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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL

PRÓ-REITORIA ACADÊMICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

AS ESCOLAS MILITARES E A FORMAÇÃO DO SUJEITO


NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

MARGRID BURLIGA SAUER

Dissertação de Mestrado

Canoas, RS, 2017


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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL - ULBRA


PRÓ-REITORIA ACADÊMICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

AS ESCOLAS MILITARES E A FORMAÇÃO DO SUJEITO


NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

MARGRID BURLIGA SAUER

Dissertação de Mestrado apresentada ao


Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Luterana do Brasil – ULBRA –
como requisito parcial para a obtenção do
título de Mestre em Educação.

Orientadora: Prof.ª Dr. ª KARLA SARAIVA

Canoas, 2017
3

Para Miguel Sellitto,


meu amor, meu companheiro, meu incentivador.
4

AGRADECIMENTOS

À minha orientadora, Prof.ª Dr. ª Karla Saraiva, pelos ensinamentos, pelo incentivo, pelo
exemplo e por todas as contribuições durante esta trajetória, em especial nesta dissertação.

Meu muito obrigada às Professoras, Dr. ª Cristianne Famer Rocha, Dr. ª Iara Tatiana Bonin e
Dr. ª Bianca Salazar Guizzo, pelas contribuições, por terem aceito fazer parte da comissão
examinadora desta dissertação, por apontarem outros caminhos, pela cuidadosa revisão, pelas
sugestões.

Aos demais professores do Programa de Pós-Graduação em Educação da ULBRA, por me


conduzirem no caminho dos Estudos Culturais, que me ofereceu uma nova perspectiva de olhar
para a história. Com vocês, aprendi que nada é (de verdade) aquilo que parece ser. A vocês,
meu muito obrigada.

Aos meus colegas de Mestrado, pelas trocas, pelas contribuições, pelo companheirismo. Sem
vocês, este caminho não teria sido de tanta riqueza. Um agradecimento especial aos meus
colegas do Grupo de Estudos Foucaultiano, que sob a orientação da Prof.ª Dr. ª Karla Saraiva
fomos apresentados às teorizações de Michel Foucault.

Aos meus filhos, Giselle, Filipe e Henrique, à minha nora Caroline Scharlau e ao meu genro,
Cláudio Fonseca. Todos vocês sempre me apoiaram, me incentivaram e ficaram felizes com as
minhas conquistas. Para vocês, meus amores, dedico também essa dissertação. Obrigada por
me ouvirem, pelos longos papos e teorizações nos finais de semana e por trazerem ao mundo
meus netinhos, Rodrigo e Martin.

Agradeço aos meus pais, Haini Sauer (in memoriam) e Edith Burliga Sauer, por terem me dado
oportunidades de estudo que me possibilitaram seguir em frente.

Ao meu sócio, Alessander de Moraes Souto, por compreender todas as vezes que precisei me
ausentar e por sempre me incentivar a seguir em frente, meu muito obrigada.

Por fim, agradeço por esse ciclo de aprendizados, de construção e reconstrução da minha
própria vida, que se completa nesta dissertação.
5

Estamos todos no mesmo barco. Essa é a primeira


vez na história em que o mundo é realmente um
único país, em certo sentido. E não há reversão.
Logicamente, podemos tentar construir muros
impenetráveis ao redor do nosso lugar escolhido,
onde queremos ser felizes sozinhos, sem
compartilhar com os outros, mas essas são
tentativas fracassadas. Não darão certo a longo
prazo. O fato é que nós somos, agora,
interdependentes.
Zygmunt Bauman.
Falecido enquanto eu escrevia esta dissertação,
janeiro de 2017.
6

RESUMO

Esta dissertação de Mestrado tem como objetivo compreender a valorização da disciplina na formação
de jovens em tempos contemporâneos. Mais especificamente, proponho-me a pesquisar os motivos que
levam pais e mães de alunos a buscarem Escolas Militares para seus filhos e quais os significados que
atribuem à disciplina para sua formação. Em alguns dos estados brasileiros vem acontecendo um
processo de Militarização de Escolas públicas o que me leva a pensar na hipótese de que os processos
disciplinares, que passam pela docilidade do corpo, ainda encontram espaço na contemporaneidade. É
para este espaço ocupado pelas Escolas fortemente disciplinares, que pretendo voltar minha
investigação. Para realizar este trabalho, tomei como material de pesquisa entrevistas com pais e mães
de alunos que frequentam o Colégio Militar Tiradentes, localizado em Porto Alegre. Este Colégio é
mantido pelo Estado do Rio Grande do Sul e tem no seu comando a Brigada Militar. Escolho o Colégio
Tiradentes porque ele integra o sistema de ensino civil, diferente dos Colégios Militares do Exército,
que possuem um sistema próprio de regulação. Minha pesquisa ficou dividida em duas etapas, sendo a
primeira parte composta por entrevistas estruturadas, com pais e mães de alunos que estavam realizando
a prova de seleção para ingresso. Nesta etapa, levantei as motivações para a escolha do Colégio
Tiradentes. Também, nessa mesma etapa, solicitei autorização deles para realizar a segunda etapa, que
seria com pais e mães cujos filhos tivessem obtido aprovação. Na prova de seleção. Aqueles que
aceitaram participar da segunda etapa forneceram o telefone para contato. A segunda etapa da pesquisa
foi no final de 2016, um ano após a primeira etapa. Na segunda etapa, a entrevista foi semiestruturada e
realizada com cinco mães e teve como objetivo aprofundar as motivações para a escolha do Colégio
Tiradentes e dificuldades de adaptação ao sistema disciplinar. A partir desta pesquisa, consigo perceber
que uma instituição fortemente disciplinar, como o Colégio Tiradentes, ainda encontra espaço ativo na
contemporaneidade. O que leva estas famílias a optarem por um sistema fortemente disciplinar para
educar seus filhos ou filhas é a esperança de um bom desempenho no Exame Nacional de Ensino Médio-
ENEM, que permita a classificação em universidade pública de alta qualidade. O que me parece possível
poder afirmar é que os alunos e alunas do Colégio Tiradentes estão fazendo uma troca, deixando de
usufruir no tempo presente, liberdades típicas da juventude para investir em um resultado que virá em
tempo futuro e que poderá ser mais proveitoso.

Palavras-chave: disciplina; educação militar; estudos foucaultianos; heterotopia; norma.


7

ABSTRACT

This dissertation aims to understand the value of discipline in the formation of young people in
contemporary times. More specifically, I propose myself researching the reasons that lead parents of
students to seek military schools for their children and what the meanings they attribute to the discipline
for their education. In some of the Brazilian states, a process of Public School Militarization has been
taking place, which leads me to think about the hypothesis that disciplinary processes which rely on the
docility of the body, still find space in the contemporaneity. To this space, occupied by the strongly
disciplinary Schools, in which I intend to focus my investigation. To carry out this work, I took as
research material interviews with parents of students attending the Tiradentes Military School, located
in Porto Alegre. The institution is maintained by the State of Rio Grande do Sul and has at its command
the Brigada Militar. I have chosen the Tiradentes Military School because it integrates the civil education
system, different from Army Military Colleges, which have their own system of regulation. My research
was divided into two stages, the first part of which consisted of structured interviews with parents of
students who were taking the entrance selection test. At this stage, I raised the motivations for choosing
the Tiradentes College. Also, at this same stage, I asked for their authorization to carry out the second
stage, which would be with parents whose children had been approved in the selection test. Those who
agreed to participate in the second stage provided the phone to contact. The second stage of the research
was by the end of 2016, one year after the first stage. In the second stage, the interview was
semistructured and carried out with five mothers and aimed to deepen the motivations for choosing the
Tiradentes Military College and difficulties in adapting to the disciplinary system. From this research, I
can see that a strongly disciplinary institution, such as the Tiradentes Military College, still finds an
active space in the contemporary age. What drives these families to choose such a strongly disciplinary
system to educate their sons or daughters is the hope of a good performance in the ENEM, which allows
them to be classified in a high-quality public university. What I think it is possible to affirm is that the
students of the Tiradentes Military College are making an exchange, failing to enjoy, in the present time,
typical liberties of youth to invest in a result that will come in a future time and that could be more
profitable.

Keywords: discipline; military education; foucaultian studies; heterotopy; norm.


8

Lista de Figuras

Figura 1 - Instituições de Ensino sob o comando da PM/Estado .......................................................... 15


Figura 2 - Uniforme de Gala ................................................................................................................ 27
Figura 3 - Uniforme diário de inverno .................................................................................................. 29
Figura 4 - Uniforme de Educação Física .............................................................................................. 31
Figura 5 - Alamar na cor azul ............................................................................................................... 33
Figura 6 - Medalha de Honra ao Mérito Escolar .................................................................................. 35
Figura 7 - Medalha de Mérito Escolar .................................................................................................. 35
Figura 8 - Medalha de Mérito Disciplinar ............................................................................................ 36
Figura 9 - Medalha de Mérito Cultural ................................................................................................. 36
Figura 10 - Medalha de Mérito Esportivo ............................................................................................ 37
Figura 11 - O uso das Medalhas ........................................................................................................... 37
Figura 12 - O crescimento das escolas militares em todo o país ........................................................... 39
Figura 13 - A expansão do Ensino Militar no RS ................................................................................. 40
Figura 14 - Presença, ou não, de Militar na família .............................................................................. 59
Figura 15 - Gênero do/da adolescente que realizava a prova de seleção .............................................. 60
Figura 16 - Idade do/da adolescente que realizava a prova de seleção ................................................. 60
Figura 17 - Rede de ensino de origem .................................................................................................. 61
Figura 18 - De quem foi a decisão pelo Colégio Tiradentes ................................................................. 61
Figura 19 - Dificuldade de adaptação no Colégio Tiradentes ............................................................... 62
Figura 20 - Cerimônia de troca de boinas ............................................................................................. 71
9

Lista de Tabelas

Tabela 1 - Motivos para a escolha do Colégio Tiradentes – múltipla escolha ...................................... 62


Tabela 2 - Tipo de dificuldades que os filhos e filhas podem encontrar: .............................................. 63
Tabela 3 - Cruzamento de dados segundo a presença ou não de Militar na família: ............................. 63
Tabela 4 - Escolas gaúchas com melhor desempenho no ENEM (2015) .............................................. 79
Tabela 5 - Escolas públicas gaúchas com melhor desempenho no ENEM (2015) ................................ 80
10

Lista de Quadros

Quadro 1- Roteiro da entrevista semiestruturada.................................................................................. 69


Quadro 2 - Organização da discussão do capítulo ................................................................................ 82
11

SUMÁRIO
1. INTERESSE SOBRE O TEMA ............................................................................................. 13

1.1 – Contornos da pesquisa ....................................................................................................... 16

1.2 – O Colégio Tiradentes......................................................................................................... 17

1.2 – Estrutura do trabalho ......................................................................................................... 19

2. HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO MILITAR NO BRASIL ...................................................... 20

2.1 – Colégios das Polícias Militares.......................................................................................... 21

2.1.1 – O Colégio Tiradentes da Brigada Militar - CTBM ......................................................... 22

2.1.2 – Uniformes e regras de uso .............................................................................................. 24

2.1.3 – Sistemas de Punição e Premiação ................................................................................... 32

2.2 – O processo de militarização de escolas públicas ............................................................... 38

3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................................................. 42

3.1 – Artigos relacionados ao tema ............................................................................................ 42

3.2 – Dissertações relacionadas ao tema..................................................................................... 44

4. MINHA CAIXA DE FERRAMENTAS................................................................................. 46

4.1 – Fabricando Corpos Dóceis ................................................................................................ 46

4.2 – Escola moderna - uma instituição disciplinar .................................................................... 49

4.3 – Escola Contemporânea – o fim da disciplina? ................................................................... 53

4.4 – Um conceito importante: válidos e falhos ......................................................................... 54

5. MAPEANDO O CAMINHO PERCORRIDO........................................................................ 57

5.1 – A escolha pela entrevista estruturada e a questão ética ...................................................... 57

5.2 – Caracterização do público selecionado na primeira etapa.................................................. 59

5.3 – O mundo lá fora e a disciplina ........................................................................................... 64

5.4 – Desempenho no vestibular como passaporte para o futuro ................................................ 65

6. ANALISANDO AS ENTREVISTAS .................................................................................... 68

6.1 – Definindo as categorias de análise ..................................................................................... 69

6.2 – O mundo lá fora ................................................................................................................ 70

6.3 – Disciplina para a vida ........................................................................................................ 75


12

6.4 – Desempenho no vestibular como passaporte para o futuro ................................................ 77

7. REVENDO O CAMINHO PERCORRIDO ........................................................................... 84

REFERÊNCIAS ......................................................................................................................... 89

APÊNDICE A - entrevista estruturada ....................................................................................... 95

ANEXO A – termo de consentimento livre e esclarecido ......................................................... 97


13

1. INTERESSE SOBRE O TEMA

O soldado é antes de tudo alguém que se reconhece de longe; que leva os sinais
naturais de seu vigor e coragem, as marcas também de seu orgulho: seu corpo
é o brasão de sua valentia
(Michel Foucault, 2007, p.117)

A escolha do meu tema de pesquisa se deu a partir de um acaso: certo dia, quando
passava em frente ao Colégio Militar de Porto Alegre, observei jovens estudantes adolescentes
ostentando uniformes militares. Meninas com cabelo preso, meia calça branca, saia e boina e
meninos com cabelos bem curto, calça comprida, todos impecavelmente arrumados. Em outros
tempos, essa cena cotidiana não teria chamado a minha atenção, mas desta vez, já como aluna
do Mestrado em Educação da Universidade Luterana do Brasil, meu olhar não foi o mesmo e
passei a refletir sobre como aquela educação se encaixaria no mundo atual e que atrativo teria
para aqueles jovens.
A cena já tinha me surpreendido em outros momentos, pois como não sou natural de
Porto Alegre, e a cidade onde nasci e vivi parte da minha vida não tem quartel, nem colégios
de ordem militar, confesso que tinha total ignorância sobre o assunto. Mesmo tendo me
surpreendido em outros momentos, nunca havia me ocorrido qualquer divagação a respeito do
assunto. Apenas achava curiosa tanta imponência. Porém, neste curso de mestrado, fui
apresentada a autores que mudaram a perspectiva sob a qual olho o mundo, e sob a qual olhei
para aqueles jovens. As leituras, as discussões em aula, a dedicação de meus professores e em
especial as leituras que tenho feito da obra de Michel Foucault, para os nossos encontros de
orientação, me permitiram outro olhar para aquela cena. De acordo com as teorizações desse
autor, a disciplina “esquadrinha, desarticula e recompõe o corpo humano, num mecanismo que
o torna tanto mais obediente, quanto mais útil, e inversamente. Temos nessa relação a
fabricação de corpos dóceis”. E foram estes corpos “dóceis” que observei, pela primeira vez,
naqueles alunos (FOUCAULT, 2007, p. 119).
Esta inquietação e a expressão “corpos dóceis” me acompanharam por alguns dias. Era
o encontro da teoria com a prática, e só conseguia pensar que estava diante de um tema
interessante para pesquisa. Fui, então, investigar um pouco mais sobre os Colégios Militares.
Inicialmente, imaginei que restavam poucas instituições de ensino com orientação militar em
todo o Brasil. Porém, deparei-me com um cenário completamente diferente e com um ativo
movimento de militarização de escolas estaduais em diferentes estados do Brasil. Reportagens
14

de jornais, disponíveis on-line, demonstrando que este é um processo atual, aumentaram a


minha curiosidade sobre o assunto.
Embora este processo de militarização de escolas públicas não seja foco da minha
pesquisa, as reportagens encontradas foram despertando minha curiosidade sobre o papel que a
disciplina ocupa na sociedade atual. Destaco aqui algumas destas reportagens, a começar pela
página da ANPED (Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação), de agosto
de 2015, trazendo o seguinte título: Militarização das Escolas públicas – solução? A matéria,
que se posiciona contra esta tendência, destaca que a militarização de escolas públicas aparece
como uma resposta à crescente violência no ambiente estudantil contra professores, servidores
ou até mesmo entre os próprios alunos, além de relatos de tráfico de drogas na comunidade
escolar.
Em outro documento on-line, encontrei a 3ª Nota Pública do Fórum Estadual de
Educação de Goiás-FEE, (30/07/2015), manifestando-se contrariamente à tendência de
militarização das escolas estaduais naquele Estado. A nota ressalta que é “atribuição do
Governo de Goiás oferecer e assegurar as condições efetivas de uma educação escolar pública
em sua rede e não transferir a responsabilidade para a Polícia Militar (...)”. A meta do governo
goiano era chegar ao final do ano de 2015 com 26 escolas estaduais sob o comando da Polícia
Militar. A meta foi alcançada antes do final de 2015. Goiás é o Estado com maior número de
escolas militarizadas no país. No capítulo 2, retomo essa militarização de escolas públicas com
mais detalhamento.
O Brasil tem dois tipos de ensino militar: os Colégios Militares do Exército, que são
colégios federais, cuja gestão é feita pelo Exército Brasileiro, e os Colégios Militares da Polícia
Militar, que são colégios estaduais e a gestão é feita pela Polícia Militar (PM) dos Estados. Já
as escolas militarizadas, categoria da qual trata esse capítulo, são escolas estaduais de ensino
civil, que passam a ser comandadas pela Polícia Militar estadual, com o objetivo de conter a
crescente onda de violência no interior dessas instituições de ensino. Essas escolas geralmente
estão localizadas nas periferias das grandes cidades, em áreas de maior pobreza. O Brasil tem
hoje 93 escolas sob o comando da Polícia Militar, considerando-se as escolas militarizadas
(antigas escolas estaduais de ensino civil) e as escolas que já nasceram sob o comando da Polícia
Militar.
A Figura 1 apresenta como se distribuíam em 2014, por Estado, os Colégios sob o
comando da Polícia Militar:
15

Figura 1 - Instituições de Ensino sob o comando da PM/Estado

30

25

20

15

10

0
GO MG BA RS AMMA TO RO SC CE PI PE PR PB MT DF RR AL ES AP AC SP SE RJ RN MS PA
Fonte: Censo Escolar de 2014

No site do jornal O Tempo, de Belo Horizonte (26/10/2015), há uma reportagem sobre


a rotina de uma dessas Escolas Militares:

O relógio marca exatamente 7h15 de uma terça-feira ensolarada quando o


toque ritmado da corneta rompe o silêncio no enorme pátio (...). Enfileirados,
mais de 700 alunos, entre 10 e 18 anos, acompanham, com corpos fixos,
cabeças erguidas, o hasteamento da bandeira (...).

O excerto desta matéria me faz pensar no que escreve Foucault (2007) “a disciplina é
uma anatomia política do detalhe”. Segundo o autor, os processos disciplinares tiveram seu
espaço nos conventos, nos Exércitos e nas oficinas, mas foi a partir dos séculos XVII e XVIII
que se tornaram fórmulas gerais de dominação. Este processo de dominação, de controle
minucioso do corpo, que acaba por lhe impor uma relação de docilidade-utilidade, o autor
chama de disciplina (FOUCAULT, 2007, p. 118). No capítulo 4, retomo e aprofundo as
questões disciplinares.
Os atuais processos de militarização de escolas públicas, em diferentes Estados do
Brasil, levam-me a pensar na hipótese de que os processos disciplinares, que passam pela
docilidade do corpo, ainda encontram espaço na contemporaneidade. É para este espaço
ocupado pelas escolas fortemente disciplinares que pretendo voltar minha investigação. Meu
objetivo é investigar que valor tem a disciplina na formação de jovens em tempos
contemporâneos, segundo seus responsáveis. E mais especificamente, quais são os motivos que
levam pais e mães a buscarem um Colégio Militar, como o Tiradentes, para matricularem seus
16

filhos e filhas. E ainda, quais são os significados que estes pais e mães atribuem à disciplina
para a formação desses jovens?
Assumo aqui o pressuposto de pesquisa de que a disciplina nos colégios sob o comando
da Polícia Militar funciona de modo mais rígido do que nas demais escolas públicas.

1.1 – Contornos da pesquisa

Para compor o corpus desta pesquisa, escolhi o Colégio Tiradentes de Porto


Alegre/RS, que pertence a Policia Militar do RS e oferece formação de ensino médio. O Colégio
Tiradentes é mantido pela Secretaria de Segurança Pública do Estado e sua administração é
exercida por oficiais superiores, auxiliados por um efetivo militar especialmente designado pelo
comando da Brigada Militar1. A coordenação pedagógica e os professores pertencem aos
quadros da Brigada Militar e da Secretaria de Educação. Esta diferença é central entre os
Colégios Militares do Exército e os Colégios Militares da Brigada Militar. No Capítulo 2,
aprofundo um pouco mais a diferença entre estes dois sistemas de ensino.
A pesquisa no Colégio Tiradentes foi desenvolvida em duas etapas. A primeira
consistiu na realização de entrevistas estruturadas (Anexo A) com pais e mães de 41 alunos que
fizeram a prova de seleção para ingresso no Colégio Tiradentes, em novembro de 2015. Discuto
os resultados no capítulo 5. A segunda etapa desta pesquisa previu a realização de entrevistas
semiestruturadas com pais e mães que participaram da primeira etapa da pesquisa e
manifestaram o desejo de participar da segunda etapa.
Para realizar a pesquisa, foi necessária a autorização da Direção do Colégio Tiradentes.
Visando obtê-la, agendei uma reunião com o Diretor do Departamento de Ensino da Brigada
Militar. Além dele, participou o Diretor do Colégio Tiradentes. A reunião ocorreu nas
dependências do Departamento de Ensino da Brigada Militar, no dia 17 de novembro de 2015,
às 14 horas.
A reunião, que tinha por objetivo obter a autorização para a pesquisa com pais e mães
de alunos matriculados no Colégio, acabou por resultar numa longa conversa, com mais de duas

1
No Rio Grande do Sul a Polícia Militar é chamada de Brigada Militar, nome que a Força Policial do Estado do
RS assumiu em 1892. Ao longo de sua história, a Brigada Militar – BM tem diferentes objetivos, e, por
consequência, diferentes nomes. A partir de 1932 é que a BM assume a tarefa de fazer a segurança pública na
capital do RS. Em 1967 passa também a fazer o policiamento ostensivo de todo o Estado, assumindo a função de
Polícia Militar, porém permanecendo com o nome adotado em 1892.
17

horas de duração. Durante esse tempo, foi possível fazer várias observações, ainda que estas
não estivessem no escopo inicial. Na próxima seção, apresento os dados produzidos nesta
conversa com a direção da Escola.

