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ABSTRACT – This text examines the insertion of mental health professionals into the work
field propitiated by health systems and comments on a few aspects related to the formation of the
mental health professional in light of that insertion, particularizing Colective Mental Health. These
1Departamento de Saúde Pública e Núcleo de Saúde Mental, Universidade Federal de Santa Catarina –
UFSC.
PSICOLOGIA E SAÚDE - Walter Ferreira de Oliveira, Ph. D.
are themes open to exploration and reminds us of the constant need to learn, and to strenghten
professionals´ critical views. The text examines the historical evolution of the concepts of health,
mental health and colective mental health, pointint out opportunities and challenges for the
integration of mental health professionals in the context of Public Health. The principle of
integrality does not condone the dicotomy body-mind, however, a cultural tradition of exclusion of
mental health patients and, by extent, of mental health professionals, contextualizes the
relationships between the different fields of knowledge and of action which delimits the two areas.
Key words – Colective mental health; Health policy; National health system; Integrality;
Interdisciplinarity.
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“saúde mental.” A seguir o construto “Saúde Mental Coletiva”, tentando contextualizar o tema no
cotidiano de indivíduos, grupos, comunidades e instituições. Nesta discussão, referimo-nos à Saúde
Mental como ciência, como profissão e como função social.
CONCEITOS DE SAÚDE
Em 1946 a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu, no preâmbulo de sua constituição,
o ser humano saudável como o que vive em completo estado de bem-estar físico, mental e social.
Esta definição serve até hoje de referência para muitas pessoas e muitos sistemas de saúde e
constituiu um avanço em relação à generalizada idéia anterior de saúde como ausência de doenças.
Mas revelou-se, com o tempo, pouco prática e algo equivocada. A concepção de saúde como um
estado de bem-estar presta-se a um subjetivismo perigoso e revela-se, até certo ponto, meramente
adaptativa. É possível, com base nesta definição, considerar uma pessoa possa sã, desde que se
perceba em boas condições. Por outro lado, pessoas que pareçam saudáveis para alguns podem ser
consideradas insanas por outros, dependendo da interpretação de bem estar de cada um. Um
exemplo atual é trazido pelas padronizações estéticas que, em muitos casos, determinam a
insatisfação com o próprio corpo. Este fenômeno já é considerado, hoje, problema de saúde pública,
responsável, em alguns países, por alta incidência de anorexia (relatos de até 20% da população
adolescente feminina nos EUA) e pelo uso indiscriminado de substâncias que visam alterar o corpo,
como os hormônios esteróides, entre outros.
Aquela definição da OMS suscita outras questões, relativas à assimetria do valor subjetivo das
percepções, inclusive entre pessoas comuns e profissionais. A autoridade profissional pode decidir
pela insanidade, discordando do paciente e/ou familiares e comunidade, sendo clássico o caso de
“doentes mentais” e algumas internações por uso de drogas.. Uma série de outros fatos comuns à
vida urbana contemporânea tornou questionável a definição de saúde como bem estar.
A idéia da promoção da saúde, consolidada a partir do relatório do ministro canadense
Lalonde, publicado em 1974, sugere evitar a doença como referência fundamental para a definição
de saúde e tem sido aceita como uma melhor opção conceitual para a fundamentação das práticas
em saúde pública, inclusive do SUS. Esta idéia facilitou, por exemplo, a integração de fatores
ambientais no âmbito da saúde, trazendo ao escrutínio deste campo fenômenos econômicos e
políticos que circundam, por exemplo, os conceitos de desenvolvimento econômico e social. O
contraponto entre a necessidade de preservar o meio ambiente e a expansão do consumo de bens e
serviços, baluarte do projeto político-social, neoliberal, atualmente hegemônico em nosso país, é
flagrante. Os interesses da indústria do consumo não se coadunam com as necessidades primordiais
de saúde: ar puro, água potável e uma cadeia alimentar relativamente intacta. Cuidar da saúde é,
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portanto, cuidar do meio ambiente, independente do bem estar que se atribua ao consumo conspícuo
a que somos levados pela manipulação do desejo pela ideologia de mercado.
