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ISSN ELETRÔNICO 2316-3828

A IMPORTÂNCIA DA SEMIÓTICA NA PUBLICIDADE PARA A PROJEÇÃO DOS SIGNIFICADOS:


UMA ANÁLISE DO ANÚNCIO MITSUBISHI PAJERO FULL
Ítalo Jorge Menezes Medeiros 1 Talita de Azevedo Déda 2

RESUMO
Este artigo se destina a explicar a importância dos perceber por meio da semiótica as relações sígnicas
estudos semióticos na publicidade, tendo como refe- e a produção de sentido engendrada na mensagem
rência os teóricos, Algirdas Julien Greimas, Charles publicitária.
Pierce, Roland Barthes e Martine Joly para um melhor
entendimento dos conceitos que envolvem, desde as
premissas básicas à semiótica da imagem, fundamen- PALAVRAS-CHAVE
tal no ramo publicitário, tendo como objeto de análise
o anúncio da Mitsubishi Pajero Full, com o objetivo de Semiótica. Publicidade. Signos.

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ABSTRACT RESUMEN
This article is intended to explain the importance of Este artículo tiene la intención de explicar la impor-
semiotic studies in advertising, having as reference tancia de los estudios semióticos en la publicidad,
the theorists Algirdas Julien Greimas, Charles Pier- con referencia a los teóricos, Algirdas Julien Greimas,
ce, Roland Barthes and Martine Joly for a better un- Charles Pierce, Roland Barthes y Martine Joly para
derstanding of the concepts involved, since the basic una mejor comprensión de los conceptos involucra-
premises to semiotic of the image, fundamental in dos, ya que los supuestos básicos de la semiótica de la
advertising industry, having as analysis’ object the imagen, fundamental en la industria de la publicidad,
announcement of Mitsubishi Pajero Full, aiming to que tiene como objeto de análisis el anuncio de Mit-
perceive through the semiotic sign relations and the subishi Pajero Full, con el objetivo de realizar a través
production of meaning engendered in the advertise- de las relaciones de signo semiótico y la producción
ment. de significado engendra en el anuncio.

KEYWORDS
PALABRAS CLAVE
Semiotic. Adversiting. Signs.
Semiótica. Publicidade. Signos.

INTRODUÇÃO
Há muitos estudos sobre a comunicação huma- e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de
significação e de sentido (SANTAELLA, 2005, p. 13).
na e sobre como os indivíduos de uma mesma socie-
dade interagem e comunicam entre si, através de
desenhos, ideogramas, algarismos, idiomas, fala, A este ponto de vista, Santaella (2005) ressalta que
a semiótica não pode ser considerada como uma ciên-
entre outros. Porém, as análises sobre a significa-
cia pronta e acabada, mas como “algo nascendo e em
ção e produção de sentido gerados na mensagem
processo de crescimento. Esse algo é uma ciência, um
e o efeito que o discurso pode gerar no receptor,
território do saber e do conhecimento ainda não sedi-
enquanto ações comunicativas e de linguagens
mentado, indagações e investigações em progresso”
ainda são recentes. Esses estudos ficam a cargo da
(SANTAELLA, 2005, p. 8). Ou seja, persiste em constante
Semiótica, sendo “conhecida como uma ciência dos
aperfeiçoamento e aprofundamento por parte dos seus
signos, da significação e da cultura no século XX”
estudiosos, que ao longo dos anos, agregaram conceitos
(SANTAELLA, 2002, p. 11) que não só investiga a re-
e correntes filosóficas ao estudo da significação do dis-
lação entre significantes e o seu significado, como
curso, podendo ser este um gesto, um texto, uma ima-
também se apropria da linguística para fundamen- gem, um som ou qualquer forma de linguagem.
tar o modo como interagimos no mundo.

