Você está na página 1de 5

JT McDermott

Professor Dunn
Literatura Afro-Brasileira
7 de Março de 2024

Barreto e Amado: A Ponte entre Pré-Modernismo e Modernismo

Lima Barreto e Jorge Amado foram grandes figuras da literatura brasileira, separados de
distância temporal por apenas uns anos. Alias, Jorge Amado tinha dez anos de idade no ano de
1922 quando Lima Barreto faleceu. Essa curta separação resultou em diferenças significativas
entre as obras deles que refletem mudanças na literatura, cultura, e história do Brasil e no resto
do mundo também. Neste ensaio, eu comparei dois romances escritos por Barreto e Amado, O
Triste Fim de Policarpo Quaresma por Barreto, e Terras do Sem Fim por Jorge Amado. Por isso,
quero explorar a diferença entre o pré-modernismo e o modernismo, particularmente como se
manifestam na literatura brasileira.
Primeiramente, é preciso entender o que significam os termos “modernismo” e
“pré-modernismo,” e por que são importantes para entender a literatura e a cultura. Ainda, temos
que entender o “pré-pré-modernismo” no contexto brasileiro também. Na nossa aula temos dois
exemplos de obras que explicam a situação literária antes do ano de 1900, Úrsula, um romance
romancista por Maria Firmina de Reis publicado no ano de 1847, e As Memórias Póstumas de
Brás Cubas, um romance realista por Machado de Assis publicado no ano 1881. Úrsula
representa um estilo mais antigo e parecido com a literatura tradicional. Tem uma maneira de
contação de histórias simples e direto elementos idealizados. Contudo, foi inovador no seu
tratamento de personagens negros e do topico de escravidão, e não quero ignorar isso. Mais ou
menos trinta anos depois chegou As Memórias Póstumas de Brás Cubas, considerado uma obra
do realismo brasileiro. No romance, Machado de Assis experimentou com um “narrador do
além", recontando a sua vida com detalhes emocionais realísticos, refletindo decepção, ironia e
cinismo que não aparecem em obras romancistas que vieram anteriormente.
No Brasil, essa mudança em estilo coincidiu com a lenta morte de escravidão, a Guerra
do Paraguai, e um aumento nos sentimentos republicanos e anti-monarquista. O interesse de
Machado de Assis num estilo mais realista e menos idealizado também refletiu a permeação das
ideias do iluminismo, o aumento de interesse nas ciências pelo mundo, e de entender o mundo
numa forma objetiva.
Considerado o início do modernismo no Brasil, a Semana de Artes de 1922 representou
uma partida da cultura brasileira desde estilos tradicionais e contra formas rigorosas das obras
anteriores, e segunda a professora de portugues Flavia Neves, o movimento no Brasil teve três
fases distintas, a primeira entre os anos de 1922 e 1930 caracterizado como “valorização do
cotidiano brasileiro, com grande destaque da linguagem coloquial e espontânea, com suas gírias,
erros e capacidade expressiva (humor, ironia e sarcasmo),” a segunda fase desde 1930 até 1945,
do que veio o romance Terras do Sem Fim, que trouxe “uma grande reflexão e crítica da
realidade brasileira, sendo retratados problemas sociais das diferentes regiões, com destaque para
o regionalismo nordestino,” e uma terceira que durou até o ano de 1960.1 Obviamente, mais
relevante para este ensaio são as primeiras duas fases do modernismo.
Armado com uma definição de modernismo, podemos encontrar uma explicação de
pré-modernismo. É se define como foi o estilo que precedeu o modernismo que conteve
elementos dos estilos mais antigos e aspetos mais inovadores também. Com o novo estilo
também chegou um nível mais alto da consciência social e crítica dos problemas sociais,
particularmente por causa do caos político da república inicial. Segundo Warley Souza do site
Português, “Durante os anos de 1902 a 1922, o modernismo foi sendo forjado até fixar as suas
bases. Nesse período, os problemas sociais, econômicos e políticos tornaram-se mais evidentes, e
falar sobre eles era inevitável.”2 Publicado no ano de 1911, o Triste Fim do Policarpo Quaresma
emergiu nesse contexto.
Agora, podemos começar os elementos de pré-modernismo encontrados na obra de Lima
Barreto. O enredo segue a história da personagem titular, Policarpo Quaresma, uma super
patriota brasileira, por três fases distintas. Primeiro, o livro conta como Policarpo tenta mudar a
língua oficial do Brasil do portugues ao tupi, a língua nativa (na verdade um grupo de línguas)
mais prevalente no Brasil antes da colonização portuguesa. Como um patriota, Policarpo crê que
o país deve abraçar a sua própria identidade. Continuando a sua missão de trazer glória ao seu
país, na segunda parte ele se retira a um sítio no campo e trabalha para melhorar a agricultura

