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Luciana Borre Nunes

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As Imagens que Invadem
as Salas de Aula
LUCIANA BORRE NUNES

As Imagens que Invadem


as Salas de Aula
Reflexões sobre Cultura Vi sual

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;CORTESIA
IOEiAS & LETRAS

Exemplar de o :vutgaçào
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DIRETOR EDITORIAL : COPIDESQU~:

Marcelo C. Araújo Eliana Maria Barreto Ferreira

R EVISÃO:
EDITORES:
Avelino Grassi Ana Lúcia de Castro Leite
Brun a M arzullo
Márcio F. dos Anjos
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Dados Internacio nais de Catalogaç ão na Publicaçã o (CIP)


(Cãmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Nunes, Luciana Borre


Luciana
As imagens que invadem as salas de au la: refl exões sobre cultura visual/
Borre Nunes. - Aparecida, SP: Idéias ft Letras, 2010.

Bibliografia .
ISBN 978- 85- 7698-061- 2

A meus pais que, como exemp los de trabalh o, virtude e


5. Percepção
1. Arte na educação 2. Cultura 3. Estudos culturais 4. Identidade social
- Direção 9.
visual 6. Relações de gênero 7. Representações sociais 8. Sala de aula
Sociologia educacion al 1. Titulo. perseverança, deixar am as marca s mais profun das
09-12779 CDD- 370. 19 de minha vida.
Índices para catalogo sistemátic o: Ao Institu to de Educação São Francisco,
1. Cultura visual no ambiente escolar:
os ensina mento s e oportu nidade s.
Sociologia educaciona l : Educação 370.19
Sumári o

Apresentação .......................................................................... .............................. 9

Palavras Iniciais ................................................................................................. 11

1. Primeiras marcas .................................................................... ........... 17


Pensar as imagens através dos Est udos Cu ltu rais ............................ 17
Desestabil izando metanarrativas educacion ais................................. 26
Imagens e processos d iscu rsivos na prod ução de ident idades ... 33

2. A Cultura Visual nas escolas ........................................................ 43


A Cult u ra Visua l constitu indo ol hares ..................................... .............. 48

3. A Cultura Visual produzindo gênero ......................................... 55


Olhares de investigação............................................................................... 60
"M eni nas são mais doces!": atribuição
de comporta m entos f emini nos ......................................................... 70
"Eu j á sei o que vou comprar!" : desej os de consumo ..................... 91
"Eu queria ser igua l a elas!" : a busca pela beleza .......................... 106

4. Trocando experiências de sala de aula ................................. 123


Desafio dos Sorrisos ..................................... .............................................. 123
Os Girassóis ..................................................................................................... 128
Apresentaç ão
A bela Tarsila: refletindo sobre padrões de beleza .......................... 133
Um flash na natureza ................................................................................. 141
Minha camiseta ............................................................................................ 153
A vida pintada no muro ........................................................ .................... 159
lberê Tristonho .............................................................................................. 164

Palavras Finais ................................................................................................. 173

Referências Bibliográficas ......................................................................... 177 xistem inúmeros trabalhos que buscam pes-
quisar, conhecer e mostrar as características
da infância contemporânea, q uais aspectos
interferem n a su a constituição e como ela
vem sendo concebida, bem como seu desenvolvimento. A
instituição escolar, um d os cenários de construção d a cultura,
permeia parte da socialização infantil. Sabemos que essa cons-
trução era constituída num sentido de mão única, de forma
que a criança apenas reproduzia o que já estava instaurado.
Hoje, considera- se que as crianças também produzem
cultura mediante suas interações, suas vivências, suas rela-
ções nos espaços de convivência. P ort anto, é emergente criar
espaços educativos que possibilitem às crianças adquirirem
cultura através de suas interrelações.
Nessa perspectiva, Luciana B orre Nunes nos presen-
teia com o livro "As Imagen s que Invadem as Salas de Aula:
Reflexões sobre Cultura Visual", o qual teve sua origem
na Dissertação de Mestrado, apresent ada no Programa de
Pós-graduação da PUCRS, para obter o título de Mestre
cm Educação, processo que tive a felicidade d e orient ar.
A autora teve a originalidade de abordar a temática
da cultura visual no ambien te escolar, destacando a contri-
~~~~~~~~~~~-A_s_Im~_a_ge_n_s~q_u_e_l_n_v_a_d_e_m~a_s_S_a_la_s_d_e~A_u_l_a

buição das imagens na composição dos olhares sociais e da Palavras Iniciais


produção de subjetividades nos sujeitos envolvidos. Essas
imagens contribuem para a composição dos olhares sociais,
através dos quais percebemos as diversas identidades e re-
presentações socioculturais.
Ao longo de sua construção, Luciana realiza constan-
tes indagações provocadas por suas vivências como educa-
dora, preocupada com a formação dos seus alunos. Ao final,
numa visão prospectiva, apresenta interessantes propostas
didático-pedagógicas, que revelam como trabalhar com iversas instâncias de minha vida contri-
alunos no ensino fundamental em artes visuais, a partir do
próprio referencial exposto e contribuindo para uma prática
que utilize elementos importantes da cultura visual infantil.
Pensar a prática pedagógica e o papel da escola na for-
mação de nossas crianças nos leva a crer o quão necessário é
D buíram, significativamente, para que hoje
minhas reflexões e práticas na área da edu-
cação estejam voltadas ao ensino e à apren-
d izagem das artes visuais nas escolas. Meu âmbito familiar
e a instituição escolar na qual estive inserida alicerçaram
trabalhar temáticas relacionadas a valores e costumes, além importantes construções em minha subjetividade, como al-
de inserir aspectos da subjetividade, que promovem uma in- guém supostamente portadora de dons artísticos e com uma
ter-relação saudável na sala de aula. Todos esses aspectos são "criatividade inata". Penso que talvez tenha sido produzida,
fundamentais para serem trabalhados em contextos educa- descoberta ou pelo menos instigada uma identidade artísti-
tivos. Como exemplo, as atividades que envolvam a questão ca que atualmente permeia minhas atividades reflexivas de
do sorriso em nossa cultura e a importância que uma discus- pesquisa e profissionais, motivando-me a investigar e abor-
são acerca desse tema traz para as pessoas constituírem sua dar um assunto relacionado à Arte/Educação.
subjetividade e serem pessoas mais reflexivas. Essa possibi- Durante o curso de Pedagog ia, no nível de graduação,
lidade no meio educativo enaltece a seriedade e rigorosidade vivenciei os primeiros contatos na área dos Estudos Cul-
do trabalho aqui apresentado por Luciana Borre Nunes. turais em Educação alicerçados pelas concepções pós-es-
Para concluir, considero que esta obra pode servir de tru turalistas. Desde então, esse caminho reflexivo tem me
subsídio relevante à prática educacional, bem como promo- envolvido de maneira singular, sendo inspiração para meus
ver novas pesquisas e trabalhos que representem avanços no estudos, meus escritos, e para indagações referentes à escola.
contexto brasileiro educacional. Esse campo de fértil pensamento provoca-me a deter novos
e distintos olhares sobre a produção de subjetividades dos
Ora. Bettina Steren dos Santos sujeitos envolvidos no processo escolar.

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~~~~~~~~~~~~A_s~•an~a~g_e_n_s_q~u_e~ln_v_a_d_e_an~ª-s~S_a_la_s_d~e_A_u_l_a Palavras Iniciais
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Por esse motivo, o trabalho que desenvolvo com crian- Além disso, as instituições escolares enfrentam difi-
ças de Séries Iniciais do Ensino Fundamental está repleto de culdades para atender a demanda de uma geração que está
constantes indagações, pois me sinto provocada ao dar-me imersa numa cultura visual dinâmica, rápida e marcada pelos
conta de que também estou contribuindo para a constituição avanços tecnológicos. As crianças e os jovens da contempo-
de diversas identidades. raneidade estão diante de novas maneiras de agir e de pensar
Uma das problematizações que surge nesse contexto socialmente. Vivenciam a força do m ercado de consumo, as
está relacionada à realização de atividades artísticas em sala relações sociais contemporâneas e os constantes investimen-
de aula, pois visualizo um grande envolvimento dos estu- tos midiáticos. Com isso, estabelecem relacionamentos dife-
dantes e o relato de aprendizagens (articuladas com outras renciados de outros tempos históricos com as instituições es-
áreas do conhecimento), e de experiências pessoais que ul- colares, porque seu contexto social exige maior dinamicidade
trapassam os limites físicos da escola. Muitas falas das crian- e conhecimento no manejo das ferramentas tecnológicas e
ças relacionam suas experiências estéticas e as habilidades maior reflexão sobre as diferenças no convívio social.
artísticas a "dons" que, geralmente, são característicos das Cotidianamente, os estudantes evidenciam que suas
des trezas manuais femininas. Diversos relatos, que atribuem identidades também são construídas por um imenso reper-
às meninas a agilidade com trabalhos de cunho manual, ins- tório de imagens. A escola é invadida por mochilas, cader-
tigam reflexões para uma tentativa de compreensão sobre a nos e outros materiais escolares decorados pelas imagens dos
origem de tais concepções e como essas ilustram as repre- personagens preferidos das crianças (que muitas vezes não
sentações de ser menina na atualidade. Junto a isso, também permanecem nessa preferência por mais de três semanas).
há uma significativa "invasão" de imagens nas salas de aula Essas vivem numa sociedade de consumo, onde as imagens
que marcam, por exemplo, a distinção entre brinquedos e contribuem significativamente para compor o desejo de
personagens dos meninos e das meninas. compra de produtos destinados ao público infantil femini-
Outra inquietação diz respeito à ausência de discus- no e masculino. Assim, as salas de aula tornam- se cenários
sões sobre uma cultura visual no ambiente escolar, embora pertinentes a um estudo relacionado à Cultura Visual.
seja rotineiro encontrá-la, não somente em meio aos estu- Diante disso, ainda não presenciamos a discussão so-
dantes, mas em todas as instâncias da vida. E stamos sub- bre tais evidências entre os profissionais da educação nas
mersos em uma sociedade imagética, onde somos constan- escolas. As práticas escolares adotadas em outros perío-
temente produzidos por imagens. As imagens contribuem dos histórico-sociais já não atendem às necessidades que o
para a composição dos olhares sociais e através delas perce- nosso tempo exige. A escola parece ainda querer manter as
bemos as diversas identidades e representações. Produzimos m esmas concepções de ensino que já não correspondem às
e interagimos com imagens que expressam aquilo que pen- transformações que o âmbito social apresenta. Hernández
samos sobre as coisas. (2007, p. 38) sugere que a escola deve rever su as práticas

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educativas para adaptar-se às necessidades dos educandos e campos sociais. Entre essas, encontram-se as artes visuais da
que " ... todas as concepções e práticas pedagógicas podem contemporaneidade, que através da Cultura Visual, buscam
e devem ser questionadas. [ ... ] A partir daí é que surge a desestabilizar nossos sentidos e provocar diferentes leituras
necessidade de colocar em questionamento as práticas de e interpretações. A Cultura Visual contemporânea utiliza as
naturalização que hoje circulam e se mantêm como dogmas novas ferramentas tecnológicas, como a fotografia digital e
na educação". a informatização, para promover olhares diferenciados sobre
Vivenciamos a facilidade de acesso a um grande nú- as temáticas do cotidiano.
mero de informações que são múltiplas e incertas, e isso Relato tudo isso na tentativa de justificar minhas mo-
modifica as relações entre o sujeito e o conhecimento. Essa tivações pessoais para o desenvolvimento deste livro, que ca-
realidade reconfigura o processo de ensino e de aprendiza- minha sobre referenciais ligados à Arte/Educação e Cultura
gem no momento em que já não podemos esperar a centra- Visual e que faz a tentativa de verificar como as imagens
lidade de conhecimentos na escola. Devido a isso, é crescen- estão presentes nas escolas, contribuindo para produzir sub-
te a necessidade daquilo que Pozo (2002) chama de Gestão jetividades.
do Conhecimento, em que a formação dos estudantes deveria
Assim, passo a desenvolver as primeiras marcas deste
estar voltada para sua autonomia (aprendendo a buscar, se-
livro proporcionadas por reflexões acerca dos Estudos Cul-
lecionar e interpretar criticamente as informações) e que, a
turais numa perspectiva pós-estruturalista, acreditando que
partir disso, possam produzir contínuas aprendizagens. O
inúmeras contribuições e questionamentos poderão surgir
mesmo autor (2002, p. 48) afirma que vivemos na sociedade
sobre as práticas educativas adotadas nas escolas e sobre o_:;
do conhecimento e que, por esse motivo, as atribuições das
"novos" estudantes que encontramos nas salas de aula. E
instituições escolares se modificaram:
nesse capítulo que apresento as conceituações sobre consti-
tuição de identidades, representações e subjetividades.
En la sociedad de la información la escuela ya no
es la fu ente primera, y a veces ni siqu iera la principa l, de
Depois, aproprio-me das concepções de arte/educa-
conoci miento para los alumnos en muchos dominios. Son dores, principalmente Fernando Hernández (2000, 2007),
muy pocas ya las primicias informativas qu e se reservan para falar sobre as imagens que "invadem" as salas de aula e
para la escuela.
que, através de uma Cultura Visual, cada vez mais dinâmica, ,
acabam instaurando maneiras de ser e de agir socialmente,
As práticas escolares ainda se mostram defasadas, constituindo nossas representações sobre o mundo.
pois procuram constantemente enquadrar seus educandos Posteriormente, apresento um recorte da minha dis-
em uma única linha de formação, sem articular a sala de
sertação (Meninas são doces e calmas: um estudo de Gênero
aula às problemáticas que estão "em alta" em todos os outros através da Cultura Visual) defendida em dezembro de 2008,
~~~~~~~~~~~-A_s~l1n~a_g_en_s~q_u_e_l_n_v_a_d_e_1n~a_s_S_a_la_s_d~e_A_u_l_a

na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.


Nesse capítulo apresento considerações sobre como as ima-
1. Primeiras Marcas
gens contribuem para a produção de subjetividades femi-
ninas e sobre como as meninas do Ensino Fundamental
manifestam suas representações de feminilidade no âmbito
escolar.
Por fim, apresento o relato de sete projetos de traba-
lhos sobre a Cultura Visual desenvolvidos por mim, com
crianças da Educação Infantil e de Séries Iniciais do Ensi-
no Fundamental. Com isso, busco comprovar que a Cultura
Visual pode ser trabalhada de maneira legítima e significa- s discussões pertinentes neste livro es-
tiva nas salas de aula. t ão sob a luz dos E stud os Culturais em
Educação, enfocadas pelas perspect ivas
pós-estruturalist as, pois acredito que esses
campos possam subsidiar as problematizações propostas e
contribuir para que essas sejam significativas para a área da
Arte/ Educação (que problematiza as imagens em nosso co-
tidiano). Dessa maneira, seguem reflexões acerca da histo-
ricidade dos Estudos Culturais em Educação, dos processos
discursivos que produzem identidades e da possível desesta-
hilidade de metanarrativas educacionais.

Pensar as imagens através dos Estudos Culturais

Os Estudos Culturais apresentam como concepção pri-


rnordial a discussão sobre cultura. Estudam as manifestações
rnlturais de grupos sociais que tiveram, ou ainda têm , por um
longo período de nossa história, suas vozes silenciadas p ela
supremacia de grupos considerados hegemôn icos. Seus auto-
~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula 1. Primeiras Marcas ~
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res enfocam questões referentes à constituição de identidades O conceito de cultura como "tudo de bom" que a so-
inseridas em sistemas de representação. Também tratam das ciedade produziu foi central para a educação moderna até
relações sociais imbricadas pelo poder e dos artefatos e peda- que movimentos de diversos grupos sociais surgiram para
gogias culturais que contribuem para a nossa formação. combatê-la. Por muito tempo acreditou-se que a educa-
ção era o caminho natural para a "conquista" ou "elevação
Historicamente, a escola apresenta em sua prática
cultural" de um povo, favorecendo assim a visão de que era
educativa um enfoque naquilo que acredita ser uma cultura
necessária a busca pelo modelo ideal de cultura civilizada.
superior, mostrando a todos os seus educandos a "verdadei-
Dessa maneira, as discussões dos estudos sobre a cultura
ra cultura" e os padrões que os estudantes deveriam seguir
tornam-se importantes p ara a ressig nificação de uma trad i-
para alcançar o reconhecimento social. A cultura erudita
ção escolar que ainda acredita e trabalha com uma suposta
norteou, durante muito tempo, os trabalhos e os pensamen-
cultura erudita em detrimento da chamada cultura popular.
tos pedagógicos. A escola, como detentora do "verdadeiro"
Veiga-Neto (2003, p. 11) amplia esse aspecto histórico dos
conhecimento, era vigente e desconsiderava possibilidades
Estudos Culturais ao dizer que:
educativas que não atendessem à erudição. Diante disso, os
Estudos Culturais apresentam em sua gênese discussões so-
Fo i só nos anos 20 do sécu lo passado que começaram
bre a cultura, legitimando as expressões culturais até então
as rachadu ras mais sérias no conceito m oderno de cu ltur<i .
marginalizadas. Repudiam concepções binárias que distin- Os pri meiros ataques vieram da antropologia, da linguística
guem alta cultura e baixa cultura, cultura erudita e cultura e da f ilosofia ; e logo parte da sociologia tam bém começou
popular. Costa (2004, p. 23) enfatiza o primordial nos Es- a co locar em questão a epistemo logia monocultu ra/. Mais
recen t emente, a poloticologia e especialmente os Estudos
tudos Culturais:"( ... ) fica evidente que uma quest ão central
Culturais foram particularmente eficien tes no sentido
nos Estudos Culturais são as transformações na concepção de desconstru ir - ou, às vezes, no sen tido até de det onar
de cultura". Eles pretendem deslocar concepções naturali- - o conceito moderno e nos mostrar a produtividade de
zadas e criar espaço para que outros olhares sobre a cultura entendermos que é melhor fa larmos das culturas em vez de
fa larmos em cul t ura.
possam ser legitimados. A mesma autora (2004, p. 13) con-
tribui novamente ao se referir a esse campo de reflexões:
Os Estudos Culturais surgiram em meados do século
Sua celebração mais importante provavelmente seja
XX, período pós-guerra, nos países britânicos, principal-
a de celebrar o fim de um elitismo edificado sob re distin ções 111ente na Inglaterra, com posterior expansão para os EUA,
arbitrárias de cultura. Nest e sentido, os Estudos Cultura is, Austrália e Canadá. O movimento trouxe reviravolta nas
ao operarem um a reversão nesta tendência na t uralizada l·oncepções sobre cultura, pois questionava a centralidade de
de admitir um único ponto ce nt ra l de referência para os
11ma cultura que deveria ser almejada por todos os grupos
estudos da cultura, co nfiguram um movim ento das margens
co ntra o centro. sociais. Costa (2003, p. 36) contribui ao dizer que: "Cultura
~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula 1. Primeiras Marcas ~
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deixa, gradativamente, de ser domínio exclusivo da erudição, como diretor. Hall sucedeu-o em 1969 e p ermaneceu com o
da tradição literária e artística, de padrões estéticos elitiza- diretor por uma d écada". Richard J ohson, seguido por Jorge
dos e passa a contemplar, também, o gosto das multidões". L arrain, sucedeu Hall n a direção do Centro. A institucio-
Partindo da afirmação de Silva (1999, p. 115): "O cur- nalização dos Estudos Culturais foi determinante para sua
rículo existente está baseado numa separação rígida entre significativa expansão. O s projetos d esse Centro incluíam a
'alta' cultura e 'baixa' cultura, entre o conhecimento científico p ublicação d e uma revista e de diversos livros, e a promo-
e conhecimento cotidiano", po de-se dizer que o binarismo ção de cursos. Inicialmente, as discussões giravam em torno
que distingue alta cultura e b aixa cultura, cultura erudita e das temáticas sobre o racismo e a hegemonia cultural. No
cultura popular passa a não ser tão natural n os m eios sociais, entanto, o movimento feminista logo fez com que os Estu-
principalmente n as instituições perpassadas pelos Estudos dos Culturais rep ensassem sob re n oções de su bjetividades,
Culturais. política, gênero e posteriormente raça, etnia e pós-colonia-
lism o.
A principal atribuição dos Estudos Culturais talvez
esteja na reflexão ou desmistificação de uma tendência natu- Os principais autores e obras "fundadoras" foram:
ralizada de admitir um único referencial para os estudos da Rich ard R oggart com 7he use ef literacy (1 957), Richard
cultura. Por isso, inúmeros grupos sociais, como os neg ros, Johnson, R aymond Willians com Culture and Society (1958),
as mulheres e a classe operária iniciaram discu ssões sobre Edward Thompson com 7he making efthe English Working-
suas atribuições na sociedade. Eles p assar am a não aceitar o class (1963) e Stuart Hall (COSTA, 2004). Todos eles são
domínio de uma classe considerada superior e uma supos- oriundos d e classes operárias e foram u n s dos primeiros es-
t a submissão. Através de reivindicações, questionamentos e tudantes a ing ressarem em instituições d a elite universit ária
atos públicos esses grupos trouxeram para a discussão social britânica, conforme relata Costa (2004, p . 18) :
as suas expressões, seu modo de viver e de agir.
As obras conside radas pioneiras nos Estudos
A institucionalização dos Estudos Culturais aconte-
Cu lturais contemporâneos foram produzidas por autores
ceu em 1964, na Universidade de Birming h am, na Ing later- proven ientes de famíl ias de classe operária, e que est iveram
ra. Seu primeiro diretor foi Richard H oggart que, oriundo entre os primeiros estudantes desse segmento, cujo acesso
d a classe operária inglesa (histórico pouco comum para a às instituições de elite da educação universitária britânica
foi possibi litado pelo pau latino processo de democra t ização.
época), buscou introduzir discussões sobre a chamada baixa
Surgidos no período pós-guerra, esses estudos fa lava m
cultura na universidade. de um lugar diferen te daquele ocupado pelos autores da
Nelson (1995, p. 23) expõe que: "O momento ins- t rad ição levisista, ou sej a, ana lisavam a cu ltura popu lar
como integra ntes dela e não como quem a olha a distância,
titucional crucial é a fundação do Centre for Contempora-
ca utelosamente, sem qua lquer pon t o de contato.
ry Cultural Studies at B irmingham, em 1964, com Hoggart

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~~-----------A_s_1ana_~g_e_n_s_q~u_e_ln_v_a_d_e_111_a_s_S_a_1a_s_d_e_A_u~la 1. Printeiras Marcas ~
--------~

Os Estudos Culturais expandiram-se de maneira sig- Culturais queriam falar sobre aqueles que, supostamente,
nificativa e diversos países apropriaram-se de suas concep- ainda deveriam adequar-se à cultura hegemônica para obter
ções, atribuindo diversas versões nacionais, como é o caso legitimação.
dos Estudos Culturais Latinos. Mesmo dentro dessas ver-
Os Estudos Culturais acolhem os infames, ou seja,
sões, eles se subdividiram em perspectivas teóricas e influên-
aqueles que não têm fama, a cultura da massa, os que pre-
cias, como o feminismo (SILVA, 1999).
cisam adaptar-se para ganhar voz, os que têm suas expres-
A autora Schulman (2006, p. 202) apresenta impor- sões culturais negadas e silenciadas durante a história. Mas
tante contribuição ao mostrar alguns pontos referentes ao quem são esses? Qpem representa a cultura de massa? Para
início das reflexões dos Estudos Culturais em uma institui- cada contexto social encontraremos grupos diferentes e es-
ção acadêmica e ao visualizar sua significativa expansão: ses percebem nos Estudos Culturais uma oportunidade para
que suas vozes sejam escutadas. Tais grupos buscam muito
Os Estudos Culturais de Birmingh am, como vimos, mais do que o respeito para com sua cultura, procuram a
estava m pensados para preencher um vazio intelectual
legitimação, a valorização perante outras culturas e a visi-
(e po lítico) num a sociedade altamente estratifi cada, cujo
sistema de ensino superior estava construido de acordo bilidade.
com as linhas disciplinares trad icionais. [. ..] De fato, desde No Brasil, as discussões propostas pelos Estudos Cul-
o inicio dos anos 60, os Estudos Culturais tornaram-se
turais em Educação foram trazidas através de traduções rea-
um movimento internaciona l, com revistas, conferências,
associações profissionais, com cursos acadêmicos em mui tas lizadas, principalmente, por Silva (1995 e 1999). As pes-
facu Idades e universidades. quisas nesse campo têm-se desenvolvido sobre temáticas
diversificadas. Entre elas são encontrados assuntos relacio-
As discussões propostas pelos Estudos Culturais cor- nados à etnia e raça, sexualidade, gênero, indígenas, nature-
respondem a um campo de "luta" e de questionamentos in- za, infância, portadores de necessidades especiais, entre ou-
tensos. Procuram, de forma bastante especial, falar sobre as tros. Essas vozes buscam a legitimação de suas expressões e
expressões culturais marginais (aquelas que estão fora das não querem mais serem vistas como inferiores a uma cultura
discussões acadêmicas) e sobre os grupos minoritários com l1cgemônica. Qperem falar de si mesmas e atribuir deno-
representações pouco ou não legitimadas. 111 inações próprias. Através dos Estudos Culturais buscam

Esses estudos assumiram a cultura considerada infe- :rrgumentos para desnaturalizar concepções que defendem
11111a única percepção de verdade e para deslocar significados
rior e de massa. Buscavam as manifestações culturais da-
: 1rraigados.
queles que eram vistos como portadores de expressões não
dignas de serem estudadas anteriormente e, por isso, não No contexto da educação, pretendem refletir sobre
presentes nas reflexões acadêmicas. Sendo assim, os Estudos q11cstões referentes à escola e sobre tudo aquilo que implica
11a constituição dos sujeitos envolvidos. Buscam questionar

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~~~~~~~~~~~~A_s_l_m~ag~en~s_q_u_e_l_n_v_a_d_e_m~a_s~S_a_la_s_d_e~A_u_l_a 1. Primeiras Marcas
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~

as práticas educativas e ressignificá-las através de constantes tinuar abertos a possibilidades inesperadas, inimaginadas ou
análises e problematizações. Percebem que diversas temáti- até mesmo não-solicitadas. Ninguém pode esperar contro-
cas englobam o cotidiano da escola e que, por esse motivo, a lar esses desdobramentos".
seleção que os professores e a equipe diretiva fazem dos as- Os Estudos Culturais problematizam situações usu-
suntos a serem desenvolvidos no ambiente escolar pode ser ais, que estão acontecendo e merecendo discussão. Também
arbitrária se não questionada constantemente. Costa (2003, não pretendem permanecer somente no campo das discus-
p. 56) apresenta importante apreciação sobre a influência sões, mas acreditam que é através dessas que as transforma-
direta dos Estudos Culturais na educação brasileira: ções ocorrerão. Procuram mudanças que sempre podem ser
reconfiguradas. Nelson (1995, p. 17) contribui novamente
Entre nós, no Brasil , as contribuições mais importantes afirmando que: "Os Estudos Culturais acreditam, pois, que
dos Estud os Culturais em Educação parecem ser aque las a prática importa, que se espera, que seu próprio trabalho
que têm possibilitado: a extensão das noções de educação, intelectual possa fazer uma diferença. Mas suas interven-
pedagogia e currículo para além dos muros da escola ; a
desnaturalização dos discursos de teorias e disciplinas
ções não são garantidas; não se esperam que elas durem para
instaladas no aparato esco lar; a visibil idade de dispositivos sempre". Não buscam mudanças bruscas, mas também têm
discipl inares em ação na escola e fora dela; a ampliação e a intenção de interferir no que é comumente aceito como
comp lexifí cação das discussões sob re id entidade e diferença natural, pois no momento em que certa situação é analisada
e sobre processos de subjetivação. Sobretudo, tais análises
t êm chamado a atenção para novos tem as, probl emas e já se criam mecanismos de transformações.
questões qu e passam a ser objeto de discussão no currícu lo No artigo "Pós-marxismo e estudos culturais" a autora
e na pedagogia. Me Robbie (1995) destaca que, em sua origem, os Estudos
Culturais britânicos apropriavam-se de concepções marxis-
Pensar sobre as imagens que estão presentes em nos- tas. No entanto, o constante questionamento ao reducio-
so cotidiano sob a luz dos Estudos Culturais pressupõe um nismo e ao economicismo da superestrutura social fizeram
olhar atento e reflexivo diante de uma Cultura Visual, que com que houvesse uma ruptura aos pensamentos de Marx.
contribui para a formação de nossas representações e que, A mesma autora (1995, p. 42) refere-se a essa ruptura di-
portanto, tem muito a revelar sobre nossos relacionamentos zendo que: "A desconstrução e o movimento de afastamen-
sociais. Os Estudos Culturais compõem um campo reflexi- to das oposições binárias, incluindo a dos inícios e dos finais
vo que não se encontra definido e que acolhe as novas in- absolutos, podem ser vistos aqui como uma abertura para
dagações propostas pela Cultura Visual, pois seus assuntos uma nova forma de conceptualizar o campo político e criar
e temáticas podem mudar de acordo com o contexto social. 11m novo conjunto de métodos para os Estudos Culturais".
Não tem uma definição ou uma narrativa única, como relata A concepção de uma sociedade capitalista, dividida
Nelson (1995, p. 11): "Os Estudos Culturais precisam con- por classes e com tensões entre dominados e dominadores,

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~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula
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já não atendia às necessidades desse campo de reflexão. Des- escola enfrenta na atualidade) sejam alcançadas com agili-
sa maneira, por volta de 1980, muitos autores rompem com dade. Essas concepções causam dificuldades para enfrentar,
o marxismo para contemplare m e se basearem nas perspec- tanto no meio social quanto na vida privada, as intensas e
tivas pós-estrutur alistas através, por exemplo, de Foucault e profundas mudanças culturais, sociais, econômicas e polí-
Derrida (SILVA, 1999). ticas em que estamos mergulhado s. Dessa maneira, todo
Qyestionar, repensar e ressignificar são palavras-cha - aquele pensamento progressista moderno demonstra ser
ve para visualizar o princípio dos Estudos Culturais. Esses distante da realidade, principalme nte no que se refere à área
são, atualmente, perpassados por concepções pós-estrutu- da educação. Silva (1999, p. 112) novamente contribui ao
ralistas que compreende m que os sujeitos são constituídos argumentar sobre alguns pontos relacionados às instituições
no interior de relações sociais imbricadas pelo poder. Dessa escolares:
maneira, o próximo item tem o propósito de elucidar ainda
mais a base teórica dessa obra, evidenciand o o possível mo- Nossas noções de edu cação, ped agog ia e currícu lo
mento histórico no qual transitamos. est ão sol idamente f incadas na Modern ida de e nas ideias ·
modernas. A edu cação, ta l como a con hece mos hoje, é a
institui çã o modern a por excelência. Seu objetivo consiste
em t ransmitir o conheciment o cien t ífico, em forma r um ser
Desestabi lizando metanarra tivas educacion ais hu mano supostamente racional e autônomo e em moldar o
cidad ão e a cidad ã da moderna democraci a represe nt at iva.
É através desse sujeito racional, autônomo e democrát ico
Durante muito tempo (modernidad e), a escola foi qu e se pode chegar ao ideal modern o de uma soci edade
ra cional, prog ressista e democrática. Nesse sentido, o
detentora dos conhecimen tos considerado s "verdadeiros ".
questionament o pós- modernista constit ui um at aq ue à
A ela era atribuída a função de tornar os sujeitos críticos, própria ideia de educação.
autônomos, emancipado s e conscientes, sendo considerada
o caminho para a conquista da harmonia social e libertação Nesse contexto, a Idade Contemporâ nea serve de
do homem. Procurava-s e a igualdade entre as pessoas e a palco para a pós-modern idade. As intensas transformaç õ es
resistência a todas as formas de dominação. A escola embar- que acabariam com as injustiças e com a dicotomia entre
cava como uma das possibilidad es reais de transformaç ão e classes sociais não aconteceram como previa a modernidad e.
ascensão social. Educadores, em geral, sentem-se frustrados por não alcan-
Nossa formação intelectual e profissional aconteceu çarem soluções para problemas recorrentes n as instituições
nesses moldes, porque procuramos e esperamos rápidas e de ensino, como a falta de recursos físicos e humanos. A
grandiosas modificaçõe s sociais. Qyeremos que as respos- escola não foi detentora de mudanças significativa s na vida
tas às nossas inquietações (por exemplo, os problemas que a da população. É nesse ponto que a pós-modern idade entra

