Você está na página 1de 114

A história do rei Arthur vivida num mundo paralelo cheias de aventuras.

Personagens inesquecíveis que irão compor este fantástico universo


arturiano.
INÍCIO

O mundo que habitamos foi tirado dos sonhos do Tempo, portanto surgiu
de forma inspiradora, esculpidas pelos quatro ventos e desenhadas nas
correntezas das águas.
No momento em que o Tempo saiu de seu sono profundo todo mundo
imaginário começara a morrer, pois, nascera a matéria, é esta
acompanhada de consciência tornara-se mortal, a consumir os dias,
segundo, a cada despedida do poente. Surgia a partir dai, à noite, a senhora
que dentro das masmorras tecia as vestes do Tempo com fios cor de prata
vindo dos horizontes.
A cada noite o Tempo ia se deitar sobre as paredes de pedras dos castelos
imaginários, e os temores noturnos davam vida às sombras, que das tramas
tecidas pela noite despertaram a história dum rei e seus cavaleiros.

A História Do Tempo

Muito distante dos mundos, existia um tempo em que o próprio tempo não
existia.
Lá entre os pilares de Hércules, havia um casulo envolto em muita luz, e
dentro dele o Tempo dormia.
O universo vivia na total escuridão, a vastidão do vazio cheio de solidão.
O pensamento olhava tudo aquilo sem nunca ter sentido desejo de saber o
que era a vida, até que um dia a olhar um pequeno ponto de luz azulada a
pulsar dos confins do firmamento, resolveu ir ao seu encontro. Aproximou-
se lentamente, e pode então observar melhor do que aquilo era feita. Uma
trama de fios de prata tecido por mãos desconhecidas, sim, porque até no
universo existem mistérios que nada jamais será desvendado.
O pensamento viu um casulo gigantesco, capaz de preencher todos os
espaços vazios que ele ainda não havia passado, mas como abri-lo, se
desconhecia mãos que pudessem ajudá-lo.
Soube então da existência de uma grande estrela de diamante, e ao
transformá-la em viajante errante, fez com que cortasse os céus, e passar
de raspão rasgando as tramas prateadas do casulo. Ao ser abrir sentiu que
de lá saíra algo invisível, mas que mudaria tudo daqui pra frente, pois o era
o Tempo.

O tempo percorreu os espaços do pensamento dando vida à consciência, é


esta por sua vez, mostrará os verdes campos nas primaveras. A luz das
manhas envolvera as montanhas que seus contornos eram feitos da mesma
luz em que fios de prata embalaram o Tempo.
E por assim foi ao longo os tempos, a viajar entre águas cristalinas, dentes
de leões semeando os campos.
As rochas guardavam a memória do tempo, que por um momento revelou
numa noite de paixão, o fogo expressava seus sentimentos nas lavas dos
vulcões.
Sobre seu manto ardente e líquido, a cair nas águas do mar, e desse
encontro do fogo com a água, fecundara as brumas, que um dia envolveria
os castelos; moradia do Tempo, onde desenvolveriam as tramas, os
dramas e as paixões.
Nas suas paredes talhadas pelos ventos abrigavam o Tempo, e este a
contar as histórias. As tochas desenhavam nas sombras, o destino da vida.
Uma dessas histórias se deu num tempo distante. Foram contadas por um
peregrino.

Foi numa noite de eclipse lunar que a história de um jovem rei de nome
Artur foi contada. Ele caminhava só em uma estrada de seixos
avermelhados, e ao longo de sua jornada parou para descansar sobre a
sombra de um carvalho milenar. Lá permanecera até adormecer.
O Tempo que se apossara do velho carvalho, posse a contar-lhe histórias
que ninguém ouvira falar. Por serem muito velhas suas raízes
aprofundaram-se nas entranhas das pedras. Em suas memórias guardara
os contos proibidos, revelando assim o que de misterioso havia num
espelho negro. O Tempo começou a contar histórias de estranhos mundos
escritos nas areias, que se apagaram pelas ondas, mas não esquecidas dos
olhos da noite.
Arthur sonhava com um céu mesclado de azul e verde das folhas do velho
carvalho, de onde surgira um poço aberto no céu. As folhar escureceu o
poço, e este se abriu, tomando forma dum lago de águas negras de
superfície bem lisa e polida, onde os reflexos se fundiam com o céu numa
noite estrelada. Dos ramos do carvalho, desenhavam formas curvas até
chegar a uma aparência do lago a flutuar sobre a cabeça de Arthur.
—O que é isto diante de meus olhos? Disse Arthur. -Ha pouco descansava
sobre este velho carvalho, e agora vejo um oceano de águas negras em cima
de minha cabeça! Existe outro mundo sobre minha cabeça! O que é isso?
Sentia-se atônito diante deste estanho universo surgido no céu, que há
pouco tempo, era só o azul, o branco das nuvens e o verde das folhas a
embalar seus pensamentos e devaneios acariciados pela brisa.
Sobre a superfície do espelho, teve um sentimento que só as noites de
escuridão trazem. Sentia-se esquecido, e as raízes daquela velha árvore que
servira de leito, agora lhe dava uma sensação angustiante, sem poder se
mover, apenas olhar e esperar o que viria.
O tempo foi passando e nada se movia sobre a superfície congelada na
presença da escuridão do espelho, mas quanto tudo parecia nada mudar,
num mergulho inverso, Arthur fora lançado dentro do universo da
escuridão.
Por mais estranho que sentia alguns segundos atrás, neste momento,
parecia que o mundo havia lhe tirado o chão, e de fato isto estava
acontecendo.
Arthur caíra do mastro para o centro do convés do navio, que por sorte
sofrera pequenas escoriações. As velas o amorteceram de uma queda mais
brusca, porém enquanto caia segurou instintivamente numa bandeira
negra, levando consigo ela até o convés.
Com certeza aquela não fora uma boa forma de se apresentar diante de
piratas, dos quais conhecemos muito bem suas reputações nada amigáveis.
Cercados por uma parte da tripulação, o silêncio e os olhares fixos e
penetrantes, sob uma noite pouco amigável. Neste momento ninguém sabia
o que fazer, mas foi quando que de dentro do convés, uma pequena porta se
abriu, e de lá uma voz rouca, mas cheia de energia quebrou o silêncio.
-O que está acontecendo, não posso mais beber meu rum em paz!
A voz era do lendário Cortez, procurado por diversos reinos de países dos
quais mantinham comércio além dos mares. Ele tinha ouro em todos os
dentes que reluziam pela luz do lampião. Suas sobrancelhas eram negras e
tenebrosas. Será que daria uma chance para Arthur?
—Olha o que fez com nossa bandeira! Você a arrancou do mastro principal.
Tem muita coragem, meu jovem, mas creio que não dá muito valor a vida!
Arthur pensou logo em um motivo tal situação, e disse:
—Na verdade, estava escondido nos porões do navio, mas fui para o
convés, e procurei chegar ao ponto mais alto e tentar avistar um navio
mercante, sabe, sempre quis ser um pirata, e quanto à bandeira, foi um
acidente, escorreguei com o balançar do navio, ela tampou meu rosto e ao
cair agarrei na primeira coisa que havia.
Cortez fitou o rapaz não acreditando muito, olhando seus trajes reais,
pensou em um bom resgate. Dava pra se ver nitidamente seus olhos
brilharem com sádicas ideias para a diversão de sua tripulação, e falou:
—Se deseja mesmo ser um pirata, terá de mostrar sua bravura. Se sair vivo,
então terá a oportunidade de se tornar um pirata.
—Essas coisas de bravura, não é bem uma qualidade de piratas, meu
capitão! Exclamou um de seus homens.
—Tem toda razão, marujo. Então que tal mostrar sua habilidade em
sobreviver? Afinal não queremos uma tripulação de maricas!
Naquele momento não tinha escolha, mas qualquer coisa seria melhor do
que ser atirado ao mar, sem que antes tivesse uma chance de lutar por sua
vida.
Amarraram Arthur com uma corda na cintura, e o puseram sobre a
prancha. Ali lhe parecia ser o último mergulho. Sentia que não estava na
hora de sua morte. Queria aprender muito sobre os mistérios da vida, sobre
os porquês dos marinheiros partirem para o desconhecido, sem a certeza
da volta. Queria saber bem qual a razão que os levavam para o mar. Quem
sabe por que deixavam suas vidas ordinárias. O que ele tanto procurava o
porquê de sua existência, agora, com certeza, saberia, ou simplesmente,
morreria sem saber.
O capitão Cortez então disse ao Arthur:
—Se é valente, mas não suficientemente tolo, toma este gancho preso à
outra corda, quem sabe talvez o salve dos dentes do tubarão. Se conseguir
fisgá-lo, será um de nós.
Arthur saltaria para enfrentar o desconhecido, com uma sensação de que a
partir daquela hora deixaria de ser um simples garoto.
Pelos movimentos das águas percebeu por sorte que não estava em alto-
mar. O navio pirata estava perto da costa, até achou que nada de grave
aconteceria naquelas águas, mas mal sabia que por ali a região era famosa
por avistarem tubarões devoradores de marinheiros.
Por enquanto ainda sentia seus pés sobre da prancha, e segurou
firmemente em sua mão o gancho; um passaporte para sua sobrevivência.
Foi empurrado fortemente por um dos marujos, e ao mergulhar, moveu os
braços e pernas freneticamente para não afundar ainda mais como o peso
do gancho. Sentiu um ligeiro deslocamento das águas sob suas pernas, e foi
nesse momento que levou o gancho bem pra debaixo das pernas,
esperando o momento certo. O tubarão abriu sua enorme boca, e por uma
fração de segundos, quando os dentes do tubarão roçaram o gancho, Arthur
bravamente empurrou o objeto com toda sua energia pra dentro daquelas
mandíbulas mortais, fisgando a fera marinha. Preso ao gancho a luta do
tubarão daí por diante seria com a tripulação.
—Podem puxar, gritou Arthur.

Algumas décadas se passaram, desde quando o jovem Arthur fisgara o


tubarão.
Havia um castelo, ao olhar em direção as altas encostas, por aonde a luz da
manha ia pouco a pouco revelando o verde da relva. As ilhas de rochas
erguiam-se para os céus. O sol com seus primeiros raios levava o frescor da
brisa da manha, junto com a neblina para o mar, realçando detalhes neste
tapete de cor verde-esmeralda com os minúsculos pontinhos coloridos de
flores silvestres. Havia um perfume suave que subia até o ponto mais alto
na torre do castelo.
Lá de dentro o rei Arthur observava o mar, a fazer isto todas as manhas.
Era como se conversasse com ele. Rascunhava rotas imaginarias que o
levaria para além-mar.
Cedo ou tarde enfrentaria o seu maior inimigo: o desconhecido. Penetrar
nos mistérios de outros mares, outras estrelas a se guiar, ventos e monstros
marinhos, além é claro dos piratas, que naqueles tempos infestavam os
oceanos, tanto quanto os tubarões, e as lulas gigantes.
Atravessar os limites do reino era incerto o retorno, e muitas vezes
voltavam com baixas, deixando aflitas as mulheres que ficavam a esperar
seus maridos, onde o fantasma da viúves era constante no dia a dia desse
reino. Povos de outros reinos limítrofes sofriam escassez de alimentos, o
inverno havia sido rigoroso, povos de outras culturas, línguas diferentes, e
lugares distantes, invadiam aldeias, desprovidos de sentimentos e
misericórdia, apenas com a fome voraz de um lobo acompanhado pela
matinha de saqueadores, pra saciar seus desejos primários de saborear o
sofrimento e o desespero. A pilhagem virara rotina, nada mais havia de
riquezas nos reinos vizinhos, apenas fome, doenças e sofrimento.
Das janelas do castelo a natureza ficava alheia a tudo, desde os jardins, os
vales, as montanhas. O olhar de um rei que sabe que tudo aquilo, logo
poderia definhar se nada fosse feito, e o único caminho era o mar.
Recolheu todos os mapas e rotas esboçadas por ele, em que passara noites
estudando sob a companhia de uma luz de vela, que aos poucos ia se
consumindo, deixando rastros das horas derretidas sobre a mesa. Junto aos
pensamentos, a busca de novas esperanças para resgatar a plenitude
perdida de seu reino.
Antes do dia clarear, Arthur desceu as escadas até o salão principal, e
ordenou que chamassem seus cavaleiros e súditos e se preparassem para
uma viajem ao desconhecido. Estava determinado em partir, pois
permanecer seria o fim do povo da vila e de seu reinado.
Os conselheiros logo recusaram aquela proposta afirmando que seria
arriscado deixar o castelo a mercê dos invasores, e que a insanidade
possuirá a mente do rei. Procurar novas terras significaria abandonar a
família, e expor o reino a todo tipo de perigo, e a incerteza do que viria pela
frente, e um retorno duvidoso.
O rei Arthur enfurecido com todos, disse: - não ha outra forma, este reino
deixara de existir em breve se medidas corajosas não forem tomadas.
Ninguém deste reino se tornou rei ao acaso. Ele se perdura por muito
tempo devido a atitudes corajosas dos ancestrais, porém, estes atos
deverão ser prudentes, e inteligentes, buscando o mínimo de erros a serem
cometidos quando o inesperado nos desafiar. Disse o rei inflando seu peito
e olhando duramente para seus conselheiros.

O Mapa

Enquanto o rei convencia seus súditos da viagem, há poucos dias, o Mago se


embrenhara na floresta como de costume em todo entardece nos dias mais
longos do ano. Colhia algumas ervas específicas para suas magias.
Procurava uma planta que lhe desse visões do futuro, pois sabendo das
intensões de Arthur de que logo deixaria o reino a mercê de inimigos,
dedicava-se com afinco em obter tal poção alquímica. Nesta fatídica tarde
permaneceu no campo por mais tempo de costume, e suas velhas costas
começaram a reclamar. Sobre a sombra de um salgueiro e um riacho bem a
sua frente, decidiu por ali descansar.
O barulho das águas a correr relaxava seu corpo, abaixou a cabeça, e
observou uma plantinha jamais vista antes através olhares minuciosos de
um alquimista. Tomou uma de suas folhar extraindo o sumo, levou
primeiramente ao seu nariz, para ter certeza de que não tinha substâncias
agressivas, e em seguida provando na ponta da língua, sentiu um gosto
agridoce, semelhante aos trevos, porém bem mais intenso.
Aquele sabor em vez de diluir-se na saliva, se intensificou, trazendo
memórias de algum lugar ainda não visitado, algum lugar no futuro. As
nuvens começaram a descer lentamente, e aonde chegava a quase tocar as
águas do riacho. O Mago entrava em outra dimensão, e linhas desenhadas
de vários tons de terra dançavam a sua frente. Visualizou um mapa nas
brancas nuvens, rico em detalhes, que certamente impressionariam
qualquer cartógrafo da época. Ali diante de seus olhos as nuvens se
transformaram em pergaminho, contendo o mapa de terras desconhecidas.
O Mago o recolheu o mapa que caíra das nuvens nas areias. As cores do
traçado tornaram-se vermelhas, as imagens possuíam movimentos. O Mago
vê um mundo prestes a desaparecer. Uma civilização inteira seria
chacoalhada pela Terra, e uma inundação lavaria em pouco tempo, o que se
foi erguido durante milênios.
Com o pergaminho em mãos, enrolou guardando em sua cintura, e logo
compararia com o de Arthur, e caso fossem semelhantes, o rei teria créditos
pelos membros da corte.
Na manhã seguinte procurou o rei que estava prestes a sair para caça, com
alguns dos cavaleiros.
—Meu senhor! Exclamou o Mago ao ver o rei montado em seu cavalo a
atravessar a ponte do castelo.
—Por que está com uma expressão aflita, Mago?
—O mapa meu senhor! O mapa! Temos que conferi-los.
Bom, foi o que Arthur fez, depois de voltar da caçada.

O rei fala aos conselheiros.

—Observem vocês, quando uma águia ataca uma perdiz, um pouco antes
e logo após a ação existe um silêncio mortal. Saibam que todo ser é avisado
pela natureza, quando chega sua hora, e ela executa seu ritual de morte,
embora muda e muitas vezes parecendo surda aos pedidos de misericórdia
presta uma homenagem a todas as vidas que já não pertençam mais a este
cenário.
—Ouça o silêncio que tem feito nestes dias, em breve os alimentos se
tornarão escassos, e ai o tempo tão precioso que possuímos para tomar
decisões terá ido, e o desespero tomará conta de nossas mentes, e atitudes
insanas então tomaremos.
—Fixando um olhar, em todos que estavam à volta do salão e disse:
—Eu, o rei o insano! Não, isso nunca, pelo menos enquanto puder decidir
nos momentos cruciais, decisões a tomar, e esta é a hora.
Naquela manhã, naquele salão do castelo, decisões eram tomadas, criando-
se uma atmosfera aterrorizadora, onde estavam em jogo muitas vidas. Um
momento único, e não só para os habitantes daquele reino, mas de toda
uma geração que viria, teria nesta fração do tempo a pesada mão da
decisão, e de uma coroa sobre a cabeça de um rei.
Depois daquela longa manhã de planos traçados, caiu à noite. As tochas
iluminavam as paredes de pedras, e dada à imaginação num universo
noturno e soturno a tecer as tramas das fantasias que habitam nas chamas
dos castiçais de prata. Criavam um mundo paralelo de sombras e destinos e
juntas com os ouvidos atentos ouviam histórias pertencentes à noite. Os
lares se esvaziariam em breve, e se tornariam sombrios, quando alguns de
seus habitantes partem, sem saber ao certo se iria tê-los novamente a
contar suas glórias vividas em outras terras.
Após a decisão tomada, o rei fora com a rainha para o leito real:
—Quando partir, e o navio não mais ser visto pelos meus olhos que te
seguem até a última onda subir e engolir a certeza tê-lo presente na luz da
manhã, e que irá se calar diante do vazio da solidão, estarei só dentro da
capela, e perto do ouvido do senhor implorando pelo seu retorno. Disse a
rainha em seu leito num tom tristonho ao rei que no tecido acima de seus
corpos, procurava visualizar rotas para essa viagem a cruzar mares
desconhecidos.
—Faça isso, disse o rei. Precisarei mais do que nunca de suas preces e o
reino de seus talentos e virtudes, para resistir firme, caso for preciso sem a
ajuda de alguns de nossos cavaleiros.
Muitas vezes a força bruta se torna frágil diante da perspicácia da mente
criativa, e de um braço que mal consegue levantar uma espada, para abater
seu inimigo.
—As armas invisíveis que possuímos são mais fortes do que se imagina.
A ouvir estas palavras do rei, a rainha dormiu em seus braços, enquanto ele
permanecia a olhar o vazio, e a traçar rotas imaginarias sobre a fraca
iluminação das chamas das velas que consumiam seus pensamentos, mas
logo veio o cansaço, e lhe restava poucas horas de sono que tinham pela
frente. Quando a última vela se apagou, e uma fina e fugaz fumaça sumiu no
quarto e ao findar, veio à luz da manhã.

A tripulação.

A caravela que partiria para o desconhecido com Arthur e seus cavaleiros,


estava na baia, ancorada a uma distância segura das pedras e dos bancos de
areias. A um bom tempo não havia tamanha movimenta de botas e
sandálias a encrespar a superfície dos finos grãos de areia, tão brancos que
pareciam neve. O vento, os pássaros e as conchas desenhavam texturas
padronizadas imitando o movimento das ondas. As pegadas solitárias da
rainha deixadas alguns minutos atrás, logo se apagariam. Respirava o
tranquilo ar da manha, e a apreciar a brevidade de uma paisagem bucólica.
Logo seria palco de um frenesi de vidas que partiriam e outras a esperar,
sabe se lá, por quanto tempo.
A tripulação era formada de alguns bravos cavaleiros dispostos a trocarem
seus cavalos e espadas por uma nau de um casco que flutuava sobre as
águas em vez de trotar sobre as pedras, e que junto ao rei decidiram partir
rumo ao desconhecido. Fariam isso pela primeira vez, enquanto outros
como alguns marujos mais experientes despediam-se das famílias.
Mantimentos eram levados por botes até o navio.
A embarcação flutuava suavemente ao balanço das águas numa manhã
crepuscular. O céu carregado de brancas nuvens, e o mar os levariam para
bem longe, habitado até então, por imaginários monstros marinhos.
O rei foi o último a subir no bote que o levaria a bordo do Corvo. Este nome
foi dado a Caravela devido a sua madeira escura. Teve muita polêmica
sobre este nome, mas tratava-se também de um pássaro tenaz e inteligente,
e assim ficou.
Dos doze cavaleiros fiéis ao rei, seis partiram, e mais oito marujos, o Mago,
o cartógrafo, além do rei, e dum velho conhecido de Arthur, que sempre
trazia notícias e especiarias de outras partes do mundo, experiente e audaz,
velhaco e controvertido capitão Malenca.
Ao erguerem as velas e recolher a pesada ancora lá do fundo, um vento
mais forte vindo em boa hora começou a direcioná-los para o alto-mar. O
Corvo, que se parecia mais como uma baleia, tinha o nome de um pássaro,
onde as velas eram suas asas a arrastar sobre as águas seu pesado corpo,
até não ser mais visto pelos olhares distante da praia, que a pouco fora
envolvido por um sentimento de vazio deixado ali entre as pedras e as
areias.
Caverna

O rei e capitão estavam a olhar para o mar, e cada um com pensamentos


distantes no convés do Corvo, já em alto-mar capitão Malenca com um olhar
de desconfiança, quebrou o silêncio:
—Ainda não acredito no que estamos fazendo, meu rei! Estou a me
perguntar o porquê desta navegação absurda. Só porque o Mago teve uma
alucinação com um mapa surgido do nada. Não acho que ele está ficando
senil?
—Certamente que não Malenca! Não deveria falar assim de um velho sábio.
Respondeu o rei um tanto chateado.
Confio nele, e depois ele guardou em detalhes na memória sobre esse novo
continente, e sem sua presença aqui não chegaríamos a lugar algum, com
certeza que não!
O rei continuou a falar: - Mais coisas aconteceram naquele dia quando
entravamos na floresta com os cavaleiros para a caça.
O capitão fitava atento a história que o rei começara a contar.
—Havia um silêncio mortal no interior daquela floresta, arriamos os
cavalos numa clareira antes de embrenharmos pela mata, apenas nossos
passos eram ouvidos ao quebrarem os gravetos e os fios secos dos velhos
pinheiros, nem as gralhas que costumavam ficar por ali apareceram,
pensamos até que inimigos nos espreitavam, e sentimo-nos como caça.
—Senhor! Exclamou Sir Adam um dos cavaleiros, empunhando sua espada
diante do estranho silêncio da mata.
—Presentes algo de ruim, Sir Adam?
—Não dá pra definir, mas parece que tem alguma coisa estranha dentro
daquela caverna onde os ursos costumam hibernar, checarei se assim o
senhor permitir.
—Vá bem devagar, enquanto outros de vocês se espalham ao redor, e
fiquem atentos aos flancos. Não queremos ser surpreendidos pelos
inimigos que podem estar tocaiados atrás de nós.
O rei e três dos cavaleiros entraram na caverna, enquanto os outros quatro
faziam a guarda do lado de fora, atentos a qualquer movimento.
A entrada da caverna era iluminada pelo Sol. Havia estranhas inscrições
nas paredes e gravuras de animais, pessoas, e objetos. Conforme andavam
na caverna uma escuridão envolveu de forma súbita, sem dar tempo de
acenderem as tocas. Algo estranho estava acontecendo, ouvia se a voz dos
cavaleiros do lado de fora.
Sem enxergar nada, o rei empunhou sua espada contra e escuridão, e gritou
ao que estavam do lado de fora.
—O que está acontecendo ai?
—Sir Breton responde. Parece que a noite nos tomou de surpresa. Não
podemos ver nada ao redor.
—Fiquem calmos, disse o rei. O mago comentou há pouco tempo que o Sol
seria ocultado pela Lua por um breve período, mas depois disso, algo muito
importante nos seria revelado.
Pouco a pouco a luz do dia voltava lá fora, mas dentro da caverna a
escuridão permanecia, e ao tentar voltar, depararam que na entrada da
caverna agora havia uma fina lâmina degelo negro bloqueando a entrada, e
não só a escuridão, mas um frio que passava das paredes aos pulmões.
—Sir Carlton pegou a espada para quebrar o gelo da entrada, mas quando o
rei notou o que ele faria, gritou:
—Não faça isso, talvez este seja um sinal vindo do senhor, vamos aguardar.
Foi dai que da fina película de gelo negra uma luz quase imperceptível
começou a traçar contornos de mapas de terras desconhecidas. De repente
o gelo se esfacelou em mil pedacinhos, e ao tocar o chão já não mais existia.
Naquele dia voltaram para o castelo sem caça, mas o rei tinha toda certeza
de que o Mago os levaria a glória dum reino justo a se perpetuar assim por
gerações de sábios e bravos reis e rainhas.
O capitão Malenca já havia passado por inúmeras situações incomuns, mas
como aquela, que o rei acabara de contar, certamente que não. Agora sabia
mais do que nunca que somente um rei e poucos escolhidos poderiam
experimentar tais situações.
O invisível tecia o destino de um rei em cumprir uma missão oculta diante
de olhares incrédulos dos humanos, mas transparente naquele que rege a
sinfonia do universo.
O Corvo continuara a navegar em águas conhecidas, mas à medida que de
distanciava da costa e antes da noite cair, seria envolto numa brisa a
cheirar maresia, e o sol a fechar a cortina de mais um dia distante dos
olhares e pensamentos saudosos de quem ficara parado no porto, diante de
um oceano sem sentimento, desprovido de alma humana, que roubava seus
amados, agora calados num lar vazio e numa noite longa e silenciosa.
A noite estava sendo generosa com os marujos de primeira viagem. Um céu
estrelado, nenhum sinal de tempestade, e no convés, alguns cavaleiros
contemplavam os astros. Tentavam de alguma forma colocar seus
pensamentos sobre as estrelas para que fossem entregues em seus lares, e
em sonhos a quem se destinasse, e pudessem lê-los.
O olhar atento do capitão Malenca sabia se orientar muito bem pelas
estrelas, mas daqui pra frente seguiria uma rota fornecida pelo Mago
conhecedor dos mapas estrelares, embora estivesse sempre com os pés na
terra, e a cabeça no firmamento. Estava em suas mãos a responsabilidade
de guiá-los em rotas precisas e seguras. Homens, inclusive o capitão
deveriam confiar neste mago de fala precisa e olhar profundo de
antepassados druidas, que lhe dera uma memória privilegiada através de
seus ancestrais, os quais possuíam o registro do passado de forma oral sem
fazer muito o uso da escrita, que embora fosse útil e prática, não
distinguiam quais seriam os olhos de quem o lesse, e usurpar seu conteúdo
para o mau. Agora colocada em prova sua intuição e sobre o mapa que os
levariam através de suas faculdades de comunicação telepática com os
povos do outro lado do mundo.

História contada pelo Carvalho.

