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Cássia Morais Mano


Materiais recicláveis
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Descrever o comportamento, as características e os atributos dos


materiais recicláveis.
 Reconhecer os métodos e processos de extração, manipulação e
fabricação.
 Identificar o uso adequado do material em projetos de mobiliário e
ambientes de interiores sustentáveis.

Introdução
A escolha de materiais de baixo impacto ambiental no desenvolvimento
de produtos é um aspecto relevante nos novos modelos de produção e
consumo. Projetar ambientes, desenvolver produtos e executar serviços
considerando-se a redução do uso de recursos não renováveis contribui
para reduzir a geração de resíduos e promover a economia de custos de
disposição final. Nesse sentido, destaca-se a importância da utilização de
materiais recicláveis como alternativa para produção, a fim de compre-
ender o comportamento desses materiais, suas particularidades e sua
contribuição para o meio ambiente.
Neste capítulo, você aprenderá sobre os materiais recicláveis e sua
importância para o meio ambiente. Serão apresentados os principais
atributos dos materiais recicláveis por meio de exemplos, além de sua
aplicabilidade em projetos sustentáveis de mobiliário e de interiores.

O homem e sua relação com os materiais


Na história da humanidade, os materiais sempre acompanharam a evolução do
homem, garantindo, no início, a sua sobrevivência por meio de ferramentas de
defesa e, mais tarde, apurando a funcionalidade para atender às necessidades
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específicas do cotidiano. À medida que a humanidade foi avançando, o grau de


desenvolvimento e de uso dos materiais teve uma progressão em conjunto, por
exemplo: idade da pedra, idade do bronze, idade do ferro, etc. (CÂNDIDO, 2008).
Com a Revolução Industrial no século XIX, boa parte dos trabalhos manuais
foram substituídos pelas máquinas industriais, observando-se a fabricação em
massa de produtos de bens de consumo. Atualmente, o sistema econômico e
a maneira como consumimos os produtos têm modificado as relações entre
recursos materiais, energéticos e os seres humanos (BARBERO; COZZO, 2009).
A introdução dos materiais recicláveis no mercado teve como objetivo
reduzir o impacto ambiental, a fim de evitar o desperdício de matéria-prima,
utilizando materiais que já estão disponíveis (Figura 1), sendo que alguns são
não poluentes ou tóxicos, como, por exemplo, o vidro. Nesse sentido, o design
sustentável consiste em uma forma de minimizar os impactos ambientais,
propondo valor de responsabilidade de não prejudicar o meio ambiente. Sobre
a importância de considerar os impactos ambientais na produção dos objetos,
vale destacar que “[...] a partir do momento em que conhecemos os proble-
mas ambientais e suas causas, passamos a influir na concepção, escolha dos
materiais, fabricação, uso, reuso, reciclagem e disposição final dos produtos
industriais [...]” (SANTOS, 2001, p. 16).

Figura 1. Demandas do produto, incluindo os aspectos ambientais.


Fonte: Adaptada de Tischner et al. (2000).

Mas, afinal, o que são materiais recicláveis? Antes de responder a essa


pergunta, precisamos compreender o que é o ciclo de vida de um produto. Para
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que um objeto seja produzido, é necessário explorar recursos naturais para a


obtenção da matéria-prima, logo, é produzido, distribuído, utilizado e tem sua
destinação final (Figura 2). O material é reciclável quando é transformado e
reutilizado, por exemplo, quando garrafas PET são decompostas quimicamente
para se tornarem matéria-prima de novos objetos.

Fique atento para não confundir material reutilizado com material reciclável, eles
se diferenciam pela natureza dos produtos que originam. O material reciclável é
transformado de forma química ou física, já os materiais reutilizados são transformados
quando um novo uso é dado ao objeto, com alterações formais e estruturais (BARBERO;
COZZO, 2009).

Figura 2. Ciclo de vida de um produto e estratégias de ecodesign.

Para caracterizarmos os materiais recicláveis, precisamos conhecer os


tipos de resíduos sólidos urbanos que os originam. Os resíduos mais co-
muns são os resíduos úmidos e os resíduos secos. Os restos de alimentos,
guardanapos usados, cascas de frutas e legumes, filtro de papel para café,
folhas de árvores, plantas e hortaliças são resíduos úmidos e podem ser
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transformados em adubo por meio da compostagem. Os resíduos secos podem


ser classificados como:

 papéis: papelão, revistas, jornais, cadernos, caixas longa vida (TetraPak);


 plásticos: embalagens de materiais de limpeza, xampu, sacos, potes de
produtos em geral;
 vidros: garrafas, copos, todos os tipos de vidro inteiro ou em cacos
(exceto lâmpadas fluorescentes, pois necessitam de um processo
específico para a remoção dos metais tóxicos existentes no interior
do bulbo);
 metais: tampas de garrafas, pregos, latas de óleo e de leite, latas de
alumínio, grampos, arames, panelas, embalagens de alumínio.

