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coleção

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Este livro destina-se ao pesquisador iniciante e aos
formadores de professores e pesquisadores em educação
formação

1 US1O!] a ol J2d
matemática, pois ambos encontrarão subsídios operacionais
que orientam a iniciação à pesquisa nesse campo. Os
capítulos centrais descrevem e ilustram as principais fases de professores
do processo de investigação: a elaboração do projeto de
pesquisa; o processo de coleta e constituição do material
de estudo; a sistematização e a análise de dados; e a
redação final do estudo. 't
'

O livro também aborda o surgimentoe o desenvolvimento


da educação matemática no Brasil e no mundo e suas
tendências temáticas e metodológicas de pesquisa. Outro
destaque é a discussão que os autores fazem sobre a
avaliação da pesquisa e os princípios e cuidados éticos
do pesquisador ao desenvolver uma pesquisa de campo.
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ASSOCIADOS ASSOCIADOS
A educação matemática é vista mun-
dialmente como uma área de conheci-
mento das ciências sociais e humanas
que mantém forte interlocução com a
matemática, a pedagogia, a sociologia,
a história, a filosofia, a psicologia, a
linguística, a semiótica, a antropologia,
a sociologia, entre outras.
Há, hoje, uma comunidade inter-
nacional de pesquisadores que vem
ajudando a construí-la enquanto campo
profissional e científico, configurando,
assim, seu próprio objeto e problemá-
tica de estudo.
nvestigação
| 1) es

Este livro atende às necessidades,


+,
principalmente,do pesquisador inician-
te em educação matemática, pois, além
em educacão
. “s

de abordar o surgimento e o desen-


volvimento dessa área emergente de ,
conhecimento no Brasil e no mundo TÁ º

e apresentar algumas tendências te- matematica


máticas e metodológicas de pesquisa,
descreve e ilustra, com detalhes e
exemplos, as diferentes etapas de um percursos teóricos e metodológicos
processo de pesquisa, que vão desde
a concepção do projeto, passam pelos
procedimentos e alternativas de coleta
e análise de dados e culminam com a
elaboração do relato final do estudo de
acordo com normas técnicas da ABNT.
Outra contribuição do livro são
os capítulos finais. Neles, os autores
discutem o problema da avaliação da
pesquisa e alguns princípios e cuidados
que o pesquisador deve ter ao realizar
pesquisa de campo.
coleção

formação
de professores
EDITORA AUTORES ASSOCIADOS LTDA.
Uma editora educativa a serviço da cultura brasileira

Av. Albino J. B. de Oliveira, 901 | Barão Geraldo


CEP 13084-008 | Campinas - SP
Telefone: (55) (19) 3289-5930 | Vendas: (55) (19) 3249-2800
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Investigação
Catálogo on-line: www.autoresassociados.com.br

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Bernardete A. Gatti
Carlos Roberto Jamil Cury

em educação
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Gilberta S. de M. Jannuzzi
Maria Aparecida Motta
Walter E. Garcia

Diretor Executivo
Flávio Baldy dos Reis

Coordenador Editorial
Rodrigo Nascimento

Revisão
matemática
Aline Marques
Edson Estavarengo Jr. percursos teóricos e metodológicos
Rodrigo Nascimento

Diagramação e Composição
DPG Ltda.
32 Edição Revista
Fotografias de Capa
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Dario Fiorentini & Sergio Lorenzato
Capa e Arte-final
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AUTORES Q
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Fiorentini, Dario
Investigação em educação matemática: percursos teóricos e
metodológicos / Dario Fiorentini, Sergio Lorenzato. — 3. ed. rev. —
Campinas, SP: Autores Associados, 2012. — (Coleção formação de
professores)

Bibliografia.
ISBN 978-85-7496-147-7

1. Matemática: estudo e ensino 2. Pesquisa educacional 8. Professores


Formação I. Lorenzato, Sergio. II. Título. III. Série.

06-1122 CDD — 510.72


Índice para catálogo sistemático:

1. Educação matemática: Pesquisa educacional 510.72

1º edição — março de 2006


Impresso no Brasil — maio de 2009
1º reimpressão - fevereiro de 2012
Copyright O 2012 by Editora Autores Associados LTDA.

Depósito legal na Biblioteca Nacional conforme Lei n. 10.994, de 14


de dezembro de 2004, que revogou o Decreto-lei n. 1.825, de 20 de
dezembro de 1907. )
. De Dario:
Nenhuma parte da publicação poderá ser reproduzida ou transmitida À minha esposa Dora e aos meus filhos Bruno e Guilherme.
de qualquer modo ou por qualquer meio, seja eletrônico, mecânico, de Sei que a presença deste livro não preenche minhas frequentes
fotocópia, de gravação, ou outros, sem prévia autorização por escrito da ausências, mas, depois deste, quem sabe sossego um pouco...
Editora. O Código Penal brasileiro determina, no artigo 184:
Ao amigo Sergio, pela paciente espera pelo meu tempo...
“Dos crimes contra a propriedade intelectual
Violação de direito autoral De Sergio:
Art. 184. Violar direito autoral Nesta vida, Deus utiliza-se de algumas pessoas para nos
Pena — detenção de três meses a um ano, ou multa.
possiblitar a superação de dificuldades e a realização de sonhos.
1º Se a violação consistir na reprodução, por qualguer meio, de obra
intelectual, no todo ou em parte, para fins de comércio, sem autorização
Pela confiança e orientação que recebi em momentos decisivos de
expressa do autor ou de quem o represente, ou consistir na reprodução minha trajetória profissional, dedico este livro aos meus ex-professores:
de fonograma e videograma, sem autorização do produtor ou de quem José Aloísio Aragão, Lourdes de La Rosa Onuchic, Marconi Freire Montezuma,
o represente:
Newton César Balzan, Joel Martins e Claude Gaulin.
Pena — reclusão de um a quatro anos e multa”.
Aos colegas do Grupo de Pesquisa Prática Pedagógica em Matemática
(PrapEM) da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas
(FE-Unicamp), pelas leituras e discussões dos originais deste livro.

Aos nossos orientandos, ex-orientandos, alunos e ex-alunos de pós-graduação pelo


apoio e colaboração para que esta obra finalmente fosse concluída.

Aos colegas do Centro de Estudos, Memória e Pesquisa em Educação


Matemática (CempEM): Ana Regina, Angela, Dione e Miguel.
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PREFÁCIO
5. ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA .......icicii 81

6. PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E


DE CONSTITUIÇÃO DO MATERIAL DE ESTUDO ............ 101

7. PROCESSO DE SISTEMATIZAÇÃO E ANÁLISE


DAS INFORMAÇÕES

8. REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA... 147

PARTE III
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
FUNDAMENTAIS À INVESTIGAÇÃO sta obra é resultado de anos de estudo, ensino, investigação e orien-
tação de trabalhos de pesquisa tanto em nível de graduação (iniciação
9. AVALIAÇÃO DO TRABALHO DE PESQUISA. .....lcci 181 científica) quanto em cursos de pós-graduação lato sensu (especialização)
e stricto sensu (mestrado e doutorado) em educação matemática (EM).
10. ÉTICA NA PESQUISA EDUCACIONAL: Desde sua primeira versão, em forma de apostila, produzida em 1999,
IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ........... 193 este livro foi gradativamente ganhando forma, estrutura e consistência
teórica e metodológica graças, em grande parte, às leituras, discussões e
necessidades de nossos alunos e orientandos da Universidade de Franca
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (UNIFRAN) e da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Mas
um grupo em especial merece nosso reconhecimento por suas críticas
e contribuições. Referimo-nos ao Grupo Prática Pedagógica em Mate-
mática (PrAPEM) da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp, sobretudo
a colaboração de nossas colegas Ana Regina Lanner de Moura e Dione
Luchesi de Carvalho que, juntamente com mestrandos e doutorandos
do grupo, analisaram e discutiram esta obra, por três ocasiões. Tentamos,
na medida do possível, contemplar as várias sugestões apresentadas.
Alguns leitores certamente perguntarão: por que mais uma obra
sobre metodologia da pesquisa? Já não há tantas no mercado? Sim, mas
poucas tomam como objeto de estudo os problemas relativos à EM.
A EM hoje, no mundo, é uma área de conhecimento reconhecida pela
comunidade internacional, possuindo seu próprio objeto de estudo.
xii INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

Ou seja, a EM tem uma problemática específica e suas próprias ques-


tões investigativas. Além disso, é a natureza desse objeto de estudo
que define qual a melhor abordagem metodológica a ser seguida ou
construída pelo investigador.
Ào escrever este livro, tomamos como referência principal o pesqui-
sador iniciante, pois é ele quem apresenta maiores dificuldades na elabora-
ção e desenvolvimento de um projeto autenticamente investigativo. Mas o
livro destina-se, também, aos formadores de professores e de pesquisadores
na área de EM, pois poderão encontrar nos dez capítulos que compõem
este livro um razoável material de apoio. Desses profissionais, gostaríamos
de receber um retorno com críticas e sugestões para a melhoria do texto,
o que esperamos poder atender nas edições seguintes.
Diante disso, preferimos apresentar um trabalho mais voltado aos
aspectos operacionais do processo de investigação do que promover uma Educação matemática
discussão teórico-epistemológica dos fundamentos da pesquisa educa- como campo profissional
cional. No entanto, consideramos importante iniciar o livro descrevendo
historicamente o surgimento da EM como campo profissional e área de
de ensino e pesquisa
conhecimento. À primeira parte do livro conta com três capítulos, con-
templando tanto o cenário nacional quanto o internacional.
À segunda parte é constituída de cinco capítulos e representa o
núcleo principal da obra, pois, além de apresentar algumas modalidades
de investigação, dedicamos especial atenção às fases de uma pesquisa
que começa com a elaboração do projeto investigativo, passa pelas fases
de coleta e análise de dados ou informações e, finalmente, o processo
de elaboração do relatório ou texto final.
Na última e terceira parte do texto, procuramos abordar também
questões que consideramos relevantes ao processo de investigação — a
avaliação do trabalho de pesquisa e a ética na pesquisa educacional.
Além disso, após as referências bibliográficas, apresentamos também
um glossário dos principais termos utilizados em investigação em EM.

Os autores.
CAPÍTULO +“ UM

A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
Como CAMPO PROFISSIONAL E CIENTÍFICO

1. INTRODUÇÃO

professor de matemática é chamado com frequência de matemático.


“Essa associação, entretanto, nem sempre é válida, pois “suas
práticas profissionais podem ser muito distintase seus conhecimentos
que estão na base da profissão podem não pertencer à mesma vertente
epistemológica. Embora tenham em comum à matemática, o olhar para
esse campo de saber pode ser diferente, mesmo quando ambos pensam
sobre o ensino dessa matéria.
O matemático, por exemplo, tende a conceber a matemática como
um fim em si mesma, e, quando requerido. a atuar na formação de
professores de matemática, tende a promover uma | educação para a
matemática, priorizando os conteúdos formais e uma prática voltada
à formação de novos pesquisadores em matemática.

6) educador matemático, em contrapartida, tende a conceber a ma-
temática como um meio ou instrumento importante à formação inte-.
lectu: e. social de. crianças, jovens-e-adultos.e também. do.professor de
E matemática do ensino fundamental e médio Edo diede, por isso, tenta promover

uma
mol
educação pela matemática. Ou seja, o educador matemático, na
4 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA COMO CAMPO PROFISSIONAL E CIENTÍFICO 5

relação entre educação e matemática, tende


odeiaa colocar
as
a- matemática * Onde institucionalmente se devem desenvolver as pesquisas
a serviço da educação, priorizando, portanto, esta última, mas sem em EM?
estabelecer uma dicotomia entre elas. * Como pesquisar em EM?
A produção de conhecimentos nessas duas categorias de profis-
sionais tambémé distinta. Enquanto os matemáticos, de um lado, estão As respostas a essas indagações, advindas das distintas acade-
preocupados em produzir, por meio de processos hipotético- dedutivos, K mias, indicam nem sempre haver consenso.

novos conhecimentose ferramentas matemáticas que possibilitam o A partir da leitura e análise das informações constantes das pá-
desenvolvimento da matemática pura e aplicada, os educadores matemáticos, ginas seguintes, o leitor poderá refletir e elaborar algumas respostas
a esses questionamentos.
de outro, realizam seus estudos utilizando métodos interpretativos e
Por ora, é possível dizer que a EM é uma área de conhecimento
analíticos das ciências sociais e humanas, tendo como perspectiva o
das ciências sociais ou humanas, que, estuda o ensino e a aprendizagem q
desenvolvimento de conhecimentos e práticas pedagógicas que con-
(da matemática. De modo geral, poderíamos dizer que a EM caracteriza-
tribuam para uma formação mais integral, humana e crítica do aluno
e do professor.. c
mes uma práxis que envolve o domínio do conteúdo específico (a matemática) e o y
domínio de ideias e processos pedagógicos relativos à transmissão/assimilação e/ou à a
Acrescenta-se a essas diferenças o fato de a matemática ser uma y
apropriação) construção do saber matemático escolar. Entretanto, sendo a prá-
ciência milenar, sendo estruturada em bases lógicas bem definidas, en-
STE
tica educativa determinada pela prática social mais ampla, ela atende
quanto a educação ; matemática (EM) é uma área emergente. de estudos,
a determinadas finalidades humanas e a aspirações sociais concretas.
recém- -nascida, nãopossuindo uma metodologia única de investigação
Assim, podemos conceber a EM como resultante das múltiplas relações
nem uma teoria claramente configurada, que se estabelecem entre o específico e o pedagógico num contexto
Em resumo, podemos dizer que a matemática e a EM possuem constituído de dimensões histórico-epistemológicas, psicocognitivas 1
objetos distintos de estudo, cada qual com sua problemática específica, histórico- culturais e sociopolíticas (FIORENTINI, 1989, p. 1).
tendo suas próprias questões investigativas. A EM, nascida há pouco mais de 40 anos, está, portanto, direta-
Nas últimas décadas, esforços educacionais empreendidos por mente relacionada com a filosofia, com a matemática, com a psicologia e
diversas nações, dentre elas o Brasil, têm favorecido a constituição da com a sociologia, mas a história, a antropologia, a semiótica, a economia
EM como um campo de ensino e de pesquisa com saberes próprios,
procurando responder a algumas questões básicas, tais como:
e a epistemologia têm também prestado sua colaboração. Ou seja, é uma
área com amplo espectro, de inúmeros e complexos. saberes, “na qual
À
apenas o conhecimento da matemática e a experiência de magistério
* Qual é a identidade da EM? não garantem competência a qualquer profissional que nela trabalhe.
* Quais são os domínios e fronteiras da EM? x Lamentavelmente, mi ainda é frequente,
meme
em emuitas instituições
a rm eminio 2 vertente na de

* Oque é ser um educador matemático? ' ensino superior, a organização de dois grupos ; profissionais. disjuntos—
* Há necessidade de investigação em EM? os matemáticos, de um lado, e os educadores matemáticos, de outro,
e Quais são os objetivos da pesquisa em EM? cada qual com suas expectativas, concepções e interpretações acerca

* Quais são os principais campos da pesquisa em EM? NE do ensino da matemática.


6 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA COMO CAMPO PROFISSIONAL E CIENTÍFICO 7

2. O SURGIMENTO DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA Group (SMSG), que se notabilizou pela publicação de livros didáticos e
ENQUANTO CAMPO PROFISSIONAL E CIENTÍFICO ] pela disseminação do ideário modernista para além das fronteiras norte-
-americanas, atingindo, segundo D' Ambrosio (1987), também o Brasil.
Z

Tomando por base o estudo de Kilpatrick (1992), poderíamos E a partir desse período que ttambém surgem, principalmente
destacar pelo menos três fatos determinantes para o surgimento da EM E fonos, Estados. Unidos, “OS primeiros programas específicos de mestrado/
como campo profissional e científico. O)primeiro é atribuído à preocu- doutorado em EM. Os estudos em EM cresceram tanto que, segundo
pação dos próprios matemáticos e de professores de matemática sobre Kilpatrick (1999), até final dos anos de 1980, haviam sido realizados
mais de cinco mil estudos na área, a maioria nos Estados Unidos.
| gerações. Essappreocupação dizia respeito t;tanto à melhoria destsuasàs aulas (O surgimento
O rn financia
EM no Brasil, como mostraremos mais adiante,
da pnieod
“quanto E] atualização/modernização do currículo escolar da matemática. também teve início a partir do |MMM, “mais precisamente nno final. dos
Segundo Schubring (1999), a matemática foi a primeira das disciplinas anos de 1970 e durante a década de 1980. É nesse período que surge a
escolares a deflagrar um movimento internacional de reformulação cur- Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM) e os primeiros
orogramas de | pós-graduação em EMO banco de dissertações/teses'!
ricular. Esse movimento aconteceu a partir da Alemanha, no início do
em EM organizado pelo Centro de Estudos, Memória e Pesquisa em
século XX, sob a liderança do matemático Felix Klein.
Educação Matemática (CEMPEM) da Faculdade de Educação da Univer-
am O segundo fato é atribuídoà iniciativa das universidades eu-
sidade Estadual de Campinas (FE-UNIcAMP) — com um acervo que, em
A& ropeias, no final do século XIX, em promover DN man institucionalmente a
2005, já ultrapassava a cifra de mil estudos traduzidos em dissertações/
2 de professores secundári os. Isso contribuiu para o surgimento
teses de mestrado ou doutorado — dá uma amostra bastante real da
| de especialistas universitários em ensino de matemática, mo
vitalidade da produção científica brasileira em EM.
em O terceiro fato diz respeito aos estudos experimentais realizados
Podemos afirmar que, no início do século XXI, havia no Brasil
5 por psicólogos éamericanos e europeus, desde o início do século XX,
uma comunidade de, educadores matemáticos que contava com uma
sobre o modo como as crianças “aprendiam a matemática. ="
l , ' associação. própria (SBEM) congregando cerça de 12 mil associados.
No entanto, em nível internacional, a pesquisa em EM daria um
Nesse período, podemos verificar a existência, no Brasil, de
salto significativo com o Movimento da Matemática Moderna (MMM),
quase duas dezenas de programas stricto sensu de pós-graduação que
de um
/" ocorrido nos anos de 1950 e de 1960. Esse movimento surgiu,
formam pesquisadores em EM. Eis alguns desses programas:
lado, motivado pela Guerra Fria entre Rússia e Estados Unidos e, de
« QUtro, como resposta à constatação, após a 2º Guerra Mundial, de uma (1993) em EM na Universi-
e Mestrado (1984)? e doutorado
Lx ) considerável defasagem entre o progresso científico- tecnológico eo
dade Estadual Paulista (UNESP) de Rio Claro;
currículo escolar então vigente. A Sociedade Norte- Americana de Ma-
e Mestrado em educação matemática na Universidade Santa
* temática, por exemplo, optou, em 1958, por direcionar suas pesquisas ao
Úrsula (USU)-Rio (1992);
desenvolvimento de um novo currículo escolar de matemática. Surgiram,
então, vários grupos de pesquisa envolvendo matemáticos, educadores t. Veja site: <http://www.cempem.fae.unicamp.br>.
e psicólogos. O mais influente deles foi o School Mathematics Study 2. A data entre parênteses indica o ano em que teve início o programa.
8 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA COMO CAMPO PROFISSIONAL E CIENTÍFICO 9

* Mestrado em educação matemática na Pontifícia Universida- * Mestrado (acadêmico e profissionalizante) e doutorado em


de Católica de São Paulo (PUC-SP) (1993); educação matemática da PUC-SP,
* Área de concentração em EM do mestrado ou doutorado em * Mestrado (acadêmico) e doutorado em alfabetização cientí-
educação: fica e tecnológica da UFSC;
* na FE-UNIcAMP — mestrado/doutorado (1994); * Mestrado (acadêmico) em ensino de ciências e matemática
* na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo da Universidade Luterana do Brasil (UlLBRA);
(Feusp) — mestrado/doutorado (1994); * Mestrado (acadêmico) e doutorado em ensino de ciências e
* na PUC-Rio — mestrado/doutorado (1995); educação matemática da Univesidade Estadual de Londrina
e Linha de pesquisa em EM de programas de pós-graduação (UEL),
em educação: * Mestrado (acadêmico) em educação em ciências e matemática
e na Faculdade de Educação da Universidade Federal de da Universidade Federal do Pará (UFPA);
Santa Catarina (FE-UFSC) — mestrado/doutorado (1995); * Mestrado (acadêmico) em educação matemática da USU-Rio;
e na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) — * Mestrado (acadêmico) em ensino de ciências e matemática
Núcleo de EM — mestrado (1995) e doutorado (1998); da PUC-RS,
e Na Universidade Federal de Minas Gerais (UEMG) — * Mestrado (profissionalizante) em ensino de ciências naturais
mestrado e doutorado. e matemática da Universidade Federal do Rio Grande do
* nos cursos de mestrado nas instituições de ensino superior Norte (UFRN),
(IES): Fundação Universidade Regional de Blumenau (Furs),
* Mestrado (profissionalizante) em ensino de ciências e matemática
Universidade Federal do Espírito Santo (UrEs), Universida-
do Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET-RJ).
de Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), Universidade
Federal do Paraná (UFPR), Universidade do Vale dos Sinos
(UNISINOS), Universidade Regional do Noroeste do Estado 3. O OBJETO E OS OBJETIVOS DA PESQUISA
do Rio Grande do Sul (Unyuí), Universidade de Passo EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
Fundo (UPE), Universidade São Francisco (USF).

Com o surgimento da área de ensino de ciências e matemática


so de construção, “poderíamos, de modo “geral, dizer que ele envolve,
na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior -
"as múltiplas relações . e determinações entre ensino, aprendizagem, e
(CAPES), foram aprovados, em reunião do Conselho Técnico Científico +
conhecimento matemático em um contexto sociocultural específico. J
da CaPEs, em dezembro de 2001, novos programas de pós-graduação
Isso não significa que uma determinada investigação não possa prio-
relacionados à EM. E em dezembro de 2003 essa nova área apresentava
rizar o estudo de um desses elementos, ou de uma dessas relações.
a seguinte relação de programas aprovados:
Mas, mesmo que isso aconteça, os outros elementos jamais podem ser
3. Os programas anteriores da PUC-SP e USU-Rio, a partir dessa aprovação da CAPES, totalmente ignorados. Por exemplo, se o foco de estudo for o ensino,
foram extintos como programas de pós-graduação da área de educação da CAPES.
10 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA COMO CAMPO PROFISSIONAL E CIENTÍFICO 11

o pesquisador não pode ignorar que se trata do ensino da matemáti- Existem dois tipos básicos de perguntas quando se faz pesquisa
ca, que só faz sentido se considerar a existência de aprendizes como em EM e têm a ver com os objetivos mencionados:
sujeitos sociais. Também não significa que o estudo deva ser somente
prático com trabalho de campo. Fle pode : ser também teórico, histórico * Aquelas que surgem diretamente da prática de ensino, ou
mermer cgi cares pararam ——
X melhor, da reflexão do professor-investigador sobre sua
e/ou bibliográfico.
Assim posto, o objeto da EM parece óbvio; mas será que um própria prática e sobre a prática de outros. Exemplos: por
educador matemático e um epistemólogo veem as questões sobre a que os alunos têm tanta dificuldade em aprender álgebra?
aquisição de conhecimento pelo mesmo prisma? Será que um. educador Por que os alunos não gostam de resolver problemas? Como
matemático e um matemático interpretam o conhecimento matemático ensinar frações de modo mais significativo para o aluno? Os
“pela mesma ótica? Perguntas sobre o processo de ensino- -aprendizagem alunos aprendem melhor a resolver/interpretar problemas
em sala de aula seriam respondidas da mesma forma por um educador matemáticos por meio de materiais manipulativos ou do uso
matemático, por um sociólogo, por um psicólogo e por um pedagogo? de desenhos e esquemas? É mais produtivo ensinar matemá-
Quanto aos objetivos da investigação em EM, estes são múltiplos e tica iniciando com atividades ou situações-problema do que
X difíceis de serem categorizados, pois variam de acordo com cada pro- com explicações teóricas? Por que os alunos confundem tanto
blema ou questão de investigação. Poderíamos, entretanto, afirmar que, o significado das letras em álgebra? Por que os professores
por um espectro amplo e não imediato, existiriam dois objetivos básicos: geralmente não ensinam geometria? É possível (e qual é a
vantagem) ensinar números decimais usando calculadora? É
v * um, de natureza pragmática, que tem em vista a .melhoria-da possível ensinar (e qual a vantagem) análise combinatória a
qualidade do ensino e da aprendizagem da matemática; partir de situações-problema e sem uso de fórmulas? Como
e outro, de cunho científico, que tem em vista o desenvolvimento ensinar funções (e quais as vantagens disso) explorando
da EM como campo de investigação e de produção de co- exemplos ou situações-problema do cotidiano do aluno?
No nhecimentos. Como ensinar frações (e quais as vantagens disso) utilizan-
do jogos ou atividades lúdicas? É possível ensinar números
inteiros relativos a partir da produção/negociação de signi-
4. ALGUMAS QUESTÕES OU PERGUNTAS ESPECÍFICAS ficados, istoé, dos significados e construções que os alunos,
DA INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA em grupo, são capazes de produzir a partir de atividades ou
situações-problema?
Aquelas geradas a partir de investigações ou estudos prece-
mm Apesar de a EM estar na interseção de vários campos científicos
dentes ou da própria literatura, como por exemplo: o que as
1 (matemática, psicologia, pedagogia, sociologia, epistemologia, ciências
pesquisas brasileiras mostram ou dizem sobre as dificuldades
3 cognitivas, semiótica etc.), ela tem seus próprios problemas e ques-
dos alunos em aprender frações? Que tipo de dificuldades de
e tões de estudo, não podendo simplesmente ser vista «como aplicação
aprendizagem da matemática as pesquisas têm investigado
| particular desses campos.
mam
A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA COMO CAMPO PROFISSIONAL E CIENTÍFICO 13
12 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

e que explicações são dadas para elas? O que os estudos e a recomendável a aproximação entre o matemático e o educador mate-
literatura em EM dizem a respeito da utilização de calcula- mático, de modo que conteúdo e forma (método) não se constituam.
doras no ensino da matemática na escola fundamental? em entidades dicotômicas. Mas esse não é um empreendimento fácil. |
Talvez essa dificuldade residano fato de a EM ser uma ciência com suas
interfaces voltadas, quase todas, às ciências sociais e também porque
5. À EDUCAÇÃO MATEMÁTICA COMO CAMPO educadores matemáticos não estão preocupados. em provar teoremas.
PROFISSIONAL E CIENTÍFICO Talvez essa seja a razão pela qual, segundo Kilpatrick (1996, p. 118),
a EM “progride, mais rapidamente quando ela é um programa distinto |
dentro da Faculdade de Educação”. Afinal, “matemáticos e educadores
Diante do que foi dito até agora, podemos reafirmar que a EM
matemáticos têm essencialmente orientações diferentes tanto em rela-
“. não é apenas um campo profissional, mas também uma área de conhe-
ção à pesquisa quanto em relação à organização curricular e acadêmica”.
| * cimento. Ou seja, a EM é tanto uma área da pesquisa teórica quanto
| uma área de atuação prática, além de ser, ao mesmo tempo, ciência,
| arte e prática social.
Dent Enquanto campo acadêmico, a EM, segundo Kilpatrick (1996),
tem uma curta história que difere de país para país, tendo em cada um
deles uma história própria e certo grau de desenvolvimento. Em alguns
X, países, como na França e na Alemanha, é chamada simplesmente de,

Ada “metodologia do ensino da matemática, No Brasil e nos Estados


= Unidos, assim como na grande maioria dos países, ela é denominada
( educação matemática”. Apreferência pelo uso do termo “educação
matemática” é atribuída ao fato de que este tem uma conotação mais
abrangente, “podendo significar tanto um fenômeno ou uma atividade
educacional — que visaà formação integral do cidadão — quanto uma
área multidisciplinar de conhecimento — em que a matemática é uma.
disciplina entre outras, tais como a psicologia, a filosofia, a história, a,
eepistemologia, a antropologia, a sociologia, a pedagogia, a linguística.
(OMlém disso, termos como “instrução matemática”, “ensino de mate-
) mática” ou “didática da matemática” têm uma conotação mais restrita
(. à matemática e às técnicas de ensino dessa disciplina.
Entretanto, se considerarmos que não deve haver hiato entre o
processo de produção e o de socialização de conhecimentos, então é
r
CAPITULO * DOIS

BREVE HisTÓRIA DA EDUCAÇÃO


MATEMÁTICA BRASILEIRA COMO
CAMPO PROFISSIONAL E CIENTÍFICO:

histórico que aqui apresentamos é baseado no estudo de Fiorentini


(1994), que inventariou e descreveu historicamente a evolução
das tentativas brasileiras de investigação em educação matemática
(EM). Dentre outros aspectos, o estudo destaca: (1) os principais
investigadores e centros de investigação; (2) os aspectos/dimensões
da EM que têm sido privilegiados pelos estudos; e (3) as principais
tendências temáticas e teórico-metodológicas.
Embora o conceito do que seja pesquisa em EM tenha variado his-
toricamente à medida que sua região de inquérito foi sendo construída e
ampliada, adotamos para este estudo a concepção stricto sensu de pesquisa:
“indagação metódicae disciplinada” (KILPATRICK, 1992, p. 3) ou “estudo
sistemático e consistente de problemas” (PONTE, 1993, p. 96), cujo
relato da pesquisa apresentava, além dos pressupostos teóricos que
sustentam a formulação e o tratamento do problema/pergunta, a linha

* Este texto foi originalmente apresentado por Dario Fiorentini no Congresso


Internacional de História e Educação Matemática em Braga, Portugal, em 1996
e publicado em Proceedings, Actes, Actas do Congresso Internacional de História e
Educação Matemática (HEM), Braga, 1996, v. II, p. 214-221.
16 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 17

de inquérito ou os procedimentos metodológicos de coleta e análise E com base nessa periodização que passamos, a seguir, a des-
dos dados que produziram os resultados e conclusões. crever historicamente a EM brasileira.
Portanto, foram somente considerados, neste levantamento,
aqueles estudos que tinham como foco principal de investigação
problemas ou indagações relativas ao ensino e à aprendizagem da ma- 1. 1º FASE: GESTAÇÃO DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
temática, à formação de professores, aos estudos histórico-filosóficos COMO CAMPO PROFISSIONAL
do ensino da matemática ou da própria matemática, desde que relacio-
nados ao seu ensino, aos materiais/recursos didático-curriculares etc.
A fase da gestação da EM como carípo rofissionabvai do início
A construção da trajetória da EM brasileira como campo profis-
do século XX até o final dos anos de 1960. Nesse período, a EM ainda
sional emergente de produção de saber foi realizada a partir da seguinte
não se encontrava claramente configurada. Não era usual olhar para o
pergunta: que aspectos e dimensões da EM têm sido, nos diferentes
ensino da matemática com perspectivas diferentes daquelas voltadas
momentos, privilegiados pela pesquisa brasileira e de que forma e em
que condições ela tem sido realizada? diretamente ààs tarefas e aos procedimentos da prática de sala de aula
Os documentos selecionados para realizar tal estudo histórico à produção de manuais ou subsídios didáticos. É possível, entre-.
foram constituídos, antes de 1970, dos poucos estudos-pesquisas sis- tanto, identificar, nesse período, alguns esforços e movimentos que
temáticos realizados na área e, após esse período — décadas de 1970 preparariam terreno para o surgimento posterior da EM como campo
e 1980 —, da produção científica realizada no âmbito dos cursos de profissional não só de ação, mas também de produção sistemática de
pós-graduação do país, perfazendo um total de 204 teses/dissertações conhecimentos.
! Q movimento “escolanovista”, desencadeado a partir da década
de mestrado ou doutorado relativas à EM. Excluímos dessa análise,
portanto, os relatos de experiência, as reflexões, os pontos de vista, Não 1920 no Brasil, seria de grande consequência para a EM. Engajados
os subsídios didáticos produzidos etc. nesse movimento educacional, vemos surgir os primeiros "educadores
A partir dos resultados obtidos pelo estudo, foram identificadas matemáticos”.— se é que podemos assim chamá-los — e, com eles, os
quatro fases de desenvolvimento da EM brasileira como campo pro- primeiros manuais de orientação didático-pedagógica de matemática.
fissional e área de investigação: Destacaram-se, entre outros, Everardo Backheuser com relação ao
ensino da matemática na escola primária e Euclides Roxo com relação
1º Fase: Gestação da EM como campo profissional (período ao ensino secundário e às reformas curriculares. Mais tarde — décadas
( anterior à década de 1970); de 1940 e 1950 — surgiriam outros como, por exemplo, Júlio César de
A 2º Fase: Nascimento da EM (década de 1970 e início dos anos Mello e Souza (Malba Tahan), Cecil Thiré, Ary Quintella, Munhoz
DX de 1980); Maheder, Irene Albuquerque e Manoel Jairo Bezerra.
3º Fase: Emergência de uma comunidade de educadores mate- Entretanto, segundo nosso estudo, esses matemáticos ou pro-
máticos (década de 1980); fessores de matemática, interessados no ensino primário e secundário,
14º Fase: Emergência de uma comunidade científica em EM (anos em vez de pesquisar a realidade escolar ou o processo de ensino-
de 1990). -aprendizagem, preferiram, nesse período, compendiar livros-texto
18 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 19

para os alunos e prescrever orientações didático-metodológicas e melhor investigação, parecem nãose tratar de professores de matemá-
“eurriculares aos professores. Essa situação não difere muito daquela tica, mas de pedagogos e psicólogos que, entre outras preocupações,
«* observada em Portugal (PONTE, 1993) e nos Estados Unidos, no início estudavam também o ensino e a aprendizagem da matemática.
| “do século XX (KILPATRICK, 1999). Após 1950, os estudos relativos ao ensino e à aprendizagem
o Malba Tahan! diferenciou-se dos demais pela qualidade e quan- da matemática no Brasil receberiam um novo impulso graças, princi-
tidade de suas publicações. Além de publicar romances, textos de palmente, à realização, entre 1955 e 1966, dos congressos brasileiros
1
+ —divulgação/popularização da matemática e de orientação didática, de ensino de matemática (CBEM) eàà criação, em 1956, dos centros
À ; realizou estudos bibliográficos de tópicos específicos da matemática, regionais de pesquisas educacionais (CRPE).
- estudos de episódios da história da matemática como, por exemplo, “ Os cinco CBEMS' contribuíram para que centenas de matemáti-
) biografias, paradoxos, lendas e problemas célebres e levantamentos cos, professores de matemática e pedagogos voltassem suas atenções
í

í
e ilustrações de fatos, de jogos e curiosidades populares nos quais a para o ensino primário e secundário. Esse envolvimento deveu-se,
(| | matemática se fazia presente. em grande parte, a um anseio brasileiro em engajar-se no movimento
Os poucos estudos, com características que se aproximam da pes- internacional de reformulação e modernização do currículo escolar
quisa stricto sensu, relativos ao ensino e à aprendizagem da matemática, (Movimento da Matemática Moderna — MMM).
realizados antes da década de 1950, ocorreram no terreno da psicome- “ Apesar dessa intensa mobilização nacional; à produção de estudos-
tria e consistiam no estudo psicológico da criança por meio de testes. -pesquisas relativos a aspectos e problemas do ensino e da aprendiza-
Estes ficaram restritos ao nível da escola primária e investigaram noções gem da matemática parece não ter acompanhado o mesmo ritmo. De
numéricas, habilidades nas técnicas operatórias de adição e subtração, fato, apesar do grande volume de trabalhos apresentados naqueles
habilidades com cálculos mentais etc. Os autores? desses estudos, salvo congressos, encontramos apenas dois satisfazendo os requisitos de
uma pesquisa educacional mais sistemática*.
Além dessas, encontramos, nas décadas de 1950 e de 1960, mais
1. Malba Tahan era o pseudônimo de Júlio César de Mello e Souza, engenheiro, pro-
cinco pesquisas. Todas elas foram produzidas nos CRPEs e versavam
fessor do Colégio Pedro II e catedrático da Faculdade Nacional de Arquitetura da
Universidade do Brasil (Rio de Janeiro). Mais informações sobre Malba Tahan poderão
ser encontradas em Lorenzato (1995) e em alguns sites: <http://athena.mat.ufrgs.
br/—portosil/malba.html>; <http://sites.uol.com.br/matematicagospel/malba tahan.
3. Salvador (1955), Porto Alegre (1957), Rio de Janeiro (1959), Belém (1961) e São
html>, <http:/Awww.ohomemq uecalculava.hpg.ig. com.br>. José dos Campos (1966).
2. PAIVA E SOUZA, Alfredina. Pesquisa 1: O ensino da matemática no curso primá- 4. Um desses trabalhos (KUNZ et al., 1957) foi realizado por professores-pesquisadores
rio: adição e subtração. Arquivos do Instituto de Educação, Rio de Janeiro, v. 1,n.2, do CRPE de Porto Alegre e relata uma pesquisa feita junto a empresas comerciais
p. 181-229, jun. 1936. Pesquisa 2: A pesquisa em educação: operações aritméticas e industriais com o intuito de levantar situações de vida que exigissem o uso da
fundamentais. Rio de Janeiro, Departamento de Educação, RJ, Relatório Interno de matemática para, então, com base nesse estudo, sugerir e implementar reformulações
Pesquisa, 1938, 50p. curriculares para a matemática escolar. O outro trabalho de pesquisa (WEIL, 1957;
TERRA, Alcimar. À escola primária e a aritmética. Revista Brasileira de Estudos Peda- do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial — SENAC) investigou aspectos
-gógicos, INEP v. 1, n. 3, p. 387-392, 1944. cognitivos de crianças de 7 a 12 anos relativos à evolução da seriação numérica, à
LUSTOSA, Irene. A criança de 7 anos através de testes mentais aplicados em Belo capacidade de estabelecer relações de identidade, à formação da noção de número
Horizonte. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, INEP v. 3, n. 8, p. 157-175, fev. 1945. etc. ,
BR EVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO
À MATEMÁTICA BRASILEIRA... 21
EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
20 INVESTIGAÇÃO

aritmética, decada seguinte, da EM. É na esteira dessé movimento que surgem


sobre a mesma temática: o ensino e à aprendizagem da
mas arit- pl cepos em Conto É egre e no Rio de Janeiro, respectivamente, o
sendo que três trataram da formulação/resolução de proble
dos erros ucação Matemática de Porto Alegre (GEEMPA)
méticos (CRPE-SP, 1961 e 1962; e CRPE-MG, 1960) e uma
cálculos e o Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Matemática (GEPEM)S
mais comuns apresentados pelos estudantes ao efetuarem
Desses grupos, cabe destacar que apenas o GEPEM continua atual
aritméticos. in- em atividade relacionada à EM. em
a, outros tipos de produção
Considerando, em contrapartid N Mendo je NO
O surgimento das licenciaturas em matemática, |
ensa ios,
décadas de 1950 e 1960, vários
.telectual, encontraremos, nas
sobre 0 ensino da, “es ; dos ginásios de aplicação, nos anos de 1940; e |
. selatosde experiência, pontos de vista e reflexões sido muito diver-
y
N
a obrigatoriedade da disciplina de prática de ensino e do estági |
” matemática. Embora esse tipo de produçãodois tenha Pd É
supervisionado firmada nos anos de 1960 (parecer do CREIMEC o
Es
o pre dom íni o de focos temáticos: um
sificado, identificou-se no n. 292/62) abririam um campo profissional para o surgimento, nas
de renovação curricular do ensi
|
N$! relativo ao movimento (MMM) o estudo u n iversidades , de es pecialistas em
ária e secundária; outro sobre
, iali didática
i ee m et odo og ia do ensino
i

) da matemática na escola prim


o
da matemática. |
met

| dirigido em matemática.
Os poucos estudos mais ou menos
Em síntese, podemos dizer que
ta:

até O final dos anos de 1960


sistemáticos relativos à EM produzidos a FASE: SURGIMENTO DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
ao ensino primário. Com relação
se referiam quase exclusivamente pontos MO CAMPO PROFISSIONAL E ÁREA DE CONHECIMENTO
encontramos apenas ensaios, reflexões,
ao ensino secundário,
relatos de experiência
de vista, prescrições didático-metodológicas, preocu-
matemática, denotando mais
e alguns estudos históricos da da
aos conceitos € procedimentos
pação com os aspectos referentes
de matemática e de seu ensino.
“matemática que com as concepções
como campo diferenciado de
Esse quadro sugere que a EM | Passo: À

uma existência claramente configurada.


estudo/pesquisa não possuía
o intercâmbio com educadores Aà valorização
valorizaçã ã
da educação, pelo regime militar, como locus
Entretanto, a realização dos CBEMSs, de
sobretudo, a formação de grupos privilegiad 9 para.a formação
prves ormaçã de mãoã de obra “mais qualificada” que
matemáticos internacionais e,
por exemplo, o Grupo de Estudos ten se És oxgências
A .
de desenvolvimento e de . modernização
4 j
da
n

estudos em torno do MMM, como,


e o Grupo de Estudos de Matemática ção, desencadearia,i no final
nação i da década
scada dede 1960 o! juma grande a m E
de Ensino de Matemática (GeEM) o, na
.

ariam terreno para O nasciment


(GRUEMA)* em São Paulo, prepar
6. 0) GEEMPA foi fundado em 1970 por Esther F ilar Grossi. O GEPEM foi fundado em

