Capitulo um Abril de 1792 Enquanto atravessava a noite a pé
escondida sob a sombra de um sobretudo negro, uma única frase
se repetia na cabeça de Daphne York: " a que ponto cheguei". Uma busca inútil e uma ameaça de escândalo, a trouxeram a esse momento de completa humilhação. Parou de frente a porta da taberna e observou aquele lugar. Podia dizer com certeza que já tinha andado por muitos buracos de Londres, mas ainda não tinha chegado tão longe de casa. Conhecia a fama do bairro, seu meio de trabalho exigia isso, e qualquer pessoa com o menor senso de perigo o evitaria, mas ainda assim ele estava ali. Daphne se perguntou o que diabos alguém como ele fazia naquele lugar esquecido por Deus. Tudo estava silencioso e enevoado, dando um clima tão pavoroso quanto a loucura que ela estava prestes a fazer. Ergueu uma mão enluvada e pensou duas, três, quatro, cinco vezes, antes empurrar a porta giratória e entrar. O cheiro forte de fumaça de ópio chegou até ela, juntamente com o som de uma voz feminina muito sensual, a dona da voz cantava para um público inteiramente masculino em cima de um palco rodeado de cortinas de cetim vermelho fúcsia. Mais para o lado um homem tocava um piano dando melodia para a canção. A bela mulher negra, usava nada mais que um espartilho e meias translúcidas, e enquanto cantava, usava um leque para dar profundidade aos seus olhos, vez ou outra permitindo que o público visse seus lábios carmesim. Daphne sentiu seu rosto esquentar ao entender a letra obscena da canção. Felizmente toda a atenção estava voltada para a dama da noite e não notaram sua entrada. Ela vasculhou o salão com seus olhos de águia á procura daquele alguém, mas só o encontrou mesmo quando ouviu o som irritante e inconfundível de sua gargalhada. Sua vista foi diretamente para ele. Estava sentado em mesa redonda ao fundo, na companhia de duas mulheres. Uma sentada em cada lado do seu colo, as duas brigavam por sua atenção. Daphne pôs-se a andar até ele, não sem antes rolar os olhos, se perguntando que espécie de duque atravessa metade da cidade apenas para ter companhia feminina. Ela sabia que ele podia ter a amante que quisesse. Já tinha ouvido muitas conversas sobre sua seletividade no clube. Na grande maioria das conversas as mulheres falavam com detalhes, desnecessários aliás, sobre as suas aptidões e desejos sexuais. Ela chegou até a mesa e sem pedir licença sentou-se no banco que ficava de frente para ele, atrapalhando o momento que uma das meretrizes falava algo em seu ouvido. Os três olharam para ela, as mulheres com curiosidade, mas ele não, Daphne teve certeza que mesmo antes de baixar o capuz, ele a reconheceu, pois em sua boca insolente se abriu um sorriso. As meretrizes quando viram que ela era uma mulher, passaram a olha-la como uma rival. De certa maneira, Daphne era. — Está bem longe de casa, York. — Ele disse, Daphne lançou um olhar tedioso para ele enquanto tirava uma luva. — Tinha preferido que não precisasse me arrastar até tão longe para encontrar você, milorde. Pensei que tivesse um gosto mais refinado para estabelecimentos...— olhou para a mão da meretriz que viaja pelo peito dele. — E para mulheres. As belezas olharam para ela ofendidas e estavam prestes a manda-la para um lugar bem incomum, quando Alec as dispensou. — Muito bem meninas, infelizmente teremos que deixar nossa pequena aventura para outro momento. — As mulheres choramingaram tristemente, ao serem tiradas do colo dele, mas não deixaram de piscar sedutoramente ao levantar-se e saírem balançando os quadris. Daphne virou o rosto na direção oposta para não ter que ver aquilo. — O que você está fazendo aqui York? Se pretende armar uma armadilha para me colocar diante de um padre, vou logo dizendo que perderá seu tempo, como o diabo que foge da cruz eu fujo de uma aliança. — Disse tranquilamente, erguendo a mão para para sinalizar que queira mais bebidas. — Foge da ideia de casamento ou do casamento em si? — Ela indagou, se afastando para que um garoto, que ela observou não ter mais que quatorze anos, colocasse duas canecas de rum nas suas frentes. — Qual é a diferença entre as duas? — Ele perguntou, bebendo um gole do rum. Daphne bebericou do seu copo, a bebida era repulsiva mas a esquentou quase imediatamente. — A idéia de um casamento implica na união de duas pessoas que vivem exatamente aquilo que foi prometido diante de um altar, como fidelidade, obediência e todo o restante da coisa. Enquanto que o casamento propriamente dito, não precisa necessariamente seguir esses fundamentos. O duque permaneceu em silêncio quando ela concluiu, a observando atentamente com aqueles olhos de fogo líquido enquanto refletia sobre suas palavras. Daphne aproveitou esse momento de descarada especulação e passou os olhos por sua vestimenta. A blusa que ele vestia tinha os primeiros três botões abertos revelando uma única faixa de pele dourada, que provavelmente uma das meretrizes tinha aberto. — Acho que tem razão. — Ele disse, finalmente. — Me deixe reformular minha primeira objeção, fujo da idéia de um casamento. — Daphne sentiu certo alívio ao ouvir aquilo, e teve mais confiança para dizer o que tinha ido fazer ali. — Tenho uma proposta para fazer para você, Vossa graça. — Falou demorando-se a chegar ao foco apenas para irrita-lo. Na verdade existia uma infinidade de coisas nela que irritavam Alec Lancaster. Por isso ela sabia que aquele plano tinha tudo para dar certo. — Por algum motivo eu estou interessado em ouvir. — Ele falou, apoiando os cotovelos na mesa e se inclinando sobre ela para ouvi-la mais atentamente. A fazendo se sentir desconfortável pela aproximação. — O segui até aqui para barganhar. — Começou, e bebericou mais um pouco do rum para ganhar coragem. — Como já deve saber, estou prometida em casamento. — Ele assentiu uma vez, um movimento que pareceu bastante calculado. — O pequeno problema é que prefiro ser uma eterna solteirona a ter que me casar com alguém que meu pai escolheu ao acaso. — Ela fez uma pausa, nem acreditava que diria mesmo aquelas palavras que pairavam em sua boca. — Por isso, vim propor que se case comigo. O silêncio reinou por um tempo doloroso. A última frase de Daphne pairou no ar e ela teve a oportunidade de se ouvir e perceber o quão ridícula era aquela proposta. "A que ponto cheguei." pensou de novo. Alec estourou em uma gargalhada que fez a fez ficar ridiculamente vermelha e queimando internamente de raiva, vergonha e injúria. — Me diga... — Ele disse em meio a risada. — por que acha que eu aceitaria me casar com você? — Porque sei que tem um prazo até perder o seu ducado, e pelas minhas contas, deve estar tão desesperado quanto eu. — Rápido o riso dele arrefeceu, seus olhos dourados adquiriram rapidamente a sombra periculosa de uma fera que acabara de ser cutucada com uma vara curta. — Como você sabe disso? — Inquiriu, deixando claro o seu descontentamento no tom amargo de sua voz. — As mulheres conversam, milorde. — Ela enfatizou a última palavra propositalmente para dar peso a sua proposta inicial. Ele cerrou os olhos, e seus longos cílios pretos e volumosos encontraram-se. Sua boca fina e rosada formou uma linha atraente e rígida no rosto bem esculpido. Muito calmamente, ele tirou um rolo grosso e marrom do bolso do casaco e o levou aos lábios, usando a vela que iluminava a mesa entre eles para acender o longo charuto. — Se importa? — Perguntou apontando para o objeto aceso. Daphne negou com a cabeça e observou os lábios dele fazendo uma longa sucção, puxando a fumaça fortemente para os pulmões. Parecia perigosamente sensual e pecaminoso. Quando o via nesses momentos de beleza maliciosa, Daphne pensava nas palavras que sua primeira preceptora disse para ela certa vez. A bíblia descrevia lucifer como um anjo de beleza incomparável, ele era capaz de ludibriar a todos com sua beleza e ninguém conhecia sua verdadeira essência. Daphne imaginava que Alec estava ainda além disso. Nunca tinha conhecido alguém no mundo que tivesse olhos tão magníficos, e um rosto tão perfeitamente desenhado que faria o mais belo dos anjos retorcer-se de inveja. — A diferença entre nós dois, senhorita Daphne York, é que eu tenho um leque vasto de opções, posso me casar com quem eu desejar, então, me diga, o que ganharei me casando com você? — Perguntou, a fumaça do charuto abandonando a sua boca e se espalhando pelo ar. Serpenteando como uma cobra. Saturando tudo com seu cheiro masculino. — Além da pequena fortuna do meu dote, também ficará livre. Teremos o casamento, mas não a ideia de um casamento. Será uma conveniência. Não exigirei nada de você e você fará o mesmo comigo, poderá manter seu ducado e sua fortuna e sua vida disoluta, e tudo que me dará em troca é liberdade. — Ele anuiu devagar, parecia estar levando aquilo finalmente em consideração. Ele estava pensando, pelo menos. — Seu plano perfeito, meu doce, tem uma pequena falha...— Ele adotou um ar atrevido. — A gente se odeia. Daphne encarou seu rosto, adquirindo um semblante de obvia consternação. Foi sua vez de rir. — Ah, você não está entendendo, milorde. — Ele a olhou friamente. — Não ficaremos juntos após a cerimônia, sequer precisaremos consumar o casamento. Após as bodas eu voltarei para a casa de meus pais, e você poderá seguir sua vida, na Escócia ou onde bem entender. Seu rosto clareou ao entender onde ela estava querendo chegar. Seus olhos penetraram os dela por mais tempo do que ela gostaria, a fazendo estremecer e sentir como se ele vasculhasse sua alma em busca de pecados. E ela tinha muitos. — Escute, também não me faz feliz ter que me casar com você. Mas se é para estar casada com alguém que detesto, prefiro que seja com alguém de minha escolha. — Mesmo que eu aceite, não terei tempo de salvar o meu ducado. Tudo estará perdido em dois dias. — Ele falou sombriamente, fitando o rum com desprazer. — Não se nos casarmos antes. — Ela falou, com uma a animação indiferente ao momento. — Vamos até Gretna Green, se partimos em vinte minutos, sem qualquer imprevisto ou paradas, estaremos casados antes que o sol se ponha no sábado. Ele a olhou como se ela fosse louca. Mas um brilho admirador enfeitavam seus olhos. Uma esperança de vitória fez Daphne festejar internamente. Sabendo que ela venceria aquele primeiro obstáculo. — Você é louca, mulher. — Ele disse com um sorriso quase idolatrante. — Gosto disso. — Então é isso? Vamos para Gretna Green? — Questionou levantando-se, ele passou uma mão pelos cabelos castanhos. Dando uma última tragada em seu charuto antes de joga-lo na caneca de rum. — Vamos para Gretna Green. ∞∞∞ Eles viajariam na carruagem do duque, porque era maior e muito mais confortável para a longa jornada que estavam prestes a fazer. Daphne pediu para que o cocheiro do duque parasse o veículo próximo a esquina da rua de sua casa. Deixou Alec esperando, e sumiu nos fundos da casa escura. Pouco mais de trinta minutos depois ela retornou, trazendo uma valise em uma mão e arrastando algo atrás de si com a outra. Alec abriu a porta da carruagem pronto para reclamar sobre sua demora quando viu que algo a seguia, algo pequeno, rosado e monstruoso. Ele deu um salto para fora da carruagem e retirou o canivete que guardava na bota com uma agilidade impressionante. — Que coisa é essa? — Ele indagou apontando para o pequeno porquinho que assustou-se e começou a grunhir para soltar-se da coleira que tinha enredada no pescoço. — É só o Thomas. — Daphne disse, o olhando feio por ele ter assustado o animal. — Você assustou-o, agora levará uma eternidade até que se acalme. — Pegou o porco nos braços para tentar acalma-lo. — O que você disse? — Alec indagou, perplexo com aquela cena. — É apenas um porco. — Ela explicou, o estarrecimento do escocês ficou nítido em seu rosto ao ver que o porco começou a se acalmar devagar a medida que Daphne ia passando uma mão em seu flanco. — Abaixe isso, ele tem sensibilidade a coisas afiadas. Ainda perplexo, ele guardou novamente o canivete em sua bota, somente então deu-se conta de como o porco se chamava e sentiu uma enorme vontade de gargalhar. — Você tem um porco e deu a ele o nome de Thomas? — Ela o olhou envergonhada, ele por outro lado tinha achado aquilo genial. — Bom, sim. Mas tenho pensado em novos nomes para ele desde que o Thomas original mudou-se para o lado dos mocinhos. — Ela colocou o pequeno animal no chão. — O que exatamente você planeja fazer com esse porco? — Vou leva-lo oras. — Ela disse com obviedade. — Ah, mas não vai mesmo. — Alec ergueu um dedo no ar, e apontou para o chão da carruagem. — Não tem uma semana que troquei o carpete, que a propósito equivale seis vezes o valor desse porco. — Bom, eu não poderei ir sem ele. Tenho feito uma promessa. — O olhar do escocês dividiu- se entre a pura perplexidade e o riso absoluto. — Como poderia fazer uma promessa a um porco nanico? — O rosto de Daphne avermelhou por todo a parte. — Isso não interessa, o que interessa é que não vou sem ele. — Ela disse, muito irritada. — Tudo bem. — Ele bufou resignado. — mas se esse porco fizer minha carruagem de latrina, amanhã pela manhã comerei presunto no desjejum. Não tardou eles já estavam na estrada com destino à Escócia. Daphne York seguia o caminho inteiro em silêncio, sentindo um peso no coração por estar embarcando em uma aventura da qual não sabia quais seriam as consequências. Sentia muito por estar deixando seus pais e irmãs. Amanhã pela manhã eles dariam-se conta de que ela não estava lá e no mais leve dos casos ficariam preocupados. Sua única consolação era que tinha deixado um bilhete sobre a escrivaninha de seu quarto informando de sua recente decisão. O casamento com Northwest não seria algo horrível. Não sentia "aquilo" pelo homem, na verdade sentia muitas coisas pelo lorde na sua frente, mas nenhuma delas era afeto ou empatia. — Então, meu doce...— falou o apelido carinhoso com sarcasmo. — Por que se casar com o seu prometido é algo assim tão horrível? Daphne se admirou por ele estar tentando puxar uma conversa, esperava que pudessem viajar em silêncio o caminho todo até Gretna Green, não queria criar qualquer vínculo com ele. Não queria saber de sua vida e nem sobre os seus interesses. Preferia se manter em sua zona segura, afastada. — Me dá náuseas o destino de uma esposa prendada. — Respondeu consisa, ele deu um leve sorriso de canto. Parecia ver nitidamente que ela estava desconfortável. — Você está mentindo. — Constatou, simples assim. Sem pestanejar, a fazendo gelar por dentro. — Do mesmo jeito que tem seus segredos, milorde, eu também tenho os meus. — Ele dirigiu aquele olhar para ela, aquele maldito olhar avaliador. Os dois topázios amarelos a vasculhando a procura de mentiras. — Isso deveria me assustar? — Absolutamente. Por quê assustaria? Pretendo que nos vejamos o menos possível durante a vida. — Ela respondeu arqueando uma sobrancelha, deixando claro que ele não conseguiria intimida-la. — Muitas mulheres dariam o pescoço para estar em seu lugar. — Ele comentou, estudando as reações dela. — Então por que não se casou com nenhuma delas? — Retrucou rápida e ele a olhou outra vez admirado. — É impressionante que uma coisa tão pequena consiga ter uma língua tão grande. — Ele falou, se aconchegando nos acentos da carruagem suntuosa. Em resposta Daphne crispou os lábios virando o rosto para a janela, sem deixar de notar que ele fugiu de sua pergunta. A carruagem seguia em uma velocidade assombrosa, passando pelos buracos na estrada e causando solavancos que faziam os corpos saltarem dos acentos. Daphne agradeceu por toda a distância que a carruagem proporcionava do homem que dormia com as pernas esticadas uma em cima da outra. As mãos cruzadas em cima da barriga coberta pela mesma vestimenta de horas atrás. As canelas esbeltas tinham panturrilhas rijas e torneadas cobertas por meias de algodão e botas que iam até quase nos joelhos. O início de suas coxas estavam expostos, como uma tentação silenciosa coberta de pêlos castanhos e espessos. O kilt de lã xadrez tinha listras que seguiam um único padrão, em horizontal, sendo cortadas por duas linhas em vertical, com uma faixa escura na barra pesada. Ela seguiu com os olhos o caminho de seu corpo grande, passando pela faixa amarrada na cintura com um emblema de duas espadas cruzadas em cima da cabeça de um lobo de olhos dourados. Seguindo pelo abdômen que deveria estar relaxado pela posição, chegando no peito que subia e descia em um ritmo constante, passando pelo pescoço grosso com um grande pomo de Adão atraente para um beijo, e chegando no rosto que permanecia afundado no sono. De boca fechada até que ele ficava mais atraente. Ela lembra nitidamente da primeira vez que o viu em um passeio no Hyde Park, onde ele a cativou a atenção de imediato por seu jeito extrovertido e olhos de um amarelo hipnotizante, com as maçãs do rosto salientes e o queixo pontudo, lábios atraentes e o famigerado kilt que chamava atenção a onde quer que ele fosse. Mas naquele dia ele não a notou, nem no outro, e nem outra vez depois daquele, e nem nas muitas outras seguintes ocasiões em que se esbarraram. Era como se ela fosse invisível aos seus olhos. Daphne nunca admitiria, nem sobre a mira de uma arma, que isso a deixou definitivamente abalada. O galope furioso dos cavalos a mantinham acordada, de qualquer maneira ela não estava sentindo sono e não entendia como ele podia estar dormindo tão serenamente diante daquela situação. Quando o dia clareou, ela o acordou com um chute na perna. Eles precisavam parar rapidamente em uma estalagem para alimentar os cavalos e Thomas precisava passear um pouco. O porquinho sempre esteve acostumado com os grandes prados de Yorkshire, precisava de grama fresca e um bom lugar para rolar. Eles não tinham tempo para uma refeição, ainda faltava um bom pedaço até chegar na metade do caminho e teriam que chegar lá a tempo para que o casamento fosse válido. Caso contrário não teria porque ele se casar com ela, e ela teria que voltar para casa como uma perdedora. Daphne bebeu apenas um pouco de água, e molhou o rosto com o restante, para espantar a fadiga. Quando tudo estava pronto, e voltaram para a carruagem, ele tinha trago para ela algumas castanhas, pão de mel e uma caneca de leite. — Foi tudo o que consegui. — ele disse, mas mesmo assim ela se sentiu muito agradecida. Dividiu o pão com o porco, e comeu as castanhas distraidamente. Enquanto ele ia lendo um jornal que também comprou na estalagem, a jovem tentava ler um livro de contabilidade, mas sem muito sucesso. O balanço da carruagem impedia que sua vista identificasse as palavras. Decidiu então largar o livro de lado e passou a amaciar as mechas de seu cabelo longo. Não era um casamento por amor, mas aquele seria seu único casamento e ela queria estar apresentável. Soltou as mechas, que desceram pelas suas costas e barriga. Seus cabelos eram um emaranhado de fios incontroláveis, volumosos e espessos, nem a escova projetada pelo mais hábil artesão ou a forquilha mais forte do mundo eram capazes de doma-lo. Daphne quando mais jovem, não gostava das madeixas que tinha herdado de sua avó, suspirava de inveja de Seraphne, que tinha os fios lisos escorridos, comportados e macios. Foi somente com a idade que ela passou a se aceitar e ver a beleza de sua juba. Fez uma longa trança volumosa, e a jogou para trás. Soltando alguns cachos menores ao redor do rosto e nas têmporas. Com um calafrio na espinha ela percebeu que estava sendo observada. Tentou reprimir o rubor nas bochechas ao ser pega em um momento de tão íntima distração. — Qual o problema? — Perguntou envergonhada. Juntando as mãos no colo. — Nada, eu apenas nunca tinha visto o comprimento de seus cabelos. — Ele disse, e o tom profundo de sua voz fez os pêlos da nuca de Daphne arrepiarem. — São apenas cabelos. — Respondeu com um dar de ombros. Ao qual ele respondeu com o silêncio. Ainda estudando-a até que ficasse vermelha em cada centímetro de pele. Tirou os olhos dela e voltou a olhar o jornal, parecia um pouco mais tenso, mas ela suspirou agradecida por não ter mais a atenção dele. Ainda restavam algumas horas até chegar ao seu destino e ela sentia que seria algumas horas de pura tortura. Capitulo dois "São apenas cabelos" ela disse. Só cabelos. Não a vasta nuvem de ouro esculpido, que adornava o seu rosto pequeno, deixando-a parecida com uma pequena escultura da deusa Afrodite. Atraindo-o com sua beleza e seu encanto. Não, não era nada disso, era apenas cabelo, e ele logo tratou de se convencer disso. Não falou mais nada, e nem arriscou olhar para ela. No pouco tempo que pôde avalia-la, viu que de alguma maneira sua presença a deixava desconfortável. Também estava nervosa, isso era sua emoção mais nítida. Ela não conseguia se manter parada e dava para ver refletido nos olhos, que sua cabeça não parava de pensar um só segundo. Alec tinha a certeza de que daria uma boa quantia apenas para saber o que se passava ali dentro. Daphne York era intrigante, como uma dessas bonecas russas. Quanto mais se abre as camadas, mais encontram segredos lá dentro. Nunca foi do seu interesse revelar os segredos da moça, pelo contrário, quanto mais distância mantivesse entre os dois, melhor se sentia. Tinha fingido que esteve dormindo boa parte da noite. A presença dela deixava-o nervoso e acabava falando demais quando isso acontecia. Ela conseguia deixa-lo mudo, com sua língua ferina e uma determinação atípica de uma mulher. Alec suspeitava que Deus tinha feito uma parcela de mulheres iguais e quando chegou a vez de Daphne, cansou-se da fórmula e fez algo único. Afinal, quantas mulheres ele conhecia que entravam em tabernas no meio da noite para propor casamento, e andava por aí fazendo promessa para suínos? Isso era algo que o deixava apavorado e ao mesmo tempo admirado. E o assustava. Mais do que jamais iria admitir. E agora, estava indo se casar com ela. Depois de anos evitando-a nos salões de bailes e jantares, iria transformá-la em sua esposa. Não sabia se ria da própria desgraça, ou se chorava pela maldita sorte que tinha. Já estava conformado com a derrota até ela aparecer vestida de negro como uma resposta divina. A princípio ele pensou em recusar de imediato. Porém, depois que ouviu suas condições, achou que aquela era a maneira de Deus mostrar que não tinha se esquecido dele. Não foi preciso pensar muito mais. Não tinha garantias quanto ao castelo, mas poderia salvar o ducado e manter Ashleigh segura, e ainda não precisaria ter que passar pela fadiga e drama do casamento. Daphne era madura e deixava claro que não gostava dele, e o sentimento era recíproco, não precisariam morar na mesma casa, nem dividir uma cama, depois do casamento ele ficaria no castelo Stirling até que acabasse p período de um ano, e ela poderia ir morar em sua residência de Londres. Poderia gozar da liberdade que tanto desejava e Alec poderia regressar para a sua terra finalmente. Ela teria a proteção do título e poderia ficar com o dinheiro do próprio dote. Ele não queria. Já tinha dinheiro suficiente para sete vidas. O restante da viagem seguiu no mesmo ritmo louco, quando o dia virou noite nenhum dos dois aguentavam mais estar na estrada. Eles pararam na primeira estalagem que encontraram, precisavam comer alguma coisa e esticar as pernas. O lugar era muito humilde, mas serviria para o propósito. A mulher do estalajadeiro era quem preparava a comida, ironicamente o prato do dia era porco defumado. Ela comeu apenas a salada com a sopa de legumes enquanto ele se fartava de carne. — Poderia ter um pouco mais de consideração. — Ela disse, olhando-o discriminadamente. — Ele é um porco, já tive consideração demais por deixa-lo dormir durante toda a viagem sobre minhas botas. — Thomas é um porco especial se quer saber. — Ela disse passando geleia em uma parte do pão. — O veterinário disse que o lhe falta em tamanho, tem em esperteza. Tem os sentidos muito apurados e pode magoar-se com facilidade. — Magoar-se? Um porco? — Alec riu, ela ergueu o queixo, muito orgulha ao falar: — Sim, e também é muito medroso tadinho, sua mãe o rejeitou ainda bebê por ser minúsculo. — Alec percebeu apenas pelo modo como ela falava olhando para o porco que realmente tinha apego emocional pela criaturinha. Ele via aquele porco como uma anormalidade, já ela, via ele como algo especial. Deixaram a estalagem cinco minutos depois, satisfeitos e revigorados para o restante da viagem. Os cavalos já estavam nos arroios, bem alimentados e descansados. Alec estava para subir na carruagem quando um grupo de homens saíram do bosque trazendo espingardas nas mãos e algumas perdizes. Nesse mesmo momento uma gaivota que estava por ali issou voo, um dos homens apontou a arma para o pássaro, e o barulho do disparo ecoou pelo ar. O porco, que vinha nos braços de Daphne assustou-se e imediatamente se soltou do aperto dela, correndo em disparada na direção contrária do disparo. — Oh não, Thomas volte! — Daphne gritou erguendo as saias com as mãos, e se pondo a correr atrás do porco. Alec se encostou na lateral da carruagem e começou a assistir aquela cena pronto para dar boas gargalhadas, mas o medo no rosto da pequena noiva era real. — Oh saco! — Ele lamentou, quando o pingo de moralidade que ainda restava dentro dele gemeu entre a vida e a morte. Deixou o cocheiro para trás e também pos-se a correr atrás do porco. Ele logo a alcançou e a deixou para trás, seguindo sozinho na perseguição. Alec nunca imaginou em toda a sua vida que fosse correr atrás do porco de uma donzela, e muito menos que um porco pudesse correr tão rápido. De todos os animais de estimação que ela poderia ter, foi escolher justamente um porco nanico, sentimentalista, medroso e rápido como um inferno. Quando o porco finalmente se cansou de fazê-lo comer poeira, e diminuiu a velocidade, Alec o alcançou. Sem fôlego, afogueado e provavelmente descabelado. Já não era mais um menino atlético, sentiria os efeitos daquela corrida por semanas. Quando retornou para Daphne a insolente tinha a mão na boca escondendo uma risada. Ele torceu o maxilar, pelo menos alguém estava se divertindo. — Coloque esse presunto em uma coleira. — Ela pegou o animal e o colocou dentro da carruagem. — Não o chame de presunto. Vai magoa-lo. — Ela sussurrou, como se o porco pudesse entende-lo. — Bacon então? — Ela cerrou os olhos para ele. — Você é desprezível. ∞∞∞ Daphne parecia cada vez mais pálida à cada minuto que chegava mais perto da Escócia. Alec esperou ela dizer a qualquer momento que desistia, mas ela se mantinha firme, agarrando a valise que trazia contra o colo. Por volta das três e meia, eles atravessaram a ponte que ligava a Inglaterra e a Escócia e entraram no indiscutível país de Alec. Fizeram uma viagem de quatro dias em um, Alec estava se sentindo um pouco culpado pelo estado que sua noiva se encontrava. Ela não dormiu a noite toda e nem um pedaço do dia, tinha se alimentado muito mal e ele tinha certeza que ela colocaria o fígado para fora a qualquer minuto. Só não sabia se isso era por conta da exaustão física, ou pelo que estavam prestes a fazer. Andaram mais um pouco até finalmente chegar em Gretna Green. A chegada na cidade pitoresca pareceu revitaliza-la um pouco. A pequena cidade fazia isso com as pessoas. O palco de centenas de histórias de amor. O destino de fuga de milhares de amantes em busca de unir-se em matrimônio. O motivo disso era uma lei que permitia que qualquer homem ou mulher acima dos quatorze e doze anos de idade, poderiam se casar livremente sem uma autorização dos pais. Tudo que tinham que ter, era a presença de duas testemunhas e algumas libras no bolso. A cerimónia poderia ser realizada por quase qualquer um com uma permissão, mas era muito mais comum que ferreiros fizessem o trabalho, era quase como uma tradição. O cocheiro estacionou a carruagem de frente para uma estalagem caprichosa. Assim como a maioria dos comércios naquela região, a estalagem era toda projetada para proporcionar o clima de bodas. O arco do cupido, eram os dizeres na placa de entrada. Daphne desceu da carruagem sem a ajuda do lorde e observou o lugar ao redor com curiosidade. — Já tinha estado na Escócia antes? — Perguntou Alec, se sentindo muito mais confiante em seu país de origem. Ela negou com a cabeça. Os olhos azuis admirando as muitas casas que formavam fileiras rua abaixo. Entraram na estalagem, e logo na recepção puderam ver o pequeno restaurante bem movimentado. Alec andou até o balcão para reservar um quarto e se informar onde ficava a ferraria mais próxima. Apertou a companhia e logo um casal de idosos vieram andando dos fundos calmamente para atende-los. Apesar da idade nitidamente avançada, aparentavam ter um ar primaveril apaixonante. Se apresentaram como Sr. e Sra. Uig. — Oooh, mais um casal apaixonado em busca de matrimônio... — disse a velhinha, olhando para eles com uma mão no peito. Northwest deu um sorriso amarelo. — Me diga, qual a historia por trás deste ato tão romântico? O duque ficou abrindo e fechando a boca como um peixe, enquanto a mulher o olhava esperando um conto de amor arrebatador. — Não tem história de amor, ele precisa salvar o ducado e eu preciso fugir de um matrimônio arranjado. No fim da cerimónia cada um vai para o seu lado. — Respondeu Daphne direta, sem piscar. O rosto da senhora murchou de decepção, como uma criança que acabou de perder o doce. — Bom temos uma exceção para tudo. — Falou desiludida. — Sabem que o casamento só será válido até que tenha sido consumado certo? Isso fez as faces de Daphne arderem como fogo, Alec foi incapaz de controlar o riso. Recebendo uma olhada mortal da noiva. — Minha noiva não vê a hora de consumar o casamento, por isso viemos tão depressa de Londres. — Burlou o escocês. — Só resta saber qual de nós será a noiva, visto que você, querido, tem um gosto estranho por saias. — Ela retrucou arrancando o riso do rosto do noivo de imediato. — Parece que nem tudo está perdido...— comentou a Sra. Uig, olhando para os dois com aquele irritante olhar que somente as pessoas idosas tinham. Northwest logo se empertigou, desconfortável. — Aqui está a chave do quarto, logo mais no fim da rua tem um ferreiro, Bryant MacKenzie, é o melhor da região. — Disse o Sr. Uig, colocando uma chave em formato de coração no balcão. — Tem mais uma coisa, estamos precisando de duas testemunhas... — ia dizendo Alec, mas foi atrapalhado pela velhinha, que brilhava com uma determinação inquietante. — Será um prazer fazer isso por vocês. — Disse amável e Alec assentiu agradecido. Acompanhou Daphne até o quarto da estalagem. — Darei um tempo para você se recompor, estarei esperando aqui fora. — Disse e a loira assentiu sem olha-lo, levou a valise para dentro do quarto e sumiu atrás da porta. Capitulo tres Daphne levou os minutos em silêncio, estava cansada e queria acabar logo com aquilo para que pudesse voltar para casa. Ela imaginava que a aquela altura sua família já estaria armando buscas por toda a Londres para encontra-la. Trocou o vestido de viajem por um verde de musselina com cintura alta e um decote discreto, e luvas de cetim cintilantes que iam até os seus cotovelos. Ela era um noiva bem simples, mas estava razoavelmente agradável se levasse em consideração seu estado de espírito. Deixou a trança no cabelo, despojando alguns fios para dar uma aparência mais espontânea, e molhou o rosto mais uma vez, para espantar a fadiga. Evitou olhar para a cama bem arrumada, pois ela parecia tão convidativa quanto um banquete para um faminto. Deixou o porco bem acomodado no quartinho em frente ao fogo e saiu no corredor pronta para derrubar um gigante, dando de cara com Northwest lá. Ele também tinha trocado de roupa. Usava meias brancas até os joelhos e suas botas já não tinham mais lama. O kilt também era diferente, ainda era verde com negro, seguindo o mesmo padrão de quadriculado, mas o tecido era mais grosso, de uma qualidade melhor e caia reto para baixo. Usava também um casaco de pele na cor preta, ele era longo com couro aveludado por toda a extensão e pele grossa e felpuda nos ombros largos. Uma boina verde musgo descansava em sua cabeça, caindo só para um lado do seu rosto tenso. Ela travou saliva, desviando os olhos, não se conformava que um homem pudesse ser tão bonito de saia. — Tem um animal morto em seus ombros. — Ela disse, e ele levou um momento em silêncio até entender que ela estava criticando sua vestimenta. — É uma herança de família, além disso não é hora para ser hipócrita meu mel. — Ele se defendeu. — Quero que use uma coisa. — e só então ela percebeu que ele trazia um pedaço de tecido nas mãos. Se aproximou mais dela, abrindo o tecido que se revelou ser uma longa faixa com a mesma estampa do seu kilt. — É um costume que a noiva leve um pedaço de tecido com as cores da família do noivo. — Ele disse muito suavemente enquanto passava a faixa pelo ombro dela. Deu uma volta pelas costas de Daphne e prendeu as duas pontas da faixa com um broche do emblema Armstrong no lado direito do quadril dela. Daphne ficou inquieta enquanto ele a avaliava da cabeça aos pés. Ao fim, ele acenou com a cabeça satisfeito. Ela não sabia o que aquela faixa significava para ele e sua tradição, era um pedaço de tecido feioso que parecia ter sido retirado da saída dele, mas ela não pôde reprimir a pequena pontada de satisfação bem lá no fundo. Os dois caminharam lado a lado até o andar de baixo, onde o casal Uig os aguardavam ansiosos. A senhora Uig a olhou e sorriu levando uma mão ao peito, emotiva. Daphne tentou reprimir a vontade de rolar os olhos. Aquilo não era romântico. Era tudo, menos romântico. — Você está linda. — Daphne agradeceu com um sorriso. — Mas está faltando algo... — a mulher mais velha a avaliou minuciosamente e seus olhos iluminaram quando teve uma idéia. — Já sei! Volto em um segundo! A senhorinha deu as costas para todos e correu para os fundos da estalagem. Eles a aguardaram como estátuas no lobby. Northwest olhando um relógio de bolso enervado, Daphne batendo o solado da bota no chão com impaciência, e o senhor Uig muito sereno alheio ao desconforto dos noivos. — Aqui, voltei. — Disse a mulher voltando dos fundos, trazendo um buquê de flores nas mãos. — São urzes brancas. — Ela disse enquanto puxava a trança de Daphne e colocava as flores entre os fios loiros de seu cabelo volumoso. — É um costume. Para trazer sorte ao casal. O olhar dela cruzou com o de Northwest, e um forte rubor aqueceu a cútis dela. Não precisariam de sorte, amanhã mesmo depois de descansada ela voltaria para casa. — Agora sim, está uma verdadeira noiva escocesa. — a senhora Uig disse carinhosamente depois de avalia-la uma outra vez e puxou-a pela mão para fora da estalagem. Contudo, quando Daphne foi colocar o pé para fora do estabelecimento a velhinha deu um baita grito que fez a noiva pular de susto com o coração na boca e os olhos fora da cara. — A noiva deve sair com o pé direito, é um costume. Para trazer sorte. Mastigando a própria língua para não manda-la engolir seus costumes escoceses, Daphne fez o que a mulher instruiu, ignorando o sorriso divertido no rosto de Northwest. Os quatro desceram a rua em harmonia até a ferraria. A cada passo que dava, Daphne sentia que poderia desmaiar. Estava culpando o cansaço, mas tinha que parar de mentir para si mesma. Talvez, só talvez, aquela fosse uma péssima ideia, e todos os seus planos dessem errado. Entraram na ferraria e o duque bateu no sino da entrada. Segundos depois um homem grande vestindo um kilt azul e vermelho, saiu por uma portinha minúscula nos fundos, limpando as mãos sujas de carvão em um paninho imundo. O ferreiro avaliou os quatro. Os olhos percorreram os urzes no cabelo dela, a faixa que rodeava seu ombro e parou no kilt de Alec. — Um Armstrong. — Disse como uma saudação, andou até eles com um sorriso acolhedor. — Imagino que estejam aqui para se casar, certo? — Sim. — Foi Northwest quem respondeu. — Me acompanhem. — O homem fez sinal que eles o seguissem. Enquanto eles se embrenhavam na casa soturna, Daphne se aproximou do noivo que seguia o caminho sério e calado. — Como ele reconheceu você? — Perguntou em voz baixa, o escocês olhou para ela sem entender. — A poucos minutos, ele olhou para você e disse "Um Armstrong". Ele ergueu as sobrancelhas, entendendo, e indicou o próprio kilt. — Pelo tartan, meu doce. — Daphne emburrou o cenho, incomodada com o apelido. — O que é isso? Uma espécie de código secreto escocês? — Zombou. — É, basicamente. — Ele respondeu arrancando o sorriso dela. — Vê essas listras? — apontou para as listras no kilt. — Segue o padrão do meu clan, cada clan tem o seu único, olhe o kilt dele, as listras mudam de padrão. Ele é do clan Mackenzie. Daphne o olhou bastante impressionada. Sempre pensou que fossem apenas listras em um tecido. Eles pararam de frente para uma bigorna, e o senhor Mackenzie, se colocou atrás da mesma. Encarou os dois com uma paz irritante. — Declan!!! — Deu um berro repentino que deu um susto em todos. Mais um pouco e Daphne iria matar um escocês. Independente de qual fosse. Um menino ruivo e magricela de aproximadamente quinze anos entrou ali atrapalhado, carregando uma espécie de sacola de pano com vários tubos finos de maneira ao redor, cheio de pequenos buracos entalhados. — Para deixar a cerimônia ainda mais tradicional, meu filho vai tocar. — Disse o ferreiro Mackenzie, dando permissão para o menino, que puxou o ar para os pulmões e começou a soprar para dentro de um dos tubos de madeira. Logo em seguida o local foi preenchido pelo som do que parecia ser uma rinha de gatos, misturado com carneiros sendo atropelados. — Você tem um anel? — Perguntou o ferreiro para Northwest, alheio ao crime ambiental que seu filho estava cometendo. O duque pareceu envergonhado. — Não, senhor. É um casamento de... — Daphne começou a explicar, quase gritando para ser ouvida por cima daquele som estridente, mas foi atrapalhada por Northwest. — Na verdade, eu tenho. — Ele estendeu a mão direita no ar, onde todos os dedos longos estavam ocupados por anéis. Do dedo mindinho ele tirou um anel dourado e brilhante. Os olhos dela se pregaram naquele anel. Um diamante amarelo lapidado em formato de gota, cravejado no ouro. Na parte interna tinha um relevo que ela não soube identificar. — Muito bem. — Disse Mackenzie. — Fiquem de frente um para o outro e coloque-o na sua noiva. Eles obedeceram e Northwest tomou a mão esquerda dela. A música irritante foi esquecida, e um formigamento estranho começou a subir pelo braço de Daphne, ele deslizou a aliança pelo seu dedo, e aquilo se encaixou nela como se fosse feita sob medida. — Dê-me sua mão. — O ferreiro pediu, pegou a mão dela e antes que Daphne pudesse perceber, ele estava cortando sua palma com um punhal. — Aí! — Ela reclamou, vendo o risco raso em sua mão verter sangue fortemente vermelho para fora da carne. Mackenzie fez o mesmo com a mão do noivo e em um gesto que Daphne achou além de nojento, juntou as duas mãos, misturando assim o sangue dos dois. O ferreiro pegou uma fita de tecido branco e amarrou as mãos dos dois juntas, dando um nó bastante firme ao fim. — Tem algo dizer? — Perguntou para os dois, que fizeram um não bem apavorado com as cabeças. — Repitam comigo... — pediu, e engolindo em seco, tentando não vomitar o nada que havia em seu estômago, Daphne repetiu junto com Alec. — Compartilho contigo meu sangue, meu corpo e minha alma, deste dia em diante, até o fim dos meus dias. — Northwest escolheu bem este momento para olha-la nos olhos, talvez fosse o nervosismo por estarem naquela situação, o que quer, que fosse, arrancou o ar dos seus pulmões, e fez ela acreditar que naquele momento suas palavras eram mais sinceras do que deveriam. — Eu te aceito. — O que Deus uniu o homem não separa. — a frase reverberou pelo ar como uma indireta silenciosa, e um fungado alto ali perto anunciou que a Sra. Uig estava em prantos. — Está feito. Foi tudo tão rápido que Daphne só teve tempo de piscar. — Então é isso? Estamos casados? — Perguntou, querendo sair dali voando antes que fizesse aquele garoto engolir aquele instrumento demoníaco. — Ao que parece. — Respondeu Northwest, agora quem estava pálido era ele. Eles abandonaram a ferraria logo após pagarem o serviço, o registro de casamento seria entregue no prazo de uma hora. Daphne nunca apreciou tanto o silêncio, mas sua mão mutilada ainda estava atada a de Northwest e isso estava incomodando-a. Levantou o pulso para tentar tirar o nó mas foi impedida pela senhora Uig. — Não pode desamarrar a fita até que tenha se consumado o casamento. — Daphne bufou, irritada. Estava cansada de escoceses. Todos eles. — Deixe-me adivinhar, mais um costume escocês?! — Perguntou retórica. Ela voltou a tentar abrir o nó com impaciência, mas o senhor Mackenzie tinha apertado demais a coisa. — Precisaremos de uma faca. — Falou frustrada por estar apanhando de um nó, a senhora Uig a interrompeu novamente. — O nó sairá normalmente. Basta parar de lutar contra ele. — Disse de maneira misteriosa. Daphne franziu o cenho para Alec. Ele acreditava naquela sandice? Em resposta ele deu de ombros. Essa tinha sido sua resposta para muitas coisas naquele dia. — Agora vamos. Temos que comer para celebrar! — Disse a velhinha, festiva. O estômago de Daphne roncou ao ouvir a palavra comer. — Não, não poderemos ficar. — Disse Northwest fazendo a animação dela se esvair. — Ainda tem um bom pedaço até Kinlochleven. — É realmente necessário que eu vá? Você pode levar a certidão de casamento. — E o que dirão quando eu chegar lá casado mas sem uma esposa? — Que é um homem de sorte? — Ela gracejou. Mas não se sentia nada feliz, não podia adiar ainda mais sua volta para Londres, e nem queria passar mais tempo que o necessário na companhia dele. — Assim será melhor, poderemos comer alguma coisa enquanto esperamos a certidão ficar pronta. Quando chegarmos no castelo Stirling você poderá descansar devidamente para ter vitalidade para voltar para casa. — Ela ponderou, talvez fosse melhor daquele jeito, estava muito exausta, e não queria passar a noite de suas bodas sozinha, sem falar que daria tudo para descansar em uma cama quentinha e confortável. — Muito bem. Mas não pretendo me demorar, voltarei amanhã pela tarde. — Ele concordou sem dizer nada e a puxou em direção a estalagem. Como um presente pelas bodas a senhora Uig serviu um pequeno banquete para os dois no restaurante da estalagem. Eles comeram lado a lado em silêncio, rodeados pelo ambiente propositalmente apaixonante. Daphne estava além de irritada por ter que comer com sua mão esquerda, felizmente o cordeiro estava delicioso e macio, e as batatas bem cozidas, ela pode corta-los com o garfo e leva-los a boca sem muita dificuldade. Enquanto ainda comiam, um casal irrompeu pela porta da frente da estalagem. O rapaz carregava a recém esposa nos braços e os dois estavam as gargalhadas enquanto subiam as escadas em direção ao quarto. Daphne sentiu o pescoço esquentar ao entender o motivo da pressa dos pombinhos. — O cupido está solto. — Ela disse, dando uma risada sem graça. — Nunca entendi porque associam o cupido apenas ao amor. — Northwest devolveu, bebendo um gole do seu vinho. — Talvez seja porque ele é filho de Afrodite. — Com Ares, o deus da guerra. — Ele adicionou, eles estavam tão próximos que Daphne pôde ver os espirais que ele tinha nas íris impressionantes. — Pela lógica ele trás tanto o amor quanto o ódio. — Há quem diga que os dois andam de mãos dadas. — Ela parafraseou. Os olhos do duque caíram para as mãos dos dois atadas, e abriu um sorriso irônico. — É melhor irmos indo, antes que Eros resolva nos flechar. — Ela nunca concordou com ele tanto quanto naquele momento. Uma hora e meia depois, ela, Alec e o porco Thomas estavam se despedindo do casal Uig, do ferreiro Mackenzie e do seu filho desprovido de talento, indo de encontro as famosas highlands. ∞∞∞ A viagem pela Escócia foi rápida, desconfortável e fria. Northwest estava muito quieto. Desde que tinham abandonado Gretna Green, não tinha falado quase nada em todo o percurso e seguia olhando pela janela da carruagem, onde uma geada havia se formado. Eles passaram pelas muitas cidades pequenas, o ar era frio e úmido e a noite estava muito escura. Por mais que Daphne tivesse odiando aquele nó em sua mão, a partir de um momento da viagem, ter Northwest ao seu lado foi algo reconfortante. Depois que passaram pela famosa Edimburgo, o frio se tornou algo insuportável e ele era uma fonte de calor agradável. Irradiando perto dela como uma fogueira de músculos atraentes. Até mesmo Thomas estava se aproveitando do calor dele, depois do porco muito bater com o focinho gelado em sua perna, ele pegou o animal e o acomodou em seu colo. — Presunto folgado. — Ele resmungou para o porquinho que apenas enfiou o rostinho nas dobras das vestes dele. Daphne escondeu o sorriso de lado, e desejou ter um retrato da cena para emoldurar e pôr em sua sala de estar. Ela dormiu um sono raso, e quando acordou novamente uma neve grossa caía do céu, diminuindo significativamente a velocidade da carruagem. Lembrou de sua infância na América. Quando corria com suas irmãs pelo quintal de sua antiga casa, atirando bolas de neve umas nas outras. Tudo parecia tão distante, como um sonho enevoado. Era difícil pensar que agora suas irmãs estavam casadas e construindo suas próprias famílias. Daphne sentia uma falta absurda delas, era triste ser a única que permaneceu sozinha, triste perceber que nunca mais nenhuma delas seriam as mesmas. Olhou para o homem ao seu lado, sentia certa culpa por estar enganando-o. Não era como se estivesse mentindo para ele, tinha falado a verdade, precisava mesmo de um marido para se livrar de Phineas, estava apenas omitindo algumas coisas, coisas que quando ele descobrisse, seria bom que estivessem bem longe um do outro para não haver atritos ou mágoas. Mesmo querendo manter distância, ela não podia evitar de se sentir curiosa sobre ele. Desde a primeira vez que o viu, percebeu que ele usava a máscara de cinismo para camuflar algo mais profundo, algo que era doloroso. E o mais perturbador, era ver que ele se acostumou a isso. Não era preciso conhecê-lo a fundo para saber que se orgulhava de seu sangue escocês. Isso era algo que ela admirava muito nele, sua confiança mesmo usando saias, era algo irritante. Quantas mulheres já passaram por sua cama? Ou pelo seu coração? Ela imaginava que muitas. Era um galanteador, dava em cima de tudo que usava saias e tinha seios, sua fama de libertino era muito comentada no Rough Diamond, já tinha cortejado suas irmãs e tinha uma paixão platônica por sua amiga Sophie, aparentemente a única mulher no mundo que não chamava o seu interesse, era ela. — Posso sentir que está me encarando, meu doce. — Ele falou, virando o rosto para olha-la. Daphne se afastou, enrubescendo por ter sido pega em flagrante. — Eu só estava pensando. Por que tinha que se casar para manter o ducado? — Ele dirigiu um olhar cínico para ela. — Isso é muito injusto docinho, se vou revelar um segredo meu, terá que revelar um seu também. — Barganhou com um tom bastante sedutor. Se Daphne não o conhecesse diria que estava a cortejando. — Faremos o seguinte, você responde minha pergunta, e eu responderei uma sua. — Ele sorriu, animado com a proposta. — Isso pode ser um jogo perigoso, doçura. — Arqueou uma sobrancelha. — Mas interessante. Pensou por uns instantes, olhando através da janela. — Muito bem, meu pai temia que eu nunca fosse me casar, achou que ameaçando me tirar o ducado, me deixaria sem opções. — Respondeu direto, sua resposta parecia sincera, mas Daphne sabia que tinha mais coisa aí, ele não parecia o tipo de homem ganancioso, somente o ducado não seria motivo suficiente para fazê-lo viajar como um louco até Gretna green apenas para se casar com ela. — E por que ele achava que você nunca iria se casar? — ele deu um sorriso malvado. — Uma pergunta de cada vez, meu pudim. — Daphne revirou os olhos ao ouvir o apelido enjoativo. — Agora é minha vez. Esfregou as mãos uma na outra, e ela soube que daí viria uma bomba. — Por que eu? — Ela olhou para ele confusa. — Por que eu dentre vários homens? Pelo que sei você foi muito cortejada após o aumento do dote, qualquer homem teria aceitado. Mellbourne, por exemplo, deixou evidente seu interesse em você. Daphne fez uma cara de puro desprezo. — Não consigo imaginar alguém mais detestável que Mellbourne. Esteve cortejando Jane Dudley durante toda a temporada e quando descobriu que a garota não tinha um dote, simplesmente a deixou de lado. — O pai de Mellbourne o deixou atolado em dívidas, não pode culpa-lo por querer livrar-se delas. — Partiu o coração da garota! — Daphne disse, injuriada. — Pobre Jane, teve que ir para a casa de uma tia no interior. — O coração das mulheres é volúvel. Logo ela encontrará o filho de um fazendeiro por quem se apaixonará perdidamente e Mellbourne será nada mais que uma vaga lembrança. — Daphne não deixou de perceber o toque do rancor em suas palavras. Percebendo que tinha deixado escapar mais do que deveria, Alec a olhou acusadoramente. — Você não respondeu minha pergunta, York. Por que eu? Daphne ficou muda. Um pouco pálida e dura. Não deveria ter começado com isso. A resposta devia ser direta, mesmo assim, as palavras se recusavam a sair. Ele vasculhou seu rosto com cuidado, com aquele olhar. E ela se remexeu inquieta no acento. — Mas eu já disse, você pode me dar a liberdade que nenhum deles me daria. — Respondeu, quase sem acreditar em suas próprias palavras. — Você não deseja um casamento como o de suas irmãs ou pais? Não deseja amor? Felicidade? Filhos? — Rapidamente ela se sentiu exposta. Aquela foi a conversa mais íntima que já teve com ele, e a mais longa também. Era um assunto delicado demais para ela, nunca tinha parado para pensar em tais coisas. Nunca tinha sequer experimentado do amor. Se sentia exposta com a pergunta por que não tinha as respostas. Para nenhuma delas. E mesmo que encontrasse, era tarde demais. Para tudo. Estava em um beco sem saída, e casada com o último homem a quem poderia vir a amar. — Uma pergunta de cada vez. — Disse virando o rosto para longe. Ele deu uma risada baixa em resposta. — Logo chegaremos em Kinlochleven. — Ele falou, se abaixando e tirando o canivete de dentro da bota. — É melhor tirarmos isso...