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Família, Separação e Mediação Uma Visão Psicojurídica CEZAR
Família, Separação e Mediação Uma Visão Psicojurídica CEZAR
Produção: TypoDigital
CIP – Brasil. Catalogação-na-fonte.
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.
Inclui bibliografia
ISBN: 978-85-309-3944-1
CDU-347.61
04-1155
O Direito de Família é o lugar de
onde o Direito transcende seu
objetivo primário – organizar a
sociedade de uma forma justa – para
atingir o âmago dos cidadãos, em seu
desiderato: a possibilidade de ser
feliz.
A Psicologia é o lugar do
autoconhecimento e da compreensão
do outro, o que permite organizar de
forma mais justa as relações na
procura da realização do desejo
existencial: ser feliz.
Para
minha família,
com todo o meu amor.
AGRADECIMENTOS
A Autora
PREFÁCIO JURÍDICO
À 3.ª EDIÇÃO
Prossegue Torres2:
Com carinho,
Ministra Nancy Andrighi
Brasília, agosto de 2011
1 Citado por SOUZA NETO, João Baptista de Mello e. A prática da moderna mediação: uma
integração da Psicologia com o Direito. In: ZIMERMAN, David; COLTRO, Antônio Carlos
Mathias (Orgs.). Aspectos psicológicos na prática jurídica. 2. ed. Campinas: Millenium, 2007.
p. 516.
2 Idem, p. 517.
PREFÁCIO
PSICOLÓGICO À
3.ªEDIÇÃO
1 Hetherington, M. E. & Kelly, J. For better or for worse: divorce reconsidered. New York: W.W.
Norton, 2003, p. 2.
APRESENTAÇÃO À 2.ª
EDIÇÃO
A Autora
PREFÁCIO JURÍDICO
À 2.ª EDIÇÃO
Da Visão Psicojurídica
Pais se separam
Filhos são para sempre...
A Autora
PREFÁCIO JURÍDICO
À 1.ª EDIÇÃO
Da visão jurídica
Euclides de Oliveira
Advogado especializado em
Direito de Família e Sucessões.
PREFÁCIO
PSICOLÓGICO À 1.ª
EDIÇÃO
Da visão da psicologia
INTRODUÇÃO
1. A família é a “pré-escola” da vida
2. O direito e a justiça privilegiam cuidados com a família
3. A psicologia destaca a importância da família
4. Pesquisando psicologia em direito
5. Operadores do direito perguntam
6. A pessoa como valor-fonte de todos os valores
6. FAZENDO HISTÓRIA
6.1 O judiciário põe-se em ação
6.2 A experiência do setor de conciliação do TJSP
6.3 A prática de uma coconstrução
6.4 Fatos curiosos e gratificantes
6.5 Setor de mediação/conciliação da família
6.6 A experiência piloto da 11.ª Vara da Família e das Sucessões
6.7 Um sorriso denunciador
6.8 Breve nota sobre processo e procedimento
6.9 Em outras palavras
6.10 A resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça
6.11 Tribunal de Cochem
6.12 Das pequenas e grandes comarcas
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
8.1 Conclusões e recomendações
8.2 A mentalidade interdisciplinar
8.3 Carta aos pais
8.4 Fecho
BIBLIOGRAFIA
REFERÊNCIAS LEGISLATIVAS
ANEXO
Substitutivo do Senado Federal ao Projeto de Lei 4.827-B, de 1998
Emenda 1 – CCJ (substitutivo)
Lei 12.318, de 26 de agosto de 2010
Emenda Constitucional 66, de 13 de julho de 2010
Lei 11.965, de 3 de julho de 2009
Lei 11.698, de 13 de junho de 2008
Lei 11.441, de 4 de janeiro de 2007
CASAIS SE SEPARAM;
PAIS E FILHOS SÃO PARA SEMPRE
DO POEMA
N os dias que correm, separações conjugais não são mais exceções. Isso
significa que, pelo menos numericamente, deve haver mais problemas
relativos a filhos de pais separados ou em separação. E, de fato, o aumento
da demanda clínica para atendimento de problemas familiares decorrentes
de separações indica nessa direção. Como, de outro lado, a lei civil deixa
espaço para a humanização da Justiça de Família, pensamos que algo
deveria ser tentado no sentido de minorar tanto sofrimento.
Na verdade, o interesse por uma investigação que aliviasse os
problemas da separação resultou de uma antiga inquietação, em que, pelo
contato com o Direito de Família e a Psicologia, particularmente na área da
Terapia Familiar, fomos fortalecendo a ideia de que as causas de família
mereceriam ser examinadas com um olhar psicojurídico.
A literatura do campo da Psicologia tem confirmado que a separação
constitui uma crise emocional que acarreta desestabilização da família,
produzindo, frequentemente, prejuízos emocionais nos filhos,
particularmente nos menores. Isso ocorre, em função de que qualquer
evento que atinja algum membro do sistema familiar acarretará efeitos
sobre os demais e sobre o grupo como tal. A separação conjugal, evento dos
mais estressantes na vida de uma família, provoca efeitos
desestabilizadores. A literatura e a clínica têm mostrado, também, que
cuidados emocionais com a família podem atenuar tais efeitos.
No campo do Direito, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 227,
priorizou a proteção ao menor, o que está minuciosamente especificado no
Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual determina que se atente para o
maior interesse da criança e do adolescente.
Que caminho seguir?
Ora, a consecução legal da separação e a discussão legal sobre temas
decorrentes daquela, que afetem os filhos, passam forçosamente pelo
encontro entre o juiz de Direito e o casal, no Juízo da Família. Isso propicia
oportunidade para que esse momento processual seja mais bem aproveitado
a favor da minimização de prejuízos emocionais nos filhos envolvidos.
Assim, um corolário dessas afirmações seria a busca das possibilidades
existentes na construção de uma nova realidade de auxílio à família que se
separa, quando o Poder Judiciário (representado pelo juiz de Direito) se
encontra com o casal parental, em Vara da Família.
Para que se pudesse, porém, pretender fazer qualquer reflexão acerca
de alternativas de ajuda que demandassem uma ação direta da autoridade
judicial, seria preciso que, antes, tomássemos ciência das convicções que o
conhecimento do campo e a experiência na área, haviam gerado na referida
autoridade.
A nosso ver, esse era um tema que estava a merecer investigação
acadêmica urgente.
A forma como os juízes se colocassem diante das ações de separação e
correlatas, e como as percebessem, seria crucial para a abertura de um
diálogo, ou não, considerando que o Direito tem suas normas e princípios, e
a Justiça suas próprias regras de funcionamento. Daí surgiu a necessidade
de investigação do pensamento de juízes de Família, a respeito da separação
de casais com filhos menores.
A convicção do assunto, como relevante, veio, em primeiro lugar, de
nossa experiência pessoal, pela formação em Direito e em Psicologia;
adveio, também, da experiência clínica, pela convivência com o sofrimento
alheio, através dos problemas trazidos à clínica, e das consultas feitas;
confirmou-se, ainda, em conversas informais com pessoas separadas.
A constatação prática de que os problemas da separação não terminam
pela sentença de homologação do acordo ou pela sentença decisória, mas
que ações de guarda, alimentos e regulamentação de visitas podem
estender-se ad aeternum, em função de razões emocionais do casal – o que
já foi confirmado por pesquisa científica – constituiu outro importante
elemento de convicção.
Restava, então, saber o que profissionais do campo jurídico pensavam
sobre o assunto. Um pré-teste foi elaborado com tal propósito.
– “Como ajudar o juiz a olhar o que está por trás do fato da crise?”
– “De que métodos um juiz pode se valer para obter certos fins, como
tentar uma conciliação do casal?”
– “Como encaminhar para que as perdas não sejam tão violentas, para
que o desfecho seja menos prejudicial para as partes e os filhos?”
1 BARROS MONTEIRO, Washington de. Curso de direito civil. Direito da Família. vo1. 2, p. 1.
2 Idem, ibidem, vol. 1. p. 1.
3 Idem, Parte Geral, vol. 1, p. 2.
4 SOUZA, Rosane M. de. Paternidade singular. p. 28.
5 HOFFMAN, Lynn. Fundamentos de la terapia familiar – Um marco conceptual para el cambio
de sistemas. p. 27.
6 MACEDO, Rosa M. S. de. Sobre o método. Comunicação pessoal. PUC-SP. 1997.
7 Lei de Introdução ao Código Civil (Dec.-lei 4.657/1942), art. 5.º.
8 Idem, art. 4.º.
9 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. p. 379.
A FAMÍLIA E O EVENTO
DA SEPARAÇÃO
A crise que leva o casal, que tem filhos menores, a buscar a separação,
no âmbito legal, não é diferente das demais, ressalvadas suas
especificidades. Apenas, em relação às crises macrossociais, afunila-se,
atingindo um microuniverso, o familiar, em princípio, de modo mais
contundente e dirigido. Em relação às crises pessoais, a crise da separação
apresenta a agravante de estender seus efeitos aos filhos, tanto no presente
da agudez do momento processual, quanto no futuro, no que diz respeito à
criação deles, com a inerente manipulação de ligações, vínculos e afetos.
As separações conjugais são uma das crises não previsíveis mais
frequentes destes tempos. Elas estão se tornando crônicas e afetando, direta
ou indiretamente, quase todas as famílias, na sociedade. Ora são as próprias
famílias nucleares que se veem atingidas por esse evento, ora são as
famílias extensas que veem as famílias de seus filhos desfazer-se. E, em
ambos os casos, o estresse é inevitável e o risco de perturbação no processo
de desenvolvimento das crianças e adolescentes envolvidos é significativo.
A crise inerente à separação conjugal deve ser encarada como uma
crise não previsível, porque ela não é indispensável ao crescimento. Não
deixa, no entanto, de ser crise que, como qualquer outra, pode ser útil ao
desenvolvimento. Frequentemente, porém, traz problemas para os filhos,
em razão do posicionamento dos pais.
A crise conjugal afeta diretamente o vínculo estabelecido entre o par e
o vínculo de cada um dos pais com seus filhos. Para Ainsworth (in Parkes,
Hinde e Marris: 1991), por definição, vínculos afetivos se referem a
relacionamentos diádicos com uma pessoa específica, sendo essa pessoa
valorizada como única, de tal sorte que a ninguém será dado tomar-lhe o
papel.
Ao se proteger o vínculo do ex-casal, por ocasião da separação, na
condição de pais, o que se está fazendo é trabalhar em benefício da
manutenção e desenvolvimento do vínculo de cada um deles com os filhos.
Não há como a separação conjugal não gerar crise. Soa mesmo
impróprio falar-se em gerar, se a própria separação é um evento crítico.
