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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE COMUNICAÇÃO, TURISMO E ARTES


CURSO DE LICENCIATURA EM MÚSICA

Lucas Benjamin Potiguara

O PAPEL DE RECURSOS TECNOLÓGICOS NO PROCESSO DE


APRENDIZAGEM DE BATERIA

JOÃO PESSOA
2021
Lucas Benjamin Potiguara

O PAPEL DE RECURSOS TECNOLÓGICOS NO PROCESSO DE


APRENDIZAGEM DE BATERIA

Monografia de graduação apresentada ao Centro de


Comunicação, Turismo e Artes, da Universidade
Federal da Paraíba, como requisito parcial para a
obtenção do título de Licenciado em Música.

Orientadora: Prof.ª Dr. Juciane Araldi Beltrame

JOÃO PESSOA
2021
AGRADECIMENTOS

Agradeço a Laura e a Lis, minha família, por terem sempre me apoiado e me ajudado durante
todo o processo deste trabalho, me dando muito amor e carinho. Espero retribuir em dobro.

Aos meus pais e a minha irmã, por terem me propiciado uma ótima educação e por todo o
companheirismo.

À minha querida orientadora Juciane Araldi, por ter aceitado ser minha orientadora, pelas
orientações valiosas, por toda a paciência e pelo empenho em me ajudar nesse desafio.

Aos professores, Francisco de Assis Santana e Marcos Rosa, por prontamente terem aceitado
fazer parte da banca avaliativa, pelas correções, sugestões e provocações que contribuíram
para o aprimoramento da versão final deste trabalho.

À professora Alice Lumi e ao grupo de estudos Laboratório de Estudos Etnomusicológicos


(LABEET), no qual pude aprender sobre pesquisa científica e me desenvolver enquanto
pesquisador.

Aos professores Vanildo Marinho, Carla Pereira e Nadya Amorim, e ao Programa


Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) em Música, no qual pude
experienciar momentos em sala de aula que contribuíram para minha formação como
professor de música.

Aos meus amigos queridos da graduação, com quem convivi intensamente durante os últimos
anos, pelo companheirismo e pela troca de experiências que me permitiram crescer não só
como pessoa, mas também como formando.

À todos os participantes desta pesquisa, por toda disponibilidade e por sua enorme
contribuição.

E a todas as pessoas que estiveram comigo nessa caminhada, e que contribuíram diretamente
ou indiretamente para essa realização
RESUMO
Este texto tem como temática a tecnologia como recurso na aprendizagem da bateria. Trata-se
de um trabalho de conclusão de curso (monografia) e tem como objetivo geral: compreender
qual o papel dos recursos tecnológicos no processo de aprendizagem do instrumento para os
estudantes de bateria do curso de licenciatura em música da UFPB. Os objetivos específicos
são: analisar quais tecnologias estão presentes no processo de estudo da bateria e como são
utilizadas pelos alunos; discutir desafios e possibilidades do uso dos recursos eletrônicos para
a aprendizagem de bateria; verificar a articulação dos recursos tecnológicos nas aulas de
bateria da UFPB. A metodologia consistiu num estudo qualitativo tendo como fonte de dados:
pesquisa bibliográfica e entrevista coletiva com estudantes de bateria da UFPB. A revisão de
literatura aponta que há uma unidade em relação à potencialidade das transformações
tecnológicas nas formas de aprender, ensinar e consumir música, principalmente tendo como
foco o uso da tecnologia no processo de ensino-aprendizagem do instrumento. Mas também
é possível perceber uma lacuna quando procuramos tratar do ensino-aprendizagem de bateria
aliado a tecnologia, utilizando esta como recurso para a aprendizagem. Os principais
resultados mostram que o uso de recursos tecnológicos podem proporcionar o
desenvolvimento de diferentes experiências de aprendizagem da bateria, como o
desenvolvimento da autonomia e da autoaprendizagem.

Palavras-chave: ensino-aprendizagem de bateria; educação musical; recursos tecnológicos.


ABSTRACT

This text has as its theme technology as a resource in learning the battery. This is a course
conclusion work (monograph) and has the general objective: to understand the role of
technological resources in the instrument learning process for drum students in the music
degree course at UFPB. The specific objectives are: to analyze which technologies are present
in the battery study process and how they are used by students; discuss challenges and
possibilities of using electronic resources for battery learning; verify the articulation of
technological resources in the UFPB battery classes. The methodology consisted of a
qualitative study having as data source: bibliographical research and collective interview with
UFPB drum students. The literature review points out that there is a unity in relation to the
potential of technological transformations in the ways of learning, teaching and consuming
music, mainly focusing on the use of technology in the instrument's teaching-learning process.
But it is also possible to notice a gap when we try to deal with the teaching-learning of battery
combined with technology, using this as a resource for learning. The main results show that
the use of technological resources can provide the development of different battery learning
experiences, such as the development of autonomy and self-learning.

Keywords: drum teaching-learning; musical education; technological resources.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Primeira configuração da bateria........................................................................... 15


Figura 2 – Pedal para bumbo desenvolvido por William Ludwig.......................................... 16
Figura 3 – Baterista Gene Krupa com seu drum set e a configuração da bateria como
conhecemos hoje...................................................................................................................... 17
Figura 4 – Tela de mixagem do aplicativo moises.ai............................................................. 42
Figura 5 – Módulo Yamaha EAD10 acoplado na bateria....................................................... 43
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Perfil dos alunos entrevistados.............................................................................28


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 11
1. ESTUDOS SOBRE BATERIA E TECNOLOGIA 15
1.1. A BATERIA E SEUS ASPECTOS MUSICAIS E PEDAGÓGICOS 15
1.1.1 História da Bateria 15
1.1.2 Bateria no Brasil 17
1.1.3 Ensino-aprendizagem na bateria 18
1.2 TECNOLOGIA E EDUCAÇÃO MUSICAL 21
1.2.1 Tecnologia e ensino de música 21
1.2.2 Tecnologia e ensino/aprendizagem de instrumentos 22
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA 25
2.1 SELEÇÃO DOS PARTICIPANTES 25
2.2 REALIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS 26
3. RECURSOS TECNOLÓGICOS E APRENDIZAGEM DE BATERIA NA
PERSPECTIVA DOS ESTUDANTES ENTREVISTADOS 28
3.1 PERFIL DOS ENTREVISTADOS 28
3.2 COMO APRENDERAM A TOCAR BATERIA 29
3.3 USO DA TECNOLOGIA NO ESTUDO DA BATERIA 31
3.3.1. Redes e mídias sociais no estudo da bateria 31
3.3.2 Potenciais e desafios no acesso às informações sobre bateria na internet:
construindo a autonomia 34
3.3.3 Apreciação e autoaprendizagem com recursos de gravação 36
3.3.4 Recursos que integram a prática e aprendizagem da bateria 39
3.3.5 O uso de tecnologias nas aulas de bateria na UFPB 44
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 47
REFERÊNCIAS 52
APÊNDICE 54
11

INTRODUÇÃO

A bateria e a tecnologia sempre me despertaram muito interesse e muita vontade de


pesquisar sobre novas possibilidades. Recordo-me de quando criança subir no muro da casa
vizinha para acompanhar os ensaios de uma banda do bairro e ficar impressionado com o que
faziam o baterista e os percussionistas, ficava a tarde inteira acompanhando os ensaios. Os
tambores sempre me fascinaram. Na adolescência ingressei na banda marcial da escola e logo
dominei todos os instrumentos percussivos, foi ali que me encontrei na música. Ainda quando
adolescente já comecei a estudar bateria sozinho em casa e foi nesse contexto que comecei a
experimentar o uso da tecnologia como um recurso para o estudo de bateria.
Quando iniciei meus estudos na bateria, de imediato me encantei com o mundo das
gravações e em consequência na produção de drum covers1. Sempre tive muito interesse em
pesquisar sobre música e bateria na Internet, acessava blogs, sites e o YouTube, este último
era o que mais utilizava na época.
Após alguns anos de estudo de bateria e música, de forma autodidata, ingressei no
curso técnico em instrumento musical no Instituto Federal da Paraíba. Antes de começar a ter
aulas no IFPB, pesquisei sobre o curso de instrumento musical no YouTube e encontrei
algumas produções de alunos e do professor de bateria. Na época o professor de bateria do
IFPB desenvolvia um projeto com os estudantes de bateria chamado “música de férias”, e
lembro de assistir várias vezes as produções dos alunos. Assim, quando ingressei no curso fui
com muito entusiasmo ao encontro do professor. Nos primeiros meses de curso tive apenas
uma aula de bateria, pois era período de troca de professor no curso, estava havendo a saída
de professores substitutos e a chegada dos professores que entravam via concurso público, e
também por conta de uma greve de professores. Porém, mesmo tendo apenas uma aula de
bateria, consegui neste contato com o professor substituto de bateria Bruno Torres, que
inclusive contribui com suas pesquisas para esse trabalho, ter ciência da sua metodologia e do
seu processo de ensino, e isso influenciou bastante no meu processo de aprendizagem na
bateria. Percebi ali que poderia utilizar a tecnologia como um recurso para a minha
aprendizagem na bateria, fazendo o uso da gravação como ferramenta de avaliação da minha
prática.
Durante todo o meu curso no IFPB procurei sempre articular o máximo possível o
uso da tecnologia dentro do meu estudo de bateria, durante esse período trabalhei bastante

1
Termo utilizado em inglês para quando um baterista toca bateria acompanhando uma música gravada, imitando
ou tocando junto de uma bateria já gravada na música.
12

com o uso das gravações de áudio e vídeo. Também criei um canal no YouTube2 e produzi
alguns vídeos meus fazendo drum covers. Nesse período também comecei a explorar o uso de
equipamentos tecnológicos durante a minha prática na bateria, visto o que fiz na apresentação3
do meu recital de conclusão de curso. Pesquisei sobre o uso de pedais de loop durante a
performance e o estudo na bateria, utilizei esse recurso em uma parte da minha apresentação.
Durante a minha graduação consegui desenvolver ainda mais as práticas que explorei
durante meu curso do IFPB, fui capaz de levar práticas utilizadas unicamente no meu estudo
de instrumento para as minhas performances, e ainda consegui explorar outras possibilidades
de uso das tecnologias como recurso e que me trouxeram ótimos benefícios.
Em virtude da minha relação com o uso da tecnologia e o estudo de bateria, vejo a
necessidade de pesquisar mais sobre como a tecnologia pode influenciar na aprendizagem da
bateria, buscando refletir sobre o diálogo entre a bateria e os diversos usos que a tecnologia
nos proporciona nos tempos atuais e como essa utilização contribui para a aprendizagem da
bateria. Visto isso, nesta pesquisa teremos como enfoque compreender como os bateristas
utilizam a tecnologia como recurso para o aprendizado do instrumento.
Esse trabalho tem como foco principal discutir acerca da aprendizagem da bateria
aliado ao uso de recursos tecnológicos nesse processo, procurando compreender quais são as
práticas e que recursos são utilizados por bateristas no seu processo de aprendizagem. Assim,
faz-se necessário um estudo mais aprofundado sobre os diferentes processos de aprendizagem
de bateria e como a tecnologia pode agregar nesses diferentes processos. A fim de
entendermos mais sobre esses assuntos, temos como questão principal o seguinte problema de
pesquisa: o papel dos recursos tecnológicos no processo de aprendizagem da bateria para
os estudantes de bateria do curso de licenciatura em música da UFPB?
Neste trabalho, tivemos como objetivo geral: compreender qual o papel dos
recursos tecnológicos no processo de aprendizagem do instrumento para os estudantes
de bateria do curso de licenciatura em música da UFPB. Assim, seguindo os objetivos
específicos desta pesquisa, discutimos o processo de aprendizagem de bateria e a relação entre
a tecnologia e a educação musical, verificamos quais recursos tecnológicos e como são
utilizados no processo de aprendizagem de bateria, buscando também identificar as
potencialidades e desafios descobertos nesse processo de aprendizagem de bateria e por fim,
investigamos a articulação dos recursos tecnológicos nas aulas de bateria da UFPB.