— ele falou cortando a fita em suas mãos com a lâmina. —...não será muito bajulador chegar com minha esposa, e todos verem que ainda não a fiz minha. Daphne sentiu seu rosto incendiar como em fogo vivo. Pelo modo possessivo como suas palavras saíram e pelo uso da palavra "ainda" em sua última frase. Ela não se considerava uma mulher tímida. Na verdade, era por não ser tímida que se encontrava nesta atual situação, mas com Northwest era tudo diferente, ele conseguia surpreende-la com sua petulância. Diferente dos homens nobres que ela conhecia, ele não tinha filtros. Depois de libertos, ele juntou os restos da fita manchada com o sangue dos dois e guardou-as em uma bolsa pequena que carregava na cintura, junto com o canivete. A carruagem passou por cima de uma ponte sobre um lago congelado e perdeu a velocidade. — Esteve com o canivete o tempo todo, por que não nos soltou antes? — Gostei de ter você amarrada. — Foi sua resposta atrevida, acompanhada de uma piscada audaciosa. A carruagem parou no instante seguinte, a impedindo de arranjar uma resposta a altura de seu cinismo. Daphne se preparou para deixar a carruagem e vislumbrou pela primeira vez o imponente castelo Stirling, ficou parada meio dentro, e meio fora da carruagem, com um pé no ar, encarando o grande monumento coberto de neve, rodeado de torres e árvores, e quando procurou um apoio para descer, encontrou o vazio, perdendo o apoio e indo direto ao chão. Ela foi enfiada vários centímetros na neve congelante. Northwest estendeu uma mão para ela enquanto ria a plenos pulmões, Daphne deu um tapa em sua mão e levantou sozinha com um pouco de dificuldade. Sacudindo rodo o seu corpo para tirar a neve dos ombros e do casaco que já não servia para aquece-la do frio. — Odeio a Escócia. — Ela rosnou. — Vamos para dentro, antes que você pegue uma friagem. — Ele falou se recuperando do ataque de risos e a guiou, junto com o porco, para dentro do aconchego do castelo. Enquanto entravam pelo terraço, indo de encontro a porta de entrada, vários archotes, com tochas e lamparinas, iluminavam o caminho e espantavam a bruma negra da noite. Entraram no grandioso hall, onde vários pilares de mármore liso sustentavam o teto abobadado, e uma grande coleção de estátuas de gesso de deuses, a maioria das vezes seminus, usando apenas retalhos, brandiam espadas e travavam batalhas. Chegaram de frente a uma porta dupla de três metros de altura, e ele a parou com uma mão antes de entrar. A olhando cauteloso. — Tem algo que deve saber. — Ele falou quando pararam de frente para uma grande porta dupla. — Existem dois tipos de família, aquelas onde todos que se amam e vivem em harmônia, e aquelas onde todos se odeiam a maior parte do tempo mas no fim do dia ainda se amam. Já a minha família se encaixa em uma categoria especial, para ser mais curto, nós nos odiamos em uma parte do tempo e na outra buscamos mais razões para isso. — Ela piscou duas vezes, aturdida por ele dizer aquilo com tanta tranquilidade. — Mas não se preocupe, basta ficar imóvel que com um pouco de sorte eles não tentarão nada hoje. — Northwest, espere... — Antes que ela pudesse perguntar o que ele quis dizer com aquilo, ele a puxou para dentro do castelo. O calor agradável a rodeou, mas Daphne não teve tempo de apreciar isso, pois a visão de quatro pessoas sentadas em uma mesa a beira do fogo, chamou sua atenção. — Desculpe, estou atrapalhando a pequena reunião familiar? — Northwest indagou despreocupado, as mãos unidas atrás das costas e uma postura relaxada. Um dos homens na mesa levantou bruscamente, ele era alto, e grande, muito grande. — Alecsander, o que está fazendo aqui? — Perguntou ríspido, tinha longos cabelos ruivos e usava um kilt nas mesmas cores e padrão de tartan que o homem ao lado dela. — Eu que deveria fazer essa pergunta para você, da última vez que me informei essa casa ainda era minha. — Daphne percebeu que as expressões de todos na mesa ficaram confusas, então ele a puxou para perto e os olhares caíram sobre ela como bolas de fogo vivo. — Adorada família, apresento-lhes minha esposa, Lady Daphne Lancaster. As quatro cabeças se viraram para ela simultâneamente, a estudando dos pés a cabeça, desde as botas, até a faixa em seu ombro, e os urzes em seu cabelo. Daphne estremeceu, não com os olhares, estava acostumada a ter gente olhando-a com repúdio, mas estremeceu sim com o modo que Northwest falou o seu novo nome. E somente naquele momento ela se deu conta de que agora era uma duquesa. — Você é tão repugnante quanto o seu pai foi...— disse o ruivo alto, ficando realmente assustador. — ... é capaz de se casar com uma pobre coitada apenas para manter este ducado nojento. Daphne ergueu as sobrancelhas ofendida, pobre coitada? Deu um passo para frente realmente brava. — Ora seu...— Northwest a puxou de volta pelo braço. — Não fiz isso pelo ducado, fiz por Ashleigh, e porque prefiro morrer a deixar que vocês ponham a mão neste castelo. — Ele a pegou pelo pulso e a puxou para o corredor ao lado dali. Daphne pegou o porco de estimação do chão e o seguro nos braços. — Agora, se me derem licença, estão atrapalhando minha lua de mel. Eles se afastaram dali a passos largos. Daphne quase correndo para alcança-lo, as faces dele estavam rígidas e sombrias, mesmo tentando não aparentar nada, e ela percebeu dentro de si um desejo imenso de descobrir os segredos mais obscuros do seu, agora, marido. Capitulo quatro Pisando firme, Alec adentrou pelos corredores de sua casa. Sentia uma náusea forte castigar seu estômago ao mesmo tempo que o alívio invadia suas veias. Tinha achado que nunca mais iria pôr os pés ali novamente. E agora podia caminhar seguro de que a casa onde tinha passado os momentos mais felizes de sua infância, ainda era dele. Pelo menos pelo tempo que ele precisava para garantir o futuro de Ashleigh, graças a mulher miúda que andava ao seu lado. Ele olhou para ela quase correndo para acompanha-lo, levando aquele porco nos braços como um bebê. Ela não deveria estar ali. A aquela altura eles deveriam estar há quilômetros de distância um do outro. Mas Alec foi incapaz de deixa-la ir. Foi incapaz de enfrentar seus familiares sozinho. Era irônico, revoltante, e um tanto ridículo que ele precisasse de alguém tão pequeno em quem se apoiar. Mas naquele momento, quando esteve diante dela na frente daquela bigorna, usando aquele vestido de noiva verde, com a faixa com as cores de sua família, e todas aquelas flores naquela massa de cabelos revoltados, ele pensou em uma remota possibilidade e que talvez devesse adiar a partida. Trouxe ela consigo, com a desculpa de que precisaria dela para provar a veracidade do casamento, quando na verdade apenas não quis enfrentar sua família sozinho. Ela parecia o tipo de mulher que poderia derrubar um elefante apenas com a força de sua teimosia. — E eu que pensei que minha família tinha problemas. — Ela falou quando passaram por uma entrada lateral, entrando em um corredor longo cheio de portas fechadas. Alec engoliu em seco. Sabia que estava se arriscando ao leva-la ali. Sabia que de uma maneira ou de outra estava enfiando Daphne nos seus assuntos. Estava enfiando ela nos seus segredos. Tinha que tomar cuidado, tanto com ele mesmo, quanto com o que ela poderia vir a descobrir. — Você deve estar cansada, mandarei que preparem imediatamente acomodações para você. Deseja algo mais? Ela estreitou os olhos para ele. ficou nítido que percebeu sua tentativa medíocre de mudar o foco do assunto. Mas não se importou ou estava cansada demais para argumentar. — Eu gostaria de um banho quente, por favor. — pediu. — Esse lugar é muito frio e eu não trouxe roupas adequadas. — Tudo bem, providenciarei roupas também. — Ele a guiou por uma sala de estar e os dois entraram em um salão oval, onde uma moça de cabelos curtos e castanhos ensaiava uma luta de espadas. A jovem, que também usava um vestido quadriculado verde, notou a presença dos dois e soltou um grito de êxtase ao ver o homem ali. Largando a espada no chão com um estrondo correu para ele e se jogou em seus braços com um salto. — Alec! Eu sabia que você viria! Eu disse a eles que viria me buscar! — Ela falou com alívio, se agarrando ao pescoço do escocês. — Ashleigh. — Alec pousou uma mão nas costas dela tentando acalma-la. — Eu não vim busca-la. Eu vim para ficar. A garota se afastou para olha-lo e só então notou a jovem loira escondida atrás dele. — Alec, me diz que não... — Alec a interrompeu antes que falasse algo que não devia. — Ash, quero que conheça minha esposa, Daphne. — indicou a moça, puxando ela pelo braço para o seu lado. — Daphne, esta é Ashleigh, minha irmã. As duas mulheres se estudaram da cabeça aos pés. Ashleigh fez sua avaliação minuciosa, os olhos idênticos aos do irmão vasculharam as vestimentas da pequena esposa e pararam em suas mãos, onde o anel amarelo descansava tão perfeitamente. — Tem traços muito angelicais para ser escocesa, de que classe você é? — Ashleigh não se esforçou para parecer simpática. — Da classe americana. — Daphne respondeu em igual, erguendo o queixo para deixar bem claro que não seria intimidada. — Ah. — Foi a resposta de Ashleigh, acompanhada de um olhar de intensa e firme de repulsa. — É ainda pior. — Murmurou alto o bastante para ser ouvida. Dirigiu um olhar de repreensão para o irmão. — Você não deveria ter feito isso, não por mim ou por este lugar, é apenas uma pilha de pedras... — Não é hora para termos esta conversa. — Alec cortou-a firme, e puxou a sineta para que viesse um lacaio. Ashleigh torceu a boca, engolindo sua revolta. Logo o criado entrou ali, e Daphne ficou em silêncio enquanto Alec instruía que o homem servisse as vontades da nova duquesa. Daphne apenas deixou Alec com seus mistérios e foi-se atrás do criado, junto com o porco, finalmente sumindo ao fim do corredor. — Não acredito que fez isso. — Ashleigh explodiu, quando finalmente ficaram a sós. — Você deu o anel da nossa mãe para ela! — É o que eu deveria fazer. Ela é minha esposa. — Ele se afundou em uma poltrona. Também se sentia cansado pelas ocorrências dos últimos dias. — Mas você deveria da-lo á mulher que amasse verdadeiramente, era o que deixaria mamãe feliz, não a mais uma interesseira que só está visando o seu título. — retaliou, com as faces retorcidas pela raiva. — E veja só, ela tem um porco de estimação, acaso é louca? — Suspeito que sim, irmã. — Ele disse com um olhar misterioso e um sorriso suspeito demais. — De qualquer maneira é a única mulher que terei daqui em diante. E não está interessada em meu título, amanhã irá embora. — Ele tentou convencer os dois disso. — Está querendo me dizer que é um casamento de conveniência? — Ele assentiu. - E por acaso a moça sabe disso? Assentiu novamente, detestando o rumo que aquela conversa estava levando. — E o que pretende fazer quando ela descobrir que precisa de mais um pequeno detalhe para manter o castelo? — Alec respirou fundo. Isso era algo que estava tentando ignorar até o presente momento. — Uma coisa de cada vez, tenho tempo de sobra para pensar em uma solução, enquanto isso é bom que se mantenha longe do caminho dela, Daphne não é do tipo que se intimida facilmente e não ficará em silêncio diante de um ataque. Ashleigh sorriu. — Acabo de me afeiçoar a ela um pouco mais. Os dois levaram horas conversando sobre os últimos dias em Stirling. Sobre como a família de sua mãe já estava se preparando para tomar posse do castelo e casar Ashleigh com o primo Vikram, para quem iria a posse do castelo caso Alec não obedecesse a vontade de seu pai. Ashleigh era tudo o que restava para ele. Tinha apenas dezessete anos, e era a única motivação que ele tinha para ir adiante com aquilo. Depois do que tinha se passado na vida de Alec, ele pensou que jamais poderia passar por aquilo novamente, e antes de ver Daphne sair do quarto vestida de noiva, pensou uma ou duas vezes em desistir. Foi louco e estranho, pois parecia que ela era a única mulher no mundo com quem ele poderia enfrentar aquilo novamente. Aquele pesadelo repetitivo e sufocante. E agora, graças a ela, ele podia manter o seu ducado, e também podia manter Ashleigh. Daphne nunca saberia que tinha feito mais por ele do que ele tinha feito por ela, e tudo que pedia em troca era liberdade. Liberdade...A palavra pairava na mente de Alec como um soneto irritante. A pergunta recorrente era, liberdade para quê? Quando se encerrou todo o assunto que tinha pendente com sua irmã, ele deixou-a com um beijo de boa noite e caminhou pela escadaria do castelo que levava até o terceiro andar, onde sua cama macia e aconchegante estaria esperando por ele. A noite estava fria, mas as paredes de Stirling foram bem projetadas para suportar baixas temperaturas. O castelo era rodeado por montanhas e colinas, no topo de uma elevação, por isso os invernos ali costumavam ser sempre rigorosos. Ele entrou em seu quarto e foi agraciado pela chamas da lareira, pelo cheiro de hortelã e pelo corpo de Daphne York submerso na água morna. Os cabelos dela estavam soltos e molhados jogados para trás, fora da banheira, e os seios, com os mamilos marrons rijos, saltavam para o ar. Ela arregalou os olhos ao vê-lo e cobriu os seios fartos com as mãos. — Mas o que diabos? — Gritou furiosa. Alec engoliu em seco repetidamente, tentando focar seus olhos em qualquer coisa que não fosse nas mãos pequenas que não cobriam absolutamente nada em toda aquela abundância voluptuosa. Ele ainda podia ver, bem, tudo. — Bom, você... É... Bom... Quarto... Meu... Está. — Ele balbuciou e se sentiu como um idiota. — O quê? — Ele limpou a garganta. — Você está em meu quarto. — Corrigiu. — Mas o criado me trouxe para cá! — Obviamente ele confundiu a condição do nosso casamento. — Ele disse, puxando a sineta nervosamente várias vezes para chamar novamente o criado. Ela olhou para ele com petulância. — Você não pretende ficar aí enquanto eu estou aqui nua, pretende? — Alec sorriu maliciosamente. — Na verdade isso me parece bastante interessante. — Ele percebeu bem a tempo que poderia se divertir bastante com aquela situação. — Argh... — Ela grunhiu, apertando mais firmemente aos mãos em volta dos seios que pareciam vazar para todos os lados. Alec fez uma aposta mental consigo mesmo de que suas mãos eram grandes o suficiente para comporta-los. Em seu momento de espera acabou se permitindo criar questões sobre Daphne que antes jamais passaram por sua cabeça. Como por exemplo, se ela seria uma amante obediente e aberta a possibilidades, se gostaria com força ou carinhosamente, ou os dois em ordens alternadas, se era tão atrevida na cama como é no dia a dia, se gostaria de fazer o amor com as luzes apagadas, ou se gostava de ver...Questões que, obviamente, não deveriam existir na cabeça dele. Quando o criado chegou, a tensão entre os dois era presente como uma terceira pessoa. — Creio que houve um engano Hoyt, pedi que alojassem a duquesa em um aposento, não este, outro que estivesse disponível. — O criado olhou para ele embaraçado. — Acontece milorde, que não fomos avisados da chegada de duas pessoas, este é o único aposento preparado devidamente para o frio. — Falou em tom de desculpas, evitando olhar para a mulher nua que ouvia a tudo atentamente. Os olhos de Alec cruzaram com os dela, e ele viu ali pavor e incredulidade, abriu uma gargalhada pela maldita ironia do destino. — Ouviu isso meu docinho? Teremos que dividir uma cama. Capitulo cinco Daphne permaneceu estagnada na banheira enquanto Northwest dispensava o criado e fechava a porta atrás de si, isolando os dois dentro daquele quarto que pareceu subitamente pequeno demais. Ela não sabia o que deveria fazer, e no fim, viu que a melhor estratégia para escapar daquela circunstância embaraçosa era entrar no jogo do duque escocês. Ela era uma mulher madura, e enfrentaria a situação como ele faria, com cara de pau e muito cinismo. — Você pode ao menos me dar privacidade para me vestir? — Ele sorriu cinicamente. — E qual seria a diversão disso? — Ela bufou e esticou um braço para fora da banheira, lutando para pegar a toalha que repousava em uma cadeira há alguns centímetros dali, sem deixar que ele visse além do necessário. Alec rapidamente andou até a toalha e a pegou, esticando-a no ar, para que ela levantasse, e ele mesmo pudesse envolve-la. Daphne o olhou com uma mensagem clara de "Sem chance". — Vamos docinho, o que de mal tem uma esposa ficar nua diante do marido? — Ele perguntou balançando as sobrancelhas sugestivamente para ela. — Nenhum, tirando o enorme fato de que você não é o meu marido. — A expressão divertida dele vacilou. Seu sorriso turvou-se para o lado, parecia contrariado. — Bom, uma hora terá que sair daí, e eu não estou muito disposto a abrir mão disso. — Falou, adotando novamente o ar travesso. Daphne aborreceu-se e levantou de súbito da água, molhando o chão do quarto no processo. — Ora. É apenas uma mulher nua, como se nunca tivesse visto uma antes. Ele vacilou por um momento, seus olhos dourados percorreram ligeiramente o pequeno corpo pelado e molhado. Daphne se sentiu tão exposta que podia jurar que ele via além de seu corpo, que ele via também seu coração batendo furiosamente contra seu peito. Ela viu um sorriso satisfeito balançar em seus lábios finos. — Sim, certamente vi, mas nenhuma delas era Daphne York. — Ele murmurou, enquanto envolvia o corpo nú com os braços e aproximava demais seu rosto risonho do dela. Se afastou bruscamente, deixando-a parada de pé na banheira e se afastando para o lado, para deixa-la passar. Sem entender o que quis dizer com sua última frase. Não era como se ele tivesse pensado nela nua antes, era? Como poderia? Se sequer notava a a presença dela até dois dias atrás? Daphne não ocupou sua mente com esses assuntos, apenas saiu da banheira e tratou de se vestir com uma camisola de algodão que ia até os calcanhares, secou o cabelo com a toalha e logo depois estava indo deitar-se. A cama de Northwest era alta e foi necessário que ela subisse em uma escada de três degraus que ficava ao lado da cama, com esse propósito. A cama também era incomparável em largura, ela sabia que suas duas irmãs e Sophie poderiam dormir ali com ela com folga. Daphne pouco se importava se teria que dividir a cama com ele apenas por uma noite. Era apenas uma cama, e aquilo não tornava os dois mais casados. E depois de amanhã, não se veriam tão cedo. Se enrolou nos lençóis de pele macia e quentinha e agradeceu a Deus por poder aproveitar aquele momento sublime, onde seus músculos doloridos e seu corpo exaurido poderia finalmente descansar. Porém, quando achou que Morpheus ia finalmente arrasta-la para o mundo dos sonhos, ouviu o som de roupas sendo tiradas e seus olhos foram parar vidrados no homem que despia o casaco de viagem. A peça passou pelos braços dele com dificuldade, como se não quisesse largar o seu corpo e por um momento ela entendeu aquela pobre peça de roupa. Ele jogou de qualquer jeito no chão, e andou até a cama sentando- se na borda para começar a tirar as botas dos pés, junto com as meias, revelando canelas brancas, peludas e panturrilhas torneadas. Ele então puxou a camisa para por cima de sua cabeça, revelando um físico de fazer Apolo chorar. Suas costas eram largas, e até mesmo ali podiam-se ver músculos firmes, ele tinha ombros delgados e trapézios salientes. Daphne tentou recapitular os últimos dois dias em sua cabeça, juntar as peças loucas que insistiam em se soltar. Estava tentando compreender como foi parar ali, deitada na cama de um homem, não simplesmente um homem, mas sim Northwest, que a propósito é seu marido, assistindo-o tirar sua saia e achar aquilo a coisa mais sensual que já viu em vida. E a pior parte era desejar olhar cada vez mais, como se fosse uma apresentação de uma orquestra, cada movimento que ele fazia soava como o acorde sensual de um instrumento, do qual ela não conseguia parar de ouvir. Ele tinha razão quando dizia que não usava nada por baixo do kilt, não usava nada mesmo. Nem mesmo uma bandagem ou sequer um mísero pano. Nada que escondesse a visão de seu traseiro malditamente belo, ou a magnitude de sua espada escocesa saltando de uma moita de pêlos castanhos. Aquele foi o limite. A partir daquele momento Daphne sentia que poderia morrer em paz. Ela sentiu seu ventre se contrair uma vez e outras mais e algo doloroso e pulsante começou a fazê-la se sentir inquieta. Observou o homem entrar na mesma água a qual ela tinha acabado de sair e começou a se banhar com a calma de um padre que reza uma missa. Céus. Ele era uma injustiça. Com ela, com a natureza e com todos os outros homens na terra. Nada faria jus a aquilo e ela se sentiu privilegiada por apenas presenciar aquele momento. Suspirou alto, conformada de que não poderia ter aquilo para ela. Fechou os olhos e tentou dormir, mas foi somente quando sentiu o peso do corpo do outro lado do colchão, que o sono conseguiu finalmente leva-la. Ela dormiu um sono pesado, envolvida pela pele do cobertor, e pelo calor reconfortante que exalava ali perto. Acordou na manhã seguinte de um pesadelo e por um momento não soube onde estava, seus olhos se fixaram no dossel de uma cama e aos poucos seus ouvidos captaram um som distante bastante parecido com o que o filho do ferreiro Mackenzie tocou em sua cerimônia de casamento, logo percebeu a razão de seu pesadelo, certamente estava no inferno. A diferença era que esse som parecia mais melodioso, limpo e sincronizado. Ainda assim, não deixava de ser perturbadoramente estridente. Levantou da cama percebendo que Northwest não estava lá, e correu até o lavatório para se preparar para ir embora. Não queria estender sua partida além do necessário. Não queria e não podia criar qualquer laço com Northwest ou deixar que ele se infiltrasse de alguma maneira na sua vida. A experiência na última noite foi suficiente para ela perceber que ele representava um perigo alarmante. Vestiu suas roupas de viagem, colocou tudo organizadamente em sua valise, deu uma última olhada no quarto grande e bem organizado, não encontrou Thomas em nenhuma parte, imaginou que o duque tivesse levado ele para fazer suas tarefas, fechou a porta atrás de si e andou em direção ao som perturbador que soava ali perto. Andou pelo corredor largo, percebendo que mesmo com as janelas fechadas, o clima li era bastante frio. O chão era coberto por um tapete longo e verde e a maioria dos móveis eram de alvenaria, Daphne saiba que cada um deles teria uma longa e maravilhosa história para contar. Dobrou no fim do corredor, onde estava o salão oval e viu a fonte da música irritante. Era o próprio duque, tocando aquele instrumento com uma maestria invejável. Ele usava seu kilt verde de um tecido mais simples e nada cobrindo a parte de cima do seu corpo robusto. Ele expulsava o ar dos seus pulmões para dentro da flauta enquanto seus dedos ágeis dedilhavam os buracos. Era impossível não olhar. Impossível não babar e morrer de indignação. — Você nunca sente frio? — Quando o homem parou de tocar para olhar para ela, Daphne percebeu que pensou em.voz alta, seu rosto pinicou por toda a parte. Para completar ele não estava sozinho. Ashleigh estava logo ali. Ele sorriu ao vê-la e seus olhos desceram por suas roupas de viagem. Ashleigh que até então estava entretida em um livrete levantou os olhos para ela apenas o suficiente para escancarar seu desprazer por Daphne estar ali. O desgosto foi mútuo. Ontem ficou nítido para Daphne que a menina não gostou de sua presença ali e isso era apenas mais um motivo para ela ir embora o quanto antes. — Raramente, sou fogo puro. — Ele respondeu, com um franzir de nariz que o deixou perturbadoramente fofo. — Hm, onde está Tommy? — Tommy? — Ele franziu o cenho. — Meu porco. — Ela explicou, e lançou um olhar mortífero para Ashleigh quando a menina riu desdenhosa. — Pedi que levassem-no para comer. — Espero que os criados tenham entendido o que quis dizer com "leva-lo para comer", do contrario teremos suíno para o almoço. — Ashleigh grasnou, Daphne cerrou os olhos para a garota que já estava começando a se sair impertinente. Olhou para Alec. — Peça que tragam-no. Estou pronta para ir embora. — Daphne teve a impressão de que um brilho de decepção passou por seus olhos dourados. — Receio que isso não será possível, aqui na Escócia temos uma crença de que dá azar viajar em uma terça. — Ele falou, deixando o instrumento sobre uma poltrona. — Felizmente não sou escocesa, então, não tenho problemas com crenças. — Ela refutou, tentando soar segura de sua decisão. Ele parecia uma muralha de músculos firmes e irredutíveis. — E na neve você acredita? — Ele deu espaço para que ela tivesse uma visão direta do lado de fora. Irritada pela sua postura confiante, Daphne andou até a janela e sentiu-se endurecer como gelo com visão a sua frente. Um mar de branco, cobrindo cada pedaço de solo firme, formando uma grande montanha que cobria até metade das muralhas do castelo. Ela estava presa. Presa em um castelo com Northwest. ∞∞∞ Aquilo não podia estar acontecendo. Ela não podia estar realmente presa nas terras altas. Tinha que voltar para casa, para sua família e os assuntos pessoais que necessitavam de sua presença com urgência. Ficou parada por um bom tempo de frente para a janela, apenas implorando para a neve parar de cair e o sol dar o ar da sua graça. Embora duvidasse muitíssimo que isso fosse acontecer. Agora que estava de dia, podia ver com clareza que o castelo Stirling ficava bem no centro de uma aglomeração de montanhas e colinas, que o protegiam como grandes guardiões de rocha imponentes. Ela estava literalmente enfiada em um buraco no fim do mundo. Ao noroeste dali, no outro extremo do lago congelado, ela viu um pequeno vilarejo. As casas também estavam enfiadas na neve, e pareciam com bolinhos cobertos de glacê. O frio era quase insuportável e Daphne não tinha outras roupas além da que estava em seu corpo, o vestido de casamento e uma camisola. Além de que não podia permanecer ali, pelo simples fato de que se sentia como uma intrusa. Aquilo estava errado. Ela deveria ter voltado para casa desde Gretna green. Eles fizeram um acordo, deu a ele seu ducado, e agora queria sua liberdade. O oposto do que estava acontecendo. — Deve haver alguma maneira de locomoção, algo que tire a neve da estrada! — Ela falava enquanto seguia ele pelos corredores. — Você é um maldito duque, deve ter algo que possa fazer! — Sou um duque, não um deus. — Ele retrucou sem olha-la e sem dar importância ao seu apelo. — Eu não posso ficar presa neste fim de mundo, tenho assuntos que tratar em Londres! — Ela bateu um pé no chão, tomada pela raiva. Ele parou de andar e virou-se para ela. — Bom, a única maneira de você sair daqui é voando, e por mais que tenha essa cara de dragão, duvido que seja um. — Daphne levou uma mão ao peito, insultada. — Seu...seu...— Ela balbuciou, procurando uma ofensa que pudesse exprimir perfeitamente o estado de sua indignação. Nunca um homem tinha chamado-a de feia antes, muito pelo contrário, elogios nunca lhe faltavam e era sempre comparada com anjos, lírios e deusas. Jamais com algo tão medonho como dragão. Quando nenhuma palavra veio à sua boca, a única saída que Daphne encontrou para lutar pelo seu resto de dignidade era pela força. Procurou algo ao seu alcance que pudesse jogar nele sem causar ferimentos graves, mas não encontrou nada além de uma armadura velha e empoeirada. Puxou o que parecia ser um escudo e tarde demais percebeu que aquele escudo era o eixo que mantinha aquela velharia de pé. Para seu total horror o negócio começou a inclinar- se em sua direção, e ela não teve reação para retroceder, Daphne sentiu mãos fortes puxa-la bruscamente e uma barulheira infernal ecoou por todo o corredor. O rosto dela estava espremido contra a pele quente do abdome de Alec e as mãos grandes e macias mantinham ela imóvel, ela não registrou oa movimentos que levaram ela até aquele abraço estranho. Um pedaço de alumínio ficou girando pelo que pareceu uma eternidade até finalmente cair e o silêncio se sobrepujar. Então ela ouviu uma batida de um coração tranquilo e seu corpo começou a ser chacoalhado. Demorou alguns segundos até Daphne perceber que o maldito escocês se dobrava de tanto rir. — Você é um desastre ambulante, Daphne York. — Alec riu, sacudindo os pedaços da armadura para longe dos dois. — Vá para o inferno! — Ela berrou, empurrando-o e andando para longe dali com as orelhas em chamas. Daphne estava com um azar inexplicável desde que pós os pés naquele castelo. Caminhou a passos rígidos até o parapeito da janela mais próxima que permanecia fechada, ela apoiou o queixo em ambas as mãos enquanto via o vidro coberto por uma camada grossa de geada. Suspirou derrotada, finalmente se conformando de que teria que passar mais uma noite nas Highlands. ∞∞∞ O dia ali era longo como um dia no inferno. Daphne passou a maior parte do tempo deitada na cama, encarando as cortinas de cetim verde e o dossel real. Vez ou outra estudava o anel de ouro escocês. Ele era quente e ela o sentia pesado em seu dedo. O dourado brilhava mais polido do que nunca e na parte de dentro, a frase em gaélico estava gravado no ouro com letras caprichosas e refinadas. "Tha gad Agam Ort." Daphne não sabia porquê ele tinha se dado ao trabalho de arranjar um anel. E ela percebeu, muito tarde, que aquela pequena peça talvez de alguma maneira evasiva desse uma importância maior a aquilo. Uma importância que não deveria ter. Ela de uma maneira nova sentia-se casada. E a parte mais estranha era pensar que era com Northwest, sim, o mesmo homem a quem dedicou anos de desprezo, fiel e cru. O mesmo que não escondia sua aversão a ela, e o único homem no mundo ao qual Daphne não tinha poder nenhum de sedução. Varias horas depois, quando seus pensamentos já não cabiam mais em sua cabeça, o tédio a alcançou. Não tinha comido nada o dia inteiro, e não foi preciso ligar um mais um para entender que era insignificante naquele lugar. Northwest nunca olhou para ela, nem para lhe desejar bom dia e não seria agora depois de cinco anos que mostraria interesse em sua existência. E sua irmã era igual no quesito simpatia. Devia ser o charme de todo Lancaster, a arrogância e a prepotência. Levantou da cama vencida pelo tédio e teve uma visão inteira do quarto grande. Foi então que pela primeira vez Daphne percebeu que estava no quarto de Northwest. No seu santuário mais sagrado e bem no lar de muitos dos seus segredos. O ambiente era inegavelmente limpo, mas isso era crédito para os criados. Porém, a decoração do lugar era crédito totalmente dele. O aposento era sem sombra para dúvidas de um homem adulto. Como por exemplo, a loção de barbear que descansava ao lado de um lavabo, junto de adereços, como uma brocha, uma lâmina, e um espelho oval. Daphne pegou a brocha em seus dedos e sentiu a maciez das cerdas, inconscientemente levou o objeto ao nariz e inalou o cheiro forte de cedro e mais ao fim ela podia distinguir o almíscar de charuto. Eram aromas muito íntimos que ela nunca tinha sentido em homem nenhum, geralmente seus pretendentes cheiravam a sabão, que era uma essência bem comum. Ela deixou a brocha de barbear de lado e andou até a escrivaninha. Sem sentir um pingo de remorso, puxou a gaveta de cima, encontrando apenas papéis inúteis. Fez o mesmo com todas as gavetas daquela fileira e depois foi para o outro lado para fazer o mesmo com as outras, não encontrando nada que pudesse incrimina-lo. Seus olhos baterem em uma caixinha de veludo azul royal no fim da última gaveta, estava escondida atrás de papéis e parecia esquecida. Daphne capturou o objeto, e o abriu em seguida, vislumbrando a jóia ali dentro. Foi enfeitiçada pela peça deslumbrante de um material prateado. Os acabamentos eram elegantes. O diamante tinha o corte princesa e era rodeado de pequenas e delicadas sáfiras. Era uma peça digna de uma rainha, ou melhor, digna de uma duquesa. E o mais curioso não era a jóia em sí, e sim o bilhete que estava bem dobrado e encaixado no forro interno da caixa. Ela ponderou se aquilo era da sua conta. Certamente não o era. Mas estava chateada e com bastante tédio e há um bom tempo vinha buscando uma rachadura na muralha de sarcasmo de Northwest. Havia existido uma mulher, e ela foi importante. Pelo menos o suficiente para mantê-lo guardando aquele anel e aquela carta. E talvez, o motivo por ele nunca ter se casado. Mesmo sob a ameaça de perder o título. Abriu o papel amassado, não era um bilhete longo, e quem quer que tenha o escrito, fez as pressas e não esperou que a tinta secasse antes de dobra-lo. Estreitou os olhos tentando identificar as letras daquele idioma confuso, ao mesmo tempo que o próprio carrasco entrava pela porta segurando nas mãos uma bandeja cheia de comida. Os olhos dele caíram sobre ela, parada atrás de sua escrivaninha, e depois no papel e na caixa aveludada em suas mãos. Calmamente, Alec caminhou até Daphne. Ele usava, por milagre, uma camisa que voava ao redor do seu corpo. Ele depositou a bandeja na mesa e dirigiu um olhar que fez as tripas dela enrolarem em um nó. — Eu não lembro de ter dado permissão para fuçar em minhas coisas. — Tomou bruscamente os objetos das mãos dela. Tentando não se sentir mal pela situação. Daphne deu de ombros. — Nada que você não teria feito se estivesse em meu lugar. — ele cerrou os olhos para ela, e ambos ficaram em silêncio corrosivo. — Quem era ela? Ele hesitou, e olhou para ela com uma frieza compatível com a que caia do lado de fora. — Mandei que preparassem um quarto para você. — Ele falou firme, indo até o fogo da lareira e atirando o bilhete lá dentro, exterminando as chances que Daphne tinha de sanar suas questões. — Se quiser que vá você para outro quarto. — Disse, voltando para deitar-se na confortável cama. — gosto mais deste e pretendo ficar. Ele a olhou novamente por alguns segundos intermináveis, e no fim apenas deu de ombros e se foi, batendo a porta em seguida. Capitulo seis Alec encarava fixamente o diamante que brilhava sublime pelo fogo baixo da lareira. Devia se sentir irritado ou rancoroso, assim como se sentiu por muitos anos depois do ocorrido, mas agora todas as suas emoções se resumiam a um leve dar de ombros. Tinha esquecido que ele ainda estava ali, guardado entre suas coisas, junto com o bilhete que tinha dizimado as suas chances de regeneração. Por mais que tivesse atirado-o ao fogo, nunca, jamais esqueceria de cada letra, vírgula e parágrafo, que continha naquele pedaço de pergaminho. Maldita Daphne York e sua mania desgraçada de pega-lo desprevenido. Ela tinha o insultado, jogado seu passado em sua cara, e ainda tinha o disparate de expulsa-lo do seu próprio quarto. Ao invadir os limites da privacidade dele, ela tinha dado início a algo bem maior do que os dois. Alec não se sentia somente violado, como também se sentia no direito de retaliação. Na manhã seguinte, ele acordou-a ao melhor estilo escocês, com uma canção revigorante na gaita de fole. Particularmente ele gostava de tocar o instrumento, era uma herança de sua família que aprendeu com seu avô, mas saber que aquilo iria irrita-la deixou o ato ainda mais prazeroso. Ele se colocou de pé próximo a janela do quarto, podia ver que ela dormia tranquilamente, tão miúda e delicada perdida na imensidão de pele do cobertor. Alec se perguntou como seria rolar nu em meio aos lençóis com ela, perdendo-se no sabor de sua língua inteligente, e mergulhando no aroma de seus cabelos volumosos. Balançando a cabeça para afastar tais ideias, ele puxou fôlego e soprou-o para dentro do instrumento, com seus dedos dedilhando as saídas de ar para formar o som. Em questão de segundos ela ergueu seu torso da cama e vagou os olhos sonolentos pelo quarto. A imagem da mulher com o rosto nublado pelo sono, com aquela mata densa de cabelos loiros revoltos para todos os lados fez Alec perder o ar que restava em seus pulmões. Ele apostaria seu título que ela teria aquela mesma aparência após um orgasmo quente. — Bom dia meu doce, que bom que acordou. — Eu não acordei, você e esse instrumento de tortura me acordaram. — A voz dela saiu rouca e aquele som apenas incrementou mais a imaginação de Alec. Uma deusa Afrodite, era isso que ela era. Ele a observou enquanto ela alongava os graciosos braços, bocejando. Ela era tão pequena, e ainda assim, conseguia deixar o ambiente cheio com sua presença. — Por favor, me diga que a neve parou de cair. — Ela pediu, olhando através da janela e constatando que não, não tinha parado de nevar. Seu rosto caiu pela decepção. Sua insistência em ir embora estava afetando a curiosidade de Alec, que aliás, era um de seus maiores pontos fracos. A pergunta recorrente era: o quê ela tinha que fazer em Londres que exigia sua presença tão logo? Ou apenas estava com pressa em livrar-se dele? — Como pode ver terá que aturar minha presença por mais um dia. — Ele disse, deixando a gaita de fole de lado. — possivelmente amanhã também. E como sei que não trouxe roupas, pedi que madame Laurent, a estilista pessoal da Sua Alteza, viesse ao seus aposentos esta manhã para que lhe vista de acordo. — Não seria mais fácil me emprestar uma de suas saias? — ela disse maliciosa. Alec admirou aquele sorriso ardil que o deixava possesso e com vontade de encher o pequeno traseiro dela de palmadas. — Não é uma boa ideia insultar minha masculinidade neste momento. — Ele murmurou perigosamente, e com apenas um passo já estava próximo demais dela, sentindo sua pele ainda quente pelo sono. Daphne não esperava isso, cambaleou com a aproximação e engoliu em seco. Erguendo a cabeça para olha-lo no rosto. Imediatamente algo quente, denso e tentador se tornou presente ali com eles, como uma terceira pessoa. — Não tenho medo de você, Northwest. — Daphne disse, tentando parecer corajosa, mas o tremor em sua voz a denunciou. Não era medo, ou, nervosismo, era mais. E Alec sentia isso. Ela era tão miúda, instigante, e bela. Tirava as capacidades de raciocínio rápido, que eram sua melhor qualidade e o reduzia a nervos trementes e sensítiveis. Foi Daphne quem começou com aquilo, aquela pequena guerra pessoal que existia entre os dois. Ela quem fez o primeiro insulto, antes disso ele estava indo muito bem em sua missão de ignora-la. Movido por aquele instinto animal, ele ergueu uma mão e infiltrou os dedos nos cabelos de sua nuca fina e macia. Àquilo foi melhor do que o toque mais íntimo que ele já tinha recibido de uma mulher. Sentiu a pele do pescoço dela arrepiar-se e ela vacilar com aquele contato íntimo. Devia ser a primeira vez que ele tocava tão intimamente em seu corpo. A primeira vez que Alec se permitia tal tortura. — Alec. — Ele disse como um comando, obrigando-a olhar nos seus olhos. — Quero que me chame de Alec. Daphne abriu a boca para protestar, mas sentiu a intensidade e a firmeza daquele poderoso olhar dominador. Alec era um dominador por natureza e nem a mais audaciosa das criaturas conseguiria resistir a aquele olhar. Daphne fechou os labios volumosos e apenas assentiu, as bochechas coradas. Do jeito que ele imaginou que seria, obediente. Só precisava de um pouco de pulso firme. Uma batida suave na porta os interrompeu e ele foi obrigado a deixa-la, a terceira pessoa no ambiente sumiu imeditamente quando eles se afastaram, sendo substituído pelo frio intrusivo. — Entre. — Ele disse, e as três mulheres entraram ali. — Bom dia milorde, milady. Está pronta para as provas de roupas? — Perguntou a madame Laurent com seu sorriso simpático, duas criadas estavam atrás dela, carregando montes de tecidos nas mãos e de olhos para o chão, envergonhadas por encontrar o duque de peito nu. — Sim. — Daph respondeu, parecia recuperada, o que não era o caso do duque. Alec andou para a saída, e ela o acompanhou. Quando ficaram sozinhos de novo no corredor, ela se virou para ele, insegura. — Quero deixar claro que pagarei pelos vestidos. — Ele a olhou insultado. — Isso é ridículo. Está hospedada em minha casa, eu arcarei com suas despesas. — Deu para ela um olhar maroto. — Afinal, graças a você eu ainda tenho uma fortuna. — Não. Prefiro que seja do meu jeito, quando eu for embora não quero deixar nada pendente entre nós. — Disse direta e Alec sentiu algo incomodo balançar lá dentro em seu cerne. — Nada ficará pendente. — Retrucou amargo, estranhando seu próprio comportamento. Ele não deveria estar tão chateado com isso, ela estava certa. Fizeram um acordo bastante justo para ambas as partes. — Considere os vestidos um presente de um marido afetuoso. — Não confunda as coisas Northwest, você não é meu marido. Era a segunda vez que ela dizia com tanta firmeza que eles não eram casados, e Alec não entendia o porquê de ficar tão incomodado com isso. Não era como se ela estivesse errada. Realmente não eram casados, não do jeito que importava. — De qualquer maneira não há por quê haver discussão, madame Laurent é uma subordinada oficial do castelo, eu pago seu salário, assim como pago os tecidos das roupas, se oferecer dinheiro a ela estará ofendendo-a, assim como está me ofendendo agora. Em resposta Daphne revirou os olhos e bufou de um jeito que deixava Alec em nervos. Ela deu as costas para ele e sumiu atrás da porta, jogando ela em sua cara. Cerrando os punhos, ele pegou a gaita de fole e saiu dali a passos largos, lutando para não entrar naquele quarto e ensina-la ele mesmo como respeita-lo, a sua melhor maneira escocesa. ∞∞∞ — Olhe essas ancas. — Dizia madame Laurent indicando os quadris avantajados de Daphne. — Digam se não são formidáveis. Daphne encolheu-se de vergonha enquanto as duas outras criadas avaliavam-na em descarado. Sempre achou que seus quadris fossem largos demais e estar sob tão atento escrutínio não ajudava a melhorar o seu amor pelo seu corpo. A verdade é que sempre desejou ser magra e esbelta como Seraphne, ou um meio termo como Josephne, mas ao contrário de ambas tudo em seu corpo era grande. Suas coxas, seios, e quadris eram as partes que mais notavam-se. — Terá filhos fortes e saudáveis. — continuou a modista enquanto envolvia Daphne em tecido xadrez. — Lorde Northwest não poderia ter escolhido melhor mulher. Daphne não sabia que tipo de resposta deveria dar para tal comentário, então decidiu sorrir. Um sorriso pavoroso com os lábios muito esticados e os olhos esbugalhados demais. Depois de passar horas intermináveis em provas de vestidos com acabamentos estranhos e estampas quadriculadas, ela resolveu que já que estava presa entre as muralhas daquele castelo devia a menos conhecer aquele pequeno pedaço de Kinlocheven. Abandonou o aconchego do quarto, e andou pelos corredores silenciosos, admirando a arquitetura do monumento e a decoração luxuosa. Parando vez ou outra para admirar um quadro intrigante nas longas paredes que pareciam não ter fim. Foi impossível não se sentir diminuída pela opulência daquela construção, sua família sempre foi muito abastada, mas aquilo era demais. Não lembrava nada que fosse parecido com os castelos da realeza inglesa, era diferente. Podia-se sentir que centenas de histórias tinham se passado ali. Por mais que fosse luxuoso, não abandonava o aspecto de lar. Sim, era a melhor palavra para descrever aquilo, lar. Porém, não dela. Andou a passos lentos, silenciosa como uma brisa, sabendo que Northwest estaria em qualquer parte do castelo. Daphne estava temendo encontra-lo a qualquer curva que fazia. Não era como se estivesse fugindo dele depois do que tinha acontecido aquela manhã. Não. Jamais. Apenas estava evitando ficar no mesmo ambiente que ele para poupar seu pobre coração de tanta adrenalina. Apenas isso. Depois que ele saiu do quarto na última noite após o estranho ocorrido com o anel Daphne achou que ele agiria indiferente e até um pouco raivoso, ela não tirava o direito dele, mas para a total consternação dela ele decidiu agir como se nada tivesse acontecido. Como se Daphne pudesse simplesmente ignorar a voz que berrava em sua cabeça. Ou o anseio desesperado de descobrir de quem foi aquele anel. Ou o por quê ela estava tão irritada com o fato de ter existido uma mulher. Uma coisa era saber que Alec frequentava a cama de dezenas de mulher. Sua vida de libertinagem nunca foi algo com que ela se importasse, também não foi a mais rogada das moças, mas um ponto completamente diferente era saber que existiu uma mulher importante o suficiente para deixa-lo transtornado a sequer menção de sua memória. E maldito fosse ele, Daphne queria saber quem era a mulher misteriosa e queria saber ainda mais o por quê de ela não estar ocupando o lugar que possivelmente Daphne tinha usurpado. Enquanto meditava, finalmente dobrou no corredor de acesso a biblioteca, mas engoliu em desagrado ao avistar a figura curvilínea de sua adorável cunhada. Os olhares das duas se encontraram, e Daphne soube que o desprazer era mútuo. Ela não sabia e nem tinha interesse em saber sobre os muitos problemas familiares que circulavam Stirling, enfiar-se nas questões de Northwest era o mesmo que dar passe livre para ele fazer o mesmo com ela e isso era totalmente o oposto do que planejava, quanto mais distantes um do outro melhor. Porém, não era preciso ser um gênio para ver que algo grande circulava aquela família. Daphne via refletido nos olhos âmbar que a Lancaster mais nova apenas queria proteger o irmão. E isso a intrigava. Northwest não parecia o tipo de homem que necessitasse de proteção, contudo, sua irmã agia como se Daphne fosse uma ameaça. As duas pararam em uma distância de dois metros uma da outra. Mãos cruzadas atrás das costas. Ashleigh desceu os olhos astutos pela vestimenta de Daphne, que eram bem parecidas com as dela própria. Um vestido de lã grossa e pesada, por conta do frio terrível, e o tartan dos Armstrong nas cores verde e negro de estampa. Um corset de couro marrom definia sua cintura, e a saia, semelhante a um kilt, caia até os pés cobertos por botas de cano alto. — Decidiu sair de seu exílio. — Comentou Ashleigh, o forte sotaque quase impossibilitando que Daphne entendesse suas palavras. — Estou apenas conhecendo o castelo. — Respondeu, forçando igualmente seu sotaque americano. — Espero que tenha dormido bem nas últimas duas noites, milady. — Ashleigh continuou, seu sorriso era simpático mas o brilho ardiloso de seus olhos, não enganaram Daphne nem por um segundo. — Melhor impossível. — Mentiu. A noite passada tinha sido um tormento sem fim, dormir sozinha naquele lugar tão escuro e isolado fez Daphne desejar que Northwest voltasse para lá. — Ah, então não deve ter ouvido nada, menos mal. — Disse, balançando-se sobre seus pés. — A que se refere? — Ashleigh olhou para os lados cautelosa, se aproximou mais de Daphne e cobriu a boca com uma mão. — O castelo milady, ele é mal assombrado. — sussurrou. — Mal assombrado? — Daphne perguntou, uma expressão de tedio e incredulidade. Ashleigh assentiu. — Stirling está em nossa família há três gerações, mas as conversas divergem quando o assunto são os antigos proprietários dessa terra. — Piscou os olhinhos travessos e olhou além dela, adquirindo aquele ar de quem estava prestes a contar uma história. — dizem que no início do século quinze, um casal de camponeses que moravam nas redondezas de Stirling tiveram uma filha, a menina era tão bonita que aos doze anos já despertava a paixão nos corações dos homens, que não mediam esforços para chamar sua atenção. Um desses era o chefe de um clã de uma terra próspera, um guerreiro temido por toda a província, que vinha há anos tentando conquistar o coração da moça, porém quando completou dezesseis anos a menina se apaixonou pelo filho de um mercador local, os dois acabaram noivando, e isso não alegrou muito o guerreiro. Na noite do seu casamento, ele sequestrou-a e escondeu-a em Stirling. Sabendo que o amado da jovem viria em seu auxílio, o raptor preparou uma emboscada que resultou na morte do mocinho. Consumida pelo luto e devastada pela dor, a jovem que não aguentaria viver longe do amor, atravessou o próprio corpo com um punhal. Dizem que os dois nunca puderam se encontrar novamente no além, quando tirou a própria vida, a moça acabou ficando presa para sempre entre as muralhas de Stirling e vaga por aí a noite, em busca do seu amado. Daphne piscou duas vezes, a tentativa da cunhada de colocar medo foi óbvia e ridícula. Era só o que faltava, estar presa em um castelo com um escocês irritante, uma pirralha mimada e um fantasma suicida. — Não acredito nessas sandices. — Falou, Ashleigh deu de ombros e retorceu a boca levemente. — Cada um escolhe em que acreditar.