Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
O Cavaleiro Das Sombras - Amanda Scott
O Cavaleiro Das Sombras - Amanda Scott
MACLEOD 5
Realização/Créditos:
Tradução/Pesquisas: GRH
Revisão Inicial:
Inicial: Ana Claúdia
Revisão Final: Caroline Alves
Formatação : Ana Paula G.
Um misterioso desconhecido
reaviva a chama da paixão que lady
Adela Macleod acreditava apagada
para sempre.
Raptada durante suas primeiras
bodas e viúva apenas uma hora
depois de seu segundo casamento,
lady Adela Macleod, a noiva mais
desafortunada que tenha existido
jamais, perde toda esperança de
encontrar o verdadeiro amor… até
que em uma noite sem lua, a voz
sedutora de um estranho oculto nas
sombras e seus ardentes beijos
despertam nela um sentimento que
nunca tinha conhecido.
O cavaleiro templário sir Robert
Logan abandonou sua casa para
proteger um segredo de vital
importância para sua família e jurou
proteger o tesouro dos templários.
Rob não está em situação de
cortejar a fascinante donzela que o
cativou. Mas, mais tarde, um
assassinato força as circunstâncias.
Quando seus inimigos tratam de se
apoderar do tesouro e o governo
escocês acusa Adela de matar a seu
marido, Rob deverá defendê-la.
Juntos enfrentarão os perigos mais
temíveis para proteger o futuro da
Escócia… e o seu próprio.
—Espero que tenha ganhado sabedoria durante os quatro anos em que permaneceu no
estrangeiro, rapaz — disse-lhe com severidade sir Ian Logan, segundo barão Lestalric.
Sir Ian estava em pé diante da enorme lareira na imponente sala do castelo de Lestalric,
seus pés bem separados e calçados com sapatilhas, seus robustos braços cruzados sobre o
peito. Um luxuoso casaco de veludo carmesim, meias de seda e joias de ouro evidenciavam
sua fortuna, assim como o cenho franzido revelava suas dúvidas.
De pé sobre um estrado próximo, seu herdeiro, William, era uma bela réplica de seu pai,
com a mesma postura orgulhosa e viril e o mesmo luxuoso aparato. Ele também olhava
com o cenho franzido a seu irmão mais novo:
—Esperamos que tenha adquirido ao menos a sabedoria suficiente para nos contar o
maldito segredo que esteve guardando desde que partiu Robbie.
—Já não me interessa sua possível sabedoria: vai nos contar, e o fará imediatamente —
rugiu o barão —É uma ordem.
O filho mais novo do barão, sir Robert, tinha dezoito anos, media um metro e oitenta e
estava em excelente forma, pois acabava de retornar após ganhar seu título de cavaleiro no
campo de batalha. Tinha chegado a Lestalric fazia duas horas, com a esperança de poder
casar-se por fim com o amor de sua vida e sabendo que necessitava a aprovação de seu pai
para fazê-lo. Mas não podia obedecer a ordem de sir Ian.
Os três homens tinham os cabelos escuros, olhos castanhos e se pareciam muito entre si,
embora Rob fosse o mais alto de todos; seus ombros eram mais largos e seus quadris mais
estreitos que os dos outros dois homens. Separava-os apenas um tapete de reduzidas
dimensões sobre o chão, mas quatro anos e dezenas de confrontos similares a este se
interpunham entre eles.
A toalha de linho branco cobria a mesa até o chão, de maneira que a atividade que se
desenvolvia detrás dela ficava oculta aos comensais. Mas a Adela não cabia a mais mínima
dúvida de que o estranho tinha percebido o desmaio de Ardelve. Se ele percebera, talvez
outros também tenham percebido. Agora, o estranho estava ficando de pé. «meu Deus,
que não se aproxime até aqui», rogou para si.
Um criado e um dos soldados de Hugo se ajoelharam ao lado de Ardelve. A figura
musculosa e magra do soldado, e sua barba escura e abundante, eram vagamente
familiares a Adela, mas ela não deu importância ao assunto. Manteve sua atenção
concentrada no homem que tinha sido seu marido durante tão pouco tempo. Jazendo no
centro de um caos que se mantinha sob um precário controle, Ardelve parecia estar em
paz.
Os serventes não deixaram de servir vinho, comida e oferecer seus serviços. No salão
inferior, os histriões faziam malabarismos enquanto os acrobatas continuavam com suas
piruetas e cambalhotas. As pessoas riam e aplaudiam. Isabella conversava com o príncipe
Henry como se Ardelve tivesse se desculpado e se retirado por alguns minutos.
O soldado de Hugo reparou em Adela nesse momento, e ela voltou a sentir a sensação
de algo familiar. Em seguida o soldado tocou o braço de Hugo e lhe sussurrou algo no
ouvido.
Hugo a olhou por cima do ombro antes de voltar-se para sua esposa.
—Sorcha — disse em voz bem audível apesar do estrépito circundante —acho que talvez
Adela e você…
O homem que acabava de conversar com Adela abriu a porta da escada, escutou os
ligeiros passos da moça e esperou até que entrou no quarto. Com guardas por toda parte,
se chegasse a seu quarto sem tropeçar com ninguém, ao menos só uns poucos saberiam
pela manhã que ela tinha estado perambulando pelo castelo.
Se já estavam preocupados com seu estado emocional, algo lógico tendo em conta as
circunstâncias, seu passeio noturno podia causar mais rebuliço de que podia imaginar. Mas
confiava em que ela se recuperaria mais rápido das provas às que se viu submetida se
conseguisse que as bem-intencionadas mulheres a deixassem um pouco em paz.
A beleza de lady Adela era conhecida em todos os rincões das Terras Altas. Mas quando
a viu com seu apertado vestido de bodas de veludo e seus cabelos cor de mel derramando-
se sobre suas costas, ficou mudo de admiração. Seus seios suaves cobertos de veludo
Adela despertou ao escutar uns passos abafados no quarto, seguidos do ruído familiar da
pá raspando o chão da lareira. Abriu as cortinas de sua cama e viu Kenna agachada junto a
uma pilha de brasas, tentando reavivar o fogo.
—Bom dia, milady. Espero que não se importe que tenha vindo tarde, mas como esteve
acordada até tão altas horas da noite, pensei que seria melhor deixá-la dormir um pouco
mais. De todos os modos, a condessa assegurou que você preferia se levantar cedo para
poder receber quem viesse render seus respeitos a lorde Ardelve.
—É verdade — bocejou Adela, afastando as mantas. Teria que cumprir com certas
obrigações, e ela tinha aprendido que as afirmações da condessa deviam ser interpretadas
como ordens mais que como sugestões.
Ao menos se sentia descansada e, por uma vez, não tinha tido nenhum dos terríveis
pesadelos que a tinham acossado desde seu sequestro. Obrigando-se a recordar uma vez
mais que estava a salvo, Adela recordou que o Castelo de Roslin era uma das fortalezas
mais bem guardadas do país. Erguido no topo de um promontório que caía sobre uma
profunda garganta por onde corria o rio North Esk, era inexpugnável mesmo para o inimigo
mais decidido.
O rio rodeava quase todo o promontório, que olhava ao sul, e deixava apenas uma
estreita e aterradora ponte de terra que o conectava a uma traiçoeira região boscosa ao
norte. Dali, alguns caminhos descendiam seguindo a margem oeste do rio, para o norte até
Edimburgo ou para o sul até Roslin Glen. Havia outro caminho que podia alcançar-se
vadeando o rio um pouco mais abaixo do castelo e que continuava ao longo desta margem.
Mais tranquila já, ao repassar as virtudes da fortaleza, a jovem se moveu com rapidez
pelo quarto gelado, lavou-se e depois aceitou a ajuda de Kenna para vestir uma singela
túnica e uma saia de um suave tecido verde.
49 GRH - Grupo de Romances Históricos
—Necessita uma boa touca hoje — sugeriu Kenna enquanto lhe escovava o cabelo.
Adela estava de acordo. Tanto Isabella como lady Clendenen esperavam que se
comportasse como uma viúva decorosa e, como tal, não podia mostrar-se em público com
apenas um curto véu cobrindo seus cabelos.
—Só trance-o, Kenna — pediu —Mas primeiro escove bem para trás. Usarei a touca
branca e o véu de seda que me deu de presente Isobel.
A maior parte da roupa que usava em Roslin provinha da generosa Isobel. Graças à
condessa, tinha o vestido de veludo dourado e uma túnica de seda debruada com fitas
brilhantes na barra, no profundo decote e na borda de cada manga.
Mais tarde, enquanto se dirigia ao salão para tomar o café da manhã, disse-se que talvez
lhe custaria manter-se fiel a sua decisão de comportar-se de maneira cortês. Hesitou ao
chegar à soleira e ver que Isabella, lady Clendenen, Isobel, Sorcha e Sidony estavam
sentadas à mesa conversando.
«OH, Por Deus, aqui vamos de novo», suspirou. O mais provável era que estivessem
falando dela. Ninguém pareceu perceber sua presença, entretanto, e Adela exalou um forte
suspiro para desafogar seu nervosismo. Ergueu-se e caminhou com passo firme para elas.
Exceto dois serventes, não havia nenhum homem presente, até que seu pai entrou no
salão pelo corredor sudeste que conduzia à entrada principal.
