Você está na página 1de 5

Capítulo 2 – Mansão da Família Edwin

Marcus não conseguia tirar aquela cena da mente. Ele já havia matado muitas pessoas no
passado, mas nunca havia matado alguém puramente inocente. A memória ainda fresca do
velho implorando por sua vida sempre reaparecia para azucriná-lo.

Não apenas Marcus estava sendo importunado por aquele vislumbre, tanto Crowley quanto
Lucius tinham a mente em um turbilhão de pensamentos. Principalmente Crowley, se por
algum motivo isso viesse à tona no futuro, ele teria que ter alguma desculpa como forma de
escape.

Ele estava confiante que ninguém viu aquela cena, pois ele próprio checou o local, assim como
Lucius. Entretanto, o medo ainda existia em seu coração.

“Porra! O que eu fiz?!”

Não demorou muito para que uma solução surgisse em sua mente.

“Na verdade... Eu não fiz nada!”

Um sorriso demoníaco pairou no rosto de Crowley.

“Caso a situação chegue em um ponto irreversível, preciso apenas jogar a culpa para Marcus,
foi ele quem matou aquele lixo, não eu!”

Crowley visou a figura de Marcus, que estava atrás dele, o rapaz conseguia perceber como
aquela circunstância deixou-o chocado. Ele era uma ótima presa, definitivamente conseguiria
usá-lo como escudo.

“Hehe.” Crowley deixou escapar um riso baixinho.

Este riso quebrou um pouco o clima sombrio que se instalava em seus guardas, ambos
esqueceram por um segundo o que havia acontecido e prestaram atenção em Crowley, que
disse: “Não se preocupem. Ninguém descobrirá, e caso alguém descubra, quem terá a maior
perda será eu, e não vocês.”

Aquelas palavras deixaram uma grande impressão em Marcus, ele era quem estava mais
conturbado com a situação, e ouvir do jovem mestre que ele não precisava se preocupar era
reconfortante. Então, em um ato de coragem, Marcus focou-se o máximo possível para limpar
sua mente e entrar em vigia novamente. Lucius seguiu o exemplo de Marcus e também se
atentou em seu trabalho.

Antes de retornar ao silêncio convencional, Crowley abriu a boca mais uma vez, dizendo:
“Lucius, Marcus, quero que vocês me escoltem até o quarto. Assim que entrarmos lá, faremos
um banquete. Vocês passaram por muito hoje, nada mais justo do que recompensá-los.”

Aquela sentença alegrou bastante os dois guardas. Além de poderem ter a experiência divina
que era entrar na mansão, eles também ganhariam mais moral com os outros guardas e
poderiam até mesmo subir de posto para Guardas de Ouro, assim passando a receber um
salário maior.

Claro que esse convite tinha outras intenções para Crowley, ele queria tratar os dois de
maneira excepcional para que pudesse ter uma garantia com ambos. Assim eles ficariam em
débito com ele, e caso precise usar algum dos dois para um trabalho sujo, ou até mesmo para
descarte, ele teria mais chance de êxito.

Só tinha uma coisa que o incomodava, ele não queria realmente ter que descartar algum deles.
Tanto Lucius quanto Marcus eram peões extremamente úteis se fossem usados corretamente.

Marcus era um antigo Soldado de Elite do Reino de Zegrath, seu feito mais notável foi ter
ganho uma medalha de honra pela campanha de dominação contra o extinto Reino de
Dewbell. Ele conseguiu, com uma única tropa de quinze homens, saquear e destruir os
estoques de comida do Reino inimigo, fazendo com que eles recuassem e fossem pressionados
pelo exército de Zegrath. Isso impactou muito para que Zegrath tivesse uma vitória
esmagadora contra Dewbell.

Lucius também não ficava para trás. Ele não tinha um feito tão importante quanto Marcus,
mas ele também levava créditos por ser um ex-comandante do exército de Zegrath. Ele já
chegou a comandar uma tropa de dez mil soldados.

Um soldado capaz de feitos absurdos e um gênio estrategista, os dois juntos se completavam.


Sendo assim, para Crowley, era uma situação muito difícil ter que descartar algum dos dois, e
ele realmente queria que esse dia nunca chegasse.

