme.

A Tabela 2.2 mostra de forma qualitativa a influência do material da peça e sua espessura e da
velocidade de avanço sobre a qualidade do corte obtido e a Figura 2.19 apresenta a influência
da velocidade de avanço e granulometria dos abrasivos sobre a rugosidade da parede gerada.
A Figura 2.20 apresenta a influência do fator de forma (razão entre o menor e o maior diâmetros
de um grão abrasivo), dureza do abrasivo e velocidade de avanço sobre a taxa de remoção.

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Figura 2.18: Influência da velocidade de avanço sobre a inclinação da fenda.

Tabela 2.2: Qualidade obtida para diferentes condições de trabalho: pressão de 3800 bar e
distância de corte de 2 mm (Berkeley Chemical Research Inc., apud Kulekci, 2002).

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Figura 2.19: Influência da velocidade de avanço e granulometria do abrasivo sobre a rugosidade


da parede (Hocheng et al., 2013).

Figura 2.20: Taxa de remoção de material (Ti6Al4V) em função de: (a) e (b) fator de forma
(vf=0,03 – 0,08 e 0,17 m/s), (c) e (d) dureza do abrasivo (Fowler et al., 2009).

As principais vantagens do corte por jato abrasivo são:


• forças de usinagem baixas
• dispensa pré-furação
• não induz alterações térmicas na peça

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• corte sem partículas suspensas


• fácil integração com sistemas automatizados
• corte de camadas múltiplas
• pequena largura de corte.

Em contrapartida, este processo apresenta as seguintes limitações:


• baixa eficiência no corte de materiais metálicos
• acabamento opaco
• tolerâncias dimensionais abertas (±0,13 mm)
• produz estrias na peça
• requer proteção contra ruído e altas pressões
• elevado custo do equipamento.

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2.3 Usinagem por fluxo abrasivo

Trata-se de uma operação de acabamento na qual dois pistões opostos alternadamente


extrudam um fluido abrasivo semissólido de um cilindro para o outro através do espaço
existente entre peça e matriz, promovendo a remoção do material da peça (Figura 2.21).
A repetição da operação através de passagens restritas provoca a abrasão da peça e
permite a fabricação de até milhares de peças por hora, porém com baixa taxa de
remoção de material. Desta forma é possível usinar diversas passagens inacessíveis
simultaneamente, além de montar diversas peças em um único dispositivo. A ação
abrasiva assemelha-se à retificação ou lapidação e é tanto maior quanto maior for a
restrição à passagem do fluido, pois assim a força de corte e a velocidade do fluido são
elevadas.

Figura 2.21: Diagrama da usinagem por fluxo abrasivo.

O equipamento, ilustrado na Figura 2.22, opera a uma pressão de 0,7 a 20 MPa e vazão
de 10 a 380 L/min e o número de ciclos necessário ao acabamento de uma peça varia de
três a centenas de ciclos (Benedict, 1987). Temperatura, viscosidade, pressão, desgaste
e vazão são controlados durante a operação. Máquinas automatizadas apresentam
tempo de produção entre 1 e 3 minutos, porém, o processo não é adequado quando se
deseja elevado volume de material removido por peça. A matriz mantém a peça
posicionada e direciona o fluido corretamente e restringindo sua passagem onde abrasão
deve ocorrer (Figura 2.23).

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Figura 2.22: Equipamento para usinagem por fluxo abrasivo.

Figura 2.23: Matriz e peça na usinagem por fluxo abrasivo (Benedict, 1987).

O fluido abrasivo é composto de um mistura de polímero orgânico com grãos abrasivos.


O polímero é um material similar à borracha com lubrificante. As propriedades do fluido
são alteradas de acordo com o resultado desejado, ou seja, baixa vazão e alta
viscosidade são recomendadas para remoção mais uniforme (geração de cantos vivos),

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ao passo que para a produção de raios usa-se fluido abrasivo com vazão mais alta e
menor viscosidade, vide Figura 2.24.

(a)fluido de alta viscosidade (b) fluido de baixa viscosidade


Figura 2.24: Influência da viscosidade do fluido abrasivo sobre a remoção de material:
(a) fluido com viscosidade alta e (b) fluido com viscosidade baixa (ASM, 1995).

Valores de rugosidade em torno de Ra=0,5 µm são obtidos em materiais como alumínio,


cerâmicas e ligas de níquel, entretanto, o limite prático é de 0,05 µm. As tolerâncias
dimensionais podem chegar a ±5 µm (Benedict, 1987), porém, irregularidades e
imperfeições profundas não podem ser removidas. Além disso, furos não passantes não
podem ser usinados.

As Figuras 2.25 a 2.27 mostram a influência do número de ciclos sobre a rugosidade da


superfície e massa removida (Liang Fang et al., 2009). Observa-se na Figura 2.25 que a
rugosidade cai drasticamente após o primeiro ciclo, entretanto, não há melhoria
substancial nos ciclos subsequentes, nem em função do material da peça. Por outro lado,
as Figuras 2.26 e 2.27 mostram que o material da peça e a viscosidade do fluido afetam
de forma acentuada o volume removido de material.

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Figura 2.25: Influência do número de ciclos sobre a rugosidade dos aços AISI 1045,
1080 e A36.

Figura 2.26: Influência do número de ciclos sobre a massa removida dos aços AISI
1045, 1080 e A36.

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Figura 2.27: Influência do número de ciclos e da viscosidade do fluido sobre a massa


removida de material.

Os principais materiais abrasivos utilizados são o óxido de alumínio (Al2O3), o carboneto


de silício (SiC), o carboneto de boro (BC) e o diamante. O primeiro é empregado para uso
geral enquanto o segundo proporciona taxas de remoção de material mais elevadas. O
carboneto de boro é indicado para materiais mais duros e o diamante para a usinagem de
carboneto de tungstênio e remoção de camada fundida. O tamanho das partículas varia
de 0,005 a 1,5 mm (quanto menor o grão abrasivo, melhor o acabamento, porém menor é
a taxa de remoção). Em geral, o abrasivo pode ser usado por semanas, produzindo
milhares de peças antes de ser substituído.

Entretanto, Tzeng et al. (2007) observaram que a relação entre tamanho médio dos
abrasivos e rugosidade é um pouco mais complexa. De acordo com estes autores, a
força que mantém os abrasivos de pequeno diâmetro presos ao fluido é baixa, o que
prejudica a remoção de material e a redução da rugosidade da superfície. Assim, a
rugosidade diminui com a elevação do tamanho das partículas abrasivas, da viscosidade
do fluido e do tempo de processamento, vide Figura 2.28.

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Figura 2.28: Efeito dos parâmetros da usinagem por fluxo abrasivo sobre a rugosidade da
peça: (a) tamanho dos abrasivos, (b) concentração de abrasivos e (c) pressão de
extrusão (Tzeng et al., 2007).

Aplicações típicas (produção em massa) da usinagem por fluxo abrasivo abrangem:


• fabricação de componentes aeronáuticos: substituição do polimento manual de
turbinas (9 horas) por fluxo abrasivo (1 hora) seguido de acabamento manual (2 horas)
• fabricação de componentes cirúrgicos
• rebarbação e polimento (injetor de combustível: 30000peças/dia)
• geração de raios de curvatura em regiões de difícil acesso
• acabamento de matrizes para conformação mecânica
• acabamento de rotores maciços, discos de turbinas, engrenagens, etc.

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A Figura 2.29 mostra a integridade superficial de canais produzidos por eletroerosão a fio
antes e depois de serem submetidos à usinagem por fluxo abrasivo. Além da remoção da
zona termicamente afetada, nota-se a redução do raio produzido.

(a) após eletroerosão (b) eletroerosão seguida de fluxo abrasivo


Figura 2.29: Influência da usinagem por fluxo abrasivo sobre a integridade superficial de
canais usinados por eletroerosão à fio (Tzeng et al., 2007).

Jha e Jain (2004) estudaram a influência do campo magnético sobre a usinagem por fluxo
abrasivo utilizando como fluido uma mistura de pó de ferro carbonila e SiC com graxa e
óleo mineral (Figura 2.30). Na ausência do campo magnético os grãos abrasivos rolam ao
entrar em contato com as irregularidades, reduzindo a eficiência da operação. A aplicação
do campo magnético durante a operação faz com que as partículas de ferro sejam
usadas para pressionar os abrasivos contra as irregularidades. Controlando a força
magnética é possível controlar a remoção das irregularidades e assim promover melhor
acabamento na superfície.

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(a) Campo magnético ausente: remoção deficiente.

(b) Campo magnético presente: remoção eficiente.

Figura 2.30: Usinagem por fluxo abrasivo: (a) sem campo magnético e
(b) com campo magnético

A Figura 2.31 mostra exemplos de peças antes e após serem submetidas à operação de
usinagem por fluxo abrasivo (Extrude Hone, 2009). Observa-se o elevado acabamento
obtido em regiões de acesso restrito após a operação de fluxo abrasivo.

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Figura 2.31: Exemplos de peças usinadas por fluxo abrasivo.

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2.4 Usinagem ultrassônica

A utilização de ondas sonoras de alta frequência visando a remoção de material foi


aventada pela primeira vez em 1927 por Wood e Loomis, entretanto, somente em 1945 a
primeira patente foi depositada por Balamuth e em 1950 as primeiras máquinas
ferramentas ultrassônicas começaram a ser comercializadas (McGeough, 1988).
Esta operação emprega a vibração ultrassônica a uma frequência acima de 20 kHz e
amplitudes de 1 a 35 µm para usinar materiais duros, frágeis e preferencialmente não
metálicos. A ferramenta pode ser rotativa ou estática e é pressionada contra a peça por
um sistema pneumático, por molas ou contrapeso (mais simples). Na usinagem com
ferramenta estática uma mistura de abrasivo e água é injetada entre ferramenta e peça. A
cavidade formada é o negativo da ferramenta e cavidades grandes são produzidas por
trepanação.

A remoção é provocada pelos seguintes fenômenos (Thoe et al., 1998), conforme


ilustrado na Figura 2.32:
• abrasão pelo impacto direto de partículas abrasivas forçadas contra a peça pela
ferramenta
• microlascamento causado por abrasivos livres
• cavitação.

Figura 2.32: Mecanismos de remoção de material na usinagem ultrassônica (El-Hofy,


2014).

Entretanto, não há consenso a respeito da predominância de um ou mais desses


fenômenos, embora para alguns autores a cavitação responda por, no máximo, 5% da
taxa de remoção de material (McGeough, 1988). Em contrapartida, Ichida et al. (2005)

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realizaram testes nos quais a ferramenta foi mantida afastada da peça e sem a utilização
de abrasivos (apenas água ou álcool metílico foram usados como fluido). Sob tais
circunstâncias, a cavitação foi considerada o único responsável pela remoção de material
na forma de crateras com diâmetro de 0,5 a 5 µm e profundidade de 0,05 a 1 µm.

As principais aplicações da usinagem ultrassônica com ferramenta estática são as


seguintes:
• corte de materiais frágeis e duros com área inferior a 1000 mm2, tais como: cerâmicas,
quartzo, diamante e vidro (alta eficiência); metais com dureza acima de 40 HRC (média
eficiência); cobre, chumbo, aços em geral (baixa eficiência)
• produção de geometrias irregulares e complexas
• furação de pequenos diâmetros (Ø 0,1 mm) e furação múltipla.

A Figura 2.33 mostra a influência do material da peça sobre a velocidade de penentração


na usinagem ultrassônica (Klocke e Konig, 2007). Nota-se que a taxa de remoção de
material diminui com a elevação da tenacidade à fratura (k1c) da peça.

Figura 2.33: Influência do material da peça sobre a velocidade de penetração na


usinagem ultrassônica.

Na usinagem com ferramenta rotativa, além de vibrar, a ferramenta diamantada gira. A


remoção de material ocorre essencialmente pelo cisalhamento causado pelos cristais de

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diamante incrustados na ferramenta, efeito que é maximizado pela vibração ultrassônica.


Abrasivos não são aplicados nesse caso e apenas água é usada para refrigeração e
remoção de resíduos. A amplitude de vibração varia de 25 a 50 µm e o sistema deve
trabalhar a baixas pressões para se evitar a quebra de peças frágeis. As aplicações da
usinagem ultrassônica com ferramenta rotativa envolvem principalmente o fresamento de
canais, além da furação e retificação de materiais não metálicos como vidro, cerâmicas,
quartzo, rubi, safira, etc. e alguns compósitos.

Em linhas gerais, o equipamento consiste de uma fonte que eleva a freqüência de 60 Hz


para a faixa ultrassônica (20kHz) e potência de 150 – 2500 W para usinagem com
ferramenta estática e 450 W para ferramenta rotativa. Um transdutor piezelétrico
(normalmente quartzo, cuja eficiência de conversão é de 96%) ou magnetostritivo
(eficiência de conversão de 20-35%) é responsável pela conversão de energia elétrica em
mecânica (Benedict, 1987). Em virtude de sua baixa eficiência de conversão, a
temperatura do transdutor magnetostritivo tende a se elevar, o que exige um sistema de
refrigeração a água.

De forma geral, os transdutores piezelétricos (mais modernos) têm seu funcionamento


baseado nas alterações dimensionais induzidas quando determinados materiais
(cerâmicas sintéticas) são submetidos a um campo elétrico. Um disco de material
piezelétrico é montado entre duas chapas espessas de metal, de forma que a passagem
de corrente a uma determinada frequência faz com que esse sanduíche vibre a uma
frequência ressonante ao longo do eixo longitudinal.

O funcionamento do transdutor magnetostritivo é baseado no fenômeno de alteração do


comprimento de um objeto ferromagnético quando submetido a um campo magnético de
frequência ultrassônica. O perfil de alongamento do transdutor magnetostritivo varia com
seu comprimento, de forma que a amplitude máxima de alongamento ocorrerá a uma
distância de um quarto do comprimento de onda a partir do plano nodal. Assim, o
alongamento máximo será obtido para um transdutor de comprimento igual à metade do
comprimento de onda, como mostra a Figura 2.34.

A velocidade do som em um meio sólido (v) pode ser calculada pela Equação (2.3), o
comprimento de onda (λ) pela Equação (2.4) e a frequência de ressonância (fr) pela
Equação (2.5). Por exemplo, a uma frequência de 25 kHz, uma onda se propagando em
um meio sólido possui comprimento de onda aproximado de 200 mm.

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1
E  m(m − 1)  2
v=  2  Eq.(2.3)
ρ  (m − m − 2) 
v 1 E
λ= =  Eq.(2.4)
f f ρ
1 E
fr =  Eq.(2.5)
2ℓ ρ

Onde,
E: módulo de elasticidade.
ρ: densidade.
1/m: coeficiente de Poisson.
f: frequência de alteração do campo magnético.
ℓ: comprimento do transdutor.

Figura 2.34: Variação do alongamento com o comprimento do transdutor.

A Tabela 2.3 apresenta o valor do coeficiente de alongamento magnetostritivo de


algumas ligas (determinado pela razão entre a variação no comprimento e o comprimento
do transdutor). Os valores de alongamento obtidos diretamente são relativamente baixos,
variando de 0,001 a 0,1 µm (McGeough, 1988) e por isso têm pouca utilidade prática. Por
esse motivo, faz-se necessário um amplificador de amplitude (também chamado de
concentrador ou cone) de forma a se obter amplitudes na faixa de 10-40 µm, necessárias
para o corte de materiais. Por fim, tem-se a ferramenta cujo diâmetro máximo não deve
ser superior a Ø 50mm.

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Tabela 2.3: Coeficiente de alongamento magnetostritivo de algumas ligas (Kaczmarek


apud McGeough, 1988).

Coeficiente de alongamento
Material
magnetostritivo (x106)
Alfer (13% Al, 87% Fe) 40
Hypernik (50% Ni, 50% Fe) 25
Permalloy (40% Ni, 60% Fe) 25
Permendur (49% Co, 2% V, 49% Fe) 9

A Figura 2.35 ilustra um sistema composto de transdutor, amplificador e ferramenta.


Máquinas estáticas mais sofisticadas são equipadas com comando numérico
computadorizado e dispositivos de compensação do desgaste da ferramenta. O
comprimento do amplificador deve ser múltiplo da metade do comprimento de onda do
som de forma a se atingir a frequência ressonante e, consequentemente, amplitude
máxima de vibração do amplificador e da ferramenta. O amplificador deve ser feito de
material com elevada resistência à fadiga, sendo o titânio e as ligas a base de bronze os
materiais mais utilizados para esta finalidade.

Figura 2.35: Sistema para usinagem ultrassônica (McGeough, 1988).

O amplificador é um elemento crítico pois, além amplificar, direciona e foca a energia


convertida pelo transdutor, garantindo o aproveitamento ótimo dessa energia por meio de

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ressonância. Seu perfil geralmente é cilíndrico, cônico ou exponencial. Ao contrário do


suporte cilíndrico, que mantém a mesma amplitude de vibração do transdutor, os
amplificadores de seção variável têm a capacidade de amplificar a amplitude em até
600%, aumentando a taxa de remoção de material em até 10 vezes, porém, são de
fabricação mais complexa (Benedict, 1987).

A Figura 2.36 mostra dois amplificadores exponenciais externo e interno (Pandey e Shan,
1980). Nesses casos, a energia acústica não é refletida na superfície lateral e é
gradualmente concentrada em uma área casa vez menor, fazendo com que amplitude e
velocidade de vibração aumentem.

Figura 2.36: Representação de cones exponenciais para usinagem ultrassônica.

O material da ferramenta estática também deve possuir elevada resistência à fadiga,


além ser dúctil o suficiente para minimizar o desgaste, podendo ser de aço inoxidável, aço
prata, aço cromo-níquel, carboneto de tungstênio ou mesmo latão. Quanto maior a
dureza da ferramenta, mais acentuado será o seu desgaste. A fixação ao amplificador se
dá por parafuso, entretanto, a rosca deve ser superdimensionada na porca e
subdimensionada no parafuso para evitar que ocorra soldagem ultrassônica desses
elementos durante a operação.

Quanto menor a área de contato ferramenta-peça, melhor será a distribuição de abrasivos


na interface e, consequentemente, maior será a velocidade de avanço da ferramenta. Por

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esse motivo, a operação de trepanação é preferível à furação em cheio. Além disso, a


área da ferramenta não deve exceder a menor área de seção do amplificador em mais de
15% e a profundidade de penetração não deve exceder o diâmetro da ferramenta em
mais de 2,5 vezes. A Figura 2.37 ilustra exemplos de ferramentas estáticas para
usinagem ultrassônica, algumas delas já montadas nos amplificadores.

Figura 2.37: Ferramentas estáticas para usinagem ultrassônica (ASM, 1995).

A dureza do abrasivo deve ser igual ou superior a do material a ser usinado.


Normalmente são usados como abrasivos o carboneto de boro - BC (vida de 200 horas),
carboneto de silício - SiC (60 horas) e óxido de alumínio (Al2O3) com granulometria entre
9 e 50 µm (Benedict, 1987). O diamante é recomendado apenas para a usinagem de
peças do mesmo material ou de rubi. A mistura contém de 30 a 60% em massa de
abrasivos em água e é necessária uma vazão mínima de 25 L/min. A Figura 2.38
apresenta dois modos de aplicação da mistura: jorro e sucção. A primeira é mais simples,
porém a segunda permite maior eficiência da operação por se capaz de renovar os
abrasivos na região de corte, especialmente na usinagem de furos profundos.

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Figura 2.38: Aplicação da mistura: (a) por jorro e (b) por sucção.