A Semiótica é a ciência que tem por objeto de investi-


Desta forma, este artigo destina-se a analisar o
gação todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem anúncio da Mitsubishi Pajero Full tendo como base o
por objetivo o exame dos modos de constituição de todo princípio da semiótica e a sua importância para a in-

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terpretação e percepção da mensagem publicitária. Tal Embora seja de extrema importância a análise dos
estudo será referenciado os teóricos, Algirdas Julien discursos publicitário, este estudo não tem a preten-
Greimas (1973), Charles Pierce (2010), Roland Barthes são de obter uma interpretação única e precisa sobre
(1990) e Martine Joly (1996) para perceber por meio da o anúncio analisado, mas sim, de poder contribuir
semiótica as relações sígnicas e a produção de sentido para os estudos acadêmicos e para a dinâmica da se-
engendrada na mensagem publicitária. miótica na comunicação.

2 O PRINCÍPIO DA SEMIÓTICA
Os semióticos têm como base a semiologia, a ciên- maneiras de percepção foram originados por Charles
cia que estuda a linguagem verbal, originalmente pro- Pierce (2010) considerado como um dos principais se-
pagada por Ferdinand Saussure em seu Curso de Lin- mióticos e autor da semiótica moderna.
guística Geral no fim do século XIX, que evidenciado
por Algirdas Julien Greimas em Semântica Estrutural Peirce (2010) criou o princípio da fenomenologia,
(1973), enfatiza o poder de significação no mundo e uma quase ciência que estuda os modos como o ser
destaca a importância dela para as ciências humanas. humano apreende qualquer coisa pela mente, tendo
Neste estudo Greimas (1973) citado por Fiorin (1999) como base três ciências normativas (aquelas que es-
identificou, também, a ausência de uma ciência espe- tudam normas e valores) divididas através da estética,
cífica para o estudo da significação em sua época e a ética e a lógica ou semiótica. A estética foca no que
sugere a criação de uma “semântica linguística, que é admirável, no que sensibiliza, guia os sentimentos e
se ocuparia da análise da significação, tal como é for- atrai. A ética define os valores e normas de conduta, e
necida pelo código da língua” (FIORIN, 1999, p. 3). a lógica estuda o pensamento, o raciocínio com base
na estética e na ética, uma vez que Pierce (2010) ar-
A esse conceito é importante frisar que as deno- gumenta que não há pensamentos sem signos.
minações sobre linguagem não podem ser restritas
apenas à língua, uma vez que esta atua sobre várias A partir desta ciência normativa, Pierce (2010) di-
formas de linguagem. Portanto o objeto de estudo da vidiu a lógica em três ramos: a gramática especulati-
semiologia é a língua, idioma falado pelas pessoas de va (aquela que rege o estudo e classificação acerca
determinada nação ou etnia, língua pátria, podendo dos tipos de signos), a lógica crítica aquela que, como
ser verbal (fala) ou não verbal (escrita), e vem a ser define Santaella (2002, p.3), “estuda os tipos de infe-
apenas uma das formas de linguagem. Já a semiótica rências, raciocínios ou argumentos que se estruturam
se encarrega de estudar todas as formas de se comu- através do signo”, e a retórica especulativa ou meto-
nicar (SANTAELLA, 2005). dêutica que são os métodos de pesquisa.

Partindo pelo princípio das formas de comunica- A esse princípio da lógica, a semiótica Piercea-
ção seja ela sonora, imagética, gestual, escrita, um na se preocupa com a percepção e interpretação do
fenômeno da natureza, entre várias outras, e tendo mundo ao redor dos indivíduos, e nesse caminho da
como conceito de linguagem como todo e qualquer percepção à interpretação. Para Pierce (2010) exis-
sistema produtor de sentido, é importante perceber tem três etapas, ou categorias, como os fenômenos
como o homem interpreta esses sistemas comunica- aparecem à consciência, chamadas de primeiridade,
tivos que estão a sua volta. Parte dos estudos sobre as secundidade e terceiridade.

