Você está na página 1de 18

RELEITURA NÃO É CÓPIA: REFLETINDO UMA DAS POSSIBILIDADES DO

FAZER ARTÍSTICO

Valeska Bernardo
Maria Cristina Alves dos Santos Pessi

ABSTRACT: This article has the objective of clearing up some frequent mistakes among art
educators from the late 1980’s, in Brazil. Among those mistakes are: 1) to consider that
rereading is a copy; 2) to consider that Art Production corresponds only to the practice of
rereading and 3) to consider that rereading is associate only to make, to the act of producing
an art object. Other mistakes are being cleared up in this context, for example call Proposta
Triangular erroneously by Metodologia Triangular, and apply it in a unique and constant
sequence: 1º) appreciation, 2º) contextualization and 3º) production. These reflections are
based theoretically and founded in my own teaching practice experience, about which I
describe an experience on project named: “Reread is not a copy”, developed at Escola Técnica
Federal de Santa Catarina. To reflect the close relation between theory and practice in my
pedagogical action, that was the challenge that I faced when I began my research, which I
present in this article.

KEY WORDS: art education, Proposta Triangular, art production, rereading, copy.

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo elucidar alguns equívocos freqüentes entre os
arte-educadores, a partir do final da década de 80, no Brasil. Entre esses equívocos estão: 1)
considerar que releitura é cópia; 2) considerar que o Fazer Artístico corresponde apenas à
prática da releitura; 3) considerar que a releitura está associada apenas ao fazer, a produzir um
objeto artístico. Nesse contexto vão sendo elucidados outros mal entendidos, como chamar a
Proposta Triangular de Metodologia Triangular, e aplicá-la em uma sequência única e
constante: 1º) apreciação, 2º) contextualização 3º) produção. Estas reflexões estão embasadas
teoricamente e fundamentadas na minha própria prática pedagógica, desenvolvida na
experiência de um projeto intitulado: “Releitura não é cópia” desenvolvido na Escola Técnica
Federal de Santa Catarina. Refletir a íntima relação entre teoria e prática na ação pedagógica
por mim praticada, eis o desafio que me propus ao iniciar as pesquisas que apresento neste
artigo.

PALAVRAS-CHAVE: arte-educação, Proposta Triangular, fazer artístico, releitura, cópia.


Graduada em Licenciatura Ed. Artística – Artes Plásticas/UDESC (1997), Professora de Artes da Escola
Técnica Federal de Santa Catarina, em artigo apresentado para obtenção do título de especialista no curso
“A Linguagem Plástica Contemporânea”/UDESC (1999).

Orientadora da pesquisa, Professora do CEART/UDESC, e mestranda no curso “Educação e Cultura” -
UDESC.
O presente artigo tem por objetivo refletir questões pertinentes ao campo da Arte
Educação, referentes à interpretação frequentemente errônea que se faz do Fazer Artístico,
um dos pilares da Metodologia Triangular. Essa má interpretação restringe o Fazer Artístico à
prática da releitura, e define esta apenas como a produção de um objeto artístico. Mas o
equívoco mais comum é achar que releitura significa cópia. Este artigo não pretende condenar
a cópia, mas procurar esclarecer qual é o verdadeiro significado da releitura. A cópia também é
um recurso didático possível, quando queremos realizar estudos de estilo, de técnica, estudos
comparativos, mas não deve estar associada à releitura, que requer não copiar a obra
escolhida, mas recriá-la sob uma nova ótica, a ótica do fruidor-produtor, e não somente do
artista.
Destacamos ainda que todas estas discussões ganharam corpo a partir da década de
80, no Brasil, com a divulgação da Metodologia Triangular, através de Ana Mae Barbosa, que
introduziu esta experiência no MAC – Museu de Arte Contemporânea da USP. Esta Proposta
Triangular (que foi apelidada erroneamente de Metodologia, como veremos adiante), está
apoiada em três pilares: a Apreciação, a História da Arte, e o Fazer Artístico. A leitura da
imagem entraria na categoria Apreciação, e a releitura entraria no Fazer Artístico. À História da
Arte, caberia não apenas o estudo dos Movimentos Artísticos e seus respectivos artistas, mas
também o contexto em que surgiram.
Aliás, esta Proposta foi disseminada entre os arte-educadores brasileiros, que em
alguns casos a adotaram sem refletir sobre as possibilidades de adequação à sua própria
realidade. Mesmo porque esta Proposta requer recursos mínimos, como por exemplo, a
utilização de reproduções de obras de arte a serem apreciadas, ou as obras originais que se
encontram nos museus. Quando o professor não tem a disposição ou condições para mostrar
aos alunos as reproduções ou as originais, o que fazer? É o que veremos adiante, quando
ampliamos o sentido de leitura de imagens, restritas à obra de arte, para a leitura de imagens
do mundo. Outro equívoco frequente é a aplicação da Proposta Triangular, na seguinte ordem:
apreciação, contextualização (História da Arte) e fazer artístico, como se fosse a única
sequência possível.
Por fim, estaremos resgatando uma experiência realizada na Escola Técnica Federal de
Santa Catarina, com o projeto entitulado “Releitura não é cópia”. Este projeto foi desenvolvido
junto às turmas das Primeiras Fases do Ensino Médio, no ano de 1998. Na verdade, este artigo
é fruto de minhas inquietações e dúvidas a cerca da prática da releitura, fruto de discussões
com outros arte-educadores, quando estes apresentavam trabalhos de seus alunos,
nitidamente cópias, como sendo releituras. A pesquisa e leituras que apresento neste artigo
serviram, portanto, para reavaliar a minha própria prática pedagógica, que também estava
permeada por dúvidas semelhantes. Espero assim poder partilhar com arte educadores e
demais interessados estas reflexões, para que sirva de estímulo para reavaliarem sua própria
prática pedagógica.

