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32.8.

Nanã
Certamente estamos falando da mais velha Orixá cultuada no panteão
africano.

Isso porque Nanã era cultuada pelo povo do Daomè, hoje República
do Benin, e os ritos e cultos deste povo eram muito antigos, vindos de
uma cultura ancestral, que muitos atribuem ser anterior à descoberta
do fogo.

O nome Nanã significa “mãe” e era exatamente isso que ela significava
para os daomeanos. Da mesma forma que para os iorubas é Iemanjá
quem ocupa esse papel.

Também conhecida como Nanã Buruquê, Nanã Burucu, Nanã Bukuu e


Nanã Brukung. Esta última considerada uma divindade do fundo rio
Níger. Nanã também é um título que era dado a pessoas idosas e
responsáveis. Por último, era costume uma mulher viúva ou de idade
avançada ir morar ao lado do rio para ter menos dificuldade de criar
os filhos, essas mulheres também eram chamadas de Nanã ou Nenê.

Foi incorporada à mitologia ioruba há séculos, quando o povo ioruba


invadiu e conquistou o Daomé. Mesmo assim, a paternidade dos filhos
de Nanã é atribuída à Oxalá, mesmo não sendo ele parte do culto
original à Nanã. Com o tempo, a absorção de Nanã foi alcançada com
sucesso e estas pequenas faltas de sincronia mitológica deixaram de
ser relevantes.

Muitos acreditam que o surgimento de Nanã esteja associado à


criação do mundo, quando Oduduá separou a terra das águas, foi no
contato destes dois elementos, na lama formada pelos dois elementos
e na água parada que surgiu Nanã. Por esta antiguidade Nanã é
considerada senhora de muitos mistérios, sendo que ela também
representa a memória ancestral.

Também considerada a mais antiga das iabás, senhora dos búzios, da


morte, da fecundidade e da riqueza.

É a mãe dos orixás Iroko, Obaluaê e Oxumarê. Entretanto, por ser


representada sempre muito idosa, é considerada por muitos também
a avó de todos os orixás.

É o princípio, o meio e o fim. O nascimento, a vida e a morte.

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Os cânticos de Nanã são súplicas para levar Iku (a morte) para longe. É
ela quem permite que a vida seja mantida. Representa a força natural
mais temida pelos homens, pois ninguém quer morrer. Ela é a senhora
da passagem deste mundo para outro, a dona do portal para as
dimensões do além.

Nanã é a possibilidade de conhecer a morte para se valorizar a vida. É


agradar a morte para se viver em paz. Protege contra feitiços e o
perigo de morte.

É a chuva, a tempestade e a garoa. Dona dos pântanos sendo o lodo


seu domínio natural.

O banho de chuva é considerado lavagem de corpo consagrada para


este orixá. Os africanos acreditavam que a chuva traz a vida e a
fecundidade da terra, quando a chuva cai demais é porque Nanã não
está satisfeita.

Nanã é considerada a mãe ou a avó boa, compreensível, carinhosa,


sensível e bondosa, mas não reconhece ninguém quando em estado
de fúria.

Foi a grande mantenedora do início da humanidade, pois quando as


suas grandes chuvas caíam enchiam os rios, e quando estes recuavam
ao seu leito normal, deixava grande faixa de terra fértil onde
ocorreram as primeiras plantações. Foi do barro também que o
homem pôde construir sua primeira morada e foi a mesma argila que
forneceu diversos utensílios que tornaram mais fáceis a vida dos seres
humanos.

Entre os símbolos de Nanã estão a chave, que simboliza a passagem


para o plano espiritual, e o ibiri, que é feito com palitos ou fibras do
dendezeiro dobrados e adornado com búzios, que representa a
multidão de eguns. Ela é a senhora de todos os eguns, que obedecem
suas ordens, e foi quem dominou por primeiro este mistério.

Os búzios, que simbolizam morte por estarem vazios, e fecundidade


porque lembram os órgãos genitais femininos, também pertencem a
Nanã.

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Contudo, o símbolo que melhor sintetiza o caráter de Nanã é o grão,
pois ela domina também a agricultura e todo o grão tem que morrer
para germinar.

No Candomblé, sua dança é lenta, segurando seu ibiri como um bebê,


cujos movimentos parecem o de embalar uma criança. Seu andar é
curvado mostrando toda a sua velhice.

Nanã rege as águas paradas, o pântano, o mangue, a lama, o barro. O


mesmo barro que serviu de matéria prima para criar o corpo físico do
homem. E como dizem: “do pó o homem veio e ao pó retornará”. Isto
também é uma alusão da terra que recolhe o corpo físico para
consumi-lo e fazê-lo retornar ao pó. Isto também é atributo de Nanã.