Nada se via naquela noite, quando negras nuvens encobriram a lua, ouvia
se apenas o barulho do vento e das águas do mar a bater violentamente
sobre as rochas. Foi então que de repente um clarão de um raio revelou as
paredes íngremes e cortantes do penhasco. No topo da encosta via-se a
silhueta de um cavaleiro negro, segurando firmemente o arreio do cavalo
ao pressentir o perigo do abismo em seus cascos nervosos e agitados,
indiferente por outro lado o cavaleiro permanecia ali, parado no
vertiginoso e belo cenário, a olhar fixo para o mar.
Tinha em sua mão um diamante negro, que ao estender o braço em direção
ao mar, abria a palma da mão, expondo uma luz acetinada numa bola azul
do tamanho de uma noz a flutuar, e repentinamente partiu em direção ao
mar.
Quanto mais uma vez se fez o clarão, o cavaleiro já havia partido.
A pequena lua azul seguiu pelo mar até próximo ao Corvo, que já estava
navegando em alto-mar. Pairou acima do navio a uma distância que
pudesse ser notada, então a tripulação que estava no convés começou a
comentar o que seria aquele ponto azulado navegando entre as estrelas.
Um dos marujos comentou.
—Veja capitão aquela luz parece nos seguir. Malenca com um olhar curioso,
comentou.
—Sempre me guiei pelas estrelas e agora uma está a nos seguir. Falou em
tom de brincadeira, mas com certa apreensão.
Aquela bola de aparência inocente e de brilho envolvente começou a subir
ao céu e a crescer até ficar do tamanho da própria lua, e ai então do azul
passou ao vermelho e numa explosão dividiu-se em bolas de fogo caindo
sobre o Corvo. As velas começaram a pegar fogo. Todos se apavoraram e
três dos marujos sentiram seus corpos em chamas e se atiraram ao mar.
O terror tomava conta da tripulação que foi pega desprevenida numa noite
aparentemente calma. O Mago que ouvira os gritos de horror subiu no
convés, e ao olhar o que acontecia gritou. –Fiquem calmos, o que vocês
estão vendo, não está de fato acontecendo!
O rei que confiava nos conhecimentos do Mago percebeu que era apenas
magia, enquanto o capitão nervoso, e apavorado tentava se proteger do
fogo, não dando ouvido ao Mago, e ordenava aos marujos que apagassem o
fogo.
O Mago fica parado no centro do convés e falou. -Vejam as chamas estão em
minhas vestes e, no entanto o fogo não as consome. Isto é pura ilusão!
Aos poucos foram se acalmando, enquanto do mar, ouviam-se os gritos dos
marujos.
O capitão ordenou que abaixassem as velas, e pelos gritos dos marujos
percebeu que estavam a uma distância que não dava pra atirar as cordas. O
mar não estava agitado, havia luar, e decidiu remar para resgatá-los.
—A corda não os alcança, Capitão!
—Vamos, desçam os botes. Não quero ver nenhum marujo sendo devorado
pelos tubarões.
Sir Breton se ofereceu para ir com os dois marujos.
—Por aqui, venha logo. -Remem mais rápido, aqui está infestado de
tubarões. Os marujos não sabiam nadar lá muito bem, mas o suficiente para
não se afogarem.
Ficaram juntos, um de costas para o outro, enquanto aos seus redores as
barbatanas de um desses peixões, nadava em círculo, e cada vez mais perto.
Um puxão repentino levou um deles para baixo. Foi uma forte pressão
duma mordida poderosa na perna, dilacerando parte da perna.
O marujo voltou à superfície, e num desespero de lutar até o último
instante pela vida, conseguiu se agarrar ao bote.
Sir Breton equilibrava-se no balançar do bote, e com o arpão empunhado
ao ver a enorme barbatana voltando em direção ao marujo que se debatia
desesperadamente para escapar de outra mordida que, com certeza, seria
fatal. Ser Breton lançou o arpão de uma forma certeira. Um frenesi entre os
tubarões fez com que atacassem o que estava ferido e assim puderam
regatar os três marujos com vida, embora um gravemente ferido na perna.
—Tua sorte é que o tubarão não apreciava muito carne de marujo. Falou
um dos companheiros que remava de volta ao Corvo.
Com todos no convés o marujo ferido foi levado ate a cabine do mago.
—Vamos ver o que posso fazer, disse o Mago já salvei muito dos cavaleiros
de cortes profundos, o que temos a fazer neste instante é parar com a perda
de sangue.
Abrindo a tampa do seu baú, retirou um frasco com uma porção para
aliviar a dor e acalmá-lo, e logo em seguida untou a parte do ferimento com
uma pasta feita de ervas usado para estancar o sangue, e com uma agulha
costurou, enquanto isso o rei entrava e olhando o marujo cair num sono
profundo, perguntou ao mago:
—Acredito que saiba quem no enviou aquela pequena lua azul, na verdade
não sei se teremos maiores problemas em enfrentar os perigos que vem
pela frente, ou tipo desses mandados atrás de nos.
O Mago desamarrou um saquinho feito de couro de ovelha, que estava
preso a sua cintura, e de lá retirou algumas pedras jogando-as ao chão, e
fixou seu olhar por alguns minutos. O assoalho do Corvo se abriu num
enorme redemoinho onde pode se ver umas câmaras do interior de uma
pirâmide asteca, e vários objetos de cerâmica pintadas com temas animais
e rituais de sacrifício. O Mago começou a falar sobre isso:
—Essa luz estava guardada dentro de uma urna a mais de mil anos,
saqueadores a roubaram, e não faziam ideia que aquela seria a luz da
ilusão. Ela faz com que as pessoas tenham visões horríveis se atirando de
penhascos, ou no caso dos marujos, ao mar. Verdade é que ela faz com que
as pessoas morram por si próprias. Muitas delas preferem morrer pela
ignorância a enfrentar por alguns breves momentos o horror.

O plano de Drakos com os piratas.

Do outro lado da floresta havia um castelo muito antigo já em ruínas, com


um histórico de muitas guerras e pestes, dizimando todos que ali viviam,
com exceção do cavaleiro negro. Era neto do barão Brutus, tio-avô de
Arthur. Nos arredores do castelo, dava um frio na espinha de quem
passasse por lá. Lá moravam Drakos e seu cavalo (Eqos) e o criado
Godofredo. Pouco se sabe sobre a vida dentro deste castelo. O que podemos
dizer, é que de tempos em tempos vinha ocorrendo visitas por parte de
Cortez, e muitos objetos pilhados eram levados para lá.
Drakos sempre foi uma ameaça ao reino de Arthur, desde quando os dois
eram crianças.
Arthur gostava de se afastar de seu castelo quando os olhos de sua ama se
dispersavam em devaneios procurando figuras nas nuvens ao descansarem
sobre a relva depois de uma longa caminhada. As energias de Arthur nunca
findavam.
Numa manhã, acompanhado de seu cão, um enorme irish wolfhoud, que
sempre o protegera de animais selvagens e maus intencionados. Era feroz,
porém carinhoso e companheiro de Arthur. Sua alegria era se esconder
entre os trigais fazendo com que Arthur o procurasse através de seus
latidos, mas achar um cão com a mesma cor dos trigais não era tão fácil
assim. O cão chamava-se Boris.
—Olha para aquelas nuvens mais à direita, e me diga o que vê. Disse a ama
para Arthur
—Vejo apenas nuvens, ora!
—Vamos lá Arthur, seja mais imaginativo!
—Esta bem. Vejo um castelo, e dentro dele uma mesa e sobre a mesa umas
frutas vermelhas e verdes, alguns biscoitos e amêndoas.
—Ou você tem imaginação em demasia, ou esta brincando comigo. Sério
que consegue ver tudo isso?
—Não, mas meu estômago sim. Esta caminhada me deu fome.
—á que sua imaginação esta correndo solta hoje, vou olhar bem para esta
sua nuvem, e depois fechar os olhos e contar uma história do que aconteceu
nesta sua mesa cheia de frutas e doces.
A ama começou a contar a história, mas não era lá muito do agrado de
Arthur, além do que a história de frutas e doces só aumentava sua fome e
voltou os olhos na direção da floresta, despertando uma curiosidade em
saber o que havia além do universo do reino.
Estava ali uma rara oportunidade que o então príncipe tinha para escapar,
e atravessar a floresta e ver de perto este tão falado castelo amaldiçoado.

O encontro do rei com os bandidos.


O rei Uther comentava sobre a caçada com Sir Dimitri (cavaleiro), enquanto
voltava sobre seus cavalos.
—Esse javali não é dos maiores, mas nos deu um bom trabalho para
alcançá-lo.
—Se me permite meu Senhor, os cães sofreram muito para cercá-lo, e o
enfrentamento acabou ferindo dois dos nossos melhores cães, espero não
ter que sacrificá-los.
—Com certeza não, Sir Dimitri! Pedirei ao Mago que faça uma daquelas
suas porções mágicas, e logo os ferimentos estarão cicatrizados. Se não
atingiram as articulações das patas, então as chances de voltarem à caça
são boas.
Enquanto conversavam durante o caminho, os cães começaram a farejar
algo no ar, e a latir, os cavalos ficaram nervosos e não queriam continuar, e
foi logo depois que atravessavam o riacho, uma flecha certeira atingiu o
peito do rei fazendo com que caísse naquelas águas onde o sangue se
espalhara nas correntezas.
—Protejam o rei, falou Sir Adam puxando de sua cintura a pesada espada.
—Vi algo se movendo lá em cima daquelas pedras, e os cães estão indo para
lá. Vamos.
Os cães cercaram uma árvore de troncos largos e bem encopada. Sir
Carlton permaneceu ali, e tentando ver algo escondido entre as folhagens,
gritou: - Desça já dai seu covarde. Vamos acertar a conta, com que fez ao
nosso rei.
As folhas começaram a chacoalhar de repente, e levantando o escudo
rapidamente, para se proteger, a flecha quase o atingiu, ficando cravada no
escudo. Enquanto outro, não teve dúvida atirando sua lança em direção
onde a flecha saiu e num grito, o inimigo caiu entre as raízes e folha seca
daquela frondosa árvore.
—Ferido na barriga com a ponta da lança encravada, estava agonizante e
falou:
—Que o senhor me perdoe, mas tive que fazer, porque se não fizesse, eles
iriam me matar.
—Quem mandou matar nosso rei de forma tão covarde?
—Tentávamos mais uma vez atacar o castelo, mas foi em vão. Quando
saíram para a caça, mas como não conseguimos, designaram-me para essa
missão suicida. Luciot estava possesso, creio que sua mente esteja sendo
controlada por algo invisível, ele está alucinado, conversa com o vento, e
ele não diz coisa com coisa, creio que logo um novo líder tomara seu lugar,
mas até lá, fará muita destruição e teremos muitas baixas.
—O rei continuava a sangrar, a correnteza levava sua fonte da vida
lentamente, mas ainda restavam-lhe forçar para falar: - Quero todos os
cavaleiros aqui, não tenho muito tempo.
—Sim meu senhor disse Sir Dimitri. Venham todos aqui, e deixem de
procurar os inimigos, a essa altura estão longe.
Os cavaleiros se posicionaram em círculo de frente para rei abatido e
seriamente ferido.
—Daqui a pouco não estarei mais entre vocês, a pouco antes de sair para a
caça, tive uma triste sensação de que não apenas a caça, mas o castelo,
meus fiéis cavaleiros, que sempre defendeu um ideal compartilhado com
seu rei nos passeios pelo jardim, junto à rainha, que por horas discutíamos
desde assuntos tolos aos que envolviam o futuro e destino de todos os
habitantes do reinado, mas agora me sinto impotente diante do destino que
quer me levar ao mundo invisível.

A Ilha

Amanheceu e não se via o azul celestial, apenas brancas nuvens, indo além
do horizonte. A tripulação no convés se impressionara com um céu
inteiramente coberto por baixas nuvens tão alvas naquela manhã. O sol por
detrás criava nuanças de tons de prata. A brisa empurrava nuvens e velas
em direção ao novo mundo.
O Mago, ainda sonolento, subiu ao convés, após passar a noite tendo visões
do rumo a tomar. Sonhara com uma floresta muito além do reino, de tons
de verdes jamais vistos no reino. Dirigiu-se ao capitão mostrando o mapa
que havia desenhado, e Falou:
—Capitão, de acordo com este mapa, qual a distância que estamos desta
ilha?
—Sinceramente não sei onde estava meu juízo, quando aceitei levar vocês
para essa viagem insana.
—Sabe muito bem que nosso rei buscou o homem certo para nos levar, e
agora põe em xeque a credibilidade de sua majestade? Além do que deve
inúmeros favores ao rei, ou devo lembrá-lo disto?
—Mago o mar modifica o pensamento do homem, e muitos ficam loucos.
Acho que falei demais, não? O capitão com um olhar com mais atenção para
o mapa, pensou, coçou a barba e falou:
—Quer saber? Vamos todos cair no abismo quando cruzarmos esta linha.
Estamos condenados.
—Sabe de uma coisa capitão? O reino vem atravessando séculos, e se não
fosse gerações de reis arrojados, não estaríamos aqui agora, e não só de
reis, e rainhas, de magos também. Nossas visões raramente falham, e se
falharmos, será porque uma força maior assim determinou.
—Se esses desenhos no mapa forem realmente corretos, creio que antes do
sol se pôr, mas não se aflija, o marujo do alto do mastro de observação
avisará.
—Capitão não perca a esperança, e no final da jornada será devidamente
compensado.
Rei Arthur que estava na proa a observar alguns golfinhos acompanhado de
Sir Breton alheio à conversa do Mago com o capitão, falou para ele. –Meus
pensamentos estão voltados para o reino, penso na rainha. Só espero que
não sofram ataques durante nossa ausência, mas caso isso aconteça,
lutarão bravamente. Tenho certeza disto.
—Sim, meu Rei, sinto-me impotente nestas águas. Rezo ao Senhor a cada
momento que isso não ocorra, mas melhor que o nosso rei, sabe que a
rainha cuidara bem do reino.
—Vamos procurar manter nossos pensamentos direcionados adiante, pois
está nessa nova terra a esperança de vencermos nossos inimigos.

Monólitos de pedras.

As brancas nuvens pareciam não findar, e o Corvo a navegar sob elas. Os


Brancos das velas puxavam para a cor cinza, ao contrastar com as nuvens,
dando a impressão que todo aquele infinito céu carregava o navio preso ao
mastro.
O rei Arthur foi até a proa a procura de algo diferente, além de nuvens, água
e horizonte.
Lembrou-se de quando era um jovem príncipe, após a morte de seu pai, o
rei Uther. Há poucos dias antes do pai sair para sua a última caçada. Disse
que o levaria quando completasse seus treze anos. Estar com o rei e os
cavaleiros era o que mais desejava. Isto nunca aconteceu, é acredito que
este seja o motivo de pouco se importar em caçar. No fundo preferia ver os
animais vivos a mortos.
O Mago se aproximou de Arthur, e falou: - Sei em quem está pensando meu
rei.
—Sabe sim, é nele mesmo, meu pai.
—Quando você era um príncipe, lembro bem do orgulho que tinha quando
alguém tocava no seu nome, e das muitas travessuras que fez, deixava-o
furioso, mas que no fundo sempre olhou para você como um guerreiro,
Sabia que quando partisse deixaria o futuro do reino em boas mãos. Um rei
justo com seu povo era tudo que ele queria.
—A rainha, minha mãe também acabou partido cedo após sua morte, a
tristeza tomou conta de sua mente, e dia apos dia olhava para ela se
definhando, mal se alimentava, e depois me tornei rei aos 15 anos.
—Uma ilha bem a nossa frente capitão! Gritou o marujo do alto do mastro
de observação.
—Vamos, abaixem as velas. Leme a bombordo e soltem a ancora, gritou o
capitão.
A ilha estava a uma distância segura, o capitão achou melhor assim para
não comprometer o casco e nem a quilha do seu navio nos arrecifes.
Aparentemente uma ilha inabitada, mas como muitos marujos e o capitão
eram supersticiosos, preferiram observar por mais um tempo se alguma
coisa estranha poderia surgir daquela densa mata fechada de árvores
gigantescas e de uma vegetação que jamais vista antes.
Arthur ansiava em pisar em terra firme, não só ele, mas os cavaleiros,
marujos de primeira viagem.
O rei ordenou: - Desçam todos! Vamos explorar essa ilha. Sei o que ai se
encontra, e nos levará às novas terras, mas isso será possível com o
trabalho de todos, inclusive do capitão e seus marujos. Olhou firme para o
capitão, pressentido que algo de ruim aconteceria.
Ao se aproximarem da ilha com os botes, sentiam-se como os primeiros
cristãos a pisarem em areias virgens, mas quando desceram suas botas
pesadas afugentaram pequenos seres marinhos.
Ouviu-se um enorme lamento vindo do interior da densa vegetação.
Apavorados com o som que nunca ouviram antes. O ruído não era humano,
e tão pouca de algum animal conhecido.
Lá se acomodando, o cartógrafo desenha a exótica paisagem a sua frente,
enquanto o Mago retirava algumas pedras telepáticas colocando-as sobre a
areia. Desenhou um círculo em volta delas. Fixou o olhar até surgirem
imagens a sua frente, entrando em transe por alguns.
O Mago visualizara antigas ruínas camufladas pela vegetação. As imagens
foram se modificando diante de seus olhos, e então pode ver sacerdotes
reunindo-se ao centro do pátio rodeado por enormes blocos de pedras que
circundavam uma área de uns 50 metros de diâmetro, e cada bloco com 12
metros de altura, seis de largura e três de espessura, eram 12 ao total
desses blocos, alguns com inscrições e outro com gravuras de formas
geométricas associadas a animais.
As orações dos sacerdotes assemelhavam-se aos extintos povos moradores
de uma ilha dos mares do sul do reinado de Arthur, num tempo em que os
reinados estavam em formação, mas estes estavam em seu ápice. Uma
civilização que havia descoberto as maravilhas de uma vida plena de
sabedoria, aonde facilmente chegavam a uma idade avançada sem doenças,
desgraça, fome e destruição. Viviam isolados dos povos ávidos por riquezas
materiais, e desprovidos de compaixão.
Não possuíam armas ou castelos para se defenderem, e sua mais eficaz
arma: tornavam-se invisíveis diante dos inimigos. Possuíam um grito
ensurdecedor, fazendo descer dos céus nuvens carregado de raios, e ventos
fortes, e assim os afugentavam sem nada levarem, apenas experimentavam
a fúria dos fenômenos da natureza.
Meu rei, disse o Mago. -Embora tenha acompanhado a vida de todos os reis
que antecederam a de vossa majestade, estes povos que aparem nas
minhas visões, são muito antigos. Sei que desaparecem depois duma ilha
afundar por um vulcão, mas disseram que seus habitantes se mudaram de
lá antes da catástrofe. Eles passaram por aqui, e em seguida dirigiram-se ao
novo mundo.
—Cavaleiros! Disse Arthur. Não levantem as espadas, se por ventura
alguém surgir, tenham a máxima prudência, e não demonstrem hostilidade.
—Verdade disse o mago. -Possivelmente antes de irem para o novo mundo,
deixaram guardiões nesta ilha para preservar algum artefato.
Logo atrás vinha o capitão e seus marujos, cheios de superstições, fazendo
o sinal da cruz, ainda pensando naqueles sons estranhos que ouviram há
pouco.

Arthur e seus cavaleiros caminhavam para um platô situado bem no centro


da ilha. O Mago diminuiu seus passos, esperando que o capitão o
alcançasse, e falou: – Capitão ouviu as ordens de vossa majestade? Não
deve agir de forma agressiva a qualquer ser vivente nesta ilha. Olhando
firmemente sobre a testa do capitão, o advertindo ao desconfiar de suas
más intenções.
— Ora, essa! Mago, minha obrigação é levar o Corvo até o novo mundo, e
sabe que sou amigo do rei Arthur. Claro que não sou nenhum dos seus
súditos, mas devo leal a sua majestade.
-Isto não vem ao acaso, Capitão, mas pensa que adquiriu o Corvo pelos
serviços de pouca valia prestados a coroa? Ou que através de seus
medíocres feitos além de jogatina, mulheres e bebida? Claro que não! Fez
uma pausa e continuou a falar. -O Corvo, é um navio muito especial, trata-se
de uma caravela de velas triangulares, fazendo com que navegue em ventos
contrários, além de rápidas, ela não pertence ao nosso tempo. Foi concedia
a você, devido a sua experiência em navegação, e o destino a ser cumprido
para um dia no futuro o mundo possa caminhar para as maravilhas do
conhecimento das leis do universo e com sabedoria, e compartilhar.
Portanto se algo der errado, abrirá uma fenda no firmamento e todo esse
mundo será devorado, e voltará ao início do que se propunha pelo destino.
-Eu, diante de Deus, - falar o capitão: sou tão minúsculo quanto a um verme,
e minhas atitudes tão perceptíveis quanto ao movimento de um marisco. -
Como poderei intervir no destino do universo, e na vontade do senhor?
-Simples Capitão se der uma besta na mão de uma criança, ela poderá
desferir a flecha em seus pais, por não perceber o potencial de morte de
uma arma.
—Por isso é que peço que controle sua natureza, e não faça asneiras.
Enquanto trocavam farpas, o rei chegou ao platô, e bem acima de suas
cabeças, estava o templo com as placas megalíticas enigmáticas.
—Não toquem em nada, e permaneçam atentos! Disse Arthur, acenando
para o Mago ser o primeiro a entrar e poder analisar.
O Mago ficou no centro da gigantesca estrutura de pedra, e pôs-se a olhar
um a um dos monólitos com estranhas inscrições, em seguida entrou em
estado de hipnose profunda. Conectou-se com as energias emanadas destas
gigantescas pedras esculpidas. A cima das colunas formou-se uma luz de
coloração intensa, ora azul, ora vermelha, passando para o verde e
retornado ao azul. O Mago absorveu todo aquele conhecimento dos povos
que passaram por ali
Abriu os olhos saindo de seu estado de hipnose, e falou: - Senhores estão
diante de uma máquina do futuro, e o que me foi mostrado não poderei
revelar, mas é muito importante que continuemos a viagem, mas antes
devemos encontrar aquilo que nos foi designado. Devemos permanecer na
ilha por três dias apenas, e não mais.

Ilha a bordo do Corvo

O sol se despedia lá no horizonte, e as primeiras estrelas apresentavam um


novo céu onde às velhas conhecidas, Polares, Ursa Maior e Menor davam
espaço para outra do hemisfério sul.
Deveriam retornar para o Corvo, pois pernoitar nesta ilha na primeira noite
seria imprudente, como também deixar as sós Malenca a bordo.
Certamente ter uma surpresa desagradável na manha seguinte, caso
partisse com o navio sem Arthur e os cavaleiros, pois a confiança que
Arthur havia depositado no capitão Malenca já não era a mesma de outrora.
A bordo do Corvo, a tripulação se maravilhava com um céu de uma
negritude carregadas de mistério, e cheio de estrelas. O cartógrafo pôs-se a
desenha-as, criando o registro de um mapa estrelar para futuras
navegações nesses novos mares a desvendar, e que aos poucos seriam
desmistificados da existência de monstros marinhos, e do fim do oceano
terminando num precipício.
Um tanto abafado em sua cabine Arthur, foi para o convés, observando de
perto o trabalho do cartógrafo, e constatou nos desenhos uma constelação
em forma de cruz, voltou os olhos para o céu, e lá estava ela que mais tarde
seria conhecida com Cruzeiro do Sul.
—O sinal do senhor nesse céu! Tudo indica que irá nos proteger durante a
navegação, isto me deixa mais tranquilo, e posso voltar meus pensamentos
para a rainha, e quem sabe aparecer em seus sonhos e dizer que por aqui
está tudo bem.
O cartógrafo olhou para o rei e continuou a desenhar. Era de pouca fala, e
passava a maior parte do tempo a reproduzir com minúcias o que lhe era
designado, e exótico.
Os três cavaleiros reunidos à proa, relembravam os feitos e das viagens em
outros reinos. Sir Breton, sentou-se do outro franco do convés e com sua
flauta transversal, começou a tocar sobre este infinito oceano uma melodia
melancólica, tendo como fundo musical os sons das baleias.
Esta combinação sonora deixava a tripulação tristonha e reflexiva. Por mais
que o homem viva no mar, seu porto seguro sempre será nos braços da
amada, e rodeados pela família, sentados à mesa dividindo o pão no jantar.
O capitão Malenca não tinha família, viviam de maneira errante, de cais em
cais, mas, de qualquer forma, sempre retornava a um velho porto, onde
buscava as mesmas mulheres, que com paciência, ouviam atentas suas
desventuras. Embrutecido, sedento e fragilizado pela solidão do mar.
Por alguns instantes esqueceram-se da ilha, mas está não os esqueceu.
Todos os seres viventes na ilha, invisíveis ou não ouviam as belas músicas
desse instrumento que despertara na memória daqueles gigantescos
monólitos o cantar dos sacerdotes. Os seres invisíveis saíram de dentro
desses blocos de granito, pondo-se em círculos, e numa dança de ciranda
entoavam os sons da magia num palco de luz, iluminado pelas estrelas.

A luz da manhã pousava sobre o convés vazio. Vinha da ilha o barulho dos
pássaros que começavam a despertar a tripulação. O primeiro a se levantar
foi o capitão, acompanhado de seu mau humor matinal, e já ordenando a
limpeza no convés aos marujos.
—Vamos bandos de imprestáveis, não se esqueçam de suas tarefas, só
porque acham que estamos na ilha do paraíso! Vou mostrar o paraíso a
vocês com estes esfregões!
A luz entrava pela escotilha na cabine do Rei Arthur, que aos berros do
capitão Malenca, o acordara.
Aquele seria o segundo dia. O Mago concentrava-se para desvendar a chave
do mistério que os levariam ao novo mundo, mas por onde começar?
—Capitão Malenca, ordene que baixem os botes, e deixe um de seus
marujos no navio. Vamos! Vamos desvendar esse mistério. Ordenou Arthur.
Ao descerem na praia, se embrenharem pelas matas, e o rei falou: -
Espalhem-se aos pares pela ilha, e ao final do dia retornem a praia. Se algo
merecer nossa presença, dê um sinal. Entenderam?
—O rei observava o capitão com um ar de pouco interesse, e em voz baixa
pediu: - Sir Carlton, Fique com o capitão, e quanto aos outros, deixem
decidirem com quem irão forma as duplas.
Desta forma atrapalhará os planos do capitão—bom já que existe uma
desconfiança, o melhor é não facilitar o sorrateiro plano do capitão.
O rei, o Mago, e Sir Adam, dirigiram-se ao platô onde havia as inscrições.
—Incrível majestade! O Mago olhou atento para todos aqueles gigantescos
monólitos, e continuou a falar: - Tenho a nítida impressão de que este
templo tem relação com os primeiros druidas de onde veio meus
conhecimentos de mago, mas quanto as inscrições, não posso afirmar sua
origem, talvez os primeiros druidas que estiveram aqui, adquiriram novos
costumes com povos desconhecidos. Sinto que essas pedras, não querem
apenas ser decifradas, mas nos dizer algo.
—Quem sabe exista algum mecanismo para despertar essas vozes, disse o
rei.
—Meu senhor, disse Sir Adam: Ontem quando Sir Breton pôs-se a tocar sua
flauta, pude notar uma estranha luz acima do platô, e depois que a música
parou essa mesma luz diminuíra sua intensidade.
—Faz sentido, Sir Breton, disse o Mago. A cultura de meus ancestrais vem
de forma oral, e a música acompanhada das canções vibra de forma a se
combinarem para ativar algum mecanismo. Espero que isto dê a resposta
ao enigma.

Da outra parte da ilha o capitão Malenca e Sir Carlton, percorriam a mata


seguindo um riacho. A luz do sol atravessava as folhagens, e refletia um
brilho dourado sobre as águas transparentes. Ofuscando os olhos de
Malenca, fazendo com que parasse por ali.
—Vamos andando Malenca! Por que parou?
—Nada não, apenas um cansaço. Vá à frente, e logo o alcanço.
—Talvez o cansaço seja esse brilho dourado que te alucina. Não é?
—Nem notei! Creio que já estou um pouco velho para acompanhar os
passos de um cavaleiro tão jovem assim.
—Está bem, estarei apenas um pouco a sua frente. Se perdê-lo de vista...
—Não confia em mim?
—Minha opinião não vem ao caso.
—Está bem, mas me deixe descansar aqui só um pouco.
Sir Carlton agora só tentava através do silêncio, ouvir algo que o chamasse
a atenção.
Malenca se ajoelhou no riacho, e com as mãos, ergueu um punhado de
argila, e pode constatar que ali havia ouro. Neste momento, seus olhos
brilharam, e levando aos céus a argila cintilante falou: - Ouro! Isso é o que
de mais valioso um homem pode encontrar. Nenhuma ordem de um rei irá
me impedir de levar esta maravilha a bordo do Corvo. Tentou conter sua
emoção com a voz abafada para Sir Carlton não desconfiar.
—Vamos logo Malenca, nosso tempo é precioso!
—Muito, mas muito precioso Sir Carlton você nem imagina, como! Falava
em voz baixa.
—Quer que eu volte para te buscar?
—Não será necessário já estou indo!
O cartógrafo foi o único a andar só, é diante de tamanha diversidade de
fauna e flora, achara lamentável e injusto permanecer tão pouco tempo
nesta ilha. Extraiu seivas coloridas que o ajudassem a ilustrar suas
iluminuras.
Este lugar era um verdadeiro achado entre o velho e novo mundo, sem
grandes interferências de aventureiros. Uma frágil beleza, que podia se
desfazer tão facilmente quanto castelos de areias construídos na beira da
praia. Parecia que ali a natureza encontrara a fórmula certa de se proteger.
O cartógrafo desenhava uma vegetação aérea de folhas de um verde que
custara encontrar o tom em sua palheta que se aproximasse, mas
misturando alguns azuis, amarelos e carmim, chegou à cor desejada. A
planta de folhagens de longas raízes caia ao solo, e viu dali, correr uma
seiva cor de sangue vivo.
Intrigado diante do que vira. Aproximou-se, e tocou a seiva, e uma voz
falou: - Creio que já conversaste ante com a natureza, mas é a primeira vez
que ouves ao meu chamado.
—Será que esses anos todos andando só, me deixou doente da cabeça?
—Isto parece sangue escorrendo da raiz da planta!
—Não se aflija, é uma ilusão. Disse a voz. Se observar melhor é apenas
orvalho. A cor vermelha está apenas na mente de quem nos vier a fazer
mal.
—Que mal fiz eu, além de extrair a seiva de algumas flores que encontrei
em meu caminho?
—Confiamos em você. Parece tem respeito por nós, indiferente ou não de
seus serviços ao rei. Sua natureza nos parece confiável. Foi apenas uma
forma de lhe chamar a atenção, antes que saísse correndo por gritando a
todos de que ouviu fantasmas.
—Meu rei procura nesta ilhar um enigma, e talvez você saiba algo a
respeito? Temos apenas mais dois dias aqui
—Infelizmente não posso lhe dizer. Creio que ele próprio descobrirá, afinal
é um enigma, o qual o destino colocou nas mãos de seu rei, mas posso lhe
adiantar que dois dias são poucos para vocês nesta ilha.
—Poucos? Por quanto tempo mais?
A voz não respondeu mais suas perguntas. Parou por um instante achando
que teve uma alucinação ao tocar naquela raiz. Tomou a em suas mãos
novamente para ver, e nada havia de anormal na raiz, além do orvalho.
No templo, o rei perguntou ao mago: - Por que motivo não usa suas pedras
telepáticas para nos ajudar? Estamos há horas olhando com minúcia as
pedras deste templo e até agora nenhuma luz!
—Não é tão simples assim meu senhor. Aqui nem as pedras ou ervas irão
nos ajudar. A chave para isso é: vibração, ou seja, existe uma sequência de
notas musicais que executadas da maneira correta irão nos abrir o caminho
para o enigmar. Além do mais, o templo está diretamente ligado a uma
constelação, e então precisamos estar sincronizados com a posição da lua
também, e a canção deverá vibrar de maneira exata para funcionar.
—Isso quer dizer que devemos executar o ritual durante a noite? Não
vamos desperdiçar todo nosso tempo nesse templo, por agora. Se você
quiser ficar por aqui, ou explorar a flora, tudo bem, Mago. Talvez existam
outras partes da ilha que mereça nossa atenção.
Desceram o platô em direção ao outro lado da ilha, Arthur e Sir Adam.
—Desconfia do capitão, meu senhor?
—Parece que este não é mais o velho capitão Malenca que conheci, de
outros tempos. Quem sabe este novo céu sobre nossas cabeças esteja
mudando sua mente.
—O dono da taberna onde Malenca costuma aparecer, comentou a respeito,
que ele andou rodeando o castelo de Drakos,
—Por que razão não me informou isso antes da viagem?
—Desculpa meu senhor, mas achei desnecessário, devido ao fato de ter
sido visto embriagado e blasfemando ao redor do castelo, achei que andava
sem rumo.
—Se Drakos esteve conversando com Malenca, devemos dobrar nossa
atenção, esse cavaleiro negro, como é conhecido já nos causou grandes
transtornos depois que começou a negociar com Cortez.