—Aguarde moça — a deteve com sua voz estrondosa —Quero te dizer umas palavras.
—Como quiser senhor — soprou ela. Virou-se para enfrenta-lo, e sentiu todos os olhares
sobre ela.
Macleod era um homem robusto, com uma voz potente e um humor imprevisível. Mas,
para sua surpresa, pôs uma mão sobre seu ombro e disse em tom alegre:
—Alegra-me vê-la de pé. Não deve se encerrar.
—Não tenho intenções de me encerrar, senhor — declarou a jovem em voz baixa, apesar
de que sua irritação cresceu ao precaver-se de que seu pai estivera conversando a respeito
dela com lady Clendenen —Conheço minhas obrigações — adicionou em voz bem alta.
—Sei, querida. É uma de suas características mais admiráveis. Confio em seu bom senso
e em que agirá como é devido.
Sob o impacto do que acabava de ouvir, Adela ficou imóvel recordando ao soldado
barbudo que tinha ajudado Hugo depois da queda de Ardelve. Einar Logan era capitão das
tropas de Hugo, que tinha colaborado em seu resgate logo depois de seu rapto. De fato, à
exceção de Hugo e de Sorcha, tinha arriscado sua vida por ela mais que ninguém. Waldron
o tinha derrubado com uma flecha, mas por sorte sua cota de malha o tinha protegido e
não tinha sofrido feridas graves, embora ela mesma tivesse sido ferida nesse dia. Quando
terminou de recuperar-se, Ardelve, Macleod e a condessa já tinham arrumado suas bodas.
Em meio aos preparativos e incapaz até de pensar nas coisas espantosas que lhe tinham
acontecido, esqueceu-se de Einar Logan. Percebia agora, muito a seu pesar, que nunca o
tinha agradecido.
Ansiava escutar algo mais, mas a porta de cima se fechou de uma portada, e já não pôde
ouvir suas vozes. Uma parte dela queria precipitar-se escada acima, abrir a porta de
repente e perguntar por que diabos Hugo estava pensando em trair a um de seus chefes e
de seus soldados mais fiéis. Acabar com Einar Logan, isso sim que era terrível!
Outra parte mais prudente de seu ser a convenceu de renunciar a essa ideia. Tampouco
seria conveniente que algum dos soldados de Hugo a encontrasse na escada logo debaixo
dessa porta fechada, farejando.
Já em seu quarto, correu o passador para assegurar tranquilidade e assim poder pensar.
Embora assim que terminou de fazê-lo, lhe ocorreu outra ideia. Uns minutos depois pos sua
capa lavanda e correu escada abaixo.
Podia encontrar-se com Sorcha e lhe contar o que tinha escutado. Sua irmã conhecia
Einar muito melhor que ela, porque como capitão da retaguarda de Hugo, tinha-os
acompanhado a todas as partes.
Antes de apagar a única vela, Rob ainda sentia a presença de lady Adela como uma suave
brisa cálida na capela. Escutou o débil rumor de seus movimentos enquanto se voltava para
ele.
—O que houve com seu sotaque francês? —perguntou-lhe, um pouco tensa. Ele hesitou
—Como vê… adivinhei quem é.
—Realmente?
—Sim, mas não deve ter medo. E embora eu não aprove os segredos ou os
comportamentos clandestinos, queria lhe pedir um conselho.
—Verdade? —ainda medindo a parede para avançar, adicionou —Perdoe-me, acredito
que não compreendo lady Adela.
—Acaso vai negar que fingiu ter um forte sotaque francês, sir?
Embora tentado a negar categoricamente, respondeu em troca:
—Admitirei que de vez em quando acho útil fingir esse sotaque, e outros também, em
todo caso.
—Sabia! —exclamou aliviada.
—O que sabia? —perguntou ele divertido.
—Sua identidade, é obvio. Não sou tola, sir. Delatou-se imediatamente, sabe?
—Fiz isso?
—Certamente. Se não tivesse me olhado na capela de uma forma tão chamativa, nunca
teria adivinhado. E depois, me cortejar como fez esta noite… Sua voz soava completamente
distinta, isso é tudo.
Rob apertou os punhos ante a ideia de que alguém a tivesse estado olhando e que
também se atreveu a lhe fazer a corte, mas fez um esforço para relaxar e deixar passar sua
irritação. Com suavidade, disse-lhe:
71 GRH - Grupo de Romances Históricos
—Hoje manifestou sua necessidade de um amigo, milady. E, além disso, expressou sua
preocupação por outro homem.
—Em efeito — admitiu ela, surpreendendo-o.
Ele tinha imaginado que a jovem iria fazer uma pergunta tímida para descobrir se estava
ciumento, mas depois de pensar, reprovou sua vaidade masculina.
Adela não tinha dado nenhum motivo para que ele esperasse essa reação de sua parte.
Na realidade, tinha revelado muito pouco de si mesma, além de manifestar sua confiança e
lhe fazer uma ou duas confidências. Esteve tentado a lhe advertir que essa inocente
confiança podia resultar perigosa, mas não quis assustá-la. Em troca, perguntou-lhe:
—O que aconteceu para que se preocupe tanto por ele?
—Eu… eu escutei duas pessoas conversando. Diziam que tinha chegado o momento de
acabar com ele. Ele me fez um favor muito especial, e não desejo que lhe aconteça nada de
ruim. Mas não sei como posso ajudá-lo. Você nem sequer o conhece, não é?
—Sei quem é. —Rob estava afundando cada vez mais no poço de seu engano. Mas tinha
que averiguar o que ela pensava fazer com respeito a Einar Logan —Quem são os homens a
quem ouviu falar?
—Não sei. Só escutei vozes no vão da escada.
Imediatamente notou que mentia pelo tom de sua voz e poderia ter percebido inclusive
se não soubesse a verdade. De todos os modos, aprovava que a jovem fosse capaz de
guardar segredos. Adela não tinha reconhecido a voz de Rob, mas sem dúvida tinha
reconhecido a de Hugo.
O cavaleiro seguiu o jogo e perguntou:
—Que mais disseram esses desconhecidos?
—Um deles disse que alguém tinha morrido. Não, que duas pessoas tinham morrido. Isso
é… — vacilava. Por fim, com um forte suspiro, concluiu —A verdade é senhor, que não
estou de todo segura. Ele disse que alguém tinha morrido, sir Ian. Isso acredito… Mas o
único nome conhecido que escutei foi o de Einar Logan.
—Que mais disseram a respeito dele?
—Isso foi tudo. Ouvi um golpe forte, como de uma porta fechando-se, e nada mais.
Rob ficou de pé junto à porta entreaberta da capela, observando como Adela cruzava o
pátio até encontrar-se com a paciente Kenna. Amaldiçoou-se por ter cedido a seus impulsos
mais baixos, complicando a situação.
Recordou de repente as palavras de seu avô:
—É capaz de manter a boca fechada como corresponde, rapaz — o elogiara sir Walter ao
revelar o primeiro segredo. Orgulhoso pela importância que lhe adjudicavam, um Rob de
treze anos aguardava sem fôlego as ordens de seu avô. —É forte e veloz, como fui eu e foi
meu pai antes que eu. Seu pai nunca foi muito hábil com a espada, mas você já está
Como não gostava de adiar as tarefas desagradáveis, Rob partiu em busca de Hugo.
Quando o informaram que estava no quarto da condessa, mandou Ivor com uma
mensagem: «Desejo te falar de um assunto privado».
O criado logo retornou com Hugo, que elevou as sobrancelhas ao ver Rob.
—O que acontece?
—Prefiro discutir a sós. —Compreendendo a alusão, Ivor se retirou com uma solene
reverencia. Em seguida Rob se voltou para Hugo e lhe disse sem mais preâmbulos —
Acredito que chegou o momento.
Hugo o olhou divertido.
—Estou de acordo, embora antes não pensasse o mesmo. Não te ocorreu que depois de
tantos anos a ignorar sua família e à maioria de suas relações, pode ser difícil provar quem
é?
—Não, por que teria que ser? Não mudei tanto que não possa voltar a por as coisas em
seu lugar. Necessito a roupa adequada, é obvio, e um bom cavalo ou dois. Mas se você,
Michael, Henry e a condessa me reconhecem…
—Milady e eu teremos partido para as Ilhas antes. Mas tem razão. A palavra de Henry é
suficiente. Não vai primeiro a sua casa?
—Para que? Encontrar-me-ei com algumas dificuldades ali. Para começar, nem sequer sei
quem está a cargo do lugar. Meu pai só tinha um irmão, que morreu faz tempo, e como a
propriedade inclui a maior parte das terras entre Holyrood Abbey e Leith Harbor, apostaria
a que uma boa quantidade de pessoas que pensam que estou morto provavelmente
também está tentando proclamar-se terceiro barão Lestalric. Quero ver quem aparece.
Hugo se apoiou na pesada mesa que usava para revisar sua contabilidade.
—Tem ideia de quem poderia aparecer?
81 GRH - Grupo de Romances Históricos
—Douglas, talvez, em defesa dos direitos de lady Ellen, mas duvido de que ele me
desafiasse ou tentasse ocupar as terras de Lestalric. Depois da morte de Will, o mais
provável é que tenha mandado buscar Ellen e a tenha escoltado até Hermitage ou
Tantallon.
