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ÍNDICE

Contribuidores da obra
Introdução
I. O Que Cantaremos na Adoração a Deus?
II. O Cântico de Salmos na Adoração a Deus
III. Cristo em Todos os Salmos
IV. O Louvor do Santuário
V. Cante o Cântico do Senhor
VI. Louvor Terapêutico
VII. O Saltério é Suficiente?
VIII. A Presença Permanente de Cristo nos Salmos
IX. O Que Deve Acompanhar nossa Adoração a Deus?
Apêndice
Livros deste autor
As Canções do Espírito
A DOUTRINA DA SALMODIA EXCLUSIVA EXPLICADA

ORGANIZADO POR
KENNETH STEWART

As Canções do Espírito

A Doutrina da Salmodia Exclusiva Explicada

Arrependimento da Igreja e Reforma Escocesa

"Senhor, morro na fé de que Tu não deixarás a Escócia, mas que farás que o sangue das Tuas
testemunhas seja a sementeira da Tua Igreja; que retornes novamente e sejas glorioso em nossa
terra."
James Renwick (1662-1688), no cadafalso.
Copyright © 2014 pela Fé da Reforma Escocesa, exceto quando indicado de outra forma.
Os direitos autorais de cada artigo pertencem ao respectivo autor.
Todos os direitos reservados.
Primeira edição em brochura impressa em 2014 no Reino Unido.

Um registro de catálogo para este livro está disponível na Biblioteca Britânica.

ISBN 978-1-910013-00-7
Nenhuma parte deste livro deve ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico
ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou por qualquer sistema de recuperação de informação, sem autorização
por escrito do editor.
Publicado pela Fé da Reforma Escocesa .
Church Office, Muirpark Street, Glasgow G11 5NP.

Projetado por Alasdair Macleod.


Imagem de capa © Jupiter Images, 2014.
Santificamos o nome de Deus quando oferecemos a Ele uma adoração santa e espiritual.
1. Quando oferecemos a Ele o mesmo tipo de adoração que Ele ordenou. “Serei santificado
naqueles que se chegarem a mim, e serei glorificado diante de todo o povo” (Levítico 10:3). Isto
é: “Serei santificado com a mesma adoração que ordenei”. É a pureza na adoração que Deus
ama. Melhor do que a pompa.
Desonra Seu nome trazer para o culto qualquer coisa que Ele não instituiu; como se Ele não
fosse sábio o suficiente para apontar a maneira pela qual Ele deve ser servido. Homens dão
ordens a Ele e adicionam ainda mais às suas invenções, as quais Ele vê como oferta de fogo
estranho e como uma grande provocação.
2. Quando oferecemos a Ele a devoção sincera na adoração que Ele ordenou. “Fervorosos no
espírito, servindo ao Senhor” (Romanos 12:11). A palavra para fervoroso é uma metáfora que
alude à água que ferve; o que significa que nossas afeições devem ferver em santos deveres.
Oferecer a Deus uma adoração externa e não uma devoção do coração, ao invés de santifica-Lo,
insulta-O; como se alguém pedisse vinho e lhe fosse dado um copo vazio. É lidar com Deus
como Prometeus fez com Júpiter, ao comer a carne e presentear Júpiter com nada além do que
ossos cobertos de pele. Santificamos o nome de Deus numa ordenança quando oferecemos a Ele
o que é vital na religião e um coração flamejante de zelo.
Thomas Watson – The Lord’s Prayer [A Oração do Senhor] (1692).
CONTRIBUIDORES DA OBRA
Tradução: Joelson Galvão
Revisão: Gabrielle de Souza Macedo
Capa: Lidia Castaldi
Edição: Filipe Macedo

Agradecimento:

A Editora Caridade Puritana agradece aos irmãos do grupo "Publicações O Pacto" por terem nos
concedido esse material tão rico. Que Deus abençoe vocês nessa peregrinação. Agradecemos por
essa parceria!

PREFÁCIO
“E invoca-me no dia da angústia; eu te livrarei, e tu me glorificarás.”
Salmos 50:15

uando pensei primeiramente em patrocinar a impressão e distribuição desta coleção de


Q textos sobre os Salmos no culto, me lembrei de alguns irmãos que conheci durante anos
que expressaram a sua apreciação pelos Salmos — pelo saltério escocês, em particular.
Eles tiveram o privilégio de memorizar o saltério durante a infância. Alguns comentaram comigo
que quando suas mentes se desviam para outros lugares durante a oração, eles têm o costume de
recitar algumas palavras do saltério para voltar o foco da sua oração. Me lembro particularmente
de visitar uma senhora que estava no hospital e ela comentava comigo o quanto estava grata por
poder recitar o saltério metrificado como sua oração, porque a sua doença era tão severa que ela
era incapaz de orar de forma apropriada por ela mesma. Contudo, ela guardava as palavras dos
Salmos em sua memória por muitos anos. Ora, essa é uma experiência escriturística tremenda!
Um exemplo claro disso podemos também encontrar no livro de Jonas, no segundo capítulo,
onde ele se encontra na barriga do grande peixe. Durante sua oração, em oito versículos, ele cita
não mais que doze citações ou passagens paralelas do livro de Salmos.
Ouvindo todas essas experiências, comecei a meditar e valorizar o conteúdo de oração dos
Salmos, especialmente porque eles expressam a experiência e a necessidade humana que não
diferem tanto nos dias dos salmistas como nos nossos. Não esqueçamos que o nosso Deus
também permanece o mesmo.
Foi Thomas Watson quem disse: “A oração é nosso principal dever e traz o céu até o homem.
Não há nenhum dever como a oração que tenha tantas promessas associadas a ela, embora a
maioria delas seja condicional. Ela dá mais honra a Deus e traz mais bençãos de Deus". Bernard
chamou a oração de "a conquistadora daquele que é invencível". E Lutero disse que ela era
"onipotente". Admiro as palavras de John Bunyan sobre esse assunto, quando ele diz: “A oração
leva aqueles que têm o espírito de súplica a uma grande familiaridade com Deus. Aqueles que
oram recebem grandes coisas para si mesmos e para aqueles por quem oram. A oração abre o
coração de Deus e preenche a alma vazia. Por meio da oração, o cristão pode abrir seu coração a
Deus como a um amigo e obter um novo testemunho da amizade de Deus para com ele... A
verdadeira oração é sentida, suspirada, gemida e borbulha no coração quando algum fardo
pesado recai sobre ele ou quando algum doce sentimento de misericórdia recebida é apreciado.
Oh, o calor, a força, a vida, o vigor e a afeição que há na verdadeira oração!”
Ninguém pode privar um crente desse privilégio. Os Salmos estão lá para nos ajudar! Na prática,
será muito mais fácil memorizá-los na forma métrica, especialmente as versões clássicas
encontradas no saltério escocês de 1650. Essa coleção faz parte de nossa herança espiritual,
nacional e da reforma protestante. Ela não merece uma posição subordinada na adoração pública,
assim como não mereceu para as gerações que nos antecederam.
Hoje, a igreja cristã na Escócia, herdeira dessa gloriosa herança, está dolorosa e tragicamente
dividida. Valorizo a sabedoria de J. C. Ryle, quando escreveu sobre esse assunto: "As divisões
dos cristãos são uma das grandes causas da fraqueza da igreja visível. Elas frequentemente
absorvem energia, tempo e poder que poderiam ter sido bem empregados em coisas melhores.
Elas fornecem ao ímpio um argumento primordial contra a verdade do cristianismo. Essas
separações ajudam o diabo. De fato, Satanás é o principal promotor das divisões religiosas. Se
ele não pode extinguir o cristianismo, ele trabalha para fazer com que os cristãos briguem entre si
e para colocar a mão de cada homem contra o seu próximo. Ninguém sabe melhor do que o
diabo que "dividir é conquistar" (Expository Thoughts on Mark, 1985, pp.54-55).
Recentemente, desafiei um ministro presbiteriano devoto, altamente respeitado e experiente,
sobre a maldição das denominações, ao que ele respondeu que as denominações eram
abominações para o Senhor.
Vale a pena lembrar que, antes da época dessas divisões, a Igreja Reformada na Escócia usava os
Salmos como método exclusivo de louvor. Isso foi acompanhado de muita prosperidade
espiritual para nossa nação. Há uma conexão inegável entre a prosperidade espiritual e a
nacional. Talvez a falta dessa última, no momento, tenha algo a ver com nossa falha em buscar
sinceramente a glória de Deus na Escócia.
Desde que comecei a refletir sobre essas coisas, ouvi um sermão desafiador sobre o assunto:
"Que tipo de adoração devemos dar a Deus, aquela que o homem escolhe ou aquela que o
próprio Deus ordenou? Essa pergunta realmente resume toda a essência deste livro. Ela não
apenas desafia a responsabilidade individual e eterna que todos os crentes têm — especialmente
os líderes da Igreja de todas as denominações —, mas também não me deixou dúvidas de que
esta publicação é desejável e necessária para promover o arrependimento e a reforma na igreja
cristã de hoje.
Em nenhuma área as tendências de adoração de hoje são mais obviamente centradas no homem
do que no conteúdo do louvor cantado a Deus. Toda essa tendência é adequadamente criticada
pelo escritor cristão Warren Wiersbe: Muitos crentes individuais e congregações inteiras
imitaram Abraão e "correram para o Egito" para obter ajuda. Eles deixam de ser forasteiros,
perdem sua separação do mundo e começam a promover a imitação do mundo. Os santuários se
tornam teatros, os líderes de adoração se tornam artistas e todos ficam felizes, exceto o Senhor. A
Palavra de Deus e a oração são minimizadas, a música estrondosa é maximizada e o evangelho é
comercializado. Essa pode ser uma maneira de reunir uma multidão, mas será que é a maneira de
Deus glorificar Jesus Cristo e construir uma igreja? Considere o que Paulo escreveu no primeiro
livro aos Tessalonicenses 2: 1-7 e leve isso a sério. (Too Soon to Quit, 2010, p.20).
Foi para tentar fornecer ajuda nessa área, tanto para igrejas quanto para pastores, que incentivei a
publicação deste livro. Os oito capítulos incluídos na coletânea, juntos, constroem um argumento
poderoso para uma conclusão firme: que Deus ordenou que Ele fosse louvado nas palavras dos
Salmos divinamente inspirados e que esses Salmos são inteiramente suficientes para a adoração.
Sou e tenho sido pessoalmente abençoado por vivenciar o ensino sólido do evangelho ao longo
de muitas décadas, no entanto, os capítulos deste livro, ao lê-los, expuseram mais ignorância
espiritual em meu coração do que eu poderia ter suspeitado. Percebi que nunca havia apreciado
totalmente a importância de cantar Salmos — em oposição aos hinos de composição humana —
na adoração pública. Eu não tinha consciência do abismo de diferença entre os dois e da
seriedade da escolha que deveria ser feita. No entanto, ao pesquisar sobre o assunto do louvor na
igreja de forma abrangente, ficou claro para mim que minha ignorância pessoal não era isolada,
mas pode muito bem ser predominante em meu grupo de colegas e, em um grau ainda maior, nas
gerações que virão depois de mim.
Ao meditar e ponderar sobre a solenidade desta publicação no que se refere à pergunta:
"Adoramos a Deus de acordo com sua vontade e prazer ou de acordo com nossa própria
motivação humana?”. Eu oro especialmente pelo culto e para que os líderes da igreja sejam
desafiados por esta pergunta. Eles têm uma posição mais privilegiada, mas também têm
responsabilidade diante da congregação. As consequências de minha liderança, boas ou ruins,
terminarão com minha aposentadoria ou morte, o que o Senhor julgar apropriado. Mas a
responsabilidade da profundidade espiritual de cada líder de igreja é — para eles mesmos e para
seus seguidores — infinita, eterna e pode trazer sérias consequências. Devemos pensar e meditar
solenemente nisso. Esse tópico, de fato, merece compromisso com a oração.
Tenho a firme convicção de que o único padrão que importa é aquele usado por nosso Deus — o
nosso juiz — que avalia cada um de nós, incluindo a forma como o adoramos. Espero que, ao ler
este livro, você seja desafiado a considerar que a adoração que Deus aceita é aquela que Ele
determinou, não a que o homem escolhe. Esse princípio é igualmente verdadeiro para a reforma
da igreja cristã e, embora eu aceite que esse seja um assunto mais profundo e amplo, a
restauração do canto dos Salmos no culto público é, sem dúvida, um aspecto dessa reforma
necessária.
Como acontece com qualquer tarefa que eu me proponha ou que tenha sido proposta a mim,
comecei a buscar orientação divina sobre o assunto. Depois de algumas semanas, a inspiração
necessária veio do quarto capítulo de Hebreus, nos três primeiros versículos:
“Temamos, pois, que, porventura, deixada a promessa de entrar no seu repouso, pareça que
algum de vós fica para trás. Porque também a nós foram pregadas as boas novas, como a eles,
mas a palavra da pregação nada lhes aproveitou, porquanto não estava misturada com a fé
naqueles que a ouviram. Porque nós, os que temos crido, entramos no repouso, tal como disse:
Assim jurei na minha ira que não entrarão no meu repouso; embora as suas obras estivessem
acabadas desde a fundação do mundo.”
Algumas palavras contidas nestes versículos que ressoaram em mim foram "temor" e "ficar pra
trás" de uma promessa (e será que, por não usarmos os Salmos, estamos ficando pra trás de uma
promessa?). O temor do Senhor é um assunto raramente discutido na maioria dos círculos da
igreja, até no púlpito. A ira de Deus é um tabu. A verdade disso foi tristemente confirmada para
mim em um funeral recente em que o Salmo 90 foi lido como a "lição", mas os dois versículos
que contêm "ira" e "raiva" foram deliberadamente deixados de fora da leitura do salmo.
Desde então, conversei coletiva e individualmente com vários pastores evangélicos sobre a
ligação entre os "caminhos antigos" (conforme recomendado em Jeremias 6:16), o canto dos
salmos na adoração e a reforma da Igreja. Individualmente, sem exceção, todos concordaram
com a necessidade de reforma no culto, porém, da mesma forma — quando se tratava das
especificidades da implementação dessa reforma — todos divergiam. Para eles, a reforma tinha
de ser feita em seus termos individuais e, infelizmente, variados. Isso apenas refletia o fato dos
seus valores pessoais, espirituais e doutrinários serem tão variados.
Antes de me despedir de cada uma dessas reuniões amigáveis, perguntei aos pastores
individualmente como a lacuna entre a percepção deles da reforma e o padrão de Deus poderia
ser preenchida, já que Ele não faz concessões. Essa pergunta foi de parar a conversa! Foi
interessante que esses mesmos líderes da Igreja me disseram que, como grupo, não conseguiam
chegar a um acordo sobre um caminho a seguir, pois não conseguiam se unir em torno de um
único fundamento de prática no culto e, particularmente, no louvor. Era dolorosamente evidente,
até mesmo para um leigo, que a variedade de formas de adoração praticada pelas congregações
representadas só havia gerado confusão quanto ao que a Igreja deveria realmente ensinar.
Por isso, que sejamos guiados pelo ensinamento das Escrituras nessa área e em todas as outras:
“Assim diz o Senhor: Ponde-vos nos caminhos, e vede, e perguntai pelas veredas antigas, qual é
o bom caminho, e andai por ele; e achareis descanso para as vossas almas; mas eles dizem: Não
andaremos nele.” (Jeremias 6:16)

Rev. Donald Macdonald (1952 - 2019) - Free Presbyterian Church


INTRODUÇÃO
Kenneth Stewart

uestões relacionadas à teologia e à prática da adoração têm se tornado cada vez mais
Q problemáticas. Este tem sido o caso há algum tempo, mas tem sido assim especialmente
depois do crescimento de formas mais distintamente carismáticas de culto, de meados do
século XX em diante.
Esta ênfase carismática levou a um crescente impulso para fazerem-se mudanças nas igrejas mais
tradicionais e as igrejas presbiterianas da Escócia não são exceção - tanto é assim que agora está
se tornando cada vez mais raro encontrar igrejas que praticam o cântico de hinos com o
acompanhamento de um único instrumento musical, tal como um piano ou um órgão.
Em meio a tal transformação, é facilmente esquecido que na forma de adoração dos
presbiterianos originais não havia lugar para hinos ou instrumentos de maneira alguma! Para os
presbiterianos originais, o cântico dos louvores de Deus significava o cântico de Salmos sem
acompanhamento musical. Notavelmente, com exceção dos luteranos, esta era a prática das
igrejas da Reforma magisterial nas Ilhas Britânicas e no continente. Além do mais, ainda que
pareça surpreendente, eles adotaram esta prática com base em convicções bíblicas ao invés de
conveniência, alegando que era um retorno à adoração apostólica e histórica.
O declínio do presbiterianismo na Escócia é um assunto geralmente discutido, mas o papel
desempenhado neste declínio pelas alterações na adoração da igreja raramente é mencionado, se
é que de fato é. Porém, Deus é um Deus zeloso e se o cântico de Salmos sem acompanhamento
musical é, na verdade, o modo correto para a igreja se aproximar de Deus em adoração, e se essa
nação foi privilegiada o suficiente para conhecer e desfrutar de seus benefícios, então, não
deveria ser uma surpresa se o abandono desta prática tem sido a causa do desprazer de Deus com
a igreja e a nação.
O único caminho a seguir é voltar atrás. A resposta à confusão generalizada e apostasia reside na
recuperação de verdades que uma vez foram de todo o coração abraçadas – e, na verdade, juradas
– mas que agora estão, em grande parte, abandonadas e esquecidas. É a convicção de todos os
que contribuem com este livro que a recuperação do zeloso, inteligente e espiritual cântico dos
Salmos sem acompanhamento de instrumentos musicais no louvor da igreja é uma parte
importante do arrependimento e renovação tão necessários à igreja de hoje.
É claro que é preciso mais do que isso para o arrependimento. E mais do que isso precisa ser dito
sobre o culto em si. No entanto, essa questão tem de ser tratada antes do cântico de Salmos (sem
acompanhamento de instrumentos musicais) desaparecer – o que seria outro dentre os muitos
julgamentos de Deus sobre nossa terra.
I. O QUE CANTAREMOS NA
ADORAÇÃO A DEUS?

Uma Defesa do Cântico Exclusivo dos Salmos a Partir das Escrituras


Kenneth Stewart

INTRODUÇÃO

uitas pessoas que frequentam igrejas estão cientes das significativas mudanças no
M conteúdo e no estilo da adoração nos anos recentes – particularmente em relação aos
cânticos oferecidos a Deus como parte do culto.
É claro que é natural para a humanidade compor e cantar, e isto não é menos verdade no que diz
respeito à humanidade redimida ao compor e cantar louvores a Deus. O que é surpreendente, no
entanto, é o extraordinário aumento do número de músicas cristãs sendo escritas e cantadas
desde a metade do século XX. Não menos surpreendente é a facilidade com que estas músicas
entraram na adoração da igreja.
Numa área que muitos são, por muitas razões, instintivamente conservadores, este crescimento
tem provocado uma considerável reação – com base tanto em princípios quanto em gosto.
Porém, aqueles que estão a favor do desenvolvimento, geralmente repudiam esta reação como
“tradicionalismo” – e, para ser justo, eles têm um argumento: afinal de contas, não é
simplesmente verdade dizer – como muitos fazem – que os cânticos antigos são melhores. Às
vezes eles são, mas às vezes não. De qualquer maneira, é difícil aceitar que o mero fato de estar
presente por um longo tempo faz com que uma música de adoração tenha o seu lugar eterno,
competindo com outras de superior qualidade.
No entanto, a maioria das pessoas não consegue resolver as questões mais profundas – e é isto
que demonstra se elas são a favor da mudança ou não. Estas questões dizem respeito aos critérios
que devem ser aplicáveis quando se trata da escolha de quais músicas devemos usar na adoração
a Deus, primeiramente. Por exemplo, considere as seguintes perguntas:
"Quem deve escrever as canções de adoração da igreja? Quem deve decidir se são adequadas
para o uso? Quem deve decidir quais músicas devem ser cantadas em qualquer ocasião? É
aceitável que um incrédulo componha uma canção de adoração se a música expressa a
verdade? Uma canção tem de mencionar Deus ou Jesus explicitamente antes que possa ser
aceita para a utilização na adoração? Seria aceitável para um cântico conter somente a verdade
em geral ou teria que conter verdades expressamente teológicas a fim de ser considerado para
uso no culto? Uma canção de adoração precisa se dirigir a Deus diretamente?”
Você já pensou nestas questões? O quão confiante você estaria ao responder esse tipo de
perguntas? Você saberia até mesmo por onde começar ao tentar respondê-las? As chances são de
que a maioria das pessoas nunca considerou essas questões seriamente o suficiente, se é que já o
fizeram.
O propósito deste capítulo é apresentar uma defesa para o uso exclusivo dos Salmos da Bíblia
quando oferecemos nosso cântico a Deus em adoração, e que devemos cantar estes Salmos sem o
uso de acompanhamento de instrumentos musicais.
Se a sua resposta instintiva a esse argumento é vê-lo como algo novo ou bizarro, poderá ser um
choque para você descobrir que essa forma de cantar a Deus em adoração já foi aceita como a
norma das igrejas reformadas da Europa! De fato, o poderoso operar de Deus no século XVI –
conhecido como Reforma – viu o estabelecimento da adoração regular congregacional, em quase
todas as igrejas reformadas, precisamente de acordo com essas linhas.
E isso não foi acidente: a Reforma não foi apenas uma reforma na doutrina e governo de igreja,
mas uma reforma na adoração também. No movimento da Reforma, a autoridade da Escritura
foi de suprema importância e esse princípio orientador determinou o conteúdo e forma de culto
tanto quanto a doutrina da igreja e seu governo. E para João Calvino – e, na verdade, para a
maioria dos líderes reformadores do século XVI – a Bíblia autoriza apenas o cântico dos Salmos,
sem acompanhamento instrumental.

"A esmagadora maioria das igrejas reformadas na Europa adotou a prática de


cantar Salmos desacompanhados de instrumentos musicais na sua adoração.”

Não é de se surpreender então, que a grande família de igrejas reformadas que foram distinguidas
de outras pelo uso do nome de Calvino (calvinistas) – e de onde veio a esmagadora maioria das
igrejas reformadas na Europa – adotou a prática do cântico dos Salmos sem acompanhamento
instrumental no culto.
Significativamente, embora eles tenham enfatizado que esta era a prática da igreja nos dias
imediatamente seguintes aos dos apóstolos (ver mais abaixo), o principal motivo para adotar essa
posição foi o de que eles entenderam que essa é a posição bíblica sobre a adoração. E essa é a
convicção por trás deste capítulo também – a convicção de que Deus nos deu um Livro de
cânticos para cantarmos, que somos ordenados a cantar estes cânticos e cantá-los exclusivamente
na adoração de seu nome.
Infelizmente, porém, nos últimos 150 anos, essa forma de adoração tem se tornado cada vez mais
rara. Nos últimos anos em particular, como notado acima, a adoração reformada mudou até
quase ficar irreconhecível e é agora geralmente dominada por cânticos de mera composição
humana e pela performance de instrumentos musicais.
Para examinar como, quando e porque tudo isso mudou levaria muito tempo e está além do
nosso escopo. Minha principal preocupação aqui é defender essa posição histórica e promovê-la
como a forma de adoração que Deus requer e que, portanto, mais glorifica a Ele e beneficia mais
a nossa saúde espiritual e edificação.
Para ajudá-lo a entender de onde venho, é importante afirmar desde o início que eu estou
escrevendo do ponto de vista de alguém que acredita que cada parte do culto (como o cântico, a
oração, a pregação e a leitura bíblica) precisa de um mandamento claro de Deus para que seja
autorizado. Em outras palavras, quando se trata de culto, nunca é o bastante dizer: "Deus não
condena tal coisa, portanto, deve ser correto fazê-la". Em vez disso, devemos ser capazes de
dizer: "Deus ordena que isso seja feito e, portanto, devo fazê-lo ". Vou dizer algo mais sobre isso
à medida que avançarmos.
Então, por onde começamos?
Talvez faça sentido começar com a seguinte questão: se o cântico de Salmos sem
acompanhamento instrumental era a norma nas igrejas calvinistas da Europa, de acordo com a
Reforma, quais foram os argumentos usados para mover estas igrejas para outra direção?
Quando abordamos esta questão, descobrimos que os argumentos usados naquela época para
estimular essa mudança eram os mesmos argumentos que estão sendo usados agora para
promovê-la. Também descobrimos que, ainda que estes argumentos pareçam tomar diferentes
formas, eles podem ser reduzidos, em essência, a dois: primeiro, a Bíblia ordena essa mudança e,
segundo, os eventos do Novo Testamento necessitam dessa mudança.
Interessantemente, estes dois argumentos apareceram recentemente (2010) num artigo
especialmente escrito para defender o uso de novos cânticos com acompanhamento instrumental
na adoração do Novo Testamento. Enquanto prossigo, farei referência a um artigo – apenas para
clarificar os argumentos. O artigo é intitulado Biblical Interpretation: Music and Song in
Worship [Interpretação Bíblica: Música e Cântico na Adoração], por rev. A. I. Macleod, e o texto completo
pode ser consultado neste link .
No que se segue, então, examinaremos esses dois argumentos a favor da mudança em alguns
detalhes. A questão dos instrumentos musicais será tratada num capítulo à parte.

DOIS ARGUMENTOS EM FAVOR DA MUDANÇA

“Cantai um novo cântico!”

O primeiro argumento para o uso de cânticos além dos Salmos é que a Bíblia nos diz para
fazermos assim – portanto, devemos cantá-los!
É verdade que a Bíblia nos ensina a cantarmos “novos” cânticos. Vemos tal mandamento, por
exemplo, nos Salmos 33:3; 96:1 e 98:1. Além disso, algumas pessoas argumentam que temos
exemplos de tais novos cânticos no Livro de Apocalipse no Novo Testamento.
Da mesma forma, argumenta-se que a presença de outros “cânticos escriturísticos” na Bíblia é a
evidência de que havia um contínuo compor de cânticos e se cantavam estes novos cânticos na
adoração da igreja sempre que novos cânticos fossem necessários. Estes cânticos, obviamente,
são adicionados àqueles que mais tarde foram registrados para nosso uso no Livro dos Salmos.
Aqueles que defendem essa posição, então, não estão apenas afirmando que devemos cantar
esses cânticos escriturísticos, mas que devemos ver a própria presença deles com um indicador
de que devemos nos engajar num constante processo de compor e cantar cânticos para o uso na
adoração da igreja.
Então, o primeiro argumento afirma que a Bíblia ordena uma contínua composição de novos
cânticos de adoração.

“Os Salmos não são mais suficientes.”

O segundo argumento para adicionar cânticos ao Livro dos Salmos é um mais familiar: é o
argumento de que o Livro de Salmos – como um Livro escrito durante o tempo da Antiga
Aliança – é simplesmente insuficiente para o louvor da igreja sob a Nova Aliança.

“Estes cânticos ‘celestiais’ foram registrados na Bíblia para nosso uso no


cantarmos os cânticos do Senhor aqui na terra ou eles foram registrados para
algum outro propósito?”

Penso que é importante notar que esse é o mais antigo, o mais emotivo (“Por que não podemos
cantar o nome de Jesus?”) e o mais poderoso argumento para o desenvolvimento da composição
de hinos. De fato, na verdade tem sido o mais efetivo argumento no processo de primeiro
complementar e, gradualmente, substituir os Salmos como o livro de cânticos das igrejas
reformadas durante os últimos 150 anos.
É claro que esses argumentos já foram bem refutados antes. Mas é importante continuar a
respondê-los, sempre que aparecem, e o que vem a seguir tem exatamente esse propósito.
Primeiramente, então, precisamos examinar o que a Bíblia ensina sobre novos cânticos.

I. “CANTAI UM NOVO CÂNTICO!”


Quando se trata do mandamento de cantar novos cânticos, precisamos começar encontrando o
que estes novos cânticos são – como o oposto daquilo que pensamos!
Para isto, é provavelmente melhor começarmos pelo fim – com o Livro de Apocalipse. Afinal de
contas, embora o mandamento para se cantar novos cânticos seja um mandamento que aparece
no Livro dos Salmos, muitas pessoas não estão cientes deste mandamento e estão, talvez, mais
familiarizadas com o cantar de novos cânticos no único lugar onde os encontramos
explicitamente cantados: no Livro de Apocalipse. Estes novos cânticos aparecem em Apocalipse
5:9-14, 14:3 e 15:3-4.
Mas o que estas passagens realmente ensinam?

Os cânticos de Apocalipse
Quando estudamos estes cânticos, uma coisa é imediatamente aparente: todos eles são cantados
no céu! Isto deve levantar uma questão: esses cânticos “celestiais” foram registrados na Bíblia
para nosso uso ao cantarmos os cânticos do Senhor aqui na terra ou eles foram registrados para
algum outro propósito? É provavelmente melhor examiná-los um por vez.
Apocalipse 5:9-14
O cântico a que mais geralmente se faz referência neste debate é encontrado em Apocalipse 5:9-
14. Esta passagem contém um “novo cântico” declarando o quão digno é o Cordeiro, louvando-o
como o redentor de seu povo, atribuindo a Ele honra, glória e poder.
O escritor do artigo que mencionei anteriormente pensa em por que alguém deveria ser proibido
de cantar essas palavras em cultos de adoração e, num apaixonado apelo pelo cântico dos céus
para serem copiados pela igreja na terra, ele encerra seu artigo fazendo uma pergunta que, para
ele, e provavelmente para outros, resume toda a questão:
“Também somos chamados para cantar: ‘Digno é o Cordeiro!’ Ao fim deste artigo, se alguém
está procurando por alguma questão que pode centralizar a discussão, eu ofereço esta pergunta:
Podemos cantar ‘Digno é o Cordeiro!’ numa adoração pública? Se não, por favor diga- me o
motivo”.
Ao ler isto pela primeira vez, tudo isso pode parecer convincente o suficiente. Porém, o
argumento não suporta um exame minucioso. É realmente tão óbvio, como ele diz, que a
adoração do céu deve ser copiada por nós aqui na terra? Vamos considerar esta ideia
completamente por um momento.
Se olhar essa passagem mais de perto, você verá que o cântico em particular que ele destaca está
sendo cantado no céu pelos “animais viventes” e os “vinte e quatro anciãos” ao redor do trono.
Você vai perceber também que enquanto eles cantam, todos levam uma harpa e salvas com
incenso que contém as orações dos santos. Outro novo cântico (se é que é isto mesmo), em
Apocalipse 7:10-12, é cantado com palmas nas mãos e com vestes brancas.
Agora, se o cantar destes novos cânticos na adoração dos céus é nossa autorização para cantá-los
agora mesmo em nossa adoração na terra, então, seria bastante óbvio que isto também é uma
autorização para cantá-los com a harpa, a salva de incenso, as palmas nas mãos e as vestes
brancas! Se, como o escritor insiste, este cantar deve ser feito como é feito no céu, então todas
essas coisas fazem parte da adoração tanto quanto as palavras que estão sendo cantadas.
Na verdade, de acordo com o princípio de interpretação da Bíblia que está sendo aplicado pelo
escritor, todos os atos litúrgicos que acompanham o oferecimento de louvor celestial em
Apocalipse devem ser completamente oferecidos na terra também! Já vi este tipo de pensamento
sendo energicamente defendido anteriormente – mais recentemente no luteranismo
reconstrucionista – mas fico surpreso ao vê-lo disfarçado de presbiterianismo clássico.
Porém, se a adoração celestial deve ser copiada na terra, então deve ser copiada como um todo.
Aplicações seletivas não funcionarão.
Apocalipse 14:3
O “novo cântico” de Apocalipse 14:3 é ainda mais problemático. Examine mais de perto e você
verá que é uma canção que ninguém pode cantar de maneira alguma – exceto os 144.000 que
foram redimidos da terra. Que sentido há em afirmar que deveríamos estar cantando um cântico
que ninguém pode cantar de maneira alguma – exceto os 144.000 que foram redimidos da terra?
Na verdade, esse exemplo em particular nos leva claramente a todo o ponto em questão: todos
estes cânticos são claramente cantados por anjos e santos glorificados, e eles nos mostram um
relance do que acontece no céu. Por qual razão então, devemos concluir que essas performances
realizadas pela igreja triunfante no céu são um mandato para a adoração da igreja militante aqui
na terra? Não é muito mais natural concluir que o que temos nesses novos cânticos são cenas
celestiais que simplesmente não devem ser copiadas na terra?
Isto é ainda mais enfatizado quando fazemos uma pergunta ainda mais fundamental: de que
maneira esses cânticos são “novos”? E aqui, é realmente fácil ficar perdido por causa de uma
falsa suposição relacionada a esses “novos” cânticos. A falsa suposição é de que o “novo” destes
cânticos deve ser consistente com eles serem cânticos da “Nova Aliança” e que eles foram
escritos para serem cantados por nós em nossa nova adoração da Nova Aliança.
Mas é esse realmente o caso? Não, não é. De fato, o “novo” desses cânticos não é uma referência
a esses cânticos serem cânticos da “Nova Aliança”, mas como sendo cânticos que pertencem a
uma nova ordem de coisas no estado final!
Para ver isto mais claramente, apenas pare para pensar nas outras “novas coisas” que aparecem
no Livro de Apocalipse: há uma “nova Jerusalém” (3:12; 21:2), há um “novo céu e uma nova
terra” (21:2), há um “novo nome” dado ao povo de Deus (2:17; 3:12) e, finalmente, temos
“todas as coisas feitas novas” (21:5). O que todas estas coisas têm em comum? Elas
explicitamente pertencem ao céu ou ao “estado final”! O “novo” de todas essas coisas pertence
ao futuro – para aqueles que vencerem (2:17). Isto não é verdade no que diz respeito a nós aqui
na terra!
Novamente, vale a pena notar que todas essas “novas” coisas são de imediata origem divina.
Nenhuma delas é feita pelo homem: é Deus quem faz uma “nova criatura”, é Deus quem faz
“um novo cosmos”, é Deus quem dá “um novo nome” e é Deus quem inspira “um novo cântico”
– e todas elas pertencem ao céu. Em outras palavras, não temos mais autorização para fazer
novos cânticos do que temos para nos dar um nome novo! Ambas são prerrogativas de Deus.
Falarei mais sobre isso abaixo.
Claramente, então, esses novos cânticos em Apocalipse não foram designados para formar parte
do conteúdo de nosso hinário aqui embaixo. Essas palavras nos foram dadas simplesmente como
confortantes percepções acerca do louvor da Igreja como vencedora e como uma antecipação de
como será uma nova ordem de coisas – mas a realização desta adoração espera para quando o
povo peregrino estiver no céu.
Por agora, é a vontade de Deus que usemos o hinário da igreja militante, não o da Igreja
triunfante.
Então, a presença de novos cânticos no Livro de Apocalipse não tem nada a nos dizer em
conexão com quais cânticos de adoração devem ser usados na terra.

Outros “novos cânticos” no Novo Testamento


E quanto então aos outros “cânticos” que aparecem no Novo Testamento?
Pode ser uma surpresa para você descobrir que não há tais “cânticos” no Novo Testamento de
maneira alguma! Significativamente, à parte do Livro de Apocalipse e suas percepções acerca do
céu, nenhum outro Livro do Novo Testamento fala sobre cantar novos cânticos.
Infelizmente isto não tem impedido aqueles que querem cantá-los de procurarem por eles. De
fato, tem sido alegado por anos que temos fragmentos de tais “novos cânticos” em Filipenses
2:5-11, 1 Timóteo 3:16 e em outros lugares.
Francamente, é sempre desapontador encontrar defensores dos hinos apelando para a alegada
presença dos tão chamados “fragmentos do hino apostólico” no Novo Testamento. Se estes
“fragmentos” são algo mais do que prosa exaltada, eles apenas poderiam facilmente ser
fragmentos de credos primitivos. Mas o teimoso fato permanece que, a despeito da ingenuidade
dos estudiosos acadêmicos determinados a identificar tais fragmentos, simplesmente não há real
evidência para a sua existência. Os fragmentos não podem ser provados serem fragmentos e
hinos que vieram de “fragmentos” que nunca foram encontrados.
A significância deste fato não pode ser exagerada: o cântico de hinos é um tipo de arte durável e,
sendo assim, a completa ausência de hinos nos primeiro 200 anos (e mais) da história pós-
apostólica é um grande problema para aqueles que acreditam que eles eram cantados nas igrejas
pelos apóstolos e pelos seus sucessores. De fato, sua ausência é um grande problema para os
defensores dos hinos, tanto quanto a ausência de instrumentos musicais nos primeiros 800 anos
da história da igreja é para os defensores do uso de instrumentos (veja abaixo).
Este é, particularmente, o caso se “hinos” eram tão importantes para serem parcialmente
incorporados nas epístolas do Novo Testamento. Afinal de contas, o argumento para a sua
existência é baseada em supostos fragmentos que aparecem nessas cartas. Porém, se realmente
eles existiram e se eles eram conhecidos e memorizados pelos apóstolos, cantados regularmente
na sua adoração e incorporados em suas epístolas, o seu desaparecimento dos registros da
história se torna simplesmente e completamente inexplicável.
Na verdade, em primeiro lugar, o fato do aparente ‘desaparecimento’ deles se torna uma
evidência quase conclusiva contra a sua alegada existência!

“A introdução original de cânticos extrabíblicos na adoração da igreja parece


ter sido a obra de hereges e não dos ortodoxos”

Conectado a isto, pode ser surpreendente para a maioria dos leitores a descoberta de que o único
cântico religioso que sobreviveu a esse período é o Hino ao Divino Logos de Clemente de
Alexandria – que não é de boa qualidade e que não foi provavelmente projetado para ser usado
na adoração pública. De fato, não há evidência de que alguma vez foi utilizado.
De fato, a introdução original de cânticos extrabíblicos na adoração da igreja parece ter sido a
obra de hereges e não dos ortodoxos. Ário usou a composição de hinos como um veículo para
espalhar o seu falso ensino enquanto, de acordo com Eusébio, o historiador, Paulo de Samosata
substituiu novos cânticos no lugar dos: “Salmos (que são) em honra de nosso Senhor Jesus
Cristo”. Também, por volta de 430 d.C., Agostinho – que, a despeito de afirmações contrárias
nunca advogou o uso de hinos – pôde dizer que os donatistas reprovaram a igreja por usar
cânticos divinos enquanto eles: “foram inflamados em suas mentes ao cantar hinos de
composição humana”.
Sem fazer muita digressão na história dos cânticos de louvor, é digno de nota que mesmo quando
tais cânticos começaram a ser usados nas igrejas, a oposição a eles foi forte: por volta de 343
d.C., o Concílio de Laodicéia proibiu o: “cântico de hinos não inspirados”, tanto quanto a:
“leitura de livros não canônicos da Escritura” – uma descoberta que foi ratificada pelo famoso
Concílio de Calcedônia. Incidentalmente, é importante notar a lógica aplicada pelo Concílio: a de
que ler um livro de composição humana, ainda que possa ser bom, no lugar da Escritura, na
adoração, é o mesmo tipo de erro equivalente ao cantar um cântico de composição humana no
lugar da Escritura no mesmo ato de adoração!
Porém, o propósito de tudo isso é apenas mostrar que a tentativa de encontrar fragmentos de
hinos na literatura do Novo Testamento é fútil. A tentativa de identificá-los se tornou, há muito
tempo, um exercício de especulação escolástica – o tipo de especulação favorecida pelos
acadêmicos que desistiram do estudo daquilo que é revelado na troca pela busca de novidades e
originalidades espúrias – para não mencionar os graus acadêmicos!
Diante da completa falta de evidências para sua existência, a busca para encontrá-los deveria
simplesmente ser abandonada – eles estão para serem encontrados tanto quanto Atlântida ou o
Abominável Homem das Neves. De fato, neste tipo de debate, não deveria haver mais apelo a
estes tão chamados fragmentos e o aparecimento de qualquer apelo nesse sentido deve ser
interpretado como uma admissão de fraqueza no argumento da parte daqueles que o fazem.

“Salmos, hinos e cânticos espirituais” – são eles novos cânticos?

Além da ordem específica para cantar novos cânticos, o mais comum argumento para seu uso é
encontrado no mandamento dado por Paulo para as igrejas em Éfeso e Colossos para cantar
“salmos, hinos e cânticos espirituais” (Efésios 5:19 e Colossenses 3:16).
Admitidamente, estas são as únicas passagens da Escritura que podem ser recorridas para dar
alguma autorização expressa para cantar alguma coisa além dos Salmos. E é claro, tal
autorização expressa é importante quando se trata de uma teologia de culto verdadeiramente
reformada. Porém, é importante nos aproximarmos de um mandamento como esse de um modo
claro e, particularmente, vê-lo através dos olhos do primeiro século ao invés dos olhos do século
XXI. Em outras palavras, não devemos começar perguntando o que essas palavras significam
para nós, mas o que elas significaram, primeiramente, para aqueles que as escreveram e para
aqueles que as ouviram.
Quando fazemos isso, descobrimos algo interessante: muitos dos Salmos no Livro dos Salmos
contêm um ou mais dos termos “salmos”, “hinos” e “cânticos” em seus títulos! Em 67 destes
Salmos a palavra “salmo” aparece no título. Em seis deles a palavra “hino” aparece, enquanto em
outros 35 a palavra “cântico” aparece. Significativamente, alguns destes Salmos levam dois
destes títulos juntos (por exemplo, Salmo 65 é: “um salmo e cântico de David”) enquanto um
Salmo leva todos os três títulos: Salmo 76, na tradução grega – que os apóstolos usaram e com a
qual estavam familiarizados – é um “salmo”, um “hino” e um “cântico”! Estes títulos, em si
mesmos, seriam simplesmente a tradução grega para os três nomes em hebraico usados nos
títulos destes Salmos: “Mizmorim” (Salmos), “Tehillim” (Hinos) e “Shirim” (Cânticos).
Num contexto histórico então, a pressuposição seria a de que Paulo estava se referindo a esses
títulos do Livro dos Salmos, de fato, de que ele estava se referindo ao próprio Livro dos Salmos.
Isso se torna mais claro quando consideramos alguns aspectos da tradução e interpretação da
referida passagem.
É significativo que uma tradução legítima da passagem grega que está sendo discutida poderia
ser lida assim: “salmos, hinos e cânticos – espirituais”. Em outras palavras, o adjetivo
“espiritual” poderia muito bem qualificar todos os três substantivos. A significância disto reside
no fato de que a palavra “espiritual” aparece apenas 25 vezes no Novo Testamento: em 24 destas
ocasiões refere-se a algo que é produzido pelo Espírito Santo de Deus – a única exceção a esta
regra é a referência às: “hostes espirituais da maldade” em Efésios 6 – que é uma referência
àquilo que é produzido pelos espíritos do mundo demoníaco. Sendo este o caso, o termo seria
visto como referindo-se aqui a salmos, hinos e cânticos espirituais que foram de autoria do
próprio Espírito Santo por meio do processo de inspiração. Se esta é, de fato, a melhor tradução,
seria apenas para deixar a referência que Paulo faz aqui ao Livro dos Salmos ainda mais
explícita.
Para ser justo, no entanto, poderia ser o caso de que o adjetivo “espiritual” está meramente
descrevendo o último desses substantivos, que o sentido seria: “salmos, hinos e cânticos
espirituais”. Porém, isto não afeta o argumento tanto quanto alguém pode pensar. Afinal, se estes
“cânticos” são “espirituais” – isto é, inspirados pelo Espírito de Deus – por que deveria ser o
caso de que apenas eles fossem inspirados, enquanto os “salmos” e os “hinos” poderiam ser não
inspirados? Se, pelo contrário, o argumento que está sendo usado, de que o louvor da igreja deve
ser inspirado pelo Espírito Santo, então, o anexar do adjetivo à palavra “cântico” apenas seria na
suposição de que os salmos e hinos fossem compreendidos como inspirados de qualquer forma, e
isto serviria para chamar atenção à natureza do cântico do cristão – quando cheio do Espírito –
como sendo oposto ao daqueles que cantam quando estão: “cheios de vinho”.

“Do ponto de vista da própria Bíblia, as evidências apontam para os três


termos como se referindo ao mesmo corpo de cânticos – o Livro dos Salmos!”

Em outras palavras, o sentido da referida passagem seria como segue: “Não deixe o seu discurso
ser as efusões daqueles que estão cheios de vinho, pelo contrário, que seja as efusões daqueles
que são cheios do Espírito Santo de Deus – e que o teu alegre cantar não seja também produzido
pelo vinho, mas, ao invés disso, seja o alegre cantar daqueles que cantam os cânticos que o
próprio Espírito Santo deu.”
No contexto então, não faz um sentido real interpretar esses termos da forma pela qual a maioria
das pessoas descuidadamente os interpretam. A tendência contemporânea de usar o termo
"salmos" para as canções do Velho Testamento e os termos “hinos” e “cânticos” para nossas
próprias composições não tem nenhum apoio nas Escrituras. Do ponto de vista da própria Bíblia,
as evidências apontam para os três termos como se referindo ao mesmo corpo de cânticos – o
Livro dos Salmos! E novamente, dentro do contexto, é apenas de se esperar tal referência a tão
conhecidos cânticos, afinal, todos esses Salmos eram os cânticos conhecidos e ensinados pelos
apóstolos – e, na verdade, pelo próprio Cristo – pelos quais eles provaram a divindade de Cristo
(ver especialmente os primeiros capítulos do Livro de Atos e Hebreus) e nos quais eles viram a
Sua Pessoa e Obra mais claramente demonstrada. Todos os exemplos do cântico apostólico,
como veremos, são melhor compreendidos como cântico dos salmos, hinos e cânticos espirituais
que eram familiares a eles, mas que agora se tornaram “novos” à luz da ressureição de Cristo.
Infelizmente, essa compreensão do texto tem sido repudiada, por vezes de uma forma bastante
arrogante, por intérpretes mais recentes como um caso de "defesa especial”. Porém, era uma
opinião comumente sustentada em textos exegéticos do passado e ainda é sustentada por muitos,
e permanece – dentro do contexto – o sentido mais natural do texto. Essa interpretação é também
fortalecida pelo modo como os três termos são usados alternadamente com referência ao Livro
dos Salmos por antigos escritores, como Clemente de Alexandria, Filo, Josefo e Atanásio. De
fato, Atanásio, em sua célebre carta a Marcelino a respeito do cântico de Salmos, refere-se aos
Salmos da Bíblia pelos três termos gregos que estamos discutindo dentro do espaço de poucos
parágrafos!
Ainda que haja várias pequenas diferenças de sentido que se pretende transmitir por esses três
termos, penso que uma resposta conclusiva é imprecisa – mas isso não é surpreendente. Afinal, a
Bíblia contém muitos exemplos de um simples conjunto de obras, ou uma unidade de algum tipo,
sendo referida por três termos distintos, que não são facilmente distinguidos. Por exemplo, no
que é uma referência clara ao conjunto de “leis” dadas por Deus, quais são as distinções exatas
entre: “mandamentos, estatutos e juízos” (Deuteronômio 30:16)? Ou, no que é uma clara
referência à entidade do “pecado”, quais são as exatas distinções entre: “iniquidade, transgressão
e pecado” (Êxodo 34:7)? Finalmente, no que é uma clara referência a milagres, o que são as
exatas distinções entre: “sinais, prodígios e maravilhas” (2 Coríntios 12:12)?
Encontrar estas pequenas diferenças de sentido tem a sua própria importância – mas não é crucial
para o argumento, afinal, é um fato simples que os três termos são usados com relação aos títulos
– apenas por si mesmos ou combinados – no Livro dos Salmos e, neste nível, isto é tudo que
precisamos saber.
Quando tudo isso é feito e dito, pode ser útil destacar que nada disso é para desencorajar a
composição e o cantar de cânticos que são para o louvor de Deus. Muitos desses cânticos – por
exemplo: “When I Survey the Wondrous Cross” [Quando Considero a Maravilhosa Cruz] – têm
atingido as afeições de muitos dentre o povo de Deus, provendo um conteúdo que honra a Deus.
A composição de tais cânticos, e a sua execução, pode ser vista como exercício de um dom
válido. Porém, a questão em pauta se refere a quando, onde e como tais cânticos devem ser
usados.
Afinal, é o entendimento reformado acerca da adoração que esta acontece quando nos
aproximamos de Deus ao invocar o Seu nome. Esta adoração consiste num ato ou numa série de
atos através dos quais Deus fala conosco (na leitura da Bíblia, pregação e sacramentos) e através
dos quais nos oferecemos a Deus (em cânticos e orações – às vezes acompanhando com votos e
jejuns). É também o entendimento reformado de que nada deve ser oferecido a Deus “como
culto” sem seu explícito mandamento – e que os cânticos que Ele ordenou para serem oferecidos
neste contexto de culto são os Salmos!
Isto deveria nos alertar para o problema envolvido em colocar esses cânticos, meramente
humanos, juntamente com os Salmos, num hinário de adoração. E o problema é mais profundo
do que imaginamos. Não é simplesmente uma questão de quantos cânticos de Deus nós cantamos
e quantos dos nossos cânticos nós cantamos. Certamente há um problema nisso, afinal, o que isso
diz quanto ao valor relativo e autoridade dos cânticos de Deus e os nossos, se escolhemos cantar
um dos cânticos de Deus no culto e três dos nossos? Mas o problema é maior do que este:
quando uma congregação se reúne para oferecer o seu tributo de louvor a Deus, que autoridade
tem para colocar juntos os cânticos divinos e os humanos, naquele louvor que é oferecido, como
se eles fossem iguais em valor e autoridade na adoração a Deus? Consideraríamos seriamente
colocarmos juntos os sermões de John Piper, ou mesmo os apócrifos, com os livros canônicos da
Bíblia para a leitura pública? Eu acredito que não. Do mesmo modo então, não deveríamos juntar
cânticos humanos com os cânticos divinos para o louvor público.
Note, por favor, que essa não é uma questão de que devemos juntar as coisas como tais - afinal,
o Breve Catecismo de Westminster foi muitas vezes usado como tabuada! É mais uma questão
sobre o que é de autoridade divina e seu uso adequado. Parece-me óbvio que, em tudo o que está
sendo feito em relação ao culto, as questões não estão sendo simplesmente pensadas.
Suponho que tudo toca numa questão que está relacionada: o que Deus parece abençoar? Por
exemplo, se Deus usa um hino para comover uma alma em sua adoração, isto também não
sanciona o uso de hinos no louvor a Deus? Bem, se sim, também sancionaria a leitura de
apócrifos, se a leitura deles foi usada para comover uma alma da mesma forma! Porém, como
cristãos reformados, devemos decidir de uma vez por todas se princípios e práticas devem ser
governados pela Palavra de Deus ou pela experiência humana.
O fato é que, na adoração a Deus, um bom cântico que nós mesmos compusemos não pode
substituir o cântico de um Salmo, mais do que um bom livro de composição humana pode
substituir a Bíblia quanto à leitura!
Mantendo em mente que a introdução de qualquer forma de adoração precisa de explícita
autorização da Palavra de Deus. Em outras palavras, não é suficiente argumentar que algo que
não é proibido, deve ser demonstrado que foi ordenado – mesmo os mais apaixonados
defensores dos hinos teriam que admitir que a sua defesa para o cântico de hinos não inspirados
não é provada com base no mandamento de louvar a Deus com: “salmos, hinos e cânticos
espirituais”.
E quanto então aos outros cânticos que aparecem no Velho Testamento?

