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ATOS DO CURRÍCULO
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Olá!
Ao final desta aula, você será capaz de:
1. Conceituar “atos de currículo” a partir das contribuições teóricas críticas e pós-críticas do currículo;
2. analisar os diversos aspectos que constituem os atos do currículo, compreendidos como eixo central do
processo curricular: os conteúdos selecionados, a forma como são abordados, organizados, traduzidos em
atividades e avaliados;
3. refletir sobre as conexões entre os atos de currículo e o multiculturalismo, assim como sobre a importância
desses atos na prática docente e na formação das identidades dos alunos, seja pelo seu papel transformador ou
reprodutor da sociedade.
"O currículo é um território em que se travam ferozes competições em torno dos significados. currículo não é um
veículo que transporta algo a ser transmitido e absorvido, mas sim um lugar em que, ativamente, em meio a
tensões, se produz e se reproduz a cultura. Currículo refere-se, portanto, à criação, recriação, contestação e
transgressão".
(...) os/as educadores não poderão ignorar, no próximo século, as difíceis questões do multiculturalismo, da raça,
da identidade, do poder, do conhecimento, da ética e do trabalho que, na verdade, as escolas já estão tendo que
escolarização, do que significa ensinar e da forma como os/as estudantes devem ser ensinados/as para viver em
um mundo que será amplamente globalizado, ‘high tech’ e racialmente diverso que em qualquer outra época da
história.”
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Figura 1 - Henry Giroux
Quais os desafios que se colocam na sociedade contemporânea em relação ao papel da escola e do currículo na
perspectiva de uma educação de qualidade para todos e todas, pautada nos princípios democráticos e
multiculturalmente orientada?
Nesta aula, aprofundaremos o olhar sobre os novos desafios que se impõem na sociedade contemporânea, pós-
moderna, e sobre a importância da cultura nos processos de controle e mudança social que se configuram na
instituição escolar, tentando esboçar respostas, mesmo que provisórias, para estas questões.
Para isso, começaremos nossa reflexão retomando alguns pontos analisados na aula anterior e ampliando a
discussão sobre a abordagem multiculturalista, de forma a subsidiar o debate sobre os atos de currículo.
Se orientarmos a discussão para refletir e ou definir sobre o que a escola deve ensinar (para citarmos apenas um
dos aspectos que esta compreensão pode envolver), encontraremos posicionamentos e formulações teóricas
bastante distintas, algumas delas complementares e outras excludentes ou contraditórias, que se revelam,
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Contudo, a reflexão sobre o papel dos conhecimentos escolares e a relevância e centralidade da cultura nos
processos de construção das identidades dos alunos/as tem caracterizado o debate acerca do tema e nos
impulsionam a analisar de que forma as modificações que vêm ocorrendo na sociedade, seja no âmbito da
economia, da política, da cultura, das interações sociais, é significada e trabalhada nas salas de aula.
Portanto, a reflexão sobre o que a escola deve ensinar está profundamente vinculada ao debate sobre como as
transformações sociais vêm interferindo na construção das identidades dos sujeitos e de que forma a cultura
Tais evidências, inseridas na complexidade que caracteriza as transformações sociais do mundo contemporâneo,
nos remetem a Forquin (1993) que, ao abordar as relações entre escola, cultura e modernidade, referenciado por
“(...) que o mundo muda sem cessar: eis aí certamente uma velha banalidade. Mas para aqueles que
analisam o mundo atual, alguma coisa de radicalmente nova surgiu, alguma coisa mudou na própria
mudança: é a rapidez e a aceleração perpétua de seu ritmo, e é também o fato de que ela se tenha
tornado um valor enquanto tal, e talvez o valor supremo, o próprio princípio da avaliação de todas as
coisas (...). Em quê o mundo muda, por quê, em quais direções? (1993, p. 18,19)
Mais especificamente, coloca-nos a emergência de buscarmos resposta para uma questão colocada inicialmente,
tantos dilemas e incertezas, neste conturbado tempo em que vivemos. Exige o enfrentamento do desafio de
encontrar caminhos, possíveis e realizáveis, para redefinirmos o papel social que a escola deve ocupar, nesse
contexto em que se deslocam para outros espaços sociais a difusão da cultura e a incorporação do conhecimento
socialmente produzido.
