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FACULDADE METROPOLITANA DE CAMAÇARI

CURSO DE BACHARELADO DE ENGENHARIA AMBIENTAL

ERNANE LUZ ROCHA

REÚSO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS NA AGRICULTURA IRRIGADA

Camaçari - BA
2013
ERNANE LUZ ROCHA

REÚSO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS NA AGRICULTURA IRRIGADA

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de


Bacharelado em Engenharia Ambiental, Faculdade
Metropolitana de Camaçari – FAMEC, como requisito parcial
para obtenção do grau de Bacharel em Engenharia Ambiental.

Orientador: Prof. M.Sc. Manuel Vitor Portugal Gonçalves

Camaçari - BA
2013
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP).

ROCHA, Ernane Luz.


R571 Reúso de águas residuárias na agricultura irrigada. / Ernane
Luz Rocha. – Camaçari, 2013.
35 f.; 29 cm.

Monografia (Bacharelado) – Faculdade Metropolitana de


Camaçari (FAMEC), Bacharelado em Engenharia Ambiental, 2013.
Orientador: Prof. M.Sc. Manuel Vitor Portugal Gonçalves.

1. Reúso. 2. Efluentes Domésticos. 3. Irrigação. I. Faculdade


Metropolitana de Camaçari, Bacharelado em Engenharia Ambiental.
II. Título.

CDD 628.3
ERNANE LUZ ROCHA

REÚSO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS NA AGRICULTURA IRRIGADA

Trabalho de conclusão de curso apresentado à


Faculdade Metropolitana de Camaçari – FAMEC, para
obtenção do grau de Bacharel em Engenharia Ambiental.

Apresentado em: 24/07/2013

Banca Examinadora:

___________________________________________
Prof.º M.Sc Manuel Vitor Portugal Gonçalves
Orientador

___________________________________________
Prof.º M.Sc Linaldo Santos Bezerra
Examinador

___________________________________________
Prof.º M.Sc Gildásio Ferreira Félix de Santana
Examinador
AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, pois sem ele nada seria possível. A minha avó,
Alaíde Pires Rocha (In Memoriam), que não mediu esforços e sempre me deu forças
para alcançar meus objetivos e superar minhas dificuldades e minha mãe Zenaide e
esposa Marina que sempre cobraram minha graduação.
“A Terra pode sobreviver bem sem
amigos, mas os humanos se quiserem
sobreviver, devem aprender a serem
amigos da Terra.”

John Muir (1938 – 1914)


RESUMO

O presente estudo apresenta relevância econômica e socioambiental no setor


agrícola, ao passo que a sua demanda por água é um desafio à gestão hídrica
sustentável. O reúso de efluentes domésticos tratados na irrigação agrícola
representa uma alternativa de baixo custo e um ganho em ecoeficiência à agricultura,
a sustentabilidade e a gestão hídrica. Assim sendo dos citados efluentes podem ser
redestinados à agricultura, permite a economia de água de boa qualidade, de
fertilizantes químicos sintéticos e a redução dos impactos negativos da agricultura.
Segundo CUTOLO (2009), o uso racional de efluentes domésticos na agricultura não
afeta significativamente a saúde humana. É uma alternativa de gerenciamento para a
convivência com a insegurança e a perda da qualidade dos recursos hídricos,
principalmente nas regiões semi-áridas do Brasil. Entre os benefícios atribuídos a
prática do reúso de efluentes domésticos na irrigação destacam-se a contribuição à
recarga das águas subterrâneas e a fertirrigação, por conta do aporte de nutrientes
tais como nitrogênio, fósforo e potássio as culturas, desde que sejam respeitados os
limites sanitários e ambientais de aplicação desta alternativa. O estudo em questão
baseado nas referências bibliográficas demonstra tendência ao crescimento do reúso
de efluentes domésticos na irrigação, cabendo ao setor público regulamentar e
fiscalizar esse mercado, tornando-o uma poderosa ferramenta de gestão dos recursos
hídricos no Brasil.

Palavras-chave: Reúso. Efluentes Domésticos. Irrigação.


ABSTRACT

This study has important economic and environmental in the agricultural sector, while
its demand for water is a challenge to sustainable water management. The reuse of
treated domestic wastewater in agricultural irrigation is a low-cost and eco-efficiency
gains in agriculture, sustainability and water management. Thus the cited effluent can
be re-used in agriculture, the economy allows good water quality, synthetic chemical
fertilizers and reducing the negative impacts of agriculture. According CUTOLO
(2009), the rational use of domestic wastewater in agriculture does not significantly
affect human health. It is an alternative management for coping with insecurity and
loss of quality of water resources, especially in semi-arid regions of Brazil. Among the
benefits attributed to the practice of reuse of domestic wastewater in irrigation
highlight the contribution to groundwater recharge and fertigation, due to the supply
of nutrients such as nitrogen, phosphorus and potassium cultures, subject to
compliance with the limits and sanitary environmental applications of this alternative.
This study based on references demonstrates the growing trend of domestic
wastewater reuse in irrigation, leaving the public sector to regulate and supervise this
market, making it a powerful tool for water resources management in Brazil.

Keywords: Reuse. Domestic Wastewater. Irrigation.