O sol dourava as nuvens, e as águas do mar vista da praia criavam


pequenos cristais cintilantes sobre a vastidão de um universo liquido.
O entardecer era o momento mágico para o mago se inspirar em antigos
poemas de seus ancestrais.
Escreveu ali mesmo nas areias com um galho seco:

Nuvens que carregam o mistério dos tempos idos,


Na memória do homem, e na exatidão das palavras.
Venha dos quatro ventos a sabedoria oportuna.
Venham das quatro estações os sonhos de outrora,
Veste-se de estrelas o verão na branca lua,
Despem-se as tardes gentis das cores do outono,
Latentes são as paixões agasalhadas no inverno,
Que na primavera desnuda-se na luz das manhãs.

Ao findar este poema nas areias, a noite se fez com a primeira estrela
anunciando um cenário propicia para magia. Veio a maré e carregou para o
mar aquele poema, levando a esperança como uma onda que vem e vai, ao
reino de onde Arthur viera.
No caminho sem que percebessem, o capitão falava ao pé do ouvido de seus
marujos:
—Quanto chegar o momento oportuno, darei um sinal. Afastem-se do
templo, e fiquem na praia perto dos botes.

Estavam todos ali sobre a luz da lua e do fogo que ardia nas tochas, numa
noite de pura magia as esperas do momento em que o rei ordenasse a
subida ao platô.
Ali chegando puseram-se em círculos; Arthur, e os cavaleiros. O Mago ficou
bem ao centro, enquanto o capitão e seus marujos seguravam as tochas,
entre os monólitos, mas do lado de fora. A iluminação das chamas
desenhava sobre as laterais das pedras o movimento de suas mãos
trêmulas diante do desconhecido.
O Mago então proferiu certas palavras antes de iniciar o ritual:
—Seja o que virem aqui, não abandonem o interior do templo, muito das
visões irá levá-los a mundos e universos nunca visitados, apenas peço que
não desviem seus pensamentos.
—O que importará, será a frequência da vibração das vozes que irão ao
encontro das paredes. Continuou o mago a falar. – Cantem, e que todas as
vozes sejam harmônicas, e fortes para que possa despertar aqueles que
vivem dentro desses monólitos.
O mago pediu então ao cavaleiro Sir Carlton para iniciar uma canção com
sua flauta, e aos outros que primeiro ouvissem a canção para depois
acompanhá-lo.
Um palco com vidas invisíveis ali se manifestava. A sensação de bem-estar
se impregnava com perfumes de rosas ao redor do templo. A energia
criadora dava esperanças e promessas de que a longa viagem não seria em
vão.
Os corações dos cavaleiros dispararam quando do alto do firmamento,
algumas estrelas redesenhavam as constelações, e desceram para se
juntarem ao ritual de magia.
O templo ficou iluminado. Era um imenso palco a céu aberto, e ao som da
flauta deu-se o início. Da garganta do mago a voz vibrou arrepiando a alma
de qualquer mortal, e pôs-se a entoar uma canção que a muito não se
ouvira, e tão pouca conhecida além do rei e Sir Carlton. Vozes abafadas
foram ouvidas de dentro dos monólitos, vozes que estavam ali por muitos e
muitos séculos adormecidos entre pedras do templo. Elas eram fracas no
início e quase não se ouviam, mas aos poucos foram se tornando fortes, e
sincronizadas. Interagiam com as vozes humanas, criando formas de
corpos de luzes, que como fachos ligeiros, serpenteavam entre os
monólitos, seguidos aos olhos atentos e confiantes de Arthur.
A visão era magnífica, mas pensava Arthur: Até onde isso irá simplesmente
nos deslumbrar e quando trará as respostas?
Os fachos de luz iam pouco a pouco diminuindo sua intensidade, cada um
ficou com um monólito, e das inscrições que nelas havia, foram se diluindo
e transformando-se nas imagens dos cavaleiros do reino de Arthur, além do
próprio rei.
—O que é isso, pergunto o rei. Nossas imagens, inclusive dos que ficaram,
estão gravados nessas rochas! O que isso significa?
—A resposta é clara meu senhor, disse o mago: - Só será possível desvendá-
las, com a presença de todos os cavaleiros, sem isso nada vai acontecerá.
—Devemos voltar então antes de continuar a viagem, mas o reino ficará
desprotegido contra-ataques de invasores que rodeavam o castelo feitos
hienas.
-Meu senhor! Gritou Sir Breton ao constatar que o capitão e seus marujos
desapareceram.
—O que foi agora?
— Malenca não se encontra entre nós!
—Só isso que me faltava! Vamos voltar à praia, tenho um pressentimento
que algo de desagradável esta acontecendo.
Ao voltarem perceberam que os botes não estavam mais lá.
—Que a mão justa do senhor desça sobre esses vermes que nada de bom
trazem para esse mundo! Grito Arthur, indignado. Cofiamos nesse Capitão,
e infelizmente demos a ele o Corvo, mas agora todo foi em vão. Não ha como
partir dessa ilha do fim do mundo.
-Não perca as esperanças meu rei. Disse o Mago em tom consolador. Ainda
posso ter visões do futuro, e lhe garanto que ainda venceremos. Só uma
questão de tempo e paciência.
Aquela noite que seria de glória passara a ser de um enorme pesadelo.
Dormiram todos ao relento, olhando as estrelas se distanciarem, e voltando
para suas antigas posições.

Sobre um céu de estrelas e camuflado pela noite o Corvo navega de volta,


sem que ao menos o capitão voltasse sem nenhum remorso para com a
tripulação abandonada.
—Se alguns de vocês abrirem o bico, seremos todos mortos, mas antes
disso darei cabo em quem o fizer. Entenderam? Disse o capitão com um ar
de incertezas do que seria sua vida daqui pra frente.
—Seremos todos presos e enforcados quando ancorarmos ao porto. Disse
um dos marujos.
—Depende. Retrucou o capitão Malenca. -Uma boa mentira talvez nos livre
disso.
Chegando bem perto do marujo que acabara de falar, tirando um punhal de
sua cintura e crava no abdômen do pobre marujo que nem ao menos
conseguiu esboçar sua dor e surpresa, e num rápido movimento joga-o ao
mar.
—Queria saber de uma boa desculpa? Isto parece uma boa desculpa. Voltar
sem parte da titulação, incluído marujos. Como poderia acreditar que
apenas eu e todos meus marujos voltamos ilesos e quanto a rei e seus
bravos cavaleiros dizimados pelo infortúnio?
—Nunca! Quanto menos homens voltarem, mais chances teremos para
continuar vivos.
Estava bem claro a todos que o capitão perdera a razão, ou percebera
tardiamente da grande besteira que fez. Dali por diante seria cada um por
si, e Malenca poderia sofrer um motim e perder o Corvo, mas pra isso
lutaria, e até este momento os marujos não estavam organizados para tal
feito.
Seria uma noite longa, em um navio que mal ao certo sabia seu destino, e o
que os aguardavam, enquanto isso no meio da madrugada o capitão
amaldiçoava seus fantasmas que devoravam em pesadelos sua alma na
escuridão.

Longe dali as atenções da noite voltam-se ao cavaleiro negro, Drakos, que


mais uma vez subira ao penhasco em seu cavalo, donde as estrelas
compartilhavam da maldade sob o mesmo teto de estrelas. De suas mãos
cobertas por uma luva negra que ainda há de pesar sobre o reino de Arthur,
abre-se, e libera uma pequena bola de luz azulada até onde navegava o
Corvo, e numa mensagem telepática, capta o sofrimento do capitão que
havia traído o rei. Percebera então de que o mal fora cumprido, e que
Malenca estava voltando.
Esse foi um momento de rara satisfação para Drakos, pois começava a
instalar o sofrimento sobre o reino de Arthur.
A pequena luz azul voltava para suas mãos, mas antes disso, fez com que
parasse no ar,
Dirigindo-a aos aposentos da rainha.
Drakos podia ver em sua mente a rainha sentada na cama penteado seus
longos cabelos. Sentiu inveja de Arthur por viver com uma bela e talentosa
rainha. Logo lhe veio à mente em possuí-la, já que Arthur não iria mais
retornar.
Em algumas semanas todo o reino sofreria com a notícia dada por Malenca.
A noite estava silenciosa, e antes de dormir a rainha foi à janela para olhar
o mar e um pensamento de boa noite lançado além do horizonte para
Arthur.

Deveria ser uma manhã como outra qualquer, se não fosse da visão do cais
indo em direção ao horizonte. O Corvo aproximava-se lentamente trazendo
a má notícia sobre rei. Muitos não acreditavam que fosse o Corvo, pois a
viagem seria demorada, mas cada vez mais perto, tiveram a certeza quanto
viram a caravela do rei.
—O rei está voltado! Gritaram alguns pescadores.
Logo a mensagem chegava à rainha, que ansiosa tratou de se arrumar o
mais rápido possível para estar lá na praia quando o navio ancorasse.
O capitão em tom enérgico falou aos marujos: - Pela última vez, lembrem-se
bem de como foi que o rei e seus cavaleiros e cartógrafo desapareceram. Se
alguns de vocês contarem outra história, seremos todos enforcados.
A alma da rainha congelou quando desceu apenas um bote levando apenas
o capitão e alguns dos seus marujos. Rapidamente pediu a seus soldados
que escoltassem o capitão até ela para explicações.
—Capitão! Onde está Arthur! Você pode me disser qual o motivo? Onde
deixou o rei?
Malenca se ajoelhou diante da rainha e numa encenação dramática, e falou:
- Que o céu caia sobre minha cabeça, majestade! Uma desgraça pensei até
que não voltaria mais, mas talvez o senhor quisesse que alguns
sobrevivessem para dar essa terrível notícia.
—Diga logo, Malenca, meu coração está muito agoniado. Vamos, diga!
—Vivemos um inferno no mar, após alguns dias navegando em mares
desconhecidos, surgiram monstros, alguns até maiores que o Corvo, e o rei
e cavaleiros lutaram bravamente com suas bestas e espadas, mas o
infortúnio aconteceu. Um dos cavaleiros foi arrancado do navio por um
monstro feroz que numa só bocada, ficou com metade de seu corpo entre
suas enormes e poderosas mandíbulas, enquanto o rei deferia-lhe golpes de
espadas, mas o couro do monstro era mais resistente do que as armaduras
e impenetráveis até pelas flechas das bestas. Nesse dia perdemos Sir Adam,
e um dos meus marujos, mas não foi só isso. No dia seguinte avistamos uma
ilha, descemos os botes, mas onde estava o rei e seus dois cavaleiros, de
repente um redemoinho começou a se formar diante de nós, e infelizmente
o bote onde estava Arthur foi tragado para dentro das águas. Remamos
com todas nossas energias para sair dali, e escapamos.
—Meu coração não quer acreditar do que saiu de sua maldita boca
Malenca, apesar de ser uma rainha justa, o Corvo será confiscado e você e
seus homens irão para as masmorras, até que resolvam contar o que de
fato aconteceu ao rei.
—Mas majestade, essa é toda a verdade, e ainda bem que voltamos, pois
assim quis o senhor para noticiar o desaparecimento do rei.
—Guardas! Levem o capitão e seus marujos para a prisão lá nas torres.
A rainha estava sentindo seus pés perderem o contato com o solo, como se
fosse areias movediças encobrindo seus sonhos e esperanças na escuridão
onde habita o medo.

No castelo

A forte intuição feminina da rainha pressentia de que aquilo era tudo uma
farsa, ainda mais relatado por Malenca, e fosse o que fosse, descobriria toda
a verdade. Simplesmente não aceitava a ideia de que Arthur deixara esse
mundo.
Nada podia acalmá-la, e pensou que o melhor seria buscar forças para não
deixar sua alma padecer ao enorme infortúnio que abalou o reino e seu
coração.
O que podia fazer naquele momento de tristeza, se não orar pedindo
proteção para a alma de Arthur. Só, e distante de todos seus súditos, entrou
na capela para orar. Olhou para o crucifixo preso às paredes de pedras
acima de sua cabeça, pediu ao senhor forças para ir ao fundo de toda a
verdade, e que levasse uma luz de consciência para o capitão, e que se
arrependesse e dissesse toda a verdade.
Não sei se naquele momento o senhor ouvira seu pedido, mas uma pomba
branca pousara sobre a cruz por alguns segundos, depois voou até a janela.
Sua sombra se projetara sobre duas rosas vermelhas sobre o altar.
Sentia seu coração junto de Arthur, e ainda pulsava distante, porém,
inseparáveis.
Em seguida entraram os cavaleiros, e um a um se ajoelharam para rezar
por Arthur e seus companheiros.

Caia a noite sobre o reino, e os archotes iluminavam o salão principal do


castelo. Criava-se um contraste de luz e sombra, dividindo esses dois
mundos sobre as paredes de pedras. Ali a rainha se reunia com todos seus
cavaleiros, traçava planos a fim de resolverem o mais rápido possível, mas
sem saber quando, onde e em que situação Arthur e de Sir Adam, Breton e
Carlton se encontram. Ficava difícil suportar ataques de invasores ao
castelo, e precisam fazer algo rapidamente.
Sir Dimitri que estava ao lado da rainha falou: - Tenho certeza de que
Malenca está mentindo, e tem algo muito grave por detrás de tudo isso, e
continuou: - Nada adianta deixá-lo preso nas masmorras.
-Então o que sugere Sir Élder?
-Vamos fingir que acreditamos, e o soltamos. Colocaremos espiões na
taberna, e, com certeza, esse será o primeiro lugar aonde irá, depois de
vários dias de abstinência.
Sir Ferdinad fez uma expressão brilhante no olhar e falo: - Evidente!- mas
nem será necessário espiões. Lembro-me de uma prostituta que sempre
procura Malenca quando volta de suas viagens. Por algumas moedas de
ouro, fará com que ele beba bastante vinho, para fazê-lo cair na armadilha,
e confessar o que realmente fez ao rei e aos nossos companheiros.
A rainha voltou a fala depois de escutar atentamente a todos: - Tem toda
razão! Deixá-lo preso só fará aumentar a angustia e sofrimento de todos,
mas que fique bem claro que todos os seus passos após sua soltura deverá
ser seguido, mas de maneira nenhuma ele desconfie isso. Sejam cautelosos.

Nos subterrâneos escuros do castelo ficavam as masmorras, onde o ar


úmido e de odor acre invadia as narinas de Malenca. Ele encontrava-se em
posição de cócoras olhando fixamente para uma fresta da porta onde a luz
entrava Parecia à espera alguém para libertá-lo. Um dos marujos pergunta
ao capitão: - Qual a vantagem em trairmos o rei deixando-o naquela ilha? A
masmorra é o nosso prêmio?
Outro marujo em tom irônico retruca: - Ora! Não vê quanto ouro ha nessa
prisão, quantas mulheres e bebidas a nossa volta! – Malenca, você é um
imbecil!
-O que é isso um motim dentro da prisão? Levanta rapidamente e com um
olhar ameaçador, diz: - Já disse que isso será por pouco tempo, e quando
sairmos, Drakos nos recompensará pelos serviços prestados.
—Drakos esta pouco se importando com você, Malenca.
—Se não calar a boca, sentira o gosto do meu punhal quando formos
libertados, além do que aquela ilha está cheia de ouro, e só nos sabemos
como voltar.

A noite caia sobre a vila, e a notícia de que o rei desaparecera, era o


comentário de todos, e agora se sentiam mais vulneráveis aos ataques dos
inimigos, mas a vida de qualquer maneira contínua e a taberna está
funcionando como se nada tivesse mudado no reino, afinal ali era o lugar
onde muitos iam para esquecer os problemas e se divertir.
Sir Ferdinand ao entrar na taberna, procurou de forma discreta a prostituta
com que Malenca costumava se engraçar. Não demorou muito a avistou na
outra extremidade do balcão conversando com um comerciante. Fez um
pequeno sinal ela então parou sua conversa e com um olhar intrigante tirou
os olhos do comerciante, como se aquele cliente fosse pouco importante, e
foi ao encontro de Sir Ferdinand.
-Ora! Não é sempre que desperto interesse por algum cavaleiro do rei!
—Diga-me o que sabe sobre Malenca?
Olhando o com um ar desconfiança, perguntou?
—O que deveria saber? Sou apenas uma mulher, não me interesso pela vida
particular de cada um com quem saiu!
—Olha, sabemos que ele tem uma preferência por você.
—Doce ilusão em pensar que um cavaleiro me desejasse.
—E quero.
—Verdade!
—Não é para mim.
—Ora! Quem sabe se é para Sir Adam, ele sempre me pareceu tímido?
—Prestará um serviço coroa. Será bem recompensada em moedas de ouro.
—Olha não quero confusão com Malenca.
—Porque se preocupa com aquele marujo traidor do reino? Você acha que
ele pensou em vocês quando sumiu com o rei e os cavaleiros, deixando o
castelo e a vila a mercê dos inimigos. Quem defenderá a vila quando
começarem os incêndios e assassinatos?
—Verdade, mas o que quer de mim?
—Logo, ele estará solto por falta de provas de que é o responsável pelo
desaparecimento do rei. Quero que descubra qual a verdade disso tudo, e
somente você poderá arrancar de sua boca, o que realmente aconteceu. Dê-
lhe um belo porre.

Na manhã seguinte os guardas se dirigiram para a masmorra onde Malenca


dormia.
—Acorde Malenca, - a rainha quer vê-lo, vamos!
— Pensei que esse dia nunca chegaria, estava até me acostumando com o
serviço da hospedaria.
Malenca levantou, chacoalhou, tirou o pó de suas roupas, espreguiçou para
recuperar os movimentos do corpo, pois alguns dias de prisão fez com que
ficasse a maior parte do tempo deitado ou sentado num solo úmido e frio
com poucas palhas que serviam de cama e cobertor. – Então vamos lá ver a
rainha!
A rainha o esperava no salão principal, com um olhar severo, porém não
tão inamistoso a ponto de despertar desconfiança na velha raposa dos
mares.

—Capitão Malenca, por muito tempo você prestou serviços à coroa, e


adquiriu a confiança de Arthur, porém deixou uma mancha nesse laço de
confiança, mas por outro lado não há como provar que esteja mentindo.
Você, e seus homens serão libertados, mas deverá por um tempo não voltar
a navegar. Perderá o título de capitão até que a verdade através do tempo
venha à tona. Só peço que não se afaste do reino.
—Majestade, como viverei sem navegar? Passei minha vida toda nos mares,
como mercador!
—Pois então volte a sua antiga atividade de pescador. Para isso basta um
barco e não um navio que lhe foi dado devido aos votos de confiança do rei.
Se falar a verdade, não perca a esperança de um dia voltar a navegar no
Corvo. Agora vá.
Malenca saiu da posição de joelhos diante da rainha, e com um movimento
de balançar a cabeça de que estava bem claros os termos impostos a ele, se
dirigiu até os portões do castelo escoltados pelos guardas.
Ao sair do castelo, Malenca já estava sob vigia de olhares atentos, mas
quanto se esperava que fosse a taberna para comemorar sua liberdade,
tomou outro caminho em direção ao castelo de Drakos.
Ao chegar ao castelo, foi recebido por Godofredo.
—Ah, é você! Drakos está a sua espera.
Malenca voltara ao ninho da serpente, a atmosfera que cercava aquele
castelo era parecida com as das masmorras, sentiu um calafrio na espinha
ao lembrar-se dos dias de cárcere, mas voltar atrás já era tarde, e agora iria
em frente nessa aliança com Drakos.

—Ora, ora! Quem temos aqui, se não a velha raposa do mar, Malenca!
—Está feito Drakos, o rei e três dos seus cavaleiros estão fora do reino, e
isto me custou a perda da confiança da rainha e o Corvo. Espero ser bem
recompensado por toda essa desgraça que caiu sobre mim e meus homens.
Um capitão sem seu navio não é nada.
—Calma Malenca, agora com o reino mais fragilizado, cedo ou tarde terão
que fazer uma aliança comigo, e lhe asseguro que terá tudo o que deseja.
—Maldita hora em que me aproximei de seu castelo, estava bêbado e
perdido. Se tivesse recusado a ajuda de seu serviçal nada disso teria
acontecido.

O calabouço

—Malenca, quero que veja algo, vamos até o subterrâneo do castelo.


Ao descerem as escadarias sinuosas e escuras, iluminadas apenas por
alguns archotes esparsos, chegaram a uma imensa caverna com uma série
de gravuras em formas de símbolos e desenhos estranhos. Ali a iluminação
brotava de cristais enormes e de uma pureza jamais vista. Encravados nas
paredes da rocha de coloração cinza azulada, colunas greco-romanas, e
esculturas gigantes de semideuses em pedras escuras, sustentavam o teto
da caverna.
Folhagens de grandes dimensões em cores e formas nunca vistas antes
pelos olhos de Malenca em suas inúmeras viagens, Ali era outro mundo.
— O que foi capitão? Perdeu a fala?
—Isso tudo é real, Drakos?
— Sim, mas é um mundo artificial criado por antigos habitantes que
partiram a milhares de anos. Aqui existe uma biblioteca contando toda a
história desse povo. Por um longo tempo desço aqui todos os dias apos a
morte de me pai, e comecei a decifrar esses intrigantes símbolos, e aprendi
muito sobre assuntos científicas, e mistérios revelados dessa antiga
civilização.
—Se você possui essa maravilha bem abaixo das ruínas de se castelo, não
entendo o porquê de querer se livrar de Arthur, e dos cavaleiros. Qual a
razão?
—Simplesmente sigo ao que fui designado, minha natureza deseja possuir e
colecionar castelos, e o de Arthur com certeza será o mais importante, e
depois outros mais distantes. Quero meu nome lembrado, onde minha luva
negra pesar sobre a cabeça, desde servos até nobres. Quero a todos
reverenciando minha bandeira, e meu cavalo por onde passar.
No centro daquele imenso salão corria um riacho que terminava numa
parede tão polida que toda a imagem era refletido tal qual a um espelho
negro. Nesta parede espelhada as águas corriam para dentro do espelho,
onde os olhos de Malenca não acreditavam no que estavam vendo.
— Aqui deve ser a morado de algum demônio! Um rio que corre para
dentro de um espelho!
— Esse é o problema. Apenas essas águas conseguem passar além dessa
parede.
No dia em que conseguir também passar, minha vitória será praticamente
certa.
—Deve haver muito ouro ali.
—Provavelmente, mas não é isso que procuro, mas se houver fique com
uma fração, mas cuidado ao construir um castelo, talvez eu possa tomá-lo
depois. - ria ao olhar para Malenca com um ar de sarcasmo.
— Estou começando a achar que fiz a coisa certa em deixar o rei naquela
ilha que não existe em nenhum mapa de navegação.
—Fez sim, além do que, o reino que agora pertence à rainha está prestes a
ser invadido. Com Arthur ou sem ele isso um dia aconteceria, e todos que
estão ali pagarão caro por isso. Você saiu a tempo, sua velha raposa dos
mares.
—Agora vá Malenca, ficarei mais um pouco aqui, Godofredo espera por
você lá em cima. -Puseram-me pra fora das masmorras vestido com estes
trapos. Estou sem moedas, necessito de novos trajes, Drakos.
—Sei, diga isso ao Godofredo. - ele lhe dará algumas, mas cuidado com o
que fala por ai.
— Quando o verei novamente?
-Breve, receberá notícias minhas, mas agora vá, preciso ficar só.
Sem a presença de Malenca. Drakos acessaria outras câmaras, sem que a
velha raposa dos mares fizesse perguntas demais, e fugisse assustado com
o que visse por lá.
Ao entrar numa das câmaras, a sensação era de voltar num tempo anterior
a era cristã, onde espécies inteligentes de raças não humanas existiram.
Eram demônios petrificados dormindo o sono da eternidade enquanto seus
corpos se conservavam na inanição.
Diante das estátuas vivas em estado latente, Drakos se alimentava de uma
energia que emanavam delas. Olhares fixos e pensantes acompanhavam
seus passos, envolvidos na penumbra, por onde feixes de luzes emanavam
do salão principal.
A caverna na verdade era uma catedral do mal. Aprisionados ali estavam os
seres que ousaram aniquilar toda a raça humana. Estes seres possuíam um
conhecimento tecnológico avançadíssimo, porém sem nenhum sentimento,
e compaixão. Drakos também mal sabia de que ali originaram todas as
doenças, flagelos e desgraça das civilizações extintas. Era um risco para
toda a humanidade, caso Drakos quisesse despertá-los.
Não era a toa que morava entre as ruínas, e que ninguém ousava passar por
ali.
A maldição que caiu sobre o castelo se deu há muito tempo, onde o Barão
Nitrus, pai de Drakos ouvia estranhos sons vindos de baixo do solo, e ao
descer até o calabouço as vozes se intensificavam, então se deitou ao solo e
colocando seu ouvido, sentiu que eram de lá que vinham. Chamou alguns
homens para cavar. Cavaram por horas até a exaustão. Depararam-se com
um bloco de pedra com símbolos indecifráveis até então, mas para removê-
lo dali necessitaria de mais homens e alavancas.
Ao removê-lo havia uma entrada, e com os tocheiros a mão desceram as
escadarias que pareciam nunca findar, e um pouco antes do término dos
degraus, uma fraca luminosidade ia dar em um portal, que ao se
aproximarem se depararam com uma gigantesca construção encravada nas
pedras de uma caverna, aquela imagem parecia surreal, mas continuaram a
caminhar até que o som que o barão ouvia se intensificou e penetrou nas
cabeças fazendo com que seus cérebros vibrassem numa frequência indo
ao limite da dor humana. Desmaiaram todos, e assim permaneceram por
longas horas.
Depois daquele ocorrido o barão Nitrus não fora mais o mesmo, uma força
não humana controlava seus pensamentos, fazendo com que se tornasse
uma ameaça ao reino do rei Uther.