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A primeiridade se dá basicamente pela percepção traços, possa substituir a anterior. (1983: p 21). Logo,
signo é tudo aquilo que gera uma representação men-
primária, pelo reconhecimento do que é apresenta-
tal (SANTAELLA, 2005, p. 21).
do, do que é percebido, é a sensação pura daquele
momento presente, daquele instante. A secundidade
Neste contexto, Santaella (2005) argumenta que
traz o que aquele signo representa, o seu significado,
quanto à relação consigo mesmo, o signo pode expres-
sua existência e materialização. Já a terceiridade é o
sar qualidade, indicar existência ou uma lei. Quando re-
pensamento intelectual, direcionado para o repertó-
presenta uma qualidade, remetendo ao seu significado
rio que os indivíduos possuem com o universo, para as
através das associações feitas pelo intérprete em cima
relações que têm com o mundo ao redor e a partir daí,
de uma qualidade, é chamado de quali-signo, exem-
interpretam o signo.
plo: a cor vermelha é utilizada para chamar atenção,
advertir um risco ou algo emergencial. Quando indica
A essa divisão, Santaella (2005, p. 42) enfatiza que
existência, ocupando lugar no tempo e espaço, intera-
“não se deve entender essas categorias como entidades
gindo e indicando outros signos existentes, é chamado
mentais, mas como modos de operação do pensamen-
de sin-signo, tendo como exemplo a fumaça, que indi-
to-signo”. Estes níveis de percepção são importantes
ca que ali há fogo. Já quando representam por meio de
para perceber como interpreta-se o que está em volta e
uma lei, são chamados de legi-signo, como a queda de
por consequência as mensagens verbais e visuais.
um corpo é regida pela lei da gravidade.
Já o estudo dos signos, fica a cargo da Gramática
Se abordado a partir da referencialidade, ou seja,
Especulativa que estuda o signo e a sua natureza, clas-
da relação do signo com o seu objeto, o signo poderá
sificando-o com base nas suas propriedades de repre-
ser um ícone, índice ou símbolo (BARDARI, 2011). O as-
sentação, naquilo a que se refere e no efeito que vem
pecto icônico apresenta uma referencialidade aberta,
a causar na mente do interpretante. “Pela qualidade,
onde os ícones têm um grau de semelhança com qua-
tudo pode ser signo, pela existência, tudo é signo, e
lidades de algum objeto (DALFORNO, 2012), quanto ao
pela lei, tudo deve ser signo” (SANTAELLA, 2002, p. 12).
aspecto indicial, Dalforno (2012) define que o índice
Para esclarecer o significado de qualquer palavra, te-
faz uma referência direta e ambígua ao seu objeto, ob-
mos que recorrer a uma outra palavra que, em alguns servando as marcas, traços e aspectos factuais.

3 SEMIÓTICA NA PUBLICIDADE
Dentre os vários campos de atuação da semiótica, dução, já que os arranjos estéticos são contempláveis,
como na linguística e no cinema, a publicidade tam- admiráveis e atraentes, e a publicidade visa enaltecer
bém se faz presente. Ela surgiu com a necessidade do as qualidades daquilo que propaga para estimular o
mercado de divulgação dos seus produtos, e começou consumo, utilizando os elementos visuais para atingir
a ser veiculada por meio das mídias sociais, a exemplo esse objetivo (SOUZA; SANTARELLI, 2008). Para ob-
da mídia impressa (jornais, folhetos, cartazes), radio- ter primeiramente uma definição de imagem, Martine
fônica e televisiva (SANTAELLA, 2002). Joly (1996, p.14) em sua obra Introdução a análise da
Imagem defende que “uma imagem seria um objeto
O uso de imagens nos discursos publicitários é segundo com relação a outro que ela representaria
presente e fundamental na tática de persuasão e se- de acordo com certas leis particulares”. A partir des-