1.2 – O Colégio Tiradentes

Esta seção foi elaborada com as informações obtidas na conversa com a Direção, já
mencionada. De acordo com os diretores, o Colégio Tiradentes teve início na década de 1980,
tendo por objetivo principal suprir uma necessidade da corporação para com a formação de
jovens para a carreira militar. Ainda segundo os diretores, este propósito já não existe mais.
Hoje, o Colégio tem como objetivo a formação de “cidadãos”, “bons profissionais” e “pais de
família”.
Também fui informada de que a busca por vagas no Colégio Tiradentes tem aumentado
nos últimos anos. Em média, são de 500 a 600 inscritos para noventa vagas do ensino médio.
São ofertadas trinta vagas para filhos de policiais militares e sessenta vagas para a comunidade
em geral. Este aumento pela procura de vagas vem acontecendo gradualmente. O quadro
docente é formado por professores da rede estadual de ensino, subordinados à Secretaria de
Educação do Estado.
O Colégio Tiradentes oferece estudo aliado à “hierarquia e disciplina”, conforme me
diz o Diretor. Ele acredita que a procura pelo Colégio esteja embasada em diferentes fatores,
sendo o principal deles a busca pelo ingresso na Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), pois o Colégio Tiradentes tem tido bons índices de desempenho no Exame Nacional
do Ensino Médio (ENEM). Ele ainda comenta que alguns pais fazem vista grossa para a
questão disciplinar para que filhos ou filhas tenham o que consideram uma boa formação. Outro
fator citado por ele é a segurança, relacionada com a tranquilidade de pais e mães por manterem
seus filhos e filhas longe do perigo das drogas. Os pais acreditam que dentro do Colégio seus
filhos estão seguros e a companhia dos colegas é boa. O diretor do Colégio e o diretor do
Departamento de Ensino comentam a expulsão de um dos alunos, por ter sido pego fumando
um cigarro de maconha nas dependências do Colégio.
Pergunto se os adolescentes têm problemas de adaptação. Segundo os Diretores, o
aluno tem três meses de adaptação. Caso não consiga se adaptar, pode solicitar transferência
para outras escolas estaduais. Dizem não haver muitos casos de falta de adaptação, pois as
18

regras e a proposta pedagógica do Colégio são claras e a família é que tem que perceber se o
filho ou filha tem o perfil de comportamento requerido pelo Colégio.
Os alunos que passam pelo período de adaptação, que visa o uso correto do uniforme,
o cumprimento das normas que regem o Colégio Tiradentes da Brigada Militar, a realização de
atividades extraclasse de rotina como formaturas diárias e formaturas gerais, participam da
solenidade da troca de boina. Segundo o que está descrito no site do Colégio, a troca de boina,
que inicialmente é na cor marrom claro, passa a ser de cor azul, significando a incorporação do
aluno às fileiras do Colégio Tiradentes da Brigada Militar, conforme descrito a seguir:

A boina une o jovem de hoje, idealista e esperançoso à Brigada Militar,


baluarte das tradições de honra do povo gaúcho e de patriotismo ao nosso país.
É símbolo de amizade, de respeito, de camaradagem, de civismo, de espírito
de corpo e de disciplina. É nela que os dedos do jovem, unidos e perfilados,
tocam para, na continência orgulhosa, reverenciar os símbolos nacionais e
saudar os chefes, os professores e os amigos, na manifestação mais pura de
patriotismo.2

Após nossa conversa inicial, solicitei aos diretores autorização para realizar a
entrevista com pais e mães. Neste momento, os diretores sugerem que eu entreviste os pais e as
mães no dia da seleção para ingresso no Tiradentes, que ocorrerá no final se semana seguinte à
entrevista. Segundo me relatam, os pais e as mães ficam aguardando no pátio do Colégio os
filhos e as filhas realizem a prova. Aceito a sugestão, uma vez que teria a oportunidade de
conversar com vários pais e mães em uma única ocasião, tendo em vista que todos estariam na
mesma condição, a de postulantes a uma vaga no Tiradentes.
Uma vez que me foi dada a oportunidade de conversar com os diretores do Colégio
Tiradentes, aproveitei a oportunidade para fazer o registro de algumas de suas falas a respeito
do Colégio Militar.

- Mais do que educar, o objetivo é formar bons cidadãos;


- Aqui aprendem a manter sua farda em dia, cabelo cortado, que um banho
por dia e barba feita não faz mal a ninguém;
- É bonito de ver aquele jovem que chega aqui civil e dentro de alguns meses
percebe-se a mudança no corpo, na postura dele;
- Alguns pais voltam aqui para contar como o filho/filha se modificou que
agora arruma a cama, o quarto, cuida das suas coisas;
- Ontem, infelizmente, tivemos uma reunião para tratar da expulsão de um
aluno que foi pego fumando maconha. Chamamos o pai e informamos que
ele não terá sua matrícula renovada. Não podemos deixar que ele fique aqui
e influencie os demais. O pai entendeu;

2
Cerimônia de TROCA DE BOINAS. Disponível no site do Colégio Tiradentes da brigada Militar.
19

- Não somos um reformatório, sabemos que eles são jovens, que querem
namorar, e isso aqui é permitido. Não pensa que não temos jovens
homossexuais e todos aqui são tratados com respeito.

As falas ilustram o caráter fortemente disciplinar do Colégio escolhido para a pesquisa.


Na próxima seção, apresento a estrutura do trabalho, detalhando um pouco mais cada um dos
capítulos desenvolvidos nesse projeto.

1.2 – Estrutura do trabalho

Além da Introdução, a dissertação se estruturou em mais seis capítulos.


No capítulo 2, segue um histórico da educação militar no país, apontando as diferenças
entre os Colégios Militares do Exército e os Colégios da Polícia Militar. No capítulo 3,
apresento a revisão bibliográfica, com artigos e dissertações que contribuem com as análises
pretendidas; no capítulo 4, apresento algumas teorizações que alinham esta pesquisa com o
campo dos Estudos Culturais, principalmente com as teorizações de Michel Foucault, nas
questões relacionadas à disciplina, heterotopia, governamentalidade e norma. O capítulo 5 traz
os resultados da primeira etapa da pesquisa e aprofunda as questões metodológicas das duas
etapas que vão compor esta pesquisa. O capítulo 7 encerra esta dissertação com as
considerações finais.
Esta pesquisa não tem a intenção de traçar um juízo de valor acerca da educação
militar, mas sim entender que lugar ocupa a disciplina na vida dos estudantes do Colégio
Tiradentes, segundo seus responsáveis, articulando os conceitos de disciplina e norma com as
práticas que constituem os sujeitos contemporâneos.
20

2. HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO MILITAR NO BRASIL

A disciplina fabrica indivíduos; ela é a técnica específica de um poder que


toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos de
seu exercício. (FOUCAULT, 2007, p.143)

Os Colégios Militares no Brasil têm seu início no final do Segundo Império, com a
criação do Imperial Colégio Militar no Rio de Janeiro, em 1889. Antes deste período, as Escolas
Militares estavam destinadas somente à formação de quadros para o Exército. A criação do
Imperial Colégio Militar (atual Colégio Militar do Rio de Janeiro, que faz parte do Sistema de
Colégios Militares do Brasil - SCMB), visava garantir aos filhos de Militares uma educação
secundária respaldada pelo Estado (LUCHETTI apud NOGUEIRA, 2014).
Em 1912, foram criados os Colégios Militares de Porto Alegre/RS e de Barbacena/MG
e, posteriormente, o Colégio Militar do Ceará (1919). Por razões políticas, estes Colégios
funcionaram por poucos anos e, a partir de 1925, foram sendo extintos, restando apenas o
Colégio Militar do Rio de Janeiro. Ao longo do tempo, os Colégios Militares recuperaram sua
importância, reativando-se os Colégios fechados e surgindo novos Colégios (BRASIL,
MINISTÉRIO DA DEFESA, 2016).
Segundo Nogueira (2014), a instituição Exército Brasileiro sempre viu na educação
uma oportunidade de estreitar laços com a sociedade civil, buscando diminuir as barreiras
historicamente existentes entre Militares e civis. Sob esta perspectiva, a educação Militar exerce
a função de preparar seus alunos, tanto para as carreiras Militares, quando para o exercício das
diversas profissões e funções públicas civis.
O sistema de Ensino Militar Federal se subordina às normas e prescrições do sistema
de Ensino do Exército e, ao mesmo tempo, obedece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional-LDBEN (BRASIL, 1996). Hoje, são doze os Colégios Militares no Brasil, a saber:
Colégio Militar do Rio de Janeiro, Colégio Militar de Porto Alegre, Colégio Militar de
Fortaleza, Colégio Militar de Manaus, Colégio Militar de Brasília, Colégio Militar de Recife,
Colégio Militar de Salvador, Colégio Militar de Belo Horizonte, Colégio Militar de Curitiba,
Colégio Militar de Juiz de Fora, Colégio Militar de Campo Grande e Colégio Militar de Santa
Maria.
Além dos Colégios Militares do Exército, que possuem um sistema próprio de
regulação, existem os Colégios das Polícias Militares - PM dos Estados e do Distrito Federal,
no Rio Grande do Sul, também chamado de Colégio da Brigada Militar. Esses Colégios
21

integram o sistema de ensino civil. Na próxima seção, apresento a diferença entre os dois
sistemas de ensino.
O Colégio Militar do Rio Grande do Sul, localizado em Porto Alegre, tem seu início
em 1851 como “Escola Militar de Porto Alegre”, destinado à formação de oficiais. Esse foi o
primeiro estabelecimento de ensino militar no Brasil e o primeiro de ensino superior no Estado.
A atual denominação “Colégio Militar de Porto Alegre”, vem com o decreto presidencial, em
22 de março de 1912, data em que o Colégio passa a ter como objetivo a formação do ensino
médio e não mais a formação de oficiais. O Colégio passa por algumas reformulações ao longo
dos anos e em 1939 passou a se chamar “Escola Preparatória de Porto Alegre”, destinada à
formação de cadetes, tendo em vista a II Guerra Mundial. No ano do cinquentenário de sua
fundação (1962), volta a se chamar “Colégio Militar de Porto Alegre”, denominação que
mantém até hoje (ROCHA, 2007).

2.1 – Colégios das Polícias Militares

A diferenciação entre o sistema de ensino do Exército e da Polícia Militar teve início


com a promulgação da Constituição Federal - CF de 1988, que no art. 144, § 6º, dispõe que as
“Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, Forças Auxiliares e Reserva do Exército,
subordinam-se, juntamente com as Polícias Civis, aos Governadores dos Estados e do Distrito
Federal, desvinculando estas Polícias do Exército Nacional, ao qual estavam subordinadas até
então, conforme art. 26, do Decreto Presidencial nº 88.777/1983” (SANTANA, 2014, p.37).
Em 2008, uma nova alteração foi feita quando a Câmara de Educação Básica (CEB)
reorganizou a educação profissional técnica de nível médio por eixos tecnológicos, incluindo o
eixo Militar como uma das modalidades de educação profissional no país. Essa alteração
contribui para a ampliação das escolas militares nos Estados. “Embora guardem algumas
diferenças entre si, conforme particularidades de cada unidade da federação, a formatação do
sistema de ensino Militar no âmbito estadual normalmente está vinculada a uma Secretaria de
Segurança Pública, sendo atribuição do poder executivo emanar diretrizes para seu
funcionamento” (SANTANA, 2014, P.33). No Rio Grande do Sul, esse sistema de ensino teve
início nos anos 1980. Na próxima seção, apresento como se configura atualmente a educação
militar nesse Estado.
22

2.1.1 – O Colégio Tiradentes da Brigada Militar - CTBM

No Rio Grande do Sul, os Colégios Militares da Brigada Militar fazem parte do Centro
de Ensino Médio Tiradentes, criado através do Decreto nº 29.502, publicado em Diário Oficial
do Estado (DOE) nº 130 de 25 de janeiro 1980, então com a denominação de Escola Estadual
de 2º Grau da Brigada Militar, passando a ter a denominação atual no ano de 2000. A Rede
Estadual de Ensino Militar inclui sete estabelecimentos de ensino, localizados nas seguintes
cidades: Porto Alegre, Passo Fundo, Santo Ângelo, São Gabriel, Pelotas, Santa Maria e Ijuí.
O foco desta pesquisa é o Colégio Tiradentes de Porto Alegre. O Colégio é mantido
pela Secretaria de Segurança Pública e sua administração é exercida por oficiais superiores,
auxiliados por um efetivo militar especialmente designado pelo Comando da Brigada Militar.
A coordenação pedagógica e os professores pertencem aos quadros da Brigada Militar e da
Secretaria de Educação. As unidades do departamento de ensino têm oficiais e praças da
Brigada Militar na Direção Administrativa.
O ensino médio regular, ministrado pelo Colégio Tiradentes da Brigada Militar,
destina-se à comunidade em geral e aos dependentes de policiais militares, com a destinação de
trinta das noventa vagas existentes para este público, pois um de seus objetivos contempla a
garantia de oferta educacional de qualidade aos dependentes de policiais militares. A seleção
para ingresso no Colégio Tiradentes é realizada por exame intelectual constituído por uma
prova escrita com 25 questões de língua portuguesa e 25 questões de matemática, referentes a
conteúdos curriculares do ensino fundamental. Os classificados no exame intelectual passam
por um exame de saúde e, posteriormente, por um exame físico, conforme critérios descritos
no edital de seleção, disponível no site do Colégio.
O exame básico de saúde é composto por um eletrocardiograma - ECG em repouso e
pela ficha médica, devidamente preenchida, datada e assinada pelos responsáveis legais e pelo
médico cardiologista que realizou o exame. Os documentos são enviados à junta médica da
Brigada Militar para análise e confecção da ata médica quanto ao parecer do candidato estar
apto ou inapto para ingresso no Colégio Tiradentes da Brigada Militar - CTBM.
Estando apto para ingresso, o candidato passa para o exame físico, que segundo dados
disponíveis no site do Colégio Tiradentes3, é composto por:

3
Maiores informações estão disponíveis no site do Colégio Tiradentes da Brigada Militar.
23

corrida para testagem de resistência aeróbica: será exigida no tempo


cronometrado de 12 minutos, a realização do percurso de 1.600 metros para
as meninas e 2000 metros para os meninos;

abdominais: será exigida, no tempo de um minuto, a realização de 25 flexões


abdominais para as meninas e de 30 para os meninos; e

apoio e exercício de braço: flexões frente sobre o solo. Será exigida a


realização de oito apoios para as meninas e de 12 para os meninos.

Os exames físicos exigidos nos Colégios Militares limitam o ingresso de alunos com
problemas físicos ou mentais, ou acima do peso. No caso do Colégio Tiradentes, essas barreiras
de entrada encontram apoio legal na legislação estadual – Lei nº 12.349, de 26 de outubro de
2005 que, em seu artigo primeiro, instituiu o ensino médio na Brigada Militar “de forma
preparatória para o ingresso na carreira de policial militar”.
Passada a etapa de ingresso no Colégio Tiradentes, os estudantes admitidos são
apresentados aos valores que orientam a formação dos alunos na instituição, a saber4:

Visão:
Ser referência como instituição pública de excelência na Educação de Ensino
Médio; promover o desenvolvimento pessoal e intelectual do aluno
Tiradentes.

Missão:
Promover a formação integral de jovens através da disciplina, da hierarquia e
do ensino qualificado, de acordo com as exigências de seu tempo.

Princípios:
Ética; disciplina; moral; cidadania; excelência intelectual e disciplinar;
solidariedade; responsabilidade; respeito; liderança; autonomia.

Como valores que orientam o processo educativo dos adolescentes, o Colégio destaca
os princípios da cidadania, solidariedade, respeito, liderança, autonomia, hierarquia e
disciplina. Na proposta pedagógica, lê-se que a ação educativa prioriza a disciplina, a iniciativa,
o respeito e a consciência cidadã, valorizando os talentos do educando nas atividades artísticas,
culturais e esportivas.

4
Missão, visão e princípios estão disponíveis no site do Colégio Tiradentes da Brigada Militar.
24

O Colégio funciona em turno integral, de segunda a sexta, e alguns sábados letivos


pela manhã. Segundo o que consta no site do Colégio, há monitoramento com vídeo para
acompanhamento da vida escolar dos alunos e da segurança escolar e também dispõe de
transporte com ônibus próprio para atividades pedagógicas diversas. Destacam no site que há
um incentivo à participação efetiva em diversos projetos sociais e promoção de atividades
socioculturais. Outro ponto a destacado no site do Colégio Tiradentes é a qualificação docente.
Segundo dados ali encontrados, os professores participam de um processo de educação
continuada, com o objetivo de melhorarem sua qualificação e, desta forma, prepararem melhor
os alunos para os principais concursos vestibulares, incluindo o ENEM e o Programa de
Ingresso ao Ensino Superior (PEIES). O Colégio oferece ainda aulas de línguas estrangeiras
(inglês, espanhol e/ou japonês), aulas de reforço, a partir do 2º trimestre, aos alunos com média
trimestral inferior a sete, além de plantões para esclarecimento de dúvidas.

2.1.2 – Uniformes e regras de uso

A seguir, apresento os uniformes e o regramento para o uso. Apesar de ser uma leitura
um pouco mais longa, penso ser importante, pois mostra o quão no detalhe a escola leva a
necessidade de homogeneizar a aparência e a apresentação de seus alunos.
Após a análise das regras do uso do uniforme, apresento e discuto o sistema de punição
e premiação como mais um aspecto do exercício da disciplina no Colégio Tiradentes. Pois, “na
essência de todo o sistema disciplinar, funciona sempre um pequeno mecanismo penal”
(FOUCAULT, p. 149). As micropenalidades adotadas nos sistemas disciplinares podem ser por
atraso, por falta, por interrupção das atividades, por fala inadequada, pela maneira de se portar,
pela maneira de se vestir, entre tantas outras que aqui poderiam ser exemplificadas
(FOUCAULT, 2007). No bojo desse mecanismo de sanção está a premiação, que é o destaque
para aqueles que se enquadram na norma vigente e não incorrem nas falhas passíveis de
micropenalidades. No Colégio Tiradentes, os alunos que se destacam por atingir os objetivos
da instituição e por não incorrerem em falhas puníveis, são condecorados com medalhas e
alamares5 e podem até assumir o posto de comando da turma, como demonstrarei mais adiante.

5
Alamares são adornos que guarnece uniformes militares de gala, feito de cordão trançado de seda, lã ou metal
com alças.
25

Num sistema disciplinar, o detalhe faz toda a diferença. É no detalhe que a disciplina
opera. Segundo Foucault (2007, p. 118) “é dócil um corpo que pode ser submetido e
transformado”. Escreve ainda esse autor:

É nessa grande tradição da eminência do detalhe que viriam se localizar, sem


dificuldade, todas as meticulosidades da educação cristã, da pedagogia escolar
ou militar, de todas as formas, finalmente, de treinamento. (FOUCAULT,
2007, p.120).

Um importante exemplo da meticulosidade do detalhe das regras de conduta exigidas


pelo Colégio Tiradentes está no uniforme. Os cuidados e exigências quanto a uniformes foram
falas recorrentes ao longo da pesquisa. O correto uso dos diversos tipos de uniforme exige que
o aluno esteja familiarizado com o regulamento escolar. No total, são seis diferentes uniformes,
sendo três de uso obrigatório para todos os alunos e três de uso exclusivo para os alunos
matriculados em atividades extracurriculares (natação, equitação diário, equitação gala). Além
de serem seis uniformes, há também as vestimentas específicas para meninos e meninas, além
das composições de verão e inverno.
Os uniformes obrigatórios do Colégio Tiradentes são três: o uniforme de gala (CT1),
o uniforme diário (CT2) e o uniforme de educação física (CT3). A posse dos uniformes de gala,
diário e de educação física é obrigatória para todos os alunos regularmente matriculados. A
seguir, apresento os principais detalhes dos uniformes, sem esgotar a descrição. O que segue
foi baseado em material disponível no site do Colégio Tiradentes, na sessão relativa ao
regulamento de uniformes.
Inicio pelo uniforme de gala. Seu uso ocorre em recepções de gala ou sociais, em
desfiles, solenidades, formaturas e representações ou seguindo orientações do Comando do
Colégio.
O uniforme de gala é composto pelos seguintes itens comuns a meninos e meninas:
 boina na cor azul-marinho CTBM com insígnia do Brasão do CTBM;
 túnica confeccionada em tecido branco, com extremidades das lapelas
confeccionadas em azul-marinho CTBM, e afixado à seis centímetros da
costura do ombro do braço esquerdo, o Brasão do CTBM e, a quinze
centímetros a partir do inicio do punho do braço direito, o símbolo bordado da
Brigada Militar (centauro);
26

 camiseta branca com gola olímpica e brasão do CTBM afixado no peito do


lado esquerdo (mangas curtas ou longas), contendo a dois centímetros abaixo
desse Brasão, o nome de guerra do aluno (a), em letras maiúsculas (tamanho
24, fonte Arial), em cor azul-marinho CTBM, devendo ser usada sob a túnica
branca;
 barrotes dourados, referentes ao ano em que o (a) aluno (a) está matriculado
(a), afixados na extremidade azul-marinho CTBM da lapela esquerda, e na
lapela direita, afixada na extremidade azul-escuro CTBM, a Torre dourada
símbolo das Escolas Militares;
 cinto cinza CTBM com fivela, niquelada, contendo em sua face externa o
“Castelo” em alto relevo; e
 luvas na cor branca CTBM.

