Você está na página 1de 6

D I R E I T O CONSTITUCIONAL

Hélcio Corrêa

A IMPORTÂNCIA DA LEI DE
34
INOVAÇÃO TECNOLÓGICA
THE IMPORTANCE OF THE LAW OF TECHNOLOGICAL INNOVATION
Reis Friede e André Carlos da Silva

RESUMO ABSTRACT
Afirmam que paira sobre a nação brasileira uma indiscutível The authors state that the so-called “technological
ameaça à soberania nacional, denominada “dependência tec- dependence” constitutes an undeniable threat that looms over
nológica”. the sovereignty of the Brazilian nation.
Analisam a importância da edição da Lei de Inovação Tecnoló- They assess the importance of the issuing of the Law of
gica para a recuperação da indústria nacional de defesa e, por Technological Innovation for the recovery of the Brazilian
via de consequência, para a manutenção da soberania nacional. defense industry and consequently for the maintenance of
national sovereignty.
PALAVRAS-CHAVE
Direito Constitucional; ciência; tecnologia; Lei de Inovação Tec- KEYWORDS
nológica – Lei n. 10.973/2004; defesa; soberania. Constitutional Law; science; technology; Law of Technological
Innovation – Law No. 10,973/2004; defense; sovereignty.

Revista CEJ, Brasília, Ano XIV, n. 50, p. 34-39, jul./set. 2010


A Constituição Federal preceitua, logo no art. 1º, inc. I, a aproximação de eventuais países concorrentes. (Grifos
que a Soberania é um dos fundamentos sobre os quais nossos)
repousa a República Federativa do Brasil. Não obstante a Em reforço ao que está dito no preocupante quadro
importância dedicada pelo Texto Constitucional ao tema em retratado, a experiência internacional revela que, historica-
foco, tal elemento constitutivo da ideia de Estado1 vem sen- mente, diversas maneiras foram empregadas por Estados
do rotineiramente ameaçado, seja mediante as tradicionais para atentar contra a soberania de outro país. Argumentos
ações militares expressas e declaradas, seja por meio da jurídicos, econômicos, políticos, geográficos, dentre tantos,
mais implícita, velada e sutil das estratégias estatais. foram utilizados para eliminar esse precioso bem jurídico e,
Com efeito, acerca dessas ameaças que rondam os em última análise, a própria noção de Estado.
interesses nacionais, a publicação Concepção Estratégica, No nosso caso em particular, dentre muitos antagonis-
Ciência, Tecnologia e Inovação de Interesse Nacional2, p. mos3 com os quais convivemos, paira sobre a rica Nação
8, obra editada no ano de 2003 pelos Ministérios da Defesa brasileira uma indiscutível ameaça à Soberania Nacional,
e da Ciência e Tecnologia, traça o seguinte panorama: O forte em sua essência e, ao mesmo tempo, dramática em
mundo, que passa por um amplo e acelerado processo suas possíveis consequências.
da globalização, tem assistido resignadamente à deterio- Trata-se da denominada “dependência tecnológica”,
ração do conceito de soberania nacional em algumas autêntico desafio que, por força de seus variados matizes,
regiões do planeta, em face de ousadas estocadas promo- haverá de ser superado, de modo a evitar os terríveis riscos
vidas pelo implacável terrorismo internacional, pelo tráfico decorrentes do atraso brasileiro nos campos da ciência, tec-
