Você está na página 1de 14

LINGÚISTICA BANTU

Introdução geral

O TERMO “Bantu” designa uma família de línguas pertencente ao grupo Níger-Congo. Estas
línguas são faladas desde o sul dos Camarões, na região sudeste da Nigéria perto da fronteira
com os Camarões, Gabão, República do Congo, República Democrática do Congo, Uganda,
Kénia, Tanzânia, Angola, Zâmbia, Malawi, Moçambique, Zimbabwe, Namibia, Botswana,
Suazilândia e África do Sul. Esta família linguística é o maior de todo o continente africano,
com cerca de 310 milhões de habitantes, mais ou menos. O número total destas línguas é
difícil de definir, havendo estimativas díspares que avançam números entre 300 e 600 (as
menos optimistas) e 1500 a 2.000 (as mais optimistas). Vários estudos confirmam que o
termo “bantu” foi primeiramente usado por Wilhelm Heinrich Immanuel Bleek (1827-1875) e
designa pessoas e significa “pessoas”, sendo que o singular é “ntu” e é usado em todas as
línguas bantu para significar pessoa.
Em pleno século XXI, poucas línguas apresentam gramáticas completamente sistematizadas.
As soluções para colmatar este atraso inqualificável encontram-se num estado embrionário.
Os esforços para o ensino das línguas nacionais africanas esbarram em inúmeros obstáculos,
sendo assim previsível que as línguas das ex-potências coloniais subsistam ainda por muito
tempo como línguas de prestígio. Contudo parece certo que as variedades africanas se vão
distanciando progressivamente daquelas europeias. Historicamente, a colonização que durou
cinco séculos afectou seriamente a evolução linguística, ao encetar, através de políticas de
assimilação, um processo de marginalização sistemática das línguas autóctones,
enfraquecendo-as na veiculação da cultura e da ciência e relegando-as para o plano familiar e
de cerimónias mágico-religiosas.
O continente africano é constituído por estados pluri-étnicos e multilíngues em razões
históricas determinaram que as línguas oficiais não fossem as línguas maternas da maioria dos
africanos, mas sim as línguas das ex-potências europeias, nomeadamente frança, Inglaterra e
Portugal. No caso vertente dos PALOP, a língua portuguesa é ponte entre diferentes povos
que constituem os países. De facto, os dados mostram-nos países heterogéneos, constituídos
por várias etnias e subsequentes subdivisões, todas com diferentes línguas, culturas, valores,
tradições. Não obstante a administração colonial portuguesa preconizar a eliminação das
tradições dos PALOP, dada a sua incapacidade de administrar a totalidade dos territórios, a
transmissão do conhecimento de geração em geração por via oral decorreu uniformemente nas
zonas rurais até que a sucessão dos vários factores, nomeadamente os conflitos bélicos, a
inexistência de quadros habilitados para o ensino das ínguas locais, as epidemias que ceifam
quadros especializados, a fome e as calamidades naturais abriram profundas brechas na escala
natural da vida, ceifando os detentores da sabedoria – os mais velhos – e outros estratos
vulneráveis. Estes factores e as eternas e sensíveis questões de ordem sociolinguística e
política tornam a tarefa do desenvolvimento e do ensino abrangente e sistemático das línguas
bantu, nas escolas africanas, um desígnio ainda quase virtual.

CAPÍTULO I
BASES HISTÓRICAS DO ESTUDO DAS LÍNGUAS BANTU

1
Para se ter uma ideia adequada do real alcance da abordagem e das aportações trazidas à luz
ao longo da história pelos pesquisadores no domínio do estudo das línguas bantu, é necessário
passar de revista as principais etapas da referida pesquisa ao longo dos séculos. É o que nos
propomos realizar nesta primeira secção ou capítulo sobre a Linguística bantu
a. Os primórdios dos séculos XVI e XVII

No que diz respeito ao conhecimento das línguas africanas por não africanos, os primeiros
trabalhos importantes foram publicados no século XVII pelos missionários católicos. O mais
conhecido é uma gramática da língua kikongo, publicada em 1659, em Roma, pelo Padre
Jacinto Brusciotto di Vetralla, sob o titulo: “ Regulae quaedam pro difficilimi Congesium
idiomatis faciliri captu ad grammaticae norma redactae”.
É uma obra notavelmente em avanço sobre o seu tempo, não obstante este titulo
incontestavelmente da época. O padre Bruscioto parece não ter pisado no Congo, mas
escreveu a sua obra a partir das observações, traduções, compilações de vocabulário de
missionários tendo trabalhado in loco.
A partir do século XV alguns autores europeus tinham procurado vocabulários oeste africanos
a partir de relatos dos exploradores portugueses, seguindo, assim, o exemplo de geógrafos e
viajantes árabes, graças aos quais algumas raízes sudanesas foram detectadas desde o século
X.
Importa salientar que algumas etnias islamizadas, Swahili, Peul e Hausa, sobretudo,
começaram muito cedo a transcrever as suas línguas em caracteres árabes.
Desde o fim do século XVII ao século XVIII, o tráfico de escravos faz recuar
consideravelmente o conhecimento de África. O estudo científico do continente negro
retomou apenas com o desenvolvimento do movimento anti escravatura.
É somente depois da primeira guerra mundial que aparece um africanismo cientifico
autónomo, no sentido de uma especialização geográfica de diversas disciplinas das ciências
humanas, orientada na aquisição de conhecimentos fundamentais tocando a sociedade
africana.
b. O século XIX e o Renascimento da investigação.