Assim, os resíduos sólidos urbanos secos são passíveis de reciclagem, isto


é, nem todos poderão reintegrar o ciclo de produção, uma vez que a reciclagem
não é inerente aos resíduos recicláveis (BIMBATI; RUTKOSKI, 2017). Boa
parte dos materiais recicláveis acaba tendo o mesmo destino final dos rejeitos
devido a apresentarem algum atributo que impede sua reciclagem. Chamamos
essa característica de reciclabilidade, ou seja, o potencial do produto em
passar pelo processo de reciclagem após o consumo, no fim de sua vida útil.
Em relação aos atributos dos materiais, o Quadro 1 destaca os principais
parâmetros e suas descrições.

Quadro 1. Atributos físico-químicos dos materiais

Parâmetros Descrição

Composição dos materiais Consiste nos tipos de materiais, ligas e


resinas utilizadas à incorporação de aditivos
químicos e materiais compósitos.

Combinação dos materiais É a junção de mais de um tipo de material no


produto. Materiais multi ou monocamadas
e materiais compostos. Influencia no des-
monte do material.

Tipo de união dos materiais Consiste no tipo de junção do produto. Pode


ser do tipo adesiva ou montagem. Interfere
diretamente no desmonte do material.

Fonte: Adaptado de Bimbati e Rutkowski (2017).


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A seguir (Figuras 3, 4 e 5), você pode conferir alguns exemplos de utilização de materiais
reciclados.

Figura 3. Cadeiras de jardim feitas com plástico reciclado.


Fonte: Chiyacat/Shutterstock.com.

Figura 4. Poltrona feita com papelão.


Fonte: KYNA STUDIO/Shutterstock.com.

Figura 5. Piso ecológico feito com plástico reciclado.


Fonte: hiv360/Shutterstock.com.
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A Política Nacional de Resíduos Sólidos (BRASIL, 2010) foi instituída por meio da Lei nº
12.305/2010, contendo instrumentos fundamentais para a prevenção e redução na geração
de resíduos. Dentre os principais tópicos abordados na PNRS, estão os listados a seguir.
 a não geração, redução, reutilização e tratamento de resíduos sólidos;
 destinação ambientalmente adequada dos rejeitos;
 diminuição do uso dos recursos naturais (p. ex., água e energia) no processo de
produção de novos produtos;
 intensificação de ações de educação ambiental;
 aumento da reciclagem no País;
 promoção da inclusão social e geração de emprego e renda para catadores de
materiais recicláveis.

Extração, manipulação e fabricação


O processo de reciclagem constitui a transformação de um produto após o
término do ciclo de vida em um novo material, daí o termo “reciclar”: reinserir
no ciclo de produção. A reciclagem é um processo que inicia com a coleta
seletiva dos materiais recicláveis na fonte, de modo a garantir o maior potencial
de reciclabilidade dos materiais. Em seguida, é realizada a triagem, geralmente
em galpões de reciclagem, e o material retorna à indústria para ser transformado
em matéria-prima para novos produtos, economizando energia e diminuindo o
impacto ambiental na produção. O Quadro 2, a seguir, apresenta os processos de
reciclagem dos principais resíduos secos recicláveis: papel, plástico, vidro e metal.

Quadro 2. Síntese dos processos de reciclagem

Coleta seletiva

Papel Plástico Vidro Metal

Material cortado Com Sem separação Separação Material com-


em tiras e colo- separação de resinas conforme pactado e limpo
cado em tanque de resinas a cor entregue às
com água quente empresas

Formação de Triagem dos Triagem dos Lavagem Retirada das


pasta de celulose diferentes tipos diferentes tipos para retirada impurezas (metais
de plástico de plástico de impurezas ferrosos, areia, etc.)

(Continua)
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(Continuação)

Quadro 2. Síntese dos processos de reciclagem

Coleta seletiva

Papel Plástico Vidro Metal

Drenagem da Retorno do Lavagem, Trituração e Remoção das


água, despejo plástico - po- secagem e mistura com tintas e vernizes
sobre tela de límero - à sua trituração areia e pedra
arame composição calcária
primária de
monômero

O material é Processo Processo físico Fundição e jato Fundição do


seco, prensado químico de ar quente material e gera-
e alisado por para aumento ção de chapas
rolos de ferro da resistência metálicas
e enrolado em
bobinas

A reciclagem constitui o reaproveitamento de materiais originários de


determinada matéria-prima para a criação de um novo produto. Assim, a
reciclagem é o resultado de vários processos pelos quais passam os materiais
que seriam rejeitados (MOTA et al., 2009).

