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O campo da Saúde Coletiva no Brasil: definições e

debates em sua constituição1


The field of Collective Health in Brazil: definitions and debates
on its constitution

Alan Osmo Resumo


Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina. Departamento
de Medicina Preventiva. Programa de Aprimoramento Profissional A Saúde Coletiva pode, em um primeiro contato,
em Saúde Coletiva. São Paulo, SP, Brasil. parecer bastante múltipla e fragmentada. Buscando
E-mail: alan.osmo@usp.br compreender melhor o que a define como conhe-
Lilia Blima Schraiber cimento e atuação na sociedade, realizou-se uma
Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina. Departamento recuperação de natureza teórica das considerações
de Medicina Preventiva. São Paulo, SP, Brasil. históricas e epistemológicas desenvolvidas por
E-mail: liliabli@usp.br
pesquisadores dedicados a caracterizá-la como
campo científico e social. Primeiro, com base nessa
produção bibliográfica, foi feita uma breve carac-
terização da emergência da Saúde Coletiva. É de
se destacar que suas origens situam-se no final da
década de 1970, em um contexto no qual o Brasil
estava vivendo uma ditadura militar. A Saúde Co-
letiva nasce, nesse período, vinculada à luta pela
democracia e ao movimento da Reforma Sanitária.
Apontam-se as influências do preventivismo e da
medicina social em sua constituição. Ao longo deste
estudo, foram exploradas distintas tentativas de sua
delimitação como campo de saberes e de práticas.
Buscou-se apresentar a Saúde Coletiva não com uma
definição única, mas considerando a multiplicidade
de construções encontradas, o que permite apontar
para uma identidade de difícil elaboração e ainda
em desenvolvimento.
Palavras-chave: Saúde Coletiva; Medicina Social;
Domínios Científicos; Conhecimento.

Correspondência
Lilia Blima Schraiber
Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina. Departamento
de Medicina Preventiva.
Av. dr. Arnaldo, 455, 2º0 andar. São Paulo, SP, Brasil. CEP 01246-903.
1 Este artigo foi elaborado a partir de um trabalho, “O campo da Saúde Coletiva: definições e debates na sua constituição”, anteriormente
apresentado pelos autores no VI Congresso Brasileiro de Ciências Humanas e Sociais em Saúde, em 2013.

DOI 10.1590/S0104-12902015S01018 Saúde Soc. São Paulo, v.24, supl.1, p.205-218, 2015 205
Abstract Introdução
At first sight, Collective Health might seem to be O que instigou a escolha do tema para este trabalho
multiple and fragmented. Aiming to understand foi a percepção de que a Saúde Coletiva pode, em
better what defines it as knowledge and activity in um primeiro contato, parecer bastante múltipla e
society, we made a theoretical review of historical fragmentada, tanto do ponto de vista teórico quanto
and epistemological considerations developed by do prático. Pretendendo, então, conhecê-la melhor,
researchers who dedicated themselves to character- foi realizado um estudo a partir da produção em
izing it as a scientific and social field. First, based Saúde Coletiva na tentativa de buscar respostas
on this literature, we provide a brief panorama of para as questões: O que caracteriza e define a Saú-
the emergence of Collective Health in Brazil. It is de Coletiva? O que a distingue de outros campos de
important to notice that its origins date back to conhecimento e intervenção?
the end of the 1970s, in a context in which Brazil Com a qualidade de uma primeira reflexão sobre
was experiencing a military dictatorship. Collective essas questões, optamos por revisitar estudos que se
Health emerges, at that moment, connected with the dedicaram a pensá-la como um campo específico e que
struggle for democracy and with the Health Reform foram realizados por autores considerados referência
movement. We show the influences of preventive na Saúde Coletiva, tanto por figurarem entre aqueles
medicine and social medicine in its constitution. que participaram da elaboração e implantação da
Then, we explore different attempts to delimit it proposta de uma Saúde Coletiva no país, ao final
as field of knowledge and practice. We sought to dos anos 1970, quanto por serem pesquisadores da
present Collective Health not through one single
Epidemiologia, das Ciências Humanas e Sociais em
definition, but taking into account the multiplicity
saúde e também da Política, Planejamento e Gestão
of constructions about it that we found. This allows
em saúde, que, desde esses distintos ramos da Saúde
us to point to an identity of difficult development
Coletiva, estudaram sua constituição.
and that is still under construction.
A referência de que a Saúde Coletiva configura
Keywords: Collective Health; Public Health; Social
um “campo” é registrada em quase todas as publi-
Medicine; Scientific Domains; Knowledge.
cações. Neste texto, manteremos essa referência
seguindo Paim e Almeida Filho (1999, 2000), que,
em suas reflexões sobre a Saúde Coletiva, caracte-
rizam-na como “campo de conhecimento e âmbito
próprio de práticas”: “A Saúde Coletiva pode ser
considerada como um campo de conhecimento de
natureza interdisciplinar cujas disciplinas básicas
são a epidemiologia, o planejamento/administração
de saúde e as ciências sociais em saúde” (Paim;
Almeida Filho, 2000, p. 63).
No entanto, em recente publicação que examina
a Saúde Coletiva, essa qualificação de “campo”,
desde o início embasada pelo conceito cunhado por
Pierre Bourdieu (1993), é relativizada, considerando
que a Saúde Coletiva, ora denominada como “área”,
ora como “espaço social”, aponta em seu desenvol-
vimento uma tendência para consolidar-se como
um campo (Vieira da Silva; Paim; Schraiber, 2014).
Conhecendo essa questão em aberto, como um
campo futuro ou consolidado, instigou-nos, sobre-
tudo, a delimitação de uma identidade, científica