A exploração fez-se, a partida, seguindo dois eixos diferentes, que apenas se encontraram no
fim do século XIX. O primeiro desses eixos parte do Cabo de Boa Esperança em direcção ao
Norte; o segundo, um pouco mais tarde, vai da costa Atlântica em direcção a Leste. Podemos
dizer que os africanistas se dividiram, grosso modo, em sudanizantes e bantuinizantes,
divisão cujas consequências são ainda visíveis hoje.

c. Predominância inicial da escola alemã.

A unidade fundamental das línguas bantu, pressentida desde o século XVII pelos portugueses,
descoberta de novo no fim do século XVIII pelos ingleses, será demonstrada na primeira
metade do século XIX em diversas obras, sobretudo, a região do Cabo.

2
Os fundamentos definitivos da bantuistica serão, enfim, colocados a partir de 1856, pelo
bibliotecário alemão do Governador do Cabo, Wilhelm bleek, cuja obra inacabada,
Comparative Grammar of South african Languages (1862-1869), introduziu em
linguística moderna o termo mesmo de “BANTU”.
Na mesma época, na África Ocidental, outro alemão, o missionário S.W. Koelle
interrogando, em Freetown, escravos libertados pela Royal Navy, publica, em 1854, a
Polyglotta Africana “Compative vocabularies of more than 100 distinct African
Languages”, que joga, para as línguas sudanesas, o mesmo papel que a obra de Bleek para as
línguas bantu.
Depois desses dois homens (BLEEK e KOELLE), a escola alemã, durante mais ou menos um
século, continua preponderante, dominada por duas poderosas personalidades: Carl Meinhoff
(ʈ 1944) para as línguas bantu e Diedrich Westermann (ʈ 1954) para as línguas sudanesas e
das Guinés.
Os dois (Meinhoff e Westermann) aplicaram às línguas os métodos dos neogramáticos que
vieram a provar a sua eficácia nos domínios indo-europeu e semítico.
Meinhoff reconstituíu a fonética, o vocabulário e a estrutura gramatical do Urbantu, língua
anciã hipotética de todos os falares bantu actual.
Westermann trabalhou num domínio muito heterogêneo, mais aberto as influencias asiáticas
e árabes e cujas línguas diferem muito fortemente umas das outras. Fez para essas línguas
uma tentativa comparável com a de Meinhoff para as bantu.

d. Nascimento das escolas britânica e francesa e internacionalização da


disciplina.

A escola alemã gerou, em primeiro lugar, na África do Sul depois da Inglaterra uma escola
cujos grandes nomes são, entre outros, os de Alice Werner, F.W. Migeod, Ida Ward, Sir
Harry Johnston, Clement Doke, etc.
Esta escola, mais pragmática e menos teorista que a escola alemã publicou até à segunda
guerra mundial e mesmo depois, gramáticas e dicionários de qualidade excepcional. Pode-se
dizer a mesma coisa da escola dos bantuistas belgas, conduzida por A. E. Meeussen,
influenciada igualmente por Meinhoff e pelos seus continuadores sul-africanos.
A escola francesa, numericamente muito mais importante, foi influenciada nos seus princípios
pelos trabalhos de Antoine Meillet, de quem Maurice Delafosse, depois Lilas Homburger,
tiraram os seus métodos de trabalho.
São os dois últimos autores citados que criticaram independentemente, um do outro, os
trabalhos da escola alemã e formularam em 1911 e 1912 a hipótese do parentesco
fundamental das línguas bantu e sudanesas.
A revolução introduzida em linguística geral pelas teorias fonológicas e estruturais não
demorou em influenciar a linguística Africana: é em grande parte dessas teorias que se
reclamam as novas gerações de linguísticas africanistas, britânicos, americanos, alemães,
russos, belgas e franceses.