Sangiorgi e Renata
1976 sob a lider ança de Maria Laura Leite Lopes e outros colegas: Moema de Sá
sob a liderança de Osvaldo
5. O Gem foi fundado em 1961 Averbuch, Franca
panvalho, José « e Mello e Souza, Estela Fainguelernt, Anna Averbuch e
ado por: Anna Franchi, Anna
Watanabe. O GRUEMA foi form rman .
a Bechara e Manhúcia Libe
Gottlieb, Jacy Monteiro, Lucil
22 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ' BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 23

pliação do sistema educacional brasileiro. Nesse contexto, ocorre A maioria desses estudos (23) foi produzida em programas
um expansionismo universitário desmesurado, no início dos anos de ligados às faculdades de educação. Dos cinco produzidos em institutos
1970, verificado pela multiplicação das licenciaturas em ciências e de matemática, dois seriam oriundos de um programa temporário de
matemática e pelo surgimento de vários programas de pós-graduação mestrado em ensino de ciências e matemática oferecido pelo Instituto
em educação, matemática e psicologia. de Matemática, Estatística e Computação Científica da Universidade
É no âmbito desses cursos de pós-graduação que surgiriam Estadual de Campinas (IMEcc-UNICAMP) em convênio com o Ministério
algumas tentativas mais sistemáticas de produção de estudos sobre a da Educação (MEC)-Programa de Expansão e Melhoria de Ensino
aprendizagem da matemática ou sobre o currículo e o ensino. (PREMEN) e a Organização dos Estados Americanos (OEA). Esse
Entre 1971 e 1978, por exemplo, seriam produzidos 29 estu- programa multinacional vigorou de 1975 a 1984 e atendeu a quatro
dos — quatro teses de doutorado e 25 dissertações de mestrado — com turmas de alunos oriundos de toda a América Latina.
temática relacionada à EM. Essa produção foi bem dispersa, pois Segundo seu coordenador, Ubiratan D' Ambrosio, esse programa
resultou de 14 programas diferentes de pós-graduação. pretendia desenvolver/qualificar especialistas e lideranças em ensino
A primeira diferença notada com relação ao período anterior é de ciências e matemática, nas diversas regiões da América Latina, que
que agora outros níveis de ensino passam a se constituir também em fossem capazes de: promover cursos e programas de melhoria do ensi-
objeto de estudo sistemático. De fato, dos 27 estudos produzidos”, no; desenvolver análise, adaptação e elaboração de currículos; adaptar
apenas cinco continuam a referir-se às primeiras séries do 1º grau, e produzir material instrucional etc. De acordo com esses propósitos, o
enquanto dez envolvem o ensino de 5º a 8º séries do 1º graunseis o trabalho de pesquisa, que conduziria à dissertação de mestrado, deveria
de 2º grau e cinco o ensino superior. necessariamente ser desenvolvido pelo aluno em seu local de trabalho.
Três focos temáticos foram dominantes nesses estudos: As 28 dissertações relativas à EM aí produzidas guardam coe-
rência com essas orientações e apresentam uma preocupação mais
* estudo, desenvolvimento e testagem, via método experi- pragmática com relação à prática pedagógica que uma postura analítica
mental, de técnicas/métodos de ensino ou de propostas e investigativa de estudo e elucidação de seus aspectos, processos e
metodológicas (13 trabalhos); problemas. Entretanto, cabe destacar como inovadora nesses estudos
e estudos exploratórios/descritivos, geralmente do tipo survey a preocupação em romper com o tratamento meramente quantitativo
(veja glossário), do currículo escolar e/ou do processo ensino- dos dados, dando início aos estudos de caráter intervencionista na
-aprendizagem da matemática (sete trabalhos); prática. Isso é percebido mais claramente nos últimos estudos produ-
e estudos de natureza psicológica e/ou cognitiva (oito traba- zidos, que, também, se diferenciam por superar as leituras negativistas
lhos). da prática pedagógica.
De fato, o conjunto das dissertações produzidas no programa
apresenta três linhas básicas. A primeira, constituída por 15 traba-
7. Excluímos, nessa breve análise, dois estudos produzidos pelo programa Imecc/ lhos, refere-se a estudos ou projetos de desenvolvimento, testagem,
OEA-MEC-PREMEM-UNICAMP, que serão objeto de análise mais adiante. validação/avaliação de “novos” métodos e materiais instrucionais ou
24 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 25

de propostas metodológicas “inovadoras” de ensino de matemática. Em síntese, podemos dizer que o período que compreende
A segunda diz respeito a projetos ou programas de treinamento de a década de 1970 e o início dos anos de 1980 representou a fase
professores (seis trabalhos) ou outras alternativas de formação do pro- do surgimento da EM como campo profissional de.especialistas em
fessor in service que se aproximam da pesquisa-ação (dois trabalhos). A didática e metodologia do ensino. da matemática, Entretanto, apesar
terceira (cinco trabalhos) refere-se a projetos de formação preservice do da existência temporária de um programa especial de pós-graduação
professor de matemática com ênfase na formação didático-pedagógica, em ciências e matemática e de vários outros ligados às faculdades de
educação, a produção científica, nesse campo, apresentou-se dispersa
envolvendo sobretudo as disciplinas de didática especial e prática de
e sem continuidade.
ensino com estágio supervisionado.
A análise de cerca de oitenta dissertações/teses produzidas no
Em linhas gerais, esses estudos parecem priorizar a dimensão
período mostra que esses estudos foram, salvo poucas exceções,
didático-metodológica da EM e, geralmente, por uma perspectiva que
marcados pedagogicamente pela tendência tecnicista — para a qual a
Godino (1990) chama de tecnicista, pois enfatizam, salvo algumas
melhoria do ensino da matemática se dá pela descoberta, desenvol-
exceções, a elaboração e experimentação de materiais e técnicas de
vimento e fornecimento ao sistema de ensino de novos métodos ou
ensino. Outras dimensões como, por exemplo, a epistemológica (re-
técnicas de ensino — e cientificamente pelo modelo de investigação da
ferente à natureza e às concepções do conhecimento matemático), a
agricultura — método experimental que tem como princípio “experi-
teleológico-axiológica (relativa aos fins e valores da EM) e a psicológica
mentar para melhorar produtos através de tratamentos manipulativos”
foram pouco enfocadas.
(Nisbet apud BONILLA Rius, 1989) — acompanhado de uma abordagem
Entretanto, nesse mesmo período (de 1979 a 1982), nos outros
quantitativista ou computacionista de supervalorização das técnicas
programas de pós-graduação do Brasil, começam a surgir as primei- estatísticas (FIORENTINI, 1989). Subjacente a esses estudos, parecia haver
ras tentativas de estudos nessas outras dimensões. De fato, é nesse uma relação dicotômica entre o papel do professor e do pesquisador-
período que surgem os primeiros estudos do mestrado em psicologia -especialista. Ao professor não caberia a tarefa de produzir seu projeto
da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE-Recife), com a orien- didático-pedagógico, mas sim de ser um eficiente aplicador de métodos
tação de David Carraher, Terezinha Carraher e Analúcia Schliemann, ou propostas metodológicas produzidas pelo pesquisador-especialista.
que procuram investigar aspectos cognitivos relativos à formação de Além disso, os poucos esforços de realização de estudos mais sis-
conceitos matemáticos. temáticos parecem não passar de iniciativas individuais e isoladas que
Além de outros relacionados à dimensão psicológica, encon-
tramos também, nesse período, alguns que exploram, ainda que par-
cialmente e de modo nãosistemático, aspectos relativos às dimensões tos ideológicos, conceptuais e políticos subjacentes às propostas metodológicas de
teleológico-axiológica e epistemológica”. ensino da matemática; de Nilson Machado (PUC-SP 1981), que tratou da relação
entre matemática e realidade, procurando superar a visão formal de matemática;
de LuizJ. Lauand (Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo — Feusp,
8. Este é o caso dos estudos de: Corinta Geraldi (Faculdade de Educação da Uni- 1981) que focalizou os fins, os valores e os objetivos pedagógicos subjacentes a
versidade Estadual de Campinas — FE-UniIcaMP, 1980) que investigou os aspec- dois enfoques de geometria analítica.
26 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 27

visavam, antes de tudo, atender exigências acadêmicas para titulação experiência envolvendo estudo, desenvolvimento e aplicação de novos
de especialistas mais que constituir uma prática consistente de estudo/ métodos de ensino, notadamente a modelagem matemática (seis estu-
investigação para além dos cursos de pós-graduação. Ou seja, não havia dos) e a resolução de problemas (três estudos); a outra, constituída por
ainda uma comunidade nacional organizada e articulada que tivesse estudos sem uma unidade/continuidade temática aparente, reúne estudos
como objeto de pesquisa e de reflexão-ação a EM. sobre a formação de professores (quatro), estudos socioculturais ou
etnomatemáticos (três) e estudos histórico-filosóficos (três); a terceira
frente compreende estudos sobre os significados e as concepções pre-
3. 3º FASE: SURGIMENTO DE UMA COMUNIDADE DE sentes na EM. Estes apresentam preocupação não apenas com a unidade
EDUCADORES MATEMÁTICOS E A AMPLIAÇÃO DA teórica dos estudos mas, sobretudo, com a busca/desenvolvimento
REGIÃO DE INQUÉRITO DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA e processos mais sistemáticos de investigação, por uma abordagem
qualitativa, de vertente fenomenológico-hermenêutica.
O mestrado em psicologia cognitiva da UFPE consolida, nesse
Consoante à abertura política e à redemocratização do país, a
período [sua linha de pesquisa em cognição-matemática. Duas frentes
partir da década de 1980, amplia-se a concepção de EM e sua região
de investigação parecem destacar-se a partir de 1985. A mais notável
de inquérito. Novos problemas e novas perguntas surgem em EM e
(com reconhecimento internacional) é aquela que relaciona contexto
com eles novas formas de investigação. Outras dimensões, além
sedid da

A | MA
|
CD amam
sociocultural e cognição matemática. As seis dissertações produzidas
didático-metodológica e da psicológica, passam a fazer parte Traginale,
dosmen
nessa frente procuram investigar, por meio do método etnográfico
estudos naárea.
combinado com o clínico piagetiano, a influência da escolarização
— De fato, isso pode ser observado a partir do estudo das mais
formal e do contexto sociocultural (agricultura, feira etc.) sobre o
de 120 dissertações/teses produzidas entre 1983 e 1990, em trinta
desenvolvimento de noções, estratégias e habilidades matemáticas. A
programas de pós-graduação do país.
outra frente de investigação diz respeito à relação entre aprendizagem e
Dentre esses programas, delimitamos, para uma breve análise,
ensino. Os sete estudos dessa frente procuram investigar pelo método
apenas aqueles que produziram dez ou mais pesquisas relacionadas à
experimental combinado com o clínico piagetiano:
área, totalizando mais da metade da produção desse período.
O primeiro programa brasileiro regular de mestrado na área
1) a formação e o desenvolvimento de conceitos e habilidades-
teve início em 1984, na Universidade Estadual Paulista (UNEsP-Rio
estratégias cognitivas mediante situações ou programas espe-
Claro), como uma área de concentração do mestrado em matemática.
ciais de ensino tais como: o uso de palavras-chave; materiais
Em 1987, deixou de ser área de concentração e passou a oferecer três
concretos; diagramas de Vergnaud” no ensino-aprendizagem
linhas de pesquisa: (1) tendências atuais, (2) fundamentos matemáticos
de resolução de problemas aritméticos;
e filosóficos da EM e (3) ensino e aprendizagem da matemática.
Da análise das 22 dissertações produzidas até final de 1990, en-
contramos três frentes distintas: uma, a mais numerosa e cujos trabalhos 9. Esses diagramas são esquemas recomendados e utilizados como facilitadores para
a resolução de problemas.
mantêm uma certa unidade temática, é constituída de ensaios e relatos de
28 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 29

2) a influência de atividades com Logo!” ou com jogos na aqui- O quarto grupo envolve pesquisas de natureza histórico-filosófica
sição e no desenvolvimento do conceito de ângulo; e epistemológica como, por exemplo, a relação entre matemática e so-
3) as consequências de tipos convencionais ou não de ensino ciedade e as concepções de matemática dos professores.
na compreensão e aprendizagem das técnicas operatórias. O Programa de Mestrado em Educação da Faculdade de Educa-
ção da Universidade Federal do Paraná (FE-UFPR-Curitiba) distingue-
Os 12 estudos do mestrado/doutorado em educação da Faculda- -se dos demais pela sua preocupação em estudar o currículo escolar do
de de Educação da Universidade Estadual de Campinas (FE-UlNicaMp), ensino da matemática. Isso é feito, como mostram as 11 dissertações
produzidos entre 1983 e 1990, evidenciam, de um lado, certa pulveri- em EM aí produzidas, em três perspectivas diferentes.
zação temática e teórico-metodológica, mas, de outro, mostram que, A À primeira tenta buscar na história/filosofia da matemática ou
praticamente, todas as dimensões da EM foram tomadas como objeto na própria evolução do ensino secundário brasileiro de matemática os
de estudo. Mesmo assim, é possível distribuí-los em quatro grupos fundamentos histórico-epistemológicos para compreender e subsidiar
temáticos. as mudanças curriculares no ensino da matemática.
O primeiro reúne trabalhos que dizem respeito à produção, Xe A segunda procura, pelo método experimental ou por estu-
desenvolvimento e experimentação de propostas metodológicas ou de dos exploratórios, desenvolver e testar inovações ou atualizações
projetos curriculares. Metodologicamente, estes apresentam-se como curriculares para o ensino da matemática em nível de ensino de 1º
relatos críticos, tendendo para estudo de caso em algumas pesquisas e e 2º graus.
para a pesquisa-participante ou a pesquisa-ação em outras. Rd A terceira procura avaliar, por meio do estudo exploratório
O segundo compreende investigações analíticas e históricas do ou histórico-bibliográfico e documental, ou ainda, da observação da
ensino da matemática e/ou de sua produção científica e pedagógica. prática pedagógica e da análise de depoimentos, currículos em ação,
Estas vão desde a análise de material didático e a revisão/avaliação sejam estes emergentes da prática tradicional da escola ou propostos
de estudos sobre propostas metodológicas até o estudo histórico do pelos órgãos oficiais.
ensino da geometria no Brasil. Do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Federal
O terceiro compreende estudos psicológicos e/ou cognitivos de São Carlos (UFscaRr) resultaram, a partir de 1985, dez dissertações
como, por exemplo, atitudes diante da matemática e do seu processo com temática relacionada à EM. Os estudos da prática pedagógica e/
ensino-aprendizagem e estudos experimentais combinados com o ou do cotidiano da sala de aula parecem configurar a principal linha
método clínico piagetiano sobre o desenvolvimento cognitivo diante de investigação desse programa.
de atividades de ensino. De fato, cinco dissertações procuram — pelo estudo de caso com
gravações, entrevistas, observações participantes do tipo etnográfico,
análise de provas e de material didático utilizado — estudar, descrever
10. Logo é uma linguagem computacional que foi desenvolvida a partir dos anos de
e analisar as relações e interações entre alunos, professor e conteúdo
1960 por um grupo de pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts matemático que ocorrem em sala de aula. Algumas enfatizam mais a
(MIT), sob a direção de Seymour Papert. dinâmica e contexto de sala de aula. Outras, a metodologia e a ação
30 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 31

pedagógica do professor; e uma, a percepção do professor sobre as ção de problemas, a cognição matemática relacionada aos contextos
dificuldades do ensino e da aprendizagem da matemática. socioculturais, a prática pedagógica e a formação de professores.
Os outros estudos desse programa referem-se à produção, apli- Ampliou-se também a região de inquérito da EM, de modo que
cação e análise de projetos pedagógicos histórico-críticos de ensino outras dimensões passaram a ser investigadas, notadamente a histórico-
de matemática para adultos; à análise, numa perspectiva histórica, de -filosófica, a epistemológica, a antropológica, a sociológica e a teleológico-
livros didáticos e a estudos do desenvolvimento cognitivo diante de -axiológica.
Esse período também seria marcado por outros movimentos
situações de ensino.
de grande consequência para a área. Esse é o caso do Projeto SPEC/
O quadro anterior, relativo à década de 1980, mostra que a pes-
PADCT/MEC!! que, ao longo da década de 1980, financiou a formação,
quisa em EM no Brasil foi relativamente intensa e diversificada. Isso
por todo o Brasil, de um grande número de grupos de estudo voltados
se deve, em parte, à colaboração de muitos profissionais que, embora
à melhoria do ensino de ciências e matemática tanto em nível de 1º e
não tivessem formação específica na área (EM), fizeram da EM seu
2º graus como nas licenciaturas em ciências e matemática. Esses grupos
principal campo de produção de conhecimentos. Esse parece ser o
desenvolveram inúmeros projetos de inovação curricular, produziram
caso, entre outros, dos doutores em matemática e psicologia:
e publicaram subsídios curriculares, formaram laboratórios de ensino
de matemática, realizaram encontros regionais como, por exemplo,
* Eduardo Sebastiani Ferreira, João Frederico Meyer, Lafayette
os simpósios Sul-Brasileiro e Norte-Nordeste de ensino de ciências/
de Moraes, Rodney Bassanezi, Ubiratan D' Ambrosio, todos
matemática.
da UNicaMP;
Embora esses grupos e eventos tenham se notabilizado mais
e Mário T. Teixeira, Lourdes Onuchic, Roberto Ribeiro Baldino, pelo ativismo que pela reflexão sistemática sobre o processo de ensino
Maria Aparecida Bicudo, todos da UnEsp-Rio Claro; e aprendizagem, esse movimento contribuiu para que muitos profes-
* Maria Laura M. Leite Lopes, da Universidade Federal do Rio sores do ensino de 1º e 2º graus, com significativa experiência em
de Janeiro (UFRJ; Osvaldo Sangiorgi, da Universidade de sala de aula, passassem a fazer parte de grupos de estudos, chegando,
São Paulo (USP), muitos deles, a realizar mestrado ou doutorado em área relacionada
* David Carraher, Terezinha Nunes Carraher e Analúcia ao ensino. Foram justamente esses professores que trouxeram, para O
Schliemann, da UFPE. âmbito da reflexão sistemática da pós-graduação, as interrogações e os
problemas concretos por eles vividos no dia a dia da sala de aula. Esses
Mas, embora poucos, já existiam, na década de 1980, alguns profissionais, inclusive, constituem hoje o principal grupo de apoio
doutores em educação ou em didática da matemática: Sergio Lorenzato e sustentação da comunidade nacional de educadores matemáticos.
(FE-Unicamp), Scipione de Pierro Neto (Feusp), Luis Roberto Dante
(UnEsp-Rio Claro), Esther Pilar Grossi (GEEMPA-RS), entre outros.
Nesse mesmo período, surgiram novas linhas de estudo como, 11. SpEc/PADCT/MEC: SubProjeto de Ensino de Ciências do Programa de Apoio de
por exemplo, a etnomatemática, a modelagem matemática, a resolu- Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Ministério da Educação e Cultura.
32 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 33

Aliás, parece não ter sido mera coincidência a fundação e orga- sobretudo aquelas relativas às linhas mais recentes de estudo como a
nização, nesse período — anos 1987a 1988 —, da Sociedade Brasileira modelagem matemática, a etnomatemática, a resolução de problemas
de Educação Matemática (SBEM) e, a partir de então, a realização e outras relativas à produção, desenvolvimento e experimentação de
regular de encontros estaduais e nacionais de EM? novas propostas metodológicas ou projetos de ensino.
Foi somente após todos esses acontecimentos que os educadores Esse descaso para com a metodologia não foi generalizado. Por
matemáticos passaram a identificar-se como tal e a interrogar sobre a exemplo, praticamente todos os estudos sobre o desenvolvimento cog-
natureza desse novo campo profissional. É a partir desse momento — nitivo, de vertente piagetiana, mantiveram a tradição do uso sistemático
final da década de 1980 — que as pesquisas realizadas isoladamente, do método clínico piagetiano combinando-o, conforme o caso, com
nas diversas partes do país, passaram a ser socializadas e discutidas o método experimental (para estudos que investigam a aprendizagem
por meio dos encontros específicos. diante de situações especiais de ensino) ou com o método etnográfico
Na verdade, a falta de organização dos educadores matemáticos (para estudos em contextos socioculturais).
e a ausência de espaços apropriados para divulgar, discutir e avaliar a Outras linhas, entretanto, parecem apresentar uma evolução
A
produção científica na área foi, provavelmente, a principal razão pelo progressiva na tentativa de encontrar processos mais sistemáticos e
seu estado de pulverização temática, metodológica e teórica. apropriados de investigação. Esse é o caso dos estudos pela abordagem
Na Essa situação certamente acabou contribuindo para a emergência fenomenológico-hermenêutica da UnEsp-Rio Claro; de algumas pes-
de uma produção pouco sistemática e pouco consequente, acarretando quisas pela abordagem histórico-dialética da FE-Ulnicam», da UEsCAR e
descontinuidade entre os estudos e não permitindo o acúmulo e o da UFPR, e das investigações sobre a prática pedagógica e o cotidiano
aprimoramento de experiências na área. escolar da UrscaR e de outros programas.
Não obstante, convém observar que, nesse período, a própria Por exemplo, os primeiros estudos sobre a prática pedagógica
, pesquisa educacional estava passando por um período de transição em sala de aula procuravam analisá-la em sua negatividade, isto é, pelas
teórico-metodológica. No início dos anos de 1980, o processo de in- suas carências ou confirmações em relação ao modelo teórico prévio
a
s,
vestigação empírico-analítico, com ênfase na abordagem quantitativa, que a idealizava. Essa prática também era, muitas vezes, descrita por
x,
; passou a ser fortemente questionado, sendo, inclusive, apontado pelo fatos observados no cotidiano, como se esses falassem por si mesmos.
o “ debate epistemológico como inadequado para abarcar as múltiplas fa- Para a pesquisa educacional não é suficiente descrever e descobrir
i
cetas do fenômeno educacional. Isso contribuiu para que, nesse perío- fatos. É preciso buscar as explicações que permitem compreendê-los
' do, muitos pesquisadores e orientadores descuidassem dos processos e elucidá-los. Isso requer uma interação dialética entre pesquisador e
metodológicos de investigação. Os reflexos disso podem ser perce- realidade física ou social, de modo que o primeiro explique a segunda,
“ bidos em muitas dissertações/teses produzidas na década de 1980, pois pesquisar não significa uma simples reprodução da realidade, mas,
sim, uma reconstrução baseada nos conhecimentos e significados do
pesquisador.
12. O 1º ENEM (Encontro Nacional de Educação Matemática) aconteceu em 1987 na De três linhas ou focos temáticos de pesquisa da 2º fase avan-
PUC-SP e o 2º Enem em Maringá (PR) em 1988. çamos, na 3º, para dez:
34 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 35

* estudo/experimentação de novos métodos ou técnicas de 4. 4º FASE: EMERGÊNCIA DE UMA COMUNIDADE CIENTÍFICA


ensino (resolução de problemas e modelagem matemática);
* etnomatemática e educação de adultos;
Início dos anos de 1990. Retornam ao país mais de duas deze-
* cognição matemática no ensino e/ou em contextos sociocul-
nas de educadores matemáticos que concluíram doutoramento nos
turais;
Estados Unidos, França, Inglaterra e Alemanha em diversas áreas de
* filosofia/história/epistemologia e ensino de matemática;
investigação: didática da matemática, história, filosofia, epistemologia e
* formação inicial e continuada de professores de matemática;
psicologia da EM, currículo escolar; resolução de problemas; formação
* materiais didáticos e meios de ensino;
de professores; ensino de geometria; álgebra e pensamento algébrico;
* currículo escolar;
etnomatemática; informática educativa etc.
* estudos do cotidiano escolar;
Nesse período, um número ainda maior de educadores mate-
* estudos histórico-analíticos do ensino da matemática;
máticos concluiu doutorado no Brasil, em cursos de pós-graduação
* concepções/significados/ideologia no ensino-aprendizagem.
em educação. Se incluirmos também, nessa relação, os doutores em
matemática ou de outra área que, a partir da década de 1980, passaram
Nessa 3º fase, passamos da quase ausência de crítica (anos de
a se dedicar exclusivamente ao campo da EM, podemos seguramente
1970) para um período de amplas discussões políticas, sociais e ideo-
afirmar que, até o final dos anos de 1990, tínhamos, no Brasil, uma co-
lógicas. De “como ensinar?” passamos para “por que, para que e para
munidade de aproximadamente duzentos doutores fazendo da EM seu
quem ensinar?”. Se a pesquisa, nos anos de 1980, contribuiu, de um
principal campo de atividade profissional de produção de saber. Isso
lado, para elucidar alguns determinantes socioculturais e políticos, de
sem incluir um número ainda maior de não doutores que, igualmente,
outro, priorizou os aspectos pedagógicos mais amplos do fenômeno
N& vêm dedicando exclusivamente a essa área.
educacional em detrimento daqueles mais específicos relacionados aos
MN A EM, nesse período, passou a ser reconhecida pela própria
conteúdos matemáticos.
N. Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
S Nesse período, surgem as abordagens qualitativas de pesquisa

(ANPEd), que aprovou, em 1997, a constituição de um Grupo de
= “(método da antropologia), percebendo-se, também, em muitos traba-
Trabalho (GT) de educação matemática. Desde 1998, este GT vem
lhos, uma certa despreocupação com o rigor metodológico da pesquisa.
reunindo-se anualmente por ocasião das reuniões da ANPEd, tendo
Entretanto, a região de inquérito da educação matemática se ampliaria
apresentado, até o ano de 2001, 48 trabalhos.
significativamente nessa fase. De fato, outras dimensões — como, por
Tomando por base os 48 trabalhos aprovados pelo Comitê Cien-
exemplo, a histórico-filosófica e epistemológica, a antropológica, a
tífico da ANPEd, para o GT de educação matemática, Fiorentini (2002)
linguística, a sociológica etc. — começaram a ser investigadas.
identificou oito focos temáticos dessas investigações:

* estudos sobre o professor de matemática (12 trabalhos — 25%), t

* estudos cognitivos e metacognitivos (12 trabalhos — 25%);


36 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 37

e estudos sobre o ensino de matemática na universidade (seis No que diz respeito à metodologia da pesquisa em EM, é pos-
trabalhos — 12,5%); sível observar certa evolução a partir dos anos de 1990. Entre outros
s estudos sobre as tendências em EM (seis trabalhos — 12,5%); aspectos, podemos destacar:
* estudos que utilizam a metodologia da engenharia didática
(quatro trabalhos — 8,3%); maior consistência e cuidado teórico-metodológico no de-
* estudos sobre EM e políticas educacionais públicas (quatro senvolvimento das pesquisas;
trabalhos — 8,3%); focalização de aspectos mais pontuais da prática de ensino
* estudos sobre a produção de significados em atividades ma- da matemática;
temáticas (três trabalhos — 6,25%); maior diferenciação entre pesquisa e relato de experiência;
e estudos sobre a matemática em contexto não escolar (um aparecimento de múltiplas alternativas metodológicas de
trabalho — 2%). investigação, sobretudo em relação ao processo de docu-
mentação e coleta e análise de dados e informações;
Na verdade, o que vemos, nessa 4º fase, é um grande movimento aumento do número de estudos de intervenção na prática
nacional de formação de grupos de pesquisa, de consolidação de linhas pedagógica como, por exemplo, a “pesquisa-ação” e práticas
de investigação e de surgimento de cursos de mestrado/doutorado colaborativas entre professores universitários e escolares.
em EM.
A partir dos anos de 1990, surgem novas linhas ou focos de investi- Alguns centros de investigação em EM têm-se destacado nessa
dação, como, por exemplo: 4º fase:
A Unesp-Rio Claro, com seu Programa de Mestrado e Doutorado
* informática e ensino de matemática; em EM, consolida-se em torno de cinco linhas:
* ensino de álgebra e pensamento algébrico;
* ensino de geometria e pensamento geométrico; filosofia e epistemologia na EM;
* educação estatística; relações entre história e EM;
* didática e epistemologia em matemática; novas tecnologias e EM;
* análise da comunicação e do discurso de professor e alunos formação pré-serviço e continuada do professor de mate-
em sala de aula; mática;
* estudo dos processos interativos em sala de aula; ensino e aprendizagem da matemática.
* psicoanálise e educação matemática;
* desenvolvimento profissional de professores de matemática; A PUC-SP vem oferecendo curso de mestrado acadêmico em
* saberes docentes sobre a prática pedagógica em matemática. EM desde 1994 e, em 2002, deu também início ao curso de doutorado
em EM e ao mestrado profissionalizante em ensino de matemática. São
três as linhas de pesquisa desse programa de pós-graduação:
38 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA BRASILEIRA... 39

* a matemática na estrutura curricular e formação de professores; discussão da produção científica da área, tais como o Seminário Inter-
* história, epistemologia e didática da matemática; nacional de Educação Matemática (SiPEM)e o EBRAPEM.
* tecnologias da informação e EM, O 1º Sire, realizado em Serra Negra, em novembro de 2000,
reuniu 124 pesquisadores em EM, tendo como principal objetivo dis-
O Programa de Pós-Graduação em Educação da FE-UNICAMP tem cutir e trocar experiências sobre pesquisa no campo da EM e estruturar
uma área de concentração em EM (mestrado e doutorado) e conta, algumas linhas ou GTs de pesquisa. Como um dos resultados desse
desde 1994, também com três linhas de investigação: 1º Seminário, a comunidade científica de educadores matemáticos
ficaria organizada em 12 grupos de trabalho: EM nas séries iniciais
* história, filosofia e EM (relações entre história da matemática (CT); EM nas séries finais do ensino fundamental e no ensino médio
e EM, história do ensino da matemática); (GT, e GT); EM no ensino superior (GT ); História da matemática e
* prática pedagógica em matemática (saberes e formação docente; cultura (GT); EM: novas tecnologias e educaçãoà distância (GT);
educação conceitual; EM de jovens e adultos); Formação de professores que ensinam matemática (GT); Avaliação
* psicologia da EM. em EM (GT); Processos cognitivos e linguísticos em EM (CT);
Modelagem matemática (GT,); Filosofia da EM (GT|); Ensino de
No anos 2000 e 2001 foi criada uma nova área de conhecimento
probabilidade e estatística (GT).
na CapES: área de ensino. de ciências e matemática, independente da
O 2º SipEM foi realizado em Santos e contou com cerca de 300
ção. Em dezembro de 2001 9 Conselho Técnico Científico da
pesquisadores que apresentaram e discutiram 143 comunicações orais
aprova, envolvendo essa área, o funcionamento de dois cursos de
e 19 pôsteres. O 3º SipEM foi realizado em Águas de Lindoia em 2006.
doutorado (PUC-SP e Universidade Federal de Santa Catarina— UFSC),
Nesse período — final dos anos de 1990 -, surgem também os
seis cursos de mestrado acadêmico (PUC-SP UFSC, Universidade
encontros brasileiros de eu estudantes de pós- graduação em EM CEBRAPEM).
Estadual de Londrina — UEL, Universidade Federal do Pará— UFPA, Crieicade ir seita, minima mae ao mermo 4
O 1º EBRAPEM aconteceu em Rio Claro, em 1997, e foi realizado por
Universidade Luterana do Brasil — ULBRA, Universidade de Santa Úr- ante esemeti gt. ar re ueaao eo o o]

iniciativa dos estudantes de fpós-graduação da UNESP-Rio Claro com o


sula — USU) e três cursos de mestrado profissionalizante (PUC-SP
objetivo de criar um fórum específico para discutir e intercambiar pes-
PUC-RS e Universidade Federal do Rio Grande do Norte — UERN).
quisas desenvolvidas e em desenvolvimento em cursos de mestrado e
Considerando o crescimento dos programas de pós-graduação
e da comunidade científica em EM, a SBEM passou a organizar e
doutorado em educação ou em educação matemática no Brasil. Desde sua
primeira edição, em 1997, esses encontros passaram a ocorrer anualmen-
promover, além dos já tradicionais Encontros Nacionais de Educação
Matemática (ENEMs)!º, encontros voltados mais especificamente à te, alternando, sempre que possível, a instituição organizadora. Assim,
em 1998 tivemos o 2º EBRrAPEM na UNEsP-Rio Claro. O 3º foi organizado
pela USU-RJ, em 1999. O 4º foi novamente organizado pela UNEsp-Rio
13. 1º ENEM em São Paulo, 1987, 2º ENEM em Maringá, 1988; 3º ENEM em Natal, 2000; Claro. O 5º pela PUC-SP em 2001. O 6º pela FE-LnicaMP, em 2002.
4º ENEM em Blumenau, 2001; 5º ENEM em Aracaju, 1995, 6º ENEM em São Leopoldo,
1998; 7º ENEM no Rio de Janeiro, 2001; 8º Enem em Recife, 2004; 9º ENEM em Belo O 7º pela Unesr-Rio Claro. O 8º pela UEL, em 2004. O 9º pela USP
Horizonte, em 2007. em 2005, e o 10º pela Universidade Federal de Minas Gerais, em 2006.
40 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

Fa A
CAPITULO * TRES
Os periódicos nacionais (revistas, boletins ou jornais) de divul-
gação da produção científica em EM ainda podem ser considerados
reduzidos se comparados à dimensão do movimento da área. Embora
os pesquisadores em EM utilizem periódicos geralmente da área edu- TENDÊNCIAS TEMÁTICAS E METODOLÓGICAS
cacional para publicar seus trabalhos, existem alguns periódicos especí-
ficos que publicam relatos de pesquisa: o Borema (UINEsP-Rio Claro); o
DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
Boletim GepEM (RJ); a Revista Zetetiké (FE-UNICAMP) e, mais recentemente,
a Educação Matemática Pesquisa da PUC-SP. Além disso, existem também
as revistas da SBEM (da Diretoria Nacional Executiva —- DNE — e de
algumas regionais) !*.

1. HISTÓRIA E TENDÊNCIAS TEMÁTICAS DA PESQUISA


INTERNACIONAL EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

P ara descrever historicamente a pesquisa internacional em educa-


ção matemática (EM) e suas tendências atuais, baseamo-nos, em
grande parte, em Kilpatrick (1994). Esse autor identifica e descreve
as tendências da investigação relativas a sete temáticas consideradas
“em alta” na EM mundial, durante a década de 1990. Essas tendências
temáticas são:

* processo ensino-aprendizagem da matemática;


e mudanças curriculares;
* utilização de Tecnologias de Informação e Comunicação
(TICs) no ensino e na aprendizagem da matemática;
* prática docente, crenças, concepções e saberes práticos;
* conhecimentos e formação/desenvolvimento profissional do
professor;
* práticas de avaliação;
* contexto sociocultural e político do ensino-aprendizagem da
14. Veja relação desses periódicos ao final deste livro.
matemática.
42. INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
TENDÊNCIAS TEMÁTICAS E METODOLÓGICAS DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 43

A seguir, passamos, com base nesse autor, a descrever resumi- *. as pesquisas sobre a aprendizagem individual são ainda pre-
damente cada uma dessas temáticas.
dominantes em relação àquela que ocorre em grupos de
alunos nos processos interativos em sala de aula;
1.1. Processo ensino-aprendizagem da matemática * as atitudes, crenças é concepções dos alunos em relação à
matemática ainda continuam atraindo a atenção dos investiga-
Nessa temática estão relacionados os estudos que têm como
dores, embora se note uma leve queda nos últimos anos, tendo
objeto de investigação o processo de ensino e aprendizagem da ma-
surgido também interesse pelas representações sociais.
temática. À principal mudança verificada nos últimos anos é que esses
estudos deixaram de focalizar aspectos muito gerais da aprendizagem
Além dessas tendências apontadas por Kilpatrick, verificamos
e passaram a centrar foco na aprendizagem de conteúdos matemáticos
recentemente a emergência de estudos metacognitivos, isto é, aqueles
mais específicos. O foco de estudo mais prestigiado pelas pesquisas
que procuram investigar o modo como os alunos percebem e relatam
tem sido o processo de contagem, os sistemas de numeração e as ope-
seu processo de resolução de problemas ou de aprendizagem de algum
rações fundamentais com números naturais, nas séries iniciais. Só mais
conceito matemático. Essas pesquisas têm frequentemente utilizado,
recentemente tem sido dada maior atenção ao estudo dos racionais,
como recurso de coleta de dados, mapas conceituais elaborados pelos
da álgebra, da geometria, da estatística e probabilidade e do cálculo
próprios alunos.
diferencial e integral.
Kilpatrick (1994) tem verificado, com relação a essa temática,
outras tendências: 1.2. Mudanças curriculares

* o ensino médio e o superior também passaram, a partir do


À primeira questão que surge para o investigador, com relação a
final dos anos de 1980, à atenção e ao interesse dos pesqui-
esse tema, é: quais são os fatores que provocam as mudanças curricu-
sadores em EM;
lares e como estas se processam na prática escolar? Podemos apontar,
* à medida que surgem novos conhecimentos e novas apli-
além das pressões sociais, econômicas e políticas em relação à formação
cações da matemática, têm surgido pesquisas sobre como
dos novos profissionais, a pressão dos especialistas e acadêmicos em
estes poderiam ser ensinados e/ou aprendidos na escola. Um
querer transpor para a sala de aula os resultados de suas pesquisas sobre
exemplo disso são os fractais;
o ensino da matemática. Outra mudança no currículo é em razão do
* as respostas corretas e incorretas às tarefas ou aos problemas
uso de novas tecnologias e novas aplicações no ensino da matemática.
matemáticos e as estratégias utilizadas pelos alunos e outros
Um terceiro tipo de mudança é atribuído aos próprios professores,
sujeitos para obtê-las continuam, até então, a interessar os
que, por meio da pesquisa-ação, tentam, eles mesmos, produzir as
pesquisadores da área;
inovações curriculares que julgam convenientes.
* ainda se pesquisam os esquemas cognitivos gerais e as estru-
O estudo dessas mudanças e, sobretudo, de seus efeitos cons-
turas cognitivas desenvolvidas pelos alunos ante a resolução
tituem temas e/ou problemas de interesse da pesquisa em EM. Eis
de problemas;
alguns exemplos:
44 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA TENDÊNCIAS TEMÁTICAS E METODOLÓGICAS DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 45

* efeitos do Movimento da Matemática Moderna (MMM) na bretudo, um gestor e principal responsável, junto com seus
prática escolar ou no ideário dos professores de matemática; alunos, pela produção do currículo escolar. Essa produção
* estudos comparativos entre diversos países tanto em relação é estabelecida pelo diálogo entre os saberes historicamente
ao currículo proposto oficialmente quanto ao currículo em produzidos e aqueles socioculturais trazidos ou produzidos
ação (aquele que efetivamente acontece na sala de aula) ou pelos alunos em sala de aula;
aquele que os alunos realmente aprendem; * nos últimos anos, alguns pesquisadores têm voltado sua aten-
* efeitos do uso da modelagem matemática — explorando o ção para o currículo oculto — aquele relativo aos valores, ideias
estudo de problemas da vida real — no ensino e na aprendi- e concepções que estão subjacentes à prática pedagógica —,
zagem da matemática nas escolas; o qual, na maioria das vezes, é ensinado e apreendido sem
e efeitos do uso de tecnologias educacionais (vídeo, calculado- que professores e alunos tenham consciência dele.
ras, computadores, internet) no ensino da matemática — que
podem promover uma mudança na abordagem (ou prática
1.3. Utilização de TICs no ensino e na aprendizagem da
pedagógica) e no modo de ver/conceber (ou estabelecer
matemática
relação com) a matemática e seu ensino;
* a importância do estudo da história/epistemologia das ideias À utilização de calculadoras e de audiovisuais como recursos para
matemáticas na configuração do currículo; o ensino e a aprendizagem da matemática começou a atrair o interesse de
* no Brasil, os estudos curriculares relativos ao ensino funda- pesquisadores em EM com mais intensidade a partir dos anos de 1970.
mental têm sido mais frequentes, havendo poucos estudos O aparecimento de novas tecnologias como o computador, a televisão
relativos ao currículo de matemática do ensino médio;
e a internet tem levado educadores matemáticos a tentar utilizá-las no
* em razão da recente concepção de que a aprendizagem re- ensino. À partir da década de 1990, surge, então, uma nova terminologia
presenta um processo de construção social de significados, a no meio educacional: TICs. As TICs resultam da fusão das tecnologias
pesquisa tem passado a dar mais atenção à visão e aos sentidos de informação, antes referenciadas como informática, e as tecnologias
que os alunos apresentam em relação às ideias e representa- de comunicação, denominadas anteriormente como telecomunicações
ções matemáticas do que simplesmente às informações que e mídia eletrônica. Elas envolvem a aquisição, o armazenamento, o
os alunos recebem em aula e são capazes de devolver nas processamento e a distribuição da informação por meios eletrônicos e
provas;
digitais, como rádio, televisão, telefone e computadores.
* outra mudança da investigação em EM que se tem verificado A atenção dos investigadores e elaboradores de tecnologia
ultimamente é a maior importância atribuída pelos investi- computacional e vídeo interativo vem sendo, nas últimas décadas,
gadores ao currículo em ação do que àquele proposto ou direcionada ao desenvolvimento de projetos/programas para ensino,
planejado e supostamente avaliado pelos professores. Em alguns para alunos e outros para professores, para serem manejados
relação a isso, o professor passou a ser visto não mais como
por professores e não por técnicos.
um simples reprodutor e executor do currículo, mas, so-
46 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA TENDÊNCIAS TEMÁTICAS E METODOLÓGICAS DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 47

As TICs permitem aos estudantes não apenas estudar temas maior com os efeitos dos diferentes métodos ou materiais de ensino na
tradicionais de maneira nova, mas também explorar temas novos como, aprendizagem dos alunos. Esses estudos compreendiam basicamente
por exemplo, a geometria fractal. testagem e/ou validação de novas técnicas ou materiais de ensino.
Embora as calculadoras (inclusive as gráficas que produzem A partir da metade da década de 1980, os pesquisadores passa-
gráficos e trabalham com funções algébricas) sejam, no Brasil, ainda ram a interessar-se, por um lado, sobre como os professores manifestam
pouco utilizadas e investigadas em sala de aula, atualmente, os mi- seus conhecimentos e suas crenças no processo de ensino e, por outro,
crocomputadores e a internet vêm ganhando cada dia mais espaço e sobre como os alunos aprendem e compreendem aspectos específicos
adeptos tanto na prática escolar como na pesquisa educacional. da matemática.
Entretanto, apesar dos avanços, pouco ainda se conhece sobre o No início da mesma década, Thompson (1997) deu início às
impacto das TICs em sala de aula, tanto no que diz respeito às crenças, investigações sobre a relação entre as concepções/crenças dos pro-
às habilidades, às concepções e às reações de professores, alunos e pais fessores e sua prática pedagógica. Os resultados dos estudos que se
como, também, ao próprio processo de ensino. seguiram mostram que o conhecimento e as crenças dos professores se
Parece haver uma crença, entre alguns responsáveis pelas polí- transformam continuamente, afetando de modo significativo a forma
ticas educacionais, de que as novas tecnologias são uma panaceia para como os professores organizam e ministram suas aulas.
solucionar os males da educação atual. Essa é mais uma razão pela qual À partir do final dos anos de 1980, surgem também estudos que
a comunidade de EM deve investigar seriamente a implementação e investigam os conhecimentos profissionais dos professores. Estudos
utilização das TICs, pois, se, de um lado, pode ser considerado rela- mais recentes, partindo do pressuposto de que os professores produ-
tivamente simples equipar as escolas com essas tecnologias, de outro, zem, na prática, saberes práticos sobre matemática escolar, currículo,
isso exige profissionais que saibam utilizá-las com eficácia na prática atividade, ensino, aprendizagem, mostram que esses saberes práticos
escolar. se transformam continuamente, sobretudo quando os professores
O leitor interessado pode consultar, no final deste capítulo, uma realizam uma prática reflexiva e/ou investigativa.
lista de alguns sites na internet sobre o tema das novas tecnologias no Em relação à prática docente, pode-se destacar ainda os estudos
ensino e na formação de professores de matemática. diferenciados que os franceses vêm desenvolvendo sobre, por exemplo:

1.4. Prática docente, crenças/concepções e saberes * contrato didático: esse conceito foi introduzido por Guy Brousseau
práticos para explicar algumas relações que acontecem em sala de aula.
Contrato didático significa as atitudes, comportamentos,
Até meados dos anos de 1970, as pesquisas em EM focalizavam posturas e ações dos alunos, que são esperadas pelo profes-
mais a aprendizagem que o processo de ensino ou a prática docente sor, e aquelas do professor, que são esperadas pelos alunos.
em sala de aula. Esse contrato pode ser implícito ou explícito, podendo ser
Entretanto, quando os estudos sobre o processo de ensino come- negociado entre professor e alunos. É esse contrato didático,
garam a aparecer com mais frequência, esses revelavam uma preocupação portanto, que determina as regras do jogo em sala de aula;
48 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA TENDÊNCIAS TEMÁTICAS E METODOLÓGICAS DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 49

* transposição didática: esse conceito foi elaborado por Chevallard 1.5. Conhecimentos e formação/desenvolvimento profissional
para problematizar e destacar a necessidade de transformar do professor
(transpor) os conhecimentos matemáticos histórica e cien-
Os estudos sobre os saberes profissionais do professor, até
tificamente sistematizados em conteúdos de saber escolar
início dos anos de 1990, têm revelado baixos níveis de compreensão
situados, contextualizados e relevantes para os alunos;
e domínio do conhecimento matemático a ser ensinado. Relacionado
* obstáculo didático e obstáculo epistemológico: esses conceitos foram a esse problema, ainda continua em alta o debate sobre que tipo de
também desenvolvidos por Guy Brousseau, a partir das ideias conhecimento matemático deve ter o professor e como deve combiná-
iniciais de Bachelard. Os obstáculos epistemológicos podem -lo com seu conhecimento pedagógico. Se a pesquisa não pode decidir
ser encontrados na própria evolução histórica das ideias ma- sobre isso, pelo menos ela pode aprofundar nossa compreensão sobre
temáticas, sobretudo quando havia dificuldades no avanço como os professores utilizam e mobilizam os conhecimentos quando
de alguns conceitos. Exemplos disso são: o problema do ensinam matemática em sala de aula.
zero absoluto versus zero relativo; a incomensurabilidade dos Os estudos de correlação entre as características dos professores
e sua relação com o desempenho dos alunos têm sido, em sua maior
irracionais etc. Esses mesmos obstáculos, segundo Brousseau,
parte, improdutivos. Por isso, os pesquisadores começaram a entrar
também podem fazer-se presentes em sala de aula. Mas, ainda
em sala de aula para avaliar de perto a ação e o desempenho docente.
segundo Brousseau, os obstáculos mais frequentes no trabalho
Os estudos que relacionam ações específicas do professor com
pedagógico são os obstáculos de origem didática, que podem o desempenho dos alunos, muito frequentes na década de 1970, foram
dificultar o avanço ou a compreensão dos alunos de alguns aos poucos dando lugar a investigações do tipo:
conceitos. Por exemplo: quando o professor insiste em afir-
mar que multiplicar significa aumentar, esse procedimento * contraste entre professor principiante e professor experiente;
faz com que o aluno não entenda por que 5 multiplicado por * tentativas (alternativas) para melhorar a prática pedagógica
1/3 resulta em um número menor que 5. Como podemos do professor;
* descrições de como o professor constrói significados e per-
observar, os obstáculos de origem didática dependem fun-
cebe sua vida profissional,
damentalmente das opções e dos procedimentos didáticos
e estudo das crenças e concepções do professor;
utilizados pelo professor para facilitar o ensino.
* estudo de alguns programas de formação continuada ou
permanente.
Mais informações e esclarecimentos sobre a didática matemá-
tica francesa podem ser obtidas em Machado (1999), Pais (2001) e Só a partir dos anos de 1990 é que surgem estudos que procuram
nos estudos desenvolvidos no mestrado em educação matemática da descrever ou investigar a identidade e o desenvolvimento profissional
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). de professores de matemática por meio de entrevistas, história de
vida, história oral.
50 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA TENDÊNCIAS TEMÁTICAS E METODOLÓGICAS DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 51