Da Metodologia Triangular: e das mazelas de sua má interpretação

Metodologia ou Proposta Triangular? As confusões já começam aí. O que a princípio


era para ser uma proposta, foi interpretada e disseminada como uma Metodologia, por arte
educadores de todo Brasil. Contribuiu para este equívoco a própria Ana Mae Barbosa, que
anos mais tarde assume que falhou ao permitir que os arte-educadores tenham "apelidado"
assim o que seria uma proposta "culpo-me por ter aceitado o apelido. Hoje recuso a idéia de
metodologia por ser particularizadora, prescritiva e pedagogizante, mas subscrevo a
designação triangular"1. A triangulação fica por conta dos três eixos do ensino/aprendizagem:
criação (fazer artístico), leitura da obra de arte e contextualização histórica; bem como por sua
origem, da sistematização a partir de três outras abordagens epistemológicas: as Esculeas al
Aire Libre mexicanas, o Critical Studies inglês e o DBAE americano. Segundo Ferraz & Fusari2,
existem alguns componentes curriculares básicos que se articulam nas aulas de Arte. Estes
componentes vão mais além do que métodos e técnicas, pois perpassam pelos professores de
Arte e seus alunos, que enquanto agentes atuantes no processo ensino-aprendizagem
estabelecem os objetivos educacionais, os conteúdos, os métodos de ensino e aprendizagem e
os meios de comunicação escolares em arte. Ou seja, todo esse processo é o que poderíamos
chamar de proposta, e não apenas metodologia, o que seria restritivo. Quando Ana Mae
Barbosa amplia o conceito de Metodologia para Proposta está justamente querendo alertar
que esta não envolve apenas contextualizar, ler e produzir um objeto artístico. Todo esse
processo seria esvaziado de sentido se não temos bem claros objetivos, conteúdos, métodos e
os meios de comunicação escolares em Artes.
Além disso, a ânsia dos professores por aplicar fórmulas prontas e eficazes, contribuiu
para a adoção da Proposta Triangular como modelo, único padrão viável a aplicação em sala
de aula. Parecia a única saída para o laisse-faire de até então, ou que a Proposta Triangular,
viria a dar o merecido valor e respaldo a Arte Educação, uma vez sistematizado na forma de

1
Barbosa, Ana Mae. In.: Arte na Escola: Anais do primeiro seminário nacional sobre o papel da arte no
processo de socialização e educação da criança e do jovem. São Paulo: Universidade Cruzeiro do Sul,
1995, pág. 238.

2
FERRAZ, Maria Heloísa & FUSARI, Maria F. de Rezende. Metodologia do Ensino em Arte. São Paulo:
Cortez, 1993, pág. 98 – 105.
Metodologia, o que não existia até então. Este processo de liberação das artes, do fazer
artístico, da livre expressão foi desencadeado com o fim do regime militar no Brasil, que
representava a censura e o ensino tecnicista, e que na década de 80 passa a ser reavaliado
com o Movimento Arte Educação.
Outro fator que intensificou este processo é a falta de pesquisas na área de Arte-
Educação. Estas pesquisas são relativamente recentes. Uma das primeiras autoras, e que
muito produz na área é Ana Mae Barbosa, e assim foi por um longo período, o que contribuiu
para que seus estudos ficassem em voga e fossem rapidamente assimiladas por um público
ávido por novas metodologias de ensino. Não podemos, porém ignorar a contribuição das
professoras Analice Dutra Pillar, Ana Amélia Bueno Buoro, Miriam Celeste Martins, entre
outras com pesquisas recentes e diversificadas no campo da Arte-Educação.
Ana Mae Barbosa define a Proposta Triangular como “uma proposta para conhecer a
linguagem das artes plásticas, para ver, para conhecer por meio da imagem"3. A Proposta
Triangular tem como uma das bases mais influentes o DBAE (Discipline-Based Art Education),
ou Educação Artística como Disciplina. Os princípios teóricos do DBAE, foram desenvolvidos
por Manuel Barkan e Elliot Eisner, na década de 60, nos E.U.A e Inglaterra respectivamente.
Um estudo mais aprofundado desta teoria está sendo fomentado desde a sua criação em
1982, pelo Getty Center for Education in Arts. Segundo as palavras do próprio Elliot Eisner, não
é uma receita padrão para o sucesso, ela é "um conjunto de recursos desenvolvidos a partir de
um conjunto de convicções, teorias e fatos sobre como as crianças aprendem, o que é
importante ensinar e como o respectivo conteúdo pode ser organizado"4. A procura por
fórmulas, receitas padrão de sucesso para serem aplicadas em sala de aula, é que contribuiu
para reduzir a Proposta Triangular a uma fórmula. Aplicada em sala de aula nem sempre da
maneira mais eficaz, principalmente pela precária formação dos professores, que vem em
grande parte do Magistério em sua maioria (sendo assim habituados a fórmulas, papéis
mimeografados, receitas prontas). Ou então formados nos cursos de Licenciatura, que pouco
aproximam o futuro professor da realidade da sala de aula, adiando este contato para as fases
finais do curso. Quando este se depara com a realidade, acaba apelando para alguma fórmula
eficaz pelo menos para manter o controle da turma. A nova Lei de Diretrizes e Bases da
Educação prevê a ampliação da carga horária para os estágios, o que fez com que as

3
VIEIRA, Denyse. Metodologia Triangular: exemplos de estratégias. Anotações da palestra de
BARBOSA, Ana Mae. Seminário Arte na Escola. Porto Alegre, Projeto Arte na Escola, 1989. In: Banco
de Textos do Projeto Arte na Escola nº017/1993, pág. 4.
4
EISNER, In: DUKE, Lilani Lattin. The Getty Center for Education in the arts and Discipline-Based Art
Educacion. Banco de Textos do Projeto Arte na Escola nº037/1993, pág. 4.
Universidades reformulassem seus currículos possibilitando o contato com a sala de aula em
outras fases do curso não somente na última.
O DBAE baseia o seu conteúdo em quatro disciplinas interelacionadas: História da Arte,
Crítica de Arte, Estética e Produção Artística. Na adaptação feita para o caso brasileiro da
Proposta Triangular, Crítica de Arte e Estética transformaram-se em Leitura da Imagem. Os
Parâmetros Curriculares Nacionais divulgados pelo MEC, em 1999 no Brasil, ampliou de Leitura
da Imagem para Apreciação, de História da Arte para Contextualização e de Fazer Artístico
para Produção Artística, conforme quadro comparativo abaixo.

