Você está na página 1de 6

1

As influências do Movimento Rastafári: Crenças, princípios e opressão

Bianca da Costa da Silva1

Resumo: O presente artigo tem o objetivo de apresentar o Movimento Rastafári: a sua


etimologia, definição, crenças, princípios, costumes e todo o sistema opressor. Dentre essas
caracterizações, será apresentado o estudo acerca do tricolor, as cores verde, amarela e
vermelha que é um forte símbolo, carregado de significados. Tendo enfoque, o cantor de
reggae Bob Marley que foi um dos principais influenciadores dessa crença que atualmente, é
seguida por cerca de 1 milhão de pessoas. O presente estudo irá detalhar as discussões feitas
acerca do Deus cristão Jeová, abreviadamente conhecido por Jah, que fora considerado pelos
seguidores do Movimento Rastafári como o “Messias Negro”, reencarnado no século XX no
corpo do Imperador etíope Haile Selassie I.
Palavras-chave: Movimento Rastafári. Reggae. Bob Marley. Jeová. Haile Selassie I.

The Influences of the Rastafarian Movement: Beliefs, Principles and Oppression

Abstract: This article aims to present the Rastafarian Movement: its etymology, definition,
beliefs, principles, customs and the entire oppressive system. Among these characterizations,
the study about the tricolor, the colors green, yellow and red, which is a strong symbol, loaded
with meanings, will be presented. Focusing on the reggae singer Bob Marley who was one of
the main influencers of this belief that is currently followed by about 1 million people. The
present study will detail the discussions made about the Christian God Jehovah, abbreviated
as Jah, who was considered by the followers of the Rastafari Movement as the “Black
Messiah”, reincarnated in the twentieth century in the body of the Ethiopian Emperor Haile
Selassie I.
Keywords: Rastafarian Movement. Reggae. Bob Marley. Jehovah. Haile Selassie I.

1
Graduanda do Curso de Licenciatura Interdisciplinar em Ciências Humanas/História da Universidade Federal
do Maranhão -UFMA Campus de Codó. E-mail: bc.silva2@discente.ufma.br. Atuando na linha de pesquisa na
área das Interseccionalidades de Gênero e a mulher afrodescendente no reggae – Projeto PIBIC.
2

Introdução

O Rastafarianismo ou a religião Rastafári foi um movimento que surgiu dentre o


século XX, resultante de fenômenos sociais, políticos, religiosos e também no meio musical.
Surgiu a partir da crença de que a figura central Haile Selassié I (1892-1975), imperador da
Etiópia, fosse considerado o tão somente descendente e herdeiro do rei Salomão e da rainha
Sabá. No entanto, após discursar diante dos representantes da Liga das Nações a respeito das
teorias racistas que surgiram durante a Segunda Guerra Mundial, o então abominável e
corajoso imperador recebeu o título Ras Tafari, “príncipe da paz”.
Com o passar do tempo, os jamaicanos e descendentes de africanos passaram a ver na
figura de Hailé Selassié I, o próprio Jah, Javeh, Jeová, o Deus cristão. Ficaram então,
deslumbrados com a possibilidade de que a figura de um homem negro pudesse ser na
verdade, pertencente à divindade, de caráter massiânico e que tivesse como missão, os salvar
de toda a pobreza e opressão sofrida. Assim, é compreensível que a maioria das pessoas que
acolheu tal crença fosse pertencente à camada mais baixa da sociedade, os subalternos, pobres
e negros, o que de certa forma, foi fundamental para formar e construir a identidade da
Jamaica, com contornos e particularidades próprias.
A partir dessa acolhida, o reggae, estilo musical surgido e pertencente à Jamaica,
introduziu-se e aderiu às crenças do Rastafarianismo, e por conta disso, os cantores desse
estilo musical, compunham suas músicas com letras voltadas para questões do meio social, as
opressões e discriminações, ou seja, as angústias e o sofrimento de seu povo, bem como, as
alegrias e perspectivas de um futuro próspero. Poder-se-á citar o reggae roots e seus
precursores: Peter Tosh, Burning Spear e Bob Marley.
Com o passar do tempo, influenciado pelo rastafarianismo, o reggae enriqueceu-se de
elementos que foram fundamentais para a sua identificação, além de ter em suas letras,
registros da opressão de um povo, versos do sofrimento de um povo, as angústias do preto e
pobre jamaicano que outrora, espera pelo messias prometido que o tiraria desse mundo de
injustiças e lamentos.
Acrescidos a esses elementos, podemos citar as características próprias que a partir do
Rastafarianismo, foram introduzidos nos costumes e princípios do reggae. Elementos
estéticos do movimento Rasta, como, a vestimenta tradicional alargada com as cores verde,
vermelha e amarela e o uso de dreads nos cabelos. Uma outra característica do
Rastafarianismo são os hábitos alimentares, compostos de ervas e vegetais com a marijuana
(cannabis), popularmente conhecida como a maconha.
3