Tomando por base as investigações relatadas no Working Group O que tem ocorrido, com frequência, é uma adaptação da prática do-
for Action-7 (WGA-7)! do International Congress on Mathematical cente aos princípios/critérios que regem essas avaliações.
Education-2000 (ICME-2000) — sobre formação e desenvolvimento Esse autor lamenta que as pesquisas em EM não se tenham de-
profissional de professores —, Ponte (2000) identificou quatro ênfases bruçado sobre esse problema. Verifica também que os poucos estudos
principais: que investigam a avaliação e as políticas públicas têm sido muito tími-
dos quanto à análise dos processos de adoção, adaptação ou resistência
1) estudos sobre a estrutura dos programas de formação e os dos professores às avaliações externas.
papéis desempenhados pelos diversos participantes; Numa visão mais abrangente do problema, a avaliação no/do
2) estudos sobre novas experiências ou iniciativas de formação processo ensino-aprendizagem da matemática tem sido muito pouco
e seus respectivos objetivos; investigada pelos educadores matemáticos.
3) estudos sobre o currículo da formação do professor de ma-
temática visando definir “standards de formação”;
4) e estudos sobre recursos e políticas de formação do professor. 1.7. Contexto sociocultural e político do ensino-
aprendizagem da matemática
Na verdade, segundo o mesmo autor, a ênfase atual sobre for-
"mação de professores tem incidido sobre os processos de formação, ou As investigações que buscam relacionar o ensino-aprendizagem
melhor, de aprendizagem profissional. Dentre os processos pesquisados, da matemática ao contexto sociocultural foram a grande novidade da
destacam-se: a reflexão sobre a prática pedagógica; a pesquisa-ação; pesquisa em EM a partir dos anos de 1980. Nesse contexto, a mate-
e os processos colaborativos. mática e a EM passaram a ser vistas como práticas socioculturais que
atendem a determinados interesses sociais e políticos.
São inúmeras as pesquisas que procuram investigar a relação
1.6. Práticas de avaliação
entre a cultura da matemática escolar, a cultura matemática que o aluno
traz para a escola e a cultura matemática produzida pelos trabalhadores
Muitas mudanças curriculares fracassaram, segundo Kilpatrick
(adultos e algumas crianças trabalhadoras) ao realizar suas atividades
(1994), porque entraram em conflito com as avaliações externas. Existe
profissionais.
hoje um esforço para que as mudanças da prática docente em sala de aula
Essa é a área de investigação em que o Brasil mais se tem des-
venham acompanhadas de mudanças também no processo de avaliação.
tacado internacionalmente. Este é o caso:
Em todos os países do mundo, em função da crescente inter-
ferência do governo na educação, tem havido nos últimos anos um
e da etnomatemática — linha de investigação criada e desenvolvi-
aumento das avaliações externas. Essas, entretanto, nem sempre estão
da pelo educador matemático brasileiro mais reconhecido
sintonizadas com os princípios de uma EM crítica ou transformadora.
internacionalmente, Ubiratan D'Ambrosio (1990);
1. Grupo de trabalho do International Congress on Mathematical Education.
52 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
TENDÊNCIAS TEMÁTICAS E METODOLÓGICAS DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 53

* dos estudos de cognição matemática em diferentes contextos socio-


* ensino de cálculo e pensamento diferencial (6);
culturais — linha de investigação criada e desenvolvida pelo
* atitudes, concepções e crenças de professores (6);
grupo de pesquisa do mestrado em psicologia cognit
iva da * atitudes ante a matemática (6);
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) (CARRAHER,
* diferenças individuais (6);
CARRAHER, SCHLIEMANN, 1988).
* história e filosofia da matemática e da EM (5);
* educação infantil ou alfabetização matemática (5);
2. ALGUMAS LINHAS INTERNACIONAIS * linguagem no ensino da matemática e lógica matemática no
DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ensino (4),
* raciocínio analógico, cálculo mental, estimativas (4),
Segundo a pesquisa realizada pela Universidade de Bielefe * modelação (ou modelagem) matemática (4),
ld
(Alemanha) e publicada por Batanero et al. (19992), feita * funções, gráficos e pensamento funcional (3),
a partir da
compilação de trabalhos apresentados em congressos interna * ensino interdisciplinar e/ou com aplicações (3);
cionais
e de um levantamento das linhas de pesquisa desenvolvida * etnomatemática (3);
s em 87
programas de mestrado (46) e doutorado (41) em 61 univer * instrução conceptual versus processual (3);
sidades
de 19 países, foram encontradas as seguintes linhas de * metodologia da pesquisa em EM (3);
pesquisa (o
número entre parênteses significa o número de vezes em que * provas e demonstrações (3);
a linha
apareceu nos programas): * processos cognitivos (2);
* construtivismo (2);
* resolução de problemas (29), e fatores sociais e afetivos e estudantes com dificuldades (2);
* informática, computadores e ensino-aprendizagem da mate- * professores escolares como pesquisadores (2);
mática (21); * teoria e epistemologia em EM (2);
geometria , visualização e representação espacial e pensa- * crenças, concepções e representações sociais de alunos (2);
mento geométrico (15); * abordagens investigativas para a matemática (2).
* álgebra e pensamento algébrico (14);
* desenvolvimento curricular ( 14);
* avaliação e atribuição de notas (12), 3. TENDÊNCIAS METODOLÓGICAS DA
* proporcionalidade e pensamento proporcional (11); INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
* aritmética e pensamento aritmético (10);
* tecnologia educacional (vídeos, uso de calculadoras etc.)
(8); Segundo Kilpatrick (1994), até os anos de 1970, a pesquisa bus-
* formação e treinamento de professores (7);
cava regularidades nos fenômenos educativos. Procurava especificar o
* estatísticas/probabilidade e pensamento estatístico/pr
obabi- comportamento dos alunos e dos professores. O mundo do ensino e da
lístico (7);
aprendizagem era visto como
um sistema de variáveis que interagiam
54 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA TENDÊNCIAS TEMÁTICAS E METODOLÓGICAS DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 55

entre si. À pesquisa visava descrever essas variáveis e descobrir suas em direções que permitam aos participantes maior liber-
inter-relações. dade de ação e de aprendizagem. Essa aproximação crítico-
Essa tendência de investigação foi denominada pelo autor de -sociológica apresenta-se como transformadora, libertadora,
tradicional. Em síntese, podemos dizer que a pesquisa, numa tendência provocando mudança de significados, assemelhando-se ao
metodológica tradicional, consistia em produzir explicações, fazer que entendemos por pesquisa-ação;
predições e produzir mecanismos de controle do processo ensino- * aproximação sistêmica: nela os fenômenos são estudados em sua
aprendizagem em matemática, sobretudo em relação aos seus pro- mútua interação e interpretação, o que capitaliza em autenti-
blemas ou fenômenos. cidade mas perde em precisão; é atualmente mais dominante
No Brasil, como já descrevemos no capítulo anterior, tivemos, que a aproximação analítica.
até final da década de 1970, a predominância do método experimental
(método da agricultura), utilizado para aplicação ou testagem de novos Convém destacar que cada uma dessas aproximações traz alguma
materiais ou novas estratégias de ensino da matemática. contribuição para a área; ou seja, não se pode negar nenhuma delas, nem
A pesquisa do tipo survey (quantitativo) foi empregada para estudos afirmar que uma é melhor que a outra. À escolha de uma abordagem
descritivos, com número muito grande de questionários. Isso sem falar depende, entretanto, da visão de ciência e de educação do pesquisador.
no alto número de relatos de experiências ou de propostas curriculares. Além disso, nenhum método é completo; todos estabelecem recortes
A partir dos anos de 1980, surgem novas abordagens. Entre parciais do fenômeno educativo.
outras, Kilpatrick (1994) destaca as seguintes, para o caso dos Estados Kilpatrick (1994) comenta que, durante a década de 1990, nos
Unidos: Estados Unidos, era possível encontrar a convivência de todas essas
abordagens na pesquisa em EM, embora já fosse possível identificar
* aproximação condutivista: o pesquisador situa-se fora do encontro uma mudança de tendência na investigação educacional. Essa mudança
educativo e assume uma atitude de observador neutro; foi por ele sintetizada da seguinte forma: de uma tendência tradicional de
* aproximação analítica: nesse modo de pesquisa, o investigador investigação, pautada na explicação, predição e controle, passamos para
manipula/isola e procura controlar e medir os eventos, com uma tendência contemporânea de busca de compreensão, interpretação e
o propósito de inferir acerca de acontecimentos internos ação. Segundo nossa percepção, o quadro brasileiro não difere muito
como a aprendizagem e a tomada de decisões, capitalizando do norte-americano.
precisão;
* aproximação interpretativa: o investigador introduz-se no am-
biente educacional com o propósito de compreender sem SITES SOBRE NOVAS TECNOLOGIAS:
julgar/intervir. Busca interpretar o significado que o ensino
tem para os participantes, em sala de aula;
http://www.cempem.fae .unicamp.br
* aproximação crítica: o pesquisador insere-se no ambiente edu-
http://www.apm.pt
cacional não só para compreendê-lo, mas também para mudá-lo
http://www.educ.fc.ul.pt
56 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

http://www. prof2000.pt/users/folhalcino/pontes/sitemat
http://www.cabri.com.br
http://www.geometria.com.br
http://www.igce.unesp.br/igce/pgem/gpimem
http://www.keypress.com (Sketchpad)
http://www. edumatec.mat.ufrgs.br
http://www.ufv.br/cee/pec/Neicim/ecad /linksmat.htm
http://www.educ.fc.l.pt.ivestiga
http://www.lite.fae.unicamp.br
http://www.nied.unicamp.br
http://www. —cabri.imag.fr/produits/cabripc-e.html
http://www.ies.co.jp/math/indezeng.html
http://www.cmas.smsu.edu/smt
http://www.mste.vivc.edu/mathed/mathedlinks html Metodologia da investigação
em educação matemática
4
CAPITULO «e QUATRO

APRESENTANDO A
INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA

( Y omo podemos saber quando um trabalho é realmente uma pesqui-


'sagientífica? As definições a seguir talvez possam ajudar. Reflita e
discuta sobre estas definições e apresente o seu conceito de pesquisa:
mm

(o “A pesquisa científica é uma investigação metódica acerca de


um determinado assunto com o objetivo de esclarecer aspectos
U do objeto em estudo” (BASTOS; KELLER, 1995, p. 53).
* “Pesquisa é uma atividade humana, honesta, cujo propósito
é descobrir respostas para as indagações ou questões signi-
ficativas que são propostas” (TRUJILLO, 1982, p. 167).
* Pesquisar significa “perseguir uma interrogação (problema,
pergunta) de modo rigoroso, sistemático, sempre, sempre
andando em torno dela, buscando todas as dimensões...
qualquer que seja a concepção de pesquisa assumida pelo
pesquisador” (BICUDO, 1993, p. 18-19).
* Segundo Kilpatrick (1994, p. 2): “pesquisa é uma indagação
metódica ou estudo sistemático e consistente de um pro-
blema”. O termo “indagação” sugere que o trabalho esteja
direcionado para responder uma questão específica e o termo
60 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA APRESENTANDO A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA 61

Z
“metódica” significa que a investigação, por um lado, é guia- A Figura 1 mostra dois modos de chegar-se às conclusões, par-
da por conceitos e métodos e, por outro, é aberta de modo tindo do problema ou da questão de investigação.
que a linha de inquérito possa ser examinada e verificada. A o Sea questão de investigação só pode ser efetivamente respondida
exigência de um método de investigação não significa que a ' mediante a realização de um experimento ou da coleta de informações/
pesquisa deva ser “científica” no sentido de estar embasada “) dados empíricos ou de inserção/intervenção no ambiente a ser estudado,
empiricamente na testagem de hipóteses. então dizemos que a pesquisa será de campo ou de laboratório.
. . - .
Para Beillerot (2001), um trabalho pode ser caracterizado cd
RN 7. -
Se, ao contrário, a questão de investigação pode ser respondida
? como pesquisa se satisfizer a três condições básicas: (1) pro- ' Y sema coleta de dados empíricos, não havendo, portanto, uma pesquisa
duzir conhecimento novo; (2) possuir uma metodologia ” de campo, então a investigação poderá ser uma pesquisa teórica ou
| rigorosa; e (3) tornar-se pública. simplesmente bibliográfica.
A

Qualquer que seja a alternativa de pesquisa a ser seguida, a


“Talvez nenhuma das definições anteriores seja satisfatória; no N
pertinência, a relevância e o sucesso de uma investigação dependem,
entanto, os substantivos mais presentes nelas (investigação, indagação, de um lado, do conhecimento de estudos anteriores sobre o mesmo
estudo, assunto, problema, questão), bem como os verbos (descobrir, 7 tema ou problema e das leituras teóricas e, de outro, das reflexões e
esclarecer, buscar, perseguir) e os adjetivos (metódico, rigoroso, “- experiências práticas em torno desse tema.
sistemático, consistente), deixam clara a ideia de que a pesquisa é Para o investigador iniciante, é bom lembrar que, para eleger-
“ um processo de estudo que consiste na busca disciplinada/metódica -se um problema ou questão de investigação, existe toda uma fase
|
: de saberes ou compreensões acerca de um fenômeno, problema ou exploratória inicial em torno do tema de investigação. Essa exploração
. . a . .
será mais fecunda se for reflexiva, inquisitiva e mediada por leituras
u a í 11 1 1 1 1 , .
questão da realidade ou presente na literatura o qual inquieta/instiga
o pesquisador
pesquisado perante
n o que se sabe ou diz a respeito.
i iênci
e experiências ti
acerca da temática. A conversa com colegas e outros
= pesquisadores também é recomendável.
1. ESTRUTURA DE UMA INVESTIGAÇÃO De um modo geral, a estrutura de uma investigação possui as
seguintes partes:

Conforme mostra a Figura 1, existem dois momentos funda-


a) “razões” ou “inquietações/motivos” que respondem à per-
mentais num processo de investigação: o de formulação do problema ou;
gunta: “Por que realizar esta pesquisa?”;
da questão de investigação e o de construção das conclusões da pesquisa. '
- . d

Entretanto, para chegar-se a uma conclusão ou a uma resposta consis- | b) problema;


tente e confiável para a questão/pergunta de investigação, precisamos c) hipóteses;
“ =. x ou Z 3!
. . . . , . Vo c .
buscar ou construir um caminho (isto é, uma alternativa metodológica 7 d) “
“questão”,. que responde
La
à " pergunta: “O que é" procurado?”,
mais segura possível), o qual permita, de maneira satisfatória, tratar o e) “alternativa metodológica”, que responde a “Como obter e
. ZA

analisar os dados?”;
.
problema ou responder à questão de investigação. ZA
que responde a “Onde se chegou?”, t
“" = “
A
“ .
conclusão”,
1 «
62 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA APRESENTANDO A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA 63

g) “implicações”, que respondem a “Para que serve?”, “Em


EA

eIed sagóvol
que o estudo contribui para a prática profissional ou para a


.o
º” [eUoIssIjoId OjuStmAjOAuSsad]
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e,

oe
realização de novas pesquisas?”.

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a en.
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SHOSNTONOO

OJuSuIdaquo? Sp Bary

as. qo sPSmEnUnana, ata


Para melhor esclarecer as principais etapas de uma investigação,

TeuoIssIoIg vonvId

Jopesmbsad
descreveremos, a seguir, alguns paradigmas epistemológicos e alguns
tipos e modalidades de pesquisa.

“ras, e,
op

voIdo powo) sido


*+.,
e
od
+"
OYÔVDILSIANE VNN

“a, e
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2. OS GRANDES PARADIGMAS EPISTEMOLÓGICOS

Q
Q
.
.
.
Q
.
e
.
znnDNH<LAO WU "es DA PESQUISA EDUCACIONAL

/
N
Considerando os aspectos teórico-epistemológicos que fun-
oonIeue ojusuiejem
OpÍBZIUBBIO/BJ9/0)
ap asr[tue o vjajo)

damentam a prática da pesquisa, Sánchez Gamboa (1989) distingue


3 SOjuouinoop sp

SagÍBunOfuI Sp
[elIaeur/sopep

Iriouoniodxo
no ooduo

ercocncacacros três tendências metodológicas da pesquisa educacional: a empírico-.

à
-analítica, a fenomenológico-hermenêutica e a histórico-dialética.
JA VANLNALSI

vITIO 4 39)
“ “Cereser
se.
A abordagem empírico-analítica tem sua origem no positivismo e
“ ramifica-se em três correntes: o indutivismo ou empirismo; o estrutura-
lismo e o neopositivismo. O processo de produção de conhecimentos,
odwro op esinbsag

nessa abordagem, orienta-se pela aplicação do método científico, o qual,


OLIQIRIOQLT Ap NO

0EÔÍteJU9ISASG
voLIgaT esmbsag
voigeiBolarg no

de modo geral, compreende as fases de formulação de um problema,


EL VANDIA

levantamento de hipóteses, testagem dos pressupostos, confirmação


ou refutação das hipóteses e conclusões.
Esse método também é conhecido como experimental ou método
da agricultura, pois, segundo Nisbet (apud BONILLA RIUS, 1989,
', EN
e
.
+* Jopesinbsad o ejoinbur onb
.
. A
PepITe9I no emjeron e zip onb 0,

p. 33), tem como princípio da investigação “experimentar para melho-.


um mumusooa |
e .º

rar produtos através de tratamentos manipulativos”. Os dados obtidos.


PPP

..
PIA T to

nesse processo devem ser. tratados estatisticamente. TT A


X

A título de ilustração, poderíamos, metaforicamente, compa-


rar uma classe de alunos a um canteiro de hortaliças, onde os alunos
TT

“o,

seriam pés de alface e uma nova técnica de ensino (a ser testada) o


0"
º

adubo. Nesse contexto, a técnica de ensino seria uma variável inde-


64 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA APRESENTANDO A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA 65

pendente e o desempenho dos alunos a variável dependente, pois se estatística; experimentos didáticos com classes de controle e expe-
tem como hipótese que, variando a técnica de ensino, o desempenho “rimental, uso de pré e pós-testes; aplicação de testes e questionários
(rendimento) dos alunos também varie. Mas, para isso, é necessário fechados e padronizados. Os resultados são tratados estatisticamente
que se tenha classes experimentais (em que a nova técnica de ensino | tendo como parâmetro de análise uma escala validada previamente.
é aplicada) e classes controle (em que essa técnica não é aplicada — no Os leitores interessados poderão encontrar exemplos dessa
caso, as classes controle poderiam ter um ensino tradicional expositi- abordagem na educação matemática (EM) nas dissertações/teses de
vo). O controle de entrada poderia ser feito mediante a aplicação de Lorenzato (1976) e, sobretudo, naquelas produzidas pelo Grupo Psi-
um pré-teste, de maneira que garantisse que, antes da realização do cologia da Educação Matemática (Psiem) da Faculdade de Educação
experimento didático, todas as classes (experimentais e de controle) da Universidade Estadual de Campinas (FE-unicAMP): Brito (1996);
estejam niveladas. Os dados quantitativos, expressos pelas notas dos Neumann Garcia (1995); Gonçalves (1995); Pirola (1995); Lima
alunos nos pós-testes, devem posteriormente ser tratados e os resul- (1996); Moron (1998); Araújo (1999), entre outras!.
tados validados estatisticamente. = A abordagem fenomenológico-bermenêntica, em contrapartida, critica
o
Por acreditar que existe uma verdade objetiva, independente- / as abordagens fundadas no experimentalismo, nos métodos quanti-
mente do sujeito que investiga, procura-se empregar processos /
neutros tativos e nas propostas tecnicistas. Acusa a abordagem cientificista
e rigorosos de coleta e tratamento dos dados, valendo-se geralmente (positivista) de ser insensível com a experiência primeira, isto é, com
de técnicas ou instrumentos previamente validados. A pesquisa edu- o cotidiano da vida humana; de restringir-se à magnitude aparente dos
cacional, por essa abordagem, procura encontrar explicações causais! fatos, sem buscar a essência dos fenômenos: seus significados, seus
ou correlacionais para os problemas e fenômenos. Dá aspectos invariantes e fundantes. Essa “essência” não se desvela pela
Me A finalidade da pesquisa educacional, nessa abordagem, seria a simples manifestação “objetiva” do fenômeno, pois muito pouco das
: de conhecer para controlar/melhorar. Entretanto, as propostas de me- relações humanas pode ser quantificável ou mensurável.
! Ihoria produzidas a partir dessas pesquisas são, geralmente, propostas - Essa abordagem fundamenta-se filosoficamente na fenomenolo-
| tecnicistas. De fato, os temas ou propostas mais pesquisadas nessa gia e no processo hermenêutico de interpretação. Parte do pressuposto
abordagem são: produção e testagem de novos materiais ou técnicas -de que a solução dos problemas educacionais passa primeiramente
de ensino da matemática; treinamento de professores; estudos do pela busca de interpretação e compreensão dos significados atribuídos
rendimento escolar em matemática; estudo de atitudes e habilidades | pelos envolvidos (os sujeitos que experienciam o fenômeno). Isso
em matemática; estudos de correlação confrontando, de um lado, “pode acontecer por meio de um processo de investigação que consiste
características pessoais do professor e/ou sua didática/atuação, e, de em desvendar mecanismos e significados ocultos, atingindo, assim, a
outro, o rendimento/desempenho/motivação dos alunos; estudos de essência dos fenômenos.
correlação entre planejamento e avaliação; desenvolvimento de estudos
experimentais em sala de aula etc. o
As técnicas de pesquisa mais empregadas nessa abordagem são 1. As referências destes estudos podem ser encontradas em: <http://www.cempem.
de natureza quantitativa, tais como gráficos e tabelas de frequência > fae.unicamp.br>.
66 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA APRESENTANDO A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA 67

A O sujeito, portanto, ocupa lugar de destaque nessa abordagem Essa abordagem, segundo Fiorentini (ibidem), vê a ciência como
/ que aposta na capacidade dele de interpretar fenômenos e discursos. uma categoria histórica — um fenômeno em contínuo devir inserido no
i
Por isso, procura empregar técnicas qualitativas de pesquisa, tais como “movimento das transformações sociais. Ou seja, a história (a dinâmica
entrevistas abertas ou semiestruturadas, observação etnográfica, histó- das ações e ideias) é o eixo da compreensão e da explicação científica,
rias de vida; análise de discurso ou de depoimentos, análise ideográfica e. tem na prática seu fundamento epistemológico.
(buscando os significados e as ideias subjacentes aos ideogramas, O Para essa abordagem, portanto, não basta desvendar o “conflito
desenhos ou símbolos) e nomotética (buscando as unidades de significa- mim pretações É preciso também desvendar o “conflito dos interes-
das
: dos por meio de categorias abertas) etc. Aos leitores interessados em — Além edisso, não basta compreender a realidade,é preciso também
“aprofundar essa abordagem, sugerimos a leitura do livro de Martins e isando à Emancipação (libertação) dos sujeitos. Por isso,
“Bicudo (1989). a pesquisa Participante e a pesquisa-ação são modalidades de pesquisa
Como exemplos de estudos realizados nessa abordagem, o muito utilizadas nessa abordagem. Igualmente, são frequentes os estu-
leitor poderá encontrar as dissertações/teses de Medeiros (1985) e, « dos históricos de práticas, de movimentos, de instituições e das ideias.
principalmente, aquelas orientadas por Maria Aparecida Bicudo (Uni- Metodologicamente, o processo de investigaçãoé visto como
versidade Estadual Paulista - UNEsp-Rio Claro): Silva, J. G. (1987); um procedimento que vai do empírico real (que apresenta uma visão
Danyluk (1988 e 1997); Chamie (1990); Garnica (1992 e 1995); Kluth caótica e sincrética) ao concreto — síntese de múltiplas relações e deter-
(1997), entre outros?. minações (apresentando uma visão crítica e orgânica) — por meio da
A abordagem histórico-dialética, por sua vez, questiona fundamental- - partição do todo, de categorias e abstrações (KOSIK, 1976). Por isso,
mente a visão estática de realidade implícita nas abordagens anteriores, essa abordagem explora com frequência categorias analíticas bipolares,
ignorando, assim, o caráter dinâmico, contraditório e histórico dos.. as quais preservam uma tensão dialética, tais como conteúdo/forma,
fenômenos educativos. Aquilo que hoje se apresenta diante de nossos) teoria/prática, histórico/lógico, concreto/abstrato, tese/antítese etc.
olhos é apenas uma síntese do processo histórico em transformação| Como exemplos de estudos em EM que se aproximam dessa
Por isso, procura apresentar uma concepção unitária, coerente e orgã abordagem, o leitor poderá encontrar as dissertações/teses de Duarte
nica de mundo, fazendo da crítica seu modelo paradigmático; mesmo Í| (1987); Soares (1988); Bérgamo (1990); Gasparini (1990); Giardinetto
porque não há modelo teórico ou síntese, por melhor que seja, que dê | (1991 e 1997); Neeleman (1993); Knijnik (1995), Gasparetto (1999) e,
A
N
conta da realidade (FIORENTINI, 1989). principalmente, em alguns estudos realizados na FE-UNicamp (grupos
A educação, em particular,é vista como uma prática inserida História, Filosofia e Educação Matemática — HirEM e Prática Pedagó-
no contexto das formações sociais que resulta de condicionamentos gica em Matemática — PRAPEM): Miguel (1984 e 1993); Souza (1986);
sociais, políticos e econômicos, reproduzindo, de um lado, as con- Fiorentini (1994); Miorim (1995); Moura (1995), entre outras”. Alguns
tradições sociais, mas, de outro, dinamizando e viabilizando as trans- leitores poderão questionar a pertinência de alguns desses trabalhos à
formações ao garantir aos futuros cidadãos o efetivo acesso ao saber. categoria histórico-dialética. Entretanto, respondemos que, embora
2. Às referências destes estudos podem ser encontradas em: <http:/www.cempem
fae. 3. As referências destes estudos podem ser encontradas em: <http://www.cempem.
unicamp.br>. fae.unicamp.br>.
68 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA APRESENTANDO A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA 69

não possam ser exemplos autênticos, esses estudos expressam uma e classificar contradições até não seria uma tarefa difícil, mas trabalhá-
visão de mundo, de conhecimento, de educação e de pesquisa que se -las, confrontá-las e expressá-las por meio de uma síntese de tensões
aproxima mais dessa abordagem que das duas anteriores. dialéticas já não é uma tarefa fácil.

2.1. Qual das abordagens é a mais adequada?


3. ALGUMAS MODALIDADES DE PESQUISA

É muito arriscado afirmar qual dessas abordagens é a mais ade-


quada ou recomendada. Segundo Sánchez Gamboa (1989), a convivên- 3.1. Modalidades de pesquisa segundo os objetivos da
cia de todas essas abordagens num mesmo centro de pesquisa pode, - investigação
pela mútua contestação, desenvolver o senso crítico e a qualidade das
Dependendo dos objetivos que a integram, a pesquisa pode
pesquisas.
assumir uma perspectiva teórica, exploratória (diagnóstica), descritiva
Fr DB!

Para ilustrar essa relativização, podemos, metaforicamente, di- /


f ou explicativa.
zer, do mesmo modo que Sánchez Gamboa (1989), que a abordagem/
-— Dizemos que uma pesquisa pode ser caracterizada como um
empírico-analítica se assemelha a uma máquina fotográfica: capta um
“ estudo ou ensaio teórico quando tem por objetivo a (re)construção e/ou
determinado instante de um fenômeno sem poder abarcar a evolução.
+ desenvolvimento de “teorias, conceitos, ideias, ideologias, polêmicas,
histórica dele; ou seja, congela de certa forma o movimento (ou o toma
“tendo em vista, em termos imediatos, aprimorar fundamentos teóri-
como uma sucessão de imobilidades) limitando-se à evidência dos fatos
cos” ou desenvolver quadros de referência (DEMO, 2000, p. 20). O
num determinado momento. A fenomenológico-bermenêutica assemelha-se
| “pesquisador, nesse tipo de estudo, não utiliza dados e fatos empíricos
a uma máquina de “raios X”: mostra a estrutura interna, ultrapassando j .
q ' P | para validar uma tese ou ponto de vista, mas a construçãox de uma rede
a aparência fenomênica. istórico-dialéti - ' ; j . RD
p omênica. A histórico-dialética apresenta-se como uma * de conceitos e argumentos desenvolvidos com rigor e coerência lógica.
máquina filmadora: consegue registrar os fatos em movimento, isto é 1
Ou seja, trata-se de um estudo que, segundo Severino (1978), carac-
a evolução e a dinâmica dos fenômenos. 9 teriza-se como “bem desenvolvido, formal, discursivo e concludente,
À primeira vista, a filmadora parece constituir-se no melhor, consistindo numa exposição lógica e reflexiva e numa argumentação
instrumento para captar o real. Entretanto, por trás de cada máquin | rigorosa com alto nível de interpretação e julgamento pessoal” (p. 121).
há um operador. Dependendo da habilidade e do conhecimento do Dizemos que uma pesquisa é exploratória ou diagnóstica quando
operador e do caso a descrever ou ilustrar, pode-se obter melhores o pesquisador, diante de uma problemática ou temática ainda pouco
resultados ou informações com fotografias do que com um filme. *. definida e conhecida, resolve realizar um estudo como intuito de
)
Uma evidência desse problema é apontada por Gouveia (apud o” obter informações ou dados mais esclarecedores e consistentes sobre
FIORENTINI, 1989), ao mostrar que muitas pesquisas, com um ela. Esse tipo de investigação acontece, com frequência, antes de o
referencial teórico marxista ou histórico-dialético, apresentam, na hora da - pesquisador elaborar propriamente um projeto de pesquisa. Funciona
coleta e análise dos dados, um procedimento empírico-analítico. Identificar como uma sondagem e visa verificar se uma determinada ideia de
70 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA APRESENTANDO A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA 71

investigaçãoé viável ou não. Essa modalidade de pesquisa também históricos ou estudos analítico-descritivos de documentos ou produções
é frequentemente utilizada como primeira entrada em campo, tendo culturais, quanto os do tipo “pesquisa do estado da arte”, sobretudo quando
em vista o levantamento de hipóteses ou a busca de subsídios que “procuram inventariar, sistematizar e avaliar a produção científica numa
permitam um melhor redirecionamento da pesquisa. determinara área (ou tema) de conhecimento” (FIORENTINI, 1994,
Esse tipo de pesquisa pode envolver levantamento bibliográfico, p. 32). Há também um outro tipo de revisão de estudos denominado
realização de entrevistas, aplicação de questionários ou testes ou, até pela literatura de meta-análise. Os estudos meta-analíticos diferem dos
mesmo, estudo de casos. estudos do estado da arte, pois não pretendem descrever aspectos ou
Uma pesquisa é considerada descritiva quando o pesquisador dese- tendências gerais da pesquisa num determinado campo de conheci-
ja descrever ou caracterizar com detalhes uma situação, um fenômeno mento, mas, tão somente, realizar uma análise crítica de um conjunto
ou um problema. Geralmente esse tipo de investigação utiliza a ob- de estudos já realizados, tentando extrair deles informações adicionais
servação sistemática (não etnográfica) ou a aplicação de questionários que permitam produzir novos resultados, transcendendo aqueles an-
padronizados, a partir de categorias previamente definidas. teriormente obtidos.
A pesquisa é considerada explicativa quando o pesquisador pro- Às pesquisas experimentais, quase-experimentais ou de laboratório caracterizam-
cura explicitar as causas dos problemas ou fenômenos, istoé, busca -se pela realização de “experimentos” que visam verificar a validade de
o porquê das coisas. É comum a pesquisa explicativa apoiar-se numa determinadas hipóteses em relação a um fenômeno ou problema.
investigação do tipo descritiva ou exploratória. O) Entendemos por experimento aquela parte da investigação na qual se
manipulam certas variáveis e se observam seus efeitos sobre outras.
Esses estudos podem ser realizados em laboratórios ou não, podendo
3.2. Modalidades de pesquisa segundo o processo de coleta
ser caracterizados como quase-experimentais ou, simplesmente, ex-
de dados perimentais. Essa é uma modalidade de pesquisa típica da abordagem
empírico-analítica.
Embora isso diga respeito ao sexto capítulo, em que preten-
A modalidade de pesquisa naturalista ou de campo acontece quando
demos melhor descrever e ilustrar essas modalidades de pesquisá,
os dados do estudo são coletados diretamente “no campo”, em con-
julgamos conveniente mencioná-las aqui.
traste com aqueles realizados em laboratórios ou controlados pelos
Considerando as diferentes formas de obtenção de materiais
investigadores (BOGDAN; BIKLEN, 1994). Ou seja, é aquela modali-
ou dados para a investigação, encontramos com mais frequência três
dade de investigação na qual a coleta de dados é realizada diretamente
grandes modalidades de pesquisa: a (histórico-)bibliográfica; a expe-
no local em que o problema ou fenômeno acontece e pode dar-se
rimental ou de laboratório; e a naturalista ou de campo.
por amostragem, entrevista, observação participante, pesquisa-ação,
A pesquisa (histórico-)bibliográfica ou de revisão é a modalidade
aplicação de questionário, teste, entre outros.
de estudo que se propõe a realizar análises históricas e/ou revisão de
Como já dissemos antes, detalhes e exemplos de cada uma dessas
estudos ou processos tendo como material de análise documentos escri-
modalidades de pesquisa o leitor poderá encontrar no sexto capítulo
tos e/ou produções culturais garimpados a partir de arquivos e acervos.
deste livro.
Essa modalidade de estudo compreende tanto os estudos tipicamente
72 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA APRESENTANDO A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA 73

4. À PESQUISA NA PERSPECTIVA DOS PROFESSORES ESCOLARES um estudo sistemático e intencionado dos professores sobre seu próprio
trabalho na sala de aula e na escola. [...] Com sistemático nos referimos funda-

Muitos professores escolares têm criticado as pesquisas acadê- mentalmente a formas ordenadas de reunir e registrar informações, documentar

micas sobretudo pela forma como essas tratam e investigam a prática as experiências que acontecem dentro ou fora da aula e criar uma espécie de

pedagógica. Reclamam também que os resultados dessas pesquisas são registro escrito. [...] Com intencionado indicamos que a investigação dos

muito genéricos e raramente chegam à sala de aula dos professores. professores é uma atividade planejada, isto é, não espontânea (p. 321).

Ante esse problema, muitos professores têm tentado fazer de sua prá-
tica pedagógica um campo de estudo e pesquisa. Outros têm tentado Os quatro tipos mais comuns de estudo de professores identi-
associar-se aos professores universitários, com o intuito de desenvolver ficados por Lytle e Cochran-Smith (1999, p. 324-336) são:
projetos conjuntos ou colaborativos do tipo “pesquisa-ação”.
Essas iniciativas de investigação, muitas vezes, não são reco- 1) os diários dos professores, que, na verdade, são informes da di-
nhecidas como pesquisas pelos acadêmicos, os quais alegam que tais nâmica das aulas, nos quais os professores registram obser-
trabalhos não seguem os princípios da metodologia científica e, por- vações, analisam suas experiências e refletem e interpretam
tanto, se configuram apenas como “relatos de experiência”. suas práticas ao longo do tempo. Assemelham-se a notas
Em contrapartida, ninguém parece discordar que o professor, etnográficas nas quais os professores utilizam descrições,
ao refletir e sistematizar sua prática escolar, produz e renova saberes. registros de dados, comentários e análises. Poderíamos dizer
Esse fato remete-nos às seguintes perguntas: o modo de produção de que esses trabalhos, quando tomam uma forma final de uma
conhecimentos (ou de investigação) do professor pode ser diferente monografia ou de um artigo para publicação, se assemelham
do modo como os cientistas ou acadêmicos procedem? Haveria um às narrativas descritas por Connelly e Clandinin (1995). As
caminho diferente ou o que muda é o modo de caminhar em busca do narrativas, segundo esses autores canadenses, representam
conhecimento? um modo bastante fecundo e apropriado de os professores
Foi pensando numa problemática como essa que as pesquisa- produzirem e socializarem significados e saberes ligados à
doras norte-americanas Lytle e Cochram-Smith (1999) desenvolveram experiência docente;
* um estudo sobre os vários modos e casos de investigação de profes- 2) os ensaios dos professores, normalmente, constituem-se em traba-
sores escolares, nos Estados Unidos. A partir desse estudo, tentaram lhos argumentativos e/ou reflexivos elaborados com base em
sistematizar e descrever o que poderia ser uma tipologia de trabalho experiências ou casos ocorridos em sala de aula ou no âmbito
de investigação desses profissionais. Embora as autoras tenham encon- escolar, e visam defender um ponto de vista ou apresentar
trado muitas diferenças em relação ao modo acadêmico de produzir alguma proposta ou solução para um determinado problema
pesquisas, encontraram também alguns pontos comuns. Com base da prática escolar;
nessas diferenças e semelhanças, as autoras chegaram a uma definição 3)»os processos de investigação oral compartilhada de professores
do que seria a pesquisa dos professores: constroem-se sobre um caso/episódio especial de ensino ou
uma questão concreta do trabalho pedagógico. Os professores,
74 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
APRESENTANDO A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA 75

para melhor tratar desses casos, reúnem-se para discutir o forma aos nossos pensamentos interiores [...] escrever significa aprofundar
assunto ou problema e buscar alternativas de ação. As falas, nossa pesquisa e nossa reflexão (p. 192).
nesse caso, podem ser gravadas e transcritas ou mesmo re-
gistradas em forma de notas ou apontamentos. Essas notas Segundo Marques (1999), existe uma relação estreita entre pesquisar,
e esses registros, após serem sistematizados e analisados, recortar e escrever:
podem resultar num artigo ou texto, o qual, na verdade, é
fruto de um estudo compartilhado dos professores; Isso é pesquisar: escrever texto centrado em determinado assunto. No
4) os estudos sistemáticos de aulas usam processos etnográficos de pesquisar, o escrever se torna polarizado, persegue um tema preciso. O
coleta de materiais e de análise similares âqueles desenvol- que então importa é a disciplina do trabalho de busca do esclarecimento
vidos pela pesquisa acadêmica. de um tema de interesse do escrevente [...] (p. 170).

l Bicudo (1992) é uma pesquisadora brasileira da área de EM que Fazendo uma síntese do que mostram e dizem os autores anterior-
se tem pronunciado sobre a possibilidade de o professor se constituir mente citados e trazendo a nossa própria experiência como formadores
também em um pesquisador. Segundo essa autora, “quando o professor de professores — sobretudo quando tomamos como eixo de formação
de matemática interroga o que faz ao estar-com-seus-alunos na sala de e desenvolvimento profissional dos professores o desenvolvimento de
aula de matemática e persegue sua interrogação de modo sistemático atividades reflexivas e investigativas sobre a prática de ensino de ma-
e rigoroso, está realizando pesquisa” (p. 7). temática nas escolas —, podemos dizer que um estudo do professor pode ser
Observemos que Bicudo (ibidem) não apresenta como necessá- considerado pesquisa quando este for um trabalho intencional, planejado e constituído
rio o registro escrito ou a apresentação de um relato final da pesquisa. em torno de um foco ou questão de seu trabalho escolar; for metódico (passe por algum
Entretanto, quando se refere ao modo sistemático e rigoroso do processo processo de produção/organização e análise escrita de informações) e apresente um
de pesquisa, o que ela estaria querendo dizer? Estaria implícita, nesse relatório final do estudo desenvolvido (texto escrito ou relato oral).
modo sistemático, a necessidade de registros escritos? A nossa hipó- Embora, conceitualmente, possamos qualificar quando um tra-
tese é que sim. balho do professor pode ser considerado pesquisa, na prática, como
Para sustentar nossa hipótese, buscamos apoio em Altrichter mostram Hammer e Schiffer (s.d.), existe uma fronteira difusa ou
et al. (1996), principalmente quando argumentam que o processo indefinida entre pesquisa e ensino. De fato, apesar de existir uma
de escrita do professor não apenas aumenta a qualidade de sua re- indissociabilidade entre ensino e pesquisa, elas, na verdade, são duas
flexão, mas é também uma forma de análise e de investigação sobre práticas distintas que apresentam objetivos diferentes. Assim, cabe des-
sua prática: tacar que nossa experiência na orientação de investigações em cursos
de pós-graduação tem evidenciado que professores mais experientes
[...] escrever não é apenas comunicar resultados definitivos de uma análise, - tendem a confundir esses objetivos, sobretudo quando o objeto de
mas escrever é em si uma forma de análise. E uma continuação do processo estudo do professor é sua própria prática pedagógica.
de análise sob uma restrição mais severa, porque precisamos dar contorno e
76 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA APRESENTANDO A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA 77

Para ilustrar melhor o que estamos a dizer, podemos afirmar como atualmente vêm defendendo alguns formadores de professores,
que, como educador, o objetivo do professor é desenvolver uma práti- que todo professor reflexivo é, por consequência, um pesquisador. A
ca pedagógica inovadora em matemática (exploratória, investigativa, reflexão é uma condição necessária mas não suficiente para o professor
problematizadora, crítica etc.) que seja a mais eficaz possível do ponto vir a ser pesquisador. À prática investigativa pressupõe, primeiro, uma
de vista da educação/formação dos alunos. Porém, como pesquisador, seu prática reflexiva. Êa própria natureza complexa e multifacetada da prática
objetivo é sistematizar, analisar e compreender como acontece esse que exige do professor essa atitude e prática reflexiva. E é essa prática ou
processo educativo dos alunos ou quais os limites e as potencialidades atitude que o faz perceber problemas em seu trabalho e levantar questões
didático-pedagógicas dessa prática inovadora. Ou seja, a pesquisa que podem levá-lo a um processo mais sistemático de pesquisa.
visa extrair lições, aprendizagens ou conhecimentos das experiências Ser professor-pesquisador, portanto, configura-se como uma
docentes. Nesse sentido, uma experiência educativa pode resultar opção profissional. Opção essa que exige do investigador envolvi-
em um fracasso pedagógico, mas, do ponto de vista investigativo, a mento, tempo para dedicar-se a esse tipo de empreendimento, paixão,
mesma experiência pode significar uma rica fonte de aprendizagem ou investimento intelectual e emocional e, além disso, muita disciplina e
de produção de conhecimentos sobre a prática docente. cuidado na coleta e tratamento de informações.
O processo de pesquisa,de um lado, exige centralidade num foco “ Em síntese, dizemos que o professor reflexivo poderá vir a
de estudo; exige um recorte da prática pedagógica ou a delimitação de ser também pesquisador de sua prática se ele tentar sistematizar suas
um problema de modo que esse possa ser sistematicamente estudado. experiências e socializar ou compartilhar seus saberes com os outros
À prática de ensino, de outro lado, exige um movimento contrário, professores. Essa sistematização exige que o professor, a partir de uma
buscando abarcar a totalidade do fenômeno educativo. O professor, ao determinada perspectiva (recorte, foco ou questão), faça registros es-
ensinar, procura contemplar as múltiplas dimensões e perspectivas da critos, organize suas ideias e revise suas práticas e as analise, buscando/
práxis pedagógica e, durante o ato educativo, não pode parar o processo produzindo, assim, uma melhor compreensão de seu trabalho docente.
de ensino para se aprofundar numa determinada questão. Para finalizar, podemos perguntar: então, o que há de comum
A pesquisa, além disso, exige leitura, registro de informações, entre as modalidades de pesquisa valorizadas e perseguidas pela acade-
uma descrição do fenômeno educativo; exige um certo distanciamento . mia e aquelas perseguidas e realizadas pelos professores? Uma síntese
da ação e um tratamento interpretativo e analítico do fenômeno. Isso possível poderia ser a seguinte: ambas as modalidades concebem a
só pode ser feito separadamente ou paralelamente à prática pedagógica, pesquisa como um estudo metódico e intencionado em torno de um .
pois o processo de ensino, a tomada de decisão sobre como continuar problema/questão ou foco/recorte, requerendo, para isso, um plane-
seu trabalho docente, não pode esperar pelos resultados da pesquisa. jamento inicial e um relato final. Isso, de certo modo, contemplaria as
É claro que a pesquisa traz novas compreensões sobre a prática pe- três condições básicas apresentadas por Beillerot (2001) para que um
dagógica e, a longo prazo, vai ressignificando e redimensionando o trabalho possa ser considerado pesquisa.
trabalho docente. | O leitor que desejar aprofundar-se sobre essa temática pode
Entretanto, tanto a prática do ensino quanto a prática da pesquisa consultar o livro Reflectir e investigar sobre a prática profissional organiza-
exigem que o professor seja reflexivo. Mas isso não significa afirmar, N
do pelo Grupo de Trabalho de Investigação (GTI) da Associação de
78 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA APRESENTANDO A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA 79

Professores de Matemática (APM) de Portugal (2002). Os autores do FIGURA 2: FASES DA PESQUISA


livro sublinham que a investigação dos professores sobre sua própria
prática confere poder aos professores e promove o seu desenvolvimento
- interrogações, leituras
Exploração
profissional, servindo, inclusive, como catalisadora de melhores práticas. temática
- observações e conversas sobre
o tema
João Pedro da Ponte (2002), no capítulo introdutório desse livro,
destaca que a investigação sobre a própria prática, além das contribuições já - especificação do tema
Identificação
citadas, pode também ajudar os professores a se tornarem autênticos e delimitação Lmem
- revisão bibliográfica
do tema e do - configuração do problema
protagonistas do processo educacional na medida em que participam problema - formulação da questão
- formulação dos objetivos
da construção dos conhecimentos do trabalho docente e da edificação
do patrimônio cultural do grupo profissional do qual fazem parte.
- escolha da modalidade
— O livro ilustra alguns exemplos de pesquisa de professores de de pesquisa
- especificação das variáveis e
matemática sobre sua própria prática e tenta apresentar alguns con- hipóteses, se for o caso
- seleção de sujeitos,
tributos teórico-metodológicos para o desenvolvimento desse tipo de Estruturação
população ou amostra da
metodológica jm
investigação, pois, segundo Ponte (2002), nenhum dos três grandes da pesquisa
pesquisa
- seleção dos instrumentos,
paradigmas clássicos de investigação — o positivista, o interpretativo materiais e forma de coleta
de dados
e o crítico — traz elementos teórico-metodológicos que contemplem Pesquisador - especificação da forma de
y análise
a perspectiva de investigação sobre a própria prática. Ponte chega a conhecimento
x
falar na emergência de um quarto paradigma que poderia sustentar realidade

epistemologicamente esse tipo de investigação, estabelecendo critérios - sondagem inicial


alternativas
- levantamento de documentos
mais consistentes de qualidade e validação”. - observações/registros
- experimentação
- questionários/entrevistas
- triangulação de dados
- pesquisa-ação
5. AS FASES DA PESQUISA

- ordenação, classificação,
Embora o processo de pesquisa seja dinâmico, constituído por categorização e tratamento dos
dados/informações
um movimento constante de idas e vindas que não flui linearmente, - seleção de episódios para
análise, se for o caso
para efeito de orientação podemos caracterizar e descrever as princi- - obtenção de resultados

pais fases de uma pesquisa.