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para questionar tudo aquilo que era dito como único e ver- Hernández (2000, p. 122) também contribui ao dizer
dadeiro. Ela problematiza as atribuições da escola na forma- que: "A pós-modernidade constitui-se numa situação social
ção de seus alunos e pensa sobre as grandes verdades sociais na qual a vida econômica, política, de organização e inclu-
inseridas nesse ambiente, as chamadas metanarrativas e mi- sive pessoal se organiza em torno de princípios muito dife-
cronarrativas 1 educacionais. rentes dos da modernidade".
A partir de meados do século XIX foram se acumulan- O pós-moderno, diante de "verdades" como: a edu-
do algumas fraturas no amplo paradigma da modernidade. O cação é a única fonte de tran.iformação social, ou, o aluno não
surgimento de novos estados de pensamento passou-se a de- aprende porque sua família está desestruturada!, propõe-se a
nominar pós-modernidade. Fala-se em tendência, perspectiva duvidar. Pergunta-se: será? Por quê? Qyem disse isso? Por
ou condição pós-moderna devido à multiplicidade de novos que disse?
olhares e novos pensamentos em diversas áreas, como na lite- O pós-modernismo não representa uma oposição ao
ratura, na arte, na arquitetura e no cinema (VEIGA-NETO, moderno, mas tenta reconfigurar a rede social que determi-
1996). Não é um movimento que busca uma linha única de na padrões de comportamento. Avança nas discussões sobre
pensamento, mas que abarca diversos questionamentos sobre o que é concebido como natural e opõe-se aos binarismos
o que era considerado verdade. O pós-modernismo não é o que constituem a modernidade. Ele é simplesmente com-
antimodernismo, ele tenta ir além, transcender o pensamento plexo e resiste a uma explanação redutiva e simplista. Não é
moderno sem querer colocá-lo abaixo. Abandona aspectos da um conceito ou sistema de ideias, nem movimento social ou
modernidade, embora muitos permaneçam. Procura trans- cultural unificado (VEIGA-NETO, 1996). O pós-moder-
formar e desconstruir sem modificar bruscamente. Chama nismo rege atualmente os Estudos Culturais, embora pre-
a atenção para novos elementos de discussão e transita por tenda ser mais amplo. Qyestiona as grandes verdades que
diferentes campos, como a política, a economia, a religião, a constituem nossa sociedade. Problematiza tudo aquilo que
educação, a arte, a literatura. durante muito tempo se acreditou como único e verdadeiro.
Silva (1999, p. 111) afirma que: "O chamado pós-mo- Concepções sociais inquestionáveis são colocadas em dúvi-
dernismo é um movimento intelectual que proclama que da. Duvidar e questionar são ações pertinentes ao pós-mo-
estamos vivendo uma nova época histórica, a Pós-moderni- derno. Veiga-Neto (1996, p. 30) contribui:
dade, radicalmente diferente da anterior, a Modernidade".
Assim, para o pensamen to pós-moderno não há
uma perspectiva privi legiada a parti r da qual possamos ver e
ente nder melhor a nossa rea lidade social , cul t ural , econ ômica,
1
Metanarrativas e micronarrativas referem-se às concepções educacionais
educacional et c. [...] Bem ao contrári o, para o pós-m odern o
tomadas como verdadeiras, únicas e generalizadas. Como exemplo, apresento
o que interessa é problematizar todas as nossas ce rtezas,
uma "verdade" bastante corriqueira nas escolas: dizer que as dificuldades de
aprendizagem de um aluno são originadas pela negligência familiar. todas as nossas decla rações de princípios. Isso não signi f ica

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Primeiras Marcas ~
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que se passe a viver num mundo sem princípios, em que va le -estrutura lismo limita-se a teorizar sobre a linguagem e o
tudo. Isso significa, sim , que tudo aquilo que pensamos sobre processo de signi ficação, o pós-m odern ismo ab range um
nossas ações e tudo aqui lo que fazemos tem de ser contínua campo bem mais extenso de objetos e preocupa ções.
e permanentemente questionado, revisado e criticado.
O pós- estruturalismo incorpora concepções estrutu-
A pós-modernidad e perpassa diversos campos sociais, ralistas ao mesmo tempo em que as transcende. Ambos par-
mas algumas questões específicas à área educacional são i ilham "a mesma ênfase na linguagem como um sistema de

pertinentes: como a pós-modernidad e tem se apresentado significação" (SILVA, 1999, p. 119), embora o pós-estrutu-
nas escolas? Como ela tem sido percebida por educadores e ralismo faça o trabalho de problematizar as estruturas fixas
demais envolvidos no processo educativo escolar? Será que e rígidas concebidas pelo estruturalismo. Chanda (2005, p.
os alunos e as alunas da contemporaneid ade estão eviden- 71) apresenta a arte egípcia como um exemplo do estru-
ciando novas representações sociais? turalismo na área de artes, pois essa manifestação cultural
Avançando nas discussões, passo a trabalhar com um foi marcada por narrativas que determinavam características
dos principais pontos de problematização e análise situados comuns nas produções artísticas desse grupo e que acaba-
dentro do pós-modernismo : o pós-estruturalism o. Esse per- vam por evidenciar informações sobre o modo de viver e de

cebe a linguagem como determinante na formação dos sujei- rnnviver dos egípcios. Uma análise numa abordagem pós-
tos e procura, nos diferentes discursos e narrativas, a reflexão -cstruturalista questionaria as interpretações dadas à arte do
para compreender nossa constituição. Acredita, pois, que a t•:gito antigo e repensaria as histórias narradas sobre esse
linguagem determina maneiras de ser e de agir e que tudo que povo. Diante disso, questiono: quais os discursos que con-
é falado modela a constituição dos indivíduos. Nessa concep- tribuem para a composição de nossas representações? Como
ção não interessa se algo é verdadeiro, mas como se tornou tudo aquilo que falam sobre nós acaba realmente consoli-
verdadeiro. Silva (1999, p. 117) apresenta alguns pontos de dando modos de ser e de agir socialmente?
diferenciação entre pós-modernismo e pós-estruturalism o: Dessa maneira, o campo da linguagem passa a ter re-
levância para se pensar sobre como determinadas crenças
O pós-estruturalismo é frequentemente confundido ganham valor de verdade. A linguagem não é simplesmente
com o pós- modernismo. Há análises que simplesmente não :i expressão de pensamentos, mas sim, o próprio processo
fazem qualquer distinção entre os dois. Embora partilhem l lc produção de pensamentos. A chamada virada linguística
certos elementos, como, por exemplo, a crítica do sujeito
centrado e autônomo do modernismo e do humanismo, o
1; 1i um marco na pós- modernidade, pois se constituiu como
pós-estruturalismo e o pós-mod ernismo pertencem a campos 11111a reviravolta nas formas de entender a nossa formação,

epistemologicament e diferentes. Diferentemente do pós- ;1prcsentando discussões relativas à linguagem como forma-
estruturalismo, o pós- modernismo define-se relativamente dora de conhecimentos e de sujeitos. A virada linguística
a uma mudança de época. Al ém disso, enquanto o pós-
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tornou-se um marco para reflexões pós-estruturalistas por "indisciplina" da turma, afirma que estudar as fórmulas da
representar o grande impulso dado à Filosofia da Lingua- física é muito importante para a vida cotidiana dos estudan-
gem no final do século XX e com grandes projeções para tes, esse discurso está legitimado, pois um profissional da
o século XXI. Segundo Veiga-Neto (1996, p. 29): ''A vira- educação assim o proclamou. No entanto, essa fala pode ser
da linguística se constitui exatamente na mudança para um questionada pelos alunos, que também estarão exercend o o
novo entendimento sobre o papel da linguagem, a saber, de poder. O poder é um modo de ação sobre sujeitos livres,
que os enunciados têm suas regras próprias, de modo que pois se não h á liberdade de resistência não h á poder e sim
não temos, sobre os discursos, o controle que pensávamos l lominação.

ter". Com isso, ocorre o declínio das relações binárias que O poder nem sempre é negativo, m alfeitoso e opressor.
apostavam, por exemplo, que o bem é oposto ao mal ou que Ue está em todas as relações e pode produzir aspectos positi-
cultura popular é oposta à cultura erudita. vos. Seguindo no exemplo citado anteriormente, se os alunos
Nesse contexto, surge a conceitualização acerca da rela- questionam o professor e esse passa a refletir sobre suas falas
ção poder/saber. O poder está diretamente ligado ao conheci- e, juntos, decidem melhorar as aulas subsequentes, essa é uma
mento e é algo constante no cotidiano. O conhecimento deter- relação de poder que se manifestou produtivamente.
mina as relações sociais e está presente em todas as instâncias A linguagem, circunscrita nas articulações entre o co-
da vida, e mais, todos somos parte viva nessa intensa cadeia na nhecimento e as relações de poder, constitui o referencial des-
qual o poder emerge. Sofremos e exercemos o poder em todas sa obra no que se refere à produção de identidades. Partindo
as circunstâncias, mesmo que seja de maneira diferenciada. Por dessa abordagem dos Estudos Culturais numa perspectiva
exemplo: a escola torna válidos determinados saberes. Os con- pús-estruturalista, passo a problematizar sobre a constituição
teúdos são pré-estabelecidos, pois a escola detém o poder de le- l lc nossas representações através da intensa "teia" narrativa na

gitimar e valorizar certos assuntos que serão trabalhados. A ela qual estamos submersos e que apresenta em sua composição
é atribuída a função social de conhecer o que deve ser ensinado. visual um rico arsenal de significações sociais.
Com isso exerce o poder ao mesmo tempo em que os alunos
também o exercem ao resistirem (de formas explícitas, implíci-
tas, conscientes ou inconscientes) ao que é determinado.
Por que a escola escolhe certos assuntos para serem
l 1nagens e processos discursivos na produção
abordados nas salas de aula em detrimentos de outros? c.lc identidades
Qyem determina isso? Por quê? O poder está em tudo e em
todos e se instaura através dos discursos estabelecidos como Transcendendo ao que o período da modernidade
verdadeiros. Outro exemplo elucida essas questões: se o pro- aneditava, a identidade é construída n as relações sociais,
fessor, com dificuldades para ministrar suas aulas devido à pois somos produzidos por nossa família, pela escola, pela

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mídia, pela religião, pelo círculo de amizades, pela música, diferentes g rupos culturais, torna-se importante para compre-
pelas imagens e por toda a rede de relações na qual estamos endermos e problematizarmos como as identidades femininas
inseridos. Somos constituídos pelos aspectos culturais de foram produzidas ao longo do tempo por heranças culturais
nossos grupos de convivência e acabamos por reproduzir que determinam suas maneiras de agir e de pensar.
suas maneiras de agir e de pensar. Vivemos influenciados Stuart Hall (2005), em sua obra ''A identidade cul-
por uma identidade cultural local, perpassada por questões tural na pós-modernidade", destaca que as identidades es-
de nível global. Silva (2000, p. 97) amplia a significação tão sendo intensamente discutidas no campo social e que
sobre a identidade ao dizer que somos sujeitos culturais: antigas concepções sobre esse tema estão sendo desveladas.
Dessa maneira, o suj eito visto com uma identidade única e
A identidade não é fixa, estável, coerente, unificada, imutável está send o constantemente desmistificado. O autor
permanente. A identidade tampouco é homogênea, também apont a que o sujeito pós-moderno é constituído
definitiva, acabada, idêntica , transcendenta l. Por outro
lado, podemos dizer que a identidade é uma construção,
por várias identidades que sempre estão se modificando e
um efeito, um processo de produção, uma relação, um que isso transcende a uma concepção de sujeito do iluminis-
ato performativo ... A identidade está ligada a estrutura s mo (o indivíduo está centrado em si, na razão, n a individua-
discursivas e narrativas. A identidade está ligada a sistemas lidade) e de um sujeito sociológico (é formado na relação, na
de representação. A identidade tem estreitas conexões com
interação entre o eu e a sociedade).
relações de poder.
Não é uma tarefa fácil descrever a historicidade sobre as
As concepções sobre identidade passam por transfor- noções de formação do sujeito. Hall (2005) relata tal afirmação,
mações, pois se entende que sua formação é perpassada por 111as realiza um breve mapeamento para iniciar uma d iscussão
inúmeros aspectos mutáveis ligados a idade, gênero, sexualida- s<>bre noções de identidade e de sujeito na pós-modernidade,
de, raça e etnia, classe social, religião, preferências esportivas. A destacando cinco grandes avanços da teoria social e das ciên-
necessidade do sentimento de pertencimento cultural faz com 1'ias humanas durante a segunda metade do século XX, cujo

que nossas identidades se modelem conforme características 111aior efeito foi o descentramento do sujeito cartesiano. Para o
do grupo social almejado. Ao mesmo tempo, també m apresen- 1111.:smo autor as cinco rupturas d a concepção de sujeito, visto
1·111110 o centro d o conh ecimento, foram: as tradições do pen-
tamos identidades híbridas porque a interação em nível local e
global favorece a influência de diferentes manifestações cultu- s:1mento de Marx, a d escob erta do inconsciente de Freud as
'
rais. Diante disso, quanto mais conhecermos as histórias dos tt·orias linguísticas de Saussure (a u tilização de uma língua não
indivíduos, mais perceberemos que as identidades nunca serão sig nifica apenas expressar pensamentos originais, mas repro-
homogêneas e sim complexas e não acabadas. Visualizar, por d11zir um sistema social repleto de significad os), os escritos de
exemplo, o processo histórico da relação homem/mulher em I.'< 111cault sobre o poder e os impactos do feminismo e de outros
111ovimentos de diferentes grupos sociais.

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Visitar esse breve apanhado histórico contribui para cultural que estabelece nossas identidades individuais e coleti-
que possamos compreender que um novo paradigma sobre vas. Diz respeito ao que pensamos sobre as coisas e como nos
a constituição do sujeito emerge e que problematizar isso se comportamos diante das mais variadas situações. Woodward
torna relevante para pensarmos o processo educacional. Isso (2000, p. 18) relata que "( ... ) a produção de significados e a
acontece porque, se acreditarmos que o sujeito é formado nas produção de identidades que são posicionadas nos (e pelos) sis-
interações sociais e que essas apresentam múltiplas identida- temas de representação estão estreitamente vinculadas".
des, estaríamos inferindo que as instituições escolares já não O conceito de representação pode apresentar inúme-
apresentam um status de detentora de conhecimentos "verda- ros significados em diferentes áreas do conhecimento. No
deiros". E, ainda, que suas práticas não determinam com ex- entanto, para o pós-estruturalismo "a representação é conce-
clusividade a formação social dos alunos, nem estão separadas bida como um sistema de significação" (SILVA, 2000, p. 90) .
de um contexto social mais amplo. Nessa perspectiva, as prá- O mesmo autor afirma que: "A representação não é, nessa
ticas educativas apresentariam novos olhares diante de sujei- concepção, nunca, representação mental ou interior. A re-
tos que aprendem através de inúmeros meios e que manifes- presentação é, aqui, sempre marca ou traço visível, exterior"
tam diversas identidades em suas convivências. Educadores e (SILVA, 2000, p. 90).
educadoras também não deixariam de refletir sobre a conexão
Woodward (2000, p. 17) amplia a compreensão sobre
dos estudantes, cada vez mais rápida, com informações locais
os sistemas de representação ao dizer que:
e globais. A relação entre tempo e espaço se reconfigurou,
possibilitando interações cada vez mais diversificadas.
A representação inclui as práticas de significação e
Se na modernidade a identidade era vista como fixa e os sistemas simbóli cos por meio dos quais os significados
estável, hoje ela é sempre questionada e está em constante são produ zidos, posicio nando- nos como suje ito. É por meio
mudança, pois sendo relacional, modela-se com as transfor- dos sign ificad os produ zid os pelas re presentações que damos
sen t ido à nossa experi ência e aq uilo que somos. Podemos
mações sociais. O que somos ou acreditamos hoje pode não
inclusive sugerir que esses sistemas simbólicos t orn am
ser o que seremos ou o que acreditaremos amanhã, ou até possíve l aquilo que so mos e aqu ilo no qual pode mos nos
mesmo em uma fração de segundos posterior. Hall (2005, p. tornar. A representação, com preend ida como um processo
13) afirma que: "Dentro de nós há identidades contraditórias, cult ural esta belece iden tidades ind ividu ais e coletivas.
empurrando em diferentes direções, de tal modo que nossas
identificações estão sendo continuamente deslocadas". As representações denunciam os sentidos que damos
Ao avançar nessas reflexões se torna importante compre- ;\s coisas, pois as concretizamos através de nossas falas, ges-
ender que os sentidos e as interpretações que damos aos mais tos e ações, mesmo que de maneira informal e corriqueira.
diversos acontecimentos estão situados em sistemas de repre- ;\todo momento expressamos nossas percepções do mundo
sentação. O conceito de "representação" se refere a um processo e isso acaba por influenciar outros sujeitos da mesma ma-

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~e_ir_a_s_M

neira que fomos influenciados. E ssa dinâmica é constante. Nossa consciência de mundo e de nós mesmos é refleti-
Silva (2000, p. 91) ressalta esse aspecto ao dizer que: "a re- da pela linguagem utilizada em cada época nos grupos sociais,
presentação é um sistema linguístico e cultural: arbitrário, conforme ressalta Hernández (2000, p. 107): "Somos organis-
indeterminado e estreitamente ligado a relações de poder". mos que utilizam a linguagem e não podemos escapar do efeito
O mesmo autor (2000, p. 93) ilustra uma situação na qual os da influência das práticas discursivas da cultura (do tempo) e
sentidos são produzidos através da linguagem: do poder que o acomp anha, e que repercute em nossas formas
de compreender e interpretar os fenômenos sociais".
Em geral, ao dizer algo sobre certas caracte rísticas A íntima relação da identidade com estruturas n arrati-
identitárias de alg um grupo cultu ra l, achamos que estamos vas e discursivas se refere a compreender que tudo aquilo que
simplesmente desc revendo uma sit uação existente, um
é falado sobre determinado assunto transforma esse assunto, e
"fato" do mundo social. O que esquecemos é que aqui lo que
dizemos faz parte de uma rede mais ampla de atos linguísticos muitas vezes essa transformação é constituidora de maneiras
que, em seu conj un to, contribui para defin ir ou reforça r a de ser e de agir. Neste momento, exemplifico: por décadas,
identidade que supostamente apenas estamos descrevendo. os afro-descendent es foram narrados pela história como um
Assim, por exemplo, quando utiliza mos uma palavra racista
povo intelectualmente inferior, e sua trajetória n o Brasil foi
como "negrão" para nos referir a uma pessoa neg ra do sexo
masculino, não estamos simplesmente fa ze ndo uma descrição marcada por violência e opressão. Tal discurso, que é sempre
sobre a cor de uma pessoa. Estamos, na verdade, inserindo- caracterizado pelas práticas, constituiu maneiras d e pensar
nos em um sistema lingu íst ico mais amplo que contribu i para sobre o negro e sobre suas m anifest ações culturais. Diante
reforça r a negatividade atribuída à identidade "n eg ra''.
disso, será que o que pensamos sobre os homossexuais, sob re
os índios, sobre as crianças, sobre as mulheres e sobre tantos
Os sentidos são criações discursivas. Cada discurso outros grupos é algo natural? Há a consolidação de algumas
carrega maneiras particulares de compreensão do mundo e verdades e de certos pré-conceitos em relação a esses sujeitos?
está imerso num jogo constante de atribuições de valores. Como produzimos e reproduzimos marcas culturais?
Silva (1995, p . 199) fala sobre a composição d e identidades
Inúmeros discursos são u t ilizados durante um gran-
através das formações discursivas:
d e período d e tempo sem questionamento s e reflexões. Os
livros didáticos narraram, através de seus textos, imagen s e
A representação é, pois, um processo de produ ção
atividades, a coloniz ação europeia e m d etrimento da his-
de sign if icados socia is através dos diferentes discursos. Os
sign ificados têm, pois, que ser criados. Eles não pré- existem toricidade dos colonizados. Era comum encontrar sessões
como coisas no mundo social. É através dos significados, correspondentes à cultura d e Portugal e da Espanha, no que
contidos nos diferentes discursos, que o mundo social é d iz respeito a su a literatura, arte, arquitetura, relig ião, ex-
representado e conhecido de uma certa forma, de uma forma
periências de desbravamentos e aventuras e apen as citações
bastante particu lar e que o eu é produzido. E essa "forma
particular" é determinada precisa mente por relações de poder. sobre suas colô nias. Aventureiros e civilizados eram adjeti-

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vos recorrentes, e a ideia de "levar civilidade" aos coloniza- regimes regi dos pelo poder. Discurso, aqui, não se
refe re exclusivamente a t exto letrado; os discursos têm
dos foi duradoura. Como tais discursos foram produzidos
materialidade: artefatos e p ráticas tam bém são discursos
e consolidados pelo âmbito escolar? Por que contar apenas que nos con t am algo.
um olhar sobre uma história que apresenta diversas percep-
ções? Onde estão os olhares silenciados dos colonizados?
Veiga-Neto (2005, p. 100) discute sobre a linguagem
Como tal discurso adquiriu status de naturalidade?
como componente constituidor de nossas identidades:
Diante disso, é necessário "sacudir a quietude com
a qual aceitamos certos discursos" (FOUCAULT, 2005, Ao invés de ser vista como a própria essência das
p. 28). No trabalho educativo torna-se necessário que cer- coisas ou como representação das coisas, a li nguagem passa
tas verdades proferidas, através das forças discursivas, sejam a ser entend ida como co nsti tu idora das coisas e, enquanto
problematizadas . Segundo Foucault (2005, p. 24): "É preci- ta l, como próprio obje to de co nh ecimento. Com isso, o que
in teressa não é pensar se as coisas t êm , ou não, umél essência
so também que nos inquietemos diante de certos recortes e/o u uma rea lidade real, estável e ind epe ndente de nós,
ou agrupamentos que já nos são familiares". senão é pensá- las no sign ificado qu e ad quirem para nós.
Cada discurso apresenta historicidade, atendendo a con-
dições que pré-existem. Está incluso em períodos e lugares Diante de tudo isso: "O vínculo entre a linguagem e
específicos, afinal "... não se pode falar de qualquer coisa em a constru ção de identidades individuais e sociais é eviden-
qualquer época" (FOUCAULT, 2005, p. 50). O discurso não é te .. ." (GIROUX, 1995, p. 95). Muitos são os artefatos que
despretensioso e atua na constituição dos sujeitos. Hall (2000, produzem e reproduzem discursos. No caso dessa pesquisa,
p.109) apresenta importante contribuição a esse respeito ao di- d estacam- se as imagens presentes na escola, que com suas
zer que: "É precisamente porque as identidades são construídas narrativas, vinculadas a um sistema mais amplo de signifi-
dentro e não fora do discurso, que nós precisamos compreen- cações, produzem maneiras de ser menina em nossa cultura.
dê-las como produzidas em locais históricos e institucionais !\o considerar que nossas representações estão imersas nos
específicos, no interior de formações e práticas discursivas es- emaranhados discursivos, Marzola (2004, p. 93) afirma que
pecíficas, por estratégias e iniciativas específicas". "todo discurso, sem exceção, aprisiona".
Costa (2004, p. 76) apropria-se das noções de poder Para o pós-estruturalis mo não interessa se algo é ver-
de Foucault para dizer que os discursos têm materialidade: dadeiro, mas como se tornou verdadeiro. Mas o preocupan-
te é que determinados discursos perduram por um longo
A verdade ou as verdades são coisas deste mundo, t-cmpo, sem nenhum tipo de problematização , perpetuando
constitu ídas no seio de correlações de forças e de j ogos L-Crtezas e verdades . Por esse motivo, compreender como os
de poder. Aquilo que chamamos de "verdade" é produzido
µ;êneros são produzidos diz respeito a uma investigação de
na forma de discursos sobre as coisas do mundo, segundo

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~~~~~~~~~~~-As~_l111a~_g_en_s~q_u_e_I_n_v_a_d_e_n1~a_s_S_a_la_s_d_e~A_u_l_a