Outros “novos cânticos” no Velho Testamento


Como vimos anteriormente, há, de fato, um mandamento claro no Velho Testamento para
cantarmos novos cânticos. Nós o encontramos repetidamente nos Salmos 33:3; 40:3; 96:1; 98:1;
144:9 e 149:1. Está este mandamento autorizando ou na verdade nos ordenando a escrevermos
nossos próprios cânticos de adoração? Novamente precisamos começar perguntando o que são
estes cânticos!
Primeiramente é importante notar que esses Salmos, na verdade, nos ordenam a “cantar” novos
cânticos – e não “compô-los”! Isto pode parecer uma distinção insignificante, afinal, como
podemos cantá-los a não ser que primeiro eles sejam compostos? Mas a distinção não é de
maneira alguma insignificante. Nas poucas ocasiões em que esse mandamento é dado, a mais
natural compreensão dele é vê-lo como uma referência ao cantar daquele próprio cântico. Em
outras palavras, o Salmo que nos diz que temos que cantar um novo cântico é, ele mesmo, o
novo cântico!
Provavelmente o mais claro exemplo disso é o Salmo 40:3, que Davi descreve como um “novo
cântico” que é colocado em nossos lábios por Deus após a libertação de um lago horrível
(Salmos 40:2-3). O Salmo 40 é, ele próprio, um novo cântico. O princípio, porém, é aplicável a
todas as ocasiões nas quais esse mandamento aparece.
Novamente, embora possa parecer incomum, cantar um novo cântico pode ser compreendido
muitas vezes como cantar um velho cântico com uma nova perspectiva – da mesma forma que o
“novo mandamento” de Cristo é uma nova declaração do “velho mandamento” – a partir de uma
“nova perspectiva” (1 João 2:7-8). O novo mandamento de Cristo – “amar uns aos outros” – não
era “novo”, afinal foi ordenado na Velha Aliança desde o começo da criação, mas veio da parte
de Cristo com um novo sentido e, sem dúvida alguma, com um novo poder. De maneira similar,
cada vez que um cântico alcança um novo cumprimento, é cantado novamente como um “novo
cântico”, sem qualquer alteração em seu conteúdo.
Por exemplo, o Salmo 98 é um novo cântico de pós-libertação, assim como o Salmo 96. Ambos
os Salmos, porém, alcançam a sua completa aplicação na proclamação da Salvação de Deus e
justiça às nações por meio do Evangelho. Sua linguagem, ainda quando retém elementos de
ordem antiga, é projetada para acomodar aquela aplicação – como veremos mais tarde.
Vemos algo similar em Isaías. Em Isaías 12:1-6, o profeta nos fala acerca de Deus sendo louvado
pelas nações num cântico. O conteúdo deste cântico é revelado no verso 4 – o que qualquer um
que canta os Salmos com regularidade reconheceria, a partir do Salmo 105:1-2, um Salmo que, a
julgar pelo seu conteúdo, significativamente parece ser anterior ao próprio Isaías.
Em outras palavras, isso serve como outro argumento para o canônico cântico dos Salmos
tornando-se um “novo cântico”, por meio do advento de Cristo!

“O Salmo que nos diz que temos que cantar um novo cântico é, ele mesmo, o
novo cântico!”

Salmos como este e outros, são na verdade para serem cantados para as nações e pelas nações,
em evangelismo e louvor: “Cantai ao SENHOR um cântico novo, cantai ao SENHOR toda a
terra. Cantai ao Senhor, bendizei o seu nome; anunciai a sua salvação de dia em dia. Anunciai
entre as nações a sua glória; entre todos os povos as suas maravilhas.” (Salmos 96:1-3).
Finalmente, em passagens escatológicas como Isaías 42:10, o chamado para cantar um novo
cântico é praticamente reduzido a uma figura de linguagem ao invés de um mandamento direto
para que esse seja cantado: note que esse cântico deve ser cantado pelas criaturas marinhas e
pelas ilhas! Note também o tão conhecido exemplo de árvores e rios batendo palmas enquanto
eles participam do “novo cântico” dos Salmos 98 e 96! Estes cânticos se tornaram ainda mais
novos com o advento de Cristo e, como veremos, não necessitam de suplementação.
Tudo isto acima demonstra que o mandamento para: “cantar um novo cântico ao Senhor”, por si
mesmo, não significa que há um mandato para compor hinos para a adoração da igreja.
Antes de deixarmos esse argumento, porém, precisamos examinar a presença de outros cânticos
escriturísticos fora do Livro dos Salmos. Novamente, precisamos ver o que estes cânticos são e
se eles devem ser cantados nos cultos das igrejas. Isto nos permitirá lidar com assuntos vitais do
cânon e da inspiração e a sua importância quanto ao que devemos cantar na adoração a Deus.

Cânticos Escriturísticos
O termo “cânticos escriturísticos” é, estritamente, uma referência aos cânticos encontrados
dentro da Bíblia, mas que não estão contidos no do Livro dos Salmos.
Tais cânticos foram considerados para o uso na igreja pela Assembleia Geral da Igreja da
Escócia em 1707. Porém, o apetite da igreja escocesa por tais cânticos no século XVIII pareceu
se dissipar – indicando, talvez, que não era tão forte assim desde o começo. Porém, com o
surgimento dos moderados (ministros ortodoxos, mas não evangélicos), o clamor por uma
mudança cresceu e o resultado foi o surgimento de paráfrases para o cântico, mais tarde, no
mesmo século. (Apenas para explicar, paráfrases são passagens das Escrituras que não são
cânticos, mas foram metrificados com o propósito de serem cantadas – em distinção de “cânticos
escriturísticos”, que foram projetados para o cântico desde o início).
No caso dos cânticos do Velho Testamento – como aqueles escritos por Moisés, Ana e
Habacuque – é interessante que os defensores do cantar de novos cânticos demonstram um
notável pequeno entusiasmo para o seu uso no manual de louvor! Talvez, a principal razão para
isto seja que eles adicionam pouco aos cânticos do Saltério, a substância de grande parte destes
cânticos é encontrada no Livro dos Salmos.
Para os cânticos encontrados no Novo Testamento, duas coisas em particular precisam ser ditas.
Primeiro, se você ler esses cânticos cuidadosamente, você notará que nenhum desses assim
chamados cânticos são referidos como cânticos na Bíblia. Não nos é dito que Maria, Isabel ou
Zacarias “cantaram” alguma coisa. Na verdade, parece absurdo pensar em Maria chegar na casa
de sua prima e, logo em seguida, cantar o Magnificat! Então, a despeito da tendência comum de
se referirem a eles como cânticos, eles provavelmente não são para serem considerados como
cânticos de maneira alguma.
Segundo, é importante notar que, como os cânticos escriturísticos do Velho Testamento, eles não
adicionam nada, no que diz respeito a informações, ao Livro dos Salmos! De um certo modo,
isto não é surpreendente: embora eles apareçam no Evangelho de Lucas, eles são, no entanto,
cânticos da Velha Aliança e poderiam verdadeiramente, tanto em forma quanto conteúdo, serem
elevados ao mesmo nível do Saltério!
Agora, isto deveria nos fazer parar e pensar naqueles que exigem novos cânticos para celebrarem
novos eventos: o “novo evento” do nascimento de Cristo produz supostos “novos cânticos” tanto
de Maria quanto de Zacarias, que são virtualmente indistinguíveis, em forma e cântico, daquele
de Ana sob a Velha Aliança.
Pergunto-me: quantos daqueles que professam um sentimento de grande privação sendo
impedidos de usar o Benedictus ou o Magnificat realmente pararam para lê-los e examiná-los o
quão além dos Salmos estes “cânticos” realmente vão? Vá em frente – leia o Magnificat e, então,
o Cântico de Ana e você vai descobrir o que quero dizer!
No entanto, se fosse para ser considerado que essas composições poderiam passar a ser cânticos,
então é justo dizer que o único motivo pelo qual elas poderiam ser excluídas do acervo de
cânticos em nossa adoração hoje é que elas aparecem como rejeitadas na compilação final dos
Salmos, como encontra-se no canônico Livro dos Salmos – um Livro que foi fechado
provavelmente por Esdras, e nunca foi reaberto pelos apóstolos. Isto levanta questões
importantes que estão interrelacionadas com o cânon e a inspiração.

A importância do cânon e inspiração


Essas questões de cânon e inspiração devem ser de grande importância em toda essa discussão,
afinal, os cânticos de Moisés, Débora e outros, são tidos, pelos defensores de novos cânticos,
como exemplos de como devemos compor tais cânticos: usando situações de triunfo, tristeza e
alegria para produzirem materiais de louvor a Deus.
No entanto, é necessário mais do que competência para compor cânticos ou realizações na vida
piedosa para justificar a inclusão de nossas produções no livro de louvor da igreja! Em vez disso,
requer-se a inspiração do Espírito, bem como a ordem expressa de Deus para fazê-lo!
Considere, primeiramente, a questão do cânon.

Cânon
“Cânon” é o termo usado para descrever os livros que são Escrituras inspiradas e que são, como
tais, nossa regra (cânon) de fé. Eles são livros que, coletivamente, formam a Bíblia: Gênesis à
Apocalipse.
Crucialmente, o fechamento do canônico Livro dos Salmos está ligado à cessação da profecia e
salmodia inspirada até o advento do Salvador. No tempo de Cristo, nenhuma canção inspirada,
fora do Saltério canônico, aparece sendo usada no serviço do Templo. Presumivelmente, eles não
teriam sido usados também em outras situações – por exemplo, nos cultos de adoração no
Shabat.

“Significativamente, o cânon dos Salmos, compilados por um período de mais


de 1.500 anos, não foi reaberto pelos apóstolos para que eles pudessem incluir
o Magnificat ou o Benedictus”

Significativamente, o cânon dos Salmos, compilados por um período de mais de 1.500 anos, não
foi reaberto pelos apóstolos para que eles pudessem incluir o Magnificat ou o Benedictus. Isto
pode ser porque o conteúdo desses “cânticos” já estava contido no cântico da igreja ou, como é
mais provável, porque, na verdade, eles não eram cânticos mesmo – como mencionei
anteriormente, alguém realmente acredita que Maria chega para visitar Isabel e começa a cantar?
Ou que Simeão cantou com a criança em seus braços?
Claramente, então, enquanto a inspiração foi essencial para a inclusão de um cântico no canônico
Livro dos Salmos, a mera presença da inspiração não era o único critério para incluir um cântico
no Saltério. Um cântico poderia ser inspirado, mas ainda ser deixado de fora do Saltério
canônico!
Por exemplo, Salomão escreveu 1.005 cânticos – porém, apenas um ou dois destes aparecem
incluídos no Livro dos Salmos. É claro que seu “Cântico dos Cânticos” está incluído em outro
lugar, tendo seu próprio lugar distinto no cânon como o cântico por excelência. O pai de
Salomão, Davi – presumivelmente, como o “doce salmista de Israel”, um autor mais prolífico do
que seu próprio filho – escreveu a maior parte do Saltério, como é próprio de um típico Servo-
Rei.
Porém, assim como ele escreveu outros Salmos referidos na narrativa de Samuel – que não foram
incorporados no canônico Livro dos Salmos – ele deve ter escrito milhares de cânticos que
também não aparecem no Saltério. Admitidamente, não temos como saber se estes eram
espirituais em sua natureza, mas o fato de que eles não foram registrados na Escritura não é uma
razão para que eles não fossem.
Novamente, como indicado acima, embora a inspiração fosse exigida para a inclusão no Livro de
Salmos, o mero fato de que um cântico era inspirado não significava que, portanto,
automaticamente, ele deveria entrar no Saltério! Por exemplo, embora Moisés tenha pelo menos
três cânticos inspirados incluídos na Escritura (Salmo 90, o cântico de Êxodo 15 e o cântico de
Deuteronômio 32), apenas o primeiro destes foi incluído no Livro dos Salmos. Similarmente,
muitos cânticos de Davi são, obviamente, incluídos no Saltério, mas o seu lamento acerca de
Jonatas, como também um ou outro cântico registrado na narrativa de Samuel, não são. O
mesmo, é claro, é verdade quanto ao cântico de Débora, Ana, Habacuque e outros.
Como afirmei em outro lugar, não tenho certeza do motivo pelo qual esses cânticos não foram
incluídos – especialmente quando, no caso de Habacuque, fico contente em reconhecer que a
oração foi projetada para ser cantada no próprio Templo. É possível que tenha sido originalmente
cantada no Templo, mas ela cessou de ser cantada quando a igreja foi levada à formação do seu
canônico Livro dos Salmos.
Isto não deveria soar estranho – afinal, é muito mais do que provável que uma considerável
quantidade de discursos apostólicos e escritos inspirados não conseguiram encontrar um lugar
permanente no cânon do Novo Testamento também. Muito foi provavelmente escrito e dito pelos
apóstolos, que era inspirado, mas que não entrou na Escritura canônica. Isto não nos dá, contudo,
uma autorização para preencher lacunas!
Isto nos deixa com aquilo que deveria ser bastante óbvio de qualquer forma: o Livro dos Salmos
foi compilado pela igreja, sob a direção e inspiração de Deus, para ser o Saltério da igreja. É o
livro de louvores da igreja. É o Livro de Salmos para o cântico, projetado para ser cantado na
igreja. Isto não pode ser dito de qualquer outra passagem da Escritura, que alguns podem desejar
converter num material de cântico.

Inspiração
A conexão entre inspiração, cânon e cântico levanta uma questão a mais também. Talvez
possamos destacar a questão ao fazermos uma pergunta: Como o mandamento para: “cantar um
novo cântico” (um cântico que é inspirado pelo Espírito e composto por um profeta), se torna um
mandamento para compor e cantar nossos próprios cânticos numa igreja da Nova Aliança?
Alguns argumentam que é simplesmente lógico que devemos compor nossos próprios cânticos
após os eventos da crucificação, ressureição, ascensão e pentecostes. Alega-se que estes eventos
simplesmente exigem novos cânticos! Desde a disputa na Orthodox Presbyterian Church of
America (OPC) [Igreja Presbiteriana Ortodoxa da América] sobre a questão dos louvores nas
igrejas, tem se dado muito valor a esse argumento em particular: novos atos redentivos na Bíblia
sempre devem ser seguidos por novos cânticos redentivos – por exemplo, o evento de Êxodo é
seguido pelo cântico de Moisés.
Aqueles que argumentam desse modo afirmam que a consumada obra de Cristo, como o grande
ato redentivo, deve ter seu próprio surgimento de hinos em seguida. O argumento é
aparentemente fortalecido por um apelo à explosão de cânticos que acompanham a encarnação.
O argumento é como se segue: se o nascimento de Cristo foi acompanhado pelo Nunc Dimittis e
o Magnificat, certamente o Calvário deveria ser seguido por novos cânticos ainda mais
maravilhosos.
O fato de que eles não são seguidos por tais cânticos – tais cânticos não aparecem no registro
bíblico, pelo menos – seria explicado pelos defensores de novos cânticos como um chamado para
nós mesmos, com cristãos cheios do Espírito, para usarmos nossos dons ao escrever esses
cânticos e cantá-los. Não penso que eu seria injusto com aqueles que defendem essa posição ao
dizer que eles argumentariam que a igreja é livre, sob a liderança do Espírito Santo, para compor
quantos cânticos quiser para sua adoração.
Porém, novamente, o que parece ser convincente e sincero é falho! A verdadeira situação é mais
complexa do que isto. A sequência por trás da composição de novos cânticos, sob a Velha
Aliança, não é simplesmente que um ato redentivo é seguido por um cântico redentivo. É, ao
invés disso, que o ato redentivo é seguido por um cântico inspirado!
Agora, alguns podem afirmar que isso não é justo, afinal, eles diriam que a única razão pela qual
esses cânticos são “cânticos inspirados” é porque eles são encontrados na Bíblia! Se eles não
estivessem na Bíblia, eles não seriam inspirados! Então, eles diriam, se outros podem compor
cânticos, isso significa que podemos compor também – se eles aparecem na Bíblia ou não, isto
não é discutível.
Porém, isto é perder de vista o ponto: os cânticos compostos numa celebração de eventos
redentivos não são inspirados porque eles estão incluídos nas Escrituras, mas, eles estão
incluídos nas Escrituras porque eles são inspirados! Há uma grande diferença! Para ser preciso,
o Espírito Santo não apenas registrou esses cânticos para nós na Bíblia: Ele, na verdade, é o
Autor deles para a ocasião em particular e para o uso da igreja.
É importante compreender esta distinção: algumas palavras são inspiradas simplesmente porque
elas aparecem na Bíblia – e essas incluem as mentiras do diabo. Outras palavras estão na Bíblia
porque elas são inspiradas, porque primeiramente foram ditas por Deus – tais como as palavras
de Cristo. Não sabemos se outros cânticos foram compostos no tempo dos grandes atos
redentivos do Velho Testamento, mas sabemos que o que nós temos – como o Salmo 126 após a
libertação do cativeiro – foi autorizado e inspirado pelo Espírito para o uso da igreja!
Para enfatizar mais esta questão, note cuidadosamente o seguinte: aqueles que escrevem os
cânticos da igreja são invariavelmente profetas! Por exemplo, Moisés, o autor do cântico de
Êxodo, é um profeta; Miriam, uma possível autora, também é uma profetiza (Êxodo 15:20-21).
Débora, que compôs seu cântico, é outra profetiza (Juízes 4:4 e 5); Davi é um profeta;
crucialmente, os oficiais que supervisionam a música e compõem os cânticos da adoração do
Templo, tais como Hemã, Asafe e Jedutum, são todos profetas também (veja 1 Crônicas 25:5 e 2
Crônicas 29:30, 35:15).
Para estender isto à narrativa de Lucas (ainda, é claro, sob a Velha Aliança), as elocuções de
Maria, Zacarias e Simeão são imediatamente inspiradas pelo Espírito Santo. Indo para a Nova
Aliança, os Salmos carismáticos de 1 Coríntios 14 – supondo que eles eram novas composições
ao invés de escolhas dos Salmos já existentes – são inspirados por profetas também.
Estamos compreendendo a figura? O que poderia ser mais claro? Os cânticos da igreja são
sempre produzidos por profetas com o propósito de serem cantados na igreja! As igrejas
reformadas parecem não ter compreendido que compor novos cânticos para o uso na adoração
pública é, na verdade, uma atividade carismática – e têm falhado em pontuar a ligação entre o
surgimento do fenômeno pentecostal/carismático com a proliferação de cânticos de adoração.
É importante notar, nesta particular discussão, como Ezequias se comporta quando ele se
compromete com uma reforma nacional durante o seu reinado. Ele começa a obra com uma
reforma no culto do Templo e quando se trata da questão do louvor, o critério que ele aplica é
simplesmente: “o que a Palavra de Deus nos autoriza a fazer?”. Como veremos posteriormente,
ele restabelece os instrumentos de adoração ordenados por Davi. Porém, ele também ordena os
cânticos que devem ser cantados: “Então o rei Ezequias e os príncipes disseram aos levitas que
louvassem ao Senhor com as palavras de Davi, e de Asafe, o vidente” (2 Crônicas 29:30).
A importância disto não pode ser exagerada: o reino de Ezequias teria muitos poetas e músicos
competentes. Porém, porque não havia cânticos que foram compostos pela inspiração do Espírito
Santo, desde os dias da reconstrução do Templo, Ezequias sentiu-se compelido a usar apenas
cânticos que haviam sido inspirados pelo Espírito Santo há uns 300 anos atrás! Isto é uma prova
da preocupação de se usar apenas os cânticos que o Espírito Santo inspirou na adoração a Deus.
Não nos é dito por Deus, em lugar algum, que essa posição mudou! Se precisamos de outros
cânticos sob a Nova Aliança, à parte destes que temos, que um profeta inspirado pelo infalível
Espírito de Deus os escreva! A afirmação de que isso pode ser feito pertence à teologia
carismática, não à teologia reformada.
“Se precisamos de outros cânticos sob a Nova Aliança, à parte destes que
temos, que um profeta inspirado pelo infalível Espírito de Deus os escreva!”

De tudo que foi exposto, vimos que o mandamento para “cantar um novo cântico” não nos
permite criar novos cânticos para a adoração da igreja. Isso nos leva ao segundo argumento para
o uso de hinos, que é o de que os Salmos não são suficientes.

II. “OS SALMOS NÃO SÃO SUFICIENTES”


Quase todo apelo pelos hinos repousa, em algum ponto, numa alegada insuficiência relacionada
ao Livro dos Salmos como um manual de louvor para a Nova Aliança. O raciocínio é bastante
simples: se é suficiente como um livro de louvor, então por que completá-lo? Para ser justo,
deve-se entender que a deficiência inerente ao Saltério não deve ser entendida em termos do que
ele é em si mesmo, como um livro de louvor, mas estritamente na forma como ele funciona
como um manual de louvor da Nova Aliança. O escritor do artigo mencionado no início também
usa esse argumento. Além dele estar frustrado com a falta de claridade nos Salmos, apenas
porque foram escritos com antecedência, ele diz que ele está:
“(...) infeliz com a inteira e exclusiva posição por motivos mais estritamente teológicos (...) a
posição exclusivista (...) afirma que um Livro da Escritura do Velho Testamento é para sempre
suficiente para nosso louvor, ao invés do cânon inteiro. Eu não acredito na suficiência dos
Salmos apenas, para o louvor cristão (...) os Salmos não dizem muitas coisas que queremos
dizer em nosso novo cântico da Nova Aliança”.

Os Salmos dizem o suficiente?


Antes de lidarmos com a questão da própria suficiência em si, eu gostaria de ressaltar um ponto
importante – e não de qualquer maneira jocosa – que “o que queremos dizer” em um cântico da
Nova Aliança nunca deveria ser a questão. Estou certo de que sei o que o autor quer dizer com
isso, mas ainda é importante dizer, sempre, que nós não somos os juízes do que é adequado para
ser cantado no louvor da Nova Aliança.
Porém, à parte disso, muitos sentiriam que o argumento dele é plausível e alguns poderiam
afirmar que a reivindicação dele dificilmente necessita de provas. Como poderiam os cânticos da
Velha Aliança ser adequados para a Nova Aliança de qualquer maneira?
No entanto, esse argumento falha porque ele não faz justiça à singularidade do Livro dos Salmos
na revelação bíblica ou, mais especificamente, à maneira particular como os Salmos foram
criados pelo Espírito Santo, que os projetou com uma linguagem especialmente adequada para
acomodar os “eventos” da Nova Aliança, quando estes chegassem.
Existem várias maneiras de mostrar isso.
Cristo nos Salmos
Não é de se surpreender que, neste ponto, a discussão focará na presença de Cristo nos Salmos.
Particularmente, irá focar se Ele está lá, a extensão da sua presença e a clareza com a qual Ele
pode ser visto.
É bom talvez começar com um exemplo menos óbvio: Cristo cantando em Mateus 26:30. É mais
ou menos universalmente reconhecido que o salmo “cantado” aqui é o Halel egípcio (Salmos
113-118), que tem o foco e o clímax no Salmo 118.
Este Salmo não é o mais fácil de interpretar, mas é claramente centrado em Cristo (Atos 4:11).
Ele irrompe em triunfo a partir do verso 15 em diante: o Dia do Senhor (verso 24) viu o braço do
Senhor trazendo Salvação (verso 15) e regozijo para o povo de Deus. Também abre os portões da
justiça para presença de Deus (verso 19). Estes portões são abertos com base no homem cuja
reivindicação em ser o Messias foi rejeitada pelos “construtores” da casa de Deus, mas que, no
entanto, através do Seu sacrifício, se torna a própria pedra fundamental do templo de Deus (verso
22). O resultado é uma tremenda alegria enquanto o povo recebe o Messias em seu meio (verso
26), enquanto oram pelo florescimento do Seu Reino (verso 25).
Esse Salmo, associado tão estreitamente tanto com a vinda de Cristo como Salvador, quanto com
o sacramento da Páscoa, foi aplicado pelas multidões a Cristo quando Ele entrou triunfantemente
em Jerusalém, montado num jumento (Mateus 21:9). Este foi um caso muito raro de percepção
espiritual! Porém, os “edificadores” da igreja – os religiosos daqueles dias – rejeitaram essa
reivindicação de messianidade, visto que o resultado da oração pela bênção ao Messias feita pela
multidão (Mateus 21:9) foi uma aparente frustração pela “rejeição” a Ele. Porém, como o Salmo
descreve, Ele iria no Dia do Senhor ser escolhido para se tornar a pedra fundamental ao final
(Atos 11:4). Tudo isto, de alguma maneira, estava relacionado à Páscoa por razões que agora
compreendemos.
Agora, para nossos propósitos, o ponto interessante e - na verdade- crucial é este: como esse
Salmo é tomado por Cristo em seus lábios nas suas horas finais, Ele apenas converteu a Páscoa
da Velha Aliança na Ceia do Senhor da Nova Aliança.
Porém, Ele claramente não sente desconforto, inadequação ou incongruência ao tomar o mesmo
Salmo da Velha Aliança em seus lábios! Se o Salmo fosse inadequado por causa da transição que
estava acontecendo, Ele ou o Espírito de Deus teria provido novas palavras. Porém, nada desse
tipo é feito.
Por favor, note o que está acontecendo: o cântico dos Salmos no encerramento da primeira Ceia
do Senhor tem a função de trazer tanto o Salmo quanto essa refeição para a Nova Aliança!

“Parece estranho que, finalmente, quando a igreja pode cantar seus cânticos
da Aliança em plena luz do advento de seu Servo-Rei, de quem eles
constantemente falam, ela deseje complementá-los ou abandoná-los!”

O simples cumprimento da Páscoa em Cristo é suficiente para autorizar o cântico com


entendimento desse Salmo e, de fato, eu iria mais longe ao dizer que esse Salmo, de agora em
diante, poderia ser cantado como nunca antes. Tornou-se, efetivamente, um “novo cântico”!
Indubitavelmente, os discípulos eram incapazes de cantá-lo com a necessária iluminação naquela
noite em particular – foi necessário o sopro do Espírito, mesmo antes do Pentecostes, para
iluminar os Salmos para eles. Porém, o ponto chave é que tal iluminação era tudo que era
necessário.
Com o passar do tempo, eles iriam cantar esses versos maravilhosos com uma crescente
apreciação e, certamente, sem a necessidade de suplementação. “Não morrerei, mas viverei (...)
Abre-me as portas da justiça (...) a pedra (...) tornou-se a cabeça da esquina (...) Este é o dia
que fez o Senhor”. Por que eles precisavam de mais? Esse Salmo, é claro, continua a
desempenhar o seu papel em muitas mesas de comunhão tal como aconteceu na primeira Ceia do
Senhor 2000 anos atrás. Por que suplementá-lo? Pior ainda, por que substituí-lo?
Esse princípio pode ser estendido por todo o Saltério. Por exemplo, é difícil ver como o Salmo
110 pode ser cantado com uma compreensão adequada sob a Velha Aliança:
“Disse o SENHOR ao meu Senhor: Assenta-te à minha mão direita, até que ponha os teus
inimigos por escabelo dos teus pés. O Senhor enviará o cetro da tua fortaleza desde Sião,
dizendo: Domina no meio dos teus inimigos. O teu povo será mui voluntário no dia do teu poder;
nos ornamentos de santidade, desde a madre da alva, tu tens o orvalho da tua mocidade. Jurou o
Senhor, e não se arrependerá: tu és um sacerdote eterno, segundo a ordem de Melquisedeque”.
(Salmos 110:1-4)
Um momento de reflexão deve revelar a dificuldade de cantar essas palavras antes do advento de
Cristo. A igreja da Velha Aliança deve ter lutado, no bom sentido, com essas palavras – e talvez,
a sua obscuridade os tenha feito olhar para a frente com uma espécie de santa inveja, para
aqueles que as veriam de uma forma mais clara (I Pedro 1:10-12). Parece estranho que,
finalmente, quando a igreja pode cantar seus cânticos da Aliança em plena luz do advento de seu
Servo-Rei, de quem eles constantemente falam, ela deseje complementá-los ou abandoná-los!
Poderíamos continuar nesse caminho pelo Livro dos Salmos para mostrar que os fatos
relacionados à vida e ministério do Salvador não são vagamente prefigurados dentro de enigmas
ou mistérios – como geralmente é afirmado ser o caso – mas são claramente afirmados na
linguagem dos lábios do próprio Senhor. Esta linguagem de Cristo foi dada aos profetas muitos
anos antes, para o benefício da igreja da Velha Aliança, e contempla sua obra do ponto de vista
da ressureição em diante: note que o Salmo 110, referido acima, sendo escrito sob a Velha
Aliança, fala numa linguagem simples de eventos entre a ascensão e consumação de todas as
coisas. O que mais alguém poderia pedir?
Muitos cristãos laboram sob a ilusão de que poucos Salmos testificam de Cristo ou que contêm
sua Palavra. A verdade é bem diferente.
A ressureição, ascensão, coroação e domínio de Cristo são claras no Salmo 2, sua exaltação
como governante do mundo no Salmo 8, sua luta no Getsêmani no Salmo 16, sua angústia no
Salmo 20, sua libertação da angústia e sua glorificação no Salmo 21, sua angústia e libertação em
seus próprios sentimentos e palavras no Salmo 22, o guiar do seu povo como seu Pastor/Rei no
Salmo 23, sua ascensão à glória no Salmo 24, sua encarnação e ofício profético e sacerdotal no
Salmo 40, sua traição no Salmo 41, seu ofício de Rei e seu Reino no Salmo 45, sua ascensão no
Salmo 68, seu Reino universal no Salmo 72, sua intercessão no Salmo 80, sua preservação do
mal no Salmo 91, sua vinda em julgamento e governo no Salmo 96 e 98, seu senhorio no Salmo
102, seu reinado sacerdotal no Salmo 110, e sua ressureição e Ele como cabeça da Igreja nos
Salmos 118, 132 e 133 – e esta lista não é exaustiva.

Cristo está suficientemente claro neles?


Porém, mesmo quando a força de tudo isso é sentida, a afirmação persiste: que ainda não é claro
o suficiente. Mas este não é o caso! Do contrário, a clareza com a qual tudo isso é trazido diante
de nós não pode ser exagerada: poderiam esses eventos da crucificação ser mais exatamente
retratados pungente e vividamente como no Salmo 22 – alguém, sob a Velha Aliança, poderia
ficar profundamente perplexo acerca das mãos e pés perfurados quando a crucificação ainda era
algo desconhecido? Tudo o que era necessário para trazê-lo para a Nova Aliança é o simples
reconhecimento de que é o cumprimento de Cristo. Nada mais é necessário! A linguagem é
gráfica, clara e é na primeira pessoa! Recentemente eu estava presente onde houve uma
prolongada meditação sobre a crucificação que foi encerrada pelo cântico de um hino, quando a
ocasião da adoração corporativa clamava pelo cântico do Salmo 22!
Isso é importante porque a frustração é, às vezes, com cânticos que aparentemente exigem
“muita explicação”. Aparentemente, as pessoas prefeririam cânticos que precisam de menos
explicações do que os Salmos. Porém, isto é tolice. Toda a literatura do Novo Testamento –
incluindo a história do Evangelho – requer explicação e iluminação. Você já tentou ler a epístola
aos Efésios para um homem comum na rua? A igreja simplesmente precisa crescer e começar a
ensinar.
O que torna os Salmos únicos é que eles não são profecias escuras envoltas na obscuridade –
como, por exemplo, o Tabernáculo com seu simbolismo tão encoberto – mas são, de fato,
especialmente concebidos pelo Espírito Santo, usando um vocabulário extremamente seletivo e
imagens para levar a igreja, sem muito esforço, para a Nova Aliança, e isto pelo “novo cântico”
do próprio céu.
Deste modo, os Salmos são como uma sala cheia de pinturas intrincadas de Cristo. Tudo o que
precisamos fazer para apreciá-las é simplesmente acender a luz. A luz é provida pelo Espírito
Santo do Cristo exaltado no céu. Nós não precisamos de mais pinturas, ou, pior ainda, jogá-las
fora e começar a pintar novamente nós mesmos. Nós só precisamos acender a luz - isso é tudo!
Uma vez que este princípio de iluminação é compreendido, a função precisa dos Salmos como
hinário da igreja e sua adequação a essa capacidade sob a Nova Aliança torna-se mais clara. De
fato, uma vez que esse princípio é adequadamente compreendido, todo o argumento contra a
suficiência do Livro dos Salmos desmorona!

Os Salmos falam demais?


Porém, outra questão precisa ser tratada e, surpreendentemente, não está relacionada aos Salmos
falarem pouco demais, mas aos Salmos falarem muito!
É cada vez mais difícil escapar da conclusão de que o desejo de complementar ou substituir os
Salmos, muitas vezes, procede de um desconforto com a sua teologia. É triste dizer, mas este
desconforto aparece no artigo que defende os hinos, o qual foi referido acima.
Ele aparece quando o escritor passa a destacar o que ele vê como a inadequação de alguns
cânticos da Velha Aliança para o uso na Nova Aliança. Neste contexto, ele faz a seguinte notável
declaração:
“Estou longe de sugerir que todos os cânticos devem ser cantados em nossos cultos, e, por
exemplo, tenho dificuldades em ver como uma versão métrica de Juízes 5:24-30 tornaria nosso
louvor mais atrativo e acessível. Não tenho desejo de cantar sobre as bênçãos de Jael, com sua
bacia de leite e sua habilidade com martelo e estaca, ou recontar o choro da mãe de Sísera e
suas especulações sobre os despojos e: ‘uma moça ou duas para cada homem’”.
Certamente, não sou o único que tem uma séria dificuldade com este tipo de pensamento!
Primeiramente, é sábio ou correto afirmar, como o escritor faz, que “não tenho desejo em cantar
bênçãos sobre Jael” – quando o próprio Deus disse para abençoá-la? Débora, a profetiza, chama
Jael de “bendita entre as mulheres” e o escritor ainda pode dizer que ele não tem desejo de
abençoá-la!
Segundo, é realmente o caso que devemos contemplar deixar fora de nossa adoração um cântico
inspirado com base naquilo que pode não ser “atrativo” ou “acessível” o suficiente? Não é
estranho que após gastar sua energia tentando construir um argumento para cantar coisas que não
são realmente cânticos, em primeiro lugar, então, o autor encontra um cântico na Bíblia inspirado
por uma profetiza e ele “não tem vontade de cantá-lo”?
Significativamente, é vital notar que o tipo de coisas que o escritor cita como sendo não atrativas
e inacessíveis (o martelo e a estaca de Jael) são coisas que devem fazer com que uma enorme
porção de Salmos não sejam atrativos e sejam inacessíveis para ele também! Não foi
precisamente por isso que Isaac Watts deliberadamente decidiu “cristianizar” os Salmos ao
reescrevê-los, removendo deles aquilo que supostamente era inconsistente com o espírito da
Nova Aliança?
Mas, de qualquer maneira, quem somos nós para julgar o quão atrativo é aquilo que Deus
inspirou? Certamente, quando você começa a se sentir desconfortável com cânticos que Deus
compôs, o que realmente você precisa fazer não é defender um novo cântico, mas examinar a sua
teologia e o estado do seu coração!
Infelizmente, há um sentido em que esses tipos de declarações revelam o que está por trás de
tudo: apesar de todos os elogios que são feitos aos Salmos pelos defensores dos hinos, e as
necessárias reafirmações de seu valor supremo e lugar ímpar em nossa adoração – que
invariavelmente assumem a forma de “eu amo os Salmos, mas (...)” – não posso deixar de sentir
que há um considerável desconforto com eles e com algumas de suas ênfases teológicas, em
particular.
Numa era de declínio, a obsessão agora é com aquilo que é “atrativo” e “acessível”. É difícil
conceber uma abordagem mais espiritual. Em vez de ficar perplexo com essas dificuldades e
recusar a bendizer pessoas com martelos e estacas, certamente deveríamos urgentemente
redescobrir os Salmos como o Livro de louvor que revela o Servo-Rei e começar a ensiná-lo e a
cantá-lo com sua própria ênfase: o domínio mundial do Servo-Rei, sua justiça, seu julgamento,
sua Salvação, sua paz, sua bondade e a sua adoração!

“O cântico dos Salmos de uma maneira inteligente e espiritual, à luz de seu


cumprimento em Cristo e por Cristo, é provavelmente a grande e única ajuda
para edificação que eu conheço”

O triste fato é que os Salmos cessaram de ser adequadamente compreendidos e apropriadamente


cantados nas igrejas reformadas da Escócia há muito tempo. Por muito tempo eles foram
apologeticamente tidos como um Livro de louvor e cantados sem entendimento e de maneira
pobre. Infelizmente, no caso de algumas igrejas, a sua completa teologia reformada encontra
pouca aceitação porque um mais fraco e mais geral sentimento evangélico agora reina.
Alegadas deficiências
O escritor do artigo a que venho me referindo encerra apresentando cinco pedidos pelo cântico
dos hinos com base na edificação, ecumenismo, evangelismo, emoção e exultação. Em todas
estas áreas, ele argumenta que o cântico de louvor na igreja será defeituoso se ele repousar
apenas nos Salmos. Eu não poderia, dificilmente, deixar de discordar tanto.
Quanto à edificação, é difícil compensar a falta de um bom Saltério bem memorizado e cantado
com frequência. O cântico dos Salmos de uma maneira inteligente e espiritual, à luz de seu
cumprimento em Cristo e por Cristo, é provavelmente a grande e única ajuda para edificação que
eu conheço. Nada forma a piedade de um povo tão bem quanto isso (veja a carta de Atanásio a
Marcelino, referida acima). Aqui precisa ser enfatizado que a tendência atual em produzir muitas
versões do Saltério é prejudicial para a memorização do cântico tanto quanto a produção de
muitas versões das Escrituras também é.
Quanto ao ecumenismo, é um fato notório que os hinos, no passado pelo menos, foram
denominacionais, partidários e exclusivos. Os hinos e cânticos que não caem tão facilmente nesta
categoria são agora, não surpreendentemente, os menos radicais, os mais comemorativos e
menos ofensivos deles. Os hinos contemporâneos são alarmantemente anêmicos. São quase,
senão completamente, desprovidos de qualquer ensino relacionado ao julgamento final ou ao
inferno. Mais do que qualquer outro gênero ou coleção de cânticos, os Salmos pertencem à
igreja católica e por quaisquer motivos – e eu poderia sugerir alguns – eles são mais valorizados
nas mais antigas comunhões da terra do que naqueles que são “Reformados”.
Quanto ao evangelismo, é importante afirmar que o papel principal da igreja, na adoração do Dia
do Senhor, não é um papel evangelístico – pelo menos não “evangelismo” como é comumente
compreendido. É, na verdade, oferecer o seu tributo pactual de adoração ao seu Senhor. Isso não
quer dizer que o evangelismo não faz parte do seu papel, nem é dizer que o oferecimento do seu
tributo não é, em si mesmo, evangelístico.
Não é novidade que, provavelmente há um pressuposto subjacente aqui sobre o que Deus usa na
evangelização e o que o evangelismo realmente é. A cultura teológica contemporânea pensa que:
“Beijai o Filho, para que não se ire, e pereçais no caminho” (Salmos 2) é algo inaceitável ou uma
forma "inacessível" de evangelismo, enquanto: "venha a Jesus”, sempre atinge objetivo. Isto diz
muito sobre o entendimento atual acerca de Cristo (que agora quase que invariavelmente, e não é
sem razão, foi substituído por “Jesus” – você já parou para pensar por que “Cristo” é agora
sempre “Jesus”?) e indica uma mudança definida acerca de como o Evangelho é visto. Os
Salmos são simplesmente evangelísticos. Eles não precisam conter apelos, que foram inventados
em nossa forma aceitável contemporânea, para os qualificarmos como tais!
Quanto à emoção, enquanto o escritor reconhece que a escala inteira é coberta pelos Salmos, ele,
no entanto, acredita que o cântico exclusivo dos Salmos nos deixa privados da emoção ou
atrofiados. Simplesmente não posso concordar. Encontro uma emoção profunda, em conexão
com a adoração do Salvador encontrada nos Salmos, de um modo que falho em encontrar em
qualquer outro lugar. Enquanto continuo e, esperançosamente, cresço em minha peregrinação
cristã, descubro cada vez mais que apenas os Salmos podem fazê-lo. É nos meus verdadeiros
altos e baixos que invariavelmente recorro a eles institivamente, e em sua linguagem encontro-
me expressando-me. E, por qualquer motivo, o prazer que tenho em cantar diferentes tipos de
canções, em diferentes momentos, evaporaria completamente se eu fosse trazê-las, especialmente
em detrimento dos Salmos, para a adoração de Deus.
Quanto à exultação, o escritor diz que: “(...) é central para nossa teologia de adoração que
devemos tomar parte da adoração do céu. Fazemos parte daquela comunhão e adoração
(Hebreus 12:22-24), e assim erguemos nossos corações e vozes para nos unirmos aos redimidos
e hostes angelicais ao redor do trono”. De fato – mas isto começou apenas sob a Nova Aliança?
Até mesmo ele deve ter notado que a adoração do céu, no Livro de Apocalipse, é descrita com o
simbolismo da Velha Aliança! Vir ao Monte Sião em Hebreus 12 certamente significa mais do
que isso!
Finalmente, embora dificilmente devesse ser necessário dizer, fazer a vontade de Deus na terra
como é feita no céu não significa necessariamente que a sua vontade para os dois lugares é
exatamente a mesma. Estamos todos no escuro quanto ao que, precisamente, Ele requer dos
membros de Sua Igreja no céu quanto à sua obra, sua aparência, seu discurso e, é claro, a sua
música – além dos vislumbres que temos em Apocalipse. Nós não sabemos sequer em qual
língua Ele deseja que eles cantem! Nossa preocupação, é claro, deve ser com fazer a sua vontade
na terra – e fazê-la como é feita no céu, isto é, imediatamente, sem reservas e fazê-la bem. Se
isto significa cantar os cânticos da igreja militante até que cheguemos a cantar como igreja
triunfante em nosso lar, devemos ficar contentes com isso.

CONCLUSÃO
A última coisa que pode ser dita é, então, que o argumento para se cantar hinos está longe de ser
provado. E, para alguém verdadeiramente reformado em sua abordagem e, portanto, zeloso em
não incluir na adoração qualquer coisa que não tem autorização expressa de Deus, isto deve ser
suficiente. Porém, isto é apenas o mínimo daquilo que deveria ser dito e, na realidade, está longe
de ser suficiente.
É mais necessário e correto dizer que o argumento para cantar apenas os Salmos da Bíblia é bem
provado! Segue-se que a igreja precisa urgentemente se arrepender nessa área e redescobrir essa
verdade que uma vez ela segurou e professou, mas que agora, em grande parte, abandonou - para
sua grande perda.

Rev. Kenneth Stewart é ministro da congregação de Glasgow da Reformed Presbyterian Church


of Scotland [Igreja Presbiteriana Reformada da Escócia].
II. O CÂNTICO DE SALMOS NA
ADORAÇÃO A DEUS
William Maclean

“A palavra de Cristo habite em vós abundantemente, em toda a sabedoria, ensinando-vos e


admoestando-vos uns aos outros, com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando ao
Senhor com graça em vosso coração” (Colossenses 3:16)

uando há diferenças de opiniões entre os cristãos acerca de qualquer assunto, é sempre útil
Q inquirir até onde eles concordam, e, deste modo, verificar em qual ponto exato eles
começam a divergir. Em relação aos cânticos que devem ser empregados no louvor a Deus,
há muitos pontos de geral acordo.

Pontos de Concordância
- Concorda-se que os Salmos foram dados por divina inspiração e eles são a própria Palavra de
Deus. “Diz Davi, filho de Jessé, e diz o homem que foi levantado em altura, o ungido do Deus de
Jacó, e o suave em salmos de Israel. O Espírito do Senhor falou por mim, e a sua palavra está
na minha boca” (2 Samuel 23:1-2).
“Homens irmãos, convinha que se cumprisse a Escritura que o Espírito Santo predisse pela boca
de Davi, acerca de Judas, que foi o guia daqueles que prenderam a Jesus” (Atos 1:16. Veja
também Atos 4:25; Hebreus 3:7 e outros). Homens devem tomar cuidado com aquilo que falam
contra o Livro dos Salmos. O Espírito Santo é o seu autor. Este é o primeiro ponto de
concordância.
- Concorda-se que esses Salmos inspirados foram apontados por Deus para serem usados em sua
adoração. “Cantai-lhe, salmodiai-lhe” (1 Crônicas 16:9). “Então o rei Ezequias e os príncipes
disseram aos levitas que louvassem ao Senhor com as palavras de Davi, e de Asafe, o vidente. E
o louvaram com alegria e se inclinaram e adoraram” (2 Crônicas 29:30). “Apresentemo-nos ante
a sua face com louvores, e celebremo-lo com salmos” (Salmos 95:2). Expositores bíblicos e
historiadores da igreja igualmente concordam que os Salmos inspirados eram usados
exclusivamente na adoração do Velho Testamento. Deus os apontou para serem usados e
ninguém, exceto Deus, poderia mudar este decreto. Este é o segundo ponto de concordância.
- Concorda-se que até onde vão os registros, nosso Senhor Jesus Cristo usou exclusivamente os
Salmos na adoração. Apenas numa ocasião há uma referência ao nosso Senhor cantando. Isto foi
em conexão com a observância da Páscoa. É dito: “E, tendo cantado o hino, saíram para o Monte
das Oliveiras” (Mateus 26:30, Marcos 14:26). Estudiosos da Bíblia não são enganados pelo uso
da palavra “hino” em nossa tradução neste verso. O original simplesmente afirma o fato de que
eles cantaram louvores a Deus. Na margem, lê-se: “Quando eles cantaram um Salmo”. É um fato
bem conhecido que os judeus estavam acostumados a cantar, durante a Páscoa, o grande Halel,
que consistia dos Salmos 113 ao 118, inclusive. Certamente, nosso Senhor e Seus apóstolos não
se apartaram desta prática. Na verdade, seria estranho se o Senhor Jesus, que sempre exaltou e
honrou o Espírito Santo, tivesse colocado de lado os cânticos que Ele apontou para este exato
propósito. Mas Ele não o fez. Aqueles que seguiriam de perto os passos de Jesus deveriam cantar
os Salmos. Este é o terceiro ponto de concordância.
- Concorda-se que temos uma expressa autoridade para o uso dos Salmos do Velho Testamento
na igreja do Novo Testamento. “A palavra de Cristo habite em vós abundantemente, em toda a
sabedoria, ensinando-vos e admoestando-vos uns aos outros, com salmos, hinos e cânticos
espirituais, cantando ao Senhor com graça em vosso coração” (Colossenses 3:16). Ainda que
possa haver diferenças de interpretação quanto ao sentido de: “hinos e cânticos espirituais”,
todos concordam que salmos, mencionados aqui, são os Salmos inspirados das Escrituras. A
passagem, portanto, contém uma expressa autorização para o contínuo uso do Saltério na igreja
do Novo Testamento. Ninguém nega isso. Este é o quarto ponto de concordância.
Não está sendo afirmado que não há opiniões contrárias ou diferentes nestes quatro pontos, que
alguns indivíduos sustentam, mas há uma concordância geral em todas as classes de cristãos
evangélicos nestes pontos.