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sa definição, Joly (1996) aproxima a interpretação da Nos anúncios e propagandas, elas são utilizadas para
imagem com os conceitos semióticos, na medida em qualificar o produto referente, em muitos casos fazen-
que a esfera visual é uma das várias formas de lingua- do alusão a outro elemento.
gem coincidindo com a definição de signo, podendo a
imagem ser um signo: Na publicidade as imagens nem sempre estão so-
zinhas, algumas peças publicitárias são substancia-
[...] em publicidade, a significação da imagem é, cer- das por meio da utilização da mensagem verbal, já
tamente, intencional: são certos atributos do produto
que formam a priori os significados da mensagem pu-
que muitas vezes a imagem por si só não consegue
blicitária, e estes significados devem ser transmitidos transmitir de forma precisa a informação, dando mar-
tão claramente quando possível; se a imagem contém gem a erros de interpretação em relação à esperada
signos, teremos certeza que, em publicidade, esses pelo anunciante. Para esse processo de significação
signos são plenos, formados com vistas a uma melhor
leitura: a mensagem publicitária é franca, ou pelo me-
da mensagem publicitária Barthes (1990) apud Souza
nos enfática (BARTHES, 1990 apud SOUZA, SANTA- & Santarelli (2008) discriminou duas funções: a de an-
RELLI, 2008, p. 4). coragem e a de revezamento. Na primeira, a imagem
só consegue ser interpretada da maneira esperada
Para transmitir a mensagem, o discurso publicitá- pelo anunciante, por meio da mensagem linguística
rio faz uso de técnicas que tendem a convencer o re- que vai atuar como apoio à imagem, reforçando o con-
ceptor de um querer-poder-fazer em relação ao que é ceito da mensagem conotada. Já na segunda, a ima-
apresentado, despertando no leitor uma necessidade gem sozinha dá margem a várias interpretações, fica
que até então não era percebida, e aguçando a busca vaga, e a mensagem linguística entra servindo como
do mesmo pelo consumo do produto. parte fundamental para chegar à mensagem conota-
da, respectivamente.
Esta indução é gerada por uma relação de iden-
tificação do consumidor com o produto, feita pelo Afinal, como dito anteriormente, uma imagem pode
enunciatário por meio de estudos sobre seu públi- conotar vários significados a depender do contexto em
co alvo, seja enaltecendo as qualidades do produto que esteja inserida, cabe à mensagem linguística situ-
ou serviço, por testemunho de terceiros, por asso- ar o leitor e orientá-lo na sua interpretação.
ciações com famosos ou estilos de vida almejados,
por criar uma sensação de credibilidade na marca, O discurso publicitário é um produto cultural com
ou até mesmo com uma função apelativa, com ver- foco na venda de produtos ou serviços, se espelhando
bos no imperativo. Em muitos casos esta persuasão na cultura e na sociedade que o produz e para a qual
encontra-se implícita na mensagem publicitária, se dirige, criando um processo de identificação entre
cabendo utilizar os estudos semióticos para não só o público alvo e a mensagem do anúncio, tonando cla-
entender as conotações e estruturas da mensagem ro os aspectos e sistemas de valores daquele meio so-
formulada, como também, perceber a produção de cial (BAGGIO, 2003, p. 4), e é com base na sua cultura
sentido evidenciada no ato publicitário. que o indivíduo faz a série de associações, chegando
a uma interpretação.
As imagens são dotadas de uma gama vasta de
significações, visto que, se utilizadas em determina- Sendo assim, é necessário analisar a mensa-
do contexto, conotam outro significado, a exemplo gem publicitária em seu contexto verbal e visual
das metáforas, que nada mais são do que elementos para não só visualizar os níveis de significação e
utilizados fora do seu significado original, mas que re- produção de sentidos inseridos, mas verificar se
metem a outro por similaridade (SANTAELLA, 2002). a mensagem elaborada irá projetar o seu objetivo

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final (o ato da compra e identificação pelo consu- sociedades para não haver uma dissociação do
midor). Desta forma, no mundo das marcas e em- sentido original, a fim de evitar a má interpreta-
presas multinacionais, é preciso rever as campa- ção, agressão à cultura local e rejeição da marca,
nhas globais antes de inseri-las em determinadas produto ou serviço naquele meio social.