Geração, aqui, refere-se mais ao movimento de agravamento de uma
situação, em si desorganizadora, e crise pode ser lida, também, no sentido
coloquial.
A mudança de estado civil, o afastamento de um dos pais –
comumente, o pai – do contato íntimo diário com os filhos, o acúmulo para
a mulher da perda da proteção do companheiro e aumento de
responsabilidades como mãe e chefe de família, o fato de os membros do
casal enfrentarem os próprios conflitos e de enfrentarem as redes familiares
extensas e a rede social são alguns dos elementos que se conjugam para
desestabilizar emocionalmente a família. Isso sem esquecer que a idade dos
filhos, à época do processo de separação, conforme estudos de Peck e
Manocherian (1995), determina diferentes efeitos psíquicos e que questões
de ordem socioeconômica não são absolutamente desconsideráveis.
Isaacs et alii (1986) mostram como a separação coloca exigências
extremas. A separação cria necessidades radicais. As pessoas devem ser
capazes de fazer frente a sentimentos de raiva, perda, culpa, alívio,
encontrar novos marcos de intimidade, recuperar a confiança em si, manter-
se envolvidas com os filhos. E tanto mais complexo é o encontro do foco da
disfunção, “quanto maior a incongruência entre separação formal e
separação psicológica”,13 como lembra Saccu (1985, in Andolfi e Angelo:
1987).
Não é fácil separar-se, na medida em que tal atitude implica integrar-se
e recuperar partes suas que foram colocadas sob responsabilidade e
proteção do outro.
O divórcio legal e, antes dele, a separação judicial e, antes desta, a
separação de fato são antecedidos por um distanciamento afetivo, o qual
Kaslow (1995) chama de “divórcio emocional”, em que ocorre a quebra do
vínculo amoroso, mas não a separação psicológica, que envolverá a
necessidade de modificação dos vínculos estabelecidos, ou seja, dos
vínculos mais profundos como casal.
Salvo casos específicos, que nem sempre são os arrolados na lei civil,
as separações legais, apesar do alívio imediato, costumam trazer muito
sofrimento para o casal e sua família, além de não proporcionarem nenhum
entendimento do que se passou e prepararem terreno para novos desastres.
Isso porque são precedidos de afastamento afetivo, do divórcio emocional,
o que gera sofrimento, uma vez que, em nossa cultura, os motivos que
levam ao casamento são, acentuadamente, de ordem sentimental.
Casais que se casaram por amor sempre passam pelo sofrimento do
divórcio14 de seus sentimentos antes de enfrentarem o estresse da separação
legal. Vai havendo distanciamento afetivo e físico, denunciadores da
ruptura.
A separação legal, em si, não é nem problema nem problemática. É
apenas a contrapartida do casamento. Na verdade, é o distrato de que o
casamento é o contrato, cumpridas, tanto num caso quanto em outro, certas
formalidades.
O que acarreta tanta dor são os sentimentos que envolvem uma
separação, o luto que cobre as pessoas em questão. Se aqueles sentimentos
estivessem elaborados no ex-casal e em seus filhos não haveria tanto espaço
para sofrimento nem, consequentemente, para excesso de dificuldades
quanto aos aspectos materiais da separação, de guarda de filhos ou de
regulamentação de visitas.
O casamento, por tradição, se reveste de rituais de passagem que
facilitam a mudança de estado de vida, o que não ocorre na separação.
Nessa, todo o procedimento é jurídico e se dá ou de forma muito rápida ou
de forma delongada e sofrida.
Contou-nos uma juíza participante da pesquisa, que uma senhora muito
simples, ao término da separação, que durou cerca de quinze minutos,
perguntou a ela: “Já acabou? Não vai ter nem fotografia?”
Certamente o ritual de passagem da separação não seria festivo como o
do casamento, mas deveria contemplar a dor e os ressentimentos,
rememorar os pontos positivos da união e preparar o ex-casal para o novo
estado de vida.
A vida transcorre num suceder-se de vinculações e desligamentos. Mas,
mesmo que se saiba que vinculações e separações ocorrerão durante todo o
processo vital, como decorrência de mudanças por desenvolvimento ou de
forma acidental (Simon: 1986), nem por isso deixam de ser críticas, e a
separação conjugal, particularmente num casal parental, é uma crise de
relevante importância, como passagem de ciclo vital.
A esse respeito, vale a pena conhecer as experiências que Bowlby
realizou, em 1990, com bebês e crianças pequenas acerca dos fenômenos de
apego e separação, pois elas se reeditam em diferentes momentos da vida
do ser humano.
Whitaker (1990) lembra que a capacidade de o casal se separar dentro
do casamento, no sentido de manter a própria identidade, tende a aumentar
sua capacidade de estar junto e ter intimidade. Isso faz supor, também, que
da capacidade de desenvolver e exercer a individualidade advirá a
possibilidade de se superar a crise de maneira mais adequada.
Situações de ruptura sempre acarretam perdas e desgaste emocional.
Separações remetem a reflexões sobre vínculos, como resultante de
dinâmicas relacionais. Como diz Saccu (1995): “o conflito é um vínculo
que satisfaz instâncias profundas, que não podem ser preenchidas pela
separação física”.15
A separação ou a ameaça dela gera grande ansiedade; o risco de perda
provoca imensa dor. Mas mesmo esse tipo de crise, como situação de perigo
que instala, se bem administrada na preocupação com o provimento de
proteção e cuidados, pode reorganizar o vínculo do ex-casal,
independentemente da ruptura do relacionamento conjugal e fortalecer os
vínculos com os filhos, reassegurando que o fim do casamento não significa
necessariamente, para eles, a perda do pai ou da mãe.
Em psicoterapia individual, pessoas separadas frequentemente falam
sobre como foi importante o acompanhamento psicológico, a orientação
jurídica de um advogado humanitário e o apoio das redes familiar e social,
durante o momento agudo da crise, quando o mundo parecia ter virado “de
pernas p’ro ar”. Elas relatam que apesar de terem firmado convicção quanto
a não querer mais o ex-cônjuge como tal, puderam encontrar canais de
comunicação, antes bloqueados entre si. Dizem que, agora, sentem um ao
outro como amigo e companheiro confiável, na condição de pais, o que lhes
tem facilitado o contato sobre os cuidados e proteção dos filhos de forma
mais amistosa e razoável do que na vigência do casamento.
É possível que, em casos como esses, a compreensão de como o
vínculo afetivo fora estabelecido e manejado durante o relacionamento
conjugal e a compreensão da importância de uma efetiva parceria para o
desenvolvimento dos filhos tenham permitido o rompimento de um vínculo
“doente” – o conjugal – e o estabelecimento de uma outra vinculação, – a
parental – com menos prejuízos e, certamente, em alguns casos, com mais
benefícios emocionais para todos. Isso implica transformação na qualidade
da relação, o que é indispensável ocorrer na passagem por uma crise não
previsível tão grave como a separação.
É relativamente frequente, numa separação bem preparada, que os pais
– sobretudo o pai – reconheçam que se tornaram melhores pais do que o
eram na vigência do casamento. Nesses casos, numa boa relação
guarda/visita, o pai acaba por assumir tarefas cotidianas de cuidados com os
filhos, o que não fizera até então.
Lembro-me de um caso, em que o pai era relativamente distante e em
que a mãe sofria muito para deixar as crianças com ele, por ocasião das
visitas.
O fato é que como ambos consideravam a mãe mais competente, ele
nunca havia tomado qualquer iniciativa e ela, embora se queixando, arcava
com toda a responsabilidade. Com a separação, tiveram que experimentar
uma nova forma de relação, desde que não havia motivo que justificasse o
temor.
As crianças, então, passaram a pernoitar na casa paterna, uma vez por
semana, e a estar com ele por todo o fim de semana, a cada quinze dias,
além de viajarem juntos em feriados prolongados e nas férias.
A experiência comprovou que os temores eram infundados: o pai
confirmou sua capacidade para cuidar dos filhos, a mãe viu dissolvidos seus
medos e aliviou-se da sobrecarga, tanto que, após alguns meses, já pedia,
vez ou outra, ao ex-marido que ficasse com as crianças para que ela pudesse
cumprir algum compromisso e sentir-se tranquila.
Esse casal havia construído um sistema de significados baseado na
cultura que sempre indicou a mulher como mais competente que o homem
no que se refere à criação dos filhos; confirmaram-no, na fantasia e na
rigidez dos papéis, e, na vigência do casamento, nunca se haviam dado
outras oportunidades.
Trabalhos como esses passam pela descoberta dos elementos de união,
porque só é possível a separação psicológica, a partir da identificação do fio
que une (Andolfi: 1987), o que, dito de outro modo, implica o
reconhecimento de certo conjunto de significados e a alteração deles.
Por outro lado, mesmo pacientes separados cuja separação transcorreu
de forma razoavelmente harmoniosa, afirmam que, ainda assim, fora difícil
e que algum auxílio psicológico, sobretudo em relação ao trato com os
filhos, possivelmente teria evitado alguns erros.
Segundo Pittman (1991), “uma crise não é mais que a situação em um
período de mudança iminente, o ponto em que as coisas poderiam melhorar
ou piorar, mas, inevitavelmente, mudarão”.16
Realmente, a mudança é drástica e, para os filhos, o luto pela perda da
união entre os pais é quase intolerável. Daí, a importância de todos os
participantes do processo – inclusive os pais – terem claro que quem se
separa é o casal e não os pais.
Enquanto parte de um processo de mudança inevitável, a separação
fatalmente trará desestabilização e desorientação aos parceiros e a sua
família.
Mesmo que não advenha de acontecimento agudo e traumático, como
uma infidelidade, e até seja resultado de decisão por consenso, ainda assim,
em algum grau, a separação guardará características de golpe inesperado
para uma das partes, surpreendida que é pela iniciativa da outra, a qual,
supõe-se, já poderá ter ultrapassado o ponto crucial de desorientação, visto
que a ideia vinha amadurecendo há mais tempo.
A separação alterará a organização da família. Os filhos passarão a ter
duas famílias: a que formarão com o pai e a que formarão com a mãe. De
outra parte, alterará seu modo de funcionar, até então. Novas formas de
funcionamento e normas de conduta deverão ser encontradas. E, da maior
flexibilidade da estrutura decorrerá uma probabilidade maior de a crise vir a
ser superada com menores prejuízos, perdas e danos emocionais para todos
e, eventualmente, ser um impulso ao desenvolvimento de seus membros.