I. NÃO HÁ AUTORIZAÇÃO PARA HINOS


Agora chegamos ao exato ponto de divergência. Enquanto todos concordam que os “salmos” que
são mencionados em Colossenses 3:16 são os Salmos da Bíblia, há muitos que defendem que os:
“hinos e cânticos espirituais” são meras composições humanas e que a igreja do Novo
Testamento está, portanto, autorizada e instruída a adicionar, ao seu Livro de louvor, as
composições de homens não inspirados. Este é o texto crucial acerca deste assunto. Se este texto
contém uma clara autorização para o uso de hinos não inspirados, outras passagens podem ser
usadas também como apoio; mas se esta autorização não pode ser encontrada aqui, não poderá
ser encontrada em outro lugar. Os defensores do cântico dos hinos irão admitir a verdade desta
afirmação. Agora será demonstrado que esta passagem não só não autoriza o uso de cânticos não
inspirados no culto, mas que obriga o uso exclusivo dos Salmos da Bíblia.
Nenhuma autorização pode ser encontrada, para o uso de hinos não inspirados, nas palavras:
“hinos e cânticos espirituais”. À primeira vista, estas palavras parecem ser conclusivas em favor
dos defensores do cântico de hinos. No texto grego são as palavras: “psalmois, humnois, odais
pneumatikais” – isto é: “salmos, hinos e cânticos espirituais”. Estes três nomes gregos são todos
encontrados nos títulos dos Salmos na tradução grega do Velho Testamento, que estava em uso
entre o povo para quem Paulo escreveu essa epístola. Eles aparecem muitas vezes nos títulos de
vários Salmos. A palavra “psalmois” cerca de sessenta e três vezes; a palavra “humnois” seis
vezes, e outra palavra, “aleluia”, que tem o mesmo sentido, cerca de vinte e quatro vezes; e a
palavra “odais” (mais na forma singular) trinta e quatro vezes. Com o fato diante de nós de que
estas três palavras são todas, na realidade, encontradas muitas vezes nos títulos dos Salmos
inspirados – e quando todos concordamos que a palavra “psalmois” se refere aos cânticos
inspirados – não é mais ilógico insistir que “humnois e odais” significam cânticos não
inspirados? Como se para remover qualquer dúvida, a palavra “espiritual” é usada para qualificar
as três palavras. Thayer, em seu léxico do Novo Testamento, referindo-se a esta passagem e a
outra similar – Efésios 5:19 – define a palavra “espiritual” como: “divinamente inspirado e
relacionado ao Espírito Santo”.

“‘Cânticos espirituais’ são cânticos produzidos de uma maneira sobrenatural,


aqueles dados imediatamente pelo Espírito Santo”

O Dr. Albert Barnes em seu comentário em 1 Coríntios 10:3: “E todos comeram de uma mesma
comida espiritual”, diz: “A palavra ‘espiritual’ é evidentemente usada para denotar aquilo que é
dado pelo Espírito, por Deus; aquilo que é o resultado de seu dom miraculoso; aquilo que não foi
produzido por modo ordinário”. Novamente: “A palavra ‘espiritual’ deve ser usada no sentido
sobrenatural, ou aquilo que é imediatamente dado por Deus”. Portanto, “cânticos espirituais” são
cânticos produzidos de uma maneira sobrenatural, aqueles dados imediatamente pelo Espírito
Santo. É como se lêssemos: “Ensinando-vos e admoestando-vos uns aos outros, com salmos,
hinos e cânticos dados pelo Espírito Santo”. Que cânticos são estes? O doce salmista de Israel
responde: “O Espírito do Senhor falou por mim, e a sua palavra está na minha boca”. Esses
mesmos nomes, portanto, que têm sido usados para fornecerem uma autorização para o uso de
cânticos não inspirados, descobrimos que são títulos bem conhecidos para os Salmos da Bíblia, e
que, qualificados pela palavra “espiritual” não podem ser usados para designar músicas sem
inspiração, mas fornecem uma autorização para o uso exclusivo dos cânticos do Espírito.

II. OS SALMOS: A PALAVRA DE CRISTO


Os Salmos são, num sentido eminente, a: “palavra de Cristo”. “A palavra de Cristo habite em vós
abundantemente, em toda a sabedoria”. Esta é a condição para ser capaz de ensinar e admoestar.

Como os Salmos são “a palavra de Cristo”?


1. Cristo, pelo Seu Espírito é o autor deles. Isto foi completamente demonstrado acima.
2. Cristo é aquele que fala em muitos deles. Por exemplo: “Proclamarei o decreto: o Senhor me
disse: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei” (Salmos 2:7). “Então disse: Eis aqui venho; no rolo do
livro de mim está escrito” (Salmos 40:7). “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”
(Salmos 22:1). Salmos como estes são “a palavra de Cristo” no mesmo sentido que o sermão do
monte é Sua Palavra. Ele, e ninguém mais, é quem fala neles.
3. Cristo somente é o assunto de muitos deles. A objeção mais ignorante e sem sentido que é
feita aos Salmos é a acusação de que eles “são sem Cristo”. A verdade é que nenhum livro na
Bíblia revela Cristo com tal plenitude do que o Livro dos Salmos, nenhum, exceto o Evangelho
segundo João ou a Epístola aos Hebreus.

O que podemos aprender acerca de Cristo neste maravilhoso Livro?


1. Sua Divindade. “O teu trono, ó Deus, é eterno e perpétuo” (Salmos 45:6 comparado com
Hebreus 1:8). “Disse o SENHOR ao meu Senhor: Assenta-te à minha mão direita, até que ponha
os teus inimigos por escabelo dos teus pés” (Salmos 110:1 comparado com Mateus 22:42-45).
2. Sua Eterna Filiação. “Proclamarei o decreto: o Senhor me disse: Tu és meu Filho, eu hoje te
gerei” (Salmos 2:7 comparado com Hebreus 1:5).
3. Sua Encarnação. “Pois pouco menor o fizeste do que os anjos, e de glória e de honra o
coroaste” (Salmos 8:5 comparado com Hebreus 2:9). “Então disse: Eis aqui venho; no rolo do
livro de mim está escrito” (Salmos 40:7 comparado com Hebreus 10:5-7).
4. Seus Ofícios como Mediador.
(a) Seu ofício Profético. “Preguei a justiça na grande congregação; etc.”
(Salmos 40:9-10). “Então declararei o teu nome aos meus irmãos” (Salmos 22:22 comparado
com Hebreus 2:12).
(b) Seu ofício Sacerdotal. “Jurou o Senhor, e não se arrependerá: tu és um sacerdote eterno,
segundo a ordem de Melquisedeque” (Salmos 110:4 comparado com Hebreus 7:17).
(c) Seu ofício de Rei. “O teu trono, ó Deus, é eterno e perpétuo; o cetro do teu reino é um cetro
de equidade” (Salmos 45:6 comparado com Hebreus 1:8). “Disse o SENHOR ao meu Senhor:
Assenta-te à minha mão direita, até que ponha os teus inimigos por escabelo dos teus pés”
(Salmos 110:1 comparado com Mateus 22:42-45; Hebreus 1:13). Veja também Salmos 22:28, e
todo o Salmo 72.
5. Sua Traição. “Até o meu próprio amigo íntimo, em quem eu tanto confiava, que comia do
meu pão, levantou contra mim o seu calcanhar” (Salmos 41:9 comparado com João 23:18).
6. Sua Agonia no Jardim. “Deus meu, eu clamo de dia, e tu não me ouves; de noite, e não tenho
sossego” (Salmos 22:2 comparado com Hebreus 5:7).
7. Sua Provação. “Falsas testemunhas se levantaram; depuseram contra mim coisas que eu não
sabia” (Salmos 35:11 comparado com Mateus 26:59-60).
8. Sua Rejeição. “Mas eu sou verme, e não homem, opróbrio dos homens e desprezado do povo”
(Salmos 22:6 comparado com Mateus 27:21-23; Lucas 23:18-23). “A pedra que os edificadores
rejeitaram tornou-se a cabeça da esquina” (Salmos 118:22 comparado com Mateus 21:42; Atos
4:11-12).
9. Sua Crucificação. Todo o Salmo 22, também o Salmo 69 (comparado com os Evangelhos).
As cenas que estão na crucificação são descritas nos mínimos detalhes. A zombaria, o menear da
cabeça, o partir das vestes, o lançar sortes sobre as vestes, a sede, o vinagre e o fel, o clamor por
causa do abandono, a entrega do seu espírito a Deus e o: “Está consumado”, como muitos leem
no último verso do Salmo 22.
10. Seu Sepultamento e Ressureição. “Pois não deixarás a minha alma no inferno, nem
permitirás que o teu Santo veja corrupção. Far-me-ás ver a vereda da vida” etc., (Salmos 16:9-11
comparado com Atos 2:25-31).
11. Sua Ascensão. “Deus subiu com júbilo, o Senhor subiu ao som de trombeta” (Salmos 47:5
comparado com Atos 1:11, e 1 Tessalonicenses 4:16). “Tu subiste ao alto, levaste cativo o
cativeiro, recebeste dons para os homens, e até para os rebeldes, para que o Senhor Deus
habitasse entre eles” (Salmos 68:18 comparado com Efésios 4:8-10). “Levantai, ó portas, as
vossas cabeças; levantai-vos, ó entradas eternas, e entrará o Rei da Glória” (Salmos 24:7-10
comparado com Apocalipse 5:6-14).
12. Sua Segunda Vinda. “Virá o nosso Deus, e não se calará; um fogo se irá consumindo diante
dele, e haverá grande tormenta ao redor dele. Chamará os céus lá do alto, e a terra, para julgar o
seu povo” (Salmos 50:3-4). “Com trombetas e som de cornetas, exultai perante a face do Senhor,
do Rei”. “Perante a face do Senhor, porque vem a julgar a terra; com justiça julgará o mundo, e o
povo com equidade” (Salmos 98:6,9 comparados com Mateus 24:31; 1 Coríntios 15:52). Jesus
bem disse: “está escrito de mim nos Salmos” [Lucas 24:44]. “Os sofrimentos de Cristo e a glória
que se lhes haviam de vir” [1 Pedro 1:11] estão aqui revelados, e estes: “salmos, hinos e cânticos
espirituais” estão repletos de Cristo. Se qualquer um for examinar e comparar estas passagens, tal
pessoa irá prontamente crer que quando Paulo escreveu: “A palavra de Cristo habite em vós
abundantemente, em toda a sabedoria”, é como se ele tivesse dito: memorize os Salmos.

III. OS SALMOS COMO VEÍCULO DE INSTRUÇÃO


Cânticos não inspirados não podem ser colocados no mesmo nível que os cânticos inspirados
como uma regra para o: “ensino e admoestação”. Todos concordam que os salmos do texto são
os Salmos inspirados, eles são a própria Palavra de Deus. “Ensinando” refere-se à doutrina –
àquilo que devemos crer. “Admoestando” refere-se à prática – como devemos viver. Não é
concebível que Paulo colocaria os escritos de homens não inspirados no mesmo nível dos Salmos
da Bíblia como o padrão de doutrina e prática. “As Sagradas Escrituras do Velho e do Novo
Testamento são a Palavra de Deus, a única regra de fé e obediência” (Catecismo Maior de
Westminster).
Cânticos não inspirados abundam em erros. Dr. H. Cooke, de Belfast, disse que ele nunca
encontrou uma compilação de hinos que: “poderia ser considerada livre de sérios erros
doutrinários”. Em 1836, a antiga Assembleia Geral Presbiteriana (E.U.A) apontou um Comitê
para revisar seu hinário. Em seu relatório, eles dizem: “Num exame crítico, encontramos muitos
hinos deficientes no mérito literário, alguns incorretos na doutrina, e muitos completamente
inadequados para o santuário”. Que acusação para se fazer contra o livro que a própria igreja
deles usou para substituir o Livro de louvores de Deus! Alguém supõe que Paulo, com: “hinos e
cânticos espirituais”, se referiu a estes e os colocou no mesmo nível com os Salmos da Bíblia
para o “ensino e admoestação”?
Pode o leitor cristão crer que Paulo indicou estes como padrão de doutrina e prática, como tendo
igual autoridade à dos Salmos para o ensino e admoestação? Não, não. Paulo nunca foi
descuidado com as doutrinas do Evangelho. Ele diz: “Mas, ainda que nós mesmos ou um anjo do
céu vos anuncie outro evangelho além do que já vos tenho anunciado, seja anátema”
(Gálatas 1:8). Se não houvesse nenhum outro argumento para mostrar que os: “hinos e cânticos
espirituais”, pelos quais os cristãos devem ensinar e admoestar uns aos outros, não são meras
composições humanas, isto seria conclusivo. Paulo não está recomendando a propagação do erro.

“Os Salmos são objetivos. Eles são centrados em Deus. A alma olha para fora e
para cima. Eles conduzem a alma à adoração de Deus: ‘na beleza da
santidade’, como objeto de louvor, para devotamente se prostrar diante dEle no
Seu trono, como Aquele que ouve orações”

IV. OS SALMOS COMO UM VEÍCULO DA GRAÇA


Somente os Salmos inspirados são adaptados para serem os veículos da graça no coração e de
louvor ao Senhor. “Cantando ao Senhor com graça em vossos corações”. Aqui temos o fim a ser
alcançado. Este fim é duplo: (1) o despertar de graciosas afeições no coração e (2) o elevar da
alma a Deus. Duas características dos Salmos inspirados marcam sua adaptação a este duplo
propósito, a saber, (a) sua objetividade natural e (b) seu espírito devocional. Hinos são
subjetivos. Homens cantam acerca de si mesmos, sua situação e experiências, suas decisões.
Hinos são introspectivos. Eles centralizam-se em si mesmos.
Os Salmos são objetivos. Eles são centrados em Deus. A alma olha para fora e para cima. Eles
conduzem a alma à adoração de Deus: “na beleza da santidade”, como objeto de louvor, para
devotamente se prostrar diante dele no seu trono, como Aquele que ouve orações. Isto é
verdadeira devoção. “Adorar a Deus”.
O caráter devocional do Livro é manifesto a todos. Nisto ele é, num sentido preeminente, o Livro
devocional da Bíblia. Algumas vezes é afirmado que os Salmos não são adaptados para ser o
veículo da graça para o coração, e, portanto, eles não podem ser empregados com sucesso num
avivamento religioso! Tal visão está completamente errada.
Pense por um momento acerca do conteúdo do Livro. Sua visão acerca de Deus, do homem, da
lei, do pecado, de Cristo, do arrependimento, do perdão, da relação pactual, da nova vida, do
julgamento, do céu, do inferno. O que é que é necessário para um avivamento que ele não
contenha? E qual o livro mais honrado desta forma pelo Espírito Santo do que o seu próprio
Livro? Como Dr. J. Bain disse, os Salmos: “serão considerados apropriados para qualquer
avivamento que possa vir; aqueles avivamentos que foram ‘fabricados’ podem precisar de algo
menos divino”.
O fato é que os maiores avivamentos da religião que o mundo já viu estavam conectados com o
uso exclusivo dos Salmos. Eles foram usados exclusivamente nos grandes avivamentos nos dias
de Ezequias, Josias, Esdras, Neemias. O mesmo é verdadeiro quanto ao avivamento de
Pentecostes quando 3.000 foram convertidos em um dia. O período da Reforma foi um grande
avivamento, e foi um glorioso avivamento do cântico dos Salmos. Os reformadores calvinistas
usaram os Salmos exclusivamente. Toda a França ficou emocionada com sua música nos dias
dos huguenotes. Eles foram usados exclusivamente na igreja escocesa naquele glorioso dia em
Kirk O’ Shotts quando, sob Livingston, 500 foram convertidos com um sermão. Nos tempos de
Robert McCheyne, quando os discípulos de Cristo continuavam sua reunião até a meia-noite,
eles tornaram felizes aqueles momentos noturnos ao cantarem os cânticos de Sião.
O presidente Edwards 1 dá seu testemunho quanto ao uso deles no grande avivamento de
Northampton na Nova Inglaterra em seus dias. “Uma das mais observáveis características da
Obra foi o singular deleite que todo aquele que havia sido despertado tinha ao cantar os Salmos.
Nos lares, nos campos, nos bosques, sozinhos ou em conjunto, eles exprimem o louvor do Rei; e
mesmo as pequenas crianças e as mais idosas pessoas que nunca antes haviam aprendido a
cantar, vieram a cantar louvores com solenidade e doçura”. Isto, deste modo, demonstra que os
Salmos da Bíblia são eminentemente adaptados para serem veículos da graça para o coração e do
louvor ao Senhor. “Cantando ao Senhor com graça em vossos corações”.
Concluímos, portanto, que essa passagem, que sempre foi usada pelos defensores do cântico de
hinos como contendo uma autorização para as suas práticas, não tem tal sentido. Os títulos:
“salmos, hinos e cânticos espirituais”, pertencem aos Salmos inspirados sendo qualificados pela
palavra “espiritual”, como não é o caso com qualquer outro. Os Salmos são a Palavra de Cristo;
cânticos não inspirados não são; os Salmos são adaptados para ser o veículo da graça para o
coração e do louvor ao Senhor, cânticos não inspirados não são.
A passagem não fornece autorização para o uso de cânticos não inspirados na adoração, mas é
uma injunção apostólica explícita de que, no louvor da igreja do Novo Testamento, a salmodia
divinamente autorizada deve ser continuada.
_______________________________
Edwards presidiu o Colégio de Nova Jersey, que mais tarde veio a se tornar a Universidade de
Princeton [Princeton University].

CONCLUSÃO
Não podemos encerrar sem um fervoroso apelo ao coração dos cristãos com relação a duas
coisas:
1. A restauração do próprio Saltério de Deus como hinário de todas as igrejas. O presente
movimento nessa direção deve ter a sincera cooperação de todo cristão. Essa rejeição tem sido
em desprezo ao mandamento divino, ao exemplo de nosso bem-aventurado Senhor e à autoridade
apostólica contida nessa passagem. Deve ser restaurado ao seu lugar pela unida voz de toda a
cristandade e pela alegre aclamação de todos. Seria como trazer de volta a Arca de Deus;
2. Quando o Saltério for restaurado ao seu lugar nos hinários da igreja, ele deve ser usado
EXCLUSIVAMENTE na adoração a Deus. Pode ser encontrado um lugar para cânticos não
inspirados, mas não no culto público. Deus deve ser servido com aquilo que é seu. “Pois seja
maldito o enganador que, tendo macho no seu rebanho, promete e oferece ao Senhor o que tem
mácula; porque eu sou grande Rei, diz o Senhor dos Exércitos, o meu nome é temível entre os
gentios” (Malaquias 1:14).

Rev. William Maclean foi ministro das congregações da Free Presbyterian Church of Scotland
[Igreja Presbiteriana Livre da Escócia] em Gisborne (Nova Zelândia), Grafton (Austrália), e
Ness, Ilha de Lewis. Ele faleceu em 1985.

CITAÇÕES ÚTEIS
Rev. W.D. Ralston em “Talks on Psalmody” [Palestras sobre Salmodia] relata a seguinte
história: “Enquanto eu caminhava para casa, parei nos meus tios e passei a noite lá. À noite, eu
peguei meu hinário e cantei com meus primos. Depois que o coloquei de lado, meu tio pegou-o,
pôs os seus óculos e passou um tempo lendo-o. Ele era um crente firme no uso exclusivo dos
Salmos, e meu livro era um hinário de outra denominação. Dava os nomes dos hinos e das
músicas, com os nomes dos compositores de cada um deles, até onde eram conhecidos. Meu tio
leu um hino e, mencionando o nome do autor, disse: ‘Não conheço coisa alguma acerca dele’.
Ele leu outro e disse: ‘Eu li sobre o autor deste aqui. Ele era um padre da Igreja Católica
Romana’. Ele leu outro e disse: ‘Eu li sobre este autor algumas vezes. Ele era um bom homem e
um ministro fervoroso’. Ele, então, disse: ‘Agora, John, se eu fosse usar um destes hinos no culto
a Deus essa noite, qual você acha que teria escolhido como o melhor: aquele de cujo autor eu não
sei coisa alguma, aquele do padre da Igreja Católica Romana ou aquele do ministro cristão
fervoroso?’ Eu respondi: ‘Aquele do ministro’. ‘Verdade’, ele disse, ‘devemos escolher aquele
que foi escrito pelo melhor homem; e, ao ler este livro, eu posso ver que contém muitos hinos
escritos por bons homens; mas se eu encontrasse algum que foi composto pelo próprio Deus, não
seria melhor cantá-lo mais do que aqueles produzidos por bons homens?’ Eu respondi: ‘Seria,
com certeza’. Pouco depois ele disse: ‘Eu, agora, li cuidadosamente o seu livro e não encontro
um hino em que esteja marcado: ‘Composto por Deus’; mas eu tenho um pequeno hinário, e
Deus, pelo Seu Espírito, compôs cada hino dele; Pedro diz: ‘Homens santos de Deus falaram
inspirados pelo Espírito Santo’ ’. Enquanto ele falava, deu-me um dos nossos Saltérios, e o modo
como ele apresentou seu argumento causou uma impressão na minha mente que jamais
esquecerei”.
O quão conclusivo é este argumento. Devemos servir a Deus com o melhor. O Livro de Deus é o
melhor. Quando Ingersol [um famoso agnóstico e crítico do cristianismo] disse que poderia
escrever um livro melhor do que a Bíblia, os cristãos ficaram chocados e o denunciaram como
um: “infiel e blasfemo”. Como, então, podemos dizer que podemos escrever um livro melhor de
louvores do que o Saltério de Deus? Se é verdade que os hinários são melhores do que o Saltério,
isto marca a maior realização de todas, pois o homem conseguiu superar a Deus em seu próprio
meio de adoração! Se não é verdade, então a substituição do Saltério feito por Deus pelos hinos
feitos pelos homens, na adoração a Deus, é um ato muito ousado de presunção.
Numa reunião de ministros de várias denominações numa cidade oriental, um artigo sobre
hinologia da igreja havia sido lido. Uma discussão geral seguiu-se após a leitura. Um defensor do
uso exclusivo dos Salmos inspirados empregou uma ilustração com grande efeito! “Se tenho uma
importante mensagem para enviar a um morador dos distritos mais altos da cidade, eu posso
chamar um jovem mensageiro e dizer a ele: ‘Você pode levar esta mensagem para mim para ser
entregue a tal pessoa que mora em tal parte da cidade?’. O jovem responderia com dúvidas: ‘Eu
acho que posso. É verdade que eu nunca estive nessa parte da cidade. Eu nasci aqui perto. Eu
ouvi falar da pessoa para quem você deseja enviar a mensagem, mas não estou familiarizado com
ele, mas acho que posso encontrá-lo. Estou disposto a tentar’. Minha mensagem é muito
importante e, ainda que eu esteja satisfeito com as boas intenções desse jovem, eu não estou
seguro acerca de sua habilidade para cumprir a responsabilidade. Então, eu chamo outro jovem e
lhe pergunto a mesma coisa. Prontamente ele responde: ‘Oh sim, eu posso levar a mensagem
diretamente à sua casa. Eu conheço toda aquela parte da cidade. Eu nasci lá. E eu vim de lá. Na
verdade, seu amigo me enviou aqui para te encontrar e para carregar qualquer mensagem que
você deseje entregar-lhe’. Não seria difícil decidir quais desses mensageiros eu deveria
empregar. Isto é uma alegoria. Se tenho uma mensagem de louvor para enviar a Deus, e eu
emprego um hino para levá-la, eu estaria inseguro sobre isso; pode chegar até Ele, e pode não
chegar. Mas se eu empregar um Salmo para levá-la, eu sei que ela subirá aos céus. Os Salmos
nasceram lá. Vieram de Deus para mim; e, na verdade, Deus os enviou a mim para carregar
qualquer mensagem de louvor que eu possa desejar enviar a Ele”.

- Rev. Robert J. George, D.D.


“Eu gostaria de saber qual é o homem que pretende compor hinos melhores do que os do Espírito
Santo. Sua coleção é grande o suficiente; não precisa de adição. É tão perfeita quanto o seu autor,
e não é passível de qualquer melhoramento. Por que, neste caso, qualquer homem deste mundo
iria pôr em sua cabeça que ele se sentaria e comporia hinos para serem usados na igreja? Seria o
mesmo caso de alguém que resolvesse escrever uma nova Bíblia, não apenas melhor do que a
antiga, mas tão melhor, que a antiga poderia ser posta de lado. Que blasfêmia! E nossos
fabricantes de hinos, inadvertidamente, eu espero, têm chegado muito perto desta blasfêmia; pois
eles tiraram os Salmos, introduziram seus próprios versos na igreja, cantam seus versos com
grande prazer e, como imaginam, com grande proveito; embora a prática esteja em oposição
direta ao mandamento de Deus, e, portanto, não possa, eventualmente, ser acompanhada da
bênção divina”.

- William Romaine

PERGUNTA 2. Qual regra Deus deu para nos dirigir sobre como devemos glorificá-Lo e
desfrutá-Lo?

RESPOSTA: A Palavra de Deus, que se acha nas Escrituras do Velho e do Novo Testamentos, é
a única regra para nos dirigir na maneira de o glorificá-Lo e desfrutá-Lo (Texto Prova: 2 Timóteo
3:16).

- Breve Catecismo de Westminster


III. CRISTO EM TODOS OS
SALMOS
Donald Balfour

odo crente cristão conhece a bênção de Cristo sendo revelado à sua alma em certos versos
T do Livro dos Salmos. Temos exemplos no verso 1 do Salmo 22: “Deus meu, Deus meu, por
que me desamparaste?” e os versos 7 e 8 do Salmo 40: “Então disse: Eis aqui venho; no
rolo do livro de mim está escrito. Deleito-me em fazer a tua vontade, ó Deus meu; sim, a tua lei
está dentro do meu coração”; ou o verso 1 do Salmo 110: “Disse o SENHOR ao meu Senhor:
Assenta-te à minha mão direita”.
Mas é uma questão de maior admiração discernir Cristo em cada um dos 150 Salmos! Não
somos levados a pensar no cenáculo após a ressureição de Cristo quando Ele declara aos seus
discípulos que: “convinha que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na lei de Moisés, e
nos profetas e nos Salmos” (Lucas 24:44)? A próxima afirmação das Sagradas Escrituras
imediatamente a isto é vital: “Então abriu-lhes o entendimento para compreenderem as
Escrituras” (Lucas 24:45). Oremos para que tenhamos esta compreensão. Então, seremos levados
para mais perto de Cristo do Salmo 1 ao 150.
Podemos considerar juntos alguns menos conhecidos exemplos da vida de Cristo Jesus nos
Salmos.

A pureza de Cristo
Em sua vida inteira, Jesus foi completamente sem pecado (Hebreus 2:15). Sua vida foi uma vida
de santa perfeição (Hebreus 7:26). Isso nos ajuda a abrir um Salmo como o Salmo 139, e nos
permite ver as palavras deste Salmo como as palavras de Cristo a seu Pai. É Cristo (mais do que
Davi) que pronuncia as palavras: “Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração; prova-me, e
conhece os meus pensamentos. E vê se há em mim algum caminho mau, e guia-me pelo caminho
eterno” (Salmos 139:23-24). Maravilhoso! Há outros Salmos nos quais a pureza do homem reto
nos é apresentada de tal maneira que podemos concluir que deve se referir a Cristo. Por exemplo,
no Salmo 1:3 não podemos evitar a conclusão de que somos levados a Cristo, não há outra
pessoa além de Cristo de quem pode ser apropriadamente dito: “as suas folhas não cairão, e tudo
quanto fizer prosperará”.

Cristo levando sobre si o pecado


Mas nós paramos em grande admiração quando ponderamos sobre as implicações dessas grandes
palavras no Novo Testamento, quando lemos que: “Aquele que não conheceu pecado, o fez
pecado por nós; para que nele fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Coríntios 5:21). É quando
recebemos isto pela fé que começamos a expandir nosso amor por Jesus, nosso Salvador, como
Ele é revelado mais e mais nos Salmos. Mesmo naqueles claros Salmos Messiânicos onde o
escritor, de repente, fala de si mesmo como um pecador diante de Deus – até mesmo estas
palavras são melhores compreendidas como palavras de Cristo. No Salmo 69, temos Cristo
falando claramente – mas, de repente, ele diz: “Tu, ó Deus, bem conheces a minha estultice; e os
meus pecados não te são encobertos” (Salmos 69:5). É Cristo falando ainda? Sim, é – agora
como: “Aquele que foi feito pecado por nós”. Ele não é um pecador, pessoalmente – mas ele é
carregado com nossos pecados pelos quais Ele é pessoalmente culpado.

O Cristo obediente
Esses exemplos lançam luz em outros Salmos e outras situações nas quais nosso Salvador
encontrou a Si mesmo. Vamos considerar Sua obediência. Se meditarmos na verdade que Jesus:
“Ainda que era Filho, aprendeu a obediência, por aquilo que padeceu” (Hebreus 5:8), podemos,
então, reconhecer o cântico de Cristo no Salmo 119 enquanto Ele clama a Deus para ser ensinado
e conservado: “Escondi a tua palavra no meu coração, para eu não pecar contra ti” (Salmos
119:11) e: “Ensina-me, ó Senhor, o caminho dos teus estatutos, e guardá-lo-ei até o fim” (Salmos
119:33). Não há ninguém que possa dizer com tanta verdade como Cristo pode: “Oh! quanto
amo a tua lei! É a minha meditação em todo o dia” (Salmos 119:97).

A adoração de Cristo
Ao longo de seu ministério terreno, o Filho de Deus levou uma vida de oração e adoração. A
Bíblia registra que era seu deleite fiel tomar parte na adoração na sinagoga nos Shabats (Mateus
12:9; 13:54; Marcos 1:21; Lucas 4:16 e João 6:59). Enquanto engajava-se na adoração, Jesus
teria cantado Salmos – cada um deles – e, ao fazê-lo, ele tomaria o “Eu” do salmista para si
mesmo. Por exemplo: “Com a minha voz clamei ao Senhor” (Salmos 3:4). E “Amo ao
SENHOR, porque ele ouviu a minha voz e a minha súplica” (Salmos 116:1). Há uma grande
profundidade quanto ao humilhante sofrimento de Cristo como o Redentor dos eleitos de Deus
brilhando no Salmo 116. Não esqueçamos que Jesus de Nazaré, o Filho de Deus que também é o
Filho do Homem, tomou cada palavra de cada Salmo nos seus lábios. Consequentemente,
quando louvamos a Deus com os Salmos, estamos usando exatamente as mesmas palavras que
Cristo usou.
Quanto à oração, os Evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João revelam que Jesus foi muito
dado à oração (Mateus 14:23, 26:36; Marcos 1:35, 6:46, 14:32; Lucas 5:16, 6:12, 9:28-29 e João
17). Ainda assim, à parte de João 17 e Mateus 26, muito pouco das orações de Cristo são
registradas nos Evangelhos. Porém, Davi, o doce salmista de Israel e outros, foram usados pelo
Espírito Santo como profetas para escreverem as orações de Cristo! As súplicas dos Salmos são,
realmente, as súplicas de Cristo a seu Pai. Estes Salmos dão uma profunda compreensão e nos
levam a: “compreender, com todos os santos, qual seja a largura, e o comprimento, e a altura, e a
profundidade, e conhecer o amor de Cristo, que excede todo o entendimento, para que sejais
cheios de toda a plenitude de Deus” (Efésios 3:18-19).

O Cristo que julga


Agora, considerando as orações de Cristo nos Salmos, creio que não seja errado ir um pouco
mais longe. Porque Cristo é a Segunda Pessoa da divindade, ele pode rogar ao seu Pai por coisas
que não podemos. Apenas Cristo – que é perfeitamente santo – pode rogar o justo juízo de Deus
sobre os ímpios. No Salmo 59:13, Ele roga: “Consome-os na tua indignação, consome-os, para
que não existam”. Como criaturas caídas, poderia haver pecado se fôssemos rogar tais coisas. É
mais seguro para nós rogarmos: “Venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como
no céu” (Mateus 6:10).
Cristo é o centro de cada Salmo e é desde o início ao fim. Do Salmo 1 ao Salmo 150, devemos,
nas Sagradas Escrituras, para nosso aprendizado, ver Cristo humilhando-se, Cristo sofrendo,
Cristo orando, Cristo louvando, Cristo julgando, Cristo ensinando tanto quanto Cristo
crucificado, ressurreto e exaltado. Aqui está a chave para o nosso louvor, que possamos nos
aproximar de Cristo mais e mais: “Para conhecê-lo, e à virtude da sua ressurreição, e à
comunicação de suas aflições, sendo feito conforme à sua morte” (Filipenses 3:10).

Conclusão de advertência
Finalmente, precisamos reconhecer que o diabo sabe que os Salmos nos direcionam a Cristo. O
diabo odeia isso e ele vai fazer o que puder para mudar e diminuir a declaração de Cristo como o
Filho de Deus, Salvador de pecadores. Isto é trazido à nossa atenção quando o diabo cita
incorretamente o Salmo 91, versos 11 e 12 – que é uma profecia de Cristo – durante a tentação
no deserto (Mateus 4:6). Em referência ao Salmo, o diabo remove toda a afirmação importante:
“para te guardarem em todos os teus caminhos”.
Este tipo de coisa é um perigo real em nossos dias quando homens estão tentando depreciar os
Salmos ou removê-los da adoração a Deus. Faríamos bem em nos lembrar que o Livro dos
Salmos é uma parte integral das Escrituras: “Toda a palavra de Deus é pura”
(Provérbios 30:5) e “Toda a Escritura é divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para
redarguir, para corrigir, para instruir em justiça” (2 Timóteo 3:16).
Com respeito a isso, Cristo, ao ensinar seus discípulos, os encoraja ao dizer-lhes: “Escutarei o
que Deus, o Senhor, falar; porque falará de paz ao seu povo, e aos santos, para que não voltem à
loucura” (Salmos 85:8). Que bênção e que advertência!
Creio que esses poucos comentários de uma alma conflitante possa ser de alguma ajuda. É
apenas o Espírito Santo que pode confirmar a verdade.

Donald Balfour é professor de Geografia e de Apoio ao Aprendizado na Academia Fortrose, e é


membro da congregação de Dornoch da Free Presbyterian Church of Scotland [Igreja
Presbiteriana Livre da Escócia].
IV. O LOUVOR DO SANTUÁRIO
Salmos, Hinos, Paráfrases – O Seu Valor Como Louvor
William Mackay

iscussões sobre o assunto de louvor geralmente incluem a questão se hinos inspirados ou


D não inspirados devem ser usados. Os argumentos frequentemente baseiam-se na prática
daqueles que são considerados cristãos e grandes nomes podem ser citados em ambos os
lados. Parece uma base insatisfatória sobre a qual se deve decidir tão importante questão,
portanto, tenho me esforçado para receber a orientação da própria Escritura.

I. SALMOS
Cânticos do Velho Testamento
Podemos, de forma útil, começar examinando o desenvolvimento do cântico no Velho
Testamento. O primeiro cântico é, provavelmente, o de Lameque em Gênesis 4:23-24, e é um
cântico de guerra. Muitos dos oráculos do Velho Testamento são expressos de forma poética,
como a bênção de Jacó, mas o primeiro verdadeiro cântico de louvor é o cântico de Moisés após
cruzarem o Mar Vermelho. Então, há, no capítulo 32 de Deuteronômio, em que Deus instruiu
Moisés a ensinar a Israel, um cântico de testemunho contra eles quanto à infidelidade. Segue-se a
bênção de Moisés e o Salmo 90 é dele. Então temos os cânticos de Débora e Ana, e isto nos leva
ao tempo de Davi. A maioria dos Salmos são dele, mas seu lamento por Jônatas e as últimas
palavras de Davi aparecem apenas em 2 Samuel. Um dos cânticos de Davi aparece duas vezes,
em 2 Samuel 22 e no Salmo 18.
Agora temos uma questão que transcende completamente aquilo que foi referido anteriormente
quanto ao cântico inspirado e não inspirado. Aqui temos cânticos, alguns dos quais são
genuinamente inspirados, e, não obstante, quando o Livro de Salmos foi compilado, eles não
foram incluídos. Certamente poderíamos ter esperado que o cântico de libertação do Egito, o
cântico de nascimento da nação de Israel, tivesse um lugar proeminente no hinário deles. Mas ele
está ausente juntamente com aquele que Deus disse que não deveria ser esquecido dos lábios da
semente deles. Se olharmos um hinário moderno, veremos que cada cântico, que por qualquer
motivo possa ser chamado de espiritual, não importando quais são as credenciais do autor, foi
pressionado para o culto. Se esses métodos tivessem sido operados no caso dos Salmos, então,
todos os cânticos de Moisés e Davi, com os de Débora e Ana, teriam certamente sido incluídos.
Como é, então, que eles foram omitidos?

Princípios para seleção dos Salmos


As palavras nos títulos de muitos Salmos: “Para o músico-mor”, indicam a autorização dos
Salmos para o uso na adoração. Podemos descobrir algum princípio que aparece operar nesta
seleção? Penso que podemos. Eu sugiro três.
1. A atmosfera dos Salmos é o louvor e exaltação de Deus, em seu Ser, sabedoria, poder,
santidade, justiça, bondade e verdade; em sua Palavra e em suas obras, na criação, providência,
redenção. Cento e quarenta e quatro Salmos começam com “Deus”; 24 mencionam Deus em
todos os versos. Mas mesmo quando o salmista está sendo mais pessoal, é o lidar de Deus com
ele que é exaltado. Ver o Salmo 23, “me” ou “mim” em cada verso, mas sem egotismo. O tema é
o que Deus fez. Louvor é feito a partir da expressão e não da impressão. Como na presença da
realeza, todos os olhos são voltados para o monarca, e ninguém lhe dá as costas, assim é o
salmista diante de Deus e o que ele diz é pronunciado nos ouvidos de Deus. No louvor, Deus é
glorificado e o homem é humilhado; e o primeiro requisito do Saltério é que Deus deve ser
louvado.
Cada livro da Escritura é para a glória de Deus, mas nos livros históricos temos que passar por
um capítulo, ou muitos, antes da ação de Deus se tornar mais evidente. Nos Salmos históricos,
por outro lado – 78, 105, 106 – você encontra a ação de Deus rapidamente, raramente demora-se
mais do que dois versos e, comumente, em cada verso.

“No louvor, Deus é glorificado e o homem é humilhado; e o primeiro requisito


do Saltério é que Deus deve ser louvado”

2. Em segundo lugar, há um princípio seguido de que apenas cânticos que são adequados para
uso no louvor por todas as pessoas estão incluídos entre os Salmos. Isso não significa que não
haverá referências a assuntos judaicos, pois a economia judaica era algo típico, e sua história
revela o propósito e governo de Deus de uma forma que é fundamental para a dispensação cristã.
Mas isso significa que os Salmos não foram compilados apenas ou principalmente como um
manual de louvor para a nação judaica. Se tivessem assim sido, os dois cânticos de Moisés não
poderiam ter sido omitidos. Embora o cântico de Êxodo 15 não esteja incluído como um todo,
sete Salmos referem-se à divisão do mar, e 18 contêm passagens paralelas a Deuteronômio 32. O
cântico de Débora é de importância principalmente para Israel, e é excluído, mas uma frase dele:
“Tu subiste ao alto, levaste cativo o cativeiro”, aparece no Salmo 68. O cântico de Ana é
excluído, mas uma parte dele é reproduzida no Salmo 113:7-8 e cada verso é citado em outros
lugares. O lamento de Davi por Jônatas não está incluído - não é louvor de Deus, e parece ser
uma das expressões meramente humanas e sem inspiração, de Davi. As últimas palavras de Davi
não estão incluídas, embora inspirado, sendo pessoal para si mesmo.
Concluímos, então, que cânticos que eram verdadeiramente cânticos nacionais de Israel não
foram incluídos, mas apenas cânticos que estavam numa forma adequada para ser a substância
do louvor de Deus de uma maneira mais ampla e por outras nações.
3. Em cerca de metade dos Salmos a expressão é de uma única pessoa, e o terceiro princípio que
podemos traçar é que esta é uma pessoa representativa. Em cerca de 12 destes Salmos pessoais,
fala um pecador representante, David ou Asafe, um pecador salvo. Em mais de 60 Salmos temos
um orador que em muito transcende David ou Asafe em sua pessoa, caráter e obra. Ele oferece a
Deus o louvor de um coração justo, mas, ao mesmo tempo, ele carrega uma carga de culpa. Ele é
o redentor, e os principais Salmos desta natureza foram compilados por nosso Senhor para si
mesmo, e Ele disse: “Na sua lei está escrito acerca de mim”. Os apóstolos seguiram Cristo nesse
ensino, e têm apontado para passagens que não são verdades acerca de Davi, e não se aplicam a
ele.

Salmos messiânicos pessoais


A igreja primitiva parece ter consistentemente considerado os Salmos pessoais como
especialmente messiânicos, e assim fez Agostinho. Em tempos mais modernos, temos os
comentários do Bispo Home, John Brown e Andrew Bonar seguindo a mesma linha. É um
infortúnio que Calvino, em seus comentários dos Salmos, tenha persistido em identificar cada
Salmo pessoal como referindo-se, em primeiro lugar, ao seu autor, e apenas de modo secundário
e por acomodação, a Cristo – mesmo nos Salmos 16, 22, 40 e 69, que são atribuídos somente a
Cristo no Novo Testamento. O respeito que Calvino tem como comentarista talvez explique
porque nos púlpitos de uma igreja que canta os Salmos, como a nossa, a ênfase primariamente
num personagem messiânico, em mais do que uns poucos Salmos, não é mais fortemente feita.
Em seu comentário sobre Atos, escrito depois dos Salmos, Calvino expõe num sentido
primariamente messiânico os mesmos Salmos que ele tinha previamente tratado como
primariamente referindo-se a Davi. Isto demonstra que ele tinha pensamentos secundários, e,
neste caso, estes pensamentos secundários eram, sem dúvida, melhores.
Vemos, então, que Davi ou Asafe, como pecadores representantes eram adequados, sob a
orientação do Espírito, para serem nossos guias naquela esfera. Mas para nos guiar no caminho
da justiça, não apenas para apontar para nós, Davi deve dar lugar a Cristo. Há duas tremendas
vantagens nisto. Em primeiro lugar, nosso modelo é perfeito; e, em segundo lugar, onde nossa
experiência manca enquanto tentamos seguir os Seus passos, nossa fé entra em exercício e,
então, nunca estamos cantando um algo estranho a nós ou uma experiência não prescrita, como
em muitos hinos.
Os Salmos foram, desde o início, divinamente designados para serem os veículos de louvor para
todas as nações e gerações, e não simplesmente para os judeus. A vida, morte e ressureição de
Cristo, e o seu próprio ensino sobre como os Salmos testificam quanto a estes assuntos lançaram
nova luz nos Salmos e o tornaram o Livro duplamente aceitável como manual de louvor Cristão.
Nenhum livro novo de louvor foi provido. Em toda a abundante provisão para a igreja infante,
nos ricos dons – sabedoria, conhecimento, fé, curas, milagres, profecias, discernimento, línguas,
interpretação (1 Coríntios 12:8) – que choveram sobre seus membros em vários ofícios –
apóstolos, profetas, mestres, e assim por diante – pelos quais ela foi servida, não há sequer
nenhuma sugestão de que uma nova salmodia era necessária, ou de que algum novo salmista haja
sido apontado.
O hinário da igreja cristã foi completado centenas de anos antes e precisava apenas da
ressurreição e ascensão de Cristo para interpretá-lo, porque nos Salmos, Cristo é sempre visto do
ponto de vista do pós advento. A prática da igreja apostólica confirma completamente esta
afirmação e a igreja primitiva seguiu a prática apostólica.

“Uma coleção, com os mais irrepreensíveis hinos reunidos, choca


imediatamente por esta característica de ser centrada no homem e ter Deus
como secundário”

II. HINOS
Os primeiros competidores a ganharem terreno contra os Salmos foram aqueles hinos que
apareceram no segundo século para promoverem o gnosticismo e heresias similares. Os: “hinos e
cânticos espirituais”, por outro lado, mencionados em Efésios e Colossenses, são termos usados
na Septuaginta para descreverem os Salmos, e o hino mencionado em Mateus é também um
Salmo. Alguns dos hinos gnósticos louvavam virtudes práticas. O partido ortodoxo escreveu
hinos para contrapor, mas eles não foram bem recebidos porque eram na sua maior parte
baseados em credos e lhes faltava calor. Depois disso seguiram-se os hinos latinos e gregos,
contemplativos, narrativos, subjetivos, que estabeleceram a moda para os hinos modernos.
Muitos hinos são uma expressão da experiência cristã, sentimentos, ambições, orações do autor,
e têm muitas das valiosas características de um diário cristão. Diários, tais como os de Boston,
Fraser, Halyburton e Bonar, podem ser leituras edificantes para outros cristãos. Do mesmo
modo, hinos como o de Murray McCheyne, “I once was a strange” [Eu era um estranho], ou o de
Charlote Elliot “Just as I am” [Apenas como eu sou], descrevem a conversão do autor de um
modo simples e comovente, calculado para ajudar outros a tomarem o mesmo caminho. Mas eles
são, por necessidade, composições subjetivas, não possuindo as altas características do louvor
exemplificado nos Salmos e não foram, de fato, escritos tendo em vista este fim. Não é algo
ofensivo ser subjetivo - o Livro de Jó, por exemplo, é quase completamente assim. Temos muito
respeito por esses hinos. Mas nós temos um problema com aqueles que compilaram tais hinos e
os puseram como substitutos para o manual divino. Uma coleção, com os mais irrepreensíveis
hinos reunidos, choca imediatamente por esta característica de ser centrada no homem e ter Deus
como secundário.
Murray McCheyne, que citamos, veria com aversão a ideia de usar qualquer uma de suas
composições como uma substituta para os Salmos no louvor público. Mas houve muitos
compositores de hinos que pensaram que Deus deixou a si mesmo sem uma testemunha quanto à
questão do louvor na época do Novo Testamento e que cabia a eles suprir esta deficiência. Isaac
Watts rescreveu os hinos para fazer Davi falar como um cristão e outros compositores de hinos
adotaram papéis igualmente presunçosos. Os resultados podem apenas ser descritos como
desastrosos. Eu proponho fazer um breve resumo acerca disso.