LISTA DE FIGURAS

Figura 01 – Principais bacias hidrográficas do Brasil 15


Figura 02 – A água que você não vê 17
LISTA DE QUADROS

Quadro 01 – Modalidades de reúso de água 18


Quadro 02 – Classes das águas de reúso 18
Quadro 03 – Composição dos esgotos domésticos 21
Quadro 04 – Diretrizes da USEPA para o uso agrícola de esgotos sanitários 24
LISTA DE TABELAS

Tabela 01 – Composição dos efluentes domésticos que não contêm resíduos


industriais. Dados primários obtidos a partir de MARTINELLI
(2011, p. 43) 21
Tabela 02 – Volumes de esgotos domésticos urbanos produzidos e tratados
e o percentual de tratamento de esgoto doméstico urbano 22
Tabela 03 – Período de sobrevivência de patógenos nos efluente em
função da temperatura 25
Tabela 04 – Relação entre o aumento da produtividade agrícola (ton./ha/ano)
e a destinação de efluentes domésticos na irrigação 27
LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01 – Setor da comparação entre as demandas consuntivas no País 16


Gráfico 02 – Composição dos resíduos do esgoto doméstico 21
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas


ANA Agência Nacional de Águas
ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CNRH Conselho Nacional de Recursos Hídricos
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
EUA Estados Unidos da America
ETE Estação de Tratamento de Esgotos
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
FAPEMA Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento
Cientifico e Tecnológico do Maranhão
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
MI Ministério da Integração Nacional
NBR Norma Brasileira
NEERI Instituto Nacional de Pesquisas de Engenharia Ambiental
OMS Organização Mundial da Saúde
PNSB Pesquisa Nacional de Saneamento Básico
RBRH Revista Brasileira de Recursos Hídricos
SENIR Secretaria Nacional de Irrigação
UASB Upflow Anaerobic Sludge Blanket
USEPA United States Environmental Protection Agency
UTE Usina Termoelétrica
WHO World Health Organization
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO............................................................................................................. 12
1.1 JUSTIFICATIVA........................................................................................................... 13
1.2 PROBLEMA ................................................................................................................. 13
1.3 HIPÓTESE ................................................................................................................... 13
1.4 OBJETIVOS GERAIS E ESPECÍFICOS ..................................................................... 13
1.5 METODOLOGIA .......................................................................................................... 14
2 REÚSO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS NA AGRICULTURA IRRIGADA ........................ 15
2.1 A ÁGUA E SUA UTILIZAÇÃO ..................................................................................... 15
2.2 MODALIDADES DE REÚSO DE ÁGUA ...................................................................... 18
2.3 REÚSO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS ........................................................................... 18
2.4 O ESGOTO DOMÉSTICO E SUAS CARACTERÍSTICAS .......................................... 20
2.5 POLUIÇÃO DOS CORPOS HÍDRICOS POR ESGOTOS DOMÉSTICOS ................. 23
2.6 QUALIDADE DA ÁGUA DE REÚSO PARA IRRIGAÇÃO ........................................... 23
2.7 UTILIZAÇÃO DO REÚSO NA AGRICULTURA........................................................... 25
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 29
REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 30
ANEXOS ............................................................................................................................. 32
12

1 INTRODUÇÃO

A Engenharia Ambiental é regulamentada no Brasil desde o ano 2000 pela


Resolução 447 do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia. O
papel do engenheiro ambiental é atuar na preservação e na recuperação da
qualidade ambiental da água, do ar e do solo a partir de diagnósticos, manejo,
tratamento, etc. Entre suas funções, compete projetar e dimensionar processos de
tratamento de efluentes líquidos, a exemplo dos esgotos domésticos, bem como
elaborar propostas e alternativas para a reutilização destes e gestão hídrica
sustentável.
O uso constante e excessivo de água para atender o crescimento
populacional e a expansão da economia produz um elevado volume de água
residuária, torna crítica à poluição dos corpos d'água, que por sua vez, perdem
qualidade. A urbanização e a industrialização ampliam a demanda pela água,
aumentam o desperdício e os custos de gerenciamento deste recurso fundamental a
saúde ecossistêmica e ao desenvolvimento humano local e sustentável.
O Esgoto Doméstico é uma combinação de excretas de humanos e animais, a
exemplo das fezes e urina, bem como efluentes resultantes de lavagens, banhos e
cozimento, além de esgoto proveniente do comércio e de algumas indústrias. Fazem
parte da composição desse esgoto a água, sólidos orgânicos como nutrientes,
proteínas, carboidratos e lipídeos e inorgânicos, amônia, nitrato e ortofosfatos, além
de outros elementos e microrganismos. Saliente-se que alguns desses constituintes
presentes no esgoto doméstico representam risco à saúde humana e aos recursos
hídricos.
Os tipos de tratamentos mais usados para o reúso de efluentes domésticos
são: fossas sépticas, tanques imhoff, filtros biológicos, lagoas de estabilização,
lagoas anaeróbias, lagoas aeróbias, lagoas facultativas, lagoas de maturação,
lagoas aeradas e por lodos ativados. O grau do tratamento dos esgotos depende da
qualidade exigida para água de irrigação. Esta, por sua vez depende da legislação
que regula o uso do esgoto na agricultura.
13

1.1 JUSTIFICATIVA

A pressão exercida pelo uso constante dos recursos hídricos justifica a


realização deste estudo sobre o reúso de efluentes domésticos na agricultura, uma
oportunidade a gestão hídrica e a sustentabilidade da agricultura pela minimização da
contaminação dos corpos receptores, economia de produção de água potável e
redução do custo pelo aporte de matéria orgânica e de nutrientes essenciais às
culturas agrícolas.

1.2 PROBLEMA

Qual o impacto do uso de efluentes domésticos tratados na irrigação agrícola?

1.3 HIPÓTESE

A prática do reuso dos efluentes domésticos na agricultura poderá ser


aplicada se as características do efluente disponível atenderem os requisitos de
qualidade exigidos pela aplicação na qual se pretende usar o efluente como fonte de
abastecimento. Para isso, é necessária uma avaliação das características do
efluente disponível e dos requisitos de qualidade exigidos para a aplicação que se
pretende, podendo então, o efluente ser encaminhado nas condições em que se
encontra da estação de tratamento até às áreas cultivadas.