3
e) O Século XIX e as Ciências da Linguagem
Não obstante o facto de todos os séculos terem sido importantes na vida do ser humano,
pelo facto de cada um deles ter constituído uma base sobre a qual o século seguinte se
desenvolveu, o século XIX ocupa um lugar muito particular na história da humanidade devido
aos progressos alcançados no campo das ciências naturais. A “teoria analítica das
probabilidades” (La Place 1812) em Física, e a teoria da “origem das espécies” (Darwin
1859), mais conhecida por “teoria da selecção natural” , em Biologia, são duas entre as mais
célebres descobertas que testemunham o avanço científico do referido século. Estas teorias
revolucionaram sobremaneira a concepção do mundo e da vida através da sua aplicação tanto
noutros ramos das ciências naturais como em algumas áreas que hoje constituem as chamadas
ciências sociais e humanas contribuindo, assim, para uma melhor interpretação dos
fenómenos naturais e sociais.
Na área das ciências sociais e humanas, mais concretamente no que diz respeito aos
estudos da linguagem, pode afirmar-se que é no século XIX que se assiste ao nascimento de
uma nova ciência, a Linguística, que se define como a ciência da linguagem ou simplesmente
“estudo cientifico da linguagem” (Lyons 1968:1).
Esta nova ciência surge como resultado de muitos estudos que se desenvolveram no
principio do século XIX, como o “Romantismo alemão e com o interesse avivado pelo estudo
das velhas civilizações, pelo conhecimento dos movimentos literários e das línguas da Índia
antiga, em especial do Sânscrito recém – descoberto” (Carvalho 1973: 5).
A descoberta do Sânscrito, língua falada na Índia antiga e seu consequente estudo por
cientistas europeus, permitiu que fossem identificadas algumas semelhanças entre esta língua
e as línguas clássicas europeias, nomeadamente o Latim e o Grego. A observação destas
semelhanças levou à conclusão de que as línguas “Sânscrito, Latim e Grego surgiram da
mesma fonte que provavelmente deve ter desaparecido” (Greenberg 1951:1). Desta forma,
foram lançadas as bases para a descoberta da família indo-europeia a que se diz pertencer a
maioria das línguas da Europa e da Índia contemporâneas.
Do estudo comparativo de Sânscrito, Latim e Grego surge a Gramática comparada que
viria a incentivar aquilo que ficou conhecido como “Filologia indo-europeia e depois “as
filologias germânica e românica. Com este movimento começaram a delinear-se os primeiros
traços que deram forma à Linguística como ciência. Contudo, a afirmação da Linguística
moderna como disciplina académica viria a versificar-se nos princípios do século XX, com a
publicação a título póstumo em 1916, do trabalho de Ferdnad de Saussure, intitulado “Cours
de Linguistique Générale”.
Actualmente, a Linguística, como estudo científico da Linguagem, não só é uma
disciplina, como também se constituiu em conjunto de disciplinas ou como resultado de
“encontro” entre esta e outras ciências, ou como resultado da diferença dos objectivos em
vista quando se desenvolve um determinado estudo da língua. Três exemplos de tais
disciplinas são:
-.Linguística histórica – este ramo do saber procura investigr e descrever a forma como as
línguas mudam ou mantêm a sua estrutura no curso do tempo. O seu domínio é por
conseguinte, a língua no seu aspecto diacrónico (Bynon 1977.19. Portanto em Linguística

4
histórica, a Língua é encarada como um fenómeno dinâmico cujo desenvolvimento
compreende vários estágios.
-Linguística descritiva – Ramo das ciências da Linguagem que estuda a língua do ponto de
vista sincrónico. Descreve e analisa as estruturas da Lingua bem como as regras do seu
funcionamento de acordo com a maneira como é usa pelos falantes num determinado
período . O seu objecto pode ser um dos seus estágios identificados pela linguística histórica.
-Linguística comparada- primeira forma “adoptada pela linguística moderna, surge nos
primórdios do romantismo europeu e participa no movimento histórico do século XIX
(Masseney – Guiton, 1976: 33). Focaliza o estudo comparado das línguas e aplica os
seguintes métodos:
1º- Tipológico: define-se pela análise das estruturas das línguas em questão. Trata-se de um
método que não implica nem “o parentesco genético nem a aproximação geográfica das
línguas, mas também nãos as exclui” (Berten, 1976: 347). “A tipologia constitui um precioso
instrumento da pesquisa no estudo da história das línguas: estudo dos fenómenos de
convergência e divergência, previsão de mudanças linguísticas, verificação de resultados
obtidos pela reconstrução histórica (Berten, Ibid.). Em linguística comparativa é usual
aplicar-se o método tipológico com os fins aqui descritos, embora geralmente se reserve o
termo comparação à “investigação que visa reconhecer no mundo um determinado número de
famílias de línguas consideradas aparentadas” (Manessy, - Guitton, Ibid.). Com este fim, a
Linguística comparada aplica um outro método, o genealógico.
2º- Genealógico: apoia-se em diferentes métodos que reflectem o processo histórico de
fragmentação de uma a proto-língua ancestral em línguas derivadas. Tais modelos são
construídos com base em determinadas unidades classificatórias, entre as quais as seguintes:
Família »»» Sub-família »»» Grupo de línguas »»» (Sub-grupo de línguas) »»»
Línguas »»» Dialetos.
Note-se que, nem todas as unidades classificatórias precisam de estar presentes em toda a
classificação. A unidade “sub-grupo de línguas” está entre parêntesis para indicar que pode
estar presente ou não. Em contra partida, o investigador precisa de estar alerta para o facto de
em certas ocasiões poder vir a encontrar situações que requeiram introdução de uma unidade
não prevista neste esquema.
Relativamente aos ramos de Linguística, aqui apresentados como exemplos de possíveis
disciplinas, ocorre referir que os mesmos não são estanques. Há uma complementaridade
entre si e os métodos aplicados por cada um. Por exemplo, para proceder à comparação de
duas categorias linguísticas de línguas diferentes, o linguista comparativista precisa de
descrever primeiramente cada uma delas. Esta descrição preliminar permite a identificação
das semelhanças e diferenças entre as referidas categorias. Este exercício de comparação
baseada na descrição de itens a serem comparados pode fornecer dados sobre relações de
parentesco que eventualmente possa existir entre as línguas em questão. Isto é, a comparação
pode fornecer informações sobre factos históricos que determinam a aproximação ou o
distanciamento genético de línguas.
Por outro lado, há também casos em que o linguista só pode descrever um fenómeno
linguístico se estiver munido de dados históricos. Daqui se pode afirmar que a Linguística