Você sabia que a primeira proposta de produto a partir de materiais reutilizados foi
desenvolvida em 1974? Na Escola Superior de Design de Offenbach, Alemanha, um
grupo de pessoas elaborou o design de um sofá a partir de pneus usados! Devido
a limitações financeiras, o projeto acabou não sendo produzido, porém essa foi a
primeira equipe que buscou a criação de um produto alternativo que reaproveitasse
os resíduos urbanos. Embora não seja um exemplo de material reciclável, mas sim
reutilizável, vale o destaque devido à importância da preocupação com o meio am-
biente a partir dos anos 70.
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Uso dos materiais recicláveis: mobiliário


e interiores
O uso de materiais recicláveis para projetos de mobiliário e ambientes de
interiores sustentáveis é uma alternativa cada vez mais frequente, tanto no
design quanto na arquitetura. O desenvolvimento de mobiliário considerando
uma corrente sustentável apresenta como possibilidade a proteção dos re-
cursos naturais sem abrir mão da estética (BARBERO; COZZO, 2009). Na
Figura 6, podemos visualizar alguns exemplos de mobiliário desenvolvido
a partir de materiais recicláveis.
Diversos escritórios de arquitetura têm utilizado materiais recicláveis
na especificação de produtos para projetos de interiores, tais como: painéis,
revestimentos de piso, divisórias internas de ambientes. Uma área que tem
se preocupado com o uso de materiais recicláveis é o campo dos espaços
efêmeros, que consistem em estandes, displays de lojas, cenografia de eventos
e quiosques construídos para espaços curtos de tempo, daí a denominação
efêmeros. Alguns exemplos de materiais recicláveis em espaços efêmeros são:
policartão de alta densidade (papel reciclado), laminados pet (plástico tipo
PET) e madeiras de reflorestamento.

Acesse o link a seguir e leia o artigo “Características dos materiais da coleta seletiva
de resíduos sólidos no Bairro Camobi/Santa Maria/RS”, de Elenice Gomes, Airton
Sieben e Waterloo Filho, que investiga os materiais recicláveis encontrados na coleta
seletiva urbana.

https://qrgo.page.link/hzwm
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Empresas brasileiras têm desenvolvido linhas de móveis recicláveis, como, por exemplo
a Cartone Design, responsável pela criação e a fabricação dos móveis da Figura 6,
uma alternativa para quem pretende decorar os espaços de uma forma sustentável
e diferenciada.

Figura 6. Mobiliário feito de papelão.


Fonte: Adaptada de Cartone Design (2019, documento on-line).
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BARBERO, S.; COZZO, B. Ecodesign. São Paulo: H. F. Ullmann, 2009.


BIMBATI, T. A. V.; RUTKOWSKI, E. W. Atributos e parâmetros de reciclabilidade de materiais
que compõem os resíduos sólidos. In: CONGRESSO INTERAMERICANO DE RESÍDUOS
SÓLIDOS, 7., 2017, Cuenca. Anais [...]. Cuenca: [s. n.], 2017.
BLACK, C. How to recycle tires for your homestead. 2015. Disponível em: https://www.
survivopedia.com/how-recycle-tires-for-homestead/. Acesso em: 09 abr. 2019.
BRASIL. Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos
Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12305.
htm. Acesso em: 09 abr. 2019.
CÂNDIDO, L. H. A. Contribuição ao estudo da reutilização, redução e da reciclagem dos mate-
riais com aplicação do ecodesign. Dissertação de Mestrado. Escola de Engenharia, UFRGS,
2008. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/15687. Acesso em 12 abr. 2019.
CARTONE DESIGN. [Site]. [2019]. Disponível em: https://cartonedesign.com.br/produtos/.
Acesso em: 09 abr. 2019.
MOTA, J. C.; ALMEIDA, M. M.; ALENCAR, V. C.; CURI, W. F. Características e impactos ambien-
tais causados pelos resíduos sólidos: uma visão conceitual. In: I Congresso Internacional
de Meio Ambiente Subterrâneo. Anais... São Paulo, SP, 2009.
SANTOS, P. A. Inovação sustentável: o ecodesign aplicado ao projeto de novos produtos.
2001. Monografia (Especialização em Agente de Inovação Tecnológica) – Universidade
de Caxias do Sul, Caxias do Sul, 2001.
TISCHNER, U. et al. How to do ecodesign? A guide for environmentally and economically
sound design. Dessau-Rosslau: German Federal Environmental Agency, 2000.

Leituras recomendadas
BÜRDEK, B. Diseño: história, teoría y práctica del diseño industrial. 2. ed. Barcelona:
Gustavo Gili, 1999.
GOMES, E.; SIEBEN, A.; PEREIRA FILHO, W. Características dos materiais da coleta seletiva
de resíduos sólidos no Bairro Camobi/Santa Maria/RS. Ciência e Natura, Santa Maria,
v. 26, n. 1: p. 83-100, 2004.
MALAGUTI, C. Requisitos ambientais para o desenvolvimento de produtos. São Paulo:
CSPD - Centro São Paulo de Design, 2005.
PLATCHECK, E. R. Design industrial: metodologia de ecodesign para o desenvolvimento
de produtos sustentáveis. São Paulo: Atlas, 2012.
ROSA, A. H.; FRACETO, L. F.; MOSCHINI-CARLOS, V. (org.). Meio Ambiente e sustentabilidade.
Porto Alegre: Bookman, 2012.

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