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GARRA, O PODER DA PAIXÃO E DA PERSEVERANÇA.

O presente texto está baseado no livro, que tem o mesmo título, do presente artigo,
de Angela Duckworth, publicado no Brasil, em 2016, pela Editora Intrínseca, do Rio de
Janeiro.
Diz a autora, professora de Psicologia na Universidade da Pensilvania, que as pessoas
bem-sucedidas exibem um tipo de perseverança feroz, que se manifesta de duas
formas: em primeiro lugar, são mais persistentes, e esforçadas, do que a média; em
segundo lugar, sabem o que desejam. Elas têm perseverança e direção, por isso são
especiais e têm garra.
Angela trabalhou na MCKINSEY, e cita um relatório de três sócios da firma, intitulado
“A Guerra pelo Talento”, que defendia o argumento de que, na economia moderna, a
ascensão e queda das empresas depende da sua capacidade de atrair e reter “pessoas
classe A”, ou pessoas talentosas. Sendo o talento definido como a soma das aptidões
de uma pessoa, e a capacidade de aprender e de se desenvolver.
O jornalista Malcom Gladwell criticou o relatório da MCKINSEY, dizendo que a empresa
Enron foi o símbolo máximo da “mentalidade do talento”, na Administração de
Empresas, defendida pela MCKINSEY. A Enron havida sido classificada, pela revista
Fortune, como a empresa mais inovadora dos Estados Unidos, por seis anos
consecutivos, e como a maior empresa de energia do mundo.
Em 2001, a Enron decretou falência, tendo sido apurado que seus imensos lucros
estavam baseados em fraudes contábeis, generalizadas e sistemáticas. Gladwell
argumenta, que o fato da Enron exigir, que seus funcionários provassem ser mais
inteligentes que todo mundo, contribuiu para uma cultura narcisista, que incentivava o
desempenho a curto prazo, e desencorajava o aprendizado e o crescimento a longo
prazo.
Utilizavam um sistema de avaliação de desempenho, no qual os funcionários recebiam
notas, e os 15% com pontuações mais baixas eram sumariamente demitidos. No final
das contas, esse sistema pode ter contribuído para um ambiente de trabalho que
premiava a fraude, e desencorajava a integridade, para obter promoções e
recompensas, a qualquer preço.
Angela concluiu, nos seus estudos, que somente o talento não é suficiente para
explicar o sucesso de alguém, e produziu uma teoria da Psicologia do Sucesso, que
pode ser resumida como segue: talento x esforço = habilidade; habilidade x esforço =
êxito. Ou seja, o talento é a rapidez com que as habilidades de uma pessoa aumentam,
quando ela se esforça. Êxito, é o que acontece quando uma pessoa utiliza, com garra,
com persistência, as habilidades adquiridas.
Segundo sua teoria, quando se consideram pessoas diferentes, em circunstâncias
idênticas, o resultado obtido, por cada uma delas, depende somente de duas coisas:
talento e esforço. O talento é importante, no entanto, o esforço entra na equação
duas vezes, e não apenas uma. O esforço constrói a habilidade, e ao mesmo tempo, o
esforço torna a habilidade produtiva.
Angela dá um exemplo de um ceramista americano famoso, Mackenzie, que sempre
manipulou argila no torno, todos os dias de sua vida, e com o esforço, sua habilidade
aumentou.
Angela concluiu, após inúmeros estudos, que as pessoas bem-sucedidas exibem um
tipo de perseverança feroz, que se manifesta de duas formas: são mais persistentes e
esforçadas que a média; sabem o que pretendem alcançar. Possuem não só
perseverança, como uma direção, da qual não se afastam.
Angela criou uma escala de garra, um teste destinado a predizer o sucesso, que foi
aplicado, por exemplo, a cadetes de West Point, e a empregados de uma empresa de
turismo, permitindo prever, com êxito e segurança, quem seria eliminado, no final do
curso, na escola militar citada, ou quem não teria sucesso em vendas, no caso da
empresa de turismo. Ela constatou que a diferença entre os bem-sucedidos, e os que
eram eliminados, após testar várias hipóteses, era devido ao fator garra e
determinação. Ou seja, à uma extraordinária perseverança, e à uma extraordinária
capacidade de se esforçar.
Ao longo da minha carreira, tenho trabalho em Gestão de Pessoas, com recrutamento
de executivos, avaliação de potencial e performance, em projetos de carreira e
sucessão, em projetos de mudança organizacional, e em fusões e aquisições. Também
tenho trabalhado com business coaching e mentoring, para o desenvolvimento do
potencial, da liderança e da capacidade de gestão, estudando hard skills e soft skills
dos key people e dos high talent executives.
Pela vivência que adquiri na minha carreira, como executivo e como consultor, posso
dizer que tenho comprovado, em vários projetos, e diferentes organizações, o que
Angela diz. O sucesso, em resumo, demanda comprometimento, talento e garra.
