3 4 Atraso tecnológico: mais um dilema para a Nova Indústria Brasil 5 6 Lucas Milanez de Lima Almeida1 7 8 O carnaval acabou e a semana passada sequer teve três dias úteis. Normalmente, 9 pouca coisa muda na economia brasileira durante tais festejos. Por isso, seguiremos a 10 série de textos sobre a política industrial chamada de Nova Indústria Brasil (NIB). Hoje , 11 falaremos do chamado “gap” ou “hiato” tecnológico. 12 Termos muito utilizados no “economês”, o “gap ” e o “hiato ” são duas palavras 13 usadas para expressar a mesma coisa: a diferença entre o valor real de uma variável e o 14 seu valor ideal (previsto, estimado ou considerado de excelência). No caso da 15 tecnologia, os termos “gap” e “hiato” servem para expressar o diferencial entre o nível 16 de desenvolvimento tecnológico alcançado por um país e os padrões alcançados pelas 17 economias mais avançadas. Quanto maior o hiato (ou gap ,) maior o atraso do país em 18 questão. 19 Há diversas formas de mensurar o hiato tecnológico, desde a participação dos 20 setores de média e alta tecnologia no PIB, no emprego, na renda, nas exportações e na 21 P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), até o número de patentes registradas e inovações 22 implementadas a cada ano. Disto podemos deduzir: os países que já dispõem de 23 infraestrutura técnica-científica-produtiva avançada são aqueles que lideram o 24 desenvolvimento industrial mundial. 25 No capitalismo, a pesquisadora Carlota Perez apontou cinco grandes revoluções 26 tecnológicas que mudaram o curso da História e criaram novos paradigmas: Revolução 27 Industrial; Era do vapor e ferrovias; Era do aço e engenharia pesada; Era do petróleo, 28 automóveis e produção em massa; e Era da informática e telecomunicações. Dessas, o 29 Brasil internalizou em seu território a estrutura produtiva das quatro primeiras, mas de 30 forma muito desigual, dependente e descompassada. Só não internalizou a estrutura 31 produtiva capaz de garantir a reprodução das tecnologias da informação e da 32 comunicação (TIC). E isto é um grave problema. 33 Em todas as Eras, por mais que mudassem as tecnologias líderes, os produtos 34 das tecnologias antigas eram incorporados ou “reinventados” a partir das novas. 35 Inovação também é isso, fazer a mesma coisa, só que diferente. Por exemplo, mesmo 36 com a Era dos automóveis, uma parte significativa dos transportes continuou a ocorrer 37 em navios e trens. Com o advento da Era da informação foi a mesma coisa: 38 colheitadeiras à diesel passaram a trabalhar sem a necessidade de motoristas, pois 39 começaram a ser guiadas por redes móveis e GPS. 40 Por sua vez, tudo leva a crer que o próximo paradigma tecnológico está ligado à 41 “economia verde” e às suas aplicações. Por exemplo, o transporte de cargas e pessoas 42 ainda vai existir de maneira muito parecida com o que temos hoje. A diferença é que os 43 motores à combustão serão substituídos por elétricos , e os motoristas , trocados pelos 44 computadores. Enquanto isso, os recursos renováveis certamente se tornarão a base da 45 geração de energia. Hoje, cerca de 80% de toda energia que move o mundo vem do 46 petróleo e derivados, do carvão e do gás natural.
1 1 Professor do DRI/UFPB, do PPGCPRI/UFPB e do PPGRI/UEPB; Coordenador do PROGEB.
2 (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). 3 Colaboraram: Valentine de Moura, Gustavo Figueiredo, Raquel Lima e Paola Arruda. 47 Como já vimos, para ter e desenvolver algo ligado aos novos paradigmas, é 48 necessário ter know-how, ou seja, acumular elementos da infraestrutura técnico- 49 científica-produtiva , baseada em tecnologias de ponta. O problema é que o Brasil tem 50 um hiato tecnológico elevado, o que limita nosso crescimento de curto prazo. 51 Em primeiro lugar, o Brasil viu sua indústria definhar nos últimos 30 anos, 52 através daquilo que chamamos de desindustrialização. Em segundo, essa indústria não 53 deu o passo seguinte na implementação de novas fábricas produtoras de máquinas para 54 outras fábricas. Isso é ainda pior com aquelas que fornecem o maquinário produtor das 55 TIC. Em terceiro, vimos uma redução brutal das verbas públicas destinadas à pesquisa e 56 inovação, em especial após o Golpe de 2016. Sem falar que, em 2022, batemos 57 recorde na “fuga de cérebros” para o exterior. 58 Diante do que foi levantado, alguns problemas se apresentam de maneira 59 urgente: como realizar a transição de uma estrutura produtiva atrasada para uma 60 (relativamente) avançada? Será possível “queimar” etapas e chegar à economia verde 61 sem termos sólidas base s nas TIC? Como convencer nossa burguesia de que isso pode 62 ser rentável pra ela? Como outros países mais avançados podem ser aproveitados (ou 63 aproveitadores) nesse processo? 64 Resumindo, para o Brasil avançar, é preciso muito planejamento e engenharia 65 econômica , para encontrar aqueles que certamente serão os gargalos da NIB. Caso 66 contrário, continuaremos atrasados e, por isso, dependentes de empresas estrange iras , 67 para vermos nossa economia funcionar. Esse é outro dilema...