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Otimização da Logística de Manutenção baseada no Planejamento da


Distribuição de Materiais em uma Malha Ferroviária

Conference Paper · November 2020


DOI: 10.59254/sbpo-2020-122696

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3 authors, including:

Rafael Martinelli Eduardo Pestana de Aguiar


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Federal University of Juiz de Fora
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Otimização da Logı́stica de Manutenção baseada no Planejamento da
Distribuição de Materiais em uma Malha Ferroviária

Hugo Campbel
Departamento de Engenharia Industrial, PUC-Rio, Brasil
Rua Marquês de São Vicente, 225 RDC – Gávea – Rio de Janeiro / RJ
hugo.campbel@engenharia.ufjf.br

Rafael Martinelli
Departamento de Engenharia Industrial, PUC-Rio, Brasil
Rua Marquês de São Vicente, 225 RDC – Gávea – Rio de Janeiro / RJ
martinelli@puc-rio.br

Eduardo Aguiar
Departamento de Engenharia de Produção e Mecânica, UFJF, Brasil
Rua José Lourenço Kelmer, s/n - Campus UFJF - Juiz de Fora / MG
eduardo.aguiar@engenharia.ufjf.br

RESUMO
O uso de ferramentas de otimização destaca-se como um relevante diferencial para as
empresas no que tange a otimização de processos e melhoria de sistemas e performances. Neste
contexto, a busca por modelos de programação simples e eficazes para a resolução dos problemas
contribuem para adaptação de modelos existentes para atender a esta crescente demanda. O presente
artigo tem como objetivo realizar o planejamento da distribuição de materiais de manutenção em
uma malha ferroviária com o menor custo operacional viável. Para isto, o problema é modelado
como um problema de programação inteira mista e busca tornar o processo mais eficiente, com
redução de desperdı́cios e otimização dos recursos. Os resultados obtidos indicam que o modelo
é eficiente em tempo e qualidade de solução quando comparado com o atual, apresentando uma
redução de 20% nos custos totais de distribuição.

PALAVRAS CHAVE. Logı́stica Ferroviária, Planejamento da Manutenção, Estratégia de


Distribuição.
Tópicos: PM – Programação Matemática, L&T – Logı́stica e Transportes

ABSTRACT
The use of optimisation tools represents a relevant advantage to companies when it
comes to improving processes, systems and performance. In this context, the search for simple and
effective programming models for problem solving contributes to the adaptation of existing models
to attend this increasing demand. The present article aims to plan the distribution of maintenance
equipment in a railway with the best feasible operating cost. Therefore, the issue is presented as
a mixed-integer programming problem and aims at making the process more efficient with waste-
reduction and improvement of resources. The obtained results point out that the model is effective
both in terms of solution time and quality when compared to the current one, indicating a 20%
decrease in the total distribution costs.

KEYWORDS. Railway Logistics, Maintenance Planning, Distribution Strategy.


