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daniel grimoni
lorena medronho
Nosso tempo é especialista em criar ausências
Ailton Krenak
2
um corpo bicho que morde as coisas
até escorrer delas seu segredo
entre ruínas
baforando o tempo
3
outro você, você sabe
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performar o tempo
estou certa de que morrerei nas mãos de um bicho não bicho homem ou mulher
bicho bicho decerto que um boi ou uma vaca
estarei caminhando entre capins e ele - ou ela - estará:
nos observaremos por minutos talvez dias
e continuaremos por ali. não como quem perde tempo, mas como quem de fato está
no tempo
performando-o
com a beleza dos olhos
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jiboias
grandes sapos
laranjas, intercalando
pequenas vontades
a grandes prazeres
ter língua, jorge me diz, basta ter língua
não, laura interrompe
é preciso saber usá-la
e eles riem
compartilhar segredos
é como cuidar de jiboias
6
cipó
sem se gabar da
mais apurada finesse
enquanto
cravam
a ponta em corpos
cheios da
vida que desprezam:
até um dia
levantar na praça a estátua
de um ditador
como se
fosse homem santo:
uma estátua em mármore
branco tão
branca e santa quanto eles
acreditam ser. inda se acham
malandros,
apesar de desprezar
além da vida também a rua: o que inclui
os malandros.
a rua a vida e o gozo
(que têm os malandros).
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enfurnados em fortalezas
de design contemporâneo,
fazendo o possível
pra destruir tudo que está fora
(até mesmo
a reputação das cobras) e
agora querem voltar a sentir
de perto
a adrenalina da
miséria: pairar feito anjos
de mercúrio
sobre o resíduo de
barragens:
por cima da máquina
que bolaram pra engolir
coisas vivas.
embevecidos
em seus sonhos
de napoleão
parecem não
perceber a sombra
do cipó
veloz
8
havia um rio aqui
9
estamos todos ainda lúcidos
10
ah, se marx fosse latino…
ocaso no céu
vagando feito louco corre corre
venha ver ocaso no céu
e as ruínas sob nossos pés
nem doem tanto assim, daqui de cima
vejo marte corre venha ver
operacionalizar academizar sua morte
caso me pergunte
foi jorge quem tomou os cadarços
ligue para jorge diga-o
de uma vez
cinza não destoa de verde nem tente
dessa vez a cidade precisa saber
acaso no capim
verborragizando o etéreo coisas mais
bárbaro. berrando alto na superfície do teu suvaco
venha ver a sucata
logo acima da floresta
jorge, me diga, foi você? jorge?
foi você quem pôs lá?
11
terra selvagem
ruindo
por debaixo
se desvelando no tempo
12
camboatá
absolutamente
sonoras
talvez
elas devessem
ser mais
me diga, ruth,
quantos pensamentos cabem
num espaço
vazio?
13
habitado
não existe
um
bicho apenas dentro
de mim
– é em quantidade
suficiente
para dar
conta de festa & fome
que sou habitado
– atravessado
entre chão e mistério:
plumas, patas, rastro
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e viva
verde
junto ao verde
todas elas juntas:
e quando falo não acredito
serem minhas
as palavras que digo: erra quem
pensa que basta
uma
pessoa para movimentar
um corpo
uma língua: se escutar verá como foi
preciso,
para a manifestação
mais simples, que cada voz
esbarrasse na outra & na outra & na
outra & na outra & na outra & esbarrasse na outra & na outra
& na outra & na outra & na outra & esbarrasse na outra & na
outra & na outra & na outra & na outra & esbarrasse na outra
& na outra & na outra & na outra &
15
nela fazer caber a afronta
16
inventar nosso alimento
de olhar te
encontro
repito
as palmeiras
nos ensinam a ficar
de pé
17
transmutar fuligem
em transparência
18
raiz
ser a planta,
que segue, em meio ao asfalto,
ser a planta,
que com delicadeza
vive a contrapor lógicas
questionar descartes
ser a planta
19
panfleto | escondam-se
20
índice
lorena medronho
performar o tempo 5
jiboias 6
te diria, no sofá 9
ah, se marx fosse latino… 11
camboatá 13
nela fazer caber a afronta 16
raiz 19
eis aqui um poema panfletário | escondam-se palavras 20
daniel grimoni
21
para estar ao lado
SUBVERTA – @subvertamos
22
essa plaquete foi composta
em minion e garamond pro
em outubro de 2020
durante a pandemia de covid-19
enquanto a floresta amazônica e o pantanal
ardem em chamas como nunca antes:
um projeto: a terra urge
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