A partir da 8a. Conferência Nacional de Saúde (CNS), em1986, materializou-se, no Brasil,
uma outra definição de saúde:
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potencializam este novo olhar, esta nova atitude, estas novas formas de fazer saúde mental, trazendo
novos ângulos de análise e novos oportunidades de realização no campo de trabalho.
Mas o conceito de saúde mental se configura, para a população em geral e profissionais, a
partir de sua historicidade, reportando-se tradicionalmente, como o conceito de saúde, à doença. E,
por sua natureza, as ciências da mente inseriram componentes existenciais em suas práticas e
conceituações. Karl Menninger, em 1947, (citado por JAHODA, 1958), definiu saúde mental como:
A adaptação dos seres humanos ao mundo e a outros com o máximo de efetividade e felicidade.
Não somente eficiência, ou apenas contentamento - ou a graça de obedecer alegremente às regras
do jogo. É tudo isto junto, os comportamentos que implicam consideração social, e uma disposição
alegre.
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maior objetividade à análise do estado de sanidade mental, sem voltar a privilegiar uma nosologia
posta sob suspeita do ponto de vista da eficácia terapêutica? Definições claras, que ajudem a
elucidar e quantificar a saúde mental, para fins de diagnóstico e tratamento, não existem ou, as que
existem, não gozam de credibilidade absoluta ou consenso.
Há outro problema: o modelo médico, tradicionalmente hegemônico na saúde, dicotomiza
saúde e doença. O avanço de um lado significa a menor ingerência do outro, isto é, quanto mais uma
pessoa se encontra doente menos possibilidades há de se tornar saudável, e vice-versa. Esta
premissa é aceita, com reservas, na clínica geral, complicando-se muito no terreno mental. Um
indivíduo pode, por exemplo, apresentar sinais de doença mental e ao mesmo tempo funcionar, em
outros planos existenciais ou temporais, de forma saudável. A recíproca também é verdadeira.
A saída, para a hegemonia positivista, tem sido recorrer à quantificação dos sintomas, o que se
traduz numa cultura institucional que, ao final, reforça a promiscuidade terminológica
saúde/doença: usamos muito o termo saúde mental quando na verdade estamos nos referindo à
doença mental e, como Zusman (1975) bem ilustra:
Muitas outras tentativas têm sido conduzidas no sentido de buscar definições de saúde mental.
Classificações diversas têm sido oferecidas, levando em consideração a resistência funcional, a
constância da personalidade, crescimento, desenvolvimento e auto-afirmação - isto é, o que uma
pessoa faz consigo própria -, a construção de estruturas mentais de acordo com o ciclo vital, atitudes
individuais para com o self; variabilidade da disposição pessoal, percepção da realidade,
previsibilidade das ações, formas de reagir perante circunstâncias internas e externas, características
adquiridas e adaptadas em relação ao meio-ambiente, habilidade de se relacionar com o meio
ambiente e graus de autonomia, entendida como uma certa independência das influências sociais,
entre outros (Jahoda, 1958; Kaplan, Sadock e Grebb, 1997). O assunto é de particular interesse da
etnopsiquiatria, que nos alerta para a enorme variação dos conceitos culturais de saúde mental e
doença mental (DEVEREUX, 1977) e do campo jurídico, onde se busca constantemente classificar
as ações que violam os códigos éticos, civis e penais.
Pouco abordada na literatura tem sido a relação entre saúde mental e valor moral. A análise,
por exemplo, do comportamento rebelde e outros comportamentos proscritos pela sociedade,
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A Promoção da Saúde Mental envolve discussões fundamentais sobre a natureza humana, nas
perspectivas socio-política, econômica e cultural, e à luz de nossas vivências cívicas e profissionais.