A Figura 2 mostra que esse processo possui, em tese, quatro - organização do estudo e
construção de conclusões
fases principais: a partir dos resultados
- e redação do relatório da
pesquisa

4. Mais detalhes sobre isso, ver capítulo nove deste livro.


80 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

4
CAPITULO * CINCO
1) a fase do planejamento, momento importante que compreende
a fase exploratória e preparatória da pesquisa e que culmina
com a elaboração do projeto de pesquisa;
2) a fase de coleta de dados e/ou de documentos, os quais irão cons- ELABORAÇÃO DE
tituir o material de análise do estudo;
3) a fase da análise propriamente dita, momento em que o pes-
ProjETOSDE PESQUISA
quisador tenta organizar, sistematizar e tratar interpretativa
e analiticamente os dados e informações;
4) e, finalmente, afase de elaboração do relatório final da pesquisa,
momento em que o pesquisador tenta descrever o processo
desenvolvido, apresenta os principais resultados e produz as
conclusões.

Nº capítulo anterior, mostramos que todas as modalidades de


investigação — acadêmicas ou não — concebiam a pesquisa como
um estudo metódico e intencionado em torno de um problema ou de
uma questão, requerendo, por isso, um planejamento inicial.
A elaboração de um projeto de pesquisa serve para mapear um
caminho a ser seguido durante o percurso investigativo, ajudando a
esclarecer para o próprio pesquisador os rumos de seu trabalho. Os
rumos são estabelecidos à medida que o investigador tem uma ideia
bastante clara do que pesquisar, como e por quanto tempo...
Antes de dar início à elaboração de um projeto de pesquisa, o
pesquisador precisa ter em vista, ainda que de forma ampla, um assunto
ou tema de seu interesse. É preferível que esse tema tenha relação
com suas experiências e seus conhecimentos prévios e instigue a sua
curiosidade. Pode ser algo que o perturbe — um problema que necessite
ser resolvido ou, pelo menos, mais bem compreendido.
Só depois disso é que podemos dar início à elaboração do plano
ou projeto de pesquisa. O objetivo do projeto é delinear a direção e os
procedimentos da investigação, evitando assim dispersão de recursos
e de tempo.
82 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA 83

1. QUESTÕES FUNDAMENTAIS PARA A ELABORAÇÃO 3) Quais pesquisas existem sobre esse tema ou correlatas a ele?
DE UM PROJETO DE PESQUISA Quais os problemas investigados por essas pesquisas? Como
elas foram realizadas? E quais são suas principais conclusões?
Para quem pretende iniciar uma investigação, é importante fa- - 4) Que problemas, inquietações ou contradições você percebe
zer uma introspecção que, em linhas gerais, pode conter as seguintes ao confrontar suas experiências e conhecimentos com o que
interrogações: dizem a literatura e as pesquisas até então realizadas?
5) Que questão ou pergunta você pretende ou gostaria de res-
1) Sobre que assunto farei minha pesquisa? ponder?
2) Por que escolhi esse assunto? 6) Como você pretende responder a essa pergunta? Você tem
3) O que me perturba ou me inquieta em relação a esse assunto? algumas hipóteses?
4) Quais questões referentes a esse assunto me instigam? 7) À escola ou turma na qual você pretende realizar a pesquisa de
5) À qual delas tentarei responder especificamente nessa pes- campo já possui rotina de pesquisa? À escola, o professor e os
quisa? alunos concordaram com a pesquisa? Será necessário contato
6) Quais fontes (bibliográficas ou não) deverão ser acessadas prévio com a direção da escola e com os pais? Eles exigem que
para aprofundar meus conhecimentos sobre o assunto e, mais os nomes dos pesquisados sejam mantidos em sigilo?
especificamente, sobre a minha questão de investigação? 8) Se você for o próprio professor da classe em que realizará a
7) Onde, com quem e como obterei as informações (processo
investigação, que atividades você pretende desenvolver ou
de coleta de dados) que preciso para responder à questão
aplicar? Antes disso não seria interessante fazer um pequeno
específica? |
estudo exploratório ou aplicar um pequeno teste?
8) Quando e em quanto tempo (cronograma) será realizada cada
9) O que será observado na sala de aula? De que modo? Durante
etapa da pesquisa?
quanto tempo? Em quais condições? Quais tipos de dados
deverão ser coletados?
À partir dessa introspecção inicial, o pesquisador procura or-
10) Se o pesquisador não for o professor da classe em que fará
ganizar, de forma mais cuidadosa e detalhada possível, um plano de
a pesquisa de campo, como será a forma de relacionamento
pesquisa que pode ser de natureza teórica, bibliográfica, de laboratório
com o professor: a de simples observador, sem interferir
ou de campo.
no processo das aulas e sem discutir ou trocar ideias com o
A seguir, apresentamos com mais detalhes perguntas orientadoras 4
professor sobre o que observa ou percebe nas aulas? Ou o
para o planejamento de uma pesquisa de laboratório ou de campo:
trabalho será colaborativo, no sentido de discutir conjunta-
1) Qual o tema ou assunto de pesquisa você pretende investigar? mente o planejamento das atividades, de participar/intervir
2) Que literatura (artigos, livros...) existe sobre esse assunto? durante as aulas, de discutir e trocar ideias e interpretações
O que ela diz sobre o tema? com o professor sobre o que acontece em classe?
84 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA 85

11) Quais dimensões serão analisadas: desenvolvimento, apren- e Revisão bibliográfica: indica as fontes que serão inicialmente
dizagem ou ensino (ou as três indistintamente)? Da leitura consultadas, com o propósito de aprofundar e conhecer o
sobre as ações dos sujeitos, a pesquisa pretende verificar a que já se tem pesquisado ou estudado sobre o tema, visando
disponibilidade cognitiva, imaginativa ou afetiva do sujeito? principalmente definir uma questão de investigação ou, se já
12) Será definido um modelo prévio de pesquisa? Ou a meto- estiver escolhida, conhecê-la melhor;
dologia é definida, construída ou modificada ao longo do e Problema, questão e objetivos da pesquisa: explicita, com mais de-.
processo de pesquisa de campo? talhes, uma contradição/problema percebido na prática ou
13) Com quantos e quais alunos será realizada a pesquisa? Como nos estudos já produzidos, ou expressa uma contradição/
serão feitos os registros dos dados? É possível usar gravador inadequação entre o que se sabe (conhecimentos, teorias,
pontos de vista encontrados na literatura) e o que se percebe/
ou filmadora?
14) Qual será a duração da pesquisa de campo? encontra na realidade. A partir do problema, pode-se formular
; a. ã ífic reten nder
15) Como será o processo de análise ou tratamento dos dados uma questão/pergunta específica, a qual se pretende respond
pesquisa. Em função da q questão-pergunta de investigação
x 1 .
e registros? Serão utilizados eixos ou categorias analíti- pela ela pesq S perg Saç
j - . no - é que são formulados os objetivos do estudo e delineados os
cas? Essas categorias serão previamente definidas ou serão- ] o . a
, . é procedimentos metodológicos da investigação;
construídas ao longo do processo de interpretação dos E. « ,
, . ) e Procedimentos metodológicos: indica o modo como a questão será
dados, ante o que diz a literatura? Está prevista a seleção . é n s
Do , na . respondida pela pesquisa. Define a forma pela qual será feita
de episódios? Qual será o critério dessa seleção? . x
a coleta de dados. Determina a população e/ou a amostra da
16) Quais são as possíveis contribuições esperadas pela pes- . o 4, :
Q P S p pela p pesquisa de campo. Explicita também a maneira como os
uisa e de que modo seus resultados Õ ã = ; j .
q q e conclusões poderão dados serão provavelmente sistematizados e analisados;
retornar ao p professor, , àà escola
escola e aos alunos 2 e Resultados esperados: expressa a expectativa : do pesquisador;
:
17) À pesquisa pretende-se conclusiva ou é apenas parcial/ e Cronograma: descreve o momento e a duração prevista para
exploratória, prevendo continuidade? cada etapa da pesquisa.

2. ETAPAS DO PROJETO Na verdade, esse primeiro projeto é uma carta de intenções do


pesquisador. Como a pesquisa é um processo dinâmico de construção
| e desenvolvimento, certamente o projeto sofrerá alterações ao longo
Um projeto pode compreender as seguintes etapas: , a = a pe
do período de realização dos estudos. Essas alterações são necessárias e
ajudam a tornar o projeto mais consistente ou viável metodologicamente.
* Tema: aponta o assunto escolhido para estudo;
p P ' Os fatores que mais: contribuem
- ã ou aprimoramento
para a alteração : do
* Justificativa: contém os motivos que cé i . autos e 4 E
f que conduziram o autor a projeto inicial são, de um lado, a revisão bibliográfica sobre o assunto/
escolher o tema da pesquisa e aponta as possíveis questões/ questão escolhido e, de outro, a natureza dos dados obtidos na pesquisa
perguntas que poderiam ser investigadas; de campo
86 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA 87

De fato, a leitura de outros estudos sobre o tema de investigação Um aspecto importante referente ao tema é sua delimitação, e
permite ao pesquisador compreender a natureza ou a especificidade do para tal é preciso considerar:
problema a ser estudado, alterando, assim, a visão que o pesquisador
tinha da problemática. De outra parte, os dados coletados na pesquisa * o foco de estudo: o pesquisador principiante tende a fazer delimi-
de campo podem surpreender o pesquisador, de modo que este tenha, tação muito abrangente, isto é, tem dificuldade em definir ou
às vezes, que rever o rumo de seu projeto. identificar um foco específico de estudo; assim, por exemplo,
Apresentamos, a seguir, algumas observações mais específicas a escolhe inicialmente como problema a ser pesquisado “O
cada etapa do projeto. O objetivo desse detalhamento é favorecer a com- ensino da matemática”; depois o reduz para “O ensino da
preensão da importância e da função de cada uma das etapas da pesquisa. matemática no Brasil”; em seguida, torna a reduzi-lo, dessa
vez para “O ensino da matemática na cidade X nos últimos
10 anos”, o qual é transformado depois em “O atual ensino
2.1. Tema = ;
da matemática na escola Y” e que ainda pode ser reduzido a
. . “Algumas dificuldades de meus alunos de 5º série na apren-
E o assunto sobre o qual a pesquisa se desenvolverá. . . . .
, . dizagem do conceito de área de figura plana”,a ou ainda
: mais:
Para sua escolha, convém considerar: e u
especificamente, para: “Os erros mais. frequentes que meus
. Ao no alunos de 5º série apresentam durante o processo de apren-
a experiência e/ou conhecimento inicial do pesquisador sobre di d ito de área de fi I "
izagem do conceito de área de figuras planas”,
o assunto;
. ferênci a ) * o tipo de enfoque a ser dado à pesquisa: se este será filosófico, so-
a preferência e a competência do pesquisador para estudá-lo; iológico históri tatísti . tal Ad
+ o tempo e os recursos disponíveis, cio ógico, is órico, estatís ico, experimen al, experiência
. o aa =" == - didático-pedagógica, pesquisa-ação, estudo bibliográfico
as prováveis contribuições para a prática profissional; b e bi À
o sobre um tema ou problema etc.;
* a sua importância para a educação;
. a . : o * o lugar [área geográfica: região, escola, série(s), classe(s)] e
a facilidade em obter as informações necessárias. período (t D dará
o período (temporal) em que a pesquisa se dará;
o a * outros fatores tais como: conteúdo, método de ensino, va-
Algumas fontes inspiradoras ou facilitadoras para a escolha do -
) lores e pressupostos.
tema de pesquisa: ú ú
* situação do cotidi da práti fissional Muitos pós-graduandos apresentam dificuldades para escolher um
cotidiano da prática profissional; ,
. " Í tema!, Convém, entretanto, observar que a escolha de um tema não a
* literatura específica;
* consulta a especialistas; DON
e falha percebida em trabalh blicad 1. Alguns temas de investigação em EM:
raDalhos publicados:
. iência (história) d d P , 1) Ensino de números racionais com o uso de calculadoras comuns;
experiência (história) de vida; . = ,
Pe ' 2) Ensino de funções utilizando calculadoras gráficas;
* polêmica.
88 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA 89

deve atender a uma simples necessidade ou desejo de estudo, visando atender a um desejo investigativo mais profundo do pesquisador, tendo o
apenas atualizar seus conhecimentos. À escolha deve, acima de tudo, propósito de contribuir para a obtenção de novos conhecimentos para a
comunidade a que pertence. Os pesquisadores iniciantes frequentemen-
3) Educação estatística na educação infantil,
te se interrogam sobre a validade ou pertinência de determinado tema
4) O desenvolvimento da linguagem e do pensamento em algébrica;
5) O pensamento algébrico de alunos de 5º série;
para um projeto de pesquisa. Em relação a isso, vale lembrar o que diz
6) | Estudos de erros e dificuldades dos alunos na resolução de problemas algébricos; o reconhecido pesquisador italiano Umberto Eco (1991): “trabalhando-
7) Obstáculos epistemológicos e didáticos no ensino e na aprendizagem das -se bem, não existe tema que seja verdadeiramente estúpido” (p. 10).
operações fundamentais;
8) Jogos e atividades lúdicas no ensino da matemática;
9) Laboratório de ensino de matemática; 2.2. Justificativa
10) Materiais manipulativos e jogos no ensino da álgebra;
11) Ainteração entre materiais manipulativos e o ambiente Logo na exploração Nessa fase devem ser destacadas a importância do tema e as
de conceitos geométricos;
razões que influenciaram a escolha. Essa justificativa geralmente se
12) Porquês matemáticos no ensino médio;
baseia na experiência profissional do pesquisador e faz referência às
13) O ensino de áreas e perímetros por (de) composição de figuras;
14) Diferentes concepções de resolução de problemas;
suas preferências, aos seus questionamentos e às suas dificuldades.
15) A exploração e construção de conceitos relacionados à geometria pelas Também podem ser descritas ou apontadas as possíveis questões/
transformações no plano, por meio de tecelagem no ambiente Logo; perguntas que poderiam ser investigadas, destacando suas prováveis
16) Resolução de problemas no ambiente Logo; contribuições para a melhoria do ensino-aprendizagem da matemática.
17) Contrato didático e currículo oculto nas aulas de matemática;
18) Etnomatemática (relações culturais) e a formação da cidadania;
19) Uso da modelagem matemática no ensino médio; 2.3. Bibliografia inicial
20) A matemática, o cotidiano e a mídia;
21) Educação matemática para jovens e adultos; Uma vez escolhido o tema, já se podem selecionar alguns tex-
22) Ensino-aprendizagem de geometria na séries iniciais do ensino fundamental,
tos que lhe trarão maior esclarecimento, visando à delimitação de um
23) Formação de professores que ensinam matemática nas séries iniciais;
problema de estudo ou à formulação de uma questão de investigação.
24) À formação do professor formador de professores de matemática;
Como se trata de uma pré-seleção de textos, estes não precisam ser
25) Alfabetização matemática;
26) Professor reflexivo e investigador de sua prática;
lidos integralmente para a elaboração do projeto inicial. Pode-se, a
27) Aulas investigativas de matemática; princípio, consultar resumos ou resenhas.
28) Formulação e resolução de problemas; Nesse estágio, portanto, são indicadas as fontes que serão inicial-
29) Exploração de conceitos geométricos através do Cabri Géomêtre; mente consultadas, com o propósito de aprofundar e conhecer o que já
30) Modelo de Van Hiele e a evolução do pensamento geométrico; se tem pesquisado ou estudado sobre o tema escolhido. Se o problema
31) As Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) na formação conti- ou questão de investigação já estiver definido, então a revisão biblio-
nuada de professores de matemática;
gráfica cumpre a função de aprofundar teoricamente o conhecimento
32) As TICs e as mudanças no ensino e na aprendizagem da matemática.
90 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA 91

sobre o problema/questão. A revisão da literatura é a pedra angular da Uma vez definida a problemática de estudo (isto é, o contexto de
pesquisa. E ela que dá sustentação e consistência à investigação. Sem que emerge a questão) e delimitado um problema, pode-se, então, for-
ela o pesquisador poderá apenas reinventar a roda ou nem isso. mular uma ou mais questões/perguntas específicas, as quais se pretende
responder pela pesquisa. Ou seja, a questão indica uma direção de en-
frentamento ou tratamento do problema. Se o pesquisador possui, antes
2.4. Problema, questão e objetivos da pesquisa
de iniciar uma investigação, uma resposta à pergunta formulada, essa, na
verdade, não se constitui como autêntica pergunta investigativa. O que
Nessa etapa de elaboração do projeto, cabe explicitar, com
mais detalhes, o problema, a questão ou a pergunta de investigação. o pesquisador pode fazer, diante de um problema, é formular algumas
O problema da pesquisa pode surgir de uma contradição/dificuldade hipóteses que podem ser consideradas possíveis soluções antecipadas.
percebida na prática ou nos estudos já produzidos. Também pode Na pesquisa pela abordagem qualitativa, as hipóteses podem ajudar na
expressar uma contradição/inadequação entre o que se sabe (conhe- definição ou na escolha de uma questão investigativa.
cimentos, teorias, pontos de vista encontrados na literatura) e o que Uma vez definida a questão/pergunta de investigação, os ob-
se percebe/encontra na realidade. Ou pode, ainda, expressar a lacuna jetivos da pesquisa podem ser, então, formulados ou revistos, caso já
que existe entre uma situação insatisfatória de partida e uma situação tenham sido inicialmente estabelecidos. Na formulação dos objetivos
desejável de. chegada. Ou seja, o problema expressa geralmente uma da pesquisa, portanto, é necessário e fundamental apresentar aqueles
inquietação, uma situação dilemática ou de impasse a ser enfrentada propósitos diretamente relacionados ao problema e que permitam
pelo pesquisador. obter respostas satisfatórias à questão de investigação.
Só depois dessa fase do planejamento da pesquisa é que os pro-
Popper (1978, p. 14) ajuda-nos a compreender a natureza do
problema: cedimentos metodológicos de coleta de material podem ser definidos.
Explicitando melhor essa fase de elaboração do projeto de
[...] cada problema surge da descoberta de que algo não está em ordem com
pesquisa, podemos afirmar que a delimitação e a formulação de um
o nosso suposto conhecimento; ou, examinado logicamente, da descoberta
problema e da respectiva questão de investigação constituem a prin-
de uma contradição interna entre o nosso suposto conhecimento e os fatos;
cipal etapa do planejamento da pesquisa científica. Sem a delimitação
ou, declarado mais corretamente, da descoberta de uma contradição entre
de um problema claro de investigação ou sem a formulação de uma
nosso suposto conhecimento e os supostos fatos.
questão específica, tanto a pesquisa como seu relatório ficarão preju-
dicados e essa ausência tem sido apontada como a principal causa da
Os motivos que levam um pesquisador a delimitar um problema dificuldade na realização de uma pesquisa científica. São o problema e
de investigação têm a ver com: oportunidade (que surge por ocasião a questão claramente configurados que orientarão todo o processo de
de uma situação vivida); comprometimento (em relação a uma causa investigação a ser desenvolvido. É, em última instância, o problema ou
educativa ou ao grupo ao qual pertence); prioridade; modismo (novi- a questão que ajudará a definir o tipo de coleta de dados e a respectiva
dade, não sendo necessariamente algo original); e originalidade (algo análise. São eles que permitem que um trabalho de pesquisa chegue a
resultados e conclusões consistentes.
ainda não investigado/percebido por outros estudos).
92 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA 93

O próprio conceito de pesquisa, como já referido no início do 6) Quais são os erros e dificuldades mais frequentes, em ma-
capítulo quarto, traz subjacente a ideia de que todo o projeto de in- temática, dos alunos que ingressam no ensino médio, na
vestigação tem um problema/questão em torno do qual ele se estrutura resolução de problemas de física?
e organiza. 7) Que conceitos matemáticos são mais frequentemente utiliza-
Portanto, quanto mais abrangente ou difuso for o problema, mais dos pela mídia na cidade X e de que modo eles são veiculados?
difícil e complicada será a realização da pesquisa e, contrariamente,
quanto mais específico ou claro for o problema, mais fácil poderá ser
sua execução. 2.5. Procedimentos metodológicos
Um exercício que pode ajudar na compreensão da natureza
de um problema investigativo é analisar um artigo, uma monografia, 2.5.1. Aspectos fundamentais a observar
uma dissertação ou uma tese, procurando identificar o problema ou a
questão central que ali é tratada ou investigada. A rigor, são a natureza da questão (ou pergunta) de investigação
Na formulação do problema e da questão, é importante que se e os objetivos da pesquisa que, em última instância, definem os pro-
considerem os seguintes aspectos: clareza e a concisão de linguagem; cedimentos de coleta de dados e de análise a serem projetados para
pretensões (limites) da pesquisa; contexto teórico que sustenta o a pesquisa. Em outras palavras, a natureza da questão e o modo como
problema ou questão; discussão conceitual dos principais termos do a concebemos indicarão qual será o tipo de pesquisa de campo a ser
problema ou da pergunta; as variáveis ou fatores que interferem. adotado: se utilizaremos questionários ou entrevistas; se realizaremos
Embora saibamos que a questão de investigação é construída a observação etnográfica, pesquisa participante ou pesquisa-ação; se reali-
partir de um problema de pesquisa, apresentamos, a título de ilustra- zaremos uma pesquisa experimental ou quase-experimental; se realizare-
ção, algumas perguntas que poderiam ser consideradas orientadoras mos um estudo teórico; se analisaremos documentos; se registraremos
de uma pesquisa: os dados em áudio, em vídeo ou apenas em apontamentos escritos;
se realizaremos um estudo de caso; ou se simplesmente faremos um
1) Quais são as concepções que alunos, pais e professores de estudo bibliográfico.
uma determinada escola têm da matemática? A questão e os objetivos de investigação também ajudarão o
2) Por que os alunos de 5º série da escola X apresentam dificul- pesquisador a definir melhor o local (região, escola, instituição, comu-
dades na resolução de problemas aritméticos? nidade, laboratório etc.) e o número de sujeitos da pesquisa.
3) O que os professores, alunos e pais pensam sobre a utilização A questão ainda orientará a forma como os dados serão or-
da calculadora no ensino e na aprendizagem da matemática ganizados e analisados: se usaremos ou não categorias de análise;
no ensino fundamental? se usaremos ou não triangulação? na coleta de dados ou no processo
4) Como os professores de matemática da escola Y têm escolhido, de exame.
nos últimos cinco anos, o livro didático de matemática?
5) Como os mestres de obras utilizam o conceito ou a noção
2. Ver glossário.
de proporcionalidade em seu trabalho?
94 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA 95

O uso de categorias de análise pode ajudar a destacar aspectos da questão de investigação, várias decisões deveriam ser tomadas em
relevantes da pesquisa, contribuindo para responder à questão de in- relação à delimitação do objeto de estudo. Considerando que existem
vestigação. Por isso, as categorias devem ser construídas atendendo alunos que não eram ainda professores quando iniciaram o curso, poderia
às solicitações que emanam da questão de investigação. excluí-los de minha amostra de pesquisa. Entre os que lecionam, alguns
A título de exemplo, consideremos a seguinte pergunta de inves- não lecionam matemática de 5º a 8º séries. Poderia excluí-los também da
tigação: Quais as contribuições de um curso de especialização em EM amostra. Ou seja, restringiria o estudo aos professores-alunos que já
em termos de mudança de ideias e práticas do professor de matemática? lecionam matemática em nível de 5: a 8º séries do ensino fundamental.
Há várias formas de tentar responder a essa pergunta. Para verifi- Se essa nova amostra ainda for numerosa, poderia sortear, aleatoria-
car a mudança em relação às ideias, poderiam ser realizadas entrevistas mente, três ou quatro alunos-professores. Essa seria minha amostra
semiestruturadas em três momentos diferentes: uma antes de iniciar final, aproximando-se assim do estudo de caso.
o curso, outra na metade e uma terceira após sua conclusão. Duas Mas, se a questão de investigação for outra, outros procedimen-
preocupações surgem para o investigador: Que perguntas deveriam ser tos metodológicos, então, deveriam ser definidos.
formuladas nas entrevistas? De que forma as entrevistas poderiam ser
analisadas? É nesse ponto que podem entrar as categorias de análise. 2.5.2. Formulação de hipóteses
Podemos traduzir as ideias dos professores por crenças, concepções e repre-
sentações acerca: do que é a matemática escolar (categoria 1); de como As hipóteses são essenciais principalmente para o tipo de pes-
deve ser uma aula de matemática (categoria 2); de como os alunos quisa experimental. Também resultam da natureza do problema a ser
aprendem matemática (categoria 3); de como devem ser as atividades investigado e, geralmente, são apresentadas na forma de conjecturas
(tarefas) matemáticas em sala de aula (categoria 4); de como deve ser ou soluções possíveis antecipadas. As hipóteses são, normalmente, for-
feita a avaliação da aprendizagem dos alunos (categoria 5); das finali- muladas após a configuração do problema, sendo encaradas como uma
dades do ensino da matemática (categoria 6); e outras. alternativa fecunda para criar indagações a serem verificadas durante
É claro que as perguntas a serem feitas aos professores-alunos, a investigação. Ou seja, a formulação de hipóteses acontece junto ao
durante as entrevistas, não podem ser diretas, como por exemplo: qual processo de formulação de questões investigativas.
a sua concepção de matemática? É recomendável, nesses casos, encon- No caso de uma pesquisa qualitativa, a hipótese também recebe
trar uma maneira indireta de perguntar isso, de modo que a resposta o nome de hipótese de trabalho, principalmente se ela ajudar a orientar o
procurada esteja implícita. pesquisador em relação ao caminho, possivelmente, mais conveniente
A essa altura, o leitor deve estar se perguntando: vou entrevistar a seguir. Nesse caso, a hipótese caracteriza-se pela enunciação de uma
todos os alunos do curso? Essa pergunta torna-se ainda mais importante proposição exploratória?, que pode, a seguir, ser decomposta e desenvolvida
se levarmos em conta a segunda parte da questão de investigação: quais
são as mudanças na prática pedagógica dos professores? Para responder a
essa segunda pergunta, terei de observar as aulas dos professores-alunos 3. A título de exemplo, podemos tomar a pergunta 2, apresentada no item 2.4: por
que os alunos de 5º série da escola X apresentam dificuldades na resolução de pro-
(antes e depois de realizar o curso). Em função desse fato e da natureza -blemas aritméticos? Uma hipótese de trabalho poderia ser traduzida pela seguinte
96 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA 97

em partes. Estas partes devem, no final do processo, ser reintegradas, rendimento escolar. Algumas variáveis são precisas, enquanto outras
expressando uma síntese. necessitam de definição antes de servirem à análise.
Se a pesquisafor experimental, as hipóteses devem ser testadas/ De acordo com a função que cada variável tem, segundo a hi-
verificadas empiricamente. Nesse caso, as hipóteses funcionam como pótese, ela pode ser:
um guia para o projeto de pesquisa e determinam a coleta de dados,
pois dependem desses para serem consideradas falsas (refutadas) ou e dependente, quando seu valor varia em função do valor das ou-
verdadeiras (confirmadas). tras variáveis (as independentes). Na pesquisa experimental,
Tendo em vista a qualidade do trabalho, recomenda-se que a variável dependente é aquela que se observa para avaliar os
hipótese apresente as seguintes características: efeitos que a variação das outras variáveis causa nela;
* independente, quando sua alteração de valor influi sobre os
. seja consistente com teoria e fatos; valores das outras variáveis.
* esteja clara e precisamente redigida com relação ao que se
pretende verificar, às variáveis e aos conceitos utilizados; Por exemplo, se eu tivesse como questão de investigação “as di-
ficuldades dos alunos na aprendizagem da álgebra na 7º série”, poderia
* explicite uma predição do pesquisador;
formular a seguinte hipótese: talvez as meninas confundam mais que
* concorde com o enunciado do problema;
os meninos o significado das letras nas expressões algébricas. Aqui
* permita verificação;
a variável dependente seria “o significado que os alunos atribuem às
* sugira respostas ao problema;
letras nas atividades algébricas”, pois estou supondo que ela varia em
* seja consoante ao processo de avaliação;
função do “sexo” — a variável independente.
* induza à escolha da forma de coleta de dados;
E o que você diria no que se refere aos exemplos seguintes:
* determine as variáveis;
* seja única, distinta de quaisquer outras;
t. “Crianças e adolescentes têm maior facilidade na iniciação
* não contenha juízo de valor.
ao uso do computador do que as pessoas com maior idade.”
Nesse enunciado, a variável independente é: idade, compu-
2.5.3. Quando a pesquisa trabalha com variáveis
tador, manipulação, jovens ou pessoas de idade?
2. “À motivação do professor em sala de aula influencia o rendimento
Variável é uma característica de um fenômeno observável empi- dos alunos.” Nesse enunciado, a variável dependente é: professor,
ricamente, como, por exemplo: sexo, idade, altura, grau de motivação, motivação do professor, aluno ou rendimento dos alunos?

proposição exploratória: dificuldade dos alunos, na resolução dos problemas, 2.5.4. Quando a pesquisa trabalha com uma amostra
deve-se à dificuldade de interpretar o enunciado do problema. Para investigar isso,
o pesquisador poderia decompor as tarefas investigativas em duas partes: uma,
na qual os alunos traduzem verbalmente o que o problema estaria solicitando; e A amostra é um subconjunto da população e esta é a totalidade
outra, na qual os alunos deveriam ilustrar a interpretação do problema por meio (ou o universo) dos elementos que constituem o objeto de uma pes-
de desenhos, esquemas ou representações com material concreto.
quisa pela abordagem quantitativa.
98 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA 99

Quando a população é numerosa, faz-se necessário trabalhar e heurísticas utilizadas pelos alunos. Ou seja, pedir, nesse caso, que
com parte dela para tornar viável a pesquisa. Assim, a amostra deve os alunos pensem em voz alta, durante a resolução do problema, ou
ser seguramente representativa da população, caso contrário podemos registrem no caderno como construíram sua resolução. Esse levanta-
colocar sob suspeita a validade da pesquisa, sobretudo sua generalidade. mento pode ser complementado com registros em áudio e em vídeo.
Esse cuidado é procedente, pois, ao escolher preferencialmente uma
amostra, podemos estar também manipulando os resultados da pesquisa. 2.5.6. Referentes à análise de dados e à interpretação
Dependendo do tipo de problema, o pesquisador deve ou selecionar de resultados
criteriosamente a amostra (como ilustrado no item 2.5.1, para o caso
dos alunos-professores que lecionam matemática de 5º a 8º série), ou Na fase de planejamento de uma pesquisa, sobretudo se ela for
então não deve interferir na seleção da amostra. Neste último caso, o de natureza qualitativa, é difícil decidir qual processo de análise e
pesquisador pode utilizar um procedimento estatístico aleatório. interpretação dos dados será mais conveniente, antes de conhecê-los.
Cabe esclarecer que estudo de caso não pode ser confundido Entretanto, o pesquisador pode apontar algumas perspectivas
com amostra. O estudo baseado na amostra permite ao pesquisador que pareçam mais promissoras. Pode, por exemplo, indicar no projeto
obter informações e resultados sobre o conjunto da população da se pretende realizar uma análise qualitativa, estatística ou, até, simu-
qual a amostra é apenas uma parte representativa. O estudo de caso, lação em computador. A escolha por uma determinada abordagem
por possuir contornos específicos ou próprios, não permite ao pes- depende fundamentalmente do problema ou questão de investigação
quisador estabelecer generalizações sobre os outros possíveis casos e, sobretudo, do tipo de dados e do modo como esses pretendem ser
pertencentes à população. coletados.
Se optar por abordagem qualitativa de análise de conteúdo, o
2.5.5. Referentes à coleta de dados pesquisador pode projetar possíveis categorias de classificação e análise
dos conteúdos. Pode também anunciar que pretende selecionar episó-
À coleta de dados, como veremos no capítulo seguinte, pode dios que contemplem essas categorias. Um exemplo de categorização
ser projetada segundo diferentes métodos/técnicas, tais como: obser- foi descrito no item 2.5.1.
vação, entrevista, análise documental, estudo de caso, aplicação de Se optar pela abordagem estatística para a análise dos dados,
questionário, simulação, pesquisa-ação etc. então deverá prever como codificá-los para representá-los em tabelas e
No entanto, vale lembrar mais uma vez que a escolha da forma gráficos, prevendo, inclusive, os testes recomendados pela estatística.
de coleta de dados deve estar de acordo com a natureza do problema
ou questão de investigação e dos objetivos da pesquisa. A natureza dos
2.6. Resultados esperados e cronograma
dados a serem coletados também interfere na escolha dos instrumentos
rem

de coleta. Por exemplo, se o pesquisador pretende investigar o movimen- Aqui o autor do projeto deve explicitar suas expectativas e
to do pensamento dos alunos na resolução de problemas matemáticos, previsões em relação aos prazos e às fases de desenvolvimento do
terá de escolher um instrumento que permita explicitar as estratégias projeto de pesquisa.
100 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

4
CAPITULO e SEIS
Um bom projeto de pesquisa deve apresentar um cronograma
de ações para desenvolvimento da pesquisa. Esse cronograma pode ser
expresso por meio de um quadro ou tabela que registra os períodos de
tempo previstos para a realização de cada uma das etapas da pesquisa. PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E
Devido à imprevisibilidade, o cronograma deve ser flexível.
O estabelecimento das datas é conveniente porque:
DE CONSTITUIÇÃO DO MATERIAL DE ESTUDO

* geralmente existem exigências de prazo para a conclusão do


trabalho;
* toda pesquisa é envolvente, o que induz o autor a querer
prosseguir sempre;
* pode servir de baliza para o pesquisador avaliar a evolução
do trabalho.

T ma vez delineado e definido, por meio de um projeto de pes-


QUADRO 1: EXEMPLO DE CRONOGRAMA x
quisa, o objeto de estudo, passamos então à fase seguinte, que
APRESENTADO NA FORMA DE QUADRO
consiste na construção e no desenvolvimento de modos de investigar
Ri E E Es EE TERCE TE
esse objeto.
e SE]

Considerando a educação matemática (EM) uma prática social,


o trabalho de campo torna-se uma opção importante, pois fornece ele-
mentos que nos permitem compreendê-la e, então, transformá-la. Além
o disso, são as informações que nos levam a criar e desenvolver conheci-
mentos a partir da prática e nos impedem que inventemos explicações
ou suposições irreais e totalmente imaginárias ou fantasmagóricas. As
informações, entretanto, não nos fornecem gratuitamente as explica-
ções e compreensões que buscamos. As informações não são simples
dados fornecidos pela natureza ou pelas práticas sociais. Nós é que os
produzimos mediante um processo interativo de diálogo e questiona-
E lógico que, quanto mais bem estruturado estiver o projeto, mais mento da realidade. Nosso olhar, no trabalho de campo, portanto, é
facilidade ele propiciará ao desenvolvimento da pesquisa. No entanto, 4 orientado pelas nossas questões e pelo que queremos investigar. Isso
é preciso lembrar que em toda investigação existem os imprevistos, que significa que não podemos inventar qualquer coisa sobre a realidade
podem mudar o rumo, o ritmo, os prazos e até o ânimo do pesquisador. nem abarcar sua totalidade. Isso porque algo sempre escapa de nosso
olhar e de nossa síntese, por mais atentos e cuidadosos que sejamos.
102 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 103

Há aspectos da realidade que, ante as nossas questões, podem não nos


como fonte de informação, pois incluem: filmes, fotografias, livros,
interessar e, por isso, podemos deixá-los de lado. É esse recorte que
propostas curriculares, provas (testes), cadernos de alunos, autobiogra-
nos permite perscrutar uma prática social com certa profundidade.
fias, revistas, jornais, pareceres, programas de TV, listas de conteúdos
Mas também não podemos esquecer que esse recorte é parte de uma
de ensino, planejamentos, dissertações ou teses acadêmicas, diários
totalidade mais ampla e complexa, envolvendo múltiplas dimensões e
pessoais, diários de classe, entre outros documentos.
uma trama de relações.
Apesar da crítica de que geralmente a amostra não é representa-
Há várias formas de interrogar a realidade e coletar informações.
tiva e de que toda análise é sempre subjetiva, o exame de documentos
Algumas são mais dirigidas, como os questionários e entrevistas com
pode ser uma técnica útil de investigação se o pesquisador conseguir
questões fechadas. Outras são mais abertas, como as entrevistas abertas
construir categorias de análise, constituídas pelos itens principais,
ou semiestruturadas e a observação participante ou etnográfica. Todas
mais frequentes e diferentes que surgem nos dados. As categorias, no
essas técnicas têm suas vantagens e desvantagens. O pesquisador,
entanto, devem refletir os propósitos da pesquisa.
visando obter maior fidedignidade, pode lançar mão de mais de uma
Dentre os vários tipos de estudos bibliográficos ou documentais,
técnica, procurando, assim, triangular as informações. Tentaremos,
podemos destacar três: a meta-análise, os estudos do estado da arte e os
neste capítulo, descrever algumas dessas formas, mostrando suas po-
estudos tipicamente históricos.
tencialidades e limites. Além disso, não podemos também deixar de
A meta-análise é uma revisão sistemática de outras pesquisas, visando
considerar outras formas de coleta de informações como, por exemplo,
realizar uma avaliação crítica delas e/ou produzir novos resultados ou
a pesquisa bibliográfica ou a pesquisa experimental.
sínteses a partir do confronto desses estudos, transcendendo aqueles
anteriormente obtidos. Os estudos do estado da arte, em contrapartida,
tendem a ser mais históricos e procuram “inventariar, sistematizar
1. PESQUISA BIBLIOGRÁFICA OU HISTÓRICO-BIBLIOGRÁFICA e avaliar a produção científica numa determinada área (ou tema)
de conhecimento”, buscando identificar tendências e descrever
Z
E aquela que se faz preferencialmente sobre documentação o estado do conhecimento de uma área ou de um tema de estudo
escrita. O campo pode ser caracterizado pelas bibliotecas, pelos (FIORENTINI, 1994, p. 32). Os estudos tipicamente históricos utilizam
museus, pelos arquivos e pelos centros de memória. Nesse tipo de geralmente fontes primárias (textos impressos, manuscritos e outros
pesquisa, a coleta de informações é feita a partir de fichamento das documentos originais). Aos leitores interessados em conhecer com
leituras. A ficha de anotações ajuda a organizar de maneira sistemática mais detalhe e profundidade o objeto e o processo de investigação dos
os registros relativos às informações. A elaboração da grade relativa à estudos históricos da e na EM, sugerimos a leitura do livro de Miguel
ficha dependerá das questões investigativas estabelecidas previamente e Miorim (2004).
pelo pesquisador. Essa ficha, entretanto, pode ser reformulada após as Um exemplo de estudo histórico-bibliográfico em EM é a tese
primeiras leituras e consultas aos documentos. de doutorado de Fiorentini (1994). O primeiro capítulo deste livro
Esse tipo de pesquisa é também chamado de estudo documental. foi produzido com base nesse estudo. Para descrever o estado da arte.
Os documentos para estudo apresentam-se estáveis no tempo e ricos da pesquisa acadêmica brasileira em EM, no período de 1971 a 1990,
104 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 105