— Deu uma falso sorriso inocente. — Espero que tenha uma boa noite, cunhada. — E saiu andando para longe, dando pulinhos enquanto assobiava alegremente. Quando a noite caiu, um criado anunciou para ela que Northwest estava convocando-a para o jantar. — Me convocando? — Perguntou, o homem chamado de Hoyt assentiu nervoso. — Diga ao seu senhor que não sou sua subordinada para ficar me convocando. Não irei a jantar nenhum. Ele não esperou ela repetir, deu as costas e saiu dali as pressas, a deixando novamente sozinha. Daphne andou até a janela e observou a neve cair, tranquila, serena e silenciosa. Parecia que estava em um limbo eterno. Sentia falta da agitação de Londres. Do barulho dos cavalos nas ruas, das fichas de poker, dos dados rolando nas mesas de apostas, das cartas sendo distribuídas, e risadas, vozes altas. Estar ali dava a sensação de estar sozinha no mundo. E ela não gostava disso. Daphne odiava sentir-se sozinha. A porta se abriu com brusquidão a dando um sobressalto, e a massa de músculos enorme que era Northwest atravessou o quarto e andou em sua direção. — O que você está fazendo? — Perguntou, dando um passo para trás ultrajada. — Você não foi até mim, então eu vim até você. — Os olhos desceram pelo corpo dela, estudando. Admirando as peças de roupa que madame Laurent havia posto nela. Daphne quase sentia falta da época que ele mal a notava, pois nesses momentos, onde seus olhos a vasculham, ela se sentia completamente nua e quente. De um jeito que faziam os bicos de seus seios enrijecerem e se espremerem contra o tecido da roupa. Invés de ficar lá parada sob inescrupulosa avaliação, ela o avaliou também. Alec usava uma blusa de cor carmesim posta dentro do kilt. Um cinto de couro marrom circulava sua cintura e meias brancas e botas cobriam do joelho até os pés. Estava perfumado, e tinha a aparência de recém banhado. — Aquele porco está usando um suéter? — Ele quebrou o contato visual, e ela deu-se conta de que ele observava Tommy dormindo tranquilamente em uma cesta ao pé da cama. — Por acaso eu tinha trago comigo e ele estava sentindo muito frio. — Ela disse, se preparando para um comentário maldoso dele, mas em resposta Northwest sorriu, encantado. — A família de minha mãe resolveu milagrosamente aparecer para o jantar. — Disse, os olhos fixos no rosto dela. — Estão dizendo que querem apenas fazer as pazes mas eu duvido muitíssimo disso. — O que acha que podem querer? — Daphne perguntou intrigada, tentando não deixar que todo aquele perfume masculino se infiltrasse em seus pulmões. — Tenho certeza que querem ver de perto como anda nosso casamento. — Ele andou tranquilamente até a cama e mexeu em na cortina do dossel enquanto falava. — veja bem meu pudim, nós escoceses levamos os laços matrimoniais muito a sério, e se por acaso meu tio desconfiar que ainda não consumamos nosso amor, poderá exigir uma anulação, em vista de que estou burlando a lei do contrato que meu pai redigiu. — Como eles poderiam saber disso? Ele deu um sorriso acompanhado de uma arqueada de sobrancelhas, sugestiva. — Uma esposa satisfeita sexualmente, jamais teria essa cara azeda que você tem. Pelo menos não a minha. — Disse de maneira convencida e Daphne cerrou os punhos diante de tal insulto. — O que está querendo dizer com isso? — Indagou a beira de um ataque de nervos. — Não é óbvio meu doce? — Sorriu triunfante. — Terá que fingir ser a esposa mais apaixonada de toda a Escócia. Capitulo sete — Você deve estar brincando. — Ela retrucou, e ele se afastou um passo para trás, cauteloso. — Vamos docinho, não precisará fazer nada demais, basta inventar uma mentira ou duas, e fingir que me adora. A última parte não deve ser tão difícil. Imeditamente Daphne pensou no outro lado da situação. Aquele em que ela sairia beneficiada. Pois teria chance de descobrir o que acontecia nos bastidores do clã Armstrong, e também poderia usar a situação de maneira sábia. Se recuperou muito rapidamente e ele percebeu pela velocidade com que ela acalmou-se que algo não estava certo. — Farei isso, mas ficará me devendo um favor. — Os olhos de ele repente brilharam. — A cada minuto que passa fico mais convicto de que somos almas gêmeas. — Ele estendeu o braço para ela, que o pegou e deixou ser levada porta a fora. Andaram pelos corredores em silêncio, uma caminhada tão curta, que mais pareceu durar uma eternidade. Aquela coisa que se desprendia dela sempre estavam muito próximos cresceu entre eles durante todo o trajeto. Quando chegaram finalmente no salão de jantar, ela agradeceu por ter uma desculpa para ganhar distância dele, quando um gigante ruivo levantou-se e andou até ela. Ele abriu um sorriso, aparentava ter em torno de cinquenta anos, mas ainda preservava a beleza de sua mocidade, tão charmoso que Daphne quase caiu apaixonada. — Boa noite, milady,agradeço pela oportunidade de nos receber. — Disse galentemente, seu sotaque acentuado tornando ele ainda mais atraente. Seus olhos âmbar transmitiam sinceridade, mas Daphne não se deixou enganar. Era um lobo. Todos ali eram lobos. E ela era o cordeiro que seria servido naquele banquete. — O prazer é meu. — Falou sem forçar emoção alguma. — Sou Calagham, tio de Alecsander. — Se apresentou e indicou a família com uma mão. — Esta é minha esposa Astrid, meu filho Vikram e minha filha Moira. Os três fizeram uma reverência de cabeça. A menina não tinha mais que dezoito anos e olhava para ela com desprezo, o menino era um tanto magricela e tinha os ombros para dentro, estava destoado do local. — Peço que perdoe nossa indelicadeza no outro dia, toda família tem suas desavenças. — Disse a mulher se aproximando dela com a mesma simpatia ensaiada que seu marido. — Bom, certamente não é a mim que vocês devem pedir perdão. — Daphne soltou. E o músculo na bochecha de Calagham saltou, desafiado pela resposta. Daphne o encarou vorazmente, instigando-o a falar o que quisesse. Porém, antes que ele precisasse formular uma resposta, Northwest tomou dianteira. — Por que não nos sentamos? — Indicou a mesa, rapidamente todos se dirigiram aos seus lugares. O jantar era formal, e exigia que os assentos fossem bem distribuídos de modo que possibilitasse uma conversação aberta, Calagham puxou a cadeira para que Daphne se sentasse e se colocou ao lado dela, à direita de Ashleigh que permanecia calada. Northwest ficou do outro lado da mesa, de frente para a esposa, ao lado de Moira que, muito ridiculamente, Daphne notou estar com as faces em vermelho por causa do duque. Os olhos faiscando de adoração enquanto ele puxava a cadeira para ajuda-la a sentar-se. Daphne domou o desejo de revirar os olhos diante daquela cena. — O quadriculado lhe cai bem, doce. — Alec cutucou, a olhando através da mesa, alheio ao olhar da garota ao seu lado. Ao ver que a atenção do duque estava na esposa, Moira voltou a olhar para Daphne com o desprezo que agora Daphne entendia não passar de ciúmes juvenil. — Madame Laurent é uma excelente modista, pode deixar até um bode apresentável. — Foi Ashleigh quem comentou. — É, acredito nisso. Northwest comentou mais cedo que é ela quem veste você. — Daphne rebateu e o sorriso da jovem vacilou por um momento. Daphne vibrou de prazer ao mesmo tempo que um brilho de admiração percorria os olhos âmbar da cunhada. — Se refere ao seu marido pelo título? — Uma voz enjoativa perguntou e Daphne moveu a cabeça para descobrir ser de Moira. — Não sei quais são os costumes aqui na Escócia, mas na Inglaterra, uma esposa só deve chamar o marido pelo nome na intimidade do casal. — Acentuou a palavra "intimidade" de propósito fazendo a menina engolir em desagrado. — Me diga Lady Lancaster, com tantos motivos óbvios, por qual deles se manteve solteira até uma idade tão avançada? — Ashleigh voltou a alfineta-la. Foi a vez de Daphne sorrir em aprovação. Os Lancaster eram criaturas peculiares, criados a base de sarcasmo venenoso e sorrisos de falsa inocência. Sem sombra de dúvidas oponentes à altura dela. Daphne sempre achou que as únicas pessoas capazes de tal feito fossem suas irmãs. Mas a maternidade e o casamento tinham amolecida os corações delas. Rapidamente se pegou desejando conhecer os progenitores de duas criaturas tão interessantes como Alec e Ashleigh. Trocou um olhar com Alec e soube que aquele era o momento para suas mentiras entrarem em ação. — Estava esperando que seu irmão tomasse a iniciativa. — Sentiu um calor repetindo pelo corpo que a fez ter a completa noção de que Northwest estava a encarando. — Se conhecem há muito tempo? — Perguntou Astrid, interessada pelo maravilhoso conto de amor que estava por vir. — Há exatos cinco anos. — A resposta veio de Alec, Daphne o olhou surpresa por ele se lembrar. — Deve ser uma incrível história de amor. — Resmungou Moira. — Na verdade não. — Disse Daphne. — Na primeira vez que o vi ele sequer se apresentou e na segunda vez eu estava seminua e nem isso foi o suficiente para chamar a atenção. Os olhares pasmos percorreram a mesa e se grudaram nela. — Era um jogo. — Ela se explicou. — Eu estava jogando, e precisava correr e as saias do vestido me impediam. — É comum que Alec não tenha notado você, ele evita as loiras. — Disse Calagham, e Alec o olhou de maneira repressiva. — Isso é de todo mentira. Notei a ti sim, como não poderia notar? — Ele disse, ignorando o tio e olhando para ela. Daphne colocou uma mecha imaginária de cabelo atrás da orelha. — Não precisa tentar adular meu ego querido, já superei isso há muitos anos. — Não, mas eu há vi. — Ele insistiu muito sério. — Você era a única que não usava espartilho, usava um corselete e uma regata de seda branca escandalosa, além disso usava meias, meias translúcidas que iam até os seus joelhos, e uma calcinha rosa cheia de babados e renda. Muito bem, ele conseguiu choca-la. Daphne recapitulou aquele fatídico dia em sua mente diversas vezes durante os anos e se perguntou em que momento ele a olhou para reparar em algo como os babados de sua calcinha. Realmente não sabia como ele poderia lembrar, pois durante aquele dia os olhos dela estiveram sobre ele em todo o momento e ele apenas tinha olhos para Sophie. Sempre Sophie. — Muito bem. — Recuperou- se. — Estive errada durante todo esse tempo. Ele sorriu convencido. — Mas isso não muda o fato de que chamou-me de Delfine na primeira vez que falou comigo. — Acusou-o. — Bom, eu tinha coisas mais interessantes para concentrar minha atenção. — Ele falou dando um olhar muito quente para ela. Algo em seu tom de voz fez ela se arrepiar, e ela não o olhou com medo do que iria encontrar. Daphne mexeu inquieta do outro lado da mesa pois podia sentir que aquele olhar estava a tocando. — Se é assim porque esperou tanto tempo para ele pedi-la em casamento? — Perguntou Astrid, escondendo o veneno em suas palavras dentro do copo de conhaque. — Mas quem disse que fui eu que a pedi em casamento, tia? — Disse Northwest sem se deixar abalar pela alfinetada. — Foi meu doce quem me propôs casamento. — Isso explica muita coisa... — Comentou Calagham ao lado dela. — Eu já estava certo de que você jamais voltaria a propor casamento a alguém. Pelo visto seu pai também, ou não teria feito o contrato. O silêncio que se seguiu foi ainda mais severo que o primeiro. Daphne buscou os olhos de Northwest com os dela, e encontrou apenas o vazio, ele encarava o tio com um ódio lancinante. Então realmente teve alguém antes dela. E com um clarão de luz repentina, sua mente se iluminou, dando as respostas que ela buscava. A causa do pai dele fazer um acordo obrigando-o a um casamento era por medo de que ele não viesse se casar um dia, porque aparentemente, a noiva anterior o magoou de tal maneira que deixou-o traumatizado. Ter a noção disso entristeceu Daphne de uma maneira estranha. Ele deve te-la amado muito. — Pedirei que sirvam o jantar. — Falou Ashleigh e chamou um valete. Northwest não voltou a falar, ficou apenas em silêncio, bebendo de um grande copo de uísque. Nesse momento ela via a escuridão em seus olhos. Por tantos anos buscou entender os motivos por ele ser como é, se escondendo detrás de uma parede de sarcasmo tão sólida que mulher nenhuma jamais foi capaz de penetrar, e tudo se resumia à uma única mulher. Revirou os olhos, homens! O jantar foi servido em pratos de porcelana, comidas das quais ela nunca tinha visto, pelo menos não naqueles ingredientes. Os sabores eram estranhos e inéditos no paladar dela. O silêncio na mesa era cortado apenas pelo som dos talheres e pelas respirações pesadas. Aquela família era complicada demais para ela. Daphne já tinha complicações o suficiente em sua própria família, que já tinha sua cota bem grande de problemas e confusões. O prato principal foi servido, e quando o criado tirou a tampa da bandeja ela encarou a comida por um bom momento tentando entender. Era uma espécie de bolha com aparência pálida, refogada em um molho avermelhado que ela esperava ser proveniente de tomate. Com um garfo ela cutucou aquilo com medo de que fosse explodir ou algo assim. Observou como os outros cortavam e fez o mesmo. Dentro o negócio era bem recheado com condimentos e tinha um cheiro forte. Ela levou um bocado até a boca, sentindo as texturas diferentes dos alimentos e em sua língua e o paladar se expandir com o sabor. Não era ruim, apenas distinto. — Isso é bom, o que é? — Perguntou, comendo outro bocado. — Se chama Haggis. São vísceras de bode temperadas com condimentos, cozidas dentro do tecido estomacal... — Ashleigh sequer terminou de falar antes de Daphne cuspir o alimento. que foi parar vários centímetros a frente, por muito pouco não acertando o rosto de Northwest. — Vísceras de bode? — Indagou quase aos gritos, bebendo um bocado de água na tentativa de apagar aquele sabor da língua para sempre. Porém, só piorou. Um forte enjoo rodeou a saída do seu estômago. Levantou da mesa de um pulo, lançou um olhar de desculpas para Northwest e saiu dali em disparada, antes que colocasse tudo para fora em cima mesa. ∞∞∞ Alec sabia desde o início da noite que aquele jantar resultaria em um fiasco. Não pelo fato de que a mentira sobre seu casamento viria a tona. Ele se importava o mínimo com o que seu tio pensava, mas sim porque sabia que de alguma maneira sua família acabaria assustando Daphne ainda mais. Sabia quais eram as reais intenções de Calagham ao vir ali aquela noite, mesmo assim, submeteu Daphne ao escrutínio de sua família. Ela estava se saindo tão bem, rebatendo as indiretas com elegância e leveza, mostrando que não estava intimidada com nada daquilo, uma mulher sozinha, em um país estrangeiro, rodeada de lobos. Mostrando para ele que esteve certo em leva-la ali. Era a única mulher no mundo capaz de passar pelo inferno da família dele sem sair queimada pelas chamas. E ele não ficou surpreso quando começou a deseja-la de maneira tão abrupta e sufocante. De um jeito que nunca antes tinha se permitido pensar nela. Era forte, não somente por fora, mas também por dentro. Durante todos os anos que passou vendo-a de longe, entretida em suas conversas, dando atenção aos seus admiradores, nunca lhe passou despercebido que Daphne tinha um encanto diferente, um fascínio pelo novo. Não era do tipo que se derretia por palavras, ou com um buquê de flores, ela desejava mais, desejava algo que Alec sempre soube que jamais poderia lhe dar. Ano após ano, esperou receber a notícia de que ela estava noiva de algum asno, e ano após ano, Alec se pegou aliviado por saber que ela permanecia livre. Tal foi sua gratificação, ao ouvir da boca dela que esteve esperando por ele por todos aqueles anos, por mais que fosse uma mentira, soou doce e tentadora como uma verdade recém revelada. Alec sabia que Calagham não estaria satisfeito até que conseguisse desestabiliza- lo. O tio sabia exatamente onde tocar para romper os pontos da ferida jamais cicatrizada. E lá estava. A vergonha. Alec cerrou os punhos, e se absteu de começar uma boa discussão com seu tio. Quanto menos Daphne soubesse, melhor. Mesmo assim ele imaginava que ela não era estúpida, era só juntar as peças e teria as respostas. Não as respostas exatas, mas saberia o núcleo. Por um momento tudo voltou a transcorrer agradavelmente, ele só não esperava que sua doce esposa fosse dar um pequeno ataque ao comer um prato típico de sua terra. Ele observou enquanto ela se tornava pálida e soube que ela iria colocar as próprias vísceras pra fora. Levantou da mesa e saiu correndo tapando a boca com uma mão, deixando eles atordoados na mesa silenciosa. — Ela tem o estômago sensível. — Explicou, comendo como se nada tivesse acontecido. Ele devia esperar que ela teria aquele tipo de reação, afinal, ela tinha um porco de estimação. — Se seu casamento não fosse tão recente eu diria que ela está grávida. — Comentou Astrid, o perscrutando. — Se ela não está agora, terá de estar em algum momento, não se esqueça Alecsander terá apenas um ano para arranjar um herdeiro, ou todo esse teatro que armou, não terá servido de nada. - Disse Calagham fazendo agora ele sentir vontade de vomitar. — É bom ir se contentando em ser apenas visita neste castelo porque ele nunca será seu. — Falou levantando da mesa, já tinha aturado daquela falsidade tempo demais. — Alec, tente pensar com coerência, Moira seria uma esposa muito melhor para você. — Moira aprumou-se imeditamente, mas Alec sequer olhou para ela. — uma mulher que tem o mesmo sangue que o seu, que entende como cuidar de um marido. Essa seria a melhor maneira de acabar com a desavença, e o castelo permaneceria nas duas famílias. — Alec mal escondeu seu repugno. Moira mal tinha feito dezoito anos e era sua prima. — O Castelo de Stirling permanecerá em meu nome, e quando chegar o dia passará para o meu herdeiro, que eu terei com minha esposa, Daphne. — enfatizou cada palavra para entendessem de vez. — Atena nunca deveria ter colocado o legado de nossos antepassados nas mãos de um menino. — Calagham rosnou, também pondo-se de pé. — Ela não teria feito isso se vocês não tivessem abandonado-a. — Alec gritou, furioso que o tio tivesse tocado no nome de sua mãe, isso foi suficiente para fazê-lo calar a boca. Abandonou a sala sem olhar para trás, sabendo que Ashleigh estaria logo atrás dele. Bastava por os pés na Escócia, para a maré constante de estresse atingi-lo por todo o lado. Achou que depois que tivesse casado seu tio fosse esquece-lo de vez, mas aparentemente não se dariam por vencido enquanto ele não desse logo o ponto que faltava. O problema seria: como fazer um filho em uma mulher que não é realmente sua esposa. Alec esteve evitando pensar naquilo a todo momento desde que os dois deixaram Londres. Deveria ter sido sincero com Daphne desde o início. Mesmo que se casasse com ela, ele teria o título pois isso estava além dos poderes de seu pai, mas não teria o castelo, não até ter um herdeiro. Ele não entendia a lógica de seu pai, passou anos tentando compreender, mas tinha desistido. — Não deixe que eles te pressionem a fazer algo a que não está preparado. — A voz de Ashleigh cortou o silêncio. — É só um castelo Alec, quando papai fez aquele contrato tenho certeza que não era isso que queria, eles queriam apenas ver você feliz de novo. — Não é só um castelo, é tudo o que restou dela, isso e aquele anel. — Ele falou, virando para olha-la. — Eu tive a chance de escolher Ash, por cinco anos, e nunca teria entregado aquele anel a ela, se não tivesse certeza de que ela é digna de carrega-lo. Ashleigh olhou no fundo dos olhos do irmão, surpresa. Nem mesmo Alec tinha notado a verdade das suas palavras até dize-las. — Se você diz. — Ela falou em tom brando, pondo sua confiança nas mãos dele. — Espero que ela não te machuque. Alec piscou um olho para ela, com um sorriso apaziguador. Ele já não era mais um garoto de vinte e um anos criando bases em sentimentos infundados, agora ele saberia o que fazer e o que esperar, principalmente de Daphne. Aquela estrada que ele estava prestes a percorrer era longa. Primeiro ele precisava descobrir com o que estava disputando, saber o que a puxava tão insistentemente para Londres, e somente depois, lutar com as armas disponíveis. Capitulo oito Daphne só queria enfiar a cara entre as cobertas e nunca mais ter que encarar aquelas pessoas novamente. Tinha quase cuspido no rosto de Northwest. No rosto de Northwest! Ela tinha certeza que o duque jamais deixaria ela esquecer disso e sentia dor em seus ossos só de imaginar os comentários que estavam por vir. Onde já se viu servir tripas de bode em um jantar? Não era para menos que tinha colocado tudo para fora antes mesmo de alcançar uma latrina. O tempo que passou com o clã Armstrong a fez ver que não tinha espaço naquele ambiente. Desejava falar com Alec parar cobrar o favor que ele tinha pendente com ela. Exigiria que ele arranjasse um meio de manda-la para casa amanhã pela manhã e deveria falar com ele o mais logo possível, quanto mais cedo agilizasse, mais cedo ela iria embora. Pensou em ir até ele imediatamente, mas percebeu que não seria muito prudente aparecer em seu quarto à aquela hora da noite, além de que não sabia em qual aposento o duque estava dormindo. Ouviu uma batida delicada na porta e se animou com a ideia de que poderia ser ele, mas murchou ao ver o rosto de Ashleigh do outro lado. — Ah, é você. — Ela disse, sem deixar de transparecer sua decepção. Se afastou, deixando a porta aberta para a garota entrar. — Esperava alguém mais? — Ashleigh indagou com uma sobrancelha arqueada. — Um salvador talvez? — Disparou com sarcasmo. — Realmente não gosta de Stirling não é? — Daphne olhou para a menina e arrependeu-se de suas palavras. Estava sendo rude, afinal ela e seu irmão estavam dando abrigo para ela. — Não, o castelo é maravilhoso. — Corrigiu-se em tom mais brando. — Apenas não nasci para viver enclausurada. — Acho que entendo você. — Disse Ashleigh e ambas ficaram em um silêncio desconfortável. — O que veio fazer aqui? — Daphne perguntou quando viu que a cunhada não diria seu propósito. — Pensei que seria um bom momento para tentar uma aproximação amigável. Sabe, como uma dessas reuniões noturnas onde as mulheres se juntam para fazer fofoca enquanto trançam os cabelos umas das outras. — ela retirou uma garrafa aparentemente velha e cilíndrica de dentro das vestes. — Não sei exatamente qual é o protocolo para essas festas, mas não queria aparecer de mãos abanando então, aqui está. Ela andou até o lado da cama onde descansava uma jarra de água e copos. Ashleigh retirou a rolha que tampava a garrafa, serviu um pouco do líquido nos copos e entregou um para Daphne. — O que é isso? — Daphne perguntou, levando a bebida ao nariz. Tinha o cheiro de conhaque envelhecido e açúcar. — Hidromel. — disse a cunhada, levando o líquido aos lábios. — Roubei da adega de meu irmão. — Nunca o bebi antes. — Daphne bebericou um pouco, a bebida por mais que tivesse um nome delicioso e parecesse inofensiva era forte. — É o senhor Dwalight, o boticário de Kinlochleven quem o prepara. — Ela andou até o recamier acolchoado e sentou entre as almofadas. — Antigamente acreditavam que o mel era um afrodisíaco. Muitos maridos do povoado estavam insatisfeitos pela falta de participação conjugal de suas esposas, se é que me entende. — A menina deu um olhar muito sugestivo e Daphne sorriu, andando para mais próximo e se sentando em uma almofada no chão. — Cansados de serem expulsos das camas todas as noites, eles pediram ao boticário da região que fizesse uma poção que pudesse acordar o desejo de suas mulheres. O boticário obviamente não sabia o que fazer, misturou uma efusão de ingredientes com destilados, e ao fim o gosto estava tão horrível que ele decidiu adicionar o mel para disfarçar. Assim nasceu a bebida. — E deu certo? — A cunhada deu de ombros. — Acredito que sim, mas ninguém sabe se a poção fazia efeito por sua eficácia, ou porque as mulheres ficavam bêbadas demais. — Daphne riu baixinho e a mulher adulta dentro dela lembrou de um detalhe. — Você deveria estar bebendo isso? — Perguntou. — Dentro de sete meses farei os dezoito anos. — Ashleigh respondeu e olhou para ela com aqueles grandes e reveladores olhos de mel. — Quero me desculpar pelo meus comentários mais cedo. Acho que me enganei sobre você. Daphne não tinha se sentido ofendida em nenhum momento, mas mesmo assim ficou agradecida pelo pedido de desculpas. — Tudo bem. Achei até bastante divertido. — Deveria ter visto o rosto de Calagham quando você simplesmente saiu correndo as pressas. — Ashleigh falou, começando uma risada. — Foi como se você tivesse ateado fogo no kilt dele. — e então Daphne começou a rir e no instante seguinte as duas compartilhavam uma gargalhada. — Eu gostaria de repetir aquele momento pela eternidade. Aos poucos o riso de Daphne foi mudando até se transformar em um gemido angústiado. Ela afundou o rosto nas mãos. — Alec nunca me deixará esquecer isso. — se lamuriou. — Ele não vai mesmo. — Disse Ashleigh, Daphne a olhou, aquilo não a ajudando em nada. — Mas eu sei uma infinidade de coisas sobre o meu irmão que você também poderia usar contra ele ocasionalmente. Daphne ergueu o rosto, e logo estava muito animada com a idéia. — Ele não vai ficará chateado com você? — Somos irmãos, eu já sei lidar com Alec. — Ela deu de ombros e se inclinou mais para a frente. — Quando ele era mais jovem era um pequeno pestinha, gostava de passar horas do dia abaixo do sol, brincando, pescando ou caçando, isso resultou em muitas sardas em sua cútis, eram tantas que em seu rosto não sobrava muita pele para ver a tonalidade, acabou ganhando o apelido de ferrugem dos outros meninos. — Na mente de Daphne se formou a imagem do menino sardento, e ela o achou incrivelmente fofo. — E não era muito bom com as palavras, trocava todas de lugar quando ficava nervoso sabe? Até hoje o faz em alguns momentos. — Daphne rapidamente lembrou-se do momento que ele a viu nua na banheira, ele tinha trocado as palavras, isso significava que tinha estado nervoso? — Jamais esperava que alguém como seu irmão tivesse qualquer falha em sua armadura de confiança. — Isso é apenas o que ele quer que acreditem. — Disse, e deu para Daphne um olhar pesado de significados. — Mas é precioso e único, cuide bem dele. Daphne sabia que nada do que dissesse seria sincero o suficiente e não era isso que Ashleigh merecia, ela amava o seu irmão, assim como Daphne amava as dela e esperava que seus maridos as tratassem como as jóias que eram. Ashleigh no fim de tudo queria apenas o bem de seu único irmão e Daphne descobriu que a entendia muito no fim das contas. — Agora dei-me conta de algo. — Disse Ashleigh passando a vista pelo quarto. — onde está o porco? Daphne virou-se para apontar o cesto onde ele estava dormindo ainda há pouco e deteve-se. Tommy não estava mais lá. — Estava aqui há poucos instantes. — Ela disse, procurando o porco pelo quarto com a vista. Não o encontrando em lugar nenhum. Daphne levantou-se para olhar debaixo da cama e pelo espaço lá de baixo viu a porta semiaberta por onde Ashleigh tinha passado. — Não Tommy! Ela correu para o corredor escuro e olhou para ambos os lados vazios, não enxergou nada na penumbra. — Para que lado acha que ele foi? — Ashleigh juntou-se a ela. — Não sei, mas devo encontra-lo, poderia perder-se e morrer de frio, ou pior, poderia ser capturado! — Somente a suposição fazia Daphne ficar aflita. — Estamos conversando há apenas alguns minutos, ele não deve ter ido longe. — Ashleigh sumiu dentro do quarto e voltou com uma luminária. — Faremos o seguinte, eu vou para o Leste e você para o Oeste, nos encontramos aqui em vinte minutos. — Daphne assentiu e foi na direção ordenada. Enquanto perambulava por aquele castelo escuro e solitário, Daphne lembrou-se da história fantasmagórica que Ashleigh tinha contado para ela mais cedo, e naquele momento ela sentiu pena da pobre fantasma. Devia ser um martírio eterno ter que viver presa naquele mar de gelo para sempre desejando a liberdade ou somente algo para comer que não fosse feito das tripas de alguém. Ela colocou uma mão em formato de concha na boca: — Tommy! — Sussurrou. — Volte aqui seu pequeno fujão. Em resposta Daphne ouviu o ronco do porquinho mais adiante. Ela apressou o passo e dobrou no corredor seguinte, e lá estava a bolinha rosada usando um suéter verde encolhida contra a porta da biblioteca. — Aí está você. — Ela disse chegando até o porco que ergueu o nariz para olhar para ela. Ela abaixou-se e estendeu um dedo para dar-lhe uma bronca. — Não deve escapar desse jeito por aí, imagina se alguém te encontra e te... Daphne parou de falar quando as portas duplas da biblioteca se abriram, primeiro ela viu dois pés cobertos por meias brancas, depois canelas compridas, e a barra de um kilt, então viu uma cintura masculina e o início de um abdôme totalmente nu, ela seguiu aquela quase eterna estrada de pele alva até que finalmente chegou nos olhos dourados de Alec. ∞∞∞ Alec já estava esperando por ela. Após o jantar desejou durante toda a noite ir de encontro a ela, mas invés de entrar em seu quarto ou de simplesmente convoca-la, ele ficou onde estava e esperou. Não entendia como sabia que ela estaria na biblioteca, mas sentia isso como um sexto sentido. E embora a esperasse, não deixou de se sentir surpreso ao vê-la agachada ao chão dando bronca em seu porco. A expressão dela deixou óbvio que ela não esperava vê-lo ali. Os olhos azuis acinzentados caíram pelo fogo, por ele e depois espalhou-se por ali. Ela usava aquela camisola horrenda que não deixava nada para a imaginação. Quando ele abriu a porta o porco entrou ali dentro rápido e andou até estar no tapete de frente para o fogo, Daphne levantou-se devagar. — Me desculpe não queria incomodar, Tommy escapou e vim procura-lo. – ela evitava olhar diretamente para ele, mas vez ou outra seu olhar deslizava pelo peito dele, isso deixou Alec muito à vontade. Ele encostou-se no batente da porta e cruzou os braços. — Não espera que eu acredite nisso, espera? — ela o olhou com um vinco charmoso se formando entre as sobrancelhas. — O que quer dizer? — Você espera que eu acredite que seu porco nanico fugiu no meio da noite fria e fez seu caminho coincidentemente até a biblioteca? – As sobrancelhas dela juntaram-se ainda mais. — O que está insinuando? — Ela cerrou os punhos ao redor do corpo e adquiriu um semblante perigoso. — Admita meu docinho, você veio até aqui para tentar me seduzir. — O rosto dela ficou muito vermelho e ele festejou internamente, simplesmente adorava irrita-la. — Você se põe mais crédito do que é merecido, milorde. — Ela desdenhou. — Não é tão irresistível quanto pensa. Ele continuou sorrindo de maneira convencida. — É a primeira vez que uma mulher usa um porco como uma tática para me levar para a cama. — Não quero te levar para a cama! — Daphne disse, indignada. — E se o quisesse não ficaria de rodeios, não sou chegada a joguinhos alteza, se quero algo vou lá e simplesmente pego. Oh! Alec realmente sentiu uma parte muito, muito, secreta de seu corpo palpitar. — Mas não é assim que as coisas funcionam comigo meu mel, eu gosto de ser conquistado. — Ele piscou um olho para ela e Daphne bufou enraivecida. — Saia da frente. — Ela o empurrou para o lado e entrou na biblioteca, indo até o tapete onde o porco descansava. — Então é aqui que está passando suas noites. — Ela disse, olhando ao redor da biblioteca circular. — Não lhe dói as costas? — Indicou o pouco espaço que ele tinha no divã. — Sim, mas se voltasse a dormir com você outras partes minhas começariam a doer. — Daphne ergueu uma sobrancelha acintosa e Alec soube que ela entendeu exatamente o que ele quis dizer. Foi então que Alec se deu conta de algo; Daphne não era mais tão inocente como acreditava. — O que você sugere para alguém que não consegue dormir? — Ela disse, passando os dedos por uma prateleira cheia de volumes pesados. — Porque não escolhe algo de Shakespeare? — Olhe para mim, milorde. — Ele estava olhando. Muito fixamente, até. — Tenho cara de que lê Shakespeare para passar o tempo? Não, ela não tinha. Alec conseguia a imaginar facilmente lendo os livros indecentes entre as cobertas, durante a noite. Suada, tremente e luxúriosa. Como a deusa audaciosa que era. — Eu estava pensando em algo de administração talvez. — Ela disse, ficando na ponta dos pés para alcançar um exemplar uma prateleira acima. A camisola ergueu-se o suficiente para ele ver um calcanhar rosado. Aquilo era curioso, porque Daphne estava interessada em um assunto que para a maioria das outras mulheres seria considerado enfadonho? — Algumas prateleitas acima. — Ele disse, e observou quando ela foi até a lareira para pegar uma luminária, que acendeu com um graveto do fogo baixo, voltou para onde estava, e puxou a escada de madeira, subindo exatos quatro degraus. — Já leu algum? — Ela perguntou, colocando a luminária em uma prateleira e inclinando-se para pegar um livro mais para a direita. A luz escapando da vela delineou a silhueta dela por baixo da camisola e ele viu a curva de um seio tentador. — Eu dormiria se tentasse. — Eu esperava que como um duque, Vossa Alteza tivesse que ler. — Ela disse enquanto folheava o livro devagar. Alec se aproximou mais dela apenas por precaução, o fino pedaço de madeira que sustentava o peso dela poderia romper-se e ele sentia calafrios de pavor só de imaginar os resultados disso. — Eu deveria, não fui muito bom na escola, meu assunto não é literatura. Sempre que começo a ler algo me sinto entediado antes da metade. Os únicos livros que não me dão sono são os indecentes. — Ela tirou os olhos do livro e os colocou nele. — Típico. — disse com um sorriso que ele achou atrevido e adorável. — É por isso que nunca me casei, me entediaria muito rápido e tenho feito uma promessa de fidelidade no passado. — Não imagino alguém como você fazendo tal promessa. — Nós canalhas também temos honra. — Ele bateu no peito e ela gargalhou, e Alec percebeu que aquela Daphne era muito mais divertida do que a mau humorada com quem ele estava acostumado a lidar. — Também são muito bom de memória. — ela disse. — Nem eu mesmo lembrava o que estava vestindo há quatro anos atrás. — Guardo na memória apenas o que me encanta. — Alec percebeu no exato momento em que as palavras deixaram sua boca que disse algo irreversível, forte e esclarecedor. Os olhos dela encontraram e o ar ali dentro se tornou pesado, denso, pulsante. — Aqui, este vai servir. — Ela fechou o livro com um baque e desceu rápido para o chão. Colocou a luminária e o livro sobre a mesa e foi até o porco para pega-lo no colo. Virou-se para ele uma última vez. — Devo ir. — Ela não parecia ter certeza. — Sim, deve. — Ele também não passou muita confiança em suas palavras. Daphne andou depressa até a saída. — Espere. — Ele disse e ela obedeceu de súbito, não se virou para ele, apenas permaneceu de costas, esperando. Alec andou até ela até chegar muito próximo, tão próximo que alguns fios do cabelo dela acariciaram sua face. — Esqueceu o livro. — Ele sussurrou e colocou o volume na frente dela. Daphne pegou o livro entre os dedos, e Alec percebeu que estavam trêmulos. — Obrigada. — Ela saltou e escancarou a porta, andando para longe. Alec esperou até que ela dobra-se no corredor e só então voltou para seu divã, onde deitou-se e sorriu, muito satisfeito consigo mesmo. Capitulo nove Quando acordaram pela manhã a primeira coisa que os habitantes de Stirling viram foi que durante a noite a neve tinha parado de cair. Isso resultou em reações diferentes entre eles. Enquanto Alec estava desapontado, Daphne estava exultante de felicidade. Finalmente algo de bom tinha acontecido com ela. Pela janela do quarto ela pôde ver as nuvens abrindo espaço para o azul do céu. Embora que fosse o azul acinzentado do inverno, ainda era azul e aquela era sua nova cor preferida. Vários homens usando kilts e longos casacos de frio ocupavam as ruas de Kinlochleven carregando pás e carrinhos de mão para tirar a neve da estrada e das portas das casas. Ela viu também as muitas chaminés soltando fumaça, e as crianças saindo de suas casas, correndo pelo vilarejo com gorros e luvas de lã. Ela viu quão formosa Kinlochleven ficava quando não estava enfiada em centímetros de neve. Alec comia na mesa de café da manhã quando ela e Ashleigh irromperam pela porta. Ele ergueu as sobrancelhas, surpreso ao vê-las unidas. Queria saber em qual momento da última noite elas tinham se tornado amigas. — Bom dia irmão. — Disse Ashleigh, muito alegre. — Bom dia. — Ele disse trocando o olhar de uma para a outra. — Acha que demorará muito até que tirem toda a neve das ruas? — Daphne indagou ao sentar- se à mesa e Alec perdeu parte da animação. Ele já imaginava que ocasionalmente o assunto de uma partida surgiria. Isso não podia ir mais contra os seus planejamentos, realmente a neve ter parado de cair foi um infortúnio, agora teria que adiar o máximo da partida que fosse possível para descobrir a intenção de Daphne em Londres. — Não tenho muita certeza, me informarei sobre isso. — Ah mas não pode ir ainda. — Ashleigh disse para ela. — Espere para ir somente amanhã, hoje eu quero leva-la para conhecer Kinlochleven. — Daphne parecia inclinada a não aceitar. Mas Ashleigh exibiu grandes olhos de cão pedinte e a mulher resignada, assentiu. Alec observou aquilo com espanto e se perguntou como sua irmã conseguia extrair dela tão facilmente o que ele não conseguiria nem em mil anos, um simples sim. — Você vem também não é Alec? — A menina se voltou para ele, Alec quase levantou para dar um beijo de agradecimento na irmã. — Com certeza. — Ashleigh olhou de um para o outro e escondeu um sorriso esperto dentro da xícara de café. Uma hora depois eles estavam indo em direção ao povoado. — Iremos a pé? — Daphne indagou ao não ver nenhuma carruagem na saída do castelo. — Sim, que melhor maneira de conhecer a cidade? — Disse Ashleigh e a duquesa fez uma expressão de dor estomacal. Estava frio, muito frio e mesmo que usasse grossas camadas de lã, Daphne sentia suas juntas endurecendo. Ela envolveu o corpo com os braços e Alec desejou pairar sobre ela para fornecer seu calor corporal, mas sabia que isso ficaria estranho, então tirou seu casaco. — Pegue isto. — Estendeu o confortável casaco de pele pelos ombros dela. Daphne o olhou com os olhos bem abertos. — Não posso aceita-lo. — Disse tentando tirar o casaco. — Você terá frio. — Apenas aceite a gentileza, carinho. — Ele disse ajeitando o casaco nela e aproveitando para dar uma passada de mão além de audaciosa pelas costas dela, as faces dela ficaram vermelhas, e ele adorou que fosse capaz de fazer o sangue dela esquentar mesmo no frio. — Obrigada. — Ele assentiu, e deixou que ela andasse na frente. Enquanto ela se afastava ele a avaliou. Ela estava bastante engraçada pois o casaco era demasiado grande para ela. Ele desejou rir mas achou aquilo acima de tudo excitante, as pessoas veriam que ela usava as roupas dele e teriam a ilusão de que ela pertencia a ele, e mesmo que fosse longe da realidade foi algo muito agradável de sentir, possessão. Ele esteve satisfeito por todo o trajeto até o momento que entrou no povoado. Alec abaixou os olhos para o chão enquanto andava, pois odiava quando olhava nos olhos cheio de pena daquelas pessoas e via ali a memória de um menino ingênuo. Ele sentia a fúria nascer dentro dele com força e desejava se afastar. As mulheres pararam no boticário, e ele sentiu alívio pesado por saírem das ruas. Daphne e Ashleigh andaram pela loja conversando baixinho. Alec adorou isso. Ashleigh não tinha muitas presenças femininas em que se apegar e Alec via em Daphne essa possibilidade. — Não tenho muita certeza, não parece rústico demais? — Disse Daphne colocando um pequeno frasco abaixo do nariz de Ashleigh. — Como um perfume poderia ser rústico demais? — perguntou Ashleigh. — Adocicado demais, então? — Daphne disse outra vez, inspirando o aroma. — Você está fazendo isso errado. — Disse Alec, largando o que estava fazendo e indo até elas. — Você sente muito adocicado porque está sentindo a fragrância ainda no frasco. — Ele pegou o frasco de vidro da mão dela. — Dê-me seu braço. — Ela não moveu um músculo, então ele mesmo pegou o fino braço delicado, subiu a manga do casaco um pouco e encostou o vidro apenas um pouco no pulso branco. Então ele mesmo levou ao nariz, e aquilo foi sua perdição. Era orvalho, rosas e Daphne. Alec sentiu aquele aroma bombear sangue para as partes mais vitais de seu corpo. Ela tinha cheiro de uma manhã de primavera. Ele desejou, e simplesmente depositou os lábios no pulso dela. Uma carícia rápida, frívola, quase invisível aos olhos, mas ele sentiu como se fadas tocassem seus lábios e ele soube que ela sentiu também pois estremeceu. Satisfeito ele se afastou. — Veja, agora não está mais tão doce. Está suave. Daphne tinha o rosto em chamas e escondeu o pulso atrás das costas como se alguém pudesse ver o rastro do que tinha acontecido ali. — Não é necessário, irei levar. — Ela disse para o boticário e Alec se afastou, com um sorriso convencido. Eles pararam para comer em um restaurante, e Ashleigh pediu pudim negro, bolinhos de conhaque e canecas de cerveja. Daphne perguntou os exatos ingredientes de cada um, e depois de muito cutucar o pudim com um garfo, levou um pouco para a boca. Depois do restaurante eles andaram de volta para casa. Ao passar pelo lago congelado próximo do castelo eles viram todas as crianças que brincavam ali. Todos os anos naquela época os moradores do povoado iam ali para deslizar pelo gelo em trenós ou em patins. Ele mesmo tinha feito muito aquilo com Ashleigh e seus pais em um passado muito distante. — Oh! — Daphne exclamou assistindo os patinadores com fascinação. — Ah sim, o fim de um dia perfeito, devemos ir! — Disse Ashleigh, puxando uma Daphne bastante encantada para as margens do lago cheio de pessoas. Alec sorriu, devia saber que sua irmã planejava algo assim. — Não sei, nunca andei de patins antes. — Daphne parecia relutante mas Alec viu o desejo em seus olhos. — É a melhor chance para aprender, Alec é um exímio patinador, ele pode ensina-la. — sua irmã disse e Alec percebeu pelo olhar sugestivo, talvez um pouco tarde demais, que Ashleigh realmente estava tentando aproxima-lo de Daphne. A mulher olhou para ele e mordeu o lábio inferior, ele