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FUNDAÇÕES E

OBRAS DE
CONTENÇÃO
Fundações
profundas
Dione Dulcinea dos Santos

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Caracterizar fundações profundas e estacas.


>> Identificar os métodos construtivos de fundações profundas.
>> Comparar estacas pré-moldadas e moldadas in loco para a escolha da solução
mais adequada.

Introdução
Durante o planejamento de uma solução em fundação profunda é necessário que
sejam observadas diversas variáveis, como características do terreno, capacidade
de carga a ser suportada pela estrutura de fundação e recursos financeiros dispo-
níveis. Os elementos estruturais de fundação não possuem facilidade de inspeção
direta, visto que ficam enterrados após a conclusão da obra, e este é mais um
fator a ser considerado na escolha adequada do tipo de fundação profunda.
No momento de decisão acerca de qual tipo de fundação se adequa a cada situação,
é necessária a verificação de informações como: perfil geológico do terreno,
espaço disponível, condições das edificações vizinhas, escolha da melhor técnica
de dimensionamento e execução da obra, viabilidade econômica, entre outras.
O mercado da indústria da construção civil está em franca expansão tecnológica
quanto ao desenvolvimento de novos materiais de construção e novas soluções
operacionais de execução a serem aplicados na etapa de fundação em obras.
Neste capítulo, você será apresentado ao conceito de fundações profundas e
verá quais são as diferentes classificações possíveis dessa solução de engenharia.
Verá que a utilização de diferentes tipos de estacas depende não somente da
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capacidade de carga a ser suportada, mas também da interferência de variáveis


como os impactos à vizinhança, materiais a serem utilizados e recursos financeiros
disponíveis. Há uma gama de soluções em fundações profundas disponíveis para
que o engenheiro calculista tome a melhor decisão quanto a qual se adequa a
cada projeto em sua especificidade.

Introdução às fundações profundas


A ABNT NBR 6122:2019, em seu item 3.27, nos diz que fundação profunda é
um elemento de fundação que transmite a carga ao terreno ou pela base
(resistência de ponta), ou por sua superfície lateral (resistência de fuste),
ou por uma combinação das duas, sendo sua ponta ou base apoiada em uma
profundidade superior a oito vezes a sua menor dimensão em planta; e no
mínimo 3,0 m. Quando não for atingido o limite de oito vezes, a denominação
é justificada. Neste tipo de fundação incluem-se as estacas e os tubulões.

Conforme a ABNT NBR 6122:2019, em seu item 3.11, estaca é um


elemento de fundação profunda executado inteiramente por equi-
pamentos ou ferramentas, sem que, em qualquer fase de sua execução, haja
trabalho manual em profundidade. A norma reconhece a execução, no Brasil,
dos seguintes tipos de estacas: madeira, aço, concreto pré-moldado, concreto
moldado in loco, argamassa, calda de cimento, ou qualquer combinação dos
anteriores.
Já o tubulão, caracterizado no item 3.49 da referida norma, é um elemento
de fundação profunda em que, pelo menos na etapa final da escavação do
terreno, faz-se necessário o trabalho manual em profundidade para executar
o alargamento de base ou para a limpeza do fundo da escavação, uma vez que
nesse tipo de fundação as cargas são resistidas preponderantemente pela ponta.
Os tubulões dividem-se em dois tipos básicos: a céu aberto (normalmente sem
revestimento) e a ar comprimido (ou pneumático), estes sempre revestidos; o
revestimento pode ser constituído por camisa de concreto armado ou por camisa
de aço (metálica). Neste caso, a camisa metálica pode ser perdida ou recuperada.

Classificação das estacas


As fundações podem ser classificadas segundo diferentes critérios. De acordo
com o processo construtivo (ou seja, o tipo de deslocamento que provocam
no solo; Quadro 1), podemos classificá-las em estacas de deslocamento ou
estacas escavadas (também chamadas de estacas de substituição).
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Quadro 1. Classificação de estacas quanto aos efeitos no solo

Processo construtivo Características da estaca

Introduzidas no terreno através de algum


De deslocamento
processo que não promova a retirada de solo

São aquelas executadas “in situ” através


da perfuração do terreno por um processo
Escavadas ou de
qualquer, com remoção de material, com ou sem
substituição
revestimento, com ou sem a utilização de fluido
estabilizante

Não há praticamente remoção de solo e/ou,


Sem deslocamento na ocasião da concretagem, são tomadas medidas
para restabelecer as tensões geostáticas

Fonte: Adaptado de Velloso e Lopes (2011).

