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Chiroptera Neotropical, 12(2), December 2006

TÉCNICA PARA PUNÇÃO VENOSA EM MORCEGOS (MAMMALIA, CHIROPTERA)

Márcia Baptista1, Anderson de Oliveira Monteiro2, Nádia Regina Pereira Almosny2, Helena de Godoy
Bergallo3

Projeto Vida de Morcego – Caixa Postal 70614 – cep 22741-970, Rio de Janeiro, RJ
1.

marciabap@ibest.com.br
2
Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Medicina Veterinária, Laboratório de Patologia Clínica.
aomont@ig.com.br e mcvalny@vm.uff.br

3
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Departamento de Ecologia, Rua São Francisco Xavier 524,
20559-900, Rio de Janeiro, RJ, Brasil RJ, bergallo@uerj.br

Atualmente existe uma grande preocupação mundial Faz-se uma leve compressão digital sobre a veia
no que concerne ao meio ambiente, saúde pública e propatagial ou cefálica, imediatamente proximal ao
controle de pragas. O estudo dos morcegos está local de punção, funcionando como garrote. Após anti-
relacionado a estas três grandes preocupações sepsia do local, perfura-se a veia propatagial pela face
mundiais, quando consideramos a disseminação de ventral da asa com o auxílio de uma agulha hipodérmica
sementes, a transmissão da raiva e o controle de insetos (13x3.8, 27.5G), tomando-se o cuidado para não
vetores. Assim, os morcegos possuem grande transfixá-la. A perfuração pela face dorsal da asa ou a
importância para o equilíbrio do planeta e isto justifica transfixação da veia permitirá que o sangue se espalhe
um estudo detalhado de sua fisiologia visando a pela área com mais pêlos, dificultando assim o
preservação das espécies relacionadas. aproveitamento da amostra.
Cada vez mais, as análises laboratoriais vêm ganhando Uma vez ocorrendo o sangramento pelo local
espaço na avaliação do estado fisiológico de animais perfurado, utilizam-se tubos capilares de vidro rinsado
selvagens, tanto em condições de cativeiro quanto em com anticoagulante para colher as gotículas de sangue
populações de vida livre. Entretanto, poucos trabalhos que se formarem (a escolha do anticoagulante deve ser
descrevem valores laboratoriais nas espécies brasileiras feita de acordo com as dosagens a serem realizadas).
e alguns trabalhos consultados (Baptista & Esbérard, Para facilitar essa colheita das gotículas de sangue,
1997; Caire et al., 1981) realizavam punção cardíaca pode-se usar uma pipeta para tubos capilares
seguida de eutanásia dos animais para obtenção de (ReflotonÒ). Após a obtenção da quantidade desejada
amostras sangüíneas. Tal método torna-se pouco de amostra, transfere-se o conteúdo dos capilares para
satisfatório pois, além de não permitir a utilização dos tubos eppendorff e acondiciona-se o material
dados na avaliação clínica dos animais, esta técnica adequadamente em isopor contendo gelo para o
vai de encontro à crescente preocupação com bem-estar transporte até o laboratório. Após a venipunção, o local
animal. de punção deve sofrer compressão digital a fim de
ajudar a coibir o sangramento.
O presente trabalho tem como objetivo descrever uma
técnica de coleta de sangue venoso em A quantidade de sangue colhida deverá sempre ser
microquirópteros que não debilite os animais, visando compatível ao tamanho corporal do animal para não
fornecer subsídios para estudos futuros sobre aspectos debilitá-lo a ponto de prejudicar sua capacidade de vôo.
hematológicos e bioquímicos dos representantes deste Morcegos têm um volume sangüíneo variando de 7 a
grupo. 10 ml/100g de peso corporal (Neuweiller, 2000) e, de
uma maneira geral, mamíferos saudáveis podem perder
No presente estudo efetuou-se a colheita de sangue a até 10% do volume total sem alterar sua rotina normal
partir da veia propatagial e, para tanto, o animal deve (Jain, 1993).
ser contido fisicamente e mantido em decúbito dorsal
durante o procedimento. Para facilitar a visualização Este método tem se mostrado satisfatório, visto que
da veia propatagial, pode-se posicionar a asa sobre um não predispõe a formação de hematomas. Além disso,
foco de luz (p.ex., uma lanterna) para transiluminação. os animais apresentam uma boa capacidade de vôo
imediatamente após a coleta permitindo o estudo de

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parâmetros hematológicos diversos em animais de vida Baptista, M. & Esbérard, c.. 1997. Valores
livre sem provocar danos à população local. Por Hematológicos de Artibeus sp e Desmodus rotundus
conseguinte, o método proposto pode ser utilizado em (Mammalia, Chiroptera). Revista Científica do
estudos ecológicos onde a avaliação clínica dos animais Instituto de Pesquisas Gonzaga da Gama Filho, 3
possa fornecer dados relevantes aos planos de manejo (2): 11-22.
e conservação das espécies locais. Algumas recapturas
realizadas na mesma noite, horas mais tarde, e até Caire, W.; Cox, B.L. & Levescy, B. 1981. Some blood
alguns meses depois veio a corroborar a idéia de que o values of Myotis velifer (Chiroptera,
método proposto não debilita os animais ao ponto de Vespertilionidae). Journal of Mammalogy, 62 (2):
virem a óbito. 436-439.

Jain, N.C. 1993. Essentials of Veterinary


AGRADECIMENTOS
Hematology. Philadelphia: Lea & Febiger.
Gostaríamos de prestar nossos sinceros agradecimentos
Neuweiler, G. 2000. The biology of bats. New York:
às biólogas Viviane M. Lins e Shirley S. P. Silva pelas
Oxford University Press. 310p.
sugestões e críticas e Alexandre M. Carneiro e Rodolfo
B Pinheiro pelo auxílio nos trabalhos de campo.

REFERÊNCIAS

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