A taberna

Malenca carregava algumas moedas em sua algibeira, mal podia esperar a


hora de entrar na taberna. Há um bom tempo não sentia o sabor do vinho, e
o prazer de entorná-lo de uma só vez. Comprara um perfume de um
mercador árabe para sua Mimi, bom pelo menos era assim que ele a
chamava quando se divertiam regados a vinho e hidromel.
Ao entrar na taberna todos pararam de falar, fez-se um silêncio que lhe
causara certo desconforto, mas mesmo assim dirigiu-se ao taberneiro e
pediu:
— Uma caneca de vinho pra começar a noite!
— Aqui você não é mais bem-vindo, Malenca. Disse o taberneiro
— Qual o problema? Tenho moedas e pago até antecipado.
— Pode guardar suas moedas, aqui ambos não têm nenhum valor.
— Do que me culpam? Fui perdoado pela rainha! Os monstros marinhos
devoraram o rei e os cavaleiros. Vá atrás desses monstros e vingue o rei, já
que é tão valente assim!
O taberneiro então retirou um porrete, e falou firmemente:
— Já disse para sair! Vamos ver o quanto macho é agora se seu punhal.
Sir Ferdinand, que estava lá para assegurar a eficiência do plano, interveio:
— Deixe o ficar, taberneiro. A própria rainha o perdoou, e creio que deva
fazer o mesmo, caso contrário nossa rainha ficará sabendo do que houve
aqui, e não será bom para você. Malenca tentando relaxar do inconveniente
olhou para Sir Ferdinad e disse: - Sei que é difícil alguém crer em mim, fico
grato por ter me ajudado.
— Não tem que agradecer, foi só uma questão de justiça. Agora fique com
seu vinho.
Sir Ferdinad olhou para Mimi que estava numa parte sombria da taberna
conversando com um viajante, e com o sinal combinado ela foi até Malenca,
surpreendendo-o por trás.
— Quanto tempo Malenca! Pensei em não vê-lo por aqui! Passou as mãos
em suas costas, sentou em seu colo, e tomou um gole do seu vinho.
— Mini! A velha raposa do mar jamais abandona seu navio e sua sereia.
—E o que trouxe pra mim desta vez?
—A última viagem desgraçou minha vida, mas tenho algumas moedas para
gastarmos juntos, além é claro deste perfume vindo do oriente.
—Ora, ora, Malenca, quanta gentileza! Você sempre será meu capitão
predileto.
Naquela noite consumiram vários canecos de vinho, mas Mimi com seu
grande talento de dissimulação fez com que pensasse que ela também
estava embriagada.
— Malenca querido, pensei que nunca iria sair lá das masmorras.
—Não quero falar sobre isto agora, apenas esquecer e me afogando em
seus abraços, e nesta caneca de vinho. Olhou para o fundo da caneca, parou
por um instante e gritou: - Taberneiro traga mais vinho. Mimi sentiu que
mais um caneco, ele não aguentaria e fez um sinal para Sir Ferdinad que
impedisse que lhe fosse servido mais vinho.
— Malenca me fale sobre esses monstros marinhos, são tão terríveis assim?
—Que monstros? Do que está falando?
—Nada não, só pensei que existissem monstros além-mar.
- Se existissem monstros eu já teria sido devorado nesta última viagem
insana.
—Imaginei que meu bravo capitão lutara com monstros marinhos para
salvar o rei, mas, diga-me como o rei desapareceu?
—Desapareceu do mapa apenas. Onde ele está não existe registrado em
nenhum mapa. Entendeu?
Depois de muitas risadas, voltou a falar:
—Ele agora reina numa ilha de caranguejos junto com seus fiéis cavaleiros.
Malenca mal se dera conta de que Sir Ferdinand estava sentado a suas
costas e ouvindo a conversa. Levantou, e deu ordem de prisão a Malenca.
— O que é isso? Quero beber mais, onde está meu vinho taberneiro inútil.
— Você já falou o suficiente, Malenca, agora vamos voltar para as
acomodações reais do castelo.
No dia seguinte ao acordar Malenca se viu no mesmo lugar que lhe dava
tanta angustia e fobia: as masmorras. Na situação em que se encontrara não
tinha certeza se sonhou que havia sido libertado e visitado um estranho
mundo subterrâneo do castelo de Drakos, e bebido vinho com Mimi.
—Parece que foi tão real quando me vi livre desse lugar sombrio e frio.
Será que perdi a noção das coisas, e estou ficando louco? Ao colocar a mão
sobre a algibeira percebeu que tudo fora real, pois as moedas ainda
estavam lá.
—Guardas! Guardas! Por que razão estou mais uma vez preso nesse lugar
nefasto? Fui perdoado pela rainha. Esqueceram?
Ficou ali sem que ninguém respondesse a seus chamados, agora sozinho
sem os marujos, sem navio, completamente isolado, e sem entender o
porquê voltara para lá.
Depois de um longo tempo apareceu um soldado com uma vasilha
contendo água e pão.
—Diga soldado! Por que fui preso desta vez?
—Você fala de mais, só isso.
Enquanto discutiam, Sir Ferdinand descia até as masmorras para ter uma
conversinha com Malenca.
—Como nosso hóspede está se sentindo nesta manha?
—Péssimo, parece que o mastro caiu sobre minha cabeça, e nem sei porque
estou aqui.
—Foi uma confissão que o trouxe de volta.
—Quer explicar isso melhor.
—Pois não! Sempre tive curiosidade em alquimia, e por várias vezes visitei
o mago quando estava trabalhando em seu quarto, e acabei conhecendo o
efeito de algumas ervas e misturas. Dai resolvi ir até lá e encomendar a
porção da verdade e coloquei em seu vinho.
Malenca percebera que sua farsa fora descoberta, mas até onde ele sabia, o
deixou um tanto apreensivo.
—Diga-me então tudo o que foi que falei na Taberna?
—Você falou o que queríamos saber. Satisfeito?
-Sobre minha luta com os monstros, foi isso que falei! Quase perdi minha
vida também nessa viagem para tentar salvar nosso rei.
—Agora é tarde demais, e amanhã irá falar com a rainha, mas creio que ela
não será tão complacente como foi da última vez.
—Vão enforcar-me no carvalho?
—Só ela é quem irá decidir Malenca.

Castelo de Drakos

A notícia sobre o incidente na taberna com a prisão de Malenca chegara ao


conhecimento de Godofredo, que se dirigiu a Drakos: - Meu senhor soube
que Malenca esta de volta a prisão.
—Grande imbecil, provavelmente irão saber o que de fato ocorreu a Arthur,
mas, por outro lado, isso pode ser até bom.
—Não vejo que benefício traria ao senhor, se Malenca falar de quem partiu
a ordem para sumir com o rei.
— Ainda é cedo pra comentar sobre isto Godofredo. A prisão de Malenca
não foi de todo mal para mim, pode ter certeza.
Sem entender bem o motivo, Godofredo sai, deixando Drakos sozinho com
uma expressão diabólica, e um pensamento que certamente iria resultar
em sofrimento para os habitantes do reino de Arthur.
Drakos foi até a caverna, abriu uma câmara onde havia vários
pergaminhos, e começou a estudá-los. Era um tratado do ano 1230 da era
Genus, ou algo que se estimasse há 500 mil anos antes da era do senhor,
mas pare ele era de pouca importância saber sobre datas ou costumes da
época, mas sim, na eficácia para seus planos.
O tratado era a respeito sobre O Tempo, e como criar mecanismos para
anular a consciência durante certo período, pra depois despertá-la no local
e data desejada, mas existia outro fator que se referia à dimensão, onde
ainda não estava bem claro, em que camada deveria vibrar para o
correspondente universo que ocupasse o mesmo espaço físico. Estudou-os
por várias horas até perder a paciência e praguejar o nome de Arthur:
—Por várias vezes tentei me reconciliar com Arthur, mas por capricho do
destino tive minha vida ceifada e deixada à parte da convivência humana, e
confinado neste castelo de mau agouro, nada me restava senão buscar esse
tempo perdido, e reclamar a posse do reino de Arthur. Tê-lo em minhas
mãos seria um momento de glória, e sentar em seu trono. Sei que de fato
não me pertence, mas usurpado por intervenção divina de um Deus que
atenda meus desejos. Adoraria esse Deus, seja qual for sua natureza—
maldita ou não.
Ao proferir tais palavras, um corvo pousou na parte mais alta da ruína do
castelo, e gritou por várias vezes, e seus gritos sobressaíram sobre os
demais corvos que voavam ao seu redor. Um sinal de que a conspiração
começara.
O pergaminho que Drakos segurava lhe foi arrancado de suas mãos
repentinamente por um sopro forte do interior daquela câmera.
Instintivamente, abaixou para apanhá-lo, mas quando foi desenrolá-lo, o
pergaminho estava petrificado, e não pode ser mais aberto.
—Aqui parece que tudo vira pedra, mas porque fui impedido de continuara
a ler esse pergaminho?
- Chegará o momento certo Drakos, disse uma voz vinda das paredes da
câmara.
— Será algum Deus que pretende atender meus apelos?
— Seus desejos despertaram-me destas paredes úmidas e sombrias do
Tempo, logo o atenderei, mas terá de achar um meio pra que possa me
libertar.
—Um Deus que não tem o poder de se libertar sozinho! Que tipo de Deus é
então?
—Ora!- um Deus que atenderá seus pedidos. Quer saber algo mais?
—Desejo possuir o conhecimento para atravessar dimensões. Pode me
conceder?
—Claro que posso, fui eu quem colocou essa teoria em prática.
— Tenho pressa.
— Vamos com calma! Sim a terá, mas primeiro é preciso que me liberte.
-— Que garantia terei eu de que cumprirá meus desejos?
— Você sabe qual o motivo de nunca ter sido aceito pela corte?
— A culpa será sempre deste castelo que me amaldiçoou.
— Não é bem assim, Drakos. Não somos humanos, e estamos confinados a
permanecer neste espaço. Inclusive você. Sabia? Está é a razão de nenhum
humano querer estar na sua presença.
— E qual o motivo para isso?
— Instinto de sobrevivência. Seu olhar, Drakos - nunca inspirou confiança
dos humanos.
— Eu sou tão humano quanto a eles, isso não é verdade.
—Está bem, isso é parte verdadeira.
— Não me convence.
— Você é meio humano, se quer saber! Isto é uma verdade.
—Sir William Blakington meu pai e Lady Gláucia, minha mãe sempre me
pareceram humanos, não vejo uma ligação entre vocês.
— Você conviveu mais com seu avô, o Barão Brutus Blakington, e pouco
conheceu seus pais, mas posso lhe provar.
— Vê essa marca que tem no braço esquerdo?
Drakos olhou para ela levantando a camisa, e falou: - Apenas uma mancha
de nascença.
— Lembra que seu avô tinha igual, e te lembrava disso o tempo todo?
— Sim, ele dizia que era a marca da família, e que tanto meu pai como meu
bisavô as possuíam.
—Olhe bem para essa marca, e depois te mostrarei a mesma marca cravada
na pedra em uma dessas câmaras.
— Conheço bem o local e não há nenhuma pedra com essa mancha.
— Esta é uma câmara secreta, e para acessa lá, precisa de certos rituais que
deverá executar em breve.
O vento soprou fortemente dentro da caverna, e por algumas fissuras
produziram um som de notas musicais sequenciais, fazendo com que o
sangue escorresse de seu nariz, e ao tentar estancá-lo com a manga da
camisa, viu ali se formar a mesma mancha da marca de família, e a partir
dali a voz não respondeu mais suas perguntas.
Tinha dúvidas se deveria realizar esses rituais, mas se não fazê-lo como
conseguir meios para realização de seus planos. Seu meio lado humano
pedia para que não fizesse acordos com esses seres de natureza
desconhecida, mas o lado não humano de Drakos também pedia para
libertá-los.
Decidiu não tomar decisões precipitadas, e talvez conseguisse por si
próprio desvendar a passagem de dimensões, mas pra isso teria de roubar
os pergaminhos que faltavam e provavelmente seriam Tratados de Viagens
Dimensionais, mas, alguém deveria entrar no quarto do Mago.

Malenca e Rainha

Na manhã seguinte a rainha pediu a presença de Malenca no salão


principal.
Temendo o pior, ficou ajoelhado e cabisbaixo a espera de sua sentença.
Quase nenhuma esperança restava nos olhos de Malenca, apenas
aguardava sua sentença de morte.
— Sinceramente não sei por onde começar, disse a rainha ao se levantar do
trono e ficando a poucos passos de Malenca.
Olhou para ele. Esperava algum esboço de arrependimento, e continuou a
falar:
— Há muito tempo não executamos traidores no velho carvalho, e talvez
ele tenha sido esquecido por nós, mas quando planejou voltar para o reino,
ao abandonar o rei em uma ilha fora da rota de navegação. Sinto que esta
noite deverá começar a sonhar com o velho carvalho.
Malenca levantou a cabeça movendo os lábios, mas as palavras demoravam
a sair de sua boca.
— Majestade sabe que não há de me perdoar, mas aquele Malenca que
deixou o rei naquela ilha não era exatamente eu.
— Está bem, vamos supor que estivesse enfeitiçado, e agiu contra sua
vontade. O certo seria disser a verdade para mim, e não para tal mulher de
poucas qualificações que bebeu com você na taberna antes de ser preso.
— Não me lembro de nada majestade.
—Se não lembra o que falou quando estava bêbado, não vem ao caso, mas
quero ouvir de sua boca, por que motivo deixou Arthur em tal ilha?
— Majestade juro! - o que mais quero é voltar atrás e trazê-lo de volta ao
reino, para desfazer o erro que tanto me envergonha, e de nada adiantaria
ser enforcado, se somente eu sei a rota certa para aquela ilha.
Na verdade a esperança de Malenca é de que Drakos invadisse o castelo
antes de sua viagem para a ilha, libertando-o dessa situação desastrosa.
— Certamente voltará para tal ilha, o mais rápido possível, com alguns dos
cavaleiros e marujos que escolheremos pessoalmente sem que nenhum dos
seus voltem a navegar no Corvo.
— Quando devo partir majestade?
—Aqui você não está em condições de fazer perguntas, não se esqueça de
que ainda é prisioneiro, mas antes que vá não está se esquecendo de algo?
—Do que exatamente, majestade?
— A pergunta que lhe fiz, e ainda não respondeu.
—Isso é tudo, majestade.
A rainha olhou para Malenca com certa firmeza, e falou num tom mais
severo:
— O que foi que o levou a abandonar o rei naquela ilha?
— Isso é o que me pergunto todos os dias, eu apenas...
—Basta de mentiras Malenca! Sabemos que dias antes de viagem você
esteve no castelo de Drakos, não é mesmo?
—Sim, majestade, ele me enfeitiçou, mas fui levado para dentro pelo seu
criado, dizendo que me ajudaria a curar minha bebedeira.
—A vida do rei neste momento é mais importante do
que te mandar para a forca, e está é a tua sorte.
— Certamente, vossa majestade.
—Agora volte para masmorras.
Malenca saiu da posição de joelhos, e manteve a
cabeça baixa, indo aos poucos recuperando o fôlego
de sua alma que estava convencida em deixar aquele
gordo e pesado corpo pendurado no velho carvalho.
Depois do encontro da rainha com Malenca, ela
decidira ir só até a capela e orar por Arthur, antes da
escolha de quem iria nesta viagem de resgate ao rei.
Apreensiva, mas também esperançosa por saber que
seu marido estava vivo.
Semanas havia se passado enquanto Arthur
permanecia preso na ilha. Por sorte puderam
encontrar um abrigo ao lado do templo. A caça até
que era farta, e muitas frutas exóticas para serem
saboreadas.
O cartógrafo já mapeara toda ilha, catalogou plantas,
e pensava se um dia voltasse ao reino poderia
mostrar essas maravilhas jamais vista no velho
mundo. Sua preocupação agora seria em descobrir
alternativas de suportes para continuar seus
desenhos, e pigmentos vindos da terra e plantas para
as suas aquarelas.
Arthur preocupado com o que poderia ter acontecido
a rainha enquanto permanecia prisioneiro da ilha
cercada pela imensidão de águas, onde os monstros
marinhos eram apenas frutos da ignorância, e que
talvez Malenca tenha usado esse argumento para se
safar. Arthur parecia conhecer bem a mente
perturbada, mas astuta de Malenca, que apesar de
desnorteada sempre soubera se safar. O Mago estava
ali ao seu lado tentando ler o mundo através das
formações de nuvens, e sem tirar os olhos do céu
disse a Arthur:
— A leitura dessas nuvens sempre foi um desafio, não
se comportam no mesmo padrão que as estrelas e os
astros. Nada se posiciona ao acaso, isso posso afirmar
o fato de estarmos presos a essa ilha já era esperado.
— Diga o que vê nessas nuvens, Mago?
—Espere um pouco, estou tentando associá-las ao
sonho que tive nesta noite, e procurando um espaço
entre as nuvens para poder criar uma leitura.
O mago parou por um tempo de falar, enquanto
Arthur olhava para ele esperançoso de que visse algo
nas nuvens, que para ele nada mais eram do que
simples nuvens que protegiam das queimaduras de
pele.
— Sim Arthur, posso ver que há um movimento do
reino para nos resgatar, mas, ao mesmo tempo,
enfraquecerá a defesa. A rainha terá de procurar uma
aliança para salvar o reino.
— Pode intervir mago?
—Talvez possa se achar certas ervas e pedras e
posicioná-las no centro do templo, e buscar algum
meio pra me comunicar com Sir Ferdinand, ele
sempre foi interessado no meu trabalho. Essa noite a
lua estará favorável a esse tipo de realização.
—Então faça isso, mago.
—As nuvens continuam a mandar mensagens, e é fato
que Drakos esteja envolvido com o nosso abandono
aqui nessa ilha. A rainha deverá tomar muito cuidado
com ele.
Ritual

A noite caiu sobre a ilha e a Lua iluminava as pedras dos templos,


criando sombras que despertavam o mistério na mente de todos ali
presente.
As tochas estavam no círculo, minuciosamente espaçadas entre os
monólitos, envolvendo os segredos da noite, onde as chamas dançavam
movidas pela brisa noturna. O Mago retirou de sua bolsa presa à cintura
algumas pedras que havia apanhado das areias da praia do reino, e as
colocou em cima das ervas selecionadas da ilha, assim faria uma ponte
entre o reino e a ilha. Pediu para que Sir Breton tocasse sua flauta e após
alguns minutos de concentração ouvindo a música que emanava da flauta, o
Mago entoou uma melodia que intercalava em harmonia com as notas
musicais, ao som de sua voz, a alma se elevara produzindo um estado de
estase em todos os participantes, e despertando os seres que habitavam
aqueles monólitos. Uma luz emanou de cada um dos monólitos, que aos
poucos iam tomando formas e se materializando em corpos humanos bem
delineados e definidos por músculos numa pele de cor do cobre sem
nenhuma imperfeição, eram semideuses onde o Tempo não possuía
domínio sobre eles, e sendo assim tinham vida eterna, mas deveriam viver
a maior parte do tempo naqueles monólitos e somente em ocasiões
especiais sairiam para o mundo dos humanos.
Ao se materializarem, um dos seres se aproximou de Arthur fitando-o com
seus olhos que continham uma profunda sabedoria e sem disser uma
palavra entrou em sua mente, e lhe fez ter visões que até então Arthur
nunca havia vivenciado. Pode ver a rainha traçando planos com os
cavaleiros, e quem deveria ir nessa viagem, desceu até as masmorras e viu
Malenca, pensativo e cabisbaixo, mas, de repente, saiu de seu castelo e
penetrou no castelo de Drakos. Sentiu um calafrio ao observar Drakos
sentado em uma cadeira toda entalhada com formas de serpentes que
pertencia ao Barão Brutus Blakington. Estava ali sozinho olhando para as
paredes que se consumiam com o tempo, mas continuou e foi dirigido até
os subterrâneos, onde pela primeira vez tomou conhecimento da caverna.
A principio se assustou ao ver outro mundo bem em baixo do castelo de
Drakos. Aquelas ruínas guardavam um segredo, e somente agora Arthur
pode entender o porquê aquele castelo era tido como maldito.
A porta de uma das câmaras se abriu mostrando uma passagem estreita
para o interior de um túnel que ia dar em um salão com um espelho negro,
que já era conhecido por Arthur na sua fase adolescente. Só que desta vez
não estava em corpo presente diante do espelho, mas sua mente podia
perfeitamente traduzir alguns símbolos que eram refletidos das paredes, e
assim conheceu toda a história de um povo que desapareceu no Tempo,
mas deixou registros para um rei de alma pura pudesse salvar não tão
somente seu reino como outros reinos de outra parte distante de seu
mundo. Repentinamente foi trazido de volta ao seu corpo, a sensação era
de ter caído num abismo e a poucos metros antes de sentir o chão, outro
buraco se abriu levando-o de volta ao seu corpo que permanecera em
estado catatônico por alguns instantes.
O ser então deu alguns passos atrás e retornou ao seu monólito, e tudo
voltara como antes, mas agora Arthur tinha noção do perigo, e com que tipo
de natureza teria de enfrentar.

A olha para Arthur com uma expressão de preocupação, devido ao estado


em que seu rei se encontrava, Sir Adam pergunta: - Meu senhor está se
sentindo bem?
—Sim, Adam, eu estou bem, mas o que vi é mais grave do que poderíamos
imaginar.
—Meu senhor bem sabe que juramos lealdade, e vejo que nos olhos do
senhor espelha seriedade em relação ao futuro. Nunca esqueceremos ou
abandonaremos nosso rei, seja qual for a situação. Não sei do que se trata,
mas, permita-me saber, assim ficara mais claro para nós o inimigo
enfrentaremos.
—Ao longo de todas as batalhas, nunca sofri traição, ou desistência de
vocês, nobres cavaleiros. Muitas vezes enfrentamos os inimigos numa
posição inferior a eles, mas com a ajuda do nosso senhor, vencemos o
inimigo mais bem equipado ou numeroso. Crer na nossa fé será o alimento
para a vitória.
—Meu rei, que tipo de batalha enfrentaremos?
—A pior de todas Sir Adam, teremos que enfrentar demônios, e com a
ajuda do Mago iremos procura saber quais são seus pontos fracos. Não se
trata mais de inimigos humanos, os quais conhecemos bem quanto a sua
natureza.
—Deixe-me ficar só nesse templo diante dos monólitos. Vão todos vocês
deixem-me só por alguns preciosos momentos que nos restam antes de
traçarmos planos.
Arthur olhou para o céu cheio de estrelas, mais especificamente para uma
constelação em especial na forma de uma cruz, e ali ficou a fitá-la, até que
lhe viesse uma mensagem que, sobre seus ombros havia uma
responsabilidade muito grande e bem maior do que o reino, mas também a
esperança de povos do novo mundo, mas na realidade eram mais antigos
do que do velho mundo. Um povo que foi quase instinto devido à presença
desses demônios que agora tentam voltar.
Ao abaixar a cabeça e olhar para um dos lados do templo, viu o Mago
olhando também para a mesma constelação. – O que pode ver, olhando
para esse céu de diferentes estrelas? Pergunto Arthur ao Mago.
—Sei que representa uma cruz cristã, e é sobre esta cruz que juraram
lealdade ao senhor.
Quanto a nós, druidas, tornamo-nos quase extintos com a invasão romana,
e sofremos com a propaganda enganosa vinda de Roma, de que éramos.
Não sinto nem vontade de falar sobre isso, mas não se esqueça de que tem
sangue de antepassados druidas em vossa majestade, e de que também
possuíamos uma cruz, assim como o povo do novo mundo. -Devemos
esquecer as diferenças de credo, pois o verdadeiro Deus quer que nos
tornemos forte para combater esse flagelo que pretende vingar sobre os
humanos.
—Mago você sabia da existência de uma caverna onde abriga demônios em
estado petrificados sob o castelo de Drakos?
—Sim meu rei eu sabia da existência.
—E porque nunca me falou a respeito?
—Porque não era o momento para falar sobre isso.
—Eu como rei deveria saber. Não acha!
—Sim, mas existem exceções, e momentos oportunos para saber.
Arthur ficou sozinho, pois o Mago sabia que aquele era um momento
crucial para que ele pudesse meditar sobre a experiência que a pouco teve.
Então olhou para o céu e nem se dera conta que havia poucas estrelas,
enquanto que outras eram encobertas por negras nuvens atravessavam no
brilho da lua; e foi nesta fase da Lua que o rei Uther morreu. Lembrou-se de
uma frase de seu pai antes da última caçada quando ambos cavalgavam
pelas campinas:
—Um rei que adquire sabedoria ao longo do tempo num belo dia sofrerá
algum tipo de atentado.
— Mas não acha importante que um rei deva ser sábio?
—Sim Arthur, mas no tempo certo, caso contrário sua imaturidade poderá
trazer desastres.
— O senhor sabe muito?
— Ora Arthur, por mais que um rei saiba, sempre haverá uma surpresa,
algo inesperado e depois os ouvidos e os olhos dos reis não podem estar ao
mesmo tempo em todos os lugares. Sempre haverá uma conspiração, mas
conforme observamos o mundo, chega um dia em que gostaríamos de
nunca ter entrado em contato com algo tão sinistro e superiores às forças
humanas. Exceto a divina, é claro.
— Quem poderia ser mais forte do que meu pai?
— Arthur, é melhor pararmos com essa conversa. Um dia saberá, quando
chegar a hora.
Ao lembrar-se desse dia, poderá ver claramente que a morte de seu pai foi
motivada por ter tido contato com esses estranhos seres.
Arthur tornou a perguntar ao Mago.
— Pode-me dizer se meu pai teve contato com esses demônios que habitam
o castelo de Drakos?
—Essa foi a causa de sua morte prematura, meu senhor.
—Pode-me contar?
—O rei Uther, como sabe, era primo do Barão Brutus Blakington, e meu
senhor notara que seu primo diminuíra a frequência de suas visitas ao
castelo. Isto foi num momento muito difícil onde povos que habitavam os
limites do reino começaram a formar grupos para invadir o castelo. Sem a
ajuda do Barão conseguiram expulsar vários grupos, e houve algumas
baixas de cavaleiros e guardas que permaneciam nas torres devido a
flechas certeiras e traiçoeiras. As vilas também eram constantemente
saqueadas, e o povo reclamava por mais proteção. Vosso pai quis saber por
que seu primo virara as costas para ele. Um dia resolveu investigar o
castelo do Barão, chegou a desconfiar por que aquele era o único castelo
que não sofrera nenhum tipo ataque depois que o Barão Blakington
restringiu suas idas ao castelo.
— Foi a partir dai que meu pai começou a suspeitar do barão?
—Sim, ele tomou uma decisão de entrar no castelo do barão, e foi para lá
acompanhado por alguns cavaleiros e soldados. Ordenou que abrissem os
portões. Os soldados do barão hesitam em abrir para o rei, mas acabaram
cedendo e então vosso pai começou a vasculhar o castelo com os cavaleiros,
mas nada de encontrar o Barão, decidiram ir procurar no subterrâneo, e foi
onde deparam com a caverna.
A ilha

—Então ele guardava um segredo da caverna que abrigavam demônios


petrificados.
—Meu senhor, sempre achava estranho o porquê do vosso pai nunca
respondeu a hostilidade do barão.
—Faz sentido.
—A situação era muito delicada, pois se o barão sentisse alguma ameaça
num ato de desespero, os demônios seriam libertados e todo o reino
destruído.
—Agora o que resta é esperar o Corvo retornar a ilha. Deve existir uma
maneira de avisá-los de que iremos para o novo mundo, assim virão mais
bem preparados.
—Isso já foi feito meu senhor, durante o ritual.
—Tem certeza disso?
—Se não sofrer nenhuma interferência, com certeza receberão o sinal.
—Assim espero Mago.

