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As Melhores Histórias Da Mitologia Nórdica (O Roubo Do Brisingamen)
As Melhores Histórias Da Mitologia Nórdica (O Roubo Do Brisingamen)
As Melhores Histórias Da Mitologia Nórdica (O Roubo Do Brisingamen)
E foi assim que Freya conseguiu apossar-se do Brisingamen, o mais belo colar que
olhos humanos e divinos já viram.
O roubo do Brisingamen
F reya, a deusa nórdica do amor, havia ganho dos anões Brisings, em troca de
alguns deliciosos favores, o mais belo colar de todo o mundo. Como o negócio, no
entanto, fizera-se às ocultas (pois Freya, como uma perfeita negociante, não gostava de
tornar públicos os seus acordos), imaginou que ninguém ficara sabendo de nada.
"Oh, céus!", exclamara o enxerido. "Mas até com anões ela já anda?"
Ninguém ignorava que Freya não era nenhum modelo de virtudes, e que era mesmo
o oposto de Frigga, a esposa de Odin, um exemplo perfeito de piedade, de virtude, de
retidão moral - e de chatice. Não à toa, o mais poderoso dos deuses volta e meia
permitia-se afrouxar um pouco os seus rígidos princípios e dar também algumas
"escapadinhas" em busca de uma companhia menos sufocantemente perfeita, o que ele
somente encontrava, quando caía nos braços de Freya, a deusa deliciosamente
imperfeita.
- Odin, meu caro, você não sabe da maior! - disse ele, entrando nos majestosos
salões de Gladsheim, onde o deus estava assentado em seu trono.
- O que foi desta vez? - disse o velho deus, franzindo as sobrancelhas, pois a
presença do importuno era sempre o prenuncio infalível de nova encrenca.
- Sua esposa está por peito? - disse Loki, passando o salão em revista.
- Não, está assistindo, escondida atrás do altar, ao vigésimo culto do dia que lhe
prestam em Midgard - disse o deus com um olhar enfadado, que parecia dizer: "Como
gosta de ser cultuada!"
- Oh, Freya, você não sossega nunca!... - disse o deus, sacudindo a cabeça.
- Perdão, poderoso Odin - disse Loki, curvando a cabeça - pretendia apenas animá-
lo um pouco.
Sem saber direito, se o maligno deus debochava, Odin cobrou-lhe explicações mais
detalhadas. Loki explicou-lhe toda a história e o velho deus escutou com uma ira
crescente, pois é sabido, que os ciúmes dos amantes, não raro, excedem aos dos
próprios maridos. Tão logo a matraca de Loki cessou de falar, Odin tomou o mensageiro
da desgraça pelo pescoço e lhe disse, rilhando os dentes:
- Tire o colar dela imediatamente! Nenhum castigo lhe poderá ser pior.
- Mas como farei para adentrar os portões de Sessrymnir? - disse Loki, referindo-se
ao palácio onde morava a deusa. - Todos sabem que tem portas inexpugnáveis e que
somente ela detém as suas chaves!
Na mesma hora, partiu para o palácio de Freya, pois não havia tempo a perder. A
noite já caía e ele ainda tinha uma tarefa ciclópica a cumprir: tirar das mãos da mais
vaidosa das mulheres o seu enfeite mais cobiçado!
Loki chegou, rapidamente, ao local onde ficava o majestoso palácio, graças aos
seus sapatos mágicos, que tal como os do Hermes grego, tinham a propriedade de voar.
"Um magnífico lugar para se morar, aquele, não resta a menor dúvida!", pensou,
enquanto observava os portões dourados de Sessrymnir. Ao alto, as cúpulas prateadas
afinavam-se até parecer longas espadas afiadas prestes a espetar o traseiro acolchoado
do céu, que estava recoberto de nuvens brancas e algodoadas.
Mesmo sabendo que não teria sucesso, resolveu tentar forçar os portões:
- Hmf! - fez ele, com as duas mãos apoiadas a uma das portas. Nada.
- Hmmmfff! - fez ele, sentindo o ouro gelado esfriar-lhe o osso do ombro. Nada, outra
vez.