1.4 OBJETIVOS GERAIS E ESPECÍFICOS

Demonstrar a necessidade e importância da utilização de efluentes


domésticos tratados na agricultura, um passo importante e estratégico na gestão
ambiental dos recursos hídricos para alavancar o desenvolvimento sustentável. Para
isto, esta pesquisa abrange os seguintes objetivos específicos:
 Mostrar os principais padrões de qualidade da água para o uso na irrigação;
 Estimar as potencialidades da alternativa do reúso da água para atendimento
complementar da demanda hídrica do setor agrícola;
 Identificar as necessidades do uso da água de reuso;
14

 Identificar oportunidades de ganhos em ecoeficiência e sustentabilidade para


a gestão hídrica, a partir do uso racional de águas superficiais e subterrâneas;
 Apresentar uma alternativa de redução do lançamento de efluentes
domésticos em cursos de água e a melhora da qualidade das águas naturais.

1.5 METODOLOGIA

O estudo foi realizado através de técnicas de coleta de dados por


documentação indireta subdividindo-se em pesquisa documental e pesquisa
bibliográfica.
A Pesquisa documental abrange a sistematização de informações a partir de
documentos (leis, portarias, legislações, etc.) disponíveis em arquivos públicos,
bibliotecas, sites da internet. Enquanto que a Pesquisa bibliográfica foi desenvolvida
entre os anos de 2012.2 a 2013.2: livros, artigos, revistas técnicas, jornais, etc.
15

2 REÚSO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS NA AGRICULTURA IRRIGADA

2.1 A ÁGUA E SUA UTILIZAÇÃO

O Brasil possui uma situação confortável comparada com outros países em


relação aos recursos hídricos. Entretanto, cerca de 80% de sua disponibilidade
hídrica se concentra na Região Hidrográfica Amazônica, conforme Figura 01, onde
se encontra menor contingente populacional (ANA, 2012, p. 27).

Figura 01 – Principais bacias hidrográficas do Brasil.

Fonte: Murilo Cardoso, 2012.

O crescimento demográfico, principalmente na área urbana, por conta do êxodo


rural, as formas de uso do solo e a revolução técnico-científica industrial provocaram
impactos ambientais negativos as componentes ambientais, como as águas naturais.
No âmbito dos recursos hídricos, a poluição das águas naturais e o aumento da
demanda equivalem ao custo de oportunidade1 do modelo de desenvolvimento vigente.
O uso sustentável dos recursos naturais é uma oportunidade de superação do
dilema entre a conservação e crescimento econômico, questão política crucial à

1
O custo de oportunidade é definido como a melhor maneira alternativa que tem de ser sacrificada quando escolhemos fazer algo
(DALY & JOSUA, 2004: p.43). Este deve ser considerado em relações aos limiares e a resiliência dos diversos sistemas ambientais.
16

sustentabilidade das sociedades humanas (RUSCBEINSKY, 2004). Por conta disso, a


sociedade civil organizada tem cobrado uma atenção ao consumo racional e
sustentável do capital natural. No âmbito dos recursos hídricos, uma maior importância
tem sido atribuída ao reúso da água em termos quantitativos e qualitativos.
Estudos divulgados pela Agência Nacional de Águas (ANA) aponta a irrigação
como maior responsável pelo consumo de água, detendo 72% da vazão total, tendo
2010 como ano-base. Portanto, este setor deve ser considerado como de maior
importância em termos de reuso de efluentes tratados.
A irrigação é estratégica para agricultura e a principal usuária de água, a qual
segundo o Censo Agropecuário 2006 (IBGE) a área irrigada compreendeu 4,45
milhões de hectares e comparando-se com os dois últimos censos agropecuários,
houve um aumento de 39,0% no número de estabelecimentos que declararam
utilizar irrigação e 42,0% no total da área irrigada no País. O valor estimado de área
irrigada em 2010 foi de 5,4 milhões de hectares, 20% superior ao estimado para
2006 (ANA, 2011).
O Gráfico 01 apresenta a demanda consuntiva2, a qual parte da água captada
é consumida no processo produtivo, não retornando ao curso de água fonte. O setor
agrícola possui a maior vazão consumida e maior relevância quanto à demanda
hídrica.

Gráfico 01 – Setor da comparação entre as demandas consuntivas no País.


Vazão Retirada Toral: 2.373 m3/s Vazão Consumida Total: 1.212 m3/s

Urbano Rural Animal Urbano Rural Animal


Irrigação Industrial Irrigação Industrial
7%
1%
9%
19% 24% 11%
1%
49% 7% 72%

1A 1B
1A. Percentuais por setores econômicos da vazão retirada total; e 1B. Vazão consumida total no País.
Fonte: ANA, 2012

2
O principal uso não consuntivo de água no Brasil é a do setor de hidroeletricidade. Neste setor, em novembro de 2008
chegaram à quantidade 1.042 Usinas Termoelétricas (UTE’s) (ANEEL, 2008).
17

Segundo CUTOLO (2009, p. 15) a escassez de recursos hídricos leva a


ponderar que as atividades agrícolas devem ser consideradas como prioritárias para
o reuso de efluentes domésticos passiveis de tratamento.
O homem necessita de água para seu metabolismo e sobrevivência e o que
produzimos precisa muito mais. A Figura 02 demonstra o quanto de água potável é
necessário para produzir itens do nosso cotidiano que já compramos prontos.

Figura 02 – A água que você não vê.

Fonte: Planeta Sustentável, Editora Abril, 2011.

Em 04 de maio de 2011 a Presidenta Dilma Rousseff cria a Secretaria


Nacional de Irrigação (SENIR), com políticas específicas para este setor, aprovada
pelo Decreto 7.472/2011.
O objetivo principal da SENIR é configurar um sistema de gestão para a
agricultura irrigada, com o desenvolvimento de regiões menos favorecidas, eficiência
na produção agrícola e erradicar a pobreza com a geração de emprego e renda. (MI,
2011).
18

2.2 MODALIDADES DE REÚSO DE ÁGUA

SANTOS (2006, p. 2) sugere um conjunto de terminologias para descrever as


diversas possibilidades de reúso de água. (Quadro 01).