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e prática, com base em seus conteúdos de saber e A constituição do campo da Saúde
âmbitos de intervenção. Desse modo, buscamos,
nessa mencionada revisita às publicações sobre a Coletiva
construção da Saúde Coletiva, explicitar quais do- As origens do campo da Saúde Coletiva são situadas
mínios de competência se fala desde suas origens. por Nunes (1994) na década de 1950. Vieira-da-Silva,
Menos que uma revisão bibliográfica, portanto, Paim e Schraiber (2014) reforçam o final da década
este trabalho busca uma releitura de importantes de 1970 utilizando como marco o surgimento do
discussões sobre a identidade da Saúde Coletiva. termo Saúde Coletiva no Brasil e a criação da asso-
Trata-se de um esforço para se ter uma clareza ciação civil que representaria o campo – a Associação
maior sobre o que constitui “o todo” da Saúde Cole- Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva
tiva, tentando superar uma possível visão fragmen- (Abrasco) –, não negando as raízes apontadas por
tária baseada nos diversos recortes disciplinares Nunes em períodos anteriores. A Saúde Coletiva
que a compõem, de modo, inclusive, a compreender consolidou-se, então, com esse nome e com suas
melhor uma construção de sua identidade. Segundo especificidades no Brasil. Apesar de o nome não ter
Everardo Nunes (2005), tal esforço parece ser uma sido adotado em outros países, muitos autores veem
preocupação importante na própria história da a Saúde Coletiva como parte de um movimento mais
Saúde Coletiva: amplo da América Latina, como aponta o próprio
Nunes (1994).
Recuperar a história e desvendar sua composição
Com base em uma distinção entre “projeto” e
interna (epistemé) tem sido uma das preocupações
“campo” de Saúde Coletiva, Nunes (1994) apresenta a
presentes em diversos trabalhos e análises que vêm
emergência desse campo composta por três momen-
acompanhando a própria construção da Saúde Co-
tos: o primeiro, denominado fase pré-Saúde Coletiva,
letiva no Brasil. Esse esforço tem estado presente
durou os primeiros quinze anos a partir de 1955, e
desde os anos 80 e se estende até a atualidade,
foi marcado pela instauração do projeto preventi-
buscando fornecer os elementos que configurem
vista; o segundo, que vai até o final dos anos 1970,
nossa identidade e revelem quem somos, onde nos
é denominado fase da medicina social; o terceiro vai
situamos, o que fazemos, quais os produtos de
do final dos anos 1970 até pelo menos 1994, quando
nossas práticas (p. 14).
o autor escreveu o artigo Saúde coletiva: história de
O presente artigo está divido em duas partes. A uma ideia e de um conceito. O autor considera este
primeira faz uma breve apreciação sobre a constitui- último segmento como sendo o período da Saúde
ção da Saúde Coletiva, tal como apresentada por au- Coletiva propriamente dita. Segundo Nunes (1994,
tores do campo, em que damos destaque às correntes p. 2), “a emergência desses projetos reflete, de um
de pensamento em torno a processos saúde – doença modo geral, o contexto socioeconômico e político-
em coletivos, como formas de aproximação distintas ideológico mais amplo, como também as sucessivas
de uma saúde pública e com base no olhar cunhado crises, presentes tanto no plano epistemológico,
pela medicina da modernidade. O modo como são como das práticas de saúde e da formação de recur-
articuladas questões da medicina e da saúde públi- sos humanos”.
ca é a referência para a compreensão das questões Nesse sentido, Paim e Almeida Filho (1999)
que cercam o conteúdo disciplinar que a proposta também alertam para a importância do contexto
da Saúde Coletiva abraçou. A nossa segunda parte nas questões relativas ao campo do conhecimento.
explora contrastes entre distintas tentativas de de- Esses autores, a partir de ideias de Kuhn e de Rorty,
finição da Saúde Coletiva. Tais contrastes também defendem que a construção do conhecimento cientí-
constam em textos de autores do campo, os quais fico não é produzida pelos investigadores de forma
trazem diferentes perspectivas de delimitação da isolada, em abstrato, mas ocorre, sim, organizada
Saúde Coletiva, já indicando em seu interior uma institucionalmente, dentro da cultura, imersa na
grande multiplicidade de correntes de pensamento linguagem. A ciência seria, portanto, determinada
acerca de suas definições como campo. social e historicamente. Os autores propõem que a

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ciência deva ser entendida como uma prática social tros conhecimentos, mas fornecer uma visão mais
que tem fundamentos particulares, que se exerce em completa do indivíduo (Nunes, 1994, p. 7).
um processo de diálogo e de negociação destinado
O fato de que o ensino fosse pautado na especiali-
à produção de um consenso localizado e datado,
zação tornava a educação médica muito estilhaçada.
baseado em uma certa solidariedade dos atuantes
Como reação a isso, buscou-se realizar propostas de
da comunidade científica.
mudanças no ensino, a fim de que o futuro profissio-
A nosso ver, um importante aporte dessa pe-
nal médico tivesse uma compreensão do indivíduo
riodização está em evidenciar o preventivismo e
como um todo, acreditando-se que, assim, haveria
a medicina social como abordagens do processo
uma recomposição do bio-psico-social que tinha
saúde-doença em coletivos que podem ser reconhe-
sido fragmentado. O movimento social que originou
cidas como as raízes da proposta de Saúde Coletiva
a Medicina Preventiva como disciplina do currí-
elaborada no Brasil e que tiveram influência na
culo das escolas médicas denominou-se Medicina
implantação institucional do campo.
Integral, com o objetivo de buscar a recomposição
A seguir, vamos caracterizar essas raízes para
das práticas especializadas (Schraiber, 1989). Dele,
que se possa compreender a modalidade de propo-
porém, resultou apenas a inclusão de uma única
sição disciplinar e prática que constituíam.
disciplina curricular, ainda que perpassasse diver-
O preventivismo sos momentos da formação do médico, mas sem
Segundo Paim e Almeida Filho (1998), na década que outros projetos integradores além do ensino da
de 1940, começou-se a diagnosticar nos Estados prevenção fossem incorporados, quer na formação
Unidos uma crise de determinada medicina, que dos médicos, quer em termos de seus exercícios
estava extremamente especializada e fragmentada, profissionais em serviços de saúde. Como apontou
o que ocasionava, também, um aumento dos custos Schraiber (1989), essas propostas pretendiam uma
relacionados às práticas médicas. Em resposta a reforma da prática médica, mas pressupunham
isso, surgiram propostas de mudanças no ensino que essa reforma seria alcançada pela formação do
médico, incorporando nele uma ideia de prevenção. médico, como se cada médico em sua prática fosse o
Essas propostas serviram de base para uma reforma principal recurso transformador da forma de prestar
dos currículos escolares dos cursos de medicina de assistência à população. Esse modo de olhar a refor-
várias faculdades norte-americanas na década de ma da prática médica foi bem caracterizado, como
1950. Organismos internacionais do campo da saúde uma leitura liberal e individualizante das questões
aderiram à nova doutrina, que veio a ser chamada sociais, bastante próprio à cultura norte-americana
de Medicina Preventiva, ocorrendo, então, uma in- relativamente ao papel do Estado na sociedade, por
ternacionalização dessa proposta. Arouca (2003) em publicação hoje considerada um
Nunes (1994) aponta que a emergência do “proje- marco para a Saúde Coletiva brasileira (Vieira da
to preventivista”, na América Latina, aconteceu na Silva; Paim; Schraiber, 2014).
segunda metade dos anos 1950, nos seminários que Além da Medicina Preventiva, chegou na Améri-
se realizaram no Chile e no México, sob o patrocínio ca Latina a Medicina Comunitária. Esta surgiu, na
da Organização Pan-americana de Saúde (Opas). As década de 1960, também nos Estados Unidos, em um
reformas defendidas apareceram vinculadas a um período de intensa mobilização popular e intelectual
plano pedagógico: em torno das questões sociais. Como mostraram
Donnangelo e Pereira (1976), a Medicina Comunitá-
O grande saldo do período é a inclusão, no curso ria foi uma resposta à baixa cobertura de assistência
de graduação em medicina, de disciplinas e temas médica aos mais pobres, tais como comunidades ca-
associados à epidemiologia, ciências da conduta, rentes de migrantes ou de estratos de baixa renda da
administração de serviços de saúde, bioestatística. sociedade norte-americana, e à baixa cobertura aos
Procurava-se, dessa forma, ao criticar a biologiza- idosos, que, por estarem fora do mercado de trabalho,
ção do ensino, calcado em práticas individuais e também ficavam sem acesso adequado aos serviços
centradas no hospital, não somente introduzir ou- médicos. Diversos modelos de intervenção foram,

