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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE ECONOMIA
MONOGRAFIA DE BACHRELADO

O DESENVOLVIMENTO A CONVITE E OS ACORDOS DE


BRETTON WOODS

ANTÔNIO AUGUSTO MARANHÃO FERNANDES


Matrícula nº: 112128352

ORIENTADOR: Prof. Franklin Leon Peres Serrano

ABRIL 2018
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE ECONOMIA
MONOGRAFIA DE BACHARELADO

O DESENVOLVIMENTO A CONVITE E OS ACORDOS DE


BRETTON WOODS.

______________________________________________________
ANTÔNIO AUGUSTO MARANHÃO FERNANDES
Matrícula nº: 112128352

ORIENTADOR: Prof. Franklin Leon Peres Serrano

ABRIL 2018
As opiniões expressas neste trabalho são de exclusiva responsabilidade do autor.
AGRADECIMENTOS

Dedico esse trabalho a minha Mãe, Marília Maranhão; ao meu irmão, Jader; a
minha tia, Terezinha; minha avó, Rosa; ao Miguel; à Mia; e a todos os demais familiares e
amigos que têm me acompanhado ao longo da minha jornada pelo Instituto de Economia
da UFRJ.
RESUMO

Com o advento da Guerra-Fria, a politica externa dos EUA mudou muito. A fim de fortalecer
o capitalismo frente à ameaça do comunismo, eles passaram a reconstruir e a desenvolver
países que tinham risco de se associar ao último. O estado americano começou a ser usado
para gerar progresso econômico e social nestas nações de localização estratégica, a saber, a
Europa e, em seguida, a Ásia. O presente trabalho tem como objetivo mostrar que o processo
de desenvolvimento de tais regiões à luz dos acordos de Bretton Woods. A ideia central é que
o rápido progresso conquistado pelas mesmas se deu a partir de políticas estatais
estadunidenses, gerando condições externas muito favoráveis, demasiadamente diferentes das
demais regiões do mundo. Tal política só foi possível visto que os EUA tinham a moeda
mundial e também porque podiam ter déficits constantes no seu Balanço de Pagamentos, o
que permitia a enorme saída de recursos necessária.

PALAVRAS-CHAVE: EUA, Breton Woods, Plano Marshall, Gansos Voadores, Patos


Vulneráveis, Padrão Ouro-Dólar, Keynesianismo Bélico, Complexo Industrial-Científico-
Militar, Dilema de Nixon.
ÍNDICE

INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 5

CAPÍTULO 1 - O PADRÃO OURO-DÓLAR ........................................................................... 7


1.1 Cenário Mundial Antes do Padrão Ouro-Dólar .................................................................... 7
1.2 Debate entre White e Keynes ................................................................................................ 9
1.3 O Bretton Woods Vencedor ................................................................................................ 12
1.4 O Bretton Woods Na Prática............................................................................................... 14

CAPÍTULO 2 - CONVIDADOS VS. NÃO-CONVIDADOS .................................................. 17


2.1 Os Países Escolhidos .......................................................................................................... 17
2.2 A Europa e o Plano Marshall .............................................................................................. 19
2.3 A Ásia e o Modelo dos Gansos Voadores .......................................................................... 23
2.4 América Latina e os Patos Vulneráveis .............................................................................. 27
2.5 Comparação Entre América Latina e Sudeste Asiático ...................................................... 28

CAPÍTULO 3 – KEYNESIANISMO E DESENVOLVIMENTISMO BÉLICO ................. 31


3.1 O Complexo industrial-científico-militar e o Lado da Oferta ............................................ 31
3.2 O Lado da Demanda ........................................................................................................... 33

CAPÍTULO 4 - FIM DOS ACORDOS DE BW ...................................................................... 38


4.1 Início do Processo de Declínio ........................................................................................... 38
4.2 Visões Acerca do Fim do Padrão Ouro-Dólar .................................................................... 41
4.3 O Dilema de Nixon e o fim da conversibilidade................................................................. 44

CONCLUSÕES........................................................................................................................... 48

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................ 52
INTRODUÇÃO

Os grandes fatores condicionantes do desenvolvimento podem ser difíceis de ver a


primeira vista. Entretanto, analisá-los com calma é imprescindível para entendermos, não só o
processo pelo quais tais estados desenvolvidos passaram, mas também a nossa própria
realidade. Entender a trajetória do progresso das nações que apresentam melhores condições
de vida é de suma importância para elaboração de políticas econômicas e sociais eficientes e
realistas.

Devemos começar estudando o caso dos Estados Unidos. No século XX, ele já era o
pais com maior produtividade, tinha a moeda mundial. Isso permitiu que, com o fim da
Primeira Guerra, ele se consolidasse como a maior potencia do globo, já que a batalha não foi
em seu território, não sofrendo destruições, e ainda recebeu grandes indenizações. As guerras
e o New Deal trouxeram grande dinamismo e demanda agregada para a sua indústria. O
último foi um projeto de combate à grande crise de 1929, via aumento do gasto público,
criação de infraestrutura, fortalecimento do poder de compra e das condições trabalhistas.
Com o fim da Guerra, os estadunidenses temiam a queda no seu nível industrial, criaram
então os Acordos De Bretton Woods.

Os acordos de Bretton Woods visavam garantir a continuidade do crescimento nos


Estados Unidos nos pós-guerra, através do fortalecimento da Europa - que encontra-se
destruída. Para tanto foram criados o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional. As
convenções aprovadas beneficiaram os estadunidenses, aumentando sua capacidade de
dominância mundial. Todavia, com a guerra fria, eles mudaram de estratégia e decidiram
reconstruir a Europa, já que ela - fragilizada, poderia ser seduzida pelo socialismo. Criaram
então o plano Marshall. Posteriormente, a partir da guerra da Coreia, também desenvolveram
o Japão. Visavam criar parceiros comerciais fortes. A estratégia era promover grande
crescimento interno e garantir o fortalecimento do capitalismo em detrimento do socialismo.

O forte progresso do Japão o levou a transferir indústrias de menor valor agregado,


que já tinham demanda para exportação garantida, para outros países vizinhos. Isso acabou
gerando um forte crescimento na região. Posteriormente, os mesmos se integraram ao
processo de ―desenvolvimento a convite‖, diretamente com os EUA.

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O objetivo desse trabalho de pesquisa é analisar a o processo de ―desenvolvimento à
convite‖ à luz dos acordos de Bretton Woods. Primeiramente, no Capítulo 1, como os
mesmos foram criados. Em segundo lugar, no Capítulo 2, como a Europa, Japão e demais
países asiáticos se desenvolveram. Em terceiro, no Capitulo 3, é realizado um comparativo
entre tais países e a América Latina. Em seguida, no Capitulo 4, há a explicação sobre os
aspectos incomuns do sistema de inovação dos Estados Unidos, assim como uma análise da
sua política industrial pela ótica da oferta e da demanda. Finalmente, no Capitulo 5, mostro
como se deu o processo de declínio dos acordos, assim como o fim da era do
desenvolvimentismo na Europa e, posteriormente, na Ásia - ainda que, no caso da última, o
progresso tenha durado até regime financeiro posterior: o sistema de dólar flexível.

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CAPÍTULO 1 - O PADRÃO OURO-DÓLAR

Apresentação

Primeiramente, o capítulo traz o panorama do pós-guerra e mostra que os EUA,


através dos acordos de Bretton-Woods, visavam criar mecanismos de dominância sobre as
demais nações. Em seguida, trata sobre o debate acerca de suas diretrizes. Em último lugar,
explicita como que, na prática, ele foi diferente, em razão das condições peculiares geradas
pela Guerra-Fria.

1.1 Cenário Mundial Antes do Padrão Ouro-Dólar

Ao vencer a Primeira Guerra, os EUA receberam grandes indenizações. Eles


emergiram da guerra como principal potência mundial e grande credor internacional. Como
eram os financiadores e fornecedores de armamentos dos Aliados, os conflitos geraram muita
demanda por produtos industriais de guerra. Esse cenário gerou recordes de produção
industrial, promovendo grande crescimento e desenvolvimento 1 nos EUA. Outro ponto
importante é que não sofreram nenhuma destruição em seu território, já que o conflito se deu
na Europa, na Ásia e na África.

Anos depois, para sanar a Grande Crise de 1929, o governo de Roosevelt tornou-se
mais interventor, concebendo uma série de programas, chamados de New Deal, que
transformou o estado em um motor do crescimento e desenvolvimento. Houve a criação de
grandes obras de infraestrutura, empregos, sindicatos, direitos trabalhistas e a previdência
social.

Tais medidas geraram enorme crescimento do poder de compra e da demanda efetiva,


atuando pró ciclicamente no investimento. Também aumentaram os salários reais, de modo
que crescimento chegou aos mais pobres. A época foi marcada por um estado de bem estar
social. Além disso, houve maior controle sobre os bancos, mais subsídios às empresas. O
keynesianismo foi essencial para tirar os EUA da crise e promover seu desenvolvimento.

1
O conceito de desenvolvimento diz respeito a grandes mudanças na estrutura produtiva, econômica e social de um
país. É diferente de um simples crescimento. O Segundo pode ocorrer sem o primeiro.

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Entretanto, sua politica expansionista foi parcialmente revertida mais tarde, gerando a
volta do baixo crescimento. Foi só no final dos anos 30, com a eclosão da Segunda Guerra
Mundial, que a economia americana se recupera, fortalecendo sua posição de fornecedora para
os países em guerra. Posteriormente, a partir a sua entrada no confronto em 1941, consolidou-se
– especialmente, como produtora para suas forças armadas, promovendo ainda mais demanda
efetiva em sua economia. Neste período, eles crescem a taxas muito elevadas e tem um altíssimo
grau de intervenção estatal e planejamento.

Ainda durante a Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos e seus aliados começaram
a discutir como organizar uma Nova Ordem Mundial, depois do evento da derrota das Potências
do Eixo, visando criar um mecanismo que gerasse maior cooperação entre os países capitalistas,
a fim de promover um maior crescimento entre os mesmos, particularmente nos EUA.

O período anterior aos anos 30 foi marcado pela rejeição às políticas que visavam
estimular a economia. Entretanto, surgiu a necessidade de se criar instrumentos internacionais
que possibilitaram políticas expansionistas por parte dos governos dos países, gerando o um
cenário que permitisse a manutenção da expansão econômico dos EUA. Eles estavam
insatisfeitos com o sistema vigente até então: o padrão-ouro e os câmbios livres (Carvalho,
2004).
Acreditava-se que a guerra tinha interrompido a depressão — em virtude da
mobilização de recursos que impunha [...] o fim da guerra poderia ter um efeito
perverso: a paz nos campos de batalha traria de volta o desemprego e os conflitos
sociais. Medidas domésticas, no entanto, poderiam não ser suficientes para evitar a
volta da depressão. (CARVALHO, 2004).

Em razão do risco de queda no crescimento econômico nos EUA após a Segunda


Guerra, resolveram que deveriam criar um sistema que melhorasse as condições de vida da
Europa, que se encontrava destruída. Neste momento, havia a necessidade dos europeus
importarem produtos, não sendo possível a exportação e a subsequente geração de divisas,
necessárias ao comércio internacional. Era necessário criar um meio de garantir o aumento de
demanda e da liquidez mundial. Para tal, criaram os Acordos de Bretton Woods.

Para Moffit, os EUA estavam assumindo o papel de potência hegemonia. Para ele, foi
a guerra, mais que o New Deal, que curou a grande depressão. O planejamento estatal
intensivo possibilitou a melhora na indústria e gerou muitos empregos. Após a Segunda

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Guerra, os estadunidenses se tornaram o grande credor do mundo, além de um poder militar
muito forte, com destaque para a bomba atômica. (Moffit, 1984).