—E quem mais?
—Céus, Hugo, Ealga Clendenen é minha parente, em certo grau. De modo que qualquer
um parente dela pode reclamar Lestalric.
—Pensava em algo mais concreto—assinalou Hugo —Os Stuart, por exemplo. As pessoas
os consideram arrivistas porque não têm terras próprias além de Carrick em Galloway.
—Exceto o castelo de Stirling e de Edimburgo —lhe recordou Rob secamente.
—Essas são posses reais que adquiriram com a coroa —esclareceu Hugo —Pertencem-
lhes porque recentemente se estabeleceu que o filho mais velho do rei herde a coroa em
lugar de que a nobreza escocesa escolha a seu monarca. Sua Alteza tem mais vergônteas
que terras, e vários de seus filhos estão decididos a aumentar suas propriedades. O conde
de Fife é um deles, e Lestalric está a menos de duas milhas de Edimburgo. Isso o converte
em uma sede importante para qualquer príncipe com ambições de acrescentar seu poder.
Fife não oculta a ninguém seu desejo de converter-se em rei da Escócia.
—Os Stuart não têm nenhum direito legítimo a aspirar Lestalric.
—Só estou dizendo que talvez deva enfrentar a interesses muito poderosos.
Rob suspirou.
—Meu avô esperava que Will e Ellen tivessem um montão de filhos. Desgostar-lhe-ia
muito inteirar-se de que não nasceu nem uma filha. Por certo, ele nunca esperou que eu
herdasse. Tampouco eu. Deve haver-se enfurecido comigo quando sai de casa —adicionou,
pensando com carinho em sir Walter.
—Não pode culpa-lo por isso.
—Certamente —concordou Rob —Mas eu era muito jovem e iracundo, e me senti traído.
Talvez se tivesse me dado melhor com meu pai ou com Will, as coisas teriam resultado
diferentes, mas não respeitava muito a nenhum dos dois. Mantive meu sobrenome porque
Adela despertou mais tarde que de costume, tomou o café da manhã na intimidade de
seu dormitório e perguntou a jovem criada se seus irmãos já tinham falado com Einar
Logan.
—Tam acredita que quero paquerar com esse homem —se queixou a moça, ruborizando-
se —Mas eu não estou apaixonada por ele, milady. Além disso, ele não tem interesse em
mim.
Então Adela voltou para o estábulo. Mas o rapaz disse que Einar partira.
—Partiu ao amanhecer com uma mensagem de sir Hugo para Douglas — comentou —
Mas me pediu que lhe dissesse que não têm nada que lhe agradecer. Que é feliz de ter
podido ajudá-la.
—Sei — murmurou Adela, desiludida e mais preocupada com ele que nunca.
Agradeceu ao rapaz e foi em busca de Sorcha, mas sua irmã ainda não tinha retornado a
Roslin.
—Mas… sir Hugo está aqui, milady — adicionou o criado —Ele deve estar com… OH,
não… já vem.
Hugo saía do quarto da condessa. Adela reuniu coragem para enfrenta-lo e se dirigiu a
seu encontro com passo firme.
—Por favor, senhor, desejaria falar contigo.
—Qual é o problema? —perguntou-lhe.
A jovem olhou preocupada a vários serventes que cumpriam suas tarefas.
—Venha, nos aproximemos do fogo. Ali poderemos falar a sós.
Suas irmãs lhe emprestaram tanta roupa que parecia que Adela permaneceria uma
década na Corte. Mesmo assim, passou quase uma quinzena antes que lady Clendenen se
considerasse pronta para partir.
Sorcha e Hugo foram a Glasgow uns dias antes, e tinham levado Macleod com eles, para
fiscalizar os preparativos da volta do senhor das Ilhas. Donald se encontraria com eles em
Dumbarton durante o fim de semana, depois de despedir-se formalmente do rei e da Corte.
Adela quase não pôde dissimular sua consternação quando a condessa insistiu em
acompanhá-la até Edimburgo.
—Quero me despedir de Donald. Mas ficarei na casa de Sinclair, é obvio, com Henry. Ele
adora receber visitas.
Sir Michael tinha ordenado que um grande contingente de soldados os escoltasse. Lady
Clendenen levava inumeráveis baús e bolsas, todos seus serventes, montanhas de bagagem
e alguns de seus móveis favoritos. Parecia um cortejo real, pensou Adela contrariada.
A viagem de Roslin não foi muito longa. Quando chegaram ao último topo, uma ampla
planície se estendeu ante eles, com serras a nordeste cujo escarpado relevo se assemelhava
a um leão adormecido.
—Essa é a Poltrona de Artur — assinalou lady Clendenen —E a oeste, pode divisar Castle
Hill. A cidade real de Edimburgo se encontra entre ambas as colinas.
Começou a identificar as demais montanhas, as águas azuis do Firth of Forth, e, mais à
frente, a distante costa de Fife. Mas o olhar de Adela se deteve no castelo de Edimburgo,
que resplandecia imponente à luz do entardecer. Estava localizado no topo de uma
elevação escarpada e seus muros continuavam nos penhascos da montanha.
Parecia impossível de conquistar, mas ela sabia que os ingleses o tinham tomado em
várias ocasiões. De fato, tinham dominado a região durante quase dezoito anos e levaram
94 GRH - Grupo de Romances Históricos
com eles os arquivos reais, o tesouro e a pedra de Scone. E agora ameaçavam voltar a
invadi-la.
Enquanto se aproximava a comitiva, a cidade real se erigia majestosa. Suas ruas largas
impressionaram lady Ardelve. Segundo a condessa, todas as casas tinham jardins.
—Agora temos quatrocentas casas — se gabou lady Clendenen.
—Meu Deus! —exclamou Adela —Quantas pessoas há?
—OH, quase dois mil, acredito, contando os habitantes do castelo e os da abadia. Essas
agulhas ali adiante são as da catedral de St. Giles, que está na metade do caminho entre o
castelo e a abadia. Essa torre alta e solitária, a leste, pertence à abadia.
—Holyrood Abbey?
—Com efeito. Dentro da cidade todas as ruas são chamadas Gates, ao velho estilo
escandinavo. Entraremos pela Cowgate. Minha casa é perto da dos Sinclair na Cannongate,
a oeste da abadia.
Aspirando profundamente, Adela exclamou:
—Que bom é voltar a cheirar o aroma do mar!
—Ah, claro que sim — suspirou Isabella, sorrindo —O porto de Edimburgo está perto,
em Leith, um pouco ao nordeste.
—OH, Leith me faz pensar no pobre barão de Lestalric e em seu herdeiro, assassinados
de uma maneira tão trágica — suspirou lady Clendenen, de maneira dramática —Foi algo
espantoso. Pergunto-me quem reclamará agora suas vastas posses.
—Não me assombraria encontrar a um príncipe de sangue real entre eles — opinou
Isabella, depreciativa —Ultimamente Sua Excelência se deixa persuadir com facilidade,
inclusive com argumentos muito débeis, de que pode reclamar terras para os Stuart ou
para a coroa. Mas necessita o apoio do Parlamento escocês. Embora seus filhos mais
ambiciosos estejam tentando dominar não só ao rei, mas também ao Parlamento.
—Refere à Fife, não é? —disse lady Clendenen. E dirigindo-se a Adela, adicionou —
Ninguém o quer sabe? É capaz de fazer qualquer coisa para subir ao trono. Mas, sem
dúvida, Isabella, deve haver aspirantes com mais direitos a Lestalric que qualquer desses
Stuart arrivistas.
A chegada da condessa à casa dos Sinclair provocou uma grande comoção. As donzelas e
os criados se apressaram a dar as boas vindas e logo se dispuseram a carregar tudo o que
havia trazido consigo.
Henry a esperava com Rob no extremo norte do salão principal, que ocupava a maior
parte do segundo piso. Quando a ouviram subir para o primeiro piso, Henry se adiantou
para saudá-la. Esperando na soleira, vestido com mais elegância que nunca, Rob observava
com cautela o encontro,
Lady Clendenen tinha um carro fechado, puxado por dois cavalos, que ela chamava «sua
carruagem». Como tinha vivido toda sua vida nas Terras Altas, sem estradas, Adela nunca
tinha visto um antes, mas lhe pareceu um veículo prático.
—O castelo fica muito longe para ir caminhando, e, além disso, o caminho é muito
íngreme — explicou a dama —E chegaria ensopada se decidisse ir a cavalo, aqui chove a
maior parte dos dias.
Rob não sabia se amaldiçoava lady Clendenen, que se dirigia para eles com um sorriso
resplandecente, ou lhe dava um beijo. Odiou-se por ter acreditado estupidamente que a
moça não reconheceria sua voz imediatamente.
Tinha pretendido apresentar-se a ela à vista de uma multidão fascinada por sua aparição,
de maneira que todos acreditassem que era a primeira vez que se viam. «E foi uma bela
apresentação», disse a si mesmo.
Tinha preparado sua indumentária com a generosa ajuda de Henry e de seu alfaiate. Mas
talvez por causa dessa confiança, não tinha considerado a inteligência de lady Adela. De
fato, subestimou sua capacidade para reconhecer uma voz que só tinha escutado na
escuridão, mesmo no meio do tumulto da Corte.