Paper topics: MP - Mathematical Programming, L&T – Logistics and Transportation
1. Introdução
Em um ambiente mundial cada vez mais competitivo cujo objetivo das empresas têm
sido a busca por otimização dos processos, os sistemas estão cada vez mais robustos e complexos.
Com isso, o uso de ferramentas de otimização é necessário para atender esta crescente demanda e
aumentar a eficiência na utilização dos recursos existentes, buscando simplificar e agilizar a tomada
de decisões.
Dentre as diversas áreas que estão se aperfeiçoando, a logı́stica ferroviária se tornou um
objeto de estudo e a aplicação de ferramentas de otimização está ganhando cada vez mais destaque.
Cordeau et al. [1998] destacam que a aplicação de métodos de otimização em ferrovias tem crescido
nos últimos anos em diversos paı́ses, entretanto, sua utilização ainda é rara e/ou superficial nas
ferrovias brasileiras [Fukasawa, 2002]. Dessa forma, para se tornarem competitivas no mercado
mundial, essas empresas precisam utilizar a otimização para operar de maneira mais eficiente.
Outro fator que indica a necessidade de ferrovias brasileiras otimizar seus processos é a
sua baixa representatividade no transporte de cargas do paı́s [Pereira, 2009]. Segundo estatı́sticas da
Pesquisa Custos Logı́sticos no Brasil, divulgada pela empresa de consultoria logı́stica Ilos [2012],
67% da carga transportada pelo Brasil foi movimentada por rodovias, enquanto apenas 18% pas-
saram por ferrovias. Aliado à expectativa de crescimento de demanda por transporte de cargas e à
sobrecarga do sistema rodoviário brasileiro, o modal ferroviário é uma alternativa eficiente e segura
frente ao caos apresentado nas rodovias nacionais, contribuindo para uma redução nos custos de
frete. Nesta perspectiva, o estudo da Ilos mostra ainda que o frete ferroviário é seis vezes menor,
se comparado com o rodoviário. Porém, como investimentos na construção de novas linhas férreas
demandam tempo e são extremamente caros, é preciso que os recursos ferroviários sejam melhor
aproveitados, melhorando a eficiência e desempenho deste sistema de transporte [Campos et al.,
2008].
Muitos problemas relacionados à otimização na logı́stica ferroviária podem ser encon-
trados na literatura, conforme apresentado em Cordeau et al. [2015]. Um problema comumente
estudado é o Problema de Elaboração da Grade de Trens. Segundo Caprara et al. [2002], seu obje-
tivo é determinar o itinerário e os horários de cada composição ao longo da malha ferroviária a fim
de maximizar o atendimento da demanda. Outro problema relacionado é o de Equipagem, que visa
reduzir os custos de contratação através da alocação ótima de maquinistas aos trens, respeitando as
regras da legislação trabalhista para o setor e as especificidades da operação ferroviária, de acordo
com a posição de cada locomotiva no trem e/ou equipamentos disponı́veis [Caprara et al., 1997].
Ainda relacionado com a maximização do atendimento da demanda operacional e redução dos cus-
tos de composição na formação dos trens, outros problemas abordados são: Problema de Fluxo de
Locomotivas, apresentado nos estudos de Ahuja et al. [2005] e de Kocjan [2001], e o Problema
de Fluxo de Vagões, estudado por Fukasawa [2002]. Martinelli et al. [2008] também abordam o
Problema de Planejamento no Atendimento, que visa definir o atendimento da demanda para um
determinado perı́odo, considerando aspectos relevantes como a extensão da malha ferroviária, ta-
manho das frotas e disponibilidade de material rodante (locomotivas e vagões).
A utilização de ferramentas de otimização vem se tornando frequente e mais difundida nas
ferrovias e alguns problemas possuem ampla abordagem e discussão na literatura, conforme men-
cionado acima. Entretanto, o mesmo não pode ser observado no âmbito de manutenção da malha,
no qual pouco se discute sobre a otimização dos processos e ganhos em eficiência. Os estudos exis-
tentes estão focados em priorização da manutenção através de mecanismos de detecção de falhas
[Meireles, 2010] ou no ganho de produtividade com sequenciamento das atividades [Branco Filho,
2008]. Não há, portanto, nenhum estudo que aborde a logı́stica e distribuição de materiais utilizados
para manutenção da via permanente.
Este trabalho tem como objetivo analisar o modelo atual de distribuição de material para
manutenção em uma malha ferroviária e sugerir um novo modelo baseado na distribuição por fer-
rovia. Além disso, os modelos serão comparados levando em consideração os custos logı́sticos
envolvidos, utilização de recursos necessários para a distribuição e eficiência do processo.
Este documento está organizado da seguinte forma: a Seção 2 apresenta o modelo de
distribuição atual com suas caracterı́sticas e particularidades. Na Seção 3, é apresentado o modelo
matemático utilizado na construção da proposta para distribuição de materiais. Os resultados obti-
dos a partir do modelo, suas caracterı́sticas e o comparativo com o modelo atual são encontrados
na Seção 4. Por fim, a Seção 5 resume quais foram as principais conclusões acerca dos resultados
alcançados e também sugere caminhos para a continuidade do trabalho em situações futuras.
2. Descrição do Problema
A empresa objeto de estudo é uma operadora logı́stica que controla grande parte da malha
ferroviária da região sudeste do Brasil. A companhia está entre as maiores ferrovias de carga do
mundo, com uma produção diversificada em contêineres, siderúrgicos, cimento, bauxita, agrı́colas,
carvão e minério de ferro. Um grande desafio para as empresas do setor é a gestão eficaz do nı́vel
de interferência mútua entre os trens e as comunidades, e a segurança de suas operações.
Para garantir a segurança operacional da malha, a companhia possui uma robusta área de
manutenção estratégica composta por: Engenharia, responsável por definir normas e técnicas de
manutenção que devem ser adotadas pela execução e priorização das atividades, de acordo com a
criticidade; Planejamento e Controle (PCM), que dimensiona e distribui os recursos com base na
capacidade de manutenção de cada local e conforme priorização determinada pela Engenharia; e a
Execução, responsável pela execução das atividades de manutenção seguindo os critérios definidos
pelas demais áreas.
Através das informações fornecidas pelas três sub-áreas mencionadas anteriormente, é
gerado o orçamento anual de manutenção da malha ferroviária. O orçamento é o documento que
determina o volume de manutenção por ano considerada para cada local e quais atividades serão
realizadas. Seu objetivo é garantir a segurança da linha para que a operação de trens seja realizada
de forma segura, sem restrições e/ou impactos. Este documento é ajustado e desmembrado no
Plano Trimestral de Manutenção da Via Permanente, que possui um horizonte de tempo menor
que o orçamento e, consequentemente, possibilita a maior assertividade dos locais com necessidade
de manutenção e o tipo de manutenção a ser realizada. O plano trimestral, também chamado de
cronograma de planejamento, determina o planejamento diário com a demanda de manutenção para
cada local. A priorização desta demanda é feita pela área de Engenharia e Confiabilidade, levando
em consideração critérios técnicos e parâmetros de inspeção de equipamentos, que diagnosticam a
confiabilidade e geometria da linha.
Para um melhor entendimento do processo de distribuição dos materiais e da formulação
matemática desenvolvida, é necessário detalhar alguns conceitos presentes na malha ferroviária:

• Pátios: são locais ao longo da malha ferroviária com duas ou mais linhas cujo objetivo é
desviar trens, realizar manobras, realizar carga ou descarga de material;

• Entre-pátio: é uma ligação entre dois pátios;

• Trechos: são pontos de ligação da malha, com origem e destino definidos, que podem con-
templar pátios e entre-pátios;
• Trem: é definido pelo conjunto de locomotivas e vagões associados com uma rota definida.
Durante a formação de um trem, ele é associado a uma rota e, consequentemente, fica restrito
a este trajeto, não sendo possı́vel circular por rotas alternativas.

• Dormentes: são peças colocadas transversalmente aos trilhos férreos com o objetivo de ga-
rantir a bitola da via (distância entre os trilhos), transmitindo os esforços do trilho para o
lastro. Os dormentes geralmente são compostos por madeira, mas também podem ser de aço,
concreto ou polı́mero;

• AMV: Os aparelhos de mudanças de via (AMV) são responsáveis por permitir que um trem
circule de uma linha para outra. Eles são compostos basicamente por Meia Chaves, Jacarés e
Contra-trilhos.

• Contra-trilho: É um pedaço de trilho colocado lateralmente ao trilho interno da via principal.


Sua função é servir de guia para as rodas do trem, assegurando a passagem correta das rodas
opostas pelo jacaré.

• Jacaré: Parte principal do AMV, o jacaré permite às rodas dos veı́culos ferroviários passar de
uma via para os trilhos da outra. Esta peça desgastam-se muito mais do que qualquer outro
componente da ferrovia e sua composição é de aço de alto carbono.

• Meia Chave: É um dos componentes do AMV, cuja função é variar a direção dos veı́culos.
Composta por agulha, trilho de encosto de agulha, escoras laterais, placas de apoio bitoladora
e de deslizamento, barra de conjugação e aparelho de manobra. É comum a subdivisão em
meia chave direita e meia chave esquerda.

• Vigotas: As vigotas são dormentes com dimensões maiores (variando entre 3,0 e 5,4 metros),
aplicadas em região de AMV’s.