O uniforme de gala inclui os seguintes itens exclusivos para meninos:


 calça azul-marinho CTBM, com listra vertical de 1,5 centímetro nas laterais
em cetim azul-marinho CTBM, devendo ser usada com o cós posicionado a
três centímetros abaixo do umbigo com bainha na altura do salto do sapato; e
 sapato preto, em couro, tipo social com cadarço, sem adereços.

O uniforme de gala inclui os seguintes itens exclusivos para meninas:


 saia-envelope confeccionada em tecido azul-marinho CTBM, devendo ser
posicionada com o cós a três centímetros abaixo do umbigo, e com bainha a
dois dedos abaixo dos joelhos;
 meia-calça branca, lisa (fio 15 no verão e até fio 80 no inverno); e
 sapato tipo colegial, na cor preta, em couro, salto até 3 cm, sem detalhes e
adereços;

A Figura 2 ilustra o uniforme de gala para meninas e meninos.
27

Figura 2 - Uniforme de Gala

Fonte: Site Colégio Tiradentes

Já o uniforme diário possui duas versões, uma em manga longa e outra em manga
curta, respectivamente para inverno e verão. Seu uso ocorre em deslocamentos, representações
e atividades internas do Colégio. Excepcionalmente, em dias de temperatura muito elevada, e
mediante ordem expressa do Comandante do Corpo de Alunos, os discentes poderão participar
das atividades do Corpo de Alunos (CAL) e de sala de aula sem a camisa azul-claro, desde que
estejam com a camiseta branca regulamentar.
O uniforme diário de inverno é composto pelos seguintes itens comuns a meninos e
meninas:
 boina na cor azul-marinho CTBM com insígnia do Brasão do CTBM;
 camisa azul-claro CTBM, lapelas azul-marinho CTBM, manga longa, com
listra de dois centímetros na cor azul-marinho CTBM nas mangas, com brasão
do CTBM posicionado no centro do bolso esquerdo;
 camiseta branca com gola olímpica e brasão do CTBM afixado no peito do
lado esquerdo (manga longa), contendo a dois centímetros abaixo desse Brasão
28

o nome de guerra do(a) aluno (a), em letras maiúsculas (tamanho 24, fonte
Arial), em cor azul-marinho CTBM, devendo ser usada sob a camisa de manga
longa;
 na camisa azul-claro CTBM, barrotes dourados, referentes ao ano em que o
aluno está matriculado, afixados na extremidade azul-escuro CTBM da lapela
esquerda, e na lapela direita, afixada na extremidade azul-escuro CTBM, o
Castelo dourado símbolo das Escolas Militares;
 japona confeccionada em nylon azul-marinho CTBM, com capuz, brasão do
CTBM, afixado de forma centralizada no bolso esquerdo, e a 1,0 cm, acima
desse bolso, afixado de forma centralizada, o nome de guerra do (a) aluno (a)
em letras maiúsculas (tamanho 24, fonte Arial), da cor vermelho, podendo em
dias frios ter o zíper fechado até o pescoço;
 cinto cinza CTBM com fivela, niquelada, contendo em sua face externa o
“Castelo” em alto relevo;
 suéter de lã, azul-marinho CTBM, liso e com gola “V”, com brasão CTBM e
nome de guerra do aluno, em letras maiúsculas, na cor vermelha, ambos
bordados no lado esquerdo do peito. O nome de guerra será bordado 02
centímetros abaixo do brasão do CTBM em letras tamanho 24, fonte Arial;
 luvas de cor azul-marinho ou preto para baixas temperaturas;
 cachecol de cor azul-marinho ou preto liso, para baixas temperaturas; e
 plaqueta de acrílico em azul com letras maiúsculas, em branco com o indicativo
do nome de “guerra” do aluno, fixada sobre o bolso direito da camisa azul-
claro CTBM.

O uniforme diário inclui os seguintes itens exclusivos para meninos:


 calça azul-claro, com listra vertical nas laterais de dois centímetros, em cetim
azul-marinho CTBM, devendo ser usada com o cós posicionado a três
centímetros abaixo do umbigo e com bainha na altura do salto do sapato;
 meias pretas; e
 sapato preto, em couro, tipo social com cadarço.

O uniforme diário inclui os seguintes itens exclusivos para meninas:


29

 saia-calça azul-claro CTBM, com listra vertical nas laterais, com dois
centímetros em cetim azul-marinho CTBM, devendo ser usada com o cós
posicionado a dois dedos abaixo do umbigo e com bainha posicionada a dois
dedos abaixo dos joelhos;
 legging ou meia-calça de cor preta, lisa (até 80 ou em lã, para baixas
temperaturas); e
 bota em couro ou similar, exceto camurça, estilo montaria, na cor preta, lisa,
em tom opaco, salto grosso até três centímetros, cano alto, logo abaixo dos
joelhos, com zíper nas laterais, sem detalhes (fivelas, laços, botões ou outros
adereços).

A Figura 3 ilustra o uniforme diário de inverno para meninas e meninos. As meninas


estão ao fundo na figura, enquanto que os meninos estão à frente.

Figura 3 - Uniforme diário de inverno

Fonte: Site Colégio Tiradentes


30

Quanto ao uniforme de verão, as únicas diferenças são a troca de camisa de manga


longa por manga curta para todos e a troca de bota e legging por sapato tipo colegial, salto até
três centímetros, sem detalhes ou adereços e meia-calça, lisa, de tonalidade natural (tipo cor da
pele fio 15), para as meninas.
Chego ao uniforme de educação física. Seu uso ocorre na instrução de treinamento
físico, eventos esportivos, atividade extraclasse, deslocamento em trânsito, atividades internas
do Colégio e/ou por determinação do Comando do CTBM. Em dias de alta temperatura,
mediante ordem do Comandante do Corpo de Alunos, os alunos poderão participar das
atividades do CAL e da sala de aula sem a parte superior do abrigo, desde que estejam com a
camiseta branca regulamentar.
O uniforme de educação física é composto pelos seguintes itens comuns a meninos e
meninas:
 camiseta branca, manga curta ou manga longa, utilizadas em função da
temperatura, gola olímpica com o brasão do CTBM fixado no peito do lado
esquerdo, contendo abaixo desse brasão, a dois centímetros, o nome de guerra
do(a) aluno(a), em letras maiúsculas (tamanho 24, fonte Arial), em cor azul-
marinho CTBM;
 boné confeccionado em tecido tactel de cor azul-marinho com brasão do
CTBM afixado na parte frontal (para uso em dias de sol forte);
 meias soquetes brancas;
 tênis esportivo: deverá ser 90% da cor preta e os cadarços totalmente pretos; e
 abrigo esportivo nas cores azul-marinho, cinza e vermelho CTBM, no modelo
indicado pelo Colégio, contendo de forma centralizada, no peito do lado
esquerdo, em caixa retangular medindo 2,0cm x 12,0cm, com fundo da cor
azul-marinho CTBM e bordas em vermelho CTBM, o nome de guerra do(a)
aluno(a) em letras maiúsculas na cor vermelha CTBM, fonte Arial, tamanho
24, podendo, em dias frios, ser usado com zíper fechado até o pescoço;

O uniforme de educação física inclui um item exclusivo para meninos: calção


confeccionado na cor azul-marinho CTBM, com listra vermelha, de dois centímetros, nas
laterais. O uniforme de educação física inclui os seguintes itens exclusivos para meninas:
31

 bustiê azul-marinho;
 bermuda justa, com comprimento até o joelho, confeccionada na cor preta ou
azul-marinho CTBM, para ser usada sob calção;
 calção confeccionado na cor azul-marinho CTBM, com listra vermelha de dois
centímetros, nas laterais; e
 bermuda, confeccionada na cor azul-marinho CTBM, com listra vermelha de
dois centímetros nas laterais;

A critério do Comando da Escola, meninas poderão usar, sem prejuízo das demais
peças do uniforme, uma das seguintes composições:
 camiseta branca sem manga, bustiê, calção e malha atlética; ou
 camiseta branca manga curta ou manga longa e bermuda justa, com
cumprimento até o joelho.

A Figura 4 ilustra o uniforme de educação física para meninas e meninos. As meninas


estão à frente na figura, enquanto que os meninos estão ao fundo.

Figura 4 - Uniforme de Educação Física

Fonte: Site Colégio Tiradentes


32

Para atividades extraclasse de natação e equitação existem mais três uniformes. Os


detalhes destes uniformes também podem ser obtidos no site do Colégio Tiradentes. De modo
geral, seguem padrões parecidos com os já mencionados. Não parece ser necessário acrescentar
novos detalhes aos já apresentados. Destaca-se apenas que, para a equitação, há uma versão de
gala do uniforme, usado em exibições e concursos de equitação, por isso são ao todo seis
diferentes uniformes.

2.1.3 – Sistemas de Punição e Premiação

Foucault (2007, p. 149) escreve que “na essência de todo o sistema disciplinar,
funciona um pequeno mecanismo penal”. É um microssistema de penalidades para os mais
diversos motivos. São penalizáveis as frações mais tênues de conduta inadequada, a ponto de
deixar que cada indivíduo se encontre preso numa universalidade punível-punidora. Segundo
esse autor, a punição se dá num sistema de gratificação-sanção, na qualificação dos
comportamentos e dos desempenhos a partir de valores opostos, como o bem e o mal.
(FOUCAULT, 2007). E o sucesso deste “poder disciplinar se deve, sem dúvidas, ao uso de
instrumentos simples: o olhar hierárquico, a sanção normalizadora e a sua combinação num
instrumento que lhe é específico, o exame” (FOUCAULT, 2007, p. 143).
O Colégio Tiradentes de um mecanismo reverso de sanção. Os alunos que tiverem
desempenho disciplinar e nota acima da média são condecorados, na presença de todos os
alunos. A sanção para os alunos que não atingem desempenho satisfatório disciplinar e de notas
é ficar de fora da gratificação que ocorre na formatura interna. No entanto, esta não é a única
forma de punição presente no Colégio Tiradentes. O regulamento disciplinar, disponível no site
do Colégio, aborda no Capítulo I, do Título III – Das Medidas Disciplinares e Educativas, a
natureza a amplitude das medidas disciplinares. O Objetivo dessas medidas é, segundo o
regulamento, restabelecer o adequado convívio escolar e conscientizar o estudante da
necessidade de atender o regramento social. São as seguintes medidas disciplinares adotadas,
que podem ou não acarretar na pontuação disciplinar considerada para a obtenção de medalhas:
I – Advertência escolar verbal – não decresce a pontuação;
II – Realização de Trabalhos Sociais – não decresce a pontuação;
III – Tarefa de Recuperação Disciplinar – não decresce a pontuação;
IV – Restrição na participação de eventos do CTBM (curriculares ou
extracurriculares) – não decresce pontuação;
33

V – Atividade de Estudo – decresce 0,10 na pontuação;


VI – Advertência escolar por escrito – decresce 0,20 na pontuação;
VII – Repreensão escolar – decresce 0,30 na pontuação;
VIII – Mudança de turma durante o ano letivo – decresce 0,40 na pontuação, nos
casos disciplinares;
IX – Suspensão da Frequência das Aulas Curriculares, até 05 dias, com a realização
de trabalho escrito, coordenado pelo CAL – decresce 0,60 (por dia) na pontuação.
X – Transferência do Aluno para outra Unidade de Ensino, independente de
pontuação;
§1° – As medidas disciplinares educativas têm função essencialmente
educacional/pedagógica, fundamentais na formação pessoal, profissional e de
cidadania do aluno.
§2° – As faltas disciplinares e as medidas educacionais aplicadas ao aluno serão
lidas em formatura interna, buscando o efeito educativo e a conscientização do
corpo discente, quanto à falta disciplinar cometida.

A seguir descrevo as condecorações oferecidas pelo Colégio Tiradentes, que


dependem também da pontuação alcançada pelos alunos com conduta ilibada.
Inicio apresentando o uso dos alamares6, cuja posse é obrigatória a todo aluno que fizer
jus ao seu uso. Em nenhuma hipótese, o aluno terá direto ao uso de qualquer alamar, caso tenha
ficado em recuperação no trimestre a que adquiriu o direito de uso. A figura 5 ilustra o que é
um alamar.

Figura 5 - Alamar na cor azul

Fonte: site da internet

6
Adorno que guarnece uniformes militares de gala, feito de cordão trançado de seda, lã ou metal com alças.
34

Os alunos que conquistaram durante um trimestre o alamar de mérito intelectual e de


mérito disciplinar farão parte do grupamento de honra. O alamar do grupamento de honra terá
a coloração azul, vermelho e branco. São dois os alamares:

 Alamar de Mérito Intelectual: Os alunos que possuírem média trimestral igual


ou superior a 9 e nota mínima 8 em cada componente curricular no trimestre,
bem como pontuação disciplinar mínima 8, terá o direito ao uso do alamar na
coloração azul e vermelho; e

 Alamar de Mérito Disciplinar: Os alunos que obtiverem nota disciplinar, no


final do trimestre, igual a 10 pontos, bem como, todas as notas das
componentes curriculares iguais ou superiores a 8 no trimestre, têm o direito
do uso do alamar na coloração azul e branco.

A seguir, apresento as medalhas, que são distinções aos alunos que fizerem jus durante
o decorrer do ano letivo pelo Mérito Escolar, Cultural, Disciplinar e Esportivo. Elas serão
concedidas por portaria do comandante do CTBM e usadas em solenidades, desfiles e
formaturas especiais, colocadas sobre o bolso direito dos fardamentos CT1, CT2, CT5 e CT67,
mediante ordem do comandante do CTBM e o passador será utilizado diariamente nos
uniformes CT2 e CT5 quando não estiver sendo utilizada a medalha. Não podem ser usados ao
mesmo tempo as insígnias (também chamadas de passadores) ou barretes (pequenas
condecorações) com as medalhas, salvo quando os passadores metálicos delas façam parte
integrante.
 Medalha de Honra ao Mérito Escolar: É a condecoração concedida ao aluno
que ao longo dos 3 anos possuir a maior média entre todos os alunos, além de
possuir uma conduta ilibada e demonstrar o devido comprometimento com as
atividades do Colégio, possuindo média disciplinar igual ou superior a 8 pontos
no mês da concessão;

7
As numerações correspondem aos uniformes do Colégio Tiradentes, assim identificados: uniforme de gala
(CT1), uniforme diário (CT2), uniforme de educação física (CT3), uniforme de natação (CT4), uniforme de
atividades diárias de equitação (CT5) e uniforme de gala de equitação (CT6)
35

Figura 6 - Medalha de Honra ao Mérito Escolar

Fonte: Site do Colégio Tiradentes

 Medalha de Mérito Escolar: É a condecoração concedida ao aluno com a maior


média aritmética na avaliação da aprendizagem do ensino de cada série no
respectivo ano letivo, devendo, também, ter nota igual ou superior a 8 pontos
na média disciplinar, no mês da concessão;

Figura 7 - Medalha de Mérito Escolar

Fonte: Site do Colégio Tiradentes

 Medalha de Mérito Disciplinar: É a condecoração concedida ao(s) aluno(s)


que, durante o ano letivo, apresentar uma conduta ilibada e um
comprometimento com as atividades do Colégio, avaliada através do conselho
disciplinar e possuir nota disciplinar 10 pontos e deverá ser aprovado na série
que estiver cursando, será indicada ao Comandante do Colégio a quem cabe a
decisão final pela concessão.
36

Figura 8 - Medalha de Mérito Disciplinar

Fonte: Site do Colégio Tiradentes

A Medalha de Honra ao Mérito Escolar, Mérito Escolar e Mérito Disciplinar serão


entregues por ocasião da formatura comemorativa ao final do ano letivo e formatura do 3º ano.

 Medalha de Mérito Cultural: É a condecoração concedida ao(s) aluno(s) com


destaque em atividades culturais, com representatividade e cunho relevante
para o colégio, além de ter nota igual ou superior a 8 pontos na média
disciplinar no mês da concessão;

Figura 9 - Medalha de Mérito Cultural

Fonte: Site do Colégio Tiradentes

 Medalha de Mérito Esportivo: É a condecoração concedida ao(s) aluno(s) com


destaque em atividades desportivas de repercussão no CTBM ou de caráter
municipal, estadual, nacional ou internacional, com representatividade e cunho
relevante para o colégio, ter nota igual ou superior a 8 pontos na média
disciplinar e aprovação no ano letivo em curso.
37

Figura 10 - Medalha de Mérito Esportivo

Fonte: Site do Colégio Tiradentes

As condecorações de Mérito Cultural e Esportivo serão concedidas em solenidade


Militar a ser realizada conforme deliberação do Comando do CTBM.
A hierarquia das medalhas e passadores é definida pelo grau de importância, baseada
nos preceitos do ensino e da disciplina, sendo usadas no peito do lado esquerdo, acima da
pestana do bolso, e colocadas em uma fileira horizontal de três no máximo, na seguinte ordem,
a partir da linha dos botões: Medalha de Honra ao Mérito Escolar, Medalha de Mérito Escolar,
Medalha de Mérito Disciplinar, Medalha de Mérito Cultural, e Medalha de Mérito Esportivo.
A figura 11 ilustra o uso das medalhas numa cerimônia do Colégio Tiradentes.

Figura 11 - O uso das Medalhas

Fonte: site do Colégio Tiradentes


38

A medalha será adquirida e concedida com ônus para o CTBM, portanto será
concedido exclusivamente ao aluno que estiver com o pagamento da contribuição escolar
atualizada até o mês da concessão. Embora se exalte o mérito para àqueles que conseguem se
enquadrar na norma, as punições para quem não se enquadra na mesma, ou por algum motivo
não pagou a contribuição escolar, consiste em ficar de fora, apenas como expectador desse
cerimonial.
Abordo a seguir o processo de militarização de escolas públicas que vêm ocorrendo
em diferentes Estados do Brasil e no que esse processo se diferencia do Colégio Tiradentes da
Brigada Militar.

2.2 – O processo de militarização de escolas públicas

Fique, pois, estipulado que, a todos aqueles que nasceram homens, é


necessário o ensino, pois é necessário que sejam homens, não bestas ferozes,
não brutos, não troncos inertes. (COMENIUS, p.23).

Ao escolher o tema desta pesquisa, deparei-me com o processo de militarização de


escolas públicas brasileiras que, como mencionei anteriormente, vem sendo tomado como
solução por alguns governantes para os problemas de violência, indisciplina e tráfico de drogas
nas escolas estaduais.
Os estabelecimentos de ensino que estão sendo militarizados são escolas públicas
estaduais que funcionavam até um determinado momento sob o comando das Secretarias
Estaduais de Educação de seus Estados e que foram entregues para serem administradas pela
Polícia Militar do Estado, numa parceria com a Secretaria de Segurança Pública. Nestas escolas,
o modelo de gestão é semelhante. Na maioria dos casos, a parte pedagógica fica sob a
coordenação da Secretaria Estadual de Educação e a parte administrativa e disciplinar a cargo
da Polícia Militar. Os professores, na maioria das escolas que foram militarizadas,
permaneceram sendo civis. Aqueles que não se adaptam ao novo sistema são remanejados para
outra escola. O mesmo processo é adotado com os alunos que não se adaptam à disciplina
militar implantada na escola.
O jornal Folha de São Paulo, na edição de 30 de outubro de 2015, faz referência à
crescente militarização de escolas públicas no Estado de Goiás. O jornal destaca a rigidez dos
regulamentos das escolas que estão passando pelo processo de militarização, com a proibição
de mascar chicle, usar óculos com armações coloridas, beijar, entre outras proibições.
39

A Figura 12 traz a reportagem veiculada no site.

Figura 12 - O crescimento das escolas militares em todo o país

Fonte: Folha de São Paulo

Em relação a este tipo de rigidez dos regulamentos, Foucault (2007) argumenta que o
olhar esmiuçante nas inspeções disciplinares, o controle das mínimas parcelas da vida e do
corpo se organiza a partir de algumas práticas, práticas essas cujo objetivo é produzir um
determinado tipo de sujeito. Este tipo de sujeito talvez seja o objetivado pela educação militar.
Esse processo de militarização de escolas públicas não está ocorrendo no Rio Grande
do Sul. Entretanto, nos últimos anos, houve uma expansão na rede de escolas ligadas à Brigada
Militar, com duas novas unidades implantadas, sendo uma na cidade de Ijuí e outra na cidade
de Pelotas. Atualmente, são sete as escolas sob o comando da Polícia Militar no Estado do RS.
40

É contra essa expansão que a nota do jornal Extra Classe, publicação do Sindicato dos
professores das escolas privadas (SINPRO) se posiciona, como mostra a Figura 13, a seguir.

Figura 13 - A expansão do Ensino Militar no RS

Fonte: Jornal Extra Classe

A matéria apresentada na figura 13 e disponível no site do mesmo jornal mostra a


posição contrária assumida pelo sindicato em relação à expansão da rede de ensino administrada
pela Polícia Militar do Estado. Na matéria, o Sindicato questiona a limitação de acesso a alunos
com problemas físicos ou mentais nessas escolas e até mesmo de adolescentes que estiverem
acima do peso. Para o sindicato, uma escola mantida com recursos públicos não poderia
selecionar alunos, produzindo exclusão no sistema de ingresso da escola pública. Segundo o
professor de da Faculdade de Educação da UFRGS, Fernando Becker, entrevistado para a
matéria:

Uma escola que pretende ser exemplar, top de linha, deveria esmerar-se em
criar condições didáticas e pedagógicas para incluir progressivamente todos
os alunos que nela tentam ingressar. É muito fácil dar aula para alunos
41

selecionados, mediante testes, e lograr objetivos educacionais nobres com tais


alunos (BECKER, 2015).