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então, testados e institucionalizados sob a forma de Vieira da Silva; Paim; Schraiber, 2014). Ao valorizar
movimentos organizados em comunidades urbanas, a presença do social na saúde, Garcia, assim como
tendo como objetivo reduzir as tensões sociais nos muitos dos pesquisadores brasileiros partícipes da
guetos das principais cidades norte-americanas. No construção da Saúde Coletiva, buscou referências
campo da saúde, houve a implantação de centros em uma abordagem histórico-estrutural do social e
comunitários de saúde subsidiados pelo governo não apenas assumiu uma presença segmentada do
federal, que estavam destinados a efetuar ações social tal como a abordagem isolada de elementos
preventivas e prestar cuidados básicos de saúde à do meio ambiente e da própria população.
população local (Paim; Almeida Filho, 1998). De outro lado, diversos autores, ao fazerem refe-
Assim como na Medicina Preventiva, havia, na rência à Medicina Social, com os estudos que George
proposta da Medicina Comunitária, uma ênfase Rosen fez sobre o assunto, valem-se do movimento
nas “ciências da conduta”. Nesse caso, entretanto, o que surge na Europa em meados do século XIX. A
conhecimento dos processos socioculturais e psicos- esse respeito, Nunes (1983) diz:
sociais destinava-se “a possibilitar a integração das
Este artigo de Rosen tem sido considerado de
equipes de saúde nas comunidades ‘problemáticas’,
fundamental importância para a compreensão da
através da identificação e cooptação dos agentes e
medicina social e entre os pontos que levanta fica
forças sociais locais para os programas de educação
ressaltada a questão dos problemas sanitários, que
em saúde” (Paim; Almeida Filho, 1998, p. 304).
se avolumam quando das transformações decorren-
Os organismos internacionais do campo da saú-
tes do processo de industrialização (p. 19).
de incorporaram, mais uma vez, o novo movimento
ideológico comunitário e preventivista, traduzindo Rosen (1983) vai apontar que uma questão cen-
o seu corpo doutrinário às necessidades dos diferen- tral na Europa, durante o século XIX, poderia ser
tes contextos em que poderia ser aplicado. explicitada em termos de qual orientação política
A Medicina Comunitária e a Medicina Preventi- o governo devia seguir a fim de aumentar o poder e
va, apesar de terem surgido em momentos diferentes a riqueza nacionais. Via-se como um dos principais
nos Estados Unidos, chegaram, mais ou menos, ao meios a indústria. Em consequência disso, o traba-
mesmo tempo no Brasil (Donnangelo; Pereira 1976; lho passou a ser olhado pelos estadistas como um
Schraiber, 1989). elemento essencial para gerar a riqueza nacional.
Qualquer perda de produtividade no trabalho em
Medicina Social
relação à doença e morte era, nessa época, visto como
O movimento da Medicina Social apareceu na Amé- um problema econômico significativo. Essa aborda-
rica Latina no final da década de 1960 e no início da gem implicou na ideia de uma intervenção pública de
de 1970. Em seu centro está a discussão acerca da caráter nacional para a saúde, que foi desenvolvida
valorização do social enquanto esfera de determi- em diferentes direções, dependendo do país.
nação dos adoecimentos e possibilidades de saúde, O primeiro lugar em que apareceu uma preocu-
na prevenção das doenças e na promoção da saúde, pação do Estado em relação aos problemas de saúde
assim como esfera própria de intervenção, para além da população foi nos estados alemães, antes mesmo
de, e em, uma articulação com a medicina como de se unificarem ou passarem pelo processo de in-
intervenção nos casos individuais (Vieira da Silva; dustrialização, surgindo pela primeira vez a ideia
Paim; Schraiber, 2014). Trata-se, pois, de um olhar al- de polícia médica. Sobre o termo, diz Rosen (1983),
ternativo à redução biomédica em que se estruturou Polizei, em alemão, (police, em inglês), deriva da
o saber e a prática da medicina, ainda que com explo- palavra grega politeia. A teoria e prática da admi-
rações diversas quanto ao sentido da valorização do nistração pública veio a ser conhecida ao longo do
social. Nesse sentido, a figura central para a América século XVIII, nos estados alemães, como Polizeiwis-
Latina, e com forte influência no Brasil, foi o médico senschaft (a science of police) e o ramo que trata
e sociólogo argentino Juan Cesar Garcia por meio de da administração da saúde como Medizinalpolizei
sua atuação junto à Opas (Garcia, 1985; Nunes, 1983; (medical police).