como prioridade a universalização da oferta de ensino e a melhoria da qualidade da escola básica, a definição
sobre os conteúdos que devem constituir os currículos de 1ª à 4ª série tem sido motivo de muita polêmica, e de
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Secretarias de Educação, sejam estaduais ou municipais, têm produzido inúmeras versões de propostas
curriculares nos últimos anos. Assim como, a exemplo de outros países, foi feito a nível federal, pela Secretaria
Da mesma forma, estudos produzidos no campo do currículo vêm apresentando contribuições que alimentam o
Ganha terreno, nesta área, uma diversidade de estudos que busca estabelecer relações entre o currículo e
diferentes aspectos que caracterizam as discussões sobre cultura, educação e reformas do sistema educativo.
as experiências atualmente proporcionadas pela escola e pelo currículo e as características culturais (...),”
“no novo mapa cultural traçado pela emergência de uma multiplicidade de atores sociais e por um
anacronicamente, os critérios e os parâmetros de um mundo social que não mais existe.” (p. 185)
A desconstrução dos discursos e das narrativas hegemônicas e dominantes pela afirmação de narrativas e
discursos alternativos dos grupos subjugados socialmente, devem ser, segundo o autor, um compromisso
Para isso, indica quatro componentes centrais representativos das novas configurações culturais e sociais que
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5 Componentes Centrais
• Caráter dominante masculino e patriarcal
instâncias sociais e suas implicações para as relações que se estabelecem na escola e a expressão disso
corporificada pelo currículo. Para ele, é central que se desestabilize essa situação. E, apesar de
considerar que esta questão nos coloca uma série de dilemas e dificuldades, aponta para a importância
currículo.
Outro componente trata da relação cultural entre povos e nações dominantes e povos e nações
cultura sobre a outra devem ser desestabilizados e dasalojados pela escola e pelo currículo. Neste
sentido, Silva (1995) argumenta que: “Num mundo como este, no qual conhecimento e poder estão
Um terceiro aspecto destacado pelo autor aponta a necessidade de a escola rever posições para lidar com
o novo cenário cultural representado pela difusão e generalização das novas mídias. Para ele, tais
transformações:
“não podem ser interpretadas no registro conservador do pânico moral e da visão patologizante que vê a
ampliação da influência da cultura popular e o predomínio dos novos meios e conteúdos culturais como
uma ameaça a tradicionais valores e capacidades supostamente mais universais, humanos e superiores.”
(p. 198)
• Estudos culturais
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Como último componente, o autor evidencia as contribuições de trabalhos desenvolvidos no campo dos
Estudos Culturais, colocando em destaque a ideia do multiculturalismo. Nessa direção, sublinha que os
diferentes aspectos do debate sobre o multiculturalismo, movimentos e identidades sociais devem ser
“pode ser imediatamente transportada ao âmbito da escola e do currículo, pois as relações aí envolvidas
não são abstratas e removidas do âmbito da prática. Elas estão presentes, manifesta e diretamente, no
campo educacional da América Latina, analisa as origens e os avanços destas correntes, assinalando que tais
perspectivas, embora venham ocupando um espaço “crescente no nível internacional”, no contexto da América
Como destaca a autora, muito embora possamos reconhecer que, desde o início do século, em alguns países
adequado a diferentes grupos sociais e culturais marginalizados”, como no caso das populações indígenas.
O que pode nos indicar a “hipótese de que a preocupação por uma educação que respeite a diversidade cultural
emerge de modo original na América Latina e é muito anterior ao atual movimento de valorização desta
perspectiva que se desenvolve no plano internacional.”- nossas escolas ainda permanecem cultivando uma
“o sistema público de ensino em nosso país (...), além de estar longe de garantir a democratização
efetiva do direito à educação e ao conhecimento sistematizado, terminou por criar uma cultura
escolar padronizada, ritualística, formal, pouco dinâmica (...) e está referida à cultura de
determinados atores sociais, brancos, de classe média, de extrato burguês e configurados pela
Outra questão discutida pela autora diz respeito à diferença que é preciso estabelecer entre o significado dos
Tal concepção deve refletir inúmeros aspectos envolvidos nos processos de interação que ocorrem em sala de
aula.