Origem do movimento Rastafári: visões teóricas

A cultura ou movimento Rastafári, surgiu na Etiópia, país da África Oriental,


localizado na região conhecida como Chifre da África, porém formalizou-se na Jamaica, de
modo que a sua visibilidade partiu da aceitação e proliferação do movimento pela massa
negra e subalterna do país.
O movimento faz alusão e cultuação à Haile Selassié I (1892-1975), cujo imperador
representava para os pobres negros e camponeses da Jamaica, a representação messiânica de
Jesus Cristo, isto é, do próprio Deus Jeová, ou abreviadamente, Jah. Para White (ibid.), o
movimento rastafariano foi norteador e dava rumo a um livramento de perseguições e
opressões sofridas pelos negros, que lutavam para sobreviver ao babylon system (Sistema que
chamavam de Babilônia), como afirmado a seguir:

Aqui estão as palavras do Rastaman. Babilônia seu trono caiu! E eu ouço os anjos
com os sete selos. Babilônia seu trono caiu! Eu digo, voe de volta para casa, para
Zion. Em uma bela manhã quando tiver terminado o meu trabalho, eu voarei de
volta para casa. (Rastaman Chant. Bob Marley, 1999. Grifo meu)

Nós nos recusamos a ser o que você queria que nós fôssemos. Somos o que somos e
é assim que vai ser (...) Estou falando da minha liberdade e da liberdade do povo. O
Sistema Babilônico é um vampiro.5 (Babylon System. Bob Marley, 1999. Tradução
minha)

A religião rastafári, ficou conhecida mundialmente, a partir da crença do Cantor


jamaicano Bob Marley, o mesmo influenciado por sua crença, cantava músicas de cunho
messiânico e espiritual, deste modo, a sua religião era então conhecida mundialmente a partir
das letras de suas canções.
Para Martin Claret (s. d.), Bob Marley influenciava os seus fãs a lutar pelos seus
direitos e lutar contra esse sistema opressor babilônico. As doutrinas da religiosidade rastafari
não permitia o amputamento dos membros, por isso, Bob Marley, ao não desobedecer as leis
de sua religião, decide continuar com a sua trajetória e missão enquanto interlocutor de
anseios e opressões de seu povo. Quando soube da decisão que tinha que tomar, Bob Marley
afirmou:
Rasta não concorda com amputação (...) Eu e Eu [eu e meus irmãos] não vamos
permitir que um homem seja desmantelado. Jah, o Deus vivo, Sua Majestade
Imperial Hailé Selassié I, Ras Tafari, o Leão Conquistador da Tribo de Judá,
ducentésimo vigésimo quinto Soberano do Império etíope de três mil anos, Senhor
dos Senhores, Rei dos Reis, Herdeiro do trono de Salomão, Ele vai me curar com a
meditação do meu cálice de ganja, meu cutchie [cachimbo de argila tipo narguilé],
ou me levará mais cedo pro Seu Reino. Nenhum bisturi vai cortar minha carne! Eles
não podem matar Jah, não podem matar Rasta, o Rasta sobrevive. (White, 1999, pp.
21-22)
4

Deste modo, o ato de Bob Marley foi visto como um ato de heroísmo, por isso,
influenciou em massa, os seguidores da religião e os fãs à conhecer os princípios e doutrinas
do rastafári.

Influências do Rastafarianismo: reggae roots de Bob Marley, Peter Tosh e Burning


Spear

O reggae roots é um subgênero do gênero reggae e fora difundido na Jamaica, sua


tradução: “reggae raiz”, demonstra que é o tipo de música que contém na letra, reprovações e
revoltas com o sistema opressor. Por isso, é importante ressaltar que Bob Marley, Peter Tosh e
Burning Spear foram os principais difusores desse subgênero. Abaixo estão listadas as
principais obras musicais e letras dos clássicos do reggae roots:

1- One Love - Bob Marley (Um Amor):

“Ouça as crianças chorando (um só amor) Ouça as crianças chorando (um só coração)
Dizendo: Seja grato e louve ao Senhor e eu ficarei bem Dizendo: Vamos seguir juntos e
ficaremos bem Wo wo wo wo!”
Hear the children cryin' (one love) Hear the children cryin' (one heart) Sayin': Give thanks
and praise To the Lord and I will feel alright Sayin': Let's get together and feel alright Wo wo
wo wo!