A taxa de penetração da ferramenta é baixa: em torno de 3,8 mm/min para o vidro, 1,5
mm/min para materiais cerâmicos e 0,25 mm/min para WC. Os principais parâmetros do
processo que afetam a taxa de remoção são:
• amplitude de vibração
• pressão aplicada à peça
• tamanho e material do abrasivo
• pressão da mistura abrasivos/água.

As Figuras 2.39 a 2.42 mostram o efeito de vários parâmetros sobre a taxa de remoção
na usinagem ultrassônica (McGeough, 1988). A elevação da amplitude de vibração e da
pressão da ferramenta contra a peça resulta em maior taxa de remoção de material
(Figura 2.39).

Embora alguns autores tenham relatado que a taxa de remoção de material aumenta com
a frequência na faixa de 5 a 20 kHz, a Figura 2.40 mostra que a elevação da frequência
de vibração de 19 para 43 kHz resulta na queda da taxa de remoção de material. De
acordo com Markov (apud Pandey e Shan, 1980), a taxa de remoção de material é
diretamente proporcional à velocidade da partícula abrasiva, ou seja, é proporcional à
razão entre amplitude e frequência ressonante. Isto significa que a frequência a ser
utilizada para usinagem deve ser a de ressonância para que se obtenha amplitude
máxima na ponta da ferramenta e, por conseguinte, máximo aproveitamento do sistema
acústico.

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Pressão:
○ 0,04 MPa
0,10 MPa
△0,16 MPa
0,20 MPa

Figura 2.39: Influência da amplitude de vibração sobre a taxa de remoção na furação de


vidro com ferramenta de aço e abrasivo BC.

Freqüência:
○ 19 kHz
24,7 kHz
△ 43 kHz

Figura 2.40: Influência da amplitude de vibração sobre a taxa de remoção na furação de


aço temperado com ferramenta de aço e abrasivo BC.

A Figura 2.41 mostra que o BC é um abrasivo mais eficiente que o SiC devido a dureza
mais elevada do primeiro (4200 HV para o BC e 3100 HV para o SiC).e que a eficiência
da operação aumenta com a concentração de abrasivo, uma vez que a quantidade de
abrasivos disponível para o corte aumenta. Finalmente, a Figura 2.42 ilustra a redução da
rugosidade à medida que o tamanho das partículas abrasivas é reduzido. Além disso,
valores mais baixos de Ra são obtidos para o aço temperado e mais altos para o vidro,
provavelmente devido à maior fragilidade deste.

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Figura 2.41: Influência relativa da concentração sobre a taxa de remoção (○ BC e SiC).

Material da peça:
○ vidro
silício
 cerâmica
aço temperado

Figura 2.42: Influência do tamanho de grão abrasivo sobre a rugosidade da peça.

A exatidão do processo estático depende principalmente do tamanho do grão abrasivo,


muito embora o desgaste da ferramenta, a vibração transversal e a profundidade do furo
também sejam influentes. A folga entre ferramenta e peça (sobrecorte) varia de 2 a 4
vezes o tamanho médio dos grãos abrasivos e normalmente é maior na superfície de
entrada do que na de saída, o que resulta em conicidade do furo. Esta conicidade pode

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ser reduzida pelo aumento da carga estática (reduzindo assim o tempo de usinagem),
redução do desgaste da ferramenta ou redução do tamanho dos abrasivos.

Outro aspecto crítico diz respeito à assimetria do furo, que surge devido à vibração
transversal da ferramenta quando sua linha de centro não está perpendicular à peça,
quando os componentes acústicos da máquina estão desalinhados ou ainda quando a
linha de centro da ferramenta está fora do eixo vertical de movimento. Esta assimetria
varia de 40 a 120 µm para o vidro e de 20 a 60 µm para a grafita (McGeough, 1988).
Valores típicos de rugosidade e tolerâncias dimensionais encontram-se em torno de
Ra=0,7 µm e ±0,025 mm, respectivamente.

Dentre as vantagens do processo estático destacam-se:


• independência das propriedades elétricas da peça
• processo seguro
• geração de calor muito baixa
• indução de tensões residuais compressivas (aumento da resistência à fadiga)
• bom acabamento.

Por outro lado, citam-se as seguintes desvantagens:


• custo de ferramental elevado
• necessidade de reposição do abrasivo
• baixa taxa de remoção
• baixa eficiência contra materiais dúcteis.

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3. PROCESSOS ELÉTRICOS

Este grupo de operações é limitado a materiais condutores elétricos. As operações são


capazes de produzir peças com geometria complexa em um único passe e, em muitos
casos, a ferramenta não apresenta desgaste.

3.1 Usinagem eletroquímica

Consiste na remoção de material por meio da dissolução anódica em uma célula


eletrolítica, na qual a peça é o anodo e a ferramenta é o catodo, conforme ilustrado na
Figura 3.1. Embora o princípio da eletrólise tenha sido descoberto por Faraday no século
XIX, a primeira patente foi depositada em 1929 e somente na década de 1950 é que o
processo evoluiu de forma significativa a permitir sua aplicação industrial na remoção de
material.

Figura 3.1: Princípio da remoção eletroquímica.

O eletrólito é bombeado entre ferramenta e peça enquanto corrente contínua é aplicada


sob baixa tensão, dissolvendo o material da peça (Figura 3.2). No caso de um material
ferroso, tem-se:
Anodo: Fe Fe++ + 2e-
Catodo: 2H2O + 2e- H2 + 2OH-

Resultando em: Fe + 2H2O Fe(OH)2 + H2


E ainda: 4Fe(OH)2 + 2H2O 4Fe(OH)3

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Figura 3.2: Célula eletrolítica.

Assim, o anodo é dissolvido e o catodo (ferramenta) não, pois somente hidrogênio gasoso
participa da reação. Por exemplo, para se remover 7,85 g de ferro (1 cm3), 6,3 g de água
são consumidos (dos quais 0,28 g são H2) e são gerados 15 g de resíduos (hidróxido de
ferro). Quando seco, o volume correspondente de resíduo é de 4 cm3, porém quando
úmido forma uma borra que chega a ocupar 300 cm3 (Pandey e Shan, 1980).

A Figura 3.3 mostra o esquema de funcionamento do equipamento que, apesar das


baixíssimas forças de usinagem, deve ser rígido o suficiente para suportar a pressão
hidráulica de alimentação do eletrólito (que na região de saída pode resultar em forças de
milhares de Newtons). Em contrapartida, o uso de eletrólito a alta velocidade pode
resultar em pressões negativas que fazem com que a ferramenta seja succionada pela
peça. O sistema hidráulico ainda inclui reservatório, filtros, bombas e trocador de calor.

O sistema funciona com corrente elétrica na faixa de 50 a 40000 A para máquinas


industriais de grande porte, entretanto, é essencial garantir uma densidade de corrente
mínima de 0,2 a 0,3 A/mm2 e tensão elétrica de 30 V CC, aplicadas através de uma
distância ferramenta-peça de 0,2 a 1,3 mm. Se essa distância for muito pequena, pode
haver o acúmulo de resíduos causando curto circuito. Por outro lado, se a distância for
muito grande, a densidade de corrente diminui e, consequentemente, a taxa de remoção
de material é reduzida.

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Figura 3.3: Esquema de funcionamento do equipamento de usinagem eletroquímica.

Máquinas mais simples possuem apenas um eixo e controle manual de tensão e avanço,
ao passo que máquinas mais sofisticadas possuem até 5 eixos e comando numérico
computadorizado. O monitoramento da corrente é necessário a fim de evitar curto circuito
e possíveis danos à peça e ferramenta. A Figura 3.4 representa catodo e anodo no início
e final da operação. Observa-se que não há desgaste da ferramenta, mas a produção de
cantos vivos é dificultada.

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Figura 3.4: Configuração do catodo (ferramenta) e anodo (peça) no (a) início e (b) final da
operação de usinagem eletroquímica.

À medida que a remoção de material ocorre, se a posição da ferramenta permanecer


inalterada, a distância ferramenta-peça aumenta (Figura 3.5a). Com isso a resistência
elétrica é elevada e a taxa de remoção de material cai (situação utilizada em operações
de rebarbação). Para que a taxa de remoção de material permaneça constante, é
necessário o avanço da ferramenta contra a peça (Figura 3.5b). Assim, o negativo da
ferramenta será transferido para a peça.

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(a) Eletrodo com avanço nulo

(b) Eletrodo com avanço constante

Figura 3.5: Variação da distância eletrodo-peça com o tempo de usinagem: (a) eletrodo
com avanço nulo e (b) eletrodo com avanço constante.

O tempo total de usinagem é consideravelmente menor comparado ao fresamento de


topo e eletroerosão, o que faz com que o custo total por peça possa atingir 10% do
fresamento de topo. Por outro lado, a resistência à fadiga de peças fresadas é superior
em virtude das tensões residuais impostas pela operação (compressivas no fresamento e
nulas na usinagem eletroquímica).

Máquinas para usinagem eletroquímica são caracterizadas por apresentarem grandes


dimensões e pelo cuidado na seleção dos materiais que entram em contato com o
eletrólito e que por este motivo devem ser fabricados em aço inoxidável, plástico ou outro
material resistente à corrosão. Os sistemas de acionamento (motores e fusos) devem ser
protegidos e, em alguns casos, pressurizados com ar seco e livre de contaminantes. Uma
máquina industrial com capacidade de remoção de 25 cm3/min (15000 A) tem custo
estimado em aproximadamente US$ 500000.

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O eletrólito deve escoar a uma velocidade de 30 - 60 m/s com pressão entre 25 e 60 kPa
e temperatura na faixa de 24 - 65oC de forma a garantir a remoção de resíduos e a
refrigeração da ferramenta e da peça. Consiste de uma solução aquosa de sais
inorgânicos como NaCl, KCl, NaNO3, NaClO3. Cloreto de sódio e nitrato de sódio são os
mais empregados, embora o primeiro seja bastante corrosivo e o segundo tenha
tendência à formação da camada passivadora e possua condutividade térmica
ligeiramente inferior (Pandey e Shan, 1980).

A Figura 3.6 mostra a influência da densidade de corrente sobre a eficiência de corrente


aplicada aos eletrólitos de cloreto e nitrato de sódio (McGeough, 1988). Nota-se que a
eficiência do NaCl apresenta tendência de ligeira queda com o aumento da densidade de
corrente, enquanto o NaNO3 apresenta eficiência crescente com a elevação da densidade
de corrente. Embora aparentemente vantajosa, a eficiência de corrente constante do
NaCl resulta em sobrecorte lateral mais acentuado na peça usinada, em oposição ao
NaNO3, que apresenta baixa eficiência sob baixas densidades de corrente. Como
resultado, o sobrecorte lateral é menor, uma vez que a distância ferramenta-peça é maior
na superfície lateral do que na frontal, o que conduz a menores densidades de corrente
(Figura 3.7).

Figura 3.6: Influência da densidade de corrente sobre a eficiência de corrente aplicada


aos eletrólitos de NaCl e NaNO3.

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Figura 3.7: Sobrecorte lateral obtido com eletrólitos de: (a) NaNO3 e (b) NaCl.

A Figura 3.8 (Klocke e Konig, 2007) compara o comportamento dos dois eletrólitos
supracitados, entretanto, devido à diferença na concentração utilizada nos testes, não é
possível avaliar a influência do composto sobre a eficiência do processo. No entanto,
nota-se que a elevação da densidade de corrente (J) causa o aumento linear da
velocidade de avanço (va) e a redução da distância eletrodo-peça (s90).

Figura 3.8: Influência da densidade de corrente sobre a velocidade de avanço (va) e


distância eletrodo-peça (s90).

Soluções ácidas ou básicas podem se empregadas em aplicações especiais. Enquanto o


resíduo produzido pelos sais inorgânicos é insolúvel, as soluções ácidas ou básicas
produzem resíduo solúvel, entretanto, estas exigem um rígido controle para manutenção
de suas propriedades e obtenção de resultados consistentes. Além de fechar o circuito

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elétrico entre peça e ferramenta, o eletrólito tem as funções de promover as reações


químicas necessárias, controlar a temperatura do processo e eliminar os resíduos da
operação. A Tabela 3.1 mostra os eletrólitos mais comumente empregados na usinagem
eletroquímicas de diversos metais (ASM, 1995).

Tabela 3.1: Eletrólitos para usinagem eletroquímica (ASM, 1995).

Concentração
Taxa de remoção
Material da peça Eletrólito máxima
(mm3.103/min) para 1000A
(kg/L de água)
Aço e ligas de níquel e NaCl ou KCl 0,3 2,1
cobalto NaNO3 0,6 2,1
Aço temperado NaClO3 0,78 2
NaCl 0,3 2
Fofo cinzento
NaNO3 0,6 2
NaCl ou KCl 0,3 2,1
Ligas de alumínio
NaNO3 0,6 2,1
Ligas de titânio NaCl ou KCl 0,12 1,6
Tungstênio NaOH 0,18 1
NaCl ou KCl 0,3 4,4
Ligas de cobre
NaNO3 0,6 3,3

De forma a executar suas funções de maneira eficaz, o eletrólito deve apresentar as


seguintes características (Pandey e Shan, 1980):
• alta condutividade térmica
• alto calor específico
• baixa viscosidade
• estabilidade química
• resistência à formação da camada passivadora sobre a superfície da peça
• não tóxico e não corrosivo
• baixo custo e disponibilidade imediata.

A aplicação do eletrólit pode se dar através da ferramenta com pressão positiva ou


negativa ou lateralmente, conforme representado esquematicamente na Figura 3.9
(Klocke e Konig, 2007).

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Figura 3.9: Formas de aplicação do eletrólito: (a e b) através da ferramenta e (c)


lateralmente

Segundo Pandey e Shan (1980), a vida do eletrólito é limitada pela perda de hidrogênio,
perda de água por evaporação (que afeta a concentração e consequentemente a
viscosidade e condutividade elétrica do eletrólito), formação de precipitado e absorção de
sal pelo precipitado (reduz a concentração e afeta a condutividade elétrica).

A diferença entre a temperatura do eletrólito na saída e entrada da célula eletrolítica pode


chegar a 45º C (Kubeth e Heitmann apud Pandey e Shan, 1980) sob condições normais
de trabalho. Por um lado, a elevação de temperatura acelera as reações químicas,
aumenta a solubilidade dos produtos das reações químicas e reduz a tensão elétrica
necessária para a manutenção de uma determinada densidade de corrente, no entanto,
por outro lado temperaturas mais elevadas afetam a vazão e pressão do eletrólito.

O projeto e construção da ferramenta são críticos para o desempenho do processo, muito


embora o método para determinação da ferramenta mais adequada seja bastante
empírico. A ferramenta deve ser tenaz, feita de material de boa usinabilidade e condutor
elétrico, térmico, além de possuir resistência química ao eletrólito. A área da seção
transversal da ferramenta deve ser alta o suficiente para evitar seu superaquecimento
pela passagem de corrente elétrica (no caso de uma corrente de 1000 A, a área mínima
deve ser de 6 cm2 para uma ferramenta de cobre e 250 cm2 para aço inoxidável).
Geralmente usam-se latão, bronze, cobre, monel, titânio, aço inoxidável, alumínio, liga
Cu-W, etc. A Tabela 3.2 compara as propriedades relativas de quatro materiais
tipicamente empregados na fabricação de ferramentas.

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Tabela 3.2: Propriedades relativas de materiais para ferramentas.

Propriedade Material do eletrodo


Cobre Latão Aço inox. Titânio
Resistividade elétrica 1 4 53 48
Tenacidade 1,1 1 1,9 1,1
Usinabilidade 6 8 2.5 1
Condutividade térmica 25 7,5 1 2,6

Em geral, a ferramenta é um negativo da área a ser usinada e sua exatidão e


acabamento afetam diretamente a exatidão e acabamento da cavidade usinada. Cabe ao
projetista determinar os desvios e folgas necessários de forma a garantir uma taxa de
remoção uniforme e aceitável. As dimensões da ferramenta devem ser ligeiramente
inferiores às da cavidade (0,025 – 0,8 mm) e furos com razão profundidade/diâmetro de
até 20 podem ser produzidos. A utilização de sistemas CAD/CAM é de grande utilidade
para a produção de ferramentas com maior exatidão a custo mais baixo. A Figura 3.10
mostra diversas configurações para ferramenta (ASM, 1995).

Figura 3.10: Exemplos de configurações para ferramenta: (a) trepanação com ferramenta
isolada externamente, (b) ferramenta dupla externa, (c) furação cônica, (d) furação
escalonada, (e) ferramenta para alargamento interno, (f) ferramenta para produção de
nervuras, (g) trepanação com ferramenta de parede dupla e (h) ferramenta de fluxo.

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Praticamente qualquer material que conduza eletricidade pode ser usinado, entretanto,
observam-se os seguintes efeitos:
• microestrutura mais grosseira causa pior acabamento
• inclusões, como a grafita, podem causar problemas
• variações na composição (camada cementada, por exemplo) podem causar diferenças
durante a usinagem
• a taxa de remoção de material é insensível à dureza da peça, mas não a alterações na
microestrutura
• limpeza é fundamental ao término da operação.

A taxa de remoção depende, basicamente, da densidade de corrente, que por sua vez é
afetada pelos seguintes parâmetros:
• tensão elétrica: determina, junto com a resistência, a corrente elétrica
• velocidade de avanço: é inversamente proporcional à distância eletro-peça e varia de
0,25 a 20 mm/min
• eletrólito: aumentando a concentração e temperatura aumenta-se sua condutividade
• material da peça: valência e densidade determinam a taxa de remoção teórica (vide
Equação 3.1 e Tabela 3.3).

AI
υ=          Eq.(3.1)
zFρ
Onde,
υ: taxa de remoção volumétrica.
A: peso atômico do metal anódico.
I: corrente aplicada.
z: valência do metal anódico.
F=96500 C (constante de Faraday).
ρ: densidade do metal anódico.

A qualidade do acabamento frontal é sempre superior ao lateral (em geral na faixa de


Ra=0,1 – 1,5 µm contra 5 µm) e é muito sensível aos parâmetros de usinagem. A Figura
3.11 mostra a redução da rugosidade da superfície gerada com a elevação da densidade
de corrente para três valores de distância eletrodo-peça (Klocke e Konig, 2007).

As tolerâncias dimensionais podem chegar a ± 0,012 mm sob condições especiais,


entretanto, ± 0,12 mm é a faixa mais comumente atingida. Além disso, existem
dificuldades em usinar raios internos inferiores a 0,8 mm ou externos inferiores a 0,5 mm.
Valores de conicidade da ordem de 0,025 mm/mm são possíveis.

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Tabela 3.3: Taxa de remoção de material teórica (ASM, 1995).

Peso Taxa de remoção a 1000 A


Metal atômico Valência Densidade (eficiência de 100%)
(g/cm3) kg/h mm3.103/min
Alumínio 26,97 3 2,7 0,34 2,1
Cobre 58,93 1 9 2,37 4,4
2 9 1,18 2,1
Ferro 55,85 2 7,9 1,04 2,3
3 7,9 0,69 1,5
Molibdênio 95,94 3 10,2 1,19 2
4 10,2 0,89 1,5
6 10,2 0,6 1
Titânio 47,9 3 4,5 0,59 2,1
4 4,5 0,45 1,6
Tungstênio 183,85 6 19,3 1,14 1
8 19,3 0,86 0,8
4340 2,18
17-4 PH 2,02
René 41 1,77

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Figura 3.11: Influência da densidade de corrente (J) sobre a rugosidade (Ra) da superfície
gerada pela usinagem eletroquímica.