Estacas de deslocamento são aquelas introduzidas no terreno através


de algum processo que não promova a retirada de solo. O solo presente
no espaço que a estaca vai ocupar é deslocado apenas horizontalmente.
No Brasil, o exemplo mais característico desse tipo de estaca é o das estacas
pré-moldadas de concreto armado. Também se enquadram nessa categoria
as estacas metálicas, as estacas de madeira, as estacas ômega, as estacas
apiloadas de concreto e as estacas de concreto fundido no terreno dentro
de um tubo de revestimento de aço cravado com ponta fechada, sendo o
exemplo mais característico destas últimas as estacas tipo Franki.
As estacas pré-moldadas de concreto, ao serem cravadas, além de mobili-
zarem imediatamente o atrito lateral, adensam o solo da base, aumentando,
assim, a capacidade de suporte do solo na ponta da estaca — ou seja, aumen-
tando a resistência na ponta da estaca). Uma questão que merece atenção
nas estacas pré-moldadas é a sua cravação, visto que as tensões de cravação
devem ser sempre inferiores à tensão característica do concreto. Como as
tensões de compressão que surgem na cabeça da estaca no momento do
impacto são diretamente proporcionais à altura de queda do martelo, para
evitar o esmagamento da cabeça da estaca deve-se trabalhar com alturas
de queda pequenas e adotar amortecedores.
Estacas escavadas ou de substituição são aquelas executadas “in situ”
através da perfuração do terreno por um processo qualquer, com remoção de
material, com ou sem revestimento, auxiliada ou não pela utilização de fluido
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estabilizante. Como o solo presente no espaço a ser ocupado pela estaca é


removido, há algum nível de redução nas tensões horizontais geostáticas.
Em alguns processos de estacas escavadas, nos quais praticamente não
há remoção de solo, e na ocasião da concretagem, são tomadas medidas
para restabelecer as tensões geostáticas (ao menos parcialmente). Essas
estacas podem ser classificadas em uma categoria intermediária, chamada de
"sem deslocamento" (essa terminologia segue a norma inglesa de fundações
(BRITISH STANDARDS INSTITUTION, 1982) e mobilizam a reação de atrito lateral
e de ponta após o carregamento e/ou um leve recalque.
As estacas do tipo hélice contínua estão classificadas em duas categorias,
uma vez que, havendo remoção ou não de solo durante sua execução, elas
podem se aproximar das características de uma estaca escavada ou de uma
estaca cravada (quando são chamadas de "estacas hélice de deslocamento").
De acordo com o material utilizado, as estacas podem ser classificadas
em estacas de madeira, de concreto, de aço e mistas (Quadro 2).

Quadro 2. Classificação das estacas de acordo com o tipo de material

Tipo de execução Estacas

„„ Madeira
„„ Pré-moldada de concreto
Grande „„ Tubos de aço de ponta fechada
„„ Tipo Franki
„„ Microestacas injetadas
De
deslocamento
„„ Perfis de aço
„„ Tubos de aço e ponta aberta (desde que
Pequeno não haja embuchamento na cravação)
„„ Estacas hélices especiais (estacas hélice
de deslocamento)

„„ Escavadas com revestimento metálico


Sem deslocamento perdido que avança à frente da escavação
„„ Estacas raiz

„„ Escavadas sem revestimento ou com uso


Escavadas ou de substituição de lama
„„ Estacas hélice contínua em geral

Fonte: Adaptado de Velloso e Lopes (2011).


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Há também a classificação clássica de Terzagui e Peck (1967 apud VELLOSO;


LOPES, 2011), segundo a qual as estacas podem ser agrupadas em três tipos:
estacas de atrito de solos granulares muito permeáveis, estaca de atrito em
solos finos de baixa permeabilidade e estacas de ponta (Quadro 3).