2- Bush Doctor - Peter Tosh (Aviso! O cirurgião geral adverte)

“Fumar cigarro é perigoso... Perigoso Perigoso para sua saúde Será que isso significa algo
para você? Então legalize a maconha Bem aqui na Jamaica Eu digo que isso cura glaucoma
Eu um homem de Bush Doctor.”
Warning! Warning! The Surgeon General warns Cigarette smoking is dangerous, dangerous
Hazard to your healt Does that mean anything to you To legalize marijuana Right here in
Jamaica I'm say it cure glaucoma I man a de Bush Doctor.

3- Jah No Dead - Burning Spear (Jah não morreu)

“Eles tentaram enganar toda a população Nos dizendo que Jah está morto Disse que eles
tentaram enganar toda a população Nos dizendo que Jah está morto Nós sabemos que Jah
não morreu, Jah não morreu.”
5

They tried to fool a whole population By telling us Jah Jah dead Say them try to fool a whole
population By telling us Jah Jah dead I & I knows that Jah nuh dead, Jah nuh dead

Todavia, pode-se perceber que estes artistas expressaram em suas canções, as


insatisfações, anseios e revolta com as injustiças, os mesmos foram influenciados pelo
rastafarianismo e seus princípios. Observa-se ainda, as influências presentes na bandeira do
movimento rastafári, ou as cores que conhecemos como, as cores do reggae: a cor vermelha
representa o sangue que os mártires, a cor verde representa a beleza e prosperidade da
vegetação do campo, enquanto que a cor amarela simboliza o ouro e a riqueza existente no
continente africano.

Costumes Rastafári

É possível associar e perceber as influências do Rasta, nas práticas e costumes do


estilo musical reggae. Os regueiros geralmente, utilizam uma vestimenta peculiar, trajes
alargados e compridos, além do uso de dreadlocks nos cabelos. De acordo com as doutrinas
da religião, o cabelo é uma parte sagrada do corpo, por isso, é proibido cortar e pentear os
cabelos, os dreads são ,portanto, sagrados e cada dread constitui uma parte importante do
corpo.
Ademais, é importante destacar que os praticantes dessa religião mantém uma dieta e
higiene formuladas para atender e acompanhar as doutrinas rastafári. São vegetarianos e se
abstenham de carne, nem mesmo o peixe e conchas são permitidos. Além disso, não ingerem
álcool e tabaco, substituindo o seu consumo pelas mais diversas ervas como a Ganja e
marijuana (maconha). Elas são usadas pelos rastas como forma de limpeza e purificação nos
rituais.

Considerações finais

Conclui-se portanto, que o movimento Rastafári fora difundido a partir da crença da


camada subalterna. O subalterno é o indivíduo reduzido a um nada dentro da sociedade, são
vários os fatores responsáveis por reduzir esse ser, podem-se citar as camadas sociais, a
pirâmide que divide uma sociedade em classes e como se sabe, a camada de base é constituída
pelo pobre e operário.
Todavia, é importante pontuar que além da camada já existente, esse ser carrega
6

consigo marcadores de interseccionalidades, se este homem é negro, pobre, morador de zonas


periféricas, este carrega consigo, marcadores sociais que o oprimem e o subalternizam mais
ainda. Diante disso, este homem subalternizado procura refúgios e uma luz do fim do túnel, e
nessa procura, estes homens encontraram em suas crenças a possibilidade de haver uma
divindade semelhante a si mesmo, uma figura messiânica capaz de o tirar desse mundo de
opressões e sofrimentos. Por isso, acolhem essa crença e a apropriam-na em seu estilo
musical, o reggae, fazendo dele, o ritmo de Jah, louvam e cantam a Jah, o seu salvador
eterno.

REFERÊNCIAS

Bob Marley: Songs of Freedom. Trevor Wyatt e Nerville Garrick. New York: Island Records
Ltd., 1999. 4 CD-ROM.

CHEVALIER, Jean et al. Dicionário de Símbolos: (mitos, costumes, gestos, formas,


figuras, cores, números). 18 ed. Rio de Janeiro: José Olimpo, 2003

DE LUCCA, Arturo et al. Psicologia Transpessoal – uma introdução. São Paulo:


Totalidade, 1993.

FONSECA, Luiz H.de Sá. Grof, Psicologia Transpessoal e Respiração Holotrópica TM:
uma Análise sobre as Experiências de um Indivíduo sob uma Nova Perspectiva.
Monografia (Trabalho de Conclusão de Curso) – Faculdade de Psicologia. São Paulo: PUC.
2003

WHITE, Timothy . Queimando Tudo: a biografia definitiva de Bob Marley. Rio de


Janeiro: Record, 1999.

Você também pode gostar