A rainha reuniu-se com os cavaleiros, e começou a traçar planos para a


navegação em cima do mapa.
—O rei antes de partir deixou estes esboços da rota para o novo mundo, e
aqui deve ser a tal ilha que o rei se encontra.
— Certamente, vossa majestade pretende enviar não apenas os cavaleiros,
mas alguns homens que tenham experiência no mar além do capitão
Malenca? Perguntou Sir Gilbert para a rainha, e continuou:
Se por algum motivo perdermos Malenca, quem ira navegar o
Corvo? - Alguma sugestão?
Sabe de alguém, Sir Gilbert?
— Sim minha rainha, na vila existe um homem que é pescador. Dizem que
vivia em terras nórdicas de Rogaland. Ele costumava pescar em águas
turbulentas num barco a vela, mas com ventos fortes foi levado para longe
e com muita habilidade retornou, devido a seu conhecimento preciso em
navegação.
—Sabe seu nome, disse a rainha.
—Igor
—Pois bem traga-o aqui, pelo que contou é um homem bravo e experiente.
Aquela noite parecia interminável, e logo o dia iria raiar. As chamas ardiam
das tochas presas às paredes do castelo e num determinado momento um
sopro atravessou o salão e a rainha olhou para Sir Gilbert e não sabendo
bem a razão disse:
-Você acompanhou o Mago em alguns de seus experimentos alquímicos.
Desça até seu quarto e pegue o que achar necessário para a viagem.
—Sim minha rainha.
Sir Gilbert ao entrar no quanto, observou inúmeras ervas, substâncias e
porções. Pensando no que seria de útil ao Mago, mas algo chamou sua
atenção, a caixa de carvalho e na tampa havia o entalhe do símbolo de uma
cruz druida, e ao abri-la encontrou um pergaminho com a seguinte
mensagem: “Se vosso rei não retornar de algum lugar distante, saiba que é
de suma importância que todos os cavaleiros devam procurá-lo numa ilha
que está no meio do seu destino. Deverão continuar viagem até o lugar
predestinado.”.
Sir Gilbert ao ler a mensagem teve a certeza de que o mago fez uma viagem
dimensional.
A partida

Quando a noite se foi e os primeiros raios de luz incidiram sobre as


brancas velas do Corvo amarradas nos mastros, o espírito das montanhas
no reino de Arthur desceu até as águas azuis da baia para se despedir dos
outros cavaleiros que partiriam rumo ao novo mundo.
Ao olhar seu reino mais vazio, a rainha despediu-se de um a um dos
cavaleiros. O céu parecia tornar-se cinza a cada barco que partia em
direção ao Corvo, enquanto as velas se abriam rumo à incerteza das águas
distantes. Inesquecível! Uma visão gravada na memória daquela manhã,
com a rainha em sua postura majestosa a olhar o navio se distanciando do
reino.
A situação que era um tanto delicada na defesa do reino, agora ficara mais
frágil sem a presença de seus fiéis cavaleiros. Olhou para alguns de seus
soldados que a acompanhavam, e falo: - Daqui pra frente, atenção
redobrada das torres, nós não estamos vendo, mas ocultos olhos estão a
nos observar, e logo a mensagem chegará aos inimigos. Podem ter certeza.
A bordo do Corvo - os cavaleiros, que trocaram suas pesadas armaduras por
roupas mais adequadas à navegação, embora jamais ficasse distante de
suas espadas presas a cintura. A situação de Malenca era um tanto
desconfortável, seria capitão somente nesta viagem até a ilha, e não mais
amigo do rei e respeitado por seus marujos. Igor por outro lado, sentia-se
orgulhoso na possibilidade de vir a ser o novo capitão, seus olhos pareciam
brilhar ao lembrar-se dos momentos em que navegava seu barco através
dos fiordes em direção ao mar aberto. Além deles havia a bordo três novos
marujos que foram escolhidos pela rainha e que não estavam acostumados
ao capitão Malenca. A situação poderia ficar tensa, mas os cavaleiros com
toda certeza garantiriam a ordem, visto que Malenca não dispunha de
poderes e respeito sobre eles.
O Corvo rapidamente entrou em alto-mar, os ventos fortes sopravam rumo
ao novo mundo. Sir Gilbert diante da proa segurava firmemente as
amarras, falava com Sir Hilton sobre a segurança do castelo.
—Não éramos pra estarem todos a bordo, antes de encontrarem a carta do
Mago. Agora tudo parece incerto quanto à segurança do castelo.
—Tenho o mesmo sentimento Gilbert, mas se o plano do rei falhar, então
essa viagem, será em vão.
—Outra preocupação minha é quanto a Malenca. Será que nos levará ao
rumo certo?
—Temos o esboço feito pelo rei antes de partir. Vamos por Igor a parte
deste mapa. Seu conhecimento de navegante nos avisará caso a rota for
alterada.
Sir Hilton então chama Igor, que estava a bombordo, com um olhar talvez
um tanto saudoso de sua terra natal.
—Igor, venha até nos.
—O que deseja de mim, Sir Hilton?
—Quero que entre na minha cabine, e de uma olhada num mapa de
navegação.
—Agora?
— Espere um pouco. Irei descer e depois quando Malenca estiver
conversando com Sir Gilbert, você vai.

Capitão! Gritou Sir Gilbert para desviar o olhar de Malenca, assim que Sir
Hilton desceu do convés.
—O que há Sir, Gilbert?
—Como estamos indo?
—Sem problemas Sir Gilbert, eu tenho uma ótima memória e um bom faro
para não desviar o rumo.
—O faro de uma venha raposa do mar atrás das galinhas marinhas?
—Não existe tal tipo de bicho, Sir Gilbert.
—Se existem monstros nesses mares distantes do reino, por que não
galinhas marinhas? Disse num tom irônico. Uma parte da tripulação
começou a dar boas gargalhadas. Apesar do mau humor de Malenca, e não
esboçar nenhum tipo de amistosidade, muito pelo contrário, parecia que o
ódio aumentava para com a tripulação. Na verdade Malenca estava de
guerra com o mundo. Quais pensamentos ocultos passavam pela mente de
Malenca?
Dentro da cabine Sir Hilton abriu o mapa de navegação, e mostrando para
Igor disse:
—Este mapa foi feito pelo rei diante de uma visão, e dá pra perceber de que
esta deve ser a ilha a qual vossa majestade se encontra.
—Onde eu nasci e cresci, as viagens marítimas eram constantes, e nosso
povo havia adquirido um conhecimento de diversas rotas. – Esses mares,
como costumam dizer: nunca antes navegados e repletos de monstros
marinhos, - nunca intimidaram nossos ancestrais. Alguns navios vikings
partiram para lá, onde se encontra no mapa, mas a rota traçada era mais ao
norte. Costumavam voltar com mercadorias estranhas ao que estávamos
acostumados ver, mas um dia não voltaram. Alguns dizem que tiveram
sucesso e formaram uma nova tribo nessas novas terras.
—Com a posição do sol, a velocidade do Corvo, na noite com a posição das
estrelas, é possível supor em que dado momento passará perto dessa ilha.
Subirei e ficarei atento ao rumo tomado por Malenca, e tirarei algumas
informações, mas pela sua desconfiança não sei se terei sucesso.
—Malenca aqui não está em posição de negá-las. Caso não consiga, darei as
ordens diretamente a ele.
Votando ao convés, Igor tenta um dialogo com Malenca:
—Capitão, sinto que esta confiante sobre a rota tomada.
—Em toda minha vida no mar sempre fui e voltei de um porto ao outro,
sem nunca me perder. Vejo que esse não é o seu caso, Igor.
—Tem razão velho capitão, mas quando me perdi possuía apenas um
barco, e não um navio que tem mais condições em navegar em mares
tempestuosos. Por um bom tempo fiquei em deriva, até consertar a vela
rasgada e o mastro quebrado. Bom isso não vem ao caso, são situações
diferentes.
—Mas é fato, ou não que você se perdeu?
—Sim, foi o que aconteceu.
—Neste caso, não confiaria a você um navio como esse. Se sobreviveu foi
por pura sorte.
—São métodos diferentes de conhecimento de navegação capitão Malenca,
mas pode ter certeza que meu povo chegou a esse novo mundo em que
você nunca esteve antes. Nós fomos mais além do que esta ilha perdida
onde você abandonou o rei.
—Já me expliquei para rainha. O que pensa sobre mim não tem relevância.
—Sendo a velha raposa do mar que você é bem sabe que o mar sempre nos
revela uma surpresa, e isto é um sinal para não nos esquecemos de que
somos apenas humanos.
—Não sou um aventureiro como você Igor, e daria tudo que possuo para
voltar a navegar nas rotas comerciais novamente. Sua Majestade errou em
querer que um homem como eu fizesse uma viagem inconsequente como
essa.
Ouvindo a conversa Sir Hilton que estava atrás de Malenca respondeu: -
Sua majestade nunca comete erros, Malenca. Apesar de você ser cheio de
vícios, ainda assim é um navegador habilidoso. O errou foi você ter traído
nosso rei.
—Bem sabe que não o trai. Sua majestade ainda há de me perdoar, não agi
por minha própria vontade, uma força maior dominou minha mente.
—Foi isso que disse lá na taberna para sua amada? - traído pela sua própria
língua, estava também com a mente dominada? Dominada pelo excesso de
vinho, creio eu.
—Não me lembro de nada o que falei, delirava quando puseram essa
porção da verdade.
—Malenca, cabe ao rei e a rainha julgar seus atos e não a mim. Agora
responda: Quando chegaremos à ilha?
O capitão olhou para frente, melhorou sua postura, mantendo a espinha
ereta, e procurada não demonstrar algum tipo de rancor guardado, disse:
—Se as condições dos ventos forem favoráveis, mais dois dias.
A vontade de Malenca era de que esse dia nunca chegasse. O que ele menos
queria era voltar para aquela ilha, e olhar Arthur novamente. Pensou numa
possibilidade de Drakos enviar Cortez atrás do Corvo, mas sabia que um
navio cheio de cavaleiros e sem tesouro não interessaria a nenhum pirata.
Igor se afastando daquela discussão, voltou seus olhos para o mar em
direção ao Norte, buscando através da maresia o cheiro dos mares do
báltico, ou do silêncio quando envolvia seu barco ao passar pelas altas
encostas dos fiordes.
Sabia de que era capaz de avistar tal ilha bem antes do capitão, sentia ali a
presença de seus ancestrais indicando a direção através da pedra do sol que
mostrava diferentes tons de cores de acordo com a posição do cristal no
céu encoberto. Sim poderia ver este cristal presente em sua mente, quem
sabe um presente de Odin, ou de seus ancestrais. Lembrou-se do casco de
seu barco roçando o fundo das areias da praia. Foi assim com a ajuda da
pedra do sol que chegasse à costa da Irlanda, recebendo ajuda dos
pescadores locais. Deram-lhe água fresca e comida, salvando-o de morrer
desidratado por permanecer vários dias sem água fresca. Caso pressentisse
o desvio de rota por Malenca, iria imediatamente avisar um dos cavaleiros,
antes que se perderem neste imenso mar rumo ao novo mundo.
A noite já estava quase envolvendo o Corvo que permanecia soberano em
sua rota, voltando para resgatar Arthur.

Tempestade

O céu estava repleto de estrelas, mas subitamente mudou todo o


cenário por onde Corvo navegava. Deixada a pouco para trás a tarde de um
céu escarlate, onde a visão do entardecer alimentavam as preces
direcionadas aos que ficaram em terra firme. O capitão a olhar para aquelas
estrelas segurava firme o timão, mas enquanto aos seus pensamentos não
se mantinham tão firmes assim. Levar ou não levar a tripulação para aquela
maldita ilha, que fora a causa de toda sua desgraça. A incerteza de voltar a
ser o capitão do Corvo, ou ver a decepção no rosto do rei para com ele,
trazia uma dúvida cada vez mais forte de mudar da rota. Caso assim o
fizesse, poderia despertar a fúria da tripulação e ser jogado ao mar
servindo de banquete aos tubarões. Pensava a todo instante numa maneira
de se safar ileso, mas diante daquela imensidão marinha pouca escolha
teria, senão esperar o momento oportuno.
A noite que parecia calma começava a se fechar encobrindo as estrelas com
nuvens negras e ligeiras. Um vento mais úmido e frio veio a bater no rosto
de Malenca, fazendo-o parar repentinamente com seus pensamentos. O
som do vento a tremular as velas, avisando-o da tempestade. Com as ondas
se avolumando, o Corvo balançava violentamente, derrubando parte da
tripulação que dormia em seu interior, quanto aos outros que
permaneciam no convés, seguravam firme no que pudessem agarrar, para
não ser lançado ao mar.
Igor lá de baixo ouvia Malenca berrar com os marujos parta abaixarem as
vela e posicionando a proa do Corvo de frente para as ondas. A tormenta
parece aumentar e a inundar os porões fazendo com que toda a tripulação
jogasse as águas para fora. Era uma batalha de homens contra a fúria da
natureza. Os cavaleiros com os mesmos músculos fortes que erguiam a
espada, agora empunhavam baldes de água.
A tormenta assim que veio, passou deixando os porões do Corvo cheios de
água, e alguns cavaleiros mareados.
Sir Hilton ao ver que o Corvo se estabilizar novamente, falou para Sir Justin
que exausto olhava para o céu agradecendo ao senhor por ter parado com
aquela tormenta: - Agora sei qual a sensação de não termos o solo abaixo
de nossos pés. Estamos fora do nosso ambiente, e espero chegar logo à ilha.
Sir Gilbert olha para Malenca e fala: - O quanto nos desviou da rota?
—Não dá para saber agora. Somente de manhã, quando o sol aparecer.
Igor desconfiou de Malenca e acrescentou: - Vamos ficar atentos desde já,
pois poderá abrir um espaço entre as nuvens, o suficiente para navegar
através das estrelas. Quanto mais desviarmos da rota, menos tempo de
navegação.
Malenca parece que havia esquecido de que estava diante de alguém que
conhecia tão bem o mar quanto ele.
Malenca voltou a olhar para os cavaleiros e disse, tentando se explicar:
—Certamente isso não será descartado, Sir Gilbert.
A rainha e o conde

A rainha reuniu-se no salão principal com alguns de seus conselheiros,


estudando as possibilidades de fortalecer a defesa do castelo
Depois de ouvir várias sugestões, mas nenhuma que fosse relevante
levantou-se do trono e falou: - Será que perdemos todos nossos aliados, e
só temos inimigos? Esqueceram que sua majestade ainda está lutando pelo
reino! Não é possível que agora nos tornemos fracos, tendo que nos livrar
dos muitos inimigos.
—Vossa majestade se me permite, disse um dos conselheiros.
— Sim, o que tem a disser, lorde Franklin, depois de tanto ouvir por um
bom tempo calado. Espero que seja algo brilhante nesse imenso mar de
conselhos medíocres.
— Vossa majestade ainda pode contar com o conde Baraniak.
— O que é isso lorde Franklin! O castelo do conde Baraniak foi um dos
últimos a resistir ao ataque dos inimigos, e foi completamente saqueado e
massacrado. Quer fazer aliança com fantasmas?
— Vossa majestade, me escute, por favor.
— Continue, então.
— Por um bom tempo frequentei o castelo do conde, e alguns dias antes de
ser atacado, parecia que ele estava pressentindo isso. Ficou a me olhar
como se tivesse um segredo a contar a alguém de sua confiança, e disse
para mim: - Lorde Franklin há momentos em que devemos compartilhar
nossos segredos, e este é o momento.
Sei que se persistirem os ataques ao castelo, logo irão no derrotar. Deixei a
salvo algumas relíquias. Resistirei ao Máximo, mas chegará o momento que
devo me proteger. Existe uma passagem secreta neste castelo que me
levará para um templo subterrâneo escavado por povos que viveram nessa
região há muito tempo. Quero lhe mostrar isso, talvez com o conhecimento
de alguém de fora possa nos ajudar quando ocorrer a invasão Se deseja
compartilhar com tal segredo comigo, não vejo porque recusar.
— Vamos até lá.
Desceram a escadaria que dava passagem para um túnel, e terminava numa
sala escavada de pedra com monólitos ao redor do centro.
— Isso é incrível conde Baraniak!
— Só há um problema, lorde Franklin.
— Qual o problema?
—Ainda não descobri um meio de sair deste salão. Não, sei que há um jeito,
e quero que me ajude.
—Farei o que puder.
— Se os inimigos invadirem o castelo virei para esse lugar, com
mantimentos e tentarei achar um meio de sair. Peço para que só procure
ajuda depois de no máximo quinze dias. Tentarei sair sem ajuda externa,
mas depois disso, venha me ajudar.
—Este é o plano, Vossa Majestade: Resgatar o conde Baraniak, e seus
soldados, assim juntarão suas forças a nós.
—Peço que se explique melhor, lorde Franklin!
Estamos com nosso exército defasado, e ainda assim quer
invadir o castelo que pertencia ao conde Baraniak?
Assim provocaremos mais baixas entre os soldados e, além do
mais, seria incerto o resgate dos prisioneiros, se é que restou
algum.
Vossa Majestade tem toda razão. Devemos mandar um espião
para ver a situação em que se encontra o castelo do conte, assim
traçamos um plano de resgate, e sem baixas, Majestade.
Então faça isso! Amanhã cedo?
Terá o plano pela manhã, Majestade. Em um sinal de reverência
se retirou.
A rainha continuou a discutir outros problemas relacionados ao reino,
dando pouca importância ao plano de lorde Franklin.
Em seu aposento Lorde Franklin, diante do silêncio da noite, via as chamas
em movimentos mágicos, aguçando sua imaginação. Travou um dialogo
entre a chama e seu pensamento.

O pensamento fala:
—Tua luz incide sobre o quarto e vence a escuridão da noite.
Uma simples chama que atrai meu olhar para ti.
Ensina-me de como através da magia, vencer o inimigo.
Estar diante de ti foi porque meu pensamento te trouxe da noite,
Na forma de uma estrela do norte a navegar nos mares da alma.
Quero a ti pedir o manto que me fará invisível diante dos inimigos.

A chama fala:
—Me comparas a algo que não sou; uma estrela que te orienta.
Perto de ti, dar-te-ei meu calor, mas longe deste quarto nada sou.
Entenda que tudo é ilusório. Estas paredes se alimentam do teu sonho,
E partirei tão cedo quando os grilos pararem seu canto da noite,
E as estrelas deixarem as montanhas surgirem no frescor da manhã.
Esta noite sonharas em minha companhia, e terás o que procuras.

Lorde Franklin adormeceu diante da chama da vela, e sonhou. Na manha


seguinte quando acordou, teve a resposta sobre o plano para sua
majestade.
A chama alimentou o sonho, e este por sua vez deu ao pensamento uma
visão do futuro.
Arthur e o Mago estão distantes do reino, mas o reino não abandonara seus
habitantes, e a vida continuava a tecer o manto do destino.

Exausta em seu quarto a rainha adormece. Foi um dia tenso, cheio de


expectativas, que, com certeza, trarão frutos pela manhã.

A rainha e o plano

Lorde Franklin acordou com o plano mente. Tinha a certeza de que não fora
um simples sonho, mas uma visão concedida pelo senhor. Levantou, e foi
rapidamente até sua escrivaninha e com um pedaço de pergaminho e uma
pluma de falcão, começou a escrever o que acabara de sonhar.
Ao se apresenta a sua majestade, estava com um ar confiante, e de que não
a decepcionaria. Ela o esperava sentada em seu trono, com o olhar um
tanto cansado, demonstrando uma noite de muita conversa e pouco
resultado. Ao redor da rainha estavam os conselheiros, onde alguns
cochichavam entre si, esperando que não aprovasse tal plano, mas, de
qualquer forma, na situação em que se encontravam, nenhuma ideia
deveria seria descartada.
— Então Lorde Franklin, estamos ansiosos para ouvir seu mirabolante
plano.
— Sim Vossa Majestade, mas peço para ficarmos as sós para detalhá-lo.
Alguma desconfiança para com os conselheiros?
Vossa Majestade peço desculpas por ousar desconfiar de vossos
leais conselheiros, mas por saber que Drakos está usando de
magia, e homens com Malenca de total confiança do rei, o traiu. O
mais prudente é que essa conversa deva ser sigilosa.
O silêncio envolveu todo o salão principal, e por alguns momentos
pareciam que todos foram tomados por uma atmosfera pesada, onde antes
a confiança era inquestionável, mas agora estavam todos diante de uma
nova situação.
—Que todos saiam e deixem-nos a sós.
—Mas vossa majestade, devemos todos ouvir e opinar sobre tal plano de
lorde Franklin! -disse um dos conselheiros, esperando que a rainha não
concordasse com o pedido.
— Já disse, deixem-nos a sós!
Assim que todos deixaram o salão principal, a rainha olhou seriamente
para Lorde Franklin de uma forma severa, mas, ao mesmo tempo,
demonstrando grande curiosidade, e disse:
— Espero que esse tal plano seja muito bom para superar o
constrangimento entre os conselheiros.
-Sinto me constrangido por ter pedido que esse assunto seja sigiloso,
mas peço a.
Vossa Majestade que analise não como um simples plano, mas como uma
visão que me foi concebida por ordem divina.
—Sua majestade, o rei nunca foi um simples mortal, sinto que seja
especial, o mesmo digo isso do Mago. A verdade é que todo o reino está
sobre um solo privilegiado.
Este castelo tem vida que transpira em suas paredes.
-Também tive visões, lorde Franklin. Quanto fui orar pela alma do rei.
Acredito no que diz através dos seus olhos, percebo que suas palavras que
vem do coração.
Mas minha rainha, ainda não sabe a respeito do plano, por que
razão está tão confiante bem antes de saber?
Isso chama-se fé, Lorde Franklin, e quanto a ela não se deve
duvidar. Acredito em que vejo, e isto me basta. Parou por alguns
instantes de falar, fechou os olhos e respirou fundo, e ai então
continuou: - Vamos lá, diga-me em detalhes como será.

Lorde Franklin detalhou seu plano, mas caso perdessem a fé, tudo seria em
vão.

No dia seguinte Lorde Franklin, trocara suas vestis de nobre, por uma de
monge. Levava numa carroça, um enorme tonel de vinho para o castelo do
conde Baraniak.
—Olá! Assim gritou Lorde Franklin ao chegar às proximidades do portal do
castelo.
—O que vem trazendo ai, disse um dos soldados ao avistá-lo.
— O vinho, que mais poderia ser?
— Espere ai mesmo.
Da torre o soldado pediu que chamassem Ugheru.
Ugheru estava bem mal humorado ao se dirigir até lá, e perguntou ao
guarda.
— O que foi agora? Algum cobrador de taxas reais? Se for reviste-o. Se tiver
algum pertence pegue tudo e depois o joguem ao fosso.
— Não é isso Ugheru, é carregamento de vinho.
—Assim é melhor, mas antes de matá-lo, deixe-o entrar para descarregar
nosso vinho. Ao abrirem os portões, Lorde Franklin entrou no castelo, e
bem a sua frente estava Ugheru, com uma aparência nada amistosa,
bloqueando com seu corpanzil as mulas.
Lorde Franklin engoliu a saliva e seu estômago gelou ao ficar diante do
bárbaro.
— Para quem vai entregar esse vinho? Disse Ugheru.
—De tempos em tempos venho sempre entregar um vinho especial para o
conde. Aqui o consumo é grande, e todos adoram este vinho de sabor
incomparável.
— Deixe-me prová-lo, se for tão bom assim poderá partir e trazer mais,
caso contrário, não fabricará mais vinho e nem irá orar mais pelas almas
das pessoas. Não fora avisado de que este castelo pertence a mim agora?
—Sinto muito, mas vivo num isolamento total, e as notícias não correm tão
rápido assim para mim.
—Desça dessa carroça, e deixe-me provar. Lorde Franklin esperava que o
vinho fosse de ótima procedência, pois ficou estocado a um bom tempo nas
adegas do castelo da rainha.
Ugheru entornou a taça cheia de vinho, e lambendo os beiços, disse: - Por
enquanto agradeça ao seu Deus de que sua alma foi salva por um bom
vinho.
— Trata-se de um vinho especial, e deve ser descarregado de maneira
gentil na adega.
—Disse adega? E onde ela está? Meus homens estão sedentos por bebidas.
—Com certeza não as encontrou, pois é preciso percorrer uma passagem
secreta para chegar até os tonéis de vinhos.
—Homens, levem esse barril até o salão principal, e quero que dois homens
acompanhem o monge até onde estão os outros barris.
Enquanto isso os soldados da rainha aguardavam o momento certo de
atacar o castelo do conde e expulsar de vez seus invasores.
Lorde Franklin percorria pelas galerias estreitas em direção onde o conde
Baraniak estava confinado com seus soldados. Num dado momento
deparam-se com o fim da galeria, e um soldado desconfiado perguntou: - O
túnel termina aqui. Está tentando nos enganar?

—Ora! Disse que era uma passagem secreta, não disse? Pois bem, ela está
bem diante de nós atrás da parede.
Lorde Franklin procurava uma pedra solta na parede e ao encontrá-la,
empurrou fazendo com que se abrisse, revelando a continuação do túnel.
—Não sei se é certo ir mais além, pode ser uma armadilha. Disse um dos
guardas.
—Certamente que não. Pode sentir o aroma do vinho que vem no fim desse
túnel?
—Posso sentir.
—Pois então, um lugar que cheira a vinho, só pode vir de uma adega.
—Continue na frente, mas se algo der errado, morrerá com a lâmina desta
espada.
Lorde Franklin sabia que ao abrir a passagem secreta, o conde sentiria o
buque do vinho pela passagem de vento. Teria tempo suficiente para
posicionar alguns de seus guardas em pontos estratégicos a espera dos
invasores.
Escoltado, por dois guerreiros, Lorde Franklin só podia continuar a
prosseguir, sem despertar desconfiança, mas, de repente, um dos guardas
de Ugheru, foi imobilizado com uma chave de pescoço, seguido duma
punhalada no peito. Ao perceber que seu companheiro fora abatido,
levantou a espada dizendo ao Lorde Franklin: - Nos trouxe para uma
armadilha, monge dos infernos. Irá sentir o gosto da morte com a lâmina de
minha espada.
Ao levantá-la foi alvejado por flechas ante que atingisse a espada na cabeça
de lorde Franklin.
—Não me mate, sou Lorde Franklin.
—Certamente que não o farei, pensei que nunca viesse. Disse o conde
Baraniak, abraçando o fortemente.
—Temos que ser rápidos, antes que desçam mais homens de Ugheru atrás
de mim, parece que ele estava meio desconfiado, mas não resistiu ao vinho.
—Bravo lorde! Espero que os soldados da rainha devam estar prontos para
entrar no castelo?
—Sim, mas quero ter certeza se o pombo que trago comigo está bem,
passou um bom tempo por debaixo dessas roupas de monge.
—E o que pretende fazer com ele pombo?
—Será o sinal. Ao verem o pombo voando para fora de vosso castelo,
atacarão.
—Guarda, venha cá. Quero que escale a parede até aquela claridade e solte-
o por aquela fresta, disse o conde, colocando o pombo que ainda
permanecia preso a faixas de panos por segurança.
Os soldados ao verem o pombo sair voando de uma área perto do castelo,
avançaram gritando e a atirando flechas sobre os inimigos nas torres.
Ugheru ao ouvir os gritos, saiu da sala principal cambaleando bêbado e
espumando pela boca: Esta bebida está envenenada, fomos enganados, não
consigo enxergar. Onde esta minha espada? Parem de beber e vomitem
esse maldito vinho.
Desesperado e mal podendo ver o que estava a sua frente, dava ordens
cambaleando de um lado para o outro. Estava embriagado, ainda assim
tinha noção que de que seria facilmente derrotado, e num ato de desespero
ordenou a seus homens que fossem para as passarelas dos muros e torres,
e arremessassem flechas, lanças, e óleo quente, porém não imaginava que
os guardas do conde surgiriam de dentro do castelo. Os guardas da rainha
atacavam pela frente e flancos, esperando que alguém abrir os portões.
Ugheru que permanecia na sala com poucos homens foram surpreendidos
com o ataque pela retaguarda. Ugheru mal podia compreender de como os
guardas entraram.
—De que forma entraram no castelo? Maldito monge.
— Cale-se, falou o conde Baraniak, colocando bem diante de sua testa a
ponta da lâmina da espada.
—Onde está esse monge maldito?
—Já disse para se calar se não quiser sentir sua cabeça rolar pelo chão.
— Não posso ver, e nem lutar, estou completamente indefeso. Creio que
não mataria um homem nessas condições.
—Sempre pensei que os bárbaros preferiam a morte por uma questão de
honra para com seu Deus, ao invés disso, parece que está se comportando
como um fraco.
Ajoelhado diante do conde, implorou por sua vida:
—Tenha piedade não me mate.
—O que há com você Ugheru, já matou tanta gente sem se importar se
eram mulheres, crianças ou velhas. Por que motivo agora pede clemência?
— Nunca pensei em invadir vosso castelo, vivia bem de pequenos roubos e
emboscadas, mas Lorde Drakos ofereceu joias e moedas de ouro para que
pudesse aumenta o número de homens e atacar seu castelo.
—O conde olhou para lorde Franklin e falou: - Não posso compreender o
porquê sua majestade o rei Arthur, nunca puniu Drakos desde o começo, e
agora ele vem adquirindo mais poder e cada vez mais perigoso para com o
reino.
— Deve ter razões que desconhecemos, certamente: disse lorde Franklin.
— Levem Ugheru para o calabouço, e lancem as flechas naqueles que estão
nas passarelas dos muros e torres, enquanto aos outros desçam os portões
para os soldados de sua majestade entra.
Os homens de Ugheru aos serem acuados, largaram suas armas e se
rendera.
Do lado de fora os soldados eufóricos gritavam: - Os portões estão se
abrindo. Vencemos!
Ao receber notícias da vitória, a rainha dirigiu-se para a capela, e com um
olhar radiante, envolvida pela luz que atravessava os vitrais, a iluminava
seu semblante cheio de esperança e justiça para com o reino. O que mais
queria neste momento era que Arthur soubesse a batalha vencida sobre o
sorrateiro Drakos. A rainha não era de forma alguma tão indefesa assim,
aos olhos de alguns conselheiros e inimigos
Talvez não fosse assim uma vitória como esta, que colocasse o reino numa
situação fora de risco, mas, com certeza, traria a confiança e esperança
depositadas nas mãos de uma rainha que se fortalecera com a retomada do
castelo do Conde.