2
Disponível em: https://www.youtube.com/channel/UCbBtA7UzFBgvIgWqYASZQWw. Acesso 26 de jul de 2021.
3
Disponível em : https://www.youtube.com/watch?v=F2dhPT0DI3k&t=829s. Acesso 26 de jul de 2021.
13

Como consequência do desenvolvimento da tecnologia, crescem as possibilidades de


seu uso em várias áreas, e assim ampliam-se as alternativas de uso dessas tecnologias no
aprendizado da bateria. A presente pesquisa torna-se necessária a partir das demandas que
surgem no processo de aprendizagem do aluno com seu instrumento, considerando que as
metodologias mais tradicionais de aprendizagem da bateria não são as únicas no seu processo
de aprendizagem musical e que o uso da tecnologia, como afirmam, Kruger, Gerling e
Hentschke (1999), Schramm (2009), Melo (2015), Leme (2006), Gohn (2016) e Hamond e
Adessi (2019), geram novas possibilidades para o auxílio no processo de aprendizagem da
bateria. Neste sentido iremos vislumbrar a função que os recursos tecnológicos têm no
processo de aprendizagem dos alunos de bateria do curso de licenciatura da Universidade
Federal da Paraíba, levando pesquisadores e educadores a uma reflexão sobre suas próprias
metodologias de ensino do instrumento.
Ademais, este trabalho faz-se necessário à medida que não temos uma grande
quantidade de trabalhos que discutam a aprendizagem da bateria pela ótica dos estudantes de
bateria e bateristas. Assim, o objetivo desta pesquisa perpassa questões puramente técnicas
referentes a bateria e busca discutir como esses bateristas utilizam das tecnologias como
recursos na sua aprendizagem no instrumento, como elaboram diferentes formas de estudar o
instrumento e como esse uso tem impacto na prática musical.
A coleta de dados desta pesquisa ocorreu na Universidade Federal da Paraíba, com
alunos de bateria do curso de licenciatura em música. Nesta pesquisa foram realizadas
entrevistas coletivas e semiestruturadas com a turma de Classe de bateria da UFPB, para
compreendermos seus processos de aprendizagem na bateria. Realizamos uma pesquisa
bibliográfica como base para reflexões e fundamentando nossas discussões juntamente com
os dados coletados nas entrevistas, e em seguida os dados foram analisados correlacionando a
temática principal desta pesquisa com os dados obtidos através das experiências dos alunos.
Este trabalho organiza-se em três capítulos, sendo assim divididos: I) estudos sobre
bateria e tecnologia, no qual discutimos sobre as concepções do ensino-aprendizagem da
bateria e a relação da educação musical e a tecnologia, II) procedimentos metodológicos da
pesquisa, aqui apresentamos os procedimentos metodológicos da pesquisa, apresentando os
instrumentos de coleta de dados e a organização e análise. III) análise dos resultados, onde
discutimos sobre a função da tecnologia na aprendizagem da bateria, nesse, também
apresentamos as análises dos dados coletados nesta pesquisa, e as reflexões acerca das
experiências de aprendizagem e uso dos recursos tecnológicos dos bateristas estudantes
entrevistados. Por último tecemos conclusões a partir dos trabalhos e teorias dos autores
14

estudados frente à prática baterística dos entrevistados, como relatado por eles e de minhas
experiências e perspectivas sobre o uso de recursos tecnológicos no processo de
aprendizagem de bateria.
15

1. ESTUDOS SOBRE BATERIA E TECNOLOGIA

1.1. A BATERIA E SEUS ASPECTOS MUSICAIS E PEDAGÓGICOS

1.1.1 História da Bateria

A bateria é um conjunto de instrumentos percussivos composto, basicamente, por


caixa, bumbo e hi-hat, podendo ser adicionados também outros tambores, pratos e diferentes
instrumentos de percussão. A sua prática envolve o uso das mãos e dos pés, tendo como
auxílio o uso de diferentes tipos de baquetas, podendo ser tocada apenas com as mãos.
A bateria, um instrumento nascido nos Estados Unidos, tem origem a partir da
necessidade de que um único músico pudesse fazer o papel que antes era designado a três ou
quatro músicos numa orquestra ou bandas marciais. Com o passar do tempo isso se tornou
mais viável com a chegada do pedal de bumbo, estante de caixa e a estante de prato. Bastos
(2010, p. 16) afirma que, “nascia aí, a forma característica básica de tocar o instrumento, em
termos de postura e montagem do set up, que se mantém até os dias de hoje”.
Figura 1: Primeira configuração da bateria

Fonte: Site da Vic Firth4

4
Disponível em: <https://vicfirth.zildjian.com/education/history-of-the-drumset-part-01.html>. Acessado em 06
de jul de 2021.
16

Como visto na imagem (Figura 1), os primeiros modelos de bateria resumiam-se a


uma caixa e um bumbo, onde estes dois tambores eram posicionados sobre uma cadeira e
eram tocados apenas com as mãos. No início da década de 1900 foram desenvolvidos
protótipos de pedais para o bumbo e no fim da década que “William Ludwig comercializou
um pedal dobrável com molas que faziam voltar o batedor e que possuía um dispositivo preso
à haste que permitia percutir um prato acoplado ao bumbo” (BOLÃO, 2009, p. 3). Nele
também possuía um dispositivo que permitia tocar um prato que ficava acoplado em paralelo
à pele do bumbo. Conforme a imagem abaixo (Figura 2).

Figura 2: Pedal para bumbo desenvolvido por William Ludwig.

Fonte: Site da Vic Firth5

Com o decorrer do tempo surgiram os mecanismos que possibilitavam tocar dois


pratos com o pé esquerdo com o auxílio de um pedal que ao ser acionado possibilita que um
prato superior se choque com um prato inferior. Com o passar do tempo também foram
introduzidos à bateria os tom-tons, que são tambores colocados tanto sobre o bumbo como no
chão ao lado da caixa (ver Figura 3).

5
Disponível em: <https://vicfirth.zildjian.com/education/history-of-the-drumset-part-02.html>. Acessado em 06
de jul de 2021.
17

Figura 3: Baterista Gene Krupa com seu drum set e a configuração da bateria como
conhecemos hoje

Fonte: Site da Vic Firth6

1.1.2 Bateria no Brasil

A bateria foi introduzida no Brasil por volta da década de 1920, na época em que
o cinema mudo e as jazz bands estavam em alta. Com a propagação da dança e da música
estadunidense no Brasil, grupos brasileiros, ao agregarem os ritmos norte-americanos à sua
música, passaram a ser conhecidas como jazz bands (BARSALINI, 2013). Entretanto, vale
salientar que as jazz bands brasileiras não contavam com um repertório somente jazzístico,
como o das jazz bands norte americanas. Os grupos brasileiros dispunham de um som mais

6
Disponível em: <https://vicfirth.zildjian.com/education/history-of-the-drumset-part-9.html>. Acesso em 06 de
jul de 2021.
18

dançante e moderno para época, as influências americanas eram mais visíveis nas vestimentas
e na instrumentação.
Autores como Barsalini (2013) e Faleiros (2000 apud BASTOS, 2010)
consideram Luciano Perroni (1908 - 2001) o pai da bateria brasileira. Faleiros (2000 apud
BASTOS, 2010, p. 16) ainda afirma que, “foi Luciano Perrone quem inventou a bateria no
Brasil. Este típico instrumento americano recebeu através das mãos deste baterista, o suingue
e a nobreza dos ritmos brasileiros”. Barsalini (2013) aponta Perroni como o responsável por
parte das transformações musicais ligadas à área da percussão em sua época.
Com o passar das décadas, a bateria foi se tornando cada vez mais popular no
Brasil, como aponta Patriarca (2014), na década de 1950 a chegada da bossa nova e a criação
do ritmo da bossa nova na bateria, tocado com vassourinhas, chamou a atenção e influenciou,
como afirma o autor, “bateristas do mundo inteiro com esse novo estilo” (PATRIARCA, 2014,
p.13). Bastos (2010) aponta em seu trabalho que o movimento tropicalista como mais um dos
responsáveis pela popularização do instrumento. O autor constata que a partir das décadas de
1960 e 1970, o acesso a instrumentos musicais foi ampliado graças ao surgimento de fábricas
nacionais. E que “com a abertura do mercado brasileiro às importações ocorrida na década de
1990, teve início um processo de fortalecimento da indústria nacional, que passou a competir
com as estrangeiras” (BASTOS, 2010, p. 16). E que em consequência disso, a bateria foi
ficando cada vez mais popular e em decorrência dessa popularização, “o mercado do ensino
de bateria se ampliou de forma considerável”(BASTOS, 2010, p. 16).

1.1.3 Ensino-aprendizagem na bateria

Em se tratando do processo de aprendizagem da bateria, assim como ocorre com


outros instrumentos relacionados à música popular, é comum o mesmo dar-se fora dos
contextos formais. Como afirma Melo (2015, p. 35), “os músicos populares são geralmente
influenciados pelos familiares e amigos próximos, aprendem a tocar seu instrumento através
de observações de outros músicos e utilizam o tirar músicas de ouvido. Ao referir-se a tirar
músicas de ouvido, esta é uma prática bastante comum que consiste em ouvir, praticar, tentar,
resolver problemas e tocar o instrumento ouvindo discos (faixas musicais). Esta prática tem
dado origem para uma prática recente conhecida como drum cover que, segundo Melo (2015,
p. 36), “[este é] um processo em que o baterista grava em áudio e vídeo sua performance
tocando a bateria no acompanhamento de uma música escolhida por ele e, ainda, disponibiliza
o resultado do vídeo na internet”. Quanto à prática das observações, esta ocorre através da
19

observação atenta da performance de outros músicos, a fim de entender cada detalhe do que é
tocado. As observações podem ocorrer tanto em apresentações ao vivo, como em vídeos
disponibilizados na internet, que também são conhecidas como videoaulas. Como também
vídeo de performances disponibilizados na Internet podem ser utilizados para a aprendizagem
do instrumento
Atualmente já é possível estudar bateria em ambientes de ensino formal. Bastos
(2010) afirma que a bateria e a percussão passaram por um processo de escolarização a partir
da década de 1980 e hoje em dia esses instrumentos já estão inseridos em conservatórios,
institutos federais, faculdades privadas e universidades públicas. Entretanto, Bastos (2010) em
sua dissertação teve como objetivo conhecer as trajetórias de formação de bateristas que
buscaram estudar o instrumento em ambiente de ensino formal e observou que os bateristas
investigados, mesmo depois de terem ingressado em ambientes de educação formal e
não-formal, ainda continuaram a aprender, cada um da sua forma, de maneira informal. O
autor afirma que “isto foi percebido nos relatos dos entrevistados com relação às suas posturas
em momentos nos quais detectaram que a escola eventualmente não abrange tudo” (BASTOS,
2010, p. 100).
Como dito anteriormente muitos bateristas estudam seu instrumento por conta
própria, mesmo aqueles que têm acesso a aulas em ambientes de ensino formal. Muitas das
informações são obtidas através da internet, ou outras mídias físicas. Desta maneira, em sua
pesquisa, Daniel Gohn (2016) buscou abordar o uso de aplicativos para o aprendizado de
bateria, procurando entender e discutir como as tecnologias têm modificado o aprendizado do
instrumento.
Com o surgimento da internet, surgiram novas oportunidades de se aprender um
instrumento, neste caso a bateria. Segundo Gohn (idem), é possível encontrar facilmente
ofertas diversas de materiais didáticos, videoaulas e aulas online de diversos instrumentos,
inclusive a bateria, possibilitando um contato mais imediato do aprendiz com o professor de
música. Um outro marco importante apontado pelo autor é o surgimento do YouTube:
A criação do YouTube, em 2005, tornou comum a visualização de vídeos
pelas redes eletrônicas, incluindo registro de performances e materiais
didáticos de bateria, assim como de outros instrumentos. Para aprender a
tocar uma música, um indivíduo poderia não somente ouvir gravações
repetidamente, mas também assistir aos movimentos realizados pelos
instrumentistas para produzir os sons registrados (GOHN, 2016, p. 62).

Vale ressaltar que apesar do baterista passar a ter acesso a mais informações
referentes ao seu instrumento, ele não tem como saber se aprendeu de fato, pois como não
20

existe interação entre quem publicou o material e o baterista, ele não tem como saber se está
tocando corretamente os exercícios propostos ou até se a sua tentativa de tocar uma música foi
bem sucedida (idem, 2016). O autor ainda reforça que mesmo em contextos onde um músico
ou professor prepara um material didático e posta no YouTube, só é possível estabelecer
alguma interação entre quem produziu o material e quem assistiu, se algum canal de
comunicação for disponibilizado. Podemos considerar também que “ [...] gravações de áudio
e vídeo preservam performances virtualmente por tempo indefinido e não há garantias de que
o músico ainda esteja atuante e disposto a interagir com aprendizes” (GOHN, 2016, p. 62).
Entretanto, é importante apontarmos que no Youtube a interação pode ocorrer por vezes
através dos comentários e redes de comunicação. Como é o caso de vídeos onde o vlogger7
que produziu o conteúdo pede para que seu público entre em contato e interaja por meio dos
comentários do vídeo.
A partir dessa necessidade de uma maior interação entre aluno e professor, novas
plataformas surgiram na internet com o objetivo de oferecer conteúdos específicos para o
estudo de bateria, em forma de websites. Daniel Gohn (2016) cita alguns sites que oferecem
serviços direcionados para o ensino de bateria: “Lesson Face”, “Drumeo”, “Drum Channel” e
o “Artist Works”. Todos esses websites oferecem serviços pagos de aulas de bateria das mais
diversas formas, seja por disponibilização de videoaulas gravadas, aulas com interação em
tempo real utilizando videochamadas, ou interação por vídeos gravados. A principal diferença
entre os vídeos disponibilizados no YouTube e os disponibilizados por esses websites é que no
Youtube os vídeos geralmente são “soltos”, não seguem e nem são disponibilizados
necessariamente seguindo uma organização didática, diferentemente do que acontece nos
websites.
Como já citado anteriormente, uma prática comum entre os bateristas é a de tocar
ouvindo uma música, que consiste basicamente em ouvir o que foi gravado e em seguida
executar tocando e ouvindo a música. Essa prática pode ser feita tanto com uma música onde
temos presente o áudio da bateria, como também com os play alongs, que são músicas onde o
som da bateria é suprimido para que o baterista tenha a sensação de estar tocando junto com
uma banda, como se fizesse parte do conjunto. Essa prática é importante no estudo da bateria
e é um exemplo de como a tecnologia integra esse processo de aprendizagem e prática no
instrumento.