A eficiência da operação (definida como a razão entre as taxas de remoção experimental


e teórica) é afetada pela corrente aplicada e também pelo tipo e vazão do eletrólito
(McGeough, 1988). Com a elevação da densidade corrente, tem-se a queda da eficiência
do processo em virtude da ocorrência de outras reações químicas no anodo e da
liberação preferencial de oxigênio. Alguns materiais são mais facilmente usinados por
determinados eletrólitos. Por exemplo, a eficiência da usinagem eletroquímica de titânio é
bem superior quando se utiliza um eletrólito a base de fluoreto, em comparação com
cloreto de sódio. Finalmente, valores muito baixos de vazão do eletrólito reduzem a
eficiência na medida em que os resíduos da operação não são prontamente eliminados,
impedindo a dissolução do material e podendo causar curto circuito.

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A Figura 3.12 (Lanna e Abrão, 1999) apresenta resultados obtidos por durante a
realização de testes de furação eletroquímica em materiais diversos com ferramenta de
cobre (no caso do aço ABNT 4340, ferramentas com e sem revestimento isolante de
nylon foram usadas).

5 14
12
4
TRM (cm3/Amin)

10

Ra (µm)
3 8

2 6
4
1
2

0 0
AISI 4340 AISI 4340 Bronze Alumínio AISI 4340 sem AISI 4340 Alumínio
sem rev. revestimento

(a) Taxa de remoção de material (b) Rugosidade

2
Conicidade (mm/mm)

1,5

0,5

0
AISI 4340 AISI 4340 Bronze Alumínio
sem rev.
(c) Conicidade

Figura 3.12: Comparação entre valores obtidos na furação eletroquímica de diversos


materiais: (a) taxa de remoção de material, (b) rugosidade e (c) conicidade.

Nota-se que a taxa de remoção mais elevada foi observada para o bronze enquanto os
demais materiais apresentaram valores similares. Com relação à rugosidade, valores
mais baixos foram encontrados após a furação do aço ABNT 4340 com ferramenta sem
revestimento que, conforme esperado, apresentou valores de conicidade e sobrecorte
lateral bem superiores aos materiais usinados com ferramenta revestida.

O uso de equipamento de segurança (exaustores para eliminação do hidrogênio liberado


pela reação química, ventiladores, óculos, luvas, máscaras, etc.) é essencial. Além disso,
são necessários equipamentos e dispositivos para armazenamento, descarte e

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reciclagem do eletrólito. Essas duas últimas etapas requerem especial atenção devido ao
elevado volume e reduzido tamanho das partículas de hidróxido férrico e ferroso
produzidas, o que exige, no caso de operações em escala industrial, o uso de sistemas
de filtragem mais sofisticados, como por exemplo, filtros-prensa. De acordo com Benedict
(1987), sob condições adequadas de trabalho a quantidade de resíduos produzidos pode
chegar a 2% da massa do eletrólito. O tamanho médio das partículas pode chegar a
1 µm.

A Figura 3.13 ilustra algumas aplicações da usinagem eletroquímica. Em geral, o


processo é recomendado para:
• usinagem de aços temperados e ligas resistentes a altas temperaturas
• rebarbação de superfícies previamente usinadas, especialmente de interseções de
furos
• gravação, furação profunda e rebarbação em regiões de difícil acesso
• geração de geometrias complexas (matrizes) e atípicas
• fabricação de componentes aeroespaciais (peças para turbinas a gás, injetores, etc.).

Figura 3.13: Aplicações da usinagem eletroquímica: (a) contorno de furo profundo, (b)
disco compressor, (c) bocal cônico, (d) cápsula com ressaltos, (e) pá de turbina, (f) rasgos
em válvula, (g) rasgos espirais e (h) furos irregulares.

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O processo de usinagem eletroquímica pode ser combinado com as operações de


brochamento e eletroerosão para a fabricação de pás de compressor em liga de titânio ou
níquel, conforme ilustrado na Figura 3.14 (McGeough, 1988). Neste caso, a raiz é gerada
pela operação de brochamento. Em seguida, utiliza-se a usinagem eletroquímica para a
produção do perfil da pá e finalmente o comprimento final do componente é usinado pela
operação de eletroerosão. O ciclo completo de fabricação da pá dura quatro minutos.

Figura 3.14: Produção de pás de compressor pela combinação de: (a) brochamento, (b)
usinagem eletroquímica - ECM e (c) eletroerosão - EDM.

Uma tendência mais recente é a aplicação deste processo à microusinagem, mais


especificamente para a produção de furos com diâmetro inferior a 1 mm. Neste caso, a
distância eletrodo-peça pode ser reduzida a micrometros porém, para isso é necessário
reduzir a tensão e a concentração do eletrólito. Por outro lado, reduzindo a distância
eletrodo-peça há o risco de deposição de material na ferramenta, o que prejudica a
remoção uniforme de material. De forma a solucionar este problema, recomenda-se o uso
de corrente contínua pulsada. A Figura 3.15 (Bhattacharyya e Munda, 2003) mostra o
efeito de alguns parâmetros do processo sobre a taxa de remoção de material e
sobrecorte na microfuração eletroquímica. Observa-se que com a elevação da tensão e
da concentração do eletrólito há um aumento da taxa de remoção de material (Figura
3.15a). Da mesma forma, o sobrecorte aumenta com tensão e duração do pulso (Figura
3.15b).

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Alternativamente, Bhattacharyya et al. (2007) propõem o emprego de um transdutor


piezelétrico para promover a vibração da ferramenta e assim garantir a circulação do
eletrólito e a remoção de resíduos na microfuração. Os resultados indicaram que baixa
vibração na faixa de 150 a 200 Hz é mais eficiente do que alta frequência (3-23 kHz) na
microfuração de cobre. Já Ahn et al. (2004) sugerem a utilização de corrente pulsada do
duração de pulso na faixa de 20 a 80 ns para produzir furos em aço inoxidável com
diâmetro de 20 a 80 µm. Além disso, a geometria da ponta da ferramenta afeta a
geometria do furo (eficácia no fornecimento de eletrólito), vide Figuras 3.16 e 3.17.

(a) Taxa de remoção

(b) Sobrecorte

Figura 3.15: Efeito de alguns parâmetros do processo sobre: (a) taxa de remoção de
material e (b) sobrecorte.

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Figura 3.16: Efeito da geometria da microferramenta sobre a qualidade do furo

Figura 3.17: Etapas da microfuração eletroquímica do aço inoxidável SS304 com


espessura de 100 µm (diâmetro da ferramenta de 50 µm, tensão de 7,5 V e duração do
pulso de 300 ns)

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3.2 Outras operações

A usinagem eletroquímica deu origem a diversas variações, algumas delas híbridas,


conforme descritas a seguir.

3.2.1 Retificação eletroquímica

Este processo combina a remoção eletroquímica (90%) com a ação abrasiva (10%) e
emprega um rebolo abrasivo e condutor elétrico como catodo (polo negativo). O
equipamento consiste de uma fonte de corrente contínua, um rebolo e um sistema de
circulação e aplicação do eletrólito (Figura 3.18). Rebolo e peça não ficam completamente
imersos, mas a vazão e a posição do bocal devem garantir o fornecimento abundante de
eletrólito. O eixo árvore pode ser disposto vertical ou horizontalmente. A tensão máxima é
de 15 V e a corrente normalmente é de 1000 A, podendo chegar a 3000 A.

Figura 3.18: Esquema da retificação eletroquímica.

Ao contrário da retificação convencional, na qual o arco de contato entre rebolo e peça é


mais extenso, na retificação eletroquímica o arco de contato é menor devido ao fato de a
distância entre rebolo e peça ser reduzida gradativamente à medida que os grãos
abrasivos entram em contato com a peça (Benedict, 1987). Isto ocorre porque a etapa
inicial de remoção de material é totalmente eletroquímica, entretanto, à medida que o
eletrólito é arrastado para o interior da peça, sua eficiência cai, provocando a queda da
ação eletroquímica e, consequentemente, da distância entre rebolo e peça. Ao entrar em
contato com a peça, os abrasivos presentes no rebolo removem mecanicamente material
da peça (na forma de cavacos) e a camada de óxido aderida, expondo a superfície da

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peça novamente à ação eletroquímica. A Figura 3.19 (Benedict, 1987) compara a


remoção de material na retificação convencional com a retificação eletroquímica.

Figura 3.19: Remoção de material nas operações de retificação convencional (esquerda)


e eletroquímica (direita).

O abrasivo empregado no rebolo geralmente é o Al2O3 (também SiC e diamante) com


resina impregnada de cobre (ou prata) para garantir a condutividade elétrica. A velocidade
do rebolo é crítica, pois se for muito alta, a força centrífuga afasta o eletrólito da região de
remoção e se for muito baixa, não há passagem de corrente elétrica. Os eletrólitos
normalmente utilizados são o cloreto de sódio (NaCl) e o nitrato de sódio (NaNO3) a
concentrações de 0,12 a 0,36 kg por litro de água.

De modo análogo à retificação convencional, o equipamento pode ser configurado para


as seguintes operações:
• retificação de mergulho
• retificação plana (permite penetração de trabalho superior à retificação convencional)
• retificação cilíndrica (mais lenta devido à área de contato limitada)
• retificação de perfil (mais cara).

A rugosidade da peça varia de Ra = 0,12 – 0,8 µm com tolerâncias dimensionais em torno


de ± 25 µm (ou menos sob condições especiais) e, ao contrário da retificação
convencional, este processo produz superfícies isentas de rebarbas e não há risco de
queima da peça.

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Esta operação é usada nas seguintes situações:


• afiação de ferramentas de corte de carboneto de tungstênio (redução de 75% no custo
do rebolo e de 50% na mão de obra em comparação à retificação convencional)
• retificação de materiais de difícil usinabilidade (ligas resistentes ao calor e aços com
dureza superior a 60 HRC)
• peças frágeis ou sensíveis ao calor
• fabricação de instrumentos cirúrgicos
• fabricação de peças livres de tensões residuais ou rebarbas.

Principais vantagens da retificação eletroquímica:


• não há encruamento da peça
• não ocorre queima da peça (peça sem distorções)
• peça sem rebarbas
• dressagem do rebolo menos frequente que na retificação convencional
• vida mais longa do rebolo.

Desvantagens:
• custo de capital superior à retificação convencional
• limitada a materiais condutores
• ação corrosiva do eletrólito
• exige um sistema de filtragem e descarte do eletrólito
• competitiva somente para materiais exóticos.

3.2.2 Retificação por descarga eletroquímica

Trata-se de um processo híbrido de retificação eletroquímica (dissolução anódica) e


eletroerosão (descargas elétricas). Difere da retificação eletroquímica basicamente pelo
fato de a corrente aplicada ser alternada (ou pulsada) e o rebolo não ser abrasivo, mas de
grafita. Assim, não há qualquer remoção de material por abrasão. O material da peça é
primeiro transformado em óxido com espessura entre 0,25 e 1,25 µm durante o pulso
positivo. Durante o pulso negativo o óxido que se deposita na superfície da peça é
removido nos pontos onde ocorre descarga elétrica. Em alguns casos a descarga pode
remover, além do filme de óxido, uma pequena porção de metal, o que é indesejável pois
prejudica o acabamento da peça além de promover alterações metalúrgicas.

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A taxa de remoção de material na retificação por descarga eletroquímica pode chegar a


cinco vezes o valor obtido na retificação eletroquímica, entretanto, para isso é necessária
uma corrente elétrica dez vezes maior.

O equipamento consiste de um eixo principal isolado eletricamente, ao qual é fixado o


rebolo de grafita (vide Figura 3.20). A mesa dispõe de dispositivos de avanço e de
posicionamento da peça. O eletrólito, altamente condutivo, é bombeado do reservatório e
passa por um filtro antes de atingir a peça e ferramenta.

(a) Vista geral do equipamento

(b) Peça e rebolo

Figura 3.20: Equipamento de retificação por descarga eletroquímica: (a) vista geral e
(b) peça e rebolo.

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Máquinas industriais possuem ainda um sistema para coleta do eletrólito (na forma de
névoa), acessórios para dressagem do rebolo e distribuidores para assegurar a aplicação
homogênea do eletrólito, como mostra a Figura 3.21.

(a) (b)

Figura 3.21: (a) Distribuidor para uniformizar o eletrólito e (b) distribuição não uniforme.

O equipamento opera com uma fonte de baixa tensão (4-12 V), porém com corrente
elétrica entre 200 e 2000 A. Empregando corrente alternada, a densidade de corrente
máxima deve ser de 0,9 A/mm2 para a retificação de metal duro (WC + Co) e 1,6 A/mm2
para metais. A velocidade do rebolo varia de 20 a 30 m/s e a razão G (razão entre o
volume de material removido e o volume desgastado do rebolo) pode variar de 7 a 40 de
acordo com o material da peça e condições de operação. A Figura 3.22 ilustra a influência
da distância rebolo-peça sobre o desgaste do rebolo (ASM apud Benedict, 1987).
Observa-se que para baixos valores de tensão o desgaste do rebolo é essencialmente
mecânico, ao passo que sob valores mais altos de tensão o desgaste é devido ao
centelhamento.

Figura 3.21: Influência da tensão sobre o desgaste do rebolo utilizado na retificação por
descarga eletroquímica.

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A taxa de remoção de material varia de 100 a 250 mm 3/min (para uma corrente aplicada
de 200 A). Valores típicos de rugosidade situam-se na faixa de R a entre 0,12 e 0,37 µm
(WC + Co) e de 0,37 a 0,75 µm (aços). Em geral, tolerâncias de ± 25 µm são obtidas,
podendo chegar a ± 12 µm sob condições especiais. A Figura 3.22 mostra a influência de
alguns parâmetros (tensão, velocidade de avanço e rotação do rebolo) sobre a taxa de
remoção de material e rugosidade Rt obtidas na retificação por descarga eletroquímica
(Rodriguez et al., 2002).

0.14 0.14
0.13 0.13
0.12
0.12
0.11
0.11 0.10
TRM (mm3/min) TRM (mm3/min) 0.09
0.10
0.09 0.08
0.07
0.08 0.06
0.20 500
30 600 30
0.25 40 700
40
Vf (mm/min) 0.30 800
50 n (rpm) 900 50
V(V) V(V)
0.35 60 1000 60

(a) Taxa de remoção de material

7
9.5 6
9.0
5
8.5
8.0 Rt(um) 4
7.5 3
Rt(um) 7.0 2
6.5
1
6.0
500
5.5 600 30
5.0 700
40
0.20 800
30 n (rpm) 900 50
0.25 40 1000
V (V)
60
Vf (mm/min) 0.30 50
V (V)
0.35 60

(b) Rugosidade Rt

Figura 3.22: Influência de tensão, velocidade de avanço e rotação do rebolo sobre: (a)
taxa de remoção de material e (b) rugosidade obtidas na retificação por descarga
eletroquímica.

70
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De forma geral, nota-se que a taxa de remoção tende a aumentar com a tensão elétrica e
que há uma rotação intermediária correspondente a máxima taxa de remoção. A
influência da velocidade de avanço parece ser de menor importância. No que se refere à
rugosidade da superfície usinada, esta apresenta menores valores para tensão elétrica e
velocidade de avanço intermediárias, enquanto a rotação intermediária (responsável por
taxa de remoção mais elevada) promove valores mais altos de Rt.

Aplicações da retificação por descarga eletroquímica:


• usinagem de aços ferramentas temperados e de ligas de níquel
• retificação de ferramentas de metal duro (12 V, 200 A, 60 Hz: 1 pastilha/minuto)
• retificação de peças frágeis ou sensíveis ao calor.

3.2.3 Furação por eletrofluxo e por capilaridade

São processos bastante similares desenvolvidos especificamente para o setor


aeronáutico. São empregados para a furação profunda de milhares de pequenos
diâmetros (para fins de refrigeração) em ângulos variados em ligas resistentes ao calor.
Ambos empregam tubos de vidro como catodo e eletrólito ácido. Como a diferença de
potencial elétrico é aplicada entre o eletrólito e a peça, não há necessidade de uma
ferramenta condutora de eletricidade. A remoção de material se dá por dissolução
anódica e o emprego de um eletrólito ácido mantém os resíduos da operação dissolvidos,
impedindo seu acúmulo em regiões onde o acesso de eletrólito poderia se comprometido.
A Figura 3.23 representa o esquema de funcionamento da furação por eletrofluxo.

A principal diferença entre os dois processos reside no fato da furação por eletrofluxo ser
realizada sob alta tensão, aplicada entre a peça e o eletrólito ácido que flui através de um
tubo de vidro afunilado com comprimento de 50-100 mm e diâmetro tão pequeno quanto
0,13 mm. Já a furação por capilaridade emprega uma matriz de tubos de vidro mais
curtos, dentro dos quais passam fios de platina. Assim, necessita-se de tensão mais
baixa, o que torna o processo mais seguro.

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Figura 3.23: Esquema da furação por eletrofluxo (ASM, 1995).

Em ambos os casos o equipamento básico consiste de unidade principal, fonte, bombas,


filtros, trocadores de calor, controlador de temperatura, unidade de mistura do ácido e
dois reservatórios. De acordo com ASM (1995), a fonte é de 900 V e 25 A para eletrofluxo
e 125 V e 25 A para capilaridade. Como eletrólitos usam-se os ácidos sulfúrico, nítrico ou
hidroclórico (concentração de 15 a 20%) a uma temperatura de 40oC e pressão de 275 –
400 kPa. A velocidade de avanço varia de 0,75 a 3 mm/min. Para furos com Ø 0,25 mm
obtém-se tolerâncias de ± 25 µm.

Principais vantagens:
• dureza da peça não afetam os processos
• alta razão entre profundidade do furo e diâmetro
• elevado número de furos pode ser feito simultaneamente
• sem alterações metalúrgicas
• produção de furos cegos ou interseções
• peça sem rebarbas
• não há distância mínima entre furos (furação por capilaridade).

Principais limitações:
• os processos são lentos
• necessidade de manuseio de produtos ácidos
• descarte do resíduo requer cuidados

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• furos oblíquos são problemáticos.

A Figura 3.24 mostra um exemplo de aplicação da furação por capilaridade (furação de


canais de refrigeração com comprimento de 10 mm e diâmetro de 0,5 mm em pás de
turbinas à base de níquel) descrito por Klocke e Konig (2007).

Figura 3.24: Exemplo de aplicação da furação por capilaridade.

3.2.4 Furação eletrolítica

Também é derivada da usinagem eletroquímica, porém emprega um eletrólito ácido para


que o metal removido fique na forma de solução, e não de precipitado (o que poderia
obstruir o fluxo de eletrólito e prejudicar a operação). Para isto, utilizam-se eletrodos de
titânio puro (resistente ao ataque do eletrólito ácido) e revestidos com uma camada
isolante para evitar a remoção de material na região lateral. Assim, a ferramenta volta a
ser o catodo.

O equipamento é similar ao de usinagem eletroquímica, vide Figura 3.25, entretanto, seus


componentes devem ser resistentes ao ataque ácido. Além disso, o fluxo de corrente
elétrica deve ser revertido periodicamente para evitar a deposição de material da peça na
ferramenta. Pelo fato da pressão de aplicação do eletrólito ser mais baixa, o sistema
exige menor rigidez construtiva.

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Figura 3.25: Esquema da furação eletrolítica.

O equipamento opera com uma fonte de 20 V e 600 A com reversão a cada 5-10 s
(duração de 75-250 ms). Os principais eletrólitos são os ácidos sulfúrico, nítrico ou
hidroclórico (concentrações de 10 a 25%) a uma temperatura de 40oC e pressão de 275 -
400kPa. A velocidade de avanço da ferramenta vai de 0,75 a 3 mm/min, podendo se
estender de 0,12 a 25 mm/min (ASM, 1995).