Mas ter feito o comentário sobre seu pai e sobre Will sem ter em conta o preço que teria
que pagar: esse tinha sido seu pior engano. Confiava em que ao seu devido tempo poderia
explicar-lhe tudo, mas preferia poder escolher o momento. Só um imbecil acreditaria que
poderia seguir enganando-a durante tanto tempo.
Ela voltou a surpreendê-lo quando lady Clendenen e De Gredin os alcançaram, e os
saudou com alegria, como se não tivesse estado cinco minutos antes a ponto de arrancar-
lhe os olhos.
—Espero não interromper, queridos, e que não se ofenda milord, se o trato como a
alguém da família — se adiantou lady Clendenen. E sem esperar resposta, continuou —
Isabella está falando com Donald das Ilhas agora. Logo estará pronta para partir. Talvez
deseje conhecê-la primeiro, milord? Para refrescar a lembrança que tem de você.
—Agradeço sua amabilidade, milady — disse Rob, com esse tom curiosamente agudo
outra vez, embora agora o suavizasse um pouco e tentasse não olhar para Adela. Enquanto
não reparasse em seus magníficos olhos, ele poderia manter a compostura. Perguntou-se,
108 GRH - Grupo de Romances Históricos
de todos os modos, se lady Clendenen ou o irritável De Gredin teriam notado o rubor nas
bochechas da jovem.
Deu uma olhada ao sujeito, o maldito não lhe tirava os olhos de cima.
—Por Deus! Que descortesia a minha! —exclamou lady Clendenen —Deveria ter
apresentado meu primo, o Chevalier de Gredin. Por favor, me perdoe.
Rob lhe fez uma leve inclinação de cabeça e decidiu falar com o canalha com um tom de
superioridade.
Assim que De Gredin murmurou algumas palavras corteses, a dama prosseguiu:
—Estou segura de que Étienne deve ser seu primo por algum lado, sir, como ambos são
meus parentes… A verdade é que todos os escoceses são parentes entre si — seus olhos
cintilavam excitada por poder expor uma vez mais sua teoria sobre os parentescos
escoceses —Também, e têm direito de saber: o sequestrador de nossa pobre lady Ardelve
era outro primo meu. OH, pensem quão repugnante é ter que admitir ser parente do
arrivista…
—Cuidado, milady — Rob a interrompeu com rapidez, enquanto olhava de esguelha à
plataforma real. Ele sorriu, como se estivessem compartilhando uma brincadeira, mas disse
com toda seriedade —Não diga aqui nada que não queira que se repita em todas as casas
da cidade.
—Temo que tenha razão, prima — concordou De Gredin, sorrindo.
Arrependida, lady Clendenen se voltou para Adela:
—Eles têm razão, querida. Não deveria dizer uma palavra, mas às vezes não seguro a
língua. Não devemos criticar a ninguém que tenha o poder de nos enviar ao cadafalso. E
menos neste salão, que inclui a metade dos homens desse tipo e mais mulheres do que
alguém poderia supor.
—Por favor, senhora — murmurou Adela —Me assusta.
—A Corte Real pode converter-se em um lugar perigoso para alguém que carece de
experiência com os homens poderosos, milady — explicou De Gredin —De todos os modos,
tenho muita experiência com esse tipo de pessoas e estou ao seu serviço. Não vacile em me
pedir qualquer coisa.
Donald das Ilhas se despediu de seu avô, o rei, um pouco mais tarde, em meio de solenes
fanfarras.
Como Donald geralmente não usava chapéu quando ia a Corte, um ardil que tinha
aprendido de seu pai para evitar ter que tira-lo na presença do rei, ambos os homens
pareciam compartilhar igual poder. O mais velho era o rei da Escócia; o mais jovem, o
senhor das Ilhas.
De todos os modos, ao rei não parecia importar muito a diferença.
Rob viu a faísca da ira, mas não pôde pensar em nada que dizer para evitar que se
produzisse o incêndio. Suas palavras talvez soassem falsas.
A culpa pelo assassinato de seu pai e de seu irmão podia recair sobre ele. Seria possível
que aquela briga com Will anos atrás se convertesse com o tempo em algo muito mais
importante? Ou estava exagerando?
O grupo cavalgou pelo bosque até as portas do castelo. O administrador do castelo saiu
para receber seu senhor.
—Espero que não tenha esquecido Tam Geddes, rapaz —o saudou o homem de uma
maneira afável, enquanto olhava Henry e à meia dúzia de soldados que cavalgavam atrás
deles —Um de meus moços escutou no povoado que estava de volta. Estou tão contente
de vê-lo. Imagino que haverá muitas mudanças, não é verdade?
Adela tinha estado se enganando ao considerar-se uma pessoa pouco curiosa. Ela tinha
sentido curiosidade em relação a Lestalric e tudo o que o rodeava desde o primeiro
momento. Agora, enquanto vigiava de uma das janelas do corredor com seus ouvidos
alerta, morria por saber o que tinham encontrado.
Isabella tinha razão: a vista de Firth of Forth era magnífica. Mas sua mente não estava
concentrada no panorama. Como tinha administrado uma casa com irmãs muito pouco
ordenadas e um pai que deixava seus pertences esparramados em qualquer parte,
imediatamente notou, mesmo antes de ver os aposentos, que alguém tinha estado
revistando o grande salão.
Mas Lestalric não fez nenhuma pergunta. Ao escutar que chegavam os dois homens,
voltou-se.
—Acredito que vou fazer algumas pergunta mais, sir Robert —anunciou a jovem.
—Como quiser, milady. Eu também tenho que te fazer algumas — replicou em um tom
severo.
Ao encontrar-se com Geddes no salão, Rob lhe disse com afabilidade:
—Os quartos estão muito desordenados. Quem esteve revolvendo no quarto de sir Ian?
O homem se ruborizou.
—Ah, desculpe milord. Não foi nenhum de nós! Vieram algumas noites atrás com um
estandarte real. Disseram que tinham morrido os herdeiros e que a propriedade tinha que
voltar para o rei…, não pude lhes negar a entrada.
—Confio em que tenha a coragem de fazê-lo se voltarem.
—Sim, senhor, com certeza.
—Bem. Quero que o lugar esteja limpo e ordenado antes que eu retorne. Pode utilizar
todos os homens que necessitar e também mais soldados para custodiar o castelo. Se não
puder cuidar disto com rapidez, terei que procurar um novo administrador.
—Diabos! —exclamou Rob, enquanto retornavam —Do que se trata tudo isto, Henry?
Não tinha pensado no dinheiro, mas me diga como vou fazer para pagar a todos esses
homens antes de saber qual é minha renda por Lestalric e…
—Eu emprestarei o dinheiro — o interrompeu Henry, sem pedir desculpas —E antes de
ir ao norte, deixarei estabelecido que pode dispor de meus recursos com liberdade. Não
fique nervoso, Rob. Foi prudente no castelo ao não deixar transparecer suas suspeitas. Mas
se não se deu conta pelo estado das terras de que suas rendas devem ser enormes, não é
meu problema que esteja tão cego.
Rob franziu o cenho.
—Sabe que estou preparado para administrar minhas finanças. Todos nós fomos
preparados para fazê-lo, um homem não pode lançar-se ao combate sem estar seguro de
que tem os recursos necessários para pagar seus homens. Mas não sei muito de rendas.
Posso ver que estas terras estão em melhor estado que o castelo, mas suponho que Tam
entregou a renda a meu pai ou a Will e eles a gastaram em luxos.
—Pode ser — reconheceu Henry —Mas foi um parvo ao não examinar as contas.
Recordo-te que alguém já se intrometeu em seus assuntos. E isso significa que seu pai e seu
Adela ouviu um grito e quase desmaiou quando ao voltar-se viu Lestalric ferido caindo
de seu cavalo. Só um rápido movimento de Henry evitou que desabasse entre os cavalos.
—Vocês duas com a condessa! —gritou Henry.
De algum modo obteve com uma só mão segurar a manga do casaco de Lestalric.
Enquanto Henry lutava para controlar aos dois nervosos cavalos e tentava ajudar Lestalric,
o tecido começou a rasgar por onde o tinha atravessado a flecha. Adela viu tudo isto em um
instante, e esporeou a sua montaria para poder chegar antes possível ao corcel a ponto de
desembestar. Sustentou-o com firmeza, rogando que o animal não se espantasse, falou
com ele para tranquiliza-lo, até que Lestalric de repente deu um puxão para afastar-se de
Henry.
—Não lute contra ele, tolo! —gritou ela quando seu cavalo tentou encabritar-se outra
vez. E adicionou com rapidez, mas desta vez com tom tranquilizador —Posso ver a ponta da
flecha, milord. Não se mova, ou aprofundará a ferida. Bom rapaz! —murmurou ao cavalo,
que se serenava.
—A dama tem razão — demarcou Henry —Terei mais cuidado, mas deve descer do
cavalo já para que examinemos essa ferida.
—Primeiro ponha às mulheres a salvo — grunhiu Lestalric, enquanto Henry o ajudava a
sentar-se outra vez direito sobre sua montaria. Parecia zangado, Adela não sabia se com o
arqueiro ou consigo mesmo por deixar transparecer sua dor.