de armas e de drogas e, também, pela ampliação do po- nologia e inovação (C, T&I), adversidade que, por via direta,
der político, econômico e militar de nações hegemônicas e atinge também a expressão militar do poder nacional 4, de
globalizantes. fundamental importância para a Defesa Nacional5, assunto 35
Cada vez mais, verifica-se a crescente descaracte- que, nos últimos anos, por fatores diversos, mas, sobretudo
rização dos contornos nacionais, que vão perdendo a por autêntico preconceito, experimentou um longo proces-
sua função de demarcar a linha da atuação suprema e so de verdadeira marginalização.
independente dos Estados, expressa nos campos do po- A história recente revela que, com o fim do regime
der: fisiográfico, psicossocial, político, econômico, militar e militar, assuntos com tal tonalidade eram ostensivamente
científico-tecnológico. evitados pela agenda política que se instalou no País no
Fatos acontecidos recentemente têm mudado rapida- pós-regime, o que muito contribuiu para o desaparelha-
mente este cenário: redes internacionais de terrorismo e mento das nossas Forças Armadas e para a consequente
crime organizado exigem uma melhor coordenação dos di- diminuição do poder militar estatal6.
ferentes setores envolvidos no combate e repressão dessas
atividades, fazendo com que esferas de responsabilidades Havia a necessidade de se implantar no Brasil,
que antes pareciam afastadas tornem-se mais próximas;
urgentemente, um marco jurídico que
ações políticas, econômicas e militares de alguns países
sobre outros, menos preparados para defender a sua so- concebesse uma verdadeira política de
berania. Mesmo em nome da defesa da paz mundial, atos incentivo à inovação, conectando-a a outras
de guerra têm sido perpetrados sem o necessário respaldo
legal do direito e do apoio internacionais. Faz-se mister, políticas não menos importantes, tais como a
então, que os países que valorizam a democracia, a liber- de C&T, a industrial e a de defesa.
dade e o respeito mútuo entre os povos, se mantenham
devidamente preparados para sustentar a sua própria Como a soberania também se constitui, em última aná-
autodeterminação e, também, a das demais nações livres lise, em uma abstração, o direito estatal que dela deriva,
e democráticas do planeta. para realmente valer, de maneira genérica e obrigatória,
Na área de Ciência e Tecnologia, o Brasil, país que necessita de algum tipo de elemento concreto, que tenha
tem buscado com persistência o seu completo crescimento, a capacidade de viabilizar, sob o ponto de vista efetivo, a
tem enfrentado, como acontece também com os demais indispensável concretização do chamado “poder de impé-
países emergentes, ventos desfavoráveis soprados por na- rio” (poder sobre todas as coisas no território estatal) e do
ções do primeiro mundo que, por meio de barreiras técni- denominado “poder de dominação” (poder sobre todas
cas ou comerciais, procuram dificultar o vôo brasileiro em as pessoas no território estatal), ambos inerentes ao poder
direção ao grande desenvolvimento científico-tecnológico, político derivado da soberania.
a fim de evitar quaisquer progressos que venham permitir Este elemento de efetivação traduz-se pela existência