Depois de um tempo andando, eles finalmente chegaram em seu destino, a Mansão da Família
Edwin. Era uma residência extravagante, possuía muros enormes ao redor da casa, em cada
canto dos muros estava uma bandeira de fundo preto com um brasão vermelho em formato
de três coroas. Além disso, a área da mansão era enorme, se comparado com outras casas
daquela região, era possível dizer que uma Mansão da Família Edwin era comparável à dez
casas normais.

Um portão enorme de ferro separava a mansão do resto do mundo. Em frente ao portão havia
alguns guardas portando alabardas com cerca de dois metros de altura. Era uma visão
pavorosa para quem passasse por ali, apenas com o peso da alabarda já era suficiente para
fazer um estrago considerável em alguém.

Crowley se aproximou do portão e tirou um talismã do mesmo saco onde guardava as moedas
de prata. Originalmente, o talismã era apenas um pedaço de metal escuro, entretanto, quando
Crowley apontou o talismã para o portão, o símbolo do brasão da Família Edwin apareceu
irradiando uma luz vermelha fortíssima.

O portão de ferro se abriu ao receber aquela luz em sua direção. Os guardas ao redor abriram
o caminho e se curvaram para Crowley, dizendo em uníssono: “Seja bem-vindo, Jovem
Mestre!”

Crowley apenas continuou caminhando, com Lucius e Marcus atrás dele. A cena de Lucius e
Marcus adentrando no interior da Mansão foi chocante para os outros guardas, era conhecido
que os guardas não deveriam, de maneira alguma, entrar na Mansão.

Um dos guardas que estava curvado disse com grande energia: “Marcus, Lucius, voltem!”

Crowley olhou para aquela tentativa do guarda e disse: “Eles estão comigo, cale a boca e faça
seu trabalho.”

O guarda se surpreendeu com a receptividade de Crowley e tentou novamente: “M-Mas,


Jovem Mestre, os guardas não podem...” Antes que ele conseguisse finalizar sua frase, Crowley
disse com um tom arrogante: “Eu já não falei para você calar a boca? Entenda algo, desde que
eu diga poucas palavras, você perderá seu emprego e sua miserável família voltará para a
pobreza que se encontrava antes de começar a trabalhar aqui.”

*Gulp* O guarda engoliu seco.

Ele percebeu que Crowley estava mal humorado e se curvou novamente: “Meu sincero
perdão, Jovem Mestre!”

Crowley apenas bufou e seguiu seu caminho. Um barulho pôde ser ouvido atrás deles, que era
do portão externo fechando. Logo em seguida, Crowley abriu o portão interno, que era feito
de madeira escura. A visão seguinte chocou tanto Marcus quanto Lucius de maneira
exponencial, a Mansão era muito mais extravagante por dentro do que por fora. Nas paredes,
vários quadros famosos estavam pendurados. Em alguns lugares haviam esculturas feitas por
artistas lendários. Até mesmo os vasos das plantas eram chiques, muitos eram cobertos por
ouro e diamantes.

Somente nessa entrada, já era possível dizer que havia mais dinheiro em decoração nessa casa
do que grande parte do dinheiro que era movimentado pela cidade. Crowley percebeu que
seus dois guardas estavam extasiados e tentou acalmar um pouco os dois: “Por favor, fiquem à
vontade. Vocês estão em minha residência...” ao lembrar da cena de momentos atrás com o
outro guarda, eles não ousaram desobedecer às ordens de Crowley e logo colocaram suas
mentes no lugar.

Crowley seguiu até a cozinha da mansão, chegando lá, ele disse para uma das empregadas:
“Elizabeth, por favor, faça três pratos usando carne de cordeiro, deixo a escolha do corte com
você.”

Elizabeth se chocou com aquele pedido, usar carne era algo muito raro, pelo fato de ser um
material muito caro. No Reino de Zegrath não havia fazendas com animais, isso significava que
para comer carne, deveria ter que fazer um pedido de importação para um Reino vizinho. Isso
inflacionou em muito o preço da carne por essas regiões.

Dessa forma, ver o Jovem Mestre pedindo três refeições utilizando carne era algo no mínimo
inusitado. Ela faria de tudo para cumprir seu trabalho da melhor forma possível.

Em seguida, Crowley foi até seu quarto, que ficava no segundo andar. Ele abriu a porta e
deixou os dois entrarem na frente, como sinal de respeito. Novamente, os dois ficaram
chocados. Aquele quarto era quase uma casa em tamanho e tinha de tudo dentro, cama,
mesa, armários, até mesmo centenas de livros estavam ali.