Quadro 3. Classificação de estacas de Terzagui e Peck

Tipo de estaca Características da estaca

Estaca de atrito em solos granulares Transferem a maior parte da carga por


muito permeáveis atrito lateral. O processo de cravação
(estacas de compactação) dessas estacas, próximas entre si,
em grupos, reduz especialmente a
porosidade e a compressibilidade do
solo dentro e em torno do grupo.

Estacas de atrito em solos finos Também transferem ao solo as


de baixa permeabilidade cargas que lhes são aplicadas pelo
(fundações em estacas flutuantes) atrito lateral, porém não produzem
compactação apreciável do solo.

Estacas de ponta Transferem as cargas a uma camada


de solo resistente situada a uma
profundidade considerável abaixo da
base da estrutura.

Fonte: Adaptado de Velloso e Lopes (2011).

Principais processos de execução de estacas


e seus efeitos
Estacas cravadas são geralmente classificadas como de grande deslocamento,
sejam elas pré-moldadas ou moldadas in situ após a cravação de um tubo de
ponta fechada. Em contrapartida a esse tipo de execução, temos as estacas
escavadas, em que não há uma redução nas tensões no solo.
6 Fundações profundas

Estacas cravadas
As estacas cravadas em solos granulares pouco a medianamente compactos
causam densificação ou aumento na compacidade desses solos à medida que
o volume da estaca, introduzido no terreno, acarreta uma redução do índice
de vazios. Esse efeito é benéfico do ponto de vista do comportamento da
estaca (obtém-se maior capacidade de carga e menores recalques do que
se o solo fosse mantido em seu estado original). Se o solo já estiver muito
compacto, a introdução da estaca não causará mais aumento de compacidade,
mas deslocamento do solo, o que poderá, eventualmente, ser danoso para
outras estacas ou estruturas já executadas.
Como os solos granulares são muito permeáveis, esses efeitos ocorrem
praticamente durante o processo de execução. Em areias finas ou solos
arenosos siltosos ou argilosos, algum excesso de poropressão pode ocorrer
durante o processo de cravação, e a dissipação desses excessos ocorrerá
após a execução da estaca, completando o processo de densificação do solo
descrito (Figura 1).

Excesso de
poropressão

(a) (b) Δu
Tensão cisalhante
(atrito) residual
Zona de
Densidade

compressão
lateral e de Zona de solo
Δu

compactação amolgado e
Distância de aumento de
poropressão
Acréscimo de tensão
lateral causado pelo
deslocamento do solo
Tensão cisalhante
(atrito) residual

Carga de
ponta residual

Figura 1. Efeitos da cravação de estaca sobre o terreno: (a) em areia e (b) em argila saturada.
Fonte: Adaptada de Velloso e Lopes (2011).

Devido à baixa permeabilidade dos solos argilosos saturados, as estacas


cravadas neles causam, em um primeiro momento, um deslocamento do solo
praticamente igual ao volume da estaca. Na região afetada, há um aumento
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nas poropressões (sobretudo nas argilas normalmente adensadas ou pouco


sobreadensadas) e um amolgamento do solo. Após a execução da estaca, os
excessos de poropressão dissipam-se em um processo de adensamento radial
(fluxo de água da estaca para o restante da massa de solo ou, eventualmente,
do solo para a estaca se esta for de madeira ou concreto poroso) e há uma
recuperação parcial da estrutura do solo, chamada de recuperação tixotrópica.
Se o solo for pouco sensível e, portanto, sem uma perda considerável de
resistência pelo amolgamento, o adensamento terá um efeito benéfico, pois
causa redução no índice de vazios e aumento nas tensões efetivas — pode
compensar o efeito do amolgamento. Tem-se, assim, ao fim do processo, um
solo melhorado; no entanto, se o solo for muito sensível, pode-se ter, ao final
desse processo de dissipação dos efeitos de instalação, um solo enfraquecido
e até mesmo com um abatimento em torno da estaca.