Revista CEJ, Brasília, Ano XIV, n. 50, p. 34-39, jul./set. 2010


de uma força coerciva de natureza múltipla (política, blica claramente definida e endereçada à construção desse
econômica, militar e/ou psicossocial), mas que, de modo ambiente integrado.
derradeiro, perfaz-se por meio da existência de uma real Havia a necessidade de se implantar no Brasil, urgente-
capacidade militar no sentido amplo da expressão. mente, um marco jurídico que concebesse uma verdadeira
Nesse sentido, correta, portanto, a previsão contida na política de incentivo à inovação, conectando-a a outras po-
Política de Defesa Nacional (PDN), aprovada pelo Decre- líticas não menos importantes, tais como a de C&T, a indus-
to n. 5.484, de 30 de junho de 2005, ao enfatizar que a trial e a de defesa.
expressão militar do País fundamenta-se na capacidade A propósito, essa imprescindível interação política fez
das Forças Armadas e no potencial dos recursos nacionais com que o Ministério da Defesa consolidasse as denomina-
mobilizáveis. das “tecnologias de interesse da Defesa Nacional” a partir
Ora, se a expressão militar do País, como restou afir- de três eixos, a saber:
mado no Decreto n. 5.484/05, fundamenta-se também na Eixo da Defesa – contempla as especificações e os re-
capacidade das Forças Armadas, cumpre criar, implantar e quisitos militares da Defesa Nacional a serem satisfeitos
manter estratégias que assegurem tal capacidade, de modo por Sistemas de Armas. Relaciona-se primordialmente às
que as Instituições Militares possam cumprir fielmente a Expressões Política e Militar do Poder Nacional.
missão7 que lhes foi constitucionalmente conferida. Isso in- Eixo da Ciência e Tecnologia – contempla as Áreas
clui, certamente, incentivos ao desenvolvimento da C, T &I. Tecnológicas Estratégicas necessárias para atender às es-
pecificações e aos requisitos definidos para os Sistemas da
Além de ser um fator de reprodução de Defesa Nacional. Relaciona-se primordialmente à Expres-
são Científica e Tecnológica do Poder Nacional.
relações assimétricas, afirma-se até mesmo que
Eixo da Indústria – contempla as capacidades inova-
a soberania nacional possa estar comprometida doras e características industriais próprias para satisfação
pela dependência científica e tecnológica. das especificações e dos requisitos estabelecidos para os
Sistemas da Defesa Nacional. Relaciona-se primordial-
Assim, os correlatos temas Soberania, Defesa e C,T&I mente às Expressões Econômica e Psicossocial do Poder
devem pautar a agenda brasileira no seu aspecto mais am- Nacional 10.
plo8, independentemente da concepção político-partidária No cenário internacional, a implantação de políticas
36
reinante, de forma que o Estado e a sociedade possam estar assim entrelaçadas é, inclusive, destacada e recomendada
devidamente preparados para responder a qualquer ambi- pela Organização para Cooperação Econômica e Desen-
ção externa (porque não dizer, autêntica e genuína cobiça) volvimento (OCDE) através do denominado “Manual de
por parte dos mais variados protagonistas internacionais, OSLO, Proposta de Diretrizes para Coleta e Interpreta-
que, sob argumentos de toda a sorte, tencionem atentar ção de Dados sobre Inovação Tecnológica”11, 2ª ed., pg
contra a integridade e/ou legítimos interesses nacionais. 17: Apenas recentemente surgiram políticas de inovação
Diante desse preocupante cenário, parece-nos que o como um amálgama de políticas de ciência e tecnologia
Poder Público definitivamente atentou para a dimensão do e política industrial. Seu surgimento sinaliza um crescen-
problema e de suas consequências para a Defesa Nacio- te reconhecimento de que o conhecimento, em todas as
nal, assunto que tem provocado inquietações nos diversos suas formas, desempenha um papel crucial no progresso
atores nacionais envolvidos, o que, com certo conforto, de- econômico, que a inovação está no âmago dessa ‘eco-
monstra a atual importância dedicada aos temas (Sobera- nomia baseada no conhecimento’, que a inovação é um
nia, Defesa e C, T&I). fenômeno muito mais complexo e sistêmico do que se
Analisando o arcabouço jurídico pátrio, detectamos evi- imaginava anteriormente. (Grifos nossos)
dências de que o Estado brasileiro realmente atingiu tal per- No plano doméstico, essa articulação entre políticas
cepção, passando, então, a concentrar esforços no sentido correlatas também encontra previsão nas Diretrizes da Polí-
de criar condições favoráveis ao desenvolvimento da C,T&I tica Industrial Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE),
de um modo geral, o que, obviamente, envolve a chamada segundo a qual a nova dinâmica realça a importância da
“C, T&I de interesse da Defesa Nacional”9. inovação como um elemento-chave para o crescimento da
É certo, porém, que, por conta da extensão do hiato, competitividade industrial 12.
muitas eram, e ainda são, as ações a serem concretizadas. Portanto, a implementação de um sistema legal com o
A magnitude do problema demanda uma atuação ampla e objetivo de criar condições necessárias para que o espírito
conjunta, envolvendo, na esfera Executiva, diversas Pastas científico/inovador pudesse florescer no setor produtivo na-
Ministeriais. Os Ministérios da Defesa e da Ciência e Tecno- cional era, por assim dizer, uma verdadeira tarefa estatal,
logia, por exemplo, devem caminhar de braços dados, uma conforme previsto nos artigos 218 e 219 da Carta Consti-
vez que o progresso na área de C,T&I é imprescindível para tucional13.
o campo da Defesa. Diante desse panorama prioritário, era mesmo incon-
Malgrado esse inegável diagnóstico, qual seja, de que cebível que o país não tivesse, até os idos de 2004, um
o desenvolvimento da C,T&I é absolutamente importante arcabouço legal verdadeiramente voltado para promover
para o futuro do País e, por via direta, para a manutenção esse ambiente articulado. Nesse contexto, de acordo com a
da soberania nacional, carecia o Brasil de uma política pú- Exposição de Motivos Interministerial14 n. 28, de 2004, um