7
Produtor de conteúdo audiovisual para internet como uma espécie de diário pessoal.
21

1.2 TECNOLOGIA E EDUCAÇÃO MUSICAL

1.2.1 Tecnologia e ensino de música

Para discutirmos sobre o ensino-aprendizagem da bateria em um curso de


graduação em música a partir do auxílio das tecnologias, é preciso entender como a área de
Educação Musical tem olhado para as diferentes tecnologias contemporâneas. Em sua
pesquisa, Rodrigo Scharmm (2009) propõe que o uso das tecnologias no ensino de música
pode ser amplo, contemplando diversos conteúdos da área, como também pode ser focada em
conteúdos específicos, afirmando que é preciso entender qual o foco do uso da tecnologia no
processo de ensino-aprendizagem de música. Segundo o autor, os focos do ensino podem ser
“tecnologia musical em si” ou a “música por intermédio da tecnologia”. (SCHARMM, 2009,
p. 3)
Desse modo, para Scharmm, se o objetivo está em dominar a tecnologia para que
esta sirva como ferramenta para a aprendizagem musical, ou seja a tecnologia musical em si, é
preciso que o professor planeje “formas de ensino para que o aluno seja capaz de operar a
tecnologia da melhor forma possível de modo que possa gerar um produto musical final de
alta qualidade” (idem, p. 3). Neste caso, o autor se refere a utilização de softwares de
gravação de áudio e vídeos, possibilitando ao aluno que este utilize esses softwares para a
criação de “componentes multimídia que possam ser utilizados em objetos de aprendizagem
musical” (idem, p. 3). Já se o foco do ensino é música por intermédio da tecnologia, O autor
(idem) afirma que, “[...] é preciso explorar certas características da mesma”. Para melhor
entendimento, um exemplo dessas características é a utilização de softwares editores de
partituras. Neles é possível trabalhar, por exemplo, a percepção musical, como os intervalos
musicais, ritmo e teoria musical de maneira geral.
A partir dessas considerações de Rodrigo Scharmm (2009) é possível
compreender a relação entre a tecnologia e a aprendizagem musical, buscando compreender
qual o papel da tecnologia em cada processo. Assim o autor nos coloca essas duas
possibilidades de tecnologia na educação musical; uma sobre a aprendizagem da tecnologia
como ferramenta para a aprendizagem em música e outra pensando a música por intermédio
da tecnologia. Ou seja, neste primeiro exemplo, o aluno deverá ser capaz de operar a
tecnologia, podendo utilizar isto no seu processo de aprendizagem musical. Já no segundo
exemplo, a música está em primeiro plano, ele aprenderá música e utilizará da tecnologia para
auxiliá-lo no seu processo de aprendizagem. No nosso caso, o foco está no ensino do
22

instrumento, então é preciso refletir sobre como devemos utilizar essas tecnologias, de
conceitos, técnicas e habilidades musicais.

1.2.2 Tecnologia e ensino/aprendizagem de instrumentos

Abordando o ensino do instrumento, as autoras Kruger, Gerling e Hentschke


(1999) estabelecem em sua pesquisa duas categorias de softwares que podem auxiliar no
ensino e aprendizagem do piano; os softwares de atuação direta e os de atuação indireta.
Em se tratando da utilização de softwares que têm atuação indireta no processo de
ensino e aprendizagem do piano, as autoras descrevem como sendo aqueles que inicialmente
foram desenvolvidos para a utilização em aulas de teoria, mas que também acabam sendo
utilizados para o ensino de instrumento. Estes seriam os softwares de editoração de partituras,
os que são utilizados para exercício da percepção, entre outros que tem atuação específica em
áreas da educação musical.
Já os Softwares de atuação direta no processo de ensino aprendizagem do piano,
segundo Kruger, Gerling e Hentschke (1999, p. 7), “são aqueles que intervém no processo de
ensino e aprendizagem do piano, auxiliando na monitoração do estudo técnico ou da execução
musical”. Estes seriam aqueles softwares que servem como um tipo de supervisor ou tutor,
com lições e tutoriais para o ensino do instrumento. Atualmente é comum encontrarmos
aplicativos com esses recursos, que são maneiras alternativas de aprender o instrumento,
muitas vezes sem o auxílio da teoria musical convencional.
Outro trabalho que também vai tratar do uso da tecnologia no processo de ensino
e aprendizagem do piano é o artigo publicado pelas autoras Luciana Fernandes Hamond e
Anna Rita Addessi (2019). Nessa pesquisa, as autoras investigaram os usos pedagógicos do
software MIROR-Impro a partir do feedback adicional provocado pelo uso da tecnologia
digital no desenvolvimento da improvisação em instrumentos de teclado. As autoras discutem
também o uso do feedback mediado por tecnologia procurando entender como pode
influenciar no desenvolvimento da improvisação no piano. Em citação aos autores John Hattie
e Helen Timperley (2007 apud HAMOND; ADDESSI, 2019, p. 104), as autoras colocam que
o feedback é essencial para a aprendizagem do aluno, explicando que este ocorre, geralmente,
a partir de algum indivíduo, seja professor, colega ou até pelo próprio aluno baseado em sua
experiência.
De acordo com Hamond e Addessi (2019), nos contextos de ensino de
instrumento e canto presencial, é possível ter dois tipos de feedbacks, o intrapessoal e o
23

interpessoal. O feedback intrapessoal ocorre dentro do próprio indivíduo, ou seja, a partir da


percepção do próprio aluno, por exemplo o uso da audição ou da visão. Já o que as autoras
colocam como feedback interpessoal ocorre a partir da interação entre dois indivíduos,
subdividindo-se entre o feedback verbal e o não verbal. O feedback verbal pode ocorrer a
partir de instruções, perguntas, entre outros comentários. Já os não verbais ocorrem quando o
professor toca junto com o aluno, toca algum exercício, marca a pulsação, ou seja, quando
existe uma interação mas ela não acontece por meio da fala e sim através de ações. E segundo
as autoras este segundo feedback também pode ocorrer entre o aluno e o uso de alguma
tecnologia digital.
Ao tratarem do uso das tecnologias digitais, Hamond e Addessi (2019) também
afirmam que estas geram outros tipos de feedback, o que elas chamam de feedback adicional.
Estes outros tipos de feedback são o visual e o auditivo, que podem ter um impacto no
processo de ensino e aprendizagem do instrumento se trabalhados junto ao feedback
interpessoal.
O feedback visual é obtido através do registro do aluno por meio de algum
software de gravação. Que no contexto da pesquisa é o MIROR-Improv, onde as
representações gráficas através do piano roll são registradas por meio da gravação da
performance do aluno, possibilitando um entendimento de como o aluno toca através das
notas MIDI escritas no software.
O feedback auditivo também é obtido através da gravação da performance do
aluno. Neste caso ele ocorre a partir da audição da gravação feita pelo aluno, onde é possível
fazer uma análise baseada apenas na sonoridade. Para as autoras Hamond e Addessi (2019, p.
99), “a reprodução dos dados gravados pela tecnologia pode oferecer aos professores e seus
alunos oportunidades para avaliarem aspectos que podem ser melhorados e/ou mantidos em
suas performances, improvisações e composições”. Esses recursos possibilitam que os alunos
tenham uma perspectiva diferente acerca da sua performance no instrumento. Sendo assim, as
autoras concluem que:
No caso da utilização do software MIROR-Impro, o feedback visual
disponível através das visualizações em piano roll e do feedback auditivo ao
ouvirem suas improvisações parece ter aumentado a percepção dos alunos
sobre suas improvisações, tornando-os mais conscientes de seus processos de
aprendizagem e dos elementos, variações melódicas e rítmicas e diversas
texturas escolhidas durante o desenvolvimento das improvisações com o uso
do software MIROR-Impro (HAMOND. ADDESSI, 2019, P. 99)

Ou seja, a tecnologia pode ser uma ferramenta agregadora no que diz respeito ao
processo de ensino-aprendizagem do instrumento. Ela pode trazer novas formas de avaliar,
24

compreender e analisar um estudo ou uma performance musical, possibilitando tanto ao aluno


quanto ao professor diferentes formas de se ensinar e estudar um instrumento musical. E
ademais, entendendo o emprego dado a tecnologia neste pesquisa, dentro do contexto
estudado pelas autoras o uso da tecnologia como uma ferramenta agregadora no processo de
ensino e aprendizagem do piano pode se mostrar bastante proveitoso se aliado às
metodologias de ensino já tradicionais utilizadas dentro de uma instituição de de ensino
superior no Brasil.
Leme (2006), em sua dissertação, trata do uso da tecnologia por professores no
ensino de música em escolas específicas de música. Nesse processo, o professor deve ser
capaz de refletir e pensar em como o uso de recursos tecnológicos pode ser relevante para o
ensino de música. O autor (2016) acrescenta que um professor reflexivo e preparado vai poder
utilizar de recursos tecnológicos para o auxílio de seu ensino, porém este não deve esquecer
do seu objetivo principal com os alunos, que é o de proporcionar um ensino de música e uma
prática musical significativa. Ou seja, é preciso pensar maneiras de tornar esse processo de
aprendizagem do instrumento algo muito mais próximo de uma prática musical real. O autor
ainda complementa que é importante pensar na autonomia dos alunos no seu fazer musical e
no seu processo de aprendizagem.
Sobre o ensino e aprendizagem de bateria articulada com a tecnologia,
considerando a gravação, o trabalho de Melo (2015) discute os efeitos de estudos formais
associados ao recurso didático da gravação na prática de bateristas populares. Em sua
dissertação, Bruno Melo (2015) utiliza da pesquisa-ação para intervir na prática de dois
bateristas populares e fez uso da gravação como recurso didático nas aulas. Para o autor:
[...] os registros realizados ao longo das aulas, mostraram resultados
positivos de aprendizagem, permitindo que os participantes pudessem se
analisar através de vídeos, e, assim também percebessem quais eram as suas
limitações e os seus avanços obtidos no estudo da bateria (MELO, 2015, p.
153).

Dessa forma, com base nas pesquisas relativas ao ensino de música/instrumento e


tecnologia trazidos nessa revisão, é possível perceber uma unidade em relação à
potencialidade das transformações tecnológicas nas formas de aprender, ensinar e consumir
música, principalmente tendo como foco o uso da tecnologia no processo de
ensino-aprendizagem do instrumento. Mas também é possível perceber uma lacuna quando
procuramos tratar do ensino-aprendizagem de bateria aliado ao uso de recursos tecnológicos.
Poucos são os trabalhos que abordam o uso da tecnologia e a bateria, no recorte aqui
apresentado, foi possível encontrar mais trabalhos que relacionam o uso do piano/teclado.
25

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

A coleta de dados desta pesquisa ocorreu com alunos de bateria do curso de


Licenciatura em Música da Universidade Federal da Paraíba, durante as aulas coletivas. Para
esta pesquisa foram feitas duas entrevistas coletivas com alunos do primeiro ao oitavo período
do curso.
A princípio, a coleta de dados desta pesquisa seria feita em duas etapas: a primeira
seria por meio de entrevistas individuais a partir da seleção de dez alunos do curso de
licenciatura em música, seguido de observações das práticas musicais dos entrevistados.
Entretanto, em virtude da pandemia da COVID-19 tivemos a necessidade de fazer uma
adaptação na nossa forma de coletar os dados e optamos em fazer esta por meio de entrevistas
coletivas. As entrevistas foram feitas por meio de rodas de conversas com todos os alunos de
bateria matriculados no componente curricular classe de bateria8.

2.1 SELEÇÃO DOS PARTICIPANTES

Com relação à escolha dos participantes, em artigo escrito por Boni e Quaresma
(2005, p. 73) elas afirmam que “os participantes [podem ser escolhidos] a partir de um
determinado grupo cujas ideias e opiniões são do interesse da pesquisa”. Assim, o grupo
de entrevistados escolhidos para participar foi selecionado a partir do objetivo da pesquisa e
do foco em estudantes do curso de Licenciatura em Música - Bateria, da UFPB. Tendo em
vista que o objetivo da pesquisa é compreender qual o papel dos recursos tecnológicos no
processo de aprendizagem do instrumento para os estudantes de bateria do curso de
licenciatura em música da UFPB, entendemos que seria importante que todos os alunos, ou
a maioria dos matriculados, pudessem contribuir com a pesquisa.
Dentro de todo o curso estão matriculados onze alunos que cursam do primeiro
período (período inicial), até o oitavo período (período final). Porém, destes onze alunos
apenas seis estão matriculados e efetivamente participando das aulas da disciplina de Classe
de Bateria. Vale salientar que além dos seis alunos matriculados, outros quatro alunos de
bateria estão participando das aulas como ouvintes, totalizando assim um número de dez
alunos que participam efetivamente das aulas. É importante ressaltar aqui que, enquanto aluno

8
A Classe de bateria é um Componente Curricular Obrigatório dentro do Curso de Licenciatura em Música da
UFPB, para os alunos com habilitação em bateria. Esta disciplina agrega (obrigatoriamente) alunos matriculados
até o 5º período do curso em aulas coletivas.
26

do curso de licenciatura em música com habilitação em bateria, também estou entre esses dez
alunos participantes das aulas de classe de bateria, portanto apenas oito dos dez alunos
participantes puderam efetivamente participar desta pesquisa. Por critérios de disponibilidade,
apenas oito alunos destes participaram das entrevistas desta pesquisa.