Fiorentini leu e fichou cada uma das 204 dissertações e teses, tentando Existem, consagrados pela literatura, dois tipos especiais de
coletar as seguintes informações: autor, título do trabalho, orientador, pesquisa experimental:
programa de pós-graduação, ano em que foi concluído, nível de ensino
investigado, tema central, problema ou questões orientadoras, obje- a) quase-experimental: é aquele em que a variável independente
tivos, referencial teórico, procedimentos metodológicos de pesquisa é manipulada pelo pesquisador, operando com grupos de
e principais resultados obtidos. sujeitos escolhidos sem o seu controle;
b) experimental: é útil quando se deseja destacar as relações entre
variáveis (previamente selecionadas); nele, as hipóteses de-
2. PESQUISAS EXPERIMENTAIS, QUASE-EXPERIMENTAIS sempenham importante papel e o pesquisador pode controlar
OU DE LABORATÓRIO tanto a variável independente como também a constituição
dos grupos de sujeitos envolvidos na pesquisa.
Os estudos experimentais caracterizam-se pela realização de
“experimentos” que visam verificar a validade de determinadas hi- - Para ilustrar um tipo de pesquisa “quase-experimental”, temos
póteses em relação a um fenômeno ou problema. Entendemos por o estudo realizado por Lorenzato (1976) com alunos de 5º série do
experimento aquela parte da investigação na qual se manipulam certas ensino fundamental. A pesquisa testou a facilitação da aprendizagem e
variáveis e se observam seus efeitos sobre outras. Esses estudos podem da retenção do cálculo de áreas de figuras planas, mediante o manuseio,
ser realizados em laboratórios ou não. pelos alunos, de réplicas das figuras. À verificação da estratificação dos
O que diferencia esse tipo de investigação de outros é que, nesse alunos por idade, sexo, nível socioeconômico e conhecimento prévio
caso, o pesquisador tenta reproduzir um fenômeno para observá-lo sob da aritmética mostrou que as dez turmas da amostra não apresenta-
controle. Por exemplo: se a questão a ser investigada for: “Por que os vam diferenças significativas. Em seguida, todas foram submetidas a
alunos apresentam dificuldades na resolução de problemas aritméti- um pré-teste composto por três tipos de questões: fáceis (F), médias
cos em classe?”, o pesquisador, diante de hipóteses das dificuldades, (M) e difíceis (D). O tratamento ministrado às cinco turmas de con-
poderá retirar de sala de aula um grupo de alunos — aquele com maior trole foi centrado na utilização de fórmulas recomendadas pelo livro
dificuldade — e estudá-lo em um laboratório. Nesse ambiente isolado, didático, enquanto o tratamento às turmas experimentais utilizou a
esses poderão ser submetidos a uma bateria de testes ou questões a fim manipulação de réplicas das figuras construídas em cartolina e seguiu
de verificar se o problema é, por exemplo, cognitivo, psicoemocional uma proposta didática do pesquisador. Após o tratamento, foi aplicado
ou de capacidade de leitura e interpretação dos problemas. O pesqui- o pós-teste e, três meses depois, o teste de retenção, ambos com as
sador pode também escolher um grupo de alunos sem dificuldades para mesmas questões (F M, D) do pré-teste. Os dados assim coletados
tomá-lo como grupo controle. Esse grupo também será submetido aos propiciaram a verificação das 32 hipóteses, definidas a priori, por meio
mesmos testes do grupo experimental, servindo como parâmetro de dos testes: proporção; “t” de Student; “F” de Snedecor; Bartlett; e o
comparação dos resultados. “Least Significante Diference — LSD”.
106 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 107

3. PESQUISA NATURALISTA OU DE CAMPO ausente ensino da geometria escolar na região de Belo Horizonte. Os
dados foram coletados por meio da aplicação de três questionários,
A denominação “pesquisa naturalista ou de campo” é normal- os quais foram aplicados a duzentos professores que frequentavam o
mente utilizada pelos antropólogos e sociólogos para significar que os curso de especialização em EM:
dados do estudo são coletados diretamente “no campo”, em contraste
com aqueles realizados em bibliotecas/museus ou em laboratórios/am- * o primeiro visava estabelecer o perfil do professor referente
bientes especiais que controlam determinadas variáveis do fenômeno à formação matemática e à experiência de magistério;
em estudo (BOGDAN; BIKLEN, 1994). Ou seja, é aquela modalidade * o segundo visava delinear a formação geométrica do profes-
de investigação na qual a coleta de dados é realizada diretamente no sor;
local em que o problema ou fenômeno acontece e pode dar-se por * eo terceiro visava conhecer a opinião do professor sobre a
amostragem, entrevista, observação participante, pesquisa-ação, apli- importância do ensino da geometria escolar (fundamental
cação de questionário, teste etc. e médio) e sobre o fato de a geometria estar, a cada ano,
Por exemplo: se a questão a ser investigada for: “Por que os alunos sendo menos ensinada pelos professores; além disso, eles
apresentam dificuldades na resolução de problemas aritméticos em foram arguidos sobre como desenvolviam os conteúdos de
classe”, o pesquisador poderá, de modo diferente daquele descrito geometria em suas aulas.
anteriormente, investigar um pequeno grupo de alunos durante o pro-
cesso normal de aula. Ele pode acompanhar, entrevistar e analisar mais A fim de possibilitar a análise dos dados, esses foram separados
de perto aquele grupo em situação real de aula, podendo contrastá-lo em categorias, de acordo com as semelhanças ou diferenças entre as
com o restante da classe, sem que para isso tenha de retirá-los da sala respostas dos professores.
de aula.
Vejamos, a seguir, alguns tipos especiais de pesquisa de campo.
3.2. Observação participante ou etnográfica

3.1. Levantamento (survey) É um tipo de estudo naturalista ou etnográfico em que o pesqui-


Z
sador frequenta os locais onde os fenômenos ocorrem naturalmente. A
E um tipo de estudo exploratório que procura abranger um coleta de dados é realizada junto aos comportamentos naturais das pes-
grande número de sujeitos, mediante aplicação de questionários (pre- soas quando essas estão conversando, ouvindo, trabalhando, estudando
viamente validados) a um grupo menor de sujeitos, definido por amos- em classe, brincando, comendo... A denominação etnográfica é oriunda
tragem. Mas, tal qual uma foto, esse método de pesquisa fornece uma dos antropólogos; objetiva descrever a cultura de um determinado
visão estática e momentânea. Entretanto, ela mostra-se útil quando se grupo étnico. O termo “participante” aqui significa, principalmente,
deseja obter uma visão geral de uma situação ou problema. participação com registro das observações, procurando produzir pouca
Como exemplo de “levantamento”, temos o estudo realizado por ou nenhuma interferência no ambiente de estudo.
Gazire (2000), o qual pretendia investigar as possíveis causas do quase
108 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 109

Para que essa pesquisa seja confiável, é preciso planejá-la quanto pação do grupo, mas não faz anotações perante o grupo e durante
aos aspectos do problema a serem observados e quanto à forma de os acontecimentos. Justamente por isso, é preciso muita atenção,
observar e registrar os fenômenos, isto é, sobre “o que” e “o como” memória e método. Durante o registro, após os acontecimentos, o
observar. É provável que o pesquisador necessite de uma fase de pesquisador deve separar sempre o descritivo (fatos) do analítico
preparação para aprender a: concentrar sua atenção durante a obser- (opinião). Muitos pesquisadores questionam a fidelidade e a validade
vação participante; separar os detalhes importantes dos triviais; fazer dos dados obtidos pela observação não estruturada, uma vez que eles
anotações organizadas. Esses cuidados são essenciais para diminuir os são filtrados pelas concepções e pela memória do pesquisador, além
vieses subjetivos nas observações e, também, para não se perder diante da possibilidade de ocorrerem fatos importantes no grupo durante a
da complexidade e abundância dos dados. ausência do observador.
Se, por um lado, a observação pode provocar alterações no com- Um exemplo de “observação participante” é o estudo realizado
portamento dos observados, por outro, a observação in loco facilita a por Passos (2000), que investigou, de um lado, os procedimentos que
compreensão do significado que esses dão à realidade. Segundo Liidke alunos de 10/11 anos empregavam para representar, no plano, alguns
e André (1986, p. 26), sólidos geométricos, e, de outro, suas dificuldades para reconhecer
as representações planas de objetos tridimensionais; investigou ainda
a observação possibilita um contato pessoal e estreito do pesquisador como os professores percebem e exploram essas representações em sua
com o fenômeno pesquisado, o que apresenta uma série de vantagens. prática pedagógica. Para tanto, por meio da resolução de problemas
Em primeiro lugar, a experiência direta é sem dúvida o melhor teste de geométricos, foram observados alunos de cinco turmas da 4º série do
verificação da ocorrência de um determinado fenômeno. “Ver para crer” ensino fundamental e seus respectivos professores; estes participaram
diz o ditado popular. da pesquisa por aceitarem o convite da pesquisadora e por adotarem um
tipo de prática pedagógica conveniente aos objetivos traçados por ela.
A “observação participante” é uma estratégia que envolve não só Embora a pesquisa tivesse sido planejada como participante,
a observação direta, mas todo um conjunto de técnicas metodológicas isto é, sem intervenção, o seu desenvolvimento, entretanto, exigiu
(incluindo entrevistas, consulta a materiais etc.) pressupondo um alguns momentos de participação no desenvolvimento das atividades
grande envolvimento do pesquisador na situação estudada. em classe. Os dados foram coletados por meio de observação (com
Das anotações obtidas da observação, devem constar a descrição registro em diário de campo), de filmagem e de entrevistas.
dos locais, dos sujeitos, dos acontecimentos mais importantes e das
atividades, além da reconstrução dos diálogos e do comportamento do
3.3. Estudo de caso .
observador. Para organizar melhor as observações, o pesquisador pode
elaborar uma grade de registros, optando, assim, por uma observação
É “o estudo profundo e exaustivo de um ou de poucos objetos,
chamada estruturada.
com contornos claramente definidos, permitindo seu amplo e deta-
Outro tipo é a observação não estruturada, na qual o pesquisador
lhado conhecimento” (GIL, 1988, p. 58). Ele é recomendável para a
também se baseia em hipóteses, possui intencionalidade na partici-
construção de hipóteses, para confirmação ou reformulação do pro-
110 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 111

blema e, sobretudo, quando se quer estudar algo singular, que tenha cultural. O estudo de caso etnográfico permite, assim, “[...] compreender
um valor em si mesmo. melhor a manifestação geral de um problema, as ações, as percepções, os
O caso não significa apenas uma pessoa, grupo de pessoas ou comportamentos e as interações das pessoas [...] relacionadas à situação
uma escola. Pode ser qualquer “sistema delimitado” que apresente específica onde ocorrem ou à problemática determinada à que estão
algumas características singulares e que façam por merecer um investi- ligadas” (LUDKE, ANDRÉ, 1986, p. 18-19).
mento investigativo especial por parte do pesquisador. Nesse sentido, Em síntese, o estudo de caso etnográfico é mais apropriado, segundo
o caso pode ser uma instituição, um programa, uma comunidade, uma André (1995, p. 51-52), quando: .
associação, uma experiência, um grupo de professores de uma escola,
uma classe de alunos ou até mesmo um aluno diferente dos demais 1) se está interessado numa instância em particular, isto é, numa
* que apresente características peculiares. Por exemplo, se uma classé determinada instituição, numa pessoa ou num específico
“regular possui um aluno cego, este pode ser tomado como foco espe- programa ou currículo; ,
cial de estudo caso o pesquisador esteja interessado em saber como
|,
a
2) se deseja conhecer profundamente essa instância particular
um aluno, nessa condição, estuda e aprende junto aos demais. Um em sua complexidade e em sua totalidade;
grupo de alunos com sérias dificuldadesem . matemática ou com forte 3) sé estiver mais interessado naquilo que está ocorrendoe no
resistência ou aversão ao estudo pode constituir um caso especial de - como está ocorrendo do que nos seus resultados;
investigação. Assim, também, um professor de matemática considera- 4) se quer retratar o dinamismo de uma situação numa forma
do extraordinário pelos colegas e alunos pode constituir-se num caso muito próxima do seu acontecer natural.
especial de análise. U
O estudo de caso busca retratar à realidade de forma profunda Com base nessa caracterização de André (1995), podemos
e mais completa possível, enfatizando a interpretação ou a análise do afirmar que todo o estudo etnográfico é um estudo de caso, embora
objeto, no contexto em que ele se encontra, mas não permite a manipu- nem todo estudo de caso seja etnográfico.
- lação das variáveis e não favorece a generalização. Por isso, o estudo de Tendo em vista o propósito do investigador em compreender
caso tende a seguir uma abordagem qualitativa. Mas isso não significa com profundidade e exaustão o caso, ele pode lançar mão de diversos
abandonar algumas quantificações necessárias. Essas quantificações instrumentos de coleta de informações: diáriode campo, entrevistas,
podem ajudar a qualificar melhor uma análise. questionários, gravações em áudio ou vídeo, registros escritos produ-
Dependendo das questões investigativas e do interesse do zidos pelos sujeitos da pesquisa etc.
pesquisador, o estudo de caso pode assumir uma perspectiva mais Um exemplo de estudo de caso do tipo etnográfico em EM é o
analítico-descritiva, de abordagem quantitativa, ou uma perspectiva realizado por Castro (2002) em sua dissertação de mestrado.
mais etnográfica ou interpretativa, de abordagem qualitativa. - Pretendendo compreender, com profundidade, como o futuro
- A abordagem qualitativa busca investigar e interpretar o caso professor se constitui profissionalmente na prática escolar — em sabe-
como um todo orgânico, uma unidade em ação com dinâmica própria, res, ações e significados — quando entra em contato com ela durante
mas que guarda forte relação com seu entorno ou contexto socio- as disciplinas de prática de ensino de matemática e estágio supervi-
112 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 113

sionado, Castro optou por investigar o caso de Allan. Essa escolha cativa. Ou seja, a prática educativa, ao ser investigada, produz com-
baseou-se no fato de ele ter estagiado em escola pública e sobretudo preensões e orientações que são imediatamente utilizadas em sua
por representar o perfil mais comum de aluno da licenciatura noturna própria transformação, gerando novas situações de investigação. Com
de matemática da UNICAMP; ou seja, um estudante que trabalhava base em Kurt Lewin (apud FIORENTINI, SOUZA JR.; MELO, 1998),
durante o dia, mas tinha o firme propósito de futuramente seguir a' podemos associar os momentos da pesquisa-ação ao movimento de
carreira docente. uma espiral autorreflexiva formada por ciclos sucessivos de:
Em seu trabalho de campo, Castro utilizou vários instrumentos
de coleta de informações: diário de campo da pesquisadora, diário de Planejamento => Ação = Observação = Registros > Sistematização/Refle-
campo do estagiário; material produzido por este no desenvolvimento xão/Análise => Avaliação => Planejamento de novas ações => Novas ações
das disciplinas (resenhas, reflexões, relatórios, autobiografia, monogra- => Novas observações = Novos registros => Novas análises e avaliações
fias); observações e registros etnográficos realizados durante os encon- > e assim por diante...
tros na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP); observações
e registros etnográficos realizados durante as aulas ministradas pelo Para o caso da investigação escolar, Carr, Kemmis e Elliott
- estagiário na escola; entrevistas semiestruturadas (gravadas em áudio (apud FIORENTINI, SOUZA JR.; MELO, 1998) entendem que os
e, posteriormente, transcritas). professores devem, eles próprios, constituir-se como pesquisadores
de sua prática (podendo ter ou não um auxiliar externo: o professor-
3.4. Pesquisa-ação e pesquisa colaborativa -pesquisador universitário).
Esses autores atribuem como objetivos principais da pesquisa-ação:

À pesquisa-ação é um tipo especial de pesquisa participante,


em que o pesquisador se introduz no ambiente a ser estudado não só * a melhoria da prática pedagógica dos professores;
para observá-lo e compreendê-lo, mas sobretudo para mudá-lo em * o desenvolvimento curricular centrado na escola,
direções que permitam a melhoria das práticas e maior liberdade de * o desenvolvimento de um grupo autorreflexivo na escola;
ação e de aprendizagem dos participantes. Ou seja, é uma modali- * a melhoria das condições de trabalho pedagógico e investi-
dade de atuação e observação centrada na reflexão-ação. Apresenta-se gativo.
como transformadora, libertadora, provocando mudança de significados
(FIORENTINI, 2004). O relatório desse tipo de investigação consistiria na descrição
Internacionalmente, segundo Thiollent (1983), a pesquisa-ação e análise do trabalho desenvolvido/produzido, destacando sobretudo
se tem constituído como um procedimento voltado para a resolução de os avanços obtidos tanto no âmbito da prática como no das ideias do
problemas práticos e que envolve uma ação conjunta ou cooperativa grupo. É
dos pesquisadores com os envolvidos nos problemas. Como mostrado em Fiorentini (2004), é bastante comum pro-
Trata-se de um processo investigativo de intervenção em que fessores e alguns investigadores iniciantes confundirem pesquisa-ação
caminham juntas prática investigativa, prática reflexiva e prática edu- com prática reflexiva (individual ou colaborativa) dos professores sobre
114 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 115

seu trabalho. Alguns desses, inclusive, por não conseguirem configurar


Em relação à pesquisa colaborativa, convém, primeiramente, distin-
claramente sua metodologia de pesquisa, afirmam, às vezes de maneira
guir as várias formas de trabalho coletivo, que pode ser cooperativo,
simplista e sem maiores justificativas, que adotam a pesquisa-ação como
colaborativo ou, até mesmo, constituir-se em uma colegialidade artificial".
metodologia de pesquisa.
Para Boavida e Ponte (2002), embora as denominações “cooperação”
Embora possamos considerar a pesquisa-ação como uma técnica
e “colaboração” tenham o mesmo prefixo co, que significa ação conjunta,
especial de coleta de informações, ela também pode ser vista como
elas diferenciam-se pelo fato de a primeira ser derivada do verbo latino
uma modalidade de pesquisa que torna o participante da ação um
operare (operar, executar, fazer funcionar de acordo com o sistema) e a
pesquisador de sua própria prática e o pesquisador um participante
segunda de laborare (trabalhar, produzir, desenvolver atividades tendo
que intervém nos rumos da ação, orientado pela pesquisa que realiza.
em vista determinado fim). Assim, na cooperação, alguns ajudam os outros
Acreditamos que esse é o principal sentido da pesquisa-ação. E, em
(co-operam), executando tarefas cujas finalidades geralmente não re-
que pese o sufixo “ação”, a pesquisa-ação também deve ser concebida
sultam de negociação conjunta do grupo, podendo haver subserviência
como um processo investigativo intencionado, planejado e sistemático
de alguns em relação a outros e/ou relações desiguais e hierárquicas. Na
de investigar a prática.
colaboração, todos trabalham conjuntamente e se apoiam mutuamente,
E muito comum, nas pesquisas acadêmicas de mestrado e dou-
visando atingir objetivos comuns negociados pelo coletivo do grupo.
torado, tomar um trabalho colaborativo de pesquisa-ação como objeto
Na colaboração, as relações, portanto, tendem a ser não hierárquicas,
de pesquisa. Nesses casos, entendemos que a pesquisa individual
havendo liderança compartilhada, confiança mútua e corresponsabili-
desenvolvida pelo mestrando ou doutorando não poderia, a rigor, ser
dade pela condução das ações (FIORENTINI, 2004).
denominada pesquisa-ação.
Outra diferenciação a ser feita é entre trabalho cooperativo/co-
Um exemplo de pesquisa que tem como objeto de estudo um
laborativo e pesquisa cooperativa/colaborativa. O trabalho cooperativo
trabalho de pesquisa-ação é o caso da tese de doutorado de Nacarato
ou colaborativo pode ser tomado como objeto de pesquisa, sem que esta
(2000). À autora investigou os saberes curriculares, as reflexões e os
seja, necessariamente, colaborativa. Mas há um outro sentido que concebe
conflitos produzidos por um grupo de professoras das séries iniciais
a própria pesquisa como cooperativa ou colaborativa, contando com a
do ensino fundamental, durante um processo simultâneo de aprender
participação de todos os envolvidos numa prática também investigativa
geometria e de tentar ensiná-la. As informações foram coletadas pela
em que todos co-operam ou co-laboram na realização conjunta do processo
pesquisadora em reuniões de estudo com as professoras e também
investigativo que vai desde sua concepção, planejamento, realização até
pelas entrevistas individuais, quando elas se revelaram necessárias.
a fase de análise e escrita do relato final.
Ao longo do processo de coleta de informações, que ocorreu con-
comitantemente ao processo de investigação-ação, as professoras
apresentavam, ainda que timidamente, modificações em seus conhe- 1. Para mostrar que nem todo trabalho coletivo é autenticamente colaborativo, Hargreaves
cimentos geométricos, em suas condutas didático-pedagógicas e em (1998) desenvolve os conceitos de colegialidade artificial (colaboração não espontânea
nem voluntária; sendo compulsória, burocrática, regulada administrativamente e
suas práticas em sala de aula.
orientada para objetivos estabelecidos em instâncias de poder; sendo previsível e
fixa no tempo e espaço) e de balcanização (colaboração que divide).
116 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 117

Em sintese, uma pesquisa é dita colaborati


va se um grupo de duas As questões fechadas são mais fáceis de serem respondidas, com-
Ou mais pessoas trabalharem co-labor
ativamente ao longo de todo o piladas e tratadas estatisticamente. As questões abertas, por sua vez,
processo investigativo, passando por
todas as suas fases, as quais vão
desde a concepção, planejamento e prestam-se melhor a coletar informações qualitativas. No entanto, são
desenvolvimento da pesquisa in-
cluindo a coleta e análise dos dados, mais difíceis de serem obtidas, pois exigem do sujeito que responde
e a escrita conjunta do rel bri
final, send maior atenção e tempo. As informações fornecidas pelo questionário
oi sendo, portanto, todos pesquisa
uisadores e auto res do estudo.
tr parte, se um pesquisador decide
do DeDe aberto podem ser agrupadas em categorias, sendo possível também
individualmente investigar uma
prática colaborativa — isto é, busca sua quantificação.
descrever e analisar os processos
ormativos e de produção de conhecim As perguntas mistas, que combinam parte fechada com parte
entos que aí ocorrem -. essa
pesquisa não pode ser metodologica aberta, podem ser do tipo:
mente caracterizada como es-
quisa colaborativa, pois os particip
antes do grupo colaborativo não
Assinale a matéria que você menos gosta:
participam como co-investigadores
e co-autores desse estudo. Mais ( ) Matemática; ( ) Fisica; ( ) Português...
q I ei r encontrará em Justifique por quê:

Embora, atualmente, sejam pouco utilizados pelas pesquisas em


4. EXPLORANDO ALGUNS INSTRU abordagem qualitativa, os questionários podem servir como uma fonte
MENTOS DE
COLETA DE INFORMAÇÕES complementar de informações, sobretudo na fase inicial e exploratória da
pesquisa. Além disso, eles podem ajudar a caracterizar e a descrever os
4.1. Questionários sujeitos do estudo, destacando algumas variáveis como idade, sexo, estado
civil, nível de escolaridade, preferências, número de horas de estudo, nú-
= O questionário é um dos instrumentos mero semanal de horas-aula do professor, matérias ou temas preferidos etc.
mais tradicionais de coleta
e informações e consiste numa série A diferença desse instrumento de pesquisa em relação às entre-
de perguntas que podem ser:
vistas é que o questionário pode ser aplicado a um grande número de
* Fechadas, quando apresentam alte sujeitos sem que haja necessidade de contato direto do pesquisador .
rnativas para respostas
Neste caso, o pesquisador pressupõ com o sujeito pesquisado. Os questionários podem ser enviados e
e quais são as respostas
Possíveis que o sujeito irá dar, não have devolvidos via correio convencional ou eletrônico (e-mail).
ndo, portanto pos-
sibilidade de obter alguma resposta Tendo em vista que as perguntas são, de certa maneira, uma tra-
fora desse conjunto
Abertas, quando não apresentam alter dução das hipóteses da pesquisa, a opção por esse instrumento de coleta
nativas para respostas
podendo o pesquisador captar algu de informações exige do pesquisador conhecimento prévio sobre o tema
ma informação não
vista por ele ou pela literatura. e sobre o nível de conhecimento da população pesquisada. Além disso,
ne
Mistas, combinando parte com perg tendo em vista clareza, pertinência, precisão, ordenação, contaminação
untas fechadas e parte
com perguntas abertas. e abrangência das questões formuladas, é recomendável que o questio-
118 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 119

nário, antes de ser aplicado definitivamente à amostra


selecionada, seja sador registra observações de fenômenos, faz descrições de pessoas e
testado junto a um grupo piloto (descartável) de indiví
duos. cenários, descreve episódios ou retrata diálogos. Quanto mais próximo
E prudente que o pesquisador avalie qual é o tamanho mais
ade- do momento da observação for feito o registro, maior será a acuidade
quado do questionário. Questionários longos (que exigem
mais de 30 da informação.
minutos para serem respondidos) e com perguntas pouco
claras podem A organização do diário de campo pode variar de um pesquisador
ser cansativos e dificultar a disposição dos sujeitos em
respondê-los de para outro. Liidke e André (1986) recomendam que, ao iniciar cada
forma adequada, colocando sob suspeita a fidedignid
ade
do instrumen-
to. O pesquisador, além disso, deve avaliar qual o melhor registro, o observador indique o dia, a hora, o local da observação e o
momento ou
ambiente para aplicá-los, procurando evitar fazê-lo quando período de duração; e, ao proceder às anotações, deixe uma margem
os sujeitos
podem estar cansados ou sob tensão. para posterior codificação e/ou comentários e reflexões.
Algumas recomendações relativas à preparação, elabor Alguns pesquisadores apontam como principal limitação desse
ação e
organização do questionário: instrumento de coleta de informações o alto grau de subjetividade
do pesquisador. Apresentam como recomendação, nesse caso, que O
1) evite formular perguntas pouco contributivas para observador, sempre que for acrescentar às suas observações e descri-
o estudo
ou que não digam respeito às questões investigativas
;
ções algumas reflexões ou comentários pessoais, abra uma nota com
2) elabore perguntas claras, destituídas de linguajar técnic as iniciais RCP” (reflexões e comentários do pesquisador).
o ou
de termos abstratos; Outros pesquisadores, entretanto, sustentam que o diário de
3) evite duas perguntas em uma, campo deve conter as reflexões diárias do pesquisador referentes à
4) evite formular perguntas muito diretas sobre um concei pesquisa. Assim, espera-se que contenha impressões, comentários €
to
complexo. Exemplo de pergunta a ser evitada: “Qual a “opiniões do observador sobre o meio social em que realiza suas ob-
sua
concepção de matemática”. Em lugar disso, poderia formular servações, seus erros, dificuldades, confusões, incertezas e temores,
uma pergunta mais indireta que traga subjacente a concep
ção suas boas perspectivas, acertos e sucessos, suas reações e as dos par-
de matemática como, por exemplo, “fale sobre o que repre-
ticipantes (gestos, expressões verbais e faciais etc.).
senta a matemática em sua vida”,
Os diários, portanto, podem conter uma dupla perspectiva: uma
5) todo questionário deve ter uma parte inicial breve de
apre- descritiva e outra interpretativa. À perspectiva descritiva atém-se à
sentação do questionário, solicitando a colaboração,
expli- descrição de tarefas e atividades, de eventos, de diálogos, de gestos e
citando os objetivos, a promessa de sigilo das informações,
atitudes, de procedimentos didáticos, do ambiente e da dinâmica da
algumas orientações para seu preenchimento e agradecendo
prática, do próprio comportamento do observador etc. À perspectiva
a colaboração.
interpretativa, por sua vez, tenta olhar para a escola e a sala de aula
4.2. Diário de campo ou de bordo como espaços socioculturais produzidos por seres humanos concretos,
isto é, por sujeitos que participam da trama social com seus sentimen-
Um dos instrumentos mais ricos de coleta de informações tos, ideias, sonhos, decepções, intuições, experiências, reflexões e
du-
rante o trabalho de campo é o diário de bordo. É nele relações inter-pessoais. Para que o diário não seja meramente técnico
que o pesqui-
120 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 121

ou muito genérico e superficial, recomenda-se que busque contemplar


o entrevistador não se pode desviar. Essas são mais fáceis de serem
de forma equilibrada essas duas perspectivas.
tratadas estatisticamente e, por isso, são preferidas pela abordagem
No caso do professor que pretende investigar sua própria prá- empírico-analítica.
tica, recomenda-se que ele proceda à elaboração do diário tão logo As não estruturadas ou abertas, por não apresentarem um roteiro
termine suas aulas. Pode, para isso, valer-se de outros instrumentos de de questões previamente formuladas, permitem que o informante
coleta de informações: gravações em áudio ou vídeo; coleta de registros aborde livremente um assunto, podendo estabelecer um diálogo com
dos alunos, entre outros.
o entrevistador. Este, nesse caso, desempenha o papel de orientador
O diário de campo pode ser um ótimo complemento às entre- e estimulador. Essa modalidade de entrevista é a preferida pelas abor-
vistas ou aos questionários.
dagens fenomenológicas e hermenêuticas.
Há, entretanto, uma outra forma de entrevista que articula essas
4.3. Entrevistas duas modalidades: a entrevista semiestruturada. Essa modalidade é
muito utilizada nas pesquisas educacionais, pois o pesquisador, pre-
À entrevista é, nas ciências sociais, o procedimento
tendendo aprofundar-se sobre um fenômeno ou questão específica,
mais usual
no trabalho de campo. Trata-se de uma conversa a dois com propósitos organiza um roteiro de pontos a serem contemplados durante a en-
bem definidos. Etimologicamente, a palavra “entrevista” é construída à trevista, podendo, de acordo com o desenvolvimento da entrevista,
partir de duas palavras: entre (lugar ou espaço que separa duas pessoas alterar a ordem deles e, até mesmo, formular questões não previstas
ou coisas) e vista (ato de ver, perceber). Ou seja, a entrevista é uma inicialmente. Essa modalidade de entrevista é a preferida pelas abor-
comunicação bilateral e significa o “ato de perceber realizado entre dagens histórico-dialéticas.
duas pessoas” (RICHARDSON et al., 1985). Um exemplo, em EM, de utilização de entrevista semiestru-
A entrevista, além de permitir uma obtenção mais direta e ime- turada pode ser encontrado na tese de doutorado de Tadeu Oliver
diata dos dados, serve para aprofundar o estudo, complementando Gonçalves (2000, p. 13). Tendo como objetivo “investigar a formação
outras técnicas de coleta de dados de alcance superficial ou genérica e o desenvolvimento profissional de oito formadores de professores
como, por exemplo, a observação e o survey com aplicação de ques- de Departamento de Matemática da Universidade Federal do Pará”,
tionários sobre um grande número de sujeitos. Ela é particularmente Gonçalves (2000) organizou um roteiro de entrevista semiestruturada
vantajosa com pessoas de pouca instrução e que têm dificuldade de se em torno de três blocos.
expressar por escrito (preencher um questionário, por exemplo). Mas O primeiro bloco referia-se à formação inicial do formador. Em
ela também pode ser vantajosa com pessoas com grande conhecimen- seguida, vinha uma pergunta de transição, a qual comparava/relacionava
to, pois permite ao entrevistado fazer emergir aspectos que não são a formação inicial com a formação continuada ou a prática profissional.
normalmente contemplados por um simples questionário. O segundo bloco versava sobre as percepções e reflexões do formador
As entrevistas podem ser estruturadas ou não estruturadas sobre a licenciatura em matemática da Universidade Federal do Pará
(abertas). As estruturadas pressupõem perguntas precisas, previamente (UFPA), olhando para o coletivo dos professores, as mudanças ocorri-
formuladas e organizadas segundo uma determinada ordem, das quais das ao longo dos anos, o que devia fazer para formar um bom professor
122 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA E DE CONSTITUIÇÃO... 123
PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES

e como avaliava a licenciatura na UFPA. O último bloco de perguntas * Por isso, o entrevistador não deve discutir sua opinião ou seus
referia-se a um nível mais pessoal, inquirindo sobre “o que” e “como” pontos de vista, nem mostrar surpresa ou desaprovação e, me-
cada docente fazia para desenvolver a disciplina que trabalhava, tendo nos ainda, avaliar negativamente sua fala. Ao contrário, deve
em vista a formação do professor de matemática. demonstrar grande interesse no que o entrevistado diz ou narra.
O acesso às informações mais significativas, durante a entrevista, e Recomenda-se que o entrevistador não interrompa o curso
exige do entrevistador atenção, respeito ético e cuidado especial. Para do pensamento do entrevistado. Não apresse o entrevistado
isso, segundo Chizzotti (1991), e dê o tempo necessário para que conclua seu depoimento.
Evite, também, perguntas diretas, como por exemplo: “Qual a
[...] o entrevistador deve manter-se na escuta ativa e com a atenção re-
sua concepção de currículo?”. Perguntas como essa induzem
ceptiva a todas as informações prestadas, intervindo com discretas inter-
a respostas superficiais e estereotipadas. À concepção de
rogações de conteúdo ou com sugestões que estimulem a expressão mais
currículo do entrevistado resulta da análise e interpretação
circunstanciada de questões que interessem à pesquisa. A atitude disponível
do pesquisador sobre o discurso do entrevistado.
à comunicação, a confiança manifesta nas formas e escolhas de um diálogo
descontraído devem deixar o informante inteiramente livre para exprimir-
Embora as entrevistas sejam geralmente individuais, elas também
-se sem receios, falar sem constrangimentos sobre seus atos e atitudes,
podem ocorrer coletivamente, envolvendo um grupo de pessoas. Essa
interpretando-os no contexto em que ocorrem (p. 93).
modalidade de entrevista é também chamada de discussão de grupo e visa
à complementação das entrevistas individuais e da observação partici-
Alguns manuais de metodologia da pesquisa apresentam uma
pante. O entrevistador é o próprio coordenador do grupo de discussão
série de recomendações aos entrevistadores. Dentre outras, destacamos:
e a ele cabe preparar, com base num estudo prévio de entrevistas ou
Antes de iniciar o processo de entrevista, o entrevistador observações individuais, um roteiro de questões a discutir, buscando
deve explicar o objetivo e a natureza do trabalho, esclare- esclarecer e confrontar depoimentos e percepções divergentes e
cendo por que ele foi escolhido para entrevista. convergentes.
* Assegurar o anonimato do entrevistado e o sigilo dos depoi- Essa modalidade de entrevista em EM foi utilizada por Maria
mentos, garantindo que estes serão utilizados somente para Paulina Camargo (1998), em sua dissertação de mestrado. Tendo como
a finalidade da investigação. pergunta diretriz de investigação “Como os licenciandos e licenciados
O entrevistador deve solicitar a autorização para gravar (em em matemática e ciências da UNIMEP refletem e percebem sua forma-
áudio ou vídeo) a entrevista, assegurando, depois, que a ção profissional?”, Camargo (1998) solicitou, inicialmente, que oito
transcrição será lida, revisada e autorizada pelo entrevistado. licenciandos/licenciados, que já haviam iniciado a prática docente na
Escolher, para a entrevista, um lugar apropriado e tranquilo escola, produzissem individualmente relatos reflexivos sobre como
que favoreça um diálogo profundo, esclarecendo que o entre- vinham percebendo, ao longo de um ano letivo, seu processo de for-
vistado tem o direito de não responder a todas as perguntas, mação profissional. Da análise inicial desses relatos, Camargo encon-
podendo, inclusive, interromper a entrevista. trou dois aspectos recorrentes: (1) a orientação de ensino baseada na
124 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA É DE CONSTITUIÇÃO... 125
PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES

imitação de professores “modelares” que marcaram a vida estudantil registra (grava em áudio ou vídeo) a informação. Como a experiência é
de cada um, e (2) a formação matemática e científica que adquiriram o principal foco da história oral de vida, o depoente deve ter liberdade
ou estavam adquirindo naquele momento, em contraste com aquela para dissertar o mais livremente possível sobre sua experiência pessoal.
necessária à prática profissional. Esses dois aspectos foram levados Por isso, as entrevistas devem ser abertas e não estruturadas, podendo,
para uma entrevista coletiva com os sujeitos da pesquisa, a qual teve no máximo, apresentar algumas perguntas amplas que indiquem os
duração de duas horas de discussão. grandes acontecimentos.
Segundo Trivifios (1987), as entrevistas semiestruturadas apre- Entretanto, não há um consenso entre os historiadores sobre
sentam melhores resultados quando realizadas primeiro individu- qual é o documento essencial da história oral: a gravação; a primeira
almente e depois coletivamente. Essas duas etapas de entrevistas transcrição; a entrevista conferida e autorizada; ou a entrevista tex-
desenvolvem-se em processo de retroalimentação. tualizada (isto é, a entrevista transcrita e lapidada em forma de texto
Associadas ao processo de entrevista, há também outras moda- pelo pesquisador). O leitor interessado nessa modalidade de pesquisa”
lidades de pesquisa: a história de vida ou a história oral. pode consultar o trabalho de Garnica (2004) e dissertações e teses em
EM tais como: Oliveira (1997), Souza (1999), Vianna (2000), Teixeira
4.4. Biografias e histórias de vida (2000) e Guérios (2002)º.
Os dados coletados por meio da história de vida podem fornecer
A biografia ou a história de vida é uma modalidade de investiga- novas hipóteses para pesquisas subsequentes e, no caso de haver várias
ção que se presta a narrar e a compreender a evolução de uma pessoa histórias de vida, pode-se estabelecer uma análise comparativa (ou de
ou de um grupo de pessoas, dando destaque à trajetória profissional, contraste) entre elas.
sobretudo às suas práticas sociais e ao seu ideário. Uma vantagem da história de vida é que, por intermédio dela, as
Para compor as histórias de vida, podem ser utilizados como fon- pessoas conseguem transmitir informações que não seriam expressas
tes de informação autobiografias, cartas, fotografias, diários, anotações, se as questões fossem propostas diretamente.
crônicas, publicações, entre outras. Uma outra fonte ou modalidade No entanto, as constatações, via história de vida, dificilmente
investigativa muito utilizada atualmente é a história oral. A história poderão ser generalizadas. Além disso, os dados coletados por meio
oral, segundo Meihy (2000), “é um recurso moderno usado para a da história de vida sempre são naturalmente filtrados por uma ótica
elaboração de documentos, arquivamento e estudos referentes à vida pessoal; para o pesquisador, é difícil estabelecer um quadro de refe-
social de pessoas. Ela é sempre uma história do tempo presente e tam- rência prévio à coleta de dados, assim como, igualmente, é difícil se
bém conhecida por história viva” (p. 25). E, além disso, “se apresenta ater a ele durante a coleta de dados, mediante história de vida.
como forma de captação de experiências de pessoas dispostas a falar
sobre aspectos de suas vidas” (p. 26).
A história oral exige a participação direta do informante (en- 2. Consultar tambémo site: <http://www.ghoem.com>.

trevistado), que presta um depoimento a alguém (entrevistador) que 3. As referências destes estudos podem ser encontradas em: <http://www.cempem.
fae.unicamp.br>.
126 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 127

Apesar das limitações da técnica história de vida, ela continua Há também os casos de enganos de boa-fé, por exemplo:
sendo útil ao pesquisador, pois, afinal, a função da pesquisa não é só a
de descrever o observado, mas também de compreendê-lo. a) W. Shanks, em 1873, calculou o valor de p com 707 casas
decimais, mas, em 1948, Ferguson descobriu erros a partir
da 528º casa;
5. ACASO, FRAUDES E MANIPULAÇÃO DE INFORMAÇÕES — b) Ptolomeu defendia a ideia de que a Terra era o centro do universo.
ALGUNS CASOS HISTÓRICOS
Há, ainda, os casos de fraudes, isto é, erros intencionais. Alguns
o, Vo = exemplos famosos são:
Toda pesquisa é um processo extremamente versátil, possibi-
litando seguir
8 inúmeros caminhos q que conduzem a de scobertas ou
a) em 1912, o paleontólogo inglês Charles Dawson apresentou
conclusões desejadas ou inesperadas, casuais ou planejadas, mas 1
) P ' plane) ' que ossos humanos “fossilizados”, pretendendo comprovar elo de
também podem induzir o pesquisador a enganos (de boa-fé) ou a
er evolução entre o macaco e o homem. Em 1956, no entanto,
fraudes (de má-fé).
A foi provado que os ossos eram de humano moderno e de
À história da ciência registra inúmeros casos interessantes de
orangotango;
descoberta por acaso, tais como:
b) em 1985, a Universidade de San Diego comprovou que a
numerosa produção do médico Robert Slutsky, em apenas
a) a vulcanização da borracha, depois que Goodyear (1844) três anos, era devida a resultados inventados por ele;
deixou cair um pedaço de borracha de apagar lápis numa c) em 1999, arqueólogos chineses enterraram juntos um lagarto
frigideira quente,
e uma galinha; mais tarde, apresentaram à comunidade cien-
b) o corante índigo (1893), quando um químico, ao quebrar um
tífica a “descoberta” da prova do elo perdido entre aves e
termômetro, deixou cair mercúrio na solução de tintura;
dinossauros;
c) o náilon (1939), quando pesquisadores se divertiam esticando d) em 2000, o arqueólogo japonês S. Fujimura disse ter achado
um novo composto químico; ferramentas de 60 mil anos; depois, ele confessou tratar-se
d) o polietileno (1953), devido a vazamento involuntário ocor- de algumas de suas ferramentas que foram enterradas por ele
rido num laboratório; mesmo”.
e) o vidro de segurança (de automóvel), quando — em 1903 — um
tubo de colódio caiu no chão, quebrou-se, mas manteve a Lentin (1996) pinçou da história da ciência outros exemplos de
forma; deslizes, entre eles os seguintes:
f) também por acaso foram descobertos os raios X, o celuloide,
a gelatina explosiva, a penicilina.
4. Extraído da Revista Galileu, Rio de Janeiro: Editora Globo, n. 114, ano 10, p. 11,
jan. 2001.
128 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 129

a) Newton manipulou alguns cálculos, a fim de acelerar a acei- por convidados da Fira; esses convidados são escolhidos dentre espe-
tação de suas descobertas (velocidade do som, precessão dos cialistas em futebol — jornalistas, ex-jogadores famosos, por exemplo.
equinócios); Para o ano 2000, além do melhor jogador do ano, a Fira decidiu
b) Mendel, para chegar aos resultados que desejava, manipulou escolher o melhor jogador de futebol do século. Várias pesquisas já
dados estatísticos, segundo o estatístico R. A. Fisher; haviam sido realizadas na Europa por jornais, revistas ou programas
c) Millikan, segundo G. Horton, das 140 experiências sobre de TV. Especialistas no assunto, dirigentes da Fira e de clubes já se
medição da carga do elétron, selecionou as 58 cujos resulta- haviam pronunciado a respeito e todos os resultados eram unânimes
dos mais lhe convinham; em apontar um único nome: Pelé.
d) Cyril Burt, psicólogo inglês, “estudou” 53 pares de gêmeos (não A Fira, entretanto, querendo mobilizar a opinião pública, decidiu
criados juntos), a fim de distinguir o que é hereditário do que fazer um levantamento de opinião popular pela internet. O ganhador,
é adquirido... no entanto, a maioria dos casos foi inventada. - segundo esse levantamento, foi Maradona, com 53% (78 mil votos),
sendo seguido por Pelé com 16% (23 mil votos). Além dessa diferença
A história da matemática também registra casos de apropriação entre os resultados de avaliação feita por especialistas e os de opinião
indébita como, por exemplo, o de Cardano, que publicou como seu o pública, existem outras diferenças entre Maradona (M) e Pelé (P),
método de resolução de equações do 3º grau descoberto por Tartaglia. como mostra o quadro seguinte:
Qualquer que seja o exemplo de fraude, ele faz emergir um
problema ético, gerando grande descrédito profissional e institu- ITENS M P
cional. No entanto, seja com enganos de boa-fé, seja com fraudes, Nasceu no ano 1960 1940
informações enganosas são divulgadas, atualmente, mais do que an- Marcou em sua carreira 352 gols 1281 gols
tes, pois, devido à internet, nunca tantas informações estiveram ao Integrou a seleção de seu país 105 vezes 114 vezes
dispor ou chegaram até as pessoas. É por isso que o consumidor de Marcou pela seleção 33 gols 95 gols
informações (e quem não o é?), bem como o pesquisador, precisam Jogou em copas mundiais 4 vezes 4 vezes
estar atentos e ser críticos. Marcou em copas mundiais 8 gols 12 gols
Um exemplo recente e interessante de “pesquisa” que ocasionou Foi campeão mundial 1 vez 5 vezes”
um imbróglio internacional foi protagonizado pela Associação Federação
Internacional de Futebol (Fira), ao realizar um levantamento de opinião E mais diferenças entre M e P poderiam ser acrescidas:
pública para a escolha do melhor jogador de futebol do século XX.
Anualmente, a Fira promove um levantamento que indica quem * Pjogou nos Estados Unidos e M na Europa;
é o melhor jogador do ano; para tanto, são considerados: o total de * Paos 60 anos parece fisicamente melhor que M com 40;
gols marcados; o total de partidas jogadas, as penalizações sofridas; e P não se envolveu com drogas, M sim.
a regularidade de atuação apresentada; entre outras variáveis. A cada
ano, um só ganhador tem sido indicado, por uma comissão composta 5. Três vezes pelo Brasil e duas pelo Santos.
130 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE COLETA DE INFORMAÇÕES E DE CONSTITUIÇÃO... 131

a divulgação da eleição pela mídia;