Bretton Woods foi [...] a resposta aos manifestos fracassos do gerenciamento


econômico mundial durante as criticas décadas de 20 e 30. A recuperação da
Primeira Guerra Mundial e da Grande Depressão ficou em grande parte confinada
aos Estados Unidos e, mesmo assim, evidenciou-se como precária. Na Europa, tanto
a Alemanha quanto a Áustria experimentaram hiperinflações durante os anos 20,
depreciando enormemente suas moedas. [...] Depois do craque da bolsa americana
de 29 e da crise financeira europeia de 31, a economia internacional enveredou por
uma espiral de queda de preços, queda na produção, falências e recente desemprego.
O colapso foi fomentado pelo protecionismo e outras formas de nacionalismo
econômico. (MOFFIT, 1984).

Além disso, era preciso criar instituições que promovessem o aumento do poder e do
domínio estadunidense sobre as demais nações, além de gerar um mercado de consumo para o
mesmo, já que o interno geraria pouca demanda efetiva. (Cini, 2001). Isso era necessário
pois, com o fim da Guerra, o mercado interno dos EUA naturalmente deixaria de crescer
tanto. Havia a preocupação de achar fontes adicionais de demanda efetiva para a sua
economia através da exportação.

Dessa forma, em razão do cenário de destruição e desunião na Europa, promover


meios para recuperação da última era um dos objetivos estratégicos dos acordos de Bretton
Woods, visando tornar possível o contínuo crescimento dos Estados Unidos e a recuperação
mundial. No início, houve um intenso debate sobre como deveria ser o seu modo de
funcionamento.

1.2 Debate entre White e Keynes

As reuniões para decidir as diretrizes dos acordos aconteceram em 1944 e foram


marcadas por um intenso debate entre John Maynard Keynes – representante da Inglaterra, e
Harry Dexter White - dos EUA; que divergiam sobre como deveria ser o modo de
funcionamento no novo padrão. Cada um defendia os interesses de seu país.

Ambos criticavam o padrão ouro-libra e estavam preocupados com os mesmos


problemas, isto é, tanto com a desorganização da economia mundial após o fim do primeiro,
quanto com a volta da recessão dos anos 30, que o fim da guerra provavelmente causaria. Eles

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concordaram que deveria haver uma coordenação dos esforços principais economias
internacionais, visando maior prosperidade e Pleno Emprego. A mazelas da Grande
Depressão de 1929, fizeram com que as políticas econômicas da época fossem baseadas na
manutenção do último. (Carvalho, 2004). Assim como também eram baseadas no papel do
estado como motor do desenvolvimento.

As visões de Keynes e White diferiam principalmente quanto a mobilidade de capital


e o tipo cambial dos países membros. Para o primeiro, modificações cambiais e medidas
protecionistas poderiam ser adotadas a fim de alcançar o pleno emprego e o equilíbrio no BP.
Já para o segundo, o câmbio deveria ser fixo e sem controle sobre a mobilidade de capitais.
(Eichengreen, 2000).

Keynes era o maior crítico ao Padrão-Ouro, seus principais pontos eram: 1. Havia o
risco de falta de ouro para sustentar o comércio, já que ele é escasso. Essa situação acabaria
gerando uma queda de preços. Ofertas de moeda só seriam possíveis com o aumento nos
juros, a fim de atrair ouro de outros países; 2. O problema do ―ajuste assimétrico‖: Quando
uma economia cresce mais que todas as outras, há um aumento da renda interna e do poder de
compra - consequentemente há um maior crescimento das importações. Em consequência, há
a tendência de problemas no BP. A nação que passa por essa situação, acaba tendo que
diminuir sua renda interna, a fim de controlar tal déficit, gerando desaquecimento no mercado
internacional. Esta ação caracteriza um ―ajuste assimétrico‖, já que a responsabilidade de
melhorar o balanço de pagamentos recai somente sobre o país deficitário. (Carvalho, 2004).

Keynes apresentou soluções para os problemas do padrão-ouro: Deveria haver uma


política que gerasse crescimento aos parceiros comerciais dos EUA, de modo a promover uma
maior capacidade externa de absorção das exportações estadunidenses, eliminando os dois
problemas anteriores. Ele idealizou a ―Câmara de Compensação‖, que agiria como um BC do
mundo, sendo o emprestador de última instância aos BC de cada país. A forma de transação
entre os mesmos seria análoga a como os bancos comerciais operam entre si. Para ele, deveria
haver uma nova moeda escritural internacional, que não pudesse ser entesourada - conversível
em ouro a uma taxa constante, chamada Bancor. Ela seria posta em circulação entre os BC.
(Carvalho, 2004).

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Por conseguinte, seu plano tem três consequências positivas. Em primeiro lugar, a
Bancor poderia ser criada, garantindo o crescimento internacional, já que não haveria o risco
de falta, ao contrário do ouro. Em segundo, os países em desenvolvimento obter a moeda
internacional diretamente em troca de suas commodities, o que evitaria a instabilidade de
preços e a demanda por commodities da periferia. Em terceiro, déficits no BP poderiam ser
resolvidos. Para tal, seria necessária a participação ativa de outros países. O deficitário
deveria aumentar suas exportações, e o superavitário teria que absorvê-las; caso contrário,
pagaria multa. Dessa forma, seu plano era caracterizado pela liquidez automática e ajuste
expansivo do BP. (Carvalho, 2004).

White, por sua vez, defendia um sistema mais tradicional, baseado no câmbio fixo -
que não permitia desvalorizações competitivas no mercado internacional, que votariam em
risco o crescimento dos EUA e o mundial. Para ele, não deveria haver barreiras de capital e o
dólar conversível em ouro seria a moeda internacional. Também idealizou um Fundo de
Compensação, chamado de Fundo Monetário Internacional (FMI). Ao contrário da Câmara de
Compensação de Keynes, este não criaria dinheiro - na verdade, armazenaria as moedas de
diferentes países, a fim de que problemas no BP de curto prazo fossem resolvidos com
simples empréstimos. Também idealizou um banco que financiava o desenvolvimento de
outras nações, especialmente através de investimento em infraestrutura - a saber, o Banco
Mundial. (Carvalho, 2004).

Segundo Moffitt, em 22 de julho de 1944, os acordos foram aprovados. Eles geraram


as instituições que, mais tarde, seriam fundamentais para criar a era de ouro do capitalismo.
Nos anos seguintes, a renda per capita aumentou como nunca se viu antes nos países
capitalistas, foram construídas enormes obras de infraestrutura, criou-se ainda uma grande
sociedade de consumo de massas. (Moffit, 1984).

Os acordos de Bretton-Woods fortaleceram o dólar como moeda internacional, o que


foi essencial para a futura política da Doutrina Truman, que se aproximava. Isto é, os acordos
permitiram que os Estados Unidos não tivessem restrições em termos de balanço de
pagamentos, o que permitiu que uma estratégia de fortalecimento de outros países fosse
realizada. Entretanto, o Bretton Woods teve várias fases.

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1.3 O Bretton Woods Vencedor

Em razão do grande poder dos EUA, o mecanismo de White foi o escolhido. Foi
criado o regime de câmbio semifixo, que permite ajustes para controlar os problemas de
Balanço de Pagamentos, já que os recursos disponíveis no Fundo eram limitados. Acreditava-
se que esse sistema garantiria a continuidade do seu crescimento e eliminaria o risco da volta
da crise de 29. No pós-guerra, os estadunidenses eram quem mais poderiam lucrar com o
livre-comércio, através de um aumento nas exportações. (Carvalho, 2004).

A proposta aprovada dava grandes poderes assimétricos às nações que tinham


superávits. Os EUA eram os que tinham o maior deles. Havia o risco de este país promover
políticas protecionistas, a fim de manter os saldos positivos, não permitindo desvalorizações
cambiais em países mais fracos - por exemplo, podendo colocar o mundo em uma nova
recessão. (Serrano, 2004).

Foram criados o FMI e o Banco Mundial, subordinados. O primeiro passou a regular o


comércio internacional e as questões monetárias. Alterações no câmbio fixo passaram a ser
autorizadas por ele, que analisava a necessidade - em razão de déficit no BP, por exemplo.
Também emprestava recursos para resolver desequilíbrios no útimo, a fim de evitar
desvalorização da moeda. Em troca, era preciso seguir certas obrigações. Já o Banco Mundial,
estava destinado a reconstruir os países. Só recebiam os recursos, aqueles que pertenciam ao
FMI; ou seja, os que estavam com sua política subordinada aos EUA. Ele tinha maioria dos
votos e capacidade de veto. (Moffit, 1984).

Havia o entendimento de que a nação mais poderosa seria aquela que não tivesse
restrições do Balanço de Pagamentos, uma vez que poderiam financiar seus déficits em sua
própria moeda e não em dívida externa. Dessa forma, não ficaram presos a ter que exportar
para gerar superávit e, consequentemente, recursos para o próprio desenvolvimento.

Segundo Moffitt, o sucesso dos acordos era baseado no em grande déficit no BP dos
EUA, uma vez que sustentavam muitos financiamentos, transferências militares e de ajuda
estratégica, assim como empréstimos a governos e bancos estrangeiros. Essa política expandia
a oferta de moeda internacional. Estabelecer o dólar com paridade em ouro, os EUA puderam

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criar políticas de expansão monetária, que promoveram um grande aumento do comércio
internacional. (Moffit, 1984).

Apesar de suas características positivas, o os arranjos de Bretton Woods eram ainda,


sob importantes aspectos, deficientes. Seria um exagero dizer que eles foram
efetivamente a ponte que ligou a transição à recuperação do pós-guerra. Keynes
estava com a razão, o FMI e o Banco Mundial eram insuficientes para fazer o que se
esperava que eles fizessem: promover as grandes somas necessárias ao
financiamento da recuperação europeia. [...] O problema primordial era a escassez
de dólares. (MOFFIT, 1984).

O Fundo acabava agindo bem mais sobre os países deficitários, pois - na prática, os
superavitários ignoravam as recomendações de absorver exportações, gerando necessidade de
ajustes recessivos frequentes nos primeiros; característica marcante do FMI. Esse problema
também acontecia pela falta de controle sobre as reservas dos países membros. Por seguinte, o
sistema adotado não era eficaz controlando a capacidade de absorver exportações dos
deficitários pelo superavitário. (Carvalho, 2004).

No pós-guerra, era evidente que a nação que mais teria a lucrar com a liberdade de
comércio seria os EUA. Barreiras ao comércio, por sua vez, certamente teriam como
alvo as exportações americanas. A eventual restauração do sistema de
desvalorizações competitivas causaria muito mais danos aos Estados Unidos que a
qualquer outro país. A construção de um sistema de pagamentos internacionais teria
como meta, do ponto de vista daquele país, eliminar a possibilidade de adoção desse
regime cambial. (CARVALHO, 2004).

Dessa forma, o Bretton Woods criou um ambiente internacional propício ao


desenvolvimento dos EUA via da melhoria das condições na Europa. Na verdade, os
estadunidenses se tornaram motor da recuperação mundial, baseado no fortalecimento do
dólar e na criação de instituições, que garantiriam um alto domínio sobre os demais países.
Também era uma sistematização em escala mundial, da relação estado-sistema monetário.

Este sistema fortaleceu o dólar como moeda internacional e gerava o condicionamento


necessário para que nenhum país desafiasse a hegemonia americana e de sua moeda. Mas a
grande novidade é que o fez sem recorrer a guerras físicas, que pudessem frear a economia, já
que havia um receio de que novos combates iriam provocar novas crises.

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1.4 O Bretton Woods Na Prática

Os acordos acabaram sendo essenciais para promover o aumento da paz mundial que
se sucederia. A Guerra-fria, que surgiu com o advento do comunismo e da União Soviética,
foi um conflito bem menos violento que as duas grandes guerras. O afloramento da mesma
marcou uma grande mudança no padrão que o sistema funcionava.

O advento da Guerra-Fria, em 1947, levou o Bretton Woods, a se afastar das ideias de


White, e a se tornar mais Keynesiano. Isto é, criar desenvolvimento para os aliados na Europa
passou a ser de interesse dos americanos, sendo uma forma de defender o capitalismo e o
crescimento interno da nação. Os EUA passaram a operar o sistema financeiro de maneira
tipicamente benigna. (Serrano, 2002).

