OPAÍS Sexta-feira, 27 de Outubro de 2023 23

REFLEXÃO

ESTEVÃO CHILALA CASSOMA*

CONCERTO
Adeus à razão
A
DR
Yuri da Cunha celebra 30 anos de carreira plausos ensurdecedo-
com concerto em Maputo res. Ovações adulado-
ras. Exaltações ecle-
A tournée em celebração aos 30 anos de carreira do músico Yu- siásticas. Venerações
ri da Cunha continua em bom ritmo. Após realizar um concerto, no monárquicas. A ocasião exigia.
passado dia 13 do corrente mês, no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, Era um momento incomum. Tu-
desta vez o artista angolano vai à cidade de Maputo, capital de Mo- do preparado ao detalhe. As pé-
çambique, realizar um mega concerto celebrando o seu 30º aniver- rolas adornadas no espaço, a pas-
sário da carreira musical. sarela purpurosa, as vestimentas
O concerto será realizado no Sábado, 28, e promete revisitar to- coloridas dos presentes, a pom-
da a trajectória durante os 30 anos de carreira de Yuri da Cunha. De pa do acto, tudo longe de um fu-
acordo com uma nota da produção, citada pelo Jornal Cultura, no nesto acontecimento. Mas era isso
concerto o artista vai apresentar os temas de sua autoria e de alguns que aconteceria, uma funestida-
músicos que os tem como referência e inspiração como Bonga, Te- de, a imolação da razão. Ergueu-
ta Lando, David Zé, Artur Nunes, Urbano de Castro, André Mingas, se o machado, que passara noi-
Carlos Burity, Bangão e Eduardo Paim. tes a fio sob o jugo dos ferreiros,
Como habitual, Yuri da Cunha será acompanhado por uma banda os melhores, aqueles cujas habi-
integrada por artistas nacionais e estrangeiros, com destaque para lidades foram adquiridas nos me-
Nelo Paim (teclados), Mayo Bass (viola baixo), Kyary Flores (percus- lhores centros de preparo, lá on-
são) e Manecas Costa (viola ritmo e solo). de se aprende não só a fazer, mas
a ser também. E se tão bem apren-
deram a ser, como justificar a sua
participação neste acto sanguiná-
rio? O que lhes competia fizeram.
O machado estava afiado. Agora, os humanos numa categoria es- sim, mesmo que aquele acto signi-
já não há mais volta. Já foi erguido. pecial, superior e dominante. Po- ficasse afronta aos humanos, não
Entre os ferreiros, há quem tentou rém, aconteceu o inédito… se olvidaram de acompanhar, de
travar o movimento curvilíneo do O acontecimento mudava com- perto e de longe. Sim, vamos ver
golpe. Foi em vão. Ninguém tra- pletamente o paradigma. Desa- até onde isso chega, o que vai mu-
va uma tempestade com as mãos, fiava a lucidez da percepção e ul- dar, o prognóstico sobre o nos-
assim como não se impede uma trapassava a limpidez do raciocí- so futuro. Os inumanos, ávidos
acção com intenções. Portanto, o nio. Agora não eram somente os de assistir o golpe mortal, aplau-
seu desejo não passou disso mes- humanos, os inumanos também diam aos gritos: Aniquile! Aniqui-
mo, desejo. O altar estava prepa- falam, e como falam, falam co- le! Aniquile. No entanto, não foi o
rado, em escassos minutos, o ac- mo discursam, discursam como que aconteceu.
TELEVISÃO to aconteceria e a razão morreria. mentem, uma espécie de razão Para a surpresa de todos, o sim-
A quem cabia a execução do gol- especial. Entenda-se, os animais bolismo da morte da razão não se-
“Morangos Com Açúcar” regressa pe mortal? “irracionais” começaram a falar. ria a morte de uma vaca apelida-
às telas portuguesas, 20 anos após Há muito que se discute entre ho- Na verdade, já falavam, conclu- da de “razão”. Uma noite antes do
a estreia do primeiro episódio mens e animais que diferença há. sões discutidas por humanos ba- evento, em reunião secreta, deci-
A Biologia apresenta as suas res- seados em especulações. Sim, já diu-se em vez de imolar, discur-
A série juvenil mais vista e apreciada da televisão portuguesa está de postas. A Epistemologia também. falavam numa outra linguagem. sar. Se a disputa era a razão, quem
regresso. A nova temporada da série/telenovela “Morango com Açú- A Linguística, igualmente, invo- A transição deu-se porque apren- estava do lado certo ou errado,
car” estreiou esta Segunda-feira, 23, na TVI, numa co-produção com cando a linguagem como elemen- deram a linguagem humana. E, quem compreende melhor as coi-
a Amazon Prime Video. to separador entre uns e outros. As agora, para simbolizar a igual de- sas, quem vive ou não os flagelos,
Após 20 anos, desde a estreia do primeiro capítulo desta emocionante religiões são as que mais se esme- sigualdade para com os humanos, então o melhor é traduzir isso em
e contagiante série juvenil, eis que é chegado o momento do regresso ram em explicar o porquê e a dife- nada melhor que um acto simbóli- palavras. “A morte da razão”, foi
do projecto que marcou a televisão portuguesa ao longo de 12 tempo- rença entre as espécies. As catego- co, tal como os dos humanos, num o discurso que mudou tudo e na-
radas, marcando gerações de jovens e adolescentes. rias são claras, duas apenas: racio- areópago semelhante às majesto- da. Nada para os inumamos e tu-
“Esperemos que seja um sucesso repetido, depois de nove anos na te- nais e irracionais, ambos criados sas construções das assembleias, do para os humanos. Afinal, não
levisão, com a descoberta de muitos autores e actores”, disse José Edu- por Deus, só que, uma é dotada de com toda a pompa e uma assistên- era para entender com a razão. Era
ardo Moniz, director geral da TVI, na cerimónia de assinatura da par- razão e a outra não, por isso, a su- cia das mais elevadas. Até os hu- para ouvir, ler, entender e aplaudir
ceria que decorreu nas instalações da Media Capital em Barcarena, na premacia da primeira sobre a se- manos foram convidados. Afinal, com a emoção. Morreu a razão. Vi-
Segunda-feira. gunda. Ainda vale essa classifi- a nova regra é a democracia e a mo- va a emoção!
A produção da telenovela fica a cabo da See My Dreams, nova produ- cação? Facto mesmo é que a ra- eda de troca a liberdade e a paz. Em
tora da Media Capital, que tem como rosto principal Piet-Hein Baker, cionalidade é invocada como o nome da liberdade e da paz, o res-
director geral da Plural. elemento distintivo que coloca peito mútuo deve prevalecer. As- *Professsor de literatura