não praticava há muito tempo e era arriscado que caísse e levasse ela junto, mas ele jamais perderia a oportunidade. — Pegarei os patins. — Ele disse e ela assentiu uma vez, entusiasmada. Ele deixou elas alguns minutos para ir até o castelo e voltou com os objetos. Ele esperou que Daphne calçasse e se abaixou para apertar bem o nó dos cadarços dela. Quando os dois estavam preparados, Ashleigh já patinava pelo lago, com habilidade. Ele estendeu uma mão para ela, para ajuda-la a pisar no gelo escorregadio. Ela o fez devagar segurando firme na mão dele, Alec desejou eliminar as luvas de seu caminho. Logo no primeiro passo Daphne escorregou e se segurou nos ombros dele e se Alec não estivesse ocupado demais em segura-la, teria apreciado tê-la em seus braços. — Tente primeiro manter o equilíbrio. — Ele disse, erguendo um pouco a barra do vestido dela. — Ei! — Daphne protestou dando um tapinha na mão dele. — É tudo pela sua segurança, docinho. — Ele brincou dando um sorriso coquete para ela. Se colocou atrás dela para lhe dar mais segurança. Ele deslizou a mão pela cintura dela e Deus, como era esguia. Ele encostou muito nas costas dela e pôde ver que Daphne sentiu sua presença e a respiração dela acelerou. As costas dela ficaram bem retas. O ar saia pelos lábios dela como fortes esbaforidos de fumaça gelada. — Agora deslize um pé de cada vez. — Ele instruiu e ela fez devagar. — Isso, muito bem, tente deslizar com um pouco mais de força. Não se preocupe, eu não soltarei você. — Ela anuiu e obedeceu de novo e aos poucos os dois começaram a deslizar pelo gelo. O sorriso dela foi crescendo como o raiar do sol pela manhã e se tornou enorme e radiante e Alec se sentiu ofuscado. — Alec isso é incrível. — Ela disse em meio a uma risada que aqueceu o peito dele e tudo se resumiu a aquilo, aos dois deslizando pelo gelo e a mão dele na cintura dela, e ao sorriso dela e Deus e ninguém mais. Alec soube, com a mais absoluta certeza que nada mais importava, realmente lutou contra aquilo por tantos anos a custo de nada. De nada. Cinco anos reduzidos a um só momento, deslizando com ela pelo gelo. E ele queria ser a liberdade que ela almejava, queria dar a ela isso. Então soltou-a para que ela voasse livre. Daphne patinou alegre para longe, e ele sentiu uma fisgada em seu estômago pela vontade de tê-la de novo. E quando Daphne viu que Alec não estava mais ali, perdeu completamente o eixo e o equilíbrio e sua expressão alegre virou pânico. — Alec! — Ela chamou por ele, e muito tarde ele percebeu que ela não saberia parar. Alec patinou para ela, mas ela ia reto, reto, reto até que saiu dos limites de lago, e caiu esborrachada no chão de neve. Quando ele finalmente a alcançou, ela cuspia neve para fora boca. — Você disse que não me soltaria! — Ela o acusou, e jogou um punhado de neve nele, Alec se sentiu culpado. — Não pensei que fosse cair de cara no chão por conta própria. — Ele se defendeu. — Machucou-se em alguma parte? — Meu tornozelo dói. — Ela queixou-se. — Veja se consegue levantar e andar. — Ele ajudou-a a se erguer, ela deu dois passos para frente e pendeu para o lado, com dor. — Venha, levarei você no colo até Stirling. Ela não protestou e ele presumiu que realmente deveria estar doendo. Quando chegaram em Stirling ele colocou-a deitada na cama e pediu que viesse um médico imediatamente. Enquanto a ajuda não chegava, Alec pediu que trouxessem compressas geladas para pôr no tornozelo. Quando o médico chegou, o inchaço já tinha diminuído mas Daphne ainda se queixava de dor. O médico pegou o pé dela e fez movimentos rotativos. — Au, Au. — Reclamava Daphne. — Não está ajudando muito! — É impossível examina-la milady se não me deixar ver onde dói. — Daphne emburrada fechou a boca e aguentou a dor em silêncio. — Foi apenas uma lesão leve. Fique de repouso, não faça esforço sobre o tornozelo pelos próximos dois dias e estará novo bem em breve. — Não, não posso ficar de repouso por dois dias, tenho que fazer uma viagem em breve. — Daphne apressou-se em dizer enquanto o médico enfaixava a área lezada. — Não tem nada que possa me dar que possa adiar uma melhora? — Talvez daqui a cem anos, por hora, já fiz tudo que está ao meu alcance. — Disse o homem e partiu, deixando ela desolada sobre a cama. — Sinto muito por tê-la soltado. — Ele disse, se sentindo realmente péssimo. — Tudo bem Northwest, foi provavelmente o melhor momento que eu tenho anos. — Oh, então ele tinha voltado a ser Northwest? — Minhas irmãs ficarão em êxtase quando eu contar. — Poderá convidá-las para cá no próximo inverno. — Ele disse e ela sorriu animada com a perspectiva, mas logo o sorriso dela arrefeceu devagar. — Não tenho meus planos de voltar. — Ela disse e ele viu sinceridade ali. — Principalmente porque esse lugar me trás uma falta de sorte inexplicável. — Talvez não devêssemos ter tirado a fita, afinal. — Ele brincou e os olhos de Daphne brilharam como estrelas. — É isso! A fita! — Ela afastou as cobertas para longe e levantou da cama de um pulo. — Volte para a cama, não deve fazer esforço. — Ele disse, mas ela ela estava ocupada demais tirando uma fita de dentro da sua valise para ouvi-lo. — Tudo faz sentido. Desde que tirou a fita na carruagem vem acontecendo coisas comigo. Começando pela queda da carruagem, depois a neve e o incidente com a armadura, o fiasco do jantar, e a agora meu tornozelo, tem que ser isso. Enquanto falava ela dava voltas no pulso dos dois, tantas que Alec perdeu a conta. Ao concluir ela deu um nó bem dado com as pontas. — E agora ficaremos de mãos atadas para sempre? — Ele gracejou, achando aquela ideia altamente absurda, mas Daphne não sorria, ela olhava para a boca dele com intenção, e o sorriso de Alec se foi. — Não, vamos consumar o casamento. — e o beijou. ∞∞∞ Ele ia rejeita-la, Daphne sentiu isso no momento que seus lábios encontraram com os dele. Arrependeu-se dolorosamente por ter agido por impulso, obviamente tinha entendido os sinais de maneira errada. Confundiu tudo, os olhares, a confissão dele na noite passada, o beijo que ele deu em seu pulso e o momento que tiveram enquanto patinavam. Agora ali enquanto os seus labios esmagavam os dele de um jeito rude e tosco, ela só conseguia pensar na humilhação que seria ter que olhar novamente nos olhos de Alec. Uma coisa era ser deixada de lado por ele durante toda uma vida, outra bem diferente era ele rejeita-la em meio a um beijo. A única solução que sua mente inútil achou foi fazer aquele beijo durar uma eternidade. Ela agarrou os dois lados da gola da camisa e manteve os olhos bem apertados, puxando ele mais para ela. Ele era muito alto e os pés dela doíam por estar há tanto tempo sustentando seu peso nas pontas. Alec não estava nem se afastando e nem retribuindo, talvez estivesse bestificado. — Daphne, não faça isso. — Ele falou dentro da boca dela. Daphne não conseguiu pensar em uma situação pior do que aquela. Devagar ela soltou a camisa dele e o afastou. — Me desculpe, milorde. — Ela cuspiu rancorosa. Sabia que ele tinha todo o direito de rechaça-la. Nunca antes o duque mostrou interesse nela, a culpa era totalmente dela e simplesmente não iria se perdoar nunca por aquilo. — Não me entenda mal, é que não parece ser as razões corretas para fazer isso. — Ela o olhou com tanto ódio que poderia tê-lo reduzido a cinzas. — Obrigada por escolher justamente este momento para dar uma de cavalheiro exemplar. — bruscamente puxou a mão do laço que amarrava os pulsos deles, mas a fita não cedeu. Raivosa, ela trabalhou para a abrir o nó mas estava apenas apertando ainda mais. — Não entendo porque está tão irritada. Eu fiz o que é certo, maldição. — Ele rosnou de volta, mas ela não deu a menor importância, então ele a puxou para olhar para ele. — Eu fiz o que achei que você fosse querer. — Por acaso eu parecia querer ser rejeitada? — É realmente assim que você quer fazer isso? Por uma crença? — Já ouvi histórias sobre você Northwest, já dormiu com mulheres por menos do que isso. — O músculo da mandíbula dele saltou e os olhos dourados ficaram realmente furiosos. — Ponha-me na fogueira por desejar tratar minha esposa com um pouco mais de respeito. — Daphne odiou aquele nó em seu pulso que a impedia de ganhar distância dele. — O que te faz achar que deve ser cuidadoso comigo? E pelos céus, eu já disse, não sou sua... — Ela foi silenciada por lábios possessivos, e agarrada por braços, que a puxaram com força contra um peito robusto que respirava erroneamente. Por um instante ela ficou sem ar pois a mesma boca que estava dura e fria sobre a dela há poucos instantes, agora a beijavam com liberdade e volúpia. Uma mão esgueirou-se pela nuca dela até encontrar abrigo em seu couro cabeludo, e a outra que estava atada com a dela, deslizou por sua cintura até parar bem no centro de suas costas. Daphne sentiu seus seios espremendo-se contra o abdome dele e o vestido de tecido grosso e pesado que usava poderia ter sido reduzido à cinzas com o fogo que cresceu dentro dela. Daphne abriu a boca em busca de ar mas Alec não estava disposto a cedê-lo e a encheu com sua língua. Ela teria deslizado para o chão se ele não tivesse segurando-a tão firme. Em meio ao beijo desvirtuoso, ele a levou pelo espaço curto e Daphne flutuou, literalmente flutuou pois seus pés não alcançavam o chão e soltou um pequeno grito quando caiu de costas em algo suave, confortável e macio. O colchão balançou em ondas e as penas afundaram com o peso deles dois quando ele a cobriu com urgência, voltando a beija-la. O espartilho que Daphne usava por baixo de todas aquelas camadas de tecido estavam impedindo que seus seios respirassem livres, ela os sentia desconfortáveis, pesados e doloridos e suas pontas doíam por atenção. Ela esmagou os seios contra o peito dele, e isso proporcionou um alívio superficial. Alec colocou uma mão no queixo dela e virou o rosto de Daphne para morder sua mandíbula e lambe-la como um selvagem. Daphne arfou, já tinha beijado algumas vezes e ouvido as experiências de outras mulheres mas nunca, jamais, alguém mencionou lambidas. Os fios ásperos da barba dele por fazer arranharam seu pescoço. Aquilo era rude e machucava mas era uma dor prazerosa. Sua mente ficou inebriada com o cheiro de charuto e cedro e ela se sentiu pequena debaixo de todo aquele homem. Ela decidiu então toca-lo, nunca antes desejou provocar um homem mas seus dedos pinicavam por sentir nem que fosse uma faixa de pele dele. Daphne deslizou a mão pelos ombros dele até chegar naquele músculo masculino que juntavasse com o pescoço, ela o acariciou fazendo círculos com seu dedo polegar e o deslizou devagar para a abertura do colarinho, encontrando o osso da clavícula, e deslizou o dedo por aquela parte de pele nua e ela o sentiu estremecer. Sentiu-se libertina. Com um pouco mais de audácia ela levou sua única mão livre pelas costas dele até chegar na bainha da camisa onde finalmente, finalmente, pôde toca-lo com toda uma mão. Ela agora entendia porque ele nunca sentia frio, era fogo por natureza. Explorou a cintura com os dedos e subiu sua mão pelo abdôme que retraiu-se involuntariamente. Ela sentiu o peito dele vibrando de um jeito muito felino e sorriu internamente. Daphne estava conhecendo o homem somente com a palma de sua mão, e estava adorando. Ele gemeu quando um dedo dela passou por cima do seu mamilo, e Daphne desejou morde-lo, mas como a posição não permitia, ela decidiu apertar o mamilo entre os dedos. Alec rosnou e de maneira abrupta puxou os botões do vestido dela, deixando o espartilho à mostra. A respiração de Daphne acelerou e seus seios espremeram-se contra a vestimenta inconveniente. Parecia que ele também não estava gostando muito da interferência da peça, pois começou a puxar os fios até que tivesse liberdade o suficiente para liberar os seios dela. Ele primeiro os apalpou de um jeito curioso, como se quisesse se certificar de algo e sorriu como um devasso. — Foram feitos para as minhas mãos. — Ele disse de maneira possessiva e Daphne sentiu um forte arrepio de desejo em seu ventre. Ele abaixou-se para ela e espalhou beijos por todo o seu colo, nunca chegando no ponto crucial, então, quando ela já não conseguia se manter parada, ele finalmente tocou em seu seio com a mão nua e ela jogou a cabeça para trás em meio a pele do cobertor. Nunca achou que sentiria tanto prazer com um homem tocando seus seios. Sequer sabia que podia sentir prazer naquela região. Com um dedo ele circulou o pico turgido do mamilo dela e quando Daphne menos esperava ele apertou o botão entre os dedos. — Oh! — Ela exclamou quando aquele aperto enviou poderosas ondas de prazer pelo corpo dela. Alec enfiou o rosto no pescoço dela e Daphne sentiu seu mundo ser chacoalhado quando a voz dele, lânguida e cheia de luxúria, disse em seu ouvido: — Não é tão divertido quando você é a vítima, sim? — Ele gemeu, e beijou por toda a curva de seu pescoço enquanto brincava com o mamilo dela. Daphne agarrou-se aos seus ombros por medo de que ele pudesse simplesmente fugir. Antes nunca tinha sido daquele jeito. Algo mais forte, mais primitivo a fez abrir as pernas e erguer os quadris para cima, e como uma resposta em igual, Alec abaixou-se para ela e espremeu sua ereção em sua carne desejosa. Daphne arfou, meio surpresa, meio aliviada, meio sedenta por mais. Então ela o fez de novo. E de novo e a pequena loba dentro dela queria desfazer-se de suas roupas e tornar aquilo mais cruel. A mão dele não largava o seio e ele continuava a lhe dar apertos voluptuosos. — Minha Afrodite. — Ele sussurrou no ouvido dela. Sim, naquele momento ela era sua Afrodite e ele era o seu Ares, o seu deus da guerra. E os dois eram amantes apaixonados em uma cama de penas e pele, consumidos pela paixão. Então, no momento seguinte ele voltou para beija-la e para esconder novamente aquele volume precioso no latejamento do ventre dela, e no caminho para sua boca, ele a olhou. Os cabelos dele estavam espalhados e uma mexa charmosa caia por sua testa, os olhos estavam o mais dourado que Daphne já tinha visto na vida, como ouro puro e líquido. As pálpebras pesadas e os cílios de plumas encantadores. Eles se olharam profundamente nos olhos pela primeira vez desde que estavam se beijando e Daphne deu-se conta de uma coisa. Aquele ali tocando nela tão intimamente era Northwest, céus! Era Northwest! Sim, era Northwest. E santo deus, àquilo nunca apareceu tão perfeitamente correto. E isso não somente a pegou desprevenida como também a fez acordar do seu surto momentâneo. Seu coração, seu tolo coração, bateu duas vezes. " É ele. " sussurrou. Aquilo foi como receber um pesado balde de água fria em seu fogo. A forja se apagou. Doeu e a fez se encolher. Ela colocou uma mão em seu coração e tateou pela liberdade, ele a olhou sem entender nada e deu espaço para ela sair, Daphne precisava correr e correr e correr para longe dali, ele suspirou pausadamente e passou uma mão pelo rosto decepcionado. O nó que antes existia no pulso dos dois agora não existia mais, de alguma maneira eles tinham se soltado durante o interlúdio. — Deveria ter parado quando te dei a oportunidade. — Ele disse, aborrecido. Estava confundindo a consternação dela com arrependimento. Bem, arrependimento estava no pacote. Sim, céus, como ela se arrependia! — Provavelmente você tem razão. — Ela disse, e mesmo que ali fosse tecnicamente seu quarto, ela andou de costas em direção a saída. Tentando fazer seu coração parar de bater em agonia, ansiando novamente por aproximação. — Sabe que isso não pode ser desfeito não é? — Ele disse antes que ela se fosse e Daphne se virou para ele uma última vez antes de sair. — Não pode, mas não dirão que eu não tentei. — E se foi. ∞∞∞ Não foi uma surpresa quando antes mesmo que os primeiros clarões da manhã iliminassem o céu, Daphne já estava pronta para deixar Stirling. Alec se colocou nos portões de saída do castelo com uma carruagem bem equipada para uma longa viagem, esperando por ela. A neve havia sido retirada das estradas até a saída de Kinlochleven, o clima estava úmido e o ar estava fumacento, já não caia neve do céu, mas ela sentia como se uma forte nevasca brincasse em seu estômago. Ela trazia Tommy pela correia e usava seu vestido de casamento no corpo, coincidentemente o verde do vestido era o mesmo do suéter do porquinho. Os cabelos dela estavam amarrados em um coque rigido na nuca, o rosto estava taciturno e a boca rígida. Definitivamente não existia nenhum traço da mulher quente, risonha e voluptuosa da noite passada. Talvez fosse pelo frio, ou talvez fosse pela vergonha, ela estava com as faces coradas, segurando a valise nas mãos, evitando olhar para o duque. A esposa, parou na frente do marido e Ashleigh abaixou-se para se despedir de Tommy. Daphne adquiriu coragem o suficiente para olha-lo no rosto. Ela viu ali um olhar tranquilo e sereno. Alec não estava se importando se ela ia ou ficava e por mais que soubesse que era o melhor ela não deixou de se sentir triste. Seu coração ansiava por afeto, e seu corpo ansiava por contato. — Então é isso. — Disse timidamente, se sentia tola por estar agindo como uma tímida, coisa que ela nunca foi. — Agradeço pela hospedagem, e por todo o resto. Alec no entanto não disse nada. Se ela precisava ir para Londres, então ele deixaria ela ir para Londres. Enquanto desejasse voltar para casa, ela nunca se sentiria bem ali e ele não queria isso. Ele queria ser o alguém para quem ela desejaria voltar um dia. Além de que aquela era a única maneira de ele descobrir para o que ela desejava isso, ou para quem. — Confesso que eu desejava que pudesse ficar um pouco mais, você é a oponente mais divertida que encontro em anos. — Disse Ashleigh se erguendo novamente, Daphne pegou as duas mãos da cunhada e sorriu, logo em seguida a puxou para um abraço. — Talvez devesse me visitar em Londres, garanto que ficará igualmente fascinada ao conhecer minhas irmãs. — Quem sabe, eu vá. — Respondeu a mais nova e os três ficaram se encarando em um silêncio desconfortável, até Daphne soltar uma grande lufada de ar e se preparar para subir na carruagem. Alec ofereceu a mão para ajuda-la a subir no veículo e antes que a donzela sumisse ali dentro ele apertou sua mão fazendo com que parasse. Daphne olhou para a mão apertando a dela e seus lábios se abriram assustados, Alec viu os lábios tintos de frio e lembrou que eles tinham sabor do mel e desejou embriagar-se. Ele viu dentro dos olhos azul acinzentado, por um momento fugaz, a esperança. Era apenas o que ele precisava. — Quero que fique na Northwest House. — os olhos dela se abriram, estupefatos. — Isso não será necessário, ficarei na casa dos meus pais. — É uma mulher casada agora, já terá falatório o suficiente por estar separada do marido, não dê mais assunto para as más línguas falarem. — Argumentou sabendo que aquelas palavras eram uma mentira, estava pouco se importando com as más línguas, ele só estava fazendo aquilo para mantê-la sobre seu domínio de alguma maneira. — De qualquer maneira é tarde demais, eu ja enviei uma nota pelo mensageiro ordenando que os criados preparassem a casa para a sua chegada. Ela ainda parecia não concordar, mas assentiu. Relutante o olhou por alguns segundos. — Alec... — O nome dele soou doce nos lábios dela, e ele desejou ouvi-lo junto ao ouvido, em meio a suspiros ofegantes, junto com o som mais cru da carne batendo na carne, acompanhado de um gemido. Ou de vários. Ela parecia querer falar algo, seus olhos azuis percorreram todo o rosto dele como se quisesse decora-lo. Fechou os olhos apertado, dando um suspiro longo, e quando os abriu novamente, o frio estava personificado em seu olhar. — É melhor eu ir. — Disse dando as costas para ele e subindo na carruagem alta, e partindo, sem olhar para trás uma única vez. ∞∞∞ A viagem de volta para Londres foi solitária e carregada de emoções controversas. Era estranho estar sozinha dentro daquela carruagem, regressando para casa, sentindo como se deixasse uma parte essencial de sí mesma para trás. Seu coração ficou pesado no peito até o momento que a carruagem saiu de Kinlochleven, talvez estivesse sendo tola, mas acreditava que a qualquer momento Alec fosse aparecer ali, puxando-a de volta para trás. No fim de tudo era melhor assim, Northwest e ela nunca poderia dar certo, os dois sempre se detestaram, e nunca trocaram nada além de farpas, a vida de libertinagem dele deixava em evidência que ele jamais poderia ser fiel, e tinha quase certeza que ele jamais aceitaria a vida privada que ela levava. Sim, no fim de tudo era melhor assim. Daphne passou a noite em um hotel em Edimburgo, e partiu bem cedo pela manhã. Desejava chegar logo em casa, sentia-se estranhamente vulnerável e sabia que a qualquer minuto iria chorar, por um motivo que não entendia. Ou talvez entendesse, e apenas não queria admitir para sí mesma. A noite ela chegou na pitoresca Gretna Green e apenas para se punir decidiu passar a noite na estalagem dos Uig. Entrou no lugar que não tinha mudado absolutamente nada desde a última vez que esteve ali. Era estranho, pois parecia que tudo fazia tanto tempo, quando na verdade foi a somente há alguns dias. Ela bateu na sineta sobre balcão e logo depois a velhinha carismática surgiu por uma porta lateral, ostentando seu formoso sorriso doce. Ela soltou uma exclamação ao reconhecer a duquesa. — Lady Northwest! — Um caroço se formou na garganta de Daphne ao ouvi-la chamando daquela maneira. — Que surpresa agradável. Os olhos astutos da velhinha buscaram o escocês pelo recinto, e quando não encontrou- o, seu olhar se fixou no rosto de Daphne, entendendo que ele não estava ali, se enchendo de uma pena que fez Daphne se sentir incomodada. — Hoje serei apenas eu e Tommy. — Falou indicando o porquinho, a senhora Uig sorriu para o animal perto da dona e pegou uma chave atrás do balcão. — Espero que desça para comer conosco. — Disse gentilmente, entregando a chave para ela. — Uma mulher não deve comer sozinha em noite de lua cheia. — Mais uma superstição escocesa? — Não, dessa vez é apenas um convite. — Ela respondeu, fazendo Daphne sorrir genuinamente pela primeira vez desde o dia anterior. — Eu ficarei bastante feliz. — Respondeu contente e se dirigindo para as escadas de madeira, pisou no primeiro degrau e se deteve. — Espere, não servirá nada feito das tripas de algum animal, não é? — Pode ficar tranquila, nada de tripas. — Disse jocosa e a duquesa respirou aliviada. A estalagem estava tão cheia naquela noite quanto no dia de suas bodas. Vários casais estavam por ali. Absortos em suas conversas particulares, aproveitando a noite enevoada e o clima romântico que as velas proporcionavam. Ela se sentou sozinha em uma mesa aos fundos, não queria atenção para si. Enquanto bebia do seu vinho, Daphne observava o modo companheiro como o casal Uig serviam as mesas. Sempre se olhando e sorrindo com afeição um para o outro. Ela imaginou que tipo de sentimento forte era esse capaz de vencer até mesmo o tempo. Encarou o pudim de figo em seu prato, e cutucou o alimento sem intenção de come-lo. Daphne estava acostumada a estar sozinha, mas naquele momento ela sentiu um tipo diferente de solidão. Ela imaginou que se Northwest estivesse ali com ela, eles teriam uma conversa sobre mitologia, eles acabariam discordando em algum ponto, ele faria um comentário desagradável e ela desejaria acerta-lo com a cadeira. Ela olhou para aquele anel de ouro escocês em seu dedo anelar, a única lembrança que havia se permitido trazer consigo. Passou o dedo nas letras caprichosas entalhadas no ouro, "Tha gad agam ort", nem sequer teve a chance de perguntar o que significavam. — Você me tem. — Disse senhora Uig surgindo ao lado dela. Daphne franziu o cenho, confusa. A senhorinha sorriu, inclinando a cabeça de lado. — Tha gad agam ort, em gaélico significa, você me tem. Daphne encarou as feições da mulher, estarrecida. Aquilo não podia ser verdade, e mesmo que fosse, a frase era uma mentira descarada. — Deve ser algum mal entendido. — Falou, incapaz de olhar novamente para as letras. Sentindo o anel queimar em seu dedo de um jeito incomodo. — Nunca duvide do amor de um homem que atravessa metade do país como um louco para se casar com você. — Ela disse com aquela sabedoria que toda pessoa de idade tinha, e se afastou com um sorriso ligeiro para servir uma mesa mais a frente. Os pensamentos de Daphne ficaram embrulhados enquanto seu coração batia louco no peito. O que ela estava fazendo? Criando bases no argumento sem sentido de uma senhora romântica. Northwest só amava a sí mesmo. Era apenas uma frase insignificante em um anel. — Ele precisava salvar o ducado. — Falou firme, tentando infiltrar as palavras dentro de si mesma e afastando os pensamentos intrusos para longe. Na manhã seguinte ela se despediu de Gretna Green um pouco mais recuperada da depressão pós partida. Tudo que esteve sentindo nas últimas horas era apenas o resultado do momento de paixão que teve com ele. Ela estava confundido a paixão do prazer algo com mais, e tinha que parar com isso. Só porque havia sido único e loucamente prazeroso, não significava que tinha sido igual para ele. Ela era só mais uma de uma extensa lista. Respirando fundo ela ergueu novamente a muralha. Deixando todos os sentimentos confusos para trás junto com a Escócia. Capitulo dez A temporada social estava em seu auge. Mesmo com o clima úmido do inverno, aquela era a melhor época do ano para os negócios e Daphne não via a hora de voltar às ativas. Passou dias demais brincando de ser esposa de alguém e agora era hora de tornar a realidade. E dessa vez seria muito melhor. Teve que se tomar um cuidado dobrado por anos, e o status de mulher casada dariam para ela a liberdade que esteve almejando durante toda a sua vida adulta. Agora ela não teria mais que dar explicações e essa era a melhor parte. Infelizmente antes que pudesse gozar completamente disso ela teria que dar explicações uma última vez. Para seus pais. Quando a carruagem parou de frente para o número cinco, ela já estava se preparando mentalmente para o que viria a seguir. Colocou Tommy no chão e o porco correu para a porta feliz por estar em casa. Ela andou até a porta da frente e entrou devagar rezando para que pudesse se recuperar um minuto antes de enfrentar os seus pais, porém, quando virou-se para a sala deu de cara com uma confusão de pessoas paradas no centro. Suas irmãs e seus maridos, Sophie e o duque de Ballister, sua mãe e seu pai, e sete policiais, todos boquiabertos com os olhos fixos nela. O silêncio reinou por meio segundo e de repente uma avalanche de gritos e vozes preencheu a sala. — Daphine Annabell York! — Marie York foi a primeira. — Como pôde sumir sem dar explicações? Daphne deu um passo para trás com o berro de sua mãe. — Eu... — Foi interrompida antes que pudesse responder. — Tudo por causa de uma ameaça de casamento? — Mamãe não... — Novamente foi interrompida. — Você sabe que tenho os nervos sensíveis! — Ela disse chorosa aninhando-se nos braços do marido, Daphne se sentiu péssima. — Se não queria se casar bastava ter dito, filha. — Disse Phillip York. — Papai, eu tentei. — É, deveria ter ao menos nos dito, teríamos te ajudado a fugir.— Isso veio de Josephne, sua mãe deu um olhar fulminante para a filha mais nova. — O que disse? — Josephne coçou a cabeça e sorriu sem graça. — Nada. — Deu um passo para mais perto do marido, o conde de Haddington. — Quase nos matou a todos de preocupação, Daphne. — Disse Seraphne. — Afinal, onde você esteve? — Josephne concluiu, enquanto ela se mantinha dura e pálida diante da enxurrada de berros. — Eu deixei um bilhete. — Foi sua resposta débil. Marie York largou o marido e a puxou pelo braço colocando-a sentada no sofá. Daphne se sentiu no banco dos réus. — Comece a falar mocinha. — Ela disse, cruzando os braços e batendo com a ponta do pé no chão. Daphne passou a vista entre aquelas pessoas ali, todos esperando que ela começasse a falar, se sentiu mortificada por ter que dar aquela notícia daquela maneira. — E-eu... — Limpou a garganta. — Eu fui para Gretna Green me casar. Rapidamente todos os olhos se abriram como pratos, tomados pela surpresa. — Está me dizendo que está casada? — Perguntou sua mãe, pondo uma mão sobre o colo dos seios. — Sim. — Daphne falou com um sorriso amarelo, levantando a mão para exibir o anel de ouro escocês. Sentiu a mão pesar com os olhares sobre a joia. — Sei que vou me arrepender por perguntar isso, mas com quem se casou Daph? — Perguntou Seraphne e Daphne engoliu com dificuldade. Sabendo que o que diria a seguir surtiria os efeitos de uma bomba. — Com o duque de Northwest. — Sussurrou e um momento de silêncio veio antes de sua mãe cair desmaiada para trás. — Mamãe! — Gritou indo até a mulher estatelada no chão. Todas eles se abaixaram ao redor da matriarca caída, enquanto os policias e os três lordes assistiam a tudo como se a família fosse uma maluca peça teatral. — Marie acorde. — Phillip chamou, dando pequenos tapinhas no rosto da esposa, até perder a paciência e começar a chacoalha-la pelos ombros. — Acorde mulher! Imediatamente Marie acordou, procurando a filha com os olhos. Quando encontrou Daphne olhando para ela com preocupação, o rosto da mulher relaxou e um sorriso amoroso surgiu em sua boca. — Minha filha é uma duquesa! — Gritou cheia de orgulho, levantando e puxando Daphne em um abraço sufocante. — Eu sempre soube que você o amava. "Certo, a mulher enlouqueceu! " Daphne pensou. — Oh, estou tão feliz, minhas três meninas casadas e com nobres. — Continuou em tom meloso. — Phillip, mande trazer champanhe, devemos comemorar. Onde está o noivo? Daphne abriu e fechou a boca de maneira inútil, enquanto todos esperavam pela resposta. Uma resposta que nem ela mesma sabia.Olhou para as irmãs em busca de auxílio, e elas entenderam a súplica em seu olhar. — Por que não deixamos Daphne se refrescar antes do champanhe mamãe? Gretna Green é longe, deve estar exausta. — Disse Seraphne. — É, tem razão, enquanto isso mandarei preparar um jantar. — Marie disse indo em direção a cozinha, se virando uma última vez para olhar para as filhas cheia de orgulho, voltando a caminhar e murmurando: — Minhas três filhas...esposas de nobres..vou escrever para Gertrude, aquela megera nunca acreditou que eu conseguiria! — Agora que está tudo esclarecido, e a moça está bem, iremos embora. — Disse um policial, e Phillip acompanhou os homens até a saída. — O que acham de fumar um charuto ao ar livre? — Sugeriu Standhurt. — Isso não é antiético? — Indagou Haddington alheio a tentativa do amigo de dar privacidade para as mulheres. Standhurt o olhou como se ele fosse um asno. — Então vamos admirar o pôr do sol. — Dessa vez foi Ballister quem sugeriu, Haddington o olhou com o cenho franzido. — Da última vez que vi o céu estava fechado. — continuou o conde e Daphne segurou firme a vontade de rir. — Thomas querido, poderia acompanhar seus amigos até lá fora para nos dar um pouco de privacidade? — Perguntou Josephne amorosamente e o conde logo amoleceu ao ouvir a voz da esposa. A olhou com uma adoração que deixou as faces de Daphne coradas. — Se era isso que queriam deveriam ter dito logo. — Ele resmungou para os dois lordes quando os três começaram a se afastar pelo corredor. Quando ficaram sozinhas, e Daphne pôde respirar finalmente, desabou sobre o sofá pensando na pequena confusão que tinha criado. — Ele não está em Londres, não é? — Perguntou Josephne se sentando ao lado dela e rodeando Daphne com um braço. Daphne olhou no rosto da irmã, e aquele toque gentil, acompanhado de seu tom acalentador, foi tudo o que ela precisava para liberar a corrente de água que insistia em cair dos seus olhos. Aquele choro foi tão confuso quanto todo o resto, principalmente por ela não saber o motivo por estar chorando, entre soluços contou tudo para elas, ocultando apenas a parte do beijo. Elas a acalentavam como podiam, Sera de um lado afagando o cabelo dela, Jose do outro a abraçando pela cintura, e Sophie na frente, tocando nas mãos frias dela com as suas. — Eu sempre soube que Northwest escondia algo cabeludo. — Disse Sophie. — Acha que ele manterá esse acordo? — Inquiriu Seraphne, e Daphne deu de ombros, sinceramente não sabia o que esperar de Alec. — Me diga, Daph, vocês chegaram a...? — Perguntou Jose e as faces da duquesa ferveram. — Não foi exatamente uma consumação, mas digamos que foi o suficiente para eu estar mentalmente comprometida. — Jesus. — Disse ela pasma, levando uma mão ao rosto. — E é verdade que ele não usa nada por baixo do kilt? — Indagou Sera, e recebeu um tapinha de Sophie. — Seraphne! — Ora vamos, como se nenhuma de vocês não quisesse saber. — Disse a marquesa. — Não, ele não usa. — Daphne respondeu, compreendia suas irmãs, em outra época ela tinha a mesma curiosidade. — Jesus. — Dessa vez foi Sophie quem falou. Isso foi o suficiente para elas cairem na risada, deixando o clima triste para trás. Daphne se sentiu bem por estar entre elas novamente, suas irmãs curavam qualquer tristeza e espantavam suas preocupações e anseios para longe. — Está certa de que não sente nada por ele? — Perguntou Jose depois de um tempo, as três a olharam esperando a resposta preocupadas. — Sim. — "Mentira" o coração sussurrou. — Ótimo, porque homens como Northwest não se tornam celibatários da noite para o dia. — Disse Seraphne. — Não quero que se magoe quando ele aparecer com uma amante. As vísceras de Daphne deram um nó ao perceber que até o presente momento ela não tinha se dado conta deste detalhe. Seu coração encolheu no peito de um jeito sufocante e totalmente novo, provocando uma dor física inexplicável. Ela nunca tinha sentido emoção parecida com isso antes, e isso clareou as ideias dela para algo totalmente novo. Ela não podia suportar a idéia de outra mulher com Alec e isso foi completamente aterrorizante. xxx — Eu detesto aquela cadela! —Gritou Ashleigh irrompendo pela porta do escritório sem pedir licença. Alec levantou a vista do livro que estava encarando sem ler há mais de uma hora, e juntou as sobrancelhas ao ouvir a irmã ostentar um linguajar tão gentil. — E é por este motivo que eu não levo você para Londres. — Falou jogando o livro de lado, grato por ter qualquer motivo que pudesse distrair sua mente. — Não me culpe por ter maus modos, a culpa é sua que nunca contratou uma preceptora para mim. — Disse a mais nova andando de um lado para o outro do escritório. — A quem está se referindo? — Ele perguntou alheio a irritação dela, acendendo o terceiro charuto somente naquela manhã. — Acaso existe outra cadela em Kinlochleven? Óbvio que estou falando de Moira. — Disse e ele viu que ela estava realmente irritada pois não se mantinha quieta. — Desde que Daphne foi embora ela não para de tentar se aproximar de mim. A menção de tal nome fez o charuto amargar na boca do duque. Ele colocou o negócio de lado, e achou melhor se servir de uma dose de conhaque se o assunto a seguir fosse ser sua esposa. — Eles estão nos sondando, já sabem que lady Northwest não está aqui, o que fará Alec? Não posso me casar com Vikram. — Ela disse sentando em uma poltrona e segurando a cabeça com ambas as mãos. Alec andava se fazendo a mesma pergunta há três semanas. O que ele iria fazer? Pela primera vez em muito tempo não teve uma resposta na ponta da língua. Uma coisa era certa. Jamais iria permitir que arrastassem Ashleigh até um altar com aquele vara-pau sardento. — Daremos um jeito. — Foi sua reposta direta e ela o olhou sem confiança. — O único jeito é você ter um herdeiro, e aparentemente isso está tão próximo quanto a ida do homem à lua. Alec cerrou os olhos para a irmã. Já não bastava estar se sentindo tão frustrado. Na manhã que Daphne foi embora, juntamente com o recado em que pedia para que seus funcionários preparassem a casa para a chegada dela, mandou também uma carta adjacente, cobrando um favor que um velho amigo estava lhe devendo. Ele tinha instruções para segui-la de perto por toda a maldita Londres, e assim que descobrisse algo de importante deveria enviar imediatamente um bilhete para ele. Até o presente momento, duas semanas depois ele não tinha recebido resposta, e estava em agonia porque já não conseguia mais esperar. — Desde quando você apoia meu casamento? — Se existe alguém capaz de te aturar pela eternidade esse alguém deve ser a Daphne. — Ashleigh respondeu se pondo de pé. Ele sorriu, sabendo que a irmã tinha razão. Na manhã seguinte quando os dois tomavam o café da manhã na paz da sala amarela, Moira entrou ali usando roupas de montaria. A família da mãe dele morava em um casarão na parte leste da propriedade, o que permitia livre acesso ao castelo. A jovem tinha um sorriso gentil, e era muito bonita. Tinha o tipo físico da mulher que Alec estava acostumado a gostar. — Bom dia, meu lorde. — Ela disse fazendo uma reverência. — Bom dia Moira, nos acompanha na refeição? — Ele perguntou cortês, ignorando a cara de fúria que Ashleigh fez pra ele. — Ah, eu adoraria se não for um incômodo. — Disse Moira, sorrindo para ele. — Na verdade... — Ashleigh ia falar mas ele a interrompeu. — De modo algum, sente-se. — A garota puxou uma cadeira ao lado dele e sentou-se. Um criado logo tratou de servi-la. — Eu só vim para perguntar se Ashleigh gostaria de cavalgar, é a primeira vez em muito tempo que está fazendo um pouco de calor. — Talvez você devesse mesmo ir Ashleigh, passa muito tempo sozinha neste castelo. — Alec falou bebendo um gole do chá preto, a irmã deu um olhar fulminante para ele. — Devia vir também milorde, imagino que agora que sua esposa está em Londres, sobre muito tempo livre. — Disse Moira com um olhar sugestivo, que pegou Alec desprevenido. Há muito tempo ele não parava para conversar com Moira, cinco meses depois da morte dos seus pais ele foi para Londres, na época ela tinha em torno dos treze anos de idade, era uma menina. E depois ele só voltava até ali uma vez por ano e só ficava o suficiente para garantir que Ashleigh estava bem. Até este momento, Alec não tinha se dado conta de que Moira era uma mulher. Talvez Astrid tivesse razão, talvez Moira fosse uma esposa melhor para ele. Eles teríam uma relação baseada no interesse, como ele sempre desejou e isso ajudaria a acabar com a briga entre as duas famílias. Moira seria obviamente uma esposa obediente, jamais o responderia ou o rejeitaria, e o melhor de tudo, seria simples, tudo com Moira seria simples. Ele até conseguia imagina-los muitos anos no futuro. Dormiriam em quartos separados, fariam refeições juntas, e ele procuraria ela esporadicamente para o sexo quando tivesse vontade, eles manteriam uma rotina agradável e saudável para os dois e de uma maneira conformada seriam felizes. Mas no instante seguinte outra ideia de um futuro invadiu a mente dele, ofuscando completamente a anterior. Nesse futuro Alec corria pelos corredores do castelo atrás de pequenas criaturinhas com cabelos cacheados, espessos e loiros que davam gargalhadas por terem fugido do banho. Nesse futuro os dias quase nunca seriam previsíveis, a noite ele teria sempre uma nova fantasia para realizar e em todas as manhãs ele acordaria sentindo cheiro de orvalho, rosas e primavera. Aquele futuro era imensamente mais difícil, mas seu pai sempre dizia que nada do que vem facil vale a pena. E era aquilo que ele queria. Ele abriu a boca para responder Moira, mas foi atrapalhado pela entrada do mordomo. Ele carregava uma bandeja com um punhado de cartas e colocou na mesa ao lado do duque. Como fazia todos dias, Alec vasculhou envelope por envelope, atrás daquele que realmente e importava e festejou internamente quando encontrou o selo negro com um corvo e o "H". Rompeu o lacre com um puxão e tirou o papel preenchido até a metade, em letras repuxadas e na cor preta. No meio da leitura, Alec não percebeu que estava amassando o papel a ponto de quase rasga-lo. Furioso. Ele estava furioso. Maldita fosse Daphne York! Levantou da cadeira bruscamente, fazendo as moças olharem para ele assustadas. A princípio ele estava sem reação, meio paralisado, mas no instante depois deste ele já sabia o que fazer. Não ia esperar nem mais um maldito minuto, não ia ficar ali enquanto sua esposa arrastava seu nome na lama. — Arrume suas coisas Ashleigh, partiremos em uma hora. — Ordeu dando as costas, tremendo com fúria latente, andando a passos largos em direção ao seu quarto. — Espere, para onde vamos? — Perguntou a menina. Tentando ignorar a pontada sufocante em seu peito, o ciúme cego que o mastigava de dentro para fora, ele gritou para a irmã: — Para Londres. Capitulo onze — Eu realmente gostaria de não estar fazendo isso. — Thomas Stock falou, olhando de um lado para o outro da rua vazia. — Ficar reclamando não vai apressar muito as coisas. — Alec respondeu, sem tirar os olhos da enorme porta de mogno. Esperando pacientemente. Tinha chegado em Londres já era noite e só teve tempo de acomodar Ashleigh em um hotel antes de ir até a casa de Thomas para arrasta-lo e enfia-lo dentro dos seus assuntos. — Não entendo porque me quer aqui, minha dívida já foi paga com você, você me pediu para investiga-la e eu o fiz, e isso já me cobrou um custo altíssimo, se minha esposa descobre que eu me afiliei a um clube secreto de moças, ela vai me matar. — O conde disse aflito, e Alec notou que essa era a verdadeira preocupação de Thomas. Causar uma briga com Josephne. — Preciso de você e de sua filiação no clube para entrar. — Thomas bufou e andou impaciente de um lado para o outro da pequena sombra que os dois dividiam atrás de uma árvore. — Não seria mais fácil confronta-la sobre isso? — Sim, seria muito mais fácil. Mas Daphne não devia satisfações para Alec, devia? — Silêncio, alguém está saindo. — Alec sussurrou, e olhou para o relógio, que marcava pontualmente vinte e três horas. Os dois homens recuaram ainda mais para as sombras. A noite estava muito profunda, e a fachada da Northwest House deixava muito a desejar no quesito iluminação. Ele primeiro viu uma silhueta, estava coberta por camadas de vestido mas ele não precisava de muito para saber que aquela era Daphne. Seu tamanho minúsculo não deixava dúvidas. Ela desceu os degraus que levavam ao chão e finalmente entrou na pouca luz que irradiava de uma lamparina em um poste na rua. A respiração de Alec tornou-se rápida e densa. Sim, aquela era Daphne. Mas não se vestia como a Daphne. Devagar ele subiu os olhos por ela. O vestido que usava era luxuoso e elegante mas definitivamente não era modesto. Seus ombros estavam totalmente nus. O espartilho vermelho aveludado tinha detalhes pretos nas barbatanas, nas taças do sutiã e nas bordas. Era fechado na frente por um fio de seda negra que estava traçado em um padrão ousado. Os seios fartos estavam saltados para cima, como duas meia lua pálidas e aconchegantes. O vestido caía em camadas de tafetá preta e vermelha para baixo, com um laço de fita sedosa bem no fim da coluna dela. Os braços finos estavam cobertos por luvas de cetim negro que iam até os seus cotovelos. Em seu rosto, ela usava uma máscara de veludo vermelho e dourado que de um jeito habilidoso escondia metade do seu rosto pequeno, mas deixava seu queixo e lábios tingidos de vermelho à mostra. Aquela definitivamente, não era a Daphne. Ela olhou para os dois lados na rua e usou dois dedos para levar a boca e assobiar. Pouco depois uma pequena cabriole sendo puxada por um cavalo dobrou a rua, o condutor, um homem vestido totalmente de negro parou o veículo no acostamento e desceu para ajuda-la a subir. Por um momento, antes de sumir dentro do veículo, Alec teve a impressão de que ela olhou diretamente para ele. Mas devia ser somente coisa da sua cabeça pois logo depois ela já estava dentro da carruagem. O condutor voltou ao seu lugar e bateu as rédeas para tirá-los dali. Até agora tudo tinha sido como Thomas disse que ela faria, e por mais que já tivesse visto o suficiente para chegar a conclusão óbvia, ele desejava ver mais. Pois ainda demorava a acreditar que Daphne tinha realmente feito ele de imbecil. — Vamos, não quero correr o risco de perde-la de vista. — Ele disse, saindo das sombras e correndo para a esquina, onde seu próprio coche de aluguel esperava por ele. Thomas murmurou uma reclamação mas foi atrás do amigo mesmo assim. — Siga aquela carruagem de longe. — Ele disse para o condutor, impaciente, e inquieto pelo medo de perder Daphne de vista. O caminho até o centro de Londres não foi demorado, naquele horário, onde os inocentes estavam seguros no conforto de suas casas, não havia tráfego nenhum nas ruas a não ser uma ou duas carruagens distintas. Antes aquele lugar representava uma parte periférica de Londres, somente com o crescimento do Rough Diamond, um clube infame de jogatina para mulheres, a área passou a ser mais valorizada. Era um clube de luxo, onde não se podia entrar qualquer um, somente membros de maior poder da aristocracia e os que tinham condições de pagar um custo por sua filiação com o clube. Seu crescimento e fama tinha surgido de maneira repentina, e ninguém sabia quem eram os donos. A carruagem de Daphne parou na frente do clube e Alec bateu no teto do coche para que o condutor parasse em uma distância segura. Ele viu quando um homem de estatura mediana saiu de dentro do clube, trajando vestes igualmente negras e uma máscara de cetim escuro, e abriu a porta da carruagem para ajuda- la a descer. Ela sorriu para ele e aceitou a mão que ele ofereceu e se aproximou mais dele para cochicar algo. Alec sentia seus sapatos incendiando de vontade de correr até ali. Era óbvio que ela tinha um amante. Foi estúpido por não pensar nisso antes. Ele não fazia o tipo ciumento, há muito tempo tinha se desprendido de emoções temperamentais, por perceber que nada de bom resultava delas e poderia ter facilmente ignorado o fato de que ela tinha um amante, se o sentimento de rejeição em seu peito não o estivesse fazendo suas entranhas doerem de um jeito corrosivo. E o simples pensamento de que era por ter um amante que ela queria voltar para Londres com tanta urgência, o fazia tremer de um ciúme doentio e uma fúria descontrolada. Ela tinha um amante. Óbvio que ela tinha. Vinha com aquela conversa fiada de liberdade quando na verdade pretendia encher a cabeça dele de chifres. Para o inferno com isso, com ela e com esse mal nascido, se estava achando que ele ia permitir que tivesse uma vida liberal em Londres enquanto fica preso em um castelo cumprindo uma promessa ridícula de fidelidade. Ela sumiu para dentro do clube. E ele saltou da carruagem imediatamente para ir atrás dela. A entrada do clube era coberta por uma longa cortina de seda escura, que garantia a privacidade de quem chegava pela rua, e um segurança ficava na entrada distribuindo máscaras para os desprevenidos. Alec e Thomas pegaram uma e andaram para dentro. Alec sentiu como se tivesse passado por um portal que o tinha levado para um mundo paralelo. Ele passou a vista pelo lugar. O clube era todo projetado para entreter o público feminino, desde a decoração luxuosa, em acabamentos de renda