Estacas escavadas
Estacas escavadas podem causar uma descompressão do terreno, que será
maior ou menor, dependendo do tipo de suporte. Num extremo estariam as
estacas escavadas sem suporte (o que só é possível em solos com alguma
porcentagem de finos e acima do nível d'água), em que a descompressão é
pronunciada. No outro extremo estariam as estacas escavadas com auxílio
de camisas metálicas que avançam praticamente no mesmo nível que a
ferramenta de escavação, em que o alívio é muito reduzido.
No meio desses extremos estariam as estacas escavadas com auxílio de
fluido ou lama estabilizante. Quanto menos tempo decorrer entre o término
da escavação e a concretagem da estaca, menor a descompressão e, con-
sequentemente, menor a deterioração das características originais do solo.

Na fase de escavação, as tensões horizontais são reduzidas ao em-


puxo da lama (y l significando o peso específico da lama) e, após
a concretagem, são devidas ao empuxo do concreto fresco (yc significando o
peso específico do concreto fresco). Com o tempo, as tensões podem crescer
ligeiramente. O gráfico de umidade indica que, quanto menos tempo a escavação
permanecer aberta, antes da concretagem, menor será o aumento de umidade
do solo (Figura 2).
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(a) (b) σh
σh,0

γC z

γl z

ω
(c)
Solo amolgado

ω0
Alívio de tensões
t

Escavação Concretagem

Figura 2. Efeitos da execução de estaca escavada sobre o terreno e evolução das tensões
horizontais e da umidade junto ao fuste em estacas escavadas com lama.
Fonte: Adaptada de Velloso e Lopes (2011).

Principais tipos de fundações profundas

Estacas de madeira
As estacas de madeira são constituídas por troncos de árvores, razoavelmente
retilíneos, que passam por uma preparação das extremidades (topo e ponta)
para cravação, limpeza da superfície lateral e, caso sejam utilizadas em obras
permanentes, um tratamento com produtos preservativos. No Brasil, as esta-
cas de madeira são utilizadas, quase exclusivamente, em obras provisórias.
Elas têm uma duração ilimitada quando mantidas permanentemente debaixo
d'água; já sujeitas a alternâncias de secura e umidade, quase todas as madeiras
são destruídas rapidamente. Como vantagens, poderiam ser mencionadas a
facilidade de manuseio e de corte e a preparação para a cravação e após a
cravação. As estacas de madeira têm sua carga estrutural admissível calcu-
lada, sempre em função da seção transversal mínima, adotando-se tensão
admissível compatível com o tipo e a qualidade da madeira.
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Estacas metálicas
As estacas metálicas, ou estacas de aço, são encontradas em diversas formas,
desde perfis (laminados ou soldados) a tubos. Entre os perfis laminados estão
os trilhos, utilizados, em geral, depois de retirados das ferrovias (trilhos
usados). Os perfis podem ser usados isolados ou associados (duplos ou
triplos). Pode-se adicionar em sua composição uma porcentagem de cobre,
o que confere resistência à corrosão. As estacas metálicas executadas em
solos sujeitos à erosão, aquelas que vierem a ficar expostas e aquelas que
tenham sua cota de arrasamento acima do nível do terreno devem ser pro-
tegidas ou ter sua espessura de sacrifício definida em projeto. As estacas
metálicas devem ser dimensionadas de acordo com a ABNT NBR 8800:2008,
considerando-se a seção reduzida da estaca. No caso de ocorrência de camada
de argila mole, deve-se levar em conta o comprimento cravado e a inércia da
peça metálica, a fim de reduzir a possibilidade da ocorrência de instabilidade
dinâmica direcional (drapejamento) durante a cravação. Nas estacas em que
a parte superior ficar desenterrada, é obrigatória a proteção com camisa de
concreto ou outro recurso de proteção do aço ou o aumento da espessura de
sacrifício definida em projeto. As emendas das estacas de aço, realizadas por
meio de talas soldadas ou parafusadas, devem resistir às solicitações que
possam ocorrer durante o manuseio, a cravação e o trabalho do componente
estrutural (Figura 3).