Revista CEJ, Brasília, Ano XIV, n. 50, p. 34-39, jul./set. 2010


passo relevante para a consecução vidamente conjugada com outras po- sição, discussões, emendas, relatórios)
das metas na área de ciência e tecno- líticas, era prioridade absoluta, o que percorridas por um projeto de lei é
logia é a formulação de sistema legal, se deu com a edição da Lei de Inova- fundamental para a compreensão do
cujo conteúdo possa dinamizar a rela- ção Tecnológica, a qual dispõe sobre texto jurídico.
ção entre universidades, institutos de incentivos à inovação e à pesquisa Assim, para Miguel Reale (2002, p.
pesquisa e o setor produtivo nacional. científica e tecnológica no ambiente 284), é indispensável estudar as fon-
A perspectiva de se formular um produtivo, e dá outras providências. tes inspiradoras da emanação da lei
sistema legal que dinamizasse os se- Durante os trabalhos legislativos para ver quais as intenções do legis-
tores envolvidos com a C, T&I era realizados no Parlamento Federal, lador, mas também a fim de ajustá-la
realmente pertinente, uma vez que a como era de se esperar, a problemá- às situações supervenientes.
importância do conhecimento como tica relativa à dependência tecnológica Tal entendimento do saudoso Re-
viés de promoção do desenvolvimento do País (e sua correlação com o tema ale é corroborado por Sílvio de Salvo
passou a ostentar contornos até então Soberania Nacional) veio à tona nos Venosa (2006, p. 176-177), segundo
inimagináveis. debates promovidos acerca do PL n. o qual, sob o prisma histórico, o exe-
Em virtude das transformações 3.476/04. geta deve, pois, analisar os trabalhos
operadas ao longo das últimas déca- Para demonstrar o que ora se preparatórios da lei, os anteprojetos
das, o conhecimento passou a assumir afirma, confira-se o seguinte trecho e projetos, as emendas, as discussões
posição central no processo de produ- das notas taquigráficas concernentes parlamentares, a fim de ter um qua-
ção, sendo certo afirmar que a ciên- a umas das audiências públicas re- dro claro das condições nas quais a
cia e a tecnologia estão no coração alizadas na Câmara dos Deputados, lei foi editada.
do processo produtivo de fronteira ocasião em que o Relator do PL n. Portanto, interpretando-se os do-
no mundo, conforme registrou Luís 3.476/04, Deputado Federal Zaratti- cumentos e dados históricos obtidos
Manuel Fernandes, então Secretário- ni, asseverou18: As contribuições dos (mensagem presidencial, exposição
Executivo do Ministério da Ciência e demais depoentes foram igualmente interministerial que acompanhou o
Tecnologia, quando de sua explana- importantes. Contudo, a análise fei- PL n. 3.476/04, notas taquigráficas
ção acerca do PL n. 3.476/04, o qual ta pelo Secretário Luís Fernandes foi pertinentes às audiências públicas
redundou na Lei n. 10.973, de 2 de mais apropriada à luta que, como na- realizadas no Congresso Nacional), é
dezembro de 2004 – Lei de Inovação ção, devemos ter. Ou seja, um projeto possível chegar à primeira conclusão: 37
Tecnológica. nacional com uma base tecnológica a problemática decorrente da nossa