5
comparativa pode ser considerada histórica na medida em que permite determinar o
parentesco genético das línguas. De certa maneira, a Linguística histórica pode ser
considerada descritiva uma vez que ela também descreve os itens a serem estudados,
permitindo visualizar a mudança de um determinado item ao longo dos tempos.
Portanto, a separação que se faz dos três ramos da Linguística aqui apresentados como
exemplos e dos seus métodos em vários estudos, deve ser entendida apenas a nível teórico,
académico e didáctico-pedagógico. A nível pratico é deveras dificil trabalhar-se
exclusivamente com cada um deles e até nem é necessária uma tal compartimentação.

2- A Linguística e o estudo das Línguas Bantu


Na segunda metade do século XIX, o método histórico-comparativo, que tinha dado bases
para a descoberta das relações entre o Sânscrito e as línguas clássicas europeias, viria a ser
aplicado ao estudo das línguas africanas.
De acordo com Guthrie (1967-1971, foi Meinhof (1895) quem sugeriu pela primeira vez a
possibilidade de aplicação às línguas africanas dos mesmos métodos gerais que tinham sido
aplicadas ao estudo das línguas europeias. Werner (1919) refere que foi Bleek (1851) quem ,
depois de ter chamado ‘pronominal prefix languages” (línguas de prefixo pronominal) às
línguas da África sub-saariana que comparou e observou a existência de um sistema comum
de concordância por meio de prefixos, utilizou pela primeira vez o termo Bantu para se referir
a estas línguas.
A confirmar este facto está Guthrie (1962) para quem o grande mérito do trabalho de Bleek
reside no facto de ter sido ele quem pela primeira vez chamou a atenção da existência deste
grupo, e a quem a Linguística deve o termo Bantu como denominação de um grupo
linguístico.
Apesar de ter havido trabalhos anteriores a Bleek (1851, 1862-1869), tais como Krapf (1850)
e provavelmente outros, este autor é tido como um marco histórico indiscutível na história da
Linguística Bantu.
Meinhof (1899) utilizou o método diacrónico no estabelecimento das correspondências
fonéticas das diferentes línguas bantu com base nas leis da linguística histórica segundo as
quais as relações genéticas entre as línguas são observadas através da correspondência regular
de sons de palavras das línguas em comparação (Robins, 1964: 353). Assim, depois de estudar
os princípios fonéticos e de decidir sobre ortografia a ser usada, desenvolveu a teoria de uma
língua ancestral comum das línguas bantu com base na observação de que havia uma
correspondência regular entre os sons de certas palavras das diferentes línguas deste grupo.
Este trabalho permitiu concluir que as línguas bantu deviam ter tido origem numa proto-
língua comum no passado que hoje se estima em mais de 2.500 anos. E chamou ‘pro-bantu’
ou ‘urbantu’ a essa língua ancestral hipoteticamente reconstruída com base nos dados
fonéticos recolhidos de algumas línguas actualmente conhecidas.
Sir Johnston (1919) publicou dois volumes de um estudo comparativo das línguas bantu e
semi-bantu, aparentemente com base em trabalhos de Bleek, Meinhof e provavelmente outros.
Neste estudo, o autor estabelece alguns critérios para a identificação de línguas com vista à

6
sua integração no grupo bantu, sendo o mais notável o facto de os nomes destas línguas terem
regra geral “prefixos pronominais”.
Werner (1915) publicou um estudo contendo reconstruções gramaticais das línguas bantu no
qual sublinha, também ele o sistema de organização dos nomes em grupos de acordo com os
seus prefixos como um dos traços fundamentais.
Meeussen (1967) publicou um estudo contendo reconstruções gramaticais das línguas bantu e
um dicionário de palavras reconstruídas do proto-bantu onde são apresentadas sugestões de
reconstrução de algumas formas fonético-fonológicas nos morfemas da hipotética língua
ancestral com base na observância da lei de regularidade de mudanças fonéticas nas actuais
línguas bantu.
Greenberg (1955:1) realizou um estudo propondo uma classificação das línguas africanas com
base “no reconhecimento de senso comum de que certas semelhanças entre línguas só podem
ser explicadas com base nas hipóteses de relação genética”. Nesse trabalho, o autor defende
que um estudo comparativo de qualquer grupo de línguas deve ser feito com base nas
características intrínsecas inerentes a elas, tais como a observância do princípio de
regularidade de mudanças fonéticas, que são determinadas por condições puramente
fonológicas. Este princípio foi uma das formas mais eficazes usadas pelos neogramáticos no
estabelecimento de relações genéticas entre as línguas europeias.
Utilizando o ‘método comparativo em massa’ que consiste na recolha do vocabulário comum
de várias línguas e na observância do tal princípio de regularidade de mudanças fonéticas
nessas línguas, Greenberg formou cognatos linguísticos (itens linguísticos que pela sua
correspondência fonética, podem ser considerados da mesma origem) que foram usados na
comparação. Este método baseia-se não só na recolha do vocabulário de várias línguas, mas
também na sua análise. Além da recolha dos itens lexicais, este método recorre também aos
morfemas presos que se dizem ter uma função exclusivamente gramatical (Welmers, 1973).
Desta maneira, Greenberg (1963) apresenta , em classificação revista, as línguas as línguas
africanas em quatro grandes famílias , identificando em cada uma delas as subfamílias que
variam em número de uma família para outra. Assim, são seguintes as quatro grandes famílias
linguísticas identificadas por Greenberg:
-Afro-asiática. Subfamílias: Semítica, Egípcia, Cushítica, Berber, Chádica.
-Nilo-sahariana. Subfamílias: Songhai, Sahariana, Maban, Fur, Chari-Nilo, Koman.
-Congo-Kordofaniana. Subfasmílaias. Níger-Congo e Kordofaniana.
Khoin-San. Subfamílias: Khoi, San, Sandawe Irakw, Hatsa ou Hadza.
Em anexo apresenta-se o mapa de classificação das línguas africanas de Greengerg.
No quadro desta classificação, as línguas bantu ou Benue-Congo na terminologia de
Greengerg, pertencem à subfamília Níger-Congo que por sua vez faz parte da família Congo-
Kordofaniana.
Aplicando as unidades classificatórias estudadas acima a uma língua bantu de Angola como
Umbundu, por exemplo, na classificação de Greenberg, teríamos:
Congo-Kordofaniana> Níger-Congo>Bantu>Umbundu