4 ANÁLISE SEMIÓTICA DO ANÚNCIO MITSUBISHI


PAJERO FULL
A análise a seguir trata do anúncio da empresa Mitsu- A peça publicitária apresenta ao leitor a imagem
bishi, publicado na revista Veja (Ed. 2277), que se refere de uma mulher trajando um vestido longo, vermelho
ao veículo Pajero Full 4x4 exposto na figura 1. A escolha e esvoaçado, joias, salto alto e maquiagem elegantes,
de tal anúncio se deu pelo impacto causado por meio dos montada em um rinoceronte; no canto inferior esquer-
elementos visuais do mesmo, como fotos, cores e símbo- do, a figura do carro em si, e no canto inferior direito, a
los utilizados e dispostos, ainda que com auxílio de pouco marca da empresa. Estes elementos, segundo a análise
texto, para transmitir a mensagem de uma forma pouco dos tipos de mensagem proposta por Barthes (1990)
convencional em relação aos demais anúncios do mesmo apud Souza e Santarelli (2008) representam o nível
segmento, sem exaltar as qualidades do produto de ma- denotativo (icônico). Neste, “a mensagem denotada é a
neira explícita e direta, apelando para termos simbólicos representação pura das imagens apresentando os obje-
e recursos predominantemente visuais. tos reais da cena” (SOUZA; SANTARELLI, 2008, p. 136).

Figura 1. Anúncio Pajero Full 4x4

Fonte: Veiculado na Revista Veja (ed. 2277).

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Ao lado da imagem principal, há o texto “When Na publicidade [...] há, propositalmente pela intencio-
nalidade deste tipo de gênero discursivo, uma ideia
luxury meets the 4 x 4” (“Quando o luxo encontra o
de presente muito forte, pois as mensagens publicitá-
4x4”). Na parte inferior do anúncio, os textos “4x4 rias indicam que a hora do comercial ou de leitura do
é Mitsubishi”, “Mitsubishi Pajero Full. The car. The anúncio é a hora oportuna de você conhecer e pensar
legend.” (“Mitsubishi Pajero Full. O carro. A lenda.”). em comprar o produto.
Estes compõem a mensagem linguística, que “tem a
tarefa de ajudar na compreensão das imagens e pode Também nota-se o aspecto de anterioridade e pos-
exercer duas funções: a de ancoragem e a de reveza- terioridade da narrativa, quando o anúncio propõe que
mento” (SOUZA; SANTARELLI, 2008, p. 136). No caso o carro apresentado surge após a fusão citada anterior-
do anúncio em análise, a mensagem linguística exer- mente. Neste sentido é importante referenciar a análi-
ce função de ancoragem, pois esta “fornece uma ex- se do percurso gerativo de sentido proposta por Grei-
plicação da imagem” (SOUZA; SANTARELLI, 2008, p. mas (1973) apud Fiorin (1999), que divide a mensagem
136), além da associação e interpretação direta dos em três níveis: fundamental, narrativo e discursivo. O