• Demanda: É a necessidade de manutenção definida para ser realizada trimestralmente pelas


equipes de manutenção da via permanente.

• PCM: Área responsável pelo Planejamento e Controle da Manutenção, desdobrada nos se-
guintes setores: Malha Ferroviária, Material Rodante, Produtividade e Inovação e Materiais.
O setor de PCM Malha é responsável pela construção do Plano de Manutenção.

• Coordenação de Via: Corresponde a divisões da malha ferroviária em trechos menores para


facilitar o controle das equipes de manutenção e garantir a confiabilidade dos ativos. Ao todo
a empresa possui 20 coordenações distribuı́das em 3 estados.

• Estaleiro de Soldas: É o local responsável por realizar a soldagem de trilhos longos (240 me-
tros) e meia chaves, com o objetivo de garantir que os itens estejam dentro das especificações
para aplicação na ferrovia. Este local também prepara os trilhos utilizados na fabricação de
meia chaves, contra-trilhos e jacarés para envio ao fornecedor.

• Almoxarifado: Local para armazenamento dos materiais de manutenção até a necessidade


de uso. A empresa estudada possui três almoxarifados, sendo um por cada estado, devido a
caracterı́sticas especı́ficas de tributação.
A realização da manutenção requer a distribuição prévia dos materiais no local da ati-
vidade. É importante que este processo esteja alinhado para que não haja falha no planejamento,
programando uma equipe para execução da atividade sem que todos os materiais necessários já
estejam posicionados no local.

Atualmente, a logı́stica de distribuição dos materiais acontece de forma hı́brida, utilizando


tanto o transporte rodoviário quanto o ferroviário. Porém, o ferroviário é utilizado apenas para dis-
tribuir os materiais do pátio de cada coordenação até os locais de manutenção, ficando a cargo da
própria coordenação o posicionamento. Todas as etapas anteriores, com inı́cio no fornecedor até o
pátio de cada coordenação, são realizadas por rodovia. De acordo com o tipo de material transpor-
tado, a logı́stica possui uma caracterı́stica especı́fica. Para distribuição de dormentes, por exemplo,
o fornecedor entrega os materiais nas coordenações de via. No caso da distribuição de vigotas, o
fornecedor transporta os materiais até os almoxarifados, e para peças de AMV, o fornecedor realiza
a logı́stica até o Estaleiro de Soldas. A necessidade de todas as peças de AMV passarem pelo Es-
taleiro é uma questão tributária necessária no processo de distribuição de materiais. Sendo assim,
no caso das vigotas e peças de AMV, cabe então a própria empresa realizar a logı́stica rodoviária de
entrega dos almoxarifados ou do Estaleiro até o pátio principal de cada coordenação.

Conforme mencionado acima, o modo utilizado para distribuição dos materiais ainda é
muito dependente do transporte rodoviário, o que incrementa os custos da operadora logı́stica, além
de estar regida pelas limitações e caracterı́sticas das rodovias. Em resumo, o processo atual acontece
de maneira fragmentada, sem padrão no planejamento demandado e envolve alto volume de recursos
necessários (equipagem, locomotivas e vagões).

Outro fator relevante deste processo é que, devido ao significativo volume de material
transportado, a grande quantidade de destinos (ao todo a malha possui 20 coordenações de via) e a
baixa capacidade de transporte das carretas, a distribuição dos materiais não permite o planejamento
prévio ao longo do trimestre; isso aumenta ainda mais o volume de viagens realizadas. Esta carac-
terı́stica engessa o modelo de manutenção, pois algumas atividades crı́ticas emergenciais não podem
ser realizadas devido à falta do material na coordenação. Além disso, como o transporte ferroviário
fica a cargo das coordenações, cada uma deve ter um trem (formado por uma locomotiva e três
vagões) para posicionamento dos materiais ao longo do trimestre. Este alto dimensionamento de re-
cursos, muitas vezes, não está alinhado de forma estratégica, e atividades de rotina da coordenação
acarretam em atrasos no posicionamento e, consequentemente, na postergação de manutenção em
determinados locais. Todas essas caracterı́sticas e particularidades apresentadas dificultam o plane-
jamento de manutenção, o sequenciamento das atividades e, consequentemente, elevam os custos
de manutenção.