Acontece que, como apontamos, situações de crise são situações de
desequilíbrio e, nesse sentido, a experiência tem comprovado e a literatura
reiterado que seria recomendável que toda crise interpessoal, toda crise que
se refere à intimidade das pessoas, pudesse ser objeto de atenção
especializada. De um lado, porque, ainda que uma família tenha estrutura
flexível e seja encabeçada por um casal de pessoas coerentes e sensatas,
nem por isso deixará de viver emoções ligadas ao próprio estado de separar-
se e a sentimentos de inconformismo, rejeição, raiva, inferioridade ou
superioridade, competição, ou a desejos de retaliação, dentre outros. De
outro lado, porque a crise, em si mesma, é fonte de desestabilização e
gerará mudanças (para melhor ou para pior), queira-se, ou não. Nessas
circunstâncias, sensibilidade, cuidados e um conhecimento mínimo do
assunto serão indispensáveis.
Além disso, Gergen (1993) lembra muito oportunamente que a família
é um lugar de enfrentamento, em que os problemas se instalam facilmente e
em que as soluções são mais difíceis de ser encontradas.
Isso sugere uma superposição de crises. Entendendo-se que as crises,
em si, são desestruturantes do sistema e fragilizam as relações, mais e mais
elas tendem a se agravar, se o contexto a ser considerado é o familiar.
A ruptura, que vem como auge de situação crítica, antiga e crônica, é
demasiado complexa para ser tratada de forma simplista. É uma bola de
neve que, ao atingir o casal, afeta os filhos e, pelas paredes desmoronadas
da casa, rola para fora e se esparrama pela rede social que envolve, direta
ou indiretamente, a família.
Os efeitos da separação são distribuídos, injustamente (Kaslow, 1995),
uma vez que sofrem a interferência das mais diversas variáveis: idade, sexo,
tempo de casamento, situação econômica, autoimagem, recursos
emocionais, filhos e suas idades, relacionamento com a família extensa e
com amigos e recursos da rede social, dentre outras.
Cuidar desse momento de transição é um desafio que vale a pena
enfrentar, já que o custo da prevenção é sempre menor.
Aliás, por falar em desafio, é de Eduardo Cárdenas, ex-juiz de Família
portenho, a frase: “Cada processo em uma Vara de Família constitui a
manifestação de uma crise”.17 (T.A.). E, também: “O que a família
necessita do sistema judicial é uma resposta estruturante frente ao desafio
da crise”.18
De qualquer forma, desligamentos e separações produzirão crises na
pessoa ou pessoas envolvidas e precisarão ser superadas. Da maneira como
forem superadas essas crises, os indivíduos poderão sair fracassados ou
fortalecidos. Esta segunda alternativa supõe mudança na qualidade das
relações a partir de uma superação criativa da crise e possibilidade de uma
nova equilibração psíquica num estágio de maior desenvolvimento.
Frequentemente, os recursos psicológicos da família são insuficientes
para enfrentar tão aguda situação. A eles devem aliar-se os recursos da rede
social – família extensa, amigos, profissionais e Estado – no sentido de
prevenir um desastre e propiciar o levantamento de novas paredes.
A esse respeito, um olhar especial deve ser voltado para as famílias
menos favorecidas, social, instrucional e economicamente, as quais, mais
que as outras, podem desconhecer os recursos de ajuda que têm à
disposição, sobretudo no meio universitário.
O Estado, em sua função de proteger a família e a dignidade dos
cidadãos, talvez não requeira mais que informação e vontade política para
implementar os recursos que também estão à sua disposição, para ajudar a
minorar os efeitos indesejáveis dessa importante crise não previsível, que é
a separação, e que pode acarretar prejuízos nos filhos, como veremos a
seguir.
“Aqui, nem um de nós é bobo. O senhor está usando seus filhos para
prejudicar sua mulher. O senhor está semeando”.
Texto anterior:
A lei que rege as separações é única para todo o território nacional.
A separação legal só ocorre por via judicial e se formaliza por meio de
sentença proferida por um juiz de Direito, o que significa que depende da
abertura de ação, na Justiça.
No Brasil, o instrumento jurídico para pôr fim à sociedade conjugal é a
separação judicial e o instrumento jurídico para a dissolução do
casamento é o divórcio.
A matéria sobre separação foi regida de 1916 a 1977, pelo Código Civil
de 1916. Até 1977 não havia divórcio no Brasil. Em 26 de dezembro de
1977, foi promulgada a Lei 6.515, conhecida como Lei do Divórcio.
Atualmente, o novo Código Civil rege a matéria, permanecendo em vigor
a Lei do Divórcio apenas em suas disposições processuais.
Designa-se separação judicial aquela que é formalizada pelo Poder
Judiciário, em contraponto à separação de fato, que decorre da simples
ruptura da vida em comum.
A legislação contempla duas formas básicas de separação judicial: a
separação consensual e a separação litigiosa.
A separação consensual, também chamada de amigável ou por mútuo
consentimento, como o nome diz, é a que decorre do consenso, do
acordo entre as partes, marido e mulher. Essa forma de separação só é
permitida para casais com mais de um ano de casamento.
A separação litigiosa, referida na lei simplesmente como separação
judicial, decorre da alegação de culpa de um dos cônjuges, que
impossibilite ao outro a vida em comum, conforme os motivos previstos
no art. 1.573 e seu parágrafo único.
Quanto à impossibilidade dessa comunhão de vida, a lei oferece um rol
de eventos que podem caracterizar tal impossibilidade. Faculta, porém,
ao juiz considerar outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da
vida em comum, o que, entendemos, torna aquele rol pouco mais que
exemplificativo.
Assim, uma vez que os fatos enumerados no referido artigo de lei podem
ser compreendidos na hipótese genérica de conduta desonrosa ou grave
violação dos deveres conjugais, de que falava o art. 5.º da Lei do
Divórcio, temos que concordar com Euclides de Oliveira (2003) que a
alteração seria dispensável, até porque o dispositivo do novo Código
também será objeto de interpretação, caso a caso.
A separação litigiosa, em que não houver alegação de culpa, pode ser
proposta por cônjuge que prove ruptura da vida em comum por mais de
um ano e a impossibilidade de sua reconstituição. É, ainda, motivo para o
pedido de separação a existência de doença mental grave, adquirida
pelo outro cônjuge, após o casamento, impossibilitando a continuação da
vida em comum. Neste caso, é condição para a ação que a doença
exista há dois anos e que sua cura tenha sido reconhecida como
improvável.
A separação consensual é processada em conformidade com os arts.
1.120 a 1.124 do CPC. Nela, a petição deve ser assinada pelos cônjuges
e seus advogados, ou um advogado único. A separação litigiosa tem
procedimento pelo rito ordinário. Nela, o pedido deve ser de iniciativa de
um dos membros do casal, representado por advogado.
Ambas as formas de separação requerem sentença judicial prolatada por
juiz de Direito, para que surtam efeito jurídico. No caso da consensual, o
juiz homologa por sentença o acordo firmado entre as partes; no caso da
litigiosa, ele decide por sentença, ao final. Da decisão judicial cabe
recurso ao Tribunal. A qualquer momento do processo, a separação
judicial pode ser convertida em consensual, a pedido das partes.
A separação judicial, em qualquer de suas duas formas, põe fim à
sociedade conjugal, mas não dissolve o casamento válido. Este só será
dissolvido pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio. O art. 1.571,
§ 1.º, do CC/2002 dispõe sobre a matéria.
A separação judicial faz com que desapareçam os direitos e deveres
conjugais de coabitação e fidelidade recíproca, bem como o regime de
bens do casamento, mas não rompe o vínculo matrimonial. O divórcio
rompe o vínculo matrimonial e desfaz o casamento válido. É essa ruptura
que libera os ex-cônjuges para nova união legal.
Após um ano do trânsito em julgado da sentença que decretou a
separação judicial, ou da decisão que concedeu medida cautelar de
separação de corpos, qualquer das partes pode requerer que a
separação seja convertida em divórcio. Após dois anos da separação de
fato (separação sem ratificação legal), o divórcio pode ser pedido por
qualquer dos cônjuges. A conversão em divórcio ou o pleito após a
separação de fato podem ser consensuais ou litigiosos, conforme haja,
ou não, acordo dos separados em relação às medidas.
A possibilidade de os casais desfazerem, no sentido jurídico, seu
casamento, ficando livres do vínculo matrimonial e podendo realizar nova
união legal, foi a grande mudança sociojurídica trazida pela Lei do
Divórcio. Essa lei trouxe uma mudança de segunda ordem expressiva, no
Direito de Família brasileiro. Antes dela, não havia segundo casamento
legal, senão por viuvez.
Como nenhuma mudança de segunda ordem é simples, a promulgação
dessa Lei resultou de décadas de luta, encabeçada pelo deputado
Nelson Carneiro, durante a qual, simultaneamente, o concubinato foi
conquistando espaço e os concubinos, conquistando direitos. Tal
persistência culminou com a Emenda 9, de 28.06.1977, à Carta
Constitucional de 1967.
A Emenda 9/1977 retirou o caráter de indissolubilidade do casamento e
instituiu o divórcio, o qual foi, em seguida, regulamentado pela Lei
6.515/1977, a Lei do Divórcio. O Código Civil de 2002 consagrou
definitivamente esse instituto.
Vale observar que, como o divórcio ocorre um ou dois anos, pelo menos,
depois da separação, na ocasião em que ele é sentenciado, o casal já
ultrapassou o ponto apical da crise emocional, na maioria dos casos. Por
esse motivo, no Brasil, diferentemente de outras sociedades, parece
mais apropriado falar-se em crise da separação do que em crise do
divórcio.
Tanto a separação consensual quanto a litigiosa são passíveis de
reconciliação, fazendo retornar o casamento à condição anterior,
mediante requerimento ao juízo que decretou a separação que, após
ouvido o Ministério Público, será homologado pelo juiz. No Código Civil
de 2002, a matéria vem regulada pelo art. 1.577 e seu parágrafo único.
Com exceção do divórcio litigioso, as demais formas de separação –
separação consensual, separação litigiosa e divórcio consensual –
devem ser objeto de audiência prévia de conciliação, como tentativa de
reconciliar o casal, nos casos consensuais, e de reconciliar ou
transformar a ação litigiosa em consensual, nos de separação litigiosa. O
divórcio litigioso não está sujeito a essa regra, embora a doutrina não
seja pacífica. Segundo Amorim e Oliveira (1999): “Para muitos, sendo o
divórcio um plus em relação à separação judicial, haveria de seguir as
mesmas regras impostas ao procedimento judicial desta última”.7
Õ
2.4.1 EMENDA CONSTITUCIONAL 66, DE 2010 – DISCUSSÕES
O ideal para os filhos é que sejam criados pelos pais num lar único e
harmonioso. No caso dos filhos de pais separados, o melhor interesse
também está em serem criados pelos pais, qualquer que seja a forma de
guarda, inclusive a unilateral.