Quadro 01 – Modalidades de reúso de água.


Aproveitamento Descrição
Reúso indireto Ocorre quando a água já utilizada é descarregada no meio ambiente, portanto
não planejado sendo diluída, e novamente utilizada a jusante de maneira não intencional.
Ocorre quando os efluentes, depois de convenientemente tratados, são
Reúso indireto descarregados de forma planejada nos cursos d’águas superficiais ou
planejado subterrâneas, para serem utilizados a jusante de forma intencional e controlada,
no intuito de algum uso benéfico.
Reúso direto Ocorre quando os efluentes, depois de convenientemente tratados, são
planejado encaminhados diretamente ao local de reúso.
Fonte: Modificado de SANTOS, 2006.

Além das modalidades descritas no Quadro 01, as águas de reúso


apresentam sua classificação conforme Quadro 02, baseadas nos usos, conforme
ABNT NBR 13969/1997.

Quadro 02 – Classes das águas de reúso.


Classe Reúso
Lavagem de carros; e Outros usos que requerem o contato direto do usuário com a
Classe 1
água, com possível aspiração de aerossóis pelo operador, incluindo chafarizes.
Lavagens de pisos, calçadas e irrigação dos jardins;
Classe 2
Manutenção dos lagos e canais para fins paisagísticos, exceto chafarizes.
Classe 3 Reúso nas descargas dos vasos sanitários.
Reúso nos pomares, cereais, forragens, pastagens para gados; e
Classe 4
Outros cultivos através de escoamento superficial ou por sistema de irrigação pontual.
Fonte: ABNT NBR 13969, 1997.

2.3 REÚSO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS

Devido à escassez cada vez mais de água potável, bem mais precioso e
necessário a toda vida existente na Terra, o homem tem se preocupado em
desenvolver tecnologias de como lidar com tal situação, tendo como uma promissora
solução o seu reúso, pois utilizaríamos de água de qualidade inferior (efluentes
domésticos) para usos que a tolerem.
A água de reúso é imprópria para o consumo humano devido aos riscos
associados à saúde, mas os seus usos atendem diversos propósitos tais como,
geração de energia, lavagem de ruas, torres de resfriamento, lavagem de veículos,
19

combate a incêndio, irrigação de campos de esportes, parques, jardins, cemitérios,


agricultura, etc.
A estratégia de reúso3 da água é uma promissora alternativa a demanda hídrica
que permite o ganho ambiental e econômico, ou seja, de ecoeficiência, para a gestão
sustentável dos recursos hídricos, uma vez que se utiliza complementariamente a água
de qualidade inferior, a exemplo dos efluentes domésticos, para fins que a tolerem.
Uma grande vantagem da utilização de técnicas para tais fins é a preservação
e minimização da água potável, deixando-a exclusivamente para atendimento de
necessidades que exigem sua potabilidade, como o consumo humano e
dessedentação de animais.
Em 1973 a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou suas primeiras
diretrizes sanitárias sobre o uso de águas residuárias, constantemente atualizadas
(WHO, 1973; WHO 1989; WHO, 2006a, b apud SANTOS, 2006 p. 5).
A Resolução nº 54 do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), de
28 de novembro de 2005 estabelece modalidades, diretrizes e critérios gerais para a
prática de reúso direto não potável de água, e dá outras providências.
Toda e qualquer forma de reúso de efluentes deverá passar por algum tipo de
tratamento. SANTOS (2006, p. 63-73) apresentou uma proposta de agrupamento
para as tecnologias de tratamento de efluentes. Esta proposta abrange os seguintes
grupamentos, partindo das mais simples às mais mecanizadas:
 Lagoas de Estabilização: Lagoa Facultativa; Lagoa Anaeróbia + Lagoa
Facultativa; Lagoa Aerada Facultativa; e Lagoa Aerada de Mistura Completa
+ Lagoa de Decantação;
 Disposição de efluentes no solo: Escoamento Superficial; e Terras Úmidas
Construídas;
 Reatores anaeróbios: Sistema Tanque-Séptico + Filtro Anaeróbio (TS+FAn); e
Reator Anaeróbio de Fluxo Ascendente e Manta de Lodo (UASB);
 Reatores anaeróbios + pós-tratamento: Reatores UASB + Filtro Biológico
Percolador; Reatores UASB + Lodos Ativados; Reatores UASB + Biofiltro
Aerado Submerso; e Reatores UASB + Lagoas de Polimento.

3
O reúso ou reaproveitamento é um processo pelo qual as águas servidas passam por um tratamento ou não, a depender
de sua utilização, para o mesmo ou outros fins.
20

2.4 O ESGOTO DOMÉSTICO E SUAS CARACTERÍSTICAS

O esgoto doméstico, também chamado de efluente doméstico, segundo a


norma brasileira NBR 9648 (ABNT 1986) é o “despejo líquido resultante do uso da
água para higiene e necessidades fisiológicas humanas”. O mesmo é gerado a partir
das águas provenientes para o abastecimento humano tendo sua medida dada pela
taxa de consumo per capita. Para MARTINELLI (2011, p. 37), é usual a taxa de
200L/hab./dia variável segundo hábitos e costumes locais.
A composição dos esgotos sanitários podem conter os mais variados
organismos patogênicos e em concentrações elevadas, dependendo de sua origem
podem também conter agentes químicos (SANTOS, 2006, p. 17). Segundo dados do
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES, 1998), 65% das
internações hospitalares de crianças menores de 10 anos estão associadas à falta
de saneamento básico.
O esgoto doméstico é um líquido com composição variada, a qual é estimada,
quando não contem resíduos industriais, conforme apresentada pela Tabela 01.