Com base nestes problemas discutidos, o novo modelo proposto tem por base o transporte
ferroviário para a distribuição dos materiais de uma forma otimizada, com redução de recursos
e ganho de produtividade. Este modelo melhora a eficiência logı́stica e auxilia na redução dos
custos operacionais de distribuição e posicionamento de materiais para a manutenção da via. Sua
caracterı́stica principal de entrega é que toda a logı́stica de material dos fornecedores seja feita
até os almoxarifados, e não mais até as coordenações. Dessa forma, a empresa irá sequenciar o
atendimento da demanda, minimizando os custos totais por meio da geração de trens, que sairão
carregados dos almoxarifados (origem) e serão descarregados nos pontos de manutenção (destinos)
ao longo da malha ferroviária. Após a descarga completa, o trem retorna ao almoxarifado para dar
sequência ao ciclo de distribuição, priorizando os locais, conforme modelo de otimização.
3. Formulação Matemática
O problema a ser formulado tem por objetivo minimizar o custo logı́stico no transporte
de material por meio do atendimento da demanda através da ferrovia. Este problema leva em
consideração o custo do trem carregado assim como o custo da tara do trem vazio, a distância
percorrida e a quantidade de carga que passa em determinado trecho por um trem, em especı́fico.
O desafio da formulação está em apresentar um modelo inicial que atenda a demanda de
cada item para um determinado local, por meio de trens de serviço que otimizem as paradas dentro
de uma rota logı́stica pré-definida pelo fluxo operacional da malha ferroviária. Dessa forma, o
objetivo do modelo é minimizar o custo total de transporte através do sequenciamento da demanda
para cada local.
Inicialmente, para a construção do modelo, alguns parâmetros foram determinados como,
por exemplo, a capacidade máxima de transporte de um trem. Esta capacidade (Q) possui um
valor fixo devido a padronização dos tamanhos dos trens (2 locomotivas e 6 vagões). Além disso,
o modelo será testado para cada um dos três almoxarifados separadamente, a fim de facilitar as
análises e conclusões por região.
O problema é modelado como um problema de Programação Inteira Mista (MIP) com
base em um modelo de fluxo com múltiplos produtos. Para isso, foram adicionadas várias restrições
visando garantir a conservação do fluxo de demanda e do fluxo de trens e atingir uma maior proxi-
midade com o problema real encontrado pela empresa.
Seja I o conjunto de itens a serem atendidos, K o conjunto de trens disponı́veis para aten-
dimento da demanda, P o conjunto de pontos da malha e T o conjunto de trechos, arcos orientados
de um grafo que ligam estes pontos (formando origem e destino). Baseando-se no modelo de fluxo
com múltiplos produtos, as primeiras variáveis criadas são os fluxos de demanda ftik , que indicam
a quantidade de cada item i que passa no trecho t da malha atendida pelo trem k. As primeiras
restrições, compostas por estas variáveis, determinam que, dado um ponto p da malha ferroviária
que não representa nem uma origem e nem um destino da demanda, a quantidade do item que entra
naquele ponto deve ser igual a quantidade do item que sai pelo mesmo ponto. Esta caracterı́stica in-
dica a conservação do fluxo de demanda, ou seja, só haverá alteração caso o ponto p em questão seja
um ponto de destino e essa diferença existente entre a quantidade de fluxo que entra no ponto δ + (p)
e a quantidade de fluxo que sai do mesmo ponto δ − (p) é a quantidade de demanda atendida wpi k do

item i naquele ponto p por um determinado trem k. É importante destacar que estas restrições de
fluxo não são aplicadas para o almoxarifado, representado no modelo como o ponto p = 0. Com
essas duas variáveis, surgem as primeiras restrições do problema:

X X
ftik − ftik = wpi
k
∀k ∈ K, p ∈ P \{0}, i ∈ I (1)
t∈δ + (p) t∈δ − (p)

Como um desdobramento deste primeiro conjunto de restrições, é necessário definir novas


restrições que limitem o volume do fluxo de demanda que sai do almoxarifado (p = 0) pelo trem k
ao volume de demanda atendida pelo mesmo trem para todos os pontos de atendimento p ao longo
da malha. Isto garante que não seja atendida uma quantidade maior de um determinado item do
trem k do que o fluxo daquele trem que sai do almoxarifado.