Crowley pegou as sacolas com as garrafas da mão de Lucius e tirou o conteúdo da embalagem,
guardou uma em um dos armários e colocou a outra em cima da mesa. Em sequência, abriu
outro armário e pegou três taças de cristal e também as colocou sob a mesa. Com um
movimento límpido, derramou o vinho nas taças em uma quantia razoável e chamou os dois
para sentar.

Por um breve momento, um pequeno receio passou por eles, mas Crowley insistiu: “Por favor,
sentem-se. Eu imploro.” Apenas depois de se sentirem confortáveis com isso que eles foram
até a mesa e se sentaram.
Nesse momento, Crowley disse calmamente: “Aguardem alguns minutos, não deve demorar
muito até que Elizabeth nos traga a refeição. Enquanto isso, por que não me contam sobre
suas histórias no campo de batalha?”

Os dois se surpreenderam ao ouvir as palavras do Jovem Mestre. Eles tinham certeza que ele
não gostava de assuntos militares. Mas já que ele pediu para que contassem, os dois não
recusariam.

Lucius começou: “Eu era um Comandante de nível três, responsável por uma tropa de dez mil
soldados. Muitas batalhas em que participei o Reino ganhou de forma unilateral. Uma delas
em específico, eu pude colocar meu máximo no campo de batalha. Nós dividimos a tropa dez
mil soldados em dez tropas de mil soldados e colocamos cada tropa para fazer funções
diferentes no campo. Entretanto, uma delas seguiu um rumo considerado aleatório para os
inimigos. O que eles não esperavam era que essa tropa desencadearia o papel principal de
matar o General inimigo.”

Crowley fingiu um olhar interessado e disse: “Oh... Como eles conseguiram tal feito?”

Lucius continuou: “Enquanto os outros nove grupos iam para diferentes locais no campo de
batalha, auxiliando as tropas principais, o décimo grupo foi para a mata ao redor, lá, eles
formaram dois grupos, um de dez pessoas e outro de novecentas e noventa. Minhas ordens
foram que o grupo de dez se instalasse em uma vila afastada fingindo serem nômades,
enquanto o resto cuidava para que ninguém tentasse chegar perto do grupo principal. Como
as tropas inimigas estavam ocupadas tendo que lidar com os grupos de apoios e os grupos
principais, eles não conseguiram ir atrás do grupo principal e prever meu movimento.”

Nesse momento, Marcus interrompeu e disse: “Essa é a batalha de Elderglen?”

Lucius assentiu com a cabeça e disse: “Então você já sabe o que vem a seguir, não é?”

“Hahaha, com certeza!” Respondeu Marcus.

Crowley não pôde ficar calado e perguntou: “E então, o que é que aconteceu?”

Lucius retomou seu foco outra vez: “A vila que o grupo principal se hospedou era na verdade a
vila onde a primeira esposa do General inimigo, Magnus, vivia. Em uma das noites em que ele
foi visita-la para ter uma relação, o pequeno grupo de dez executou os dois. Nesse momento, a
guerra já havia sido vencida por nós. Sem chance dos nossos inimigos retomarem a força que
tinham anteriormente.”

Crowley, que antes apenas fingia estar interessado agora estava de fato perplexo. Lucius era
alguém que conseguiu ludibriar um exército inteiro e matar a pessoa mais importante deles na
calada da noite. Isso era invejável. Ter alguém como ele ao seu redor era muito reconfortante,
caso ele consiga fazer que Lucius o siga fielmente, terá muitas chances de subir para o alto
escalão da Corte Interna do Reino de Zegrath, nesse ponto, ele já teria poder suficiente para
viver uma vida de regalias sem precisar se preocupar com nada.

Tendo um vislumbre do seu futuro magnifico, Crowley disse com um tom alegre: “Perfeito!
Você realmente é incrível, Lucius.”

Recebendo aquele elogio do Jovem Mestre, Lucius ficou envergonhado e alegre ao mesmo
tempo. Nunca em sua vida ele imaginaria que uma pessoa tão importante o elogiaria de tal
forma.
Depois de ouvir toda a história de Lucius, Crowley focou em sua verdadeira presa: “E você,
Marcus?”

Marcus abriu sua boca: “Vejamos...”

Entretanto, antes que Marcus conseguisse pensar em algo, batidas na porta foram ouvidas.
Crowley sabia quem era e disse: “Entre, Elizabeth.”

Você também pode gostar