7
Portanto, na sequência estão representados neste esquema uma família (Congo-
Kordofaniana), uma subfamília (Níger Congo), um grupo de línguas (Bantu), Uma língua
(Umbundu, por exemplo). Como bem se vê, bantu não é família nem indica origem de
línguas. A maioria das línguas de Angola são do grupo bantu e não da família bantu nem de
origem bantu.

3- As Línguas Bantu em África


A situação sociolinguística da África pré-colonial continua praticamente uma grande
incógnita. As tentativa de reconstituição de movimentos migratórios têm sido feitas com base
na actual dispersão linguística do continente. Foi a aplicação do método comparativo ao
estudo das línguas africanas que permitiu que os cientistas descobrissem algumas
características comuns entre as línguas de um grupo a que mais tarde se chamou “bantu”. Os
exemplos que se seguem ilustram a semelhança morfológica do termo que significa “gente”
ou” pessoas” em algumas línguas moçambicanas (que tomamos como exemplo), com
relativas diferenças de caracter fonológico que justificam o princípio de observância regular
das mudanças fonéticas entre as línguas aparentadas. Portanto, trata-se de diferenças que
podem ser explicadas em termos históricos. Assim temos:
Gitonga: ba-thu; Swahili: wa-tu; Nyanja: wa-nthu; Nyungwe: wa-nthu;
Shonha: va-nhu; Changana: va-nhu; Yao: vaa-ndu; Makonde: va-nu;
Makhuwa: a-thu; Nyanja: a-nthu
Esta lista poderia ser mais longa e sempre se verificaria que as duas partes do vocabulário
seriam constantes em todas as línguas. Um prefixo (de classe 2) –“ba” (wa-, va-, a-) e um
tema nominal “-ntu (-ndu, -nhu, -nthu, -thu, -tu).
Actualmente, o termo “bantu”, como aliás já foi frisado na introdução e reiteramo-lo, é usado
nos estudos da linguística moderna para se referir a um grupo de cerca de 600 línguas faladas
por perto de 310 milhões de pessoas, numa vasta região da África contemporânea que se
estende a sul de uma linha que vai desde os Montes Camarões (a sul da Nigéria), junto a
Costa Atlântica, até à foz do rio Tana (no Quénia), abrangendo os seguintes países: África do
Sul, Angola, Botswana, Burundi, Camarões, Malawi, Moçambique, Namibia, Quénia,
República Democrática do Congo, República do Congo, Ruanda, Swazilância, Tanzânia,
Uganda, Zambia, Zimbabwe. Nesta região existem, em alguns países, enclaves de línguas não
bantu, nomeadamente, Khoi, San e Hotentote (Kalahari). Na África do Sul, no Botswana e na
Namíbia; Maasai e Luo, no Quénia; Hadza (Hatsa), Irakw, Maasai, Sandawe, na Tanzania e
provavelmente outras línguas, noutros países.