como alguns discursos na área da cultura visual determinam


maneiras de ser menina na contemporaneidade. O discurso
z. A Cultura V i sual
não é simplesmente expressão. Está ligado à formação sub- nas Escolas
jetiva dos sujeitos (FOUCAULT, 2005).
''Analisar o discurso é fazer com que desapareçam e
reapareçam as contradições" (FOUCAULT, 2005, p. 171).
Muito mais do que descrever e analisar as falas e os gestos
das meninas, procurei encontrar aquilo "que se dizia no que
estava dito" (FOUCAULT, 2005, p. 31), verificando as con-
dições em que certos discursos foram criados e mapeando o inferir nossas lembranças ao tema das ar-
intenções, ocultamentos, esquecimentos e a própria mate-
rialidade das representações femininas.
Neste livro, a pretensão está em analisar a materialida-
de dos discursos transmitidos pelas imagens para a produ-
ção de identidades, e refletir como essas ajudam a tornarem
A tes na escola, dificilmente encontraremos
relatos que fujam aos incessantes desenhos
e pinturas no término de outras tarefas esco-
lares. Mas o que talvez nos deixe intrigados é a atual concep-
ção e práticas, nessa área, aplicadas desde a Educação Infantil
verdadeiras certas atitudes e normas comportamentais dos até o Ensino Médio, em que as artes são concebidas como um
estudantes. Procuro entender as imagens como uma lingua- "passatempo" e como um campo complementar da educação
gem que produz sentidos, significados. formal, tornando-se pano de fundo para o trabalho de outras
atividades escolares, tidas como mais importantes. Franz (1995,
p. 74), denota esse fato ao dizer que "as artes ocupam, no currí-
culo, um lugar nitidamente marginal, e raramente são conside-
radas iguais em importância àquilo que uma comissão nacional
recentemente chamava 'disciplinas .sérias"'.
A historicidade da arte no Brasil pode fornecer ele-
mentos para uma possível compreensão do fenômeno de
depreciação das artes nas escolas, pois por ser considerada
erudita, esteve sempre com seu marco referencial em classes
com uma conotação "aristocrática" para desfrute e lazer. A
arte não condizia com os preceitos populares, não era para
todos e sim para aqueles que poderiam desfrutá-la. Alguns
pontos da nossa história demonstram que as artes sempre
~~~~~~~~~~~~A_s_l_111a~=g_en~s~q~u_e_l_n_v_a_d_e_an~a_s_S..::....::.:_al=a=s_d~e-=-=-A=u=l=a 2. A Cultura Visual nas Escolas "b\
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tiveram um papel desprivile giado no âmbito social, devido a As reflexões sobre a arte nas escolas reproduze m o ce-
um contexto que valoriza uma formação escolar de interes- nário social de ordem mais ampla. Por isso, os rompimen tos
ses econômic os imediatos . Hernánde z (2000, p. 43) enfatiza mais significati vos nessa área estão ligados à percepção de que
esse ponto de discussão ao dizer que: vivenciam os uma nova cultura visual, alicerçada pela utiliza-
ção e pelo avanço das ferrament as tecnológ icas. As imagens
Diferenteme nte do que acontece com matérias dominam o cenário social, apresenta ndo tanto valor quanto a
provenientes de campos discipl inares de reconhecida leitura das palavras. Uma imag em tem muito a relatar e a ser
presença no currículo, as matérias artísticas necessitam interpreta da, pois carrega consigo inúmeras mensagen s. Mes-
sempre argumentar o porquê de sua inclusão no currícu lo
mo assim, muitas escolas ainda não apresentam esse tipo de
escolar. Entre o utras razões, porque continuam pa recendo
um campo de con hecimento pouco útil diante de outros reflexão, baseando seu ensino em práticas tradiciona is. Her-
de garantia comprova da para conformar os elementos nández (2000, p . 92) apresenta important e contribuiç ão ao
ideológicos para os quais a escola co n t ribui. argumenta r sobre concepçõe s contemporâneas para o ensino
das artes visuais:
Mesmo com rupturas important es, a fase histórica atual
no ensino das artes ainda manifesta fortement e as concepçõe s O atual planeja mento da área de ed ucação visual
espontaneí stas, ocasionan do, por exemplo, certa despreocu - e plástica destaca a impor tância d<i leitura da im agem, da
pação pedagógic a com as propostas em artes, pois a espon- aná lise e fr ui ção da ob ra artíst ica e do uso exp ressivo da
representaçã o plástica. A o rientação prioritári a da atua l
taneidade teria como base atividades d e cunho "livre" (com o proposta é educa r para sa ber ol har, analisa r e compreend er
intuito de não se comprome ter com a potenciali dade criativa a imagem e ampli ar a percepção de represe ntações pl ásticas
do estudante) . Cunha (2002) em sua obra - "Cor, som e movi- e da expressão de sentimentos e ideias. També m se destaca
mento: A expressão plástica, musical e dramática no cotidiano a necessidade de in trodu zir a aná lise e reflexão sobre a
produção artísti ca com a fin alidade de descobri r va lores de
da criança" - argumenta que o olhar espontane ísta se refere à beleza num objeto.
crença de que a criança tem "dom'' para criar, e por acreditare m
nisso, educadore s não intervém em suas produções artísticas. A
Diante disso, as reflexões contempo râneas na área das
mesma autora (2002, p. 17) ainda problemat iza:
artes visuais apontam para o declínio de certezas absolutas,
para a legitimaçã o de expressõe s culturais até então oculta-
Os adultos, na maioria das vezes, não percebem que a
das e para a manipulaç ão e reflexão das novas ferramentas
aquisição da linguagem gráfico-plást ica se dá de modo gradativo,
como em qualquer outra instância do desenvolvim ento como a tecnológic as. Buscam múltiplos olhares sociais e distintas
fa la e a locomoção. Eles pou co oportunizam situações para que interpreta ções sobre aquilo que, muitas vezes, não está ex-
as crianças possa m desenvolver seus sentidos, sua imaginação plicitado. Assim, a área da Arte/Edu cação apresenta impor-
e suas hipóteses sobre como se dão seus processos de aq uisição
da linguagem visual.
tantes estudos sobre a chamada Cultura Visual.
fiJ' As Imagens que Invadem as Salas de Aula
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=%~.A=-C~u=l=t=u=r~a~V~i=s~ua~l~n~a_s_E_s_c_o_la_s~~~~~~~~~~~~~~-~
As relações sociais estão em constante processo de mo- (2007) fala sobre a educação através da cultura visual, a partir
dificação e os estudantes contempo râneos vivenciam uma di- de quatro grupos de objetivos: Experienciais (o que vou apren-
versidade de novos olhares sociais que influencia m diretamen te der a partir de mim mesmo?), Conceituais (sobre o que vamos
em suas representa ções (seus modos de ver, de pensar e de agir pensar?), R elacionais (que conexões vamos explorar e propor?,
no mundo). A Cultura Visual rompe com as barreiras de uma De aplicação prática (o que vamos fazer com tudo isso?).
educação tradiciona l, pois propõe diferentes olhares e inter- O mesmo autor (2007) também aponta e problema tiza
pretações sobre as mais diversifica das situações. Usa e proble- alguns enfoques nos trabalhos com a cultura visual que estão
matiza as temáticas e os objetos do cotidiano, porque acredita sendo desenvolv idos por educadore s nas escolas. São eles: as
que os sentidos atribuídos a esses não são únicos e sim mutá- imagens midiáticas são tratadas como nocivas às crianças e
veis.Torna- se um campo propício para o desenvolv imento de jovens, influencia ndo-as negativam ente através da violência
outros olhares e terreno fértil para que as intensas mudanças e apelação sexual; professore s acreditam que trabalhar criti-
sociais estejam presentes nas discussões e nas reflexões de edu- camente com as imagens tornará os alunos emancipa dos e
cadores, educadora s e estudantes no âmbito escolar. prontos para não cair em "armadilh as" ou ilusões, que não
As problemat izações propostas por uma Cultura Vi- serão persuadid os, enganado s ou influencia dos pelas ima-
sual numa perspectiv a pós-mode rna não desconsid era os gens; educadore s colocam ênfase nos prazeres (satisfação )
desafios que a área enfrenta nas escolas. Porém, sua ênfase que a cultura visual pode proporcio nar aos estudante s; e o
está em transcend er verdades vigentes através d e constante s enfoque autorrefle xivo que propõe inúmeros questiona men-
questiona mentos, e legitimar ações pedagógic as que possam tos acerca das nossas relações com as imagens.
tornar-se significati vas aos estudante s. Diante disso, questiona r as artes visuais nas escolas
As imagens estão presentes em nossa vida cotidiana, é algo essencial para uma ressignific ação de novos olhares
constituin do maneiras de perceber o mundo. Por isso o tema sociais. E também, para que questões presentes no cotidiano
central dos debates em Arte/Edu cação pós-mode rnos está <los alunos, como raça, etnia, gênero e sexualidad e, estejam
concentra do nessa mudança cultural, " ... tendo a imagem nos focos dos planejame ntos e das discussões em sala de
como matéria- prima" (BARBO SA, 2005, p. 98). aula, procurand o desvelar as práticas e estratégia s discur-
A Cultura Visual está em expansão, ultrapassa ndo os sivas vinculada s às manifesta ções d a cultura visual. As re-
limites tradiciona is e penetrand o o cotidiano. A metodolog ia flexões sobre as imagens no cenário social atual ganharam
de ensino, nessa perspectiv a, está concentra da em questionar , impulso e importânc ia, sendo descontex tualizada a falta de
explorar e desvendar as experiênci as culturais dos sujeitos. problemat izações nessa área. Sendo assim, o próximo item
Procura desencade ar reflexões para um processo de ensino e abordará a nova Cultura Visual como fator que contribui
de aprendiza gem contextua lizado e crítico, problemat izando para modificar , constante mente, nossas representa ções.
as imagens de maneira reflexiva e construtiv a. Hernánde z

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A Cultura Visual constituindo olhares Ler uma obra seria, en tão, perceber, com pree nder,
interpretar a trama de cores, texturas, vo lumes, formas,
linhas que const ituem uma imagem. Perceber objetivamente
A amplitude com que as imagens embrenharam-se na os elementos presentes na imagem , sua temática, sua
vida cotidiana já não pode passar despercebida pelos estu- estrutura . No entanto, ta l imagem foi produzida por um
sujeito em deter minado contexto, numa determinada época,
diosos que se preocupam com a Arte/Educação. Exemplo segundo sua visão de mundo. E esta leit ura, est a pe rcepção,
dessa expansão encontramos no mercado editorial de livros esta compreensão, esta atribuição de significados va i ser
infantis, que destaca a publicação de obras com efeitos ilus- feita por um sujeito que tem um a hist ória de vida, em
trativos cada vez mais intensos e com recursos tecnológicos que objetiv idade e subjetividade organ izam sua forma de
apreensão e apropriação do mundo.
cada vez mais sofisticados.
Sobre isso se torna importante problematizar: por que
A relevância do trabalho com imagens nas escolas diz
não trabalhar nas escolas com a arte produzida através de tec-
respeito a compreendê-las como portadoras de representa-
nologias contemporâneas? Como a cultura visual produz senti-
\·<)es culturais. Ou seja, a produção e a interpretação de uma
dos nas crianças? Como elas produzem significações através da
imagem reflete o que um sujeito pensa sobre determinado
cultura visual? Como as reflexões sobre a cultura visual podem
assunto ou situação, denunciando pontos de vista e percep-
contribuir para a ressignificação do processo educacional?
,·ões sob re uma realidade. Por isso, as imagens carregam
Barbosa (2005) ressalta que estudiosos da atualidade muito mais do que informações d iretas e explícitas. Cao
indagam como ver, ouvir, aprender e ensinar as artes aliadas (2005, p. 208) apresenta importante contribuição ao afirmar
às novas tecnologias e que a utilização desse campo como que: ''As imagens não são neutras . Tampouco o olhar que
instrumento de mediação cultural é tarefa dos Arte/Educa- projetamos sobre elas. Não existem imagens denotativas,
dores contemporâneos. nas quais não exista um grau retórico de informação. Dito
Através de atividades pedagógicas voltadas para a leitura de outra m aneira, não existe imagem que somente transmita
de imagens, os estudantes começam a perceber as relações que informação sobre si mesma".
essas desempenham no dia-a-dia. Conseguem, por exemplo, A intensa expansão de informações visuais fomenta
contextualizar, interpretar, produzir e compreender os possíveis llm campo de reflexão ao qual se denominou cultura visual,
sentidos que cada imagem reproduz e como isso se relaciona a l' ll1 que as imagens passam a ganhar destaque nas relações
suas experiências pessoais. A diversidade de interpretações pro- sociais e legitimidade como meio de comunicação. Cocchia-
porciona o respeito e a compreensão de que existem diferentes rale (2006, p. 37) evidencia que o período de industrialização
olhares sobre uma mesma imagem ou situação. Segundo Pillar 110 Brasil contribuiu significativamente para a ampliação da
(2001, p. 15) a leitura de uma imagem elabora novas e diversas p resença das imagens em nosso contexto:
criações interpretativas e apropriações culturais importantes:

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~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula t. A Cultura Visual nas Escolas ~
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A radicalidade das t ransformações socioeconômicas l'nvolvidos no contexto escolar. Hernández (2007, p. 22) afirma
introduzidas pelos processos de produ ção industriais se que "... a expressão cultura visual refere-se a uma diversidade de
fizeram sentir muito fortemente na esfera da produção de
pr;iticas e interpretações críticas em torno das relações entre as
imagens. Antes restr itas à feitura manua l, passaram também
a serem produzidas a partir de tecnologias como a fotografia, posições subjetivas e as práticas culturais e sociais do olhar".
o cinema e, décadas adiante, o vídeo. A Arte/Educação transformou-se juntamente com
todos os outros âmbitos sociais. Por isso, Hernández (2000,
Segundo Barbosa (2005) a origem do termo cultu- p. 50) afirma que essas modificações são necessárias para que
ra visual data da década de 90, através das publicações de (>s estudantes possam analisar reflexivamente a extensa gama
Fernando Hernández2 que pesquisa sobre os ensinamentos l lc informações disponibilizadas pelos meios tecnológicos:
produzidos pelos processos midiáticos. Esse autor (2007,
p. 21) fala sobre essa origem ao dizer que os estudos da Trilhar esse cam inho da arte na educação não
cultura visual vão além da ampliação de conteúdos a serem corresponde a uma moda, mas sim conecta com um fenômeno
desenvolvidos nas salas de aula. Procuram o "alfabetismo vi- mais gera l que tem a ver com o papel da escolarização
na sociedade da informação e da com unicação, e com a
sual" em que os sujeitos possam analisar, interpretar, avaliar necessidade de oferecer alternativas aos alunos para que
e criar conhecimentos ligados às imagens: aprendam a orientar-se e a encontra r referências e pontos de
ancoragem que lhes permitam avaliar, seleciona r e in terpretar
Os Estudos da cultura Visual não constituem uma a avala nche de informações que recebem todos os dias.
nova disciplina no campo acadêmico. Os estudos da cultu ra
visual emerg em no final dos anos 80 entre o cruzam ento de
debates propostos pelos saberes da história da arte, estud os
O trabalho com a compreensão da cultura visual busca
cinematográficos, linguísticos, literatura e as teori as pós- ir além de um entendimento sobre como as imagens estão
estruturalistas e os Estudos culturais. Tendo como principal presentes no contexto social, e sim, como elas se articulam
ponto de convergência a afirmação de qu e ve rdades são
para produzir nossas percepções de mundo. O objeto de
constituída s pela linguag em.
prática, nessa área, se refere a utilizar imagens de diferentes
épocas e grupos para traçar um estudo e uma trajetória de
O trabalho com imagens tornou-se um dos pressupos- l·nmpreensão de alguns fatos, tentando revelar aquilo que
tos para o desenvolvimento de atividades pedagógicas na área está ocultado (que não foi dito) . Por exemplo, usar as ima-
da Arte/Educação. Isso acontece porque a cultura visual é um µ.;c ns oferecidas por propagandas publicitárias para compre-
novo campo de ação e de reflexão para a formação dos sujeitos e nder como o corpo é entendido ao longo de séculos (en-
tender o que se pretende transmitir como valor estético).
2 Fe rnando Hernández é professor da Universidade de Barcelona, Estamos imersos em uma extensa diversid ade de ima-
Coordenador do Mestrado em Estudos, Projetos de Cultura Visual e do
Programa de Doutorado em Artes Visuais e Educação.
µ.;e ns e não podemos ignorá-las como constituidoras de ima-
~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula :z. A Cultura Visual nas Escolas ~
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ginários e de subjetividades (como artefato que "afeta" nos- e de musica - e esses elementos complementam - se de
diferentes modos. Uma consequência disso é que os
sas visões e entendimentos do mundo). Hernández (2007, estudantes to rnam-se familiarizados co m o pensame nto
p. 25) contribui ao dizer que: visual em termos de mu ltimídia . Acham isso natu ral e
pensam melh or dessa forma . A ênfase da escola numa
Por tudo isso, ao utiliza r a expressão cu ltura visua l lingua gem isolada é restritiva para os alunos. Em te rmos
para sugerir um outro rumo pa ra a ed ucação das artes práticos, isso quer dizer que org an izam e expressam melhor
visuais, defendo que estamos vivendo em um novo reg ime os pensamentos em termos visuais ou fa zendo um t rabal ho
de visualidade. Uma consequê ncia deste reposicion amento m ultimídia do que escrevendo um relató rio ou ensa io.
em relação a diferentes práticas educat ivas (não so mente
na Escola) é q ue nos leva a propor a necessidade de aj udar
crianças e jovens e também os educadores, a irem mais
Por isso, cada vez mais, se admite a importância de se
além da trad icional obsessão por ensinar a ver e a promover considerar o universo visual e os aspectos culturais d a comu-
expe riências art ísticas. Em um mundo dominado por nidade, no trabalho com as artes. O ensino d a arte t rata de
dispositivos visuais e tecnologias da representação (as artes
nmhecer as histórias em que tais imagens ou expressões se
visuais atuam como t ais). nossa finalid ade ed ucativa deveria
ser a de facilitar experiências reflexivas criticas.
L:ncontram e em qu al contexto estão inseridos. Hernández
(2000, p. 54) afirma que as dinâmicas de comunicação não
podem mais ignorar o universo d as imagens:
O s estudantes contemporâneos apresentam vivências
visuais diferentes de outras gerações, pois suas experiê ncias
Partindo da ed uca ção para a comp reensã o da cu ltu ra
são intermediadas por avançadas tecnolog ias apresentadas
visua l não se trata de estudar os processos individuais
p ela televisão, pela publicidade, por filmes e vídeos, por jo- re lacionados com a compreensão desses significados, mas
gos eletrônicos e pela internet. A interação dos alunos com sim a dinâmica social da linguagem que escla rece e estabiliza
as n ovas tecnologias interfere diretamente nas maneiras que a mu lti pli cidade de sig ni ficações pelas quais o mundo se
aprende e se representa.
esses se relacionam com o ensino e com a aprendizagem
escolar, pois a ênfase das instituições escolares e m apenas
alguns meios d e expressão e de comunicação j á n ão atende A Cultura Visual se apresen ta como ponto característi-
as necessidades dos estudantes que aprenderam a conviver rn da pós-m odernidade, pois abre p ortas para que a arte seja
com a variedade visual. P arsons (2005, p . 307) contribui ao vista como um campo de produção d e diferentes significados.
refletir sobre as novas interações de comunicação com as Não há mais verdades ab solutas ou interpretações corret as,
quais as crianças convivem: 111as sim, contextos e lugares que nos contam histórias. A arte
pús-moderna é plural e sujeita a múltiplas leituras e interpre-
t :1ções e implica problematizar sobre aquilo que Hernández
As imagens visuais encontradas em revistas, filmes,
quadrinhos e em muitos outros lu gares são quase sempre chamou de imaginários visuais, nos quais nossas representa-
acompan hadas de palavras - alg umas vezes de m ovim entos

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ta' As Imagens que Invadem as Salas de Aula
~--------

ções sociais, culturais e históricas são expressada s através das


imagens (HERNÁ NDEZ, 2000). O mesmo autor (2000)
3. A Cult ura Visu al
também afirma que isso pressupõe assumir que as representa - Prod uzin do Gêne ro
ções (e não as imagens) contêm ideias que refletem estruturas
sociais e que mostram o artista como mediador das constru-
ções de significad os das diferentes sociedade s e culturas.
Nas escolas, a arte, muitas vezes, é percebida e traba-
lhada de maneira pouco reflexiva, sem a consideraç ão de as-
pectos do cotidiano dos estudantes . H ernández (2000, p.133)
acredita que "na era das imagens, há mais informaçõ es em
nosso meio do que aquela que 'vemos'. Talvez por isso, falar área das artes visuais carrega consigo o

A
de cultura visual a essas alturas seja algo que, como acontece grande desafio da percepção sobre a ex-
com outros temas e problemas debatidos pelos saberes con- pressão do mundo no qual vivemos. Permi-
temporân eos, esteja chegando muito tarde à escola". te refletir sobre questões pessoais e sociais
Por fim, o mundo visual produz olhares sobre as ma- e instigar novas maneiras de pensar e de agir. Mas como per-
neiras de se perceber o cotidiano. Por esse motivo não pode- ceber tudo isso se o nosso olhar não foi desenvolv ido para tal?
remos deixar de refletir sobre a escola como um local onde Como a produção de imagens em nosso cotidiano interfere
algumas narrativas tornaram- se guias de todo o processo na constituiç ão de nossas subjetivida des? Como incorpora -
escolar, e o nde há grande barreira para propostas de mu- mos as imagens em nosso dia-a-dia? O que as imagens falam
danças. Algumas narrativas circundam o âmbito escolar há sobre ser menina na contempo raneidade ? Como as imagens
muito tempo, determina ndo as maneiras e os enfoques a se- produzem gênero dentro das salas de aula? Essas problemat i-
rem trabalhado s em sala de aula. A escola prevê sujeitos com ·1,ações nortearão o seguimen to deste capítulo.
formação homogêne a, regulados e normatiza dos, quando a O aumento de materiais visuais (com recursos tecnó-
realidade impõe sujeitos autônomo s, criativos e mutáveis em logicos avançados ) no cotidiano das crianças é recente ao
uma sociedade onde o amanhã é incerto. Hernánde z (2007, mesmo tempo em que se mostra crescente. Os estudantes ex-
p. 24) coloca em questiona mento as práticas naturaliza das I)Crienciam muitas atividades mediadas pela TV, por filmes,
nas instituiçõe s escolares: " Vivemos em um mundo visual- internet , vídeo games, revistas e propagand as publicitári as.
mente complexo , por isso a importânc ia de aprender a ler ·lo dos esses recursos comunica m mensagen s visuais, acom-
as imagens. Aprender a comunica r-se é uma exigência na panhadas de pequenos textos e sons, e estão inseridos nas sa-
atualidade e esta comunicação articula as diferentes mani- las de aula através dos brinquedo s, roupas, livros e materiais
festações da imagem (filmes, comerciai s etc.)".
cscolares com ilustrações , que estão na preferênci a infantil.

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~~~~~~~~~~~~A_s_l_an~a=g_e_n_s~q~u_e_l_n_v_a~d~e~an~a~s::......::..S=a=la=s~d=e=--:.A=u=l=a ~3·_A:__C_u~l1:_u_r_a_V~is_u_a_l_P~ro_d_u~zi_n_d_o~G_ê_n_e_r_o~~~~~~~~~~~-~

Partindo disso, as imagens, através de suas relações socioeconômicas que constituíam as desigualdades de gê-
com outros artefatos, produzem identidades de gênero. Na nero. Elas passam, então, a refletir sobre os modos como o
definição de Louro (2005) discutir sobre gênero representa feminino e o masculino são representados, acreditando que
pensar sobre como o masculino e o feminino são consti- isso determina a maneira de ser homem e mulher na socie-
tuídos e problematizar sobre as relações sociais ditas como dade. Pensam que "é no âmbito das relações sociais que se
" comuns " ou " normais
.,, . constroem os gêneros" (LOURO, 2007a, p. 22). Nesse con-
texto, as representações de feminilidade e de masculinidade
O termo "gênero" remete a história do movimento
são constituídas pelo que se pensa e fala sobre o feminino e
feminista, que surgiu no início do século XX, com a busca
pelos direitos femininos de voto e de contestação das atri- o masculino.
buições da mulher na sociedade (trabalhar no lar ou sob o A partir disso, o conceito de gênero passa a ser modi-
comando dos homens). Desde seu início, em países como ficado pelas perspectivas pós-estruturalistas que abordam a
França, Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos, esse movi- linguagem como produtora de saber e de poder. Esse enfo-
mento se apresentou multifacetado, pois tinha diversas ver- que aponta que nos constituímos, enquanto homens e mu-
tentes organizadas por grupos de mulheres que buscavam lheres, ao longo da vida por diversas instituições e práticas
sanar diferentes necessidades, tais como: o direito ao ensino sociais que narram os comportamentos masculinos e femi-
superior, a formação de sindicatos pela melhoria da quali- ninos. Meyer (2007, p. 16) apresenta importante colabora-
dade no trabalho e a discussão dos direitos das mulheres de ção ao falar sobre a vertente pós-estruturalista na discussão
decidir sobre o próprio corpo e sua sexualidade. Com isso, sobre gênero:
elas buscavam seu lugar social e o rompimento da domina-
ção masculina. Louro (2007a, p. 17) fala sobre esse período As abordag ens femin istas pós-estrutura 1ista s se
afastam daq uelas verte ntes que t rata m o co rpo como uma
histórico ao evidenciar qual foi o principal objetivo do mo-
entidade bio lógi ca un ive rsa l (apresen t ada como origem
vimento feminista em sua origem: das d iferenças entre hom ens e mulheres, ou co mo super-
fície sobre a qua l a cu ltu ra ope ra para produzir desigual-
Torna r visíve l aquela que fora ocul ta foi o grande dades) para teorizá-lo como um const ru to sociocultura l e
objetivo das estudiosas fem inistas desses primeiros tempos. linguísti co, produto e efei t o de relações de pod er Nesse
A segregação social e po lít ica a que as mu lheres foram con text o, o conceito de gênero passa a eng lobar t odas as
historicamente conduzidas tiveram como consequência formas de constr ução social, cultu ral e lingu ística i m plica-
a sua amp la inv isibilidade como sujeito - inclu sive como das como processos que diferenciam mul heres de hom ens,
suj eito da ciência. i ncluindo aquel es processos q ue prod uzem seus corpos,
distingu indo-os e sepa rando-os como corpos dotados de
sexo, gênero e sexua lidad e.
As feministas estavam diante de um contexto em que
não eram somente as diferenças biológicas, anatômicas ou

€-----
~~~~~~~~~~~-A_s~IJD~a_g_en_s~q_u_e_l_n_v_a_d_e_JD~a_s_S_a_la_s_d~e_A_u_l_a ~~·~A~C==u~lt=ur=-=a~V-=--=is=ua==l~P~r~o~d=u=z=in=d_o~G_ê_n_e_r_o~~~~~~~~~~~~

Isso implica dizer que não nascemos mulheres: nós hasta acreditarmos que somos "man1pu . 1a d os ", "governad os "
nos tornamos mulheres. E ainda: "A construção de gênero ou "subjetivados'', pois participamos ativamente dessa rede.
é histórica e está em constante mudança, sendo assim, es- Falar sobre gênero, nessa perspectiva, perturba po-
tamos construindo gênero" (LOURO, 2007b, p. 35). Nessa sicionamentos que defendem uma identidade masculina e
perspectiva pós-estruturalist a, os estudos relacionados a gê- feminina baseada nas diferenças biológicas, pois homens e
nero procuram problematizar a diferença e as relações de mulheres se constituem ao incorporarem valores culturais
poder em que o feminino e o masculino são produzidos, que determinam os comportamento s adequados e as atitu-
buscando transcender o objetivo inicial de luta pela dimi- des previstas para determinadas situações.
nuição da dominação masculina. Nessa ótica pós-estruturalist a, a cultura visual é pro-
Diante disso, não é possível descartar que vivemos na dutora de significados que estão imersos em relações de po-
diferença e que a busca pela igualdade é um objetivo im- der. Esses significados regulam as percepções, os gestos, os
possível de ser alcançado. Por isso, "na perspectiva pós-es- sentimentos, os pensamentos, os h ábitos e as maneiras de
truturalista as ambições de transformação social são menos perceber a si e aos demais, dizendo como um homem e uma
severas, acreditando que essas podem ocorrer de maneira mulher devem agir socialmente em determinado contexto.
gradual, local e cotidiana" (LOURO, 2007b, p. 121). Nesse sentido, o sujeito é produzido nas práticas cul-
Segundo Louro (2007b, p. 37), "os Estudos Feminis- turais que vivencia cotidianamente, e é nessas práticas que
tas estiveram sempre centralmente preocupados com as re- estão inscritas as relações de poder, através das quais o su-
lações de poder". Por isso, a atual abordagem desses estudos jeito institui maneiras de olhar a si mesmo e o mundo ao
está ligada à desnaturalização de concepções que percebem .seu redor. O sujeito torna-se participante de uma cultura
a mulher como portadora de uma natural submissão ao porque passa a compartilhar significados e a interpretar o
homem, desconstruindo binarismos que diferenciam, por mundo de maneira semelhante. Essa é uma discussão em-
exemplo, as funções sociais de homens e de mulheres na blemática para a área da educação, já que tira a centralidade
família e no trabalho. A suposta hierarquização de subordi- de ação das escolas para a constituição dos sujeitos, embora
nação do feminino perante o masculino denota um olhar de não as exima da responsabilidade formativa dos estudantes.
vitimização e culpabilidade da mulher, pois pressupõe que Pensar sobre gênero, nessa perspectiva, torna-se ou-
ela não tem a opção de transformar a realidade. sado e instigante para os profissionais ligados à área educa-
Com isso, a mulher não está simplesmente dominada cional. Isso acontece porque acreditar que gêneros não são
pelo homem, mas ambos exercem e sofrem as consequências construídos de maneira "natural" e "espontânea" é uma tarefa
de suas ações e estão, constantemente , resistindo, transgre- ambiciosa para uma realidade marcada por fortes discursos
dindo e negociando suas representações. O poder acontece que procuram enfatizar as diferentes atribuições femininas e
diante da liberdade de resistência do sujeito, por isso não
~~~~~~~~~~~-A_s~l=m==a~ge=n=s~q~u=e~l=n~v~a~d=e~m~as~S~a~la~s~d~e~A~u~l~a ~._A~C_u_I_tur~a~V_i_s_u_a_l_P_r_od~u_zi_n_d_o~Gê_-_n_e_ro~~~~~~~~~~~~

mascu linas. Gêner o é uma identid ade fabrica da, produ zida relevân cia de trabalh o pedag ógico no mome nto em que
ao longo da vida por diversa s pedago gias cultura is, pois se perceb emos suas influên cias sobre as crianç as. Essas não só
aprend e a viver como homem e como mulhe r. vivenc iam uma nova cultur a visual como també m interag em
e corpor ificam os discur sos produz idos e transm itidos pelas
A escola, atravé s de suas prática s educat ivas em torno
imagen s. As crianç as carreg am suas percep ções do mundo
da cultur a visual, produ z conhe cimen tos e contri bui para a
visual em seu cotidia no e aprese ntam conflit os sobre rela-
consti tuição de repres entaçõ es. Ela fala sobre como são (ou
cionam entos interpe ssoais impor tantes de serem trabalh a-
devem ser) os menin os e as menin as. Forma um imagin ário
dos. Os estuda ntes passam a ser intérp retes e produ tores de
social sobre os compo rtamen tos mais ou menos aceitáv eis
imagen s.
para cada gênero , institu indo falas e gestos para as mais di-
versifi cadas situaçõ es. Com isso, temos diante de nós um Diant e disso, passo a aprese ntar um recorte da pesqu i-
univer so visual a ser desven dado cotidia namen te. Temos um sa de mestra do que realize i em 2007 e 2008 pela Pontif ícia
mund o de image ns para ler e para tentar compr eende r as- Univer sidade Católi ca do Rio Grand e do Sul, com apoio da
pectos impor tantes de nossa cultura . Capes . Nela, o princi pal objetiv o foi analisa r a consti tuição
de identid ades femini nas, atravé s da cultur a visual, em con-
Nas salas de aula, torna- se impos sível a tentati va de
texto escola r, sob a luz dos Estudo s Cultur ais em Educa ção
contar ou mensu rar a quanti dade de image ns com as quais
numa perspe ctiva pós-es trutura lista.
as crianç as interag em e que conso mem em seu dia-a- dia. As
propag andas, as fotos dos jornai s, a Intern et, a manei ra de As questõ es que nortea ram a realiza ção do estudo
se vestir, as revista s, os enfeite s de cabelo , as ilustra ções de foram: Como a cultur a visual contri bui para a consti tuição
todo tipo estão carreg adas de inform ações sobre o ambie n- de identi dades femini nas? Como as menin as compr een-
te em que vivem os; portan to, muito temos a proble matiza r. dem sua forma ção social atravé s das image ns? Como as
Nesse sentid o, o estuda nte passa a ser intérp rete e produ tor menin as de uma turma de 3ª série do Ensin o Funda menta l
de image ns. manif estam suas repres entaçõ es de femin ilidad e no âmbi-
to escola r? Qyais as image ns que invade m o cenári o es-
colar e que contri buem para a produ ção de subjet ividad es
femini nas?
Olha res de inves tigaç ão
A pesqui sa foi condu zida pela investi gação qualita -
tiva com aborda gem etnogr áfica, pois os dados coleta dos
As image ns, como artefat os que produ zem conhe - referem -se a um períod o prolon gado de observ ações (e de
cimen tos e que contri buem para a consti tuição de nossas interve nções) e são marca dos pelo meu envolv imento sis-
repres entaçõ es, falam sobre como são (ou devem ser) os me- temáti co com o grupo pesqui sado. Ela aconte ceu em uma
ninos e as menin as. Nas salas de aula as image ns ganha m escola da rede privad a de ensino da zona norte de Porto
~~~~~~~~~~~~A_s__l1n---a~g~e=n~s~q~u=e::....:::ln~v~a=d=e=1n:::.:a=s=-=S=a=la=s~d::::_e~A~u~l~a -'• A Cultur a Visual Produz indo Gênero