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O desenvolvimento da teoria e prática da admi- se espalharam pela Alemanha. Entre os principais
nistração pública estava intimamente relacionado nomes do movimento alemão, que assume então a
aos interesses do Estado absolutista. Alcançou-se aí Medicina Social e não a Polícia Médica como pro-
uma sistematização de pensamento e comportamen- posta de intervenção nacional, estavam Neumann
to administrativo que atribuía ao Estado absoluto as e Virchow. Neumann, em 1847 (apud Rosen, 1983,
atividades de bem-estar. Ficava, entretanto, a cargo p. 50), afirma que “a ciência médica é intrínseca e
do legislador determinar qual era o maior bem-estar, essencialmente uma ciência social e, enquanto isto
de modo que o Estado tinha o poder de intervir nos não for reconhecido na prática, não seremos capazes
assuntos dos indivíduos visando o interesse geral. O de desfrutar de seus benefícios e teremos que nos
desenvolvimento e aplicação do conceito de “polícia satisfazer com um vazio e uma mistificação”.
médica” foi uma tentativa pioneira de um exame me- Os proponentes da ideia da medicina como uma
tódico e preciso dos problemas de saúde do ponto de ciência social empregavam-na como uma formu-
vista social. No princípio e na metade do século XIX, lação conceitual sob a qual resumiam princípios
foi na França que esse tipo de estudo se desenvolveu definidos:
teoricamente. Na França, todavia, o conceito de polí-
O primeiro destes princípios é que a saúde das
cia médica não foi aceito amplamente (Rosen, 1983).
pessoas é um assunto societário direto e que a so-
No contexto da Revolução Francesa, problemas
ciedade tem a obrigação de proteger e assegurar a
de saúde e de bem-estar haviam sido pensados pelos
saúde de seus membros [...]. O segundo, como notou
governos revolucionários. Chegou-se, inclusive, a
Neumann, é que as condições sociais e econômicas
uma tentativa de se estabelecer um sistema nacional
têm um importante e – em muitos casos – crucial im-
de assistência social, que incluía atenção médica.
pacto sobre a saúde e a doença e que estas relações
Apesar de isso não ter avançado, algumas das ideias
devem ser submetidas à investigação científica [...].
e objetivos do período iriam influir profundamente
O terceiro princípio, que se segue logicamente, é
na França da primeira metade do século XIX. “Ideias
que os passos tomados para promover a saúde e
de serviço público e utilidade social forneceram a
combater a doença devem ser tanto sociais como
semente da qual germinaram novas ideias sobre a
médicos (Rosen, 1983, p. 51-52).
relação entre saúde, medicina e sociedade” (Rosen,
1983, p. 43). A influência de toda essa formulação na Saúde
Durante a primeira metade do século XIX, houve Coletiva brasileira pode ser vista, por exemplo, no
na França um fecundo cruzamento entre a filosofia fato de esses princípios terem sido revisitados no
social e a medicina. “Como resultado, a medicina Brasil na VIII Conferência Nacional de Saúde, em
francesa esteve permeada, em grau considerável, uma releitura própria ao contexto histórico dos anos
com o espírito de mudança social” (Rosen, 1983, 1980 e para a realidade de um país periférico ao de-
p. 46). O contato com as novas condições de vida senvolvimento capitalista. Portanto, são princípios
decorrentes do processo de industrialização, como que, enquanto conexões entre a medicina e o social,
a condição dos trabalhadores e a realidade social vão influenciar a reforma sanitária brasileira.
em que viviam, fez emergir novas ideias no campo O processo revolucionário da década de 1840,
da saúde em suas relações com a sociedade. Desse entretanto, foi derrotado na Alemanha, assim como
cenário, germinou a ideia de Medicina Social. Jules na França, e com isso o movimento de reforma mé-
Guérin foi um dos primeiros autores a utilizar esse dica terminou rapidamente (Rosen, 1983). Durante
termo, em 1848. as décadas seguintes, a ampla proposta de reforma
Nunes (2007) enfatiza que foi em um contexto transformou-se em um programa limitado. A ideia de
revolucionário, ocorrido na década de 1840, que medicina social foi aparecer novamente em uma reu-
muitos médicos, filósofos e pensadores assumiram nião convocada pela Organização Mundial de Saúde,
o caráter social da medicina e da doença. As ideias OMS, em 1952, em Nancy, e depois, mais uma vez,
e propostas que tinham progredido na França, an- em um documento da Opas, de 1974 (Nunes, 1994).
tes e durante o movimento revolucionário de 1848, O final da década de 1960 e início da década de

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1970 foram anos extremamente férteis em discus- modelo de saúde pública desenvolvimentista, que
sões teóricas sobre as relações saúde-sociedade. havia postulado que um dos efeitos do crescimento
Houve bastante influência de discussões oriundas econômico seria a melhora das condições de saú-
de autores das ciências humanas, sendo um marco de. Isso é particularmente válido para o Brasil do
nesse sentido a conferência de Michel Foucault, em período, que, apesar de passar por um momento de
1974, no Rio de Janeiro, sobre as origens da Medicina crescimento econômico, não via resultados disso
Social (Nunes, 2005), já rediscutindo o conteúdo refletidos nas condições de vida de sua população.
significativo desse termo. De acordo com Paim Nos anos 1970, houve, no âmbito internacional,
(1992), nesse momento, observou-se no Brasil e no um fortalecimento da discussão sobre a extensão
restante da América Latina uma produção teórica da cobertura dos serviços de saúde, de modo que, na
importante, que reconhecia os vínculos das práticas Assembleia Mundial de Saúde, em 1977, foi lançado o
de saúde com a totalidade social. Nesse sentido, as lema “Saúde para todos no ano 2000” (Paim; Almeida
contribuições das ciências sociais ao estudo da saú- Filho, 1998). No Brasil, em um contexto marcado pelo
de foram fundamentais para alcançar o grau atual recrudescimento das forças repressivas por parte de
de sistematização dos conhecimentos no campo. um Estado autoritário e pelo aumento das desigualda-
Sobre a proposta da medicina social, Sérgio des sociais e piora das condições de vida de boa parte
Arouca vai dizer o seguinte: da população, foi-se tentando construir um campo de
saber e de práticas inovadores na área da saúde.
A Medicina Social aparece, pois, com duas tendên- Nunes (1983), fazendo referência a Laurell, diz
cias; a primeira [...] movimento de modificação da que a reflexão crítica sobre a medicina e suas insti-
medicina ligado à própria mudança de sociedade, tuições, nos países latino-americanos, no período,
ou [...] através de sua mudança institucional [...]; a pode ser vista como resposta a quatro grupos de
segunda é uma tentativa de redefinir a posição e o questões: 1) a posição de classe explica muito melhor
lugar dos objetos dentro da medicina, de fazer de- do que qualquer fator biológico a distribuição das do-
marcações conceituais, colocar em questão quadros enças na população; 2) a crença de que as condições
teóricos, enfim, trata-se de um movimento ao nível de saúde da população melhorariam como resultado
da produção de conhecimentos que, reformulando do crescimento econômico se mostrou equivocada;
as indagações básicas que possibilitaram a emer- 3) o desenvolvimento da atenção médico-hospitalar
gência da Medicina Preventiva, tenta definir um não implicou em um avanço significativo nos índices
objeto de estudo nas relações entre o biológico e de saúde dos grupos cobertos por ela; e 4) a distribui-
o psicossocial. A medicina social, elegendo como ção dos serviços de saúde entre os diferentes grupos
campo de investigação estas relações, tenta esta- e classes sociais não depende de considerações
belecer uma ciência que se situa nos limites das técnicas e científicas, mas, principalmente, de
ciências atuais (Arouca, 2003, p. 150). considerações políticas e econômicas.
Arouca aponta aqui duas dimensões da Medicina A Saúde Coletiva
Social: a formulação de propostas de intervenção Paim e Almeida Filho (1998) apontam influências
na vida social e na medicina baseadas na conexão mútuas entre o desenvolvimento de um projeto de
saúde-sociedade e a proposta de estabelecer um campo de conhecimento chamado Saúde Coletiva
ramo de estudos dessa específica conexão, seja nas e os movimentos pela democratização no Brasil,
questões de adoecimento, seja nas de produção da especialmente o da reforma sanitária. Isso nos leva
assistência médica e das práticas profissionais a ressaltar a importância em considerar o contexto
nos serviços. Além de uma crítica a certa medicina histórico no qual apareceu a Saúde Coletiva, que
– cara, fragmentada e com poucos resultados para foi o de um país vivendo sob um regime autoritário.
a saúde da população – estava em pauta também Nesse sentido, pode-se afirmar que a
uma discussão em torno da extensão da cobertura
dos serviços de saúde para a população. De acordo Aliança da Saúde Coletiva com a democracia e os
com Nunes (1994), assistia-se ao início da crise do direitos humanos e sociais deve-se ao fato histórico