A modalidade da guarda é o menos importante, desde que, como sócios
na função parental, os pais possam ter uma relação madura e equilibrada. Se
orientados, provavelmente exercerão de forma conjunta a autoridade
parental, separando as tarefas não pelo que está disposto no acordo ou
determinado na sentença decisória, e, sim, como quaisquer pais fariam.
Um casal emocionalmente amadurecido, salvo em situações de
exceção, dificilmente passaria por uma separação litigiosa e, se passasse,
pediria conversão em consensual assim que saísse do momento agudo da
crise e pudesse refletir.
O tema “interesse do menor” desperta controvérsias ricas de conteúdo e
inúmeras indagações.
Uma das formas de se entender a introdução do critério de interesse do
menor, pelo legislador, é pensar em tal interesse como uma estratégia
empregada pelos diferentes profissionais que intervêm na área judicial da
família, como juízes, advogados, assistentes sociais, psicólogos, clínicos e
psiquiatras diante de um contexto de indefinição e incerteza, no qual se
exige proteção social (Leite: 1997).
Essa posição é compreensível, sobretudo agora que, juridicamente, os
pais estão equiparados no exercício da autoridade parental e que, com as
transformações sociais, não há mais papéis rigidamente estabelecidos para
pai e mãe. Alguma estrutura de controle seria de se esperar. “O interesse do
menor serve, primeiramente, de critério de controle, isto é, de instrumento
que permite vigiar o exercício da autoridade parental sem questionar a
existência dos direitos dos pais. Assim, na família unida, o interesse
presumido da criança é de ser educado por seus dois pais; mas se um deles
abusa ou usa indevidamente suas prerrogativas, o mesmo critério permitirá
lhe retirar, ou controlar mais de perto, o exercício daquele direito. O
interesse do menor é utilizado, de outro lado, como critério de solução, no
sentido de que, em caso de divórcio, por exemplo, a atribuição da
autoridade parental e do exercício de suas prerrogativas pelos pais, depende
da apreciação feita pelo juiz do interesse do menor”1 (Leite: 1997).
Esse segundo critério revela o poder de que o juiz de Direito está não
apenas investido, mas, sobremaneira, revestido, nas causas que envolvem o
interesse do menor.
Tal poder implica agir com liberdade; agir com liberdade implica
responsabilidade. Agir com poder, liberdade e responsabilidade, porém, em
contextos específicos, requer conhecimento mais aprofundado sobre o
assunto em questão.
Em causas judiciais de família, a avaliação do casal e da relação
poderia iniciar-se no primeiro encontro do juiz com as partes, na audiência
de reconciliação, pois a primeira troca de olhares e de palavras começa a
narrar a história de uma vida.
Não se espera que o juiz seja também psicólogo, especialista em
conflitos emocionais e relacionais, mas entende-se que, agregado à
indispensável sensibilidade, à sua experiência de vida, à sua experiência
jurídica e à sua experiência como magistrado, ele precisaria ter algum
preparo para captar funções no relacionamento humano. Como diz Fukui
(1999), o conhecimento de uma outra disciplina não precisa ser profundo,
mas deve ser suficiente para que a pessoa possa, pelo menos, fazer
perguntas a respeito do outro campo.
Parece demasiado exigir-se que um juiz de Direito, cuja formação é
exclusivamente jurídica, tenha que decidir o que é melhor para os menores:
ficar com o pai ou com a mãe. Ele próprio, provavelmente, terá, em relação
a si mesmo, uma de duas posturas emocionais: ou negará a seriedade do
contexto em que está inserido e a responsabilidade a que o submetem ou
olhará de frente a situação e sentir-se-á muito preocupado por ter em suas
mãos o destino de alguém.
A lei sempre admite revisão dos itens relativos aos filhos, como
guarda, visita e alimentos. Essa abertura leva a inferir boa intenção no
legislador, deixando margem ao reparo de equívocos e ao advento de novas
necessidades.
Estabelecer uma listagem de interesses que estejam adequados à lei,
como critério de orientação quanto ao que é melhor para a criança ou o
adolescente, é um avanço dentro da mentalidade jurídica, mas pode ser
insuficiente, em termos relacionais familiares, com vistas ao
desenvolvimento biológico, psíquico e social do menor. Sem que se
considerem casos de maior gravidade, uma avaliação acurada poderá
indicar, por exemplo, que nem sempre é melhor uma menina ficar com a
mãe, independentemente de esta ser uma boa pessoa; ou a simples oitiva (a
escuta) de uma criança poderá não vir a apontar nada de significativo
quanto à sua relação com o pai e/ou mãe. A gradual queda das barreiras
entre as ciências e, particularmente, a interdisciplinaridade psicojurídica
aplicada ao Direito de Família pode ser uma sensível contribuição à
realização da intenção do juiz de fazer a melhor justiça.
A delicadeza das causas judiciais de família, em razão dos conflitos
emocionais que lhes dão base, aponta para o acordo entre os pais como a
melhor solução possível.
Para a realização do acordo, no entanto, o casal deveria ser preparado,
participando de alguma prática indicada por especialista, desde que
possibilitadora de ressignificações.
Essa prática poderia ser uma mediação psicojurídica, uma intervenção
focada na relação entre pais e filhos ou outra da mesma natureza. A busca
de auxílio deveria ser feita antes da separação consensual; se não por
iniciativa do casal, por indicação do advogado. Uma perícia relacional
também poderia contribuir para o conjunto das provas.
Atualmente, com exceção da perícia, ainda não há lei que permita
determinação nesse sentido, por parte do magistrado. Se ele próprio, porém,
estiver convencido da importância da intervenção para a realização de um
acordo que venha a mostrar-se eficaz, poderá recomendá-la nas ações
consensuais, na audiência de reconciliação e, com maior razão, nas ações
litigiosas, procurando a aquiescência dos advogados. O Projeto de Lei 94,
de 2002, atual Substitutivo ao PL 4.827-B/1998, afasta essa dificuldade,
tornando obrigatória a tentativa de mediação do conflito. A lei a ser
promulgada deverá confirmá-lo.
A propósito, reitere-se, o Estado deveria ser sensibilizado para essa
necessidade, a fim de poder propiciar auxílio psicológico, durante a
separação, às famílias menos favorecidas financeiramente. Não se têm
dados estatísticos sobre casais desse estrato social que chegam à Justiça
para se separar. É provável que um bom número não tome nenhuma
providência dessa ordem, até porque uma separação, mesmo integralmente
custeada pelo Estado, também implica despesas pessoais (condução, lanche,
perda de dia de trabalho). Essas famílias, no entanto, poderiam ser
beneficiadas com a assistência, pois sua capacidade de entrega e de confiar
em profissionais dispostos a ajudá-las é muito maior, no primeiro momento,
que a de classes diferenciadas instrucional e economicamente. O trabalho
com as chamadas famílias simples, em clínicas universitárias e em clínicas
de atendimento gratuito, vem demonstrando essa afirmação.
A problemática é diferente nas famílias dos diversos estratos sociais.
Os conflitos emocionais e os concretos variam, porém todas as famílias
necessitam de apoio preventivo, em benefício de seus filhos.
Para dirimir dúvidas quanto à possibilidade de o juiz interferir nas
separações consensuais, é de boa lembrança ouvir o que diz Peluso (1983),
referindo-se à audiência preliminar, nessa modalidade de separação:
O juiz, para dar uma sentença decisória, forma sua convicção a partir das
provas que instruem o processo. Do elenco probatório faz parte a
perícia judicial, recurso de que o juiz pode se valer sempre que entender
que depende de conhecimentos teóricos ou técnicos especializados, sobre a
matéria em discussão, para formar sua convicção. A perícia materializa-se,
no processo, sob a forma de laudo.
O Código de Processo Civil, ao preceituar perícias de uma forma geral,
admitiu, obviamente, entre elas, a perícia psicológica. É comum, em causas
de família, a perícia ser determinada nas ações em que se discute guarda de
menores ou regulamentação de visitas.
O juiz nomeia o perito, dentre profissionais habilitados para tanto. O
perito não precisa ser um funcionário da Justiça, mas, durante a realização
do trabalho, ele adquirirá atribuições de auxiliar da Justiça. Como é
frequente a realização de perícias por psicólogos judiciários no auxílio às
Varas de Família, é comum operadores do Direito, e até juízes de Família,
identificarem psicólogo judiciário como um realizador de perícias, como se
elaborar perícias fosse sua única função. Na verdade, a Psicologia Clínica,
judiciária ou não, tem muito mais a oferecer em termos de recursos técnico-
científicos aos processos de família, que só a elaboração de laudos. A lei
também faculta às partes indicar profissionais da mesma especialidade,
chamados de assistentes técnicos que, em seu nome, acompanharão o
trabalho do perito judicial, confirmando, ou não, a avaliação realizada.
Conversamos, largamente, com juízes sobre o uso de recursos
psicológicos em Varas de Família. E foi importante e curioso ouvi-los a
respeito de laudos periciais. Um deles disse, textualmente: “Não utilizo
recursos psicológicos, nunca. A senhora quer saber, não gosto de
psicólogos, eles só atrapalham”. Outros afirmaram que só o utilizam em
casos extremos: “Só recorro aos assistentes técnicos em último caso”; “(...)
só em casos graves mando fazer perícia”.
Durante as conversas, sem distinção de gênero, alguns expressaram
uma certa desconfiança nos laudos. Uma juíza: “O próprio laudo pericial é
pobre, porque é escrito e só passa informações”. Um juiz: “Os laudos são
muito frios e muito imperfeitos”.
E, nessas conversas, os dois deram exemplos de laudos que não os
ajudaram em nada, na formação de convicção. Ela contou: “uma vez, por
indicação de uma das partes, enviei o casal para um terapeuta, que me
mandou um laudo, dizendo: ‘Isso interessa ao juiz, aquilo interessa ao
juiz’. Não me ajudou em nada, porque, além de muito pobre, como laudo, é
o juiz que tem que saber o que interessa a ele”. E o outro disse: “Tive um
caso em que tiraram uma fotografia de um menininho de cinco anos, à
beira de uma piscina, mostrando o ‘pipi’, e de uma menininha que o pai
estava abaixando a calcinha. O laudo foi muito bem escrito, citando
autores etc., mas só baseado na foto. O pai ficou como um ‘tarado’, sem ter
sido visto nem ouvido pela psicóloga. Isso é sério, porque, se um pai é
‘tarado’, não vai ter nem visitas”.