Alegre , com uma turma de 3ª série do Ensin o Funda menta l O proced imento para coleta r os dados percor reu o se-
' µ;uinte camin ho: durant e o períod o de quatro meses , no ano
compo sta por vinte e cinco estuda ntes com idade entre oito
letivo de 2008, fotogr afei diversa s image ns trazida s, "espon -
3
e nove anos. A escolh a por esse grupo de crianç as deve-s e
ao meu víncul o profiss ional com a institu ição, na qual atuo tan eamen te'', pelos estuda ntes para a sala de aula, as quais
como profes sora de Séries Iniciai s. lll anifes tam a cultur a visual na qual a turma está inserid a.
Para coleta r inform ações, utilize i as contrib uições da O objetiv o era selecio nar image ns que pudess em auxilia r na
técnica de coleta e produ ção de dados dos Grupos Focais. rdlexã o sobre a produç ão de identid ades femini nas e para
Dessa manei ra, o corpus da pesqui sa é compo sto por vin- qu e pudes sem instiga r, poster iormen te, algum as discus sões
te e quatro fotogr afias digitai s, de produ tos vincul ados à sistem áticas com as crianç as.
cultur a visual, que surgir am "espon taneam ente" na sala de A partir das fotogr afias coletad as, organi zei um "tópi-
aula. Ou seja, registr ei a "invas ão" de um vasto repert ório de co-gui a"4 para cada um dos seis encon tros com as crianç as.
image ns associa das à consti tuição de gênero nos produ tos Nessa etapa da pesqui sa utilize i as contrib uições da técnic a
consum idos pelas crianç as, como mochi las, estojos , cader- de coleta e produ ção de dados dos Grupo s Focais para obser-
nos, brinqu edos, tatuag ens, filmes, revista s, jogos, álbuns de var como os estuda ntes se posici onam frente às image ns que
figurin has, revista s e roupas . Ao mesm o tempo , esse mate- des mesm os trazem para a sala de aula. Com isso, queria
rial foi utiliza do para a organi zação dos encon tros com as perceb er quais os sentim entos, percep ções e aponta mento s
crianç as (Grupo s Focais) que, atravé s do registr o escrito das das crianç as sobre ser menin a.
falas, dos gestos e das produç ões escrita s produz idas durant e Os Grupo s Focais repres entam uma técnic a para co-
os encont ros, també m compõ em o corpus da pesqui sa. Esses letar inform ações qualita tivas em pesqui sas que preten dem
dados foram coleta dos porqu e se tornou impor tante con- explor ar experi ências , opiniõ es, sentim entos, posici oname n-
templa r os olhare s dos própri os estuda ntes sobre as image ns tos e preferê ncias. Segun do Gaske ll (2002, p. 75): "O obje-
que estão inserid as em seu meio. tivo do grupo focal é estimu lar os partici pantes a falar e a
As fotogr afias contem plam os brinqu edos, as revista s reagir àquilo que outras pessoa s no grupo dizem" .
de maior circula ção na sala de aula e os divers os materi ais Com as crianç as essa técnic a não pode restrin gir-se
escola res das crianç as. A utiliza ção de fotos procur ou le- ao u so da oralida de, pois os estuda ntes não de;non stram
gitima r as poster iores reflexõ es acerca da consti tuição de dispon ibilida de e interes se suficie ntes para tal. E necess á-
identi dades femini nas, atravé s daquil o que Loizo z (2002,
p. 137) defend e: "a image m, com ou sem acomp anham en-
to de som, oferec e um registr o restrit o, mas podero so das
3
As imagens coletada s e m sala de aula estão disponív eis, para visua lização,
110 decorrer do li vro.
ações tempo rais e dos aconte cimen tos reais - concre tos, 4
"Tópico-g uia" refere-se à elaboraç ão de uma questão que no rteia as discussõ
es
materi ais". grupo na pesquisa com técnica de grupos.focais (GASKE LL, 2002, p. 66).
de um
~~~~~~~~~~~-A_s.:_::l111-==a~g=en=s=--:!q~u=e~l=n~v~a=d=e=111::...::a~s~S~a~la~s~d~e~A~u~l~a J. A Cultur a Visua l Produ zindo Gêner o

rio, pois, a organ ização de encon tros que tenha m ativid ades :111alis ar todo um contex to discur sivo na qual estão inseri das
instig antes para as crianç as, envol vendo -as com exper iên- :rs fótogr afias, as falas, os gestos e as produ ções escrit as das
cias mais lúdica s. E ainda , por estar em conta to diário com lTÍanç as. Masc ia (2002 , p. 28) ressal ta as condi ções de exis-
as crianç as, perce bi que elas se sentia m mais "livre s" para 1C.:·ncia da a nálise do d iscurs o ao afirm ar que, "conf orme os
demo nstrar o que realm ente pensa vam sobre determ inado s pressu posto s da Análi se do Discu rso, a anális e será empr e-
assun tos, super ando uma das princi pais dificu ldade s apre- rn<lid a na conve rgênc ia do linguí stico com o social , visan do
sentad as pela coleta de dados atravé s degru posfoc ais: o perío - :rpont ar as marcas linguí sticas como produ to histór ico-so -
do de adapt ação entre pesqu isado r e sujeit os (GAS KELL , t·ial, com base nas condi ções de produ ção".
2002, p. 66). A linguagem é enfati zada, nos estud os pós- estrut ura-
Colet ar dados sobre a const ituiçã o de identi dades fe- li stas, como produ tora d e sentid os (BUJ ES, 2005, p. 185).
minin as atravé s de grupo sfocais foi uma neces sidade que sur- · l 'oda vez que descre vemo s ou interp retam os algo, estam os
giu no decor rer da invest igação , pois esse proce dimen to não produ zindo uma realid ade e molda ndo as mane iras como as
1icssoa s devem inseri r-se no mund o. Por esse motiv o, as
fo-
visa uma perce pção gener alizad a dos fatos, ou seja, aquilo
que colete i se refere , unica mente , ao grupo de crianç as que tograf ias dos mater iais visuai s, as falas, o s gestos e as produ -
a preten são
invest iguei, não preve ndo gener alizaç ões para outras turmas ~·ões escrit as das crianç as foram regist rados com
de estud antes. Gaske ll (2002 , p. 65) pressu põe esse aspec to de invest igar os discur sos const ruído s sobre ser menin a e
ao afirm ar que os dados fornec idos pelos grupo s focais não as condi ções em que esses são produ zidos no âmbit o esco-
repres entam o todo e que auxili am a "expli car achad os espe- lar. Prete ndi mostr ar que os dados coleta dos estão imers os
cífico s" de um grupo . numa rede de signif icado s e que as intera ções e as escolh as
Consi deran do que as image ns são porta doras de inú - d as crianç as por determ inado s artefa tos visuai s repres entam
meros textos e que nelas muita s inform ações podem ser uma const rução social rica em possib ilidad es de probl emati -
consta tadas, no decor rer da leitur a poder ão ser visual izadas '/,ações . Nesse caso, a sala de aula oferec eu inúme ras possib i-
as vinte e quatr o fotogr afias regist radas, em sala de aula, lidades de invest igaçõe s, e a anális e do d iscurs o repres entou
duran te o proce sso de invest igação . Elas não const ituem impor tante camin ho para poster iores reflex ões.
simpl esmen te um mater ial comp lemen tar e ilustra tivo das Gill (2002 , p. 244) afirm a que as persp ectiva s que pro-
anális es, ao contrá rio, elas repres entam a princi pal fonte de curam analis ar os discur sos partil ham de uma "rejei ção da
probl emati zaçõe s. noção realis ta de que a lingua gem é simpl esmen te um meio
Levan do-se em conta o pressu posto teóric o pós-e s- neutro de refletir, ou descre ver o mund o, e uma convi cção
trutur alista desse estud o, utilize i a anális e do discur so para d a impor tância centra l do discur so na construção da vida
verifi car as condi ções de produ ções de identi dades femin i- social ". A mesm a autor a (2002 , p. 247) també m afirm a que
nas nos dados coleta dos. Isso porqu e consid ero releva nte o discur so é perce bido como prátic a social :
~ As Imagens
que Invadem as Salas de Aula
~,..---------=- ----=---~~
•· A Cultura Visual Produzi ndo Gênero

É proveitos o pensar a anál ise de discurso como tendo Assumir posturas co mo essa, entenden do-as como se_ndo
quatro temas principai s: uma preocupação com o discurso interessantes e produt ivas para os processos de pesquisas,
em si mesmo; uma visão da lingu agem como construti va não é, evidente mente, muito confortáv el. Ao contrário , elas
(criadora) e construid a; uma ênfase no discurso como uma desestab ilizam nossas ancoragens teóricas e nossas certezas,
forma de ação; e uma convicçã o na organização retórica do nos colocam frente a frente com a parcialidad e dos mundos
discurso. que habitamo s e nos confront am com as nossas próprias
incongru ências.
Investi gar como as feminil idades são produz idas atra-
vés da cultura visual implica deter novos olhares sobre as O que também tornou o estudo instiga nte foi a p~s­
prática s educati vas nas escolas, origina r interrog ações sobre sihilida de de problem atizar, constan temente , tudo aqmlo
as relaçõe s sociais e investig ar os acontec imento s discurs ivos , ue é conside rado como verdad e no campo educac~o~al.
para a constit uição de nossas represe ntações . 1
Foi necessá rio deter diversa s perspec tivas sobre o que e tido
Segund o Gill (2002, p. 253): "fazer uma análise de dis- l·omo comum na escola, buscan do olhares de desconf iança.
curso implica questio nar nossos próprio s pressup ostos e as Confor me Meyer e Soares (2005, p. 39), o surgim ento da
maneir as como nós habitua lmente damos sentido às coisas". possibi lidade de uma multipl icidade de novos olhares ,aten-
Por isso, durante muitos momen tos da pesquis a, senti que d e aos pressup ostos de uma pesquis a com enfoqu e pos-es-
trilhava um terreno desesta bilizant e, pois percebi a a impos- t ruturali sta:
sibilida de de alcança r respost as únicas e verdade iras. A insta-
bilidad e de minhas proposi ções foi algo provoca nte, porque Os desafios colocados para aqueles e aquelas que se
propõem a fazer pesquisas em aborda gens pós-estru tu_ralis-
já não é mais possíve l alcança r rápidas e grandio sas respost as
tas envolvem, pois, essa disposição de operar com l1m 1t es e
às nossas inquiet ações no meio educac ional ou realizar , atra- dúvidas com con flitos e divergências, e de resistir à te nta-
vés de pesquis as, uma modific ação social signific ativa para os ção de formular sínteses conclusivas; de adm itir a proviso-
sujeitos envolvi dos. E também porque analisar os discurs os ri edade do sabe r e a coexistência de diversas verdades que
operam e se articulam em campos de poder-saber; de a:ei-
signific a o envolvi mento simultâ neo com esses.
tar que as ve rdades com as quais operamos são construid as
Meyer e Soares (2005, p. 39) também destaca m que o social e culturalm ente.
percurs o da pesquis a passa por trajetos inst áveis, descon for-
táveis e desesta bilizant es: As trilhas percorr idas pela pesquis a, para uma possíve l
;málise do discurs o, buscara m olhar e problem atizar as nar-
pesquisas pós-estru turalistas se organ izam por movimen tos r;ttivas na sala de aula de uma maneir a perspic az, naquilo que
e deslocélmentos, ao invés de priorizarem os pontos de se refere aos acontec imento s mais sutis e menos evident es
chegada, e focalizam suas lentes nos processos e nas práticas,
sempre múltiplas e conflitan tes, qu e vão conforma ndo os -
sobre ser menina através das imagen s. Compo rtamen tos e
esse conforma ndo nos - próprios "caminho s investiga tivos". falas corriqu eiras e que, geralm ente, ganham pouca atenção
~~~~~~~~~~~~A_s_l_JD~a~g_en~s~q~u_e_l_n_v_a_d_e_JD~ª-s~S_a_la_s_d_e~A_u_la_
dos educa dores p assara m a fazer parte do m eu repert ório Perce b o, provi soriam ente, que as subj etiv~dade s ~emi­
:,
ninas n ão são simpl esmen te "form adas" pel~ u~~verso vis~al
s
de invest ig ação. Gesto s apare nteme nte simpl es e n aturai
r
ganha ram reflex ões que consi dero releva ntes para se pensa mas intera gem e se relaci onam de mane ira coope rativa
a produ ção de gêner o na cultur a visual . Assim como Louro com o utras instân cias. Ident idade s estão fabric ando e sen do
é
(2007 , p . 63) ressal ta, procu rei deses tabiliz ar aquilo que fabric adas ao mesm o tempo . Sobre isso, novam ente H er-
dito como "comu m": nán d ez (2007 , p. 31) contr ibui ao dizer:

O processo de " fabrica ção" dos suj eitos é con - consi dero que as represen tações visuais con t ribuem , assim
tinuad o e gera lm ente muito sut il, qu ase imperce pt ível. com o os espe lhos, para a consti tuição de maneiras e modos
Antes de tenta r percebê - lo pela leitu ra das leis ou d os de ser. As representações visuais deri vam - se e ao mesmo
decret os qu e insta la m e regul am as in stitui ções ou per- tempo interag em de e com as formas de relação que c_ad_a
cebê-l o nos so lenes di scurso s das auto rid ades (embor a ser hu mano estabelece, ta mbém com as formas de s_oc1al 1-
todas essas inst ânci as també m façam se n t id o), n osso zação e acul turação nas q ua is cada um_se enco nt ra imerso
olh ar deve se vo ltar especi alment e pa ra as práticas co- desde o nascim ento e no deco rrer da v ida. Estas formas d_e
tidiana s em qu e se envo lvem t o dos os suj eitos. São, poi s, relação con tri buem para dar sent ido à sua maneira de sentir
as prát icas rotine i ras e comun s, os gestos e as pa lavras e de pensa r, de ol ha r- se e de ol har, não a p a rt~r de uma
banaliz ad os qu e precisa m se torn a r alv os de ate nção posição determ inista, mas em cons tan te 1nteraça o com os
renova da, d e qu esti o n ament o e, em es pec ia l, de des- o utros e co m sua ca pacida de de agencia mento.
confi ança. A tarefa m ais urgen te t alvez sej a exata men t e
essa: desco n f iar do q ue é tom ado co mo " nat u ra l".
Assim como Wort mann (2002 , p. 90), não procu rei de-
socultar ou denun ciar nada q ue estive sse escon dido, mas sim
Quis desco nfiar das ati tudes cotid ianas das
qu estion ar o que geralm ente é considerado natura l, o q ue n~o
c rianç as e comp reend er como as inúm eras image ns
foi proble matiz ado. As anális es, inspirad~s _num refere n_c ial
que invad em a rotina e scola r contr ibuem para qu e as
pós-es trutur alista, não estão restrit as a de~cnçoes. ?s
pesq.m sa-
meni nas escol h a m seu s brinq ue dos, roupa s, mater iais
e dores recon hecem q ue suas análises modif icam, sao modifi~~­
e deter mina das atitud es. A cultu ra visua l mostr a
e das e podem fugir ou diluir- se entre divers as certez as. As an~­
const itui, s utilm ente (e às vezes de mane ira direta
ses discur sivas "ao mesm o tempo em que exami nam a manei ra
objeti va), como as meni nas são ou devem ser. Sobre isso,
como a lingua gem é empre gada, devem també m estar sensív eis
Hern ández (2007 , p . 29) afirm a que " um mund o o nde o
àquilo que não é dito - aos silêncios" (GILL , 2002, p. 255).
que vemo s tem muita influê ncia em nossa capac idade de
D essa mane ira, atravé s d as interr ogaçõ es possib ilita-
opini ão é mais capaz de despe rtar a subje tivida d e e de
das pela anális e d o discur so, exam inei regula ridad es e va-
possi bilita r inferê nci as de conhe cimen to do que o que
ouvim os ou l emos ". riabil idade s n os dados coleta dos (GIL L, 2002, p . 267) . A
partir disso e da articu lação com as questõ es norte adora s,

E:-- ---3
~._A~C_u_l_tu~ra~V_i_s_u_a_l_P_r_o_d_u_z_i_n_d_o_Gê~-n~er_o~~~~~~~~~~~~~

emerg iram três focos para anális e, intitu lados a partir d e al- hdeza corpo ral) quant o a mane iras de ser e de agir (gesto s
~uma~ falas ilustra tivas d as crianç as envol vidas no estud o: ddica dos e realiz ação de ativid ades mais "calm as"). Atrav és
Menm as são mais doces !": atribu ição de comp ortam entos disso, elas acaba m incor poran do atitud es sociais que são <li-
femin~,nos; "Eu_já sei o que vou comp rar!": desejo s de consu - ras comu ns às menin as, como docili dade, meigu ice e recato .
m~; e_ Eu quena ser ig u al a elas!": a busca pela beleza . Esses Assim , a constr ução de subjet ividad es femin inas no mun-
tres eixos analít icos serão d esenv olvido s n o seg uimen to. do conte mpor âneo é produ zida atravé s de repres entaçõ es
visuai s e de prátic as cultur ais (HER NÁN DEZ , 2007) .
Ao falar sobre a Mora nguin ho, por exemp lo, algum as
5
"Me nina s são mais doces !": atrib uição
de comp orta men tos femi nino s menin as demo nstrar am que almej am e admir am os traços de
femin ilidad e aprese ntado s pela perso nagem . Isso acont eceu
no mome nto em que conve rsei com um grupo d e cin co me-
. As image ns que os estuda ntes trazem para a sala de aula ninas que pintav am uma revist a da Mora nguin ho. Pergu ntei
~lustram e promo vem, com certa "precisão", os gostos , os d ese- os motiv os que as levam a gosta r da perso nag em e obtive as
JOS e os comp ortam entos aceito s para cada
gênero . As crian-
seguin tes respos tas: "Gost o da Mora nguin ho porqu e ela gos-
ças, através d e suas p~~ferências por determ inado s brinqu edos, ta de moran gos e d e bichin hos que nem eu. Ela se veste bem e
p~rsonagens e maten a1s escola res, demo nstram que
vivenc iam
as e usa sainha , blusin ha da moda que gurias gosta m, coisa d e me-
d1ve~sas experi ências visuai s que d elimit am 0 que menin
nina. Eu sô que nem ela!" (Elisa).<' Outra menin a falou: "Eu
menm os podem fazer, pensa r e desejar. Isso denot a aquilo que qu eria ser igual a ela porqu e ela é bem guriaz inha, boniti nha,
f_Jern ández (2000 , p. 133) afirma : "fazem os parte d a cultura delica dinh a, queria me arrum ar que nem ela. Olha as roupa s
visual e estam os inund ados por uma extraordinár ia varied ade dela, são bonita s e brilho sas, enfeit adas, mod ernas e charm o-
de image n s e, sobret udo, de imagi nários visuai s".
sas" (Lúci a). E ainda : "Eu me acho até parec ida com a Mo-
D esse modo , reflito sobre algum as regula rid ades que rangu inho, com o jeito dela, eu també m gosto dos anima is e
e ncont rei nos dados colet ados acerca da con stituiç ão de re- porqu e as minha s roupa s são iguais as dela" (Gabr iela) .
prese ntaçõ es femin inas. No entan to, é impo rtant e salien tar O s imagi nários das estuda ntes busca m uma identi ficaçã o
~ue as anális es serão caract erizad as pela busca const ante de com as suas perso nagens prefer idas e um desejo de tornar em-
I~terrogaç~,es e por aquilo que Andr é (1994 , p. 45) caract
e-
r~za como d esvela mento de mens agens implí citas, dimen -
eram e m
soes contr aditór ias e ponto s sistem aticam ente omitid os". 5
As primeir as apariçõ es da persona gem Morang uinho acontec
reperc ussão e sucesso , na
1977, mas o desenh o animad o surgiu, com intensa
O prime iro desse s ponto s evide ncia que as menin as década de 80. Em 2002, a persona gem e suas hi stórias retomar
am ao me rcado
a p ersonag em
se identi ficam com suas perso nagen s prefer idas no que se através de filmes, sites e trilhas sonoras específi ca s e a inda com
e seu contexto numa versão ma is "adoles cente".
refere tanto a aspec tos físicos e est éticos (roup as, acessó rios, 6
Todos os nomes das c rianças particip antes, citados nesse estudo,
são fictícios .
~ As Imagens que
\.E!Y~----=------=------Invadem as Salas de Aula
-------=-=-:~

-se semelh antes a elas. As criança s demons tram que suas vidas
apresen tam inúmer os aspecto s que procura m "imitar " o jeito de
ser instaura do, por exempl o, pela Morang uinho. As menina s
buscam ser "iguais" ou semelh antes ao que conside ram bom e
bonito, mas que tipo de compor tamento s a persona gem acaba
por provoca r? As menina s corpori ficam e reprodu zem o dis-
curso transmi tido pela Morang uinho, e isso ficou evidenc iado
durante o mesmo encontr o citado anterio rmente, no qual uma
menina afirma: "Menin as têm que ser delicad as igual a Mo-
ranguin ho, não dá pra fazer as coisas de menino porque ele
gosta de coisa mais agitada , luta. Menina é calma!" (Yas).
É relevan te e instigan te notar que tal persona gem e ou-
tras, como a Barbie7 e as Princes as da Disney, 8 convive m de
Me nina pintando desenho da Moranguinho
maneir a interati va com as menina s da turma, pois essas não Nas imagen s, Mo-
(2008)
consom em soment e o livro de imagen s para serem pintada s, as ranguin ho é apresen tada
rnochila s ou os caderno s que estão na sala de aula. Elas tam- com trejeito s de timidez ,
bém interag em com um extenso repertó rio visual que inclui recato e doçura, ao mesmo
filmes, livros infantis , sites específi cos e grupos de relacion a- tempo em que está dentro
mentos virtuais (comun idades no orkut, por exempl o). dos padrões culturai s de
As imagen s a seguir ilustram uma das brincad eiras beleza estética (roupas jo-
preferid as dessas menina s: pintar as imagen s do álbum da viais, acessór ios, corpo ma-
Moran guinho durante a hora do recreio. E também eviden- gro e cabelos longos) . Isso
ciam que essa person agem exerce grande influên cia nos pa- demon stra os inúmer os
drões de compo rtamen tos das menina s da turma. discurs os que circulam no
univers o da persona gem e
que são reprodu zidos pelas
7
J\ boneca Barhie foi criada em 1936 por Ruth Handler. e m homenag em a menina s da turma. A Mo-
sua filha Bárbara. Desde então, ela tornou-se um fenômeno de vendas e ntre os
públicos infantil e adulto. Barbie represent a uma top mode/, s ímbolo de be leza ranguin ho, através de seus
e j uventude. e atualmen te apresenta diversas versões étnicas. diverso s recurso s visuais
x "As Princesas ", da Disney, é composiç ão recente e ntre as personag ens dos Me nina pin tand o o livro da Moranguinho (filmes, adesivo s, boneca s,
contos c lássicos da literatura infantil. São elas: Cinderela , Rapunzel , Branca de (L008)
Neve. Pocahont as, Bela e Jasmine. álbuns de figurinh as, es-
~~~~~~~~~~~~A_s~IJD~a_g_e_n_s_q_u_e~ln_v_a_d_e_JD~ª-s~S_a_la_s_d~e_A_u_la_

tampa s em roupa s, desen hos anima dos), contri bui para que Junto a isso, as
as menin as acred item que ser doce e calma são caract erístic as crianç as ressal tam a do-
comu ns ao femin ino. Freed man (2005 , p. 126) realiz a impor - cilida de das perso nagens
tante argum entaç ão sobre as image ns enqua nto artefa tos que femin inas e a agress ivida-
solidi ficam determ inada s repres entaçõ es: "Imag ens são uma de dos person agens mas-
forma poder osa de repres entaç ão.[ ... ] Além da beleza estéti - culino s. Eles relata m que
ca, uma image m perso nifica um signif icado... ". os brinqu edos, os filmes
e os desen hos anima do s
Uma menin a, porém , manif estou -se contr a a argu-
dos menin os geralm ente
menta ção da coleg a de que menin as devem ser calma s, evi-
possu em superp odere s
denci ando sua prefer ência pelas a titude s de outra perso na-
gem e assoc iando suas mane iras de agir com a neces sidade porqu e seu enred o (estilo
de vida) exige isso, afinal,
de não ser mais classi ficada como uma "crian ça peque na".
eles conviv em com cons-
A estud ante prefer e as atitud es da perso nagem Pucca" (que
age confo rme uma faixa et ária mais "adole scente ") e repud ia tantes lutas, com o com-
bate ao mal e com com-
o estilo de vida da Mora nguin ho. Enqu anto as colega s fala- Men ina com caderno da Pucca petiçõ es que necessitam
vam, empo lgada s, sobre a pintu ra das image ns no álbum , a
menin a rebate a afirm ação de outra menin a dizen do: "Nad a de adere s sobren aturai s para aquisi ção d~ s~ce:sos em su~s
a ver... Meni na també m luta. Eu gosto de bater nos guris. . P, . Com ·isso há a conso lidaçã o da distmçao entre atn-
h istona s. ' ·
buiçõe s sociai s destin adas às menin as e aos menm Th d
Eu não olho a Mora nguin ho. Gosto da Pucca que dá na Net os. . eo oro
e o lho todos os dias. Ela inven ta várias coisas e acaba semp re (2007 , P· 3) apont a algum as consid eraçõe s sobr_: o~ bnn~uedos
. .
fazen do bem. Ela tá procu rando dar um beijo em algué m produ zidos para as crianç as.. "Os brinqu edos vem _ imbm
, dos de
..
espec ial. Ela fica corre ndo atrás dele" (Fern anda) . norma s que define m o que é permi tido e o que nao e p_e rmitid o
para cada sexo, há um abism o que separa bem os _bn~:uedos
A estud ante demo nstra sua prefer ência pela Pucca (e
por seu estilo de viver) com a aquisi ção de um cader no, mos- destin ados para menin os e os destin ados para menm as .
trando , assim , que as image ns invad em a sala de aula, ins- Em outro mome nto em sala de aula, quand o ~onver­
tauran do, conso lidand o e molda ndo aquilo que as menm as sávam os sobre como são as menin as nos desen hos am~a~os
devem , ou não, ser e fazer: que as crianç as assist em, surgir am inúme ras falas que dis~m­
iruem as prefer ências de cada gêner o. Segun do um menm~,
~
"só os guris têm super po d eres, porque os guris gosta m mais
.
'' Pucca é uma persona gem coreana , com 1O anos de idade, produzi
da no de ação e de terror . As gunas ... se o lha m um filme de terror ,
ocidenl e com a marca Disney. No seu desenho animad o, Pucca
é apai xonada por j;'t saem gritan do pela porta" (Lucc a).
um persona gem ninja que loge, conslan lemenle , das suas tentativ
as de beijá-lo.

E :- -- --
~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula
~~------=------=-------~===
~3~.A~C~u~lt~u~r~a~V_:__:is~u~a~l~P:_~ro=d==u=zi=n=d=o=-=G~ê=n~e=r~o------------~
Os personagens instauram padrões de comporta- Através disso mostravam que sua imaginação estava ligada a
mentos masculinos que condizem a atitudes de agressi- um mundo de contos de fada, onde ser princesa era o objetivo
vidade, de dinamicidad e, de "adrenalina" e com emoções Je todas. Os textos produzidos pelos meninos, ao contrário,
fortes (necessitand o, assim, do auxílio dos superpodere s). enfatizavam histórias relacionadas a aventuras de corrida, de
As personagens das meninas, porém, não precisam de tais guerra, de lutas, de tragédias e com a presença significativa de
poderes porque suas histórias falam de uma rotina mais "palavrões". Escreveram palavras de ordem que sinalizavam
"comum" (passeios e conversas entre amigas) e sem gran- a agressividad e dos personagens . Durante essa atividade um
des aventuras ou turbulências . No mesmo momento de aluno mostra seu filme preferido, que estava guardado na mo-
discussão, citado anteriormen te, uma menina ressalta: "As chila, e diz: "Esse é o melhor filme que eu já vi!" (Adriano).
meninas são mais delicadas e elas não são igual aos meni- Em inúmeros momentos, as crianças ressaltaram que
nos, que lutam. Elas não têm armas poderosas pra lutar" seus materiais, brincadeiras , brinquedos e roupas devem es-
(Yas). tar de acordo com as característic as atribuídas a cada gêne-
Os meninos também evidenciam suas representaçõ es ro. E que seus personagens preferidos devem atender a um
logo após escutarern as falas das meninas: "Eu acho que as padrão de atitudes tipicamente feminino e masculino para
princesas não têm isso (superpodere s) porque as meninas serem aceitos pelo grupo. Ao problematiz ar a escolha por
são muito delicadas e não gostam de violênóa.Já os meninos determinado s cadernos,
gostam de violência, por isso eles têm que ser mais fortes, os estudantes eviden-
mais atléticos, mais rápidos" (João). E ainda: "As Barbies ... ciaram que as diferentes
A Rapunzel... Não precisam de poderes. Os Power Rangers interações sociais entre
precisam de poderes pra lutar contra o mal" (Nico) . Com meninas e meninos se
isso, fica evidente a reprodução de discursos que buscam a solidificam, dia-a-dia,
diferenciaçã o na atribuição de valores femininos e masculi- no âmbito escolar, dei-
nos e a concomitan te identificação pessoal das crianças com xando marcas profundas
seus personagens . nos seus comportame n-
Tal constatação também foi demarcada quando as tos. A seguinte discus-
crianças produziram textos com diálogos entre seus persona- são foi transcrita para
gens preferidos. Nos textos produzidos por meninas as histó- que seja proporciona da
rias giravam em torno de um estilo de vida mais delicado, com a problematiz ação das
convites cordiais e demonstraçõ es de amizade. Suas histórias narrativas sociais de gê-
contavam fatos ligados a passeios ao shopping, a brincadei- nero, nas quais as crian-
M1 11 ino co m DVD do fi lme Troia (2008) ças estão submersas:
ras de boneca, encontros com as amigas e festas em palácios.

- - - --3
~ as Salas de Aula As Imagens que Invadem
~~------ -

Após explorar em as fotos que focavam seus caderno s


e de conversa rem entre si, pergunte i às crianças : "Por que
meninas e meninos escolhem caderno s diferente s?" Logo,
Men ino co m seus mat eriais (2008)
um menino diz: "Os guris gostam mais de ação e adrenali na,
e as meninas são mais calmas. Por isso elas escolhem esses
cadernos com coisas delicada s" (João). No mesmo instante ,
várias crianças levantam suas mãos para contribu írem com
suas opiniões . Um outro menino fala: "As meninas são mais
doces e escolhem os caderno s que têm coisas doces também "
(Rodrigo ). Uma colega imediata mente concord a: "É verda-
de! A gente não gosta das coisas deles porque eles são muito
brutos" (Elisa). Um menino insiste em obter a palavra (atra-
vés do gesto de levantar sua mão e balançá- la diversas vezes)
e diz: "As gurias gostam de coisas de princesa s porque são
gurias. O s guris gostam de brincar de luta, jogar bola, vídeo
game, coisas que não são calmas. Elas gostam de fofocar e
conversa r" (Luan). Outro garoto complem enta: "Elas não
gostam dos guris, só das maquiag ens . O s caderno s têm as
Mrn inas co m seus ca dt'rnos (2008)
fotos dos personag ens preferid os delas . Persona gens calmos;
e os meninos gostam de personag ens com adrenali na" (Car-
los). Uma menina ressalta com voz tímida: ''A gente gosta
mais das princesa s e da Barbie, e as coisas de guris a gente
não gosta" (Fernand a).
Segundo esse diálogo, é possível identific ar, nas ima-
gens a seguir, quais os cadernos das meninas e quais os ca-
dernos dos meninos ? E ainda, problem atizar: Por que as
crianças enfatiza m um discurso de demarca ções de compor-
tamento s específic os para cada gênero? O que acontece com
as crianças que não se inserem nos padrões "esperad os"?

E:~---
~~~~~~~~~~~~A_s~lin~a_g_e_n_s_q_u_e~ln_v_a_d_e_in
~ª-s~S_a_la_s_d~e_A_u_l_a :J. A Cultura Visual Produzindo Gêner o

