COLABORAÇÃO ISCAP

A Contabilidade de Gestão
como fator de diferenciação
O desenvolvimento de serviços na área da contabilidade de gestão é uma estratégia
alternativa. Este caminho, sendo de diferenciação, será extremamente exigente e só produzirá
efeitos a longo prazo. Mas valerá a pena olhar para ele com atenção.

Por Amélia Ferreira da Silva* | | Artigo recebido em julho de 2014

A
formação exigida, e necessá-
ria, para o exercício capaz de
uma ocupação é o principal
patamar de diferenciação entre uma
ocupação profissional de exercício li-
vre e uma profissão regulada. A pro-
fissão de contabilista, que para uns se
esgota na figura do TOC (técnico ofi-
cial de contas), e para outros corres-
ponde a uma profissão mais abran-
gente onde o TOC aparece apenas
como uma ramificação, conheceu
no seculo XX uma evolução surpre-
endente a vários níveis. Pese embora
a existência prévia da OROC (Ordem
dos Revisores Oficiais de Contas), é
claramente com a criação da ATOC
(Associação dos Técnicos Oficiais de
Contas), e subsequente CTOC (Câ-
mara dos Técnicos Oficiais de Contas)
e atual OTOC (Ordem dos Técnicos
Oficiais de Contas), que os contabi-
listas são projetados para o seu papel
atual na sociedade e na economia.
Os requisitos de formação técnico-
-científica aumentaram significati-
vamente nos últimos anos. O acesso à
profissão exige hoje o domínio de um
corpo de conhecimentos altamente
especializado, inacessível aos leigos,
só conferível pela via do ensino su-
perior. Ora, sem esquecer que estas
exigências fazem parte da própria
dinâmica da regulação profissional,
há que reconhecer que também a
dinâmica do ambiente político, eco-
nómico e social em que a profissão é
exercida obriga a mais e melhor for-
mação técnico-científica, a mais e
«mais desenvolvidas» competências
profissionais.
No conjunto das condições necessá-
rias para acesso à OTOC destacamos
«os critérios para o reconhecimento
da habilitação académica adequada
para o exercício da profissão de téc-
nico oficial de contas» que constam
no anúncio n.º 6 060/2010, particu-
larmente os conteúdos programá-
ticos das unidades curriculares da
área disciplinar de Contabilidade de
Gestão. Independentemente de even-
tuais apreciações sobre os conteúdos
propriamente ditos, o que aqui que-
remos salientar é o papel da Conta-
bilidade de Gestão na formação dos
TOC e principalmente a sua relação
com as competências e funções asso-
ciadas aos TOC previstas nos Estatu-
tos da OTOC.
No artigo 6.º do EOTOC vêm defi-
nidas as funções do TOC. Ora, não
obstante a diversidade, abrangência e
sobretudo o grau de exigência e res-
ponsabilidade inerente às funções aí
mencionadas, é inegável o predomí-
nio das funções relacionadas com a
prestação de contas e ao cumprimen-
to das obrigações fiscais e parafiscais.
As funções e competências ligadas
à Contabilidade de Gestão parecem
esquecidas, ou pelo menos relegadas
para segundo plano.
Na nossa condição de docentes de
Contabilidade de Gestão de uma das
escolas mais antigas de Contabili-
dade (e falo em nome do grupo de
Contabilidade de Gestão do ISCAP)
chamamos frequentemente a aten-
ção dos futuros TOC que esta área
disciplinar pode fazer a diferença nas