Para Luís Manuel Fernandes, a nacional, senão vamos ficar eterna- dependência tecnológica (e sua corre-
dependência tecnológica se transfor- mente dependentes da ciência e da lação com o tema soberania nacional)
mou num dos principais instrumentos tecnologia das multinacionais. As- inspirou os trabalhos legislativos reali-
de geração e preservação de assime- sim, de fato, a nossa soberania vai zados por ocasião da tramitação do PL
trias no sistema internacional15. estar comprometida e dificilmente n. 3.476/04.
Além de ser um fator de reprodu- alcançaremos o estágio de nação Outrossim, é possível afirmar,
ção de relações assimétricas, afirma-se independente e soberana. Sem re- ainda, que a mesma problemática
até mesmo que a soberania nacional solver esse problema, dificilmente inspirou também a implementação da
possa estar comprometida pela depen- construiremos um país socialmente denominada “Estratégia Nacional de
dência científica e tecnológica. Nessa justo, porque a questão nacional vem Defesa”19, aprovada pelo Decreto n.
linha de raciocínio, o Livro Verde16, sempre antes da questão social. Sem 6.703, de 18 de dezembro de 2008,
publicação do Ministério da Ciência resolvermos a questão nacional, difi- cujo lançamento, de acordo o pro-
e Tecnologia, aponta que: O conheci- cilmente resolveremos a questão so- nunciamento20 do Ministro da Defesa
mento tornou-se, hoje mais do que no cial no País. (Grifos nossos) Nelson Jobim, marca uma nova eta-
passado, um dos principais fatores de Da leitura do trecho em destaque pa no tratamento de tema tão rele-
superação de desigualdades, de agre- é possível depreender que a questão vante, intrinsecamente associado ao
gação de valor, criação de emprego relativa à soberania nacional realmen- desenvolvimento nacional e reafirma
qualificado e de propagação do bem- te inspirou os debates parlamentares o compromisso de todos os cidadãos
estar. A nova situação tem reflexos no então promovidos, dado histórico que brasileiros, civis e militares, com os
sistema econômico e político. A sobe- permite interpretar e compreender a valores maiores da soberania, da in-
rania e a autonomia dos países pas- Lei de Inovação Tecnológica como ins- tegridade do patrimônio e do territó-
sam mundialmente por uma nova trumento de suma importância para a rio e da unidade nacional.
leitura, e sua manutenção – que é manutenção desse elemento constitu- A propósito, um dos eixos estru-
essencial – depende nitidamente do tivo do conceito de Estado. turantes da Estratégia Nacional de
conhecimento, da educação e do A propósito, acerca da denomi- Defesa é a reorganização da indús-
desenvolvimento científico e tecno- nada “interpretação histórica”, ora tria nacional de material de defesa21,
lógico17. (Grifos nossos). empregada, afirma a doutrina que a objetivando, assim, assegurar o aten-
Evidente, então, que o estabeleci- análise do cenário anterior à edição de dimento das demandas das Forças
mento de uma política de C, T&I, de- uma lei, bem como das fases (propo- Armadas, apoiado em tecnologia sob