As personagens femininas (nesta pesquisa, represen-


tadas pela Barbie, Moran guinho, Hello Kitty, Pucca e pe- Meninas com ma teriais
las Princesas) apresentam padrões comportamenta is que da Barbie (2008)

instituem "elegância" e cordialidade para com os out ros,


recato nas palavras proferidas, uso de det erminadas roupas,
maneiras de moviment ar-se corporalmente, entre outros
a t ributos .
As meninas são seduzidas e convidadas por suas per-
sonagens a entrarem em um mundo imaginário de histórias
fantásticas, através de um articulado sistema de produção
de sentidos. Por exemplo: o contexto da Barbie é formado
pelos seus inúmeros filmes, músicas, álbuns de figurinhas,
acessórios, roupas, livros infantis, materiais escolares e pela
interação proporcionada pelos sit es (nos quais as meninas
"ganham" autonomia para montar histórias e figurinos) .
Esse arsenal visual "ensina e produz certas formas de pensar,
de agir, de estar e se relacionar com o mundo" (THEODO-
RO, 2008, p. 6). Meni no com caderno dos
heróis M arvel (2008)
Os sentimentos de docilidade, de amizade e de ter-
nura são moldados como algo inerente ao feminino. Em
seu estudo sobre os desenhos infantis, Rael (2007) afirma
que muitas histórias apresentam o feminino conectado di-
retamente com a afetividade (o coração) e que esses dis-
cursos naturalizam que as mulheres são mais dóceis, emo-
tivas e fracas.
As imagens a seguir evidenciam que as crianças con-
somem personagens que reproduzem um discurso d e doci-
lidade feminina e agressividade masculina.
~~~~~~~~~~~~A_s_l_ma~=g_en~s~q~u_e_l_n~v~a=d=e~Dl=..:a=s=--=S=a=la=s~d=e=-=-A=u=l=a :J. A Cultura Visual Produzind o Gênero
-------~
~

Durante a retoma- L·om contos da literatura clássica infantil, materiais escolares


da e reflexão das infor- e outros, contribue m para constituir o imaginári o infantil
mações coletadas com a sobre o sentiment o amoroso ligado a conjugalid ade? Por
turma, surgiu uma ques- que tal evidência está presente, principalm ente, no universo
tão que atribui às meni- fominino? As meninas consomem os contos de fada? O que
nas uma visão romântica esses clássicos narram para elas? Que representa ções de fe-
acerca dos relacionam en- minilidad e as princesas da Disney instauram ?
tos amorosos. Ou seja,
apesar de todas as crianças
associarem a frase "vive-
ram felizes para sempre"
à união de um casal he-
terossexua l, elas também
enfatizam que esse desfe-
M eni nas ca min hando com suas mochilas cho acontece somente nas
(2009)
histórias das meninas.
Instigadas pelo questiona mento sobre a frase "vive-
ram felizes para sempre" nos contos das princesas, as crian-
ças afirmaram : "Eu acho que felizes para sempre ... Que eles
casaram, tiveram a casa deles e foram felizes para sempre"
(Carlos); "I sso significa que a história foi bonita e termina
com os mocinhos se casando e sendo felizes pra sempre"
(João); "Eu entendo mais ou menos disso ... É que no meio
do filme o cara e a mulher se apaixonam e daí no final eles
se casam. Os dois pombinho s ficam felizes" (Luan). E ain-
da: "Eu, que gosto muito dos contos de fadas, eu sei. É que
no começo das histórias as princesas eram muito infelizes ...
Eram as empregad as ... No final elas se casam e vivem felizes
pra sempre" (Elisa).
Livros In fantis das cria nças (2008)
Diante disso, problemat izo: Como as inúmeras ima-
gens, presentes em sala de aula através dos brinquedo s, livros

- - - -3
fiJ' As Imagens que Invadem as Salas de Aula '· A Cultura Visual Produzi ndo Gênero
~--------

No artigo "As re- Diante disso, que atitude s sociais são prevista s para as
present ações de crian- 111 c ninas e para os menino s através das narrativ as dos dese-
ças sobre a conjuga li- 1il10s animad os, por exempl o?
dade a través da litera- Em seu estudo sobre gênero e sexuali dade nos dese-
tura infantil " (NUNE S, 1il1os da Disney , Rael (2007) aponta que os desenh os ani-
2007), ressalto que 11ia<los constit uem-se como uma pedago gia cultura l na qual
muitos artefato s cultu- :-.ao instituí das formas de agir socialm ente. A autora
(2007,
os sem percebe r
rais, entre eles os con- 11 . 160) ressalta que "assisti mos aos desenh
tos infantis clássico s, q11c eles estão nos constitu indo e ensinan do o que é ser mu-
instaur am maneir as de lh er, ser homem , ser criança , ser branco ou ser negro".
se pensar sobre o amor As menina s são apresen tadas, de forma efetiva e con-
e a união de pessoas tínua, a uma maneir a dócil e meiga de convive r no mundo :
jovens/ adultas . Afirmo "Nos desenh os animad os são apresen tadas determ inadas
que associa r a frase "fe- IÍ>rmas de feminil idade (e também de mascul inidade ), são
Men ina com cad ern o da Cinderela (2008) lizes para se1npre " ao enfatiz ados determ inados compo rtamen tos, gestos e postu-
casame nto certam ente ras .. . " (RAEL , 2007, p. 169).
constró i subjetiv idades de que esse é um estado necessário Diante das "influên cias" e da constituição de compo r-
na vida, trazend o, assim, questõe s que envolve m o amor ro- t arnento s mascul inos e feminin os, destaco que foi interes -
mantiz ado como caracte rístico das menina s, pois elas criam sante verifica r a "paixão " de um menino pelos persona gens
o imagin ário da espera do príncip e como salvaçã o de pro- Naruto e Ben 10. 1º Ele demon stra estar totalme nte envol-
blemas e de que ele esse irá propor cionar- lhe a felicida de. vido com a história dos persona gens e apresen ta o intenso
Costa (1998, p. 18) afirma que "o romant ismo foi e con- (!ese jo de ter alguma s caracte rísticas deles:
tinua sendo uma das marcas registra das da cultura ocident al".
Ainda se trata o amor como tendo ligação íntima com o casa- Eu queri a se r igu al ao Ben 101 Eu gosto de a/iens
mento, e as criança s reprodu zem tal crença, ao mesmo te1npo e também do Chama, que atira fogo. O Diamant e atira
em que vivenci am novas maneir as de relacion amento s amo- d iam an tes q ue cor tam os out ros. Olho o Naruto, no 5,
todos os di as às 11 e pouco. O Ben 10 vira os braços pra
rosos, já que inúmer as famílias apresen tam diferen tes formas bater nos o utros, mas ele é do bem . Eu gosto do relógi o
de configu ração. Mesmo que o romant ismo, na época atual,
entre em decadên cia, inúmer os são os artefato s que o repro-
'" Naruto e Bcn 1O são desenhos animados . ve iculados na rede aberta de
duzem, princip almente aqueles ligados aos persona gens fe- tdcvisão. com personag ens repletos de supcrpod cres que v ivem aventuras
minino s dos desenh os animad os, dos brinque dos, dos livros. c·hcias de lutas e no estilo japonês.
~~~~~~~~~~~~-A_s_l_in~a_g_e_n_s_q_u_e~ln~v_a_d_e_in~a_s_~sa_la_s~d_e_A~u~la ~C_u~ltu~r_a~V_i_s_u_a_l_P_r_o_d_u_z_i_n_d_o~Gê_-_n_e_r_o~~~~~~~~~~~~~
~_._A

dele que fica guardado no braço. Quando eu crescer


eu posso se r igua l ao Ben 10. Eu ten ho o v ídeo game
dele, o caderno, as canetinhas e as figur inha s. Fui eu
que compre i. Hoje eu quase chorei porque morreu uma
guria que o Zabuza treinava. O Naruto matou ela com um
poder porque ela era do ma l. Antes ela era do bem, mas
depois ficou do mal (Fábi o).

Sua admiração é demonstrada pelos diversos mate-


riais e brinquedos trazidos para a sala de aula:

M eni nos brincando com ca rtas do Naru to (2008)

Esses exemplos evidenciam como as crianças perce-


----..., __ _ bem suas atribuições sociais de gênero e como elas incor-
. 1)( >ram as maneiras socialment e aceitas de viver no mundo.

'
':.,;

Sn;í. que admitem outros modos?


A necessidade d e constante diferenciação entre atitu-
1 k s, materiais e brincadeiras femininas e masculinas reve-

le >11 um dado até então ocultad o pelo grupo de estudantes.


1:iqt 1ci surpresa ao escutar algumas vozes e discursos que
M enino com materiais do Ben 10 (2008) evidenciaram o preconceito àquelas pessoas que não aten-
d1· 111 aos comportamento s considerados naturais para cada

E:~-- ---- -3
~~~~~~~~~~~~A_s_l_m~a_g_e_n_s_q_u_e~ln_v_a_d_e_m~ª-s~S_a_la_s_d~e_A_u_l_a ~__.A~C~u_lt_u_r_a~V_í_su_a_l_P~ro_d~u_z_ín_d_o~G_ê_n_e_r_o~~~~~~~~~~~-~

gênero. Ao conversarmos sobre a escolha de seus cadernos, os tipos de "sofrimento" que sentem aqueles sujeitos que não
um menino realizou uma afirmação que recebeu gestos cor- -;e adaptam ao que é comumente aceito? O que fazemos para
porais de aceitação de alguns colegas: sermos aceitos nos grupos de convivência? O que os filmes,
desenhos animados, revistas, personagens infantis e outros
A gente é menino, não é bichinha_ Seri a bich inha dementos visuais narram sobre aqueles que não apresentam
se tivesse desenho de menina, com caderno de cheir in h o, comportamentos condizentes com o padrão vigente?
brilh o, adesivo qu e muda de posição. Isso é proi bido pros
Ao pensar sobre isso, também constatei que surgiram
meninos. É fora da lei' Esse cadern o é proibid o pros men inos,
se não vão ac har qu e eles são m eninas ao invés de men in o_
dissonâncias ao que foi apresentado até o momento. Ou seja,
Meu próximo caderno tem que ser de carro, paraqu edas ou algumas crianças reproduziram d iscursos de contrariedade
herói. Ou um caderno an imado. Qualquer tipo que seja de ;\s atribuições sociais específicas dos meninos e das meninas.
guri. Agora, pod ia ser do Ben 10 que dá na 1V (Otávio)_
Quando meninas pintavam o livro d a Moranguinho, uma d as
estudantes apresentou a seguinte argumentação de contrarie-
Ao escutar isso, outro estudante ressalta com tom de dade à identificação de suas colegas com a personagem: "Eu
voz alto e determinado: não queria ser igual a ela, eu me acho bonita. Ela é bonita,
mas eu também sou e eu gosto de mim assim. Ela não existe,
Eu gosto de aventura e não ia gosta r de caderno de existe só na TV, nos DVDs, revistas, livros, gibis, shows na TV,
men ina_ A gente não curte coi sa de menina_ A gente não
11 0 shopping" (Roberta). No encontro VII, enquanto conver-
é bicha_ Quem gosta é guria_ É o fim da picada: menino
com coisa de menina é estra nho, esqu isit o_ As menin as
s;ivamos sobre o porq u ê das meninas gostarem das princesas,
usam aqueles cadernos porque os personagens são meninas uma aluna falou: "Nem todas as gurias gostam de princesas,
e fazem co isas de men inas___ Co isas rosas ___ Vestid os __ _ e isso eu não sei por quê. Qye nem eu ... Eu não gosto porque
Tamancos_ Casacos com pêlos_ Batom __ (D iego)_
cu acho muito menininha e infantil" (Bia) .
Qyan do um menino afirmou que meninas não gos-
Uma menma também evidencia uma sutil fala pre- 1a m de lutas e de violência nos desenhos animados, uma
conceituosa ao mesmo tempo em que ressalta o discurso de 111enina levantou- se e, com voz altiva, d isse: "Tem menina
que todas as pessoas têm direito a escolher as atividades que que gost a também. Nada a ver. Eu j ogo vídeo game. Brinco
consideram positivas para si: "Eu conheço uma m enina que de luta com meus primos quando vô na casa d eles. Qyando
tem jeito de guri. Ela só gosta de carrinho. Mas menino v<·> na casa deles a gente brinca de bicicleta, de cientista, de
pode brincar de Barbie e menina pode brincar de carrinho. rnmputador, de bicicleta e de futebol" (Gabriela).
Todos têm direito" (Lúcia).
Essas falas evidenciam uma certa "rupturà' ao que, co-
Diante de tais evidências, reflito: Por que nos enquadra- 111u mente, é transmitido às meninas sobre suas maneiras ade-
mos em determinados padrões de comportamentos? Qyais q11adas de ser e de agir socialmente. Fica ilustrado que as estu-

8~-- ----3
~~~~~~~~~~~~-A_s~l1n~a_g_e_n_s_q_u_e~ln_v_a_d_e_1n~ª-s~S_a_la_s~d_e_A_u_la_ '· A Cultura Visual Produzindo Gênero

dantes vislumbram uma certa "mudança" nos padrões de com- q11 c determinam como nos constituímos enquanto sujeitos:
portamentos femininos, nos quais é privilegiada uma mulher "Somos organismos que utilizam a linguagem e não pode-
mais independente. Elas já vivenciam, em suas famílias, nas 111<ls escapar do efeito da influência das práticas discursivas
novelas, nos filmes, nas revistas, nas histórias em quadrinhos d~1 cultura (do tempo) e do poder que o acompanha, e que
e nos contos de seus personagens preferidos, uma modificação repercute em nossas formas de compreender e interpretar os
nas relações interpessoais entre homens e mulheres. ll_· nômenos sociais".
Mesmo sonhando e imaginando as roupas e as his- As imagens que invadem as salas de aula, a través de
tórias românticas e de amizade de suas personagens pre- 111ateriais escolares, roupas, acessórios, desenhos animados,
feridas, elas também demonstram que admiram e almejam lilmes, t atuagens e brinquedos, produzem um discurso so-
um estilo de vida que procura ser independente, dinâmico, bre a maneira "adequada" de meninas pensarem e agirem
com sucesso profissional e adaptado à moda. Os profissio- socialmente. P adrões de gênero são demarcados e deli-
nais ligados à produção da Moranguinho, da Barbie e das rnitados pela cultura visual que, atualmente, atende a um
Princesas já se adaptaram aos novos anseios das meninas rnercado de consumo cada vez mais específico p ara as me-
produzindo bonecas (e seus complementos) adaptadas às 11 inas. Elas não só corporificam as maneiras d e ser de suas

novas possibilidades de relacionamentos sociais. personagens, mas também desejam adquirir diversos pro-
Agora, são as meninas que buscam os "guris" no d utos relacionados - nesse caso, a Barbie, a Moranguinho,
shopping, que pagam as contas, que têm cartões de crédito a Pucca, a Hello Kitty e as Princesas da Disney. Assim, a
e cheques e que organizam os seus dias com programações reflexão que segue no próximo item é sobre o consumo de
intensas. Em um texto produzido pelas crianças, fica evi- produtos específicos pelas crianças.
dente esse novo olhar: "Eu vou comprar! Com o meu cartão
de crédito ... E eu com o meu cheque ... Depois vamos para
casa e vamos buscar os guris no bar da esquina! Depois do "Eu já sei o que vou comprar!": desejos
shopping eu vou pra balada, tu quer ir junto? Eu pago tudo!"
de consumo
(Bia e Roberta).
É interessante perceber que elas estão vivenciando ou-
A constatação de que as crianças apresentam seus de-
tras maneiras de se relacionar socialmente e deixam trans-
sejos de compra determinados, muitas vezes, pelo arsenal
parecer isso, através de suas preferências por certos persona-
de imagens veiculadas por propagandas e diversos tipos de
gens, como a Barbie e a Moranguinho, que apresentam um
programas televisivos fez originar este foco analítico que
estilo de vida jovial, independente e que atende a determi-
pre tende pensar sobre as imagens como instauradoras de
nados padrões de beleza. Hernández (2000, p. 107) afirma
desejos de compra. I sso aconteceu porque percebi' que os
que os aspectos culturais de determinados grupos sociais é
_~_.A~C~u_lt_u_r_a_V~is_u_a_l_P~ro_d~u_z_in_d_o~G_ê_n_e_r_o~~~~~~~~~~~~~

mundo altamente tecnológ ico, velocidade e f ugacidade


estudantes apresentam a necessidade de aquisição constante
compõem um estado de constante insastifação e
de produtos que têm destaque e significativa circulação en- obso lescênc ia: sempre há algo de novo a que nã o temos
tre os componentes da turma em sala de aula. acesso, e parece que nunca atingimos a linha de chegada .
Experimentamos a desqualificação das formas de v id a que
Eles procuram adquirir materiais, roupas, brinquedos
não se inscrevem no un ive rso mid iático, de consumo e
e acessórios relacionados aos seus personagens preferidos ou tecnológico.
:os produtos que estão na moda. E sse desejo de aquisição
e f~mentado por uma avalanche de imagens que circulam,
A mesma autora (2008, p. 6) ainda ressalta que a nossa
articuladamente, na mídia televisiva (propagandas e dese-
sociedade está organizada para o consumo d e bens mate-
~hos animados), na mídia impressa (jornais ou revistas), na
riais e culturais: "O mundo de hoje engaja seus membros
internet e, principalmente, na mochila e na casa dos colegas.
na sociedade em função de su a condição de consumidor".
Toda novidade que surge em sala de aula acaba transfor-
Com isso, o consumo é uma temática q u e apresenta refle-
mando-se no objeto de desejo de todos, ganhando a insis-
xões diferenciadas para as gerações que estão inseridas nas
tência para a compra no âmbito familiar. Assim aconteceu
escolas, especialmente para aquelas que estão na Educação
com os tênis com rodinhas, com as bonecas Polly, com as
Infantil ou nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental. Isso
cartinhas do Naruto, com os carrinhos de corrida de um fil-
acontece porque as crianças estão submersas num articulado
me infantil, com as tatuagens do desenho animado do Bob
sistema social, no qual se vende aquele produto que apresen-
Esponja, com a casa e o carro da Barbie e com diversos ou-
ta a propaganda mais eficiente e se insere num grupo aquele
tros produtos que, se não consumidos pelas crianças, causam
sujeito que consegue comprar.
nelas_ a sensação de não pertencimento ao grupo com que
Felipe (2007), em sua obra "Erotização dos corpos
convivem. Nesse caso, as condições de consumo determi-
infantis", revela que as crianças foram "descobertas" como
nam os relacionamentos sociais.
consumidoras em potencial a partir da década de 50 do sé-
Sobre isso, Momo (2008, p. 5) apresenta importan-
culo XX, através do surgimento das novas t ecnologias (após
te contribuição ao considerar as transformações sociais de
a Segunda Guerra). Ela exemplifica que a expansão do ser
consumo ligadas à contemporaneidade:
infantil como con sumidor pode ser verificada em diversos
estabelecimentos comerciais que reservam um espaço exclu-
Entre as configurações desse surpreenden te mundo sivo aos produtos infantis e também com a mídia televisiva,
contemporâneo, está o vertiginoso vo lume de informa ções,
o excesso de imagens que passam por nós (e pelas qua is
que se preocupa em veicular propagandas d e produtos nessa
passamos: outdoors, revistas, televisão, internet etc.). a faixa etária, em horários específicos, nos quais se pressupõe
efemeridade de bens materiais e culturais, a demasiada que as crianças estão assistindo à televisão. Sobre isso, ames-
oferta de bens e se rviços de consumo, a globa lização de ma autora (2007, p. 56) ainda afirma: "Com o surgimento
merca dorias, de modos de vida e de costumes. [...] Em um
a.A_C_u_l_t_u_r_a_V_í_s_u_a_l_P_r_o_d_u_z_ín_d_o~Gê_-_n_e_ro~~~~~~~~~~~-~

d~s veículo s de comun icação de massa, em especi al a TV, as do Power Range rs" (Otávi o). Outro menin o compl ement a:
" l~te Narut o ... Antes eu gostav a. Eu vi uma vez e gostei
,
cnanç as passar am a ser vistas como peque nos consum idores
e a cada dia são alvos consta ntes de propag andas" . s,·, que aí repete muito a tempo rada e aí já enjoou . Agora
1· 11 olho Drago n Ball, que agora dá uma
nova série no Car-
. Além disso, as possib ilidade s de compr a do mund o o ressalt a
1< ><>n" (Lucca ). Seguin do na discus são, um menin
1~fantil são inesgo táveis e com fácil e rápido acesso . É pos-
q11c seus materi ais escola res já estão desatu alizad os, pois
s1vel obter qualqu er produ to com rapide z, usufru ir dele por
:1gora ele gosta de outro person agem dos desenh os ani-
pouco tempo : ~escartá-lo e procur ar um novo materi al para
1nados : "Eu quero dizer que eu també m enjoei ... Agora eu
v~lt~r a adqu1n r. Os desejo s de compr a das crianç as são di- que
vejo Pokem om quand o eu chego da escola . Tenho até
nai:n1cos e mutáv eis, ou seja, se antes um brinqu edo, um ma-
l·ornpr ar outro cadern o!" (Yan).
tenal escolar , uma roupa ou a prefer ência por um determ i-
nado person agem perdur ava por longos meses ou até anos Outro ponto releva nte de reflexã o está relacio nado a
agora os estuda ntes expõe m que seus anseio s de consu mo: 11m fato "novo" no âmbito escolar , pois as crianç as descob ri-
suas preferê ncias mudam em questã o de pouca s seman as. ram que compr ar pela Intern et é muito mais fácil e rápido .
l•:nqua nto a mesm a discus são anteri or transc orria, uma das
. Is~o fo~ o que aconte ceu no decorr er desta pesqui sa,
niança s fez questã o de destac ar suas experi ências de com-
?~1~ venfiqu e1 que os person agens predile tos das criança s no
i ira on fin e, sugeri ndo, assim, que ele está mais atualiz ado
m1c10 do ano letivo de 2008 (perío do referen te à coleta de
cm relação aos seus colega s no que se refere às técnica s de
dados desta pesqui sa) não condiz em com as suas preferê ncias
consum o. Ele relata o seguin te: "Eu gosto de compr ar coisa
no decorr er do~~º· Diante disso, os brinqu edos, person agens,
pda intern et. Eu acho que pela intern et é melho r. Dá pra
roupas e matena 1s escolar es são descar táveis e empilh am-se
llcar ali horas escolh endo, e eu não preciso sair. Nas lojas
apenas pela necess idade de consum ir algo novo.
11ão dá pra demor ar muito" (Luan ). Esse mesm o menin o é
As priorid ades de consu mo das crianç as mudam em
surpre endido pela fala "irônic a" de uma menin a, que afirma
pouco tempo e estão em consta nte transfo rmaçã o. Elas fi- que essa prática já é comum entre os compo nentes da tur-
cam "enjoa das" de assisti r a um mesm o desen ho anima do
ma: "Hããã ããã! Todo mundo aqui já compr ou pela interne t!
na televis ão e não gostam de um person agem por muito 1:: claro que é bem melho r!" (Lúcia ).
tempo . Essa consta tação també m foi verific ada duran te a
Em seu estudo , Momo (2008, p. 6) aprese nta impor -
conver sa instiga da pela questã o "Por que vocês escolh em mido-
1antes consid eraçõe s para se pensar a infânc ia consu
materi ais escola res decora dos com os person agens dos de-
ra da contem porane idade. Para isso, ela relata a reconf igu-
senhos ?". A partir disso, os alunos iniciar am uma discus -
ração das concep ções de infânc ia que aconte ceu no final
sã~ que eviden cia que seus desejo s de aquisi ção por deter-
do século XX:
mmad os pe~sonagens e por toda a sua linha de produ tos
muda com mtens a rapide z: "Antes do Ben 10 eu gostav a
~
•· A Cultura Visual Produzi ndo Gênero---~
----

_Em relação às crian ças, as mudança s na sconfigu rações • 1111sumidas pela família . A seguint e fala evidenc ia que os
culturais do mundo têm alterado a form a com o se ap rende • 1111sumidores infantis apresen tam poder de decisão em suas
sobre. a in'.ância. Se no passado se aprendia a ser crian ça
1·sl«1lhas: "Eu escolhi meu caderno , porque se a minha mãe
a traves da 1greJa, da família, da escola e de outras institui ções
modern as, na pós-mod ernid ade o aprend er a ser cri ança e 1·sn>lhe eu não uso . E la não sabe escolhe r pra mim. Eu não
a 1de1a que se tem d e in fâ ncia amplia-s e para além dessas gcisto. Acho muito feio. Ela só compra coisa que eu não gos-
instituições. Cada vez mais as crianças aprendem o que é 111. l ~u acho na loja e mostro qual eu quero" (Nicole ).
v iver a infâ ncia por meio da mídia e do consumo .
Diante disso, os materia is consum idos pela infânci a
:1jt1dam a modela r identid ades femininas e mascul inas, já
A publici dade busca atrair a criança para a compra só para
ljllC também apresen tam produto s específ icos não
de produto s específ icos, produz indo o seu desejo de consu-
1·ada faixa etária, mas também para cada gênero. A demarc a-
mo. Ao mesmo tempo, as opiniõe s das criança s determi~am
,·ao dos limites entre o que as menina s e os menino s conso-
as est~atégias de m a rketing veicula das pela mídia em geral.
11 1cm é bastant e visível, desejad a e propag ada por todos . As
Com isso, a chamad a socieda de de consum o é produz ida
nianças não consom em soment e os produto s, mas sim todos
por um jogo seduto r que envolve os sentim entos de querer, Segund o
e 1s valores sociais que esses mantém e propag am.
obter e descart ar. Todos os materia is que são levados para
Sabat (2007, p . 152), as imagen s de homen s e de mulher es
a :s~ola represe ntam os produto s que estão circulan do pela
s;to consumidas, estabel ecendo identi<l ades de gênero : "As
m1dia em geral, e as criança s mostra m suas potenci alidade s
imagen s carrega m sentido s, apresen tam hábitos , modos de
de interaç ão constan te com novos lançam entos. Segund o
vestir, compo rtamen tos, que constit uem identid ades".
Momo (2008, p. 8):
As imagen s veicula das por diverso s meios de comun i-
l·ação represe ntam um mecani smo educati vo eficient e, que
_ O que hoje é pub licamente valioso amanhã j á pode
nao se r'. de modo qu e as crian ças parecem n unca possuir in staura modos de ser e de estar present e no mundo , que for-
o suf1 c1ente. Mui t os artefatos se t ornam obsolet os no mula identid ades de gênero e que exclui outras possibi lidades
mesmo instante em que deixa m de se r visíve is na míd ia l lc convivê ncia. As imagen s publicit árias não inventa m coisas,
principal mente na m íd ia t elevisiva. O que as cria nças leva ~
pois estão relacion adas com os desejos e com os conhec imen-
para as esco las, e o qu e desejam levar, é o que co nsid eram
publ ica mente va lioso, facilmen te reconh ecido e desejado. tos que circulam na socieda de. Sabat (2007, p. 150) colabor a
n>m essa discuss ão ao afirmar que:
A s propag andas são direcio nadas especif icamen te às
As im age ns produ zem um a pedag og ia, um a fo rm a
~riança s , e elas também não querem que seus pais ou fami-
de ensi nar as form as do mundo, produ ze m con ceitos o u
liares escolha m seus materia is. Muitas vezes, os estudan tes é pré - co nce itos sob re di versos as pectos soc iais, p ro du zem
que influen ciam na escolha de produto s e marcas que serão fo rm as de pensa r e ag i r, d e estar no m u nd o e de se re la-

----~3
~~~~~~~~~~~~A_s_lln~_a_g_e_n_s_q_u_e~ln_v_a_d_e_1n~a_s~S_a_la_s_d~e_A_u_la_ • · A Cultura Visual Produzindo Gênero

cionar com ele. A constru ção de im agens que va lori zam Neve combina com todos os outros materiais e com aces-
determinado tipo de comportamento, de estil o de vida i.1'1rios corporais (brincos, adereços de cabelo, tatuagens),
ou de pessoa , é uma forma de regulari zação soc ial que
t1>rnando a menina visível, enquanto consumidora, perante
rep rod uz padrões mais comumente ace itos em uma so -
ciedade. 11s d emais. Elas não consomem, unicamente, a imagem das
11ri ncesas o u da Barbie, mas t ambém seu estilo de vida e
.. 11 ;ts hist ó rias repletas de g lamour e de romances.
Diante disso, que representações de feminilidade as
crianças estão consumindo através da aquisição dos produ-
tos relacionados aos seus personagens preferidos? O que tais
produtos falam e ensinam sobre ser menina? O que uma
menina realmente consome quando afirma: "Eu tenho tudo
da Barbie porque eu brincava ... A única coisa que eu não
tenho é o sapatinho" (Nicole).
As crianças vivenciam experiên cias sociais ligadas à
separação de objetos de consumo feminino e masculino.
Seg undo Felipe (2003, p. 125), o feminino está ligado ao
desejo de obtenção de produtos e de comportamentos das
personagens:

Se observarmos as propagandas de bri nquedos


dirigidas às men inas, também ve remos que elas investem
de fo rm a importan te na ideia de cul t ivo à be leza como
algo in erente ao f em in ino, aliada sempre ao supé rfl uo,
ao co nsum o dese nfreado, ou seja, não basta t er apenas a
boneca Barbie, Susi ou Polly, é preciso ter todos os modelos e
variações da mesma boneca e se us respectivos acessó rios.
Men inas brincando com o laptop (200 8)

Através das imagens a seguir, as meninas da turma


pesquisada demonstram o consumo de materiais das "Prin-
cesas" (personagens da Disney) e da boneca B arbie. Nesse
caso, elas não estão consumindo somente um produto, mas
sim toda uma rede de representações que ensina como as
menmas devem ser, agir e pensar. O estojo da Branca de

€----- ----~3
.: ...::ln::v.:..:a=d=e::.'.m~a~s~S':"'a~la~s~d~e.!_A~u~la~
~-----------A_s_lm.:. : .: .:a. : '.g:.: .e:n=s-=q~u::e: ~._A_C_u_l_t_u_r_a_V_i_s_u_a_l_P_r_o_d_u_z_i_n_d_o_G_ê_n_e_ro_ _ _ _ _ _ __ _ _ __ ~

Os produ t os con-
sumi dos pelos meni nos,
Meninas com mate riais das
princesas (2008) porém , corre spon dem
ao ideal de comp orta-
ment o previ sto para o
masc uli no, semp re liga-
do aos rosto s ofens ivos
de seus perso nagen s e a
demo nstra ções de pode r
(supe rpode res) e de co-
ragem . É o caso dos pro-
dutos con sumi dos pelos
meni nos (ver imag ens
das págin as 77 e 86) .
Jun to ao consu mo
Mochila d<Js Princesas da Disney e B;irhie (2008)
de deter mina dos prod u-
admi -
tos, as crian ças tamb ém desen volve m senti ment os de
s
ração (mes mo que mom entân ea) para com os perso nagen
Menina com figurinh a da am
Branca de Neve (2008) de su as aquis ições . É in críve l como os estud antes realiz
referi -
relat os detalh ados de seus progr amas e perso n agens p
falar
dos, além de evide nciar em inten sa paixã o por eles. Ao
ques-
sobre um desen ho anim ado espec ífico (insti gado pela
os
tão "Por qu e men inas e meni nos não escol hem os mesm
mate -
tipos de cader no?") , um meni no diz : "Eu pegu ei esses
que,
riais porqu e eu sô fanát ico pelo Ben 10. Eu não sei por
(João ).
só sei q u e eu olhei a prim eira vez e me apaix onei"
e
Outr o meni no compleme nta, com tom de fala mais forte
eira
altivo , sobre seu cader no do Ben 10: "Foi amor à prim
vista" (Yan ) .

~--------~ ---------~~
~~~~~~~~~~~~~A._s~lnaa~_g_e_n_s~q_u_e~ln~v_a_d_e_na~a_s~S_a_l_a_s_d_e~A._u_l~a J. A Cultura Visual Produzind o Gênero

Menino com mochi la


A admiração a determina dos personage ns é mate- dos Power Rangers
rializada, até mesmo, pela inscrição corporal de tatuagens (2008)

que combinam com outros acessórios e pela aquisição de


produtos com estampas de seus personage ns prediletos . É
o caso da menina que combina o uso dos diversos produtos
da Hello Kitty, 11 do menino que se mostra fã dos Power
Rangers e de outra criança que consome os produtos do
Homem-A ranha:

M1·111no vestind o a camiset a do


Ho mem - Aranha (2008)

M enina com t ênis e tatuagem da Hei lo Ki tty (2008)