DBAE PROPOSTA TRIANGULAR PCNs


Arte Educação como Parâmetros Curriculares
Disciplina Nacionais
(Hamilton, Barkan, Eisner déc (Ana Mae Barbosa –
60 -Inglaterra/EUA ) déc. 80 -Brasil ) (MEC-1999/Brasil)

História da Arte História da Arte Contextualização

Crítica da Arte
Leitura da Imagem Apreciação
Estética

Produção Artística Fazer Artístico Produção Artística

Portanto, temos assim correspondente à História da Arte, à Contextualização, ou seja,


analisar uma imagem no contexto em que foi produzida, e de que maneira esta se relaciona
com nosso contexto atual. Analisamos desse modo através das imagens, os aspectos culturais,
históricos e sociais que permeiam a produção de determinada imagem. Sendo assim, na
Proposta Triangular, “a História da Arte, não é tratada numa abordagem puramente
cronológica e sim contextualiza o artista e sua obra no meio sócio cultural”5.
Na Leitura da Imagem – Apreciação, que derivou da Crítica de Arte e Estética (DBAE),
destacamos “as habilidades de ver, julgar e interpretar as qualidades das obras,
compreendendo os elementos e as relações estabelecidas no todo do trabalho”6. O aluno
deverá estabelecer uma leitura não apenas formal, restrita a imagem em si, mas também
deverá ser capaz de julgar e interpretar esta imagem, onde entraria, portanto a Crítica e a

5
PILLAR, Analice. O Vídeo e a Metodologia Triangular no Ensino da Arte. Porto Alegre: UFRGS:
Fundação Iochpe, 1992, pág. 10.
6
Idem: 10.
Estética. Apreciar o todo, o contexto, estabelecer uma experiência estética que transcende o
objeto, a obra, a imagem lida. E a cada nova leitura irão surgindo novas e diversificadas
interpretações, pois não existe uma leitura única e correta sobre uma imagem, mas sempre
existirão múltiplas leituras possíveis.
No Fazer Artístico – Produção Artística, o aluno é colocado em contato com o processo
de criação, de uma imagem, de uma obra, podendo assim aprender sobre os diferentes
aspectos que envolvem este processo, como seleção de materiais a serem utilizados, escolha
do tema, da técnica entre outros. Ele agora poderá traduzir plasticamente o que não comporta
apenas em palavras ou gestos, ao colocar suas vivências, suas interpretações no trabalho
produzido.
Deste modo, ao contextualizarmos as imagens, “histórica e culturalmente, através de
uma leitura crítica, objetiva e interpretativa poderemos diminuir a distância criada entre o
trabalho do artista e o entendimento do público em relação à produção artística”7. Mas acima
de tudo devemos conceber a Proposta Triangular como um processo, que deve ser reavaliado
e adaptado conforme a realidade a qual será aplicada.

Da leitura
Antes de falarmos da releitura cabe definir o que entendemos por leitura, uma vez que
necessitamos de uma primeira leitura para que possamos realizar uma nova leitura, ou seja, a
releitura. Esta seria a definição primordial da releitura: uma nova leitura, reler, ler novamente.
Esta nova leitura não precisa necessariamente ficar restrita a produção artística. Pode ser um
novo olhar sobre algo já lido anteriormente. Essa nova leitura poderá ser verbal, mental ou
ainda uma nova experiência estética ao identificarmos detalhes que possam ter passado
despercebidos numa primeira leitura. Seria a releitura portanto, uma leitura mais atenta,
procurando observar aspectos não lidos anteriormente, resultando ou não em uma produção
plástica.
Se a releitura seria uma segunda leitura, o que seria esta primeira leitura? O que é ler?
Que implicações envolvem o ato da leitura? Podemos ler uma imagem? Ou ler restringi-se
apenas a textos escritos?
Ao ler, estamos reconhecendo através da visão o que está escrito, ou pintado. Esta
leitura pode ser silenciosa ou não. Podemos ainda atribuir outros significados ao ato da leitura
como decifrar ou interpretar o sentido, reconhecer, perceber, explicar. Esse processo,
portanto, está intrinsecamente ligado a aquisição de conhecimento, de saber. A leitura de

7
Idem: 10.
textos escritos nos permite aprender sobre determinado assunto. Mas para isso é primordial
reconhecer os códigos de linguagem, para que um amontoado de letras e regras gramaticais
façam sentidos. A leitura é, portanto um fator cultural, uma vez que possuímos diversificados
códigos lingüísticos, que para serem compreendidos em determinadas culturas precisam de
um processo de "iniciação" dos indivíduos para identificar esses códigos. Um texto em chinês,
por exemplo, não faz sentido algum a um brasileiro, a menos que este domine os códigos que
permitam decifrá-lo.
Não podemos esquecer que a leitura sempre será produção de significados, “não é
encontrar o sentido desejado pelo autor (...) ler é, portanto, constituir e não reconstituir um
sentido”8. Esta definição é importante quando encontramos muitos arte-educadores querendo
que os alunos descubram “qual a intenção do artista ao produzir aquela obra”, ou ainda “o que
o artista quis dizer com tal obra”.