2.2 REALIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS

Para um melhor entendimento sobre a relação entre tecnologia e aprendizagem


do estudante de bateria, elegemos a entrevista semiestruturada como melhor ferramenta para a
coleta de dados desta pesquisa. Com esta modalidade de entrevista é possível mesclar
perguntas abertas a perguntas fechadas e ter uma maior volatilidade em relação às perguntas
previamente escolhidas, tendo o entrevistador total liberdade para dirigir as perguntas
assemelhando a entrevista a um tipo de conversa informal (BONI; QUARESMA, 2005).
Aliado à entrevista semiestruturada, também nos inspiramos em algumas técnicas
de entrevista com grupo focal para uma melhor coleta de dados. Visto que, por as entrevistas
terem ocorrido a partir de rodas de conversas, tivemos o pesquisador como figura de
moderador e os alunos da disciplina de Classe de bateria compondo o grupo de participantes
da pesquisa. Utilizamos, assim, uma característica presente nas técnicas de coletas de dados
por grupo focal.
Para a construção dos roteiros da entrevista semiestruturada, Boni e Quaresma
(2005, p. 75) afirmam que “o pesquisador deve seguir um conjunto de questões
previamente definidas”. Assim, o roteiro (Ver Apêndice A) foi organizado a partir de sete
questões previamente estabelecidas e durante as entrevistas outros questionamentos foram
adicionados ao roteiro, por se mostrarem relevantes as reflexões da pesquisa. Esta modalidade
de entrevista possibilita uma maior flexibilidade em relação aos questionamentos. Segundo as
pesquisadoras:
O entrevistador deve ficar atento para dirigir, no momento que achar
oportuno, a discussão para o assunto que o interessa fazendo perguntas
adicionais para elucidar questões que não ficaram claras ou ajudar a
recompor o contexto da entrevista, caso o informante tenha “fugido”
ao tema ou tenha dificuldades com ele (BONI; QUARESMA, 2005, p.
75)

As entrevistas foram realizadas de forma online, por meio de videoconferência


através da plataforma Google Meet, posteriormente gravadas e anexadas no drive como
arquivos de vídeo, para assim facilitar os processos de transcrição e análise do material. Elas
27

ocorreram durante a pandemia da Covid-19, no mês de abril de 2021. Como dito


anteriormente, as entrevistas ocorreram durante os encontros da turma de Classe de Bateria.
Na primeira sessão de entrevista, participaram oito alunos e ela teve duração de uma hora e
vinte e seis minutos. Na segunda sessão da entrevista, participaram três alunos e esta teve
duração de uma hora e vinte minutos. Apesar de haver uma diferença no número de
participantes da primeira para a segunda sessão de entrevistas, elas acabaram tendo quase a
mesma duração, pois o número de perguntas e de interação dos alunos na segunda sessão foi
maior do que a primeira.
O número de entrevistados na segunda sessão de entrevista foi menor pois, no dia
da aula de Classe de bateria, o professor teve um problema de saúde e não pôde comparecer.
Porém, mesmo com a sua ausência, o professor não cancelou a aula, visto que o momento da
aula é utilizado para leitura de textos, debates e discussões acerca do universo da bateria. Mas
acreditamos que a ausência dos alunos pode ser explicada pela não presença da figura do
professor na aula, inclusive por entenderem também que a ausência do professor
consequentemente estava relacionada ao cancelamento da aula.
No processo de transcrição das duas entrevistas foi gerado um documento de texto
com 49 páginas. Na redação foi utilizada a fonte Times New Roman, fonte tamanho 12, com
espaçamento de 1,5 e todo o texto justificado. Também durante esse processo, algumas das
falas foram regulamentadas tendo como parâmetro a norma culta e coloquial da língua
portuguesa, além também da supressão de algumas palavras repetidas e vícios de linguagem.
Em relação à ética de pesquisa, os alunos participantes desta pesquisa
preencheram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TCLE - (Ver Apêndice B). O
convite para participarem da pesquisa foi feito durante uma aula de classe de instrumento na
plataforma Google Meet. O convite também foi reforçado pelo professor da disciplina
(professor de bateria do curso) e um segundo convite foi feito através do grupo da disciplina
no aplicativo de mensagens WhatsApp.
28

3. RECURSOS TECNOLÓGICOS E APRENDIZAGEM DE BATERIA NA


PERSPECTIVA DOS ESTUDANTES ENTREVISTADOS

Neste terceiro capítulo, apresentaremos os dados coletados nas entrevistas em


articulação com autores que discutem a respeito da aprendizagem de bateria e sobre o uso de
tecnologia no processo de ensino-aprendizagem de instrumentos musicais.

3.1 PERFIL DOS ENTREVISTADOS

Aqui falaremos sobre o perfil dos alunos entrevistados nesta pesquisa. Dentre os oito
alunos participantes, cinco alunos estão matriculados na disciplina de classe de bateria e três
alunos estão matriculados no curso de bateria e participam da disciplina de classe de bateria
apenas como ouvintes. Por tratar-se de uma disciplina que reúne quase todos os alunos de
bateria do curso de licenciatura em música, este grupo apresenta diferentes vivências musicais
e diferentes características.
Elaboramos um quadro (ver Quadro 1) contendo informações com o propósito de
contribuir para o melhor entendimento do perfil dos entrevistados:
Quadro 1 - Perfil dos alunos entrevistados

Fonte: Autor da pesquisa


29

A partir do que foi apresentado no Quadro 1, acima, destaco aqui alguns pontos sobre
o perfil dos alunos. Primeiro podemos observar que dos oito alunos entrevistados, metade
teve a bateria como seu primeiro instrumento dos quatro alunos que não tiveram a bateria
como primeiro instrumento, dois tiveram a percussão como primeiro instrumento e os outros
dois tiveram a guitarra e o violão como instrumentos anteriores à bateria.
Todos os alunos entrevistados são homens. A faixa etária é variada, o que é natural nos
cursos de graduação em música, pois enquanto alguns alunos ingressam no curso logo após o
término do ensino médio, outros só vão entrar no curso anos depois. Neste caso é comum que
já estejam atuando profissionalmente e buscam no curso mais uma opção de formação. O
tempo que tocam bateria também é um dado que reúne iniciantes e mais experientes na
mesma turma. Mesmo entendendo que as aulas de bateria se dão de forma individual, nas
aulas de classe de bateria as aulas são coletivas e isso possibilita uma diversidade em vários
aspectos: vivências anteriores e concomitantes a bateria, momentos de vida distintos, tempo
de contato com o instrumento e etc.
Durante as entrevistas, alguns alunos relataram manter entre eles uma rede de contatos
e ajuda em relação ao estudo e suas vivências na bateria. Vale salientar que os alunos mais
velhos da turma já se conheciam antes de ingressarem no curso de licenciatura em música,
alguns até já tiveram relação de aluno e professor, como é o caso do aluno Hugo, que relatou
ter tido aulas de bateria com o aluno entrevistado Ewerton. Alguns alunos também participam
conjuntamente de atividades musicais na UFPB, como é o caso dos alunos Rodrigo, Hugo e
Marcos, que atuam em gravações de grupos de trombone da universidade.
Quando questionados sobre como se deu o início de seus estudos na bateria, apenas
um aluno começou a estudar bateria em um ambiente de ensino formal, os outros sete
entrevistados estudaram por conta própria ou a partir de aulas particulares.
Por fim, a partir dos dados obtidos e analisados das entrevistas, foi possível constatar
que todos os entrevistados fizeram uso de pelo menos um recurso tecnológico em seu estudo
de bateria. Este dado é importante e relevante para o prosseguimento desta pesquisa.

3.2 COMO APRENDERAM A TOCAR BATERIA

Por ser um instrumento relativamente novo, se comparado a outros instrumentos como


piano, violino e até mesmo a percussão, instrumento que a originou, a bateria ainda não
apresenta materiais didáticos que trabalhem o uso da tecnologia e o aprendizado do
30

instrumento. Assim, trabalhos relativos a seu ensino e consequentemente a sua presença em


ambientes de ensino formal é bastante recente.
Sendo assim, é comum encontrarmos bateristas que começaram a estudar o
instrumento sozinhos, sem ter auxílio de professores de bateria. Como relata Melo sobre o
processo de aprendizagem de bateristas populares, estes “geralmente adquiriram seus
conhecimentos musicais influenciados por familiares, estudando seus instrumentos de forma
autônoma e sem auxílio de professores” (MELO, 2015, p. 4). O entrevistado Kamillo relata
que, no início do seu estudo na bateria, todo o seu aprendizado foi feito com base na
observação de videoaulas. O entrevistado Hugo narra que o seu primeiro contato com a
bateria ocorreu após a saída do baterista da banda que tocava, quando decidiu largar o
instrumento que tocava na época, a guitarra, e foi tocar bateria. Nas suas palavras: “[..] foi
meu encontro com ela, [...]. Eu lembro que quando eu comecei veio aquela luz. Falei, é agora!
Vou começar a tocar bateria. Comprei um método, não sabia fazer leitura nenhuma, não
conhecia nenhuma notação musical, mas comecei a fazer por conta própria” (HUGO).
Já os entrevistados Ewerton e Marcos relatam que tiveram influência de familiares
para suas vivências musicais. Ewerton expõe que o seu contato com a música ocorreu por
influência do seu pai e que foi no ambiente de sua igreja que teve o primeiro contato com o
instrumento e que a princípio seu estudo foi todo sozinho, sem o auxílio de professores. O
aluno Marcos conta que foi o seu irmão quem o apresentou a bateria, e que o fez largar o
instrumento que tocava na época, a guitarra, e conta que inicialmente teve a ajuda do irmão
para tocar a bateria. Os entrevistados Gilson, Carlos e Rodrigo também relatam que
começaram seu estudo na bateria sem o auxílio de um professor.
Neste estudo de bateria sem o auxílio de um professor, é possível perceber como os
bateristas utilizam da tecnologia, como já citado acima no relato do entrevistado Kamillo,
para auxiliá-los no seu processo de aprendizagem do instrumento. Assim relata também o
entrevistado Marcos:
[...] uma coisa que eu utilizava bastante [...] foi o Guitar pro, que é um
software de edição de partitura, né. E aí, esse programa, ele me ajudou
bastante, porque as dúvidas que eu tinha, se eu tava tocando a coisa certa ou
errada, como eu já tinha muita leitura, o que eu fazia, jogava no programa, e
aí eu botava para tocar, e eu disse, “ah, o programa tá soando, pelo menos a
rítmica tá certo” (MARCOS)

O entrevistado Marcos relata o uso de um software de edição de partituras e tablaturas


como ferramenta para gerar parâmetros de avaliação em seu estudo, onde o mesmo faz um
estudo comparativo, um estudo de apreciação. O software proporciona o que Hamond e
31

Adessi (2019) chamam de “feedback auditivo”, mesmo que o som reproduzido no editor de
partituras não seja uma reprodução do que o aluno executou, ele pode utilizar o áudio do
software como referência para a sua prática. O aluno Marcos também segue uma perspectiva
do uso da tecnologia na educação musical levantado por Rodrigo Schramm (2009), que é o
“aprendizado de música através do uso da tecnologia”, onde o baterista utiliza a tecnologia
como um recurso que auxilia no aprendizado do instrumento.
Podemos entender que o software faz nesta situação, em parte, um papel que em outro
momento poderia ser exercido pelo professor de bateria, pois o baterista executa o ritmo
desejado na bateria e em seguida escuta o ritmo escrito no programa. Logo, ele entende que
está executando o ritmo corretamente, quando sua execução está soando semelhante ao áudio
reproduzido no software.
Entretanto, a figura do professor não torna-se substituível, na verdade ela pode fazer-se
necessária, na medida em que é importante ter a avaliação e orientação do professor, pois em
algumas situações o aluno ainda não tem o entendimento necessário para se autoavaliar,
principalmente se pensarmos aqui em alunos iniciantes no instrumento, como relata o aluno
Kamillo sobre suas experiências com o uso da observação de videoaulas durante seus anos
iniciais no instrumento, “isso daí foi uma escola para mim durante muito tempo, que tem seus
pontos positivos e os negativos, os negativos é porque a gente não tem como ser avaliado se tá
fazendo certo”. Notamos assim o papel do professor como figura que deve encaminhar,
ajudar, observar e orientar o estudante durante seu processo de aprendizagem no instrumento.
Ademais, apesar de entendermos que o professor pode ter um papel relevante dentro
desse processo inicial de aprendizagem da bateria, é possível perceber que os próprios
bateristas, de maneira individual, já conseguem desenvolver diferentes formas de estudar seu
instrumento.

3.3 USO DA TECNOLOGIA NO ESTUDO DA BATERIA

3.3.1. Redes e mídias sociais no estudo da bateria

As redes sociais também têm um papel importante no processo de aprendizagem de


bateria. Além de ser um ambiente que serve como um canal de interação entre pessoas,
também pode ser utilizado com um ambiente de registro e armazenamento de conteúdos. O
aluno entrevistado Kamillo relata como utiliza o aplicativo Instagram para registrar,
armazenar e analisar seus estudos na bateria:
32

Então, um dos meios que eu gosto de usar também, que ultimamente eu tô


até... dei uma parada. É o próprio Instagram, que eu uso sempre como uma
nuvem também. Às vezes o cara tá postando um stories, algo que tá
estudando, às vezes tem cara que não entende, pensa que é exibição e tal.
Mas aquilo tudo tá arquivado para mim. E às vezes eu vou lá atrás e vou ver
como é que tava quando eu tava, como eu tava e como tô (KAMILLO).