Defeitos nos hinos


1. A vasta maioria dos hinos tem uma esmagadora nota subjetiva, mesmo quando o assunto de
muitos hinos individuais seja bom. Um escritor, ao apoiar os hinos, diz: “O verdadeiro hino deve
nos levar em direção a Deus. Não é necessário que Deus deva ser diretamente abordado, mas
deve ser predominante nos pensamentos, senão particularmente notável na expressão. O
verdadeiro hino deve tender para Deus; trazê-lo à mente, exaltar seu nome e buscar a sua glória.
Aqueles que são simplesmente introspectivos, didáticos, dogmáticos, sentimentais, egoístas e
similares não são hinos. Alguns dos chamados hinos são como as declarações dos fariseus no
Templo, eles não contêm um único elemento de louvor”. Em minha opinião, a grande maioria
dos hinos não consegue alcançar o padrão aqui estabelecido.
2. Nos hinos em geral, Deus está contemplado quase sempre como amigável, o pecador como
justo. A prevalência da impiedade e o julgamento de Deus, sobre o qual uma igual ênfase é
colocada nos Salmos, são quase ignorados.
3. As porções proféticas do louvor com relação à vida, morte, ressureição e governo de Cristo
são completamente perdidas nos hinos.
4. Há multidões de erros, dos quais apenas alguns dos mais gerais podem ser notados. Em sua
tentativa de ser vívido, o compositor de hinos, muitas vezes, consegue apenas ser superficial. Um
notável exemplo disto pode ser visto no emprego da palavra "cruz". Esta é uma palavra cujo uso
pode ser visto de modo diferente sob os nossos próprios olhos no Novo Testamento. Antes da
morte de Cristo, a palavra cruz significava uma estaca na qual um homem condenado, sob o
governo romano, era exposto à morte. Após a ressurreição de Cristo, não encontramos a palavra
cruz sendo usada deste modo. A palavra “madeiro” é usada como substituta cinco vezes. O
apóstolo Paulo, ensinado pelo Espírito de Deus, para adaptar palavras espirituais a verdades
espirituais, usou a palavra cruz como equivalente à expiação pela morte vicária de Cristo.
Quando ele pregou a cruz e se gloriou na cruz, não é a mera madeira ou símbolo que estava em
questão. Mesmo num caso onde à primeira vista o uso parece ser literal – “Havendo riscado a
cédula que era contra nós nas suas ordenanças, a qual de alguma maneira nos era contrária, e a
tirou do meio de nós, cravando-a na cruz” (Colossenses 2:14) – a ação é figurativa, e pode ser
explicada apenas em termos da completa expiação.
O símbolo da cruz não pode ser encontrado até o quarto século. O imperador Constantino
modificou o sistro pagão de Osíris para fazer um emblema sob o qual tanto pagãos quanto
cristãos poderiam marchar. A Igreja Romana com a sua veneração da “verdadeira cruz”, suas
“cruzadas” e crucifixos perpetuou o erro e a Igreja Anglicana o manteve, fazendo o sinal da cruz
nas crianças, no batismo, e multiplicando o símbolo dentro e fora das igrejas. As igrejas
reformadas se livraram deste símbolo e o uso da cruz como algo pagão, mas nos hinos temos isto
reintroduzido com força, sendo a verdade vital e espiritual substituída pelo fraco e pobre
elemento simbólico. Por exemplo:
With the cross of Jesus going on before [Com a cruz de Jesus indo adiante] – S. Gould
When I survey the wondrous cross [Quando considero a maravilhosa cruz] – Watts
Hold Thou Thy cross before my closing eyes [Segure Tu a Tua cruz diante do fechar dos meus
olhos] – Lyte
Simply To Thy cross I cling [Somente à Tua cruz me agarro] – Toplady
Beneath the cross of Jesus [Debaixo da cruz de Jesus] – Clephane
The old rugged cross [A antiga rude cruz] – Bennard
Quase toda referência nos hinos é passível de ser interpretada, principalmente, como referindo-se
à cruz física. A cruz no sentido paulino, você pode encontrar nos Salmos 22, 40, 96 e 102, onde
você tem alguém que reivindica uma perfeita justiça suportando e confessando uma carga de
culpa. A degradação da palavra “cruz” foi grandemente fomentada pelo uso de hinos e a doutrina
bíblica da expiação tornou-se uma ofensa.
Quando pessoas têm o propósito de elaborar um hinário, fica evidente que uma grande afeição as
inclina às suas preferências por todo tipo de composição, exceto quanto aos Salmos. Exemplos
disso são os acolhimentos às dúvidas de Arthur Hugh Clough, em “Say not the struggle not
availeth” [Não diga que a luta é inútil], e à deserção de John Henry Newman. No hino, “Lead
kindly light” [Conduza gentil luz], há duas impropriedades que deveriam deixar-nos
imediatamente em guarda. Em primeiro lugar, não devemos nos dirigir a Deus como se Ele fosse
um dos seus atributos. Ele é um Deus pessoal que se cobre de luz. Em segundo lugar, não há uma
luz nas Escrituras com as características que Newman dá. A luz de Newman, que o conduziu
sobre uma terra estéril, é o complemento espiritual do fogo-fátuo que o levou a cair no pântano
do romanismo.
No “Crown him with many crowns” [Coroe-o com muitas coroas] de Bridge, temos uma vã
intrusão nas coisas que não se podem ver, com Cristo andando num prado pagão florido, e
honrado como o fruto da “Mystic Rose” [Rosa Mística], a Virgem Maria, e o autor gerenciando o
palco para os subordinados celestiais.
Imagens da natureza são largamente utilizadas, as ondas sobem e os ventos varrem. Nuvens e o
brilho do sol, os penhascos e as torrentes, mares revoltos e rios obscuros, preenchendo o vago e
incerto relato para criar uma atmosfera sem compromisso. Há uma diferença entre um desejo e
uma oração. Balaão disse: “Que a minha alma morra a morte dos justos, e seja o meu fim como o
seu”. Isto era um desejo. Balaão amou o salário da injustiça, mas desejou a recompensa de um
homem justo. Os hinos estão cheios de desejos e suspiros, e como substitutos para a oração, para
as realidades, eles são coisas perigosas. Pensamentos ilusórios ao invés de oração verdadeira, são
uma forma de: “doce, doce, doce veneno para o faminto” [sweet, sweet, sweet poison for the
age’s tooth – citação de Shakespeare, numa obra chamada King John]. A coletânea de poemas
The Christian Year [O Ano Cristão] promove a observância de festas inventadas pelo coração
dos homens e é uma sutil substituta, com uma atraente forma de ritualismo, para os sacramentos
e os Shabats, que foram apontados por Cristo.
Fiquei espantado ao virar as páginas de uma coletânea de composições espiritualistas e descobrir
quantas delas, que são populares, têm sido incorporadas com pouca ou nenhuma alteração aos
manuais de louvor que são usados. Essas composições, nas quais a invocação é feita à luz, à
alegria, ao amor, ao invés de a um Deus pessoal, prestam-se prontamente a essa mudança. Havia
apenas a porção de dois Salmos que poderiam ser encontrados nos referidos manuais.
Devemos perguntar a nós mesmos sobre qual tipo de atitude devemos ter ao nos aproximarmos
de Deus. O salmista o faz com um temor piedoso, com amor misturado com reverência. O
Senhor Jesus, em sua vida terrena, foi gentil e paciente com seus discípulos, mas ainda havia um
grande respeito na forma como o abordavam. Após a sua ressureição, esta reverência ficou ainda
mais pronunciada. E quando Ele apareceu a João, em Patmos, foi com uma glória que fez o
amado e amável discípulo cair como morto. Deus tem se agradado em demonstrar-se familiar aos
seus escolhidos tais como Abraão, Moisés e Daniel, mas nunca lemos acerca deles buscando
demonstrar alguma presunção ao tratar com Deus de um modo desrespeitoso. No entanto, uma
das principais formas pelas quais alguns compositores de hinos perderam o contato com a
realidade espiritual foi pela sua abordagem exageradamente familiar. Há hinos que alcançam a
consagração de seus compositores apenas à custa da profanação de seu Senhor.

Erros doutrinários nos hinos


Num hinário típico penso que não mais do que um terço dos hinos são passíveis de objeções,
com base na péssima doutrina, irreverência, orgulho ou complacência que saltam diante dos
nossos olhos. E os inofensivos remanescentes são tão preponderantemente sobre experiências
pessoais ou didáticos, que não possuem as características de louvor, como os Salmos nos
ensinaram a praticá-lo.
O efeito da doutrina errada e de outros erros dos hinários é muito mais poderoso do que é
comumente percebido. Se somente a verdade nos é ensinada, ainda é o caso que, como criaturas
falíveis, consigamos infundir nosso próprio erro nela. Nosso Senhor não disse aos discípulos
muitas vezes que Ele tinha vindo para morrer? Mas eles persistiram na sua própria crença de que
Ele tinha vindo para reinar. Calvino diz: “Tal é a propensão da mente humana em se desviar, que
irá mais rapidamente para o erro pelo uso de uma palavra, do que irá para a verdade por meio de
um longo discurso”. Mesmo sob o ensino perfeito do Senhor, os homens erraram. Misture com a
sua verdade meros 5% de erro e o que você terá? Aquele pequeno bocado de erro torna-se todo o
conteúdo de assimilação do ouvinte.

“Para pessoas que não são diligentes no estudo das Escrituras, o hino,
impresso na memória pelo ritmo e melodia, é a mais efetiva agência de ensino,
e seus padrões errôneos agem como um antídoto contra a verdade”

Há uma seletiva absorção do elemento errôneo. Para pessoas que não são diligentes no estudo
das Escrituras, o hino, impresso na memória pelo ritmo e melodia, é a mais efetiva agência de
ensino, e seus padrões errôneos agem como um antídoto contra a verdade. Tudo o que foi dito
num recente Monthly Record [um periódico] sobre a mudança de ênfase do conhecimento para o
sentimento no modernismo se aplica igualmente à coleção de hinos, sem o qual o modernismo
seria privado de um dos seus mais efetivos pilares.
Não conheço igreja alguma que, ao fazer uso de hinos, não tenha uma grande rachadura interna
no que diz respeito a questões de fé ou prática. Isto não é um acidente. Uma pessoa convertida,
fundamentada na Escritura, tem um antídoto contra a influência dos hinos que geralmente a
capacita a suportar uma pequena influência adversa. Uma pessoa não convertida não possui esse
antídoto e os hinos, pelas suas expressões duvidosas e omissões da verdade vital, tanto quanto
seus erros, confirmam-na em sua disposição natural.
Hinos também são grandes divisores entre as igrejas porque desde o tempo dos gnósticos e até o
tempo presente, cada diferente tipo de crença prefere ser fortificada pelo uso de seus próprios
hinos particulares.
Os Salmos, divinamente aprovados como o veículo de louvor, são designados para ser uma
influência unificadora com respeito à soberania de Deus e à autoridade das Escrituras. Esta é
outra razão pela qual devemos ser militantes em nossa defesa do seu uso.

III. PARÁFRASES
Agora uma palavra sobre paráfrases. O que é uma paráfrase? Antigamente, os Salmos
metrificados foram chamados de paráfrases métricas dos Salmos. A prosa do Salmo diz: “O
Senhor é meu pastor, nada me faltará. Deitar-me faz em pastos verdes”. E paráfrase métrica diz:
“O Senhor é meu pastor, nada me faltará. Ele me faz deitar”. Isto é, a paráfrase métrica diz a
mesma coisa que a prosa, mas as palavras são reorganizadas para se encaixarem na métrica, com
poucas mudanças, conforme a possibilidade. A primeira coisa que podemos notar, portanto, é
que um terço das chamadas paráfrases não são paráfrases de modo algum e outro terço delas são
transcritos frouxos. Alguns versos são boas traduções das Escrituras; por exemplo, a paráfrase de
Romanos 3:19-20: “Nenhuma esperança pode ser edificada sobre a lei”, etc.. Mas: “Vós que sois
indolentes e preguiçosos! Levantem-se, vejam o trabalho das formigas e sejam sábios”, não tem
a mesma concisa simplicidade do original. Nenhum destes, porém, é um louvor, mas na verdade
é pregação ou exortação, dito da parte de Deus para o homem, e não do homem para Deus.
Em Gênesis 28:18 temos: “Então levantou-se Jacó (...)” etc., e na segunda paráfrase: “Oh Deus
de Betel”. Isto não é, com certeza, uma paráfrase, mas apenas um hino baseado num pensamento
sugerido pela prosa da passagem. Não devemos ser enganados por um nome.
A maioria das chamadas paráfrases faz uso de uma liberdade bem indevida em seu material,
acrescentando à divina Palavra conceitos humanos. Não há virtude em desviar-se daquilo que
Deus apontou para o cântico e substituí-lo por aquilo que Deus apontou para ser pregado e
narrado. Pode haver uma boa razão para pessoas iletradas usarem a forma métrica de uma
narrativa para ajudar a memória. As Gude and Godly Ballads [As músicas boas e piedosas] na
Escócia e os hinos de Lutero na Alemanha ajudaram grandemente a divulgar a Reforma. Mas
não podemos cair na ilusão de que porque algo está num verso, se torna, por isso,
automaticamente um louvor como aqueles que fazem coleções de hinos são tão propensos a
imaginar.
Se eu fosse informado que deveria tirar uma igreja ortodoxa que canta os Salmos para fora das
Escrituras, primeiro eu sugeriria que eles deveriam ser induzidos a usarem paráfrases, como se
fossem a Palavra de Deus em versos. Após uma geração ou mais, eu lhes diria que há hinos mais
escriturísticos (como “Rock of Ages” [Rocha das Eras]) do que algumas paráfrases (tais como
“O God of Betel” [Oh Deus de Betel]), e os faria adotar alguns hinos melhores. Após isso,
alguém pode, de acordo com a ocasião, fazer com que os hinos cheguem a uns 500 e substituam
tanto as paráfrases quanto os Salmos. Isto não é realmente muito original – aconteceu assim em
nossa própria igreja. Em 1870, a Assembleia Geral da Free Chuch of Scotland [Igreja Livre da
Escócia] concordou em admitir: “vinte e cinco hinos do melhor tipo”. Numa questão de dez
anos, havia centenas e eles desempenharam um importante papel no movimento de declínio
espiritual em direção ao término do século XIX.

CONCLUSÃO
A diferença entre a mais orgulhosa composição de um homem não inspirado, tentando revelar a
Deus, e o mais humilde Salmo é toda a diferença entre a terra e o céu. Nos Salmos, temos a
Escritura em miniatura – história, biografia, teologia, profecia, devoção – tudo revestido de um
traje de louvor e expresso, como em muitos deles, pela boca de um mediador cujos pensamentos
são amplamente escritos. Hinários, por comparação, naquilo que eles incluem e ainda mais
naquilo que são incapazes de expressar, são como a palha para o trigo.
A lei de Deus é perfeita e converte a
alma que no pecado está
O testemunho de Deus é verdadeiro,
e torna o simples sábio.
É tanto nosso privilégio quanto nossa sabedoria testemunhar a nós mesmos e a outros que esta
mensagem evangelística, missionária e revitalizante não é menos que os Salmos, os Evangelhos
ou qualquer outro livro bíblico. Esta é uma verdade que muitos têm esquecido.
Este capítulo IV foi originalmente uma palestra realizada na Reunião Anual da Associação de
Estudantes da Free Church e foi impresso na Monthly Record [um periódico] da Free Church of
Scotland [Igreja Livre da Escócia], em abril de 1956, 67 - 71.
Major William Morton Mackay, M.C, lutou como oficial do exército nas duas guerras mundiais,
ensinou engenharia elétrica na Universidade de Saint Andrews, e serviu por muitos anos como
presbítero regente em Dundee, na congregação da Free Church of Scotland [Igreja Livre da
Escócia]. Ele faleceu em 1971.
V. CANTE O CÂNTICO DO
SENHOR
Salmos Bíblicos na Adoração
John Keddie

I. PREPARANDO A CENA

cântico de louvor ao Senhor tem sido um aspecto da vida da igreja desde o tempo do Velho
O Testamento. Mesmo antes das especificações do Tabernáculo serem reveladas, havia um
derramar de cântico inspirado ao Senhor. O êxodo do Egito produziu o cântico de Moisés
(Êxodo 15:1-18) e o cântico de Miriã:
“Cantai ao Senhor,
porque gloriosamente triunfou;
e lançou no mar o cavalo
com o seu cavaleiro”
(Êxodo 15:21).

Até no último livro do Novo Testamento, os remidos do Senhor têm uma canção para cantar em
seu louvor. Na verdade, o cântico dos remidos em glória é o cântico de Moisés e o cântico do
Cordeiro (Apocalipse 15:3-4). Desta forma, uma ligação é feita entre o primeiro cântico
inspirado da Escritura e o último! Pode ser facilmente reconhecido que a música sempre
desempenhou um papel importante na vida da igreja do Deus Vivo.

A posição dos Salmos na adoração


Até relativamente pouco tempo os Salmos inspirados desfrutaram de um lugar de proeminência
no louvor da igreja. Estes cânticos de Sião, de uma forma ou de outra, têm encorajado, erguido,
instruído e inspirado gerações de cristãos fervorosos. A Reforma do século XVI viu uma
renovação do cântico congregacional dos Salmos, restaurando a prática que prevaleceu na igreja
primitiva. Subsequentemente, especialmente nas igrejas presbiterianas, os Salmos metrificados
foram mais ou menos usados exclusivamente nos cultos da adoração pública.
Hoje a situação é muito diferente. Os Salmos da Escritura têm sido largamente substituídos na
adoração da igreja moderna. Padrões de adoração estão mudando rápida e desnorteadamente.
Cânticos e hinos de inteira concepção e composição humana têm proliferado. Parece que em
qualquer coisa que acontece no culto hoje, há um desejo por algo novo. Cultos e programas
evangelísticos devotam uma quantidade significativa de tempo aos hinos e cânticos de coros. Os
Salmos das Sagradas Escrituras parecem ter sido deixados bem atrás. Igrejas que têm mantido o
cântico dos Salmos estão sob pressão para mudar esta prática com base na ideia de que o louvor
hoje é considerado algo que impede as pessoas de virem à igreja. Talvez tal louvor possa até ser
considerado como “restritivo” por alguns ou como algo que não encoraja a “verdadeira”
adoração.

A situação da adoração hoje


Em todo esse fluxo na área da adoração pública é mais fácil reconhecer o que homens desejam
ou exigem do que estabelecer respostas bíblicas para perguntas como estas: “O que Deus
autoriza em seu Culto?”, “A Bíblia é clara quanto àquilo que devemos usar na adoração?”,
“Realmente devemos contar com aquilo que é moderno, no entanto, o que está sendo avaliado ou
por quem deve ser determinado?”.
Até certo ponto será inevitável que o estilo musical das pessoas será moldado por fatores
culturais. Mas isso será verdade também quanto ao conteúdo? Deus não proveu um manual de
louvor? Este capítulo é devotado a considerações como estas. A tese básica é que uma reforma é
amplamente necessária nesta área da adoração. Afirmamos que exige-se que um retorno seja
dado tanto a um “princípio regulador” responsável e centrado em Deus quanto ao uso de material
de louvor ordenado e inspirado por Deus.

“É uma preocupação deste capítulo estabelecer que, na área do culto público,


há o mandamento para o cântico congregacional de apenas materiais de
inspiração diretamente divina”

Uma defesa do uso exclusivo de materiais inspirados no louvor


É uma preocupação deste capítulo estabelecer que, na área do culto público, há o mandamento
para o cântico congregacional de apenas materiais de inspiração diretamente divina. Por:
“materiais de inspiração diretamente divinos”, queremos apontar para aquelas composições que
derivam seu conteúdo, pensamento, detalhe, verdade e autoridade do fato de serem a Palavra de
Deus escrita e serem parte do cânon das Sagradas Escrituras, infalível e inerrantemente
produzidas sob a inspiração do Espírito de Deus (ver Hebreus 1:1; 2 Pedro 1:21; 2 Timóteo
3:16). Em outras palavras, está pressuposto neste estudo uma alta doutrina da Escritura e do
cânon da Sagrada Escritura, como expresso, por exemplo, na Confissão de Fé de Westminster,
capítulo 1.
Por “não inspirado” queremos dizer todos os escritos que não fazem parte do cânon da Sagrada
Escritura, ainda que possam ser fiéis às Escrituras. É nossa convicção que há mandamento para o
uso do Livro dos Salmos no cântico de louvor no culto público de Deus. Mas e quanto aos outros
cânticos encontrados nas Escrituras, fora do Saltério?
A posição dos cânticos fora do Saltério
Em face disso, o uso de outros cânticos da Escritura, que estão fora do Saltério, não parece ser
questionável visto que o princípio que defende que apenas cânticos inspirados não é violado.
Mas nossa preocupação deve ser quanto ao uso daquilo que tem uma divina sanção e aprovação.
Há uma sanção clara para o Livro dos Salmos. Tal sanção não é clara em conexão com outros
cânticos encontrados na Escritura. Estes podem ter sido destinados a um uso temporário e
nacional, e raramente expressam verdades que já não estejam nos Salmos. Sobre esta questão, a
conclusão de John Murray em seu Minority Report do Comitê Sobre Cânticos na Adoração
Pública, apresentado à Assembleia Geral da Igreja Presbiteriana Ortodoxa em 1947, recomenda:
“Diante da incerteza com respeito ao uso de outros cânticos inspirados, devemos nos confinar ao
Livro dos Salmos”.

A questão das paráfrases das Escrituras


É sabido que mesmo dentro da tradição reformada, materiais bíblicos, além dos 150 Salmos tais
como paráfrases das Escrituras, têm sido usados ocasionalmente em igrejas que cantam Salmos.
Para esse escritor, há duas principais objeções para a adoção de tais materiais:
(1) Não há uma clara autorização nas Escrituras para colocar em verso, para serem cantadas,
partes da Bíblia que não foram originalmente registradas em forma de cântico; e
(2) na verdade, é algo presunçoso para qualquer pessoa ou grupo de pessoas tomarem sobre si
a responsabilidade de selecionar as passagens que serão adaptadas para o cântico. Afinal, se o
Senhor não intencionou que tais passagens fossem expressas em forma de cântico nem indicou
que tais passagens devam ser parafraseadas para o cântico, por qual autoridade homens tomam
esta responsabilidade?

Uma reflexão pessoal


Talvez, neste ponto, um comentário pessoal possa ser conveniente. O escritor foi criado numa
tradição predominantemente presbiteriana de cântico de hinos. Pouco se pensava em como as
composições eram feitas, no conteúdo dos hinos ou nos princípios – se havia algum, por trás da
seleção de materiais para o louvor da igreja. Isto não quer dizer que os cantores não sabiam o que
significava o que eles estavam cantando ou que não havia cuidado na seleção que faziam. Mas o
princípio para o cântico de hinos – do uso de material não inspirado – não era questionado. Era
apenas aceito e não havia questionamentos. Bons homens devem concordar com isso. Era bom o
suficiente para mim e, sem dúvida, para a maioria das outras pessoas. Porém, quando eu percebi
que a maior parte das igrejas da Reforma usaram apenas os Salmos, e do mesmo modo os
puritanos ingleses e os covenanters escoceses, sem mencionar a maioria dos presbiterianos dos
séculos XVIII e XIX na Grã-Bretanha, nos Domínios e nos Estados Unidos da América, comecei
a questionar minha aceitação, até então impensada, dos hinários modernos. Comecei a perguntar:
“Não há, afinal, ao menos bons argumentos para usar apenas os cânticos das Sagradas Escrituras,
inspirados por Deus, nos louvores públicos formais do Senhor?”.
A descoberta e estudo de algumas exposições dessa posição, a maioria do século XIX, não
fizeram nada para acabar com minhas novas incertezas sobre essa questão. De fato, com o
decorrer do tempo, fui convencido acerca do "princípio regulador", de que só o que é sancionado
por Deus em sua Palavra é apropriado na adoração pública. Foi então um pequeno passo para a
posição adotada por quase todas as igrejas evangélicas cristãs em algum momento no passado,
que nos Salmos das Escrituras há um manual de louvor satisfatório e suficiente mesmo para a
igreja cristã. Quando tive mais familiaridade com os Salmos, passei a ver a sua riqueza na
experiência espiritual; o seu perfeito equilíbrio teológico; a realidade de que Cristo está em todos
os Salmos como Ele está em “todas as Escrituras” (ver Lucas 24:44). Os Salmos, como passei a
vê-los, tendem a produzir um tipo distinto de piedade que é completamente centrada em Deus e
experimental de um modo equilibrado, como alguém poderia esperar do uso de um material
divinamente inspirado. Eu fui convencido.
Isto não é dizer que uma igreja que canta os Salmos é, consequentemente, uma igreja perfeita.
Não é dizer que sua performance quanto ao louvor não possa ser melhorada ou, que para isso, as
traduções dos Salmos cantados não possam ser revisadas e periodicamente melhoradas. Mas,
pelo menos, significa que alguém pode ter uma perfeita confiança, usando apenas os cânticos da
divina revelação, que está sempre cantando, na adoração pública, cânticos que o Senhor aprova
completamente, algo que não é dito mesmo daquilo que pode ser considerado a melhor
composição humana.

"A prática do canto congregacional dos Salmos foi, em si, uma vez difundida,
pelo menos nas igrejas reformadas. Uma revisão dos hinários modernos revela
como os materiais de louvor da igreja moderna largamente datam do século
XVIII"

II. PERGUNTAS FEITAS FREQUENTEMENTE


Abordando a questão de quais materiais são veículos apropriados para o louvor na igreja cristã,
muitas perguntas surgem na mente das pessoas, especialmente quando a posição predominante
sobre o uso de materiais não inspirados é questionada. Neste ponto lidaremos com alguns
possíveis problemas ou mal-entendidos que possam surgir, ou objeções que geralmente são
levantadas contra a detenção do material de louvor dos Salmos Bíblicos.

Não é apenas uma opinião minoritária?


Alguém pode dizer: “Esta é a opinião minoritária hoje. Deve haver, portanto, uma presunção
nessa visão. A vasta maioria dos cristãos certamente não pode estar errada”. O que podemos
dizer quanto a este argumento? Obviamente, não há uma virtude especial em aderir a uma
opinião minoritária. Do mesmo modo, no entanto, a opinião ou prática minoritária não é
necessariamente errada. Era uma opinião majoritária em Israel que deveria haver um rei para
governar. No entanto, isto não pareceu ser reto diante dos olhos de Deus, nem parecia ser algo
bom para a nação a longo prazo (ver 1 Samuel 8:1-22; 10:17-27; 15:10-35)! Opinião majoritária
na história da igreja tem, geralmente, causado opressão ou mesmo tirania. Opinião majoritária
portanto, e do mesmo modo qualquer visão minoritária, deve estar sujeita à consideração
primordial: O que Deus diz? O que é escriturístico (Romanos 4:3; Gálatas 4:30)?
A verdade é que os profetas do Velho Testamento e os apóstolos do Novo Testamento foram,
muitas vezes, chamados para se oporem a uma opinião ou prática majoritária. Mencionar o
profeta Jeremias é suficiente para provar este ponto. Repetidamente, esses homens se
encontraram numa minoria e frequentemente pareciam estar sozinhos por reivindicarem a
verdade. Mesmo o Senhor Jesus Cristo em seus dias na terra não ordenou um apoio à maioria.
No entanto, Ele estava completamente certo. Não devemos prestar muita atenção onde a maioria
está. Nem deveria uma prática da minoria ser desmerecida simplesmente porque ela tem pouco
apoio. Ao mesmo tempo tem que ser dito que a prática do canto congregacional dos Salmos foi,
em si, uma vez difundida, pelo menos nas igrejas reformadas. Uma revisão dos hinários
modernos revela como os materiais de louvor da igreja moderna largamente datam do século
XVIII. Em qualquer outra coisa que ainda possa ser dita quanto a isso, fica claro que, de um
modo geral, materiais de louvor das igrejas de hoje não são apostólicos em sua origem e nem
especificamente ordenados por Deus em sua Palavra. Em nossa opinião, isto levanta sérias
questões para o moderno cantar de hinos.
Foram todos os hinos escritos errados?
Esta questão, então, pode ser levantada: “Você está dizendo que todos esses compositores, cujos
hinos foram tão notavelmente abençoados, estavam errados e estavam em desarmonia com o
Senhor?”. A resposta a isso é um enfático “Não!”. O argumento não é sobre se era certo ou
errado aquela pessoa compor hinos e cânticos religiosos. Não é disputado o fato de que há
muitos hinos com qualidade poética, sã doutrina e doce devoção bem excepcionais. Não é
disputado o fato de que muitos hinos foram grandemente abençoados para muitas almas com o
passar dos anos. O que é questionada é a autorização para o uso de hinos e cânticos de
composição meramente humana na adoração pública e formal da igreja. Embora tais
composições possam ter excelentes sentimentos, mesmo a melhor está aquém de ser
imediatamente inspirada por Deus. Nessa conexão, “inspirado” se refere especificamente àquilo
que é Escritura canônica. É verdade que algumas pessoas dirão que este ou aquele compositor de
hino foi certamente “inspirado” e produziu um cântico inspirado. Num certo sentido, isto pode
estar correto, mas não no sentido de que houve uma divina inspiração, uma inspiração atribuída
somente aos escritores das Sagradas Escrituras. Este é um ponto muito mais significativo do que
é usualmente admitido.

E quanto à questão da bênção?


“Se o cântico dos Salmos é tão correto, por que as igrejas que mantém essa posição não são mais
obviamente abençoadas?”. A questão do material de louvor de uma igreja é apenas um aspecto
da capacidade de resposta da igreja ao Senhor. Há muitos outros importantes aspectos da vida da
igreja e testemunho nos quais deve haver obediência à Palavra e à vontade do Senhor. A bênção
certamente pode ser impedida onde as pessoas ou a igreja falham em obedecer ao Senhor. É
preciso tomar cuidado ao reivindicar uma causa e efeito particular na questão da bênção
desfrutada dentro de uma igreja ou denominação. O que pode ser dito é que há uma relação entre
a bênção do Senhor e a fidelidade de um povo. Vemos isso refletido, por exemplo, no chamado
de Abraão (Gênesis 12:1-3), quando o Senhor diz a ele para se mudar para outra terra e adiciona
a promessa de bênção para ele mesmo e para o mundo de acordo com sua resposta a este
chamado. Mas devemos ter cuidado aqui. Pois pode ser que, enquanto o remanescente é fiel, o
desagrado do Senhor contra uma geração é tal que Ele se recusa a abençoar, apesar da presença
de um Noé, Daniel ou um Jó (ver Ezequiel 14:12-14).
Pode ser sustentado que a igreja tem desfrutado de bênçãos e períodos de avivamentos quando
apenas os Salmos bíblicos foram usados no louvor. Uma igreja que canta os Salmos não ficará
sem a bênção do Senhor porque ela confina o seu material de louvor aos Salmos bíblicos. Falta
de bênção em qualquer igreja surgirá da desobediência em algum lugar na obra e na observância
daquela igreja, talvez por conta do cântico de hinos doutrinariamente dispersos e
devocionalmente desequilibrados.
Não é esta uma questão desnecessária que divide as pessoas?
“Não há questões muito mais importantes para nos preocuparmos do que discutir sobre Salmos e
hinos?”. Não há dúvida de que há outras questões de grave importância e de grande influência
confrontando a igreja. É inegável a prioridade dentro da igreja em apresentar o Evangelho aos
pecadores para que eles possam ser salvos e evitarem uma eternidade perdida. Missões devem
estar na linha de frente quanto ao dever da igreja neste mundo: “Portanto ide, fazei discípulos de
todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (Mateus 28:19).
Mas, é claro, tem mais. A própria grande comissão não termina aí. Jesus continua e diz:
“Ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado; e eis que eu estou convosco
todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mateus 28:20). À igreja cabe não apenas
evangelizar, mas também instruir; para guardarem a Palavra de Cristo, para se conformarem aos
seus ensinos e não, consciente e voluntariamente, irem além dele, por mais que as pessoas
possam considerar-se competentes para adicionar ou melhorar aquilo que já está lá.

Não é uma questão relativamente sem importância?


Sempre que a questão do conteúdo do louvor da igreja é levantada não é incomum as pessoas
sugerirem que é uma questão secundária. Mas isto é correto? A verdade é que a grande
prioridade da igreja cristã, num sentido maior, é a adoração a Deus. O que poderia ser mais
importante? Não é o caso de que a ordem das prioridades da igreja é esta: primeiro de tudo, a
adoração a Deus; segundo, a edificação do corpo de Cristo; e terceiro, a proclamação do
Evangelho para os de fora? Estas coisas, é claro, devem ser encontradas numa igreja ou
congregação viva. Mas é lógico que, se os dois primeiros elementos mencionados não estão bem,
haverá então pouca eficácia no terceiro. Ao mesmo tempo em que chama os pecadores para vir à
fé em Jesus Cristo, o Evangelho está chamando as pessoas de volta para o verdadeiro culto a
Deus (ver Apocalipse 14:6-7). Em vista disso, é um erro considerar o conteúdo do louvor uma
questão, relativamente falando, indiferente para a igreja confessante.
Também é comum que as pessoas aleguem que há uma hierarquia de prioridades nas Escrituras.
Alguns sentem, por exemplo, que as exigências da evangelização têm precedência sobre tais
preocupações como os princípios e práticas de culto. É verdade que não há dúvida de que há
algumas coisas relativamente mais importantes que outras na vida de uma igreja cristã, quando
ela está sendo guiada pela Palavra de Deus. Mas é um erro pensar que há exigências na Palavra
de Deus tão relativamente sem importância que possamos dispensá-las, como se pudéssemos
colocar de lado certas coisas simplesmente porque percebemos que elas não são importantes na
obra e no testemunho da igreja. É perigoso para meros homens decidirem quais partes da
Escritura são necessárias e suficientes e quais podemos seguramente ignorar ou tratar com uma
relativa indiferença. É para a igreja, pelo contrário, submeter-se ao ensino da Escritura como
completamente suficiente em todas as questões de fé e prática (ver 2 Timóteo 3:14-17). Como
diz o Catecismo Maior de Westminster, em resposta à pergunta: “O que é a Palavra de Deus?”
(pergunta 3): “As Sagradas Escrituras, o Velho e o Novo Testamento, são a Palavra de Deus, a
única regra de fé e prática”. A Confissão de Fé é explícita quanto a isso: “Todo o conselho de
Deus concernente a todas as coisas necessárias para a sua própria glória e para salvação, fé e vida
do homem, ou é expressamente declarado nas Escrituras ou pode ser, por boa e necessária
consequência, deduzido dela, à qual nada se acrescentará em tempo algum, nem por novas
revelações do Espírito, nem por tradições dos homens” (I:6).
É muito fácil dizer que a questão acerca dos específicos materiais de louvor não é central ou
primordial nas preocupações da igreja. No entanto, as Sagradas Escrituras contêm um Livro de
150 Salmos claramente destinados para o louvor entre o povo de Deus. É uma ironia sem dúvida
que nos padrões modernos de culto, o elemento louvor tende a ser tratado como uma questão de
importância considerável. Hoje em dia os cultos estão cada vez mais absorvidos com louvor e
canto, e cada vez menos com a proclamação da Palavra de Deus. Em meio a tudo isso, as pessoas
estão sendo chamadas para engajarem-se na adoração a Deus! As palavras que estão sendo
tomadas nos lábios das pessoas devem ser agradáveis ao Senhor. Isto deve, portanto, ser uma
preocupação central. Consequentemente, é importante inquirir acerca da suficiência da Escritura
nessa questão. Jesus colocou a tarefa da igreja na perspectiva correta quando Ele disse na
parábola do mordomo infiel: “Quem é fiel no mínimo, também é fiel no muito; quem é injusto no
mínimo, também é injusto no muito” (Lucas 16:10).

“É muito fácil dizer que a questão acerca dos específicos materiais de louvor
não é central ou primordial nas preocupações da igreja. No entanto, as
Sagradas Escrituras contêm um Livro de 150 Salmos claramente destinados
para o louvor entre o povo de Deus”

Não é uma questão do coração?


Alguém pode objetar: “Será que importa tanto o que estamos cantando desde que não soe
positivamente defeituoso? Não é o Espírito que é mais importante e não a letra?”. Há algo
plausível neste argumento. Formalismo morto ao cantar, ainda que seja o melhor material, é,
dificilmente, superior ao canto de cânticos não extraídos das Escrituras. Não se pode supor uma
correta atitude na adoração automaticamente somente porque cânticos da Bíblia são usados. O
Senhor claramente deseja a atitude espiritual expressa pelo escritor aos Hebreus: “Portanto,
ofereçamos sempre por ele [isto é, Jesus] a Deus sacrifício de louvor, isto é, o fruto dos lábios
que confessam o seu nome” (Hebreus 13:15). A questão, porém, não é a atitude do coração do
adorador. Não há dúvida de que pessoas, ao cantarem hinos de mera composição humana, podem
ter um bom espírito e um verdadeiro fervor. A questão aqui é a seguinte: Que materiais de louvor
o Senhor deseja que Sua igreja use? Quais cânticos possuem, inquestionavelmente, sua sanção e
seu selo? Um exemplo da Bíblia ilustra este ponto de que o espirito ou o coração quanto a algo
não é única nem mesmo a consideração primária. Quando Áquila e Priscila se encontraram com
Apolo, em Éfeso, eles o viram como um homem instruído no caminho do Senhor e “fervoroso de
espírito”. Ele até mesmo ensinou com exatidão as coisas do Senhor, embora seja dito que ele
conhecia “somente o batismo de João”. Então, o que Áquila e Priscila fazem depois de ouvi-lo
pregar? “O levaram consigo e lhe declararam mais precisamente o caminho de Deus”. Eles não
questionaram sua sinceridade ou fervor, nem mesmo sua solidez geral. Mas eles o ajudaram a
melhorar em suas deficiências quanto as ordenanças cristãs (Atos 18:24-28; ver também Atos
19:1-7 para um incidente similar envolvendo o apóstolo Paulo).

O Novo Testamento não dá maior liberdade quanto aos elementos de adoração?


É verdade que é falado relativamente pouco acerca do padrão de adoração no Novo Testamento.
É também verdade que há uma certa continuidade e descontinuidade entre os Testamentos que
não é fácil de definir. Porém, há fundamentos para sustentar que as diferenças entre o Velho e o
Novo Testamento podem permitir a adoção de elementos em nossa adoração que o Senhor não
prescreveu nas Escrituras? Há duas passagens do ensino de Jesus que poderosamente tratam
dessa questão:
(a) Primeiramente, em Marcos 7, há um registro de um debate entre Jesus e os fariseus. Estavam
em pauta as leis que os fariseus sobrepunham aos mandamentos bíblicos, leis que eles
impuseram sobre todo mundo simplesmente a partir de sua própria iniciativa e autoridade. Em
resposta a isso, Jesus cita Isaías 29:13. “E ele, respondendo, disse-lhes: Bem profetizou Isaías
acerca de vós, hipócritas, como está escrito: Este povo honra-me com os lábios, mas o seu
coração está longe de mim; em vão, porém, me honram, ensinando doutrinas que são
mandamentos de homens” (Marcos 7:6-7). Ao confrontar as atitudes e ações dos fariseus, Jesus
continua e afirma que eles estão anulando a Palavra de Deus pela tradição que eles transmitiram
– sua tradição que não tinha qualquer autoridade na Palavra de Deus (v.13). “Em vão, porém,
me honram, ensinando doutrinas que são mandamentos de homens”. Isto demonstra claramente
que (i) Jesus estava ciente da continuação, pelo menos com respeito a isto, do Velho
Testamento; (ii) e que quanto aos elementos do culto a Deus uma sanção é exigida a partir da
Palavra de Deus. Não há qualquer possibilidade, de acordo com o princípio declarado pelo
Senhor aqui, de introdução de elementos de culto simplesmente a partir da iniciativa e autoridade
dos homens.
(b) A segunda passagem em questão é João 4, na qual é registrada uma conversa entre Jesus e
uma mulher cujo nome não é mencionado, junto ao poço de Sicar, em Samaria. João 4:23-24,
juntamente com a discussão geral com a mulher, enfatiza a necessidade da internalidade da
adoração. Porém, nos termos que Jesus afirma aqui, tal adoração deve ser em conformidade com
a natureza de Deus: “Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o
Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem”. Deve ser algo
interno, adoração espiritual, do coração; mas também deve ser de acordo com a verdade: “Deus é
Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade”. Deve ser
consistente com sua verdade revelada ao invés de ser de acordo com os julgamentos dos homens.
Também há argumentos poderosos em Colossenses 2:8-23 e Romanos 1:21-25. Incidentalmente,
nessa discussão em Sicar, Jesus é claramente ciente da descontinuidade com o Velho Testamento
quando Ele indica o desaparecimento ou revogação do Templo e seus serviços, incluindo os
sacrifícios, o sacerdócio e os instrumentos musicais associados ao templo e o seu culto. A partir
disso pode ser sustentado que passando do Velho Testamento para o Novo Testamento, qualquer
que seja a descontinuidade que estava envolvida, não há evidência alguma que Deus abriu mão
do direito de determinar a adoração aceitável. Para a igreja do Novo Testamento, a preocupação
também deve ser: o que é sancionado na Palavra de Deus?

“É nossa convicção, porém, que uma reforma é necessária nesta área de


adoração pública, pelo retorno ao uso de cânticos bíblicos inspirados”

Você tem argumentos?


A responsabilidade deste capítulo é simplesmente mostrar argumentos. Em primeiro lugar,
olharemos os materiais bíblicos que de alguma maneira tratam do conteúdo do louvor para a
igreja do Novo Testamento. Consideraremos, então, certas questões doutrinárias e históricas de
um princípio regulador bíblico governando a adoração a Deus. Espera-se que não seja visto
como priorização do supérfluo, nem como algo para jogar qualquer dúvida sobre a sinceridade
ou piedade daqueles que, por escolha ou simples negligência, cantam cânticos diferentes
daqueles providos nas Sagradas Escrituras. É nossa convicção, porém, que uma reforma é
necessária nessa área de adoração pública, através do retorno do uso de cânticos bíblicos
inspirados. Não há dúvida de que há muitos hinos bons, antigos e modernos, e talvez haja algum
lugar para eles na vida do povo de Deus. Mas no culto público nada deve suplantar o que Deus
inspirou e forneceu para o uso em sua igreja. Pode até ser considerado um escândalo na igreja
moderna que os Salmos das Escrituras têm sido tão largamente, e em alguns lugares
completamente, substituídos por composições de meros homens.
Que o Senhor possa guiar mais e mais igrejas e cristãos à voltarem-se para os próprios Salmos
como a principal fonte de uma equilibrada piedade e espiritualidade bíblicas. Que mais e mais
cristãos e igrejas possam reviver o uso devocional dos Salmos, tanto na adoração privada quanto
na pública. Será então descoberto que o Senhor Deus, que inspirou essas maravilhosas
composições, e que o Cristo, do qual elas inteiramente falam e através das quais Ele mesmo
também fala, se tornarão uma realidade mais poderosa na vida da igreja de Deus.

III. O MATERIAL BÍBLICO

O cântico dos Salmos ordenado


O cântico de louvores ao Senhor é um elemento distinto na adoração a Deus. Naturalmente a
pergunta a ser feita é: O que o Senhor exige da sua igreja com relação a isso? O que Ele
ordenou? O que Ele proveu? Isto importa? Pelo menos em um aspecto não parece haver qualquer
dúvida sobre o que o Senhor proveu e ordenou quanto ao seu louvor. Os Salmos da Escritura
devem ser cantados pelo seu povo. Há ampla evidência para isso nos próprios Salmos, mas
também, e não menos importante, no Novo Testamento. Vamos brevemente rever a evidência
aqui:

Há as implicações dos títulos dos Salmos


Não há razão para crer que estes títulos não sejam de considerável antiguidade e perfeita
autenticidade. Eles parecem ter sido incluídos com os Salmos durante o tempo em que o Velho
Testamento estava sendo formado. Trinta e quatro Salmos, no texto hebraico, não possuem um
título, ainda que na Septuaginta (ou LXX) – a tradução grega do Velho Testamento que foi
finalizada por volta de 180 a.C. – faltem apenas dois títulos. Se estes títulos devem ou não ser
considerados parte do texto original inspirado é uma questão de disputa, mas como Edward J.
Young assinala: “eles devem ser considerados como fidedignos e de grande valor ao determinar
o Salmo em questão”. Os escritores do Novo Testamento certamente teriam se familiarizado com
os vários títulos dos Salmos. O fato de que não menos do que 55 Salmos são endereçados “ao
músico-mor”, demonstra, eloquentemente, o propósito dos Salmos.

Há implicações acerca da forma dos Salmos


Em sua maior parte, a poesia dos Salmos é caracterizada por paralelismos e por um sentido de
ritmo, em vez de pelo ritmo de rimas métricas que são distintivas da poesia ocidental. No
entanto, a estrutura rítmica dos Salmos foi, sem dúvida, concebida para ser consistente com uma
forma musical subjacente. Derek Kidner explica que: “na poesia dos Salmos há uma
simplicidade ampla de ritmo e imagens que sobrevivem ao serem transplantadas para qualquer
solo. Sobretudo, o fato de que seu paralelismo esteja mais relacionado ao sentido do que à
sonoridade, permite reproduzir seus efeitos mais importantes com pouca perda de beleza ou
força. É bem adequado pela providência de Deus para chamar ‘toda a terra’ para ‘cantar a glória
do seu nome’”. Este é um ponto que, incidentalmente, responde ao problema que alguns têm com
a tradução dos Salmos para uma forma métrica para o cântico, dentro de nossa tradição musical
ocidental.

Há afirmações diretas nos Salmos e também em outras partes da Escritura


No Salmo 95: “Apresentemo-nos ante a sua face com louvores, e celebremo-lo com salmos”
(v.2). No Salmo 105: “Cantai-lhe, cantai-lhe salmos; falai de todas as suas maravilhas” (v.2).
Além disso, em muitos Salmos há encorajamento para cantar ao Senhor com as palavras dos
Salmos. Tal encorajamento pode ser encontrado em 37 Salmos.
Mas mesmo fora do Saltério, há indicadores suficientes ao uso dos Salmos pelos adoradores. Em
1 Crônicas 16, encontramos os Salmos sendo cantados quando Davi colocou a Arca de Deus no
Tabernáculo. Em Neemias 12, os Salmos de ação de graças foram cantados após a restauração e
reconstrução dos muros de Jerusalém. Os cânticos dos Salmos eram liderados por determinados
cantores (ver versos 8 e 27). Também, no Novo Testamento, há um claro encorajamento para o
cântico dos Salmos (ver Efésios 5:19; Colossenses 3:16).

Há as implicações do ensino do Novo Testamento


O Livro dos Salmos é frequentemente citado no Novo Testamento. Num grau significativo, a
teologia e experiência do Novo Testamento são derivadas dos Salmos. O próprio Jesus afirmou
isso. Quando Ele apareceu aos seus discípulos após a ressureição disse: “Que convinha que se
cumprisse tudo o que de mim estava escrito na lei de Moisés, e nos profetas e nos Salmos”
(Lucas 24:44). É por isso que pode ser dito com verdade e convicção que Cristo está em todas as
Escrituras. O próprio Cristo, obviamente, não começou a existir em sua concepção no ventre da
virgem. Ele disse de si mesmo: “antes que Abraão existisse, eu sou” (João 8:58; ver Colossenses
1:16-18). Pode-se argumentar que alguns Salmos apontam mais direta e explicitamente para o
Messias ou são mais especificamente aplicáveis a Ele. No entanto, como o professor Edmund
Clowney, anteriormente do Seminário Teológico de Westminster, nos lembra: “Em sua
profundidade teológica os Salmos são cânticos da Aliança de Deus e da esperança da Aliança. Já
que a grande obra de salvação de Deus será realizada pelo Filho de Davi, os Salmos são,
explicitamente, messiânicos.” Escrevendo, em 1859, Andrew Bonar, disse isto sobre Cristo nos
Salmos: “Agora, em tempos antigos, homens cheios de pensamentos de Cristo, nunca poderiam
ler os Salmos sem se lembrarem do Senhor. Eles provavelmente não tinham nenhum sistema ou
uma teoria fixa sobre todos os Salmos referindo-se a Cristo; mas ainda (...) eles encontraram seus
pensamentos voltados para o Senhor, como a Pessoa em quem esses suspiros, esses louvores,
esses desejos, essas esperanças, esses sentimentos profundos, encontraram sua única, verdadeira
e completa realização. Portanto, Agostinho (Salmo 58) disse aos seus ouvintes, enquanto ele
estava expondo esse Livro, que: ‘a voz de Cristo e sua igreja eram as únicas vozes que poderiam
ser ouvidas nos Salmos’”.
Não há qualquer dúvida razoável de que os Salmos sejam, em si mesmos, essencialmente, louvor
bíblico – o Livro de cânticos da igreja que foi provido e inspirado para esse propósito. Eles
foram, obviamente, ricos em sua significância a Israel, como cânticos de inspiração e esperança.
Mas eles são num real sentido ainda mais ricos no seu significado cristológico para a igreja do
Novo Testamento, que é, de fato, porque eles são tão frequentemente citados. Num sentido real
eles são atemporais. Eles são cânticos designados para serem cantados pelo povo de Deus em
todas as épocas e deve ser considerado uma tragédia que tantas igrejas cristãs hoje falhem em
usar estes cânticos canônicos e pactuais da Escritura na adoração a Deus.

Evidência textual
Por evidência textual queremos dizer aqueles textos ou versos da Escritura que tem uma
incidência sobre a questão do louvor bíblico. Ao examinar esse material, precisamos determinar
quais palavras e passagens são consideradas relevantes e por qual motivo.
Deve-se, certamente, concordar que o Senhor proveu no Livro dos Salmos um Livro de cânticos
pelo menos para a igreja do Velho Testamento. Também, certamente concorda-se que os Salmos,
dentro do lugar que lhes é dado no Novo Testamento, continuam sendo materiais apropriados
para a adoração da igreja da Nova Aliança. Mas surge a questão: há um mandamento para se
cantar cânticos de mera composição humana? Há uma divina autoridade para se cantar hinos de
Isaac Watts (1674-1748), John Newton (1725-1807), Charles Wesley (1757-1834), Horatius
Bonar (1808-1889) ou de qualquer outro compositor?
Os defensores dos cânticos não canônicos irão buscar autorização para seus cânticos em algum
lugar nas Escrituras. Apela-se para um número de passagens para dar-se apoio ao uso, no cântico
congregacional, de materiais além daqueles encontrados nas próprias Escrituras. Passagens que
afirmam serem fragmentos de hinos, no Novo Testamento, também são citadas a título de
suporte adicional. Examinaremos essas passagens da Escritura e nossa principal preocupação
será perguntar se elas realmente dão autorização para a expansão do louvor para além dos limites
do próprio Livro de louvor da Bíblia. Deve ser dito, talvez, que nessa conexão há muitas palavras
no grego do Novo Testamento, cuja tradução pode causar equívocos. Por exemplo, a palavra
traduzida por “hino” não significa, necessariamente, dentro do contexto do Novo Testamento, o
que a palavra passou a significar no uso comum. As palavras gregas relevantes encontradas no
Novo Testamento, em relação ao cântico, são os substantivos psalmos, hymnos e ōdē, e os verbos
hymneō e psallō. Examinaremos as referências do Novo Testamento nas quais estas palavras ou
seus derivados aparecem.

“O que era este ‘hino’? Comentaristas concordam que isto teria sido um dos
Salmos de Halel, do grupo dos Salmos 113 ao 118, comumente usados na
Páscoa”

Mateus 26:30; Marcos 14:26


Os discípulos estão reunidos com Jesus para a última ceia no cenáculo. É a Páscoa judaica.
Lemos que quando eles cantaram um hino (hymnēsantes), subiram para o Monte das Oliveiras. O
que era este “hino”? Comentaristas concordam que isto teria sido um dos Salmos de Halel, do
grupo dos Salmos 113 ao 118, comumente usados na Páscoa. Hymnēsantes é um particípio ativo
aoristo que indica simplesmente uma ação no passado. Neste caso, o sentido é em grosso modo:
“tendo cantado o hino”. Vem do verbo hymneō, que significa simplesmente: “cantar um hino” ou
“cantar um louvor”. Qualquer um destes Salmos do Halel seria apropriado para Jesus pouco
antes de sua crucificação. É como se Jesus tomasse estas palavras como a sua própria oração
para a tempestade que estava se formando nos seus últimos dias e horas na terra. Ele promete
pagar seus votos na presença de todo o povo (Salmo 116:12-19); Ele chama os gentios para
participarem dos louvores de Deus (Salmo 117); e Ele conclui com um cântico de triunfo: “Não
morrerei, mas viverei; e contarei as obras do Senhor” (Salmos 118:17). William Lane comentou
que: “quando Jesus levantou-se para ir ao Getsêmani, o Salmo 118 estava em seus lábios. Este
proveu uma descrição apropriada de como Deus guiaria seu Messias, por meio da angústia e
sofrimento, à glória”. Então aqui pelo menos, essa referência a “hino”, ao invés de apontar para
qualquer cântico de louvor não inspirado, aponta para o Saltério.