11 He i lo Kitty apresenta
a forma de uma gatinha branca com traços
humanos (sem boca). É um desenho japonês criado em 1974.
~~~~~~~~~~~_A_s~l1n~a=g~en=s:::..___:::q~u=e~l=n~v~a=d=e=1n=-=a~s~S=a=la=s:...::d~e~A~u~l~a ~. A Cultura Visual Produzindo Gênero

Além d e determinarem os produtos que querem com- são, realmente, instituídos enquanto consumidores e sabem
prar, as crianças també m já escolheram o local e as su as lojas que a obtenção d e d et erminados produtos qualifica a sua in-
preferidas, evidenciando suas habilidades e nquanto consu- teração no grupo. Segundo Momo (2007, p. 10), "as crianças
midoras. Devido a fat ores d e segurança, oferta de diferentes vivem o mundo d as visibilidades no qual, mais do que ter, é
produtos e status social, o shopping é o lugar destacado pe- importante parecer: parecer ter, parecer ser".
los estudantes para realizarem suas compras. Dornelles (2005, p. 90) realiza importante contribuição
N o m omento e m que produ ziam textos com diálogo sobre a constituição das crianças enquanto consumidoras:
entre dois personagens fotografado s, uma dupla de crian-
ças comentou que iria ao sh opping no final da aula. A par- As cri anças pós- m odern as são ca pt ura das pelas
tir desse comentário, surgiram diversos outros: "Eu j á sei regu lações de pod er. Elas aprendem desde cedo que consumir
é possuir de te rmin ados objetos ou demarcadores socia is,
o que vou comprar, é tipo uma b at a maravilhosa, branca,
adotar ce rto esti lo de vida ê "condição" necessária pa ra <i
lá no shopping" (Lúcia). "No shopping é legal porque d á "fe licid ade", é ter pod er. Port an t o, co nsumi r é, também, uma
pra comprar um m onte d e coisa. Ainda mais pras mulhe- fo rm a de poder, um modo ou um estilo de autossubj etivação
res. Roupa, bolsa, carteira" (Higor). "Eu acho muito legal ir o u de govern o de si.
no shopping porque lá tem muitas coisas pra fazer. Lá tem
muita loja pra fazer compra" (Yas). E ainda: "Eu gosto de ir Outro ponto que considero importante para proble-
no shopping. Sempre que eu vô no shopping ... A gente vai matização d á origem ao próximo foco analítico desse estu-
no cabeleireiro. A gent e vai comprar na Lilica R epilica, na do, que é o consumo de d eterminados padrões de beleza.
Tok. .. , na C&A e num monte de loja. Só pra escolher uma As meninas participantes dessa pesquisa evidenciaram que
roupa a gente leva quase duas horas" (Nicole). buscam, constantemente , enquadrarem- se nos padrões vi-
Diante disso problematizo: por que o sh opping é o gentes de moda. As preferências e os desejos de compra das
local escolhido pelas crianças da turma para o consumo? crianças são demarcados por fatores sociais que produzem
Como são inseridos nos g rupos d e sala d e aula aquelas a necessidade de obtenção de produtos específicos. N esse
crianças que não vão ao shopping para fazer suas compras? caso, o consumo está diretamente ligado aos padrões de be-
Por que as crianças escolheram tal lugar? leza estética aceit os socialmente.
E nquanto pesquisadora e educador a, percebo que os Certamente, a boneca Barbie e as Princesas da Disney
estudantes tornam-se consumidores eficientes e h abilitados são um dos artefatos que instauram maneiras de ser menina
a adaptarem-se às novidades do mercado, pois eles classifi- e esses modos de agir e de pensar socialmente, estão direta-
cam os produtos que condizem com a sua faixa et ária, con- mente ligados à importância de estar inserido e de con sumir
somem aquilo que julgam que será bem aceito pelo grupo d e um determinado padrão de belez a . Assunto, para o próximo
colegas e determinam o local em que querem comprar. E les item d e reflexão.
1. A Cultura Visual Produzind o Gênero

"Eu queria ser igual a elas!": a busca pela beleza l:111til onde a aparência física magra é almejada por todas
11 ~ meninas e reverencia da pelos meninos.
As imagens, junto a outros artefatos culturais, cons-
Diante da retomada das informaçõ es coletadas e da
t i t ucm um imaginári o de beleza física ideal, e as meninas
const~nte interrogaç ão a tudo aquilo que vivenciei enquanto
buscam isso constante mente. As fotografia s a seguir eviden-
pesqmsad ora e educadora com as crianças envolvida s nes-
1·i:1m que os padrões estéticos para o corpo feminino são
se estudo, percebi a presença significati va de falas, gestos,
1iroduzidos numa rede sutil de significaçõ es. As fotos de-
produções escritas e fotografia s que apresentav am discur-
sencadeia m as seguintes questões: Qye inferência s são rea-
so~ semel~antes relacionad os à produção cultural do corpo.
lizadas pelas meninas diante das imagens que elas veem nas
Diante disso, passei a problema tizar as representa ções do
revistas a seguir? Qye padrões estéticos são apresentad os?
corpo feminino e como essas se naturaliza ram através das
<...hJe corpos são fabricados por essas imagens? O que essas
seguintes perguntas : Qye tipo de padrão est ético de beleza a
imagens falam constante mente para as meninas? Como o
boneca Barbie e a Morangu inho constroem ? Qyais as ima-
padrão estético atual ganhou legitimida de social?
gens femininas mostradas pela maioria das revistas? Como
o corpo feminino está presente na publicidad e? Como as
meni.nas constituem um desejo de consumir e alcançar de-
te:min~dos padrões estéticos de beleza? Qyais os corpos que
M eni na observando uma
nao e~tao presentes nas personage ns preferidas das crianças revista {200 8)

e nas imagens publicitár ias das revistas?


Essas questões emergem e provocam -me de maneira
peculiar no momento em que vivencio a angústia de alu-
nas (com apenas oito ou nove anos de idade) relacionad a
à sua ~parência_ física. Diversas vezes as meninas expres-
sara1:° intensas inquietaçõ es e frustraçõe s sobre seu cor po,
mamfesta_ ndo o desejo de fazerem dietas, de usarem roupas
que valorizem determina das partes do corpo (sutiãs com
enchimen to, por exemplo) , de escondere m-se atrás dos
colegas para tirar uma foto (para não deixarem que regis-
trem o suposto peso indesejad o) ou de chorarem diante de
ofensas dos meninos, que também sabem expressar seus
padrões estéticos preferidos . Tudo isso em um universo in-
~~~~~~~~~~~~A_s~lrna:.::.::..:::~g=e=n=s~q~u=e=--=ln~v~a=d=e=111~a=s:_:::S~a~la~s~d~e~A~u~l~a _t. A Cultura Visual Produzind o Gênero

As meninas "so- O corpo é produzido pela rede de significad os cultu-


frem" com a ditadura da rais na qual estamos inseridos. Com isso, cuidar de um cor-
beleza ao mesmo tempo 11º feminino é, certament e, diferente de cuidar de um corpo
em que buscam enqua- 111asculino, porque as exigências , mesmo que sejam seme-
drarem-se aos padrões 1hantes no que diz respeito à necessidad e de investime nto

determina dos. Durante 11a saúde, não são as mesmas. A ideia da busca constante da
outro momento em sala hdeza tem sido expandida como algo inerente ao feminino.
de aula - no qual a dis- Segundo Felipe (2007, p. 54), "ao longo da história e nas
cussão foi gerada a partir mais diferentes culturas, o corpo tem sido pensado, cons-
da pergunta: "Como são tn1ído, investido, produzido de diferentes formas ... Corpos
os homens e as mulheres !Cmininos e masculino s não têm sido percebido s e valoriza-
dessas revistas?" - uma dos da mesma forma".
menina evidencio u seu A mesma autora (2007, p. 55) ressalta que, atualmen -
Mrnina fo lheando a revista Quem (2008)
desejo de adequar- se a te, o corpo está sendo montado e esculpido para atender
um padrão estético de a um determina do padrão de beleza estética. Um corpo
beleza física ao dizer: "Eu queria ser igual a elas porque elas cirúrgico, fabricado e produzido para ficar no centro das
são lindas, elas são modelos, são modernas e usam roupas atenções e como desejo de consumo para qualquer faixa
extravaga ntes" (Bia). c:tária:
O corpo almejado pelas meninas é constantem ente
produzido , fabricado e moldado culturalme nte, pois, a todo o Ta l preoc upação tem ating ido não só as mul heres,
mas t ambém as men in as, poi s é comum observarmo s em
mo~ento, novas técnicas surgem para que a forma física seja
suas fa las e comportam entos uma grande preocupação
modificad a. Q.yeremos alcançar a magreza, a saúde, os cabe- com a aparência ... O constante ape lo à be leza, qu e se
los lisos, uma pele sem manchas e sem pêlos, um rosto com exp ressa através de um corpo magro e j ove m, e que, para
um sorriso perfeito e clareado. Tudo isso são discursos que as se m an t er dentro desses padrões, precisa ca da vez mais se
imagens instauram e perpetuam , cotidianam ente, através de submet er a sac ri fícios e cu id ados, tem enco nt rado acolhida
não só entre mulheres mais madu ras, ma s t ambém en tre as
revistas (com fotografias publicitári as, manipulad as, de mode- jovens e meninas. Elas frequ en t am cada vez mais cedo as
los supostame nte "perfeitas" ), de livros infantis que apresentam academ ias de g inástica, se submetem a ciru rgias plásticas,
princesas belas, das bonecas com cabelos longos e corpos ma- fa zem dietas, estabe lece m pactos en tre amigas (fica r dois
gros, dos anúncios de facilidades para tratamento s e de cirur- m eses sem t omar refrigeran tes, por exe mpl o). t udo em
nome da beleza.
gias estéticas e dos diversos outros mecanism os que circulam,
também, no universo infantil feminino e masculino .
~._A~C_u_l_t_u_r_a_V_i_s_u_a_l_P_r_od~u_z_i_n_d_o_Gê~--º_e_ro~~~~~~~~~~~~~

O ~orpo é delimit ado no tempo em que se vive e vem se firm and o, fazendo parecer serem normais, inerentes,
essenciais, portanto , "naturais " do viver a ident idade
onde se vive, por isso devemo s perceb ê-lo não só biologi -
contemp orânea. Já não basta apenas ser saudável: há que
cament e, mas como algo constru ído pela socieda de. "Pen- ser belo, jovem, estar na moda e ser ativo. Há que se ter
sar o corpo assim é pensá- lo como um constru cto cultura l" estilo criado e va lorizado consoant e às possibilidades e as
(FIGU EIRA, 2007, p. 126). Dessa maneir a, ele está em in formaçõe s disponíveis a quem quiser acessá-las. A opção é
individua l e depende do esforço, da dedicação, da disciplina
constan te transfo rmação , sendo cultura lmente modifi ca-
e dos cuidados de cada um/a para construí- lo.
~º .pelos próxim os anos. Segund o Figueir a (2007, p. 124):
Vivemo s um momen to em que o culto ao corpo se tornou
As menina s da turma na qual desenvo lvi esta pesquis a
qu~se ~~a obrigaç ão. [ ... ] Os corpos não só se tornara m
demon straram que convive m, intensa mente, com inúmer as
~ais vis1veis como ~ora1:1, também , objetos de investig a-
imagen s que mostra m como deve ser um corpo feminin o. O s
Ǫ?·, Sobre eles se cnam imagen s, discurs os, formas de ad-
mira-lo s, de negá-lo s, de represe ntá-los ". menino s também evidenc iaram isso através de suas falas e
atitudes , que valoriz am determ inados padrões estético s, sen-
. Corpos esculpi dos permei am, signific ativame nte as
do bastant e incisivo s em suas opiniõe s sobre beleza. Qiand o
ii:nagen s do cotidia no. Estão nos desfiles de moda, nas 're-
questio nados sobre suas opiniõe s acerca da aparênc ia física
vistas, no meio publici tário, nos program as televisi vos nos
das mulher es que aparece m nas revistas , um deles relata: "Só
desenh~s animad os, nos livros, nos jornais , nos filmes' nas não é feia se tiver um corpo bonito, com pele branca, seios
academ~as ... Difícil seria não pensar sobre 0 nosso pr;prio volumo sos, com silicone , pé normal , 100% cheio de silico-
corpo diante de tudo isso. Ou melhor , percebe r que nunca
ne. Isso é ser bonita! " (Lucca ). Outro menino comple menta:
chegare mos .ª uma plenitu de de satisfaç ão corpora l, por-
"Mulhe r tem que ser bonita e magra" (Nico).
que.ª ~ada dia que passa os padrõe s estético s se modific am.
Qiand o pergun tado sobre como são as menina s nos
Cotidian~m~nte são criados novos produto s para provoc ar
desenh os animad os que assiste, um menino (fã do desenh o
nossa cu,~10sid~~e ,~ para incenti var a constan te busca pela
animad o Naruto ) relata sua admira ção por uma person a-
suposta perfeiç ao . Figueir a (2007, p. 126) contrib ui no-
vament e, ao identifi car a impossibilidad e de não se p~nsar gem e ressalta os aspecto s que uma menina deve ter para
sobre o corpo: ser conside rada bonita por ele: "Eu acho a Tentey bonita
porque é loira. Se ela tivesse o cabelo solto ia ser mais bo-
nita" (Fábio) .
Enfim, não são poucas as estratégias e os discursos
ela_bo rados e divulgad os em nome do culto ao corpo Diante d esses padrões de beleza, pergun to: Qiais das
~1ngindo-sc, por exemplo, à valorização da eterna juventud e imagen s a seguir atendem ao que os menino s da turma con-
a associação da saúde com a beleza e desta com a felicidade: sideram belo e que, ao mesmo tempo, fabrica m tais prefe-
Ter um co rpo perfei_to, trabalhad o, escu lpid o à imagem e
semelhança do dese10 de cada um/a é uma tendência que
rências ? Qie tipos de corpos são apresen tados?
As Imagens que Invadem as Salas de Aula ~_._A_C~u_ltur _-_n_e_r_o~~~~~~~~~~~-~
~-ª~V_i_su_a_l_P~ro_d~u_z_in_d_o~Gê

Os meninos relataram alguns padrões para uma mu-


1her (ou menina) ser considerada bonita. E sses padrões são
M en ina com a revista Caras
(2008) encontrados nas imagens acima? O feminino é loiro? Sua
pele é branca? Seu corpo é esculpido e magro? Alguma das
personagens tem silicone?
A cultura visual ensina como devem ser as meninas
e quais as preocupações que devem estar presentes no seu
dia-a-dia. As imagens registradas nesta pesquisa não mos-
tram mulheres que estejam fora do padrão estético de beleza,
mas é sobre elas que se fala o tempo todo. É ao corpo delas
que todas temem chegar. Onde estão as personagens, ou ou-
tras imagens de seres femininos, que não atendem a um pa-
drão estético de beleza determinado? Se existem tais imagens,
porque não estão presentes nas fotografias dessa pesquisa?
É produtivo e d esafiante pensar o corpo como algo
construído socialmente. Goellner (2007, p. 28) realiza uma
importante argumentação ao dizer que:
Meni na com cade rno
da Cinderela (2008)
o corpo é provisório, mu t ável e muta nte, suscet ível a
inúm eras intervenções co nsoantes ao desenvolvim ento
cientifico e tecnológico de cada cultura, bem como suas
leis, se us códigos morais, as rep resentações que cria sobre os
co rpos, os discursos que sob re ele produz e reproduz.

A mesma autora (2007, p. 29) também destaca a lin-


guagem como fat or determinante para a produção dos cor-
pos, já que é através dela que discursos são proferidos, ex-
pandidos e consolidados:

O corpo é também o qu e dele se diz e aqui est ou


a afirmar que o corpo é construído, tam bém, pela ling ua-
gem. Ou sej a, a linguagem não apenas reflete o que existe.
~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula
~_ _ ___:::___:___:_::_:_::_-=-=-==--==--=-===-==-::.::::=
~. A
Cultura Visual Produzindo Gênero ~
--------~

Ela própria cria o existente e, com relação ao corpo, a lin- estudantes estão diante de um conjunto de "regras" para o
guagem tem o poder de nomeá-lo, classificá-lo, defin ir-lhe desenvolvimento de seu corpo, ainda infantil, e desde cedo
normalidades e anormalidades, instituir, por exemplo, o que
é considerado um corpo belo, jovem e saudável.
já aprendem e seguem as normalidades vigentes.
Nesse contexto, poder e saber se entrelaçam e acabam
Os discursos das revistas, dos livros infantis, das Prin- por compor novos campos de conhecimento, pois aprendi-
cesas inseridas nos materiais escolares, das bonecas Barbie, zagens sobre o corpo são criadas e instituídas (muitas ve-
dos brinquedos, dos álbuns de figurinhas e das tatuagens zes, como únicas e verdadeiras). "O cor po, tornando-se alvo
temporárias estão inscritos em relações de poder. Um poder dos novos mecanismos do poder, oferece-se a novas formas
que regula as atitudes, que fala como agir e o que dizer, que de saber" (FOUCAULT, 1987, p. 132). Poder e saber em-
pressupõe até mesmo aquilo que se pode comer. Um poder brenham-se um no outro e coexistem; por exemplo: coti-
que disciplina nossos comportamentos para a convivência dianamente são apresentadas novas "descobertas" sobre os
social e que regula nossos desejos. Diante disso, o corpo é alimentos (aqueles alimentos que antes eram os vilões da
disciplinado e domesticado pela linguagem. "O corpo está saúde e da busca de um corpo perfeito agora passam a g a -
preso no interior de poderes muito apertados, que lhe im- nhar credibilidade nas refeições), são criados e expandidos
põem limitações, proibições ou obrigações" (FOUCAULT, novos produtos nas prateleiras dos supermercados (é cres-
1987, p. 118). cente o número de produtos light e diet oferecidos nos es-
tabelecimentos comerciais) e é ampliada a comercialização
Ao feminino está definido o cuidado constante com
de roupas que procuram disfarçar pequenas "anormalidades"
seu corpo, a obrigação de mantê-lo belo e a responsabilidade
corporais ou favorecer determinadas partes do corpo. F ou-
por ingerir qualquer substância que não esteja prevista no
cault (1987, p. 27) nos apresenta outra important e reflex ão
código de condutas de uma dieta. ''A disciplina fabrica, as-
sobre a relação entre poder e construção do saber:
sim, corpos submissos e exercitados, corpos 'dóceis"' (FOU-
CAULT, 1987, p. 119).
Tem os ant es que admitir q ue o poder pro duz sa -
As meninas aprendem, respondem e atendem a um ber (e não simplesme nt e favorece ndo-o porque serve ou
código de condutas para a manutenção e busca de uma apa- apl icando -o po rque é úti l); q ue poder e saber est ão d ire t a-
rência física que esteja inserida em determinados padrões m en t e implicad os; q ue nã o há relaçã o de poder sem cons-
t ituiçã o co rre lata de um ca m po de saber, nem sa ber q ue
culturais. Essa afirmação torna-se ilustrada com situações
nã o suponha e não con st itua ao m esmo tem po rel ações de
de sala de aula, nas quais as meninas negam-se a realizar seu pode r. Essas re lações de " pod er-saber" não deve m ent ão
lanche para não correrem o risco de adquirir peso ou ainda ser ana lisadas a pa rt ir de um suj eit o do co nhec imen to q ue
de serem fortemente criticadas por seus colegas quando co- seria ou não l iv re em relação ao sistem a do poder; m as é
preci so co nsiderar ao contrário que o sujeit o que co nhece,
mem um bombom ou uma barrinha de chocolate. Assim, as
os objetos a co nhecer e as m oda lidades de co nhecimentos
~~~~~~~~~~~~A_s~lrna~_g_e_n_s_q_u_e~ln_v_a_d_e_1n~ª-s~S_a_la_s~d_e_A_u_l_a ~~·A=--:C=u:::.:lt=u=r~a~V-=--=is~u=a=l~P~r~od::....:.::.u~zi~n_d_o~Gê--_n_e_r_o~~~~~~~~~~~-~

são outros tantos efe itos dessas implicações fundamen- A mídia publicitária, apresentada pelas revistas e é forte-
tais do poder-saber e de suas transforma ções histórica s.
111cnte consumida pelas crianças, é um exemplo de como o cor-
Resumindo, não é a ativ idade do suje ito de conhecimento
que produziria um sabe r, úti l ou arredio ao poder, mas o po é planejado e instituído. As imagens das revistas correspon-
poder-saber, os processos e as lu tas qu e o at ravessam e l km a uma das instâncias que produzem o corpo, pois, através

que o consti tuem, qu e det erminam as formas e os campos t las tecnologias fotográficas, possibilitam uma prática possível
possíveis do con hecim en t o.
1iara se alcançar uma aparência considerada bela. Passaremos,
então, a procurar por toda a vida um corpo "perfeito'', mas esse
As imagens, articuladas a outros artefatos culturais, nunca será alcançado, porque nunca é o mesmo.
produzem saberes que ocasionam a disciplina dos corpos O corpo se tornou um local das tecnologias, das mu-
femininos, pois as meninas aprendem e seguem as regu- Janças e das novidades constant es. Segundo Couto (2007,
laridades previstas para seu corpo. Elas procuram manter- p. 177):
se "em forma'', inserindo-se naquilo que Foucault (1987,
p. 143) chama de poder disciplinador, que atinge seu objetivo
As intensas t ransform ações pe las quais o co rpo
não pela força ou pela opressão, mas sim por articuladas es- está passando e, segund o os prognósticos, ainda passará,
tratégias de convencimento e de encantamento: aprese n tam um conj u nt o de promesséls, temo res, sonhos e
rea lizações in te iramen te novos. Cada vez mais existe me-
nos h ia t o en tre a imag inação e o que pode ser realiza do. A
O pod er disciplinar é, com efeito, um poder que, em
utopi a tecno lóg ica do co rpo perfeito é, si m ultaneamente,
vez de se apropriar e de retirar, t em como fun ção ma ior
idealizada e co nstruída. [. .] O que essa utopia promove é a
"adestrar"; ou sem dúvida adest rar para retirar e se apropriar
in dústria do design cor poral que se converte num autênti -
ainda mais e melhor. Ele não amarra as forças para reduzi-las;
co hino à liberdade. É anunciado a ca da instante que cada
procura ligá- las pa ra mul t iplicá- las e utilizá -las num t odo. [... ]
um pode dispor das fo rm as sonhadas, mod ificar e compor a
A disciplina "fab rica " indivídu os; ela é a técnica especifica de
aparência desejada, refo rçar e di nami zar o f uncion amen to
um poder que toma os individuas ao mesmo tempo como
do seu organ ismo.
objetos e como instrum entos de seu exercício.

Sendo assim, cada um é responsável pela arquitetura


Olhares sobre o corpo são projetados e naturalizados
de seu próprio corpo e d eve sempre recorrer a atualizações.
através das relações de poder instauradas pelas imagens.
Diante disso, é possível estranhar que as meninas de oito e
A cultura visual, então, promove e perpetua discursos que
nove anos de idade já estejam preocupadas com sua aparên-
acabam sendo refletidos nas práticas culturais, nos compor-
cia física (ainda em fase de crescimento)?
tamentos cotidianos. As imagens exercem poder sobre as
mulheres e meninas porque ensinam como deve ser o seu As meninas da turma demonstraram que já aprende-
corpo. ram sobre a "obrigação" de enquadrarem-se e de percebe-
rem aspectos ligados a normalidade constituída para seus
~~~~~~~~~~~~A_s_l_1n~a_g_en~s_q_u_e_I_n_v_a_d_e_1n~a_s~S_a_la_s_d_e~A_u_la_ :J. A Cultura Visual Produzindo Gênero ~
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corpos. Elas apresentam a necessidade de ficar com o ca- da revista, estava com roupas íntimas: "Profe! E ssa aqu i e
belo liso, de preocuparem-se com tudo aquilo que comem, muito feia! Odeio ela! Ela é má. Ela é feia, horrorosa porque
de comprarem somente roupas da moda e de mostrarem é muito má e se acha muito. Se eu encontrasse ela na rua
os acessórios que podem ser usados ao mesmo tempo que não ia nem falar ou ia estapear ela" (Yas). A outra menina
repudiam outros. rnmplementou: "Tem mulher que é feia pelo seu jeito. Essa
Novamente, as crianças apontaram imagens (nas re- t;Í fumando e isso é feio" (Elisa). E ainda: "Essa aí tá quase

vistas) de mulheres que elas consideravam belas e das que 11dada! Não acho ela bonita!" (Gabriela).
não estavam inseridas em seus padrões estéticos, eviden- As fotografias desse estudo não registraram somente
ciando, assim, suas aprendizagens sociais de atendimento as personagens preferidas das meninas, mas sim, de maneira
ao que é "esperado" e "desejado" para o visual feminino: subliminar, as atitudes, os comportamentos, as histórias e os
"Menina tem que se pintar pra ficar bonita!" (Yas). E ainda: corpos almejados pelas cri a nças. I sso aconteceu porque as
"Essa aqui não é bonita porque tem o cabelo ruim" (Yan). estudantes se identificam com bonecas e personagens q ue
Outro menino destaca que também deseja ter um familiar usam roupas joviais e que tenham histórias que mostram a
(no caso a sua mãe) que atenda ao que é considerado belo: autonomia e a independência d as meninas. Com isso, repro-
"Tem umas mulher de revista que são bem bonita, tem duzem um imaginário ideal de comportamento e de estilo
um corpo bem formado, bem bonito. Essa é feia porque de vida. Essa reflexão fica ilustrada pela fala de uma menina
está toda escabelada e isso deixa a mulher muito feia. Eu que materializou uma de suas representações sobre ser me-
xi ngo a minha mãe porque ela não quer pentear o cabelo" nina através do seguinte relato:
(Lucca).
Eu sô delicad a, esperta e gosto de brincar co m a
Outro ponto importante para reflexão é que, para
Barbie, de ser professo ra e t ipo assi m ... Eu monto um carrinho
as meninas envolvidas nessa pesquisa, a beleza corporal pras m inhas Barbi es. Eu acho a Ba rbie bem ma is legal e bem
também está associada a valores de convivência social. Ou mais bon ita, porque o ca belo dela é bem mais bon ito. O jeit o
seja, a beleza está diretamente ligada à b o ndade, à sim- dela se vest ir é bem m ais bon it o e de se diverti r tam bém. O
jeito qu e ela se veste é d ireito. Eu me vist o pare cida com a
patia e ao estilo de vida jovial e dinâ mico. Algumas falas
Barbie (Lúcia).
e gestos das meninas, enquanto folheavam as páginas das
revistas durante o encontro II, demostram que beleza não
A s personagen s preferidas das meninas produzem
corresponde a expressões de maldade, de vulgaridade e de
comportamentos que perpetuam as qualidades pessoais de
pornografia.
bondade, de respeito ao próximo e de angelicalidade como
Algumas evidências sobre isso foram apresentadas pe- inerente ao feminino. E também constroem um ideal de
las alunas enquanto conversavam sobre uma personagem de corpo que é constantemente almejado. É o caso da Moran-
uma novela que fazia o papel de uma vilã e que, na imagem guinho e das princesas da Disney :
~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula
__::=-:...=.==-==-:===--=:::...:.:::= ~u_z_i_n_d_o_G~ê_n_e_ro~~~~~~~~~~~~~
~_._A~C_u_l_tu~r_a_V_i_s_u_a_l_P_r_od
\E!Y-----___:::_______::_:_:_

Mt>n inas r;i min hando co m Moda, corpo magro e modelado , sorriso clareado, es-
mochilas (2008)
tilo de vida dinâmico e meiguice são perspectiv as que in-
vadem o cotidiano das salas de aula através d as inúmeras
imagens que as crianças vivenciam . Eis questões que já não
podem estar fora das discussões e das reflexões dos educa-
dores e educadora s em geral.
Com esse eixo de problemat ização procurei verificar
um dos aspectos de constituiç ão de identidad es femininas
através da cultura visual em contexto escolar. Também re-
fleti sobre as imagens que estão presentes na sala de aula e
sobre como elas contribue m para a instituição de um ideal
de corpo feminino. As estudante s evidencia ram suas repre-
sentações sobre ser menina e a consolida ção de padrões es-
téticos em seu universo visual.
Diante disso, análises finais não são permitida s, pois
inúmeras questões emergem novament e: Enquanto edu-
Livros infantis das rria nç<1 s (2008)
cadora, que procedim entos pedagógic os posso adotar p ara
contribuir para uma reflexão "menos inocente" dos estudan-
tes perante a cultura visual? Ao pensar sobre as meninas da
turma não deixei de contempl ar as representa ções dos me-
ninos. Por isso, problema tizo: Onde estão os corpos mascu-
linos? Que padrões são desejados e construído s para o corpo
masculino através da cultura visual?
Após realizar reflexões sobre a produção do feminino
através das imagens, passo, no próximo capítulo, a relatar
projetos pedagóg icos que procuram transcend er a análise.
Ou seja, busco proporcio nar a visualizaç ão de práticas pos-
síveis para o desenvolv imento de atividades significati vas na
área da cultura visual.
Trocando Experiênci as
de Sala de Aula

ste é o momento no qual posso compartilhar


as experiências dos trabalhos pedagógicos rea-
lizados com crianças de Educação Infantil e
Séries Iniciais do Ensino Fundamental sobre
a Cultura Visual. Com isso, tenho o objetivo de contribuir
para que diversos olhares possam surgir entre educadores e
educadoras que vivenciam, cotidianamente, a invasão de um
vasto repertório de imagens nas salas d e aula. E ssas experiên-
cias são oriundas de projetos desenvolvidos nos anos de 2005
a 2009, e todos apresentam as imagens como principal alvo
de problematiz ações e, principalmente, de criações. Serão sete
projetos: D esqfio dos Sorrisos; Os Girassóis; A B ela Tarsila: re-
fletindo sobre padrões de beleza; U m Flash na N atureza; Minha
Camiseta; A Vida Pintada no Muro; e Iberê Tristonho.