De forma semelhante, Marcos também costuma armazenar e compartilhar suas


performances na bateria, no entanto, utiliza o YouTube. Segundo o entrevistado, após a
criação de um canal em sua conta no site, ele costuma compartilhar vídeos de suas
performances e também utiliza desses registros como parâmetro para medir a sua evolução no
instrumento.
Dessa forma, além do Instagram, o YouTube é uma plataforma que também tem se
mostrado uma importante ferramenta utilizada por bateristas para o estudo do instrumento. Os
entrevistados, por exemplo, têm o YouTube como um ambiente de armazenamento e busca
para conteúdos de bateria. Nesse espaço, o baterista pode não somente ouvir e ver as
gravações, como também atentar-se aos movimentos realizados pelos músicos para tocar seus
instrumentos e produzir os sons registrados. (GOHN, 2016). E é exatamente assim que o
entrevistado Carlos explica que faz no seu estudo de bateria, “[se] eu quero aprender mais
sobre Maracatu, a primeira coisa que eu faço é ir no YouTube ver algumas células alí. Ver
algumas pessoas, formas de tocar encontro alguma, faço anotações e depois eu crio um
repertório e tento colocar isso dentro de repertório”. O aluno entrevistado Marcos também faz
um relato referente ao uso da plataforma no seu estudo de bateria:
[...] eu vi um vídeo no YouTube de um cara que ele colocou um play along,
ele colocou um de um frevo tocando a 140[bpm], se não me engano, era só
pandeiro surdo e caixa. E aí, eu comecei a ver o movimento que ele fazia,
rapaz eu entendi, então o movimento, é o movimento quem vai dar o swing,
né, e o acento a gente vai só controlando alí a força (MARCOS).

Ao refletirmos sobre o papel que as redes sociais9 e mídias sociais10 têm no processo
de aprendizagem da bateria, compreendemos que estas também possibilitam ao baterista um
diferente fazer musical, na medida em que estes ambientes virtuais nos trazem uma outra
perspectiva do que é praticar música. O entrevistado Marcos relata que quando começou a
tocar bateria já utilizava as redes sociais para disponibilizar seus registros na bateria, porém,
seu uso não era focado na autoavaliação e sim em disponibilizar material para divulgação do
seu trabalho. Como expõe o entrevistado, “eu não fazia no sentido de me avaliar, eu fazia mas
9
Ambientes virtuais desenvolvidos para interação entre pessoas, possibilitando que o usuário compartilhe
informações sobre si mesmo para seus amigos ou outras pessoas. Como por exemplo o Instagram.
10
Ambientes virtuais de senvolvido para a divulgação de conteúdo, notícias e informações. As interações aqui,
diferentemente das redes sociais, ficam em segundo plano. Como por exemplo o YouTube.
33

no sentido de divulgar, [..] eu tinha essa visão de querer ocupar um espaço”. Esta fala do
aluno Marcos nos faz refletir sobre o papel que as redes sociais podem ter na vida profissional
do músico. As redes sociais possibilitam um acesso imediato a diversos tipos de conteúdos e
diferentes grupos sociais que consequentemente proporcionam uma conexão entre as pessoas
que antes não existia e que também proporcionam uma maior autonomia do baterista, visto
que ele é quem controla o que produz e expõe nas suas redes.
O fazer musical nas redes sociais não precisa ter relação com o fazer musical que é
feito fora desse ambiente, nem tampouco ter qualquer relação com objetivos e perspectivas de
ensino-aprendizagem da bateria. O fazer música pode ter outros objetivos e perspectivas, o
baterista pode não querer fazer música com o objetivo de tocar com artistas ou promover-se
como músico free lancer, mas sim com o objetivo de produzir conteúdo para a internet. Essa
prática de baterista que produz seu próprio conteúdo ou que se apresenta como digital
influencer, já é bastante difundida no YouTube, são diversos os canais e bateristas que se
propõem a produzir conteúdos voltados exclusivamente para a bateria, seja com a gravação de
drum covers, vídeos com dicas de manutenção do instrumento, dicas de microfonação de
bateria, etc. No Instagram estes bateristas também estão presentes com contas profissionais
voltadas apenas para a produção de conteúdo de bateria e para bateristas.
Esse fato no faz refletir sobre as diversas outras práticas que as redes sociais podem
proporcionar para o baterista independente do seu objetivo, entendemos que isso pode ser
vantajoso para o músico, uma vez que ele tem acesso a um ambiente onde é possível expôr
para inúmeras pessoas o seu trabalho e consequentemente utilizar dessas redes como vitrine
para a sua prática musical e para o seu trabalho.
Outra reflexão que levantamos aqui, é a de como esse outro fazer musical pode ter
relação com os processos de aprendizagem dos próprios bateristas que produzem conteúdo
nesse ambiente, mesmo que não seja uma prática feita com essa consciência. Podemos pensar
também que a disponibilização desses materiais podem também afetar os processos de
aprendizagem de outros bateristas.
Compreendendo que esta prática já é recorrente, como relataram alguns dos
entrevistados, sobre o uso que os bateristas que eles acompanham fazem, através de lives no
instagram, torna-se importante discutir e ter um olhar mais atento acerca do papel que essas
redes sociais têm para a carreira do baterista.
34

3.3.2 Potenciais e desafios no acesso às informações sobre bateria na internet:


construindo a autonomia

Os entrevistados falam da importância do contato visual para a aprendizagem da


bateria, utilizando da observação como ferramenta para o estudo do instrumento. A
observação é um recurso bastante utilizado em aulas de instrumento, pois permite ao aluno
uma aprendizagem por imitação. Ao pensarmos no seu uso a partir destes recursos
tecnológicos, como no caso dos vídeos, é possível expandir as possibilidades do uso da
observação, podemos mudar a velocidade de um vídeo deixando-o mais lento, pará-lo e
repeti-lo. A prática citada acima não é relatada pelos alunos, mas já foi utilizada por mim
durante meu estudo de bateria. Essas possibilidades diferenciam esta aprendizagem daquela
proporcionada por uma observação no contato ao vivo com outro indivíduo, configurando
assim um modo de aprender que é específico nesse contexto.
Entretanto, apesar do baterista ter com plataformas como o YouTube acesso imediato a
um grande número de conteúdos para o seu estudo, pode lhe faltar, em muitos momentos, a
interação com quem produziu o conteúdo assistido. Nem sempre essa é a intenção de quem
produz vídeo na plataforma e isso pode resultar em um não entendimento de se realmente o
baterista aprendeu ou não o conteúdo estudado, “pois não há feedback para a sua tentativa de
tocar a música ou o exercício proposto” (GOHN, 2016, p. 62 grifo do autor). Além disso,
também é importante entender que nem todo material postado no YouTube é feito por
professores, ou tem algum fim pedagógico, então até a própria orientação de quem produz o
conteúdo pode ser confusa, se somada a enorme quantidade de vídeos disponibilizados com
uma mesma temática. O aluno entrevistado João narra a sua frustração perante este fato:
Eu entrava no YouTube. Eu queria estudar um frevo, assim, eu abria o
YouTube, [tinham] 35 caras falando que... um que dizia que o outro estava
ensinando você errado, se você fosse em um caminho, você estava indo
errado, não sei o quê... E aí, eu perdi muito tempo nisso assim (JOÃO).

A fala do João traz para a discussão dois fatores que são cruciais nesse processo de
articulação entre a tecnologia e a aprendizagem da bateria, que é o volume excessivo de
materiais disponíveis e a falta de orientação durante o processo de ensino-aprendizagem da
bateria.
O primeiro fator aqui exposto está relacionado a diversas questões referentes a
benefícios e malefícios ocasionados pela tecnologia, como o imediatismo, por exemplo. Nesse
sentido, os autores, Junger, Amaral, Leite, Pertanella e Lui (2018, p. 8) apontam que, “[...] a
35

influência das tecnologias faz com que os jovens sejam cada vez mais imediatistas e
consumistas”. Em relação a este imediatismo, o aluno entrevistado Kamillo lança a seguinte
crítica: "as pessoas não estão sabendo usufruir do que tem, meio que a informação perdeu o
valor. [...] Hoje em dia a gente tem vídeo, a todo tempo no YouTube. Muitas vezes a galera
não assiste, bota um pedacinho, não curte, vai para outro. Tá faltando um pouco de foco”.
Este pensamento trazido por Kamillo alinha-se a uma colocação que o sociólogo Bauman
(2016 apud JUNGER et al, 2018) faz em uma palestra:
[...] há uma crise de atenção, tendo em vista a quantidade de notícias
recebidas ao mesmo tempo. Isso faz com que os indivíduos não consigam
mais se concentrar e se dedicar em um longo período de tempo em uma
única atividade, ou seja, buscam sempre uma mudança em algo no dia a dia,
estão se tornando cada vez mais líquidos (BAUMAN, 2016 apud JUNGER
et al, 2018, p. 8)

Isso nos leva a refletir sobre como o acesso a excessivas informações pode ser
negativo para o estudante, pois pode trazer mais dúvidas e frustrações do que aprimoramento
de seu conhecimento. Além de quê, nos mostra que talvez seja importante para o estudante ter
o auxílio de um professor para ajudá-lo a conduzir melhor seu estudo, e possibilitando
também ao aluno um melhor entendimento de quais materiais podem ser mais interessantes
para o seu estudo. Como exposto anteriormente, nem todo material disponibilizado no
YouTube, por exemplo, tem uma finalidade pedagógica, ou seja, tem o intuito de ensinar algo,
o objetivo do material exposto na internet pode ter diversos outros fins. O professor pode
entrar em cena atuando como mediador, estabelecendo com o estudante pontos a serem
observados durante sua prática, para que assim com o tempo o próprio baterista consiga obter
a sua autonomia em relação ao seu estudo.
A construção da autonomia pode estar ligada com os processos de autoavaliação.
Sobre isso, o entrevistado Hugo relata:
[...] eu me avalio de acordo com os parâmetros que alguém me ensinou um
dia. Assim, ‘olhe Hugo, o seu posicionamento da mão esquerda tem que
estar de tal forma’. Aí eu vou lá, não só com a parte do áudio, mas até com a
câmera. [...] eu vou ver, a minha mão esquerda não tá tão legal, tem dia que
ela tá lá no lugar certo, tem dia que ela não quer ficar no lugar certo, e o que
me faz perceber isso é monitoração (HUGO).

Importante salientarmos aqui que a ideia é trazer cada vez mais o estudante para o
protagonismo de sua aprendizagem, a atuação do professor aqui não aparece para criar uma
relação de dependência do aluno com o professor. Assim, o autor Pierre Levy (2010, p. 171)
afirma que em um ambiente tecnológico, “[..] a principal função do professor não pode mais
ser a difusão dos conhecimentos, que agora é feito de forma mais eficaz por outros meios. Sua
36

competência deve deslocar-se no sentido de incentivar a aprendizagem e o pensamento”.


Deste modo, concordamos com Levy e entendemos que o professor pode ensinar a buscar e
organizar o conteúdo e, a partir daí, o aluno vai ter a possibilidade de desenvolver suas
próprias estratégias de aprendizagem do instrumento.

3.3.3 Apreciação e autoaprendizagem com recursos de gravação

Não é de hoje que as câmeras filmadoras e gravadores de áudio são utilizadas para
registar momentos ou situações do nosso cotidiano. Desde os primeiros registros em áudio até
os registros em vídeo, percebemos a importância destas tecnologias. Um dos recursos
tecnológicos mais acessíveis hoje em dia é o smartphone. Tal aparelho agrega diferentes
recursos e funções e no campo da música, através dos seus recursos de gravação multipista, é
possível com ele criar até mesmo um estúdio de gravação. Falaremos aqui de duas
ferramentas presentes nestes aparelhos e que se mostram importantes para o estudo de bateria:
a câmera filmadora e os gravadores de áudio.
Na música, estes recursos vêm sendo amplamente utilizados em gravações de discos,
videoclipes, shows, performances, entre outras coisas. Mas será que estes recursos também
podem ser ferramentas utilizadas para auxiliar a aprendizagem de instrumentos? Ou melhor,
no estudo da bateria?
Conforme Gohn:

O universo constituído pelos aparelhos tecnológicos, sejam instrumentos


musicais eletrônicos, gravadores, computadores, estúdios digitais, sistemas
de amplificação, ou quaisquer outros, oferece ao músico certas formas de
criação e interpretação, e torna-se parte integrante do processo musical.
(GOHN, 2003, p. 16)

Pois bem, ao entendermos a importância que uma câmera ou gravador de áudio tem
ao registrar determinado momento no tempo, podemos trazer esse recurso para dentro do
estudo da bateria. Ao fazermos uma gravação em áudio e/ou vídeo um estudo, uma
performance ou uma ideia musical, temos em nossas mãos um retrato de um momento
específico do tempo, proporcionando ao baterista, “ouvi-la diversas vezes, estando sujeito a
perceber e internalizar múltiplos detalhes desse registro, assim como construir outras
possibilidades de arranjos, através da observação dos seus erros e acertos” (MELO, 2011, p.
1718). Isso nos possibilita fazer coisas que jamais poderiam ser feitas antes do surgimento
destas tecnologias, que é a oportunidade de nos vermos e nos ouvirmos. E, consequentemente,
37

isto nos possibilita analisar e apreciar nossa performance. Como relata o entrevistado
Kamillo:
Eu acho que a tecnologia nos possibilita realizar, o que eu acredito que é o
sonho de todo músico, que é se ver tocando. [...] Por exemplo, tem um CD
que eu gravei com uma cantora daqui de samba, acho que foi em 2010.
Bicho, tem uma abertura de chimbal que eu faço toda vez, no mesmo lugar,
em todas as músicas, eu não aguento ouvir esse CD, bicho. Isso era uma
mania, uma falha que eu tinha, que eu só pude perceber ouvindo o CD. Eu
tenho vergonha desse CD por causa disso, mas enfim. [...] Porque tem coisa
que a gente não percebe, porque como a bateria tem muita coisa para prestar
atenção: é timbre, é dinâmica, se for lendo, é leitura, se tiver com click, é
click [metrônomo]. Às vezes tem coisa que termina passando, às vezes
passa, né, normal. E com a gravação, seja só de vídeo, ou de áudio, a gente
consegue ter uma visão macro da coisa. E quando a gente corrige certas
coisas, isso se automatiza e não erra mais (KAMILLO, grifos nossos).