Furos com diâmetro entre 0,64 e 6,4 mm podem ser produzidos pela furação eletrolítica,
que além disso garante altos valores de razão profundidade/diâmetro do furo em
materiais que não podem ser usinados convencionalmente. Tolerâncias de ± 50 µm são
obtidas para furos com diâmetro de 0,5 mm e de ± 0,1 mm para furos com diâmetro de
6 mm. A rugosidade varia de 0,8 a 3 µm, dependendo do material da peça e condições
operacionais e o sobrecorte lateral varia de 0,05 a 0,25 mm.

Exemplos de aplicações do processo:


• furos para refrigeração de pás de turbinas
• passagens de óleo
• bicos de combustível
• furos com profundidade superior a100 mm
• produção de furos sem zona termicamente afetada.

Principais vantagens da furação eletrolítica:


• a operação não depende da dureza da peça

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• é possível produzir furos com L/Ø de até 300


• um grande número de furos pode ser feito simultaneamente
• furos não paralelos podem ser feitos simultaneamente
• sem alterações microestruturais na peça
• produção de furos curvos.

Por outro lado, o processo apresenta as seguintes desvantagens:


• aplicada somente a metais resistentes a corrosão
• ineficaz em materiais refratários
• maquinário complexo
• processo lento para a geração de um único furo
• necessidade de manuseio de ácido
• resíduo tóxico.

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4. PROCESSOS TÉRMICOS

Esta é a área que apresentou maior crescimento nos últimos anos, particularmente as
operações de usinagem a laser e por eletroerosão. Isto se deve, entre outros fatores, à
popularização do comando numérico e à ampla gama de componentes que podem ser
submetidos a estas operações, principalmente o corte a laser de chapas de metais
ferrosos e a usinagem de matrizes, moldes e estampos pela operação de eletroerosão
por penetração.

Neste grupo a energia é aplicada na forma de fótons, elétrons, centelhamento, etc. e os


processos geralmente não são afetados pelas propriedades físicas da peça. Por outro
lado, estas operações produzem zonas termicamente afetadas na peça, o que é um fator
limitante grave por comprometer o desempenho em serviço do componente.

4.1 Usinagem por eletroerosão

A erosão de eletrodos metálicos causada por descargas elétricas foi observada pela
primeira vez em 1768 por Sir Joseph Priestley, porém, somente em 1943 B.R. e N.I.
Lazarenko deduziram que a energia da descarga elétrica poderia ser controlada e
utilizada na usinagem dos materiais recentemente desenvolvidos e que se mostravam
difíceis de se usinar pelos métodos tradicionais (McGeough, 1988). Além disso, estes
pesquisadores demonstraram que quando a operação é realizada submersa em um fluido
dielétrico a energia se concentre em uma área menor, o que é desejável.

Na eletroerosão por penetroção a remoção se dá por centelhamento e a ferramenta é


usada para produzir uma cavidade na peça. As duas partes são imersas em um fluido
dielétrico e separadas por uma distância que varia de 0,01 a 0,5 mm. A aplicação de
pulsos de tensão faz com que a resistência elétrica do dielétrico seja vencida em pontos
isolados. Quando elétrons e íons atingem anodo e catodo, respectivamente, sua energia
cinética é transformada em calor produzindo temperaturas em torno de 8000 a 12000oC e
um fluxo de calor de até 1017Wm-2 com duração de 0,1 a 2000 µs, o que causa a fusão e
evaporação de material nos eletrodos. A Figura 4.1 resume os eventos que ocorrem
durante o processo. A combinação de pulsos a alta frequência com o movimento
servocontrolado da ferramenta em relação à peça faz com que o centelhamento ocorra
ao longo dos eletrodos. Desta forma, um negativo da ferramenta é reproduzido na peça,
como mostra a Figura 4.2.

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Figura 4.1: Eventos presentes no centelhamento.

Figura 4.2: Exemplos de peças e ferramentas para eletroerosão por penetração.

De acordo com Dibitonto (1989), a energia total de uma descarga elétrica é dividida
em três parcelas distribuídas da seguinte forma: 18% consumida na fusão de material
do catodo, 8% para fundir o anodo e 74% gastos no aumento da massa e do diâmetro
do canal para converter o dielétrico líquido em plasma.

A polaridade é selecionada em função do tempo de descarga: para tempos de descarga


muito curtos, a peça deve ser o anodo (polo positivo), vide Figura 4.3 (Storr, 1999). Isso
ocorre devido à quantidade de elétrons em movimento ser maior que a de íons devido
velocidade mais alta daqueles, consequentemente um maior aporte térmico é liberado

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para o anodo até que a descarga seja interrompida. Por outro lado, para tempos de
descarga mais longos, a peça deve ser o catodo (polo negativo) uma vez que devido à
sua maior massa, os íons têm maior capacidade de conversão de energia cinética em
calor (Figura 4.3).

Figura 4.3: Influência da freqüência e polaridade empregadas na quantidade de


material removido em EDM.

A Figura 4.4 representa o diagrama de funcionamento do equipamento de eletroerosão


por penetração (ASM, 1995). A peça é presa à mesa e o movimento de avanço da
ferramenta é controlado por servomotores. O fluido dielétrico é bombeado entre
ferramenta e peça dentro do tanque onde a peça está imersa. Um computador controla
os pulsos de energia e a distância ferramenta-peça.

O equipamento para usinagem por eletroerosão opera com uma fonte de corrente
contínua pulsada com tensão entre 60 e 120 V e corrente de 1 a 100 A. A frequência de
descargas varia de 50 a 500 kHz, o que resulta em um tempo de descarga de
aproximadamente 200 µs e de descanso de 0,1 a 10 µs. Normalmente utilizam-se pulsos
de alta energia e baixa frequência para operações de desbaste (alta taxa de remoção e
acabamento de qualidade inferior) e pulsos de baixa energia e alta frequência para
operações de acabamento (qualidade superior às custas de baixa taxa de remoção).

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Figura 4.4: Diagrama esquemático do equipamento de eletroerosão por penetração.

De maneira geral, quando os eletrodos estão afastados a tensão é de aproximadamente


100 V e o circuito está aberto. Com a aproximação da ferramenta, o dielétrico é ionizado
até o ponto em que a corrente elétrica começa a circular (35 V) provocando o
centelhamento e, consequentemente, a fusão e vaporização do material. A operação é
então interrompida para remoção de resíduos e então reiniciada.

A Figura 4.5 mostra um diagrama simplificado do circuito elétrico RC (resistivo-capacitivo)


desenvolvido pelos Lazarenkos para controle da duração e frequência das descargas. No
início da operação o capacitor tem sua tensão aumentada continuamente. A descarga
entre os eletrodos acontece quando a tensão no capacitor for igual à tensão ferramenta-
peça. Após a descarga o fluido dielétrico é deionizado, o capacitor é recarregado e o ciclo
recomeça. Os ciclos de tensão e corrente são representados na Figura 4.6. Apesar de
liberarem mais energia, valores mais altos de tensão exigem tempos mais longos para
recarga do capacitor. Além disso, a duração do pico de corrente é curta.

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Figura 4.5: Diagrama elétrico RC para eletroerosão (McGeough, 1988).

(a) Variação de tensão elétrica

(b) Variação de corrente elétrica

Figura 4.6: Variação de: (a) tensão e (b) corrente no circuito resistivo-capacitivo.

Embora outros circuitos para controle da descarga tenham evoluído com o passar dos
anos, o circuito RC apresenta como vantagens baixo custo, simplicidade, robustez e faixa

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de atuação relativamente ampla. Em contrapartida, o circuito RC provoca alta taxa de


desgase da ferramenta e baixa taxa de remoçãode material (Pandey e Shan, 1980).

Para superar as limitações do circuito RC, foi desenvolvido o gerador de pulso controlado.
A Figura 4.7 mostra o comportamento da tensão e corrente elétricas durante os perídos
de descarga e de pausa deste tipo de gerador. Neste caso, o valor da corrente de pico é
reduzido e o tempo de descarga é prolongado, promovendo a redução do desgaste da
ferramenta e o aumento da eficiência do processo (McGeough, 1988). Observa-se ainda
um atraso no início da remoção de material associado à queda de tensão elétrica. Alguns
equipamentos, entretanto, incorporam amobs os circuitos (RC e de pulso controlado).

Figura 4.7: Variação de tensão e corrente gerador de pulso controlado


(McGeough, 1988).

Cabe ao sistema de avanço garantir o movimento da ferramenta de forma que a distância


eletrodo-peça e, consequentemente, a tensão de descarga, permaneçam inalteradas. Se
o espaço entre eletrodo e peça for ocupado por algum material condutor, o sistema de
avanço deve inverter a direção de avanço até que o material seja removido da região pelo
fluido dielétrico. Depois disso a operação é reiniciada. Assim, a eficiência do dielétrico em
eliminar resíduos da região tem influência direta sobre o desempenho do sistema de
avanço. O sistema de avanço também pode ser utilizado para compensar o desgaste da
ferramenta em máquinas mais sofisticadas.

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As Figuras 4.8 a 4.10 (Storr, 1999) mostram de forma detalhada todas as etapas do
processo de remoção de material por centelhamento. Na Figura 4.8 pode ser visto que
inicialmente a d.d.p. (U) é elevada, gerando um campo elétrico entre os eletrodos.
Dependendo da intensidade deste campo e das características geométricas das
superfícies, partículas condutoras suspensas no dielétrico se concentram nas regiões
onde o campo elétrico é mais intenso, o que promove a formação de um canal. Ao
mesmo tempo, partículas carregadas negativamente são emitidas do polo negativo e
colidem com partículas sem carga elétrica que se encontram na região entre os eletrodos
e são divididas. Assim, novas partículas negativas e positivas são formadas a uma taxa
altíssima (fenômeno conhecido por ionização por impacto).

Figura 4.8: Abertura do canal.

Em seguida (Figura 4.9), as cargas positivas migram para o polo negativo e as cargas
negativas para o positivo, promovendo o fluxo de corrente elétrica (I). A corrente aumenta
até atingir valor máximo, provocando o aumento de temperatura e pressão no canal.
Consequentemente, bolhas de vapor se expandem.

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Figura 4.9: Expansão do canal.

Finalmente, a Figura 4.10 mostra que com a interrupção da corrente elétrica, a


temperatura cai e também a quantidade de partículas carregadas eletricamente. A queda
de pressão provoca o colapso do canal e o metal fundido evapora. As bolhas de vapor
entram em colapso e as partículas metálicas formam juntamente com o fluido dielétrico
deteriorado o resíduo do processo.

Figura 4.10: Colapso do canal.

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A Figura 4.11 (Klocke e Konig, 2007) resume as etapas do processo e o


comportamento da tensão elétrica e corrente correspondente a cada uma e a Figura
4.12 correlaciona a velocidade de penetração com o ponto de fusão do material da
peça. Conforme esperado, aquele diminui com a elevação deste (Klocke e Konig,
2007).

Figura 4.11: Etapas do processo de remoção por eletroerosão.

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Figura 4.12: Relação entre ponto de fusão do material da peça (T) e velocidade de
penetração (Vw).

De acordo com Eubank (1993), o principal mecanismo de remoção de material na


eletroerosão está associado ao fenômeno de superaquecimento do metal fundido nas
cavidades do eletrodo e da peça. Durante o tempo de aplicação da descarga, as
superfícies das cavidades fundidas estão superaquecidas, com temperaturas
próximas às de ebulição do material, correspondente ao estado de sobrepressão do
plasma. Entretanto, devido à alta pressão que o plasma exerce sobre as cavidades,
pouco material se evapora. Com a suspensão da descarga, uma pequena cratera é
formada nas superfícies da peça e do eletrodo devido à queda instantânea da
pressão, que extingue a bolha de gás e o canal de plasma, com forças associadas ao
superaquecimento para separar o material fundido das cavidades. Uma parte do
material fundido fica solidificada na cratera e a outra parte é removida pelo fluido
dielétrico.

A corrente elétrica de descarga é um parâmetro de extrema importância para a


qualidade e eficiência da operação. A corrente afeta a rugosidade da peça e o
desgaste do eletrodo e é influenciada pela velocidade de avanço, pelas características
térmicas do eletrodo e pelas condições na região entre eletrodo e peça (distância e
área). O aumento da corrente resulta em maior volume removido, entretanto, a
rugosidade da superfície da peça também aumenta, conforme ilustrado na Figura
4.13.

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Figura 4.13: Efeito da corrente no processo de eletroerosão.

A frequência de descarga é outro parâmetro operacional de grande relevância. Para


operações de desbaste, utilizam-se tempos de descarga mais longos para se obter
altas taxas de remoção, consequentemente, emprega-se baixa frequência de
descarga. Nas operações de acabamento, os tempos de descarga e de pausa são
reduzidos, logo se trabalha com alta frequência (Arantes, 2001). A Figura 4.14,
adaptada de Guitral (1997), ilustra a influência da frequência de descarga sobre o
acabamento da peça.

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(a) baixa frequência: operação de desbaste.

(b) frequência moderada: operação de semi-acabamento.

(c) alta frequência: operação de acabamento.

Figura 4.14: Influência da frequência de descarga sobre o acabamento.

A textura da superfície gerada por eletroerosão é bastante peculiar, formada por


pequenas crateras sem indicação da direção de avanço, como mostra a Figura 4.15. O
acabamento da peça é influenciado pela corrente e pela duração do pulso (Figura 4.16),
variando tipicamente entre Ra = 1,6 – 3,2 µm, porém, podendo chegar a Ra = 0,2 µm sob
condições especiais.

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Figura 4.15: Textura de superfície gerada por eletroerosão

Figura 4.16: Influência do tempo de descarga e corrente sobre rugosidade


(Storr, 1999).

Em geral, tolerâncias dimensionais de ± 25 µm são obtidas (± 5µm em casos especiais).


O desgaste da ferramenta pode afetar a qualidade dimensional da ferramenta e exigindo,
inevitavelmente, a realização de ciclos de desbaste e acabamento. A Figura 4.17 mostra
o desgaste do eletrodo e sua influência sobre o raio produzido na peça (Diniz et al., 2009).

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Desgaste da
ferramenta

Arredondamento da
peça

(a) Diagrama do eletrodo (b) Diagrama da peça

(c) Fotografia do eletrodo (d) Fotografia da peça

Figure 4.17: Desgaste do eletrodo e raio correspondente produzido na peça.

A Figura 4.18 ilustra a influência do tempo de descarga e da corrente sobre: (a) desgaste
relativo do eletrodo e (b) taxa de remoção de material (Storr, 1999). Observa-se que com
a elevação da corrente acentua-se tanto o desgaste da ferramenta quanto a taxa de
remoção de material. Já com o aumento do tempo de descarga tem-se a queda do
desgaste do eletrodo e o aumento da taxa de remoção (até um ponto de máximo, a partir
de onde se tem a queda desse valor).

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(a) Desgaste relativo (b) Taxa de remoção de material

Figura 4.18: Efeito do tempo de descarga e da corrente sobre: (a) desgaste relativo do
eletrodo e (b) taxa de remoção de material.

Uma forma de se minimizar o desgaste do eletrodo (chegando a uma razão entre o


volume de material removido e o volume desgastado do eletrodo acima de 100) baseia-se
no fato de que para uma determinada corrente, o desgaste do eletrodo independe do
tempo de duração da descarga. Com isso, baixíssimas razões de desgaste são obtidas
empregando polaridade positiva do eletrodo, baixa corrente e elevado tempo de descarga
(ASM, 1995), conforme pode ser visto na Figura 4.19. Embora tais condições
operacionais propiciem bom acabamento da superfície usinada, a taxa de remoção é
muito baixa (valores mais elevados são atingidos com polaridade negativa do eletrodo).

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Figura 4.19: Minimização da razão de desgaste por meio de polaridade positiva do


eletrodo, baixa corrente (12 A) e tempos de descarga longos (2, 3, 4, …, 400 µs).

As Figuras 4.20 e 4.21 ilustram a influência dos principais parâmetros operacionais


(corrente, polaridade, tempo de descarga e tempo de pausa) sobre a rugosidade (Rz -
µm) e a taxa de remoção de material (TRM – mm3/s) durante a operação de eletroerosão
por penetração do aço ferramenta ABNT H13 com eletrodo de grafita.

Figura 4.20: Gráfico de efeitos principais sobre rugosidade (Rz).

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Constata-se pela Figura 4.20 que valores mais baixos de rugosidade são obtidos
empregando-se valores mais baixos de corrente e de tempo de descarga associados à
polaridade positiva da ferramenta e tempo de pausa mais elevado. Observa-se ainda uma
maior influência dos parâmetros corrente e polaridade. Já a Figura 4.21 mostra que
valores mais elevados de taxa de remoção de material são obtidos com a elevação da
corrente e do tempo de pausa, associados à polaridade positiva da ferramenta e tempo
de descarga baixo.

Figura 4.21: Gráfico de efeitos principais sobre taxa de remoção de material (TRM).

O fluido dielétrico é essencial para o êxito do processo e suas principais funções são
(Storr, 1999):
• Isolamento: o fluido dielétrico deve isolar eletricamente a peça da ferramenta
mesmo a uma distância mínima.
• Ionização: as condições ideais para geração do campo elétrico devem ser
propiciadas o mais rapidamente possível pelo dielétrico. Após a descarga, o canal
deve ser deionizado imediatamente antes que o processo se reinicie. O dielétrico
também deve restringir a largura do canal ao mínimo, de modo a aumentar a
densidade de corrente e a eficiência do processo.
• Refrigeração da peça e da ferramenta durante o processo.
• Remoção de resíduos (baixa viscosidade).

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Inicialmente o ar foi usado como fluido dielétrico, entretanto, logo se descobriu que fluidos
derivados de petróleo apresentavam inúmeras vantagens, tais como permitir menor
distância eletrodo-peça, maior freqüência de descarga e facilidade de remoção dos
resíduos. Durante muito tempo o querosene foi o dielétrico mais usado, entretanto, devido
à sua inflamabilidade ele tem sido substituído por fluidos sintéticos e água deionizada.
Atualmente fluidos de base vegetal tem recebido maior atenção devido a sua
biodegradabilidade.

A Figura 4.22 mostra a influência da vazão do fluido dielétrico (Q) sobre os seguintes
parâmetros operacionais: taxa de remoção de material (Vw), razão de desgaste (ϑ) e
corrente elétrica (Klocke e Konig, 2007).

Figura 4.22: Influência da vazão de dielétrico sobre alguns parâmetros operacionais.

As ferramentas para eletroerosão devem ser produzidas a partir de materiais com alto
ponto de fusão e que possuam boa usinabilidade e baixo custo. A grafita de alta
densidade é o material mais usado devido ao seu alto ponto de fusão (3000 ºC), seguida
do cobre (além de ser estável, permite elevada taxa de remoção e apresenta desgaste
similar à grafita), latão (também é estável, porém apresenta taxa de desgaste acentuada),
ligas Cu-W (possuem alta taxa de remoção e baixa taxa de desgaste, porém apresentam

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alto custo e dificuldade de fabricação da ferramenta), ligas Ag-W (desgaste muito baixo) e
Cu-grafita. Os aços não apresentam bons resultados e por isso são raramente
empregados. As Tabelas 4.1 e 4.2 apresentam, respectivamente, os principais materiais
metálicos e a base de grafita usados na fabricação de eletrodos para eletroerosão, bem
como suas principais vantagens, desvantagens e aplicações.