A corrosão causada pelo solo em estacas de aço é, em geral, muito


pequena e pode ser desprezada quando o aço está em contato com
solo natural, de forma que qualquer proteção ou pintura pode ser dispensada
(desde que seja considerada uma espessura de sacrifício). No caso de obras
marítimas, deve-se considerar separadamente a corrosão no solo, na água e
na atmosfera.
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(a) (b) (c)

Solda

(d) (e) (f)

Solda

Figura 3. Estacas metálicas: (a) perfil de chapas soldadas, (b) perfis i


laminados associados, (c) perfis tipo cantoneira associados, (d) tubos,
(e) e (f) trilhos associados duplo e triplo, respectivamente.
Fonte: Adaptada de Velloso e Lopes (2011).

As estacas metálicas apresentam vantagens importantes, listadas a seguir.

„„ São fabricadas com seções transversais de várias formas e dimensões,


o que permite uma adaptação bem ajustada a cada caso.
„„ Devido ao peso relativamente pequeno e à elevada resistência na com-
pressão, na tração e na flexão, são fáceis de transportar e de manipular.
„„ Pela elevada resistência do aço, são mais fáceis de cravar do que as
estacas de madeira ou de concreto pré-moldado, podendo passar por
camadas compactas ou permitir o embutimento nesses materiais.
„„ Pela facilidade com que podem ser cortadas com maçarico ou emenda-
das por solda, não oferecem dificuldade aos ajustes de comprimento
no canteiro. Além disso, os pedaços cortados podem ser aproveitados
no prolongamento de outras estacas.
„„ Pode-se utilizar, em casos especiais, aços resistentes à corrosão.

Estacas pré-moldadas
O concreto é um excelente material para a confecção de estacas devido à sua
resistência aos agentes agressivos e ao seu suporte a alterações dinâmicas.
Além disso, nesse material de construção, é possível executar estacas tanto
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de pequena como de grande capacidade de carga. Estacas pré-moldadas


são estacas constituídas de segmentos de pré-moldado ou pré-fabricado
de concreto e introduzidas no terreno por golpes de martelo de gravidade,
de explosão, hidráulico ou por martelo vibratório. Para fins exclusivamente
geotécnicos, não há distinção entre estacas pré-moldadas e pré-fabricadas,
e na ABNT NBR 6122:2019 elas são denominadas apenas como pré-moldadas
(Figura 4).
As estacas de concreto são moldadas no canteiro ou em usinas e podem
ser classificadas, quanto à forma de confecção, em concreto vibrado ou
concreto centrifugado; já quanto à armadura, classificam-se em concreto
armado ou concreto protendido.

Figura 4. Estacas pré-moldadas de concreto em suas seções transversais (a–d) e em seção


longitudinal com armadura típica (e).
Fonte: Adaptada de Velloso e Lopes (2011).

A grande vantagem das estacas pré-moldadas sobre as moldadas no


terreno está na boa qualidade do concreto que se pode obter e no fato de
que os agentes agressivos, eventualmente encontrados no solo, não terão
nenhuma ação na pega e na cura do concreto. Outra vantagem é a segurança
que oferecem na passagem através de camadas muito moles, nas quais a
concretagem in loco pode apresentar problemas. Como desvantagem principal
das estacas pré-moldadas pode-se apontar a dificuldade de adaptação às
variações do terreno.
Quando é necessário que a fundação profunda suporte grandes cargas
e tenha grandes comprimentos, pode-se lançar mão do uso de estacas de
concreto protendido. Elas apresentam como vantagens:
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„„ elevada resistência na compressão, na flexão composta, na tração


decorrente da cravação e na flexão transitória;
„„ maior facilidade de manipulação e cravação com menor fissuração;
„„ capacidade de suportar forças de tração elevadas (como em ancoragens
e dolfins portuários);
„„ facilidade de serem moldadas com qualquer configuração de seção
transversal, seja ela maciça ou oca, para atender a exigências de projeto;
„„ possibilidade de serem executadas com seções transversais de grandes
dimensões e grandes comprimentos.