Tabela 01 – Composição dos efluentes domésticos que não contêm resíduos


industriais. Dados primários obtidos a partir de MARTINELLI (2011, p. 43).
Material Percentual (%)
Água 99,87
Sólidos sedimentáveis 0,04
Sólidos não sedimentáveis 0,02
Substâncias dissolvidas 0,07
Total 100
Fonte: Modificado de MARTINELLI, 2011.

O Gráfico 02 mostra o conteúdo relativo de sólidos sedimentáveis e não


sedimentáveis e de substancias dissolvidas dos efluentes domésticos, que não
contêm resíduos industriais.
21

Gráfico 02 – Composição dos resíduos do esgoto doméstico.

Sólidos Sedimentáveis
31%
Sólidos Não Sedimentáveis
54%
15% Substâncias Dissolvidas

Fonte: MARTINELLI, 2011.

Para MARTINELLI (2011, p. 189), cerca de 75% desses sólidos são


constituídos de matéria orgânica em processo de decomposição onde proliferam
microrganismos. Podem ainda ocorrer poluentes tóxicos como fenóis e metais
pesados.
O Quadro 03 apresenta uma ideia da constituição qualitativa dos esgotos
domésticos:

Quadro 03 – Composição dos esgotos domésticos.


Tipos de substâncias Origem Observações
Sabões Lavagem de louças e roupas -
A maioria dos detergentes contém
Detergentes (podem ser ou
Lavagem de louças e roupas o nutriente fósforo na forma de
não biodegradáveis)
polifosfato.
Cada ser humano elimina pela
Cloreto de sódio Cozinhas e urina humana
urina de 7 a 15 gramas/dia.
Cada ser humano elimina, em
Fosfatos Detergentes e urina humana
média, pela urina, 1,5 gramas/dia.
Sulfatos Urina humana -
Carbonatos Urina humana -
Cada ser humano elimina de 14 a
Ureia, amoníaco e ácido úrico Urina humana
42 gramas de ureia por dia.
Gorduras Cozinhas e fezes humanas -
Vão se constituir na porção de
Substâncias córneas,
matéria orgânica em
ligamentos da carne e fibras Fezes humanas
decomposição, encontrada nos
vegetais não digeridas
esgotos.
Porções de amido (glicogênio,
glicose) e de proteicos
Fezes humanas Idem
(aminoácidos, proteínas,
albumina)
Urobilina, pigmentos hepáticos
Urina humana Idem
etc.
Mucos, células de
Fezes humanas Idem
descamação epitelial
Vermes, bactérias, vírus,
Fezes humanas Idem
leveduras etc.
22

Continuação Quadro 03.


Tipos de substâncias Origem Observações
Areia: infiltrações nas redes
Outros materiais e de coleta, banhos em
substâncias: areia, plásticos, cidades litorâneas, parcela
cabelos, sementes, fetos, de águas pluviais etc. -
madeira, absorventes Demais substancias são
femininos etc. indevidamente lançadas nos
vasos sanitários
Água - 99,9%
Em termos elementares, o esgoto doméstico contém:
C H O N P S etc.
Outros
Carbono Hidrogênio Oxigênio Nitrogênio Fósforo Enxofre
microelementos
Fonte: MARTINELLI (2011, p. 190).

Dependendo de sua origem os esgotos podem também conter agentes


químicos, alguns de toxidade relevante e outros de padrão de ocorrência e
significado à saúde ainda pouco conhecido (os chamados químicos
emergentes, tais como os disruptores endócrimos e os resíduos
farmacêuticos). (SANTOS, 2006, p. 17).

Segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento realizada em 2008 pelo IBGE,


pouco mais da metade dos municípios brasileiros (55,2%) tinham serviço de
esgotamento sanitário por rede coletora (PNSB, 2010, p. 40).
Geralmente seu destino final, denominado como corpo receptor, na maioria
dos casos, dar-se em cursos d’água, lagoas, oceano e até mesmo diretamente no
solo.
Os baixos índices de coleta e tratamento dos esgotos contribuem para o
agravamento dos problemas relacionados com a incidência de doenças de
veiculação hídrica além de comprometer a qualidade das águas superficiais
inviabilizando o uso deste recurso (ANA, 2012, p. 67).
A Tabela 02 demonstra o percentual de esgoto tratado em relação ao volume
de esgoto produzido no Brasil.

Tabela 02 – Volumes de esgotos domésticos urbanos produzidos e tratados e o


percentual de tratamento de esgoto doméstico urbano.
Indicador 2000 2008
3
Volume de esgoto produzido (m /dia)* 24.830.162 28.249.154
3
Volume de esgoto tratado (m /dia) 5.137.171 8.460.590
Percentual de esgoto tratado em relação
20,67 29,94
ao volume de esgoto produzido (%)
Fonte: IBGE: Censo Demográfico (2000); Contagem da População de 2007 e PNSB (2000 e 2008).
Nota: * estimado com base na população urbana do País em 2000 e em 2008. A população de 2008
foi estimada a partir da Contagem da População de 2007.
23

2.5 POLUIÇÃO DOS CORPOS HÍDRICOS POR ESGOTOS DOMÉSTICOS

Quando o esgoto doméstico é lançado in natura no meio aquático, o mesmo


afeta a sobrevivência dos seres vivos aquáticos, diminuindo o oxigênio dissolvido,
exalando gases malcheirosos e a contaminação de animais e humanos quando em
contato com essa água, inviabilizando também o seu uso para dessedentação de
animais.
A Tabela 74 da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) 2008 (ver
Anexo 01), o Brasil possuía 3.909 pontos de lançamentos em cursos d’água
permanentes, 886 em cursos d’água intermitentes, 153 no mar e 524 em lagoas
(PNSB, 2010).
Os despejos destes esgotos nos corpos hídricos ocasionam a eutrofização do
meio aquático, processo pelo qual a grande carga de matéria orgânica (nutrientes)
lançada, tais como nitrogênio, fósforo e potássio, ocasiona o crescimento excessivo
de plantas aquáticas, gerando uma camada densa na superfície da água impedindo
a penetração da luminosidade. Este processo impede a realização da fotossíntese
nas camadas mais profundas, reduzindo o oxigênio dissolvido e impactando a
respiração de peixes e animais aquáticos e por consequência a morte dos mesmos.

