Pau Brasil: crime e castigo | Opinião | Valor Econômico 03/04/2024, 11:31

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Tiago Cavalcanti Presentear matéria

03/04/2024 05h00 · Atualizado há 2 horas

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pai foi um dos primeiros
Netzero economistas a se especializar em meio ambiente no Brasil, tendo sido
Solis Investimentos presidente da International Society for Ecological Economics. Ambos
são militantes da vida inteira em favor da natureza e as maiores
Soluções Confiáveis Leno…
referências espirituais para mim.
Transformando o amanhã

UBS Numa propriedade ecológica cultivada e cultuada pelo meu pai há

XP Corporate meio século, ao lado do vilarejo de São Severino dos Macacos, interior
de Pernambuco, resiste uma reserva florestal, num dos últimos
XP Empresas
resquícios de Mata Atlântica da região. Aí se pratica a biodiversidade e
se protege o ecossistema, especialmente as nascentes de água,
beneficiando as comunidades vizinhas. O zelo do meu pai pela
natureza também protege e estimula nossas histórias, individuais e
coletivas.

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superintendente do Cade

Neste contexto familiar, desde pequeno me fascinava saber que o

nome do nosso país veio de uma árvore, o Pau Brasil. Um belo Pau
Brasil, que sempre me encantou, está ao lado da casa na propriedade
do meu pai.

Lendo Yuri Tavares Rocha, professor de Geografia da USP, referência

sobre o Pau Brasil, descobri que já no século XII a Europa usava a
madeira tintorial Caesalpinia sappan L., da mesma espécie do Pau
Brasil. Vários séculos antes de Pedro Álvares Cabral avistar o Monte
Pascoal, a madeira vermelha do Oriente era levada da Tailândia, Ilhas
Molucas e Japão rumo à Europa, para ser aplicada como corante
vermelho em tecidos.

Com o “descobrimento” do nosso país, foi encontrado o Pau Brasil, ou

Caesalpinia echinata L., recentemente redesignada como Paubrasilia
echinata L.. Os indígenas a chamavam de ibirapitanga, do tupi
ybyrapytã?a, que significa madeira vermelha ou pau-vermelho. Os
portugueses muito antes haviam inventado a palavra brasil, que vem a
ser cor de brasa ou vermelho, dando origem ao nome Pau Brasil.

Ocorre que ao longo dos séculos o Pau Brasil sofreu de extração

excessiva, a ponto de hoje existir o risco elevado de desaparecer.

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Segundo Yuri Tavares Rocha, a situação levou “o Pau Brasil a ser

considerado como uma espécie em perigo de extinção, compondo a
Lista Oficial de Espécies da Flora Brasileira Ameaçadas de Extinção.
Também está na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas de Extinção
da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) e
consta, desde julho de 2008, no Apêndice II da Convenção sobre o
Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Ameaçadas
de Extinção (CITES)”.

Vale ressaltar que o Pau Brasil é a única árvore que tem uma legislação
exclusiva para marcar a sua importância. A Lei Federal 6.607 de 1978
estabelece o Pau Brasil como a árvore nacional, institui o Dia do Pau
Brasil para sua comemoração regular a ser promovida pelo Ministério
da Educação e determina atividades para sua conservação.

Existem outras legislações para proteção da flora nativa nacional como

um todo, a exemplo da Lei Federal 9.605 de 1998, onde no seu Artigo
38 determina que “destruir ou danificar floresta considerada de
preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com
infringência das normas de proteção” leva à pena de detenção de um a
três anos.

Com efeito, o Pau Brasil deveria ser a árvore mais protegida em nosso
país. Porém o que vemos é a repetição de um mal crônico brasileiro:
muita legislação e regulação, porém pouca efetividade na devida
aplicação das normas legais.

Escrevo sobre o tema especialmente porque li no jornal eletrônico “O

Poder”, de Pernambuco, que um bosque praticamente inteiro de Pau
Brasil foi destruído no Recife, em Mata Atlântica pertencente a
empresário do setor educacional. Inclusive foram apresentadas
imagens de satélite, mostrando a destruição do bosque de Pau Brasil.

Houve também a destruição de outras árvores nativas, em diferentes

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áreas, num flagrante delito ambiental há poucas semanas. E o pior,

tudo se passou em uma área de proteção ambiental (APA), criada em
2010 pelo governador Eduardo Campos, com o objetivo oficial de
“proteger os recursos hídricos, as espécies da fauna e da flora da Mata
Atlântica raras e ameaçadas de extinção”.

A referida APA se chama de Aldeia-Beberibe, parte de uma Unidade de

Conservação da Mata Atlântica. O “Crime do Pau Brasil”, como
chamado pelo “O Poder”, se deu na única área no Recife com as
últimas nascentes do lendário Rio Beberibe, “que se junta ao Rio
Capibaribe para formar o Oceano Atlântico”.

Árvore sofre de um mal crônico do país: muita

legislação e pouca efetividade na aplicação das
normas

O bosque destruído tinha alta densidade de Pau Brasil, parte de um

trabalho que plantou mais de 500 mil mudas desta árvore em diversas
partes da propriedade, que é um dos últimos espaços de Mata
Atlântica do Recife. Provavelmente foi a maior plantação de Pau Brasil
que já se realizou até hoje em todo o país e o bosque destruído era seu
principal núcleo.

Conforme descrito pelo “O Poder”, o “Crime do Pau Brasil” fazia parte

de um jogo de especulação imobiliária. Perante esse quadro, o normal
seria a Justiça julgar e condenar como grave crime a destruição do
bosque de Pau Brasil no Recife. Ainda mais na atualidade, quando há o
compromisso com desmatamento zero da Mata Atlântica e existe
previsão legal de penas para os transgressores.

Porém, à luz das práticas correntes no Brasil, é realista nutrir

esperanças de que realmente sejam aplicados os rigores da legislação
em vigor para este tipo de crime? Alguma chance da devida sentença

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penal para crimes contra a Natureza?

Um “castigo” alternativo para tais tipos de contraventores seria o

reflorestamento das áreas desmatadas e também de áreas com baixa
densidade florestal.

A urbanização torna as cidades mais quentes. É sabido que as florestas

tropicais ajudam a resfriar a temperatura média local e global. Assim, o
reflorestamento das cidades deveria ser uma prioridade do poder
público. A destruição de matas existentes deveria ser acompanhada
por compensações ambientais transparentes e significativas.

É essencial que os movimentos ambientalistas se mobilizem no sentido

de buscar compensações exemplares em defesa do meio ambiente.
Ou vamos assistir, de forma distópica e silenciosa, à destruição de
nossas florestas?

Tiago Cavalcanti é professor titular de Economia da Universidade

de Cambridge e da FGV-SP.

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