Desafio dos Sorrisos

Este projeto pedagógico em artes visuais surgiu durante


a seguinte situação: convidei meus alunos e alunas para serem
fotografados, em grupo, durante as primeiras semanas de aula.
~ f!à.s Imagens que Invadem as Salas de Aula 4 Troca~_n_d_o~E_x~p~e_r_i_ê_n_ci_a_s_d_e~S_a_la~d_e_A~u_la~~~~~~~~~~~~
~-·~
\E!Y~-------

A fotógrafa pediu um grande sorriso para cada uma das crian- relações soCia1s, promover a cordialidade e o cuidado com
ças. Diante disso, uma menina falou: "Eu não gosto d e sorrir o próximo entre os componentes da turma, reconhecer que
para tirar foto!". Outra discorda: "T od o o mundo tem que sor- um sorriso pode ser mais valioso que muitas palavras no
rir nas fotos, senão fica feio!". Na réplica: "Eu é que não sou momento em que queremos fazer alguém feliz.
falsa, não vou sorrir só para me mostrar!". Essas afirmações ali- Para alcançarmos os objetivos elaborarei uma série de
mentaram uma pequena discussão que seguiu durante alguns atividades. São elas:
minutos, e que despertou a ideia de trazer o gesto de sorrir e
as imagens relacionadas a isso para reflexões em sala de aula, 1. O R eino dos Sorrisos (Hora do conto). Como moti-
tendo em vista que "pessoas felizes e sorridentes" estão maciça- vação e reflexão inicial realizei a hora do conto interativa
mente presentes nas propagandas publicitárias como modelos através da seguinte história:
a serem seguidos por quem as consome. Junto a isso, constatei
a necessidade de cultivar valores de convivência essenciais para
O Reino dos Sorrisos
uma relação saudável entre os componentes da turma: amizade,
cordialidad e e cuidado para com o próximo. Existia um reino mu ito distant e onde todas as
Assim, a turma do t erceiro ano do Ensino Funda- pessoas viviam muito felizes. O motivo de ta l fe licidade é
que cada u ma t inha um ca rtã o do sorriso (nesse rnornento a
mental (entre sete e oito anos) passou a trabalhar, durante
professora distrib ui um ca rtão que co ntém um sorriso para
duas seman as, com a temática dos sorrisos apresentados nas cada cria nça). Esse car tão t inha uma regra de ut ilização :
imagens publicitárias, principalmente nas revistas. Os prin- t oda vez q ue uma pessoa passasse perto de ou t ra deveria
cipais o bjetivos estavam em promover reflexões acerca da dar o se u cart ão, consequ entemente, receberia tam bém.
Todos eram fel izes porqu e t rocava m sorri sos. No ent anto,
construção social da felicidade, na qual o sorriso torna-se o
um dia , a ci dade recebeu a v isi ta de um forast eiro. Ele foi
símbo lo d a satisfação, do prazer e de algo essencial para os muito bem recebido por todos e tam bém ga nh ou um cart ão
mecanismos de nossa sociedade voltada para o consumo, e da felicidade. O seu coração estava re plet o de en tusiasmo e
t ambém evidenciar que o sorriso pode ser um importante aleg ria, mas ele qu eria muito mais... Ele já não se co ntentava
somen te com um cartão e resolveu que, ao ganha r, não
gesto de carinho e cordialidad e para com o próximo.
dari a m ais o se u so rriso (a professora passa a reco lher algu ns
Outros objetivos fizeram parte do projeto: interpretar cartões). Aos poucos, o rei no foi fi cando t riste e, mesmo
as diversas informações contidas n as imagens publicitárias, tend o muitos ca rtões, o forasteiro també m já não sentia
tanta fel icidade. No fi nal da história, o forasteiro descobre
compreender que os produtos comercializados apresent am
que o segredo de fe li cidade daq uela ci dade não est ava nos
imagens ligadas à busca da satisfação e do bem-estar indi- cartões, m as sim naqui lo que se fazi a co m eles. Ele voltou
v idual e coletivo, desenvolver a formação reflexiva perante a entregar os seus sorri sos e o re ino recuperou a felicidade
diversos fatos sociais, respeitar as diferentes opiniões sobre (t odos os estud antes t rocam seus sorri sos).
o assunto, reconhecer a importância d e um sorriso para as
~-----------A_s_11n
__a_g_en_s_q_u_e_l_n_v_a_d_e_n1_a_s_S_a_la_s_d_e_A_u_l_a 4::.·__:T:..:r:...::oc:..=ª:::º:..:d::..::o:_E=:::x~pe__::_::_ri:_ê:_n_c_i_as_d_e_S_a_l_a_d_e_A_u_l_a_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _~

2. Produção textual Cada criança registrou, através de essa atividade envolveu as crianças e seus familiares de ma-
produção textual, a história contada. No entanto, elas deve- neira significativa, e o resultado final foi a produção de um
riam dar continuidade ao conto. Ou seja, relatar o que pode painel contendo duas mil e cem imagens de sorrisos. O pai-
ter acontecido depois que o forasteiro devolveu os sorrisos. nel foi destaque na escola, pois ocupou um grande espaço
Cada criança teve a oportunidade de ler a sua história para nos corredores. Além disso, deixava curiosos todos aqueles
os demais colegas e, com isso, criaram diferentes e criativas que por ali passavam.
situações para o Reino dos Sorrisos.
3. Ginástica facial do sorriso. Li para a turma uma re-
portagem que esclarece os benefícios do sorriso para a mus-
culatura facial e propus uma ginástica facial. Nesse momento
as crianças seguiam orientações, tais como: todos devem dar
uma gargalhada de bruxa, todos devem sorrir discretamente,
todos devem dar um sorriso de paquera, todos devem dar um
sorriso falso, um sorriso muito alegre, um sorriso para uma
foto (as crianças podem sugerir tipos diferentes de sorrisos).
Nessa atividade, a expressão corporal tornou-se evidente e
proporcionou um período de muitas risadas e descontração.
4. Música. Cantamos uma música relacionada ao as-
sunto dos sorrisos:

a.'
Crianças e o pain el com 2.100 imagens de sorr isos [200 8)
Sorria ao dizer: Boa Tarde!
Sorria ao dizer: Boa Tarde!
Sorria fe liz. Sorria feliz. 6. Reflexão sobre o painel Durante posterior momento
Sorria ao dizer: Boa ta rd e! de debate, realizei as seguintes perguntas para as crianças: se
Sorr ia ao dizer _ _ _ __ _
o desafio fosse procurar imagens de pessoas tristes, seria fácil
encontrá-las? Foi fácil achar imagens de pessoas sorrindo? Por
quê? Essas questões desencadearam um debate rico em per-
5. Desafio dos sorrisos. A turma recebeu o desafio de cepções sobre a Cultura Visual na qual estamos inseridos. Foi o
trazer mil imagens de pessoas sorrindo (retiradas de revis- momento final do projeto e as falas das crianças evidenciaram
tas) em um prazo de apenas três dias. Por ser um desafio, as aprendizagens realizadas, tais como: "Uma revista n ão pode

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~~~~~~~~~~~-A_s_I_m~a_g_en_s~q_u_e_I_n_v_a_d_e_m~a_s_s_a_Ia_s_d_e~A_u_l_a 4. Trocando Experiências de Sala de Aula ~
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ter pessoas tristes porque fica feia e ninguém compra"; "As pes- e que não acreditavam nas possibilidades que esse campo
soas só tiram fotos quando estão felizes"; "Eu nunca fiquei tris- poderia obter na formação dos educandos. Nessa escola, as
te"; "Se eu vou comprar um tênis, eu não quero ver foto de nin- aulas de artes eram pouco reflexivas, pouco planejadas e se
guém com dor, e as revistas não vão colocar pessoas tristes pra resumiam à pintura com lápis de cor de desenhos fotoco-
vender"; ''Acho que o colégio vai ficar mais feliz agora porque piados, à apresentação de uma música no dia das mães ou
eu nunca vi tanta gente feliz junta"; "Já pensou se as revistas não no dia dos pais e à produção de bandeirinhas de São João
tivessem gente rindo?"; "Eu gosto de ver todo o mundo feliz" e decorados com restos de lápis apontados.
"Tem um monte de gente com sorriso falso nas revistas". As possibilidades pedagógicas que as expressões artísti-
Essas afirmações demonstram que diferentes olhares cas podem proporcionar ao currículo escolar foram redefinidas
foram lançados sobre o assunto e que nenhum deles repre- pelas professoras e pela equipe diretiva através de reflexões de-
sentou a resposta "correta". Através de suas afirmações, os correntes do planejamento e da execução desse projeto. Desta
estudantes desenvolveram reflexões críticas importantes so- maneira, o relato deste busca abrir caminhos para novas possi-
bre as imagens publicitárias das revistas, e ainda compreen- bilidades educacionais na área das artes visuais, ressaltando seu
deram a importância de um sorriso sincero nos relaciona- ensino e ressignificando aquilo que Franz (1995, p. 74) acredita
mentos interpessoais. Não posso afirmar que as brigas em ao dizer que "as potencialidades pedagógicas das artes ainda
sala de aula terminaram. No entanto, essas crianças tiveram são pouco conhecidas pela educação escolar".
a oportunidade de pensar, problematizar e autoavaliar as si- O projeto pedagógico "Os Girassóis" foi desenvolvido
tuações que estavam ocorrendo em seu meio. com crianças da primeira série do Ensino Fundamental, em
processo de alfabetização, durante o segundo trimestre do
ano letivo de 2005. Articulou experiências relacionadas ao
Os Girassóis desenvolvimento das plantas com a obra "Os Girassóis", de
Vicent Van Gogh.
Este projeto pedagógico surgiu em meio a um con- No plano de estudos dessa série estava previsto o tra-
texto no qual as artes visuais ou qualquer outra expressão balho sobre o desenvolvimento das plantas, desde seu ciclo
artística não eram contempladas nos planos de estudo e nos de vida ao processo de preservação ambiental. Além disso,
planejamentos diários das Séries Iniciais do Ensino Funda- as crianças demonstraram inúmeras curiosidades sobre uma
mental. Por esse motivo, tornou-se fonte produtiva de ques- coleção de livros que se encontravam na caixa da leitura dis-
tionamentos para todas as educadoras da instituição que, até ponibilizada em um espaço na sala de aula. Apesar de ain-
então, percebiam as artes visuais como uma simples estraté- da não conseguirem ler com :fluência o conteúdo das obras,
gia de ação para desenvolver outras áreas do conhecimento, os alunos e as alunas ficaram encantados com as imagens (e
com a possível história) dos livros que contavam as aventuras
4. Trocando Experiências de Sala de Aula ~
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de Érica~ nos títulos "Érica e os girassóis", "Érica e a Mona


Lisa" e "Erica e os impressionistas'', todos de James Mayhew
(2001). Diante disso, passamos, eu e minha paralela, a estudar
e planejar o projeto que veio a se chamar "Os Girassóis".
. Tínhamos os seguintes objetivos: desenvolver apren-
dizagens sobre o desenvolvimento das plantas, através do
processo de germinação de sementes; promover a reflexão
sobre a preservação da natureza e sobre a importância da
reciclagem do papel como estratégia para preservar as ár-
vores; avançar o processo de alfabetização; conhecer a vida
e algumas obras do artista Vicent Van Gogh; relacionar a
obra "Os Girassóis" com aprendizagens sobre as plantas; de-
senvolver a formação cidadã e valores de responsabilidade
para com a preservação da natureza; e ampliar a criatividade
através da valorização do poder da imaginação. Reprod ução da obra Os Girassóis utiliza da durante o proje to
Fonte: hisl oriaar tebrasileira.blogspot.com/2009/06/v__ _
Para alcançarmos os objetivos, elaboramos uma série
de atividades, entre elas:
3. Hora do conto. Li para as crianças, de maneira intera-
tiva e utilizando um 31-vental com imagens coladas em velcro,
. . 1. Pesquisa na Internet sobre Vicent Van Gogh. Nessa
a história do livro "Erica e os girassóis", de James Mayhew
atividade, os alunos descobriram, junto aos seus familiares,
(2001). Essa história conta a aventura de uma menina que
inúmeras curiosidades sobre a vida e a obra do artista. As
visita um museu de arte com sua avó e lá entra em confusões
descobertas foram compartilhadas entre o s componentes da
devido à invasão de seu cachorro. Em uma das confusões o
turma através do relato oral de cada criança.
cachorro entra no quadro "Os Girassóis" e derruba as plan-
2. Apreciação e reflexão sobre a obra "Os Girassóis': Nesse tas, espalhando as diversas sementes de girassóis.
momento, as crianças visualizaram a obra, em lâmina de retro-
4. Coleção de sem entes. Realizamos uma coletânea de
proj.etor, para que pudéssemos conversar sobre suas impressões,
diversos tipos de sementes para compormos o "livro das se-
dúvidas e inferências. Partimos da seguinte questão: quem co-
mentes". Nessa atividade, também selecionamos algumas
nhece um girassol? Os comentários e relatos dos estudantes
para realizarmos o processo de germinação em potes, inclu-
evidenciaram seus conhecimentos prévios acerca do assunto,
sive com sementes de girassóis. A partir disso, iniciamos um
possibilitando a elaboração das atividades posteriores.
estudo sobre o desenvolvimento das plantas.
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5. Bonecos de alpiste. Cada criança produziu um bo- Por esse motivo, realizamos uma visitação ao Santander Cul-
neco com sementes de alpiste (que apresenta o crescimento tural (localizado no centro de Porto Alegre). L á, as crianças
muito rápido). Colocamos sementes de alpiste e terra dentro realizaram apropriações culturais e conheceram um pouco
de meias-calças, amarramos em formato redondo (cabeça), sobre o funcionamento de um museu.
decoramos, molhamos as cabeças depois de prontas e espe- A avaliação do projeto foi realizada através de observa-
ramos crescer o "cabelo verde" em apenas três dias. ções diárias das professoras e coleta de alguns m ateriais dos
6. Livro com aventuras do boneco de alpiste. No labora- alunos com registro escrito. As principais produções das crian-
tório de Informática, produzimos um livro no qual as crian- ças (textos escritos, bonecos de alpiste, papel reciclado, livro
ças escreveram histórias contando as aventuras dos bonecos das sementes) foram expostas n a biblioteca da escola. Também
de alpiste, sempre inspiradas em Érica. constatei que as crianças realizaram inúmeras aprendizagens,
7. Visita ao galpão de reciclagem. Estudamos sobre a pro- não somente ligadas ao conhecimento das plantas, mas tam-
dução de papel e depois visitamos um galpão de reciclagem, bém à formação de reflexão crítica perante fatos sociais ligados
a fim de que os estudantes pudessem visualizar o processo de à preservação da natureza. Eles sentiam-se responsáveis pela
reciclagem do lixo, compreendendo assim a importância de se- separação do lixo em suas casas, como também realizavam
pararmos o lixo seco constantes inferências (relações) com as obras de Van Gogh.
do orgânico, para que Na escola, a repercussão do projeto foi ainda maior. Isso
não seja necessária a aconteceu porque relatávamos as atividades durante ocasiões
derrubada de tantas informais com nossas colegas e também porque começamos a
árvores para a produ- reconstruir os planos de estudo na área das artes visuais na escola.
ção do papel. As percepções das educadoras sobre a arte com as crianças passa-
ram a ganhar novos olhares e ressignificações importantes.
8. Produção de
papel reciclado. Pro-
duzimos, em sala de
aula, papel reciclado. A bela Tarsila: refletindo sobre padrões de beleza
9. Visita ao
museu de arte. Assim
O projeto "Pintando com Tarsila do Amaral" foi de-
como Érica, as crian-
senvolvido com alunos de Educação Infantil da quarta série
ças desejaram ter
do Ensino Fundamental, durante três meses do ano letivo
Crianças visitando um galpão de reciclagem (200 5) uma aventura dentro
de 2006. Meu relato, porém, diz respeito às atividades da
de um museu de arte.
segunda série, na qual trabalhava e que tinha como principal
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objetivo a construção de conhecimentos realmente significa- pensam sobre o seu corpo físico. Muitos querem ter um corpo
tivos para a vida de cada estudante e a de aprendizagens que diferente do que possuem por não se considerarem bonitos.
ampliem o leque de saberes e a constituição não somente de ~erem ser magros, altos, vestir-se na última moda, escon-
habilidades cognitivas, mas também de aprendizagens afe- der o uso de aparelhos dentários e óculos, disfarçar partes do
tivas e sociais. O tema proposto estava ligado à articulação corpo consideradas desproporcionais e, em alguns casos, não
de estudos sobre a vida e as obras da artista brasileira Tarsila gost ar da p rópria cor de pele. Tudo isso marcado por acon-
do Amaral, com a construção de reflexões críticas acerca dos tecimentos que passo a exemplificar: diante da ofensa de um
padrões de beleza sociais, implicados na cultura visual (ima- colega, uma menina sai chorando da aula de Educação Física
gens publicitárias) e nos quais estamos inseridos . e me diz: "Profe, eu j á tentei fazer todas as d ietas, mas não
Os seguintes objetivos basearam o desenvolvimento do consigo emagrecer" (aluna com nove anos). Em outra oca-
projeto: apreensão de que existem inúmeras formas de expres- sião percebi qu e, durante vários dias, u ma menina (com oito
são que também estão repletas de significados, pensamentos anos) não estava lanch ando. Ao comunicar-me com a família,
e sentimentos; desenvolvimento da sensibilidade na busca de descobri que a estudante escondia seu lanche para não ter d e
novos olhares sociais; reconhecimento da imensa diversidade comer e, assim, não en gord ar.
na qual se está inserido; promoção da liberdade d e imagina- Desta maneira, foi con siderado importante trazer esse
ção, incentivando o poder de criação e de recriação; desenvol- assunto para reflexão em sala de aula, p artindo do conceito
vimento de reflexões críticas sobre os padrões d e beleza física que Trindade (2002, p. 78) nos traz: "A concepção e percep-
que regem nossa atualidade; valorização p essoal e d as carac- ção de corpo humano nem sempre foi concebida ou perce-
terísticas corporais de cada aluno; conhecimento d a história bida como hoje, tudo t em uma longa história, logo, não é
de vida e das principais obras da artista Tarsila do Amaral; e natural". E ainda "Seja qual for a visão do corpo que t e nha-
promoção de interpretações criativas e da criatividade. mos, ela é m arcada por um legado histórico, social, p o lítico,
O desenvolvimento desse projeto procurou instigar as ideológico, econômico, cultural". Por este motivo, encontra -
discussões sobre a constante busca pela beleza física, presen- mos na arte um pouco da história sobre as con cepções de
te em nosso cotidiano e que é refletida nos gestos e nas falas p adrões de beleza d e épocas e context os históricos diferen-
dos alunos e das alunas em sala de aula. Busquei propor- tes, sempre buscando a contextualização atu al.
cionar reflexões sobre a valorização d o próprio corpo como Outro ponto que justifica o d esenvolvimento de um
portador de beleza única. E ainda que os padrões de altura, projeto ligado à área das artes visuais, com especial enfoque
peso e etnia, sugeridos nos mais diversos veículos de comu- n a artista T arsila d o Amaral, está n a promissora articula-
nicação como modelos de beleza, podem ser contestados. ção do proj eto com o utras áreas do conhecimento. Estava
O assunto se originou da seguinte constatação: a maio- previsto no Plano d e E studos das Séries Iniciais o t rab alho
ria dos alunos demonstra preocupações com o que os outros com o corpo humano em suas diversas abordagens, desde
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a biológica, que vai das partes e funções do corpo humano, quanto o cartaz dos conhecimentos prévios foram guarda-
até os aspectos sociais, como os padrões de beleza de nossa dos para análise e reflexão posterior.
sociedade que já são almejados pelas crianças (aqueles que 3. Pesquisa sobre Tarsila do Amaral. Nessa atividade, as
não se inserem na beleza esperada, são apelidados e até ri- crianças realizaram uma pesquisa sobre a artista T arsila do
dicularizados pelos demais, acarretando baixa autoestima). Amaral, em conjunto com suas famílias. As pesquisas foram
Desta forma, Tarsila do Amaral apresenta suas obras com posteriormente apresentadas e exploradas pelos componen-
grande ênfase ao corpo humano sob um olhar diferenciado. tes da turma.
Suas telas provocam a quem observa, fazem surgir questio-
namentos e curiosidades. As cores vibrantes e suas combi-
nações atendem ao imaginário infantil de um mundo que
não precisa ser necessariamente o que vemos. Ela é uma ar-
tista provocante, que apresenta uma história de vida singular
e com inúmeros aspectos interessantes a serem verificados.
O trabalho com o corpo humano e suas reflexões sobre os
padrões de beleza contemporâneos se articularam com per-
feição à vida e obra de Tarsila do Amaral.
Segue o relato das principais atividades desenvolvidas
durante o projeto:

1. Cartaz dos conhecimentos prévios. Nessa atividade, Meninas co m suas pesqu isas (200 6)
registrei em um cartaz as falas dos estudantes e suas dúvidas
referentes à artista Tarsila do Amaral. Isso representa veri- 4. Hora do conto. O livro "Tarsila do Amaral", da Edi-
ficar os conhecimentos prévios que os alunos apresentam tora Moderna (BRAGA, 1998), foi utilizado para a hora do
sobre o assunto que será trabalhado. A seguinte pergunta conto interativa, na qual os alunos acompanharam a histó-
norteou essa atividade: o que sabemos e o que queremos ria, relacionando-a com suas pesquisas.
saber sobre Tarsila do Amaral? 5. Exploração de imagens. Foram mostradas aos alunos,
2. Painel com imagens de revistas. A turma, organiza- em forma de lâminas de retroprojetor, as obras ''Abaporu", ''A
da em pequenos grupos (que possuíam cola, tesoura, papel Negra'', ''Antropofagia" e "Os operários" (imagens escolhidas
pardo e revistas), deveria montar um painel com imagens pela turma) para que pudéssemos conversar sobre elas. Os alu-
de pessoas que consideravam bonitas. Tanto esse trabalho nos relataram suas impressões e hipóteses através das seguintes
perguntas instigadoras: por que Tarsila pintou dessa forma o
~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula 4. Trocando Experiências de Sala de Aula ~
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corpo humano? Qyem já viu algo parecido? Esses corpos são


bonitos? Por quê? A partir disso, os alunos começaram a refletir
e discutir sobre os padrões de beleza em d iferentes contextos
sociais, compreendendo que esses se modificam com o tempo e
que cada povo, em determinado momento histórico, apresenta
peculiaridades. Nesse momento, o painel produzido com ima-
gens d e pessoas que os alunos consideravam bonitas foi apre-
sentado novamente. Com isto eles passaram a conversar sobre
as questões: qual o corpo ideal em nossa atualidade? Por quê?
Qyal a relação entre padrões de beleza com as imagens vistas?
Como percebemos o corpo através do meio de comunicação?
O que isso implica na n ossa vida? O que consideramos belo?
6 . Obras em argila. O s alunos, inspirados em Tarsila do
Amaral e em suas obras, produziram uma escultura em argila.
7. Autorretrato. Inspirados n a obra "Manteau Rouge",
os alunos utilizaram espelhos para produz ir um autorretrato
com lápis grafite. Com essa a tividade surgiu o sempre pre-
sent e questionamento: com qual lápis pinto a cor da minha
pele? Através dessa inquietação iniciamos uma discussão
pertinente sobre questões é tnicas com a seguinte reflexão:
qual o lápis d e cor que tem a minha cor de pele? Vale ressal-
t ar que esse momento fez originar outro proj eto pedagógico
ligado à discussão sobre diferenças étnicas.
8. P rodução da tela e organização da exposição de arte. O s Telas prod uzidas pelas
cr ia nças (2006)
alunos produz iram telas, com tintas específicas, in spirados
nas obras de Tarsila do Amaral e nas reflexões que fizemo s
durante a realização do projeto. Posteriormente, elaboramos
convites e a organização de uma exposição aberta à comuni-
dade com as telas produzidas.
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M om en tos da exposição 9. Avaliação. Ao concluir as atividades realizamos uma


1 das te las (2006)
avaliação do proje to . Nesse momento, os alunos visualizaram
o cartaz inicial dos conhecimentos prévios e compararam
su as hipóteses iniciais com as aprendizagens adqu iridas.
O processo de avaliação foi ponto importante nesse
proj eto, pois buscou constatar as aprendizagens e as n eces-
sidad es apresentadas pelos alunos. Registros escritos, obser-
vações diárias, t rabalhos individuais e em grupos represen-
tam os instrumentos avaliativos utilizados pelas professoras
no decorrer do projeto.
Ao final, constatei aprendizagens significativas nos
alunos através de suas falas, escritas e gestos. Seus olhares e
suas percepções sobre as artes visuais puderam ser ressig ni-
ficadas através da com preensão que existem diversas formas
de expressão. Trabalhar com a imaginação proporcionou
escritas diferenciadas e o prazer pela busca de novas apren-
dizagens. Por fim, os alunos perceberam- se criativos e suas
potencialidad es artísticas se ampliaram. Com essas ativida-
des foram possibilitadas reflexões críticas sobre os padrões
de beleza presentes na atualidade. O s alunos puderam pro-
blematizar, argumentar e produzir concepções sociais que
auxiliarão em sua formação pessoal e social.

Um flash na natureza

O projeto "Um flash na natureza" foi desenvolvido no


primeiro trimestre do ano de 2007, com alunos e alunas da
terceira série do Ensino Fundamental. I nsere- se na área d e
artes visuais (fotografia) e apresent a importantes articula-
ções com o utras áreas do conhecimento.
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Foram desenvolvidas atividades relacionadas ao estu- as mudanças climáticas, o d esperdício d e água e luz e os
do de uma temática com grande enfoque nos meios de co- desmatamentos são exemplos de assuntos vivenciados pelas
municação: a relação entre o homem e a natureza. Isso pro- crianças cotidianamente.
porcionou o desenvolvimento de diversas atividades, sendo Os objetivos específicos para a área de artes visuais
que a principal foi uma exposição de fotos, organizada pelas foram: desenvolver a sensibilidade na busca de novos olha-
crianças, sobre a n a tureza. res sociais, tornando - se capaz de assimilar o meio visual e
Justifico esse projeto pedagógico a partir de três pers- plástico em que vive com uma atitude reflexiva e crítica;
pectivas: a primeira se refere à relevância d e discussões sobre compreender e analisar imagen s; promover a liberd ade de
a prática educativa d esenvolvida nas escolas na área das artes imaginação, incentivando o poder de criação e de recriação;
visuais, considerando que essa pode contribuir significativa- ampliar a percepção d e representações plásticas e da expres-
mente para a formação de sujeitos reflexivos e criativos. são de sentimentos e de ideias; desmistificar que a arte re-
A segunda se refere à constatação de que a vida so- presenta somente um dom e que pode ser praticada apenas
cial está transformando-se radicalmente, através das novas por uma minoria de nossa sociedade; ampliar os conheci-
tecnologias e das novas maneiras de se ver e de se p erceber mentos na área visual e a bagagem cultural; promover a bus-
o mundo. As imagens dominam o cenário social e apresen- ca de informações em diferentes fontes para obtenção de
tam tanto valor quanto a leitura das palavras. Uma imagem respostas; desenvolver a verbalização de suas aprendizagens,
tem muito a relatar e a ser interpretada, pois carrega consi- reflexões, dúvidas e questionamentos, registrar de maneira
go inúmeras mensagens. Dessa forma, a instituição escolar clara su as aprendizagens; e vivenciar atitudes de cidadania
també m deve ser reconfig urada para atender às novas n eces- para a preservação da n atureza.
sidades apresentadas pelo contexto social. A e scolha pelo trabalho específico em fotografia diz
O terceiro ponto que justifica o desenvolvimento d es- respeito à necessidade de apresentar uma nova forma de
se projeto está na necessidade de conhecer melhor o am- expressão artística para os estudantes e demais e nvolvidos,
biente no qual vivemos: sua história, com fatos que j á acon- como familiares e professores.
teceram, que estão acontecendo, sua paisagem e o resultado A exposição de fotos foi o ponto culminante desse pro-
das ações das pessoas. Por isso, o tema da preservação da jeto. No entanto, diversas outras atividades foram desenvolvi-
natureza surge com muita força. As transformações climá- das sobre a temática da preservação d a natureza. Entre elas:
ticas, o acúmulo do lixo e diversos outros assuntos viraram
notícias constantes n a sociedade, e já não devem ficar fora 1. Cartaz dos conhecimentos prévios. Nessa a tividade, a
das discussões em sala de aula. Diversos meios de comuni- professora registrou em um cartaz as falas dos alunos e su as
l.:HJío enfatizam a necessidade da criação urgente de estra- dúvidas referentes à atual situação do n osso m eio ambiente.
1égias para preservar o meio no qual vivemos. A reciclagem,

14:1
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As Imagens que Invadem as Salas de Aula _4_._T_r_oc_a_n~d_o_E_x_p~e_n_-_ê_n_c_ia_s_d_e~S_a_l_a_d_e_A~u_l_a~~~~~~~~~~-~

A seguinte pergunta norteou essa atividade: o que sabemos


e o que queremos saber sobre a natureza? O painel foi fixado
na sala de aula para posterior visualização.
2. Reportagens. Cada criança pesquisou reportagens (vei-
culadas em jornais) acerca da destruição da natureza para que
pudéssemos conversar e realizar um debate. Cada estudante
verbalizou suas interpretações e reflexões sobre as notícias, tor-
nando esse momento rico em trocas de aprendizagens.
3. Hora do conto. O livro "Um flash na natureza", de
Luciana Borre Nunes, foi utilizado para a hora do conto
interativa, em que os alunos acompanharam a história, re-
lacionando-a com as reportagens citadas anteriormente. No
enredo, um menino torna-se um grande pesquisador p eran- Visita a u ma fá brica de papel higiênico (2007)
te seus colegas de aula por trazer belas fotos sobre a natureza
e por apresentar diversas alternativas e dicas para cuidarmos 6. Papel reciclado. Diante de tantas atividades, as crian-
do meio ambiente, entre elas, a reciclagem do papel para a ças sentiram-se provocadas a também produzir papel reci-
preservação das árvores. clado em sala de aula, e, com ele, elaboramos cartões com
4. Estudo dos vegetais. Diante das informações e opi- dicas para a preservação da natureza.
niões expressas pelas crianças, decidimos que realizaríamos
estudos sobre a reprodução, respiração, transpiração e o pro-
cesso de fotossíntese dos vegetais, a fim de compreender a
importância da preservação das árvores para o equilíbrio
do meio ambiente. As atividades realizadas nessa etapa do
projeto foram importantes para construção e produção de
conhecimentos, dando origem a atividade seguinte.
5. Visita a uma fábrica de papel higiênico. Visitamos
uma fábrica de papel higiênico que utiliza o papel reciclado
como matéria-prima. Nesse local, as crianças observaram
todo o processo de transformação do papel reciclado em
novos produtos.
Produção de papel reciclado em sala de aula (2007)
~-----------A_s_l_m_a_g_e_n_s_q_u_e_l_n_v_a_d_e_m_a_s_s_a_la_s_d_e_A_u_l_a 4. Trocando Experiências de Sala de Aula ~
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8. Passeio de barco pelo Lago Guaíba. Fizemos um pas-


seio de barco pelo lago Guaíba para que as crianças pudes-
sem refletir e questionar a poluição de nossa principal fonte
de abastecimento: o lago Guaíba. Foram momentos de mui-
t as aprend izagens, sorrisos e indignação diante de tantos
materiais (lixo) que "boiavam" pelas águas.

Produção de papel rec iclado em sa la de aula (2007)

7. Parifletagem. O sentimento de proteção ao meio am-


biente ficou extremamente aflorado entre as crianças. Por isso,
fomos até um supermercado local para realizarmos uma pan-
fletagem com os cartões que produzimos com papel reciclado.
Esses continham dicas de preservação da natureza, tais como:
não deixar a torneira aberta quando escovamos os dentes, não
lavar as calçadas e os carros com mangueira.

Passeio pelo La go Gua iba (2007)

9. Visita à unidade de tratamento de água de Porto Alegre


(DMAE). Também visitamos o D MAE, para que as crian-
ças presenciassem o processo de tratamento de nossa água e
para que pudessem sanar algumas curiosidades apresentadas
em sala de aula. Por exemplo : as crianças não conseguiam
acreditar que a água que saía de nossas torneiras era a mes-
ma, extremamente poluída, que estava no lago Guaíb a.

\ri<rn ças rea lizando pan fl etagem ecológica (2007)

I46
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Passeio ao DMAE (2007)

10. Peça teatral. Devido ao grande envolvimento da


turma, o projeto estendeu-se por várias semanas, tornando
possível a execução de uma peça teatral apresentada para a
comunidade escolar. ''A vida em nossas mãos" é uma fábula
que contou a história de uma menina que reuniu diversos
amigos animais para ajudar a natureza contra a destruição
do homem.