As estacas pré-moldadas precisam ser dimensionadas para resistir aos


esforços da estrutura. Os esforços de manipulação previstos para a estaca
são calculados a partir dos modos de levantamento (ou suspensão) — para
carga, descarga e estocagem — e de içamento para cravação.
A cravação de estacas pode ser feita por percussão ou prensagem.
A escolha do equipamento deve ser feita de acordo com tipo, dimensão da
estaca, características do solo, condições de vizinhança, características do
projeto e peculiaridades do local. O uso de martelos mais pesados e com
menor altura de queda é mais eficiente do que o uso de martelos mais leves
e com grande altura de queda.
O uso de prolongas e suplementos em estacas pré-moldadas é admitido
apenas em situações excepcionais, e seu comprimento total é limitado a
2,50 m, com as devidas e necessárias alterações de nega e repique. O suple-
mento pode ser fabricado em aço ou concreto, e sua utilização deve garantir o
bom posicionamento da estaca no final da cravação e a minimização da perda
de eficiência do sistema de cravação até que esta seja concluída. O topo do
elemento inferior, quando danificado, deve ser recomposto e a cravação só
pode ser retomada após o tempo necessário à cura da recomposição.

Para você entender, confira a seguir definição de nega e repique.


„„ Nega: medida da penetração permanente de uma estaca, causada
pela aplicação de um golpe de martelo ou pilão, sempre relacionada com a
energia de cravação. Dada a sua pequena grandeza, em geral é medida para
uma série de dez golpes.
„„ Repique: parcela elástica da penetração máxima de uma estaca, decorrente
da aplicação de um golpe do martelo ou pilão.
Fundações profundas 13

As emendas devem ser feitas por meio de anéis soldados ou outros dis-
positivos que permitam a transferência dos esforços de compressão, tração
(mesmo durante a cravação) e flexão (Figura 5).
O uso de luva de encaixe somente será aceito se for feita uma única emenda
por estaca, não houver tração ou flexão tanto na cravação quanto na utilização
da estaca, caso as luvas de encaixe não possuam geometria diferente da
geometria dos segmentos de estacas que são unidos e as folgas existentes
entre a luva e os segmentos de estacas nunca forem superiores a 10 mm.

(a) (b)

Solda
elétrica
Elemento
a cravar

Anel de
extremidade

Corte Vista
Anel de
encaixe

Anel de
extremidade

Elemento
cravado

Perspectiva do
anel de emenda Perspectiva

Figura 5. Emendas de estacas moldadas por luvas de aço (a) soldadas ou (b) simplesmente
encaixadas.
Fonte: Adaptada de Velloso e Lopes (2011).

Estacas de concreto moldadas in solo


A grande vantagem das estacas moldadas no solo em relação às pré-moldadas
é permitir que seja concretado o comprimento estritamente necessário. Quanto
à capacidade de carga, as estacas moldadas no solo podem oferecer valores
ainda mais elevados do que as pré-moldadas. Elas podem ser executadas
após escavação (com ferramentas especiais) de rochas ou solos muito du-
ros, materiais que não poderiam ser penetrados por estacas pré-moldadas.
14 Fundações profundas

A qualidade das estacas moldadas no solo depende mais da habilidade e da


competência da equipe executora.
Conforme as definições presentes na ABNT NBR 6122:2019, são estacas de
concreto moldadas in loco as listadas a seguir.