No pós-guerra, surgem dois elementos principais: Primeiramente, o antagonismo entre


o sistema capitalista e o comunista. Em segundo lugar, a necessidade de afirmação da
supremacia industrial, comercial, financeira e militar dos EUA; onde o FMI e o BIRD são
instrumentos de controle e manutenção de seus interesses. (Medeiros e Serrano, 1999).

Ao vencer a Primeira Guerra, o estado norte americano exigiu grandes indenizações


das nações perdedoras, consolidando sua posição de grande dominador mundial. Já ao
adentrar na Guerra Fria, não fez exigências prejudiciais, muito embora seu poderio global
fosse maior e crescente. Na verdade, eles fizeram políticas keynesianas externas, gerando
prosperidade para os demais países. A motivação para tal comportamento era estratégica.
Apenas algumas nações foram convidadas a se desenvolver.

Foram feitos: investimentos externos diretos; transferências diretas de tecnologia –


através de envio de maquinário e mão de obra especializada, aumentando a produtividade da
indústria; compras de produtos de exportação militares, gerando industrialização local;
apoiavam a desvalorização cambial competitiva – a fim de estimular as exportações desses
países; fez doações; concederam grandes empréstimos destinados ao desenvolvimentismo.
Além disso, toleravam protecionismo, alfandegário ou não, e desenvolvimentismo. Não era
uma simples tolerância ao desenvolvimento, tampouco um mero empréstimo. Tais medidas
permitiram: a expansão das multinacionais americanas, a diminuição da restrição externa de
tais países, a adoção de um regime de conversibilidade ao dólar. (Medeiros e Serrano, 1999).

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As condições externas eram muito favoráveis, gerando ―milagres‖ nacionais de
reconstrução e/ou crescimento. A forma como o sistema ouro-dólar foi na prática, permitiram
que o Keynesianismo expansivo de pleno emprego dos Estados Unidos fosse levado aos
demais países capitalistas. Essas condições externas favoráveis permitiram uma
industrialização muito acelerada, liderada pelo estado, voltada para o desenvolvimento, com a
característica de conglomerados nacionais. O ―desenvolvimento a convite‖ foi a estratégia dos
EUA de atuar diretamente no desenvolvimento de países aliados. (Medeiros e Serrano, 1999).
O poder dos EUA era muito grande, ―a hegemonia deles é subestimada‖. (Serrano, 1999).

Os casos de desenvolvimento mais rápidos e exitosos, a começar pelo Japão, foram


os que combinaram exportação de manufaturas com produção local e subsidiada de
bens de capital, além de estrito controle estatal sobre o setor financeiro e os fluxos
de capital. (MEDEIROS e SERRANO, 1999).

Segundo Pecequilo, a estratégia consistia em mostrar que o capitalismo era melhor


que o comunismo, eliminando as condições negativas do mesmo, tornando a escolha pelo
último menos provável. Para isso, precisavam consolidar um novo centro de poder na Europa,
que rivalizava com a URSS, e mostrasse como o capitalismo, o livre comércio e a democracia
era um caminho melhor que o socialismo. Fortalecer as potências europeias era de suma
importância para tal objetivo. (Pecequilo 2003).

Para Moffit, os Estados Unidos passaram a fazer política keynesiana no mundo,


acelerando a recuperação da guerra, da depressão e a economia mundial. O superávit no
Balanço de Pagamento dos países aliados foi financiado com constantes déficits
estadunidenses. Isto é, houve uma expansão da oferta de moeda internacional a partir dos
mesmos. Os recursos para o desenvolvimento mundial a convite dependiam da existência do
padrão ouro-dólar, isto é, do dólar como moeda mundial. Só assim os déficits constantes no
Balanço de Pagamentos eram possíveis, permitindo uma política expansionista a partir da
oferta de moeda. (Moffit, 1984).

Havia uma necessidade de exportar muito grande na Europa e no Japão; em razão das
guerras e de grande dependência de importações, respectivamente, além da falta generalizada
de dólares no velho continente. Os Estados Unidos geraram tais reservas internacionais para
os aliados, com doações e empréstimos, montando uma nova ordem económica internacional

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- a partir do dólar. Para tal, foi preciso garantir acesso dos países capitalistas ao dólar. Caso
contrário, haveria uma desaceleração por falta de liquidez. (Medeiros e Serrano, 1999).

De acordo com De Cecco, havia um conflito entre os EUA e a Inglaterra, no que diz
respeito à afirmação do dólar como moeda internacional, mas a última já encontrava-se sem
condições de competir com o dólar, em razão do seu déficit de atenção. No ano de 1949, os
estadunidenses obrigaram a mesma a desvalorizar a libra em 30%, assim como muitos outros
países, transformando-os em uma economia voltada para a exportação. Entretanto, os ingleses
não queriam essa depreciação pois ainda acreditavam na libra como uma moeda mundial e,
para isso, queriam manter seu valor e ouro constante. (De Cecco, 1979).

Havia uma grande assimetria em relação aos outros países. A guerra fria foi um
período peculiar: os americanos agiram de forma desenvolvimentista no mundo,
reconstruindo vários países, enquanto respondiam enormes quantias de dinheiro para a manter
o domínio militar sobre outros países.

Como os Estados Unidos tinham a moeda mundial, sobre os acordos de Bretton


Woods, eles não precisam de outras moedas para comercializar a fim de gerar superávit, pois
todos os países aceitam a sua moeda, condição única no mundo. Essa promoção do
desenvolvimento aconteceu mesmo apesar do seu poderio militar estar cada vez maior, é um
grande sinal de sua força.

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CAPÍTULO 2 - CONVIDADOS VS. NÃO-CONVIDADOS

Apresentação

Este capítulo mostra que os condicionantes externos eram bem diferentes entre os
países que foram convidados a se desenvolver e as demais nações, onde não havia interesse
estratégico por parte dos Estados Unidos. É tratado, em primeiro lugar, o desenvolvimento da
Europa, que se deu através do Plano Marshall. Em segundo, o do Japão e do sudeste asiático,
via modelo dos Gansos Voadores. Em seguida, há um panorama das condições da América
Latina e, por fim, uma comparação entre ambos.

2.1 Os Países Escolhidos

Os países escolhidos pelos Estados Unidos localizavam-se em regiões estratégicas


para a manutenção do capitalismo, a saber, a Europa e Ásia. Estas tiveram tratamento bem
diferente dos locais mais distantes, como a América Latina e Continente Africano, que não
tiveram um plano de desenvolvimento. (Medeiros e Serrano, 1999).

Com a Guerra da Coreia, houve um grande impulso às exportações dos aliados. O


crescimento econômico dos últimos passou a ser de interesses dos EUA. Na Europa, o plano
era promover o crescimento do comércio na região, além de gerar maior conversibilidade
monetária, com atuação de multinacionais americanas. Ademais, o crescimento alemão era de
suma importância para os EUA. Seu projeto de desenvolvimento levou a um crescimento
maior que o resto da Europa, tornando-se um exportador de bens de capitais e químicos e
gerando mais dinamismo no continente - que foi inicialmente puxado pelos estadunidenses,
mas passou a promover o crescimento das exportações europeias, com destaque para Itália e
Holanda. (Medeiros e Serrano, 1999).

Como o crescimento da Alemanha era maior do que o do resto da Europa, havia


déficits comerciais na maioria dos outros países. Entretanto, os mesmos eram facilmente
financiados, em razão do crescimento regional, do crédito comercial inter-regional abundante,
do aumento das importações por parte da Alemanha, além de baixas taxas de juros e da

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introdução da conversibilidade em 1959. Dessa forma, tais déficits não eram um entrave ao
desenvolvimento da região. (Medeiros e Serrano, 1999).

A Europa se encontrava geograficamente entre os EUA e a URSS e encontrava-se


numa região de interesse para os estadunidenses. Sendo assim, eles promoveram o
desenvolvimento do lado norte do planeta, ampliando as suas diferenças com o sul, uma vez
que os demais países não estavam nessa região de importância.

Só com o Keynesianismo do plano Marshall é que a Europa pode crescer e se


reconstruir. Após a Primeira Guerra, os países perdedores tiveram limitações industriais
impostas, além de serem condenados a pagar indenizações. A Alemanha, por exemplo,
2
assinou o abusivo Tratado de Versalhes, não podendo produzir bens industriais
importantíssimos, gerando forte recessão. Entretanto, a ação dos EUA, na Guerra Fria, a
tornou o país mais dinâmico da região, com maior crescimento, e que tinha capacidade de
puxar a indústria dos outros países na região.

Tabela 1

Fonte: Mattos (2005).

Como podemos observar na tabela acima, política de ―desenvolvimento a convite‖ foi


baseada no extensivo aumento dos gastos públicos dos Estados Unidos. Além disso, o modo
em que a Europa passou a ser reconstruída, através do Plano Marshall, também foi baseado no
aumento dos gastos governamentais de cada aliado, com recursos oriundos dos primeiro.

2
O Tratado de Versalhes foi impôs várias restrições importantes à Alemanha, que foi proibida de fabricar tanques e
armamentos pesados, de manter sua aeronáutica em funcionamento – a Luftwaffe, teve que reduzir seu exercito,
perdeu territórios e teve que pagar uma enorme indenização aos vencedores, especialmente, para os EUA. Tais
condições ampliaram profundamente sua crise economia, que se iniciou com a guerra.

18
Dessa forma, o papel expansivo do estado foi de suma importância não só para a mudança de
paradigma que a Europa estava vivendo no pós-guerra, mas também para gerar crescimento
nos Estados Unidos, assim como mundial.

Em um primeiro momento, os escolhidos foram os países europeus e o Japão. Em


seguida, Taiwan, Cingapura, Coréia do Sul e Hong Kong acabaram se incluindo na lista de
escolhidos. Décadas depois, no final dos anos 70, a China também passou a fazer parte da
mesma. O projeto de reconstrução e ―desenvolvimento a convite‖ da Europa foi o Plano
Marshall.

O Plano foi proposto a todos os países europeus, inclusive à União Soviética. A


adesão por parte dos soviéticos, contudo, não se mostrou possível, pois a condição
imposta, de cooperação econômica supranacional, não se enquadra em seus objetivos.
Os governos do Leste europeu, alinhados à Rússia, sofreram pressões para não aceitar
o Plano. De todos os países do Leste, apenas a Iugoslávia recebeu ajuda. Ele abrangeu
os seguintes países europeus: Reino Unido, França, Itália, Trieste, Alemanha
Ocidental, Holanda, Grécia, Áustria, Bélgica-Luxemburgo, Dinamarca, Noruega,
Turquia, Irlanda, Suécia, Suíça, Portugal e Islândia. (SIMON, 2001).

2.2 A Europa e o Plano Marshall

Em 1946, a Europa ainda encontrava-se destruída e com escassez de dólares, não


podendo comprar produtos dos EUA, comprometendo a demanda efetiva americana. Como o
BW e suas novas instituições não foram capazes de promover a reconstrução da Europa, foi
criado o Plano de Recuperação Europeia.

A Doutrina Truman 3 – que se deu durante a Guerra Fria, foi uma estratégia de
combate ao socialismo através do fortalecimento e da criação de novos mercados capitalistas.
Os EUA fizeram um esforço de desenvolver outras nações, mesmo sabendo que estavam
criando um mercado concorrente – ao contrário do déficit de atenção da Inglaterra, em seu
processo de declínio.

3
O início da Doutrina Truman foi marcado pelo discurso do então presidente Harry S. Truman em 1947, que
alertava seus conterrâneos sobre a propagação do comunismo.

19
Já o Plano Marshall, por sua vez, levou o ideário da Doutrina Truman e do New Deal
para à Europa; a partir de 1947. Em razão da ameaça do comunismo e da necessidade de criar
um mercado consumidor para suas exportações. A Guerra-Fria tornou o Bretton-Woods mais
Keynesiano.

Após os Acordos de Bretton Woods surgiu um novo cenário internacional,


configurado pela rivalidade americano-soviética, principalmente após o Acordo de
Potsdam e o anúncio da Doutrina Truman. Os Estados Unidos passaram a ter duas
prioridades: conter o avanço comunista e garantir os mercados europeus. Nesse
contexto, foi anunciado, em 1947, o Plano Marshall [...] O Plano consistia em uma
política de estabilização dos países da parte Ocidental da Europa. O que chama a
atenção, contudo, é o fato de serem evidentes as semelhanças entre o Plano [...] e a
proposta delineada por John M. Keynes, a qual havia sido rejeitada pelos Estados
Unidos, em 1944. (SIMON, 2011, p.34).