e vermelho, até os sabores de bebidas, mais suaves e adocicados. As mulheres andavam por ali abertamente, usando vestidos de cortes e tecidos incomuns e fumando charuto. Podia-se ver claramente que não eram prostitutas, pois tinham a mesma leveza e elegância que exibiam quando estavam em salões de bailes e em reuniões da aristocracia. A grande maioria estavam em bandos, em mesas de apostas, partidas de bilhar e nas roletas com copos de brandy nas mãos, mas algumas estavam em companhia de homens. Alec sentiu muitos olhares em cima dele a medida que ia entrando, se sentiu exposto e agradeceu por ter escolhido usar calças aquela noite. As mulheres ali usavam máscaras de diferentes tipos, mas muitas usavam veludo vermelho e tinham os cabelos loiros recolhidos em um coque, ele levaria uma eternidade até que encontrasse Daphne de novo. Foi quando que ele sentiu. Por cima do cheiro de cigarro e das essências femininas, ele sentiu a primavera. Fechou os olhos e virou o rosto em uma direção e quando os abriu de novo, ela estava lá. Andando em direção aos fundos onde tinha uma porta dupla. — Voltarei em um segundo. — Ele disse para Thomas e atravessou o espaço apressado. Passou pela porta devagar, não desejando chamar atenção, e viu-se dentro de um corredor branco, que dava acesso a outros corredores, ele a viu bem a tempo de a barra vermelho do vestido dela dobrar à direita em outro corredor, novamente ele foi atrás, o mais silencioso que podia. O corredor dava para uma escada, que levava ao segundo andar, onde tinha diversas portas brancas. Ele sabia exatamente para que serviam aqueles quartos e sentiu seus punhos se fecharem e resistiu a vontade de sair socando todas elas ao imaginar Daphne usando um daqueles quartos com alguém. Mas não, curiosamente ela continuava andando mais para dentro do clube, até chegar a um corredor de acesso restrito, a testa de Alec vincou, ele estava cada vez mais curioso. Ficou escondido atrás da parede enquanto ela abria a porta com uma chave que tirou de dentro do decote e sumiu atrás da porta. Alec andou até lá, primeiro colocou o ouvido na madeira na tentativa de ouvir algo, como não ouviu nada, ele simplesmente girou a maçaneta e escancarou a porta, dando de frente para um escritório vazio. Ele deu três passos para dentro e passou a vista por ali, estava se perguntando onde Daphne tinha se enfiado quando algo gelado e pontudo encontrou sua nuca, não foi preciso ser um gênio para saber que era uma arma. — Sem movimentos bruscos ou eu atiro. — Sua esposa ameaçou, e mesmo com muita raiva ele sentiu vontade de sorrir. Pequena raposa, o traiu para uma armadilha e o pegou em sua própria caçada. ∞∞∞ Daphne estava descendo os degraus da Northwest House quando os pêlos de sua nuca arrepiaram-se, avisando para ela que alguém a observava. Ela não podia vê-lo, mas podia sentir seu olhar pesado em cima dela. Seus instintos ativaram-se imediatamente. Sentiu medo primeiramente. Estava sozinha e se não fosse rápido o bastante para pegar a arma que trazia na liga de sua meia, estaria perdida. Ela estava andando com a arma ali desde alguns dias atrás, quando notou estar sendo seguida pela primeira vez. Pensou no que iria fazer. Se corresse de volta para casa, teria o risco de ser apanhada antes mesmo que abrisse a porta, e se o seu perseguidor soubesse que ela já tinha dado conta de sua presença, ela poderia nunca saber quem era. Ela desatou um plano em sua cabeça e resolveu agir normalmente para saber até onde aquela pessoa iria, e o que ela queria. Antes de subir no veículo olhou para a escuridão apenas para confirmar qualquer dúvida. Estava acostumada com aquele tipo de perseguição, com o crescimento do clube ela tinha ganhado rivais. Rivais esses que dariam qualquer quantia para aquele que descobrisse a cabeça por trás de todo o sucesso repentino de um clube para mulheres. Ela ocasionalmente era seguida por jornalistas, sempre dava um jeito de enfiar-se na multidão de mulheres e sempre conseguia despista-los, mas daquela vez ela sentia em seus ossos que aquele não era um jornalista. Quando chegou no clube, agradeceu por Brooke estar ali e disfarçadamente inclinou-se para ele para dizer que estavam sendo observados. O chefe de segurança logo a levou para dentro e ajudou a começar o andamento para o seu plano. Seu perseguidor mascarado mordeu a isca com afinco e agora ela o tinha na mira de sua arma. — Me diga o que quer e por quê está me seguindo. — Ela disse para o homem que estava com as mãos para cima. Ele era alto, tinha cabelos castanhos e pernas longas e torneadas. — Não reajo muito bem a pressão, meu doce. — Ela ouviu a voz austera e o apelido enjoativo e por um momento pensou que sua mente estava lhe pregando peças. Não poderia ser ele, aquele homem na sua frente usava calças. – Vire-se. — Ela disse se afastando um passo para trás. Devagar o homem fez o que ela pediu. Ele usava uma máscara de visitante, veludo negro, o queixo quadrado estava teso e os olhos dourados, furiosos. — Alec? Ela estava atônita. — Não esperava por mim? — Ele perguntou, sem humor. O espanto de Daphne era tanto que a arma deslizou de sua mão e caiu no chão com um baque sólido. Brooke irrompeu pela porta bruscamente acompanhado de mais dois seguranças. O chefe de segurança olhou para Alec, que olhava para ele como se fosse um inseto indesejado em seu jantar. — Brooke, está tudo bem, deixe que eu cuido disso. — Ela disse, abaixando-se para pegar a arma do chão. Brooke trocou o olhar entre ela e Northwest. — Tem certeza milady? Estará segura? — Daphne teve certeza que ouviu um rosnado escapar do peito de Northwest. Soube que estaria tudo, menos segura. — Sim. — Olhou para o segurança. — Houve apenas um mal entendido. Brooke não muito à vontade com a ordem dela, olhou entre os dois uma última vez antes de sair fechando a porta atrás de si. Então ela olhou para o escocês parado no meio da sala. Ele ficava ainda mais alto usando aquela calça, e seu corpo musculoso parecia maior. Os nervos de Daphne gritavam pelas memórias, desejando senti-lo de novo. Ardentemente. Mas antes ela tinha questões, porque ele estava seguindo-a? — Há quanto tempo está em Londres? — Perguntou, tentando desmanchar aquela barreira ostensiva entre eles. Ele ignorou a pergunta dela. — Você devia se preocupar mais com sua imagem milady, não é mais uma mulher solteira, agora é uma duquesa. Minha duquesa. E eu não aceito ser conhecido como um chifrudo. — Olhava intensamente para ela, seus olhos a despindo de dentro para fora, a deixando pouco à vontade. Ela o olhou muito ofendida. Então era por isso que ele a estava seguindo? Tudo era uma questão de honra dele, afinal? — Não se preocupe, não estou sujando sua reputação, eu tenho uma máscara. – Ela disse apontando para o próprio rosto, ele soltou um riso petulante. — Uma máscara? Você tem uma máscara? Isso não te protege de nada, assim que pus os olhos em você eu te reconheci. Vestida desse jeito, como uma...uma... — Ele desceu os olhos pelo corpo dela várias vezes com um desprezo que Daphne nunca tinha visto ali antes. — Como uma mulher livre? Porque é isso que eu sou. — Ela rosnou de volta. — Lembra-se por acaso? Cada um deveria seguir o seu rumo. O que você veio fazer em Londres? — Sua liberdade deixa de ter validação quando suas ações prejudicam o meu nome. — Ele a ignorou novamente. — O que você faria se começasse a sair por aí o boato de que eu andei me divertindo em bordéis? Daphne sentiu suas orelhas pegarem fogo. Esse pensamento fazia a garganta dela fechar e seu peito arder até deixa-la sufocada. Aquilo era tão absurdo, desde que tinha percebido que sentia ciúmes de Northwest, não parou nunca mais. Era simplesmente mais forte do que ela. Uma raiva descontrolada circulava por seu sangue como veneno em suas veias. Mesmo sabendo que ela não tinha direito nenhum de sentir nada do tipo. — O que eu teria haver com isso? Não somos marido e mulher, o desfecho de um casamento de conveniência é esse, eventualmente, as duas partes vão pular a cerca. Ela observou com assombro enquanto o rosto dele se tornava vermelho vivo e ele crescia em fúria. — Só sob o meu cadáver. — Ele falou e no instante seguinte estava em cima dela, a agarrando pelo braço e a puxando para a saída. — Solte-me, seu escocês burro e teimoso! — Daphne gritou firmando os pés no chão e puxando o braço do aperto, fazendo com que ele apenas aproximasse ainda mais corpos dos dois. Alec olhou para ela, e naquele momento de fúria ele esteve mais parecido com um anjo maligno do que nunca. Sua boca fina formando um traço rude, seu maxilar quadrado e saliente retesado, com o amarelo de seus olhos flamejando como as brasas de uma fogueira e aquela máscara que o deixava imensamente atraente. A esquentando por dentro. — Deixe de tanta imaturidade Daphne, você é minha esposa e vai começar a agir como tal. — Disse e sua voz trovejou ao redor dela, a fazendo estremecer. — Não me chame de esposa, não sou sua esposa! — Gritou tão enfurecida quanto ele. Muito insensatamente ela acertou um tapa em seu peito firme, e ele a olhou desafiado, soltando um rosnado baixo de aviso, para ela não era o suficiente, ela queria vê-lo explodir, acertou outro, desta vez mais forte e ele grunhiu chegando ao limite de sua paciência e a empurrando de encontro a mesa para cobri-la com o volume do seu corpo. Ele pairou sobre ela como uma nuvem de calor, e com um único movimento brusco ergueu a perna direita dela prendendo-a na altura de seu quadril. Sua mão puxou um punhado de tecido do vestido para cima, revelando a perna branca e lisa coberta pela meia translúcida, ainda olhando fixamente nos olhos dela, Alec levou os dedos até a liga da meia e puxou a elástico para cima, soltando-o e fazendo com que batesse na pele dela com força, causando uma ardência na pele macia. Daphne sentia seu coração traidor chamando furiosamente por ele, mas seu cérebro a fazia permanecer parada. Ele prosseguiu subindo a mão pela parte interna da coxa dela, traçando circulos pela pele, cada vez mais próximo do destino final, ela ainda usava sua calcinha, mas mesmo assim, ele foi diretamente no lugar que pulsava descontroladamente de antecipação, e a ponta do seu dedo pressionou o botão de carne inchado. Daphne mordeu o lábio inferior e desejou que seu cérebro fosse forte o suficiente para ajuda-la a fazer alguma coisa, até pensou em se mover, mas o único que conseguiu fazer foi se segurar nos braços dele. Tão forte e masculino. Ela olhou para cima, desejando que ele a beijasse novamente, mas ele não o fez, permaneceu a olhando de maneira fria. — O que você faz nesse lugar? — Ele perguntou, sua voz saiu baixa e ardilosa. E ele aumentou a pressão dos dedos, fazendo um movimento circular. A mente inebriada de Daphne a fez ver por um momento o absurdo daquela situação. Ela estava sentada de pernas abertas na mesa de um clube de jogatina, sendo acariciada de um jeito muito, muito, depravado pelo marido, bem em cima das cabeças de dezenas de pessoas. — Me responde. — Ele ordenou, afastando os dedos do ponto de prazer dela e apertando o pequeno sexo com brutalidade, a fazendo escorrer de uma tensão deliciosa. Daphne queria responder, sim, faria qualquer para ele não se afastar dela nunca mais, mas não podia. Não por enquanto. Alec ainda não era confiável, não para ela. — Eu não posso. — Falou com a respiração entrecortada e ele parou imediatamente. Se empertigou. Tirando sua mão dela. A deixando carente e molhada. — Maldita seja Daphne, Maldita seja. — Ele disse raivoso, se afastando dela.— Vamos embora, agora. Ela odiou o comando, desejou replicar, mas compreendeu que ele estava irritado. Em seu lugar também estaria. Mas Alec não era um santo, também escondia segredos, e se ela não era confiável o suficiente para ser sua confidente. Ele também não seria confiável para mais nada. ∞∞∞ Em uma situação normal, Alec teria feito pouco caso das suas emoções, teria dito uma piada infame, e teria rido, provocando-a. Como sempre fazia quando Daphne declarava seu ódio público para com ele, mas naquele momento ele não se sentiu tão forte para aquilo. Não conseguiu camuflar suas emoções e pela primeira vez em dez anos não queria. Uma parte dele acendeu de felicidade ao vê-la depois de tantos dias longe, ele teria a puxado para um beijo se não estivesse tão possesso de raiva consigo mesmo por perceber que era um tolo por estar feliz em vê-la mesmo sabendo que ela estava ali possivelmente com seu amante. Anos de esforço por permanecer intacto a sentimentos inúteis, para no fim de tudo estar perseguindo uma mulher que preferia outro em seu lugar. E ele desejou machuca-la, e ao mesmo tempo desejou se inundar dentro dela. Certo que não era culpa dela que ele se sentisse tão traído, Alec realmente acreditou pelo pouco tempo que eles estiveram na Escócia, que ele e Daphne poderiam ser mais. Há muitos anos atrás ele desejou uma família, chegou muito perto de ter uma, mas ganhou uma bela rasteira da vida. E agora, aos trinta e três anos, mesmo tentando se convencer do contrário, ele ainda desejava uma família. Ficou feliz por seus amigos, quando os assistiu um a um se casando com mulheres que os amavam e criando suas próprias famílias, mas não era um sentimento muito feliz o de inveja. Ele desejava isso, e desejava tanto que não poderia mais esperar. Ele tinha um casamento, complicado, mas tinha, talvez Daphne nunca chegasse a ama-lo um dia, mas eles poderiam se dar bem. Ela era engraçada, e bonita, e ele tinha a certeza de que nunca se sentiria entediado com ela. Deus era testemunha de que ele tentou evitar aquilo. Mas já que estava feito, iria aproveitar a situação a sua maneira, e maldita fosse ela se achava que ele iria desistir tão fácil por uma ameaça de um clube. Alec estava muito dividido com relação a tudo. Todas setas indicavam que ela tinha um amante, mas quando ele a tocou, ela se entregou tão facilmente para ele. Alec sabia ler uma mulher como ninguém e era óbvio o quanto Daphne estava carente por ele, se ela tivesse mesmo um homem ele não estava fazendo seu trabalho direito. Mas um amante seria uma resolução simples demais, e Alec sentia que algo de maior acontecia ali, e ele ia descobrir, pela boca dela, ou não. Depois de ir buscar Ashleigh no hotel onde ele tinha deixado-a e de se despedir de Thomas, ele regressou para casa com todos os seus planos muito bem articulados. Ele sabia que provavelmente Daphne iria odia-lo, mas bom, segundo ela, ela já odeia. Um pouco mais de ódio iria ajudar a apimentar a relação. Ele entrou no aposento ducal que já estava preparado para ele, e abriu a porta de ligação sem se importar em bater. Daphne estava de pé perto do espelho, usava uma camisola de algodão longa, dessa vez não era mais aquela mortalha horrorosa, agora era seda e cambraia e estava com os cabelos soltos caindo pelas suas costas. Alec se sentiu um pouco abalado, aquela era uma visão que jamais esperou ver. Os olhos azuis acinzentados dela o olharam com rancor. — Temos que conversar. — Ele disse, indo tranquilamente até a cama e se sentando na beirada do colchão alto. — Você se recusa a me contar o que vai fazer naquele clube... Ela o interrompeu. — Pare de agir como se não tivesse seus segredos. — Acusou, apontando uma escova de cabelo na direção dele. Alec se colocou em alerta, não sabia mais o que esperar da sua pequena Afrodite, mas sabia que devia estar cauteloso, ele tinha estado na mira de uma arma mais cedo naquela noite. — Todos temos segredos, uns apenas escondem melhor do que outros. — Ele disse com um sorriso de lado, e ela bufou. — Não pode me exigir nada. — Disse cruzando os braços frente aos seios. — Na verdade eu acabei de descobrir que posso sim. — Alec falou com um sorriso cínico, que sabia que a deixaria raivosa. — Exercendo meu direito de marido, estou definitivamente proibindo você de pôr os pés no Rough Diamond. Ela o olhou bem pasma. — Você não pode fazer isso. — disse, aturdida. — Eu posso e estou fazendo. — Disse Alec, observando como aquele quarto estava cheio de coisas dela. — Se continuar indo para aquele clube será descoberta e não posso arriscar que afunde a todos nós. — Nunca me descobriram em quatro anos, porque fariam agora? — Ela explodiu, sem perceber que tinha soltado uma preciosidade. Então ela já frequentava o clube há quatro anos? Isso era curioso, porque pelos rumores que circulavam por aí, o clube só ganhou notoriedade há cerca de dois anos. — Isso foi porque não procuraram da maneira certa. Você saiu pela porta da frente da minha casa, não acha que qualquer um que veja isso não chegará a conclusão óbvia? — Não suspeitarão de nada, pois não será a primeira mulher vestida indiscretamente saindo da sua casa altas horas da noite. — Ela disparou e ele adorou o tom ciumento. — Mas agora não posso mais me dar ao luxo, meu coração. — Alec andou para mais próximo dela. — Trouxe Ashleigh comigo, ela já está na idade de debutar e sinceramente adiei isso por tempo demais. Qualquer atitude indecorosa de nossa parte poderia arruinar a reputação dela. Ele ficou parado enquanto observava a cabeça dela matutando. Alec quase podia ouvir as engrenagens funcionado. Se Daphne se importasse um pouco com a cunhada faria aquilo por ela e ele sabia disso e não se sentia nenhum pouco arrependido por usar a irmã em seus propósitos, estava apenas unindo o útil ao agradável. — E como pretende debuta-la tão em cima da hora? — Ela indagou. — Você fará isso. — Ele disse, e Daphne arregalou os olhos. — Eu? — Sim, e também daremos um baile. — Ele respondeu, como se tudo fosse tão simples. — Um baile? — Ela estava um pouco perplexa. — Sim, um baile. — Ele tocou no queixo dela, para fechar a boca que estava aberta de susto. — E será o maior dessa temporada, porque será quando faremos nossa primeira aparição como um casal, lorde e lady de Northwest. Soa muito gostoso, não acha? Daphne piscou várias vezes, e quando se recuperou de sua pequena síncope começou a ficar com as orelhas em fogo puro. — Mas isso não está certo, fizemos um acordo, isso é o oposto do que me prometeu. — Falou e ele deu um passo para trás ao ver a aura mortífera emanando dela. — E talvez este seja o problema meu doce, teve liberdade demais para uma mulher, se seu pai não conseguiu lhe por freios, eu conseguirei. — Ele respondeu, andando em direção ao seu quarto ao ter a certeza que Daphne cometeria um mariticídio. — Isso é jogo sujo! — Ela arremessou a escova na direção dele, e Alec teve tempo apenas de correr e fechar a porta. A madeira recebeu a pancada. — É a única maneira que sei jogar! — Gritou do outro lado com um sorriso satisfeito. Capitulo doze Daphne colocou de lado o jornal que lia e bebeu um gole do seu chá. Alec tinha sido visto saindo com uma mascarada misteriosa do clube na noite passada e aquilo poderia ser um problema. Havia um motivo para ela nunca ter revelado sua identidade no clube, a única razão para todas aquelas mulheres frequentarem o Rough Diamond era por acharem que a dona era apenas uma burguesa qualquer, se as pessoas soubessem que ela, Daphne York, era a portadora de todos os seus segredos mais secretos, parariam de frequentar o clube imediatamente. Aquilo seria a ruína dela. E seria muito fácil agora que era casada com Northwest associaren o nome dela ao dele. Isso poderia acabar gerando o maior escândalo de toda a cristandade. Ela olhou para a jovem de cabelos castanhos ao seu lado na mesa. Não entendia onde Alec estava com a cabeça quando decidiu debutar Ashleigh bem no meio da temporada social. A garota precisaria de meses de antecedência para ser treinada, do contrário apenas seria o motivo de risadas e piadas insolentes nos salões de baile. Daphne mesmo não poderia ajudar a cunhada em nada, os conhecimentos dela sobre etiqueta eram equivalentes a nada. Foi a pior aluna de Sophie, e não sabe sequer montar em um sela de amazona. Tudo o que entende sobre regras, era como quebra-las. Porém, ela era uma mulher, e tinha o entendimento básico da moda para saber o que precisava ser mudado com urgência. Como o seu corte de cabelo, que era muito liso e muito reto e suas vestimentas rústicas demais para uma dama, e sua postura envergada. O resto ela poderia pedir a ajuda de suas irmãs e Sophie. — O que acha de conhecer um pouco de Londres hoje? — Perguntou amistosa e Ashleigh a olhou cheia de excitação. — Seria ótimo, sempre quis conhecer a famosa Catedral de St. George, foi onde mamãe e papai se conheceram. — Daphne se surpreendeu, era a primera vez que ouvia falar nos pais de seu marido como um casal. Foi inevitável não se sentir curiosa. — Eles estavam em alguma cerimônia de casamento? — Perguntou, a menina deu um breve sorriso. — Não, mamãe era freira e estava em uma visita na igreja, papai estava prometido em casamento ao uma jovem, mas segundo eles foi amor a primeira vista. — O queixo de Daphne foi ao chão. Uma freira? Santo Deus, não era atoa que o marido fosse tão tentador, era fruto de um pecado. — Como eles se chamavam? — Perguntou e a menina suspirou pesadamente, acompanhado de um olhar triste. — Atena e John. — Disse fitando o líquido em sua xícara. Naquele momento, naquele leve toque de saudade na sua voz, Daphne soube que Atena e John Lancaster foram excelentes pais. Desejou saber mais, desejou descobrir sobre a infância de Alec, e como era sua relação com seu pai, saber mais profundamente sobre as causas que fizeram John Lancaster a obrigar o seu filho a se casar, saber o que os levou a morte, mas era demais e ela não queria estragar aquela manhã com tristezas. — Depois que passarmos pela St. George, iremos até o ateliê do modista Gianny, precisamos providenciar vestidos novos para você. — Falou e a cunhada fez uma careta engraçada. — Roupas de baile, de montaria, camisolas, vestido de debute, roupas do dia-a-dia e tudo a que uma debutante tem direito. — Vamos empobrecer meu irmão. — Daphne abriu um sorriso maligno. Ele bem que merecia por tê-la proibido de ir ao Rough Diamond. Como se fosse invocado, o homem apareceu na porta dando o ar da sua graça, tinha os cabelos molhados caidos para trás, usava novamente seu kilt costumeiro, com um colete de camurça na cor negra por cima de uma camisa branca enfiada para dentro do kilt. — Bom dia. — Disse com um sorriso sedutor, indo até a mesa, Daphne não olhou em sua direção, ainda estava irritada demais sobre ontem. Tommy, que estava dormindo aos pés dela levantou imediatamente ao ouvir a voz do duque. O porco correu saltitante até Alec e enroscou-se na perna dela. — Vejo que pelo menos alguém está feliz em me ver. — Ele disse abaixando-se para acariciar o porco. — Olá, presunto. O porquinho roncou em resposta e Daphne o olhou de olhos cerrados "pequeno traidor." Levantou da mesa. — Se já tiver acabado, poderemos ir. — Falou para Ashleigh. — Para onde vão? — Alec inquiriu, esquecendo-se do porco para olhar pata ela. — Daphne vai me levar para comprar vestidos. — Ashleigh respondeu e ele assentiu uma vez. Aliviado. Elas pegaram os guarda-sóis e foram para a porta com Alec as acompanhando, muito próximo de Daphne, pois ela podia sentir o calor de seu corpo irradiar por toda a pele das suas costas. Antes de entrar na carruagem ele a segurou pelo braço. — Lembre-se de minha ordem, doce esposa, se me desobedecer, eu ficarei sabendo e não serei benevolente no meu castigo. — Ele murmurou no ouvido dela, fazendo os pêlos de sua nuca arrepiarem, sua mão bateu levemente no traseiro dela. — Ei! — Exclamou ultrajada, e ele piscou um olho com um de seus sorrisos cínicos. — Apenas para não se esquecer de mim. — Disse em tom coquete, dando permissão para o cocheiro ir, antes que ela tivesse tempo de responder sua petulância. ∞∞∞ Alec ficou parado na calçada observando a carruagem se afastar e virou-se para voltar para casa quando uma voz o interceptou. — Tenho a impressão de que tem alguém tentando se esquivar da gente. — Ele amaldiçoou as sete gerações do rei ao ouvir a voz irritante de Christopher bem atrás dele. Bebeu o último gole do seu copo de paciência e se virou para encarar os três idiotas que olhavam para ele com sorrisos irritantes nas caras. — Não é sua esposa? Ela que tem essa mania de fugir de você. — Replicou com uma sobrancelha arqueada e Christopher cerrou a mandíbula. Ele sempre teve uma facilidade muito grande de irritar seus amigos, no inicio, usava o sarcasmo como uma maneira de camuflar sua própria vergonha, mas com os anos, passou a ser parte da sua identidade, bastava tocar no ponto fraco de cada um, e o de Christopher era sua esposa, Sophie. — Não venha de rodeios, fizemos uma aposta, e você perdeu, agora nos deve cento e cinqüenta libras. — Disse Sebastian, e os outros dois assentiram. Na verdade Alec estava se preparando para esse momento há muitos dias, em sua cabeça ele já tinha revivido-o várias e várias vezes e estava além de satisfeito por ter chegado. Abriu um sorriso maligno, que fez a excitação se esvair dos olhos deles. Virou-se e andou em direção a casa. — Muito bem, se vamos falar de dívidas, vocês também estão me devendo. — Os lordes de um por um se entreolharam e seguiram o escocês. — Não estamos lhe devendo nada. — Disse Thomas, receoso. — Estamos? Quando já estava dentro da casa, Alec se virou novamente para eles e balançou-se sobre os pés de excitação. — Se não fosse por mim, nenhum de vocês teriam feito às pazes com suas esposas. — Os três homens ficaram olhando para ele como três idiotas. Christopher abriu a boca em uma risada. — Você está delirando, deve ser os efeitos de estar casado com Daphne York. — Disse e Alec percebeu que aquele momento não seria nada como havia idealizado, não, seria muito melhor. — Deixem-me recapitular. — Falou adquirindo um tom triunfal. — Se não fosse por mim, cortejando Sophie, você não teria explodido de ciúmes, e consequentemente, não teria agido imediatamente para reconquistar sua esposa. Christopher piscou duas vezes, atordoado. Possivelmente recordando do fatídico dia. — E você Sebastian, se eu não tivesse insistido em colocar juízo na sua cabeça naquela noite de baralho na casa de Thomas, você não teria voltado para o castelo Cartland, onde sua esposa estava abandonada por você. — O marquês abriu a boca para refuta-lo e logo a fechou, ao ver que ele tinha razão. — E quanto a mim? Em que me ajudou a recuperar Josephne? — Indagou Thomas. — Simples, se eu não tivesse te chamado para cavalgar no Hyde Park comigo, você nunca teria encontrado seu filho, portanto, não teria reencontrado Josephne. Ela teria feito seu trabalho para Legrand e teria voltado para Paris. — Respondeu e os três ficaram mudos. Enquanto eles o olhavam embasbacados, Alec acendeu um charuto calmamente, e sentou-se em uma poltrona na sala de visitas, cruzou as pernas, respirou fundo, apreciando daquele sabor doce. — Eu teria ido atrás dela. — Disse Thomas, firme e Alec não duvidou disso nem por um momento. — Mas nunca saberemos como teria sido não é? Então, creio eu, que isso nos deixa quites. — Falou depois de soltar uma grande quantidade de fumaça no ar. — Você é um desgraçado. — Disse Christopher se servindo de uma dose de uísque. — Eu sei. — Respondeu ele, muito orgulhoso. — Você pode até estar um pouco certo nesse quesito, mas sabe que nós tínhamos razão. — Disse Sebastian. — Sobre o que? — Alec questionou com o charuto entre os dentes. — Sobre estar apaixonado por nossa cunhada. — Foi Thomas quem respondeu. — Nós acertamos e você sabe disso. Sim, no fundo Alec sabia, mas nada iria estragar o prazer daquele momento. — O único que me deixa feliz é saber que ela não vai facilitar nenhum pouco para você. — Disse Christopher, Alec ergueu as sobrancelhas de modo desafiador. — Como pode ter tanta certeza disso? — Por que ela é igual a você. — Foi sua resposta sutil e Alec anuiu, sabendo que ele tinha razão. — E não vamos esquecer que ela sempre abominou você. — Disse Thomas. — A diferença meus queridos amigos, é que não sou como vocês, sei como conquistar uma mulher, e não é pondo ela para fora de casa, ou armando uma armadilha para leva- la ao altar, ou engravidando-a e se casando com outra. — Todos eles o fulminaram com os olhos. — Pelo que vejo mudou de ideia sobre não gostar dela fisicamente. — Disse Sebastian, e Alec ficou em silêncio. Não iria falar das qualidades físicas de sua esposa. Mas a verdade era que desde que viu o corpo cheio de curvas nu e molhado na primeira noite dos dois em Stirling, todas as outras mulheres foram arrastadas para uma masmorra nos confins da mente dele e tudo o que pensava era Daphne. Ela era sua meta. Fogosa, respondia ao toque dele de uma maneira desesperada, e ele não via a hora de leva-la para a cama. Mas Daphne era tão autossuficiente, nada conseguia intímida-la, e Alec sentia uma necessidade pavorosa de fazer parte dela de alguma maneira. De estar dentro dela da maneira mais crua. Mas não faria isso, não enquanto os sentimentos dela ainda fossem tão frios. — Acaso ela sabe sobre Bridget? — Perguntou Christopher e rapidamente o prazer que Alec sentia, se foi. Não, ela não sabia sobre Bridget, e ele esperava que continuasse assim. Não suportaria, não suportaria que Daphne o olhasse com olhos de pena. Os mesmo olhos que o acompanharam durante anos. Preferia receber o ódio descarado de sua esposa, do que aquilo. — Isso não será necessário. — Ele disse, e viu que não somente o duque, como o conde e o marquês também discordavam dele. Mas sabiam que Alec não gostava daquele assunto, então ficaram em silêncio. Um barulhento e tangível silêncio. ∞∞∞ — Isso me doe os dentes. — Disse Ashleigh ao colocar uma quantidade grande de sorvete na boca. Daphne riu da cunhada inexperiente tentando engolir a sobremesa gelada. — Deve comer em pequenas quantidades, assim. — Tirou um pouco com a colher do seu próprio sorvete de sabor de limão e levou à boca. O azedo e o doce festejaram em sua língua. Elas tinham ido até a St.George para colocar um donativo na caixinha que ia para a caridade e no caminho para o ateliê tinham parado em uma sorveteria. Ashleigh estava resplandecente com tudo, era a primeira vez que via algo além de Kinlochleven e Daphne estava feliz por proporcionar aquilo para a cunhada. Ashleigh ficou nitidamente desconfortável quando chegaram ao ateliê para tirar as medidas de roupas. A menina ficava quase sempre muito próxima dela, e não tinha aquela excitação de uma garota de dezessete anos ao comprar roupas novas. Daphne por exemplo, adorava vestidos e se pudesse teria um para cada dia, e era absurdo que Ashleigh não se sentisse assim. Era estranho vê-la tão intimidada, observando um grupo de meninas ali próximo. Daphne logo entendeu que a cunhada provavelmente nunca tinha convivido com muitas ladys antes dela, ou pelo menos tido uma amiga com que fazer aquelas coisas. — Então...— falou para puxar um assunto. —O que você entende sobre etiqueta? Ela deu de ombros, um gesto que Daphne adorava muito mais sabia que deveria ser cortado. — O mesmo que você aparentemente. — Respondeu passando as mãos por um punhado de seda verde perolada. A cor combinava com a pele dela. — Bom, seu pai e seu irmão são duques, eles certamente devem ter contratado uma preceptora para você quando mais jovem. — Quando meus pais morreram eu tinha apenas doze anos, e Alec não estava muito preparado para se tornar pai. — Disse despreocupada. — Sem falar que nunca me interessei, sempre achei que essas regras só eram úteis a quem vive para o intuito de conseguir um marido. Daphne sorriu orgulhosa, aquela era exatamente a maneira como ela pensava cinco anos atrás. — O que você gostava de fazer em Stirling? — Perguntou e um brilho surgiu no rosto da menina. — Bom, quando Alec ainda morava lá, costumávamos caçar, lutar de espadas, praticar o arco e flecha. — Enumerou excitada. — pescavamos no lago, e sempre apostavamos corrida. Ele sempre me deixava ganhar. — Pois veja, praticar a etiqueta é semelhante a fazer todas essas atividades. — Daphne disse e ela ergueu as sobracelhas interessada. — É? — Daphne assentiu. — Sim, dançar uma valsa por exemplo, exige a mesma maestria que uma luta de espadas. — Posso atravessar a meu oponente no meio? — Ashleigh perguntou e Daphne riu. — Não, mas se for do tipo irritante, pode lhe dar uns pisões no pé, já fiz isso várias vezes. — Confessou com uma mão na boca e Ashleigh abriu uma risada gostosa de ouvir. Algumas mulheres que estavam ali deram olhares discriminadores para elas. — Mesmo assim não sei se me sairia bem, não sou tão delicada quanto elas. — Disse apontando para o grupo de moças, que olhavam para elas de soslaio. — Me tome como exemplo, sou a maior cometedora de gafes em bailes e mesmo assim, estou casada com um duque. — Disse e Ashleigh olhou para ela de um jeito diferente. — Gosta de você, sabe não é? — Um vinco se formou entre as sobrancelhas de Daphne. — Meu irmão, gosta de você. Daphne tentou não transparecer que seu coração batia ensandecido no peito, tinha medo de piscar e deixar escapar algo pelo qual iria se arrepender, então ficou imóvel como uma estátua. — Mamãe ficaria feliz em ver que ele escolheu bem a mulher que leva o anel dela. — O impacto daquilo atingiu Daphne em cheio e a fez ficar momentaneamente sem ar. Seus olhos foram para o anel. — O que disse? — Perguntou com a voz fraca. — Você não sabia? — Ashleigh sorriu de lado. — Foi o anel que meu pai deu a ela no dia do noivado dos dois, ele disse que era para ela se recordar dos olhos dele sempre que o visse. — Suspirou dando uma pausa. — É um diamante amarelo, eles são muito raros, e na nossa crença significam o amor puro e a lealdade. Santo Deus! Aquilo era de valor inestimável, não somente monetário, mas sentimental. Muito mais sentimental. Droga Alec! Rapidamente um sentimento novo se apossou do coração de Daphne, algo parecido com saudade, e carinho e ela se sentiu privilegiada. Agora, sempre que olhasse para aquele anel, recordaria de olhos cor de âmbar, enevoados de paixão. Depois de saírem do ateliê, ela decidiu levar Ashleigh até a casa dos seus pais. Sua mãe sempre tinha cortado o seu cabelo e o de suas irmãs quando eram mais jovens, e o de Ashleigh gritava por socorro nas pontas ressecadas. Ela entrou na casa quentinha e o cheiro de biscoitos polvilhados chegou até ela. Elas andaram pela sala vazia e atravessaram o longo corredor que levava até o terreno dos fundos. Uma criança passou correndo por Daphne, e ela logo reconheceu os cabelos dourados de Liliana. A menina adentrou a casa rindo e logo depois Reymond surgiu, indo atrás dela. — Oi tia Daph. — Disse o rapazinho sem parar de correr atrás da prima. Rindo, Daphne saiu pela porta e viu toda a família reunida ali. Josephne pintava um ramo de flores que crescia na sebe, Seraphne lia um livro deitada sobre a grama, e seu pai jogava críquete com sua mãe. — Então estão se divertindo sem mim. — Falou em tom acusador, se abaixando para pegar o livro das mãos de Sera. — Se eu fosse você dava meia volta e fugia. — Disse Josephne, e antes que Daphne especulasse o por quê, uma terceira silhueta que até então ela não tinha notado, surgiu em seu campo de visão. Exibindo um corpo escultural, do qual ela definitivamente não lembrava, uma cabeleira loira de tirar o fôlego, e um sorriso de derreter geleiras, estava Phineas ao lado de seu pai. Os olhos do homem encontraram ela, e ele deixou Phillip lá para andar até ela. Daphne ainda atordoada, permaneceu parada como uma estátua de boca aberta. Pensando em que momento nos últimos cinco anos, Phineas deixou de ser feioso, e se transformou...naquilo. — Senhorita Daphne, é um prazer revê-la. — Disse de modo acanhado. Seus olhos azuis eram simpáticos e transmitiam sinceridade. — É lady Lancaster agora. — Ela corrigiu, porque sentia que devia dizer alguma coisa e a única que conseguiu foi aquela. — Sim, claro. — Ele falou. — Cheguei essa manhã de Nova York, seu pai me contou sobre seu recém arranjo, fico feliz por você. — Ele disse e ela assentiu uma vez. — Seu pai ofereceu a casa para que eu ficasse por uns dias antes de voltar para Nova York, espero que não seja um problema. — De modo algum, espero que possa aproveitar a temporada social. — Ela disse e seu pai gritou ao longe, chamando-o Phineas para jogar sua partida. — Bom, é minha vez, nos vemos outra hora. — Ele disse e lançando outro sorriso para ela, se foi. Daphne continuou ali, torpe, olhando suas costas largas se afastando. — Esta muito diferente não é? — Disse Seraphne surgindo ao lado dela. — Parece que foi substituído. — Ela falou, e lembrou-se que sua cunhada estava ali observando tudo. Voltou-se para ela. — Irmãs, essa é Ashleigh, irmã de Northwest. Ash, essa é Seraphne, e Josephne. — As irmãs sorriram para a menina. — Que nomes engraçados. — Disse a escocesa. — Ashleigh também não é o mais comum dos nomes. — Sera observou. — Ashleigh vai debutar essa temporada e em está em nossas mãos a responsabilidade de guia-la. — Daphne anunciou, e as irmãs quase riram. — Tirando o enorme fato de que não somos nem de longe exemplos de bons modos, está muito em cima da temporada social, jamais poderiamos prepara-la a tempo. — Disse Josephne, voltando para o seu quadro. — Por isso, teremos que agir com rapidez. — Daphne disse, ignorando o pessimismo da irmã. — Alec dará um baile em duas semanas para apresentá-la. — Mas ele estará jogando ela para os lobos. — Josephne disse o óbvio, Daphne sabia que sim, e era por isso que não podia deixar Ashleigh por si só. Não queria que a menina sofresse como ela e suas irmãs tinham sofrido ao chegarem ali. — Sophie vai adorar saber disso, não tem um desafio como este desde que nós éramos suas alunas. — Disse Seraphne com um sorriso. Daphne gemeu de dor ao ver sua mãe se aproximando. No último mês desde sua volta para Londres sua mãe não parava de perguntar sobre Alec, e sobre suas bodas. Daphne sabia que deveria ter dito a verdade logo no início, que seu casamento era de conveniência, mas se sentiu envergonhada, suas irmãs tinham casamentos felizes e ela não queria dizer para sua mãe que o seu era uma completa mentira, então disse que Alec estava resolvendo coisas na Escócia e que ela tinha vindo na frente para organizar a Northwest House para ele. Agora que sua mãe sabia que ele estava ali, não demoraria até que aparecesse para exigir um jantar, já que não tinha tido a oportunidade de ver o casamento de Daphne. — Daph, minha doce Daph, está tudo bem — Disse Marie York, pegando a filha confusa e a puxando para um abraço. — Aquele homem vil, como ele pôde fazer isso com você? — Do que está falando mamãe? — Daphne perguntou tentando escapar do abraço sufocante. Marie a soltou e olhou para ela. — Ora do que estou falando. Você não leu os jornais? Seu marido foi visto saindo de um clube em Londres na companhia de uma mulher mascarada. Daphne desesperou-se. — Se ele pensa que pode fazer isso com uma de minhas filhas, está muito enganado. — A mulher gritou, indignada. — Eu mesma o chamarei para um duelo para recuperar seu respeito. As três filhas arregalaram os olhos. — Mamãe, não é como pensa, Alec estava comigo na noite passada. — Ela se apressou em dizer. Não estava mentindo, ele realmente estava com ela. Marie parou de se abanar e olhou para a filha. — Estava? — Daphne assentiu, e aos poucos o semblante da mulher foi mudando. — Eu sabia! Esses jornais de fofocas, mentirosos. — Ela tocou no queixo de Daphne. — Óbvio que um homem que tem minha Daphne jamais procuraria outra. Daphne sentiu seu rosto arder ainda mais. — Agora que ele está aqui não poderá mais adiar o banquete que me prometeu. — Disse, Daphne pensou seriamente em fingir um desmaio para escapar daquele destino. — Essa noite, e vocês também devem vir e trazer seus maridos. Ela olhou para as irmãs a espera de auxílio, mas as traidores estavam se divertindo muito as custas dela. — Oh quem é essa coisa linda? — Marie finalmente notou Ashleigh ali. — Essa é Ashleigh, irmã de Northwest. — Daphne apresentou. — Eu devia saber, tem os mesmos olhos. — Marie disse afetivamente, tocando no queixo da morena. — Ashleigh está precisando de um corte de cabelo novo, vim ver se poderia me ajudar com isso. — Marie bateu as mãos animada. — Oh, será um prazer, tenho uma infinidade de ideias, você tem um belo rosto oval, porque não mostramos ele um pouco?! — Ela disse pegando Ashleigh pela mão e levando ela casa a dentro. — Será uma noite e tanto. — Comentou Josephne quando as duas já estavam longe. Daphne suspirou, sim, seria. Capitulo treze Enquanto cortavam as ruas de Londres dentro da grande carruagem ducal, Daphne sentia que uma dúzia de borboletas voavam em seu estômago. Quando comunicou a Alec sobre o jantar tinha tido a pequena esperança de que ele fosse recusar. Não entendia o motivo do seu nervosismo, seus pais, irmãs e cunhados já conheciam Northwest há anos, porém, mesmo assim estava se sentindo inquieta. Sempre que imaginava o escocês em uma mesa rodeado com seus familiares, sua mente formulava uma série de desastres. Foi somente quando estava há poucos metros da casa de seus pais que ela percebeu que o motivo de sua preocupação não era que sua família não fosse gostar de seu marido, mas sim o contrário. E se ele achasse que eram inadequados demais? Ele parecia muito confortável exibindo sua expressão casual de desinteresse. Mesmo tendo aquele porte incomum, ainda era muito elegante, nem mesmo o kilt era capaz de macular sua vestimenta impecável. Era um duque afinal. Em todos os bailes que frequentava, sempre tirava para dançar a filha de um nobre, típicas garotas prendadas e moldadas para serem duquesas, cheias de leveza e delicadeza, tudo o que sempre faltou em Daphne. Quando a carruagem chegou na frente da casa dos pais dela, ele ajudou Ashleigh a descer e logo ofereceu uma mão para ajuda-la também e não a soltou quando andaram até a porta. O calor da sua palma confortou as borboletas no estômago dela. Mesmo estando chateada com ele, Daphne não conseguia evitar de quere-lo por perto, e não entendia o porquê e se sentia frustrada. Fitzgerald, o mordomo, abriu a porta quase imediatamente, e depois de deixa-los entrar, recolheu os casacos de noite. — Seus pais a esperam na sala de jantar principal, senhorita. — disse o mordomo. — Obrigada Fitz, não é necessário que nos acompanhe. — ela falou gentilmente e levou Alec e Ashleigh pela casa de seus pais. Ainda no corredor Daphne podia ouvir o som de vozes e risadas enérgicas. Daphne ficou curiosa com a escolha da sua mãe de usar aquele salão. Ela o preservava como um filho e o reservava somente para eventos de extrema importância. Era um lindo salão com teto oval, paredes cor de pêssego e piso de madeira. Tinha sido ali onde tinha acontecido a recepção do casamento de Seraphne, quatro anos atrás. Eles entraram na grande sala harmoniosa. Os homens conversavam em um canto da sala, enquanto suas irmãs, com a inclusão de Sophie, estavam do outro lado da sala. Mulheres normais estariam bebendo chá ou conversando sobre bordados, porém suas irmãs não eram mulheres normais, estavam olhando a coleção de armas de Phillip que ficava pendurada em uma parede próxima da janela. Marie York os percebeu e soltou um fôlego animado, chamando a atenção de todos para o casal. A mulher pegou o marido pelo braço e praticamente o arrastou até os recém chegados, quase batendo a cabeça no chão ao fazer uma reverência além de exagerada. — Olhe Phillip que belo casal formam. — Disse a matriarca com doçura. Daphne sentiu seu estômago retorcer.— Vossa graça, acredito que falo por todos quando digo que é um prazer inimaginável ter você e sua irmã em nossa família. Ashleigh sorriu de um jeito acanhado, já o duque foi mais ousado, ele exibiu um sorriso cheio de dentes e puxou a mão de Marie para beijar o dorso. — Me sinto privilegiado. — Ele disse e não foi preciso mais que isso para ver que Marie York caiu de amores por ele. — Já conhece todos os presentes imagino, com exceção do senhor Harrison. — Disse ela apontando para o homem que olhava fixamente para eles do outro lado da sala, Marie fez um sinal de mão para ele se aproximar. Daphne ficou tensa imediatamente. — Lorde Northwest, este é Phineas Harrison, senhor Harrison, este é Lorde Northwest, o marido de Daphne. Todos na sala assistiam a aquele momento como se fosse uma bomba prestes a explodir. Daphne evitava olhar para o marido, devia ter avisado que Phineas estaria ali, mas esteve tão ocupada ficando nervosa que se esqueceu completamente da existência do seu antigo quase noivo. O americano fez uma reverência ao duque, que retribuiu sem muito interesse. — Bebe uísque, Vossa graça? — Perguntou o senhor York, amistoso. — Sou escocês, não beber seria um insulto ao meu sangue. — O lorde respondeu com seu humor costumeiro, e o pai de Daphne sorriu. Alec lançou uma última olhada nela antes de ir se afastando para onde os outros homens estavam. Ela se sentiu nervosa durante todo o tempo que Alec e Phineas ficaram juntos, vez ou outra dava olhadas para eles, desejando ouvir sobre o que conversam. Quando o jantar foi anunciado e todos começaram a andar para a mesa ela tentou puxar ele para terem um momento à sós mas sua mãe se agarrou ao braço dele como um polvo. O jantar foi o mais tranquilo que se pode dizer com relação a família York. Ninguém ficava em silencio para comer e as vezes todos falavam ao mesmo tempo, Marie York tinha sentado Alec bem ao lado dela para ter a atenção dele durante toda uma noite e não parava de enche-lo de perguntas sobre a Escócia e seus costumes. Coisas de que Alec parecia muito animado em falar. O prato principal foi servido, e Daphne se sentiu murchar ao ver que era vitela, foi inevitável não fazer uma cara de desgosto. — Qual o problema meu doce, não tem nenhuma víscera de bode no seu prato, tem? — A voz de Northwest se sobressaltou por cima das outras, e Daphne levou seu olhar para ele, estavam há metros um do outro e ele estava dando um jeito de provoca-la. — Não, mas para mim dá no mesmo. — Respondeu, bebendo um gole do vinho. — Pelo que vejo me casei com uma defensora dos animais. — Ele brincou. — Isso é bom, assim você que é um asno não corre perigo em minhas mãos. — Ela respondeu e o silêncio, que até o momento parecia impossível, caiu na mesa como um raio. Ela e Alec trocaram um olhar desafiador e ele deu uma risada divertida, um som tranquilo e ressonante que se infiltrou para dentro da pele dela. As pessoas que estavam duras como estátuas até o presente momento soltaram risadinhas para quebrar a tensão. — Daphne realmente sempre foi muito amante dos animais, veja aquele porco que ela adotou, o pobre animal foi rejeitado pela mãe após o parto e Daphne o amamentou com leite de vaca por meses. — A mãe dela falou. — Espere... — O escocês disse com a voz risonha. — acaba de dizer que Daphne amamentou o porco? — Sim, e depois disso o porco começou a segui-la achando que ela era sua mamãe leitoa. — Continuou sua mãe, e no instante seguinte toda a mesa ria de Daphne. — Chega mamãe. — Ela disse, cobrindo o rosto com uma mão. — De jeito nenhum meu doce, estou adorando este assunto, conte-me mais Marie. — ela o fulminou com os olhos. Marie que obviamente estava confundindo o interesse de Alec naquele assunto, continuou: — Daphne acabou irritada por todos estarem rindo dela e rejeitou o porquinho, ele sumiu por dois dias tadinho e quando ela o achou novamente pretendia comprá-lo do senhor Bennet, nosso vizinho em Yorkshire, mas o homem é muito bondoso e acabou dando o porco para ela, Daphne prometeu que nunca mais iria deixa-lo novamente e desde então o porco está em sua tutela. — Ao fim da história Daphne encarava seu prato quase amassando a prata dos talheres em suas mãos, esperando o comentario sarcastico que Alec faria. — Não esperava menos dela. — Ele disse e ela levantou a cabeça de súbito para olhar para ele. Alec a encarava com orgulho, carinho e admiração. E ela não sabia que um olhar podia conter tantas emoções. Sentiu suas faces incendiaram e na tentativa de fugir daquele assunto se virou para Phineas que estavam bem ao seu lado. — Então, como foi a viagem de Nova York até a Inglaterra? Imagino que tenha sido uma tortura. — Indagou e o homem piscou várias vezes antes de responder. — Sim, de fato...