„„ Estaca escavada com uso de fluido estabilizante: estaca moldada in


loco, sendo a estabilidade da perfuração assegurada pelo uso de fluido
estabilizante (ou água, quando houver também revestimento metálico).
Recebe a denominação de estacão quando a perfuração é feita por
uma caçamba acoplada a uma perfuratriz rotativa, e estaca barrete
quando a seção for retangular e escavada com utilização de clamshell.
„„ Estaca escavada mecanicamente: estaca executada por perfuração
do solo por trado mecânico, sem emprego de revestimento ou fluido
estabilizante.
„„ Estaca Franki: estaca moldada in loco executada pela cravação, por
meio de sucessivos golpes de um pilão, de um tubo de ponta fechada
por uma bucha seca constituída de pedra e areia, previamente firmada
na extremidade inferior do tubo por atrito. Essa estaca possui base
alargada e é integralmente armada.
„„ Estaca hélice contínua monitorada: estaca de concreto moldada in loco,
executada mediante a introdução no terreno, por rotação, de um trado
helicoidal contínuo no terreno e injeção de concreto pela própria haste
central do trado, simultaneamente à sua retirada, sendo a armadura
introduzida após a concretagem da estaca.
„„ Estaca hélice de deslocamento monitorada: estaca de concreto moldada
in loco que consiste na introdução no terreno, por rotação, de um trado
especial dotado de aletas, sem que haja retirada de material, o que
ocasiona um deslocamento do solo junto ao fuste e à ponta. A injeção
de concreto é feita pelo interior do tubo central, simultaneamente
à sua retirada por rotação. A armadura é sempre introduzida após a
concretagem da estaca.
„„ Estaca hélice monitorada com trado segmentado: estaca de concreto
moldada in loco, executada mediante a introdução no terreno, por rota-
ção, de segmentos de trado helicoidal de diâmetro constante. A injeção
de concreto é feita pela haste central do trado, simultaneamente à sua
retirada. A armadura é sempre colocada após a concretagem da estaca.
„„ Estaca raiz: estaca armada e preenchida com argamassa de cimento e
areia, moldada in loco e executada por perfuração rotativa ou rotoper-
cussiva, revestida integralmente, no trecho em solo, por um conjunto
de tubos metálicos recuperáveis.
Fundações profundas 15

„„ Estaca Strauss: estaca executada por perfuração do solo com uma


sonda ou piteira e revestimento total com camisa metálica, realizando-
-se gradativamente o lançamento e o apiloamento do concreto, com
retirada simultânea do revestimento.
„„ Estaca trado vazado segmentado (Hollow Auger): estaca moldada
in loco executada mediante a introdução no terreno, por rotação, de um
trado helicoidal constituído por segmentos de pequeno comprimento
(aproximadamente 1,0 m), rosqueados, e injeção de argamassa pela
própria haste central do trado, simultaneamente à sua retirada.
„„ Microestaca ou estaca injetada: estaca moldada in loco, armada, exe-
cutada por perfuração rotativa ou rotopercussiva e injetada com calda
de cimento por meio de um tubo com válvulas (manchete).

As estacas Strauss podem ser armadas com uma ferragem longitudinal


(barras retas) e estribos que permitam livre passagem do soquete de compac-
tação e garantam um cobrimento da armadura, não inferior a 3 cm. Quando
não armadas, deve-se providenciar uma ligação com o bloco, por meio de
uma ferragem que é simplesmente cravada no concreto fresco (Figura 6).

“Piteira”

Armação

(a) (b) (c) (d)

Figura 6. Execução de estaca Strauss: (a) escavação, (b) limpeza do


furo, (c) concretagem após colocação da armadura, (d) estaca pronta.
Fonte: Adaptada de Velloso e Lopes (2011).
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As estacas Franki são executadas através da cravação de um tubo por


meio de sucessivos golpes de um pilão em uma bucha seca de pedra e areia
aderida ao tubo. Atingida a cota de apoio, procede-se com expulsão da bucha,
execução de base alargada, instalação da armadura e execução do fuste de
concreto apiloado com a simultânea retirada do revestimento. A execução da
estaca pode apresentar alternativas executivas em relação aos procedimen-
tos da estaca padrão, como, por exemplo: perfuração interna (denominada
“cravação à tração”), fuste pré-moldado, fuste encamisado com tubo metálico
perdido, fuste executado com concreto plástico vibrado ou sem execução de
base alargada.
Esse tipo de estaca foi desenvolvido pelo engenheiro belga Edgard Frankig-
noul na década de 1910. Por conta das vibrações produzidas no processo
original de execução, chamado de standard, passou a ser pouco usual em
centros urbanos (Figura 7).
Bucha

Estaca concluída
A bucha impede entrada da água

Concretagem do fuste e retirada do tubo


Execução da base e colocação da armadura

Lençol d’água

Figura 7. Execução de estaca Franki standard.