Atos 16:25; Hebreus 2:12


Paulo e Silas levaram o Evangelho à Europa. Há encorajamento (Atos 16:11-15). Mas também
há oposição. Eles estão presos em Filipos (versos 16-24). Eles estão desanimados? Nem um
pouco! Afinal, Jesus os tinha encorajado a regozijarem-se em tais situações (Mateus 5:12). À
meia-noite, com seus pés nos troncos em uma prisão interna, Paulo e Silas são ouvidos orando e
cantando hinos (hymnoun) a Deus (v.25). Esta palavra hymnoun é um modo imperfeito do verbo
hymneō, indicando ação contínua. O que eles estão cantando? Não sabemos com certeza, é claro.
Mas a sugestão de Addison Alexander é recomendável: “Orando e cantando a Deus, parecem
expressar, não dois atos distintos (...) mas o simples ato de adoração lírica, ou orando (...) ao
cantar ou entoar um cântico, talvez uma ou mais passagens do Livro dos Salmos peculiarmente
adotadas e planejadas para o uso de prisioneiros e outros sob perseguição”.
Claramente, seja o que for que Paulo e Silas cantaram naquela noite, era algo conhecido pelo
coração deles. “A explicação é, sem dúvida,” diz o professor William Binnie: “que eles foram
ensinados a pronunciar e a cantar os Salmos desde sua infância; e que a sua habitual participação
na sinagoga e nos seus cultos havia impedido que a familiaridade inicial com os ‘louvores de
Israel’ fosse perdida ou prejudicada”.
Este entendimento de hymnoun aqui é fortalecido pela referência em Hebreus 2:12 – o único
outro lugar onde, no Novo Testamento, este verbo é encontrado. Isto é, de fato, encontrado numa
citação de um Salmo! Falando da relação fraternal de Jesus com os crentes, o escritor cita o
Salmo 22:22: “Então declararei o teu nome aos meus irmãos; louvar-te-ei [hymnesō] no meio da
congregação”.

1 Coríntios 14:26
A palavra psalmos é encontrada em 1 Coríntios 14: “Que fareis pois, irmãos? Quando vos
ajuntais, cada um de vós tem salmo (psalmon) (...)” (verso 26). C.K. Barret sugere que isto pode
ser: “uma nova, talvez espontânea composição e não um Salmo do Velho Testamento”. Porém,
seria mais provável que fosse “carismático” – a questão do “charismata” está em questão neste
capítulo. Além disso, Paulo está falando de elocuções individuais. Não é provável que esses
sejam cânticos congregacionais e, de qualquer maneira, eles seriam diretamente inspirados pelo
Espírito. Em adição, como Ralph Martin observou: “nada (...) se sabe do conteúdo ou forma de
tal criação espontânea” supondo, isto é, que eles não eram Salmos bíblicos, e que, de fato, eles
podem ter sido. Em outras palavras, seria incerto fazer uma afirmação baseando-se muito nesta
referência.

Efésios 5:19; Colossenses 3:16


Chegamos agora às duas passagens mais comumente usadas em apoio de uma autorização para a
adoção de hinos não inspirados. “Veja”, alguém dirá, “certamente esses versos indicam que
podemos usar mais do que os Salmos do Velho Testamento!”. Os substantivos psalmos, hymnos
e ōdē são encontrados juntos em ambas as passagens. Num artigo escrito alguns anos atrás,
Robert Morey afirmou que: “a menção de ‘hinos’ e ‘cânticos’ claramente revela que podemos
cantar outros materiais além dos Salmos”. Este é um entendimento comum. Mas essa passagem
dá alguma autorização? É sustentável? Vejamos:
Nesses versos, Paulo está certamente preocupado com a adoração. Ele está também falando da
vida interior do crente. Ele exorta os crentes de Éfeso a serem cheios do Espírito (5:18). Para os
crentes de Colossos, ele diz que: “a palavra de Cristo habite em vós abundantemente, em toda a
sabedoria” (3:16). O enchimento do Espírito, é claro, traz a Palavra de Cristo ao coração, pois é a
obra do Espírito Santo receber o que é de Cristo (João 16:15). Paulo afirma isso dizendo aos
Romanos: “E, se o Espírito daquele que dentre os mortos ressuscitou a Jesus habita em vós,
aquele que dentre os mortos ressuscitou a Cristo também vivificará os vossos corpos mortais,
pelo seu Espírito que em vós habita” (Romanos 8:11). Uma consequência da habitação do
Espírito é o louvor. Então, Paulo ordena aos cristãos de Éfeso e Colossos a falarem, ou
ensinarem e admoestarem uns aos outros, por intermédio dos: “salmos, hinos e cânticos
espirituais, cantando ao Senhor com graça em vosso coração” (Efésios 5:19; Colossenses 3:16).

“Será que as composições dos homens, não imediatamente inspiradas pelo


Espírito de Deus, qualificam-se como a ‘palavra de Cristo’, a qual os crentes
devem ter habitando neles?”

A questão é: o que exatamente são “salmos, hinos e cânticos espirituais”? Consequentemente,


todo cristão ficará contente em cantar os cânticos a que Paulo está se referindo aqui. Deve-se
supor, obviamente, que esses eram cânticos existentes, caso contrário, seus leitores de Éfeso e
Colossos simplesmente ficariam confusos com essa referência. Paulo, ao fim do seu ministério,
tinha uma visão elevada das Escrituras (ver 2 Timóteo 3:14-17). Será que as composições dos
homens, não imediatamente inspiradas pelo Espírito de Deus, qualificam-se como a "palavra de
Cristo", a qual os crentes devem ter habitando neles? Isto, certamente, nos levaria a crer que
pode-se sustentar que tais materiais não eram inspirados ou que o apóstolo estava dando
liberdade para escritores pós-apostólicos para irem em frente e comporem seus próprios hinos
para uso no culto.
Certamente, não podemos saber sobre como os ouvintes de Paulo o teriam compreendido.
Comentaristas são, em geral, concordes no fato de que não há uma concordância geral quanto ao
sentido desta tripla descrição! Nem há um acordo se o adjetivo pneumatikais (“espiritual”)
qualifica apenas ōdē (“cântico”), ou todos os três termos. O comentário de F.F. Bruce é
representativo: “É improvável que intenciona-se qualquer divisão bem demarcada, embora os
‘salmos’ possam ser tirados do Saltério (que forneceu o principal veículo para o louvor cristão
desde os tempos primitivos), os ‘hinos’ possam ser cânticos cristãos, e os ‘cânticos espirituais’
possam ser palavras não premeditadas cantadas ‘no Espírito’, expressando aspirações santas”.
Não podemos deixar de notar como esse parágrafo de Bruce é tão repleto de “possam” e vagas
sugestões. Não há evidência positiva, nesses versos, para confirmar a conclusão de que Paulo
estava referindo-se a três grupos distintos ou tipos de composição, embora não haja dúvida de
que as palavras tenham seu significado distinto, indicando a variedade e riqueza dos cânticos que
Paulo tinha em mente. Não há, simplesmente, nenhum fundamento para tomar Efésios 5:19 e
Colossenses 3:16 como justificativa para a adoção de hinos não inspirados na adoração a Deus.
Isto seria fazer com esses versos fossem além do que a boa exegese pode sustentar.
Parece perfeitamente razoável, porém, tomar as referências aos salmos, hinos e cânticos
espirituais como referindo-se coletivamente ao Saltério. Os vários termos gregos seriam mais
familiares ao Novo Testamento por se encontrarem na tradução grega do Velho Testamento (a
Septuaginta ou LXX) que estava comumente em uso. Na Septuaginta, os títulos dos Salmos
frequentemente continham esses termos. Em muitos casos, mais de um dos termos é usado num
título, e pelo menos num exemplo, todos os três termos são encontrados no título (Salmo 76)!
- Psalmos aparece 87 vezes no Velho Testamento grego, 67 vezes nos títulos dos Salmos. No
Novo Testamento, esta palavra aparece sete vezes: em cada um dos versos presentemente sendo
considerados, quatro vezes com referência ao Livro dos Salmos (Lucas 20:42; 24:44 e Atos 1:20,
13:33) e uma vez em 1 Coríntios 14:26, onde a referência é aos Salmos bíblicos ou uma elocução
carismática, em cujo caso o cântico seria individual e inspirado pelo Espírito.
- Hymnos aparece 17 vezes, 13 vezes nos Salmos, seis das quais estão nos títulos. No Novo
Testamento esta palavra aparece apenas nos versos que estão sendo examinados.
- Ōdē aparece 80 vezes, 36 nos títulos dos Salmos e muitas outras vezes dentro dos próprios
Salmos.
Como temos visto, a palavra hymneō é usada no Livro dos Salmos (ver Hebreus 2:12). Ōdē
também pode ser usada como Salmos, embora no Novo Testamento, à parte dos textos em
Efésios e Colossenses, a palavra seja apenas encontrada no Livro de Apocalipse (5:9; 14:3;
15:3), onde o “novo cântico” não se refere aos hinos modernos e nem a qualquer composição não
inspirada. Em conexão com as passagens em Efésios e Colossenses, Schlier comenta: “É
‘espiritual’, isto é, tem uma medida de inspiração (Efésios 5:19). Portanto, não é uma expressão
de sentimento pessoal ou experiência, mas uma ‘palavra de Cristo’ (Colossenses 3:16)”.
Há força, portanto, na interpretação que entende que Paulo, ao usar estes três termos, psalmos,
hymnos e ōdē, está se referindo ao Livro dos Salmos. Isto corresponderia, largamente, aos termos
hebraicos mizmorim, tehillim e shirim – os tipos de composição encontrados no Saltério do
Velho Testamento. Como Thomas Manton (1620-1677) escreveu: “Em Colossenses 3:16 e
Efésios 5:19, Paulo nos ordena a: ‘falar uns com os outros em salmos, hinos e cânticos
espirituais’. Estas palavras (que são as conhecidas divisões dos Salmos de Davi, e,
expressamente correspondem às palavras hebraicas, Shirim, Tehillim, e Mizmorim, pelas quais
seus Salmos são distinguidos e intitulados), sendo tão precisamente usadas pelo apóstolo em
ambas as passagens, claramente nos apontam para o Livro dos Salmos”. Sem dúvida os termos
refletem diferentes tipos de Salmos e Paulo estaria sugerindo, o que pensamos ser o caso, que há
Salmos que relacionam-se com toda a extensão da nossa necessidade espiritual. É interessante
que em outros lugares do Velho e do Novo Testamento, descrições tríplices de coisas similares
são dadas. Por exemplo, em Êxodo 34:7, podemos encontrar: “iniquidade, transgressão e
pecado”. Em Deuteronômio 5:31 e 6:1 encontramos: “mandamentos, estatutos e juízos”. Em
Atos 2:22 encontramos a frase: “maravilhas, prodígios e sinais”. Este entendimento de Efésios
5:19 e Colossenses 3:16 era comum entre os puritanos. Isto fica claro no prefácio da edição de
1673 do Saltério Métrico Escocês de 1650, subscrito, entre outros, por Thomas Manton, John
Owen, Thomas Watson, Matthew Poole, Thomas Vincent e Edward Calamy. No prefácio é
afirmado que: “embora cânticos espirituais de mera composição humana possam ter seu uso,
nossa devoção será melhor assegurada onde o conteúdo e as palavras forem de imediata
inspiração divina; e para nós, os Salmos de Davi claramente são pretendidos por estes termos:
‘salmos, hinos e cânticos espirituais’, que o apóstolo usa (Efésios 5:19; Colossenses 3:16)”. Essa
perspectiva geral também encontra grande apoio em alguns comentaristas como Jean Daillé
(1594-1670) e William Binnie (1823-1886), e em anos mais recentes foi habilmente exposta pelo
professor John Murray e William Young num Minority Report que eles produziram para a Igreja
Presbiteriana Ortodoxa em 1947.
Alguém pode ainda objetar que essa interpretação é um pouco especulativa e menos do que
conclusiva. Mas Paulo está claramente dizendo algo, e a hipótese parece ser mais forte para essa
visão que vê uma referência exclusiva ao Saltério nesses versos. De qualquer forma, pode ser
percebido que esses textos não dão uma autorização positiva para a adoção de materiais de
louvor extrabíblicos não inspirados como cânticos congregacionais. Essas passagens, e nem
mesmo outras relacionadas no Novo Testamento, não dão qualquer apoio para a introdução de
hinos não inspirados na adoração pública cristã. Além disso, que seja dito que nenhum cristão é
obrigado a cantar as músicas que o Senhor, em sua sabedoria, não lhe ordenou cantar ou proveu
para que eles cantem, embora possam parecer bons cânticos num nível humano.

Tiago 5:13; Romanos 15:9


A última palavra que iremos olhar é o verbo psallō: “cantar salmos ou louvores”. Tiago encoraja
aqueles que estão sofrendo a orarem. Ele encoraja aqueles que estão alegres a: “cantarem
salmos” (psalletō). O que Tiago tem em mente aqui? Esta palavra, psallō, aparece 56 vezes na
Septuaginta, predominantemente nos Salmos. Passou a significar, em geral, um cântico de
louvor. É claro que não pode ser demonstrado conclusivamente que isto se refere aos Salmos
bíblicos. Porém, como o escritor puritano Thomas Manton sugere: “No original há apenas uma
palavra, psalletō, cuja tradução é: ‘que ele cante’; mas porque o apóstolo os está pressionando ao
proveito religioso em todas as situações, e porque esta é uma aceitação comum da palavra
psalletō na igreja, está corretamente traduzido: ‘que ele cante salmos’”.
O uso de psallō em outro contexto do Novo Testamento indica que a interpretação de Manton é
saudável. Em Romanos 15:9, o único outro lugar no Novo Testamento onde essa palavra
aparece, Paulo encontra apoio bíblico para os gentios louvarem a Deus. Onde? Nos Salmos, é
claro! Jesus Cristo veio, diz Paulo: “para que os gentios glorifiquem a Deus pela sua
misericórdia, como está escrito: Portanto eu te louvarei entre os gentios, e cantarei [psalō] ao teu
nome” (Salmos 18:49). Não há simplesmente nenhuma defesa para o uso de cânticos não
inspirados de louvor na adoração pública em nenhuma das referências que se referem à própria
adoração ou que usam linguagem relevante para o conteúdo de louvor bíblico.

“Hinos cristãos” no Novo Testamento


Há alguns cânticos no Novo Testamento. No Evangelho de Lucas, por exemplo, há os cânticos
de Maria (1:46-55), Zacarias (1:68-79) e Simeão (2:29-32). Estes são, certamente, cânticos
inspirados pelo Espírito e enquanto não parece haver qualquer objeção, a princípio, à sua
utilização no culto público, não é totalmente claro que mesmo essas músicas foram destinadas
pelo Senhor para tal finalidade.
Há, porém, passagens que alguns têm sugerido serem de fragmentos de composições de hinos. É
dito que estes “fragmentos” dão testemunho acerca de um desenvolvimento de uma tradição
litúrgica na igreja primitiva. Efésios 5:14, Filipenses 2:6-11, Colossenses 1:15-20 e 1 Timóteo
3:16 são mencionados a fim de ilustrar este ponto. O que devemos dizer acerca de tais
afirmações?
1. O procedimento é especulativo. Não importa o quão confiante a afirmação possa ser, de que
há citações de hinos no Novo Testamento, não há uma prova que isso seja irrefutável. Binnie
corretamente chamou essas afirmações de “precárias”. Pesquisas mais hábeis e cuidadosas foram
feitas. A despeito disso, ainda há uma falta de concordância universal entre os estudiosos sobre a
precisa natureza desses versos. Não pode ser demonstrado que eles foram cantados, que mais de
um escritor do Novo Testamento citou o mesmo fragmento de “hino” e que alguém tenha citado
o mesmo fragmento de “hino” duas vezes! Comentando sobre o assunto, no “Cânticos do
Cristianismo Primitivo”, Delling faz uma observação significativa de que: “tentativas foram
feitas para distinguir hinos cristãos no Novo Testamento, mas estes são hipotéticos diante da
ausência de leis discerníveis”. Ele também usa o óbvio argumento de que: “(...) a mera presença
de um elevado discurso ou uma estrutura integrada não precisa denotar um hino”.

“Se o Espírito quisesse que a igreja os usasse, é inconcebível que Ele iria
simplesmente ter deixado fragmentos aqui e ali e não teria assegurado que as
composições (se é que eram) fossem preservadas inteiramente”

2. O procedimento não é conclusivo. Ainda que pudesse ser provado conclusivamente que
fragmentos de hinos foram encontrados no Novo Testamento, isto ainda não provaria que estes
itens eram parte de uma tradição litúrgica que estava em desenvolvimento. Por um lado, a
providência de Deus é contra ele. Do seguinte modo: nenhum dos itens, dos quais vários versos
no Novo Testamento são considerados como fragmentos, chegou até nós. Os escritores
poderiam, de fato, ter coletado esses “fragmentos” de cânticos contemporâneos, mas por que
então esses cânticos não nos chegaram em sua inteireza, se eles eram para serem usados pela
igreja, ou se eram para ser parte de uma tradição litúrgica? Que tipo de tradição é esta que falha
em manter tais itens? Se o Espírito quisesse que a igreja os usasse, é inconcebível que Ele iria
simplesmente ter deixado fragmentos aqui e ali e não teria assegurado que as composições (se é
que eram) fossem preservadas inteiramente.
Não há evidência de que essas passagens eram cânticos ou parte de uma tradição litúrgica em
desenvolvimento. Mas mesmo supondo que essas passagens fossem descobertas como sendo
cânticos ou partes de cânticos, não se segue que isto provê algum tipo de autorização para o uso
de cânticos não inspirados na adoração ou que seja uma prova demonstrável de que foram usados
em cultos. Toda essa área de estudo do Novo Testamento é incrivelmente imaginativa, mas
inteiramente inconclusiva no que se refere à questão do louvor no Novo Testamento.
IV. O PRINCÍPIO REGULADOR
Todos os cristãos são regulados de um modo ou de outro. Se poderia esperar que todas as igrejas
fossem ao menos afirmar que elas são reguladas pela Escritura. Em muitos exemplos, porém,
igrejas se desviaram das Escrituras como sua regra de doutrina e prática. Na história da igreja
isto se tornou um foco particular de discussão e diferenças. O que precisa ser examinado é como
as igrejas desenvolveram e aplicaram um “princípio regulador”, particularmente na questão da
adoração.

O que regula a vida da igreja?


A maioria das igrejas sustentaria algum tipo de autoridade bíblica por trás do seu governo e
prática. Porém, sob várias pressões sociais e secularistas, a aplicação da autoridade bíblica na
vida da igreja foi diminuída ou modificada nas igrejas de “linha principal”. O movimento da alta
crítica, que surgiu no século XIX, produziu considerável pressão para uma mudança na visão da
igreja acerca da autoridade da Bíblia; uma pressão continuou ao longo do século vinte até o vinte
e um, para que houvesse uma mudança para uma abordagem crítica tanto ao Velho quanto ao
Novo Testamento.
Gradualmente, a Bíblia foi sendo reconhecida como insuficiente para prover uma fonte exclusiva
de doutrina e governo na igreja. Se a igreja não aceita a completa inspiração e suficiência da
Bíblia como Palavra de Deus, isto terá um profundo efeito em como ela regula as suas
atividades. O princípio regulador, deste modo adotado, será influenciado por considerações
centradas nos homens e talvez até mesmo por preocupações, em grande parte, sociais e
políticas.

É uma questão indiferente?


Ao mesmo tempo, existem alguns que não aceitam a inspiração e autoridade da Bíblia em um
sentido ortodoxo e ainda não consideram que a Bíblia fornece materiais suficientes para a
regulação do culto e do governo da igreja. Muitos membros de igreja sustentam, de um ponto de
vista evangélico conservador, que, em grande parte, essas áreas e práticas devem ser deixadas ao
critério de cada igreja. Eles podem até citar a seção da Confissão de Fé de Westminster para
apoio: “há algumas circunstâncias, quanto ao culto de Deus e ao governo da igreja, comum às
ações e sociedades humanas, as quais têm de ser ordenadas pela luz da natureza e pela prudência
cristã, segundo as regras gerais da Palavra, que sempre devem ser observadas” (I:6). O que é
referido aqui, porém, são circunstâncias comuns à ação e sociedade humanas. A adoração de
Deus, e mais especificamente o seu conteúdo, a forma de governo de igreja, os ofícios e os
sacramentos da igreja são, portanto, os distintivos da igreja e raramente: “comum às ações e
sociedades humanas”! A Confissão, neste ponto, simplesmente se refere a algumas
circunstâncias externas, tais como tempos e lugares de culto, seus registros, seus prédios, suas
finanças e coisas semelhantes. Então a questão de um princípio regulador, afirmado ou implícito,
não é de menos importância para determinar o conteúdo do louvor, uma área na qual
peculiaridades denominacionais, distintivos ou parcialidades encontrarão expressão.

Que “princípio regulador” é encontrado na Escritura?


A questão portanto, que precisa ser perguntada é: qual é o princípio regulador da igreja? É
sólido? É bíblico? Quais são as implicações disso para o governo da igreja e a adoração? As
igrejas do Velho e do Novo Testamento tiveram que ser reguladas em seu governo e adoração,
bem como em sua doutrina. Elas foram reguladas pela expressa vontade de Deus. Descobriu-se
ser perigoso ir além da vontade revelada de Deus, como Nadabe e Abiú descobriram (Levítico
10:1-3); como o rei Saul descobriu (1 Samuel 13:13-14); como o rei Salomão descobriu (1 Reis
11:9-11); como Israel descobriu (Ezequiel 5:5-8; Malaquias 2:1-17); como os fariseus nos dias
de Jesus descobriram (Marcos 7:6-13); como o homem rico descobriu (Lucas 16:19-31,
especialmente os versos 29-31); e como muitas igrejas que são mencionadas no Livro de
Apocalipse descobriram (capítulos 2 e 3).

“A adoração não é para ser estabelecida de acordo com a vontade do homem,


mas de acordo com o expresso mandamento de Deus”

A lei, particularmente em foco, expressa a Palavra e vontade de Deus, era o Decálogo – os Dez
Mandamentos. O fator em comum era a violação da vontade de Deus em conexão com sua
adoração. Era a violação, essencialmente, do Segundo Mandamento (Êxodo 20:4-6). A adoração
não é para ser estabelecida de acordo com a vontade do homem, mas de acordo com o expresso
mandamento de Deus. Que este não é um princípio estranho no contexto do Novo Testamento, é
suficientemente demonstrado numa passagem tal como Mateus capítulo 15 verso 9, na qual Jesus
baseia-se no profeta Isaías ao reprovar os hipócritas que subverteram os mandamentos de Deus,
expressos no Decálogo, por meio de suas adições. Paulo, de maneira similar, em sua carta aos
Colossenses, contrasta os mandamentos de Deus e os mandamentos dos homens em relação à
vida devocional (ver Colossenses 2:20-23). A Palavra e a vontade de Deus, então, devem ser
supremas! Esta é a consistente mensagem do Velho e do Novo Testamento. No Velho
Testamento o princípio era: “guarda meus mandamentos” (Êxodo 20:4-6). “Tudo o que eu te
ordeno, observarás para fazer; nada lhe acrescentarás nem diminuirás” (Deuteronômio 12:32).
Havia bênçãos relacionadas à obediência: como Moisés descobriu (Deuteronômio 4:1-2, 39-40);
como Noé descobriu (Gênesis 6:22; 7:5-7; ver Hebreus 11:7); como os filhos de Israel
descobriram (Jeremias 7:23-24). O último capítulo do Livro de Êxodo é um modelo do princípio
regulador do Velho Testamento.
Também no Novo Testamento encontramos uma atitude similar. Em seu ensino sobre oração, o
Senhor Jesus Cristo inclui a petição: “seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu”
(Mateus 6:10; Lucas 11:2). Além disso, Jesus comissiona seus discípulos a irem ao mundo com a
mensagem do Evangelho. Ele explicita a tarefa deles: “ensinando-os a guardar todas as coisas
que eu vos tenho mandado” (Mateus 28:20). Ele diz: “se me amais, guardai os meus
mandamentos” (João 14:15; ver João 15:14; 1 João 5:3).
Em outras palavras, o princípio regulador do Novo Testamento é consistente com o do Velho
Testamento. A igreja do Novo Testamento deve obedecer os desejos expressos do Salvador. Para
ajudar nisso, obviamente, o Espírito Santo foi enviado à igreja, para representar a Cristo, para
estender o Reino (João 3:3,5), para assegurar que as Escrituras fossem completadas, e para
capacitar as subsequentes gerações a entenderem-na e a obedecerem-na (ver João 14:26; 16:7-8;
Atos 2:33). É significativo que no fechamento do cânon das Sagradas Escrituras há um alerta,
um princípio regulador (Apocalipse 22:18-19; ver Deuteronômio 4:2). O Novo Testamento
contém princípios e regulamentos claros que governam a vida da igreja cristã. Há princípios e
regulamentos, por exemplo, em conexão com os oficiais (Atos 6:1-7; 1 Timóteo 3:1-13 [ver 4:11
e 5:21]; Tito 1:5-9, e etc.); em conexão com a Ceia do Senhor (Mateus 26:26-30; 1 Coríntios
11:23); em conexão com o ensino de Paulo (ver 1 Coríntios 2:12-16; Gálatas 1:12). A principal
preocupação é saber fazer a vontade do Senhor.

Como este princípio se aplica hoje?


A responsabilidade da igreja cristã hoje, não menos que a da igreja do primeiro século da era
cristã, é conformar-se à vontade revelada de Deus. Espera-se que a igreja seja edificada: “sobre o
fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra de esquina”
(Efésios 2:20). Portanto, a vontade de Cristo é suprema.
É verdade que exige-se que a Bíblia seja interpretada apropriadamente e que diferenças podem
aparecer em conexão com isto. É necessário que os princípios da Escritura sejam compreendidos
o mais claramente possível, com sinceridade e boa consciência (Romanos 14:5). Um princípio
regulador da igreja, da fé e da vida cristã de um modo geral, irá ser determinado por uma
combinação dos seguintes fatores: (a) a compreensão da autoridade da Bíblia; (b) a aceitação da
suficiência da Escritura; e (c) a aplicação de um saudável método de interpretação bíblica.

Qual princípio regulador deve ser aplicado na igreja?


Uma igreja ou corpo de cristãos professos com uma fraca visão da autoridade da Bíblia e sua
suficiência, ou uma abordagem crítica ou liberal, terá padrões de doutrina e adoração muito
diferentes dos de uma igreja ou corpo de cristãos professos que possui uma visão elevada das
Escrituras e da sua suficiência. O que nos interessa é como tais visões afetaram o
desenvolvimento dos materiais adotados dentro das igrejas. Duas visões principais, pelo menos,
surgiram dentro do protestantismo evangélico.
1. A visão luterana ou anglicana. A visão do princípio regulador associada com a perspectiva
dos luteranos ou anglicanos é aquela que basicamente mantém que qualquer coisa que pode ser
admitida ao culto ou prática da igreja não deve ser proibida ou censurada pela Palavra de Deus.
De uma forma ou de outra, esta é a visão predominante na igreja hoje. Esta visão mais ampla e
aberta é expressa, por exemplo, no Artigo XX dos 39 Artigos da Igreja da Inglaterra (1571) que
afirma que: “A igreja tem poder para decretar ritos ou cerimônias e autoridade nas controvérsias
de fé: e, contudo, não é lícito para a igreja ordenar qualquer coisa que é contrária à Palavra de
Deus escrita”. Em outras palavras, qualquer coisa que não é proibida pode ser admitida. Será
reconhecido o quão grande alcance este princípio pode ter. Por exemplo, como o professor
Petticrew disse em 1902, aceitando-se essa ideia seriam permitidas tais coisas como: “o sinal da
cruz no Batismo (...) ajoelhar em direção ao oriente, as vestimentas simbólicas, o uso de velas de
cera na igreja durante o dia, o uso cerimonial do incenso, água benta (...) a elevação da hóstia,
etc., pois nenhumas destas coisas estão expressamente proibidas nas Escrituras”.
Pode-se ver como esse princípio amplo poderia ser a ocasião, não só para a adição de todos os
tipos de coisas não ordenadas na Bíblia, mas também de uma séria imposição na consciência das
pessoas. Ninguém pode ser obrigado a fazer qualquer coisa que não seja completamente bíblico.
Esta abordagem de: “fazer o que não é proibido”, realmente afirma que o que a igreja diz, tanto
uma denominação quanto uma congregação local, quanto a esse assunto, é o que deve acontecer.
É difícil não ver como isso se equivale à imposição de mandamentos de homens (ver Mateus
15:6,9; Marcos 7:6-13; Colossenses 2:18-23).
2. A visão reformada ou calvinista. Esta visão afirma que apenas o que é prescrito na Palavra de
Deus é autorizado. Esta foi a abordagem das igrejas reformadas. Essa visão sustenta que a igreja
está sujeita ao que Deus se agradou em revelar nas Sagradas Escrituras. Não é preciso dizer que
isso implica numa visão elevada da Escritura, sua suficiência e aplicação em todas as questões de
fé e adoração. A Confissão de Fé de Westminster (1647) expressa isso bem, quando declara que:
“foi o Senhor servido, em diversos tempos e diferentes modos, revelar-se e declarar à sua igreja
aquela sua vontade; e depois, para melhor preservação e propagação da verdade, para o mais
seguro estabelecimento e conforto da igreja contra a corrupção da carne e malícia de Satanás e
do mundo, foi igualmente servido em fazer escrever toda esta; o que torna indispensável a
Escritura Sagrada, tendo cessado aqueles antigos modos de revelar Deus a sua vontade ao seu
povo” (I:1).
A implicação disso, aplicado à adoração, foi visto da seguinte maneira: “o modo aceitável de
adorar o verdadeiro Deus é instituído por Ele mesmo e tão limitado pela sua vontade revelada,
que não deve ser adorado segundo as imaginações e invenções dos homens ou sugestões de
Satanás nem sob qualquer representação visível ou de qualquer outro modo não prescrito nas
Santas Escrituras” (XXI:1). Isto está em perfeita harmonia com o princípio regulador evidente
nas próprias Escrituras e descrito acima.

O princípio é bem estabelecido pelo proeminente teólogo escocês reformado, William


Cunningham (1805-1861): “A parte calvinista dos reformadores (...) era da opinião de que há
suficientes e claras indicações na própria Escritura, de que é a mente e a vontade de Cristo, que
nada deve ser introduzido no governo e adoração da igreja, a não ser que uma autorização
positiva para isso pudesse ser encontrada nas Escrituras. Este princípio foi adotado e posto em
prática pelos puritanos ingleses e presbiterianos escoceses; e estamos persuadidos de que é o
único verdadeiro e seguro princípio aplicável quanto a este assunto”. Até onde se refere às
aplicações desse princípio, Cunningham continua e pontua que: “se isto for completamente
levado a cabo, irá apenas levar a igreja à condição em que foi deixada pelos apóstolos, até onde
somos informados; um resultado que certamente não precisa ser muito preocupante, a não ser
para aqueles que pensam que eles próprios têm poderes muito superiores para melhorarem e
adornarem a igreja por suas invenções”.
E quanto à liberdade permitida no Novo Testamento?
Há dois pontos que são levantados pelos defensores dos materiais de louvor não canônicos, que
parecem qualificar a aplicação do princípio regulador [reformado calvinista] como muito
rigorosa.
1. A analogia com a oração e a pregação. É sustentado por alguns que, assim como há
liberdade, no Novo Testamento, quanto à pregação e oração, por analogia, liberdade também
deve ser permitida ao uso de cânticos adequados de composição humana. Cada elemento, porém,
deve ter sua própria autorização da Palavra de Deus. As exigências desses diferentes elementos
de culto não são idênticas. O que distingue o cântico de louvor da oração e da pregação é o
seguinte: (a) há um claro precedente (e, portanto, autorização) para oração e pregação “livre”; e
(b) como em sua natureza o cântico de louvor é algo que engaja todos os adoradores, este deve
portanto envolver uma forma (cânon?) de material em que todos possam se engajar, sem
qualquer violação da consciência. Qualquer que seja o mérito de materiais não inspirados, eles
não são, afinal, imediatamente inspirados por Deus. Ninguém nunca pode dizer: “estes foram
dados pelo Senhor para o uso de todos os cristãos adoradores”. O fato é que Deus deu um
manual ou Livro de louvores nos Salmos. Não é presunçoso impor algum outro “cânon” de
louvores cantados o qual, em última análise, não é a Palavra de Deus? Em sua natureza, oração e
pregação são “livres”. O louvor, porém, é semelhante à leitura das Escrituras. Em sua natureza,
deve ser um manual fixo. Assim como não esperaríamos que a leitura das Sagradas Escrituras
fosse substituída por leituras de obras de meros homens, pela mesma razão não deveríamos
esperar que os cânticos congregacionais devessem ser outros cânticos a não ser aqueles que Deus
deu.

“O fato é que Deus deu um manual ou Livro de louvores nos Salmos. Não é
presunçoso impor algum outro ‘cânon’ de louvores cantados o qual, em última
análise, não é a Palavra de Deus?”

2. A demanda de expansão da revelação. Alguns dirão que a expansão da revelação no Novo


Testamento justifica a extensão do louvor para além daquilo que temos no Velho Testamento.
Porém, como John Murray ressalta: “não temos evidência do Velho Testamento nem do Novo
Testamento que a expansão da revelação recebeu expressão nos exercícios devocionais da igreja
por meio do cântico não inspirado de louvor. Isto é um fato que não pode ser desconsiderado”.
É sugerido que alguns hinos podem expressar verdades melhor do que os Salmos, especialmente
em relação aos temas do Evangelho. Isto implica que, de alguma forma, o homem deve criar o
que Deus deixou de fora, a saber, produzir cânticos baseados no material do Novo Testamento.
Mas quem decide quais materiais devem ser e quais não devem ser usados por toda a igreja? Isto
não apenas é potencialmente destrutivo para a uniformidade da adoração, mas também para a
unidade na adoração.
O derramar do Espírito em pentecostes causou, obviamente, uma profunda diferença na igreja.
Mas é presunçoso concluir, a partir disso, que há deste modo uma competência dada à igreja para
adicionar materiais não canônicos para o cântico congregacional. Houve uma nova revelação, é
claro, registrada no Novo Testamento, embora significativamente não um manual de louvor
separado. Em sua maravilhosa obra sobre o Espírito Santo, George Smeaton disse o seguinte
sobre os Salmos, em relação a sua relevância para a igreja cristã: “Nenhum livro, de um tipo
similar, foi preparado para a igreja do Novo Testamento. O Espírito Santo, enchendo os doces
cantores de Israel com verdade espiritual e amor santo, antecipou, deste modo, muito da
necessidade que seria sentida nos tempos cristãos (...) Eles descrevem a eternidade e onipresença,
a majestade e condescendência, a justiça e misericórdia de Deus na mais ardente espécie de
devoção. Eles cantam acerca do arrependimento e fé, da alegria em Deus e deleite na lei de Deus,
com ardor além do qual é impossível ir. Eles descrevem o reinado de Cristo e sua união com sua
igreja; a unção com o óleo de alegria (Salmos 45:7); o recebimento de dons por parte dos
homens (Salmos 68:18); e o supremo domínio com o qual Cristo iria ser investido pelo Pai com
uma ternura, unção e alegria, para o qual não há outras palavras semelhantes. E aqueles Salmos
que são chamados de ‘novos cânticos’ antecipam a completa glória do milênio”.
É interessante que na aparição, pós-ressurreição, de Cristo aos discípulos na estrada de Emaús
(Lucas 24:13-35) Jesus, em certo ponto, repreendeu-os como: “néscios, e tardos de coração para
crer tudo o que os profetas disseram! Porventura não convinha que o Cristo padecesse estas
coisas e entrasse na sua glória?” (versos 25-26). E a isto Ele acrescentou: “E, começando por
Moisés, e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras”
(verso 27). O Novo Testamento é, com certeza, muito necessário. Mas isto não significa que
temos que recorrer a materiais de louvor não inspirados em cânticos congregacionais. O Espírito
irá certamente capacitar o povo de Deus a não ser “tardio de coração” para entender Cristo em
todos os Salmos! Devidamente entendido, o Livro dos Salmos, sustentamos, constitui um
volume suficiente para o louvor da igreja cristã. Os Salmos foram dados por Cristo e pode ser
completamente compreendido que eles falam a respeito dele e de suas obras.
Sustenta-se, portanto, que igrejas que se sujeitam à autoridade e suficiência da Bíblia como
Palavra de Deus escrita devem aplicar o princípio de que: “aquilo que a Escritura não prescreve,
ela proíbe”. Isto, por sua vez, irá encorajar a igreja a procurar autorização e provisão quanto ao
conteúdo dos seus louvores, e ser circunspecta acerca de qualquer coisa que deriva de mera
invenção ou gosto humano. Se a igreja se limitasse àquilo que deriva da Escritura, sendo
preceitos ou exemplos, ela teria um diretório perfeitamente adequado para a adoração e governo.
Essa é a esfera do seu critério. É uma aplicação coerente desse princípio que é a base do nosso
apelo para o uso de cânticos, no culto público, somente dos cânticos de louvor encontrados na
Sagrada Escritura.

V. O TESTEMUNHO HISTÓRICO

“Philip Schaff nos lembra: ‘Nós não temos nenhum cântico religioso completo
remanescente do período de perseguição (isto é, dos primeiros três séculos),
exceto a música de Clemente de Alexandria para o Logos divino - que, no
entanto, não pode ser chamado de um hino’”

Igreja primitiva
A evidência para o cântico exclusivo dos Salmos na igreja imediatamente pós-apostólica é forte.
Um historiador concluiu que: “aqueles que contendem pelo uso exclusivo do Saltério da
Escritura, no louvor de Deus formal e dirigido, encontra na história da igreja primitiva um sinal
de confirmação de sua posição”. Um mais recente hinologista concorda: “Na igreja ocidental, o
hino foi mais lento em ganhar seu espaço, em grande parte por causa do preconceito contra o
louvor não escriturístico, e não quase até o fim do século IV, o cântico de hinos começou ser
praticado nas igrejas”. Isto é confirmado pelo fato de que a cláusula 59 do Concílio de Laodicéia
(314-372) decretou o seguinte: “Proíbe-se cantar hinos não inspirados na igreja, e ler os livros
não canônicos”.
Até certo ponto, esta atitude na igreja primitiva surgiu de uma preocupação em estabelecer o
cânon do Novo Testamento. As igrejas estavam conscientes do carácter distintivo da literatura
canônica. Cecil Northcott, na citação que acabou de ser mencionada, é injusto ao usar o termo
“preconceito” como ele faz. Afinal, ele poderia facilmente ter elogiado a igreja primitiva pela
evidente preocupação para com o louvor exclusivamente bíblico. O verdadeiro preconceito
parece ser da parte de Northcott.
Há confirmação dessa prática da igreja primitiva pelo lado negativo. É claro que o cântico de
Salmos era generalizado. Mas, como Philip Schaff nos lembra: “Nós não temos nenhum cântico
religioso completo remanescente do período de perseguição (isto é, dos primeiros três séculos),
exceto a música de Clemente de Alexandria para o logos divino - que, no entanto, não pode ser
chamado de um hino”.
Enquanto há abundante evidência do uso dos Salmos da Bíblia na adoração da igreja pós-
apostólica, há uma ausência de evidência para o uso de qualquer outra coisa a não ser os Salmos
no louvor formal e dirigido das igrejas.

Igreja da Reforma
O movimento da reforma não foi um movimento unificado. Havia diferentes vertentes dentro do
que é amplamente chamado de reforma do século XVI. Martinho Lutero (1483-1546) e João
Calvino (1509-1564) estavam ambos preocupados com a reforma na igreja, mas eles diferiram
em suas convicções sobre o princípio regulador, como indicado acima. No entanto, os apoiadores
do movimento da reforma calvinista enfatizaram que uma autorização específica ou
“mandamento expresso”, como o reformador escocês John Knox afirmava, era necessário para
todos os aspectos do culto divino. João Calvino expressou da seguinte forma: “todas as partes do
culto divino (...) o Senhor fielmente abrangeu, e claramente revelou em seus sagrados oráculos”.
O Catecismo de Heidelberg, de 1563, faz a seguinte pergunta: “O que Deus exige, no segundo
mandamento?” E responde, dizendo: “Que nós, de modo algum representemos a Deus por
imagens, nem o adoremos de qualquer outra forma além do que Ele ordenou em sua Palavra”.
O período da reforma viu um renascimento do canto congregacional e, especificamente, do canto
dos Salmos bíblicos. Os Salmos eram, em geral, o “hinário” das igrejas da reforma. Como Millar
Patrick observou: “com um só golpe, a igreja reformada cortou suas amarras com toda a missa de
hinos em latim e com o uso dos hinos em geral, e adotou os Salmos do Velho Testamento como
o único meio de louvor da igreja”.
É verdade que alguns dos reformadores, como João Calvino, anexaram os cânticos, os Dez
Mandamentos em métrica, a oração do Senhor e o Credo dos Apóstolos aos seus Saltérios. Isso,
no entanto, dificilmente é uma defesa dos hinos não inspirados. O próprio Calvino sustentou que:
“não podemos encontrar cânticos melhores do que os Salmos de Davi que o Espírito Santo
proferiu e criou”.
Deve ser entendido que, para os reformadores, o uso dos Salmos da Bíblia era uma coisa muito
positiva. Isto é melhor afirmado por Calvino na “Introdução” do seu comentário sobre os
Salmos: “Não existe outro livro onde mais se expressem e magnifiquem os louvores divinos, a
liberalidade de Deus sem paralelo em favor de sua igreja e todas as suas obras. Não há nenhum
outro livro em que haja registrados tantos livramentos, nenhum outro em que as evidências e as
experiências da providência paternal e a solicitude que Deus exerce para conosco sejam
celebradas com tanto esplendor de expressão e ao mesmo tempo com a mais estrita aderência à
verdade. Em suma, não há outro livro em que somos mais perfeitamente instruídos na correta
maneira de louvar a Deus, ou em que somos mais poderosamente estimulados à realização desse
religioso exercício”.
É claro que a adoção dos Salmos pelos reformadores surgiu tanto de um profundo respeito pela
sua natureza, como composições imediatamente inspiradas pelo Espírito Santo, como de uma
consciência positiva de sua beleza inerente e verdade em termos espirituais. Não parece haver
qualquer desvantagem no desenvolvimento de sua piedade cristã por terem utilizado apenas esses
materiais de louvor, retirados exclusivamente do Livro inspirado por Deus.

Puritanos
A atitude e abordagem dos puritanos ingleses do século XVII é bem expressa na Confissão de Fé
de Westminster (1647), sem dúvida a mais bem sucedida das confissões das igrejas reformadas
no mundo de fala inglesa. A Confissão, além de ser clara sobre o princípio regulador que rege a
adoração e a prática dentro da igreja, também ordena especificamente: “o canto dos Salmos com
graça no coração”. Se for necessária alguma prova do zelo da Assembleia de Westminster para
com o cântico dos Salmos, então certamente é bem estabelecida pelo fato de que ela patrocinou
uma tradução métrica dos 150 Salmos da Bíblia. Esta foi a base do Saltério Escocês de 1650.
Não há dúvida de que as igrejas puritanas eram igrejas que cantavam os Salmos. Num prefácio
puritano à edição de 1673 do Saltério Escocês de 1650, referido acima, foi notado que, na
opinião deles: “a tradução que agora é colocada em vossas mãos é mais fiel ao original do que
qualquer outra que já temos visto, e possui uma tal fluente doçura que pensamos ser
recomendada para a vossa aceitação cristã (...)”. Em outras palavras, o Saltério foi visto como
uma mera paráfrase dos Salmos. D.H. Hislop estava certamente correto ao observar que: “o uso
exclusivo do Saltério é derivado de sua [isto é, dos reformados ou calvinistas] concepção da
revelação”.
Os puritanos, basicamente, operaram a partir dos mesmos princípios que as igrejas da Reforma.
Aquele príncipe dos teólogos puritanos, John Owen (1616-1683), por exemplo, falou claramente:
“A parte principal do dever da igreja neste assunto [isto é, de adoração] está em tomar cuidado
para que nada seja admitido ou praticado na adoração de Deus, ou como se à ela pertencesse, que
não seja instituído e apontado pelo Senhor Cristo. Em seu zelo, fidelidade e vigilância quanto à
isso, se consiste a parte principal da sua lealdade ao Senhor Jesus, como o Cabeça, Rei, e
Legislador de Sua igreja; e para estimular-nos à tal, Ele tem deixado tantas interdições e
proibições graves em sua Palavra, contra todas as adições às suas ordens, sob qualquer pretexto”.
Owen estava descontente com a convicção de alguns de que o Senhor não tinha prescrito cada
elemento de sua adoração e descreve isto como um caso de: “negligência em inquirir sobre o que
Ele prescreveu”. O século seguinte viu o início da introdução de materiais não inspirados para
louvor no culto das igrejas. Isto foi promovido principalmente pelo independente Isaac Watts
(1674-1748), talvez o pai fundador inglês do cântico de hinos, e mais tarde pelos hinos de Olney
(1779), de John Newton (1725-1807) e William Cowper (1731-1800). Watts produziu o que ele
considerou versões “cristianizadas” dos Salmos. Ele provavelmente sentiu que o Senhor tinha
esquecido de fazer isso na era do Novo Testamento. Mas estes eram homens de seu tempo. Era o
tempo, supostamente, do "Iluminismo". Como resultado dos movimentos intelectuais e
filosóficos deste tempo, as igrejas ficaram sob pressão para modificar posições anteriormente
mantidas sobre a natureza e suficiência da revelação divina. A razão humana foi vista ser
perfeitamente adequada em conexão com as coisas desse mundo. As pessoas, aparentemente, não
precisavam mais ser constrangidas pelas ideias anteriores acerca da autoridade bíblica.
Em matéria de conteúdo de louvor na igreja, pode-se ver como poderia haver pressão para
estender os itens de louvor utilizados, pela adição de materiais de composição meramente
humana, por mais que isto implicasse que houve omissões da parte do Senhor naquilo que se
tornou o cânon do Novo Testamento. Entre aqueles que levantaram suas vozes contra esta
tendência estava William Romaine (1714-1795), um pastor anglicano que escreveu em 1775 que:
“nossos fabricantes de hinos (...) tiraram os Salmos, introduziram seus próprios versos na igreja,
cantam seus versos com grande prazer e, como imaginam, com grande proveito; embora a prática
esteja em oposição direta ao mandamento de Deus, e, portanto, não possa, eventualmente, ser
acompanhada da bênção divina”.
A situação tem avançado rapidamente desde então. Hoje parece que há, como Owen disse acerca
dos seus dias: “negligência em inquirir” aquilo que Deus prescreveu (ou, quanto a este assunto,
proibiu) em matéria de culto. Existe hoje um fluxo contínuo de hinos e versos produzidos para o
culto cristão, em grande parte para satisfazer as demandas de tendências passageiras, e em muitas
igrejas parecem ser cada vez mais separadas do louvor as práticas fundamentadas nas Escrituras.
Será que devemos olhar para trás com pena daqueles puritanos que “apenas” louvaram o Senhor
com os Salmos e não tiveram o benefício dos hinos dos últimos anos, ou será que nós não
preferiríamos lamentar o fato de que a igreja hoje, em geral, não tem uma compreensão tão firme
das gloriosas verdades e realidades experimentais da Palavra de Deus, que as gerações anteriores
desfrutaram?