X X
ftik = k
wpi ∀k ∈ K, i ∈ I (2)
t∈δ − (0) p∈P
Embora as restrições apresentadas acima garantam a conservação de fluxo de demanda,
elas não garantem os fluxos dos trens, sejam eles carregados ou vazios. Dessa forma, se faz ne-
cessária a criação de outras restrições para garantir este fluxo. Com base neste problema, as
variáveis xkt são criadas, representando se o trem k é transportado pelo trecho t. Essas variáveis
assumem um valor binário, onde 1 indica que o trem é transportado pelo determinado trecho da
malha ferroviária e 0, caso contrário. Além disso, estas variáveis não diferenciam se os trens estão
carregados ou vazios, podendo representar ambos. É importante destacar que os trens devem sem-
pre ficar na malha, ou seja, se o trem entra em determinado trecho, ele também deve sair deste
determinado trecho. Logo, a diferença de trens para um mesmo ponto p pertencente ao trecho t
sempre deve ser nula, indicando a circulação operacional daquele trem.

X X
xkt − xkt = 0 ∀k ∈ K, p ∈ P (3)
t∈δ + (p) t∈δ − (p)

Todas as restrições descritas acima servem apenas para definir as caracterı́sticas dos flu-
xos, seja de demanda ou de trens, presentes no modelo. Entretanto, elas não limitam a quantidade
de cada demanda que será atendida e, por isso, é necessário criar restrições com esta finalidade.
Assim, as restrições de atendimento máximo da demanda podem ser definidas como o valor das
variáveis de demanda de cada item no ponto p para todo trem k e limitada à quantidade (em tonela-
das) demandada deste item neste ponto.

X
k
wpi = qpi ∀p ∈ P, i ∈ I (4)
k∈K

Cada trem possui uma capacidade máxima, em toneladas, que indica o peso total máximo
permitido de carga para este trem (Qk ). Sendo assim, o volume do fluxo de demanda dos itens no
trecho t pelo trem k deve ser limitado a esta capacidade máxima. Vale lembrar que se o trecho não
é um trecho viável para este trem, seu valor de demanda será nulo.

X
ftik ≤ Qk xkt ∀k ∈ K, t ∈ T (5)
i∈I

Por fim, é preciso incluir as restrições que garantem que o trem k saia no máximo uma
vez do almoxarifado.

X
xkt ≤ 1 ∀k ∈ K (6)
t∈δ − (0)

Com todas as restrições definidas, a formulação da função objetivo necessita apenas da


definição dos custos para ser criada. Os custos existentes estão relacionados com o custo de trans-
porte por quantidade (em tonelada) e distância (em quilômetros) do trem k (ck ), que varia conforme
o consumo do diesel pelas locomotivas de tração do trem e com o custo de tara do mesmo trem por
quilômetro percorrido (ctk ), isto é, o custo de transporte do trem vazio, considerando os custos de
maquinista, operador, equipagem e o próprio peso de formação do trem. A função objetivo mini-
miza o custo total composto pelo custo do transporte dos itens mais o custo de tara do trem. Dessa
forma, obtêm-se a formulação completa do problema, conforme detalhado abaixo:
X XX XX
min ck dt ftik + ctk dt xkt (7)
k∈K t∈T i∈I k∈K t∈T

sujeito a:
X X
ftik − ftik = wpi
k
∀k ∈ K, p ∈ P \{0}, i ∈ I (8)
t∈δ + (p) t∈δ − (p)
X X
ftik = k
wpi ∀k ∈ K, i ∈ I (9)
t∈δ − (0) p∈P
X X
xkt − xkt = 0 ∀k ∈ K, p ∈ P (10)
t∈δ + (p) t∈δ − (p)
X
k
wpi = qpi ∀p ∈ P, i ∈ I (11)
k∈K
X
ftik ≤ Qk xkt ∀k ∈ K, t ∈ T (12)
i∈I
X
xkt ≤ 1 ∀k ∈ K (13)
t∈δ − (0)

ftik ≥ 0 ∀k ∈ K, t ∈ T, i ∈ I (14)
k
wpi ≥0 ∀k ∈ K, p ∈ P, i ∈ I (15)
xkt ∈ {0, 1} ∀k ∈ K, t ∈ T (16)