Mas e as imagens? Podemos então, ler as imagens? De que maneira? Seria pois um
mero exercício de domínio e decodificação de códigos? Ou implicaria a leitura das imagens em
uma leitura também subliminar, subjetiva? Segundo Ana Mae Barbosa, leitura da imagem é
"construir uma metalinguagem da imagem. Isto não é falar sobre uma pintura, mas falar a
pintura num outro discurso, às vezes silencioso, algumas vezes gráfico, e verbal somente na
sua visibilidade primária"9. Sendo assim leitura e releitura podem ser interpretadas por um
“discurso silencioso”, e não apenas produção artística.
Segundo Analice Dutra Pillar, ler uma imagem seria “compreendê-la, interpretá-la,
descrevê-la, decompô-la para aprendê-la enquanto objeto a conhecer” 10. A autora destaca
ainda que os pesquisadores do Projeto Zero de Harvard consideram a leitura “uma atividade
simbólica tão importante quanto a produção artística porque ela é que possibilita interpretar
as imagens”11. Para estes pesquisadores, que fundamentados em Kant e na teoria
construtivista de Piaget, ler é compreender, apreender informações, selecioná-las e
reconstruir o objeto analisado,

8
GOULEMOT, Jean Marie. “Da Leitura como produção de sentidos”. In.: Práticas da Leitura. Brasília:
Estação Liberdade, pág. 108.
9
BARBOSA, Ana Mae. Arte-Educação no Brasil: Realidade hoje e expectativas futuras. In: Estudos
Avançados. Banco de Textos do Projeto Arte na Escola n.º 006/1993, pág. 178.
10
PILLAR, Analice Dutra. Leitura da Imagem. Porto Alegre, Projeto Cultural Arte na Escola, 1990, In:
Banco de Textos do Projeto Arte na Escola n.º 007/1993, pág. 1.
11
Idem.
“numa visão construtivista, a leitura é uma atividade complementar a
produção, ou seja, para o sujeito se apropriar de um determinado objeto de
conhecimento ele constrói representações e as interpreta. As representações
possuem algumas propriedades dos seus referentes e excluem outras. O que
foi excluído, no entanto, ressurge na interpretação, no ato da leitura. Assim,
ler não é decifrar, 'não equivale a reproduzir com a boca o que o olho
reconhece visualmente'12, isto porque a atividade de leitura supõe a
compreensão do modo de construção seja de um texto ou de uma imagem"13

Se ler não é meramente decifrar, mas inclui também uma leitura subjetiva, uma leitura
do processo de construção de um texto/imagem, o não domínio dos códigos da linguagem
visual determinaria a impossibilidade de ler estas mesmas imagens? Acreditamos que não.
Devemos ensinar a ler e não a decorar a tabuada ou o alfabeto para posteriormente repeti-lo
mecanicamente sem maiores significações para o aluno. Do mesmo modo com relação às
Artes, seria pouco produtivo para o processo de ensino-aprendizagem bem como para seus
agentes envolvidos, uma aula onde fossem apresentados os elementos da linguagem visual
como ponto, linha, estudos de cores, etc. Mas como se apresentam estes elementos? Onde se
apresentam, na História da Arte e no cotidiano dos alunos leitores? Avaliar a quantidade de
variações de linhas que o aluno é capaz de (re)produzir, equivaleria a decorar a tabuada. E
para os não iniciados na arte de decorar restam alguns recursos de emergência tais como a
calculadora, ou mesmo a contagem com o auxílio dos dedos. E para aqueles que não
memorizaram todas as variações possíveis de retas, planos, cores, ritmos, texturas, pontos,
linhas e superfícies, restam os manuais de leitura de imagem ou uma visita guiada ao museu, o
que provavelmente resultaria em uma leitura superficial da imagem. Precisamos reverter o
conceito de que estudar não significa memorizar dados e sim compreender processos14.
Defendemos aqui a formação de um cidadão que por sua capacidade crítica, possui o
poder de emitir opiniões, juízos de valor, de atribuir significado. Mesmo porque atribuímos à
leitura de imagens, um significado mais amplo do que a mera decodificação de códigos. Se
podemos ler uma imagem sem o domínio prévio dos códigos seria importante reavaliar os
processos de aprendizagem em Artes que priorizam o domínio dos fundamentos da linguagem
visual, descontextualizados de suas funções, caindo nas leituras meramente formais
esvaziadas de significados. Restringir o aprendizado em Artes a um mero domínio dos

12
FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo, Cortez, 1985. P. 55.
13
PILLAR, Analice Dutra. Leitura da Imagem. Porto Alegre, Projeto Cultural Arte na Escola, 1990, In:
Banco de Textos do Projeto Arte na Escola n.º 007/1993, pág. 1.

14
RAMALHO e OLIVEIRA, Sandra R. Leitura de Imagens para a Educação. São Paulo. PUC, 1998,
Tese de Doutorado. Pág. 24.
fundamentos da linguagem visual, reflete um processo de simplificação. Este processo de
simplificação está presente nas escolas de um modo geral e em outras disciplinas, além de
Artes.
Neste sentido determinamos o que ensinar a nossas crianças conforme sua
"capacidade" de aprender determinado assunto. Assim, as crianças da 1ª série do ensino
fundamental só aprendem contar até 30 - quando a televisão divulga as comemorações dos
500 anos de Brasil, ou a virada do milênio para o ano 2000. Como ela vai assimilar então
centena e milhar se só foi a ela permitida aprender contar até 30? Outro processo de
simplificação é o de começar a ensinar a ler pelas unidades mínimas do alfabeto, vogais,
consoantes, para depois chegar no todo, no mais complexo, na formação de palavras, orações,
etc. Segundo Fernando Hernández, "o complexo já está no simples, não é do mais simples que
se chega ao complexo". O autor defende ainda que o que os alunos podem ou não podem
compreender em determinadas séries é questionável. Estaríamos subestimando, ou ainda nas
palavras de Hernández, "infantilizando as crianças, isto graças a Psicologia principalmente com
Piaget que determinou a capacidade de apreensão das crianças conforme a idade” 15. Do
mesmo modo não estaríamos subestimando nossos leitores aos lhes impor uma aprendizagem
que passe primeiro pelo domínio dos códigos para posterior leitura da imagem? É sabido que
não devemos considerar nosso aluno uma “uma folha em branco”, ou seja, através de suas
vivências, experiências relacionais com o mundo das imagens, que possa estabelecer uma
primeira leitura, um primeiro contato com a obra, com a imagem, que ele se permita a num
primeiro momento estabelecer suas próprias relações e significados. Se esta leitura puder ser
mais aprofundada tanto melhor será para seu leitor fruidor. E o que carecemos justamente é
de uma educação estética que leve a níveis mais aprofundados de leitura. A esse respeito
RAMALHO E OLIVEIRA, apresenta um estudo esclarecedor onde propõe justamente o ensino
dos códigos e não a alfabetização dos códigos, o que desconsideraria a bagagem que o aluno já
possui. Defende ainda que “é um processo que necessita, como qualquer outra área de
conhecimento, de procedimentos pedagógicos para conduzí-los”16.
Se considerarmos que a Arte é uma linguagem e que, portanto possui códigos
específicos para ser apreendida, o conceito de leitura de uma imagem ou de uma obra de arte
seria o ato de decifrar, interpretar, decodificar esta imagem através de seus códigos
específicos. Em Artes Visuais, entendemos por estes códigos específicos os Fundamentos da
Linguagem Visual (ponto, linha, plano, cores, etc.). Mas seria a leitura de uma imagem