Outro argumento que traz a matéria, também citado pelo Professor Becker, é que a
disciplina rígida pode causar mais estragos do que benefícios para muitos alunos e que jamais
deveria ser utilizada como fim educacional.
Não há um consenso na comunidade escolar a respeito das escolas militares, sejam
elas oriundas de processos de militarização ou não. Porém, cabe salientar que o processo que
ocorreu no Rio Grande do Sul é diferente dos demais estados, como explicou-me o Diretor da
Rede de Ensino Médio Tiradentes (CTBM), em entrevista realizada no dia 17 de novembro de
2015:

A militarização que vem ocorrendo em escolas estaduais de outros


estados é um processo distinto daquele que ocorreu no RS. As escolas
que estão sendo militarizadas são escolas estaduais de periferia com
graves problemas de violência e segurança. No Rio Grande do Sul, as
escolas militares, mesmo aquelas localizadas no interior do estado, já
nasceram com o objetivo de ser um colégio militar, não ocorrendo o
processo de migração do ensino estadual civil para um ensino militar.

Prosseguindo no tema disciplina, procurei por teses, artigos e dissertações que possam
contribuir com o entendimento do papel que a disciplina tem na educação de jovens em tempos
contemporâneos. No próximo capítulo, apresento alguns dos trabalhos já realizados sobre o
tema e que contribuíram para a minha pesquisa.
42

3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Para esta revisão, utilizei a Biblioteca da ULBRA, o Repositório Digital


LUME/UFRGS, o banco de Teses e Dissertações da CAPES, a base de artigos acadêmicos
SCIELO e a ferramenta eletrônica de busca Google Acadêmico. Procurei por teses, dissertações
e artigos com as palavras disciplina; Foucault; Colégio Militar e Militar. Embora sejam
inúmeras as teses e dissertações encontradas, nem todas são relacionadas a Colégios Militares:
há muito mais teses e dissertações sobre Instituições Militares e formação de militares em
quartéis. É importante ressaltar que nem todas são na perspectiva teórica pós-estruturalista.
Dentro do espectro que pesquisei, acabei selecionando cinco, que acredito que possam
contribuir com a minha pesquisa.

3.1 – Artigos relacionados ao tema

Inicio apresentando o artigo Pesquisas Educacionais em Colégios Militares do Brasil:


Estado da Arte, de Fabiana Teixeira da Rosa (2012), divulgado nos anais do VIII Colóquio
"Ensino médio, história e cidadania”. O artigo apresenta o estado-da-arte das investigações que
tomam por objeto os colégios militares do país. A pesquisa de Teixeira foi realizada em 59
trabalhos, sendo 54 resumos de teses e dissertações, assim distribuídos: 26 da área da Educação
e 28 da grande área das Ciências Humanas e cinco artigos publicados em anais de congressos
e periódicos. Segundo a autora, é possível perceber que há certa escassez de pesquisas sobre as
práticas pedagógicas das instituições militares e a própria cultura escolar destes
estabelecimentos de ensino. Também observa que houve um aumento no interesse por
pesquisas em colégios militares a partir do ano 2000. Teixeira levanta a hipótese de que, com o
final da ditadura militar em 1985, o acesso a estas instituições escolares foi permitido com
maior facilidade a profissionais da educação.
Nesse artigo, Rosa (2012) aponta que 76% das pesquisas acadêmicas tiveram como
objeto Colégios Militares do Exército e 24% tiveram como objeto Colégios da Polícia Militar.
Segundo o artigo, as regiões que mais tiveram seus Colégios pesquisados foram a Região Sul,
com 34% das pesquisas, e a Região Sudeste, com 29%. As demais regiões ficaram assim
distribuídas: 16% das pesquisas foram em Escolas do Centro-Oeste, 15% em Escolas do
43

Nordeste e 6% em escolas do Norte do país. Outro dado importante foram os sujeitos


encontrados como objetos desses estudos: os alunos em 54% dos trabalhos; os professores em
27%; as instituições em 8%; a direção das instituições em 5%; a equipe pedagógica em 3% e
as famílias, também em 3% dos trabalhos.
Uma das conclusões de Rosa (2012) revela que há um pequeno número de ocorrências
de pesquisas realizadas em Colégios Militares, quando comparado com outras instituições de
ensino. Também revelou que o interesse acadêmico-científico por este sistema de ensino é
recente, sendo que as instituições de ensino militar no Brasil remontam o século XVIII.
Incluo também o artigo Militarização das Escolas públicas do Estado de Goiás: uma
reflexão sob os olhares de Glória Anzáldua e Michel Foucault, de Leandra Augusta Cruz et al.
O artigo foi publicado na Revista Mosaico, v. 8, n. 2, p. 199-205, 2015. Este artigo faz uma
reflexão sobre a disciplina exacerbada, cobrada nos Colégios Militares do Estado de Goiás,
onde militares assumiram um crescente número de escolas públicas estaduais. Diante dessas
militarizações, as autoras se perguntam: militarizar as escolas? Para quê? Para quem? Quem
serão os maiores beneficiados com esse crescente processo de militarização? A disciplina
cobrada no Colégio Militar é a ideal? Disciplina, medo, coação e punição, são determinantes
para se garantir um ensino de qualidade? As autoras fazem também uma reflexão sobre a
fronteira física dos Colégios Militares, estabelecidas por seus muros, com as redondezas dessas
escolas. Chamam atenção para a relação dos alunos que conseguiram adentrar essa fronteira,
fazendo parte de um grupo seleto, com aqueles que ficaram do lado de fora, ou ainda, por não
se adequarem ao sistema disciplinar, foram convidados a se retirar. Novamente as autoras
perguntam, será que a militarização das escolas é a solução para melhorarmos a educação e a
segurança nas escolas e nos bairros?
Sem fechar questão sobre o tema, e sem responder a todos os questionamentos feitos,
as autoras sugerem, ao final, que os militares retornem para os quartéis, pois lá desenvolverão
o ofício ao qual foram destinados e capacitados a fazer, e deixem as escolas serem escolas e
não quartéis, que as deixe trilhar seus caminhos, pois possuem competência para tal ofício.
44

3.2 – Dissertações relacionadas ao tema

Dentre as dissertações pesquisadas destaco a de Jefferson Gomes Nogueira (2014),


que trata do tema da educação militar, intitulada Educação Militar: Uma Leitura da Educação
no Sistema dos Colégios Militares do Brasil (SCMB). A dissertação foi defendida em 2014 no
PPGEDU/UFMS. O autor apresenta uma inserção na historicidade do sistema de educação dos
Colégios Militares do Brasil (SCMB), no sentido de desvelar o ethos como orientação do
Colégio Militar na formação de seus alunos. Esses contemplam valores, preceitos e tradições a
serem preservados nas práticas diárias, que são específicas na formação do soldado.
O corpus do trabalho de Nogueira é formado por documentos oficiais do Exército,
além de teses e dissertações sobre o tema. Os resultados da pesquisa apontam para um sistema
educacional que tem no ethos, na doutrina, nos valores e na tradição do Exército Brasileiro os
sustentáculos de uma ideologia secular. São práticas cotidianas que vão sutilmente introjetando
valores da ideologia militar, por isso os indivíduos envolvidos nesse processo acabam não
percebendo o quanto eles são determinantes em seus comportamentos, discursos e visões de
mundo. Nesse processo de assimilação de preceitos atinentes ao ethos militar, o sujeito acaba
defendendo os valores e princípios próprios da instituição Exército Brasileiro, como se fossem
seus.
Entre as dissertações que tratam da questão disciplinar, inicio destacando a dissertação
de Alcionéia Teixeira (2010), intitulada Cenas de Uma Escola Contemporânea: Uma Geração
Indisciplinada ou Uma Geração de Novos Sujeitos? A dissertação foi defendida em 2010 no
PPGEDU/ULBRA. A autora problematiza um suposto “desencaixe” entre o que alunos e
professores entendem como (in)disciplina na condição cultural contemporânea. A Dissertação
contribuiu com a construção do tema disciplina na minha pesquisa, uma vez que aponta o que
é considerado indisciplina pelos professores. De fato, deparei-me com esse conceito quando
abordei a disciplina com os pais e as mães dos alunos do Colégio Tiradentes.
Entre algumas das conclusões a que a autora chegou está o destaque para muitas
situações em que a indisciplina é entendida de modo diferente por professores e alunos, porque
há um desencaixe no modo como eles entendem o tempo. O tempo na prática docente parece
se inscrever numa racionalidade moderna, com uma conotação coletiva e linear, enquanto os
alunos se inscrevem numa racionalidade contemporânea, que está pautada num tempo
fragmentado e individualizado. Outra das conclusões é a noção de que as transformações sociais
adentram o ambiente Escolar. Aqui a (in)disciplina se apresenta pelo descompasso entre o modo
45

como agem professores e alunos. Enquanto os professores mostram a necessidade de uma


ordenação, de um ritmo sincronizado no desenvolvimento de suas aulas, os alunos rejeitam
esses princípios (...). Esta nova geração precisa de liberdade de movimentos, de desafios que os
impulsionem. Nesse sentido, pode-se dizer que a morosidade da Escola desencadeia
comportamentos indesejáveis pelos professores que realçam a noção de indisciplina na escola.
Diante das conclusões da autora, volto a me perguntar que lugar ocupa a disciplina na vida dos
jovens matriculados em colégios militares, uma vez que Teixeira (2010) observa o anseio pela
liberdade na sua pesquisa.
E, por último, destaco a Dissertação Disciplina e controle na Escola: do aluno dócil
ao aluno flexível, de Antônio Luiz de Moraes, do PPGEDU/ULBRA, defendida em 2008. Esta
Dissertação busca compreender como operam alguns procedimentos contemporâneos de
controle na escola — instituição tradicionalmente presente nos procedimentos disciplinares de
confinamento, enquadramento e vigilância. O objeto da pesquisa é a caracterização de algumas
das novas formas de subjetivação viabilizadas pela integração planetária das tecnologias
eletrônico-digitais de informação e comunicação. As recentes discussões acerca da proibição
do uso do telefone celular na sala de aula foram o ponto de partida para a pesquisa. Argumenta-
se que alguns comportamentos persistentes dos alunos na escola, tais como o uso e a exibição
de telefones celulares na sala de aula, sejam atitudes geralmente qualificadas como
indisciplinares. Entre as conclusões apontadas está que o uso reiterado do telefone celular na
sala de aula não é uma expressão de rebeldia do aluno contra o professor ou contra a escola,
mas a manifestação de uma subjetividade flexível, diferente da subjetividade dócil
tradicionalmente requerida no espaço fechado da sala de aula. Observa-se que a adequação da
escola a esse estado de coisas está contribuindo para a dissolução das suas fronteiras
institucionais. Em especial, meu interesse nessa dissertação está na questão disciplinar dos
alunos e na caracterização da escola como um local de corpos dóceis.
No próximo capítulo, apresento as teorizações que irão orientar a análise pretendida,
sempre dentro da perspectiva pós-estruturalista. Neste capítulo, apresento a sociedade
disciplinar, baseada nas teorizações de Michel Foucault e procuro traçar uma linha de tempo,
demonstrando o contexto histórico em que emerge a escola moderna.
46

4. MINHA CAIXA DE FERRAMENTAS

Tem sido um desafio olhar para o mundo com novas lentes, com novas ferramentas,
que me foram apresentadas no Programa de Pós-Graduação em Educação da ULBRA. Em
especial, cito a caixa de ferramentas de Foucault, da qual irei me apropriar para esta pesquisa.
Outros autores, dentro da perspectiva teórica pós-estruturalista, também contribuíram para as
articulações necessárias.

4.1 – Fabricando Corpos Dóceis

A obra Vigiar e Punir de Michel Foucault (2007) apresenta um estudo que descreve
como a disciplina foi utilizada para um controle minucioso do corpo e como essa lhe impõe
uma relação de docilidade-utilidade. Os processos disciplinares já existiam nas instituições
religiosas medievais, mas foi nos séculos XVII e XVIII que a disciplina se tornou uma estratégia
de dominação que passou a ser utilizada em diversas instituições como a prisão, o quartel, a
fábrica e a escola.
Diferente do poder soberano, em que havia uma relação de aniquilação dos corpos, por
meio de práticas como matar, esquartejar e expor o corpo em praça pública, para que servisse
de exemplo aos que porventura se atrevessem a desobedecer às leis impostas, o momento
histórico da disciplina é o momento em que nasce uma arte do corpo humano a ser controlado
em cada detalhe. A disciplina visa não unicamente o aumento das habilidades do corpo, mas a
relação que no mesmo mecanismo o torna tanto mais obediente quanto é mais útil, e
inversamente. Esse domínio sobre o corpo do outro não é simplesmente para que façam o que
se quer, mas para que operem como se quer. “Muito mais sutil do que a força física, a disciplina
fabrica corpos submissos, exercitados, corpos dóceis”. Em suma, são corpos modelados para
aceitar as rotinas que lhes serão impostas (FOUCAULT, 2007, p.119).
De acordo com Saraiva (2010), a passagem da ênfase no poder soberano para o poder
disciplinar, que vai acontecer ao longo dos séculos XVI e XVII, abre um campo de
possibilidades para as transformações nas relações sociais, fazendo surgir uma nova forma de
exercício de poder, mais econômica e eficaz porque mais sutil. Gradativamente, o poder-força
vai cedendo sua hegemonia para um poder revestido de uma maior astúcia, um poder-saber.
Um poder não mais como algo que se possui, mas que se exerce na relação. Um poder que
submete não pela força, mas por meio de produção de discursos de verdade. A invenção dessa
47

nova anatomia política não pode ser entendida como uma descoberta súbita., mas como uma
multiplicidade de processos muitas vezes mínimos, de origens diferentes, de localizações
esparsas, que se acoplam, se repetem, se imitam, se apoiam e aos poucos vão esboçando um
método geral de dominação. Para Foucault (2007, p.119):

A disciplina fabrica corpos submissos e exercitados, aumenta a força do corpo


(em termos de utilidade) e diminui essa mesma força (em termos políticos de
obediência). Em uma palavra, ela dissocia o poder do corpo; faz dele por um
lado uma “aptidão”, uma “capacidade” que ela procura aumentar; e inverte
por outro lado a energia, a potência que poderia resultar disso, e faz dela uma
relação de sujeição estrita. Se a exploração econômica separa a força e o
produto do trabalho, digamos que a coerção disciplinar estabelece no corpo o
elo coercitivo entre uma aptidão aumentada e uma dominação acentuada.

Segundo Gadelha (2009), o poder disciplinar vai tomando o corpo social, da família à
escola, desta ao quartel, dos hospitais aos reformatórios de “menores”, das fábricas aos
manicômios, mas também dos saberes das disciplinas clínicas às práticas do direito, dos saberes
da epistemologia aos procedimentos que orientam a administração pública, dos saberes das
ciências humanas às práticas que se incumbem da educação e da formação para o trabalho.
Tudo isso é trespassado pelo que Foucault chamou de dispositivo disciplinar (GADELHA,
2009). No dizer de Saraiva (2010):

A rede que permeia as relações sociais permite que o poder disciplinar seja
exercido na sua plenitude. É essa rede de relações que forma a sociedade
disciplinar. Nessa sociedade, é a arquitetura que toma o lugar do soberano com
o esquadrinhamento do espaço, e passa a ser planejada para permitir vigiar
aqueles que estão em seu interior (SARAIVA, 2010, p. 132).

O modelo arquitetônico ideal para as instituições disciplinares é o de organização


espacial circular. Concebido por Bentham (apud FOUCAULT, 2007) para as prisões, esse
modelo consiste em espaços fechados, mas como aberturas amplas, dispostos em forma de anel,
com um vigia no centro, permitindo a vigilância dos diversos indivíduos ali presentes.
Vigilância que também é acompanhada de rigorosas punições que visam à normalização das
condutas dos sujeitos, na maioria das vezes sem apelo à violência física, mas utilizando-se de
outras formas de punição (FOUCAULT, 1979). Embora as sociedades modernas possam ser
definidas como “disciplinares”, a disciplina não pode ser identificada como uma instituição
nem como um aparelho de Estado, nos diz Deleuze (2005), justamente porque ela é um tipo de
poder, uma tecnologia, que atravessa todas as espécies de aparelhos e instituições para reuni-
los, prolongá-los, fazê-los convergir, fazendo com que se apliquem de um novo modo. O poder
48

disciplinar é exercido através da observação vigilante, de estar sempre sob a presença de um


poder maior e coercitivo.
Foucault (2007) mostra como o uso do tempo fracionado em horas, minutos e até
mesmo em segundos foi importante para o nascimento da sociedade disciplinar. Nas instituições
de sequestro8, o uso do tempo será intensificado ao extremo, preenchendo todas as horas do dia
com diversas atividades, sejam elas de trabalho, refeições, orações, entre outras. Neste caso,
todas as atividades possuem horários bem delimitados e previamente determinados:

[...] serão propostos para a Escola horários como os seguintes: 8:45 entrada do
monitor, 8:52 chamada do monitor, 8:56 entrada das crianças e oração, 9 horas
entrada nos bancos, 9:04 primeira lousa, 9:08 fim do ditado, 9:12 segunda
lousa, etc. (FOUCAULT, 2007, p.128).

O controle de todas as horas do dia, enquanto instrumento do poder disciplinar, evitava


qualquer tipo de organização paralela de seus internos e até mesmo a formação de um
pensamento rebelde, uma vez que o foco eram as tarefas a serem realizadas. Um bom emprego
do corpo permite um bom emprego do tempo: nada deve ser ocioso ou inútil.
Segundo Foucault (2007), o poder disciplinar tem como efeito maior o adestramento
do indivíduo. O poder disciplinar “fabrica” indivíduos; é a técnica específica de um poder que
toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos de seu exercício. O
sucesso do poder disciplinar se deve ao uso de instrumentos simples, tais como: distribuição
dos corpos no espaço e controle temporal das atividades; vigilância hierárquica; sanção
normalizadora e exame. Outra questão destacada pelo autor é a de que na base de todos os
sistemas disciplinares funciona um pequeno mecanismo penal, que acaba por reprimir um
conjunto de comportamentos que escapam aos grandes sistemas de castigo por sua relativa
indiferença. Na Escola, no Exército e na oficina existe todo um sistema de micropenalidades
que se aplica sobre o tempo (atrasos, ausências, interrupções de tarefas), sobre a atividade
(desatenção, negligência, falta de zelo), sobre a maneira de ser (grosseria, desobediência), sobre
os discursos (tagarelice, insolência), sobre o corpo (atitudes incorretas, gestos não aceitos, falta
de higiene pessoal, má aparência) e sobre a sexualidade (imodéstia, indecência). Essas
penalidades vão desde o castigo físico leve, chegando a privações ligeiras e a pequenas
humilhações (FOUCAULT, 2007).

8
São exemplos de instituições de sequestro: a escola, a prisão, o quartel, o hospital, a família (SARAIVA, 2010,
p. 133).
49

Todos esses instrumentos disciplinares acabam produzindo um novo funcionamento


punitivo que aparece através da disciplina, baseado na norma. Tal como a vigilância, e junto
com ela, a regulamentação é um dos grandes instrumentos de poder no fim da era clássica,
segundo Foucault (2007). O normal se estabelece como princípio de coerção no ensino, com a
criação das Escolas normais, estabelece-se no quadro médico e hospitalar, capaz de fazer
funcionar normas gerais de saúde, e estabelece-se na regularização dos processos e dos produtos
industriais. Na escola, o poder da norma tem duplo efeito: distribuir os alunos conforme suas
aptidões e exercer sobre eles uma pressão constante para que se submetam todos ao mesmo
modelo. Em suma, para que sejam obrigados todos juntos à subordinação, à docilidade, à
atenção nos estudos e nos exercícios, ao zelo com os deveres e com todas as partes da disciplina,
para que, ao final, todos se pareçam. O poder de regulamentação obriga à homogeneidade, mas
também individualiza, pois permite medir desvios, formar especialidades e tornar úteis as
diferenças (FOUCAULT, 2007).
Na próxima seção, vou tratar da escola moderna e de como essa instituição foi gestada
ao longo dos séculos, chegando à escola que temos hoje.