E você, leitor, com base nessas informações, já tem sua opinião e argumentação
cada torcedor pode votar quantas vezes quiser;
a respeito de quem foi o melhor jogador de futebol do século XX?
e a idade dos votantes;
e a cor ou nacionalidade dos candidatos?
Partidarismos à parte, cabe aqui uma reflexão sobre essa pes-
Que comentários você faz a respeito do imbróglio Maradona
quisa da Fira. À julgar pelas informações veiculadas pela mídia, a Fira
versus Pelé?
acreditava que os resultados a serem obtidos via internet confirmariam
os das pesquisas realizadas entre especialistas em esporte. Tal fato
não aconteceu. Ocorreu, na verdade, um resultado inesperado. Quais
fatores poderiam ter contribuído para isso?
A fim de auxiliar o leitor em sua própria análise, seguem algumas
questões:

1. À opinião de um grande número de pessoas deve ser neces-


sariamente igual à de especialistas?
2. Os critérios que os especialistas utilizam e o material de que
dispõem para julgar seriam os mesmos do público em geral?
3. Quando pessoas do público em geral são indagadas “Qual
foi o melhor jogador do século XX2”, será que muitas não
interpretaram a pergunta como se fosse “Qual é o melhor
jogador que eu vi jogar?”, ou, então, “Qual é o jogador que eu
gostaria que vencesse a pesquisa?”, ou, ainda, “Qual jogador
marcou mais gols em sua carreira?”.
4. Será que é possível julgar com justiça jogadores que atuaram
em distintas épocas, nas quais os campeonatos tiveram dife-
rentes quantidades de jogos e diferentes níveis de competição
(atlética, financeira e profissional) e dispuseram de diferentes
meios de divulgação (rádio, TV com replay)?
5. Num levantamento de opinião via internet, quais dos fatores
seguintes poderão influir nos resultados:
* a relação número de habitantes por computador;
* o número de torcedores com internet;
CAPÍTULO * SETE

PROCESSO DE SISTEMATIZAÇÃO
E ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES

Ace de análise das informações obtidas no trabalho de campo,


ou levantadas a partir de documentos, é uma fase fundamental da
pesquisa. Dela depende a obtenção de resultados consistentes e de res-
postas convincentes às questões formuladas no início da investigação.
A fase da análise envolve, inicialmente, a organização das in-
formações obtidas por meio de observações etnográficas, entrevistas
transcritas, questionários respondidos, notas de campo, fichas de
informações obtidas a partir de documentos, entre outros meios. Sem
essa organização ou separação do material em categorias ou unidades de
significado, torna-se difícil o confronto das informações, a percepção
de regularidades, padrões e relações pertinentes.
Esse é um processo trabalhoso e meticuloso que implica múlti-
plas leituras do material disponível, tentando nele buscar unidades de
significados ou, então, padrões e regularidades para, depois, agrupá-los
em categorias. A busca dessa organização é guiada, geralmente, pela
questão investigativa e pelos objetivos do estudo. É aí que, às vezes,
surgem dificuldades, pois as informações obtidas podem não estar
adequadas às hipóteses ou expectativas iniciais. É nesse momento
que o pesquisador precisa ser flexível, ajustando melhor a direção da
134 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE SISTEMATIZAÇÃO E ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES 135

pesquisa e sua questão investigativa. O problema torna-se maior se, podendo ser ou não provenientes da literatura; (2) emergentes, quando são
ante os fatos e evidências, o pesquisador tiver de rever os conceitos obtidas, mediante um processo interpretativo, diretamente do material
teóricos que embasam a pesquisa. de campo; (3) ou mistas, quando o pesquisador obtém as categorias a
Alguns autores consideram que a análise e a interpretação acon- partir de um confronto entre o que diz a literatura e o que encontra
tecem em momentos separados. Nós, entretanto, temos uma concep- nos registros de campo. Na pesquisa qualitativa é menos comum o
ção próxima à de Gomes (1999) e à de Bogdan e Biklen (1994), pois uso de categorias prévias, pois é grande a probabilidade de surgirem,
compreendemos a análise num sentido mais amplo, abrangendo a na pesquisa de campo, dados ou informações ainda não contempladas
interpretação. Para Gomes (1999, p. 68), “a análise e a interpretação pela literatura ou por outras pesquisas. O processo de construção de
estão contidas num mesmo movimento: o de olhar atentamente para boas categorias de análise depende, em grande parte, do conhecimento
os dados da pesquisa”. teórico do pesquisador e de sua capacidade de perceber a existência
O processo de análise, como veremos a seguir, pode ser de- de relações ou de regularidades.
senvolvido de maneira mais efetiva mediante o uso de categorias ou procedimento prático para o processo de categorização
Um
eixos de análise.
emergente ou mista é transcrever, na primeira coluna de um quadro
ou tabela, entrevistas, gravações e descrições do material de campo.
A segunda coluna desse quadro, chamada “produção de significados”,
1. O PROCESSO DE CATEGORIZAÇÃO fica reservada para anotações, interpretações, comentários e conexões
com literatura. À terceira coluna destina-se à “construção de unidades
À categorização significa um processo de classificação ou de or- de significados”, isto é, à construção das categorias analíticas (veja
ganização de informações em categorias, isto é, em classes ou con- Quadro 2 a seguir).
juntos que contenham elementos ou características comuns. Nesse
processo, existem alguns princípios que devem ser observados pelo
QUADRO 2: ILUSTRAÇÃO DO PROCESSO
pesquisador. O primeiro deles é que o conjunto das categorias deve
DE CONSTRUÇÃO DE CATEGORIAS
estar relacionado a uma ideia ou conceito central capaz de abranger
todas as categorias. Por exemplo, podemos categorizar os “porquês”
Texto relativo às entrevistas, transcrição de gravações, | Produção de significados | Construção de unidades de
matemáticos dos alunos segundo o campo conceitual da matemática: (interpretações) significados (categorias)
descrições de observações etnográficas ou anotações
porquês aritméticos; algébricos; geométricos etc. Outro princípio: é de campo...
altamente desejável que essas categorias sejam disjuntas, isto é, mu- [1 xyz xyz XyZ XyZ XVZ XYZ XYZ XYZ XyZ XyZ
2 abc abc abc abc abc abc abc abc abc abc abc
tuamente exclusivas, de modo que cada elemento esteja relacionado XXXXXXXX A
3 rstrstrstrst rstrst est rst rstrst ret rst rst
com apenas uma categoria. Por fim, as categorias estabelecidas devem 4mmmmmmmmmm..
verem S< B
ZZ2Z2222722
abranger todas as informações obtidas. 5
As categorias podem ser de três tipos: (1) definidas a priori, quando 6

o pesquisador vai a campo com categorias previamente estabelecidas,


136 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE SISTEMATIZAÇÃO E ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES 137

Uma vez definidas as categorias de análise, damos prosseguimen- Embora existam várias alternativas para se proceder à organiza-
to à análise, podendo esta seguir um percurso vertical ou transversal. ção e análise das informações — algumas qualitativas e outras quanti-
No processo de análise vertical, cada uma das categorias é analisada tativas ou estatísticas —, optamos, neste livro, por descrever e ilustrar
separadamente. Somente após o término da análise de cada categoria a análise de conteúdo e a análise de discurso por serem, atualmente,
é que se realiza um confronto entre elas, tentando produzir resultados as modalidades de análise mais comuns nas pesquisas em abordagem
e conclusões consistentes e relacionadas à questão de investigação. qualitativa. Vejamos as características de ambas.
No processo de análise transversal, todas as categorias são consideradas
simultaneamente quando se está analisando uma situação ou um dis-
curso. À análise transversal é mais apropriada quando as categorias 2. A MODALIDADE DE ANÁLISE DE CONTEÚDO
não são totalmente disjuntas.
Um exemplo de processo de categorização na pesquisa em EM
A análise de conteúdo surgiu no início do século XX nos Estados
pode ser encontrado em Chamie (1990), que utilizou uma abordagem
Unidos (GOMES, 1999) e é concebida, hoje, como uma técnica que
fenomenológica para analisar as respostas dos alunos à pergunta “Que
tem como principal função descobrir o que está por trás de uma men-
dificuldades vocês sentem em matemática?”.
sagem, de uma comunicação, de uma fala, de um texto, de uma prática
A partir de depoimentos transcritos, essa autora desenvolve o
etc. Segundo Rizzini, Castro e Sartor (1999, p. 91),
processo de categorização em quatro etapas:

é uma técnica de investigação que tem por objetivo ir além da compreensão


* 4º etapa: leitura atenta dos depoimentos dos alunos, tentando
imediata e espontânea, ou seja, ela teria como função básica a observação
familiarizar-se com seus discursos e buscar o sentido geral destes;
mais atenta dos significados de um texto, e isso pressupõe uma construção
* 2 etapa: identificação, em cada texto, das unidades de signifi-
de ligações entre as premissas de análise e os elementos que aparecem no
cados, as quais são expressas em linguagem do pesquisador;
texto. Essa atividade é, assim, essencialmente interpretativa.
* 3ºetapa: análise ideográfica: produção individual de unidades de
significado em relação à pergunta da pesquisa;
Para que o processo de análise do conteúdo seja bem-sucedido,
* 4º etapa: análise nomotética: busca de categorias de significados
Bardin (1985) recomenda que o pesquisador faça reiteradas leituras dos
convergentes, tentando captar a essência das dificuldades
registros escritos (textos), de modo que evidencie os elementos comuns
relatadas.
e divergentes subjacentes aos discursos, os quais permitem estabelecer
relações e promover compreensões acerca do objeto de estudo.:
A autora, durante o processo, identifica inicialmente 94 unida-
À análise de conteúdo, portanto, exige a utilização de critérios
des de significado, passa por uma fase intermediária de 12 unidades
claramente definidos sobre registros fornecidos pelas pessoas interro-
invariantes e, ao fim, chega a três grandes categorias de convergência:
gadas; tais critérios consideram as palavras utilizadas nas respostas, as ideias
o significado de matemática; o preconceito com a matemática; e O
ou opiniões expressas e as interpretações e justificativas apresentadas. Para tanto,
desenvolvimento lógico na matemática.
todos os registros devem ser atentamente lidos, vistos e revistos a fim
138 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE SISTEMATIZAÇÃO E ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES 139

de efetuar-se um levantamento das principais informações neles contidas. ou associação entre o quadro teórico e o material empírico,
Em seguida, elas devem ser organizadas em categorias. verificando se há correspondência entre eles. O sucesso da
Mas, mesmo organizado, o material poderá continuar bruto, não análise dependerá da qualidade e da versatilidade do quadro
permitindo extrair tendências claras e resultados mais consistentes e e da grade de análise.
conclusivos. Ou seja, é preciso, ainda, um estudo minucioso de seu 2º) Construção iterativa de uma explicação. Nessa estratégia, a análise
conteúdo, das palavras e frases que o constituem; é preciso procurar o e a interpretação das informações obtidas não se processam
sentido, captar as intenções, contrastar, avaliar e descartar o que não a partir de um quadro teórico previamente definido. De
é essencial. “Este é o princípio da Análise de Conteúdo: consiste em maneira contrária à anterior, aqui
desmontar a estrutura e os elementos desse conteúdo para esclarecer
suas diferentes características e extrair sua significação” (LAVILLE; o pesquisador elabora pouco a pouco uma explicação lógica do fenô-

DIONNE, 1999, p. 214). meno ou da situação estudados, examinando as unidades de sentidos,


e entre as categorias em que
Há múltiplas maneiras de se desenvolver uma análise de con- as inter-relações entre essas unidades

teúdo. Elas variam de acordo com o objeto ou caso de estudo. Para elas se encontram reunidas. Essa modalidade, que lembra a construção

ilustrar, vejamos alguns exemplos em EM: de uma grade aberta, convém particularmente aos estudos de caráter
exploratório quando o domínio de investigação não é bem conhecido

e Análise de livros didáticos. Pode-se analisar os conteúdos e a (LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 227-228).
forma como são abordados; os erros conceituais, a ideologia
subjacente ao texto e às ilustrações etc. Ou seja, as hipóteses explicativas são simultaneamente desen-
* Análise de depoimentos de professores. Pode-se investigar volvidas e verificadas, ao longo do processo de análise e interpreta-
seus conhecimentos profissionais, suas crenças, concepções, ção, em um processo de vai e vem que envolve reflexão, observação,
representações sociais, ideologias etc. comparação, contraste e interpretação.
* Análise da prática de sala de aula de matemática. Pode-se Esse processo iterativo de análise e interpretação pode ser en-
investigar: atitudes; valores subjacentes, contrato didático, contrado em Fiorentini (1994), em que o autor construiu, a partir do
currículo oculto etc. fichamento de 204 dissertações e teses, 12 focos temáticos da pesquisa
brasileira em EM. Essa forma de organização exige que, primeiramente,
Com base em Laville e Dionne (ibidem), duas-estratégias básicas seja identificado, em cada trabalho, o foco principal da investigação.
de análise e de interpretação do conteúdo podem ser distinguidas nas Esse processo não é simples ou direto, pois acontece de forma indutiva
abordagens qualitativas: e, às vezes, dedutiva, exigindo ajustes individuais (para cada estudo)
e grupais (envolvendo um conjunto de estudos). À vantagem é que
1º) Emparelhamento ou associação. Essa estratégia consiste em ana- as categorias construídas emergem do material em análise, e não da
lisar as informações a partir de um modelo teórico prévio. literatura propriamente dita, embora, nesse processo, o diálogo com a
Isso pode ser feito por intermédio de um emparelhamento literatura e outras formas de classificação seja conveniente e necessá-
140 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE SISTEMATIZAÇÃO E ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES 141

rio. O resultado obtido, isto é, o quadro dos estudos organizados em analogias ou comparações, das justificativas ou dos exemplos apresen-
12 categorias temáticas, é uma elaboração particular relativa àquele tados, para tentar descobrir tendências, comportamentos, prioridades,
conjunto de trabalhos, não sendo, portanto, facilmente transferível preferências, crenças, causas, consequências etc., sempre tendo em
para outros conjuntos. À vantagem dessa forma de organização é que vista os objetivos da pesquisa.
ela permite, independente da opção teórica ou metodológica de cada A análise de conteúdo é, segundo Rizzini, Castro e Sartor (1999),
estudo, comparar, por contraste, os diferentes olhares e resultados geralmente usada com um número grande de sujeitos. Quando esse nú-
produzidos. Isso não significa ecletismo. Significa, acima de tudo, mero for três ou quatro, eles recomendam que seja utilizada a análise de
respeito à diversidade e às múltiplas formas de produzir conhecimentos discurso, pois isso daria maior profundidade aos resultados.
dentro de um campo específico, como o da EM.
À análise de conteúdo, entretanto, em razão da sua aparente
simplicidade, apresenta várias armadilhas, nas quais o pesquisador me- 3. A MODALIDADE DE ANÁLISE DE DISCURSO
nos avisado ou cuidadoso pode ser envolvido ou apanhado. Uma delas
refere-se à autenticidade das informações ou do material de análise. Muitas ve-
Essa modalidade surgiu na França em meados da década de
zes, o pesquisador vale-se de fontes não confiáveis, isto é, de recortes
1960 e foi desenvolvida por linguistas, historiadores e psicanalistas
e informações de segunda mão ou previamente interpretadas, para, a
interessados em investigar os processos ideológicos subjacentes às
partir delas, realizar suas análises e interpretações. Nesse caso, a análise
práticas discursivas. Essa modalidade viria também a atrair o interesse
de conteúdo fica seriamente comprometida, produzindo resultados
de sociólogos e antropólogos americanos e ingleses interessados na
pouco confiáveis.
interpretação dos discursos.
À segunda armadilha diz respeito à fidedignidade da análise. O pesqui-
Atualmente, podemos destacar, com base em Rizzini, Castro e
sador, ciente de que não existem análises e interpretações totalmente
Sartor (1999), pelo menos três enfoques distintos da análise de dis-
objetivas, pode, por isso, relaxar e não se preocupar em produzir aná-
curso. O primeiro centra foco na estrutura formal da língua. O segundo
lises e interpretações mais distanciadas e controladas emocionalmente.
baseia-se na teoria da argumentação!, para a qual a “análise dos argumentos
Ou, ele, tendo preferência por alguma relação, pode projetar uma in-
é uma alternativa de análise de discurso na qual interpretações são
terpretação que cria algo que não existe nas informações coletadas. Por
procuradas muito mais junto à intenção do interlocutor de persuadir
isso, é importante que o pesquisador procure triangular suas análises
do que junto a significações pontuais de cada momento do discurso”
e seus exames com outras perspectivas ou com outros pesquisadores.
(p. 105). O terceiro enfoque busca desvendar as estratégias usadas pelos autores
Os grupos multidisciplinares de pesquisa, nesse sentido, podem ser
do discurso e os significados compartilhados pelos sujeitos em um grupo social,
extremamente úteis, pois permitem contemplar e ponderar as múltiplas
considerando o contexto social e histórico em que acontece o discurso.
interpretações que um mesmo fenômeno ou discurso pode ter.
Entre esses enfoques, desenvolveremos, aqui, apenas o terceiro; por
Se, de um lado, a subjetividade e a evidência podem, às vezes,
enganar o pesquisador, por outro lado, ele pode valer-se, numa análise
de conteúdo, das palavras e da frequência com que elas são usadas, das 1. Para conhecer melhor essa teoria, ver Perelman (1993).
142 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE SISTEMATIZAÇÃO E ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES 143

ser o mais apropriado aos estudos educacionais. do discurso;


À rigor, um discurso individual, que não se refira a um grupo 6) busca da estratégia do discurso.
social ou a alguma instituição, isto é, isolado do grupo social a que
pertence, não é pertinente à análise de discurso. Isso porque, segun- 3.1. A constituição do corpus de análise
do Rizzini, Castro e Sartor (1999), a “Análise do Discurso estuda os
processos discursivos característicos de um determinado grupo social Após concluir o trabalho de campo, vêm a seleção e organização
e deve interrogar-se sobre a articulação entre o processo de produção do material de análise. Para fazer isso, é necessário identificar e sele-
de um discurso, as condições em que ele é produzido e seus efeitos” cionar episódios, depoimentos ou partes de texto que tenham relação
(p. 100). explícita ou implícita com a questão investigativa. Os materiais que
O que caracteriza um discurso são suas condições de produção. restam dessa seleção devem ser arquivados e numerados para eventual
Isto é, o que é dito e o modo como se diz dependem do lugar social consulta durante o processo de análise.
que ocupa quem fala ou escreve algo e, também, daquele a quem dirige Após essa fase seletiva, caso o conjunto de material seja ainda
sua fala e sobretudo das intenções implícitas e explícitas. volumoso, pode-se proceder a uma segunda redução, a qual consiste
Como a análise de discurso tem por vocação básica a interpreta- em eliminar partes discursivas que forem repetitivas, redundantes ou
ção dos processos ideológicos subjacentes ao discurso, é recomendável de reforço de linguagem (como, por exemplo, “sabe o que eu estou
que o pesquisador tenha alguma experiência e leitura sobre processos querendo dizer; você me entende, não é mesmo?”).
ideológicos. Além disso, visando obter maior fidedignidade e riqueza A terceira fase seletiva é a mais difícil, pois consiste, primeira-
analítica, recomenda-se, também, que o exercício de interpretação do mente, na identificação de aspectos ou pontos de vista que podem ser
discurso seja feito em grupo, podendo ter, como parceiros, alunos, explorados durante a análise e, secundariamente, na seleção daquelas
professores ou colegas pesquisadores. Esse procedimento justifica-se opções fundamentais que dão coerência ao discurso. Ou seja, essa
porque os múltiplos olhares e interpretações sobre um mesmo discurso redução já é, em si, uma versão interpretativa do texto em análise.
podem fazer emergir aspectos que poderiam passar despercebidos para Nessa redução, pode-se também abandonar aqueles aspectos sobre
um único pesquisador. os quais o pesquisador não tem domínio teórico.
Existem alguns procedimentos técnicos que favorecem a rea-
lização da análise de discurso; assim Rizzini, Castro e Sartor (1999,
3.2. Procura do autor do discurso e de sua intenção
p. 101) destacam e descrevem seis momentos na elaboração da análise
de discurso:
É preciso, na análise de discurso, deixar claro quem são os au-
tores do discurso, para quem falam e por quê. Às vezes, o autor do
1) constituição do corpus de análise;
discurso pode não ser aquele que fala. Outra possibilidade é esconder
2) procura do autor do discurso e de sua intenção;
a autoria, usando para isso expressões do tipo “alguém disse que...”.
3) identificação dos temas ou argumentos do discurso;
Rizzini, Castro e Sartor (1999) ilustram isso utilizando um es-
4) identificação do tipo de discurso;
tudo envolvendo o diálogo entre meninas de rua:
5) produção de um intertexto que expresse a coerência interna
144 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PROCESSO DE SISTEMATIZAÇÃO E ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES 145

AM - Eu não acho não.. também tem umas mulheres que sai com um aqui Orlandi (1987) identifica três tipos de discurso: autoritário,
e outro ali, esses papos já não é comigo. lúdico e polêmico.
P — Você acha que a mulher não tem direito de ter outros parceiros? O discurso autoritário é aquele em que o falante se coloca num nível
AM — Não. Sabe por causa de que... se a mulher sai com um aqui outro ali superior, de modo que somente sua fala interessa ou é valorizada. À
é chamada de piranha... aí, se o homem saiu com uma aqui outra ali, ele já polissemia — quando há mais de uma interpretação ou significação para
não é chamado de nada. Porque é homem. uma mesma palavra ou objeto de discurso — é rechaçada a qualquer
custo, não havendo possibilidade de reversibilidade. Esse é o típico
Análise: A menina não toma como sua a afirmação de que mulher que discurso de um professor tradicional aos seus alunos.
sai com vários é piranha. Ela usa uma indeterminação para sua afirmação O discurso lúdico acontece quando todos os falantes se encontram
(CASTRO, 1998, apud RIZZINI, CASTRO, SARTOR, 1999, p. 109). num mesmo nível hierárquico e admitem várias significações e interpre-
tações, resultando disso a polissemia aberta. Nesse tipo de discurso,
3.3. Identificação dos temas ou argumentos do discurso os falantes têm facilidade para mudar seus pontos de vista.
O discurso polêmico acontece quando os interlocutores procuram
Após identificar o autor do discurso, procura-se levantar os chegar a um consenso ou acordo, de modo que a polissemia tenda a
argumentos ou temas relevantes utilizados estrategicamente por ele ser controlada. A negociação de significados, às vezes, pode tornar-
para atingir seus objetivos. Entretanto, nem todos os temas e argu- -se calorosa e polêmica, prevalecendo a opinião ou significação do
mentos manifestos no discurso são aproveitáveis, uma vez que devem interlocutor com maior conhecimento ou argumentação.
ser considerados apenas aqueles que têm relação direta com a questão
investigativa. 3.5. Produção de um intertexto que expresse a coerência
Por exemplo, se, durante uma atividade em sala de aula, o pes- interna do discurso
quisador estiver interessado em investigar os significados produzidos
pelos alunos em relação aos entes algébricos, ele deve considerar o O falante nunca é totalmente explícito, qualquer que seja o contexto
significado que cada um deles dá ao sinal de igualdade e às incógnitas, discursivo. Por exemplo, mesmo em contextos familiares, o falante pode
e não verificar se o aluno acertou a resolução da equação. omitir algumas palavras sem que, com isso, prejudique a comunicação e sua
compreensão. Segundo Rizzini, Castro e Sartor (1999), “basta a menção a
3.4. Identificação do tipo de discurso algum aspecto compartilhado para obtermos a compreensão do outro”. Em
contrapartida, se o contexto da fala for marcado pelas diferenças sociais e
O tipo de discurso produzido por alguém depende: do lugar culturais, com maior razão nem tudo pode ser dito de maneira explícita.
e posição de quem fala; do tipo de interlocução que estabelece com Assim, “Se o falante precisa dizer aquilo que não pode ser dito, ele arruma
os outros; das condições de sua produção; e de suas finalidades. Por uma forma implícita para dizer. À linguagem, mesmo na comunicação,
exemplo, dependendo do modo como o professor fala, podemos dizer nunca é explícita, se fosse, não haveria lugar para a Análise do Discurso”
que ele fala como se fosse o único “dono da verdade”. (RIZZINI; CASTRO; SARTOR, 1999, p. 104-105).
146 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

CAPÍTULO * OITO
Nesse caso, a análise de discurso consiste em revelar as motiva-
ções ou intenções subjacentes ao discurso, explicitando por que algo
foi dito daquela maneira, para o outro, naquele momento. Para isso, O
pesquisador produz um intertexto — isto é, um novo texto — no qual REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA
explica o texto analisado, favorecendo, assim, uma melhor compreen-
são do discurso analisado.

3.6. Identificação da estratégia do discurso

A identificação da estratégia utilizada pelo autor do discurso é


o principal objetivo da análise do discurso. Mais que os significados, a
análise de discurso busca o que dá “inteligibilidade e organização ao
discurso”. O pesquisador experiente, entretanto, sabe que “existem
formas de falar peculiares a cada grupo social, maneiras pelas quais este 1. COMO COMEÇAR A REDAÇÃO?
grupo entende mais facilmente o que está sendo dito” (ibidem, p. 105).
Por exemplo, a forma de falar dos matemáticos é diferente da
C oncluídas a revisão bibliográfica, a coleta e a análise-interpretação
forma de falar dos pedagogos. Do mesmo modo, a prática discursiva
inicial dos dados, o pesquisador passa a preocupar-se com a reda-
dos alunos índios em aula é muito diferente da prática discursiva dos
ção do relatório final da pesquisa. Bogdan e Biklen (1994) dizem que
alunos urbanos.
os investigadores novatos tendem a adiar continuamente essa tarefa.
Arrumam mil desculpas antes de começar a redigir. Mesmo quando se
sentam para fazê-lo, encontram algo que os distraem, como, por exem-
plo, tomar um cafezinho, apontar o lápis, ir ao banheiro, beber água,
ler mais algum texto, reler mais uma vez os registros de campo etc.
Escrever, de fato, não é tarefa fácil. Exige esforço, disciplina e
decisão para começar de maneira efetiva e contínua. É um desafio não
só para novatos, mas também para pesquisadores experientes. Além
da dificuldade de escrever, o pesquisador precisa estar ciente de que
a redação de uma pesquisa não acontece somente no final. Durante
todo o processo de pesquisa, o pesquisador produz anotações de
campo, redige revisões bibliográficas e registra comentários, reflexões,
interpretações e análises.
MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 149
148 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO

nda Judith Bell (1997, p 7) Solicite ao seu orientador ou a algum colega para ler e ajudar
Tomando por base o que recome
. 186-
i

Ópri ncia na orie


iênci ã de dissertações e teses,
i ntação na revisão do texto. Caso isso não seja possível, deixe o texto,
de orientações que podem cont
r buir após ter sido concluído, “dormir” por um ou mais dias. Ao
apresentamos, f à seguir, uma série
da pesquisa: retomá-lo, com mais distanciamento, perceberá o que não
para o desenvolvimento da redação
está bem redigido e que necessita ser reescrito ou comple-
textual e mentado. Uma outra forma interessante e que pode favorecer
1) Esboce uma ou mais alternativas de organização
nn a revisão é a leitura do texto em voz alta e, se possível, por
discuta-as com o orientador ou colega.
um so cio outra pessoa.
2) Tendo decidido por uma das alternativas, elabore
. ' moor
ou cronograma de trabalho, fixando prazos e datas
nte O percurso, é
esse roteiro possa ser alterado dura 2. COMO ORGANIZAR O RELATO DE PESQUISA?
vista do pesquisa xr des
niente que ele esteja sempre à
o. Para isso é desciáve es
3) Redija com regularidade e ritm Ao esboçar uma organização textual para o relato da pesquisa,
o processo y
um ambiente reservado que favoreça o investigador depara-se com o seguinte desafio: como organizar, a
. Fixe horários diários So
e que evite interrupção de trabalho partir dos materiais até então produzidos e escritos, um texto que seja
nte próximos u os
semanais de trabalho, e suficienteme teórica e metodologicamente coerente e consistente e que tenha
um
do. Evite o
outros, criando um ritmo apropria fio condutor? Como a própria pergunta indica, a elaboração do relato
o. É preferíve : =” ão
redação para reler um livro ou artig final pressupõe que o pesquisador, durante o processo de pesquisa, já
do, nesse mom o, cem
ao seu pensamento, não se importan tenha produzido uma série de registros e textos escritos contemplando
Faça à leitura e renso
a qualidade ou precisão da redação. discussões teóricas, descrições, análises e interpretações.
o a primeira versã er
do texto somente após ter terminad Temos constatado, em várias dissertações e teses, uma certa
à redação por um períoco
ta. Além disso, evite interromper confusão entre processo de pesquisa e forma de organizar seu relato
o embalo, leva-se mu
prolongado, pois, além de perder final. Embora essas duas etapas sejam indissociáveis, cada uma delas
ritmo. io de sabalho
tempo para entrar novamente no possui sua própria lógica e dinâmica. O relatório de pesquisa não neces-
es o seu p ano e ne ,
4) Divulgue aos seus amigos € familiar sariamente precisa seguir ou reproduzir os mesmos passos do processo
pelas possíveis ausên =
solicitando apoio e compreensão desenvolvido durante a realização da investigação. Lembramos, entre-
é inevitável, pare rum PO no
5) Quando a interrupção da escrita tanto, que o texto final deve apresentar e descrever esse processo, isto
e um gancho que ac Ve
em que seja fácil retomá-la ou deix é, explicitar a linha de inquérito, sobretudo o histórico da construção
rnativa é terminar a pare
a retomada da redação. Uma alte e desenvolvimento da pesquisa, não se limitando apenas a descrever
comentários sobre como v
interrompida com alguns aqueles aspectos metodológicos esboçados no projeto inicial. Deve
|
dia continuar o texto. apresentar, até mesmo, as dificuldades, as hesitações, os insucessos é
espaço entre as linhas para
6) Deise uma boa margem e um bom os imprevistos ocorridos durante o percurso. Essa descrição ajuda a
isãão manuscrita
e revis i d o texto.
ter lugar para complementação
ã dar credibilidade e sustentação aos resultados obtidos com o estudo.
150 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 151

Existem diferentes formas. de organizar um relatório de pesquisa. Quanto aos relatos que seguem o modelo clássico de apresen-
Os relatórios clássicos tendem, normalmente, a separar em capítulos tação, em capítulos separados, do problema, do referencial/revisão
próprios: formulação/discussão do problema; revisão bibliográfica e/ bibliográfica, da descrição da metodologia de pesquisa, da análise/
ou referencial teórico; metodologia de pesquisa; pesquisa de campo; interpretação e das conclusões; também encontramos, com frequência,
análise e discussão de resultados e conclusões. Hoje, entretanto, já problemas tais como: ausência de um fio condutor percorrendo todos
encontramos relatos que rompem com essa tradição, pois o leitor os capítulos; descontinuidade ou desconexão entre referencial teórico
poderá encontrar exposições organizadas textualmente de forma mais e a análise/interpretação dos dados; falta de diálogo entre literatura
artística ou reflexivo-narrativa, nas quais a teoria, os procedimentos revisada (ou referencial teórico) e o objeto de estudo etc. Essa forma
metodológicos e a análise-interpretação são tecidos organicamente fragmentada de apresentar o relato tende, também, a produzir resul-
juntos. É quando o pesquisador exerce sua própria arte de apresentar tados e conclusões pouco consistentes.
seus achados.
A forma do relato depende, também, do público ao qual ele se
destina. Este último modo de relatar e divulgar a pesquisa, por exemplo, 3. MODALIDADES DE RELATOS DE PESQUISA
pode ser apropriado para relatos destinados a professores escolares,
pois, por possuir um estilo reflexivo-narrativo, facilita a comunicação Existem várias modalidades de apresentação escrita de investi-
e pode contemplar melhor a relação teoria/prática. Além disso, esse gação. As principais são:
tipo de relato busca contemplar com mais autenticidade os múltiplos
aspectos e fatores que constituem a complexidade das práticas edu- e Monografia: trata-se de relato de estudo sobre um só tema!,
cativas, fazendo emergir o sentido educativo das ações, articulando devidamente especificado e delimitado, configurando-se como
dimensões contextuais, sociais, políticas, culturais e emocionais. Como um trabalho de iniciação à pesquisa. A monografia, como
exemplo, citamos as teses de doutorado de Guérios (2002), Pinto trabalho de conclusão de curso, geralmente é uma exigência
(2002) e Jaramillo (2003). dos cursos de especialização. Em alguns casos, ela é solicitada
Consideramos, entretanto, esse modo de relatar uma pesquisa como trabalho final de conclusão de curso de licenciatura.
muito mais difícil que o primeiro, pois exige do pesquisador capacidade e Dissertação de mestrado: é um relato de trabalho de pesquisa
de síntese e um domínio orgânico da relação teoria/prática. Talvez essa realizada mediante um processo metódico de construção
seja a razão pela qual essa forma tem sido frequentemente questionada e tratamento de um problema ou questão de investigação,
pela tradição acadêmica com críticas muitas vezes procedentes, pois essa versando sobre um tema único e delimitado.
forma pode esconder a ausência de cuidado e rigor teórico-metodológico
no tratamento do material de análise. Argumenta-se que o trabalho final, t. Alguns pesquisadores entendem, equivocadamente, que o radical “mono” da
nesse caso, deixa de ser de uma pesquisa, aproximando-se da forma de palavra monografia indica que o trabalho deve ser individual. Esse radical, na ver-
dade, indica que se trata de um estudo sobre um único assunto, sobre um único
um relato de experiência. Esse é o perigo dessa forma de organizar e relatar problema, sendo um trabalho devidamente especificado e delimitado. Ou seja,
a pesquisa. um trabalho monográfico pode ser elaborado por mais de um autor.
152 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 153

Tese de doutorado ou de livre-docência: é um relato de trabalho de expositor e dê uma ideia panorâmica de seu conteúdo, deve
pesquisa que, além de conter as características de uma pesquisa apresentar também, de forma tópica, elementos relativos à
de mestrado, deve ser um estudo original e apresentar um trata- questão ou aos objetivos do estudo, o foco conceitual, o mé-
mento teórico mais aprofundado que o do mestrado, trazendo todo de pesquisa e resultados/conclusões principais. Porém,
uma contribuição efetiva para o conhecimento da área. há de se ter cuidado para não sobrecarregar o pôster com
Artigo científico: é um
Z
relato de pesquisa mais sucinto que informações, uma vez que estas devem ser lidas à distância.
os anteriores e é elaborado com o intuito de submetê-lo à e Resenha: resenha de um texto ou de uma pesquisa consiste em
publicação em revistas e periódicos ou à apresentação em uma síntese de suas principais ideias acrescida de comentá-
congressos. O pesquisador, tendo uma limitação no ná- rios, interpretações, análises e críticas de quem a elabora.
mero de páginas, procura dizer o essencial, com estilo claro e Ou seja, a resenha não significa o resumo de um estudo; ao
conciso, dando destaque à problemática do estudo, à questão e contrário, ela exige um posicionamento do resenhista em
aos objetivos da investigação, à constituição teórica do estudo relação às ideias principais do texto ou estudo. À resenha
(discussão conceitual dos termos básicos), aos procedimentos contém, além disso, informações sobre o(s) autor(es) e as
metodológicos utilizados na coleta e na análise/interpretação de réferências bibliográficas.
dados, às conclusões obtidas e às contribuições do estudo para a
prática profissional e para o avanço do conhecimento. Completam
o artigo as referências bibliográficas (apenas aquelas citadas no 4. ESTRUTURA GERAL DE MONOGRAFIA,
texto). DISSERTAÇÃO OU TESE
Comunicação científica: é um relato oral de pesquisa, apresentado
em sessões coordenadas em congressos e seminários, haven- De um modo geral, a apresentação dos trabalhos científicos,
do geralmente um tempo de 15 a 20 minutos de exposição, segundo a Associação Brasileira de Normas e Técnicas (ABNT, 2002a),
seguido de debate. Pode-se usar como apoio visual para a co- tem a seguinte estrutura:
municação a projeção de imagens por meio de transparências
ou de slides com o PowerPoint. A exposição deve ser sucinta Pré-texto:
e clara, dando destaque à problemática, à questão e aos obje- Capa [obrigatório];
tivos da investigação, à discussão teórica, aos procedimentos Folha de rosto [obrigatório];
metodológicos utilizados na coleta e na análise/interpretação Catalogação na fonte [opcional],
de dados, às conclusões obtidas e às contribuições do estudo. Errata [opcional];
Pôster: é um relato de pesquisa ou experiências por meio de Folha de aprovação [obrigatório];
exposição de cartazes ou banners. Estes devem dar destaque Dedicatória(s) [opcional];
visual para as ilustrações, gráficos ou esquemas. Entretanto, Agradecimento(s) [opcional];
para que o pôster não dependa da presença obrigatória do Epígrafe [opcional];
154 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 155

e Resumo na língua vernácula [obrigatório], Exemplo de capa:


* Resumo em língua estrangeira [obrigatório];
* Lista de figuras [opcional],
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
e Lista de tabelas [opcional];
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
e Lista de abreviaturas e siglas [opcional],
* Sumário [obrigatório].
Texto: Carmen Lúcia Brancaglion Passos
* Introdução;
* Desenvolvimento;
* Conclusão.
Pós-texto:
AS REPRESENTAÇÕES MATEMÁTICAS DOS ALUNOS
* Referências [obrigatório];
DO CURSO DE MAGISTÉRIO E SUAS POSSÍVEIS
* Obras consultadas (e não citadas no texto)? [opcional], TRANSFORMAÇÕES: UMA DIMENSÃO AXIOLÓGICA
e Glossário [opcionall,
* Apêndices [opcional];
* Anexos [opcional];
e Índices (analítico, onomástico, remissivo) [opcional]. Campinas

1995
A seguir, ilustramos e descrevemos as principais partes dessa
estrutura.

5.2. Folha de rosto (obrigatório)


5. CONSIDERAÇÕES E EXEMPLOS RELATIVOS AO PRÉ-TEXTO Devem constar, na sequência: nome do autor; título do trabalho,
natureza (monografia, dissertação, tese...), objetivo (trabalho apresen-
tado com a finalidade de...), nome da instituição a que foi submetido
5.1. Capa (obrigatório)
e área de concentração; orientador; cidade, e ano de defesa.
Exemplo de folha de rosto:
Devem constar, de cima para baixo, os seguintes elementos:
nome da instituição; nome do autor; título e subtítulo; número do
volume (se tiver mais de um); cidade da instituição em que o trabalho
foi apresentado; ano de defesa.
3. Algumas instituições, como é o caso da UNICAMP, aceitam reunir numa mesma
2. Colocar em uma lista separada das Referências e também em ordem alfabética. página a folha de rosto e a folha de aprovação.
156 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 157

5.4. Folha de aprovação (obrigatório):


Rosana Giaretta Sguerra Miskulin

Devem constar, observando-se a sequência: nome do autor;


título do trabalho; natureza, objetivo, nome da instituição, área de
CONCEPÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS concentração; data de aprovação; titulação e assinatura dos compo-
SOBRE A INTRODUÇÃO E A UTILIZAÇÃO DE nentes da banca e instituições a que pertencem.
COMPUTADORES NO PROCESSO
ENSINO/APRENDIZAGEM DA GEOMETRIA
MARIA LAURA MAGALHÃES GOMES

QUATRO VISÕES ILUMINISTAS SOBRE


Tese apresentada a FE/Unicamp como exigência parcial para a A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA:
obtenção do título de doutor em Educação, na Área de DIDEROT, D'ALEMBERT, CONDILLAC E CONDORCET
Concentração em Educação Matemática.

Maria Laura Magalhães Gomes submetida à FE/Unicamp para


Orientador: Prof. Dr. Sérgio Lorenzato. ão: Ed ão M: áti
obtenção do título de doutor em Ed
tendo sido aprovada, em 02/04/2003, pela seguinte Banca
Examinadora:

Campinas
1999 Prof. Dr. Antonio Miguel (FE/Unicamp) [ori dor]
Prof. Dr. Dario Fiorentini (FE/Unicamp)
Prof. Dr. Gert Schubring (Univ. de Bielefeld)

5.3. Ficha de catalogação na fonte (colocada no verso Prof.


Prof.
Dr.
Dr.
João Pitombeira de Carvalho (PUC-RJ)
Roberto Romano (IFCH/Unicamp),

da folha de rosto) (obrigatório):


Exemplo de catalogação na fonte elaborada pela biblioteca da 5.5. Elaboração do resumo
Faculdade de Educação da UNICAMP*.
Um problema frequente em relação à divulgação da pesquisa
Lopes, Jairo de Araújo.
L881L Livro didático de Matemática: concepção, seleção e
é a elaboração do resumo. Em nossos estudos sobre o estado da arte
da pesquisa brasileira em educação matemática (EM), temos notado
possibilidades frente a descritores de análise e tendências em
Educação Matemática. Jairo de Araújo Lopes. — Campinas.

nos resumos a ausência de informações essenciais de um estudo, não


SP: [s.nJ, 2000.

Orientador: Sergio Lorenzato.


Tese (doutorado) — Universidade Estadual de Campinas,
Faculdade de Educação. dando, assim, uma ideia clara ao leitor sobre seu conteúdo e forma
A Matemática
— Estudo e ensino. 2, Livros didáticos - de realização.
Avaliação. 3. Educação Matemática. 1. Lorenzato, Sergio. há
Ea Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação.
. Título.
Um resumo deve descrever de maneira concisa:

4. Para a elaboração da catalogação na fonte, solicite este serviço ao bibliotecário * o objeto de estudo (objetivos ou questão diretriz, foco do
de sua instituição.
estudo e aportes teóricos e metodológicos que o sustentam);
158 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 159

* como ele foi realizado (onde, com quem, como os dados 6. PARTES PRINCIPAIS DE UM RELATO DE PESQUISA
foram coletados, como a análise foi desenvolvida);
* e quais foram os resultados mais importantes. Ao organizar o relato da pesquisa, o pesquisador deve destacar,
não necessariamente nessa ordem, o problema e/ou questão fundamen-
Cabe, no entanto, observar que parece existir uma relação tal de investigação, os objetivos, os aspectos teóricos e conceituais que
bastante direta entre resumos mal elaborados e a fragilidade teórico- embasam o estudo, os procedimentos de coleta e análise/interpretação
-metodológica do estudo. dos dados, os resultados obtidos e a conclusão. Mas, lembramos mais
A título de exemplo, apresentamos, a seguir, o resumo de uma uma vez ao leitor, não existe um modelo único de organizar esse relato.
tese de doutorado: É importante que o pesquisador, ao iniciar o relato da pesquisa,
verifique se a publicação e divulgação se destinam à comunidade de
Moura, A. R. L. A medida e a criança pré-escolar. 1995. 210f. Tese (Doutorado
em Metodologia do Ensino) — Faculdade de Educação, Universidade Estadual de
educadores matemáticos ou à sociedade em geral. Se o relato se destina
Campinas, Campinas. à comunidade científica, a construção teórica e conceitual do objeto
Este trabalho estuda as ações de medir de crianças pré-escolares, em situações de estudo passa a ser fundamental, buscando estabelecer uma relação
interativas de ensino, em que são submetidas a situações-problema que envolvem
lógica e coerente com a parte empírica (relativa ao trabalho de campo
a necessidade de medir o espaço unidimensional. A metodologia fundamenta-se numa
perspectiva etnográfica com enfoque participativo. O estudo se baseia numa análise e à análise/interpretação dos dados) de modo que produza conclusões
interpretativa das noções que são manifestas em episódios de ensino, transcritos firmes e consistentes.
de registros videográficos das atividades de ensino e pesquisa. Para a elaboração
das atividades considerou-se a gênese da medida unidimensional e, para a análise Alguns manuais de metodologia da pesquisa chegam a sugerir
interpretativa, aspectos matemáticos e aspectos educacionais com enfoque na teoria uma distribuição aproximada do espaço destinado para cada uma das
sócio-histórica. Da análise dos episódios, ficou evidenciado como as crianças elaboram
os três aspectos que constituem a ideia matemática da medida: a seleção da unidade
partes do relato de pesquisa. Martínez Miguélez (1998, p. 108), por
de medida, a comparação da unidade com a grandeza a ser medida e à expressão exemplo, sugere, para o caso de um artigo científico, a distribuição
numérica da comparação. Foram levantadas, também, conjecturas sobre possíveis
percentual que consta no Quadro 3.
contribuições de elementos educacionais e de elementos emergentes da estrutura da
atividade na formação dos processos de medir. Para o caso da escrita de monografia, dissertação ou tese, apre-
Palavras-chaves: Educação Infantil; conceito de medida; educação conceitual. sentamos, a seguir, alguns detalhes importantes. Uma sugestão inicial
é redigir, por último, o sumário, a introdução/apresentação e o título,
uma vez que, ao longo da pesquisa, relações e fatos novos poderão
surgir e modificar as posições iniciais.
Pelas normas da ABNT (2002a), o resumo pode conter, no
máximo, 500 palavras e deve ser escrito em um único parágrafo, com
letra tamanho 12, com recuo de 0,5 cm de cada lado, sem uso de itá-
licos, aspas, recuo e com espaçamento simples entre as linhas. Após o
resumo, devem constar de três a cinco palavras-chave.
160 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 161

QUADRO 3: DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL * uma breve descrição dos procedimentos de coleta e análise
DAS PARTES DE UM RELATO DE PESQUISA dos dados;
* e uma pequena descrição da estrutura do texto dissertativo,
Partes do relato % do espaço
1. Objetivos do estudo
destacando o que será tratado em cada capítulo.
5
2. Orientação (ou pressupostos) epistemológica 5
3. Marco teórico e conceitual 20
A introdução, segundo Severino (1978, p. 87), deve esclarecer
4. Desenho geral da pesquisa 10 o leitor sobre a natureza e o teor do estudo. Por isso, adverte, “deve
5. Seleção, descrição e situação dos sujeitos e participantes 10 ser sintética e versar única e exclusivamente sobre a temática do traba-
6. Experiência e papel do pesquisador no trabalho de campo 5 lho, evitando os intermináveis retrospectos históricos, a apresentação
7. Estratégias de coleta de dados 10 precipitada dos resultados e os discursos grandiloquentes”.
8. Categorização, análise e interpretação 25 Se o pesquisador preferir uma apresentação mais simples e rápida
9. Resultados, conclusões e implicações 10 do trabalho, sem antecipar elementos da discussão teórica e conceitual
Total 100 e também do método de pesquisa utilizado, pode chamar essa parte
introdutória de apresentação.