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Tabela 4.1: Eletrodos metálicos para eletroerosão.

Grupo: Vantagens: Desvantagens: Aplicações:


• Fácil obtenção; • Elevado desgaste; • Furos profundos e de pequeno
Metais comuns: • Qualidade uniforme; • Baixa taxa de remoção; diâmetro;
Cobre, zinco e latão. • Baixo custo. • Baixo ponto de fusão (<1100ºC); • Eletroerosão a fio;
• Dificuldade em produzir detalhes. • Trabalhos que exigem
ferramentas dúcteis.
• Melhor entre metálicos; • Difícil usinabilidade; • Cavidades profundas e exatas;
• Elevadas resistência, dureza • Altíssimo custo; • Eletrodos complexos e
Tungstênio e suas ligas. e densidade; • Baixa taxa de remoção; diminutos;
• Ponto de fusão de 3400ºC. • Dimensões limitadas • Matrizes e fieiras de WC;
• Microfuros com Ø<0,2 mm.
Metais exóticos: • Vantajosos em situações • Baixa taxa de remoção; • Aplicações raras e especiais
Tântalo, níquel, prata e específicas. • Elevado custo; com requisitos específicos.
molibdênio. • Difícil usinabilidade;
• Dimensões limitadas.
Tabela 4.2: Eletrodos de grafita para eletroerosão.
Grupo: Vantagens: Desvantagens: Aplicações:
• Elevada resistência mecânica; • Custo elevado. • Moldes e matrizes intricados;
Grafita angstron fina (< • Estrutura uniforme e isotrópica; • Gravação fina e detalhada;
1µm) e ultrafina (1 – 5 µm) • Excelente taxa de remoção; • Eletrodos frágeis e
• Excelente usinabilidade; delicados;
• Excelente resistência ao desgaste. • Acabamento superior.
• Resistência mecânica média; • Mais porosa que ultrafina; • Matrizes de forjamento e de
Grafita superfina (6 – 10 µm) • Boa usinabilidade; fundição;
• Dimensões maiores que ultrafina. • Detalhes menos críticos;
• Bom acabamento.
• Dimensões maiores; • Estrutura menos uniforme; • Eletrodos grandes;
Grafita fina (11 -20 µm) • Baixo custo. • Baixa resistência mecânica; • Eletrodos de desbaste.
• Inadequada para eletrodos frágeis.
• Menor custo entre grafitas; • Estrutura não uniforme; • Trabalhos com poucos
Grafita média (21 – 100 µm) • Anisotrópica; detalhes;
• Desempenho não uniforme. • Trabalhos sob alta corrente.
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A presença de danos térmicos (camada fundida e zona termicamente afetada – ZTA com
significativas alterações microestruturais) é praticamente inevitável devido às elevadas
temperaturas e taxas de resfriamento. Em casos críticos as alterações subsuperficiais
atingem 400 µm, conforme representado esquematicamente na Figura 4.23.

Figura 4.23: Extensão dos danos térmicos na eletroerosão: zona A – camada fundida;
zona B: zona termicamente afetada e zona C: zona de transição (McGeough, 1988).

No caso da eletroerosão de aços, a formação de martensita revenida e não revenida


ocorre com frequência, como ilustra a Figura 4.24, o que induz tensões residuais de
tração e torna a peça susceptível a trincas, prejudicando sua resistência a fadiga do
componente (Storr, 1999).

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Figura 4.24: Danos térmicos causados pela eletroerosão.

Em consequência do aporte térmico intenso, tensões residuais de tração são induzidas


nas camadas mais superficiais da peça (Figura 4.25), o que resulta em prejuízo para a
resistência à fadiga de componentes produzidos por eletroerosão, vide Figuras 4.26.

Figura 4.25: Tensões residuais induzidas pela operação de eletroerosão.

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Figura 4.26: Resistência à fadiga de corpos de prova produzidos por: (1) usinagem
química, (2) retificação e (3-5) eletroerosão.

Um recurso que vem sendo utilizado para garantir um melhor acabamento e reduzir a
espessura da camada fundida em peças usinadas por eletroerosão é a adição de pós
metálicos (Al, Si, Ni, Cr) ao fluido dielétrico. A Figura 4.27 mostra a influência da adição de
pó de alumínio ao querosene sobre a rugosidade da superfície usinada (Wu et al., 2005).
De acordo com os autores, o pó de alumínio aumenta a distância eletrodo-peça, o que
reduz a distribuição de energia sobre a peça. Com isso, a espessura da camada fundida
é reduzida e a rugosidade apresenta uma queda de até 60%.

Figura 4.27: Influência do fluido dielétrico sobre a rugosidade.

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A usinagem por eletroerosão tem aplicação limitada a materiais condutores elétricos,


independentemente de sua dureza ou tenacidade. Merecem destaque as seguintes
aplicações:
• Fabricação de matrizes e moldes.
• Fabricação de fieiras para extrusão e trefilação.
• Texturização de superfícies.
• Fabricação de protótipos.
• Peças com geometrias complexas.
• Peças miniaturizadas.
• Furos com L/Ø < 20 ou com Ø>0,05 mm.
• Rasgos com 0,05 – 0,3 mm de largura.

A Figura 4.28 mostra exemplos de geometrias de peças passíveis de serem produzidas


pela operação de eletroerosão por penetração de acordo com a geometria da ferramenta
e número de eixos acionados.

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Figura 4.28: Possíveis geometrias geradas por eletroerosão por penetração.

Além da operação por penetração esquematizada na Figura 4.4, existem outras três
possíveis configurações para o equipamento, a saber:
• eletroerosão a fio;
• retificação por eletroerosão;
• texturização.

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4.1.1 Eletroerosão a fio

Este operação evoluiu de forma significativa na década de 1970 devido ao


desenvolvimento de geradores mais potentes, novos materiais para eletrodo (fio),
sistemas de controle inteligentes e aplicação mais eficiente do eletrólito. Neste caso um
fio de cobre, bronze ou latão (com diâmetro entre 0,05 e 0,25mm) assume a função de
ferramenta, desenrolando continuamente a uma velocidade máxima de 3 m/min (Figura
4.29). Tais máquinas são normalmente equipadas com comando numérico
computadorizado e possuem, no mínimo, três eixos acionados de forma independente.
Água deionizada deve ser usada como fluido dielétrico obrigatório a fim de inibir a ignição
do dielétrico. Eventualmente o fio pode se partir, interrompendo a operação, entretanto,
equipamentos mais sofisticados dispõem de dispositivos para que o fio seja reposicionado
e a operação reiniciada automaticamente.

Figura 4.29: Diagrama da eletroerosão a fio (McGeough, 1988).

Taxas de remoção típicas da eletroerosão a fio são 300 mm²/min para o aço
ferramenta ABNT D2 com 50 mm de espessura e 750 mm²/min para alumínio com
150 mm de espessura. A qualidade do acabamento superficial varia de Ra= 0,04 -
0,25 µm. A Figura 4.30 mostra os principais componentes da máquina e a Figura 4.31
apresenta um exemplo de peça produzida por este processo.

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Figura 4.30: Configuração do equipamento para eletroerosão a fio.

Figura 4.31: Exemplo de peça usinada por eletroerosão a fio.

4.1.2 Retificação por eletroerosão

Difere da eletroerosão por penetração pelo fato da ferramenta ser um rebolo de grafita
(raramente de latão) girando entre 30 e 180 m/min, vide Figura 4.32. É bastante usada na
afiação de ferramentas de metal duro.

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(a) (b)
Figura 4.32: Retificação por eletroerosão (ASM, 1995): (a) esquema do equipamento e
(b) esquema de dressagem do rebolo.

Um aspecto negativo associado à retificação por eletroerosão diz respeito aos danos
térmicos causados à peça. A Figura 4.33 ilustra este aspecto para as operações de
desbaste e acabamento de quatro materiais diferentes (ASM, 1995).

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Figura 4.33: Variação de dureza abaixo da superfície induzida pela retificação por
eletroerosão: (a) aço AISI 4340 (50 HRC), (b) aço AISI D6 (50 HRC), (c) aço maraging
(50 HRC) e (d) liga Ti8Al1Mo1V.

4.1.3 Texturização

É uma operação empregada especificamente em cilindros de laminação (vide Figura


4.34) de modo a produzir uma textura consistente e homogênea que será transferida para
a chapa a ser laminada, garantindo assim a lubrificação adequada durante a laminação
ou ainda a aderência da pintura na chapa laminada. O acabamento do cilindro é uniforme
e opaco, com Ra = 1 – 5 µm.

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Figura 4.34: Texturização de um cilindro laminador.

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4.2 Usinagem por feixe de elétrons

No final do século XVIII, Roentgen observou que quando a trajetória de um feixe de


elétrons era subitamente interrompida por um anteparo havia a emissão secundária de
raios X. Além disso, o feixe de elétrons era capaz de aquecer e fundir o anteparo
(Benedict, 1987). A primeira utilização do feixe de elétrons em usinagem foi em 1930,
quando foi usado para produzir furos de abertura em microscópios eletrônicos (Pandey e
Shan, 1980). Em 1950 o processo foi adaptado para a operação de fresamento de canais
e desde da década de 1960 é empregado para soldagem de componentes aeroespaciais
e da da indústria nuclear.

O feixe de elétrons se presta a inúmeras aplicações devido às suas características,


principalmente altas resolução e profundidade de campo associadas à elevada densidade
de potência. O processo pode ser classificado em dois tipos: térmico, empregado para o
aquecimento e vaporização de materiais, e atérmico, utilizado para catalisar reações
químicas.

No processo térmico, um feixe com diâmetro de 25 µm atinge a peça sob alta velocidade
causando a fusão e vaporização do material. O equipamento, representado
esquematicamente na Figura 4.35, consiste de uma fonte de energia, um canhão que
gera o feixe de elétrons e uma câmara de vácuo. Os elétrons livres são produzidos
aquecendo-se um filamento de tungstênio (catodo) a temperaturas entre 2500 e 3000oC
através da passagem de corrente elétrica. A alta tensão entre catodo e anodo faz com
que os elétrons sejam acelerados contra o último a uma velocidade de aproximadamente
60% da velocidade da luz. O anodo possui um furo que permite a passagem dos elétrons
que atingirão a peça. Filtros e lentes são usados para focalizar e direcionar o feixe. Todo
sistema opera a vácuo (1 Pa).

A Figura 4.36 ilustra as etapas envolvidas na remoção do material. Inicialmente, o feixe de


elétrons atinge a superfície do material, provocando o aquecimento e fusão superficiais
(Figura 4.36a). Em seguida, a alta densidade de potência do feixe produz um canal de
vapor envolto por material fundido (Figura 4.36b). Na etapa seguinte, vide Figura 4.36c, o
feixe atravessa todo o material a ser usinado e atinge o suporte. Finalmente, a Figura
4.36d mostra que o material a ser removido é expelido devido à alta pressão do suporte
evaporado.

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Figura 4.35: Diagrama da usinagem por feixe de elétrons (McGeough, 1988).

Figura 4.36: Etapas de remoção pelo feixe de elétrons: (a) aquecimento e fusão
superficiais, (b) canal de vapor, (c) vaporização do suporte e (d) expulsão de material
fundido.

A taxa na qual o material é vaporizado é diretamente proporcional à potência do


equipamento e inversamente proporcional à energia especifica de vaporização. Por sua
vez, a energia específica de vaporização depende dos pontos de fusão e de vaporização,
do calor específico, do calor de fusão e do calor de vaporização do material. A eficiência
de usinagem é baixa (de 2 a 20%) e depende da área da seção transversal a ser

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removida. A Tabela 4.3 apresenta os pontos de fusão e de ebulição e a energia especifica


de vaporização de alguns metais (Pandey e Shan, 1980).

Tabela 4.3: Energia específica de vaporização de alguns metais.

Ponto de Ponto de Energia específica de


Material
fusão ( C)
o
ebulição ( C)
o
vaporização (x104 W/cm3)
Ferro 1536 3000 6,3
Molibdênio 2610 5560 7,5
Tungstênio 3410 5930 10
Titânio 1668 3260 5

O equipamento opera com uma fonte de alta tensão (120 - 150 kV) e baixa corrente (25 -
100 mA), o que resulta em uma densidade de potência de aproximadamente
1,55 MW/mm2 (potência inferior a 12 kW por pulso) e uma densidade de corrente que
varia de 5 – 10 A/cm2. A duração do pulso varia de 0,05 a 100 ms e a velocidade de
avanço da mesa onde a peça é fixada é de aproximadamente 100 mm/s. Um sistema
computadorizado integrado é necessário para garantir o posicionamento exato da peça e
controle dos parâmetros de corte. O ponto focal deve ser definido cuidadosamente, já que
sua posição determina o número de pulsos necessário para furar uma determinada
espessura (Figura 4.37). Além disso, a Figura 4.38 mostra que existe um valor ótimo de
tensão associado a um número mínimo de pulsos necessário para a produção de um furo
com determinada profundidade.

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Figura 4.37: Influência do ponto focal sobre o número de pulsos necessário para furar
uma chapa de 2 mm de espessura (Kaczmarek, apud McGeough, 1988)

Figura 4.38: Influência da tensão de aceleração sobre o número de pulsos (Kaczmarek,


apud McGeough, 1988).

As Figuras 4.39 a 4.41 mostram o efeito de alguns parâmetros sobre as características


dos furos produzidos. Observa-se na Figura 4.39 que a produção de furos mais profundos
requer a elevação da tensão e/ou do número de pulsos. Entretanto, o número de pulsos
necessários aumenta hiperbolicamente com a profundidade do furo. Além disso, à

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medida que o número de pulsos aumenta, um valor de corrente mais baixo pode ser
utilizado para o mesmo tempo de duração do pulso (Figura 4.40). Já a Figura 4.41 mostra
que a taxa de furos produzidos em aço e liga de níquel cai linearmente com o aumento do
diâmetro dos furos e da espessura da peça.

Figura 4.39: Influência da tensão sobre o número de pulsos necessário (Kaczmarek, apud
McGeough, 1988).

Figura 4.40: Relação entre o número de pulsos e o tempo de duração do pulso


(Kaczmarek, apud McGeough, 1988).

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Figura 4.41: Influência da espessura do material e do diâmetro do furo sobre a taxa de


furação (Bellows e Kohls apud McGeough, 1988).

A Figura 4.42 mostra o dano causado à parede de um furo produzido em um aço Cr-Mo e
a Figura 4.43 representa o efeito do tempo de duração do pulso sobre o diâmetro do furo
e zona afetada pelo calor (Kraczmarek, apud McGeough, 1988). Via de regra, a distância
entre centros de dois furos adjacentes deve ser, no mínimo, o dobro do diâmetro dos
furos (Figura 4.44), o que não impede que até 1000 furos sejam produzidos por
centímetro quadrado.

Figura 4.42: Dano causado pela furação por feixe de elétrons (Kaczmarek, apud
McGeough, 1988).

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Figura 4.43: Influência do tempo de duração do pulso sobre o diâmetro do furo


(Kaczmarek, apud McGeough, 1988).

Figura 4.44: Seção transversal de furos produzidos por feixe de elétrons (ASM, 1995).

A rugosidade da parede produzida pelo feixe de elétrons é bastante afetada pelo material
a ser usinado (principalmente por suas propriedades térmicas), e da energia do pulso,
como mostra a Figura 4.45. Tolerâncias dimensionais tipicamente obtidas encontram-se
na faixa de ± 5% do diâmetro do furo.

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Figura 4.45: Influência da energia do pulso sobre a rugosidade da parede (Kaczmarek,


apud McGeough, 1988).

A Figura 4.46 ilustra a utilização do feixe de elétrons para o polimento de aço endurecido
previamente usinado por eletroerosão. A rugosidade inicial de Rz=6 µm diminui com a
elevação da densidade de energia do feixe de elétrons para atingir um mínimo de
Rz=0,7 µm correspondente a 6-7 J/cm2 (Klocke e Konig, 2007).

Figura 4.46: Influência da densidade de energia do feixe de elétrons sobre a rugosidade


de uma superfície de aço usinada por eletroerosão.

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Vantagens da usinagem por feixe de elétrons:


• produção de até 4000 furos/s
• sem limitação de propriedades da peça
• sem forças de corte (distorções)
• flexibilidade de parâmetros
• alta exatidão e repetibilidade
• baixo custo relativo para pequenos furos.

Desvantagens da usinagem por feixe de elétrons:


• custo de equipamento elevado
• tempo improdutivo associado à evacuação da câmara (cerca de 3 minutos por metro
cúbico)
• presença de camada fundida
• necessidade de um suporte para a peça
• Industrialmente ainda inviável para materiais não metálicos ou corte não retilíneo.

Principais aplicações:
• usinagem de materiais sem restrição de propriedades (dureza, condutividade térmica ou
elétrica, etc.)
• furação de precisão (Ø0,1 - 1 mm) em materiais metálicos, especialmente para um
elevado número de furos com pequeno diâmetro e profundidade inferior a 10 mm.
Exemplos: câmara de combustão de motor a jato em aço Cr-Ni-Co-Mo-W (Figura 4.47):
3800 furos de Ø0,9 x 1,1 mm por hora; cabeçote para a produção de fibras de vidro em
liga de cobalto: 11766 furos de Ø0,8 x 4,3-6,3 mm em 40 minutos (5 furos/s)
• fabricação de filtros para a indústria de alimentos
• vestuário: produção de furos para ventilação em materiais plásticos (5000 furos/s)
• fabricação de circuitos integrados.

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Figura 4.47: Furos em câmara de combustão de motor a jato produzidos por feixe de
elétrons (Klocke e Konig, 2007).

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4.3 Usinagem por feixe de íons

É um processo similar ao feixe de elétrons, no qual a usinagem ocorre em uma câmara


de vácuo onde íons de argônio são arremessados contra a peça. Entretanto, o
mecanismo de remoção de material é bastante distinto do processo anterior. O
equipamento consiste de uma fonte de plasma (que gera os íons), de uma malha
responsável por extrair os íons do plasma e arremessá-los contra a peça e de uma mesa
onde a peça é posicionada.

Os elétrons são acelerados do catodo (filamento de tungstênio aquecido) para o anodo


por meio de alta tensão (aproximadamente 1000 V) seguindo uma trajetória espiral, a
qual aumenta o percurso e, por conseguinte, a ionização. Os elétrons interagem com
átomos de argônio, liberando íons (Ar+). Os íons são retirados do plasma por uma malha
composta de duas ou três lâminas de carbono ou molibdênio perfuradas e então atingem
a peça. O ângulo de incidência pode variar de 0 a 90º (McGeough, 1988). Ao atingir a
peça, se o íon possui massa menor do que a do átomo atingido, aquele irá quicar e se
afastar da peça. Caso contrário, ambos se moverão para dentro da peça (Figura 4.48).
Embora a primeira colisão não resulte na efetiva remoção de material, outras colisões
oriundas dessa primeira causarão a ejeção de átomos da superfície da peça dependendo
do ângulo de impacto secundário. Para que haja remoção de átomos, a energia aplicada
deve ser maior que a energia de ligação dos átomos (5-10 eV).

Figura 4.48: Colisões possíveis entre íons e átomos.

A intensidade de energia também afeta a remoção atômica, uma vez que o momento
transferido de íons para átomos aumenta com a intensidade de energia (Figura 4.49). A

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taxa de remoção é de cerca de 0,1 - 1 átomo por íon incidente (ou 1 - 18 µm/hora) e
profundidades de corte de 100 nm e rugosidades em torno de Ra=1,5 nm são possíveis
de se obter. A Tabela 4.4 apresenta a taxa de remoção obtida para alguns materiais e as
Figuras 4.50 e 4.51 mostram alguns exemplos de aplicação.