“As igrejas presbiterianas na Escócia, a partir do momento da Reforma,


durante o período do Pacto Nacional no século XVII e até a última parte do
século XIX, eram, basicamente, igrejas que cantavam os Salmos”

Presbiterianos
As igrejas presbiterianas na Escócia, a partir do momento da Reforma, durante o período do
Pacto Nacional no século XVII e até a última parte do século XIX, eram, basicamente, igrejas
que cantavam os Salmos. O Saltério Escocês, produzido em 1650, tomou um lugar significativo
e exercia uma influência importante na vida e na cultura da nação ao longo desse período. O
Saltério era o único manual autorizado de louvor, em sua forma métrica, até o final do século
XIX. No século anterior, houve um movimento para introduzir algumas Paráfrases das
Escrituras, e muitos Saltérios foram produzidos com essas Paráfrases e cinco outros “hinos”,
juntamente com os Salmos. Isso deu a impressão de que houve uma sanção eclesiástica que na
realidade não existiu. É verdade que em 1781 as Paráfrases Escocesas receberam uma
aprovação provisória para o uso experimental pela Igreja da Escócia. A legislação, no entanto,
nunca foi aprovada, dando posterior autorização explícita para esses cânticos.
Não foi até 1861 que a Igreja da Escócia formalmente autorizou hinos de composição meramente
humana. A Igreja Livre da Escócia seguiu o exemplo em 1872, mas não sem controvérsia. James
Macgregor (1830-1894), o professor de Teologia Sistemática no New College Edinburgh, por
exemplo, estava descontente com esse movimento. Ele expressou suas reservas em termos
inequívocos em um “Memorial” à Assembleia da Igreja Livre de 1869. Dentre outras coisas, ele
disse que: “a nossa Igreja, por muitas gerações, não tem, em seu louvor congregacional, feito uso
de quaisquer materiais de inspiração meramente humana, e com referência até mesmo a materiais
de inspiração divina, a ambígua ‘quase sanção’ alcançada pelas ‘paráfrases’ data apenas de um
período muito recente da sua história, e deriva a sua origem da mais profunda escuridão de sua
‘idade escura’ da moderação”.
Quanto aos cinco “hinos”, muitas vezes impressos na parte de trás dos Saltérios, o julgamento de
Macgregor era o de que estes eram: “parcialmente socinianos, principalmente deísticos,
totalmente não evangélicos em seu coração”, e tinham sido: “introduzidos na contracapa com o
propósito de dar a impressão de que havia algum fundamento para eles”, a saber, que eles tinham
alguma sanção eclesiástica, que na verdade eles não possuíam. Mas esta era uma abordagem
comum daqueles que desejavam introduzir materiais não inspirados para o louvor, ocultando
assim uma mudança de atitude quanto à natureza da revelação e à suficiência das Escrituras em
matéria de fé e prática. Por volta de 1884, o notável estudioso do Novo Testamento, professor
George Smeaton (1814-1889), renunciou à posição de presbítero na Igreja Livre de Grange,
Edimburgo, por causa da introdução do hinário da Igreja Livre naquela congregação.
Previsivelmente, houve um deslocamento gradual dos Salmos da adoração presbiteriana e junto
com isso um crescente descontentamento com o conteúdo dos louvores com o fundamento de
que, aparentemente, há sempre a necessidade de ser contemporâneo. Se refletirmos, pode-se
observar que Jesus não cantou os hinos da era moderna; os apóstolos nos tempos do Novo
Testamento não cantaram os cânticos da era moderna; e nem os reformadores e puritanos. Eles
eram cristãos inferiores? Será que isso não demonstra que não é necessário cantar hinos ou
músicas de composição meramente humana para termos uma adoração cristã autêntica, real e
espiritual? Diz-se frequentemente que as igrejas que cantam os Salmos são “tradicionais”. Na
realidade são as igrejas que cantam hinos que são tradicionais, já que elas derivam sua música
congregacional, na medida em que eles usam cânticos não canônicos, inteiramente de tradição
humana!
Isso não quer dizer que a igreja precisa estar presa a uma tradução métrica de uma época
anterior, por mais que esta possa ser venerada. Costuma-se argumentar contra os Salmos
métricos que eles próprios são paráfrases, adaptados a certo estilo. A consideração primordial
deve ser a de ter Salmos para serem cantados, que reflitam com precisão o fundamento hebraico,
com a ajuda das citações da Septuaginta e do Novo Testamento em grego. Nas “Direções” pré-
fixadas ao seu Calendário de Leituras Diárias produzidas pela primeira vez em 1842, Robert
Murray McCheyne (1813-1843) disse o seguinte sobre os Salmos Escoceses: “É verdadeiramente
uma tradução admirável do hebraico, e frequentemente é mais correto do que a versão em prosa”.
Melhorar traduções é, sem dúvida, sempre desejável, mas ao mesmo tempo é importante que a
tradução seja adequada para o canto congregacional e fácil de compreender. Esta foi certamente
a preocupação dos reformadores e das pessoas envolvidas no desenvolvimento do cântico dos
Salmos que surgiram a partir da Assembleia de Westminster.

“A piedade de um povo é, em grande medida, moldada pelos louvores que ele


canta”

Avivamentos
Provavelmente seria considerado inimaginável hoje que poderia haver um genuíno reavivamento
espiritual em uma igreja que utiliza apenas os Salmos da Bíblia. A influência dos Salmos no
desenvolvimento e na difusão do cristianismo no mundo pode ser bem apreciada a partir de tudo
o que já foi descrito neste capítulo. O fato é que os Salmos têm sido significativos em tempos de
avivamento na história da igreja. Isso não deve ser uma surpresa, pois os Salmos, nas palavras de
João Calvino, são: “uma anatomia de todas as partes da alma”.
Em um livro intitulado The True Psalmody [A Verdadeira Salmodia], produzido pela primeira
vez nos Estados Unidos em 1861, a observação que é feita é a de que: “os valdenses cantaram os
Salmos e nada mais em seus vales alpinos; (...) A igreja francesa, e as igrejas da Suíça, não
utilizaram nada mais no cântico durante os mais prósperos dias de sua vida religiosa, enquanto
esses cânticos sagrados não contribuíram pouco para a propagação do Evangelho. Estes Salmos
constituíram a única salmodia da igreja escocesa na primeira e na segunda reforma (...) Estes
Salmos eram os cânticos sagrados da igreja reavivada na Irlanda”.
Acerca do efeito do Saltério em métrica em conexão com os avivamentos do século XVIII na
Escócia, Arthur Fawcett sugeriu que: “não é possível avaliar a enorme importância do Livro de
Salmos em métrica; quase todos os sujeitos do avivamento - pelo menos aqueles cujas histórias
temos - citaram ele. Repetidamente, era a partir das linhas lembradas de suas páginas que a luz
brilhava na sombria escuridão”.
Quando se pensa que a piedade de um povo é, em grande medida, moldada pelos louvores que
ele canta, a importância e o significado dos Salmos tornam-se evidentes.

VI. CONCLUSÕES
Nenhum cristão pode, possivelmente, negar que a adoração a Deus é uma questão extremamente
importante. Como devemos adorar o Senhor? Cante Davi, o: “suave em salmos de Israel” (2
Samuel 23:1):

Dai ao SENHOR,
ó filhos dos poderosos,
dai ao SENHOR
glória e força.
Dai ao Senhor
a glória devida ao seu nome,
adorai o Senhor
na beleza da santidade.
(Salmos 29:1-2)

A igreja do Velho Testamento fez a seguinte pergunta: “Com que me apresentarei ao Senhor, e
me inclinarei diante do Deus altíssimo? Apresentar-me-ei diante dele com holocaustos, com
bezerros de um ano? Agradar-se-á o Senhor de milhares de carneiros, ou de dez mil ribeiros de
azeite? Darei o meu primogênito pela minha transgressão, o fruto do meu ventre pelo pecado da
minha alma?” Qual foi a resposta?: “Ele te declarou, ó homem, o que é bom (...)” (Miquéias 6:6-
8). O Senhor nos mostrou! Estamos contentes com aquilo que o Senhor proveu em sua Palavra,
ou precisaremos adicionar algo para terminar o que Ele deixou incompleto?
Tem sido a responsabilidade deste livro sugerir que, em matéria de adoração, o Senhor nos
mostrou o que é bom. Ele providenciou materiais nos Salmos suficientes para o culto, e a
introdução de composições meramente humanas, não importando quão agradáveis aos seus
sentimentos ou quão espiritual os seus conteúdos sejam e por mais bem intencionados que sejam
os seus defensores, é basicamente um ato de presunção humana. Nós acreditamos que os
argumentos a este respeito são tanto sólidos quanto bíblicos. Eles estão aqui resumidos.
Os Salmos são frutos da inspiração divina
Os Salmos são tanto designados quanto providos para serem cantados na igreja. O fato é que
apenas o Livro dos Salmos pode ser usado com a certeza de que essas músicas foram
divinamente designadas para esse propósito. Mesmo com o melhor dos hinários não há essa
garantia. A adoção de outros materiais não inspirados de louvor traz consigo a implicação de
que, de alguma forma, algo está faltando na provisão bíblica em matéria de louvor
neotestamentário. As palavras de William Romaine são tanto desafiadoras quanto diretas: “Eu
gostaria de saber qual é o homem que pretende compor hinos melhores do que os do Espírito
Santo (...) Por que (...) qualquer homem deste mundo iria pôr em sua cabeça que ele se sentaria e
comporia hinos para serem usados na igreja? Seria o mesmo caso de alguém que resolvesse
escrever uma nova Bíblia”.

Os Salmos são suficientes para o louvor no Novo Testamento


Alguém pode dizer: “Não é o Livro dos Salmos desnecessário ou restritivo? Certamente não
deveríamos cantar o nome de Jesus num cântico?”. Este é um ponto razoável. Mas Cristo está
nos Salmos. Como O. Palmer Robertson, anteriormente professor de Velho Testamento no
Seminário Teológico de Westminster, nos lembrou: “Num certo sentido, todos os Salmos se
referem a Cristo, pois cada um está relacionado à Redenção que Ele realizou pelo seu povo (...)
Todos os Salmos se relacionam com Jesus Cristo e sua obra redentora”.
Além disso, pense no impacto dos próprios Salmos no Novo Testamento. Há, pelo menos, 150
citações dos Salmos no Novo Testamento. O argumento da Epístola aos Hebreus está, num grau
considerável, ligado aos Salmos. O próprio Jesus afirmou que os Salmos falavam dele (Lucas
24:44-47). Eles falam de sua pessoa, como Profeta (Salmos 2:7), como Sacerdote (110:4 com
Hebreus 5:6) e como Rei (2:6; 45:6). Eles falam da sua eterna filiação (2:7; com Hebreus 5:5),
seu advento (96:11-13) e sua humanidade (22, completo). Eles falam de sua obra (118:22; ver
Atos 4:11), em seus sofrimentos e morte (40:6-8; 21 completo; 22:1; 69:9; ver Mateus 27:46),
em sua ressureição (16:8-11; ver Atos 2:25-31), sua ascensão (68:18; ver Hebreus 10:12-13) e
sua segunda vinda (50:1-6; ver 1 Tessalonicenses 4:16; 2 Pedro 3:10). Ele é o pastor do seu povo
(23; 80:1; ver João 10:11), o Filho de Davi (78:68-72 ver Mateus 22:41-46; Salmos 132:11; ver
Mateus 1:1), o Filho do Homem (8:4; ver Hebreus 2:6; Mateus 8:20) e o 3Redentor dos eleitos
de Deus (25:22; 26:11; 130:7-8).
William Balfour (1821-1895), ministro da Igreja Livre de Holyrood, Edimburgo, falando em
1880, estava certamente correto quando disse, com referência às verdades cristãs nos Salmos: “A
pergunta é, elas estão lá? Se temos a certeza de que sim, como certamente é, então deve ser a
nossa própria culpa, se não as encontramos. Devemos ter falhado em não conseguir ter entrado
no espírito dos Salmos; e se assim for, o remédio não deve ser encontrado na provisão de um
hino ou hinos nos quais é feita referência a essas verdades em tantas palavras, mas sim em buscar
o Espírito de adoção, sem o qual os hinos mais evangélicos já escritos não irão nos permitir
louvar a Deus corretamente, e, com Ele, os Salmos fornecerão o material mais rico e inesgotável
para o louvor de Deus”.
Tudo isto poderia ser ampliado. O fato é, porém, que não há evidências de que as referências a
cânticos no Novo Testamento sejam a qualquer coisa que não seja os Salmos das Escrituras.
Nenhuma autorização pode, eventualmente, ser tomada a partir desses para a adoção de
composições não inspiradas. Como o professor Macgregor colocou de forma direta: “Não há
nenhum caso visível no qual, com a sanção de Deus, qualquer congregação jamais tenha cantado
um cântico de inspiração meramente humana”.

Os Salmos produzem piedade bíblica


Já foi mencionado que o cântico de uma igreja, de uma forma ou outra, irá influenciar a piedade
dos fiéis. Com a melhor boa vontade do mundo, o canto de hinos de composição meramente
humana - hinos não inspirados - tenderá a produzir uma piedade não mais profunda do que a do
autor humano. A piedade irá refletir a compreensão dele da verdade. E isso pode ser bom, até
certo ponto. Não importa o quão bíblico possa ser, ele ainda ficará aquém da piedade e devoção
refletida nos Salmos. Pois os salmistas experimentaram a intervenção direta e poderosa do
Espírito de Deus em suas vidas. Isso garantiu que eles fossem possuidores da realidade e do
poder da verdade de Deus no sentido mais pleno. Como resultado, o tipo de piedade que flui do
uso dos Salmos no culto será uma devoção inteiramente baseada no conhecimento, fé, realidade
e poder da verdade de Deus.
Não é uma evidência de uma superficialidade que prevalece no cristianismo moderno que os
Salmos têm praticamente desaparecido do uso nas devoções da igreja em geral? Seja qual for a
experiência que está sendo promovida através dos hinos, isso não vai se comparar com a
experiência devocional baseada nos materiais de louvor de inspiração divina quando aplicados
pelo Espírito Santo. Não importa o quão atraentes os cânticos possam estar em um nível humano,
eles não se tornam mais palatáveis para a pessoa não salva, que em termos bíblicos está morta
para as realidades espirituais (ver 1 Coríntios 2:14; Efésios 2:1-6). É quando o Espírito de Deus,
que inspirou os Salmos, regenera uma pessoa e faz com que essa pessoa se torne uma nova
criatura em Cristo (2 Coríntios 5:17), que ele ou ela começa a entender os Salmos em termos
profundamente pessoais, não menos do que nos cânticos que falam de Cristo, e começa a refletir
as experiências de homens em quem o Espírito operou diretamente e poderosamente.
Embora isto possa ser igualmente argumentado a favor dos hinos, o ponto é que os Salmos,
sendo fruto de inspiração divina, devem, devido à sua natureza, tender a produzir uma piedade
bíblica de uma forma que materiais sem inspiração não podem.

Os Salmos podem ser cantados sem reservas


O que torna o cântico dos Salmos diferente do orar e pregar? Cada um, naturalmente, deve ter
seu mandamento bíblico separado. Mas se você permite “liberdade” na oração e pregação, por
que não também no cântico? Pela razão de que: “Esta é uma parte do culto para a qual uma
forma prescrita é necessária, enquanto mais de uma pessoa, em conjunto, se expressa oralmente
ao mesmo tempo, e por isso deve ser uma forma na qual se espera que todos possam se unir sem
reservas”.
Esse é um ponto importante. Ao fornecer à igreja o Livro dos Salmos, o Senhor impede que um
pregador e congregação, ou denominação, fiquem entre a consciência de uma pessoa e o seu
Deus no tocante àquilo que ela canta, para que sua consciência tenha somente a Palavra de Deus
como sua regra. Porque o melhor dos homens é homem pecaminoso, na melhor das hipóteses, os
materiais bíblicos de louvor são os únicos que podem ser cantados sem qualquer reserva em uma
congregação reunida.

“Hugh Martin disse o seguinte em 1872: ‘Os Salmos são o grande hinário
católico e o canto deles prevê a união cristã para a catolicidade perfeita’”

Os Salmos encorajam a unidade da igreja


A adoção de materiais não inspirados para o louvor cria problemas para a unidade da igreja. Isto
pode ser ilustrado da seguinte maneira: Um líder do culto anuncia um hino (variedade não
canônica). Sou obrigado a cantar? Não. É um pecado eu não cantá-lo? Não, afinal não é a
Palavra de Deus. Mas como pode a unidade da congregação, em seu ato de louvor cantado, ser
preservada se todos não cantarem-no? Por outro lado, tome um Salmo (canção canônica). O líder
o apresenta. Sou obrigado a cantar isso? Bem, eu não teria nenhuma razão para não fazê-lo. Se
eu for capaz de cantar, a resposta deve ser sim. O louvor do santuário, especialmente onde a
participação está envolvida (como o cântico), deve ser expressão da unidade da igreja
(congregação). O uso exclusivo dos Salmos não pode atrapalhar isso. Apenas os Salmos da
Bíblia podem sempre ser verdadeiramente ecumênicos. Apenas os Salmos da Bíblia podem ser
cantados sem quaisquer escrúpulos para a consciência sobre as palavras, expressões,
experiências, ou teologia utilizada, apropriadamente compreendida.
Hugh Martin (1822 – 1885) disse o seguinte em 1872: “Os Salmos são o grande hinário católico
e o canto deles prevê a união cristã para a catolicidade perfeita (...) Se Cristo Jesus estivesse
fisicamente na sinagoga, em Nazaré, você daria a Ele outra coisa além dos seus Salmos para Ele
cantar, enquanto te guia no cântico? Seus próprios Salmos, por serem compostos por Ele mesmo;
seus próprios Salmos que sua alma cantou com graça em seu coração ao Senhor, nos dias de sua
carne. Você mantém comunhão com Ele e Ele com você, na qual os louvores do santuário que
você canta, são os Salmos dele. Você pode pensar que seus hinos estão em conformidade com a
Palavra, mas os Salmos são a própria Palavra de Deus”.

Os Salmos devem ser restaurados na adoração cristã


Isso equivale a um apelo para a igreja cristã em geral. Em seu breve trabalho admirável, “The
Psalms - Prayer Book of the Bible” [Os Salmos – O Livro de Oração da Bíblia], Dietrich
Bonhoeffer disse o seguinte: “A comunidade cristã, sem o Saltério, perdeu um tesouro
incomparável e ao resgatar o seu uso, irá recuperar recursos que nunca sonhou ter”. Recursos.
Recursos espirituais. Esses são materiais que moldaram a piedade cristã das gerações – em
padrões bíblicos. No desenvolvimento da igreja, ao longo dos últimos cem anos ou mais, os
Salmos das Escrituras desapareceram completamente da adoração formal de Deus em muitas
igrejas. É nossa convicção de que é preciso haver um retorno aos Salmos nos louvores de Deus.
O Saltério não é apenas divinamente inspirado e uma coleção divinamente apontada por Deus de
salmos, hinos e cânticos, também é a expressão de todos os aspectos da experiência cristã, e é
perfeitamente equilibrado teologicamente. É claro que tal retorno significará uma correção de
atitudes: a reforma do nosso canto. Mas o retorno valerá a pena e será mui alegre.
Dr. Henry Cooke, de Belfast, fez este apelo emocionante - um apelo, que gostaríamos de sugerir,
com contínua relevância na área de adoração: “Enquanto eu não estabeleço minhas próprias
convicções como uma regra ou medida para a consciência dos outros, não posso deixar de ter
pena daqueles que podem encontrar, como eles afirmam, tão pouco de Cristo na inspirada
salmodia da Bíblia, e que eles precisem buscar e empregar uma salmodia não inspirada para
expô-lo mais completamente. Nosso Senhor encontrou a si mesmo nos Salmos (Lucas 24:44-45)
– e assim abriu o entendimento dos seus discípulos para que eles pudessem entender as
Escrituras. Certamente o que era a mais clara luz para os olhos deles, deve ser para os nossos. E,
verdadeiramente, eu acredito, há uma visão de Cristo – e não é a menos importante para o crente
atribulado e cansado – que pode ser descoberta apenas no Livro dos Salmos. Eu me refiro a sua
vida interior (...) As mais piedosas produções de homens não inspirados são riachos rasos,
enquanto os Salmos são um oceano insondável e sem limites”.
Não há nada mais importante do que a adoração a Deus. O desafio permanente para a igreja hoje,
nesta questão de como e com o que deveria adorar a Deus, é simplesmente que a verdade deve
ter o seu espaço, por mais que possa fazer com que as tradições e práticas desenvolvidas
recentemente sejam anuladas e reformadas. A igreja moderna deve estar disposta a deixar que a
verdade tenha o seu espaço, especificamente nesta questão dos cânticos e do lugar dos Salmos no
culto. Quais são os cânticos do Senhor? É o cântico que Ele deu, que Ele apontou e proveu em
sua Palavra.
Vinde, cantemos ao Senhor
Vinde todos
Jubilemos à rocha da nossa Salvação.

Vamos ante à sua presença


Com louvores e ação de graças,
Celebremo-lo com Salmos

(Salmo 95:1-2 – Saltério de 1650).

LEITURA ADICIONAL

Beeke, Joel R. e Selvaggio, Anthony T. (Editores), Sing a New Song, Grand Rapids, 2010.
Um dos melhores dentre um número crescente de livros que pretendem recuperar, reafirmar ou
redescobrir o cântico de Salmos na igreja moderna. Excelente!

Begg, James, Anarchy in Worship, Edimburgo,


1875. Este pequeno trabalho (48 páginas) foi
reproduzido nos últimos anos. Trata de inovações na adoração, no contexto do final do século
XIX no presbiterianismo escocês.

Binnie, William, The Psalms: Their History, Teachings and Use, Londres, 1886.
Um livro único. Não só cheio de excelentes comentários e conhecimento a partir de um ponto de
vista conservador, mas este livro também oferece um belo panorama do Saltério e seu uso
cristão.
Blaikie, Alexander, A Catechism on Praise, James Begg Society, 1997.
Blaikie foi um pastor na Associate Reformed Presbyterian Church [Igreja Presbiteriana
Reformada Associada],
Boston. Uma obra breve e
útil publicada pela primeira vez em 1854.

Bonar, A. A., Christ and His Church in the Book of Psalms, Stoke on Trent, 2001.
Publicado pela primeira vez em 1859, este é um livro excelente, que traz de forma eficaz, de
breve abrangência e não de uma forma exaustiva, a cristologia do Saltério. Diz Bonar: “Os
Salmos são para todas as idades – não mais para Davi que para nós”.

Bushell, Michael, Songs of Zion. The Biblical Basis for Exclusive Psalmody, Norfolk Press,
2011.
Originalmente uma tese de mestrado, este é o tratamento mais abrangente e acadêmico de
"salmodia exclusiva” na era moderna.

Church, Francis (Ed.), The True Psalmody, Edimburgo,


1888. Um combinado esforço de ministros e presbíteros
das Reformed and United Presbyterian Churches [Igrejas Reformada e Presbiteriana Unidas] da
Filadélfia. [Este livro também foi traduzido pela Editora Caridade Puritana: A Verdadeira
Salmodia]

Gibson, James, Public Worship of God: Its Authority and Modes, Glasgow, 1869.
A obra de um professor da Free Church [Igreja Livre] dentro do contexto da discussão da
questão do presbiterianismo escocês.

Kerr, James, McDonald, John, The Voice of His Praise, James Begg Society,
1999. Reimpressão de quatro folhetos, lançados pela primeira vez pela Reformed
Presbyterian Church of Scotland [Igreja Presbiteriana Reformada da Escócia], cerca de 1880.

LeFebvre, Michael, Singing the Songs of Jesus, Christian Focus,


2010. Um
interessante e poderoso argumento para o uso dos Salmos como um louvor centrado em Cristo.

McNaugher, John (Ed.), The Psalms in Worship, Still Waters Revival Books, 1992.
Este compreende uma reedição de um volume de Convenção de Artigos sobre o lugar dos
Salmos na adoração, produzido pela United Presbyterian Church of North America [Igreja
Presbiteriana Unida da América do Norte] em 1907. Excelente.

Psalm Singers’ Conference, Belfast,


1903. Documentos de conferências que
cobrem todos os aspectos do cântico de Salmos com contribuições do USA e Europa.

Ramsay, M.C., Purity of Worship, Presbyterian Church of Eastern, Austrália, 1968.


Um excelente livreto de 47 páginas, conciso mas completo.
RPCNA, The Biblical Doctrine of Worship, Reformed Presbyterian Church of North America,
1973.
Um Simpósio enormemente útil. Em certo sentido, uma versão atualizada da publicação Psalm
Singers’ Conference [Conferência dos Cantores de Salmos] de 1903.

Smith, Frank J. e Lachman, David C. (Eds.), Worship in the Presence of God, Greenville, South
Carolina, 1992.
Uma instigante e abrangente coleção contemporânea de ensaios sobre a natureza, elementos e
visões históricas e práticas de culto.

Ward, Rowland S., Psalm-Singing in Scripture and History, Melbourne, 1992.


Um estudo doutrinário e histórico. Particularmente útil para a visão histórica, cobrindo muitas
igrejas e países.

Williamson, G. I., The Singing of Psalms in the Worship of God, Belfast, 1972.
Um esplêndido pequeno livreto que sucintamente cobre os princípios envolvidos.

O capítulo V foi publicado num formato anterior pela Knox Press em 1994, e pela Crown and
Covenant Publications em 2003. É republicado aqui numa forma atualizada e por gentil
permissão.

Rev. John W. Keddie foi recentemente aposentado como ministro de Bracadale, congregação da
Free Church of Scotland (Continuing) [Igreja Livre da Escócia (Continuada)], e serve como
professor de História da Igreja e Princípios da Igreja no Seminário da Free Church [Igreja
Livre], Inverness.
VI. LOUVOR TERAPÊUTICO
David Murray

pesar das centenas de novos cânticos cristãos, de todos os gêneros possíveis, sendo
A compostos a cada ano, os antigos Salmos estão experimentando um avivamento. Por que?

Eu acredito que a principal razão é o seu valor terapêutico; em uma época de tantas emoções
desordenadas, adoradores estão descobrindo como os Salmos ministram tão poderosamente às
suas vidas emocionais.

Os Salmos equilibram revelação divina e emoções humanas


Algumas músicas cristãs são emocionalmente fortes, mas têm pouco conteúdo teológico; o
coração está envolvido, mas não a mente. Ao reagir contra isso em excesso, alguns têm
composto cânticos que estão cheios de fatos teológicos, mas que não envolvem os sentimentos
do adorador. Eles são mais como sermões cantados.
Os Salmos atingem um inspirado equilíbrio de teologia doxológica e doxologia teológica; eles
combinam o objetivo com o subjetivo em perfeitas proporções. Repetidamente lemos: “Louvai
ao Senhor por (...)” seguido por razões e motivações para este louvor. Deus é declarado e
descrito, mas sempre para incitar nossos corações e para interagir com Ele por meio da revelação
de si mesmo.

Os Salmos expressam as emoções humanas de um modo completo


Os Salmos contêm uma mistura incomparavelmente rica de emoções extremas e variadas:
tristeza e alegria, dúvida e confiança, solidão e companheirismo, desespero e esperança, medo e
coragem, derrota e vitória, queixas e louvores, e etc..
É de se admirar que Calvino chamasse aos Salmos de: “uma anatomia de todas as partes da
alma”? Como ele explicou: "Não há uma emoção da qual qualquer um pode estar consciente que
não é aqui representada como num espelho. Ou melhor, o Espírito Santo tem, aqui, trazido à vida
todos os pesares, tristezas, medos, dúvidas, esperanças, cuidados, perplexidades, enfim, todas as
emoções perturbadas com as quais as mentes dos homens estão acostumadas a serem agitadas”

Os Salmos retratam um quadro realista das emoções cristãs


Os Salmos não retratam a vida cristã como vitória sobre vitória. Derek Thomas pontuou que pelo
fato de muitos cultos contemporâneos serem otimistas e positivos e, portanto, estarem em
desacordo com o que os cristãos experimentam no restante da sua semana, eles produzem uma
desconexão que eventualmente leva ao cinismo e a uma perda de convicção.
Mas quando nos voltamos para os Salmos, encontramos uma honestidade muito clara. Embora as
fortes expressões da dura realidade possam, inicialmente, abalar nossos refinados ouvidos, em
breve ficaremos aliviados ao encontrar espíritos familiares que prestativamente expressam o que
muitas vezes pensamos, sentimos e experimentamos em nossas confusas vidas diárias.

Os Salmos abrem uma saída bem vinda para nossas dolorosas emoções
Você já cantou sobre a certeza da salvação enquanto estava cheio de dúvidas? Você já cantou
sobre a alegria quando se sentia deprimido? Eu também. E é horrível, não é? Por que não posso
cantar o que eu realmente sinto? Com os Salmos você pode! Alguns nos permitem expressar
dúvidas e até mesmo o desespero (por exemplo, o Salmo 88); outros podem nos ajudar a
descrever nossas lutas com a providência (por exemplo, o Salmo 73); outros ainda podem nos
guiar explicando nossas batalhas com a depressão (por exemplo, os Salmos 42 e 78).

“Os Salmos abrem a válvula de pressão de nossos corações e nos dirigem em


como articular nossas emoções mais dolorosas. Nós não precisamos engarrafá-
las ou negá-las. Em vez disso, Deus inspirou cânticos para admiti-las e pô-las
para fora”

Os Salmos abrem a válvula de pressão de nossos corações e nos dirigem em como articular
nossas emoções mais dolorosas. Nós não precisamos engarrafá-las ou negá-las. Em vez disso,
Deus inspirou cânticos para admiti-las e pô-las para fora. Como alguém disse: “Que alívio! Eu
posso cantar o que está realmente na minha mente e coração, e Deus me dá palavras para
expressar justamente essas emoções. Os Salmos alcançam essas emoções e depois as leva para
cima, em direção a Deus”.

Os Salmos nos chamam para a transformação de nossas emoções


Os Salmos não apenas nos permitem “desabafarmos” nossas emoções, mas também exigem a sua
transformação. Nós não somos deixados para nos chafurdarmos em nossos sentimentos, mas eles
nos demonstram que devemos mudar do medo para a coragem, da dor para a alegria, da raiva
para a paz, e do desespero para a esperança. Um ponto de partida doloroso é legítimo, mas é
apenas um ponto de partida. O ponto final da cura emocional deve ser mantido em vista, e
precisamos nos mover em direção a ele, com a ajuda da mão do salmista que nos guia.

Os Salmos nos convocam a uma emoção que é compreensiva


Como um adolescente rebelde, muitas vezes eu frequentava a minha igreja que cantava os
Salmos, imaginando porque eu estava cantando palavras nas quais não havia relevância nenhuma
para mim, de modo algum. Por que cantar sobre a tristeza, quando eu estava perfeitamente feliz?
Ou em alguns domingos, por que cantar sobre alegria quando me sentia tão deprimido com a
minha vida?
Bem, é claro, tal é a mentalidade de um adolescente, centrada em si mesma. Mas quando Deus
nos salva, começamos a olhar um pouco além de nós mesmos e percebemos que, embora eu
possa não sentir essas coisas, outros certamente sentem. Os Salmos me convocam a chorar com
os que choram e a me alegrar com os que se alegram, não importa se eu me sinto exatamente o
oposto. Eles me fazem lembrar a diversidade emocional do corpo de Cristo e convidam-me a
compartilhar os sofrimentos e os sucessos dos outros. Eles me transformam de dentro para fora.

Os Salmos fornecem um estímulo emocional para o justo


Eu tentei enfatizar o envolvimento emocional e o estímulo dos Salmos. No entanto, em última
análise, os Salmos usam a energia emocional que eles geram para estimular a obediência prática.
Observe quantos Salmos de “sabedoria” são intercalados em todo o saltério, estabelecendo o
caminho da obediência para o adorador despertado e energizado. Transformação emocional deve
resultar em transformação de vida.

Rev. Dr. David P. Murray é o ministro da congregação da Free Reformed Church [Igreja Livre
Reformada], em Grand Rapids, Michigam e também serve como professor de Velho Testamento
e Teologia Prática no Puritan Reformed Theological Seminary [Seminário Teológico Reformado
Puritano], em Grand Rapids, Michigan.
VII. O SALTÉRIO É SUFICIENTE?
A Suficiência do Livro dos Salmos para o Louvor de Deus Hoje
David Silversides

ma das objeções mais frequentes hoje, para o uso exclusivo dos Salmos na adoração, é a
U questão da adequação. O Saltério pode ser considerado suficiente para o uso da igreja do
Novo Testamento, tendo em vista o fato de que ele foi escrito no período do Velho
Testamento e de que agora temos o benefício do registro da redenção realizada por Cristo e a
exposição deste evento nas Escrituras do Novo Testamento? Argumenta-se sobre como pode ser
correto ficar confinado ao uso de um Saltério bíblico que foi escrito, ainda que por inspiração de
Deus, no Velho Testamento, quando vivemos agora na era do Novo Testamento.
O argumento continua: os Salmos precisam ser parafraseados ou alterados para que possam
adequar-se à adoração do Novo Testamento, como Isaac Watts afirmava,
ou que, alternativamente, podemos cantá-los como eles estão, mas sendo em si mesmos
insuficientes, e logo precisam ser suplementados por hinos não inspirados compostos por
homens piedosos que viveram desde que a era do Novo Testamento começou. Em outras
palavras, é afirmado que os Salmos bíblicos devem ser alterados ou suplementados para termos
uma completa coleção de materiais de louvor para a igreja no Novo Testamento. É esta visão que
é desafiada aqui.

I. IMPORTANTES FATOS SOBRE OS SALMOS

Primeiro: os Salmos são infalivelmente inspirados por Deus. Isto deve ser óbvio, mas precisa
ser dito. Temos que temer criticar qualquer parte da Palavra de Deus, incluindo o Livro dos
Salmos. Às vezes, em seu zelo de se oporem ao canto exclusivo dos Salmos, homens têm dito
coisas sobre os Salmos que, numa reflexão mais calma, eles deveriam certamente perceber que
nunca deveriam ter criticado alguma parte da Palavra de Deus. Os Salmos são inspirados por
Deus. Eles são infalíveis e sem erro.
Quando o Salmo 95:7-11 é citado em Hebreus 3:7-8, as palavras do Salmo são atribuídas ao
Espírito de Deus: “Portanto, como diz o Espírito Santo: Se ouvirdes hoje a sua voz, não
endureçais os vossos corações, como na provocação, no dia da tentação no deserto”. Isto
significa que os cânticos contidos no Saltério são espirituais no sentido mais elevado possível.
Quando nos voltamos para Efésios 5:19, lemos: “falando entre vós em salmos, e hinos, e
cânticos espirituais, cantando e salmodiando ao Senhor no vosso coração”. Aqueles que estão
familiarizados com a posição do canto exclusivo dos Salmos saberão que os termos: “salmos,
hinos e cânticos”, são termos os quais, todos os três (no equivalente hebraico e exatamente as
mesmas palavras na tradução grega do Velho Testamento), são usados nos títulos dos Salmos, no
conteúdo dos Salmos, e no conteúdo do Velho Testamento fora do Livro dos Salmos, para
descrever o Livro dos Salmos. Um argumento mais detalhado pode ser encontrado em outro
lugar, mas é suficiente dizer que, para o propósito deste artigo, consideramos: “salmos, hinos e
cânticos” como três termos que se referem ao Livro dos Salmos.

“Um dos sentidos de ser cheios do Espírito Santo é cantar estes cânticos que
são inspirados pelo Espírito Santo. Os conteúdos do Saltério são do Espírito de
Deus no sentido mais elevado possível, de serem dados e ditados, palavra por
palavra, pelo Espírito Santo”

A ordem original das palavras é: “salmos e hinos e cânticos espirituais” (psalmois kai humnois
kai odais pneumatikais), então a palavra “espirituais” poderia se referir simplesmente ao cântico,
ou poderia qualificar todos os três termos: salmos espirituais, hinos e cânticos. O que a palavra
espiritual significa se está apenas se referindo aos cânticos? A resposta está no verso 18: “E não
vos embriagueis com vinho, em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito; falando entre vós
com salmos, e hinos, e cânticos espirituais”. A palavra “espírito” é pneumati (v.18) e a palavra
“espiritual” (v.19) é pneumatikais. Assim como é no nosso idioma, assim também é no grego, as
palavras “espírito” e “espiritual” são, essencialmente, uma palavra, uma sendo a forma adjetiva
da outra, que é o substantivo. No verso 18, fica bem claro que o “Espírito” em questão não é
outro senão o Espírito Santo e, portanto, um dos sentidos de ser cheios do Espírito Santo é cantar
estes cânticos que são inspirados pelo Espírito Santo. Cânticos espirituais são cânticos do
Espírito Santo, não num sentido vago tendo algo a ver com o espírito humano ou “coisas
espirituais”, que tendemos a usar num sentido mais aberto. Os conteúdos do Saltério são do
Espírito de Deus no sentido mais elevado possível, de serem dados e ditados, palavra por
palavra, pelo Espírito Santo.
Além disso, isto significa que o Livro dos Salmos é a Palavra de Cristo. Note a passagem
paralela em Colossenses 3:16: “A palavra de Cristo habite em vós abundantemente, em toda a
sabedoria, ensinando-vos e admoestando-vos uns aos outros, com salmos, hinos e cânticos
espirituais, cantando ao Senhor com graça em vosso coração”. Aqui a prática do canto destes
salmos, hinos e cânticos espirituais é um aspecto de fazer com que: “a palavra de Cristo habite
em vós abundantemente, em toda a sabedoria”. Os Salmos foram dados pelo Espírito de Cristo,
eles falam de Cristo (Lucas 24:44) e eles também são cantados pelo Senhor Jesus Cristo nos dias
de sua carne. O Senhor Jesus não cantou cânticos que são composições meramente humanas. Ele
cantou os Salmos dados por Deus.
A distinção entre a infalível revelação e aquilo que é bom, mas falível, os homens devem manter
rigorosamente. Nenhuma quantidade de sentimento ou tradição deve obscurecer isso. Os Salmos
foram inspirados por Deus. Às vezes, as pessoas dizem: “Bem, estes bons homens não foram, em
certo sentido, inspirados por Deus?”. Não, eles não foram: Isaac Watts, Toplady ou Doddridge
não foram inspirados, ou qualquer outro desde o fechamento do cânon da Sagrada Escritura. Não
afirmamos que eles não eram homens piedosos e que o Espírito de Deus não deu a eles
entendimento acerca da verdade, mas o que eles produziram não foi inspirado como a Palavra de
Deus, de outro modo, tais escritos deveriam ser incluídos na Bíblia. Não cremos em inspiração
fora das Escrituras, quer seja com relação ao papa de Roma, algum pseudoapóstolo carismático
ou até mesmo homens piedosos que escreveram poemas que eles pensaram que deveriam ser
usados na adoração a Deus. A diferença entre a Palavra de Deus e a palavra de homens, ainda
que piedosos, deve ser mantida.

Segundo: os nomes de Cristo aparecem nos Salmos. O nome hebraico “Jeová”, do Velho
Testamento, é normalmente traduzido como SENHOR em nossas versões. Na tradução grega do
Velho Testamento, conhecida como Septuaginta e algumas vezes citada pelos apóstolos, a
palavra kurios é usada para traduzir Jeová quando o Velho Testamento está sendo citado no
Novo. É também a palavra que é constantemente usada quando o Novo Testamento fala do
Senhor (kurios) Jesus Cristo. O hebraico Jeová aparece constantemente no Livro dos Salmos e,
às vezes, muito claramente referindo-se ao Senhor Jesus Cristo. Por exemplo, o Salmo 102:21-24
refere-se ao SENHOR (Jeová) e os versos 25-27 são citados em Hebreus 1:10-12 sendo
aplicados ao Senhor Jesus Cristo. Quando o Livro dos Salmos fala de Jeová, estaríamos
enganados ao supor que não há referência ao Senhor Jesus Cristo.
Do mesmo modo, o nome de Jesus significa Salvador e este termo, e especialmente Salvação,
aparece muitas vezes nos Salmos (Salmos 3:8; 9:14; 13:5, etc.).
O nome Cristo também aparece no Livro dos Salmos. Salmo 2:2 é citado na tradução grega
sendo traduzido em Atos 4:25-26: “Que disseste pela boca de Davi, teu servo: Por que bramaram
os gentios, e os povos pensaram coisas vãs? Levantaram-se os reis da terra, e os príncipes se
ajuntaram a uma, contra o Senhor e contra o seu Cristo [Ungido]”. Cristo é simplesmente a
forma portuguesa da forma grega Christos, que é equivalente a Messias em Hebraico, que
significa “Ungido”. Os nomes de Cristo aparecem nos Salmos.

Terceiro: os Salmos são muito citados no Novo Testamento. Em Hebreus 1 e 2, onde nos é
mostrado que Deus falou nos últimos dias pelo Seu Filho, temos citações dos Salmos 45, 110,
102, 104, 22, 8 e 22. Do mesmo modo, os apóstolos no Livro de Atos, pregando, fazem grande
uso do Livro dos Salmos. De fato, se formos contar tanto as citações diretas dos Salmos, quanto
a linguagem dos Salmos no Novo Testamento, encontraremos que há cerca de 300 lugares onde
os Salmos são citados ou sua linguagem é utilizada no Novo Testamento. Eu recomendaria o
livro Make His Praise Glorious [Torne Glorioso o Seu Louvor] por Roy Mohon, 25 p., para um
completo tratamento desse ponto, e de fato esta obra oferece uma completa exposição de um
número de assuntos abordados neste presente artigo.

“Deus nos deu um Livro de louvores no Velho Testamento que é idealmente


adequado para o povo de Deus no Novo”

Quarto: as profecias do Saltério concernentes aos sofrimentos de Cristo estão no tempo


passado. Algumas vezes, a objeção levantada é que tudo o que é dito sobre Cristo nos Salmos é
profético e se refere ao futuro. Isto é verdade quanto a serem proféticos porque foram escritos
antes dos eventos, mas não é verdade que foram todos escritos como se fosse algo futuro.
“Muitos touros me cercaram; fortes touros de Basã me rodearam.
Abriram contra mim suas bocas, como um leão que despedaça e que ruge. Como água me
derramei, e todos os meus ossos se desconjuntaram; o meu coração é como cera, derreteu-se no
meio das minhas entranhas. A minha força se secou como um caco, e a língua se me pega ao
paladar; e me puseste no pó da morte. Pois me rodearam cães; o ajuntamento de malfeitores me
cercou, traspassaram-me as mãos e os pés. Poderia contar todos os meus ossos; eles veem e me
contemplam. Repartem entre si as minhas vestes, e lançam sortes sobre a minha roupa” (Salmos
22:12-18).
Isto está falando do Senhor Jesus, sem sombra de dúvida. Está parcialmente no tempo passado e
no presente. A questão a ser compreendida é que o Senhor usou os sofrimentos de Davi, por
causa da verdade, como uma ocasião providencialmente ordenada para uma profecia para muito
além de si mesmo, acerca dos sofrimentos do Cristo que havia de vir. Embora profético, está
escrito não como algo relacionado ao futuro, mas algo acontecendo no presente ou como algo
que já aconteceu.
“Afrontas me quebrantaram o coração, e estou fraquíssimo; esperei por alguém que tivesse
compaixão, mas não houve nenhum; e por consoladores, mas não os achei. Deram-me fel por
mantimento, e na minha sede me deram a beber vinagre” (Salmos 69:20-21).
Embora os Salmos contenham profecias concernentes aos sofrimentos de Cristo, muito do que
foi escrito sobre Cristo não está escrito como algo futuro. Isto é muito importante porque indica
que, no plano de Deus, Ele estava dando no Velho Testamento um Livro de louvores para o uso
do seu povo após a vinda de Cristo e completamente adequado mesmo, por exemplo, na mesa do
Senhor, quando se lembram da morte de Cristo no passado. Quando vamos à mesa do Senhor e
cantamos esses Salmos, não consideramos de maneira alguma que há algo errado. Não estamos
nos lembrando de algo que aconteceu no passado, mas estamos cantando acerca daquilo como se
fosse algo que ainda estaria para acontecer no futuro. Deus nos deu um Livro de louvores no
Velho Testamento que é idealmente adequado para o povo de Deus no Novo.
Quinto: o Saltério não possui um suplemento divinamente inspirado no Novo Testamento.
Deus proveu a igreja do Velho Testamento com um perfeito e puro Livro de louvores. Se aquele
Livro fosse inadequado, não esperaríamos que o Senhor provesse um suplemento no Novo
Testamento equivalente ao Livro dos Salmos? Isto é muito significativo. O Novo Testamento,
para que supostamente tenha um livro de louvor mais adequado, deve ter um padrão inferior de
pureza em seu conteúdo de cântico de louvor quando comparado à igreja do Velho Testamento?
Claro que não! Se o Saltério infalível do Velho Testamento realmente fosse inadequado, Deus
certamente teria dado um hinário no Novo Testamento.

Sexto: não há um dom de composição de hinos prometido no Novo Testamento. Ainda que
pudéssemos considerar a possiblidade do Saltério inspirado ter a necessidade de suplemento pela
composição de homens não inspirados no Novo Testamento, esperaríamos algum dom sendo
prometido para este propósito, não esperaríamos? Mas pode-se dizer que é óbvio, pelo fato de
que bons homens escreveram bons hinos, que o Senhor fez tal provisão para suplementar o
Saltério do Velho Testamento. Mas isto não é tão óbvio. A presença de uma habilidade em fazer
algo, por si mesmo, nunca justifica a inclusão disto na adoração a Deus.
Se há alguém bom em arte, nós permitimos que arte entre para a adoração na igreja? Se alguém é
bom em fazer escultura, deve isso também ser incluído? Permitimos que a existência de uma
habilidade em fazer algo e a afirmação de que a intenção é glorificar a Deus em seu uso, seja um
fundamento adequado para se trazer esta atividade para a adoração a Deus? O catolicismo
romano não tem dificuldade com isso, é claro, já que todas as atividades podem e devem ser
trazidas sob a jurisdição da “igreja” (isto é, papado), quer seja arte, escultura ou música – tudo
deve estar sob o controle da igreja, juntamente com o governo das nações, educação, saúde, etc..
E estas habilidades que podem ser expressas em adoração, a igreja tem o direito de incorporá-la
em seus cultos.
Mas este não é o ensino protestante e nem é o ensino bíblico. Toda a vida é para ser vivida sob a
Palavra de Deus e para a honra de Cristo, mas não toda a vida é para ser governada pela igreja
como organização. A igreja organizada tem funções limitadas apontadas pelo seu cabeça (Cristo)
e levadas até os limites prescritos por Ele. O fato de que tem havido homens com habilidades
poéticas e ortodoxia teológica, que podem produzir versos poéticos, não significa que isto deva
ser trazido para a adoração de Deus, a não ser que possamos mostrar, a partir das Escrituras, que
o Cristo que ascendeu aos céus prometeu tal dom para esse propósito. Encontraremos isto se
examinarmos as Escrituras? Não há menção de compositores preparando porções para o povo de
Deus usar em sua adoração.
O argumento para o cântico exclusivo dos Salmos não se fundamenta na ideia de que cada parte
da adoração do Novo Testamento deve ser confinada a palavras inspiradas. Porém, o que
dizemos é que há uma provisão prometida para cada parte da adoração. Quando lemos acerca do
que deve ser lido na adoração, temos a infalível Escritura. Quando se fala em pregação da
Palavra, pregadores não são infalíveis, mas temos a promessa do dom de mestre da parte do
Cristo que ascendeu aos céus (1 Coríntios 12:29; Efésios 4:11). Quando falamos acerca da
oração, temos a promessa de que seremos ajudados pelo Espírito Santo (Romanos 8:26). Quando
falamos acerca do cântico de louvores, não há uma promessa de um dom ordinário de
composição de hinos, mas há um infalível e inspirado Livro de 150 composições providas e
designadas para o louvor de Deus.

Sétimo: muitos que lutaram pela verdade sob severa perseguição consideraram o Saltério
adequado. Nem todo herói da fé estava comprometido com o cântico exclusivo dos Salmos, mas
muitos eram e muitos cantaram os Salmos, mesmo diante do sofrimento e da morte, e os
consideraram completamente adequados. Os reformadores cantaram os Salmos, alguns na época
da reforma que enfrentaram serem queimados na estaca, cantaram os Salmos, mesmo com o
aumentar das chamas. Quando os covenanters [pactuantes] subiram no cadafalso esperando para
serem enforcados, cantaram os Salmos. Margaret Wilson cantou o Salmo 25 quando ela estava
para ser afogada nas águas de Solway pela causa de Cristo na Escócia em 1685. Nenhum destes
mártires se sentiu desanimado porque eles tinham apenas os Salmos para cantar. Toda a
Assembleia de Westminster, durante seus dias especiais de oração e jejum, cantou os Salmos.
Ninguém reclamou dizendo que eles eram inadequados para os crentes do Novo Testamento.
Será que alguma inadequação, de fato, não está em nós? O Livro dos Salmos é perfeito; veio da
parte de Deus. O problema deve estar em nós.

Oitavo: a provisão de Deus é sempre suficiente. Todo o argumento para a alegada


insuficiência do Saltério não é argumento de forma alguma. A questão é bem simples: o que
Deus apontou? Se a resposta é que Deus apontou o Livro dos Salmos, então este deve ser
suficiente. Qualquer inadequação deve estar em nossa apreciação do Saltério e nós precisamos
mudar e buscar graça com este propósito. Aqueles que têm usado hinos podem achar difícil ter
que abandoná-los porque se tornaram tão ligados a eles. A resposta não está em negar a verdade
do canto exclusivo dos Salmos, mas em buscar graça para apropriadamente apreciar os Salmos.
Quando isto for alcançado, não se sentirá falta dos hinos de maneira alguma. O que Deus proveu
é o melhor.

II. UM EXAME ACERCA DO CONTEÚDO DO LIVRO DOS


SALMOS
Vamos examinar brevemente o escopo do conteúdo do Saltério.
a) A Palavra de Deus
O que o Saltério diz acerca da Palavra de Deus? Aqui temos o que o Saltério diz acerca da
Palavra de Deus.
A pureza da Palavra de Deus:
“A lei do Senhor é perfeita, e refrigera a alma; o testemunho do Senhor é fiel, e dá sabedoria
aos símplices. Os preceitos do Senhor são retos e alegram o coração; o mandamento do Senhor
é puro, e ilumina os olhos. O temor do Senhor é limpo, e permanece eternamente; os juízos do
Senhor são verdadeiros e justos juntamente. Mais desejáveis são do que o ouro, sim, do que
muito ouro fino; e mais doces do que o mel e o licor dos favos. Também por eles é admoestado o
teu servo; e em os guardar há grande recompensa” (Salmos 19:7-11).
A Suficiência da Palavra de Deus:
“Por isso estimo todos os teus preceitos acerca de tudo, como retos, e odeio toda a falsa
vereda” (Salmos 119:128).

b) Sobre Deus
O Saltério nos fala que Deus é um Espírito diferente dos deuses dos gentios (Salmos 115:1-11).
Ele é onipresente (Salmos 139:1-18); Ele é infinito (Salmos 147:5), eterno (Salmos 90:2) e
imutável (Salmos 102:26-27). O Saltério nos fala da sua sabedoria e do seu poder (Salmos
147:5), sua santidade (Salmos 99:9), justiça (Salmos 11:6-7), bondade (Salmos 145:9 e 36:7) e
verdade (Salmos 31:5).