Revista CEJ, Brasília, Ano XIV, n. 50, p. 34-39, jul./set. 2010


domínio nacional. variável do poder perceptível (em senti- micos resultantes da produtividade de seu
do mais genérico) ou da força efetiva (em trabalho.
Com efeito, chega-se, então, à um sentido mais específico) de um Estado, § 5º – É facultado aos Estados e ao Distrito
segunda conclusão: os contornos permitindo não só a garantia do reconhe- Federal vincular parcela de sua receita orça-
da Estratégia Nacional de Defesa, cimento de sua soberania, mas, acima de mentária a entidades públicas de fomento
tudo, garantindo a sua própria inserção na ao ensino e à pesquisa científica e tecnoló-
coerentemente, encontram-se em
comunidade internacional. gica.
perfeita sintonia com o que dispõe a 7 De acordo com o art. 142, caput, da Carta da Art. 219. O mercado interno integra o patrimô-
Lei de Inovação Tecnológica, motivo República, As Forças Armadas, constituídas nio nacional e será incentivado de modo a
pelo qual sua edição, como verda- pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáu- viabilizar o desenvolvimento cultural e so-
tica, são instituições nacionais permanen- cioeconômico, o bem-estar da população e
deiro marco, configura importante tes e regulares, organizadas com base na a autonomia tecnológica do País, nos termos
passo para a recuperação da indús- hierarquia e na disciplina, sob a autorida- de lei federal.
tria nacional de Defesa, seja pelo de suprema do Presidente da República, e 14 O referido documento, que acompanhou a
destinam-se à defesa da Pátria, à garantia Mensagem Presidencial enviada ao Parla-
suprimento da demanda das Forças dos poderes constitucionais e, por iniciativa mento acerca do Projeto de Lei de Inovação
Armadas quanto a equipamentos de de qualquer destes, da lei e da ordem. Tecnológica (PL n. 3.476/04), foi elaborado
altíssimo valor agregado, seja pela 8 Em relação a tal amplitude, e a fim de sinto- pelos Ministros da Ciência e Tecnologia, do
nizar as diversas políticas envolvidas com a Desenvolvimento, Indústria e Comércio Ex-
ampliação da expressão militar do temática, não por acaso o art. 2º do Decre- terior, da Fazenda e Chefe da Casa Civil.
Poder Nacional, possibilitando, em to n. 5.484/05 determina que os órgãos e 15 Ver nota taquigráfica n. 0873/04, de
última análise, a manutenção da so- entidades da administração pública federal 16/06/04, Comissão Especial – PL 3.476/04
deverão considerar, em seus planejamen- – Lei das Inovações Tecnológicas, disponível
berania do Estado brasileiro. tos, ações que concorram para fortalecer a em http://www2.camara.gov.br/comissoes/
Defesa Nacional. temporarias/especial/encerradas/pl3476/
9 De acordo com o Ministério da Defesa, são ctramit.html, acessado em 02/10/09, às
exemplos de tecnologia de interesse da de- 15h40, p. 21 e 22. Cabe registrar que Luis
NOTAS
fesa nacional: reatores nucleares, sistemas Manuel Fernandes, na condição de Secre-
1 Convém registrar, desde logo, que o Esta-
espaciais, microeletrônica, sistemas de in- tário-Executivo do Ministério da Ciência e
do se constitui da soma de três elementos
formação, radares de alta sensibilidade, am- Tecnologia, presidiu o grupo que elaborou
básicos, ou seja, povo (elemento humano),
biente de sistemas de armas, materiais de a versão final do Projeto da Lei de Inovação
território fixo (elemento físico ou geográfi-
alta densidade energética, hipervelocidade, Tecnológica.
co) e soberania (elemento abstrato), sendo
navegação automática de precisão, inteli- 16 De acordo com o site do Ministério da Ciên-
certo que, de forma simples, o Estado repre-
gência de máquinas e robótica, materiais e cia e Tecnologia, o Livro Verde foi publicado
senta a Nação dotada de uma Constituição,
processos em biotecnologia, defesa quími- em 2000 e aponta uma proposta inicial de
ou seja, de uma organização político-jurídica
ca, biológica e nuclear (QBN), fontes reno- ações concretas, composta de planejamen-
fundamental, em que é estabelecido o direi-
38 váveis de energia. Para uma consulta mais to, orçamento, execução e acompanhamen-
to interno em sua dimensão ampla.
aprofundada, ver o site: http: www.defesa. to específicos do Programa Sociedade da
2 A íntegra do texto pode ser obtida em http:
gov.br, acessado em 16/10/09, às 15h20. Informação.
www.defesa.gov.br, acessado em 25/09/09,
10 Fonte: Ministério da Defesa. Ver o site: http: 17 Ver Sociedade da informação no Brasil, Li-
às 11h10.
www.defesa.gov.br, acessado em 16/10/09, vro Verde, organizado por Tadao Takahashi,