A fragilidade política e econômica causava uma preocupação de que a Europa


adotasse o socialismo. A guerra foi nociva para sua indústria e para sua capacidade de
exportar e criar reservas. Tal situação compromete a continuidade do crescimento dos EUA
após as guerras. O objetivo mais importante era consolidar o capitalismo na Europa ocidental.
Para tal, promoveram a recuperação económica europeia, fizeram políticas para aumento de
comércio entre ambos, estabilização financeira e cooperação regional. Foi criada a União
Europeia de Pagamentos, onde as moedas locais se tornaram conversíveis e os superavitários
cobriam os deficitários, gerando injeção de moeda. (Solomon, 1976).

Os EUA conseguiram manter o nível de produção alcançado com a guerra. Para tal,
foi muito importante conquistar aliados, que em troca de financiamento a taxas reduzidas,
tomariam medidas liberais em favor dos americanos. As nações europeias deveriam demandar
produtos dos EUA, assim como se tornar fornecedores de importações. A elite exportadora
estadunidense apoiou tais políticas, já que elas geram demanda efetiva. (Mcglade, 2001)

O Bretton Woods Keynesiano trouxe benefícios, uma vez que garantia os mercados
europeus e criava fortes aliados políticos para os Estados Unidos, contendo o avanço do
comunismo e da União Soviética. Entretanto, ele por restringir a capacidade de manobra da
política externa dos Estados Unidos, já que as demais nações participantes tinham cotas e
direito a participação na tomada de decisões. (Simon, 2011, p.34).

Segundo Mattos (2005), dois fatores promoveram um enorme aumento na demanda


agregada. Em primeiro lugar, o plano foi muito pró-cíclico, pois criou muita infraestrutura,

20
gerou um aumento na industrialização e nos investimentos privados europeus e das
multinacionais estadunidenses. Além disso, gerava muita estabilidade financeira e cambial.
Em segundo lugar, houve muito investimento público, que também foi pró-cíclico, e a
explosão econômica aumentou mais a capacidade de arrecadar tributos. (Mattos, 2005).

O Plano foi um sucesso, conseguiu atingir os objetivos políticos e econômicos, assim


como atender os interesses do capital privado. Os recursos transferidos para o Plano
correspondiam a apenas 0,5% da economia anual dos EUA na época. Ele marcou uma era de
maior cooperação e saída do isolamento que os americanos tinham tradicionalmente, gerado
vantagens tanto para Europa, quanto para os EUA. Uma vantagem é o plano se colocava
como uma forma de ajuda e não como um instrumento de domínio. Ele foi oferecido a todos
os países europeus, até a URSS, que não via vantagens. Acreditava que perderia autonomia
política, pressionando os países ao leste da Europa para que não o aceitassem. (Simon, 2011).

Para Wall, conforme citado por Simon (2001), as políticas impostas pelos EUA - a
saber, o livre comércio, a estabilização monetária e inflacionária, além do incentivo à
integração; foram mais importantes que a própria transferência de recursos. Em outras
palavras, o fator decisivo foi a criação de um novo eixo de comércio com a Europa. Dessa
forma, o plano foi o fator mais importante do projeto de domínio americano, consolidando sua
hegemonia mundial. (Wall, 2001).

A guerra da coreia teve efeito pró-cíclico na Europa e no Japão. Na primeira, a


recuperação foi enorme. A partir de 48, houve crescimento da produção industrial de 39% e
de 100% das exportações. Depois de 62, o crescimento da produção passou a ser 60%. A
Europa começou a crescer mais rápido que os americanos. (Solomon, 1986).

21
Tabela 2
Taxas médias anuais de crescimento do Produto Interno Bruto em %

Países 1820-1870 1870-1913 1913-1950 1950-1973

EUA 4,2 4,2 2,8 3,9

Grã-Bretanha 2 1,9 1,3 3

Alemanha 2 2,8 1,3 6

França 1,3 1,6 1,1 5,2

Itália - 1,5 1,4 5,6

Japão 0,3 2,5 2,2 9,2


Fonte: Maddison (1989).

A Tabela 2, acima, mostra o resultado de tal política no crescimento do PIB dos


aliados. Por outro lado, como as condições trabalhistas melhoram muito, com grande repasse
do crescimento aos salários, a distribuição de renda melhorou e o PNB per capita aumentou.
Isso ocorreu pois o salário real foi aumentando à medida que a produtividade crescia. As
mudanças foram tão significativas que acabaram gerando uma sociedade de consumo de
massas, baseada no fordismo, de linhas de produção - que baixavam os custos produtivos, e
especialização ainda maior da mão-de-obra. Podemos ver tais dados na Tabela 3:

Tabela 3

Fonte: Mattos (2005).

22
Tal politica gerou uma mudança na estrutura produtiva com investimentos cada vez
maiores no setor terciário e secundário europeu. O trabalho passou se concentrar no setor de
serviços, deixando gradativamente o primário. A indústria aumentou sua participação, exceto
nos EUA e Inglaterra, mas não tanto quanto o setor de serviços. Vide tabela 4:

Tabela 4

Fonte: Mattos (2005).

O Japão também teve um projeto de desenvolvimento análogo ao Plano de


Reconstrução Europeia, promovendo mudanças em sua economia e sociedade - nos moldes
dos Estados Unidos, que é tratado a seguir.

2.3 A Ásia e o Modelo dos Gansos Voadores

A partir da Guerra da Coreia, o Japão também fez parte do ―desenvolvimento a


convite‖ (Medeiros e Serrano, 1999) e a Ásia também passou a considerada uma região de
suma importância para os EUA. Foram destinandos recursos análogos aos do plano Marshall.
Além de promover sua industrialização, os EUA compraram as exportações japonesas,
gerando grande industrialização e demanda efetiva.

O milagre japonês do pós-guerra [...] ilustra muito bem o ―desenvolvimento a


convite‖ induzido pela Guerra-fria. A partir da guerra da Coréia em 1950, a
estratégia americana em relação ao Japão muda radicalmente (Torres, 1999). As
indenizações de guerra foram perdoadas [...] as encomendas dos EUA
impulsionaram a indústria de máquinas e a automobilística que passam a crescer a
uma velocidade acelerada. Com os ganhos de produtividade daí derivados, a taxa de
câmbio nominal de 360 ienes por dólar começou a representar uma taxa real de
câmbio bastante desvalorizada contribuindo para um grande crescimento das
exportações manufatureiras. (Medeiros e Serrano, 1999)

23
O plano para o sudeste asiático consistia em fortalecer o Japão a fim de torná-lo um
elemento dinamizador na região, puxando os outros países. Tal feito só seria possível com a
criação de um mercado externo para as exportações japonesas, assim como acesso ao
financiamento internacional. (Medeiros e Serrano, 1999).

Comprar as exportações japonesas foi um grande diferencial. Essa política, quando


comparado com uma simples politica pro-cíclica interna, deu um resultado muito maior. Pois
havia uma garantia de demanda efetiva para os investidores no Japão.

Com isso, o Japão cresceu muito, tornando-se um líder na sua região que, baseada no
Modelo dos Gansos Voadores, gerou uma industrialização acelerada na Ásia. Após os anos
80, nenhuma região cresceu tanto como a mesma. A forma de crescimento é sequencial: Os
EUA se desenvolveram e o Japão foi puxado, o último foi passando parte de sua
industrialização e demanda aos demais países asiáticos. (MEDEIROS, 1997).

No Modelo dos Gansos Voadores4, o líder da região puxa os demais países com quem
faz comércio. Primeiramente, o Japão gerou uma demanda local por commodities. Este tipo
de bem é mais fácil de produzir, num primeiro momento, em razão da baixa capacidade
tecnológica, que os demais se encontravam. Entretanto, à medida que os custos trabalhistas
japoneses foram aumentando, ele transferiu as indústrias de menor geração de valor para os
seus parceiros mais atrasados. Dessa forma, o ganso líder puxou o resto, levando a uma
explosão nas exportações dos outros. Em outras palavras, o Japão fez Investimento Externo
Direto nos outros países da Ásia, que passaram a produzir produto relativamente simples, que
já não eram mais foco do líder, que estava dando prioridade para bens de maior valor. (Palma,
2004).

A característica marcante deste modelo é que, há a substituição de quem oferta os


produtos industriais mais simples, num cenário onde já existe demanda agregada pelos
mesmos. O primeiro é caracterizado como um planejamento para criar exportações, isto é, é
um caso de export led.

4
O Japão se tornou o ganso líder na Região, puxando os demais. Seu papel era análogo ao da Alemanha na Europa
e semelhante ao dos EUA, que eram – em ultima instância, o grande ganso mundial.

24
A hipótese básica é a de que as manufaturas com menor densidade tecnológica vêm
sendo reproduzidas sequencialmente em países com menor grau de industrialização
aproveitando espaços anteriormente ocupados pelos países mais desenvolvidos. A
dinâmica deste movimento pode ser atribuída a: no ganso líder: - substituição de
exportações decorrente da penetração em novos setores com maiores taxas de
crescimento nos mercados mundiais e com maiores efeitos expansivos sobre a
economia e as pressões do balanço de pagamentos; aumento do protecionismo nos
mercados consumidores (EUA); no ganso retardatário: aproveitamento dos espaços
abertos pelo ganso líder em grandes mercados consumidores e introdução de
técnicas anteriormente desenvolvidas por aquele. (MEDEIROS, 1997, pg. 37).

A força motriz desse modelo só poderia vir dos EUA. Como os eles estavam em
padrão ouro-dólar, não importava o déficit externo não era de grande importância, permitindo
uma grande quantidade de importações. Após meados dos anos 60, dada a proximidade, a
Coreia do Sul e Taiwan conseguiram seguir bem o caminho do mesmo, em razão da sua
política industrial agressiva. Inicialmente, eram exportados produtos industriais de baixo
valor. Como já havia uma demanda efetiva por tais produtos, estes países cresceram muito
rapidamente, o que é mostrado pela Tabela 5, abaixo:

Tabela 5

Fonte: Maddison, 2001.

Em um primeiro momento, tais países passaram a fornecer indiretamente para os


EUA, através do comércio com o Japão. Posteriormente, passaram a ser fornecedores diretos,

25
sendo convidados a desenvolvolver-se. O ganso a ser copiado era o Japão, os EUA não era
um ganso copiavel. Os países asiáticos que passaram a ser fornecedores dos EUA precisaram
ter qualidade e logística maior.

A política de desenvolvimento a convite na Asia também foi marcada pelo


fortalecimento do poder de compra dos trabalhadores, análogo ao vivenciado pela Europa,
criando um mercado de consumo de massas nos moldes estadunidenses. Também passaram a
concentrar a maior parte da mão de obra no setor terciário, com destaque para o secundário,
em detrimento do primário. Como podemos ver na Tabela 6, a seguir:

Tabela 6
Distribuição da força de trabalho
japonesa, 1980-85

Setor Setor Setor Total


Ano
Primário Secundário Terciário (%)

1950 48,3 21,9 29,8 100

1960 32,6 29,2 38,2 100

1970 19,3 33,9 46,8 100

1985 8,6 34 57,4 100

Fonte: Bank of Japan, Comparative International Statistics. 1985.

Fonte: Rattner, 1987.

Apesar do Desenvolvimento do Japão ter se iniciado no Padrão Ouro-Dólar, com a


guerra da Coreia - que surgiu em 1950, a continuidade do desenvolvimento da região asiática
continuou após o fim dos acordos de Bretton Woods. Seu desenvolvimento a convite
continuou no Padrão Dólar Flexível.

A China foi o último5 dos Convidados (Medeiros, 1999), inicialmente fornecedora de


bens industriais simples para Hong Kong, com base no ganso. A explicação para a demora de
sua inclusão se abriga no fato de que era um rival na Guerra-Fria, apesar de ter rompido com
a URSS nos anos 50. (Medeiros e Serrano, 1999).