“Cristo é nosso Rei. Seu sepultamento, ressurreição, ascensão e exaltação para


reinar à mão direita do Pai são encontrados no Livro dos Salmos”

c) A Obra de Deus da Criação, Providência e Redenção


O Saltério fala sobre a obra da criação (Salmos 104 fala dos seis dias da Criação) e providência
(Salmos 33:9-11). O Saltério fala claramente sobre o pecado do homem (Salmos 14 e 53). A
doutrina da eleição está no Livro dos Salmos (Salmos 33:12; Salmos 65:4).
O Saltério fala bastante sobre Cristo, o redentor: sua deidade (Salmos 45:6; ver Hebreus 1:8-9) e
sua encarnação e ativa obediência (Salmos 40:7-8; ver Hebreus 10:5-9).
Cristo como nosso profeta (Salmos 40:9; ver Hebreus 2:12; a grande congregação não é
simplesmente a igreja dos dias de Davi, exceto por antecipação; na verdade, está falando sobre
toda a igreja de Deus, dentre os quais, Cristo, o Filho de Davi, é o primogênito entre muitos
irmãos).
Cristo é nosso sacerdote (Salmos 110:4), sofrendo pelo pecado (Salmos 69:20-21, com Mateus
27:34 e 48; Salmos 22:1, com Mateus 27:35; versos 7-8 com Mateus 27:39-43; verso 16 com
Mateus 27:35; verso 18 com Mateus 27:35). Embora nos refiramos a estes versos que são citados
no Novo Testamento, outros versos, no Salmo 22 por exemplo, dão alguns detalhes dos
sofrimentos internos de Cristo mais do que qualquer outro que possa se encontrado em qualquer
outro lugar nas Escrituras.
A consumação do sofrimento de Cristo é expresso no Salmo 31:5 (ver Lucas 23:46) e Salmo
22:31 ((...) “porquanto ele o fez”) que é o que Cristo parece ter em mente quando Ele clamou:
“Está consumado” (João 19:30).
Cristo é nosso rei. Seu sepultamento, ressurreição, ascensão e exaltação para reinar à mão direita
do Pai são encontrados no Livro dos Salmos (Salmos 16:8-11; 68:16-20; 110:1). Estes versos são
todos citados no Novo Testamento (Atos 2:24-32; Efésios 4:7-12; Atos 2:34-36) como referindo-
se a Cristo, e explicando o seu contínuo: “fazer e ensinar” (Atos 1:1-2) a partir da mão direita do
Pai, e derramando dons entre os homens para esse fim.
O reinado mediatorial de Cristo sobre todos, ao executar os decretos de Deus na Redenção e em
seu reinado sobre a igreja no reino da graça, é encontrado nos Salmos 110:1, 104:4 (ver Hebreus
1:7); 2:6-12 (ver Atos 4:25-28); 89:20-28; 22:25-31, etc.. O tema do Salmo 45 é o noivo
tomando a sua noiva, falando de Cristo e sua igreja. Cristo, o rei, é quem é também o marido e
cabeça da igreja, que amou-a e se entregou por ela.
Assim, temos Cristo como profeta, sacerdote e rei, que é o rei que tem poder sobre todas as
coisas, que deve ser reconhecido como rei sobre todos os homens e nações e que é o rei e cabeça
da igreja.
A redenção aplicada por meio do pacto da graça é abundantemente exposta no Livro dos
Salmos.
Salmo 95:7 apresenta o tema do pacto encontrado tanto no Velho quanto no Novo Testamento:
“Porque ele é o nosso Deus, e nós povo do seu pasto e ovelhas da sua mão. Se hoje ouvirdes a
sua voz” (ver Gênesis 17:7; 2 Coríntios 6:16; Apocalipse 21:7).
“Mas a misericórdia do Senhor é desde a eternidade e até a eternidade sobre aqueles que o
temem, e a sua justiça sobre os filhos dos filhos. Sobre aqueles que guardam a sua aliança, e
sobre os que se lembram dos seus mandamentos para os cumprir” (Salmos 103:17-18).
“Todas as veredas do Senhor são misericórdia e verdade para aqueles que guardam a sua
aliança e os seus testemunhos” (Salmos 25:10).
“O segredo do Senhor é com aqueles que o temem; e ele lhes mostrará a sua aliança” (Salmos
25:14).
O chamado eficaz é exposto: “O teu povo será mui voluntário no dia do teu poder; nos
ornamentos de santidade, desde a madre da alva, tu tens o orvalho da tua mocidade” (Salmos
110:3).
A convicção de pecado é descrita: “Quando eu guardei silêncio, envelheceram os meus ossos
pelo meu bramido em todo o dia. Porque de dia e de noite a tua mão pesava sobre mim; o meu
humor se tornou em sequidão de estio” (Salmos 32:3-4).
Confissão de pecado, arrependimento e fé em relação a Cristo: “Cria em mim, ó Deus, um
coração puro, e renova em mim um espírito reto” (Salmos 51:10).
“Roguei deveras o teu favor com todo meu coração; tem piedade de mim, segundo a tua
palavra. Considerei os meus caminhos, e voltei os meus pés para os teus testemunhos. Apressei-
me, e não me detive, a observar os teus mandamentos” (Salmos 119:58-60).
“Se tu, Senhor, observares as iniquidades, Senhor, quem subsistirá? Mas contigo está o perdão,
para que sejas temido” (Salmos 130:3-4).
Justificação é apresentada: “Confessei-te o meu pecado, e a minha maldade não encobri. Dizia
eu: Confessarei ao Senhor as minhas transgressões; e tu perdoaste a maldade do meu pecado”
(Salmos 32:5). Os versos 1 e 2 são citados pelo apóstolo Paulo em Romanos 4 e é dado o aspecto
objetivo, perdão e paz com Deus, enquanto o verso 5, o subjetivo, o desfrutar da paz de Deus na
alma. Veja também o Salmo 130:4,7- 8.
Igualmente, vemos a adoção: “Assim como um pai se compadece de seus filhos, assim o Senhor
se compadece daqueles que o temem” (Salmos 103:13).
A doutrina da santificação, por meio da verdade de Deus, é encontrada por todo o Salmo 119.
Nossa dependência do Espírito de Deus ao nos iluminar e nos despertar para a verdade de Deus é
também encontrada neste Salmo (por exemplo, versos 33-35, 169-176).
O lugar das aflições na vida cristã como um meio de santificação nos é apresentado: “Foi-me
bom ter sido afligido, para que aprendesse os teus estatutos” (Salmos 119:71).
De maneira similar, vemos a perseguição na experiência do povo de Deus: “Pois tu, ó Deus, nos
provaste; tu nos afinaste como se afina a prata. Tu nos puseste na rede; afligiste os nossos
lombos, fizeste com que os homens cavalgassem sobre as nossas cabeças; passamos pelo fogo e
pela água; mas nos trouxeste a um lugar espaçoso” (Salmos 66:10-12).
“Porque eis que teus inimigos fazem tumulto, e os que te odeiam levantaram a cabeça. Tomaram
astuto conselho contra o teu povo, e consultaram contra os teus escondidos. Disseram: Vinde, e
desarraiguemo-los para que não sejam nação, nem haja mais memória do nome de Israel”
(Salmos 83:2-4).
Do mesmo modo o Salmo 129 lida com a perseguição como parte da experiência do povo de
Deus: “Muitas vezes me angustiaram desde a minha mocidade (...)” (Salmos 129:1).

“Pelo Espírito de Deus, abençoando o cântico dessa parte de sua Palavra, que
Ele deu para o cântico, podemos esperar ser dirigidos a termos pensamentos
corretos acerca de Deus”

A igreja e seu zelo pela sua adoração é incluída nos Salmos 84, 87 e 122, e sua unidade no Salmo
133. O reavivamento da oração da igreja é encorajado nos Salmos 67, 126 e 85:5-7, e as
promessas de grande avanço do Evangelho estão nos Salmos 22:27-31; 86:9; 102:13-22; 67:5-7 e
68:31-32.
Salmo 72 leva o governo medial de Cristo e o avanço do Evangelho até mesmo ao topo das
montanhas (isto é, o lugar mais improvável para os olhos humanos).
Enfim, temos a vinda de Cristo em juízo nos Salmos 50, 96 e 98. Os novos céus e nova terra são
profetizados no Salmo 102:24-28. A glorificação do povo de Deus é belamente descrita nos
Salmos 73:24; 16:9-11 e 17:15.
Temos aqui apenas o conteúdo dos Salmos resumidamente analisado, e acreditamos ser isto
suficiente para demonstrar que todas as doutrinas mais importantes da Palavra de Deus
encontram alguma expressão no Livro dos Salmos. A ordem na qual temos concluído nosso
breve esboço aproxima-se do panorama doutrinário apresentado no Breve Catecismo. Se
considerarmos o Livro dos Salmos inadequado, uma das duas coisas é verdadeira:
1. Nós não o conhecemos ou não o compreendemos.
2. Ficamos tão ligados aos hinos não inspirados, por tanto usá-los, que ficamos incapazes de
analisar a questão sem sermos tendenciosos.

III. AS BÊNÇÃOS QUE SE PODE ESPERAR DO CÂNTICO


DOS SALMOS
Quais benefícios podemos esperar do cântico dos Salmos na adoração de Deus?

1. Imediatos benefícios a partir do presente canto deles


Primeiro: livres do erro. Podemos ter confiança no conteúdo porque é parte da Palavra de Deus.
Nossas consciências não precisam ficar preocupadas se o ato de cantá-los tem a aprovação divina
ou se o conteúdo é doutrinariamente correto. Não há Salmos ruins. Podemos buscar a Deus para
nos abençoar através da sua própria Palavra em nós.
Segundo: pensamentos corretos acerca de Deus. Pelo Espírito de Deus, abençoando o cântico
dessa parte de sua Palavra, que Ele deu para o cântico, podemos esperar ser dirigidos a termos
pensamentos corretos acerca de Deus. O quão importante é isso e quem melhor pode nos dizer
como Deus é além dele mesmo?

2. Benefícios a longo prazo


Primeiro: se cantamos os Salmos, é a Palavra de Deus que é fixada em nossas mentes. Que
grande bênção em tempos de dificuldades, prosperidade ou na hora da morte. Precisamos da
própria Palavra de Deus em tempos assim. Sabermos o que alguns bons homens pensaram não é
o suficiente.
Segundo: o cântico dos Salmos contribui para a segurança da igreja. Hereges podem trazer
heresias sem hinos, é claro, mas os hinos têm sido um meio frutífero de trazer falsas doutrinas
para a igreja. Hereges não têm sido lentos em compreender que uma boa melodia pode derrubar
o incauto. Agostinho escreve: “Os donatistas nos reprovam porque na igreja cantamos com
sobriedade os cânticos divinos (...) enquanto eles inflamam a intoxicação de suas mentes ao
cantar salmos de composição humana” (Confissões, ix, 4).
Os Salmos colocam um limite dado por Deus para que a tolice seja deixada de fora. O quão
precisamos disto hoje, quando a igreja está sendo inundada com entretenimento musical. Pessoas
que normalmente são sensíveis, sóbrias e até atenciosas quanto à doutrina, terminam cantando as
coisas mais banais e triviais imagináveis porque não há barreira para conter a inundação. Aqueles
que pensam em Deus, em sua grandeza e glória, podem apenas ficar perturbados diante da
estupidificação da adoração e do ataque contundente da música trivial de hoje. A resposta não é
apenas ficar barganhando sobre o que pensamos ser melhor, reverente ou suficientemente
substancial em seu conteúdo. A resposta é o hinário de Deus: o Saltério. O restante precisa ir
embora.
Terceiro: a unidade da igreja. Pessoas veem o cântico exclusivo dos Salmos como algo que
divide as pessoas. O reverso é o caso. O cântico dos Salmos é um fator unificador útil para
cumprir a injunção apostólica: “para que concordes, a uma boca, glorifiqueis ao Deus e Pai de
nosso Senhor Jesus Cristo” (Romanos 15:6).
Falando acerca da mais conservadora denominação que não canta os Salmos exclusivamente,
que gastou mais tempo e cuidado com a produção do seu hinário do que a maioria, G.I.
Williamson oferece esta pessoal observação:
“Eu estava presente na Assembleia de Denver da Ortodox Presbyterian Church [Igreja
Presbiteriana Ortodoxa] em 1956, quando a lista de cânticos foi apresentada à Assembleia para
a inclusão no hinário que foi proposto. Eu ainda me lembro do fascinante debate sobre o
conteúdo destes hinos não inspirados. Repetidamente, um delegado se levantava e objetava
quanto ao conteúdo – o ensino de tal e tal hino. Geralmente, as objeções eram formidáveis para
mim. Ainda que, repetidamente, a objeção fosse negada. Eu senti que a popularidade era o fator
predominante. Mas o que permanece comigo é o fato de que quando os homens determinam o
conteúdo do livro de louvor da igreja de Jesus Cristo, nunca haverá um livro de louvor contra o
qual as hesitações da consciência não permanecerão – a não ser que toda a preocupação com a
verdade esteja morta!” (Trinity Hymnal, um artigo por G.I. Williamson em “The Biblical
Doctrine of Worship” [A Doutrina Bíblica da Adoração] publicado pela Crown and Covenant
Publications, Pittsburg, 1974).

CONCLUSÃO
Quando a igreja foi mais unida, o cântico exclusivo dos Salmos era a norma. O cântico dos hinos
é uma causa de divisão e um fruto do individualismo semeado pela divisão. Quando a igreja foi
mais unida nas Ilhas Britânicas? Na época dos puritanos, a igreja não era tão perfeitamente unida
de forma alguma, mas muito mais do que é hoje. Eles não tiveram problema algum com o que
eles cantavam. Todos eles poderiam cantar os Salmos. A Assembleia de Westminster não
concordou em tudo, mas todos eles poderiam cantar os Salmos. Aqui, no Saltério, está um
hinário que todos podem cantar com uma consciência limpa, sabendo que é sem erro, que nos diz
apenas a verdade sobre Deus e que é completamente adequado para a igreja de hoje. O cântico
dos Salmos é uma ordenança unificadora apontada por Deus e com a promessa de sua bênção.
Vamos nos unir fazendo aquilo que o salmista nos diz para fazermos: “Cantai-lhe, cantai-lhe
salmos” (Salmos 105:2).

Rev. David Silversides foi ministro da congregação de Loughbrikland da Reformed Presbyterian


Church of Ireland [Igreja Presbiteriana Reformada da Irlanda].
VIII. A PRESENÇA PERMANENTE
DE CRISTO NOS SALMOS
Matthew Vogan

lguns afirmam que os Salmos da Escritura não são suficientes para o louvor de Deus na
A adoração pública. Eles dizem que o Senhor Jesus Cristo deve ser mencionado o mais
explicitamente possível em nosso louvor. Com esta fraca objeção, eles abrem as portas
para os hinos não inspirados. Uma mais profunda apreciação dos Salmos deve, porém, nos
convencer de que o Senhor Jesus Cristo dificilmente poderia estar mais nos Salmos do que Ele já
está. “Convinha que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na lei de Moisés, e nos
profetas e nos Salmos” (Lucas 24:44). Os Salmos são, de fato, cheios de Cristo, mas, como nos
esforçaremos para descobrir, isto vai além até mesmo de apontar para Cristo.
Em seu valioso livro, Christ’s Presence in the Gospel History [A Presença de Cristo na História
do Evangelho] (mais recentemente publicado como The Abiding Presence [A Presença
Permanente]), Hugh Martin demonstra que os Evangelhos não são meramente um registro
histórico, mas um meio de comunhão com o Cristo vivo. Ele observa que nenhuma biografia
comum, ou até mesmo autobiografia, conclui com a promessa: “e eis que eu estou convosco
todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mateus 28:20).
Os Evangelhos devem ser abordados com essa promessa de sua presença. “Tome o Evangelho
em suas mãos”, diz Martin, “e você tem os meios de fazer com que você perceba a presença de
Cristo. A biografia, então, não está morta, Aquele que vive está nela. A presença não é algo
misterioso e vago; pois Ele está presente como em um espelho biográfico, e de acordo com a
bem definida e refletida glória que lá está. A biografia agora é mais do que uma biografia, é a
vida de Jesus”. Através da obra do Espírito Santo, na inspiração da Escritura e na habitação e
iluminação do crente, há um certo conhecimento e verdadeira experiência de Cristo por meio da
infalível Palavra e viva presença.
Nos Salmos, temos precisamente a mesma coisa. E.S. McKitrick afirma que: “a Pessoa de Cristo
é completamente apresentada no Saltério, tanto quanto a sua obra. De fato, tem sido afirmado, e
não sem motivo, que a partir dos Salmos pode-se compilar uma biografia de Jesus”. McKitrick
vai adiante e demonstra que a completa extensão das coisas e eventos associados com a pessoa e
obra de Cristo deve ser encontrada dentro dos Salmos. Os Salmos não apenas revelam a vida de
Cristo; eles nos dão, em muitos exemplos, as próprias palavras e pensamentos do Salvador. E.S.
McKitrick escreve: “Nestas revelações de Jesus no Saltério, há esta vantagem acima de todas as
outras: Ele fala especialmente na primeira pessoa, e nos conta seus próprios sentimentos
enquanto estava trabalhando, sofrendo e morrendo por nossa redenção. E estas revelações estão,
principalmente, no tempo passado, como para indicar que elas foram pensadas mais para a época
do Evangelho do que para a época em que foram escritas”. (‘Christ in the Psalms’ [Cristo nos
Salmos], in The Psalms in Worship [em Os Salmos na Adoração], John McNaugher, ed,
Pittsburgh, 1907).
Portanto, estamos lendo e cantando acerca de coisas que foram cumpridas, e não meras
predições. É notável que os Salmos tenham uma ênfase proeminente e frequente sobre a atual
posição do Salvador, o seu reinado como mediador e seu assentar à mão direita de Deus, nos
céus. Estas características da obra de Cristo são, de fato, muito escassas nas coleções de hinos
não inspirados.
R.J. George também expressou, utilmente, a plenitude de Cristo nos Salmos: “Cristo é Aquele
que fala em muitos deles (...) Apenas Cristo é o sujeito de muitos deles (...) A verdade é que
nenhum livro da Bíblia revela Cristo com tal plenitude como o Livro dos Salmos, sem mencionar
o Evangelho de João e a Epístola aos Hebreus” (The Free Presbyterian Magazine [A Revista
Presbiteriana Livre - um periódico], vol. 30, p. 288). Henry Cooke escreve: “Verdadeiramente,
eu creio, há uma visão de Cristo – e não é a menos importante para o crente que está sendo
provado e está perturbado – que pode ser descoberta apenas no Livro dos Salmos; me refiro à
Sua vida interior (...) O Espírito que: ‘penetra as profundezas de Deus’ abriu, nos Salmos, os
pensamentos mais profundos, as tristezas e os conflitos de nosso Senhor. Os evangelistas, fiel e
diligentemente, descrevem o Homem sem pecado; apenas os Salmos abrem o coração do
‘Homem de dores’” (The True Psalmody [A Verdadeira Salmodia], 1861, p. 17). Quando
consideramos esta perspectiva, podemos facilmente ser constrangidos a dizer que os Evangelhos
são a biografia de Cristo, mas os Salmos sua autobiografia.
Podemos ir além, já que no canto dos Salmos estamos tomando, juntos, as mesmas palavras em
nossos lábios. A Escritura nos diz que Cristo está presente e diretamente participando quando a
igreja está cantando louvores: “Cantar-te-ei louvores no meio da congregação” (Hebreus 2:12,
citando o Salmo 22). Temos a viva presença de Cristo enquanto cantamos as suas próprias
palavras concernentes a Ele mesmo nos Salmos. Cristo habita em seu povo e entra numa
comunhão especial com eles por meio de sua Palavra. Devemos oferecer nosso louvor nele e por
meio dele (Hebreus 13:15). Calvino comenta sobre o verso citado anteriormente: “Assim, nosso
Senhor aparece como Aquele que lidera nossos cânticos e é o principal compositor de nossos
hinos”.
No The Abiding Presence [Presença Permanente], Martin destaca exemplos dos dias do tempo de
Cristo na terra que podem ser considerados à luz da prometida realidade da presença contínua de
Cristo com seu povo. Ele escreve acerca da “The Temptation, and its perpetual Triumph”
[Tentação e seu perpétuo Triunfo] e “The Synagogue and its perpetual Sermon” [A Sinagoga e
seu perpétuo Sermão]. Podemos adicionar outro exemplo: “A Última Ceia, e seu perpétuo
Louvor” (Marcos 14:26). Cristo cantou um Salmo em meio aos seus irmãos, como parte da Ceia
que estava sendo instituída no mundo para ser observada até que Ele venha. Ele prometeu estar
com seu povo sempre: “até a consumação dos séculos” (Mateus 28:20) e Ele estará
especialmente presente no cântico dos Salmos do seu povo.
Hugh Martin fez um discurso diante da Assembleia Geral da Free Church of Scotland [Igreja
Livre da Escócia] defendendo o uso exclusivo dos Salmos no louvor. Neste discurso, ele enfatiza
que Cristo: “está espiritualmente presente com seu povo na adoração deles, no santuário. Mas
Ele estava presente na sinagoga de Nazaré, quando lhe foi dado o Livro do profeta Isaías. Lhe
daríamos algum outro livro de cânticos além do Livro de Salmos de Davi? (...) Daríamos a Ele
outro além dos seus próprios Salmos para nos guiar no cântico – seus próprios Salmos, que são
compostos por Ele mesmo; e seus próprios Salmos, que sua alma cantou, com graça em seu
coração ao Senhor, nos dias de sua carne? Mantemos comunhão com Ele, e Ele conosco, quando,
nos louvores do santuário, cantamos seus Salmos”. Não é de se admirar que o cântico de
louvores é frequentemente mencionado como um dever que se assemelha aos exercícios dos
santos no céu em seu imediato desfrutar da comunhão com Cristo.
Quando Martin escreveu sobre a presença permanente de Cristo nos Evangelhos, isto pode ser
claramente discernido nos Salmos também. “A própria voz bendita de Cristo fala comigo em
oráculos vivos. Sua própria face bendita resplandece sobre mim a partir de uma imagem viva de
sua biografia. Por meio de um arranjo que não deixa espaço para a imaginação, e, portanto,
nenhum espaço para a má compreensão. Nada é dado para alimentar o sentimentalismo, e,
portanto, não há nenhum espaço para o sentimentalismo perverter; por um arranjo que não deixa
para mim nenhum critério qualquer que seja, mas me chama simplesmente a receber a revelação
celestial que me é dada: o próprio Senhor Jesus comigo – não em minha imaginação, não em
meu sentimento piedoso, mas comigo verdadeiramente”. Deve ser a própria verdade perfeita e
inspirada para que Ele: “deva vir, identificar-se a si mesmo com esta verdade, investir a si
mesmo com ela, torná-la vital com seu poder vivo e cantá-la com sua voz pessoal, e fazer dela a
permanente habitação de sua presença”. Deve haver: “uma absoluta infalibilidade, para que o
Senhor não seja em nada deturpado para mim (...) um espelho pelo qual nenhum sopro manchado
pela imperfeição humana foi permitido passar” (The Abiding Presence [A Presença Permanente],
Knox Press reprint, pp 25-6,57,60).
Precisamos da autorrevelação perfeita de Cristo em suas próprias palavras para realmente termos
comunhão com Ele. Não precisamos da imaginação e do sentimentalismo extravagantes de
escritores de hinos sem inspiração, quando temos comunhão com a pessoa de Cristo diretamente
através de sua própria Palavra nos Salmos. Podemos então cantar os Salmos: “na fé sem mácula,
na plena certeza da fé, desembaraçados do espírito de crítica que a palavra do homem provoca
continuamente e certamente exige” (Hugh Martin, em The Free Presbyterian Magazine [A
Revista Presbiteriana Livre], vol. 2, p. 27). Como Henry Cooke expressou: “As mais piedosas
produções de homens não inspirados são riachos rasos, enquanto os Salmos são um oceano
insondável e sem limites”. O canto espiritual dos Salmos, desta maneira, nos permite ir além de:
“concepções, noções, ideias sobre Ele, por mais verdadeiras que sejam”. “Você lida com Ele, e
Ele com você. O verdadeiro e vivo Cristo, presente com você - secreta e subjetivamente presente
em você pelo seu Espírito - lida com você. E você, no Espírito, lida com o Cristo vivo e
verdadeiro, presente contigo – ostensiva e objetivamente presente contigo - em sua própria Santa
Palavra” (The True Psalmody, 1861, pp 17,37).
Isto é ter: “A Palavra de Cristo habite em vós abundantemente, em toda sabedoria” (Colossenses
3:16). Martin diz: “Eu posso entender como a Palavra de Deus deveria habitar em nós
abundantemente, cantando a Palavra de Deus - permanecendo nela em solene, meditativa, grave
e doce cantar até que - para usar uma frase escocesa – ela penetre na alma e lá encontre a sua
morada, enquanto na fervorosa emoção da fé, o espírito do adorador habita deliberadamente no
cântico piedoso. Assim, ela pode vir a habitar abundantemente em nós” (The Free Presbyterian
Magazine [A Revista Presbiteriana Livre], vol. 2, p. 25). “De acordo com a nossa espiritualidade,
proporção do vigor e a atividade de nossa fé”, os Salmos: “são para nós as galerias do Rei,
repletas e iluminadas com as revelações vivas e atuais de nosso Senhor” (The Abiding Presence ,
p. 61).

Estão grandemente enganados aqueles que acreditam que os Salmos devem ser postos de lado
com base na visão de que o Senhor Jesus Cristo deve ser mencionado o mais explicitamente
possível dentro de nosso louvor. Quando os Salmos são cantados, Cristo não poderia estar mais
presente tanto no conteúdo quanto na realidade espiritual do louvor. Um punhado de adoradores
cantando Salmos sem acompanhamento instrumental num velho prédio pode parecer desprezível
para as suposições carnais deste mundo e de uma igreja mundana, mas há profundidades de
maiores realidades espirituais ao cantá-los do que eles são capazes de discernir. Há: “os
caminhos do Rei”, no santuário (Salmos 68:24). O próprio Salvador está presente, engajado e
próximo ao seu povo, dizendo: “faze-me ouvir a tua voz, porque a tua voz é doce” (Cantares de
Salomão 2:14).
A fé vai repetidas vezes aos Salmos e lá encontra novas verdades e meios de graça por meio de
novas visões de Cristo. O próprio Martin descreve essa vitalidade na religião dos Salmos de
Davi: “A religião de intensa personalidade e adoração, amando a comunhão com Deus, por meio
de um pessoal e fraternal mediador, é a religião de recursos inexauríveis; de experiências sempre
variadas; instintivo aos encantos daquilo que é novo, de incansáveis novidades e de variações
incessantes; ecoando alegremente, em sua contínua marcha e história, o harmonioso movimento
e contínua mudança de combinações de todas as honráveis afeições. Apenas porque assim é a sua
personalidade” (The Abiding Presence [A Presença Permanente], p. 177).
Como crentes que sobem ao deserto encostados em seu amado, os Salmos são perfeitamente
adequados para serem os cânticos de suas peregrinações (Cantares de Salomão 8:5). “E os
resgatados do Senhor voltarão; e virão a Sião com júbilo” (Isaías 35:10).

O capítulo VIII foi originalmente impresso na Free Presbyterian Magazine, em Agosto de 2013,
e foi reimpresso por gentil permissão.

Matthew Vogan é gerente de projetos do governo local e um presbítero regente na congregação


de Inverness da Free Presbyterian Church of Scotland [Igreja Presbiteriana Livre da Escócia].
IX. O QUE DEVE ACOMPANHAR
NOSSA ADORAÇÃO A DEUS?
Um Argumento a partir da Escritura para o Cântico de Louvor
sem Acompanhamento Musical
Kenneth Stewart

INTRODUÇÃO
O argumento para o uso de acompanhamento musical na adoração é relativamente direto.
Geralmente, argumenta-se que o uso de altares e incenso na adoração da Antiga Aliança é
suficiente para autorizar seu uso na adoração da Nova Aliança. O silêncio do Novo Testamento
não deveria apresentar-se como um problema de forma alguma. A suposição é de que estes
instrumentos eram usados na igreja apostólica também – é que apenas eles não são
mencionados, somente isso.

Porém, simples, como de fato é, o argumento não faz completa justiça a uma importante questão:
a precisa natureza da mudança que aconteceu com a passagem da Antiga Aliança – com seu
sacerdócio e adoração – para o advento da Nova Aliança.
Para deixar mais claro, vamos apenas ver o que acontece quando usamos incenso e altares para
substituir instrumentos musicais no parágrafo acima. Se você foi convencido pelo parágrafo
quando você o leu, vejamos como você se sente quando fazemos a mudança. Aqui está:
O argumento para o uso de altares e incenso na adoração é relativamente direto. Geralmente,
argumenta-se que o uso de instrumentos musicais na adoração da Antiga Aliança é suficiente
para justificar seu uso na adoração da Nova Aliança. O silêncio do Novo Testamento não
deveria apresentar-se como um problema de forma alguma. A suposição é de que eles eram
usados na igreja apostólica também – é que apenas eles não são mencionados, somente isso.
O argumento parece igualmente plausível – e seria, se fossemos usar também vestimentas e óleo
para unção! Isto demonstra que o caso não é tão simples quanto parece.
Por um lado, embora haja um uso considerável de acompanhamento de instrumentos na adoração
sob a Antiga Aliança, não há evidência de que as reuniões de adoração organizadas, regulares e
corporativas de Israel incluíram o uso de instrumentos musicais. Se as reuniões ordinárias de
adoração semanal do povo no Shabbat nas sinagogas os incluíam, a sua posterior ausência na
sinagoga, e de fato, na igreja primitiva, se torna inexplicável.
Por outro lado, o silêncio do Novo Testamento é ensurdecedor! Em face disso, tal silêncio se
constitui um completo e poderoso argumento para evitar completamente o seu uso na adoração
da Nova Aliança. Porém, pode ser facilmente objetado que isto equivale a um argumento a partir
do silêncio – o que é, admissivelmente, uma forma precária de argumento. Em outras palavras, o
objetor argumenta que o fato de que eles não são mencionados em conexão com o louvor do
Novo Testamento, em si mesmo, não significa que eles não eram usados. Se a adoração, em si
mesma, foi raramente mencionada no Novo Testamento, seria, de fato, perigoso argumentar
sobre a anulação dos instrumentos musicais a partir do silêncio. Porém, o Novo Testamento
raramente deixa de mencionar a questão da adoração.
Bem como as referências à adoração em todos os Evangelhos e no Livro de Atos, a Primeira
Epístola de Paulo aos Coríntios tem uma extensiva discussão sobre adoração nos capítulos de 11
a 14. Mais diretamente ao ponto, Primeira Timóteo é escrita, primariamente, para dar orientações
adicionais quanto a questões relacionadas ao culto. Muito deste material está conectado com a
correção dos abusos que entraram na adoração da igreja. Sabendo que com facilidade os
instrumentos musicais podem ser abusados em tal adoração, parece-nos notável que nenhuma
palavra é mencionada acerca de seu uso em todo esse material bíblico.

“Em todas as referências à adoração no Novo Testamento, fica claro que o


padrão de adoração ordinária e não cerimonial na sinagoga – com a qual os
apóstolos estavam tão familiarizados – se tornou o padrão de adoração na
igreja cristã”

Afinal, é importante manter em mente que a única razão para o uso de acompanhamento
instrumental não ter causado contendas, sob a Antiga Aliança, reside no fato de que seu uso
estava fortemente regulado pela autoridade profética: o número de instrumentos, seu tipo, o seu
uso preciso – tudo isso estava explicitamente estipulado por Davi em resposta à expressa ordem
de Deus, como veremos daqui a pouco.
Tudo isso por si mesmo torna o silêncio ainda mais significativo. Porém, há mais do que apenas
o silêncio. Em todas as referências à adoração no Novo Testamento, fica claro que o padrão de
adoração ordinária e não cerimonial na sinagoga – com a qual os apóstolos estavam tão
familiarizados – se tornou o padrão de adoração na igreja cristã. A evidência para isso é
surpreendente – não apenas no fato de que a assembleia de cristãos é, na verdade, mencionada
como “sinagoga” no Novo Testamento (Tiago 2:2).
Que isto é fato, não deveria ser algo surpreendente: a sinagoga, como o local regular de
adoração, foi estabelecida como um local de adoração semanal em todo o mundo de fala grega –
devido à influência e necessidades da ampla diáspora judaica – enquanto o templo era um local
central de adoração ocasional. É um fato claro que nenhum instrumento musical foi usado na
adoração da sinagoga – de fato, isto permaneceu até 1810, na Alemanha, e assim permanece o
mesmo nas mais ortodoxas sinagogas até hoje.
Sem dúvida, os instrumentos estavam presentes no corporativo e formal ritual de sacrifícios e
festivais – mas a sua presença e uso lá, como veremos, é explicitamente regulado por Deus e é
inextricavelmente ligado aos levitas e o seu uso de ofertas de sacrifício.

Adoração ordinária e extraordinária


Tudo isto serve para destacar uma importante distinção que se precisa ter em mente: aquela que
existe entre a ordinária e a extraordinária adoração de Deus sob a Antiga Aliança.
- A Sinagoga
O ordinário e regular local de adoração para o povo de Deus sob a Antiga Aliança não era o
tabernáculo, ou o templo, mas a sinagoga – ou o “local de reunião”. Estes locais de reunião
(sinagogas) eram locais de adoração e o povo se reunia para adorar em todos os Shabbats e, de
fato, por toda a semana, para oração e ensino adicional.
A crescente e moderna tendência em ver a sinagoga como um tipo de comunidade ao invés de
um local de adoração, é, de longe, muito revisionista e depende de poucas evidências reunidas
muito tempo depois dos tempos bíblicos, sendo algo irrelevante. Claramente, as reuniões nas
sinagogas, no Shabbat, eram reuniões de adoração. Havia, de fato, outras reuniões para o ensino
e disciplina, mas era essencialmente um local de adoração ou uma: “casa de oração”
(interrupções, como quando nosso Senhor pregou – e, de fato, quando Paulo pregou – não
representavam o costume ordinário: elas aconteceram devido à impressão de que uma heresia
grosseira estava sendo pregada por aqueles que estavam responsáveis por expor a lei).
O presbiterianismo sempre apelou para a adoração moral, simples e regular da sinagoga –
difundida pela providência de Deus por todo o mundo antes da vinda do Messias – como sendo
não apenas um forte contraste com a adoração complexa e ocasional do templo, mas o único e
mais efetivo meio de difundir o Evangelho quando este chegou, e o pronto molde no qual o novo
vinho do Evangelho seria derramado.
Esta instituição tinha oficiais e uma forma de adoração reconhecível aos presbiterianos e não
continha o uso de instrumentos musicais em sua adoração, e, significativamente, Paulo nunca
debate o seu uso em qualquer sinagoga que ele visitou!
- O Templo
O extraordinário e ocasional local de adoração sob a Antiga Aliança era o templo – um prédio
central, localizado em Jerusalém, no qual a adoração era de fato constantemente oferecida, mas
em que, crucialmente, o comparecimento era requerido apenas três vezes ao ano.
A razão para esta distinção reside, primariamente, no fato de que o templo era um permanente
tipo de Cristo e sua obra. Não é surpreendente portanto que o templo contivesse muitos dos tipos
e símbolos temporários. Continha o sacerdócio, incenso, altares, sacrifícios, vestes, o pão
sagrado, a arca, cortinas sagradas, óleo sagrado, incenso sagrado – e muito mais. A sinagoga,
porém, era um local simples e ordinário e continha um púlpito, bancos para as pessoas sentarem
e, num baú, uma cópia das Escrituras – e seu culto consistia de orações, louvores, leitura e
exposição.
Agora, é de tremenda significância que o templo continha o acompanhamento musical para o
sacrifício, mas a adoração semanal não tinha instrumentos musicais de forma alguma! Em outras
palavras, diante disso, parece ser o caso de que o acompanhamento musical, como o sacrifício
que este acompanhava, era temporário, típico e cerimonial. Tentaremos demonstrar isto no que
segue.

“Notaremos a significância de sua ausência tanto no Novo Testamento quanto


nos cultos de toda adoração da cristandade na maior parte nos primeiros 800
anos de sua existência”
Começaremos, então, examinando o papel preciso dos instrumentos musicais no tabernáculo e no
templo. Logo, tendo em mente a sua ausência na adoração semanal do povo de Deus na
sinagoga, notaremos a significância de sua ausência tanto no Novo Testamento quanto nos cultos
de toda adoração da cristandade na maior parte nos primeiros 800 anos de sua existência. Sim,
você leu corretamente: a sua ausência dos cultos em toda a adoração da cristandade na sua
maior parte nos primeiros 800 anos de sua existência!
Primeiro, então, consideraremos o seu uso no tabernáculo e no templo.

Quem autoriza o uso de instrumentos?


Embora associemos Moisés com a adoração no tabernáculo em diante, e associemos Davi com a
adoração do templo em diante – até a vinda de Cristo – é crucial notar que nenhum deles ordenou
qualquer aspecto da adoração, incluindo o uso de instrumentos musicais, sem a expressa ordem
de Deus .

Moisés
Podemos começar com Moisés, a pública adoração do povo de Deus e o tabernáculo. É
relativamente bem conhecido o fato de que Moisés seguiu o padrão revelado a ele por Deus,
quando ele ordenou a adoração no tabernáculo (Êxodo 25:40). A despeito de ser: “instruído em
toda a ciência dos egípcios” (Atos 7:22) – e, sem dúvida, familiarizado com a ampla ostentação
de instrumentos musicais usados no Egito, tanto no campo secular quanto no sagrado – Moisés
ordenou que o instrumento musical para ser usado na adoração pública do tabernáculo seria
apenas a trombeta. O seu uso é ordenado em Números 10 e vem claramente da parte de Deus.
Note que seu uso estava confinado ao sacerdócio e às festas ordenadas. Esta adoração prevaleceu
por muitas centenas de anos.

Davi
No tempo de Davi, um maior desenvolvimento aconteceu quando a adoração de Deus estava
centralizada em Jerusalém. Neste ponto, Davi aponta alguns dos levitas, sob a supervisão de
Asafe, como cantores profissionais e músicos ministrando diante da arca do Senhor a fim de
adorá-lo – o seu papel de carregar o tabernáculo e os seus utensílios chega ao fim, com o novo e
central lugar de adoração (1 Crônicas 23:25-26). O próprio Asafe deveria soar os címbalos;
Zacarias, Jeiel, Semiramote, Jeiel, Matitias, Eliabe, Benaia, Obede-Edom e Jeiel deveriam tocar
alaúdes e harpas e Benaia e Jaaziel eram os sacerdotes que tocavam as trombetas (1 Crônicas
16:4-6).
Significativamente, Davi fez esses apontamentos em obediência a uma ordem específica de Deus
e isto fica claro em suas palavras a Salomão, em 1 Crônicas 28:19, Davi diz que as mudanças
que ele introduziu foram porque: “fez-me entender o Senhor, por escrito da sua mão, a saber,
todas as obras desta planta”.

Moisés e Davi, normativos para a Antiga Aliança


Aproximadamente 200 anos depois, num breve período de reforma, Joiada restaura as ofertas de
sacrifício sob o controle dos sacerdotes levitas: “com alegria e com canto, conforme a instituição
de Davi” (2 Crônicas 23:18).
Cerca de 100 anos depois, quando Ezequias estava reformando a nação – notavelmente,
começando com o templo e sua adoração – ele tomou cuidado em realizar sua reforma de acordo
com a Palavra de Deus. Isto significa que ele usou apenas os instrumentos que Davi ordenou
para serem usados – que são referidos como: “instrumentos de música de Deus” (1 Crônicas
16:42). É importante citar a passagem com alguns detalhes: “E pôs os levitas na casa do Senhor
com címbalos, com saltérios, e com harpas, conforme ao mandado de Davi e de Gade, o vidente
do rei, e do profeta Natã; porque este mandado veio do Senhor, por mão de seus profetas.
Estavam, pois, os levitas em pé com os instrumentos de Davi, e os sacerdotes com as trombetas”
(2 Crônicas 29:25-26).
É importante notar qual é a fonte de autoridade: Deus ordena Gade e Natã (os profetas) que, por
sua vez, ordenam a Davi para que a ordem profética e divina venha a ser registrada como
normativa nas Escrituras. Em conformidade, esta forma de adoração dada por Deus é adotada por
Salomão no Templo (2 Crônicas 8:14) e, mais tarde, este trecho da Escritura se torna a
autoridade para Ezequias em suas reformas. Ele não inova na questão da adoração – ele obedece
até mesmo na questão dos instrumentos musicais.
Por volta de 80 anos depois, durante a reforma de Josias, o rei ordena aos levitas organizarem-se
de acordo com o mandamento de Davi como é encontrado nas Escrituras: “E os cantores, filhos
de Asafe, estavam no seu posto, segundo o mandado de Davi, e de Asafe, e de Hemã, e de
Jedutum, vidente do rei” (2 Crônicas 35:15).
Novamente, mais de meio milênio depois de Davi, após o retorno do exílio e com a reconstrução
do templo, lemos que: “Quando, pois, os edificadores lançaram os alicerces do templo do
Senhor, então apresentaram-se os sacerdotes, já vestidos e com trombetas, e os levitas, filhos de
Asafe, com címbalos, para louvarem ao Senhor conforme à instituição de Davi, rei de Israel”
(Esdras 3:10).
Finalmente, por volta de cinquenta anos depois, Neemias organiza a adoração do templo
assegurando que o louvor fosse: “com os instrumentos musicais de Davi, homem de Deus”
(Neemias 12:35-36).
Daniel nos informa (Daniel 3:5-7) acerca de uma vasta ordem de instrumentos sendo usados na
cultura e adoração da Babilônia, mas fica claro, a partir daquilo que vimos, que a exposição à
cultura e adoração da Babilônia não foram mais influentes em Esdras e Neemias do que a cultura
e adoração do Egito foram em Moisés.

De onde vieram os instrumentos?


Embora possa ser uma surpresa para alguns, há abundantes evidências de que os instrumentos
musicais usados na adoração de Deus sob a Antiga Aliança foram projetados e feitos
exclusivamente para aquele propósito. Num certo sentido, isto não deveria ser surpreendente.
Afinal, os altares eram diferentes daqueles dos egípcios, assim como eram todos os outros
utensílios, portanto não deveria ser uma real surpresa descobrir que os próprios instrumentos
estavam de acordo com a revelação especial de Deus a Davi. Considere o seguinte:
Em primeiro lugar, a trombeta para uso no tabernáculo era de um formato divinamente
especificado (Números 10:1). Este formato reto e estreito era contrário ao formato curvo comum
da maioria, senão de todas as outras trombetas.
Segundo, os: “instrumentos musicais de Davi” (Neemias 12:35-36) parecem ser uma referência
aos instrumentos que Davi designou e fez ao invés daqueles que ele simplesmente autorizou e
usou.
Afinal, Amós se refere a Davi como tendo “inventado” seus instrumentos (Amós 6:5). O
hebraico usado por “inventar” é uma referência a algo novo e é usado por aqueles que
inventaram novas armas de guerra nos dias do Rei Uzias (2 Crônicas 26:15).
Além do mais, Davi especificamente se refere aos instrumentos sendo usados na adoração: “com
os instrumentos, que eu fiz para o louvar” (1 Crônicas 23:4-5). Novamente, o hebraico traduzido
por “fiz” é usado para formar um objeto – tanto criativamente quanto de acordo com
determinado plano.
Portanto, os “instrumentos de Davi” são aqueles que foram concebidos, construídos e designados
por Davi de acordo com o mandamento de Deus.
Portanto, é digno de nota, novamente, o que vimos em conexão com a reforma de Ezequias.
Notamos como ele começou com a reforma do templo e a sua adoração. Na questão do louvor,
ele regula os materiais de louvor e o acompanhamento musical. Quanto aos materiais, Ezequias
se deparou com os Salmos de Davi e Asafe, ainda que o mais recente deles fosse de quase 300
anos. Quanto ao acompanhamento musical, novamente, Ezequias não inova – ele simplesmente
obedece. Consequentemente, lemos: “ao tempo em que começou o holocausto, começou também
o canto do Senhor, com as trombetas e com os instrumentos de Davi, rei de Israel” (2 Crônicas
29:27).
Quem deveria tocar?
Deve ter ficado claro, a partir de nosso estudo, que os instrumentos deveriam ser tocados pelos
levitas. Eles foram separados para tocar. Isto é claro a partir de 1 Crônicas 16:4; 23:1-5; 2
Crônicas 29:25-26; 35:3-10; Esdras 3:10 e Neemias 12:27.
Também é evidente as circunstâncias que cercaram o retorno da arca a Jerusalém. Quando Davi
primeiro tentou trazer a arca de volta, o julgamento de Deus irrompeu contra ele, contra Uzá –
que foi ferido de morte por tocar a arca – e, de fato, contra Israel. O julgamento veio por causa
do mandamento de Deus que não foi estritamente seguido com relação à arca (1 Crônicas 15:13).
Note que nesta ocasião: “Davi e todo o Israel, alegraram-se perante Deus com todas as suas
forças; com cânticos, e com harpas, e com saltérios, e com tamborins, e com címbalos, e com
trombetas” (1 Crônicas 13:8).
Porém, após a humilhação e o castigo, Davi, com sucesso, traz a arca de volta a Jerusalém. Note
que nesta ocasião, os instrumentos são tocados apenas pelos levitas (1 Crônicas 15:14-24).
Claramente, o descuido e desprezo pelo uso de instrumentos musicais eram parte da razão do
castigo da parte de Deus sobre Davi e a igreja!
Por que, então, os instrumentos musicais eram tocados apenas pelos levitas? A resposta reside na
razão pelo seu uso – especificamente, nas ocasiões que eles deveriam ser tocados.

“O estudo cuidadoso das Escrituras revela que, em atos de adoração,


instrumentos musicais foram tocados pelos levitas como um acompanhamento
ao ritual de sacrifício no templo”

Quando eles deveriam ser tocados?


O estudo cuidadoso das Escrituras revela que, em atos de adoração, instrumentos musicais foram
tocados pelos levitas como um acompanhamento ao ritual de sacrifício no templo. Em 2
Crônicas 29:27-28, lemos:
“ao tempo em que começou o holocausto, começou também o canto do Senhor, com as
trombetas e com os instrumentos de Davi, rei de Israel. E toda a congregação se prostrou,
quando entoavam o canto, e as trombetas eram tocadas; tudo isto até o holocausto se acabar”.

Qual era a sua função?


Se considerarmos cuidadosamente tudo o que foi dito acima – o apontamento de instrumentos,
quem os fez, quem os tocava e quando eles deveriam ser tocados – é difícil evitar a conclusão de
que todo o seu papel na adoração era simbólico e cerimonial.
Isto não deveria ser uma surpresa. Com respeito a isso, a sua presença não era diferente de outros
símbolos que acompanhavam o ritual do tabernáculo/templo e seu uso pouco diferente do
incenso que acompanhava as orações. Se o incenso acompanhando a oração falava acerca da
doçura das orações diante de Deus, então, seria completamente claro que os instrumentos
musicais, juntamente com os sacrifícios, falavam de algo também: provavelmente, a alegria
espiritual no coração do crente.
Além das poucas referências a instrumentos musicais sendo usados em celebrações nacionais,
como também em ocasiões sociais (como, por exemplo, Juízes 31:24 e 1 Samuel 18:6), a figura
trazida diante de nós é a de que um acompanhamento musical, como o sacrifício que ele
acompanha, é estreitamente regulado por Deus.