—Não iremos a nenhuma parte — respondeu ela —Dois dos soldados de Henry estão
protegendo à condessa e lady Clendenen, e já estão fora da linha de fogo. Sem dúvida,
estamos mais seguras aqui com os soldados de Henry que se tentássemos nos afastar sem
eles.
134 GRH - Grupo de Romances Históricos
—Tem razão uma vez mais, Rob — disse Henry dando uma olhada em torno —Tem o
cérebro embotado, rapaz. Assim me escute, a menos que queira receber um bom murro.
—Por favor não, Henry. Esta maldita coisa me arde como um fogo.
—Certo — respondeu Henry, fazendo um sinal a um de seus homens para que
desmontasse e viesse a ajudá-lo.
—Está sangrando muito, sir — assinalou Adela —Devemos tirar essa flecha e enfaixar a
ferida o antes possível.
—Sim, mas estou pensando em enviar a um par de meus homens…
—Escute! —gritou Adela —Se aproximam cavaleiros!
Trocando um olhar com Lestalric, Henry fez um sinal a outros dois homens. Um penetrou
no bosque, o outro se dirigiu ao encontro dos recém chegados.
Um instante depois se ouviu um grito:
—São mais ou menos uma vintena, milord, e levam o estandarte real e o do conde de
Fife.
—Graças a Deus! Agora estaremos a salvo — suspirou Adela.
—Estou sangrando muito, Henry? Não posso ver minha ferida — perguntou Rob.
—Sangra o bastante para arruinar seu precioso casaco — resmungou Henry —Mas ao
menos o veludo escuro impedirá que alguém note de longe que está ferido.
—Por favor, sir, desça do cavalo — rogou Adela —Devemos tratar a ferida.
—Talvez seja mais importante escondê-la —opinou Rob —Usa uma anágua de cambraia,
moça?
Ela franziu o cenho, mas entendeu em seguida o sentido de sua pergunta e começou a
rasgar tiras da cambraia de sua anágua.
—Use o tecido como atadura. Henry, meu casaco é escuro, mas as ataduras vão ser
vistas. Terá que me emprestar essa esplêndida capa que está usando.
—Maldição, vagabundo, vai sujar tudo! —queixou-se Henry, tirando a capa.
—Não se preocupe por isso —tirou o cilindro de sua manga esquerda —Tome isto, moça,
e guarda-o dentro de seu sutiã.
Rob apertava os dentes enquanto via a moça cavalgando adiante com o maldito francês.
Cada passada do cavalo representava uma tortura, e não era o intenso golpe que havia
sentido quando Henry tinha tirado a flecha, nem tampouco a dor da ferida aberta. Todo o
ombro e a parte superior de seu braço esquerdo doíam, quase não podia segurar as rédeas.
Por sorte, seu cavalo necessitava pouca guia, inclusive quando Henry lhe indicou que se
atrasasse um pouco.
—Maldito seja De Gredin! Não confio em um homem que anda com Fife, Rob, e
tampouco deveria confiar você. Só lhe interessa aumentar seu poder. A única razão pela
qual seu irmão Carrick segue vivo é que todos responsabilizariam Fife se algo lhe
acontecesse.
—Entretanto, deve haver umas quantas pessoas que estão de acordo com Fife em que
Carrick não é o homem ideal para converter-se no próximo rei da Escócia —opinou Rob.
A pressão por cumprir obrigações começava a asfixiar a jovem viúva. Não só se sentia
obrigada a deixar que De Gredin cavalgasse ao seu lado durante a viagem de volta lhe
dizendo todo tipo de frivolidades, mas também recordou o convite de lady Clendenen para
jantar com eles. «Maldição — se queixou Adela para si —Esperava que ele o tivesse
esquecido».
—Espero ansioso outro jantar maravilhoso — exclamou o Chevalier, enquanto se
aproximavam da mansão —Em minha opinião, esse cozinheiro é um dos melhores de
Edimburgo.
—Acreditei que você gostava mais da comida do castelo — comentou Adela, sorrindo,
mas desejando que o diabo o levasse.
Lady Clendenen estava radiante, mas o jantar foi terrivelmente aborrecido. De Gredin
falou apenas dos Sinclair e dos Lestalric e a anfitriã comentava trivialidades controlando-se
todo o tempo para não dar informações demais, conforme tinha recomendado Isabella.
Quando terminou o jantar, via-se tão esgotada mentalmente como a própria Adela.
Quando lady Clendenen se levantou por fim de seu assento, deu por terminada a noite
dizendo:
—Foi um prazer, Étienne, mas agora deve nos deixar, pois devemos ter o melhor aspecto
possível esta noite na Corte. Necessito um banho. —Quando o Chevalier se foi, Ealga
confiou a Adela em tom cúmplice —Esta obrigação de ser discreta representa um esforço
muito grande para mim. E é muito injusto, também, da parte de Isabella, ter insistido em
que não contasse a meu queridíssimo Étienne o que aconteceu realmente. Ele não diria a
ninguém se pedíssemos que mantivesse em segredo.
—Está segura disso, senhora? Você mesma recomendou que deveríamos ser cautelosos
com Fife, não foi? O Chevalier parecia estar em muito bons termos com ele.
—Por Deus! Não pode ser de outro modo! Fife não é alguém com quem alguém possa
desgostar, querida —se desconcertou e não disse nada mais em defesa de De Gredin.
Suas palavras não tranquilizaram Adela, sobre tudo porque a anfitriã estava mais
preocupada com seu bom aspecto que pelos acontecimentos violentos do dia. Em todo
Quando a carruagem de lady Clendenen chegou à casa dos Sinclair duas horas mais
tarde, descobriram que Henry e Lestalric também viajariam ao castelo em um veículo.
Henry tinha uma elegante carruagem de duas rodas puxada por um só cavalo, com um
assento adiante para o condutor. Henry disse que estava exibindo-a para benefício de
Lestalric.
—Acabo de adquiri-la — confessou orgulhoso, enquanto ajudava à condessa a subir na
carruagem —Mas não podem viajar mais de duas pessoas, assim mamãe terá que ir com
vocês.
—Como vai? —perguntou lady Clendenen a Isabella, assinalando Lestalric com a cabeça.
—Está bem. Foi uma lesão séria, mas não atingiu os ossos do ombro nem do braço. Sem
dúvida é uma ferida dolorosa, mas não vai deixá-lo inválido.
—Maravilhoso —exclamou aliviada —Então só precisa descansar para repor-se.
Mas assim que o lorde chambelán anunciou o nome de Lestalric, uma formosa mulher de
cabelos escuros saiu da multidão e se dirigiu rápida para ele. Ele se deteve para observá-la
e não teve tempo de fazer nenhum movimento para proteger-se quando a dama abriu os
braços e o estreitou com todas suas forças.
Rob ficou sem fôlego, uma onda de dor ameaçava domina-lo, mas se recuperou em
seguida. Pôs sua mão direita sobre o ombro da jovem e a afastou para contemplar melhor
seu rosto. Mesmo depois de uma década, reconheceu-a imediatamente.
—Lady Ellen — disse, entrecerrando os olhos como se lhe resultasse incrível.
—Sim, Robbie, eu mesma — respondeu contente.
—O que está fazendo aqui?
—Vim com meus pais — explicou, fazendo um gesto impreciso em direção à mesa
principal.
Adela ficou petrificada, incapaz de acreditar no que estava escutando. Quis esbofetear
essa mulher por difamá-la com tanta desfaçatez. Em troca, tomando fôlego para controlar
suas emoções, respondeu:
—Que prazer conhecê-la. Peço que aceite minhas condolências por sua grande perda.
—Imagino que as pessoas não acreditarão nesses falsos rumores, Ellen —replicou
Isabella com severidade.
—OH, armou-se um grande rebuliço —respondeu entusiasmada —Dizem que aquele
homem horrível não só a raptou no dia de suas bodas mas também, também… —se
ruborizou —lhe roubou sua virgindade. Dizem, além disso, que quando Ardelve descobriu o
rapto, ameaçou devolve-la a seu pai pela desonra. Então, para evitar o escândalo ela
envenenou o pobre homem durante o banquete de bodas.
Parecia uma maldita lenda de histriões. Quem diabos era essa mulher? Adela não cabia
em si de indignação.
—Em Roslin? —perguntou Isabella consternada.
Adela se sentiu enjoada e começou a cambalear, mas uma mão firme lhe devolveu a
estabilidade.
—Quem demônios está difundindo esses rumores infames? —perguntou Lestalric.
—OH, ignoro-o, querido — respondeu Ellen —Não são mais que falatórios que se ouvem
por ai — se abanou com a mão.
Recuperando-se enquanto a firme mão abandonava seu cotovelo, Adela respondeu com
cuidada dignidade:
—Muito obrigada por ter me advertido, madame.
Ele sorriu.
—Como é que sabe tanto dessas coisas?
—Meu pai comenta sempre o que escuta dos frades mendicantes — respondeu ela —E
antes que minha tia Euphemia fosse viver com minha irmã Cristina, frequentemente nos
explicava o parentesco entre as famílias nobres. Mas não respondeu a minha pergunta.