4- Centro de Fragmentação do núcleo proto-bantu


Existem várias hipóteses, por vezes contraditórias, apresentadas por linguistas, historiadores e
arqueólogos sobre localização do centro de dispersão do núcleo proto-bantu. Entre elas,
acenamos apenas a duas, a título ilustrativo:

8
-A primeira destas hipóteses é aquela proposta por Guthrie e seus seguidores e baseada
na tentativa de reconstituição de um possível proto-bantu ou língua ancestral da qual se teriam
originado as línguas bantu hoje existentes. Comparando os sons, os morfemas (lexicais e
gramaticais) de cerca de 300 línguas bantu, (escolhendo cerca de 28 das mais documentadas
de cada área), Guthrie sintetizou as formas morfológicas mais comuns e mais representativas
para todo o conjunto das línguas bantu.
Utilizando para o efeito o método léxico-estatístico, na comparação de 2.300 séries, o
linguista em causa inventariou aquilo a que chamou “Bantu comum”. No seu estudo, Guthrie
sustenta que um importante centro de dispersão do núcleo proto-bantu deve-se ter
estabelecido na região de Shaba, planalto de Katanga, na actual República Democrática do
Congo. Um dos suportes desta constatação é o facto de que as línguas como Bemba, Kasai,
Luba, etc., faladas nesta região e regiões circunvizinhas retêm altos índices de percentagem
do vocabulário do “Bantu Comum”. Assim, Guthrie propõe uma hipótese de reconstituição
da migração bantu que considera duas fases de fragmentação a partir de Shaba:

Fase 1: Dispersão para o ocidente;


Fase 2: Dispersão para o oriente, sendo este grupo de maior homogeneidade que o primeiro.
- A segunda hipótese sobre a fragmentação do núcleo pro-bantu é proposta por
Phillpson 1977. Trata-se de uma hipótese baseada em dados arqueológicos. Segundo este
estudioso, a dispersão bantu pelo continente deu-se em diferentes etapas, correspondentes a
dez fases, ao longo de mais de dois mil anos da seguinte maneira:
Fase 1 (por volta do ano 1.000 a.C): As línguas bantu desenvolvem na região
camaronesa entre as populações utentes de instrumentos de pedra, que relativamente cedo,
conseguiram domesticar gado caprino e começaram a praticar a agricultura.
Fase 2a (por volta de 1.000-400 a.C): Dispersão de alguns dos falantes das línguas
bantu em direcção a oriente ao longo do limite norte da floresta equatorial. Neste processo,
entraram em contacto com povos agricultores que se supõe sejam os antepassados dos falantes
das línguas sudanesas de quem , depois de um período relativamente longo de contacto,
adoptaram a criação de gado bovino e ovino, bem como o cultivo de certos cereais sobretudo
sorgo. É quase certo que nesta fase, os povos falantes das línguas bantu já tinham adquirido as
técnicas de produção de utensílios de metal.
Fase 2b (por volta de 1.000-200 a.C): Nesta fase, um segundo grupo de povos falantes
de línguas bantu se teria deslocado dos Camarões rumo ao sul para a região do Baixo Congo.
Estes teriam utili9zado utensílios de pedra e panelas de barro e teriam trazido consigo as
técnicas de produção de alimentos que já eram conhecidos pelos seus antepassados na região
dos Camarões.
Fase 3 (cerca de 400-300): Os falantes das línguas bantu mencionados na fase 2, os
tais que se tinham deslocado para o oriente a partir dos Camarões, fundaram uma cultura da
idade de Ferro Inferior na região doso grandes lagos.

9
Fase 4 (cerca de 3000-100): Alguns dos povos que se tinham estabelecido entre os
flancos da floresta equatorial e as zonas de savana do sul deslocaram-se para o ocidente rumo
ao Baixo Congo, onde foram responsáveis pela introdução de muitos aspectos da cultura da
Idade de Fero inferior junto de outros grupos de falantes de línguas bantu referidos em 2b que
se tinham deslocado directamente dos Camarões para a região do Baixo Congo. Esta fusão
deu subsequentemente a vaga ocidental da idade de Ferro Inferior.
Fase 5 (cerca de 100 a.C): Uma dispersão para o sul do grupo do ocidente trouxe a
cultura da Idade de Ferro Inferior para o Baixo Congo através de Angola, para o norte da
Namíbia, acompanhado de falantes das línguas bantu do grupo das Terras Altas Ocidentais.
Fase 6 (por volta de 100-200 d.C): A vaga oriental da Idade de Ferro Inferior dos
povos que não se tinham deslocado para ocidente rumo ao Baixo Congo deslocou-se em
direcção ao sul e ao oriente a partir da região lacustre da costa do sul do Kenya e norte da
Tanzânia. As línguas destes povos e de outras comunidades de vaga ocidental eram
relacionadas cm as línguas bantu faladas pelos povos que se tinham deslocado para o oriente,
tal como foi referido em 2a.
Fase 7ªa (cerca de 300-400 d. C): Uma grande expansão da vaga oriental da região
lacustre para o sul teria passado pelas terras altas do Lago Niassa em direcção a Transval. O
facto de passar por regiões infestadas pela mosca tsé-tsé no da Tanzânia, parece ter impedido
que estes fossem até ao sul com seu gado.
Fase 7b (cerca de 300-400 d.C): Uma expansão paralela rumo ao sul a partir das
planícies da região oriental do Lago Niassa levou gente ao sul de Moçambique e a Transval
oriental.
Fase 8 (por volta de 400-500 d.C): Povos do grupo ocidental expandiram-se para o
oriente, para o interior de Shaba e região ocidental da Zâmbia. Nesta última região, foram
estabelecidos contactos com os povos do grupo oriental.
Fase 9 (por volta de 500-1000 d.C): Ocorrência em Shaba de um aumento substancial
de povos da Idade de Ferro Inferior, com um concomitante desenvolvimento económico,
tecnológico e socio-político, permitindo mais tarde a prática de culturas de Idade de Ferro
Inferior pelos povos bantu do grupo das Terras Altas Orientais.
Fase 10 (cerca do ano 1000 a 1110 d.C): Nessa fase, a expansão de falantes das
línguas bantu das Terras Altas orientais de Shaba introduziu a cultura da Idade de Ferro
superior na metade oriental do sub-continente.