— ele ia começar uma história entediante sobre sua viagem até ali mas foi atrapalhado por Alec. — Espere... — O escocês disse. —... acaba de dizer que chegou de Nova York? Um calafrio desceu pela espinha de Daphne. — Sim, sou um dos sócios de Phillip York. — Phineas respondeu, sem perceber que o rosto que a pouco estava relaxado por um sorriso, exibia a mesma expressividade de uma estátua. Os olhos de Alec se encontraram com os de Daphne, e ela soube que ele sabia. Ele já o conhecia o bastante para saber quando sua mente mirabolante estava juntando peças e se arrependeu por não ter dito para ele quando teve a oportunidade. — Como é que acontece os noivados na Escócia? — Perguntou Seraphne, apenas para jogar mais lenha na fogueira. — As famílias mais abastadas costumam fazer um verdadeiro espetáculo sobre isso. – Disse Ashleigh, e as cabeças se voltaram para ela, menos a de Alec, este continuava encarando a esposa. — Eles montam jogos. — Jogos? — Josephne perguntou, interessada. — Sim, escolhem três ou quatro homens de clans diferentes para disputar pela mão da moça, aquele que mostrar mais habilidade, força e inteligência fica com a noiva. — Isso não é muito romântico. — Disse Sophie. — Ah é sim, geralmente a noiva já tem uma escolha e eles colocam o rapaz entre os jogadores para testar se ele a merece. — Disse Ashleigh e sua irmã Josephne suspirou. — É o tipo de jogo que eu pagaria para ver. — Disse. — Nós temos seis homens aqui esta noite, porque não organizamos um? — Indagou Seraphne e o rosto de Josephne brilhou. — E quem poderia ser a noiva disputada? — Indagou Sophie e muito tarde, muito tarde, Daphne percebeu que aquela era uma armadilha para ela. Olhou para todos os pares de olhos que olhavam para ela. — De jeito nenhum. — Disse inflexível. — Não sei se já notaram, mas eu já sou casada. — Ela mostrou o anel em seu dedo. — E não nos convidou para seu casamento, isso é o mínimo que nos deve. — Disse a mãe delas e Daphne olhou para sua mãe escandalizada. — Mamãe! — Vamos Daph, será apenas um jogo. — Pediu Jose e Daphne bufou, já tinha ouvido aquela frase antes e na ocasião acabou de ceroulas em uma clareira. — Eu não me importaria com um pouco de competição. — Disse Alec, e ela deu um olhar acusador para ele, sabia que ele estava fazendo aquilo por causa de Phineas. Homens! Ela levantou arrastando a cadeira no chão de madeira brilhante da sua mãe e disparou um olhar para o duque, que a olhava em igual petulância. O maxilar dele estava retessado indicando sua raiva. — Posso falar com você a sós por um segundo? — Ela perguntou, não estava se importando se faria uma cena, não podia deixar que ele alongasse aquilo apenas por um desejo masculino de marcar território. — Claro. — Ele disse levantando e seguindo ela para fora. xxx Eles foram para o corredor, mas não tiveram muita privacidade pois os criados de sua mãe estavam passando por ali a todo momento. Daphne pensou no lugar onde teria realmente alguma privacidade e o puxou o restante do trajeto para lá. Seu quarto ainda preservava as características dela, mas dava para sentir que ali já não morava mais ninguém. — O que está pretendendo com isso? — Ela disparou irritada, quando fechou a porta atrás de si. Depois de passar os olhos rápidos pelo quarto Alec se voltou para ela. — Por que me trouxe aqui esta noite? — Ele disparou de volta. E Daphne se sentia em carne viva com aquele frio olhar que ele deu para ela. — Ora, você já sabe o porquê. — Ela respondeu, incerta se ele realmente sabia. — Eu achei que era porque queria me apresentar para sua família. Como seu marido. — O tom de voz dele denotava ressentimento, mas ele a olhava inexpressivo. — E foi. — Ela disse, incomodada. — Então por que não me contou que seu antigo noivo estaria aqui? — Ele indagou, de maneira quase rude. — Antes de vir para cá eu tinha esquecido e depois não tive mais a chance. — Ela respondeu e ele a olhou fixamente no fundo de seus olhos por um bom minuto até que tivesse certeza de que ela estava sendo sincera, Alec foi abrandando sua aura gélida até se tornar morna. Ele deu as costas para ela e andou até a cama dela, tocou na madeira da cabeceira, deslizando os dedos pelo acabamento e se sentou no colchão, seus olhos não estavam mais frios, agora estavam cheios de determinação. — Venha até aqui. — Ele bateu com uma mão devagar em seu colo e Daphne se segurou na maçaneta da porta, suas pernas queriam ir, mas a parte dela comandada pelo seu cérebro a fez ficar onde estava. — Estou bem onde estou. — Disse, mas estava óbvio que não tinha muita certeza disso. — Tenho sonhado com isso há tantos anos, me deixe realizar somente essa fantasia. — Ele pediu, soando absurdamente tentador. — De que fantasia está falando? — Ela perguntou, cautelosa. Agarrando aquela maçaneta como se sua vida dependesse disso. — Sempre desejei estar em seu quarto. — Ele conseguiu deixar a voz em um tom ainda mais sedutor. Grave, rouco, masculino. — Nos meus sonhos você está deitada bem aqui. — Ele acariciou a coberta do colchão. — usando apenas uma fina camisola. Oh, céus! A respiração de Daphne ficou pesada e seu coração acelerou. Ele tinha mesmo tido pensamentos indecentes com ela no passado? Isso foi algo que ela nunca esperou, nem em suas fantasias mais improváveis. — Você chama meu nome, enquanto uso a língua para te dar prazer. — Daphne arregalou os olhos, aquilo era pecaminoso. Ela conseguiu se imaginar em um cenário bem parecido com aquele, se sentiu como Eva e ele era a cobra oferecendo para ela o seu fruto do pecado. — Não devemos, seria errado, você e eu não somos... — Na minha fantasia você não fala tanto. — Ele a cortou. — A não ser meu nome, e sim, e por favor, e mais forte. — O aperto da mão dela afroxou em volta da maçaneta. — Diga sim para mim, Daph. — Ele sussurrou, e que Deus a ajudasse pois ela faria aquilo, bem ali, em cima do salão de jantar dos seus pais. — Sim. — Ela sussurrou de volta, largando a maçaneta de vez. Naquele momento ela soube que largaria muitas coisas por ele dali em diante. Aquele passo que ela deu para mais próximo dele, foi um passo mais para longe do controle de si mesma. Quando ela esteve no alcance de suas mãos, ele a puxou, e fez o que Daphne estava ansiando há dias, ele a beijou. Tinha luxúria, volúpia, saudade e algo mais, algo agridoce e rude. O vestido que ela usava se fechava por uma fileira de botões quase infinita em suas costas, ele a virou para desabotoa-los, com pressa. Ela fez uma anotação mental para usar somente roupas fáceis de abrir dali em diante. Mais rápido do que ela esperava, o vestiu caiu com um susssurro para o chão, deixando-a somente de chemise, meias e corpete. — Por que esteve tão irritado há poucos instantes? — Ela perguntou quando ele a virou de novo para puxar os fios da roupa íntima. — Estava louco de ciúme. — Ele disse sem piscar e ela ficou um pouco abalada com a sinceridade crua. Suas costelas foram liberadas do corpete e ele a deitou na cama, se colocando de joelhos em frente a ela, sem cerimônias. Ele sorriu como um lobo malicioso e Daphne percebeu pela urgência e pelo olhar cheio de lascívia que aquela realmente era uma fantasia dele. Ele subiu uma mão pela perna direta dela enquanto beijava seu joelho esquerdo, acariciando a meia rosada e o princípio da coxa macia, Alec tocou na parte detrás do joelho dela e o toque íntimo naquela parte intocada a fez estremecer. As bochechas dela adquiriram um tom de rosa atraente, que o voltou latejante de desejo. Ele foi subindo, subindo, subindo pela perna dela até chegar lá, Alec parou de beijar a parte interna da coxa e foi preciso que ele levantasse bastante a chemise dela para acreditar que ela não usava nada para proteger sua intimidade. Com apenas um abrir de pernas ele teria todo um banquete disponível para ele. — Pequena tarada, você está nua aqui. — Ele disse, e Daphne achou que fosse morrer de luxúria. Jamais iria admitir que não tinha colocado suas calcinhas propositalmente naquela noite. Ele a acariciou ali, e ela sentiu fortes arrepios de desejo. Os lábios dele encontraram a parte interna mais intima da coxa dela e beijou ali, molhado, quente e apaixonado e seus dentes morderam a carne dela quando um dedo se introduziu para dentro. — O que você está...oh! — As palavras se perderam na garganta fina. As coxas macias rodearam os ombros dele, ela o olhava abismada enquanto ele ia de encontro ao sabor doce de sua feminilidade, sentindo a maciez da pele com a língua, e o cheiro suave nos pêlos dourados, aquele aroma o deixou faminto. E ele sentia essa fome há muito tempo. — Céus...— Ela arfou quando conheceu a pressão da boca masculina, e Alec soube que antes dele, nenhum outro havia feito aquilo. E isso o fez desejar vicia-la, o fez desejar ouvir o seu nome sair de sua boca quando ele levasse ela a caminho do pecado. A carne foi se tornando cada vez mais inchada e úmida, e ela arfava de maneira descontrolada, sem saber o que fazer com as mãos, apenas o dedicando um olhar vez ou outra, com a pele vermelha e as pálpebras pesadas, a boca semi aberta prometendo palavras que ele desejava ouvir incandescentemente. Aquilo não era somente novo para ela, também era novo para ele, não era apenas sexo, ele estava amando sua esposa. Ela querendo ou não, ela aceitando ou não. Seu corpo berrava. Minha, minha minha. Alec desejou se juntar a ela, mas ainda não era a hora. Ela apertou os lençóis com as unhas, se preparando para receber o prazer imensurável, ele penetrou na sua entrada aquecida, e sentiu os músculos tensionarem ao seu redor, a boca dela se abriu. Por favor, diga meu nome, diga meu nome. Ele implorou em silêncio. Ela jogou a cabeça para trás e apenas gemeu, gemeu como uma mulher, não como uma virgem que acabará de descobrir o prazer. Enquanto ela despertava do orgasmo, ele voltou a espalhar beijos pela coxa dela, ajeitando as meias que estavam emboladas nos joelhos, ouvindo a respiração dela se regular. Ela ficou em silêncio por um bom momento e ele desejou saber o que se passava dentro de sua cabeça. — Daph...— Ele a chamou, e depois de relutar por um momento ela olhou nos olhos dele. Alec se sentiu poderoso com o que viu refletido nos olhos azuis. — Não vou competir nos jogos. — Ele disse, levantando-se e ajudando ela a se erguer. Ela estava vermelha e seu rosto refletia toda a confusão de seus sentimentos, mas para ele estava mais do claro agora. Alec colocou um dedo no queixo dela e deu um suave selinho em sua boca antes de dizer as palavras finais, o reconhecimento que tanto desejava e pelo qual esperou tempo demais para obter. — O que realmente importa, eu já ganhei. Capitulo quatorze Daphne estava sentindo os efeitos daquelas palavras se infiltrando de maneira sorrateira dentro da cabeça dela. Nunca tinha se sentido tão covarde em toda a sua vida diante de meras palavras, e decidiu que a melhor solução para fugir daquele sentimento pavoroso que causavam, era fugir do homem que estava causando tudo isso. Nos dias seguintes ela decidiu se empenhar unicamente no treinamento de Ashleigh. A cunhada era muito mais arredia que ela em sua época de estudos. Sophie sempre tinha que estar corrigindo ela quando a menina se distraia e relaxava a postura, ou quando dava de ombros, que aliás era sua resposta para tudo. Na terceiro dia de treinamento, após um exaustivo treino as moças decidiram cavalgar pelo Hyde Park. Naquele horário muitas pessoas importantes estariam cavalgando por ali e seria a oportunidade perfeita para apresentar Ashleigh antes do baile de debute que aconteceria na semana seguinte. Se sentar em uma sela de amazona sempre foi um obstáculo para Daphne, mas valia o esforço para estar com Ashleigh e suas irmãs e para garantir alguns metros de distância de um certo escocês. Além de que não estava mais se sentindo tão excluída, já que sua cunhada também não se equilibrava muito bem na sela. Sempre que uma lady parava para cumprimenta-las, Daphne apresentava a jovem, e sempre que Ashleig abria a boca a lady em questão deixava cair o leque de pavor, o sotaque da menina era muito forte. — Isso é mais divertido do que eu tinha imaginado. — Disse ela ao ver lady Glasgow se afastando depressa após a cunhada ter dito que não entendia qual a necessidade de tantos panos em suas pernas para cavalgar. — Eu tinha sentido falta de fazer isso... — Comentou Sophie, compartilhando uma risada com elas. — Algumas coisas nunca mudam. — Disse Josephne e uma maré de desagrado banhou Daphne ao ver que quatro cavalheiros cavalgavam em suas direções. — Tome cuidado com Northwest, Daph, Thomas andou me fazendo perguntas muito suspeitas. Daphne olhou para trás, para garantir que estava Ashleigh entretida demais tentando cavalgar em sua sela, para ouvir a conversa delas. — Que tipo de perguntas? — Indagou nervosa, diminuindo a velocidade do cavalo. — Sobre você, e no quanto era suspeito que nunca tivesse arrumado um noivo. — A irmã respondeu mais baixo. — Tenho certeza que Northwest tem algo haver com isso, Thomas é distraído demais para reparar em algo assim. — Acha que Northwest suspeita de alguma coisa? — Indagou Seraphne e e Daphne suspirou pesadamente. — Ele sabe que vou ao clube. — elas arregalaram os olhos. — mas não sabe para quê. — Uma hora ele terá que saber, pelo que vejo está muito empenhado em manter o casamento. — Disse Sophie e Daphne se resignou a ficar calada, pois os lordes já estavam próximos demais. Contudo Daphne sabia que a amiga tinha razão. E a única solução que encontrou para que ele a deixasse voltar a frequentar o clube, era sendo sincera. Ele teria que compreender os motivos dela e lidar com isso de maneira racional. Eles pararam em suas frentes, e foi inevitável não lembrar de uma situação semelhante a essa, cinco anos atrás, neste mesmo ponto do Hyde Park. Naquele dia Daphne estava fascinada pela beleza rústica do homem. Nunca tinha visto um homem ser tão masculino usando uma saia, e a cor amarela de seus olhos a deixou hipnotizada. Ele ficou enamorado por Sophie e deixou isso bem claro, porém, diferente daquele dia, seus olhos de fogo flamejante estavam presos nela. Só nela. — Que coincidência agradável. — Disse lorde Standhurt dando a volta nelas para cavalgar ao lado da esposa. — Estávamos indo até o serpentine. — Disse Seraphne para o marido. Os olhos do marquês eram de um verde hipnotizante e olhavam a esposa com algo próximo da idolatria. — Íamos para lá também, que tal irmos juntos? — Lorde Cavendish sugeriu, juntando suas mãos com a da esposa no espaço vago entre os cavalos. E para a desgraça de Daphne todas concordaram. Foram se afastando, restando apenas Alec e ela para trás. Nem mesmo Ashleigh ficou por ali, a grande traiçoeira cavalgou mais para a frente para deixa-los a sós. Daphne começou a trotar ao lado do marido fixando os olhos nas costas de Josephne e Haddington que cavalgavam a uma distância segura deles. — Você sabe que não adianta se esquivar de mim. — Ele falou e sua voz lançou uma enxurrada de arrepios por ela. As lembranças de três dias atrás ainda estavam muito nítidas em sua mente e em seu corpo. — Nossos destinos estam traçados, meu doce. — É muita presunção sua achar que estou te evitando. — Ela retrucou, olhando para o rosto indecente e sentindo prazer com a maneira selvagem como ficava a aparência dele quando montava em um cavalo. — Não é presunção, é um fato. Porém, quero que saiba que quanto mais me negam algo, mais fico desejoso de obter. — Disse dando um olhar lascivo para ela, o rosto de Daphne ardeu. O lampejo de uma ideia clareou na mente dela. Aquilo definitivamente era uma loucura, mas naquele momento ela estaria dando qualquer coisa para recuperar nem que fosse um terço do controle sobre si mesma. — Vamos fazer uma aposta. — Falou de súbito, fazendo com que ele a olhasse intrigado. — Uma aposta? O que você exatamente pretende apostar? — Se eu vencer, você me deixará livre para voltar ao Rough Diamond. — Ele rapidamente retesou a mandíbula e apertou as rédeas com mais força, em sinal de desagrado. — Se você vencer, eu responderei todas as suas perguntas. Seu olhar de aborrecimento se amenizou ao ouvir a proposta, seus olhos se fixaram no horizonte enquanto ele parecia pensar a respeito, Daphne sentia seu coração bater forte no peito pela ansiedade, ele respirou fundo e a olhou decidido. — Aceito sua aposta, mas eu escolho o desafio. — Disse e indicou as rédeas do cavalo. — Uma corrida. Agora. Quem chegar no serpentine primeiro, será o vencedor. A excitação de Daphne foi rapidamente embora, ela nunca foi boa com corridas, suas pernas eram muito pequenas e mal conseguia se equilibrar naquela sela desconfortável, mas aquela era a sua última oportunidade antes de entregar os pontos de vez, antes de entregar tudo para ele. E Alec logo iria descobrir que uma York sempre tem uma carta escondida no decote. — Feito. — Falou, sentindo a euforia se apoderar do seu corpo. — Me siga. — Ele disse, e os dois sairam da trilha por onde os transeuntes passeavam, e entraram em uma parte vazia do parque, onde as sebes eram altas o suficiente para esconde-los dos olhos curiosos. Eles pararam na entrada de uma trilha cobertas por folhas secas caídas das árvores, e Alec se preparou para correr, segurando as rédeas do seu cavalo com uma confiança que deixou Daphne debilitada. — Está pronta? — Perguntou com um olhar desafiador. — Só um momento. — Ela pediu, se erguendo no lombo do cavalo e mudando a posição para uma que a deixava mais livre para correr. Alec a observou fixamente enquanto ela erguia as saias do vestido até as coxas e se sentava escarranchada no animal. Ela devolveu o olhar desafiador dele. — Agora estou pronta. — No três. — Disse depois de tirar os olhos das coxas dela, alto e claro como um trovão. — Um. Dois. Três! Com uma batida no flanco do cavalo, ele disparou como uma bala pela trilha ladeada, arrastando com ele uma rajada de poeira e folhas, fazendo ela literalmente comer poeira. Daphne se recuperou da tosse, e fez seu cavalo pegar velocidade. Não demorou para ela alcança-lo, os dois cortando as sebes lado a lado, ele exibia o sorriso mais lindo que ela tinha visto em rosto. Felicidade misturada a diversão, enquanto ela provavelmente estava com os cabelos desgrenhados pelo vento e pálida pelo temor de perder. Ele estava um metro a frente dela, as saias do seu kilt voando, revelando a brancura de sua coxa grossa e torneada. O trote firme dos cavalos no chão eram quase ensurdecedores, e faziam o sangue dentro dela vibrar de adrenalina. Na tentativa de tomar a frente dele, ela pegou um atalho à esquerda, se afastando da trilha vazia e entrando em uma parte populosa do parque. Daphne desesperou-se. — Saiam da frente! — Gritou enquanto seu chapéu desamarrava o nó no queixo e saia voando para longe. As pessoas corriam para fugir estrada, pulando nas calçadas, soltando arquejos e gritos. Aquele com certeza seria o escândalo do ano. Do século! Quando ela finalmente voltou para a trilha vazia, sorriu ao ver que tinha deixado-o para trás. Bom, foi o que pensou, pois no instante seguinte ele estava ao seu lado, exibindo um sorriso convencido e uma expressão de vitória. Daphne gritou de frustração ao avistar o lago de longe. Ela impulsionou o corpo para frente para ganhar ainda mais velocidade, ele fez o mesmo. Em uma parte na estrada eles passaram pelos seus amigos, que olharam para eles com expressões estarrecidas. Duros como estátuas. O vento beijava a pele dela de maneira furiosa a deixando fria e seus olhos lacriimajevam, junto com seu coração que recebia um alto nível de emoção. Por um momento ela viu a vitória iminente, e o sabor doce quase tocou em sua língua. Porém, no instante seguinte, ele passou por ela, como o som ensurdecedor que vem depois do clarão de um relâmpago, que te pega desprevenida e te faz sentir o poder de sua impotência. A decepção da derrota foi ofuscada pelo brilho vitorioso que ele tinha em seu olhar, e Daphne teria perdido mais mil vezes apenas para vê-lo tão radiante de novo. Ele deu a volta, diminuindo a velocidade do cavalo, e voltando na direção dela. — Agora você me deve respostas. ∞∞∞ Alec sentia o alívio da vitória abrandar o furor do seu coração. Estava exultante, para dizer o mínimo. Ele esteve tão desanimado nos dias anteriores, sua ideia inicial ao proibir Daphne de voltar para o clube era para impeli-la a revelar seus propósitos, se o que quer que ela fizesse naquele lugar fosse remotamente importante ela faria qualquer coisa para retornar, mas ela esteve dias o evitando e ele estava sem qualquer ideia de como iria extorquir as informações que precisava dela, tal foi sua surpresa ao ouvi-la fazer uma aposta tão arriscada. Aquilo era o tudo ou nada, e ele teve receio de perder. Contudo, avaliou a situação de modo que pudesse vira-la ao seu favor, sempre foi muito bom em equitação e viu a brecha que Daphne deixou passar, ele sabia que existia um risco de ela ganhar, já tinha aprendido a não subestimar uma York. E por um momento, ela quase realmente ganhou, mas agora ele estava ali nos aposentos dela, observando-a pela luz da tarde que entrava pela janela, vermelha, desgrenhada e suada, e nunca esteve tão atraente em sua vida. Ele retirou o casaco de montaria, as luvas e cruzou os braços frente ao peito, degustando o delicioso sabor de ter Daphne York sob a palma de sua mão. — Já pode começar. — ela apertou os dedos em sinal de nervosismo. — O que quer saber? — Perguntou evitando olhar nos olhos dele, o azul acinzentado encarava o colarinho da blusa dele. — Eu quero saber de tudo.— Fez uma pausa. — Tudo. — Embora aparentasse estar tranquilo, ele estava gelado por dentro. De medo, receio, insegurança. Ele ia descobrir um lado de Daphne que ninguém mais sabia. E isso o deixou inflado como um pavão, mas também o mendrontou. — O que faz naquele clube e para quê quer tanto a liberdade. Ela tragou saliva, olhando ambas as portas fechadas do quarto, parecia tentada a correr. Respirou fundo, olhando para os pés e pareceu aceitar finalmente a derrota. — A primeira fez que fui no Rough Diamond foi há quatro anos atrás... — Começou. — logo após o escândalo envolvendo Haddington e Josephne. Eu estava me sentindo muito sozinha, Seraphne tinha acabado de reatar seu casamento com Standhurt e estava grávida de Liliana, morando em sua casa no interior, Josephne tinha decidido reconstruir sua vida em Paris, e Sophie estava muito ocupada com os preparativos para a chegada de Harriet. Isso me aproximou de Garret. Pelo movimento trêmulo de seus lábios Alec notou que a menção daquele nome era importante de alguma maneira. E não gostou nada. — Quem é Garett? — Inquiriu sombriamente. — O antigo contador de meu pai. — Respondeu ligeira. — Ele me levou até o clube, que até então não era nada além de um galpão vazio. Ele já tinha tudo planejado, tudo. Queria fazer do lugar apenas mais um clube para homens beberem e gastarem rios de dinheiro com apostas descabidas. Mas tudo não passava de um mero planejamento, ele não tinha verba para colocar o seu plano em ação. — ela levantou da cama e andou até a janela, provavelmente para evitar olha-lo no rosto. — E é aí que eu entro. Deu uma breve pausa. Seguida de uma mexida inquieta no cabelo. — Seríamos sócios, ele ganharia sessenta por cento dos lucros enquanto eu ficaria com os outros quarenta. No início eu não queria concordar, visto que era eu quem estava pagando por tudo, mas aproveitei essa vantagem para exigir os mesmos direitos que ele tinha com o clube. Ele não gostou muito da ideia, mas como precisava de mim, aceitou. —... Alguns meses depois, o clube estava pronto e inaugurado com o nome de White Tie. Como já deve imaginar não teve qualquer repercussão, como eu já havia dito era apenas mais um clube para homens, e desses Londres ja esta cheia até a tampa. Foi então que me surgiu a ideia do Rough Diamond. Garett obviamente discordou, mas como eu também tinha direitos pelo clube, eu tinha a liberdade de fazer quais mudança quisesse. Seus olhos pareceram brilhar nesse momento ao falar do clube. — Reformei tudo novamente, e espalhei de maneira sorrateiramente nos salões de bailes sobre o novo clube infame de mulheres que tinha aberto no centro da cidade. Não demorou nem um mês para o clube estar apinhado de mulheres, a princípio algumas desconhecidas, até a sigilosidade do clube ficar em evidência, então começaram a vir baronesas, condessas e até duquesas. Mulheres que eu vejo no dia à dia. A essa altura Alec já não sabia se ficava surpreso ou fascinado pela criatura na sua frente. Esse tempo todo ela era difamada nos salões de bailes enquanto tem sob as mãos o poder sobre dezenas de famílias importantes do seu meio. Se era possível ele sentiu um desejo ainda maior de possui-la como um louco. — Aparentemente eu sabia mais de negócios que Garett, assumi o total controle do clube. Ele esteve bem com isso no início, mas quando viu que estava perdendo seu espaço ali dentro, tentou me confrontar. Ele queria que mostrassemos nossos rostos, que deixassemos que as pessoas soubessem quem eram as mentes por trás do sucesso do clube. Mas eu não quis assim. Na época o escândalo de Josephne ainda estava muito recente e eu não queria que meus pais sofressem o assédio por mais um escândalo envolvendo uma de suas filhas. —... Quando eu me recusei, Garret disse que venderia a parte dele para alguém que estivesse disposto a pagar uma fortuna. Eu não podia permitir isso, a aquisição de um novo sócio poderia me trazer dores de cabeça. Foi quando entrei em contato com meu advogado e juntos conseguimos agir pelas costas de Garret, ele foi tolo e estava tão cego pela inveja que vendeu sua parte no clube para o primeiro que lhe ofereceu uma quantia, eu mesma. —... Desde então eu cuidei do clube sozinha e foi assim durante dois anos e eu estava feliz com minha vida, até papai anunciar que eu tinha que arrumar um noivo, e todo o rosto você já sabe. — Concluiu se virando para ele, a cabeça do escocês fervilhava de perguntas, mas tinha uma que se sobressaía sobre as outras, a pergunta que o perturbava de maneira dolorosa, na qual ele sabia que odiaria a resposta, mas mesmo assim, desejava ouvi-la. — Foi ele, não foi? — Perguntou, mesmo que a pergunta não fosse direta, ele suspeitou que ela entendeu cada letra. — A quê se refere? — Vamos Daphne, sou experiente o suficiente para saber quando estou lidando com uma mulher virgem. — O rosto dela adquiriu o vermelho fúscia mais lindo. — Desde quando você sabe? — Ela perguntou olhando para o chão, talvez estivesse se sentindo culpada. Ele suspirou. — Desde a noite na biblioteca. — Os lábios dela se abriram um pouco, surpresos. — Como poderia? — Daphne, eu estava nú da cintura para cima e você sequer ficou vermelha. — Ele disse, com um pequeno sorriso. — E ainda assim desejou me beijar na noite seguinte. — Ela disse, como se isso fosse algo surreal. Ele andou até ela, tirando um cacho dourado de cabelo do rosto e o colocando atrás da orelha pequena. — Achou que eu rejeitaria você por algo tão fútil? — Ela piscou várias vezes. — A maioria dos homens o faria. — Ele esquivou os dedos para trás da nuca dela e puxou os fios de cabelo ali. — Já devia saber esposa, não sou como a maioria dos homens. — Então ele a puxou para um beijo calmo. — O único que me dói é desejar voltar no tempo para me casar com você antes disso, e não poder. Ela suspirou, olhando nos olhos dele ao ouvir aquelas palavras. — Daphne, não quero mais a idéia de um casamento com você. — Ele quase podia sentir as batidas frenéticas do coração dela. — Quero um casamento, com fidelidade, honestidade, e a obediência a gente vê depois. Aquelas palavras em qualquer mulher teria surtido um efeito magnífico, qualquer outra mulher teria se jogado nos ombros dele e o beijado e o puxado para a cama, mas Daphne não era qualquer mulher, com ela nada vinha fácil. Ela se afastou dele bruscamente. — Não posso. — Aquelas palavras foram como sopros de vento frio na chama do coração dele. — Agora você entende que eu não posso simplesmente abandonar o clube, sim? — Disse em um tom cauteloso. — Dediquei anos da minha vida a isso, e não posso jogar tudo para o alto por conta de um casamento. A raiva súbita voltou a invadir o peito dele ao ouvir ela admitir tão severamente que um maldito clube era muito mais importante do que o casamento dos dois. Do que aquilo que ele estava propondo. Alec era um homem afinal, e também tinha suas inseguranças e o seu ego. Ele estava disposto a fazer tudo o que ela o pedisse, a aceitar suas condições, a ir na sua velocidade, mas naquele momento, ela era o centro do mundo dele, e ele queria ser o do dela. — Não estou lhe fazendo uma proposta Daphne. — Ele disse, muito mais frio. Alec estalou a língua e adquiriu aquela pose de cinismo que ela odiava. — Tem algo que eu andei omitindo de você. — Um vinco cresceu entre as sobrancelhas dela. — Para manter Stirling eu preciso de algo além de uma certidão de casamento. — O que você quer dizer com isso? — Perguntou com a voz trêmula. Ele abriu um sorriso cruel. — Um bebê, meu mel, vai ter que me dar um antes que se feche o período de um ano. — a cor sumiu dos lábios dela com um sopro. — Vo-você não me disse... — Por um momento achou realmente que ela fosse cair dura para trás. Até a cor voltar com tudo para sua pele, e ela tão perigosa quanto um touro em uma arena. Ele deu dois passos cautelosos para trás. — Foi para isso que voltou então? É por isso que vem tentando fazer este casamento acontecer a qualquer custo? — Ops, Alec não previu aquilo. Ela bateu com os pés no chão. — Fique você sabendo que vai perder o seu castelo, pois eu não vou lhe dar bebê nenhum! — Esbrevejou furiosa e o tom da audácia em sua voz o fez queimar como um barril de pólvora. — Não vai? — Indagou desafiador, a agarrando contra seu peito. — É o que nós vamos ver. ∞∞∞ Daphne não teve tempo sequer para respirar antes de sentir o peso do duque ao redor de seu corpo pequeno. Tudo nele emanava possessividade e fúria, e ela sabia que ele não seria delicado, e maldito fosse ele, pois ela não queria que fosse. Uma parte racional de seu cérebro gritava que ela não devia se entregar daquela maneira, gritava que ela não devia ser tão submissa de maneira imediata. Principalmente depois do que tinha acabado de ouvir. Mas ela tinha aquele homem musculoso e atraente a abraçando, e o cheiro de suor exalando como um aroma primitivo. E a voz era facilmente ignorada. Estava com raiva por ele esconder que teria que ter um filho varão, e estava ainda mais por querer obriga-la a aquilo, mas a ideia de carregar em seu ventre um filho dele, soou como uma visão deliciosa, que estremeceu o corpo dela com vigor e satisfação. Nunca iria admitir em voz alta. Nunca. Esteve sentindo tanta falta dele nos últimos três dias, e agora ela se sentia estúpida. Os lábios dele agora não eram calmos, nem carinhosos, era bruto e lascivo, mas ela gostava, e como gostava. Ele mordeu e raspou os dentes nos lábios dela como um castigo, apertando ela ela contra ele. Seus olhos queimavam com raiva e desejo ardente, e ele estava amassando ela contra ele de propósito. Privando ela de respirar por uns bons momentos antes de lhe dar alguns segundos para respirar. — Não voltei pelo castelo sua megera odiosa, eu voltei por você. — Ele rosnou contra o pescoço dela, tateando em busca do fecho do traje de montaria, perdendo a paciência e puxando a musseline sem muito cuidado. Ela pôde ouvir o barulho da roupa rasgando em vários pontos antes de ele tira-la. Ela não se importou, estava longe de se negar a aquilo, desejava aquele homem e iria aproveitar o quanto dele fosse permitido, embora o sentimento predominante naquele momento fosse a raiva, existia algo querendo desabrochar no peito dela. Mandou todas essas sensações para longe, e abraçou a cintura dele com as pernas, enquanto ele a levava para a cama. Ele gemeu para ela, apressiando essa submissão. Alec juntou suas mãos aos seus seios e levou sua boca depravada até os picos rosados que estavam sensíveis e rijos. Daphne gritou de prazer genuíno quando ele lambeu e sugou aquela região até formar manchas arroxeadas na pele branca. Ela era pequena demais para ele, mas de uma maneira estranha, ela conseguia ficar perfeitamente alinhada para recebe-lo no meio de suas pernas. E se entregou sem ressalvas ao momento, sentindo a pele cálida raspando na dela, o poder luxuriante que a intimidade proporcionava, lambendo o suor do seu pescoço e sentindo o sabor salgado da pele, e ele era dela, os músculos proeminentes, os fios de cabelo castanho, a língua audaciosa e os olhos âmbar, levou uma mão até o rosto dele e infiltrou em seus cabelos, compreendendo finalmente que aquele ali era seu marido. A névoa de raiva foi dissipada, sendo substituída pela paixão, só a paixão. Ele a beijou no pulso, e a mordeu ali. Daphne sorriu, o marido gostava de morde-la. Ela se contorceu debaixo dele, querendo que o casamento dos dois chegasse à sua conclusão final. Daphne quis pertencer a alguém, além dela mesma, pela primeira vez na sua vida inteira, e por mais do que alguns segundos teve o vislumbre de um futuro com Alec. Agora ele conhecia todos os segredos dela e ainda estava ali, ele ainda à queria depois de tudo. Ela tateou com as mãos para baixo em busca dele, para ajuda-lo a encontrar o caminho até ela. Daphne infiltrou uma mão por dentro do kilt e o sentiu, quente, longo, pulsante, macio, e molhado. Alec gemeu, e tremeu e investiu contra a mão dela, Daphne desejou dar para ele o mesmo prazer que ele tinha dado para ela dias atrás, queria saber como ele se sentiria se ela o levasse na boca. Mas no momento que ela decidiu isso ele a deixou, olhou para ela deitada ali confusa e vulnerável. Uma quebra de rejeição se apoderou de Daphne, enquanto olhava o homem tentar controlar a respiração. Ele a rejeitou pela segunda vez, e ela se contorceu por dentro ao perceber que tinha se aberto demais. Tinha deixado escapar emoções demais naquele breve momento de beijos, que deveria ter sido apenas carnal. Nada de sentimental. Recapitulou em sua mente todo o ocorrido, buscando entre as linhas em qual momento deixou a parede cair. — Você poderá voltar para o clube. — Ele disse em um tom brando. Ela ficou surpresa, mas não demonstrou, se sentia um tanto cinza por dentro. — Obrigada por compreender. — disse deslizando pela seda das cobertas e se cobrindo com o que tinha restado de seu belo vestido azul. Precisava de um banho, para tirar do corpo o suor, tanto dele quanto dela, e também para apagar dali os vestígios do corpo dele, que latejavam de maneira incessante. — Contudo, eu tenho uma condição. — Falou e ela se virou para olhar em seu rosto, o diabo nunca faz um pacto sem antes rabiscar nas entrelinhas. — Eu vou com você, aquilo lá é muito perigoso para uma mulher. Ela apertou os dentes. — Não finja que se preocupa comigo. Só quer se certificar de que não vou fazer nada indiscreto. — Falou com ríspidez. — É essa a minha condição. — Ele disse sem dar qualquer importância para sua ira. Daphne desejou chorar. Quando atravessou a noite duas semanas atrás com a idéia louca de fazer um acordo com o diabo, ela não imaginou que ele fosse lhe tomar mais do que a simples liberdade, não imaginou que ele fosse lhe tomar também, o coração. Capitulo quinze O que fazer quando se descobre que está apaixonada pelo próprio marido? A pergunta era recorrente na cabeça de Daphne, tinha passado tantos anos preocupada em como seria caso um dia se apaixonasse por alguém, que nunca reparou que sentia "aquilo" quando estava ao lado de Northwest. Foi tão burra! Era óbvio que sentia, e ficava tão transtornada por ele nunca lhe dedicar o mínimo de atenção que a única maneira que encontrava de chamar sua atenção era insultando-o de alguma maneira. E a percepção disso era terrível. E dolorosa. Muito na verdade. O fato era que ela não sabia lidar com a rejeição, não sabia antes, e não saberia agora. De maneira tão deliberada, se convenceu de que aquilo que sentia por ele era repugno, quando na verdade o detestava por nunca ter se interessado por ela. Naquela noite ela dormiu sozinha, e enquanto as horas da noite passavam, ela só conseguia sentir a pressão da responsabilidade que Alec tinha jogado em cima dela. E ela se sentiu tola por ter tido pena dele no início por achar que estava enganando ao omitir sobre o clube, ele foi muito egoísta, sequer parou para pensar que talvez ela não quisesse ter filhos. Coisa que Daphne acreditava que não queria até semanas atrás. E se não fosse capaz de dar um filho varão a ele? E se viesse uma menina? Ou pior, e se sequer pudesse engravidar? Ele iria odia-la eternamente por ser a responsável pela perda de seu precioso castelo. E a ideia de Alec pudesse vir a odia-la, deixava seu coração debilitado. Daphne duvidava muito que fosse se curar desse sentimento da noite para o dia, então decidiu procurar ajuda para aprender a lidar com ele. Olhou para as três moças sentadas graciosamente na grama alta do jardim da casa de sua mãe. — Posso lhes fazer uma pergunta? — Indagou cautelosamente, aproveitando aquele resquício de coragem que brotou em seu íntimo. Suas irmãs ergueram a cabeça, e a olharam, esperando. Os olhos grandes a encaravam cheios de carinho, verde, azul e castanho. Aquele pingo de coragem que ela sentia esvaziou pela metade. — O que fizeram quando descobriram que estavam... Apaixonadas... Por seus maridos? — Questionou quase em um sussurro, mexendo na barra de renda do seu vestido. Um silêncio se seguiu por muito tempo, até Josephne soltar um gritinho seguido de um pulo em uma espécie de dancinha comemorativa. — Eu sabia, eu sabia, eu sabia. — Cantarolou alegremente, os cachos dourados de seu cabelo pulavam junto com ela e fazia muito tempo que Daphne não via sua irmã tão jovial. — Agora me devem cinco soberanos, cada uma. — disse para as outras duas que assistiam a tudo de caras azedas. Daphne então entendeu tudo e abriu a boca ultrajada. — Apostaram que eu estava apaixonada por Alec? — elas tiveram a descendência de ficar envergonhadas. — Não exatamente. — Disse Sophie. — sempre soubemos que estava apaixonada, apostamos apenas quanto tempo levaria até admitir isso. — Sophie e eu apostamos que levaria três semanas, e Jose apostou que levaria uma só. — Disse Seraphne desgostoso e Jose sorriu batendo palminhas. — Como sempre, estou certa. — Disse e se virou para Daphne. — Agora me diga, como se deu conta do óbvio? — Apenas me dei conta. — Ela falou dando de ombros, percebendo o quanto era doloroso estar apaixonada. — Bom, você já consegue admitir em voz alta, isso já é um passo e tanto. – Disse Sophie lhe dando um sorriso aprovador. — Se puder dar um conselho, aproveite enquanto tem a oportunidade Daph, seja sincera com ele. — Disse Seraphne e Daphne ponderou. Talvez sua irmã tivesse razão. — E se não sentir o mesmo? — Ela perguntou com a voz falha e se deu conta de que sua maior preocupação era aquela. — Daph, já vi como ele olha para você. Tenho certeza que nesse momento ele deve estar se fazendo essa mesma pergunta. Ela anuiu, seria um tanto vergonhoso, mas poderia tentar ser agradável. A noite, se preparou para ir ao clube, desta vez usou um vestido azul royal, as mangas caíam pelos seus ombros deixando seu colo à mostra, levava luvas de seda branca, e pérolas em seu pescoço, escolheu uma máscara da mesma cor do vestido e fez um coque volumoso onde colocou forquilhas com pedras preciosas ao redor. Uma das coisas que ela mais adorava em ser a dona de um clube era que tinha a liberdade para ser ousada em suas indumentárias. Quando desceu para o andar de baixo encontrou o marido no pé da escada esperando por ela. Ele conseguia se superar cada vez mais em questões de beleza. Usava calças de veludo negro e um colete prateado por cima da camisa também negra, o sobretudo que usava ia até os joelhos, e os cabelos brilhantes estavam jogados para trás, sensualmente, mas a melhor parte era sem sombra para dúvidas a máscara negra que cobria metade do rosto perfeitamente esculpido, possibilitando ver apenas as íris flamejantes reluzindo como duas estrelas. Daphne esqueceu como respirava enquanto descia as escadas e teve medo de perder o movimento das pernas e sair rolando. Então pegou firme no corrimão. Era a primera vez que sentia tão nervosa enquanto ia de encontro a ele, insegura, e temerosa. Nem mesmo no dia do casamento dos dois ela se sentiu assim, e deduziu que isso era porque agora ela sabia que o amava. Ele ergueu um mão coberta por uma luva de couro marrom para ela, e ela a pegou deixando que ele a envolvesse com os dedos. — Está pronta para ir? — Perguntou e sua voz soou como um canto sensual. Daphne assentiu, e foram em direção a rua. Ela tinha enviado um bilhete para Brooke mais cedo, por isso sabia que seu coche particular estaria ali. Assobiou e logo ele apareceu, ao entrar na carruagem Daphne soube que dali em diante, tudo seria diferente. ∞∞∞ A partir do momento que ela desceu as escadas, Alec soube que sua cor preferida tinha deixado de ser verde e agora era o azul. Ultimamente esteve vendo o azul em todos os lugares que mais gostava. Esparramado entre os lençóis enquanto eles se beijavam, cobrindo o corpo dela naquela vestimenta que a deixava exuberante, e principalmente nas íris sensuais, que insistiam evitar olha-lo. Ela estava muito quieta, fitando todo o percurso pela janela, batendo com a sola do pé no chão do veículo. Provavelmente estava chateada por estar ele acompanhando-a até o seu trabalho. Alec sentia muito, mas não podia ser diferente. Ele jamais permitiria que ela pusesse os pés ali novamente sozinha, era um clube feminino, mas não deixava de representar perigo. Não se sentia muito confortável usando calças, nunca encontrava a medida certa, e acabava sempre apertado demais, porém o kilt deixaria sua identidade muito em evidência. Já que não se costumam ter por aí homens usando "saias", como diria sua engenhosa esposa. A carruagem parou no beco escuro, na rua detrás do grande clube, e estava completamente vazio. Um homem saiu de uma porta escura para recebê-los. — Boa noite lady D. — Disse ele e Alec o reconheceu, era o homem chamado Brooke. Daphne sorriu gentilmente. — Boa noite, Brooke. — Disse ela, e ele estendeu a mão para ajuda-la a descer. Seus olhos revelavam que ele a admirava. — Você já deve conhecer o meu marido. Ela indicou Alec com o dedo e o homem não tinha notado ele ali até aquele momento. Fez uma reverência digna de pena. — Seja bem vindo, Sua Alteza. — Ele disse, e Alec o olhou de cima, depositando uma mão na cintura da esposa. Sendo bastante claro com aquele gesto. — Aqui o chamaremos de lorde D. — Daphne continuou e o homem assentiu, andando para dentro do clube, indicando que eles o seguissem. Quando ele ficou seguramente afastado, Alec se aproximou por trás da bela mulher. — Lorde D? Sério? Por que não Lorde A? Ou até mesmo N? — Perguntou de modo brincalhão e os cantos dos lábios dela subiram levemente. — Meu clube, minhas regras. — Falou de maneira sagaz e ele ficou encantado por sua beleza. Entraram por uma porta que dava para um corredor e após alguns passos Alec reconheceu onde estava. Eles tinham chegado cedo, o clube não estava aberto ainda, por isso alguns funcionários passavam para lá e para cá, sempre apressados para chegar em algum lugar. O homem chamado Brooke abriu a porta do escritório dela e deu passagem para que os dois entrassem, ali de novo naquele escritório um pensamento desagradável passou pela cabeça dele e sentiu um enjoou súbito ao imaginar Daphne usando aquele escritório no passado, com um maldito de nome semelhante a um barulho de vômito. Ele afastou essa ideia intrusa para longe e prestou atenção somente no escritório. Tudo era admiravelmente decorado, os móveis eram de alvenaria, tinha uma escrivaninha de mogno muito bem organizada, um lustre no teto cheio de velas, um tapete vermelho no chão, e poltronas de couro marrom avermelhado bem distribuídas. — Aconteceu alguma coisa em minha ausência? — ela perguntou adotando uma postura de negócios, ele sentiu seu corpo tremer de desejo. — Bom, não abrimos no domingo, e na semana o movimento foi regular. Apenas pequenas brigas costumeiras em mesas de apostas. Eu e meus homens demos cabo da situação rapidamente. — Disse ele com os olhos focados nela, e um sorriso muito audacioso para o agrado de Alec. — Acredito que sim. — Ela disse gentilmente. — Agora que já cheguei, pode mandar que abram as portas. — Sim, milady, com licença. — Ele disse e com uma reverência, se foi, fechando a porta ao passar. Alec tirou os olhos da porta e os dirigiu para ela, muito bem sentada atrás de sua mesa grande. — Esse homem quer você. — Constatou e ela ergueu os olhos céticos para ele. — Brooke trabalha aqui desde que o clube foi aberto e nunca tomou liberdades comigo. — Falou e ele franziu os lábios, a máscara estava esquentando o seu rosto. — O que ele faz aqui? — Perguntou caminhando até uma janela e puxando uma fresta da cortina de onde podia ver o salão de baixo, que ainda estava vazio. — Ele é o chefe de segurança. — Respondeu, voltando sua atenção para uma espécie de planilha grossa e encapada. Na noite que tinha estado ali em busca de sua esposa, Alec não parou para prestar atenção que até mesmo quem trabalhava nas roletas e nas mesas do cassino, eram mulheres, vestidas formalmente, escondendo os rostos com diferentes tipos de máscaras. Aquele lugar devia ser uma espécie de paraiso masculino, mas na verdade era o contrario. Em uma sociedade onde uma mulher deve ser o retrato da prudência e dos bons modos, a sua esposa tinha criado um antro onde o seu sexo não recebia nenhum tipo de descriminação por agir exatamente como um homem agiria. E ele se pegou completamente enamorado por ela. Sua Afrodite selvagem e corajosa. Daphne representava o perfil perfeito de uma esposa