Dizem que Nanã ampara o espírito do morto enquanto seu corpo é


enterrado. A responsabilidade de Nanã também rege a reencarnação,
pois é ela que recolhe os espíritos prontos para a reencarnação, e, em
seu abraço, faz com que percam a forma, assumindo a forma de uma
esfera de energia para ser conectado ao óvulo fecundado na barriga
da futura mãe terrena. É Nanã também, por cuidar da memória
ancestral, quem apaga a memória dos espíritos ao reencarnarem para
que isso não atrapalhe a reencarnação vindoura.

Forma com Oxalá o casal mais velho. Oxalá que é representado ora
como esposo, ora como amante, que lhe deu filhos e que roubou o
segredo dos eguns de Nanã.

Como uma boa idosa, Nanã é previdente, organizada e grande


zeladora da moral e dos bons costumes. É austera, autossuficiente e
tem grande capacidade de trabalho; não tolera preguiça, falta de
educação, desordem e desperdício.

Não perdoa mentirosos, traições e nem a desonestidade. Jurar por


Nanã é assumir uma grande responsabilidade perante a orixá, a qual
cobrará incessantemente o promissor até que cumpra com o
juramento. Os filhos de Nanã sabem, por este motivo, que não devem
nunca jurar em seu nome.

Recorremos à Nanã para o recebimento de entes queridos falecidos,


contra o perigo de morte, para aprimorar nossas virtudes, pois é ela
quem decanta nossos defeitos, no encerramento e início de ciclos,
também para a maternidade e em todas as “mortes” que passamos

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pela vida. Nanã ativa o nosso racional para que possamos “morrer”
(transformar), para que possamos nascer melhores e mais
equilibrados.

Podemos pedir ainda sabedoria, experiência e amadurecimento em


nossas vidas.

Características dos filhos de Nanã

Normalmente são calmos e até um pouco lentos. Gostam de crianças,


sempre aparentam mais idade do que realmente possuem. Não
sentem grandes apelos nem pela beleza e nem pela vaidade.

São pessoas de ímpeto, boas, decididas, simpáticas, remoem as coisas,


guardam rancor de situações não resolvidas. Exigem a atenção e o
respeito que julgam merecer, independente de terem ou não
conquistado estes sentimentos daqueles que o cercam.

Tem dificuldades em entender as opiniões alheias, e, da mesma forma,


ficam implicados quando não compreendidos. Não entendem como as
pessoas não pensam da mesma forma que eles.

Não tomam decisões de imediato, pois sabem que toda decisão deve
ser muito bem analisada. Quando as tomam, são decisões sábias,
justas e equilibradas.

São conservadores e nostálgicos. Sempre desejando que momentos e


costumes do passado retornem, mesmo sabendo que não voltarão.
Gostam de um mundo previsível e sem sobressaltos.

Reclamam dos novos costumes, das novas posturas, da vida atual,


enfim, reclamam de tudo o que for novo ou que altere sua rotina muito
bem programada.

Envelhecem mais rápido que os demais e não aparentam força física,


mas são capazes de surpreender quanto à força e à disposição que
possuem.

Valorizam por demais os detalhes e pequenas coisas, transformando


quase sempre pequenos problemas em dramas indissolúveis.

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No sentido oposto são excelentes ouvintes e tem grande capacidade
de compreensão do ser humano, como se fossem mais velhos e
experimentados do que realmente são.

Como consequência, dar o perdão para os que erram e o consolo para


os sofredores é uma habilidade natural dos filhos desta orixá.

Equilibrados os filhos de Nanã são sensatos, perseverantes,


organizados, dispostos e objetivos. Em desequilíbrio demonstram
estupidez, preguiça, conservadorismo extremo, medo e avareza.

Aparência física pesada, desgraciosa, podendo indicar fracasso na


sexualidade e no amor. Seu modo de vida austero e “reclamão” pode
levá-lo à solidão.

A filha de Nanã tem um temperamento severo e austero. Rabugenta,


é mais temida do que amada, podendo não ter grandes atrativos para
o sexo oposto. Afasta-se do amor por medo de ser abandonada.
Afasta-se do sexo por medo de ser usada.

Os filhos de Nanã são sempre prontos e tem facilidade para enxergar


as necessidades dos outros. Dedicam-se muito à vida profissional e à
ambição social, postos que galgam com facilidade pela entrega e
dedicação que carregam em si.

São caridosos e frequentemente estão envolvidos em campanhas


sociais ou comunitárias visando o bem de uma coletividade.