No dia seguinte ouve uma comemoração. Lorde Franklin foi homenageado


como herói, enquanto o conde Baraniak manteve seus votos de lealdade
para com a rainha. O reino continuava sem a presença de Arthur, que
embora distante sempre presente no coração da rainha guerreira, e amado
por todos.
A rainha sentada em seu trono recebeu Lorde Franklin como herói com
todas as honrarias.
Com toda a corte presentes no salão principal a rainha fez um longo
discurso, dando ênfase à coragem de Lorde Franklin.
— O reino agora se recupera, depois de vários ataques. Estarmos distantes
do rei e seus cavaleiros, soubemos nos defender bravamente. O reino a
muito se fortalece graças aos desejos do Senhor. Fomos gratificados ao
receber uma visão divina de Lorde Franklin.
Celebração

—Pela sua bravura, Lorde Franklin, eu rainha Vitória lhe concedo o título
de Barão.
De hoje em diante deverá jurar lealdade à coroa, e será o representante
mor de todos os conselheiros dessa corte. Que Deus te abençoe, e todo o
reino da Bretunia.
Ajoelhado diante da rainha, o barão Franklin jurou lealdade: - Eu, agora
Barão Mathias Franklin juro diante de Vossa Majestade, que serei leal e
protegerei o reino com minha própria vida se for preciso. – Que minha voz
seja ouvida nos corações puros, e minhas palavras como conselheiro,
expressas de maneira exata na vontade do Senhor no destino da Bretrunia.
A rainha olhou para o Barão e com um sorriso e gestos delicados, ordeno
que se levantasse dizendo:
—Que continue a olhar o futuro, e guiar o destino do reino com sabia
palavras.
Apos o cerimonial, um banquete os esperavam. A rainha queria reviver o
clima da vitória.
Por alguns momentos, deu se a impressão que os bons tempos de reinado
voltaram. As cores cinza das paredes contrastavam com o colorido das
vestes, e o brilho dos olhos que celebravam ao som das flautas, a viola de
arco, o organetto com os movimentos suaves da dança. Tudo era
harmonioso, até a paisagem bucólica que se via da janela, traziam as
nuvens para dentro do salão.
O momento era festivo, e o banquete servido. Ao lado da rainha estava o
Barão Franklin, porém havia um trono vazia ao seu lado direito, e este lugar
todos sabiam que pertencia a Arthur, o qual a rainha quis mantê-lo assim.
Sobre a mesa havia carne de javali, coelho, pães em formatos de castelos,
amêndoas, música, dança, e malabaristas, além de vinho.
O barão ao ter sua a caneca entornada de vinho levantou-se para brindar e
disser algumas palavras:
—Um brinde a rainha Vitória. Um brinde ao renascer da esperança. Um
brinde ao nosso amado rei, apesar de sua ausência neste momento de
gloria, que o Senhor faça com que regresse logo ao reino da Bretunia, e que
nossas forças se unam neste momento de longas apreensões e momentos
de felicidade.
—Só espero que esse vinho não venha do mesmo barril em que Ugheru
bebeu, disse um dos lordes, em tom de brincadeira, e gargalhadas.
O Conde Baraniak retrucou: - Com certeza não é, pois este tem o sabor do
sucesso, enquanto aquele teve o gosto da derrota.
Ouve até uma encenação por parte do bobo da corte, vestindo-se de
bárbaro, imitava Ugheru. Cambaleava bêbado de um lado para o outro, caia
de quatro, tentava achar sua espada, enquanto um anão vestido de monge
chutava-lhe o traseiro.
O Barão Franklin deu algumas risadas, mas parou um pouco de rir ao
lembrar-se do encontro com Ugheru, nada agradável e por um triz aquele
vinho poderia ter lhe custado à vida, mas aliviado em saber que ele agora
estava bem seguro nas masmorras aos cuidados dos guardas da rainha.
A corte voltara seus dias felizes, apesar de breve, porque sabia que no dia
seguinte deveriam estar mais atentos aos movimentos de Drakos, que
provavelmente aquela altura já fora informada da derrota de Ugheru.
No castelo de Drakos

Quando Drakos recebeu a notícia sobre a retomada do castelo ficou


enfurecido.
Esperou a noite chegar, e então montou em seu cavalo, dirigindo-se para o
alto do penhasco, e por ali ficou com os pensamentos voltados para Arthur.
Seu olhar das alturas penetrava entre as ondas do mar, e com os
pensamentos atirados sobre as ondas que se fragmentavam no encontro
das rochas, sentia seus sonhos dissipados pelas espumas iluminadas do
luar.
—O meu erro foi subestimar a rainha. O plano que criei para Arthur e os
cavaleiros deixassem o terreno livre para mim não teve grande efeito.
Assim falou Drakos ao seu cavalo e fantasmas olhando fixo para o mar.
—Muitas vezes penso que aqueles demônios que habitam os subterrâneos
do castelo, não estejam conspirando para o meu fracasso, a fim de que num
ato desesperado, eu os liberte. Sei que tenho uma fração de sangue vindo
desses seres, mas caso retire-os da hibernação das rochas, destruirão a
raça humana e nada sobrará para que eu possa usufruir o mundo dos
humanos, embora o ódio que carrego contra Arthur parece maior que meus
desejos de possuir seu castelo. Um dia abrirei mão para esse ato insano,
caso derrotas constantes e sucessivas venham a acontecer novamente.
Com um curto, e enérgico puxão nas rédeas de seu corcel negro desceram a
galope
pelas encostas, beirando o abismo. O vento em seu rosto da noite
aumentava sua ira, e o som das patas de seu corcel sobre o caminho de
pedra deixavam para trás um rastro de amargura.

Em seus aposentos, retirou a indumentária negra e pesada. A água fria


que estava na bacia, jogou-a no rosto com as mãos em forma de concha,
para lhe aliviar o suor frio e salgado da marca da derrota.
Jogou-se sobre a cama querendo esquecer aquele maldito dia. Olhou para
seu braço, mas a luz da vela perto da cama, fez com que lembrasse sua
origem na mancha de nascença carregada por gerações. Novamente voltou
a conversar com seus fantasmas: - A quem devo orar nesses momentos de
derrota? Aos seres que lá embaixo estão havidos por sangue humano? Ou
devo orar para um Deus que me transforme em cordeiro e não aceita um
lobo faminto da forma em que me encontro? -Esses demônios me enchem
de dúvidas. Talvez pela mesma natureza que juntos fomos feitos do
universo. Uma serpente parece muito mais confiável do que esses
demônios quando desço até lá.
—Sou visto da mesma forma por todo o reino da Bretunia, e até os piratas
olham para mim com temor de que posso devorá-los a qualquer momento.
— Acharei um meio para penetrar no castelo de Arthur, mais
especificamente no quarto do Mago, e roubar-lhe o segredo do espelho
negro.
A festa no castelo estava chegando ao fim. As carnes, frutas e doces sobre a
mesa já quase esquecida eram jogadas aos cães que pareciam ter uma fome
insaciável.
As conversas iam pouco a pouco sendo finalizadas com os olhares
cansados, enquanto a música diminuía o ritmo e os dançarinos.
A rainha sabia que os momentos de alegria eram fugazes, e que amanhã os
velhos problemas voltariam, porém dentro de um coração renovado.
Existe uma cadência rítmica para com a vida, e caso mudemos essa ordem,
padecemos sem perceber por falta de amor, esperança e sabedoria.
À noite Drakos traçava planos para entrar no quarto do Mago, a procura do
Tratado Do Espelho Negro.
Precisava de alguém para esse serviço. Poderia contar com alguns dos
piratas de Cortez, e assim o fez, no dia seguinte ao recebê-lo em seu castelo.
—Estava a sua espera Cortez.
—Soube da derrota de Ugheru. Imaginei que seria chamado por vossa
Graça.
—Infelizmente não podemos vencer todas as batalhas, principalmente
diante de uma rainha astuciosa, e conta como aliado o Conde Baraniak.
—Mas agora Arthur não é mais uma ameaça a seus planos? Disse Cortez de
uma forma surpresa.
—O covarde do Malenca deu com a língua nos dentes, e o Corvo partiu
novamente para resgatá-los.
—Posso afundar o Corvo, caso pague pelo serviço?
- Com aquele navio vindo do futuro e o Mago fazendo parte da tripulação,
não devo arriscar. Tentaremos atravessar as águas do espelho negro.
Possuo lá minhas convicções de que sairemos no novo mundo. Chegaremos
primeiro que Arthur, e tomaremos aquilo que ele partiu para buscar.
Preciso de um de seus homens para entrar no castelo de Arthur e roubar os
escritos. Teremos que criar uma situação em que alguém de fora adquira a
confiança da rainha.
—Meus homens não tem lá uma aparência inocente ou confiável, além das
cicatrizes que os denunciariam. São assassinos sem nenhuma educação,
porém não posso reclamar de seus trabalhos quando se trata de saques, e
pilhagem.
—Tem certeza de que nenhum deles estão aptos para tal façanha? Nenhum
com talento para ator? Perguntou Drakos,
— Agora que tocou no assunto de ator, tem um jovem que há pouco tempo
esta fazendo parte da minha tripulação. Esteve por um tempo num grupo
de atores viajantes percorrendo o reino, mas foi expulso do grupo por ter
ferido gravemente uns de seus colegas por motivos fúteis. -Creio que esse
rapaz possa se encaixar bem nos teus plano.
—Ele deverá roubar os tratados sobre o espelho negro?
—Creio que agora entenda a importância do plano dar certo, Cortez!
—O rapaz a quem me referi para tal tarefa, está lá fora com outros dos
meus homens.
Vou chamá-lo?
—Godofredo, gritou Drakos. Quero que me traga o rapaz de nome...
—Fininho, disse Cortez.
Drakos olhou para o jovem pirata bem a sua frente e sem falar nada, apenas
o analisava de cima a baixo—depois perguntou: - Com esta tua aparência
creio que sempre fez o papel de vilão nas peças de teatro?
Fininho olhou com certo temor e desconfiança para Drakos, acenando a
cabeça que sim e não.
—Terá de ser um ótimo ator para conquistar a confiança da rainha e entrar
no castelo.
—Não sei se poderei executar tal tarefa, Senhor.
Se for esperto fará, o que estou mandando. Olhe pra dentro de
meus olhos, e tente ler meus planos refletidos nas pupilas. Vê o
futuro?
Sim.
Você entrando no quarto do mago para roubar os escritos sobre
o Tratado Do Espelho Negro. – Consegue ver?
Sim, posso me ver dentro do castelo no reflexo de seus olhos,
Senhor.
Drakos entrou em sua mente e a possuiu. Agora obedecerá a ordens dadas
por ele telepaticamente. Entregou-lhe um pequeno frasco contendo um
poderoso veneno.
Preste atenção: Leve esse frasco com você, e caso seja pego por
algum descuido, morda fortemente.
Sim, meu senhor, respondeu sem questionar, em estado
hipnótico.
Lembre-se bem o que vou lhe dizer: - Tudo o que viu nos meus
olhos, deverá esquecer por enquanto, mas quando entrar no
quarto do Mago executará o que lhe ordenei exatamente como
você a viu a cena em meus olhos.
Estalou os dedos, tirando o rapaz de seu estado de hipnose.
Sobre o que falava? Perguntou Drakos olhando com ironia para
Fininho.
Que terei de ser um ótimo ator para conquistar a confiança da
rainha e entrar no castelo.
E quanto ao plano?
Plano, senhor? Nada sei sobre plano?
Ótimo, e pode sair.
Fininho sem saber, mas também sem questionar se retirou, deixando
apenas Drakos e Cortez a sós.
O que temos de fazer agora é simular uma situação de perigo
para a rainha, e colocar Fininho como herói, e esperar que
mordam a isca.
Sou um homem de ação Lorde Drakos, e assim também são
meus homens. Não sei como encenaremos algo que pareça
verídico.
A cena será perfeita, terão que simular uma emboscada, e o
resto deixe para Fininho que é ator. Saberá representar bem seu
papel.
Drakos continuou; - Ponha alguns dos piratas para vigiarem o castelo,
quando a rainha sair para um passeio acompanhada de seus guardas, eles
darão o sinal para agirmos.
Cortez despediu-se de Drakos e voltou a seu navio pirata ancorado em uma
baia longe das torres do castelo de observação da rainha, após detalharem
todo o plano.
Drakos desceu para a caverna aproximando-se daqueles demônios
petrificados, observando detalhadamente um a um. Tocava seus contornos,
sentindo a vida adormecida dentro da dureza fria habitada dentro das
rochas demoníacas.
Procurou um contato telepático novamente, mas parecia em vão o esforço.
Mais ao longe numa outra câmara ouviu-se um chamado. Drakos estranhou
o porquê nunca teve interesse em olhar mais atentamente no que havia por
lá.
A porta estava entreaberta, ele fez um esforço para abri-la. Provavelmente
nunca fora aberta há milênios. A porta começou a ranger, vibrava numa
frequência duma energia misteriosa, atingindo a fundo de sua alma. A luz
do grande salão penetrou na câmera, e pode revelar uma bela silhueta de
um corpo feminino.
Aquelas formas perfeitas, as linhas suaves que seu olhar percorria naquelas
curvas vertiginosas, magníficas, ávidas de desejos em suas ancas, que
jamais havia observado com tal paixão para com as mulheres do reino.
Havia partes não humanas naquele belo corpo, mas eram tão sutis e
estavam posicionados em áreas que podiam ser confundidos com adornos
de uma joia de rara beleza.
Aquela Deusa demoníaca também estava petrificada, para sua frustração,
mas já era de se esperar, pois todos os seres ali estavam neste estado
aprisionados pela eternidade em corpos fossilizados.
Drakos se apaixona

Os olhos de Drakos não conseguiam se desvencilhar de tal beleza, e os


mesmos olhos que aprisionavam sobre as teias de suas vontades
maquiavélicas, agora foram capturados por um demônio em forma de
mulher. Um sopro suave e gélido tocou sua nuca, que o fez arrepiar por
toda sua coluna vertebral, e junto a ele uma voz doce e suave como das
sereias: - Drakos, meu querido!
—Por que está a me chamar dessa maneira? – Tem uma beleza superior
aos dos humanos. Não posso perder a razão. – Isso é uma armadilha por
parte de vocês?
— Chamo-te assim porque estou a te observar desde os primeiros dias que
aqui chegou, mas agora pode-me ouvir. — Já penetrei em teus sonhos, e
creio que se lembra bem, quando acordava como corpo todo suado. Ficava
olhando por um longo tempo as chamas das tochas em movimentos
voluptuosos, dançando diante desse seu olhar que enfeitiça e é enfeitiçado
nas chamas das paixões.
— Tudo que vem de ti, me enfeitiça, e nem ao menos sei se e mulher ou
demônio – Tem o olhar distante e frio de uma víbora, e parece de uma leoa
a olha a caça sem compaixão.
—Ora, Drakos querido, até pretende me convencer que é sentimental!
- Já tive momentos em minha infância de compaixão, mas isso passou, e
talvez fosse o mesmo de meu avô. Houve um momento oportuno em que
poderia ter atacado seu primo rei Uther, mas a amizade entre o rei e barão
criou a dúvida fazendo com que desistisse da invasão, e depois seu título foi
retirado e amaldiçoado pelo rei Uther. Maldita fraqueza de origem humana
que nos tirou da corte. Jurei não mais possuir sentimentos de compaixão.
—Tem medo de me libertar?
— A nossa natureza não é tão diferente assim, afinal a marca de vocês
carrego em meu braço, mas é meu instinto de sobrevivência que impede de
libertá-los. – Diga-me porque foram aprisionados nesses corpos de pedras?
- Meu querido. Arthur faria o mesmo com você se soubesse como
aprisionar almas em pedras. – Os humanos fizeram uma aliança com outras
espécies de seres contemporâneos a nós bem mais evoluídos, para nós
derrotar, eles não aceitavam nossa natureza bélica de conquistar e
escravizar humanos. Humanos fazem isso com os da mesma espécie e não
são punidos. Estranho mundo esse. Não acha?
- Caso venha a te libertar, creio que minha vida será breve como a de uma
aranha macho de viúva-negra. Serei devorado após as núpcias, caso
tenhamos algo a mais do que alianças.
Vejo que tem dúvida querido. – Esse ato de prazer seria a
preservação de nossa espécie, e quanto aos outros demônios, não
precisamos libertá-los, sendo que meu interesse é formar um
reino junto a ti. Juntos seremos donos de inúmeras terras,
castelos e humanos. – Uma vida longa e duradoura para nós.
A proposta daquela mulher demônio era tentadora, mas, ainda
assim, achava que havia algo de sombrio por trás daquelas belas
formas de semideusa, e então Drakos voltou a falar sem se dar
conta que pouco a pouco estava sendo envolvido pelas teias da
paixão.
- Meu corpo arde diante de ti e diz, sim, mas minha mente tenta
apagar a chama com a razão. – Não sei por quanto tempo mais
minha mente será mais forte que meus desejos, e a ideia de
reinarmos juntos são irresistíveis. Até que ponto isso é verdade,
me faz novamente criar duvidas, e isso é ruim. – Partirei agora.
Com uma força sobre-humana, afastou o pensamento sobre tal
criatura, e saiu de uma forma brusca daquela câmara. Entrou em
seu quarto, e mais do que depressa jogou a água da bacia em seu
rosto para retirar os resíduos da paixão que ali ficara.

A emboscada

A luz da manhã banhava a verdejante relva de uma forma convidativa


para um passeio. Este convite foi de encontro aos olhos da rainha ao se
deparar com a vastidão infinita de um céu azul envolvido por uma
atmosfera de paz e liberdade naquela manhã.
Os portões se abriram, e cercada por seus guardas e alguns súditos,
partiram a cavalo para o passeio.
A majestosa rainha exibia seus dotes de amazonas, que lhe parecia bem
natural estar sobre uma cela bordada em vermelho e dourada, com temas
de pavões e torres de castelo. Sobre seu cavalo branco, docilmente
obedecia a seus comandos.
Os guardas estavam bem alerta diante, embora um passeio aparentemente
calmo.
O silêncio já impera por um bom tempo, quebrado apenas pelos sons dos
cascos dos cavalos que trotavam no compasso acompanhado de ora em ora
das risadas despreocupadas de uma bela manhã de primavera.
Em um dado momento a rainha pede a seus guardas que se adiantem, pois
logo a frente estava a floresta. Pretendia estender seu passeio sob a copa os
pinheiros e carvalhos que lhes proporcionariam uma sombra refrescante
diante de um céu de pouquíssimas nuvens.
Não bastou muito tempo dentro da floresta, e o clima tranquilo foi
quebrado por gritos vindo das matas. Rapidamente alguns guardas se
posicionaram ao redor da rainha, levantando seus escudos para protegê-la,
enquanto outros foram averiguar de onde vinham os gritos.
- Não se afastem muito, talvez seja uma armadilha para tentar nos
dispersar. Disse um dos guardas que protegia a rainha.
Logo a frente do estreito caminho entre árvores gigantescas, apareceu um
rapaz a correr desesperadamente e gritava: - Socorro, socorro! -Piratas
atrás de mim.
– Cuidado, Vossa Majestade, é uma emboscada. E enquanto gritava e corria,
homens de Cortez de uma forma simulada alcançaram o rapaz, e o
derrubaram. Um deles levantou uma adaga fingindo que iria cravar em seu
peito. Foi quando um dos guardas grito:
—Larguem o rapaz ou morre sobre a lâmina de minha espada.
Soltaram Fininho, e fugiram numa parte da floresta onde os cavalos
dificilmente passariam, e vestidos com roupas leves tinham uma vantagem
sobre os guardas com seu vestuário pesado, tornava-os lentos, fora da sela
de seus cavalos.
O que faz por esses lados, Jovem? - Esta é uma área de caça
pertencente ao rei, e ninguém deve estar aqui sem autorização do
rei ou da rainha. Disse o guarda que havia gritado com os piratas.
—Não, por favor. Vim para cá porque fique sabendo que os
piratas planejavam uma emboscada a Vossa Majestade, a rainha
Vitória.
— Continue a falar, jovem.
— Era quase noite, quando passava pela estrada do castelo de
Drakos, e notei alguns homens de aparência suspeita. Fiquei
escondido atrás da mata para não ser assaltado.
—E o que fazia perto do castelo de Drakos?
— Estada indo ao vilarejo, quando me deparei com uma
bifurcação. Fique na dúvida qual caminho tomar, pois já estava
quase escuro, e por meu azar e sorte da rainha tomei o caminho
errado.
A rainha que ainda estava sobre a proteção dos soldados,
estranha a demora de uns deles, e pediu que outro guarda fosse
atrás dele.
—Demétrio o que há com esse rapaz?
— Está me dizendo que sofreríamos uma emboscada?
—Sim, disse Fininho.
—Bem, Vossa Majestade quer vê-lo, é melhor falar o que sabe
para a rainha. – Vamos!
Fininho diante da rainha estava com algumas escoriações e a
camisa rasgada, ajoelhando-se diante dela, e ali ficou fingindo ser
um servo inofensivo e fiel à coroa.
— Então me salvou duma emboscada? Pergunto a rainha.
— Sim, Vossa Majestade.
—Teve muita coragem.
—Arriscaria minha vida novamente, se fosse para o bem do reino.
— O que faz jovem?
— Sou camponês, trabalho com o arado.
—E o que mais sabe fazer?
—Trato com os animais. Sei cuidar bem de cães, Vossa Majestade.
— Ora, ora! Creio que apareceu em minha frente em um bom
momento. – O garoto que cuidava dos cães de caça adoeceu. –
Vamos ver se você é hábil no trato com cães, pois não os quero
ver em brigas constantes entre eles.
— Farei com que não briguem Vossa Majestade.
—Antes de partir, diga-me seu nome.
—Fininho, é assim que me chamam.
A rainha com um gesto ordenou que todos voltassem ao castelo, e
saíssem dali sem muita demora para uma área aberta, onde uma
emboscada seria pouco provável de acontecer.
Já em seu castelo a rainha manda chamar o Barão Franklin.
Estava nervosa, e preocupada com o acidente que ocorrera há pouco.
— Mandou me chama Vossa Majestade? - De fato, mandei sim, Barão
Franklin.
—Fique sabendo do ocorrido e lamento pelo infortúnio de ser novamente
incomodada pelos piratas, Majestade.
— Não lamente Barão! Não lamente, porque lamentos não trarão segurança
para o reino.
— Vossa majestade me desculpe, mas está querendo meus conselhos ou
apenas fala por desabafar?
—As duas coisas, Barão. – Não podemos mais deixar Drakos agir
livremente, a região está ficando infestadas de piratas, que nada são além
de mercenários de Drakos.
—Temos que ser prudentes se por algum motivo esteja querendo tomar
seu castelo, e jogá-lo nas masmorras. – Aquele castelo parece vazio, mas
reside um mistério demoníaco dentro dele.
—O que falam pelas tabernas do vilarejo não deve se levado muito a sério.
—Não é bem assim, Majestade. – O próprio rei Arthur falou que seu pai, o
rei Uther veio a ser assassinado, porque descobriu algo muito grave dentro
o castelo de Drakos.
—O fato é que não podemos mais esperar o regresso de Arthur. – O que
podemos mais fazer?
—Vossa Majestade foi incomodada por piratas. – Bom; neste caso devemos
percorrer a orla marítima a procura de algum navio pirata ancorado, e
ficarmos atentos quando descerem a terra em seus botes. – Seriam alvos
fáceis para nossos arqueiros.
— Peça ao Conde Baraniak que ceda alguns de seus soldados e vasculhem a
área, e caso haja algum navio pirata ancorado por aqui, enviarei os
arqueiros para rechaçá-los.·.

Um ar de preocupação no rosto do Barão Franklin deixou dúvidas quanto


à ideia de neutralizar Drakos.
—Tem alguma crítica a fazer, Barão?
—Tudo é uma questão de paciência e tempo, Majestade. – Confesso que fui
tomado de surpresa. Se ele sentir-se acuado, tomará atitudes drásticas e
inconsequentes.
— Disse uma questão de tempo, mas enquanto isso as invasões continuam
enfraquecendo nosso exército, e fazendo com que circulem livres pelo
reino. Não deixaremos que proliferem como ervas daninhas. Não permitirei
que chegue a um ponto crítico-disse a rainha deixando bem claro que a
ação será sua bandeira daqui em diante. Quando a discussão sobre o
assunto terminou.
Fininho esperava o momento para trabalhar, e a rainha o chama.
—Vejo que está mesmo disposto a cuidar dos cães, se apresentando logo
pela manhã.
— Estou ao seu dispor. Vossa Majestade.
—Vamos ver como se sai no trato com os meus cães. Ultimamente eles
andam esparsos pelo castelo, mas pouco antes das refeições, todos
aparecem.
Enquanto a rainha falava com o rapaz, deitado ao pé do trono do rei estava
Lugus, observando os movimentos do rapaz para com a rainha, e num dado
momento, começou a rosnar para Fininho, mas sem demonstrar que iria
atacá-lo, seria apenas um sinal de advertência ao jovem, que por algo
estranho motivo, lhe despertou atenção.
—E quanto a esse enorme cão ao seu lado, Majestade, terei de tratá-lo
também.
— Todos, menos este. – Ele pertence ao rei, e vem de uma linhagem de
caçadores de lobos (Wolfhound). O pai de Arthur, o Rei Uther o encontrou
perdido na floresta ainda filhote, e resolveu presentear Arthur.
Fininho olhou para Lugus, com certo temor, mas sendo um bom ator não
deixou transparecer seu desconforto, diante de um cão daquele porte.
—Agora, vá, e fique na cozinha que um dos meus servos lhe dará
instruções.
A rainha notara o estranho comportamento de Lugus sobre Fininho. A
aparição do rapaz na floresta não se encaixava muito bem no contesto,
pensou a rainha
—Guarda, aproxime-se!
—A ordem de Vossa Majestade!
—Quero que mantenha os olhos sobre este rapaz, e também peça ao
serviçal, vigiar o rapaz. Ele irá cuidar dos cães, mas seja discreto quanto aos
seus movimentos. Fui clara?
—Sim, Vossa Majestade, estarei atento aos passos deste jovem pelo castelo.
Fininho sentia-se mais à vontade, e conversava de uma forma desinibida
com os servos na cozinha, fazia algumas graças, querendo chamar a
atenção. Pegou quatro maças sobre a mesa, e deu um show de
malabarismo. Era um jovem habilidoso, com os movimentos e as palavras.
O guarda manteve certo distancia na vigia, para não desconfiasse. Notou
que Fininho despertara interesse para uma das cozinheiras. Entrou na
cozinha, no pretexto de saborear uma ameixa, e fazendo um sinal com os
olhos para a cozinheira o acompanhar onde Fininho não os pudesse
observá-los.
— O que deseja de mim? Disse a moça com um ar malicioso.
—Vejo que despertou o interesse no novato.
—Ora! Está com ciúmes guarda!
—Nada disso, sua tolinha! Quero que se aproxime do rapaz. E veja o que
consegue saber sobre ele.
Os dias iam esvaindo-se, e a esperança de encontra a ilha, estava se
acabando.
Igor observava a sua frente um horizonte que há vários dias não via
nenhum pedaço de terra. Olhou para o mastro de observação. Pediu para
Malenca que mandasse um marujo lá em cima: - Malenca! -ouviu que acabei
de dizer a você?
—Já ouvi, sim.
—E qual o motivo do mastro de observação continuar sem ninguém?
—Quem é o capitão aqui? Isso sou eu quem decide.
—Ser Hilton olhou para Malenca, e disse: - O capitão é você Malenca, mas se
não enviar algum marujo lá pra cima agora, Igor tomará seu lugar.
—Está bem, está bem!
Em questão de um curto espaço de tempo o marujo já estava no alto do
mastro. Não demorou muito lá em cima para avisar: - Uma ilha logo a
bombordo, Capitão!
Essa era a frase que Malenca não queria ter ouvido. Logo estaria na frente
de Arthur.
Sir Justin olhou atentamente e confirmou a presença da ilha: - Graças ao
Senhor, fomos presenteados com tal bela visão. – Desde quando entrei
nesse navio, não via o momento de pisar em terra firme.
Enquanto a euforia tomava conta da tripulação, Malenca olhou seriamente
a Igor, e perguntou:
—Como sabia que a Ilha estava próxima?
— Um pássaro me avisou, e é o mesmo pássaro que o fez continuar calado.
Não é mesmo Malenca?
O capitão achara melhor nem responder, e desviar o olhar de Igor, para não
criar mais atrito com os cavaleiros de Arthur.
Com o Corvo ancorado, começaram a remar os botes em direção à praia. Ela
estava vazia e nenhum sinal de Arthur, Mago, cartógrafo, e os cavaleiros.
— Sir Hilton gritou para Malenca: - Então Malenca está é a Ilha? – Ela
parece deserta.
— Decerto que é Sir Hilton!
Os Cavaleiros começaram a chamar por Arthur, e de seus companheiros,
mas ouvia-se apenas o barulho das ondas do mar, e eventualmente de
alguns pássaros.
—Você é o único que já esteve nessa ilha, Malenca. Quero que vá à frente e
siga para onde o rei provavelmente possa estar. Disse Sir Hilton.
Enquanto todos estavam ansiosos em encontrar o rei, Malenca respirava
aliviado, rezando para que as histórias inventadas sobre monstros havia se
concretizado.
Malenca levou-os até o templo, mas nada encontraram. Resolveram então
se espalhar.
Igor juntou-se a Sir Gilbert e Sir Hilton, que preferiram olhar
minuciosamente os arredores do templo, enquanto Sir Kent e Sir Loth
contornaram a ilha. Ser Ilnos, Sir Justin e Malenca, percorreram o interior
da Ilha, numa estreita e quase imperceptível trilha.
Sinais de que pessoas passaram por aqui não nos restam dúvidas, disse Sir
Ilnos para Sir Justin, enquanto caminhavam ilha adentro, Malenca deparou-
se com o pequeno riacho onde havia ouro. A velha raposa do mar na aquela
altura se parecia mais com um gato silencioso, tentando ser ignorado, e
quem sabe escapar novamente para o navio, levando consigo algumas
pequenas rochas que continham ouro, em sua algibeira.
Sir Justin percebeu o silêncio de Malenca, e num tom enérgico disse: - Qual
o motivo de diminuir o passo? Distanciar-se de nós? - Apresse o passo, e vá
à frente.