2.6 QUALIDADE DA ÁGUA DE REÚSO PARA IRRIGAÇÃO

A qualidade da água para agricultura contempla um conjunto de


características físicas, químicas e biológicas. Habitualmente as análises que se
realizam na água são: pH (acidez ou alcalinidade), a salinidade tal como
condutividade elétrica ou total de sais dissolvidos, íons: sódio, cálcio, magnésio,
cloretos, sulfatos, carbonatos e bicarbonatos, além dos nutrientes tais como nitrato
(NO3− ), amônia (NH3), fosfato (PO4-3) e potássio, boro e razão de absorção de sódio
(ALMEIDA, 2010).
No Brasil não possui uma norma especifica para o uso de águas provenientes
de Estação de Tratamento de Esgotos (ETE’s) para a irrigação na agricultura.
24

Para MARTINELLI (2011, p. 518), “o exame da qualidade de água para


agricultura irrigada deve levar, principalmente, em consideração”:
1) Efeitos no solo e sobre o desenvolvimento da cultura;
2) Efeitos sobre os equipamentos;
3) Efeitos sobre a saúde do irrigante e do consumidor de produtos irrigados.
Apesar de não termos normas para este tipo de uso, devemos seguir os
padrões estabelecidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA),
Resolução 430, de 13 de maio de 2011, onde dispõe sobre as condições e padrões
de lançamento de efluentes e a Resolução CONAMA 357, de 17 de março de 2005
que dispõe sobre a classificação dos corpos d’água.
SANTOS (2006) utilizou critérios de qualidade para o reúso agrícola, com
base nas diretrizes adotadas pela United States Environmental Protection Agency
(USEPA) nos Estados Unidos da America (EUA) e recomendadas pela OMS.
O critério da USEPA exige para a irrigação irrestrita, ou a irrigação por
aspersão em qualquer situação, um padrão de qualidade de efluentes semelhante
ao padrão de potabilidade da água (SANTOS, 2006, p. 34).

Quadro 04 – Diretrizes da USEPA para o uso agrícola de esgotos sanitários.


Tipo de irrigação e cultura Processo de tratamento
Culturas alimentícias não processadas comercialmente
Secundário + filtração +
Irrigação superficial ou por aspersão de qualquer cultura, incluindo
desinfecção
culturas a serem consumidas cruas
Culturas alimentícias processadas comercialmente
Irrigação superficial de pomares e vinhedos Secundário + desinfecção
Silvicultura e irrigação de áreas com acesso restrito público
Culturas não alimentícias
Secundário + desinfecção
Pastagens para rebanhos de leite, forrageiras, cereais, fibras e grãos
Fonte: SANTOS, 2006.

A análise microbiológica da água de rotina não deve ser baseada no isolamento


e na identificação de microrganismos patogênicos, mas na detecção de microrganismos
cuja presença na água indica à possível presença de microrganismos patogênicos.
Para PELCZER et al (1997) os microrganismos indicadores da qualidade da água, a
exemplo dos coliformes (Tabela 03), sugere a presença de patógenos por conta da
poluição por materiais fecais de origem humana ou de outros animais homeotérmicos.
25

Tabela 03 – Período de sobrevivência de patógenos nos efluente em função da


temperatura.
Tempo médio de sobrevivência no ambiente (dias)
1
Organismos Temperatura
Clima temperado (10 – 15ºC) Clima tropical (20 – 13ºC)
Vírus < 100 < 20
Bactéria:
Salmonela < 100 < 30
Cólera < 30 <5
2
Coliformes fecais < 150 < 50
Protozoário:
Cistos de ameba < 30 < 15
Helmintos:
Ovos de ascaris 2 – 3 anos 10 – 12 meses
Ovos de tênias 12 meses 6 meses
Fonte: DAMASCENO, 2003.
1
Quando exposto diretamente ao sol, o período de sobrevivência é mais curto.
2
Os coliformes fecais são bactérias comensais de intestino humano e utilizadas como organismos
patogênicos indicadores.

A bactéria Escherichia coli, pertencente ao grupo dos coliformes termotolerantes,


é o microrganismo indicador da qualidade da água usado pelos Estados Unidos, porque
abrange características de um indicador ideal de poluição (PELCZAR, et al.,1997).
Outras bactérias indicadoras são Streptococcus faecalis e Clostridium perfringens,
pertencentes à flora normal do intestino humano e de outros animais homeotérmicos.
Obriga-se ao reúso de efluentes, ou esgotos, na irrigação de culturas agrícolas
tratamento prévio nas ETE’s para que sejam evitadas fontes de poluição dos solos,
dos corpos hídricos e patógenos causadores de problemas sanitários e de saúde
ambiental. Deste modo, evita-se igualmente a eutrofização4 dos corpos hídricos, pois
os microrganismos são os principais responsáveis pela degradação da matéria orgânica
e pela decomposição de substâncias químicas indesejáveis (PELCZAR et al, 1997).
A alternativa do reúso de esgotos domésticos na agricultura irrigada
representa uma alternativa da engenharia ambiental, no contexto da prevenção a
saúde e da economia de recursos, ao gerenciamento hídrico e para o saneamento.