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Nesses processos professores e alunos entrecruzam “crenças, aptidões, valores, atitudes e comportamentos.” (p.
88) - conferindo ao que se aprende ou ao que se deixa de aprender uma dimensão real que não se limita aos
Assim considerado, “um currículo multicultural no ensino implica mudar não apenas as intenções do que
queremos transmitir, mas os processos internos que são desenvolvidos na educação institucionalizada.” (p.88).
É preciso, dessa forma, reorientar a formação docente para evitar que se perpetuem visões e atitudes de não
valorização de grupos sociais diversos e socialmente excluídos, considerar criticamente a utilização de materiais
pedagógicos e, particularmente, dos livros didáticos que se apresentam carentes de uma visão multicultural,
assim como levar em conta o conhecimento prévio dos alunos, obtido pelas experiências cotidianas e
Neste sentido, é fundamental aprofundar a reflexão sobre o papel dos atos de currículo neste processo de busca
por uma educação mais democrática, na qual as diferentes representações sociais possam ser contempladas.
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6 Atos de currículo: o currículo corporificado na práxis
• O que são atos de currículo?
• Qual o seu significado e importância numa perspectiva multirreferencial e intercrítica de currículo?
• Quais os seus pontos de contato com a abordagem intercultural?
Estas questões nos ajudam a pensar no currículo em uma das principais instâncias onde ele se corporifica: a sala
de aula.
O termo Atos de currículo é um conceito que vem sendo desenvolvido pelo professor e pesquisador brasileiro
Roberto Sidnei Macedo, no Grupo de Pesquisa em Currículo, Complexidade e Formação / UFBA - Bahia, a partir
ara compreendermos os aportes fundantes deste conceito, procuraremos sintetizar o que se entende por uma
dialogicamente interligados, representando uma perspectiva que rompe com a ideia de disciplinaridade, tão
A partir das contribuições de Edgar Morin e de Jacques Adorno, e suas críticas radicais à rigidez prescritiva da
lógica disciplinar, Macedo propõe uma “virada multirreferencial” como alternativa para a compreensão dos
complexos processos curriculares. Quer dizer que olhar o currículo por uma perspectiva multirreferencial e
muito mais fecunda e coerente a intercriticidade nos âmbitos dos atos de currículo.” (2007, p. 82)
Trabalhar o currículo nesta perspectiva é entender o currículo de forma heterogênea, não centrado nas
categorias disciplinares, mas incluindo como referências, os múltiplos e diferentes saberes nele implicados, nele
presentes.
É conceber o caráter híbrido do currículo, no sentido de que nele podem coexistir e se confrontarem múltiplas
significações, fecundadas num debate intercrítico e radicalmente democrático (MACEDO, 2007). Significa abrir
espaço para um “diálogo” possível sobre e com a realidade curricular, contemplando diferentes pontos de vista.
Os atos de currículo, entendidos como toda ação socioeducacional através da qual o currículo é corporificado,
têm um papel central nos processos elencados, vistos no texto que você acabou de ler, pois é através deles que os
processos de produção e negociação cultural ocorrerão na escola: na escolha dos conhecimentos que comporão o
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currículo e estarão presentes nas aulas (os conteúdos, as imagens, os textos, as músicas, as artes, o corpo, as
linguagens);
nas formas como os conhecimentos serão organizados e abordados (o que e como estará presente nos cadernos,
nos livros didáticos, nos murais e em outros espaços); no modo como serão tratadas as diferenças (que valores e
visões de mundo serão contemplados); na organização dos espaços e tempos escolares; nas expectativas
positivas ou negativas que projetamos sobre a escola, os alunos, os grupos sociais, sobre nós mesmos.
CONCLUSÃO
Nesta aula, você:
• Compreendeu a centralidade da cultura nos processos educativos da sociedade contemporânea;
• conheceu as contribuições das abordagens multiculturalistas/interculturalistas para a prática
pedagógica;
• conceituou atos de currículo compreendendo sua inserção na abordagem multirreferencial e intercrítica
e sua relevância para a prática educativa.
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