1
1. Flávia Neves, “Modernismo No Brasil: As Três Fases Do Movimento Modernista,” Norma Culta, March 30,
2017, https://www.normaculta.com.br/modernismo/.
2
1. Warley Souza, “Pré-Modernismo: Contexto Histórico, Autores, Obras,” Português, accessed March 7, 2024,
https://www.portugues.com.br/literatura/pre-modernismo.html#:~:text=O%20pr%C3%A9%2Dmodernismo%20foi
%20uma,falar%20sobre%20eles%20era%20inevit%C3%A1vel.
brasileira apenas para fracassar nisso também. Finalmente, na terceira parte, ele vai para ajudar o
governo contra a rebelião da armada, mas outra vez fica decepcionado quando as suas
percepções positivas da república e do presidente Floriano Peixoto são refutadas. No fim,
Peixoto condena Policarpo à morte.
Quais são os elementos de pré-modernismo no Triste Fim de Policarpo Quaresma?
Primeiramente, os aspectos de crítica social e política são elementos representativos do
modernismo. Barreto usa o personagem Policarpo Quaresma como um veículo da sua sátira. O
próprio personagem é um exagero das características nacionalistas. Ele se dedica a estudar e
melhorar o Brasil com ingênuo otimismo e crença, mas por fim descobre que a versão do Brasil
na sua mente é uma ilusão. Particularmente, o comportamento do Presidente Floriano Peixoto em
relação a Policarpo representa a farsa da república velha, que deveria ter representado a liberdade
do país contra a tirania da monarquia. Em vez disso, o leitor realiza que a revolução do ano de
1889 apenas substitui um autocrata por outro.
Além dos temas críticas da obra, o estilo também tem elementos modernistas. Por
exemplo, é escrito numa maneira acessível, em língua comum em comparação a Úrsula e
Póstumas Memórias de Brás Cubas. Por isso, podemos inferir uma mudança na audiência
pretendida. É claro que Lima Barreto queria que o brasileiro cotidiano lesse o seu romance e
entendesse a sua crítica.
O livro Terras do Sem Fim também expressa uma mensagem de crítica social, mas é
numa forma mais sutil do que a sátira ácida de Lima Barreto. O romance conta a história de uma
guerra territorial entre dois barões de cacau na Bahia. Em vez de ter um personagem principal,
Jorge Amado continuamente muda perspectivas, saltando em tempo e espaço.
Terras do Sem Fim é emblemático da segunda fase do modernismo brasileiro por várias
razões. O uso de várias perspectivas mostra a complexidade dos eventos acontecendo no
romance. Em vez de ter um protagonista e antagonista como uma obra tradicional, Amado
experimenta e deixa o leitor formar as suas próprias opiniões sobre a moralidade dos
personagens. Além disso, Amado mistura informações históricas com uma história de ficção. Por
exemplo, ele dedica um capítulo inteiro para descrever a história verdadeira da formação da
cidade de Tabocas (atualmente chamada Itabuna). Faz isso para explicar o contexto da violência.
O enredo é baseado nos eventos que aconteceram quando Amado crescia na Bahia no início do
século XX, quando o sul da Bahia estava experienciando um período de crescimento econômico
e alto nível de violência também.
Jorge Amado nesse tempo era um marxista, e estava morando em exílio no Uruguai por
causa de perseguição política sob o regime de Getúlio Vargas quando escreveu o romance. Terras
do Sem Fim ultimamente é uma crítica marxista embora uma crítica menos óbvio do que o Triste
Fim de Policarpo Quaresma. Enquanto os problemas culturais e políticos são feitos aparentes
por os fracassos de Policarpo Quaresma e as caracterizações dele e dos outros personagens no
livro, a crítica de Jorge Amado surge como um mosaico de sofrimento por pessoas com posições
distintas na sociedade. Os personagens pobres são vítimas de exploração pelos barões, e os