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de que se gesta o campo em plena década de tur- o pacto federativo, assegurando a descentralização
bulências sociais e movimentos reivindicatórios, do processo decisório e o controle social, bem como
dentro da luta contra a ditadura brasileira e pela fomentando a ética e a transparência dos governos;
reforma social (Schraiber, 2008, p. 15). c) democratização da sociedade alcançando os
espaços da organização econômica e da cultura,
Essa reforma social inclui no projeto da Saúde seja na produção e distribuição justa da riqueza
Coletiva uma reforma sanitária. No Brasil, duas ins- e do saber, seja na adoção de uma ‘totalidade de
tituições surgem diretamente ligadas a esse projeto: mudanças’, em torno de um conjunto de políticas
o Cebes e a Abrasco. O Centro Brasileiro de Estudos públicas e práticas de saúde, seja mediante uma
de Saúde (Cebes) foi criado em 1976 “trazendo para reforma intelectual e moral (Paim, 2008, p. 173).
discussão a questão da democratização da saúde
e constituindo-se como um organizador da cultu- Em um cenário de crise no setor da saúde na
ra capaz de reconstruir o pensamento em saúde” segunda metade da década de 1970 – apesar de ha-
(Paim, 2008, p. 78). De acordo com Paim (2008), o ver um discurso oficial, por parte do governo, com
Cebes é reconhecido como o primeiro protagonista maior abertura ao social –, as medidas adotadas
institucionalizado do movimento sanitário brasi- foram muito limitadas diante dos determinantes
leiro, desempenhando papel importante a partir da dessa crise que “se expressava pela baixa eficácia
socialização da produção acadêmica crítica oriunda da assistência médica, pelos altos custos do mo-
da então emergente Saúde Coletiva. delo médico-hospitalar e pela baixa cobertura dos
Dois momentos importantes na criação em serviços de saúde em função das necessidades da
1979 da Associação Brasileira de Programas de população” (Paim, 2008, p. 75). Nesse mesmo pe-
Pós-Graduação em Saúde Coletiva (Abrasco) – hoje ríodo, “ocorreu um renascimento dos movimentos
Associação Brasileira de Saúde Coletiva –, foram o sociais, envolvendo a classe trabalhadora, setores
I Encontro Nacional de Pós-Graduação em Saúde populares, intelectuais e profissionais da classe
Coletiva e a Reunião sub-Regional de Saúde Pública média” (Paim, 2008, p. 77). No âmbito da saúde, es-
da Organização Pan-americana de Saúde/Associaci- ses movimentos articularam-se, tornando-se forças
ón Latinoamericana de Escuelas de Salud Pública sociais contrárias às políticas de saúde autoritárias
(Opas/Alesp), ambos realizados em 1978. Eles tive- e privatizantes.
ram como objetivo redefinir a formação de pessoal Em relação aos fundamentos teóricos vincula-
para a área da saúde, propondo uma associação que dos à proposta da reforma sanitária, Paim (2008)
pudesse congregar os interesses das instituições for- aponta que as concepções de saúde utilizadas foram
madoras em nível de pós-graduação (Nunes, 1994). elaboradas pelo seu braço acadêmico, ou seja, pelos
O movimento da reforma sanitária brasileira, departamentos de medicina preventiva e social e as
surgido em meados da década de 1970, tinha como escolas de saúde pública ou equivalentes. Havia, na
principal bandeira a luta pela democratização da década de 1970, bastante influência do movimento
saúde. Paim (2008) defende que, muito além de um preventivista, que trazia as ideias da Medicina
projeto de reforma setorial da saúde, constituía-se Integral. Porém, na medida em que as críticas das
como um amplo projeto de reforma social: propostas de Medicina Preventiva e de Medicina
Comunitária eram elaboradas, no Brasil e em outros
[...] como uma reforma social centrada nos seguin- países latino-americanos, parte dessas instituições
tes elementos constituintes: a) democratização acadêmicas passou a se inspirar na Medicina Social
da saúde, o que implica a elevação da consciência desenvolvida na Europa em meados do século XIX
sanitária sobre saúde e seus determinantes e o (Paim, 2008). A Saúde Coletiva apareceu no Brasil,
reconhecimento do direito à saúde, inerente à cida- então, como uma ruptura, a partir da crítica aos
dania, garantindo o acesso universal e igualitário movimentos da medicina preventiva, comunitária
ao Sistema Único de Saúde e participação social no e ao sanitarismo institucional (Paim, 1992).
estabelecimento de políticas e na gestão; b) demo- Dois conceitos importantes como fundamento
cratização do Estado e seus aparelhos, respeitando teórico para a reforma sanitária, desenvolvidos

