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Educação literária
Um rei moço e valente partira a batalhar por terras distantes, deixando só e triste a rainha e um
filho pequeno. O rei perdeu a vida numa das batalhas e foi chorado pela rainha. Sendo herdeiro natural do
trono, o bebé estava sujeito aos ataques de inimigos dos quais e se destacava o seu tio, irmão bastardo do
rei morto, que vivia num castelo sobre os montes, com uma horda de rebeldes. O pequeno príncipe era
amamentado por uma aia, mãe de um bebé também pequeno. Alimentava os dois com igual carinho pois
um era seu filho e outro viria a ser seu rei. A escrava mostrava uma lealdade sem limites.
Porém, o bastardo desceu da serra com a sua horda e começou uma matança sem tréguas. A
defesa estava fragilizada pois a rainha não sabia como fomentá-la, limitando-se a temer e a chorar a sua
fraqueza de viúva sobre o berço de seu filho. Uma noite a aia pressentiu uma movimentação estranha,
verificando a presença de homens no palácio. Rapidamente se apercebeu do que iria passar-se e trocou,
sem hesitar, as crianças dos respetivos berços. Nesse instante, um homem enorme entrou na câmara,
arrebatou do berço de marfim o pequeno corpo que ali descansava e partiu furiosamente. A rainha, que,
entretanto, invadira a câmara, parecia louca ao verificar as roupas desmanchadas e o berço vazio. A aia
mostrou-lhe, então, o berço de verga e o jovem príncipe que ali dormia.
Entretanto, o capitão dos guardas veio avisar que o bastardo havia sido vencido, mas infelizmente o
corpo do príncipe tinha também perecido. A rainha mostrou, então, o bebé e, identificando a sua
salvadora, abraçou-a e beijou-a, chamando-lhe irmã do seu coração. Todos a aclamaram, exigindo que
fosse recompensada. A rainha levou-a ao tesouro real, para que pudesse escolher a joia que mais lhe
agradasse. A ama, olhando o céu, onde decerto estava o seu menino, pegou num punhal e cravou-o no seu
coração, dizendo que agora que tinha salvado o seu príncipe tinha de ir dar de mamar ao seu filho.
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Professora: Ana Cristina Costa
Categorias da narrativa – “A Aia” – Eça de Queirós
F) F – A aia temia verdadeiramente pelo principezinho por causa do tio cruel, que estava faminto
pelo trono.
G) V
H) F – Após a aia se ter apercebido de uma movimentação estranha e após ter compreendido o que
estava a acontecer, trocou sem hesitações, as crianças dos respetivos berços.
I) V
J) F – Por ter salvado o príncipe e o reino, a aia foi levada …, com o qual se matou, para poder ir dar
de mamar ao seu filho, que, segundo as suas crenças, estaria no Céu.
O título do conto
A palavra “aia” significa “dama de companhia” ou “mulher encarregada da educação doméstica de
uma criança filha de nobres”. No caso deste conto, a aia é uma ama que amamenta um principezinho, uma
ama de leite.
O título do conto destaca a personagem principal (a protagonista). O determinante artigo
definido “a” destaca a importância desta aia, o seu carácter exemplar.
Estrutura da Ação
Este conto apresenta a estrutura habitual de uma narrativa: introdução (ou situação inicial),
desenvolvimento e conclusão (ou desenlace).
Identifica, no texto, cada uma destas partes, estabelecendo os respetivos limites e o assunto de
cada uma delas.
Reação das personagens à morte do rei, assalto ao palácio por parte do tio bastardo para se apoderar do
reino, troca dos bebés pela aia, morte do filho da aia, reação das personagens ao salvamento do
principezinho.
Peripécias:
- comportamento / reação das personagens aquando da morte do rei;
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- assalto ao palácio;
- a aia troca as crianças quando pressente o ataque ao palácio pelo ambicioso e malvado tio e a sua horda;
- o rapto;
- revelação de que o principezinho está vivo reação das personagens a esta notícia;
- a rainha percebe que a aia salvou o seu filho e deixa-a escolher o tesouro que ela desejar;
Conclusão / desenlace
(três últimos parágrafos)
Desfecho da narrativa: a aia anuncia que vai dar de mamar ao filho e suicida-se.
Neste conto estamos perante uma narrativa fechada, pois apresenta um desenlace irreversível.
Sequências narrativas que constituem a ação
1ª (parágrafos 2 e 3) – notícia da morte do rei e consequente desgosto da rainha;
2ª (parágrafos 4 a 7) – os receios da aia que teme pela vida do seu príncipe que ficou exposto aos ataques
dos inimigos;
3ª (parágrafo 8) – os preparativos, no palácio, para enfrentar o bastardo que começara já a atacar o povo;
6ª (parágrafos 11 e 12) – a rainha pensa que o príncipe foi raptado, mas a serva acalma-a mostrando-lho no
7ª (parágrafos 13 e 14) – a rainha mostra à sua gente, que pensava que o herdeiro tinha sido morto com o
bastardo, que, afinal, o príncipe está vivo e que fora a aia quem o salvara. Todos aclamam e pedem que
8ª (parágrafos 15 e 16) – a aia é conduzida ao tesouro real para escolher uma joia;
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A articulação das sequências narrativas (momentos de avanço) faz-se por encadeamento, uma vez
que os acontecimentos são narrados respeitando a ordem cronológica.