Ambos os magistrados deixaram claro que a decisão final é deles e que,
portanto, a responsabilidade é sua. Nesse sentido, lembraram que o juiz é
que tem que saber o que interessa a ele e que o perito deve ater-se à perícia
e não pretender tomar o lugar do magistrado, e que certas afirmações
podem ser muito graves e alterar profundamente a vida das pessoas e que,
depois, a responsabilidade pela decisão terá sido do juiz. Em contrapartida,
esses entrevistados enfatizaram a necessidade de conhecer outros recursos
psicológicos de auxílio à Justiça, e emprestaram total colaboração à
pesquisa, ela, convidando a pesquisadora a participar de audiências para
buscar novas formas de ajuda, e ele, dispondo-se a levantar o número de
separações, por não haver estatísticas a respeito.
Outros juízes referem-se ao laudo pericial de forma mais amigável, por
exemplo, lembrando que uma deficiência em relação a esse recurso é que só
chega até o diagnóstico e uma deficiência da utilização desse recurso, no
âmbito da Justiça, é haver prazo: “Às vezes, recorro à perícia psicológica.
O problema da perícia é que tem prazo. Um problema que surge é que as
partes querem solução, os advogados pressionam e o juiz tem que decidir.
Então, o juiz pede auxílio aos psicólogos e assistentes sociais da Vara, mas
não se pode fazer muito mais que o diagnóstico, (...)”. Ou então: “Os
profissionais são excelentes, fazem laudos bem profissionais. São laudos
para fixação ou alteração de guarda, para fixação ou modificação de
visitas, para ações subsequentes à ação de separação. O maior problema
que vê, no seu caso, é não haver esse serviço na Família e requerer
‘empréstimo’ da Vara da Infância”.6
Há, por outro lado, juízes que dizem utilizar esse recurso, com
regularidade: “No caso de estabelecimento de regime de visitas, por
exemplo, eu peço estudo social e laudo psicológico. O laudo acaba
mostrando como os filhos ficam divididos. Tive um caso em que ao invés de
dar a guarda definitiva, dei um tempo para ficar com os pais biológicos,
mandei reavaliar, fazer o laudo da família, para, depois, poder decidir”.
Ou: “Esses casos, só o Direito não resolve. Temos que ter a colaboração da
Psicologia e do Serviço Social”. E referiu-se a um caso, em particular:
“Nesse caso, foi feito um laudo que deixou bem claro que a mãe tinha um
desequilíbrio, que se manifestava como heteroagressividade, quando ela
era colocada sob pressão. Enquanto ela podia raciocinar, ela se
controlava. Não sei se é verdade, mas condiz com o laudo.
Em geral, os juízes mostram-se cautelosos quanto à fidelidade dos
resultados: “Não precisam acreditar que sejam verdades absolutas o que
está nos laudos, mas é alguma coisa para dirigir as discussões”.
Os juízes parecem não estar familiarizados com perícias psicológicas
em que todas as inter-relações familiares pertinentes ao caso são
investigadas, sem prejuízo de testagem individual, quando necessária, e nas
quais o relatório é redigido em linguagem o quanto possível coloquial e
acessível, oferecendo ao Juízo uma confiável referência sobre o
funcionamento emocional/relacional da família. Chama a atenção, no
entanto, que mesmo aqueles que fazem críticas e têm restrições acabam por
utilizar esse recurso, em determinados casos, por ser o que existe na lei.
Como a lei é importante para abrir caminhos!
É importante que haja lei, mas também é importante que os recursos
disponíveis sejam utilizados da melhor maneira possível e mereçam
credibilidade. Assim, na tentativa de sanar a má impressão dos magistrados
sobre as perícias psicológicas, vale registrar o seguinte:
As perícias psicológicas tradicionais visavam a levantar dados de
personalidade e a fazer prognósticos, fundamentando-se, sobretudo, na
aplicação de testes. As modernas perícias relacionais, na Família, visam a
investigar, contextualmente, as inter-relações familiares, a compreender a
estrutura de funcionamento da família e a verificar a flexibilidade para a
realização de mudanças.
As perícias relacionais modernas ampliaram e transformaram as
possibilidades da avaliação, não rejeitando a investigação do inconsciente
individual, mas colocando o foco nas relações familiares do sistema em
estudo.
Uma avaliação dessa natureza pode não apenas fornecer elementos de
reflexão para o juiz, mas também procurar devolver aos litigantes a
autonomia necessária para que ponham fim à pendência jurídica e à
emocional, podendo construir uma relação parental mais equilibrada e
coerente.
Deve-se ressaltar que, no exercício da função, o perito judicial é um
assessor do Juízo. Sua função é fazer a avaliação e oferecer o laudo pericial.
A desejável ajuda às partes deve vir das relações estabelecidas pelo técnico
e sob a forma de esclarecimentos e recomendações vindas por meio do
laudo
Em primorosa pesquisa sobre perícias psicológicas, Martins (1999)
“identifica na teoria sistêmica, subsídios teóricos que podem fundamentar
essa forma de trabalho, na medida em que propicia a ampliação no nível de
análise do individual para o relacional e, também, não admite uma visão de
verdade ontológica, mas relativa”.7
Diferentemente de perícias realizadas em outros campos do
conhecimento, as perícias psicológicas não visam a fornecer resultados
precisos ou a propor verdades absolutas. As perícias referentes a causas de
Família, particularmente, devem visar ao melhor interesse do menor. Por
serem, até o momento, o único recurso psicológico previsto em lei para
auxílio à Justiça de Família, podem ser, indiretamente, um recurso de
auxílio à família, na Justiça.
Os laudos periciais podem ser um excelente recurso de ação e os
psicólogos do Judiciário são profissionais incansáveis na busca do melhor
interesse do menor, até porque são especialistas extremamente conscientes
de que não se pode pôr em risco o saudável desenvolvimento
psicoemocional de crianças e jovens, em nenhuma situação de vida.
Os princípios que norteiam a perícia psicológica em Vara de Família
não guardam qualquer intimidade com o propósito de definir quem é
melhor ou pior, quem é bom ou mau, mas destinam-se a fornecer elementos
para reflexão sobre o que seria melhor para atender às várias necessidades
do menor.
A importância dos pais para o bem-estar mental e emocional dos filhos
é tida como pacífica na literatura psicológica e, dessa forma, a própria
função dos assistentes técnicos torna-se peculiar. Como psicólogos, eles
devem estar atentos ao bem-estar biopsicossocial dos menores envolvidos
na perícia, podendo ser muito úteis, tanto ao prestar assessoria ao advogado,
nos aspectos psicológicos do caso, quanto em auxiliar seu assistido, na
função parental. Os pais precisam tomar contato com o que seja benéfico e
com o que possa prejudicar, emocionalmente, o filho, e resgatar a
independência de decidir e gerir sua família. O assistente técnico deve
atender a essas necessidades sem comprometimento de sua condição de
psicólogo.
O trabalho do psicólogo é de extrema delicadeza e de grande
amplitude. Cabe a ele, na interface com outras ciências e profissões,
mostrar as possibilidades de que sua especialidade dispõe, como cabe a ele,
em relação a si mesmo no trato com a Justiça, cuidar para não assumir
postura de operador jurídico, o que, no convívio com os profissionais do
Direito e no entrelaçamento dos atos processuais, não seria difícil ocorrer.
4.1 NEGOCIAÇÃO
4.2 CONCILIAÇÃO
4.5 O MEDIADOR
nível superior
capacitação básica em mediação
noções de Direito de Família
experiência no emprego de técnicas de resolução de conflitos
relacionais 4
credibilidade das partes
imparcialidade
E seja:
favorecedor de cooperação
facilitador da comunicação entre os pais
facilitador de entendimento dos pais em prol dos filhos
facilitador do contato entre pais e filhos
equilibrador na disputa de poder
facilitador da troca de informações necessárias ao acordo
4.10 O DINHEIRO
4.11 AS INFORMAÇÕES
Mediação
– Processo breve
– Focado no conflito
– Considera a emoção como um todo
– Considera os estados emocionais: choque, negação, permuta, culpa,
medo, depressão, raiva, aceitação e resolução5
– Trabalha presente e futuro
– Visa à mudança nas relações
– Visa à tomada de decisões
Terapia
– Processo de duração variável
– Focado na investigação do vínculo
– Trabalha os conteúdos emocionais
– Trabalha passado, presente e futuro
– Visa à transformação do vínculo
4.14 AUTOCONHECIMENTO
F atos curiosos estão se tornando cada vez mais raros, na medida em que
o tempo passa e os advogados se familiarizam com os objetivos do
Setor.
Houve um caso interessante em que uma advogada comentou, ao final
de uma sessão, que a única coisa de que ela não gostava na profissão era
que advogados, homens e mulheres, envelheciam muito rapidamente, por
viverem com a “cara amarrada” e a testa enrugada, como forma de contato,
e que ela havia descoberto uma diferença no Setor de Conciliação: eles
chegavam emburrados e saiam sorridentes.
Em outra oportunidade, uma jovem advogada se irritou com o colega,
pediu por cinco vezes à conciliadora que a audiência fosse dada como
infrutífera, o colega a chamou de “pirralha” e ambos tentavam fazer com
que seus clientes não acordassem. Estava claro que as partes queriam um
acordo, mas o advogado tentava dissuadir seu cliente e fazia ironias,
enquanto que a advogada chegou a dizer, bastante alterada, que se ela não
quisesse, seu cliente não faria acordo.
A conciliadora acalmou os ânimos, pediu respeito, explicou o objetivo
do Setor, deu força às partes para tomarem sua decisão e denotou
reconhecimento aos advogados, em sua função.
Por incrível que pareça, esse caso acabou em acordo. Não será tão
incrível, porém, se se souber que a conciliadora usou de recursos
psicológicos e jurídicos para auxiliar na conciliação. O mais notável, no
entanto, é que a advogada cumprimentou a todos, desculpou-se com a
conciliadora, disse que sua opinião sobre o Setor havia mudado
completamente, e que gostaria de voltar a atuar lá. Quanto ao advogado,
também se desculpou, inclusive com a colega, e disse à conciliadora que
tinha muitos casos e passaria a submetê-los, extraprocessualmente, ao Setor.
A propósito, esse foi um caso extraprocessual e era a primeira vez que
ambos os colegas advogados entravam no Setor de Conciliação do Cível.
O Fórum João Mendes Jr. é, talvez, o mais complexo Fórum do país em
número de causas, e seu Setor de Conciliação do Cível tem sido uma
experiência bem-sucedida. Referimo-nos a ele por sua característica
precursora e por vir denotando a importância da Psicologia como substrato
para a compreensão de conflitos, mesmo quando não há intenção de fazê-lo.
Já está em funcionamento, também, o Setor de Conciliação das Varas
de Família.