Aqui podemos observar a importância da apreciação no processo de aprendizagem da


bateria. Segundo França e Swanwick (2002, p. 12), “a apreciação é uma forma legítima e
imprescindível de engajamento com a música. Através dela podemos expandir nossos
horizontes musicais e nossa compreensão”. Como relata o entrevistado Kamillo, ouvir as
gravações com um olhar crítico nos ajuda a entender erros e, acima de tudo, nos auxilia na
correção dos mesmos.
As gravações de áudio auxiliam no melhor entendimento do timbre que estamos
extraindo do instrumento, se estamos tocando dentro da pulsação, ou seja, nos mostra qual o
som que estamos tirando do instrumento. Como também relata outro entrevistado, o Hugo,
que possui um home studio com equipamentos de gravação e afirma que: “hoje eu tô na
pegada muito de sincar as coisas, acho que é pela questão do estúdio, eu percebi que eu tinha
muitas falhas de não tocar sincado o que era para tocar sincado”. O que o entrevistado chama
de tocar ‘sincado’ é o que tecnicamente chamamos de tocar quantizado, ou seja tocar dentro
da pulsação e suas subdivisões.
Além das gravações de áudio, as gravações de vídeo também são ferramentas
utilizadas no processo de aprendizagem da bateria. O uso da gravação de vídeo, citando o
aluno entrevistado Ewerton, “[...] é bom demais. Porque você vê muita coisa, postura,
sonoridade, é muita coisa que você consegue ver”. Ter o registro em vídeo possibilita ao
baterista analisar, por exemplo, a sua postura e sua performance, como relata o entrevistado
Hugo, que durante seu estudo de bateria, além das gravações de áudio, também faz o registros
em vídeo, para posteriormente analisar, por exemplo, a sua postura no instrumento. Quem
também faz esse uso é o aluno Gilson, que criou o hábito de se gravar e usar isso para fins
avaliativos: “eu usei a câmera mais para a coisa da autoavaliação, né, da coisa da postura, de
38

posicionamento da mão, da maneira de se expressar na bateria, da contextualidade do gêneros,


né, como é que tá soando os rudimentos, cada notinha tá se encaixando”.
O uso da gravação como um recurso também pode auxiliar nos estudos do instrumento
dentro do seu processo de aprendizagem. Conforme Melo (2015) relata a experiência dos
participantes da pesquisa que resultou em sua dissertação, “as gravações trouxeram pontos
positivos de aprendizagem de bateria” (MELO, 2015, p. 147). Com o uso de um computador
e uma interface de áudio, gravadores digitais ou até gravações feitas pelos smartphones,
podemos explorar ainda mais a utilização da gravação como recurso de ensino-aprendizagem
de bateria. Com o auxílio destes equipamentos, temos a possibilidade de ir além e trabalhar a
criação musical e a composição, por exemplo. O aluno entrevistado Rodrigo relata como neste
período de pandemia vem fazendo o uso de equipamentos tecnológicos nesta perspectiva:
Eu aqui, comecei a gravar várias percussões. Por exemplo, para montar uma
levada de um Afro, [...] eu já gravo cowbell, gravo congas, sabe? Consigo
me auto produzir, ter um trabalho mais independente para mim, [...]. Você se
serve de um auto estudo. Porque quando você se grava, faz a sua auto
gravação e você escuta... fica muito mais fácil. Quando você vai para o
estúdio, você já sabe o que vai fazer, sabe assim? Até em relação a edição
mesmo, de áudio. E tem um lance hoje em dia, e se torna, devido aos meios
das redes sociais, o áudio visual. Então a gente, automaticamente, já faz a
captação do áudio e da imagem separado, pega o celular, grava a imagem do
celular [câmera], faz a captação do áudio e depois linca [sincroniza] tudo
(RODRIGO, grifos nossos).

E o entrevistado ainda sugere que esta produção pode possibilitar a criação de


materiais audiovisuais que o baterista pode disponibilizar em suas redes sociais, ou outras
plataformas de compartilhamento de vídeos. Acrescentamos que esse movimento de
disponibilização de materiais tem o potencial de ampliar a rede de práticas e, assim, o
baterista participa da rede como um produtor de conteúdo, a partir do momento em que
disponibiliza seus materiais, e não somente como um consumidor. Cria-se, assim, uma espécie
de troca que pode ser muito potente. Diferentemente do aluno entrevistado Hugo, que utiliza
da gravação apenas como um monitoramento pessoal e auto avaliação, como relatou durante a
entrevista:
Aí eu uso para isso, para me avaliar, no final. Eu me monitorando, que no
caso à parte da monitoração, eu faço quando eu vou gravar alguma coisa
minha. Se eu vou tocar uma bossa nova, boto lá para tocar uma música bem
tradicional, um standard de bossa nova e gravo por cima. Às vezes tiro a
bateria também. As vezes eu boto um metrônomo em cima ou até um
metrônomo flutuante, que essas músicas antigas não tem esse metrônomo
que a gente hoje tem tão sincado, era flutuante e eu tento fazer a música de
acordo como ela foi gravada também, não é só buscar sincar tudo não.
(HUGO)
39

E a prática da gravação não precisa restringir-se somente ao ambiente de estudo do


baterista. É possível utilizar este mesmo recurso de gravação para análise dentro do ambiente
de prática musical, como as gravações de apresentações. Assim relata o entrevistado Rodrigo,
que durante a pandemia em alguns dos shows que fez, levou um tripé para seu celular e
registrou os shows. Ele expõe que, “a gente vê coisa quando a gente grava, que a gente não vê
se a gente não tivesse gravado, né, que a gente não percebe. No show, em uma apresentação é
muita informação”.
Tais práticas podem desenvolver nos bateristas a autoavaliação, como afirma Bruno
Melo (2015, p. 67): “quando se grava a prática no instrumento, seja em sala de aula, seja em
ensaios, ou apresentações, seguido de momentos de audições críticas das gravações
realizadas, cria-se um espaço para auto avaliação”. O desenvolvimento da autoavaliação pode
favorecer a autoaprendizagem. Melo (2012) expõe a partir de suas experiências como
professor de bateria pôde perceber que a autoavaliação:
i) promove a aprendizagem; ii) aumenta o nível de consciência dos
aprendizes sobre suas habilidades; iii) orienta o processo avaliativo para os
objetivos de aprendizagem; iv) expande o escopo da avaliação, por incluir o
ponto de vista do aprendiz; v) em contexto de ensino formal, pode aliviar a
carga de trabalho do professor, ao permitir que a responsabilidade da
avaliação seja compartilhada; vi) aumenta a motivação; vii) desenvolve a
autonomia; viii) traz efeitos benéficos que extrapolam a sala de aula, uma
vez que é um aspecto necessário para o auto direcionamento. (MELO, 2012,
p.162-163)

O uso da gravação como recurso para aprendizagem da bateria mostra-se bastante


favorável para um bom desenvolvimento do baterista. E torna-se importante desenvolver nos
bateristas essa consciência dos benefícios obtidos com a autoavaliação, principalmente para
os alunos entrevistados nesta pesquisa.

3.3.4 Recursos que integram a prática e aprendizagem da bateria

Dentro de um smartphone temos diversos recursos e funcionalidades que podem e são


utilizadas como ferramentas para a aprendizagem na bateria. Podemos enxergar isso desde o
uso de simples aplicativos de metrônomo, ao uso de aplicativos de edição de áudio e vídeo.
Vale salientar que estes aplicativos desenvolvidos para smartphones trazem também
facilidade de acesso a equipamentos, que em outros tempos eram menos acessíveis, como é o
exemplo do metrônomo, que é em grande parte um aplicativo disponibilizado de maneira
gratuita nos smartphones. Estes aplicativos possibilitam também uma maior portabilidade,
40

pois é mais prático transportar um smartphone com um metrônomo virtual, do que um


metrônomo físico. E assim relata o aluno entrevistado Kamillo, expondo como o smartphone
impacta no seu processo de aprendizagem na bateria:
Porque nele eu tenho os aplicativos e plataformas necessárias, [...] com ele a
gente tem acessibilidade para se gravar, para se filmar, de aplicativos de
música, de metrônomo. Que inclusive, eu acho que estudar com metrônomo
em si, passou a fazer parte da minha, do meu estudo, a partir do smartphone,
porque eu nunca tive um metrônomo no físico (KAMILLO).

Aqui é possível ver como o smartphone tornou mais fácil o acesso a recursos musicais
como o metrônomo. Entretanto, entendendo o smartphone como uma tecnologia e que nesse
sentido tende a trazer cada vez mais inovações, o entrevistado João traz um uso diferente do
convencional para o normalmente oferecido e utilizado nestes aplicativos de metrônomo:
[...] eu sempre organizo meu estudo no caderno e no meu aplicativo de
metrônomo, ele tem um... ele já facilita bastante, porque ele já me diz horas
estudadas, [...] enquanto eu tiver no metrônomo ele está registrando tudo que
eu tô usando, eu posso até gravar por ele o meu estudo, né. Então, eu já
tenho uma noção mais ou menos de tipo, por exemplo, pelo menos todo dia
eu estou estudando uma, duas horas com o metrônomo do meu lado (JOÃO).

A fala do entrevistado João nos expõe uma característica dos smartphones que é a de
unir diferentes ferramentas em um único ponto, como é o caso do aplicativo apresentado por
ele. De acordo com seu relato, o aplicativo não dispõe apenas de um metrônomo digital, mas
também possui recursos de gravação e monitoramento de tempo de estudo.
Assim como este aplicativo relatado por João, existem diversos outros que buscam
trazer diferentes recursos para o usuário, como é o exemplo do aplicativo Loopz11, que tem a
proposta de trabalhar o metrônomo de uma maneira diferente da convencional. Este é um
aplicativo desenvolvido para bateristas e que tem como proposta trabalhar o pulso a partir de
loops de ritmos de bateria, assim possibilitando ao usuário tocar junto, ouvir e entender o que
precisa executar. Ele também possibilita ao baterista a criação de novos loops rítmicos.
Outro ponto interessante para discutirmos aqui é o de como aplicativos, muitas vezes
desenvolvidos para fins que não os pedagógicos, por exemplo, podem servir de recurso para
o processo de ensino-aprendizagem da bateria. Como é o caso de aplicativos de edição de
vídeo que possibilitam mudar a velocidade do vídeo editado, possibilitando assim uma análise
mais minuciosa de determinada frase ou groove de bateria, que proporciona também o tocar
junto, o baterista pode utilizar deste recurso para tocar com uma música começando

11
Disponível em:
https://play.google.com/store/apps/details?id=com.envelopedevelopment.loopz&hl=pt_BR&gl=US. Acesso em
26 de jul de 2021.
41

lentamente e depois ir aumentando gradativamente até a velocidade original. Tal recurso


também pode prover ao baterista analisar aspectos específicos da sua própria prática musical.
Um aplicativo bastante citado entre os entrevistados é o Spotify, um serviço de
streaming de música, podcast e vídeo. A vasta quantidade de músicas disponíveis no
aplicativo torna o seu uso bastante interessante no estudo de bateria com play along, um
termo em inglês utilizado para identificar um formato de performance gravada com a
subtração de um instrumento para que se possa praticar tocando com o áudio. Conforme Silva
(2017, p. 2), o uso dos play alongs tem como uma das propostas “amenizar os obstáculos
deparados pelos profissionais e estudantes de música, que ansiavam um aprimoramento no
instrumento e/ou desenvolver as técnicas de improvisação, mas na maioria das vezes não
havia músicos disponíveis para os acompanharem”. Normalmente os play alongs são
produzidos para ter a ausência de um instrumento específico, geralmente é extraído a faixa de
áudio do instrumento de quem vai acompanhar o play along, ou o mesmo pode ser já
produzido sem o instrumento em questão.
Porém, isso não limita o seu uso apenas a faixas musicais com a ausência/extração de
um instrumento, se entendermos o play along em sua tradução literal, que significa ‘tocar
junto’, podemos conceber que o estudo com play along pode ser feito a partir de qualquer
interação entre um músico tocando com seu instrumento e acompanhando uma música já
gravada, entendendo inclusive que isso pode gerar diferentes usos para este recurso. O estudo
com play along não precisaria limitar-se a tocar uma música com a ausência de seu
instrumento, mas também pode possibilitar que o baterista desenvolva seu estudo a partir de
músicas que nunca possuíram uma bateria gravada, gerando assim um estudo do instrumento
com foco na criação musical, por exemplo. E assim relata o entrevistado Kamillo sobre o uso
do Spotify no seu estudo de bateria, “[...] pesquisando eu fui encontrando vários discos que
foram gravados só sem bateria. Por exemplo, Diana Crow tem uns dois discos que tem a
banda inteira, só não tem bateria, ou seja, é um play along pra gente” (KAMILLO).
Outrora o acesso aos play alongs era restrito a métodos de instrumentos, geralmente
músicas instrumentais compostas pelo autor do método e serviam mais como estudo para o
mesmo. Porém, como já citado no parágrafo anterior, existem outras alternativas para o estudo
de bateria no mesmo sentido dos play alongs, com o avanço da tecnologia já é possível
termos a disposição aplicativos como o moises.ai, aplicativo que utilizo em minha
performance e que possibilita a extração do áudio de instrumentos em qualquer música (ver
Figura 4).
42