(a) baixa energia (b) alta energia

Figura 4.49: Influência da intensidade de energia sobre a remoção atômica.

Tabela 4.4: Taxas de remoção típicas para o fresamento por feixe de íons
(Spencer e Schmidt, apud McGeough, 1988)

Material Taxa de remoção (µm/h)


Quartzo 2
Cerâmica 1
Vidro 1
Ouro 2
Permalloy 1
Diamante 1
GaAs 10
GaP 125

Aplicações típicas do feixe de íons:


• acabamento de espelhos para aparelhos laser
• texturização de superfícies
• limpeza em nível atômico
• polimento
• fresamento de canais com largura de 5 a 200 µm e profundidade de até 1mm

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• fabricação de microcomponentes.

(g)

Figura 4.50: Exemplos de aplicação da usinagem por feixe de íons: (a) usinagem de lente
anesférica, (b) afiação de penetrador de diamante, (c) afiação de micrótomo de diamante,
(d) máscara holográfica, (e) memória magnética, (f) fresamento (10 div = 25 µm) e
(g) fresamento de alumínio 6061.

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Figura 4.51: Exemplos de aplicação da usinagem por feixe de íons: fabricação de micro-
ferramentas (Picard et al., 2003).

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4.5 Usinagem por arco plasma

Quando aquecido a altas temperaturas, um gás se transforma em plasma, caracterizado


pelas seguintes alterações (Pandey e Shan, 1980):
• O número de colisões entre átomos aumenta.
• O gás é ionizado, ou seja, elétrons são removidos das órbitas mais externas (íons e
elétrons são formados).
• Estes elétrons produzidos colidem com átomos aumentando a temperatura destes e,
consequentemente, sua energia cinética. Com o decaimento da energia, luz é emitida
pelos átomos causando a ionização de novos átomos (novos íons e elétrons são
produzidos).

O plasma também pode ser produzido expondo o gás à radiação ionizante, porém este
método é pouco utilizado. A temperatura no núcleo do plasma pode chegar a 33000o C, o
que a provoca a fusão e vaporização do metal, além da remoção dos resíduos. A
elevação de temperatura da peça ocorre devido à transferência de calor do plasma para a
peça principalmente por convecção (a contribuição da radiação é considerada mínima).

Este processo foi empregado pela primeira vez em 1955 para o corte de alumínio e aço
inoxidável (Benedict, 1987), além de outros metais não ferrosos inviáveis para o oxicorte
devido às reações químicas resultantes. Uma fonte de corrente contínua (de até 1000 A e
200 V) é empregada para aquecer um catodo de tungstênio. O plasma é produzido
quando o gás sob pressão de 1,4 MPa flui entre este catodo de tungstênio e um anodo de
cobre refrigerado, o qual é vazado para permitir a passagem do plasma (Figura 4.52).
Sob condições ideais, cerca de 45% energia elétrica é disponibilizada para remoção de
material e chapas com espessura de até 150 mm podem ser cortadas.

Figura 4.52: Diagrama esquemático do corte a plasma.

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O arco pode ser transferido ou não transferido (Figura 4.53). No primeiro caso, o arco é
formado entre o eletrodo na tocha e a peça e a temperatura pode atingir 33000º C, sendo
empregado no corte de materiais condutores elétricos. No segundo caso, empregado em
metais não condutores e cuja eficiência é inferior, o arco é formado dentro da tocha e a
temperatura pode chegar a 16000º C.

(a) Arco transferido (b) Arco não transferido

Figura 4.53: Tipos de arco plasma: (a) transferido e (b) não transferido.

A tocha utilizada em operações de corte tem as seguintes características (Pandey e


Shan, 1980):
• Catodo com diâmetro entre 10 e 20 mm e ponta cônica.
• Bocal com diâmetro de 3 a 5 mm e mesmo comprimento.
• Potência: de 10 a 200 kW.
• Vazão do gás: de 20 a 60 L/m.

As possíveis configurações do equipamento são:


• Sistema dual: um gás adicional é usado para proteger o gás de corte da influência
atmosférica. Em geral o gás de corte é nitrogênio ou argônio e o gás de proteção
hidrogênio (para aço inoxidável e metais não ferrosos), dióxido de carbono (metais em
geral) ou oxigênio (aços baixo carbono);
• Sistema por água injetada (Figura 4.54): neste caso o gás de proteção é substituído por
água, assim, a largura de corte é reduzida e a qualidade do corte é melhorada pela
ação refrigerante da água. Cerca de 10% da água se transforma em vapor e forma uma
fina camada de vapor que restringe o canal de plasma;
• Sistema por ar comprimido (Figura 4.55): o oxigênio presente no ar permite a elevação
da velocidade de avanço em aproximadamente 25% devido à reação exotérmica,
entretanto, uma superfície altamente oxidada é produzida. Além disso, o eletrodo de
tungstênio deve ser substituído por outro de háfnio ou zircônio devido à reatividade do

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tungstênio com oxigênio. Independentemente desta modificação, a vida do eletrodo é


curta (cerca de duas horas). Este método é empregado somente para materiais
condutores elétricos, em geral aços inoxidáveis e aços cromo-níquel, ligas de alumínio e
cobre. Por utilizar ar comprimido como gás de corte de aços ao carbono, o custo da
operação é aproximadamente a metade daquele obtido com as configurações
anteriores. Além disso, a velocidade de avanço pode chegar de três a cinco vezes a do
oxicorte, cuja temperatura máxima não ultrapassa 3000o C.

Figura 4.54: Arco plasma com água injetada.

Figura 4.55: Arco plasma com ar comprimido.

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O corte a plasma se apresenta como uma alternativa competitiva ao oxicorte de metais


que possuam alta condutividade térmica e/ou alta resistência à oxidação, tais como aços
inoxidáveis e ligas de alumínio. Além disso, taxas de remoção bem superiores ao corte
oxiacetilênico (velocidades de avanço de 2,5 contra 0,5 m/min) são possíveis no corte de
chapas de aço de 12 mm de espessura, mas a expensas de uma potência em torno de
220 kW. Comparativamente, o corte do aço inoxidável por arco plasma promove
precipitação mínima de carbonetos, menor oxidação (baixa contaminação na superfície
cortada) e nenhuma alteração na permeabilidade magnética (Pandey e Shan, 1980). A
Tabela 4.5 apresenta as condições para o corte a plasma para alguns metais (Pandey e
Shan, 1980) e a Figura 4.56 compara velocidades de avanço típicas para o corte por arco
plasma com e sem injeção de água e o oxicorte de chapas de aço baixo carbono
(McGeough, 1988).

Tabela 4.5: Condições de corte a plasma para ligas de alumínio, aços ao carbono e
inoxidáveis.
Velocidade Diâmetro
Espessura Potência
Material de avanço do orifício Gás
(mm) (kW)
(m/min) (mm)
Ligas de alumínio 7,5 3 60 Ar-H2 ou N2-H2
6 Aços ao carbono 5 3 55 N2-O2
Aços inoxidáveis 5 3 60 N2
Ligas de alumínio 2,25 4 80 Ar-H2 ou N2-H2
25 Aços ao carbono 1,25 4 85 N2-O2
Aços inoxidáveis 1,25 4 80 N2
Ligas de alumínio 0,5 4 80 Ar-H2 ou N2-H2
50 Aços ao carbono 0,63 4,5 110 N2-O2
Aços inoxidáveis 0,5 4 100 Ar-H2
Ligas de alumínio 0,3 4,5 90 Ar-H2 ou N2-H2
100
Aços inoxidáveis 0,18 4,5 100 Ar-H2

A integridade da peça usinada é caracterizada por tolerâncias abertas (1,6 mm) e


rugosidade na faixa de Ra = 5 - 7,5 µm. A superfície é lisa, porém com uma camada de
material fundido (0,15 mm) e uma zona afetada pelo calor que varia de 0,25 – 1,25 mm. A
possibilidade de ocorrência de trincas é elevada devido ao rápido resfriamento. A Figura
4.57 mostra os danos térmicos causados pelo corte a plasma em uma peça de aço
inoxidável austenítico AISI 304 (Gullu e Atici, 2006).

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Plasma com água injetada


Plasma
Corte oxi-acetilênico

Figura 4.56: Influência da espessura da chapa sobre a velocidade de avanço.

Figura 4.57: Seção transversal de uma peça em aço inoxidável submetida ao corte por
plasma.

A qualidade do corte é influenciada pela velocidade de avanço; se esta velocidade for


muito elevada, o aporte térmico na parte superior da chapa é muito mais intenso do que
na parte inferior, o que resulta em uma fenda em forma de “V” bastante inclinada. Por
outro lado, se a velocidade de avanço for muito baixa, a abertura da fenda na parte
inferior da chapa será maior do que na parte superior. O uso de potência excessiva ou
velocidade muito elevadas provoca o arredondamento da borda superior. Além disso, a

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largura da fenda aumenta com a espessura da chapa a ser cortada. A Figura 4.58 ilustra
a influência da velocidade de avanço da tocha sobre a taxa de remoção de material
durante o corte de um aço liga (Lucey e Wylie apud McGeough, 1988).

Figura 4.58: Influência da velocidade de avanço sobre a taxa de remoção de material.

De acordo com Benedict (1987), um método amplamente empregado visando melhorar a


qualidade do corte é submeter o gás de proteção ou a água (dependendo do caso) a uma
trajetória helicoidal. Assim, uma das arestas apresentará um corte quase perfeito (±3o),
enquanto a outra (refugo) apresentará corte inclinado de aproximadamente 15o (Figura
4.59). O canto reto é obtido do lado direito do arco plasma em relação ao movimento de
avanço da tocha, enquanto o lado esquerdo é inclinado devido à rotação do gás.

Figura 4.59: Influência do sentido de rotação do gás sobre a qualidade do corte a plasma.

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Diversas precauções devem ser tomadas com relação à segurança durante a operação,
principalmente a utilização de equipamentos de proteção individual contra ruído e
radiação infravermelha e ultravioleta (que causam danos à pele e à visão) e a instalação
de exaustores para eliminação dos gases tóxicos gerados.

Além do corte de chapas, o arco plasma é largamente utilizado na soldagem de materiais


como ligas de titânio e aços inoxidáveis, na deposição de camadas metálicas em
superfícies de componentes metálicos (recuperação de peças desgastadas ou aumento
das resistências ao desgaste e à corrosão) e na deposição por spray. Neste caso,
gotículas de material fundido (normalmente refratários, tais como ZrO2, TiC, TiN) são
depositadas formando o revestimento.

Exemplos de aplicações de corte por arco plasma:


• corte de chapas planas (aço inoxidável, ligas de alumínio e de cobre) com espessura de
6 a 25 mm (velocidade de avanço quatro vezes superior a do corte oxiacetilênico)
• produção de chanfros para subsequente soldagem (10-30x mais rápido do que o corte
convencional)
• auxílio ao torneamento de materiais de difícil usinagem
• corte submerso em água (redução de ruído e gases).

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4.5 Usinagem por feixe laser

Laser é o acrônimo para light amplification by stimulated emission of radiation. Este


fenômeno foi previsto em 1958 por Schawlow e Townes, que vislumbraram o uso de um
interferômetro Fabry-Perrot como uma cavidade ressonante (McGeough, 1988). A
usinagem a laser ocorre quando há interação entre um feixe intenso e coerente de luz
monocromática e a peça, causando a remoção do material por vaporização.

Sob condições normais, um átomo tende a permanecer no nível de energia mais baixo
possível. Ao ser exposto a radiação, entretanto, este átomo provavelmente irá absorver
um fóton e será excitado para um nível de energia mais elevado, entretanto, após alguns
nanossegundos, o átomo emitirá um fóton de energia e retornará ao nível mais baixo. Na
prática, o processo exige sistemas com três ou quatro níveis de energia.

Em 1917, Einstein demonstrou que este processo pode acontecer de forma espontânea
ou estimulada (Wilson e Hawkes, 1987). Duas considerações importantes devem ser
feitas com relação à emissão estimulada: primeiro, o fóton produzido tem a mesma
energia que o fóton estimulador, assim, as ondas luminosas associadas devem ter a
mesma frequência. Segundo, as ondas luminosas associadas a esses dois fótons
apresentam a mesma fase e estado de polarização. Isso significa que se um átomo é
estimulado a emitir energia luminosa, a onda que representa o fóton estimulado se
acrescenta à onda incidente em um processo construtivo, aumentando a amplitude. Ao
contrário da emissão espontânea (na qual os átomos emitem fótons de forma aleatória), a
emissão estimulada é coerente, ou seja, as ondas que formam o feixe estão em fase.

Para que o feixe luminoso seja amplificado por emissão estimulada, é necessário elevar a
densidade populacional de átomos no nível energético mais elevado (inversão
populacional), o que é obtido quando os átomos são excitados para atingir uma
distribuição de não equilíbrio por meio da aplicação de uma grande quantidade de energia
de uma fonte externa. Isso pode ser feito por radiação óptica, descarga elétrica,
passagem de corrente, bombardeamento de elétrons ou liberação de energia química
(Wilson e Hawkes, 1987).

Um sistema com três níveis de energia, antes e após excitação atômica é representado
nas Figuras 4.60a e 4.60b, respectivamente. A Figura 4.49a (condição de equilíbrio
térmico) mostra que a população de átomos diminui com o aumento do nível de energia.
Entretanto, observa-se na Figura 4.60b que a população de átomos no nível E 2 é maior

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que no nível E0 devido á absorção de radiação. Do nível E2 os átomos decaem para E1


(normalmente por um processo não radiativo) e a inversão populacional ocorre entre os
níveis E1 e E0 (N1 excede N0) quando a amplificação de radiação ocorre por emissão
estimulada.

(a) (b)

Figura 4.60: Populações em sistemas de três níveis: (a) antes da excitação


e (b) após a excitação.

O princípio de funcionamento do equipamento baseia-se em dois espelhos paralelos


entre os quais o feixe de luz sofre reflexões múltiplas mantendo a mesma fase. A
cavidade entre os dois é preenchida com um meio amplificador (gasoso ou sólido) que
garante o crescimento da onda luminosa. O espelho M2 é parcialmente transmissor,
permitindo a propagação da luz através de si quando a onda atinge o comprimento
adequado (Figura 4.61).

Figura 4.61: Princípio de funcionamento do laser.

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Além de coerente, o feixe de luz deve ser monocromático e colimado. Por ser
monocromático, o comprimento de onda ocupa uma faixa muito estreita do espectro.
Assim, lentes mais simples podem ser usadas para focar e concentrar o feixe em uma
área menor e com maior intensidade do que outros tipos de luz. A escolha da lente mais
adequada depende do material a ser cortado e sua espessura, além do diâmetro do feixe
e distância focal. O feixe também deve ser altamente colimado, com divergência menor
do que 0,002 rad. A Figura 4.62 mostra os principais elementos de um cabeçote de corte
a laser (Lima, 2006) e a Figura 4.63 ilustra a configuração do equipamento.

Figura 4.62: Elementos de um cabeçote para corte a laser.

Benedict (1987) compara duas fontes de luz (uma lâmpada incandescente e um laser)
com potência de 100 W posicionadas a uma distância de 1 m do objeto. A lâmpada
apresenta uma densidade de potência de 0,0008 W/cm2 e por emitir luz em todas as
direções, apenas uma pequena parcela é interceptada pelo objeto. Por sua vez, um laser
com diâmetro do feixe de 10 mm possui uma densidade de potência de 127 W/cm 2. Este
valor pode ser ainda aumentado com o uso de lentes para focar e concentrar o feixe.
Para o corte e furação, densidades de potência acima de 1,5 x 106 W/cm2 são
necessárias. A sublimação do material da peça ocorre quando uma densidade de
potência acima de 1,5 x 106 W/cm2 é aplicada.

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Figura 4.63: Configuração do equipamento para corte a laser.

O perfil espacial do feixe laser é chamado de modulação eletromagnética transversal


(TEM) e apresenta melhor desempenho em usinagem quando segue uma distribuição
gaussiana, conforme representado na Figura 4.64 (McGeough, 1988). Caso contrário, a
qualidade do corte é prejudicada.

Figura 4.64: Distribuição gaussiana de intensidade do feixe laser.

A eficiência do processo depende da frequência e focalização do feixe, além da


refletividade, coeficiente de absorção, condutividade térmica, calor específico e calor de
vaporização do material da peça. A parcela do feixe de luz que é refletida depende do
comprimento de onda da radiação e das condições da superfície da peça (rugosidade,

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oxidação e temperatura). Em geral, quanto maior o comprimento de onda, maior a


refletividade dos metais (Figura 4.65). Para comprimentos de onda acima de 5 µm, a
maioria dos metais reflete cerca de 90% da radiação incidente.

Figura 4.65: Influência do comprimento de onda sobre a refletividade de vários metais


(Wilson e Hawkes, 1987).

Quanto menor for a parcela refletida pela superfície, maior será a parcela de energia
absorvida, que ocorre devido a um efeito fotoelétrico. Como tempo entre duas colisões de
elétrons em um material condutor é muito curto (entre 10-14 s e 10-13 s), a energia do feixe
absorvida pelos elétrons é rapidamente transferida para o retículo, mesmo que duração
do pulso seja curta. Normalmente a energia é absorvida em uma camada com espessura
de 0,1 µm (McGeough, 1988).

Os equipamentos utilizados para usinagem as laser e dividem em dois grupos:


• laser no estado gasoso: He-Ne, Ar e CO2 (Figura 4.66)
• laser no estado sólido: rubi (Cr3+), YAG (Nd3+) e vidro (Nd3+), vide Figura 4.67.

Figura 4.66: Esquema do laser a gás (McGeough, 1988).

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Figura 4.67: Esquema do laser sólido: (a) lâmpada helicoidal e (b) lâmpada reta
(McGeough, 1988).

O laser gasoso CO2 apresenta maior potência (25 a 5000 W) que o sólido YAG (100-
500 W), porém este é capaz de usinar ângulos e espessuras impraticáveis para aquele. A
operação pode ainda ser assistida por um gás (ar, O 2 ou Ar) que irá auxiliar na remoção
do material fundido. Além disso, o gás protege a lente contra respingos e vapores
emanados durante o corte, elimina vapores cuja presença poderia absorver parcialmente
o feixe e permite, em alguns casos, a elevação da velocidade de avanço. O corte
assistido por ar ou oxigênio permite velocidades de avanço mais elevadas a expensas de
uma superfície oxidada e uma zona afetada termicamente mais profunda. Embora proteja
a superfície da oxidação, o corte assistido por argônio opera a velocidades de avanço
mais baixas. A Tabela 4.6 apresenta recomendações de gases auxiliares a serem
utilizados no corte com laser CO2 de alguns materiais metálicos (Lima, 2006).

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Tabela 4.6: Recomendação de gases para o corte com laser CO2.