4.2 – Escola moderna - uma instituição disciplinar

Acredito ser importante para esta investigação contextualizar o surgimento da escola


moderna, seus objetivos e a sua destinação. Tendemos a ver a escola como “algo desde sempre
aí”, dificilmente conseguindo imaginar o mundo sem esta instituição. A escola, como a
conhecemos hoje, começa a se desenhar em meados do século XVI, com o aparecimento dos
colégios de jesuítas. Esses colégios objetivavam uma transformação na forma de educar os
filhos da classe dominante do antigo regime. Segundo Foucault (2007), na Idade Média, havia
um monopólio da cultura e do pensamento por parte da Igreja Católica e a educação era
tributária do pensamento monástico. Eram os integrantes da Igreja que estabeleciam o que
deveria ser estudado, os conteúdos e os objetivos da educação. Enquanto as escolas paroquiais
destinavam-se à formação sacerdotal e as escolas monásticas objetivavam a formação de
monges, as escolas palatinas cuidavam da formação dos filhos dos nobres. Havia nas
instituições palatinas um currículo um pouco mais vasto do que nas demais escolas9. Para os

9
Escolas palatinas: tinham como objetivo a formação mais ampla do indivíduo. Exigiam muita dedicação e
empenho dos estudantes, pois tinham um currículo vasto. As principais artes liberais estudadas eram: Gramática,
Retórica e Dialética (Trivium) e Aritmética, Geometria, Astronomia e Música (quadrívium).
50

filhos dos camponeses, sem recursos financeiros e presos às obrigações servis, não havia acesso
à educação escolar, ficando eles sem saber ler e escrever por toda a vida (LAUAND, 2013).
No final da Idade Média (século XIV e XV), com o surgimento da burguesia, as escolas
e universidades passaram a receber estudantes oriundos desta nova camada social. Os filhos
dos burgueses iam para escolas e universidades que ofereciam uma formação mais ampla ou
um ensino de caráter técnico, o que vai forçar a nobreza a também enviar seus filhos para essas
escolas. Como escreve Varela (1992), os colégios jesuítas surgem, em grande medida, da luta
contra as instituições educativas medievais, assim como acontece com a manufatura, que
emerge em oposição à oficina artesanal. Das escolas medievais, passa-se a instituições
modernas com colégios e universidades reformadas. Mas é a imposição da escola obrigatória,
inicialmente destinada às classes populares, que transformará os filhos dos artesãos e operários
de “tábula rasa” em trabalhadores disciplinados (VARELA, 1992). No entanto, a instrução dos
filhos das classes populares, mais especificamente na segunda metade do século XIX e início
do século XX, faz parte da medida geral do “bom governo”. Essa educação não tem por
finalidade ensinar esses jovens a mandar, mas sim a obedecer, ensinar-lhes bons costumes e
moralizá-los para que a sociedade tenha paz, pois “custam menos as Escolas do que as
rebeliões” (FERNANDES; GONZALES apud VARELA, 1992, p. 89).
Para o filósofo Kant, do século XVIII, o propósito da educação é não deixar o homem
desviar-se de seu destino, que é a própria humanidade. Segundo o filósofo, “um homem não
pode se tornar um verdadeiro homem senão pela educação. O homem é aquilo que a educação
faz dele”. Os próximos excertos demonstram o pensamento desse filósofo sobre a educação
(KANT, 2012, p.9-12):

O homem é a única criatura que precisa ser educada. Por educação se entende
os cuidados básicos da infância (alimentação, subsistência), a disciplina e a
sua instrução;

A espécie humana deve desenvolver todas as características naturais da


humanidade, gradualmente, a partir de si mesmo e com seu próprio esforço.
Uma geração educando a outra;

[...] as crianças são mandadas cedo à escola, não para que ali aprendam alguma
coisa, mas para que lá se acostumem a ficarem sentadas em silêncio e a
obedecer pontualmente aquilo que lhes é mandado, a fim de que no futuro elas
não sigam de imediato seus impulsos.

Nas palavras de Kant, é possível perceber o contexto do surgimento da escola


moderna, que tem entre suas finalidades transformar os filhos dos artesãos e operários em
51

trabalhadores disciplinados. E segundo Varela (1992), para socorrer os filhos dos operários, a
quem se destina a escola nacional, não faltarão filantropos, higienistas, reformadores sociais e
educadores. As escolas tornaram-se um meio de isolar cada vez mais as crianças da sociedade
dos adultos. Segundo Sibila (2012), a sociedade moderna pensou a si mesma como igualitária,
fraterna e democrática. E para dar conta desse projeto era necessário educar todos os cidadãos,
servindo-se para esse fim dos recursos do Estado Nacional. Na modernidade, a escola não foi
o único dispositivo criado para conter a classe trabalhadora, também vista como perigosa pela
burguesia. Diversos outros dispositivos foram sendo instituídos para que se obtivesse a
transformação dessas classes, como aponta Varela (VARELA, 1992, p. 88):

 Construção de casas baratas para operários;


 Regulamentação do trabalho de mulheres e crianças;
 Criação de caixas econômicas, sociedades mútuas, cooperativas e
casas de seguro;
 Fundação de berçários, casas-asilos, lactários e consultórios de
puericultura.
 Criação de dispensários contra tuberculose, dispensários
antialcoólicos e emissão de cartilhas higiênicas;
 Remodelação de bairros e ampliação da vigilância e da polícia;
 Construção de cárceres e manicômios para o tratamento de presos e
alienados;
 Nascimento da assistência social e de sociedades para a proteção da
infância em perigo e perigosa;
 Criação de Escolas dominicais e de adultos.

Para Foucault (2007), o nascimento da chamada escola disciplinar se deu em um


período de intensas modificações nas estruturas de poder. Modificações essas que dão origem
ao aparato social e político denominado por ele de “sociedade disciplinar”. A genealogia
foucaultiana nos oferece um modelo teórico para entender o surgimento não apenas da escola
moderna, mas também da prisão, do hospital, do hospital psiquiátrico e da fábrica, todas essas
instituições da modernidade (CÉSAR, 2010). Hardt (2000) compara essas instituições da
modernidade com arquipélagos, formados por grandes ilhas, com limites bem definidos,
passando o indivíduo uma vida deslocando-se de uma instituição à outra. O mesmo Hardt
(2000) afirma que essa relação entre dentro e fora, interior e exterior, público e privado foi
primordial para o funcionamento das instituições disciplinares.
As leis de obrigatoriedade escolar existentes na Europa no final do século XVIII e
início do século XIX tinham como objetivo capturar as crianças das ruas e colocá-las em um
ambiente fechado, aplicando-lhes exercícios disciplinares que visavam governar seus corpos e
52

almas (CÉSAR, 2010). A aliança que ocorreu entre estado, pedagogia e medicina colocou todos
os aspectos da vida das crianças em evidência: além das aulas, as brincadeiras de pátio, a
merenda, as vacinas, os exercícios físicos, a higiene corporal, tudo foi tomado como campo de
intervenção e produção de verdades sobre a infância, formando-se um sistema disciplinar no
qual os exames corporais compuseram medidas centrais no processo de educação escolarizada,
que acabava por repartir a infância entre normal e anormal. Ao longo do século XIX foi se
constituindo um aparelho judicial especialmente concebido para o cuidado da infância e da
juventude, tendo em vista tratar da delinquência juvenil. Esses novos personagens já
apareceram orientados pela psicologia da adolescência e não mais pelas regras moralizadoras
dos filantropos do século XIX (CÉSAR, 1999).
Prosseguindo na análise da sociedade disciplinar, César (2010) aponta que quando se
acena para o fim dos sujeitos escolares, isto é, para o fim da infância e para a morte da
adolescência, o foco do argumento é que as práticas e os discursos que constituíram tais sujeitos
no âmbito dos processos da escolarização disciplinadora da modernidade entraram em crise e
deixaram de produzir tais sujeitos. Essa passagem da sociedade disciplinar para a sociedade de
controle permite entender as mudanças pelas quais a instituição Escola vem passando desde a
última década, a fim de tornar-se a instância de produção do novo sujeito moral, flexível,
tolerante e supostamente autônomo, requerido pelas novas modulações do controle que
gravitam entre o estado e o mercado neoliberal (CÉSAR, 2010). Foucault já demostrara, no
final da década de 1970, que os limites históricos da sociedade disciplinar estavam demarcados
e que estávamos passando de uma sociedade disciplinar para uma sociedade de controle
(SARAIVA; VEIGA-NETO, 2009). Seguindo na mesma linha de raciocínio de Foucault,
Deleuze compreendeu a crise da sociedade disciplinar como uma crise dos modos de
confinamento centrados na prisão, hospital, fábrica, escola e na família. Para Deleuze (2005),
se os confinamentos da disciplina eram moldes produtores de subjetividades, os novos controles
são uma modulação desses e podem ser transformados continuamente de maneira a produzir a
subjetividade flexível como chave de controle.
Na próxima seção, aprofundo um pouco mais a transição da sociedade disciplinar para
a sociedade de controle e as implicações dessa passagem nas escolas, quando alunos
contemporâneos se deparam com professores e instituições carregadas dos valores da
modernidade.
53

4.3 – Escola Contemporânea – o fim da disciplina?

Na sociedade de controle, o trabalho já não prioriza o corpo, mas a alma, como dizem
Lazzarato e Negri (2001), chamando essa “captura da alma” de trabalho imaterial. Esse tipo de
trabalho não está mais limitado ao tempo que os trabalhadores estão na empresa, podendo ser
executado fora dela. Ao priorizar o cérebro, o trabalho não está mais fortemente ligado ao tempo
e ao espaço, fazendo com que a vigilância sobre o corpo perca importância, o que não significa
a ausência de controle, como mencionam Saraiva e Veiga-Neto (2009). Ainda segundo esses
autores, “o cronômetro é substituído por indicadores e a visibilidade se desloca do corpo para
o cumprimento de metas” (p.192). O trabalho imaterial modifica as atividades da cadeia
produtiva e a “transição do capitalismo industrial para o capitalismo cognitivo marca a
passagem da ênfase nos corpos dóceis para a ênfase nos cérebros flexíveis e articulados” (p.
194). Para esses autores, “pensar como estamos sendo governados na atualidade é condição
para que se possa compreender o que vem acontecendo no mundo e, em particular, nas escolas
e em torno das escolas contemporâneas” (p.197). (SARAIVA; VEIGA-NETO, 2009).
Quando voltamos nosso olhar para a Escola contemporânea, ainda encontramos um
forte resquício da escola disciplinar e de seu modo de confinamento. Embora a vigilância sobre
o corpo tenha perdido importância, como destacam Saraiva e Veiga-Neto (2009), ela ainda é
uma das formas de controle dos adolescentes na escola contemporânea. Na Dissertação de
Alcionéia Teixeira, intitulada Cenas de uma Escola contemporânea: uma geração
indisciplinada ou uma geração de novos sujeitos? a pesquisadora aponta para o descompasso
entre os professores e os alunos.

O tempo na prática docente parece se inscrever numa racionalidade moderna,


com uma conotação coletiva e linear, enquanto os alunos se inscrevem numa
racionalidade contemporânea, que está pautada num tempo fragmentado e
individualizado. (TEIXEIRA, 2010, p. 93)

Prossegue a pesquisadora em suas conclusões a respeito das expectativas de alunos e


professores, sobre a Escola.

Enquanto os professores mostram a necessidade de uma ordenação, de um


ritmo sincronizado no desenvolvimento de suas aulas, os alunos rejeitam esses
princípios. [...]. Esta nova geração precisa de liberdade de movimentos, de
desafios que os impulsionem [...]. (TEIXEIRA, 2010, p. 93)
54

Em outro ponto, Teixeira toca nos modelos disciplinares que se observam na escola,
embasados na obediência aos regulamentos, enquanto que para os alunos, inseridos em uma
outra lógica, não veem sentido nessas normas: “Para estes sujeitos, surgidos numa racionalidade
contemporânea, parece não haver sentido seguir normas e regras pré-estabelecidas pela Escola”
(TEIXEIRA, 2010, p. 93).

A autora trata dos sujeitos (in)disciplinados no contexto da escola contemporânea e do


desencaixe que parece existir entre o que esperam da escola os professores e os alunos. Outra
pesquisa que vai ao encontro dos resultados de Teixeira (2010) é a pesquisa de Moraes (2008).
Para esse pesquisador, muitos dos comportamentos que hoje proliferam nas escolas e são
entendidos como indisciplina, podem ser mais bem entendidos quando se faz uma leitura mais
ampla da atual sociedade de controle, como dizem Saraiva e Veiga-Neto (2009). Para esse autor
e essa autora, a sala de aula da modernidade era um lugar de trabalho e a satisfação dos alunos
era adiada para o final do ano, para a vida adulta e para o futuro, ao passo que na
contemporaneidade “busca-se cada vez mais pela satisfação imediata e mais importante que
aprender um determinado conteúdo é aprender a aprender” (SARAIVA E VEIGA-NETO,
2009, p. 198).
Diante de alguns dos resultados que encontro em pesquisas realizadas no ambiente
escolar, que apontam para significados distintos da escola para professores e para alunos, em
que os alunos parecem não entender o sentido das normas e regras pré-estabelecidas, bem como
alunos que buscam liberdade de movimentos e desafios, como apontou Teixeira (2010), retomo
o que me proponho a pesquisar: que valor tem a disciplina na formação de jovens em tempos
contemporâneos, segundo seus responsáveis? E mais especificamente, quais os motivos que
levam estes pais e mães a buscarem um Colégio Militar, como o Tiradentes, para seus filhos e
ainda, quais significados atribuem à disciplina para a formação desses jovens?
Na próxima seção, apresento o conceito de válidos, utilizado por Bauman (2012),
aqueles que conseguem encarnar a subjetividade do capitalismo atual.

4.4 – Um conceito importante: válidos e falhos

Um conceito relevante para esta pesquisa é o conceito de válidos, em oposição aos


falhos. Os válidos são aqueles indivíduos com capacidade de encarnarem de forma modelar as
virtudes do capitalismo atual, enquanto os falhos são aqueles que não conseguem encarná-las.
Para Bauman (2012), os processos de exclusão se dão de três formas: por meio da construção
55

da ordem, por meio do progresso econômico e por meio da globalização. Vou me deter na
exclusão produzida pelos projetos baseados na ordem. Segundo esse autor, este tipo de projeto
tem a pretensão de modificar o mundo. Pretensão esta que sustentou o projeto moderno em suas
mais diferentes vertentes.
O objetivo era construir um mundo novo sob a égide de alguns referenciais
considerados universais, tais como a força e a dominação, no caso do fascismo e do nazismo; o
livre mercado, no caso do capitalismo; e a supressão das classes, no caso do comunismo. Nesses
projetos, há aqueles que se integram, fazem parte, sendo chamados pelo autor de válidos. Mas
há outros tantos que não se adaptam ou que não se encaixam na ordem, funcionando como
falhos. Os falhos são aqueles que não são necessários, ou não se enquadram nas regras impostas
pelo sistema vigente. Bauman (2012) chama à atenção para o fato de que essa exclusão é sempre
legítima, pois é feita pelo próprio aparelho do Estado ou pelas instituições sociais diversas, que
de certa forma a legitimam. A exclusão, dos que merecem ser excluídos pela ordem se dá pela
perda do direito de fazer parte de algo, não pelo resultado da delimitação dos incluídos
(BAUMAN, 2012).
O que Bauman (2012) aponta, e que em especial me interessa nessa análise, é que no
sistema de ordem, os falhos não estão lá porque delimitamos uma fronteira. Eles não estão lá
porque não conseguem fazer parte da ordem imposta, perderam o direito de fazer parte do
espaço que é destinado aos válidos. Portanto, acabam sendo eliminados, banidos do sistema,
pois a ordem é sempre limpa (grifo da autora). O termo válidos também foi utilizado por Saraiva
(2006) para se referir aos consumidores que interessam numa sociedade controlada pelo
biopoder. Nessa sociedade, “só interessam os consumidores válidos. Aqueles que podem, e
devem ir atrás de seus desejos de consumo, em constante renovação” (SARAIVA, 2006, p. 78).
A partir das entrevistas com os diretores do Colégio Tiradentes, mencionada
anteriormente, não encontro uma preocupação com a inclusão. Neste espaço, nada que esteja
fora da ordem é tolerado e isso se justifica por sua forte orientação disciplinar, pois a norma
disciplinar segrega os anormais do grupo (FOUCAULT, 2008). Durante a minha pesquisa, me
foi revelado que a gravidez precoce de uma das meninas fez com que a mesma abandonasse o
Colégio Tiradentes. Ela deixara de ser uma aluna válida: sua gravidez tornava-a uma falha.
Talvez, num outro espaço, o abandono do colégio não tivesse acontecido, mas, naquele espaço,
permanecer estudando não era uma alternativa possível para aquela adolescente.
Outro aspecto, que julgo importante destacar é que o Tiradentes me parece ser um
Colégio para os válidos, para aqueles capazes de bom desempenho, hígidos e diferenciados dos
56

demais, haja vista que só estes passam pelos testes de aptidão já mencionados. Lá se exige
limpeza, limpeza que vai do corpo à mente. Pois, como diz Bauman (2012), a ordem é sempre
limpa.
Segundo Veiga-Neto, os processos inclusivos na educação só puderam ser pensados a
partir do final do século XX, quando a disciplina começa a perder um pouco de sua força
(VEIGA-NETO, 2001). Ainda segundo esse autor, a inclusão precisa da aproximação com o
outro para que se dê um primeiro (re)conhecimento, e para que se estabeleça algum saber acerca
desse outro. Esse processo de inclusão, a que se refere Veiga-Neto, ainda não é realidade para
todos no Colégio Tiradentes.
No próximo capítulo, apresento as análises das entrevistas estruturadas realizadas na
primeira etapa da pesquisa e respondidas por pais e mães de alunos que estavam realizando a
prova de seleção para ingresso no Colégio Tiradentes de Porto Alegre, em novembro de 2015.
57

5. MAPEANDO O CAMINHO PERCORRIDO

Neste capítulo, descrevo as etapas da pesquisa, que me permitiram trilhar esse caminho
de análise. A primeira etapa, da qual vou tratar nesse capítulo, foi uma entrevista estruturada
(Anexo A), realizada com pais e mães que aguardavam enquanto seus filhos e filhas realizavam
a prova de seleção no Colégio Tiradentes, na manhã do dia 22 de novembro de 2015. Esta
primeira etapa foi realizada no pátio do Colégio, espaço em que os mesmos se encontravam
durante a espera. A seleção dos participantes foi aleatória, não havendo uma prévia distinção
entre homens ou mulheres. Não foram realizadas entrevistas com outros familiares, sendo esses
descartados na abordagem. Para esta etapa da pesquisa, escolhi elaborar questões que pudessem
ampliar meu olhar sobre o meu questionamento inicial: quais os motivos que levaram à escolha
do Colégio Tiradentes?

5.1 – A escolha pela entrevista estruturada e a questão ética

Escolhi o formato de entrevista estruturada em função da rapidez que o momento


exigia. Eu tinha apenas uma manhã para entrevistar o maior número de pais e mães possível.
Como a minha área de atuação profissional é a pesquisa mercadológica, trabalho nessa área
aproximadamente há 27 anos, sendo que durante os últimos vinte anos a frente de institutos de
pesquisa mercadológica, foi possível contar com a ajuda de duas outras pesquisadoras. Com
isso, ao final da manhã, tínhamos realizado 41 entrevistas. Cerca de seiscentos alunos
realizaram a prova de seleção. Noventa vagas foram oferecidas. Como as outras pesquisadoras
não estavam familiarizadas com o tema desta pesquisa procurei formular questões mais
abrangentes. Com isto, foi possível registrar as respostas na íntegra, sem necessidade que elas
tivessem que fazer alguma interpretação. No dia que antecedeu a realização da pesquisa, fiz
uma reunião de trabalho com as pesquisadoras que me auxiliariam nessa etapa, para que elas
soubessem do objetivo e da importância de registrar a resposta de forma mais completa, sem
abreviações ou interpretações, por parte delas. Algumas das questões que gravitaram em torno
da escolha pelo Colégio Tiradentes e dos motivos que levaram à escolha deste, além das
dificuldades de adaptação esperadas pelos pais e mães no Colégio.
Passada esta primeira etapa da pesquisa, decorreu um ano para que eu retornasse a
contatar com os pais e mães entrevistados que na ocasião aceitaram participar da segunda etapa.
58

Expliquei, naquele momento, que nessa segunda etapa me interessaria conversar com aqueles
pais e mães cujos filhos tivessem sido aprovados e que já teriam cursado parte do ensino médio
no Colégio Tiradentes. Na segunda etapa, que será tratada no capítulo 6, as entrevistas foram
pessoais e semiestruturadas, todas realizada por mim. Para tanto, utilizei de um Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo B), que foi assinado por todos os participantes da
segunda etapa. Esse termo não foi necessário na primeira etapa. A decisão de entrevistar apenas
pais e mães foi para que somente adultos participassem, não adolescentes. A segunda etapa da
pesquisa, assim como a primeira, não foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa. Esta
decisão ancora-se no questionamento feito por pesquisadores no campo das Ciências Humanas
e Sociais a respeito do viés biomédico das resoluções aprovadas pelo Conselho Nacional de
Saúde. Por outro lado, como se refere Pereira (2015) em seu artigo, o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido tem por real objetivo proteger o pesquisador e a Universidade, caso um dia
queiram os pesquisados acioná-los judicialmente, não sendo o pesquisado o alvo das garantias
desse termo (PEREIRA, 2015).
O editorial da revista Educação e Sociedade (2015) aborda a relação
pesquisador/pesquisado como sendo uma relação de mútua confiança, uma relação que se
estabelece ao longo do processo, nos diferentes contatos que fazem e, às vezes, num
acompanhamento de todo um período de pesquisa. Por outro lado, as pesquisas nessa área não
desencadeiam maleficência nos sujeitos pesquisados, motivo pelo qual a área de Ciências
Humanas e Sociais tem se empenhado junto ao Conselho Nacional de Saúde, visando a
conquista de autonomia no desenvolvimento de pesquisas e de definição do risco aos sujeitos
participantes, dadas as idiossincrasias de matrizes teóricas, estatutos epistemológicos e
procedimentos metodológicos dessa área do conhecimento (REVISTA EDUCAÇÃO E
SOCIEDADE, 2015).
Nas duas etapas da minha pesquisa, obtive o consentimento para a realização da
entrevista do próprio entrevistado, uma vez que esse não estava recebendo nenhum benefício
ao conceder a entrevista e nem estava sob nenhum tipo de pressão. Concederam a entrevista de
livre e espontânea vontade, com o objetivo de contribuir com a pesquisa acadêmica. Aqueles
que manifestaram o interesse de participar da segunda fase da pesquisa forneceram
espontaneamente seus nomes e telefones para que pudessem ser encontrados posteriormente.
No entanto, conforme foi acordado com os pesquisados, seus nomes não seriam aqui revelados.
59

5.2 – Caracterização do público selecionado na primeira etapa

Entre os que responderam as entrevistas, houve um equilíbrio de famílias com e sem


Militares, bem como entre os gêneros daqueles que realizavam a prova, conforme mostram as
Figuras 14 e 15. A idade predominante dos/as adolescentes que realizavam a prova de seleção,
segundo informaram os familiares, era entre 14 anos e 15 anos, sendo que a média das idades
ficou em 14,5 anos (Figura 16), sendo que 63% eram oriundos de escolas da rede pública de
Ensino (Figura 17). Em 46% dos casos, a decisão de estudar no Colégio Tiradentes foi do
próprio estudante (Figura 18), segundo disseram os familiares entrevistados.