Além das restrições apresentadas, as restrições (14) - (16) são os domı́nios das variáveis
ftik e k,
wpi que possuem valores positivos ou iguais a zero, e da variável binária xkt .
4. Resultados Experimentais
Para a realização dos testes experimentais de implementação do modelo, foi utilizada a
base de dados do Plano Trimestral de Via. Esta base de parâmetros fornece, por exemplo, os locais
necessários para descarga dos itens, a distância entre estes pontos e a quantidade de cada item
demandado para cada local. Através dela, é possı́vel obter também, qual almoxarifado é responsável
por atender um local especı́fico, permitindo segregar os dados conforme atendimento.
Os testes foram realizados para um dos três almoxarifados existentes em dois perı́odos,
correspondente ao 1o e 2o Trimestres de 2020, a fim de facilitar a interpretação dos resultados e o
comparativo com o modelo atual de distribuição de material. Como há similaridade entre todos os
almoxarifados, alterando apenas os pontos de descarga, sua aplicabilidade pode ser estendida para
qualquer caso. O almoxarifado analisado (descrito no modelo como o ponto p = 0) está localizado
no estado de Minas Gerais e atende a 39% das coordenações de via, que correspondem a 42% da
demanda total.
O modelo foi implementado utilizando a linguagem de programação Julia, rodando o
solver da biblioteca Gurobi, utilizando as configurações padrões. O computador utilizado possui
um processador Intel Core i5 1,80GHz e 8GB de memória RAM, com um sistema operacional
Windows 10 de 64 bits. O software Julia gerou um modelo de Programação Inteira Mista (MIP)
com soluções ótimas para o perı́odo em questão.
Os resultados foram obtidos com menos de 60 segundos, assumindo um GAP de 0,17%
para o perı́odo 1 e 0,21% para o perı́odo 2. Porém, o tempo de processamento foi limitado em 1
Perı́odo Variáveis V. Inteiras Restrições GAP
1 17.325 3.975 544.328 0,1691%
2 18.750 4.575 562.439 0.2171%
Tabela 1: Resultados experimentais dos testes

hora (3600 segundos) para garantir que a solução encontrada é a ótima. Os resultados referentes a
quantidade de variáveis e restrições por perı́odo estão compreendidos na Tabela 1.
Para comparação dos resultados obtidos no modelo com o processo atual de distribuição
de material, foram utilizados dois indicadores: custo de distribuição por coordenação e custo total
de distribuição. O custo de distribuição por coordenação é um indicador que analisa quanto custa,
em média, distribuir o material nos locais de demanda de uma determinada coordenação de via. O
modelo mostra que, em todas as 7 coordenações analisadas, houve redução dos custos, variando
entre 8 e 35% no Perı́odo 1 e entre 10 e 36% no Perı́odo 2, conforme gráfico abaixo (Figura 1). A
redução é mais significativa nas coordenações mais próximas do almoxarifado, visto que os custos
são diretamente proporcionais à distância percorrida, ou seja, quanto mais próxima do almoxari-
fado, menor os custos de distribuição para esta coordenação. Como a demanda varia conforme
necessidade de manutenção de cada local, este indicador precisa ser analisado trimestralmente com
base na demanda referente àquele perı́odo.

Redução dos custos de distribuição por coordenação

36%
35% 35%
33%

28%

24%
22%
21%
19%

16%
15%
13%

10%
8%

Coord. 1 Coord. 2 Coord. 3 Coord. 4 Coord. 5 Coord. 6 Coord. 7


Período 1 Período 2

Figura 1: Redução dos custos de distribuição por coordenação

Ao comparar os custos totais de distribuição entre os dois modelos, verificou-se uma


redução de, aproximadamente, 20% no Perı́odo 1 e 25% no Perı́odo 2. O fator que mais contribuiu
para esta redução foi o novo dimensionamento dos trens de distribuição; a utilização de locomotivas
reduziu em 71% e a de vagões reduziu em 82%. Esta redução é comum para os dois perı́odos
analisados e ocorre devido a eliminação dos trens de distribuição por coordenação. Sob o ponto de
vista estratégico, reduzir a utilização de locomotivas e vagões na manutenção representa um ganho
significativo de disponibilidade destes ativos para a operação, que poderá utilizá-los no transporte
de cargas. Outro fator que também contribuiu foi a eliminação dos custos relacionados ao transporte
rodoviário dos almoxarifados até às coordenações de via.