Metal Gás Observações
Aço carbono O2 Bom acabamento, alta velocidade, camada superficial
N2 oxidada
Requer alta potência, limitado a espessuras inferiores a 3 mm
Aço inoxidável O2 Escória espessa nas arestas
N2 Boa qualidade de corte, requer alta pressão do gás
Alumínio AC Qualidade moderada
O2 Altas velocidades de corte, qualidade das arestas ruim
N2 Qualidade levemente superior ao ar comprimido
Titânio Ar Boa qualidade da aresta
Ar+H Melhor qualidade metalúrgica
e

A Figura 4.68 representa as etapas envolvidas na remoção de material pelo feixe laser:
inicialmente, a energia do feixe é absorvida pela peça e conduzida para seu interior. A
elevação da temperatura provoca a fusão do material, seguida de sua vaporização. Zonas
termicamente afetadas são inevitáveis chegando, em alguns casos, a 200 µm de
espessura, embora possam ser minimizadas aumentando a velocidade de avanço do
feixe (Figura 4.69) ou reduzindo a duração do pulso. De acordo com McGeough (1988), a
resistência à fadiga (Figura 4.70) e propriedades mecânicas também são reduzidas em
comparação à usinagem convencional.

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Figura 4.68: Etapas da remoção pelo feixe laser: (a) absorção e aquecimento,
(b) fusão e (c) evaporação

Figura 4.69: Influência da velocidade de avanço sobre a ZTA (liga de titânio).

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Figura 4.70: Curvas de fadiga para o Ti-Al-V para a usinagem convencional e a laser.

As Figuras 4.71 e 4.72 ilustram a influência de alguns parâmetros sobre a operação de


corte a laser de chapas de titânio. A zona termicamente afetada pelo processo pode ser
observada na Figura 4.71, ao passo que a Figura 4.72 mostra a influência da frequência
no modo pulsado e do tipo e pressão do gás auxiliar sobre a zona termicamente afetada
(Shanjin e Yang, 2006).

Figura 4.71: Zona termicamente afetada pelo corte a laser de titânio.

(a) (b)
Figura 4.72: Influência dos parâmetros sobre a espessura da zona termicamente afetada:
(a) frequência e (b) tipo de gás auxiliar e pressão.

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A furação a laser pode ser em cheio para diâmetros inferiores a 1,3 mm com espessura
de 25 mm ou por trepanação para diâmetros maiores. A furação em cheio empregando o
laser YAG com potência de 100 a 250 W e duração do pulso de 0.5 - 2 ms (frequência de
5 a 100 Hz) tem sua eficiência aumentada quando assistida por oxigênio. A razão L/Ø
pode chegar a 40, mas geralmente varia de 10 a 20, entretanto, a reflexão interna do
feixe nas paredes do furo causa o desvio do feixe. A Figura 4.73 apresenta diversas
técnicas empregadas na produção de furos com diâmetro inferior a 1 mm (Lima, 2006).

Contínuo Pulsado Trepanação


Interpolação
helicoidal

Figura 4.73: Técnicas de furação a laser.

Insertos de PcBN (alta dureza e baixa condutividade elétrica) podem ser cortados
empregando potência entre 250 e 5000 W (contínuo - CO2) ou menor no modo pulsado
(maior potência instantânea). Geometrias intrincadas exigem pulso de curta duração
(inferior a 0,75 ms), ao passo que peças mais espessas exigem pulsos de duração mais
longa (inferior a 2 ms).

A Figura 4.74 (Boehme e Herbrich, apud McGeough, 1988) mostra a influência da


espessura da peça sobre a velocidade de avanço para vários processos: corte a laser,
oxicorte e corte a plasma. Observa-se que o corte a laser permite velocidades de avanço
mais altas, porém a espessuras menores.

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Figura 4.74: Influência da espessura da peça sobre a velocidade de avanço para vários
processos: (i) aço inoxidável austenítico e (ii) aço médio carbono.

A Tabela 4.7 indica valores de velocidade de avanço e potência recomendados para o


corte de materiais com espessuras variadas (Wilson e Hawkes, 1987) e a Figura 4.75
apresenta a influência da velocidade de avanço sobre a potência específica (razão entre
potência e espessura de corte) para vários materiais (Lima, 2006).

Tabela 4.7: Velocidades de avanço e potências recomendadas para o corte a laser.


Velocidade de
Material Espessura (mm) Potência (kW)
avanço (m/min)
Alumínio 1,3 6 2
13 0,8 3
Aço inoxidável 410 0,3 2,3 0,2 (O2)
6,4 1,5 1,2
Aço ao carbono 3,2 0,5 0,2 (O2)
Liga de titânio 6,4 2,8 0,25 (O2)
Vidro 3,2 4,5 5
Compensado 6,4 5,4 0,85
Polietileno 0,5 9 0,38

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Figura 4.75: Influência da velocidade de avanço sobre a potência específica.

Com a elevação da espessura da chapa a ser cortada tem-se a redução da velocidade de


avanço do feixe laser, como mostra a Figura 4.76 (Klocke e Konig, 2007).

Figura 4.76: Influência da espessura da peça (aço alta liga) sobre a velocidade de avanço
para diversas potências de laser CO2.

O feixe laser pode operar nos modos contínuo ou pulsado. O primeiro permite o emprego
de velocidades de avanço mais elevadas devido à potência média mais elevada,
entretanto, a utilização do feixe pulsado reduz consideravelmente os danos térmicos.
Equipamentos laser com duração de pulso da ordem de picossegundos (10-12 s) e

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femtossegundos (10-15 s) têm recebido atenção pelo fato de não gerarem zonas
danificadas pelo calor, como representado na Figura 4.77 (Lima, 2006).

Figura 4.77: Danos térmicos causados por pulsos longos (esquerda) e curtos (direita).

A Tabela 4.8 indica o tempo necessário para que ocorra difusão térmica em três grupos
de materiais, isto é, caso a duração do pulso seja maior do que o valor indicado, os fótons
incidentes serão absorvidos pelos elétrons e convertidos em calor.

Tabela 4.8: Tempo necessário para difusão térmica (Meijer, 2004).


Material Duração do pulso
Metais 1 ps
Cerâmicas 10 ps
Plásticos 1 ns

A Figura 4.78 mostra o tempo de interação e a densidade de potência para diversas


aplicações. A linha verde tracejada representa o limite a partir do qual tem-se a fusão de
materiais metálicos.

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Figura 4.78: Tempo de interação e densidade de potência para diversas aplicações de


laser (Meijer, 2004).

Laser excimer: família de equipamentos pulsados que opera no espectro ultravioleta


devido a uma combinação de um gás nobre (Kr, Ar ou Xe) com um gás halógeno (F, H ou
Cl) sob alta pressão, a qual determina o comprimento de onda. A potência média varia de
10 W a 1 kW com duração de pulso de 10 – 20 ns, o que resulta em uma potència de
pico de dezenas de megawatts.

Tabela 4.9: Diferentes fontes para laser excimer (Meijer, 2004).


Fonte λ (nm) Energia do fóton (eV)
XeF 351 3.53
XeCl 358 4.03
KrF 248 5
KrCl 222 5.50
ArF 193 6.42
F2 157 7.43

Dois mecanismos de remoção de material são observados no laser excimer:


• ablação fotolítica: a energia do fóton é diretamente aplicada para superar a
energia de ligação química das macromoléculas. No caso de polímeros, estas se
quebram em monômeros gasosos.
• ablação pirolítica: primeiro a energia do fóton é absorvida pelos elétrons e então
convertida em calor que funde e evapora o metal (idêntico ao laser tradicional).

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Alguns exemplos de aplicação do corte a laser são mostrados na Figura 4.79 e a Figura
4.80 mostra um exemplo de corte a laser tridimensional.

(a) stent (b) cabeçote de impressora

(c) corte 3D de tubo (d) fieira de diamante

Figura 4.79: Exemplos de aplicação do corte a laser.

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Figura 4.80: Corte a laser tridimensional.

Outras aplicações industriais do feixe laser:


• soldagem
• tratamento superficial
• fratura controlada de componentes eletrônicos
• gravação e fratura controlada de materiais frágeis (cerâmicas)
• ajustagem de componentes eletrônicos
• balanceamento
• deposição de camadas de materiais resistentes ao desgaste ou oxidação.

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5. PROCESSOS QUÍMICOS

Os processos químicos são caracterizados pela remoção de material por dissolução


química (transformação do material da peça em sal metálico) e apresentam alto volume
de produção. Durante a ação química não há forças de usinagem atuando, o que permite
a utilização destes processos para a usinagem de peças delicadas ou extremamente
delgadas.

5.1 Usinagem química

De acordo com Benedict (1987), o registro mais antigo deste processo data de 2500 a.C.,
quando os egípcios utilizaram soluções a base de ácido cítrico para decorar joias de
cobre, porém somente na década de 1940 o processo começou a ser empregado
industrialmente, principalmente para a remoção do mesmo material em placas de circuito
impresso.

Esta operação se baseia no ataque químico controlado da peça por um reagente ácido ou
alcalino. A remoção pode ser parcial (redução de espessura) ou total. Antes da imersão
da peça no tanque com o agente responsável pelo ataque, um revestimento é usado para
proteger as partes que não devem ser removidas (Figuras 5.1 e 5.2).

Figura 5.1: Configuração do equipamento para usinagem química.

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Figura 5.2: Etapas da usinagem química: (a) aplicação da máscara (b) primeiro ataque,
(c) reaplicação da máscara e (d) segundo ataque (ASM, 1995).

Qualquer metal pode ser usinado quimicamente, sendo o alumínio trabalhado mais
facilmente e as superligas os mais difíceis. A operação é geralmente empregada em
peças nas quais a razão resistência sobre peso é elevada e eventualmente é assistida
por corrente elétrica. De acordo com Pandey e Shan (1980), os elementos-chave são o
agente corrosivo (solução ácida ou alcalina) e a máscara de proteção (feita de materiais
de fácil manuseio e resistentes ao ataque químico, como por exemplo, a base de vinil,
butil ou neopreno).

Sequência de operação:
a) limpeza
b) aplicação da máscara
c) traçagem
d) remoção da máscara nas partes a serem atacadas
e) ataque químico (depende do tempo e temperatura da solução)
f) repetição das etapas (d) e (e), se necessário
g) limpeza final
h) remoção da máscara
i) acabamento final (lixamento).

A limpeza pode ser feita com solventes comuns, produtos específicos ou mesmo jato
abrasivo, de acordo com a necessidade. A máscara é aplicada através da imersão da
peça em tanque ou aerosol, ou pela técnica de serigrafia. Além de resistir ao ataque, ela
deve possuir elevada aderência ao metal. O tempo de cura pode chegar a 12 horas a
temperatura ambiente, mas é reduzido quando feita em forno (acima de 50 oC). A

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espessura do filme varia de 0,2 – 0,4 mm, mas em casos especiais variar de 0,025 a
0,075 mm.

A traçagem pode ser feita por facas ou a laser e o ataque químico é realizado em
tanques, sendo normalmente é interrompido para determinação do tempo necessário
para se atingir as dimensões finais. A liberação de gases pode criar bolsões e prejudicar a
remoção uniforme de material, portanto, é necessária a constante mudança de posição
da peça. O reagente usado deve garantir bom acabamento da peça, remoção uniforme,
evitar ataque seletivo ou intergranular, ser seguro, apresentar baixo custo, ser reutilizável
ou facilmente neutralizado.

A usinagem química permite taxas de remoção em torno de aproximadamente


0,025 mm/min (a uma temperatura de trabalho de aproximadamente 50oC) e produz um
acabamento com Ra=0,75 – 3,74 µm e tolerâncias de ± 0,05 a ±0,08 mm em chapas de
alumínio. Os principais agentes químicos usados são: NaOH (ligas Al), HNO3 (aços),
HNO3, HCl e HF (ligas Ni, Co e Ti), vide Tabela 5.1.

Tabela 5.1: Reagentes recomendados para usinagem química (ASM, 1995).


Material Reagente Rugosidade Ra (µm)
Alumínio 2024-T3 NaOH+Na2S 2,5-4
Alumínio 2219-T37 HCl 1,5-2,5
Aços ao carbono HNO3 3,2-5
Aços baixa liga HNO3 1-2
Aços alta liga HNO3, HCl, HF 1,5-3,2
Aços inoxidáveis HNO3 0,75-1,5
Ligas de níquel HNO3, HCl, HF 1,5-2,3
Ligas de titânio (laminadas ou forjadas) HF, HNO3 0,25-1
Ligas de titânio (fundidas) HF, HNO3 0,75-1,5
Ligas de magnésio H2SO4 1-1,5

Ao nível microscópico, o ataque químico ocorre tanto na superfície de grãos individuais


quanto nos contornos de grãos, normalmente a diferentes taxas de reação química.
Assim, peças previamente fundidas ou extrudadas que apresentam grande variação no
tamanho de grão ou estrutura irregular oferecem grande dificuldade para obtenção de
bom acabamento. Além disso, ataque seletivo e intergranular são problemas inerentes à
corrosão química e devem ser tratados por meio do controle do reagente.

146
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A Figura 5.3 mostra a espessura removida (Figura 5.3a) e a rugosidade correspondente


(Figura 5.3b) obtidas na usinagem química de cobre eletrolítico com cloreto férrico (FeCl3
a 3,76 M) e cloreto cúprico (CuCl2 a 2,30 M), conforme Çakir et al. (2005). A maior taxa de
remoção propiciada pelo cloreto férrico (9,3 µm/min contra 3,4 µm/min) se deve ao fato de
o primeiro reagente se comportar como dois (FeCl3 e o subproduto CuCl2), como
mostram as Equações 5.1 e 5.2. Com relação à rugosidade da superfície atacada, valores
mais baixos de Ra foram obtidos usando cloreto cúprico como reagente.

(a) (b)
Figura 5.3: Influência do tempo de ataque sobre (a) espessura removida e (b) rugosidade
obtida na usinagem química de cobre eletrolítico.

FeCl3 + Cu → FeCl 2 + CuCl  Eq.(5.1)


FeCl3 + CuCl → FeCl 2 + CuCl 2  Eq.(5.2)

A influência da temperatura do reagente sobre a taxa de remoção e rugosidade da


superfície na usinagem química de alumínio com cloreto férrico (FeCl3) é mostrada na
Figura 5.4 (Çakir et al., 2005). Com o aumento da temperatura, o reagente se torna mais
ativo para a remoção de material. Consequentemente, o acabamento da peça é
prejudicado.

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(a) (b)
Figura 5.4: Influência da temperatura do reagente sobre (a) taxa de remoção e (b)
rugosidade Ra na usinagem química de alumínio.

Tendo em vista que a remoção de material ocorre em todas as direções, é necessário


superdimensionar a máscara a fim de se compensar a remoção indesejada. Assim, o
fator de ataque pode ser definido pela Equação (5.3):

Sobremetal
Fator de ataque = ...............Eq.(5.3)
Pr ofundidade de corte

O fator de ataque depende principalmente do material da peça e do reagente utilizado e


varia de 1,5 a 2 para aços e ligas de alumínio, estanho, zinco e de 2 a 3 para ligas de
cobre e de 1 a 3 para níquel (Pandey e Shan, 1980. A Figura 5.5 (ASM, 1995) ilustra o
superdimensionamento da máscara de forma a garantir que as peça atinja as dimensões
previstas em projeto.

Os principais defeitos induzidos em peças pela usinagem química são listados abaixo e
representados na Figura 5.6 (ASM, 1995):
• formação de canais e sulcos nas base de raios de canto
• canais e sulcos verticais resultantes de bolhas de gás que movem em direção à
superfície
• redução da espessura da parede a partir das bordas em direção ao centro de
cavidades
• depressões localizadas
• protuberâncias

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• “ilhas” resultantes da presença da máscara ou de outro material deixados na


superfície da peça
• arestas formadas na base da cavidade
• sulcos resultantes de força excessiva exercida pela marcação mecânica.

Figura 5.5: Superdimensionamento da máscara para usinagem química em duas etapas.

Figura 5.6: Defeitos típicos da usinagem química.

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As principais vantagens da usinagem química são:


• ausência de tensões residuais e rebarbas
• produção de formas complexas
• simplifica a conformação
• produção de superfícies extremamente finas
• não afeta a dureza ou tenacidade da peça
• o tamanho da peça só é limitado pelo tanque
• produz bom acabamento e tolerâncias razoáveis
• baixo custo de equipamento, ferramental e de manutenção.

Por outro lado, a usinagem química apresenta as seguintes limitações:


• o material é removido em todas as direções
• baixa eficiência em cortes muito profundos
• dificuldade em produzir raios pequenos
• bons resultados exigem uma estrutura homogênea
• textura depende do tamanho de grão
• polimento subsequente pode ser necessário
• ligas de titânio α e β necessitam de reagentes especiais
• manuseio de produtos químicos perigosos.

Aplicações típicas:
• fabricação de componentes estruturais aeroespaciais (fuselagem, dutos para ventilação,
tubos de plataformas para lançamento de mísseis, etc.)
• fabricação de circuitos impressos
• produção de paredes finas em peças usinadas, fundidas ou conformadas
• remoção de determinados filmes (camadas descarbonizada, refundida) que se formam
sobre a superfície de certos materiais
• remoção de defeitos superficiais (riscos, falhas)
• rebarbação (0,03 – 0,13 mm) de peças complexas
• gravação.

A Figura 5.7 mostra componentes estruturais aeronáuticos maciços (dutos de ventilação


de turbina e câmara de combustão de turbina) produzidos por usinagem química (ASM,
1995).

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a) dutos de ventilação de turbina b) câmara de combustão de turbina

Figura 5.7: Exemplos de peças produzidas por usinagem química.

Uma aplicação interessante da usinagem química consiste na produção de eixos cônicos


por meio da retirada da peça da solução a uma velocidade controlada (Figura 5.8). Outro
exemplo mostrado na Figura 5.9, mostra o emprego da usinagem química para a
fabricação de microagulhas de silício (reagente KOH) para aplicações médicas (injeção
de medicamentos sob a pelo ou coleta de fluidos), descrita por Wilke et al. (2005). Neste
caso, a taxa de remoção de material varia de acordo com a orientação dos planos
cristalográficos: ± 0,02 µm/min em {100} e 1,3 µm/min em {111}.

Figura 5.8: Produção de eixo cônico por usinagem química.

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(a) sequência de operações

(b) fotografias de microagulhas

Figura 5.9: Produção de microagulhas.

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5.2 Usinagem fotoquímica

Processo semelhante à usinagem química, entretanto a máscara é feita de material


fotossensível. É usado para a produção de peças complexas e com tolerâncias estreitas
(±0,05%) em chapas finas de metal (0,01 a 1,6 mm). O projeto da máscara pode ser feito
em escala que, em geral, varia de 2:1 a 20:1. Com isso, maior exatidão é obtida ao se
produzir a máscara em tamanho natural.

O processo pode ser dividido nas seguintes etapas, também ilustradas na Figura 5.10:
• preparação da peça (limpeza, lavagem e secagem)
• aplicação do material fotossensível
• preparação da matriz (negativo ou positivo fotográfico)
• usinagem (exposição à luz ultravioleta, revelação, ataque, limpeza e inspeção).

(a) (b)
Figura 5.10: Etapas da usinagem fotoquímica: (a) ferramenta negativa
e (b) ferramenta positiva (McGeough, 1988).

O material fotossensível pode ser aplicado na forma líquida (o que requer posterior
secagem) ou sólida (laminado sob alta pressão e temperatura). O ataque é feito com
soluções de cloreto cúprico ou férrico em quantidades cuidadosamente controladas de
ácido hidroclórico. Uma vez removida a superfície externa da peça, o ataque ocorre em
todas as direções, como mostra a Figura 5.11 (Allen, 2004). A Figura 5.12 ilustra a
influência do tempo de ataque sobre a remoção de material (McGeough, 1988).

153
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Figura 5.11: Seção transversal de peças produzidas por usinagem fotoquímica.

Figura 5.12: Remoção de material versus tempo de exposição.