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pela produção acadêmica em Saúde Coletiva, foram: saúde presente nas proposições do relatório final
determinação social das doenças e processo de da VIII Conferência Nacional de Saúde (CNS) pode
trabalho em saúde. Segundo Paim (2008), o “enten- ser creditada à produção teórica sobre determina-
dimento de que a saúde e a doença não podem ser ex- ção social do processo saúde-doença, realizada por
plicadas exclusivamente pelas dimensões biológica pesquisadores da área de Saúde Coletiva no Brasil
e ecológica permitia alargar os horizontes de análise e na América Latina desde a década de 1970, tendo
e de intervenção sobre a realidade” (p. 165). Ganhou elementos nesse sentido tais como: ampliação do
força a compreensão dos fenômenos da saúde e da conceito de saúde, reconhecimento da saúde como
doença como determinados social e historicamente, direito de todos e dever do Estado, criação do SUS,
sendo o materialismo histórico um importante fun- participação popular e constituição e ampliação do
damento epistemológico. A Medicina Social latino- orçamento social.
americana, já alinhada nesse sentido, passou a ser, Outro evento importante foi o I Congresso Bra-
no período, uma corrente de pensamento crítico em sileiro de Saúde Coletiva (I Abrascão), cujo tema era
relação à Saúde Pública dominante. Essa corrente “Reforma Sanitária e Constituinte: garantia do di-
orientou muitas das proposições do movimento da reito universal à saúde” e que aconteceu também no
reforma sanitária relativas às políticas de saúde ano de 1986. Assim, o presidente da entidade definia
(Paim, 2008). a linha da atuação da Abrasco, naquela conjuntura:
Um marco de grande importância na reforma
A recente convocação da VIII CNS trouxe-nos a
sanitária brasileira foi a VIII Conferência Nacional
grande responsabilidade de dar continuidade a este
de Saúde, realizada em 1986. Essa foi a primeira
processo e de contribuir tanto com o conhecimento
conferência com ampla participação da sociedade
técnico científico produzido na área de saúde co-
civil, contando com “o protagonismo dos profissio-
letiva, como na competência política de analisar
nais de saúde, trabalhadores e setores populares”
criticamente certas conjunturas, mobilizar vonta-
(Paim, 2008, p. 99). A Abrasco elaborou um docu-
des, articular ações e iniciativas que levem adiante
mento para embasar discussões nessa conferência,
um projeto de transformações profundas e radicais
que acabou servindo de referência para textos e
para o setor saúde. É esta a responsabilidade, é este
intervenções apresentados. O documento partia do
o compromisso que a Abrasco, ao organizar este
reconhecimento de uma conjuntura de crise econô-
congresso, quer dividir com todos os participantes
mica com mudanças na ordem político-institucional
(Paim, 2008, p. 128).
e buscava revisar questões teórico-políticas, assim
como recuperar princípios e diretrizes do movimen- É possível observar, desse modo, um entrelaça-
to pela democratização da saúde; sublinhava que a mento, no período, entre outras, das instituições
saúde deveria ser vista como “fruto de um conjunto da Abrasco e do Cebes, com a produção teórica em
de condições de vida que vai além do setor dito de Saúde Coletiva, no engajamento político em torno
saúde” (Paim, 2008, p. 100); defendia a participação da reforma sanitária. Nesse sentido, Paim (2008)
popular na política da saúde bem como o controle afirma que “a Saúde Coletiva apoiou teoricamente
da sociedade sobre o aparelho estatal; e reconhecia a RSB a partir do triedro ideologia, saber e prática,
a saúde como função pública. porquanto surgiu e se desenvolveu, enquanto campo
Em um dos eixos da conferência, chamado científico, de forma vinculada à proposta e ao projeto
“saúde como direito inerente à cidadania, aos di- da Reforma Sanitária” (p. 292). Para o autor, o campo
reitos sociais e ao Estado”, nas discussões sobre as da Saúde Coletiva apresenta rupturas fundamentais
respostas sociais visando à ampliação do direito em termos políticos em relação ao da Saúde Pública,
à saúde, foram destacados os movimentos sociais apesar de trazer ainda algumas continuidades.
vinculados ao aparecimento da Medicina Social do A visão da saúde da população como resultante
século XIX. Foram, inclusive, retomados os prin- das formas de organização social de produção, tal
cípios elaborados por Virchow e Neumann (Paim, como concebida pela Medicina Social e pela Saúde
2008). Paim também afirma que a compreensão de Coletiva, acabou sendo, por meio da reforma sanitá-

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ria, assimilada pelo arcabouço legal no Brasil (Paim, mação mostra que o campo da Saúde Coletiva, talvez
2008, p. 306). De acordo com Schraiber (2008), por ser novo e existir apenas no Brasil, ou talvez por
o campo da Saúde Coletiva instituiu-se como um articular-se também em uma dimensão mais prática
projeto duplamente reformador: de um lado, na sua dos serviços de saúde, por vezes confundindo-se
crítica às necessidades de saúde culturalmente da- com essa dimensão de corte político-administrativo,
das e ao modelo assistencial vigente em satisfazê-las carece de reflexões mais aprofundadas no campo
“na assistência médica (modelo biomédico, liberal epistemológico. De antemão, chama a atenção que
e privatizante da produção dos serviços e elitista é comum autores usarem como sinônimos, em um
no acesso) e na saúde pública (modelo da educação mesmo texto, os termos Saúde Coletiva e Saúde Pú-
sanitária, de cunho liberal-individualizante no que blica, ou Saúde Coletiva e Medicina Social, ou ainda
concerne às práticas de prevenção)” (p. 13); de outro Saúde Coletiva e Epidemiologia.
lado, na sua crítica à alienação da face tecnocientí- É interessante que essa própria dificuldade em
fica do campo. definir o campo da Saúde Coletiva foi tematizada
Segundo a autora, o projeto do campo da Saúde por alguns autores. Assim, Nunes (2007) diz que
Coletiva “se situa na tensão entre a crítica contra- muitas têm sido as tentativas de se definir a Saúde
cultural de ordem técnico-científica e a democratiza- Coletiva, mas tornou-se difícil um consenso a res-
ção dos modelos médico e sanitário cientificamente peito. O autor, fazendo referência a Stotz, atribui à
tradicionais” (Schraiber, 2008, p. 14). O campo foi interdisciplinaridade e às tensões epistemológicas
sempre desenvolvido em compromisso com a demo- internas ao campo a impossibilidade de uma teoria
cratização e com a luta pelos direitos humanos e so- unificadora que explique o conjunto dos objetos de
ciais, em um compromisso, como disse Donnangelo estudo. A dificuldade, portanto, de se definir o campo
(1983), com o coletivo desde sua origem: residiria no fato de “ser uma criação que transbor-
da os limites disciplinares e que se apresenta na
Essa multiplicidade de objetos e de áreas de interface de áreas do conhecimento detentoras de
saber correspondentes – da ciência natural à ci- especificidades teóricas e conceituais” (Nunes,
ência social – não é indiferente à permeabilidade 2005, p. 14). Poderíamos acrescentar também como
aparentemente mais imediata desse campo a possível fator para essa dificuldade a composição
inflexões econômicas e político-ideológicas. O heterogênea, tanto institucional quanto profissio-
compromisso, ainda quando genérico e impreciso, nal, dos autores da Saúde Coletiva, cujas pesquisas
com a noção de coletivo, implica a possibilidade abarcam disciplinas diversas, como a Epidemiolo-
de compromissos com manifestações particula- gia, as Ciências Sociais e Humanas, a Filosofia, ou
res, histórico-concretas desse mesmo coletivo, a Administração.
dos quais a medicina ‘do indivíduo’ tem tentado Campos (2000) é bastante incisivo nas questões
se resguardar através do específico estatuto da que coloca em relação ao campo: “[a] saúde coletiva
cientificidade dos campos de conhecimento que teria criado um novo paradigma, negando e supe-
a fundamentam (Donnangelo, 1983, p. 21). rando o da medicina e o da antiga saúde pública?
A saúde coletiva corresponderia a todo o campo da
saúde, ou apenas a uma parte?” (p. 220). E ainda:
Características e especificidades “qual a identidade da saúde coletiva? Ou seja, qual
da Saúde Coletiva: tentativas de o seu núcleo de saberes e de práticas? [...] Quem é o
agente que faz saúde coletiva? Haveria um agente
delimitação especializado?” (p. 221) E, por último, o que a troca de
Contemporaneamente, com o desenvolvimento da nomes de saúde pública para saúde coletiva revelou
Saúde Coletiva e a emergência de um corpo bem de novo? “Que rupturas, de fato, aconteceram? O que
constituído de produções científicas, observa-se existe de continuidade?” (p. 221).
também a importância em debater acerca de suas Uma característica muito associada à Saúde Co-
delimitações e competências. Uma primeira aproxi- letiva é a de ser um campo interdisciplinar (às vezes