—Pensei que era melhor baixa-lo de seu pedestal provocando sua irritação. Madame —
adicionou, voltando-se para Isabella —Levarei lady Adela para conversar um pouco com
Sua Alteza. Logo se iniciará o baile e talvez o ruído do folguedo lhe cause outra dor de
cabeça. Se virem Henry, lhe façam saber que quero vê-lo. Decidi tirar a viúva daqui antes
que Fife tente nos deter.
—Acha que se atreveria a prendê-la aqui? —perguntou-lhe Isabella —Os Sinclair
também têm um poder considerável, apesar de tudo.
—De acordo, mas mais em Midlothian que em Edimburgo. Esta cidade se converteu em
seu território. Se devemos lutar, será melhor que o façamos em nossas próprias terras.
—O que lhe parece o castelo de Lestalric? —perguntou-lhe Adela —Não o defenderiam?
O conde de Fife caminhava furioso de um lado a outro. O homem que lhe trouxe notícias
de lady Adela e se encontrou com ele no austero aposento que usava para ocupar-se de
seus assuntos no castelo ousou questionar seus métodos. Logo depois de fazê-lo calar com
uma ordem colérica, Fife bramiu:
—Vos disse que não viesse a menos que chamasse por você, Chevalier. Não é bom para
nenhum dos dois que nos vejam juntos.
—Sem dúvida têm razão, milord — disse De Gredin, olhando-o com cautela —Mas não
entendo as decisões que está tomando.
—Não têm por que entender meu modo de agir, sir — replicou com frieza.
—Não me opus a que ordenasse que atirassem em Lestalric — recordou Étienne —
Realmente, não me importaria se o matassem. Mas o que espera ganhar acusando lady
Adela de ter envenenado Ardelve? Pensava que estávamos de acordo em que o melhor
caminho era que eu ganhasse sua confiança. E o farei, asseguro-lhes isso, porque inclusive
Ealga parece favorecer minhas tentativas.
—Sua prima Ealga é uma parenta tão longínqua que não pode esperar influir nela mais
que a condessa Isabella, e não percebi indícios de que Isabella a favoreça. Meus métodos
para obter informação são muito mais eficientes.
—Mas ambos sabemos perfeitamente que a jovem não matou Ardelve.
Não entendia por que diabos tinha contado sua conversa com Ardelve no dia de suas
bodas. Talvez porque era fácil lhe contar tudo. Mas tinha parecido correto dizer-lhe
inclusive para fazê-lo ter um pouco de ciúme.
Claro que não imaginava que sua resposta despertaria sentimentos tão profundos nela.
Recordou o beijo apaixonado da capela de Roslin. A jovem noiva estremeceu.
Permaneceu em silêncio então, pensando no que estava por enfrentar… De repente,
recordou o misterioso mapa e todas suas preocupações virginais se desvaneceram.
Repassou em sua mente o momento em que Rob tinha entregado o cilindro para que o
A entrada ao castelo de Hawthornden havia uma alta arcada fechada por duas portas
maciças, que se abriram imediatamente quando Lestalric assobiou e gritou seu nome. O
pátio interior iluminado com tochas exibia os estandartes, a torre maior, os estábulos, a
padaria e a carpintaria, três pequenas construções em pedra que se alinhavam contra as
muralhas.
Adela observou seu marido desmontar, tentando descobrir se a ferida afetava seus
movimentos.
Em comparação com Roslin ou Chalamine, Hawthornden era pequeno, mas quando
entraram na torre principal, descobriu que o interior era muito parecido ao de Roslin.
Tal como no castelo de Lestalric, faltava ordem e asseio. Sua primeira ideia foi culpar
Sorcha pela falta de cuidado, mas recordando que sua irmã tinha residido ali só um mês
antes de voltar a partir para as Terras Altas, reprovou-se por critica-la de maneira tão
precipitada. Sorcha e Hugo ficavam em Hawthornden só durante as noites e retornavam a
Roslin pela manhã.
Havia alguns homens descansando no chão do salão, mas quando tentaram levantar-se,
Rob lhes fez um sinal para que não o fizessem. O cavaleiro conduziu a sua donzela pela
escada até um aposento na penumbra.
Rob cruzou o quarto e abriu as portinhas de uma alta janela para deixar entrar a luz
pálida da lua que já se via muito mais baixa a oeste que quando tinham deixado a abadia.
—Venha — disse afetuosamente —Venha ver o panorama.
Ela fechou a porta e obedeceu, passando junto à grande cama que ocupava quase toda a
parede a sua direita, com os pés para a janela.
—Que belo!
173 GRH - Grupo de Romances Históricos
Do castelo ela podia divisar Roslin, a mais de uma milha de distância e também o curso
do rio.
Quando sir Robert a pegou pela cintura, Adela se voltou exultante, ditosa de receber o
beijo de seu marido. Os lábios de Rob roçaram os seus com suavidade, mas logo seu braço a
estreitou com mais força e entreabriu sua boca com a língua, abrindo caminho com avidez.
O belo guerreiro deslizou sua mão até o seio dela. Começou a acariciá-lo com intensidade,
despertando todos os sentidos da jovem.
Os beijos de Lestalric se tornaram mais exigentes. Sua língua a devorava. Assombrada, já
que nunca ninguém a tinha beijado assim antes, Adela ficou tensa e teria se afastado se não
tivesse sido pela mão que retinha sua nuca. Depois seu marido se apertou contra ela, e
sentiu novas sensações, que a fizeram esquecer seu assombro. Gemendo com suavidade,
começou a lhe desatar a capa, e logo o veludo lavanda caiu a seus pés.
—Não te dói o ombro? —perguntou-lhe em um murmúrio.
—Me acredite, meu ombro não é o que mais me incomoda neste momento — ele
sussurrou com voz rouca, logo seus lábios voltaram a tomar posse dos dela.
Um casaco de seda seguiu à capa, e em seguida as saias. Sua única roupa agora era sua
anágua enrugada, o colar de ouro que lhe tinha dado sua mãe e o anel de seu marido.
Tentando alisar a anágua, perguntou contrariada:
—Despe as mulheres frequentemente, sir? Parece que tem muita prática.
Seus olhos brilharam.
—Juro que não é mais que instinto masculino.
—Suspeito que essas palavras estejam cheias de falsidade — o acusou com severidade,
elevando suas sobrancelhas.
—Jamais despi uma dama tão bela — se evadiu com um sorriso sedutor —Nem tão
sensual.
Segurou-a com força pela cintura e voltou a possuir sua boca. E Adela logo esqueceu
suas preocupações pelo passado de Robert.
Ele se deteve beijando seu pescoço de marfim, tão suave como o veludo. Seus seios se
incharam pelas carícias. Robert desejava possuí-la ali mesmo, contra a janela, simplesmente
Cavalgava tranquila sob um sol de ouro, montada em seu corcel branco com crinas e
cauda de seda. Parecia-lhe estar sobre almofadões, balançando-se brandamente, como se
navegasse em um pequeno bote sobre um mar em calma. Mas quando se deu conta de que
estava em um bote, e não sobre um cavalo, a embarcação começou a oscilar com rapidez
primeiro e logo com violência.
A segunda lição de Adela foi ainda mais agradável que a primeira. Depois, seu marido a
ajudou a encontrar e a vestir sua roupa que estava espalhada pelo quarto. Ela se sentiu em
perfeita harmonia com ele. O fato de ter que voltar a usar seu vestido de seda da noite
anterior lhe recordou seu sequestro, porque então tinha tido que usar o mesmo vestido
durante vários dias. Entretanto, Isobel tinha enviado roupa a Hawthornden para Sorcha, de
modo que Adela decidiu que depois do café da manhã procuraria algo mais adequado para
esse lugar tão descuidado.
Fez mentalmente uma lista das coisas necessárias para organizar o castelo e se apressou
escada abaixo para ir ao encontro de seu marido. Encontrou-o sem camisa, na sala,
enquanto um jovem soldado corpulento tratava sua ferida e alguns serventes preparavam
uma mesa coberta com uma toalha de linho para o café da manhã.
—Milady — a saudou Lestalric —Quero apresentar-lhe Archie Tayt. Trate-o bem. Seu tio
é um influente burguês de Edimburgo. Faça uma reverência, jovenzinho.
Sorrindo ao «jovenzinho», que, como a maioria dos homens de sir Hugo, era muito mais
alto que ela, Adela respondeu à faísca em seus olhos azuis ao saudá-lo, adicionando um
comentário para seu marido:
Adela quase não falou com Rob durante o café da manhã, temendo que seguisse
fazendo brincadeiras, mas continuava sentindo curiosidade. Terminou de comer, e ficou de
pé.
—Necessita roupa mais adequada —observou ele —Não vai querer arruinar esse vestido.
—Bem, se Sorcha usou a roupa de Isobel, eu também posso fazê-lo.
—Acima há um baú com umas poucas coisas. Devia ter pensado nisso esta manhã, mas
tinha outras preocupações em mente.
A jovem se ruborizou e deixou que seu marido a levasse escada acima.
Havia dois vestidos no baú. Escolheu o mais singelo, uma simples túnica azul com laços de
seda vermelha adiante. Quando firmou o laço bordado sobre os quadris, o cavaleiro opinou
encantado:
—Senta-te maravilhosamente. Espero que não se importe em se sujar.