O Fórum não precisa ser assustador para os filhos de pais separados, nem
a sala de audiências o monstro com que vão sonhar, à noite. Exemplo
disso foi uma sessão, seguida de audiência, em que se discutiam Alimentos.
Nessa ocasião, estavam presentes os pais e seu filho menor de 10 anos,
acompanhados da advogada.
Na medida em que os trabalhos se desenvolviam, o menino foi
mudando. Seu semblante, inicialmente sério e preocupado, foi se
transformando, enquanto via os pais conseguindo se entender.
Ao final, a mãe, no princípio séria e irascível, aceitou a realidade da
situação do ex-marido e concordou com a proposta.
A colaboração da advogada foi decisiva para a aceitação daquela
realidade.
Já na sala de audiências, a juíza confirmou com o ex-casal o que este
havia acordado e homologou o acordo. O clima amenizou-se. Aí, então, o
menino abriu um largo sorriso e começou a fazer sinais de positivo para
todos.
Pois é, o sorriso dessa criança denunciou o fato de que os filhos querem
os pais unidos, ainda que o casal esteja separado, e a compreensão dessa
realidade mental da criança é o objetivo de nosso trabalho.
1 Padrão relacional, interacional, comunicacional são usados, neste texto, como sinônimos.
2 ESTEVES DE VASCONCELLOS, Maria J. Terapia familiar sistêmica. Bases cibernéticas. p. 68.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Prezados pais,
Vocês que estão pensando em se separar, estão se separando ou já se
separaram? Não importa, a vida é sempre um eterno reiniciar.
Vocês têm filhos pequenos ou adolescentes? Aí, a situação complica
um pouco. Mas mesmo filhos adultos ficarão abalados com a separação,
não tenham dúvidas. Vocês pensam que é fácil? Imaginem seus pais
separando-se. Se vocês são filhos de separados, sabem muito bem o que é
isso.
Às vezes, a vida traz situações que não têm volta e, talvez, a sua seja
uma dessas.
Não se precipitem, porém, pensando em separar-se com pressa, ou por
entusiasmo ou por raiva. Lembram-se de que a pressa é a inimiga da
perfeição? Então... Será que seu caso é mesmo de separação? Será que os
sonhos foram todos destruídos mesmo? Será que vocês não estão falando
línguas diferentes e pensando que dizem a mesma coisa?
Cuidado! Quando se começa a brigar, entra-se por uma escalada
desenfreada que pode não ter fim. As paradas são apenas para tomar
fôlego e retornar de forma cada vez mais rancorosa e violenta.
Será que a situação financeira está complicada? Lembrem-se de que
em casa em que falta pão, todos gritam e ninguém tem razão.
Se for isso, pense, cada um, como o companheiro deve estar se
sentindo. Seu marido pode estar humilhado, sua mulher pode estar
insegura, ambos podem estar com medo do futuro. Tentem lembrar que
vocês, antes de serem marido e mulher, são amigos, são confidentes e
confiam um no outro. Ou será que a confiança acabou? Falem sobre isso.
Será que seus filhos estão crescendo e vocês estão se desentendendo
sobre como educá-los? É, não é fácil mesmo educar filhos que estão
crescendo, sobretudo os adolescentes. Criar um filho pequenininho é mais
fácil, claro, pois ele só faz o que vocês querem, mas quando ele começa a
pensar e os desafia, que complicado! Se vocês não tiverem firmeza e
equilíbrio, aí vai ser um problema.
Será que vocês se esqueceram um do outro?
Era tão fácil no tempo do namoro, e nos primeiros tempos de
casamento, chegar em casa, alegres, fazer um elogio à comida, aos
encantos da casa, à aparência pessoal, às conquistas profissionais e
encontrar graça em tantas pequenas coisas.
Lembram do tempo em que vocês riam à toa? Ou de quantas vezes um
consolou o outro em momentos de tristeza sem motivo aparente, de
aborrecimentos no trabalho, com um chefe injusto, um colega mau caráter
ou um cliente desagradável? Vocês diziam “deixa p’ra lá, isso passa”.
Lembram do tempo em que a escola reclamava de seu filho e vocês se
preocupavam, sofriam, mas sentavam-se para conversar, iam falar com a
professora e tocavam a vida? E quando algum de vocês se aborrecia com
os palpites e as alfinetadas da sogra e o outro dizia “não ligue, minha mãe
é assim mesmo, para mim está bem como você é, é assim que eu gosto de
você, a vida é nossa”, e que tais?
Lembram de quando ele procurava aquela camisa especial e o
colarinho estava mal passado ou quando ela se arrumava toda para
esperá-lo porque era o aniversário de casamento e ele se esquecera de
levar umas flores? Tudo se resolvia, rapidamente. A camisa logo era
substituída por outra e um pedido de desculpas carinhoso, um beijo e uma
declaração de amor substituíam as flores. Vocês conseguiam sorrir e saíam
para festejar. Não havia cansaço e até o florista do Largo do Arouche,1
acostumado com loucuras amorosas, ficava espantado com a braçada de
rosas que entrava no carro. E vocês riam, e tudo que os aborrecera era
logo esquecido.
O tempo passou e as coisas mudaram? As caras alegres ficaram
amarradas, o cansaço tomou conta da vitalidade e os elogios foram
arrefecendo? A comida virou “uma droga”, a casa virou um lugar para se
descarregar as desgraças do dia?
E as crianças? “Você nem acompanha as lições”. “E você, que nunca
está em casa e nem sabe em que ano estão”. “Pare com tanta tristeza, isso
já é depressão”. “Você implica com minha mãe, coitada, ela só quer
ajudar”. “Como a comida poderia ser melhor, se você não dá um tostão,
em casa”. “O quê? Você só gasta, parece um saco sem fundo”. “Nunca tem
uma roupa em ordem, nesta casa”. “Você nem se incomoda mais com nosso
aniversário de casamento”. “Dia dos Namorados? Nosso tempo já
passou”. “Esta casa é uma bagunça”. “Você não sabe o que é cuidar de
casa, de filhos e trabalhar fora”. “Ninguém pediu para você trabalhar”.
“Você quer ser dondoca”. “Você pensa que é um meninão”. “Você está
louca”. “Você está louco”.
O que será que aconteceu com vocês? Será que foi só o tempo que
passou? O tempo, sozinho, não tem esse poder todo.
Será que vocês esqueceram que plantas têm que ser cultivadas? Será
que vocês esqueceram de cultivar seu amor e esqueceram da frase que diz
que quem usa, cuida? Será que vocês não dão valor ao que têm e, portanto,
depois de conquistado, aquele bem já não interessa mais? Pode ser, pensem
nisso. Afinal, há alguns anos vocês eram tão apaixonados.
Lembram como vocês sonharam com a construção de uma família?
Como se entregaram de corpo e alma a essa relação, e quiseram ter filhos,
e conseguiram ter esses filhos? Como depositaram, um no outro, tantas
esperanças e expectativas? Como planejaram fazer o melhor que pudessem
para que o outro fosse feliz?
Para onde foi tudo isso?
Será que vocês foram endurecendo com o tempo e deixaram de sonhar
a dois? Será que vocês acreditaram que amor é coisa para jovens e estão
imaginando que poderão reencontrar a juventude em outros braços e que
em outra relação não terão problemas para serem solucionados?
Que bobinhos vocês podem estar sendo! Que ingênuos! Vocês não
sabem que o cachorrinho muda de lugar e carrega as pulgas?
Tentem pensar.
Será que seu caso é mesmo de separação ou vocês só estão precisando
recasar em seu próprio casamento, rever suas posições e reencontrar o
encanto que viam no outro, nos primeiros tempos?
Será que são realmente sérias as razões que os estão levando a
distanciar-se ou está havendo uma falha de comunicação? Comunicação de
corpo, de alma e de palavras?
Já pensaram em fazer uma boa revisão de sua vida e encontrar o ponto
em que as coisas deixaram de ser boas e vocês passaram a se atacar para
defender-se?
Tentem fazer isso.
Eu sei que tudo isso é triste para vocês. É duro ver tantos castelos
desmoronando. Agora, imaginem com deve ser isso para seus filhos. Eles
os amam. Curioso, não? O tempo também passa para eles e, no entanto,
eles os amam cada vez mais. Por que será? Não será porque vocês são
amorosos, amáveis, compreensivos e cuidadosos com eles? Pensem nisso.
Vocês têm achado que seus filhos estão meio nervosos, irritados,
tristes, indo mal na escola, brigando com os irmãos ou com os amigos?
Antes de procurar tratamento para eles, perguntem a si mesmos se não
estará em vocês o problema.
Numa casa, as emoções correm como uma faísca elétrica, que vai
tomando conta de todo o ambiente. Se as pessoas forem calmas, estiverem
satisfeitas, e se derem bem, toda a casa tenderá a ser mais tranquila, e
mesmo que haja problemas – que casa não tem problemas? – eles serão
resolvidos também de forma mais serena, um a um, sem se transformarem
em tragédias. Serão apenas problemas e problemas existem para serem
solucionados. Se as pessoas, por outro lado, forem nervosas, irritadas,
briguentas, impacientes e grosseiras, umas com as outras, a casa toda irá
entrar nessa sintonia.
Como vocês, pais, são o eixo da família, sua boa ou má disposição terá
um efeito muito maior do que o das demais pessoas sobre a disposição de
todos, na casa.
Podem prestar atenção e verão como mesmo seu filho mais nervoso
ficará mais calmo, se vocês forem pessoas moderadas e amorosas, e mesmo
seu filho mais tranquilo ficará com o humor instável, se vocês estiverem
sempre se desentendendo.
Nem tudo na vida nós conseguimos resolver sozinhos. Assim, não
tenham preconceitos. O fato de vocês terem tentado conversar e não terem
chegado a nada, ou até visto a situação piorar, não significa que vocês não
tenham jeito. Insistam. Procurem uma terapia de casal, para procurar
descobrir o que os levou a tamanha mudança, na relação, e o que os estará
levando à destruição do casamento.
Pode ser que tudo se resolva e vocês reencontrem o prazer de amar e
de viver numa casa em que há bem-estar. Mas pode ser, também, que vocês
descubram que a separação, em seu caso, é a solução mais saudável.
Nesse último caso, procurem, também, por ajuda, pois isso os
beneficiará e a seus filhos.
Há muita gente querendo ajudá-los. Vocês nem imaginam a quantidade
de pessoas, no mundo todo, que se dedicam a estudar formas de fazer as
famílias saírem ilesas de uma separação.
Há muitos profissionais, de diferentes áreas de atividade, que estão
preocupados em se aprimorar para ajudar casais, como vocês.