15
Em palestra proferida na UFSC, em 01 e novembro de 1999, com o tema "Trabalhos por Projetos”.
16
RAMALHO e OLIVEIRA, Sandra R. Leitura de Imagens para a Educação. São Paulo. PUC, 1998,
Tese de Doutorado. Pág. 22.
meramente o reconhecimento destes fundamentos? Sabemos que não. Além disso, é
necessária a regra de articulação, ou seja, como os elementos se organizam para gerar
significação. A leitura implica ainda em uma interpretação, uma leitura subjetiva dos dados,
dos códigos apresentados, ler nas entrelinhas, captar o significado oculto das formas, não
aparentes. Segundo Goulemot , “ler será, portanto, fazer emergir a biblioteca vivida, quer
dizer, a memória de leituras anteriores e de dados culturais”17. Ou seja, interpretar baseado
nos seus conhecimentos previamente adquiridos. Conhecimentos estes, que no caso das Artes,
não se restringem especificamente a conceitos e conteúdos do âmbito das Artes. Caso
contrário, um leigo jamais seria capaz de ler uma imagem, contribuindo assim para a elitização
da Arte se considerarmos que só é capaz de ler uma imagem aquele que domine os códigos de
apreensão desta linguagem. Daí a justificativa do ensino de arte. Creio que para os não
iniciados no âmbito das Artes, é possível que sejam capazes de esboçar algum sentido, alguma
interpretação para a imagem a qual estão sendo apresentados, é possível que tenham,
portanto uma experiência estética. Afinal "ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo. Todos
nós sabemos alguma coisa. Todos nós ignoramos alguma coisa"18. Ignorar que os não iniciados
sejam capazes de emitir alguma opinião, sobre a leitura de uma dada imagem, é desconsiderar
sua bagagem histórico-cultural, que lhe permite estabelecer relações entre a imagem lida e
suas vivências. Esse discurso reproduz uma ideologia onde exclui os não iniciados neste
processo, contribuindo assim para ampliar o abismo que separa cidadãos comuns do acesso a
Arte. Segundo Ana Mae Barbosa, "sonegação de informação das elites para as classes
populares é uma constante no Brasil, (...) segundo eles, os pobres precisam somente aprender
a ler, escrever e contar. O que eles não dizem, mas só nós sabemos, é que, assim, estes pobres
serão mais facilmente manipulados"19. Analfabetos da palavra, certamente não são
analfabetos da imagem, condená-los a analfabetos da imagem artística por considerá-los
incapazes de leitura, de produção de significado, seria contribuir para esta manipulação.
Para diminuir este abismo, cabe a Arte Educação, mais do que conhecer técnicas,
artistas, história da arte, ou os fundamentos da linguagem visual, formar um cidadão leitor,
fruidor, do mundo em que está inserido, não só no campo das artes visuais, mais da cultura

17
GOULEMOT, Jean Marie. “Da Leitura como produção de sentidos”. In.: Práticas da Leitura. Brasília:
Estação Liberdade, pág. 113.

18
FREIRE, Paulo. A Importância do Ato de Ler; em três artigos que se completam. São Paulo; Cortez,
1999, pág. 69.
19
Barbosa, Ana Mae. In.: Arte na Escola: anais do primeiro seminário nacional sobre o papel da arte no
processo de socialização e educação da criança e do jovem. São Paulo: Universidade Cruzeiro do Sul,
1995. pág . 241.
visual como um todo e que seja capaz de interagir criticamente neste contexto "isto porque a
leitura da palavra é sempre precedida da leitura do mundo. E aprender a ler, a escrever, a
alfabetizar-se é, antes de tudo, aprender a ler o mundo, compreender o seu contexto, não
numa manipulação mecânica de palavras, mas numa relação dinâmica que vincula linguagem e
realidade"20 Perceber, conhecer, interpretar, significar a linguagem do mundo cabe ao (arte)
educador, iniciar seu aluno neste processo. E ainda segundo Ana Mae Barbosa, “o importante
não é ensinar estética, história e crítica de arte, mas, desenvolver a capacidade de formular
hipóteses, julgar, justificar e contextualizar julgamentos acerca de imagens e de arte. Para isso
usa-se conhecimentos de história, de estética e de crítica de arte”21.
Ler antes de tudo é um ato de cidadania, compreender o contexto ao qual se está
inserido é antes de tudo um ato político "a aprendizagem da leitura e a alfabetização são atos
de educação e educação é um ato fundamentalmente político"22 O domínio dos códigos de
linguagem, quando repassados de maneira superficial privilegiam alguns grupos e excluem
outros. Assim têm-se a ilusão de que o aluno é capaz de realizar uma leitura de uma imagem,
empurrando-lhe os fundamentos da linguagem visual. Ou seja, decorar a tabuada. Igualmente
cria-se a falsa ilusão de que estamos alfabetizando nossos alunos quando vemos na verdade
cada dia mais diminuírem os níveis de conhecimento de Língua Portuguesa23 Isto contribui
para aumentar a massa de analfabetos deste país, entenda-se aqui por analfabetos não só os
que não sabem ler e escrever, mas os que não conseguem realizar uma leitura crítica do
mundo que os cerca, "num país onde os políticos ganham eleição através da televisão, a
alfabetização para leitura da imagem é fundamental e a leitura da imagem artística
humanizadora"24. Isso talvez ocorra porque há uma distância significativa entre a maioria das
cartilhas e a realidade de nossos alunos. Talvez este quadro possa ser revertido, tomando-se
como ponto de partida algumas iniciativas onde se busca a leitura de textos do cotidiano do