Acho interessante, correlacionar o tema de garra e perseverança com o livro “Outliers”
de Malcolm Gladwell, publicado no Brasil em 2008 pela Sextante (GMT Editores Ltda).
O livro enfoca a trajetória de pessoas que apresentaram um desempenho
extraordinário, em áreas e épocas diversas, mostrando que o êxito não é fruto apenas
do mérito, ou do talento individual. Ele também resulta, de fatores que garantiram a
esses indivíduos a chance de cultivar seu talento, intensamente, e de forma peculiar,
destacando-se como personalidades fora de série. Para o autor, todas as pessoas com
esse perfil receberam ajuda de alguém da família, ou da comunidade, ou foram
beneficiadas por circunstâncias de sua geração, cultura ou meio. Do ponto de vista do
autor, o sucesso resulta do acúmulo constante de vantagens, e em grande parte
depende de quando e onde nascemos, da profissão dos nossos pais e do tipo de
criação que recebemos.
A Psicologia tem uma grande discussão em torno do tema genética e ambiente, como
fatores mais ou menos predominantes na personalidade de um ser humano. Mesmo
considerando a natureza, a genética e o cérebro, como influenciadores do talento e do
sucesso, não pode deixar de ser assinalada a influência da cultura, do meio ambiente,
da família e dos amigos, e dos relacionamentos (networking) no êxito das pessoas que
se projetam na sua sociedade, em algum campo, em forma diferenciada. Também não
se pode ignorar “estar no lugar certo, com as pessoas certas”, como facilitador do
progresso e do sucesso pessoal.
No início da década de 1990, o Psicólogo K. Anders Ericson, e dois colegas, realizaram o
estudo “Exhibit A”, na Academia de Música de Berlim. Com a ajuda dos professores,
formaram três grupos com os violinistas da escola. No primeiro, foram colocados os
que tinham potencial para se tornar solistas de nível internacional. No segundo, foram
reunidos aqueles considerados apenas bons. No terceiro, estavam os estudantes que
dificilmente chegariam a tocar como profissionais, mas que queriam se tornar
professores de música. Todos eles tiveram que responder à pergunta: ao longo da sua
carreira, quantas horas você praticou?
Quase todos começaram a praticar por volta dos 5 anos de idade, praticando duas a
três horas por semana. Por volta dos 8 anos, ocorreram diferenças entre os
estudantes. Os alunos que se tornaram os melhores das suas turmas, passaram a se
dedicar mais do que todos os outros: 6 horas por semana, aos 9 anos, 8 horas por
semana, aos 12 anos, 16 horas por semana, aos 14 anos. Aos 20 anos estavam
praticando bem mais do que 30 horas semanais. Nessa fase da vida, os melhores
alunos, os do primeiro grupo, haviam totalizado 10 mil horas de treinamento em sua
vida, os meramente bons, 8 mil horas, e os futuros professores de música, pouco mais
de 4 mil horas.
O Psicólogo Ericson, e sua equipe, compararam depois pianistas amadores com
pianistas profissionais. Identificaram um padrão idêntico. Os amadores nunca haviam
praticado mais do que cerca de três horas por semana, durante a infância. Assim, aos
20 anos, totalizaram 2 mil horas de prática. Os profissionais, por outro lado, foram
aumentando o tempo de treinamento, a cada ano, e aos 20 anos chegaram também a
10 mil horas de prática. Essa pesquisa indicou que, quando uma pessoa tem
capacidade suficiente para ingressar numa escola de música, de alto nível, o que o
distingue dos outros estudantes é o seu grau de esforço. Também ficou claro, que são
necessárias dez mil horas de prática para se atingir os graus de destreza pertinente a
um expert de nível internacional, em qualquer atividade, como diz o neurologista
Daniel Levitin. Em vários estudos, de compositores, de jogadores de basquete,
escritores de ficção, esquiadores, pianistas, jogadores de xadrez, mestres do crime,
seja qual for a categoria e a atividade do pesquisado, esse número sempre ressurge.
Dez mil horas equivalem a cerca de três horas por dia, ou 20 horas por semana, de
treinamento, durante 10 anos. Naturalmente, isso não explica por que alguns
indivíduos se beneficiam de suas sessões de estudo mais do que outros. No entanto,
não se encontrou ainda um caso em que a excelência de nível internacional tenha sido
alcançada em prazo menor. Aparentemente, o cérebro precisa desse tempo para
assimilar tudo o que é necessário para atingir a verdadeira destreza.
Mais estudos e comentários, relacionados com o tema, também poderão ser
encontrados no meu livro “Gestão de Pessoas nas Organizações; O Talento Humano na
Sociedade da Informação”, publicado pela Editora Atlas em 2014.
Para concluir, garra e perseverança, expressos em treinamento e prática frequentes, em
qualquer atividade, produzem profissionais notáveis.

Ugo Barbieri

ubarbieri@taplowbr.com.br

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