5
Foi só no final dos anos 70, que a China passou a ser aliada dos EUA.

26
Em suma, as condições externas foram muito favoráveis, puxando o desenvolvimento
da região, em um modelo que gera superávit comercial, dada às exportações. Sendo assim,
conseguiram dólares o suficiente para comprar bens de capital importados, que deviam ser
pagos em dólar, sem gerar dívida externa - exceto a China, num primeiro momento

2.4 América Latina e os Patos Vulneráveis

Segundo Medeiros e Serrano, a América Latina estava bem longe do centro da Guerra-
Fria. As condições externas da região eram bem diferentes, não sendo tão favoráveis ao
crescimento industrial. Ela não contou com um Plano Marshall, nem com a construção de
uma economia regional baseada no acesso privilegiado ao mercado americano, ficamos muito
dependentes do investimento externo direto das multinacionais dos EUA e da Europa. Além
disso, a ―ajuda externa‖, que além de ser insuficiente para as maiores nações, veio
tardiamente. Foi somente após a crise da revolução cubana que recebemos tais recursos, mas
em pequeno montante. (Medeiros e Serrano, 1999).

Como o IED das multinacionais eram feitos em setores voltados para o mercado
interno, havia o problema das pioras dos termos de divisas, como foi apontado por Prebisch6
(1964) e Kalecki (1972). Tal propriedade acabou por gerar uma economia dependente da
performance exportadora. A capacidade de importar era limitada pela de exportar. Medeiros e
Serrano (1999).

Conseguir dólares é de suma importância para o desenvolvimento de um país, pois as


nações não aceitam qualquer moeda ao transacionarem. Em geral, na época do pós-guerra,
aceitavam dólares. Isto é, o dólar já era a moeda mundial. Os países aliados recebiam dólares
através das políticas de ajuda dos Estados Unidos. Entretanto, os da América Latina
dependiam mais de exportar a fim de criar superávit no Balanço de Pagamentos, conseguindo
dólares ou reservas internacionais.

6
Prebisch (1964) acredita que os termos de troca das economias primário-exportadoras vão se deteriorando, pois –
para tal autor, há uma tendência de desvalorização perene das commodities exportadas, em comparação ao preço
dos bens industrializados.

27
Nos anos 50, os termos de troca do Brasil eram mais favoráveis que os da Argentina.
Ele apresentou taxas de crescimento maiores que o da ultima, nos anos 50 e 60, gerando uma
menor necessidade de importados. Além disso, havia mais diversificação industrial, maior
mercado interno e uma rápida evolução na fase de substituição de importações, resultando em
um processo mais planejado e diversificado, que promovia bem mais as exportações. Dessa
forma, nos anos 60, o Brasil começou a fase de diversificação de importações, ao mesmo
tempo que Coreia do Sul e Taiwan, só que em contextos regionais diferentes. Medeiros e
Serrano (1999)

Em razão dos contextos regionais e externos, Coreia do Sul e Taiwan conseguiram


continuar o seu desenvolvimento industrial e social. O Brasil, por sua vez, não atingiu os
mesmos resultados, pois não estava em uma área favorável para receber a ajuda do
―desenvolvimento a convite‖.

2.5 Comparação Entre América Latina e Sudeste Asiático

Conforme defendido por Palma, as diferenças de crescimento entre América Latina e


o Leste Asiático, nos anos 60, podem ser explicadas pelas características distintas no lado da
oferta e da demanda de produtos industriais. Com relação à oferta, a disparidade reside na
questão de que os o Leste Asiático consegue criar uma cadeia de médio e longo prazo na
economia, levando a um grande aumento na demanda e produtividade de outros produtos.
Também conseguiram aumentar a produtividade e a absorção de mão de obra, mas não basta
só isso. Já no lado da demanda, a diferença é os mesmo produzem conteúdo de maior valor
tecnológico e que a procura mundial por eles subiu muito mais do que pelos produtos de
origem natural de baixo valor agregado. Isso acabou por gerar uma maior demanda e
encadeamento nesses países do que nos da América Latina. (Palma, 2004).

Outras duas questões de suma importância são: Em primeiro lugar, o crescimento do


PIB e da produtividade estão ligados a políticas industriais e de desenvolvimento,
encabeçadas pelo estado, que agiu de maneira pró-cíclica de forma continuada - a fim de
agregar valor à oferta e se adaptar à demanda externa, criando uma economia de exportação.
Além disso, o papel do setor empresarial nesse processo foi decisivo. Em segundo lugar, a
dinâmica regional levou a um desenvolvimento maior no sudeste Asiático, pois foi puxado

28
pela política do Japão, no modelo dos gansos voadores e pelos Estados Unidos, de uma
maneira geral, gerando uma enorme demanda por seus produtos industriais. (Palma, 2004).

Em razão dos seus interesses para que a região se tornasse exportadora, a OCDE
sustentava uma política de criar superávits constantes na Ásia, gerando grande crescimento de
exportações manufatureiras. Isso permitiu que saldos deficitários entre o Japão e seus
vizinhos existissem, gerando uma dupla inserção para os últimos, a de exportadores de
manufaturas mais baratas para a OCDE e a de mercado para investimento de exportações
japonesas de bens de capital. Isso ajuda a explicar o alto crescimento regional. Esse superávit
constante com a OCDE foi uma das grandes diferenças que tiveram. Já a América Latina, ao
contrário da Ásia, voltou a se especializar em bens primários. Além disso, entrou em
crescentes déficits de transações correntes e tornou-se muito dependente do financiamento
externo para o seu desenvolvimento. (Medeiros, 1997).

A América Latina não teve tanta dinamização quanto o sudeste asiático. Após as
reformas, aí mesmo é que não tiveram tantos benefícios, com crescimento baixo ou nulo da
produtividade. Nos casos em que houve um grande aumento da ultima, há evidencias de que
eles provavelmente não se sustentaram ao longo do tempo, pois não têm efeitos de
encadeamento tão grandes. Foi um erro voltar a se especializar em produtos primários,
baseado em vantagens comparativas questionáveis, levando à deterioração dos termos de
troca. O ganho de produtividade no modelo exportador da América Latina é mais difícil do
que os baseados na produção de bens mais complexos. (Palma, 2004).

Podemos concluir que o Modelo de Gansos Voadores criou um forte e rápido


desenvolvimento puxado pelo estado, isto é, pelo Japão e - em última instância, pelos Estados
Unidos. Isso tornou a Ásia muito forte e competitiva, enquanto que a América Latina não
contava com o mesmo cenário externo. Dessa forma, a menor integração, a questão de não
fazer parte do desenvolvimento a convite, de não ter industrialização com demanda garantida,
de ter que conquistar seu superávit comercial baseado em dívida externa e exportações
incertas, levou os países da mesma a ser um exemplo de ―patos vulneráveis‖.

Como podemos ver na Tabela 7, essas condições tão diferentes geraram um menor
crescimento na América Latina, em comparação com os países do Sudeste Asiático e do Leste
Europeu. Tal fato é demostrado na comparação entre as taxas de crescimento do PIB por hora

29
trabalhada entre tais países, assim como a diferença entre o período de 1950 a 1973 e e o
anterior.
Tabela 7

Fonte: Maddison, 2001.

A conjuntura externa foi muito importante para explicar o rápido desenvolvimento dos
países do sudeste asiático. Essa questão foi mais importante do as politicas pro-ciclicas internas
de cada pais da região. Além disso, o capitalismo se desenvolveu a partir do Estado, que se dizia
liberal, mas que fazia políticas keynesianas de demanda efetiva.

30
CAPÍTULO 3 – KEYNESIANISMO E DESENVOLVIMENTISMO
BÉLICO

Apresentação

O Capítulo 3 mostra que desenvolvimento de todas as nações convidadas foi baseado


na existência de guerras, isto é, no keynesianismo e desenvolvimentismo bélico dos EUA. Em
seguida, discorre sobre as peculiaridades do seu sistema de inovação e pesquisa, que
permitem que eles sejam o país mais eficiente do mundo em tal área. Por fim, mostra a
politica industrial e de inovação americana pela ótica da demanda efetiva.

3.1 O Complexo Industrial-Científico-Militar e o Lado da Oferta

Com a Guerra-Fria, os americanos acreditavam que a melhor estratégia era se


fortalecer no papel de potência tecnológica, e que deviam se consolidar como a principal
potência do mundo. A influência militar da nova política gerou um setor industrial ainda mais
relacionado com a guerra, que especializou-se em tecnologias militares, enquanto os demais
países capitalistas especializaram-se em produzir a baixo custo as inovações. O quadro
geopolítico gerou uma onda de grandes inovações tecnológicas onde o estado era o grande
demandante industrial. (Medeiros, 2004).

Dessa forma, o fortalecimento da União Soviética acabou por criar condições onde
uma maior integração entre o setor industrial, o militar, o científico e o estado era necessária;
o que criou condições muito peculiares para o progresso dos Estados Unidos e do mundo do
pós-guerra.

Segundo Misa (1985), as guerras fortaleceram a relação entre as empresas, o governo,


os militares e os centros de ensino e pesquisa acadêmica. Houve também um esforço para
centralização e canalização de pesquisa e produtivo. Uma das instituições mais importantes
criadas no pós-guerra foi o National Science Foundation, que tinha a finalidade de aproximar
mais a pesquisa entre o governo e o setor militar. Misa (1985).

31
Nos centros de pesquisa, estão presentes representantes do setor militar, que demanda
tais tecnologias e também das empresas. Dessa maneira, tal processo de P&D engloba
simultaneamente esses quatro agentes; a saber, as universidades, o governo, os militares e as
empresas - que estão intimamente interligados, como não ocorre em nenhum outro lugar,
permitindo muito mais eficiência de pesquisa que as demais nações. (Medeiros, 2004).

Apesar de se autodeclararem liberais, o esforço de invenção, de maneira geral, é feito


pelo governo. Já a as empresas ficam com o benefício da distribuição dessa inovação. As
inovações militares básicas - como internet, avião a jato, fibra ótica, transistor et, foram
dirigidas como um empreendimento militar. (Roe Smith, 1985). Havia dois interesses,
baseados na visão de que a superioridade militar era o melhor caminho para ganhar guerras:
vencer a Guerra-Fria e consolidar os EUA como principal potência tecnológica. (Medeiros,
2004).

Segundo Misa (1985), para fazer a política de pesquisa tecnológica, que iniciou-se
nos anos 40, o governo precisou garantir uma maior proximidade entre ele mesmo, o setor de
pesquisa e o setor militar. Os últimos promovem, nesse contexto, a formação de uma indústria
inicial - subsidiada pelo estado, para produzir nova tecnologia em questão; além de criar
padrões de produção, o que ajuda a difundi-la. Essa característica acaba por reduzir custos de
produção. As principais grandes inovações tecnológicas surgiram através dessa grande
ligação entre os militares, o governo, as empresas e as universidades. Misa (1985)

Um dos principais avanços do período do pós-guerra foi a criação do Transistor. Ele é


um exemplo de pesquisa com recursos do governo para o setor militar que criou um novo
setor industrial, isto é, tornou possível e viável a capacidade de produção em massa da nova
tecnologia. Dois fatores políticos teriam sido fundamentais para que ele fosse construído: Em
1947, a criação do national security act, que visava melhorar a coordenação sobre a pesquisa
do setor militar e acadêmico; além da explosão da Guerra da Coreia. Misa (1985).

Conforme colocado por Misa (1985), a criação de novas tecnologias importantes leva
a um ciclo vicioso. O surgimento de uma tecnologia primária leva a gênese de outras grandes
tecnologias como, por exemplo, o transistor levou a uma melhora no campo da comunicação e
da aviação; que - por sua vez, geraram suas próprias inovações importantes e assim por
diante. (Misa,1985).

32
Além da criação de muitas inovações, a capacidade de difusão da mesma, ao longo da
cadeia econômica, é de suma importância. Nesse sentido, os estadunidenses são os melhores
em difundir as suas novas tecnologias para as empresas, o que acontece rapidamente, já que a
elas são produzidas nas universidades de altíssimo nível, com recursos federais. Isto é, os
EUA tem a maior integração entre as empresas, os militares e universidades já vista.