Os momentos de pausa (descrição) abrem e fecham a narrativa e interrompem, por vezes, a
narração com descrições (espaço – destaca-se a descrição da sala do tesouro real-, objetos (punhal),
personagens - bebés).
Personagens
As personagens deste conto não são identificadas pelo seu nome próprio. De facto, o importante é
realçar comportamentos humanos, negativos (tio) ou positivos, designadamente as atitudes da aia, não
sendo, pois, importante a individualização das personagens. A ausência de nomes próprios reforça a
intemporalidade da história.
Relevo
Rei, Rainha, tio bastardo e crianças (repare-se que os bebés não têm ação autónoma, mas pela sua
importância, não são apenas figurantes) – secundárias
Cavaleiro que traz a notícia da morte do rei, os soldados de um e do outro lado, pajens, as aias, a gente
fiel da rainha e a multidão – figurantes
Ao longo do texto está presente o processo de caracterização direta, pois as informações são dadas
pelo narrador. No entanto, há também informações que são deduzidas a partir do comportamento das
personagens (caracterização indireta).
Caracterização /
Personagens Caracterização / Retrato psicológico
Retrato físico
Aia Caracterização direta: Caracterização direta: (5º §) “leal escrava”, (6º §) “ela tinha a
paixão, a religião dos seus senhores” (hipérbole), “ Nenhum
(5º §) “bela e robusta”,
pranto correra mais sentidamente que o seu pelo rei morto”,
(16º §) “olhos
“Pertencia, porém, a uma raça que acredita que a vida da Terra
brilhantes e secos”
se continua no céu”, (7º §) “tremia pelo seu principezinho”,
(14º §) “Serva sublimemente leal!”, “serva admirável”.
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acima de tudo: o dever de escrava e o dever de mãe. O desejo da aia de provar que a cobiça e a ambição
podem estar arredadas de um coração leal, fez com que ela escolhesse um punhal para pôr termo à sua
vida. Trata-se de um objeto pequeno, certeiro que remete para o caráter decidido da personagem e que
era o maior tesouro que aquela mulher ambicionava, pois, esse objeto lhe abriria caminho para o encontro
com o seu filho, para cumprir o seu dever de mãe, dando-lhe de mamar.
O rei, a rainha, o tio, o príncipe e o escravo são personagens secundárias e planas. Não são identificadas
por um nome próprio uma vez que remetem para a intemporalidade da história.
As crianças estão, no conto, marcadas pela sua posição social: uma dorme em berço de ouro entre
brocados, a outra, num berço pobre e de verga. À hora da morte é por essa marca que o inimigo vai
identificar o futuro rei. O príncipe não intervém diretamente na ação, mas é o centro das atenções de todas
as personagens. A personagem escravo existe para salvar a vida do príncipe.
- entregue à morte
- a aia beijava
pela mãe, morreu nas
ligeiramente
mãos dos homens do
tio bastardo
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as suas mãos
- foi salvo
pela aia
Símbolos
Ao longo da ação há inúmeras referências ao ouro, material precioso e incorruptível, símbolo de perfeição.
Para além do seu valor material, simboliza a salvação, a elevação de uma forma superior de vida, mais
espiritual. O príncipe, frágil e inocente, tem cabelos louros e dormia no seu berço com o seu guizo de ouro
fechado na mão. Na câmara dos tesouros todos os objetos cintilavam e até o céu se tingia de ouro. E era no
céu que se encontrava o escravo salvo dos perigos e era junto dele que a aia desejava estar.
Por outro lado, a presença da escuridão, da noite, ao longo da ação, acentua o carácter trágico da mesma.
Os cabelos negros do escravo, em contraste com os cabelos louros do príncipe são referências à morte do
primeiro versus a salvação do segundo.
Tempo
Não há referências a datas ou locais que permitam, claramente, localizar a ação no tempo. Há
apenas algumas expressões referentes ao tempo: (1º §) “Era uma vez…” (cf. Conto tradicional,
intemporalidade e exemplaridade);
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Noite (conota escuridão, morte, tragicidade): (2º §) «lua cheia […] começava a minguar»; (4º §),” havia
anos”, “agora”; (5º §) «noite de verão», (9º §) «Ora uma noite, noite de silêncio e de escuridão», (13º §) “e
nesse instante”;
Madrugada: (16º §) «luz da madrugada, já clara e rósea»; «nesse céu fresco de madrugada»; «e já o Sol se
erguia, e era tarde»; (18º §) «onde subiam os primeiros raios de Sol».
É à noite que ocorrem os principais acontecimentos desta história como: o nascimento do príncipe
e do escravo, o ataque ao palácio, a troca das crianças, as mortes do escravo, do tio e da sua horda.