barões são vítimas de violência nas mãos dos outros barões. Por isso, o vilão do romance na
verdade é o cacau, e o sistema capitalista que cria o ganha-perde e inspira atos de violência em
nome de lucros.
As obras têm similaridades interessantes que quero mencionar. As estruturas dos livros
são similares em que são separados em fases distintas, e os enredos de cada livro culmina num
clímax que encapsula os temas deles. Os dois livros passam muito tempo estabelecendo os
personagens e o contexto, particularmente o contexto político. As duas obras são tragédias
também, que têm fins pessimistas: Policarpo Quaresma é executado, e muitas pessoas são
assassinadas sobre um pedaço de terra.
As primeiras diferenças entre as obras são os estilos, os tons, e os focos de tema. Como já
mencionei, Terras do Sem Fim é mais ou menos uma crônica de um grande luta envolvendo
muitos personagens, enquanto Triste Fim de Policarpo Quaresma é uma biografia do fim do
personagem titular. O tom de Terras é sério e dramático, e ele falta os elementos irônicos e
satíricos do Triste Fim. Geograficamente, Barreto foi um carioca, e o seu romance é baseado
assim. O foco de Armado nos desafios nordestinos reflete o interesse da segunda fase do
modernismo brasileiro no regionalismo nordestino. Por isso, Barreto foca na política nacional e
da República Velha e crítica da classe alta carioca, enquanto Armado descreve a violência em
relação à política regional e local, particularmente enfocado nos abusos do governo de Ilhéus que
os barões fazem para avançar os seus próprios interesses econômicos.
O que mudou no Brasil e no mundo que explica as diferenças entre Barreto e Amado?
Primeiramente, a Primeira Guerra Mundial aconteceu depois da publicação original do Triste
Fim no ano de 1911 como folhetim. Numa maneira similar à concepção do pós-modernismo
depois do horror da Segunda Guerra Mundial, os eventos da primeira guerra fizeram as ideias
tradicionais e o otimismo cultural antes da guerra. Ficou óbvio que com a industrialização veio
também a possibilidade de destruição indescritível. A guerra inspirou a Revolução Russa no ano
de 1917 que causou as ideias marxistas a espalhar-se pelo mundo. A consciência de classe
marxista inspirou obras como Terras do Sem Fim. Logo depois, a famosa Semana de Artes de
1922 em São Paulo representou a maior rejeição dos estilos antigos até esse ponto na cultura
brasileira. O otimismo cultural dos anos 20 saiu com a repressão da ditadura de Getúlio Vargas.
Vendo inimigos na direita e na esquerda, Vargas começou uma campanha de encarceramento
contra comunistas e outros oponentes políticos. Além disso, os anos de 30 trouxeram A Grande
Depressão que destacou a desigualdade econômica e problemas com o sistema mundial
capitalista.
Geralmente, o curto tempo entre os anos de Barreto e de Armado mostra a mudança
rápida na sociedade brasileira no início do século XX. Por comparar as obras deles, podemos
entender como as mudanças na sociedade criaram um novo estilo na literatura brasileira. Se pode
ver que a cultura, neste caso a cultura literária, experiencia fases de rejeição do estilo anterior. Os
efeitos dos eventos históricos no Brasil na literatura brasileira fizeram os autores explorarem
novos modos de contar histórias, e novos temas de exploração orientado aos problemas sociais
experienciada por uma variedade de classes sócio-económicas. Entretanto, podemos ver que sem
as obras de Lima Barreto, as obras de Jorge Amado seriam muito diferentes. A influência
pré-modernista é aparente em Terras do Sem Fim. Eu percebo esta obra como a evolução da
crítica de Barreto, e a comparação entre os dois grandes autores brasileiros como uma janela para
entender o Brasil como um estrangeiro.

Você também pode gostar