Sincretismo: Sant’Anna
Data de culto: 26 de julho
Saudação: Saluba Nanã! (Nos refugiamos com Nanã)

Área de atuação: A vida e a mrte, maternidade, amadurecimento,


sabedoria. Senhora dos espíritos.
Elemento: Água (em contato com terra)
Chacra: Frontal
Metal: Níquel ou latão
Astro regente: Lua (no quarto minguante)
Nota musical: Si
Número: 13
Dia da semana: Segunda-feira (junto com as almas)
Cor da guia: Lilás ou violeta

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Cor da vela: Lilás ou violeta
Pedra: Ametista, tanzanita
Bebida: Champanha rosé, vinho licoroso, água de coco, água
de chuva
Amalá: Feijão preto com purê de batata doce, pipoca, farofa de
dendê
Frutas: laranja lima, figo, ameixa, uva escura, fruta do conde,
coco seco, banana da terra, melão de São Caetano,
abacaxi e jaca
Flores: Rosa rubra, crisântemo roxo e violeta
Algumas ervas: Manacá, folhas de berinjela, folha da fortuna,
avenca, alfavaca. Viuvinha, cana do brejo, manjericão
roxo, canela de velho
Local de oferta: Pântanos, lamaçais, beira de rio e cemitérios
Animais: Rã, galinha branca, pata branca
Instrumentos: Ibiri – cetro feito de cerne de dendezeiro curvado e
adornado de búzios)

Lendas de Nanã
Lenda nº 1
Ogum, numa de suas viagens, aproximou-se das terras de Nanã. Sabia
que o lugar era governado por uma velha e poderosa senhora. Se
quisesse, não seria difícil tomar as terras de Nanã, pois para Ogum,
não havia exército, nem força que o detivesse.
Mas Ogum estava ali apenas de passagem. Seu destino era outro, mas
seu caminho atravessava as terras de Nanã. Isto ele não podia evitar e
nem o importava, uma vez que nada o assustava e Ogum nada temia.
Na saída da floresta, Ogum deparou-se com um pântano, lamacento e
traiçoeiro, limite do inicio das terras de Nanã. Era por ali que teria que
passar. Seu caminho, em linha reta, era aquele – por pior que fosse e
não importando quem dominava o lugar. O destino e objetivo de
Ogum era o que realmente lhe importavam.
Parou à beira do pântano e já ia atravessá-lo quando ouviu a voz rouca
e firme de Nanã:
- Esta terra tem dono. Peça licença para penetrar nela!
No que Ogum respondeu em voz alta:
- Ogum não pede, toma! Ogum não pede, exige! E não será uma velha
que impedira meu objetivo!
- Peça licença, jovem guerreiro, ou se arrependerá! Retrucou Nanã
com a voz baixa e pausada.
- Ogum não pede licença, avança e conquista! Para trás, velha, ou vai
conhecer o fio da minha espada e a ponta de minha lança!

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Dito isto, Ogum avançou pelo pântano, atirando lanças com pontas de
metal contra Nanã.
Ela, com as mãos vazias, cerrou os olhos e determinou ao pântano que
tragasse o imprudente e impetuoso guerreiro. E assim aconteceu...
Aos poucos, Ogum foi sendo tragado pela lama do pântano,
obrigando-o a lutar bravamente para salvar sua própria pele,
debatendo-se e tentando voltar atrás. Ogum lutou muito, observado
por Nanã, até que conseguiu salvar sua vida, livrando-se das águas
pantanosas e daquela lama que quase o devorava.
Ofegante e assustado, Ogum foi forçado a recuar, mas sentenciou:
- Velha feiticeira! Quase me matou! Não atravessarei suas terras, mas
vou encher este pântano de aço pontudo, para que corte sua carne!
Nanã, impassível e calma, voltou a observar:
- Tu és poderoso, jovem e impetuoso, mas precisa aprender a respeitar
as coisas.
Por minhas terras não passarás, garanto!
E Ogum teve que achar outro caminho, longe das terras de Nanã. Esta,
por sua vez, aboliu o uso de metais em suas terras.
E, até hoje, nada pode ser feito com lâminas de metal para Nanã.

Lenda nº 2
Dizem que quando Olorum encarregou Oxalá de fazer o mundo e
modelar o ser humano, Oxalá tentou vários caminhos.
Tentou fazer o homem de ar, como ele. Não deu certo, pois o homem
logo se desvaneceu.
Tentou fazer de pau, mas a criatura ficou dura.
De pedra, mas ainda a tentativa foi pior.
Fez de fogo e o homem se consumiu.
Tentou azeite, água e até vinho de palma, e nada.
Foi então que Nanã veio em seu socorro e deu a Oxalá a lama, o barro
do fundo da lagoa onde ela morava, a lama sob as águas, que é Nanã.
Oxalá criou o homem, o modelou no barro.
Com o sopro de Olorum ele caminhou.
Com a ajuda dos Orixás povoou a Terra.
Mas tem um dia que o homem tem que morrer.
O seu corpo tem que voltar à terra, voltar à natureza de Nanã.
Nanã deu a matéria no começo, mas quer de volta no final tudo o que
é seu.

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