—E por que deveria sujar-se?
—Já verá. Venha comigo —a conduziu até o pátio —Para fazer isto como corresponde,
deveria te levar até aquela colina coberta de erva. Mas até que saiba que riscos podemos
correr no caminho, ficaremos aqui no pátio.
Decidida a não lhe pedir mais explicações, seguiu-o mansamente até o extremo mais
afastado do pátio, onde estavam lutando quatro homens.
Sem lhes dar explicações, enviou-os a ocupar-se de outras tarefas.
—Agora, moça, vamos ao duelo. Inicie o combate.
Adela não cabia em si de surpresa, acaso estava zombando dela outra vez?
—Do que está falando, milord?
Durante dois dias Rob e Henry exploraram juntos enquanto Adela organizava à servidão
para uma limpeza sistemática do castelo. Também convenceu Archie Tayt de que a
ajudasse a praticar as artes do combate e também a manejar sua nova adaga. Rob a tratava
com amabilidade, mas sua cabeça estava posta na busca.
Mas ao final do segundo dia, sem ter ainda nenhum indício de cavaleiros de Edimburgo,
nem encontrar nada parecido a uma espada, e com o navio de Henry que retornava a Leith
em dois dias para buscá-lo, os homens se achavam em um ponto morto.
—Posso dedicar um dia mais ao assunto — propôs Henry, durante o jantar —Mas se não
encontrarmos nada, Rob, terá que esperar Hugo.
Rob concordou com ele, e mais tarde, quando Henry já tinha retornado a Roslin, Adela e
ele subiram a seu dormitório.
—Ainda está zangado comigo?
—Não, meu tesouro. O mau humor de ambos já passou.
—Então, posso fazer uma cópia de seu mapa para estudá-lo?
Ele hesitou, dificilmente ela seria capaz de descobrir algo que ele ou Henry não tivessem
visto.
—Céus, teme que lhe aconteça algo enquanto está em minhas mãos? Eu não gosto de
segredos, mas jamais o trairia.
—Sei —suspirou.
Ainda reticente, procurou papel, pluma e tinta para que sua esposa fizesse uma cópia.
Observou-a enquanto reproduzia com supremo cuidado o mapa.
Quase tinha terminado quando disse:
—E este pedacinho daqui, sir? Não posso decifrar sua cópia.
204 GRH - Grupo de Romances Históricos
—Lembro-me dessas linhas estranhas. Pensei que não eram mais que um defeito do
couro, mas estavam em minha metade do mapa. Lhe demos outra olhada.
Um momento mais tarde, ela comentou:
—Não acredito que seja um defeito. Não poderia ser uma cascata?
Ele franziu o cenho, e fixou seu olhar em três linhas onduladas em sua metade do mapa
original.
—A tinta se desvaneceu —assinalou —Entretanto, a textura da vitela pode ter me
enganado, e acredito que é possível que tenha razão.
—Será nas cavernas debaixo de Hawthornden?
—Nenhuma que eu conheça. Mas há numerosas cascatas em Glen, e também existem
entradas em outras cavernas. Há uma coisa que me tem obcecado desde que começamos
esta busca.
—O que é?
—O tamanho… — fez uma careta, depois sacudiu sua cabeça para limpar-se.
Adela suspirou; podia perceber a luta interna que travava seu marido ainda duvidando
se confiava nela ou não.
—Você disse «o tamanho» — o incentivou a continuar —portanto, suponho que se referia
ao tamanho do objeto ao que o mapa nos conduz. Parece-me que acha que o tamanho do
objeto faz muito improvável o fato de que esteja escondido em alguma das cavernas que
vimos. Por que não me diz diretamente o que pensa?
—Porque é muito possível que esteja equivocado —Rob deu um murro na mesa —Posso
me haver detido em detalhes mínimos, produto de uma esperança infantil logo depois de
tantos anos de ter escutado os relatos de meu avô. Ficarei como um parvo, e os Sinclair não
vão esquecer nunca. Já te contei parte do assunto.
—Não me contou nada sobre o tesouro — ela recordou —O que é, exatamente, e de
onde provém?
—Deite-se — ele disse, beijando sua bochecha —Vou apagar as velas.
Durante toda a manhã Adela tinha estado ocupada com suas tarefas. Com Archie como
seu principal assistente, tudo estava funcionando às mil maravilhas. Tayt tinha encontrado
duas mulheres jovens para que a ajudassem e recrutado um exército de peões.
Durante os dois dias anteriores, enquanto Rob e Henry exploravam as cavernas debaixo
do castelo, a servidão tinha limpado os quartos do piso superior e rastelado os velhos
Rob olhava com ceticismo a escarpada pendente norte, na borda ocidental da garganta
do rio North Esk. Do topo de Glen caía a suposta cascata de Adela.
—Mas ainda estamos na primavera, Henry —protestou Rob —Não vejo como este
pequeno córrego…
—Zombe o quanto queira. Vi-o derramando-se em toda sua exuberância. E, o que é mais
importante: nunca seca, como a maioria dos arroios dos arredores. E olhe também esses
grandes blocos de rocha mais à frente… Se eu quisesse ocultar a entrada a uma caverna…
Os três blocos de rocha estavam em posição vertical. A distância pareciam estar em um
precário equilíbrio. Mas mais de perto, os via sólidos e irremovíveis.
Tinham deixado os cavalos em uma estreita praia de pescadores que corria ao longo da
borda oeste do rio e entraram no Glen, seguindo o quase imperceptível fio de água e o
passo firme de Henry que conhecia bem a zona. A densa folhagem quase não lhes permitia
avançar, o aroma do bosque era delicioso. O lado ocidental do desfiladeiro também tinha
um pendente impressionante.
Enquanto Rob contemplava com o cenho franzido os três blocos de pedra, Henry
começou a rir.
—Diabos, o que esperava que caíssem tão logo os tocasse? Faz quarenta ou quarenta e
cinco anos, seu avô e seus amigos andavam por aqui acossando os invasores ingleses. Tudo
que pudesse mover-se com facilidade já estaria no chão, e o esconderijo, à vista de
qualquer um.
—Tem razão — aceitou Rob, ainda contemplando as rochas, perdido em uma profunda
reflexão.
Os dois homens trabalharam duro para limpar os três grandes blocos de rocha da terra e
das plantas que se acumularam sobre eles. Por último, Rob afundou a pá na terra no bloco
principal, para calcular quanto mais iam ter que cavar. Para sua surpresa, a base apareceu a
poucos centímetros da superfície.
—Por Deus! —disse Henry, ajoelhando-se para observá-lo mais de perto —Parece um
trabalho de ourivesaria.
Rob assentiu.
—Acredito que encontramos o que procurávamos.
—Antes de proclamar nosso triunfo, devemos ver se podemos mover esse bloco.
—Prometi a Adela que a buscaria se encontrássemos uma entrada perto da cascata.
—Insisto em seguir trabalhando até que saibamos com certeza que encontramos uma
entrada —sugeriu Henry —Recorda que devo tomar meu navio amanhã. Maldita seja se
vou me inteirar do que está escondido aqui, pelo menos, vejamos se podemos mover esta
rocha antes de ir procurar a sua mulher.
—Muito bem —aceitou Rob —Em todo caso, com a corrente tão forte, teremos que ir
até a ponte para cruzar o rio. Uma pena, porque só nos levaria uns minutos se pudéssemos
cruzá-lo com os cavalos.
Adela voltou a dar um passo fora da porta secreta, com a esperança de que sua decisão
se fortalecesse.
Enquanto lutava contra a vertigem que lhe produzia olhar para o fundo do abismo,
escutou passos na escada. Finalmente se arrependeu e correu pelo escuro passadiço até a
Da margem do outro lado do castelo, Rob e Henry tinham visto a corda pendurada, a
porta aberta e o Chevalier De Gredin olhando para baixo. Aterrorizado ante a possibilidade
de que Adela tivesse tentado fugir usando a corda, Rob gritou frenético.
—Não posso perdê-la, Henry!
—Repito que sua esposa não pode ter descido por essa corda. Pense! Parece que não a
conhece…
—A conheço como conheço a mim mesmo — o interrompeu Rob —Soube desde a
primeira vez que estive com ela. —O eco de suas palavras seguia rondando na cabeça de
Rob, e começou a tranquilizar-se —Tem razão. Estive comparando-a com Isobel e com
Sorcha, pensando que agiria de um modo tão impulsivo como suas irmãs. Mas ela é
diferente. Pensa antes de agir. Devo cruzar o rio, Henry. Traga-me as cordas, por favor.
Tinham que caminhar rio acima um breve trecho e, enquanto atavam as cordas entre si e
atavam um extremo ao tronco de uma forte árvore, Henry comentou cético:
—Vai ter que nadar com muita energia. Não se esqueça de seu ombro. Poderá fazê-lo?
—Tenho que fazê-lo - respondeu Rob, ajustando a espada em sua bainha de maneira que
o punho impedisse, no possível, que entrasse a água —Céus, quase me esqueci —
adicionou, tirando a bota para extrair sua metade do mapa —Guarde isto. E pelo amor de
Deus, que não deixe que lhe apanhem com o mapa.