escocesa, forte, determinada, certa de suas decisões. Assim como sua mãe foi. E Alec se sentiu tão sortudo que desejou beija-la. Foi até aquela mesa, e se sentou em sua frente. — Quero que me mostre como funciona tudo neste local. — disse cruzando as pernas. Em uma pose relaxada. Ela ergueu os olhos para ele, vê-la ostentando aquele semblante sério de negócios enviava ondas de desejo pelo peito dele. Um dia no futuro ele a comeria ali naquela mesa, usando nada mais que aquela máscara e os sapatos, talvez ele deixasse as pérolas. Com certeza ele deixaria as pérolas. — Posso saber o por quê do interesse? — Questionou, parecia insegura, e brincava com uma pena de escrever entre os dedos. — Alguém terá que tomar conta de tudo quando você estiver grávida. — Mesmo com a metade da face coberta, ele pôde ver que ela ficou ruborizada. — A mim não soa nada agradável a ideia de servir unicamente com o propósito de lhe conceder um herdeiro. — Replicou, no seu tom não tinha nada de austero ou rude. Ele achou aquilo além de estranho, imaginou que ela fosse atira-lo pela janela. — Mas será assim, e não pararei no primeiro, desejo ter no mínimo quatro. — Falou com total sinceridade e ela abriu a boca, pasma. — Cinco? — Levantou, e caminhou de lado para o outro, em busca de ar. — Está vendo? Era justamente isso que eu temia, me casar e me transformar em uma mulher sem objetivos. — Não será uma mulher sem objetivos Daphne, será mãe, e esposa, e se te alegra, deixarei que continue com os seus negócios, mas será em casa. Se quiser manter o clube, terá que aceitar essas condições. — Ela foi de suave à irritada em questão de segundos. — Me recuso. — Disse firme. — Me recuso a regredir dessa maneira apenas porque você quer que seja assim. — Se não queria um casamento, não tivesse batido em minha porta pedindo por um. — Ela bufou, cada centímetro de pele branca ficando vermelha. Aí estava sua Daphne. — Se é desta maneira deveria ter concluído todo o serviço noite passada, se está tao desesperado para manter o seu precioso castelo não deveria desperdiçar um só gota de sua preciosa semente. — Ele ergueu as sobracelhas, sabia que uma hora ou outra ela falaria sobre isso. — Daphne, eu não quero que engravide para manter o castelo. Eu quero que você queira ter um filho comigo, eu quero que deseje isso tanto quanto eu desejo. — Ele inspirou, frustrado. — Mas talvez eu tenha me precipitado, talvez isso esteja mais distante do que nunca. Ele passou uma mão nos cabelos, cansado. Aquela luta entre os dois seria eterna. Daphne nunca poderia ser totalmente dele, não enquanto ainda ansiasse pela vida de uma mulher liberta. Ele esperou que ela dissesse alguma coisa, que desse qualquer indício de que ele estava errado, mas ela não o fez. — Estarei conhecendo o clube, me chame quando decidir ir embora. — Falou e deu as costas, sentindo o peso de seus olhos em seus ombros ao fechar a porta e sair dali. Capitulo dezesseis No dia seguinte Daphne acordou bem tarde, e ficou a maior parte do dia enclausurada em seu quarto. A viagem de volta para casa foi bem sombria e pesada. As palavras dele ainda esmagavam o seu peito. E a verdade não parava de berrar em sua cabeça. Ele estava certo, sabia que ele estava, mas a parte sua que sonhou com aquilo, preferia acreditar que ela poderia achar uma saída. Não poderia ser mãe, e dona de um clube ao mesmo tempo. A não ser que tivesse o menino e deixasse a criança sob os cuidados de uma ama, ou deixasse que o pai o levasse para morar nas highlands em Stirling, mas nunca seria capaz disso, nunca. Nunca tinha pensado em si mesma como mãe, mas agora que tinha que pensar, se imaginava sendo uma igual a sua, ou as suas irmãs. Se Alec escolhesse ir para Stirling, teria de ir sozinho. Ela estava de frente para uma bifurcação, um lado indicava seu marido e tudo o que ele representava, e o outro indicava o clube, junto com todos os seus sonhos e esforços. Escolher um significava dar definitivamente as costas para o outro. E ela não tinha certeza se queria libertar qualquer um dos dois. Ele passou aquele dia fora, Deus sabe onde, e ela fingiu não se importar com isso enquanto ajudava Ashleigh, junto de suas irmãs, a pôr em prática seus estudos de etiqueta. — Uma dama nunca deve sorrir durante a dança, ou demonstrar qualquer tipo de emoção de maneira exagerada. — Sophie ia falando enquanto lia um manual de etiqueta, o restante das moças ali encaravam o teto com tédio absoluto. — Isso é ridículo. — Ashleigh falou, aborrecida, jogando os braços para cima. — Foi o que disse há quatro anos atrás. — Daphne disse, aquele almanaque era pedante, assim como a velha frígida que o escreveu. — Basta que saiba dançar e que não seja pega nos jardins aos beijos com o anfitrião, e se sairá bem. — Disse Seraphne escondendo um sorriso com a mão. — Que belos exemplos vocês são. — Sophie as repreendeu com um olhar. — Isso será um problema, em vista de que não sei dançar. — Ashleigh falou. — Não sabe dançar? — Sophie quase gritou de espanto. — Como pode não saber dançar? — Nunca fui a um baile antes. — Ashleigh disse quase apavorada pelo surto da duquesa. Sophie suspirou cansada, e andou até o meio da sala. — Venha até aqui. — Chamou a escocesa, que foi mesmo relutante. — Tudo que deve fazer é deixar que o seu parceiro te guie, assim. Sophie colocou uma mão na cintura dela, e a outra na mão dela, e tentou guia-la nos passos de uma valsa. Ashleigh era quase como um boneco de madeira sem juntas. Dava pisões nos pés da duquesa, e vez ou outra atropeçava nos próprios pés. — É como tentar ensinar um urso a patinar. — Josephne sussurrou para Seraphne e a irmã escondeu a boca com a mão para esconder um riso. — Sou um fracasso! — Disse a menina, desistindo e indo se sentar no sofá, onde escondeu o rosto com as mãos. — Peça que meu irmão cancele esse baile, eu só irei envergonha-los. Daphne arregalou os olhos ao ter uma idéia brilhante. — Máscaras! — Gritou e as mulheres ali a olharam como se fosse louca. — Um baile de máscaras. — Repetiu e os olhos de suas irmãs acenderam. — Magnífico Daph. — Disse Josephne, e Daphne sorriu lisonjeada. — Como isso poderia ser a solução para o problema de Ashleigh? — Sophie perguntou. — É bem uma verdade que quando as pessoas sabem que suas identidades estão protegidas se sentem mais livres para fazer coisas que normalmente não fariam. — Ela explicou, Sophie ergueu as sobrancelhas. — Está sugerindo que com a máscara Ashleigh poderia aprender milagrosamente a dançar? — Indagou, cerrando os olhos de maneira cética. — Estou afirmando que sim. — Ela andou até o meio da sala até Ashleigh. — Eu já a vi patinando sobre um lago congelado e tinha a desenvoltura de cisne. — Mas não é a mesma coisa. — Disse Ashleigh, embaraçada. — Sim, o é. — Falou Sophie, andando até sua pupila. — Se pode se equilibrar sobre o gelo, pode também valsar. É tudo uma questão de adquirir confiança. Ashleigh estava de cenho franzido e ainda não as entendia, mas não parecia abominar a idéia e isso já era o suiciente. — Muito bem. — Disse Daphne. — Faremos um baile de máscaras então. ∞∞∞ — Conhecem um homem de nome Garett? — Os três cavalheiros que até então estavam concentrados na mesa coberta por veludo verde, ergueram os rostos para Alec. Aquele noite, após esperar Daphne inutilmente para o jantar, Northwest resolveu aceitar o convite de Christopher para jogar uma partida de bilhar em sua casa. Mas nem mesmo distante da esposa ele conseguia reprimir os anseios em seu coração. — Conheço Garett Payne, o contador de Phillip York. — Sebastian respondeu alheio ao cenho franzido dele. Odiava saber o nome e agora odiava saber o sobrenome do maldito. — Ele quem foi o padrinho de Phillip no dia que me pediu um duelo, anos atrás. — Disse Thomas, mirando em uma bola e a acertando em uma tacada precisa, o pequeno objeto correu pela mesa, se chocou com a bola vermelha de Christopher, que rolou para dentro do buraco. — Por que o interesse no homem? — Perguntou Christopher, usando um pequeno pedaço de gesso para polir a ponta de seu taco. — Estou buscando seu paradeiro. — Ele respondeu, fitando a fumaça do charuto em seus dedos serpenteando pelo ar. — Eu não sabia que tinha voltado para suas antigas atividades. — Disse Sebastian arqueando um sobrancelha para ele. — Não voltei. — Alec falou, se preparando para fazer a sua jogada. Avaliou os ângulos da pequena bola de marfim verde e levou ela vários centímetro à frente com uma só tacada, imaginando ser as bolas de Garett Payne. — Por que estou achando que isso tem algo haver com Daphne York? — Sondou Christopher de olhos cerrados, e um sorriso "sabetudo" no rosto irritante, e o outro duque lhe lançou um olhar ameaçador. — O nome dela é Daphne Lancaster agora. E eu preferia que a chamasse de lady Northwest. — Corrigiu sério e Christopher abriu um sorriso debochado. — Perdoarei seu mal humor porque já estive em seu lugar e sei o quão terrível é estar apaixonado por uma mulher arredia. — Disse o duque e Alec o olhou irritadiço. — Como pode dizer isso com tanta certeza? — Indagou entre dentes. — Não estaria tão raivoso e temperamental se não tivesse apaixonado. — Ele falou, sabiamente. — Todos já estivemos em sua posição meu caro, nem mesmo o diabo é capaz de se esquivar da flecha do cupido embora no seu caso eu diria que a flecha tenha vindo um pouco danificada. Tudo que Alec fez foi ignora-lo, escondendo o rosto dentro do copo de brandy. — Bricadeiras a parte, se deseja um conselho, é bom que seja sincero com ela enquanto pode ou a oportunidade escapará de suas mãos e demorará bastante até que possa dizer de novo. — Disse Christopher adquirindo um semblante muito sério. Os outros dois amigos ficaram em um silêncio de acordo e Alec ingeriu um gole daquele brandy, sentindo o sabor se tornar desagradável em sua língua, como fel. Olhou para o teto abobadado da sala de jogos onde pendia um lustre brilhante. — Não posso, não é recíproco. — Disse, quase sem acreditar que tinha mesmo revelado aquilo na frente de seus amigos. Aquela era uma demonstração de fraqueza, e Alec não gostava de se sentir fraco. Em sua covardia decidiu andar até uma estante onde girou um pequeno globo terrestre. — Eu descobri o que ela vai fazer no Rough Diamond. Os três homens o olharam em um silêncio medonho. Alec olhou em direção a porta da sala de jogos, se certificando de que estavam em completa privacidade. Não se podia mais confiar totalmente nos criados. — Ela é dona do lugar. — A frase reverberou pelo ar como um disparo de canhão. — Não vou dizer que estou impressionado, isso era algo que eu já esperava de Daphne. — Disse Sebastian, com um sorriso quase orgulhoso. — O que você vai fazer com relação a isso? — indagou Thomas e Alec o olhou inexpressivo. Adoraria ter a resposta para aquela questão, mas não seria Alec quem deveria responde-la. Tudo estava nas mãos de Daphne, somente ela poderia decidir o que faria com o próprio destino. Embora todo o ser dele gritasse: escolha a mim. Escolha a mim. Escolha a mim. Mesmo que em seu íntimo ele já soubesse que ela jamais iria escolhe-lo. Bridget não o escolheu. E Daphne não seria diferente. Sequer o amava. Se amasse, não restaria a dúvida. Bridget ao menos tinha a decência de fingir, mas ele não podia reclamar pois era justamente por não ter filtros que ele admirava a pequena esposa. — O que mais eu posso fazer? Proibi-la? — Ele indagou, realmente eeperando que um de seus amigos tivesse uma solução, qualquer solução para seu problema. — Se proibi-la é capaz de ela fugir como fez sua primeira noiva. — Disse Sebastian e ele se sentiu apavorar com essa idéia. — Bridget me largou nas vésperas do nosso casamento e eu não me importei o suficiente em ir atrás dela, Daphne já é minha, terá que correr muito longe para conseguir fugir de mim. — Apenas quando ouviu as palavras impulsivas deixarem sua boca Alec se deu conta que durante todo o tempo esteve com a resposta que esteve esperando ouvir de seus amigos. Ele também tinha sua própria escolha. Daphne tinha algo alem do apego emocional pelo clube, era o legado dela e ele estava sendo egoísta por fazê-la abrir mão disso pelos desejos dele. Sim, ele queria uma família com ela, e se a proibisse de fazer o que amava ele estaria apenas afastando ela ainda mais dele, e não podia mais suportar isso. Stirling tinha sido seu lar desde menino, e era onde guardava suas lembranças mais preciosas mas o que realmente importava não era o castelo, mas sim as pessoas com quem ele tinha aprendido os princípios de uma família. Seus pais. Enquanto ele tivesse Daphne e Ashleigh, ele já teria tudo o que realmente importava. ∞∞∞ Os dias que se seguiram foram corridos. Para Daphne e principalmente para Ashleigh. Teriam que transformá-la em uma pérola antes que chegasse o dia de sábado e Daphne não estava descansando um segundo sequer. Juntamente com suas irmãs, estavam correndo contra o tempo, como um quarteto de heroínas na missão de preparar a jovem escocesa para ser apresentada em sociedade. Em quatro dias, Ashleigh teria que aprender tudo que se dizia relacionado a um jantar formal e a etiqueta nos bailes da alta sociedade. Os vestidos que elas tinham encomendado pelo modista Gianny tinham chegado na manhã de quinta feira. Um desfile interminável de musseline, seda, cambraia cetim, tafetá, algodão, véu, e veludo. De variadas cores e modelos. A maioria cores claras, e brancas, que remetiam a pureza e a delicadeza que uma debutante deve ter. Nas tarde elas ensaiavam os tipos de dança, o reel, e principalmente a valsa. Também tentaram ensina-la como cumprimentar o seu parceiro após uma dança, como se comportar durante o balé, e o que nunca falar durante uma conversa. A jovem ouvia a todas as dicas com aborrecimento fingido, mas Daphne via em seus olhos o brilho da excitação. Vez ou outra Alec se juntava a elas no salão e tentava ele mesmo guiar sua irmã. Era um exímio dançarino e Daphne sabia disso pois costumava vê-lo dançar de longe nos salões de baile. A única coisa boa de se manter ocupada com as preparações para o baile, foi que ela pôde fugir das questões insinuantes em sua cabeça. Ela não estava fugindo dele, ou da responsabilidade que tinha que tomar, mas sentia que precisava daquele dias de distância para poder ver com coerência, e listar todos os prós e os contras e tudo pelo qual ela poderia abrir mão. Alec sentia que ela precisava daquele espaço, era como se conseguisse compreende-la apenas com as respostas do corpo dela e isso deixava Daphne atordoada. Eles dois voltaram ao Rough Diamond todos os dias naquela semana, mas não ficava muito tempo próximo dela, logo a deixava sozinha na privacidade do escritório e ia fazer rondas pelo clube com Brooke. Ele estava muito mais familiarizado com tudo. A parte mais perturbadora para ela, era quere-lo quando estava distante, e quere-lo mais ainda quando estava perto. Isso devia significar alguma coisa. Daphne ficava horas olhando o movimento de pessoas na planta baixa do clube. Aquilo tudo representava a liberdade, não somente dela, como também de várias mulheres, a liberdade de casamentos forçados e de maridos agressivos, a liberdade de escolha, que é tirada no momento em que nascem. E ela se sentia orgulhosa disso. Contudo, a parte revolucionária dentro dela parecia querer abraçar a outra parte, a parte que desejava ser mãe, e jamais admitiria em voz alta, a parte que também queria ser esposa. Ela sentia no fundo dos seus ossos que Alec era o homem perfeito para isso. Era um homem incrível, e sabia que se fosse qualquer outro em sua posição, jamais a aceitaria. Jamais. Talvez fosse por isso que ela sempre o admirou. Mesmo dando todos os indícios de que o desprezava. A sua liberdade em cometer escândalos, a sua inclinação para o errado. Era como ela no fim de tudo, com o diferencial de que tinha mais determinação ao tomar suas decisões. Ele estava ali, ao alcance das mãos dela, e estava oferecendo tudo para ela, porém, Daphne sentia as mãos pesadas demais para se mexerem. Na noite anterior ao baile ele entrou no quarto dela quando ela se preparava para dormir. Ele segurava uma caixa nas mãos. Seus olhos de fogo líquido vasculharam o corpo dela coberto por uma camisola de seda, e ele andou a passos felinos até ela. Parando a pouco centímetros em sua frente, metade do seu rosto estava sendo iluminado pelas chamas na lareira, a outra parte estava ocultada pela escuridão. — Amanhã será a nossa primeira apariçao como um casal. — Disse e ela assentiu, apenas para não ficar lá, parada como uma estátua. —Sei que não gosta da cor, ou da estampa, mas eu ficaria muito feliz se usasse isso. Ela pegou a caixa que ele estendeu e a colocou em cima da cama. Puxou a fita de cetim que a fechava e a abriu. Ela olhou o monte de tecido lá dentro, e o puxou pelas alças para fora, ergueu-o no ar para vislumbrar a peça de roupa. O vestido que tinha um decote em formato de coração e a cintura alta, exibia um emaranhado de tecidos que faziam um jogo fascinante de estampas. Nos acabamento das barras em cima dos seios, uma estreita fileira de quadriculado verde e negro faziam um belo contraste com o prateado perolado da seda, pérolas e mais pérolas na parte de trás do fecho. E ela se imaginou facilmente ali dentro, o perolado deixaria o tom branco dos seios dela em evidência. As saias caiam volumosas e prateadas, com uma grossa camada de véu cintilante por cima. — Alec, é lindo. Eu adorei. — Ela falou controlando todas as emoções que formavam um bolo em sua garganta. — Que bom que gostou. — Ele sorriu para ela. — foi o vestido que minha mãe usou em seu debute, eu gostaria que tivesse usado no dia do nosso casamento, mas ele estava em Stirling. — E foi naquele instante, ao ouvir as aquelas palavras doces saírem sua boca, que ela sentiu algo desprender e soltar. Uma chama, que até então era pequena e enclausurada, queimou como uma fogueira em um solstício de verão, aquecendo tudo que era frio e escuro, e ali Daphne soube, simplesmente soube, e chegou à uma decisão. Capitulo dezessete Ser uma duquesa exigia muitas coisas, coisas com as quais Daphne ainda não tinha sequer sonhado em lidar. Sempre achou que alta sociedade tinha regras inúteis demais, coisas simples, como por exemplo o ato de sorrir, uma duquesa não deveria sair por aí mostrando os dentes a quem quisesse ver, porém naquela noite isso se tornou uma tarefa impossível para ela. Não conseguia parar de sorrir. Dentro daquele vestido, ela se sentiu como uma rainha, e sabia que estava incandescente, não de beleza física, mas sim de felicidade. Seu marido estava ao seu lado, e os dois estavam parados na porta da Northwest House junto de Ashleigh recepcionando seus convidados. Ele estava quase inacreditável de tão bonito. Com os cabelos penteados para trás, formando um leve topete na testa lisa, usava uma máscara veneziana prateada com acabamentos em seda verde. Um fraque negro por cima de um colete grafite e uma camisa de linho branco, o kilt verde de costura impecável caindo até a altura de suas canelas, e as meias brancas até os joelhos e botas hessianas. Era belo. E era dela. Mas aquela noite não poderia girar somente em torno dos dois, também tinha Ashleigh, a jovem escocesa estava exuberante. Seu vestido rosa pálido era simples mas mesmo assim denotava elegância. Usava luvas de seda perolada e tinha os cabelos recolhidos em um penteado elaborado. Pela primera vez via-se como uma mulher, feminina, uma flor que acabava de desabrochar na primavera, não mais como uma garota. Usava um colar com uma única esmeralda no pescoço e alguns cachos de seu bonito cabelo castanho, caiam em volta da sua máscara de tecido translúcido e rendado. Na hora das apresentações ela envolveu as mãos com as de Ashleigh, tentando lhe passar alguma tranquilidade, quando na verdade ela tamvem tentava buscar alguma tranquilidade para si mesma. Era a primeira vez que ela apareceria em público como uma mulher casada, e a fama já não era muito boa. Daphne nunca tinha se importado com as más línguas, mas naquele momento, tudo girou em torno daquilo e do desejo de que o mundo soubesse que ela era apaixonada por Alec, que o casamento dos dois era real e não havia sido impulsionado apenas pelo dote dela e a necessidade dele de se casar. Ela desejou loucamente que soubessem que ele era inteiramente dela. Quando todos os convidados já tinham chegado, eles caminharam para dentro do salão. Estava orgulhosa da decoração e davia todo o crédito para suas irmãs. Tudo estava na medida certa para proporcionar o clima de misterioso que ela desejava. A iluminação era feita por velas colocadas em lustres. Os arranjos eram feitos de rosas vermelhas e cortinas e mais cortinas de cetim fuscia. No centro do salão, os móveis haviam sido afastados de modo que criasse uma pista de dança. Eles atravessaram o salão em direção ao seu grupo de amigos. Sophie e o marido formavam um casal inigualável. O homem era grande e intimidante e tinha um olhar gelado como o pólo norte, enquanto a duquesa era serena e esguia, e seu olhar transmitia bondade. Christopher usava uma máscara de veludo negro e não deixava de tocar na esposa sempre que tinha a oportunidade. Quando os viu se aproximando, Sophie olhou para Daphne de um jeito estranho. Daphne já a conhecia o bastante para saber que ela estava querendo contar alguma uma coisa. — Chegaram em boa hora. — Disse Standhurt. — estávamos indo pegar uma bebida, deseja ir conosco Alec? — Invés de responder Alec olhou para ela em busca de permissão. Daphne ficou muito mais do que surpresa com aquilo. — Tudo bem, ficaremos bem. — Ela disse, embaraçada e ele assentiu uma vez com a cabeça. Mas antes de ir Alec se aproximou dela o suficiente para falar perto do ouvido. — Reserve a primeira valsa para mim. — o calor de sua voz batendo no lóbulo da orelha dela desceu como um rojão até o centro de suas pernas. Ela tragou saliva, olhando nos seus olhos quentes enquanto ele se afastava junto dos outros lordes. — Que belo vestido Daph, exótico, mas muito bonito. — Disse Josephne olhando o longo vestido. — Foi o vestido de casamento de minha mãe. — Disse Ashleigh, com orgulho e Daphne sorriu com afeto para a cunhada. Elas estavam em um ponto estratégico, de onde tinham uma vista bem ampla do salão, quando Marie York as viu ali, pegou o marido pela manga e o puxou até elas, trazendo o senhor Harrison junto. — Olhe para nossas filhas Phillip, foram ou não foram feitas para isso? — Perguntou com o peito cheio de orgulho e Phillip quase rolou os olhos. O patriarca se inclinou para depositar um beijo na testa de Daphne. — Está preciosa minha Daph. — Ele susssurrou no ouvido dela e Daphne sorriu com amor para seu pai. — Me reserva a valsa lady Lancaster? — Perguntou Phineas e Daphne olhou para o homem temendo que aquilo pudesse causar algum desentendimento com seu marido, mas para sua surpresa os olhos de Phineas não estavam nela, mas sim em Ashleigh. O rosto da moça ficou pálido imediatamente enquanto ela assentia de maneira automática. — Oh, estou vendo Dolores Fowkes, ela sempre esteve falando algo de Daphne nos salões de bailes. quero só ver o que ela tem para me dizer agora que minha Daphne é uma duquesa e sua anfitriã. — Disse Marie, e as mulheres observaram com olhares de pena enquanto seu pai e Phineas eram arrastados para longe. — Isso foi uma péssima ideia, eu vou errar todos os passos, sei que vou. — Disse Ashleigh saindo da armadura de donzela e sentando- se em uma cadeira para esconder o rosto com as mãos. Sophie foi imediatamente até ela e a levantou. — Não há o que temer, seu irmão será o primeiro a dançar com você, logo verá como é simples. — Falou tentando acalma-la. Ashleigh pareceu concordar, do seu jeito receoso, mas concordou. Sophie permanecia dando olhadas para Daphne de maneira inquieta, e Daphne não teve a oportunidade de perguntar o que a afligia, pois um desfile interminável de pessoas foram cumprimenta-las. Pouco mais de quinze minutos depois, seus cartões de baile estavam razoavelmente cheios e a orquestra se preparou para começar o reel. Alec veio buscar sua irmã para levar para a pista de dança, e Daphne olhou para seu cartão de baile para saber com quem seria sua primeira dança, sentiu dor de estômago ao ver o nome de Mellbourne. Quando o homem cruzou o salão de baile para leva-la para o salão, Alec a olhou enviesado, sem tentar esconder seu descontentamento. Uma fila de casais se formou na pista de dança e Sophie se colocou ao lado dela com o barão de Sheffield. Formando duas filas impecáveis de casais. O som do violino começou a tocar ao mesmo tempo que somente as mulheres davam um passo a frente e executavam o primeiro passo, Sophie se inclinou para ela. — Há algo que quero te contar. — Disse, fazendo um giro ao redor de seu parceiro de dança e se afastando para acompanhar o seu par, Daphne fez o mesmo com Mellbourne, juntando as mãos protegidas por luvas, e se enredando pelos casais que faziam os passos com extrema perfeição. Era uma dança complicada que exigia um pouco de concentração. Ela deu uma olhada em Ashleigh e Alec, o escocês guiava a sua irmã com calma, sem se importar com os outros casais ao seu redor. Novamente ouve um giro e uma troca de casais. — Sobre o que? — Ela perguntou ao passar por trás de Sophie para tomar o seu lugar com o barão. O homem seguia a dança com os olhos fixos nos pés, com medo de errar o passo. — Sobre Northwest, desvendei o mistério por trás de tudo. — Ela respondeu dando um pulo com Mellbourne, e voltando a ocupar o seu lugar com Sheffield. A revelação fez Daphne errar o movimento e dar um encontrão no peito de Mellbourne. — Perdoe-me. Se recompôs e lançou outra olhada para Alec e ele a olhava com o cenho franzido de preocupação. Desviou seus olhos, incapaz de esconder o medo que ebulia suas vísceras, fez os passos seguintes quase automaticamente, sentindo os lábios frios e os pêlos da nuca eriçados. Estava submersa na curiosidade que existia há quatro anos, aquilo seria finalmente o fim de suas especulações? os pensamentos não paravam de brotar em sua cabeça. Ela passou por Sophie ao dar um giro e as saias dos vestidos das duas farfalharam. — Então me conte, o que está esperando? — suas mãos se juntaram por um segundo. — Há algumas noites, eu ouvi uma conversa entre os lordes no salão de jogos de minha casa. — Disse rapidamente antes de ser puxada para longe pelas mãos de Sheffield. Daphne bufou de frustração. Juntou suas mãos com as de Mellbourne, ele deu um sorriso irritante para ela, e a girou executando com perfeição o passo seguinte, seguido de um pulo, mesmo ela sendo tão mais pequena, ele conseguia guia-la sem qualquer dificuldade. Um giro, um salto, um cruzar de mãos depois, com um grande rodopio pela sala, a música cessou e Sophie a puxou para um canto do salão para terem meio minuto sozinhas antes que alguém as atrapalhasse de novo. — Eu os ouvi dizer que há doze anos atrás, Northwest, ele abandonado pela noiva nas véspera do casamento. ∞∞∞ Alec aguardava inquieto a chegada da primeira valsa. O momento glorioso quando teria sua esposa só para sí, quando tomaria ela entre os braços e rodopiaria pelo salão na vista de todos. Infelizmente enquanto essa hora não chegava ele tinha que se contentar em ficar em silêncio em um canto do salão, enquanto assistia ela dançar com uma caravana de débeis de mãos escorregadias. Pensou vez ou outra em simplesmente ir até ela e toma-la em seus braços, mas não pôde fazer isso, ou apenas iria estragar o grande momento de Ashleigh. Então ele ficou em silêncio admirando-a enquanto dançava, a seda de suas saias esvoaçantes, prateada com o tartan dos Armstrong formando arabescos pela barra, os cabelos dourados, tão bem penteados em um coque trabalhado que nem parecia aquela mata de fios selvagens, e mesmo de longe dava para ver o brilho do diamante em seu dedo. Vez ou outra ela o dirigia olhadas furtivas, apenas para virar o rosto logo em seguida. Ele não tinha deixado de notar que ela tinha estado estranha desde sua primeira dança com Mellbourne, estava evitando olha-lo diretamente e parecia incômoda. Isso fez algo ruim acordar dentro dele. Quando a música parou ela se despediu do seu par com uma reverência e um sorriso cortês, e se juntou as outras ladys, andando até eles vagarosamente. Ashleigh sorria abertamente, conversando alegremente com lady Haddington, ele estava feliz em ver sua irmã sorrir de maneira tão descontraída, não via ela assim há muito tempo, anos na verdade. A cada minuto ele ficava mais certo de que tudo que Ash precisava era de uma presença feminina. Ele foi um parvo por demorar tanto em fazer justamente isso. Sua mãe morreu muito cedo e Ash não teve tempo de aprender a lidar como uma mulher. Ele tentou dar o seu melhor, lhe falando sobre as regras mensais e sobre as mudanças em seu corpo, mas isso só resultou em momentos embaraçosos e uma demonstração nítida de sua falta de tato. Daphne chegou até ele e lhe um breve olhar antes de se colocar ao seu lado, suas feições estavam rígidas, e suas sobrancelhas formavam um arco pra baixo. Ele sentiu que algo estava errado. Ele nunca tinha visto aquele olhar no rosto de Daphne antes e não gostou nada. Quinze minutos depois a valsa estava sendo anunciada, e o cretino do Harrison surgiu do inferno para acompanhar Ashleigh. Antes que Alec pudesse dizer qualquer coisa, ela recebeu o braço dele e foram em direção a pista de dança. Ele falou algo para ela, que imediatamente se ruborizou, e respondeu com um enorme sorriso coquete. Foi então que uma realidade se chocou com Alec, sua pequena irmã já não era mais tão pequena. Abriu um sorriso involuntário, ao mesmo que se sentia grandemente feliz, e se virava para sua esposa, para fazer o que sempre quis fazer, mas nunca fez. Tira-la para dançar. Ofereceu a mão para ela, que o recebeu com um meio sorriso sem graça, logo voltando a olhar para os próprios pés. Ele ignorou a irritação em seu íntimo, ela era muito mais pequena, e sua mão repousava em suas costelas, na curva do espartilho, ela encarava o lenço no pescoço dele, fixamente. Alec resolveu ignorar o aperto no peito e se preparou para guia-la ao início da música. — Você parece estar me evitando, meu doce. — Ele comentou quando a primeira nota soou pelo ar, e eles deram o primeiro passo em direção a plenitude. Ela sorriu nervosamente. — Como poderia estar te evitando, estando literalmente em teus braços? — mas mesmo assim aquilo não o convenceu. Os primeiros passos da dança se seguiu fluentemente, por um momento foi como o momento que os dois tiveram no lago em Kinlochleven, eles giravam e deslizavam, e ele estava concentrado naquele momento, anos e anos vendo-a de longe, sempre resplandecente, sorrindo e quebrando centenas de regra de etiqueta em meio a valsa. Agora ele era o felizardo da vez, ela girava com uma graciosidade quase pura, o brilho de centenas de velas refletindo o loiro de seus cabelos, os longos cílios formando um leque de plumas sobre os olhos azuis, os lábios carnudos e rosados erguidos em um sorriso gentil, e Deus, como ela era linda, a mais adorável e intrigante das criaturas, e tão claro quanto a neve do inverno escocês, como no dia em que de casaram, Alec se deu conta de que não poderia ficar um só dia sem ela. Foi incapaz de controlar a risada e ela o acompanhou, por motivo nenhum, aparentemente. Apenas a vontade de rir. As pessoas passavam por eles como borrões, e tudo era azul, prateado e dourado e rosa, e doce e primaveril e Daphne. Quando deu por si, Alec já se inclinava para ela para beijar seus lábios, com uma pressão dolorosa. Desejando que ela sentisse aquilo tão forte quanto ele sentia. Esquecendo-se do mundo, e de que aquele provavelmente seria o escândalo do milênio. Bem no meio do salão de baile, rodeado de boa parte da aristocracia britânica, ele se afastou para dizer as palavras, para colocar para fora um sussurro que estava espremendo seus pulmões. Contudo, quando olhou para o rosto de sua esposa, ele viu que seus olhos estavam alagados de lágrimas, franziu o cenho, imediatamente preocupado. — Daphne carinho, fiz- te mau? — Indagou e ela negou com a cabeça, mesmo assim parecia perturbada. Olhando-o com uns olhões cheios de... Alec sentiu um arrepio, aquilo escondido nos olhos azuis acinzentados parecia pena. Ela continuou dançando e envolveu os dedos com os dele, aproximando seus corpos, olhando em seu rosto com aquele olhar que ele tanto detestava. — Quero que saiba que eu nunca vou te deixar. — Sussurou e algo gelado e pontudo se cravou no centro do corpo dele, e fez todo o restante de dele se apagar como um sopro certeiro na chama de uma vela. O que antes estava pulsando loucamente, desintegrou e virou pó. Ele olhou novamente em seus olhos. — Você sabe. — Ele constatou friamente e desejou ter a esposa longe dele. Ela trangou saliva, e novamente lhe dirigiu aqueles olhos, aqueles olhos cheios de pena e ele deu um passo em direção ao inferno. — Não me olhe assim York, não vai gostar das consequências. O tom de sua voz saiu rasteiro como o sibilar de uma cobra, e ela se afastou dele, com medo. Ótimo, até isso era melhor do que a pena. O restante da valsa foi rápida e tão desagradável quanto poderia ser. — Alec. — Ela chamou por ele, mas ele ignorou completamente. Quando finalmente terminou a valsa ele afastou-a para longe da pista de dança. Desejava estar longe dela. Não suportava, não suportaria ter que ver Daphne olhando para ele daquela maneira. Como se ele fosse um inválido. Alguem incapaz de ser amado. Sua mente mandava repentinamente lapsos de memória do passado, da vergonha e da humilhação. E tudo o que veio depois. A pena. — Não estou me sentindo bem, vou me recolher. — Ele disse curto e grosso, ignorando o decoro e se dirigindo sem se despedir em direção as portas e depois para as escadas. No percurso até o seu quarto Alec ficou com a cabeça estranhamente vazia, pela primera vez em anos, não estava pensando em nada. Talvez toda a sua essência estivesse concentrada no buraco que crescia em seu peito à cada minuto que passava. Ele andou pela casa pisando firme e entrou no quarto dando uma grande batida na porta, socando o ar na tentativa de extravasar sua frustração. Tirou as botas dos pés, chutando-as para longe, e desatou o nó do lenço em seu pescoço, puxando-o dali e o jogando atrás do biombo, fazendo o mesmo com o fraque, e o colete, até estar apenas de meias, camisa e kilt, foi até o aparador onde se serviu de uísque. Se abaixando para retirar suas meias, bem no momento que ela irrompeu porta a dentro. Estava vermelha e furiosa. O penteado do baile estava desfeito, os longos cabelos indomáveis adornavam o seu rosto em formato de coração, já não usava luvas e estava descalça, apontou um dedo intimidador para ele. — Você, seu escocês acéfalo! — Gritou, cerrando os dentes. — O que eu te fiz para você me humilhar daquela maneira? — Não é você que vive dizendo que não se importa com o que as pessoas falam? — Ele disse ironicamente. — Me perdoe, Vossa graça, por ter estragado sua noite com lembranças que obviamente ainda são dolorosas demais para você. — disse acidamente. — Eu só gostaria de refrescar sua memória, eu não mereço sua raiva, não fui eu que larguei você no altar. Muito pelo contrario, estive lá quando você precisou e fui até o final, guarde sua raiva para quem você vem vindo guardando todo esse rancor durante anos, ela merece isso, não eu. Finalizou com um olhar de desprezo e deu as costas, já se preparando para sair do quarto, ela achava que podia entrar em seu quarto gritar o que queria e sair impune. De jeito nenhum. Alec atravessou o espaço que os separava e a puxou pelo braço. — Você me largou também, quando foi embora de Stirling. — Acusou, ela tentou puxar seu braço do aperto. — Nós tínhamos um acordo! — Gritou. — Eu esperei por você! Por quatro anos eu fiz isso. Enquanto você se divertia em sua vida de libertinagem! Onde você estava quando todos se afastaram e eu fiquei sozinha? Quando todos estavam construindo suas famílias e seguindo suas vidas. Onde você estava? Alec engoliu as palavras. Derrubado pelas lágrimas se formando em seus olhos cheios de raiva, e pela dor contida em sua voz. Aquelas palavras continham uma revelação que ele jamais esperou ouvir dos lábios dela, vez ou outra ele se permitiu sonhar com isso. Mas nunca chegou a crer que de fato ela o esperava, Cristo, quão estúpido ele foi? — Daph... Me perdoe, eu... Não podia imaginar... — Ele disse, lamentando amargamente. Ela o olhou por uns bons segundos, respirou fundo. Seus olhos pareciam querer gritar milhares de sentimentos. — E se eu estivesse disposta a vender o Rough Diamond? Se eu escolhesse você, se escolhesse nós? Ele cambaleou dois passos para trás, talvez fosse a dose de uísque, ou foi somente o impacto de suas palavras bem no meio do seu coração, que até a cinco minutos atrás parecia não querer bater. Olhou no rosto daquela mulher impressionante, achou que caso soubesse sobre Bridget, ela não fosse mais dirigir aquele olhar para ele. Aquele olhar cheio de admiração e respeito, mesmo com anos de brigas, Daphne sempre o olhou com algo diferente nas íris azuis, esse mesmo olhar que o assustava e o deixava louco ao mesmo tempo, esse mesmo olhar que dizia que ela o via como um igual. — Não posso fazer isso. — Ele falou sem medir as palavras e o rosto dela perdeu toda a sua cor, e seus olhos transmitiram toda a dor. — Foi o que eu pensei. — ela disse estrangulando um soluço, puxou o braço e quase correu em direção a porta de ligação para seu quarto. Ainda de costas, ele a alcançou e abraçou o corpo frágil e pequeno, enfiando o rosto nos cabelos macios que tanto adorava, sentindo seu cheiro de primavera. — Não vai. — Pediu, puxando ainda mais seu corpo para o dele. Ela soluçou. Ver uma criatura tão forte como Daphne York chorar era algo tremendamente intimo. — Mas você disse que não podia... Você disse... — Ela choramingou, e Alec sentiu sua alma se aquecer por completo ao vê-la tão abalada por achar que ele não a correspondia. Ele beijou a lateral de seu rosto, depositando as mãos em sua cintura, sentindo suas costas contra o peito. — Não posso fazer isso. — Repetiu e ela ficou atenta. — não posso deixar que venda o Rough Diamond, é seu legado, e eu sou malditamente orgulhoso de você por isso, daremos um jeito, eu e você, juntos. Ele sentiu o coração dela acelerar no peito, podia sentir como se fosse uma extensão dele mesmo. — Então você me quer? — Ela perguntou, sua voz carregada de alívio, e esperança, e Deus, ele a queria muito mais do que já quis algo nessa vida. Puxou a cintura com força contra sua virilha, para que ela sentisse o quanto ele a queria, pulsante e doloroso, — Chega de jogos. — Alec falou ao abrir o primeiro botão de seu vestido, cego para estar dentro dela. — Chega de brigas. — ele não aguentaria abrir de um por um, então pegou os dois lados do tecido. — Chega de provocações. — ele puxou com força, e os botões voaram para todos os lados. — Chega de fugir. Capitulo dezoito Sim, chega de fugas. Daphne pensou. Se agarrando à aquela última tentativa de fazer a coisa certa. Alec se apertava contra as suas costas como se quisesse se fundir a ela e formarem um só. — Faremos dar certo, Daph, faremos. — Ele prometeu, ainda com o rosto enfiado em seu cabelo, puxando os fios de seu espartilho com uma urgência dolorosa. Por algum motivo, Daphne sentia como se fosse a primeira vez que ficaria nua diante do marido. Aquilo não se tratava somente da nudez física, ela despiria sua alma para ele. O vestido caiu no chão deslizando pelo corpo ela devagar, e ele a virou com um movimento brusco para trabalhar nos fios da roupa íntima, os olhos amarelos alagados de um furor que derreteu as pernas dela, se livrando das peças de roupa e deixando-a nua, somente com as meias brancas e translúcidas que iam até as suas coxas. Daphne sentiu a brisa noturna beijar seus mamilos e a pele de suas costas, enquanto ele devorava, sem qualquer pudor, o seu corpo com os olhos. — Me dispa querida, me deixe nú para você. — Ele pediu, levando uma mão dela até os botões de seu colarinho. Com as mãos trêmulas, Daphne começou a tirar um botão de cada casa. Se sentia como uma menina desembrulhando o pacote do maior presente de aniversário, revelando a pele branca a cada novo botão, até finalmente descobrir tudo e passar a camisa pelos braços largos daquele homem que bem podia ser um descendente de viking. Ele observava tudo com as pálpebras pesadas, e a respiração lenta, uns fios do seu cabelo caiam para a testa, as sobrancelhas escuras e grossas formavam um arco sedutor que deixava seu semblante ainda mais atraente, ela desceu os olhos pelo tronco bem esculpido, desde os tendões do pescoço grosso, até o v que se formava no fim de seu abdômen, sumindo para dentro do kilt. Se sentindo altamente libidinosa, ela levou as mãos até o fecho do kilt. enfiando dois dedos para dentro e sentindo o homem grande dar um leve espasmo ao toque de sua pele, ela desprendeu os fios daquela veste e tirou o cinto de couro que o prendia em sua cintura curvilínea, fazendo o tecido descer para baixo, revelando o brinde volumoso que vinha escondido dentro daquele presente escocês divino. — Em toda a minha vida nunca imaginei que fosse tirar as saias de alguém. — Ela falou com um sorriso audacioso, e todo o corpo dele estremeceu com uma risada quente. Ele era tão puramente viril, que nem mesmo uma saia era capaz de diminuir sua masculinidade. — Não é saia, se chama Kilt. — Ele corrigiu-a, devorando-a intensamente com os olhos. — É bom que já esteja acostumada, nossos filhos serão pequenas miniaturas minhas. — Deus me ajude. — Ela respondeu em tom brincalhão, e não esperou mais um segundo sequer, a cada minuto que perdiam falando, menos tempo ela tinha com ele dentro dela. Se aferrou a ele com uma fome desequilibrada, sabendo que tudo antes desse momento estava nulo, apagado e esquecido, somente ali e agora, eles iriam consumar o seu casamento. Eles se juntaram em um beijo ardente enquanto caíam lentamente de joelhos no tapete felpudo de frente para a lareira, o calor que emanava do fogo abraçou os dois, criando uma névoa densa de luxúria e paixão. Enquanto ele descia os lábios para o pescoço dela, ela tratou de conhecer o corpo dele com os dedos, cada curva de cada músculo saliente, os ombros largos, os fios de cabelo de sua nuca, e o pomo de Adão, que ela enfim, pôde realizar o desejo de beijar. Ele a admirou com ardor tão intenso que lhe doía a carne entre as pernas. — Sempre quis te beijar aqui. — Ela comentou estranhando o toque sensual em sua voz. — Hmmm...