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seus autores usam o termo multidisciplinaridade, mento secundário no processo saúde-doença, uma
ou então transdisciplinaridade – não cabendo aqui condição adjetiva, uma espécie de linha auxiliar de
entrar em discussão). Nunes (1994) destaca que apreensão dos fenômenos que só adquirem positi-
o campo fundamenta-se na interdisciplinaridade vidade no organismo individual. Para Ayres (2002),
como possibilitadora de um conhecimento ampliado
de saúde e na multiprofissionalidade como forma Desde o estabelecimento da hegemonia clínica no
de enfrentar a diversidade interna ao saber/fazer pensar e produzir saúde, os eventos extraorgânicos
das práticas sanitárias. A Saúde Coletiva necessita da doença e de seus determinantes passam a ser,
pensar o geral e o específico. Para Birman (1991), o no plano da construção do conhecimento, somente
campo “admite no seu território uma diversidade suporte lógico ou empírico para construções fisio-
de objetos e de discursos teóricos, sem reconhecer patológicas (p. 27).
em relação a eles qualquer perspectiva hierárquica A dimensão extraorgânica da doença passou a
e valorativa” (p. 15). ser apenas um elo das relações de eficiência causal,
Outra característica bastante destacada é o papel do “determinismo exato” das ciências da saúde. O
das Ciências Humanas nesse campo de conhecimen- “irrequieto social” foi domado pelas variáveis mor-
to. Nesse sentido, Ayres (2002) apresenta a seguinte fofuncionais e físico-químicas do corpo: traduzida
compreensão: “pelo comportamento coletivo dessas qualidades
O campo da “saúde coletiva”, termo pelo qual estare- empíricas, a determinação social da doença é apri-
mos nos referindo genericamente a um conjunto, na sionada sob o inofensivo emblema de condicionante
verdade muito amplo e contraditório, de disciplinas externo dos estados de saúde” (Ayres, 2002, p. 132).
ocupadas do “social da saúde” (medicina social, A investigação em saúde na dimensão coletiva
medicina preventiva, saúde pública etc.), é, sabida- passou a distinguir, então, de um lado, grupos
mente, o principal polo de aglutinação e irradiação populacionais tomando por base características
dessa renovada preocupação com as relações entre demográficas, e do outro lado, as variáveis morfofun-
a saúde e sociedade no campo acadêmico (p. 26). cionais orgânicas. “O comportamento quantitativo
dessas subpopulações torna-se os elementos neces-
Segundo Birman (1991), a concepção de Saúde sários e suficientes para as inferências causais”
Coletiva “se constituiu através da crítica sistemática (Ayres, 2002, p. 133). A natureza de um conhecimento
do universalismo naturalista do saber médico. Seu assim gerado reveste-se de um ar de neutralidade,
postulado fundamental afirma que a problemática como se fosse uma forma universal de apreensão
da saúde é mais abrangente e complexa que a leitura da realidade.
realizada pela medicina” (p. 12). Ayres (2002), em sua crítica de como ocorreu esse
Essa questão é bastante importante quando con- processo, conclui: “Ao perder-se a dimensão social
sideramos como o âmbito do social foi progressiva- dos fenômenos coletivos de saúde em sua objeti-
mente silenciado, no campo da saúde, pelo discurso vação científica, perde-se, imediatamente, a possi-
biomédico. A Saúde Coletiva teria, justamente, como bilidade de abordar racionalmente sua substância
uma de suas principais propostas resgatar o social. propriamente pública” (p. 150). O discurso científico
Ao traçar a história da epidemiologia em seu livro hegemônico tornou unidimensional a apreensão do
Epidemiologia e emancipação, Ayres (2002) apre- espaço público da saúde, naturalizando-o.
senta como se deu esse processo de domesticação Nesse sentido, a Saúde Coletiva, ao ter como uma
do social nas ciências da saúde. de suas propostas a aproximação com as ciências
Segundo esse autor, a partir de um dado momen- humanas, busca reconfigurar o campo do social na
to histórico, os discursos predominantes acerca da saúde. Paim e Almeida Filho (1998) colocam como
saúde e da doença passaram “a traduzir os careci- elementos significativos do campo “a superação do
mentos humanos associados a esses conceitos em biologismo dominante, da naturalização da vida so-
termos estritamente biológicos” (Ayres, 2002, p. 92). cial, da sua submissão à clínica e da sua dependência
O social foi, então, incorporado meramente como ele- ao modelo médico hegemônico” (p. 310).