Mulher serpente hipnotizava com o olhar a todos numa dança, outros


povos haviam convidados para uma festa, e capturou todos, menos o
cartógrafo escondido nas matas.
Continuaram a caminhar através do riacho, quando de repente ouviu-se um
gemido vindo da margem direita. Quieto! Disse Sir Justin.
—Creio que ouvi uma voz humana. - Puderam ouvir?
—Pode ser a voz dos espíritos que habitam essas águas. – Parece que ainda
ouço esses demônios falando dentro de minha mente, quando me lembro
de que já caminhei por aqui respondeu Malenca.
—Quieto! -pare com essas blasfêmias, e faça silêncio.
Nada se ouvia, e ao olhar na direção de onde supostamente viera o som, Sir
Justin notou um movimento sutil entre as folhagens.
– Creio que é naquela direção, alguma coisa está por ali.
Com passos rápidos chegaram até o local dos movimentos, e então, ali
mesmo estava deitado e coberto pela vegetação, o cartógrafo quase
desfalecido com a visão debilitada.
— Bem-vindo a ilha Sir Justin, identificando-o pela voz, disse o cartógrafo, e
continuou-
—Graças ao Senhor! Parece que ouviu minhas preces enviando-os a esta
pequena ilha distante de tudo. Estava quase perdendo as esperanças de ser
achado. – Quis caminhar até a praia, mas não conseguia enxergar quase
nada, tenho a vista turva, e minhas pernas já não querem me obedecem.
—O que está acontecendo? Disse Sir Justin.
—Horrível, foi horrível. – Espero que estejam todos vivos.
—Vamos cartógrafo, diga o que sabe! – Onde está nosso rei?
—Existe outra ilha logo mais adiante, indo em direção onde o sol se põe. Do
alto desta ilha poderá visualizar. Vão para lá onde existe outro templo. Há
uma passagem que leva ao seu interior. Bom, foi lá a última vez que
estávamos todos, depois consegui fugir, e voltar para cá com um pequeno
bote de uma tribo de gentios
—Vamos deixá-lo na praia com os marujos, e enquanto isso iremos até essa
outra ilha.
— Sim, devem ir o mais rápido possível, mas antes leve o antídoto, caso
contrario não terão melhoras, podendo morrer com o veneno dentro de
seus corpos.
—Sinto que minha visão esta melhorando, recolha essas folhas que
estavam sobre meu corpo, e procure outras iguais a esta. – Elas deverão ser
esfregadas nos seus corpos e coloque algumas também dentro de suas
bocas. - Depois é só esperar pela melhora.
“I” tomou uma dessas folhas em suas mãos, e um pouco a li a alguns passos
a sua frente estava o arbusto.
O cartógrafo sendo carregado por I e J, e Malenca indo à frente, voltavam
para a praia.
Intrigado Sir Ilnos pergunto ao cartógrafo, de como tomará conhecimento
desse antídoto:
—Sei que cataloga plantas, mas não sabia que tinha conhecimento sobre a
magia das plantas. – Isso sempre coube ao Mago.
- Uma longa história para ser contada nesse momento, assim como nós
fomos parar em outra ilha, mas tomem cuidado com esses povos, são
feiticeiros, e serão facilmente dominados se olharem muito temo para seus
olhos. Não façam isso em hipótese nenhuma.
Chegando à praia começaram a chamar pelos outros, enquanto isso, o
cartógrafo se recompunha lentamente a ponto de quer ir junto, pois ele
sabia a direção correta até o templo.
—Irei com vocês, já estou me sentido melhor. – Ah! – Importante levar as
tochas, porque não há passagem de luz onde eles estão aprisionados.
—Ouçam todos! Disse - Sir Justin. – Nosso rei está em outra ilha
aprisionado junto com nossos companheiros, vamos resgatá-los.
Sem perderem tempo, começaram a remar com todo vigor arrebatando as
primeiras ondas, mas na pressa de salvarem Arthur, esqueceram Malenca
sozinho, e livre naquela ilha. Ele nem notara que por precaução Sir Justin
havia cravado a ponta de sua espada no frágil casco da canoa em que o
cartógrafo voltara.
Com os botes já quase a meio caminho, Malenca voltou os olhos para o
Corvo ancorado a sua espera, e falou consigo mesmo: - Tolos, mais uma vez
tolos! Não veem que minha vida está destinada a navegar o Corvo. - Eu, seu
único capitão. - Um verdadeiro capitão, tem várias mulheres pelos portos,
mas é fiel apenas a seu navio, onde sua alma está entrelaçada nas velas que
o levam através dos mares para portos distantes.
Provavelmente teria grandes dificuldades em navegar só, mas por ali
poderia haver outras ilhas e treinar alguns desses gentios como marujos,
mas antes disso, iria voltar ao riacho para buscar seu ouro.
Chegando à ilha tal ilha, trataram logo de arrastar os botes para uma
área distante das águas, camuflando-os com folhas de palmeiras, pois se
fossem achados pelos gentios, talvez tivessem problemas para voltar ao
Corvo.
— Prestem bem atenção no que irei falar, disse o cartógrafo. – Está é uma
tribo de feiticeiros, e não de guerreiros, portanto não os subestimem se os
virem sem armas, e jamais olhem diretamente nos olhos deles. – Vamos por
essa trilha, que logo estaremos no Templo.
O melhor seria em ficar em silêncio, e tentar tomá-los de surpresa, mas
aquelas estranhas aves de cores intensas os denunciavam através de gritos,
que provavelmente os gentios os observavam camuflados dentro da mata.
O templo seguia a mesma formação de distribuição dos monólitos, porém a
atmosfera ali presente era sinistra e ameaçadora.
Bem ao centro do templo, uma roda de pedra deitada ao solo impedia a
passagem subterrânea para o grande salão onde era feito o ritual.
Igor fincou uma tora que estava ao lado, bem no centro da roda, que se
encaixou perfeitamente, e com movimentos ritmados fazendo da tora uma
alavanca, retirou a roda de seu encaixe presa ao solo e liberando a
passagem, pelas escadarias abaixo.
Como as tochas as mãos começaram a descer, onde não se tinha a noção da
dimensão da caverna, pois acima tudo era escuridão, mas podia-se
perceber pelo som de seus passos ecoando sobre as paredes que deveria
ser gigantescas. Quando os degraus terminaram, espalharam-se por
diversas direções. A sensação era de que não havia ninguém por ali, e quem
sabe já era tarde demais para encontrá-los vivos.
Vasculharam por quase tudo naquele salão imenso, em diversos túneis que
o rodeavam.
Deveriam escolher quais dos túneis percorre aquilo até parecia um jogo de
azar da vida contra o tempo.
Sir Gilbert pediu silêncio, e se concentrarem em qual túnel percorrer. Nesse
instante o som de uma pequena esfera quebra o silêncio, e vai rolando até
os pés de Sir Gilbert.
— Foi por ali de onde ela veio, vamos seguir por essa direção disse ele
—Mas se for uma armadilha? Perguntou Sir K.
—Seria um tanto difícil, já que seus poderes estão no olhar, que mal
causariam na escuridão?
Entraram num dos estreitos túneis, e alguns passos logo mais a frente,
depararam com outro salão, e mais túneis. Pareciam que se multiplicavam,
e quando foram perceber estavam dentro de um labirinto.
Tinta de luz luminescente nos olhos
Alguma coisa encapsulada no iceberg se desprende e ao derreter libera…?
Eram túneis, e mais túneis, que se ramificavam dentro da escuridão. Sir
Gilbert, agora entendera o recado, de que aquela caverna era um labirinto.
Pararam por alguns instantes desnorteados, e resolveram voltar ao salão
principal, mas a volta estava parecendo mais longa, e era tudo o que
temiam naquele instante; estavam perdidos.
Igor pediu para que se concentrassem novamente no som das pequenas
esferas que rolavam no chão, já que não havia mais por onde se basearem
em que direção seguir, além dos ventos que percorriam pelos túneis.
Diante da total escuridão, uma mancha luminosa surgiu na altura de seus
olhos. Era um tanto difusa, mas parecia possuir uma inteligência nos
movimentos. Sir Hilton foi em direção a elas, que ora se moviam, ora
ficavam paradas, e ora desapareciam, e surgiam num outro ponto. De
repente o brilho ficou imóvel. Deu a impressão de não mais querer se
divertir com os cavaleiros. Sir Hilton empunhou sua espada, enquanto na
outra mão carregava a tocha. Existia algo misterioso por detrás daquela
florescência. Aproximando a tocha cada vez mais perto, pode ver que atrás
do brilho havia um ser, Sir Hilton foi cautelosamente se adiantando com a
chama, e num dado instante em que aquela luz parecia se afastar, abriram-
se dois olhos diante de Sir Hilton com tal poder de magnetismo, que
paralisou a mente do cavaleiro, mas antes disso sua espada foi mais rápida,
desferindo um golpe certeiro no breu, e veio o cheiro do sangue. Era um
dos feiticeiros, que Sir Hilton havia atingido. Depois daquilo várias
manchas luminosas apareceram entre eles, como estrelas da morte. Um
daqueles olhos fitou o marujo, que indefeso diante de tal poder deixou sua
alma ser devorada por aqueles olhos. Usavam uma espécie de tinta nas
pálpebras, e por isso brilhava no escuro, e assim atraiam as vítimas.
Nenhum dos cavaleiros se entregara para esses olhos que enfeitiçavam.
Procuravam não focar diretamente para eles, e desferindo golpes de suas
espadas conseguiram afugentá-los.
— Creio que já se foram. A ameaça passou. Disse Sir Gilbert.
Igor novamente ouviu mais uma esfera rolar pelos seus pés. Com a tocha
podia-se ver de onde vinha. Seguiu até sentir a presença de uma brisa mais
quente que batia em seu rosto, e por ali foi acompanhado o vento. Mais
uma esfera rolou para seus pés, e isso indicava que estava se aproximando
do ponto de origem daquelas pequenas pedras de cristal roliças. O calor
aumentava e não durou muito tempo até surgir a sua frente o Mago. Ele
estava amarrado numa coluna, não conseguia falar e nem ver, pois Igor
movimentou a chama diante de seus olhos e as pupilas não se dilataram,
mas sabia que estava consciente, e aquelas pedras caindo de sua bolsa que
levava na cintura, era prova de que estava consciente, pois podia mover
objetos com o pensamento.
—Venham todos para cá. Encontrei o Mago. Tragam as ervas para desfazer
o feitiço.
Igor andando um pouco mais adiante pode notar que todos eles estavam ali
presos a colunas. – Creio que estão aqui.
Finalmente encontraram Sua Majestade e os cavaleiros.
Um grito de urra e vida-longa ao rei foi ouvido além da caverna.
Começaram a desamarrá-los, e esfregaram as folhas em seus corpos, e
dentro das bocas. Daqui pra frente era somente esperar. O que devia ser
feito, já foi. Os mais devotos a Deus, ajoelhavam e rezavam pela cura.
O rei Arthur abriu os olhos e forçando os movimentos dos lábios, disse:
— Sei que todos dos meus fiéis cavaleiros estão aqui, ainda não posso ver
perfeitamente o rosto de cada um, apenas sinto a presença. -Que bom tê-los
novamente!

O rei e os seis cavaleiros iam pouco a pouco se refazendo do estado de


torpor em que se encontravam.
Arthur pede ao Mago que os guiem para fora daquele labirinto.
—Sigam as esferas de cristais que guiaram Igor até mim. O magnetismo faz
com que se direcionem para a entrada principal, pois lá deixei meu bastão.
— Antes de sairmos daqui, digam-me de como está a rainha?
— Está bem, Vossa Majestade, disse Sir Gilbert num tom tranquilo.
—O que aconteceu com o reino na minha ausência?
— Malenca voltou para lá com o Corvo.
Arthur enfurecido falou: - Aquele traidor ainda teve coragem de voltar!
—Sua Majestade a rainha desconfiou, e mandou prendê-lo, ele confessou
que foi Drakos o mandante.
—Isso já era de se esperar.
— Tivemos que fazer algo desagradável, mas não tínhamos opção melhor.
—Fale logo Sir Gilbert!
—Malenca foi o capitão do Corvo na volta para a ilha.
—Ironias do destino, mas era o único que sabia navegar de volta para a
ilha, por isso não me espanto. - Onde está esse infeliz agora?
—Deixamos na ilha.
— Isso não foi nada prudente deixá-lo só, sabe que tentará se apossar do
Corvo novamente.
—Não se preocupe Sir Justin furou o casco da canoa, e dessa forma não
conseguirá remar até o Corvo.
—Não subestime essa velha raposa dos mares. – Agora temos que voltar o
mais rápido possível.
Da praia, partiram nos botes para o Corvo, que permanecia ancorado, e
velas presas às amaras do mastro para alívio de Arthur.
Malenca se embrenhara para o interior da ilha, indo até o riacho. Retirava
do fundo das águas transparentes a rocha de brilho dourado.
— Voltarei para algum porto, distante do reino de Arthur, serei rico com
todo esse ouro. - Os tolos me fizeram voltar para resgatar meu ouro, e com
todos os cavaleiros para reinarem com Arthur entre os caranguejos. –
Drakos ficara feliz por saber que todos eles agora não mais atrapalharam
seus planos.
—Provavelmente serei recompensado com mais ouro.
Enquanto retirava freneticamente as pequenas pedras do fundo do riacho,
turvando, e desequilibrando a vida da mata, transformava uma veia
sagrada da ilha, num caos lamacento. Malenca preocupado com o ouro, mal
sabia que todos estavam são e salvos a bordo do Corvo.
O ouro era tanto que o saco improvisado que fizera, dando um nó em cada
manga de sua camisa, começava a rasgar, mas foi andando assim mesmo
até a canoa, e jogando todas as pedras lá dentro sem perceber que havia um
furo no casco da canoa. Remou em direção ao Corvo, enquanto isso notou
movimentos no convés.
- Não posso acreditar no que meus olhos estão vendo. – Chegaram ao Corvo
primeiro.
De longe Igor avistou Malenca remando numa canoa literalmente furada.
—Vamos fazer uma aposta senhores! – Quem adivinhar onde será a última
remada de Malenca antes da canoa afundar ganhara um colar de pedras e
ossos que retirei de um dos feiticeiros abatidos.
—Malenca ouvia os gargalhar enquanto falavam: Vamos, reme! Apostamos
qual a distância em que irá afundar.
— Qual alternativa escolher: afundar aqui ou ser regatado? Resmungava
Malenca,
A canoa a cada vez mais cheia de água. Remou freneticamente para salvar o
ouro, mas foi em vão, virou com todo seu ouro. Provavelmente em quinze
remadas chegaria até Corvo.
Resgatado, Malenca continuava sendo vítima de chacota da tripulação, mas
sem o seu punhal, não oferecia tanto perigo assim.
—O que há de engraçado! – Acabo de perder todo meu ouro no fundo do
mar. Continuem a rir! - disse Malenca bem furioso.
- Também acha que devo rir Malenca? Disse Arthur, acabando de sair de
sua cabine para o convés.
— Majestade! Mil perdoeis! Quero que entenda que minha mente estava
sobre o domínio de Drakos. Jamais em sã consciência trairia meu rei.
—Não tem mais como se safar, Malenca. Não quero ser um rei injusto, mas
também não irei tolerar que um homem que fiz capitão deste navio, fosse
um pirata. Malenca ajoelhado perante o rei pedia misericórdia. Estava ali
diante de sua majestade um homem que dava pena.
O rei prosseguiu: - Daqui em diante será prisioneiro neste navio. Pensei em
deixá-lo, aqui para viver até o fim de sua vida. Fazer o mesmo que fez
comigo. - Creio que essa ilha não mereça tê-lo como habitante, e o último
lugar que te resta é a masmorra.

Fora um dia bem exaustivo. O sol deitava-se no horizonte, deixando marcas


de um grande rei e seus cavaleiros, na memória daquela pequena ilha.
Quando a noite caia, o céu cobria-se de estrelas, e no convés do Corvo, o rei
contava o que ocorrera antes entrarem no labirinto.
— Estávamos no templo onde o Mago buscava decifrar as antigas
inscrições nos monólitos. Quando a noite chegou à posição das estrelas
estavam favoráveis para o contato com o Novo Mundo. Esses seres de uma
forma conseguiam se comunicar telepaticamente com os sacerdotes de
outras terras, clamando por nossa vinda, mas no momento do ritual
apareceram esses feiticeiros.
— Chegaram bem silenciosos. Curioso o fato de nenhum dos cavaleiros
perceberem suas presenças, e quando notamos já havia uns 14 a nossa
volta. Não eram hostis, e nem portavam alguma arma. O Mago bem que
tentou se comunicar com eles, mas a língua era totalmente desconhecida,
não se parecia com nada, e nos comunicamos através de gestos.
Pareciam amigáveis. Entramos em seus barcos estreitos e rápidos, em
pouco tempo estávamos sendo recepcionados com frutas. Tinham aves
exóticas e bem coloridas sobre seus ombros, e depois nos sentamos ao
chão, e bem diante de nossos olhos, uma linda jovem descia de uma árvore
através de cipós presos a sua cintura, que ao desenrolar ia aos poucos
mostrando suas belas curvas femininas. Por um período tão longo sem
apreciar a beleza feminina, ficamos hipnotizados.
Sua pele era de um tom esverdeado, não sei se tingido, mas não parecia
humana, pois seus olhos eram de cor de mel, e suas pupilas oblíquas iguais
a serpentes, e marrons em vez de preto. Então começou a dançar. Os
gentios possuíam estranhos instrumentos musicais, o som vibrava dentro
dos nossos corpos e a dança cada vez mais rápida. O corpo da dançarina
movia-se em ondas iguais a uma cobra, e foi ai que nos ofereceram a
bebida.
—O Mago aconselhou não beberem, pois ao provar sentiu um sabor que
lembrava uma erva dada aos prisioneiros antes de serem sacrificados, mas
naquela altura a sensação era de estase, sentia-me no paraíso. Há muito
tempo não nos divertíamos tanto assim.
Fez se uma pausa, e o rei pede ao Mago continuou a narrativa:
—Havia uma mistura mágica: Musica, dança, e bebida. – Para mim estava
bem claro se tratar de uma armadilha, e ao mesmo tempo em que deveria
avisá-los, também queria por curiosidade saber mais sobre aquele estranho
ritual. Deixei-me levar por um pouco mais naquela dança, e por um breve
descuido fui ferido por um espinho bem na nuca, tenho certeza que foi o
momento em que a jovem dançaria passou por minhas costas, minha vista
começou a enturvar, estava perdendo os movimentos, e ai era tarde para
interromper a festa.
Arthur pediu para o cartógrafo que continuasse a narrar, devido ao fato
dele ter sido o único a não perder os movimentos e escapar.
—Observei o olhar que o Mago fez ao provar a porção, aquilo me chamou a
atenção, mas infelizmente já havia ingerido um pouco daquilo, mas não o
suficiente para puder fugir e esperar que a ajuda viesse logo dos outros
cavaleiros.
Sir Gilbert que ouvia atento fez uma pergunta ao cartógrafo: - Até aqui, pelo
que vejo ninguém sabia do poder enfeitiçador do olhar dos gentios. Como
soube disso, ao tentar nos avisar para não olharmos diretamente pare seus
olhos?
— Fomos todos carregados para baixo do templo, fingi de estar
inconsciente. Deixaram-nos deitados ao solo, enquanto amarravam um de
cada um em posição vertical nas colunas. Rolei meu corpo ate uma área
onde as tochas não mais podiam iluminar, e fiquei a observar o que
acontecia.
—Não pude acreditar no que meus olhos viram: Além de nós, haviam
outros no mesmo estado amarrados a colunas. Estes foram despertados
com a mesma erva que foi passada em vocês. Ao voltarem ao estado
normal, perceberam que estavam imobilizados, e o que vi em seguida foi
aterrorizador.
—Os gentios seguravam firmes as vítimas pelos cabelos, fazendo com que
olhassem para um deles que se posicionava bem à frente. As vítimas
relutavam para não olhar, parecia que já conheciam tal ritual. Gritavam
muito com os olhos fechados, mas era em vão. O feiticeiro que estava a sua
frente retirou de uma vasilha um punhado de formigas que com imensas
presas. Abriam-lhes os olhos com os dedos, posicionava a formiga de tal
forma, que as presas, prendiam as pálpebras nas sobrancelhas, e como o
olho aberto dessa forma, o feiticeiro ficava cara a cara com a vítima,
olhando-o por algum tempo ate que suas almas fossem sugadas e
desfaleciam.
Depois disso, o feiticeiro dançava e cantava com movimentos que meus
olhos não podiam acompanhar de tão rápidos que eram, parecia possuído
de uma energia sobre-humana.
Na manhã seguinte o sol atravessava seus primeiros raios sobre as frestas
do convés do Corvo, aquecendo o assoalho úmido que a madrugada deixara
pelo orvalho. Era a primeira noite tranquila, depois de muitas noites mal
dormidas nas covas do templo.
O Corvo não era terra firme, mas representava uma parte do reino de
Arthur, e de alguma forma sentiam-se seguros.
Ao subir para o convés o Mago dirigiu-se ao rei: - Tenha um bom dia
Majestade!
—Bom dia Mago!- O frescor desta manhã parece promissor depois de um
bom sono merecido.
O reflexo nos olhos de Arthur, do brilho do sol eram esperançosos, e mais
uma vez, o tempo tecia o destino daquela bela manhã. O Mago esperou sua
majestade voltar à realidade dos fatos e falou:
—Meu senhor é uma manha esplêndida, mas teremos que partir em breve
para o novo mundo, o tempo se torna crítico. Devemos nos reunir no
templo a noite para a travessia.
—Como assim? Navegaremos a noite? Não acha isso um tanto incomum?
— Iremos até eles sim, mas não de navio. - Meu senhor, lembra-se de
quando iniciamos o ritual, e a cada monólito representava um cavaleiro?
— Sim, e essa é a chave para ter acesso ao enigma. Não é isso?
— Essa relação de números e arranjos no espaço/tempo é que nos levara
ao novo mundo.
A viagem será não através de uma embarcação, mas através de outro
universo que a consciência ira abrir e nos direcionar para lá, mas temos
que nos preparar para isso quando a tarde chegar e o sol estiver no
horizonte.
—Que assim seja Mago!

Ao regressarem a ilha em seus botes, Arthur sabia que somente ele, os


cavaleiros e o Mago, deveriam partir. Deixariam Igor, o cartógrafo e os
marujos aguardando-os na praia.
Malenca não se dera conta de que estava sozinho, e o que iria acontecer
naquele dia. Estranhou o silêncio, e começou a gritar: - Porque esse
silêncio? Onde estão todos? Nada se ouvia apenas o barulho do mar e
alguns pássaros
—Alguém a bordo? Gritou mais uma vez.
A mente de Malenca estava conturbada e aquele ouro se tornou uma
obsessão, e agora estava a só, e precisava de algo para escapar.
Não muito longe das grades havia uma barra de ferro, porém distante de
seu braço, mas para a velha raposa do mar nada era impossível de se
resolver. Retirou sua camisa e calça, dando um laço unindo a camisa à calça,
e em seguida prendendo a sua bota. Lançou várias vezes, até trazê-la onde
pudesse alcançar com suas mãos. Fez uma corda com as roupas,
amarrando-as entre as grades, e com a barra de ferro, começou a torcer até
que a grade se dobrasse, e pudesse sair.
—Livre! Estou livre para buscar meu ouro naquela ilha, e ninguém ira me
impedir.
Malenca se atirou do Corvo, e começou a nadar em direção a ilha, mas
quando estava quase se aproximando da praia, notou a presença dos
marujos, que ali ficaram para assegurar seus botes, então começou a
contornar, rezando para que ninguém o notasse.
Quando a tarde caiu, e o sol despedia-se da pequena ilha, Arthur, o Mago e
os cavaleiros foram até a plataforma, e de lá eles partiriam rumo ao
desconhecido.
Estavam todos impacientes, jamais fizeram uma viagem desta natureza.
Tudo deveria estar perfeito para que nenhum imprevisto acontecesse.
O templo era cercado por imensos monólitos, e com inscrições de difícil
compreensão. Naquela altura em que permaneceram presos a ilha, foi de
grande ajuda para o Mago se familiarizar com a estrutura de pensamento e
raciocino gravados nas pedras.
—Ouçam, disse o Mago: - Cada um de vocês está relacionado a um monólito
correspondente. Que cada um de vocês se posicionarem corretamente,
vamos iniciar o ritual para o transporte para o outro lado.
—Mas como saberemos disso? Indagou Sir Ilnos, sendo um dos cavaleiros
mais novos.
- Não foi à toa que se tornaram cavaleiros de Arthur, simplesmente
procurem se concentrar, e tenham firmeza de pensamento. Seus corpos
irão vibrar intensamente quando se posicionarem de forma correta, disse o
Mago.
—Nada a temer, disse Sir Gilbert para Sir Ilnos tentando acalmá-lo.
A noite aproximava-se e com ela, as estrelas surgiam, uma a uma até perder
a contar para uma quantidade infinita desses pequenos pontos brilhantes,
que iriam compor o cenário propício para a realização do ritual.
—Essa noite não vai tocar qualquer instrumento musical, ou orar para os
seres se aproximarem de nós, isto porque a aparição deles será
desnecessária. Possuímos o que queremos para alcançar o outro lado,
bastam apenas esperar, disse o Mago.
Eles ficaram de frente para cada um dos monólitos, enquanto esperavam o
momento da viagem. Seus corpos vibravam, suas mentes se expandiam
para poderem se adequar a nova forma de matéria que os levariam dali.
Algo de extraordinário começava a se manifestar, os monólitos ficaram
suspensos no ar. O peso monstruoso daqueles blocos maciços esmagaria
facilmente qualquer um deles, mas de uma forma iam se elevando do solo e
quando suas bases estavam acima de suas cabeças começaram a se inclinar
escondendo as estrelas, e foram se fundindo até formarem um único
monólito. Era um momento crítico, e qualquer interrupção poderia matá-
los, mas o processo continuava, e onde havia as estranhas inscrições, foram
se apagando até formar uma superfície de cor escura, refletindo a imagem
de cada um dentro no espelho negro. Arthur já havia experimentado tal
situação quando jovem, mas quanto aos cavaleiros era algo assustador.
No espelho negro que se formava através daqueles blocos de rocha, um
universo aparentemente invisível a olhos humanos surgiria. Um imenso
vértice bem ao centro. Viram o passado, estavam diante de batalhas ou
momentos de ócio, viram seus objetos pessoais, que se perderam ou foram
roubados no passado, ouviam as vozes de suas amadas sussurrando em
seus ouvidos, sentiam o perfume dos mares, e o vento agitando a vela do
Corvo. Sim a imagem do navio havia se projetado, e tornado real para
dentro do espelho, e nele, os cavaleiros viajariam para o outro mundo.
Todos estavam a bordo no clone do Corvo. Estavam dentro do espelho
negro rumo ao desconhecido universo.

Enquanto isso lá na ilha Igor o cartografo e os marujos voltavam para o


Corvo.

Ao subirem a bordo do Corvo notaram a ausência de Malenca.


— Incrível, a velha raposa do mar fugiu novamente. Disse Igor, como se o
ocorrido não fosse nenhuma novidade.
— De qualquer forma ele está preso na ilha e não iram muito longe,
comentou o cartógrafo.
— Poderá trazer problemas se continuar solto, e devemos amanhã cedo
tentar recapturá-lo.
—Isso não é minha tarefa, Igor. Vá você junto com os marujos tentar
encontrá-lo. Quanto a mim ainda tenho muito que classificar plantas ainda
não catalogadas.
—Esta bem, mas não se esqueça de que recairá sobre todos se algo
desastroso acontecer ao Corvo, ou algum de nós.
— Lembrar-me-ei disso, mas se por acaso encontra Malenca naquela ilha,
tentarei persuadi-lo a voltar. Ele está um tanto alterado e suas atitudes
poderão ser imprevisíveis.