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COLABORAÇÃO ISCAP
O desenvolvimento de serviços na área da contabilidade
de gestão é uma estratégia alternativa, quer para percur-
sos profissionais individuais quer para sociedades de profis-
sionais. Obviamente que este caminho, sendo de diferen-
ciação, será extremamente exigente.
organizações, públicas e privadas, e
pode igualmente distingui-los dos
demais TOC ao longo dos seus per-
cursos profissionais. Obviamente que
isso implica uma aposta no risco, na
criatividade, na formação continua,
na integração de saberes e no desen-
volvimento de competência inter-
pessoais, de comunicação e de lide-
rança significativamente diferentes
das que são exigidas ao TOC que se
foca na preparação de contabilidade
financeira e na fiscalidade.
Talvez não seja adequado comparar
as funções do TOC com as funções
preconizadas pelo CIMA (Chartered
Institute of Management Accounting)
do contabilista de gestão. No entanto,
parece-nos pertinente mencioná-las
aqui para evidenciar o quão distante
está o perfil funcional do TOC por-
tuguês desse paradigma. De acordo
com a CIMA1, o contabilista de gestão
certificado deve ser capaz de:
• Aconselhar os gestores sobre as im-
plicações financeiras dos seus projetos;
• Explicar as consequências financei-
ras de decisões de gestão;
• Formular estratégias de negócios;
• Monitorar os gastos e o controlo fi-
nanceiro;
• Realizar auditorias internas de gestão;
• Explicar o impacto do contexto
competitivo;
• Trazer um alto nível de profissiona-
lismo e integridade para os negócios.
Mais do que uma crítica, o que se
pretende é deixar aqui é um desa-
fio aos TOC. Embora reconheçamos
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que os serviços de contabilidade fi-
nanceira e fiscalidade sejam os mais
procurados no mercado onde os TOC
se movem, também não deixa de ser
verdade que uma grande parte des-
sa procura é decidida por critérios
de preço e deixa pouca margem para
que o TOC crie valor para as organi-
zações às quais presta serviço. O de-
senvolvimento de serviços na área da
contabilidade de gestão é uma estra-
tégia alternativa, quer para percursos
profissionais individuais quer para
sociedades de profissionais. Obvia-
mente que este caminho, sendo de
diferenciação, será extremamente
exigente (em recursos, perseverança,
tempo e, sobretudo, no desenvolvi-
mento de competências especiali-
zadas) e só produzirá efeitos a longo
prazo. Contudo, como cremos que é
deste profissional que as organiza-
ções portuguesas necessitam, esta-
mos convictos que seria um grande
contributo para o país.
Acreditamos que a OTOC está cons-
ciente disso. O requisito das matérias
de contabilidade de cestão na forma-
ção de base dos novos membros, a in-
clusão de algumas matérias nos exa-
mes de acesso à OTOC e a criação do
Colégio da Especialidade são sinais
consistentes do reconhecimento da
Contabilidade de Gestão como pilar
fundamental da formação dos TOC.
Há também que reconhecer que,
apesar do significativo avanço dos
sistemas de informação, a complexi-
dade do sistema fiscal português e a
diversidade das entidades às quais as
organizações têm de disponibilizar
informação contabilística, aliadas a
uma carga burocrática crescente, ab-
sorvem uma parte importantíssima
do trabalho, tempo e estudo dos TOC.
Todavia, os contabilistas não podem
deixar que a sua imagem profissional
se esgote neste conjunto de funções.
Aqui, a via da especialização talvez
seja a mais profícua, e neste campo
os Colégios da Especialidade têm um
importante papel a desempenhar.
Há naturalmente diversos contribu-
tos que o Colégio da Especialidade de
Contabilidade de Gestão pode trazer.
A continuação da promoção de en-
contros entre os profissionais é um
caminho já iniciado e julgamos que
se tem revelado de grande eficácia.
Exemplos disso foram a organização
do XIII Congresso de Custos – «Gestão
pelos custos, um caminho em tempos
de crise», e da I Conferência de Con-
tabilidade de Gestão – «No presente
olhando o futuro.» Contudo, estas
ações, sendo isoladas no tempo, esti-
mulam essencialmente aqueles que já
se interessam pelo assunto.
A valorização profissional do título
de especialista em Contabilidade de
Gestão, com formatos de preparação
prévios e níveis de exigência dese-
nhados à semelhança do que o CIMA
tem preconizado, é uma possibilida-
de. Muito já foi feito, e muito há ainda
a fazer. Não é certamente um desafio
maior que outros já vencidos, e por
isso estamos convictos que será acei-
te e ganho pelos contabilistas. O in-
teresse público sairia beneficiado. 
*Professora adjunta no Instituto Superior
de Contabilidade e Administração
do Porto (ISCAP)
Notas
1
http://www.cimaglobal.com/About-
-us/What-is-management-accounting/