6.1. Introdução ou apresentação


À introdução visa apresentar o tema de estudo ao leitor, situando-o 6.2. Desenvolvimento
brevemente ante o que já foi investigado e escrito sobre ele, desta-
Trata-se do corpo central do trabalho e pode ser organizado
cando, sobretudo, o problema, os objetivos e os procedimentos do
ou estruturado de acordo com a conveniência da exposição e com a
trabalho. Ou seja, a introdução apresenta uma ideia clara ao leitor do
construção lógica do trabalho. Os capítulos e seus subtítulos devem
que trata o estudo. Por isso, recomenda-se que a introdução contenha
ser claros e expressivos, dando a ideia mais exata possível do conteúdo
de forma concisa:
que cada uma dessas partes contém.
Na constituição desse corpo central do estudo é imprescindível
* asrazões e os interesses que levaram o autor a direcionar sua
ter presente o fio condutor em torno do qual esta parte será tecida. É
atenção sobre o tema escolhido. Isso, em alguns programas
esse fio que dará unidade econsistência ao estudo.
de pós-graduação, é realizado junto a um pequeno memorial
Embora existam várias formas de desenvolver a parte central
(de experiências e/ou de leituras) do autor, tendo como eixo
do trabalho, apresentamos e descrevemos ao leitor apenas uma delas:
organizador o tema de estudo;
* a relevância do tema e do problema para o campo da EM;
* a questão central da pesquisa e/ou seus objetivos;
e começar pela revisão bibliográfica sobre o tema e o problema.
Essa revisão não consiste em fazer um resumo do que diz cada
* alguns pressupostos, sobretudo teóricos, conceituais e epis-
autor ou texto. Cabe buscar em cada autor apenas aqueles
temológicos, que embasam o estudo;
162 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 163

aspectos essenciais e relativos ao foco do estudo, tentando aspectos mais relevantes, evitando a simples reprodução do
estabelecer um diálogo com o seu objeto de pesquisa. É que nela consta. Para a discussão dos resultados convém tomar
importante que, nessa revisão, o pesquisador explicite sua como foco central a questão investigativa e as hipóteses
posição pessoal — de concordância ou não — sobre o que iniciais e tentar estabelecer um diálogo confrontando as
dizem os estudos revisados; evidências empíricas, obtidas pelo trabalho de campo, com
a seguir, (re)apresentar as questões investigativas iniciais, o que diz a literatura.
ressignificando-as, agora, perante a literatura e os resultados
dos estudos já realizados; Um bom estudo qualitativo, segundo Bogdan e Biklen (1994),
estabelecer uma discussão teórica e conceitual dos termos e aspectos “é documentado com boas descrições provenientes dos dados para
fundamentais do estudo. Essa discussão pode ser realizada ilustrar e substanciar as asserções feitas”. Não existe, entretanto, uma
concomitantemente à revisão bibliográfica e torna-se deci- convenção ou norma que estabeleça o que é verdadeiro em um estudo
siva na delimitação e configuração dos avanços teóricos que qualitativo. À tarefa do pesquisador
a pesquisa pode trazer;
descrever a concepção e o desenvolvimento do trabalho de campo, deta- é convencer o leitor da plausibilidade do que expõe. Citar os sujeitos e
lhando a forma e os critérios da seleção dos sujeitos ou parti- apresentar pequenas secções das notas de campo e de outros dados ajuda
cipantes da pesquisa, situando-os em seu contexto de ação e a convencer o leitor e a aproximá-lo das pessoas que estudou. Ás citações
caracterizando-os ante outros sujeitos e participantes. Caso a não só descrevem as afirmações dos sujeitos, como também a forma como
pesquisa não seja de campo, o pesquisador também deve des- as transmitiram e a sua maneira de ser (p. 252).
crever a concepção e a forma de desenvolvimento da pesquisa,
detalhando o processo de constituição dos experimentos (no Assim, nas pesquisas em abordagem qualitativa, existem várias
caso de pesquisa de laboratório) ou dos documentos selecio- formas de organizar e apresentar os dados de uma investigação. Exem-
nados para estudo (no caso de pesquisa bibliográfica); plos dessas formas o leitor poderá encontrar em Bogdan e Biklen (1994,
descrever o modo como os dados foram coletados e o papel desem- p. 250-257). Apresentamos aqui apenas algumas delas nas quais são
penhado pelo pesquisador, informando sua experiência prévia articulados aspectos gerais (regularidades, aspectos comuns entre os
nesse tipo de pesquisa; sujeitos) e particulares (o que é característico de cada sujeito):
após estabelecer e descrever o material que constituirá a
documentação básica de análise, descrever e apresentar o processo 1) articular, num mesmo parágrafo, citações dos sujeitos (par-
de categorização, análise e interpretação dos dados; ticular) e descrições e análises, dos mesmos (geral), feitas
finalmente, apresentar e discutir os principais resultados obtidos. Esse é pelo pesquisador;
o coração do relatório. À apresentação dos resultados compreende 2) fazer uma afirmação geral (ou destacar uma regularidade
tabelas, figuras e textos descritivos e ilustrativos. Ao comen- presente em vários sujeitos) e ilustrar com vários exemplos
tar ou analisar os dados de uma tabela, deve-se enfatizar os ou depoimentos (particular);
164 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 165

3) apresentar um depoimento ou exemplo e completá-lo com incluir as hipóteses que não foram comprovadas, indicando assim novas
uma interpretação concludente; conjecturas, novos rumos para a continuidade da pesquisa.
4) incorporar, numa mesma narrativa, o diálogo ocorrido e a Nenhuma pesquisa é definitiva. Por isso, dependendo da natu-
descrição. O leitor tem a sensação de ouvir uma história reza da pesquisa e de seus resultados, o título “conclusões” pode ser
que lhe contam, ficando muito próximo do material de es- substituído por “considerações finais”. Mas, qualquer que seja o caso,
tudo. Nesse caso, os dados são incorporados diretamente o texto dissertativo deve possuir um fecho, que inclui sinteticamente
no texto, sendo parte integrante dele. Ou seja, as citações os resultados da pesquisa e aponta novas direções ou recomendações.
e as descrições extraídas das entrevistas não são isoladas ou
apresentadas separadamente.

7. AS NORMAS TÉCNICAS DE REDAÇÃO


6.3. Conclusão
À primeira preocupação com a redação deve ser referente à
A conclusão não consiste apenas em uma tentativa de síntese fidelidade de transcrição das informações coletadas, principalmente
do trabalho desenvolvido. Nela são apresentados, além das limitações se foram obtidas oralmente. Essa questão, além de contemplar um
e dificuldades encontradas durante o processo de investigação, os cuidado ético, diz respeito à cientificidade da pesquisa, pois, uma
principais resultados obtidos, dando-se destaque especial ao que eles vez deturpado o significado original e verdadeiro emitido pela fonte,
representam em relação: todas as interpretações e análises decorrentes estarão comprometidas.
Em relação à redação propriamente dita, convém lembrar que
* às contribuições para a ressignificação da teoria ou para o existem dois determinantes: um é o estilo pessoal do autor; o outro
desenvolvimento da área de conhecimento em EM; é o conjunto de normas propostas pela ABNT para redação técnico-
* ao desenvolvimento da prática profissional, apontando-se -científica. E sobre esse segundo determinante que dedicaremos nossa
alguns indicativos de ação; atenção, a seguir.
* à necessidade de desenvolvimento de outros estudos sobre
a problemática investigada.
7.1. Citações de autores ou obras no texto
Nessa fase final, é importante que o pesquisador retome a ques-
tão central da investigação e, ainda que os resultados possam surgir Desde seu planejamento, toda pesquisa leva o investigador a
durante o desenvolvimento da pesquisa, sobretudo durante o processo consultar trabalhos publicados, os quais devem ser citados em respeito
de análise ou interpretação, agora os (re)apresente com ênfase, bus- à ética e à autoria intelectual das ideias ou dos resultados de pesquisa.
cando um esforço de síntese. Essas considerações finais constituem-se Além disso, as fontes e os documentos escolhidos pelo pesquisador
numa resenha concisa a que chegou o pesquisador e devem também constituem-se num forte indicador da qualidade da filiação teórica
de seu trabalho. Mas há de se ter cuidado com as citações. O uso
166 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 167

excessivo de citações pode prejudicar a fluência do texto e descarac- tamanho da letra, lembrando da necessidade de indicar o
terizar a constituição de um pensamento próprio. Usamos citações autor, data e a página.
para esclarecer ou sustentar uma ideia. Mas só vale a pena utilizar uma Exemplo:
determinada citação se ela, de fato, ajuda a dar movimento e fluência
Além de reconceituarem o saber docente, Fioren-
ao texto. Caso contrário, é preferível omiti-la.
tini et al. (1999, p. 55) conceituam saberes experienciais
A inclusão de citações ou referências a outros estudos ou tra- como sendo “saberes práticos, ligados à ação, mesclando
balhos deve, necessariamente, obedecer às recomendações da ABNT aspectos cognitivos, éticos, emocionais e afetivos”.
(2002b), podendo aparecer de várias formas:
b) Citação indireta: ocorre quando se faz comentário, referência, re-
a) Citação direta: sumo de uma ideia ou de um texto, usando palavras diferentes
* transcrição literal de parte do texto de um autor com quatro ou mais linhas: das utilizadas pelo autor citado. Deve ser apresentado sem
deve vir destacado do texto, recuado 4cm da margem esquer- aspas e a referência ao autor pode ser feita de duas formas:
da (ou por 2 tab de computador), sem aspas e sem itálico, entre no início do comentário ou fraseamento, apresentando o so-
linhas com espaçamento simples e fonte de tamanho 10. Após brenome do autor (em caixa baixa, com exceção da primeira
a citação segue, entre parênteses, o(s) sobrenome(s) do(s) letra), seguido apenas da data entre parênteses;
autor(es), em caixa alta, seguido da data e da página da qual ou no final do comentário, colocando, entre parênteses, o so-
foi retirada a citação. brenome do autor (em caixa alta) e a data, sem indicar a página.
Exemplo: Exemplos:
Larrosa (1996) postula que a experiência não pode
A concepção de saber docente e de prática pedagógica
ser planejada de modo técnico como um experimento. A
reflexiva, abordada neste artigo, desafia o professo-
experiência comporta a incerteza, pois os acontecimentos
rado a, de um lado, possuir uma atitude crítica em
são emergentes e, portanto, não são programáveis, con-
relação à prática pedagógica e aos conhecimentos his-
troláveis e nem submetidos a leis de causa e efeito.
toricamente produzidos e, de outro, constituirem-se,
Por isso, uma mesma atividade pode ser uma expe-
juntamente com seus colegas escolares ou universi-
riência para uns e não ser para outros (LARROSA, 1996).
tários, como principais responsáveis pela produção
de seus saberes e pelo desenvolvimento curricular de
sua escola com base na investigação (FIORENTINI;
Citação de citação: trata-se de transcrição de trecho de obra (ou
SOUZA JR.; MELO, 1998, p. 16).
documento) à qual não se teve acesso direto, mas apenas in-
* transcrição literal de parte do texto com menos de quatro linhas: para diretamente por citação presente em outro trabalho utilizado
transcrições literais com menos de quatro linhas, o recuo como fonte pelo pesquisador. Embora França (2001, p. 109)
não deve ser utilizado, devendo a parte transcrita vir inserida
junto ao texto e entre aspas (ou em itálico), sem redução do 5. Estes exemplos foram extraídos da tese de doutorado de Guérios (2002, p. 172).
168 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 169

recomende que “todo esforço deve ser empreendido para se Exemplo:


consultar o documento original”, pode-se, nesse caso, utilizar
tanto a expressão portuguesa citado por quanto a versão latina UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, 1987, p. 34
Id., 2001, p. 21.
apud (que significa “citado por”).
Exemplo 1 (citação indireta):
* ibid. ou ibidem (significa “na mesma obra”) é utilizada para -
Ponce (1982), citado por Silva (1994), declara que
citar o mesmo autor e obra já referidos na citação anterior,
instrução, no sentido moderno do termo, quase não existia
na mesma página do texto em elaboração;
entre os espartanos*.
Exemplo:

Exemplo 2 (citação direta): D'AMBROSIO, 1990, p. 17


Ibid., p. 19.
... está claro que os futuros professores ascendem a sua
formação profissional com uma bagagem histórica de ex-
e etal.? (em latim significa “e outros” ou “et alii”) pode ser uti-
periências educativas como estudantes. Têm ideias prévias
sobre o que significa ser um bom professor, o conteúdo
lizada no texto em nota de rodapé e nas referências quando
que devem ensinar, como devem fazê-lo e o tipo de am- a obra possui mais de três autores;
biente de aula que gostariam de proporcionar (LISTON; Exemplo:
ZEICHNER, 1993 apud GONÇALVES, 2000, p. 190)”. Na referência:

Observação: Como nas referências finais consta apenas o autor FIORENTINL D.; NACARATO, A. M.; FERREIRA, A.
consultado, recomenda-se colocar em nota de rodapé, como C.;LOPES,C.S.; FREITAS,M. T.M; MISKULIN,R. G.
S. Formação de professores que ensinam Matemática: um
foi feito em relação à citação anterior, a referência completa
balanço de 25 anos da pesquisa brasileira. Educação em
do documento original.
Revista — Dossiê: educação matemática, Belo Horizonte,
d) Expressões latinas citadas no texto: UFMG, n. 36, p. 137-160, dez.2002
* id. ou idem (em latim “idem” significa “do mesmo autor”, mas
obra diferente) é utilizada para citar o mesmo autor da citação Citação no corpo texto:
anterior, na mesma página do texto em elaboração; * se forno início de um parágrafo ou frase, escreve-se: Fiorentini
et al. (2009);
* se for no final de uma frase ou parágrafo, escreve-se:
6. O pesquisador, nesse caso, teve acesso apenas à obra de Silva (1994), na qual encontrou
a afirmação de Ponce (1982) que foi citada de forma indireta pelo pesquisador.
(FIORENTINI et al., 2002);
7. LISTON, D. P; ZEICHNER, K. M. Formación del profesorado y condiciones sociales de la
8. A partir da NBR-6023/1989, não se coloca a expressão por extenso (et alii) e sim
escolarización. Madrid: Ediciones Morata, 1993 (citação direta desses autores).
abreviada (et al.)
170 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 171

sic (significa “tal que”), entre parênteses, é utilizada para * autor (organizador, editor, coordenador etc.) [Sobrenome
informar ao leitor que a fala ou afirmação que contenha erros em caixa alta, seguido do(s) prenome(s), abreviados ou
ortográficos ou gramaticais é uma transcrição fiel do original não. Havendo outros autores, segue-se na mesma ordem,
ou da fonte de informação; separando-os por ponto e vírgula];
cf. (significa “confira, confronte”). * título e subtítulo da obra [colocar em negrito ou itálico so-
Citação em língua estrangeira: duas opções apresentam-se: mente o título];
transcrever, no corpo do texto, a citação na língua original, * tradutor [escreve-se “tradução de ... (nome completo do
traduzindo-a em nota de rodapé. No final do texto traduzido autor) ”];
escrever, entre parênteses, (tradução nossa); * edição (abreviado “k. ed.”, para k > 1);
traduzir a citação introduzindo-a diretamente no corpo do * local da publicação,
texto e indicar, em nota de rodapé: texto traduzido por nós * nome da editora;
do... (indicar a língua original). * ano da publicação;
P) Grifo, supressão ou acréscimo de palavras na citação: * número de páginas (abreviado “kp.”;
quando parte da citação for destacada em itálico, negrito * volume (nome e número de série. Abreviado “v. k'”).
ou sublinhado, indicar, no final da citação, entre parênteses:
(grifo do autor) se o grifo já consta no original; (grifo nosso) Nos exemplos seguintes, além da ordem, deve ser observado
se o grifo foi feito por quem está fazendo a citação; que o sobrenome do autor se apresenta em caixa alta, o nome do autor
Se algum trecho intermediário do texto original for suprimi- é representado somente pela letra inicial, ou por extenso, mantendo
do, na citação, substituir o trecho suprimido por reticências uma uniformidade do começo ao fim das referências. O título da obra
entre colchetes: [...]. Se alguma palavra for inserida junto ao é em itálico ou em negrito; pontuação e espaçamento também estão
texto citado, colocar a palavra acrescida entre colchetes; padronizados; a palavra “editora” é sempre omitida. As referências são
No caso de haver omissão de termos iniciais ou finais de um digitadas em espaçamento simples, deixando-se uma tinha em branco
parágrafo, serão substituídos por reticências sem colchetes. entre uma e outra referência:

* Quando a obra tiver até três autores (organizadores, editores


7.2. Referências
etc.) principais.
Exemplos:
É a listagem por ordem alfabética de todas as obras citadas ao
longo do trabalho e deve obedecer ao seguinte critério, segundo a DANTZIG, T. Número: a linguagem da ciência. Tradução
ABNT (20020): Sergio Góes de Paula. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. 283p.
KASNER, E.; NEWMAN, J. Matemática e imaginação.
a) Para livros e folhetos, a ordem deve ser a seguinte: Tradução Jorge Fortes. Rio de Janeiro: Zahar, 1968. 347p.
REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 173
172 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

Observação: Os traços sublineares dos exemplos anteriores


LINDQUIST, M. M.; SHULTE,A.P. (org”.). Aprendendo são constituídos de seis caracteres.
e ensinando geometria. Tradução Hygino H. Domingues. b) Quando a obra se referir a monografias, dissertações ou teses: SOBRENO-
São Paulo: Atual, 1994. 308p. ME, Prenome(s). Título: subtítulo. Ano. Número de folhas ou
volumes. Tipo da monografia (grau e área de concentração)
— unidade de ensino, instituição (ambos por extenso), cidade.
* Quando a obra tiver mais de três autores:
Exemplo: Exemplos:
c) Quando a obra não tiver autor específico (entidade coletiva e publicações
FRANCHI, A. etal. Geometria no 1º grau: da composição
e da decomposição de figuras às fórmulas de área. São BARBOSA, J. €. Modelagem matemática: concepções
Paulo: CLR Balieiro, 1992. 43p. (Coleção Ensinando- e experiências de futuros professores. 2001. 256f. Tese
-aprendendo, aprendendo-ensinando) (Doutorado em Educação Matemática) — Instituto de
Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual
* Quando houver várias obras de um mesmo autor, coloca-se Paulista, Rio Claro.
GOMES, M. L. M. Quatro visões iluministas sobre a
em ordem alfabética do título:
educação matemática: Diderot, D' Alembert, Condillac
Exemplos:
e Condorcet. 2003. 291f. Tese (Doutorado em Educação:
Educação Matemática) — Faculdade de Educação, Univer-
TAHAN, M. O escândalo da geometria. Rio de Janeiro:
sidade Estadual de Campinas, Campinas.
Aurora, [s.d.]'º. 120p.
. O homem que calculava. 33. ed. Rio de Janeiro:
Record, 1983. 218p.
. Matemática divertida e curiosa. 4. ed. Rio de
governamentais): ENTIDADE. Título da obra. Cidade da publi-
Janeiro: Record, 1994. 158p. cação: órgão responsável pela publicação, ano da publicação.
Número de páginas.
9. Mesmo que a obra tenha mais de três organizadores, editores etc., deverá seguir Exemplos:
sempre no singular a abreviação e entre parênteses: (Org.); (Ed.); (Coord.).
10. A ABNT não admite sem data [s.d.]. Afirma que se deve colocar uma data provável
utilizando-se dos seguintes recursos: SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Educação e Cultu-
[1997 ou 1998]: um ano ou outro ra. Proposta curricular de matemática. São Paulo: SEC/
[19732]: data provável CENP, 1988. 183p.
[1999]: data certa, não indicada na obra BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Pará-
| [entre 1971 e 1981]: usam-se intervalos menores de 20 anos metros Curriculares Nacionais: matemática. MEC/SEF,
| [ca. 1980]: data aproximada 1997. 142p.
| [198-]: década certa UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Sistema Integrado
[198-2]: década provável de Bibliotecas. Catálogo de produção técnico-científica e
[19-—]: século certo artística da USP. São Paulo: SIBI/USP, 1997. 1 CD-ROM.
[19—2]: século provável
174 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 175

d) Para artigo de periódico, a ordem é: f) Referência de artigo de jornal: SOBRENOME, Prenome do autor.
autor; Título: subtítulo do artigo. Título do jornal (negrito ou itá-
título do artigo; lico), local de publicação (cidade), data (dia mês abreviado
título do periódico (itálico ou negrito); ano), caderno ou parte do jornal, página(s).
local da publicação (cidade); Exemplos:
editora;
volume (abreviado “v. k”); [Com autor]: CARVALHO, J. Matemática massacra alu-
número (abreviado “n. k”; nos. O Estado de São Paulo, São Paulo, 29 abr. 1989.
número da página inicial-final, Caderno 1, p. 3.
mês (abreviado)'' e ano da publicação. [Sem autor]: 70% dos alunos não sabem matemática. Folha de
São Paulo, São Paulo, 5 maio 1996. Caderno A, p. 10-13.
Exemplos:

LORENZATO, S. Os “porquês” matemáticos dos alunos e


as respostas dos professores. Proposições, Campinas, FE/ E) referência bibliográfica de documentos eletrônicos (disquetes, CD-ROM,
Unicame, v. 10, n. 1, p. 73-77, mar. 1992. on-line etc.):
FIORENTINI, D. Memória e análise da pesquisa acadêmi- Referências a trabalhos em homepage: SOBRENOME, prenome
caem educação matemática no Brasil. Zetetiké, Campinas, do autor. Título: subtítulo do artigo. Nome da publicação
CEMPEM, V. 1,n. 1, p. 55-94, mar. 1993. eletrônica (se houver). Local: data da publicação, páginas,
série (se possuir). Disponível em: <nome da homepage>.
e) Quando a obra se referir a eventos (congressos, conferências, encontros, simpósios): Acesso em: dia mês ano. (Observação: mês expresso com
SOBRENOME, Prenome do autor. Título: subtítulo do arti- três caracteres, exceto o mês de maio.)
go. inclusão do In:, nome do evento (em caixa alta), número, Exemplos:
ano, local (de realização), título da publicação (em itálico
FRANÇA, C.:; SANTOS, G. C., GOLDENBERS, S. Para
ou negrito), local (de publicação), editora!?, data, número quem precisa fazer a monografia em psicopedagogia. Psi-
da página inicial-final. copedagogia OnLine. São Paulo, 9 maio 2003. Disponível
Exemplo: em: <http://www.psicopedagogia.com.br/artigos/
print.asp?entrID=416>. Acesso em: 31 maio 2003.
LORENZATO, S; NACARATO, A. M.; LOPES, J. A. O DIMENSTEIN, G. Emprego Global. Disponível em:
livro didático de Matemática na opinião de professores <http: www/aprendiz.com.br/colunas/gilberto>. Acesso
de 1º a 4º séries. In: ENCONTRO PAULISTA DE EDU- em: 19 jan. 1998.
CAÇÃO MATEMÁTICA, 4., 1996, São Paulo. Anais... BRASIL. Ministério da Educação. Sistema de Avaliação
São Paulo: SBEM, 1996. p. 229. da Educação Básica. S4EB 2001 : relatório SagB 2001 —
matemática. Brasília : MEC/SAEB, 2002. 75p. Disponível
11. Exceção do mês de maio. Os demais, as três letras inicias. Ex.: jan./fev./mar./ etc. em: <http://www.inep.gov.br/download/saeb/2001/rela-
12. Quando não possuir editora, usar a seguinte informação: [s.n.]. torio SAEB matematica.pdf>. Acesso em: 4 jun. 2003.
176 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PESQUISA 177

* Referências de trabalhos em CD-ROM (Segue a mesm


a orientação organizada, verbetes ou apresentação de trabalhos em even-
para publicações de artigos em jornal. Veja letra
“f'). tos (congressos,
Exemplo: conferências, simpósios, encontros, semi-
nários etc.) na referência;
FERREIRA, M. C. C.; GOMES, M. L. M.
Análise dos Exemplo parte de obra:
Instrumentos de Matemática em uma avali
ação das
escolas estaduais de Minas Gerais. In: ENCO SOUZA JR., A. J. Trabalho coletivo na universidade:
NTRO
NACIONAL DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, trajetória de um grupo de professores de cálculo mediado
7., 2001,
Rio de Janeiro. Anais... São Paulo: SBEM, 2001. pelo computador. In: FIORENTINL, D. (Org.). Formação
(Publicado
em CD-ROM). de professores de matemática: explorando novos caminhos
com outros olhares. Campinas: Mercado de Letras, 2003,
p. 193-216.
* Referências de software CD-ROM:
Exemplo:
Exemplo verbete (para o caso do verbete “matemática”):
DESCOBRINDO a trigonometria. São
Paulo: Atlas
multimídia, 1995, 1 CD-ROM. Windows 3.1. ABBAGNANO, N. Matemática. In: Diccionario de filosofia.
México: Fondo de Cultura Econômica, 1963. p. 770-774.

* Referências de lista de discussão:


Exemplo parte de evento:
Exemplo:

SBEM-L mailing list mantida pela Sociedade


DA SILVA, H.; SOUZA, T. A.; BORBA, M. C.; PENTE-
Brasileira ADO, M. G. Explorando a geometria do ambiente LOGO.
de Educação Matemática e UNEsP-Rio Claro.
Disponível In: ENCONTRO
em: <sbem-l()ms.rc.unesp.br>. Acesso em: PAULISTA DE EDUCAÇÃO MATE-
5 Jun. 2003, MÁTICA, 5., 1998, São José do Rio Preto. Anais... São
José do Rio Preto: SBEM-SP, 1998. p. 253-255.
* Referências de e-mail.
Exemplo:

PONTE, J. P. Reunião da Rede Inter-Centros


Didactica da
Matemática. Mensagem recebida por: <dariof(Du
nicamp.br>
em 24 mar. 2003.

b) Referências que utilizam a expressão latina in.


* Insignifica “em”. É utilizada para citar capítu
lo de uma obra
Parte III
Algumas considerações
fundamentais à investigação

CAPITULO *« NOVE

AVALIAÇÃO DO
TRABALHO DE PESQUISA

Ms pesquisadores questionam a existência de critérios univer-


sais para avaliar trabalhos investigativos. Argumentam que tais
critérios podem cristalizar ou padronizar determinados procedimen-
tos ou formas de pesquisa, podendo impedir a emergência de outras
alternativas metodológicas. Entretanto, ninguém parece discordar
que existem alguns critérios básicos que todo trabalho investigativo
deveria contemplar. Além de abordar e discutir, neste capítulo, quem,
quando e como avaliar um trabalho científico, apresentamos também
alguns critérios de avaliação, tomando por base a literatura específica
da área de educação matemática (EM) e um roteiro para realização de
estudo e análise de pesquisas.

1. MOMENTOS E SENTIDOS DE AVALIAÇÃO DE UMA PESQUISA

Assim como ocorre com a avaliação do processo ensino-


-aprendizagem, há, em relação à pesquisa, também dois momentos
diferentes de avaliação: aquele que acontece ao longo do processo
182 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
AVALIAÇÃO DO TRABALHO DE PESQUISA 183

investigativo (avaliação contínua ou formativa) e o que ocorre no final


informações e de análise, o respeito ético para com os sujeitos e ins-
(avaliação somativa), incidindo sobre o produto final da pesquisa.
tituições que cooperaram com a realização da pesquisa, entre outros.
Um dos momentos mais significativos e formativos da avaliação
O outro momento de avaliação de um trabalho de pesquisa é
de uma pesquisa é aquele que acontece durante o seu desenvolvimento,
aquele que ocorre após sua conclusão. A avaliação, nesse caso, assume
isto é, antes de concluí-la. Essa avaliação pode ser realizada pelo próprio
um caráter mais somativo que formativo, pois é pontual e conclusiva
autor ou por um parceiro, orientador, banca ou grupo de pesquisa, os e visa, com base em determinados critérios, realizar um balanço do
quais podem ajudar a fazer uma revisão cuidadosa do trabalho em de-
trabalho e atribuir-lhe um conceito final que permite sua aceitação/
senvolvimento. Dizemos que essa avaliação tem um sentido formador
aprovação (certificação) ou não. Isso acontece quando um estudo é
porque não visa atribuir um escore ou nota ao trabalho, nem aprová-
destinado à publicação em um periódico científico ou à apresentação
“lo ou reprová-lo. Visa, tão somente, aprimorá-lo, sugerindo ajustes, em um congresso científico, e, para ser aceito, necessita passar pela
complementações, revisão do relatório escrito e sua melhor finalização.
avaliação criteriosa de um comitê de especialistas. Essa avaliação
Essa perspectiva formadora na avaliação de uma pesquisa ocorre,
também acontece quando um mestrando ou doutorando submete sua
com frequência, em grupos que têm o hábito de organizar encontros dissertação ou tese à defesa pública, perante uma banca de arguição
para discutir projetos em andamento. O exame de qualificação, pre-
e avaliação.
sente na maioria dos programas de pós-graduação em educação, tam-
bém pode ser considerado uma forma de avaliação formadora. Nesses
encontros de avaliação, pode ser constituída uma banca que assume a
2. DIMENSÕES DA AVALIAÇÃO DE UM TRABALHO DE PESQUISA
responsabilidade de ler e revisar com cuidado e profundidade um pro-
jeto de pesquisa em desenvolvimento com o intuito de analisar à perti-
nência do estudo e sua consistência e coerência teórico-metodológicas. A avaliação de um estudo de natureza científica geralmente
Essa avaliação formadora realizada antes do término de um estu- incide sobre duas dimensões básicas. Uma relativa ao valor de uma
do é aconselhável até mesmo para os pesquisadores mais experientes, pesquisa (conteúdo e processo investigativo) e outra relativa à forma
pois, partindo do pressuposto de que não existe trabalho perfeito, o de apresentação de seu relatório. Embora a primeira seja mais impor-
olhar do outro (pesquisador ou não) geralmente traz contribuições ao tante, o conteúdo pode ficar comprometido se o relato escrito não
trabalho, seja em relação à clareza das ideias, ao uso correto dos termos, for apresentado de forma adequada e compreensível. Ou seja, há uma
à organização do relatório escrito, à correção gramatical e ortográfica, interdependência entre essas duas dimensões.
seja em relação aos aspectos básicos de uma
Quanto ao valor de uma pesquisa, pode-se avaliar sobre: a relevância
investigação, tais como
a coerência teórico-metodológica!, os procedimentos de coleta de do tema para o próprio autor e para a comunidade, a precisão e clareza
na formulação do problema ou questão e das hipóteses, a relação teoria/
1. Referimo-nos à coerência entre os pressupostos teóricos e epistemológicos
prática estabelecida em torno da questão ou problema investigado; a
assu-
midos e anunciados pelo pesquisador, geralmente na parte inicial do relatório
de
pertinência e suficiência da revisão bibliográfica, o rigor e a transpa-
pesquisa, « os procedimentos metodológicos de coleta de dados e, principalm
ente, rência na descrição da metodologia da pesquisa; a adequação da forma
de análise e síntese.
de coleta de informações; a significância das informações coletadas; a
184 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA AVALIAÇÃO DO TRABALHO DE PESQUISA 185

adequação e o cuidado na análise e na interpretação das informações, * ética (no sentido de preservar a integridade dos informantes
evitando inferências indevidas; a consistência e coerência das conclu- e o consentimento deles);
sões em relação aos resultados obtidos e ao problema ou questão de * credibilidade (resultados ancorados em evidências concretas
investigação e/ou aos objetivos propostos; e suas contribuições para e não na retórica);
o avanço dos conhecimentos. * qualidades intangíveis (lucidez, transparência, organização,
Em relação à forma de apresentação do relatório, pode-se avaliar: a franqueza e originalidade).
precisão e clareza do estilo de redação adotado; a pertinência das
ilustrações e tabelas; a correção ortográfica e gramatical do texto; a Em Fiorentini (2002), destacamos que a definição ou seleção de
adequação das referências bibliográficas, o atendimento às normas da critérios de avaliação de pesquisa não é um processo objetivo, isto é,
Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a fluência do texto isento de subjetividade, pois tal seleção depende: da concepção que
e a conveniência de sua divulgação ou publicação. se tem de pesquisa; da razão e da finalidade pelas quais pesquisamos;
do foco ou recorte que fazemos em relação ao objeto de estudo; de
como e para quem pesquisamos. Assim, tomando por base o estudo
3. CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DE PESQUISAS de Kilpatrick (1996) e o caso da pesquisa brasileira em EM, apresen-
EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA tamos em Fiorentini (2002) a seguinte lista de critérios de avaliação
de pesquisas em educação matemática:

Jeremy Kilpatrick (1992, 1994 e 1996) é o pesquisador em EM


* relevância e pertinência do estudo em relação à educação e
que mais se tem destacado mundialmente na discussão de critérios de
à educação matemática;
avaliação de investigações em nossa área. Em artigo publicado na re-
* coerência (teórico-metodológica e entre embasamento teó-
vista Zetetiké, Kilpatrick (1996) faz um balanço de critérios de avaliação
rico e análise/interpretação do material de campo);
de pesquisas até então propostos para a EM e apresenta e comenta
* originalidade ou novidade do estudo;
criticamente uma lista proposta originalmente por Lester e Lambdin
* clareza e transparência na organização e apresentação do
(apud KILPATRICK, 1996, p. 108-110):
relatório de pesquisa, explicitando com detalhes os procedi-
mentos de coleta de informações e de análise, de modo que
* vantagem (ou relevância ao campo científico e à prática pe-
a comunidade científica possa apreciar e avaliar o estudo,
dagógica);
validando ou não os resultados obtidos;
* coerência (entre as várias partes do estudo);
* rigor e cuidado ético na coleta e no tratamento dos dados,
* competência (do pesquisador na coleta e análise/interpreta-
obtendo consentimento e autorização dos informantes para
ção dos dados);
uso das informações e assumindo o compromisso de preservar
* abertura à crítica (no sentido de explicitar seus pressupostos,
o anonimato dos sujeitos e de suas instituições, caso esse seja
concepções, métodos e técnicas de pesquisa);
o desejo ou a exigência deles;
186 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
AVALIAÇÃO DO TRABALHO DE PESQUISA 187

* consistência e credibilidade dos resultados;


ao ensino de matemática nas escolas ou nos cursos de licenciatura
* contribuições ao processo de pesquisa e ao campo teórico em
e matemática. Assim, se os critérios de avaliação priorizarem o rigorea
prático da EM.
consistência teórico-metodológica, esses estudos, certamente,
levarão
ligeira vantagem sobre aqueles que têm como objeto de investi
Comentemos alguns desses critérios. Em relação à origina gação
lidade temas ou problemas mais emergentes ou complexos e que, apesar de
ou novidade do estudo, é comum encontrarmos pesquisadore re-
s que levantes para a área, ainda não possuem uma base teórico-metodo
ainda acreditam que a originalidade esteja na escolha inédita lógica
de um tema sólida, sobre a qual se possam estruturar e desenvolver.
de estudo. Isso denota um viés positivista de pesquisa.
Na verdade, Assim, é possível encontrar muitos trabalhos que, pelo ponto de
segundo Kilpatrick (1996), a originalidade está na relação
que o sujeito vista teórico-metodológico, se mostram bastante consistentes, sendo
(pesquisador) estabelece com o objeto. Ou seja, a origina
lidade vai bem constituídos e desenvolvidos enquanto investigação, mas
depender do olhar e das questões que o pesquisador formul que,
ar diante pela perspectiva da prática educativa e do campo de conhecimento
do objeto de estudo. Assim, por exemplo, podemos ter “n” da
pesquisas EM, podem ser pouco contributivos. Não estamos, com isso, querend
originais ou diferentes sobre uma mesma classe de alunos. o
Um pes- defender um critério pragmático da relevância. Ao contrário, entende
quisador poderia centrar atenção em aspectos mais cognit -
ivos dos mos que a escolha ou seleção de trabalhos não pode ser determinada
alunos ao aprender matemática. Um outro poderia
investigar a gestão apenas com base em sua relação imediata ou não com a prática.
ou a dinâmica da classe. Um terceiro, ainda, poderia analisa Como
r a prática já mencionamos, há estudos que visam à compreensão e à mudanç
discursiva dos sujeitos em aula. Cada um desses estudos a da
poderá trazer prática pedagógica em matemática e há estudos que visam ao
resultados e contribuições diferentes e originais. desen-
volvimento do campo teórico da área. Ambos, portanto, possue
Outro critério que gostaríamos de discutir é à relação m sua
entre relevância. Isto porque, segundo Kilpatrick (1996),
relevância educativa e consistência teórico-metodológica do estudo.
Essa discus-
são resulta, de um lado, do que temos percebido durant
e a leitura e À pesquisa em Educação Matemática ganha sua relevância para
análise de trabalhos de pesquisa em nossa área e, de outro, a prática
de nossa ou para as futuras pesquisas por seu poder de nos fazer parar
participação na avaliação de trabalhos encaminhados aos e pensar. Ela
congressos nos equipa não com resultados que nós podemos aplicar, mas,
científicos, como os promovidos pela Sociedade Brasileira mais do que
de Educação isso, nos equipa com ferramentas para pensar sobre nosso trabalho.
Matemática Ela
(SBEM) e pela Associação Nacional de Pós-Graduação e
fornece conceitos e técnicas, não receitas (p. 104).
Pesquisa em Educação (ANPEd).
Sabemos que existem temas ou linhas de pesquisa menos
exequí- Entretanto, nos processos avaliativos, há que se considerar
veis, do ponto de vista investigativo, do que outros que
que já possuem certa existem problemas ou fenômenos de estudo — sobretudo aqueles
tradição investigativa e contam com modelos teórico-meto que
dológicos buscam contemplar a complexidade do fenômeno educativo — para
validados ou consolidados por outros pesquisadores. A os
maioria do quais é mais difícil desenvolver um processo investigativo sistemát
segundo grupo de estudos filia-se à tradição acadêmica ico
e, por vezes, e controlado. Este é o caso, por exemplo, dos estudos que procura
pode apresentar pouca relevância para a EM, sobretudo m
em relação investigar a própria prática. Essa forma de investigação, como nos
188 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
AVALIAÇÃO DO TRABALHO DE PESQUISA 189

mostra Ponte (2002), é ainda emergente e seu processo investigativo 4. QUESTÕES ORIENTADORAS PARA FICHAMENTO E ESTUDO/
não encontra aportes teórico-metodológicos junto às três grandes abor- ANÁLISE DE PESQUISAS
dagens conhecidas: a empírico-analítica, a fenomenológico-hermenêutica
e a histórico-dialética. Não obstante, esse tipo de estudo é altamente
À nossa experiência na formação de pesquisadores tem mostrado
relevante para a prática educativa e para os professores porque, me-
que uma forma bastante efetiva de o futuro pesquisador conhecer e se
diante pesquisa, estes podem efetivamente se constituir em sujeitos
apropriar da dinâmica e da estrutura de uma investigação é mediante
autônomos do processo educacional, produzindo, assim, seus próprios
a realização de leituras e análises sistemáticas de relatos de pesquisas
conhecimentos e seu desenvolvimento profissional.
já concluídas ou publicadas. Essa leitura/análise não deve restringir-se
O questionamento que geralmente aparece em relação à qua-
apenas aos bons exemplos de pesquisa. Muitas vezes podemos tirar
lidade dessas investigações é que tais estudos, muitas vezes, não
ricas lições de um mau trabalho de pesquisa, pois também aprendemos
seguem o modelo científico-acadêmico de pesquisa, carecendo de rigor
a partir dos erros dos outros. Mas para isso é necessária a realização de
teórico-metodológico. Pensando nisso, Ponte (2002) buscou apoio
uma boa análise do trabalho. Nessa dinâmica, o futuro pesquisador não
em Zeichner para apresentar alguns critérios de qualidade da inves-
apenas se apropria do processo de pesquisa como, também, aprende
tigação dos professores.sobre a prática. Para Ponte (ibidem, p. 22),
a avaliar um relatório de pesquisa. Entretanto, para que a análise do
uma pesquisa sobre a prática deve atender aos seguintes critérios
: estudo seja bem-sucedida é preciso que o leitor faça um fichamento
cuidadoso do trabalho, no qual estejam contemplados os elementos
1) referir-se a um problema ou situação prática vivida pelos atores;
essenciais de um trabalho investigativo.
2) ser expressão autêntica dos atores e relacionada ao contexto;
Dentre outras alternativas, apresentamos, a seguir, um roteiro
3) conter alguma novidade para os professores;
de fichamento de um trabalho científico”.
4) explicitar alguns elementos metodológicos que inspiram
cuidado no tratamento das informações;
1) Qual é o tema da pesquisa?
5) ser divulgada/socializada e colocada à discussão pública.
2) Que questão investigativa ou problema foi tomado como
objeto central de estudo?
O objetivo da avaliação de qualquer trabalho de investigação é
3) Como a questão investigativa ou o problema é introduzido e
verificar sua qualidade. Para tanto, é preciso considerar primeiramente
tratado, ante a experiência pessoal do pesquisador e a outros
a que fim se destina o trabalho. Os trabalhos mais frequentes são os
de estudos (empíricos, de campo ou teóricos)?
conclusão de disciplina, de especialização, de mestrado e de doutora-
do; os critérios para avaliá-los possuem crescentes graus de exigência
de rigor científico, bem como exigências mínimas de cientificidade
2. Este roteiro foi elaborado e desenvolvido por Dario Fiorentini e contou
com a
e consistência teórico-metodológica. E isso precisa ser levado em colaboração dos alunos da disciplina metodologia da pesquisa em EM, ministrada
consideração no momento da avaliação. no Programa de Pós-Graduação em Educação (Área de EM) da Faculdade
de
Educação da Universidade Estadual de Campinas (FE-UNICAMP).
190 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
AVALIAÇÃO DO TRABALHO DE PESQUISA 191

4) O estudo explicita pressupostos, hipóteses (experimentais Concluindo, podemos dizer que, ao analisar e avaliar trabalhos
ou de trabalho) e objetivos? Quais?
de pesquisa de outros investigadores, o pesquisador não se apropria
5) Qual a principal tendência ou abordagem metodológica do apenas dos resultados e aprendizados produzidos por eles. Aprende,
estudo: empírico-analítica (quantitativa), fenomenológico-
também, um pouco mais sobre o processo de pesquisar e apropria-se
“hermenêutica (ou interpretativa); histórico-dialética (ou de parâmetros para avaliar melhor sua própria pesquisa. Assim, cada
crítica)? Ou haveria alguma outra abordagem?
um de nós aprende a ser pesquisador à medida que participa da leitura
6) Quais são os sujeitos (ou informantes) da pesquisa? Como e avaliação de outras pesquisas e desenvolve — sozinho ou em parceria
eles foram selecionados?
com outros pesquisadores — seus próprios projetos de pesquisa. É
7) Que informações (dados) ou material de campo constituem mediante esse processo que o pesquisador desenvolve critérios que
a base documental de análise? Como foram coletadas (com
permitem saber quando seu trabalho está suficientemente constituído
que instrumentos) e organizadas essas informações? Que
e consistente teórico-metodologicamente para ser submetido a um
cuidados o pesquisador tomou durante esse processo?
congresso ou a um periódico científico.
8) Quais os procedimentos de análise? Existem categorias (ou Alguns pesquisadores que percebem limites de sua pesquisa pro-
eixos) de análise? Como essas categorias foram construídas
curam, muitas vezes, ocultá-los aos outros pesquisadores ou leitores,
(a partir da literatura ou emergiram do material de campo)?
pois temem que, ao explicitá-los, a sua pesquisa perca valor ou tenha
9) Quais os principais resultados e conclusões obtidos pelo menor reconhecimento social. Nós, entretanto, conjeturamos que esse
estudo e qual a relação deles com o problema ou questão
ocultamento pode desencadear um efeito exatamente contrário, pois,
inicial, com o referencial teórico e com os objetivos?
cedo ou tarde, tais limites serão apontados por outros pesquisadores.
10) Comente/analise outros aspectos relativos à avaliação da
Além disso, o fato de o próprio pesquisador explicitar os limites de
pesquisa:
seu estudo contribui para sua credibilidade e continuidade.
organização e clareza na exposição de ideias e argumentos, Outro aspecto fundamental, associado a isso, é O problema da
relevância e pertinência do estudo para a EM (como campo consciência ética do pesquisador. Essa é uma das questões sobre as
científico e prática pedagógica);
quais nos debruçaremos a seguir.
originalidade do estudo;
coerência entre a fundamentação teórica e o processo de
análise e interpretação do material de campo;
respeito aos princípios éticos e políticos da educação e da
pesquisa;
validade e confiabilidade dos resultados e conclusões.
11)O resumo do estudo expressa de maneira clara e concisa as
partes essenciais da pesquisa?
CAPÍTULO + DEZ

ÉTICA NA PESQUISA EDUCACIONAL


IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

O objeto de estudo da educação matemática (EM) envolve geral-


mente seres humanos, tais como alunos, professores de mate-
mática, formadores de professores ou instituições sociais como, por
exemplo, escolas, universidades, grupos profissionais... Para obter
informações junto a esses informantes ou instituições, o pesquisador
invade mundos e vidas, vasculhando práticas sociais públicas ou priva-
das e, às vezes, a intimidade conceptual e emocional das pessoas. De
posse dessas informações, o pesquisador, dependendo da forma como
as trata, analisa e divulga, pode tanto contribuir para o benefício das
comunidades ou sujeitos quanto para prejudicar a imagem pública de
ambos, podendo, inclusive, pôr em risco a integridade física de pessoas.
Não há pesquisa nem pesquisadores neutros. Por trás de uma
pesquisa há interesses que nem sempre coincidem com os dos sujeitos
investigados. Embora a questão ética atravesse todas as abordagens
metodológicas de pesquisa, ela é mais evidente nas abordagens quali-
tativas, pois estas buscam, mais que as outras, perscrutar a intimidade
da vida privada dos informantes ou de pequenos grupos. Por isso,
torna-se imperativo que o pesquisador se interrogue permanentement
e
sobre por que investiga, para que investiga, como investiga e o que € como
194 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
ÉTICA NA PESQUISA EDUCACIONAL 195

divulgar os resultados da pesquisa. E, além disso, que


os sujeitos desenvolvimento de experiências com seres humanos como
investigados sejam informados antes e durante todo o se estes
processo de fossem cobaias de laboratório. Experimentos que, muitas vezes,
pesquisa sobre as reais intenções, finalidades e proced podem
imentos do trazer benefícios à humanidade... Esse é um dilema da pesquis
pesquisador. a o qual
envolve discussões de natureza ética.
Essa pequena introdução põe em evidência questões de naturez
a Em contrapartida, o que tem sido considerado ético numa
ética, às quais os pesquisadores e os sujeitos investigados de-
precisam terminada época pode não ser noutra. Isso acontece porque
estar atentos e bem informados. Dada a importância dessa os valores
temática, e costumes são produzidos historicamente e acompanham
consideramos importante abordá-la neste livro, ainda que os movi-
brevemente. mentos sociais e culturais da humanidade. Por exemplo: se
À seguir, trataremos, primeiramente, das implicações outrora a
sociais dessa escravidão era socioculturalmente aceitável, hoje ela é consid
temática e de alguns sentidos e conceitos de ética e, poster erada
iormente, crime social. Há menos de um século, considerava-se eticam
discutiremos alguns princípios e dilemas éticos que consid ente cor-
eramos mais reto bater com régua nos alunos indisciplinados ou puxar suas
pertinentes à pesquisa qualitativa em educação. orelhas,
hoje essas práticas são condenáveis socialmente, podendo
resultar na
exoneração do professor que as pratica.