Para Dosi, Pavitt e Soete; o país que produz e oferta tecnologia de maneira mais
eficiente é aquele que tem maior integração entre os setores. Em sua visão, as instituições têm
um grau de suma importância no processo de desenvolvimento. (Dosi, Pavitt, Soete; 1990). A
URSS7 não tinha tanta integração entre militares, universidades e - tampouco, empresas. Sua
economia não gerava o encadeamento necessário para tal nível de progresso.

Por todas essas razões, o processo de progresso tecnológico estadunidense é mais


eficiente que o dos outros lugares, e seu sistema de inovação, mais rápido. (Medeiros, 2004).
Dessa forma, há uma grande eficiência no processo de oferta de produtos, a partir da rápida e
constante criação de tecnologias e ganhos de produtividade. Essa grande oferta é possível,
pois existe uma grande demanda efetiva para a mesma.

3.2 O Lado da Demanda

De acordo com Dosi, Pavitt e Soete; a política que sustenta o maior nível de progresso
tecnológico do mundo é também uma geração de demanda efetiva. Não basta ter somente
integração. Quanto maior for a última e a demanda efetiva, mais eficiente será o processo de
inovação. (Dosi, Pavitt, Soete; 1990).

Nos EUA, a segurança nacional é mais importante que a do valor despendido pelo
governo. Os militares têm orçamento quase que irrestrito, é muito mais que um simples
subsídio. Em razão dessas características, a velocidade da inovação é muito maior que os nos

7
Como a URSS era socialista, suas demandas bélicas não geravam tanto fator de crescimento quando os EUA, já
que havia um estimulo menor para pesquisa, inovação, investimentos etc. Dessa forma, não há um complexo
cientifico-industrial-militar tão eficiente e integrado, no que diz respeito à criação e difusão de tecnologias, assim
como no seu impacto na melhora da economia.

33
outros países. Formam, então, um complexo industrial peculiar, com uma política industrial
distinta. (Medeiros, 2004).

Segundo Serrano, ―o crescimento da economia depende de políticas macroeconômicas


altamente intervencionistas, sejam fiscais, monetárias, cambiais ou de renda, que gerem
grande aumento da demanda efetiva‖. Desde a Guerra-Fria, o governo dos EUA vem fazendo
uma fortíssima politica nesses termos, caracterizada pela existência do complexo cientifico-
industrial-militar. Este foi um período com alto crescimento econômico, de demanda efetiva,
do nível de emprego e salários, da produtividade, da recuperação europeia, de
desenvolvimentismo na periferia; em razão do intervencionismo e não graças ao livre
mercado. (Serrano, 2004).

Esta política de crescimento de demanda efetiva exigia um estado maior. Fortalecer o


mesmo, assim como promover o pleno emprego, deixava os capitalistas desconfortáveis, pois
acreditavam que estavam podendo poder, em razão do estado mais ativo e do aumento do
poder de barganha dos trabalhadores. Uma forma amenizar esse problema foi o de fazer a
expansão estatal a partir do aumento dos setores militares8 e do programa espacial, que eram
menos ameaçadores do que a criação de um estado de bem estar social mais forte, como era o
caso dos aliados. A elite dos últimos aceitou programas mais voltados para a população, pois
estavam mais próximos da destruição da linha de batalha. (Serrano, 2004).

8
A expansão do estado via setor militar era facilmente justificada com a guerra e por questões patrióticas.

34
Tabela 8

Fonte: Mattos (2005).

Na Tabela 8, acima, podemos ver que os gastos militares no exterior dos EUA sobem
vertiginosamente, desde o inicio da Guerra-Fria, assim como os recursos enviados ao exterior
e os IEDs. Tudo isso, criando uma tendência de déficit no BP. Isso é um sinal de que o estado
se expandiu, e o fez fortemente baseado no setor militar.

Os Estados Unidos não chamam essa grande geração de demanda efetiva e


industrialização de política industrial. Tudo é tratado apenas como questão da segurança
nacional, sendo - na verdade, a política industrial mais eficiente e distinta do mundo, a maior
já vista pela humanidade. Trata-se de um caso de keynesianismo e de desenvolvimento bélico,
o primeiro é em razão da grande tentativa de estimular o investimento, a partir da criação de
demanda efetiva, com foco na melhora do poder de compra dos salários; já o segundo, diz
respeito às politicas de desenvolvimento que estavam presentes no Keynesianismo Bélico,
isto é, leva a uma mudança estrutural.

O importante era gerar um grau de ocupação efetivo da capacidade produtiva e não, ao


contrário da teoria de Kalecki, um ―grau de ocupação normal ou planejado‖. A prioridade era
a obter uma elevada taxa de crescimento e altos níveis de emprego, ―baseada na reconstrução

35
e desenvolvimento dos países aliados‖. A busca pelo crescimento e alto nível de emprego
continuou mesmo com a presença da inflação rastejante, nos EUA. (Serrano, 2004).

Segundo Mattos (2005), a politica dos Estados Unidos visava estimular o crescimento
econômico e a demanda agregada. O estado investiu muito em industrialização, gastou muito
em infraestrutura, gerou um aumento na industrialização e nos investimentos privados, na
forma do Plano Marshall e das demais politicas de desenvolvimento dos aliados, da criação
do Welfare State9 e da transferência de renda para os desempregados – que, juntamente com
as politicas de pleno emprego, levaram ainda mais pessoas ao mercado de trabalho. Isso tudo,
que ocorreu baseado nos Acordos de Bretton Woods, acabou gerando um enorme boom na
indústria americana. (Mattos, 2005). Isso tudo para manter a continuidade do crescimento
alcançado com a Primeira e a Segunda Guerra.

Os EUA se beneficiaram muito das políticas desenvolvimentistas de ajuda a outros


países. Muitos deles importavam dos americanos, com Durante a Guerra-Fria, a política
econômica consistia em, no setor interno, gerar emprego e crescimento; já quanto ao setor
externo, eles deveriam desenvolver o capitalismo, de modo a não gerar uma restrição externa
no pós-guerra, uma vez que seu desenvolvimento foi baseado na economia de guerra.

Dessa forma, o Keynesianismo com desenvolvimentismo bélico é o tipo de política


industrial-desenvolvimentista mais eficiente do mundo, levando os EUA a se desenvolver tão
fortemente. Tal regime também levou progresso a todos os aliados da Guerra-Fria, que foram
convidados a se desenvolver. Dessa forma temos uma grande ironia no desenvolvimento dos
países, já que as condições que possibilitaram o desenvolvimento a convite, assim como o
Estado de Bem Estar Social; vieram do sucesso de tal politica. Isto é, o desenvolvimento dos
países capitalistas originou-se a partir da criação de uma indústria totalmente dependente da
existência de guerras. No futuro, os EUA viriam a dar um jeito de entrar em novas guerras
novamente, como é o caso da política pós 11 de setembro.

A demanda efetiva pode crescer de maneira muito forte, mesmo no inicio da fase de
compressão das margens de lucro, graças ao aumento do conflito distributivo. Na verdade, a

9
O Estado de Bem-Estar Social foi uma ideia da direita, assim como a criação das leis trabalhistas por Vargas, no
brasil. Ele não é anticapitalista, na verdade, foi essencial para que a economia chegasse no nível de crescimento
alcançado na Golden Age.

36
no inicio desse processo houve ate um aumento do consumo, mas com inflação. Apesar da
compressão, o ritmo de investimento e crescimento se manteve, pois a demanda efetiva ainda
estava em expansão. Apesar da inflação, Nixon, inicialmente, entre 68 e 71 não adotou a
política contracionista, comum nesses casos. Na verdade, manteve a politicas fiscal
expansionista, em razão dos gastos militares e sociais, com destaque para o programa de
moradia e de bens de consumo duráveis; assim como a monetária, que manteve juros baixos.
A prioridade ainda era evitar o desemprego. (Serrano, 2004). A politica foi expansionista até
1979. Veremos essas ultimas questões mais detalhadamente no capitulo a seguir.

37
CAPÍTULO 4 - FIM DOS ACORDOS DE BW

Apresentação

O capítulo 4 apresenta o processo de declínio do Sistema de Bretton Woods.


Primeiramente, apresenta o problema da compressão dos lucros em razão da queda do
conformismo social. Em seguida, mostra o Dilema de Nixon e o de Triffin e suas visões sobre
o Balanço de Pagamento dos EUA. Finalmente, disserta que Nixon acabou com a
conversibilidade unilateralmente, uma vez que os países aliados não aceitaram a proposta de
mudança cambial estadunidense.

4.1 Início do Processo de Declínio

No pós-guerra, em razão do grande crescimento, havia um compromisso com manter a


inflação sob controle. A alta taxa de emprego não levou a um aumento da inflação, que
permaneceu ―rastejante‖ em razão do papel dos sindicatos. O salário real era crescente, o seu
crescimento era ligado ao da produtividade. Esse período foi a era de ouro da melhora
distributiva. Isso só foi possível com o câmbio fixo do sistema e com o controle dos preços do
petróleo do oriente médio pelos EUA. (Serrano, 2004)

Esta performance econômica e social dos países capitalistas regulados pelo Estado
no contexto geopolítico da Guerra Fria, segundo Kalecki, afastou simultaneamente a
possibilidade de colapso econômico, de guerras entre os principais países
capitalistas e também da revolução socialista nos países avançados, onde a
prosperidade dos trabalhadores era crescente. Segundo o autor, os países capitalistas
haviam ―aprendido o truque‖ de evitar as crises e a desordem do capitalismo
desregulado através da intervenção estatal. (SERRANO, 2004).

A ―reforma crucial‖ que Kalecki argumenta ser necessária, de fato aconteceu nos
países capitalistas. A melhora na distribuição de renda, que aconteceu foi a partir do estado.
Ela exigia alto grau de ―conformismo social‖ para funcionar. Entretanto, nos anos 60, uma
nova geração - que cresceu naquelas ótimas condições econômicas e sociais, chegou ao
mercado de trabalho, levando a uma redução no ―conformismo social‖ Isto é, houve um
aumento no grau de militância sindical, por direito civis e estudantis. A consequência foi o
aumento do conflito distributivo de todos os países centrais. Nos EUA, a população se opôs à

38
Guerra do Vietnã e exigiu ainda mais direitos, exigindo mais gastos sociais financiados com
maior taxação progressiva de impostos de renda. (Serrano, 2004).

Segundo Cavalieri, Garegnani, Lucii; as políticas de pleno emprego e as exigências


por melhores condições levaram a um forte crescimento do salário real médio nos países
capitalistas, que entre 1968 e 1972 foi de 4,3% ao ano. A aceleração média no período de
1952 a 1957 foi de 2,8%, quase dobrando. A produtividade também aumentou no período.
(Cavalieri, Garegnani, Lucii; 2004).

Tal explosão no poder de consumo levou a uma inflação, já que os aumentos dos
custos do reajuste salarial iam sendo repassados aos preços. A margem de lucros não
acompanhou o crescimento dos custos e os rendimentos financeiros caíram. Apesar da
compressão dos lucros, o ritmo de investimento e o de crescimento se manteve, porque a
queda do primeiro aconteceu na mesma proporção que a queda das taxas de juros reais. Além
disso, a decisão de investir não é de acordo com sua proporção em relação à taxa de lucro. Na
verdade, é em função do tamanho do mercado. Isto acontece porque os empresários não
―investem enquanto classe‖, mas sim em razão das oportunidades. Se a demanda efetiva se
expandir, então os investimentos também farão o mesmo. (Serrano, 2004). Isto é, eles
investem apenas pensando no custo de oportunidade.

A política de desenvolvimento a convite passou a ser cada vez mais questionada pelas
elites a medida que ela começou a apresentar um grande problema para os empresários, a
saber, a queda da parcela da produção destinada aos lucros em favor do aumento dos salários
conquistado pelos movimentos sociais da época.

Como havia um maior nível de consumo, em razão da grande melhora na distribuição


de renda e aumento dos salários reais, promoveu um aumento na demanda efetiva, gerando
um aumento de investimento por parte dos empresários, mesmo com a participação nos lucros
menor.