5- As grandes línguas: factores favorecendo a sua difusão.


As línguas de grande extensão encontram-se, sobretudo, nas zonas de savanas e planaltos
onde a circulação e a vida são relativamente fáceis e onde foram criados, antes da era
colonial, os mais importantes estados tradicionais, cuja existência e desenvolvimento eram
geralmente ligados a criação e manutenção de correntes comerciais activos.

10
As línguas de grande extensão apresentem, em geral, uma grande diversidade dialectal, ao
ponto que se pode hesitar em considerá-las como constituindo unidades. Um factor importante
de unificação consiste na existência de uma transcrição espalhada no conjunto, ou na grande
parte do seu campo de extensão.
a) - Factores linguísticos
A unidade ortográfica, sobretudo quando a transcrição é utilizada nas escolas, facilita a
constituição de um conjunto de formas recebidas, compreendidas pela maioria de locutores de
diferentes dialectos.
O caso típico é do Swahili, cuja forma estandardizada é regulamentada por um comité
internacional (cuja sede se encontra na universidade de Makerere- Uganda), comité cujas
decisões fazem autoridade em todas as antigas colónias inglesas de África oriental, até certo
ponto na RD do Congo. O Yoruba e Hausa beneficiaram deste tipo de estandardização, mas
só na Nigéria, pois as escolas dos países vizinhos utilizam o Francês.
No sentido inverso, a adopção por missões religiosas de confissões rivais, de transcrições
não unificadas para as línguas ou dialectos estreitamente aparentadas é um elemento de
consolidação da heterogeneidade linguística que se encontra agravada em certos caso pelas
oposições religiosas que realçam as diferenças ortográficas.
Quando a concorrência das missões é particularmente viva, uma língua pode encontrar-se
influenciada por três, quatro ou mais ortografias às quais detentores de cada persuasão
acabam por conceder tanta importância como aos seus dogmas e doutrinas teológicas.
b) Factores não linguísticos
Os elementos não linguísticos que jogam na difusão mais ou menos importante de certas
línguas, difusão que pode ultrapassar (caso do Swahili e Hausa) os limites das etnias às quais
essas línguas são próprias:
- O factor político e administrativo: a escolha de uma língua como nacional, língua oficial ou
língua de escolaridade;
-O factor religioso: adopção de uma língua para a evangelização;
- O factor económico: difusão de uma língua por uma etnia especializada no comércio, ou
num certo tráfico (Hausa, mande- dyula, lingala, kituba);
- Factores sociológicos, combinando muitas vezes os precedentes: línguas de prestígio, como
o fulfude no norte dos camarões, línguas de distanciação ou de diferenciação social (emprego
de Songay- Jerma pelos migrantes de origem diversa, a Kumasi, o polonês em Londres seria a
segunda língua mais falada para conservar a identidade polonesa, segundo um inquérito
recente).

BBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBBB
6- A Linguística africana e a herança das tradições

11
Um exame da bibliografia da linguística africana permite constatar que as orientações
comparativas e descritivistas estão largamente representadas. Nenhuma tentativa válida foi
realizada no domínio da tipologia. Quando à linguística evolutiva, não podia avidamente se
desenvolver num terreno onde não existe nenhuma perspectiva histórica, pois as línguas de
África são principalmente orais.
Do ponto de vista critico, os trabalhos de comparação situam-se numa tradição cientifica cuja
origem remota ao surgimento mesmo da linguística como ciência no século XIX. Os trabalhos
de descrição, uma verdadeira profusão, não têm tradição própria. São motivados pela abertura
ultramarina, complexa e contingente, da Europa sobre o mundo.
A história da linguística africana apenas se compreende se a situar na linha da sua herança, em
relação as sugestões da linguística tal como se afirmou no século XIX.

6.1- Linguística africana em relação a linguística histórica e comparatista.

A linguística histórica e comparatista, nasceu com Franz Bopp e com todos os grandes
comparativas que seguiram, no século XIX. Ela é marcada por incontestáveis resultados, pois
repousa sobre um método que preconiza reconhecer na observação um valor fundamental e
rejeitar, a exemplo de todo o movimento antropológico desta época, os ingénuos apriorismos
inspirados pela preocupação de propor explicações conforme dados, literalmente
compreendidos, da Bíblia, (o hebreu como língua mãe, os negros oriundos do irreverente
Cham, filho de Noé).
Ela inscreve-se também numa corrente de ideias filosóficas cuja maturação beneficiou de
resultados mesmos de comparação das línguas indo-europeias. Apresentaremos três que
parecem ter marcado o desenvolvimento da linguística africana.
a) Crença na possibilidade de atingir uma fase primitiva das línguas parentes. Para Antonie
Meillete, trata-se apenas de um sistema definido de correspondência entre línguas
historicamente atestadas, mas a tentacão aparecida anteriormente em Meillet de
reconstruir um indo-europeu comum parece bem ter ter sido a dos africanistas Meinoff e
westermann quando propuseram um “bantu comum” ou um “sudanês comum”
respectivamente.
b) Crença numa certa noção de progresso implicando uma hierarquizacão de tipos de línguas.
Sobressai desta crença que a existência das formas elementares se impõe como hipótese
de trabalho. Isto significa que as línguas dos negros se encontram em baixo da escala.
c) Não se pode esquecer de assinalar enfim esse carácter essencialmente negativo na posição
dos grandes comparatistas do século XIX: a ausência de uma teoria de descrição
linguística. A linguística como ciência apenas podia ser, segundo a opinião de então,
comparativa.