3 Logo na parte introdutória da Política de
às 15h20. Brasília, Ministério da Ciência e Tecnologia,
Defesa Nacional (PDN), o Decreto n. 5.484,
11 O Manual de Oslo é a principal fonte inter- 2000, p. 5, disponível no site: http://www.
de 30 de junho de 2005, estabelece que:
nacional de diretrizes para coleta e uso de mct.gov.br/index.php/content/view/18878.
Após um longo período sem que o Brasil
dados sobre atividades inovadoras da indús- html, acessado em 12/10/09, às 22h30.
participe de conflitos que afetem direta-
tria e se encontra disponível no site: http: 18 Nota taquigráfica n. 0873/04, de 16/06/04,
mente o território nacional, a percepção
www.mct.gov.br, acessado em 13/10/09, às Comissão Especial – PL 3.476/04 – Lei das
das ameaças está desvanecida para muitos
20h. Inovações Tecnológicas, disponível em
brasileiros. Porém, é imprudente imaginar
12 Diretrizes de PITCE, 2003, pg. 4, dispo- http://www2.camara.gov.br/comissoes/tem-
que um país com o potencial do Brasil não
nível em: http://www.camara-e.net/_ porarias/especial/encerradas/pl3476/ctra-
tenha disputas ou antagonismos ao buscar
upload/20031126Diretrizes.pdf. Acesso em mit.html, acessado em 02/10/09, às 15h40,
alcançar seus legítimos interesses. Um dos
21/09/09, às 22h. p. 47.
propósitos da Política de Defesa Nacional
13 Art. 218. O Estado promoverá e incentivará 19 A íntegra do Decreto n. 6.703, de 18 de de-
é conscientizar todos os segmentos da so-
o desenvolvimento científico, a pesquisa e a zembro de 2008, pode ser obtida em: http:
ciedade brasileira de que a defesa da Na-
capacitação tecnológicas. www.planalto.gov.br.
ção é um dever de todos os brasileiros. O
§ 1º – A pesquisa científica básica recebe- 20 A íntegra do pronunciamento, proferido em
texto completo encontra-se disponível em
rá tratamento prioritário do Estado, tendo 14 de abril de 2009, quando da Cerimônia
http: www.planalto.gov.br, acessado em
em vista o bem público e o progresso das de Abertura do LAAD, pode ser obtida em
25/09/09, às 13h50.
ciências. http://www.defesa.gov.br/imprensa/index.
4 Prevê o Decreto n. 5.484/05 que as políticas
§ 2º – A pesquisa tecnológica voltar-se-á php?page=pronunciamento_discursos.
e ações definidas pelos diversos setores do
preponderantemente para a solução dos Acesso em 25/09/09, às 12h10.
Estado brasileiro deverão contribuir para a
problemas brasileiros e para o desenvolvi- 21 Cumpre registrar, outrossim, que acelerar
consecução dos objetivos da Defesa Nacio-
mento do sistema produtivo nacional e re- o processo de reaparelhamento das Forças
nal, e uma das diretrizes estratégicas para
gional. Armadas, com atenção especial aos progra-
alcançá-los é estimular a pesquisa científica,
§ 3º – O Estado apoiará a formação de re- mas estratégicos, e reconstruir a indústria
o desenvolvimento tecnológico e a capaci-
cursos humanos nas áreas de ciência, pes- bélica nacional são dois dos compromissos
dade de produção de materiais e serviços
quisa e tecnologia, e concederá aos que de- assumidos pelo então candidato à reeleição
de interesse para a defesa.
las se ocupem meios e condições especiais no pleito de 2006. Ver pg. 26 do Plano de
5 Nos termos do Decreto n. 5.484/05, Defesa
de trabalho. Governo Lula, disponível em: http://www.
Nacional é o conjunto de medidas e ações
§ 4º – A lei apoiará e estimulará as empre- pt.org.br. Acesso em 13/10/09, às 20h30.
do Estado, com ênfase na expressão militar,
sas que invistam em pesquisa, criação de
para a defesa do território, da soberania e
tecnologia adequada ao País, formação e
dos interesses nacionais contra ameaças
aperfeiçoamento de seus recursos humanos
preponderantemente externas, potenciais
e que pratiquem sistemas de remuneração REFERÊNCIAS
ou manifestas.
que assegurem ao empregado, desvinculada REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 26.
6 O poderio bélico representa uma especial
do salário, participação nos ganhos econô- ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

Revista CEJ, Brasília, Ano XIV, n. 50, p. 34-39, jul./set. 2010


VENOSA, Sílvio de Salvo. Introdução ao estudo do
direito: primeiras linhas. 2. ed. São Paulo: Atlas,
2006.

Artigo recebido em 21/5/2010.


Artigo aprovado em 7/6/2010.

39

Reis Friede é desembargador federal do


TRF 2ª Região e professor do Centro Uni-
versitário Augusto Motta, no Rio de Janeiro.
André Carlos da Silva é delegado de Po-
lícia Civil e professor do Centro Universi-
tário Augusto Motta, no Rio de Janeiro.

Revista CEJ, Brasília, Ano XIV, n. 50, p. 34-39, jul./set. 2010

Você também pode gostar