2.7 UTILIZAÇÃO DO REÚSO NA AGRICULTURA

O reúso de efluentes domésticos não é um conceito novo, pois relatos


demonstram sua prática desde a Grécia Antiga com utilização na irrigação. Este
4
Processo normalmente de origem antrópica (provocado pelo homem), ou raramente de ordem natural, tendo como
princípio básico a gradativa concentração de matéria orgânica acumulada nos ambientes aquáticos.
26

conceito tem aumentado principalmente nas regiões áridas e semi-áridas devido a


precipitação não cobrir as demandas para o cultivo irrigado.
Além de manter a qualidade ambiental e reduzir a demanda de água potável,
oferece também à comunidade uma oportunidade de diminuir a descarga destes
efluentes nos corpos hídricos.
Durante as duas últimas décadas, o uso de esgotos para irrigação de culturas
aumentou, significativamente, devido aos seguintes fatores (HESPANHOL, 2002):
 Dificuldade crescente de identificar fontes alternativas de águas para
irrigação;
 Custo elevado de fertilizantes;
 A segurança de que os riscos de saúde pública e impactos sobre o solo são
mínimos, se as precauções adequadas são efetivamente tomadas;
 Os custos elevados dos sistemas de tratamento, necessários para descarga
de efluentes em corpos receptores;
 A aceitação sócio-cultural da prática do reuso agrícola; e
 Reconhecimento, pelos órgãos gestores de recursos hídricos, do valor
intrínsico da prática.
Para a utilização dos efluentes domésticos tratados na irrigação de
agricultura, devemos levar em conta suas características microbianas e bioquímicas
segundo as normas de saúde pública. Deve-se levar em consideração também o
tipo de cultura, tipo do solo e forma pela qual se consumirá o produto. Na maioria
dos casos, utiliza-se o tratamento biológico e remoção de sólidos grosseiros.
Se não utilizado de forma controlada esta prática, poderão ocasionar efeitos
diversos nas plantas, incluindo alterações nas concentrações de nutrientes, no
rendimento e na qualidade das culturas (SANTOS, 2006, p. 222).
MARTINELLI (2011, p. 524) cita ainda que, “alguns países dispõem de
diretrizes e/ou normas para o uso de efluentes na agricultura” como: os Critérios do
Estado da Califórnia, nos EUA; as Diretrizes de Engelberg, Suiça; as Normas para o
Estado de Israel; as definições de risco para irrigação em regiões áridas do Peru e
suas concentrações máximas recomendadas.
27

SANTOS (2006, p. 42) recomenda alguns requisitos de qualidade da água de


interesse agrícola que devem ser considerados:
I. O potencial fertilizante dos esgotos sanitários, procurando-se o melhor
balanço possível entre a demanda e a oferta de água e nutrientes;
II. Os efeitos da qualidade da água sobre o solo e as plantas, tais como o
potencial de salinização e de comprometimento da capacidade de
infiltração do solo, ou a toxidade à íons específicos;
III. O potencial de contaminação da água subterrânea; e
IV. Os problemas nos sistemas de irrigação.
Segundo HESPANHOL (2002), “estudos efetuados em diversos países
demonstraram que a produtividade agrícola aumenta significativamente em sistemas
de irrigação com esgotos adequadamente administrados” conforme Tabela 04.

Tabela 04 - Relação entre o aumento da produtividade agrícola (ton./ha/ano) e a


destinação de efluentes domésticos na irrigação.
Trigo Feijão Arroz Batata Algodão
Irrigação efetuada com a a a a a
8 anos ( ) 5 anos ( ) 7 anos ( ) 4 anos ( ) 3 anos ( )
Esgoto Bruto 3,34 0,90 2,97 23,11 2,56
Efluente primário 3,45 0,87 2,94 20,78 2,30
Efluente de lagoa de
3,45 0,78 2,98 22,31 2,41
estabilização
Água + NPK 2,70 0,72 2,03 17,16 1,70
Fonte: HESPANHOL, 2002.
a
( ) – Numero de anos para cálculo da produtividade média.
Resultados experimentais efetuados em Nagpur, India, pelo Instituto Nacional de Pesquisas de
Engenharia Ambiental (NEERI), que investigou os efeitos da irrigação com esgotos, sobre as culturas
produzidas.

Sistemas de reúso de efluentes domésticos adequadamente planejados e


administrados trazem benefícios ambientais e de condições de saúde pública, entre
as quais (HESPANHOL, 2002):
 Evita a descarga de esgotos em corpos de água;
 Preserva recursos subterrâneos, principalmente em áreas onde a utilização
excessiva de aquíferos provoca intrusão de cunha salina ou subsidência de
terrenos;
 Permite a conservação do solo, através da acumulação de “húmus” e
aumenta a resistência à erosão;
28

 Contribui, principalmente em países em desenvolvimento, para o aumento da


produção de alimentos, elevando, assim os níveis de saúde, qualidade de
vida e condições sociais de populações associadas aos esquemas de reúso.
HESPANHOL (2002) cita também os métodos básicos de irrigação aplicados
aos esgotos tratados:
 Por inundação ou por canais laterais, molhando praticamente toda a
superfície do solo;
 Por sulcos, molhando apenas uma pequena parte da superfície do solo;
 Por aspersores, fazendo com que o solo e as culturas sejam molhados de
maneira semelhante ao que ocorre durante chuvas;
 Por irrigação sub-superficial, na qual apenas uma pequena porção do solo é
molhada, mas permitindo a saturação do sub-solo; e
 Por irrigação localizada (gota a gota, exsudação em mangueiras plásticas e
“bubbler”), na qual a água é aplicada a cada planta, individualmente, e a uma
taxa ajustável.
Não podemos deixar de esquecer que a irrigação através do reúso possui
outros propósitos tais como: realizar o tratamento complementar do efluente,
valorizar este subproduto e aproveitar os nutrientes contidos neste efluente
(SANTOS, 2006, p. 212).
Embora o reúso de efluentes domésticos esteja relacionado ao
aproveitamento dos recursos hídricos, estudos de Viabilidade Técnica e Econômica
deverão ser realizados de modo a verificar qual o custo para tal implantação.
Sempre haverá um investimento inicial para que atinjam tais benefícios.
Pesquisas e estudos realizados mostram resultados da irrigação com reúso,
onde o mesmo iguala-se ou foram superiores à irrigação convencional com
adubação química (SANTOS, 2006, p. 225-227).
Experimentos realizados na Universidade Federal do Ceará na cultura de
melancias foram avaliados em termos de qualidade microbiológica, qualidade físico-
química e sabor. Todos os frutos testados apresentaram ausência de coliformes e
Salmonella, não foi comprometida a qualidade dos frutos, pelo contrario, foi
proporcionado melhor sabor devido a valores elevados de sólidos solúveis totais e
pelo fato de menor a acidez total, mais doce é o fruto. (SANTOS, 2006, p. 231-233).
29