No entanto, a ação fecha com a morte da aia, de madrugada (símbolo de esperança).
Tempo do discurso
O núcleo central da ação centra-se numa noite. A condensação de um tempo da história longo,
numa narrativa curta (conto) implica a utilização de sumários ou resumos (processo pelo qual o tempo do
discurso é menor do que o tempo da história) e de elipses (omissão do que aconteceu num determinado
período temporal mais ou menos longo da história) - anisocronias
Ex.: 2º parágrafo
Quanto à ordenação dos acontecimentos, predomina o respeito pela sequência cronológica -
Sincronia
Os tempos verbais predominantes são o pretérito mais-que-perfeito, o pretérito imperfeito e o
pretérito perfeito do modo indicativo.
Tempo histórico
Toda a atmosfera do conto sugere que a ação se passa na Idade Média, quando o rei e a nobreza
viviam em palácios, tinham escravos, pajens e tesouros e se envolviam em guerras pela conquista de novos
territórios. Era um tempo de guerras civis pelo poder e de grande crueldade.
Espaço
Físico
A ação desenrola-se num reino (na Índia) grande e rico «abundante em cidades e searas» (1º §), e,
mais concretamente, num palácio. Toda ação decorre neste espaço, sendo que alguns recantos do palácio
são sobrevalorizados por oposição a outros, por exemplo, a câmara onde o príncipe e o filho da escrava
dormiam e a câmara dos tesouros, por se tratarem dos espaços correspondentes às sequências narrativas
mais importantes.
No entanto, alguns espaços exteriores adquirem alguma importância como por exemplo: o
primeiro é o espaço onde o rei é derrotado (“à beira de um grande rio”) e consequentemente morto o que
vai deixar a rainha viúva, o filho órfão e o povo sem rei; o segundo acaba por ser um elemento
caracterizador do vilão do conto: (4º §) «vivia num castelo sobre os montes […] à maneira de um lobo, que
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entre a sua atalaia, espera a presa», (8º §) “no cimo das serras”. Através desta apresentação, o leitor fica
na expectativa do que irá acontecer, visto que ela é indicadora de confrontação e de tragédia. É também
determinante no clima que se vive no palácio, que denota temor e insegurança.
O espaço é descrito do geral para o particular, do exterior para o interior. Primeiramente, é
apresentado «um reino abundante em cidades e searas», onde se situa um palácio (8º, 9º, 12º §),
habitado por um príncipe frágil que é protegido no seu berço pela sua ama. À medida que se desenrolam os
acontecimentos, o espaço vai-se concentrando cada vez mais, acabando a aia por se suicidar na câmara dos
tesouros (16º §). Verifica-se um afunilamento do espaço.
No exterior, no alto, encontramos um «castelo sobre os montes», «o cimo das serras», povoado
pelo tio bastardo e a sua horda, que vigiam a presa – o príncipe que vivia no palácio. Cá em baixo, (8º §)
«na planície, […] as portas da cidade» existe um palácio, onde a população e o príncipe estão
desprotegidos e são presa fácil. No interior da «casa real» (6º §) há uma câmara (10º §) com um berço,
pátios (12º §), a galeria (13º §) de mármore e a “câmara dos tesouros” (16º §).
Social
Quanto ao espaço social temos a descrição de um ambiente de corte. Os costumes, vivências,
organização social são típicos da vida palaciana: palácio real, rei, rainha, príncipe, aias, pajens, cavaleiros,
nobreza, guardas, tesouros, etc.
Narrador
Presença
Ciência / Focalização
Narrador omnisciente (conhece profundamente a história, inclusive o mundo interior das
personagens).
Posição/Ponto de vista
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Categorias da narrativa – “A Aia” – Eça de Queirós
Quanto à sua posição, o narrador parece ser objetivo, na medida em que não toma diretamente
posição sobre os acontecimentos que narra.
No entanto, em certas passagens do texto, percebemos, sobretudo através de alguns adjetivos que
usa, que o narrador está do lado da aia e contra o bastardo que caracteriza como “depravado”, “cruel”;
“homem de rapina”. O uso do discurso indireto livre, das interjeições e da frase exclamativa também
contribui para mostrar a imparcialidade não declarada, mas tácita, do narrador.
Modos de expressão ou Modos de representação do discurso
Narração e Descrição
Exemplo de momento de pausa (descrição) – 4º parágrafo; 16º parágrafo “Do chão de rocha [...]” até “[…]
durante vinte séculos.”
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Categorias da narrativa – “A Aia” – Eça de Queirós
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Hipérbole “acumuladas por cem reis durante vinte Engrandece a riqueza existente 16
séculos” na câmara dos tesouros.
Comparação “de face mais escura que a noite e o Destaca a maldade do tio e 7
coração mais escuro que a face” transmite a ideia de que uma
(comparação hiperbólica) tragédia se aproxima.
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Categorias da narrativa – “A Aia” – Eça de Queirós
principezinho (“presa”)
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Categorias da narrativa – “A Aia” – Eça de Queirós
“corpinho”
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