Figura 14 - Presença, ou não, de Militar na família

Fonte: Dados colhidos pela autora


60

Figura 15 - Gênero do/da adolescente que realizava a prova de seleção

Fonte: Dados colhidos pela autora

Figura 16 - Idade do/da adolescente que realizava a prova de seleção

Fonte: Dados colhidos pela autora


61

Figura 17 - Rede de ensino de origem

Fonte: Dados colhidos pela autora

Figura 18 - De quem foi a decisão pelo Colégio Tiradentes

Fonte: Dados colhidos pela autora

Os próximos dados tratam dos motivos da escolha do Colégio Tiradentes e da


expectativa dos pais e das mães quanto à futura adaptação dos filhos ao Colégio.
Posteriormente, apresento a íntegra das falas dos pais e das mães e as categorias e subcategorias
que emergem dessas falas e que serão o material de análise. Os motivos elencados por pais e
mães para a escolha do Colégio Tiradentes foram agrupados em categorias, o que permitiu
62

quantifica-los e identificar os principais. Como as respostas eram dissertativas, em alguns casos,


foi possível identificar mais de uma justificativa para o mesmo aluno.
A Tabela 1 apresenta a relação de motivos elencados para a escolha do Colégio
Tiradentes.

Tabela 1 - Motivos para a escolha do Colégio Tiradentes – múltipla escolha

Motivos da escolha Frequência %


Desempenho no vestibular - UFRGS/ENEM 25 61
Disciplina 21 51
Pretende seguir a carreira Militar 5 12
Segurança dentro da Escola/companhia 4 10
Precariedade da Rede Pública 4 10
Valores cívicos 3 7
Bons colegas 1 2
Infraestrutura do Colégio 1 2
Fonte: Dados colhidos pela autora

A Figura 19 apresenta o percentual de alunos que os familiares acreditam que terão


dificuldade de adaptação no Colégio Tiradentes:

Figura 19 - Dificuldade de adaptação no Colégio Tiradentes

Fonte: Dados colhidos pela autora

Para a maioria dos pais e das mães entrevistadas (80%), os filhos e filhas não
encontrarão dificuldades de adaptação no Colégio Tiradentes. Em 20% dos casos, há uma
expectativa de dificuldade, e ela recai sobre a rigidez disciplinar que os filhos e filhas podem
encontrar na fase de adaptação.
63

Tabela 2 - Tipo de dificuldades que os filhos e filhas podem encontrar:

Que dificuldades Frequência %


Rigidez disciplinar 05 62,5
Horários 02 25,0
Enfrentar a timidez 01 12,5
Muito diferente da outra Escola 01 12,5
Total 08
Fonte: Dados colhidos pela autora

Na Tabela 3, a síntese dos principais resultados da pesquisa conforme a presença ou


não de Militares na família. Na terceira parte da tabela, algumas vezes, os motivos apresentados
por pais e mães para o mesmo aluno foram mais de um, por isso a soma desta categoria extrapola
o número de entrevistados.

Tabela 3 - Cruzamento de dados segundo a presença ou não de Militar na família:

Sem Militares Com Militares Soma das


na família na família incidências
REDE DE ENSINO DE ORIGEM
Rede Pública 13 13 26
Rede Privada 6 9 15
Soma 19 22 41
ADAPTAÇÃO
Espera dificuldade de adaptação 2 6 8
Não espera dificuldade de adaptação 17 16 33
Soma 19 22 41
MOTIVOS DE ESCOLHA DO COLÉGIO
Vestibular UFRGS/ENEM 14 12 26
Disciplina 6 15 21
Precariedade da rede pública 2 2 4
Carreira Militar 4 1 5
Segurança dentro do Colégio 3 3 6
Valores cívicos 1 2 3
Fonte: Dados colhidos pela autora

As respostas dentro da tabela estão organizadas segundo a presença ou não de militares


na família. Alguns dados apontam para uma diferença de percepção e de expectativa entre
aqueles que têm militares na família e os que não têm. Entre entrevistados com familiar militar,
há maior presença de estudantes oriundos da rede privada de ensino. Entre os motivos elencados
para a escolha do Colégio, a categoria desempenho no vestibular da UFRGS/ENEM é a que
aparece com maior número de citações. Essa motivação aparece de forma equilibrada entre os
dois públicos analisados (militares e não militares). A questão disciplinar aparece em segundo
64

lugar, nas citações. É importante salientar que mais de um motivo foi citado pelos familiares,
sendo que a combinação deles é o que os leva a escolher o Colégio Tiradentes.
A partir das respostas dos familiares pesquisados, recortei categorias de análise,
porém, as categorias recortadas não aparecem de forma isolada, mas imbricadas umas com as
outras e ambas com a questão disciplinar como pano de fundo.
 O mundo lá fora e a disciplina; e
 O desempenho no vestibular como passaporte para o futuro.

5.3 – O mundo lá fora e a disciplina

[...] a Escola pública, surgida na Europa no século XVIII e consolidada no


XIX, constituiu-se numa ação biopolítica para docilizar a população,
produzindo sujeitos com sentimentos de cidadania e de vinculação a um
projeto nacional [...] impõe a fixação dos sujeitos no espaço, corta a
comunicação e cultiva a obediência aos regulamentos como um valor.
(SARAIVA, 2014, p. 144)

A Escola moderna tem como sustentação um sistema disciplinar que esquadrinha o


corpo, com o uso do tempo em atividades exaustivas e coletivas. A disciplina presente no
Colégio Tiradentes remete aos valores da escola moderna. A presença da disciplina se relaciona
nas respostas dos familiares com o desenvolvimento de valores morais, de organização e de
sentimento cívico, valores esses que as famílias demonstram não encontrar no “mundo lá fora”.
Os excertos a seguir foram retirados das falas dos pais e mães, ao responderem à
pergunta: Fale sobre os motivos que levaram à escolha do Colégio Tiradentes.

MÃE 1: Aqui é mais rígido, mas vale a pena, porque do jeito que está o mundo lá
fora.

MÃE 3: Prepara para o vestibular e para a vida também, pela disciplina, pelo
respeito, porque o mundo de hoje está perdido.

MÃE 4: Em um local público não se tem a segurança encontrada nessa Escola. E


saindo daqui ela poderá fazer qualquer outro tipo de curso, sairá muito bem
preparada.

PAI 11: Porque é referência no estado em educação e a disciplina é mais adequada


para a vida. E sem disciplina a vida se torna desorganizada.

MÃE 8: O ensino é muito bom, valoriza os professores e tem a questão disciplinar,


porque a violência infelizmente se instalou dentro das Escolas. A segurança dele está
em primeiro lugar.
65

PAI 10: A ideia é buscar uma Escola pública de qualidade. Aqui valorizam o civismo,
usam uniforme, respeitam os professores.

Que “mundo lá fora” seria esse, a que se referem os familiares? Diferentes referências
aparecem nos excertos selecionados que remetem o Colégio Tiradentes para um lugar diferente
“desse mundo que está perdido”; “do mundo violento”, “do mundo sem segurança”. O
sentimento referido pelos familiares pode ser pensado sob o conceito foucaultiano de
heterotopia. Foucault (1967) cunhou esse conceito para se referir a uma espécie de lugar que
está fora de todos os lugares, embora sejam lugares efetivamente localizáveis. Esse é um
conceito que se coloca em oposição às utopias (FOUCAULT, 1967)
Por ser uma escola fortemente disciplinar, o Colégio Tiradentes parece estar fora da
lógica neoliberal imposta pela sociedade atual, que segundo Lazzarato e Negri (2001, p. 30) se
apoia cada vez mais num “trabalho intangível, que já não pode ser mensurado em termos de
hora/homem, que não está mais limitado ao espaço da empresa, nem à jornada de trabalho”. No
Colégio Tiradentes, a disciplina é rígida, a presença é exigida, bem como a pontualidade.
Pensando no que aponta Teixeira (2010) em sua pesquisa, discorrendo sobre os alunos que
querem liberdade e no desencaixe, por ela observado, entre corpo docente e discente, como que
essa disciplina imposta no Colégio Tiradentes cabe na contemporaneidade? Na sociedade
neoliberal, a disciplina tem perdido força e o que se coloca em movimento é um poder muito
mais discreto, que produz muito menos resistências e contestações morais do que a disciplina
(SARAIVA; LOPES, 2011), mesmo assim, os pais e as mães acreditam que seus filhos estarão
bem preparados para a vida estudando numa escola fortemente disciplinar. Observei que a
referência a uma formação disciplinar tem mais força junto às famílias com a presença de
Militares. Esse grupo atribui um maior valor para a disciplina: são quinze entre 22 alunos com
militares na família comparados com seis em 19 alunos sem militares na família.

5.4 – Desempenho no vestibular como passaporte para o futuro

[...] O trabalho imaterial produz bens imateriais, como conhecimento, ideias,


informação, emoções e relações. O trabalhador do trabalho imaterial deve ser
bastante diferente do trabalhador do trabalho industrial. (SARAIVA, 2014,
p.147).
Nas respostas dos pais e das mães (excertos abaixo) à solicitação: Fale sobre os
motivos que levaram à escolha do Colégio Tiradentes, se observa que a busca por uma
qualidade de ensino que permita aprovação no vestibular da UFRGS e/ou um bom desempenho
66

no ENEM é bastante referida. Para os respondentes, parece, num primeiro momento, que
qualidade e disciplina são sinônimos. As respostas referem conteúdo, cobrança, grade curricular
e supervisão, como valores importantes para a garantia de um aporte de conhecimento suficiente
para o vestibular:

MÃE 41: Pela disciplina e organização, a qualidade do ensino e professores


comprometidos.

MÃE 13: O Colégio Militar otimiza os estudos dos alunos e preza muito pela conduta
e disciplina, o que é fundamental para se desenvolver como cidadão.

MÃE 15: A disciplina, a didática. Nas (Escolas) não militares é tudo um oba, oba!
Dão o conteúdo e não cobram dos alunos. Isso eu sei que vou encontrar aqui. Eles
supervisionam e cobram dos alunos.

MÃE 5: O conteúdo curricular é ótimo e dá disciplina para o aluno; Preparação para


a faculdade e tem bastante conteúdo.

MÃE 7: O tipo de ensino. O aproveitamento é melhor, a organização da Escola é que


faz esse aproveitamento.

MÃE 9: Primeiro por ser Militar, com regras mais disciplinares: assiduidade,
pontualidade, cobrança de atividades. Aqui também vai ter uma melhor preparação
para o vestibular porque o ensino é mais puxado.

MÃE 21: Porque ela quer passar na UFRGS.

O que observei na fala dos pais e das mães participantes da pesquisa é que a educação
disciplinar, que ainda se impõe no Colégio Tiradentes, agrada e parece produzir efeitos na
sociedade neoliberal, com a aprovação elevada de seus egressos nos vestibulares ou no ENEM.
Como esses testes medem exclusivamente conhecimento, exigem do aluno quatro horas de pura
concentração. Estariam esses sujeitos mais bem preparados física e psicologicamente para
suportar a pressão do vestibular ou do ENEM? A sociedade contemporânea questiona as escolas
disciplinares e essas parecem ser cada vez menos aceitas por alunos, como afirma Teixeira
(2010) em seu estudo. No entanto, ainda há uma parcela de jovens e de famílias que acreditam
na disciplina como forma de facilitar a aquisição de conhecimento e melhorar o desempenho.
Estas famílias vêm na disciplina uma espécie de passaporte para um futuro mais próspero para
seus adolescentes.
Como já referi em diferentes momentos, proponho-me a pesquisar os significados que
essas famílias atribuem à disciplina na formação de seus filhos e filhas, pois como nos lembra
Lazzarato, o trabalho industrial era o modelo de trabalho da Modernidade, e esse tipo de
trabalho necessitava de um corpo treinado no detalhe, capaz de suportar a dura rotina da fábrica,
67

o que não é mais necessário com o advento do trabalho imaterial. Nesse novo modelo de
capitalismo, não se faz mais necessário treinar e fixar os corpos (LAZZARATO, 2006). Essa
mudança de racionalidade educacional, segundo Saraiva (2014), passa por uma gradativa
desvalorização da chamada escola tradicional, norteada pelos princípios disciplinares, e essa
escola estaria sendo proclamada como um modelo ultrapassado, ineficiente e no cerne da baixa
qualidade de ensino. Ainda, segundo essa autora, a comunicação que era estritamente proibida
pela escola disciplinar, passa a ser, com frequência, incentivada. Com isso, a obediência ao
comando do professor também é relaxada. O que se tem percebido é que a educação atual está
muito mais em sintonia com a governamentalidade neoliberal, com o capitalismo cognitivo e
com o trabalho imaterial, do que com a disciplina. (SARAIVA, 2014).
No próximo capítulo, inicio a análise das entrevistas semiestruturadas, realizadas com
cinco mães que aceitaram participar da segunda etapa da pesquisa e cujos filhos ou filhas
passaram na seleção para o Colégio Tiradentes e cursaram o primeiro ano do ensino médio.
Portanto, à época da segunda parte da pesquisa, os alunos já haviam cursado a quase totalidade
do primeiro ano. Dos pais entrevistados na primeira etapa, um deles não aceitou dar entrevista
e, nos demais casos, os filhos não passaram na seleção. Desta forma, restaram as entrevistas
com as mães. Foram convidadas e aceitaram participar duas mães de meninos e três mães de
meninas.
68

6. ANALISANDO AS ENTREVISTAS

Neste capítulo, farei a análise do material empírico resultante das entrevistas


semiestruturadas com as cinco mães de alunos e alunas que já haviam cursado a quase totalidade
do primeiro ano do Ensino Médio no Colégio Tiradentes. Como já mencionado no Capítulo 1,
meu interesse nessa pesquisa está voltado para escolas fortemente disciplinares, tendo como
objetivo investigar o valor que tem a disciplina na formação de jovens em tempos
contemporâneos, na opinião de seus responsáveis.
Para realizar a análise, selecionei excertos das entrevistas e que demonstram o
significado atribuído à disciplina pelas mães entrevistadas. Ao selecionar esses excertos, tive
que abandonar outros, trilhando um caminho que nem sempre é fácil, pois nossa intenção é
utilizar ao máximo o material produzido. Decidi organizar a análise a partir de categorias, assim
como fiz na primeira etapa, pois considero que esta metodologia proporciona maior clareza na
apresentação dos achados desta pesquisa. Os excertos selecionados estão imbricados uns com
os outros, assim como as categorias que serão utilizadas.
Passou-se um ano desde o meu primeiro contato com os pais e mães daqueles 41
estudantes que postulavam uma vaga no Colégio Tiradentes. Isto possibilitou que essas famílias
tivessem um ano de contato com o Colégio, permitindo falarem com mais propriedade sobre o
desempenho de seus filhos, das dificuldades enfrentadas e avaliar o efeito da disciplina naqueles
corpos. Meu primeiro contato para esta segunda etapa da pesquisa com os participantes da
primeira etapa se deu por telefone. O objetivo da ligação foi agendar um horário e local que
fosse viável para conversarmos sobre como transcorreu o primeiro ano de seus filhos ou filhas
no Colégio Tiradentes. Neste contato, obtive o seguinte resultado: em 24 casos os filhos ou
filhas não foram aprovados na seleção. Em dez casos, não foi possível obter retorno com o
número informado. Nos sete casos em que consegui contato com responsáveis cujos filhos
tinham sido aprovados, obtive o seguinte resultado: cinco mães se dispuseram a ser
entrevistadas, um dos pais contatados não quis participar da segunda etapa e, no outro caso, a
menina precisou sair do Colégio porque engravidou. Houve somente um encontro com cada
uma dessas mães na segunda fase, o que foi suficiente para levantar os elementos necessários
para o propósito desta pesquisa. Os encontros foram em cafeterias na proximidade da residência
ou do local de trabalho. As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas para a
análise. Das mães entrevistadas, três são mães de meninas e duas são mães de meninos. Como
este foi o nosso segundo contato, optei por manter o número atribuído a cada uma delas na
69

entrevista da primeira etapa. Isso vai permitir confrontar a opinião que tinham antes e depois
dos filhos frequentarem o Colégio Tiradentes. As questões que elaborei para esta segunda etapa
dão continuidade às questões da primeira entrevista, permitindo um ponto de partida para a
conversa que se estabeleceu. No Quadro 1 apresento o roteiro elaborado para as entrevistas.

Quadro 1- Roteiro da entrevista semiestruturada

1- No final do ano passado, tivemos a oportunidade de conversar, enquanto você aguardava seu
filho/filha realizar a prova de seleção para o Colégio Tiradentes. Naquela ocasião, você me
falou que a escolha desse Colégio tinha sido, entre outros fatores, porque (resgatar do
formulário a resposta dada na época). Passado esse primeiro ano, como a família está vendo o
sistema educacional do Colégio Tiradentes?

2- De que maneira, esta escola contribui e onde, especificamente, contribui na formação de seu
filho/filha?

3- Houve problemas de adaptação? Quais problemas ele/ela teve?


EM CASO POSITIVO - Por que você acredita que isso aconteceu?

4- Você também me disse, na ocasião, que quem escolheu o Colégio Tiradentes, como opção
de Ensino Médio, foi de (resgatar resposta). Podes falar mais um pouco sobre esta escolha?

5- O que mais você elencaria como diferencial do Colégio Tiradentes para a formação de seu
filho/filha?

A seguir, apresento as análises do material das entrevistas a partir de três categorias de


análise.

6.1 – Definindo as categorias de análise

Para seguir com a análise do material resultante das entrevistas com as mães, mantive
as duas categorias recortadas anteriormente – o mundo lá fora e desempenho no vestibular –
deixando a disciplina como uma categoria de análise separada do “mundo lá fora”. Esta nova
categoria chamarei de disciplina para a vida, ficando assim, três categorias:

 O mundo lá fora;
 Disciplina para a vida; e
 Desempenho no vestibular como passaporte para o futuro.
70

6.2 – O mundo lá fora

As heterotopias sempre pressupõem um sistema de abrir e fechar que ao


mesmo tempo as isola e as torna penetráveis. Em geral, não se entra nesses
lugares à vontade. Ou a entrada é obrigatória, como no caso da caserna ou da
prisão, ou então o indivíduo que tem que se submeter a rituais e purificações
(FOUCAULT, 1967, p.8).

Mantive a categoria “o mundo lá fora”, porque entendo que o espaço do Colégio


Tiradentes se enquadra naquilo que Foucault (1967) chamou de heterotopia. Um lugar que está
fora de todos os lugares, embora seja um lugar efetivamente localizável (FOUCAULT, 1967).
Para esse autor, as sociedades criam suas heterotopias e cada uma delas tem sua função
determinada e precisa na sua sociedade. Contudo, a medida que a histórias se desenvolve, esses
espaços podem assumir outras funções, diferente da original.
As heterotopias são lugares que parecem manter uma espécie de suspensão ou inversão com os
demais lugares de nosso cotidiano. Parecem espaços deslocados, ou desencaixados, diferentes
daqueles que habitamos: são lugares fora de qualquer outro lugar e por isso nos inquietam
(MARTINS, 2002). De certa forma, podemos também olhar para o Colégio Tiradentes como
um lugar que nos inquieta.
No Tiradentes, os alunos passam ao longo do primeiro ano por diversas etapas de
adaptação antes de serem definitivamente integrados ao grupo. E esta integração se dá com a
cerimônia de troca de boina. É o momento em que o aluno passa a ser incorporado ao sistema
do Colégio Tiradentes da Brigada Militar, após um período de adaptação à carga horária de
estudos, aos horários de entrada e saída do Colégio, ao uso correto do uniforme, ao
cumprimento das normas que regem o Colégio Tiradentes da Brigada Militar, conforme
demonstra a figura 20.
71

Figura 20 - Cerimônia de troca de boinas

Fonte: site do Colégio Tiradentes

No decorrer deste primeiro ano, parece ocorrer uma separação desses adolescentes do
mundo que está fora do Colégio, o chamado “mundo lá fora”. O que as mães relatam, por vezes,
com preocupação, ainda que disfarçadamente, é que seus filhos vão abandonando os amigos
que tinham fora do Colégio e deixam de se preocupar com celular, maquiagem, roupas. Dito
isso, apresento alguns excertos que sinalizam neste sentido.

Mãe 14: Tem alguns pais [referindo-se às reuniões de pais e mestres], que ficam
falando (entre eles) que os filhos não têm tempo para mais nada. Acham a escola
puxada, “coitadinho”. Mas eles não sabiam como era a metodologia da escola?
[Pergunta-se a mãe]

Pesquisadora: e seu filho, também tem pouco tempo para outras atividades, qual a
sua opinião?

Mãe 14: Ele não tem mais tempo para ficar no WhatsApp, brincando no celular e
coisas assim, como ficava antes. Agora está preocupado com os estudos. Eu acho que
isso é bom!

O distanciamento do mundo lá fora, que o Colégio vai produzindo nos seus alunos,
marca a família e as relações que nela se estabelecem. Porém, curiosamente, o processo parece
se inverter e podemos pensar nesses sujeitos como “incluídos” dentro do espaço do Colégio e
“excluídos”, por assim dizer, do mundo que corre lá fora. E como escreve Ewald (1993), na
medida em que um grupo passa a se relacionar somente consigo mesmo, tem como princípio
72

de comparação somente a si próprio. Embora esta “exclusão” a que me referi seja um


descompasso momentâneo, que dura o período do Ensino Médio, ela ocorre com bastante força,
em se tratando de moldar aqueles corpos e aquelas relações.