A compressão das margens de lucros no final dos anos sessenta teve o efeito, não só
de aumentar o conflito social e distributivo e a inflação, como também de,
inicialmente, acelerar ainda mais o crescimento econômico dos principais países
industrializados. (SERRANO, 2004).

39
Apesar da queda da parcela dos lucros estar aumentando o conflito social, a política
econômica, fiscal e monetária dos EUA se manteve expansionista no primeiro mandato do
governo de Nixon, entre 1968 e 1971. O foco do governo era manter o desemprego em níveis
baixíssimos, assim como manter um alto nível de bem estar social, além de enormes gastos
militares. Havia o estímulo à construção civil e bens duráveis. Num segundo momento, em
1971, foi iniciada uma política de controle inflacionário baseada na restrição da renda, que
gerou queda dos salários. Serrano (2004).

A partir de 1968, o crescimento do salário real cresce mais que o da produtividade.


Dessa maneira, as políticas de pleno emprego, que levaram a melhora nas condições de vida e
geraram a era de ouro do capitalismo, não poderiam mais se sustentar. A contestação é fruto
do baixo nível de desemprego, não de uma conquista de maior poder político dos
trabalhadores. (Cavalieri, Garegnani, Lucii; 2004).

A inflação aumentou antes da explosão dos preços do petróleo, em 1973, em razão do


aumento dos salários reais e diminuição dos lucros capitalistas, isto é, graças ao conflito
distributivo após duas décadas de pleno emprego. O desemprego aumentou em todos os
países centrais a partir de 1973, já que - com a explosão do preço do petróleo, fortes medidas
anti-inflação começaram a ser tomadas por tais nações. O aumento do salário real torna-se
quase nulo em vários países da Europa e negativo nos EUA. (Cavalieri, Garegnani, Lucii;
2004).

Serrano argumenta que, segundo Cavalieri, Garegnani e Lucii (2004), a economia dos
EUA teve uma inflação maior e um crescimento de salários reais bem menor que os demais
países capitalistas. Diante dessa situação, mediante o regime de câmbio fixo, a
competitividade dos EUA foi relativamente piorando, mesmo com o aumento do valor de
algumas moedas importantes, como o Yen e o Marco. Dessa forma, surgiu uma pressão de
grande parte do empresariado estadunidense, especialmente daqueles ligados à exportação,
para gerar uma desvalorização cambial generalizada. (Serrano, 2004).

Na década de 40, a elite estadunidense acreditava em aumentar o poder de compra dos


trabalhadores e fortalecer os sindicatos e leis trabalhistas na Europa. Entretanto, isso mudou à
medida que foram percebendo que política de desenvolvimento a convite gerou uma

40
população acostumada uma ótima situação económica e social, de grande estabilidade, que
exigia muito dos empresários.

À medida que os trabalhadores conseguiram absorver uma maior parte do lucro, e que
união soviética foi dando sinais de enfraquecimento, e que capitalismo o estava cada vez mais
consolidado; promover o aumento de salários e a garantir a estabilidade dos trabalhadores
deixou de ser interessante. Dessa forma, no inicio dos anos 70, a elite tomou medidas a fim de
diminuir o poder de barganha e o salário dos trabalhadores. Foi o fim da era de ouro do
trabalhador nos países capitalistas. A partir dessa época, de uma maneira geral, o salário real
entrou em trajetória decrescente e as leis trabalhistas, em um segundo momento, foram se
enfraquecendo. Tal trajetória pode ser vista hoje, no Brasil, com a redução dos direitos
trabalhistas. Vários autores contribuíram com suas visões sobre o fim do sistema financeiro
baseado no lastro do dólar em ouro, como veremos a seguir.

4.2 Visões Acerca do Fim do Padrão Ouro-Dólar

Uma das visões mais famosas acerca do fim do sistema de Bretton Woods é a de
Triffin. Para tal autor, havia um grande dilema, pois não seria possível conciliar o crescimento
internacional com demanda por dólar lastreado em ouro sem levar à ruína da paridade ou sem
recorre a medidas restritivas, que desacelerariam a economia mundial.

Segundo Triffin, havia um ―dilema‖ no padrão ouro-dólar: À medida que o tempo


passa, há cada vez emissão de dólar no mundo, a fim de promover a liquidez necessária à
expansão do capitalismo. Entretanto, seu lastro em ouro permanece constante, gerando uma
tendência de enfraquecimento dessa moeda. A única solução é que os países acumulem a
mesma em forma de reservas internacionais, o que só é possível com constantes déficits no
BP dos EUA. Dessa forma, o Padrão Ouro-Dólar estaria destinado ao colapso, análogo à ruína
do sistema financeiro de 1931. Na sua visão, o dólar tinha funções contraditórias, a saber, o de
reserva internacional e de liquidez internacional. (Triffin, 1960).

Gold has long ceased to provide an adequate supply of international liquidity for an
expanding world economy[...] The process, however, is bounded to come to and end

41
at some point. The the key currency countries cannot afford to let their net reserve
position deteriorate indefinitely. If they did, their currency would stop in any case,
to considered as the safest, and other countries would cease accumulation it [...] The
protectionist groups would find in such a situation powerful arguments to in favor of
a curtailment of foreign aid programs and of a reversal in the liberal trading policies
previously pursued. (TRIFFIN, 1960, p.88)

Consequentemente, uma política de controle sobre os crônicos déficits no Balanço de


Pagamentos americano teria que ser restritiva, gerando queda no crescimento econômico no
mundo todo, culminando em problema de liquidez. Como podemos ver Na Tabela 9, a seguir,
as participações em dólar de outros países estavam aumentando em relação às reservas de
ouro dos EUA:

Tabela 9
Reservas de Ouro dos EUA e a Participações em Dólar de Outros Países.

Fonte: Triffin, 1960. Pg.22

Triffin, em trabalho posterior, argumenta que o sistema monetário baseado na


conversibilidade do ouro deve ser extinta, para parar de gerar déficits contínuos no Balanço
de Pagamentos dos EUA e da Inglaterra. Para ele, a base do ouro há muito tempo se tornou
inadequada. Para o autor, após a primeira guerra, a oferta mundial desde metal precioso era
suficiente para garantir o crescimento, mas a partir da segunda, houve problemas de liquidez,
levando o ouro a sair desses dois países. (Triffin, 1972),

42
O Dilema de Triffin foi muito discutido. Para Kindleberger, ele nunca se verificou,
mesmo com o aumento cada vez maior dos déficits no BP concomitantes com o crescimento
do comércio internacional. Para o mesmo, Triffin cometeu um eerro monetarista em sua
análise, quando assume que a velocidade de circulação do ouro é constante. Entretanto, ela
pode aumentar. Além disso, tal metal precioso continua em posse dos EUA. Para o outrora
presidente da França, Charles de Gaulle, os EUA tinham um ―privilégio exorbitante‖, já que
podiam financiar seus déficits no BP emitindo sua própria moeda sem lastro, ganhando com
senhoriagem internacional. (Serrano, 2002).

No final dos anos 60, o circuito offshore de eurodólares cresceu. Os bancos que
negociavam os dólares também eram fonte de sua emissão, amplificando a política monetária
americana. Então, os ganhos de senhoriagem passaram a se dividir entre os EUA e estes
banqueiros. Kindleberger deu à luz à política americana. Para ele, não havia ganho de
senhoriagem pois os bancos centrais dos aliados não retinham grandes quantidades de dólares
em dinheiro, mas sim títulos públicos de alta liquidez dos EUA, que eram remunerados. Dessa
forma, o último funcionava como um banco comercial mundial, fornecendo liquidez,
emprestando a curto e pegando a longo - ganhando apenas com os juros e não com senhoriagem.
Também não havia ―privilégio exorbitante, mas sim uma divisão do trabalho entre os EUA e o
resto do mundo. Para Serrano, o pensamento de Kindleberger e de Solomon estava certo,
enquanto DeGaulle cometeu um erro monetarista, assim como o Triffin. (Serrano, 2002).

Serrano, ao contrário de Kindleberger, argumentava que o privilégio do dólar era


muito maior do que os de senhoriagem. Isso ocorria pois eles não seriam um banco comercial
mundial, pagando taxas de mercado em seu passivo externo de curto prazo, mas sim um
banco central do mundo. Isso só era possível em razão do verdadeiro privilégio dos
estadunidenses, a saber, poder ter déficits constantes na Balança de Pagamentos, assim como
determinar sozinho a taxa de juros do mundo. (Serrano, 2002).

Com as políticas keynesianas do desenvolvimento a convite, os Estados Unidos


fizeram muitos Empréstimos e Investimento Externo Direto nos aliados. Seu Balanço de
Pagamentos se tornou deficitário em 1971, já que eles emprestavam no curto prazo para
receber no longo, ganhando com a diferença temporal de juros. Sistema parecido com o da
Inglaterra na época do padrão-libra.

43
Para Serrano o Dilema de Triffin não se verificou, pois a velocidade de circulação do
ouro não era fixa, em razão dos fluxos de capitais, e porque os Estados Unidos empresta a
longo prazo mas recebe a curto prazo. Tal autor erroneamente assume que a velocidade de
circulação do ouro é 1. Kindleberger e Solomon estavam corretos. Serrano (2002). Dessa
forma, para Serrano, há a existência do Dilema de Nixon, que é tratado a seguir.

O verdadeiro privilégio dos Estados Unidos era idêntico a da Inglaterra na época do


auge da Libra, a saber, não ter restrição no Balanço de Pagamentos. Essa peculiaridade
permitiu que o ―desenvolvimento a convite‖ dos demais países capitalistas pudesse ocorrer.
Caso os americanos não tivessem essa propriedade, haveria muita falta de liquidez e recursos
e todo desenvolvimento mundial estaria dependente da capacidade dos EUA exportar, a fim
de tentar gerar o superávit necessário para um empreendimento desse porte. O progresso da
Era de Ouro do capitalismo se deu em razão a essa peculiaridade.

Dessa forma, em razão das características desse sistema, os Estados Unidos poderiam
agir de maneira pro-cíclica, concedendo financiamento para vários e criando políticas de
reconstrução e pleno emprego em outros países, além de manter os juros baixos e permitir que
estes desvalorizassem suas moedas.

4.3 O Dilema de Nixon e o Fim da Conversibilidade

Para Serrano, não havia dilema de Triffin. Para o autor, o que existe é o dilema de
Nixon. Nos anos 60, apesar do superávit comercial e de conta corrente, os EUA apresentaram
déficits crescente no BP; em razão dos gastos militares no exterior e da política de
desenvolvimento a convite - que demandava a transferência de enormes quantias,
empréstimos, investimentos diretos etc. Como o dólar era a moeda mundial, então os
americanos financiaram a maior parte dos tais déficits em sua própria moeda, ou seja, o ouro
se mantinha nos EUA. Serrano (2004).

Os passivos de curto prazo dos EUA não se ampliam pois, a saída de dólar no longo
prazo, era compensada pela entrada do mesmo no curto. Ao receber os dólares, os demais
países os trocam por títulos de curto prazo do tesouro americano, a fim de receber juros, já
que os BC mundiais preferiam acumular reservas em tais títulos. Então, há uma entrada de

44
volta de dólares nos EUA. Não há, então, déficit em Conta Corrente e, consequentemente,
nem um aumento do passivo externo líquido. Assim sendo, apesar do déficit no BP, não há
saída de ouro. Nesse caso, a saída de dólar dos EUA era cada vez maior, o que diminui a
proporção entre tais títulos e o ouro. Serrano (2004).