M omentos da apresent ação da peça teat ral (2007)


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_ 4. Trocando Experiências de Sala de Aula
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11. Projeto de reciclagem. As famílias dos estudantes


foram convidadas a participar do projeto permanente de
reciclagem, que reverte a venda de produtos recicláveis em
materiais pedagógicos para as crianças. Essa iniciativa per-
dura até os dias atuais na escola.
12. Exposição defatos. Cada criança foi desafiada a regis-
trar, através de fotos (em máquina digital), os aspectos positi-
vos e negativos da situação da natureza em sua comunidade.
Duas fotos por aluno foram escolhidas, ampliadas, debatidas
e expostas pelas crianças para toda a comunidade escolar. Vi-
sualize algumas imagens produzidas pelos estudantes:

Fotog rafias tiradas pelos


es tu dan tes (2007)

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~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula 4. Trocando Experiências de Sala de Aula ~
\ro-------=-----~-___:_:_:_:_::__=-=-== --------~

se apresenta assim como facilitadora da reconstrução e re-


elaboração, por parte de cada estudante, de seu processo ao
longo de um curso ou de um período de ensino".
Ao concluirmos as atividades, constatei aprendiza-
gens significativas nos alunos através de suas falas, escritas
e gestos. Eles vivenciaram experiências importantes ao des-
cobrirem-se responsáveis pela preservação da natureza. Esse
conjunto de conhecimentos possibilitou a compreensão de
uma realidade maior e o entendimento de que todos nós
fazemos parte da construção do amanhã, e que hoje neces-
sitamos praticar mudanças comportamentais urgentes para
que a situação da destruição da natureza seja amenizada.
E, ainda, as professoras puderam questionar seus tra-
balhos com as artes visuais na escola e suas reflexões amplia-
ram-se para melhor atender ao que as crianças da contem-
poraneidade necessitam. O projeto ainda apresentou impor-
tante seguimento, pois a escola adotou práticas permanentes
de reciclagem na instituição.
O processo de avaliação é ponto importante nesse
projeto, pois buscou constatar as aprendizagens e as necessi-
dades apresentadas pelos alunos. Reg istros escritos, observa-
ções diárias, trabalhos individuais e em grupos representam Minha camiseta
os instrumentos avaliativos utilizados pelas professoras.
Foram também produzidos portfólios, nos quais os Este projeto foi desenvolvido no segundo semestre de
alunos puderam organizar e deixar registradas suas aprendi- 2007,com crianças da terceira série do Ensino Fundamental.Ti-
zagens no decorrer das atividades propostas. O portfólio foi nha como principais objetivos a valorização pessoal de cada estu-
composto por suas produções escritas, fotos, imagens bus- dante, a reflexão crítica sobre as imagens veiculadas nas revistas,
cadas em diferentes meios, pinturas e outras contribuições. a integração entre os alunos e alunas e o combate aos constantes
Hernández (2000, p. 165) apresenta importante afirmação apelidos pejorativos tão correntes no mundo escolar.
ao dizer que esse instrumento se consolida como impor- Surgiu a partir da constatação de que inúmeras crian-
tante ferramenta de aprendizagem: ''A função do portfólio ças estavam sendo "vítimas" de apelidos que provocavam
~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula 4. Trocando Experiências de Sala de Aula ~
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marcas pessoais negativas. Elas eram chamadas de "riqui- ram suas camisetas com as imagens dos objetos relacionados
nhas", "patricinhas", "gordas", "gulosas", entre tantos outros à sua característica. Por exemplo: uma m enina foi conside-
que se torna impossível relatar neste momento (quem traba- rada a "falante" da turma, então a camiseta dela deveria ter
lha em sala de aula deve imaginar os outros apelidos!). I sso inúmeras imagens de "balões de histórias em quadrinhos".
provocava diversos momentos de violência verbal e a minha Uma menina que antes ficava incomodada ao ser chamada
constante amenização de brigas. Além disso, tinha na turma de "Patricinha" adotou esse apelido como sua característica
uma criança que já não queria ir à escola, pois se sentia ridi- marcante e decidiu que sua camiseta estaria repleta de ima-
cularizada pelos demais. Com essas constatações tornou-se gens de perfumes, joias, roupas, maquiagens, bolsas e sapa-
necessária a elaboração de um projeto que valorizasse as ca- tos. Outra menina adorou quando disseram que ela era ro-
racterísticas individuais e que, ao mesmo tempo, oportuni- mântica, então sua camiseta deveria estar repleta de imagens
zasse a expressão criativa e reflexiva dos estudantes. de flores. O menino que adorava matemática encheu sua
Passo a relatar o andamento das atividades relaciona- camiseta com imagens de números. Imaginem a "b agunça"
das ao projeto: saudável que se criou em sala de aula no momento da pro-
dução dessas camisetas! Foi uma bagunça produtiva na qual
todos se ajudaram at é que as camisetas ficassem prontas.
1. Jogo da fafaca. Esse jogo foi realizado com a intenção
Observe algumas delas e os momentos de produção:
de atribuir características positivas a cada estudante, funcio-
nando da seguinte maneira: uma criança de cada vez sai da
sala de aula. Enquanto espera, os demais colegas falam sobre
suas características positivas. Ao retornar, um outro colega (o
"fofoqueiro" previamente escolhido pela professora) conta to-
das as coisas que foram ditas. A criança elege uma das fofocas
como aquela que será a sua marca. A cada marca deve ser atri-
buída uma imagem concreta. Exemplos: o menino que tinha
como característica ser o "rei da tabuada" teve diversos núme-
ros como sua imagem concreta. A menina que era a melhor
jogadora de vôlei do colégio tinha como imagem concreta
bolas e outros objetos relacionados ao vôlei.
2. Produção das camisetas. C ada estudante deveria tra-
zer uma revista, uma camiseta usada, um cabide, cola co-
mum e tesoura. Com esses materiais, as crianças preenche-
Momentos de produção das camiset as em sal a de aula (2007)
~~~~~~~~~~~~~A~s:.....:.:lm==a~g~e=n=s~q~u==e~l=n~v~a=d=e=m::..:a~s:._::S~a~la~s~d~e~A~u~la 4. Trocando Experiênci as de Sala de Aula
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M omen tos de produção


das camisetas em sala de ,
aula (2007)

3. Exposição das Camisetas. No dia de entrega de avalia-


ções trimestrais (momento em que geralment e temos a pre-
sença maciça dos pais ou responsáve is na escola) organizam os
uma exposição d as camisetas. Inúmeras camisetas (não iden-
tificadas pelo nome, mas pelas preferênci as e características
de cada aluno) estavam expostas em uma sala de aula. Foram
cerca de duzentas e trinta camisetas expostas, tornando o am-
biente visualmen te atraente para os visitantes.
4. Reflexão Final. Em sala de aula, após a expos1çao ,
chegou o momento de refletirmo s criticame nte sobre a
nossa produção. Perguntei às crianças: quais foram as duas
primeiras camisetas a serem concluída s no dia em que as
~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula 4. Trocando Experiências de Sala de Aula
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produzimos? Obtive como resposta as camisetas da menina aulas, pois as imagens veiculadas pelas revistas foram alvo de
vaidosa (Patricinha), que continha imagens de roupas, joias, reflexões críticas dos estudantes, que certamente farão novas
bolsas, maquiagens e perfumes, e a camiseta da menina que leituras e vislumbrarão diversos olhares sobre elas.
se assumiu como gulosa, tendo inúmeras imagens de doces
e guloseimas. Depois perguntei: quais foram as duas últimas
camisetas a ficarem prontas? Obtive como resposta a cami-
A vida pintada no muro
seta da menina romântica que deveria estar repleta de flores,
e a camiseta do menino que se dizia um futuro cientista, que
teria imagens de objetos relacionados ao mundo científico O projeto "A Vida Pintada no Muro" foi desenvolvido
como lunetas, planetas, células (ambas as camisetas tiveram no primeiro trimestre do ano letivo de 2008, com alunos da
de ser concluídas em outro dia devido à falta de imagens Educação Infantil da quarta série do Ensino Fundamen-
nas revistas). Diante dessas duas constatações perguntei: por tal, e apresentou como principal atividade a pintura de um
que terminamos essas duas camisetas primeiro e essas ou- muro da escola (com cerca de trinta metros de extensão)
tras tivemos de terminar em outro dia? com a temática da valorização da vida.
Diante desse questionamento surgiram outros decor- Dessa maneira, foram desenvolvidas atividades em
rentes das respostas das crianças: por que não encontramos sala de aula relacionadas à compreensão e reflexão sobre as
muitas imagens de coisas relacionadas ao mundo científico imagens que representam a "vida" veiculadas nos meios de
nas revistas? O que as revistas querem vender? Qyais as re- comunicação.
vistas que vocês trouxeram para a escola? Qye tipo de ima- O projeto surgiu da necessidade, constatada pelas pro-
gens nós encontramos com mais frequência nas revistas? fes soras e equipe diretiva, de desenvolver atividades que va-
Para que elas servem? Os comentários e inferências realiza- lorizassem a vida como um presente que deve ser cultivado
dos pelas crianças foram repletos de reflexões importantes todos os dias e para que as crianças também pudessem cons-
sobre as imagens veiculadas nas revistas consumidas por suas truir sonhos de uma convivência social mais harmoniosa.
famílias. Eles pensaram sobre os aspectos que valorizamos Além disso, queríamos colorir a escola, deixá-la visualmente
em nosso cotidiano e que acabam tornando-se referência atraente e bonita para as nossas crianças.
para a produção das revistas de maior circulação. Por isso, os objetivos foram refletir sobre aspectos re-
Ao concluir essa produção artística, percebi a valori- lacionados à valorização da vida; problematizar as imagens
zação pessoal de cada estudante, afinal, características po- publicitárias que veiculam mensagens ligadas à temática;
sitivas foram ressaltadas em meio a um ambiente que an- desenvolver a criatividade; conhecer melhor o ambiente em
tes valorizava somente os apelidos pejorativos. Além disso, que vivemos; praticar mudanças comportamentais urgen-
visualizei apropriações reflexivas em suas falas durante as tes para que a situação da violência seja reconfigurada; de-
~~~~~~~~~~~~A_s_I_m~a=g~e_n_s_q~u_e~=ln~v~a~d~e=m=-a=s=--=S~a=la=s~d==-:eA=u=l=a 4. Trocando Experiênci as de Sala de Aula
-~------~
~

senvolver a sensibilid ade na busca de novos olhares sociais 2. Seleção de imagens. Diante de tantas reflexões realiza-
'
tornando- se capaz de assimilar o meio visual em que vive das durante a atividade anterior, as crianças foram convidada s
com uma atitude reflexiva e crítica; promover a liberdade de a participar em da pintura do muro. Então, selecionam os di-
imaginaçã o; ampliar a percepção de representa ções plásticas versas imagens que seriam recriadas para a elaboração de um
e a expressão de sentiment os e de ideias; e ampliar os co- esboço para a pintura do muro. As principais imagens criadas
nhecimen tos na área visual e a bagagem cultural. pelos estudantes através de desenhos foram arco-íris, borbo-
A pintura do muro foi o ponto culminan te desse pro- letas, animais diversos, plantas diversas, pegadas de animais,
jeto. No entanto, diversas outras atividades foram desenvol- sol, gotas da chuva, fundo do mar, céu, crianças brincando ,
vidas sobre a temática. Entre elas: flores, corações, materiais escolares e outros.
3. Seleção dos participan tes e pintura do muro. Devido
1. Reflexão sobre as imagens de revistas. Nessa ati- ao grande número de crianças da escola, cada turma sele-
vidade registrei em um cartaz as falas dos alunos so- cionou (por critérios diversos elaborado s pelas professora s)
bre suas percepçõe s iniciais acerca da palavra "vida". dois estudante s para realizarem a pintura. Foram vinte e
Depois, solicitei que eles observass em algumas revis- cinco crianças envolvida s nos quatro dias de pintura. Eles
tas e que recortasse m imagens que fos sem relacionad as manipulav am as tintas e os pincéis e pintavam as imagens
à valorizaçã o da vida para a composiç ão de um painel. Or- que tinham sido previamen te rascunhad as no muro. Foram
ganizados em grupos, eles deveriam apresenta r e justificar momento s de muita risada, conversas e trabalho, no qual o
as imagens escolhidas . É interessan te relatar que, na turma envolvime nto das professora s foi essencial para um resulta-
com a qual atuei, inúmeras falas das crianças indicavam a do final positivo, que pode ser visualizad o através d as fotos:
falta de imagens relacionad as ao tema nas revistas. E ainda
que a reflexão estava sendo levada a sério pelos estudante s
que, durante suas apresentaç ões, disseram: "Não tem nada
disso nas revistas, só gente querendo vender coisas", "Não
tem muita imagem porque quem fala sobre vida são as ig re-
jas e as escolas" e "Só tem foto de coisa ruim ou gente em
festas". E ainda: "Não tem muita coisa não, mas as pessoas
também são vida e isso tem muito nas revistas" e "Nós acha-
mos só uns animais e o céu no fundo das fotos dos artistas".
Vale ressaltar que as revistas utilizadas em sala de aula, ge-
ralmente, refletem o consumo das famílias, estando ligadas
a assuntos sobre a moda e o universo dos artistas. Resultado final da pin tura do mu ro (2008)
~~~~~~~~~~~~-A_s_l~1n.: :. : . :a~~ge=n=s~q~u=e=--=l=n~v~a~d~e~1n~a~s~S~a~la~s~d~e~A~u~la 4. Trocando Experiências de Sala de Aula
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Momentos da pintura
do muro (2008)

Ao realizar uma avaliação do projeto, as professoras


mostraram-s e satisfeitas e felizes com o resultado final, mas
principalme nte com os relatos daquilo que as crianças fa-
lavam em sala de aula. Os alunos perceberam- se criativos,
reflexivos, e suas potencialida des artísticas se ampliaram.
E les também vivenciaram experiências importantes ao des-
cobrirem-se responsáveis pela escola. O resultado final foi
um muro colorido e ch eio de vida!
fiJ' As Imagens que Invadem as Salas de Aula
~~------=------_____:__:___:_:....::::..::::.-=-===--==--===
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4. Trocando Experiências de Sala de Aula
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lberê Tristonho aos sentimentos de perda, solidão e tristeza sendo traba-


lhada e refletida nas escolas, mesmo que esteja presente no
Justifico a realização do projeto pedagógico Iberê Tris- cotidiano de t odos.
tonho, desenvolvido no primeiro trimestre d o ano d e 2009, a P or t odas essas situações Iberê Camargo (reconhecido
partir d e situações pontuais que ocorreram dentro da sala de pintor gaúcho) foi escolhido como foco para o projeto, vis-
aula. A turma citada cursava o terceiro ano d o Ensino Fun- to que esse artista apresenta obras bastante expressivas em
damental e tinha um hist órico de muita afetividade entre os relação à exposição de sentimentos ditos negativos (como
componentes do grupo. Eles eram extremamente amáveis melancolia e solidão), e sua trajetória d e vida também apre-
uns com os outros e est avam sempre procurando ajudar o senta cenas "tristes" que instigam conversas e debates.
próximo (um sonho de turma para qualquer professora). Durante o projeto foram desenvolvidas atividades re-
No entant o, situações de cunho familiar com algu- lacionadas ao estudo da vida e da obra de Iberê Camargo,
mas crianças estavam originando momentos trist es em bem como moment os de reflexão e produções artísticas. Para
sala de aula, nos quais os estudant es ficavam ch at eados tal, os seguintes obj etivos se fizeram presentes: conhecer a
ao verem alguns de seus colegas passando por situações vida e a obra do importante artista gaúcho I berê Camargo;
bastante difíceis. Diversas vezes as crianças me procura- realizar apropriações culturais; desenvolver reflexões acerca
ram em segredo para darem sugest ões e para solicitarem de assuntos relacionados aos sentimentos de tristeza, perdas
que algo fosse feito para alegrar a vida de seus três colegas e solidão; perceber a importância de compartilhar emoções
(queriam escrever cartões em tamanho gigante, realizar vi- com familiares e amigos; expressar sentimentos e desejos
sita surpresa, ensaiar músicas, entre outros). E les estavam através da pintura; ampliar conhecimentos na área visual;
totalmente envolvidos com as situ ações que agora cito: na promover a busca de informações em diferentes fontes para
primeira, um menino perdeu, inesperadament e, seu pai obten ção de respostas; e promover a liberdade de imagina-
em situação de doença; na segund a, uma menina também ção, incentivando o poder de criação e de recriação.
perdeu su a irmã (recém- nascida) que estava sendo espera- A realização desse proj eto contou com as seguintes
da com muito carinho pela família; e, na terceira situação, atividades:
uma colega estava deixando a escola, pois seus pais esta-
vam em circunstân cia de separação. 1. Exploração inicial do assunto. Logo ao entrar em sala
Essas situações comoveram a turma de maneira muito d e aula perguntei para os estudantes: quem é Iberê Camargo?
especial, por isso percebi que havia a necessidade de mo- Como j á esperava, as crianças mostraram-se ansiosas e curiosas,
mentos específicos de produções, conversas e reflexões que pois não conh eciam o artista. Então passei a registrar as diversas
a tendesse m ao que os estudantes queriam dizer e manifes- hipóteses, entre elas, d estaco que Iberê poderia ser uma mulher
tar.Junto a isso, também não observo a temática relacionada famosa, um cantor estrangeiro ou um político corrupto.
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As Imagens que Invadem as Salas de Aula ~4~·T.:..:_ro=c=a=n=d=o=--=E=x~pe:..=.n=·ê=n=c=ia~s~d~e_S_a_la~d_e_A_u~Iª~~~~~~~~~~-~

2. Exploração das imagens das telas de Iberê. Distribuí 0 motivo pelo qual o artista estava triste. Nesse momento,
diversos cartões com imagens das telas de Iberê para a tur- percebi o envolvimento dos estudantes no assunto e a com-
ma e solicitei um olhar atento para tudo aquilo que estava paração com suas próprias experiências pessoais:
pintado e desenhado. Em seguida, iniciei um ciclo de per-
guntas que eram elaboradas de acordo com as respostas das - Vocês imaginam o motivo da tristeza? (Professora).
crianças. Descrevo algumas falas: - Pode ser várias coisas, mas perder alguém da família
deve ser um motivo bem grande (Yesley).
- O que vocês estão vendo? (Professora). - Talvez o cachorro dele tenha morrido. O meu ca-
- Desenhos muito feios e escuros (Adriana). chorro morreu quando fez uma cirurgia e eu fiquei muito
- São pinturas! E são de uma pessoa que tá muito triste mesmo (Vinicius).
triste ou chateada com alguma coisa (Yesley). - Eu também tô numa fase muito triste porque minha
- Por que triste? (Professora). mãe tá se separando do meu pai e ele tem outra família. Tá
- Por que tudo tá escuro, sem vida, sem cores boni- muito triste pra mim e pra ela (Ângela).
tas ... As pessoas são feias! (Ângela).
- Todas as fotos mostram isso mesmo. Acho que quem Essas e outras falas evidenciam os pensamentos e re-
pintou não tava de bem com a vida. Acho que essa pessoa flexões que surgiram através das obras de Iberê. Certamente
devia tá muito sozinha (Eduarda). foi um momento de trocas de experiências e de cumplicida-
- Ele não sabe desenhar. Tudo tá muito feio? (Vinícius). de entre os componentes da turma.
- Ele sabe desenhar, mas ele quis desenhar assim por-
que ele tava triste (Leonardo).

Esse trecho demonstra uma exploração inicial das


obras de Iberê Camargo e as hipóteses das crianças diante
de imagens que ainda não faziam parte de seu repertório
visual. Durante essa atividade os estudantes atribuíram va-
lores de tristeza, solidão, angústia e isolamento às telas por
visualizarem cores escuras, formas descontínuas e figuras
humanas "alteradas". Foi nessa situação que as crianças des-
cobriram que Iberê Camargo era um pintor (daí intitulamos
o projeto como "Iberê Tristonho") . Mas o interessante da
conversa foi quando as crianças começaram a pensar sobre Debate sob re as obras de lberê (2009)
~
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As Imagens que Invadem as Salas de Aula ~4~·=T=r=oc=a=n==d=o~E=x~pe~r~i~ê~n_c_ia_s_d_e~S_a_la~d_e_A~u_l_a~~~~~~~~~~-~

3. É ruim ficar turma investigou tudo sobre a vida e obra do artista. A cada nova
triste? Essa foi a per- descoberta, um registro era adicionado em seus cadernos.
gunta que as crian- 5. Pintura. O momento da pintura foi marcante! A
ças levaram como proposta foi a seguinte: cada um deveria pensar em um fato
tema de casa. Elas triste que t enha acontecido em sua história de vida. Depois,
deveriam pensar so- esse fato deveria ser registrado através da pintura, assim
bre isso e conversar como Iberê Camargo. Mas a pintura deveria ser "misterio-
com suas famílias, sa", ou seja, ninguém poderia iden tificar as suas imagens.
recolhendo diferen- Utilizei o termo "mistério" para aguçar a criatividade e para
tes opiniões. No dia que as crianças pudessem fugir de desenhos estereotipados
Debate sobre as obras de lberê (2009)
seguinte, um debate em suas produções. Ao falar em "mistério", o s estudantes
muito produtivo foi travado em sala de aula, pois a exploração deveriam criar imagens que fizessem sentido para eles mes-
dessa questão com os familiares levantou muitas ideias diferen- mos e que os o utros não entendessem o conteúdo.
tes e importantes. O meu interesse estava centrado na busca de As pinturas ficaram ricas em produção de sentidos.
opiniões que revelassem como as famílias e, consequentemen- Em momento posterior, cada criança relatou os seus senti-
te, as crianças, tratavam as situações conflituosas e que cau- mentos (inscritos no papel) para os demais colegas (decifrar
sam tristezas em seu cotidiano. O debate foi nota dez! Muitas o m istério!) . Foi então que os três estud antes, que inspira-
opiniões e comentários certamente balançaram as reflexões das ram a elaboração desse projeto, puderam colocar "para fora"
crianças. Observe algumas falas: suas angústias e tristezas.

- T odo o mundo lá em casa disse que ficar triste faz


parte da vida e que é impossível viver sem ter alguma tris-
teza (Nicolau).
- L á em casa ninguém disse que ficar triste é bom.
Eles disseram que faz mal pro coração! (Eduardo).
- A gente sempre consegue ver coisas boas, mas só
depois que passa um tem pão. Né, profe? (Anita).

4. Investigações na Internet. Após o momento de debate


sobre as obras de lberê, as crianças ficaram motivadas a descobrir
novas informações. Por isso, fomos à sala de informática e lá a Pinturas misteriosas (2009)
~ As Imagens que Invadem as Salas de Aula 4 . Trocando Experiências de Sala de Aula ~
~-------- --------~

6. Visita à 7. Voltamos a pintar! D e volta à escola, pintamos! Ago-


Fundação Iberê Ca- ra a temática era livre, embora ainda inspirados em Iberê.
margo. Visitamos a
Fundação Iberê Ca-
margo e lá pudemos
conhecer (bem de Pinturas (2009)

perto) as obras do
artista e um pouco
mais sobre sua his-
Pintu ras misteriosas (2009)
tória. Também per-
cebemos a impor-
tância cultural do artist a para o Rio Grande do Sul. Nessa
visita orientada, exploramos as obras, assistimos a um filme
que mostrou alguns momentos de produção artística de Ibe-
rê e t ambém participamos de uma oficina na parte externa
do prédio (com uma vista belíssima do Lago Guaíba!) .

As produções realizadas durante o projeto foram


"bárbaras", assim como as aprendizag ens e os momentos de
reflexão sobre os acontecimentos do dia-a- dia. Foram ativi-
dades importantes p ara que as crianças percebessem que a
tristeza pode, sim, conter boas aprendizagens e que podem
ser superadas com o auxílio d aqueles que nos cercam, prin-
cipalmente pela família e pelos amigos.
Cria nças explo rando a Fundaçã o lberê Camargo (2009)
~~~~~~~~~~~~A_s~l1n~a_g_e_n_s_q_u_e~In_v_a_d_e_1n~a_s~S_a_la_s~d_e_A_u~la

Vale ressaltar que todas as atividades descritas ante- Pa avras Finais


riormente tinham um registro escrito, afinal, o trabalho pe-
dagógico com o terceiro ano do Ensino Fundamental tam-
bém prevê a continuidade da alfabetização. E sses registros
foram utilizados para a composição de livros individuais, que
também continham as pinturas das crianças. Foi interessan-
te verificar que os estudantes perceberam que aprenderam
muitas coisas diferentes ao visualizarem suas respostas ini-
ciais acerca da pergunta: quem é lberê Camargo?

''
s guris não brincam com Barbie porque
eles gostam de brincar com carrinhos e
de correr, e as meninas são mais deli-
cadas. Eu acho isso!" (Lúcia). Através
dessa fala, registrada durante o andament o d a pesquisa de
mestrado, articulo um fechamento provisório de m inhas in-
quiet ações sobre nossa constituição social através da Cultu-
ra Visual. I sso porque a expressão meninas são mais d elica -
das evidencia uma das fortes representações que as meninas
apresentam sobre suas vivências e comprova que as ima-
gens com as quais interagimos dizem muito sobre nossas
identidades culturais. Elas perpetuam e instauram algumas
verdades sobre como devemos agir, pensar e falar nos mais
variados assuntos e ambientes.
Uma dessas "verdades", encontradas durante o tercei-
ro capítulo está relacionada ao imaginário de beleza física
ideal procurada, constantemente, pelas meninas. O corpo
almejado pelas estudantes é produzido, fabricado e moldado
culturalmente, pois as imagens com as quais elas convivem
dizem como esses devem ser esculpidos e revestidos. As
~~~~~~~~~~~~A_s~lm~a~g~e_n_s_q~u_e~ln_v_a_d_e_m~ª-s~S_a_Ia_s_d~e_A_u_I_a Palavras Finais ~
--------~

meninas vivenciam discursos visuais que instauram o desejo perante a educação dos olhares sociais d os estudantes. Her-
pelo corpo magro, dinâmico e fashion. Assim, as crianças nández (2007, p. 77) ressalta a importância que os educadores
estão diante de um conjunto de "regras" para o desenvolvi- detêm na incumbência de promover novos e diferentes o lha-
mento de seu corpo, ainda infantil, e desde cedo já apren- res sobre a constituição de gênero: "é necessário que os profes-
dem e seguem as normalidades vigentes. sores auxiliem as meninas a compreenderem que as im agens
Dessa maneira, o universo visual exerce pedagogias, das mídias e da cultura visual sobre a feminilidade e sobre o
pois as imagens nos ensinam a olhar as situações sociais e que é ser mulher dão forma a su as identidades e influenciam
nos educam. Elas também mostram e constituem quais os rneninos e rapazes na construção de sua masculinidade".
produtos que devem ser consumidos pelas crianças, con- Como portadoras de inúmeros tex tos e p rodutoras
figurando os relacionamentos sociais através das condi- de muitas significações, as imagens não foram trabalhadas,
ções de consumo. Nesse caso, os estudantes apresentam a neste livro, como simples acessório ou material complemen-
necessidade de aquisição constante de produtos que têm tar para as reflexões realizadas. Ao contrário, elas foram os
destaque e significativa circulação entre os componentes da principais alvos de problematizações, tanto que o último ca-
turma em sala de aula. Isso é fomentado por uma avalanche pítulo foi d edicado a sugestões práticas de atividades peda-
de imagens que circulam, articuladamente, na mídia televi- gógicas com a Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino
siva, na mídia impressa e na internet. Fundamental que problematizam as imagens.
Além disso, os desejos de compra das crianças são di- Por isso, as reflexões realizadas no decorrer do texto
nâmicos e mutáveis, pois é possível obter qualquer produto desconfortam radicalmente as posições adotadas pelas ins-
com rapidez, usufruir dele por pouco tempo, descartá-lo e tituições escolares, pois as fazem pensar sobre os relacio-
procurar um novo material para voltar a adquirir. namentos interpessoais contemporâneos, sobre os "novos"
É preciso também considerar que, ao adquirir uma sujeitos que estão inscritos no âmbito escolar, sobre as dife-
boneca, um caderno, uma roupa ou qualquer outro tipo de rentes realidades culturais transgredidas pela tecnologia, so-
acessório, as crianças não estão consumindo somente um bre a configuração recente do consumo, sobre como o corpo
produto, mas sim toda uma rede de representações que ensi- é, atualmente, moldado, e sobre o imenso repertório visual
na como as meninas devem ser, agir e pensar. Elas não con- no qual todos estamos imbricados. Novos relacionamentos,
somem, unicamente, a imagem das princesas ou da Barbie, antes impensáveis pelas escolas, atravessam as salas de aula,
mas também seu estilo de vida e suas histórias. promovendo o contato com múltiplos saberes, modos de
Diante dessas considerações, minhas inquietações vida, sujeitos e valores de convivência social.
tornam-se ainda mais fecundas, pois, enquanto professora, Embora no campo da educação seja comum a preten-
também apresento responsabilidades e comprometimentos são de apontar "receitas", d iretrizes e soluções, ressalto que
os p ercursos teóricos, as reflexões, as su gestões d e projetos
ta' As Imagens que Invadem as Salas de Aula
~---------=---------'---------

pedagógicos aqui expostos não pretendem mostrar o quanto Referências


as imagens ou outros artefatos culturais são maléficos ou
negativos, e nem marcar os caminhos mais seguros para Bibliográiicas
uma educação de qualidade. O que procurei problematizar
é como as imagens instauram maneiras de ser e de pen-
sar e como produzem conhecimentos considerados únicos
e verdadeiros. Com isso, as discussões procuram inquietar e
desacomodar algumas verdades, tão caprichosamente con-
solidadas, e apontar possibilidades de pensarmos sobre as
relações que temos com o mundo visual.
Para mim, o que de fato faz a diferença são as interro- ANDRÉ, Marl i E. D. A. "A pesqu isa no cotid ian o escolar."
gações que ainda podem ser realizadas sobre a construção de ln: FAZEN DA, lvani Catarina Arantes (org.). Metodologia da
identidades na cultura visual. São as possibilidades de ou- Pesquisa. São Paulo: Cortez, 1994.
tros olhares sobre a temática. Por isso, finalizo com algumas BARBOSA, Ana Mae. Arte/Educação Contemporânea:
questões que, felizmente, ainda perduram: Qiais pontos in- Consonâncias Internacionais. Sã o Paulo: Cortez, 2005.
visíveis ainda estão escondidos nas visíveis relações entre o BRAGA, Angela; REGO, Lígia. Tarsila do Amaral. São Pau lo:
consumo de imagens? Como professores, p ais, responsáveis Editora Moderna, 1998. (Coleção Mestres das Artes no Brasil).
ou outros familiares enxergam a constituição das crianças BuJES, Maria Isa bel Edelweiss. "Infâ nci a e poder: breves
através das imagens? Como isso pode contribuir para que sugestões para uma agenda de pesquisa." ln: CosTA, Marisa
o olhar sobre a formação dos sujeitos seja problematizado Vorraber; BuJES, Maria Isabel Edelweiss. Caminhos investigativos
nas escolas? Como deixarmos de viver como "cegos" em um Ili: riscos e possibilidades de pesquisar nas fron te iras. Rio de
contexto em que prevalecem as imagens? Qie estratégias Janeiro: DP&A, 2005.
as instituições escolares podem adquirir para desest abilizar, CAo, Marián López F. "Lugar do outro na educação
d esconfortar e desacomodar as certezas produzidas pela cul- artística: o olhar como eixo articulador da experiência : uma
tura visual? proposta didá t ica." ln: BARBOSA, Ana Mae. Arte/Educação
Contemporânea: Consonâncias Int ernacionais. São Paulo:
Cortez, 2005.
CHANDA, Jacqueline. "Teoria crítica em Histó ria da Art e:
novas opções para a prática de Arte/Educação." ln: BARBOSA,
Ana Mae. Arte/Educação Contemporânea: Consonâncias
Internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.
~ As Imagens
_ que Invadem
_ as Salas
_ de Aula
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