Indicador Modelo atual Modelo proposto Variação


Quantidade de locomotivas utilizadas 7 2 71%
Quantidade de vagões utilizados 42 6 86%
Redução dos custos logı́sticos 0% 20% 20%
Tabela 2: Análise dos indicadores

Os dois perı́odos analisados possuem algumas caracterı́sticas distintas. Enquanto o pri-


meiro tem um volume maior de demanda (cerca de 9%), o segundo possui maior quantidade de
locais destinados às descargas de material. Pode-se observar também que os pontos de descarga
no 1o Trimestre estão, em média, mais distantes do almoxarifado que no 2o perı́odo analisado.
Dessa forma, estas caracterı́sticas contribuem para o custo obtido pelo modelo para o perı́odo 1 ser
25% maior que o custo obtido para o perı́odo 2. Ou seja, o custo de distribuição é proporcional à
distância entre os pontos de demanda e o almoxarifado, e proporcional ao volume total de material
transportado pelos trens.
Por fim, o modelo proposto surge como uma alternativa para minimizar os riscos apresen-
tados no modelo atual. Sua principal caracterı́stica é a centralização da distribuição e utilização do
modal ferroviário para a logı́stica dos itens de manutenção. Isto permite reduzir custos e aumentar
a eficiência do processo, garantindo maior produtividade e utilização otimizada dos recursos. Do
ponto de vista do planejamento de manutenção, o modelo possibilita uma maior assertividade no
planejamento dos recursos atuando nos locais prioritários na data prevista e reduz os desvios do pro-
cesso relacionados aos atrasos dos fretes rodoviários e dificuldades no posicionamento ferroviário.

5. Conclusão
Este trabalho discutiu o problema de planejamento da distribuição de materiais em uma
malha ferroviária e apresentou um modelo de formulação matemática para sua resolução. Através
do modelo, foi possı́vel obter uma solução ótima que minimiza os custos logı́sticos deste processo.
Se comparado com o modelo atual, o novo modelo é cerca de 20% mais econômico, para o almo-
xarifado considerado nos testes.
Os resultados do estudo, embora preliminares, foram satisfatórios, considerando o limite
de escopo, as premissas assumidas e a qualidade dos dados disponibilizados. O estudo de caso
em questão alocou os itens de manutenção conforme capacidade dos trens, custos de transporte e
quantidade demandada por local. A principal contribuição deste estudo é abordar uma nova visão
de distribuição dos itens de manutenção, utilizando melhor o transporte ferroviário, a capacidade
dos trens e minimizando os custos com fretes rodoviários.
Como próximos passos, o modelo deve ser testado também para os demais almoxarifados,
a fim de possibilitar a comparação do processo como um todo. Além disso, é preciso que o modelo
seja testado considerando diferentes tipos de itens e diferentes tamanhos de trens, o que permitirá
obter análises relevantes e mais concretas.
Acredita-se que, com possı́veis melhorias propostas, o modelo desenvolvido possa ser
aplicado para otimização em diversas empresas do setor ferroviário. Uma continuação deste estudo
poderia explorar a definição do tamanho ótimo dos trens e a localização ótima dos almoxarifados,
de forma a garantir a otimização total do processo de distribuição de materiais por ferrovia.

6. Agradecimentos
O presente trabalho foi realizado com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Cientı́fico e Tecnológico (CNPq), processos 313521/2017-4, 425962/2016-4 e 433389/2018-4, da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nı́vel Superior - Brasil (CAPES) - Código de Fi-
nanciamento 001, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) -
APQ-02922-18, da Pontifı́cia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e da Universi-
dade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

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