signos do anúncio, o texto reforça e confirma tal inter- nível fundamental “compreende a(s) categoria(s) se-
pretação, tornando-a mais precisa para o leitor. mântica(s) que ordena(m), de maneira mais geral, os
diferentes conteúdos do texto” (FIORIN, 1999, p. 5). O
A mensagem conotada (simbólica) atribui os va- anúncio expõe de forma clara e simples as caracterís-
lores dos componentes das imagens ao veículo ao ticas contrárias do produto: luxo x potência, elegância
qual o anúncio se refere: A força e a potência de um x força, tecnológico x robusto; representadas na metá-
veículo modelo 4x4 representadas pelo rinoceron- fora da imagem principal, onde há a modelo: elegante
te, a elegância e o luxo representados pela modelo, e delicada; e o rinoceronte: animal selvagem forte e ro-
a junção dos dois em um único produto perceptível busto. Este corresponde ao seu nível fundamental.
pela junção física de ambos na imagem, a mensa-
gem verbal e a singela aparição do carro no canto Já no nível narrativo ocorre a transformação de es-
do anúncio. tado, como define Fiorin (1999, p. 7) “A transformação
é, por conseguinte, a mudança da relação entre sujei-
Esta propaganda tem o foco na união de duas to e objeto”. No anúncio, essa mudança de estado é
ideias contrárias, na dualidade entre o luxo e a força percebida no texto “Quando o luxo encontra o 4x4”,
reforçadas por meio dos “signos linguísticos” (JOLY, tendo como estado inicial carros “simples e comuns”,
1996). Esta relação de características opostas que no entanto, após essa transformação, há a fusão do
se concentra em um único produto é expressa pelo luxuoso e do potente, tornando nítido o surgimento de
texto “Quando o luxo encontra o 4x4”, e representa- um novo objeto no estado final da narrativa.
da pela modelo montada no animal, dando a ele um
ponto de vista positivo em relação às suas qualida- Quanto ao nível discursivo, “é aquele em que se
des e funções, o que é indicado pelo texto “O car- revestem as estruturas narrativas abstratas” (FIORIN,
ro. A lenda”, o que dá um ar supremo e lendário ao 1999, p. 9). Após a transformação, há o surgimento de
veículo. Apesar do aspecto atemporal da imagem, um carro inédito que une características que antes
e de não ter qualquer tipo de referência ao tempo estavam segregadas. Percebe-se então que, no esta-
físico, o tempo da narrativa se dá no presente, no do inicial da narrativa, existiam carros com apenas
momento descrito pelo texto em que “o luxo encon- parte das características que foram somadas no novo,
tra o 4x4”. O tempo no presente é algo comum no sendo esses apenas luxuosos ou apenas veículos com
segmento publicitário, como define Trindade e Bar- tração nas quatro rodas, e que por isso, o produto se
bosa (2006, p. 8): torna inédito e revolucionário.