FIGURA 4: Tela de mixagem do aplicativo moises.ai

Fonte: O autor
Agora é possível tocar qualquer música como um play along, pois o aplicativo, por
meio de inteligência artificial, consegue extrair a faixa de áudio de vozes e/ou instrumentos,
proporcionando uma prática musical bem mais significativa, pois o baterista fica livre para
estudar músicas que fazem parte do seu universo, do seu gosto e não precisa mais ficar restrito
a play alongs “genéricos”. Outro uso que o aplicativo moises.ai proporciona ao usuário é o de
fazer produções de mashups, de samples, entre outras coisas: as possibilidades são muitas.
Vale salientar aqui outra possível funcionalidade dos play alongs. Em contextos de
aulas online, o qual estamos vivendo por conta da pandemia de Covid-19, esse recurso pode
ser explorado à medida que as ferramentas disponíveis hoje para aulas online não são
favoráveis para aulas de instrumento, a medida que a sincronização de áudio é um problema
presente nestes ambientes virtuais, e isso impossibilita que o professor, por exemplo,
apresente uma música para que o aluno possa executar simultaneamente. Assim, o estudante
pode utilizar o play along para transmitir ao seu professor sua prática musical. Entretanto, em
plataformas de chamadas de vídeos, como é o caso do Google Meet e o Skype, apesar de
proporcionarem uma interação em tempo real, a compressão de áudio realizada por esses
sistemas não proporciona uma audição fiel do que o estudante ou professor estão executando
no instrumento (GOHN, 2015).
43

Aliado a este aplicativo já é possível utilizar outros que permitem a integração do


smartphone a equipamentos externos, como é o caso do módulo de captação desenvolvido
pela empresa japonesa Yamaha, o EAD10.
FIGURA 5: Módulo Yamaha EAD10 acoplado na bateria

Fonte: Site da Yamaha 12

Como visto na imagem anterior (Figura 5), este equipamento é uma espécie de
microfone desenvolvido especialmente para microfonação de bateria, acoplado a um módulo
que possibilita a utilização de diversos efeitos sonoros e que pode ter práticas bastante
interessantes para o estudo do instrumento. Falando especificamente da sua relação com o
smartphone, o EAD10 também disponibiliza um aplicativo onde tudo que é captado pelo
microfone pode ser transmitido para o smartphone e sincronizado com a câmera de vídeo. Ou
seja, é possível gravar vídeos tocando músicas com uma captação de som em alta qualidade.
Pensando na modalidade de aulas online, o Yamaha EAD10 torna-se útil para aulas de
bateria, pois quando estamos lidando com aulas de instrumento nesta modalidade, conforme
Daniel Gohn (2020, p. 158-159), “é preciso também dar atenção à qualidade das
comunicações, para minimizar problemas e garantir o aprendizado planejado”. O uso
deste equipamento, ou de interfaces de áudio e microfones adequados, pode proporcionar uma
melhor captação sonora e consequentemente melhorar o som transmitido via chamadas de
vídeo. As possibilidades de uso desses equipamentos, tanto para a produção musical, como
para o ensino-aprendizagem da bateria, mostram-se bastante diversas.

12
Disponível em:
<https://br.yamaha.com/pt/products/musical_instruments/drums/ea_drums/ead/ead10/product.html>.
Acesso em 06 de jul de 2021.
44

3.3.5 O uso de tecnologias nas aulas de bateria na UFPB

Quando indagados sobre o uso de tecnologias dentro das aulas de bateria na UFPB, os
estudantes entrevistados responderam de maneira unânime que este uso não acontece, ou pelo
menos não acontecia até a pandemia e o surgimento do contexto das aulas remotas de bateria.
Tendo em vista a necessidade de trabalhar em ambientes online para dar continuidade às
atividades, a tecnologia passou a ocupar um outro espaço no processo de
ensino/aprendizagem da universidade. Assim, buscamos compreender como esta tecnologia é
utilizada ou como poderia ser melhor utilizada nestas aulas online. Segundo o relato dos
alunos Kamillo e Rodrigo, as aulas de bateria estão ocorrendo de maneira coletiva e com a
característica de aulas de classe, ou seja, aulas em grupo com o intuito de proporcionar
debates relacionados à bateria entre os estudantes e o professor. Ou seja, as aulas, pelo menos
para os alunos entrevistados, não estão ocorrendo de maneira individual e com foco na prática
da bateria. Podemos então pensar aqui possíveis práticas para tornar possível as aulas online
de bateria, com foco na prática do instrumento, como sugere o aluno entrevistado Rodrigo ao
relatar sobre o uso que pretende fazer de recursos tecnológicos durante as aulas online no
período da pandemia:
Eu pretendo, [...] através da filmagem, ter essa conexão com o professor,
sabe. Tipo um estudo, eu digo, “professor, olha como é que tá”, já envio
para ele o vídeo, sabe. [...] Executar um exercício, mandar para o professor e
o professor analisar, e a partir dali você abrir uma discussão sobre aquilo,
depois melhorar, aprimorar, gravar novamente. (RODRIGO)

Ao falarmos sobre o uso da tecnologia dentro das aulas de bateria podemos pensar na
aplicação de todos os usos de recursos tecnológicos citados nos capítulos anteriores. O uso do
smartphone com suas diversas funcionalidades, pode ser um recurso utilizado dentro da sala
de aula. O uso de gravações de áudio e de vídeo para análise do som do instrumento, da
performance do estudante e de outros bateristas, também podem ser utilizados como recursos
nas aulas de bateria.
Mesmo entendendo que estes recursos muitas vezes são explorados pelos próprios
alunos fora do ambiente de aulas formais, acreditamos que ter estes recursos tecnológicos à
disposição do aluno e do professor nos ambientes de aula formal, como em aulas de bateria
em uma universidade, podem trazer resultados favoráveis para o ensino-aprendizagem da
bateria. Este também é o pensamento do entrevistado Kamillo quando fala sobre o estudo da
45

gravação como um recurso utilizado para praticar a análise do som que o baterista faz com
seu instrumento:
[..] a gente sabe que um dos pontos que é negligenciado, e é o principal é o
som. E essas coisas aí de som, a gente sempre aprende na vida, né, tocando e
ouvindo gravações. E eu percebo que isso muitas vezes, embora seja
conversado dentro da universidade, não é trabalhado na prática em si, né.
Porque eu posso falar “você tem que pensar nisso”, mas se tu pudesse
mostrar na prática, tipo eu pedia para o aluno tocar alguma coisa, gravava e
depois ia analisar com ele aquilo que foi gravado. É um recurso que seria
bem interessante (KAMILLO).

Acrescentamos ao comentário do Kamillo que a análise da gravação que o aluno


sugere na citação acima também poderia funcionar dentro de um momento de aulas síncronas
nas aulas em grupo. O aluno Marcos também questiona a falta dos recursos tecnológicos
durante as aulas de bateria presenciais e sugere como este uso poderia ter sido feito, citando
como exemplo uma situação que ocorreu logo depois que ingressou no curso:

[..] eu acho que a tecnologia, ela tem que estar inserida dentro das aulas. Eu
acho que a tecnologia ela já poderia estar desde então, até mesmo antes, por
exemplo, quando eu cheguei, eu percebi que tem duas caixas de som lá na
sala, não sei se vocês ligaram, e assim, não tô dizendo que tá errado, que tá
certo, mas em nenhum momento, pelo menos nas minhas aulas, ela foi
ligada, entendeu? Então, “vamos ouvir uma música”, “vou botar uma música
aqui para você tocar”, “e aí você me mostra”, “e aí a gente analisa o seu
som e aí eu digo onde você pode melhorar”. Então, eu acho que a
tecnologia, ela já poderia estar inserida de alguma maneira. (MARCOS)

O entrevistado ainda relata, em outro momento, que faz este mesmo uso durante as
aulas que ministra, “na escola eu uso o celular ligado em uma caixa de som, eu coloco o play
along ali pro aluno tocar”.
Temos aqui duas sugestões de usos simples de um recurso tecnológico, que é a
gravação e o uso de equipamentos eletrônico, que não necessitam de muitos equipamentos
para tal, o próprio smartphone já consegue ser suficiente para esta prática, tanto para gravar,
como para ser ligado a caixa de som e consequentemente reproduzir até mesmo um som que
foi registrado durante a aula. Podemos inclusive pensar além e sugerir outros usos para este
recurso, como aliar a gravação ao uso play alongs e pensar a análise não mais com foco no
som, mas agora com o foco no tocar bateria. Este recurso pode ser utilizado como forma de
avaliação, possibilitando até uma modalidade de autoavaliação do estudante. Além destes
usos citados acima, podemos também utilizar da gravação em sua principal função, que é a de
registar um momento específico e possibilitar que o estudante possa ver inúmeras vezes o que
foi gravado. Assim relata o aluno Kamillo, ao falar sobre uma experiência que teve em uma
aula particular de bateria:
46

[...] quando eu fui fazer aula com Edu Ribeiro, na aula de vassoura ele que
propôs gravar. Porque o registro ia ficar. Porque já aconteceu comigo, e eu
acredito que com todo mundo. Imagina que o cara tem uma semana, né. Aí o
cara vai, tem uma aula, tem seu entendimento do que é passado e passa uma
semana estudando, né. Às vezes quando você volta, alguma coisa foi
entendido errado, e vai ter que fazer tudo de novo. Então, você pode usar
esse recurso para gravar aula e ter aquilo em casa, para você ter informação
fiel, não correr o risco de ter se equivocado (KAMILLO)

Temos aqui a possibilidade de uso da tecnologia tanto para aulas de forma remota,
como para aulas presenciais. Tal proposta pode se aproximar ou até igualar-se aos vídeos
disponíveis no YouTube, que como relatam os entrevistados, são materiais bastante utilizados
nos seus estudos de instrumento. Com este recurso dentro da sala de aula é possível
disponibilizar ao estudante um material audiovisual com fim didático e que pode ser sempre
revisitado mediante dúvidas que surgirem durante seu estudo.
Ademais, o uso da gravação como um recurso de ensino-aprendizagem também
torna-se necessário para aulas online de bateria, como as que estão ocorrendo no momento em
que está pesquisa está sendo feita por decorrência da pandemia da Covid-19. Visto que, como
já discutido anteriormente, as condições para realização de aulas de bateria por meio de
videoconferências não são as mais favoráveis.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
47