A taxa de remoção varia de 0,01 a 0,05 mm/min. Alguns materiais, tais como cobre, latão
e aços ao carbono oferecem boa usinabilidade fotoquímica, ao passo que aços
inoxidáveis apresentam resultados razoáveis e ligas de tungstênio e titânio propiciam
baixa usinabilidade. Tântalo, ouro e titânio, além de cerâmicas, vidros e plásticos são
resistentes à corrosão e por esse motivo exigem reagentes extremamente corrosivos.

154
Processos Não Convencionais de Usinagem Prof. Alexandre Abrão

Um levantamento realizado por Greiner em 2000 (apud Allen, 2004) indicou que o aço
inoxidável é o material de peça mais empregado em usinagem fotoquímica, seguido das
ligas de cobre, de níquel, de alumínio, aços e, por fim, molibdênio.

Sadeghi-Makki et al. (2004) utilizaram a usinagem fotoquímica para a produção de


microengrenagens em polietileno. Foi utilizada uma máscara dupla de Ga/Cu para
proteção e o ataque, feito com dimetilformamida, foi assistido por iluminação ultravioleta
para que ocorresse apenas na direção de exposição à luz UV. A taxa de remoção, que
depende diretamente da intensidade de iluminação, atingiu um valor máximo de 40 µm/h.
A Figura 5.13 mostra exemplos de peças produzidas utilizando esta técnica.

Figura 5.13: Microengrenagens produzidas por usinagem fotoquímica


(Sadeghi-Makki et al., 2004).

Vantagens da usinagem fotoquímica:


• não afeta as propriedades físicas e magnéticas da peça
• baixo custo de ferramental
• tempo curto (horas) entre o fim do projeto e início da produção
• sem rebarbas
• permite alta flexibilidade no projeto.

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Desvantagens da usinagem fotoquímica:


• requer habilidade do operador
• cuidados com manuseio de produtos tóxicos e corrosivos
• instalação para fotografia
• espessura máxima a ser usinada de 1,6 mm
• não produz cantos vivos.

As principais aplicações deste processo são (Figura 5.14):


• alternativa à estampagem de precisão
• produção de peças pequenas, finas e complexas para eletrônica
• fabricação de circuitos integrados
• discos para encoders e peças para motores elétricos
• indústrias gráfica e decorativa.

(a) discos e encoders (b) célula de combustível

(c) base para circuito integrado (b) lente para cristalino

Figura 5.14: Exemplos de peças produzidas por usinagem fotoquímica.

156
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6. MANUFATURA ADITIVA

A manufatura aditiva, também conhecida como prototipagem rápida ou impressão 3D,


não é propriamente um processo não convencional de usinagem, mas compreende
um conjunto de tecnologias que permite a produção rápida de uma peça
tridimensional diretamente a partir de um arquivo CAD. Os primeiros equipamentos de
prototipagem rápida surgiram na década de 1980 e de acordo com Kruth et al.
(1998),o número de máquinas comercializadas saltou de 34 em 1988 para 1057 em
1997.

Por meio da prototipagem rápida é possível criar, em um curto período, objetos que se
prestam a inúmeras aplicações de projeto nas quais um modelo é essencial, como por
exemplo protótipos para discussão de conceitos dentro da equipe de trabalho ou com
clientes, para ensaios aerodinâmicos em túneis de vento, para avaliação de design,
etc. Mais recentemente, a manufatura aditiva tem sido empregada na área de
engenharia biomédica com o fito de se produzir próteses para tecidos ósseos
fraturados ou danificados por doenças degenerativas.

O tempo de fabricação varia de poucas horas a alguns dias, dependendo da


complexidade e do tamanho do objeto (Palm, 2002). Consequentemente, o tempo
necessário desde a concepção até a introdução de novos produtos no mercado é
reduzido drasticamente (estima-se em 60%). Um exemplo clássico é a indústria
automotiva, na qual o tempo necessário para o desenvolvimento de um novo modelo
caiu de 60 meses na década de 1990 para 18 meses na década de 2000.

Ao contrário das operações de usinagem convencionais e não convencionais, nas


quais peças são produzidas a partir da remoção do excesso de material na forma de
cavaco, a manufatura aditiva é considerada um processo de fabricação com adição de
material (papel, cera, polímeros ou pós metálicos), no qual camadas com espessura
de aproximadamente 0,1 mm são sucessivamente depositadas umas sobre as outras.
Entretanto, uma das principais limitações da prototipagem rápida se refere à
dificuldade em se produzir objetos metálicos.

Independentemente da técnica utilizada, o processo de fabricação por manufatura


aditiva envolve cinco etapas (Palm, 2002) descritas a seguir e ilustradas na Figura 6.1:

• geração de um modelo CAD tridimensional do objeto

157
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• conversão do modelo CAD para o formato STL

• fatiamento do arquivo STL em camadas finas

• construção do objeto por meio da deposição sucessiva de camadas

• limpeza e acabamento do objeto.

a) modelo CAD 3D b) modelo STL

c) planos de fatiamento d) interseção de um plano de fatiamento

e) Fatia gerada f) Adição de camadas sucessivas

Figura 6.1: Etapas da manufatura aditiva.

A primeira etapa (geração de um modelo CAD) requer a utilização de softwares


disponíveis comercialmente e capazes de representar o modelo tridimensionalmente.
Em seguida, o arquivo CAD deve ser convertido para o formato STL (de
“esteriolitografia”, a primeira técnica de manufatura aditiva), adotado como padrão

158
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pelos fabricantes dos equipamentos. O formato STL representa uma superfície


tridimensional a partir de facetas triangulares e o arquivo contém as coordenadas dos
vértices e o vetor normal a cada faceta. Consequentemente, superfícies curvas são
aproximadas por planas. O aumento do número de facetas permite representar
superfícies curvas com maior exatidão à custa de arquivos mais pesados, tempo mais
longo de processamento e maior custo, portanto, cabe ao projetista encontrar uma
solução de compromisso entre a exatidão do modelo e a manipulação do arquivo.

Na terceira etapa (fatiamento do arquivo STL), um software pré-processador é


empregado para fatiar o modelo em camadas com espessura que varia de 0,01 a
0,7 mm, dependendo da técnica a ser empregada na construção do objeto. Além
disso, nesta etapa ajusta-se o tamanho, posição e orientação do modelo. Esta etapa é
crítica pois as camadas são depositadas na direção vertical que, consequentemente,
apresentará menor resistência mecânica e exatidão dimensional. Outro aspecto
importante diz respeito à menor dimensão do modelo, que deve ser orientada na
direção vertical, de forma a contribuir para a redução do tempo de construção do
protótipo, já que o número de camadas depositadas será menor. Finalmente, ainda
nesta etapa deve ser definido e gerado o suporte no caso de modelos delicados ou
esbeltos.

A quarta etapa consiste na utilização de uma das técnicas disponíveis para deposição
de camadas e construção do objeto. Normalmente esta etapa é executada
automaticamente e requer pouca interferência humana. A montagem das camadas
ocorre por meio da solidificação de líquidos ou da fusão de pós. A última etapa
consiste na remoção do suporte e acabamento do protótipo. No caso de materiais
fotossensíveis, o protótipo deve ainda ser submetido à cura. Lixação e polimento,
selagem e pintura podem ainda ser empregadas visando melhor aparência e
durabilidade mais longa.

As principais técnicas de prototipagem rápida são:


• fotopolimerização ou estereolitografia
• deposição de plástico fundido
• sinterização a laser
• deposição por adesão
• deposição de lâminas.

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A Tabela 6.1 apresenta algumas características dessas técnicas (Kruth et al., 2008).

Tabela 6.1: Características das principais técnicas de prototipagem rápida.


Matéria Método de
Técnica Princípio Materiais
prima deposição
Fotopolímeros:
Fotopolimeri- Camadas de Foto-
Líquido acrilatos, epóxi,
zação líquido polimerização
resinas
Extrusão (fio) ou
Deposição de injeção Solidificação por Polímeros: ABS,
Líquido
plástico fundido (gotículas) à resfriamento PA, cera
quente
Sinterização Polímeros (PC,
Sólido Sinterização a e/ou fusão + PA), metais puros
Camada de pó
(pó) laser solidificação por ou com ligante,
resfriamento cerâmicas
Cerâmicas, metais
Sólido Deposição por Camada de pó + Sem mudança
ou polímeros, todos
(pó) adesão injeção de ligante de fase
com ligante
Papel, polímeros,
Deposição de Camadas de Sem mudança
Sólido cerâmicas, metais,
lâminas lâminas de fase
compósitos

6.1 Fotopolimerização ou estereolitografia (SL - Stereolithography)

Este foi o primeiro método de manufatura aditiva, patenteado em 1986. Consiste na


construção de um objeto a partir da solidificação de uma resina líquida e fotossensível
exposta a radiação ultravioleta. O protótipo é construído sobre uma plataforma
posicionada logo abaixo do nível de resina que se encontra dentro do tanque, como
mostra a Figura 6.2. Um feixe laser de baixa potência sensibiliza a primeira camada
da seção transversal do modelo que é solidificada, enquanto a região não atingida
pelo feixe permanece no estado líquido. A sensibilização do contorno pode ser feita
ponto a ponto ou utilizando uma máscara que permite a sensibilização instantânea de
todo o contorno. Em seguida a plataforma é baixada e o processo se repete até que
todas as camadas sejam depositadas. A peça é então lavada para remoção da resina
líquida em excesso e suporte é removido. Finalmente o protótipo é submetido à cura
em um forno ultravioleta.

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Figura 6.2: Diagrama esquemático da fotopolimerização (estereolitografia).

O fotopolímero é uma resina de base epóxi ou acrílica capaz de reagir em cadeia


formando polímeros quando ativados por energia radiante de comprimento de onda
específico.

6.2 Deposição de plástico fundido (FDM – Fused Deposition Modelling)

Neste processo, um polímero (nylon, ABS, policarbonato, etc.) fornecido na forma de


pellets ou filamento, ou ainda cera para fundição, é aquecido e depositado sobre o
suporte ou sobre a camada anterior. A temperatura da plataforma é controlada de
forma a permitir o resfriamento rápido (e o endurecimento) do material depositado. O
suporte é removido posteriormente. A qualidade final da peça depende da resolução
do equipamento, semelhante à de uma impressora a jato de tinta. A Figura 6.3
apresenta um diagrama esquemático deste processo.

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Figura 6.3: Deposição de plástico fundido.

6.3 Sinterização a laser (SLS – Selective Laser Sintering)

O objeto é construído quando um feixe laser infravermelho incide sobre uma camada
fina de material na forma de pó (cera, policarbonato, cerâmica, nylon ou metal), como
mostra a Figura 6.4. Após a solidificação da primeira camada, a plataforma é baixada
e o reservatório se move aplicando uma nova camada de pó. A temperatura atingida é
ligeiramente abaixo do ponto de fusão, mas suficiente para garantir a ligação entre as
partículas. A Figura 6.5 mostra um exemplo de aplicação da sinterização a laser:
fabricação de uma vértebra humana em Ti-4Al-6V em 12 horas (Hollander et al.,
2006).

Figura 6.4: Sinterização a laser.

162
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Figura 6.5: Prótese em Ti-4Al-6V (esquerda) e vértebra humana (direita).

No caso de substituição de tecidos ósseos, a prótese deve apresentar porosidade


adequada para favorecer a multiplicação de osteoblastos sem prejuízo para
resistência mecânica (Hollander et al., 2006).

Figura 6.6: Estrutura em Ti-4Al-6V produzida por sinterização a laser.

6.4 Deposição por adesão (3DP – Three Dimensional Printing)

A peça é montada em camadas quando o pó que a compõe é aglomerado pela


injeção de um ligante (Figura 6.7). Após a deposição de uma camada, o pistão é
baixado, o rolo distribui mais uma camada de pó e a operação se reinicia. O pó que
não é utilizado na construção do objeto serve de suporte.

163
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Figura 6.7: Deposição por adesão

O objeto é poroso, portanto, a aplicação de um selante é importante para aumentar a


durabilidade do protótipo e melhorar seu acabamento. Máquinas com capacidade de
produção de peças em até quatro cores estão disponíveis comercialmente.

6.5 Deposição de lâminas (LOM – Laminated Object Manufacturing)

Nesta técnica, mostrada na Figura 6.8, lâminas de papel especial (contendo um


adesivo termoplástico) são cortadas de uma bobina utilizando um laser CO2. Em
seguida, a primeira camada é abaixada e sucessivas lâminas são cortadas e unidas
aplicando-se pressão e temperatura, formando o objeto. O corte também pode ser
feito com estiletes e o material que não compõe o modelo serve como suporte. O
protótipo tem uma textura similar à da madeira e como é feito de papel, deve ser
protegido da umidade por meio da aplicação de uma camada de tinta ou verniz. Mais
recentemente, novos materiais foram desenvolvidos para bobinas, dentre eles
polímeros, papel que não absorve umidade e pós cerâmicos e metálicos (estes pós
exigem posterior sinterização do protótipo).

164
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Figura 6.8: Deposição de lâminas.

A Tabela 6.2 compara o desempenho dos principais métodos de prototipagem e a


Tabela 6.3 relaciona as principais vantagens e desvantagens desses métodos.

Tabela 6.2: Desempenho dos métodos de prototipagem rápida.


Velocidade de
Energia específica No. de
Método fabricação Ra (µm)
(J/cm3) etapas
(cm/h)
Fotopolimerização 1,5 0,94 0,1 4
Deposição de plástico 0,4 0,06 1,6 – 2,0 3
Sinterização a laser 2,5 300 1,3 – 3,0 4
Deposição por adesão 1,3 – 1,9 0,026 6,6 - 15 4
Deposição de lâminas 0,45 336 n.d. 3

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Tabela 6.3: Vantagens e desvantagens dos métodos de prototipagem rápida.


Processo Vantagens Desvantagens
• Tecnologia sedimentada • Processo complexo
Fotopolimerização • Alta velocidade • Requer suporte
• Alta resolução • Materiais limitados e caros
• Baixo custo do material • Acabamento grosseiro
• Materiais e cores diferentes • Materiais de baixo ponto de
Deposição de
na peça fusão
plástico fundido
• Pouco desperdício de
material
• Dispensa suporte • Cura intermediária (alguns
• Bom aproveitamento do materiais)
material • Acabamento grosseiro
Sinterização a laser • Trabalha materiais de • Porosidade
melhores propriedades que a
estereolitografia
• Baixo custo
• Diversidade de materiais • Rugosidade alta
• Moldes para fundição em • Baixa resolução
Deposição por
cerâmica • Requer posterior remoção
adesão
• Suporte produzido de umidade
automaticamente
• Velocidade e taxa de • Energia específica alta
deposição elevadas • Calor pode danificar lâminas
Deposição de
• Tensões e distorções baixas • Requer limpeza posterior
lâminas
• Variedade de materiais e • Descarte de resíduo
cores • Fumos tóxicos

6.6 Ferramental rápido e manufatura rápida

A partir da manufatura aditiva, este conjunto de tecnologias evoluiu para o ferramental


rápido e manufatura rápida. No primeiro caso são produzidas matrizes e moldes
(ferramental rápido direto) para lotes pilotos ou modelos (ferramental rápido indireto)
que serão posteriormente usados na confecção de moldes e matrizes.

O custo elevado de moldes e matrizes produzidos tradicionalmente (por fresamento,


retificação e polimento) só se justifica para produção em massa. Em contrapartida, o

166
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ferramental rápido permite a fabricação mais rápida e econômica (20% e 5%,


respectivamente, em comparação ao método tradicional) de ferramentas para
produção de pequenos lotes de peças. Como desvantagens, a vida de ferramentas
produzidas por ferramental rápido é menor e suas tolerâncias são mais abertas. Palm
(2002) relata que um molde de aço produzido por ferramental rápido direto
(sinterização a laser) foi capaz de injetar 50000 peças de plástico.

No caso da manufatura rápida, pequenos lotes ou lotes unitários (produtos


personalizados, tais como capacetes, luvas de trajes espaciais, produtos esportivos,
etc.) são produzidos diretamente.

A Figura 6.9 (Ding et al., 2004) ilustra as etapas envolvidas no desenvolvimento de


uma matriz para fabricação de um para-lama dianteiro automotivo como alternativa ao
método tradicional (fresamento e/ou eletroerosão).

Figura 6.9: Desenvolvimento de uma matriz para fabricação de um para-lama


automotivo.

167
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A Figura 6.9(a) mostra o modelo em CAD da peça a ser produzida e a Figura 6.9(b)
representa a variação de espessura e de deformações obtida por elementos finitos (de
forma a se prever a necessidade de alterações na matriz). Em seguida (Figura 6.9c)
são gerados os modelos da matriz de estampagem e do punção de corte. Os
protótipos rápidos de matriz e punção são produzidos (por fotopolimerização ou
qualquer outro método), conforme ilustrado na Figura 6.9(d), e a partir daquela o
negativo da matriz é produzido em gesso (Figura 6.9e). Finalmente, o negativo em
gesso recebe uma camada de desmoldante e é submetido à deposição por spray de
uma camada de 2 mm de espessura de um composto (pseudoliga) a base de Zn-Al-
Cu (Figura 6.9f). Uma resina epóxi é usada como suporte para dar resistência à
camada depositada. O punção, produzido pelo mesmo método, e a peça também são
mostrados na Figura 6.9(f). O ciclo completo de manufatura é de 20 dias.

No caso da manufatura rápida, a sinterização a laser é a técnica mais promissora, por


permitira produção de componentes metálicos com densidade acima de 60%. A
Tabela 6.4 apresenta algumas propriedades dos pós metálicos disponíveis para
manufatura rápida por sinterização a laser (Lu et al. e Levy et al. apud Santos, 2006).

Tabela 6.4: Propriedades de alguns pós metálicos usados na manufatura rápida por
sinterização a laser.
TP LR TE ME
Material
(µm) (MPa) (MPa) (GPa)
Aço P20 (ref.) x 950 751 210
T1-6Al-4V (ref) x 1030 925 110
T1-6Al-4V (SLS + HIP) 37-74 962 884 110
Inconel 625 (SLS + HIP) 16-44 855 490 208
DTM RapidTool 1 50 475 255 210
DTM LaserForm ST 100 23 510 305 137
EOS Ni-Bronze Sn60Pb infiltrado 100 162 124 60
EOS DMLS DirectMetal® 50-V3 100 199 n.d. n.d.
EOS DMLS DirectMetal® 20-V2 20 450 n.d. n.d.
TP: tamanho da partícula LR: limite de resistência
TE: tensão de escoamento ME: módulo de elasticidade

Hollander et al. (2006) compararam as tensões limites de escoamento e de ruptura,


além da deformação na fratura da liga Ti-4Al-6V produzida convencionalmente e por
sinterização a laser (com e sem tratamento posterior de recozimento). No caso das
tensões de escoamento e de ruptura, as amostras produzidas por sinterização a laser

168
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com pós-tratamento de recozimento atenderam à especificação da norma ASTM para


aplicações médicas (Figura 6.10). Além disso, testes de fadiga por torção indicaram
que os corpos de prova de Ti-4Al-6V produzidos por sinterização a laser apresentaram
comportamento equivalente às amostras produzidas por fundição sob alta pressão
isostática (superior à fundição convencional e inferior ao forjamento), vide Figura 6.11.

Figura 6.10: Tensões limites de ruptura (Rm) e de escoamento (Rp0.3) e deformação na


fratura (A5) de Ti-4Al-6V produzido convencionalmente e por SLS com e sem
recozimento posterior.

Figura 6.11: Resistência à fadiga por torção da liga Ti-4Al-6V produzida por
sinterização a laser.

169
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