No mesmo instante uma neve espessa começou a cair sobre os seus ombros,
irritando-o ainda mais. Ajoelhou-se, então, o máximo possível - até assumir uma posição,
verdadeiramente, constrangedora - só para observar a espessura da fenda sob a base
das portas. Com uma das mãos, raspou a neve ajuntada, soprando os minúsculos farelos.
Não, nem uma formiga passaria por ali!...
Mas ao se ver no solo sob esta minúscula forma, descobriu também que aumentara
em pelo menos dez vezes o trajeto até a entrada da fechadura, que estava, agora, lá no
alto, muito acima da sua cabeça (que não era maior do que a cabeça de um alfinete).
Suas duas anteninhas vibraram de ira e frustração.
- Irra! Uma burrada atrás da outra! - gritou, sabendo, que sua vozinha, ridiculamente
inaudível, jamais seria ouvida.
- Droga, mas continua escuro!... - disse Loki, tateando dentro da fechadura, que era
um emaranhado de curvas e voltas, por onde a chave devia se encaixar. Apesar de tudo,
finalmente conseguiu alcançar o outro lado, quando, então, readquiriu a sua forma
habitual. Seu corpo estava coberto de graxa, mas conseguira o seu objetivo: invadir o até
então inexpugnável palácio de Freya.
Após atravessar os salões de Sessrymnir, Loki subiu até ao quarto da deusa. A porta
estava fechada, porém, não trancada. Ele a empurrou e se deparou com uma peça
grande e confortável, onde todo o luxo que poderia assistir uma deusa, estava à sua
disposição: quatro toucadores de ouro repletos de objetos e acessórios de
embelezamento; uma grande lareira, onde um resto de fogo ainda ardia, iluminando
aquele cenário de sonho; e cortinas vaporosas, que se moviam, suavemente, impelidas
por uma suavíssima corrente de ar. E, finalmente, ao centro, estava o majestoso leito
onde a deusa descansava e tratava de seus aprazíveis negócios.
"Onde Freya guardaria seu bem mais precioso?", perguntava-se o astuto deus,
investigando silenciosamente o interior dos armários, mas sabendo de antemão que
dificilmente o encontraria ali. Então, quando revirava pela milésima vez os seus estojos,
teve uma súbita iluminação: "Seu bem mais precioso há de estar no lugar mais precioso
deste quarto!", pensou, aplaudindo-se por dentro.
Imediatamente Loki voltou-se para o bem mais precioso que havia dentro daquelas
quatro paredes: o próprio corpo de Freya. Pé ante pé, aproximou-se do leito, somente
para ter a confirmação do que já imaginava: em cima de seu divino colo subia e descia
mansamente, ao sabor da sua respiração, o maravilhoso adorno.
- Aí está o querido! - disse ele, bem baixinho, sem poder conter a euforia.
Tal como uma criança que adquiriu um brinquedo novo desesperadamente ansiado,
a deusa resolvera dormir com seu novo colar. Só havia, contudo, um pequeno problema:
ela estava deitada de barriga para cima e o fecho do colar estava localizado em suas
adoráveis costas.
Loki aguardou alguns instantes para ver se se ela virava ao menos de lado para lhe
possibilitar o furto, mas a deusa raramente se mexia e, quando o fazia, parecia hesitar,
como se uma voz interior lhe advertisse do perigo, tal como faz a menina que dorme
abraçada à sua boneca nova e invejada sem dela jamais despegar-se. Novamente Loki
teve de empregar toda a sua astúcia, transformando-se, desta vez, em uma pequenina
pulga. E tudo teria saído bem se, em um novo erro de cálculo, não tivesse ido cair dentro
do cobertor felpudo.