20
SEVERINO, Antônio Joaquim. In: FREIRE, Paulo. A Importância do Ato de Ler; em três artigos que
se completam. São Paulo; Cortez, 1999, pág. 8.
21
BARBOSA, Ana Mae. A Imagem no Ensino da Arte. São Paulo: Perspectiva. 1999. 4ªed. Pág. 64.
22
Idem.

23
RAMALHO e OLIVEIRA, Sandra R. Leitura de Imagens para a Educação. São Paulo. PUC, 1998,
Tese de Doutorado. Pág. 40.

24
Barbosa, Ana Mae. "Abordagem Triangular não é receita pronta". In.: Arte na Escola: anais do primeiro
seminário nacional sobre o papel da arte no processo de socialização e educação da criança e do jovem.
São Paulo: Universidade Cruzeiro do Sul, 1995. P 240.
aluno, não apenas da Literatura oficial. O que de mesmo modo se aplica no caso das Artes ao
ampliarmos o conceito de imagem como sendo

“toda e qualquer imagem estética produzida pelo homem, seja ela uma obra
de arte ou não; incluem-se também, além das manifestações do código visual,
aquelas pertencentes aos sistemas cênico, musical e mesmo o verbal”25

Mas se estamos aqui falando em leitura do contexto, em leitura da cultura visual, cabe
reavaliarmos nossa prática pedagógica onde a leitura ficou restrita a reproduções fixas de
obras de arte em sala de aula. Estas imagens são em sua maioria figurativas, porque assim é
mais fácil decodificá-las detectar, linhas, pontos, planos, etc. E a imagem móvel? O cinema? E a
fotografia? E as paisagens urbanas? E a televisão? As novelas? E a cultura visual que nos
rodeia? Como ler estes e outros textos que nos rodeiam?26
Ana Mae Barbosa contribuiu e muito com o seu trabalho "A Imagem no Ensino da
Arte", para a introdução de imagens no aprendizado da Arte. Agora, porém cabe ampliar este
leque de textos passíveis de serem lidos. Faz-se necessário colocar o aluno diante da obra e
não apenas da reprodução, quando possível. Na inexistência de museus próximos, pode-se
colocar o aluno diante da leitura do mundo, das imagens do cotidiano do seu contexto. Sendo
possível a visita ao museu, e análise de reproduções ao mesmo tempo, tanto melhor para o
aluno e para o professor. Para o professor que poderá atingir seu público com mais eficácia, ao
tratar de imagens que o aluno estará vivenciando em tempo e espaço real, e para o aluno que
descobrirá uma maneira prazerosa de interpretar a realidade em que vive. O aluno ainda
perceberá que poderá ter uma experiência estética não apenas diante de um quadro, mas de
qualquer outra imagem que lhe atribua significação.

Da releitura

Antes de entrarmos no mérito da releitura convém esclarecer o que é o Fazer Artístico


um dos eixos da Proposta Triangular, quais são seus objetivos, e onde entra a releitura neste
contexto. As aulas de Arte parecem estar quase sempre associadas ao Fazer Artístico, a
produção, ao artelier, ao fazer. Os próprios alunos estranham e cobram do professor quando

25
RAMALHO e OLIVEIRA, Sandra R. Leitura de Imagens para a Educação. São Paulo. PUC, 1998,
Tese de Doutorado. Pág. 3.

26
A este respeito ver HERNÁNDEZ, Fernando. Cultura Visual, Mudança Educativa, e Projeto de
Trabalho. Porto Alegre: Artes Médicas: 2000. E também RAMALHO e OLIVEIRA, Sandra R. Leitura de
Imagens para a Educação. São Paulo. PUC, 1998, Tese de Doutorado.
elaboramos uma aula teórica, sem produção. Na verdade a produção faz parte, mas não deve
ser o único momento em uma aula de Artes. Dentro da Proposta Triangular, o Fazer Artístico é
encarado como

“interpretação e representação pessoal de vivências numa linguagem plástica.


(...) é somente através do fazer que a criança e o adolescente podem descobrir
as possibilidades e limitações das linguagens expressivas, de seus diferentes
materiais e instrumentos.(...) a produção associada às imagens pode colaborar
para a construção de formas com maior força expressiva, ao mesmo tempo em
que estimula o pensar sobre a criação visual ”27

Como o aluno poderá perceber “as possibilidades e limitações das linguagens


expressivas”, apenas olhando reproduções de obras de arte, ou lendo sobre História da Arte?
Observamos então que na Proposta Triangular, o Fazer está relacionado com a aprendizagem
da História da Arte e a Leitura de Imagens, que se relacionam na construção do conhecimento.
Aprender a fazer, fazendo.
Com relação ao Fazer Artístico, Christina Rizzi, nos propõe um esquema bastante
esclarecedor, que deve ser assimilado como exercício e não como um quadro definitivo e
completo. Segundo este esquema a Arte envolveria não só as Artes Visuais mais ainda Teatro,
Dança, Música, Literatura de variados gêneros, períodos, escolas, artistas, meios,
procedências, e que tem por ações básicas:

Apreciar Fazer (inclui) Contextualizar


Assistir Encenar Instalar Continente
Escutar Atuar Pintar País
Ler Cenografar Desenhar Estado
Contemplar Iluminar Gravar Cidade
Musicar Imprimir Bairro
Dançar Esculpir Família
Coreografar Modelar Etnia
Interpretar Construir Línguas
Compor Fotografar Credos
Reger Expor Faixa etária
Performar Filmar Gênero
Escrever Montar Ideologias
Publicar Exibir Temas
Etc.