— ele murmurou, levando uma mão a um seio dela, circulando seu mamilo com o polegar. — Você tinha sonhos eróticos comigo esposa? Ela soltou uma risada, algo tranquilo e leve. — Sempre que tinha chance. — Ela confidenciou e antes que perdesse a coragem falou: — Sempre fui ciumenta com você. Eu me sentia frustrada por você nunca notar minha presença, você literalmente cortejou todas as minhas irmãs e Sophie, e bom, fui muito imatura e confundi minha desilusão com raiva, e passei a te provocar, pois vi que isso de certa maneira fazia você perceber que eu estava no recinto... Ela parou de falar ao perceber que ele estava se sacudindo, o desgraçado estava rindo dela. — Não ria! — Ela exclamou dando um tapinha tímido em seu ombro, ele a envolveu com os braços, passando uma mão por sua nuca e espremeu o corpo dela no seu, cada centímetro de pele estava em contato com a dele. — Daph. — ele pronunciou o nome dela como se fosse uma oração preciosa. — Eu evitava a ti por medo carinho, você me assustava, me fazia desejar tudo pelo qual eu andei fugindo. Ela suspirou, sentindo uma vontade angustiante de chorar ao ouvir aquela declaração. Todos esses anos, perdidos por anseios, erros, e falta de atitude, camuflando tudo que sentiam um pelo outro atrás de insultos. — Me perdoe por ter sido tão covarde. — Ele falou voltando a beija-la fortemente, deitando o corpo de ambos no chão duro coberto pelo tapete, se apoiando nos cotovelos para não esmaga-la. — Não quero perder mais tempo. As palavras saíram abafadas pois ele estava com a boca contra a pele do busto dela, lambendo aquela região com avidez. Seu sangue fervia nas veias e ela já estava faminta no centro de seu corpo para recebê-lo. Aquele escocês grande, quente e robusto, cobriu-a com seu peso. — Abra as pernas para receber meu pau, querida. — Ele pediu, e Daphne sentiu um forte arrepio de desejo deixa-la molhada ao ouvir aquelas palavras sujas, sentiu seu rosto pegar fogo, ele ao ver o embaraço dela, riu. — Santo Deus mulher, você é dona de um clube de jogatina já deve ter ouvido palavras piores. — De fato já ouvi, só não imaginei que um dia fosse ouvir você as dizendo. — Ela disse, com o rosto escondido no pescoço dele. — Você deseja que eu pare? — Ela suspirou e beijou o peito dele, passando a língua por um pequeno sinal acima do mamilo. — Tudo bem, eu gosto. — Ela abriu as pernas para ele e ele deu um sorriso pervertido ao se encaixar nela e penetrou sem preâmbulos. Seus olhos amarelos invadiram a alma dela ao mesmo tempo que ele invadia o seu corpo, ela foi incapaz de desviar a vista daquilo, tinha que assistir aquele homem em toda a sua glória, reivindicando o seu corpo e pronto para proclama-la sua. A luz do fogo deixava os seus olhos ainda mais faiscantes, e os contornos do seu rosto contraídos pelo prazer ainda mais impecáveis, e ela se sentiu altamente voluptuosa por saber que era por ela que ele se encontrava em tal nível de luxúria. Todo o ódio que julgavam sentir um pelo outro explodiu e se converteu em algo palpável e poderoso, rodeando os dois e criando um vínculo estranho, como se estivessem unidos por um único fio. Daphne se lembrou da fita de seda do seu casamento, por aquele momento pôde sentir a pressão da fita em seu pulso e todo o simbolismo que ela representava, buscou a mão de Alec com a sua e entrelaçou os dedos nos dele, os olhos dele se encontraram com dela e com um sorriso doce ele confirmou que entendeu o seu gesto. De mãos unidas, ele continuou amando-a, batendo em seu corpo com solavancos que faziam a ponta de sua ereção tocar em um ponto de prazer dentro dela, levando-a até a borda de um prazer desconhecido. — Daph, meu amor, meu amor mais precioso, eu vou gozar pra você. — Ele prometeu, chegando ao limite, soltando um rosnado alto de alívio quando liberou seu jorro quente dentro dela. Daphne se deleitou com aquela sensação, observando o modo como ele ficava tremendamente humano em seu momento de entrega. Seus olhos âmbar ficavam em um tom mais escuro, próximo do laranja, a pele de seu corpo se fundia em um avermelhado atraente, e as veias de seu pescoço saltavam para fora, juntamente com o seu abdômen se contraindo a cada novo jato de sua essência que estava sendo despejado para fora. Aquecendo o interior dela. Ele passou as mãos por baixo das pernas dela e a ergueu do chão, invertendo suas posições, e montando-a sobre seu corpo, erguendo-a alguns centímetros para poder entrar nela novamente. Daphne sentiu suas faces arderem ao presenciar aquele momento de intimidade crua. Estava escorregadia pelo prazer dele e ainda assim ele não parecia se importar com aquilo. — Cavalgue em mim querida, tire de mim o que precisar para o seu prazer. — Ele disse, e ela tentou afastar a pequena ponta de vergonha que sentiu. Por mais que não fosse mais tão inocente, Daphne ainda preservava um pingo de decência. Imaginava que agora, tudo que sabia sobre intimidade sexual, estava anulado, e redescobria tudo com seu marido depravado. Apreciou a posição em que se encontrava. Dominante. Desejou ser aquela que saciaria todos os desejos dele, físicos e sentimentais. Apoiou uma mão na coxa grossa e outra no peito dele. Ela fez um movimento para a frente e o sentiu muito fundo dentro dela, gemeu, e então o repetiu, começou devagar, sentindo seu membro semi ereto voltar a enrijecer dentro dela. Aquela posição era muito estranha e ela teve que se reposicionar várias vezes para não se sentir empalada pela ereção que naquele ângulo, parecia cada vez maior. A ponta da masculinidade roçou em algo lá dentro, que mandou uma onda de arrepios pelo corpo dela, e duas e três, e ela aumentou a velocidade daquela fricção, fazendo justamente o que ele havia ordenado, tirando o que precisava dele para seu prazer. Assassinando o ultimo fio de inocência que restava em seu ser. Seus joelhos doíam pela pressão exercida no chão, mas ela não se importava, naquele momento tudo se resumia a ela e ele, e a aquela tensão explosiva que crescia entre os dois. — Isso é o céu. — Ele sussurrou, usando a mão livre para segurar a cintura dela no lugar e passar a impulsionar os seus quadris para cima, aquele foi o empurrão que mandou ela em direção ao chão, um chão que não tinha fim nunca. Nunca. — Alec! — Ela grunhiu o nome dele, se quebrando em várias ondas tempestivas de um prazer inimaginável, ele a penetrou mais algumas vezes, e se enterrou o mais fundo que podia dentro dela ao gozar uma segunda vez, criando algo entre os dois que jamais poderia ser desfeito. Ela tombou sobre ele, descansando o rosto no peito suado e ele acariciou o dorso da mão dela com o polegar, que ainda estava unida á sua. Sentindo o seu marido em todos os lugares do corpo dela, Daphne ouvia os batimentos do coração dele contra sua orelha. Ali de novo, sendo beijada por ele em sua testa, Daphne se fez novamente uma pergunta que tinha se feito meses atrás, "a que ponto cheguei?" só que dessa vez, um satisfeito sorriso balançava nos lábios dela ao obter a resposta. ∞∞∞ Quando acordou Daphne percebeu que ainda era noite, percebeu também que não estava mais deitada sobre o corpo de seu marido no chão, mas sim sobre a cama de casal, coberta por um lençol quentinho, um braço e uma perna. O braço rodeava sua cintura, e a perna estava encaixada entre as suas, impedindo que ela fizesse qualquer movimento sem acorda- lo. Porém, não foi preciso acorda-lo de qualquer maneira, pois pôde sentir que ele estava acordado. Ao ver que ela estava disperta, ele beijou sua nuca e a puxou ainda mais para o aconchego de seu físico que logo ela notou estar nu. A mente de Daphne aqueceu com lembranças. Viu que a lareira já estava apagada, o que impedia ela de ver muita coisa, não sabia como tinha que agir agora que estava oficialmente casada. — Me perdoe por hoje, não deveria ter saído do baile daquele jeito. — Disse ele, acariciando a barriga dela com um dedo. — É que odeio que você olhe com pena. — Não te olhei com pena. — Ela se defendeu. — Pelo menos não por ti, fiquei com pena foi da tal noiva, por ter te deixado escapar. Ele soltou uma risada pelo nariz. Voltando a ficar em silêncio, ela encarou o dossel da cama, sentindo sua mente fervilhar por um dúvida que corroía seu coração. — Deve tê-la amado muito. — Falou como quem não quer nada, sentindo a garganta arder com as palavras. Ele ergueu o rosto para olha-la. — Por que acha isso? — ela deu de ombros. — Passou todos esses anos escondendo sua verdadeira dor com o humor, usando do cinismo para fugir dos reais sentimentos, sem falar que nunca quis se casar. — Ela respondeu, tentando não aparentar o quanto aquilo a deixava em carne viva. — Quem te contou sobre Bridget? — Perguntou ele fugindo descaradamente do que ela tinha acabado de falar. — Sophie, ouviu vocês conversando na sala de jogos. — Respondeu, sem tirar os olhos do dossel. — Pois fique você sabendo que está enganada. — Ele falou, se erguendo sob os cotovelos para olha-la. — Quer dizer, eu achei que amasse, eu só tinha vinte e um anos, tinha acabado de me formar em Eton e estava desesperado para ter o mesmo que meus pais tinham um pelo outro, eles se amavam loucamente... Quando falava dos pais os olhos dele transmitiam uma emoção sincera. — Bridget era bonita e parecia ser inocente, mesmo com todos me alertando sobre seu carácter eu não quis escultar, contra a vontade do meu pai pedi ela em casamento, somente meses depois que ela foi embora com o filho de um fazendeiro local, foi que descobri que o seu pai a obrigava a aceitar o meu cortejo por ser herdeiro de um ducado. — Sinto muito. — Ela falou, realmente sentindo. — Não sinta, me recuperei muito rápido da dor, e logo descobri que não a amava como imaginei, o que realmente me incomodavam eram os olhares de pena, e a desilusão por ter acreditado que iria começar uma família. — Ele suspirou. — Me alistei no exército, mas meu pai não queria me deixar travar batalhas já que eu era o único na linha de sucessão, usou do seu poder no parlamento para fechar qualquer possível porta que pudesse me levar em direção a uma bala, me dando a única opção de trabalhar em pequenas missões para a coroa. — Que tipo de missões? — ela indagou, ávida por descobrir mais sobre a vida desse homem tão misterioso. — Investigações, amor. — Explicou. — Começou com pequenas coisas, devedores, meliantes, procurados. Até perceberem meu potencial e me mandarem para missões maiores, envolvendo membros do parlamento corruptos, aristocratas, traidores da coroa e uma infinidade mais. — Isso é fascinante. Eu sempre soube que você era uma espécie de espião. — Ele beijou o canto da boca dela. — Como você fazia para obter essas informações? Esse tipo de coisa é perigosa, imagino. Ele fez uma cara de embaraço, dando um sorriso meio amarelo enquanto evitava olhar nos olhos dela. — Isso não é algo de que me orgulhe. — Disse vagarosamente. — Geralmente eu me disfarçava e me aproximava da esposa ou da filha do homem em questão, as vezes uma criada, e até amantes. Ela franziu o cenho, o olhando com olhos desconfiados. — O que você fazia? — Perguntou entre o espanto e o ciúme, e ele escondeu o rosto na curva de seu pescoço. — Eu não às obrigava a nada, eu apenas ia para a cama com algumas delas, muitas vezes nem era necessário, bastava um sorriso e uma bajulação e elas falavam pelos cotovelos. — Daphne fez uma careta de desgosto. — Você era uma espécie de prostituto, só que invés de dinheiro, recebia informações como pagamento. — Falou e ele ergueu a cabeça para olha-la. — É a primeira vez que penso por esse lado, e não me parece muito bajulador, é casada com um prostituto, meu doce. — Ele brincou, espantando o ciúme para longe e fazendo ela sorrir. — E você com a dona de um clube de jogatina, estamos quites. — Falou a loira e foi a vez do duque de rir. — Quando foi que decidiu abandonar a profissão? O sorriso dele sumiu, e seu semblante ficou sorumbático. — Meus pais pegaram a tubérculose. Fiquei os últimos meses de suas vidas cuidando deles em Stirling. — Disse e ela acariciou seu maxilar com o dedo. — Sinto muito. — Falou de coração. — Eles devem ter sido excelentes pais. — Foram. Morreram juntos, no mesmo exato momento. — seus olhos ficaram vazios, vagando para cenas das quais não deveria lembrar. — Os medicos não deixavam que ficássemos muito tempo junto deles, ao que parece essa coisa se prolifera no ar, ou algo assim, Ashleigh chegou à pegar uma tosse, mas logo se curou. — Já ouvi falar. — Meu pai tinha medo que nunca fosse voltar a querer me casar, semanas antes de morrer mudou o testamento, e exigiu que eu arranjasse uma esposa no período de cinco anos, ou o meu titulo iria para o parente vivo mais próximo. Ele também sabia que eu não dava a mínima para o ducado, então em uma manobra muito desesperada, acredito que foi a febre, resolveu vincular Stirling ao ducado, o castelo pertencia a minha mãe, caso eu não cumprisse o contrato, ele iria para Vikram. — Mas por que é tão horrível que o castelo fique para seu primo? — Ela indagou e ele a olhou ligeiramente enraivecido. — Minha mãe era freira antes de conhecer o meu pai, quando se juntou a igreja, meu avô tirou o castelo de Calagham, e deu para ela, para que fizesse uma espécie de abadia com o local, porém ela conheceu o meu pai, e quando decidiu abandonar o sacerdócio, todos deram as costas para ela. — Neste momento seu sotaque ficou forte. Indicando sua raiva. — Eles nunca nos aceitaram, nem a meu pai e nem a mim, ou a Ashleigh. A única coisa que Calagham quer unindo Moira e eu em casamento ou Vikram e Ashleigh, é ter direitos pela propriedade. — Mas Alec, e se... — ela falou receosa. — E se caso eu engravidar e vier uma menina? Ele sorriu, beijando a ponta do nariz dela afetuosamente. — Então terá que se contentar em ser a esposa de um humilde duque sem um castelo. — Falou com um sorriso. — Isso basta para você? Ela deu um meio sorriso, ainda dividida. — Você diz isso agora, mas no futuro irá me culpar pela perda do... — Ele colocou um dedo nos lábios dela. — Não vou perder nada, muito por contrário. Vou ganhar uma menina. Espero que ela nasça com esses seus cabelos, e com o seu pequeno narizinho. — Disse e Daphne esmoreceu por dentro. Sentindo a sinceridade das palavras dele em seu íntimo. — Agora lady Daphne Lancaster Armstrong, você sabe de todos os meus segredos. — Ele disse, mexendo com os quadris contra o traseiro dela, Daphne sentiu seu corpo arder ao perceber que ele estava duro. — Se tem algo que você ainda esconda de mim, este é o momento para falar. — Uma mulher tem que ter os seus segredos. — ela disse com um sorriso ardil, se esfregando manhosa contra ele. — Não entre nós, nunca. — Sussurrou, puxando-a de encontro a sua masculinidade, para possui-la novamente. Capitulo dezenove Na manhã seguinte ao baile a sala de visitas da Northwest House estava inabitável. Em cada móvel descansava um arranjo diferente de flores de tamanho e cores diferentes. Assim que Daphne entrou na sala uma sucessão de espirros a pegou. A última vez que tinha visto tantas flores diferentes juntas foi quando seu pai aumentou o valor do seu dote. — oh! — Disse Ashleigh ao entrar na sala. Passando as mãos por um ramo de papoilas. — Meu irmão não poderia ser mais clichê do que isso. Daphne, que acabara de ir a porta para receber mais um ramo de begonias, deu uma olhada para a cunhada vestindo um belo vestido de cintura alta de cor amarelo pastel. — As flores não são do seu irmão. São para você. — Disse, e a cunhada ergueu as sobrancelhas. — Para mim?! — Arregalou bem olhos. — Todas elas? — Sim. Estão chegando desde cedo. — Falou com um sorriso. — Aparentemente você apresentou uma imagem e tanto noite passada. — Como poderia? Eu fiz tudo o que me disseram para não fazer. — Agora era Daphne quem estava confusa. Tinha saído do baile tão transtornada de raiva logo após Alec e depois não pode voltar. — O que quer dizer? — Perguntou, colocando o buquê de lado. — Talvez eu tenha começado um pequeno tumulto. — Daphne arregalou os olhos. — Você o quê? — No meio da segunda valsa, após pisar nos pés do senhor Harrison pela terceira vez, eu acabei sugerindo que dançassemos algo que não exigisse tantos giros, quando dei por mim estava fazendo os passos de uma dança escocesa. — Aparentemente sua dança fez sucesso, olhe quantos buquês. — Daphne falou, indicando a sala que agora era uma floricultura. — O que devo fazer com tudo isso? — Ashleigh perguntou, andando por ali. — Ler os bilhetes suponho, aquele que estiver mais interessado não demorará a aparecer. — Quando Daphne fechou a boca a campanha tocou. As duas olharam para a porta da sala de visitas e esperaram em silêncio. Primeiro entrou o mordomo, e depois ninguém menos que Phineas. As mulheres levantaram e fizeram um breve vênia. — Senhor Harrison. — Ela cumprimentou, piscando várias vezes. — Bom dia, Alteza. — Disse para ela e se voltou para Ashleigh. — Senhorita Lancaster vim saber se recebeu as flores...— O homem passou a vista pela sala abarrotada de flores. — São as begonias. Ashleigh foi até as begonias roxas e sorriu. — São adoráveis, obrigada. — Ao longe, Daphne pode ouvir os passos pesados de Alec e soube que o marido estaria procurando por ela. O escocês não tardou a entrar ali, passou a vista pelas flores. — Mas o quê...— Parou de falar ao ver Phineas parado ali. — Sr. Harrison. — Disse gélido. — O que faz aqui tão cedo em uma manhã de domingo? O americano girou impaciente a aba do chapéu nas mãos. — Vim perguntar se Ashleigh estaria disposta a dar um passeio. — Ela não... — Vou pegar meu chapéu! — Ashleigh disse, sumindo dentro da casa e voltando logo depois com uma sombrinha, uma dama de companhia e um sorriso no rosto. Daphne observou quando Alec falou algo para a dama de companhia e foi até a porta, assistindo eles se afastarem até sumir de suas vistas. — Não gosto disso. — Ele disse, voltando para a esposa. — Bom, foi você quem quis debuta- la, agora terá que lidar com as consequências. Nos dias que se passaram Ashleigh foi convidada para mais bailes, e chás e cavalgadas pelo Hyde Park. O que quer que ela tenha feito no baile de seu debute transformou ela na estrela da temporada social. A cada dia que passava parecia deixar mais da aparência austera para trás, era como se aos poucos estivesse realmente desabrochando em uma flor, uma flor exótica, que mesmo com um beleza sem igual, ainda tinha seus toques de austeridade. Daphne logo descobriu que a vida de uma mulher casada não era o poço de tédio que imaginava. Na verdade existiam várias coisas interessantes que uma mulher podia fazer com o marido para passar o tempo, principalmente se o marido em questão for um escocês de apetite insaciável. A cada minuto estava mais convencida de que o amava cada vez mais, embora nem ela, e nem ele tivessem tido a coragem de dizer as palavras, ela podia jurar que as vezes, ouvia um sussurro em seu ouvido no meio do sono, mas imaginava que era apenas fruto do seu desejo de ouvir as palavras. Não que fosse necessário ele dize-las, ela estava contente apenas em tê-lo para sí. Imaginava que muito provavelmente o episódio com sua antiga noiva tinha traumatizado- o de certa maneira e agora estava com receio de dizer, por pensar que ele poderia achar que ela estava pressionando-o a falar algo ao qual não estava preparado, então tratou de se contentar em receber suas carícias e seus beijos. Caso um dia ele quisesse dizer as palavras, então ela estaria lá para retribuir. O mês de abril foi embora com uma velocidade impressionante, levando consigo o inverno, e dando espaço para a primavera. Aqueles que tiveram a sorte de noivar, se casariam em meados de junho quando a temporada social estaria quase no fim, no início de agosto, que seria quando todas as famílias aristocratas regressariam para as suas casas no campo, e com isso o movimento no clube diminuiria de maneira considerável. Estava dividindo a carga de trabalho com seu marido, ela e Alec trabalhavam bem em várias questões. Como amigos, amantes e até mesmo sócios. Ele a ajudava melhor até melhor do que Garett, que mesmo sendo um contador, não entendia quase nada das necessidades básicas do clube. Alec tinha em um mês, resolvido a metade dos problemas com relação aos direitos dos funcionários e das reformas necessárias no clube, que sozinha ela não conseguiria, ele também tinha feito amizade com Brooke e os dois estavam se entendendo a sua maneira masculina. O que deixava Daphne triste era que com o fim da temporada suas irmãs voltariam para suas casas no campo, Seraphne voltaria para Cartland, Josephne iria para uma viagem de trabalho em Paris, e Sophie iria para uma das propriedades de Ballister em SouthAmpton. O clube de certa maneira a prendia em Londres. Ela gostava da cidade, gostava da agitação do clube e da bruma de liberdade que aquela vida lhe proporcionava, mas não poderia criar um filho em meio à aquilo. A cada novo dia ela estava mais ansiosa com relação a isso, não era como se Alec estivesse pressionando- a, porque de fato ele não estava. Sequer mencionava isso. Contudo ela não deixava de se sentir pressionada, a missão de engravidar era sua e cada dia que passava sem estar grávida, era menos um dia que Alec tinha sem Stirling. Daphne não podia ignorar que tinha tido uma relaçao sexual antes do marido, nas quais ela podia ter engravidado, mas não o fez, embora sua regra tivesse atrasado da última vez, podia ter sido resultado do estresse por ter que arranjar um marido tão logo. E se ela fosse estéril? Se não pudesse engravidar? Isso estava respingando no relacionamento de ambos, o que na noite passada resultou em uma pequena briga, mesmo ele dizendo que não se importavam, ela não podia ignorar o amor que ele tinha por Stirling, se não fosse capaz de dar um filho a ele, isso seria o que destruiria o casamento dos dois, ele dizia que ela estava exagerando e ela o chamava de acéfalo teimoso, o que levou os dois a dormirem de costas um para o outro. No dia seguinte, ela entrou devagar no escritório dele e o encontrou sentado atrás da escrivaninha de rosto enfiado em um livro com uma pena de escrever na mão. — Oi, posso entrar? — Perguntou de maneira acanhada e ele ergueu os olhos teimosos para ela. Dando de ombros. Ignorando a vontade de chutar aquele livro de sua mão, Daphne foi até a mesa de mogno e depositou a caixinha de veludo na frente dele. Seus olhos caíram sobre a peça com curiosidade. — Dizem, que quando se falta palavras para pedir perdão a segunda melhor opção é dar uma joia. — ele ergueu os olhos para ela, risonho. — Isso se diz respeito à mulheres. — Argumentou e ela sacudiu as mãos apressadamente. — Já ficou mais do que claro que não sou uma jovem convencional, agora abra. — respondeu ligeira e os cantos dos lábios dele se ergueram em um meio sorriso, ela se sentiu derreter internamente. Ele levou as mãos até a pequena caixa e abriu o objeto com cuidado excessivo, revelando o anel que havia lá dentro, ele respirou fundo, como se tivesse que expressar sua surpresa de alguma maneira, tirando o anel prateado do encaixe, olhando as pequenas safiras que o rodeavam, e a frase bem desenhadas na platina. "Tha gad agam ort". Nesse momento Daphne ficou nervosa, pois aquela era uma declaração óbvia. — Foi bastante difícil achar um anel que lhe coubesse, aparentemente não se fazem muitos anéis de casamento para homens, o que acho um grande absurdo, os homens também deveriam usar...— ela foi interrompida de falar pela boca de seu marido esmagando a dela. Um beijo sufocante que deixava claro que a briga havia sido perdoada. — Pelo visto não é só as mulheres que se desmancham por uma joia. — Ela falou quando o beijo arrefeceu, causando um breve sorriso nele. Tomou o anel de sua mão e o deslizou pelo longo dedo anelar na mão esquerda, espalhando alguns fios de pelinhos castanhos por ali. — É para que se lembre de mim quando o vir. — Como se fosse possível esquecer. — Ele rebateu, admirando o anel na mão gigante. — Até que me cai bem. Serei o único de meus amigos com uma aliança de casamento. — Alec sobre a gravidez... — Ela começou. — Não vamos voltar a falar disso. — A cortou rapidamente, adotando um ar travesso. — Invés disso vamos nos empenhar nas atividades que levam uma mulher a engravidar. Ela ainda não estava satisfeita, mas mesmo assim decidiu fazer o que ele pediu, trancafiando todos os seus anseios em uma caixinha lá nos recônditos da sua mente. Ele infiltrou uma mão na nuca dela e a puxou para um beijo, descendo as mãos pelas costas da esposa e apalpando o traseiro dela desavergonhado. Ele a ergueu e a sentou em sua escrivaninha, se encaixando no meio das pernas dela, quando ele estava pronto para puxar os fios do decote foi atrapalhado por uma batida na porta. Suspirou frustrado, se afastando dela. — Não se mova dai. — Ele disse, mordendo o lábio dela antes de andar até a porta. Ela ouviu a voz do mordomo murmurar algo e Alec voltou para dentro com um bilhete nas mãos. — Terei de sair. — Ele disse, após ler o bilhete. — Brooke está precisando de mim no clube, algo relacionado com as mesas de bilhar. O rosto dela ostentou um semblante preocupado. — Precisará de mim? — Ela indagou, ele negou com a cabeça enquanto vestia o casaco. — Não, resolverei isso sozinho. — andou até ela e se inclinou para beijar sua testa. — Esteja esperando por mim para terminarmos isso. ∞∞∞ Daphne cansou de esperar por ele na cama, e saiu para dar uma volta pela casa. Ashleigh tinha saído mais cedo para um chá na casa das filhas do conde de Brighton e ela estava sozinha. Estava lendo uma novela obscena que encontrou nas coisas do marido sentada em um sofá em sua sala particular, quando o mordomo entrou ali. — Há um senhor na porta desejando vê-la, milady. — Daphne não tirou os olhos da sua novela. — Ele se apresentou? — Perguntou, pensando que provavelmente seria apenas mais um pretendente de Ashleigh. — Ele disse que se chama Garret Payne. — Ela ergueu imediatamente os olhos do livreto, sentindo seu sangue converter- se em chumbo. — Leve-o para a sala de visitas, Kent. — Ela disse rapidamente e o mordomo assentiu, se retirando dali. Daphne ficou parada por uns bons cinco minutos com a mente em silêncio absoluto. O que Garret estava fazendo ali depois de dois anos? Ela só tinha uma certeza, nada de bom resultaria de uma visita do seu antigo sócio. Ela alisou as saias do seu vestido com as mãos e andou devagar até a sala de visitas. Ele estava parado próximo à lareira observando as duas espadas que cruzavam um escudo com o emblema do lobo, colocada de maneira decorativa na parede. Ele tinha as mãos cobertas por luvas para trás. E ela percebeu quando ele sentiu sua presença, ele virou-se para ela a perfurando com traiçoeiros olhos azuis. Daphne sentiu algo próximo do nojo ao ver o rosto de Garret. Ele estava muito bem aliás, usava roupas em voga, e exibia uma aparência tão jovial quanto a de anos atrás. — Quanto tempo, querida. — Ele disse com um sorriso malicioso e ela sentiu vontade de se retrair com o olhar despudorado. Maldito seja o dia que ela o deixou tocar em seu corpo. Não poderia estar mais arrependida. — O que você está fazendo aqui? — Ela cuspiu as palavras sem se importar se estava sendo rude. Em outra época ela teria festejado um reencontro com seu antigo parceiro de negócios, mas nesse momento, ela apenas o estudava, temendo o ataque iminente. — Coincidentemente estava passando e resolvi fazer uma visita. — Ele andou tranquilamente até o meio da sala. — Achei que estivesse na França. — Daphne estava incomodada com a postura tranquila do homem, da última vez que tinham se visto ele jogou palavras de vingança contra ela e nomes perojativos que ela se recusava a reproduzir. — E estava. — Ele escorou o braço no encosto de uma poltrona e sorriu de lado. — Mas a vida na França custa caro. — Isso é bobagem, o dinheiro que paguei pela sua parte do clube é suficiente para viver a vida de um rei. — O olhar dele desceu para o chão covardemente. — Você gastou tudo não foi? — Um homem solteiro em Paris não pode viver a vida de um monge. — Isso nao é problema meu. — Ela disse, dando a volta para a saída. — Se não se importa, eu tenho assunto que tratar. — Eu soube que você casou. — Daphne parou de andar e arrependeu-se imediatamente por demonstrar descarada de fraqueza, aquela hesitação era tudo que Garret precisava. — Deve ter sido uma infelicidade já que você sempre odiou o duque de Northwest. Não é? Rapidamente, ela pensou em uma saída para reverter aquela situação. Para não dar poder de controle para ele. — É um casamento de conveniência. — Disse, se esforçando imparcialidade. — Com certeza sim. — Ele riu, e fez uma pequena pausa antes de olhar nos olhos dela. — Eu soube, que ele tem uma irmã que está entrando em debute. Daphne finalmente entendeu os motivos para ele estar ali. — Foi você. — Ela o acusou, e ele a olhou com falsa inocência. — O bilhete se passando por Brooke, foi você. Ele não a respondeu, invés disso andou para ela ostentando um triunfante olhar e tocou no queixo dela com um dedo. Daphne estava furiosa demais para fugir do toque asqueroso em seu queixo. — Seria uma lástima se saísse por aí a notícia de que a duquesa de Northwest é a dona de um clube para mulheres. — Ele bateu com o dedo três vezes no queixo dela. — O que acha que isso causaria na reputação da moça? — O que você quer? — Ela perguntou entredentes. Ele deu um riso vitorioso. — A essa altura da nossa conversa acredito que você já saiba. — Poderia ter vendido a informação para outra pessoa, qualquer um daria uma fortuna para saber quem é a dona do clube. — Mas você vai me pagar mais. — Ele se aproximou mais dela, até estar com o rosto ao lado do seu. — Porque você não quer manchar a imagem do seu marido quer? Ou da sua nova cunhada? Daphne engoliu em seco, e aquela voz odiosa em seu ouvido foi o impulso que precisava para afasta-lo dela. — Quanto você quer? — Cem mil libras. — Ela não se surpreendeu com o soma, era uma quantia pequena se levasse em consideração todo o patrimônio que ela obtinha, mas não tinha esse dinheiro em mãos. — Precisarei de um tempo para juntar o dinheiro. — Ele fez menção de tocar no queixo dela novamente, mas ela desviou de sua mão asquerosa. Ele parecia quase decepcionado com a atitude dela, mas estava sobretudo irritado pelo rechaço. Deu um olhar maligno para ela e mexeu nas abas de seu casaco. — Você terá esse tempo, eu estou hospedado do Hemingway e esperarei você no Rough dimoind amanhã a noite. — Ele andou até a saída e seus passos se detiveram antes que ele passasse pela porta. — E nem tente armar pelas minhas costas dessa vez, eu trarei comigo um jornalista do The London Post, e se eu suspeitar de qualquer coisa por menor que seja darei com a língua nos dentes antes que possa pronunciar seu nome. — Não farei nada. — Ela disse, apertando os punhos até que suas unhas machucasse a carne de suas mãos. Ele olhou para ela. — Ótimo. — Sorriu de lado. — Vejo você amanhã, Daph. Capitulo vinte Alec estava esperando que a qualquer momento acontecesse uma desgraça. Sua vida estava indo tão bem, que nem ele próprio estava acreditando na maneira em que as coisas estavam seguindo. Ele estava finalmente tendo aquilo que sempre desejou, um casamento harmonioso. Sinceramente, ele achou que sua jornada para domar sua esposa tinha apenas começado, mas por incrível que pareça Daphne estava se mostrando uma esposa pacífica. Na medida do possível, claro. Embora ainda tivesse um pequeno detalhe que o estava incomodando. Ela ainda não tinha dito que o amava. Ele não sabia o que estava pondo freios na língua dela, e imaginava que tudo fosse acontecer ao seu devido tempo. Embora que sempre que tinha chance, quando sabia que ela estava seguramente adormecida, ele sussurrasse as palavras em seu ouvido. Ele estava arrependido por ter revelado que precisaria de um filho varão. Por mais que ele dissesse que pouco se importava com Stirling, ele sabia que não conseguia convencê-la e que ela só ficava em silêncio para evitar uma briga entre os dois. Ele realmente não se importava com Stirling, sim, o castelo representava sua infância, e ali ele abrigava todos as boas lembranças dos seus pais e de quando era menino, mas poderia levar essas memórias no coração e na mente até quando sua idade permitisse, naquele momento tudo o que desejava já tinha. Uma família. Ele desceu da carruagem nos fundos do clube e usou sua própria chave para entrar no local. A aquele horário o clube era silencioso e parecia quase inabilitado, em nada se assemelhava a casa agitada que se tornava quando o véu da noite caía. Uma equipe de limpeza preparava o salão de baixo e algumas mulheres checavam as mesas de jogos. Não parou em nenhum lugar, ansioso para voltar para casa para encontrar Daphne. Olhou para o anel prateado em seu dedo, as safiras se davam bem com o seu tom de pele. Ele sentia aquele dedo pesar de um jeito único. Aquilo era uma perfeita demonstração de posse e ele adorava isso. Sorriu, somente sua esposa era capaz de algo assim. Ele finalmente chegou até o escritório onde encontrou Brooke dando instruções para os outros seguranças. O chefe de segurança, que vinha ganhando a confiança dele mais à cada dia se surpreendeu ao vê-lo ali. — Lorde D. — Ele disse, deixando os outros seguranças e andando até ele. — Esperava vê-lo somente mais tarde. Alec franziu o cenho. — No bilhete você pedia que eu viesse imediatamente. — O homem o olhou consternado. — Bilhete? Que bilhete? — Alec tirou o pedaço de papel do bolso e o estendeu no ar. — Este bilhete. — Brooke pegou o bilhete e o leu, e seu semblante ficou preocupado. — Desculpe Alteza, mas eu não mandei esse bilhete. — Então quem poderia... — Ele parou de falar imediatamente ao perceber que tinha caído em uma emboscada. Alec sentiu seus instintos todos alarmaren de uma vez ao lembrar que tinha deixado Daphne sozinha em casa. — Maldição... Ele deu a volta e refez o caminho que o levaria para fora do clube, a carruagem ducal esperava por ele na porta de saída, e com um único comando para o cocheiro ele estava atravessando as ruas de Londres com o coração desesperado no peito. Os minutos que ele levou até chegarem casa foram os mais próximos da ideia que ele tinha de inferno. Viveu em uma agonia inenarrável pelo medo de que tivesse acontecido algo com Daphne, ele não se perdoaria nunca. Quando chegou em casa, ele escancarou a porta da frente e subiu os degraus da escada de dois em dois gritando pelo nome dela. Ele irrompeu pela porta do quarto e sentiu novamente o fôlego de vida voltar para seus pulmões quando a viu sentada e segura na cama dos dois. Ele quase correu para ela, para toca-la e ter a certeza de que estava bem. — Daph, o bilhete... — Era falso, eu sei. — Ela completou o restante e só então, Alec notou a expressão sombria no rosto da esposa. Ele desceu os olhos para onde os dela estavam concentrados e ele viu que ela segurava algo entre os dedos finos. — O que é isso? — Ele perguntou, ela levantou a cabeça para olha-lo. — Cem mil libras. — Alec ergueu as sobrancelhas, era uma quantia absurda para se ter em casa. — Hoje Garret veio me ver. Alec sentiu seu corpo endurecer inteiramente. — O que ele queria? — Perguntou inexpressivo. — Gastou todo o dinheiro da sua parte do clube e agora quer mais. — Ela levantou da cama e andou pelo quarto devagar. — Ele me chantageou. Ele apertou os punhos com força ao sentir a raiva atingi-lo. — Você não fará isso. — disse firme. — Temos que fazer. — Ela refutou e ele estranhou a calmaria delainha algo de errado. sua Daphne jamais estaria tão tranquila diante daquela circunstância, muito pelo contrário, a Daphne que ele conhecia estaria pensando em uma nova maneira de reverter a situação a seu favor. — Daph, se ele quer dizer por aí que você é a dona do clube, que diga, no início tudo será um escândalo, mas com o tempo as pessoas esquecerão. — Ela balançou a cabeça em uma negativa. — Não podemos Alec. — disse séria. — Ashleigh. — ela disse essa única palavra e isso foi o único que ele precisava para entender tudo. Era por Ashleigh, tudo por Ashleigh. E nesse momento ele a amou e a admirou de uma maneira excruciante. — Ela está tão feliz, finalmente está fazendo amigos e... Ele diminuiu o espaço que os separava e a abraçou, abraçou tão forte até que ela deixasse de estar tensa e se sentisse segura e protegida nos braços dele. Era isso que ele queria ser para ela, seu refugiu. — Se você ceder a chantagem, ele voltará a fazê-lo e será uma cativa nas mãos dele, não posso permitir isso. — Ela encostou a face contra o peito dele, e suspirou. — Nós não iremos ceder. — Então é bom que tenha algo em mente, pois amanhã ele irá ao Rough Diamond pegar o dinheiro e caso eu não esteja lá, venderá a informação para um colunista do The London Post. — Amanhã a noite terei a resposta, então. — Ele a embalou naquele abraço, tentando passar toda a confiança que sentia para ela. — Tudo ficará bem, amor. ∞∞∞ Alec passou o dia seguinte fora de casa e Daphne passou o dia inteiro angustiada. Esperou por ele impaciente, e em dado momento estava raivosa por ele larga-la ali naquele momento que ela mais precisava dele. Quando chegou a noite ela se vestiu e o esperou mais um pouco, quando soube que ele não apareceria, ela colocou os dinheiro na bolsa de mão e partiu para pegar o coche de aluguel. A noite estava soturna, como no dia que ela cruzou a noite para propor casamento para ele, e o ar sustentava o peso de um grande acontecimento. Ela entrou no clube pela porta traseira e andou até o escritório para ganhar um tempo antes de reencontrar com Garret. Mas quando abriu a porta, Alec já estava esperando por ela sentado em uma poltrona em frente ao fogo. Seus olhos tão intensamente absortos no fogo da lareira, se voltaram para ela. — Onde esteve o dia todo? — Ela indagou, rancorosa. — Tive que resolver algumas pendências. — Ele disse, e desceu os olhos pelo corpo dela. Mesmo naquele momento Daphne sentiu seu ventre contrair com o desejo que viu naquelas íris amarelo apaixonantes. Ele bateu com uma mão em seu colo. — Venha aqui. Ela ainda estava zangada com ele mas não queria discutir com o marido naquele momento onde tudo que precisava era estar nos braços dele, andou até ele e Alec a puxou para seu afago. Ele acariciou a bochecha dela e a raiva que Daphne sentia foi instantâneamente dissipada. Ele colocou uma mão quente na nuca dela e a outra em seu queixo, a mantendo cativa de seu olhar potente. — Obrigada por ter se casado comigo.— Disse, acariciando o maxilar dela com o polegar. Daphne se aninhou contra a mão dele. Tudo ficaria bem se no fim de tudo ela tivesse aquilo. — Obrigada por ter sido tão irritantemente insistente em permanecer casado. — Ela disse e ele soltou uma risada baixa. Daphne se deleitou com o som melodioso. — Falando assim você vai me fazer acreditar que me ama. — Disse ele olhando-a profundamente nos olhos. Daphne ficou em silêncio, e o seu coração começou a bater desenfreado no peito. —E se eu amasse? Seria um problema para você? Acha que poderia chegar a me retribuir um dia? Não que eu esteja te pressionando, apenas... — Ela começou a tagarelar com as mãos trêmulas e ele a silenciou com um dedo nos lábios volumosos. — Se quer dizer que me ama, apenas diga meu doce, não precisa complicar tudo. — Disse com um sorriso audacioso e ela bufou irritada. — Eu te amo. — Rosnou a palavra e o rosto dele se iluminou em um sorriso terrivelmente lindo. — Ah, bom, obrigado. — Disse soltando a respiração tranquilo, um vinco se formou na testa dela. — Obrigado? É isso o que vai me dizer? — perguntou insultada, tentando se afastar do aperto dele. Ele levou as duas mãos para a cintura dela para mantê-la onde estava. — O que quer ouvir de mim? Que te amo tanto que tenho que ficar sempre colocando para fora para poder aliviar o sufocamento em meu peito? — Ele despejou sobre ela, sem quebrar o contato o visual ao beijar o queixo e raspar os dentes na pele dali. — Um eu te amo já bastava. — Ela falou com sorriso e ele a acompanhou, se inclinando sobre ela. — Você me tem. — Ele sussurrou juntando as alianças dos dois. Daphne sentiu o poder daquela declaração. Mais potente do que qualquer outra declaração que ele poderia dizer. Ela sentiu vontade de chorar, mas lágrimas poderiam atrapalhar o momento. Então escondeu o rosto no pescolo dele e beijou-o na curva com o ombro. — Me deixe fazer amor com você, querida. Ela duvidava que diria não para ele alguma vez em sua vida. Se ergueu e sentou-se escarranchada sobre ele, se abaixando para assalta-lo com a boca. Ele gemeu, e deslizou as mãos pelas costas dela até elas se espalmarem no traseiro redondo dela, com um impulso ele ergueu ambos e andou com ela até a mesa, onde a sentou e se encaixou entre as pernas dela. — Eu te amo. — Disse e sua voz soou como um cântico divino. — Nunca mais vai se livrar de mim Daphne, é bom que esteja preparada para uma vida de escândalos ao meu lado. Ele a puxou para um beijo faminto, algo poderoso que envolveu os dois e os fez esquecer de todo o restante do mundo. Alec não tinha tempo para perder com as roupas, ele sentia apenas a necessidade cega de se unir a ela. Apenas ergueu as saias dela até os quadris, deixando à mostra as pernas torneadas e brancas cobertas por meias de ligas e abriu o fecho da calça que usava, liberando a ereção pulsante, se acariciando despudorado antes de encontrar a abertura na roupa dela. Ele planejava ir lentamente para não machuca-la com a força do seu desejo mas sua esposa o recebeu com avidez, o engolindo até o fundo, mexendo os quadris em giros. Daphne caiu para trás pela sensação inexplicável de ter o marido dentro dela e soltou um sopro de ar doce. Alec liberou os seios dela para fora do corpete, erguendo uma perna dela para conseguir entrar mais fundo, para conseguir atingir aquele lugar único que só ele conhecia. Ele mordeu a panturrilha dela enquanto fazia amor com ela languidamente, não podia reprimir o desejo que tinha de marca-la com os dentes. Quando nenhum dos dois já não suportava o ritmo tranquilo, ele aumentou a velocidade de suas arremitidas. Alec já estava pronto, mas só queria chegar lá quando ela tivesse pronta para ir com ele. Antes ele nunca tinha dado importância para combinar seu orgasmo com o de sua parceira, mas queria fazer aquilo naquele momento, queria chegar lá junto com Daphne. — Alec. — Ela sussurrou o nome dele quando começou a contrair ao seu redor, quando sentiu a primeira contração em volta do seu pau, Alec liberou seu jorro quente dentro dela. Aquele orgasmo foi mais potente do que qualquer outro que ele já tinha tido em sua vida e soube o porquê. Sexo e amor podiam andar separados para o resto da vida mas quando unidos eram capazes de sensações e sentimentos inimagináveis. Ele beijou-a até que as respirações dos dois estivessem tranquilas. E ela suspirou quando ele deslizou para fora dela. Daphne encostou a testa no peito dele e esteve em paz por uns bons minutos antes de ser arrastada para a realidade. Ela andou até a janela do escritório para olhar para a planta baixa, onde o movimento no clube já estava grande. — Ele já está lá, temos de ir. — Ela disse, passando as mãos pelo tecido do vestido para desfazer alguns amassados. Alec não se moveu, apenas olhou para ela. — Mais cedo eu não estive em casa por que estava dando uma entrevista para o The London Post. — Ele revelou com cuidado e Daphne levou um tempo até entender o que ele tinha acabado de dizer. Arregalou os olhos. — Alec! — Disse apavorada. — Não Daphne. — Ele andou até ela e a pegou pela mão, a puxando para a janela. — Olhe para isto. — Ele indicou o clube abaixo. — Veja o que você construiu. — Daphne olhou para onde ele apontava, mas não era para o clube em si, sim para as muitas mulheres que tiveram ali a oportunidade de um emprego digno. — eu sou orgulhoso de você por isso, e tenho certeza que seus pais também serão. — E se as pessoas se afastarem? — No início vão, mas teremos os próximos meses para descobrir quem são realmente nossos amigos. — Ele beijou a mão dela. — E Ashleigh? — Você acredita mesmo que Ashleigh vai sofrer por deixar Londres? — Ele disse, e Daphne simplesmente não conseguiu não rir. — Eu falei com ela mais cedo, não tem nada que ela não faria por você. E agora as lágrimas que ela tinha lutado para reprimir, formavam barreiras em seus olhos. – Você é um homem terrível. — Ela disse e ele sorriu para ela. — É por isso que você me adora. — Ele beijou a testa dela. — Você confia em mim? Aquela era provavelmente a pergunta mais fácil que Daphne já teve que responder em sua vida. — Sim. — Disse. — Então a única coisa que te impede de sair e revelar para o mundo a mulher incrível que você é, é você mesma. — Ele olhou no fundo dos olhos dela. — O artigo do The London Post não sairá até que eu dê a ordem, a escolha é sua, eu estarei do seu lado independente da decisão que tomar. Daphne já tinha chegado à uma decisão antes mesmo de ele terminar de falar. Ela sorriu, se sentindo plenamente feliz ao puxa-lo pela mão para a saída. Os olhos de Alec brilharam pela admiração enquanto eles andavam pelos corredores lado a lado até chegar de frente para a porta de saída para o clube. Os dois tiraram as máscaras. Ela olhou para ele, e soube que nenhum outro homem no mundo faria aquilo por ela, nenhum outro homem estaria disposto a correr metade do pais em alta velocidade para se casar com ela, nenhum outro homem estaria disposto a deixa-la livre mesmo querendo que ela ficasse, nenhum outro homem colocaria sua própria felicidade na frente da dela ou a aceitaria com todos os seus defeitos nem muito menos enfrentaria o mundo ao seu lado. Daphne não precisava de mais nada. — Está pronta? — Ele perguntou e ela fez que sim a cabeça. — Faremos isso juntos, certo? — Ela perguntou juntando a mão com a dele, Alec deu um leve aperto na mão dela antes de dizer: — Sim, juntos. Epílogo Daphne tentava controlar a respiração enquanto o marido a prendia contra a parede de um corredor no segundo andar e investia contra ela incessantemente. Não conseguiu escapar do homem quando ele a encurralou ali, bem no meio do dia. A culpa era totalmente dele que tinha aquele maldito sorriso ao qual ela não conseguia resistir. — Seremos pegos. — Ela falou sem ar, se agarrando aos ombros dele para não cair no chão. — Está reclamando? — o escocês indagou com um sorriso convencido, sabia que tinha um poder de sedução enorme sobre sua esposa. Céus, ela estava longe de reclamar. Não reclamaria nunca. Apenas aproveitou o momento e se derreteu nos braços dele quando o clímax veio, sempre forte. Sempre igual. Ele espalhou beijos por todo o ombro dela enquanto a ajudava a se recompor. Exibindo aquele olhar que a aquecia por dentro e despia sua alma. Alguns fios da barba dele já estavam prateados, mas isso só ajudou o homem a ficar ainda mais irresistível. Logo eles estavam andando novamente em direção ao hall de entrada com as mãos unidas, antes mesmo que chegassem ao topo da escada ouviram os gritos no andar de baixo. — Mamãe, o Haven está fazendo de novo! — Gritou a menina, correndo até ela com aquela massa de cabelos cacheados e rebeldes espalhados pelo rosto. Eles tinham se mudado para Stirling um ano após o nascimento dos trigêmeos. Ela e Alec tinham decidido que o campo era a melhor escolha para criar as crianças até que tivessem a idade de ir fazer os estudos. Eles também tomaram essa decisão pois queriam que os meninos crescessem com os mesmos costumes do pai e da tia. Daphne sabia que Alec amava sua ascendência escocesa e ela queria que seus filhos tivessem a mesma criação que ele teve. Uma vez por mês os dois iam até Londres para se inteirar de tudo que acontecia no Rough Diamond, que durante a sua ausência ficava sob os cuidados de Brooke, que se revelou um administrador além de eficiente. Ashleigh foi uma grande ajuda nos primeiros meses de vida dos pequenos. Logo Daphne que sentia pavor com a ideia de ser mãe, acabou tendo três filhos de uma única vez. Esteve perdida no começo, e precisou da ajuda de suas irmãs e de sua mãe mas tinha se saído bem. A cunhada estava profundamente feliz e tinha um gênio tão travesso quanto dos trigêmeos. Foi uma combinação que simplesmente deu certo. A convivência deles com a família de Calagham passou a ser agradável na medida do possível, eles adoravam os pequenos e aos domingos iam almoçar no castelo, quase sempre tudo terminava em uma briga entre Calagham e Northwest mas no dia seguinte os dois agiam como se nada tivesse acontecido. Haven, o primogênito, tinha herdado o gênio competitivo de Daphne, enquanto Hardy tinha uma mente astuta e quase sempre conseguia se safar de suas travessuras, como seu pai. Heather era uma mistura dos dois, com uma pitada de sagacidade. — Certo, qual o motivo do tumulto? — ela perguntou e os três começaram a falar todos de uma vez. — Um de cada vez! As três miniaturas escocesas olharam para a mãe. — Haven me desafiou a comer o haggis, perdeu e agora não quer me pagar. — Disse Heather dando uma olhada fatal no irmão que exibia uma expressão de pura inocência. O menino de cabelos castanhos se balançava sobre os pés descalços, o kilt pequeno voava para lá e para cá, tornando-o terrivelmente fofo. — Andaram apostando de novo? — Alec inquiriu, adotando sua postura de pai autoritário. Daphne sentiu seu coração tomar, simplesmente não conseguia se conter sempre que o marido demonstrava pulso firme. — Eu falei que não deveriam ter feito isso. — Disse Hardy com um ar tranquilo, o menino segurava o porquinho Tommy por uma coleira. O porco, que assistia a tudo sem entender nada, não parava de se roçar na canela do menino. — Haven, quantas vezes vou ter que dizer para não apostar? — Daphne perguntou para o filho a sua direita e o menino lhe lançou um olhar injustiçado. — Eu sou o Hardy! — As faces dela queimaram pela vergonha. Era uma péssima mãe, seus filhos já tinham oito anos e ainda conseguia confundi-los. Já estava pronta para se desculpar quando o rosto do menino se contraiu em uma risada. — Brincadeira, sou o Haven. Ao seu lado Alec estrangulou uma risada e ela olhou de olhos cerrados para ele, o marido tossiu e deu um sorriso sem graça para a esposa. — Não quero saber de apostas, seja quais forem. — Disse firme e os três baixaram as cabeças, envergonhados. — Desculpe mamãe. — Disseram em uníssono e isso foi o suficiente para ela se desmanchar pelas criaturinhas vestidas de quadriculado. Deixou que eles fossem, sabendo que em questão de algumas horas estariam brigando de novo. — Você é leve demais com eles. — Disse Alec enquanto observavam os filhos se afastarem. — Sabem que basta olhar para você com grandes olhos de pena e terão você arriada. — Puxaram isso de você, sabe não é? — Ela o cutucou, e ele assentiu, olhando-a com um sorriso apaixonado. — E isso significa que você não consegue resistir aos meus dotes, meu doce. — Ele falou puxando-a para um beijo. Que revelava muito mais coisas do que ele seria capaz de dizer. Quando ele soltou-a, o corpo de ambos tremiam. — Eu amo você Alecsander Lancaster Armstrong, amo seu gosto, seu cheiro, o seu jeito, amo seus olhos âmbar e a maneira como eles me fazem sentir amada, amo seu sobrenome e amo ainda mais o privilégio de leva-lo. — Duvido que me ame mais do que eu amo a você. — Ele falou, encostando a testa na dela. Ela arqueou uma sobrancelha maligna para ele, abrindo um sorriso malicioso. — Você quer fazer uma aposta? FIM