Mas é dificílimo discutir os grandes dilemas e angústias inerentes à condição humana e se afinar
com as prescrições institucionais hegemônicas vigentes. Estas polêmicas ameaçam paralisar o
próprio processo de discussão e corren-se, ainda, o perigo de desqualificação das discussões mais
aprofundadas como “não científicas”, “meras teorizações” ou, pior, “mera filosofia.” Promover tais
discussões pode pôr em risco a carreira profissional, aberta ou veladamente, por isso muitos se
calam. Outro risco é puxar a discussão e não apresentar soluções, gerando o estigma de “eterno
problematizador” e de pouco prático, contrariando uma ideologia que privilegia resultados e pouco
tolera os que dão ênfase aos processos. Paulo Freire (1970), ao contrário, valoriza o questionar
como arma pedagógica e o processo de questionamento como a essência do aprendizado. É com
este espírito que propomos uma sucinta discussão sobre a inserção do profissional de saúde mental
na atenção básica, com o viés da Saúde Coletiva.
terminologia de Cordón e Garrafa (1991).3 Para a população e para muitos profissionais “saúde” é,
ainda, sinônimo de “doença” (Centros de Saúde e profissionais de saúde são, ainda, centros de
tratamento de doenças e especialistas em tratamento de doenças). A hegemonia do modelo médico -
especialistas em lidar com doenças - na área de saúde é um sinal desta situação. A diversidade
maior no mundo institucional da saúde, essencial para a melhoria da qualidade de vida e para o
enriquecimento da experiência humana, demanda a desconstrução das hegemonias de poder que têm
caracterizado o modelo médicocêntrico e hospitalocêntrico.
O dilema curativismo/prevenção/promoção de saúde tende a ser relativizado de maneira
subjetiva e perversa - o subjetivo é facilmente passível de perversão. Não se entenda que o
subjetivismo e conseqüente relativismo da saúde sejam nocivos ao avanço conceitual e concreto das
práticas de saúde. Talvez muito pouca atividade humana seja realmente baseada na objetividade. O
mais desejável, talvez, seja alcançar um equilíbrio entre subjetividade e objetividade. Estes desafios
demandam que o profissional não se abstenha de refletir sobre sua influência na vida dos que gozam
ou sofrem as conseqüências de sua atuação - como clientes, cidadãos sujeitos às políticas de saúde,
usuários de serviços públicos ou privados, ou colegas. A clareza quanto ao grau de subjetividade ou
objetividade que o profissional dispõe e aplica na sua prática é atributo essencial a ser trabalhado
continuamente no exercício da formação.
A inserção do psicológico na concepção de saúde integral marca uma expansão conceitual,
incorporando a dimensão da vida de relação. Os papéis do ego e do inconsciente, o processo de
formação de identidade e os aspectos sociopolíticos ascendem ao papel de componentes ativos na
construção da saúde de cada um e do coletivo. A perspectiva da promoção insere a dimensão
temporal - a saúde como conseqüência futura do vivido no presente -, complexifica o campo,
adiciona incertezas e angústias e recomenda maior cautela e rigor no trato teórico e prático. Tal
complexidade não é um monstro devorador e a necessidade de cautela e rigor podem dar mais
sentido ao trabalho, proporcionar sucesso profissional, e o prazer de ver uma pessoa mais saudável,
uma comunidade mais consciente e participante na construção de sua qualidade de vida, ou a
implementação de uma política favorecendo à população.