Jogou ambas as botas a um lado junto com seu casaco de couro. Fez um laço e deslizou a
corda sobre seus ombros. Henry sustentava o cilindro de corda para ir soltando-a à medida
que ele entrasse no rio. Rob mergulhou e começou a dar braçadas com todas suas forças
para a borda oposta. A água estava tão gelada que parecia que havia adagas cravando-se
em seus pulmões, mas ao final, insensibilizou seu ombro de maneira que deixou de doer.
Teve a porta ante seus olhos justo no momento em que o conde de Fife estava a ponto
de jogar Adela no abismo.
228 GRH - Grupo de Romances Históricos
Gritando ao mesmo tempo em que Fife tentava lançá-la no rio, Adela se aferrou a seu
pescoço com a ideia de arrastá-lo com ela. Mas ele não a empurrou.
De Gredin tinha segurado o conde e tentava afastá-lo da abertura.
—Milord, não seja insensato! Se a matar, não nos inteiraremos de nada.
—Me solte de uma vez — gritou Fife.
—Não, milord — se negou o Chevalier —Passei muito tempo na França. Ali não se
ameaça às mulheres.
—Então retorne a França. Não me serve para nada, bem sabe Deus.
Fife começou a lutar com De Gredin, mas Adela já estava farta: agarrou os cabelos
escuros do conde, que lhe chegavam até o ombro, envolvendo-os em seu punho e puxando
com todas as suas forças.
—Me solte sir, imediatamente!
—Maldição! —uivou ele.
Adela levantou um joelho com toda sua energia. Percebendo sua intenção, ele desviou o
alvo o bastante para evitar nefastas consequências para sua virilidade, mas de todas as
maneiras grunhiu e afrouxou sua mão. Depois a golpeou no rosto com a mão livre e a fez
cambalear perto da porta aberta.
Aterrorizada, pensando que seu próprio impulso a faria precipitar-se, fez um giro
desesperado e caiu no chão.
Fife arremeteu contra ela, mas outra vez De Gredin atuou em sua defesa, retendo o
conde pelo braço.
Enquanto Fife atacava o homem, Adela viu que a corda na abertura estava agora tensa.
Sem pensar em sua própria segurança, levantou-se e se aproximou dos dois homens que
estavam lutando.
Outro golpe de Fife a derrubou, mas agora ela rolou para cair o mais longe possível da
abertura, perto da entrada do passadiço que dava ao fosso. Então, levantou as saias e
extraiu a adaga. Ergueu-se, tomou fôlego para recuperar-se e escondeu a arma em uma
dobra de sua saia.
Quando chegaram ao pátio, a cena era caótica. Mas Fife, apesar de sua dor e de sua
debilidade evidentes, logo restabeleceu a ordem e a disciplina entre seus homens. Depois,
deu um jeito para montar seu cavalo sem mais ajuda que a que recebia normalmente de
um criado e, sem olhar para trás, tomou seu lugar à frente dos soldados.
Tinha anoitecido antes que Adela, Rob e Henry chegassem até o sombrio desfiladeiro.
Dali em adiante tudo transcorreu com rapidez. O enorme bloco central se separou dos
outros dois com grande facilidade e deixou descoberta uma abertura na base da colina.
—Santo céu, olhem isto! —exclamou Henry, medindo a borda interior da abertura —
Este bloco está colocado sobre dobradiças.
—Toma esta tocha — disse Rob —Acenderemos a minha e conservaremos as suas se por
acaso precisar.
Enquanto ele se adiantava pelo passadiço para acender a sua, Adela olhou para trás o
caminho pelo que tinham vindo. Supostamente, Michael e seus homens estavam vigiando
os acessos a Hawthornden e essa parte do desfiladeiro. Ninguém podia vê-los ali do castelo,
nem sequer da muralha. Tampouco podiam escuta-los a mais de uns passos de distância,
por causa do rugido da correnteza. De todos os modos, estava nervosa, embora muito
emocionada ante a perspectiva do que podiam encontrar.
—Um de nós deveria ficar e vigiar aqui fora — sugeriu Henry.
—Confiaremos em Michael — disse Rob, encabeçando a marcha e sustentando bem alto
sua tocha.
Já mais calma Adela o seguiu pelo passadiço com Henry atrás dela. Quando Rob se
deteve, o profundo silêncio do passadiço os envolveu.
—Aqui se abre um segundo passadiço —assinalou —Segundo o mapa, esse é o caminho
que devemos tomar.
—Tem razão —concordou Henry, observando seu próprio mapa.
A certeza aumentava à medida que avançavam. O passadiço era largo, e o chão era liso,
livre de obstáculos. Embora não tivessem caminhado muito, já tinham virado três vezes.
Não lhe surpreendeu que De Gredin aceitasse imediatamente retornar à cidade com
Henry. Assegurou a Rob com tanta veemência que não diria nada a ninguém a respeito de
seus planos, que Lestalric esteve tentado a autorizá-lo a falar deles com quem quisesse.
Mas resistiu a tentação, sem ter mais fé na integridade de Chevalier que a que tinha tido no
princípio.
De Gredin não era mais que um chamariz na armadilha. Mais tarde, quando Rob ajudou
Adela a montar antes de partir para Edimburgo, perguntou-se quando ela diria o que
pensava. Sua esposa tinha conversado com bastante amabilidade enquanto comiam, mas
se percebia certa tensão que ainda não se dissipou.
E embora ele se perguntasse o que teria feito para desgostá-la, estava seguro de que sua
mulher diria no momento oportuno.
Uma névoa leve velava a lua outra vez, mas as noites se estavam tornando mais quentes.
Cruzaram o vestíbulo iluminado com velas da abadia. Era difícil não distinguir a volumosa
figura do abade ajoelhado no mesmo lugar onde o tinham encontrado na vez anterior.
Rob pôs sua mão sobre o braço de Adela para detê-la, depois passou seu braço ao redor
de sua cintura e a estreitou contra si em um quente abraço; perguntou-se o que seria deles.
Não temia Fife, exceto porque o conde ameaçava a sua esposa. E ele faria tudo o que fosse
necessário para mantê-la a salvo. Talvez a ilha de Orkney fosse um bom lugar para
encontrar segurança, não só para De Gredin.
Fife foi o primeiro a aparecer na soleira do átrio. Sua expressão sombria bastou para que
Adela sentisse um calafrio em todo seu corpo, mas mãos cálidas sobre seus ombros lhe
recordaram que Rob estava ali, e também o abade.
O conde levava uma espada e uma escolta armada. Rob deslocou Adela para um lado e
abriu a porta.
—Busca-me, milord?
Adela voltou a localizar-se na soleira da porta, decidida a observar tudo.
A fúria de Fife aumentava com cada passo que dava.
—Está detido, Lestalric, e também sua esposa.
—Sempre vai à igreja com a espada desembainhada? —perguntou-lhe Rob, com um tom
despreocupado.
Fife estava a ponto de perder os estribos.
—Desembainhe a sua, sir, terminemos nosso combate agora.
—Não vou a desembainhar minha espada na igreja — se negou Rob, com firmeza —Mas
se quiser, enfrentar-me-ei com você no cemitério.
—Onde está Orkney?
—O que acontece? Têm medo de Henry? Ele deve estar a bordo de seu navio rumo a sua
casa, não nos vai incomodar esta noite.
—Mentira, sei que estava na cidade faz um momento e com um numeroso exército.
De repente, escutou-se o tangido do sino da abadia.
Fife se virou, gritando a um de seus seguidores.
—Ali — assinalou Rob, apontando para uma série de formações rochosas que se
divisavam de Firth of Forth —Atrás dessas rochas há uma saliência que nos protegerá do
vento e onde nossos cavalos poderão pastar.
Resultou um lugar agradável para apoiar as costas, algo que Rob recordava ter feito
durante prévias excursões em sua juventude. Tinha sido seu lugar secreto, aonde ia para
ficar sozinho. Gostava de contemplar os navios enquanto refletia. Agora, parecia-lhe justo
compartilhá-lo com sua esposa.
Com um esplêndido panorama e um diáfano céu azul sobre suas cabeças, salpicado por
movediças nuvens brancas, ficaram sentados, com as costas apoiadas, felizes suspensos em
um mundo próprio entre o céu e o mar.
—Você gosta, meu amor?
—OH, é maravilhoso! Mas me sinto culpada de ter vindo aqui desta maneira, Rob. Podem
chegar a qualquer momento, e deveríamos estar ali para lhes dar as boas vindas.
—Não pensou mais que em seu bem-estar durante quinze dias — recordou ele —Graças
ao administrador de Henry e meu esforço titânico, agora temos a nosso próprio
administrador, mordomo e uma força de segurança considerável. De todos os modos, Fife
se acha nas terras fronteiriças, fingindo que está ajudando Douglas a manter os ingleses
fora da Escócia. E —adicionou como fator decisivo —sabemos que Tam Geddes não nos
estava roubando; era meu pai quem dirigia mal seus ganhos.
—Nós o faremos bem —assegurou a jovem.
F im
1.Highland Princess
2. Lord of the Isles
3. Prince of Danger
4. O Resgate da Donzela
5. O Cavaleiro das Sombras
6. O Rei das Tormentas
G RH
Grupo de Romances Históricos
Para entrar neste grupo, enviar e-mail para
moderacaogrh@yahoo.com.br