27
PILLAR, Analice Dutra. O vídeo e a Metodologia Triangular no ensino da Arte. Porto Alegre:
Universidade Federal do Rio Grande do Sul: Fundação Iochpe, 1992. pág. 8.
Corresponde ao campo
Crítica e estética História da Arte
das práticas artísticas

Bastante diversificado este quadro nos coloca diante de mais um problema da Arte
Educação, reforçado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais. Se entendermos por Arte,
Teatro, Dança, Música, Literatura e Artes Visuais, qual será o perfil do Arte Educador? Um
sujeito polivalente que transitaria com maestria por todas as áreas? Qual seria então sua
formação? "Artes ", com uma habilitação por semestre? Ou estaríamos aqui falando em uma
escola ideal com um professor para cada habilitação? O MEC (Ministério da Educação e
Cultura), propositor dos Parâmetros, que estabelecem como sendo Artes – Música, Teatro,
Dança, Artes Plásticas, deverá entrar em acordo com escolas, e apontar saídas para que em
última instância o aluno não seja prejudicado com esta polivalência.
Além deste alerta o quadro aponta as múltiplas formas possíveis do Fazer Artístico. O
objetivo deste fazer tem que estar bem claro para o professor. Porque? Para que fazer uma
gravura? Para conhecer a técnica? Para estudar luz e sombra? Para conhecer os primórdios da
imprensa? Para conhecer a técnica utilizada por determinado artista? Para fazer pesquisa de
matrizes possíveis de serem gravadas? Para conhecer a Literatura de Cordel do Nordeste
brasileiro? Temos aqui várias entradas que possibilitem a construção do conhecimento em
Artes.
É o que nos propõe o DBAE (Disipline-Based in Art Education), ou seja, um Fazer
Artístico fundamentado em questões que orientarão este fazer. No DBAE, o Fazer Artístico
denominado "Art Production", corresponde a disciplina do art-making, "o criativo processo
através do qual os artistas produzem imagens em vários materiais produzindo efeitos visuais
desejados". Destacamos algumas das muitas facetas da Produção Artística que podem ser
exploradas, estudadas e experimentadas:
“- familiarizar-se com uma ampla variedade de materiais artísticos, ferramentas,
equipamentos e técnicas”;
- aprender sobre tradições do artesanato, tais como referentes aos materiais, e
atitudes tidas pelos artistas sobre seus trabalhos;
- desenvolver qualidades pessoais requeridas para um trabalho artístico com sucesso,
tais como persistência, paciência, e auto crítica;
- aprender como expressar idéias e sentimentos em formas visuais;
- entender a motivação dos artistas, aprendendo sobre suas vidas e suas contribuições
para a sociedade; e
- apreciar as contribuições de um trabalho artístico feito por seu treinamento artístico
e experiência. Isto inclui as histórias culturais das quais os artistas tiraram inspiração e
idéias"28.

Esta proposta ainda sugere que professor deva levantar com os estudantes algumas
questões sobre o artista e seu trabalho, enquanto os alunos estão praticando, desenvolvendo
suas habilidades no fazer artístico. Entre elas:
“- Quais são os passos envolvidos em modelar um determinado material e a aplicação
de técnicas para produzir uma composição artística?”.
- O trabalho é bem feito, e o produto final consistente com os altos padrões da obra de
arte?
- A idéia do artista é nova, uma variação ou uma idéia já estabelecida ou uma repetição
do trabalho de alguém?
- Que mudanças podem ser feitas para fortalecer o trabalho? "29

Temos assim um Fazer fundamentado, orientado por questões básicas que poderão
ser reformuladas pelo professor conforme os objetivos traçados anteriormente com seus
alunos.
O Fazer Artístico, não tem que obrigatoriamente partir da obra que foi lida
anteriormente. Pode partir da representação de um dos aspectos da contextualização, por
exemplo, ou como veremos mais adiante partir dos referenciais do artista (máscaras africanas
que inspiraram Picasso), anteriores a obra, portanto. A motivação, portanto pode partir da
obra lida, ou partir de algum aspecto interior ou exterior a ela, como o contexto histórico, a
biografia, o movimento artístico entre outros. Temos que ampliar o conceito de Fazer Artístico
que por anos ficou associado a prática da releitura. Este Fazer deve estar bem fundamentado,
e orientado por questionamentos que instiguem o aluno a produzir algo, e a refletir sobre sua
prática artística e que nesse processo ele seja capaz de emitir algum juízo crítico sobre o que
lhe foi proposto. Assim não caímos no fazer por fazer, na livre-expressão, e na cópia. Temos
que deixar claro para o aluno o que está sendo proposto. Deixar claro para o aluno o que é
uma releitura. E não simplesmente deixar uma reprodução de uma obra na frente do aluno
com uma folha em branco na mão e pedir que ele faça uma releitura, o que é muito comum.
Outro equívoco a ser esclarecido é o fato do fazer artístico constituir a última atividade
dentro da Proposta Triangular, depois da Leitura e da Contextualização. Este vício ficou
formatado no trinômio: leitura (apreciação), contextualização e por último o fazer artístico.