Esse mecanismo monetário gerava uma assimetria muito grande pois, na medida em
que os países aceitaram o dólar como moeda de reserva internacional, os EUA
podiam financiar um déficit global na balança de pagamentos de qualquer tamanho.‖
(SERRANO, 2004)

Entretanto, havia duas desvantagens na conversibilidade: Em primeiro lugar, apesar de


poder ter déficit crônico na conta de capital, isso não poderia ocorrer na conta corrente, o que
implicaria em dívida externa paga em dólar e perda de ouro, uma vez que os BC dos outros
países poderiam trocar tais dólares por ouro. Então, tal situação levaria a uma saída grande
deste metal precioso e o mesmo seria cada vez mais usado diretamente no comércio
internacional, ameaçando o dólar. A segunda desvantagem era que a relação preço do ouro
não poderia variar em relação ao dólar, para evitar ataques especulativos contra ele. O preço
foi tabelado entre 47 e 71. Essa condição não permitia que o dólar se desvalorizasse em
relação a outras moedas, enquanto os outros países podiam. Serrano (2004).

Estas duas desvantagens criavam um dilema, pois as políticas de desenvolvimento a


convite estavam reduzindo cada vez mais os superávits na conta comercial e na conta
corrente. Ameaçando acabar com superávit necessário na última, em razão da fuga de ouro.
Entretanto, a forma mais simples de melhorar a competitividade externa do dos EUA seria
desvalorizar o dólar. O que não era possível sem ameaçar o seu papel de moeda
internacional. Uma política contracionista a fim de manter a taxa de nominal não era
interessante para os EUA, pois não desejavam uma recessão. Serrano (2004).

―o Dilema de Nixon‖ [...] vinha da vontade de desvalorizar o câmbio e ao mesmo


tempo a impossibilidade de fazê-lo, dentro das regras do Sistema Bretton Woods,
sem ameaçar a posição do dólar como moeda internacional. (SERRANO, 2004).

Os Estados Unidos desejavam desvalorizar o dólar pois estavam ficando menos


competitivos que os aliados capitalistas. Entretanto, uma política de desvalorização do
mesmo só seria possível através da valorização coordenada de todas as demais moedas juntas.
Uma simples mudança cambial não poderia ser feita unilateralmente.

45
O aumento crescente na mobilidade de capital que caracterizou o pós-guerra, criou
uma tendência para taxas de câmbios cada vez mais flexíveis serem usadas, o que acabou
criando pressões para o fim do Sistema de Bretton Woods. Para ele, a combinação de políticas
de livre comércio e de restrições financeiras era pouco estável. (Eichengreen, 2000).

As negociações dos anos 60 não foram interessantes para os EUA, seja o uso do ouro
como moeda internacional que tornaria o seu BP comum, ou os Direitos especiais de Saque.
,

Nenhuma foi aceita. Os EUA solicitaram que os demais países valorizassem


coordenadamente suas moedas, a fim de criar uma desvalorização para o dólar, que
mantivesse a paridade. Entretanto, elas negaram, levando Nixon - em 1971, a abandonar
unilateralmente a conversibilidade. Além disso, ele criou uma taxa sobre importações até
1973. O eurodólar é uma afirmativa do sucesso do dólar, não do seu fracasso, como diz a
visão tradicional. O mercado mundial já era em dólar, então o dólar era mais interessante que
o ouro. Então o dólar abandonou o ouro, e não o ouro o dólar. Serrano (2004).

Os EUA deixaram o ouro para não ter restrição externa e poder continuar crescendo,
haja vista que estavam perdendo competitividade relativa com os países que vinham
ajudando, uma vez que eles estavam em processo de catching up10, tendo um aumento de
produtividade mais rápido que os estadunidenses e também porque, ao contrário dos últimos,
poderiam fazer desvalorizações cambiais competitivas.

O dólar é uma afirmação do verdadeiro desenvolvimento dos EUA, tão grande que
conseguiu reconstruir a Europa, o Japão e os Tigres Asiáticos. Os outros países desenvolvidos
não têm a moeda mundial, então o seu desenvolvimento não é tão especial quanto o dos
Estados Unidos. Foi a contradição financeira, não a globalização e o eurodólar, que fizeram
os EUA a abandonar a conversibilidade. A visão tradicional foca que o dólar estava numa
situação difícil, mas na verdade estavam muito bem, já que estavam reconstruindo e
financiando tantos países. Problemas no fechamento do BP causaram a interrupção no
desenvolvimento de vários países, inclusive os periféricos e a URSS.

10
A política de desenvolvimento a convite gerou um grande nível de crescimento econômico e de produtividade nos
países aliados, mais rápido que o do próprio EUA, alcançando o mesmo em diversos aspectos econômicos e sociais,
inclusive fazendo melhor em alguns setores.

46
Grande parte do aumento da inflação dos bens primários no mercado internacional
ocorreu graças a existência da demanda agregada gerada nos EUA nas nações aliadas com as
políticas de desenvolvimento a convite. Veremos, em seguida, as conclusões gerais sobre o
sistema financeiro criado com o Bretton Woods.

47
CONCLUSÕES

O choque de Juros de Volker marcou o início de uma nova era na estratégia política
estadunidense, marcada pelo fim da política de ―desenvolvimento a convite‖ na Europa. O
Japão e, posteriormente, os Tigres Asiáticos e China, continuaram a receber os benefícios
dessa política, mesmo no próximo padrão que se seguiu, o Dólar Flexível. Entretanto, a
Europa Ocidental já estava bem reconstruída, com o capitalismo bem consolidado, não sendo
mais uma ameaça para o capitalismo. Na verdade, a região tornou-se muito competitiva, e
seus cidadãos, muito exigentes do ponto de vista das condições sociais.

A era do câmbio flexível, desregulamentação e livre mobilidade, é marcada por uma


maior volatilidade inflacionaria que o período anterior. Isso ocorre pois há a possibilidade de
grande entrada e saída de capitais repentina. Como grande parte do financiamento agora vem do
capital financeiro especulativo internacional, uma saída repentina causaria um choque
inflacionário. A partir dos anos 80, o cenário para quem quer se desenvolver se tornou
diametralmente oposto ao enfrentado pelos países que tiveram desenvolvimento a convite.

O principal condicionante para o desenvolvimento foi o contexto externo, as políticas


internas são importantes, mas ficam em segundo plano, porque não necessariamente uma
política pró-cíclica vai estimular o investimento. Todas as nações que prosperaram tiveram
um ótimo cenário estrangeiro. Eles não cresceriam tanto somente fazendo políticas estatais.
As mesmas geraram bastante crescimento e industrialização, mas ficam bem distantes do
nível alcançado por aqueles que tinham os condicionantes externos do ―desenvolvimento a
convite‖. Países da América Latina, por exemplo, não chegaram ao nível do Japão, Alemanha,
França etc. Esse progresso era vendido para os socialistas como benefícios naturais do
capitalismo, mas não era bem assim.

O desenvolvimento de todos os países foi baseado em uma política estatal pró-cíclica,


de aumento da demanda agregada, por parte dos Estados Unidos. Ela que criou os
condicionantes externos favoráveis no mundo inteiro, modificando os níveis de investimento,
industrialização, demanda agregada, poder de compra dos trabalhadores nos países aliados.
Não foram medidas de estado mínimo que geraram tal prosperidade. A era de maior sucesso

48
do capitalismo foi em razão estado atuando como motor do desenvolvimento, o que não foi
automático. Ainda que o maior grau de liberalismo comercial entre os países tenha ajudado,
esse componente está longe de ser o grande condicionante do desenvolvimento.

O progresso também não se deu em razão de demandas sociais, como protestos - por
exemplo. Não foi a população que se tornou mais exigente, mais educada e menos corrupta
para depois exigir melhores condições e desenvolvimento. Na verdade, ocorreu o contrário, o
desenvolvimento veio primeiro e tornou as pessoas mais éticas, educadas e exigentes. Na
verdade, tão exigentes que se criaram um fator muito importante para o fim da era do
―desenvolvimento a convite‖, a saber, a queda dos lucros normais em relação aos salários
reais.

Ao contrário da época do ―desenvolvimento a convite‖, a nova era foi marcada pelo


abandono ao permissivíssimo de comportamento desenvolvimentista na América Latina e - de
uma maneira geral, pelo fim do estado de bem estar social nos capitalistas. O salário real, de
uma maneira geral, diminuiu nos últimos.

A política de desenvolvimento de outras nações gerou concorrência para os Estados


Unidos. Os aliados estavam construindo sistemas produtivos mais novos e mais dinâmicos.
Eles estavam conquistando cada vez mais espaço no comércio mundial. Dessa forma, a partir
da década de 70, o déficit comercial se tornou crescente, sendo parte do saldo negativo do
balanço de pagamentos americano. (Belluzzo, 1995).

O traçar um plano tão ambicioso quanto o de gerar prosperidade em outros estados só


poderia ter sido feito pelo país que tivesse a moeda mundial, mediante os arranjos de Bretton
Woods. Só as condições geradas pelos últimos permitiram que os déficits necessários para os
Estados Unidos realizassem tal façanha existissem. Isto é, o mesmo promoveu a liquidez
necessária que o ouro não podia gerar.

O desenvolvimento dos Estados Unidos foi baseado em guerras, é maior caso de


keynesianismo Bélico – com desenvolvimentismo, da história. Com a Guerra Fria, a politica
de desenvolvimento a convite acabou resolvendo o risco de queda da sua economia no pós-
guerra, gerando um demanda agregada baseada na própria guerra e na reconstrução dos
aliados. Sua indústria se desenvolveu baseada em fornecer recursos bélicos para os últimos e

49
para si mesmo, criando uma eterna necessidade de conflitos, a fim de manter tal demanda
agregada. Consequentemente, apesar dessa estratégia ter levado a certa paz entre as potencias,
reduzindo as chances de uma nova guerra mundial, ela criou um padrão que perdura até hoje
em dia, que nunca gerará totalmente a paz; já que sua politica industrial é – em última
instancia, a própria fonte dos conflitos.

O fato dos Estados Unidos estarem reconstruindo o mundo inteiro e ainda sustentando
algumas guerras ao mesmo tempo, mostra que ele é mais forte do o defendido pela literatura
tradicional. O verdadeiro poder dele é não precisar gerar reservas internacionais e poder
financiar déficits no Balanço de Pagamentos a partir da sua própria moeda. Afinal, todos
aceitam dólares no comércio internacional.

Os acordos, na prática, ajudaram mutuamente, tanto os aliados capitalistas, quanto os


Estados Unidos; uma vez que levaram desenvolvimento aos primeiros e resolveram os anseios
do último. Em outras palavras, o plano foi um sucesso em criar um mercado dinamizador, de
modo que seu nível industrial se manteve no pós-guerra; e também em consolidar o
capitalismo, enfraquecendo o comunismo.

Essa política externa criou, não só nações concorrentes, com produtividade que se
acelerava mais rapidamente que a dos EUA, mas também gerou uma população mais
acostumada a políticas de bem estar, mais exigente, que demandaram um aumento dos
salários e geraram redistribuição de renda em seu favor. Além disso, ele gerava um
fortalecimento do capitalismo e enfraquecimento do comunismo. Em razão dessas
características, ela era insustentável no longo prazo.

O capitalismo e o estado estão intimamente ligados, o processo de desenvolvimento


não é - de maneira nenhuma, anticapitalista. Na verdade, o desenvolvimento precisa da
atuação do Estado. Toda a melhora nas condições de vida das pessoas foi idealizada pela
própria direita e através do seu poder sobre o último. Na época do Bretton Woods, ser de
direita e esquerda era um conceito diferente do que é hoje em dia.

Havia uma teatralidade no comportamento atipicamente benevolente dos americanos,


pois queriam mostrar que o capitalismo era melhor que o socialismo. Depois reverteram o que
estavam fazendo. Com tal politica, conseguiram enfraqueceram a empreitada socialista, já que

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reconstruíram tantos países destruídos pela guerra, e desenvolveram outros, também
estratégicos.

Todos os países que tiveram grande progresso o fizeram se industrializando - cada vez
mais, em bens de maior complexidade e valor, assim como foram criando uma maior
produtividade. Mas isso não bastou, foi essencial conseguir que as inovações gerassem novos
setores na economia, uma nova cadeia produtiva. Também foi decisivo ter um país mais
desenvolvido puxando suas exportações e gerando superávit comercial. O desenvolvimento
de nenhum se deu vendendo commodities, como é o atual caso do Brasil, que - nas palavras
de Celso Furtado, ―está se perpetuando no subdesenvolvimento‖.

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