Fonte: Adaptada de Velloso e Lopes (2011).
Fundações profundas 17

Há diversos métodos construtivos e tipos de estacas Franki. Podemos


citar: Franki mista, Franki tubada, Franki com fuste vibrado, Franki cravada
com martelo automático e fuste vibrado, Franki cravada com ponta aberta.

Estacas pré-moldadas versus estacas


moldadas in loco
A escolha quanto ao tipo de fundação profunda que melhor se adequa ao
projeto deve considerar diversas variáveis: quais são as cargas que serão
suportadas pela estrutura de fundação, as características geológicas do
terreno, os recursos financeiros disponíveis para a execução dessa etapa
da obra, as técnicas construtivas e matérias-primas disponíveis na região.
Todos os tipos de estacas, sejam elas pré-moldadas ou moldadas in loco,
apresentam vantagens e desvantagens quando comparadas a outros tipos de
fundação. As estacas pré-moldadas, por exemplo, são boas soluções a serem
adotadas em terrenos com nível da água superficial. Já as estacas moldadas
in loco podem ser a escolha mais adequada para fundações profundas em
solos estáveis e/ou coesos e/ou sem água.

Quadro 4. Vantagens e desvantagens de tipos de estacas

Tipo de estaca Vantagens Desvantagens

„„ Facilidade de Quando não


manuseio, corte e submersa,
preparação é suscetível
„„ Duração ilimitada ao ataque
embaixo d'água de agentes
Madeira
biológicos e
intemperismos,
com rápido
apodrecimento
se não tratada
Pré-moldadas
„„ Capacidade de „„ Suscetíveis
adaptação bem à corrosão
ajustada a cada quando não
projeto observadas
Metálica „„ Fáceis de transportar as condições
e manipular adequadas
„„ Cravação mais fácil „„ Custo elevado
que as de madeira ou
concreto pré-moldado
(Continua)
18 Fundações profundas

(Continuação)

Tipo de estaca Vantagens Desvantagens

„„ Possibilidade de ajus-
tes no canteiro com
posterior reaproveita-
Metálica mento das partes
„„ Podem ser utilizados
aços resistentes à
corrosão
Pré-moldadas
„„ Boa qualidade do „„ Dificuldade de
concreto usinado adaptação às
„„ Segurança através variações do
De concreto
da passagem de terreno
camadas de solo „„ Alto peso
muito mole próprio

„„ Necessidade de „„ Uso desa-


equipamentos conselhável
relativamente simples abaixo do len-
Strauss
para sua execução çol freático
„„ Baixa capaci-
dade de carga

„„ Não produzem choques „„ Alto consumo


nem vibrações de cimento
„„ É de possível execução „„ Alto consumo
através de blocos de de água e
rochas ferragem
„„ Equipamento
Raiz de execução
relativamente simples
„„ Execução tanto na
Moldadas in vertical quanto com
loco inclinações
„„ Alta capacidade de
carga

„„ Há diferentes tipos „„ Necessitam de


de execução para rígido controle
atendimento às de execução
especificidades de „„ Maquinário
cada projeto mais robusto
para sua
Hélice
execução
contínua
„„ Necessidade
de amplas
áreas no
canteiro de
obras para sua
execução
Fundações profundas 19

Referências
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 6122:2019. Projeto e execução
de fundações. Rio de Janeiro: ABNT, 2019.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 8800:2008. Projeto de es-
truturas de aço e de estruturas mistas de aço e concreto de edifícios. Rio de Janeiro:
ABNT, 2008.
BRITISH STANDARDS INSTITUTION. Code of practice for foundations: British standard
code of practice 1972:2004:1982. London: BSI, 1982.
VELLOSO, D. A.; LOPES, F. R. Fundações. São Paulo: Oficina de Textos, 2011.

Leituras recomendadas
CAPUTO, H. P.; CAPUTO, A. N. Mecânica dos solos e suas aplicações: mecânica das rochas,
fundações e obras de terra. 7. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2017. v. 2.
FALCONI, F. et al. (ed.). Fundações: teoria e prática. 3. ed. São Paulo: Oficina de Textos,
2019.

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