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A partir desse quadro, Paim e Almeida Filho Enquanto campo de conhecimento, a saúde coletiva
(1998) propuseram compreender a Saúde Coletiva contribui com o estudo do fenômeno saúde/doença
como um campo científico em que “se produzem em populações enquanto processo social; investiga
saberes e conhecimentos acerca do objeto ‘saúde’ e a produção e distribuição das doenças na sociedade
onde operam distintas disciplinas que o contemplam como processos de produção e reprodução social;
sob vários ângulos” (p. 308). E também como um analisa as práticas de saúde (processo de trabalho)
âmbito de práticas, em que “se realizam ações em na sua articulação com as demais práticas sociais;
diferentes organizações e instituições por diversos procura compreender, enfim, as formas com que a
agentes (especializados ou não) dentro e fora do sociedade identifica suas necessidades e problemas
espaço convencionalmente reconhecido como ‘setor de saúde, busca sua explicação e se organiza para
saúde’” (p. 308). Os autores preferiram adotar a visão enfrentá-los (p. 309).
da Saúde Coletiva como um campo interdisciplinar, Tanto esses autores (Paim; Almeida Filho, 1998),
e não como uma disciplina científica ou como uma quanto Nunes (1994), identificam na Saúde Coletiva
ciência. três grupos disciplinares: a epidemiologia; as ciên-
Sobre os pressupostos básicos do marco concei- cias sociais em saúde; e a política, planejamento e
tual do campo, os autores fazem referência a um administração em saúde. São mencionadas ainda
texto de Paim de 1982, ou seja, a um documento de outras disciplinas complementares a essas.
um período em que a Saúde Coletiva ainda estava em Campos (2000), seguindo uma outra linha, vai
nascimento. Paim e Almeida Filho retomam alguns defender que a Saúde Coletiva é um pedaço do campo
dos pressupostos daquele texto: da saúde. O autor quer contrapor-se a uma tendência
a) A Saúde, enquanto estado vital, setor de produção que identifica em outros acadêmicos de confundir
e campo de saber, está articulada à estrutura da a Saúde Coletiva com todo o campo da Saúde. Ten-
sociedade através das suas instâncias econômica dência essa que contribuiria para a fragmentação e
e político-ideológica, possuindo, portanto, uma enfraquecimento da Saúde Coletiva enquanto campo
historicidade. de saber e de prática.
Campos (2000) propõe que o núcleo da Saúde
b) As ações de saúde (promoção, proteção, recupe-
Coletiva se constituiria no “apoio aos sistemas de
ração e reabilitação) constituem uma prática social saúde, à elaboração de políticas, e à construção de
e trazem consigo as influências do relacionamento modelos”; na “produção de explicações para os pro-
dos grupos sociais. cessos saúde/enfermidade/intervenção”; e, talvez
c) O objeto da Saúde Coletiva é construído nos seu traço mais específico, na “produção de práticas
limites do biológico e do social e compreende a de promoção e de prevenção de doenças” (p. 225).
investigação dos determinantes da produção so- A inserção da Saúde Coletiva no campo da
cial das doenças e da organização dos serviços de saúde dar-se-ia, segundo sua proposta, em dois
saúde, e o estudo da historicidade do saber e das planos: no horizontal e no vertical. No plano ho-
práticas sobre os mesmos. O caráter interdiscipli- rizontal, os saberes e práticas oriundos da Saúde
nar desse objeto sugere uma integração no plano Coletiva comporiam parte dos saberes e práticas
do conhecimento e no plano da estratégia de reunir de outras categorias e atores sociais. Assim, todas
profissionais com múltiplas formações. as profissões de saúde, em alguma medida, deve-
riam incorporar em sua formação e em sua prática
d) O conhecimento não se dá pelo contato com a
elementos da Saúde Coletiva. “Nessa perspectiva,
realidade, mas pela compreensão de suas leis e
a missão da saúde coletiva seria a de influenciar
pelo comprometimento com as forças capazes de
a transformação de saberes e práticas de outros
transformá-la (Paim; Almeida Filho, 1998, p. 309). agentes, contribuindo para mudanças do modelo
A “delimitação provisória” do campo da Saúde de atenção e da lógica com que funcionam os ser-
Coletiva na qual Paim e Almeida Filho (1998) che- viços de saúde em geral” (Campos, 2000, p. 225).
gam, no mencionado artigo, é: No plano vertical, a Saúde Coletiva consistiria

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em uma área específica de intervenção. “Uma CAMPOS, G. W. S. Saúde pública e saúde coletiva:
área especializada e com valor de uso próprio, campo e núcleo de saberes e práticas. Ciência &
diferente da clínica ou de outras áreas de inter- Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, p. 219-250,
venção” (Campos, 2000, p. 225). Alguns problemas 2000.
são levantados a partir disso, como: quem seria BOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R.
o agente da Saúde Coletiva? Haveria um curso (Org.). Pierre Bourdieu. São Paulo: Ática, 1993. p.
básico de formação? 122-155.
De todo modo, Campos (2000) defende que se
DONNANGELO, M. C. F. A pesquisa em saúde
combinem as perspectivas do plano horizontal e do
coletiva no Brasil: a década de 70. In: ABRASCO.
plano vertical na Saúde Coletiva. Ou seja, que tanto
Ensino da saúde pública, medicina preventiva e
se socialize os saberes e práticas da Saúde Coletiva
social no Brasil. Rio de Janeiro, 1983. v. 2, p. 17-35.
quanto que se assegure a existência de especialistas
que produzam saberes mais sofisticados na área e DONNANGELO, M. C. F.; PEREIRA, L. Saúde e
que possam intervir em situações mais complexas. sociedade. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1976.
Chegamos, assim, ao final deste percurso ainda GARCIA, J. C. Juan Cesar Garcia entrevista Juan
com muitas dúvidas. Neste caminho, nos pareceu Cesar Garcia. In: NUNES, E. D. (ed.). As ciências
que o campo da Saúde Coletiva pode não admitir sociais em saúde na America Latina: tendências e
apenas uma única definição sobre sua delimitação e perspectivas. Brasília, DF: OPS, 1985. p. 21-28.
caracterização. Talvez pelo fato de ser um campo bas-
NUNES, E. D. (Org.). Medicina social: aspectos
tante novo, houve nele ainda poucas cristalizações
teóricos e históricos. São Paulo: Global, 1983.
no sentido de se formarem culturas tradicionais,
de modo que existe, em seu interior, uma grande NUNES, E. D. Saúde coletiva: história de uma ideia
pluralidade (e tensões) em termos disciplinares e e de um conceito. Saúde e Sociedade, São Paulo, v.
epistemológicos. 3, n. 2, p. 5-21, 1994.
Sempre em construção e muito podendo cami- NUNES, E. D. Pós-graduação em saúde coletiva no
nhar na produção e em termos de reflexão sobre a Brasil: histórico e perspectivas. Physis: Revista de
própria identidade, a Saúde Coletiva, como outros, Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 15, n. 1, p. 13-38, 2005.
constitui um “campo vivo” (Schraiber, 2008). Mas a
NUNES, E. D. Saúde coletiva: história recente,
dificuldade em encontrar elementos aglutinadores,
passado antigo. In: CAMPOS G. W. S. et al (Org.).
tecendo pontos comuns, pode representar, por um
Tratado de saúde coletiva. São Paulo: Hucitec; Rio
lado, uma fragilidade, ainda que, por outro, tornar de Janeiro: Fiocruz, 2007. p. 19-39.
a Saúde Coletiva um campo sempre “aberto à incor-
poração de propostas inovadoras” (Paim; Almeida PAIM, J. S. La salud colectiva y los desafíos
Filho, 1998, p. 312). de la práctica. In: OPS - ORGANIZACIÓN
PANAMERICANA DE LA SALUD. La crisis de
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Contribuição dos autores


Os autores contribuíram igualmente na concepção, no levantamento
do material bibliográfico e na redação final do artigo.

Recebido: 04/04/2014
Reapresentado: 22/08/2014
Aprovado: 12/09/2014

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