Mãe 32: A exigência da escola acaba afastando eles da vida social, isso no início foi
um problema para ela. Mas agora já está mais integrada com os colegas do
Tiradentes e acaba fazendo os programas com essa turma.

Pesquisadora: ela não tem mais vida social?

Mãe 32: tem, mas é menos que antes, quando saía mais com os colegas e ia ao cinema.
Agora precisa estudar muito mais.

Outro aspecto a ser destacado é que a norma que se aplica ao Colégio Tiradentes
assume os dois sentidos que Veiga-Neto (2011, p 112) apresenta, “de um lado: norma como
regra de conduta, como oposição à irregularidade e à desordem; de outro lado: norma como
regularidade funcional, como oposição ao patológico e à doença”. Os dois sentidos de norma
se articulam no espaço do Colégio Tiradentes. O papel da norma disciplinar, segundo Foucault
(2007), é o de estabelecer os parâmetros para a vida dentro de um sistema disciplinar, definindo
os limites entre o aceitável, o normal, e o anormal.
Ao promover uma convivência intensa desse grupo entre si, eles compartilham valores
de conduta, morais e éticos, mas de uma ética interna ao grupo, promovendo a sua própria
normalização. O Colégio retira os adolescentes da exterioridade, do convívio com aqueles que
estão fora de seus muros, de suas regras, para enquadrá-los a uma distância segura da
exterioridade, a ponto deles não se incorporarem aos demais.

Mãe 22: O sistema educacional é excelente, é uma educação que não


se vê “ali fora”.

Pesquisadora: O que, dessa educação, não se vê “ali fora”?

Mãe 22: A educação, o respeito, o coleguismo, responsabilidade. Eles


aprendem a respeitar também o horário e a aceitar as regras. Se o
horário é às 7h é 7h, não 7h e 1 minuto, como temos o hábito de fazer.

A família também é envolvida pelo Colégio, pois é necessário que as regras sejam
respeitadas, e os demais membros da família precisam compreender e aceitar o que é imposto
pelo Colégio, o que parecem fazer sem muitos questionamentos, começando pela pontualidade.
A aula inicia às 7h, pontualmente: nem um minuto sequer há de tolerância para esse horário.
73

Segundo relatou-me uma mãe, às 7h01min o portão é fechado e o aluno não entra mais. O
mesmo ocorre nas reuniões de pais e mestres:

Mãe 4: Essa questão de horário foi o que mais “pegou” a todos nós
aqui em casa. Porque a gente pensa, são só cinco minutos! Não, até
nas reuniões de pais, horário é cumprido à risca. Aos poucos nós fomos
nos adaptando a isso. Eu aprendi a cumprir horário, e aprendi isso com
ele.

A articulação entre educação familiar e educação escolar, como garantia de sucesso na


educação das gerações mais jovens foi tratada pelo filósofo Comenius no século XVII. Para
esse pensador era preciso haver uma união, uma aliança, entre as duas instituições [família e
escola]. Embora que com atribuições diferenciadas, pois a educação da primeira infância se
daria em casa, esta aliança era o sucesso da educação. Passada a primeira infância os pais
deveriam confiar a educação de seus filhos a especialistas (NARODOWSKI, 2006).

Mãe 32: A família teve que se adaptar à rotina dela, que precisa estar
de volta no colégio para o turno da tarde. As aulas lá iniciam às 7h de
manhã, então isso exigiu uma adaptação de horário. É preciso fazer o
almoço dela, deixar tudo pronto para ela levar (marmita).
Acabamos nos mudando para perto do colégio e isso facilitou um pouco
essa questão dos horários dela.

Aqui também se encontra uma aliança da família com o grupo de especialistas do


Colégio. É preciso confiar a eles e neles, para submeter-se a uma disciplina tão rigorosa. É
preciso acreditar que este é o melhor caminho para a formação daqueles adolescentes. Neste
sentido, é preciso aceitar integralmente as regras da escola, como aquela do uniforme.

Mãe 22: A responsabilidade e o respeito pelo próprio uniforme são


trabalhados na escola. Ela não pode sair por aí de uniforme, ir ao
shopping, por exemplo. Ela só pode usar o uniforme no colégio, e
lógico, para ir até o colégio. Mas nunca fora disso e isso é respeitado.

O uniforme é parte da identidade do estudante do Colégio Tiradentes. O uniforme só


pode ser usado dentro do Colégio ou em atividades pertinentes. Não é possível buscar o filho
ou a filha no Colégio e ir ao shopping, fazer compras ou ir ao cinema, enquanto o(a) estudante
ainda estiver uniformizado(a). Há penalidades, caso isso ocorra, assim como há todo um
regulamento para o uso do uniforme. Nesse regulamento, no capítulo I, Art. 2º: diz o seguinte:
74

O uniforme é o símbolo do aluno do CTBM e deve ser usado com honra e


orgulho. Parágrafo único – Não é permitido sobrepor ao uniforme: peça,
artigo, insígnia ou distintivo de qualquer natureza, não previstos ou
autorizados na forma deste Regulamento (COLÉGIO TIRADENTES, 2017).

O uso do celular também é terminantemente proibido nas salas de aula do Colégio


Tiradentes, segundo me relata uma das mães. Como nem sempre os adolescentes conseguem
cumprir esta ordem, pois ficar distante do celular é quase impossível para alguns, o uso deste
aparelho passa a ser também um problema a ser resolvido pelas famílias.

Mãe 4: o uso do celular é proibido em sala de aula. Os professores falam


sempre isso e é chamada a atenção dos alunos. Mas muitos deles não
aguentam ficar sem o celular. E as famílias também não colaboram e ligam
no horário da aula. Isso foi muito cobrado nas reuniões de pais e mestres este
ano.

Muitos dos discursos acerca da escola contemporânea têm procurado demonstrar o


distanciamento que esta instituição tem do modo de ser contemporâneo. Conforme Sibilia
(2012), há uma incessante busca da escola, e também dos indivíduos, de estratégias para lidar
com a velocidade do mundo fora dos muros da escola. E o que me parece é que o Tiradentes
está ainda mais desconectado com o que acontece fora de seus muros. Dá-se ali um processo
inverso, e o familiar que está “fora” é que precisa se adaptar a quem está “dentro” daqueles
muros.

No que me foi possível observar, ao longo das entrevistas, é a família que faz um
esforço para manter o filho ou filha no Colégio Tiradentes. Estes esforços vão da adaptação do
grupo familiar às regras do Colégio ao esforço financeiro. Embora o Tiradentes pertença à rede
de ensino estadual, há obrigatoriedade do uso de uniformes, que são pagos. Há também uma
contribuição mensal com o Colégio. Este tipo de contribuição já existiu, mas não existe mais
nas escolas da rede estadual de ensino. Todos os esforços empreendidos pela família, como
mostrarei mais adiante, têm uma finalidade principal, que é a busca por uma colocação em um
curso superior oferecido pela UFRGS. Tal colocação implica a necessidade de ser bem sucedido
nos exames do ENEM e no vestibular.
A próxima categoria que recortei é disciplina para a vida. Vou discutir como as mães
justificam a disciplina como garantia de sucesso para uma carreira futura de seus filhos ou
filhas.
75

6.3 – Disciplina para a vida

Conforme Foucault (2007), no sistema disciplinar o binômio “gratificação-sanção” se


torna operante no processo de treinamento e correção. Toda essa classificação tem como função
marcar os desvios e hierarquizar as qualidades, competências e aptidões (FOUCAULT, 2007).
Parece ficar claro que a sistemática “medalha não medalha”, demonstrada na seção 2.1.3,
corresponde ao binômio “gratificação-sanção”, descrito por Foucault. O mecanismo “medalha
não medalha” e outras eventuais premiações aos alunos do Tiradentes também funcionam como
controladores de comportamentos. Quem não foi condecorado correntemente, terá nova chance
de o ser na próxima formatura, se adotar outra atitude. Portanto, esse mecanismo induz ao
comportamento desejado pela instituição. O mecanismo gratificação-sanção não se resume à
concessão de medalhas, mas incide em outros aspectos da vida escolar.

Mãe – 32: Quem não tem boa nota perde os passeios e competições com
outras escolas. Só participa o aluno que tem a nota mínima. Como ela não
vai bem nas notas, e ficou com média baixa, acaba perdendo os passeios e
também a participação no esporte, que acontece no turno contrário.

Pesquisadora: Como uma sanção?

Mãe – 32: não vejo como uma sanção, mas como um benefício mesmo, para
quem tem boas notas.

Embora essa mãe não considere a perda do passeio como sanção, esta está presente no
regulamento disciplinar como uma sanção, que ocorre por falta disciplinar, ou como relatou a
mãe, por baixo desempenho escolar. De acordo com as mães, a disciplina presente nesse
Colégio vai preparar melhor seu filho ou filha para a vida e para o mercado de trabalho. Por
ocasião da primeira etapa da pesquisa, 80% dos pesquisados disseram que os filhos ou filhas
não teriam dificuldades de adaptação. Na segunda etapa, as cinco mães entrevistadas referiram
que os filhos ou filhas e também as famílias encontraram dificuldades de adaptação,
dificuldades essas que foram desde a rigidez do horário, do uso do uniforme até a disciplina
que o aluno ou aluna precisa desenvolver para poder estudar.

Mãe 32: A exigência da escola a pegou de surpresa, porque na outra escola


ela tirava notas boas e quase não estudava. Então, achava que sabia tudo,
que estava muito bem. Quando iniciaram as aulas ela viu que não conseguia
acompanhar o ritmo de exigências do colégio
76

Porém, estas dificuldades, em geral, são significadas como algo que produz bons
resultados. Nesse sentido, as mães veem o zelo com o próprio uniforme, bem como o
comprometimento com a manutenção e limpeza da escola, aprendizagens que os transformam
positivamente e os preparam para a vida.

Mãe-22: Ela tem que limpar o sapato, tem que se responsabilizar pelo
uniforme, e são diferentes uniformes. Foi caro comprar todos eles, tem o dia
do uniforme completo, dia do abrigo, o cabelo precisa estar arrumado,
puxado para usar a boina. Tudo isso são responsabilidades que ela acabou
assumindo e isso prepara para a vida dela depois.

Mãe- 4: O colégio passou para ele coisas que eu não consegui transmitir.

Pesquisadora: como assim? Me explica melhor.

Mãe-4: Fiquei feliz de vê-lo tomando conta de suas coisas, cuidando daquele
uniforme, nem me deixa passar. Ele dá valor, tem respeito [pelo uniforme].
Cumpre o que é combinado. Creio que isso a gente acaba relaxando na
educação e lá ele aprendeu. Acho que todo o jovem devia passar por essa
escola. Vejo que em outras escolas tem vandalismo, está tudo sujo, quebrado.
Lá não tem isso e eles ajudam na limpeza da sala e do pátio do colégio.

Mãe-15: Ela aprendeu muito nesse último ano. Amadureceu, ficou mais
responsável. Ela tem que cuidar do próprio uniforme, passar todos os dias,
arrumar cabelo. Enfim, obrigações com as quais ela não estava acostumada.
Eles limpam a sala, ajudam a limpar o pátio, recolhendo as folhas, são
responsáveis em manter a sala de aula e aquele espaço em ordem.

Outra mãe me diz que a disciplina é necessária para a vida, que regras são importantes
e que estas devem ser cumpridas.

Mãe-14: A disciplina é necessária para a vida e as regras devem ser


cumpridas. A escola é como o mercado de trabalho, tem regras e horários
que precisam ser cumpridos. Acredito que isso vai tornar ele um profissional
mais capacitado para enfrentar as adversidades do mundo. Tenho
incentivado ele a estudar fora do país. Acho que essa escola só irá contribuir
para isso.

Percebi, ao longo das minhas entrevistas, uma defesa intensa de que o sistema
disciplinar do colégio prepara os filhos e filhas para a vida. Parece-me, no entanto, que não é
apenas a disciplina, como adestramento do corpo e da conduta, que opera no Tiradentes, mas
um sistema normalizador, que, como escreve Ewald, os homogeneíza, ao colocar todos no seu
interior, e os diferencia ao fazer cada um ocupar um lugar, uma classificação. “Enquanto as
77

disciplinas visam os corpos, com uma função de adestramento, a norma é uma maneira de
produzir uma medida comum” (EWALD, 1993, p. 88).
A próxima categoria que vou tratar será “desempenho no vestibular”. Este é o motivo
principal para que famílias busquem o Colégio Tiradentes, conforme a primeira etapa da
pesquisa. As famílias almejam, para seus filhos ou filhas, acesso a boas universidades públicas,
tais como a UFRGS, com entrada através do ENEM ou do vestibular. Embora as falas das mães
tenham se concentrado mais na palavra vestibular, como forma de acesso à universidade, e à
UFRGS como referência, elas sabem que um bom desempenho do ENEM também pode
garantir acesso a outras instituições públicas de reconhecida qualidade. O ENEM também pode
aumentar a probabilidade de acesso a instituições privadas de qualidade pelo Programa
Universidade Para Todos (ProUni). Por fim, o ENEM pode ao menos garantir uma condição
mais facilitada caso o aluno recorra ao Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para financiar
seus estudos em instituições privadas. Em suma, um bom desempenho no ENEM não garante
automaticamente acesso à UFRGS ou a outros benefícios, pois há competição, mas um mau
desempenho no ENEM impede o aluno de ter acesso a facilitadores importantes para a
continuidade de sua carreira de estudos.

6.4 – Desempenho no vestibular como passaporte para o futuro

Desde o início desta pesquisa, ficou claro para mim que o ingresso numa universidade
pública de qualidade é o principal motivo da busca pelo Colégio Tiradentes. Na primeira etapa,
61% dos familiares entrevistados responderam que a busca por uma vaga numa faculdade
pública, a exemplo da UFRGS, era a razão do filho ou filha estar participando da seleção. A
maioria desses adolescentes (63%) é oriunda da rede estadual de ensino, como demonstrado na
primeira etapa desta pesquisa. Ainda na primeira etapa, os pais e mães entrevistados disseram
que a escolha pelo Colégio Tiradentes havia sido do filho ou filha. Porém, as entrevistas com
as mães mostraram que uma considerável influência dos pais ou das mães nessa escolha, e a
razão apresentada para buscar o Tiradentes consiste, basicamente, no fato de que é um colégio
público, cujos egressos atingem boas notas no ENEM e boa classificação no vestibular da
UFRGS. Na segunda etapa, das cinco mães entrevistadas, apenas uma referiu que o filho sempre
quis seguir a carreira militar, que ele é escoteiro e que ir para o Tiradentes era um desejo do
adolescente, sendo que o vestibular não era o único objetivo, naquele caso.
78

Mãe 4: Ele era escoteiro, então ele que queria vir para esta escola, porque
quer ser militar. Esta escolha é dele e quando vim conhecer o colégio eu me
surpreendi com tudo o que vi. Ele fez a prova e rodou na primeira vez e depois
fez novamente. Nós apoiamos a decisão dele.

As demais mães apresentaram o ENEM e/ou vestibular, como motivo da procura pelo
Colégio Tiradentes:

Mãe 15: Queremos uma boa preparação para ela, para prestar o vestibular.
Nesse colégio, eles ensinam com base nas provas de vestibular. Há toda uma
preparação para isso. O processo [de seleção] é rigoroso e quem está lá, é
porque quer estar lá.

Mãe 22: O Colégio Tiradentes tem ótimo desempenho no vestibular e no


Enem. Sempre achei que essa fosse a melhor escola e depois dos resultados
de vestibular desse ano eu não tenho mais nenhuma dúvida.

Mãe 14: O colégio tem bom desempenho no vestibular, as provas do colégio


já são no mesmo formato do vestibular, o que prepara o aluno para isso e eu
quero que ele vá se especializar fora do País, por isso buscamos a aprovação
na UFRGS.

Em se tratando de sujeitos que podem ser considerados válidos, como já mencionei


anteriormente, é muito mais provável obter um bom desempenho no vestibular. Mesmo que
oriundos, na sua maioria, de escolas estaduais, com ensino considerado mais fraco, como
destaca uma das mães, a seleção rigorosa do Tiradentes aliada à capacidade de adaptação ao
sistema disciplinar desses alunos, é visto como fator decisivo nas notas obtidas nos testes de
seleção. Porém, em alguns casos, os alunos precisam de um processo de conversão que os
tornem válidos, conforme demonstra a fala abaixo.

Mãe 32: A busca foi pelo desempenho no vestibular. Ela provavelmente vai
rodar nesse primeiro ano. Mas não faz mal, muitos iniciam no Tiradentes
depois de já ter feito o primeiro ano em boas escolas de Porto Alegre. Ela já
está lá dentro. Mesmo que rode, ano que vem será mais fácil. Ela é jovem,
tem somente 15 anos. Então tem tempo para seguir em frente, e também ela
vai ficar mais bem preparada para o vestibular da UFRGS, que é o objetivo.

Na classificação para as vagas em universidades em 2016, o Colégio Tiradentes foi a


segunda escola gaúcha com melhor desempenho no ENEM 2015, com média de 659,17 e
posição 207 no ranking nacional. O Tiradentes ficou com uma colocação acima do Colégio
Militar de Porto Alegre e também acima das escolas da rede privada de ensino da capital gaúcha.
79

Entre as dez melhores escolas públicas do país, o Colégio Tiradentes ficou com a 6ª colocação.
Apresento na Tabela 4 o ranking do resultado do ENEM 2015, com as dez melhores
classificações do RS. Até o momento da conclusão da pesquisa, os resultados do ENEM 2016,
por escola, ainda não estavam disponíveis.

Tabela 4 - Escolas gaúchas com melhor desempenho no ENEM (2015)

Ranking
Média
Nacional
Colégio Politécnico da Univ. Federal de Santa Maria (UFSM) 716,21 33

Centro de Ensino Médio Tiradentes (CTBM) – Porto Alegre 666,74 207

Colégio Leonardo da Vinci (Unidade Alfa) – Porto Alegre 664,40 231

Colégio Sinodal – São Leopoldo 663,41 235

Colégio Militar – Porto Alegre 659,17 282

Colégio João Paulo I – Porto Alegre 658,34 290

Colégio Farroupilha – Porto Alegre 654,21 322

Colégio Riachuelo – Santa Maria 652,85 337

Colégio Israelita Brasileiro – Porto Alegre 649,04 391

Colégio Marista Nossa Senhora do Rosário – Porto Alegre 648,04 402

Fonte: site zerohora.com

Outro dado curioso é que das dez escolas públicas gaúchas mais bem classificadas no
ENEM, sete são militares e destas, cinco da rede Tiradentes de Ensino, conforme a Tabela 5.
80

Tabela 5 - Escolas públicas gaúchas com melhor desempenho no ENEM (2015)

Ranking
Média
Nacional
Colégio Politécnico da Univ. Federal de Santa Maria (UFSM) 716,21 33

Centro de Ensino Médio Tiradentes (CTBM) – Porto Alegre 666,74 207

Colégio Militar – Porto Alegre 659,17 282

Colégio Tiradentes de Ijuí 646,21 434

Colégio Militar de Santa Maria 640,30 513

Colégio Tiradentes de Santa Maria 624,02 888

Colégio Tiradentes de Passo Fundo 605,15 1.424

Colégio Tiradentes de Pelotas 599,58 1.634

Instituto Federal do Rio Grande do Sul – Campus de Bento 598,44 1.677


Gonçalves
Escola Estadual de Educação Básica Gomes Carneiro – 587,59 2.137
Porto Alegre
Fonte: site zerohora.com

Muito se tem escrito sobre os exames nacionais que aferem a qualidade do ensino e
produzem rankings para a classificação de alunos e instituições. Bujes (2012) faz uma crítica a
estes instrumentos de medida que, segundo a autora, aferem uma mera questão de
aprendizagem, ou de qualidade, não se preocupando com outras questões que envolvem o
sistema educacional. Ball é outro autor que trata desse assunto, e para ele a competitividade
desencadeia na escola uma série de práticas em busca de uma esperada performance (BALL,
2004). Em outro artigo, Ball reforça que a performance é alcançada mediante a construção e
publicação de informações e de indicadores que servem para julgar e comparar resultados
(BALL, 2005).
Os programas de avaliação externa do ensino, sejam eles nacionais como o ENEM, ou
internacionais como o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), adquiriram
importância e passaram a ser objeto de comparação entre escolas, entre os Estados (no ranking
do ENEM o RS é o 6º) e entre países (no ranking internacional, o Brasil está entre os piores
sistemas educacionais do mundo).