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Associada a esses elementos, a descrição do pro- sim de um termo a uma ‘imagem acústica’” (GENTIL,
duto é feita, de uma forma geral, por todos os elemen- 2006, p.2), sendo esta “a representação natural da
tos do anúncio: verbal e visual. Já a predicação fica a palavra, como facto virtual da língua. [...] A marca
cargo da imagem principal e do texto no canto inferior psíquica desse som” (SAUSSURE, 1916 apud GEN-
direito “O carro. A lenda”, que enaltecem as qualida- TIL, 2006). Quando feita a leitura do texto “Quando
des do carro. A avaliação pode ser vista no texto “Se a luxúria encontra o 4x4”, o leitor automaticamente
beber, não dirija”, na parte inferior do anúncio, e a remete à imagem da modelo as características da
persuasão está principalmente na imagem principal, luxúria e ao rinoceronte as características do 4x4,
pelo impacto das cores, dos signos expostos nela, a fazendo destas as imagens acústicas dos termos,
sua relação com o texto e a interpretação que o con- aos quais o anúncio concebe seus próprios concei-
sumidor faz do anúncio como um todo. tos. Há também a alusão do símbolo da marca ao
“x” do termo “4x4” no escrito “4x4 é Mitsubishi”, na
O consumidor, através de tal interpretação, se sen- parte inferior do anúncio. Se utilizando da forma da
te atraído e deseja ter um carro lendário, luxuoso e marca, o anúncio a insere no termo, transmitindo
potente, mas ao mesmo tempo o anúncio cria uma a sensação de credibilidade e qualidade, por repre-
segmentação de público, tornando evidente a possibi- sentar que a marca é pioneira e confiável quando se
lidade de possuir o veículo acessível somente àqueles trata de veículos 4x4.
que possuem boas condições financeiras.
É necessário ressaltar que na mensagem
A escolha dos signos presentes no anúncio foi de linguística é exposta a segmentação de público,
suma importância para transmitir a mensagem, já que notável em vários pontos do anúncio. O uso de um
o mesmo conta com recursos predominantemente vi- idioma diferente da língua-mãe (o inglês) no texto
suais. Sendo assim é importante analisar os signos requer um conhecimento prévio de tal língua para
plásticos composto na mensagem verbal divididos em melhor interpretação por parte do leitor, ainda que
forma, cor, enquadramento, entre outros elementos a parte textual se utilize de cognatos (luxury – luxo;
propostos por Joly (1996) quando analisada a ima- car – carro; legend - lenda) e que a imagem, mesmo
gem. O novo significado que cada um dos signos vi- isolada, tenha um bom poder de compreensão.
suais recebem se dá pelo contexto no qual estão in-
seridos. A mulher bem vestida, com vestido vermelho Há também a forte menção de valor, reforçado
(cor que representa a sedução e o luxo), remetendo pela imagem. Devido a isso, e por se tratar de um
a luxúria evidenciado pela angulação centralizada do veículo luxuoso, potente e com todos os recursos de
anúncio e pelas representações gráficas. O consumi- design e tecnologia, o consumidor sabe que o mesmo
dor interpreta, através da imagem, o conceito da ele- custa caro, mesmo não estando explícito no anúncio
gância, luxo e poder enfatizados pelos signos icônicos seu valor de mercado exato. Isso traz ao consumidor a
Joly (1996). Já o animal escolhido, o rinoceronte, em possibilidade de constatação ou elevação do seu sta-
que a modelo está montada, concede ao leitor o signi- tus social, pois utilizar um objeto (no caso deste, um
ficado de força, robustez e potência e principalmente veículo) caro, retrata uma boa e confortável condição
a singularidade do produto. financeira. Esta postura de pertencimento, expos-
ta na estrutura narrativa faz com que o consumidor
A junção dos dois elementos em uma imagem só tenha não só um produto, mas uma ferramenta opo-
passa o significado de soma de valores. Neste mo- nente, poderosa, referenciado por meio da mensagem
mento se dá o processo de significação, e este “não linguística, icônica e plástica como um produto inova-
se trata de relacionar um objeto a um conceito, mas dor, revolucionário e lendário.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir desta breve análise circunstanciada pelas rada, compõem uma teia de associações na mente
teorias dos semióticos Pierce, Barthes, Joly e Grei- do leitor, e juntos tecem uma comunicação. Tal dis-
mas, é possível perceber como a produção de sentido posição dos elementos deve ser estudada a fim de
na mensagem publicitária é evidenciada e como a ela- estabelecer uma coerência no anúncio publicitário,
boração textual e visual podem afetar o enunciatário sendo necessário recorrer à semiótica e seus estudos
de forma a persuadir e provocar efeitos de significa- sobre sistemas produtores de sentido e percurso de
ção em um simples ato de venda. Todos os elementos interpretação, obtendo-se então uma vasta gama de
dispostos num anúncio são dotados de significação, signos e representações para poder construir uma
sejam estes referentes à sua essência real ou figu- mensagem.

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história da análise da imagem no anúncio publici- TRINDADE, Eneus; BARBOSA, Ivan Santo (2006). Re-
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1 Graduando do Curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Tira-


dentes, UNIT/SE. E-email: italovc2007@gmail.com
Recebido em: 9 de Agosto de 2013
Avaliado em: 15 de Setembro de 2013 2 Mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade do Minho – Portu-
Aprovado em: 24 de Setembro de 2013 gal , Professora dos Cursos de Comunicação Social – Jornalismo e Publici-
dade e Propaganda, UNIT/SE. E-mail: talitadeda@hotmail.com

Interfaces Científicas - Humanas e Sociais • Aracaju • V.2 • N.2 • p. 45 - 54 • Fev. 2014

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