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante a pesquisa, verificou-se que a poluição dos mananciais compromete


o nível das águas de forma qualitativa, restringe o uso para abastecimento humano,
animal, e até mesmo industrial, limitando o seu uso para irrigação e pesca, além de
inviabilizar o seu uso para lazer, esporte e recreação.
Segundo as referências consultadas, o reúso de efluentes tratados na agricultura
possui um papel fundamental no gerenciamento dos recursos hídricos como um
substituto para atendimento da grande demanda hídrica do setor agrícola e de
nutrientes dissolvidos para as culturas. Esta estratégia pode fomentar a redução do
custo de produção e o aumento da produção pelo aporte de matéria orgânico e
nutriente, essenciais ao desenvolvimento das plantas.
Esta alternativa pode representar um mecanismo de desenvolvimento mais limpo
(MDL) se compuser o planejamento integrado dos recursos hídricos e socioambiental e
econômico do setor agrícola. Entretanto, um programa de reúso dos efluentes
domésticos exige um tratamento em ETE e rígido controle da qualidade para as
especificidades agrícolas, programa de gerenciamento ambiental e investimento inicial.
Programas de sucesso do reúso de efluentes domésticos na agricultura são
conhecidos em países a exemplo dos Estados Unidos, da Suíça, Israel e do Peru.
No Brasil, o sucesso e a aceitação ambiental e socioeconômica desta promissora
alternativa de engenharia para o gerenciamento hídrico e saneamento, depende de
pesquisas científicas e experiências piloto em escalas local e regional, da sua
regulamentação técnico-normativa e integração na política nacional do meio ambiente.
O programa de reúso de efluentes domésticos pode apresentar extrema
relevância nas regiões semi-áridas do país, em especial como tecnologia social de
convivência com a semi-aridez, especialmente em anos de seca meteorológica.
Portanto, a assunção desta estratégia de engenharia pode ser importante para o
desenvolvimento humano local, a segurança alimentar e a segurança hídrica nacional.
Esta pesquisa contribuiu para a discussão de uma promissora oportunidade para
o gerenciamento hídrico e para o saneamento, de relevância científica, econômica e
ambiental. Para tanto, recomenda-se uma revisão mais ampla das experiências
internacionais sobre a aceitação e a viabilidade socioeconômica, técnica e ambiental.
30

REFERÊNCIAS

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Brasil: informe 2012. Ed. Especial. Brasília: ANA, 2012.

____________. Conjuntura dos recursos hídricos no Brasil: informe 2011. Brasília:


ANA, 2011.

ALMEIDA, Otávio Álvares de. Qualidade da água de irrigação. Cruz das Almas:
Embrapa Mandioca e Fruticultura, 2010.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9648: Estudo de


concepção de sistemas de esgoto sanitário. Rio de Janeiro: ABNT, Nov. 1986.

____________. NBR 13969: Tanques Sépticos – Unidades de tratamento


complementar e disposição final dos efluentes líquidos – Projeto, construção e
operação. Rio de Janeiro: ABNT, Set. 1997.

ATLAS de Energia Elétrica do Brasil / Agência Nacional de Energia Elétrica. 3. ed. -


Brasília: ANEEL, 2008.

CONSERVAÇÃO e Reúso de Água: Manual de Orientações para o Setor Industrial.


São Paulo: FIESP / CIES. v.1.

CUTOLO, Silvana Audrá. Reúso de águas residuárias e saúde pública. São


Paulo: Annablume; Fapesp, 2009.

DAMASCENO, Lisânea Mycheline Oliveira. Fertirrigação com efluente doméstico


tratado no cultivo de gérbera com e sem suplementação mineral. Campina
Grande, 2008. 120 f. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Campina
Grande, 2008.

HESPANHOL, Ivanildo. Potencial de Reuso de Água no Brasil. Agricultura, Industria,


Municípios, Recarga de Aquíferos. RBRH - Revista Brasileira de Recursos
Hídricos, São Paulo, v. 7, n. 4, p. 75-95, out./dez. 2012.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Agropecuário


2006. Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: IBGE,
2009.

____________. Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2008. Rio de Janeiro:


IBGE, 2010.

MARTINELLI, Alexandre [et.al]. Esgoto Sanitário: coleta, transporte, tratamento e


reúso agrícola. 2 ed. São Paulo: Blucher, 2011.

PELCZAR Jr, M. J; CHAN, E. C. S; KRIEG, N. R. Microbiologia: conceitos e


aplicações. Volume 2. 2ª ed. SP: Pearson Education do Brasil, 1997.
31

RUSCHEINSKY, A. (ORG). Sustentabilidade: uma paixão em movimento. Porto


Alegre: Sulina, 2004. In: No conflito das interpretações: o enredo da
sustentabilidade.

SANTOS, Maria de Lourdes Florêncio dos. Tratamento e utilização de esgotos


sanitários. Rio de Janeiro: ABES, 2006.
32

ANEXOS
Anexo 01 – Tabela 74 da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) 2008.

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