Este trabalho teve como principal objetivo compreender qual o papel dos recursos
tecnológicos no processo de aprendizagem do instrumento para os estudantes de bateria do
curso de licenciatura em música da UFPB. E com base nos dados coletados foi possível
chegarmos a algumas conclusões acerca do papel desses recursos.
O acesso a materiais referentes a bateria foi um ponto colocado pelos alunos durante
as entrevistas. Pudemos perceber que a prática da observação tem um papel importante para a
formação do baterista, as informações que antes eram restritas a métodos de estudos e a
videoaulas, agora estão mais acessíveis. Com o surgimento de ambientes virtuais, como as
mídias sociais, onde o compartilhamento de materiais é facilitado e vasto, como o Youtube e
até o próprio Instagram, o baterista tem acesso a diferentes tipos de conteúdos e estes, mesmo
sem fins pedagógicos, podem influenciar na aprendizagem do baterista, pois o próprio
estudante pode dar este fim pedagógico ao material assistido. Portanto, compreendemos que
o uso de vídeos como recurso para a aprendizagem mostra-se bastante promissor, visto que
neste contexto os bateristas podem desenvolver uma maior independência para escolher o que
querem estudar, com quem querem aprender e como estudar o conteúdo escolhido.
E ao discutirmos sobre o acesso a materiais, outro debate que surge é a conquista da
autonomia do estudante. Em um ambiente onde o baterista tem a disposição um grande
número de conteúdos sobre bateria torna-se essencial que o estudante tenha autonomia de
identificar quais materiais podem favorecer o seu estudo, pois ao nos depararmos com um
grande número de informações, nem todas são interessantes e têm impacto favorável no
estudo do baterista. É inclusive aqui que a figura do professor pode entrar e atuar como um
mediador e possibilitar que o estudante consiga desenvolver essa autonomia e
consequentemente desenvolver um olhar crítico acerca dos materiais que consome. O
professor pode ajudar o aluno a aprender como selecionar, por exemplo, os materiais que
possam contribuir no estudo de determinado ritmo musical.
Além de proporcionar ao estudante uma maior autonomia nos seus estudos, os
recursos tecnológicos que os entrevistados trouxeram aqui podem também proporcionar ao
baterista uma autoaprendizagem, que entendemos que também se alinha à construção da
autonomia citada anteriormente. A utilização de gravações de áudio e vídeo como recursos
para a aprendizagem da bateria podem possibilitar que o aluno desenvolva esta
autoaprendizagem e em consequência sua autonomia, pois ao registrar a sua prática no
instrumento, qualquer que seja, e posteriormente utilizar este registro como recurso para
avaliação de sua prática, o baterista está aqui desenvolvendo sua autonomia na medida em que
48

consegue discernir o certo do errado e a autoaprendizagem quando consegue a partir da


identificação dos seus erros durante a prática elaborar estratégias de estudo para corrigi-las.
Durante nossa análise, pudemos perceber que um dos papéis da tecnologia no
aprendizado da bateria foi a possibilidade de criação de diferentes formas de estudar o
instrumento. Isso surge como uma demanda, principalmente para os alunos que no começo do
seu estudo de instrumento não tinham à disposição um professor para orientá-los, ou
condições de adquirir métodos de estudos do instrumento e, a partir dessa falta, criaram
maneiras alternativas de estudar bateria. Dentre essas maneiras alternativas, estão o uso de
aplicativos que não foram feitos com o objetivo de auxiliar no estudo da bateria, como é o
caso do aplicativo de streaming Spotify, utilizado pelos entrevistados para trabalhar no seu
estudo de bateria o desenvolvimento de sua prática instrumental, o estudo de ritmos musicais,
da criação musical, entre outras práticas. Como também é o caso da utilização que os
entrevistados fazem do YouTube. Utilizando vídeos de performances de outros bateristas para
trabalhar a apreciação e análise musical, fazendo uso da observação para compreender a
execução de determinado ritmo musical, de determinada frase rítmica, etc. Além disso, fazem
uso desse recurso para desenvolver sua autoavaliação, à medida em que eles também
registram suas performances, compartilham com a comunidade e tem acesso ao registro de
sua prática musical. Isso nos leva a refletir se essas diferentes formas de estudar bateria
podem estar inseridas no ambiente de ensino formal. Acreditamos que essa prática pode
proporcionar ao estudante o desenvolvimento de todos os pontos discutidos nos parágrafos
anteriores e até colaborar com o desenvolvimento de outras formas de se fazer música.
Entendemos que a soma de todas essas habilidades podem proporcionar um outro
fazer musical, que pode ser mais autônomo e mais consciente, por exemplo. A utilização de
recursos tecnológicos no processo de aprendizagem de bateria faz com que o baterista possa
experienciar o desenvolvimento de uma diferente prática musical. Percebemos que para
alguns dos alunos entrevistados, o uso de recursos tecnológicos durante sua prática musical
possibilitou um diferente entendimento de sua prática e isso gerou mudanças em seu fazer
musical, como por exemplo, alunos que citaram a utilização da gravação em vídeo das suas
apresentações musicais e como isso possibilitou que eles melhorassem sua prática,
entendendo a gravação como ferramenta avaliativa da sua performance. Além desse uso dos
recursos tecnológicos como ferramentas de avaliação, seu uso também pode possibilitar
práticas musicais onde o baterista pode, a partir do uso de samples, equipamentos como
pedais de loop, equipamentos desenvolvidos para a bateria, como é o caso do módulo Yamaha
EAD10, aplicativos como o já citado moises.ai, podem proporcionar práticas musicais cada
49

vez mais independentes e autônomas para o baterista, inclusive com o uso combinado destes
recursos citados. Além disso, percebemos que as mídias sociais também são utilizadas como
recursos tecnológicos para a aprendizagem de bateria pelos entrevistados, porém entendemos
que a utilização destes espaços podem ultrapassar o uso focado na aprendizagem. As mídias
sociais podem ser aliadas do músico/baterista na sua prática musical, gerando diferentes
formas de se fazer música, à medida que há uma dimensão participativa e colaborativa nestes
ambientes. Uma vez que os usuários das mídias sociais postam conteúdos, dão e recebem
likes e dislikes, fazem e recebem comentários, assim entendemos que esses outros fatores
podem agregar na prática musical do baterista. Espaços como o YouTube podem proporcionar
ao baterista um diferente campo de atuação e gerar diferentes oportunidades no mercado de
trabalho da música. Como também é o caso do Instagram, que é uma rede social de
compartilhamento de vídeos e fotos, as práticas citadas no exemplo do YouTube também
aplicam-se a esta outra rede social.
Além disso, as redes sociais também proporcionam um fazer musical que é diferente
do exposto acima. Estes ambientes virtuais também proporcionam um fazer musical onde o
baterista não tem como preocupação questões de ensino-aprendizagem e nem almejam obter
uma carreira musical foram das redes, seu objetivo é fazer música dentro das redes sociais e
para os que consomem seu conteúdo, seja em canais de Youtube dedicados a falar sobre
bateria, ou a contas no Instagram que se propõem a fazer conteúdo voltado exclusivamente
para bateristas.
Por fim, com base nos dados coletados, levantaremos aqui uma discussão referente à
articulação das práticas musicais já estabelecidas no ensino de bateria e as práticas trazidas
pelos entrevistados. Como já discutimos anteriormente, a utilização de recursos tecnológicos
no processo de aprendizagem de bateria pode gerar o desenvolvimento de uma maior
autonomia por parte do aluno, diferentes formas de estudo do instrumento e por fim, pode
proporcionar uma diferente prática musical ao baterista. Assim, compreendemos que a
articulação dos recursos tecnológicos com os processos de aprendizagem de bateria, poderia
potencializar o processo de ensino-aprendizagem na bateria, ao entendermos que os pontos
desenvolvidos a partir do uso de recursos tecnológicos podem trazer benefícios significativos
para o processo de ensino-aprendizagem do baterista. Levamos para dentro da sala de aula tais
recursos, como o uso das gravações para análise de som, de performance e de postura, porém
com a ótica não só do professor, mas também principalmente com a do baterista estudante,
permitindo o desenvolvimento da autonomia que citamos anteriormente, bem como a sua
autoavaliação. Em consequência disso, pode fazer com que, cada vez mais, o aluno se
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desprenda do professor colaborando para o entendimento do professor como figura


orientadora e não de uma figura dotada de todo o conhecimento e o único responsável pelo
aprendizado do aluno.
Outro exemplo que poderemos citar é a utilização de recursos tecnológicos para o
desenvolvimento da prática musical, e esta pode estar inserida já dentro da sala de aula.
Utilizar aplicativos como o Spotify para a pesquisa de músicas que não tenham bateria, ou o
uso do aplicativos como o moises.ai, para retirar o áudio da bateria de determinada música e
utilizá-la para o estudo de criação rítmica na bateria, de análise do som, contextualização
musical, ou seja, trabalhar o papel da bateria em diferentes gêneros musicais, tudo isso pode,
inclusive, estar aliado a outro recurso tecnológico, que é a gravação e, consequentemente
desenvolver as habilidades oriundas do seu uso. Acreditamos, assim, estar colaborando para
um desenvolvimento significativo da prática musical do baterista.
Compreendemos aqui que todas essas demandas citadas trazem também desafios,
tanto para o professor quanto para o estudante. Observando pela ótica do baterista estudante,
entendemos que os pontos positivos e negativos relativos à tecnologia também vão,
consequentemente, estar dentro dos usos destes recursos tecnológicos durante o processo de
aprendizagem de bateria. Como já citado aqui e relatado por alguns dos alunos entrevistados,
a quantidade de informações sobre bateria disponíveis na internet, pode impactar de maneira
negativa o processo de aprendizagem do baterista, entendendo que a qualidade do conteúdo
disponibilizado nem sempre é a melhor ou ideal para o estudante. Entendemos que outro
desafio está relacionado ao uso dos recursos tecnológicos, na medida que o baterista precisa
também aprender a utilizar tais recursos, o que exige um contínuo trabalho de pesquisa.
Entretanto, compreendemos que a tecnologia, como hoje se apresenta, é uma realidade e o seu
uso é inevitável, portanto, entendemos que o mais eficaz é entender como utilizar esta
tecnologia de maneira positiva para o baterista. Portanto, diante de tudo que foi exposto,
resumo aqui as habilidades que podem ser desenvolvidas através da articulação dos ~recursos
tecnológicos no processo de aprendizagem de bateria:
- desenvolvimento da autonomia do baterista
- favorecer ao estudante uma melhor autoavaliação e autoaprendizagem
- diferentes prática musicais
- diferentes formas de se estudar a bateria.
Por fim, a partir de toda a discussão e dados analisados nesta pesquisa, podemos
concluir que o papel dos recursos tecnológicos no processo de aprendizagem de bateria
mostra-se bastante pertinente no que diz respeito ao seu papel dentro deste processo.
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Entendemos que a inserção de tais recursos tecnológicos dentro das aulas de bateria da UFPB
podem trazer benefícios para o processo de aprendizagem de bateria, pois proporcionam ao
aluno diferentes práticas, como o fazer musical dentro das mídias sociais, o uso de recursos
tecnológicos na prática musical com a utilização de equipamentos eletrônicos, aplicativos,
computadores e gravações de vídeo, resultando também em diferentes maneiras de estudar seu
instrumento, o que pode gerar como consequência um maior interesse, entusiasmo e até um
outro desenvolvimento do aluno com seu instrumento.
Por fim, esperamos que esta pesquisa possa trazer benefícios para alunos e
professores, tanto da Universidade Federal da Paraíba, quanto de outras universidades ou de
outros cursos de bateria formais ou não formais, apresentando novos caminhos para a
aprendizagem da bateria. E deixamos aqui a nossa vontade de continuar a pesquisar sobre os
temas trabalhados nesta pesquisa e em outros também relacionados a bateria, sejam níveis de
graduação e ou pós-graduação.
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REFERÊNCIAS

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um estudo de entrevistas. 2010. 161 f. Dissertação (Mestrado em Educação Musical) -
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representações estéticas. Artcultura, v. 14, n. 24, 19 mar. 2013.

BOLÃO, Oscar. A bateria. In: Ensaio elaborado especialmente para o projeto Músicos do
Brasil: uma Enciclopédia, patrocinado pela Petrobras através da Lei Rouanet. 2008, 2009.
Disponível em: https://pt.slideshare.net/alfeuRIO/a-bateria-por-oscar-bolo. Acesso em 29 Jul.
2021.

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entrevistas em Ciências Sociais. Em Tese, v. 2, n. 1, p. 68-80, 2005.

FRANÇA, Cecília Cavalieri; SWANWICK, Keith. Composição, apreciação e performance na


educação musical: teoria, pesquisa e prática. Em pauta, v. 13, n. 21, p. 5, 2002.

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DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 23., 2017, Manaus. Anais
[...]. Manaus: ABEM, 2017. p. 1-15
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APÊNDICE

APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTAS

Roteiro de entrevistas

PERGUNTAS INICIAIS E INDIVIDUAIS


1. Qual o seu nome e sua idade?
2. Como foi o primeiro contato com a bateria?
- Bateria foi o primeiro instrumento?
3. Como estuda bateria hoje?
- Estuda apenas bateria, estuda apenas tecnologia?
- Além da UFPB, faz aulas, frequenta cursos, faz buscas na internet? Quais
- Como se mantém atualizado a novas tecnologias, novos equipamentos?
4. Como você aprendeu a tocar bateria?
- Fez aulas específicas? Aulas particulares? Escola especializada?
- Procurou conteúdo em mídias (revista, TV, rádio, internet)?
- Trocou informações com outros músicos?
PERGUNTAS SOBRE BATERIA E TECNOLOGIA (COLETIVAS)
1. Quais projetos e trabalhos está envolvido?
- Que projetos são? (performance/ensino)
- Participa de algum projeto na UFPB em que utiliza a tecnologia?
- Como atua nos projetos? O que faz? Como se prepara?
- Tem equipamentos que julga essenciais para cada trabalho?
- Como os projetos e esses recursos tecnológicos afetam a sua relação com a
bateria?
2. Qual equipamento utiliza - inclusive os tecnológicos que não a bateria?
- Utiliza algum equipamento eletrônico?
- Utiliza computador na sua prática?
- Utiliza algum instrumento eletrônico? (Bateria, Beatbox, Teclado, sintetizador)
- Utiliza alguma Daw na sua prática?
3. Conte-me sobre sua relação com a tecnologia.
- Costuma estudar sobre tecnologia?
- Utiliza algum recurso tecnológico para auxiliar o seu estudo?
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4. Conte-me sobre a relação entre o uso da tecnologia e as aulas do curso de


licenciatura em música da UFPB.
- Como é utilizada a tecnologia durante as aulas de bateria da UFPB?
- Se for utilizada, como se dá esse uso?
- Se não for utilizada, como poderia ser utilizado?
- Durante a pandemia você sentiu que essas relações com a tecnologia mudaram
a sua prática na bateria nas aulas da UFPB?
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APÊNDICE B - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO - TCLE


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