Loki permaneceu ali por um longo tempo, tentando desvencilhar-se dos fiapos do
pêlo, o qual era tão espesso, que mais parecia uma alva e inextricável selva. Mas
conseguiu, afinal, e tão logo se viu livre do labirinto de algodão, postou-se em cima da
coxa direita de Freya. Uma minúscula penugem dourada (que somente uma pulga poderia
perceber) a cobria, e foi nesta perfumada e roliça elevação que ele recomeçou seu trajeto
até chegar a seu objetivo, que era o colar. Foi subindo, subindo, subindo até que, tendo
recém costeado uma pequena floresta dourada, distraiu-se - naturalmente encantado por
aquela visão - e foi cair numa minúscula caverna.
Mas, embora não deixasse de ser mais um contratempo, aquela caverninha não
deixava, afinal, de ser um local aconchegante. Além do mais, Loki não precisou, senão,
dar um pequeno salto para se ver livre dela e descobrir que estivera o tempo todo no
umbigo da deusa, privilégio extravagante, que nem mesmo o mais poderoso dos deuses
um dia alcançara.
De pulo em pulo, foi progredindo até que se deparou com duas belas e simétricas
montanhas. Um pouco mais atilado, desta vez, preferiu seguir pelo desfiladeiro que havia
bem no centro dos dois picos majestosos. Percorreu o delicioso trajeto sem qualquer
problema até alcançar, finalmente, o próprio colar, que estava um pouco abaixo do alvo
pescoço. Chegara, agora, o momento de pôr em prática a última parte do plano.
- Desculpe, Freya adorável, mas agora vou machucá-la um pouquinho! -disse o Loki-
pulga, dando uma valente mordida no colo da deusa.
Freya levou instintivamente a mão até o seio ferido e deu um ligeiro suspiro, virando-
se de lado - e isto era tudo o que Loki queria. Por isso, readquiriu logo a sua forma
original e depois de ter desapertado o fecho, tomou, finalmente, em suas mãos o
Brisingamen, o famoso colar de Freya.
***
- Raios! - disse ele, apertando o passo de seus alados sapatos. - É aquele maldito
intrometido do Heimdall!
Loki referia-se ao famoso vigia de Asgard, que, com seus olhos agudos e
penetrantes, era capaz de enxergar tudo quanto se passava no universo, mesmo nas
maiores distâncias; havia uma rixa permanente entre estas duas divindades e qualquer
pretexto era o bastante para que ambos se engalfinhassem. Heimdall, então, ao ver que
Loki apertara o passo, esporeou com mais vigor o seu cavalo branco, que em matéria de
velocidade somente perdia para Sleipnir, o cavalo de oito patas de Odin e o mais veloz do
universo.
- Quero ver pegar-me, agora, intrometido! - disse ele, cuspindo labaredas para todos
os lados.
- Oh, vem com água, então? Pois seja! - disse o urso, abrindo sua bocarra repleta de
dentes amarelos. - Afinal, este calor me deu uma sede infernal!
- Que isto lhe sirva de lição! - disse Heimdall, pronto para retornar ao palácio de
Freya a fim de lhe devolver o colar e retomar o mais rapidamente possível as suas
funções à porta principal de Asgard.
- Nós nos vemos, novamente, na Ragnarok...! - disse Loki de olho roxo, referindo-se
ao grande combate final, que oporia os deuses aos seus inimigos.
E assim Freya recuperou o seu belo presente, não sem antes ter tido que dar
algumas explicaçõezinhas a Odin, o seu eterno amante, a respeito da maneira pouco
ortodoxa pela qual o havia obtido - mas nada que não tirasse de letra; afinal, diante de
sua astúcia, nada valiam os estratagemas de Loki e muito menos as rabugices do "deus
caolho", como chamava Odin nos seus momentos de ira.
A aposta de Loki
S if era a encantadora esposa de Thor, embora este não fosse o seu primeiro
marido; antes, ela já fora casada com um gigante anônimo, cujo nome se perdeu na noite
dos tempos. Sif era dona de muitos encantos, mas, de todos eles, nenhum impressionava
mais do que a sua dourada cabeleira. De fato, descendo do alto como uma ondulante
cascata de ouro, os fios resplandecentes percorriam os vales, montanhas e planícies do
seu corpo inteiro até alcançar-lhe os pés num desaguar majestoso.