O campo de trabalho se abre e permite ao profissional de saúde mental não só “pensar
grande,” mas também agir com grandiosidade. Sua necessidade é flagrante, nas Unidades Básicas de
Saúde, nos PSFs, na prevenção e tratamento de doenças crônico-degenerativas, terminais, agudas e
infecciosas, no assessoramento pedagógico, na elaboração de políticas públicas, no pensar
fenômenos sociais como a delinqüência, violência e drogas, no planejamento urbano, e em muitas
3A grosso modo, prevenção como ações estruturais, integrais, visando prevenir a existência de problemas de
saúde. Preventivismo: ações simbólicas, imediatistas, verdadeiros tapa-buracos, que não tratam a essência
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outras atividades em áreas tradicionalmente “de outros profissionais”. Além, claro, do espaço já
definido do planejamento, implementação e avaliação de ações, serviços, projetos e programas “de
saúde mental”, do tradicional consultório terapêutico e hospitais com internação psiquiátrica, até os
serviços substitutivos e os programas comunitários de promoção de saúde mental. Tais
responsabilidades apontam o valor deste profissional para os sistemas de saúde e,
conseqüentemente, para a construção de uma sociedade mais saudável, com mais qualidade de vida
que, conforme Koller (1996),
sua cultura, seus métodos, seus sistemas de valores. Assim, os reformadores psiquiátricos
contemporâneos procuram praticar a SMC, além dos encontros terapêuticos tradicionais, através de
atividades de formação, consultoria, planejando, implementando e avaliando programas de saúde
mental, nos hospitais e escolas, como facilitadores de encontros grupais e em comunidades. Mas é
nos serviços substitutivos (CAPS) e no ambiente do SUS que se apresenta a maior amplitude de
campo para a aplicação destes princípios de trabalho coletivo de saúde mental.
Quanto aos CAPS, guarda-se ainda muito do idealismo com que foram construídos, desde sua
implementação até os milhares de CAPS atualmente espalhados pelo território nacional. Por outro
lado, teme-se que os CAPS estejam perdendo sua função primordial, de agentes transformadores da
cultura, de veiculadores de uma pedagogia social visando o entendimento da sociedade sobre a
loucura e de fomentadores de mudanças nas relações entre os cidadãos usuários e não usuários de
serviços de saúde mental. Os CAPS foram pensados como agentes de inclusão social, mobilizadores
de forças sociais de inclusão, inclusive pelo trabalho. Estão hoje não só sufocados pela demanda de
atendimento e pelo conceito de produtividade praticado pelo Ministério da Saúde, como também
pelas determinações da legislação, como a portaria 336, que os define como ambulatórios de saúde
mental. Como resultado, os CAPS admitem, atualmente, tanto profissionais que entendem sua
finalidade e se dispõem a serem agentes da inclusão e da desinstitucionalização, como outros que
não têm a menor noção de porque estão ali, ouvindo aquele discurso, às vezes o repetindo, mas sem
a força transformadora que deviam proporcionar. Este é um desafio maior e atual da reforma
psiquiátrica no Brasil.
No âmbito da atenção básica (o que se entende, erroneamente, na linguagem popular, como “o
SUS”), a saúde mental tem muitos compromissos a cumprir. Há que tornar claro, nos serviços, que
o ser humano é um ser integral, composto de corpo, mente, emoções e relações sociais, isto é,
assumir o discurso da integralidade. A dicotomia mente-corpo é marcante desde o advento do
Iluminismo como paradigma de desenvolvimento científico e tecnológico da sociedade moderna.
Isto propicia uma formação profissional aleijada, onde se aprende muito sobre órgãos materialmente
visíveis e doenças com substratos anatômicos definidos, e quase nada sobre a condição humana. Daí
a patética situação contemporânea de ter que “humanizar” o atendimento, reconhecendo-se que, até
hoje, tratou-se do humano de forma “des-humanizada”. O terreno é fértil para problemas de
comunicação, resistências, sabotagens, fugas para zonas de conforto, onde profissionais e pacientes
possam evitar se reconhecerem como seres humanos. O trabalho da saúde mental é, neste sentido,
hercúleo, difícil, doloroso, às vezes aparentemente intransponível. Mas é onde mais o profissional
pode ajudar a sociedade e onde pode, eventualmente, obter mais prazer de seu trabalho. Pois
exatamente aí é mais necessário que nunca.
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