Diante deste quadro de desempenho a escola tem sido percebida como em


descompasso com a sociedade que lhe corresponde. Ela não estaria mais
dando conta de promover em seus alunos as condutas necessárias para que a
sociedade atinja seus objetivos e concretize seus projetos (BUJES, 2012, p.
159).
81

Para Veiga-Neto, são esses aspectos, levantados por Bujes, que nos fazem perceber a
escola desencaixada do mundo atual (VEIGA-NETO, 2003). Reposicionando o foco da
discussão no Colégio Tiradentes, estaria ele desencaixado da expectativa da sociedade? Como
referem algumas das mães entrevistadas, ele é diferente do “mundo lá fora”. É diferente de
algumas escolas estaduais do RS, onde há greve, pichação, desordem, insegurança e uma
baixíssima colocação no ranking do ENEM, na opinião das mães. Se a expectativa da
sociedade, como escreve Bujes (2012), é uma boa colocação no ranking final [vestibular], se
esta é a “caixa”, o Colégio Tiradentes estaria encaixado? Acredito que haja um espaço para este
Colégio na sociedade atual, e ele vem sabendo ocupar este espaço. As demais escolas estaduais
não podem impor sobre seus alunos o poder disciplinar, muito menos o poder da norma, como
faz o Colégio Tiradentes. Neste Colégio, as regras são outras, e estas encontram apoio legal na
legislação estadual – Lei nº 12.349, de 26 de outubro de 2005 que, em seu artigo primeiro,
instituiu o ensino médio na Brigada Militar de forma preparatória para o ingresso na carreira de
Policial Militar.
No entanto, no mundo em que tudo se move a uma velocidade inusitada, alguns
insistem em ficar parados, como diz Bauman (2012). Nossos compromissos se transformam,
assim como os afetos e os valores que professamos. Tudo se encontra sujeito a ser substituído
e descartado (BUJES, 2012). Nas escolhas feitas pelos estudantes do Tiradentes e nas
afirmações de seus parentes, observo uma troca entre abrir mão do tempo presente para investir
num tempo futuro. Diferente do que refere Bauman (2012), de que hoje vivemos a síndrome da
impaciência. Não queremos mais esperar por nada, o tempo passou a ser um enfado e nossos
desejos precisam ser satisfeitos de imediato. Nesse mundo veloz, um egresso do Tiradentes terá
que fazer uma ruptura com o sistema disciplinar ou ficará desencaixado do “mundo lá fora”.
Por outro lado, mesmo considerando esse possível desencaixe, certamente momentâneo, não
estará esse aluno, mais qualificado para o mercado de trabalho? Não terá ele desenvolvido
habilidades, ao longo de sua trajetória no ensino médio, que ainda são valorizadas na carreira
profissional? Diante desse sistema disciplinar, estaria o Colégio Tiradentes formando jovens
capazes de se integrar à sociedade também como cidadão, assim como escreve Dewey (1997)?
Para finalizar este capítulo, apresento uma síntese das falas das mães, e que foram
analisadas segundo três categorias: o mundo lá fora, a disciplina para a vida, e desempenho no
vestibular como passaporte para o futuro. Cada categoria de análise gerou evidências empíricas
relevantes, e cada evidência foi sustentada por elementos teóricos extraídos de literatura
pertinente. O Quadro 2 sintetiza sinoticamente o que foi discutido até aqui.
82

Quadro 2 - Organização da discussão do capítulo

Corpus da Categoria de Evidências


Sustentação teórica
pesquisa análise encontradas
Fala das mães O mundo lá fora Afastamento da vida Heterotopia (Foucault,2002): Espaços
social deslocados, ou desencaixados, diferentes
daqueles que habitamos;

Mundo que se move (Bauman, 2012): alguns


dos habitantes do mundo estão em
movimento; para os demais, é o mundo que
se recusa a ficar parado.

Prevenção às drogas Norma (Foucault, 2007): Como regra de


conduta;
Norma (Ewald, 1993): Maneira de produzir
uma medida comum.

Medo da violência Norma (Foucault, 2007): Como oposição à


irregularidade e à desordem;

Vigilância sobre o corpo (Saraiva e Veiga-


Neto, 2009): A vigilância ainda tem se
mostrado uma das formas de controle dos
adolescentes na escola contemporânea.

Disciplina Rigorismo quanto aos Disciplina (Foucault, 2007): Disciplina é a


uniformes anatomia política do detalhe.

Premiação e não Gratificação-sanção (Foucault, 2007): Na


premiação de alunos essência de um sistema disciplinar, funciona
sempre um pequeno mecanismo penal.

Vestibular Bom desempenho no Ranking (Ball, 2005): Performatividade


ENEM mediante a construção e publicação de
indicadores que servem para julgar e
comparar resultados;

Descompasso (Bujes, 2012): a escola tem


sido percebida como em descompasso com a
sociedade que lhe corresponde.

Troca do lazer atual pela Síndrome da impaciência (Bauman, 2012)


garantia de sucesso no A síndrome da impaciência contemporânea
futuro (Tempo como transmite uma mensagem oposta: o tempo é
investimento, não como um enfado.
enfado)

Sobre o quadro, é possível estabelecer relações hierárquicas entre as evidências


encontradas. Parece claro, pelas falas das mães, que o objetivo final dessas famílias, em relação
ao Colégio Tiradentes, é aumentar a chance de obter acesso a ensino superior público de
qualidade, e que foi referido como “vestibular da UFRGS”. Para tanto, as famílias e os
estudantes aceitam trocar facilidades, lazer e fruição atual pela possibilidade de um futuro mais
próspero. Porém, esta troca não é simples, pois implica aceitar um regime disciplinar muito
83

mais rígido do que o vigente nas demais escolas do sistema estadual de ensino. O rigorismo nos
uniformes e o sistema de premiação-punição são apenas alguns dos elementos, possivelmente
os mais importantes, do sistema disciplinar a que os estudantes devem se submeter. Para tanto,
é necessário que o estudante mantenha distância do que chamei de “mundo lá fora”. É preciso
se afastar de hábitos e costumes mantidos até então para poder dar conta de todas as exigências
e de todo o sistema normativo que o Tiradentes impõe.
No próximo e último capítulo, retomo o que considero os principais passos e achados dessa
pesquisa, apresentando a minha conclusão sobre o tema escolhido.
84

7. REVENDO O CAMINHO PERCORRIDO

A penalidade perpétua que atravessa todos os pontos e controla todos os


instantes das instituições disciplinares compara, diferencia, hierarquiza,
homogeniza, exclui. Em uma palavra, ela normaliza.
(FOUCAULT, 2007, p. 153)

Desde o início da minha pesquisa, o que me moveu foi a curiosidade sobre o espaço
ocupado no mundo contemporâneo pelas escolas fortemente disciplinares. Minha proposta era
investigar que valor a disciplina tem na formação de jovens, segundo seus responsáveis. E mais
especificamente, que motivos levam pais e mães a buscarem um colégio militar, como o
Tiradentes, para matricularem seus filhos. E ainda, que significados atribuem à disciplina na
formação desses jovens. Neste capítulo, pretendo resgatar o que me parece mais relevante
nesses achados.
Para realizar a minha pesquisa, tomei como material de análise os depoimentos de pais
e mães com filhos inscritos e posteriormente matriculados no Colégio Tiradentes de Porto
Alegre. A pesquisa foi dividida em duas etapas. A primeira incluiu a realização de entrevistas
estruturadas com pais e mães de alunos que realizavam a prova de seleção para ingresso no
Colégio Tiradentes. Nesta ocasião, consegui entrevistar 41 pais e mães de alunos ou alunas. Na
segunda etapa, com os dados dos responsáveis em mãos, realizei um primeiro contato
telefônico, a fim de obter a informação sobre o resultado do teste de seleção. Entre os pais e
mães cujos filhos passaram na seleção, consegui realizar entrevistas semiestruturadas com
cinco mães de estudantes regularmente matriculados no Colégio Tiradentes.
Os resultados da primeira etapa já indicavam como principal interesse desses pais e
mães a busca por uma escola pública capaz de preparar o filho ou filha para a prova do ENEM
ou para o vestibular. Em especial, interessa para estes pais e mães o vestibular da UFRGS. Esta
é a razão central da busca pelo Colégio Tiradentes. Outros fatores foram citados, mas com
menor importância. Ficou evidente a crença dos pais e das mães de que uma escola com mais
disciplina poderia preparar melhor seus filhos e filhas para o vestibular. Antes de realizar a
entrevista com os familiares, conversei com os diretores do Tiradentes. Naquela ocasião, um
deles mencionou que muitos pais “faziam vista grossa” para a questão disciplinar, em função
do resultado que o Colégio obtinha nas provas do ENEM e no vestibular da UFRGS. De certa
forma, ele estava certo, porque a disciplina cobra seu preço, preço esse que todos, família e
estudantes, pagam para terem a chance de ingressar numa universidade pública de qualidade.
85

Como forma de olhar para todo o material produzido nas entrevistas, construí três
categorias de análise. As categorias ajudaram a organizar o trabalho e foram ao encontro do
meu interesse, mas não são categorias estanques e devem ser consideradas como imbricadas
umas com as outras, pois se complementam. Na primeira etapa, recortei duas categorias: “o
mundo lá fora e a disciplina” e “desempenho no vestibular como passaporte para o futuro”. Na
segunda etapa da pesquisa decidi separar “disciplina” da categoria “o mundo lá fora”, ficando
então, com três categorias de análise: “disciplina para a vida”; “o mundo lá fora” e “vestibular
como passaporte para o futuro”. A seguir, passo a elencar alguns pontos que considero mais
relevantes e para os quais quero dar um pouco mais de destaque.
Uma das primeiras questões a chamar a minha atenção neste tema foi a crescente
militarização de escolas públicas no país. Embora meu foco de análise não fosse estas escolas,
não foi possível ignorar este fenômeno, que se dá como uma forma de conter a violência e a
indisciplina dentro das escolas públicas. É a sociedade buscando soluções para problemas atuais
no sistema disciplinar, que segundo Foucault (2007), já existia nas instituições religiosas
medievais e ganhou força nos séculos XVII e XVIII como estratégia de dominação. Para este
autor, o nascimento da chamada escola disciplinar se deu em um período de intensas
modificações nas estruturas de poder. Tais modificações deram origem ao aparato social e
político denominado pelo autor de sociedade disciplinar. Como escrevem Saraiva e Veiga-Neto
(2009), embora na contemporaneidade a vigilância sobre o corpo tenha perdido um pouco da
sua importância, ela ainda tem se mostrado uma das formas de controle dos adolescentes na
escola contemporânea.
A disciplina que se faz presente no Colégio Tiradentes é muito mais rígida do que a
observada em outras escolas públicas. É uma disciplina que vai da escola para dentro das
famílias. Segundo Foucault (2007), o poder disciplinar tem como efeito maior o adestramento
do indivíduo. O poder disciplinar “fabrica” indivíduos. E o sucesso desse sistema se dá com a
vigilância hierárquica, a sanção normalizadora e o exame (FOUCAULT, 2007). Todos esses
elementos estão presentes no Colégio Tiradentes. A vigilância é exercida pelo olhar do Capitão
que inspeciona cada formação e também pelo Comandante do Corpo de Alunos-CAL, que
determina, inclusive, se em dias quentes os alunos que estiverem apenas com a camiseta branca
(que tem gola olímpica) podem participar das atividades do CAL e da sala de aula. Tudo é
vigiado, o uso do uniforme, o horário de entrada no Colégio, a limpeza da sala e também a
higiene pessoal de cada aluno.
86

Na essência de todos os sistemas disciplinares funciona um pequeno mecanismo penal


(FOUCAULT, 2007). Esse mecanismo, no Colégio Tiradentes, acontece nas condecorações e
nas formaturas semanais. Elas são o reconhecimento de alunos com melhor desempenho escolar
ou disciplinar, pois a disciplina também é avaliada e condecorada. A inspeção é feita sob o olhar
do capitão, quando todos estão em forma, no pátio do Colégio e na sala de aula pelo
Comandante do CAL.

O controle disciplinar não consiste simplesmente em ensinar ou impor uma


série de gestos definidos (...); um corpo bem disciplinado forma o contexto de
realização do mínimo gesto (...), da posição do corpo, dos ombros, do olhar
(FOUCAULT, 2007, p. 130).

É como disse um dos diretores do Tiradentes, por ocasião da minha reunião, é bonito
de ver aquele jovem que chega aqui civil e, dentro de alguns meses, percebe-se a mudança no
corpo, na postura deles. A forte disciplina que rege os alunos do Tiradentes acaba por distanciá-
los do mundo que está fora dos muros do Colégio. Parece-me que o “mundo lá fora” tem um
tempo diferente daquele que vige dentro do Tiradentes. A liberdade, que opera na
contemporaneidade, não parece encontrar espaço dentro desse Colégio, onde funcionam as
velhas regras de controle. Dentro do que me foi possível observar, as famílias vão sendo
capturadas pela disciplina, e também disciplinadas pelo Colégio e pelos filhos.
Quando se referem ao “mundo lá fora”, pais e mães se referem a um mundo que se
move. Lembrando o que escreve Bauman (2014, p. 77), “alguns dos habitantes do mundo estão
em movimento; para os demais, é o mundo que se recusa a ficar parado”. Há uma busca por
uma ordem que foi perdida, uma crença que a disciplina vai preparar melhor os filhos e filhas
para o mundo e para o mercado de trabalho. Uma das mães justifica a escolha pelo Tiradentes
“pela disciplina, pelo respeito e porque o mundo de hoje está perdido”.

Os passageiros do navio “Capitalismo Pesado” confiavam (nem sempre


sabiamente) em que seletos membros da tripulação com direito a chegar à
ponte de comando conduziriam o navio a seu destino. Os passageiros podiam
devotar toda a sua atenção a obedecer e a seguir as regras (...). Já os
passageiros do avião “Capitalismo Leve” descobrem horrorizados que a
cabine do piloto está vazia e que não há meio de extrair da “caixa preta”
chamada piloto automático qualquer informação sobre para onde vai o avião,
onde aterrizará, quem escolherá o aeroporto e sobre se existem regras que
permitam que os passageiros contribuam para a segurança da chegada.
(BAUMAN, 2014, p. 77)
87

Se antes tínhamos no curso superior a certeza da chegada a um porto seguro, hoje


sabemos que esse porto se move rapidamente. O curso superior é mais uma, entre tantas outras
ferramentas, que contribuem para um possível sucesso profissional. Contudo, esta é a principal
crença daqueles alunos e alunas matriculados no Tiradentes. Quando usei o conceito de
heterotopia para marcar o espaço do Tiradentes, busquei fazê-lo porque diferente do mundo que
insiste em não ficar parado, o Tiradentes segue seu ritmo num tempo disciplinar. Sofremos hoje
da “síndrome da impaciência”. Não queremos esperar mais pelo tempo, ele deixou de ser um
valor para ser um enfado (BAUMAN, 2012). Porém, dentro do Tiradentes, tudo tem seu tempo.
Um tempo interno, um tempo linear, um tempo que é valorizado, um tempo que tem
importância. O que me parece, é que os alunos e alunas do Tiradentes estão fazendo uma troca,
deixando de usufruir a liberdade do tempo presente, para investir num tempo futuro que pode
lhes render muito mais. Isso corrobora com o que dizem os autores Saraiva e Veiga-Neto
(2009), como já mencionado, que a sala de aula da modernidade era um lugar de trabalho e a
satisfação dos alunos era adiada para o final do ano, para a vida adulta e para o futuro, ao passo
que na contemporaneidade busca-se cada vez mais pela satisfação imediata. Com isso, reforça-
se a inferência de que o Colégio Tiradentes seja mais identificado com a modernidade do que
com a contemporaneidade.
Considerando a classificação deste Colégio no ENEM e o sucesso no vestibular da
UFRGS, podemos dizer, em certa medida, que o sistema disciplinar ainda tem dado resultado,
pelo menos em termos de avaliações. E tal sistema tem dado melhores resultados que a maioria
das escolas públicas e também um resultado superior a bons colégios particulares de Porto
Alegre. Como mencionei no capítulo 4, este Colégio trabalha com os válidos de nossa
sociedade, com aqueles que têm aptidão intelectual e física que, ao serem disciplinados,
treinados e preparados conseguem dar excelentes resultados nas provas de seleção.
Chegando ao fim desta pesquisa, consigo perceber que uma instituição fortemente
disciplinar, como o Colégio Tiradentes, ainda encontra espaço na contemporaneidade. Também
consigo perceber que se um grupo de jovens egressos do Tiradentes e de outros colégios
militares obtém sucesso nos exames de avaliações de ensino médio, sejam eles nacionais como
o ENEM, ou internacionais como o PISA, então o modo como avaliamos os alunos na
contemporaneidade parece ainda estar em sintonia com uma educação disciplinar e mais
próxima da modernidade.
Todavia, o mundo aqui fora requer cérebros flexíveis e articulados, capazes de
aprender autonomamente, de se mover num mundo fluido e pós-moderno. Para Saraiva e Veiga-
88

Neto (2009), na sociedade neoliberal “o cronômetro foi substituído por indicadores e a


visibilidade se deslocou do corpo para o cumprimento de metas” (p.192). Para esses autores, o
trabalho imaterial modificou as atividades da cadeia produtiva e onde antes precisávamos de
corpos dóceis, hoje temos a ênfase nos cérebros flexíveis e articulados.
E será justamente esse o desafio dos egressos do Tiradentes: colocar-se de volta no
mundo aqui fora. Se a busca pelo vestibular é o que os move hoje, este é apenas um dos tantos
desafios que irão enfrentar. Resta-nos saber: tal rigidez disciplinar é capaz de produzir um
profissional com as capacidades requeridas pela lógica contemporânea, mais fluída e pós-
moderna? O egresso do Tiradentes consegue se adaptar facilmente ao mundo contemporâneo?
Estas são questões que ainda precisam ser respondidas, mas acredito que se libertar de um
mundo disciplinar é sempre mais fácil do que se submeter a ele. E esses jovens parecem ter
uma boa capacidade de adaptação, o que me faz crer no sucesso profissional de cada um deles,
seja qual for a área que escolherem para seguir em frente.
89

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94

APÊNDICE
95

APÊNDICE A - entrevista estruturada


96

ANEXO
97

ANEXO A – termo de consentimento livre e esclarecido

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

1. IDENTIFICAÇÃO DO PROJETO DE PESQUISA

Título do Projeto: AS ESCOLAS MILITARES E A FORMAÇÃO DO SUJEITO NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Área do Conhecimento: EDUCAÇÃO Número de Participantes: 07 Total 07


:

Curso: MESTRADO EM EDUCAÇÃO Unidade: PPGEDU

Projeto Multicêntrico Sim X Nã x Nacion Internaciona Cooperação Sim x Nã


o al l Estrangeira o

Patrocinador da pesquisa: NÃO TEM

Instituição onde será realizado: LOCAL DE LIVRE ESCOLHA DO ENTREVISTADO

Nome dos pesquisadores e colaboradores: MARGRID BURLIGA SAUER

Você está sendo convidado (a) para participar do projeto de pesquisa acima identificado. O documento abaixo
contém todas as informações necessárias sobre a pesquisa que estamos fazendo. Sua colaboração neste estudo
será de muita importância para nós, mas se desistir, a qualquer momento, isso não causará nenhum prejuízo para
você.

2. IDENTIFICAÇÃO DO PARTICIPANTE DA PESQUISA

Nome: Data de Nasc.: Sexo:


Nacionalidade: Estado Civil: Profissão:
RG: CPF/MF: Telefone: E-mail:
Endereço:
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3. IDENTIFICAÇÃO DO PESQUISADOR RESPONSÁVEL

Nome: MARGRID BURLIGA SAUER Telefone: 51-981183771


Profissão: SOCIOLOGA Registro no Conselho Nº: E-mail:
Endereço: RUA DEA COUFAL, 1411 APTO 201, IPANEMA, PORTO ALEGRE

Eu, participante da pesquisa, abaixo assinado(a), após receber informações e esclarecimento sobre o projeto de
pesquisa, acima identificado, concordo de livre e espontânea vontade em participar como voluntário(a) e estou
ciente:

1. Da justificativa e dos objetivos para realização desta pesquisa.


Em alguns dos estados brasileiros vem acontecendo um processo de Militarização de Escolas
públicas o que me leva a pensar na hipótese de que os processos fortemente disciplinares, ainda
encontram espaço na contemporaneidade. É para este espaço ocupado pelas Escolas fortemente
disciplinares, que pretendo voltar minha investigação.

2. Do objetivo de minha participação.


Contribuir para o conhecimento dos motivos que levaram a escolha do Colégio Tiradentes e também as
dificuldades encontradas e expectativas em relação a esse colégio.

3. Do procedimento para coleta de dados.


O contato para agendamento da entrevista se dará por telefone e após, a pesquisadora irá ao encontro do
pesquisado, em horário e local marcado. A coleta de dados será realizada mediante entrevista pessoal,
gravada, para posterior transcrição. A entrevista será realizada em local público e de livre escolha do
participante.

4. Da utilização, armazenamento e descarte das amostras.


As entrevistas serão transcritas e analisadas no conjunto de dados, não havendo individualização dos casos.
Haverá sigilo da íntegra da entrevista e dos dados do entrevistado. Após transcrição, os áudios serão
apagados, e os dados analisados no seu conjunto.

5. Dos desconfortos e dos riscos.


Não há riscos para os entrevistados, uma vez que seus dados não serão analisados individualmente, garantindo-se
assim o sigilo sobre as respostas dadas.
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6. Dos benefícios.
A participação do entrevistado nessa pesquisa contribuirá para a produção de conhecimento sobre a educação no
Brasil.

7. Dos métodos alternativos existentes.


Não é o caso.

8. Da isenção e ressarcimento de despesas.


A minha participação é isenta de despesas e não receberei ressarcimento porque não terei despesas.

9. Da forma de acompanhamento e assistência.


Não é o caso.

10. Da liberdade de recusar, desistir ou retirar meu consentimento.


Tenho a liberdade de recusar, desistir ou de interromper a colaboração nesta pesquisa no momento em que
desejar, sem necessidade de qualquer explicação.

11.Da garantia de sigilo e de privacidade.


Os resultados obtidos durante este estudo serão mantidos em sigilo, mas concordo que sejam divulgados em
publicações científicas, desde que meus dados pessoais não sejam mencionados.

12. Da garantia de esclarecimento e informações a qualquer tempo.


Tenho a garantia de tomar conhecimento e obter informações, a qualquer tempo, dos procedimentos e métodos
utilizados neste estudo, bem como dos resultados finais, desta pesquisa. Para tanto, poderei consultar a
pesquisadora responsável (Margrid Sauer).
Declaro que obtive todas as informações necessárias e esclarecimento quanto às dúvidas por mim
apresentadas e, por estar de acordo, assino o presente documento em duas vias de igual conteúdo e forma,
ficando uma em minha posse.

Porto Alegre/RS, ____ de ____________ de 2016.

_________________________________ _________________________________
Pesquisador Responsável pelo Projeto Participante da Pesquisa e/ou Responsável

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