28
Estas idéias foram extraídas do "The DBAE Handbook" de Stephen Mark Dobbs, e compiladas no
material de apoio distribuído no curso de verão oferecido pelo Savannah Institute for Education in the
Arts, em julho de 1997, pág. 22.
29
Idem: 22.
Quando na verdade existem outras cinco sequências possíveis: 1) fazer/ apreciar/
contextualizar; 2) apreciar/ fazer/ contextualizar; 3) contextualizar/ apreciar/ fazer; 4) fazer/
contextualizar/ apreciar; e 5) contextualizar/ fazer/ apreciar30.
Mas o que seria então a releitura? Seria uma nova leitura sobre o texto anteriormente
lido. Deste modo, “a cada leitura, o que já foi lido muda de sentido, torna-se outro”31. Pois a
cada leitura vamos ampliando nossa significação do objeto analisado, pois a cada leitura
estamos modificados, vivenciamos outras experiências, adquirimos outros conhecimentos,
ampliamos nossa bagagem cultural. Sendo assim, uma leitura nunca será igual a outra leitura,
a uma releitura. Podemos então definir a releitura, como uma atualização do olhar que se
transforma, que se amplia a cada nova leitura.
Releitura no sentido do Fazer Artístico significa fazer a obra de novo acrescentando ou
retirando informações. Não é cópia. Reler uma obra subentende adquirir conhecimento sobre
o artista e a contextualização histórica. É uma nova visão, uma nova leitura sobre a obra já
existente. O produto final da releitura pode levar ou não ao reconhecimento da obra
escolhida. Reler é interpretar a obra, é colocar sua visão do mundo, suas críticas, sua
linguagem e suas experiências sobre a obra escolhida. O importante é “que o professor não
exija representação fiel, pois a obra observada é suporte interpretativo e não modelo para os
alunos copiarem”32. É como uma música que pode ser cantada por vários intérpretes. Ela foi
elaborada por um compositor, mas ganha diferentes versões a cada vez que é efetuada pelo
intérprete.
A releitura seria, portanto, uma nova construção, um novo significado, uma nova
leitura, um novo texto. E é este novo texto que diferencia uma releitura de uma cópia. Se
apresentar como resultado a reprodução da obra escolhida, temos aí a cópia. Se ao contrário
identificarmos neste novo texto, nesta releitura, novos elementos que foram acrescentados ou
retirados, uma nova forma de representação, com uma técnica diferenciada, por exemplo,
temos então uma releitura.

30
RIZZI, Christina. "A Proposta Triangular do Ensino da Arte neste 'Último Período da Era da Escrita
Impressa'". In.: Arte na Escola: anais do primeiro seminário nacional sobre o papel da arte no processo de
socialização e educação da criança e do jovem. São Paulo: Universidade Cruzeiro do Sul, 1995. Pág. 246.

31
GOULEMOT, Jean Marie. “Da Leitura como produção de sentidos”. In.: Práticas da Leitura. Brasília:
Estação Liberdade, pág. 116.
32
BARBOSA, Ana Mae. A Imagem no Ensino da Arte. São Paulo: Perspectiva. 1999. 4ªed. pág. 107.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBOSA, Ana Mae.


1993: Arte-Educação no Brasil: Realidade hoje e expectativas futuras. In: Estudos
Avançados. Banco de Textos do Projeto Arte na Escola n.º 006.

BARBOSA, Ana Mae.


1995: Abordagem Triangular não é Receita Pronta. In: Arte na Escola: anais do primeiro
seminário nacional sobre o papel da arte no processo de socialização e educação da
criança e do jovem. São Paulo: Universidade Cruzeiro do Sul.

BARBOSA, Ana Mae.


1999: A Imagem no Ensino da Arte. São Paulo: Perspectiva. 4ªed.

DOBBS, Stephen Mark.


1997: "The DBAE Handbook”. Idéias principais foram compiladas no material de apoio
distribuído no curso de verão oferecido pelo Savannah Institute for Education in the Arts.

EISNER, Eliot
1993: In: DUKE, Lilani Lattin. The Getty Center for Education in the arts and Discipline-
Based Art Educacion. Banco de Textos do Projeto Arte na Escola nº037.

FERRAZ, Maria Heloísa & FUSARI, Maria F. de Rezende.


1993: Metodologia do Ensino em Arte. São Paulo: Cortez.

FERREIRO, Emília.
1993: Reflexões sobre alfabetização. São Paulo, Cortez, 1985. In: PILLAR, Analice Dutra.
Leitura da Imagem. Porto Alegre, Projeto Cultural Arte na Escola, 1990, Banco de Textos
do Projeto Arte na Escola n.º 007.

FREIRE, Paulo.
1999: A Importância do Ato de Ler; em três artigos que se completam. São Paulo, Cortez.

GOULEMOT, Jean Marie.


1996: “Da Leitura como produção de sentidos”. In.: Práticas da Leitura. Brasília: Estação
Liberdade.

NÉRET, Gilles.
1996: Salvador Dalí. Alemanha: Taschen.

PILLAR, Analice Dutra.


1992: O vídeo e a Metodologia Triangular no Ensino da Arte. Porto Alegre: Universidade
Federal do Rio Grande do Sul: Fundação Iochpe.

PILLAR, Analice Dutra.


1993: Leitura da Imagem. Porto Alegre, Projeto Cultural Arte na Escola. Banco de Textos do
Projeto Arte na Escola n.º 007.

RAMALHO E OLIVEIRA, Sandra R.


1998: Leitura de Imagens para a Educação. São Paulo, PUC SP, Tese de Doutorado.
RIZZI, Christina.
1995: "A Proposta Triangular do Ensino da Arte neste 'Último Período da Era da Escrita
Impressa'". In.: Arte na Escola: anais do primeiro seminário nacional sobre o papel da arte
no processo de socialização e educação da criança e do jovem. São Paulo: Universidade
Cruzeiro do Sul.

SEVERINO, Antônio Joaquim.


1999: In: FREIRE, Paulo. A Importância do Ato de Ler: em três artigos que se completam.
São Paulo: Cortez.

VIEIRA, Denyse. Metodologia Triangular: exemplos de estratégias. Anotações da palestra de


BARBOSA, Ana Mae. Seminário Arte na Escola. Porto Alegre, Projeto Arte na Escola, 1989.
In: Banco de Textos do Projeto Arte na Escola nº017/1993.

Você também pode gostar