Antes de entrar na Justiça, vocês poderão contar com a ajuda de
terapeutas familiares, se quiserem fazer uma terapia para prepará-los e a
seus filhos, para a separação; se se sentirem razoavelmente prontos para
separar-se e precisarem de um profissional que os ajude a decidir sobre os
detalhes da separação, levando em consideração seus sentimentos e
emoções, procurem um mediador familiar. Atualmente, a maior parte dos
mediadores familiares advém ou da Terapia de Família ou do Direito de
Família, como formações básicas, por serem profissionais que antes da
capacitação em Mediação, já se ocupavam das questões da separação.
Mediadores com outra formação profissional, no entanto, desde que
experientes na mediação familiar, poderão ser-lhes igualmente úteis.
Ao chegar o momento de formalizar a separação, porque vocês só
poderão fazê-la no Fórum, procurem advogados especialistas em Família,
cuja referência seja não apenas sobre a competência, mas também sobre os
traços de personalidade, pois uma pessoa moderada e branda, nas
relações, pode lhes transmitir mais serenidade para os difíceis passos que
terão que dar, do que uma mais voltada ao trato adversarial.
Lembrem-se: vocês, mais que ninguém, conhecem sua vida e sabem
que apesar de se encontrarem nessa difícil esquina da vida, deixaram muita
coisa boa construída no caminho, o que vale a pena preservar. Vocês não
estarão no Fórum para brigar. Pelo contrário, parece que vocês só
optaram por essa solução extrema de separar-se, justamente para evitar
que os desentendimentos e o desgaste emocional continuassem.
Lembrem-se de outra coisa: seus filhos dependem de vocês e
continuarão a depender até que se tornem independentes. E, ainda assim, a
interdependência afetiva não se extinguirá, de modo que é melhor preservá-
la, prevenindo qualquer arranhão nas relações. Então, procurem uma
forma harmoniosa de organizar sua nova vida, encontrando formas de
criá-los, de educá-los e de cuidar deles, que os levem a sentir que, apesar
de ter os pais separados, ambos estão preocupados com seu bem-estar
físico, psíquico e social e que se entendem a seu respeito. Seus filhos vão
ser filhos de separados, mas não precisam ser filhos de inimigos figadais.
Um mal-estar entre vocês, como pais, vai se refletir em seus filhos.
Pode ser que para magoar um ao outro, vocês acabem por magoar seus
filhos e, até, por afastar-se deles ou levar o outro a fazê-lo. Quem está se
separando são vocês, lembram? Seus filhos não pediram para separar-se
de ninguém. Além disso, vocês já ouviram falar em ex-filhos, ex-pai ou ex-
mãe? Não, não é? Claro, porque isso não existe. O que seus filhos esperam
e precisam é que vocês se lembrem de quem e de como já foram e que
passem boas mensagens sobre um e outro para eles. Hoje, eles se sentirão
melhor, e no futuro, já adultos, os admirarão e amarão mais, pela
compreensão de que vocês podem ter sofrido, mas os pouparam de ter que
ouvir alguém falar mal de seu pai ou de sua mãe.
Lembrem-se, nunca é demais: Há muita gente querendo ajudar vocês e
sua família. Os advogados, os psicólogos, os assistentes sociais, os
promotores e os juízes querem o melhor para vocês. Todos estão envolvidos
em seu bem-estar e empenhados em que sua família saia dessa crise, o
menos machucada possível. Ninguém tem interesse em aumentar seu
sofrimento, pelo contrário, mas eles também dependem de que vocês – pela
vontade de acertar e de fazer o melhor numa situação que não é nem boa
nem fácil – os ajudem a ajudá-los.
Lembrem-se: ganhar, numa ação de separação, só significa ganhar
sofrimento, dissabor, rugas e decepção. Palavras proferidas, e escritas, em
momentos de forte emoção, nem sempre são reconhecidas, tempos depois,
com a mesma coloração e intensidade mas, independentemente disso, são
irrecuperáveis.
Bem, Pais, eu só lhes contei essas coisas, para a hipótese de vocês
terem se decidido por uma separação, enquanto casal. Se, todavia, ainda
não estiverem convencidos de ser essa a melhor solução para seus
problemas, continuem lutando. Quem sabe, vocês ainda não se verão
dizendo um ao outro “que bonita você está” ou “como está bom seu
cabelo. Você foi ao barbeiro?”
Essas coisas acontecem sim, não é fala romântica.
De qualquer modo, se ainda houver alguma dúvida dentro de vocês,
percam mais um tempinho e leiam a primeira parte desta carta, de novo.
Felicidades!
8.4 FECHO
1 Largo do Arouche – logradouro público paulistano, célebre por suas bancas de flores.
BIBLIOGRAFIA
CAPÍTULO I
Disposições Gerais
Art. 1.º Esta lei institui e disciplina a mediação paraprocessual nos
conflitos de natureza civil.
Art. 2.º Para fins desta Lei, mediação é a atividade técnica exercida por
terceiro imparcial que, escolhido ou aceito pelas partes interessadas, as
escuta, orienta e estimula, sem apresentar soluções, com o propósito de lhes
permitir a prevenção ou solução de conflitos de modo consensual.
Art. 3.º A mediação paraprocessual será prévia ou incidental, em
relação ao momento de sua instauração, e judicial ou extrajudicial,
conforme a qualidade dos mediadores.
Art. 4.º É lícita a mediação em toda matéria que admita conciliação,
reconciliação, transação ou acordo de outra ordem.
Art. 5.º A mediação poderá versar sobre todo o conflito ou parte dele.
Art. 6.º A mediação será sigilosa, salvo estipulação expressa em
contrário pelas partes, observando-se, em qualquer hipótese, o disposto nos
arts. 13 e 14.
Art. 7.º O acordo resultante da mediação se denominará termo de
mediação e deverá ser subscrito pelo mediador, judicial ou extrajudicial,
pelas partes e advogados, constituindo-se titulo executivo extrajudicial.
Parágrafo único. A mediação prévia, desde que requerida, será reduzida
a termo e homologada por sentença, independentemente de processo.
Art. 8.º A pedido de qualquer um dos interessados, o termo de
mediação obtido na mediação prévia ou incidental, poderá ser homologado
pelo juiz, caso em que terá eficácia de título executivo judicial.
CAPÍTULO II
Dos Mediadores
Art. 9.º Pode ser mediador qualquer pessoa capaz, de conduta ilibada e
com formação técnica ou experiência prática adequada à natureza do
conflito, nos termos desta Lei.
Art. 10. Os mediadores serão judiciais ou extrajudiciais.
Art. 11. São mediadores judiciais os advogados com pelo menos três
anos de efetivo exercício de atividades jurídicas, capacitados, selecionados
e inscritos no Registro de Mediadores, na forma desta Lei.
Art. 12. São mediadores extrajudiciais aqueles independentes,
selecionados e inscritos no respectivo Registro de Mediadores, na forma
desta Lei.
Art. 13. Na mediação paraprocessual, os mediadores judiciais ou
extrajudiciais e os comediadores são considerados auxiliares da justiça, e,
quando no exercício de suas funções, e em razão delas, são equiparados aos
funcionários públicos, para os efeitos da lei penal.
Art. 14. No desempenho de suas funções, o mediador deverá proceder
com imparcialidade, independência, aptidão, diligência e confidencialidade,
salvo, no último caso, por expressa convenção das partes.
Art. 15. Caberá, em conjunto, à Ordem dos Advogados do Brasil, aos
Tribunais de Justiça dos Estados e às pessoas jurídicas especializadas em
mediação, nos termos de seu estatuto social, desde que, no último caso,
devidamente autorizadas pelo Tribunal de Justiça do Estado em que estejam
localizadas, a formação e seleção de mediadores, para o que serão
implantados cursos apropriados, fixando-se os critérios de aprovação, com a
publicação do regulamento respectivo.
Art. 16. É lícita a comediação quando, pela natureza ou pela
complexidade do conflito, for recomendável a atuação conjunta do
mediador com outro profissional especializado na área do conhecimento
subjacente ao litígio.
§ 1.º A comediação será obrigatória nas controvérsias submetidas à
mediação que versem sobre o estado da pessoa e Direito de Família,
devendo dela necessariamente participar psiquiatra, psicólogo ou assistente
social.
§ 2.º A comediação, quando não for obrigatória, poderá ser requerida
por qualquer dos interessados ou pelo mediador.
CAPÍTULO III
Do registro de mediadores e da fiscalização e controle
da atividade de mediação
Art. 17. O Tribunal de Justiça local manterá Registro de Mediadores,
contendo relação atualizada de todos os mediadores habilitados a atuar
prévia ou incidentalmente no âmbito do Estado.
§ 1.º Os Tribunais de Justiça expedirão normas regulamentando o
processo de inscrição no Registro de Mediadores.
§ 2.º A inscrição no Registro de Mediadores será requerida ao Tribunal
de Justiça local, na forma das normas expedidas para este fim, pelos que
tiverem cumprido satisfatoriamente os requisitos do art. 15 desta Lei.
§ 3.º Do registro de mediadores constarão todos os dados relevantes
referentes à atuação do mediador, segundo os critérios fixados pelo Tribunal
de Justiça local.
§ 4.º Os dados colhidos na forma do parágrafo anterior serão
classificados sistematicamente pelo Tribunal de Justiça, que os publicará
anualmente para fins estatísticos.
Art. 18. Na mediação extrajudicial, a fiscalização das atividades dos
mediadores e comediadores competirá sempre ao Tribunal de Justiça do
Estado, na forma das normas específicas expedidas para este fim.
Art. 19. Na mediação judicial, a fiscalização e controle da atuação do
mediador será feita pela Ordem dos Advogados do Brasil, por intermédio
de suas seccionais; a atuação do comediador será fiscalizada e controlada
pelo Tribunal de Justiça.
Art. 20. Se a mediação for incidental, a fiscalização também caberá ao
juiz da causa, que, verificando a atuação inadequada do mediador ou do
comediador, poderá afastá-lo de suas atividades relacionadas ao processo, e,
em caso de urgência, tomar depoimentos e colher provas, dando notícia,
conforme o caso, a Ordem dos Advogados do Brasil ou ao Tribunal de
Justiça, para as medidas cabíveis.
Art. 21. Aplicam-se aos mediadores e comediadores os impedimentos
previstos nos artigos 134 e 135 do Código de Processo Civil.
§ 1º No caso de impedimento, o mediador devolverá os autos ao
distribuidor, que designará novo mediador; se a causa de impedimento for
apurada quando já iniciado o procedimento de mediação, o mediador
interromperá sua atividade, lavrando termo com o relatório do ocorrido e
solicitará designação de novo mediador ou comediador.
§ 2º O referido relatório conterá:
a) nomes e dados pessoais das partes envolvidas;
b) indicação da causa de impedimento ou suspeição;
c) razões e provas existentes pertinentes do impedimento ou suspeição.