Na ilha, Malenca queria ter a certeza de estar só. Foi para o templo, e
teve uma surpresa que seus olhos mal podiam acreditar. Deparou-se com
Arthur, o Mago e os cavaleiros imóveis, haviam se tornados estátuas de
pedras junto aos monólitos, mas Malenca não fazia ideia do que se passara
por ali, acreditava que uma maldição vinda dos seres que ali habitavam os
transformou em rochas.
Sozinho e diante de homens de pedras impossibilitados de esboçar algum
movimento, Malenca se viu diante de uma situação ímpar, e não perdendo a
oportunidade de se vingar, ergueu sua cabeça na altura do rei, e fitou em
seus olhos.
—Majestade! Nem imagina o prazer que me dá, ao te encarar sem temor ou
demonstrar remorso dos meus atos. Foi um rei amado e respeitado, mas
veja você como as coisas mudam. Não posso colocá-lo ao lado dos insetos
que rastejam, porque nem consegue se mover, ou ao menos compará-lo a
um vegetal, porque nem viço tem nessa pele endurecida de rocha. Em
breve levarei o ouro dessa ilha para o Corvo, e partirei rumo ao reino onde
reina uma rainha convencida, mas logo será derrotada por Drakos, e
quanto a mim, farei parte da corte, serei um nobre, terei terras. Quanto a
você, se é que vossa Majestade não se opõe a tal tratamento, ficará preso a
esse templo para sempre, e eu livre para navegar no navio que me foi
tomado.
Depois do longo monologo que teve com a estatua de Arthur, como se fosse
o de um rei para com outro, pensava em como carregar o ouro para dentro
do Corvo e seguir viagem, mas de repente lembrara-se dos marujos, Igor e o
cartógrafo. O semblante de Malenca mudou para um ar de preocupação, e
as coisas não estavam a seu favor. O olhar da velha raposa oportunista
volta a arquitetar planos de retomar o Corvo.

No reino da Bretunia, Drakos desce até os subterrâneos de seu castelo, e


seus pensamentos continuam voltados para aquele belo ser demoníaco que
enfeitiçou sua alma.
—Não posso, e não devo me deixar levar por essa mulher demônio. Tenho
que manter o controle das minhas emoções, caso contrário serei mais uma
presa fácil na mão desses seres petrificados.
Drakos foi até o grande salão onde o navio estava ancorado em águas
cristalinas diante do portal do espelho negro, aguardando o momento de
penetrar no mundo pertencente à outra dimensão.
Drakos viu algo de estranho ao olhar para o fundo da caverna, onde o
espelho negro dividia-se em dois mundos. Um terminal levava até o navio, e
subindo a bordo, permaneceu sobre a proa a olhar a imensa parede de
espelho que refletia imagens sutis e fracionadas, por onde as águas corriam
para o lado misterioso no interior do espelho. Sua intuição queria lhe
mostrar que algo quase imperceptível estava acontecendo do outro lado.
Notou um pequeno ponto branco percorrendo o interior do espelho como
se fosse uma luz. Aquele ponto foi crescendo e tomando a forma de um
navio. Era o Corvo navegando em direção ao novo mundo, e Drakos sabia
que deveria agir rápido antes que Arthur atingisse sua meta.

No castelo de Arthur, Fininho dividia seus deveres de espião ao de


conquistador de cozinheiras.
—Dessas mãos devem surgir pães maravilhosos, disse Fininho para a
cozinheira.
—Prove um para saber. Acabei de tirá-los do forno, ainda estão quentinhos.
—Com toda certeza! Como é seu nome, creio que ainda não me disse?
—Magda, é assim que me chamo, mas pegue um pedaço do pão.
Fininho levou o pedaço de pão para sua boca bem lentamente, e fixado seu
olhar nos de Magda.
—Maravilha, tanto o sabor quanto as formas de suas mãos. Sou um expert,
e raramente cometo enganos.
—Obrigada!
—Uma dona tão talentosa como você, creio que também deva saber
guardar segredos?
—Estará bem seguro comigo.
—Sim. Há muito tempo que ouço falar sobre o Mago, e tenho uma imensa
curiosidade em saber um pouco sobre ele. Poder-me-ia levar até seus
aposentos, apenas só para dizer aos meus futuros netos que um dia estive
onde o maior mago do reino praticava sua alquimia.
—Posso ser punida por isso, mas se realmente tem grande apreso pelo
Mago, lhe farei esse favor, mas apenas uma olhada rápida Entendeu?
—Prometo não desapontá-la, doçura.
Enquanto o guarda desviava seu olhar dos dois, de uma maneira sutil foram
até os aposentos do Mago. Entre os corredores, Fininho parecia estar mais
interessado em Magda do que em achar tais manuscritos, e passou a lhe
disser gracinhas até chegar lá.
—Esse é o quarto do Mago.
— Vamos entrar juntos, talvez encontremos alguma porção do amor em
algum desses frascos.
—Não de jeito nenhum! Vá você, mas apenas olhe e seja rápido, pois se
alguém nos vir… bom, nem quero pensar.
—Está bem doçura, prometo ser rápido.
O guarda já aquela altura havia desconfiado do sumiço dos dois,
percorrendo pelos corredores do castelo a procura.
—Por que demora tanto assim? Ouço passos, mas talvez seja tarde para
voltarmos juntos. Fecharei a porta, e voltarei sozinha para a cozinha.
— Está bem, quando perceber que não há ninguém no corredor, voltarei.
—Prometa não mexer em nada.
— Tem a minha palavra.
Alguns passos adiante encontrou o guarda que estava a sua procura. Ele a
tomou pelos braços e perguntou:
— Onde está o rapaz? Pedi que ficasse de olho no nele. Aonde o levou?
— Solte meu braço! Não sei do que está falando. Fui apenas verificar se
havia água fresca dentro das jarras dos aposentos da rainha.
— Isso é serviço da camareira
— Ela não estava se sentido bem, e pediu para eu levar.
— Está bem, mas mandei você olhar o rapaz.
— Fui tirar os pães do forno, e ao voltar ele já não estava mais lá. Pensei
que o tivesse visto sair, e por isso não avisei.
—Não comente nada com a rainha sobre esse acidente. Agora vá.
Fininho estava só dentro dos aposentos do Mago, e jamais pensou que seria
tão fácil assim. Ficou abaixado num canto até não ouvir mais os passos no
corredor.
A luz vinda da janela não ajudava muito a enxergar o que procurava, mas
logo suas pupilas acostumaram-se ao escuro.
Enquanto isso Magda estava um tanto aflita com a ausência de Fininho, e
caso demorasse mais um pouco inventaria alguma mentira de que o rapaz
fora sozinho em direção ao corredor, caso ele delatasse Magda. Quem iria
acreditar na palavra de um estranho?- pensou Magda.
Dentro do quarto tentou ser o mais sutil possível, e deixar cada coisa em
seu devido lugar. O quarto lhe dava frio na espinha, parecia que olhos
invisíveis vigiam-no a cada movimento. Encontrou uns pergaminhos
enrolados em um dos armários, tomou-os e voltou o mais rápido possível
para a cozinha.
Magda estava aflita e foi logo lhe dizendo: - Por que razão demorou tanto
assim?
—Esqueceu que sou novo aqui. Errei de direção, só isso, não há motivo
para se preocupar.
O guarda voltou a seu posto, mas não foi até eles, procurava ser discreto,
como se não tivesse dado importância ao breve sumiço do rapaz.
A rainha mandou chamar o guarda que vigiava o novo tratador de cães.
— Ficou de olho o tempo todo no rapaz? Perguntou a rainha.
— Sim Majestade.
— Diga-me, o que foi que ele andou fazendo nesse tempo?
—Bom, Vossa Majestade, ele é um rapaz um tanto inquieto, fala com todos
da cozinha, fez algumas exibições de malabarismo com as frutas. Gosta de
chamar a atenção.
— Interessante: Trabalha no campo arando a terra, cuidando dos animais, e
até malabarismo sabe fazer. Gosta de se exibir, isso é um tanto estranho
para um jovem camponês. O que mais?
- Se engraçou com uma das cozinheiras, que lhe ofereceu um pedaço de
pão.
—Guarda, tenho a impressão que isso não é tudo. Caso aconteça algo de
grave, assumirá a responsabilidade. – Mais algo a dizer?
— Bom... O rapaz desapareceu por alguns instantes da minha vista, fui atrás
dele, mas não o encontrei, talvez procurasse os cães.
—Continue de olho nele, mas não omita mais nenhum fato para sua rainha.
Estamos entendidos?
—Mil perdoeis Majestade, isso não voltará a acontecer.
Assim que o guarda voltou a seu posto, a rainha sutilmente pede a outro
guarda que façam uma revista em Fininho, quando ele sair castelo.

Drakos sabia que o Tempo era um fator decisivo para intervir na viagem de
Arthur. - Por onde anda esse rapaz que mandamos ao castelo de Arthur?
Dizia Drakos olhando seriamente para a difusa imagem do Corvo
navegando numa outra dimensão.
— Godofredo! Godofredo! Esbracejava Drakos exigindo a presença rápida
do criado.
— Senhor, que deseja, de tão urgente assim?
—Preciso dos manuscritos do Mago, mas esse rapaz que enviamos, até
agora não deu notícias. Terei que subir até o penhasco essa noite. Quero
que prepare meu cavalo.
Quando a noite chegou, Drakos do alto do penhasco retirou de sua
cintura uma pedra negra. Empunhando-a firme, levantou em direção ao
céu. Com seu pensamento, no brilho da Lua, a pedra em sua mão levitou
emanada uma luz de seu interior. De repente o brilho transformou-se num
vulto, desaparecendo na escuridão da noite, indo percorrer as paredes do
castelo a procura de Fininho, que dormia junto aos cães numa cama
improvisada de palhas.
O vulto que Drakos enviara, percorria as paredes. Sua silhueta era visível,
por onde as luzes dos archotes iluminavam.
—Acorde Fininho! Vamos acorde: dizia o vulto.
Fininho passou a ter sonhos terríveis. Os cães rosnavam com sua agitação,
acordando-o. Suava frio. Ouviu a voz que vinha da sombra de Drakos
projetada numa das paredes do pátio.
—O que é isso? Fantasma? Quem é?
— Sou eu, Drakos. Saia imediatamente. Preciso do manuscrito. Já se
apossou dele?
—Sim, mas sair agora a noite despertará desconfiança dos guardas.
—Terá que sair agora. Amanhã será tarde demais.
— Mas como?
— Encontre uma corda, saia pelo muro.
—Agora como?
—Isso é problema seu, e creio que não haverá dificuldades para quem já foi
de circo.
E se os guardas me pegarem?
— Darei um pequeno entretenimento a eles, iluminando os céus
com bolas de fogo.
Fininho deu uns pedaços de bolacha para os cães pararem de
rosnar, e foi atrás das cordas, encontrou um poço, e de lá desatou
o balde.
Dos céus começaram a explodir bolas de fogo, e os guardas
olharam aquilo, sem entender do que se tratava, e na distração,
Fininho escapou.
Do lado de fora Drakos o aguardava.
- Aqui esta, senhor, foi mais fácil do que eu imaginava.
—Bom trabalho, mas agora volte ao castelo.
— Mas como voltar?
— Não se faça de tolo. Creio que a corda ainda esteja amarrada no muro do
castelo. Não esta?
— Sim, ainda está lá.
— Pois bem, volte para o castelo, e não faça mais perguntas. Aproveite o
momento enquanto as bolas ainda estouram no céu.
—Sim meu senhor.

De volta ao castelo, Drakos abriu os manuscritos sobre a mesa, olhando-os


atentamente. Os caracteres em que se encontravam eram muito antigos,
tendo dificuldades de compreendê-los, porém as imagens mostravam
claramente o diagrama da travessia no espelho negro. Por horas tentou
decifrar os hieróglifos, somente as figuras não ajudavam muito, então
desceu ao salão subterrâneo e procurou na biblioteca os códices de que
pudessem ajudá-lo. Descobrira que os hieróglifos pertenceram a uma
antiga civilização do novo mundo, mas devido a um inevitável cataclismo a
muito profetizada pelos altos sacerdotes, fizeram com que procurassem
meios de fuga antes do dia final.
Os mais evoluídos espiritualmente, e os que tinham acesso a
conhecimentos dessas ordens secretas, atravessaram por uma parede de
cristal translúcida e escura, descrita de uma polidez jamais vista, levando-
os para outra dimensão. Esse povo ainda vive, e é para onde Arthur estava
se dirigindo.
Quanto aos hieróglifos conhecidos por Drakos não muito o ajudaram,
embora ambos pertencessem a uma mesma raiz de uma língua de seres
viajantes dimensionais.
—Querido! A voz quebra a concentração de Drakos, e agora ele teme ser
novamente atormentado pelo encanto da musa pétrea.
—Por favor, agora não. Vai tirar minha concentração!
—Estou aqui para te ajudar, por que sei que é humanamente impossível
atravessar para outra dimensão olhando apenas para o manuscrito, que
mal consegue decifrar.
—Não me subestime tanto assim. Já lhe perguntei seu nome?
—Ledúnia.
—Um nome um tanto incomum, mas vindo de uma alienígena, até que soa
bem. - Veja estes manuscritos, estavam de posse do Mago, e se ele
conseguiu decifrar, também tenho uma chance de resolver. Afinal ele é
humano.
— Meu tolinho! O Mago não é totalmente humano, e seus conhecimentos
transcendem ao dos simples mortais. Alguém de sua linhagem para
começar a decifrar tais hieróglifos, tem que ter, pelo menos, uns 300 anos, e
sei que os humanos não ultrapassam os 80 anos. Vejo que é um homem de
uns 45 anos aproximadamente.
—Esquece que posso usar de meios alquímicos.
—Daqui uns 255 anos o reino de Arthur terá seu memorial. Um dos mais
relevantes da Bretunia, e será quando terá terminado de decifrar o
hieróglifo, mas até lá as ruínas de seu castelo será uma porção de partículas
viajando no esquecimento. Provavelmente aniquilado pelo exército de
Arthur.
—Quer que a liberte, não é mesmo?
—Sim, mas também quero que vença Arthur. Liberte-me. Vamos!
—Farei, mas em último caso, quando todas as possibilidades de derrotar
Arthur acabarem. Será uma espécie de sacrifício, onde darei minha vida
para acabar com Arthur. Sei muito bem o que me espera se libertar vocês.
—Tolice Drakos, sua mente é cheia de fantasias a nosso respeito.
—Por favor, me deixe só, falaremos sobre isso em outro momento.
—Como queira querido, aqui não sentimos o tempo passar, e somos
eternos, mas quanto à vida dos humanos; bem sabe que ela passa ligeira. Se
não fizer isso outro o fará.
Aquela mulher demônio havia tomado seu precioso tempo e concentração,
e usara de palavras pouco otimistas para que pudesse decifrar o processo
da viagem dimensional.
A quem recorrer àquela altura do tempo. Passaria toda a noite tentando, a
assim foi até cair de exaustão e dormir debruçado sobre a mesa.
Dormir no subterrâneo do castelo não era algo aconselhável, e naquela
noite teria horríveis sonhos.

Sonho de Drakos

O tempo neste momento era seu maior rival. Deveria compreender


rapidamente, como atravessar dimensões, e de nada lhe adiantaria, se por
ventura seu maior inimigo se apossasse do enigma. Abririam as portas para
reconquistar o poder do reino.
Debruçado sobre os manuscritos, estudava-os atentamente sobre a luz de
vela, que lentamente ia consumindo o vigor de seu raciocínio. A cera
derretia na chama, como se fosse uma ampulheta marcando o tempo.
Drakos caiu num sono profundo, depois de exaustivamente procurar meios
para decifrar os hieróglifos: o tratado sobre viagens interdimensionais.
Dormir nos subterrâneos do castelo não era muito prudente, pois os
sonhos ali liberados abririam os portões de mundos demoníacos, que lhe
consumiriam a alma de sua parte humana.
Então Drakos sonhou com os tempos de criança, e o único que poderia
ajudá-lo a decifrar tais manuscritos, era o gato de sua infância.
Avistou do alto da janela de seu quarto o jardim, olhou sua mãe
carregando-o bruscamente pelo braço. A sensação de olhar-se numa
criança era igual ao imaginar uma luz abrindo uma pequena fresta nas
paredes do tempo, para resgatar algo do passado.
Sua mente dificilmente aceitava a ideia de que podia estar
simultaneamente em dois corpos.
Repentinamente as espessas paredes de pedras do castelo não ofereceu
resistência, e atravessou caindo em cima de si mesmo, fundindo-se num
único corpo. Era carregado pela mãe, e com muita raiva, chorava
incessantemente.
—Já lhe disse mil vezes para não brincar com esse gato. Ele é um ótimo
caçador de ratos, só isso. Poderá sofrer novos arranhões como da última
vez.
— O levantei pelo rabo. Foi por isso que me arranhou, mas agora não faço
mais.
—Não estou nem um pouco interessada em suas explicações. Quando for
um lorde adulto poderá fazer o que lhe vier em mente, mas por enquanto
terá de se submeter as minhas ordens. Entendeu?
—Meu avô sempre deixa eu brincar com o gato.
—O Barão Brutus, também adora esse gato. Apesar de ele ser teu avô,
muitas vezes seus exemplos não são bons para um garoto.
—O gato me disse que a senhora é uma idiota.
—Já falei mil vezes que gatos não falam, e não são modos de falar comigo
desta maneira.
—Mas este fala comigo. O que posso fazer? Direi tudo ao meu avô sobre o
que está fazendo comigo.
—Se ousar contar, ficará sem seu cavalo de madeira.
O pequeno Drakos foi levado para o quarto, e ali ficara só, e quando a noite
chegou à luz do archote projetou a silhueta do gato sobre uma das paredes.
—Vai embora daqui. Disse o pequeno Drakos para a sombra do gato.
—Pensei que quisesse minha companhia? -disse a sombra do gato.
—Não é isso, é que sempre fico de castigo quando falo com você.
—Dessa vez ela não virá nos incomodar.
—Como pode saber?
—Ora! Gatos sabem quando alguém que nos detesta está se aproximando.
A sombra do gato sempre aparecia no quarto do pequeno Drakos, quando
sua mãe o impedia de visitá-lo.
—Tem algo que precisa saber, disse a sombra do gato.
—Você sempre tem alguma coisa pra me dizer, argumentou o pequeno
Drakos
—Mas desta vez, é muito importante.
Apesar de ser um garoto de sete anos, costumava surpreender com
eventuais flashes de um homem maduro da forma como olhava, e foi num
desses momentos que o gato se aproveita para lhe dizer: - Vou lhe falar
sobre o futuro. -Ah! Por isso, é chamado de gato sabichão?
- Sabe o porque escondemos nossos conhecimentos dos humanos?
— Sei lá!
— Não gozaríamos de tamanha liberdade, caso eles viessem a sabe sobre
nossos talentos.
—Vai me dizer qual é?
—Pois, bem! Você no futuro estará com sérios problemas, se não conseguir
resolvê-los a tempo. Irei te levar para outro reino, onde aprenderá uma
escrita que não existe mais neste seu mundo.
—Gato, sua sombra esta aumentando, e mudando de forma. Você parece
uma porta!
—Sim, uma porta por onde deverá entrar. Vamos! O que está esperando?
Atravesse!
Drakos passou através das paredes de pedra de seu quarto e caminhou
para o outro lado. Tudo tão escuro, quase nada se via diante daquela sala
que nada se parecia com o outro lado do cômodo do castelo.
Drakos continuou a andar acompanhado apenas pela voz do gato, mas
quando a iluminação penetrou através das rachaduras das paredes, pode
ver o bichano por completo ao seu lado.
—Que bom que esta aqui, prefiro você assim, mas me trouxe aqui só para
vingar-se de mim por ter puxado seu rabo?
—Aquilo doeu um bocado. Sabia? Foi bem feito para você.
Andaram em direção a uma porta, e esta se abriu. Foram surpreendidos por
uma luminosidade tão intensa, que fecharam os olhos, porém, aos poucos
se tornava mais amena, e se depararam diante de uma exótica e bela
paisagem. Vários pássaros dum colorido intenso, cachoeiras em rochas de
turmalinas, criavam vapores de cortinas das gotículas de águas,
decompondo a luz como um prisma. Era um cenário de sonhos, onde os
desejos seriam concebidos.
— O que é isso gato? Onde estamos?
—Aqui é onde o passado, futuro e presente se encontram. Com o
pensamento podemos mudar a cor do céu, as formas das montanhas, e tudo
será conforme você pensar.
—Se eu imaginar um universo de gatos verá gatos por todas as partes?
Disse o pequeno Drakos
—Sim, verá, mas não desperdice seus pensamentos com tolices. Quero que
visualize doze blocos gigantes de pedras formando um imenso círculo, e
fique no centro do círculo.
Pensar em blocos de pedras não era bem o que o pequeno Drakos desejava.
Tratava-se dum momento único de realizar seus desejos pessoais.
Não dando muita importância as palavras do gato, imaginou um bosque
com matilhas de lobos lutando ferozmente com um grande urso lutando
por sua caça.
- O que você está fazendo? Desfaça esse cenário imediatamente antes que
eu lhe arranhe o seu lindo rostinho.
- Sempre tive vontade de ver uma cena dessas. Por favor, deixe só mais um
pouco, depois prometo estudar tais hieróglifos.
- Se minha mestra souber o que está fazendo neste lugar, serei seriamente
punido por sua teimosia.
- Você tem uma dona? Nunca me falou.
- Um dia irá conhecê-la, quando adulto. Agora desfaça isto.
- Só mais pouco gato. Aaai! O que está fazendo?
- Uma mordida, oras! Dói mais que um arranhão, não é?
Com esse tipo de aviso, Drakos mudou seu pensamento rapidamente, e
agora se encontrava numa verdejante planície, onde estruturas megalíticas
brotavam do solo, formando um círculo perfeito. Drakos via surgir blocos
de rochas ao seu redor. Ele girava olhando aqueles imensos monólitos, mas,
de repente, as pedras começaram a lhe contar histórias do Tempo.
Assuntado com as vozes, já não podia mais controlar seu pensamento, pois
naquele momento estava sobre o domínio do Tempo. Surgira sobre as
paredes de pedras imagens de um universo em construção, se misturando
com os hieróglifos, saltando das paredes para dentro de sua mente, lhe
dava um profundo conhecimento sobre diversos símbolos. Aos poucos os
monólitos paravam de gira. Drakos se encontrava numa pradaria, e bem ao
centro dos enormes blocos de pedras. O sol rapidamente percorreu um
arco em direção ao horizonte, que de repente surgiu do solo um velho
carvalho com enormes raízes. Algumas dessas raízes envolveram o corpo
de Drakos, criando uma espécie de casulo levando-o para debaixo da terra.
Lá havia uma câmera, onde ele se apoiou sobre uma plataforma. A luz era
um tanto difusa, mas os cristais incrustados nas paredes projetavam sobre
seus olhos símbolos e imagens, fazendo com que assimilasse todo o
conhecimento daqueles misteriosos hieróglifos.

Um barulho repentino de bater de portas, fez com que Drakos movesse


seu braço derrubando a taça, e o vinho derramaram sobre a mesa,
molhando seu rosto, e assim despertou de seus sonhos.
Olhou para a vela que já estava quase se apagando, e com a manga de sua
camisa secou parte do manuscrito manchado de vinho. Olhando o que antes
lhe parecia impossível de decifrar, agora aqueles símbolos lhes eram
familiar, e sem saber o porquê, pode compreender a tempo hábil toda a
complexidade dos hieróglifos.
Na mesma noite, logo após a luz da vela se consumir, Drakos enrolou
cuidadosamente os manuscritos, já tendo em mente de como navegar
através do espelho negro.
Sem poder perder tempo, pediu para Godofredo que encontrasse Cortez o
mais rápido possível: - Godofredo avise Cortez que venha para cá, que
iremos zarpar imediatamente.
—Não se preocupe meu senhor, irei agora mesmo!
—Mais uma coisa: Diga a Cortez que para onde iremos há muito ouro, e que
ele poderá ficar com o que puder carregar para seu covil.
Não demorou muito e lá estava Cortez com seus homens descendo a
escadaria para o subterrâneo, onde Drakos aguardava.
—Aqui estamos Drakos. Imagino que conseguiu solucionar tal problema,
caso contrário não teria nos chamado tão cedo assim, mas onde está o
Fininho?
—O rapaz fez um ótimo trabalho roubado os manuscritos. Pedi que
voltasse ao castelo, ele é mais útil lá dentro para nós.
—Drakos quem decide sobre meus homens sou eu. Quero-o aqui, ou pague
para mim seu preço em moedas de ouro, pelo tempo em que Fininho
estiver sob seu comando.
—Não temos tempo para ficar discutindo sobre isso agora. Suba com seus
homens no meu navio.
-Um momento Drakos! Pensei que navegaríamos em meu navio a procura
de Arthur e do ouro do Novo Mundo, mas dessa forma atravessando o
espelho negro para o desconhecido, não arriscaria meus homens. Afinal
somos piratas de mar e não dessa coisa estranha.
—Assim encurtaremos distâncias, e estaremos lá antes deles.
—Quero o dobro do que me propõe a pagar em moedas de ouro, para entra
neste tipo de embarcação.
—Está bem! Ouça não temos muito tempo, e para onde Arthur está indo,
existem riquezas inimagináveis.
—Esse lado escuro e misterioso deve abrigar monstros, além do que o
retorno é incerto. Não sei se devemos ir com você Drakos, mas se eu e meus
homens ficarmos presos em outra dimensão, de nada adiantáramos todas
as riquezas desse mundo.
—Se esse tipo de viagem fosse sem retorno, também não entraria. Agora é
tarde para questionar sobre o assunto. Subam a bordo e zarpamos
imediatamente.
Todos a bordo, Drakos se dirigiu até a proa, concentrou todos seus
pensamentos diante do espelho negro. Com uma concha de um nautilus,
fixou-a na proa, aonde os piratas colocavam suas sereias entalhadas para
dar proteção a embarcação. Do espelho por onde as águas atravessavam,
podia-se ver a imagem sombria de outro firmamento repleto de estrelas.
Num dado momento em que a concha apontava uma constelação que
brilhava mais do que as outras, um vento forte começou a penetrar na
abertura do nautilus. Foi-se avolumando se quadruplicando. Provocando
um som ensurdecedor, vibrando as paredes daquela imensa caverna.
Naquele momento Drakos se desconcentrou um pouco, temendo que as
paredes desabassem, mas estavam escoradas por enormes colunas capazes
de suportar terremotos. A vida adormecida nas estátuas de pedras estavam
asseguradas para serem eternadas, graças a uma tecnologia avançada. As
amarras foram soltas, e o navio foi lentamente sendo tragado para dentro
do espelho. Finalmente conseguiram, e logo mais estariam tentando
impedir Arthur de se apossar do enigma.

Finalmente Drakos conseguira o que tanto desejava. As frustrações foram


deixadas para trás. Quando se via impotente diante daquele espelho, que o
desafiava a navegar em seu interior, toda vez que descia no subterrâneo de
seu castelo.
A tripulação navegava dentro de um universo totalmente desconhecido,
pois não havia as águas do oceano, e a brisa não os tocavam, e nem sentiam
o gosto da maresia. Não havia as estrelas do Norte como guias, mas sim
uma densa neblina acima das velas, e abaixo do casco do navio, hora ou
outra, avistavam pontos luminosos atravessando a névoa. Estavam
navegando num universo apenas formado por vapor, luz e escuridão.
—Que lugar você foi nos meter? Sem as estrelas, como iremos nos guiar?
Disse Cortez, num tom de raiva e arrependimento por entrar naquela
embarcação.
—Esquece de que conheço os manuscritos, e estes dizem que devemos
seguir as vibrações capturadas pelo nautilus. Os cantos das sereias nos
guiarão para atravessar o mar de nuvens, até ficarem menos densas. Logo
as águas surgirão sob o casco, ai então poderemos ver as terras de
inúmeras riquezas, e onde Arthur estará.
—Como tantas riquezas, como diz, quem irá se importar com o rei?
—Cortez, saiba que eu me incomodo até com o ar que Arthur respira, e
quando voltar a regatar meu título de Barão, e recuperar meu exercito, o
expulsarei e a rainha da Bretunia, fazendo com que vivam na miséria e se
lamentem a cada dia pelo ato imperdoável de seu pai de caçar o título de
Barão de meu avô. Quando chegar esse dia, toda a riqueza que
conquistarmos, não valera nada diante de reparar o mal que causaram a
minha linhagem.

Agora o rei Arthur e o barão Drakos navegavam dentro do universo do


espelho negro rumo ao Novo Mundo. Ambos não tinham a menor ideia que
o Tempo dentro do espelho negro corria lentamente em relação ao reino da
Bretunia. Para a tripulação do Corvo e do Navio de Drakos, estavam
navegando por alguns instantes, porém se passaram onze anos que a
rainha Vitoria reinava sem a presença de Athur.

FIM

Você também pode gostar