1. A ÉTICA NA PESQUISA EDUCACIONAL E


SUAS IMPLICAÇÕES SOCIAIS
2. ALGUNS SIGNIFICADOS E CONCEITOS BÁSICOS
RELACIONADOS À ÉTICA
À ética na pesquisa não se restringe à relação entre pesqui
sador e
Os sujeitos ou os participantes da pesquisa. Segundo Gauthi
er (1987), À ética, como parte da filosofia, dedica-se ao estudo dos valores
a ética perpassa todo o processo investigativo. Diz respeit
o desde a morais e princípios ideais da conduta humana. Alguns autores
simples escolha do tema ou da amostra, ou, ainda, dos instru fazem
mentos diferença entre a ética (o que é bom fazer, como agir em
de coleta de informações. Essas opções exigem do pesqui relação aos
sador um outros) e a moral (o que é permitido e o que deve ser feito).
compromisso com a verdade e um profundo respeito aos sujeito Enquanto
s que a moral trata de costumes e valores socialmente produzidos
nele confiam. Da mesma forma, a análise das informações por um
e a produção grupo social, a ética aborda e reflete, principalmente, sobre
das conclusões exigem do pesquisador cuidado ético. os valores
dos indivíduos ante dilemas e situações críticas da vida.
O mesmo acontece com a fase da publicação do relato da pes- A deontolo-
gia, como parte da ética, estuda os deveres, os princípios
quisa, pois seus resultados têm implicações sociais, tanto e as normas
no que diz adotadas por um determinado grupo profissional.
respeito à omissão quanto à divulgação deles.
O foco da reflexão ética incide sobre o respeito à dignidade
Assim, a dimensão ética é parte intrínseca de qualquer pesqui hu-
sa mana, o respeito mútuo, a solidariedade, o diálogo (para superar
e refere-se às relações de boa convivência, respeito aos direito desa-
s do venças ou conflitos), a justiça social e, sobretudo, as conseq
outro e ao bem-estar de todos. No entanto, os princípios éticos uências das
podem ações humanas. A reflexão ética, portanto, estabelece interro
cercear o desenvolvimento da ciência. Esse é o caso, por gações e
exemplo, do análises sobre a prática e a ação humana, ressaltando “a intenci
onalida-
196 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ÉTICA NA PESQUISA EDUCACIONAL 197

de presente nos empreendimentos humanos, valorizando-se fortemente Research Association (AERA)!. Apresentamos, a seguir, alguns princí-
o processo como a deliberação se opera, apelando-se a uma atitude de pios e cuidados que nos parecem mais pertinentes à pesquisa educa-
real e consciente ponderação” (MOITA; COUCEIRO, 1995, p. 6). cional, sobretudo aquela desenvolvida em uma abordagem qualitativa.
No caso específico da pesquisa, os questionamentos éticos
dizem respeito, entre outros, aos direitos dos entrevistados, ao res-
3.1. Sobre o consentimento dos sujeitos em participar
peito e bem-estar dos participantes, à preservação da identidade das
da pesquisa
pessoas envolvidas, aos usos e abusos das informações e citações de
outros autores, à fidedignidade das informações, às implicações sociais
Antes de iniciar a pesquisa de campo, as normas éticas recomen-
e políticas da pesquisa. No entanto, para Portelli (1997), os princípios
dam que o pesquisador informe aos participantes sobre as finalidades
éticos da pesquisa estão sujeitos a uma ética mais ampla — que podemos
da pesquisa, os procedimentos de coleta de informações e como estas
denominar humano-política — a qual diz respeito às responsabilidades
serão utilizadas e divulgadas pelo pesquisador. Dessa forma, os sujeitos
tanto individuais e civis quanto coletivas e políticas no seio das relações
podem aderir “voluntariamente aos projetos de investigação, cientes
humanas. Em síntese, “as diretrizes éticas e jurídicas terão razão de ser
da natureza do estudo e dos perigos e das obrigações nele envolvidos”
caso estas se constituírem manifestações externas de uma consciência
(BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 75).
mais abrangente e profunda do compromisso pessoal e político com a
O consentimento dos sujeitos pode ser formalmente estabele-
verdade e a honestidade, na medida de nossas possibilidades” (p. 13).
cido mediante um contrato assinado por ambas as partes, no qual são
É essa consciência humano-política que deve ser mobilizada sempre
descritos, de partida, os objetivos e finalidades da pesquisa e o direito
que realizamos nossas pesquisas e, principalmente, quando nos depa-
à realização da pesquisa de campo e ao uso de imagens e depoimentos.
ramos com situações problemáticas ou dilemáticas não previstas pelos
Esse contrato, segundo Portelli (1997), serve para proteger tanto os
códigos de ética.
entrevistados quanto o entrevistador de processos judiciais ou acusa-
A seguir, discutiremos mais detalhadamente alguns princípios
ções de uso indevido de imagens (no caso de vídeos ou fotografias) e
éticos e alguns dilemas da pesquisa educacional.
de outros documentos ou depoimentos.
Entretanto, considerando o caso da pesquisa qualitativa, há que
se considerar duas situações problemáticas que dificultam o cumpri-
3. ALGUNS PRINCÍPIOS E DILEMAS ÉTICOS mento pleno desse princípio ético. À primeira refere-se ao fato de
NA PESQUISA EDUCACIONAL que os procedimentos de coleta de informações e seus interesses e
possíveis usos e tratamentos nem sempre convém que sejam enuncia-
São múltiplos os princípios e cuidados éticos apontados pelos
manuais de metodologia de pesquisa e pelos códigos de ética de al- t. À AcrA elaborou e aprovou seu código de ética — Ethical Standards of the
gumas sociedades científicas, como é o caso da American Educational American Educacional Research Association — em 1992, o qual foi distribuído
a todos os associados com o intuito não de fiscalizar as práticas investigativas,
mas de orientar e estimular o debate público e a observância do código.
198 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
ÉTICA NA PESQUISA EDUCACIONAL 199

dos inicialmente aos sujeitos. Temos aqui um primeiro dilema ético.


concluído todo o trabalho de campo, e tendo respeitado o contrato
O dilema surge quando o pesquisador, tendo em vista, por exemplo,
assinado por ambos? E se isso vier a acontecer quando o relatório de
seu interesse em investigar crenças, concepções, teorias implícitas e
pesquisa estiver concluído?
experiências significativas de professores de matemática, não pode
informar aos sujeitos tudo o que pretende, pois, assim, estaria indu-
zindo respostas ou criando uma postura defensiva dos informantes. 3.2. Sobre a preservação da identidade e da integridade dos
Segundo Branco e Oliveira (1995), o que está em jogo, nesses casos, “é sujeitos
o que deve prevalecer, o direito dos sujeitos à verdade para poderem
decidir se querem ou não que os seus pensamentos, comportamentos, O pesquisador, ao relatar os resultados de sua pesquisa, precisa
memórias ou até mesmo a sua intimidade sejam devassados, ou o dever também preservar a integridade física e a imagem pública dos infor-
do investigador em construir conhecimento?” (p. 58). Acreditamos mantes. Por isso, geralmente, omite os verdadeiros nomes, usando
que, no caso de o pesquisador precisar omitir de partida, por razões pseudônimos escolhidos pelo pesquisador ou pelos próprios sujeitos.
metodológicas, alguma informação, esta deveria ser informada e jus- Esse procedimento, entretanto, pode, às vezes, não ser o mais correto
tificada tão logo termine o trabalho de campo, sendo facultado aos eticamente, pois há casos em que o pesquisador, por meio da
pesqui-
sujeitos a possibilidade de se autoexcluírem da pesquisa. sa, se apropria da produção intelectual dos informantes, assumindo
A segunda situação problemática refere-se ao fato de que nem somente para si a autoria de tais ideias. Isso acontece principalmente
todos os objetivos e procedimentos de coleta de informações podem quando o informante fornece algo de valor social e cultural. Para
ser enunciados ou previstos antes de começar o trabalho de campo. exemplificar, citamos o caso do Grupo de Sábado? da FE-UNICAMP —
Isso acontece principalmente na pesquisa qualitativa ou nos estudos de grupo colaborativo interessado em estudar e investigar a prática de
pesquisa-ação, pois algumas questões ou hipóteses de investigação so- ensino de matemática nas escolas e o processo de desenvolvimento
mente se tornarão claras ou definidas ao longo do processo de pesquisa. profissional dos professores nesse contexto de prática reflexiva e in-
Em razão disso, as normas éticas defendem o direito de os sujeitos da vestigativa. As duas teses de doutorado desenvolvidas junto ao grupo
investigação interromperem sua participação na pesquisa, sempre que (PINTO, 2002; JIMÉNEZ, 2002) mantiveram, por opção dos próprios
ocorrer algum constrangimento ou alguma mudança de procedimento professores investigados, os verdadeiros nomes dos informantes. Essa
com a qual venham a não concordar. Um procedimento recomendável, opção foi motivada basicamente por dois fatos: a confiança que eles
nesses casos, seria manter os sujeitos continuamente informados sobre depositavam nos pesquisadores e a riqueza de informações e saberes
mudanças na pesquisa, justificando a razão de tais modificações e a
conveniência de rever ou complementar o contrato inicial. 2. O GdS é constituído por professores da rede pública e privada da
região de
Para finalizar este item, deixamos para os leitores a discussão Campinas, por alunos da licenciatura em matemática e da pós-gradu
ação em EM
da FE-Unicamp e por professores universitários. Esse grupo reúne-se
da seguinte questão: até que momento o participante da pesquisa quinzenal-
mente, aos sábados pela manhã, com o objetivo de realizar leituras, reflexões
e
tem o direito de pedir sua exclusão de um projeto de pesquisa? Essa investigações sobre a prática de ensino de matemática nas escolas, focalizan
do
autoexclusão seria eticamente aceitável mesmo após o pesquisador ter principalmente os problemas e experiências da prática pedagógica
dos próprios
docentes.
200 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ÉTICA NA PESQUISA EDUCACIONAL 201

que os professores produziam naquele contexto de trabalho colabo- importantes que farão parte do material de análise da pesquisa. Esses
rativo e investigativo. Mesmo nesses casos, há ainda um certo risco equipamentos, entretanto, alteram o curso normal das práticas. Nesse
à integridade da imagem dos informantes. Algum outro pesquisador caso, o pesquisador pode desenvolver, primeiramente, um processo
poderá explorar o material publicado e fazer outras interpretações e de familiarização dos sujeitos com esses equipamentos ou, então, des-
análises as quais podem não ser favoráveis a eles. cartar como objeto de análise as primeiras seções de filmagem. Alguns
Uma postura eticamente recomendável, para casos como esses, pesquisadores, entretanto, para evitar perturbações, tem tentado usar
seria o pesquisador, antes de publicar um artigo ou defender uma tese esses equipamentos às escondidas. Embora o pesquisador possa justifi-
acadêmica, disponibilizar aos informantes o texto final, obtendo deles car a posteriori por que agiu dessa forma e, então, tentar obter ou não o
aprovação e autorização por escrito para divulgá-lo daquela forma, consentimento dos sujeitos, sempre fica um dilema ético evidenciado
momento em que os participantes podem optar por preservar sua pela falta de transparência ou honestidade do pesquisador.
verdadeira identidade ou não. Um outro dilema pode surgir quando Outra situação que pode causar interferência no processo de
uma parte do grupo solicita anonimato e a outra exige a divulgação de coleta de informações é a forma como a entrevista é desenvolvida pelo
seus verdadeiros nomes. Nesse caso, alguma negociação talvez possa pesquisador. Bogdan e Biklen (1994) sugerem que este, além de não
ajudar a resolver o impasse. procurar induzir as respostas do entrevistado com questões pouco
á
abertas, deve também evitar manifestar-se com espanto, aprovação ou
reprovação diante das respostas do informante.
3.3. Sobre a interferência do pesquisador no ambiente ou no
objeto de pesquisa
3.4. Sobre a divulgação dos resultados da pesquisa
O pesquisador, ao iniciar uma pesquisa de campo, sempre pro-
duz intervenções no ambiente a ser investigado, causando alguma Algumas questões de ordem ética perpassam o problema da
perturbação nos sujeitos. Do ponto de vista ético, é recomendável que divulgação dos resultados de uma pesquisa. Por exemplo, o pesqui-
essa intervenção seja a mínima possível, a menos que seja o caso de sador tem o direito de divulgar todos os resultados encontrados?
uma pesquisa de intervenção intencional como o são, geralmente, as Ou tem o direito de ocultar algumas informações importantes? Que
pesquisas na abordagem crítico-dialética, sobretudo aquelas do tipo tipos de resultados podem ser disseminados sem devassar a inte-
“pesquisa-ação” ou pesquisa colaborativa. Na pesquisa colaborativa, gridade ou intimidade dos informantes? Qual o compromisso do
por exemplo, todos os participantes são, ao mesmo tempo, objeto pesquisador com o retorno do estudo aos sujeitos que participaram
e sujeitos da pesquisa e buscam desenvolver, de modo conjunto e ou cooperaram com a realização da pesquisa? Existem resultados
intencional, o trabalho de investigação. Nesses casos, a interferência que o pesquisador tem o direito de não retornar aos participantes da
do pesquisador é pouco problemática. Limitemo-nos, então, a abordar pesquisa ou às instituições das quais fazem parte? Que resultados ou
os outros casos. conclusões podem ser eticamente discriminatórios? Até que ponto
O uso de equipamentos como gravador, câmara fotográfica e fil- é conveniente anexar, ao relatório de pesquisa, vídeos ou imagens
madora é valioso — eles permitem registrar, com mais acuidade, eventos dos sujeitos investigados?
202 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ÉTICA NA PESQUISA EDUCACIONAL 203

A publicação de certos resultados de pesquisa pode promover escola ou sujeitos que cooperaram para a realização do estudo. Estes,
discriminações. Por exemplo, se uma pesquisa conclui, a partir de um a rigor, deveriam ser os primeiros a receber o retorno da investigação
estudo de campo, que alunos negros apresentam menor desempenho na realizada. Isso pode ser feito em um texto ou, de preferência, em uma
resolução de problemas matemáticos que os brancos, essa informação palestra ou um seminário.
pode levar a uma imagem pública de que os negros são menos capazes
matematicamente que os brancos. À questão ética, nesse caso, pode
3.5. Outros aspectos a considerar
incidir sobre o modo como o processo de pesquisa foi conduzido e,
sobretudo, no modo como as análises e argumentações são produzidas,
Além desses, há vários outros princípios e dilemas éticos em relação
sem considerar os contextos e as circunstâncias socioculturais que
à pesquisa e que, igualmente, merecem atenção e discussão. Por exemplo:
proporcionam tais resultados...
Um dilema ético, nesse âmbito, é aquele apontado por Bogdan e
* a relação do pesquisador com os sujeitos da pesquisa;
Biklen (1994) no qual o investigador se vê “numa posição em que as suas
* a manipulação de dados de pesquisa, evitando fazer inferên-
obrigações como investigador podem colidir com as suas obrigações
cias indevidas ou forjar conclusões pouco prováveis, utilizan-
como cidadão” (p. 78). Seriam casos em que o pesquisador, ao investigar
do recursos de convencimentos não lícitos. Essa manipulação
práticas escolares em matemática, se depara com situações em que o
de dados não é uma característica exclusiva das pesquisas
professor utiliza de violência física para controlar a disciplina dos alunos
em abordagem qualitativa. Ela acontece com frequência nas
(puxões de orelha, bater nos alunos, fazê-los passar por castigos que
abordagens quantitativas nas quais, tendo em vista interes-
afetam a integridade física, moral ou psicológica) ou usa procedimentos
ses econômicos ou políticos, há manipulação estatística de
discriminatórios em relação a alguns alunos que fogem do padrão cultural
índices ou cifras. Manipulações tais como: a construção de
ou, mesmo, àqueles com menor desempenho em matemática...
gráficos que alteram a proporcionalidade numérica; super-
Um outro dilema que pode surgir é quando o pesquisador evi-
valorização de uma informação que, comparativamente, não
dencia o uso indevido de fundos públicos ou a prática de outras con-
seria tão significativa; dispersão de variáveis na coleta de
travenções, como favorecimento a pessoas amigas ou parentes, venda
informações e reunião de variáveis na hora do tratamento e
de diplomas etc. Há casos em que o pesquisador, como cidadão, se
divulgação dos resultados,
sente na responsabilidade de não esperar pela conclusão do trabalho.
* aapropriação indevida de referências bibliográficas ou esta-
Mas isso pode acarretar o aborto do processo de investigação. Nessas
belecimento de recortes descontextualizados de citações de
circunstâncias, qual a posição ética a ser assumida pelo pesquisador? A
de investigador, silenciando-se para preservar a confiança que lhe foi
depositada pelos sujeitos e garantir a continuidade de seu projeto de 3. Por exemplo, na pesquisa de opinião sobre o desempenho de um governador, o
pesquisa? Ou a de cidadão, denunciando publicamente as ocorrências, entrevistador apresenta as seguintes alternativas ao entrevistado: Na sua opinião,
a atuação do governador “Sicrano” pode ser considerada ( ) excelente; ( ) muito
correndo todos os riscos que advirão dessa tomada de decisão?
boa; ( ) boa; () péssima. Mas, para divulgar os resultados, reduz a apenas duas
Uma recomendação ética em relação à divulgação dos resultados variáveis: boa e ruim, resumindo na categoria “boa” as três primeiras variáveis.
da pesquisa é o compromisso que o pesquisador deve ter para com a
204 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
ÉTICA NA PESQUISA EDUCACIONAL 205

autores, desvirtuando o sentido realmente atribuído por eles. o trabalho de pesquisa de campo, abandonar, sem maiores
Ou seja, o cuidado que o pesquisador deve ter ao parafrasear justificativas, seus estudos e seu projeto de pesquisa?
ou recortar alguma citação sem considerar a integralidade de Os programas de pós-graduação no Brasil geralmente não pos-
uma ideia, de um texto ou de uma informação. suem critérios formais de avaliação de uma pesquisa, deixando
que cada membro da banca utilize seus próprios critérios. Seria
4. ALGUMAS QUESTÕES COMPLEMENTARES PARA DISCUSSÃO ético esse processo de avaliação de pesquisas?
Consideremos o caso de um referee de uma revista científica
ou de um órgão de financiamento de projetos de pesquisa
Toda pesquisa é um processo complexo, dinâmico e envolve
que recebe para avaliação e emissão de parecer um artigo ou
múltiplos sujeitos que, de alguma forma, cooperam ou colaboram com
projeto de pesquisa cuja temática ou cujo referencial teórico
o pesquisador para a realização da pesquisa. Assim, embora possa
pouco conhece. Que atitude ética deveria tomar, nesse caso,
existir uma deontologia que defina normas e princípios éticos a serem
o avaliador?
seguidos, sempre é possível encontrar situações ou casos que não
Estaria agindo, de maneira ética, um pesquisador que põe
são contemplados. Esses casos exigirão do pesquisador reflexão e a
seus alunos para coletar dados e depois os analisa e publica
assunção de uma consciência ética que se paute não só pelo permiti-
apenas em seu nome?
do e pelo legítimo, mas, sobretudo, por princípios humano-políticos
É eticamente correto um pesquisador se valer de informações
mais amplos. Nesse sentido, apresentamos ao leitor algumas questões
coletadas/produzidas e disponibilizadas como anexo (ou não)
complementares para reflexão e discussão:
do relato de pesquisa?
É eticamente correto um docente de pós-graduação aceitar
ft. Considerando que as teses ou dissertações nem sempre são
orientar uma pesquisa sobre um tema ou problema em relação
resultados de trabalhos individuais e recebem contribuição de
ao qual não tem experiência investigativa nem conhecimento
vários pesquisadores ou, ao menos, do orientador, esses cola-
teórico?
boradores deveriam ter a opção de figurarem como coautores,
.É ético avaliar um trabalho ou participar de um processo se-
em publicações decorrentes da conclusão daqueles trabalhos?
letivo se houver uma relação de parentesco ou amizade entre
2. O orientando tem o direito de mudar de orientador por
o avaliador e o interessado? E como ficaria o caso em que o
divergência a respeito da quantidade ou da qualidade de
interessado é alguém que mantém divergências conceituais
trabalho que este exige?
ou de relacionamento com o avaliador?
3. É eticamente aceitável que orientador e orientando escolham Z
11.E eticamente correto o orientador determinar o tema de
ou sugiram os membros que irão compor a banca examinadora
pesquisa a ser investigado por seu orientando?
da dissertação ou tese?
4. E eticamente aceitável um mestrando ou doutorando, após
Ao finalizar este capítulo, convém, mais uma vez, destacar que
ter iniciado um programa de pós-graduação e ter principiado
a EM é um campo profissional e científico certamente mais complexo
206 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
A

e problemático que o da matemática, pois em sua prática social parti-


cipam pessoas de todas as faixas etárias e níveis de escolarização que
gostam ou não de matemática. Nesse contexto, vivemos situações
problemáticas e dilemáticas, as quais exigem dos educadores mate-
máticos e investigadores uma postura e uma consciência ética que,
muitas vezes, não encontram respaldo em normas e princípios éticos
que poderiam ter sido discutidos e estabelecidos por sua comunidade
de pertencimento como, por exemplo, a SBEM. Acreditamos que a
SBEM, a exemplo do que acontece com outras sociedades, também
poderia ter seu código de ética.
Todo pesquisador sempre navega principalmente quando in-
vestiga entre a liberdade e a responsabilidade, tendo que consultar
ou considerar deveres, prazos, consciência, interesses coletivos ou
pessoais, direitos, relações sociais, conhecimentos, valores... para ALTRICHTER, H.; POSCH, P, SOMEKH, B. Teachers investigate their work:
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Site: <http://www.fe.unicamp.br/servicos/publicacoes-zetetike.html>.
08027 — Barcelona, Espaiia.
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Educação Matemática Pesquisa
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Outras revistas ibero-americanas de divulgação de pesquisa


em Educação Matemática
Quadrante
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fessores de Matemática (Portugal).
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Revista Educação Matemática
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de Professores de Matemática
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GLOSSÁRIO

ABNT: Associação Brasileira de Normas Técnicas.


Abstract: veja “resumo”.

Algoritmo: conjunto de regras que definem uma sequência de operações.


Amostra: subconjunto de uma população. Diz-se representativa quando repre-
senta a população.

Amostragem: procedimento de escolha dos elementos que constituem a amostra.

Anexo: conjunto de informações necessárias e complementares ao trabalho,


podendo ser elaborado por outro(s) autor(es); incluem-se aqui tabelas, qua-
dros e outras ilustrações.

Apêndice: material informativo complementar de uma obra, mas dispensável.

Artigo: texto informando o contexto de realização e os resultados de pesquisa,


publicado em periódico especializado e arbitrado.

Assunto: parte mais específica do tema da pesquisa.

Atitude: maneira habitual de agir diante de uma dada situação.

Bibliografia: conjunto de fontes consultadas ou recomendadas, mas não neces-


sariamente utilizadas no texto ou obra.

Categoria: subdivisão lógica que congrega diferentes objetos ou sujeitos por-


tadores de uma mesma característica.
GLOSSÁRIO 221
220 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

Entrevista semiestruturada: técnica de coleta de dados em que, além das questões


Citação: informações retiradas de obras ou documentos consultados.
previstas, o entrevistador insere outras oportunamente.
Comunicação: apresentação oral em eventos científicos a respeito de pesquisa em
Episódio: subconjunto de dados coletados, geralmente por entrevista ou ob-
andamento ou concluída, contendo assunto, procedimentos metodológicos e
servação, que constituem e descrevem um fenômeno a ser minuciosamente
resultados; geralmente não deve ultrapassar a duração de 20 minutos.
analisado.
Conceito: abstração referente a uma variedade de fatos.
Epistemologia: teoria do conhecimento; estudo crítico (natureza e fundamentos)
Correloção: processo estatístico expresso por um índice que variade-la +le do conhecimento científico.
que indica o grau de relacionamento entre dois conjuntos de medidas, obtidos
Erro de amostragem: erro de composição do subconjunto da população.
de um mesmo grupo de indivíduos.
Erro tipo |: erro que ocorre quando o pesquisador rejeita a hipótese nula, quando
Dado: elemento de informação que pode ser analisado.
não deveria.
Dedução: raciocínio lógico pelo qual são tiradas conclusões a partir de premissas.
Em pesquisa, estas são as hipóteses.
Erro tipo ll: erro que ocorre quando o pesquisador deixa de rejeitar a hipótese
nula, quando deveria.
Definição: explicitação clara e concisa dos atributos essenciais de uma coisa.
Estudo de caso: estratégia descritiva baseada na análise profunda de um único
Delimitação: demarcação de campo de pesquisa escolhida pelo pesquisador. objeto (ou de poucos objetos) considerado(s) típico(s).

Deontologia: conjunto de regras e deveres que regem o exercício de uma profissão. Ética: conjunto de regras que regem o caráter moral de um processo de pesquisa.

Doutrina: conjunto de noções julgadas verdadeiras que tentam dar uma inter- Etnografia: técnica de coleta de dados que utiliza a observação direta das atividades
pretação aos fatos. do grupo, em convivência com os participantes, a fim de captar interpretações
do que ocorre no grupo, pela perspectiva cultural do próprio grupo.
Dissertação: obra necessária à obtenção do título de mestre, defendida publi-
camente perante banca composta por dois doutores e que evidencia tanto o Fato: observação empiricamente verificada.
conhecimento de literatura existente sobre um tema, como também a capa-
Fichamento: síntese de texto expressando as ideias do autor do texto.
cidade de sistematização do autor.
Fidedignidade: característica de técnica, instrumento ou indicador que assegura
Efeito halo: influência exercida pela impressão geral que o pesquisador tem a
a coleta dos mesmos dados, sempre que os mesmos fenômenos se reprodu-
respeito daquilo que ele irá avaliar.
zirem nas mesmas circunstâncias. E a constância do fornecedor dos dados.
Feito Hawthorne: influência sobre os sujeitos estudados, resultante do fato de
Formulário: instrumento de coleta de dados contendo indagações, com espaço
eles terem consciência de que foram selecionados.
para serem colocadas as respostas, as quais devem ser escolhidas dentre
Empirismo: orientação segundo a qual os conhecimentos são obtidos pelos alternativas explicitadas a cada indagação.
sentidos ou pela experiência.
Grupo de controle: conjunto de sujeitos não submetidos ao efeito da variável
Entrevista: técnica pela qual o testemunho dos participantes é coletado oralmente. independente, controlada pelo pesquisador. Êo grupo sobre o qual não se
exerce qualquer influência experimental.
Entrevista estruturada: técnica de coleta de dados em que questões previstas e
abertas são aplicadas na mesma ordem a todos os entrevistados; cada res- Grupo experimental: conjunto de sujeitos submetidos ao efeito da variável inde-
posta deve ser escolhida dentre um conjunto de alternativas específicas a pendente, controlada pelo pesquisador. Êo grupo manipulado, submetido
cada questão. ao tratamento.
222 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
GLOSSÁRIO 223

Hipótese: é uma explicação plausível e provisória de uma suposição, com o ob- Método: conjunto de regras e de práticas próprias a uma ciência, úteis à ar-
jetivo de direcionar a investigação, sendo posteriormente confirmada ou não. ticulação de suas teorias e modelos. Conjunto de meios utilizáveis para se
História de vida: narração autobiográfica estimulada por um pesquisador, de obter resultados.
modo que o conteúdo retrate as situações vivenciadas pelo autor, segundo Método analítico: parte do mais complexo para o mais simples, primeiramente
o ponto de vista deste. vem a análise das partes, ressaltando o essencial de cada uma; em seguida,
Indicador: sinal percebido de situação que não pode ser compreendida dire- essas partes são reunidas num conjunto, o qual então adquire significado.
tamente.
Método clinico: parte da observação direta, constante e minuciosa da evolução
Indução: raciocínio lógico que, partindo de observações em casos particulares, de um objeto de estudo. Esse estudo é feito caso a caso, o que dificilmente
estabelece proposição geral. Geralmente as hipóteses resultam deste tipo de possibilitará generalizações.
raciocínio.
Método dedutivo: parte de premissas, falsas ou verdadeiras, porém precisas, para
Intervenção: ato de o pesquisador participar de atividade orientada. chegar à conclusão, falsa ou verdadeira, porém válida.

Intuição: conhecimento espontâneo, que não recorre ao raciocínio. Método estatístico: utiliza voluntariamente o quantitativo para fazer surgir o
qualitativo; isso é feito numeralizando as observações e então apontando as
Levantamento (survey): técnica que consiste na aplicação direta de questionário características do objeto de estudo.
estruturado e padronizado a uma amostra representativa de uma população
a ser pesquisada. Método experimental: coloca o objeto de estudo em condições de receber trata-
mento e tenta controlar as transformações provocadas. O experimento ideal
Literatura: conjunto de obras publicadas referentes a um tema. é aquele em que todos os efeitos podem ser avaliados e todos os fatores
Mapa conceitual: representa um retrato instantâneo de alguém, organizado picto- perturbadores podem ser eliminados.
ricamente ou espacialmente, sobre um determinado tema ou assunto. Contém Método indutivo: parte de observações ou enunciados específicos a um contexto,
um conceito central e outros conceitos secundários. para chegar a um contexto mais amplo e a um enunciado mais geral. Parte do
concreto, do particular para o geral, para o abstrato.
Materialismo: filosofia que se serve dos elementos concretos da realidade para
explicar os fenômenos. Metodologia: Estudo dos princípios e dos processos/métodos de uma pesquisa.
Média: medida de tendência central que corresponde à soma de todos os valores Moda: medida de tendência central que corresponde ao valor de maior fre-
de uma distribuição, dividida pela frequência total de casos. quência numa distribuição.
Mediana: medida de tendência central que corresponde ao ponto de distribuição Modelação: processo de preparação de um modelo.
de valores que separa os 50% de casos superiores dos 50% inferiores.
Modelo: representação simplificada de um sistema real.
Medidas de tendência central: pontos em torno dos quais os valores de uma distri-
buição tendem a se agrupar. Incluem a média, a mediana e a moda. Monografia: tratado sobre um ponto específico do conhecimento. Publicação
referente a um assunto restrito no tempo e no espaço, decorrente de pesquisa.
Medidas de variabilidade: valores que indicam o nível de dispersão das observações
que formam uma distribuição. Incluem a amplitude, a média dos desvios, a Nível de significância (o.): é o valor máximo de probabilidade que o pesquisador
variância e o desvio-padrão. aceita correr o risco de cometer o erro de rejeitar uma hipótese verdadeira;
assim, o = 0,05 significa que há confiança de 95% de que se tome uma de-
Memorial: escrito em que o autor relata os principais fatos de sua vida profis- cisão correta.
sional.
Noção: conhecimento elementar.
224 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA GLOSSÁRIO 225

Objeto: assunto que é alvo da pesquisa. Prê-teste: medida realizada antes do início do tratamento.

Observação: técnica de pesquisa pela qual se procede um exame sistemático e Problema: lacuna que deve ser preenchida no domínio do conhecimento, con-
reflexivo de uma situação ou fato, guiado por uma hipótese. cernente ao real observável, ou seja, a diferença ou contradição entre o que
se sabe a respeito de um fenômeno e o que o fenômeno realmente apresenta.
Originalidade: qualidade de retornar às origens, às fontes; popularmente significa
novidade. Problemática: conjunto de saberes factuais, conceituais ou teóricos e de valores,
que ajudam a discutir e a abordar com profundidade um problema ou objeto
Paradigma: conjunto de regras que orientam a pesquisa científica. Conjunto de de estudo.
hipóteses fundamentais e críticas que dão nascimento às teorias e aos modelos.
Questionário: instrumento para recolher testemunho de participantes através
Pergunta de pesquisa: questão específica relativa a um problema de pesquisa e de interrogatório escrito.
que guia ou orienta todo o processo de pesquisa.
Qui-quadrado: teste para verificar se as relações entre duas variáveis são esta-
Pesquisa-ação: modalidade de pesquisa na qual o pesquisador participa como tisticamente significativas.
membro ativo e transformador do meio no qual realiza a investigação.
Raciocínio dedutivo: operação mental que se inicia numa proposição de porte geral
Pesquisa colaborativa: modalidade de pesquisa desenvolvida por duas ou mais e desta tira hipótese(s) sobre casos particulares.
pessoas que trabalham colaborativamente ao longo de todo o processo in-
vestigativo que vai desde a concepção, planejamento e desenvolvimento da Raciocínio indutivo: operação mental que, partindo de fatos particulares associados
pesquisa, passando pela coleta e análise dos dados e culminando com escrita entre eles, faz dessas associações uma proposição geral que indica a probabi-
conjunta do relatório final. lidade de tais associações se manifestarem em outras ocasiões; as proposições
de porte geral assim enunciadas se chamam generalização empírica.
Pesquisa experimental: aquela em que o pesquisador exerce controle sobre a va-
riável independente e sobre a constituição dos grupos de sujeitos. Racionalismo: filosofia que só valoriza o conhecimento que se fundamenta na razão.

Pesquisa não experimental: aquela em que o pesquisador não exerce qualquer Referência bibliográfica: conjunto de fontes efetivamente consultadas durante a
controle sobre a variável independente, nem sobre a constituição dos grupos elaboração de um trabalho.
de sujeitos.
Relato de experiência: descrição de uma experiência prática, mostrando resultados
Pesquisa quase experimental: aquela em que o pesquisador exerce controle sobre a obtidos e lições aprendidas e possíveis contribuições.
variável independente, mas não sobre a constituição dos grupos de sujeitos.
Resenha: descrição ou crítica do conteúdo de obra, apresentando informações
Pesquisa participante: modalidade de pesquisa na qual o pesquisador se integra às sobre autor, principais ideias, abordagens, conclusões e referências biblio-
atividades, podendo ou não intervir nelas. A pesquisa-ação é uma modalidade gráficas.
de pesquisa participante.
Resumo (abstract): sinopse, condensação, com apresentação das principais ideias
População: conjunto de indivíduos ou objetos sobre os quais se pesquisa. de um texto, sem comentários ou críticas.

Positivismo: corrente de pensamento científico que concebe como científicos Revisão de literatura: estudo crítico das publicações referentes à questão de
apenas os conhecimentos extraídos objetivamente do real, através de obser- pesquisa.
vação e verificação empírica sistemática.
Semiótica: ciência que estuda os sinais, suas combinações, seus significados e
Pós-teste: medida realizada após o término do tratamento. suas interpretações.

Premissa: cada uma das duas proposições de um silogismo. Separata: publicação avulsa de parte de um trabalho.
226 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

SOBRE OS AUTORES
Silogismo: argumento composto de três proposições, sendo que a terceira delas
é consequência lógica das duas primeiras.

Simulação: reconstituição passo a passo de um modelo.

Sondagem: técnica de coleta de dados por meio da aplicação de questionário Dario Fiorentini
em uma amostra. Licenciado em matemática pela Universidade de Passo Fundo
Sujeito: pessoa, indivíduo, participante pesquisado. (UPF/RS), mestre em matemática pela Unicamp e doutor em
educação (metodologia de ensino) pela Faculdade de Educação
Sumário: relação numerada das seções de uma obra, para facilitar a localização delas.
da UNICAMP sob a orientação de Ubiratan D'Ambrosio. Foi
Survey. veja “levantamento”.
por vários anos professor do ensino fundamental e médio no
Taxionomia: ciência das leis de classificação. interior do Rio Grande do Sul e, posteriormente, professor
Tema: parte da realidade (objeto, fenômeno ou situação) a ser pesquisada. de matemática da UPF. Atualmente é docente pesquisador da
área de educação matemática do Departamento de Ensino e
Teoria: conjunto de enunciados genéricos logicamente concatenados que ex-
plica, elucida ou unifica um dado domínio de fenômenos. Práticas Culturais (DEPRAC) e do Programa de Pós-Graduação em
Educação da Faculdade de Educação da Unicamp, tendo atuado
Tese: obra necessária à obtenção do título de doutor, defendida publicamente
perante banca composta por cinco doutores, caracterizada por contribuição
em disciplinas tais como pesquisa em educação matemática,
científica original. pesquisa e prática pedagógica em matemática, saberes docentes
e formação do professor, problemas e tendências em educação
Teste estatístico: tratamento numérico aos dados, para avaliar a validade de uma
hipótese. matemática. Linhas de pesquisa: educação matemática, saberes
docentes e formação do professor. É fundador e coordenador do
Triangulação: técnica de coleta e análise de dados pela qual, no mínimo, três
distintas fontes se posicionam a respeito de um mesmo fato ou situação. Grupo de Pesquisa Prática Pedagógica em Matemática (PRAPEM)
e de seus subgrupos GEPFPM e GdS. Publicou dezenas de
Validade: característica de técnica, instrumento ou indicador, que assegura a
artigos em periódicos nacionais e internacionais e organizou
adequação dele(a) ao tipo de dado a ser coletado.
cinco livros em parceria com outros colegas voltados à formação
Variância: soma dos quadrados dos desvios dividida pelo número de dados.
de professores e à prática pedagógica em matemática, além de
Variável: cada um dos conceitos envolvidos pelas hipóteses; o que muda de dezenas de capítulos de livros. E-mail: dariof(Qunicamp.br
valor.

Variável dependente: aquela que está submetida à influência de outra variável.

Variável independente: aquela que influi no valor de outra variável.


228 INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

(soyne op oambie :eyelBogo)


Sergio Lorenzato
Licenciado em matemática (UNESP/Rio Claro), mestre em educação
(UnB/Brasília), doutor em educação (Unicamp/Campinas) e pós- Dario
-doutor em educação matemática (Université Laval/Canadá). Fiorentini
Foi docente de cursos de graduação e pós-graduação em várias
Docente e pesquisador da Faculdade
universidades, na área de formação inicial e continuada de
de Educação da Unicamp — área de
professores. Foi cofundador do Círculo de Estudo, Memória e educação matemática. Licenciado (UPF/
Pesquisa em Educação Matemática (CEMPEM) e do Programa de Passo Fundo) e mestre em matemática
Pós-Graduação (mestrado e doutorado) em Educação Matemática (IMecc-UnicamP) e doutor em educação
na Faculdade de Educação da UNICAMP, onde atua como docente. pela Faculdade de Educação da Unicamp.
Dedica-se à divulgação da educação matemática, ministra cursos
e conferências e escreve livros e artigos.

(Jo3ne op oainbur :eiyeõojo))


Sergio
Lorenzato
É licenciado em matemática (UNESP/
Rio Claro), mestre em educação (UnB/
Brasília), doutor em educação (UNiIcAMP/
Campinas) e pós-doutor em educação
matemática (Université Laval/Canadá).
Atuou na implantação, coordenação e
docência de cursos de pós-graduação
em educação matemática em diversas
universidades. É docente da Faculdade
de Educação da Unicamp.

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