É por isso que, os primeiros cientistas, que se dedicaram às línguas de África, orientaram-se
de imediato para a comparação. Esta posição explica o divorcio actual, mais ou menos
acentuado segundo os autores, entre comparatistas e estruturalistas. Estas, por reacção,
dedicaram-se as fazes de língua.

12
6.2- Linguística africana em relação a tradição descritiva.

A descrição linguística ficou atrás, senão fora do grande movimento de reflexão e de


elaboração através do qual se afirmou no século passado a linguística como ciência.
Uma das razões que se pode invocar é que os comparatistas trabalharam sobre documentos
que não se apresentavam como conjunto de dados brutos pelo inquérito (o que é o caso das
línguas africanas), mas como factos já sistematizados e classificados segundo as normas
históricas de diversas tradições gramaticais.
Uma outra razão, interna é a resistência da tradição descritiva fechada nos esquemas que
remontam a uma tradição antiga e de cuja projecão “grammaire raisonnee de port-royal”
(1660) foi o cume.
Ainda hoje há trabalhos que repousam sobre este mesmo postulado filosófico de uma
estrutura gramatical una e universal. O movimento filosófico do século XIX era ao contrário
sensibilizado para a multiplicidade, quer dizer para a relatividade de factos de civilização.
Seria errado dizer que os autores que descreveram línguas africanas no século XIX e na
primeira metade do século XX afirmaram-se como possuidores conscientes de uma linguística
com tendência psicológica.
Esta constitui a trama subjacente de numerosos trabalhos africanistas não na sequência de
uma opção deliberada a favor de categorias universais de linguagem, mas por intermédio de
uma reflexão de concordismo que guarda a reflexão no quadro das categorias que são as da
língua materna dos autores.
O resultado foi que se dispõe hoje de numerosos capítulos sobre o verbo “ser” e “ter”, sobre
os adjectivos, sobre o comparativo e superlativo, sobre os tempos, sobre as preposições
circunstanciais.
6.3- O desenvolvimento da linguística africana.

Um resumo sugestivo deste desenvolvimento é dado pela senhora Lilas Homburger no


capítulo XI do livro “ Les Langues negro-africaines”.
O nosso conhecimento das línguas negros africanas desenvolveu-se gradualmente segundo
linhas que foram traçadas pela abertura marítima dos circuitos comerciais, pelo
desenvolvimento das missões cristãs, pelas explorações do século XIX, enfim por certos
imperativos da colonização.
Desde 1826 o atlas etnográfico do globo teve uma primeira classificação. Outras
classificações seguiram. As pertinentes sínteses obtidas para as línguas indo-europeias
exerciam, a sua sedução.
Há que escrever no activo dos missionários católicos e protestantes, pelo menos até à data
recente, o maior número de trabalhos descritivos. Oficiais e administradores contribuíram
igualmente para este movimento.
Desta quantidade de documentos destacaram-se algumas classificações que, apesar das
divergências, completaram cumulativamente, as de Delafosse, Westermann e Greenberg.

13
A classificação de Greenbarg reteve a atenção do mundo das ciências, pois à diferença dos
seus predecessores, apoia a sua obra em um número de factos importantes.
Se fizermos o balanço, devemos reconhecer que o nosso conhecimento das línguas de África
Negra é finalmente muito avançado. Em 1956, foi criado o West African Languages survey,
dirigido por um comité que, sob a orientação de Joseph Greenberg, contava com um
representante das universidades de Ibadan, Legon, Fourah Bay College e do Instituto Frances
de África Negra.
Em 1965 aparece a sociedade linguística de África Oriental (West African Linguistic Society)
cujo secretário-geral foi o professor nigeriano Ayo Bomgbose. Existia, por outro lado, duas
revistas inteiramente consagradas às línguas de África negra: Jornal of African Languages e
Jornal of West African Languages.
O que e essencial neste balanço, e destacar a responsabilidade do desenvolvimento africanista
em matéria de linguística por homens ou mulheres da investigação cientifica, quer
profissionalmente se revelem, quer levem a cabo os seus trabalhos segundo os princípios
rigorosos de toda a investigação.
Conclusão
Podemos realçar implicitamente, apesar de um balanço final positivo, uma critica da
linguística comparativa negro africana e uma primazia de descrição das línguas. A nossa
critica não é dirigida à linguística comparativa, mas ao desenvolvimento que conheceu no
terreno africano. Este desenvolvimento foi prematuro e conserva os estilhaços do seu
nascimento prematuro.

14

Você também pode gostar