O silêncio do Novo Testamento


Quanto ao silêncio no Novo Testamento com relação à música, o escritor do artigo mencionado
acima oferece a seguinte razão missiológica:
“(...) Quero destacar a importância missiológica deste silêncio. O Evangelho deveria entrar em
todas as culturas do mundo, em cada cultura musical do mundo, e ser traduzido para cada uma.
Não havia nenhum mandamento para entrar em culturas musicais e proibi-los de usar os seus
instrumentos tradicionais. Não havia nenhum mandamento para entrar em culturas gentílicas e
insistir para que eles usassem instrumentos judaicos. Não havia simplesmente nada de novo dito
sobre o assunto. O Velho Testamento havia dito o suficiente para tornar a permissão clara. O
objetivo agora era levar o Evangelho a todos, para que mais e mais possam louvar ao Senhor e
mover o mundo em direção ao cumprimento da visão vista no Salmo 150".
Duas observações que precisam ser feitas aqui.
Primeiro, embora o escritor fale de permissão para louvar com os instrumentos, é claramente
mais do que isso. Se os mandamentos do Velho Testamento são a nossa autorização, ele contém
mandamentos opostos à mera permissão. Não existe, nos Salmos, um mandamento para usá-los?
Este comando ainda é válido? Se assim for, porque estamos em liberdade para desobedecê-lo?
Claramente, uma correta aplicação do mandamento do Velho Testamento iria tornar a sua
utilização obrigatória e não facultativa.
Em segundo lugar, embora a "teoria missiológica" soe bastante interessante, ela também soa
muito bem como uma racionalização após o fato e uma alegação especial na importante ausência
de provas. Em meio a uma infinidade de referências ao culto no Novo Testamento, uma
explicação mais satisfatória do que esta, para o silêncio sobre o uso de instrumentos musicais, é
certamente necessária.
Podemos fornecer uma? Sim.
Já notamos a ausência de instrumentos musicais no culto ordinário, semanal e público, do povo
de Deus na sinagoga até os dias de Cristo e dos apóstolos.
Além disso, é o caso que, enquanto os principais elementos do culto na sinagoga comum
aparecem na prática de igrejas do Novo Testamento, nenhuma das partes cerimoniais de
adoração no templo aparece lá. Como já foi dito, é o modo de culto na sinagoga que foi adotado
pela igreja do Novo Testamento. E é fácil perceber o motivo. Tudo o que era necessário para
transformar a sinagoga do local comum de culto semanal judaico no antigo Shabbat para o lugar
comum de culto semanal cristão no Dia do Senhor (ou Shabbat cristão) era simplesmente o
reconhecimento de que o messias que havia sido pregado havia chegado! Isso exigiria
simplesmente a adição dos livros do Novo Testamento ao cânon, como foram escritos, e admitir
no culto os novos sacramentos da aliança. O resto permaneceria o mesmo: os Salmos - sem
acompanhamento instrumental - orações, leituras e a proclamação. Encontramos abundantes
referências a todos estes nas igrejas do Novo Testamento – mas nenhuma de instrumentos,
altares, velas, vestimentas ou incenso.
No entanto, não é o caso de que precisamos argumentar a partir do silêncio apenas. Algumas das
referências ao cantar no Novo Testamento indicam que este canto era, na verdade, sem
acompanhamento.
Em Efésios 5:19, somos ordenados a: “cantar e salmodiar ao Senhor em nosso coração”. Mais
literalmente, estamos sendo ordenados a: “tocar as cordas do nosso coração”. Não é difícil ver
um contraste intencional aqui entre o que é para ser tocado no culto simples e mais espiritual da
Nova Aliança - o coração – e o que é para ser tocado no culto mais terreno e cerimonial da
Antiga Aliança - o instrumento de cordas. Da mesma forma, em uma epístola que
constantemente contrasta o antigo com o novo, o nosso “sacrifício de louvor” consiste no “fruto
dos lábios” (Hebreus 13:15).
O que é ainda mais notável é o testemunho da igreja primitiva, desde os dias dos apóstolos em
diante.

“Da mesma forma, em uma epístola que constantemente contrasta o antigo


com o novo, o nosso ‘sacrifício de louvor’ consiste no ‘fruto dos lábios’
(Hebreus 13:15)”

O testemunho da igreja primitiva


Embora este trabalho esteja preocupado principalmente com o ensino bíblico, há uma razão
particularmente forte porque uma referência à prática da igreja primitiva, e especialmente para a
era imediatamente seguinte àquela dos apóstolos, é importante neste caso.
Quanto aos fatos, é inquestionável que os primeiros pais da igreja se opunham ao uso de
instrumentos musicais no culto cristão. O que é mais notável sobre essa oposição, no entanto, é
quão uniforme e veemente ela é. Os pais são, sobre esta questão, absolutamente unânimes!
Às vezes, na verdade, a sua oposição estava no fraco fundamento de que esses instrumentos eram
tão profundamente associados com práticas pagãs e imorais. No entanto, eles também
acreditavam claramente que a sua utilização pertencia à igreja em sua infância - quando ela
estava sendo treinada por tipos e cerimônias sob a Antiga Aliança - não à obtenção da sua idade
adulta, sob a Nova Aliança.
A razão pela qual um testemunho tão universal é importante reside nisto: se era realmente o caso
de que a adoração com acompanhamento musical era a prática apostólica em todas as igrejas do
Novo Testamento na Europa, na Ásia e no Oriente Médio, simplesmente se torna impossível
acreditar que nenhum pai da igreja, na época seguinte aos apóstolos, estivesse pronto para
defender seu uso!
Se a evidência dos pais não fosse uniforme - como é o caso em algumas outras questões - isto
deixaria de ser uma dificuldade, mas esta uniformidade de testemunho entre todos os pais da
igreja (alguns dos quais virtualmente coincidem com os apóstolos), e até o século VIII, é
simplesmente incompatível com a teoria de que os apóstolos ordenaram e estabeleceram igrejas
que usaram o acompanhamento de instrumentos musicais no seu cântico de louvor.
Para fins de conclusão, pode ser útil completar a pesquisa histórica. A ausência de
acompanhamento musical prevaleceu universalmente até o século VIII, quando o primeiro órgão
foi introduzido no culto da igreja ocidental. Mesmo a partir de então, no Ocidente, a sua
utilização era rara e mais tarde no século XIII, este continuou a ser o caso. A partir do século
XIV, a sua utilização tornou-se cada vez mais comum. A igreja oriental absteve-se de usá-lo e
continua a fazê-lo até hoje.
Voltando para o ocidente, as igrejas da Reforma – com a distinção aqui da igreja luterana -
aboliram a sua utilização. Ambos Zwingli (um músico) e Calvino foram fortemente contra. A
exceção frequentemente citada - a igreja holandesa - dificilmente constitui uma exceção válida
na medida em que os pastores se opunham à sua utilização, no fundamento de que era
antibíblica. A decisão de permitir peças instrumentais antes e depois do culto era apenas uma
concessão ao poder das autoridades civis. Mesmo assim, o órgão não foi originalmente usado
para acompanhar o canto dos Salmos.
Surpreendentemente talvez, a Igreja Anglicana, na sua literatura inicial, deixou claro seu desejo
de ficar sem instrumentos musicais no culto - ver, por exemplo, a “Homilia sobre o local e a hora
da oração” no “Segundo Livro de Homilias” (de 1563).
Na Escócia, seguindo a Reforma, a proibição foi total, e esta situação manteve-se inalterada até o
século XIX, quando quatro sucessivas décadas testemunharam a introdução de instrumentos
musicais no culto público escocês: os congregacionalistas foram os primeiros, na década de
1850, seguidos pela Igreja da Escócia em 1860, os Presbiterianos Unidos na década de 1870 e a
Free Church of Scotland [Igreja Livre da Escócia] na década de 1880 – o uso de hinos já havia
sido permitido pela Free Church [Igreja Livre] em 1872.
A maioria das igrejas reformadas têm admitido hinos e músicas em sua adoração,
aproximadamente a partir da mesma época que aquelas da Escócia, e os usam com liberdade
cada vez maior na adoração contemporânea - cada vez mais, desde o nascimento e rápido
crescimento dos movimentos pentecostais e carismáticos.

A igreja tem liberdade para introduzir instrumentos musicais?


Desde que o culto no templo expirou juntamente com o seu sacerdócio, a única maneira em que
sua introdução seria justificada seria por uma ordem explícita de Cristo ou dos apóstolos, que
autorizaria o seu uso. Em outras palavras, depois de ter expirado com o templo e o sacerdócio
levítico, a inspiração do Espírito de Deus é tão necessária para introdução de instrumentos
musicais em nosso culto pactual a Deus como é para a introdução de novos cânticos.
Obviamente, a maioria dos defensores da sua utilização diria que a natureza dos instrumentos e a
sua utilização, sob a Nova Aliança, devem ser deixadas para a mesma orientação contínua do
Espírito na igreja da Nova Aliança, como supostamente acontece com a provisão de cânticos a
serem cantados. No entanto, isso levanta um problema interessante: no nível humano, vamos
aceitar a orientação de quem para ambos? Se o uso dos instrumentos e, como vimos no capítulo
I, o conteúdo dos cânticos, é uma questão de revelação profética, então, como cristãos
reformados, devemos nos contentar em deixar que a Bíblia tenha a palavra final. Sem tal
orientação profética clara do Espírito Santo, ficamos com o que temos vivido nos últimos 150
anos, contando com homens supostamente “guiados” pelo Espírito: o crescente caos litúrgico
agora prevalecente na cristandade ocidental.
A única maneira de deter esse declínio seria através da imposição de regras e regulamentos por
autoridade humana. Estas regras seriam, em si mesmas, extremamente ofensivas para qualquer
número de pessoas que desejassem outra coisa. Curiosamente, o conceito reforçado de
autoridade previne as comunhões ortodoxas mais antigas do mesmo problema - e elas
permanecem sem instrumentos e fortemente dominadas pela salmodia.
Nas igrejas que aderem a outras formas de governo, o que você tem, necessariamente, através da
introdução de instrumentos musicais para o culto de Deus, é a abertura da caixa de Pandora, da
qual tudo e qualquer coisa pode vir – e absolutamente nada pode ser feito sobre isso.
Quem, afinal, deve decidir como o aspecto musical do culto a Deus deve ser conduzido? Os
defensores de instrumentos musicais devem reconhecer que Davi tinha instruções divinas
específicas para a identificação, a introdução e utilização desses instrumentos. Isto conduziu,
invariavelmente, para a criação de “comissões de culto”, e as questões com as quais
invariavelmente precisam lidar são: Quantos instrumentos devem ser usados? É para ser uma
banda ou uma orquestra? São os instrumentos apenas para acompanhar ou eles devem ter um
ministério de música próprio? Como Erasmus disse no século XVI: “Nós trouxemos uma música
pesada e teatral em nossas igrejas (...) a igreja estremece com o barulho das trombetas, tubos e
dulcímeres, e as vozes humanas se esforçam para suportá-los e participar com eles. Os homens
correm pra a igreja como se fossem para um teatro, para terem os seus ouvidos excitados”.
Estas questões são de crescente importância, numa época quando a simplicidade do cântico
congregacional de hinos usando o piano ou órgão, deu lugar a estilos de ministérios musicais
completamente diferentes. Alguns, enquanto argumentam em favor do uso de instrumentos,
tentam manter algum tipo de controle também, argumentando a favor da simplicidade ou
economia sob a Nova Aliança. Mas por que deve ser assim? Se nossa autoridade para o
acompanhamento musical vem dos Salmos, como o Salmo 150, tal apelo pela simplicidade pode
apenas soar como algo vazio – ou, de fato, blasfemo. Afinal, se somos ordenados a usar muitos
instrumentos, por que agora devemos seguir a “simplicidade”? Se um instrumento de cordas é
ordenado, por que teríamos liberdade em não usar tal instrumento?
A maioria dos defensores do acompanhamento musical reconhece isso e dispensa o argumento
da simplicidade completamente. Porém, a nova “liberdade” tem a sua própria armadilha.
Inegavelmente, o crescente uso da música e sua crescente variação de formas têm levado à
alienação e divisão. Muitas igrejas agora estão sendo crescentemente divididas por esses estilos
musicais – às vezes, de acordo com a idade e gosto. Num certo sentido, isto não é surpreendente:
quando a simplicidade e a universalidade da regra e da prática apostólica são postas de lado,
complexidade e divisão inevitavelmente se seguirão. Na adoração, assim como na doutrina,
quando se adiciona (aos mandamentos de Deus) você divide (o povo de Deus)!
Note que este não é um argumento baseado na dificuldade prática de decidir o que cantar e como
deve ser acompanhado. Estas questões práticas são, é claro, reais e importantes – mas é
importante notar que a razão porque o louvor sob a Antiga Aliança não foi sobrecarregado com
os mesmos problemas práticos como os que são experimentados hoje foi porque, pelo menos em
conexão com a adoração pública, o uso da música foi firmemente regulado pela autoridade
profética: o número de instrumentos, seu tipo, seu uso preciso – quando e como – tudo isto foi
explicitamente estipulado por Davi em resposta ao expresso mandamento de Deus.
Finalmente, vale a pena notar duas outras coisas.
A proibição do uso de instrumentos musicais no culto público não invalida o seu uso geral –
música e instrumentos musicais são claramente dons de Deus. Na verdade, tal proibição de
instrumentos nem invalida a sua utilização no sentido mais geral de dar louvor a Deus, ao invés
de uma oferta mais específica de adoração.

“Em uma nota sobre a prática, não é necessário sustentar a posição de que o
uso da música instrumental na adoração pública invalida necessariamente
todo o culto a Deus”

Mais uma vez, e em uma nota sobre a prática, não é necessário sustentar a posição de que o uso
da música instrumental na adoração pública invalida necessariamente todo o culto a Deus.
Quando tudo estiver dito e feito, não cabe a nós dizermos exatamente o que Deus aceita ou
rejeita, mas apenas o que ele exige e espera. Tais questões surgem para todos: por exemplo,
alguém que não é presbiteriano pensa que o ministério de um presbítero regente é completamente
inválido porque ele considera seu “ofício” sem fundamento bíblico? Será que um presbiteriano
acredita que um bispo tem um ministério inválido apenas porque seu ofício é sem autorização
bíblica - bispo [J.C.] Ryle, por exemplo? Será que um batista aceita o batismo por aspersão de
um presbiteriano adulto? Em outras palavras, é pouco razoável sugerir que somente aqueles que
creem no cântico exclusivo dos Salmos precisam enfrentar problemas deste tipo. Desta forma é
possível, em algumas ocasiões, conceber que Deus aceita o culto oferecido, mesmo que ainda
desaprovando o uso dos instrumentos musicais, ao mesmo tempo que em outras ocasiões, rejeita-
o.
No entanto, como indicado acima, se Deus aceita ou rejeita atos particulares de culto - ou até
mesmo o adorador - não cabe à igreja definir. Também não é uma questão com a qual se deva
brincar ou arriscar. Quem teria pensado que a ira de Deus viria sobre Uzá para castigá-lo,
simplesmente por tentar segurar a arca de Deus? Sem dúvida, tem muito a ver com o grau de
conhecimento envolvido por parte do adorador e, de fato, sobre se o adorador está se desviando
para longe da verdade ou se movendo em direção a ela. Deus não trata de maneira graciosa com
um povo que se aparta de uma posição bíblica como Ele trata um povo que está tateando na
busca de uma. Embora seja, sem dúvida, o caso de que muitas igrejas têm sido abençoadas ao
usar hinos e instrumentos – não é tão evidente que qualquer igreja tenha sido abençoada por
tomar a decisão de abandonar o cântico de Salmos sem acompanhamento. Tudo isso é um
lembrete solene de que ainda que tudo importe para Deus, só Ele discerne o coração. Para nós, na
Escócia, nos faria muito bem lembrar de que todas as nossas ações são as ações de igrejas
geradas a partir da segunda reforma e em uma terra que entrou num pacto com Deus.
Portanto, é nosso dever seguir a verdade onde ela nos levar – não seguir cegamente os outros ou
especular sobre o que Deus fará. O julgamento cabe somente a Deus – não a nós. É dever
daqueles que acreditam que essa forma de adoração é correta, e o dever da igreja que a professa,
articular essa verdade, segui-la, defendê-la e promovê-la.

CONCLUSÃO

É nossa conclusão, então, que o Livro dos Salmos foi compilado para o uso da igreja, para o
cântico de louvor a Deus, e que a igreja não tem a liberdade de acrescentar nada a este Livro,
para completá-lo ou substituí-lo.
É também nossa conclusão que os fatos que cercam o silêncio do Novo Testamento sobre a
questão dos instrumentos musicais, bem compreendidos, constituem um argumento convincente
para a interpretação do silêncio como prova de que nenhuma música instrumental foi usada no
culto da igreja do Novo Testamento.
É também nosso desejo que o Senhor nos fortaleça para restaurar a prática do cântico dos Salmos
sem acompanhamento musical como parte da verdadeira reforma e verdadeiro avivamento
espiritual ao qual ansiamos, e pelo qual necessitamos, mais intensamente, orar.

Rev. Kenneth Stewart é o ministro da congregação de Glasgow da Reformed Presbyterian


Church of Scotland [Igreja Presbiteriana Reformada da Escócia].
APÊNDICE
Minority Report[1]

Do Comitê Sobre Cânticos na Adoração Pública de Deus Entregue


à Décima Quarta Assembleia da Orthodox Presbyterian Church
[Igreja Presberiteriana Ortodoxa]
John Murray & William Young

INTRODUÇÃO

Comitê acima mencionado apresentou, na Décima Terceira Assembleia Geral, um relatório


O levando em conta a questão do princípio regulador do culto. Este princípio é para efeito de
que uma autorização ou sanção divina é exigida para qualquer elemento entrar na adoração
a Deus. Nas palavras da Confissão de Fé desta igreja: “O modo aceitável de adorar o verdadeiro
Deus é instituído por Ele mesmo e tão limitado pela sua vontade revelada, que não deve ser
adorado segundo as imaginações e invenções dos homens ou sugestões de Satanás, nem sob
qualquer representação visível ou de qualquer outro modo não prescrito nas Santas Escrituras”
(Capítulo XXI, Parágrafo I).
Em termos da comissão dada pela Décima Primeira Assembleia Geral e de acordo com o
princípio regulador exposto no relatório do Comitê, apresentado à Décima Terceira Assembleia
Geral, a questão com a qual este relatório está relacionado é: o que as Escrituras autorizam ou
prescrevem com relação a cânticos que podem ser cantados na adoração pública de Deus?
Ao lidar com esta questão deve ser levado em conta que o cântico de louvor de Deus é um ato
distinto de culto. Deve ser distinguido, por exemplo, da leitura da Escritura e da oferta da oração
a Deus. É naturalmente verdade que os cânticos de louvor, muitas vezes, incluem o que é da
natureza da oração a Deus, como também é verdade que, na oferta de oração a Deus, há muito
que é da natureza de louvor e ação de graças. Mas não é apropriado apelar para a autorização
divina ou mandamento que possuímos quanto ao conteúdo da oração, a fim de determinar a
questão de saber o conteúdo dos cânticos. A oração é um elemento de culto, o cântico é outro.
Semelhança, ou até mesmo identidade do conteúdo, não oblitera, por pouco que seja, a distinção
entre esses dois tipos específicos de exercícios na adoração de Deus. Devido a essa distinção,
não podemos dizer que a oferta de oração e os cânticos de louvor a Deus são a mesma coisa, nem
argumentar que, a partir da autorização divina que possuímos com respeito a um, temos
autorização com respeito ao outro. Um ou dois exemplos podem ser dados acerca da necessidade
e da importância de manter as distinções das várias partes do culto e de determinar, a partir da
Escritura, quais são as prescrições, respeitando cada elemento.
Ambos os relatórios apresentados por este comitê estão de acordo com que alguns cânticos da
Escritura podem ser cantados na adoração pública de Deus. Mas esses cânticos da Escritura
também podem ser lidos como Escritura e eles podem ser usados na pregação. Em tais casos, os
materiais vigentes são os mesmos. Mas a leitura da Escritura não é o mesmo exercício de culto
como o cantar, e nem a pregação é o mesmo que cantar ou ler as Escrituras. O mesmo tipo de
distinção aplica-se aos exercícios do orar e cantar, mesmo quando o conteúdo é idêntico.
A Ceia do Senhor é um ato de ação de graças, bem como de comemoração e comunhão. Mas,
embora a participação do pão e do vinho inclua a ação de graças, assim como a oração e o
cântico, no entanto, a celebração da Ceia do Senhor é um ato de adoração distinto de ambos,
oração e cântico, e as prescrições divinas que dizem respeito à celebração da Ceia do Senhor não
podem ser determinadas pelas prescrições divinas sobre a oração ou o cântico, mas devem, antes,
ser derivadas da revelação que Deus deu respeitando a observância desse elemento distinto da
adoração a Deus.
Por conseguinte este “Minority Report” alega que o argumento utilizado no relatório do comitê,
a saber, que uma vez que não somos limitados em nossas orações às palavras da Escritura ou às
“orações” fornecidas nas Escrituras, portanto, a mesma liberdade é concedida ao cântico, é
inválido. Não podemos argumentar assim, acerca da autorização divina com respeito a um
elemento para a autorização divina com respeito a outro. A questão da prescrição divina sobre os
cânticos que podem ser cantados na adoração pública de Deus deve ser respondida, portanto,
com base no ensino da Escritura a respeito desse elemento específico de adoração.
Quando nos dirigimos para a questão do ensino da Escritura descobrimos que o Novo
Testamento não nos fornece instruções abundantes sobre este assunto. É por essa razão que
somos colocados sob a necessidade de exercermos grande cuidado, para que não ultrapassemos
os limites da autorização e sanção divinas. Este relatório [Minority Report] irá lidar com a
evidência que é diretamente pertinente à questão.

A EVIDÊNCIA ESCRITURÍSTICA
I. Mateus 26:30; Marcos 14:26
Aqui somos informados de que, por ocasião da Páscoa, Jesus e seus discípulos cantaram um hino
antes de sair para o Monte das Oliveiras. O grego é humnesantes, que significa literalmente:
“tendo cantado o hino”. A evidência disponível para nós, de outras fontes, é no sentido de indicar
que o hino cantado nesta ocasião era o que é conhecido como o Halel, que consiste nos Salmos
113-118. Este exemplo evidencia os seguintes fatos.
(1) Nenhuma sanção pode ser afirmada aqui para o cântico de hinos não inspirados. Não há
evidência de que um hino sem inspiração foi cantado nesta ocasião.
(2) A evidência que possuímos demonstra que Jesus e seus discípulos cantaram uma porção do
Saltério.
(3) O canto ocorreu em conexão com a celebração do sacramento do Velho Testamento, a
Páscoa, e do sacramento do Novo Testamento, a Ceia do Senhor.
II. 1 Coríntios 14:15,26.
Paulo está aqui lidando com a assembleia dos santos em relação ao culto. Ele diz: “Cantarei com
o espírito, mas também cantarei com o entendimento” (vs. 15), “Cada um de vós tem salmo” (vs.
26). A partir do verbo que Paulo usa, o versículo 15 pode muito bem ser traduzido como segue:
“Vou cantar um salmo com o espírito e também cantar um salmo com entendimento”, da mesma
maneira que no verso 26 ele diz: “Cada um de vós tem salmo”. Devemos concluir, portanto, que
salmos eram cantados na igreja em Corinto e tais cânticos têm, por implicação óbvia, a sanção do
apóstolo e é confirmada pelo seu exemplo.
A questão que surge: quais foram esses salmos? É possível que eles fossem salmos carismáticos.
Se assim for, uma coisa é certa, eles não eram composições sem inspiração. Se carismáticos, eles
foram inspirados ou dados pelo Espírito Santo. Se hoje possuíssemos tais salmos carismáticos,
cantados pelo próprio apóstolo nos cultos, ou sancionados por ele na adoração da igreja, então
teríamos a autoridade adequada para o uso deles nos cânticos do santuário. Acontece, porém, que
não temos provas conclusivas para mostrar que nós temos qualquer desses Salmos carismáticos
que se alega aqui. Mas, mesmo na hipótese de que eles eram salmos carismáticos e mesmo na
hipótese de que temos tais exemplos em Atos 4:23-30 e 1 Timóteo 3:16, não estamos assim,
providos com qualquer autorização para o uso de cânticos não inspirados na adoração de Deus.
Na hipótese de que eles não eram salmos carismáticos, temos que perguntar: o que eles eram?
Para responder a esta pergunta, temos simplesmente que fazer outra: quais músicas no uso das
Escrituras, enquadram-se na categoria de salmos? Há uma resposta. O Livro de Salmos é
composto de salmos, e portanto, pelo princípio simples de hermenêutica, podemos dizer que, em
termos de linguagem escriturística, os cânticos que são repetidamente chamados de Salmos
perfeitamente satisfazem a denotação e conotação da palavra “salmo”, tal como é utilizada aqui.
Se a Escritura inspirada diz: “Cada um tem salmo”, e a Escritura também chama “Salmos” de
salmos, então certamente também podemos cantar um Salmo para o louvor de Deus em sua
adoração.
Até aqui, referente a estes dois textos, podemos dizer que eles não nos fornecem autorização
alguma para o uso de hinos não inspirados. Nós também podemos dizer que, uma vez que os
salmos que possuímos no Saltério são certamente Salmos, na terminologia da própria Escritura,
somos aqui supridos com sanção divina para o cântico dos tais na adoração a Deus.

III. Efésios 5:19; Colossenses 3:16


No que diz respeito a estes dois textos, convém sublinhar, em primeiro lugar, que Paulo não está,
necessariamente, referindo-se ao culto público a Deus. O contexto não deixa claro que Paulo está
limitando-se aqui à exortação que diz respeito ao comportamento dos crentes nas relações de uns
com os outros nas assembleias de culto. Paulo pode muito bem estar dando exortações gerais. Na
verdade o contexto, em ambas as passagens, parece mostrar que ele está exortando a um certo
tipo de exercício em que os crentes devem envolver-se na relação de uns para com os outros, no
cumprimento dessa instrução e edificação mútuas, que é necessário para o avanço dos mais altos
interesses do próximo e da glória de Deus.
Esta consideração não remove, no entanto, esses textos da relevância na questão do culto público
de Deus. Pois, se Paulo especifica salmos, hinos e cânticos espirituais como os meios de
comunicação através dos quais os crentes podem mutuamente promover a glória de Deus e
edificar uns aos outros naqueles exercícios cristãos mais genéricos, esse fato tem uma influência
muito próxima sobre a questão dos meios apostolicamente sancionados e autorizados de louvor a
Deus, na adoração mais específica do santuário. Em outras palavras, se os meios de comunicação
apostolicamente prescritos ou materiais de cântico de exercícios mais genéricos de culto são
salmos, hinos e cânticos espirituais, então certamente nada inferior aos salmos, hinos e cânticos
espirituais seria intimado para uso nos exercícios mais específicos de culto, nas assembleias da
igreja. Se salmos, hinos e cânticos espirituais são os limites dos materiais de cântico em louvor
de Deus em atos menos formais de culto, quanto mais eles são os limites em atos mais formais
de adoração. No que diz respeito a estes dois textos as seguintes considerações devem ser
levadas em conta.
(1) Não podemos determinar a denotação ou conotação de salmos, hinos e cânticos espirituais
por qualquer uso moderno dessas mesmas palavras. O significado e referência devem ser
determinados pelo uso das Escrituras.
(2) Alguns dos fatos com relação ao uso da Escritura são muito significativos.
A palavra psalmos (salmo) aparece cerca de 94 vezes nas Escrituras em grego, ou seja, cerca de
87 vezes na versão Septuaginta do Velho Testamento e 7 vezes no Novo Testamento. Na
Septuaginta cerca de 78 destes casos estão no Livro dos Salmos. Na grande maioria dos casos no
Livro dos Salmos, cerca de 67 dentre todos, aparece nos títulos dos Salmos. Em três dos sete
casos no Novo Testamento, a palavra é inequivocamente usada com referência aos Salmos, em
dois casos na frase “Livro dos Salmos” (biblos psalmon) e no outro caso com referência ao
Salmo 2. É certamente significativo, portanto, que em cerca de 70 dos 94 exemplos, a referência
é claramente feita ao Livro dos Salmos ou a Salmos no Livro dos Salmos.
A palavra humnos (hino) aparece cerca de 19 vezes na Bíblia grega, 17 vezes no Velho
Testamento e 2 vezes no Novo (nas passagens em consideração). Dos 17 casos do Velho
Testamento, 13 aparecem no Livro dos Salmos e 6 deles estão nos títulos. Nos sete casos onde
não aparece nos títulos, a referência é, em cada caso, para o louvor a Deus, ou para os cânticos
de Sião. Os outros quatro casos nos outros livros do Velho Testamento têm igualmente
referência aos cânticos de louvor a Deus.
A palavra odee (cântico), aparece cerca de 86 vezes na Bíblia grega, cerca de 80 vezes no Velho
Testamento e 6 vezes no Novo. Além destas duas passagens (Efésios 5:19, Colossenses 3:16),
aparece no Novo Testamento apenas no Livro do Apocalipse. Das 80 ocorrências no Velho
Testamento, cerca de 45 estão no Livro dos Salmos e 36 destas são nos títulos dos Salmos.
É certamente evidente, portanto, que uma grande porção da ocorrências dessas palavras está no
Livro dos Salmos. Esses fatos, em si mesmos, não provam que as referências aqui em Efésios
5:19 e Colossenses 3:16 sejam exclusivamente ao Livro dos Salmos. Mas esses fatos não devem
ser esquecidos, à medida que avançarmos para determinar o caráter das composições líricas
mencionadas nesses dois textos.
(3) No Novo Testamento, a palavra psalmos ocorre sete vezes, como acabou de ser mencionado.
Dois desses casos estão nos textos que estamos considerando. Um desses casos é 1 Coríntios
14:26, um texto já tratado aqui. Dois casos (Lucas 20:42 e Atos 1:20) referem-se ao Livro dos
Salmos (biblos psalmon). Lucas 24:44 refere-se claramente à Escritura inspirada do Velho
Testamento e, provavelmente, ao Livro dos Salmos. Atos 13:33 refere-se ao Salmo 2. Em
nenhum desses casos há qualquer mandamento para supor que “salmos” referem-se à
composições humanas sem inspiração. Na maioria, sem a menor sombra de dúvida, a referência
é à Escritura inspirada.
No Novo Testamento, a palavra humnos ocorre apenas nessas duas passagens. O verbo humneo
(para hino) ocorre quatro vezes (Mateus 26:30; Marcos 14:26, Atos 16:25; Hebreus 2:12). Como
já vimos, as passagens sinópticas provavelmente referem-se ao canto do Halel por nosso Senhor
e seus discípulos. Atos 16:25 refere-se ao canto de Paulo e Silas na prisão. Hebreus 2:12 é uma
citação do Velho Testamento (Salmos 22:23) - en meso ekklesias humneso se.
Nenhuma evidência, de forma alguma, pode ser deduzida para apoiar o uso de hinos não
inspirados.
Além desses dois casos, a palavra odee ocorre no Novo Testamento apenas em Apocalipse 5:9;
14:3 (2); 15:3.
No Novo Testamento, então, não há nenhuma evidência que pode ser derivada para mostrar que
essas palavras podem ser usadas aqui (Efésios 5:19, Colossenses 3:16) com referência à cânticos
sem inspiração. Mesmo que odee seja usada no Livro de Apocalipse, com referência a cânticos
diferentes daqueles do Livro dos Salmos, não é usado como referência a composições humanas
sem inspiração, mas como referência a cânticos inspirados.
(4) Chegamos agora à consideração de alguns fatos que são ainda mais significativos do que os
já discutidos. O Livro dos Salmos é composto de salmos, hinos e cânticos. Nós já descobrimos
que a esmagadora maioria dos casos onde estas palavras aparecem, em ambos os Testamentos,
tem como referência o Livro dos Salmos. Chegamos agora à discussão do significado dessas
palavras nos títulos dos Salmos.
Na Septuaginta, psalmos ocorre cerca de 67 vezes nos títulos dos Salmos. Na maioria dos casos,
é a tradução hebraica de mismor, mas em alguns casos ela traduz outras palavras hebraicas.
Psalmos significa, simplesmente, “cântico de louvor”. A frequência com que a palavra psalmos
ocorre nos títulos é provavelmente a razão pela qual o Livro dos Salmos é chamado na versão
LXX [Septuaginta] simplesmente de psalmoi. No hebraico é chamado de tehillim.
É perfeitamente óbvio, portanto, que os escritores do Novo Testamento, familiarizados como
eles estavam com o Velho Testamento em grego, teriam necessariamente o Livro dos Salmos em
mente quando usaram esta palavra psalmos. Não há nenhuma evidência, que sequer comece a
considerar a importância do sentido da palavra “salmo” no Novo Testamento, que assuma esse
simples fato, ou seja, de que o Livro dos Salmos nunca foi ali chamado, simplesmente, de
“Salmos” (psalmoi ). O uso do próprio Novo Testamento coloca isto acima de qualquer dúvida.
Nele, os Salmos são chamados de Livro dos Salmos.
Não há nada no contexto dessas duas passagens que exija que consideremos “salmos”, como
referindo-se a composições sem inspiração. Por outro lado, há casos abundantes no uso da
Escritura, em outros lugares, que mostram que a palavra “salmo” refere-se a uma composição
inspirada. Além disso, não há nenhum caso que demonstre a palavra “salmo” sendo usada em
relação ao cântico não inspirado de louvor a Deus.
É, portanto, bastante injustificado considerar “salmos”, nestas duas passagens, como referindo-se
a cânticos sem inspiração, enquanto é abundantemente autorizado considerá-los como denotando
composições inspiradas. Consequentemente, se quisermos seguir a linha dos elementos
fornecidos pela Escritura, somos forçados a encontrar os “salmos” aqui mencionados, dentro dos
limites de inspiração.
Como vimos, a palavra humnos aparece cerca de 17 vezes na versão Septuaginta. Em treze casos,
aparece no Livro dos Salmos. Em cinco ou seis casos, aparece nos títulos dos Salmos como a
tradução do hebraico neginoth ou neginah. É significativo que, em diversas ocasiões no texto dos
Salmos, humnos traduz a palavra hebraica tehillah, que é a palavra usada para designar o Livro
dos Salmos em hebraico. Isso mostra que salmos podem ser chamados de hinos e hinos são
salmos. Salmos e hinos não excluem um ao outro. Um salmo pode ser não apenas um salmo, mas
também um hino.
Estes fatos mostram que, quando no uso das Escrituras, nós procuramos por um tipo de
composição chamada de “hino”, nós a encontramos nos Salmos. E nós não temos nenhuma
evidência de que um hino, no uso das Escrituras, sempre designa uma composição humana sem
inspiração.
A palavra odee ocorre muito mais frequentemente nos títulos dos Salmos do que palavra
humnos, mas não tão frequentemente quanto a palavra psalmos. Há cerca de 36 casos. Ela
geralmente traduz a palavra hebraica shir, mas nem sempre. Ocasionalmente, é a tradução de
mismor, a palavra geralmente traduzida por psalmos. Odee ocorre com tanta frequência nos
títulos dos Salmos que o seu significado seria definitivamente influenciado por esse uso.
A conclusão a que somos levados, então, é que com a frequência com que essas palavras
aparecem neste Livro do Velho Testamento, que é único com respeito a isso, que é uma coleção
de cânticos compostos em vários momentos e por vários escritores inspirados, o Livro que
destaca-se distinta e exclusivamente como composto de salmos, hinos e cânticos, tenderia mais
definitivamente para resolver o significado dessas palavras no seu uso pelos escritores
inspirados. O caso é, simplesmente, que está além de toda disputa o fato de que não há outro
dado que se compara com o significado da linguagem da Septuaginta na resolução desta questão.
Quando tomada em conjunto com a única evidência positiva que temos no Novo Testamento, a
evidência leva preponderantemente à conclusão de que, quando Paulo escreveu “salmos, hinos e
cânticos Espirituais”, ele esperava que as mentes de seus leitores pensassem que estes, nos
termos da própria Escritura, “salmos, hinos e cânticos Espirituais”, eram o Livro dos Salmos.
(5) A evidência não garante a conclusão de que o apóstolo entende por “salmos, hinos e cânticos
Espirituais” como designando três grupos distintos ou tipos de composições líricas. É
significativo a este respeito que, em alguns casos nos títulos dos Salmos, todas estas três palavras
ocorrem. Em muitos casos, as palavras “salmo” e “cântico” ocorrem no mesmo título. Isso
mostra que uma composição lírica pode ser um salmo, hino e cântico ao mesmo tempo.
As palavras, é claro, têm os seus próprios significados distintos, e tais significados distintos
podem insinuar a variedade e riqueza dos materiais de cântico que o apóstolo tem em mente.
Paulo usa três palavras que, no uso estabelecido das Escrituras, designam a rica variedade de tais
composições líricas, como eram adequadas para a adoração de Deus na prática do canto.
(6) Paulo especifica o caráter das canções como “Espiritual”- odais pneumatikais. Se alguma
coisa deve ser óbvia a partir do uso da palavra pneumatikos no Novo Testamento, é que ela tem
referência ao Espírito Santo e significa, em contextos como no presente: “dada pelo Espírito”.
Seu significado não é de todo, como Trench alega: “tal como aquelas que foram compostas por
homens espirituais, e moveu-se na esfera das coisas espirituais” (Synonyms [Sinônimos],
LXXVIII). Pelo contrário, significa como Meyer aponta: “que procede do Espírito Santo, como
theopneustos” (Comentário sobre Efésios 5:19). Neste contexto, a palavra significa “ditada pelo
Espírito”, assim como em 1 Coríntios 2:13 logois (...) pneumatikois são “palavras inspiradas pelo
Espírito” e “ensinadas pelo Espírito” (didaktois pneumatos).
A questão, é claro, surge: por que a palavra pneumatikos qualifica odais e não psalmois e
humnois? A resposta razoável a esta pergunta é que pneumatikais qualifica todos os três dativos
e que o seu gênero (feminino) é devido à atração do gênero do substantivo que está mais
próximo a ele. Outra possibilidade distinta, feita particularmente plausível pela omissão da
copulativa em Colossenses 3:16, é que “cânticos espirituais” são o gênero dos quais “salmos” e
“hinos” são as espécies. Esta é a visão de Meyer, por exemplo.
Em qualquer dessas hipóteses os salmos, hinos e cânticos são todos “espirituais” e, portanto,
todos inspirados pelo Espírito Santo. Levando isto em consideração quanto ao assunto em
questão, isto é perfeitamente o que parece. Hinos não inspirados são imediatamente excluídos.
Mas teremos que permitir a distinta possibilidade de que a palavra “espiritual”, na estrutura
gramatical desta cláusula, se limite à palavra “cânticos”. Nesta hipótese os “cânticos” são
caracterizados como “espirituais”, e portanto caracterizados como inspirados ou ditados pelo
Espírito Santo. Isto, pelo menos, deve ser abundantemente claro.
A questão surgiria então: são apenas os “cânticos” que precisam ser inspirados enquanto os
“salmos” e “hinos” podem ser não inspirados? Essa pergunta mostra a irracionalidade de uma
hipótese tal, especialmente quando levamos em conta tudo o que já foi demonstrado com
referência ao uso dessas palavras. Em que fundamento concebível Paulo teria insistido que os
“cânticos” precisavam ser divinamente inspirados e os “salmos” e “hinos” não precisavam? No
uso das Escrituras não há nenhuma linha de distinção entre salmos e hinos, por um lado, e
cântico do outro. Seria completamente impossível encontrar qualquer bom motivo para tal
discriminação na prescrição apostólica.
A irracionalidade de tal suposição parece ser tanto mais conclusiva quando lembramos o uso da
Escritura com respeito à palavra “salmos”. Não há a menor evidência para supor que, em tal uso
por parte do apóstolo, “salmo” poderia significar uma composição humana sem inspiração.
Todas as provas, em vez disso, irão estabelecer a conclusão oposta.
Vemos, então, que os salmos são inspirados. Cânticos são inspirados porque eles são
caracterizados como “espirituais”. E quanto aos hinos então? Podem eles ser não inspirados?
Como já foi indicado, seria uma hipótese totalmente ilógica sustentar que o apóstolo exigisse que
cânticos fossem inspirados enquanto salmos e hinos não. Isto torna-se ainda mais convincente
quando reconhecemos, como já estabelecido, que os salmos e cânticos eram inspirados. Na
realidade, seria uma estranha discriminação se hinos pudessem ser sem inspiração e salmos e
cânticos não. Mas seria estranho ao ponto do absurdo se Paulo devesse insistir que os cânticos
tinham que ser inspirados, mas não os hinos. Pois que distinção seria possível entre um hino e
um cântico, que fosse necessária para o último ser inspirado enquanto o primeiro não? Nós, na
verdade, não podemos ter certeza que há alguma distinção até onde se refere o real sentido.
Mesmo se mantivermos uma distinção em cada palavra, não há razão detectável porque tão
radical distinção entre inspiração e não inspiração poderia ser mantida.
A única conclusão que podemos chegar é que a “hinos” em Efésios 5:19 e Colossenses 3:16 deve
ser dada a mesma qualidade “espiritual” que é dada aos “salmos”, por implicação óbvia, e a
“cânticos”, por qualificação expressa, e que o apóstolo sem dúvida os considerava assim, tanto
porque a palavra “espiritual” seria considerada como qualificação para todas as três palavras, ou
porque “cânticos espirituais” eram o gênero do qual “salmos” e “hinos” eram as espécies, ou
porque no uso da igreja tanto “hinos” como “salmos” seriam reconhecidos, por direito próprio e
por causa do contexto em que são mencionados, como estando em nenhuma outra categoria, com
respeito à sua qualidade “espiritual”, do que aquela ocupada por salmos e hinos.
Em referência a essas duas passagens, então, somos obrigados a concluir:
(a) Não há autorização para se pensar que “salmos, hinos e cânticos espirituais” podem referir-se
a composições humanas sem inspiração. Estes textos não nos fornecem autorização alguma para
o cântico de hinos não inspirados na adoração de Deus.
(b) Há autorização para concluir que “salmos, hinos e cânticos espirituais” referem-se a
composições inspiradas. Estes textos nos fornecem, portanto, uma sanção para o canto de
cânticos inspirados na adoração de Deus.
(c) O Livro dos Salmos nos fornece salmos, hinos e cânticos que são inspirados e, portanto, o
tipo de composições que são referidas em Efésios 5:19 e Colossenses 3:16.

CONCLUSÕES GERAIS
Este levantamento das evidências derivadas da Escritura demonstra, na opinião do Minority
Report, que não há nenhuma evidência da Escritura que pode ser invocada para justificar o
cântico de composições humanas não inspiradas na adoração pública de Deus. O relatório do
comitê sustenta que nós temos autorização para o uso de tais cânticos. O Minority Report está
bem ciente da plausibilidade dos argumentos do comitê, a saber, o argumento retirado da
analogia da oração e o argumento retirado da necessidade de expandir o conteúdo dos cânticos
para acompanhar o ritmo da expansão da revelação dada no Novo Testamento. O primeiro desses
argumentos tem sido tratado na primeira parte do presente relatório. O último é muito mais
convincente. Há, no entanto, duas considerações que necessitam ser mencionadas a título de
resposta.
(i) Não temos nenhuma evidência no Velho Testamento ou no Novo, que a expansão da
revelação recebeu expressão nos exercícios devocionais da igreja através dos cânticos de louvor
sem inspiração. Este é um fato que não pode ser desconsiderado. Se possuíssemos evidências de
que no período do Velho Testamento a igreja deu expressão à revelação, à medida que progredia,
pelo canto de hinos não inspirados na adoração de Deus, então, o argumento da analogia seria
bastante conclusivo, especialmente tendo em vista o relativo silêncio do Novo Testamento. Mas
nenhuma evidência foi produzida para provar o uso de cânticos não inspirados na adoração do
Velho Testamento. Ou, se as instâncias do uso de hinos não inspirados no culto do Novo
Testamento pudessem ser apresentadas, em seguida o argumento do comitê seria estabelecido.
Mas até mesmo os próprios casos mencionados pelo comitê para mostrar que houve uma
expansão dos cânticos no Novo Testamento não demostram que cânticos não inspirados foram
empregados. Por isso somos obrigados a concluir que, uma vez que não há nenhuma evidência
para mostrar o uso de cânticos não inspirados na prática da igreja no Novo Testamento, o
argumento do comitê não pode pleitear essa autorização das Escrituras. A igreja de Deus deve,
nesta matéria, como em todas as outras questões relacionadas com o conteúdo real de culto,
limitar-se aos limites da autorização da Escritura, e é a alegação do Minority Report de que não
se possuem evidências sobre as quais se possa pleitear o uso de cânticos não inspirados no culto
público de Deus.
O argumento do comitê de que: “o Novo Testamento lida com condições na igreja primitiva que
não permaneceram e que não podem ser a nossa norma presente”, falha em tomar em conta o
devido caráter normativo da Escritura. É verdade que hoje não temos mais o dom da inspiração
e, portanto, não se pode compor músicas inspiradas. Mas a Escritura prescreve para nós o modo
em que devemos adorar a Deus nas condições que são permanentes na igreja. E já que a Escritura
autoriza e prescreve o uso de cânticos inspirados, mas não garante o uso de cânticos não
inspirados, devemos limitar-nos a esses materiais inspirados que nos foram disponibilizados pela
própria Escritura. Em outras palavras, a Escritura não nos fornece qualquer autorização para o
exercício dos dons, que a igreja agora possui, para a composição de verdadeiro [inspirado]
conteúdo de cântico.
(ii) Se o argumento elaborado a partir da expansão da revelação é aplicado dentro dos limites da
autorização da Escritura, então o máximo que pode ser estabelecido é o uso de cânticos do Novo
Testamento ou de matérias do Novo Testamento adaptadas ao cântico. Principalmente, o
Minority Report não é zeloso em insistir que os cânticos do Novo Testamento não podem ser
usados na adoração de Deus. Somos mais zelosos em manter que a Escritura autoriza a utilização
de cânticos inspirados, ou seja, os cânticos da Escritura, e que o canto de outra coisa a não ser
estes cânticos na adoração de Deus não encontra autorização na Palavra de Deus e, portanto, é
proibido.
Com base nestes estudos, o Minority Report apresenta respeitosamente à Décima Quarta
Assembleia Geral as seguintes conclusões:
1. Não há autorização nas Escrituras para o uso de composições humanas não inspiradas no
cântico de louvor a Deus na adoração pública.
2. Há autoridade explícita para o uso de cânticos inspirados.
3. Os cânticos de adoração divina devem, portanto, ser limitados às músicas da Escritura, pois só
elas são inspiradas.
4. O Livro dos Salmos nos fornece o tipo de composições para as quais temos a autoridade das
Escrituras.
5. Estamos, portanto, certos da divina sanção e aprovação para o cântico dos Salmos.
6. Nós não estamos certos de que outros cânticos inspirados foram destinados para serem
cantados na adoração de Deus, embora o uso de outros cânticos inspirados não viole o princípio
fundamental no qual a autorização da Escritura é explícita, ou seja, o uso de cânticos inspirados.
7. Tendo em conta a incerteza no que diz respeito ao uso de outros cânticos inspirados, devemos
limitar-nos ao Livro dos Salmos.
Respeitosamente,
John Murray
William Young

Rev. John Murray foi um ministro escocês da Orthodox Presbyterian Church [Igreja
Presbiteriana Ortodoxa], e professor de Teologia Sistemática no Seminário Teológico de
Westminster, Glenside, Pensilvânia, de 1937 a 1966. Ele faleceu em 1975.

Rev. Dr. William Young (nascido em 1918), é ministro aposentado da East Greenwich, Rhode
Island, congregação da Presbyterian Reformed Church [Igreja Reformada Presbiteriana], e
também atuou como professor de Filosofia na Universidade de Rhode Island. Ele foi ministro da
Igreja Presbiteriana Ortodoxa até 1976.
[1] Um relatório separado, feito por membros de um comitê ou grupo, que não concorda com a
maioria.
LIVROS DESTE AUTOR
A Verdadeira Salmodia
A discussão sobre a Salmodia Exclusiva vem aparecendo com mais frequência no Brasil inteiro,
mas infelizmente poucas obras antigas são traduzidas quando esse tema é tratado. Para a
edificação da Igreja e principalmente para a glória de Deus, a Editora Caridade Puritana lança
sua primeira obra que aborda justamente este assunto tão importante. Neste livro você verá que
no século XIX a Salmodia começou a ser questionada, e que muitos dos argumentos que
ouvimos hoje em dia já foram abordados e refutados por tantos autores que participam deste
livro (que foram compilados pelo Dr. James M. Willson) e pela própria história da Igreja. O livro
não trata apenas sobre o assunto de forma apologética, mas também de forma prática e pastoral,
e, nos leva ao conhecimento Bíblico sobre os Salmos de forma profundíssima.

Louvor À Capela: A Teologia E A Historicidade


A música de forma instrumental é aceitável no culto na nova aliança?
Para responder a essa pergunta devemos ser precisos sobre o que estamos tentando investigar. A
questão não é se a música instrumental pode ser apreciada em privado, nem se pode ser usada em
reuniões sociais seculares — não eclesiásticas. Certamente que pode, e é uma grande benção
nesses contextos. No entanto, como João Calvino acreditava, dizemos:
"Nós não somos, de fato, proibidos de usar — em particular — instrumentos musicais, mas eles
são banidos das igrejas pelo simples mandamento do Espírito Santo" .
A questão é especificamente se a música instrumental na adoração pública da igreja é
justificável. É da vontade de Deus que a música instrumental seja usada hoje em dia na adoração
corporativa? Esse livro irá argumentar a favor do negativo.
Com a pergunta formulada de forma clara e precisa, vamos primeiro considerar algumas
observações preliminares antes de chegarmos aos nossos principais argumentos. Esses pontos
não pretendem ser conclusivos, mas sim considerações práticas para promover a abertura de
espírito. Nos dias de hoje pode parecer muito estranho, alguns podem até dizer legalista, sugerir
que a instrumentação musical não deve ser usada no culto público da igreja. Nossa esperança é
que tais leitores céticos considerem os seguintes pontos a fim de perceber que a propriedade de
usar instrumentos musicais na igreja não é tão óbvia quanto parece à primeira vista.
Sendo bons Bereanos, devemos ser introspectivos e críticos das nossas tradições à luz das
Escrituras. Só porque sempre fizemos algo, e não conhecemos ninguém que faça algo diferente,
não significa automaticamente que nossa doutrina ou prática seja bíblica. Devemos estar sempre
abertos à correção dos argumentos bíblicos.

Tem interesse de se aprofundar nesse assunto? Adquira esse livro!


O Que Faremos Com Os Salmos Imprecatórios?
“O Pb. Rikison Moura escreveu um livro que nos chama a redescobrir a beleza e a glória dos
Salmos. De forma simples e convincente, de um ângulo no qual se pode ver toda a extensão dos
atributos do Todo-poderoso, nos mostra a grandeza de Deus revelada no Saltério, de modo que
seria incapaz de se fazer qualquer exclusão ou descaso de um sequer dos maravilhosos 150
Salmos.”
— Daniel Costa, membro da Igreja Presbiteriana de Russas — CE, Engenheiro de Produção.

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