Art. 22. No caso de impossibilidade temporária do exercício da função,
o mediador informará o fato ao Tribunal de Justiça, para que, durante o
período em que subsistir a impossibilidade, não lhe sejam feitas novas
distribuições.
Art. 23. O mediador fica absolutamente impedido de prestar serviços
profissionais a qualquer das partes, em matéria correlata à mediação; o
impedimento terá o prazo de dois anos, contados do término da mediação,
quando se tratar de outras matérias.
Art. 24. Considera-se conduta inadequada do mediador ou do
comediador a sugestão ou recomendação acerca do mérito ou quanto aos
termos da resolução do conflito, assessoramento, inclusive legal, ou
aconselhamento, bem como qualquer forma explícita ou implícita de
coerção para a obtenção de acordo.
Art. 25. Será excluído do Registro de Mediadores aquele que:
I – assim o solicitar ao Tribunal de Justiça, independentemente de
justificação;
II – agir com dolo ou culpa na condução da mediação sob sua
responsabilidade;
III – violar os princípios de confidencialidade e imparcialidade;
IV – funcionar em procedimento de mediação mesmo sendo impedido
ou sob suspeição;
V – sofrer, em procedimento administrativo realizado pela Ordem dos
Advogados do Brasil, pena de exclusão do Registro de Mediadores;
VI – for condenado, em sentença criminal transitada em julgado.
§ 1.º Os Tribunais de Justiça dos Estados, em cooperação, consolidarão
mensalmente relação nacional dos excluídos do Registro de Mediadores.
§ 2.º Salvo no caso do inciso I, aquele que for excluído do Registro de
Mediadores não poderá, em hipótese alguma, solicitar nova inscrição em
qualquer parte do território nacional ou atuar como comediador.
Art. 26. O processo administrativo para averiguação de conduta
inadequada do mediador poderá ser iniciado de ofício ou mediante
representação e obedecerá ao procedimento estabelecido pelo Tribunal de
Justiça local.
Art. 27. O processo administrativo conduzido pela Ordem dos
Advogados do Brasil obedecerá ao procedimento previsto no Título III da
Lei n.º 8.906, de 1994, podendo ser aplicada desde a pena de advertência
até a exclusão do Registro de Mediadores.
Parágrafo único. O processo administrativo a que se refere o caput será
concluído em, no máximo, noventa dias, e suas conclusões enviadas ao
Tribunal de Justiça para anotação no registro do mediador ou seu
cancelamento, conforme o caso.
Art. 28. O comediador afastado de suas atividades nos termos do art.
19, desde que sua conduta inadequada seja comprovada em regular
procedimento administrativo, fica impedido de atuar em novas mediações
pelo prazo de dois anos.
CAPÍTULO IV
Da Mediação Prévia
Art. 29. A mediação prévia pode ser judicial ou extrajudicial.
Parágrafo único. O requerimento de mediação prévia interrompe a
prescrição e deverá ser concluído no prazo máximo de 90 dias.
Art. 30. O interessado poderá optar pela mediação prévia judicial.
Neste caso, o requerimento adotará formulário padronizado, subscrito por
ele ou por seu advogado, sendo, neste caso, indispensável à juntada do
instrumento de mandato.
§ 1.º Distribuído ao mediador, o requerimento ser-lhe-á encaminhado
imediatamente.
§ 2.º Recebido o requerimento, o mediador designará dia, hora e local
onde realizará a sessão de mediação, dando ciência aos interessados por
qualquer meio eficaz e idôneo de comunicação.
§ 3.º A cientificação ao requerido conterá a recomendação de que
deverá comparecer à sessão
acompanhado de advogado, quando a presença deste for indispensável.
Neste caso, não tendo o requerido constituído advogado, o mediador
solicitará à Defensoria Pública ou, na falta desta, à Ordem dos Advogados
do Brasil a designação de advogado dativo. Na impossibilidade de pronto
atendimento à solicitação, o mediador imediatamente remarcará a sessão,
deixando
os interessados já cientificados da nova data e da indispensabilidade
dos advogados.
§ 4.º Os interessados, de comum acordo, poderão escolher outro
mediador, judicial ou extrajudicial.
§ 5.º Não sendo encontrado o requerido, ou não comparecendo
qualquer das partes, estará frustrada a mediação.
Art. 31. Obtido ou não o acordo, o mediador lavrará o termo de
mediação, descrevendo detalhadamente todas as cláusulas do mesmo ou
consignando a sua impossibilidade.
Parágrafo único. O mediador devolverá o requerimento ao distribuidor,
acompanhado do termo de mediação, para as devidas anotações.
Art. 32. A mediação prévia extrajudicial, a critério dos interessados,
ficará a cargo de mediador independente ou daquele ligado à instituição
especializada em mediação.
Art. 33. Em razão da natureza e complexidade do conflito, o mediador
judicial ou extrajudicial, a seu critério ou a pedido de qualquer das partes,
prestará seus serviços em regime de comediação com profissional
especializado em outra área que guarde afinidade com a natureza do
conflito.
CAPÍTULO V
Da Mediação Incidental
Art. 34. A mediação incidental será obrigatória no processo de
conhecimento, salvo nos seguintes casos:
I – na ação de interdição;
II – quando for autora ou ré pessoa de direito público e a controvérsia
versar sobre direitos indisponíveis;
III – na falência, na recuperação judicial e na insolvência civil;
IV – no inventário e no arrolamento;
V – nas ações de imissão de posse, reivindicatória e de usucapião de
bem imóvel;
VI – na ação de retificação de registro público;
VII – quando o autor optar pelo procedimento do juizado especial ou
pela arbitragem;
VIII – na ação cautelar;
IX – quando na mediação prévia, realizada na forma da seção anterior,
tiver ocorrido sem acordo nos cento e oitenta dias anteriores ao ajuizamento
da ação.
Parágrafo único. A mediação deverá ser realizada no prazo máximo de
90 dias e, não sendo alcançado o acordo, dar-se-á continuidade ao processo.
Art. 35. Nos casos de mediação incidental, a distribuição da petição
inicial ao juízo interrompe a prescrição, induz litispendência e produz os
demais efeitos previstos no art. 263 do Código de Processo Civil.
§ 1.º Havendo pedido de liminar, a mediação terá curso após a
respectiva decisão.
§ 2.º A interposição de recurso contra a decisão liminar não prejudica o
processo de mediação.
Art. 36. A designação inicial será de um mediador, judicial ou
extrajudicial, a quem será remetida cópia dos autos do processo judicial.
Parágrafo único. As partes, de comum acordo, poderão escolher outro
mediador, judicial ou extrajudicial.
Art. 37. Cabe ao mediador intimar as partes por qualquer meio eficaz e
idôneo de comunicação, designando dia, hora e local para seu
comparecimento.
§ 1.º A intimação deverá conter a recomendação de que as partes
deverão se fazer acompanhar de advogados, quando indispensável à
assistência judiciária.
§ 2.º Se o requerido não tiver sido citado no processo judicial, a
intimação para a sessão de medição constituí-lo-á em mora, tornando
prevento o juízo, induzindo litispendência, fazendo litigiosa a coisa e
interrompendo a prescrição.
§ 3.º Se qualquer das partes não tiver advogado constituído nos autos
do processo judicial, o mediador procederá de acordo com o disposto na
parte final do § 3.º do art. 30.
§ 4.º Não sendo encontrado o requerido, ou não comparecendo
qualquer das partes, estará frustrada a mediação.
Art. 38. Na hipótese de mediação incidental, ainda que haja pedido de
liminar, a antecipação das despesas do processo, a que alude o art. 19 do
Código de Processo Civil, somente será devida após a retomada do curso do
processo, se a mediação não tiver resultado em acordo ou conciliação.
Parágrafo único. O valor pago a títulos de honorários do mediador, na
forma do art. 19 do Código de Processo Civil, será abatido das despesas do
processo.
Art. 39. Obtido ou frustrado o acordo, o mediador lavrará o termo de
mediação descrevendo detalhadamente todas as cláusulas do acordo ou
consignando sua impossibilidade.
§ 1.º O mediador devolverá a petição inicial ao juiz da causa
acompanhada do termo, para que seja dado prosseguimento ao processo.
§ 2.º Ao receber a petição inicial acompanhada do termo de transação,
o juiz determinará seu imediato arquivamento ou, frustrada a transação
providenciará a retomada do processo judicial.
Art. 40. Havendo acordo, o juiz da causa, após verificar preenchimento
das formalidades legais, homologará o acordo por sentença.
Parágrafo único. Se o acordo for obtido quando o processo judicial
estiver em grau de recurso, a homologação do mesmo caberá ao relator.
CAPÍTULO VI
Disposições Finais
Art. 41. A mediação será sempre realizada em local de fácil acesso,
com estrutura suficiente para atendimento condigno dos interessados,
disponibilizado por entidade pública ou particular para o desenvolvimento
das atividades de que trata esta Lei.
Parágrafo único. O Tribunal de Justiça local fixará as condições
mínimas a que se refere este artigo.
Art. 42. Os serviços do mediador serão sempre remunerados, nos
termos e segundo os critérios fixados pela norma local.
§ 1.º Nas hipóteses em que for concedido o benefício da assistência
judiciária, estará a parte dispensada do recolhimento dos honorários,
correndo as despesas às expensas de dotação orçamentária do respectivo
Tribunal de Justiça.
Art. 43. O art. 331 e parágrafos da Lei nº 5.869, de 1973, Código de
Processo Civil, passam a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 982.........................................................
§ 1.º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as
partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou
advogados de cada uma delas ou por defensor público, cuja
qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
§ 2.º A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que
se declararem pobres sob as penas da lei”. (NR)
“Art. 1.124-A. ..................................................
.........................................................................................
§ 2.º O tabelião somente lavrará a escritura se os contratantes
estiverem assistidos por advogado comum ou advogados de cada um
deles ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura
constarão do ato notarial.
.............................................................................”. (NR)
Art. 2.º Esta Lei entra em vigor após decorridos 60 (sessenta) dias de
sua publicação.
Art. 2.º O art. 1.031 da Lei n.º 5.869, de 1973 – Código de Processo
Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1.031. A partilha amigável, celebrada entre partes capazes, nos
termos do art. 2.015 da Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002 –
Código Civil, será homologada de plano pelo juiz, mediante a prova
da quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas
rendas, com observância dos arts. 1.032 a 1.035 desta Lei.
.........................................................................”. (NR)
Art. 3.º A Lei n.º 5.869, de 1973 – Código de Processo Civil, passa a
vigorar acrescida do seguinte art. 1.124-A: